FISIOPATOLOGIA GERAL – CARDIOLOGIA I
INTRODUÇÃO
Hemodinâmica (fluxo sanguíneo):
O coração é, na realidade, duas bombas: o coração direito e o coração esquerdo;
Além da função cardíaca, os vasos periféricos (resistência vascular – arteríolas) e o volume circulante;
O sangue que entra pelo coração direito átrio direito ventrículo direito veias (quatro) pulmonares
circulação pulmonar átrio esquerdo ventrículo esquerdo aorta circulação sistêmica cavas átrio
direito.
𝑃𝑅𝐸𝑆𝑆Ã𝑂
𝐹𝑙𝑢𝑥𝑜 𝑠𝑎𝑛𝑔𝑢í𝑛𝑒𝑜 =
𝑅𝐸𝑆𝐼𝑆𝑇Ê𝑁𝐶𝐼𝐴
o Controle: coração, sistema nervoso central, rim e regulação local (arteríolas e capilares);
Débito cardíaco: VS x FC [~70 bpm] (5 l/min) o débito avalia função cardíaca;
o Volume sistólico: volume ejetado em cada sístole ventricular (normalmente em torno de 70 ml) –
hipertensos tem aumento da RVP – resistência vascular periférica.
Pressão arterial: DC x RVP.
Anatomia do coração:
O coração encontra-se em região de mediastino médio; ventrículo direito é mais anterior ao esquerdo; da 2ª
costela até 5º espaço interscostal, acima do diafragma, anterior às vértebras e posterior ao esterno;
Artéria pulmonar é anterior e à esquerda e a aorta é posterior e à direita;
Câmaras cardíacas: AD recebe sangue venoso da cava superior e inferior, nele se localizam o no sinusal e nó
AV; VD bombeia sangue na circulação pulmonar; AE recebe sangue arterial das veias pulmonares e desagua no
VE; VE bombeia sangue para o corpo (forma o ápice do coração)
O ventrículo esquerdo tem formato elipsoide; o ventrículo direito, triangular; o ventrículo esquerdo é a verdadeira
bomba;
As câmaras atriais são mais posteriores;
Os músculos papilares sustentam os folhetos das cúspides;
o A dilatação ventricular estende as cordas, impede o fechamento adequado das válvulas – valvopatia
secundária; qualquer alteração geométrica do VE também altera (repuxa) a geometria dos músculos
papilares repuxamento da valva mitral, causando um comprometimento.
*Valvopatias primárias x secundária: valvopatias primárias decorrem de alterações nas próprias válvulas; já as
secundárias, alterações na morfologia ventricular ou outras alterações que afetem indiretamente o funcionamento
valvular;
Seios de Valsalva seios da aórticos cada seio corresponde a uma cúspide (válvula semilunar ou sigmóidea)
da valva aórtica recebendo a mesma denominação neste nível, a parede aórtica é menos resistente que o
restante do vaso. Os seios aórticos (seios de Valsalva) estão orientados assim como as correspondentes válvulas,
sendo dois anteriores e um posterior.
O coração é considerado um sincício, isto é: um conjunto de células que se fundem, perdendo parte de sua
membrana, e formado uma única massa citoplasmática multinucleada; quando uma dessas células é excitada o
potencial de ação propaga para todas as demais, passando de célula para célula por toda a treliça de interconexões;
Importância das massas sinciciais distintas (sincício atrial / sincício ventricular): durante a ativação elétrica
cardíaca, quando qualquer dessas massas é estimulada, o estímulo elétrico (potenciais de ação) se propaga por
todo o sincício e, portanto, faz com que toda a massa muscular contraia;
As valvas cardíacas são tecidos conjuntivos com função de garantir sentido unidirecional do sangue; formadas por
valvulas (folhetos); v. aórtica e pulmonar não têm cordas tendíneas para sustentá-las;
As artérias coronárias são os primeiros ramos da aorta e suprem o miocárdio e o epicárdio; ACD supre nó SA e
AV;
Camadas do coração:
o Endocárdio endotélio e tecido conjutivo subendotelial;
o Miocárdio (músculo cardíaco);
o Camada visceral do pericárdio (membrana fibrosserosa que envolve o coração) seroso (epicárdio)
vasos coronários;
o Camada parietal do pericárdio seroso;
o Pericárdio fibroso fixado ao diafragma e aos grandes vasos.
Cardiomiócito: possui mecanismo contrátil por filamentos deslizantes de atina e miosina; Ca++ elemento
iônico fundamental na contração cardíaca
O ciclo cardíaco, lei do coração, pré e pós-carga:
O miocárdio possui 2 tipos de células fundamentais para a função cardíaca: 1 – células do sistema elétrico
(automatismo e condução) células marcapasso e células de condução; e células musculares de trabalho
(contratiblidade);
O sistema de condução é constituído de fibras musculares especializas: nó sinoatrial, nó AV, feixe de His e seus
ramos, e células de Purkinje;
Formação da atividade elétrica cardíaca:
o Nó sinusal (NSA): geralmente é o grupo de células marcapasso que comanda o ritmo cardíaco pois impõe a
maior frequência (60 a 100 bpm);
o Nó Atrio-ventricular (NAV): capaz de formar impulsos com freqüência em torno de 50 bpm;
o His-Purkinje: capaz de formar impulsos com freqüência em torno de 35 bpm.
Revisão de termos (propriedades fundamentais do coração):
o Automaticidade (cronotropismo) – início espontâneo de um impulso, sem necessidade de inervação
extrínseca;
o Excitabilidade (batmotropismo) – propriedade de iniciar um potencial de ação em resposta a um estímulo
adequado (resulta de deslocamento de íons através da membrana celular e indica de que modo a célula
responde a um estímulo elétrico);
o Condutividade (dromotropismo) – capacidade de transmitir um
impulso elétrico para outra célula cardíaca.
Fases do potencial de ação:
Fase 0: Despolarização - entrada rápida de Na⁺;
Fases 1, 2 e 3: Repolarização – saída contínua de K⁺;
o Fase 1 – cessa entrada de Na⁺; saída de K⁺ (Ito) e entrada de
Cl⁻;
o Fase 2 (platô) – entrada lenta de Ca⁺⁺ (Ca⁺⁺L);
o Fase 3 – saída de K⁺ - canais retificadores tardios (Iks, Ikr,
Ikur);
Fase 4: Repouso (diastólica) – saída de Na⁺ e entrada de K⁺ (bomba
Na⁺K⁺ATPase) e saída de Ca⁺⁺;
Toda essa atividade elétrica pode ser representada no ECG; o ECG
representa somente a atividade elétrica, e não o bombeamento real do
coração Repolarização representa a fase de repouso do coração;
Volumes X Pressões do VE: Volume diastólico final do VE; Volume sistólico final do VE; Volume sistólico
(stroke volume) – volume de sangue ejetado na sístole em cada batimento (70 ml) = VDF – VSF; Pressão
diastólica inicial; Pressão diastólica final (PD2VE);
Fração de ejeção – índice de performance sistólica Fração do sangue contido no VE no final da diástole que é
ejetado em cada sístole FE (%) = SV (volume sistólico) / VDF (volume diastólico final).
Ciclo cardíaco:
O enchimento dos ventrículos: durante a sístole ventricular, uma grande quantidade de sangue se acumula nos
átrios, uma vez que as válvulas A-V encontram-se fechadas. Ao final da sístole, as pressões ventriculares
encontram-se baixas, ao ponto de permitir a abertura das válvulas A-V, e viabilizar-se o enchimento dos
ventrículos, período este denominado de período de enchimento rápido dos ventrículos. Este período perdura por
todo o primeiro terço da diástole. Durante o terço médio da diástole, o sangue flui para os ventrículos, como
resultado do enchimento das átrios pelas veias que chegam ao coração. No terço final da diástole, os átrios se
contraem, e dão o impulso final ao influxo de sangue para os ventrículos;
O período de contração isovolumétrica: imediatamente após o início da contração ventricular, a pressão nos
ventrículos aumenta abruptamente, causando o fechamento das válvulas A-V, sendo necessário mais 0,02 a 0,03 s
para que o ventrículo gere pressão suficiente para abrir as válvulas semilunares (aórtica e pulmonar). A contração
isovolúmica ou isovolumétrica, caracteriza-se pela contração do ventrículo sem que haja o seu esvaziamento;
O período de ejeção: quando a pressão ventricular esquerda aumenta pouco mais de 80 mmHg, e a pressão
ventricular direita aumenta cerca de 8 mmHg, há pressão suficiente para proporcionar a abertura das válvulas
semilunares. Durante o primeiro terço do período de ejeção, cerca de 70% do sangue deixa os ventrículos, sendo
os 30% restantes esvaziados nos dois terços finais. É por isso que o terço inicial é chamado de período de ejeção
rápida e os dois terços finais, período de ejeção lenta;
Período de relaxamento isovolumétrico: ao final da sístole, tem-se o início abrupto do período de relaxamento
ventricular, quando as pressões intraventriculares diminuem rapidamente. Como as pressões arteriais encontram-
se elevadas, há uma tendência natural de retorno do sangue aos ventrículos, evento este que promove o
fechamento das válvulas aórtica e pulmonar. Por cerca de 0,03 a 0,06 s, o músculo ventricular continua a relaxar,
sem que haja qualquer alteração no volume ventricular, produzindo-se o chamado período de relaxamento
isovolumétrico, ou isovolúmico. A partir de então, as válvulas A-V se abrem para dar início ao bombeamento
ventricular.
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA
Síndrome que torna o coração incapaz de ofertar oxigênio em taxa adequada aos tecidos ou o faz à custa de
elevação de sua pressão de enchimento (pré-carga regime de altas pressões);
Geralmente resulta de disfunção estrutural ou funcional do coração, que compromete sua capacidade de se encher
(diástole) de sangue ou ejetá-lo (sístole), ou em ambos;
Comprometimento sistólico (contratilidade) alteração de diástole também; diastólica pode ocorrer só;
Insuficiência Cardíaca Diastólica Insuficiência Cardíaca com Fração de Ejeção Preservada;
Insuficiência Cardíaca Sistólica Insuficiência Cardíaca com Fração de Ejeção Comprometida;
Pré-carga X Pós-carga:
Pré-carga: pode ser definida como um estresse de parede para o final da diástole e portanto para o máximo de
extensão do sarcômero restante. Medida in vivo por: – Pressão diastólica final do VE no final da diástole
(PD2VE) – Dimensões cardíacas; Exemplos de sobrecarga de pressão: HAS (aumento da RVS); Estenose aórtica;
Coactação de aorta;
Pós-carga: durante a sístole o ventrículo esquerdo contrai contra a pós-carga. Força que se opõe à contração
ventricular durante o esvaziamento do coração. Exemplo: principal resistência vascular periférica (hipertensão
arterial) Obedece à Lei de Laplace.
Lei de Laplace: o estresse parietal é diretamente proporcional à pressão e ao raio intraventricular (quanto maior a
pressão e/ou raio, maior o estresse) e este é inversamente proporcional à espessura da parede (quanto maior a
espessura e menor o raio, menor o estresse parietal).
Sobrecarga de pressão aumento da pós-carga remodelamento concêntrico;
(e.g. estenose da valva aórtica eleva pós carga do VE (obstrução na saída do sangue) hipertrofia concêntrica)
Sobrecarga de volume aumento da pré carga remodelamento excêntrico.
(e.g. insuficiência da valva aórtica não está totalmente fechada na diástole (refluxo da aorta para VE) sobrecarga
de volume hipertrofia excêntrica em casos crônicos)
Etiologias:
Etiologias mais frequentes: isquêmica (IAM e angina); doença de Chagas; hipertensão arterial (principal causa
diastólica); valvopatias; cardiomiopatia dilatada idiopática, alcoólica, periparto; miocardite de origem
indeterminada;
Fisiopatologia e Classificação:
Classificação: aguda ou crônica (clínica); direita ou
esquerda (clínica); fração de ejeção preservada ou
comprometida (exames complementares – ECO); classe
funcional (clínica); estágio (clínica); apresentação
hemodinâmica (clínica);
o Duração: aguda, quando inferior, e crônica quando
superior a 6 meses;
o Direita congestão sitêmica (estase
jugular,edema de membros
inferiores,hepatomegalia dolorosa,ascite);
Esquerda congestão pulmonar (sinais e
sintomas de congestão pulmonar (dispnéia aos
esforços, tosse noturna, dispnéia paroxística
noturna, ortopnéia, crepitações pulmonares);
o Fração de ejeção de ventrículo esquerdo ou
direito: quando a fração de ejeção de ventrículo
esquerdo/direito é comprometida, é chamada
sistólica; inversamente, é chamada diastólica,
quando não é comprometida (IC com fração de
ejeção preservada). Na IC com fração de ejeção preservada (diastólica), há dificuldade de enchimento do
coração ou enchimento com pressões elevadas;
Todo indivíduo com disfunção sistólica também pode desenvolver disfunção diastólica.
o Classe funcional: avalia a limitação de esforço em pacientes com IC.É útil na prática diária por ser de
fácil aplicação e apresentar valor prognóstico;
o Estágio: essa forma de categorização reflete o modelo fisiopatológico da IC, que considera essa síndrome
como a via final comum a diferentes doenças cardíacas em indivíduos com fatores de risco. Essa
representação da IC cardíaca com caráter contínuo possui implicações preventivas, prognósticas e também
terapêuticas;
A: não tem a doença, mas tem os fatores de risco;
B: sem sintomas, apenas lesão estrutural;
C: doença estabelecida ou sintomas (tem ou já teve – não deixa de ser estágio C após o controle
da IC);
D: necessidade de intervenção especializada trasplante e aparelhos mecânicos;
o Estabilidade: de acordo com a estabilidade e as manifestações clínicas, a IC pode ser compensada,
descompensada (“de novo” ou crônica que descompensou) ou persistentemente descompensada, quando
os sinais/sintomas de descompensação persistem;
o Perfil hemodinâmico: a partir da presença de congestão e da hipoperfusão, foi desenvolvida a
classificação clínico-hemodinâmica, sendo dividida em
4 situações distintas que apresentam implicação
terapêutica e prognóstico.
IC com FE diminuída 50-40%; IC com fração de ejeção
preservada (FE maior ou igual a 50%);
Disfunção sistólica ventrículos grandes; diastólica
normais ou pequenos;
Efeito da falência ventricular esquerda sobre a curva
pressão-volume do VE: paciente com disfunção sistólica
IC com FE reduzida regime de alta pressão desvia curva
para direita porque o coração está dilatado (muito volume e
pressão aumentada);
Efeito da redução da complacência ventricular sobre a curva pressão-volume do VE na determinação da IC
com FE preservada (diastólica): desvio da curva para a esquerda VE trabalha em regime de altas pressões
volumes diminuídos (ventrículos pequenos);
Fisiopatologia: enfermidade progressiva;
o Insulto incial: clinicamente silencioso (cardiopatia hereditária) ou aguda e fulminante (distúrio primário
da contratilidade miocárdica ou sobrecarga hemodinâmica aguda – IAM grande perda de massa
muscular, ruptura de cordoalha da valva mitral);
o Mecanismos adaptativos: Frank-Starling (agudo);
Sistemas neuro-hormonais e inflamatórios; Remodelamento
miocárdico (lento, mais tardio);
o A capacidade de cada mecanismo de manter o
desempenho cardíaco frente a sobrecarga hemodinâmica e neuro-
hormonal é finita e quando mantida cronicamente, torna-se
desadaptada;
Adaptação do coração:
Frank-Starling: quanto maior o estiramento das fibras
miocárdicas no final da diástole (reflexo da précarga), maior a
contratilidade miocárdica, ocorrendo elevação progressiva do
desempenho cardíaco até que se atinja um platô de adaptação a partir do qual não ocorre mais intensificação da
resposta miocárdica;
Sistemas neuro-hormonais: ocorrem secundariamente à redução do débito cardíaco e à elevação das pressões de
enchimento das câmaras cardíacas.Incluem a ativação do sistema adrenérgico,sistema renina-angiotensina-
aldosterona (SRA-A), aumento da liberação de vasopressina, endotelina, citocinas inflamatórias e peptídeos
natriuréticos (ANP e BNP).
Em conjunto, os sistemas adrenérgico e SRA-A são responsáveis pela preservação da volemia e manutenção da
perfusão de órgãos centrais (rim,coração e cérebro) em estados de hipovolemia. Promovem aumento da
contratilidade miocárdica, taquicardia, retenção de sódio e água e vasoconstrição sistêmica. Cronicamente,
entretanto, as catecolaminas, assim como a angiotensina II e a aldosterona, promovem aumento do gasto
energético miocárdico, aumento de pós-carga, aumento de apoptose de cardiomiócitos, aumento da deposição de
colágeno no miocárdioe induzem arritmias.
A vasopressina e a endotelina são potentes vasoconstritores associados à ativação do sistema adrenérgico e SRA-
A. O componente inflamatório da IC também tem importância na sua fisiopatologia pela produção de fator de
necrose tumoral,interleucinas l e 6,interferon-gamapromovendo catabolismo protéico,sendo relacionados ao
surgimento de caquexia cardíaca. Os peptídeos natriuréticos (tipo A e tipo B, secretados pelos átrios e ventrículos,
respectivamente,mediante sobrecarga pressórica ou volumétrica), promovem vasodilatação periférica e natriurese
buscando contrabalançar os efeitos do SRA-A e adrenérgico,entretanto,são invariavelmente insuficientes. O
aumento do estresse ventricular é que determina o aumento do BNP e pró-BNP;
Remodelamentos excêntricos: aumento do raio com maior ou menor aumento da espessura da parede – maior o
estresse sistólico. Mecanismo de adaptação das sobrecargas de volume;
Remodelamento concêntrico: redução do raio aumento da espessura da parede. Mecanismo adaptativo de
sobrecarga de pressão – estresse de parede menor.