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Relações Sociais no Turismo

1) Desde a década de 1950, o turismo foi visto como uma forma de promover o entendimento entre os povos, porém estudos posteriores mostraram que as relações entre visitantes e visitados variam de acordo com fatores sociais, econômicos e culturais. 2) Estudos em diversas partes do mundo indicam que as relações dependem do comportamento dos turistas e da atitude das populações locais, que mudam ao longo do tempo com os impactos do turismo. 3) Há poucos estudos sobre relações em resorts, onde

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Relações Sociais no Turismo

1) Desde a década de 1950, o turismo foi visto como uma forma de promover o entendimento entre os povos, porém estudos posteriores mostraram que as relações entre visitantes e visitados variam de acordo com fatores sociais, econômicos e culturais. 2) Estudos em diversas partes do mundo indicam que as relações dependem do comportamento dos turistas e da atitude das populações locais, que mudam ao longo do tempo com os impactos do turismo. 3) Há poucos estudos sobre relações em resorts, onde

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Turismo em Análise, v. 15, n. 2, p. 133-149, novembro 2004 p. 133-149.

Relações entre Visitantes e Visitados:


um retrospecto dos estudos
socioantropológicos

Margarita Barretto
Professora do mestrado acadêmico em Turismo da Universidade de Caxias do Sul-
ucs; assessora científica do curso de Turismo do Instituto de Educação Superior
Luterano de Santa Catarina -lELUSC. Contato: Rua Francisco Getúlio Vargas, 1130 -
95070-560 - Caxias do Sul - RS; e-mail: [email protected].

RESUMO

Após a Segunda Guerra Mundial, muito foi escrito sobre o potencial do turismo
para promover o entendimento entre os povos, mas essa visão não é
compartida nem por todas as organizações sociais nem por todos os
intelectuais. Este artigo apresenta estudos realizados em diversas partes do
mundo que sugerem que a relação entre visitantes e visitados, apesar de ter
uma característica comum, qual seja a efemeridade, difere em função de vários
fatores condicionantes, tais como diferença social, econômica, cultural e étnica.
Também varia em função do comportamento dos turistas, que, por sua vez,
está condicionado a outros fatores, como nível educacional e motivação para
viajar, e da atitude dos diversos setores da população local, que também está
subordinada aos efeitos que o turismo provoca na sua vida cotidiana ao longo
do tempo.

PALAVRAS-CHAVE: visitantes e visitados; relações sociais;


diferença sociocultural.

ABSTRACT
Afier World War II, tourism appeared to be a powerful tool for peace
and understanding among some official institution, even this vision
was not so dear in scientific cirdes and civil institutions. This artide
presentes several case studies about the relationship between
residents and tourists in different countries, showing that, even there
is a common ground of ephemeral contacts, relations are different
depending on 􀀸ocial, eco􀀸omic cultural and ethnic conditions, as
well as on tourists behavlOr and resldents attitude, which changes
through time depending on how tourism interferes in daily life.

KEYWORDS: visitors and residents; social relations; socio cultural


differences.
Desde as origens do turismo de massas, na década de 1950, logo depois da
Segunda Guerra Mundial, as expectativas em torno do turismo, do ponto de
vista cultural, têm estado centradas na sua potencialidade para promover o
intercâmbio cultural entre visitantes e visitados, o conhecimento do outro, a
consciência da alteridade e, como conseqüência, a paz mundial. Essa
potencialidade do turismo foi difundida pela Organização Mundial do Turismo a
partir de afirmações realizadas por um dos primeiros teóricos da economia do
turismo, W. Hunziker, que entendia que o turismo tornara-se

o primeiro instrumento da compreensão entre os povos [que] permite o


encontro de seres humanos [ ... ] os reúne [ ... ] constitui um dos
principais fatores de aproximação entre os povos e, conseqüentemente,
da manutenção de relações pacíficas (apud Krippendorf, 2001: 82).

Na década de 1980, ao mesmo tempo que se proclamava ser o turismo uma


força para a paz e o entendimento, as organizações religiosas, reunidas na
Coalizão Ecumênica do Turismo do Terceiro Mundo, denunciavam os danos
provocados por ele, chegando a dizer que "a idéia de que este fenômeno
favorece a paz e a amizade entre os povos [é 1 um mito contemporâneo"
(Crick, 1992: 361).

As pesquisas realizadas até o momento não indicam que os objetivos de


entendimento e aproximação tenham sido atingidos. Ao contrário, parecem
indicar que se repetem, no turismo, velhos problemas que acompanham a
história social da humanidade, como o colonialismo cultural e a xenofobia, e
que as relações interpessoais acabam seguindo a lógica mercantil, ou seja, são
comercializadas como bem de consumo.

O relacionamento entre visitantes e visitados varia de caso para caso, em


função de uma série de circunstâncias favoráveis ou desfavoráveis, o que
obriga os pesquisadores a terem muita cautela na hora das inferências,
evitando generalizações.

Neste trabalho tentaremos traçar um histórico dos estudos do relacionamento


entre visitantes e visitados, extraindo esse tópico de muitos estudos sobre
impacto cultural realizados em sistemas abertos de turismo, isto é, em lugares
onde os turistas circulam. Há poucos estudos realizados em resorts, onde os
turistas se relacionam apenas com os prestadores de serviço. Embora seja
metodologicamente fácil pesquisar a questão nesses espaços, o maior
empecilho tem sido a autorização para fazê-lo.

Finalmente, neste estudo, espera-se não cair no estereótipo - muito difundido


em alguns âmbitos acadêmicos - da visão das populações visitadas como
vítimas e dos turistas como algozes, optando-se por mostrar como o
relacionamento vai sendo negociado entre uns e outros, permeado pela lógica
da sociedade de consumo.

Questões conceituais

O primeiro problema que se apresenta para analisar a relação entre a


comunidade visitada e os turistas é o próprio conceito de comunidade. Desde
que esse termo supõe uma "associação de pessoas que tem fins ou interesses
comuns e se sujeitam a regras específicas" (Kapeluz, 1994: 393), precisamos,
em primeiro lugar, definir sobre qual comunidade iremos falar, dentro das
sociedades complexas, tendo em conta, também, que o próprio conceito de
sociedade está sendo revisto na atualidade em face das novas mobilidades nos
espaços reais e virtuais (Urry, 2000).

Os critérios de definição de comunidade podem ser geográficos, assim temos


comunidades que correspondem aos limites territoriais, e outras que se
definem pela cultura, pela função social ou por aspectos das anteriores.
Podemos falar de uma comunidade rural, de uma comunidade caiçara, da
comunidade dos empresários, da comunidade dos lojistas, de uma comunidade
religiosa, política etc. Quando o turismo se desenvolve em lugares pequenos,
que ainda apresentam características de comunidade porque seus membros
são poucos e mantêm interesses comuns, a tarefa se torna mais simples.
Quando analisamos o turismo em sociedades complexas ou grandes cidades,
pode-se dizer que há relações diferentes entre diferentes comunidades dessa
sociedade e os turistas que a visitam.

De acordo com De Kadt (1979: 50), os encontros entre turistas e população


local podem ser categorizados, para fins de análise, em três situações: quando
os turistas compram bens ou serviços, quando turistas e residentes compartem
espaços ou quando os turistas se dirigem expressamente aos residentes à
procura de informações. Para compreender melhor o primeiro caso é preciso
ter em conta que o turismo é um ato praticado por pessoas que realizam uma
atividade específica de lazer, fora das suas respectivas cidades, e se utilizam,
para atingir seus objetivos, de equipamentos e serviços cuja prestação constitui
um negócio. A comunidade empresarial que negocia - o trade turístico -
estabelece com os turistas relações de mercado. O turista é um consumidor e
os membros do trade são vendedores de serviços e/ou produtos. A essa
relação entre indivíduos (turistas) e um sistema (o dos negócios turísticos)
Nash (1989: 44) denominou "transação complexa".

Nos outros casos, com as diversas comunidades que compõem a sociedade


mais ampla, o relacionamento será diferente, inclusive em função do tipo de
turistas e de condicionantes histórico-culturais e econômicos dessa sociedade
receptora. A relação visitante-visitado não pode ser analisada sem referência
às estruturas e processos sociais mais amplos aos quais está conectada (cf.
Nash, 1989: 45; Pi-Sunyer, 1989: 189).

Quando a sociedade receptora é mais pobre que a dos visitantes, tem menos
avanços tecnológicos e ocupa um status inferior no cenário internacional, o
relacionamento será assimétrico por questões estruturais. Com a comunidade
dos prestadores de serviços, o relacionamento sempre será assimétrico,
porque os turistas estão a passeio, enquanto os segundos estão trabalhando
para propiciar o bem-estar dos primeiros.

Os exemplos sobre estações de montanha na Suíça, apresentados por


Krippendorf (2001: 84), são eloqüentes. Tratando-se de um dos países com
maior igualdade social do mundo, era de se esperar que turistas e população
local interagissem como hóspedes e anfitriões. Isso parece ser verdade nos
casos de turistas muito antigos que visitam o local há muitos anos, mas não se
confirma com as grandes massas que começaram a chegar a partir de 1970.
As relações são mecânicas e as pessoas cansam de sempre ter de estar
disponíveis e alegres. Não há a tensão entre riqueza e miséria que se observa
em outras destinações, mas há a tensão entre aquele que está a lazer e aquele
que está a trabalho.

Os turistas, por sua parte, também apresentam comportamentos diferentes.

Na década de 1970, o sociólogo israelense Erik Cohen, em estágio nos


Estados Unidos, propõe uma série de tipologias turísticas, constituindo-se no
primeiro pesquisador a demonstrar que não se deve falar num turista genérico,
mas que é preciso diferenciar os turistas quanto a comportamento e
motivações em função de características socioeconômicas e
psicossociológicas. Para efeito deste estudo é muito útil sua classificação dos
turistas em dois grandes grupos, o dos que praticam formas institucionalizadas
de turismo (que viajam por intermédio das diversas instituições turísticas para
destinos de massa) e o dos que praticam formas não institucionalizadas (que
tentam afastar-se das multidões e organizam sua própria viagem) (cf. Cohen,
1972). Esse pesquisador também determinará que diferentes tipos de turistas
estabelecem diferentes relações com a comunidade visitada.

Não obstante as diferenças, posteriormente verifica que existem pontos em


comum. Assim, Cohen (1984: 379) classifica os encontros entre visitantes e
visitados como "essencialmente transitórios, assimétricos e sem repetição,
[onde 1 os participantes procuram gratificação imediata em lugar de
continuidade". Para essas afirmações se baseia nos estudos de Smith, Pearce,
Knox, Sutton, Van der Berghe, Greenwood, Pi Sunyer e outros cientistas que
têm realizado estudos de caso em diversos lugares do mundo. Acrescenta que
essa efemeridade das relações é a que propicia a exploração, o engano, a
hostilidade e a desonestidade, que são moeda corrente na relação entre
turistas e população local justamente porque nenhumadas partes envolvidas se
sente comprometida com as conseqüências da sua ação (cf. Cohen, 1984:
379).

Nota, também, que o relacionamento entre os dois sistemas sociais - o nativo e


o turístico - muda à medida que a quantidade de turistas aumenta. Por
exemplo, a hospitalidade e a reciprocidade, até o sorriso dos prestadores de
serviço, são transformadas em mercadoria, encenadas. O crescimento da
quantidade de turistas também leva a que estes deixem de ser individualizados
aos olhos dos residentes, que passam a relacionar-se não com a pessoa do
turista, mas com o estereótipo predominante no imaginário social local a
respeito dele (Pi-Sunyer, 1989: 189).

Vários autores têm detectado etapas diferentes no relacionamento entre


visitantes e visitados. O estudo mais conhecido é o de Doxey (1976 apud
Cohen, 1984: 381; Ruschmann, 1997: 47; Santana, 1987: 95), que
desenvolveu um modelo evolutivo da mudança nas atitudes dos locais para
com os turistas. Primeiramente, a população local reage com euforia à
presença dos turistas, depois seguem-se a apatia e o tédio, e finalmente o
antagonismo. Esse modelo, realizado num estudo de caso em Niágara
(Canadá), tem sido questionado, em primeiro lugar, porque a etapa de euforia
nem sempre acontece, e em segundo, porque a etapa de antagonismo se dá
apenas quando o turismo aprofunda ainda mais as diferenças sociais e quando
a população local precisa competir contra os turistas por recursos escassos ou
por espaço, mas continua tendo validade como marco de referência.

Na atualidade parece não haver discussão quanto ao fato de que a relação


entre visitantes e visitados apresenta graus de conflito que variam, também, em
função da visão que a população local tem dos estrangeiros em decorrência de
experiências anteriores com forasteiros não turistas, de preconceitos, da
rapidez
com que acontece o fenômeno de turistificação, da percepção que a população
tem dos benefícios econômicos e sociais advindos do turismo e/ou dos custos
sociais e ambientais (Gursoy, Jurowski e Uysal, 2002), da competição por
recursos naturais ou pelo uso de instalações, e do grau de distância social e
econômica entre visitantes e visitados (Robinson, 2001). Ao mesmo tempo,
estudos recentes continuam a detectar que a relação dos turistas com as
comunidades locais é superficial e efêmera quando não se trata do setor dessa
comunidade que presta os serviços turísticos (Robinson, 2001: 39).

Essa aparente contradição, de conta tos efêmeros mas ao mesmo tempo


geradores de conflitos em maior ou menor medida, nos dá a dimensão da
complexidade desse relacionamento. O turismo é uma atividade realizada
pelos homens em sociedade. Como tal, tem um importante grau de
imprevisibilidade, portanto, não podemos generalizar as relações entre
visitantes e visitados nem predizer como elas serão em determinado momento
e lugar. Cabe a nós apenas registrar como os fatos acontecem e, nesse
sentido, trazermos um retrospecto de pesquisas realizadas a partir da década
de 1970, chamando a atenção que a maior quantidade de pesquisas focaliza
comunidades com poucos habitantes, em ilhas ou lugares afastados dos
centros urbanos. Como atestado por Chambers (2000: 58), os antropólogos
têm, via de regra, escolhido estudar casos em que a distinção entre população
receptora e visitantes é clara.

Uma aproximação histórica

De acordo com Nash (1996: I), os primeiros estudos específicos focalizando a


relação entre comunidade visitada e turista de massa devem-se a T heron
Nunez, que descreveu os impactos do turismo no México num artigo intitulado
"Tourism, tradition and acculturation: weekendism in a Mexican village",
publicado no Southwestern Journal of Anthropology. No entanto, um
retrospecto histórico das relações entre visitantes e visitados a partir do grand
tour é apresentado no livro A horda dourada, editado na Inglaterra em 1976,
depois traduzido na Espanha pela Editorial Endymion (cf. Turner e Ash, 1991).
Seus autores, após uma exaustiva pesquisa relatos de viagem de
personalidades européias, como os escritores Lord Byron, Mark Twain, Robert
Browning, Wolfgang Goethe entre outros, demonstram que, embora a relação
entre visitantes e visitados tenha adquirido mais características de conflito a
partir do surgimento do turismo de massas, a dificuldade no intercâmbio não
parece ter sido diferente em formas anteriores de turismo.

Durante os tempos do grand tour, os representantes da aristocracia


inglesavisitavam a empobrecida Roma e outras cidades do que posteriormente
viria aconstituir-se na Itália, por ser a terra onde estavam as ruínas do Império
Romano, o que permitia um cantata com a história da civilização. Os cantatas
com as pessoas, no entanto, estavam limitados a nobres em decadência, com
os quais os visitantes já tinham relacionamento, e a mulheres e homens que
exerciam a prostituição ou que se prestavam como objetos sexuais, mesmo
sem remuneração.

Havia inclusive um mercado do amor; os curas e nobres jovens


arranjavam encontros entre os estrangeiros abastados e as mulheres
da burguesia local. Nem era preciso recorrer às prostitutas (trecho da
biografia de Goethe citado por Turner e Ash, 1991: 64).
Quando Thomas Cook começa a incluir membros da burguesia e da classe
operária inglesa nos seus tours, há queixas quanto ao desprezo que os t􀀸ristas
sentiam pelas culturas locais. Turner e Ash (1991: 80) CItam um trecho de
Jornal em que o colunista, irlandês queixava de que os turistas zombavam das
cerimônias religiosas (a Irlanda é católica, enquanto na Inglaterra predomina o
protestantismo através da Igreja Anglicana), ridicularizavam a culinária,
criticavam os trajes, o que, conforme o colunista, seria uma afronta.

Se a relação entre visitantes e visitados era distante durante o grand tour, com
a padronização das viagens organizadas ficou ainda maior, uma vez que o
grupo guiado somente visitava aqueles lugares que a empresa predeterminava,
durante um curto período de tempo, no qual obtinha apenas informações
superficiais (Turner e Ash, 1991: 85). O cúmulo do desinteresse pelo
conhecimento do outro pode ser detectado no auge do turismo de massas, na
década de 1960, quando era comum ouvir turistas afirmando que os lugares
seriam mais bonitos, "se não fosse pelos habitantes locais" (cf. Turner e Ash,
1991: 210).

Do lado da população local também podia ser detectado, naquela década, o


pouco desejo de aproximar-se do outro, como no caso de Bali, província da
Indonésia caracterizada por uma forte estabilidade cultural, estruturas sociais
hereditárias e um sistema religioso em torno do qual gira a sociedade. Por
questões históricas, culturais e religiosas, as mulheres "em geral consideram
os europeus, no que diz respeito ao cantata físico, quase com repulsa, desde
que os acham grossos, peludos e malcheirosos" (Turner e Ash, 1991: 236), e a
população em geral age como se os estrangeiros não existissem, os
considerando "não seres, sujeitos invisíveis, espectros" (Geertz apud Turner e
Ash, 1991: 241).

As pesquisas relatadas por De Kadt (1979: 51-52) em resorts do Caribe (que


ele classifica como "instituições totais" onde o turista, em média, "passa vinte e
duas horas do seu dia") também demonstram o pouco desejo que os turistas
tinham por conhecer os habitantes das cidades em que os enclaves se
encontrassem.
Respostas como "gostaria de conhecer desde que isso não interferisse com as
minhas férias" ou "já sei tudo a respeito; li no folheto" são registradas pelos
pesquisadores. Não havendo verdadeiros contatos, não há intercâmbio cultural,
mas reforço de preconceitos. Como afirma Krippendorf (2001: 87), no modelo
do turismo de massas, para os europeus os outros são pobres, mas felizes;
sujos; preguiçosos. Para os nativos os turistas são ricos, não precisam
trabalhar e vivem de festa em festa.

As pesquisas de 1970 e 1980 foram realizadas preferencialmente no Caribe,


onde a história de relacionamento entre população nativa e estrangeiros é
perpassada pela experiência da escravidão. Outros lugares pesquisados foram
ilhas do Pacífico, como as Trobriand, onde o vocábulo que definia turistas era
sodiya, que queria dizer soldados, pois estes eram os únicos forasteiros que os
moradores conheciam. Pesquisas como essas levaram Van den Berghe (apud
Crick, 1992: 378), entre outros, a dizer que os nexos entre turistas e locais são
uma paródia de relação humana; Buodhiba (apud Crick, 1992: 380) a afirmar
que a hospitalidade não passa de uma técnica de vendas; e Turner e Ash
(1991: 375-376) a escrever que:
É uma fraude descrever os anfitriões como seres universalmente
amistosos quando na verdade existem abundantes correntes de
ressentimento que afloram a todo momento [...] É uma autêntica
imoralidade difundir a ideia de que, por ser turista, alguém pode
apagar séculos de desconfiança e isolamento.

Um caso emblemático da relação entre visitantes e visitados é dado por Evans-


Pritchard (1989) em seu relato sobre o relacionamento entre índios Navajo e
Pueblo, ambos norte-americanos, e turistas da mesma nacionalidade. Na
época da pesquisa, os turistas demonstravam ignorar tudo sobre os indígenas
e estes, cientes desse fato, pregavam peças nos turistas, zombando da sua
ignorância sobre a cultura indígena contemporânea, contando piadas a respeito
deles e até ridicularizando- os em algumas peças de artesanato.

Esse caso é ilustrativo de uma das contradições fundamentais da relação entre


visitantes e visitados, quando os visitados estão em diferentes estágios de
acesso à tecnologia e a outros padrões da civilização ocidental. Os turistas
esperam encontrar "o primitivo", o "bom selvagem" não "contaminado" pela
civilização urbana. Paradoxalmente, os visitados, quanto mais pobres, mais
depositam no turismo suas expectativas de progresso, de integração ao
processo civilizatório, à economia de mercado:

(...) visto do interior [das comunidades) o turismo representa


modernidade e mudança; mas, do exterior, o objeto turístico é visto
como exótico, primitivo e imutável (Lanfant, Allock e Bruner, 1995:
IX).

A discussão desses problemas em foros internacionais levou a que na década


de 1980 a ECTWT (Coalizão Ecumênica do Turismo do Terceiro Mundo)
propusesse uma nova ordem turística, explorando outros modelos possíveis,
diferentes do turismo de massa internacional, o chamado «turismo alternativo"
(Lanfant e Graburn, 1992: 90-91). Esse modelo tampouco tem tido os
resultados esperados quanto ao ideal de comunicação e relacionamento entre
visitantes e visitados, por várias razões. Uma delas é que continua com a
lógica do desenvolvimento internacional que pressupõe o turismo como produto
de exportação; a outra é que continua a utilizar as populações locais, desta vez
como atração (Lanfant e Graburn, 1992: 112).
Aculturação, intercâmbio cultural e zoológicos culturais

Os problemas do colonialismo cultural, aplicados à relação entre visitantes e


visitados, estão bem ilustrados nos estudos realizados nas Antilhas por Nuftez
e Perez (apud Erisman, 1983). Nessas ilhas do Caribe, a relação entre turistas
e população local pode ser muito intensa ou nula, dependendo de haver resorts
fechados ou de os turistas circularem, entrando em contato com a população.
Erisman (1983: 354) cita o exemplo de Porto Rico, onde, nos subúrbios de San
Juan, há muita influência cultural dos turistas, enquanto no oeste da ilha essa
influência é praticamente inexistente. Varia também em função da classe social
dos habitantes locais. A classe dirigente local se relaciona de uma forma,
adotando os padrões culturais e de consumo dos turistas até como forma de
mobilidade social ascendente.

Algo bem diferente parece acontecer em Bali. De acordo com McKean (1989),
os balineses realizaram um processo que consiste na exaltação de formas
tradicionais e sua comercialização dentro da racionalidade capitalista, sem
perder os significados e as qualidades características. No caso dos souvenirs,
os balineses aceitam fazer artesanato adaptado ao gosto e ao poder aquisitivo
dos turistas de massa, mas não diminuem a qualidade do artesanato em geral,
que é produzido para os deuses. Os balineses souberam difundir sua arte e
seu artesanato adaptando- se às regras internacionais de mercado, sem deixar
de cultuar suas divindades, de manter seus laços familiares e comunitários, e
de respeitar suas crenças. Exigem respeito dos turistas, por exemplo, não
permitindo que participem de certas cerimônias, como cremações. Tratam o
turista com respeito, procurando apresentar sua cultura de uma maneira cada
vez melhor, com o concurso de antropólogos, historiadores e lingüistas. Os
turistas valorizam as apresentações culturais e a população jovem reforça sua
identidade.

Enquanto o reino do sagrado autentica e legitima o artesanato,


a dança e o teatro balineses, estas criações estéticas,
simultaneamente recebem estímulo econômico dos turistas.
Esta involução ilustra as características peculiares da tradição
clássica e da modernidade que se combinam para fortalecer a
produtividade cultural balinese e sua identidade (McKean,
1989: 130).

Um caso bastante semelhante foi observado por Grünewald (2001) entre os


índios Pataxó, que afirmaram sua identidade de "índios turísticos" perante os
visitantes, relacionando-se com eles profissionalmente. Fabricam um
artesanato para exportação que não perde sua autenticidade, embora
respeitem em certos aspectos os gostos europeus; ao mesmo tempo,
preservam os âmbitos sagrados da cultura mediante a figura do "pajé-para-
turistas", com o qual evitam que o verdadeiro pajé seja transformado em
atrativo turístico. Isso tem seu paralelo na já mencionada Bali, onde algumas
danças são alteradas imperceptivelmente quando apresentadas aos turistas,
de forma a preservar o significado religioso destas quando executadas para a
própria comunidade. Na comunidade Amish dos Estados Unidos (Dogan, 1989:
223) pode ser observado o mesmo fenômeno.

Outro caso que guarda semelhanças é o estudado por Giovannini Ir. (2001) em
T iradentes. A comunidade católica realiza várias procissões durante a Semana
Santa e isso vem atraindo muitos turistas, que participam ativamente, por
exemplo, da procissão do Senhor Morto. A procissão do Senhor dos Passos,
porém, que é realizada duas semanas antes, é sigilosa, reservada à
comunidade nativa – os turistas não são informados a respeito, "é feita com
tanto silêncio e mistério que os surpreende na rua" (Giovannini, 2001: 163).
Eles podem contemplar, até fotografar, o que dá aos nativos muito orgulho,
porém sempre na qualidade de espectadores.

As reações à presença de turistas podem ser diversas mesmo dentro de uma


cultura relativamente unificada. O caso dos esquimós, pesquisado por Smith
(1989), é emblemático dessa afirmação. Duas comunidades vizinhas, mas com
histórias diferentes, a Kotzebue e a Nome, reagiram ao turismo de forma
diversa, com diferenças inclusive dentro da própria comunidade. Em Kotzebue,
enquanto algumas pessoas se dedicavam a contar, interpretar e recriar a
cultura esquimó para os turistas, as comunidades de pescadores procuravam
ocultar-se dos visitantes construindo até tapumes para que os turistas não os
observassem nas suas fainas de industrialização dos prodtos derivados da
caça das baleias. Em Nome, a comunidade escolheu trabalhar em outras
indústrias, e fabricar souvenirs de marfim para os turistas, que seriam vendidos
em outros lugares, como forma de evitar o contato com os visitantes. O tipo de
contato com a comunidade, também neste caso, depende do tipo de turista.
Aqueles chamados pela autora de turistas de elite ou alternativos, que podem
pagar altos preços e que gostam de abrir seus próprios caminhos, conhecem
melhor a comunidade. Os turistas de massa, que viajam dentro da sua "bolha
turística" (metáfora usada para definir o pacote turístico com tudo estruturado),
não têm oportunidade "de aprender muito sobre a vida de seus compatriotas,
os americanos esquimós [portanto 1 sofrem do etno-centrismo míope amiúde
evidente entre os indivíduos dos países industrializados quando visitam os
chamados povos primitivos" (Smith, 1989: 82).

Um estudo semelhante ao anterior foi realizado no estado da Carolina do


Norte, Estados Unidos, por Peck e Lepie (1989). Três pequenas comunidades
adotaram diferentes formas de relacionamento com os turistas. A primeira
delas, chamada Oriental, recebia, além de turistas, veranistas e aposentados
que fixaram residência. Todos eles foram integrados à comunidade nas
diferentes organizações civis, como o Rotary Club. Já na vizinha Bath,
comunidade tradicional baseada nas relações de parentesco, estimulava-se os
turistas a ficar apenas duas ou três horas. H á duas casas históricas a duas
quadras uma da outra, e chegava-se ao cúmulo de aconselhar os turistas a que
realizassem o percurso de carro, de forma a não propiciar a interação com os
residentes. Na terceira comunidade, Harkers Island, o conflito pela ocupação
do espaço entre turistas e residentes chegou a requerer a intervenção da lei,
quando turistas ameaçaram atirar nas crianças que entrassem nos terrenos
das casas de veraneio para brincar (Peck e Lepie, 1989: 214).

Outro caso interessante de como as comunidades se relacionam de forma


diferente com os turistas é representado pelo grupo étnico Kuna, do Panamá,
que vem conseguindo manter o turismo sob o controle local, graças também a
uma coesa organização social que os diferencia no contexto latino-americano.
A atividade turística acontece dentro de limitações territoriais e temporais. Na
época da pesquisa, só algumas comunidades Kuna mantinham contato direto
com os turistas, e seus membros separavam muito bem o tempo que
dedicavam aos visitantes do tempo destinado a atividades pessoais.

Os Kuna recebem bem os visitantes, mas há coisas para


fazer, preparar a comida, dar de comer às crianças, portanto,
da mesma forma que estão felizes quando [os visitantes J
chegam, estão felizes quando os vêem partir (apud Swain,
1989: 90).

Depoimento semelhante encontrou Urbanowicz (1989: 113) na ilha de Tonga,


na Polinésia, onde os habitantes estão "extremamente felizes quando os navios
aportam nas docas com milhares de passageiros [ ... ] que injetam milhares de
dólares na economia durante oito horas [e] estão mais felizes ainda quando os
navios partem ao anoitecer".

Isso porque, de um lado, a relação entre visitantes e visitados é de competição


por produtos escassos, variável já mencionada na existência de conflitos.
Nesse reino, grande quantidade de alimentos precisa ser importada, em parte
para a população local, mas, fundamentalmente, para os turistas, ocasionando
aumento dos índices de preços ao consumidor, o que acaba sendo um
problema (cf. Urbanowicz, 1989: 111). De outro lado, a ilha foi vendida pelos
promotores turísticos como um lugar onde os turistas podem ver a vida
autêntica, andar pelas ruas, observar e fotografar o cotidiano da população, e
os habitantes de Tonga "não toleram mais serem vistos como membros de um
zoológico cultural" (Urbanowicz, 1989: 113).

Essa analogia também foi utilizada por Krippendorf (2001: 86) em relação ao
que se observa na maior parte das viagens dos europeus para os países do
Terceiro Mundo. De acordo com o autor, "o que deveria ser um encontro
sucumbe à síndrome do zoológico [onde] o autóctone torna-se um espetáculo e
um tema de fotografias".

Casos de hostilidade aberta e de conflito entre moradores locais e turistas, que


requereram até intervenção policial, foram comuns na cidade de Florianópolis
(Brasil) durante a década de 1990, quando houve uma grande demanda de
turismo de sol e praia por parte de turistas de massa provenientes da
Argentina. Schmeil (2002) detectou xenofobia por parte dos nativos e desprezo
por parte dos turistas, que vinham à procura de um estereótipo de país tropical
e mulheres fáceis vendido pelas agências. Detectou também que a própria
comunidade de comerciantes do bairro estudado priorizava o atendimento aos
turistas, desprezando a população local, que não pagava em dólares, e que
todos os nativos, de alguma forma, tentavam explorar os turistas cobrando
preços abusivos.

Na mesma ilha, mais ao sul, Oliveira (2003) estudou as representações sociais


da população residente a respeito dos turistas, encontrando que, embora as
pessoas reconheçam os benefícios econômicos advindos da presença dos
visitantes, bem como o estímulo à preservação ambiental provocado pelo
turismo, muitas vezes há hostilidade, que pode ser vista nos muros pintados
com a frase "fora haule", sendo que a palavra haule é utilizada pelos surfistas
nativos para designar os forasteiros.

Ver versus conviver

Desde que o turismo de massa propicia apenas um "turismo de ver", no qual os


turistas visitam exclusivamente os atrativos turísticos, sem tomar sequer
conhecimento da população local, uma nova modalidade foi instituída a partir
da de cada de 1970, a de um turismo que proporciona a possibilidade de
convivência com as pessoas dos Iugares visitados. Ilustra essa nova
modalidade o tour dentro de ônibus, substituído por passeios a pé, nos quais
os turistas podiam ter contato com os locais. Só que, neste caso específico,
trata-se de uma pseudoconvivência, pois somente muda o atrativo a ser visto; e
não pode haver verdadeiro intercâmbio quando um observa o outro como se
fosse uma "curiosidade" exposta numa vitrine.

Dizer que formas alternativas de turismo (alternativas ao turismo de massas e


ao modelo do resort) promovem o "intercâmbio" é pressupor que o turismo
acontece entre iguais, coisa que, na atualidade, vários antropólogos contestam.
Dann (1992) demonstra, com um estudo de mais de 500 casos em Barbados,
as diferentes reações dos turistas quando convidados a visitar os lares dos
moradores locais. Para além da acurada pesquisa, o relato do autor provoca
outras reflexões. Relata que os turistas visitam as residências dos nativos por
curiosidade, para ver como eles vivem, o que lembra o caso contado por
Urbanowicz em parágrafos anteriores.

Um estudo conduzido em Zihuatanejo, México, destino de excursionistas de


cruzeiros marítimos, demonstra que ainda hoje, apesar de todo o discurso da
integração entre visitantes e visitados, os primeiros não se aventuram além de
um raio de 200 metros do porto, por temor de se perderem, de não entenderem
o idioma ou da violência, temor esse reforçado pela presença ostensiva da
polícia turística (Jaakson, 2004: 57).

Mesmo em lugares onde se tenta realmente promover a convivência tem


havido percalços. Numa outra ilha da Indonésia, Sulawesi, os funerais foram
divulgados pelo próprio Estado como atrativos turísticos, e os turistas passaram
a integrar-se aos rituais. O problema que surgiu foi que, de acordo com a
tradição, é um dever sagrado da comunidade oferecer (sem retribuição
nenhuma) alojamento e abundante comida a toda pessoa que quiser participar
de um funeral. Essas comunidades só comiam carne de animais destinados ao
sacrifício nesses rituais, e a partir do momento que precisaram dividir a ração
com os turistas, passaram a privar-se dessa proteína.

Alimentar uma quantidade crescente de turistas "convidados"


porque o governo procura estimular o turismo passou a ser uma
carga muito grande para os camponeses (Crystal, 1989: 149).

Novamente, vemos aqui a competição por recursos escassos, só que, por


causa das características da população, isso não redundou em conflito, apenas
em perdas para a comunidade receptora, que não exige pagamento - de vez
em quando ganha um porco de alguma operadora turística ou simplesmente vê
suas crianças mendigando doces (Crystal, 1989: 166), numa relação
totalmente assimétrica, apesar da tentativa de integração e da autenticidade
cultural oferecida. É um caso emblemático de uma comunidade cuja relação
com os turistas é a de serem usados como bem de consumo, nos quais o que
é consumido é uma cultura ancestral, sem que os detentores desta aufiram
nenhum benefício econômico.

Na atualidade, o turismo rural desponta como o tipo de turismo que propicia a


convivência entre visitantes e visitados. Os resultados são diversos, em função
tanto do tipo de turistas quanto da cultura dos proprietários rurais visitados. Há
pessoas que se sentem felizes de ter hóspedes permanentemente em casa,
mas que se queixam de estarem perdendo o espaço da intimidade familiar, ou
de não terem tempo para receber e visitar parentes e amigos, de terem de
estar sempre de prontidão para atender os turistas (Costa-Beber, 2004).
Na Espanha, por exemplo, Agustín Santana relata que, aos poucos, a oferta de
alojamento com famílias camponesas vai cedendo lugar à oferta tradicional de
um alojamento separado. A fazenda transformou-se em hotel e agora toma a
forma de hotel-fazenda, despojada de suas características originais, por causa
das implicações do conviver permanentemente com estranhos dentro de casa.

Essas formas de relacionamento entre visitantes e visitados estão intimamente


ligadas a duas questões que não serão abordadas neste contexto. Uma é a da
autenticidade da experiência turística, amplamente debatida a partir da década
de 1960. A outra, a reflexividade da vida social moderna, que "consiste no fato
de que as práticas sociais são constantemente examinadas e reformadas à luz
de informação renovada sobre estas próprias práticas, alterando assim
constitutivamente seu caráter" (Giddens, 1991: 45), fenômeno que explica a
diversidade das reações de turistas e populações receptoras e os feedbacks
diferentes de cada experiência turística.

Conclusão

Por meio dessas leituras podemos perceber que o relacionamento entre


visitantes e visitados apresenta um amplo espectro, variando de uma situação
em que praticamente não há contato entre visitantes e visitados, a não ser com
os prestadores de serviços turísticos,·que é comum nas formas
institucionalizadas de turismo e no turismo realizado em grandes centros
urbanos, a outra em que os visitantes circulam dentro das comunidades
receptoras, algo próprio das formas não institucionalizadas de turismo e de
centros urbanos pequenos ou de centros não urbanos. Entre estas, há uma
ampla gama de variações nos graus de contato e nos tipos de relações que se
estabelecem.

Hoje está muito claro que, quando Valene Smith deu o título de Anfitriões e
convidados a seu livro - que com o tempo haveria de se transformar numa obra
fundamental do pensamento antropológico aplicado ao turismo -, o fez no
sentido metafórico. Os moradores dos núcleos receptores não se comportam
como anfitriões, desde que sua receptividade é profissional, e a partir do século
XIX, os turistas, muito poucas vezes, são realmente convidados, a não ser por
planos de desenvolvimento turístico. Convidados ou não, prevalece o fato de
que, do ponto de vista social e cultural, sempre serão forasteiros, e seu
relacionamento com as populações receptoras sempre se dará a partir dessa
condição.

na perspectiva dos núcleos receptores, é um negócio. Um negócio que vende


algo diferente, sim: prazer e lazer, mas que é conduzido pela lógica da
sociedade capitalista, pela produtividade e pela lucratividade.
Apesar das poucas pesquisas sistematizadas a respeito, as existentes
demonstram que, na verdade, os habitantes dos lugares turísticos que se
beneficiam economicamente com a presença dos turistas não estão
precisamente interessados em receber os turistas como hóspedes e realizar
com eles trocas culturais, mas em receber o dinheiro trazido por eles. Os
turistas passam a ser um mal necessário. Mal porque sua presença incomoda.
Necessário porque seu dinheiro faz falta. Os turistas, por sua vez, vêm no
habitante local apenas um instrumento para seus fins. O grande paradoxo do
turismo é que essa atividade coloca em contato pessoas que não enxergam a
si mesmas como pessoas, mas como portadoras de uma função precisa e
determinada: uns trazem dinheiro com o qual compram os serviços do outro. O
primeiro é consumidor, o outro, parte da mercadoria, e é essa a relação que
prevalece.

Turistas e população local têm diversos graus de empatia, dentro de um leque


que vai da simpatia à hostilidade, passando pela cordialidade profissionalmente
trabalhada. A tendência parece ser que os relacionamentos entre visitantes e
visitados sejam cada vez mais profissionais, à medida que os serviços
turísticos e os próprios turistas se profissionalizam.

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Recebido em 05/07/2004.
Aprovado em 28/08/2004

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