100% acharam este documento útil (1 voto)
444 visualizações38 páginas

Felisbelo Freire o Mulato e o Político Na História de Sergipe

Este documento analisa a obra de Felisbelo Freire "História de Sergipe" publicada em 1891. A obra é considerada pioneira e fundamental na historiografia de Sergipe. O autor destaca como aspectos da biografia de Felisbelo Freire, um político mulato e republicano, influenciaram a narrativa produzida, especialmente no tratamento do século XIX. O artigo propõe uma releitura da obra reconhecendo seu caráter autobiográfico.

Enviado por

Rudinei Freitas
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
100% acharam este documento útil (1 voto)
444 visualizações38 páginas

Felisbelo Freire o Mulato e o Político Na História de Sergipe

Este documento analisa a obra de Felisbelo Freire "História de Sergipe" publicada em 1891. A obra é considerada pioneira e fundamental na historiografia de Sergipe. O autor destaca como aspectos da biografia de Felisbelo Freire, um político mulato e republicano, influenciaram a narrativa produzida, especialmente no tratamento do século XIX. O artigo propõe uma releitura da obra reconhecendo seu caráter autobiográfico.

Enviado por

Rudinei Freitas
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
Você está na página 1/ 38

INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BRASILEIRO

SAMUEL BARROS DE MEDEIROS

FELISBELO FREIRE: O MULATO E O


POLÍTICO NA HISTÓRIA DE SERGIPE

MEDEIROS​, Samuel Barros de


FELISBELO FREIRE: O MULATO E O POLÍTICO NA
HISTÓRIA DE SERGIPE

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476): 223-259, jan./abr. 2018

Rio de Janeiro
jan./abr. 2018
Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

223

FELISBELO FREIRE: O MULATO E O POLÍTICO


NA HISTÓRIA DE SERGIPE
FELISBELO FREIRE: THE DARK-SKINNED POLITICIAN
IN THE HISTORY OF SERGIPE
Samuel Barros de Medeiros1
Resumo: Abstract:
Consenso entre os estudiosos da Historiografia There is consensus among researchers of the
Sergipana, Felisbelo Freire (1858-1916) é con- history of Sergipe that Felisbelo Freire (1858-
siderado o pioneiro nos fazeres historiográficos 1916) was a pioneer in the historiography
no estado. Sua História de Sergipe, publicada of the state. His book History of Sergipe,
em 1891, é a mais consagrada síntese histórica published in 1891, is the most consecrated
sobre Sergipe. Este trabalho estuda a obra de Fe- historical synthesis about his home state. This
lisbelo, destacando seu caráter autobiográfico e article focuses on his work and highlights its
analisando como aspectos da biografia do autor autobiographical character. We analyze how
mulato e republicano influíram na narrativa pro- aspects of the author’s biography, a dark-
duzida sobre a história de sua província natal, skinned politician who was also a republican,
sobretudo ao tratar do século XIX. are immersed in the narrative of his homeland
province, especially when he writes about the
nineteenth century.
Palavras-chave: Felisbelo Freire; Escrita de si; Keywords: Felisbelo Freire; self-referential
História de Sergipe-século XIX. writings; history of Sergipe; nineteenth century.

Tomado de excitação, Felisbelo deixara a Tipografia Perseverança.


Perambulando pelas ruas do centro do Rio, folheava sua História de Ser-
gipe, que acabara de ficar pronta. Era o primeiro livro do médico e a pedra
fundamental da historiografia sergipana, lançada naquele ano de 1891.

Mesmo que abdicássemos da imaginação histórica, registrando, fria-


mente, que a História de Sergipe foi publicada em 1891, pela Tipografia
Perseverança, no Rio de Janeiro, não poderíamos ignorar o significado do
fato. A obra inaugurou a historiografia sobre o pequeno estado da federa-
ção e consagrou-se como a mais importante síntese da história de Sergipe.

Desde a emergência dos estudos de história da historiografia sergipa-


na, em princípios da década de 1970, o pioneirismo da obra de Felisbelo
Freire vem sendo destacado.

1  –  Universidade Federal de Sergipe e Sócio do Instituto Histórico e Geografico de Ser-


gipe.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 223


Samuel Barros de Medeiros

Silvério Fontes, mesmo registrando a “preocupação historiográfica”


do comendador Travassos em seus Apontamentos históricos e topográfi-
cos sobre a Província de Sergipe (1875), considerou Felisbelo o funda-
dor da historiografia sergipana propriamente dita, com sua incontornável
História de Sergipe2, que seria “o mais valioso estudo global da história
sergipana”3.

Para Vladimir Souza Carvalho, os livros de Felisbelo (referindo-se,


também, ao História territorial do Brasil, de 1906) seriam “os dois maio-
res monumentos” da historiografia sergipana, “a ponto de, depois deles,
não aparecer nenhum outro de destaque e mérito equivalentes”4.

José Calasans considerou Felisbelo o “primeiro historiador de Sergi-


pe”, o “pai da historiografia sergipana”. A ausência de uma historiografia
local teria levado Felisbelo a “começar do nada”, fato que engrandeceria
a “realização empreendida e levada a bom termo”5.

Itamar Freitas, tratando da malograda proposta de um concurso para


a escolha da “mais perfeita história da Província de Sergipe” – lançada
pelo então deputado Sílvio Romero à Assembleia Provincial de Sergipe,
em meados da década de 1870 – concluiu que “a tão esperada História de
Sergipe seria publicada apenas em 1891, por Felisbelo Freire”6.

Entre os nomes mais consagrados da historiografia sergipana, Maria


Thetis Nunes assinalou que, “como historiador, [Felisbelo] deixou diver-
sas obras importantes, destacando-se a História de Sergipe, publicada em

2  –  FONTES, José Silvério Leite. Historiografia Sergipana. In: Levantamento das fontes
primárias da história de Sergipe. Cadernos da UFS, Aracaju, n. 1, p. 5, 1972.
3  –  FONTES, José Silvério Leite. Vultos da historiografia brasileira: Felisbelo Freire
(1858-1915). Notícia Bibliográfica e Histórica, Campinas, n. 49, p. 383, set. 1973.
4  –  CARVALHO, Vladimir Souza. A História em/de Sergipe. In: Santas Almas de Ita-
baiana Grande. Itabaiana: O Serrano, 1973. p. 12.
5  –  SILVA, José Calazans Brandão da. Introdução ao estudo da Historiografia Sergipana.
In: Aracaju e outros temas sergipanos. Aracaju: FUNDESC, 1992 (Coleção João Ribei-
ro). pp. 13-14.
6 – FREITAS, Itamar. Historiografia Sergipana. São Cristóvão: Editora UFS, 2007, p.
28.

224 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

1891, e que continua, até hoje, como a melhor interpretação, em conjunto,


da evolução histórica sergipana”7.

Ibarê Dantas, ao estudar a “criação da Casa de Sergipe”, registrou


que, “[em 1912,] entre os historiadores sergipanos afastados de sua terra,
estava Felisbello Freire (1858-1916), o primeiro a publicar uma análise
sistemática e de grande importância sobre a História de Sergipe (1891)”8.
Décadas antes, Ibarê já considerava que
[a obra] representa no todo a síntese de maior mérito sobre o Esta-
do [...], não apenas por representar um trabalho imprescindível para
quem procura conhecer o passado de Sergipe, mas também pelo desa-
fio que significa para os historiadores sergipanos que, malgrado seus
projetos, ainda não construíram uma síntese que superasse ou conti-
nuasse o estudo de Felisbelo Freire.

Pioneiro no estudo do conjunto da obra de Felisbelo, Bonifácio For-


tes, em 1958, considerava que a História de Sergipe seria “a única siste-
matização séria da História sergipana”9. Já Francisco José Alves, princi-
pal estudioso da historiografia de Felisbelo, assinalou:
A História de Sergipe de F. Freire inaugura a historiografia científica
do Estado. Até então tínhamos memórias e descrições. Com esta obra
temos a primeira tentativa de interpretação científica da História esta-
dual. Valendo-se do evolucionismo, paradigma científico hegemônico
na época, Freire oferecerá uma síntese da evolução de Sergipe10.

Acredito que a tese da “síntese não superada”, felizmente, expirou,


considerando que a historiografia sergipana, sobretudo a partir de década
de 1980, passou a receber significativas contribuições de autores como
7 – NUNES, Maria Thetis. História da Educação em Sergipe. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1984 (Educação e comunicação, 13), p. 126. Verificar observação similar na página
178 da mesma obra e no artigo NUNES, Maria Thetis. Felisbelo Freire, o historiador.
Caderno de Cultura do Estudante, Aracaju, n. 4, pp. 92-93, 1987.
8 – DANTAS, Ibarê. História da Casa de Sergipe: os 100 anos do IHGSE, 1912-2012.
São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: IHGSE, 2012 (Coleção Biblioteca Casa de Sergipe,
15), p. 25.
9  –  FORTES [NETO], [José] Bonifácio. Felisbelo Freire: o homem público, o escritor
e o constitucionalista. Aracaju: Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, 1958, p. 40.
10  –  ALVES, Francisco José. Centenário de uma história inaugural, Jornal da Manhã,
Aracaju, 29 dez. 1991, Arte e Palavra, p. 6.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 225


Samuel Barros de Medeiros

Ibarê Dantas e Maria Thetis Nunes. Sobre essa questão, considero que a
contribuição de Felisbelo foi superada, no que diz respeito à História da
Capitania de Sergipe, pelo conjunto do legado de Maria Thetis Nunes –
com os livros Sergipe Colonial I (1989) e Sergipe Colonial II (1996) – e
Luiz Mott – com os livros Sergipe del Rey (1986), A Inquisição em Sergi-
pe (1989) e Sergipe Colonial e Imperial (2008). Quanto à História da Pro-
víncia de Sergipe, Felisbelo foi superado por Ibarê Dantas, que, em 2009,
publicou a biografia do senador Leandro Ribeiro de Siqueira Maciel, es-
tudando, com afinco, a política e a sociedade sergipana oitocentista.

Ainda assim, considero que Felisbelo e sua obra representam a


cumeeira da historiografia sergipana. Todavia, preocupa-me o fato de, há
mais de um século, a celebrada História de Sergipe ser tomada, grosso
modo, como um livro sagrado, reproduzido irrefletidamente por sucessi-
vas gerações de estudiosos do passado sergipano.

Todo texto historiográfico é, potencialmente, um documento histó-


rico, e, sabemos, “nenhum documento é inocente”. Nesse sentido, ocu-
par-me-ei de uma releitura dessa obra (incontestavelmente importante),
atentando para o seu caráter autobiográfico – percebendo como a histo-
riografia está impregnada da biografia do historiador.

Os autores dos principais perfis biográficos de Felisbelo limitaram-


-se a indicar o nome dos seus pais, o coronel Felisbelo Firmo de Oli-
veira Freire e dona Rosa do Amarante Góes Freire, e o seu nascimento,
em 1858, em Itaporanga. O fato de ele ser neto de Luís Francisco Frei-
re (179?-1856), influente senhor de engenhos do vale do Vaza-Barris, e
sobrinho do Barão de Laranjeiras, Felisberto de Oliveira Freire (1819-
1889), senhor do Engenho Belém, também é evocado. O que se ignorou
ou se ocultou, todavia, foi a origem mestiça do renomado historiador.

Conforme o registro de casamento dos pais de Felisbelo, que locali-


zei no arquivo da Paróquia Nossa Senhora d’Ajuda, o coronel Felisbelo
Firmo de Oliveira Freire era filho natural de certa Inez das Virgens que,
naquele ano de 1857, residia na vila de Itaporanga. Por sua vez, o in-

226 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

ventário post-mortem de Luís Francisco Freire, datado de 1856, atesta


que o patriarca da família e antigo senhor dos engenhos Roma, Belém e
Jerusalém, reconheceu sua descendência bastarda, assumindo o papel de
provedor e transmitindo-lhe seu sobrenome.

Provavelmente, era na avó Inez que os desafetos políticos de Felis-


belo buscavam inspiração para afirmar, por exemplo, que sua ‘ascendên-
cia vai entroncar na nobre árvore genealógica das senzalas do Engenho
Belém’11. Teria a avó Inez passado de cativa à amásia do avô Luís Fran-
cisco? Quem sabe um biógrafo à altura do nosso primeiro historiador
possa, entre outras coisas, relacionar a história familiar com a militância
de Felisbelo nos movimentos abolicionista e republicano.

É preciso assinalar que, muito provavelmente, Felisbelo empenhou-


-se em ocultar ou, ao menos, omitir sua origem mestiça. Na tese apresen-
tada à Faculdade de Medicina da Bahia em 1881, por exemplo, o autor
forjou uma relação legítima entre os seus avós paternos, registrando o
nome da avó Inez das Virgens acrescido do sobrenome Freire. Nesse sen-
tido, há divergências entre os registros paroquiais e os registros constan-
tes nos elementos pré-textuais da tese de Felisbelo, no que diz respeito ao
nome de sua avó (simplesmente Inez das Virgens, para a Igreja). Sabe-
mos, todavia, que, em princípios da década de 1880, os registros válidos
eram os eclesiásticos (certidões de batismo, de casamento e de óbito).
Somente em fins daquela década, com a República, foram criados o casa-
mento e os registros civis na esfera governamental.

Considerando a indissolubilidade do casamento católico e o fato de


o avô paterno de Felisbelo ter deixado viúva, em 1856, a senhora Adriana
Francisca Freire (mãe, entre outros, de Alexandre Freire do Prado, do
Engenho Carvão, em Divina Pastora, e de Felisberto de Oliveira Freire,
do Engenho Belém, em Itaporanga d’Ajuda – futuro Barão de Laranjei-
ras), conforme consta no mencionado inventário de Luís Francisco Frei-

11 – DANTAS, Ibarê. Leandro Ribeiro de Siqueira Maciel (1825/1909). O patriarca do


Serra Negra e a política oitocentista em Sergipe. Aracaju: Criação, 2009, p. 238.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 227


Samuel Barros de Medeiros

re, concluo que o jovem autor da tese médica de 1881 atribuiu à sua avó
paterna um sobrenome que ela nunca ostentou.

Forjando uma origem socialmente “legítima”, o resultado parece ter


sido satisfatório para Felisbelo. Ao menos, é isso que indica a principal
peça celebrativa do centenário de nascimento do médico, em 1958. Em
discurso publicado pelo Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, o
acreditado professor Bonifácio Fortes repetia que os avós paternos de
Felisbelo eram “[...] o T. cel. Luiz Francisco Freire e Inez das Vírgens
Freire”12.

Finalmente, assinalo que, na produção dos monumentais dicioná-


rios biobibliográficos de Sacramento Blake (1893) e Armindo Guaraná
(1925), que veicularam os principais perfis biográficos de Felisbelo, em-
pregou-se, sempre que possível, o método dos questionários enviados aos
“ilustres” brasileiros que se eternizariam nos verbetes daquelas obras. É
provável que nosso Felisbelo tenha, cuidadosamente, respondido questio-
nários encaminhados por Blake e Guaraná, divulgando a melhor e mais
conveniente versão de si13.

O “esquecimento” em torno da condição mestiça de Felisbelo, entre-


tanto, é bastante compreensível. Gilberto Freyre, ao estudar a “ascensão
do bacharel e do mulato” no Brasil do século XIX, refere-se aos notáveis
“brancos-novos”, mulatos que, “pela ascensão econômica ou intelectu-
al, tornaram-se oficialmente brancos”, e menciona, entre outros, figuras
como Machado de Assis, alcunhado de “mulato inglês”, por sua sobrie-
dade, seu equilíbrio e sua reticência; e o fino, malicioso e sutil barão de
Cotegipe14. Assim, a condição de médico, de homem de letras e de políti-

12  –  FORTES [NETO], [José] Bonifácio. Felisbelo Freire: o homem público, o escritor
e o constitucionalista. Aracaju: Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, 1958, p. 7.
13  –  Mesmo considerando que o dicionário de Guaraná é posterior a Felisbelo, é preciso
assinalar que sua publicação é posterior ao próprio Guaraná, morto em 1924, e que sua
elaboração remete às últimas décadas do século XIX, quando Felisbelo estava vivo e atu-
ante no campo político e intelectual.
14 – FREYRE, Gilberto. Sobrados e mucambos: decadência do patriarcado rural e de-
senvolvimento do urbano. 14 ed. rev. São Paulo: Global, 2003, p. 790.

228 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

co destacado pode ter embranquecido Felisbelo ao ponto de os seus perfis


biográficos omitirem qualquer referência à sua origem mestiça.

Gilberto também notou e anotou que certos comportamentos e


trajos seriam “capazes de aristocratizarem homens de cor, mulatos,
‘morenos’”15. Penso que os registros fotográficos de Felisbelo que so-
breviveram, por exemplo, no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe,
dão-nos uma ideia clara dessa aristocratização dos mulatos16.

Mas, certamente, a explicação para o caso Felisbelo Freire não se


encerra aí. Além desse “efeito branqueamento”, penso, de fato, ter havido
um hercúleo esforço por parte de Felisbelo para que o seu mulatismo
passasse “em brancas nuvens”. Afinal, em se tratando de grandes inte-
lectuais sergipanos de fins do século XIX e princípios do século XX, por
que lembramos, claramente, que Tobias Barreto era mulato e esquecemos
(desconhecemos, na verdade) que Felisbelo também o era?

Ocultando ou omitindo a origem escrava de sua avó paterna, Felis-


belo parecia não lidar bem com sua condição de mulato. Entretanto, em
História de Sergipe (1891), ele enfrentou a questão, vertendo-a em con-
siderações sobre o papel do mulato na sociedade brasileira e sergipana de
fins do século XIX.

15 – FREYRE, Gilberto. Sobrados e mucambos: decadência do patriarcado rural e de-


senvolvimento do urbano. 14 ed. rev. São Paulo: Global, 2003, p. 722.
16  –  Lilia Schwarcz explica que a “linha de cor” no Brasil foi e “é capaz de variar de
acordo com a condição social do indivíduo, o local e mesmo a situação”. Entre nós, diz
Schwarcz, “não só dinheiro e certas posições de prestígio embranquecem, mas, para mui-
tos, a ‘raça’, transvestida no conceito de ‘cor’, transforma-se em condição passageira e
relativa”. SCHWARCZ, Lilia Moritz. Nem preto nem branco, muito pelo contrário: cor e
raça na sociedade brasileira. São Paulo: Claro Enigma, 2012 (Agenda Brasileira), p. 32.
Dialogando com Valle e Silva, Schwarcz elege a expressão “raça social” para entender
o “efeito branqueamento” existente no Brasil, relacionado à situação socioeconômica e
cultural dos indivíduos. “Enriquecer, ter educação superior, frequentar locais sociais de
um estrato mais alto, destacar-se nos esportes ou na educação, tudo leva a um certo em-
branquecimento. No país dos tons e dos critérios fluidos, a cor é quase um critério de de-
nominação, variando de acordo com o local, a hora e a circunstância. É isso também que
faz que ‘a linha de cor’ no Brasil seja, no limite, um atributo da intimidade e do fugidio,
na qual se distingue ‘raça oficial’ de ‘raça social’ [...]” Idem ibidem, p. 106.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 229


Samuel Barros de Medeiros

Para Felisbelo, o mestiço, notadamente o mulato, seria o elemento


característico da civilização brasileira. Resultado do “crusamento das tres
raças, que por aqui puzeram-se em contacto [o portuguez, o africano e o
indio]”, ele teria feição própria e original, o “genuino typo brazileiro”, e
seria a “força directora a que todos os povos se submettem”17.

Considero uma estratégia de autoafirmação o discurso de Felisbelo


sobre o lugar de proa do mulato na sociedade brasileira. Para ele, a “sub-
-raça” da qual fazia parte seria o “legitimo producto nacional”. Nesse
sentido, vale transcrever algumas considerações do autor:
Ahi está o papel da raça mestiçada no Brazil, verdadeiro agente trans-
formador e cujo trabalho de regeneração se faz sentir no momento
actual, do meado deste seculo em diante, que constitue um verdadeiro
periodo historico, o periodo de transformação18.
[...] entre as raças mestiças que do crusamento originaram-se, figura
como offerecendo maior contingente ao peso especifico da população
brazileira, o mestiço entre o branco e o africano, a que vulgarmente se
chama o mulato19.
Queremos crer que, em virtude de um facto de acção muito geral, o
mulato foi o mestiço de maior representação, de maior força transfor-
madora, aquelle que procurou mais assimilar os caracteres da raça
branca20.
O que podemos asseverar é que em Sergipe o mulato abunda mais
do que o cabra, donde pudemos concluir que o índio entre nós pouco
collaborou21.

Não por acaso, Felisbelo era um mulato brasileiro, nascido em mea-


dos do século XIX, altamente identificado com sua ancestralidade euro-

17  –  FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de


Janeiro: Typographia Perseverança, 1891, XXX e XXIX.
18 – Idem ibidem, XXXV.
19 – Idem, XL.
20 – Idem, XL.
21 – Idem, XLI. Equivocadamente, Francisco José Alves concluiu que, para Felisbelo,
o predomínio de mulatos na população sergipana seria “um entrave ao desenvolvimento”.
ALVES, Francisco José. A rede dos conceitos: uma leitura da historiografia de Felisbelo
Freire. São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010, p. 162.

230 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

peia e que, ao modo dos aristocratas do vale do Vaza-Barris, negava a


existência de índios em Sergipe22.

Aliás, a conclusão de que “[o mulato] foi o mestiço de maior força


transformadora”23 somada à biografia de Felisbelo nos faz lembrar de em-
blemáticas páginas escritas, décadas depois, por Gilberto Freyre. Confor-
me o mestre pernambucano, é impossível defrontar-se com o Brasil oito-
centista sem atentar para “[...] duas grandes forças, novas e triunfantes, às
vezes reunidas numa só: o bacharel e o mulato”24. Felisbelo reunia essas
duas forças “novas e triunfantes”.

Homem de seu tempo, adepto do evolucionismo de Herbert Spencer,


Felisbelo julgava existir uma hierarquia entre as três raças formadoras do
Brasil, relacionada ao grau de evolução rumo à civilização25. Para o histo-
riador, “o portuguez foi, pois, o mais poderoso e principal factor da civili-
sação brazileira. Elle nos prende ao grupo das civilisações occidentaes”26.
Nesse sentido, o mestiço brasileiro herdara mais do português que das
demais raças27.

22  –  Sobre a negação da existência de índios em Sergipe por parte dos aristocratas do
vale do Vaza-Barris, consultar: DANTAS, Beatriz Góis. Índios e brancos em conflitos
pela posse de terra: aldeia de Água Azeda, século XIX. In: Anais do VIII Simpósio Na-
cional dos Professores Universitários de História. v. II, p. 421-452, 1976; e DANTAS,
Beatriz Góis. Os índios em Sergipe. In: DINIZ, Diana Maria de Faro Leal (Coord.). Textos
para a História de Sergipe. Aracaju: UFS e BANESE, 1991. p. 19-60.
23 – Idem, XL.
24 – FREYRE, Gilberto. Sobrados e mucambos: decadência do patriarcado rural e de-
senvolvimento do urbano. 14 ed. rev. São Paulo: Global, 2003, p. 711.
25  –  Ao estudar a “rede dos conceitos” da historiografia de Felisbelo, Alves concluiu
que Spencer foi sua principal influência filosófica, ALVES, Francisco José. A rede dos
conceitos: uma leitura da historiografia de Felisbelo Freire. São Cristóvão: Editora UFS;
Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010, p. 79. Conforme o estudioso, Felisbelo aplica
“à história do Brasil as teorias e os modelos da sociologia de Herbert Spencer (1820-
1903). O filósofo inglês fornece ao historiador categorias fundamentais para a intelecção
historiográfica do passado brasileiro. ‘Civilização’, ‘evolução’, ‘altruísmo’, ‘egoísmo’,
‘barbárie’... são conceitos tirados dos textos de Spencer”. Idem ibidem, p. 187.
26  –  FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de
Janeiro: Typographia Perseverança, 1891, XXX.
27 – Idem, XXIX e XXX.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 231


Samuel Barros de Medeiros

O patriarca Luís Francisco Freire, alvíssimo filho de portugueses,


representaria, na biografia do neto Felisbelo, esse elemento que o ligava
às “civilizações ocidentais”. Aliás, em 1881, Felisbelo dedica sua tese
médica à “veneranda memória” de um avô que sequer alcançou, posto
que Luís Francisco morrera cerca de dois anos antes do nascimento do
neto mulato.

Em se tratando de escravidão no Brasil, Felisbelo acreditava ser ela


“a clava de Hercules do nosso pauperismo, de nosso caracter; que tem
difficultado a organisação de uma moralidade, pelo concubinato no lar
domestico, pela proliferação dos filhos naturaes, difficultando os progres-
sos da população, a equitativa distribuição da riqueza publica”28. Com
esse discurso, ele justificava, também, a origem ilegítima do seu ramo
familiar paterno, fruto de um concubinato. A escravidão seria a culpada
não só das mazelas da sociedade, mas também do desconforto que acom-
panhava o ilustre sergipano.

Sobre o “desconforto” do bacharel mulato no Brasil oitocentista, es-


clarece Gilberto Freyre:
Mulatos que tendo se bacharelado em Coimbra ou nas Academias do
Império foram indivíduos que nunca se sentiram perfeitamente ajusta-
dos à sociedade da época: aos seus preconceitos de branquidade, mais
suaves que noutros países, porém não de todo inofensivos29.

A observação de Gilberto ilumina muito da personalidade de Felis-


belo, alguém que, apesar dos títulos, dos cargos ocupados e das páginas
escritas, jamais se sentiu ajustado, social ou suficientemente, reconhecido
nos campos onde militou. O que gritava o espelho a Felisbelo era: “lem-
bra-te que és mulato” – mesmo que fosse um “fino, eugênico e asseado
mulato”30. Não acredito que ele jamais tenha se sentido um “mulato triun-
fante”, ao modo de Machado e Cotegipe31. Aliás, considerando a ligação
28 – Idem, XXXIV.
29 – FREYRE, Gilberto. Sobrados e mucambos: decadência do patriarcado rural e de-
senvolvimento do urbano. 14 ed. rev. São Paulo: Global, 2003, p. 728.
30 – Idem, p. 732.
31  –  Ao menos é isso que Felisbelo demonstra na apresentação do seu último livro – His-
toria da Cidade do Rio de Janeiro (1912). O “humilde autor” alega que, por ter “a cora-

232 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

de Felisbelo com a Escola do Recife, também nos é cara a seguinte im-


pressão de Gilberto Freyre:
O arrivismo de mulato, com todo o seu ‘complexo de inferioridade’,
ligado ao arrivismo de novo-culto, esplende de modo tão forte que
dói na vista, na grande figura de Tobias Barreto: mulato quase de gê-
nio que para compensar-se de sua condição de negróide em face de
brasileiros, portugueses, franceses ou afrancesados, requintou-se no
germanismo, no alemanismo, no culto de uma ciência de brancos – os
alemães – mais brancos que os franceses32.

Foi impossível, ao longo dessas reflexões, não lembrar de uma das


obras que mais chama a minha atenção no acervo do Museu Nacional de
Belas Artes, no Rio de Janeiro. Refiro-me ao óleo sobre tela A Redenção
de Cã (1895), do artista espanhol Modesto Brocos. Ela reflete as teorias
raciais difundidas no Brasil de fins do século XIX e a leitura popular de
uma passagem do livro do Gênesis, que relaciona a maldição lançada por
Noé sobre seu filho Cã (e seus descendentes) à escravidão negra.

A redenção de Cã (ou da sociedade mestiça brasileira) viria com a di-


luição do elemento de origem africana no elemento de origem europeia. É
essa ideia que nos transmite a imagem da avó negra (quem sabe africana),
de pé, agradecendo aos céus o milagre de sua filha, a maternal mulata ao
centro da tela, ter gerado um menino branco e saudável, com seu esposo
de talhe europeu (quem sabe um imigrante italiano).

Assim como na obra de Modesto Brocos, para Felisbelo, quanto


mais branco e europeu, melhor. O mulato seria o tipo mestiço que, mais
facilmente, alcançaria a civilização, pois era o que mais tendia a se apro-
priar do legado genético e cultural europeu. Conforme nosso historiador,
Tendo estancado a corrente tupy, pela devastação e expatriação da
raça, motivadas pela colonisação, e tendo se extinguido a immigração

gem de dizer e escrever a verdade”, fora perseguido pelo Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro – IHGB, instituição controlada por monarquistas e que adotava uma “posição
sempre odiosa e traiçoeira” com intelectuais republicanos na década de 1890. “O Instituto
tinha um fim de vingança contra mim” (p. V), declarou Felisbelo, que também concluiu
que “estava projectada a condemnação” do seu livro pelo IHGB.
32 – Idem, p. 790.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 233


Samuel Barros de Medeiros

africana, comprehende-se facilmente que o mestiço tende a fundir-se


e cruzar-se mais directamente com o typo branco, sendo mais rapida a
evolução para elle galgar os caracteres de raça33.

Defendendo a necessidade de branqueamento da população de Ser-


gipe, Felisbelo registrou sua queixa acerca da concentração dos colonos
europeus em regiões específicas no Brasil. Para ele, “[...] as correntes mi-
gratorias têm sido centralizadas em certas zonas do paiz, pela intervenção
de um politica mesquinha e anti-patriotica”34.

Lamento similar aparece no momento do texto em que Felisbelo tra-


ça um panorama da economia sergipana entre fins da década de 1880 e
princípios da década de 1890, concluindo que “a instituição de estabele-
cimentos bancários e a immigração estrangeira são medidas inadiaveis”35.

Assinalemos que, em sua meteórica passagem pelo governo de Ser-


gipe, Felisbelo empenhou-se em fundar, justamente no vale do Vaza-Bar-
ris, colônias estrangeiras. Sobre esse assunto, destacou Bonifácio Fortes:
Felisbelo [...] procurou e conseguiu instalar em Sergipe núcleos de
colonização e imigração. A 28-II-1890 fundava no engenho Patrimô-
nio, em São Cristóvão, uma colônia agrícola para colonos estrangeiros
[...]. O segundo núcleo seria instalado no lugar Pintos, ainda em S.
Cristóvão (Dec. 44, 12-5-1890) [...]. O núcleo do Patrimônio teve suas
atividades bastante incrementadas ainda no govêrno Freire36.

As ideias e ações de Felisbelo, todavia, não agradavam aos seguimen-


tos mais conservadores (e poderosos) da sociedade sergipana, que o con-
sideravam um “medicozinho voluntarioso e difícil de ser ‘conversado’”37.
Mais que isso, diriam: ele era um mulato.

33  –  FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de


Janeiro: Typographia Perseverança, 1891, XLIII.
34 – Idem, XLIV.
35 – Idem, LXXII.
36  –  FORTES [NETO], [José] Bonifácio. Felisbelo Freire: o homem público, o escritor
e o constitucionalista. Aracaju: Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, 1958, p. 16.
37 – Idem, p. 12.

234 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

Essa tensão ganhava, frequentemente, as páginas da Gazeta de Ser-


gipe, “lídima porta-voz dos proprietários rurais”, segundo Bonifácio For-
tes. Aliás, foi no referido periódico, Leandro Ribeiro de Siqueira Maciel
(1825-1909), influente político e senhor do engenho Serra Negra, lem-
brou ao presidente Felisbelo que sua “ascendência vai entroncar na nobre
árvore genealógica das senzalas do Engenho Belém” (Maciel, 1890).

Tanto em O espetáculo das raças (1987), como em Nem preto nem


branco, muito pelo contrário (2012), a leitura de Lilian Schwarcz ajuda-
-nos a compreender o discurso de Felisbelo sobre o mulato na sociedade
sergipana (e brasileira) de fins do século XIX.

A antropóloga explica que, no Brasil,


[...] ocorreu uma releitura particular [das teorias raciais em voga]: ao
mesmo tempo que se absorveu a ideia de que as raças significavam
realidades essenciais, negou-se a noção de que a mestiçagem levava
sempre à degeneração, conforme previa o modelo original. [...] Tingi-
do pela entrada maciça de imigrantes – brancos vindos de países como
Itália e Alemanha –, introduziu-se no Brasil um modelo original, que,
em vez de apostar que o cruzamento geraria a falência do país, desco-
briu-se nele a possibilidade do branqueamento38.

Dando a palavra ao estudioso da “rede dos conceitos” que embala a


historiografia de Felisbelo Freire, arremata-se a questão. Conforme Fran-
cisco José Alves,
Felisbelo é, evidentemente, um herdeiro do pensamento de Herbert
Spencer. No entanto, é oportuno ressaltar que toda herança teórica
é “um filtro crítico e transformador”. Assim, o historiador sergipano
não é um mero repetidor do pensador evolucionista. Sua historiografia
patenteia uma apropriação seletiva e heteróclita. Seletiva porque toma
de Spencer alguns elementos e descarta outros e heteróclita porque
“sintetiza” Spencer com outros autores, como H. T. Bucle, H. Taine,
por exemplo. Herança, sim, mas crítica, seletiva e filtrante39.
38  –  SCHWARCZ, Lilia Moritz. Nem preto nem branco, muito pelo contrário: cor e
raça na sociedade brasileira. São Paulo: Claro Enigma, 2012 (Agenda Brasileira), p. 39.
39  –  ALVES, Francisco José. A rede dos conceitos: uma leitura da historiografia de
Felisbelo Freire. São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010,
pp. 142-143.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 235


Samuel Barros de Medeiros

É preciso, ainda, assinalar o distanciamento de Felisbelo da vertente


mais extremada e pessimista do evolucionismo no Brasil de sua época,
cujo ícone seria o também médico (e também egresso da Faculdade de
Medicina da Bahia) Nina Rodrigues, para quem “a mestiçagem existente
no país parecia atestar a própria falência da nação”40. Pelo que vimos,
Felisbelo se aproxima da vertente da Escola de Recife, marcada por no-
mes como Tobias Barreto e Sílvio Romero, divulgadores do “suposto do
evolucionismo social de que a ‘perfectibilidade’ era possível para todos
os grupos humanos”. Por sua vez,
[Nina] não acreditava que todos os grupos humanos fossem capazes
de evoluir igualmente e chegar ao progresso e à civilização. Além do
mais, ao conferir às raças o estatuto de realidades estanques, defendeu
que toda mistura de espécies seria sempre sinônimo de degeneração41.

Além de localizar o pensamento de Felisbelo, não custa admitir sua


relativa atualidade, em um país dotado de um racismo silencioso e que,
raramente, se mostra publicamente. Schwarcz, lembra-nos que, na práti-
ca, a velha máxima do “quanto mais branco melhor” nunca foi, totalmen-
te, deixada de lado.

Foi, por exemplo, nos sertões de Pernambuco, e da boca da minha


avó Elza Medeiros de Albuquerque, alvíssima esposa do fazendeiro Apo-
linário Florentino de Albuquerque, meu avô “quartão”, que ouvi a “tabua-
da das misturas para ficar branco”. Décadas depois, reencontraria, quase
sem retoques, a tabuada que me era tão familiar, recuperada e divulgada
por Gilberto Freyre em “Sobrados e mucambos”:
1 branco com uma negra produz mulato
Metade branco, metade preto.
1 branco com uma mulata produz quartão
Trez quartos branco, e um quarto negro.

40  –  SCHWARCZ, Lilia Moritz. Nem preto nem branco, muito pelo contrário: cor e
raça na sociedade brasileira. São Paulo: Claro Enigma, 2012 (Agenda Brasileira), p. 20.
Sugere-se a leitura de Mestiçagem, degenerescência e crime, de 1899, ou As raças huma-
nas e a responsabilidade penal no Brasil, de 1894.
41  –  SCHWARCZ, Lilia Moritz. Nem preto nem branco, muito pelo contrário: cor e
raça na sociedade brasileira. São Paulo: Claro Enigma, 2012 (Agenda Brasileira), p. 21.

236 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

1 branco com uma quartão produz outão


7/8 branco e 1/8 negro.
1 branco com uma outona produz branco
Inteiramente branco42.

Possivelmente, sua condição de mulato, letrado e abolicionista, le-


vou Felisbelo a identificar-se com o secretário de governo Antonio Perei-
ra Rebouças (1798-1880), fazendo dele um dos principais heróis da His-
tória de Sergipe (1891). Ponhamos, então, em revista o primeiro capítulo
do livro III da obra, que trata do governo de Manoel Fernandes da Silveira
(1757-1829), presidente da Província de Sergipe em 1824, muitíssimo
influenciado pelo secretário Rebouças.

Felisbelo, claramente, justifica as ações do secretário que, sobrepon-


do-se ao presidente, protagonizou conflitos que desestabilizaram o gover-
no Fernandes da Silveira.

Sem indicar as fontes que comprovariam o possível plano golpista


de abril de 1824, o historiador registrou:
O plano chega ao conhecimento do presidente, que tinha junto á si,
como secretario, um homem de um talento superior e de um espirito
liberal, Antonio Pereira Rebouças, sobre quem caem principalmente
os odios do partido adverso, porque nelle vê a alma da administração
e a energia de um caracter decidido e franco43.

Mesmo tendo de reconhecer a violação dos direitos dos portugueses


estabelecidos em Sergipe, Felisbelo segue heroicizando Rebouças:

42 – FREYRE, Gilberto. Sobrados e mucambos: decadência do patriarcado rural e de-


senvolvimento do urbano. 14 ed. rev. São Paulo: Global, 2003, p. 778.
43  –  FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de Ja-
neiro: Typographia Perseverança, 1891, p. 265. A suspeitosa versão de Felisbelo para esse
episódio da história da Sergipe foi, irrefletidamente, reproduzida por historiadores como
Maria Thetis Nunes, em trabalhos como “História de Sergipe, a partir de 1820” (1978) e
“Sergipe Provincial I: 1820/1840” (2000); e Keila Grinberg, em seu excelente “O fiador
dos brasileiro” (2002: 79-80). Todavia, Grinberg não deixou de assinalar que “relatos
também diziam que a conspiração frustrada por Rebouças não passava de um desvario
inventado por ele próprio” (Grinberg, 2002: 81).

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 237


Samuel Barros de Medeiros

Agora que idéas mais livres eram incutidas na opinião pelo secreta-
rio Rebouças, alma rebelde, espirito revolto, que tratava de fazer pro-
paganda contra o privilegio de raças, os excessos da aristocracia, a
prepotência que queria manter o partido corcunda; agora diziamos,
offereceu-se opportunidade para as vinganças44.

Se o presidente ancião e o secretário mulato são os mocinhos, os


políticos alcunhados de corcundas são os bandidos da narrativa de Felis-
belo, que afirma:
Realmente, se não fôra Rebouças, o brigadeiro Silveira, septuagena-
rio, não poderia arcar vantajosamente com as difficuldades que vi-
nham de um estado social tumultuoso, de uma sociedade cheia de
ambiciosos, difficuldades que eram promovidas por cidadãos de alta
representação, como os corcundas de então45.

Mesmo mencionando as representações que, de todas as partes da


província, se sucediam contra os excessos de Rebouças, “apontando-o
como um revolucionario, um promotor de alterações da ordem publica”,
Felisbelo afirma: “Não era tal. Rebouças, espirito livre, revoltou-se por
ver o autoritarismo e a prepotência que a aristocracia de Sergipe exercia
sobre o povo. Lutou contra taes habitos e pregou a igualdade perante a
lei, deixando no meio daquella sociedade o germen da liberdade, sempre
abafada”46. Eis como se inventa um herói.

Para mim, Rebouças foi o herói no qual Felisbelo encontrou a si


próprio. Algo similar ao que concluiu Gilberto Freyre, ao tratar da iden-
tificação das pessoas com seus heróis: “há no culto dos heróis um pouco
de agrado de gato – clássico agrado do gato ao homem: parecendo estar
fazendo festa à perna do dono, o gato afaga volutuosamente o próprio
pêlo”47.

44  –  FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de


Janeiro: Typographia Perseverança, 1891, p. 269.
45 – Idem, p. 265.
46 – Idem, p. 270.
47 – FREYRE, Gilberto. Sobrados e mucambos: decadência do patriarcado rural e de-
senvolvimento do urbano. 14 ed. rev. São Paulo: Global, 2003, p. 801.

238 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

Gilberto Freyre socorre-nos, também, na compreensão das tensões


que, envolvendo o mulatismo de Felisbelo, produziam discursos como
o do destemperado Leandro Ribeiro de Siqueira Maciel e o discurso de
Felisbelo heroicizando Rebouças. No Brasil oitocentista, explica Gilber-
to, “[...] ‘centenas de bacharéis e doutores de raça cruzada’ [recuperando
expressão utilizada por Sílvio Romero], [foram] atirados no País pelas
academias: a do Recife, a de São Paulo, a da Bahia, a do Rio de Janeiro.
Mais tarde, pela Escola Militar, pela Politécnica”48.

E foi, dialogando com outros dois sergipanos (“o guerrilheiro inte-


lectual” Sílvio Romero e “o professor” Gilberto Amado), que Gilberto
Freyre concluiu que esses “bacharéis e doutores de raça cruzada” asso-
ciaram-se diretamente
[...] ao declínio do patriarcado rural do Brasil: a transferência de po-
der, ou de soma considerável de poder, da aristocracia rural, quase
sempre branca, não só para o burguês intelectual – o bacharel ou dou-
tor às vezes mulato – como para o militar – o bacharel da Escola Mi-
litar e da Politécnica, em vários casos negróide49.

Transcrevendo “páginas inteligentes”, de Gilberto Amado, Freyre


segue estudando a ascensão social do bacharel e do mulato na segunda
metade do século XIX, destacando que, “‘no eclipse das grandes famílias
arruinadas em consequência da extinção do tráfico e de outras causas acu-
muladas, [eles] substituem aos poucos nos prélios partidários, os filhos
dos senhores de engenho, os viscondes, marqueses e barões, aparecendo
no centro da arena à primeira luz da ribalta política’”. Tratava-se de uma
“‘fulgurante plebe intelectual, dos doutores pobres, jornalistas, oradores
que de todos os pontos do País surgiam com a pena, com a palavra e com
a ação, em nome do pensamento liberal, para dominar a opinião’” (Ama-
do por Freyre)50. Felisbelo compunha essa “fulgurante plebe intelectual”!

Também no Sergipe de fins do século XIX, dois mundos se encon-


travam e se chocavam: o da velha aristocracia (que, convivendo com ti-
48 – Idem, p. 801.
49 – Idem, pp. 725-726.
50 – Idem, p. 724.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 239


Samuel Barros de Medeiros

pos como Felisbelo, deveria pensar: Oh, meu tempo, meu tempo!) e o da
“fulgurante plebe” (que, ao modo de Felisbelo, identificava-se com quem
resistiu ao mando dos açucarocratas).

Décadas antes de Felisbelo, Rebouças fora alvo do preconceito culti-


vado pelas elites sergipanas em relação aos mulatos. Conforme a historia-
dora Keila Grinberg, competente biógrafa de Rebouças, episódios de dis-
criminação se repetiram na vida do rábula. Pouco antes de sua malfadada
experiência sergipana, por exemplo, um fato doloroso ficaria registrado
em suas memórias.

Em uma chácara nos arredores da Quinta da Boa Vista, em 1823,


Rebouças “deu-se conta de que todo o prestígio que conseguira não tor-
nara invisível a sua cor”51. Acompanhando o coronel João Dantas dos
Imperiais Itapicuru (1773-1832)52, em visita ao então deputado geral
Araújo Gondim (1782-1826), foi preterido à mesa de jantar do político
pernambucano, que julgara desagradar seus hóspedes “brancos e nobres”
a presença do mulato.

Para Grinberg, o episódio do jantar representou uma “ferida [que]


deve ter sido profunda” – tão profunda que Rebouças “não mais faria re-
ferências a episódios como este em suas memórias”, embora eles tenham
se repetido, concluiu53.

Baseada em interpretações de Felisbelo Freire e de Maria Thetis Nu-


nes (que, em parte, reproduziu o discurso apaixonado de Felisbelo), a
historiadora carioca concluiu:

51 – GRINBERG, Keila. O fiador dos brasileiros: cidadania, escravidão e direito civil


no tempo de Antonio Pereira Rebouças. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p.
78.
52  –  O coronel João Dantas dos Reis Portátil, depois João Dantas dos Imperiais Itapicu-
ru, senhor do engenho Santo Antônio do Camuciatá, em Itapicuru, no nordeste da Bahia,
foi figura destacada nas lutas pela independência do Brasil em terras baianas e sergipanas.
Na historiografia sergipana, Maria Thetis Nunes dedicou-lhe atenção, em obras como
História de Sergipe, a partir de 1820 (1978) e Sergipe Provincial I (2000).
53 – Idem ibidem, GRINBERG, Keila. p. 78.

240 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

De fato, a desfeita do jantar não foi nada em comparação com o que


aconteceria em 1824, quando Rebouças tomou posse como secretário
da província de Sergipe. Incomodados justamente com o fato de ter
um mulato à frente dos negócios do governo, os proprietários do local
fizeram de tudo para tirá-lo de lá, o que conseguiram ao cabo de um
ano54.

Grinberg, todavia, não ignorou dados revelados por fontes perscruta-


das no Arquivo Nacional e na Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, que
indicam os excessos do jovem secretário Rebouças e os ódios que, deles,
se desdobraram. Nesse sentido, assinalou:
No dia marcado [para jurar a Constituição, 24 de junho de 1824], Re-
bouças dirigiu-se à Igreja e, tomando o texto do vigário-geral da paró-
quia, natural de Portugal, fez ele mesmo a leitura, permitindo ao padre
somente celebrar a missa. Ao final, depois de se haverem dado os ‘Vi-
vas da Etiqueta’, um dos tenentes-coronéis do Batalhão dos Henriques
gritou ‘morra tudo que é maroto’, dando início a violentas persegui-
ções contra portugueses, que foram se refugiar nas matas, e de lá só
saíram quando tomou posse o comandante das armas designado para
pacificar a região, o capitão Manoel da Silva Daltro55.

Percebemos, por meio do olhar desapaixonado da biógrafa, um se-


cretário de governo que, desempenhando, na prática, as funções do pre-
sidente, desautorizava e enquadrava autoridades religiosas e acabava por
estimular perseguições aos portugueses residentes em Sergipe.

Justiça seja feita, Maria Thetis Nunes não se furtou em concluir que
“decorreram, em meio às agitações e animosidades, os onze meses da ad-
ministração do Brigadeiro Manoel Fernandes da Silveira, sendo persona-
gem destacado nos acontecimentos, inegavelmente, o Secretário Antônio
Pereira Rebouças”56.

54 – Idem ibidem.
55 – Idem, pp. 80-81. Sabemos que a igreja em questão é a vetusta matriz da Paróquia
Nossa Senhora da Vitória, na cidade de São Cristóvão, antiga capital de Sergipe. O vigário
mencionado é, certamente, o padre Luiz Antônio Esteves, e o tenente-coronel é Cristóvão
de Abreu Contreiras, conforme indicam autores como Maria Thetis Nunes.
56 – NUNES, Maria Thetis. Sergipe Provincial I (1820/1840). Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 2000, p. 123.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 241


Samuel Barros de Medeiros

Mas, para além da identificação com Rebouças, as posições políticas


de Felisbelo deram, visivelmente, os contornos de sua História de Ser-
gipe, pois os herdeiros políticos dos corcundas eram os inimigos monar-
quistas e escravocratas com os quais ele se confrontava desde os idos da
década de 1880.

“Sou tentado a afirmar que Felisbelo Freire foi, fundamentalmen-


te, um político”, testemunhou Francisco José Alves, estudando a obra do
“fundador” da historiografia sergipana57.

Embora tenha se dedicando ao estudo da “rede dos conceitos” que


embalou a historiografia de Felisbelo, o professor Francisco notou e ano-
tou que as análises históricas do médico “são sempre determinadas por
finalidades políticas”58. Plenamente de acordo, aprofundarei essa questão
a partir de agora.

Aos que nunca percorreram com o olhar as linhas do principal perfil


biográfico de Felisbelo, transcrevo alguns excertos do verbete dedicado
ao “Doutor Felisbello Firmo de Oliveira Freire” no dicionário de Armin-
do Guaraná: “[clinicando em Laranjeiras, Fellisbelo creou] uma forte
corrente favoravel ao abolicionismo e aos principios politicos da escola
democratica”; “[Felisbello organisou] o partido republicano historico em
1888 na cidade de Larangeiras”; “[Felisbello governou Sergipe de] 13 de
Dezembro de 1889 a 17 de Agosto de 1890”; “Eleito deputado á Assem-
bléa Constituinte [em 1891], [...] [Fellisbelo foi] reeleito nas legislaturas
de 1897-99, 1903-905, 1909-911, 1912-914, e 1915-1917”59. Eis a indis-
cutível presença de Felisbelo na vida política sergipana, entre meados da
década de 1880 e idos da década de 1910.

57  –  ALVES, Francisco José. A rede dos conceitos: uma leitura da historiografia de
Felisbelo Freire. São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010,
p. 191.
58 – Idem Ibidem, p. 190-191.
59  –  GUARANÁ, Armindo. Doutor Felisbello Firmo de Oliveira Freire. In: Diccionario
bio-bibliographico sergipano. Rio de Janeiro: Pongetti & C, 1925. p. 83.

242 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

Voltemos, então, ao primeiro capítulo do livro III da História de Ser-


gipe e, dessa forma, ao governo Manoel Fernandes da Silveira (1757-
1829) e do influente secretário Antonio Pereira Rebouças (1798-1880).

Justificando “a paixão e o odio [que] apoderaram-se” dos partidários


do presidente Silveira, Felisbelo registrou que “ainda estavam bem vivas
na memoria de todos as violencias praticadas sobre o povo, pelo partido
que appellava para as tradicções de nobreza [os chamados corcundas]”60.

Em se tratando de “paixão”, Alves assinalou que, “na História de


Sergipe (1891), o conceito tem presença frequente, designando um mó-
vel dos agentes históricos. A paixão é sempre conotada negativamente.
Todos os atores sociais podem ser motivados por ela: o governo, o povo,
as classes”61. Como veremos, o historiógrafo Felisbelo também cultivou
suas paixões e estas conduziram suas interpretações e moveram sua pena.

É perceptível o incômodo de Felisbelo em relação aos que apela-


vam para “as tradicções de nobreza”, tradições das quais ele não podia
orgulhar-se, sem que um adversário o lembrasse de sua origem mestiça.

Para além do que já fora transcrito, e, novamente, tomando partido


de Rebouças, o historiador concluiu que as ações do secretário feriam “o
espirito aristocratico da provincia, onde as questões de nobreza de familia
são tradicionaes e aventadas por qualquer motivo”62. A fleuma da aris-
tocracia sergipana, claramente, feria as sensibilidades do mulato letrado
que ascendera, politicamente, com a República.

Mesmo considerando que, sob a batuta de Rebouças, “o levanta-


mento do povo se fez sentir com excesso em todos os pontos da pro-
vincia, de onde chegavam queixas, algumas de verdadeiros saques nos

60  –  FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de


Janeiro: Typographia Perseverança, 1891, p. 268.
61  –  ALVES, Francisco José. A rede dos conceitos: uma leitura da historiografia de
Felisbelo Freire. São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010,
pp. 116-117.
62 – Op. cit., FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. p. 269.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 243


Samuel Barros de Medeiros

portuguezes”63, Felisbelo ressentiu-se do fato de o coronel Manuel da


Silva Daltro, comandante das armas da província, ter agido para reesta-
belecer a ordem: “Daltro esquecia o posto que occupava, para ingerir-se
nas luctas partidarias. A consequencia foi a completa desharmonia entre o
elemento militar e o civil, desharmonia que veiu ainda mais aggravar as
condições de paz e ordem em que vivia a sociedade de então”64.

A identificação política com o governo Silveira/Rebouças e a parcia-


lidade de Felisbelo foram tamanhas, que ele sequer estranhou o fato de
o presidente Silveira, manobrando o Conselho de Governo, ter forçado o
afastamento do coronel Daltro e passado a acumular o “Governo da Pro-
vincia e o Commando das Armas”65.

Estrategicamente ou não, Felisbelo registrou, em notas de rodapé,


dados que poderiam macular a imagem de figuras políticas com as quais
se identificava. Ao tratar, por exemplo, da composição dos partidos em
1824, desloca para uma dessas notas, a informação de que Silveira havia
substituído um desafeto político por seu irmão, Manuel Ignacio da Silvei-
ra, no Conselho de Governo da província66.

Avesso aos opositores de Silveira/Rebouças, Felisbelo demonstrou


dificuldade em admitir o fracasso daquele efêmero governo. Como quem
se esquiva da palmatória, o autor concluiu:
Se a administração de Silveira não promoveu realisação de melhora-
mentos que se tornavam inadiaveis, comtudo prestou o inolvidavel
serviço de restringir as ousadias do militarismo e da aristocracia, le-
vantando uma opinião publica e defendendo os direitos do povo, con-
culcados pelos prepotentes da epoca67.

A parcimônia com a qual Felisbelo analisou os excessos do “espíri-


to incandescente” de Rebouças não foi a mesma com a qual analisou a

63 – Idem, p. 270.
64 – Idem, pp. 270-271.
65 – Idem, p. 275.
66 – Idem, p. 271.
67 – Idem, p. 275.

244 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

reação dos opositores ao governo Silveira, os “pretensiosos” corcundas


(portugueses afortunados e aristocratas). Nesse sentido, registrou:
Este partido que na vida imperial de Sergipe foi o prolongamento do
partido colonisador, nas luctas de pela independencia e pela emanci-
pação; que oppôz-se á essa conquista liberal, sempre alliado do ele-
mento portuguez; que vendeu S. Christovão aos poderosos da Bahia;
que trahio Burlamaqui; que promoveu a deposição de Silveira; que
sentio-se irritado contra a propaganda de Rebouças, sobre a igualdade
dos cidadãos perante a lei, agora, em 1831, retardava, sem ter coragem
de uma opposição franca, a acclamação de Pedro II68.

No engajado discurso do historiador, os corcundas representavam o


atraso político e social de Sergipe. Mas, é possível que essa aversão de
Felisbelo fosse, também, uma herança política familiar. O leitor atento da
História de Sergipe, esbarra em discretas menções às divergências políti-
cas entre os Freire do Vale do Vaza-Barris e os corcundas, bem como seus
herdeiros políticos69. Desde Luis Francisco, avô de Felisbelo, os Freire
se opuseram aos corcundas, notadamente, ao seu maior chefe político, o
comendador Sebastião Gaspar de Almeida Botto (1802-1884).

Dando, novamente, a palavra ao principal estudioso da historiografia


de Felisbelo, subscrevo a seguinte conclusão:
Embora Felisbelo Freire apregoe a neutralidade do relato histórico,
os seus textos estão permeados de elementos denunciadores das suas
opções. Muitas vezes o autor toma a toga de Juiz e sua história assume
as feições de um pelourinho. Expressivos, a este respeito, são os adje-
tivos usados para qualificar pessoas, fatos ou situações. Muitas vezes,
a história, nas mãos de Felisbelo Freire tem clara função política. Isto
se torna patente em obras como História de Sergipe (1891), História
Constitucional (1894-1895), História da Revolta de 6 de Setembro
(1896)70.

68 – Idem, pp. 283-284.


69 – Idem, p. 243.
70  –  ALVES, Francisco José. A rede dos conceitos: uma leitura da historiografia de
Felisbelo Freire. São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010,
pp. 189-190.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 245


Samuel Barros de Medeiros

As paixões de Felisbelo arrebatam ainda mais sua narrativa à medida


que ela se aproxima e alcança o Segundo Reinado. Novos heróis e vilões
ganham destaque em sua História de Sergipe. Entre os primeiros, estão
os liberais Manoel Joaquim Fernandes de Barros (1802-1840) e Antonio
José da Silva Travassos (1804-1872). No polo oposto, estão os “rapinas”
Bento de Mello Pereira (1780-1866), futuro Barão da Cotinguiba, e Se-
bastião Gaspar de Almeida Botto (1802-1884).

É preciso considerar que Felisbelo produziu uma “historiografia hí-


brida”, um misto de naturalismo e de romantismo. Sobre essa marca da
historiografia de Felisbelo, o professor Francisco José Alves destacou:
[...] enquanto os autores que lhe servem de inspiração praticamente
dissolvem os indivíduos no conjunto das forças transindividuais como
meio, raça, circunstâncias históricas, organismo social, Felisbelo Frei-
re reserva aos indivíduos (grandes vultos) um lugar de proeminência
no teatro do devir histórico. Algumas vezes, ele faz da história mero
resultado da ação dos grandes homens ou heróis71.

Sobre o médico e cientista alagoano Manoel Joaquim Fernandes de


Barros, figura de destaque na política sergipana no Período Regencial,
enfatizou Felisbelo:
No campo politico ninguem podia competir com o illustrado medico.
Elle havia de impor-se á acceitação da opinião, e conquistar a suprema
direção dos partidos. As qualidades de que era dotado, o poder de sua
mentalidade e a riqueza scientifica de seu espirito, davam-lhe o privi-
legio de dominar os destinos da provincia72.

Visivelmente, Felisbelo “cede a essa tentação heroicizante típica da


historiografia romântica”73.

Bem mais que o historiador, foi o político que interpretou o assassi-


nato de Fernandes de Barros. De outra forma, onde estariam os documen-
71 – Idem, p. 181.
72  –  FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de
Janeiro: Typographia Perseverança, 1891, pp. 302-303.
73  –  ALVES, Francisco José. A rede dos conceitos: uma leitura da historiografia de
Felisbelo Freire. São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010,
p. 171.

246 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

tos que lhe permitiram relacionar tal crime à inveja despertada pelo políti-
co liberal? Além disso, veremos que Felisbelo insinua o envolvimento do
comendador Botto no rumoroso assassinato, já que o principal “inimigo
politico e pessoal” de Fernandes de Barros seria o referido comendador.
Comprehende-se perfeitamente que os chefes politicos de então, em
terreno nenhum podiam com elle competir. Não podiam apellar para
o prestigio do talento e a nobreza de saber. A consequencia da cons-
ciencia dessa desigualdade, em que se achavam os directores da poli-
tica, era a inveja. Tornava-se preciso eliminal-o do campo politico, por
meio de uma medida radical, desde quando vencel-o era um impossi-
vel. Eis as causas do assassinato de Fernandes de Barros74.

No mais, Felisbelo afirma que o assassinato de Fernandes de Barros


“foi planejado em Sergipe”75. Dessa forma, se o assassinato foi planejado
em Sergipe e se, em Sergipe, o seu principal inimigo (político e pessoal)
era o comendador Botto, logo Botto seria o mentor do crime. Entretanto,
sabemos, o comendador Botto foi inocentado no processo que investi-
gou a morte de Fernandes de Barros, ocorrida no Campo da Pólvora, em
Salvador, a 2 de outubro de 1840. Sobre o famoso processo-crime, há o
seguinte registro no Dicionário de Armindo Guaraná: “[foi a] mais com-
pleta victoria alcançada [por Botto] nos tribunaes de justiça, perante os
quaes soube manter illesa a honorabilidade do seu nome”76.

Poderíamos arrematar a questão assinalando que


[...] a forma explicativa adotada [por Felisbelo] ao longo dos seus tex-
tos torna-se um modo peculiar de psicologia individual ou coletiva.
Explicar a história é desvendar as motivações dos atores no cenário
do processo histórico. O historiador vale-se da psicologia para com-
preender os agentes e suas motivações. Explicar é descobrir causas e
estas estarão na subjetividade dos personagens postos em cena77.
74  –  FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de
Janeiro: Typographia Perseverança, 1891, p. 303.
75 – Idem, p, 316.
76  –  GUARANÁ, Armindo. Doutor Felisbello Firmo de Oliveira Freire. In: Diccionario
bio-bibliographico sergipano. Rio de Janeiro: Pongetti & C, 1925. p. 255.
77  –  ALVES, Francisco José. A rede dos conceitos: uma leitura da historiografia de
Felisbelo Freire. São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010,
p. 119.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 247


Samuel Barros de Medeiros

Todavia, considero que, de forma similar ao que ocorrera com rela-


ção ao secretário Rebouças, Felisbelo heroicizou Fernandes de Barros por
identificar-se com ele – um médico e homem de letras oponente aos polí-
ticos que barravam o avanço da civilização em Sergipe. Além disso, não
podemos perder de vista que o atribuído algoz de Fernandes de Barros,
o comendador Botto, era uma espécie de patriarca monarquista do grupo
político que, no alvorecer da República, desmantelou o governo do presi-
dente Felisbelo Freire em Sergipe. Como bem assinalou Bonifácio Fortes,
“Leandro [Ribeiro de Siqueira] Maciel [...], apoiando-se em Coêlho e
Campos e no Barão da Estância, organizou e sistematizou a oposição à
situação estadual [durante a presidência do doutor Felisbelo]”78.

Fato é que a heroicização de Fernandes de Barros ascende a desca-


bidas conjecturas, como a que se segue: “a morte de Fernandes de Barros
foi de reaes desvantagens, porque elle plantaria uma nova orientação na
politica e elevaria, fóra, o nome sergipano á altura que os seus successo-
res nunca alcançaram”79.

Sobre o comendador Antonio José da Silva Travassos, com quem


também se identifica, Felisbelo assinalou: “Travassos figura na politica
de Sergipe no tempo da regencia e no segundo reinado. Elle representa a
manifestação do espirito de revolta contra a politica autoritaria dos man-
dões de então”80.

Entre os inimigos do progresso de Sergipe, aparece Bento de Mello


Pereira que, em 1836, presidiu a província. Sobre ele, concluiu Felisbelo:
[Bento] era ignorante [e] saturado das paixões politicas”81;
Mello Pereira foi o primeiro da serie dos presidentes que formam o
segundo periodo da regencia, tão prejudicial á prosperidade da pro-
vincia, e cujas administrações caracterisam-se pela falta de segurança

78  –  FORTES [NETO], [José] Bonifácio. Felisbelo Freire: o homem público, o escritor
e o constitucionalista. Aracaju: Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, 1958, p. 24.
79  –  FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de
Janeiro: Typographia Perseverança, 1891, p. 303.
80 – Idem, p. 295.
81 – Idem, p. 294.

248 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

publica e individual, pelos arbitrios do poder, pelos excessos do parti-


darismo, que renasceu as velhas paixões, pelo esquecimento absoluto
da lei, pela preponderancia dos regulos, que eram os chefes dos parti-
dos, insconcientes e ignorantes82.

Refém das paixões de Felisbelo, sua História de Sergipe parece, por


vezes, um campo de batalhas entre anjos e demônios – os primeiros com
poderes para fazer da pequena província um paraíso na terra e os segun-
dos com poderes para verter esse paraíso em inferno. Dito de forma mais
precisa, era a luta da civilização contra a barbárie, das forças civilizadoras
contra as forças que mantinham Sergipe no atraso e no obscurantismo.
Tudo, entretanto, filtrado pelas lentes de “[um homem] rebellado contra o
regimen e os partidos monarchicos”83.

Rebelado contra o que chamava de “regimen decahido”, Felisbelo foi


um demolidor da memória do Segundo Reinado e um construtor da me-
mória da Primeira República, filha da “revolução de 15 de Novembro”84.

Concluiu o historiador que, no Segundo Reinado, o povo tornara-se


morno, “ha[via] um symptoma dominante de uma degeneração de carac-
ter, que intimidava os homens a protestarem contra as tyrannias, que os
levava a suffocarem suas convicções, na esperança das graças do poder”.
E essa degeneração da sociedade resultava da forma de governo85.

Felisbelo diminuiu a importância de feitos de primeira grandeza para


o desenvolvimento econômico de Sergipe, realizados entre 1840 e 1855.
Nesse sentido, afirmou que “[...] de melhoramentos materiaes só foram
feitos a abertura do canal que une o rio Japaratuba ao rio Pomonga, e o
trabalho de rebocagem nas barras, diminuindo assim o numero de naufra-
gios dos navios que demandavam Sergipe”86.

82 – Idem, p. 305.
83  –  GUARANÁ, Armindo. Doutor Felisbello Firmo de Oliveira Freire. In: Diccionario
bio-bibliographico sergipano. Rio de Janeiro: Pongetti & C, 1925. p. 83.
84  –  FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de
Janeiro: Typographia Perseverança, 1891, p. 255.
85 – Idem, pp. 313-315.
86 – Idem, pp. 317-318.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 249


Samuel Barros de Medeiros

No campo da instrução pública, a criação do Liceu de Sergipe, que


centralizou o ensino secundário em fins da década de 1840, e a criação da
Biblioteca Provincial, em princípios da década de 1850, foram mesqui-
nhamente referidos87.

Os representantes do Segundo Reinado que, até 1855, governaram


Sergipe, com algumas raras exceções, foram assim caracterizados por Fe-
lisbelo:
Indifferentes á segurança publica, não inqueriam da indoneidade do
cidadão, para a funcção dos cargos publicos, desempenhados por in-
dividuos que se entregavam á vontade dos dominadores, ficando sem
punição os crimes que se perpetravam, e sem as regalias os cidadãos
do partido que não era o da situação88.

Tornando a mencionar um inimigo político de sua família, Felisbelo


assinalou:
Se pelo lado de segurança publica, durante o segundo reinado, che-
gamos a uma lamentavel estado de selvageria, pelo lado financeiro
chegamos a banca-rota, na administração de Sebastião Gaspar de Al-
meida Botto, em 1842. A falta de fiscalisação dos dinheiros publicos
chegou a ponto de não haver numerario para pagar-se o funccionalis-
mo, ao qual o governo entregava vales, para serem rebatidos no com-
mercio, com grande especulação dos negociantes em lucros exagera-
dos. Durante mezes, suspenderam-se os pagamentos aos empregados
publicos. Como o leitor vê degenerava-se a sociedade89.

Felisbelo foi taxativo: “a politica dominava com a corrupção”90.


Resta-nos saber se o problema estava, realmente, na forma de governo.
O quadro pintado por Felisbelo transformou-se, consideravelmente, de-
pois de mais de 120 anos de República? Se, para Felisbelo, “evoluir, no
campo político, é substituir a Monarquia pela República”91, essa foi uma

87 – Idem, pp. 326-327.


88 – Idem, p. 316.
89 – Idem, pp. 316-317.
90 – Idem, p. 317.
91  –  ALVES, Francisco José. A rede dos conceitos: uma leitura da historiografia de
Felisbelo Freire. São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010,
p. 131.

250 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

evolução frustrada. A República de Felisbelo não conseguiu regenerar e


transformar o estado de coisas que tanto combatera.

Ainda sobre o comendador Botto, Felisbelo assinalou que, entre a


década de 1830 e princípios da década de 1850, ele tinha “domínio abso-
luto” em Sergipe.
De sua vontade dependiam todas as deliberações, todas as resoluções.
Dominava não só a administração da provincia, como as administra-
ções locaes. [...] Por conseguinte, Almeida Botto é um dos mais res-
ponsaveis pelo atrazo em que permaneceu a provincia, durante aquelle
periodo92.

No mais, o autor deu sua interpretação à lenta derrocada política


do poderoso comendador. Sem respaldo documental indicado, Felisbelo
afirmou que a suspeita de envolvimento no rumoroso assassinato do polí-
tico Manoel Joaquim Fernandes de Barros repercutira, negativamente, na
Corte, “de onde vieram ordens reservadas ao presidente José Antonio de
Oliveira e Silva”, para que se aliasse aos adversários de Botto.
Além deste facto contribuio ainda a mudança da capital, cujos habi-
tantes esperaram que Botto, pelo illimitado prestigio de que gosava, se
oppuzesse ao acto administrativo. A opinião publica pensou e pensou
muito bem, que a opposição de Botto importaria a nullidade e revo-
gação do acto93.

Como poderia Botto, em meados da década de 1850, quando, segun-


do o próprio Felisbelo, já deixara o centro do poder político em Sergipe
e sofria com os desdobramentos da morte de Fernandes de Barros, bar-
rar a mudança da capital da província? Os tempos eram outros. O Barão
de Maruim, João Gomes de Mello (1809-1890), assumira a dianteira da
política sergipana. Além disso, mesmo no grupo político de Botto, sua
liderança já era questionada.

A aversão de Felisbelo à mudança da capital da província da Sergipe


(da vetusta São Cristóvão para o Aracaju, em 1855) é, também, um re-
92  –  FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de
Janeiro: Typographia Perseverança, 1891, pp. 328-329.
93 – Idem, p. 329.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 251


Samuel Barros de Medeiros

flexo de suas relações familiares e políticas. Vinculado às elites do vale


do Vaza-Barris, o historiador abominou a iniciativa do presidente Ignacio
Joaquim Barbosa (1821-1855), apoiada pelo Barão de Maruim.

O historiador viu, na mudança da capital, um sintoma claro da deca-


dência da sociedade sergipana sob o Segundo Reinado, além de um fato
“altamente attentatorio á riqueza particular dos habitantes de S. Christo-
vão e seu municipio”94.

É preciso assinalar que, em 1855, familiares de Felisbelo eram pro-


prietários de muitos engenhos de açúcar no vale do Vaza-Barris (como o
Belém, o Roma, o Jerusalém, o Itaperoá, o Rio Comprido...) e imóveis na
cidade de São Cristóvão (como o imponente sobrado que hoje abriga a
Casa do IPHAN, na Praça de São Francisco). Os Freire, sem dúvida, sen-
tiram a mudança da capital como um verdadeiro atentado ao patrimônio e
aos interesses daquela família.

As linhas e as entrelinhas da História de Sergipe seguem revelando


desafetos e frustrações da família do seu autor:
Adimira-se realmente a coragem do Dr. Ignacio Joaquim Barbosa, que
veio consignado para realizar esse attentado. E é para admirar-se que
a deliberação da administração não recuasse perante a grande somma
de interesses particulares que o acto da mudança ia prejudicar [...]95.

Atirando à pobreza uma centena de famílias e “annullando os inau-


ditos esforços das gerações passadas”, as “mãos sacrílegas” do presidente
Barbosa teriam sido guiadas, conforme insinua Felisbelo, pelo “poder de
sugestão” do Barão de Maruim, interessado em transferir a capital para
sua zona de influência política na província96.

Herdeiro do inconformismo familiar, argumentou Felisbelo:


[...] retirava-se a vida official de uma cidade secular, situada em exce-
llente local, de excellentes agoas, de saborosas fructas, de abundancia
de alimento, rodeada de 200 sitios de pequena lavoura, com um muni-
94 – Idem, p. 318.
95 – Idem, p. 318.
96 – Idem, p. 319.

252 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

cipio de 43 engenhos, 11 alambiques, 12 fazendas de criação de gado,


de ricos e bellos edificios, de clima ameno, para ir atiral-a ás praias do
Aracajú, onde intenta edificar, de uma noute para o dia, nova cidade
[...]97.

Tratando da nascente Aracaju, os exageros de Felisbelo gritam aos


olhos: “o proprio presidente teve de habitar em uma casa de palha e a
assemblea de reunir-se debaixo de um pé de cajueiro”98. Não há docu-
mentos que comprovem esses fatos de tons anedóticos.

Se a rivalidade entre os vales do Vaza-Barris e do Cotinguiba foi


motivada pela elevação deste ao posto de principal região produtora de
açúcar e de dono do porto mais concorrido da província, a mudança da
capital deslocaria o centro da vida política também para a Cotinguiba,
que, em grande medida, era dominada por grupos políticos com os quais
Felisbelo se confrontaria no alvorecer da República.

O “republicano histórico” Felisbelo Freire legou a representação de


um Sergipe degenerado sob o Segundo Reinado. Não esqueçamos, toda-
via, que a História de Sergipe veio à luz em plena ressaca da exoneração
de Felisbelo do governo de Sergipe, em princípios da década de 1890.

Profundo deveria ser o ressentimento do autor com os antigos mo-


narquistas que, sob a República, mantiveram-se no comando da política
sergipana. Sobre eles, lembra-nos Bonifácio Fortes: “Leandro [Ribeiro
de Siqueira] Maciel [...], apoiando-se em Coêlho e Campos e no Barão
da Estância, organizou e sistematizou a oposição à situação estadual [no
governo Felisbelo Freire]”99.

Se, ao ler a história de Sergipe sob o prisma da evolução, Felisbe-


lo vislumbra o confronto entre civilização e barbárie, o que lemos cá é
a construção de discursos sobre indivíduos e grupos que, alinhados às

97 – Idem, p. 318.
98 – Idem, p. 318.
99  –  FORTES [NETO], [José] Bonifácio. Felisbelo Freire: o homem público, o escritor
e o constitucionalista. Aracaju: Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, 1958, p. 24.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 253


Samuel Barros de Medeiros

ideias do autor, representavam as forças civilizadoras ou que, de outra


forma, representavam a resistência da barbárie.

Para Francisco José Alves, “repartindo as forças motrizes da história


de Sergipe em ‘egoísmo’ e ‘altruísmo’, Felisbelo Freire é fiel a Herbert
Spencer, para quem a evolução moral de um povo marca-se pela pas-
sagem de um pólo a outro”100. Honestamente, penso que, ao escrever a
História de Sergipe, mais que a Spencer, Felisbelo foi fiel às suas próprias
paixões.

O notável engajamento do autor é um convite para uma revisão aten-


ta de sua obra, considerando, inclusive, o caráter autobiográfico que a sin-
gulariza. No mais, é preciso estudar as apropriações historiográficas dos
discursos de Felisbelo. Muitos foram os intérpretes do passado sergipano
que, irrefletidamente, reproduziram apaixonadas e frágeis conclusões do
patrono dos fazeres historiográficos em Sergipe.

Certamente, a passionalidade que marca a obra de Felisbelo contri-


buiu para que ele se tornasse “um historiador olvidado na história his-
toriografia brasileira”. Ariscaria a mesma explicação para a “velada má
vontade”, e para a “indiscutível hostilidade” notadas por Bonifácio Fortes
em relação ao político e historiador sergipano101.

Contemporâneo de Felisbelo, o célebre Capistrano de Abreu (1853-


1927), tratando de Laudelino Freire em correspondência a João Lúcio de
Azevedo, datada de 4 de agosto de 1920, disparou: “Laudelino é irmão
do Felisbelo, Ministro da Fazenda do Floriano e autor de vários livros de
escasso valor”102.

100  –  ALVES, Francisco José. Apresentação. In: FREIRE, Felisbello Firmo de. História
de Sergipe (1575-1855). 3ed. São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: IHGSE, 2013 (Cole-
ção Biblioteca Casa De Sergipe, 1). p. 14.
101  –  FORTES [NETO], [José] Bonifácio. Felisbelo Freire: o homem público, o escri-
tor e o constitucionalista. Aracaju: Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, 1958. p. 5.
102  –  ABREU, Capistrano. Correspondência de Capistrano de Abreu. Vol. II. 2ed. Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: INL, 1977 (Octalles Marcondes Ferreira – Es-
tudos brasileiros, v. 9), pp. 172-173.

254 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

Capistrano vai além, tentando compreender o que considerou a de-


gringolada física, moral e intelectual de Felisbelo. Nesse sentido, afirma:
Não compreendo a transformação. Felisbelo esteve aqui [no Rio] pela
primeira vez em fins de 1888 ou começo de 1889 e passamos dias en-
cantados com sua inteligência, com seu saber, Sílvio [Romero], João
Ribeiro, [Alfredo do] Vale Cabral, eu, [Francisco] Alves o livreiro,
que tinha bastante leitura. Chegou a república, nomearam-no governa-
dor de Sergipe, elegeram-no à Constituinte, puseram-no no ministério
e começou uma degringolada física, moral e intelectual que ainda hoje
não compreendo. Talvez na primeira fase o víssemos pelos óculos de
João Ribeiro, seu patrício e velho amigo, e só na segunda usássemos
dos próprios olhos103.

Em outra correspondência a João Lúcio de Azevedo, datada de 30


de agosto de 1921, Capistrano, desconfiando do enriquecimento de Lau-
delino, volta a mencionar Felisbelo (aludindo, inclusive, à escandalosa
“questão das loterias”, que maculou a passagem do médico pelo Ministé-
rio da Fazenda, entre 1893 e 1894, no governo Floriano Peixoto):
Estive com Laudelino Freire. Não há muitos anos simples professor
do Colégio Militar, à procura de lições particulares para equilibrar o
orçamento, hoje tem casa no Leme, automóvel, a advocacia de três
casas importantes, etc. Felisbelo Freire, seu irmão, não conseguiu a
metade e morreu pobre e desmoralizado104.

Capistrano já explicara ao amigo João Lúcio, em missiva anterior, o


que se comentava no Rio sobre a fortuna de Laudelino:
[...] Como se explica o milagre? | Era amigo do velho Homero Batista
[ministro da Fazenda, entre 1919 e 1922, no governo Epitácio Pessoa]
[...] | Fizeram-se grandes leilões nos terrenos do cais do porto. Dizem-
-me que nisto ganhou bastante dinheiro, em recompensa da preferên-
cia obtida para certos leiloeiros. Relata refero105.
103 – Idem, pp. 172-173.
104 – Idem, p. 221. Sobre a “questão das loterias”, a defesa de Felisbelo foi publicada
no ano seguinte à sua exoneração do Ministério da Fazenda, depois de ter sido acusado
pelo deputado baiano Artur Rios, na Tribuna da Câmara, de ser responsável pela liberação
da S/A Loteria Nacional, uma concessão tida como imoral e lesiva à Nação – FREIRE,
Felisbello. O ex-ministro da fazenda ao publico (Questão das loterias). Rio de Janeiro:
Typ. da Gazeta de Noticias, 1895.
105 – Idem, p, 173.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 255


Samuel Barros de Medeiros

Seja como for, Laudelino e, principalmente, seu irmão Felisbelo têm


lugar cativo na historiografia sergipana. Este é, sem dúvida, o pai da His-
tória de Sergipe, como afirmara José Calasans. Além disso, sua obra nun-
ca foi tão debatida e revisitada. Cada vez menos, seus livros são “virgens
de olhos humanos”106.

Referências Bibliográficas
ALBUQUERQUE, Samuel. De São Cristóvão ao Rio Comprido. Jornal da
Cidade, Aracaju, 16 jun./25 ago. 2013 (caderno B).
ALMEIDA, Pe. Aurélio Vasconcelos de. Esboço biográfico de Inácio Barbosa.
3 vols. Aracaju: FUNCAJU, 2000/2003.

106  –  Há quase seis décadas, o acreditado professor Bonifácio Fortes assinalara que a
vasta obra de Felisbelo era “praticamente desconhecida em Sergipe” e que “nada se fêz
para destacar a sua inegável importância”, FORTES [NETO], [José] Bonifácio. Felisbelo
Freire: o homem público, o escritor e o constitucionalista. Aracaju: Instituto Histórico
e Geográfico de Sergipe, 1958, p. 5. Felizmente, esse quadro transformou-se. Sem pre-
tender historiar as iniciativas que levaram à referida transformação, destacaria, entre as
mais recentes, a publicação, em 2010, da tese de doutorado do professor Francisco José
Alves, do Departamento de História da UFS, vertida no livro “A rede dos conceitos: uma
leitura da historiografia de Felisbelo Freire” (Editora UFS), obra fartamente explorada ao
longo desta série de artigos. Em 3 de julho de 2014, durante as celebrações dos 194 anos
da Emancipação de Sergipe, o Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe (IHGSE), com
apoio da Editora UFS, lançou a terceira edição da clássica “História de Sergipe”, tornan-
do mais acessível o livro surgido, como vimos, em 1891 e reeditado, somente, nos idos
da década de 1970. Entre 27 de agosto e 17 de dezembro de 2015, o Grupo de Pesquisa
Sergipe Oitocentista (UFS/CNPq), em parceria com o IHGSE e com o apoio do Programa
de Pós-Graduação em História (PROHIS), do Departamento de Museologia (DMS) e da
Pró-Reitoria de Extensão (PROEX) da Universidade Federal de Sergipe (UFS), realizou
a primeira edição de suas “Rodas de Leitura”, com encontros mensais, pondo em revista
os textos de Felisbelo Freire dedicados a Sergipe – “História de Sergipe” (1891), “His-
toria territorial do Brasil” (1906) e “A antiga vila de Santo Amaro das Brotas” (1914).
Entre 24 e 27 de outubro de 2016, ano do centenário de morte de Felisbelo, o IHGSE e
a Associação Nacional de História (ANPUH/SE) escolheram “O Brasil na historiografia
de Felisbelo Freire” como tema da quinta edição do “Congresso Sergipano de História &
Encontro Estadual de História da ANPUH/SE”, realizado na sede do Instituto Histórico.
O bem-sucedido evento contou com mais de 300 inscritos, conferências e palestras dos
historiadores Francisco José Alves (UFS), Paulo Knauss de Mendonça (UFF), Adriana
Pereira Campos (UFES), Joceneide Cunha (UNEB), Samuel Albuquerque (UFS), Tere-
zinha Alves de Oliva (IHGSE), Lenalda Andrade Santos (IHGSE), entre outros. Vemos,
portanto, que a obra de Felisbelo está mais viva do que nunca e, por isso mesmo, deve ser
lida com critério, considerando que suas peculiaridades obrigam-nos a arregalar bem os
olhos e redobrar nossa atenção.

256 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

ALVES, Francisco José. Centenário de uma história inaugural, Jornal da Manhã,


Aracaju, 29 dez. 1991, Arte e Palavra, p. 6.
____. A rede dos conceitos: uma leitura da historiografia de Felisbelo Freire. São
Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviedo Teixeira, 2010.
____. Apresentação. In: FREIRE, Felisbello Firmo de. História de Sergipe
(1575-1855). 3ed. São Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: IHGSE, 2013 (Coleção
Biblioteca Casa De Sergipe, 1). p. 5-19.
BARROS, Francisco Reinaldo Amorim de. ABC das Alagoas: dicionário
biobibliográfico, histórico e geográfico das Alagoas. Vol. 1. Brasília: Senado
Federal, 2005. p. 134.
BLAKE, Augusto Victorino Alves Sacramento. Felisbello Firmo de Oliveira
Freire. In: Diccionario Bibliographico Brazileiro. Vol. 2. Rio de Janeiro:
Imprensa Nacional, 1893. pp. 326-327.
CALASANS, José. Aracaju: contribuição à História da capital de Sergipe.
Aracaju, Livraria Regina, 1942.
CARVALHO, Vladimir Souza. A História em/de Sergipe. In: Santas Almas de
Itabaiana Grande. Itabaiana: O Serrano, 1973. pp. 11-15.
DANTAS, Beatriz Góis. Índios e brancos em conflitos pela posse de terra: aldeia
de Água Azeda, século XIX. Anais do VIII Simpósio Nacional dos Professores
Universitários de História. v. II, pp. 421-452, 1976.
____. Os índios em Sergipe. In: DINIZ, Diana Maria de Faro Leal (Coord.).
Textos para a História de Sergipe. Aracaju: UFS e BANESE, 1991. pp. 19-
60.
DANTAS, Ibarê. Do regional ao nacional, Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 25
fev. 1978, p. 2.
____. Leandro Ribeiro de Siqueira Maciel (1825/1909). O patriarca do Serra
Negra e a política oitocentista em Sergipe. Aracaju: Criação, 2009.
____. História da Casa de Sergipe: os 100 anos do IHGSE, 1912-2012. São
Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: IHGSE, 2012 (Coleção Biblioteca Casa de
Sergipe, 15).
FONTES, José Silvério Leite. Historiografia Sergipana. In: Levantamento das
fontes primárias da história de Sergipe. Cadernos da UFS, Aracaju, n. 1, p. 4-7,
1972.
____. Vultos da historiografia brasileira: Felisbelo Freire (1858-1915). Notícia
Bibliográfica e Histórica, Campinas, n. 49, pp. 381-385, set. 1973.
FORTES [NETO], [José] Bonifácio. Felisbelo Freire: o homem público, o

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 257


Samuel Barros de Medeiros

escritor e o constitucionalista. Aracaju: Instituto Histórico e Geográfico de


Sergipe, 1958.
FREITAS, Itamar. Historiografia Sergipana. São Cristóvão: Editora UFS,
2007.
FREYRE, Gilberto. Sobrados e mucambos: decadência do patriarcado rural e
desenvolvimento do urbano. 14 ed. rev. São Paulo: Global, 2003.
GRINBERG, Keila. O fiador dos brasileiros: cidadania, escravidão e direito civil
no tempo de Antonio Pereira Rebouças. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2002.
MOTT, Luiz Roberto de Barros. Sergipe del Rey: população, economia e
sociedade. Aracaju: FUNDESC, 1986 (Coleção Jackson da Silva Lima).
____. A Inquisição em Sergipe. Aracaju: FUNDESC, 1989 (Coleção Jackson da
Silva Lima).
____. Sergipe Colonial e Imperial: religião, família, escravidão e sociedade. São
Cristóvão: Editora UFS; Aracaju: Fundação Oviêdo Teixeira, 2008.
NUNES, Maria Thetis. História da Educação em Sergipe. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1984 (Educação e comunicação, 13).
____. Felisbelo Freire, o historiador. Caderno de Cultura do Estudante, Aracaju,
n. 4, pp. 92-93, 1987.
____. Sergipe Colonial I. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro; Sergipe: UFS,
1989.
____. Sergipe Colonial II. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1996.
____. Sergipe no processo de Independência do Brasil. Cadernos da UFS,
Aracaju, n. 2, 1973.
____. História de Sergipe, a partir de 1820. Rio de Janeiro: Cátedra; Brasília:
INL, 1978.
____. Sergipe Provincial I (1820/1840). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,
2000.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. Nem preto nem branco, muito pelo contrário:
cor e raça na sociedade brasileira. São Paulo: Claro Enigma, 2012 (Agenda
Brasileira).
SEBRÃO SOBRINHO. Laudas da história do Aracaju. Aracaju: Prefeitura
Municipal de Aracaju, 1955.
SILVA, José Calazans Brandão da. Introdução ao estudo da Historiografia
Sergipana. In: Aracaju e outros temas sergipanos. Aracaju: FUNDESC, 1992
(Coleção João Ribeiro). p. 7-37.

258 R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018.


Felisbelo Freire: o mulato e o político na História de Sergipe

Fontes
ABREU, Capistrano. Correspondência de Capistrano de Abreu. Vol. II. 2ed.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: INL, 1977 (Octalles Marcondes
Ferreira – Estudos brasileiros, v. 9).
FREIRE, Felisbello Firmo de Oliveira. Os caracteres clinicos da cirrhose
hypertrophica são sufficientes para classifical-a como uma molestia distincta
da cirrhose atrophica? Bahia: Imprensa Economica, 1881 (Tese apresentada à
Faculdade de Medicina da Bahia).
____. Historia de Sergipe (1575-1855). Rio de Janeiro: Typographia
Perseverança, 1891.
____. O ex-ministro da fazenda ao publico (Questão das loterias). Rio de Janeiro:
Typ. da Gazeta de Noticias, 1895.
____. Historia territorial do Brazil (Bahia, Sergipe e Espirito Santo). Rio de
Janeiro: Typ. do Jornal do Commercio, 1906. pp. 273-363.
____. Historia da Cidade do Rio de Janeiro. Vol. I (1564-1700). Rio de Janeiro:
Typ. da Revista dos Tribunaes, 1912.
GUARANÁ, Armindo. Doutor Felisbello Firmo de Oliveira Freire. In:
Diccionario bio-bibliographico sergipano. Rio de Janeiro: Pongetti & C, 1925.
pp. 83-86 (além das páginas 24, 48 e 255-257).
INVENTÁRIO post-mortem de Luis Francisco Freire. São Cristóvão, 1856.
Arquivo Geral do Judiciário, Fundo São Cristóvão/Cartório do 1º Ofício, caixa
12, número geral 25.
MACIEL, Leandro [Ribeiro de Siqueira]. Resposta ao pé da Letra, Gazeta
de Sergipe, Aracaju, 20 nov. 1890. In: DANTAS, Ibarê. Leandro Ribeiro de
Siqueira Maciel (1825/1909). O patriarca do Serra Negra e a política oitocentista
em Sergipe. Aracaju: Criação, 2009. p. 238.
REGISTRO DO CASAMENTO de Felisbello Firmo de Oliveira Freire com
Rosa Benta de Araújo [Góes] Mello. Itaporanga d’Ajuda, 1857. In: Livro de
registro de casamentos – 1845/1877, número 579. p. 82 (anverso). Arquivo da
Igreja Matriz da Paróquia Nossa Senhora d’Ajuda, Itaporanga/SE.
TRAVASSOS, Antonio José da Silva. Apontamentos historicos e topographicos
sobre a Provincia de Sergipe. Rio de Janeiro: Instituto Typographico do Direito,
1875.

Texto apresentado em outubro/2017. Aprovado para publicação em


fevereiro/2018.

R. IHGB, Rio de Janeiro, a. 179 (476):223-260, jan./abr. 2018. 259

Você também pode gostar