0 notas 0% acharam este documento útil (0 voto) 168 visualizações 46 páginas Caderno de Migração - Ocupação Do Paraná
WESTPHALEN, Cecília Maria; MACHADO, Brasil Pinheiro; BALHANA, Altiva
Pilatti. Nota prévia ao estudo da ocupação da terra no Paraná moderno. In:
Centro De Estudos Migratórios. Ocupação do Paraná. São Paulo: AGEN,
1988. (Série Cadernos de Migração, v. 3) 45 p. [Republicação na íntegra do
Boletim nº 7, do Departamento de História da Universidade Federal do
Paraná, de setembro de 1968].
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Gab PRESENTAGAO
‘Quando othamos para 0 que ocorre hoje
nas dreas de fronteira agricola, o que salta @
vista?
De um lado, levas de migrantes ruman-
do em sua direcao; constantes e graves confli-
10s entre posseiros, fazendeiros e grileiros; 0
desfile de jaguncos fortemente armados: a in-
xeréncia policial na defesa do latifindio.
impunidade da lei; ¢, por iltimo, wn intransi-
gente ‘Nao!" a qualquer possibilidade de im-
Plantagao de wna Reforma Agréria.
De outro lado, registra-se a existéncia
de grupos de posseiros que, apés duro e firme
combate, conquistam para suas familias 0
legttimo direito a terra.
Mas a histéria ndo acaba at. Logo a se~
uir recomeca 0 proceso de reconcentracao
da terra
© Parand, dentro de sua especificidade,
é wm exemplo pico disso. Este Estado, que
durante tres décadas recebeu significativos
contingentes populacionais, onde a luta pela
terra desencadeou uma verdadeira insur
reigdo, na década de 70 expulsou nada menos
que 1.201.475 migrantes.
Até quando serd 0 Brasil palco de seme-
thante situagao?
A
deste trabalho objetiva
trazer tona a lua travada pelos migrantes
durante 0 processo de ocupacéo da fronteira
Paranaense.
Recuperar a meméria histérica é wna
forma de lancar alicerce para a construgao
do novo.
ce. Rendon
(Centro de Estudos Migratérios —»
-03-
2
29/04/2004gO
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Sa!
£,
INTRODUCAO
o
Bomunidade que historicamente'se formou no ltoral paranaense © no pla-
curitibano, ocupou todas as terras de campo que, em largas faixas cercadas
por imensas florestas, vio desde Curitiba, pelos Campos Gerais, campos de Gua-
rapuava, campos de Palmas, até as atuais divisas entre Santa Catarina e Rio Gran-
de do Sul. Explorou ervais ¢ as florestas de araucérias a clas associados Baseade
‘nos latifiindios campeiros da cringio do gado, nos engenhos de beneficiar erva-
mate, nas serrarias de pinheiros, formou a sociedade paranaense tradicional que
ccriou o sistema da Provincia monérquica ¢ do Estado republican. Mas nio che-
g0u a ocupar todo 0 territério do Parand.
As terras cobertas de florestas que sio as terras de melhor qualidade para a
agricultura, © que se estendiam pela maior parte do territ6rio paranaense, ocupan-
do os vales do Paranapanema, ido Parand, do Ivaf, do Iguacu, no foram aprovei-
tadas por essa comunidade, cuja expansio, até 0 século XX, realizou-se pelas
freas de campos naturais. Os campos, sobretudo os Campos Gerais, tinham sido
fea predominante na estrutura social ¢ econdmica, mas essa estrutura se estava
desagregando ¢, desde o final do século XIX, outras regides do Estado estavam
iniciando a sua ascengio dentro de novas estruturas que comecam a se formar.
34, em 1892, na Mensagem ao Legislativo Estadual, o Presidente do Estado
do Parand, pedia a0 Congresso uma lei de terras que pudesse previnir a invaséo
dos fazendeiros paulistas, plantadores de café, em plena expansio no vale do Pa-
ranapanema, cujas terras eram “tio ambicionadas pelos minciros ¢ paulistas © que,
‘Por estes ‘itimos cram consideradas, para a cultura do café, como prolongamento
do textit6rio do seu Estado”(|).
Desde 1862, a vanguarda de mineiros paulistas penetrara no Norte do Pa-
rand, pela regio hoje denominada Norte Velho, fundando fazendas e criando ci-
dades, nos vales do Paranapanema, do Cinzas e do Jataf. Af apareceram as cidades
de Tomazina, Colénia Mineira (hoje Siqueira Campos) ¢ Jacarezinho, a qual, de-
pois de 1910, se tomou 0 centro da regio. A ocupacio dessa area se estende até
‘as margens do Tibagi e se completa no decénio de 1920.
‘A qualidade das terras ¢ as perspectivas de lucro atrafram colonizadores
colonos também para a margem esquerda do Tibagi. Primeiro de Maio © Sertané-
polis foram iniciativas de éxito, contratadas ambas, em 1919, respectivamente pe-
las companhias colonizadoras Corain ¢ Cia., ¢ Leopoldo de Paula Vieira, Em
1924, Lord Lovat, que tinha promovido colonizagio agricola na Austrélia © na
‘Africa, e integrants da Missio Montagu vinda ao Brasil, visitou a regio do Norte
do Parané, contratando, em 1927, com o Governo do Estado, a aquisicdo de cerca
de 500,000 alqueires das melhores terras, situadas entre os rios Paranapanema,
‘Tibagi e Ivaf. Estas terras eram jé disputadas por antigos concessionérios ¢ po:
ros, @ quem a nova companhia compraria antes os titulos discutidos e as posses
ccontestadas.
Fundara, em Londres, em 1925, a Parand Plantations Limited e, em consér-
cio com a Companhia de Terras Norte do Parané e com a Companhia Ferrovidria
Sao Paulo-Paran, executou o plano de colonizacéo das terras obtidas do Governo
paranaense. Foram estas planificadamente divididas em lotes agricolas, construiu-
4.se a estrada de ferro e fundaram-se cidades, entre as quais sobressaem as de Lon-
drina, centro da regio chamada do Norte Novo, fundada em 1931, e Maringé,
fundada em 1947.
Vieram colonos de todo 0 Brasil, desenvolvendo grande riqueza agricola
que, embora tivesse seu ponto de apoio na cultura cafeeira, expandiv-se com a pe-
quena propriedade e com a policultura. O gedgrafo Pierre Monbeig, estudando a
colonizacao do Norte do Parané, em face da colonizagio do Oeste de Séo Paulo,
‘acsimn caencterizou/aquola:i£“G tamnbéen use colodinaylo =o une We feaho‘alire:
dores ou de associagdes de familias ~ mas do tipo de economia capitalista modex-
na’’(2),
Mais além das terras da Companhia de Terras Norte do Parané, 0 Governo
do Estado, desde década de 1930, numa acidentada agao contra os grileiros e os
intrusos, dividiu o seu imenso patriménio de terras devolutas, na regio do cha-
mado Norte Novissimo, promovendo também a colonizagio pela venda de lotes
agricolas. A cidade de Paranaval, a partir de 1944, polarizaria esta regio. Outro
acontecimento de relevaincia era notado também a partir da década de 1920. Na
Mensagem de 1922, ao Legislativo Estadual, 0 Presidente do Estado informava:
“Mais de quinhentas familias oriundas do Rio Grande do Sul ¢ Estados limitrofes,
‘tém se estabelecido nestes Gltimos tempos em terras do nosso Estado, principal-
‘mente nos municfpios de Palmas e Foz. do Iguagu..."(3).
‘Comegara outro processo de deslocamento de populagdes em diregio as ter-
ras do Parané. Os rio-grandenses do sul, expelidos de suas terras agricolas, pelo
minifiindio, iniciavam a ocupagio efetiva das terras do Sudoeste e Oeste do Pa-
rand.
(© principal negécio sobre que se apoiavam os alicerces da economia da
Provincia, a exportagéo da erva-mate ¢ 0 iniciar da inddstria da madeira, esta na
década de 1880, havia, desde 0 final do século, chamado a atengo para as matas
da regio do Iguagu e do Parans.
‘A conjuntura favorecia, nessas éreas, um tipo de ocupagio extensiva, rare-
feita, pela concessio de grandes tratos de terras devolutas, pelo Governo do Esta-
do, & companhias particulares, exploradoras do mate e da madeira, sem quaisquer
ligag6es com a comunidade tradicional paranaense ¢ sem a efetiva colonizacio do
tertitério concedido.
De outro lado, col6nias militares, de nacionais, haviam, ainda no século
XIX, sido fundadas, Iguacu e Chopim, face aos problemas de fronteiras princi-
palmente com a Argentina. Esta, entre outras razdes, objetivaria também a posse
dos imensos éervais nativos da regio.
is e as madeiras do Iguacu e do Parand haviam sido objeto de maior
conhecimento e divulgagao ao tempo da guerra do Paraguai, em virtude das pene-
tragées militares ocorridas.. Muitos, sobretudo argentinos, voltariam mais tarde &
regio.
‘A aco, porém, das companhias foi tipicamente de explotaglo, depredat6ria
espotiadora. Eram, via de regra, companhias estrangeiras, inglesas ou argenti-
nas. Muitas, nem sequer tentaram a colonizagio, como no caso das concessGes fei-
tas & Estrada de Ferro Sao Paulo-Rio Grande, em troca da construgéo da ferrovia,
€ que somavam milhdes de hectares no Sudoeste, Oeste ¢ Noroeste do Parand, su-
cedida, em 1920, pela Companhia Brasileira de Viagéo ¢ Comércio - Braviaco.
‘Outras, apenas se dedicaram extragdo da erva e da madeira. Devastaram, com
-05suas obrages, a floresta, retirando-the as madeiras de lei que, pelo rio Parané,
‘eram exportadas para a Argentina, além de arrasarem 0s ervais, com a exportacio
do mate, também para a Argentina. Acresce o fato que, muitas vezes, tanto 0 ma-
te, como a madeira, eram simplesmente contrabandeados.
Entre as grandes companhias da régio, nessa conjuntura, podem ser citadas,
‘4 Compatiia Maderas del Alto Parana © a Companhia Matte Laranjeiras, aquela
proprietéria da Fazenda Britinia, e esta da drea entre porto Mendes ¢ porto Guai-
ra, © da respectiva estrada de ferro que ligava os dois pontos do rio Parand. Os
trabalhadores da mata, geralmente brasileiros e paraguaios, empregados dessas ri-
‘cas companhias, viviam, no entanto, em condigées de miséria e exploracio, trans-
formados em verdadeiros servos de gleba. Os mensu de Don Allica, proprictério
do porto Artaza € de extensos ervais, foram os mais conhecidos pelas brutalidades
‘a que eram submetidos pelos feitores. A miséria e as atrocidades suportadas pelos
trabalhadores da mata, a depredacdo que sofria 0 patriménio nacional, foram reve-
ladas, sobretudo, quando da passagem e estada das colunas revolucionérias de
1924, nessa regio, onde justamente se desenrolaram, com centro em Catanduvas,
grandes agées militares. Entre os revolucionérios estiveram no Sudoeste © Oeste
do Parané, Luiz Carlos Prestes, Joao Cabanas, Juarez. Tivora, Cordeiro de Farias
© outros, ¢, entre os legalistas, sobretudo 0 seu comandante em chefe, o general
Rondon.
Os depoimentos de revoluciondrios e de legalistas sobre as condigées dos
trabalhadores da regio ¢ a explotacio do patriménio nacional pelas companhias
estrangeiras, surpreenderam a opinido pablica brasileira. Viajantes brasileiros que
visitavam esporadicamente, dadas as dificuldades de transporte, os saltos de Guaf-
rae do Iguacu, foram sempre unanimes na sua observacdo da vida até certo ponto
faustosa dos proprietérios ¢ administradores, bem como das condicdes sub-huma-
‘nas em que viviam 0s trabalhadores das obrages ¢ dos ervais. Com a revolugao de
1930 que denunciaria também as negociatas de terras no Parana, varias con-
cessdes, sobretudo pela inoperincia e 0 no cumprimento de cléusulas contratuais,
foram anuladas, voltando 2.300.000 hectares de terra ao patriménio do Estado, O
Decreto n® 300, de 3 de novembro de 1930, fizera reverter ao Estado, 1.700.000
hectares da Braviaco; o Decreto n? 1495, de 15 de junho de 1934, fazia caducar a
concessio, de 300.000 hectares, de Antonio Alves Almeida, no norte do Estado; 0
Decreto n® 1678, de 17 de julho de 1934, operava o mesmo em relacdo a 240.000
hectares que haviam sido concedidos a Meyer, Anes © Cia. Ltda., depois Compa-
hia de Colonizacéo Espéria. Da mesma maneira, foram também anulados 87.000
hectares concedidos a Miguel Matte.
Por sua vez, a expanséo da civilizagio capitalista com a marcha do café
‘sua aplicagao na politica de Gettilio Vargas, rumo ao Oeste, teve repercussSes no
Parané, onde, em 1940, o interventor Manuel Ribas declarava: “‘precisamos acabar
‘com esses senbores feudais!”(4), ¢ iniciava forte luta contra os grileiros que se
hhaviam apossado de cerca de 59 mil quildmetros quadrados de terras do Estado
(mais:de um quarto do seu territério), procurando reconquistar milhées de hectares
que deveriam ser efetivamente colonizados.
‘A guerra de 1939-1945 levou também, por motivos de seguranga nacional, &
proibiglo da propriedade da terra, por estrangeiros, nas zonas de fronteiras, sendo,
‘em consequéncia, nacionalizadas varias companhias. Outras, para nao serem in-
corporadas a0 patriminio da Unido, transferiram 0 controle de suas agées ©
-06-gestiio, a grupos nacionais. No Parand, neste sentido, as transferéncias ou vendas
de maior importancia, foram aquelas relativas & Parand Plantations Limited ¢ &
‘Compaiiia Maderas del Alto Parana, aquela com sede em Londres, ¢ esta em Bue-
nos Aires, mas de capitais ingleses.
Esta mesma politica do Estado Novo ¢ a situago de guerra é que levaram,
ainda, a criagao do Territério Federal do Iguagu, com terras do Sudoeste © Oeste
paranaenses, além daquelas de Santa Catarina
Enquanto tudo isto se passava, continuara a entrada, nessa regidio, das famf-
lias excedentes de antigas zonas coloniais do Rio Grande do Sul e de Santa Cata-
Nas fireas coloniais rio:grandenses, desde o final do século XIX, vinha acen-
tuando-se a insuficiéncia de terras face a0 aumento da populacdo de agricultores,
descendentes dos imigrantes italianos ¢ alemies. Assim, desde as primeiras déca-
das do século XX, formaram-se companhias de colonizaco, no Rio Grande do
‘Sul, que adquiriram terras de mata, ainda nio ocupadas, primeiro no Noroeste do
proprio Rio Grinde do Sul, a0 longo do rio Uruguai, depois no Oeste catarinense
¢, em continuidade, no Sudoeste do Parané. Planificaram a colonizacao dessas ter-
fis, c veaderam os lotes agricolas acs agricliores excedentes das velhas zona
coloniais do Rio Grande do Sul. Desde, mais ou menos, 1900 a 1930, as matas fo-
ram desaparecendo com a formacio de lavouras de cereais, com a criago de suf-
nos © com 0 aparecimento de cidades ¢ municipios novos, no Rio Grande do Sul,
no Oeste catarinense, e, depois, no Sudoeste do Parané. Na década de 1940, essa
colonizacéo ultrapassa o rio Iguacu, entrando no Oeste paranaense, 20 longo do
rio Parané, até encontrar, na altura de Campo Mourio, as frentes pionciras dos
agricultores da agricultura tropical, provenicntes dos colonizadores da fea paulis-
1a que, inversamente, vinham de Norte para Sul, em busca de terras para 0 café.
Em 1946, uma dessas companhias colonizadoras. do Rio Grande do Sul, a
Industrial Madereira Colonizadora do Parani. S.A. - Maripd, adquiriu da Com-
Pafiia Maderas del Alto Parana, com sede em Bucnos Aires, as terras que esta, em
‘tempos anteriores, bavia obtido para colonizacéo, no ceste paranacase. Eram as
terras da Fazenda Briténia que mediam 36 quilémetros de norte a sul © 72 quilé-
‘metros de oeste a leste, e situavam-se no vale do rio Parand. Essa imensa gleba foi
rapidamente colonizada, pelo mesmo proceso da pequena propricdade e da poli-
cultura. Af também surgiram cidades novas, como Toledo, Marechal Cindido
Rondon ¢ outras. A regio teria, mais tarde, a cidade de Cascavel como centro po-
Na década de 1960, todo 0 Estado do Parand estava com 0 seu territério
cocupado, desaparecendo as frentes pioneiras ¢ os grandes problemas de terras.
Encontram-se € comesam a confundir-se as és ondas de povoamento, a do Pa-
rané tradicional que se expandiu desde o século XVI, de Paranagué ¢ Curitiba,
pelas regides de campo, com a criagio do gado, a indéstria da erva-mate © da ma-
deira de pinho; a dos agriculiores da agricultura tropical do café que, pelas ori-
gens € pelos interesses histéricos, ficaram mais dirctamente ligados a Sao Paulo; €
1 dos colonos da agricultura de subsisténcia, plantadores de cereais ¢ criadores de
ssufnos que, pela origem e pelos interesses histéricos, se ligaram mais intimamente
20 Rio Grande do Sul. Cada uma dessas trés ondas criou o seu préprio tipo de
economia, formou um tipo de sociedade ¢ fundou as suas préprias cidades.
-07-©. problema relevante que se-colocou ina histéria do Parané, foi o da inte-
‘gracio dessas comur
1 = LEGISLACAO
E POLITICA AGRARIA
No Parand tradicional, ou seja na érea dos Campos Gerais, a ocupacio ¢ a
propriedade da terra, como de resto em todo o Brasil, estabeleceram-se pela posse
ial e pela concessao de sesmarias,
‘As posses iniciais, nessa area, foram feitas pelos ricos e poderosos habitan-
tes de So Paulo, Santos ¢ Paranagué,, njo,como um meio para trasiadar-se uma
sociedade inteira, mas simplesmente como.um negécio a ser explorado comercial-
‘mente, tendo em vista o, abastecimento de Sio Paulo e das regides mineradoras do
século XVII, Esses proprietérios sempre foram absenteistas, e as primeiras fazen-
das foram fundadas 4 margem do caminho, que de Curitiba ia para Sorocaba © Sio
Paulo, Por essa estrada, 08 fazendeiros, mandavam conduzir as suas boiadas para
08 -‘Sto Paulo, Minas e Rio. Para fundar uma fazenda ao longo desse caminho, 0 em-
preendedor mandava um seu preposto, com alguns escravos, tomar posse da terra,
para onde conduziam algumas cabecas de gado. Depois, alegando essa posse, re-
queria a sesmaria.
Entre 1725 e 1744, mais de noventa sesmarias foram requeridas, alegando-se
‘4 ocupagao anterior, por pessoas de So Paulo, Santos e Paranagué. O mimero,
porém, de requerentes dessas sesmarias, que variavam de tamanho entre 4 mil ¢ 8
‘mil alqueires paulistas, era muito menor que o ntimero de sesmarias, o que signifi-
‘ca que a mesma pessoa requeria mais de uma.
‘Num levantamento, procedido em 1772, das fazendas do Parand, foram re-
‘censeadas, 29 grandes fazendas desde o Pitangui, hoje municipio de Ponta Grossa,
até o rio Itararé, ou seja na parte norte dos Campos Gerais. No centro dessa érea,
a Relagio assinala 12 grandes fazendas, enquanto que, nos campos da Lapa, ou
seja ao sul de Curitiba, existiam 9 grandes fazendas,
Mas, nem toda a extensio dos Campos Gerais estava coberta pelos latifiin-
dios. Na Relagio das Fazendas, de 1772, ao lado dos 29 latifiindios da parte nor-
te, existiam 100 sitios, pequenas propriedades, realmente exploradas, a0 longo da
estrada de Curitiva-Siio Paulo; na parte central, 13 sitios, € nos campos do sul, 12
sitios. Em resumo, no ano de 1772, em toda a extensio dos Campos Gerais, desde
Itararé, aos campos da Lapa, tendo por eixo a estrada das tropa, existiam SO
‘grandes fazendas e 125 sitios.
Da linha da estrada das tropas, as fazendas foram adentrando para a linha
dos confins ocidentais dos Campos Gerais. Atravessam os matos da serra da Espe-
ranga, ocupando 0s campos de Guarapuava. Daf, atravessam as matas do rio Tgua-
‘su, ocupando os campos de Palmas, Marchando mais para o sul, a comunidade
‘campeira dos Campos Gerais, entrou nos campos de Sio Joio, de Onde retrocedeu
‘ao encontrar a expansio, em sentido contrério, dos fazendeiros do planalto catari-
nense, De Palmas, ocupou 0 campo |Eré, de onde em procura de um caminho em
diregio &s Miss6es, regis produtora de muares, atravessou o passo de Goié-En,
sobre 0 rio Uniguai, chegando até Santo Angelo, com a primeira ocupagdo dos
campos do Nonoai.
Nessa drea distendida organizaram-se as fazendas que, nos meados do século
XIX, atingem toda a sua potencialidade dentro do sistema econémico-social de um
perfodo histérico. Nessa expansio reviveram aspectos de pioneirismo que retardou
& estabilizagio da sociedade Varnhagen observava, ainda em 1851, que os criado-
res de gado dos Campos Gerais, possufam 0 “espirito de exploracio dos antigos
paulistas, e com a idéia de descobrir um pedaco de campo para a criagao de gado,
Porém, a partir das primeiras décadas do século XIX, a sociedade fundada
no latifindio jé se encontrava estabilizada, com a grande familia residindo nas fa-
zendas, & base do trabalho escravo, e com a mocidade encontrando nas atividades
do tropeirismo a sua forma de participago na vida social
Nas uiltimas décadas do século, a situacdo era diferente. A constante queda
da produgdo das fazendas ¢ a perda dos mercados de So Paulo e Rio, constitui-
ram, talvez, 0 principal fator da desintegracao do sistema e decadéncia da classe
dos fazendeiros, vindo em seguida o fim dos negécios de tropeirismo ¢ de inver-
‘nagem pelo aparecimento das estradas de ferro, na zona do café paulista. Conco-
mitantemente a estes fatores, ocorriam outros: fora efetivada a completa ocupagio
oo® cas reas de campo, impedindo a colocagio, no sistema, das novas geragoes: a ca-
pacidade de producio das terras era comprometida, cada vez mais, pelas sucessi-
vas partilhas hereditérias ¢ dificultava a expansio da economia pelos métodos
tentio usados; nem contavam com capitais mobilizéveis para trabalhar as terras de
acordo com as novas situagées de mercado,
Esses capitais vo aparecer em méos de outros segmentos da sociedade, com
‘outras motivacdes econémicas. Além dos ervateiros que, desde 0 primeiro quartel
do século XIX, criariam, pela exportacdo, o principal negécio da Provincia, ga-
nhava expresso, no fim do século, a industria da madeira.
‘No entanto, com a exploragiio dos ervais ¢ das matas de araucérias, pouco
fora acrescida, no decorrer do século, a drea do territério ocupado. Por sua vez, 0
plano de colonizagio com imigrantes estrangeiros, posto em prética pelo Governo
Provincial, também. nfo visara 0 preenchimento de largos espagos vazios, mas
‘apenas a agricultura de abastecimento.
tiltimo movimento de expansio das populagdes dos Campos Gerais foi, j4
no século presente, realizado na diregéo do Tibagi. A nordeste desta cidade pas-
ssa-se da regio de campos para a zona mista de matas e campos, ¢ logo mais se
sobe a escarpa do segundo para o terceiro planalto das matas tropicais. Tibagi foi
© centro dessa pequena frente pioneira que alcancou até Queimadas © Faxinal de
‘Siio Sebastido. Na década de 1930, porém, deteve-se o avango. Ela encontrara a
frente pioneira, muito mais importante, do Norte do Parané, além de haver ficado
condicionada pela presenca do grande latifiindio da fazenda Monte Alegre.
Em 1894, 0 Presidente do Estado alertava o Congresso Estadual, depois de
informar que os paulistas e mineiros tinham iniciado plantagdes de café na regiao
hoje denominada de Norte Pioneiro, ou de Norte Velho, sobre a necessidade de
‘ocupar-se o territério: “o povoamento das fertilissimas regides do imenso serti0
do Oeste do Parand, € assumto que deve ocupar vossa atenco, pois que € 1& que
bf de descavolver-sc a agricultura ¢, especialmente, a grande lavoura dc café j6
iniciada com Gtimos resultados nos vales dos rios Paranapanema, Cinzas ¢ Ja-
tat” (6).
‘O regime de obtengio da terra era outro. A Resolucao de 17 de julho de
1822, declarara extinto aquele das sesmarias. Na realidade, porém, a simples ocu-
ppacdo da terra tomara o lugar das concessdes pelo Poder Publico. A posse, prati-
‘cada livremente, desordenaria no Brasil, em geral, a situac&o da propriedade fun-
disria.
‘A Lei n? 601, de 9 de janeiro de 1850, daria, no entanto, as grandes linhas
do regime da propriedade, no Brasil. Findou absolutamente com a concessio de
sesmarias, proibindo a ocupacio de terras devolutas. Determinava, ainda, a revali
Gago das sesmarias ou de outras concessées do Governo, central ou provincial,
que se achassem cultivadas, ou com princfpios de cultura, ¢ morada habitual do
respectivo sesmeiro ou concessionério, ou de quem os representasse, embora nio
tivesse sido cumprida qualquer das condig6es impostas pela concessio.
‘A Lei de Terras proibia, ainda, as aquisigdes de terras devolutas por outro tf-
tulo que no o de compra. As terras devolutas ficavam incorporadas ao patrimdnio
nacional. Desta maneira, somente pela aquisiclo era dado 0 acesso a terra, © 50-
mente a0 Governo Imperial era permitida a concessio de terras para a fundagio de
povoagées, abertura de estradas € quaisquer outras servidées, € assentos de esta-
belecimentos pibticos.
ANo Parand, o primeiro Presidente da Provincia, Zacanas de Goes € Vascon-
cellos. declarava, em 1854, haver encontrado confuso e desordenado 0 estado da
propriedade territorial, frequentes os conflitos pelas questées de posses e limites,
Os Relatérios dos demais Presidentes de Provincia, quase todos, contém obser-
vagGes relativas as quest6es de terras.
‘A marcha da ocupagéo do territ6rio, porém, cessara com a estabilizacio €
decadéncia da sociedade campeira dos Campos Gerais. Restavam, pois, ao final
do século, desocupadas as regiées do Norte, Oeste © Sudoeste paranaenses, afora
4 presenga de rarefeitos posseiros caboclos, nos seus confins, que nao se organiza-
ram em comunidades
Nao resta divida que 0 acesso a terra exclusivamente por meio da compra,
aralisara 0 movimento expansionista de ocupacao territorial. Na verdade, a Lei
de Terras, fora o grande instrumento de reacio da sociedade tradicional.
‘Ao Governo central competia unicamente a realizacio de concessées de ter-
ras, ¢ ele as fez com conseqiiéncias de importincia para o Parand. Haja vista as
concess6es de terras referentes as construgGes de ferrovias
No caso paranaense, 0 Decreto Imperial n° 10.432, de 9 de novembro de
1889, ja ao cair do Império, foi o mais significativo, concedendo & Estrada de Fer-
ro Sio Paulo-Rio Grande, subsididria, alids, da Brazil Railways Company, uma
rea imensa, ainda que descontinua, de terras devolutas ¢ nacionais, e bem assim
as compreendidas nas sesmarias € posses, até 9 quilémetros, para cada lado, na
extensao total das linhas de estradas de ferro da sua concessio, constitufdas pelas
linhas-tronco Itararé-Uruguai, ¢ ramal de Jaguariafva a Ourinhos (parte paranaen-
se). bem como 0 ramal de Guarapuava ¢ seu prolongamento até Foz do Iguagu, via
rio Jordao. Seriam, alifs, por diversas vezes, modificados os termos desta con-
cessio € 0 tracado da linha férrea
0 advento da Repiblica modificaria, porém, a situagio ¢ a questio de terras,
no Brasil. Pelo artigo 64 da Constituicdo de 1891, passaram a pertencer aos Esta.
dos, as terras devolutas neles situadas, ¢ cada um péde organizar a sua adminis-
taco de terras, segundo leis proprias E. verdade que, na sua maioria, seguiram
estiitannnte as diretrizes da Lei de Terras, de 1850. Entre eles, 0 Parané, com
Lei Estadual n? 68, de 20 de dezembro de 1892, justamente reclamada pelo Presi-
dente do Estado, na sua referida Mensagem ao Legislativo, ¢ regulamentada pelo
Decreto n® 1, de 8 de abril de 1893.
© artigo 3° da Lei Estadual n° 68 dispunha que as sesmarias ¢ outras con-
cesses do Governo, ou os quinhées parciais em que estivessem subdivididas,
quer se encontrassem, ou nfo, no dominio dos primeiros sesmeiros ou conces-
siondrios, poderiam ser revalidados, desde que verificada a existéncia de cultura
efetiva © morada habitual, ¢ realizada a sua medicao e respectiva demarcacio. O
prazo estabelecido era o de cinco anos, improrrogaveis.
‘A Lei Estadual n® 68 reconhecia, pois, a legitimidade das posses existentes
dentro dos limites das sesmarias ou concessées, sujeitas porém a revalidagao, des-
de que houvessem sido declaradas boas por sentengas passadas em julgado © que
tivessem sido mantidas com cultura efetiva ¢ morada habitual. A sua érea, contu-
do, nunca deveria ser superior & érea cultivada e érea igual em mata. Outras pos-
ses, encravadas em sesmarias ou concessdes. dariam direito apenas & indenizacso
pelas benfeitorias feitas. se mantidas com cultura efetiva e morada habitual, duran-
te 0s ditimos cinco anos € sem protesto piblico da parte do sesmeiro ou conces-stonéno Seniam respeitadas, entretanto, apenas as posses estabelecidas antes de
15 de novembro de 1889 Era rigorosamente proibida a invasie do dominio
alheio, sobretudo © apossamento de terras devolutas do Estado, para a derrubada
ou queimada de matas, plantages ou edificagdes, ou, ainda, quaisquer outros atos
ossessérios.
Por sua vez, 0 Estado do Parané, em toda a extensio do seu dominio, some:
te poderia alienar suas terras por forca de lei ¢ atos dos poderes competentes, a
‘aqueles que se propusessem, pelo trabalho, tornd-las uteis, ow seja em troca de
servicos em proveito da comunidade paranaense.
‘Quando da Lei de Terras, do Parand, no final do século XIX e principios do
século XX, a conjuntura caracterizava-se pelo interesse dos capitais ingleses, no
Brasil, pelos negécios de terras, além de serem os gru;-»s ingleses os principais
detentores das concessées de servicos piiblicos, feitas pelo Governo brasileiro
Um pais sem recursos para investimentos, teve que lancar miios do seu patriménio
de terras, para a implartagio de tais servigos..
A construcéo de estradas de ferro concretiza esse interesse ¢ o controle exer-
cido pelos grupos estrangeiros. Nessa conjuntura imperialist, enquadra-se a con-
cessdo de imcusas glebas, no Parand, & Estrada de Ferro Sio Paulo-Rio Grande,
‘em troca da construgio da estrada Guarapuava-Foz do Iguacu, ligando leste-oeste
Paranaenses, facilitando a ocupacdo desses espacos praticamente vazios desde a
expulsio dos jesuftas pelos bandeirantes. O préprio Governo Provisério da Rep\
blica, com atribuigées legislativas, pelo Decreto n° 305, de 7 de abril de 1890,
‘embora com modificagées, havia confirmado as concess6es em favor de Sao Pai
o-Rio Grande.
‘Muitas outras concessdes, visando todas a colonizacio dessas reas extensas
do Oeste paranaense, foram também realizadas pelo Governo no Estado, no inicio
do século, sobretudo na vigéncia da Lei Estadual de 5 de abril de 1916, revogad:
porém, em 1922. Entre elas, podem ser citadas, a estabelecida, por contrato, em
1901, entre a Secretaria de Obras Publicas ¢ Colonizacao do Estado do Parané, ¢
‘Manuel José da Costa Lisboa, por si e como procurador de Domingos Barthe, para
a compra de 50,000 hectares de terras, nas comarcas de Guarapuava e Palmas,
destinadas & localizacdo, no prazo de cinco anos, de 250 familias de colonos, ¢
para fins industriais; a concessio feita, em 1907, a Henrique Schiiller, de 50 a 150
mil hectares de terras, entre os rios Piquiri ¢ Paranapanema, para a localizacio de
1,500 familias de colonos nacionais ou europeus, no prazo de dez anos; ou as fa-
‘mosas concessdes para a construcio de ferrovias, feitas a Augusto Hauer, em
1906, para a estrada de ferro, partindo de Ponta Grossa, através da zona entre 0
Ivaf ¢ o Piquiri, atingir a Ponta da Fortaleza, & margem esquerda do Paranapane-
‘ma; a Miguel Sheeham, de uma estrada de ferro, partindo de Paranagué e termi-
nando na margem esquerda do Pepiri-Guacu, no lugar denominado Barracio ou
Dionisio Cerqueira, passando pelos municipios de Guaratuba, Lapa, Ambrésios,
Palmas e Cleveldndia.
Na vigéncia da Lei de 1916 encontram-se também as primeiras concessdes
feitas pelo Governo do Estado do Parané, de terras situadas no Norte, na margem
‘esquerda do Tibagi, a Corain ¢ Cia., a Leopoldo de Paula Vieira.
'Nas terras do Oeste ¢ do Sudoeste, via de regra, porém, no houve acto co-
lonizadora, empenhadas algumas concessionérias apenas na exploragao da erva
12-mate © da madeira. Muitas, nem sequer iniciaram quaisquer trabalhos de ocupacio
cefetiva da terra, com a localizaco de colonos.
-B-As terras do Norte do Parané, contudo, pela invasio da cultura cafeeira, to-
ram efetivamente colonizadas, sobretudo a partir da iniciativa da Parané Planta
tions Limited. E verdade que também ali, muitas concess6es nao foram devida-
‘mente aproveitadas, ou foram exploradas ‘sem éxito, voltando a0 patriménio do
Estado.
Estes anos da revelacdo das terras roxas do Parané caracterizam-se, na hist6-
ria regional, como o tempo dos negécios de terras. Negécios de terras que pela
movimentacio fundidria favoreceriam a ascenco econdmica do Parané modemo,
mas que, também, muitas vezes, convulsionaram as comunidades paranaenses,
Fregiientemente foram lesivos aos interesses do Estado, desde os primeiros
tempos, dilapidando o patrim6nio piblico. A revolucio de 1930 procurou, ja a0
tempo do interventor Mario Tourinho, reaver concess6es feitas sem observincia
das disposigées legais 2 contrérias aos interesses publicos. Entre as anulagGes rea-
lizadas, e decorrentes da nova politica revoluciondria, ressaltam aquelas das con-
cessdes feitas a Estrada de Ferro Sio Paulo-Rio Grande, & Companhia Agricola
Marcondes (Piraps), ¢ a AntOnio Alves Almeida (Nova Bahia), entre outras.
Desde 1939, na interventoria de Manuel Ribas, o Governo do Estado inves-
tiu novamente contra os exploradores de terras, reconquistando para o dominio do
Estado, centenas de milhares de hectares. Por outro lado, pela Portaria n® 8568, de
1939, 0 Governo Estadual iniciava ao norte © a oeste da Companhia de Terras
Norte do Parand, nova fase de colonizagio oficial, fundando vérias colénias. Fo-
ram aquelas de Icara, Jaguapitd, Centendrio, Pagu e Paranavaf. Da mesma manei-
ra, também no Sudoeste, foram estabelecidos nticleos coloniais, pelo Governo, em
Jacutinga, Barro Preto, Cov6, Mato Branco, Passa Quatro e Retiro do Pinhal.
Governo estabelecera, ainda, um “seguro ¢ eficiente servigo de cadastro de
com 0 objetivo de corcear ¢ eliminar tanto quanto possivel, os efeitos das crimino-
‘as atividades conhecidas pela bizarra denominacao de grilos, as quais, subtraindo
grandes reas de terras ttcis a0 povoamento de vastas ¢ ricas regies, entravam a
marcha da colonizaco do interior do Estado” (7)
Niicleos coloniais, empreendidos por particulares, foram, também, instalados
nessa regido, assim, entre outras, as colOnias de Jagoda, iniciada pela Companhia
Colonizadora Mercantil Paranaense Limitada e a de Santa Bérbara, pela Empresa
Colonizadora Santa Barbara Limitada,
A guerra de 1939-1945 ¢ a nacionalizagio de propriedades em zonas de
fronteiras, fizeram reverter em favor do patriménio nacional, grandes porgdes de
terras no Parané. Assim, a incorporacdo da Companhia Estrada de Ferro Sio Pau-
lo-Rio Grande, & Superintendéncia das Empresas Incorporadas a0 PatrimGnio da
Unio, acarretou a ineorporagio, por sua vez, das terras, entre outras, conhecidas
por Andrada, Chopim, Chopinzinho, Pinhio, Arroio Bonito, Missées, Riozinho,
‘Santa Maria ¢ Silva Jardim.
‘Contudo, nem a iniciativa governamental de colonizagiio, do Governo do Es-
tado ou da Unido, nem aquela de companhias colonizadoras idéneas, nem a incor-
Poragio de terras ao patriménio nacional, trariam ordem & questo de terras no P:
rand. Pelo contrério, a redemocratizacio do pais, em 1946, abriria © mais agitado
periodo da histéria da ocupagao da terra pelos proprietérios privados.
-14-95
2 - OCUPACAO DA TERRA NOY
PARANA MODERNO
Pelo exposto, observa-se que a primeira expansio povoadora, motivada pela
fungio dos campos na conjuntura, ficou limitada, durante largo tempo, 20 Parand
tradicional, ou scja as areas de campos € ao eixo da estrada das tropas.
‘As primeiras tentativas, mais por razes de ordem militar que colonizadoras,
dos meados do século XIX, de expansdo rumo ao Norte paranaense, com 0 estabe-
lecimento da Col6nia Militar do Jataf e dos aldeamentos de Sao Pedro de Alednta-
rae de Sao Jeronimo da Serra; ou aquelas do ultimo quartel do século, rumo ao
Oeste do Parang, com as colénias militares de Foz do Iguacu e de Chopim, justa-
‘mente porque nao tinham fungio no sistema, haja vista a repetida observagao dos
relat6rios oficiais de que 0s colonos, tanto de uma, como de outras, néo tinham
‘onde colocar a produgio agricola das coldnias, pela auséncia de mercados e de
transportes, nao resultaram, na verdade, na ocupacio colonizadora da terra.
‘Somente quando, desde 0 final do século XIX, novas estruturas comegavam
a se formar, € que outras regides paranaenses seriam efetivamente ocupadas,
partithadas pelos proprietérios privados
A partir da década de 1860, penetrando pelos cursos superior € médio do Ita-
raré, fazenieiros paulistas € mineiros, iniciaram plantages de café e a formagio
de fazendas no Norte paranaense, nos moldes tradicionais de Sdo Paulo e Minas
Gerais. Os. mateiros que percorriam a regido, haviam difundido a noticia da
existéncia de manchas de terras roxas. Concessées de terras foram requeridas, me~
diante aquisicao feita a baixo preco, ainda ao Governo Imperial e, nesta primeira
frente pioneira que chegaré apenas ao rio Cinzas, surgem cs micleos de Colénia
Mineira (1862), Tomazina (1865), Santo AntOnio da Platina (1866), Vencesiau
Braz ¢ So José da Boa vista (1867). Era constituida por fazendeiros, grandes
Proprictérios isolados que empreendiam a empresa, com suas familias ¢ emprega-
dos, espontaneamente, procurando as terras do Norte do Parana para o plantio do
café e, em menor escala, para a criagio do gado.
‘As fazendas, nessa fase, constituem grandes propriedades. O colono 6, ain-
da, geralmente nacional e assalariado, enquanto que a producdo escoa exclusiva-
mente por Séo Paulo. As técnicas agricolas ¢ 0 regime de trabalho sio todos um
prolongamento das praticas tradicionais paulistas.
‘A penetracdo em territério paranaense, porém, somente tomaria expressio,
como onda povoadora, no inicio do século XX quando a conjuntura tornaria pro-
curadas ¢ preferidas, para 0 plantio do café, as terras do Parané. Este Estado, por
no haver, ainda, ultrapassado as suas quotas, estava fora das medidas restritivas
20 plantio do café, advindas das crises de superprodugio, no incidindo sobre os
seus cafeeiros as taxas que jé gravavam, por exemplo, aqueles de S40 Paulo.
Nas primeiras décadas do século, com a fundagéo de Jacarezinho (1900),
‘Cambaré (1904), Bandcirantes (1921) ¢ Cornélio Procdpio (1924), propiciadas
timas sobretudo pela chegada a Ourinhos (1908) da Estrada de Ferro Sorocaba-
na, realizou-se a colonizacio da area entre 0 rio Itararé e o rio Tibagi, earacteriza-
1s-
On
*o Keda também pela ocupagdo espontinea dos lazendeires que. come empresa privad.
individual, estabeleciam as suas tazendas em terras adquindas ao Estado do Pa
rand, a posseiros antigos, ou a concessiondrios na regio. Nao ocuparam, porém.
toda a extenséo da rea, por completo, restando terras & sua retaguarda, ocupadas
‘mais tarde inclusive por colonizacio dirigida, como foi 0 caso da col6nia Assai
‘A colonizacao dirigida, no entanto, quer promovida por empresas privadas,
‘ou pela iniciativa oficial, seria, sobretudo, realizada entre a margem esquerda do
‘Tibagi e as barrancas do rio Parané.
‘De outro lado, os povoadores vinham agora através do rio Paranapanema,
trazidos pela agéo das companhias colonizadoras que revelaram a exuberdincia das
terras do Norte do Parané, organizaram 0 fluxo migrat6rio e a efetiva ocupacdo da
terra,
Foram, inicialmente, as concessées, de 50 mil hectares cada uma, feitas a
Corain ¢ Cia. (Primeiro de Maio) a Leopoldo de Paula Vieira (Sertanépolis). Lo-
tearam suas concessdes em chécaras, sitios e pequenas fazendas.
Outras concessées foram, ainda, realizadas, entre as quais aquelas a Manuel
Firmino de Almeida (Zacarias de Goes), a Anténio Alves Almeida (Nova Bahia) ©
& Companhia Agricola Marcondes (Piraps).
‘A mais conseqiente, no entanto, dessas concessdes, foi a realizada, por meio
de venda, feita pelo Governo do Estado do Paran4, de terras consideradas devolu-
tas, & Parané Plantations Limited, com sede em Londres, companhia inglesa que
passava, como outras jé 0 faziam, a operar no Brasil também com negécios de ter-
ras ¢ colonizacéo.
A Companhia de Terras Norte do Paran4, contando com técnica superior,
‘organizou modemamente a colonizacio da imensa érea que alcancaria 515 mil al-
queires, dividindo-a em zomas que, ap6s 0s servicos de medigio e demarcacio,
abertura de picadas e estradas, eram sucessivamente colocadas & venda. Tibagi ¢
Piraps foram as primeiras colonizadas, situadas que estavam mais préximas do es-
crit6rio central da Companhia, em Londrina. Depois, foram as zonas do Rio Bom,
Primitiva ¢ Paranhos, finalmente a do Ivaf. As zonas, por sua vez, foram divididas
‘em glebas ¢ estas, rescrvadas as dreas para a localizacio de patriménios e cidades,
‘em lotes colonials, cujo tamanho médio, nas terras da Companhia, era de cerca de
15 alqueires. Os lotes, em faixas alongadas, foram todos planejados com frente
para a estrada que passava no alto dos espig6es, e com aguadas, nos fundos, nos
‘vales. Nao havia servidées, nem propriedades encravadas.
Toda a érea colonizada pela Companhia de Terras Norte do Parané foi dota-
da de boas estradas,| colocando as propriedades rurais em comunicaciio facil com
0s centros urbanizados e fucilitando o escoamento da produgao. Foram desde logo
criados muitos patriménios, como pontos de apoio As propriedades rurais. Estas,
via de regra, niio distavam mais de 15 quilémetros de um patriménio ou de uma
cidade. Fora, assim, prevista © garantida a integragéo entre © meio rural ¢ 0 urba-
no. Intensa propaganda, acerca do Norte do Parané e das condigées da coloni-
zaG%0, foi realizada pela Companhia, sobretudo através de folhetos e de jornais de
‘grande circulagio, principalmente em Sio Paulo, com 0 objetivo de atrair colonos
nacionais. A aquisicéo de lotes rurais cra facilitada, em prestagées, até quatro
anos, aos juros de 8% ao ano, € a dos lotes urbanos, as datas, até dois anos. Ao
comprador era exigida a reserva de 10% de fea florestal na propriedade adquin-
6da \ Companhia prestava, ainda. transporte assisténcia para a instalagao inicial
dos colonos.
Milhares de colonos. com suas familias, vieram desta maneira radicar-se no
Norte do Parané, tornando-se desde logo proprietérios de suas terras, onde, via de
regra, plantavam o café e tinham, ainda, pequena lavoura de subsisténcia.
"Até 0 ano de 1943, a Companhia de Terras Norte do Parand vendera cerca
de 117 mil alqueires. Dez anos depois, em 1953, haviam sido vendidos 400 mil
alqueires, divididos em cerca de 26 mil lotes agricolas, cuja drea média era de 15
alqueires. Nese mesmo ano, em média, quatro famflias estavam localizadas em
cada lote, ou seja cerca de 100 mil familias na érea rural, colonizada pela Compa-
nhia. Esta, a partir de 1951, no tendo podido adquirir novas terras devolutas do
Estado, teve de langar-se a novos empreendimentos que ndo apenas os de venda
de terras e colonizacio, surgindo, em conseqiéncia, a Companhia Melhoramentos
Norte do Parané.
A iniciativa da Companhia de Terras Norte do Parané ¢ de outras compa-
nhias colonizadoras, particulares, fez povoar densamente a regio. Os povoadores
recém-chegados eram, sobretudo, paulistas, mineiros ¢ nordestinos. Colonos es-
trangeiros, de variada procedéncia, também se estabeleceram no Norte do Parané,
‘muitos espontancamente, outros dirigidos por companhias colonizadoras. No ilti-
‘mo caso, sio exemplificativas as coldnias de Assaf e Uraf, aquela fundada pela
Brazil Tokushoku Kaisha - Bratac, ¢ esta pela Nambei Tochibushiri, com imigran-
tes japoneses ¢ seus descendentes.
‘© Governo do Estado, proprietério, ainda, de grandes éreas de terras devolu-
tas © de terras de antigas concessées anuladas que haviam retornado ao seu pa-
triménio, iniciou também, a partir de 1939, diretamente, um programa de coloni-
zagio de muitas dessas reas, no Norte paranaense. Foram, assim, de iniciativa
oficial, além de Jataizinho, situada entre Ibipori (concessio feita, em 1935, a
Francisco Gutierrez Beltrao) ¢ © rio Tibagi, as colénias Igara (1941), Jaguapita
(1943), Centenério (1944), Interventor (1950) e Pagu (1950), em terras da ex-con-
‘cessio Alves Almeida, bem como a coldnia Paranavaf, mais a0 oeste, em 1942, si-
tuada a sede no centro da antiga Fazenda Brasileira, cujas terras haviam voltado
a0 patriménio do Estado do Paran4, apés a revolugao de 1930.
‘© sistema de colonizacéo praticado pelo Governo do Estado foi semelhante
‘a0 da Companhia de Terras Norte do Parané, vendendo suas terras em pequenos
lotes agricolas, exceto nos casos da colénia Centenério que foi loteada em fazen-
ddas, e de Paranavaf, onde as propriedades rurais eram de dimens6es variadas, con-
forme a sua localizacéo em relacio A sede da Coldnia.
No Oeste paranaense, as concessées realizadas pelo Governo do Estado as
‘companhias particulares, nas primeiras décadas do século, pouco ou nada realiza-
ram em favor da colonizacio efetiva. Os niicleos coloniais tentados, quer pelas
Préprias companhias, como aqueles estabelecidos por|Meyer, Anes € Cia. (Sol de
Maio ¢ Santa Helena), quer pelo Governo, como a colénia Bom Retiro (atual Pato
Branco), nao tiveram condigdes de progresso pelo isolamento em que se encontra-
vam ¢ pela auséncia de mercados.
‘A revolugéo de 1924 revelou claramente a situagio de miséria e de abandono
da regio, explorada apenas depredatoriamente pelas companhias que extrafam a
‘erva-mate € a madeira. Permanecia, até essa época, o Oeste paranaense pratica-
mente despovoado ¢ desconhecido.
~17-ot, porém, nessa mesma década yue teve inicio & entrada, em grande excal
da corrente povoadora vinda do Rio Grande do Sul ¢ Santa Catarina, constituida,
Principalmente, de agricultores de origem italiana e alema Entraram por Paws
Branco. infletindo depois pelos vales dos rios Chopim, Piquin Parané
Essa corrente povoadora € que, realmente, ocuparia a terra, onde a explo-
ragio da erva-mate € da madeira deixara, apenas, rarefeitos cuboclos, semindma-
des na floresta. Traziam, via de regra, alguns recursos pecuniérios para a sua ins-
talago, © plantariam cereais e criariam porcos. Entram somente com os seus re-
cursos particulares, sem quaisquer auxilios dos poderes piblicos ou de Srgaos as-
sistenciais.
‘A partir de 1939, 0 Governo do Estado resolveu colonizar também suas ter-
ras devolutas e de antigas concessdes, no Oeste paranaense, fundando, na margem
esquerda do Piquiri, as col6nias Piquiri, Cantu, Goio-Bang ¢ Goio-Eré, & mar-
‘gem direita do Ivaf, as colénias Manuel Ribas, Muquildo e Mourio. Seguiu planos
de colonizagéo, demarcando os lotes rurais ¢ prevendo reas para a instalac3o de
nécleos urbanos. Os lotes agricolas, nessas coldnias, foram, em geral, de reas su-
eriores aqueles do Norte do Paran4, medindo, em média, mais de 20 alqueires
‘PitiNeeen nova fuse Go povoemeato Go Ocete paranaenss, compantias coloniza-
portincia que teve 0 empreendimento, destaca-se a Industrial Madeireira e Coloni-
zadora Rio Parané S.A. - Maripé, com sede no atual municipio de Toledo. Esta
Companhia, em 1946, com capitais rio-grandenses, adquiriu a Fazenda Britania,
com cerca de 124 mil alqueires, da Compafiia Maderas del Alto Parané, antiga
concessionfria na regio. Iniciados os trabalhos da Maripé, com a instalacao dos
escritérios centrais ¢ de uma serraria junto 20 arroio Toledo, foram medidos e de-
marcados os lotes, abertas as picadas © estradas, reservadas as éreas para a cidade
de Toledo © mais 13 ncleos urbanos, ¢, assim, abertas as vendas de terras, lotes
urbanos ¢ lotes rurais. O lote urbano, a chécara a colémia foram as unidades se-
guidas pela MaripS. As chcaras que circundam os nicleos urbanos foram, em
média, de um alqueire, enquanto que as colénias (sitios), servidas sempre por
4guas correntes, foram demarcadas com a firea média de 10 alqucires.
‘Os colonos poderiam comprar mais de um lote, porém, a insuficiéncia de re-
cursos para tanto, impediu a formagio de grandes propriedades. A procura das ter-
ras ofertadas pela Maripé, por colonos gatichos ¢ catarinenses, foi extraordinéria,
de tal modo que, em 1951, todas as terras demarcadas, jé se encontravam vendidas
‘ou compromissadas. A Companhia, no entanto, nio realizara grande campanha
publicitéria em torno do empreendimento, a fim de nio atrair aventureiros ¢ para-
sitas. Havia preferido empregar, como agentes de venda, sitiantes ¢ comerciantes
que primeiro haviam chegado a Toledo, com a obrigagio de periodicamente visitar
suas localidades de origem, recrutando novos colonos, conhecidos © selecionados,
Em 1956, afora algumas reas extensas que vendera para serem colonizadas por
‘outras companhias, a Maripé havia vendido 9.618 coldnias do projeto inicial, res-
tando apenas 3.544 a venda. A Companhia, por sua vez, adquirira também outras
porgdes de terras. Os seus fundadores ¢ responsaveis participavam, ainda, de ou-
‘tas companhias colonizadoras da regio, tais como, a Colonizadora Gaiicha Limi-
tada, com sede em Séo Miguel, Foz do Iguacu: a Industrial Agricola Bento Gon-
sgalves, com sede em Medianeira: a Colonizadora Matellindia. com sede em Ma-
18-tclindia; a Terrase Pinhais Limitada, com sede em Sao Jorge, Foz do Iguagu; a
Pinho © Terras Limitada, com sede em Céu Azul; € a Pinho e Terras Limitada, de
Palotina,
A obra colonizadora das grandes companhias de terras que, com seriedade,
‘operavam seus negécios, € aquela do Governo do Estado, como agente coloni-
zador, constituem, no Parand moderno, 0 eixo propulsor da repartigfo da terra e
sua efetiva ocupacdo pelos proprietirios privados. Elas se fizeram sob o regime da
pequena propriedade, salvo em casos e freas excepcionais. Também, em funcio
da produgdo agricola, notadamente do café no Norte dos cereais no Oeste ¢ Su-
doeste paranaenses.
‘A colonizacio, organizada pelas companhias, fundada na venda de pequenos
lotes agricolas aos interessados diretamente no cultivo da terra, supunha, entretan-
to, uma engrenagem, um suporte juridico-contabil, de seguranca reciproca, entre
‘0s que pagavam e recebiam terras e outros beneficios, e 0s colonizadores que re-
cebiam pelas terras e pelos servicos complementares que prestavam,
© contrato de compra e venda, uma vez. efetuado, dava a0 colono a posse
imediata da terra, e 0 término do pagamento das prestagGes acertadas, garantia-Ihe
de imediato 0 titulo de dominio pleno, transferido pela empresa vendedora e pro-
prietéria capaz..
A regio Norte do Parand, gracas principalmente A aco ordenada da Com-
panhia de Terras Norte do Parané, péde experimentar, além de outras razses fa-
voraveis da conjuntura, progresso répido, em virtude das condigées de seguranca
do direito de propriedade, por parte dos lavradores, ainda que pequenos propricti-
rios. Da mesma maneira, a atuagio da Marip4, no Oeste paranaense, deu aos colo-
nos condigées de seguranga e trangiilidade, indispensdveis & sua fixacio.
Adquirindo o seu lote agricola, o lavrador, logo segurameate, tomava-se 0
proprietiirio do seu pequeno sitio, amparado pelo poderio financeiro e politico da
companhia que 0 vendera € 0 tinha como cliente. Se eram duros os tempos da
abertura da mata e das primeiras rogas, trabalhava terra sua e no era molestado
or questées de terras.
Mas, se esta foi a regra que fez povoar densamente as regides do Paran mo-
demo, pontos € momentos houve em que as questdes de terras assumiram graves
aspectos conflitantes, por vezes, dramiticos. Nao faltou a especulaco nos negé-
cios de terras, como nao faltou o ludforio de muitos lavradores, nem tio pouco a
exploracdo dos trabalhadores rurais.
Se, de um lado, a seguranca do direito de propriedade atraiu milhares de la-
vradores honestos, descjosos do legitimo acesso A terra, a exuberiincia © a riqueza
das glebas, atrairam também aventureiros em busca de toda a sorte de facilidades.
Acresce, ainda, 0 fato de que além da colonizagio particular, espontinea ou diri-
ida, ¢ da oficial, houve, muitas vezes, a ocupacéo pura e simples de terras devo-
lutas ou pertencentes a particulares que no se encontravam presentes.
Configurou-se, nesse caso, a posse quando muitos colonos estabeleceram-se
em terras devolutas ou abandonadas, com cultura efetiva e morada habitual, Em
conseqtiéncia, quando o Estado vendeu as terras, ou desejou ele préprio colonizé-
las, muitos lotes, e mesmo glebas inteiras, jé se encontravam ocupados pelos pos-
seires. Foi, por exemplo, 0 caso, no Norte do Parané, da col6nia Jaguapita, cujas
terras jf se encontravam praticamente todas ocupadas quando 0 Governo iniciou
ali os trabalhos de medigio e demarcagiio. No Oeste foram também numerosos 0s
19.casos da presenga, em massa, de possciros, como nas cokinias Piquirt © Cantu
A venda de terras devolutas, ou de antigas concessdes, a companhias colont-
zadoras ou a requerentes individuais, traria 0 problema da necessidade de regula-
rizagdo da situagdo dos posseiros nelas encontrados, ou a sua retirada, nem sempre
pacifica. O conflito juridico entre dois ou mais pretensos proprietarios que aliena-
‘vam as mesmas terras a dois ou mais compradores, também agravaria a questo de
terras. Neste sentido, foi de suma gravidade, a questio entre o Estado do Parand e
a Unifio, em torno das terras da antiga concessio da Estrada de Ferro So Paulo-
Rio Grande.
Outras vezes, a ocupagio de terras devolutas, ou pertencentes a particulares
ausentes, foi deliberada, caracterizando-se a imtrusagem, ou seja a modalidade il
cita de ocupagao e posse da terra, Sobretudo no povoamento do Oeste paranaense,
séo freqiientemente encontrados os intrusos, ilegalmente empossados em terras de
antigas concess6es inexploradoras. Também, no Norte do Parané, embora mais,
‘ordenado 0 povoamento pela aco da Companhia de Terras Norte do Parand, com
a valorizagio répida ¢ crescente de suas terras, com a cultura do café, principal-
‘mente em Areas colonizadas pelo Governo do Estado, estiveram presentes os intru-
sos, motivando & agitagio.
Em todo o Parand, onde se verificaram negécios de terras, surgiv a industria
da intrusagem, desinteressados os intrusos na legalizacéo de suas posses, € objeti-
vando apenas o recebimento de novas terras pela sua saida, ou 0 pagamento de in-
denizacdes pelas benfeitorias realizadas na propriedade, as quais, via de regra, fi-
‘cayam muito aquém das importincias exigidas para a sua retirada.
Muitas vezes, a intrusio era violenta, quando aventureiros penetravam ¢ ins-
talavam-se, mesmo pela forca, em terras j& alienadas, porém com os titulos defini-
tivos ainda no expedidos, exigindo quantias de vulto para abandonarem as terras
invadidas, nao faltando as ameacas ostensivas de sevicias ¢ mortes. Estes invaso-
res operavam freqdentemente para grupos poderosos, interessados geralmente na
formagao de grilos.
A intrusagem dirigida era efetivada no intuito da formagio de posses. pois
que estas geravam direitos, agravando, mais ainda, a questo de terras pela habili-
taco de dois ou mais pretensos proprietirios legitimos.
Com freqiéncia, a luta pela terra era travada entre o posseiro, o intruso € 0
proprictério que tinha titulo de dominio pleno, quando dois ou mais possciros,
intrusos ¢ proprietirios ndo se apresentavam disputando o mesmo lote ou a mesma
gleba
Do ponto de vista social, a existéncia no Parané de milhares de posseiros,
sua luta pelo domfnio pleno da terra que ocupavam, com suas rogas ¢ ranchos,
desde anos, € que lhes era arrebatada por terceiros, geralmente figurdes das
cidedes, constital o mais dramético aspecto das questies agririas do Parand mo-
demo. A existéncia e o tumulto| provocado pela intrusagem, complicariam sobre-
modo a solugio da efetiva ocupagio da terra pelos proprietérios privados, gerado-
res que foram de intimeros conflitos de interessesprivis 40 ettudo da ocupagio. ..
“Westphalon, Machado Bathans - NoteGRANDES GRILOS DE TERRAS NO PARANA
NE Grilos Alqucires
1 Reconquista 446.280
2 Guavirova he ote * 171.000
3 Sio Manuel. 71.000
4 Boa Ventura. 0.222. és x 5.000
5. Laranjeiras 38,000
6 Ubs .. 100.000
7 Corumbatat . 22.22 3 z 216.300
8 Bandeirantes .. o 403.740
9 Sfio Jofo do Rio Claro - 30,000
10 Colinia de Baixo 5.887
11 Boa Esperanga . 255.980
12 Piraps 4 Be «SO SID
13 Ribeirio Vermetho .... 2 45.000
asl é : 148.290
15° Tigre . : 17.660
16 Barra Bonita... Re aa ao Rap ote 16.270
17 Pontal do Rio Cinzas . 13.590
18 Sio Joo do Rio Pardo . 38.000
19° Ipiranguinha ... 2.6.22 21.000
20. Flores Conceigio 22.000
Total... enganed 2.434.567
Outros aspectos devem, ainda, ser considerados em relacfo A posse ¢ a0
dominio da terra, no Parané modemo, decorrentes da colonizacio recente e da sua
extraordindria valorizagio. Entre estes sobressai, pela perturbacio da ordem dos
negécios de terras, da efetiva ocupagio ¢ reconhecimento dos direitos dos legiti-
mos proprietirios, mesmo que simples posseiros, a pritica organizada da grilagem
de terras, ou seja da formacéo de grilos, por espertos aventureiros, hébeis no
‘apossamento de terras alheias, com base em titulos falsos de propriedade. Falsifi
‘cando documentos, como escrituras de transferéncias de propriedades, recibos
‘outros, appssavam-se!de vastas reas, gerando nao apenas conflitos de ordem juri-
dica, mas sobretudo a inquietagéo, no meio rural paranaense. Ficaram famosos, na
historia agréria recente do Parané, os grilos das terras de Reconquista,
‘Séo Manuel, Boa Ventura, Laranjeiras, Ub4, Corumbataf, Bandeirantes, Sao Joao
do Rio Claro, Colénia de Baixo, Boa Esperanca, Pirap6, Ribeiro Vermelho, Bar-
ra do Tibagi, Tigre, Barra Bonita, Pontal do Rio das Cinzas, Séo Jodo do Rio
Pardo, Assento do Salto do Ipiranguinha ¢ Flores Conceigao (8)
Intrusos ¢ grileiros, via de regra, com o concurso de jagumgos, pistoleiros de
oficio, intrangdilizavam posseiros e sitiantes, obrigados também, muitas vezes, a
reagir & bala, de sorte que muitos capitulos da hist6ria da ocupagao da terra do Pa-
rand modemo, foram escritos com fogo e sangue.
“2.pe ,
-MOVIMENTOS AGRARIOS NO
3} PARANA MODERNO
© grande problema agrério do Parandé modemo diz respeito, sem divida, &
propriedade da terra, ou seja a0 domfnio pleno da mesma pelos proprietérios pri-
vados. A repartigéo da terra nio se fez, contudo, scm maiores dificuldades. Desde
© inicio do século XX, até a década de 1960, quando o Parané encontra-se efeti-
vamente ocupado, dura e penosa foi a implantagio do regime da pequena proprie-
dade e das condigées de trabalho, no meio rural, que marcam a revolucdo agréia
paranaense.
Basicamente, por questdes de terras, j4 no comego do século, na drea limitro-
fe contestada pelos Estados do Parané e de Santa Catarina, irrompia movimento
sertanejo de graves proporgées.
Eram, em parte, terras de campo ocupadas pelos latiftindios pastoris. Os
campos de Palmas, constituiam, na verdade, a mais avangada penetragio, nesse
rumo, em terras do Parand, da sociedade tradicional campeira paranaense. Ali, os
grandes proprietérios rurais ocupavam, ainda, posigdes de prestigio social, éco-
admico ¢ politico, porque senhores da terra
Dispersa, porém, pela grande propriedade ou nos confins da mesma,
uma populagao de agregados e posseiros que o sistema de latifindio nao mais
comportava, praticando apenas uma lavoura de subsisténcia e criando alguns pou-
‘cos animais, em terra que ndo era sua. Tinham apenas a posse da terra, onde er-
guiam seus ranchos ¢ realizavam suas rogas, com 0 beneplacito do “‘coronel” fa-
Zendeiro e mesmo ao abrigo do compadrio que o regime paternalista instituira. De
outra parte, nas zonas de matas do territ6rio contestado, as atividades principais,
dominadas também pelos grandes proprictérios, eram aquelas ligadas & exploragio
de ervais e da madeira.
Os caboclos que viviam dessas atividades, dispersos pela mata, constituiam
também uma populagio miserével ¢ sem terra. Eram posseiros ou intrusos em terra
alheia
Até aos ervais © is matas chegava 0 poderio dos grandes proprietérios, se-
tnhores também dos ervais © da madeira, ou arrendatérios daqueles pertencentes 20
Estado. Em conseqiiéncia, tanto os caboclos das zonas de campo, como aqueles
das zonas. de mata, eram obrigados a seguir adiante, embrenhando-se no sertio,
para estabelecer os seus ranchos € rocas, intrusando terras ou tirando novas pos-
ses. Portm, a repressio contra intrusos © posseiros muitas vezes se fazia sentir
violenta, inclusive com a agio da Policia do Governo, este quase sempre ao lado
dos grandes proprietirios.
‘A questio de terras muito se agravaria, no final do século, na regido do Con-
testado, pela passagem das terras devolutas para a competéncia dos Estados, de
Yez que 0s seus Governos eram controlados pelas oligarquias locais que faziam
esar 0 seu poderio, conseguindo terras © beneficios e, sobretudo, ago policial
contra intrusos e posseiros
Estes cram violentamente despejados, perdendo os poucos bens que pos-
suiam, devendo tudo recomecar novamente
23.