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Medida e Integral de Lebesgue

1. O documento apresenta uma introdução à teoria da medida e integral de Lebesgue, definindo conceitos-chave como σ-álgebras, espaços com medida, medida exterior e método de Carathéodory, e medida de Lebesgue em R. 2. É fornecido um resumo conciso de cada um dos principais tópicos abordados no documento, incluindo definições, exemplos e teoremas. 3. O documento parece ser um bom material introdutório sobre a teoria da medida e integral de Lebesgue, apresentando os

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1. O documento apresenta uma introdução à teoria da medida e integral de Lebesgue, definindo conceitos-chave como σ-álgebras, espaços com medida, medida exterior e método de Carathéodory, e medida de Lebesgue em R. 2. É fornecido um resumo conciso de cada um dos principais tópicos abordados no documento, incluindo definições, exemplos e teoremas. 3. O documento parece ser um bom material introdutório sobre a teoria da medida e integral de Lebesgue, apresentando os

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Introdução à Teoria da Medida e

Integral de Lebesgue
Primeira Edição V0.8
5 de Janeiro de 2010

Marco A. P. Cabral,
PhD Indiana University, EUA
Depto. de Matemática Aplicada
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Rio de Janeiro – RJ – Brasil
ii
Introdução
Nesta apostila fazemos uma introdução curta à Teoria da Medida. Os pré-requisitos são:
(a) Teoria (elementar) dos conjuntos;
(b) Conceitos de Análise Real: enumerabilidade, limite, supremum e noções de topologia
da reta.
Fomos cuidadosos nas motivações de cada capı́tulo, fazendo considerações de caráter
filosófico/histórico da matéria. Para atender ao público do livro, alunos com pouca bagagem
matemática, colocamos exercı́cios mais concretos do que os usualmente encontrados em livros
de medida e muitos exemplos para ilustrar as definições.
Quanto ao conteúdo selecionado, apresentamos a Teoria Geral de Medida, sem nos restrin-
gir à Medida de Lebesgue, pela sua importância em Probabilidade. Apresentamos a medida
de Lebesgue utilizando o método de Carathéodory pelo seu uso na construção das medidas
de Lebesgue-Stieltjes e de Hausdorff. Damos destaque a comparação entre as integrais de
Riemann e Lebesgue.
Gostarı́amos também que o aluno adquirisse um vocabulário básico da Teoria da Medida:
Teorema da Convergência Monótona e Dominada, Fubini, derivada de Radon-Nikodým, espaço
produto. Por isso incluı́mos estes resultados explicando sua importância mas sem incluir sua
demonstração (que tomaria muito tempo).
Com o estudo desta apostila o aluno estará pronto, por exemplo, para aplicações em Teoria
de Probabilidades, Finanças e em Equações Diferenciais Parciais.

As fontes principais desta apostila são:


(a) artigos da Wikipedia sobre medida e integração;
(a) capı́tulos 11, 12 and 13 de Measure Theory, de D.H.Fremlin, University of Essex, Col-
chester, England. Cerca de metade dos exercı́cios são deste livro. Isso foi possı́vel pois este ma-
terial possui a Design Science License, que pode ser vista em http://dsl.org/copyleft/dsl.txt.
Recomendamos como leitura complementar o livro do Bartle (Elements of Integration, ver
Bibliografia) por ser um curto e apropriado para um primeiro contato com a matéria.

iii
iv
Sumário
1 Espaço com Medida 1
1.1 σ-Álgebras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
1.2 Espaços com Medida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
1.3 Medida Exterior e Método de Carathéodory . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
1.4 Medida de Lebesgue em R . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
1.5 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
1.5.1 σ-Álgebras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
1.5.2 Espaços com Medida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
1.5.3 Medida Exterior e Método de Carathéodory . . . . . . . . . . . . . . 15
1.5.4 Medida de Lebesgue em R . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

2 Integração 19
2.1 Funções Mensuráveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
2.2 Definição da Integral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
2.3 Teoremas de Convergência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
2.4 Integral de Riemann × Lebesgue . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
2.5 Teorema de Radon-Nikodým e Fubini . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
2.6 Outras Construções da Integral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32
2.7 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
2.7.1 Funções Mensuráveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
2.7.2 Definição da Integral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
2.7.3 Teoremas de Convergência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
2.7.4 Integral de Riemann × Lebesgue . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
2.7.5 Teorema de Radon-Nikodým e Fubini . . . . . . . . . . . . . . . . . 36

3 Probabilidade e Medida 39

Bibliografia 41

v
vi SUMÁRIO
Capı́tulo 1
Espaço com Medida
Uma medida num conjunto X é uma função que atribui um número real não-negativo para
subconjuntos de X. Pode ser interpretada como área, tamanho, massa, volume, capacidade
térmica ou qualquer propriedade aditiva, i.e., uma propriedade tal que a medida da união de
dois conjuntos disjuntos é igual a soma de suas medidas. Um exemplo importante é a medida
de Lebesgue no espaço euclidiano, que atribui comprimento, área e volume, respectivamente,
a subconjuntos de Rn com n = 1, 2, 3.
Podemos enxergar a origem do conceito de medida no conceito de contagem. De fato, a
ideia de contagem pode ser generalizada de dois modos:
(a) como cardinalidade, ou (b) como medida.
Existem conjuntos que são pequenos do ponto de vista da medida mas grandes do ponto
de vista da cardinalidade. Um exemplo é Q, que possui medida (de Lebesgue) 0 mas possui
infinitos pontos (cardinalidade infinita).
Gostarı́amos de atribuir uma medida para cada subconjunto de X mas o axioma da es-
colha implica, de forma não-trivial, que existem subconjuntos de R (conjuntos de Vitali1 , ver
Exercı́cio 40, p.17) aos quais não podemos atribuir medida quando ela generaliza o compri-
mento de intervalos de R. De fato é impossı́vel atribuir comprimento a todos subconjuntos
de R preservando a aditividade e invariância por translação.
Por isso temos que considerar uma coleção especial (usualmente menor) de subconjuntos
de X onde a medida está definida, a chamada σ-álgebra de subconjuntos de X.
Elementos da σ-álgebra são chamados de conjuntos mensuráveis. Uma função é dita
mensurável se a imagem inversa de todo mensurável é um mensurável.
Decidimos apresentar a Teoria Geral da Medida, ao invés de medida de Lebesgue somente,
pois a teoria geral é fundamental para a teoria de probabilidade e é mais fácil que a construção
da medida de Lebesgue. De fato, para construir a medida de Lebesgue é necessário antes
introduzir medida exterior e o método de Carathéodory.
Em resumo, nas duas primeiras seções definimos σ-álgebra e espaço de medida e nas duas
últimas seções apresentamos medida exterior (uma forma de construir medidas não-triviais) e
a medida de Lebesgue.
1
Giuseppe Vitali: 1875 Ravenna, Italy – 1932 Bologna, Italy.

1
2 CAPÍTULO 1. ESPAÇO COM MEDIDA

1.1 σ-Álgebras
O conceito usual de comprimento, área e volume se aplica somente a conjuntos com uma
certa regularidade. Por isso para definir o conceito de medida temos que começar definindo
uma classe de subconjuntos que podem ser medidos, a chamada σ-álgebra.

DEFINIÇÃO 1.1 Uma σ-álgebra de subconjuntos de X é uma famı́lia Σ de subconjuntos


de X tais que:
(a) ∅ ∈ Σ;
(b) para todo E ∈ Σ, seu complemento E { = X \ E [∈ Σ;
(c) para toda sequência hEn in∈N em Σ, sua união En ∈ Σ.
n∈N
Elementos de Σ são chamados de conjuntos mensuráveis.

Observação 1.1 Uma álgebra de conjuntos é um subconjunto fechado pelas operações de


complementação e por união finita. O σ da σ-álgebra é porque ela é fechada também pela
união enumerável. Note que, ao contrário da união, não consideramos a complementação
enumerável (porque?).

Exemplo 1.1 Existem duas σ-álgebra de subconjuntos de X que são canônicas:


(a) Σ = { ∅, X }, a menor σ-álgebra de X; (b) P(X), a maior σ-álgebra de X.

Exemplo 1.2 Considere X = { 1, 2, 3, 4 }. São σ-álgebra de X (porque?):


(a) Σ = { ∅, { 1 }, { 2, 3, 4 }, X }; (b) Σ = { ∅, { 1, 2 }, { 3, 4 }, X }.

Exemplo 1.3 O conjunto Σ = {A ∈ P(N); A é infinito} ∪ { ∅ } satisfaz algumas das


propriedades (quais?) mas não é uma σ-álgebra.

Exemplo 1.4 O conjunto Σ = { ∅, Q, Q{ , R } é uma σ-álgebra de R (porque?).

Exemplo 1.5 O conjunto Σ = {A ∈ P(R); A ou A{ é enumerável} é uma σ-álgebra de R


(porque?).

Exemplo 1.6 O conjunto Σ = {A ∈ P(R); A é um intervalo} não é uma σ-álgebra de R


(porque?).

A prova do próximo lema é um exercı́cio fácil deixado para o leitor.

LEMA 1.2 (Propriedades Elementares de uma σ-álgebra) Se Σ é uma σ-álgebra de


subconjuntos de X, então para todo E, F ∈ Σ:
(a) E ∪ F ∈ Σ; (b) E ∩ F ∈ Σ; (c) E \ F ∈ Σ;
\
(d) se hEn in∈N é uma sequência em Σ, então En ∈ Σ.
n∈N
1.1. σ-ÁLGEBRAS 3

Exemplo 1.7 Se En , Fq , Gt ∈ Σ para todo n ∈ Z, q ∈ Q e t ∈ R, pela definição e pelo


último lema (reindexando as famı́lias de conjuntos envolvidas) pertencem a Σ:
\ [ \ [
En , En , Fn , Fn .
n∈Z n∈Z q∈Q q∈Q

[ \
Por outro lado, Et e Et podem não pertencer a Σ (porque?).
t∈[0,1] t∈[0,1]

O próximo lema, cuja prova é um exercı́cio fácil deixado para o leitor, define um tipo
não-trivial de σ-álgebra gerado por uma famı́lia de σ-álgebras. A formulação é abstrata mas
é uma técnica muito utilizada em álgebra e análise para se obter a existência de um objeto
mı́nimo com certa propriedade: tome a interseção de todos objetos com esta propriedade.
Do lema decorrerá a definição de σ-álgebra gerada por uma famı́lia de conjuntos, cujo
exemplo mais importante é da σ-álgebra de Borel, gerada pelos subconjuntos abertos de um
espaço topológico.

LEMA 1.3 Seja S = (Σi )i∈I uma famı́lia (não-vazia) de σ-álgebras de subconjuntos de X.
Então \
Σi = {E ∈ Σi ; para todo i ∈ I},
i∈I

a interseção de todas as σ-álgebras que pertencem a S, é uma σ-álgebra de X.

COROLÁRIO 1.4 Seja A uma famı́lia de subconjuntos de X. Existe ΣA , a menor σ-álgebra


de subconjuntos de X incluindo A, i.e., se Σ
e é uma σ-álgebra contendo A, então ΣA ⊂ Σ.
e
Demonstração. Defina

S , {Σ; Σ uma σ-álgebra de subconjuntos de X, A ⊂ Σ}


T
e ΣA , S. Complete o argumento.

DEFINIÇÃO 1.5 Dizemos que ΣA ⊂ P(X) é a σ-álgebra de subconjuntos de X gerada


por A ⊂ P(X) se:
(a) ΣA é uma σ-álgebra;
(b) A ⊂ ΣA ;
e é uma σ-álgebra com A ⊂ Σ,
(c) Se Σ e então ΣA ⊂ Σ
e (a menor).

Exemplo 1.8 Para um X qualquer, a σ-álgebra gerada por ∅ é { ∅, X }.

Exemplo 1.9 A σ-álgebra de subconjuntos de N gerada por {{ n }; n ∈ N} é P(N).

Exemplo 1.10 A σ-álgebra de subconjuntos de N gerada por { { 1 }, { 2 } } é


{ ∅, { 1 }, { 2 }, { 1, 2 }, { 1 }{ , { 2 }{ , { 1, 2 }{ , N }.
4 CAPÍTULO 1. ESPAÇO COM MEDIDA

DEFINIÇÃO 1.6 A σ-álgebra gerada pela famı́lia de abertos de R (ou Rn ) é conhecida


como σ-álgebra de Borel. Seus elementos são os conjuntos de Borel2 ou borelianos.

Observação 1.2 Veremos no Exercı́cio 4, p.13 que a σ-álgebra de Borel de R é gerada


também pelos intervalos abertos ou fechados, limitados ou ilimitados.

Esta definição é generalizada para um espaço topológico (conjunto munido de uma


topologia, um subconjunto das partes satisfazendo algumas propriedades, similar a definição
de σ-álgebra) qualquer. Caso não saiba o que é um espaço topológico, não se preocupe, pois
esta definição não será utilizada neste texto.

DEFINIÇÃO 1.7 Seja X um espaço topológico. A σ-álgebra gerada pela famı́lia de conjun-
tos abertos de X é conhecida como σ-álgebra de Borel. Seus elementos são os conjuntos
de Borel3 ou borelianos de X.

1.2 Espaços com Medida


A teoria da medida foi desenvolvida no final do século XIX e no inı́cio do século XX por Emile
Borel, Henri Lebesgue4 , Johann Radon5 and Maurice Fréchet6 , entre outros. As principais
aplicações são:
• na fundamentação da integral de Lebesgue, que generaliza (com vantagens) a integral
de Riemann.

• na axiomatização da teoria de probabilidade feita por Andrey Kolmogorov;

• na definição de integral em espaços mais gerais do que os euclidianos.

DEFINIÇÃO 1.8 Dizemos que a sequência T hEn in∈N é disjunta se nenhum ponto pertence
a mais do que um En , isto é, se Em En = ∅ para todos m, n ∈ N distintos.
De forma análoga, se hEi ii∈I é uma T famı́lia de conjuntos indexada por um conjunto
arbitrário I, então ele é disjunto se Ei Ej = ∅ para todos i, j ∈ I distintos.

Para definir medida precisamos dizer o que significa uma função assumir valores em [0, ∞].
Este conjunto é a união do elemento ‘∞’ com o intervalo [0, ∞) ⊂ R: um novo significado
para o ∞ em Matemática. Em medida ele significa comprimento, área ou volume infinito.
Precisamos definir as operações aritméticas básicas envolvendo ∞:
(a) adição: ∞ + ∞ = ∞ + a = a + ∞ = ∞ para todo a ∈ R;
(b) subtração: ∞ − a = ∞ para todo a ∈ R; mas ∞ − ∞ não está definido;
(c) multiplicação: ∞ · ∞ = a · ∞ = ∞ · a = ∞ para todo a > 0 e convencionamos (em
medida, confronte com cálculo) 0 · ∞ = ∞ · 0 = 0.
2
Émile Borel: 1871 Saint Affrique, France – 1956 Paris, France.
4
Henri Lebesgue: 1875 Beauvais, France–1941 Paris, France.
5
Johann Radon: 1887 Tetschen, Bohemia (now Decin, Czech Republic) – 1956 Vienna, Austria.
6
Maurice Fréchet: 1878 Maligny, France – 1973 Paris, France.
1.2. ESPAÇOS COM MEDIDA 5

Finalmente podemos estender a relação de ordem usual para incluir ∞: a < ∞ para todo
a ∈ R. Com isto podemos definir o sup e o inf de subconjuntos de R ∪ { ∞ }. A convenção
usual é que inf ∅ = ∞.

X
Outro ponto é: como interpretar xn com xn ∈ [0, ∞]?
n=0
(a) se todos os xn são finitos, trata-se de uma série de termos não-negativos: ou converge
para um número real, ou é ilimitada, quando diremos que converge para ∞ (porque?).
X∞
(b) se um dos xn ’s é igual a ∞, escrevemos que xn = ∞.
n=0

DEFINIÇÃO 1.9 Um espaço de medida é uma tripla (X, Σ, µ) onde:


(a) X é um conjunto;
(b) Σ é uma σ-álgebra de subconjuntos de X;
(c) µ : Σ → [0, ∞] é uma função tal que:
(c1) µ(∅) = 0; !
[ ∞
X
(c2) se hEn in∈N é uma sequência disjunta em Σ, então µ En = µ(En ).
n∈N n=0
Os elementos de Σ são chamados de conjuntos mensuráveis (ou µ-mensuráveis), e µ
é chamado de uma medida em X. A propriedade (c2) é chamada de σ-aditividade ou
aditividade contável.

Observação 1.3 Uma medida definida numa σ-álgebra de Borel (ver Definição 1.6, p.4)
é conhecida como medida de Borel.
Em linguagem informal, uma função é chamada de medida se atribui um número real
não-negativo ou infinito para cada conjunto, é aditiva (medida da soma é igual a soma
das medidas de conjuntos disjuntos) e vale zero no conjunto vazio. Como já dissemos, é
necessário se restringir a uma σ-álgebra pois é impossı́vel, de forma geral, se atribuir uma
medida a TODOS os subconjuntos, a não ser para algumas medidas triviais que apresentamos
na sequência (por exemplo a medida delta de Dirac do Exemplo 1.11, p.6 e a medida de
contagem do Exemplo 1.12, p.6), definidas na σ-álgebra trivial P(X).

DEFINIÇÃO 1.10 Seja h : X → [0, ∞] uma função qualquer. Dado E ⊂ X, defina:


( )
X X
µh (E) , h(x) , sup h(x); I ⊂ E é finito .
x∈E x∈I

Então µh é uma medida em P(X) (porque?). Dizemos que é uma medida pontual.

X
Observação 1.4 Definimos h(x) , 0.
x∈∅
6 CAPÍTULO 1. ESPAÇO COM MEDIDA

Exemplo 1.11 Um caso particular importante é dado a ∈ X, a medida


( µIa , conhecida como
0, se a 6∈ Y,
medida delta de Dirac7 , denotada por δa , de modo que δa (Y ) =
1, se a ∈ Y.

Exemplo 1.12 Outro caso importante é obtido


( se h(x) = 1 para todo x. Obtemos a medida
no. de pontos de E, se E é finito,
de contagem em X, definida por µh (E) =
∞, se E é infinito.

Exemplo 1.13 Seja X = N, h(n) = 2−n−1 para cada n; então µ(N) = 1


2
+ 41 + · · · = 1.

LEMA 1.11 (Propriedades elementares da medida) Seja (X, Σ, µ) um espaço de me-


dida.
(a) Se E, F ∈ Σ e E ∩ F = ∅, então µ(E ∪ F ) = µ(E) + µ(F ).
(b) Se E, F ∈ Σ e E ⊂ F , então µ(E) ≤ µ(F ).
(c) µ(E ∪ F ) ≤ µ(E) + µ(F ) para todo E, F ∈ Σ. !
[ ∞
X
(d) Se hEn in∈N é uma sequência em Σ, então µ En ≤ µ(En ).
n∈N n=0
(e) Se hEn in∈N é uma sequência não-decrescente em Σ (isto é, En ⊂ En+1 para todo
n ∈ N), então !
[
µ En = lim µ(En ) = sup µ(En ).
n→∞ n∈N
n∈N

(f) Se hEn in∈N é uma sequência não-crescente em Σ (isto é, En+1 ⊂ En para todo
n ∈ N), e se algum µ(En ) é finito, então
!
\
µ En = lim µ(En ) = inf µ(En ).
n→∞ n∈N
n∈N

Demonstração. Deixamos (a), (b)


[ e (c) como exercı́cios.
(d) Seja F0 = E0 , Fn = En \ Ei para n ≥ 1; então hFn in∈N é uma sequência disjunta
i<n
em Σ. Complete esta prova.
(e) Seja F0 = E0 , Fn = En \ En−1 para n ≥ 1; então!hFn in∈N é uma sequência disjunta
[ [ [ X∞
em Σ e Fn = En . Consequentemente µ En = µ(Fn ). Mas uma indução
n∈N n∈N n∈N n=0
n
X
fácil em n, usando (a) para o passo indutivo, mostra que µ(En ) = µ(Fm ) para todos n.
m=0
Então

X n
X
µ(Fn ) = lim µ(Fm ) = lim µ(En ).
n→∞ n→∞
n=0 m=0

7
Paul Dirac: 1902 Bristol, England – 1984 Tallahassee, Florida, USA.
1.2. ESPAÇOS COM MEDIDA 7

Finalmente, lim µ(En ) = sup µ(En ) porque (por (b)) hµ(En )in∈N é não-decrescente.
n→∞ n∈N [
(f) Suponha que µ(Ek ) < ∞. Defina Fn , Ek \ Ek+n para n ∈ N, F = Fn ; então
n∈N
hFn in∈N é uma sequência não-decrescente em Σ e µ(F ) = lim µ(Fn ), por (e) acima. Temos
n→∞
que µ(Fn ) + µ(Ek+n ) = µ(Ek ); como µ(Ek ) < ∞, nós podemos escrever que µ(Fn ) =
µ(Ek ) − µ(Ek+n ), e portanto

µ(F ) = lim (µ(Ek ) − µ(Ek+n )) = µ(Ek ) − lim µ(En ).


n→∞ n→∞

Agora, F ⊂ Ek , então µ(F ) + µ(Ek \ F ) = µ(Ek ), e (novamente pois µ(Ek ) é finito)


µ(F ) = µ(Ek ) − µ(Ek \ F ). Portanto nos temos que µ(Ek \ F ) = lim µ(En ). Mas Ek \ F
\ n→∞
é somente En .
n∈N
Finalmente, lim µ(En ) = inf µ(En ) pois hµ(En )in∈N é não-crescente.
n→∞ n∈N

Observação 1.5 Observe que em (f) acima é essencial ter que inf µ(En ) < ∞. De
n∈N
fato, tome X = N e seja µ a medida de contagem em X do Exemplo 1.12, p.6. Defina
En , {i ∈ N; i ≥ n} para cada n. Então En+1 ⊂ En para cada n, mas
!
\
µ En = µ(∅) = 0 < ∞ = lim µ(En ).
n→∞
n∈N

DEFINIÇÃO 1.12 Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. Um conjunto A ⊂ X possui


medida nula se existe um conjunto E ∈ Σ tal que A ⊂ E e µ(E) = 0.

Observação 1.6 Um conjunto de medida nula não precisa ser mensurável, embora esteja
contida em um conjunto mensurável de medida nula.

DEFINIÇÃO 1.13 Espaços de medida em que todos os conjuntos de medida nula são men-
suráveis é chamado de completo.

Deixamos a demonstração do próximo lema como exercı́cio.

LEMA 1.14 (Ideal de Conjuntos de Medida Nula) Seja N a famı́lia de conjuntos de


medida nula de um espaço de medida (X, Σ, µ). Então:
(a) ∅ ∈ N ;
(b) se A ⊂ B ∈ N , então A ∈ N ; [
(c) se hAn in∈N é uma sequência em N , então An ∈ N .
n∈N

LEMA 1.15 Dado um espaço de medida (X, Σ, µ), existe um espaço de medida completo
(X, Σ,
e µe) tal que Σ ⊂ Σ
e eµ=µ
e em Σ.
8 CAPÍTULO 1. ESPAÇO COM MEDIDA

Demonstração. Seja N a famı́lia de conjuntos de medida nula de (X, Σ, µ). Considere


e , {X ∪ Z ∈ P(X); X ∈ Σ, Z ∈ N }. Para cada Y ∈ Σ,
Σ e Y = X ∪ Z, defina
µ
e(Y ) , µ(X). Complete o argumento.

Exemplo 1.14
(a) para a medida de contagem, o único conjunto de medida nula é o ∅.
(b) para a medida δa de Dirac, um conjunto A possui medida nula se, e somente se,
a 6∈ A.

DEFINIÇÃO 1.16 Se uma afirmação P (x) pode ser aplicada aos elementos x ∈ X de um
espaço com medida µ, nós dizemos que

P (x) para (µ-)quase todo ponto x ∈ X

significando que o conjunto {x ∈ X; P (x) é falso} possui medida nula com relação a medida
µ.

Observação 1.7 As expressões ‘quase todo ponto’ (qtp), ‘quase sempre’, ‘almost
everywhere’ (a.e.), ‘almost surely’ (a.s.), ‘presque partout’ (p.p.) significam a mesma
coisa.

Exemplo 1.15 Se f, g, fn : X → R são funções:


(a) ‘f > 0 qtp.’ significa que {x ∈ X; f (x) ≤ 0} possui medida nula;
(b) ‘f = g qtp.’, significa que {x ∈ X; f (x) 6= g(x)} possui medida nula;
(c) ‘f < g qtp.’, significa que {x ∈ X; f (x) ≥ g(x)} possui medida nula;
(d) ‘f ≥ g qtp.’, significa que {x ∈ X; f (x) < g(x)} possui medida nula;
(f) ‘fn → g qtp.’, significa que {x ∈ X; fn (x) 6→ g(x)} possui medida nula.

Se o conjunto onde está definido a medida é um espaço topológico (conjunto munido


de uma topologia, similar a definição de σ-álgebra), podemos colocar condições de compa-
tibilidade entre a medida e a topologia. O exemplo importante é uma medida definida na
σ-álgebra gerada pelos abertos, (σ-álgebra de Borel, ver Definição 1.7, p.4), conhecida como
medida de Borel.

1.3 Medida Exterior e Método de Carathéodory


A teoria geral de Medida Exterior (também chamado de pré-medida) foi introduzida por Cara-
théodory8 . É um método fundamental para se definir medidas não-triviais, incluindo a medida
de Lebesgue.
Vamos ilustrar como esta construção abstrata surge quando se tenta estender a medida
de intervalos para um subconjunto qualquer de R. Podemos proceder da seguinte forma:
8
Constantin Carathéodory: 1873 Berlin, Germany – 1950 Munich, Germany.
1.3. MEDIDA EXTERIOR E MÉTODO DE CARATHÉODORY 9

(a) Defina a medida de um intervalo (a, b) (ou [a, b], ou (a, b], etc.) como b − a.
(b) Dado um conjunto A ⊂ R qualquer defina sua medida como o ı́nfimo da soma das
medidas de intervalos que cobrem A.
(c) Esta pré-medida não possui a propriedade natural de ser σ-aditiva (medida da união
enumerável disjunta é igual a soma das medidas) em P(R): é necessário reduzir seu domı́nio
para que seja.
De forma mais geral o Método de Carathéodory consiste do seguinte:
(a) Definimos uma função, a chamada medida exterior ou pré-medida, em P(X). Exigimos
da medida exterior menos do que da medida (subaditividade ao invés de aditividade).
(b) Restringimos esta função a um certo subconjunto, que será uma σ-álgebra, grande o
suficiente para ser interessante, onde a medida exterior é uma medida.
Este roteiro justifica o nome pré-medida, utilizado para se denominar as medidas exteriores
por alguns autores.
Embora existam outras formas de construir a medida de Lebesgue (por exemplo veja a
Seção 2.6, p.32), esta construção é utilizada para se definir outras medidas, como por exemplo
a medida (exterior) de Hausdorff, que merecerá mais comentários no final do capı́tulo na p.12.

DEFINIÇÃO 1.17 Uma medida exterior ou pré-medida em X é uma função


θ∗ : P(X) → [0, ∞] tal que
(a) θ∗ (∅) = 0,
(b) se A ⊂ B ⊂ X, então θ∗ (A) ≤ θ∗ (B) (monótona),
(c) para toda sequência hAn in∈N de subconjuntos de X,
! ∞
[ X

θ An ≤ θ∗ (An ) (subaditiva).
n∈N n=0

Observação 1.8 A ideia de medida exterior (ou pré-medida) de A é que é um limite de


todas as possı́veis medidas de A. É similar, em integração, ao conceito de integral superior.
Será a medida de A caso A seja mensurável, o que ocorrerá caso a fronteira de A seja
“bem comportada”.

Nós apresentamos agora o Teorema mais importante da Teoria básica de Medida. Como a
prova é longa e muito técnica, será omitida. Em resumo, dada uma medida exterior θ∗ existe
uma σ-álgebra maximal tal que θ∗ restrita a esta σ-álgebra é uma medida.

? TEOREMA 1.18 (Teorema da Extensão de Carathéodory) Seja θ∗ uma medida ex-


terior em X. Defina

Σθ∗ , {A ⊂ X; θ∗ (E) = θ∗ (E ∩ A) + θ∗ (E \ A) para todo E ⊂ X}.

Então Σθ∗ é uma σ-álgebra de subconjuntos de X gerado pela medida exterior θ∗ . Defina
µ : Σθ∗ → [0, ∞] por µ(A) , θ∗ (A) para A ∈ Σθ∗ ; então (X, Σθ∗ , µ) é um espaço de medida
completo.
10 CAPÍTULO 1. ESPAÇO COM MEDIDA

Observe que o conjunto A decompõe qualquer E em duas partes disjuntas (E ∩ A) e


(E \ A) (ver Figura 1.1). Como θ∗ é somente subaditiva (se fosse aditiva terı́amos igualdade)
nós temos que
θ∗ (E) ≤ θ∗ (E ∩ A) + θ∗ (E \ A).
Se a igualdade ocorrer para todo E, então o conjunto A será mensurável com relação a
medida µ.

E1 ∩ A E2 ∩ A

A A
E1 E2

E1 \ A E2 \ A
E3 ∩ A E4 ∩ A
E4
E3
A A

E3 \ A E4 \ A

Figura 1.1: A é mensurável sse θ∗ (Ei ) = θ∗ (Ei ∩ A) + θ∗ (Ei \ A) para todo Ei .

1.4 Medida de Lebesgue em R


A medida de Lebesgue, além de ser a mais importante para aplicações, foi, historicamente, o
guia para a Teoria Geral da Medida, onde os resultados inicialmente foram desenvolvidos.
O roteiro que vamos seguir é definir o comprimento de intervalos e utilizá-los para definir
uma medida exterior. Aplicando o Teorema de Extensão de Carathéodory obtemos uma
medida e uma σ-álgebra, chamadas de medida e σ-álgebra de Lebesgue. Esta será a primeira
medida não-trivial que definiremos. Nos exercı́cios existem diversas outras medidas construı́das
de forma semelhante como por exemplo (Exercı́cio 41, p.17) a medida de Lebesgue-Stieltjes,
muita usada em Probabilidade.

DEFINIÇÃO 1.19 Seja I = [a, b) ⊂ R um intervalo semiaberto. Definimos seu compri-


mento λ(I) por
λ(∅) , 0, λ([a, b)) , b − a se a < b.
1.4. MEDIDA DE LEBESGUE EM R 11

DEFINIÇÃO 1.20 Definimos θ∗ : P(R) → [0, ∞], a medida exterior de Lebesgue por
(∞ )
X [
θ∗ (A) , inf λ(Ij ); hIj ij∈N é uma seq. de intervalos semiabertos t.q. A ⊂ Ij .
j=0 j∈N

Observação 1.9 Observe que θ∗ está bem definida pois todo [A pode ser coberto por
alguma sequência de intervalos semiabertos – por exemplo A ⊂ [−n, n); portanto nós
n∈N
sempre temos um conjunto não-vazio para tomar o infimum, e θ∗ (A) está sempre definida
em [0, ∞].

O fato que θ∗ é uma medida exterior é justificado pelo item (a) da próxima Proposição.
Deixamos como exercı́cio provar (a) e parte de (b).

PROPOSIÇÃO 1.21 (Medida exterior de Lebesgue) Seja θ∗ dada pela Definição 1.20.
(a) θ∗ é uma medida exterior em R.
(b) θ∗ é uma extensão de λ, isto é, θ∗ (I) = λ(I) para todo intervalo semiaberto I ⊂ R.
Como a medida exterior de Lebesgue é uma medida exterior, podemos usá-la para construir
a medida µ usando o método de Carathéodory.

DEFINIÇÃO 1.22 A medida µ obtida pela aplicação do Teorema 1.18 à medida exterior θ∗
é chamada de medida de Lebesgue em R. Os conjuntos E ⊂ R tais que

θ∗ (A ∩ E) + θ∗ (A \ E) = θ∗ (A), para todo A ⊂ R,

são chamados de conjuntos mensuráveis a Lebesgue.

No caso da medida de Lebesgue, em livros de análise aparece a definição abaixo, equiva-


lente a definição geral de conjunto de medida nula já apresentado (porque?).

DEFINIÇÃO 1.23 Dizemos que A ⊂ R tem medida (de Lebesgue) nula se para todo
ε > 0, existe uma sequência (In )n∈N de intervalos abertos e limitados tal que
+∞
[ +∞
X
A⊂ In e |In | ≤ ε, (1.1)
n=1 n=1

sendo que |I| representa o comprimento do intervalo I, ou seja, |I| = b − a se I = (a, b).

Terminamos apresentando (sem demonstração) um Teorema que relaciona conjuntos de


Borel com conjuntos mensuráveis a Lebesgue. Sua importância é garantir que utilizando o
método de Carathéodory obtemos uma σ-álgebra grande o suficiente para incluir os conjuntos
de Borel.
? TEOREMA 1.24 (Conjuntos de Borel são mensuráveis a Lebesgue) Todo conjunto
de Borel de R é mensurável a Lebesgue.
12 CAPÍTULO 1. ESPAÇO COM MEDIDA

Este resultado implica que todos conjuntos abertos e fechados e todos intervalos são conjuntos
mensuráveis a Lebesgue.

Observação 1.10 Pode-se exibir (exemplo de Lusin – ver Wikipedia: Non-Borel set) um
conjunto que não é Borel mas é Lebesgue mensurável. Por contraste, pode-se provar a
existência (o conjunto de Vitali) de um conjunto não-mensurável a Lebesgue mas este
conjunto não pode ser exibido pois a prova é feita utilizando o axioma da escolha (ver
Exercı́cio 40, p.17).

Devido a dificuldade da existência de conjuntos não-mensuráveis a Lebesgue, nas aplicações


eles frequentemente são ignorados: é assumido que todo conjunto pode ser medido.

Observação 1.11 Podemos provar que a medida de Lebesgue é a única medida em R


que:
(a) é completa (Definição 1.13, p.7);
(b) é invariante por translação (i.e., µ(A) = µ(A + x) para todo x ∈ R);
(c) contém a σ-álgebra dos intervalos de R;
(d) atribui 1 ao intervalo [0, 1].
Isto se generaliza de forma óbvia para o Rn . Note a semelhança com a unicidade do
determinante em Rn como única forma multilinear que atribui o valor 1 a um n-cubo.

A medida de Lebesgue é generalizada pela medida de Haar9 para um grupo topológico


localmente compacto. O conjunto R é um grupo sob a operação de soma. Assim a medida
de Lebesgue é invariante pela operação deste grupo. Podemos generalizar isto para um grupo
e obter a medida de Haar. Um exemplo é a medida de Haar no cı́rculo, que corresponde a
medida do comprimento de arco do conjunto. Ela possui uma unicidade similar a medida de
Lebesgue se for normalizada.
Finalmente temos a famı́lia de medidas exteriores de Hausdorff10 , que generalizam a
medida de Lebesgue para subconjuntos do Rn (e de forma mais geral para qualquer espaço
métrico, em particular para espaços de Hilbert). A medida 0-dimensional de Hausdorff é
o número de pontos de um conjunto (a medida de contagem do Exemplo 1.12, p.6), a
medida 1-dimensional de um curva em Rn é seu comprimento, e a medida 2-dimensional é
proporcional a área de superfı́cie, etc. Além disso existem medidas d-dimensionais de Hausdorff
para todo d ≥ 0 (não necessariamente um inteiro!). Com elas podemos definir a dimensão
(não necessariamente inteira) de Hausdorff de subconjuntos. Faz parte da chamada Teoria
Geométrica da Medida. Ela aparece no estudo de atratores (em sistemas dinâmicos), na
análise harmônica e na teoria do potencial.
A forma como construı́mos a medida de Lebesgue nesta seção pode ser apresentada de
forma abstrata da seguinte forma. Considere I uma famı́lia de subconjuntos de X (no caso
da medida de Lebesgue, intervalos semiabertos) tal que ∅ ∈ I e λ : I → [0, ∞) uma função
tal que λ(∅) = 0 (no caso da medida de Lebesgue, o comprimento do intervalo). Defina

9
Haar
10
Felix Hausdorff: 1868 Breslau, Germany (now Wroclaw, Poland) – 1942 Bonn, Germany.
1.5. EXERCÍCIOS 13

θ∗ : P(X) → [0, ∞] por


(∞ )
X [
θ∗ (A) , inf λ(Ij ); hIj ij∈N é uma seq. in I t.q. A ⊂ Ij ,
j=0 j∈N

interpretando inf ∅ como ∞, de modo que θ∗ (A) = ∞ se A não é coberto por qualquer
sequência em I (na caso da medida de Lebesgue isto não acontece). Podemo provar que θ∗ é
uma medida exterior em X. No Exercı́cio 31, p.16 exploramos uma construção similar porém
mais simples.
Outros exemplos importantes que utilizam esta construção abstrata é:
(a) A medida de Lebesgue-Stieltjes, apresentada no Exercı́cio 41, p.17, muita usada em
Probabilidade.
(b) A medida exterior de Hausdorff referida acima.

1.5 Exercı́cios
1.5.1 σ-Álgebras
=⇒ 1. Porque não precisamos considerar a operação de complementação enumerável na De-
finição 1.1, p.2?
=⇒ 2. Considere Σ = {A ⊂ R; A é enumerável ou A{ é enumerável} e A = {{ x }; x ∈ R}
(subconjuntos de R unitários). Prove que:
(a) Σ é uma σ-álgebra; (b) a σ-álgebra gerada por A é igual a Σ.
=⇒ 3. Considere X = { 1, 2, 3, 5, 6 }. Determine a σ-álgebra gerada por:
(a) A1 = { { 2 } }; (b) A2 = { { 1, 2 } }; (c) A3 = { { 1, 2, 3 } };
(d) A4 = { { 1, 2 }, { 1, 3 } }; (e) A5 = { { 1 }, { 2, 3 } }.
=⇒ 4. Considere as seguintes famı́lias de intervalos de R:
A1 = {(−∞, a) ; a ∈ R}, A2 = {[a, ∞) ; a ∈ R},
A3 = {[a, b); a, b ∈ R}, A4 = {[a, b]; a, b ∈ R}.
(a) Prove que todo intervalo I ∈ Ai , para algum i, é um conjunto de Borel.
(b) Prove que a σ-álgebra gerada por Ai , para cada i, é a σ-álgebra de Borel.
→ 5. Seja Σ uma σ-álgebra de subconjuntos de X e A ⊂ X. Prove que

{(E ∩ A) ∪ (F \ A); E, F ∈ Σ}

é uma σ-álgebra de subconjuntos de X gerada por Σ ∪ { A }.


Dica: Prove a união primeiro. Prove a interseção e use leis de Morgan para o complemen-
tar.
6. Prove o Lema 1.2, p.2.
7. Prove o Lema 1.3, p.3.
8. Complete o argumento do Corolário 1.4, p.3.
14 CAPÍTULO 1. ESPAÇO COM MEDIDA

9. Prove que todo G ⊂ R aberto pode ser escrito de forma única como a união enumerável
de intervalos abertos.
Dica: Para cada x, y ∈ G, defina a relação x ∼ y se o intervalo [x, y] ⊂ G (se x ≤ y) ou
[y, x] ⊂ G (caso contrário). Prove que ∼ é uma relação de equivalência. Defina I como o
conjunto das classes de equivalência. Prove que existe uma função injetiva de I em Q. Cada
classe é um intervalo aberto.
ý 10. (extra) Prove que dado a ∈ R e um conjunto de Borel E ⊂ R, E + a é um conjunto de
Borel.
Dica: Prove que {E; E + a é Borel} é uma σ-álgebra contendo os abertos.
ý 11. (extra) Seja E ⊂ R2 um conjunto de Borel e P : R2 → R definida por P (x, y) , x
(projeção ortogonal no eixo-x). Prove que P (E) é um conjunto de Borel em R.

1.5.2 Espaços com Medida

12. Prove que se (An )n∈N é uma sequência de conjuntos de medida nula (veja Definição 1.12,
+∞
[
p.7), então An tem medida nula.
n=1

=⇒ 13. Prove que para a medida:


(a) de contagem, o único conjunto de medida nula é o ∅;
(b) δa de Dirac, um conjunto A possui medida nula se, e somente se, a 6∈ A.
=⇒ 14. Explique o significado das expressões abaixo para a medida de contagem e para a medida
δa de Dirac:
(a) f = 0 quase todo ponto; (b) f > 0 quase todo ponto.
15. Considere µh a medida pontual do Exemplo 1.10, p.5 com h = | sen |. Então µh (A) = 0
se, e somente se, A . . . . . . . . . (complete a lacuna).
=⇒ 16. Considere µh a medida pontual do Exemplo 1.10, p.5 com h = I{ x>0 } . Determine se é
Verdadeiro ou Falso:
(a) I{ x<−3 } = 0 µh -qtp; (b) I{ x<1 } = I{ 0≤x<1 } µh -qtp.
→ 17. Considere µh a medida pontual do Exemplo 1.10, p.5. Chamamos de suporte de uma
função f o conjunto dos pontos onde f se anula. Utilize o conceito de suporte para determinar
condições equivalentes a:
(a) µh (A) = 0; (b) g = 0 qtp. com relação a µh .
18. Prove que a medida pontual µh da Definição 1.10, p.5 é uma medida.
19. Prove os itens (a), (b), (c) e (d) do Lema 1.11, p.6.
20. Prove o Lema 1.14, p.7.
21. Considere a prova do Lema 1.15, p.7. Prove que
(a) Σ
e é uma σ-álgebra; (b) (X, Σ,
e µe) é completo.
→ 22. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. Prove que:
1.5. EXERCÍCIOS 15

(a) µ(E ∪ F ) + µ(E ∩ F ) = µ(E) + µ(F );


(b) µ(E ∪F ∪G)+µ(E ∩F )+µ(E ∩G)+µ(F ∩G) = µ(E)+µ(F )+µ(G)+µ(E ∩F ∩G)
para todo E, F , G ∈ Σ.
Dica: comece com o caso em que todas as medidas são finitas.
=⇒ 23. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. Defina a relação entre funções mensuráveis f ∼ g
se f = g qtp. Prove que esta relação é de equivalência.
ý 24. (extra) Seja Σ uma σ-álgebra de subconjuntos de X. Sejam µ1 e µ2 medidas em X
com domı́nio Σ. Defina, para cada E ∈ Σ,

µinf (E) , inf {µ1 (E ∩ F ) + µ2 (E \ F )}, µsup (E) , sup{µ1 (E ∩ F ) + µ2 (E \ F )}.


F ∈Σ F ∈Σ

(a) Prove que µinf e µsup são medidas em X com domı́nio Σ.


(b) Determine µinf e µsup se µ1 = δa e µ2 = δb para a, b ∈ R, medidas delta de Dirac do
Exemplo 1.11, p.6.
(c) Determine µinf e µsup se µ1 = µf e µ2 = µg , medidas pontuais (ver Definição 1.10,
p.5) dadas pelas funções f e g.
(d) Prove que µinf é a maior medida, com domı́nio Σ, tal que µinf (E) ≤ min(µ1 (E), µ2 (E))
para todo E ∈ Σ.
(e) Prove que µsup é a menor medida, com domı́nio Σ, tal que µsup (E) ≥ max(µ1 (E), µ2 (E))
para todo E ∈ Σ.
ý 25. (extra) Seja Σ uma σ-álgebra de subconjuntos de X. Seja N uma famı́lia não-vazia
de medidas em X, todas com domı́nio Σ. Suponha também que existe uma νe ∈ N tal que
νe(X) < ∞. Defina para cada E ∈ Σ,
( n n
)
X [
µmin (E) , inf νi (Fi ); n ∈ N, ν0 , . . . , νn ∈ N, F0 , . . . , Fn ∈ Σ, E ⊂ Fi ,
i=0 i=0
( n n
)
X [
µmax (E) , sup νi (Fi ); n ∈ N, ν0 , . . . , νn ∈ N, disjuntos F0 , . . . , Fn ∈ Σ, Fi ⊂ E .
i=0 i=0

Prove que:
(a) µmin e µmax são medidas.
(b) µmin é a maior medida e µmax é a menor medida, com domı́nio Σ, tal que

µmin (E) ≤ inf ν(E) e µmax (E) ≥ sup ν(E) para todo E ∈ Σ.
ν∈N ν∈N

Dica: Suponha inicialmente que N é finito e veja o exercı́cio anterior.

1.5.3 Medida Exterior e Método de Carathéodory


=⇒ 26. Compare a definição de medida (Definição 1.9, p.5) com a definição de medida exterior
(Definição 1.17, p.9). Tente provar a condição (b) da Definição 1.17, p.9 partindo de (c).
Contraste com (c1) da Definição 1.9, p.5.
16 CAPÍTULO 1. ESPAÇO COM MEDIDA

→ 27. Prove que se θ∗ é uma medida exterior em X, com A, B subconjuntos de X, então


θ∗ (A ∪ B) ≤ θ∗ (A) + θ∗ (B).
Dica: Tem algo para ser provado?
=⇒ 28. Seja θ∗ uma medida exterior em X, µ a medida definida pelo método de Carathéodory.
Prove que se θ∗ (A) = 0, então A é µ-mensurável com medida zero. Conclua que µ é completa
no sentido da Definição 1.13, p.7.
29. Suponha que θ1∗ , θ2∗ são medidas exteriores em X e hθi∗ ii∈I é uma famı́lia não-vazia
qualquer de medidas exteriores em X. Prove que são medidas exteriores:
(a) θ1∗ + θ2∗ , definindo (θ1∗ + θ2∗ )(A) , θ1∗ (A) + θ2∗ (A) para cada A ⊂ X.

(b) θsup ∗
, onde θsup (A) , sup θi∗ (A) para cada A ⊂ X.
i∈I
(c) θ1∗ ∧ θ2∗ , definindo (θ1∗ ∧ θ2∗ )(A) , inf{θ1∗ (B) + θ2∗ (A \ B); B ⊂ A} para cada A ⊂ X.
ý 30. (extra) Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. Para A ⊂ X defina

µ∗ (A) , inf{µ(E); E ∈ Σ, A ⊂ E}.

Prove que:
(a) existe E ∈ Σ tal que A ⊂ E e µ(E) = µ∗ (A).
(b) µ∗ é uma medida exterior em X.
ý 31. (extra) Considere λ : P(X) → [0, ∞] uma função qualquer tal que λ(∅) = 0. Defina
θ∗ : P(X) → [0, ∞] por
(∞ )
X [
θ∗ (A) , inf λ(Cj ); hCj ij∈N é uma seq. in P(X) t.q. A ⊂ Cj .
j=0 j∈N

Prove que θ∗ é uma medida exterior em X.


ý 32. (extra) Sejam θ1∗ , θ2∗ duas medidas exteriores em X. Prove que θ1∗ ∧ θ2∗ , como definida no
Exercı́cio 29, p.16, é uma medida exterior derivada pelo processo do Exercı́cio 31 do funcional
λ(C) , min(θ1∗ (C), θ2∗ (C)).

1.5.4 Medida de Lebesgue em R

=⇒ 33. Identifique uma função contı́nua em R que seja igual quase todo ponto com relação a
medida de Lebesgue em R a cada uma das funções abaixo:
(a) IN ; (b) IQ ; (c) IQ{ ; (d) I[0,1] .
→ 34. Considere (a medida exterior de Lebesgue) θ∗ da Definição 1.20, p.11. Prove que:
(a) θ∗ é uma medida exterior;
(b) θ∗ ([a, b)) ≤ b−a. Provar a igualdade é uma questão mais delicada (consulte literatura).
=⇒ 35. Seja µ a medida de Lebesgue em R. Prove que:
(a) µ({ a }) = 0 para todo ∈ R; (b) µ(K) = 0 para todo K enumerável;
(c) µ([a, b]) = µ((a, b)) = µ([a, b)); (d) µ((a, +∞)) = ∞.
1.5. EXERCÍCIOS 17

36. Prove que Q é pequeno do ponto de vista da medida de Lebesgue mas grande do ponto
de vista da cardinalidade.
37. Prove que a Definição 1.23, p.11 de medida nula para medida de Lebesgue é equivalente
a Definição 1.12, p.7.
38. Considere f : [a, b] → R e X ⊂ [a, b] com medida nula com relação a medida de
Lebesgue. Prove que f (X) tem medida nula com relação a medida de Lebesgue se f é
Lipschitz ou Hölder contı́nua.
Dica: estime diam(f (I)) para I um intervalo qualquer.
39. Prove que o conjunto de Cantor (que é não-enumerável) possui medida nula de Lebesgue.
=⇒ 40. Considere a relação em R: a ∼ b se, e somente se, a − b ∈ Q.
(a) Prove que é de equivalência.
(b) Defina V (conjunto de Vitali definido em 1905) como o conjunto formado por um
elemento de cada classe de [0, 1]/Q. Seja Vq , q + V. Prove que se q 6= qe (com q, qe ∈ Q)
então Vq ∩ Vqe = ∅.
[
(c) Prove que R = Vq .
q∈Q
(d) Prove que V é não-enumerável.
[
(e) Prove que [0, 1] ⊂ Vq ⊂ [−1, 2].
q ∈ [−1,1] ∩ Q
(f) Prove que V não é mensurável.
Dica: Como Vq é translação de V, ambos possuem mesma medida. Como por (b) os Vq
são disjuntos, a medida da união é igual a soma das medidas. Por (e) a medida da união
dos conjuntos de Vitali estaria entre 1 e 3. A medida de V não pode ser zero nem positiva!
Contradição. Ver Wikipedia, Vitali set.
Obs: Note que a invariância por translação e o axioma da escolha são barreiras insuperáveis
para se atribuir medida para todo subconjunto de R.
=⇒ 41. Considere g : R → R uma função contı́nua não-decrescente. Dado um intervalo
semiaberto I = [a, b) ⊂ R defina λg (I) por

λg (∅) , 0, λg ([a, b)) , g(b) − g(a) se a < b.

Dado A ⊂ R, defina
(∞ )
X [
θg∗ (A) , inf λg (Ij ); hIj ij∈N é uma seq. de intervalos semiabertos t.q. A ⊂ Ij .
j=0 j∈N

Mostre que θg∗ é uma medida exterior em R.

DEFINIÇÃO 1.25 A medida µg gerada pelo método de Carathéodory partindo da medida


exterior θg∗ é conhecida como medida de Lebesgue-Stieltjes associada a g.
18 CAPÍTULO 1. ESPAÇO COM MEDIDA

De forma mais geral, considere uma função h : R → R não-decrescente (não precisa ser
contı́nua). Dado um intervalo semiaberto I = [a, b) ⊂ R defina λh (I) por

λh (∅) , 0, λh ([a, b)) , lim− h(x) − lim− h(x) se a < b.


x→b x→a

Dado A ⊂ R, defina
(∞ )
X [
θh∗ (A) , inf λh (Ij ); hIj ij∈N é uma seq. de intervalos semiabertos t.q. A ⊂ Ij .
j=0 j∈N

Mostre que θh∗ é uma medida exterior em R. Podemos novamente definir a medida de
Lebesgue-Stieltjes. Em que ponto o argumento não vai funcionar se definirmos λh [a, b) ,
h(b) − h(a) ao invés da fórmula acima?
ý 42. (extra) Considere µ a medida de Lebesgue e f : R → R uma função Lipschitz contı́nua
com |f (x) − f (y)| ≤ K|x − y| para todo x, y ∈ R. Prove que para todo E mensurável:
(a) f (E) é um conjunto mensurável;
(b) µ(f (E)) ≤ Kµ(E).
Dica: Prove inicialmente para intervalos.
ý 43. (extra) Vamos mostrar que a medida exterior de Lebesgue θ∗ em R é invariante por
translação.
(a) Suponha que c ∈ R. Prove que θ∗ (A + c) = θ∗ (A) para todo A ⊂ R, onde A + c =
{x + c; x ∈ A}.
(b) Suponha que c > 0. Prove que θ∗ (cA) = cθ∗ (A) para todo A ⊂ R, onde cA =
{cx; x ∈ A}.
Dica: comece com intervalos semiabertos. Depois prove que θ∗ (A + x) ≤ θ∗ (A) + ε para
todo ε > 0 e (usando este resultado) θ∗ (A) = θ∗ ((A + x) + (−x)) ≤ θ∗ (A + x).
ý 44. (extra) Seja B a σ-álgebra de conjuntos de Borel de R e ν : B → [0, ∞] uma medida
tal que ν[−n, n] < ∞ para todo n ∈ N. Mostre que existe uma função g : R → R que é
não-decrescente tal que ν(E) = µg (E) para todo E ∈ B, onde µg é definida no Exercı́cio 41,
p.17. A função g é única?
ý 45. (extra) Seja B a σ-álgebra de conjuntos de Borel de R e sejam ν1 , ν2 : B → [0, ∞]
medidas tais que ν1 (I) = ν2 (I) < ∞ para todo intervalo semiaberto I ⊂ R. Prove que
ν1 (E) = ν2 (E) para todo E ∈ B.
Capı́tulo 2
Integração
O movimento do século XIX em direção ao rigor em matemática tentou colocar o cálculo em
bases sólidas. A integral de Riemann1 é um exemplo de sucesso destas tentativas pois fornece
o resultado esperado para muitos problemas que eram conhecidos e para outros problemas
novos.
No entanto, a integral de Riemann não interage bem com a operação de limite de
sequências de funções. Isto é importante, por exemplo, no estudo da série de Fourier2 . Já com
a integral de Lebesgue é mais fácil saber quando é possı́vel tomar o limite dentro da integral.
Estas propriedades melhores decorrem do fato que a integral de Lebesgue é, num paralelo com
séries, “absolutamente convergente”, enquanto a integral de Riemann é “condicionalmente
convergente”. Ver p. 30 para detalhes.
A integral de Lebesgue estende para uma classe maior de funções a integral de Riemann
e além disso permite definir integrais sobre espaços mais gerais que o Rn . Dedicamos uma
Seção a comparação da integral de Riemann com a de Lebesgue.
A teoria de integração sobre um espaço de medida geral (que inclui a integral de Lebesgue
como um exemplo) que apresentamos neste livro consiste de:

i. uma teoria de conjuntos mensuráveis (a σ-álgebra);

ii. uma teoria de medida destes conjuntos (da σ-álgebra);

iii. uma teoria de funções mensuráveis;

iv. uma teoria de integral de funções mensuráveis.

Este é um caminho possı́vel, mas não é o único. É possı́vel construir a Teoria de Integração
sem Teoria da Medida e utilizar a integral para definir a medida. Para detalhes ver a Seção 2.6.
Os teoremas mais importantes sobre esta integral são:

• Teorema da Convergência Monótona;


1
Bernhard Riemann: 1826 Breselenz, Hanover (now Germany) – 1866 Selasca, Italy.
2
Fourier

19
20 CAPÍTULO 2. INTEGRAÇÃO

• Teorema da Convergência Dominada de Lebesgue;


• Teorema de Radon-Nikodým;
• Teorema de Fubini.

2.1 Funções Mensuráveis


Funções mensuráveis são funções “bem comportadas“ entre espaços de medida. Funções que
não são mensuráveis são consideradas em análise como patológicas. Note que o conceito de
funções mensuráveis depende da σ-álgebra mas é independente de medida. Na prática, se for
utilizado o método de Carathéodory(Seção 1.3, p.8), a σ-álgebra é que dependerá da medida
exterior. Assim, neste caso, a função ser mensurável depende da medida exterior (porque?).

DEFINIÇÃO 2.1 (Função Mensurável) Uma função f : X → R é chamada de Σ-


mensurável, ou simplesmente mensurável, se satisfaz:

{x ∈ X; f (x) < a} = f −1 ((−∞, a)) ∈ Σ para todo a ∈ R.

Se Σ é a σ-álgebra de:
(a) Borel, então f é dita mensurável a Borel;
(b) Lebesgue, então f é dita mensurável a Lebesgue.
Exemplo 2.1 (triviais)
(a) Qualquer função constante é mensurável.
(b) Se Σ = P(X), então toda função é mensurável.
(b) Se E ∈ Σ, IE é Σ-mensurável.
(c) Se g é Borel-mensurável, então g é Lebesgue mensurável.
Exemplo 2.2 (importantes, veja exercı́cios)
(a) Toda função contı́nua f : R → R é Borel-mensurável.
(b) Toda função monótona f : R → R é Borel mensurável.

Observação 2.1 Nem todas funções Borel-mensuráveis são contı́nuas. Mas, pelo Teorema
de Luzin3 (consulte literatura), se f : [a, b] → R é Borel-mensurável, dado ε > 0, existe um
compacto E ⊂ [a, b] tal que f restrita a E é contı́nua e µ(E { ) < ε.

Deixamos para o leitor provar o lema seguinte.


LEMA 2.2 Seja Σ uma σ-álgebra de subconjuntos de X. Então para qualquer função f :
X → R as seguintes afirmações são equivalentes:
(a) {x ∈ X; f (x) < a} ∈ Σ para todo a ∈ R;
(b) {x ∈ X; f (x) ≤ a} ∈ Σ para todo a ∈ R;
(c) {x ∈ X; f (x) > a} ∈ Σ para todo a ∈ R;
(d) {x ∈ X; f (x) ≥ a} ∈ Σ para todo a ∈ R.
3
Nikolai Luzin: 1883 Irkutsk, Russia – 1950 Moscow, USSR.
2.1. FUNÇÕES MENSURÁVEIS 21

DEFINIÇÃO 2.3 De forma geral, se Σ é uma σ-álgebra em X e T é uma σ-álgebra em Y ,


dizemos que f : X → Y é mensurável se

f −1 (E) ∈ Σ para todo E ∈ T.

Se A gera a σ-álgebra T, pelo Exercı́cio 10, p.34, é equivalente exigir que

f −1 (E) ∈ Σ para todo E ∈ A.

Note a semelhança com a definição de função contı́nua em um espaço topológico: f :


X → Y é contı́nua se, e somente se,
f −1 (E) é aberto em X para todo aberto E em Y.
Este primeiro resultado mostra que o conjunto das funções mensuráveis forma um espaço
vetorial (combinações lineares) e uma álgebra (produto de funções). Além disso podemos
tomar módulo de uma função mensurável e obter uma função mensurável.
TEOREMA 2.4 (Propriedades de Funções Mensuráveis I) Sejam f, g : X → R funções
Σ-mensuráveis e c ∈ R. São Σ-mensuráveis:
(a) cf ; (b) f + g; (c) f 2 ; (d) f g; (e) |f |.
Demonstração.
(a) Seja a ∈ R qualquer. Se c = 0, então {x ∈ X; cf (x) < a} é X ou ∅, e portanto
pertence a Σ. Se c > 0, então
n ao
{x ∈ X; (cf )(x) < a} = x ∈ X; f (x) < ∈ Σ.
c
O caso c < 0 é similar. Como a é arbitrário, cf é mensurável.
(b) Por hipótese, se r ∈ Q, então
Sr = {x ∈ X; f (x) > r} ∩ {x ∈ X; g(x) > a − r} ∈ Σ.
Como claramente [
{x ∈ X; (f + g)(x) > a} = Sr ,
r∈Q

segue que (f + g) é mensurável.


(c) Seja a ∈ R. Se a < 0, então {x ∈ X; (f (x))2 > a} = X; se a ≥ 0, então
√ √
{x ∈ X; (f (x))2 > a} = {x ∈ X; f (x) > a} ∪ {x ∈ X; f (x) < − a}.
(d) Segue de (a), (b) e (c) pois f g = 14 [(f + g)2 − (f − g)2 ].
(e) Se a < 0, então {x ∈ X; |f (x)| > a} = X; se a ≥ 0, então
{x ∈ X; |f (x)| > a} = {x ∈ X; f (x) > a} ∪ {x ∈ X; f (x) < −a}.

O próximo resultado mostra que as funções mensuráveis são bem comportadas com relação
a convergência pontual de sequências de funções.
22 CAPÍTULO 2. INTEGRAÇÃO

TEOREMA 2.5 (Propriedades de Funções Mensuráveis II) Seja hfn in∈N uma sequência
de funções Σ-mensuráveis de X em R. São Σ-mensuráveis:
(a) lim fn ; (b) sup fn ; (c) inf fn ; (d) lim sup fn ; (e) lim inf fn .
n→∞ n∈N n∈N n→∞ n→∞

Demonstração. Para n ∈ N, a ∈ R defina Hn (a) , {x; fn (x) ≤ a} ∈ Σ. A prova segue


dos seguintes fatos: \ [ \
(a) {x ∈ X; ( lim fn )(x) ≤ a} = Hm (a + 2−k );
n→∞
k∈N n∈N m≥n
\
(b) {x ∈ X; (sup fn )(x) ≤ a} = Hn (a);
n∈N
n∈N
(c) inf fn = − sup(−fn );
n∈N n∈N
(d) lim sup fn = lim sup fm+n ;
n→∞ n→∞ m∈N
(e) lim inf fn = − lim sup(−fn ).
n→∞ n→∞

Observação 2.2 Neste trabalho não apresentaremos mais propriedades de funções men-
suráveis. É verdade também que a composição de uma função contı́nua com uma men-
surável é mensurável, mas a composição de duas funções mensuráveis pode não ser men-
surável.
Uma função não ser mensurável implica na existência de um conjunto que não é men-
surável. Como já observamos, quase todo subconjunto de R é mensurável a Lebesgue. Por-
tanto, quase toda função que você encontrará será mensurável a Lebesgue e é comum em
aplicações assumir que todas as funções envolvidas são mensuráveis.

2.2 Definição da Integral


A definição de integração que nós fazemos é dividida em três etapas:

i. integração de funções simples (Definição 2.8, p.23);

ii. integração de funções não-negativas (Definição 2.10, p.24);

iii. integração de função real qualquer (Definição 2.13, p.24).

Existem outros caminhos para se definir a integral, mas este corresponde ao método
canônico de todo livro de medida e integração. Ele corresponde também ao método para
se provar resultados: provamos para funções simples, depois para não-negativas e finalmente
para uma função qualquer.

DEFINIÇÃO 2.6 Dado A ⊂ ( X, definimos sua função indicadora ou caracterı́stica


0, se x 6∈ A,
IA : R → { 0, 1 } por IA (x) , Outra notação usual é χA .
1, se x ∈ A.
2.2. DEFINIÇÃO DA INTEGRAL 23

DEFINIÇÃO 2.7 (Função Simples) Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. Dizemos que
n
X
f : X → R é uma função simples se f = ai IEi , onde ai ∈ R e cada Ei é Σ-mensurável,
i=0
isto é, Ei ∈ Σ.

Observação 2.3 Alguns autores permitem um conjunto arbitrário Ei . Assim uma função
simples é qualquer função que assume um número finito de valores distintos.

n
X
Observação 2.4 A representação de uma função simples não-nula f com ai IEi é única
i=0
se os a0i s são não-nulos e únicos e se os Ei ’s são disjuntos (exercı́cio).

Exemplo 2.3 Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida.


(a) Uma função constante é simples.
(b) Toda função simples é mensurável.
(c) Se f , g : X → R são simples e c ∈ R, cf + g é simples.

Vamos definir agora a integral de uma função simples. Ela está bem definida pelo Lema 2.9
(técnico) que apresentamos depois da definição sem a demonstração (consulte a literatura). A
dificuldade é que uma função simples f possui mais de uma representante e temos que provar
que o valor da integral independe do representante que nós escolhemos. Vamos explorar casos
particulares nos exercı́cios.

DEFINIÇÃO 2.8 (Integral de uma função simples) Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida
m
X
e f : X → R uma função simples, isto é, f = ai IEi . Definimos a integral da função
i=0
simples f com relação a medida µ (pode ser ∞!) por
Z m
X
f dµ , ai µ(Ei ).
i=0

LEMA 2.9 Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. Se


m
X n
X
ai IEi = bj IFj ,
i=0 j=0

onde todos os Ei e Fj são mensuráveis e ai , bj ∈ R, então


m
X n
X
ai µ(Ei ) = bj µ(Fj ).
i=0 j=0

Vamos definir a integral de funções não-negativas usando funções simples.


24 CAPÍTULO 2. INTEGRAÇÃO

DEFINIÇÃO 2.10 (Integral de funções não-negativas) Seja (X, Σ, µ) um espaço de


medida e f ≥ 0 uma função Σ-mensurável. Definimos a integral da função não-negativa
f com relação a medida µ (pode ser ∞!) por
Z Z 
f dµ , sup g dµ; g é uma função simples e 0 ≤ g ≤ f .

É comum integrarmos
Z b uma função em um subconjunto de um espaço de medida; por
exemplo integrar f (x) dx, com a < b em R.
a

DEFINIÇÃO 2.11 (Integração em Subconjuntos) Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida,


H ∈ Σ, e f ≥ 0 uma função Σ-mensurável. Definimos
(
f (x), se x ∈ H,
Z Z
f dµ , fe dµ, onde fe(x) =
H 0 se x ∈ X \ H.
Z
Exemplo 2.4 1 dµ = µ(H).
H

Observação 2.5 É fácil ver que (exercı́cio 9, p.33) fe = f · IH é Σ-mensurável.


Z b Z Z
Assim, f dµ , f dµ = f · I[a,b] dµ.
a [a,b]

DEFINIÇÃO 2.12 Definimos a parte positiva f + e a parte negativa f − de uma função f


por
f + (x) , max(0, f (x)), f − (x) , max(0, −f (x)).
Assim, f = f + − f − com f + , f − ≥ 0.

Observação 2.6 Pelo exercı́cio 9, p.33, se f é mensurável, então f + e f − são mensuráveis.

DEFINIÇÃO 2.13 (Integral) Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida e f : X → R uma


função Σ-mensurável. Definimos a integral da função f com relação a medida µ (pode ser
+∞ ou −∞, ver observação) por
Z Z Z
f dµ , f dµ − f − dµ,
+

Se H ∈ Σ, definimos Z Z Z
f dµ , +
f dµ − f − dµ.
H H H
2.2. DEFINIÇÃO DA INTEGRAL 25

Observação 2.7 Se as integrais dos componentes positivo (f + ) e negativo (f − ) de f são


∞ então a definição acima não faz sentido (∞ − ∞). Neste caso dizemos que f não é
integrável. Se somente uma das duas integrais é ∞, dizemos que a integral é +∞ ou −∞.

Deixamos para o leitor refletir sobre o seguinte. Como pedimos que a parte positiva e
negativa de uma função seja integrável, a integral de Lebesgue é “absolutamente convergente”
(no sentido de séries), pois uma função f é integrável se, e somente se, |f | é integrável.
A integral é um operador linear e monotônico pelo próximo Teorema, apresentado sem
demonstração.

TEOREMA 2.14 (Propriedades básicas da integral) Seja (X, Σ, µ) um espaço de me-


dida e f, g : X →ZR funções Σ-mensuráveis.
Z Z
(a) Se c ∈ R, (cf + g) dµ = c f dµ + g dµ (linearidade).
Z Z
(b) Se f (x) ≤ g(x) para todo x ∈ X, então f dµ ≤ g dµ (monotonicidade).
Z Z
(c) se E, F ∈ Σ, E ⊂ F e f ≥ 0, então f dµ ≤ f dµ (monotonicidade).
Z Z E Z F

(d) |f | é integrável e f dµ ≤ |f | dµ. Se |f | dµ = 0, então f = 0 µ-qtp.

DEFINIÇÃO 2.15 Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida e f, g : X → R funções Σ-


mensuráveis. Dizemos que f e g são equivalentes se f = g µ-qtp.

É claro que esta relação é de equivalência (Exercı́cio 23, p.15). A integral “não enxerga”
a diferença entre as funções f e g equivalentes. Fisicamente, por exemplo, uma força f e
g equivalentes vão realizar o mesmo trabalho. Assim, na definição dos espaços funcionais
Lp e L∞ , vamos falar na função f querendo dizer num representante qualquer da classe
de equivalência a que a função pertence. Assim como números racionais são classes de
equivalência e dizemos “considere o número racional 1/2” ao invés de dizer “considere a
classe de equivalência de 1/2”, vamos falar na função f em Lp ao invés de dizer classe de
equivalência a que f pertence.

DEFINIÇÃO 2.16 O conjunto Lp (X) = Lp (X, Σ, µ), para R 1 ≤ p < ∞, é formado pelas
p
funções f : X → R que são Σ-mensuráveis com integral |f | dµ finita.
O conjunto L∞ (X) = L∞ (X, Σ, µ) é formado pelas funções f : X → R que são Σ-
mensuráveis e limitadas µ-qtp, isto é, existe M ∈ R tal que µ{x ∈ X; |f (x)| > M } = 0.

Estes espaços são Espaços Vetoriais Normados (EVNs) pelo Teorema 2.14 se introduzimos
a norma: R 1/p
(a) em Lp (1 < p < ∞): kf kLp = |f |p dµ ;
(b) em L∞ : kf kL∞ = inf {M > 0; µ{x; |f (x)| > M } = 0} (chamado de sup essencial).
Com estas normas (devido ao fato de se tratar da integral de Lebesgue) eles são EVNs
completos, ou seja, são Espaços de Banach. Como já observamos, os elementos são classes
26 CAPÍTULO 2. INTEGRAÇÃO

de equivalência de funções iguais a menos de um conjunto de medida nula, tais quais elementos
de R são classes de equivalência de sequências de Cauchy.

Observação 2.8 Se utilizássemos a integral de Riemann este espaço NÃO seria completo.
Esta é uma razão técnica da importância da integral de Lebesgue.

Particularizando para o L2 , o membro mais importante desta famı́lia de espaços de funções,


podemos definir o produto interno (forma bilinear):
Z
(f, g) , f g dµ.

Com isto, L2 será um EVN completo com norma induzido por um produto interno, que
chamamos de Espaço de Hilbert. Este é um espaço importante onde a Teoria da série de
Fourier se desenvolve. Além disso a teoria de equações diferenciais parciais se desenvolve
nos chamados Espaços de Sobolev, espaços que envolvem a existência de derivadas (num
sentido mais fraco) limitadas nestas normas integrais. Deste modo passamos do espaço das
funções contı́nuas (C(X)) ou suaves (C n (X)) para espaços de Banach, Hilbert e Sobolev.

Exemplo 2.5 (verifique!)


(a) A função 1/x 6∈ L1 (1, ∞) mas pertence a Lp (1, ∞) para p > 1.
(b) A função 1/x 6∈ L∞ (R).
IN (x)
(c) A função f (x) = x
pertence a L∞ (R).

2.3 Teoremas de Convergência


Nesta seção apresentamos (sem demonstração) os principais resultados da Teoria de Inte-
gração, os Teoremas da convergência monótona e da convergência dominada (de Lebesgue).
Estes teoremas fornecem condições (simples) para que possamos trocar o limite com a integral,
isto é, condições para que
Z  Z  
lim fn dµ = lim fn dµ.
n→∞ n→∞

Embora a teoria seja mais complicada, as condições para poder se trocar limite com integral
são bem mais simples na integral de Lebesgue do que na de Riemann. De fato (estude os
enunciados dos dois teoremas abaixo), na integral de Lebesgue basta se ter convergência
pontual (qtp) e uma condição extra simples (monotonicidade ou dominância por uma função
integrável). Por contraste, a integral de Riemann pede, por exemplo, convergência uniforme.
2.4. INTEGRAL DE RIEMANN × LEBESGUE 27

TEOREMA 2.17 (convergência monótona) Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida e


hfn in∈N uma sequência de funções reais integráveis em X tais que

f (x) = lim fn (x), µ-qtp. em X (convergência pontual).


n→∞

Suponha que a sequência é monótona crescente, isto é,

fn (x) ≤ fn+1 (x), µ-qtp. em X, para todo n ∈ N (monotonicidade).


Z
Se sup fn dµ < ∞, então f é integrável e
n∈N
Z Z
f dµ = lim fn dµ.
n→∞

n
[
Exemplo 2.6 Seja an uma enumeração de Q e An = { ak }. Seja fn = IAn . Claramente
k=1 R
fn é uma sequência monótona crescente que converge
R para IQ . Como fn dµ = 0 para todo
n (fn = 0 excetoZ em número finito de pontos) IQ dµ = 0. Contraste com a integral de
Riemann, onde R IQ (x) dx não existe pois o conjunto dos pontos de descontinuidade desta
função não possui medida zero (é R).
TEOREMA 2.18 (convergência dominada de Lebesgue) Seja (X, Σ, µ) um espaço de
medida e hfn in∈N uma sequência de funções reais integráveis em X tais que

f (x) = lim fn (x), µ-qtp. em X (convergência pontual).


n→∞

Suponha que exista uma função integrável g tal que

|fn (x)| ≤ g(x), µ-qtp. em X, para todo n ∈ N (dominância por função integrável).

Então f é integrável e Z Z
f dµ = lim fn dµ.
n→∞

2.4 Integral de Riemann × Lebesgue


Primeiro vamos ver algumas dificuldades com a integral de Riemann:
• Troca do limite com a integral. No estudo da série de Fourier existe a necessidade de
trocar o processo de limite com a integração. No entanto, as condições que permitem
mostrar que Z  Z h i
lim fk (x) dx = lim fk (x) dx
k→∞ k→∞

são difı́ceis na integral de Riemann.


28 CAPÍTULO 2. INTEGRAÇÃO

• A ausência da convergência monótona. O exemplo canônico é considerar ak a enu-


meração dos racionais em [0, 1] e definir
(
1, se x = aj , j ≤ k,
gk (x) ,
0, caso contrário.

As funções gk são iguais a zero em todos os pontos exceto num conjunto finito pontos,
e portanto sua integral de Riemann é zero. A sequência gk , claramente não-negativa,
converge monotonamente para a função IQ , que não é integrável a Riemann.

• Inapropriada para intervalos ilimitados. A integral de Riemann é apropriada somente


para intervalos limitados. Pode ser estendida para intervalos ilimitados tomando limites
contanto que não surja ∞ − ∞.

• Definição está muito atrelada ao Rn . Como se generalizar a integral para outros


espaços?
Para fazermos uma comparação informal entre as duas integrais, imagine que desejamos
saber o volume de uma montanha (acima do nı́vel do mar) sabendo a função de sua altura h.
• na integral de Riemann dividimos a montanha numa malha de 1 metro quadrado
e medimos a altura h da montanha no centro de cada quadrado. O volume em cada
quadrado da malha é aproximadamente 1 × 1 × h. Portanto o volume total é (aproxima-
damente) igual a soma deste volumes. Neste caso estamos particionando o domı́nio.

• na integral de Lebesgue desenhamos um mapa de contorno da montanha (curvas


de nı́vel) com 1 metro de altura entre elas. O volume contido entre duas curvas de
nı́vel é aproximadamente igual a área vezes a altura h da curva de nı́vel. Portanto o
volume total é (aproximadamente) igual a soma deste volumes. Neste caso estamos
particionando a imagem.
Vamos agora (re)ver a definição da integral de Riemann numa forma apropriada para
fazer uma comparação técnica com a integral de Lebesgue, respondendo as perguntas mais
interessantes.
Começamos definindo a integral de uma função escada (compare com a definição de
função simples). Aqui surge novamente a dificuldade: como a representação de uma função
escada não é única, temos (mas vamos ignorar) que provar que a integral de Riemann está
bem definida (independe da representação).

DEFINIÇÃO 2.19 (integral de Riemann de função escada) Uma função s : R → R é


n
X
chamada de função escada se s = ci IEi , onde cada Ei é um intervalo limitado e ci ∈ R.
i=0
Sejam ai e bi os extremos do intervalo Ej . Definimos a integral de Riemann de s por
Z n
X
R s(x) dx , ci (bi − ai ).
i=0
2.4. INTEGRAL DE RIEMANN × LEBESGUE 29

É fácil ver que cada partição do intervalo [a, b] induz a duas funções escadas: uma que
assume o sup da função em cada intervalo, e outra que assume o inf da função em cada
intervalo.

DEFINIÇÃO 2.20 (integral superior/inferior de Riemann) Se f : [a, b] → R é limitada,


definimos sua integral superior de Riemann por
Z 
U[a,b] (f ) , inf s(x) dx; s é função escada e f ≤ s ,

e sua integral inferior de Riemann por


Z 
L[a,b] (f ) , sup s(x) dx; s é função escada e s ≤ f .

DEFINIÇÃO 2.21 (Integral de Riemann de função qualquer) Dizemos que f é in-


tegrável a Riemann em [a, b] se

U[a,b] (f ) = L[a,b] (f ).

Neste caso definimosZ ob valor comum como sendo a integral de Riemann de f no intervalo
[a, b], denotada por R f (x) dx.
a

Voltando e comparando a Definição 2.10, p.24 (integral de Lebesgue) com a definição da


integral de Riemann, observamos que a principal diferença consiste no uso de funções escada
ao invés de funções simples. Para comparar funções simples com escada veja exercı́cio 28,
p.36.
Apresentamos agora um resultado clássico (ver algum livro de análise para demonstração)
sobre a integral de Riemann, relacionando-a com a medida de Lebesgue.

TEOREMA 2.22 (Lebesgue) Seja f : [a, b] → R limitada. Então, f é integrável a Rie-


mann em [a, b] se, e somente se, o conjunto D = {x ∈ [a, b] ; f é descontı́nua em x} tem
medida nula com relação a medida de Lebesgue.

TEOREMA 2.23 (Riemann × Lebesgue) Se f : [a, b] → R é integrável a Riemann, então


f é integrável a Lebesgue, com a mesma integral.
Demonstração. Nós vamos provar apenas para f ≥ 0. Para o caso geral decomponha
f = f + − f −.
Como o sup para integral de Lebesgue é tomado num conjunto maior (o conjunto das
funções simples, que contém o conjunto das funções escada, veja exercı́cio 28, p.36) que a
da integral inferior de Riemann (o conjunto das funções escada),
Z b Z
R f (x) dx = L[a,b] (f ) ≤ f dµ.
a
30 CAPÍTULO 2. INTEGRAÇÃO

Pela monotonicidade da integral de Lebesgue, dada uma função escada s qualquer (que é
mensurável pois é simples) tal que f ≤ s,
Z Z
f dµ ≤ s dµ.

Tomando o inf nos dois lados com relação as funções escada s’s tais que f ≤ s,
Z Z b
f dµ ≤ L[a,b] (f ) = R f (x) dx.
a

Dessas desigualdades concluı́mos que


Z b Z Z b
R f (x) dx ≤ f dµ ≤ R f (x) dx.
a a
Z b Z
Portanto, R f (x) dx = f dµ.
a
Este teorema é sobre a integral própria de Riemann, de uma função limitada em um
intervalo limitado. Para funções ilimitadas e intervalos ilimitados Z ∞ define-se a integral to-
sin x
mando limites. Por exemplo a integral imprópria de Riemann dx é definida por
Z a Z 1 Z 1 0 x
sin x
lim dx, e a integral ln x dx é definida por lim+ ln x dx. Dessas, a segunda
a→∞ 0 x 0 a→0
Z ∞a
sin x
existe como integral de Lebesgue, mas a primeira não pois x dx = ∞.

0
Nesse sentido, a integral de Lebesgue é uma integral “absolutamente convergente”, signifi-
cando que f é integrável a Lebesgue se, e somente se, |f | também é. Na função f (x) = sinx x ,
obterı́amos que tanto a integral de f + quanto a de f − é ∞, obtendo que a integral de
Lebesgue seria igual a ∞ − ∞, algo não definido.
Em contraste, a integral de Riemann em intervalos ilimitados é “condicionalmente conver-
gente” Da teoria de séries sabemos que os termos de uma série condicionalmente convergentes
não podem ser comutados nem associados de forma arbitrária preservando o valor da série.
Assim esta restrição (“convergência absoluta”) da integral de Lebesgue assegura mais robustez
nas suas propriedades.

2.5 Teorema de Radon-Nikodým e Fubini


Devido a sua importância em diversas aplicações, apresentamos mais estes dois teoremas da
Teoria da Medida:
• Teorema de Radon-Nikodým, que define a “derivada” de uma medida com relação a
outra;

• Teorema de Fubini, que permite calcular uma integral dupla como duas integrais simples
sucessivas, trocando a ordem de integração.
2.5. TEOREMA DE RADON-NIKODÝM E FUBINI 31

Para apresentá-los precisamos de algumas definições.

DEFINIÇÃO 2.24 Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. Dizemos que uma medida µ é
finita se ela não assume o valor ∞.
Dizemos que ela é σ-finita se existe uma sequência En em Σ com:

[
En = X e µ(En ) < ∞.
n=1

DEFINIÇÃO 2.25 Dadas medidas λ e µ em definidas numa σ-álgebra Σ, dizemos que λ é


absolutamente contı́nua com relação a µ, denotado por λ  µ, se para todo E ∈ Σ com
µ(E) = 0 implica que λ(E) = 0.

Para se entender a notação λ  µ, observe que se µ(E) = 0, então 0 ≤ λ(E)  µ(E) = 0.


Logo λ(E) = 0.
Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida e f : X → R uma função mensurável não-negativa.
Para cada E ∈ Σ defina λ(E) ∈ [0, ∞] por:
Z
λ(E) , f dµ.
E

É claro que (exercı́cio) λ é uma medida absolutamente contı́nua com relação a µ. Note que
como λ é uma medida,
Z Z
λ(E) = dλ = f dµ para todo E ∈ Σ.
E E

Logo, abusando notação,


Z
(dλ − f dµ) = 0 para todo E ∈ Σ.
E


Portanto, em algum sentido, dλ = f dµ, ou seja, f =, a chamada derivada de Radon-

Nikodým. O próximo teorema mostra que toda medida σ-finita absolutamente contı́nua é
obtida desta forma.

TEOREMA 2.26 (Radon-Nikodým) Sejam λ e µ medidas σ-finitas definidas numa σ-


álgebra Σ de subconjuntos de X e suponha que λ  µ, isto é, λ é absolutamente contı́nua
com relação a µ. Então existe uma função não-negativa f : X → R mensurável (com relação
a Σ) tal que Z
λ(E) = f dµ para todo E ∈ Σ.
E
Além disso, f é única no sentido que se g possui esta propriedade, g = f µ-qtp em X.
32 CAPÍTULO 2. INTEGRAÇÃO

Observação 2.9 Chamamos a função f de derivada de Radon-Nikodým de λ com



relação a µ, denotada por f = .

Em Teoria da Probabilidade, o Teorema de Radon-Nikodým é fundamental para se definir


a probabilidade condicional em espaços de medida infinitos. A dificuldade, contornada pelo
Teorema de Radon-Nikodým, é que se tentarmos generalizar a definição usual surgirá uma
divisão de zero por zero.
Finalizamos com o enunciado do Teorema de Fubini. Para isto precisamos da definição da
medida produto.

DEFINIÇÃO 2.27 Sejam (X, Σ, µ) e (Y, T, τ ) espaços de medida. Existe uma medida
canônica numa σ-álgebra de subconjuntos de X × Y , a chamada medida produto π gerada
por µ e τ , denotada por π = µ × τ . Esta medida está definida na σ-álgebra gerada por A × B,
onde A ∈ Σ e B ∈ T.

Esta construção natural generaliza a ideia de medir subconjuntos do R2 utilizando retângulos.


A dificuldade é que conjuntos mensuráveis do plano podem não ser retângulos, embora se-
jam uniões enumeráveis de retângulos. Exige um trabalho burocrático para sua construção.
É similar a topologia produto, quando dadas topologias em X e Y se introduz a topologia
produto em X × Y .
O Teorema de Fubini permite calcular a integral no espaço produto por iteração, como
duas integrais sucessivas em cada um dos espaços. Note que o resultado independe da ordem
de integração em cada um destes espaços.

TEOREMA 2.28 (Fubini) Sejam (X, Σ, µ) e (Y, T, ν) espaços de medidas completos, π =


µ × ν a medida produto e f : X × Y → R uma função π-integrável. Então,
Z Z Z  Z Z 
f dπ = f (x, y) dν(y) dµ(x) = f (x, y) dµ(x) dν(y).
X×Y X Y Y X

2.6 Outras Construções da Integral


Um outro caminho para se construir uma Teoria de Integração é utilizando métodos da Análise
Funcional. Fazemos o caminho inverso ao percorrido até aqui: ao invés de desenvolver uma
teoria de medida para construir a integral, construı́mos uma integral para depois introduzir
uma medida.
Considere o espaço das funções contı́nuas de suporte compacto, denotado por C c (R).
Neste espaço podemos definirZ a integral de Riemann (que não necessita de teoria da medida).
Introduzindo a norma kf k , R |f (x)| dx (integral de Riemann!) em C c (R), obtemos um EVN
(espaço vetorial normado) que não é completo (tal qual Q) mas que pode ser completado
para obtermos L1 (R), um espaço de Banach, com técnica semelhante a utilizada para se
completar Q e obter R (classes de equivalência de sequências de Cauchy).
2.7. EXERCÍCIOS 33

O espaço L1 (R) é isomorfo ao espaço das funções integráveis a Lebesgue identificando


funções que diferem num conjunto de medida nula. A integral de Riemann, que está definida
no subespaço (denso) C c (R) ⊂ L1 (R), pode ser estendida por continuidade, de forma única,
para todo o espaço (analogia com como a definição de 2x para x ∈ R partindo da definição
de 2x para x ∈ Q).
Esta integral estendida de C c (R) para todo o L1 (R) é igual a integral de Lebesgue.

2.7 Exercı́cios
2.7.1 Funções Mensuráveis

=⇒ 1. (funções mensuráveis triviais) Considere f : X → R.


(a) Prove que se Σ = P(X), então toda função f é mensurável.
(b) Prove que toda função constante f é mensurável (com relação a qualquer σ-álgebra).
(c) Prove que IA : X → R é Σ-mensurável se, e somente se, A ∈ Σ.
(d) Considere Ψ = { ∅, X }. Quais são as funções f Ψ-mensuráveis?
=⇒ 2. Determine a menor σ-álgebra que torne mensurável uma função f : X → R que assuma
somente:
(a) 2 valores distintos; (b) 3 valores distintos.
3. Considere Σ = {A ⊂ R; A é enumerável ou A{ é enumerável}, uma σ-álgebra de R
pelo Exercı́cio 2, p.13. Determine se é Σ-mensurável:
(a) I[0,1] ; (b) IQ{ .
→ 4. Considere X = { 1, 2, 3, 4 } e a σ-álgebra Σ = { ∅, { 1 }, { 2, 3, 4 }, X }.
(a) Quantas funções distintas f : X → X são Σ-mensuráveis?
(b) Repita o item (a) para a σ-álgebra Σ = { ∅, { 1, 2 }, { 3, 4 }, X }.
=⇒ 5. Prove que se f = aIA + bIB é Σ-mensurável, então A, B ∈ Σ.
Dica: A ∩ B = f −1 ({ a + b }) ∈ Σ.
6. Prove o Lema 2.2, p.20. \
Dica: Para provar que (i)⇒(ii), considere {x; f (x) < a + 2−n }.
n∈N

7. Prove que toda função f : R → R é Borel-mensurável se:


(a) f é monótona; (b) f é contı́nua.
Dica: (b) Toda subconjunto aberto de R pode ser escrito como a união enumerável de
intervalos abertos (Exercı́cio 9, p.14) .
=⇒ 8. Prove que toda função Borel-mensurável f : R → R é Lebesgue-mensurável.
Dica: Existe diferença?
(
f (x), se x ∈ H,
9. Prove que se f é Σ-mensurável e H ∈ Σ, então fe(x) = f (x)IH (x) =
0 se x ∈ X \ H,
é Σ-mensurável.
34 CAPÍTULO 2. INTEGRAÇÃO

→ 10. Suponha que A gera a σ-álgebra T de subconjuntos de Y . Prove que f : X → Y é


(Σ, T)-mensurável se, e somente se, φ−1 (E) ∈ Σ para todo E ∈ A.
→ 11. Neste exercı́cio utilizamos f para representar uma função f : X → Y qualquer.
(a) Qual a σ-álgebra em X que torna toda f mensurável?
(b) Qual a σ-álgebra em Y que torna toda f mensurável?
−1
(c) Fixe f e uma σ-álgebra Σ em X. Defina TΣ f , {F ∈ P(Y ); f (F ) ∈ Σ}. Prove
Σ
que Tf é uma σ-álgebra. Prove que é a maior que torna f mensurável.
(d) Fixe f e uma σ-álgebra T em Y . Defina ΣTf , {E ∈ P(X); f (E) ∈ T}. Prove que
ΣTf é uma σ-álgebra. Prove que é a menor que torna f mensurável.
(e) No item (c), se (X, Σ, µ) é um espaço de medida então (Y, TΣf , µf ), com µf (E) ,
µ(f −1 (E)), é um espaço de medida. Desta forma uma função f definida em um espaço de
medida induz a existência de um outro espaço de medida.
12. Seja Σ uma σ-álgebra de subconjuntos de X e f, g : X → R funções Σ-mensuráveis.
Prove que são Σ-mensuráveis f + , f − , f ∧ g e f ∨ g, onde
(f ∨ g)(x) , max(f (x), g(x)), (f ∧ g)(x) , min(f (x), g(x)).

2.7.2 Definição da Integral


n
X
→ 13. Prove que a representação de uma função simples não-nula f por ai IEi é única se
i=0
os ai ’s são não-nulos e únicos e se os Ei ’s são disjuntos.
Dica: f pode assumir somente um número finito de valores (porque?). Defina Ei ,
f −1 (bi ), onde bi é cada um destes valores.
14. Sejam A, B, C, D conjuntos mensuráveis com medida finita e a, b, c, d ∈ R.
=⇒(a) Suponha que aIA = bIB + cIC . Prove que aµ(A) = bµ(B) + cµ(C).
(b) Suponha que aIA + bIB = cIC + dId . Prove que aµ(A) + bµ(B) = cµ(C) + dµ(D).
Dica: cuidado pois os números podem não ser distintos e os conjuntos podem não ser
disjuntos.
15. O que é um espaço de Banach e um espaço de Hilbert?
→ 16. Em um espaço vetorial normado, se kf k = 0 então f = 0. Dissemos que L1 (X) é um
espaço vetorial normado. No entanto, pelo Teorema 2.14, p.25, se kf k = 0, então f = 0
µ-qtp, ou seja, não necessariamente f = 0. Explique.
Dica: Leia a p. 15.
=⇒ 17. (Lema de du Bois-Reymond4 ) Considere f : X → R uma função integrável em (X, Σ, µ).
Prove que
Z f = 0 µ-qtp em X se: Z
(a) f dµ = 0 para todo E ∈ Σ; (b) f g dµ = 0 para toda g Σ-mensurável.
E
Obs: resultado importante para o cálculo das variações.
4
Paul David Gustav du Bois-Reymond: 1831, Berlim, Alemanha – 1889, Freiburg, Alemanha.
2.7. EXERCÍCIOS 35

Dica (para todos itens): suponha por contradição que o conjunto {x ∈ X; f (x) > ε} (ou
{x ∈ X; f (x) < ε}) não possui medida nula. Use este conjunto ou sua função caracterı́stica.
=⇒ 18. Prove que:
(a) A função 1/x 6∈ L1 (1, ∞) mas pertence a Lp (1, ∞).
(b) A função 1/x 6∈ L∞ (R).
(c) A função f (x) = IZx(x) pertence a L∞ (R).
19. Considere f , g : X → R funções simples. Prove que são funções simples:
(a) |f |; (b) f + g (c) f ∨ g e f ∧ g, definidas no Exercı́cio 12, p.34.
20. Considere f , g : X → R funções integráveis. Prove que são funções integráveis f ∨ g e
f ∧ g, definidas como no Exercı́cio 12, p.34.
=⇒ 21. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida e f : X → R uma função
Z integrável. Prove que
para todo ε > 0 existe uma função simples gε : X → R tal que |f − gε | dµ < ε. Dizemos
que as funções simples são densas no espaço das funções integráveis L1 (X, Σ, µ).
Dica: Considere f ≥ 0 inicialmente.
→ 22. Seja µ a medida de contagem (Exemplo 1.12, p.6) em N. Prove que uma X função
f : N → R (uma sequência hf (n)in∈N ) é µ-integrável se, e somente se, a série f (n) é
absolutamente convergente e nesse caso
Z ∞
X
f dµ = f (n).
n=0

→ 23. Sejam µ1 , µ2 duas medidas com domı́nio na σ-álgebra Σ. Defina µ(E) , µ1 (E)+µ2 (E)
para E ∈ Σ. Prove que para qualquer função Σ-mensurável f : X → R,
Z Z Z
f dµ = f dµ1 + f dµ2 .

Dica: Assuma que f é função simples e depois que f ≥ 0.


ý Z24. (extra) Seja dx a medida de Z Lebesgue. Prove que se f : X → R é integrável, então
f (x + a) dx existe e é igual a f (x) dx para todo a ∈ R.
Dica: Comece com funções simples. Assuma que a medida de Lebesgue é invariante por
translação.

2.7.3 Teoremas de Convergência

=⇒ 25. Seja fn (x) = nI[0,1/n](x) com a medida de Lebesgue em R. Utilize-a para mostrar que a
condição do Teorema da Convergência Dominada |fn | ≤ g não pode ser retirada.
36 CAPÍTULO 2. INTEGRAÇÃO

∞ Z
X
→ 26. Considere a sequência de funções reais hfn in∈N , todas integráveis e tais que |fn | dµ
n=0

X Z ∞ Z
X
é finito. Prove que f (x) , fn (x) está definida qtp. e f dµ = fn dµ.
n=0 n=0
Dica: Assuma inicialmente que fn ≥ 0.
27. Dada uma função f : R → R qualquer, defina para cada k ∈ R a função Tk f : R → R,
o truncamento de f por

f (x), se |f (x)| ≤ k;

Tk f (x) , k, se f (x) > k;

−k, se f (x) < −k.

Suponha que f é µ-integrável. Prove que: Z


R
(a) Tk f é mensurável; (b) f dµ = lim Tk f dµ.
k→∞

2.7.4 Integral de Riemann × Lebesgue


=⇒ 28. Prove que toda função escada é uma função simples (em particular mensurável). Prove
que f = IQ é uma função simples que não é uma função escada. Assim o conjunto de funções
simples é (bem) maior que o de funções escada.
29. Fixe uma função f : [a, b] → R. Dada uma partição qualquer do intervalo [a, b],
determine a função escada s associada que seja a menor de todas com f ≤ s. Assim s deve
ser constante entre os pontos da partição.

2.7.5 Teorema de Radon-Nikodým e Fubini


=⇒ 30. Prove que a relação ser dominada é transitiva. Dê um exemplo que prove que não é
simétrica.
=⇒ 31.
(a) Dê um exemplo de medida σ-finita que não é finita.
(b) A medida de contagem (Exemplo 1.12, p.6) é finita? É σ-finita?
(c) A medida δa de Dirac é finita? É σ-finita?
32. Seja (µn ) uma sequência de medidas em (Σ, X) com µn (X) ≤ 1. Defina λ : Σ → R
por
X∞
λ(E) , 2−n µn (E).
n=1

Prove que λ é uma medida e que µn  λ para todo n.


=⇒ 33. Seja X = [0, I] e Σ a σ-álgebra de Borel em X. Se µ é a medida de contagem
(Exemplo 1.12, p.6) e λ a medida de Lebesgue, então λ  µ, mas o Teorema de Radon-
Nikodým não se aplica. Porque?
2.7. EXERCÍCIOS 37

→ 34. Prove a unicidade de f no Teorema de Radon-Nikodým.


ý 35. (extra) Suponha que µ é uma medida numa σ-álgebra Σ de subconjuntos de X e
f : X → R uma função mensurável não-negativa. Para cada E ∈ Σ defina λ(E) ∈ [0, ∞]
por: Z
λ(E) , f dµ.
E
Prove que:
(a) λ é uma medida em Σ absolutamente contı́nua com relação a µ.
(b) λ é finita se, e somente se, f é integrável.
Dica: (a) prove que λ é σ-aditiva usando o Teorema da convergência monótona.
38 CAPÍTULO 2. INTEGRAÇÃO
Capı́tulo 3
Probabilidade e Medida
Neste capı́tulo de duas páginas traduzimos o vocabulário da Teoria da Medida para o da
Teoria de Probabilidade. Uma excelente referência é o capı́tulo IX do livro Measure Theory
de P. Halmos.
Vamos começar com uma definição básica.

DEFINIÇÃO 3.1 Dado um espaço de medida (Ω, Σ, µ), dizemos que é um espaço de
probabilidade se µ(Ω) = 1. Neste caso denotamos a medida µ por P e dizemos que
(Ω, Σ, P ) é um espaço de probabilidade.

• Ω é o espaço amostral.

• Os elementos da σ-álgebra Σ são os eventos, que podem ser um subconjunto próprio


de P(Ω).

• A cada evento A ∈ Σ (elemento da σ-álgebra), associamos sua probabilidade, dada


pela sua medida P (A).

• Uma função mensurável com valores em R é chamada de variável aleatória.


R
• A integral X P. é chamada de esperança da variável aleatória X com relação a
probabilidade P .

• Uma sequência (Xn )n∈N de variáveis aleatórias é chamada de processo estocástico


discreto. Uma famı́lia (Xt )t∈R de variáveis aleatórias é chamada de processo es-
tocástico contı́nuo.

Exemplo 3.1 Considere um jogo onde se lançam 2 dados a cada instante de tempo. Podemos
considerar o processo estocástico discreto Xn igual a soma do valor dos 2 dados a cada
instante.
Um exemplo de processo estocástico contı́nuo é Xt o valor de uma ação a cada instante
de tempo.

39
40 CAPÍTULO 3. PROBABILIDADE E MEDIDA

O fato que o espaço de eventos é uma σ-álgebra significa, em linguagem coloquial, que
dados eventos A e B são eventos também:

• a não ocorrência de A, isto é, A{ ;

• a ocorrência de A ou B, isto é, A ∪ B;

• a ocorrência de A e B, isto é, A ∩ B.

A necessidade de incluir uniões enumeráveis é mais sutil. Um exemplo desta necessidade


aparece considerando um jogo de dados em que o jogador deve jogar o dado repetidamente até
que apareça o número 6. Dada a possibilidade do jogo nunca acabar e se repetir infinitamente,
temos que considerar uniões infinitas enumeráveis de eventos.
A necessidade de assumir que X é mensurável provém do fato que queremos ser capazes
de atribuir probabilidades para, por exemplo, que o valor de X esteja entre a e b. Dai aparece
naturalmente a σ-álgebra de Borel em R.

DEFINIÇÃO 3.2 Dois eventos A e B são ditos independentes se P (A∩B) = P (A)P (B).

O conceito de independência entre eventos juntamente com o de probabilidade condicional,


ambos sem correspondente na Teoria da medida, inicia o caminho que separa as duas teorias,
fazendo com que a Teoria de Probabilidade seja muito mais do que simples aplicação da Teoria
da Medida.
Referências Bibliográficas
[1] Bartle R.G.; The Elements of integration and Lebesgue measure; John Wiley & Sons,
Inc., New York, (1995). ISBN: 0-471-04222-6, MR1312157 (95k:28001).

[2] Fremlin, D. H.; Measure Theory. University of Essex, (2009). Endereço:


http://www.essex.ac.uk/maths/staff/fremlin/mt.htm Acessado em ju-
lho/2009.

[3] Halmos P.R.; Measure Theory; Van Nostrand, 1950; Halmos, Paul R. Measure Theory.
D. Van Nostrand Company, Inc., New York, N. Y., (1950), MR0033869.

[4] The MacTutor History of Mathematics archive,


http://turnbull.mcs.st-and.ac.uk/~history/

[5] Royden, H. L.; Real Analysis; Macmillan Publishing Company, New York, (1988). ISBN:
0-02-404151-3, MR1013117 (90g:00004).

[6] Wikipedia. Páginas: Measure, Lebesgue Measure e Sigma-Algebra. Endereço:


http://en.wikipedia.org/wiki/Measure (mathematics), etc. Acessado em ju-
lho/2009.

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