Sarah Holland - O Principe Do Deserto (Julia Esp Ferias 21.1)
Sarah Holland - O Principe Do Deserto (Julia Esp Ferias 21.1)
Deserto
Desert Destiny
Sarah Holland
Digitalização: Silvia
Revisão: Bruna Cardoso
Julia Ed. Férias 21.1 – O Príncipe do Deserto – Sarah Holland
Sarah Holland
O Príncipe do Deserto
Esta edição é publicada por acordo com a Mills & Boon Ltd.
Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas
vivas ou mortas terá sido mera coincidência.
Projeto Revisoras 2
Julia Ed. Férias 21.1 – O Príncipe do Deserto – Sarah Holland
CAPÍTULO I
O sheik se erguia a sua frente, alto e dominador, com um chicote na mão. Ela estava
ajoelhada aos seus pés, o suor porejando sobre os lábios entreabertos. O sol ardente do
deserto os castigava impiedosamente. E ela se arrastava sobre a areia, os zunidos do
látego estalando próximos às suas pernas.
As sedas azuis de sua roupa de odalisca, os cabelos castanhos dourados e
cacheados, as pulseiras e correntes de ouro em torno de seu pescoço e ventre tilintavam
e tocavam a areia conforme ela caía e tornava a se levantar.
De repente o chicote atingiu-a e ela não pôde sufocar um grito. O homem ria, e com
um gesto firme segurou-a pelo pulso e a obrigou a se levantar, beijando-a selvagemente.
Um tropel de cavalos ao longe o surpreendeu. Surpreendeu a todos, que se viraram
para o oceano dourado do deserto para ver uma nuvem que se aproximava.
Os cavaleiros eram conduzidos por um homem em vestes brancas. Bethsheba soube
que o líder também era um sheik, pela cintilância de seu turbante.
— Deixe comigo! — Chris anunciou, por detrás das câmeras.
Mas Bethsheba não o ouviu. Seu coração pulsava mais alto do que as patas dos
cavalos e seus olhos estavam fascinados pelo sheik; o sheik verdadeiro que a fitava com
olhos estreitos como os de um falcão.
Agora, ele já estava a poucos passos de distância com seu garanhão branco, que
empinou no momento em que as rédeas foram puxadas. A areia que se levantou
envolveu-o como a um deus do deserto.
— Sou o sheik Suliman El Khazir de Auda Khazir — ele se apresentou com
autoridade. — E esta terra é minha! Quem lhes deu autorização para filmar aqui? — O
inglês dele era perfeito. Apenas um leve sotaque denunciava sua origem árabe.
— Senhor — Chris, sempre diplomata, se curvou —, meu nome é Chris Burton. Sou o
responsável pela equipe. Por favor, aceite minhas desculpas. Não fazia idéia que era ne-
cessário um pedido de autorização. Pensei que...
— Sei perfeitamente o que pensou inglês. — O sheik esboçou um sorriso cruel. —
Mas se enganou. Esta terra pertence ao povo de Auda Khazir, e eu sou seu mestre.
Sim, Bethsheba cogitou, sem fôlego: aquele rosto moreno era a estampa do poder.
O porte era aristocrático sobre o cavalo. E os olhos negros e profundos subitamente olha-
ram em sua direção, fazendo-a estremecer.
— Então permita desculpar-me mais uma vez em nome de todos e pedir
humildemente que nos conceda a autorização de prosseguirmos com a filmagem.
O sheik não se dignou sequer a olhar para Chris, enquanto examinava o corpo de
Bethsheba.
Projeto Revisoras 3
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— O que, exatamente, estão filmando? — Ele quis saber, os olhos fixos nos seios
firmes e cheios e no ventre desnudo.
— Um videoclipe. Trabalhamos na indústria fonográfica — Chris respondeu ao que o
coração de Bethsheba pulsava ainda mais rápido.
— Esta garota é cantora? — O homem finalmente se dirigiu a Chris.
— Sim. Uma cantora famosa. Seu nome é Bethsheba e...
— Sheba...? — O sheik estranhou.
— Bethsheba — Chris repetiu —, uma grande estrela no Ocidente. Já vendeu milhões
de discos e...
— Não me interesso por discos. — O sheik movimentou as rédeas e o cavalo
avançou para Bethsheba, que, involuntariamente, recuou.
— Fique onde está! — Chris ordenou, sem que o sheik ouvisse.
Os pulsos acelerados, ela ficou imóvel e seus olhos se ergueram para Suliman El
Khazir.
— É verdade que é Sheba? — O sheik a olhava atentamente.
— Ouviu falar a meu respeito?
— Oh, muito! — ele respondeu tão baixo que Bethsheba mal o ouviu. Ele sorria de
uma forma que a enfeitiçava e lhe produzia calafrios. Naquele momento seu sexto sentido
pareceu captar uma mensagem, uma espécie de premonição.
O sheik, então, fez o cavalo girar com suas mãos fortes e escuras, conduzindo-o até
as câmeras, os técnicos e Chris Burton.
— Muito bem, pode continuar seu filme na terra de Auda Khazir. — Ele ergueu a
cabeça com arrogância.
— Muito obrigado — Chris agradeceu, com evidente alívio.
— Mas cobrarei um preço, inglês! — o sheik o interrompeu.
— Sim, claro. — Chris pestanejou, mas logo recuperou seu tom diplomático. — É só
dizer!
— Quero ouvi-la cantar. — Ele indicou Bethsheba. Fez-se um silêncio pesado
enquanto, para sua humilhação, Bethsheba sentiu o rosto quente como fogo.
— Cantar? — Chris parecia não saber o que dizer? — Deseja ouvi-la cantar? Bem...
Claro... Isto é...
— Amanhã à noite! No Palácio dos Sete Sóis, nos arredores de Agadir, o portão de
entrada ao Saara Ocidental.
— Palácio dos Sete Sóis — Chris repetia perplexo, enquanto alguém mais esperto,
por detrás das câmeras, anotava a informação.
— Amanhã será meu aniversário. — O sheik sorriu. — Você jantará comigo, Burton,
e sua cantora me brindará com sua voz.
Bethsheba engoliu em seco. Os olhos, entretanto, estavam úmidos de suor que
escorria da fronte, das pálpebras.
A Chris não restou alternativa exceto se curvar e disser-se-se honrado pelo convite.
— Leve-a para mim amanhã às dezenove horas.
E, sem outras palavras, partiu a galope, seguido por um séquito silencioso.
Tudo ao redor de Bethsheba era convencional e monótono; as câmeras, o pessoal
vestido à moda ocidental. Felizmente, aquele era o último videoclipe de uma longa série
de filmes promocionais. Nem mesmo a certeza de ter se saído bem e de que a música,
sem dúvida, chegaria ao primeiro lugar nas paradas, a excitava mais.
No entanto, num recanto escondido de sua mente, uma fantasia secreta despertava:
cavalgar pelo deserto com o sheik Suliman El Khazir.
Não via a hora de tornar realidade seu sonho das mil e uma noites e cantar no
palácio.
Projeto Revisoras 4
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No dia seguinte, as filmagens foram realizadas em estúdio. Chris possuía uma Villa
em Tanger, e lá estava hospedada toda a equipe. No alto de uma montanha, a Villa
contava com uma vista deslumbrante da cidade, suas paredes brancas, telhados
vermelhos e planos, e do famoso mercado de Tanger com seus bazares e becos sujos e
movimentados repletos de jóias, tapetes e especiarias. Gritos de Allah a intervalos
regulares, vindos de uma mesquita próxima, ecoavam no calor da cidade.
— Vamos retomar desde o início outra vez — Chris solicitou.
— Oh, não dá para me dispensar ao menos da parte do coro? — Bethsheba indagou
pelo interfone, através da parede envidraçada do estúdio.
— Dá, se você prefere moleza — Chris respondeu seco, da sala de controle.
— Está bem, está bem. Do início! — O orgulho sempre falava mais alto quando Chris
a criticava. Desde que começaram a trabalhar juntos, o relacionamento entre eles fora
platônico, como se pertencessem a uma mesma família, e ao mesmo tempo perfeitamente
profissional.
— Ótimo! Parabéns, Beth — Chris a elogiou ao término da gravação.
Bethsheba o fitou, cogitando a razão de não mais sentir prazer quando Chris se
mostrava satisfeito com seu trabalho. Dependurou os fones de ouvido no microfone e foi
ao encontro dele na sala de controle.
— Gravaremos o coro amanhã — Chris anunciou.
— Então não precisará de mim, não é? — Beth tornou a perguntar.
A resposta do produtor foi pressionar a tecla do aparelho. A voz de Bethsheba sibilou
pelos alto-falantes: "Xeque! Xeque! X-X-X-X-Xeque!"
— Precisaremos providenciar um álbum de seus maiores sucessos em breve —
Prudence, uma das cantoras do coro, uma loira oxigenada, comentou do sofá. — Ouçam
só isso. — Ela indicou a última edição da revista Q: "O décimo - quinto compacto de
Bethsheba prova o velho ditado de que nunca se deve subestimar a ignorância da massa!"
— Miseráveis! — Chris praguejou.
— Nunca leio as críticas. — Bethsheba se largou numa banqueta ao lado de Chris. —
Dói muito!
— É pura inveja! — Ele desligou o instrumento e deu um beijo nos cabelos de Beth.
— O preço do sucesso. Se não o tivesse alcançado, os críticos te elogiariam. Aqueles que
só vendem dez discos por mês são chamados de artistas e adorados pelos intelectuais.
— Ou você poderia se suicidar no palco — Prudence acrescentou. — Isso provocaria
críticas sensacionais!
Chris começou a rir. Bethsheba, porém, sentiu aumentar o desejo de escapar
daquela rotina. Esse desejo a assombrava constantemente nos últimos dias. Sua vida se
tornara uma prisão. Não havia saída. Era só gravar música, gravar programas para a
televisão, exibição pública, entrevistas, sessões fotográficas...
A necessidade de fuga subitamente se tornou imperiosa. Seus olhos se desviaram
para as paredes do estúdio. Paredes negras, sem janelas, opressoras. Não havia luz, vista,
o mundo exterior deixava de existir. Não existia tempo naquelas salas abafadas. Poderia
ser manhã, tarde ou noite; verão ou inverno.
— Vou sair. — Bethsheba se levantou subitamente. Todos a olharam, espantados.
Mark, um dos assistentes, quase deixou cair seu copo de cerveja.
— Sair? Como... Sair? — Chris franziu o cenho.
— Preciso de ar — ela se justificou. — Quero sair!
— Mas não temos mais do que uma hora. — Chris consultou seu relógio de pulso. —
O sheik disse para chegarmos às sete. São no mínimo quatro horas de viagem até o
palácio.
— Não demoro — ela respondeu rápida, e se dirigiu à porta.
Projeto Revisoras 5
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— Espere! — Chris a seguiu, e dessa vez sua voz soou autoritária. — Você não sairá
daqui. Repito, não sairá. Sei que adora o lugar, Beth, mas não posso permitir que se en-
verede por esses becos e se perca.
— Mas, Chris — a frustração fez sua boca tremer —, não saí deste estúdio desde que
cheguei!
— Saiu, sim. Esteve no deserto, ontem. — Ele deu um tapinha em sua cabeça. —
Seja uma boa menina. Por que não vai um pouco até a piscina? Prue poderá te acompa -
nhar, não é, Prue?
— Sou uma boa dama de companhia. — Prudence se levantou.
— Tem razão... É melhor... Vou dar um mergulho. — Bethsheba se esforçava por
obedecer, mas por dentro queimava de ressentimento. Será que Chris era tão cego a
ponto de não ver que ela estava mudando?
Viajaram para Agadir numa limusine preta, por uma estrada moderna que parecia
incongruente com a paisagem desértica e pedregosa.
Ocasionalmente passavam por vilarejos pobres, com crianças seminuas e cachorros
correndo atrás deles, enquanto velhos em longos cafetãs fumavam cachimbos.
Bethsheba viajava no banco traseiro, em companhia de Prudence e Chris. A noite
caía quando chegaram a Agadir, cujo palácio se elevava em magnífico esplendor em meio
ao deserto infinito.
— Que lugar! Tão lindo tão romântico! — Bethsheba prendeu a respiração.
Atravessaram antigos portais de pedra, que se abriam para um pátio amplo,
ornamentado por fontes de mármores e muros em mosaicos. A segurança era ostensiva,
com guardas armados e cachorros.
— Quem quer que seja o homem, é, sem dúvida, muito rico e poderoso. Ainda bem
que não é nosso inimigo — Chris murmurou, quando o carro se deteve.
Bethsheba desceu trêmula e excitada em seu vestido de seda marfim com casaco
longo e dourado, também de seda.
— Saudações! — Um árabe de roupa vermelha os recebeu. — Sigam-me, por favor.
A curiosidade apressava o passo de Bethsheba ao longo dos corredores de beleza
mourisca, tetos abobadados e paredes em mosaicos azuis e brancos, com fontes e
estátuas de leões espalhadas pelos diversos ambientes.
Finalmente chegaram diante de uma porta dupla guardada por dois eunucos. O
árabe encarregado da recepção bateu palmas, e as portas foram abertas
instantaneamente.
A música pairava no ar. Sinos, tamborins, flautas e palmas. Os olhos de Bethsheba
percorreram o salão colorido em busca do sheik Suliman El Khazir, mas ele ainda não se
encontrava. O luxo era de tirar o fôlego. Paredes em mármore com inscrições em ouro
que ela não conseguia entender, almofadas de seda nas mais variadas cores, o ar
impregnado de incenso perfumado, lustres também de ouro...
— Meu Deus... Nunca vi nada assim!
— Pensei que tivesse nascido em Bahrain — Chris comentou.
— Sim, mas jamais visitei o interior de um palácio. Fui criada apenas com os filhos
dos oficiais do Exército.
— Que esnobe! — Prudence ergueu o nariz. — Não suporto!
— Sabe de onde se origina o termo "esnobe"? — Chris indagou, com ares de
importância. — Sem nobreza, ou melhor, sem título de nobreza. Era costume se usar a
expressão no colégio de Eton.
Subitamente a música cessou, e as portas principais se abriram. Ao som de passos,
os presentes no salão se ergueram e se curvaram.
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O sheik vestia-se inteiramente de branco, os olhos negros se movendo, inquietos,
pelos presentes, até encontrarem Bethsheba, que o fitava com igual arrogância,
inconsciente de seu porte, também, de igual realeza.
Olharam-se por um segundo por cima das cabeças curvadas. Em seguida, com um
leve sorriso, ele bateu palmas.
A música recomeçou. Todos se sentaram sobre as almofadas.
— Boa noite. — O sheik Suliman caminhou em direção aos estrangeiros. — Sejam
bem-vindos ao meu palácio.
— Boa noite — Chris respondeu em nome dos outros, como sempre. — Estamos
honrados em sermos seus convidados esta noite.
O sheik inclinou a cabeça e Bethsheba notou, pela primeira vez, o quanto ele era
alto. No mínimo cinco centímetros mais do que Chris, que já contava com mais de um
metro e oitenta.
— Beth deverá cantar aqui? — Chris indagou. — Será necessário um microfone para
que se faça ouvir.
— Ela cantará nos jardins de Sherazade. — O sheik tornou a bater palmas. —
Achmed, conduza o Sr. Burton aos jardins para que inspecione o local. Atenda-o no que
for necessário.
— Seu desejo é uma ordem. — Achmed se curvou.
— Obrigado — Chris agradeceu, sem jeito. — Beth? Prue?
— Eu... — Bethsheba endereçou um olhar ao sheik como se dissesse que preferia
ficar com ele.
— Sheba ficará comigo. — O sheik a segurou imediatamente pelo pulso. — Eu
cuidarei dela.
Chris hesitou as mãos agitadas nos bolso do smoking.
— Você precisa averiguar o som, Beth.
— Por aqui, Sr. Burton, Srta. Prue... — Achmed os apressava.
— Deve estar com fome, Sheba — o sheik comentou grave, a mão firme se movendo
para as costas de Beth, enquanto a conduzia.
Foi tudo muito rápido e, antes que percebesse o que estava acontecendo, ela se viu
caminhando ao lado do sheik, enquanto Chris e Prudence eram levados para os jardins de
Sherazade.
— Por favor, sente-se comigo. — O sheik indicou as luxuosas almofadas, e ela se
sentou lentamente num movimento provocante e sensual que também se refletia no brilho
dos olhos e na curva da boca. Seus olhos se encontraram e pareceram se esquecer do
resto do mundo, presos numa forte atração.
Ele bateu palmas e uma jovem odalisca apareceu, ajoelhando-se e oferecendo uma
bandeja de prata repleta de pequenas iguarias. Deixou-a frente a eles e, com reverência,
foi embora.
— Sua escrava? — Bethsheba indagou, com um olhar frio.
— As escravas escolhem seu próprio dono — ele respondeu, os olhos fixos em seus
seios.
O coração de Bethsheba pulsou freneticamente.
— Em civilizações ocidentais, é possível. Mas aqui neste deserto? Acho que não!
— Conhece bem o deserto?
— Nunca estive antes no Saara, mas...
— Então não nos julgue antes de nos entender. — Ele selecionou um confeito cor de
mel e o ofereceu. — É uma abelha cristalizada.
— Uma abelha?
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— É claro que retiramos o ferrão. — O sheik colocou o doce entre os lábios rosados
de Bethsheba.
O jeito com que ele a fitava, falava e tocava a deixava desassossegada, e ela não
conseguia encontrar posição nas almofadas.
— É uma mulher muito bonita, Sheba. — Ele também se moveu, mas para esticar o
braço e tocar-lhe os cabelos.
— Cabelos da cor do sol.
— Louros, apenas.
— Mas naturais. Ou você não é todinha loura? Um rubor violento subiu às faces de
Bethsheba.
— O senhor deve estar acostumado a tocar todas as mulheres que se aproximam,
não é?
— Só aquelas que desejam ser tocadas por mim.
— Pois estou certa de que seu harém está repleto delas!
— Um harém! — Ele riu e seus dedos deslizaram para os ombros bronzeados e nus.
— Os ocidentais são muito fantasiosos. Acreditam que todos os sheiks devem possuir
imensos haréns com mulheres de todos os tipos para lhes satisfazer os menores desejos!
— E o senhor nega?
— As fantasias ocidentais são mais numerosas do que as orientais, Sheba — ele
zombou. — Vamos explorá-las?
— Não estou interessada. — Ela ergueu levemente os ombros. Seu corpo, porém,
estava ligado ao dele como se por uma corrente elétrica.
— Assisti a um filme, uma vez, sobre um sheik e uma linda loira inglesa...
— Também assisti — Bethsheba se apressou a responder.
— Foi excitante vê-lo raptá-la na garupa de seu cavalo, enquanto ela gritava e
esperneava, não foi? Levá-la para o meio do deserto até seu acampamento, atirá-la sobre
as almofadas e...
— Ela lutou com o raptor! — Bethsheba protestou.
— Oh, sim, lutou bem e corajosamente — ele concordou. — Mas isso fazia parte da
fantasia, lembra-se?
Bethsheba não respondeu. Sua voz não queria sair. Subitamente ele também ficou
imóvel.
— Você gostou daquele filme, Sheba? — ele indagou a voz profunda e baixa, e ela
respondeu sem pensar
— Sim.
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CAPÍTULO II
Pouco depois Achmed retornou como se estivesse com muita pressa. Chris o seguia.
Bethsheba sentiu a tensão dominá-la. A intrusão do mundo moderno, de música pop e os
problemas que certamente aquele homem do século vinte lhe traria eram as últimas
coisas que queria naquele momento. O sopro moderno colidia violentamente com aquela
atmosfera, com aquela fantasia branca e dourada, com aquele corpo másculo deitado
sobre almofadas de seda, a seu lado.
— É tudo perfeito! — Chris esbanjava sorrisos ao chegar até eles. — Absolutamente
primeira classe! Como é que os conseguiu?
— Mandei trazê-los esta manhã de Casablanca — o sheik respondeu calmo.
— Mas é maravilhoso! — O rosto atraente de Chris vibrava de satisfação. — Ele
trouxe até uma banda, Beth! Será uma exibição realmente esplêndida.
— É claro que será. — O sheik inclinou a cabeça e bateu palmas. — Sente-se, por
favor, e sirva-se a vontade.
Outro tipo de música se espalhou pelo ambiente, e das sombras dos pilares surgiram
dançarinas se contorcendo em véus transparentes vermelhos e dourados, azuis e dou-
rados, roxos e dourados, braceletes tilintando. Bethsheba desejou ardentemente estar
entre elas, vestir aquelas roupas sensuais, os cabelos flutuando, e ela cantaria como um
pássaro do paraíso em homenagem ao seu sheik.
Outros convidados chegaram. Eram obviamente ricos e poderosos pelo aspecto, e
todos foram tratados com grande respeito. Naquele instante, Bethsheba se recordou de
Bahrain e sorriu com prazer.
— Em breve estará cantando para mim — o sheik cochichou subitamente em seu
ouvido. — Está preparada?
— Lógico. — Ela arqueou uma sobrancelha. — Sou uma profissional.
— Então venha. — Ele se levantou com graça e arrogância, um sorriso nos lábios, e
lhe estendeu a mão. — Eu a levarei pessoalmente aos jardins.
Caminharam lado a lado naquele lindo palácio, como elementos diáfanos em branco
e marfim, altivos e admirados por todos, especialmente Bethsheba.
— Seu povo está olhando fixamente para mim — Bethsheba comentou baixinho.
— Porque você é linda.
— Não — ela o corrigiu. — Sinto-me reconhecida. No entanto, não sou famosa nesta
parte do mundo...
— Por que seria então? — ele indagou, como se realmente desconhecesse o motivo.
As portas que davam para o jardim foram abertas e o ar fresco da noite os recepcionou.
Os jardins de Sherazade eram como tudo naquele lugar, excepcionais. As fontes
jorravam harmoniosamente entre flores das mais diversas espécies e cores. Palmeiras
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sussurravam mistérios e, no alto, estava a vista mais perfeita e encantadora: o céu sobre
o deserto com suas estrelas brilhantes como os mais puros diamantes.
— Você gosta de ser famosa? — O sheik indagou subitamente, surpreendendo-a.
— A fama é algo com a qual aprendi a conviver. — Bethsheba deu de ombros.
— Algo que te dá prazer, Sheba?
Ela umedeceu os lábios, e pela primeira vez admitiu a verdade a alguém.
— Sufocam-me a fama, a publicidade, os estúdios. Sinto-me freqüentemente como
um pássaro preso numa gaiola.
— E, como qualquer prisioneiro, você deseja escapar.
— Algumas vezes — Bethsheba reconheceu.
— E como um pássaro preso numa gaiola poderia aprender a ser livre? Talvez
precisasse apenas encontrar um novo dono...
— Ninguém é meu dono. — Bethsheba ergueu o queixo, desafiadora.
— No entanto descreve sua vida como monótona e sufocante. Seriam estas as
palavras de uma mulher livre? — Ele tocou-lhe levemente o braço.
— Sempre viveu aqui? — Ela sentiu uma súbita necessidade de mudar de assunto, o
que não passou despercebido pelo sheik, que sorriu divertido.
— Não. Possuo outro palácio no coração do Saara. O grande palácio de Suliman.
Fez-se um estranho silêncio. Os olhos do sheik se estreitaram e Bethsheba percebeu,
de repente, que ele esperava algum tipo de reação àquelas palavras.
— Palácio de Suliman? — ela repetiu. — Por que me olha como se eu já houvesse
ouvido falar a respeito?
— Foi construído por meus ancestrais — ele prosseguiu calmo, voltando a andar, a
mão gentilmente no braço de sua acompanhante. — Por Suliman El Khazir, o Grande, o
maior governante que o Saara já teve. Possui um significado especial para mim, Sheba, e
para todo o meu povo.
— Creio que qualquer palácio no meio do Saara deva ser especial.
— Também possuo um douar, um acampamento, a algumas horas deste local, a
cavalo.
— É um homem do deserto, então? — Ela traçou as linhas das delicadas pétalas de
um jasmim com a ponta dos dedos.
— Sou. — Ele se deteve e a fitou longamente. — Nasci aqui, Sheba, para governar
esta terra e esta gente. Meu destino será sempre amar a beleza selvagem do deserto. E
respeito esse destino como a força mais poderosa de minha vida.
— Eu também acredito em destino — ela sorriu —, mas ainda não encontrei o meu.
— E se já houvesse encontrado sem se dar conta? — o sheik perguntou em seguida,
os dedos mais firmes sobre o braço de Bethsheba. — Fugiria ou se renderia completamen-
te a ele?
— Eu me renderia — ela se ouviu dizer, quase que hipnotizada. Arrepios
incontroláveis percorriam seu corpo.
— Caso o destino se manifeste em forma de uma pessoa — ele lhe pareceu
subitamente tenso —, sua entrega também seria total?
Bethsheba sabia que o sheik estava tentando lhe contar algo. Mas o quê? O que
aqueles olhos negros escondiam? E por que, bem lá no fundo, ela já sabia a resposta?
Pouco mais tarde, Bethsheba se viu sob o foco quente e luminoso do palco, cantando
para o sheik Suliman El Khazir, seus convidados e serviçais, nos jardins de Sherazade.
Sua voz soava alta e clara para a audiência embevecida. A banda improvisada era
obviamente composta de músicos de gabarito. Prudence, à esquerda, a acompanhou com
perfeição. A apresentação, contudo, não poderia ser descrita apenas como tecnicamente
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excelente. Bethsheba parecia tocada por uma centelha divina, que a transformava numa
deusa dourada em estado de graça.
Os aplausos irromperam de todos os cantos e recantos dos jardins, mas o que mais a
emocionou foi o sorriso que o sheik lhe endereçou, ao final da última canção.
Assim que deixou o palco, Achmed se dirigiu a ela.
— Sua Majestade pede que compartilhe de sua mesa ao jantar.
O rosto corado, os olhos febris, pela primeira vez se sentindo uma verdadeira
estrela, Bethsheba acompanhou o fiel secretário.
— Você tem muito talento — Suliman a elogiou, os olhos a fitando cobiçosamente. —
O Sr. Burton deve sentir muito orgulho de seu pássaro aprisionado.
— Não sou... — Ela se deteve, recusando-se a lhe dar maiores informações sobre
sua pessoa, ao menos por aquela noite. — Quero dizer, não sou o único pássaro que ele
possui.
— Ele tem outros como você? Impossível! Não pode existir outra Sheba de cabelos
de ouro!
— Eu me referi a cantores. Quinze, aliás. Chris é dono de uma gravadora. É ele o
responsável pelos arranjos, produções, por quase tudo que compõem um disco e um
show.
— É seu produtor, então? — O sheik pediu confirmação, e desta vez seu semblante
era sério.
— Sim.
— Amante, também?
Bethsheba mordeu o lábio. Queria gritar que ele era um estranho, que não tinha o
direito de lhe fazer aquele tipo de pergunta, mas a atração que os unia era tão forte que
fazia as palavras morrerem em sua garganta.
— Uma pergunta simples, Sheba. Burton é ou não seu amante?
— Não! — ela negou com veemência. — Ele não é meu amante! — Bom Deus, ela
nunca tivera sequer um namorado, quanto mais um amante! — Somos amigos e colegas,
nada mais.
Suliman parecia considerar sua resposta de suma importância, e, ao ouvi-la, seus
olhos escureceram ainda mais.
— Quanto tempo pretende permanecer no Saara?
— Por mais dez dias — ela afirmou, rouca e zangada consigo mesma por se trair. —
As gravações serão feitas na Villa de Chris, em Tanger.
— Algum outro homem a acompanha? Um namorado? Um...
— Não — ela se apressou a dizer, antes que ele voltasse a sugerir envolvimentos
amorosos, e com isso a deixasse vermelha como um pimentão.
— Família? Eles estão na Inglaterra ou aqui?
— Não tenho família. Meus pais morreram quando eu tinha catorze anos.
— Diga-me, Sheba... Você sabe cavalgar? — O sheik pestanejou.
— Cavalgar? — A indagação a surpreendeu. — Sim, muito bem, por sinal.
— Ótimo. Então amanhã cavalgará comigo.
— Não sei se...
— Este castelo fica a pouca distância de Tanger. Possuo um haras com os melhores
puros-sangues, e o Saara nos cerca. Por que você não deveria vir cavalgar comigo?
Bem, não sei se Chris aprovará e...
— Não contaremos a ele, está bem? Será um segredo nosso. Você será minha
inglesa de cabelos de ouro, e eu serei seu sheik. Juntos viveremos nossa fantasia e nos
entregaremos ao destino.
Bethsheba sentia a boca ressequida, o rosto em fogo, a respiração suspensa.
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— Diga sim, Sheba, e nossos desejos serão realizados.
— Sim...
Na manhã seguinte, ela despertou ao som de Haya Allá Salat, que ecoava da
mesquita por toda a cidade de Tanger. O rosto de Suliman se delineou em sua mente e
ela se sentou na cama de um salto.
Concordara realmente em cavalgar com ele às três horas da tarde? Deveria estar
fora de si! Era lógico que não poderia sequer voltar ao palácio!
A manhã transcorreu com o trabalho de gravação no estúdio. Fora monótono e
repetitivo e até as brincadeiras costumeiras de Chris, para relaxar a tensão geral, lhe
estavam dando nos nervos, apesar de seu sentimento de culpa. Afinal devia tudo a Chris.
Não fora ele quem a salvara da penúria?
Christopher Burton descobrira Bethsheba, aos quinze anos, quando cantava num pub
londrino sujo, junto a uma banda desconhecida. Menor de idade e desesperada por di-
nheiro, ela se agarrara à primeira oportunidade de trabalho.
Seus pais haviam morrido um ano antes, num acidente automobilístico, e ela passara
a morar com uma tia solteira. Bethsheba se sentia triste e só, e Chris reconhecera não
apenas seu talento, mas também sua sede por amigos e proteção.
Na época, Chris era dono de um pequeno estúdio num subúrbio de Londres.
Também estava desesperado, mas para encontrar sucesso.
Bethsheba aprendeu tudo com ele a respeito da indústria musical. Virtualmente
morou naquele estúdio por três anos. Gravavam por horas intermináveis, seguidas por
mais horas intermináveis à perseguição das grandes etiquetas com quem tentavam firmar
contratos.
Cansado de perseguir o sucesso junto aos grandes, e tomado de uma furiosa
determinação, Chris arriscou tudo numa companhia própria. Passaria a fazer suas
gravações independentes, lançar seus próprios discos, e Bethsheba seria seu primeiro
trunfo.
O capital para o investimento foi levantado através da hipoteca de sua casa.
Bethsheba sofrera agonias de culpa enquanto aguardava que os disc-jóqueis tocassem
sua música, que as revistas comentassem sobre ela, que o público comprasse seu disco.
O disco chegou ao primeiro lugar nas paradas, e lá permaneceu por oito semanas
consecutivas.
Nos quatro anos que se seguiram, Bethsheba lançou quinze discos, todos chegando
igualmente ao primeiro lugar. Sua imagem era presença constante em todas as revistas
jovens e em programas musicais.
Chris Burton era agora o primeiro homem na indústria fonográfica. Todos queriam
trabalhar com ele. Os melhores artistas, inclusive do cast internacional, queriam gravar
sob sua etiqueta. E, além do prestígio, Chris possuía mais dinheiro do que jamais poderia
gastar.
Bethsheba, porém, ainda era sua maior estrela, sua favorita, pois ambos haviam
começado juntos, em uma época difícil.
— Vamos almoçar fora! — Chris propôs, quando finalmente terminaram a gravação.
— Nos misturarmos aos árabes, comer alguns petiscos, talvez descobrir algum harém...
— Estou muito cansada — Bethsheba mentiu. — Acho que ficarei por aqui para
descansar. — Seu coração já estava aos saltos só em pensar que não teria dificuldades
em se encontrar com Suliman.
O grupo partiu a pé e Bethsheba os acompanhou até a porta, o corpo vibrante de
excitação. Assim que desapareceram de vista, ela correu para o quarto, vestiu um culote
creme, uma blusa branca e botas pretas de cano longo. Escovou vigorosamente os
Projeto Revisoras 12
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cabelos e, como única maquiagem, deu um toque He rosa nos lábios para dar sorte. Na
cozinha, onde estavam às chaves do carro, ela deixou um bilhete.
"Fiquei entediada e decidi dar um passeio em Rabat. Talvez jante por lá. Não se
preocupem."
Saiu sorrateiramente pela porta dos fundos para que Mohamed, o empregado de
Chris, não a visse e fizesse perguntas sobre seu traje de montaria.
O percurso para o palácio do sheik foi longo, mas relativamente fácil. A estrada era
uma reta só, os desvios muito poucos. Ao se aproximar de Agadir, contudo, o pânico a
dominou. Seu estômago se contraía e a boca estava seca como uma folha morta.
Achmed a aguardava junto aos portões principais. O pânico foi imediatamente
substituído pela antecipação. Suliman não a esquecera.
O pátio era diferente à luz do dia. Os cachorros pareciam mais espertos, latindo
nervosos conforme ela parava o carro. As fontes brilhavam ao sol. Plantas verdejantes
enfeitavam os terraços do palácio.
— Saudações, sitt! — Achmed se inclinou. — O sheik a espera. Por favor,
acompanhe-me.
Bethsheba trancou o carro, guardou as chaves na bolsa e seguiu Achmed, desta vez
por outro caminho. As arcadas mouriscas estavam repletas de inscrições arabescas.
Pequenas alcovas mobiliadas com divãs ricamente bordados cobriam todo o caminho
impregnado do aroma de café fresco.
Achmed se deteve diante de um cortinado roxo, puxou-o e fez sinal para que
Bethsheba entrasse.
Incensos perfumavam o ar, almofadas forravam o chão, por toda a parte se via a
estampa do luxo oriental que a seduzira desde o primeiro instante com sua sensualidade
ostensiva.
— Vejo, Sheba — Suliman surgiu na outra extremidade da sala, magnífico em sua
túnica branca e dourada que realçava sua cor de mogno —, que conseguiu encontrar uma
forma de manter nosso compromisso.
— Sempre cumpro minhas promessas — ela respondeu com dificuldade. O ar se
tornava rarefeito à presença de Suliman.
— Eu também, bint! — ele concordou gentil. — Venha. Vamos cavalgar enquanto
temos a luz do sol a nosso favor. — O sheik tomou-lhe a mão e a levou ao longo do cor-
redor. — Começamos como pretendemos continuar: o gavião conduzindo a pomba!
— Oh, a Arábia...! — Bethsheba riu da comparação.
— Você se interessa por minha cultura. Notei isso desde ontem — Suliman observou.
— É muito bonita.
— Principalmente no que diz respeito às mulheres. Aqui, as mulheres são admiradas
por sua feminilidade. São as deusas de nossos desejos, de nossos corações, de nossas
crianças. Nós a ungimos com nosso amor.
— Não é essa a opinião do mundo ocidental.
— Você é única, não é o mundo, e é seu ponto de vista sobre minha cultura que eu
desejo.
O corredor finalmente se abriu para um pátio de pedra, que cheirava a pó, cavalos,
couro, estrume e suor.
Um cavalariço se apressou a levar-lhes dois garanhões; um branco e outro castanho.
Bethsheba montou, com o auxílio do rapaz, no segundo cavalo e recebeu um pequeno
chicote. A excitação a fez rir.
— Vamos, rainha das amazonas! — Suliman gritou e incitou os animais. Os serviçais
ergueram as mãos em saudações ao amo que galopava para o deserto.
Projeto Revisoras 13
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O vento e a areia fustigando-lhe o rosto e os cabelos, Bethsheba seguia seu sheik
sob o céu azul e sobre o mar dourado. Sentia-se linda, corajosa e livre, e corria, corria,
cada vez mais rápido.
A paisagem desértica os engolia. A não ser pelo som abafado das patas dos cavalos,
o silêncio era absoluto. Ao longe, ela divisou um poço e alguns tufos de verde, mas sua
animação durou pouco. A alguns passos do poço encontravam-se esqueletos de animais.
Seu rosto e todo o corpo estavam cobertos de suor e seus cabelos haviam se
transformado em chicotes.
Que distância teriam percorrido? O sol ardia no céu como uma fornalha. Não havia
nada à vista, não houvera nada desde o castelo, e ainda assim eles prosseguiam.
— Pare! — Bethsheba gritou subitamente, puxando as rédeas, mas Suliman
continuou. — Pare! — ela tornou a gritar, lutando para dominar o animal que teimava em
seguir seu dono.
— O que foi? Está com sede? — O sheik bradou áspero, dando meia-volta.
— Por que não parou quando pedi? — ela protestou, zangada. — Você ouviu muito
bem!
— Faltam apenas duas horas para o pôr-do-sol. Precisamos chegar ao acampamento
antes que escureça — Suliman explicou.
— O douar! — Bethsheba prendeu a respiração. Sabia o que isso significava! Um
mundo passado, um mundo do qual ela quase se esquecera: de tendas, areia, homens e
mulheres elegantes tomando chá de hortelã em mesas montadas sobre cavaletes.
— Vamos. Não podemos perder tempo — Suliman insistiu.
— Não posso ir lá com você! — Bethsheba gritou, angustiada. — Não posso ir lá.
— Mas precisa ir. Está escrito. — Os olhos negros faiscaram.
— Não está! Não está nada escrito e não irei lá com você! — Ela tentou fazer o
cavalo mudar de direção, mas ele não a obedecia.
— Não pode voltar sem mim!
— Posso e o farei! — O pânico a fez surrar o cavalo, que imediatamente empinou,
atirando-a pelos ares.
A última coisa que ela viu antes que a escuridão a envolvesse foi uma nuvem branca
se aproximando.
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CAPÍTULO III
O movimento do cavalo parecia embalar-lhe o sono, pois, a cada vez que tentava
abrir os olhos, sentia pontadas dolorosas na cabeça. Bethsheba tornava a mergulhar na
inconsciência, incapaz de reagir ao que sabia estar acontecendo.
O peito do sheik era forte, quente e confortável. Seu rosto estava apoiado sobre ele.
A Arábia, agora, lhe parecia um sonho. O ar começava a refrescar. As areias deixavam de
ser douradas para assumir o tom róseo do entardecer. Lilás, em seguida, violeta e
finalmente negro.
Seus olhos se fecharam mais uma vez até que ela sentiu o cavalo se deter, e ouviu
vozes e o estalar de fogueiras. Não era preciso muita imaginação para descobrir que ha-
viam alcançado o douar.
— Acorde Sheba.
Por um momento, tudo o que ela pôde ver foram às feições atraentes e arrogantes,
o peito moreno, coberto de pêlos. Só depois conseguiu enxergar além, para a noite que
caíra sobre o oásis. Tendas feitas de peles de animais se estendiam pelo acampamento,
os cavalos estavam atados ás árvores, Homens de cafetãs e turbantes montavam guarda
enquanto outros comiam, junto às fogueiras.
— Está ao seu gosto, Sheba? — Suliman indagou, e seu sorriso era implacável. — É
este o douar de suas fantasias?
— Não! — O grito selvagem era fraco e assustado, mas seus olhos chamejavam. —
Você precisa me levar embora imediatamente.
O sheik se pôs a rir. Desmontou e carregou Bethsheba consigo para o interior da
tenda real. Ela se sentia como uma caça. Assim mesmo não podia deixar de olhar,
fascinada, para o luxo reinante. Ele a deitou num leito de almofadas.
— Como está à cabeça, Sheba? — Ele se estirou ao seu lado, inclinando-se
perigosamente. — Você caiu sobre uma duna, o que felizmente amorteceu a pancada.
Assim mesmo perdeu a consciência.
— Ainda dói — ela admitiu. — Mas preciso voltar, apesar de tudo, Suliman. Não pode
me prender aqui...
— Posso sim, bint! Você agora é minha prisioneira — ele zombou, enquanto lhe
dirigia um olhar de posse. — E cumprirá minhas ordens.
— Está maluco — Bethsheba sussurrou. Sua cabeça rodopiava. — O que fez é
ilegal...
— Sou rei e senhor aqui. Sou a lei...
— Não... — Ela tentou se levantar.
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— Fique deitada! — O sheik a empurrou sobre as almofadas. — Aceite seu destino!
— Não ficarei aqui nem mais um minuto! — Ela começou a protestar, mas a entrada
de um criado a calou. Todo vestido de branco, o rapaz carregava uma bandeja de latão,
com duas xícaras e um bule que cheirava a café, figos turcos e biscoitos de especiarias.
Após dizer algumas palavras ao sheik, ele fez uma reverência e se retirou.
— O que ele falou? Que desaprova o seqüestro de uma jovem inglesa? — Bethsheba
gritou.
— Ninguém se atreveria a se dirigir a mim nesses termos, bint! — Suliman riu
baixinho.
— Você desejaria que nem eu me atrevesse, não é? — A rebeldia tingia suas faces
de escarlate.
— Você é brava, espirituosa e sei que lutará contra mim — Suliman afirmou com
frieza, a mão sobre seu quadril, mantendo-a cativa. — Mas isso faz parte de nossa
fantasia, não é? Só que eu é quem serei o conquistador.
— Você não irá me conquistar! Suliman sorriu em resposta.
— Venha para a mesa. Precisa comer alguma coisa. Estes doces foram preparados
especialmente para você.
— Não quero doce algum! — Bethsheba estava realmente assustada à ameaça
sexual implícita naquele diálogo. — Quero ir embora imediatamente!
— Repetirei mais uma vez, caso não tenha ouvido ou entendido. É minha prisioneira,
agora. Você tinha outra escolha, mas seu silêncio provou quê também desejava
compartilhar desta fantasia.
— Como pode dizer isso? — Ela o encarou, o coração disparado no peito.
— Discutimos este assunto em detalhes ontem à noite. — Ele selecionou um doce da
bandeja e o colocou entre os lábios de Bethsheba.
— Não discutimos! — Ela retirou o doce da boca e desmentiu-o.
— Fui muito claro... — O sheik deixou seus olhos repousarem sobre os seios
arfantes, o corpo trêmulo. — E você, Sheba respondeu, com os olhos, com o silêncio...
— Não... — Bethsheba ainda tentou negar, embora os mamilos rígidos traíssem sua
excitação, como acontecera na noite anterior.
— Sim. — As mãos fortes deslizaram por sobre sua blusa, abrindo o primeiro botão.
— Você aceitará seu destino e se renderá a ele.
— Não, mil vezes não! — ela protestou, e em seguida gemeu. Parecia ter levado um
choque ao sentir a ponta dos dedos de Suliman em seus seios.
— Seu corpo a trai — ele murmurou e se inclinou para possuir aqueles lábios
tentadores que só sabiam dizer não.
Bethsheba lutou, mas Suliman prendeu seus braços contra as almofadas. Tentou
gritar, mas ele a calava repetidamente com seus beijos. Tentou deter o fluxo de sangue
que ardia em suas veias, mas o alívio só chegou em forma de roucos gemidos.
Suliman ergueu finalmente o rosto, tão corado quanto o seu, e se levantou para
servir duas xícaras de café fumegante.
Bethsheba o observava intoleravelmente agitada, confusa e zangada com o sheik,
por ele ter ousado beijá-la contra sua vontade. Como ele ousara, em primeiro lugar, tê-la
raptado, tê-la forçado a vir a esse acampamento, onde a submeteria a um jogo vil que
certamente acabaria em sua completa rendição física...? Oh, ela o odiava!
— Acredita que pode levar esse seu jogo adiante, mas está enganado! Chris ficará
desesperado com meu desaparecimento. Ele virá a minha procura e...
— E onde a encontrará? — Suliman se voltou e lhe entregou uma das xícaras. — Em
meu palácio de Agadir? O que há por lá além de um carro e muitos homens prontos a lhe
fornecer explicações?
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— O carro será prova suficiente. Ele informará as autoridades e...
— E as autoridades encontrarão o bilhete que deixei no carro. — Ele sorveu o café,
gole a gole.
— Um bilhete?
— Um bilhete que escrevi antes de você chegar, querida. Um bilhete dizendo a
Burton que você me pediu que a levasse a um tour em minhas terras. Um roteiro de
alguns dias que daria uma nova profundidade a seu trabalho.
— Não espera seriamente que eu acredite no que disse, espera? — Bethsheba
arregalou os olhos, horrorizada.
— Por que não? Além de cantora, você também é uma atriz, e sabe representar.
— Mas Chris sabe que eu nunca aprendi a representar.
— No entanto estava representando uma cena no deserto, quando a encontrei, há
três dias.
— Era apenas um videoclipe!
— O suficiente para o que tenho em mente.
— Chris me conhece há anos — Bethsheba insistiu completamente em pânico. — Ele
saberá que algo está errado. Conhece-me melhor do que ninguém. É como um irmão para
mim, e eu para ele.
— Ninguém jamais pode estar seguro do que se passa no coração e na mente de
outra pessoa. — Suliman terminou de beber seu café.
— Diz isso e ainda tem a coragem de insistir que eu aprovei silenciosamente esta
farsa!
— Vi mais do que uma aprovação silenciosa quando a beijei há pouco.
O sangue subiu ao rosto de Bethsheba, a raiva a fez tremer, mas ela sufocou seu
grito e seu desejo de golpeá-lo, pois o que ele acabara de dizer não era mais do que a hu-
milhante verdade.
Suliman riu outra vez, e se voltou para sair.
— Mandarei uma menina com água e roupas limpas. Será avisada da hora do jantar.
A fúria a venceu. Suas mãos trêmulas agarraram uma almofada, atirando-a em
direção à cabeça arrogante que se abaixava para deixar a tenda.
— Vá para o inferno! — A almofada, porém, atingiu apenas a tenda, caindo ao chão
com um ruído surdo.
O eco da risada irônica em seus ouvidos aumentava a raiva e a sensação de
impotência.
"Você agora é minha prisioneira e cumprirá minhas ordens!"
— Você é que pensa! — Bethsheba falou consigo mesma, entre os dentes. Suas
mãos ainda tremiam. Ela tinha de se controlar. Fechou os olhos e respirou profundamente
por várias vezes.
Suliman acreditava que ela dera seu consentimento para aquela fantasia infame, e,
embora negasse com convicção, Bethsheba sabia que seus olhos haviam brilhado de
excitação na noite anterior. Por isso, por mais que detestasse a posição constrangedora
em que encontrava agora, a culpa era parcialmente dela mesma.
Não imaginara que isso fosse acontecer! O pânico a invadia em ondas intensas. Para
tentar se acalmar bebeu finalmente o café, que já esfriara na xícara. Não sabia que estava
com tanta sede. Serviu-se de uma segunda xícara e em seguida se viu saboreando várias
das iguarias sobre a bandeja. Só então se lembrou de que nada comia desde o café da
manhã.
— Sou Khalisha. — Uma voz delicada se fez ouvir subitamente. — Meu amo ordenou
que eu a banhasse e a vestisse.
— Quanta gentileza dele! — Bethsheba exclamou irônica.
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— Posso começar? — Khalisha se moveu para o interior da tenda e Bethsheba a fitou
admirada. A garota era linda e esbelta. Seus cabelos eram longos e negros, os olhos cas-
tanhos e vivos e a boca pequena e vermelha.
— Sinto muito, Khalisha Bethsheba não se sentia capaz de dominar a raiva —, não
pretendo ofendê-la, mas não desejo ser banhada e vestida para ser oferecida a seu amo
como um sacrifício.
— Um sacrifício? — A garota franziu o cenho.
— Estou aqui contra minha vontade e...
— Nada sei a respeito — Khalisha a interrompeu, fria e serena. — Tudo que sei é
que meu amo me deu essas ordens.
— Seu amo! Ele não é seu amo, mas apenas...
— Ele é meu amo, sitt. Sem sua orientação meu povo se perderia no deserto. — O
orgulho de sua raça e de sua descendência tornava a garota ainda mais bela.
— Não há um banheiro que eu possa usar? — Bethsheba se levantou.
— Não. A senhorita poderá se lavar atrás do Shiraz. Bethsheba olhou imediatamente
para o fundo da tenda, onde estavam dependurados vários tapetes Shiraz de forma a
proporcionar um pequeno espaço privativo. Lembranças de Bahrain voltaram, vividas, à
vista daqueles tapetes.
Khalisha ergueu um deles para ajudá-la a entrar. O local contava com uma pequena
banheira, sabonetes, essências, uma toalha e um espelho. Em seguida, a moça fez
menção de desabotoar sua blusa.
— Eu faço isso! — Bethsheba recuou, chocada.
— O banho, dado por outra pessoa, é muito mais agradável.
— Não estou acostumada, Khalisha — Bethsheba explicou envergonhada. — Na
Inglaterra, nos banhamos sozinhos.
— Ouvi falar — a garota concordou. — Mas fico contente em pertencer a uma raça
mais quente e sensual. Aqui, somos ensinados a dar a nossos corpos os prazeres que eles
merecem.
— Nós nos consideramos sensuais, também — Bethsheba respondeu, na defensiva.
— E, ainda assim, banham-se sozinhos? — Khalisha sorriu descrente. — Venha!
Feche os olhos e deixe-me lavar o cheiro do cavalo e do pó de seu corpo!
Como se sentisse obrigada a provar alguma coisa, Bethsheba acabou concordando
que Khalisha a despisse. A blusa branca caiu no chão, seguida pelo sutiã de renda. Ela
fechou os olhos, corada de embaraço, mas recusando-se a demonstrá-lo. Sem dúvida
falariam sobre a inglesa frígida aquela noite ao redor das fogueiras, caso ela não permitis -
se que a odalisca a banhasse!
Assim que ficou totalmente nua, ela se sentiu guiada para dentro da água
perfumada. Gradativamente começou a relaxar. Era tão bom sentir o calor aliviar a dor de
suas costas, de seus ombros. As armadilhas do Oriente enfim venceram sua timidez e ela
abriu os olhos.
— É verdade — Khalisha comentou subitamente —, a senhora é tão linda quanto
disseram.
— Disseram? Quem? — Bethsheba estranhou.
— Todos sabiam esta manhã, sobre sua chegada. Comentava-se que meu amo, o
sheik, encontrara sua Sheba, e que ela era tão linda quanto diziam as escrituras.
— Escrituras? — Bethsheba repetiu incrédula.
— Agora que a conhecia, sei que não mentiram. A senhorita é a Sheba de cabelos e
pele de ouro. É verdadeiramente a gata.
— Gata? — Bethsheba estava cada vez mais perplexa e assustada com o rumo dos
acontecimentos. — Mas o que isso significa? E por que me chama de Sheba como o sheik?
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— Está escrito — Khalisha respondeu simplesmente, enquanto começava a secá-la.
— Não pode me contar o que está escrito? — Bethsheba fitou a moça, suplicante. —
Eu preciso saber...
— Já falei o bastante.
Bethsheba suspirou, e decidiu mudar de tática.
— Onde estamos?
— No Saara.
— Sim, mas em que parte do Saara? — Ela sorriu.
— Não a ajudarei a selar um cavalo e fugir, sitt.
— Oh, Khalisha, não vê como estou me sentindo? Sou uma prisioneira!
No mesmo instante Khalisha se levantou, apertou os lábios e a olhou, séria.
— Não sei de nada, e meu amo ficará zangado comigo se eu disser mais alguma
coisa. Levante-se, por favor. Eu a vestirei e irei embora.
Bethsheba fez o que a outra pedia. Seu corpo refletia-se parcialmente no espelho.
Era estranho, mas até ela estava se sentindo como um felino.
Khalisha a presenteou com sedas douradas, jóias e itens de maquiagem a base de
henna e kajal. Contrariada, mas obediente, ela começou a se vestir. Sentia-se quase nua.
Procurou um sutiã, mas, da pilha de roupas, só restava um cafetã.
— Não se usa sutiã aqui?
— Meu amo não quer que o use. — Khalisha balançou a cabeça.
— Seu amo é egoísta, arrogante... — Os olhos de Bethsheba faiscavam.
— Ele é um príncipe, sitt! — Khalisha retrucou repentinamente tão zangada quanto
Bethsheba. — Deveria se sentir honrada em ser escolhida por alguém como ele!
Chocada pela explosão da moça, Bethsheba percebeu que ela fora movida pelo
ciúme.
— Khalisha... Desculpe se magoei seus sentimentos. Tente me entender. Fui trazida
aqui contra a vontade, e não desejo ficar. Não queria e não "quero" ser escolhida por ne-
nhum sheik arrogante.
— O sheik é arrogante, sim, mas é magnífico em sua arrogância. Ele faria uma
mulher chorar de prazer ao escolhê-la! No entanto, tudo o que faz sitt inglesa, é...
— Basta! — A voz do sheik Suliman EI Khazir soou como uma chicotada, na entrada
da tenda. O coração de Bethsheba quase parou de bater. Khalisha sufocou uma
exclamação. Passos furiosos se aproximavam, acompanhados por palavras em árabe, até
que um dos tapetes Shiraz foi brutalmente erguido.
— Não! — Bethsheba gritou instintivamente, as mãos se erguendo sobre os seios
para se proteger do olhar penetrante.
Fez-se um silêncio pesado e terrível. Ela não conseguia sustentar-lhe o olhar. Estava
amedrontada, trêmula, e não havia lugar onde se esconder.
Khalisha se atirou aos pés dele. Por um momento, ele não se moveu. Depois, quando
a serva murmurou suas desculpas, ele respondeu rispidamente e a ergueu. Ela deixou es-
capar um soluço, inclinou-se e saiu correndo da tenda.
— Por favor! — Bethsheba implorou, pois o sheik continuava como que paralisado a
sua frente, os olhos fixos em seu corpo. — Saia! Preciso me vestir!
Ele não respondeu. Respirava aceleradamente. Em seguida, suas narinas inflaram,
ele estendeu as mãos e puxou os braços que tentavam ocultar os seios.
— Não... Por favor... — Bethsheba murmurou desesperada em sua nudez.
O sheik respirava com dificuldade cada vez maior. Seus músculos estavam tensos e
os olhos hipnotizados sobre os mamilos eretos. No segundo seguinte, ele a puxava ao seu
encontro, a boca se fechando sobre um de seus seios, fazendo-a involuntariamente gemer
de prazer.
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Com o mesmo ímpeto que a atacou, o sheik a soltou. Ela quase tombou, corada e
trêmula de paixão. Suliman estava de costas, a menos de um passo de distância, e
Bethsheba se sentia furiosa consigo mesma pelo desapontamento que a invadia.
— Não pode fazer isso comigo — ela protestou, assim que escondeu o corpo com o
cafetã. — Não pode me manter aqui como se eu não tivesse vida e vontade própria, ou
direitos.
— Você ficará — ele respondeu sem se virar, a respiração ofegante como se o desejo
febril pulsasse em suas veias com a mesma violência que o dela. — Esta é a minha
vontade!
— Ao menos me diga por quê!
— Está escrito.
Ele falou tão baixo que Bethsheba mal o ouviu.
— Estou farta de ouvir isso como se eu não existisse, como se a única coisa
importante fosse algo escrito em algum lugar em algum tempo, do qual nunca ouvi falar.
— Você ficará Sheba. Esta é minha vontade.
— Chris virá a minha procura. — Ela tentou gritar, mas os lábios trêmulos não
permitiram. — Ele não acreditará num bilhete que não foi escrito por mim. Perceberá ime-
diatamente que algo está errado e moverá o céu e a terra para me localizar.
— E, quando a encontrar, terá de lutar comigo pelo direito de possuí-la, pois, agora
que a tenho, Sheba, não a deixarei partir. Principalmente para seu amo inglês — Suliman
acrescentou com furioso desdém.
— Chris não é meu amo! — A indignação a fez empalidecer.
— Não, mesmo, bint? Não é ele quem lhe diz quando é hora de trabalhar, ou de
dormir? Não é ele quem dirige sua vida?
— Ele é apenas meu produtor!
— Ele é seu dono! Ou melhor, era. Agora sou eu. E você cumprirá minhas ordens.
— Prefiro morrer! — ela retrucou selvagem, embora as palavras a excitassem. —
Prefiro morrer a atender seus desejos.
— Pense bem antes de me contrariar, bint. — O sheik riu provocativo. — Pois, se
não estiver em minha mesa em meia hora, virei até aqui e a farei reconhecer quem é seu
novo amo. — Ele olhou insolentemente para o corpo agitado de Bethsheba. — Não
esperarei mais para tomar posse do que é meu!
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CAPÍTULO IV
O sheik deixou a tenda com passos firmes, e Bethsheba, pela primeira vez,
reconheceu a seriedade de sua situação. Enfraquecida, caiu de joelhos sobre os tapetes
macios.
Só havia um jeito para pôr fim naquele desastre: fugir. Com renovada determinação,
levantou-se e começou a se vestir. O cafetã de seda dourada flutuava sobre seu corpo. Os
chinelinhos, também dourados, lhe serviam com perfeição. Prendeu as correntes de ouro
em seus tornozelos e ao redor do pescoço, e dependurou os brincos.
Sentou-se em frente ao espelho e usou todos os potes que Khalisha lhe trouxera.
Delineou os olhos com kajal, pintou os lábios de vermelho e escureceu os cílios com
henna. Assim que terminou, saiu da tenda. As fogueiras iluminavam o acampamento. O
aroma da comida penetrou em suas narinas e seu estômago se contraiu de fome.
Suliman estava a sua espera. Também se banhara e trocara de roupa. O cafetã azul-
escuro que usava o tornava duplamente atraente e moreno. Bethsheba soube, por puro
instinto, que ele estava nu sob a veste, e seu corpo se umedeceu de antecipação.
— Você é mais linda do que Sherazade. — Seaman lhe estendeu ambas as mãos. —
Venha. Jante comigo.
O povo emudeceu o olhar fixo no casal que caminhava lentamente para a mesa.
— Estão nos encarando outra vez — Bethsheba sussurrou. — Quem é Sheba,
Suliman? A mulher de quem fala quando...
— Ainda não chegou a hora de lhe revelar todos os segredos. — Ele apertou-lhe a
mão. — Aceite aqueles que eu já concedi e seja paciente.
— Quais segredos são esses que já me foram concedidos?
— Os segredos dos meus desejos. — Ele sorriu.
— Seu desejo é me violentar! — Bethsheba apertou os punhos. — Já deixou isso
bem claro!
— Se eu quisesse violentá-la, bint, você estaria estendida nua sobre as almofadas de
minha tenda, neste instante.
— Oh...! — Ela levou a mão à boca para sufocar o choque.
— Porém... — Suliman tornou a segurar-lhe a mão e desta vez beijou-lhe a palma —,
como pode ver, não sou tão bárbaro ao ponto de destruir sua inocência com uma brutal
indiferença à sua dignidade.
— Mas você me quer, e me forçará, se eu recusar.
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Julia Ed. Férias 21.1 – O Príncipe do Deserto – Sarah Holland
— Você não se recusará e eu não usarei de força. — Os dedos fortes deslizaram
sobre o pulso palpitante. — Seu coração acelera como as asas de um pássaro cativo ao
meu simples toque. Pode negar que seus tremores também são de excitação, além de
medo?
— Nego!
— Então nega a si mesma e as necessidades de sua feminilidade.
— Não é verdade. — Ela corou de raiva. — Recuso-me a ser tratada como brinquedo
de um sheik entediado.
— No entanto, a fantasia é um brinquedo tanto para os homens quanto para as
mulheres, não concorda? Estou certo de que seu querido produtor também concorda, ou
não teria planejado um filme tão sensual com você, em pleno deserto.
— Chris é um profissional e tem dinheiro o bastante para produzir qualquer uma de
suas visões.
— Visões! — O sheik zombou. — Apenas outra palavra para fantasia. E toda e
qualquer obra de arte, desde o início dos tempos, bint, é feita a partir da fantasia, como
bem sabe.
— Seu interesse em mim nada tem de artístico... Como bem sabe!
— Ah, mas poderia ter minha Sheba. Poderia ter... — Os olhos escuros fitaram
indolentemente a boca rubra.
— Não, se for forçada — ela replicou intoleravelmente atraída por ele.
— Eis a beleza... A mulher se entregando ao homem, não o contrário. E você, minha
Sheba, eventualmente enxergará essa verdade, a única verdade existente entre os sexos,
e que acabará por reconhecer.
— Sheba... Quem é Sheba e por que você...?
— Agora iremos comer. — O sheik bateu palmas e imediatamente surgiram três
criados de uma tenda próxima, com bandejas repletas.
Os pratos foram colocados sobre a mesa, mas Bethsheba só tinha olhos para o perfil
autoritário da Suliman, odiando-o por se recusar a responder às diversas perguntas que
fizera sobre Sheba. Ela tinha todo o direito de saber. O aroma inebriante de carne assada
com molhos espessos e pão quente, no entanto, a distraiu por um momento.
— Coma — o sheik lhe indicou o prato.
— Não estou com fome! — ela mentiu a boca cheia d'água. Morreria antes de aceitar
alguma coisa daquele arrogante príncipe do deserto.
— Está faminta, admita. — Ele franziu o cenho.
— Prefiro morrer a comer de sua comida. — Os olhos de Bethsheba o fuzilavam.
— Eu não brincaria com a morte em seu lugar, bint. Ela está sempre à espreita, no
caso de alguém relaxar sua guarda. E você a está provocando com sua arrogância e com
esse orgulho tolo.
— Arrogância! Justo você vem me falar de arrogância...
— Não é arrogância a pomba julgar que pode vencer o falcão?
— Sou uma mulher e você um homem! Por favor, poupe-me de seus provérbios
árabes.
— Sheba — Suliman a repreendeu, ríspido. — Quando chegar à hora, a lembrarei
das diferenças entre nossos sexos. Até lá, aconselho-a a pensar somente em si própria e
em seu bem-estar. Portanto, coma!
— Não comerei! — ela respondeu furiosa. Odiava-o. Aquela parecia ser a única força
que lhe restava: a força de se recusar a comer, e ela não desistiria disso sem lutar, por
mais estúpida que fosse a luta.
— É muito orgulhosa, Sheba. Mas seu orgulho será vencido, eu prometo.
— Pare de falar em me vencer, em me conquistar, em me dominar...
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Julia Ed. Férias 21.1 – O Príncipe do Deserto – Sarah Holland
— Seus olhos estão brilhando de excitação. — Ele riu. — E seu rosto está corado. Se
eu lhe tomasse o pulso agora, o que descobriria?
— Estou furiosa! — Ela escondeu as mãos antes que o sheik resolvesse provar sua
suspeita. — Tenho todo o direito de estar.
— Também tem todo o direito de conhecer o êxtase da submissão a um homem.
Ela prendeu a respiração. As chamas das fogueiras criavam sombras dançantes sobre
o rosto de Suliman, e era difícil não olhar para ele.
— Seu corpo foi feito para o amor, e não recebe nenhum. Está com fome, e você
nega alimento. Diga-me, Sheba, por que não admite suas próprias necessidades?
— Eu...
— Você me viu no deserto e imaginou-se entre meus braços, forçada a ceder aos
meus beijos, às minhas carícias.
— Mentira! — Bethsheba sussurrou a boca seca.
— Você insiste em fechar as portas de sua mente. — Ele tocou-lhe os cabelos e
depois a nuca. — Repito. Ponha um fim nessa recusa. Tome tudo de que necessite.
Alimente seu corpo em seus desejos.
Incapaz de falar, os olhos irremediavelmente presos aos dele, ela foi obrigada a
reconhecer a verdade de suas palavras. Estava faminta, e em sua estupidez recusava-se a
comer.
— E então, comerá a carne e esquecerá seu orgulho?
— Está bem. — Ela baixou os olhos.
O sheik soltou-lhe a nuca e também começou a jantar.
Bethsheba cortou um pedaço de pão e mergulhou-o no molho escuro e apetitoso. O
sabor explodiu em sua boca, e ela fechou os olhos, rendendo-se à fome. Pouco a pouco se
sentiu revigorada em energia. Assim seria mais fácil, cogitou roubar um cavalo e fugir
durante a noite.
— Satisfazer o apetite também dá prazer, não é, Sheba? — o sheik indagou de
repente, e ela corou como se houvesse sido surpreendida em flagrante.
— Estava com fome.
— Sim, e por isso comeu.
— Comi. O que há de errado?
— Nada, bint. Absolutamente nada. — Suliman sorriu. O duplo significado não se
perdeu. Bethsheba o odiou por isso. Odiava-o por saber como ela se sentia. Precisava
fugir!
Após o jantar, ele a convidou a dar um passeio. Ela se levantou obediente, e as
correntes tilintaram em seu corpo. Símbolos de cativeiro. Um profundo ressentimento a
invadiu.
Caminharam entre os beduínos e ela achou estranhamente sedutora a língua árabe
quando sussurrada ao redor das fogueiras.
— Você nasceu aqui, não? — Bethsheba indagou, quando ultrapassaram a última
tenda. — No deserto e não no palácio.
— Sim. — O sheik arqueou uma sobrancelha. — Como adivinhou?
— Não sei. Talvez porque pareça mais à vontade aqui, mais real do que em Agadir.
— Está certa. — Ele caminhava lentamente, com as mãos para trás. — Nasci e fui
criado no deserto.
— Por quê? — Bethsheba quis saber, intrigada.
— Porque estava escrito.
— Oh, suponho que você acredite que tudo está escrito!
— Você não.
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Julia Ed. Férias 21.1 – O Príncipe do Deserto – Sarah Holland
— Claro que não. Somos nós quem construímos nossos próprios destinos. O destino
de um homem não está traçado nos astros, como disse Shakespeare, e eu acredito nele.
— No entanto o destino de Shakespeare foi longo e poderoso. Quem pode afirmar
que não foi parte do grande plano de Allah?
— Oh, Suliman, Shakespeare não acreditava em Allah! — Bethsheba riu.
— Cada um tem seu próprio deus. — Ele se juntou ao riso.
Bethsheba caminhava relaxada, por sobre as areias ainda mornas, e estava gostando
da companhia de Seaman mais do que desejaria admitir.
— E você nasceu em Londres?
— Não. — Ela negou com um movimento de cabeça.
— Era o que eu pensava. Não podia imaginá-la, criança, brincando entre prédios de
concreto.
— Que esperteza a sua! Sou o que dizem um produto do Exército. Meu pai era um
brigadeiro do exército inglês e minha mãe uma enfermeira militar.
— Então nasceu no interior da Inglaterra? Numa pequena aldeia com gramados e
chá da tarde...?
— Não, eu nasci em Bahrain. Ele se deteve,
Bethsheba prosseguiu mais alguns passos, e em seguida se voltou para a silhueta
escura, recortada contra o luar.
— Bahrain? Você nasceu em Bahrain? — ele indagou num fio de voz.
— Sim. — O sangue começou a pulsar mais rápido em suas veias. — Morei lá até os
cinco anos.
Suliman a olhava fixamente. Em seguida caminhou até ela e apertou-lhe os braços
com força.
— Conta-me isso e nega o destino!
— Mas não vejo o que uma coisa tem a ver com a outra... — Ela tentou se
desvencilhar.
— Tem tudo a ver, bint, como você poderá comprovar em breve. — Ele a
impulsionou em direção à tenda real.
— O que está fazendo? — Bethsheba começou a lutar.
— Estou lhe dando sua primeira lição! — ele afirmou e a empurrou para o interior da
tenda. — Sua primeira experiência do êxtase da submissão.
— Oh, Deus! — ela exclamou o corpo pulsando de desejo e medo, enquanto era
derrubada sobre as almofadas de seda.
— Nasceu na Arábia e possui cabelos e pele de ouro — o sheik sussurrava sobre seu
corpo. — Admita seu desejo. Quero que admita e se submeta a seu amo.
— Não!
— Sim. — Ele a beijou com uma paixão que a fez perder o fôlego. Seu corpo
arqueava involuntariamente e seus lábios se entreabriam para receber a língua faminta,
que insistia em lhe explorar a boca.
Gemendo, a cabeça jogada para trás, ela sentia a boca em fogo deslizando em seu
pescoço.
— Pare! — Bethsheba implorou as mãos apoiadas na cabeça de Seaman, fracas
demais para empurrá-lo, fracas demais para abraçá-lo junto ao peito. — Pare!
— Diga que me quer! — ele ordenou ríspido. — Diga que vai se submeter!
— Vá para o inferno! — ela praguejou, para em seguida fitá-lo, estarrecida,
conforme seu cafetã era erguido, revelando os seios firmes, os mamilos rosados e
intumescidos. — Não me toque!
Mas Suliman a torturava, a fazia arder de desejo, com as carícias leves feitas com a
ponta dos dedos.
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— Se entregue! — Ele forçou o joelho entre suas pernas, imobilizando-as.
Ela o encarou tomada de ódio e febre. O ar penetrava dolorosamente em seus
pulmões. O coração batia alucinado em seu peito.
— Não posso mais esperar. — Suliman sorriu e inclinou a cabeça sobre os seios.
Bethsheba se debateu, mas ele prendeu-lhe os braços sobre as almofadas. Sua boca se
fechou, sugando vorazmente os mamilos rígidos, até fazê-la gemer. A coxa musculosa
começou a se mover ritmicamente entre suas pernas, até que ela deixou de ser carne e
osso para se transformar em lava. Seu corpo todo começou a se mover em cega resposta
àquele ritmo enlouquecedor.
Porém, quando sentiu a mão do sheik deslizar por sua coxa, ela recuperou o bom
senso juntamente com uma enorme sensação de pânico.
— Não! Por favor! — Ela lutou para se livrar das mãos que agora tentavam erguer o
cafetã.
Ele a olhava com paixão, as narinas infladas, não parecia disposto a parar.
— Estou com medo, Seaman — Bethsheba confessou rouca, sincera. — Estou
apavorada. Isto é uma loucura.
Fez-se um silêncio carregado de tensão. Suliman lutava por recuperar o
autocontrole, e ela o ouviu respirar fundo antes de responder.
— Uma loucura que ambos sentimos Sheba. Não negue o que há em sua alma, ou
sua alma te negará. Seria um inferno que não desejaria ao meu pior inimigo.
— Não posso. Simplesmente não posso. — Bethsheba fechou os olhos para não ler a
negra verdade nos dele, mas as lágrimas não foram contidas com esse gesto. Cada uma
deslizou por uma face até cair sobre a almofada.
Seaman soltou-lhe os braços, cobriu-a e em seguida a abraçou.
— Não deve haver lágrimas numa cama de amantes. O ato do amor é o mais doce
dos prazeres... Até sua dor é doce.
— Tenho tanto medo! — ela desabafou contra o peito, agora protetor. — Jamais
deveria ter permitido que você lesse minha mente, Seaman. Foi uma insensatez.
— Ah, então admite? — ele zombou, mas sua voz soou terna.
— Você sabia... Você sabia todo o tempo. — A vergonha a fez corar.
— Li em seus olhos, bint. — Suliman sorriu triunfante. — No deserto, naquele
primeiro dia. E na tensão de seu corpo quando desmontei.
— Não foi proposital. Não foi consciente.
— Também percebi isso. — O sheik a abraçou com mais carinho ainda. — Você tem
o rosto de uma virgem, e o corpo de uma gata. Uma combinação explosiva, para qualquer
homem. O desejo de domar tal mulher faz minha cabeça rodopiar. — Os braços de
Suliman a apertaram possessivamente. — Faz meu sangue latejar nas veias c faz meu
corpo lhe pertencer. — Ele pressionou o membro rijo contra seu baixo-ventre.
— Você não está entendendo... — Bethsheba arregalou os olhos.
— Estou entendendo perfeitamente. — Seaman a interrompeu. — Você aceitou o
desafio em meus olhos e o destino que lhe ofereci, mas, como virgem, teme realizá-lo.
— Nunca aceitei...
— Está aqui em minha tenda. O destino está acima de você.
Lenta e silenciosamente ela voltou a encará-lo e seu coração se apertou conforme
tentava negar o que ele dizia.
— Você me compreende, não é, Sheba?
— Teria outra escolha? — ela indagou amarga.
— Muito bem. — Seaman segurou-lhe o rosto com ambas as mãos. — Agora que nos
entendemos, dormiremos, e amanhã partiremos para o grande palácio de Suliman!
— Mas... Eu pensei que você quisesse permanecer aqui!
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— Não, Sheba, quando chegar o momento de sua rendição, será no palácio de meus
ancestrais, conforme está escrito.
— Não permitirei que me leva para lá. — Bethsheba o empurrou, a determinação
brilhando nos olhos dourados.
— E não permitirei que...
— Fará o que eu mandar, e irá para onde eu a levar. — O sheik se levantou e
caminhou para a saída da lenda, detendo-se ali e virando a cabeça por cima do ombro. —
Descanse esta noite, Sheba, pois amanhã cavalgaremos para o cumprimento de nosso
destino.
Ele se foi, então, deixando Bethsheba fitando o vazio, com os olhos cheios de raiva,
as mãos contorcidas e impotentes.
— Isto não pode estar acontecendo comigo! — ela falou consigo mesma. — Preciso
fazer alguma coisa!
Por volta de uma hora o acampamento estava completamente silencioso. Bethsheba
caminhara horas e horas de um lado para o outro da tenda, até não ouvir um único ruído,
quando saiu. Todas as fogueiras estavam apagadas, com exceção de uma, ao lado da qual
estava sentado um vigia com um rifle.
Bethsheba se recusava a se deixar intimidar. Tirou cuidadosamente os chinelos e se
arrastou entre o guarda e os cavalos amarrados às árvores do oásis.
O guarda não se movia. Estava adormecido. O alívio a fez respirar e caminhar mais
depressa. Porém, os cavalos estavam sem as selas.
Seu coração quase parou de bater. Sem selas! E agora, o que faria? Nunca cavalgara
num cavalo em pêlo... Sim, já passara por essa experiência uma vez em Bahrain!
Quando era pequena, havia um grande haras perto de sua casa e, desafiando todas
as convenções, ela fizera o pai persegui-la pelo deserto, livre e destemida como uma
índia.
Fui destemida uma vez, Bethsheba pensou, mas onde teria ido parar toda aquela
coragem? Destruída pela maturidade, pela tragédia e pelo desespero. Passarinhos
indefesos que precisavam cantar para ganhar a vida não podiam fazer muito mais do que
enfrentar o desafio diário de um microfone.
Seus lábios se apertaram num rito de determinação. Entre os animais encontrou
aquele que Suliman lhe dera para vir até o acampamento. Muito bem, ele estava sem sela,
mas com as rédeas, e ela tinha coragem e uma razão muito boa para fugir. Caso Suliman
a levasse para seu palácio no Saara, ele a teria em sua cama antes do próximo pôr-do-sol,
e isso ela não poderia deixar que acontecesse.
Bethsheba partiu bem devagar. Não podia correr o risco de despertar o guarda. Só
depois que se afastou uns seiscentos metros, correu como fazia quando criança.
O alívio e a excitação da vitória a inebriava. Era maravilhoso cavalgar sem sela.
Sentir seu corpo em perfeita harmonia com os movimentos do trote, as tendas se
perdendo a distância.
O vento açoitava seus cabelos, o tempo passava e ela continuava cavalgando.
Cavalgou por horas. A aurora começava a tingir as areias de lilás. O dia se anunciava
impiedosamente. Logo o sol nasceria e com ele o perigo.
O sol, agora, queimava sua cabeça e cobria seu corpo de suor. Estava exausta, os
dois estavam exaustos. Fazia um calor insuportável. Bethsheba sabia que precisava parar
e descansar na primeira oportunidade, ou o cavalo morreria.
Ao ver um pouco de verde despontar no horizonte, quase chorou de alívio. Rezava
para que não fosse uma miragem. Mas o cavalo também vira o oásis abençoado, pois
rumou imediatamente para lá.
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O cavalo bebia sedento, do pequeno lago, e ela desmontou cambaleante, para
mergulhar o rosto e os cabelos nas águas refrescantes. Após beber até matara sede,
recostou-se em uma palmeira. O lugar era lindo... ela fechou as pálpebras... estava tão
cansada. Mas não podia se demorar. Precisava encontrar uma cidade, um telefone, a
segurança!
Olhou para o cavalo. Ele descansava sob a sombra de uma árvore. Talvez fosse
melhor ficarem ali...
O sono lentamente a reclamava, por mais que ela tentasse resistir...
CAPÍTULO V
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Suliman, por sua vez, desmontou e começou a caminhar, a túnica branca e o chicote
balançando ao vento.
— Não me machuque! — ela implorou e tentou se levantar, uma das pernas se
descobrindo ao movimento.
Ele se inclinou sobre ela, implacável.
— Grite! — Foi à ordem seguida por um novo estalar do chicote.
Bethsheba se arrastou o suor se misturando à areia.
— Por favor...!
— Grite! — Dessa vez o chicote não lhe tocou a perna nua por um milímetro. Ela
ergueu os olhos e subitamente compreendeu.
Gritou como se tivesse perdido o juízo, enquanto ele sorria e continuava fingindo
açoitá-la.
— Basta! — Suliman sussurrou e se ajoelhou, abraçando-a. Bethsheba se aninhou
entre seus braços sem relutar, escondendo o rosto no peito arfante e aspirou o cheiro
másculo.
— Obrigada.
— Não deveria ter fugido — ele a repreendeu. — Eu não a teria forçado a fazer amor
comigo. Isso não estava claro?
— Não, não estava. Eu, no entanto, deixei bem claro que queria voltar para casa, e
que não queria me entregar... Oh! — Ela se deteve com um gemido ao sentir a mão
quente lhe apertar em seio.
— Mas você quer fazer amor comigo. — O sheik sorriu ao ver o intenso rubor em
suas faces. — Admita esse desejo e satisfaça-o.
— Satisfazer você, isso sim é o que espera. Não quero ser usada. Sei que não gosta
de mim, Suliman. Apenas deseja...
— Assim como você, bint — ele respondeu e em seguida a silenciou com um beijo
possessivo e apaixonado, que lhe provocou uma resposta aterradora.
Risos e aplausos distantes alcançaram os ouvidos de Bethsheba e o orgulho e a
dignidade a fizeram lutar. Ele prendeu-lhe os braços e imobilizou-a com o peso de seu
próprio corpo. Beijou-a tanto que ela pensou que fosse morrer sufocada.
Quando finalmente ergueu a cabeça, Suliman examinou detidamente o rosto
zangado e corado, e sorriu satisfeito.
— Eu a conquistarei, gata selvagem, e transformarei suas mordidas e arranhões em
marcas de amor.
— Nunca! Jamais!
— Sua recusa só me excita. — Ele se levantou, carregando-a nos braços até seu
próprio cavalo. Para os homens era óbvio que o sheik tivera absoluto sucesso em domar
sua gata.
Bethsheba nada podia fazer a não ser bufar de ódio. Não havia como escapar
daqueles braços fortes que a rodeavam, enquanto seguravam as rédeas.
Cavalgaram por horas e horas pelas areias infinitas, um dos homens carregando uma
bandeira vermelha e dourada, símbolo de Auda Khazir, e de poder.
Estou me sentindo quase feliz por ter sido encontrada, ela reconheceu, surpresa. É
misterioso e excitante estar aqui em pleno deserto com um verdadeiro sheik, respirando
aquele ar oriental e guerreiro.
Já era tarde quando avistaram o douar. O calor enfumaçava o horizonte, fazendo
com que as tendas de pele de cabra parecessem uma miragem.
O sheik disse algo em árabe, riu e se dirigiu para a tenda real. Seu povo veio-lhe ao
encontro, rindo também, e olhando para Bethsheba de uma forma que a fez corar violen-
tamente.
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Ele desmontou, segurou-a pela cintura e a fez deslizar até o chão. Estalou os dedos,
deu ordens a um criado, e em seguida a conduziu até o interior da tenda.
— Agora, bint, você me explicará direitinho por que fugiu — ele falou, entre os
dentes.
— Mas pensei que...
— Você fugiu de mim! — Suliman gritou os olhos brilhantes de fúria... A fúria que ele
mantivera escondida no deserto, mas que agora explodia com toda sua intensidade. —
Fugiu de mim? Do sonho que eu tornei realidade para você?
— Isto não é um sonho! — ela protestou assustada com esse aspecto da
personalidade de Suliman que ainda não conhecia. — Sou sua prisioneira. Não tenho
direitos nem esperanças de liberdade.
— Você quer isto. — Ele apontou para as almofadas de seda, para os tapetes Shiraz.
— Você quer tudo que eu tenho para dar: meu amor, meu mundo, meu deserto.
— Não dessa forma! — ela o desmentiu. — Não seqüestrada, cativa e açoitada...
— O chicote não a tocou!
— Fui humilhada diante de seus homens.
— Eu sou o sheik e você é minha mulher. — Ele avançou perigosamente. — Aos
olhos deles e aos meus, ou você me obedece ou arca com as conseqüências.
— Não sou sua mulher. Foi preciso me raptar para me manter aqui. Isso me torna
sua prisioneira, não sua...
— Cale-se! — Ele agarrou-a e a puxou ao seu encontro, embora ela se debatesse. —
Então não é minha mulher. É apenas a pobre vítima inocente de um seqüestrador. Uma
mulher indefesa sendo forçada a responder às minhas vis atenções.
— Exatamente! Sou uma vítima inocente.
— Então não gosta quando eu a toco? — Ele prendeu-lhe os braços às costas como
se fosse algemá-la.
— Você é um bárbaro! — Bethsheba tremia de raiva e excitação. — Um selvagem!
Um...
— Sim? — O sheik interrompeu-a, rude, e num gesto rápido puxou o cafetã,
revelando completamente os seios arfantes.
— Tire essas mãos imundas de mim! — ela falou a voz baixa e rouca em toda a sua
humilhação.
— Você também me quer bint. — Os olhos do sheik brilhavam furiosos e
dominadores. — Admita ou...
— Solte-me!
— Admita! Diga o que sente por mim. Admita de uma vez e coloque um fim nessas
mentiras!
— Nunca!
— Uma palavra muito definitiva, Sheba. — Subitamente, a ameaça vibrou entre eles.
Por mais que Bethsheba lutasse, seu coração adquiriu um ritmo alucinante que sobrepujou
o orgulho e a determinação.
Suliman a empurrava para as almofadas. Seus corpos caíram juntos, e o medo de
seu próprio desejo lhe deu forças para uma última tentativa desesperada de escapar.
— Não... Não...
Mas, por mais que sua boca negasse, o corpo dizia diferente. Era só sentir os lábios
de Suliman se fecharem sobre os seus, suas mãos a acariciarem ou mesmo a prenderem
seus pulsos, e ela o recebia com prazer.
— Você me quer. — Ele não descansaria enquanto não admitisse de viva voz. Seus
olhos a fitavam com ironia enquanto explorava-lhe a boca com uma sensualidade devas-
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tadora, e os seios com aquelas mãos fortes e quentes. Oh, Bethsheba não podia resistir
quando ele lhe tocava os seios.
— Não... — Ela se contorcia sob o sheik, numa tentativa de reter a consciência.
— Diga sim — Suliman ordenou e inclinou a cabeça. No momento que lhe sugou o
seio, Bethsheba gemeu como se estivesse se afogando.
— Pare com isso! — ela protestou, odiando-o e amando-o.
— Detesto quando você...
— Diga que me quer Sheba, ou te possuirei agora — ele a interrompeu.
— Não! — Ela tornou a negar, para gemer ainda mais alto quando Suliman deslizou
a mão por sua coxa.
— Diga! — O sheik não se cansava de repetir. Beijava-a e apertava-a entre seus
braços, até que Bethsheba finalmente começou a pensar em ceder.
— Oh, Suliman, por favor...
— Diga que me quer! — Ele ergueu o cafetã dourado até a altura da cintura, e
separou-lhe as pernas. — Diga imediatamente ou eu te possuirei, Sheba. Agora. Juro que
a farei minha!
— Sim — ela sussurrou, numa mescla de excitação e terror. — Direi qualquer coisa...
— A verdade. Quero que diga apenas a verdade. Que se sentiu atraída por mim
desde a primeira vez em que me viu. Que desejava que isto acontecesse.
— Sim, sim.
— Quero ouvir isso com suas próprias palavras.
— Eu te quis desde a primeira vez — Bethsheba confessou. — Quis que isto
acontecesse... E ainda quero.
Com uma exclamação de triunfo, Suliman se apossou novamente da boca macia e
dessa vez o beijo foi tão apaixonado que Bethsheba se sentiu desfalecer de prazer.
Apertou cegamente os ombros musculosos. Era a primeira vez que se permitia tocá-
lo, sentir-lhe o pulsar do sangue, vibrar com o corpo que cobria o seu. Era maravilhoso fi-
nalmente se entregar às emoções... Porém, uma espécie de agitação exterior se infiltrou
pela tenda.
O sheik pareceu parar de respirar.
— O que foi? — Bethsheba pestanejou relutante em romper aquela intimidade doce
e vibrante.
Os homens gritavam lá fora, os cavalos estavam agitados...
— Um helicóptero! — Suliman exclamou.
O olhar perplexo encontrou-se com o súbito reconhecimento.
— Chris!
— O bastardo veio buscá-la — o sheik praguejou. — Voltará com ele?
Incapaz de falar ou sequer de respirar, Bethsheba o fitava, confusa.
— Irá com ele? — Suliman apertou-lhe os ombros e a encarou, ansioso.
Que escolha ela tinha? Logicamente voltaria com Chris. Mas não seria tola ao ponto
de dizê-lo. Suliman ficaria furioso e tentaria escondê-la. Portanto, ela se limitou a fitar
aqueles olhos escuros e poderosos, sem nada responder.
— Mesmo que se recuse a me responder, Sheba, poderá ao menos dizer que foi
sincera quando admitiu que me queria? Era realmente verdade?
As hélices do helicóptero giravam agora sobre a tenda real, levantando uma nuvem
colossal de areia.
— Sim — Bethsheba admitiu, pois agora se sentia segura. Prestes a escapar do sheik
para sempre, ela se entregou ao breve momento de liberdade, para abrir seu coração. —
Sim, eu compartilhei de uma fantasia por todo o tempo.
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Fez-se um silêncio carregado de tensão e um sorriso implacável surgiu nos lábios de
Suliman. Soltou-a inesperadamente, e Bethsheba se sentiu como se fosse um brinquedo
usado e jogado fora. Com um rápido olhar em sua direção, ele deixou a tenda.
Ela se sentou sobre as almofadas, quase explodindo de indignação. Que
atrevimento! Forçara-a a confessar seus segredos mais íntimos, para depois largá-la como
se fosse uma boneca sem sentimentos!
Odiando-o mortalmente e odiando-se ainda mais, ela saiu da tenda trêmula e
corada. O helicóptero aterrissava naquele exato instante e o sheik se dirigiu para ele.
Chris Burton saltou do aparelho, os cabelos louros esvoaçando, alto e clássico. Um
Apoio encarnado.
— Chris! — Bethsheba gritou e correu para ele de braços abertos.
Um olhar de esguelha e ela vislumbrou o ciúme enrijecendo as feições de Suliman, o
que era merecido. Ele jamais poderia tê-la jogado de lado tão displicentemente, após tudo
o que acontecera.
— Beth, eu quase enlouqueci! O que deu em você?
— Um impulso. Agi sem pensar... — Ela soluçou.
— Já imaginou o que poderia ter te acontecido?
— Ela estava sob minha proteção — soou a voz autoritária do sheik.
Chris o encarou muito zangado, Bethsheba ainda entre seus braços.
— Ela vale milhões. É uma estrela de primeira grandeza e centenas de pessoas
dependem dela. Não poderia permitir que se aventurasse simplesmente pelo deserto. Meu
maior receio era que alguém a houvesse seqüestrado e estivesse se preparando para
pedir o resgate.
— Deve estar cansado após a longa procura — o sheik o interrompeu. — Posso
oferecer um refresco?
— Deve estar brincando! — Chris estava furioso com a arrogância do poderoso líder.
— Vou levar Bethsheba imediatamente para...
— Seu piloto está exausto. — Suliman o interrompeu novamente. — Eu vou lhe
oferecer uma xícara de chá de hortelã antes que volte para Tanger.
— Espere um minuto. — Chris deu um passo para o sheik, que lhe deu as costas e
começou a se afastar. — Tenho muito a dizer antes que...
O sheik se voltou com a agressividade de um gavião.
— Poderá falar com Sheba em particular, na tenda real. O chá será servido lá.
— Bem — Chris murmurou com desalento, ao ver o piloto se afastar juntamente com
o sheik —, acho que posso perder mais uma hora. Mas que não me falta vontade de dar
um soco naquele cara, não falta. Quem ele pensa que é?
— O maior dos príncipes do deserto. — Bethsheba suspirou.
— Precisamos conversar Beth. Por que não me leva a essa famosa tenda real?
Os dois caminharam pela areia. Bethsheba estava descalça e seus cabelos
completamente desgrenhados depois da tentativa de Suliman de fazer amor com ela.
— Não acredito! — Chris exclamou ao entrar. — Mas é sensacional! É se entrar num
livro de histórias das mil e uma noites!
— Sim. — Beth olhou para o luxo, ao qual já estava se acostumando.
— Agora entendo por que você caiu na tentação de vir até aqui. — Chris aspirou o
incenso perfumado e tocou uma das almofadas. — Que lugar incrível!
— Como viver uma fantasia...
As palavras sonhadoras ficaram pairando no ar, e Chris a olhou como se a visse pela
primeira vez. Até aquele instante não havia notado o brilho de sensualidade que se refletia
nos olhos e no corpo de Bethsheba, na boca cheia e vermelha, provocada pelos beijos do
sheik.
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— Uma fantasia, Beth? — Ele a fitou muito sério. — O que houve por aqui?
— Não houve nada. — ela mentiu.
— Então, por que ficou vermelha? Você não parece mais a Beth que conheço. Algo
mudou...
— Estou tão horrível assim? — ela tentou se defender, envergonhada.
— Não foi isso que eu disse. Bem... Só estou pensando em sua carreira, em seus fãs.
Sua imagem é perfeita. Jovem, inocente, saudável. Os adolescentes te adoram porque
você representa tudo o que eles desejam ser. Sabe o ditado... Nunca modificar uma
fórmula de sucesso.
— Não sou uma fórmula — ela protestou. — Sou uma mulher!
— Não disse que era uma fórmula. Só disse... O que se passou neste lugar, Beth?
Você mudou completamente!
— Em algumas horas? — ela inquiriu assustada. — Não seja ridículo!
— Foi o sheik, não foi? Foi ele o responsável.
Não sei do que está falando. — O rosto escarlate a delatou.
— Ele fez amor com você! — Chris murmurou pálido.
— Não! — Bethsheba se virou de costas para que Chris não visse a culpa em seus
olhos. Como ele pudera perceber? Quase adivinhar?
— Eu acertei, não é? — Chris apertou os punhos. — Aquele infame...
O diálogo foi interrompido pela entrada de um criado em traje e turbante brancos,
que depositou uma bandeja com chá e biscoitos numa mesinha, antes de sair com uma
reverência.
— Posso servir uma xícara? — Bethsheba indagou ansiosa por mudar de assunto. —
Deve estar morto de sede.
Chris se aproximou a fúria em seu rosto tão intensa quanto à acusação em seus
olhos.
— Tome. — Ela sorriu tensa. Em seguida também se serviu de uma, sorvendo o
líquido lentamente enquanto se recostava nas almofadas.
— Meu Deus — Chris balançou a cabeça —, você está tão à vontade como se
estivesse em sua própria casa.
Ela o olhou com sensação de culpa.
— É como se pertencesse a este lugar.
— Não diga bobagem.
— Bobagem é você tentar negar. Sei que estou certo. O bastardo do Suliman fez
amor com você!
— Chris...
— Sim, ele a possuiu e com isso arruinou o que havia de mais precioso em você. —
Chris estava tão zangado que se conteve para não atirar a xícara no chão.
— Chris, você está tecendo conclusões que... — Não minta para mim! — Ele se
ajoelhou sobre as almofadas. — Era o que a tornava especial... A inocência, a pureza...
Como uma flor numa redoma de vidro... Intocada, imaculada...
— Chris! — Bethsheba exclamou, chocada.
— Era incrivelmente sexy, mas não sabia. Não fazia a menor idéia do quanto
excitava os homens.
— Oh, Deus...
— Mas agora tem consciência! — Chris bradou, indignado. — O maldito Suliman lhe
revelou esse poder. Transformou minha adolescente em uma mulher e...
— Não sou mais uma adolescente! — Bethsheba o interrompeu.
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— Sempre será uma adolescente para os fãs. Deveria continuar ser sempre um
modelo para eles. Acha que gostariam de imitá-la agora? Como a amante de um sheik
árabe?
— Não sou amante de Suliman — ela protestou.
— Mas será se continuar nesta droga de deserto por mais um segundo que seja.
— Ele não fez amor comigo, Chris. Juro.
— Beth! — Chris gemeu e subitamente a abraçou com tanta força que ela mal pôde
respirar. — É mesmo verdade? Jure outra vez!
— Estou sendo sincera. Suliman não fez amor comigo. Naquele exato momento, o
sheik entrou na tenda, e seus olhos faiscaram ao surpreender Bethsheba e Chris abraça-
dos, sobre as almofadas.
— Oh! — Bethsheba se desvencilhou dos braços de Chris ao ver Suliman. Seu
coração quase parou de bater. — Suliman, eu...
— Vim convidá-los para jantar em minha mesa — Suliman murmurou. — Em dez
minutos. Ambos. — Ele saiu da tenda sem mais uma palavra.
— O sheik sempre fala com você nesse tom? — Chris quis saber, intrigado.
— Não te falei que não havia nada entre nós? — Bethsheba corou.
— Por que está aqui, então? Por que veio para cá?
— Não vim por minha própria vontade. Fui raptada — ela confessou, por fim.
— O quê?
— Ele me raptou e me trouxe para cá contra minha vontade. Sou sua prisioneira,
Chris, não sua amante!
— Por que não me contou antes?
— Poderia ser perigoso. — Ela engoliu em seco. — Ele é o dono e senhor absoluto
desta terra e desta gente. Não temos alternativa, exceto nos curvarmos a sua vontade.
— Tudo bem — Chris concordou furioso —, mas eu sou o dono e senhor do
helicóptero, e, assim que terminarmos esse jantar indesejável estaremos voando para
Tanger!
Bethsheba olhou para Chris e descobriu, subitamente, que sua porta de saída para
Tanger, para o Ocidente, para Chris e para o mundo em que vivera nos últimos sete anos
significava a volta para o inferno.
A saída para o Ocidente fora fechada e trancada pelo sheik, e nenhuma força no
mundo teria condições de abri-la.
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CAPÍTULO VI
O jantar foi servido em longas mesas de arabescos em frente à tenda real. O sol se
escondeu rapidamente. Desapareceu por detrás das dunas como um disco de fogo em dez
minutos. Inúmeras fogueiras foram acesas imediatamente, e o céu se transformou em
sombras negras e vermelhas.
Suliman estava arrogantemente relaxado. Recostado em sua cadeira, observava o
povo com as pálpebras semicerradas. A carne era farta e suculenta, fortemente
temperada e coberta por molhos espessos. Bethsheba jantou com apetite. O sheik,
também. Apenas Chris mal tocou no prato, o rosto carregado de tensão.
— Beth! Temos de ir. São quase oito horas e a viagem para Tanger leva duas horas.
— Sim, é claro. — Ela olhou imediatamente para o sheik. A partida seria dolorosa.
— Sheik Suliman — Chris pigarreou —, sua hospitalidade foi magnífica e muito
apreciada. Agradecemos mas precisamos partir.
— Sim, claro, mas antes haverá música e dança.
— É muita amabilidade sua, mas...
— Trata-se de um costume nosso — Suliman explicou, num tom que não admitia
réplica e bateu palmas.
Como num passe de mágica, tambores e sinos se fizeram ouvir. Khalisha surgiu das
sombras, belíssima numa roupa de seda transparente vermelha que deixava o ventre à
mostra, e os cabelos longos e negros flutuando como asas de borboleta.
Até Chris se empertigou na cadeira. Khalisha dançava para ele como se fosse
Salomé, sem desviar os olhos do rosto que se mostrava totalmente fascinado por ela.
Os címbalos soavam em seus dedos a cada vez que avançava ou recuava da mesa
real. As mãos de Chris chegaram a tremer tal a volúpia que exalava daquele corpo moreno
e daqueles olhos hipnóticos.
— Ela é magnífica, não, Burton? — Suliman indagou frio.
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— Magnífica! — Chris concordou, esvaziando seu copo de uma única vez. A um
estalar de dedos do sheik, e ele foi rapidamente enchido. Chris o esvaziou novamente.
Os címbalos estalavam furiosamente. O suor brilhava no rosto e no corpo de
Khalisha. Ela se contorcia e girava conforme a música atingia o clímax.
Bethsheba não perdia um só movimento, o rosto pálido de ciúme e raiva de Suliman.
Sim, Khalisha estava magnífica aquela noite, mas ele precisava elogiá-la na sua frente?
De repente, Khalisha se atirou aos pés de Chris. A música parou.
— Fantástico! — Chris se levantou, aplaudiu entusiasticamente e levantou Khalisha
com gentileza. — Você deveria me visitar em Tanger. Eu poderia torná-la uma estrela. Se
souber cantar tão bem quanto dança...
— Khalisha pertence ao deserto. Ela morreria se fosse confinada no Ocidente — o
sheik o interrompeu.
— Mas ela é fantástica, a melhor... — Ele levou a mão à cabeça, as feições
contraídas. — Ela... Eu... — Chris balançou a cabeça, muito pálido.
— Chris? — Bethsheba se levantou, preocupada.
— Estou me sentindo mal. Deve ser o calor — Chris murmurou e em seguida
cambaleou.
— Talvez fosse melhor ele se deitar — Bethsheba se voltou, ansiosa, para Suliman.
— Talvez fosse melhor ele cair de uma vez! — Suliman se levantou.
Fez-se um silêncio de perplexidade.
— O chá... — Chris reconheceu tardiamente — estava drogado. — Suas pernas se
recusaram a continuar sustentando-o, e ele caiu por cima da mesa com um estrondo de
madeira, copos e pratos se quebrando.
— Chris! — Bethsheba tentou socorrê-lo.
— Deixe-o! — Suliman a deteve e puxou-a para trás. — Meu povo o atenderá.
— Solte-me, maldito! — ela gritou. — Chris pode estar ferido!
— Venha comigo! — Ele a arrastou para a tenda.
— Não. — Bethsheba tropeçou. Olhou para trás a tempo de ver dois serviçais
carregando Chris. — Para onde o estão levando? O que...
— Para um lugar onde ele possa dormir tranqüilamente. — Suliman a conduziu para
o interior da tenda. — Quando acordar o sol já estará alto e nós dois muito longe daqui.
Bethsheba cambaleou, sem fôlego, o coração em disparada.
— Realmente acreditava bint, que eu fosse permitir que ele a levasse para longe de
mim?
— Mas você prometeu...
— Menti. — Ele agarrou-lhe os pulsos e a atraiu para junto do peito. — Mas você não
fez isso, não é, Sheba? Disse-me a verdade. Que me queria que me desejou desde que
nossos olhos se encontraram, assim como eu a desejei.
— Eu não sabia o que estava dizendo — Bethsheba protestou. — Estava
amedrontada. Teria dito qualquer coisa!
— Pois a armadilha agora acabou de se fechar sobre você!
— Não pode fazer isso comigo... — ela sussurrou. — Não pode...
— Partiremos imediatamente. — O sheik a soltou de repente, e foi até um baú de
onde retirou uma coleção de roupas. — Vista-as. Sairemos daqui disfarçados, Sheba. Seu
amigo não conseguirá nos encontrar, nem que vasculhe o deserto inteiro com seu
helicóptero.
— Chris não desistirá até me encontrar! Nada poderá detê-lo.
— Seu amigo estará à procura de um sheik e uma linda loura. — Suliman zombou. —
Passará direto por dois beduínos em roupões pretos. Pode estar certa.
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Ele a deixou trêmula de raiva e excitação. Como ousava? Drogara Chris, tornara-o
seu prisioneiro para que pudesse raptá-la por uma segunda vez!
Alguém se aproximou.
— Vá embora! — Bethsheba gritou impulsiva, antes de notar que era Khalisha e não
o sheik, quem estava de pé à entrada.
— Meu amo ordenou que viesse ajudá-la. Deve se vestir o mais rápido possível.
Bethsheba atirou todas as roupas sobre as almofadas.
— Não o farei.
— Dispa-se para que eu possa ajudá-la. — Khalisha começou a recolher as roupas,
os olhos negros desdenhosos. — Meu amo deseja partir imediatamente.
Bethsheba percebeu que a outra a detestava. Então, ainda sentia ciúme de seu
relacionamento com o sheik? Uma súbita esperança a iluminou. Talvez Khalisha a
ajudasse a escapar.
— Não quero ficar com Suliman. — Bethsheba falou baixinho, esperando pela reação
de Khalisha.
— Por que uma mulher recusaria um homem como o sheik? — Ela deu um risinho de
escárnio.
— Mas é verdade. Eu quero voltar com Chris para Tanger — Bethsheba repetiu.
Khalisha hesitou, para rir em seguida.
— Você mente inglesa. — Num rápido movimento, a moça despiu Bethsheba e
começou a banhá-la com uma água morna e perfumada.
— Se eu quisesse estar com Suliman, por que acha que eu tentei fugir ontem à
noite?
Khalisha a fitou em silêncio por alguns segundos.
— Mesmo que seja verdade, o que poderia ser feito? O coração de Bethsheba
acelerou.
— Quando Chris acordar oriente-o para me encontrar. Mostre como estarei vestida.
— Seu eu fizer isso, você poderia me trair para meu amo.
— Não, se Chris me encontrar e me levar de volta para Tanger.
Do lado de fora, a atividade no campo era imensa. Os cavalos estavam sendo
selados, e a babilônia dos homens era um sinal de que o sheik estava pronto para partir.
— Pensarei em seu pedido, sitt — Khalisha murmurou. — Não falemos mais nada.
O alívio se estampou no rosto de Bethsheba. A resposta fora sim: não na voz, mas
nos olhos. Ela contaria a Chris sobre seu paradeiro logo que ele acordasse.
Assim que terminou de se vestir, olhou-se no espelho.
Uma rainha guerreira a fitava do outro lado. Bethsheba prendeu a respiração. O
turbante vermelho-escuro e as túnicas negras lhe emprestavam uma majestade jamais
possuída.
Os olhos pintados com kajal, as pernas cobertas por botas também vermelho-
escuras, ela saiu da tenda. Os homens lhe endereçavam olhares curiosos, e se inclinavam
respeitosamente ao vê-la passar.
Um homem alto se dirigiu a ela. O corpo arrogante denunciava-o, mesmo sob o
disfarce. Bethsheba o reconheceria em qualquer lugar, em qualquer roupa. Seu corpo não
se deixaria enganar, tal a atração que os unia.
— Ostenta sua roupa com o porte de uma rainha guerreira — ele a elogiou,
assustando-a com a referência que ela própria havia usado diante do espelho. Não
respondeu. Seu coração acelerado dificultava-lhe a fala. Desejava-o e odiava-o. Ao mesmo
tempo desejava fugir e se render.
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— Minha gata... — Suliman sussurrou, e tirou o véu que lhe escondia o rosto. —
Minha rainha guerreira! — Ele a abraçou e beijou-lhe a boca sem a menor cerimônia
diante dos homens.
Quando a liberou, estava corado e seus olhos brilhantes de paixão. Bethsheba
vacilou consumida pelo fogo e pelo ódio. Como era possível que um homem a afetasse
tanto?
— Venha! — Ele tomou-a pela mão. — Precisamos partir imediatamente.
Caminharam juntos até os cavalos. À luz das fogueiras os dois garanhões pareciam
brilhar, e os cantis balançavam dependurados às selas.
— Chris está bem? — Bethsheba quis saber, ressentida. — A queda o feriu?
— Não se mostre tão preocupada por ele, Sheba, se não quiser provocar a ira de um
homem ciumento!
— Também drogou o piloto?
— O piloto é de Auda Khazir, bint. — O sheik deu uma gargalhada. — Somos uma
tribo antiga. Podemos ser encontrados por toda a parte, inclusive em helicópteros!
Suliman montou e tomou as rédeas. Bethsheba o fitou por um momento com
rebeldia. Em seguida apertou os lábios e montou, a cabeça erguida orgulhosamente.
— Pegue. — Suliman lhe entregou uma espada longa e curva. — Enfrentaremos um
campo perigoso e precisamos nos armar.
— Não posso. — Bethsheba olhava para a cimitarra com horror.
— É preciso.
— Mas você não disse que iria me levar para o Grande Palácio de Suliman?
— Sim, mas ele fica muito longe daqui e precisaremos cavalgar sozinhos para evitar
sermos reconhecidos. — Ele estendeu a cimitarra. — Vamos, pegue-a!
Seus olhos se encontraram em tenso silêncio. Lentamente, ela apanhou a arma e a
segurou em sua mão, espantada que ela não tremesse.
— Guarde-a, bint. Há uma bainha em sua cintura. Muito séria, Bethsheba fez o que
ele pedia, e o seguiu pela escuridão da noite, sem falar ou olhar para os lados. O troar dos
cascos sobre a areia, as estrelas no firmamento, a luz distante das fogueiras do douar,
tudo lhe provocava uma sensação de felicidade profunda.
Após uma hora de viagem encontraram-se em pleno deserto selvagem. Suas únicas
companhias eram a lua, as estrelas e o vento.
Deveria ser quase meia-noite quando o templo surgiu no horizonte. De início,
Bethsheba julgou fosse sua imaginação. As imensas paredes de pedra eram somente
formas negras àquela distância. Mas pouco a pouco foi percebendo que era real.
— É o Grande Palácio de Suliman? — ela quis saber.
— Não. Mas ficaremos lá esta noite.
Era um templo antigo, em ruínas, ela notou ao se aproximar. Deveria ter mais de mil
anos com seu teto decadente, a entrada com inscrições e símbolos árabes.
Os desenhos eram magníficos e Bethsheba desejou saber o que significavam.
— Que lugar é este? — ela indagou deslumbrada pela beleza antiga e pela
serenidade existente.
— É o templo de Sheba. — A voz de Suliman ecoou pelo pátio que levava às altas
portas arqueadas.
— Sheba! — Ela sentiu a garganta apertar e deteve imediatamente seu cavalo.
Suliman também se deteve, pouco à frente, virando-se para ela.
— Não tema seu destino, Sheba. Este é seu santuário e aqui seu destino é forte. Em
cada inscrição, em cada parede está a verdade de seu nascimento. Este é seu templo, sua
essência.
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O sheik desmontou com graça. Bethsheba não conseguia desviar o olhar daquele
homem que mudara completamente sua vida. Jamais sentira tanto medo.
— Você pretendia me trazer aqui de qualquer forma, não é?
— Sim — ele concordou e caminhou até o cavalo. Estendeu os braços, segurou-a
pela cintura e a ajudou a apear. — Estava escrito. Aqui você poderá entender tudo.
Venha... Enfrente seu destino!
Os dois começaram a subir os degraus de pedra escura. Bethsheba lutava para não
perder o controle. A entrada era alta e larga. O corredor, à frente, era longo e também
muito alto. As paredes estavam desenhadas em toda a extensão. No extremo oposto,
havia uma tênue luz dourada.
— Este caminho leva ao coração do templo, o coração de Sheba — Suliman
cochichou.
Bethsheba nunca o vira tão lindo e imponente como agora, naquele traje negro, e
turbante arrematado por uma enorme pedra preciosa.
Subitamente uma forte luz a ofuscou.
— Oh! — Ela recuou, e levou ambas as mãos aos olhos.
— Dê-me sua mão! — Suliman ordenou. — Precisamos entrar juntos.
Ela lhe deu a mão e prosseguiu às cegas. Apenas os dedos fortes de Suliman a
guiavam. Mas, mesmo com os olhos fechados, ela subitamente não conseguiu suportar a
luz e gritou assustada.
A luz se apagou.
— O que houve? — Bethsheba esfregou os olhos e olhou ao redor. — A luz surgiu e
desapareceu tão de repente que eu...
— Era o Túnel da Lua — Suliman lhe explicou. — A luz penetra por aquela abertura
no teto.
Bethsheba ergueu a cabeça e viu o túnel longo e esférico captando a luz prateada da
lua e enviando-a para uma enorme estátua de ouro.
Fitou estarrecida a mulher de corpo e longos cabelos dourados. Ou melhor, a cabeça
e dorso de uma mulher, pois a parte de baixo era de uma gata.
— Sheba! Com sua beleza, ela cega a todos que se aproximam. Só se está seguro
contra sua luz, quando se atinge seu coração.
— O coração...! — Bethsheba baixou os olhos e notou que pisavam num imenso
coração de pedra. — O que significa esta inscrição?
— As últimas palavras de Sheba ao morrer. Significa: "eu voltarei sete vezes".
Bethsheba tornou a contemplar a estátua, os lábios entreabertos, quase paralisada.
— Sim, bint, agora você está cara a cara com sua homônima. Enfim!
— Então esta é Sheba? Aquela em que pensa quando me chama?
— Pensou que fosse outra mulher? — Ele riu.
— Eu... Não tinha certeza. — O sangue lhe subiu ao rosto.
— Sentia ciúme? — Suliman apertou-lhe os ombros e a obrigou a encará-lo, os olhos
possessivos e triunfantes. — De agora em diante, Sheba, você dará vazão às suas paixões
e eu extinguirei sua chama e aliviarei seu ciúme.
— Conte-me sobre Sheba — ela pediu os pulsos acelerados ao pensamento de que o
sheik poderia fazer, caso ficassem muito tempo a sós, sem nada que os distraísse. —
Quero saber tudo. Ela era uma deusa? Uma esfinge?
— Não estamos no Egito, bint. Ele sorriu. — Não há deusas aqui. Sheba era algo
diferente.
— Uma rainha?
— A rainha do Hafu. Hafu era o nome desta região do Saara em tempos antigos. Mas
Sheba não possuía sangue real. Está escrito que ela nasceu do próprio deserto, numa
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tenda entre os nômades, e que veio da Arábia num navio de ouro. Foram sua beleza e
coragem que a tornaram uma rainha.
— Uma história romântica, mas é verdadeira? — Bethsheba sorriu.
— Há pouca evidência de sua existência, a não ser por este templo e pelas inscrições
no Grande Palácio de Suliman, mas acredito no poder de sua lenda. Nenhuma lenda surge
do nada. Sim, acredito que ela tenha existido, e que tenha sido uma rainha guerreira.
— E quanto às sete reencarnações? — Ela sorriu incapaz de resistir à doçura que
brilhava naqueles olhos escuros.
— Está escrito que meu ancestral Suliman se casou com Sheba em sua terceira
reencarnação, no século catorze. Ela era tão linda e poderosa quanto sua homônima, e
governou Hafu ao lado de meu ancestral, Suliman o Grande.
— Um final digno de uma história de fadas!
— Nem tanto. — Suliman ficou sério, de repente. — Sheba foi envenenada por
inimigos.
— Envenenada! — ela repetiu, horrorizada.
— O sheik Suliman El Khazir mandou construir este templo em homenagem a sua
beleza e ao amor que os unia. Mandou escrever estas palavras neste coração de pedra pa-
ra lembrar as gerações futuras de que Sheba retornaria.
— Sete vezes...
— Sim. E cada reencarnação aconteceria no decorrer da sétima geração. É por isso
que o filho primogênito de cada sétima geração é chamado de Suliman. Eu sou ele!
— Mas eu não sou Sheba! — Ela arregalou os olhos. — Meus pais eram ingleses!
Meu pai era um oficial do Exército inglês! Eu nasci em Bahrain, mas...
— Em que circunstâncias você nasceu?
— Eu... — sua voz parecia estranha aos seus próprios ouvidos — eu nasci numa
tenda, no deserto, num dia quente de...
— Julho!
— Sim — ela concordou num fio de voz.
— Dia sete! — A voz de Suliman, contudo, era profunda, urgente. — Você nasceu em
sete do sete...
— Não significa nada! É apenas uma coincidência. Minha mãe queria que eu
nascesse num hospital. Estava tudo arranjado, mas...
— Mas não se pode mudar o destino!
— Não, você não está entendendo. Eu nasci no deserto por acidente. Houve uma
emergência. Meu pai se perdeu no deserto e minha mãe...
— Foi chamada pelo destino.
— Não! — Bethsheba gritou o coração acelerado. — Embora em final da gravidez,
ela saiu para o deserto. Estava desesperada, e, sem perceber, se separou dos homens
que a acompanhavam. As dores começaram e ela foi amparada pelas mulheres de uma
tribo e...
— E você nasceu no deserto! No deserto, numa tenda entre nômades, em sete do
sete!
— Coincidência. — Bethsheba deu de ombros.
— Sheba! — Ele procurou-lhe a boca e a abraçou até que ela não pôde mais refrear
a excitação que a dominava. Naquele instante, junto à estátua de Sheba, o sheik Suliman
El Khazir teve a certeza final. A luz da lua tornou a brilhar sobre eles.
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CAPÍTULO VII
Mais tarde, quando Suliman a levou para fora do templo, Bethsheba sentiu que não
havia escolha para ela com relação ao que estava acontecendo. Tinha de ser assim.
Sempre seria assim.
— É melhor dormirmos aqui fora — Suliman aconselhou. — O chão do templo é de
pedra, e, portanto duro demais. Além disso, há serpentes nas rachaduras das paredes.
— Serpentes venenosas? — Bethsheba sentiu um arrepio percorrer-lhe as costas.
O sheik fez um movimento afirmativo com a cabeça enquanto se dirigia ao cavalo e
retirava o cobertor que cobria a sela.
— Teremos mais conforto e segurança na areia. A sombra das rochas nos protegerá
mais do que o templo.
Bethsheba repetiu o procedimento, retirando também de seu cavalo o cobertor
vermelho e azul, as cores reais. O sheik estendeu-os numa espécie de nicho entre as
pedras.
— Esta será nossa cama esta noite, Sheba.
— Dormiremos juntos? — A perspectiva de dormir uma noite inteira nos braços de
Suliman fazia seus pulsos dispararem.
— É apenas uma necessidade, visto o lugar em que nos encontramos. — Ele sorriu.
— Poderá soltar seus cabelos agora. Eles me agradam muito, mas amanhã deverá
escondê-los novamente. Não quero facilitar o reconhecimento para seu amigo Burton.
— Duvido que ele nos siga — Bethsheba mentiu. Seu coração se apertou ao se
lembrar de Khalisha. Teria ela informado a Chris sobre seu paradeiro?
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— Ele nos seguirá — Suliman afirmou. — Ele dominou a garota que existe em você,
Sheba, e sabe que eu dominarei a mulher. Lutará com todas as armas para me impedir. —
Ele se deitou, apoiado sobre um cotovelo. — Venha. Deite-se ao meu lado e sinta a
essência de suas origens: o deserto e seu príncipe.
Bethsheba estremecia só em olhar para aquele homem másculo, ainda de botas,
com as esporas de ouro brilhando ao luar.
Deitou-se, então, e se deixou abraçar. Uma emoção tão forte e profunda a invadiu,
que ela fechou os olhos e se perguntou se não estaria apaixonada.
Suliman estava diferente aquela noite. Sua respiração calma, o corpo relaxado, os
braços a envolvendo de forma natural...
— Suliman — ela o chamou, resistindo ao sono que se anunciava —, por que Chris
não quer que eu me torne mulher?
— Porque sabe que a perderá.
— Mas por que razão me perderia?
— É a inocência que os une. Você é prisioneira de um desejo indominável. Burton
fará tudo ao seu alcance para impedir-me de possuí-la.
Bethsheba recordou a fúria de Chris quando julgara que o sheik tivesse feito amor
com ela. Seria possível que Suliman estivesse dizendo a verdade? Pois ela própria não tes-
temunhara a reação do amigo e soubera instintivamente que não se tratava de ciúme de
um homem apaixonado? O que seria então? Uma coisa era certa, Chris era possessivo,
mas não a amava. Conhecia-o a fundo. Chris gostava dela, de sua companhia, respeitava
seu trabalho. Mas era só isso.
Chris não a amava. Nem Suliman. E essa constatação a fez sofrer.
Quisera-o no minuto em que se encontraram. Quisera-o em todos os sentidos: físico,
espiritual, mental, emocional. E também quisera a vida dele. A vida no deserto, no douar,
nos palácios, e principalmente o luxo.
Mas por quê? Não possuía tudo o que precisava no Ocidente? Sucesso, dinheiro,
fama, uma carreira excitante, amigos, agenda movimentada e um trabalho interessante?
No entanto, ansiava pela vida que Suliman lhe oferecia. Pela liberdade do deserto,
pelo prazer de andar descalça, de cavalgar, sempre acompanhada por aquele magnífico
príncipe, ambos atirando os grilhões do modernismo aos ventos.
Suliman dormia profundamente agora, mas ela estava desperta e ansiosa. Levantou-
se com cuidado e começou a caminhar. Ergueu os olhos para as altas paredes do templo e
sentiu os olhos úmidos.
— Ele não me ama! — ela soluçou. — De que adianta chorar?
Encostada na parede do templo fechou os olhos. Estava ferida, e não podia mais
negar essa fatalidade. Os sentimentos que Suliman lhe despertara atingiam-na com mais
profundidade do que uma simples atração física. Mas que sentimentos eram?
Um ruído estranho subitamente a assustou. Um silvo e um rastejar que a imobilizou.
Através da névoa de lágrima ela viu Suliman adormecido num círculo de pedra, e uma
cobra comprida e prateada ondulando-se em sua direção.
Tentou gritar, mas sua voz não saiu. A cobra, o símbolo do mal, se aproximava cada
vez mais.
A adrenalina começou a percorrer o seu corpo. Pé ante pé, num silêncio mortal, a
mão instintivamente se movendo para junto do quadril, ela chegou ao círculo de pedra.
A serpente erguia a cabeça a um centímetro do braço de Suliman, preparando-se
para o bote, quando a cimitarra brilhou e a decepou.
Suliman acordou a tempo de ver o corpo da serpente se contorcendo e sangrando.
Bethsheba estava de pé, como que paralisada, a espada nas mãos.
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— Você salvou a minha vida — Suliman murmurou, e naquele momento, ao olhar
dele, Bethsheba soube que era o amor que sentia.
— Ela iria matá-lo. — Ela se ouviu falar como se estivesse muito distante.
Suliman se levantou maravilhoso em sua túnica negra e infinitamente desejável.
— Minha rainha guerreira. Acertei em trazê-la aqui. O templo a colocou frente a
frente com seu destino e agora não poderá mais negá-lo!
— Nem sequer sabia o que estava fazendo — ela confessou, num fio de voz. —
Quando notei já havia desembainhado a espada.
— É assim que funciona a lei do carma. Surge naturalmente, sem ser anunciada por
trombetas. Exatamente como lhe aconteceu esta noite. — Suliman tocou-lhe levemente a
cintura para em seguida atraí-la junto ao peito. — Sheba! Você é realmente ela. Nossa
união será divina e nossos filhos nascerão guerreiros como seus genitores e ancestrais.
— Filhos? — Ela perdeu o fôlego e seus olhos se arregalaram incrédulos. — O que
quer dizer com isso?
— O que mais poderia surgir de uma união entre Suliman e Sheba!
— Mas é impossível! Será que não entende? — O pânico vibrou em Bethsheba.
— Entendo que é uma garota no limiar da maturidade. E que amanhã à noite a
transformação se completará, quando estiver nua e saciada em meus braços. A pureza
será uma coisa do passado. — Ele se inclinou para beijá-la. Apesar do esforço que ela
fazia para protestar contra os planos do sheik, sentiu seus lábios se abrirem para receber
e corresponder ao beijo fortemente apaixonado e sensual.
Gemeu ao ser deitada sobre os cobertores, ao ser beijada no pescoço, no colo. O
cheiro de Suliman, que era o cheiro da própria Arábia, a deixava louca de paixão, e ela
também se pôs a beijar a pele quente e macia.
Suliman, então, ergueu a cabeça e a fitou intensamente. Sua respiração estava
ofegante.
— Você está quase pronta, Sheba. Pronta para ser domada.
— Você nunca me domará! — ela negou, indignada, mas Suliman apenas sorriu. O
rosto corado, os olhos febris diziam a verdade.
— Venha. — Ele a puxou por sobre o peito. — Precisamos dormir. Amanhã você
conhecerá o Grande Palácio de Suliman, e de lá não haverá volta.
Bethsheba repousou a cabeça sobre o peito de Suliman, consumida pelas emoções e
pela dúvida. O sheik estaria certo? Seria verdade que ela estivesse quase pronta para se
entregar? Mas como seria possível, se ela lutava com tanto afinco para proteger sua
virgindade?
Porque você está apaixonada por ele, respondeu uma vozinha em sua mente.
Bethsheba recusou-se a ouvi-la. Tudo o que sentia por aquele homem do deserto era
desejo, atração física, e, se algum dia permitisse que aquela atração se transformasse em
amor, estaria completamente perdida.
Pensou que nunca mais conseguiria dormir, tal o estado de agitação e confusão em
que se encontrava, mas o cansaço foi mais forte.
Dormiu profundamente e sonhou que Suliman estava fazendo amor com ela, o corpo
rígido se movendo ritmicamente até fazê-la explodir em gemidos.
— Bom dia. O sonho te satisfez? — A voz de Suliman se fez ouvir a poucos passos.
— Oh! — Bethsheba se levantou os olhos muito abertos e o rosto assumindo a cor
da culpa. — O que o faz pensar que sonhei?
Ele riu suavemente junto ao cavalo.
— Seus suspiros de prazer, minha pombinha, e a forma como seu corpo arqueava
inconscientemente junto ao meu, esta noite.
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O rubor se intensificou. Bethsheba se virou de costas para não encará-lo. Fizera
realmente isso? Que vexame!
Os olhos de Suliman pareciam queimar-lhe as costas. Seus passos abafados foram se
aproximando lentamente.
— Não tenha vergonha de mim. — Ele a fez se virar e segurou carinhosamente seu
rosto. — Tem todo o direito de sentir desejo, de expressá-lo e também de incitar esse de-
sejo em seu companheiro, Sheba.
Ela fechou os olhos, incapaz de continuar observando a boca trêmula, os olhos
perturbadores.
— São esses direitos de mulher, os profundos conhecimentos do sexo que Burton
está tentando negar a você. — Ele olhou repentinamente sério para o céu. — Lembre-se
disso quando ouvir o helicóptero voar sobre sua cabeça.
Esquecida da vergonha, Bethsheba fitou aquele rosto bronzeado e viril, em silêncio.
Chris viria e a salvaria do destino que a esperava na Grande Palácio de Suliman.
— É hora de partirmos — ele ordenou e se abaixou para apanhar os cobertores.
Bethsheba continuou imóvel por alguns minutos. Em seguida, enrolou o turbante
novamente sobre os cabelos e o seguiu em direção aos cavalos.
Juntos cavalgaram para longe do templo, e para o coração do escaldante deserto
dourado.
E se Chris os localizasse? O que seria de sua vida? Suliman afirmara que seus filhos
seriam guerreiros. Falara a sério? Realmente pretendia ter filhos com ela?
Quando o sol estava a pino, o sheik fez um gesto que indicava a necessidade de
pararem para descansar. Viraram para a esquerda, galoparam sobre uma imensa duna e,
para espanto de Bethsheba, um oásis surgiu a sua frente.
— Como sabia da existência deste lugar? — ela indagou, enquanto os cavalos
corriam para a água, para as plantas e palmeiras.
— Não preciso de placas de sinalização aqui. Esta é minha terra e a terra de meus
ancestrais.
Ela sorriu e desmontou. Suliman a imitou e começou a beber de seu cantil.
— Beba Sheba. Não tornaremos a parar.
— A que distância estamos do palácio? — ela indagou, depois de tomar longos goles
de água.
— Duas horas, aproximadamente.
— Então chegaremos ainda de dia?
A resposta veio em forma de um sinal afirmativo com a cabeça. Bethsheba estava
muito séria. Subitamente, sentiu uma necessidade imperiosa de saber.
— Suliman... A respeito de filhos... Falou a sério?
— Lógico que sim.
— No entanto, eu posso não querê-los. — ela salientou, tentando manter a calma.
— Uma mulher que não quer filhos? — Ele arqueou uma sobrancelha, espantado.
— Bem... Isso é muito comum no mundo ocidental.
— Na sociedade ocidental, bint, as pessoas são criadas para dar mais valor aos seus
empregos, às casas e dinheiro. E o que isso tem a ver com vida? Com o nascimento e a
morte? Com tudo que é verdadeiro e natural?
— Mas, Suliman, não é esse o ponto! — Ela se defendeu. — O que eu não quero é
ter seus filhos! Não quero ir para seu palácio, fazer amor com você, ficar neste maldito
deserto por mais um minuto sequer!
— Sheba — Suliman acariciou-lhe o rosto —, você não nasceu para ficar trancada em
salas abafadas cheias de equipamentos de gravação e homens que só pensam em dinhei-
ro. Admita essa verdade e estará na metade do caminho para encontrar a felicidade.
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— Ainda assim, não quero ter seus filhos, Suliman — ela confirmou. — E nenhum
poder da terra pode me forçar a fazer o que não quero.
— Se realmente não os quer, eles não virão. — Suliman estudou o rosto perplexo de
Bethsheba por um instante, e depois se dirigiu novamente para o cavalo. — Encha seu
cantil. Precisamos partir.
Bethsheba o observou tomar as rédeas do garanhão, forte e decidido, o perfil real se
recortando contra o sol. Suliman vencia todos os argumentos, por mais que ela lutasse.
Naquele instante Bethsheba cogitou se algum dia poderia entendê-lo. Movera o céu e a
terra para tê-la a seu lado, para levá-la para o palácio de seus ancestrais. No entanto,
queria fazê-la acreditar que tudo estava nas mãos dos deuses. Mais um de seus truques
para vencê-la, é claro, concluiu zangada.
Refrescados, os cavalos galoparam com maior velocidade. Passou-se uma hora de
intenso calor e silêncio, até que um ruído os alcançou.
Chris! Bethsheba pestanejou ao reconhecer o som do helicóptero. A sombra do
aparelho logo se projetou sobre eles como um gigantesco pássaro preto, o ruído das
hélices assustando os cavalos.
— Não disse que ele viria? — Suliman gritou. — Só nos resta torcer para que não dê
importância a dois nômades.
Bethsheba, porém, sabia que Chris não se deixaria enganar, e seu coração sofreu
uma mistura de dor e alívio. Chris a levaria para casa! Não queria pensar mais em
Suliman. No entanto, por que a perda lhe parecia insuportável?
Mas o helicóptero continuava circulando, para furor de Suliman, cujos olhos se
estreitavam perigosamente. Subitamente, o aparelho começou a descer, e de uma forma
que lhes barrou o caminho. Os cavalos empinaram em protesto. A areia voou para todos
os lados, fustigando o rosto de Bethsheba.
— Desmonte! Depressa! — Suliman gritou, ao ver que ela perdia o controle sobre o
animal. De um salto estava tomando-lhe as rédeas.
Chris abriu a porta do aparelho no instante em que Bethsheba conseguiu apear,
caindo sobre Suliman.
— Suliman! — Chris gritou, transtornado. — Eu o porei na cadeia pelo que fez!
— Não está em Londres, cercado de advogados e dinheiro, Burton. — O sheik ainda
mantinha Bethsheba junto a si. — No deserto as diferenças são resolvidas de homem para
homem!
— Posso processá-lo em Tanger, Marraquesh ou Rabat! Quem falou em Londres? —
Chris fulminava o adversário com seus olhos azuis.
— Sou um príncipe do deserto! — Suliman salientou. — Aqui, meu poder e meu
dinheiro são muito mais fortes do que o seu. E, se tentar lutar comigo na cidade, se arre -
penderá.
— Sou Christopher Burton! — Chris reagiu igualmente altivo. — E esta é minha
estrela, Bethsheba Lyon! Você não tem o direito de tirá-la de mim!
Suliman sorriu conforme as hélices começavam a girar mais lentamente, a areia a
baixar, e os cavalos a acalmarem.
— Ela veio de livre e espontânea vontade.
— Se foi assim, por que me drogou ontem à noite?
— Achei que precisava descansar — o sheik zombou.
— Beth voltará comigo. — Chris avançou.
— Acho que não.
— Beth! — Chris estendeu a mão para a amiga.
Ela engoliu em seco. Em seguida se desvencilhou de Suliman e correu para Chris.
Sua alma gritava para não agir assim, mas o medo a dominava.
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— Está tudo bem agora — Chris murmurou junto a seu ouvido. — Está salva.
— Solte-a. — A voz agoniada de Suliman ecoou no fundo de seu coração, por mais
que ela lutasse por ficar indiferente. — Solte-a, maldito!
— Vá para o inferno! — Chris praguejou e começou a conduzir Bethsheba para o
helicóptero.
Como num passe de mágica, Suliman estava à frente deles, uma barreira viva e
arrogante, com as mãos nos quadris.
— Solte-a!
— Acabou, Suliman, ela não te quer. Foi tudo muito bom enquanto durou, mas agora
ela deseja voltar para casa, para seu mundo!
— Não sairei daqui enquanto Bethsheba não me disser isso pessoalmente — Suliman
insistiu.
Bethsheba não conseguia falar, nem olhar para ele. Sua cabeça estava baixa e ela só
conseguia enxergar as botas de couro com as esporas brilhando ao sol, e as pernas longas
e musculosas.
— Beth, pelo amor de Deus! — Chris implorou.
Ela abriu a boca, mas as palavras continuavam se recusando a sair. Queria proferi-
las... Elas queimavam em sua mente, mas o coração e a alma estavam dilacerados.
Forçou-se a encará-lo, a respiração suspensa. Amava-o, apesar de tudo!
— Diga a ele! — Chris gritou agora furioso. Bethsheba estremeceu e tornou a baixar
os olhos.
— Está acabado, Suliman. Deixe-me em paz.
Fez-se um longo e penoso silêncio. Chris tentou avançar para o helicóptero, o braço
sobre o ombro de Bethsheba.
— Saia do nosso caminho, Suliman!
— Não a levará daqui! — Suliman não se moveu. — Ela deseja ficar.
— Não ouviu o que ela acabou de dizer? — Chris estava lívido. — Voei centenas de
quilômetros para buscá-la, e não irei embora sem ela!
— Então terá de lutar pelo privilégio. — Suliman puxou Bethsheba dos braços de
Chris, ignorando seu grito de protesto. — Lute como um homem ou volte para casa com
seu rabo covarde no meio das pernas!
Num repente de ódio, Chris golpeou Suliman no queixo, mas, sem perder o
equilíbrio, este devolveu o golpe, mandando Chris para o chão, um fio de sangue
escorrendo-lhe da boca.
— Não! — Bethsheba correu a apartá-los. — Não lutem! Eu me decidi. Quero voltar
com Chris.
— Fique fora disso! — Suliman se virou para ela, e Chris aproveitou do momento de
distração. Com uma rapidez incrível, arrebatou a cimitarra do inimigo.
— Chris... Largue essa espada! — O sangue de Bethsheba congelou nas veias. —
Não há necessidade...
— Não se intrometa! — Chris avançou e a espada brilhou maleficamente sob o sol.
— Ela é minha, Suliman. Eu a fiz e ela me fez. Não permitirei que a tome de mim, nem
que tenha de matá-lo!
— Não, por favor... — Bethsheba murmurou trêmula. Chris sabia como manejar a
espada. Era um esgrimista experiente. Todas as escolas de arte dramática ensinavam
esgrima a seus alunos, e, além disso, Chris treinara em Rada. Representara Hamlet,
Mercuto, todos os papéis clássicos que exigiam espadachins perfeitos. Mesmo agora ele se
encontrava em pose correta, pronto para atacar caso Suliman tentasse se aproximar.
O que Bethsheba não esperava é que ele, em seu ódio, atacasse um homem
desarmado.
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— Pare! — ela gritou, ao ver Suliman levar a mão ao ombro que sangrava por entre
o tecido rasgado.
— Não se aproxime dele! — Chris encostou a espada na garganta do inimigo. —
Entre no helicóptero!
— Não posso partir e deixá-lo...
— Faça o que estou mandando! — Chris ordenou selvagem.
Bethsheba o fitava, o suor escorrendo-lhe do rosto, o coração disparado de terror.
— Ele está desarmado, Chris.
— Não foi ele quem quis lutar? — Chris perguntou, cortando superficialmente o
pescoço de Suliman, que nem pestanejou.
— Eu te desafiei a lutar como um homem — Suliman fitou o oponente com bravura e
altivez —, não como um bandido.
— Mas estamos no deserto, não é? Um lugar sem regras ou leis!
A raiva dominou Bethsheba. Subitamente ela se viu desembainhando a própria
espada, fazendo com que os dois homens se detivessem.
— Sem regras, Chris. — Ela jogou a espada para Suliman. — Sem regras!
Chris a fitou, a cor se esvaindo do rosto.
Suliman deu um grito de triunfo, voltou-se para Chris e a cimitarra faiscou ao atingi-
lo no braço.
Bethsheba assistia à luta numa agonia de tensão. O choque dos metais ecoava pelo
ar quente do deserto. O sheik avançava, o rosto contraído na mais primitiva fúria, e sua
espada se movia cada vez mais rápida. Chris recuava, defendendo-se desesperadamente,
os olhos desmesuradamente abertos de terror. De repente, sua espada escapou-lhe da
mão, e ele caiu com um grito. Foi à vez de Suliman apontar para sua garganta.
— Você está acabado, inglês! — O sheik anunciou a sentença.
Chris tremia de raiva e medo, mas não podia fazer nada para alterar a situação.
— Não o machuque! Por favor! Ele perdeu a cabeça! Não sabia o que estava
fazendo!
— Não o machucarei... Com uma condição.
— Qual? — Chris indagou, odiando-o, indefeso aos pés de Suliman, a espada na
garganta.
— Suba no helicóptero e volte para Tanger... Sozinho. Aceite minha condição e
poderá ir livre e... Inteiro.
— A decisão é minha, não de Chris! — Bethsheba protestou.
— Nós brigamos por você e eu venci — Suliman afirmou rude. — Agora, ou ele
obedece minha ordem ou paga o preço.
— Cobre de mim! — Bethsheba exclamou furiosa.
— Não aqui, nem agora, mas no palácio.
— Não irei!
— Bem? — Suliman pressionou a espada com mais força. — Qual a sua decisão,
inglês?
— Quero que ela venha comigo!
— Lutou e perdeu — Suliman o humilhou. — É um homem de palavra ou um covarde
mentiroso?
— Seu crápula! Sabe muito bem que não tenho escolha. Os lábios de Suliman se
distenderam num sorriso irônico, enquanto recuava e guardava a espada.
— Vá!
Chris se levantou, esfregou as roupas para livrá-las da areia, e, com os olhos
furiosos, voltou para o helicóptero.
— Chris, não! — Bethsheba tentou correr ao encontro dele.
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— Deixe-o! — A voz de Suliman estalou como um chicote. — Quer humilhá-lo ainda
mais? Ele lutou e perdeu. Deixe-o curar suas feridas em paz. Ele voltará, disso pode estar
certa.
Bethsheba observou o helicóptero começar a se levantar, muda de medo e
desespero.
Tive minha chance de escapar, ela pensou. Tive minha chance e a perdi.
Mas Chris poderia ter matado o sheik! E ele estava desarmado. Como poderia ver
aquilo e ficar de braços cruzados? Teria sido indigno agir de outra maneira.
Só quando o helicóptero desapareceu de vista e os dois ficaram novamente a sós na
imensidão do deserto, Suliman voltou a falar.
— No final, você acabou me escolhendo, Sheba.
— Não te escolhi. Escolhi a justiça. Não podia permitir que ele te ferisse... Ou coisa
pior.
— Como mente para si mesma, Sheba! — Suliman começou a sorrir, mas de repente
franziu o cenho e levou a mão ao ombro.
— Você está ferido!
— Um arranhão.
Bethsheba ignorou o orgulho e examinou o corte.
— Não é profundo, mas precisa ser desinfetado. Como não temos remédios, ao
menos me deixe limpá-lo. — Ela pegou o cantil, rasgou um pedaço de seu turbante e
lavou cuidadosamente a ferida.
— Minha rainha guerreira está se revelando uma boa enfermeira, também.
— Todas as mulheres são boas enfermeiras, quando é preciso.
— Esta noite, Sheba, no Grande Palácio de Suliman, eu te ensinarei a se revelar
verdadeiramente como mulher... Nos braços de um homem que te deseja mais do que
tudo no mundo.
— Eu deveria ter deixado que ele te matasse! — ela gritou, entre o pânico e a
excitação. — Deveria ter entrado naquele helicóptero e partido para sempre!
— Mas não o fez, Sheba, e esta noite, em minha cama, será recompensada por isso!
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CAPÍTULO VIII
O Grande Palácio de Suliman se erguia imponente sobre o deserto, com suas torres
douradas era cúpula e espirais. As paredes antigas em pedra apresentavam um tom
amarelado que se misturava ao cenário: areia, areia por toda a parte.
Possuía toda a vibração de uma lenda. E do destino. Bethsheba cavalgara ao seu
encontro, e sentia que o lugar a tocava profundamente. Seu coração e seu sangue aten-
diam ao chamado de Suliman, de seu palácio e daquela terra.
Cachorros latiam excitados, conforme ela e Suliman penetravam pela entrada em
arco. Homens muito morenos, com roupas do deserto, se apressaram a recebê-los.
Suliman lhes falava com toda a autoridade e aspecto de um príncipe. Desmontou
com graça e dinamismo e imediatamente a ajudou a fazer o mesmo. Os homens a
fitavam, estarrecidos. Ela, uma mulher em túnica de nômade com uma cimitarra presa à
cintura.
— Então, Sheba, gosta do palácio de meu ancestral?
— Haverá alguém que não se comova com tanta beleza? — ela respondeu com
sinceridade, embora seu olhar indicasse desafio. — No entanto, estou certa de que seu
ancestral não aprovaria que fosse transformado numa prisão.
— Numa gaiola de ouro, minha pombinha selvagem, da qual estará livre, no
momento que estiver pronta para aceitar o que só eu posso te dar.
Sem mais palavras, Suliman a segurou pelo braço e a conduziu através do pátio para
a escadaria.
A grandiosidade oriental do hall de entrada tirou o fôlego de Bethsheba. As paredes
de mármore e ouro eram tão altas que poderiam chegar às nuvens, um candelabro de
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ouro com lâmpadas de óleo iluminava misticamente o ambiente. O chão era todo em
mármore, também, branco e preto, e com inscrições em árabe.
Caminharam por um corredor que parecia não ter fim. O tamanho exato do palácio
era impossível de se calcular. Ao chegarem a uma praça central com fontes e estátuas,
Suliman bateu palmas duas vezes. Todas as portas se abriram ao mesmo tempo. Muitas
mulheres vieram saudá-lo; mulheres dele, lindas morenas com cabelos longos e olhos de
fogo. Peles perfumadas, narinas enfeitadas com diamantes, estavam vestidas com sedas
tão coloridas e belas que Bethsheba sentiu admiração ao mesmo tempo em que ciúme.
— Seu harém? — Ela se voltou para Suliman, o ciúme transparecendo nos olhos.
— São minhas mulheres — ele pareceu divertido —, mas não minhas esposas.
— Qual a diferença? — A voz soou aguda e áspera. Bethsheba se detestou por isso,
mas estava à mercê de uma emoção que nunca sentira.
— Uma grande diferença, bint, mas que não dá para discutir diante delas.
— Muito conveniente.
Suliman tornou a bater palmas. Deu uma ordem, que ela certamente não entendeu,
e todas as mulheres a cercaram.
— O que está havendo? — Ela recuou instintivamente. — Suliman, o que disse a
elas?
— Ordenei que a levassem a um lugar onde pudesse descansar e comer. Será trazida
a minha presença ao pôr-do-sol. Até lá se refaça da longa e exaustiva viagem e prepare-
se para a noite de seu despertamento.
— Trazida a sua presença? — Ela o fulminou com os olhos. — O que pensa que sou?
Uma romã? Um bombom?
— Nada mais foi tão delicioso quanto você o será está noite! Ao entardecer as
mulheres a levarão ao grande banho de Sheba. Lá você será perfumada e vestida como
convém a uma rainha prestes a se entregar ao seu verdadeiro destino. Em meus braços.
— Em sua cama! — ela acrescentou, irada.
— Eu quero assim, assim será. — Suliman ergueu a cabeça com absoluta
autoconfiança e se foi, deixando-a entre seu séquito de mulheres. Trêmula, furiosa,
excitada e confusa, Bethsheba enfrentou os olhares com orgulho.
Levaram-na a um quarto luxuosíssimo, coberto de almofadas e com um ar de tanta
privacidade, que ela quase se sentiu à vontade. O cheiro das lâmpadas de óleo a lembra-
vam de Suliman, do douar, do deserto e de sedução.
Exausta, deixou-se cair sobre as almofadas. Uma das mulheres se ajoelhou e tirou-
lhe as botas. Ela fechou os olhos e flexionou os dedos doloridos. Alguém, em seguida,
tirou o turbante.
Uma exclamação de espanto a fez abrir imediatamente os olhos. As mulheres a
fitavam, os olhos muito abertos, e se ajoelhavam em massa.
— O que houve? — Bethsheba olhou para a porta para ver se Suliman entrara, mas
não havia ninguém. — Por que se ajoelharam? — Só então Bethsheba percebeu que era
para seus cabelos que elas olhavam.
Sheba, ela adivinhou.
Era verdade. Tudo que Suliman lhe contara sobre a legendária Sheba era verdade.
As mulheres a estavam tratando como a uma rainha e ela não pôde evitar comparar
aquele tipo de adoração com a que lhe dedicavam suas fãs adolescentes.
No Ocidente, Bethsheba era tratada como alguém diferente; incomum e especial.
Não apreciava isso. Sentia-se um ser literalmente marginalizado e solitário.
No entanto, após quatro anos, acostumara-se à fama, e não se chocara com a
reverência daquelas mulheres. Seria assim que Suliman também se sentia? Um ser
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diferente acostumado a ser tratado com reverência e respeito, por todos os lugares em
que passava?
Trouxeram-lhe ovos de codorna, salmão defumado, carnes e pão. Café e uma
bandeja com doces e frutas cristalizadas. Bethsheba foi deixada a sós. Comeu com
apetite, estirou-se languidamente e adormeceu sem perceber.
Só acordou porque alguém a sacudiu ligeiramente. O rosto da odalisca a fez lembrar-
se de onde se encontrava.
O dia estava chegando ao fim.
Seu corpo estremeceu. Um suor frio a inundou. Seria banhada e preparada para
Suliman!
Como um autômato, seguiu a mulher através de uma porta.
O banheiro era imenso. Um templo circular de beleza feminina, com o piso em
mosaicos branco e azul, três fontes, plantas e uma cortina de renda dourada ao fundo,
entre duas colunas de ouro.
E ali, em meio a seu jardim secreto, estava Sheba. A deusa metade mulher, metade
gata.
As mulheres a rodearam e a despiram. Ajoelharam-se em seguida. Nua, Bethsheba
caminhou entre elas, altiva como uma rainha, para a piscina particular. A água estava
morna, deliciosa, e ela começou a nadar.
Suliman também deveria estar se banhando, ela pensou subitamente. Preparando-se
para a noite, quando a possuiria. O coração de Bethsheba pulsou violentamente à idéia.
Ele fará amor comigo, não há dúvida.
A pele macia e dourada se arrepiou. Bethsheba se torturava, sabendo que acabaria
gritando de prazer e que o acompanharia no êxtase daquela paixão reprimida. Odiava
Suliman por fazê-la sentir-se tão vulnerável. Odiava-o e odiava a si mesma.
As mulheres secaram-na com toalhas macias, perfumaram-na com óleos e
pentearam seus cabelos com um pente de ouro, incrustado de pérolas. Trouxeram-lhe
uma túnica dourada e transparente. Um rubi foi colocado em seu umbigo e fixado com
uma espécie de pasta. Os pés, a boca e os olhos foram pintados.
Por fim, uma capa negra, debruada era dourado, e um véu também negro
completaram a indumentária e Bethsheba foi levada ao príncipe.
O lugar onde a deixaram não era um quarto, ao contrário de suas expectativas.
Perplexa, virou-se para indagar o motivo de ser trazida ali, mas a porta já havia se
fechado.
Suliman se encontrava a alguma distância, conversando com dois homens. Pelo teto
alto, de vidro, penetrava uma luz vermelho-sangue que lhe provocou calafrios.
— Suliman! — ela chamou assustada, e ele se virou imediatamente. Parecia surpreso
ao vê-la. Seus olhos percorreram-na da cabeça aos pés. Era novamente o sheik: de túnica
branca e turbante dourado, um anel de ouro com um rubi enorme no dedo.
— Sheba — ele segurou-lhe os ombros —, é ainda mais linda que Sherazade.
— Que lugar é este? — ela quis saber, corada sob o véu. — Por que estamos aqui?
— Aqui é o fim de nossa jornada, e o início de todas as outras — ele falou sério.
— Não estou entendendo... — Ela olhou para os dois homens. — Trata-se de algum
ritual?
— É a cerimônia de nosso casamento, Sheba.
— Casamento? — Ela recuou os olhos muito abertos.
— Venha. Façamos os votos para podermos penetrar pelo portal do paraíso.
— Mas... Mas você não pode se casar comigo! E eu certamente não posso me casar
com você!
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— Deveria ter percebido que era algo iminente! — Os olhos do sheik se estreitaram
nervosos.
— Você nunca mencionou um casamento! — Ela mal conseguia respirar. — Nem
sequer uma vez!
— Disse que seria minha rainha guerreira. O que mais poderia ser senão minha
esposa?
— Nada do que disse indicava casamento! Nada!
— Acha que eu deixaria que bastardos governassem meu reino após minha morte?
— O que eu acho é que você é muito tolo se realmente espera que eu vá em frente
com um casamento que não desejo.
— Cuidado, Sheba! — As narinas de Suliman se inflamaram com sua súbita raiva. —
Está insultando um príncipe. E não sou tolo por sugerir este casamento. Ao menos tenho
coragem para seguir meus desejos e meu destino e para lutar com aqueles que se
colocam em meu caminho, tentando levar a mulher que escolhi, que desejo acima de
tudo.
— Você me deseja como deseja um prato de comida! — ela protestou. — Para
satisfazer uma fome temporária. Quando se saciar, não terei mais valor algum. O que
acontecerá, então? Serei mais uma de suas escravas? Terei de banhar e vestir a próxima
mulher que despertar suas fantasias?
— Sheba — ele apertou-lhe os braços —, será que não entendeu nada? Você é
aquela por quem espero desde que nasci. Aquela que possui rosto de virgem e corpo de
gata. Você é...
— Sheba é apenas uma lenda. A realidade é que sou Bethsheba Lyon, de Londres.
Que sou uma cantora pop e que não pertenço a seu mundo.
— Você é Sheba! E eu me casarei com você!
— Não.
— Você tenta fugir porque está reconhecendo o cheiro da morte. — Ele a abraçou,
ao que ela começou a se debater. — A morte de sua vida antiga e de tudo o que ela re-
presentava.
— É claro que tento fugir. Não quero me casar com você.
— No entanto, do fogo da morte acontecerá à ressurreição. Como Sheba, meu
destino, minha rainha!
— Não sou Sheba! — ela gritou os olhos marejados de lágrimas. — Será que não
entende? Você não quer se casar comigo, mas com minha semelhança a uma lenda
morta. E eu não sou uma lenda. Sou uma mulher de carne e osso.
— Você não será uma mulher enquanto não amar um homem — Suliman murmurou.
— Ao menos esta verdade sei que o Ocidente ensina as suas mulheres. Até o momento da
entrega você ainda continuará a ser uma garota, e é essa garota que existe em você que
luta para sobreviver.
— Não me casarei com você, Suliman! — ela afirmou rouca, determinada,
reconhecendo subitamente que teria de lutar com o sheik de igual para igual.
— Não me desafie em público. Não diante de meus homens.
Bethsheba fitou o rosto duro, zangado, e sentiu a imagem embaçar devido às
lágrimas. Ele a estava machucando com os dedos cravados em sua carne. Os homens os
observavam. Que outra escolha ela teria? Era inútil lutar contra o destino dentro daquele
palácio. Os guardas estavam por toda a parte, e a palavra do sheik era lei. Não havia nada
a fazer e o quanto antes reconhecesse essa fatalidade, melhor seria.
Mais tarde, poderia pedir anulação do casamento, ela cogitou. Ou o divórcio. Não
precisaria continuar casada com um homem que não a amava.
Projeto Revisoras 51
Julia Ed. Férias 21.1 – O Príncipe do Deserto – Sarah Holland
Em instantes estava ao lado de Suliman, repetindo as juras. Sua voz ecoava pelo
santuário de pedra, seguida pela de Suliman, enquanto um cordão dourado ao redor de
seus punhos os unia para a eternidade.
Quando a cerimônia terminou e os documentos foram assinados, Bethsheba
estremeceu. Ela assinara "Sheba".
— Minha rainha! — Suliman a abraçou possessivamente pela cintura.
— Não sou obrigada a permanecer casada com você, Suliman. Assim que voltar para
o Ocidente, pedirei divórcio e o obterei, acredite-me.
— Então tomarei todas as providências, minha rainha, para que jamais retorne para
lá! — Ele a soltou de repente, e bateu palmas. As portas se abriram e três mulheres se
aproximaram.
— O que foi Suliman — Bethsheba indagou furiosa. — Mais algum teste?
— Você logo descobrirá.
As mulheres a levaram gentilmente por um longo corredor e a deixaram num quarto,
sozinha, certamente para refletir no passo que acabara de dar.
G quarto, é claro, era o quarto nupcial.
Uma grande cama de casal dominava o ambiente acarpetado em azul. Ouro e pedras
preciosas brilhavam sob as lâmpadas de óleo.
Bethsheba El Khazir, ela pensou com amargura. Casara-se com o homem a quem
amava, ela sentiu o coração pulsar de orgulho e excitação, mas de que adiantava? As
lágrimas começaram a deslizar de seus olhos. Como podia amá-lo? Suliman só queria
dominá-la, usá-la!
E assim mesmo o amava. Uma guerra se travava violentamente em seu interior ao
tentar se reconciliar com o que acontecera, e com o momento que estava prestes a
acontecer, quando finalmente Suliman a possuiria em sua cama de seda.
Sua boca ficou ressequida de desejo ao observar a cama. Vestida, pintada e
perfumada eroticamente, ela se sentia como um presente sacrificar ao sheik. Era apenas
seu corpo que ele queria. Deixara esse ponto bem claro desde o começo. E essa noite
significaria a satisfação plena e total.
Uma porta se abriu subitamente e Bethsheba prendeu a respiração. Era Suliman. Por
um segundo, nenhum dos dois ousou se mover ou falar.
— Você é minha... Enfim. — Ele a fitou com intensidade.
— Nunca serei sua. Nunca. Nem que mande marcar seu nome em minha carne.
Nunca pertencerei a você ou a qualquer outro homem.
— Continua me rejeitando! — Ele avançou furioso, obrigando-a a saltar para trás. —
Mesmo agora que estamos casados. Mesmo agora que a tornei minha esposa e rainha.
— Fui forçada, assim como fui forçada a cavalgar pelo deserto.
— Sua memória está falhando, bint. — Ele tentou abraçá-la. — Você veio ao meu
palácio de Agadir por sua livre vontade. E assim virá para minha cama esta noite, por sua
vontade!
— Nunca! — Bethsheba gritou trêmula.
— Desde o instante em que a vi, não pude mais pensar, respirar, dormir, viver! Não
terei paz enquanto não a tiver no palácio de meus ancestrais como minha esposa, rainha
e amante.
— Por que não confessa o que realmente quer seu covarde? Meu corpo!
— Acha que eu tenho culpa? — Suliman tentou acalmá-la. — Acha que em algum
momento, desde que a vi, pude me sentar e raciocinar claramente sobre o que estava
acontecendo? Foi à mão do destino que nos uniu Sheba, e agora o destino exige que
libertemos nossas forças mais profundas e primitivas!
Projeto Revisoras 52
Julia Ed. Férias 21.1 – O Príncipe do Deserto – Sarah Holland
— Tudo isso para não dizer a palavra sexo, não é? Por que não a pronuncia? Por que
não me atira em sua cama e não me possui de uma vez? Acabe logo com isso e deixe-me
em paz!
— Fala como se fosse uma grande provação — ele protestou, ofendido. — Pois bem,
então é isso que será. Um sacrifício de dor e também de prazer. Você se encontra no
último degrau para chegar à maturidade, e eu lhe abrirei a porta com meu corpo.
— Não tenho forças para lutar contra você, Suliman! — ela murmurou, chorando. —
É rei aqui e pode fazer o que quiser.
— Não sou rei sem você, Sheba. Sou rei apenas em lenda, na mente dos
descendentes de Hafu. Eles foram seduzidos por sua lenda, mais do que pela minha.
— Sim, é verdade. Eu fui seduzida. Seduzida pela Arábia, pelo deserto e pela
lembrança de minha infância! — A raiva tornou a brilhar em seus olhos. — Você se
aproveitou de minha fraqueza, Suliman!
— Mas essa fraqueza é sua essência, Sheba. Ela foi sufocada pela vida falsa que
levou em Londres, mas aqui, comigo, você encontrou a verdade. A única verdade: o poder
da vida e do destino.
Subitamente ele tirou os véus e a capa que a cobriam. A túnica diáfana revelava os
seios firmes e cheios, a cintura fina, o ventre liso, as pernas longas e esguias e o triângulo
dourado entre elas.
— Ah, sim... — Os olhos de Suliman escureceram. — Sim!
— Não. Eu não quero...
— Sim, Sheba, você quer! — Ele começou a acariciar os seios, deixando-a trêmula e
excitada.
— Por favor... — ela implorou os lábios secos, as pernas débeis. — Estou indefesa.
Não posso fugir...
— Você não quer fugir! — Suliman começou a baixar lentamente a cabeça, fazendo
com que o sangue ardesse por todo seu corpo. Beijou-a, e ela, instintivamente o abraçou
pelos ombros. Uma doce fraqueza a invadiu e ela se viu correspondendo
apaixonadamente ao beijo, sua respiração se misturando à dele num calor erótico, os
gemidos traindo-a conforme o beijo se aprofundava.
Quando Suliman se inclinou para sugar-lhe o mamilo, Bethsheba quase gritou de
prazer. Suas mãos trêmulas tiraram o turbante e mergulharam entre os cabelos negros e
espessos.
As mãos fortes deslizaram para seu ventre, a tensão paralisando-a.
Suliman se deteve por um momento, voltou a fitá-la e sua boca tornou a possuir-lhe
os lábios. De repente, segurou-lhe as nádegas e a atraiu contra sua virilidade.
— Oh, Suliman... — ela gemeu alto. — Suliman...
— Você é minha! — ele murmurou rouco, erguendo-a nos braços.
Carregou-a para o leito e a acomodou entre os lençóis de cetim. Deitou-se
imediatamente a seu lado, beijou-a.
Agora a despia lentamente, torturando-a com sua própria excitação. Examinava os
seios desnudos antes de tornar a sugá-los, e Bethsheba arqueava o corpo, querendo mais
e mais.
Suliman fechou os olhos, sorriu e aceitou o que ela oferecia. Quando começou a lhe
acariciar as pernas, Bethsheba corou de vergonha e antecipação. Ansiava por senti-lo em
sua pele, nu sobre sua nudez.
A paixão se intensificava. Bethsheba instintivamente se movia, lenta, sensual e
ritmicamente contra a coxa que separava suas pernas. Ele a beijava, as mãos em seus
quadris, movendo-os para cima e para baixo. Enquanto seus gemidos o tornavam mais
forte e potente, ela se sentia mais fraca e impotente.
Projeto Revisoras 53
Julia Ed. Férias 21.1 – O Príncipe do Deserto – Sarah Holland
Possua-me, gritava em sua mente. E Bethsheba lutava para não gritar, para acalmar
o coração descompassado.
— Agora a rainha verá seu rei. — Suliman a soltou repentinamente. Bethsheba
olhava com medo e prazer, as roupas sendo jogadas ao chão, peça por peça. Era a
primeira vez que o via inteiramente despido, que poderia tocar aquele corpo moreno,
musculoso, que tantas fantasias lhe despertara.
— Estou com medo — ela sussurrou ao sentir os lábios quentes deslizarem por seu
pescoço. — Por favor, não me machuque.
— A garota precisa morrer para que nasça a mulher — ele arquejou. — Meu amor...
Meu amor... — Ele começou a penetrá-la.
Bethsheba gemeu roucamente. Sua agonia o fez parar e fitá-la em busca de
controle. Penetrou-a mais um pouco e ela começou a se debater como vítima de um
sacrifício pagão.
— Mova-se com a dor! — ele dizia a respiração entrecortada. — Mova-se!
— Não posso! Pare! Pare!
Ele apertou os lábios e fechou os olhos. Não conseguia parar. Movia-se cada vez
mais profundamente. Conforme seus gritos eram ignorados, Bethsheba tentou fazer o que
ele dizia. Começou a se mover lentamente a princípio, depois com rapidez.
Então aconteceu. Como uma lâmpada que se apaga, a dor desapareceu e o desejo
retornou. Os dois se moviam como animais no cio, a pele úmida de suor, os gemidos
guturais e selvagemente excitantes. O amor explodia como uma onda na rebentação. Ela
o beijava, tocava-o no rosto, nos cabelos, nas costas e sentia a tensão em seu ventre
clamar pela saciedade. Sentia amor, raiva e ódio. De repente, sentiu que o ar era extraído
de seus pulmões, que seus olhos reviravam sob as pálpebras, espasmos violentos
levando-a a um êxtase interminável.
O mesmo aconteceu com Suliman em seguida. Ele começou a gemer o corpo a
contorcer e tremer. Os gritos de prazer se misturaram aos dela e Bethsheba finalmente
abriu os olhos. Era maravilhoso e excitante vê-lo fora de controle, totalmente seu.
O fogo da paixão finalmente se extinguindo, Suliman descansou a cabeça sobre seu
colo. Ela o enlaçou em silêncio. A dor fora rapidamente esquecida. Ela se transformara de
princesa em rainha.
Não adiantava mais negar, nem mentir a si mesma. Não agora, nua e exausta no
círculo daqueles braços. Não poderia mais confundir as emoções. Não era ódio, medo ou
atração física; era amor.
— Minha querida, você morreu como uma rainha. — Suliman tocou-a levemente no
pescoço.
— Sou uma mulher agora? — Ela riu. — Deixei de ser menina?
— Uma mulher completa, como soube que seria desde que a vi pela primeira vez. —
Ele beijou-lhe a boca. — Estes lábios vermelhos me convidavam, este corpo maravilhoso
me tentava e estes olhos dourados me desafiavam...
— Poesia árabe ou simples lisonjas?
— Oh, Senhor, — ele sorriu —, como poderiam ser simples lisonjas?
— Por falar nisso, devo chamá-lo "meu amo" ou "meu senhor" de agora em diante?
Não sei se serei capaz, Suliman.
— Nem aqui? Na intimidade de nosso quarto? — ele brincou. — Não acha que seria
adequado? Afinal de contas, meu amor, é aqui que eu reinarei absoluto.
— Como fez agora? — Ela tentou mostrar sua independência, sua coragem e sua
própria arrogância, embora o coração pulsasse mais depressa só em pensar em outras
noites como aquela, em mais noites em que seu autocontrole desapareceria e ela seria
simplesmente uma mulher, possuída por seu homem.
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— Nenhum homem é meu senhor. Não posso aceitar ou permitir esse pedido...
Quero dizer, ordem.
— Não pode bint? Mas sou seu marido. Seu rei. Chamará-me de "amo" por bem ou
por mal.
— Que seja por mal! — Ela o fulminou com os olhos, a brincadeira esquecida.
— Como você quiser. — Ele não perdeu a calma.
— Não pode me forçar a fazer nada que eu não quiser...
— Não posso? — Ele a fitou com um brilho nos olhos, que a fez lembrar
imediatamente o fogo que sentira ao ser beijada nos lábios, nos seios, quando quase
suplicara que ele a despisse e como ansiara interiormente para que ele a possuísse.
Ele poderia obrigá-la a chamar do que quisesse. A fazer o que ordenasse, e isso a
assustava, porque era uma prova de sua completa rendição.
Amava-o desesperadamente. Não havia mais como negar.
CAPÍTULO IX
O som das preces ecoava pelo pátio de pedra sob as janelas do quarto. Bocejando
preguiçosamente, Bethsheba sentiu o rosto quente junto ao peito de Suliman. Ainda um
tanto submersa nas águas profundas da inconsciência, ela se viu curvando o corpo nu
para ele, a mente cheia de imagens da Arábia, do sheik e das experiências que ali vivera.
Uma mão afagou-lhe os cabelos.
— Está acordada?
— Mmmm...
A mão continuava a afagá-la.
— Como se sente esta manhã, minha rainha?
— Maravilhosa! — ela confessou com um sorriso sonolento.
— Está doce e gentil esta manhã, meu amor. Acho que a gata selvagem está
domada. — Ele sorriu.
— Ainda estou com sono — ela respondeu tensa, temendo que ele pudesse adivinhar
seus verdadeiros sentimentos. — É lógico que esteja doce e gentil.
— Gostei de vê-la assim. Uma mulher tem muitas facetas. Quero conhecer todos os
aspectos de sua personalidade.
— Já viu muito. — Ela tentou relaxar novamente. Estava adorando sentir o corpo nu
de Suliman junto ao seu. Era como se sempre houvessem sido amantes.
— Desejo ver muitos outros. Já sei que é sedutora, guerreira, selvagem, amante
perfeita...
— E dorminhoca? — ela brincou.
Projeto Revisoras 55
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— Talvez em breve. Então verei seu lado materno.
— Lado materno? — Bethsheba pestanejou. Suliman acariciou seu ventre.
— Talvez tenha concebido ontem à noite. Talvez conceba hoje. Em breve terei o filho
que tanto desejo.
— Concebido? — Ela se esquecera completamente dessa possibilidade. Em sua
paixão cega, adorara os gritos de êxtase do marido sem considerar que sua semente
poderia estar fertilizando-a irreversivelmente. — Eu não pensei nisso!
— A idéia de me dar um filho te apavora tanto assim?
— Sabe que sim! — Oh, ela era uma imbecil! Como pudera se entregar tão
cegamente a ponto de se esquecer de tomar alguma precaução?
— No entanto recebeu-me sem reservas, com paixão. — Suliman a segurou pelo
queixo, forçando-a a encará-lo. — O que dirá a si mesma se engravidar? Que eu a forcei?
Que você foi inocente nesta concepção?
— Sabe que eu não tive escolha sobre o que aconteceu ontem à noite — ela se
defendeu, corada. — Admito que... Que gostei, mas isso não significa...
— Não minta a si mesma, Sheba. — Os olhos escuros pareciam penetrar em sua
alma. — Você agora é uma mulher, e como tal deve aceitar o que faz.
— Mas você não me perguntou se eu queria um filho! — ela protestou ao mesmo
tempo embaraçada e ressentida com a acusação. — Jogou-me numa situação da qual eu
não tinha saída! Não era isso que eu queria...
— Eu acredito que você concebeu! — Suliman a interrompeu, de repente.
— Não seja ridículo! Como pode saber? — ela respondeu assustada.
— Você já é uma mulher, Sheba. Seu ventre está preparado para carregar meu filho.
Como é possível que não saiba o que se passa em seu próprio interior? Como é possível
que não conheça as verdades escuras e primitivas de seu corpo?
Bethsheba o fitou, muda de espanto e pânico. Ele só podia estar tentando assustá-la.
— Sua raiva e pavor provém da certeza da fecundação. Você nunca teve uma reação
histérica antes. — As mãos de Suliman tocaram-lhe o ventre.
— Você está louco! — ela gritou e se desprendeu dos braços dele. — Completamente
louco!
— A histeria está ligada à gravidez, não sabia? — ele acrescentou calmo.
Bethsheba sentou-se, a fúria brilhando em seus olhos.
— Se pensa que vou ficar aqui, presa a esta situação intolerável por mais um minuto
sequer, está muito enganado. Não lhe daria filhos nem que ficasse de joelhos...
— Somos marido e mulher — ele a interrompeu, firme. — Ficará aqui, sim, como
minha rainha, e passará a conduzir sua vida de acordo com seu novo status,
— E te dar uma dinastia prontinha, de bandeja? Vá para o inferno! E quanto a minha
vida? E quanto a minha carreira?
— Uma carreira da qual ansiava por escapar! Não abuse de minha paciência, Sheba.
A vida que levava no Ocidente estava te angustiando, matando sua energia dia após dia.
Foi por isso que correu para mim, quando a chamei, e é por isso que permanecerá onde
está.
— Forçou-me a um casamento que eu não desejava! — Bethsheba gritou amarga. —
Forçou-me a sacrificar minha virgindade por seu desejo insaciável! Agora também quer
me forçar um filho que eu...
— Não te forcei a nada! — Suliman também se sentou nervoso. — Nada do que eu
fiz foi imposto, e, até que você não admita isso, nenhum de nós terá paz.
— Não quero paz! — ela bradou, odiando-o. — Quero ir para casa. Quero ir para
Tanger e depois para Londres.
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— O ocidente se fechou para você para sempre! Por que insiste em virar o rosto para
esta verdade?
A raiva explodiu por fim, fazendo cora que Bethsheba gritasse incoerentemente, e o
golpeasse no peito, nos ombros, tentando arranhá-lo. Suliman fincava os dedos em seus
pulsos, para procurar contê-la, a respiração ofegante.
— Está lutando consigo mesma, não comigo! — ele exclamou quando conseguiu
dominá-la. — Com seus próprios desejos e necessidades e com sua decisão de continuar
vivendo comigo.
— Você torce todos os fatos para sua vantagem. — ela gritou amargamente vencida,
os punhos cerrados e presos por mãos que pareciam tentáculos. — Mas nada disso altera
o modo como me sinto. Odeio você e quero ir embora!
— Meu amor, você só está se magoando.
— Não me chame de seu amor! — Ela começou a chorar. — Você não liga a mínima
para mim. Sou apenas mais uma de suas possessões.
— A possessão constitui nove décimos da lei — ele respondeu rápido.
— Mas não tem nada a ver com amor. — Ela lutou para conter as lágrimas que
pareciam querer fazer explodir seu coração, sua alma, sua boca e seus olhos.
Suliman a fitou em tenso silêncio por um longo tempo.
— O amor é um brinquedo da vaidade ocidental. Não tem nada em comum com a
vida ou com a sucessão de um trono. Não se encontra aqui para ser amada, bint, mas pa -
ra reinar.
— Oh, eu te odeio! Como pode me sentenciar a toda uma vida de dever sem amor?
— ela indagou muito baixo, rouca, somente um vestígio de orgulho a sustentando.
— Porque está escrito — ele replicou implacável.
— Nada está escrito. Trata-se de uma lenda antiga e poeirenta, a qual me recuso a
representar. É a isto que chama de liberdade, Suliman? É esta a "maravilhosa liberdade"
de que falou quando nos conhecemos?
— Não discutiremos este assunto aqui. — Ele se levantou de repente, magnífico em
sua nudez, com o sol realçando a pele morena.
— Quando o discutiremos, então? — Bethsheba se jogou para trás, odiando-o com
cada fibra de seu ser, e sentindo-se mais frustrada e só do que nunca.
— Esta tarde — Suliman respondeu hostil. — Mandarei chamá-la.
— E, até lá, o que farei? Terei de ficar à disposição de seu harém? Banhar-me o dia
inteiro?
— Não, bint — ele respondeu as narinas infladas. — Você se banhará e se vestirá
imediatamente! Em seguida será levada à casa do artista, no sétimo pátio.
— Casa do artista? De que está falando?
— Você logo descobrirá. — Ele apanhou um cafetã vermelho-escuro de uma cadeira
e o vestiu. — E, até nosso encontro desta tarde, Sheba, desejo-lhe um bom dia!
— Espere! — Ela gritou antes que Suliman fechasse a porta. — Não pode sair desse
jeito! Não no meio de uma discussão importante...
— Não erga sua voz para mim, bint! — Ele se voltou, hostil. — Se não quiser
transformar nosso casamento num leito de escorpiões. Creia-me, eu te matarei antes que
tenha condições de me picar.
A porta se fechou com tanta violência que Bethsheba sentiu como se tivesse sido
golpeada no rosto. Lágrimas ardentes deslizavam e molhavam o travesseiro.
Ele não a amava! Queria-a apenas para gerar seus filhos e ostentar ao povo uma
réplica viva de uma estátua dourada.
Era uma situação intolerável, inadmissível!
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Seu corpo se sacudia em soluços. Em que armadilha monstruosa ela caíra? E se
Suliman estivesse certo e ela já carregasse um filho no útero? Não queria nem pensar.
Seria mesmo possível... Após uma única noite de sexo? Não, não queria, não permitiria...
Sentou-se, então, e respirou fundo, tentando se acalmar. Não estava grávida, claro
que não. Aquela afirmação era apenas parte da estratégia de Suliman para assustá-la,
apavorá-la. Pois, se realmente estivesse, todas suas esperanças de escapar daquele
inferno estariam perdidas. Precisaria ter aquele filho, não importava aonde e sob os
cuidados de quem.
Mas não estou grávida, ela tornou a se dizer. Não estou grávida e não sou Sheba, e
não ficarei aqui um minuto mais do que o extremamente necessário.
As mulheres vieram a seu quarto minutos depois que Suliman se foi. Levaram-na a
se banhar na presença de Sheba. Por alguns momentos ela se deixou flutuar na água
morna. Seu corpo apresentava as marcas da paixão deixadas por Suliman. As lembranças
voltaram e ela fechou os olhos. Oh, ele fora um amante tão excitante, apaixonado,
experiente!
A casa do artista ficava a uma distância considerável de seu quarto. O palácio era
quase uma cidade. Havia mais salas e corredores, mais jardins, fontes e estátuas do que
ela poderia contar. O que mais estranhou foi o som de telefones, máquinas de escrever e
fac-símiles, vindo de uma série de portas. As mulheres, porém, não permitiram que ela se
detivesse por ali por muito tempo.
Um pátio se abriu repentinamente para elas. Vibrava com as vozes e movimentos de
pessoas. Havia barracas com laranjas maduras, tâmaras secas e azeitonas. O cheiro de
pão e carne fresca era intenso.
Bethsheba passou em seguida por um trecho onde se misturavam as mais diversas
essências: jasmim e oleandros, cravo e almíscar. Em seguida eram sedas que estavam
expostas.
Uma cafeteria a fez rir com suas mesas e cadeiras repletas. Agora passavam por um
beco longo e frio. Sua túnica roçava pelo chão de pedra, só seus olhos podiam ser vistos
pelo povo.
O sétimo pátio era um encanto. Com seus muros antigos e aglomerados de
pequenas casas, contava também com uma praça enorme, um chafariz e uma ambiente
de boêmia artística.
A casa do artista, propriamente dita, era uma construção que parecia prestes a
desabar, com uma cortina de contas à entrada, um cachorro dormindo na recepção e um
cheiro de café atraindo os transeuntes.
Bethsheba entrou sem vacilar.
— Alô! — Sua voz e passos ecoaram pela sala que, incredulamente, contava com um
aparelho de ar condicionado.
Por detrás da primeira porta, encontrou pinturas e estátuas, umas incompletas,
outras perfeitamente acabadas. Um cavalete junto à janela lhe chamou a atenção. O estilo
daquela tela, com suas brilhantes cores, era inconfundível. Edouard de Chanderay,
obviamente. Quem quer que o tivesse imitando era o dono de considerável talento.
Um leve ruído às suas costas a fez se voltar.
— Olá! — Um homem alto, ruivo, de barba, esfregava uma faca com um pedaço de
pano, junto à porta. — Creio que deve ser Sheba.
— Sim — ela concordou, reconhecendo-o imediatamente.
— Sou Edouard de Chanderay. — Ele estendeu a mão. — Enchanté, madame El
Khazir.
Muda de espanto, Bethsheba apertou-lhe a mão. Não podia desviar os olhos daquele
rosto familiar, daqueles olhos azuis inteligentes. Edouard de Chanderay era um dos artis-
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tas mais respeitados da época, e ela se sentia profundamente honrada só em poder estar
diante dele.
— Desculpe-me. — Ela voltou a si ao notar lhe a expressão encabulada. — Sei que
estava encarando o. É que, simplesmente, não consigo acreditar que seja você mesmo.
Como foi que veio parar neste lugar? Não me diga que o sheik também o raptou!
— Não, claro que não. — Ele riu. O leve sotaque francês era agradável aos ouvidos,
suavizando as palavras com um toque dc sofisticação. — Estou aqui de livre e espontânea
vontade... E não me arrependo, posso garantir.
— Mas... Como? Bethsheba ainda não podia acreditar. — Quero dizer, como
encontrou este lugar?
— Vim para Marraquesh e virei à direita. — Os dentes alvos brilharam entre a barba
ruiva. — Venha! Há café com especiarias na cozinha. Lá, eu contarei minha história, e
depois poderemos começar a trabalhar.
Bethsheba o seguiu por um corredor sinuoso, pintado de branco, com fotos pelas
paredes e cestos com plantas. Havia uma foto de Chanderay junto a Picasso, que a fez
parar, maravilhada.
— Estou aqui há cinco anos — Chanderay revelou, enquanto servia o café. — Nem
imagina a diferença que isso fez em minha vida.
A privacidade, quer dizer?
— Alors! Ele riu. — Sem repórteres, sem multidões, sem fãs! E, principalmente, sem
falsos entendidos discutindo minha obra, apenas para impressionar os amigos!
Bethsheba aceitou o café e sorriu diante de uma pintura com uma inscrição:
Chapeuzinho Vermelho Procura um Lobo Jovem.
— Aqui — Chanderay explicou — ninguém liga para minha fama. Admiram minha
obra, sim, mas não invadem minha privacidade. Sou aceito pelo que sou não pelos pro -
clamas da imprensa.
— A fama era uma dor de cabeça para você? — ela indagou, para em seguida
completar. — Sim, bem posso compreender.
— Além disso, todas essas cores e vida do mundo de Suliman! Que lugar fabuloso! O
tempo, a paisagem, as flores...
— Sim, é um paraíso. Mas como o encontrou, Chanderay? Deve reconhecer que não
faz parte das rotas turísticas.
— Conheci Suliman em Paris — ele explicou.
— Paris? — Bethsheba repetiu perplexa.
— Sim. Suliman é um homem de grande cultura, não acha? Profundo amante das
artes, muito moderno em suas atitudes.
Bethsheba não tinha palavras. Estariam falando sobre o mesmo homem? Sobre o
sheik Suliman El Khazir, o homem que a apresentara aos mistérios do deserto, ao luxo da
Arábia? Teria se acostumado tanto com a pronúncia per feita do idioma inglês, que só
demonstrava sua origem árabe quando estava zangado, que nunca lhe ocorrera onde ele
a teria adquirido?
— Suliman veio ver uma de minhas exposições. Entendemos-nos imediatamente, Ele
adorou meus quadros e esculturas. Comprou várias peças. Conversamos por horas e
acabamos jantando juntos no Fouquet's, nos Champs Élysées. Como sempre, passei a
noite reclamando sobre a falta de privacidade que o sucesso me trouxera. Queixei-me
sobre a imprensa, sobre a vida moderna, sobre os críticos, sobre a incapacidade que eu
estava desenvolvendo de acreditar em meu próprio trabalho devido a tantas
interferências.
— Você morava em Paris?
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— Sim, num apartamento em Grasse, no sul de Paris, para ser exato. Suliman
sugeriu que eu tirasse um mês de férias e me hospedasse em seu palácio, no Saara. Eu já
tinha planos de vir a Marraquesh naquele verão, por isso o convite me pareceu uma
predestinação. Aceitei-o na hora.
À menção do destino, Bethsheba prendeu a respiração.
— Veio para cá? Não para o Palácio dos Sete Sóis, em Agadir?
— Vim direto para cá. Apaixonei-me pelo lugar e não pude suportar a idéia de voltar.
Quando o fiz, foi para vender meu apartamento e buscar minhas coisas. Acho que jamais
viverei em outro país.
— E veio desde Marraquesh a cavalo? — Ela franziu o cenho. — Deve ter sido uma
viagem horrível!
— A cavalo? — Ele deu uma gargalhada — Claro que não. Vim com o jato particular
de Suliman.
— Jato particular?
— Sim. — Chanderay ergueu uma sobrancelha. — Não sabia que Suliman possui um
avião? Pois se há um campo de pouso no fundo do palácio! Ainda não o viu?
Bethsheba sacudiu a cabeça, muda de espanto, ao impacto de todas as informações.
Obviamente Chanderay conhecia Suliman El Khazir muito melhor do que ela.
O artista lhe serviu um confeito e pegou um para si próprio.
— Ele o colocou a minha disposição. Posso voar para onde quiser voltar quando
desejar, viver com um pé no Ocidente e outro no Oriente.
— Quer dizer que continua visitando a Europa?
— Lógico. Afinal, não sou um maníaco total, madame. — Ele riu. — O mundo da arte
é o Ocidente, e eu preciso dele tanto quanto antes. Já a paz e o anonimato de que tanto
necessito está aqui, no Oriente. Então a criação acontece aqui, mas as exposições e
vendas, no Ocidente. Preciso manter meu nome junto ao público. Isso é importante para
um artista, por mais sucesso que tenha alcançado. Uma audiência, afinal de contas,
sempre é uma audiência, e eu não pinto apenas para meu bel-prazer. Como os meninos,
todos os artistas precisam dizer: Vejam, vejam o que eu fiz!
— Não é diferente com as meninas. — Bethsheba riu.
— Eu sei. — Chanderay inclinou a cabeça. — Para você, é o silêncio do público
quando canta, para no final explodir em aplausos.
Bethsheba corou um pouco, admitindo a verdade daquela afirmação.
— Ainda acho incrível que Suliman o tenha trazido para cá.
— Sim. Tenho orgulho em ser seu amigo — Chanderay assentiu, e depois completou:
— Você também deve ter muito orgulho em ser sua esposa.
O coração de Bethsheba quase parou de bater. Chanderay acreditava que Suliman a
amava. A dor da rejeição retornou ainda mais contundente. Eram apenas os filhos que lhe
importavam, e seus deveres como rainha, como ele próprio dissera aquela manhã.
Suliman nunca a amaria, e, de repente, aquela constatação lhe pareceu insuportável.
— Vamos começar com nosso trabalho? — Chanderay se levantou.
— Nosso trabalho? — Ela o fitou com estranheza.
— Suliman não contou? — O pintor pareceu surpreso. — Ele quer que eu faça uma
escultura sua.
— Uma escultura minha, de Edouard de Chanderay? A surpresa se acentuou.
— Estou lisonjeado com sua admiração por mim, Sheba, mas preferiria que não a
demonstrasse. Este aqui é meu santuário. Aqui, sou apenas um homem que gosta de pin-
tar e esculpir.
— Sinto muito... Desculpe-me.
Projeto Revisoras 60
Julia Ed. Férias 21.1 – O Príncipe do Deserto – Sarah Holland
— Não faz mal. — Ele deu de ombros. — Você deve sentir o mesmo, as mesmas
pressões. Tudo que peço é que não se esqueça dos motivos que me trouxeram a este
lugar, e que me trate como um homem qualquer. Tenho o direito de querer ser real
enquanto estiver vivo. — Um sorriso iluminou seu rosto. — Terei tempo suficiente para ser
um gênio quando morrer!
Bethsheba o seguiu novamente pelo corredor, e em seguida pelos degraus que
levavam ao estúdio, cuja janela dava para a praça e para um céu azul tão límpido que
parecia mais próximo a Deus e à eternidade, do que qualquer outro céu da Terra.
— Por favor, retire o véu — Chanderay pediu. — Suliman deseja que a estátua faça
jus a sua beleza.
O véu e a capa imediatamente caíram ao chão, e Bethsheba posou em seu traje
branco de odalisca, com o corpete em dourado, o ventre nu e enfeitado por correntes de
ouro, os cabelos caídos sobre os ombros, às mãos erguendo apenas algumas mechas.
Seria a estátua de uma sereia com pernas. Uma escultura muito sensual.
— Fale-me sobre seu trabalho. — Chanderay pediu. — Sua carreira deve tê-la
apresentado a muitas pessoas fascinantes.
— Sim, é verdade, mas o que considero mais incrível é que pessoas muito mais
famosas tenham ouvido falar sobre mim. — Ela riu.
O artista concordou.
— Isso nunca mudará. Encontra-se alguém por quem se tem admiração, e fica-se
perplexo por encontrar admiração também nos outros olhos. Ele começou a moldar suas
formas. — Será feliz com Suliman. Ele compreende os artistas.
— Talvez não seja. — Ela enrijeceu. — Não, se tiver de me transformar numa
estátua de uma lenda antiga.
— Você está acostumada à fama. — Ele percebeu sua emoção e estranhou. — Acha
que aqui será diferente?
— Sim.
— Não vejo a razão. Era inevitável que Suliman se casasse com uma artista.
Bethsheba entreabriu os lábios, surpresa.
— Agora... Poderia voltar à pose? Sim, incline se para trás... Dedique sua
sensualidade ao homem que me encomendou esta escultura! Você é Sheba, lembra-se?
Permaneceram no estúdio por horas. Chanderay moldava a argila admiravelmente
com suas facas, espátulas e agulhas, mas principalmente com seu talento.
Às três horas, Suliman mandou que fossem buscá-la. O coração disparado,
Bethsheba tornou a vestir a capa e o véu para ir ao encontro de seu marido e ouvir as
respostas às questões que fizera pela manhã.
Bethsheba caminhava no centro, rodeada por duas servas e um segurança, como
convinha a uma rainha... Ou a uma prisioneira. Para sua surpresa, foi levada à seção dos
escritórios no pátio circular, que era à entrada do palácio real. As servas a conduziam
através das máquinas até se deterem diante de uma porta alta de carvalho.
Era um escritório dos mais modernos, com carpete, escrivaninha de mogno, cadeiras
de couro preto, um microcomputador e, no fundo, uma janela com vista panorâmica, onde
se via um jato Cessna na cor vermelha. O avião brilhava para ela, simbolizando tudo que
dizia a respeito de Suliman: um magnífico exemplar da era moderna numa paisagem forte
do deserto.
A imagem que tinha de Suliman se chocava com a realidade. Ele se dividia em dois
homens, profundamente antagônicos.
Uma porta abriu às suas costas. Bethsheba se voltou, pálida.
Suliman fechou-a lentamente e se apoiou sobre ela.
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CAPÍTULO X
Suliman trajava um terno cinza-claro, de corte impecável, que realçava seus ombros,
e uma gravata de seda vermelha, em contraste com a camisa branca.
Era mais bonito, mais sexy, mais atraente do que qualquer outro homem que
Bethsheba já vira. E na escuridão de seus olhos vivia o bárbaro do deserto que a raptara e
a levara, na última noite, a uma rendição que a mudara para sempre.
— Suliman — ela chamou rouca, os olhos úmidos de amor, conforme um nó se
formava em sua garganta.
— Sim? — A voz estava tão seca quanto à expressão de seu rosto. — Posso saber o
que está se passando nessa sua mente, bint?
— Mal posso acreditar que tenha demorado tanto para me revelar este seu outro
lado!
Por quê? Ele é assim tão superior ao do sheik que você conheceu?
— Você não está entendendo. Eu...
— Estou entendendo muito bem. — Ele riu e indicou a janela. — Veio a meu
escritório, viu o Cessna na pista, e subitamente percebeu que poderia...
Chanderay me contou sobre o jato — ela o interrompeu. — Sabia de sua existência
antes de vir para cá.
— Chanderay Suliman, repetiu hostil. Gostou dele?
— Muito. Não consigo acreditar que esteja vivendo aqui.
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— Realmente. Um artista respeitável vivendo aqui, com um sheik do deserto! É algo
inconcebível!
— Suliman, eu não disse...
— Claro que não Ele riu desagradavelmente e se afastou da porta, em direção à
escrivaninha. Sente se. Temos muito a conversar.
Bethsheba sentou se e encarou-o ciente da intrigante in versão de papéis: ele, em
roupas ocidentais, ela em sedutoras sedas orientais.
— Chanderay me contou como se conheceram em Paris durante uma exposição de
arte,
Parece que ficou impressionada com minhas inclinações com relação a seu mundo.
— Havia um brilho perigoso nos olhos de Suliman.
— Sinto que agora temos mais pontos em comum, No entanto, ainda hoje pela
manhã, me julgava um bárbaro. Bem, bem, bem. Como as coisas mudam. — Ele fechou a
caixa de charutos sobre a mesa, que se encontrava aberta.
— Esta manhã você gritou comigo e bateu a porta do quarto sem uma boa razão! —
Bethsheba o lembrou tensa.
— Você ameaçou terminar com nosso casamento, bint. Que esperava que eu
fizesse? Sorrisse e a colocasse no avião de volta a Tanger?
— Eu nem sequer sabia que você tinha um avião! Mas agora sabe, não é? — Ele fez
um gesto de apresentação em direção à janela.
Bethsheba se calou, a dor se espalhando por seu coração e por sua alma. Seu amor
pelo marido nunca seria retribuí do, Nunca.
— Pois agora você está me vendo com outros olhos. Deixei de ser o bárbaro que
você recusava para me tornar um homem rico, civilizado, poderoso, e principalmente dono
de um jato.
— Você está torcendo tudo — Bethsheba protestou brava e corada. É claro que isso
fará diferença em nosso relacionamento, em nosso futuro.
— Um relacionamento que você repudiava. — Ele sorriu, mas seus olhos estavam
duros.
— Porque não tinha esperanças que fosse dar certo — ela mentiu desesperada.
Como poderia dizer a verdade? Que estava apaixonada por ele havia dias? Que nada
daquilo alteraria seus sentimentos?
— Você não queria nosso casamento. — Suliman jogou a cabeça para trás com
arrogância. — Tinha medo que eu fosse envergonhá-la perante a sociedade ocidental.
Como poderia se casar com um homem como eu? Só os tolos se casam por amor! — Ele a
fulminou com os olhos. — Agora descobriu que eu estou perfeitamente apto a enfrentar
sua sociedade. Subitamente descobriu que nosso casamento não é apenas aceitável, mas
também altamente desejável. Oh, Sheba, se não fosse tão linda, eu te desprezaria.
Deveria ter me contado antes! — Bethsheba se defendeu. — Não deveria ter
mantido segredo sobre sua vida.
— Por quê? Se eu tivesse contado, você teria ido para minha cama antes?
Você é desprezível, Suliman. — Ela perdeu o fôlego ao insulto.
— Teria? — Ele se levantou bruscamente. — Ou descobriremos isso agora, hein? —
Suliman circundou calmamente a mesa, mas não havia calma em seus olhos nem na
expressão de sua boca. — Tire a capa e o véu! — ele ordenou as mãos nos bolsos.
— Vá para o inferno!
Suliman riu, segurou-a pelos braços e a fez se levantar.
— Tire a roupa, Sheba, para que eu possa ver o que o meu Cessna comprou para
mim.
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— Prefiro morrer a deixar que me veja ou que me toque novamente. — Bethsheba
tremia de raiva.
— No entanto vibrou ao fazer amor com seu sheik do deserto! Foi preciso se
sacrificar a uma cerimônia de casamento, mas afinal de contas tudo tem seu preço, não é,
bint? E talvez uma noite de prazer fosse tudo que desejasse de mim.
— Não quero nada de você! — Ela empalideceu e se voltou para sair.
Suliman a impediu.
— Você me queria! Queria fazer amor com seu homem do deserto e conseguiu! O
problema é que agora se encontra casada e em regime de prisão perpétua. Que hora
melhor para tentar ser amiga de seu carcereiro do que quando descobre que há um jato
particular a poucos passos?
— Você não me pediu em casamento! Obrigou-me a fazer isso!
— Sim, e você protestou, mas só até eu levá-la para a cama!
— Cale-se!
— E, assim que se saciou, começou novamente a falar em voltar para casa, para
Londres, para Christopher Burton e para sua carreira.
— Sinto-me péssima em abandonar Cris desse jeito. — Mas não em abandonar a
mim! Se pudesse, me deixaria sem pestanejar! Ele explodiu finalmente, magnífico em sua
ira.
— Eles confiam em mim! — Bethsheba sussurrou incapaz de contar a verdade, de
dizer que cometera a tolice de se apaixonar por ele. — Não se trata apenas de minha car -
reira. Há centenas de pessoas envolvidas. Como posso simplesmente dar as costas a eles?
— Mentirosa! Você quer voltar porque já conseguiu o que desejava... Uma aventura!
Agora quer voltar e testar com outros homens sua experiência arduamente obtida. Para
você, os ocidentais são muito mais atraentes.
— Você não me ama, Suliman! — ela o acusou trêmula. Não me ama e nunca me
amará. Só me quis porque pareço com Sheba. Só que não sou Sheba! Sou eu mesma!
— E você só me quer quando sou o sheik de suas fantasias. Quer que ame
rudemente e que depois desapareça na noite, como acontece tão convenientemente nos
livros. Como sheik, você me rejeitou. Rejeitou meu mundo, nosso casamento e tudo que
lhe ofereci. Porém, ao ver meu avião e minhas roupas ocidentais, me julgou aceitável.
— Você mandou que me vestissem assim como uma rainha árabe antes de se casar
comigo — Bethsheba gritou furiosa. — Não me aceitou como eu era!
— Você não se comporta como uma rainha árabe. É tempo de se despojar de suas
roupas! — Ele puxou brutamente o véu.
— Oh! — Bethsheba recuou, os cabelos dourados caindo como uma cascata sobre os
ombros. — Seu... Bárbaro!
— Bárbaro? — A raiva transformou os olhos escuros em negros. — Eu te darei o
bárbaro que tanto deseja! — Ele ignorou-lhe os gritos e tirou-lhe a capa.
— Não quero seu lado bárbaro! Não quero ter mais nada com você!
— Não mesmo? — Suliman a envolveu pela cintura, apertando-a de encontro a seu
corpo. — Vamos testar essa afirmação?
— Não, solte-me! — Ela prendeu o fôlego ao sentir a mão do marido sobre seu seio.
— Sim... — Ele reconheceu triunfante que ela mais uma vez vibrava ao seu toque. —
Você ainda me quer! Admita ou eu te possuirei aqui mesmo, sobre a mesa!
— Pare! — Bethsheba gritou quando ele tirou seu corpete e a colocou sobre a mesa.
— Não, por favor!
Mas ele inclinou a cabeça e sua boca quente começou a sugar-lhe o seio. Ela gemeu
de prazer, o corpo se arqueando sob o dele conforme as imagens do que ela queria fazer
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passavam em sua mente. Por mais que tentasse negar, a idéia de ser seduzida sobre uma
mesa de escritório a excitava enormemente.
— Você me quer! — Suliman respirava com dificuldade, o rosto queimando. —
Gostaria que eu te possuísse agora, aqui, imediatamente!
— Sim... Sim... — ela admitiu consumida pela paixão.
— Então me prove Sheba! Abrace-me e implore!
— Faça-me sua, Suliman. — Seus dedos penetraram pelos cabelos espessos e
pressionaram-lhe a cabeça sobre os seios. Sabia que Suliman arrancaria as emoções mais
violentas novamente de seu corpo, e mal podia esperar por isso. — Possua-me — ela
sussurrou, o sangue pulsando como fogo líquido em suas veias, enquanto tentava
desabotoar-lhe o paletó.
— Eu ficarei vestido, bint? — Ele a deteve, machucando-lhe os punhos de tanto
apertar. — Sou o cliente, e você a prostituta.
— Oh, eu te odeio! — Ela tentou golpeá-lo no rosto, mas foi impedida.
— Odiando-me ou não, ainda me deseja. — Ele puxou o zíper da calça e a penetrou
com brutalidade, fazendo-a gritar de dor e prazer. Faziam amor como se fossem dois
inimigos, os corpos colidindo com violência, as bocas se unindo num beijo feroz.
A excitação era tão forte que os dois perderam a consciência do mundo. Era como se
todas as emoções canalizassem entre eles e explodisse numa potente corrente de energia,
que quase os matava, para depois acalmar.
Mas não foi paz ou calma que Bethsheba sentiu, quando Suliman finalmente
descansou a cabeça em seu ombro. Era dor. A dor da perda.
Ele se ergueu sem olhar para ela, como já esperava. As lágrimas que insistiam em
brotar de seus olhos foram orgulhosamente estancadas. Ele ajeitava as calças, passava a
mão pelos cabelos e era novamente o homem poderoso, impecavelmente vestido, como
estava ao chegar.
O silêncio pesava sobre a sala. Bethsheba se vestia. Não sentia vergonha. A
vergonha era uma emoção muito fraca comparada à dor.
Meu avião a levará para Tanger pela manhã — ele informou, a voz destituída de
qualquer emoção. Estava de costas. Parecia não haver mais nada a dizer.
Bethsheba desceu trêmula, da mesa. Apanhou o restante da roupa e se dirigiu para
a porta, o rosto muito pálido. Só quando saiu para o corredor foi que permitiu que as
lágrimas deslizassem livremente pelo rosto.
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Ela caminhava com o coração em disparada. Se aquilo não funcionasse, nada
funcionaria. Precisava convencê-lo de que o amava principalmente ao seu lado oriental.
Mesmo de costas, ele possuía a arrogante nobreza de um rei. Estava maravilhoso,
com um terno preto bem cortado. Uma aura de riqueza e poder brilhava a seu redor.
Finalmente se voltou e a viu.
A cabeça erguida, Bethsheba enfrentou-lhe o olhar com coragem. Era Sheba. Por um
breve momento era o destino encarnado.
A emoção os atingiu como um raio, mas logo se foi, pois Suliman lhe falou com uma
frieza que a dilacerou.
— Está tudo preparado para sua partida. Voará para Tanger às nove horas da
manhã.
— Oh...! — O desapontamento foi como um soco no estômago.
— É bastante seguro. Meu piloto é experiente e o jato é cuidadosamente
inspecionado antes de cada viagem.
— Obrigada. Não sei o que dizer. — Ela tentou não demonstrar a dor que a afligia.
— Não diga nada. Você irá embora e nunca mais nos veremos. Palavras são
desnecessárias.
Ela fez um gesto de consentimento com a cabeça. Realmente falar era impossível.
— Precisamos discutir sobre o divórcio. — Suliman colocou as mãos nos bolsos. —
Deverá ser discreto. Ninguém precisa saber. Mandarei os papéis para que você os assine e
torne a devolver. Tudo estará resolvido em algumas semanas, se você cooperar.
Ela consentiu novamente. Estava pálida e trêmula. Estaria tão frio assim?
— Se houver uma criança desta união... — Suliman começou a dizer, mas se deteve,
desviando o olhar.
A emoção em sua voz a fez ter alguma esperança. Ela não podia permanecer calada.
— Sim? Se houver uma criança...? Ele voltou a fitá-la, implacável.
— Você se vestiu para mim como Sheba. Por quê?
— Porque tive vontade. — Sua coragem desapareceu como num passe de mágica.
— Vontade de se divertir a minha custa? — Ele a fulminou com os olhos.
— N-não. Porque achei que seria adequado.
— Adequado? Acha que é adequado provocar-me com o que não posso ter? Você
está me expondo aos limites de meu autocontrole, Sheba. O quanto antes deixar este
palácio e minha vida, melhor será!
Suliman lhe deu as costas e começou a se afastar. Estava indo embora! Bethsheba
não podia permitir que se fosse. Não com aquele pesar... Um pesar que poderia significar
dor!
— Espere! Suliman, não se vá!
— Você quer que eu torne a perder o controle, não é? Como aconteceu esta tarde?
Quer que eu destrua o pouco que sobrou de nossa dignidade. — Sua boca tremia. — Sou
seu rei. Não me obrigue a mais uma demonstração de selvageria.
— Não é isso que pretendo. Vamos conversar. Só quero que fique e jante comigo,
como combinado, para que possamos conversar.
— O tempo para conversas está esgotado. Tudo já foi dito. Você deseja pôr um fim
em nosso casamento e partir Muito bem. Os preparativos foram feitos. Mas não me peça
para conversar, pois nada mais tenho para te dizer.
— Não! — Ela implorou, e agarrou-lhe possessivamente o braço. — Não... Não
podemos terminar assim. Suliman, por favor!
— Já está tudo terminado. — Ele falou muito baixo. — E não posso mais suportar vê-
la desse jeito. — Os olhos de Suliman pareciam queimá-la de repente. — Sheba en-
carnada. Meu destino, minha rainha, meu amor. Mais linda esta noite do que jamais a vi.
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— Ele fechou os punhos e suspirou. — Volte pára a Europa! Volte para seu carcereiro!
Volte para a falsidade! Errei em trazê-la para cá!
— Não, Suliman, você estava certo em me trazer.
— Errei e paguei caro por isso. — Ele mordeu o lábio. — Pensei que você me queria
que queria tudo que eu poderia te dar. Fui um tolo. Mas agora está acabado. Adeus,
Sheba. Que o Ocidente possa te dar tudo por que sonha.
Ele saiu da sala, batendo a porta.
Bethsheba permaneceu como que paralisada, olhando a porta fechada. As palavras
fustigavam sua mente. Lágrimas ardentes queimavam-lhe os olhos, e ela pestanejava ce-
gamente, afastando o orgulho e a arrogância, para que apenas o amor brotasse de seu
coração.
Ele poderia me amar, ela pensou trêmula de paixão. Não posso deixar que se afaste
de mim.
CAPÍTULO XI
— Suliman! — Bethsheba abriu a porta e gritou. — Suliman! Ele estava virando uma
curva do corredor, os passos se misturando ao seu grito desesperado, e não se deteve.
Bethsheba quase desfaleceu. Encostou se na parede e respirou fundo, para recuperar as
forças.
Se Suliman não a amasse, estaria apenas se humilhando. Mas, se houvesse uma
chance, uma mínima chance, de que a amasse tanto quanto ela o amava, valeria à pena
lutar.
E se fosse apenas Sheba que ele desejava? Uma estátua dourada para manter cativa
em seu palácio? Como poderia suportar esse tipo de vida? E se voltasse para seu país?
Seu coração se apertou só em pensar. Oh, a solidão daquela vida! As horas
intermináveis dentro de um estúdio de gravação, as horas contínuas em ônibus e hotéis,
as refeições rápidas à beira de estradas.
Ali, com Suliman, ela teria o amor pelo qual tanto esperara Teria o amor de um rei,
um rei a quem amava loucamente. Teria um bebê para acalentar, um reinado, um deserto
inteiro onde poderia cavalgar e se sentir livre... E um jatinho para levá-la ao Ocidente
sempre que desejasse.
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Bethsheba começou a correr pelo corredor. Para onde Suliman teria ido? Não o via
em lugar algum. O medo fez suas pernas fraquejarem e ela começou a realmente duvidar
que fosse ter êxito em convencê-lo.
Suliman era um homem orgulhoso. Um rei e guerreiro. Nunca demonstraria seus
sentimentos a menos que estivesse completamente seguro dos dela.
E como poderia estar seguro dos sentimentos de Bethsheba, se ela os mantivera
escondidos? Em cada momento que passara com ele, todos os esforços foram concentra-
dos em recusá-lo e desafiá-lo.
Era mais do que óbvio que, mesmo que Suliman a amasse, não o demonstraria. Era
o comportamento do sheik Suliman El Khazir. Uma exigência de seu orgulho e poder.
Isso lhe deixava uma única opção: teria de dizer a ele.
A determinação lhe deu forças. Abriria todas as portas do palácio até encontrá-lo,
mesmo que levasse a noite inteira. Percorreu cozinhas, salões, quartos, até finalmente
encontrá-lo no escritório. Estava com as mãos cheias de papéis. Ao vê-la, levantou-se
furioso, e os papéis caíram. Eram fotografias e recortes de jornal. Era o rosto e o nome de
Bethsheba recortado de dezenas de revistas e jornais.
Perplexa, ela levantou lentamente os olhos.
— Saia daqui! — Suliman ordenou pálido. Fora daqui!
— Estou apaixonada por você — Bethsheba confessou num fio de voz.
Um silêncio emocionado invadiu a sala. Suliman a olhava, descrente, os recortes
espalhados aos seus pés, e a raiva brilhando em seus olhos por ver seu último e maior
segredo inteiramente exposto.
— Estou apaixonada por você! Bethsheba tornou a dizer. Não me importa o motivo
que o fez raptar-me, ou como isso foi acontecer. Sei apenas que estou apaixonada e que
não posso partir.
— Saia! — Ele se colocou de costas para ela. Ela vacilou incapaz de responder.
— Por que não faz o que mandei? Agrada-te saber que sou completamente seu?
Saber que estou apaixonado por você desde o início?
— Suliman...
— Você viu minha coleção de fotos suas. Viu meu amor e minha obsessão! Sabe
agora que venceu Bethsheba! Mas eu não tenho de tolerar sua presença aqui por mais um
segundo sequer! — Ele ergueu a cabeça com altivez. — Saia! — Não posso Suliman. Eu te
amo!
— Ha! Nesta manhã me chamou de bárbaro e exigiu sua liberdade. Agora diz que me
ama!
— Esta manhã eu acreditava que você fosse indiferente a mim.
— Esta manhã você não sabia que eu tinha um jato particular.
— Você mentiu para mim! — ela se defendeu. — Omiti, apenas. Não é a mesma
coisa. — Para mim, é. Achei que você só queria meu corpo. Sabe o que significa isso para
uma mulher? É horrível! Ele pareceu inseguro pela primeira vez.
— Como pôde pensar assim? Sabia que eu estava preparado para lutar contra um
exército para trazê-la para cá!
— Não, eu não sabia como você se sentia Suliman. Ela deu um passo em sua
direção. — Estava magoada. Tinha medo do futuro, e em especial esta manhã, quando
me tratou com tanta crueldade. E ontem à noite, quando disse que o amor era um
brinquedo da vaidade ocidental.
— Que esperava que eu dissesse? — ele indagou tenso. — Que estava
irremediavelmente apaixonado por você?
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— Suliman... — Bethsheba estendeu a mão para ele. — Não! Não se aproxime! Se
realmente existisse amor em seu coração, você o teria demonstrado esta manhã, depois
que dormimos juntos.
— Mas eu tinha medo! — ela protestou rouca. — Despertei casada com um homem
que mal conhecia. Um homem que insistia em dizer que só queria sexo. Um homem que
me escondia sua verdadeira personalidade.
Ele a fitou intensamente. Em seguida baixou os olhos, e suas feições endureceram.
— Como posso acreditar? Suas palavras parecem tão improváveis!
Mas é quando algo parece improvável que se torna uma real possibilidade.
— Você sabe ser persuasiva, Sheba, mas... — Ele sorriu sarcástico.
— Também é improvável que você tenha acompanhado minha carreira por tanto
tempo — ela salientou o coração pulsando forte. — Também é improvável que tenhamos
compartilhado tanto sem que eu percebesse que você sabia quem eu era, durante todo o
tempo.
— Eu não podia permitir que descobrisse. Isso teria destruído a beleza de nosso
mundo íntimo.
— Eu entendo meu querido! — ela exclamou, com lágrimas nos olhos. — E estou
feliz por ter descoberto agora... No último minuto.
— Por quê? — ele a questionou, ríspido.
— Porque passei a acreditar que nosso casamento poderia dar certo. Agora sei que
você poderia aceitar meu mundo com tanto amor quanto eu passei a aceitar o seu.
— Como poderei ter certeza? — ele indagou muito tenso.
— Confie em seus instintos, Suliman. Ele a fitava em silêncio.
— Sabia que eu me encontrava em Tanger? Foi tudo planejado desde o começo? —
ela quis saber.
— Não, mas eu há reconheci aquele dia no deserto. Reconheci e vi a excitação com
que me olhou.
— E foi naquele momento que decidiu raptar-me? — Ela sorriu, corada de prazer.
— Não, foi mais tarde, quando cantou para mim.
Bethsheba sorriu e ambos se fitaram em silêncio. Depois Suliman caminhou em sua
direção. Ela vibrava de esperança, mas permaneceu onde estava. Não ousava se mover
até que ele confessasse seu amor.
Alimentei suas fantasias, e você desabrochou meu amor. Desabrochou sob o poder
da tentação. Eu podia ver o amor pelo deserto em seus olhos. O amor pela aventura e
pela liberdade.
— Eu realmente desejava tudo isso. Não podia acreditar que estava junto de um
sheik de verdade!
— Quer dizer que também se sentiu atraída pela minha imagem?
Bethsheba sentiu a boca ressequida. Precisava ser sincera. — No início... Sim! Você
fica tão sexy em roupas orientais, Suliman!
— Então você queria realmente que eu a raptasse? Que a levasse para meu douar e
fizesse amor com você?
— Sim!
— Queria que eu te devolvesse a infância que nunca foi capaz de esquecer?
— Suliman, eu te amo. — Ela sentia o coração transbordar de emoção.
— Minha querida — ele murmurou, aconchegando-a de encontro ao peito. — Eu
sempre te amei! Desde o momento em que vi seu rosto...
— Oh, Suliman! — Ela o envolveu com os braços. Queria se inebriar do perfume
másculo que julgara nunca mais poder sentir. — Você realmente teria me deixado partir?
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— Sim, meu amor, apesar de relutar contra essa decisão. Ela fechou os olhos
dominada pelo remorso de quase tê-lo perdido.
— Eu não podia mantê-la aqui contra sua vontade, por mais desesperado que
estivesse. Seria monstruoso de minha parte, uma afronta à liberdade.
— No entanto, não teve essa consideração quando decidiu me raptar... Felizmente!
— Eu sabia que tão logo a tivesse aqui como minha noiva e minha amante... Tão
logo soubesse a verdade sobre minha vida e meu amor por você, não poderia deixar de
me amar!
Ela sorriu da arrogante certeza.
— É mesmo?
— Eu sabia que você aprenderia a me amar. — Ele também sorriu, embora seus
olhos repentinamente escurecessem. — Foi por isso que perdi o controle esta tarde. Foi
por isso que a violentei. A dor era muito forte, Sheba, e a sensação de perda insuportável.
Não podia aceitar o que estava acontecendo. Tê-la trazido para meu palácio, tê-la feito
minha rainha, amado-a sob terrível pressão de autocontrole. Sentindo sua excitação,
fazendo parte dela, e lutando para não alcançar o êxtase antes de você. E então... Você
me rejeitou. Rejeitou a mim e a tudo que lhe dei.
— Não me lembre da dor que sofri esta manhã. — Ela apertou-lhe os ombros. Ele a
estudou em silêncio por um momento.
— Nunca imaginei que por detrás de sua rejeição havia amor. Nunca amei uma
mulher como amo você. Minha rainha! — Ele pousou os lábios sobre os dela, que se
abriram, apaixonados, para receber o mais lindo beijo de amor.
Quando se separaram, mal podiam respirar os corações pulsando descompassados,
os olhos brilhantes de excitação.
— Você reinará a meu lado. Verei meu filho crescer em seu ventre. Verei você em
êxtase em minha cama pelo resto da vida!
— Suliman, eu te amo! Ela o beijou espontaneamente pela primeira vez, arrancando-
lhe um profundo suspiro de paixão.
Quando é que irá buscar suas coisas? — Ele quis saber em seguida.
— Não sei! Preciso falar com Chris e tranqüilizá-lo.
— Não se preocupe. Voaremos juntos para Tanger amanhã, falaremos sobre nosso
casamento e veremos o que ele poderá aceitar pelo cancelamento de seu contrato.
Cancelamento de meu contrato? — Bethsheba repetiu insegura.
— A menos, é claro, que queira continuar com seu trabalho. — Ele arqueou uma
sobrancelha.
Quer dizer que aceitaria essa condição?
Lógico! — Suliman respondeu rápido. — Não é meu desejo destruir sua criatividade.
É artista e sempre precisará dessa válvula de escape. Se sugeri o cancelamento foi porque
você me induziu a acreditar que estava cansada desse mundo.
— Bem, na verdade estou — Bethsheba admitiu —, mas não queria perde-lo.
— Terei orgulho de minha esposa, seja ela o que for, rainha, guerreira, cantora... —
ele sorriu a mão tocando-a gentilmente no ventre — ou mãe de meus filhos!
Os olhos Bethsheba se fecharam sonhadores ante o prospecto, mas em seguida o
medo voltou a dominá-la.
— Quanto a Sheba... É essa lenda a responsável por seu amor?
— Como pode sequer pensar nisso? Foi apenas uma desculpa para eu prendê-la
junto a mim, quando você quis fugir.
Mas é verdadeira, não é? Quero dizer, eu realmente me pareço com ela.
Projeto Revisoras 71
Julia Ed. Férias 21.1 – O Príncipe do Deserto – Sarah Holland
— Muito, mas não foi essa a razão por eu ter me apaixonado por você. A lenda de
Sheba não é mais poderosa para nós, do que a lenda de Saint George para vocês,
ingleses.
Então é realmente a mim que você ama?
— Bethsheba, o que sinto por você é amor. O que acha que eu poderia sentir por
uma estátua de ouro ou por uma lenda escrita numa folha de papel? Usei Sheba como
desculpa para mantê-la ao meu lado. Não conseguia admitir o quanto a queria, o quanto
fiquei fascinado quando a vi nas capas de revistas... — Ele riu e sacudiu a cabeça.
— Querido...
— Eu sabia que um dia te conheceria. Era apenas uma questão de tempo.
Bethsheba sentiu um orgulho intenso dominá-la.
— Mas a parte da lenda que conta sobre seu nascimento numa tenda, na Arábia...
— É verdadeira — ele confirmou sério. Fez-se um breve silêncio.
— Oh, então não foi invenção sua? Não ficou sabendo sobre minha história pelas
entrevistas que dei à imprensa?
— Não. Você deve saber que o único detalhe sobre seu nascimento, que já foi
mencionado, foi Bahrain,
A flecha do destino pairava no ar e Bethsheba estremeceu.
— Quer dizer que pode ser verdade?
— Que você seja Sheba? Sim, pode, mas jamais teremos certeza, meu amor.
Ninguém poderá nos fornecer a prova de sua reencarnação e, por mais que reflitamos,
nunca teremos a resposta. — Ele a beijou profundamente. — Só sei que te amo com todo
meu coração e que quero viver com você.
— Querido, quando descobriu que me amava? Foi antes de me conhecer?
— Acha que eu poderia amar uma fotografia? — Suliman riu. — Sou um homem
estranho, mas não tão estranho assim.
— Quando?
— Acho que foi no momento em que salvou minha vida no deserto.
— Não!
— Estava tão corajosa e linda ao luar, a espada na mão e o brilho de uma guerreira
nos olhos! — Ele apertou-lhe as mãos. — Fui dominado por uma onda de amor tão forte
que mal pude falar.
Querido, foi também nesse momento que descobri que te amava. — Bethsheba
prosseguiu, emocionada.
— Nossa união é perfeita! — Suliman sussurrou.
— Então não foi apenas meu cabelo que te atraiu?
— Oh, meu amor, você não foi à única mulher de cabelos dourados que conheci.
Bethsheba não respondeu, mas seus olhos arderam de ciúme.
— Não fique assim. — Ele riu. Não tenha ciúme de outras mulheres ou de Sheba. Só
amo você, Bethsheba, só você.
— Não tenho rivais? — ela insistiu.
— O deserto, apenas. Mas esse é um amor que ambos compartilhamos, e é aqui que
encontraremos tudo de que precisarmos.
— Prefere viver no deserto?
Sim, prefiro. Adoro o Ocidente, sua arte, sua música, seu teatro. Adoro os Champs
Élysées, em Paris, e Times Square, em Nova York. — Ele se pôs a rir.
— Entendo. Como é mesmo aquele provérbio de como é bom viajar, mas como é
melhor ainda voltar para casa?
— Exatamente. — Suliman beijou a pontinha do nariz de Bethsheba. — Aqui sou um
homem que nasci para ser. Aqui sou livre para cavalgar pelo deserto como um homem
Projeto Revisoras 72
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contra os elementos. Não há dinheiro ou poder que possa me proteger lá fora. E é assim
que tem de ser para que um homem seja verdadeiramente um homem!
— Mas até onde vão as leis e tradições do deserto, meu querido? Todas essas
mulheres no palácio...
— Não são minhas amantes, embora eu tenha tido muitas. Contudo, por alguma
razão, confesso que sou um homem de uma única mulher. Não está em minha natureza
ter uma mulher atrás da outra. Acho que isso acaba com a excitação, em vez de aumentá-
la. Como pode uma mulher me agradar, se está apenas cumprindo seu dever?
Bethsheba se sentiu enrubescer.
— Gosto que a mulher, com quem faço amor, também alcance o orgasmo. Como
isso poderá acontecer se ela estiver tensa?
— Eu alcancei a plena satisfação com você na primeira vez! — Bethsheba escondeu
o rosto no peito do marido, com um suspiro.
— No fundo, você já sabia que eu te amava. — Ele riu e a beijou.
— Será que é verdade — ela ergueu os olhos apaixonados para ele que encontrei
meu eterno amor?
— Seu coração poderá lhe dizer. Não tema. Estaremos juntos para sempre, tanto no
deserto, quanto no Ocidente.
— Você será meu sheik! — ela afirmou rouca.
— E você, minha rainha guerreira!
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