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Fernando Pessoa

Poemas Fernando Pessoa

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Fernando Pessoa Fonte: http:/Avmw.secrel.com. br/jpoesia/fpesso.htm| Navegar é Preciso Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa: "Navegar 6 preciso; viver nao é preciso”. Quero para mim o espirito [dJesta frase, transformada a forma para a casar como eu sou: Viver nao é necessario; 0 que é necessario ¢ criar. Nao conto gozar a minha vida; nem em gozi-la penso. Sé quero torna-la grande, ainda que para isso tenha de ser 0 meu corpo e a (minha alma) a lenha desse fogo. S6 quero tornd-ta de toda a humanidade; ainda que para isso tenha de a perder como minha. Cada vez mals assim penso. Cada vez mais ponho da esséncla animica do meu sangue © propésito impessoal de engrandecer a patria e contribuir para a evolugao da humanidade. FE a forma que em mim tomou 0 misticismo da nossa Raga. [Nota de SF "Navigare necesse; vivere non est necesse" - latin, frase de Pompeu, general romano, 106-48 aC. dita aos marinheiros, amedrontados, que recusavam vigjar durante a guerra, of. Plutarco, in Vida de Pompeu] Tudo quanto penso Tudo quanto penso, ‘Tudo quanto sou E um deserto imenso Onde nem eu estou. Extensao parada Sem nada a estar ali, Areia peneirada Vou dar-Ihe a ferroada Da vida que vivi. Vendaval O vento do norte, tao fundo e tao frio, Nio achas, soprando por tanta solidao, Deserto, penhasco, coval mais vazio Que o meu coracio! Indémita praia, que a raiva do oceano Faz louco lugar, caverna sem fim, Nio sio tao deixados do alegre e do humano ‘Como a alma que ha em mim! Mas dura planieie, praia atra em fereza, S6 tém a tristeza que a gente Ihes vé E nisto que em mim é vacuo e tristeza E 0 visto 0 que vé. Ah, migoa de ter consciéncia da vida! Tu, vento do norte, teimoso, iracundo, Que rasgas os robles — teu pulso divida Minh'alma do mundo! Ah, se, como levas as folhas ¢ a arela, Aalma que tenho pudesses levar - Fosse pr'onde fosse, pra longe da idéia De cu ter que pensar! Abismo da noite, da chuya, do vento, Mar torvo do caos que parece volver - Porque é que nao entras no meu penssamento Para cle morrer? Horror de ser sempre com vida a conseiéncia! Horror de sentir a alma sempre a pensar! Arranca-me, é vento; do chiio da existéncia, De ser um lugar! E, pela alta noite que fazes mais'scura, Pelo caos furioso que crias no mundo, Dissolve em areia esta minha amargura, Meu tédio profundo. E contra as vidragas dos que ha que tém lares, Telhados daqueles que tém razio, Atira, ja paria desfeito dos ares, O meu coracio! Meu coragio triste, meu coragio ermo, Tornado a substincia dispersa e negada Do vento sem forma, da noite sem termo, Do abismo e do nada! Nao sei quantas almas tenho Nio sei quantas almas tenho. Cada momento mudei. Continuamente me estranho. Nunca me vi nem acabei. De tanto ser, s6 tenho alma. Quem tem alma nio tem calma. Quem vé és6 0 que vé, Quem sente nao é quem 6, Atento ao que sou ¢ vejo, Torno-me eles e nao eu. Cada meu sonho ou desejo E do que nasce e nao meu. Sou minha propria paisagem; Assisto 4 minha passagem, Diverso, mobil e s6, Nao sei sentir-me onde estou. Por isso, alhelo, vou lendo Como paginas, meu ser. O que sogue nao prevendo, © que passou a esquecer. Noto a margem do que li O que julguei que senti. Releio e digo: "Fui eu 2" Deus sabe, porque o escreveu. Quinto Império Vibra, clarim, cuja voz diz. Que outrora ergueste 0 grito real Por D. Joao, Mestre de Aviz, E Portugal! Vibra, grita aquele hausto fundo Com que impeliste, como um remo, Em EL-Rei D. J Segundo O Império extremo! Vibra, sem lei ou com lei, ‘Como aclamaste outrora em vio O morto que hoje ¢ vivo — EL-Rei D. Sebastiio! Vibra chamando, e aqui convoca O inteiro exéreito fadado Cuja extensio os pélos toca Do mundo dado! Aquele exército que é feito Do quanto em Portugal é 0 mundo Eenche este mundo vasto e estreito De ser profundo. Para a obra que ha que prometer Ao nosso esforco alado em si, Convoco todos sem saber Ea Hora!) aqui! Os que, soldados da alta glé Deram batalhas com um nome, E de cuia alma a voz da historia Tem sede e fome. E 0s que, pequenos e mesquinhos, No ver e crer da externa sorte, Convoco todos sem saber Com vida e morte. Sim, estes, os plebeus do Império; Heréis sem ter para quem 0 ser, Chama-os aqui, 6 som etéreo Que vibra a arder! E, se o futuro é ja presente Na visio de quem sabe ver, Convoca aqui eternamente Os que ho de ser! Todos, todos! A hora passa, O génio colhe-a quando vai. Vibra! Forma outra ea mesma raca Da que se esvai. A todos, todos, feitos num Que é Portugal, sem lei nem fim, Convoca, ¢, erguendo-os um a um, Vibra, clarim! E outros, e outros, gente varia, Oculta neste mundo misto. Seu peito atrai, rubra e templaria, A Cruz de Cristo. Glosam, secretos, altos motes, Dados no idioma do Mistério — Soldados no, mas sacerdotes, Do Quinto império. Aquit Aqui! Todos que sao. © Portugal que é tudo em si, Venham do abismo ou da ilusio, Todos aquit Armada intérmina surgindo, Sobre ondas de uma vida estranha, Do que por haver ou do que é vindo — E 0 mesmo: venha! ‘Vos nao soubesses 0 que havia No fundo incégnito da raga, Nem como a Mio, que tudo guia, Seus planos traca. ‘Mas um instinto involuntario, Um impeto de Portugal, Encheu vosso destino vario De um dom fatal, De um rasgo de ir além de tudo, De passar para além de Deus, E, abandonando 0 Gladio e 0 escudo, Galgar os céus. Titas de Cristo! Cavaleiros De uma cruzada além dos astros, De que esses astros, aos milheiros, Sao 86 0s rastros. Vibra, estandarte feito som, No ar do mundo que ha de se Nada pequeno ¢ justo e bom. Vibra a veneer! Transcende a Grécia e a sua historia Que em nosso sangue continua! Deixa atras Roma ea sua gloria Ea Igreja sua! Depois transcende esse furor Ea todos chama ao mundo visto. Hereges por um Deus maior E um novo Cristo! Vinde aqui todos os que sois, Sabendo-o bem, sabendo-o mal, Poetas, ou Santos ou Herdis De Portugal. Ni foi para servos que nascemos De Grécla ou Roma ou de ninguém. Tudo negamos e esquecemos: Fomos para além. Vibra, clarim, mais alto! Vibra! Grita a nossa dinsia ja ciente Que o seu inteiro véo libra De poente a oriente. Vibra, clarim! A todos chama! Vibra! E tu mesmo, voz a arder, 0 Portugal de Deus proclama Com o fazer! 0 Portugal feito Universo, Que retine, sob amplos céus, O corpo andnimo e disperso De Osirls, Deus. © Portugal que se levanta Do fundo surdo do Destino, FE, como a Grécia, obscuro canta Baco divino. Aquele inteiro Portugal, Que, universal perante a Cruz, Reza, ante a Cruz universal, Do Deus Jesus. Para Além Doutro Oceano de C[oelho] Pacheco Num sentimento de febre de ser para além doutro oceano Houve posigdes dum viver mais claro e mais limpido E aparéncias duma cidade de seres Nio irreais mas lividos de impossibilidade, consagrados em pureza ¢ em nudez Fui portico desta visdo irrita e os sentimentos eram s6 0 desejo de os ter A nogio das coisas fora de si, tinha-as cada um adentro Todos viviam na vida dos restantes Ea manelra de sentir estava no modo de se viver Mas a forma daqueles rostos tinha a placidez do orvalho A nudez era um silencio de formas sem modo de ser E houve pasmos de toda a realidade ser 6 isto Mas a vida era a vida e sé era a vida ‘O meu pensamento muitas vezes trabalha silenciosamente Com a mesma dogura duma maquina untada que se move sem fazer barulho Sinto-me bem quando ela assim vai e ponho-me imével Para nio desmanchar 0 equilibrio que me faz t@-Lo desse modo Pressinto que é nesses momentos que o meu pensamento é claro Mas eu no 0 oico ¢ silencioso ele trabalha sempre de mansinho Como uma maquina untada movida por uma correia E nao posso ouvir sendo o deslizar sereno das pecas que trabalham Eu lembro-me as vezes de que todas as outras pessoas devem sentir isto como eu Mas dizem que thes déi a cabeca ou sentem tonturas Esta lembranga veio-me como me podia vir outra qualquer ‘Como por exemplo a de que eles nao sentem esse deslizar E no pensam em que 0 nao sentem Neste saldio antigo em que as panéplias de armas cinzentas Sao a forma dum areaboigo em que ha sinais doutras eras Passeio o meu olhar materializado e destaco de escondido nas armaduras, Aquele segredo de alma que é a causa de eu viver Se fito na panplia o olhar mortificado em que ha desejos de nao ver Toda a estrutura férrea desse arcaboico que eu pressinto nao sei por qué Se apossa do meu senti-la como um claro de lucidez Hi som no serem iguais dois elmos que me escutam A sombra das langas de ser nitida marca a indecisao das palavras Disticos de incerteza bailam incessantemente sobre mim Oigo ja as coroagies de herdis que hao de celebrar-me E sobre este vicio de sentir encontro-me nos mesmos espasmos Da mesma poeira cinzenta das armas em que ha sinais doutras eras Quando entro numa sala grande e nua 4 hora do crepisculo E que tudo ¢ siléncio ela tem para mim a estrutura duma alma E vaga e poeirenta e os meus passos tém ecos estranhos ‘Como os que ecoam na minha alma quando eu ando Por suas janelas tristes, entra a luz adormecida de la de fora E projeta na parede escura em frente as sombras e as penumbras ‘Uma sala grande e vazia é uma alma silenciosa Eas correntes de ar que levantam po so os pensamentos Um rebanho de ovelhas, é uma coisa triste Porque Ihe nao, devemos poder associar outras idéias que nao sejam tristes E porque assim é e sé porque assim é porque é verdade Que devemos associar idéias tristes a um rebanho de ovelhas Por esta razo e $6 por esta razao é que as ovelhas sao realmente tristes Eu roubo por prazer quando me dao um objeto de valor E eu dou em troca uns bocados de metal. Esta idéia nao é comum nem banal Porque eu encaro-a de modo diferente ¢ no ha relagio entre um metal ¢ outro objeto Se eu fosse comprar lato e desse aleachofras prendiam-me Eu gostava de ouvir qualquer pessoa expor e explicar © modo como se pode deixar de pensar em que se pensa que se faz uma coisa E assim perderia o receio que tenho de que um dia venha a saber Que o pensar eu em coisas e no pensar nao passa duma coisa material e perfeita A posigao dum corpo nao é indiferente para 0 seu equilibrio E aesfera nao é um corpo porque no tem forma Se é assim e se todos ouvimos um som em qualquer posigio Infiro que ele nao deve ser um corpo ‘Mas os que sabem por intuico que o som no é um corpo Nao seguiram o meu raciocinio e essa nogao assim nio lhes serve para nada Quando me lembro que ha pessoas que jogam as palavras para fazerem espirito E se riem por isso e contam casos particulares da vida de cada um. Para assim se desenfastiarem e que acham graca aos palhagos de circo E se incomodam por Ihes cair uma nédoa de azeite no fato novo to-me feliz por haver tanta coisa que eu nao compreendo Na arte de cada operario vejo toda uma geracio a esbater-se E por isso eu nao compreendo arte nenhuma e vejo essa geracao operario no vé na sua arte nada duma geracio E por isso ele é operario e conhece a sua arte O meu fisico é muitas vezes causa de eu me amargurar Eu sei que sou uma coisa a porque no sou diferente de uma coisa qualquer Sei que as outras coisas serao como eu e tém de pensar que eu sou uma coisa comum Se portanto assim é eu no penso mas julgo que penso E esta maneira de me eu acondicionar ¢ boa e alivia-me Eu amo as alamedas de arvores sombrias e curvas E ao caminhar em alamedas extensas que o meu olhar afeigoa Jamedas que o meu olhar afeigoa sem que eu saiba como Elas slo portas que se abrem no meu ser incoerente E sio sempre alamedas que cu sinto quando o pasmo de ser assim me distingue Muitas vezes oculto-me sensaces ¢ gostos E entio elas variam e esto em acordo com as dos outros Mas eu nao as sinto e também nao sei que me engano Sentir a poesia é a manelra figurada de se viver Eu no sinto a poesia nao porque nao saiba o que ela é ‘Mas porque nio posso viver figuradamente E se o conseguisse tinha de seguir outro modo de me acondicionar A condicao da poesia é ignorar como se pode senti-la ‘Ha coisas belas que sao belas em si Mas a beleza intima dos sentimentos espelha-se nas coisas E se elas so belas nés nao as sentimos Na seqiiéncia dos passos nao posso ver mais que a seqiiéncia dos passos E eles seguem-se como se eu os visse seguirem-se realmente Do fato deles serem tio iguais a si mesmo E de no haver uma seqiiéncia de passos que 0 nao seja E que eu vejo a necessidade de nos nao iludirmos sobre o sentido claro das coisas Assim haviamos de julgar que um corpo inanimado sente e vé diferentemente de nos E esta nocio pode ser admissivel demais seria incomoda e fatil ‘Se quando pensamos podemos deixar de fazer movimento e de falai Para que é preciso supor que as coisas no pensam Se esta maneira de as ver ¢ incoerente e ficil para 0 espirito? Devemos supor e este é 0 verdadeiro caminho Que nés pensamos pelo fato de o podermos fazer sem nos mexermos nem falar Como fazem as coisas inanimadas Quando me sinto isolado a necessidade de ser uma pessoa qualquer surge E redemoinha em volta de mim em espirais oscilantes Esta maneira de dizer nao ¢ figurada E eu sei que ela redemoinha em volta de mim como uma borboleta em volta de uma luz Vejo-Ihe sintomas de cansago e horrorizo-me quando julgo que ela vai eair Mas de nunea suceder isso acontece eu estar as vezes isolado Hi pessoas a quem o arranhar das paredes impressiona E outras que se no impressionam ‘Mas 0 arranhar das paredes é sempre igual Ea diferenca vem das pessoas. Mas se ha diferenca entre este sentir Havera diferenca pessoal no sentir das outras coisas E quando todos, pensem igual duma coisa é porque ela é diferente para cada um A memoria é a faculdade de saber que havemos de viver Portanto os amnésicos nao podem saber que vivem Mas eles so como eu infelizes e eu sei que estou vivendo e hei de viver Um objeto que se atinge um susto que se tem Sio tudo maneiras de se viver para os outros Eu desejaria viver ou ser adentro de mim como vivem ou siio os espagos Depois de comer quantas pessoas se sentam em cadeiras de balanco Ajeltam-se nas almofadas fecham os olhos e deixam-se viver Nao ha luta entre o viver ea vontade de nio viver Ou entio — e isto é horroroso para mim — se ha realmente essa luta Com um tiro de pistola matam-se tendo primeiro, escrito cartas Deixar-se viver é absurdo como um falar em segredo Os artistas de circo sio superiores a mim Porque sabem fazer pinos e E dio os saltos s6 por os dar E se eu desse um salto havia de querer saber por que o dava E os dando entristecia-me Eles nao sao capazes de dizer como é que os dao ‘Mas saltam como sé eles sabem saltar E nunca perguntaram a si mesmos se realmente saltam Porque eu quando vejo alguma colsa Nao sei se ela se da ou nao nem posso sabé-lo S6 sel que para mim é como se ela acontecesse porque a vejo ‘Mas nao posso saber se vejo coisas que nao acontecam E se as visse também podia supor que elas sucediam Uma ave é sempre bela porque é uma ave E as aves so sempre belas ‘Mas uma ave sem penas ¢ repugnante como um sapo E um montio de penas nio é belo Deste fato tio nu em si nao sei induzir nada E sinto que deve haver nele alguma grande verdade © que eu penso duma vez nunca pode ser igual ao que eu penso doutra vez E deste modo eu vivo para que os outros saibam que vivem As vezes ao pé dum muro vejo um pedreiro a trabalhar Ea sua maneira de existir e de poder ser visto ¢ sempre diferente do que julgo Ele trabalha e ha um incitamento dirigido que move os seus bracos ‘Como é que acontece estar ele trabalhando por uma vontade que tem disso E eu nao esteja trabalhando nem tenha vontade disso E nao possa ter compreensio dessa possibilidade? Ele nao sabe nada destas verdades mas nao é mais feliz do que eu com certeza Em dileas doutros parques pisando as folhas secas Sonho as vezes que sou para mim e que tenho de viver ‘Mas nunca passa este ver-me de ilusi0 Porque me vejo afinal nas aleas desse parque Pisando as folhas secas que me escutam Se pudesse ao menos ouvir estalar as folhas secas Sem ser eu que as pisasse ou sem que elas me vissem Mas as folhas secas redemoinham e eu tenho de as pisar Se ao menos nesta travessia eu tivesse um outro como toda a gente Uma obra-prima no passa de ser uma obra qualquer E portanto uma obra qualquer é uma obra-prima Se este raciocinio é falso nao é falsa a vontade Que eu tenho de que ele seja de fato verdadeiro E para os usos do meu pensar isso me basta Que importa que uma idéia seja obscura se ela é uma idéla E uma idéia nao pode ser menos bela do que outra Porque nao pode haver diferenca entre duas idéias E Isto ¢ assim porque eu vejo que isto tem de ser assim Um eérebro a sonhar é 0 mesmo que pensa E os sonhos nao podem ser incoerentes porque nio passam de pensamentos Como outros quaisquer. Se vejo alguém olhando-me ‘Comego sem querer a pensar como toda a gente E ¢ tao doloroso isso como se me marcassem a alma a ferro em brasa Mas como posso eu saber se é doloroso marear a alma a ferro em brasa ‘Se um ferro em brasa é uma idéia que eu nado compreendo O descaminho que levaram as minhas virtudes comove-me Compunge-me sentir que posso notar se quiser a falta delas Eu gostava de ter as minhas virtudes gostosas que me preenchessem Mas s6 para poder gozar e possui-las e serem minhas essas virtudes Ha pessoas que dizem sentir 0 coragio despedacado Mas nio entrevistam sequer o que seria de bom. Sentir despedagarem-nos 0 coracio Isso é uma coisa que se nao sente nunca ‘Mas niio é essa a razio por que seria uma felicidade sentir o coragio despedagado Num saléo nobre de penumbra em que ha azulejos Em que ha azulejos azuis colorindo as paredes E de que 0 cho é escuro e pintado e com passadeiras de juta Dou entrada as vezes coerente por demais Sou naquele salio como qualquer pessoa Mas 0 sobrado ¢ concavo e as portas nio acertam A tristeza das bandeiras crucificadas nos entrevaos das portas E uma tristeza feita de silencio desnivelada Pelas janelas reticuladas entre a luz quando é dia, Que entorpece os vidros das bandeiras ¢ recolhe a recantos montes de negrume Correm is vezes frios ventosos pelos extensos corredores Mas ha cheiro a vernizes velhos e estalados nos recantos dos salées E tudo ¢ dolorido neste solar de velharias Alegra-me as vezes passageiramente pensar que hei de morrer E serei encerrado num caixio de pau cheirando a resina © meu corpo ha de derreter-se para liquidos espantosos As feigdes desfar-se-do em varios podres coloridos E Ir aparecendo a cavelra ridicula por baixo Muito suja e muito cansada a pestanejar Quadras ao Gosto Popular Cantigas de portugueses Sio como bareos no mar — Vio de uma alma para outra Com riscos de naufragar. Eu tenho um colar de pérolas Enflado para te dar: As per'las sao os meus beijos, flo 60 meu penar. A terra é sem vida, e nada Vive mais que 0 coragio... E envolve-te a terra fria Ea minha saudade nao! Deixa que um momento pense Que ainda vives ao meu lado... Triste de quem por si mesmo Precisa ser enganado! Morto, hei de estar ao teu lado Sem o sentir nem saber... ‘Mesmo assim, isso me basta P'ra yer um bem em morrer. Nao sei se a alma no Além vive.. Morreste! E eu quero morrer! Se vive, ver-te-el; se nao, ‘Sé assim te posso esquecer. Se ontem & tua porta Mais triste o vento passou — Olha: levava um suspiro... Bem sabes quem to mandou... Entreguei-te 0 coragio, E que tratos tu Ihe deste! E talvez por 'star estragado Que ainda nao mo devolveste ... A caixa que no tem tampa Fica sempre destapada Da-me um sorriso dos teus Porque no quero mais nada, Tens 0 leque desdobrado Sem que estejas a abanar. Amor que pensa e que pensa ‘Comeca ou vai acabar. Duas horas te esperei Dols anos te esperaria. Dize: devo esperar mais? Ou nao vens porque inda é dia? ‘Toda a noite ouyi no tanque ‘A pouca Agua a pingar. ‘Toda a noite ouvi na alma Que nao me podes amar, Dias sao dias, e noites Sao noites e nao dormi... Os dias a nao te ver As noites pensando em ti, Trazes a rosa na mao E colheste-a distraid: E que é do meu coragio Que colheste mais sabida? ‘Teus olhos tristes, parados, Coisa nenhuma a fitar... Ah meu amor, meu amor, Se eu fora nenhum lugar! Depois do dia vem noite, Depols da noite vem dia E depois de ter saudades ‘Vem as saudades que havia. No baile em que dangam todos Alguém fica sem dangar. Melhor é nio ir ao baile Do que estar La sem la estar. Vale a pena ser discreto? Nao sei bem se vale a pena. O melhor é estar quieto E ter a cara serena. Rosmaninho que me deram, Rosmaninho que darei, Todo o mal que me fizeram Sera o bem que eu farei. Tenho um relogio parado Por onde sempre me guio. O relégio é emprestado E temas horas a fio. Quando é o tempo do trigo E 0 tempo de trigar, A verdade é um postigo A que ninguém vem falar. Levas chinelas que batem No chiio com o calcanhar. Antes quero que me matem Que ouvir esse som parar. Em vez da saia de chita Tens uma saia melhor. De qualquer modo és bonita, E o bonita ¢ o pior. Levas uma rosa ao p E tens um andar que é teu... Antes tivesses o jeito De amar alguém, que sou eu. Teus brincos dancam se voltas A cabega a perguntar. 0 como andorinhas soltas ‘Que inda nao sabem voar. ‘Tens uma rosa na mao. Ni sei se é para me dar As rosas que fens na cara, Essas sabes tu guardar. Fomos passear na quinta, Fomos a quinta em passeio. Niio ha nada que eu nio sinta Que me nao faca um enleio. Os alcatruzes da nora Andam sempre a dar e dar, E para dentro e pra fora E nio sabem acabar, O minha menina loura, 6 minha loura menina, Dize a quem te vé agora Que ja foste pequenina ... Tens um livro que nio Iés, ‘Tens uma flor que desfolhas; Tens um coracao aos pés E para ele nio olhas. Nunca dizes se gostaste Daquilo que te calei. Sei bem que o adivinhaste. O que pensaste nio sei. O vaso que det quem Que nao sabe quem Iho deu Hi de ser posto 4 janela Sem ninguém saber que, é meu. Tive uma flor para dar A quem nio ousel dizer Que Ihe queria falar, E a flor teve que morrer. Quando olhaste para tris, Nao supus que era por mim. ‘Mas sempre olhaste, ¢ isso faz Que fosse melhor assim. Todos os dias eu penso Naquele gesto engracado ‘Com que pegaste no lenco Que estava esquecido ao lado, Tens uma salva de prata Onde poes os alfinetes... Mas nio tem salva nem prata Aquilo que tu prometes. Adivinhei o que pensas S6 por saber que nao era Qualquer das coisas imensas Que a minh'alma sempre espera. Ouvi-te cantar de De noite te ouvi cantar. Ai de mim, se é de alegria! Ai de mim, se é de penar! Por um pticaro de barro Bebe-se a agua mais fria. Quem tem tristezas nao dorme, Vela para ter alegria. O malmequer que arrancaste Deu-te nada no seu fim, ‘Mas 0 amor que me arrancaste, Se deu nada, foi a mim. Teu xaile de seda escura E posto de tal feicio Que alegre se dependura Dentro do meu coragio. O manjerico comprado Nao é melhor que 0 que dio. Poe o manjerico ao lado E da-me o teu coragao. Rosa verde, rosa verde,... Rosa verde é coisa que ha? F uma coisa que se perde Quando a gente nao esti Arosa que se nao colhe Nem por isso tem mais vida. Ninguém ha que te no olhe Que te ndo queira colhida, Ha verdades que se dizem E outras que ninguém dia. Tenho uma coisa a dizer-te Mas niio sei onde ela esti. Quando ao domingo passeias Levas um vestido claro, Nao € 0 que te conhego Mas é em ti que reparo. Tenho vontade de ver-te ‘Mas nio sei como acertar. Passelas onde no ando, Andas sem eu te encontrar. Andorinha que passaste, Quem é que te esperaria? S6 quem te visse passar. E esperasse no outro dia. Nuvem do céu, que pareces Tudo quanto a gente quer, Se tu, ao menos, me desses O que se nio pode ter! © burburinho da Agua No regato que se espalha E como a ilusao que é magoa Quando a verdade a baralha. Leve sonho, vais no chio A andares sem teres ser. Es como 0 meu coragio Que sente sem nada ter. Vai alta a nuvem que passa. Vai alto 0 meu pensamento Que é escravo da tua graga Como a nuvem 0 é do vento. Ambos 4 beira do poco Achamos que é muito fundo. Deita-se a peda, e 0 que eu ouco ¥ teu olhar, que é meu mundo. Aquela senhora velha Que fala com tio bom modo Parece ser uma abelha Que nos diz: "Nao incomodo". Maria, se eu te chamar, Maria, vem ca dizer Que nao podes ed chegar. Assim te consigo ver. Boca com olhos por cima Ambos a estar a sorrir... Ji sei onde esti a rima Do que nio ouso pedir. Quem lavra julga que lavra Mas quem lavra é 0 que acontece... Nao me das uma palavra Ea palavra nao me esquece. ‘Tinhas um pente espanhol No cabelo Portugués, ‘Mas quando te olhava 0 sol, Eras s6 quem Deus te fez. Boca de riso escarlate E de sorriso de rir... ‘Meu coragao bate, bate, Bate de te ver e ouvir. Quem me dera, quando fores Pela rua sem me ver, Supor que ha coisas melhores E que eu as pudera ter. Acendeste uma candela Com esse ar que Deus te deu, Ja nao é noite na aldeia E, se calhar, nem no eéu, Eu te pedi duas vezes Duas vezes, bem 0 sei, Que por fim me respondesses Ao que nao te pergunt Nao digas mal de ninguém Que é de ti que dizes mal Quando dizes mal de alguém ‘Tudo no mundo ¢ igual. Todas as coisas que dizes Afinal nao sao verdade. Mas, se nos fazem felizes, Isso é a felicidade. Dis nés na linha que cose Para que pare no fim. Por muito que eu pense e ouse, Nunea dis né para mim, Nio sei em que coisa pensas Quando coses sossegada... Talvez naquelas ofensas Que fazes sem dizer nada. As gaivotas, tantas, tantas, Voam no rio pro mar... ‘Também sem querer encantas, Nem é preciso voar. As ondas que a maré conta Ninguém as pode contar. Se, ao passar, ninguém te aponta, Aponta-te com o olhiar. Todos os dias que passam Sem passares por aqui Sao dias que me desgragam Por me privarem de ti. Quando cantas, disfarcando Com a cantiga 0 cantar, Parece o vento mais brando Nesta brandura do ar. Nao sei que grande tristeza ‘Me fez sé gostar de ti Quando ja tinha a certeza De te amar porque te vi. A mantilha de espanhola Que trazias por trazer Nio te dava um ar de tola Porque 0 nio podias ter. Boca de riso escarlate Com dentes brancos no meio, Meu coragio bate, bate, Mas bate por ter receio. Se ha uma nuvem que passa Passa uma sombra também. Ninguém diz que é desgraca Nao ter 0 que se no tem. Tu, ao canto da janela Sorrias a alguém da rua, Porqué ao canto, se aquela Posi¢ao nao é a tua? Da-me, um sorriso ao domingo, Para a segunda eu lembrar. Bem sabes: sempre te sigo E nao € preciso andar. Tens olhos de quem nao quer Procurar quem eu nao sel. Se um dia o amor vier Olhariis como eu olhel. Pobre do pobre que é ele E nao é quem se fingiu! Por muito que a gente vele Descobre que jé dormiu. Nao me digas que me queres Pois nao sei acredita: No mundo ha muitas mulheres Mas mentem todas a par. Agua que nao vem na bilha E como se niio viesse. Como a mie, assim a filha... Antes Deus as nio fizesse. © Ioura dos olhos tristes Que me nao quis ese Quero s6 saber se existes Para ver se te hei de amar. Hi grandes sombras na horta Quando a amiga la vai ter... Ser feliz é 0 que importa, Nao importa como o ser! O moinho de café Méi gros e faz deles pé. O po que a minh‘alma é Moeu quem me deixa so. Dizem que nao és aquela Que te julgavam aqui. ‘Mas se és alguém e és bela Que mais quererao de ti? ‘Tenho um livrinho onde escrevo Quando me esqueco de ti. F um livro de capa negra Onde inda nada escrevi. Olhos tristes, grandes, pretos, Que dizeis sem me falar Que nio hi filhos nem netos De eu nao querer amar. Meu coracio a bater Parece estar-me a lembrar Que, se um dia te esquecer, Sera por ele paar. Quantas vezes a meméria Para fingir que inda é gente, Nos conta uma grande historia Em que ninguém esta presente Trazes 0 vestido novo Como quem sabe o que faz. Como és bonita entre 0 povo, ‘Mesmo ficando para tras! A tua boca de riso Parece olhar para a gente Com um olhar que é preciso Para saber que se sente. A laranja que escolheste Nao era a melhor que havia. Também o amor que me deste Qualquer outra mo daria. Se o sino dobra a finados Ha de deixar de dobrar. Da-me os teus olhos fitados E deixa a vida matar! Por muito que pense e pense No que nunca me disseste, Teu silencio nao convence. Faltaste quando vieste, ‘Tome la, minha menina, O ramalhete que fiz. Cada flor é pequenina, Mas tudo junto ¢ feliz. A vida é pouco aos bocados. O amor é vida a sonhar. Olho para ambos os Iados E ninguém me vem falar. Dei-Ihe um beljo ao pé da boca Por a boca se esquivar. A idéia talvez foi louca, O mal foi nio acertar. ‘Compras carapaus ao cento, Sardinhas ao quarteirio. S6 tenho no pensamento Que me disseste que nio. Duas horas te esperei Duas mais te esperaria. Se gostas de mim nao sei Algum dia ha de ser dia... Tenho um desejo comigo Que me traz longe de mim. E saber se isto é contigo Quando isto nao é assim. Leve vem a onda leve Que se estende a adormecer, Breve vem a onda breve Que nos ensina a esquecer Quando a manha aparece Dizem que nasce alegria. Isso era se Ela viesse. Até de noite era dia. Nuvem alta, nuvem alta, Porque é que tao alta vais’ Se tens o amor que me falta, Desce um pouco, desce mais! Teu carinho, que é fingido, Da-me o prazer de saber Que inda nao tens esquecido O que o fingir tem de ser. A luva que retiraste Deixou livre a tua mio. Foi com ela que tocaste, Sem tocar, meu coracio. O avental, que a gaveta Foste buscar, nao tera Algibeira em que me meta Para estar contigo ji? Quando vieste da festa, ‘Vinhas cansada e contente, A minha pergunta é esta. Foi da festa ou foi da gente? Rouxinol que no cantaste, Galo que nio cantaras, Qual de vés me empresta 0 canto Para ver o que ela faz? Quando chegaste 4 janela ‘Todos que estavam na rua Disseram: olha, é aquela, Tal a graca que é tua! Nuvem que passas no céu, Dize a quem nao perguntou Se é bom dizer a quem de "O que deste, nao to dou." "Vou trabalhando a peneira E pensando assim assim. Eu nio nascl para freira. Gosto que gostem de mim." Roseiral que no das rosas Sendo quando as rosas vém, Ha muitas que sio formosas Sem que o amor Ihes va bem. Ri Que vais a correr ao léu Tu vais a correr sozinho, Ribeirinho, como eu. 'Vesti-me toda de novo E calcel sapato baixo Para passar entre 0 povo E procurar quem nio acho.” Tua boca me diz sim, Teus olhos me dizem nao. Ai, se gostasses de mim E sem saber a razio. Quero Li saber por onde Andaste todo este dia! Nunca faz-bem quem se esconde Mas onde foste, Maria? O vaso do manjerico Calu da janela abaixo. Vai bused-lo, que aqi Aver se sem ti te acho. fico O cravo que tu me deste Era de papel rosado. Mas mais bonito era inda O amor que Me foi negado, ‘Trazes os sapatos, pretos Cinzentos de tanto po. Feliz é quem tiver netos De quem tu sejas avo! ‘Vem de Li do monte verde A trova que nao entendo. E um som bom que se perde Enquanto se val vivendo. Moreninha, moreninha, ‘Com olhos pretos a rir. Sei que nunca seras minha, Mas quero ver-te sorrir. Puseste a chaleira ao lume Com um jeito de desdém. Suma-te 0 diabo que sume Primeiro quem te quer bem! ‘La vem o homem da capa Que ninguém sabe quem é... Se o lenco os olhos te tapa Velo os teus olhos por fé. Loura dos olhos dormentes, Que sio azuls e amarelos, Se as minhas maos fossem pentes, Penteavam-te os cabelos. O sino dobra a finados. Faz tanta pena a dobrar! Nio é pelos tens pecados ‘Que estaio vivos a saltar. ‘Traze-me um copo com agua Ea maneira de o trazer. Quero ter a minha magoa ‘Sem mostrar que a estou a ter. Otha 0 teu leque esquecido! Olha 0 teu cabelo solto! Maria, toma sentido! Maria, sendo nio volto! Ja duas vezes te disse Que nunca mais te diria O que te torno a dizer E fica para outro dia. Lavadeira a bater roupa Na pedra que esta na agua, Achas minha migoa pouca? E muito tudo 0 que é magoa. 0 teu lenco foi mal posto Pela pressa que to pos. Mais mal posto é o meu desgosto Do que no ha entre nés. Olhos de veludo falso E que fitam a entender, Vis sois 0 meu eadafalso A que subo com prazer. Duas vezes eu tentei Dizer-te que te queria, E duas vezes te ache So a que falava e ria. ‘Meu coragao ¢ uma barea Que nao sabe navegar. Guardo o linha na area Com um ar de o acarinhar. Tenho um desejo comigo Que hoje te venho dizer: Queria ser teu amigo Com amizade a valer. Es Maria da Piedade Pois te chamaram assim. Sé 14 Maria a vontade, Mas tem piedade de mim. Tu Es Maria da Graga, Mas a que graca é que vem Ser essa graca a desgraca De quem a graca nao tem? Caiu no chao o novelo E foi-se desenrolando. Passas a mao no cabelo. Nao sei em que estiis pensando. A tua saia, que é curta, Delxa-te a perna a mostrar: ‘Meu coracio ja se furta A sentir sem eu pensar. Meu amor ¢ fragateiro. Eu sou a sua fragata, Alguns vao atras do cheiro, Outros vio sé pela arreta. Vai longe, na serra alta, A nuvem que nela toc: Di-me aquilo que me fal s beijos da tua boca. HA um doido na nossa voz Ao falarmos, que prendemos: Eo mabestar entre nés Que vem de nos percebermos. Teu vestido porque é teu, Nao é de cetim nem chita. E de sermos tu e eu E de tu seres bonita. Entornaram-me 0 cabaz Quando eu vinha pela estrada. Como ele estava vazio, Nio houve loiga quebrada, rosario da vontade, Rezel-o trocado e a esmo. Se vens dizer-me a verdade, Vé ld bem se é isso mesmo. Castanhetas, castanholas — Tudo ¢ barulho a estalar. As que ao negar sio mais tolas Sio mais espertas ao dar. O manjerico ea bandeira Que ha no cravo de papel — Tudo isso enche a noite inteira, O boca de sangue e mel. Tem A filha da caseira Rosas na caixa que tem. Toda ela é uma rosa inteira Mas nio a cheira ninguém. A moga que ha na estalagem Ri porque gosta de rir. Nav sei o que é da viagem Por esta moga existir. Lengo preto de orla branca Ataste-o mal a valer A roda desse pescoco Que tem que se Ihe dizer. Aquela loura de preto Com uma flor branca ao peito, Eo retrato completo De como alguém é perfeito. A tua janela ¢ alta, A tua casa branquinha. Nada Ihe sobra ou the falta Sendio morares sozinha. ‘Vem ca dizer-me que sim. Ou vem dizer-me que nao. Porque sempre vens assim P'ra ao pé do meu coragio,, Cortaste com a tesoura O pano de lado a lado. Porque é que todo teu gesto ‘Tem a feigao de engragado? Ai, os pratos de arroz doce Com as linhas de canela! Ai a mio branca que os trouxe! Ai essa mao ser a delat Frescura do que é regado, Por onde a gua inda verte... Quero dizer-te um bocado Do que nio ouso dizer-te. 0 pastora, 6 pastorinha, Que tens ovelhas e riso, Teu riso ecoa no vale E nada mais é preciso, A abanar o fogareiro Ela corou do calor. Ah, quem a far corar De um outro modo melhor! Manjerico que te deram, Amor que te querem dar... Recebeste 0 manjerico. O amor fica a esperar. Dona Rosa, Dona Rosa. De que roselra é que vem, Que no tem senio espinhos Para quem sé Ihe quer bem? O laco que tens no peito Parece dado a fingir. Se calhar ja estava feito ‘Como o teu modo de rir. Dona Rosa, Dona Rosa, Quando eras inda botio Disseram-te alguma cousa Dea flor nio ter coracio? Tenho um segredo a dizer-te Que no te posso dizer. E com isto ja to disse Estavas farta de 0 saber .. Os ranchos das raparigas Vio a cantar pela estrada... Nao oigo as suas cantigas Sé tenho pena de nada. Rezas porque outros rezaram, E vestes 4 moda alheia... Quando amares vé se amas Sem teres o amor na idéia, Asenhora da Agonia ‘Tem um nicho na Igreja. Mas a dor que me agonia Nao tem ninguém quem a veja. Aparta 0 cabelo ao meio A do cabelo apartado. E a estrelinha em que leio Que estou a ser enganado. Esse frio cumprimento ‘Tem ironia p'ra mim. Porque é 0 mesmo movimento ‘Com que a gente diz que sim... Vejo ligrimas luzir Nos teus olhos de fingida. E como quando a janela ‘Chegas, um pouco escondida. Trincaste, para o partir, O retrés de costurar. Quem no soubesse diria Que o estavas a beijar. Deixaste o dedal na mesa S6 pelo tempo da auséncia — Se eu to roubasse dirias Que eu nao tinha conse Di-me um sorriso daqueles Que te nao servem de nada Como se da as criancas Uma caixa esvaziada, canario ja nio canta. Nao canta o eanario j4 Aquilo que em time encanta Talvez no me encantara. Rezas a Deus ao deitar-te Pedindo nio sei o qué. Se rezasses ao Deminio, Eu saberia o que é. Boca que tens um sorriso ‘Como se fosse um florir, ‘Teus olhos chelos de riso Dio-Ihe um orvalho de Uma boneca de trapos Nao se parte se, cair. Fizeste-me a alma em farrapos Bem: nao se pode partir. O que sinto eo que penso De tié bem e é mal. E como quando uma xicara ‘Tem o pires desigual. Levas a mio ao cabelo Num gesto de quem nao cré. Mas eu nao te disse nada. Duvidas de mim? Porqué? Compreender um ao outro E um jogo complicado. Pois quem engana nao sabe Se nao estava enganado. A roda dos dedos juntos Enrolaste a fita a rir. Coragies nao sio assuntos E falar nao é senti ‘Chama-te boa, e 0 sentido Nao é bem o que eu supunha. Boa nao é apelido: £, quando muito, alcunha. Tu Es Maria das Dores, Tratam-te s6 por Maria. Esta bem, porque deste as dores A quem quer que em tise fia. Se vais de vestido novo O teu préprio andar o diz, E ao passar por entre 0 povo Até teu corpo é feliz. Tens um anel imitado Mas vais contento de o ter. Que importa o falsificado Se é verdadeiro o prazer. Tenho ainda na lembranga Como uma coisa que veio, © quando inda eras crianga. Nunca mais me dis um beijo! O ar do campo vem brando, Faz sono haver esse ar. Ja nio sei se estou sonhando Nem de que serve sonhar. Quando ela pds o chapéu Como se tudo acabasse, Sofri de no haver véu Que inda um pouco a demorasse. Quem te deu aquele anel Que ainda ontem nio tink Como tu foste infiel A certas idéias minhas! Essa costura 4 janela Que Ihe inclinou a eabega Fez-me ver como era dela Que o coragao tinha pressa, ribeiro bate, bate Nas pedras que nele estio, Mas nem ha nada em que bata O meu pobre coracio. Nunca houve romaria Que se lembrassem de mim. Também quem se lembraria De quem se lamenta assim? Comes melio is dentadas Porque assim nao deve ser. Nio sei se essas gargathadas Me fazem rir ou sofrer. Hi dois dias que no vejo Modo de tornar-te a ver: Se outros também te nao vissem, Desejava sem softer. teu cabelo cortado A maneira de rapaz Nao deixa justificado Aquele amor que me faz, Se te queres despedir Nio te despidas de mim, Que eu nio posso consentir Que tu me trates assim. Quem te fez assim tao linda Ni 0 fez para mostrar Que se é mais linda ainda Quando se sabe negar. Floriu a roseira toda Com as rosas de trepar... ‘Tua cabega anda a roda Mas sabes-te equilibrar. Morena dos olhos bacos Velados de nio sel qué, No mundo hi falta de bracos Para o que o teu olhar vé. Quando compées 0 cabelo Com tua mao distraida Fazer-me um grande novelo No pensamento da vida. Teus olhos de quem nao fita Vagueiam, ‘sto na distincia. Se fosses menos bonita, Isso nao tinha importancia. Tocam sinos a rebate E levantaste-te logo. ‘Teu coragio s6 nao bate Por a quem puseste fogo. O coragio & pequeno, Coitado, e trabalha tanto! De dia a ter que chorar, De noite a fazer o pranto ... Deram-me um cravo vermelho Para eu ver como é a vida. Mas esqueci-me do cravo Pela hora da saida. Fiz estoirar um cartucho Contra a parede do lado. Assim farel eu a vida, Que 0 sonhar fez-me assoprado. O maimequer que colheste Deitaste-o fora a falar. Nem quiseste ver a sorte Que ele te podia dar. Comi melio retathado E bebi vinho depois, Quanto mais otho p'ra ti Mais sei que nao somos dois. ‘Trazes um lengo novinho Na cabeca e a descair, Se eu te beljar no cantinho So saber quem nos vir. E ao acabar estes versos Feitos em modo menor Cumpre prestar homenagem A bebedeira do cantor. Toda a noite, toda a noite, Toda a noite sem pen: Toda a noite sem dormir E sem tudo isso acabar. Puseste um vaso A janela. Foi sinal ou nao foi nada, Ou foi p'ra que pense em ti Que te nao importas nada? Eu viao Jonge um navio Que tinha uma vela sé, Ta sozinho no mar. Mas no me fazia dé. Corre a agua pelas eathas La segundo a sua lei. Pareces, vista de lado, Aquela que te julguei. LA por olhar para ti Nao julgues que é por gostar. Eu gosto muito do sol, E nem 0 posso fitar. Viraste-me a cara quando Taa dizer-te, a chegada, Que, se voltasses a cara, Que eu no me importava nada, Na quinta que nunca houve Ha um poco que nio ha ‘Onde ha de ir encontrar gua Alguém que te entender. ‘Voam débeis e enganadas As folhas que o vento toma, Bem sei: deitamos os dados Mas Deus ¢ sue deita a soma. Ribeirinho, ribeirinho, Que falas tio devagar, Ensina-me o teu caminho De passar sem desejar amar. Do alto da torre da igreja ‘Vé-se 0 campo todo em roda. S6 do alto da esperanga ‘Vemos nés a vida toda, Di-me um sorriso a brinear, Da-me uma palavra a rir, Eu me tenho por feliz Sé de te ver e te ouvir. Trazes um lengo apertado Na cabeca, e um né atras. ‘Mas 0 que me traz cansado E 0 n6 que munca se faz, Vite a dizer um adeus ‘A alguém que se despedia, E quase imploret dos céus Que eu partisse qualquer dia. Eu voltei-me para tras Para ver se te voltavas. Ha quem dé favas aos burros, Mas eles comem as favas. Deixaste cair no chao O embrulho das queljadas. Riste disso — E porque nao? A vida ¢ feita de nadas. Deste-me um cordel comprido Para atar bem um papel. Fiquei tio agradecido Que inda tenho esse cordel. No dia de Santo Antonio Todos riem sem razio. Em Sio Joao e So Pedro Como é que todos iro? Tenho uma pena que escreve Aquilo que eu sempre sinta. ‘Se é mentira, escreve leve. Se é verdade, no tem tinta, O capilé é barato E ¢ fresco quando ha calor. Vou sonhar o teu retrato Jé que nao tenho melhor. Baila o trigo quando ha vento Baila porque o vento 0 toca ‘Também baila 0 pensamento Quando 0 coragio provoca, este molhos de flores Para nao dar a ninguém, Sao como os molhos de amores. Que foras fazer a alguém. Se houver alguém que me diga Que disseste bem de mim, Farei uma outra cantiga, Porque esta nao é assim. Manjerico, manjerico, Manjerico que te del, A tristeza com que fico Inda amanha a terei, Ris-te de mim? No me importo. Rir no faz mal a ninguém. Teu rir é tio engracado Que, quando faz mal, faz bem. Ouves-me sem me entender. Sorris sem ser porque falo. E assim muita mulher. ‘Mas nem por isso me calo. Se eu te pudesse dizer O que nunca te direi, Tu terias que entender Aquilo que nem eu sei. Bailaste de noite ao som De uma misica estragada, Bailar assim s6 ¢ bom Quando a alegria é de nada, Nao sei que flores te dar Para os dias da semana. Tens tanta sombra no olhar Que o teu olhar sempre engana, Descasquei o camarao, Tirei-lhe a cabega toda. Quando o amor nio tem razio E que o amor incomoda. Cabega de ouro mortico Com olhos de azul do céu, Quem te ensinou o feitiga De me fazer nao ser eu? do ja onze horas da noite. Porque te nao vais deitar? Se de nada serve ver-te, Mais vale nao te fitar. Tiraste o linho da arca, Da area tiraste o linho. ‘Meu coragao tem a marca Que Ihe puseste mansinho. Ao dobrar guardanapo Para o meteres na argola Fizeste-me conhecer Como um coragao se enrola, Quando eu era pequenino Cantavam para eu dormir. Foram-se 0 canto e 0 menino. Sorri-me para eu sentir! Meia volta, toda a volta, Muitas voltas de dangar... Quem tem sonhos por escolta Nao ¢ eapaz de parar. Fui passear no jar ‘Sem saber se tinha flores Assim passeia na vida Quem tem ou nao tem amores. No dia em que te casares Hel de te ir ver a Igreja Para haver 0 sacramento De amar-te alguém que ali esteja. Quando apertaste o teu cinto Puseste 0 cravo na boca. Nio sei dizer o que sinto Quando 0 que sinto me toca. Toda a noite ouvi os caes P'ra manha ouvi os galos. Tristeza — vem ter conosco. Prazeres — é ir achi-los. Deram-me, para se rirem, Uma corneta de barro, Para eu tocar a entrada Do Castelo do Diabo. Quando te apertei a mao Ao modo de assim-assim, Senti o meu coracao A perguntar-me por mim, Tinhas um vestido preto Nesse dia de alegria... Que certo! Pode por Iuto Aquele que em ti confia. Sé com um jeito do corpo Feito sem dares por isso Fazes mais mal que o deménio Em dias de grande enguigo, Esse xaile que arranjaste, ‘Com que pareces mais alta Da ao teu corpo esse brio Que a minha coragem falta, Tem um decote pequeno, Um ar modesto e tranqi Mas va-se la descobrir Coisa pior do que aquilo! 10; Teus olhos poisam no chio Para nao me olhar de frente. Tens vontade de sorrir Ou de rir? E tio dif'rente! Quando passas pela rua Sem reparar em quem passa, Aalegria é toda tua E minha toda a desgraca. A esmola que te vi dar Nao me deu erenga nem fé, Pois a que estou a esperar Nao é esmola que se dé. Caiu no chao a laranja E rolou pelo chio fora. Vamos apanha-la juntos, Eo melhor ¢ ser agora. Quando te vais a deitar Nilo sei se rezas se niio. Devias sempre rezar E sempre a pedir perdi. E limpo 0 adro da igreja. E grande 0 largo da praca. Nao ha ninguém que te veja Que te nao encontre graca. Quando agora me sorriste Foi de contente de eu vir, Ou porque me achaste triste, Ou ja estavas a sorrir? Boca que o riso desata Numa alegria engracada, Es como a prata lavrada Que é mais o lavor que a prata. Por cima da saia azul ‘Ha uma blusa encarnada, E por cima disso os olhos Que nunca me dizem nada. Fazes renda de manha E fazes renda ao serao. Se no fazes seniio renda, Que fazes do coracio? ‘Todos te dizem que és linda. Todos to dizem a sério, Como o nao sabes ainda Agradecer é mistério, Eu bem sei que me desdenhas Mas gosto que seja assim, Que o dendém que por mim tenhas Sempre é pensares em mim. A tua irma é pequena, Quando tiver tua idade, ‘Transferirei minha pena Ou fico sé com metade? Quando me deste os bons dias Deste-mos como a qualquer. Mais vale nao dizer nada Tenho uma idéia comigo De que nao quero falar. Sea idéia fosse um postigo Era pra te ver passar. Andorinha que vais alta, Porque nio me vens trazer Qualquer coisa que me falta E que te nio sei dizer? ‘Tenho um lengo que esqueceu A que se esquece de mim. Nao € dela, nao é meu, Nao ¢ principio nem fim, Duas horas vao passadas Sem que te vela passar. Que coisas mal combinadas Que so amor e esperar! Houve um momento entre nos Em que a gente nao falou. Juntos, estivamos sis. Que bom é assim estar sét "Das flores que ha pelo campo O rosmaninho é rei..." E uma velha cantiga... Bem sel, meu Deus, bem o sel. © moinho que méi trigo Mexe-o 0 vento ou a gua, Mas o que tenho comigo Mexe-o apenas a magoa. Aquela que tinha pobre A tinica saia que tinha, Por muitas roupas que dobre Nunea ser mais rainha. E um lengo que nio é nada, Mas quem dera ter o dia De quem és a madrugada. Loura, teus olhos de eéu ‘Tém um azul que é fatal.. Bem sei: Foi Deus que tos deu. Mas entio Deus fez 0 mal? Vaialta sobre a montanha ‘Uma nuvem sem razio. Meu coragio acompanha O nfo teres coracio. Dizem que as flores sao todas Palavras que a terra diz, Nao me falas: incomodas, Falas: sou menos feliz, Duas vezes jurei ser O que julgo que sou, S6 para desconhecer Que nao sei para onde vou, pescador do mar alto ‘Vem contente de pescar, Se prometo, sempre falto: Receio nao agradar. Todos Li vao para a festa Com um grande azul de céu. Nada resta, nada resta... Resta sim, que resta eu, Andei sozinho na praia Andei na praia a pens: No jeito da tua saia Quando Ia estiveste a andar, ‘Onda que vens e que vais ‘Mar que vais e depois vens, Ji ndo sei se tu me atrais, E, se me, atrais, se me tens. Quando ha musica, parece Que dormes, ¢ assim te ealas, Mas se a musica falece, Acordo, ¢ nao me falas. ‘Trazes uma cruz no peito. Nido sel se 6 por devocaio. Antes tivesses o jeito De ter La um coragio. O guardanapo dobrado Quer dizer que se nao volta. Tenho 0 coragao atado: ‘Vé se a tua mio mo solta. ‘A tua porta esta lama. Meu amor, quem na faria?" E assim a velha cantiga Que como tu prineipia. ‘Menina de saia preta E de blusa de outra cor, Que ¢ feito daquela seta Que atirel ao meu amor? Lavas a roupa na selha Com um vagar apressado, Eo brinco na tua orelha Acompanha 0 teu cuidado. Duas vezes te falet De que te iria falar. Quatro vezes te encontrei Sem palavra p'ra te dar. Velha cadeira deixada No canto da casa antiga Quem dera ver ld sentada Qualquer alma minha amiga. Trazes a bilha a cabega Como se ela ndo houvesse. Andas sem pressa depressa Como se eu li nao estivesse. ‘Trazes um manto comprido Que nao ¢ xaile a valer. Eu trago em tio sentido E nao sei que hei de dizer. Olas para mim As vezes ‘Como quem sabe quem sou. Depols passam dias, meses, Sem que vas por onde vou. Quando tiraste da cesta Os figos que prometeste Foi em mim dia de festa, Mas foi a todos que os deste. Aquela que mora all E que ali esta a janela Se um dia morar aqui Se calhar nao sera ela. fas que grande disparate E 0 que penso e o que sinto. ‘Meu coracio bate, bate E se sonho minto, minto. Puseste por brincadeira A touca da tua irmi. corpo de bailadei Toda a noite tem manhi. Dizes-me que nunca sonhas E que dormes sempre a fio. Quais sio as coisas risonhas Que sonhas por desfastio? O teu carrinho de linha Rolou pelo chao caido. Apanhel-o e dei-to e tinha So em ti o meu sentido. A vida é um hospital Onde quase tudo falta. Por isso ninguém te cura E morrer ¢ que é ter alta. Que tenho o coracao preto Dizes tu, ¢ inda te alegras. Eu bem sei que o tenho preto: Esta preto de nédoas negras. Na praia de Monte Gordo. Meu amor, te conheci. Por ter estado em Monte Gordo E que assim emagreci. Saudades, so portugueses ‘Conseguem senti-las bem. Porque tém essa palavra Para dizer que as tem, "Mau, Maria!” — tu disseste Quando a tranga te eaia. Qual "Mau, Maria", Maria! "Ma Maria" "Ma Maria!" Era ja de madrugada E eu acordel sem razio, Senti a vida pesada. Pesado era 0 coracio. Boca de roma perfeita Quando a abres p'ra comer. Que feitico é que me espreita Quando ris sé de me ver? ‘Tenho um segredo comigo Que me faz sempre cismar, E se quero estar contigo Ou quero contigo estar. Trazes ja aquele cinto Que compraste no outro dia. Eui trago 0 que sempre sinto E que 6 contigo, Maria. Teu olhar nio tem remorsos Niao é por nao ter que os ter. E porque hoje nao é ontem E viver 6 s6 esquecer. Disseste-me quase rindo: "Conhego-te muito bem!" Dito por quem me nao quer. Tem muita graga, nao tem? a 0 coragio pesado Com 0 choro que chorel. E um ficar engracado O ficar com 0 que del... Este é 0 riso daquela Em que ni se reparou. Quando a gente se acautela Vé que nao se acautelou. ‘Tens vontade de comprar © que vés 86 porque o viste. ‘So a tenho de chorar Porque s6 compro o ser triste. Baila em teu pulso delgado ‘Uma pulseira que herdaste... Se amar alguém é pecado. Es santa, nunca pecaste. Teus olhos querem dizer Aquilo que se nao diz... Tenho muito que fazer. Que sejas muito feliz. Agua que passa e canta E agua que faz dormir... Sonhar é coisa que encanta, Pensar ¢ ja nao sentir. Deste-me um adeus antigo A maneira de eu nao ser Mais que o amigo do amigo Que havia de poder ter. Linda noite a desta lua. Lindo luar o que esta A fazer sombra na rua. Por onde ela nio vira. © papagaio do pago Nao falava — assobiava. Sabia bem que a verdade Nao é coisa de palavra, Puseste a mantilha negra Que has de tirar ao voltar. A que me puseste na alma Nao tiras, Mas delxa-a estar! ‘Trazes os brincos compridos, Aqueles brincos que sto Como as saudades que temos A pender do coracio. Deixaste cair a liga Porque nao estava apertada... Por muito que a gente diga A gente nunca diz nada. Nao ha verdade na vida Que se nio diga a mentir. Hi quem apresse a subida Para descer a sorrir. No dia de 8. Joao Wi fogueiras e folias. Gozam uns ¢ outros nao, ‘Tal qual como 0s outros dias. Santo Antonio de Lisboa Era um grande pregador, Mas é por ser Santo Antonio Que as mogas the tém amor.

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