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Uma Criança É Espancada Freud 1919 - Texto

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a “UMA CRIANGA E ESPANCADA’ NTRIBUICAO AO ESTUDO DA ORIGEM UMA CO! DAS PERVERSOES SEXUAIS (1919) NOTA DO EDITOR INGLES “EIN KIND WIRD GESCHL AGEN' BEITRAG ZUR KENNTNIS DER ENTST SEXUELLER PER VERSIONE! (a) EDIGOES ALEMAS: 1919 Int. Z. Psychoanal. §, 181-72, 1922, S.K.S.N.,5, 195-228, 1924 1926 Ps) lyse der Neurosen, 50-84. 1931 Sexualtheorie und Traumlehre, 124-35. 1947 G.W., 12, 197-226. (0) TRADUGAO INGLESA: “A Child is being Beaten” A Contribution to the Study of the Origin of Sexual Perversions’ 1920 Int. J. Psycho-Anal., 1, 371-95. (Trad. de A. e J. Strachey.) 1924 C.P., 2, 172-201. (Os mesmos tradutores.) A presente tradugio inglesa é versio corrigida da publicada em 1924. Numa carta a Ferenczi, datada de 24 de janeiro de 1919, Freud anunciava que estava escrevendo um artigo sobre o masoquismo. O artigo foi concluido erecebeu o presente titulo em mmeadoeds mango d= 1519, € foi publicado no verao do mesmo ano. A maior parte do artigo consiste em um inquérito clinico muito detalhado sobre um tipo i As descobertas de Freud elucidaram particularmente o problema do masoquismo, e, como esta implicito no subtitulo, o artigo era também destinado a ampliar o nosso conhecimento sobre as perversdes de um modo geral. Desse ponto de vista, pode ser considerado como um complemento ao primeiro dos Trés Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade (1905d). Além do mais, no entanto, o artigo inclui uma exposi¢do, a qual Freud atribuiu consideravel importincia, dos motivos que colocam_em.agio_a_ Tepressao, com especial referéncia as duas teorias sobre o tema, propostas rib ye a Awe wre sec huctey C1 5 Diss les Lif rushc> | )_ ©) pon Tespectivamente Por Fliess e por Adler (cf. Tepressiio é exaustivamente discutido em do Freud —em ‘Repressi Mas a questo dos moti Ultima parte da anilise pags, 34-37), oO me dis artigos Metapsicoldgicos de io" (191 5d) ena Segio [V de'Q Inconsciente* (19150) fivos que conduzem a Teptessdo, embora se ‘anismo dy i0 tocada ng do “Homem dos Lobos? (19185), pig, 1 lGescg., deste volume, em nenhum outro trabalho é mais ple le examinada do que no Presente artigo. Ce Ente ¢1 ¢ 0 havi referéne’ mM muitas 1950a). Jé bem no fim da a esse problema, na Ultima Parte da sua Terminavel ¢ Intermindvel’ (1937c), onde novamente discuti; teorias de Fliess e de Adler. ja as 194 ‘UMA CRIANGA E ESPANCADA’ UMA CONTRIBUICAO AO ESTUDO DA ORIGEM DAS PERVERSOES SEXUAIS pa (Vert 4 > 4 GAO V9 a pred tt Yo gn? wo 8 le ye E surpreendente a freqiiéncia com que as pessoas que procuram um tratamento analitico para a_histeria ou uma neurose obsessiva, confessam haver-se abandonado A fantasia: ‘Uma crianga é espancada.” E muito prova- vel que haja exemplos ainda mais freqiientes em um numero muito maior de pessoas que nao foram obrigadas a procurar andlise por causa de uma doenga manifesta. ‘A fantasia tem sentimentos de prazer relacionados com ela e, por causa { deles, o paciente reproduziu-aem inumeraveis ocasides, no passado, ou pode ‘até mesmo ainda continuar a fazé-lo. No climax da situagdo imaginaria, ha Jauase invariavelmente uma satisfagdo masturbatéria — realizada, em outras |palavras, nos drgios genitais. De inicio, isso acontece voluntariamente, mas 240) de do paciente e com as caracteristicas de uma APES SLES HY TEE a YO 6 Aye AE PETC A MN he perce] 0 4 art! S e essa fantasia é confessada. O seu primeiro certeza. O tratamento analitico do problema vergonha e 0 sentimento de culpa sio talvez mais intensamente provocados em relago a essa fantasia, do que quando sao feitos relatos semelhantes de lembrangas do inicio da vida sexual. Eventualmente torna-se possivel estabelecer que as s primeiras fantasias — dessa natureza foram nutridas muito cedo: certamente antes da idade escolar re jamais depois do quinto ou ‘To sexto ano de vida. Quando a crianga estava Fa Boole 6 vis outras crianigas sendo espancadas pelo professor, essa expe- riéncia, se as fantasias estavam entio dormentes, despertava-se de novo, ou, se ainda estavam presentes, reforgava-as € modificava-lhes perceptivelmente o contetdo. A partir dessa ocasiiio, era ‘um nimero indefinido’ de criangas que estavam sendo espancadas. A influéncia da escola era tio clara que 0s pacientes em questio ficaram inicialmente tentados a atribuir as suas fanta- sias de espancamento exclusivamente a essas impresses da vida escolar, que tinham data posterior 4 do sexto ano de idade, Mas nunca Ihes foi possivel manter essa posigao; as fantasias ja existiam antes disso. 195 on Ua codes Embora nas séries mais adiantadas da escola nao rhais se batesse nas S se batesse nas angas, a influéncia dessas ocasides era © mais do que sub cs tua, pelos efeitos da leitura, ea importincia destes em breve seta No milleu dos meus pacientes, eram quase sempre os mesmos lime contetido dava um novo estimulo as fantasias de espancamentoy seacye /acessiveis aos joven, tais como os que erat conhecids como “Bibliomene ‘yl rose’,' A Cabana do Pai Tomés etc, A 5 crianga comegava a competir com _/ S lessas obras de ficc’o, produzindo as suas proprias fantasi: Ltaquinagens e seu mau comportamento, 5 Essa Tantasia “ina crianga € espancada’ — era invariavelmente catexie ; zada com um alto grau de prazer ¢ tinha a sua descarga num ato dé agradavel ~ 1, + satisfac atito-erdtica, Poder-se-ia esperar, portanto, quea visiode outracrianga ~~ 3 sendoespancada na escola fosse também uma fonte de prazer semelhante. Na © iS realidade, porém, isto jamais acontecia. A experiéncia das cenas reais de espan- ~~ |? Camento na escola produzia na crianga que as testemunhava um sentimento KSYX)_ peculiarmente excitado, que era provavelmente de cariter misto € no qual a “cc Sqwfepugnaneia tinha larga parcela. Em alguns poucos casos, a experiéncia real das _ cenas de espancamento era sentida como algo intolerdvel. Ademais, era sempre uma condigao das fantasias mais sofisticadas, dos anos posteriores, que o castigo substituida, 0 “yy vs y (ass yO no causasse & crianga qualquer dano mais sério. ae Avo yu ra A guestiio estava em conex com saber Hi ia haver entre a importéncia das fantasias de espancamento ¢.0 papel que esse castigo corporal de verdade poderia fazer desempenhado na educago das criancas em casa. Foi “Tmipossivel, por causa da parcialidade do material, confirmar a primeira suspeita de que a relago era inversa. Os individuos dos quais foram obtidos os dados para as andlises haviam sido muito raramente espancados na infancia, ou n3o haviam sido, em todo caso, educados com ajuda da vara. Naturalmente, contudo, cada uma daquelas criangas estava destinada a tomar conhecimento, mais cedo ou mais tarde, da forga fisica superior dos pais ou educadores; o fato de que, em todo quarto de brinquedos ou jardim de infancia, as proprias criangas chegam por vezes as vias de fato, nao exige destaque especial. No que diz respeito as fantasias simples e primitivas que nao podiam, obviamente, ser atribuidas & influéncia das impressoes escolares ou de cenas ( Re MEU eas Arty Scene { an panes “yp vy Ay ep ay ad 4 if a) 7 1. [Famosa série de livros de Mme. De Ségur, dentre os quais Les Malheurs de Sophie era alvez ‘mais popular.} a 196 , titadas de livros, seria necessério maior informagio. Quem era.a erianga que nda espancada? A que estava ctiando a fantasia, ov uma outra? Era re a mesma crianga, ou ds vezes era una, diferente? Quem estava bater de : Pessoa adulta? Se era, quem? Ou.a criunea imaginavarce « si mesma batendo em outa? Nada do que foi apurado pode esclarecer todas as perguntas; apenas a resposta hes ae Perguntas; apenas a resposta hesitante: ‘Nada mais sei s aa lespaticando uma erianga, mais sei sobre isto: estio “As pergunt tivers Bunlas quanto ao sexo da crianga que estava sendo espancada m mats €xito, mas, ainda assim, nenhuma trouxe o esclarecimento. As vezes @ resposta era: ‘Sempre rapazes’, ou ‘Apenas meninas’; com mais freqiiéncia era: ‘Nao sei’, ou ‘Nao importa’, No entanto, jamais foi constatado © ponto a que as perguntas se dirigiam, a descoberta de alguma relagao constante entre o sexo da crianga que cria a fantasia e o da crianga que esta sendo espancada. De vez em quando, surgia outro detalhe caracteristico do contetido da fantasia: “Uma crianga esta sendo espancada, estdio-Ihe batendo no traseiro nu. Nessas circunstincias era impossivel, de inicio, até mesmo decidir se 0 prazer relacionado a fantasia de espancamento deveria ser descrito como sidico ou como masoquista. Il Uma fantasia dessa natureza, nascida, talvez, de causas acidentais na primitiva infancia, e retida com 0 propdsito de satisfac¢ao auto-erdtica, sé “pode, 4 Tuz do n0ss6 conhecimento atual, ser considerada como um trago primario de perversio. Um dos componentes da Tungao sexual desenvolv Se; a0 que parece, a frente do resto, tomou-se prematuramente independente, sofreu uma fixagio, sendo por isso afastadas dos processos posteriores de desenvolvimento, e, dessa forma, da evidéncia de uma constitui¢ao peculiar ¢ anormal no individuo. Sabemos que uma perversao infantil desse tipo nio ‘persiste necessariamente por toda a vida; mais tarde pode ser submetida repressao, substituida por uma formacao reativa ou transformada por meio da sublimagio,_(E possivel que a sublimagao nasca de algum processo especial’ que seria detido pela repressio.) Se esses processos, contudo, nfo 1 [Isto pode ser relacionado teoria da sublimagdo citada no Capitulo III de O Ego e 0 Id (19236).] a 197 ocorrem, a perversio persiste até a maturidade; e Sempre que encontramos uma aberragao sexual em adultos — perversao, fetichismo, inversao —temos motivos para esperar que a investigagao 2 ésica revele um evento como o que sugeri, que conduza a uma fixacdo na infancia. De fato, muito antes da era da psicandlise, observadores como Binet conseguiam atribuir as estranhas aberracdes sexuais da maturidade a impressées similares, e Precisamente ao mesmo periodo da infancia, ou seja, 0 quinto ou o sexto ano de vida.' Nesse ponto, porém a investigacio defrontava-se com as limitagdes do nosso conhecimento; pois as impressdes que provocavam a fixagZo nao tinham qualquer forga traumatica. Eram, na sua maioria, corriqueiras e nao excitantes para outras pessoas. Era impossivel dizer por que o impulso sexual se submetera particularmente a uma fixacdo nessas. impressdes. Era possivel, no entanto, procurar o seu significado no fato de que ofereciam uma ocasiio para fixacdo (embora acidental) exatamente ao componente que se desenvol- vera prematuramente e estava pronto para se colocar em primeiro plano. Em todo caso, tinhamos de estar preparados para chegar a um fim provisério, num ponto ou noutro, ao tracar a seqiiéncia da conexio causal; e a constitui- 4o congenital parecia corresponder exatamente ao que se exigia para uma parada dessa natureza. > Se_o componente sexual que se soltou prematuramente é o sddico, podemos esperar, com base no conhecimento derivado de outras fontes, que a sua subseqiiente repressio resultard numa inclinacao para‘a neurose obses-)” _Siva Nao se pode dizer que essa expectativa fosse contrariada pelos-resu tados da pesquisa. O presente artigo baseia-se no estudo exaustivo de seis casos (quatro femininos e dois masculinos). Destes, dois eram casos de neurose obsessiva; um extremamente grave e inqualificavel; 0 outro, de severidade moderada e bastante acessivel a influéncia. Havia um terceiro caso que, de qualquer maneira, exibia claramente tragos individuais marcados de neurose obsessiva. O quarto caso, temos que admitir, era de franca histeria, com dores e inibigdes; € 0 quinto paciente, que chegou a andllise simplesmente por causa de indecisao na vida, nao teria absolutamente sido classificado pelo diagnéstico clinico comum, ou teria sido rejeitado como ‘psicasténico’.’ Nao ha necessidade de sentir desapontamento quanto as estatisticas. Em primeiro 1 [Essa observaco de Binet foi mencionada por Freud nos seus Trés Ensaios e comentada em nota acrescentada aquela obra em 1920 (Edic3o Standard Brasileira, Vol. VII, pag. 156, IMAGO Editora, 1972). [Ver ‘A Disposigao & Neurose Obsessiva’ (1913i).] [Nada é dito quanto ao sexto caso.] we 198 lugar, um dis\ aabemos que nem toda tendéncia se de bio; em segundo lugar, devemo-nos contenta que estio diante de nds, e deviamos, vin de regra, algo que ndo ocorreu, A presente et ‘senvolve necessariamente para em explicar os fatos evitar a tarefa de esclarecer ‘apa do nosso conhecimento permitir-nos-ia abrir caminho, por enquanto, ¢ no mais além, no sentido da compreensao das fantasias de espancamento. Na mente do médico analitico, € verdade, resta uma apreen- siva suspeita de que isso nao é uma solugdo final do problema, Ele é obrigado a admitir para si proprio que, em grande medida, essas fantasias subsistem & parte do resto do conteiido de uma neurose e nao encontram lugar adequado na sua estrutura, Mas impressdes dessa espécie, conforme sei por experiéncia propria, siio apenas postas de lado muito Pprontamente. Il Rigorosamente considerado — e Por que nao deveria essa questdo ser considerada com todo o rigor? —, 0 traba ho-analitico s6 merece ser reco-_ nhecido como psicanilis quando consegue remover a amnésia que oculta do__ adulto 0 seu conhecimento da infancia desde o inicio (isto é, desde um periodo aproximadaménte entre 0 segundo 0 quinto ano de vida). Entre os analistas, isto ndo pode ser dito com muita énfase ou repetido com muita freqiiéncia. Os motivos para desconsiderar este lembrete so, na verdade, compreensi- veis. Seria desejavel obter resultados praticos num periodo mais curto e com menos problemas. Na época atual, porém, 0 conhecimento tedrico é ainda muito mais importante para todos nés do que 0 éxito terapéutico, e quem quer que negligencie a anilise infantil esta fadado a cair nos mais desastrosos erros. A énfase que é dada aqui 4 importancia das primeiras experiéncias nao implica em subestimar a influéncia das experiéncias posteriores. As impres- sdes posteriores da vida, contudo, falam alto o bastante através da boca do paciente, ao passo que é 0 médico que tem que elevar a voz em favor das reivindicagdes da infancia. E na infancia, entre os dois e os quatro ou cinco anos de idade, que os fatores libidinais congénitos so despertados pela primeira vez pelas expe- riéncias reais e se ligam a determinados complexos. As fantasias de espan- camentos que agora estamos considerando, s6 se mostram_ mais para 0 final ‘desse periodo, ou apds o seu término. Assim, pode muito bem ser que tenham um histérico anterior, que atravessem um process0-de desenvolvimento, que ‘Tepresentam unit ima manifestagdo inicial, ~~ Essa suspeita é confirmada pela anilise. A aplicagao Sistematica da andlise demonstra que as fantasias de espancamento tém um desenvolvimen- to histérico que nao é, de modo algum, simples, ¢ no decorre, mais de uma vez modificadas em muitos aspectos relagio com o autor da fantasia, e qu cado, Com a finalidade de tornar mais facil seguir essas transformagses nas fantasias de espancamento, devo arriscar-me agora a restringir as minhas descriges a casos femininos, os quais, sendo quatro contra dois, constituem de qualquer modo a maior parte do meu material. Ademais, as fantasias de espancamento nos homens estio ligadas a outra questo, que deixarei de lado neste artigo." Na minha descricdo, terei o cuidado de evitar ser mais esque- matico do que o inevitavel na apresentagio de um caso comum. Se entio, numa observagao posterior, vier a tona uma maior complexidade de circuns- JL 6 Sancias, estarei certo, ndo obstante, de termos diante de nés uma ocorréncia WA hy otipica e que, de mais a mais, nao é de natureza incomum. wf NS" A primeira fase das fantasias de espancamento nas meninas deve perten- K wy &cer, portanto, a um periodo muito primitivo da infancia. Alguns aspectos ‘XY’ permanecem curiosamente indefinidos, como se fossem uma questio de YL indiferenga. A escassa informago forecida pelas pacientes na sua primeira 9% afirmagao, ‘uma crianga é espancada’, parece justificar-se em relagiio a essa y fase. Um outro dos seus aspectos, porém, pode ser estabelecido com segu- ’ ranga, eno mesmo sentido, em todos os casos. A criangaem que esto batendo ndo é jamais a que cria a fantasia, mas, invariavelmente, outra crianga, com mais freqiiéncia um irmao ou uma irma, se existem. De vez que essa outra crianga pode ser um menino ou uma menina, nao ha relagao constante entre © sexo da crianga que cria a fantasia ¢ o daquela que estd sendo espancada. A fantasia, entdo, nao € certamente_masoquista. Seria tentador chamé-la Sadica, mas nao se pode esquecer 0 fato de que aci jue cria a fantasia nido € a que bate, A identidade real da pessoa que bate permanece obscura, ~Tinicialmente. adulto. Mais tatde, esse adulto “mente r econhecivel como o pai (da mgnina). t do qual sio — no que diz respeito & anto ao seu objeto, contetido e signifi- 1 [Na verdade, Freud expe adiante (pig. 201 ¢ segs.) as fantasias de espancamento nos homens. A base especificamente feminina das fantasias era, provavelmente, o que tinha em mente ao falar de ‘outra questdo’.] 200 Essa primcira fase da fantasia de es; representada pela frase ‘O meu pai est Pancamento é, portanto, inteiramente (a baten ‘On ratendo na crianga’. Estarei denu ciando uma grande parte do que ser4 exposto depois, quando, em lugar disso, disser: ‘O meu pai est batendo ni nco na crianga que ewoideta*. Pode-se, ad hesitar em dizer se as caracteristicas de™ fantasia’ atribuidas a esse primeiro passo no sentido de uma posterior fantasia de espancamento. E, talvez, antes uma Questo de recordagies de eventos que foram testemunhados, ou de desejos que despertam em varias ocasides. Essas duvidas, porém, nao sao importantes, Entre essa fase ¢ a seguinte, ocorrem profundas transformagises. E certo que @ pessoa que bate continua a ser a mesma (isto é, 0 Pai); mas a crianca em que esti batendo transformous el Se €m outra € torna-se, invariavelmente, aquela que produz a fantasia. A fantasia € acompanhada por um alto grau de " Prazer € adquire, ento, um contedido significalivo, a cuja origem nos dedi. _£aremos depois. Agora, portanto, as palavras seriam: “Extousendo espancada pelo meu pai.’ O que € de um carater inequivocamente-masoquista~ Essa segunda fase é a mais importante e a mais significativa de todas. Pode-se dizer, porém, que, num certo sentido, jamais teve existéncia real. Nunca é lembrada, jamais conseguiu tornar-se consciente. E uma construgao da andlise, mas nem por isso é menos uma necessidade. A terceira fase assemelha-se uma vez mais a primeira. Tem as palavras q ‘se n05 toraranr familiares por meio da afirmagio do paciente. A pescoa que bate nunca-€-o pai, mas sim, ou € deixada indeterminada tal como na primeira fase, ou se transforma irae: n substituto do pai, tal como um professor. A figura da crianca que cria a fantasia ndo mais aparece nesta. Em resposta as prementes Perguntas, as pacientes declaram apenas: ‘Provavelmente estou olhando.” Em vez de uma crianca sendo espancada, ha agora, via de regra, varias criancas presentes. Com maior freqiiéncia so meninos que esto sendo espancados (nas fantasias de meni- nas), mas nenhum deles é pessoalmente conhecido pela pessoa. A situacdo do espancamento, que originalmente era simples e monétona, pode passar Por alteracdes e elaboragdes as mais complicadas; castigos ¢ humilhacdes de Qutra natureza podem substituir_o proprio espan¢amento. A caracteristica essencial que distigue mesmo as mais simples fantasias dessa fase daquelas da primeira, e que estabelece a ligago com a fase intermediaria, é, contudo, a seguinte: a fantasia liga-se agora a uma forte e inequivoca excitacdo sexual, Proporcionando, assim, um meio para a satisfaco masturbadora. E precisa- mente isto, porém, que é desconcertante. Por que caminho a fantasia de meninos estranhos e desconhecidos sendo espancados (uma fantasia que, 201 i Nip pavers esuliar Ge mis mesmes 0 fito de cue as interrelanes 2 fantasia & PEnCamento, bem come todes 2s suas ininteli givers. fantasias de espancamento ¢ do qual so eoondadas. ela nos mostra a cunca envolvida nas ag; feigdes de mening esto fixadas no pai, ue provavelmente fez mda As sfeigses de mening asco fixadas ne pal, que provavelmente fez & © que potis pars conguIsEr os Sementes d¢ um Ver ts Chin = Senco, ear imipeto 2 uma ree Sedicasdo mie. Nio & ponim, com a relago entre a mening e mae GUE 2 fantasia de espancamento esti Higada, Hi outas criangs 3 volta, apenas alguns anos mais vethas ou mais novas, de quem no gosta por toda ape de motives, mas principalmente porque o amor dos pais tem de ser compar tilhado com elas, que, ademais, por essa razdo, so repelidas com toda a energia selvagem caracteristica da vida emocional nessa idade. Se a crianca €m questo é uma irmi ou irmio mais nove (como em tes dos meus quam, casos), € desprezada ¢ odiada: ainda assim atrai para si a parcela de azeigo que os cegos pais estio sempre prontos a dar ao cagula, e isto sum espeticulo Cuja visdo no pode ser evitada, Depressa se aprende gue sex espancado, © 2 gue sez espancado, © | mesmo gue nia dos mula signi un POS Saree ae Sees uns hum $30. E -muutas criangas. qué s® acreditavam: segurameni_eatenadas na “inabaldvel_afsigio dos pais, forum de um so golpe aeewNadas We todas os é ipoténcia imagingria. A idgia de o pat hatendo nessa odiesa Srianga_é, portanto, _agradavel, independent de ter sido realmente agindo i Sa_enlan¢ga, ama o da fantasia de espancamento n> /_sua_primeira_fase. A fantasia obvi iticao_ciume da ens / Sepende do lado-erstice-da sta-vidanmas é, também, podemsamente refor. cada pelos interesses egoistas da erianea. Resta, portanto, a davida quanto a ' 202 | saber sea fantasia pode ser descrita com: = 10 puramente * . arriscar-nos a chama-la de ‘s '¢_“sexual’, ou se podemos Como € sabido, todos 0 sinais sobre os quais nos basear as nossas distingSes, tendem a perder aclareza & medidy on cae nos aproximamos da fonte. Assim, talvez possamos diver eons were te recordam a profecia feita pelas Trés Feiticeiras a Banquo. “Nao clanren, te sexual, nem sddica, em si, mas ainda assim a natureza ratea ambos | os impulsos surgirio depois.’ Em todo caso, contudo, nio ha motives pare suspeitar de que nessa primeira fantasia jd esteja a servico de uma | excitago_que envolve os genitais e encontra saida por me eoceuma | | | 6 meio ti masturbatorio. de um ato ___E.claro que a vida sexual da crianga atingiu 0 estadio de organizacao. _genital, agora que 0 Seu amor incestuos0 Conseguiw-essa prematura esco- Tha de objeto. Isto pode ser demonstrado mais facilmente no-caso de meninos, é, Contudo, também indiscutivel no caso de meninas. Algo como uma premonigao do que sao, depois, os objetivos sexuais normais e finais, governa as tendéncias libidinais da crianga. Podemo-nos perguntar, com razdo, por que tem de ser assim; porém, podemios considera-lo prova do fato de que os genitais ja comegaram a desempenhar_o seu_papel_no processo_de excitagio. Nos meninos, 0 desejo dé procriar um filho, com a mie, jamais est ausente; nas meninas, 0 desejo de obter uma crianca do pai € igualmente constante; € isto, apesar de serem inteiramente incapazes de formar qualquer idéia clara da maneira de realizarem esses desejos. A crianga parece estar convencida de que 0s genitais tém algo-a -vercom 0 assunto, muito embora, em suas constantes cogitagdes, pos procurar peta esséncia da presumida intimidade emitre os pais em relagdes de outra espécie, tais como no fato de dormirem juntos, de urinarem-na presenca um do outro etc,; ¢ 0 material desse ultime tipa pode ser mais facilmente_apreendido em imagens verbais, do que 0 mistério queesta relacionado com os genitais. ~ ~~ Mas chega a época em que esse florescimento prematuro € estragado pela-geataNenhum desses amores incestuosos pode evitar o destino da “tepressio, Podem sucumbir a ela por ocasiio da descoberta de algum “Svento éxterno que leva a desiluso — tal como o desprezo inesperado, © indesejado nascimento de um novo irmao ou irma (que € sentido come uma infidelidade) etc.; ou pode acontecer a mesma coisa devido a condi- des internas alheias a tais eventos, talvez simplesmente porque o anscio permaneceu por muito tempo insatisfeito. E inquestionavelmente certo que tais eventos nao sfo as causas efetivas, mas sim, que esses casos de { 203 Aaoee: amor esto de nados a fracas. Ss cedo ov : 4 inados a fhicassar, mats cedo ow mais tarde, embora nao possamos dizer qual o obsticulo especiticw. O mais provavel ¢ que eles passem, porque © sew periods acabou, porque as eriangas ingressaram a par Incestvosa, tal como, numa etapa anterior, foram obri ma nova fase de desenvelyimento, na qual sho compelidas a recapitular ir da historia da humanidade, a repressio de uma escotha objetal adas a efetuar uma ssa mesma natureza.’ Na nova fase, nenhum produto escotha objetal di mental dos impulsos de amor incestuosos que esteja inconscientemente presente € assumido pela conscigneia: ¢ nada que pi tenha aleangado a Sacia é dela expulso. Ao mesmo tempo em que ocerre esse processo le € também de origem conse de repressdo, surge um sentimento de culpa. desconheeida, mas nio ha diivida de que, por qualquer que seja, esti stuosos e justificada pela persisténcia desses dese- hgada aos desejos ine no inconsciente.? A fantasia do periodo de amor incestuoso havia dito: ‘Ele (0 meu pai) soamaamim,¢ nao a outra crianga, pois esta batendo nela.” O sentimento de culpa ndo pode descobrir um castigo mais severo do que a inversio desse triun Nao, ele ndo ama voces, pois esta batendo em voce.” Desse modo, a fantasia da segunda fase, a de ser espaneada pelo pai, & uma expressio direta do sentimento de culpa da menina, ao qual o scu amor pelo pai sucumbiu agora. A fantasia, portanto, tornou-se masoquista. Até onde sei, é sempre assim; um sentimento de culpa é invariavelmente 0 fator que converte o sadismo em masoquismo. Certamente, porém, nio é este o contetido total do masoquismo. O sentimento de culpa nao pode ter conquistado o campo sozinho; uma parcela deve ser atribuida ao impulso de amor. Devemo-nos lembrar de que estamos lidando com criangas cujo componente sadico conseguiu, por motivos constitucionais, desenvolver- se prematura e isoladamente. E preciso nio abandonar esse ponto de vista. exatamente essas criangas que acham particularmente facil voltar 4 organizagao pré-genital, anal-sddica, da vida sexual. Se a organizagio genital, que mal conseguiu firmar-se, defronta-se com repressio, a con- seqiiéncia ndo é apenas a de que toda representacao psiquica do amor incestuoso se torna inconsciente, ou permanece inconsciente, mas existe também outro resultado: um rebaixamento regressivo da propria organi- jo: 1 Compare-se 0 papel descmpenhado pelo Destino no mito de Edipo. 2 [Nota de rodapé acrescentada em 1924: Ver a continuagio dessa linha de pensamento em *A Dissolucdo do Complexo de Edipo’ (1924d). 204 _ — amen zagdo genital para um nivel mais baixo. ‘9 expressar wm sentido genital; devido a Tegress: par esti me batendo (estou sendo €spancado pelo meu : espaneadg € agora wma convergéncia do sentimereg ne esac sevnal, Mo é apenas o castigo pela relaca ulpa ¢ do amor » substituto regressive daquel ercitayio libidinal que se liga escoamento em atos m Meu pai me ama’ queria #40, COnverte-se em ‘O. meu ag ! proibida, mas também ssa ultima fonte deriva a a fantasia a Partir de ent: ; f ao, € que encontra asturbatorios. Aqui temos, Pela primeira vez, a mo, . esséneia do masoquii pelas mies dos colegas ou outras mulh jeres que, de alguma forma, se ssemelhavam a ela. Nao nos devemos esquecer de que, quando a fantasia incestuosa de um menino se converte na fantasia masoquista correspon- dente, ocorreu uma inversio a mais do que no caso de uma menina, ou A, a substituigao da atividade pela passividade; e esse grau adicional de distor¢do pode salvar a fantasia de ter que permanecer inconsciente, em conseqiiéncia da repressiio. Dessa maneira, o sentimento de culpa seria satisfeito pela regressdio, em vez de o ser pela repressio. Nos casos femininos, 0 sentimento de culpa, em si talvez mais preciso, s6 podia ser apaziguado por uma combinagio das duas. Em dois dos meus quatro casos femininos, uma elaborada superestrutura de devaneios, que era de grande significado para a vida da pessoa em questo, desenvolvera-se sobre a fantasia masoquista de €spancamento. A fungao dessa superestrutura era tornar possivel um sentimento de excitaco satisfei- ta, mesmo que houvesse abstengio do ato masturbatério. Em um desses casos, permitia-se que 0 contetido — ser espancado pelo pai — se arriscasse outra vez pela consciéncia, na medida em que 0 proprio ego do sujeito se tornasse irreconhecivel por meio de um pobre disfarce. O herdi dessas historias era invariavelmente espancado (ou, depois, apenas punido, humi- Ihado etc.) pelo seu pai. Repito, no entanto, que a fantasia, via de Tegra, ermanece incon a ae © S60 pode ser reconstruida no decorrer da anilise. Esse fato i Ne a sui Os pacientes que dizem lembrar-se de que, para eles, a masturba¢! 205 antes da terceira fase da fantasia de espancamento (0 que sera discutido adiante), e que essa fase era apenas uma adi¢ao posterior, feita talvez sob a impressio das cenas na escola, Toda vez que dei crédito a essas afirmagoes, senti-me inclinado a presumir que a masturbagio estava, inicialmente, sob 0 dominio das fantasias inconscientes e que as conscientes s6 as substituiram depois. Considero a fantasia de espancamento, na sua terceira fase, que € a mais familiar e é a sua forma final, um substituto desse tipo. Aqui a crianga que cria a fantasia aparece quase como um espectador, ao passo que 0 pai persiste, sob a forma de um professor ou qualquer outra autoridade. A fantasia, que entio se assemelha a da primeira fase, parece haver-se tomado, uma vez mais, sddica. E como que se na frase ‘O meu pai esta batendo na crianga, ele s6 ama a mim’, a énfase tenha-se deslocado para a primeira parte, depois que a segunda sofreu repressio. Contudo, apenas a forma dessa fantasia é sAdica; a satisfagao que deriva assumiu a catexia libidinal da porgao reprimida e, ao mesmo tempo, 0 sentimento de culpa que esta ligado ao contetido daquela porgiio. Todas as criangas niio especificadas, que esto sendo espancadas pelo professor, afinal de contas, nada mais sio do que substitutos da propria crianga. Também pela primeira vez encontramos aqui algo como uma cons- tancia do sexo nas pessoas que desempenham um papel na fantasia. As criangas que estZo sendo espancadas sao quase invariavelmente meninos, tanto nas fantasias destes, quanto nas das meninas. Essa caracteristica nao deve ser naturalmente explicada por qualquer rivalidade entre os sexos, como se nas fantasias dos meninos devessem as meninas ser espancadas; e nada tem a ver com o sexo da crianga que era odiada na primeira fase. No entanto, tal caracteristica assinala uma complicagao no caso de meni- nas. Quando elas se afastam do amor incestuoso pelo pai, com o seu significado genital, abandonam com facilidade o papel feminino. Poem em atividade o seu ‘complexo de masculinidade’ (Van Ophuijsen [1917]) €, a partir de entdo, querem apenas ser meninos. Por esse motivo, os bodes expiatérios que as representam sio também meninos. Em ambos 0s casos de devaneio — um dos quais quase se elevou ao nivel de uma obra de arte — os herdis eram sempre rapazes; na verdade as mulheres ndo costuma- vam, absolutamente, surgir nessas criagdes e s6 fizeram a primeira apari- ¢ao depois de muitos anos, e, ainda assim, em papéis de menor importancia. 206 aii ervagoes Podem ser utilizadas em Rénese das perversdes em geral e do ar © papel desempenhado pela dife- varios sentidos: para esclarecimento da masoquismo em particular, e para avali renga de sexo na dindmica da neurose, O resultado mais ébvio de tal discussio € a sua aplicacdo a origem das perversdes. O ponto de vista que trouxe Para primeiro plano, a esse respeito, o reforgo constitucional ou 0 crescimento te sexual, na verdade nao esta abal. a Verdade. A perversion Prematuro de um unico componen- lado: mas verifica-se que no abrange toda 0 mais é um fato isolado na vida sexual da crianga, mas encontra 0 seu lugar entre os processos tipicos, para ndo dizer normais, de desenvolvimento que nos sio familiares. E levada a uma relagdo com 0 objeto de amor incestuoso da crianga, com o seu complexo de Edipo. Destaca-se, de inicio, na esfera desse complexo; € depois que 0 complexo sucumbiu, permanece, quase sempre por si, como herdeiro da carga de libido daqucle complexo, oprimido pelo sentimento de culpa ligado a ele. A constituigéo sexual anormal, finalmente, mostrou a sua forga impondo ao complexo de Edipo uma determinada ditey3o ¢ compelindo-o a deixar para tris um residuo incomum Uma perversao na infancia, como € sabido, pode tornar-se a base para a construgdo de uma perversdo que tenha um sentido similar e que persista por toda a vida, uma perversio que consuma toda a vida sexual do sujcito, Por outro lado, a perversio pode ser interrompida e perma- necer ao fundo de um desenvolvimento sexual normal, do qual, no entinto, continua a retrar uma determinada quantidade de energia. A primeira dessas alternativas j4 era conhecida antes da era da andlise. Contudo, a investigagio analitica de casos io plenamente desenvolvi- dos praticamente cobre a lacuna entre as duas. Pois descobrimos muitas Vezes que esses pervertidos também fazem uma tentativa para desen- Volver uma atividade sexual normal, geralmente durante a puberdade, Mas a tentativa no tinha forga suficiente € foi abandonada diante dos obstaculos que inevitavelmente se levantam, apés-o que voltam a fixa- io infantil de uma vez por todas. 207 ; Naturalmente seria importante Saber se a origem das Perversies infantis a partir do complexo de Edipo pode ser afirmada come urs prinefpio geral. Embora isto ndo possa ser resolvido sem mais investiga, des, ndo parece impossivel. Quando nos lembramos das anamneses que foram obtidas em casos de perversdo em adultos, nao podemos deixar de notar que a impressio decisiva, a ‘primeira experiéncia’, de todos os pervertidos, fetichistas etc. dificilmente se refere a um periodo anterior ao sexto ano de vida. Nessa época, no entanto, o dominio do complexo de Edipo ja cessou; a experiéncia que é recordada, e que foi efetiva de modo tio desconcertante, pode muito bem representar 0 legado daquele com. plexo. As ligagées entre a experiéncia ¢ 0 complexo, que por essa época esta reprimido, estdo destinadas a permanecer obscuras na medida em que a analise nao esclarece o periodo anterior a primeira impressdo ‘patogé- nica’. De modo que se pode imaginar como é pequeno o valor que se deve atribuir, por exemplo, a uma afirmagiio de que um caso de homossexua- lismo é congénito, quando o motivo dado para se acreditar que 0 seja é que, desde os seis ou os oito anos, a pessoa em questdo sé sentiu inclinagdes para o seu proprio sexo. . Se, no entanto, a derivagao das perversées a partir do complexo de Edipo pode ser estabelecida de modo geral, a nossa estimativa quanto A sua importancia terd adquirido fora adicional. Porque, na nossa opiniao, o complexo de Edipo é 0 verdadeiro nucleo das neuroses e a sexualidade infantil que culmina nesse complexo é que determina real- mente as neuroses. O que resta do complexo no inconsciente representa a inclinagio para o posterior desenvolvimento de neuroses no adulto. Dessa forma, a fantasia de espancamento ¢ outras fixagdes perversas andlogas também seriam apenas residuos do complexo de Edipo, cica- trizes, por assim dizer, deixadas pelo processo que terminou, tal como 0 notério ‘sentimento de inferioridade’ corresponde a uma cicatriz narcisica do mesmo tipo. Ao assumir esse ponto de vista do assunto, devo dizer que concordo sem reservas com Marcinowski (1918), que recentemente o expés de modo mais feliz. Como é sabido, esse delirio neurético de inferioridade é apenas parcial e inteiramente compativel com a existéncia de uma superautovalorizagao derivada de outras fon- tes. A origem do préprio complexo de Edipo e do destino que compele o homem, provavelmente sozinho entre todos os animais, a iniciar duas vezes a sua vida sexual, primeiro, como todas as criaturas, na primitiva infancia, e depois, apés uma longa interrupgao, uma vez mais na puber- dade — todos os problemas ligados a ‘heranga arcaica’ do homem —, 208 ja foram por mim debatidos em outra Parte, ¢ ndo tenho intencio de adentrar-me neles, neste artigo.' aie A nossa exposigio da fantasia de Espancamento pouco esclareceu a génese do masoquismo, Para comegar, parece hav, : de vista de que 0 Masoquismo nio é a manifestag: sc origina do sadismo que foi volt et confirmagao do ponto 410 de um instinto primario, ado contra 0 eu (self) meio de regressio de um objeto para o ego.? Pode-se ter com instintes com propésito passiv — 0u seja, por No certo que os ‘0 existem, particularmente entre as mulheres. A passividade, contudo, nao € a totalidade do masoquismo. A caracteristica do desprazer também pertence a ele — um desconcertante acompanhamento para a satisfagdo de um instinto, A transformagio do sadismo em masoquis- mo parece dever-ser a influéncia do sentimento de culpa que participa do ato de repressio. Assim, a repressio opera, aqui, de trés modos: torna incons- cientes as conseqiiéncias da organizacao genital, obriga essa organizagio a regredir ao anterior estadio sadico-anal e transforma o sadismo desse estidio em masoquismo, que é passivo € novamente, num certo sentido, narcisico. O segundo desses trés efeitos torna-se possivel pela fraqueza da organizagiio genital, que deve ser pressuposta em tais casos. O terceiro torna-se necessario porque 0 sentimento de culpa faz tantas objecdes ao sadismo, como a escolha objetal incestuosa, genitalmente concebida. Mais uma vez, a andlise nao nos fornece a origem no proprio sentimento de culpa. Parece ser trazido pela nova fase em que a crianca ingressa e, se persiste depois, parece corresponder a uma formago semelhante a uma cicatriz, como a do sentimento de inferio- ridade. De acordo com a nossa orientagio atual na estrutura do ego, que ainda é incerta, deviamos atribui-lo a instancia mental que se instala como uma consciéncia critica sobre o resto do ego, que produz o fenémeno funcional de Silberer [1910] nos sonhos e que se desprende do ego nos delirios de observacio. - Também podemos notar, de passagem, que a anilise da perversio infantil tratada aqui ¢ igualmente de grande ajuda na solugdo de um velho n suas Conferencias 1 [Freud havia discutido amplamente essas questdes, pouco tempo antes, em aaa (1916-17) asticularmente nas Conferéncias XXle XXII. Cf. também adiante, Ors ‘pio de Prazer (19208). Cros ime suas Vicissitudes’ (1915c). — [Em Além do Principi ede Precee (17208) Edicao Standard Brasileira, Vol. XVIII, pags. 74-5, pace a 5 que poderia haver, afinal de contas, um masoquismo primério) sg 3 [Ver a Pane III do artigo de Freud sobre o narcisismo (1914¢), Sn 5 descrita mais tarde como ‘superego’. Cf. o Capitulo Ill de O Ego €0 ld ( . enigma — enigma que, na vendade, sempre perturbou aqueles que nao aceitaram a psicanilise mais do que accitaram os proprios analistas, Isto, ainda que, reventemente, até mesmo Bleuler (1913. Cf. Edigio Standard Brasileira, Vol. VU, pag. 185 n., IMAGO Editora, 1972] tenha considerado importante ¢ inexplicivel o fato de que os neurdticos fazem da masturbagio © ponto central do seu sentimento de culpa, Ha muito presumimos que esse sentimento de culpa se relaciona com a masturbagio da primitiva infiincia, ¢ nao com a da puberdade; e que, no essencial, deve-se liga-lo no com o ato da masturbagiio, mas sim com a fantasia que, embora inconsciente, esta na sua raiz — ou seja, com o complexo de Edipo.' No que diz respeito a terveira fase da fantasia de espancamento, aparen- temente sadica, j expus [pigs. 206] 0 significado que cla adquire como veiculo da excitac3o que impele a masturbagdo; e demonstrei como desperta atividades da imaginagao que, por um lado, prosseguem a fantasia ao longo da mesma linha, e, por outro, a neutralizam através da compensacio. Nio obstante, a segunda fase, a fase inconsciente e masoquista, € incomparavel- mente a mais importante. Nio apenas porque continua a operar através da instancia da fase que toma o seu lugar; podemos também detectar efeitos sobre 0 carater, derivados diretamente da sua forma inconsciente. Pessoas que abrigam fantasias dessa espécie, desenvolvem uma sensibilidade e uma irritabilidade especial contra quem quer que possam incluir na categoria de ‘pai’. Sao facilmente ofendidas por uma pessoa assim e, desse modo (para sua propria tristeza), efetuam a realizado da situag’o imaginada de serem espancadas pelo pai. Nao me surpreenderia se algum dia fosse possivel provar que a mesma fantasia é a base do delirante espirito litigioso da paranéia. Vi Teria sido impossivel dar uma visio clara das fantasias infantis de espancamento, se nao me houvesse limitado, exceto em uma ou duas relagoes, 4 situago feminina. Recapitularei rapidamente as minhas conclusdes. A fantasia de espancamento da menina passa por trés fases, das quais a primeira © terceira sdo lembradas conscientemente, ao passo que a do meio perma- nece inconsciente. As duas fases conscientes parecem ser sddicas, enquanto 1 [Ver, por exemplo, o que esté exposto no caso clinico do ‘Rat Man’ (1909d), Standard Ed., 10, 202 e segs.) 210 segunda, a inconsci ir i ae Soe € indubitavelmente de natureza my, e i i ™ Ser a crianga espancada pelo pai, e far ¢ acompanhar de uma carga libidinal e de um Sentimento de culpa, N fantasia, a criangaem que esto batendo é valguemanentecae que a imaging na fase ten eee sempre asm que no sea uel : S na, € sempre a propria criang: _ n a crianga; na terceira e sempre Meninos que esto sendo espane: bate é, a partir da primeira, 0 Pai, substituido. categoria patet fantasia i ‘ categori a a ema A fantasia Iconsciente da fase média tinha primariamente um ee icado genital e evoluiu, por mcio da Tepressio ¢ da regressio, de m des ces! i , ; um aie incestuoso de ser amada pelo pai. Um outro fato, ainda que parega a0 ter liga¢ao mais estreita com o Testo, € que entre a segunda e a terceira fase ina e i i i as meninas mudam de sexo, pois nas fantasias da Ultima fase transfor- mam-se em meninos. Nao consegui progredir tanto no meu conhecimento das fantasias de espancamento nos meninos, talvez porque o meu material nao era favoravel, Esperava, naturalmente, encontrar uma analogia completa entre a situagao no caso dos meninos e no das meninas, em que a mie toma o lugar do pai na fantasia. Essa expectativa parecia confirmar-se, pois 0 contetido da fan masculina que seria tomado como correspondente era, na verdade, o de ser espancado pela mie (ou, mais tarde, por uma substituta dela). Entretanto, e: fantasia, na qual o proprio eu (se/f) do menino era mantido como a Pessoa que estava sendo espancada, diferia da segunda fase das meninas porque conseguia tornar-se consciente. Se, por causa disso, tentarmos, no entanto, tracar um paralelo entre ela ¢ a ferceira fase da fantasia feminina, encontra- remos uma nova diferenga, pois a figura do proprio menino nio é substituida por um numero de criangas desconhecidas e indeterminadas, menos ainda por uma série de meninas. Portanto, era enganosa a expectativa de haver um paralelo completo. Os meus casos masculinos com uma fantasia infantil de espancamento eram apenas uns poucos pacientes que nao exibiam qualquer outro dano grave nas atividades sexuais; inclufam também um grande nimero de pessoas que teriam que ser descritas como auténticos masoquistas, no sentido de serem pervertidos sexuais. Ou eram pessoas que obtinham sal 0 sexual exclu sivamente pela masturbagdo acompanhada de fantasi mrasoquistas; ou cram pessoas que haviam conseguido combinar 0 masoquismo coma sua atividade genital, de tal modo que, paralclamente a experiducias nasoquistas € sob condigdes semelhantes, conseguiram chegar a eregiio e ejaculagio, ou levar acabo uma relagéo normal. Além desses, haviao caso mais raro em. que um masoquista é perturbado nas suas atividades pervertidas pelo aparecimento Oquista; seu dos. A pessoa que depois por alguém escolhido na Qu de idéias obsessivas de intensidade insuportavel. Entretanto, os pervertidos que conseguem obter satisfacdo raramente tém ocasiao de procurar analista, No que diz respeito, porém, as trés categorias de masoquistas que foram mencionadas, pode haver fortes motivos para induzi-los a ir a um analista, 0 masturbador masoquista descobre que é absolutamente impotente se, afinal, tenta manter relagdes com uma mulher; ¢ o homem que sempre efetuou a relacdio com o auxilio de uma idéia ou uma proeza masoquista, faz, de repente, a descoberta de que a alianga que cra tio conveniente para ele ndo mais funciona, de que scus drgdos genitais deixaram de reagir ao estimulo maso- quista, Estamos acostumados a prometer confiantemente a recuperacao aos pacientes psiquicamente impotentes que nos procuram para tratamento; mas deveriamos ser mais precavidos ao fazer esse prognéstico, na medida em que a dinamica do distirbio nos € desconhecida. E uma surpresa desagradavel se a andlise revela que a causa da impoténcia ‘meramente psiquica’ é uma atitude tipicamente masoquista, talvez profundamente arraigada desde a infancia. No que concerne aos masoquistas do sexo masculino, no entanto, uma descoberta nos adverte para nao mais seguirmos a analogia entre 0 caso destes ¢ 0 das mulheres, mas para julga-los independentemente. A razio é que emerge o fato de que, nas suas fantasias masoquistas, bem como nos artificios que utilizam para a realizagio destas, eles invariavelmente se transferem para 0 papel de uma mulher; ou seja, a sua atitude masoquista coincide com uma. atitude feminina. Isto pode ser facilmente demonstrado a partir de detalhes das fantasias; muitos pacientes, porém, estao, eles proprios, cénscios desse fato e dio-Ihe expressao como convicgao subjetiva. Nao faz diferenga se, num embelezamento fantasioso da cena masoquista, eles sustentam a ficgdo de que um menino malvado, ou um pajem, ou um aprendiz, vai ser castigado. Por outro lado, as pessoas que aplicam o castigo séo sempre mulheres, nas fantasias como nos desempenhos. Isto é bastante confuso; e outra questo que deve ser colocada é saber se essa atitude feminina ja forma a base do elemento masoquista na fantasia de espancamento infantil.' Deixemos, portanto, de lado as consideragées sobre a situagdo em casos de masoquismo adulto, que é tao dificil de esclarecer, e voltemos a fantasia de espancamento infantil no sexo masculino. A andlise dos primeiros anos da infancia uma vez mais permite-nos fazer uma descoberta surpreendente 1 [Nota acrescentada em 1924:] Mais observacies sobre este tema serdo encontradas em ‘O Problema Econémico do Masoquismo’ (1924c). 212 cado pelo meu pai we enTaa, Na verdade, a Segunda fase familiar ” Esse estadio preliminar e \ da fantasia na menina. A €consciente, ‘Estou sendo espancado pela minha mae’, toma nal na sua existéncia, pois vejo pi com Upos mais complicados. antasia masculina— como a chamarei sumariamente e, espero, sem seer sco de ser mal interpretado — o ser espancado também significa © (Gum sentido genital), embora rebaixado a um nivel inferior, por Tegress3o, De maneira que a forma original da fantasia masculina t2 N30 era a que demos Provisoriamente até aqui, ‘Estou sendo ) pelo meu pai’, mas, antes, ‘Sou amado pelo meu pai.” A fantasia “ormada, por processos que nos so familiares, em fantasia conscien- Estou sendo espancado pela minha mae’. A fantasia de espancamento SO menino é portanto, passiva desde o comego e deriva de uma atitude 2 em relac3o ao pai. Corresponde ao complexo de Edipo tal como a mina (a da menina); apenas a relagao paralela que esperavamos rontamente a possibilidade de encontrar entre as duas, deve ser abandonada em favor de um carater comum ongem numa ligacdo incestuosa com o pai.' Ajudard a tornar as coisas mais claras se, nesse ponto, enumero as demais milaridades e diferengas entre as fantasias de espancamento em ambos os s2xos. No caso da menina, a fantasia masoquista inconsciente parte da atitude edipiana normal; no caso do menino, parte da atitude invertida, na qual o pai € tomado como objeto de amor. No caso da menina, a fantasia tem um estadio preliminar (a primeira fase), no qual o espancamento nao tem um significado especial e é feito sobre uma pessoa vista com rancor ciumento. Ambos esses aspectos estdo ausentes no caso do menino, mas essa diferenga particular é uma das que poderiam ser removidas por uma observacao mais afortunada. 1 [Uma fantasia de espancamento desempenha um pequeno papel na andlise do ‘Homem dos {Ur Lobos’ (1918h). Ver pags. 7€ 97. 213

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