Nascido na cidade de Denguin, Frana, no dia
primeiro de agosto de 1930, proveniente de uma
famlia campesina.
Ao completar seus estudos bsicos, mudou-se para
Paris, onde estudou na Faculdade de Letras aos 21
anos de idade.
Em 1954, Pierre Bourdieu formou-se em Filosofia e
iniciou sua vida profissional como professor em
Moulins.
Sua carreira sofreu uma interrupo em funo do
servio militar obrigatrio que o enviou para a
Arglia. Aproveitando-se do deslocamento, assumiu
o cargo de professor na Faculdade de Letras da
capital do pas, Argel.
Em 1993 recebe a Medalha de Ouro CNRS (Centre National de la Recherche
Scientifique), um dos mais importante smbolos de reconhecimento conferidos
pela comunidade cientfica francesa.
Morre em Paris ao dia 23 de janeiro de 2002.
Bourdieu
rejeitava
a
dicotomia
subjetivismo/objetivismo nas cincias humanas.
Anlise de como os indivduos incorporam a estrutura social,
legitimando-a e reproduzindo-a.
At meados do sculo XX predominava nas Cincias Sociais e mesmo no
senso-comum uma viso extremamente otimista.
Atribua escolarizao um papel central no duplo processo de superao
do atraso econmico, do autoritarismo e dos privilgios.
Escola pblica e gratuita: resolviria o problema do acesso educao e a
igualdade de oportunidades entre todos os cidados.
Os indivduos competiriam dentro do sistema de ensino, em
condies
iguais, e aqueles que se destacassem por seus dons individuais seriam
levados a avanar em suas carreiras escolares e, posteriormente, a ocupar
as posies superiores na hierarquia social.
A escola seria, nessa perspectiva, uma instituio neutra, que difundiria um
conhecimento racional e objetivo e que selecionaria seus alunos com base
em critrios racionais.
Nos anos 60 uma crise profunda dessa concepo de
escola e uma reinterpretao radical do papel dos sistemas
de ensino na sociedade.
Pessimismo.
No final dos anos 50: Pesquisas quantitativas patrocinadas
pelos governos ingls, americano e francs mostraram o
peso da origem social sobre os destinos escolares.
Efeitos inesperados da massificao do ensino: frustrao
dos estudantes.
Bourdieu oferece-nos um novo modo de interpretao da escola e da
educao que, pelo menos num primeiro momento, pareceu ser
capaz de explicar tudo o que a perspectiva anterior no conseguia.
Onde se via igualdade de oportunidades, meritocracia, justia social,
Bourdieu passa a ver reproduo e legitimao das desigualdades
sociais.
A educao perde o papel que lhe fora atribudo de instncia
transformadora e democratizadora das sociedades e passa a ser vista
como uma das principais instituies por meio da qual se mantm e
se legitimam os privilgios sociais.
Sucesso escolar: no poderia ser explicado por seus dons
pessoais, mas por sua origem social
A escola no seria uma instituio imparcial que seleciona
os mais talentosos a partir de critrios objetivos.
Bourdieu
questiona a neutralidade da escola e do
conhecimento escolar: o que essa instituio representa e
cobra dos alunos so, basicamente, os gostos, as crenas,
as posturas e os valores dos grupos dominantes.
A escola teria, assim, um papel ativo ao definir seu
currculo, seus mtodos de ensino e suas formas de
avaliao no processo social de reproduo das
desigualdades sociais.
O indivduo em Bourdieu: Os gostos mais ntimos, as
preferncias, as aptides, as posturas corporais, a
entonao de voz, as aspiraes relativas ao futuro
profissional, tudo seria socialmente constitudo.
A ao das estruturas sociais sobre o comportamento
individual: se d preponderantemente de dentro para fora
e no o inverso.
A partir de sua socializao que corresponde a uma
posio especfica na estrutura social, os indivduos
incorporariam um conjunto de disposies para a ao
tpica dessa posio e que passaria a conduzi-los ao longo
do tempo e nos mais variados ambientes de ao.
Normas
e constrangimentos: no operariam como
entidades reificadas que agem diretamente de fora para
dentro, sobre o comportamento individual.
Em poucas palavras, a estrutura social conduziria as aes
individuais e tenderia a se reproduzir atravs delas, mas
esse processo no seria rgido, direto ou mecnico.
A Sociologia da Educao de Bourdieu se notabiliza pela
diminuio que promove do peso do fator econmico,
comparativamente ao cultural, na explicao das
desigualdades escolares.
Do ponto de vista de Bourdieu, o capital cultural constitui o
elemento da bagagem familiar que teria o maior impacto
na definio do destino escolar.
Conjunto de qualificaes intelectuais produzidas pelo sistema
escola e pela famlia.
Existe sob trs formas:
A) Estado incorporado: disposio duradoura do corpo (facilidade
de se expressar em pblico, domnio da nguagem);
B) Estado Objetivo: posse de bens culturais (quadros, livros,
instrumentos...)
C) Estado Institucionalizado: socialmente sancionado por instituies
(ttulos escolares)
A posse de capital cultural favoreceria o desempenho escolar na
medida em que facilitaria a aprendizagem dos contedos e cdigos
escolares.
As referncias culturais, os conhecimentos considerados legtimos e
o domnio maior ou menor da lngua culta, trazidos de casa por certas
crianas, facilitariam o aprendizado escolar na medida em que
funcionariam como uma ponte entre o mundo familiar e a cultura
escolar.
Cobra-se que os alunos tenham um estilo elegante de falar, de
escrever e at mesmo de se comportar, etc.
Essas exigncias s podem ser plenamente atendidas por quem foi
previamente (na famlia) socializado nesses mesmos valores.
Conjunto
de contatos, relaes, amizades, relaes
socialmente teis que podem ser usados por indivduos e
grupos durante sua trajetria profissional e social.
O capital econmico e o social funcionariam, na verdade,
na maior parte das vezes, apenas como meios auxiliares na
acumulao do capital cultural.
A bagagem herdada por cada indivduo no poderia ser entendida como
um conjunto mais ou menos rentvel de capitais que cada indivduo utiliza
a partir de critrios definidos de modo idiossincrtico.
Dada a posio do grupo no espao social e, portanto, de acordo com o
volume e os tipos de capitais (econmico, social, cultural) possudos por
seus membros, certas estratgias de ao seriam mais seguras e rentveis e
outras seriam mais arriscadas.
Os grupos sociais constituem uma estimativa de suas chances objetivas no
universo escolar e passam
investimentos a essas chances.
adequar,
inconscientemente,
seus
Concretamente, isso significa que os membros de cada grupo social
tendero a investir uma parcela maior ou menor dos seus esforos
medidos em termos de tempo, dedicao e recursos financeiros na
carreira escolar dos seus filhos, conforme percebam serem maiores ou
menores as probabilidades de xito.
Classes populares: pobre em capital econmico e cultural,
tenderia a investir de modo moderado no sistema de
ensino. Em resumo, o investimento no mercado escolar
tenderia a oferecer um retorno baixo, incerto e a longo
prazo.
Classes
mdias: tenderiam a investir pesada e
sistematicamente na escolarizao dos filhos. Pelas
chances objetivamente superiores (dos filhos das classes
mdias alcanarem o sucesso escolar).
Elites: Esses grupos investiriam pesadamente na escola,
porm, de uma forma bem mais descontrada do que as
classes mdias. O sucesso escolar no caso dessas famlias
tido como algo natural, que no depende de um grande
esforo de mobilizao familiar.
A reproduo (1970): existem relaes entre o sistema de ensino e a
estrutura das relaes entre as classes.
A escola e o trabalho pedaggico por ela desenvolvido s poderiam
ser compreendidos, na perspectiva de
Bourdieu, quando
relacionados ao sistema das relaes entre as classes.
A escola no seria uma instncia neutra que transmitiria uma forma
de conhecimento intrinsecamente superior e que avaliaria os alunos a
partir de critrios universalistas, mas, ao contrrio, seria uma
instituio a servio da reproduo e legitimao da dominao
exercida pelas classes dominantes.
O ponto de partida do raciocnio de Bourdieu talvez se encontre
na noo de arbitrrio cultural.
Bourdieu se aproxima aqui de uma concepo antropolgica de
cultura: nenhuma cultura pode ser objetivamente definida como
superior a nenhuma outra.
Os valores que orientariam cada grupo em suas atitudes e
comportamentos seriam, por definio, arbitrrios, no estariam
fundamentados em nenhuma razo objetiva, universal.
Apesar de arbitrrios, esses valores ou seja, a cultura de cada
grupo seriam vividos como os nicos possveis ou, pelo
menos, como os nicos legtimos.
A cultura consagrada e transmitida pela escola no seria
objetivamente superior a nenhuma outra.
O valor que lhe concedido seria arbitrrio, no estaria
fundamentado
inquestionvel.
em
nenhuma
verdade
objetiva,
Apesar de arbitrria, a cultura escolar seria socialmente
reconhecida como a cultura legtima, como a nica
universalmente vlida.
Como tais arbitrrios so considerados como universais?
Isso s pode ser compreendido quando se considera a
relarelaes de fora entre os grupos ou classes sociais o
entre os vrios arbitrrios em disputa em uma determinada
sociedade e as presentes nessa mesma sociedade.
No caso das sociedades de classes, a capacidade de
legitimao de um arbitrrio cultural corresponderia
fora da classe social que o sustenta.
Para Bourdieu, portanto, a cultura escolar, socialmente
legitimada, seria, basicamente, a cultura imposta como
legtima pelas classes dominantes.
Se assim, como possvel que tais arbitrrios sejam
aceitos?
A autoridade pedaggica, ou seja, a legitimidade da
instituio escolar e da ao pedaggica que nela se
exerce, s pode ser garantida na medida em que o carter
arbitrrio e socialmente imposto da cultura escolar
dissimulado.
A autoridade alcanada por uma ao pedaggica seriam
proporcionais sua capacidade de se apresentar como no
arbitrria e no vinculada a nenhuma classe social.
Uma vez reconhecida como legtima a escola passa a
poder exercer, livre de qualquer suspeita, suas funes de
reproduo e legitimao das desigualdades sociais.
para que sejam favorecidos os mais favorecidos e
desfavorecidos os mais desfavorecidos, necessrio e
suficiente que a escola ignore, no mbito dos contedos do
ensino que transmite, dos mtodos e tcnicas de transmisso e
dos critrios de avaliao, as desigualdades culturais entre as
crianas das diferentes classes sociais. Pierre Bourdieu
Tratando formalmente de modo igual, em direitos e
deveres, quem diferente, a escola privilegiaria,
dissimuladamente, quem, por sua bagagem familiar, j
privilegiado.
Bourdieu
compreende a relao de comunicao
pedaggica (o ensino) como uma relao formalmente
igualitria, que reproduz e legitima, no entanto,
desigualdades anteriores.
rentabilidade de uma relao de comunicao
pedaggica, ou seja, o grau em que ela compreendida e
assimilada pelos alunos, dependeria do grau em que os
alunos dominam o cdigo necessrio decifrao dessa
comunicao.
Para Bourdieu, esse domnio variaria de acordo com a
maior ou menor distncia existente entre o arbitrrio
cultural apresentado pela escola como cultura legtima e a
cultura familiar de origem dos alunos.
Para os alunos das classes dominantes, a cultura escolar
seria a sua prpria cultura, reelaborada e sistematizada.
Para os demais, seria uma cultura estrangeira.
Bourdieu observa que a comunicao pedaggica exige
implicitamente o domnio prvio de um conjunto de
habilidades e referncias culturais e lingsticas que apenas
os membros das classes mais cultivadas possuiriam.
Ao dissimular que sua cultura a cultura das classes
dominantes, a escola dissimula igualmente os efeitos que
isso tem para o sucesso escolar das classes dominantes.
As
diferenas nos resultados escolares dos alunos
tenderiam a ser vistas como diferenas de capacidade
(dons desiguais) enquanto, na realidade, decorreriam da
maior ou menor proximidade entre a cultura escolar e a
cultura familiar do aluno.
A escola cumpriria, assim, portanto, simultaneamente, sua
funo de reproduo e de legitimao das desigualdades
sociais.
O efeito de legitimao provocado pela dissimulao das
bases sociais do sucesso escolar duplo: manifestar-se-ia
em relao tanto aos filhos das camadas dominantes
quanto dominadas.
Os primeiros: suas disposies e aptides culturais e
lingsticas pareceriam ser naturais, fazer parte de sua
prpria personalidade.
O segundo: tenderia a atribuir suas dificuldades escolares
a uma inferioridade que lhes seria inerente, definida em
termos intelectuais (falta de inteligncia) ou morais
(fraqueza de vontade).
Bourdieu ressalta que em relao s camadas dominadas, o
maior efeito da violncia simblica exercida pela escola
no a perda da cultura familiar e a inculcao de uma
nova cultura exgena, mas o reconhecimento, por parte dos
membros dessa camada, da superioridade e legitimidade
da cultura dominante.
Esse reconhecimento se traduziria numa desvalorizao do
saber e do saber-fazer tradicionais por exemplo, da
medicina, da arte e da linguagem populares, em favor do
saber e do saber-fazer socialmente legitimados
Violncia no percebida, fundada sobre o
reconhecimento, obtida por um trabalho de inculcao
da legitimidade dos dominantes sobre os dominados e
que assegura a permanncia da dominao.
A reproduo e legitimao das desigualdades
sociais propiciada pela escola no resultariam
apenas, no entanto, da falta de uma bagagem
cultural apropriada para a recepo da mensagem
escolar.
Bourdieu procura demonstrar que a escola valoriza
e cobra no apenas o domnio de um conjunto de
referncias culturais e lingsticas, mas, tambm,
um modo especfico de se relacionar com a cultura e
o saber.
O sistema escolar tenderia a reproduzir a distino entre
dois modos bsicos de se relacionar com a cultura:
A) um primeiro, desvalorizado, se caracterizaria pela figura
do aluno esforado, estudioso, que busca compensar sua
distncia em relao cultura legtima por meio de uma
dedicao tenaz s atividades escolares;
B) um segundo, valorizado, representado pelo aluno tido
como brilhante, talentoso, inteligente, muitas vezes
precoce, que atende s exigncias da escola sem
demonstrar traos de um esforo laborioso ou tenso.
O sistema de ensino, sobretudo nos seus ramos mais
elevados, valorizaria e cobraria dos alunos essa segunda
postura. Bourdieu observa que nas avaliaes formais ou
informais (particularmente nas provas orais) exige-se dos
alunos muito mais do que o domnio do contedo
transmitido.
Exige-se uma destreza verbal e um brilho no trato com o
saber e a cultura que somente aqueles que tm
familiaridade com a cultura dominante podem oferecer.
Essa naturalidade no seria reconhecida pela escola, no
entanto, como algo socialmente herdado.
Tenderia a ser interpretada como manifestao de uma
facilidade inata, de uma vocao natural para as atividades
intelectuais.
A escola valorizaria um modo de relao com o saber e a
cultura que apenas os filhos das classes dominantes, dado
o seu processo de socializao familiar, poderiam exibir.
Valorizar-se-ia
uma desenvoltura intelectual, uma
elegncia verbal, uma familiaridade com a lngua e com a
cultura legtima, que, por definio, no poderiam ser
adquiridos exclusivamente pela aprendizagem escolar.
Em
poucas palavras: a cultura dominante, o modo
dominante de lidar com a cultura, valorizado pela escola,
usado como critrio de avaliao e hierarquizao dos
alunos e, ao mesmo tempo, negado, dissimulado. Os alunos
oficialmente estariam sendo julgados, exclusivamente, por
suas habilidades naturais.
Sinteticamente, possvel dizer que as reflexes de
Bourdieu sobre a escola partem da constatao de uma
correlao entre as desigualdades sociais e escolares.
Segundo ele, por mais que se democratize o acesso ao
ensino por meio da escola pblica e gratuita, continuar
existindo uma forte correlao entre as desigualdades
sociais, sobretudo, culturais, e as desigualdades ou
hierarquias internas ao sistema de ensino.
Em resumo, a grande contribuio de Bourdieu para a
compreenso sociolgica da escola foi a de ter ressaltado que
essa instituio no neutra.
Formalmente, a escola trataria a todos de modo igual, todos
assistiriam s mesmas aulas, seriam submetidos s mesmas
formas de avaliao, obedeceriam s mesmas regras e,
portanto, supostamente, teriam as mesmas chances.
Bourdieu mostra que, na verdade, as chances so desiguais.
Alguns estariam numa condio mais favorvel do que outros
para atenderem s exigncias, muitas vezes implcitas, da
escola.
Ao sublinhar que a cultura escolar a cultura dominante
dissimulada, Bourdieu abre caminho para uma anlise mais
crtica do currculo, dos mtodos pedaggicos e da
avaliao escolar.
Os contedos curriculares seriam selecionados em funo
dos conhecimentos, dos valores, e dos interesses das
classes dominantes.
O prprio prestgio de cada disciplina acadmica estaria
associado a sua maior ou menor afinidade com as
habilidades valorizadas pela elite cultural.
Finalmente, a avaliao dos professores iria muito
alm da simples verificao do aprendizado,
constituindo, na prtica, um verdadeiro julgamento
social, baseado na maior ou menor discrepncia do
aluno em relao s atitudes e comportamentos
valorizados pelas classes dominantes.
A escola, sobretudo nos seus trabalhos produzidos at os
anos 70, apresentada como uma instituio totalmente
subordinada aos interesses de reproduo e legitimao
das classes dominantes.
Os contedos transmitidos, os mtodos pedaggicos, as
formas de avaliao, tudo seria organizado em benefcio da
perpetuao da dominao social.
As escolas e os prprios professores, dentro delas, no
seriam todos iguais. H variaes no modo de organizao
da escola, nos princpios pedaggicos adotados, nos
critrios de avaliao etc. No se pode desprezar o efeito
dessas variveis no desempenho escolar dos alunos.
Parece claro, por exemplo, que as vrias iniciativas que buscam
promover uma aproximao mais respeitosa entre a cultura escolar e
a cultura de origem dos alunos organizando o ensino a partir dos
conhecimentos anteriores trazidos pelos alunos, respeitando e
valorizando os modos de fala e as tradies de cada grupo social etc.
podem, no mnimo, adiar o processo de eliminao ou autoeliminao (desistncia) dos alunos.
No plano macrossocial das relaes entre as classes, Bourdieu tem
boas razes para ser pessimista. Essa anlise, no entanto, no pode
ser transposta diretamente para o plano microssociolgico. Existem
diferenas significativas no modo como cada escola e ou professor
participa desse processo de reproduo social. Essas diferenas
foram, em grande medida, negligenciadas por Bourdieu.