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2021 - Editora Amplla

Copyright © Editora Amplla


Editor Chefe: Leonardo Pereira Tavares
Design da Capa: Editora Amplla
Projeto Gráfico e Editoração: Higor Costa de Brito

Ciências da saúde: ensino, formação e pesquisa está licenciado sob CC BY 4.0.


Esta licença exige que as reutilizações deem crédito aos criadores. Ele permite que os
reutilizadores distribuam, remixem, adaptem e construam o material em qualquer meio
ou formato, mesmo para fins comerciais.
O conteúdo da obra e seus dados em sua forma, correção e confiabilidade são de responsabilidade
exclusiva dos autores, não representando a posição oficial da Editora Amplla. É permitido o download da
obra e o compartilhamento desde que sejam atribuídos créditos aos autores. Todos os direitos para esta
edição foram cedidos à Editora Amplla.

ISBN: 978-65-88332-23-8

Editora Amplla
Campina Grande – PB – Brasil
[email protected]
www.ampllaeditora.com.br

2021
Bergson Rodrigo Siqueira de Melo - Universidade Estadual do Ceará
Carla Caroline Alves Carvalho - Universidade Federal de Campina Grande
Cícero Batista do Nascimento Filho - Universidade Federal do Ceará
Clécio Danilo Dias da Silva - Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Daniela de Freitas Lima - Universidade Federal de Campina Grande
Denise Barguil Nepomuceno - Universidade Federal de Minas Gerais
Dylan Ávila Alves - Instituto Federal Goiano
Érica Rios de Carvalho - Universidade Católica do Salvador
Gilberto de Melo Junior - Universidade Federal de Goiás
Higor Costa de Brito - Universidade Federal de Campina Grande
Italan Carneiro Bezerra - Instituto Federal da Paraíba
Ivo Batista Conde - Universidade Estadual do Ceará
João Henriques de Sousa Júnior - Universidade Federal de Santa Catarina
Joilson Silva de Sousa - Instituto Federal do Rio Grande do Norte
José Cândido Rodrigues Neto - Universidade Estadual da Paraíba
Jose Henrique de Lacerda Furtado - Instituto Federal do Rio de Janeiro
Josenita Luiz da Silva - Faculdade Frassinetti do Recife
Luís Paulo Souza e Souza - Universidade Federal do Amazonas
Luiza Catarina Sobreira de Souza - Faculdade de Ciências Humanas do Sertão Central
Manoel Mariano Neto da Silva - Universidade Federal de Campina Grande
Marcus Vinicius Peralva Santos - Universidade Federal da Bahia
Marina Magalhães de Morais - Universidade Federal de Campina Grande
Natan Galves Santana - Universidade Paranaense
Nathalia Bezerra da Silva Ferreira - Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
Neide Kazue Sakugawa Shinohara - Universidade Federal Rural de Pernambuco
Sabrynna Brito Oliveira - Universidade Federal de Minas Gerais
Samuel Miranda Mattos - Universidade Estadual do Ceará
Tatiana Paschoalette Rodrigues Bachur - Universidade Estadual do Ceará
Telma Regina Stroparo - Universidade Estadual do Centro-Oeste
Virginia Tomaz Machado - Faculdade Santa Maria de Cajazeiras
Walmir Fernandes Pereira - Miami University of Science and Technology
Wanessa Dunga de Assis - Universidade Federal de Campina Grande
Wellington Alves Silva - Universidade Estadual de Roraima
Yáscara Maia Araújo de Brito - Universidade Federal de Campina Grande
Yuciara Barbosa Costa Ferreira - Universidade Federal de Campina Grande
2021 - Editora Amplla
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Editor Chefe: Leonardo Pereira Tavares
Design da Capa: Editora Amplla
Projeto Gráfico e Editoração: Higor Costa de Brito

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Sueli Costa CRB-8/5213

Santos, Yasmin da Silva


Ciências da saúde [livro eletrônico] ensino, formação
e pesquisa / Yasmin da Silva Santos...[et al.] – Campina
Grande : Editora Amplla, 2021.
356 p.

Vários autores: Fernanda Ferreira Evangelista; Fernanda


de Oliveira Bottino; Arthur Daniel Rocha Alves; Tiago
Savignon Cardoso Machado; Tainah Silva Galdino de Paula
Formato: PDF
ISBN: 978-65-88332-23-8

1. Saúde 2. Análise clínicas 3. Microbiologia


4.
. Genéti 5. Imunologia 6. Farmacologia I. Evangelista,
Fernanda Ferreira II. Bottino, Fernanda de Oliveira
III. Alves, Arthur Daniel Rocha IV. Machado, Tiago
Savignon Cardoso V. Paula, Tainah Silva Galdino de
IV. Título
CDD-613

Índices para catálogo sistemático:


1. Saúde : Pesquisa 613

Editora Amplla
Campina Grande – PB – Brasil
[email protected]
www.ampllaeditora.com.br

2021
Esta obra é fruto da adaptação de alunos, professores e pesquisadores a uma era
digital que nos abraçou com afinco, trazendo novas perspectivas na divulgação
científica. Os trabalhos contidos neste e-book foram apresentados em formato de
resumo no Congresso On-line de Ciências da Saúde de 26 a 29 de outubro de 2020 pelo
grupo Ciência em Alvo. A possibilidade de realizar um evento totalmente on-line
modificou a maneira de pensar e participar de eventos científicos.
A pandemia do novo Coronavírus fez com que a necessidade de informação
alcançasse o máximo de pessoas além de criar uma oportunidade para nos ensinar como
a tecnologia favorece a todos os níveis acadêmicos.
A troca de informações entre profissionais da saúde foi, e continuará sendo,
fundamental para o enfrentamento dos desafios impostos no atual contexto. Desta
forma, este e-book tem o objetivo principal de atualização e promoção de conhecimento
a todos os profissionais da saúde, em especial, aos estudantes que estão iniciando na
carreira científica.
O conteúdo deste material é atualizado e diversificado com pesquisas
quantitativas e qualitativas, atuando em diferentes áreas das ciências da saúde como:
análises clínicas, microbiologia, biologia molecular/genética, imunologia, farmacologia,
entre outros.
Esta produção foi pensada como uma extensão do que foi realizado no evento
científico para continuidade dos trabalhos que foram relevantes para a construção do
mesmo e também, estimular a comunidade científica a dar seguimento aos trabalhos e
divulgá-los mesmo que em períodos difíceis.
Os organizadores desejam a todos uma ótima leitura e um bom proveito de todo
o conteúdo disponível nesta composição.
Yasmin da Silva Santos
Biomédica, professora de análises clínicas.
Fundadora do Grupo Ciência em Alvo
Mestre em Ciências pelo Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (FIOCRUZ)
Especialista em Análises Clínicas e Microbiologia pela Faculdade do Vale
Elvira Dayrell - FAVED,
Doutoranda de Fisiopatologia e Toxicologia (USP)

Fernanda Ferreira Evangelista


Enfermeira pela Universidade Estadual de Maringá (UEM)
Colaboradora do Ambulatório de Toxoplasmose Gestacional no hospital Universitário de Maringá;
Mestre em Ciências da saúde (UEM);
Doutoranda em Ciências da saúde (UEM)

Fernanda de Oliveira Bottino


Médica Veterinária formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF)
Professora de Microbiologia dos Cursos Técnicos de Nivel Médio da Escola Politécnica de Saúde Joaquim
Venâncio (EPSJV/ Fiocruz)
Especialista em Patologia Clínica Veterinária pela Faculdade Qualittas
Mestre em Ciências pelo Programa de Biologia Parasitária do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/ Fiocruz)

Arthur Daniel Rocha Alves


Biólogo formado pela Universidade Estadual da Zona Oeste (UEZO)
Mestre em Ciência pelo Programa de Biologia Parasitária do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz)
Doutorando em Medicina Tropical pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz)
Técnico em Gestão Hospitalar pela Escola Técnica Estadual Oscar Tenório (Faetec)

Tiago Savignon Cardoso Machado


Biólogo, Professor adjunto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (CAp / UERJ).
Professor de Bioquímica dos cursos Técnicos de Nível Médio da Escola Politécnica de Saúde Joaquim
Venâncio.
Doutor em Ciência pelo programa de Pós Graduação em Fisiopatologia Clínica e Experimental
(FISCLINEX) da UERJ

Tainah Silva Galdino de Paula


Bióloga formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF)
Professora de Biologia Molecular dos Cursos Técnicos de Nível Médio da Escola Politécnica de Saúde
Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz)
Mestre em Ciências pelo Programa de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ)
Doutora em Ciências pelo programa de Biologia Parasitária do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz)
Pós-Doc pelo programa Brasil sem Miséria (CAPES/Fiocruz)
CAPÍTULO I - aSPECTOS GERAIS DO SARS-COV-2: UMA REVISÃO DA LITERATURA ................................................ 9

capítulo ii - CRISPR/Cas como ferramenta biotecnológica aplicada à virologia................................ 20

capítulo iii - DETECÇÃO DOS VÍRUS EPSTEIN-BARR, CITOMEGALOVÍRUS E HERPESVÍRUS HUMANO 6 E 7 EM


CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM DOENÇAS EXANTEMÁTICAS ........................................................................ 35

capítulo iv - UTILIZAÇÃO DA SALIVA E DA URINA COMO ESPÉCIMES DE DIAGNÓSTICO DA DENGUE: ANÁLISE DA


PRODUÇÃO LITERÁRIA ............................................................................................................................. 51

capítulo v - REVISÃO DA LITERATURA: LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA – MÉTODOS DIAGNÓSTICOS ... 67

capítulo vi - NÍVEIS DE CITOCINAS TNF-α, IFN-γ, E TGF-β E O PERFIL CLÍNICO-EPIDEMIOLÓGICO DE INDIVÍDUOS


COM CORIORETINITE POR TOXOPLASMOSE, SUL DO BRASIL ........................................................................... 77

capítulo vii - NEUROCISTICERCOSE: ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS, CLÍNICOS E LABORATORIAIS - UMA REVISÃO


BIBLIOGRÁFICA ....................................................................................................................................... 85

capítulo viii - APLICAÇÃO DE FERRAMENTAS MOLECULARES PARA O DIAGNÓSTICO DE LEISHMANIOSE TEGUMENTAR


AMERICANA............................................................................................................................................ 98

capítulo ix - eSTUDO COMPARATIVO DE PROTOCOLOS DE EXTRAÇÃO DE DNA EMPREGADOS NA DETECÇÃO DE


TRYPANOSOMA CRUZI EM DOIS AMBIENTES: LABORATÓRIO DE ENSINO E DE PESQUISA .................................... 111

capítulo x - Corynebacterium striatum: PATÓGENO MULTIRRESISTENTE NEGLIGENCIADO PELA DIFÍCIL E


INCORRETA IDENTIFICAÇÃO .....................................................................................................................128

capítulo xi - BIOFILME FORMADO POR Staphylococcus aureus: CAUSA ALARMANTE DE INFECÇÕES


NOSOCOMIAIS ....................................................................................................................................... 153

capítulo xii - INFECÇÕES DO TRATO URINÁRIO CAUSADAS POR Corynebacterium spp. ............................... 181

capítulo xiii - IDENTIFICAÇÃO DE BACTÉRIAS NOCIVAS DECORRENTES DO MANUSEIO INCORRETO DO KEFIR .... 194

capítulo xiv - INFECÇÃO POR Treponema pallidum E DANOS NO DESENVOLVIMENTO EMBRIONÁRIO E FETAL
.......................................................................................................................................................... 200

capítulo xv - PERCEPÇÕES DOCENTES E DISCENTES SOBRE FEEDBACK EM ESTÁGIOS PRÁTICOS NO CURSO DE


MEDICINA .............................................................................................................................................212
capítulo xvi - O CAFÉ E SUAS PROPRIEDADES FUNCIONAIS: UMA BREVE REVISÃO DE LITERATURA SOBRE O USO DA
CAFEINA E SEUS BENEFICIOS .................................................................................................................. 228

capítulo xvii - CONTROLE DE QUALIDADE EM MEDICAMENTOS CONTENDO O PRINCÍPIO ATIVO MELOXICAM..... 245

capítulo xviii - POTENCIAL ANTIOBESOGÊNICO DO EXTRATO DE FEIJÃO-BRANCO (phaseolus vulgaris L.) ... 253

capítulo xix - AVALIAÇÃO DO CONHECIMENTO DOS ALUNOS INGRESSOS DE UMA INSTITUIÇÃO DE ENSINO TÉCNICO
PRIVADO DA ÁREA DA SAÚDE SOBRE ISTs NO MUNICÍPIO DE SÃO GONÇALO/RJ .............................................. 261

capítulo xx - USO RACIONAL DAS PANCS: UM RESGATE NA REGIÃO NA REGIÃO DE AMERICANA/SP ................ 268

capítulo xxi - PREVALÊNCIA DOS TRANSTORNOS MENTAIS COMUNS ENTRE OS ESTUDANTES DO CURSO TÉCNICO EM
ADMINISTRAÇÃO ................................................................................................................................... 280

capítulo xxii - COMPREENSÃO EXISTENCIAL-FENOMENOLÓGICA DO SUICÍDIO DURANTE A PANDEMIA ............. 292

capítulo xxiii - ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM NO DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO FOTOTERÁPICO DA ICTERÍCIA


FISIOLÓGICA EM NEONATOS PRÉ-TERMO .................................................................................................. 306

capítulo xxiv - PRÉ-NATAL HUMANIZADO E EDUCAÇÃO EM SAÚDE PARA O PARTO ATIVO: PERCEPÇÃO DOS MÉDICOS
E ENFERMEIROS DE UMA UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE ................................................................................. 315

capítulo xxv - Avaliação higiênico-sanitária de alface (LaCtuca sativa L.) comercializada in natura
em restaurantes self-service no município de Maringá-PR .............................................................. 329

capítulo xxvi - ATUAÇÃO DO ENFERMEIRO FRENTE AO CÂNCER DA MAMA MASCULINA NA ATENÇÃO BÁSICA ... 339
CAPÍTULO I

ASPECTOS GERAIS DO SARS-COV-2: UMA REVISÃO DA LITERATURA


Lygia Cristine Soares da Silva ¹
Arthur Daniel Rocha Alves ²
Fernanda de Oliveira Bottino ³
¹ Estudante do Ensino Médio/Técnico da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio – FIOCRUZ
² Doutorando em Medicina Tropical no Laboratório de Desenvolvimento Tecnológico em Virologia do Instituto
Oswaldo Cruz – FIOCRUZ
³ Professora-Pesquisadora do Laboratório de Educação Profissional em Técnicas Laboratoriais em Saúde da Escola
Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio – FIOCRUZ

RESUMO

O SARS-CoV-2 é o agente etiológico da Covid-19, uma doença infecciosa caracterizada


por um quadro de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e cujo os primeiros casos
foram identificados em dezembro de 2019 na cidade Chinesa de Wuhan. Em 2019, o
Comitê Internacional de Taxonomia Viral divulgou uma nova classificação para os
coronavírus; o SARS-CoV-2 pertences à família Coronaviridae, subfamília
Orthocoronavirinae, gênero Betacoronavírus, juntamente com o SARS-CoV e o MERS-
CoV responsáveis, respectivamente, pelas SRAG e Síndrome Respiratória do Oriente
Médio (MERS). Possui um genoma RNA de fita simples polaridade positiva, não
segmentado, e um capsídeo de simetria helicoidal, envolto por um envelope lipídico que
confere uma morfologia esférica de 80 a 120 nanômetros de diâmetro aos vírions. Dos
componentes integrados à partícula viral, destacam-se as glicoproteínas Spike (S) que
desempenham a função de se ligar à Enzima Conversora de Angiotensina 2 (ECA2)
presente em tecidos humanos, como o pulmão, o coração e o intestino, permitindo a
entrada do vírus na célula por endocitose. Até o momento, a única via de transmissão
cientificamente comprovada para o SARS-CoV-2 é a respiratória, através de gotículas,
aerossóis e contato direto com o indivíduo infectado. Outras formas de transmissão,
como: vertical, fecal-oral, zoonótica ou parenteral necessitam de mais estudos a fim de
serem comprovadas cientificamente.

Palavras-chave: Covid-19. SARS-CoV-2. Coronavírus. Virologia

1. INTRODUÇÃO

Em apenas duas décadas, o mundo sofreu com três grandes epidemias causadas
por vírus pertencentes ao gênero Betacoronavírus da família Coronaviridae (PAULES et
al., 2020). De novembro de 2002 à julho de 2003 a Síndrome Respiratória Aguda Grave
(SRAG ou SARS, do inglês Severe Acute Respiratory Syndrome) atingiu países Asiáticos,

9
Europeus e a América do Norte, resultando em 8.439 casos notificados, sendo 812 fatais.
A doença emergiu na China, na província de Guangdong e o SARS-CoV foi identificado
como o agente etiológico (KUIKEN et al., 2003). Uma década depois, no período de 2012
e 2013, surgiu o MERS-CoV, causador da Síndrome Respiratória do Oriente Médio
(MERS, do inglês Middle East Respiratory Syndrome), permanecendo este limitado à
Arábia Saudita, com poucos casos descritos em outros países (DE GROOT et al., 2013).
A partir de 12 de dezembro de 2019, foram relatados casos de pneumonia grave
e SRAG com etiologia não definida em Wuhan, cidade localizada na província de Hubei,
no centro da China. Foram testadas amostras de sete pacientes com sintomas graves da
infecção, admitidos na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Wuhan Jin Yin-Tan,
para investigação do agente etiológico. Tais amostras foram enviadas para o Instituto
de Virologia de Wuhan (WIV) e, através de testes moleculares como a Reação em Cadeia
da Polimerase em Tempo Real precedida de Transcrição Reversa (RT-qPCR) e testes
sorológicos como o Ensaio de Imunoabsorção Enzimática (ELISA), foi confirmada a
infecção viral dos pacientes por um vírus similar ao SARS-CoV e até então desconhecido.
O mercado de frutos do mar de Huanan foi considerado o local de origem desta infecção,
pois seis destes pacientes tinham vínculo com o mesmo, sendo entregadores ou
vendedores (ZHOU et al., 2020).
Inicialmente, esse novo vírus era denominado como 2019-nCoV. Diante da
percepção das semelhanças de sua estrutura com o agente etiológico da epidemia da
SRAG, o Grupo de Estudos de Coronavírus (CSG, do inglês Coronavírus Study Group)
pertencente ao Comitê Internacional de Taxonomia Viral (ICTV) nomeou o vírus atual
como SARS-CoV-2 (GORBALENYA et al., 2020). Em 11 de fevereiro de 2020, a
Organização Mundial de Saúde (OMS) denominou a patologia causada por esse novo
Coronavirus de Covid-19 (do inglês Coronavírus disease ou “Doença do Coronavírus”),
sendo o número 19 referente ao ano de ocorrência dos primeiros casos notificados
dessa infecção (WHO, 2020; FIOCRUZ, 2020). Em 11 de março de 2020, a OMS decretou
a pandemia pelo SARS-CoV-2, causador da Covid-19 (OPAS, 2020).

10
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1. Classificação da família Coronaviridae

Em 2019, o ICTV divulgou uma nova classificação para os coronavírus que


passaram a pertencer ao domínio Riboviria, reino Orthornavirae, filo Pisuviricota, classe
Pisoniviricetes, ordem Nidovirales, subordem Cornidovirineae, família Coronaviridae.
Esta família foi dividida em duas novas subfamílias, sendo elas: Letovirinae (gênero
Alphaletovirus) e Orthocoronavirinae, sendo esta, dividida em em quatro gêneros:
Alphacoronavírus, Betacoronavírus, Deltacoronavírus e Gammacoronavírus (ICTV,
2019). Os gêneros Alphacoronavírus e Betacoronavírus são conhecidos por infectar
mamíferos, incluindo o homem; enquanto que os Deltacoronavírus e
Gammacoronavírus infectam espécies de aves (ICTV, 2019; PAULES et al., 2020).
As sete principais espécies conhecidas que infectam humanos são: HCoV-229e,
HCoV-NL63 (pertencentes ao gênero Alphacoronavírus), HCoV-OC43, HCoV-HKU1
(gênero Betacoronavírus), sendo estas responsáveis principalmente por infecções
respiratórias brandas. Além do SARS-CoV-2, SARS-CoV e MERS-CoV, pertencentes ao
gênero Betacoronavírus, que, como mencionado anteriormente, são responsáveis pela
Covid-19, SRAG e MERS, respectivamente (SHUO et al., 2016; BULUT E KATO, 2020).

2.2. Estrutura dos coronavírus

Os coronavírus possuem um genoma RNA de fita simples, não segmentado, com


senso positivo (ssRNA+) (FUNG et al, 2019; PAULES et al., 2020). O RNA dos coronavírus
são considerados grandes (cerca de 30 kb), logo, sua tradução é considerada complexa
(DE WILDE et al., 2017).
Estes vírus são envelopados, com morfologia esférica variando de 80 a 120
nanômetros de diâmetro e capsídeo de simetria helicoidal. Em seu envelope (envoltório
externo) existem componentes glicoproteicos ou proteicos, que estão integrados na
partícula viral em uma membrana lipídica, como: a glicoproteína Spike (S) que forma
projeções em trímeros; a glicoproteína da membrana (M), sendo esta a mais abundante;
a proteína Hemaglutinina Esterase (HE), encontrada somente em alguns
Betacoronavírus; e a proteína do Envelope (E), que é altamente hidrofóbica. No interior
deste envelope, há um nucleocapsídeo helicoidal formado pela junção da proteína do

11
Nucleocapsídeo (N) com o material genético do vírus (ssRNA+), para proteção do
genoma (Figura 1A) (CRUZ et al., 2020).

Figura 1 – Estrutura dos coronavírus

Legenda: A - Esquema demonstrando o nucleocapsídeo heliocoidal e as principais proteínas


estrurais: proteína Spike (S), proteína de Membrana (M), proteína do Envelope (E) e proteína do
Nucleocapsídeo (N); B - Eletromicrografia de vírions purificados de coronavírus murino evidenciando o
formato de ‘coroa’. (Fonte: adaptado de MASTERS E PERLMAN., 2013)

O termo coronavírus tem origem na palavra em Latim corona e significa coroa ou


auréola, fazendo referência à estrutura da sua superfície, visualizada a partir de
microscopia eletrônica, com projeções que fazem o vírus parecer com uma coroa (Figura
1B) (RICHMAN et al., 2016).

2.3. Ciclo de replicação

Assim como o SARS-CoV, a glicoproteína Spike (S) do SARS-CoV-2 têm grande


afinidade pela Enzima Conversora de Angiotensina 2 (ECA2), uma proteína que está
presente em células de tecidos humanos que compõem o pulmão, o coração, o rim, o
endotélio e a superfície luminal das células epiteliais intestinais. A interação da
glicoproteína S do envelope viral com a ECA2 permite a entrada do vírus na célula,
através de endocitose (DE WILDE et al., 2017; ZHANG et al., 2020).
Após a entrada do vírus na célula, tem-se a liberação do material genético no
citoplasma da célula e ocorre a produção de poliproteínas. O genoma dos coronavírus é
constituído por uma molécula de RNA fita simples de polaridade positiva, com a

12
presença de uma “cap” 7-metilguanosina na extremidade 5’ e uma cauda poliadenilada
(poli-A) na extremidade 3’. A replicase dos coronavírus é codificada por duas fases de
leitura aberta (ORFs, do inglês Open Reading Frames) que se sobrepõem (ORF1a e
ORF1b), ocupando dois terços do genoma e sendo diretamente traduzidas do RNA
genômico. Além disso, o genoma possui um grande número de pequenas ORFs
espalhadas entre os genes que codificam as proteínas estruturais (S, E, M, N e HE).
Independente da espécie de coronavírus, a ordem codificante do genoma é: 5’–
Replicase–S–E–M–N–3’ (Figura 2) (FUNG et al, 2019).

Figura 2 – Estrutura do genoma dos coronavírus SARS-CoV e MERS-CoV

Legenda: Diagrama esquemático demonstrando a estrutura do genoma dos vírus SARS-CoV e


MERS-CoV, na seguinte ordem: 5’–Replicase–S–E–M–N–3’, com pequenas ORFs espalhadas ao longo dos
genes estruturais. As ORFs 1a e 1b são responsáveis pela codificação da replicase e estão representadas
de vermelho. Os genes que codificam as proteínas estruturais (S, E, M, N e HE) estão representados de
azul e os genes que codificam as proteínas acessórias de cinza. (Fonte: adaptado de FUNG et al., 2019)

Após a sintese da replicase nas ORFs, o RNA viral positivo serve de molde para
um RNA negativo, que por sua vez, é utilizado como base para novos RNAs genômicos.
Além desse mecanismo, há outro para a produção de RNAs subgenômicos, responsáveis
pela tradução dos genes acessórios e estruturais durante o processo de transcrição e
replicação viral (FUNG et al, 2019).
Depois da produção das proteínas estruturais traduzidas a partir da ORF
5’ (ORF1a e ORF1b), a partícula viral é sintetizada com todos seus componentes no
Complexo de Golgi, transportada pela via secretora dentro de vesículas e excretada para
o meio extra celular por exocitose (Figura 3) (FUNG et al, 2019).

13
Figura 3 - Ciclo replicativo do SARS-CoV-2

Legenda: (1) adsorção do vírus ao receptor ECA2 e entrada nas células por endocitose, (2) fusão
do vírion com a membrana da vesícula e liberação do genoma viral, (3) codificação da replicase a partir
das ORFs 1a e 1b, (4) tradução de proteínas estruturais e acessórias, (5) montagem dos vírions no
Complexo de Golgi e (6) transporte das novas partículas virais pela via secretora para saída da célula por
exocitose. (Fonte: SHEREEN et al., 2020)

2.4. Formas de Transmissão

O SARS-CoV-2, causador da Covid-19, tem a transmissão respiratória como única


via confirmada, até o momento, de humano para humano, através de gotículas,
aerossóis e contato direto com o indivíduo infectado (ROTHAN E BYRAREDDY, 2020).
Portadores do vírus que estejam assintomáticos também são uma fonte de transmissão,
ainda que esses pacientes possam ter uma carga viral menor em relação aos que
desenvolveram a doença. Esse vírus tem alta transmissibilidade e, aliado às viagens
globais, constatou-se o seu grande potencial para o desenvolvimento da pandemia (LAI
et al, 2020).
Sobre a transmissão vertical, que se caracteriza pela passagem do vírus da mãe
para o feto durante o período gestacional, ainda não há comprovação científica.
Entretanto, esta forma de transmissão não pode ser descartada. Há relatos de fetos que

14
apresentaram sofrimento intra-uterino, resultando em cesárea de emergência e de
neonatos que ficaram na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal com falta de ar,
apresentando radiografia de tórax com turvação difusa, incluindo um caso fatal. Em
ambos os casos relatados, as gestantes testaram positivo para o SARS-CoV-2 (ZAIGHAM
E ANDERSSON, 2020).
A transmissão fecal-oral também não foi comprovada cientificamente.
Amostras fecais de indivíduos com Covid-19 apresentaram o RNA do SARS-CoV-2
detectável através da Reação em Cadeia pela Polimerase precedida de Transcrição
Reversa em tempo real (RT-qPCR). Entretanto, é importante ressaltar que esta técnica
detecta apenas o material genético do vírus, não a partícula viral infecciosa (BULUT e
KATO, 2020; LI et al., 2020). Outros estudos mostram que o vírus viável foi cultivado em
cultura celular a partir de fezes contaminadas (WANG et al., 2020), porém mais estudos
sobre o tema se fazem necessários para confirmar esse tipo de transmissão.
Shi e colaboradores (2020) verificaram um potencial de transmissão e
replicação do SARS-CoV-2 através de inoculação do vírus em animais que têm contato
próximo com humanos. Segundo os autores, porcos, galinhas e patos não são suscetíveis
ao vírus. Cães possuem baixa suscetibilidade. Furões apresentam alta suscetibilidade e
replicação viral localizada no trato respiratório superior. Os gatos possuem além da alta
suscetibilidade ao vírus, a replicação viral no trato respiratório inferior e a
transmissibilidade para outros gatos, o que os torna potenciais transmissores para
humanos e alvo de atenção para a vigilância epidemiológica da Covid-19 (SHI et al.,
2020).
Sobre a via parenteral, ainda não se sabe se o SARS-CoV-2 pode ser
transmitido por transfusão de sangue ou hemoderivados. Essa informação é
fundamental para evitar a transmissão do vírus pela doação de sangue por portadores
assintomáticos do vírus. Até o momento, foi encontrado apenas o RNA viral no plasma
ou soro (CHANG, et al., 2020; CHO et al., 2020).

15
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O entendimento dos aspectos gerais do SARS-CoV-2 faz-se necessário, afim de


que sejam desenvolvidos métodos mais eficazes de prevenção, tratamento e
diagnóstico para a Covid-19. Além disso, a revisão da literatura científica sobre esta
temática deve ser feita de forma constante, uma vez que novos estudos a cerca da
compreensão desta doença vêm sendo realizados e publicados diariamente.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos à Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/ Fiocruz)


pela concessão de bolsa auxílio para que a aluna Lygia Cristine Soares da Silva pudesse
realizar este trabalho e ao Congresso Online de Ciências da Saúde (CONCIS) pela
oportunidade de expor este trabalho através de apresentação na plataforma, na edição
de 2020.

REFERÊNCIAS

BULUT, C., KATO, Y. Epidemiology of COVID-19. Turkish Journal Of Medical Sciences, v.


50, nº 3, p. 563–570, 2020. Disponível em:
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7195982/. Acesso em: 18 mai.
2020.

DE GROOT, R. J., BAKER, S. C., BARIC, S. R. et al. Middle east respiratory syndrome
coronavírus (MERS-CoV): announcement of the Coronavírus Study Group.
Journal of Virology, v. 87, nº 14, p. 7790-7792, 2013. Disponível em:
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3700179/. Acesso em: 04 mai.
2020.

DE WILDE, A. H., SNIJDER, E. J., KIKKERT, M., VAN HEMERT, M. J.. Host factors in
coronavírus replication. Current Topics in Microbiology and Immunology, v.
419, p. 1-49, 2017. Disponível em:
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2020.

19
CAPÍTULO II

CRISPR/CAS COMO FERRAMENTA BIOTECNOLÓGICA APLICADA À VIROLOGIA


Wagner Luis da Costa Nunes Pimentel Coelho ¹
Carlos Gabriel Mathias Alves ²
Arthur Daniel Rocha Alves ³
Alexandre dos Santos da Silva 4
¹ Mestrando no Programa de pós-graduação em Medicina Tropical. Instituto Oswaldo Cruz – Fundação Oswaldo Cruz,
Rio de Janeiro, RJ.
² Graduado em Biomedicina. Centro Universitário IBMR, Rio de Janeiro, RJ.
³ Doutorando no Programa de pós-graduação em Medicina Tropical. Instituto Oswaldo Cruz – Fundação Oswaldo
Cruz, Rio de Janeiro, RJ. [email protected]
4 Doutor em Medicina Tropical. Instituto Oswaldo Cruz – Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, RJ.

RESUMO

Introdução: O CRISPR, mecanismo de defesa presente em procariotos, é capaz de


incorporar uma sequência de material genético e, posteriormente, junto de proteínas
associadas (Cas), clivar DNA/RNA específico de acordo com a sequência incorporada ao
locus. A possibilidade de reprogramar este mecanismo em laboratório possibilitou sua
utilização na área biotecnológica. Desta forma, o complexo CRISPR/Cas tem sido
estudado como alternativa ao desenvolvimento de terapias, métodos diagnósticos e até
na produção de transgênicos. Objetivo: Avaliar o potencial de utilização do CRISPR como
ferramenta na pesquisa direcionada à virologia. Materiais e métodos: Este estudo de
revisão bibliográfica teve como principal fonte de pesquisa a plataforma Pubmed, na
qual foram realizadas buscas no período entre março de 2019 e setembro de 2020,
utilizando as seguintes palavras-chave: CRISPR, virology, therapy, editing, diagnostic.
Resultados: A presente revisão demonstra algumas das possibilidades de utilização do
CRISPR no campo de estudo da virologia, como por exemplo, uma forma eficaz em
conferir resistência à vírus de RNA em plantas, levar à apoptose células infectadas pelo
HPV, e identificar sensível e especificamente os vírus Zika, Dengue e o novo coronavírus
(SARS-CoV-2) em diversas amostras biológicas. Devido ao pouco tempo desde a
descoberta do CRISPR, sua utilização em humanos ainda deve ser planejada com
cautela. Conclusões: O CRISPR, embora ainda seja uma técnica nova, demonstra
potencial para se disseminar cada vez mais em laboratórios que trabalham com biologia
molecular, e desta forma, ser utilizado para as resoluções nos campos da virologia.

Palavras-chave: Biotecnologia. Crispr. Diagnóstico. Virologia.

20
1. INTRODUÇÃO

Uma forma de defesa de bactérias contra invasores foi descoberta e denominada


como complexo CRISPR/Cas. Em procariotos, ocorre a incorporação ao lócus CRISPR de
parte do material genético do organismo que se pretende combater, por exemplo, um
bacteriófago. Ao incorporar essa sequência no material genético do procarioto, este
torna-se capaz de reconhecer o organismo invasor em um futuro encontro e, portanto,
consegue clivar seu material genético (Ishino et al. 1987, Mojica et al. 2005). Tendo em
vista essa capacidade de “cortar” o DNA, logo foi sugerida a utilização do CRISPR como
ferramenta biotecnológica (Jinek et al. 2012).
O sistema CRISPR (Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente
Interespaçadas, ou do inglês, Clustered Regularly Interspaced Short Palindromics
Repeats) é composto basicamente por um RNA guia específico para o alvo que se deseja
clivar ligado à uma endonuclease, da família Cas (Proteínas Associadas ao CRISPR, ou do
inglês, CRISPR Associated Protein), que será direcionada até a sequência específica do
genoma de interesse, para realizar um “corte” no material genético, silenciando o DNA
invasor (alvo) (Terns & Terns 2011, Bhaya et al. 2011, Jinek et al. 2012, Wiedenheft et
al. 2012).
Devido à possibilidade de programar este sistema para clivar sequências
específicas de DNA ou RNA, inúmeras finalidades foram sugeridas para utilização do
CRISPR, dentre as quais: tratamento para câncer, terapia para doenças infecciosas,
diagnóstico laboratorial, produção de transgênicos, alteração genética de vetores,
alteração genética de modelos experimentais animais, estudos genéticos, bioquímicos
e moleculares. Tamanha diversidade de estratégias fez com que as pesquisadoras
Emmanuelle Charpentier e Jennifer Doudna, que a desenvolveram, fossem laureadas
com o Prêmio Nobel de Química de 2020.
Diante das diversas possibilidades proporcionadas por este sistema, tanto no
estudo, quanto no diagnóstico e até no tratamento de infecções virais, esta revisão
busca explorar a utilização do CRISPR na virologia.

21
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1. Aspectos históricos

O lócus CRISPR foi inicialmente identificado em Escherichia coli em 1987 (Ishino


et al. 1987), porém somente em 2005 foi descoberta a sua função de imunidade
adquirida em procariotos (Mojica et al. 2005). Posteriormente, demostrou-se que a
resistência dos procariotos à bacteriófagos e plasmídeos invasores deve-se à atividade
de clivagem do DNA provocada pelo CRISPR (Garneau et al. 2010).
Emmanuelle Charpentier e colaboradores (2012) demonstraram a capacidade de
programar o complexo CRISPR/Cas, no qual a Cas9 ligada ao RNA guia consegue clivar o
DNA específico, destacando o potencial deste para edição gênica (Jinek et al. 2012). No
ano seguinte, foi visto que este sistema poderia ser utilizado em células humanas (Cho
et al. 2013). Desde então, devido ao seu potencial para edição genética, o complexo
CRISPR/Cas tem sido altamente visado e, portanto, discutido sob os aspectos éticos de
sua utilização.

2.2. CRISPR/Cas e seu potencial para edição genômica

Após o entendimento geral da funcionalidade do CRISPR, logo foi sugerida sua


utilização como ferramenta para edição genômica. Para tal, foi explorado o sistema
CRISPR/Cas que utilizava a endonuclease Cas9, o sistema CRISPR/Cas9.
A endonuclease Cas9 está associada à um RNA guia formado por tracrRNA (RNA
trans-ativador) e crRNA (CRISPR RNA), que formam um pareamento específico com uma
região do DNA alvo, permitindo que a Cas9 quebre a fita-dupla de interesse.
Desta forma, foi possível a criação de um sistema específico, que usa um RNA
guia (sgRNA), em que o lado 5’ determina a sequência do DNA alvo ao qual o sistema se
ligará e o lado 3’ está ligado à Cas9 (Doudna & Charpentier 2014). Tendo capacidade
sítio-específica, este sistema permite, por exemplo, o silenciamento de um gene de
forma planejada a se evitar efeitos de ligações inespecíficas não intencionais (efeitos
off-target).
Após a clivagem da fita dupla do DNA em uma célula eucariótica, a célula busca
o reparo da fita, que pode ser realizado por dois mecanismos: HDR (recombinação
homóloga, ou do inglês, homology-directed repair) e NHEJ (recombinação não

22
homóloga, ou do inglês, non-homologous end joining). A NHEJ ocorre naturalmente
através da inserção de nucleotídeos aleatórios, enquanto a HDR necessita de uma
sequência molde sintética para realizar os reparos de forma a reduzir possíveis erros e
mutações indesejadas (Le Cong et al. 2013, Yang et al. 2013).

2.3. O uso do complexo CRISPR/Cas para o tratamento de


infecções virais

Buscando a utilização do complexo CRISPR/Cas9 como tratamento antiviral, há


trabalhos que o relacionam a vias de knockout de genes específicos como CXCR4 (que
age em células T CD4). O sgRNA do CRISPR, neste caso, foi projetado para reconhecer
somente a sequência alvo, de modo a interferir na proteína CXCR4, que funciona como
co-receptor para a infecção pelo HIV (Schumann et al. 2015). Para permitir a inserção
do complexo Cas através da membrana celular, foi utilizada a via de eletroporação, uma
técnica que utiliza campos elétricos sobre determinadas células, a fim de que tenham
sua permeabilidade artificialmente aumentada (Neumann et al. 1982). A metodologia
de knockout de CXCR4 utilizando o CRISPR/Cas9 resulta em linfócitos T, geneticamente
alteradas, não suscetíveis à infecção pelo HIV, ou seja, resistentes à infecção (Schumann
et al. 2015).
O ART (tratamento antirretroviral) é considerado hoje como o melhor
tratamento para pacientes com HIV, porém esta terapia somente diminui a carga viral e
não elimina o vírus em sua forma latente (Gandhi et al. 2010). Existem trabalhos que
utilizam o complexo CRISPR/Cas9 para eliminar o gene do HIV-1 dos linfócitos T.
Kaminski e colaboradores (2016), com o intuito de quantificar a eliminação da
proteína Nef (codificada pelo HIV) utilizaram o marcador GFP (proteína fluorescente
verde) para substituí-la, o que, por sua vez, forneceu um meio de cultura viável para a
quantificação. Neste trabalho foi utilizada a linhagem clonal 2D10 como modelo de
latência de células T, a fim de se analisar a capacidade do CRISPR/Cas9 de deleção da
sequência que codifica o HIV-1. Concluiu-se então que o tratamento dos linfócitos T
previamente inoculados com o CRISPR/Cas9 foi eficiente para eliminação de parte do
DNA viral dentro da região LTR 3U, o que representa um nível relevante de supressão,
mostrando que o CRISPR/Cas9 pode efetivamente diminuir a expressão do DNA do HIV-
1 em sua forma latente. Tendo este trabalho em vista, há um grande potencial de

23
utilização do CRISPR/Cas9 em modelos ex-vivo, que são preferencialmente utilizados
devido às implicações éticas da utilização de algumas terapias in vivo.
Alguns trabalhos relacionam a utilização do complexo CRISPR/Cas9 para
tratamento de câncer cervical causado por Papilomavírus Humano (HPV). O HPV-16 e o
HPV-18 estão entre os tipos virais mais perigosos, devido a sua capacidade
carcinogênica. Para estes vírus é de vital importância a expressão das oncoproteínas E6
e E7. Caso esta expressão não ocorra, isto resultará na apoptose das respectivas células
infectadas pelo vírus, bem como a aceleração de seu processo de envelhecimento
(DeFilippis et al. 2002). O mecanismo de ação da Cas9 neste trabalho está relacionado à
supressão da expressão destas duas proteínas em um sítio específico em células em
processo de oncogênese no colo do útero. Este knockout causa o aumento dos níveis
celulares de p53, gene responsável pela principal via de apoptose e de pRb (proteína do
retinoblastoma), encarregada do processo de aceleração do envelhecimento celular
(senescência) e inibe o crescimento tumoral do câncer cervical (Hu et al. 2014, Kennedy
et al. 2014).

2.4. Uso do sistema CRISPR/Cas para o diagnóstico de


infecções virais

Uma das maiores dificuldades para o diagnóstico viral está na diferenciação


entre vírus relacionados entre si, ou seja, problemas na especificidade do teste,
resultando em alta ocorrência de reatividade cruzada em muitos testes, como é o caso
da família Flaviviridae, com os vírus da Dengue (DENV), Zika (ZIKV) e Febre Amarela (YFV)
(Priyamvada et al. 2016, Munoz-Jordan 2017).
Buscando um teste diagnóstico com alta sensibilidade e especificidade, ainda
capaz de implementar rapidez e sem a necessidade da utilização de equipamentos de
alto custo, um grupo de pesquisadores utilizou o complexo CRISPR/Cas13 para o
desenvolvimento de um método para diagnóstico viral.
O método desenvolvido por eles combina a amplificação isotérmica através de
recombinase polimerase (RPA) com a alta especificidade do sistema CRISPR. Dois testes
foram realizados isoladamente, nos quais um deles demonstrou ser capaz de detectar
sensível e especificamente o ZIKV, e no outro o DENV. Ambos foram realizados a partir
de amostras de pacientes RT-PCR-positivos. Foi demonstrado por essa equipe que o

24
teste desenvolvido por eles é capaz de detectar o material genético do ZIKV presente
em amostras de urina, sangue total, plasma, soro e saliva. Além de detectar o DENV em
sangue total, soro e saliva (Myhrvold et al. 2018).
Nesta técnica, chamada de SHERLOCK (Desbloqueio Enzimático-Específico de
Alta Sensibilidade, ou do inglês, Specific High Sensitivity Enzymatic Reporter UnLOCKing),
utiliza-se a Cas13, proteína associada ao CRISPR, que após realizar o corte específico do
RNA alvo, passa a clivar quaisquer moléculas de RNA não específico próximos a ela.
Portanto, é possível marcar essas moléculas com sondas, que serão visualizadas (através
de fluorescência) após o corte deste RNA não específico pela proteína Cas13, indicando
que anteriormente a Cas13 se ligou e clivou o RNA alvo (Gootenberg et al. 2017).
Embora, ainda hoje, a principal finalidade para a Cas9 não esteja relacionada ao
desenvolvimento de diagnóstico, o sistema CRISPR/Cas9 possui elevado potencial para
detecção de DNA. Portanto, Zhang e colaboradores (2018) desenvolveram algumas
técnicas que associam este sistema à tecnologia PCR (Reação em Cadeia da Polimerase,
ou do inglês, Polymerase Chain Reaction) (Wang et al. 2018, Zhang et al. 2018a).
Em um dos últimos trabalhos publicados por esta equipe, eles demonstraram o
desenvolvimento do Cas9/sgRNA-typing PCR, versão 3.0 (ctPCR3.0), sendo demonstrada
alta confiabilidade, especificidade e sensibilidade em detectar e identificar diversos
genótipos do Papilomavírus Humano (HPV). Para isso, foi desenhado um par de RNA
guia para os genes L1 (proteína estrutural do HPV) de 10 subtipos virais.
Inicialmente, para demonstrar a sensibilidade e especificidade da técnica, foi
realizado um experimento para detectar os genes do HPV em plasmídeos clonados. Esse
trabalho demonstrou que a técnica teve sucesso não apenas em detectar os genes,
como também em distingui-los. Além deste e de outros testes, através do ctPCR3.0, o
trabalho demonstrou a detecção e identificação dos genes L1 de diferentes subtipos do
HPV em 20 de 26 amostras (6 amostras verdadeiramente negativas) de células obtidas
a partir do muco cervical, indicando o grande potencial desta tecnologia. O ctPCR3.0
detecta e identifica o DNA alvo a partir do corte neste DNA provocado pelo Cas9/sgRNA,
que é observado a partir de uma PCR em tempo real (qPCR) (Zhang et al. 2018b).
Outro trabalho que demonstra a utilização do CRISPR para detecção e distinção
entre genótipos do HPV, também criou uma nova técnica para diagnóstico utilizando o
sistema CRISPR/Cas (Chen et al. 2018). Esta técnica, nomeada como DETECTR (DNA

25
Endonuclease Targeted CRISPR Trans Reporter), utiliza como proteína associada ao
CRISPR, a Cas12. Esta proteína age de forma semelhante à Cas13, com a diferença de
ser direcionada para o DNA alvo. A Cas12 se liga à fita dupla de DNA alvo e então, a partir
disso, passa a clivar indiscriminadamente qualquer fita simples de DNA nas
proximidades. Portanto, para utilização da Cas12 em diagnóstico, os pesquisadores
acoplam sondas às fitas simples de DNA que serão utilizadas no teste. A partir do
reconhecimento e clivagem da fita dupla de DNA alvo pela Cas12, esta passa a clivar as
fitas simples, liberando as sondas acopladas, que poderão ser visualizadas a partir de
fluorescência.

Como resultados obtidos neste trabalho, o DETECTR demonstrou ser capaz de


detectar e identificar HPV-16 em 25/25 amostras de DNA extraído, a partir de swab retal,
além de também detectar 23/25 HPV-18 das mesmas amostras (que continham uma
mistura heterogênea dos genótipos do HPV), mostrando alta correlação entre os
resultados obtidos a partir de PCR e do DETECTR nas mesmas amostras (Chen et al.
2018).

Recentemente, um estudo demonstrou a utilização do CRISPR em conjunto com


biossensores no desenvolvimento de uma nova técnica para diagnóstico molecular,
permitindo a detecção de DNA e RNA patogênicos. Este trabalho demonstrou a
eficiência da técnica ao detectar e identificar uma bactéria chamada Orientia
tsutsugamushi e o vírus Huaiyangshan banyangvirus, que são transmitidos por
artrópodes e apresentam sinais clínicos semelhantes, como febre, dor de cabeça e
mialgia e, além disso, ambas são endêmicas no leste da Ásia, o que dificulta o
diagnóstico clínico (Kim et al. 2018). Os biossensores permitem a identificação de
determinados alvos a partir de reações biológicas, por exemplo, de material genético ou
anticorpos em uma dada amostra, possibilitando sua utilização como método
diagnóstico (Wang 2000). A detecção desta reação pode ser visualizada através de
fluorescência, medindo-se a diferença do índice de refração entre uma amostra positiva
e um controle negativo (Wang 2000, Koo et al. 2018). Koo e colaboradores (2018)
desenvolveram esta metodologia utilizando o CRISPR e biosensor, que é capaz de
amplificar, através de reação isotermal, e detectar ácido nucleico com alta sensibilidade
e especificidade.

26
Para isso, utilizaram a dCas9, uma proteína Cas9 que perdeu sua função de
endonuclease, através de mutações. Portanto, essa proteína é capaz de se ligar
especificamente ao DNA alvo, no entanto, sem provocar clivagem desse material
(Guilinger et al. 2014). Após a ligação entre a dCas9 e o DNA alvo, ocorre uma alteração
do índice de refração, que aumenta a sensibilidade em comparação com o teste
realizado somente com o biosensor. Para a amplificação do ácido nucleico, é realizada
uma reação isotermal através da RPA. Ao buscar o DNA, o oligonucleotídeo iniciador se
liga ao DNA para permitir a sua extensão. Por outro lado, quando o alvo é um RNA, é
adicionada uma transcriptase reversa à reação de amplificação (RT-RPA), possibilitando
a transcrição do DNA complementar (cDNA) a partir do RNA. A dCas9 se liga ao produto
amplificado e aumenta o peso molecular na superfície do sensor, sendo medido através
da alteração do índice de refração. Como resultados, este trabalho demonstrou que o
biosensor mediado por CRISPR é capaz de distinguir os dois patógenos testados em
amostras de soro, indicando o potencial diagnóstico desta técnica (Koo et al. 2018).

Com a pandemia do novo coronavírus (SARS-CoV-2), agente causador da COVID-


19, estratégias de detecção viral foram desenvolvidas com a associação da enzima
Cas12. Esses métodos de detecção foram considerados ultrasensíveis por terem um
limite de detecção de 10 cópias/µL, rápidos por demorarem cerca de 30 minutos para
execução do ensaio, de baixo custo (cerca de 1 a 2 dólares americanos por teste) e
portáteis, melhorando a detecção do vírus em campo (Broughton et al. 2020, Lucia et
al., 2020).

2.5. Produção de transgênicos utilizando o complexo


CRISPR/Cas

Um dos maiores problemas relacionados à indústria agrícola global, são os vírus


capazes de infectar plantas. Percebendo o potencial do CRISPR para edição gênica, logo
surgiram alguns trabalhos buscando utilizar esta ferramenta para produção de
transgênicos (Makarova et al. 2018, Eş et al. 2019, Zhan et al. 2019).

Em um trabalho recente, um grupo de pesquisadores reprogramou o sistema


CRISPR/Cas9 da bactéria Francisella novicida (FnCas9) com o objetivo de conferir
imunidade molecular contra vírus de RNA às plantas (Zhang et al. 2018c). Para verificar
a eficiência desta metodologia, foram realizados testes de inibição para o vírus do

27
mosaico do tabaco (TMV) e para o vírus do mosaico do pepino (CMV), ambos vírus de
RNA fita simples polaridade positiva. Para a realização desta pesquisa, foi construído um
vetor pCR01, derivado do plasmídeo pCambia1300, contendo a FnCas9 e o sgRNA
desenhado. Posteriormente, foi realizado um experimento no qual se injetou, nas folhas
de plantas Nicotiana benthamiana, bactérias contendo o vetor experimental e o vetor
controle junto de clones CMV. Os clones CMV foram injetados na parte superior da
folha, enquanto que os vetores foram injetados em áreas separadas na parte inferior da
folha. Alguns dias após a injeção foram colhidos fragmentos da parte inferior das folhas.
Através de RT-qPCR, foi verificado que o sgRNA-FnCas9 foi capaz de inibir o acúmulo do
vírus nas regiões injetadas. Para verificar resistência nas folhas de tabaco, foram
injetados nas folhas de N. benthamiana o vetor experimental e o vetor controle e, um
dia depois foi inoculado o CMV. Após duas semanas, as plantas nas quais foram
inoculadas o vetor controle apresentaram sintomas típicos da infecção. No entanto, em
plantas inoculadas com o vetor experimental não foi observado nenhum sintoma grave
relacionado à infecção por CMV.

Além deste experimento, também foi incluído no trabalho um ensaio utilizando


TMV-GFP (TMV contendo uma proteína fluorescente, que é expressa quando ocorre a
infecção pelo vírus). Para isso, foram desenhados três sgRNA específicos para o TMV,
que foram inseridos no pCR01. Uma semana após a inoculação dos vetores, foi
observada fluorescência nas plantas controle. Por outro lado, nas plantas previamente
inoculadas com o vetor experimental, a fluorescência observada foi significativamente
mais fraca.

Os pesquisadores buscaram demonstrar a habilidade do sgRNA-FnCas9 em inibir


a infecção por CMV em plantas transgênicas estáveis. Com este objetivo, o pCR01
específico para CMV foi inserido na planta Arabidopsis. Duas semanas após a inoculação
do CMV em plantas controle e plantas que receberam o pCR01, foram observados os
sintomas. Nas plantas controle foram observados sintomas severos da infecção, como
deformidade da folha e crescimento tardio. Por outro lado, a maior parte das plantas
que receberam o pCR01 demonstrou sintomas leves relacionados à infecção. Além
disso, foi realizada a quantificação do acúmulo de vírus através de ELISA (Ensaio de
Imunoabsorção Enzimática, ou do inglês, Enzyme-Linked Immunosorbent Assay) e de
RT-qPCR. Para verificar a ocorrência de herança de resistência, estas plantas foram

28
observadas e testadas até a sexta geração. Com isso, todas as plantas testadas
demonstraram resistência ao CMV, sugerindo que o sgRNA-FnCas9 é capaz de gerar
plantas resistentes à vírus de RNA (Zhang et al. 2018c).

Outra possível utilização do CRISPR para produção de transgênicos é a produção


de novas linhagens de modelos experimentais animais sensíveis à infecções virais para
o estudo e avaliação de tratamentos e vacinas. Uma das utilizações mais emblemáticas
do CRISPR ocorreu com a pandemia do SARS-CoV-2. No inicio da pandemia, não havia
uma grande diversidade de modelos experimentais para esse vírus, principalmente,
pois, para que a infecção pelo SARS-CoV-2 ocorra, é necessário que as células do
hospedeiro possuam receptores ACE2 parecidos com receptores ACE2 humanos
(hACE2) e grande parte dos modelos experimentais conhecidos não possui receptores
ACE2 que são reconhecidos pelo vírus.
Desta forma, foi gerado um modelo experimental de camundongos expressando
o hACE2 pela utilização da tecnologia de CRISPR/Cas9. Em comparação com o
camundongo selvagem C57BL/6, os camundongos que possuiam o hACE2 apresentaram
altas cargas virais no pulmão, traqueia e cérebro, mostrando que essa linhagem pode
ser utilizada como modelo experimental para se estudar a infecção causada pelo SARS-
CoV-2 e também para o tratamento ou avaliação de vacinas (Sun et al., 2020).

2.6. Possíveis problemas relacionados ao CRISPR e


perspectivas futuras

O CRISPR tem se mostrado uma ferramenta muito eficiente para diversos ramos
da ciência. Porém, embora ele esteja baseado em um sistema capaz de se ligar
especificamente ao alvo de interesse, proporcionando inúmeras possibilidades no
campo da terapia, diagnóstico, edição genômica, dentre outros, os pesquisadores ainda
acabam por esbarrar em alguns obstáculos.

Buscando explorar alguns dos problemas existentes na utilização do CRISPR,


principalmente em relação ao seu uso terapêutico, houve, recentemente, a publicação
de um artigo de revisão, no qual são discutidos a forma de entrega do CRISPR ao alvo de
interesse, assim como os possíveis efeitos off-target que ocorrem neste sistema. Neste
trabalho, fala-se sobre a utilização de vetores virais e não virais para a distribuição do

29
CRISPR no alvo e sobre como cada vetor deve ser planejado, levando em consideração
as barreiras que podem ser encontradas (Lee & Kim 2019).

Em relação aos problemas relacionados ao uso de vetores virais, destacam-se: o


sistema imune e o tropismo do vetor por uma determinada célula. Por outro lado, um
problema para um tipo de vetor não viral é o dano celular causado por eletroporação,
restringindo sua aplicação no âmbito terapêutico (Cvetković et al. 2017).

Além dos problemas relacionados aos vetores, também já foi observada ação da
resposta imune contra o RNA guia, a Cas9 e a Cas12, o que pode levar à redução da
eficiência do CRISPR, dano tecidual por inflamação e até mesmo formação de memória
imunológica (Mingozzi et al. 2007, Machitani et al. 2017).

A importância dos efeitos off-target no uso desta ferramenta também deve ser
levada em consideração, pois, embora o funcionamento do CRISPR tenha como princípio
se ligar à uma sequência de pares de base especificamente, ainda podem ocorrer
ligações inespecíficas. Essas ligações inespecíficas podem levar à ocorrência de
mutações indel não desejadas, na qual há inserção ou deleção de um nucleotídeo,
alterando a proteína a ser produzida por determinado gene, e ao rearranjo
cromossômico, uma alteração estrutural do cromossomo, e que pode levar à doenças
genéticas e ao desenvolvimento de câncer (Lee & Kim 2019).

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diversos aspectos sobre o CRISPR ainda devem ser estudados para que esta
ferramenta possa ser utilizada em todo seu potencial, evitando desta forma, possíveis
problemas aos seres humanos. Ainda assim, desde seu descobrimento, houve inúmeros
avanços com a utilização desta técnica. Dentre os avanços, muitos estão relacionados
ao campo de estudo da virologia, área de pesquisa que se mostra extremamente
necessária por diversos motivos, como: dificuldades no tratamento de infecções virais;
necessidade de desenvolvimento de vacinas; prejuízos agrícolas causados por vírus; fácil
ocorrência de mutações no material genético viral; capacidade oncogênica de alguns
vírus; necessidade de métodos diagnósticos cada vez mais específicos e sensíveis; além
da facilidade de transmissão destes microrganismos através de insetos vetores,
principalmente em regiões tropicais, como é o caso do Brasil.

30
Deste modo, o complexo CRISPR/Cas pode ser capaz de agregar à pesquisas no
campo da virologia, proporcionando novas possibilidades para desenvolvimento de
terapias e métodos diagnósticos, além de possibilitar alterações genéticas em insetos
vetores e plantas que são parasitadas por vírus.

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34
CAPÍTULO III

DETECÇÃO DOS VÍRUS EPSTEIN-BARR, CITOMEGALOVÍRUS E HERPESVÍRUS


HUMANO 6 E 7 EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM DOENÇAS
EXANTEMÁTICAS
Rafaela Moraes Pereira de Sousa ¹
Jéssica Vasques Raposo ²
Arthur Daniel Rocha Alves ³
Claudete Aparecida Araújo Cardoso 4
Luciane Almeida Amado Leon 5
Vanessa Salete de Paula 6
¹ Graduanda do curso de Biomedicina. Universidade Federal Fluminense – UFF e Laboratório de Virologia Molecular,
Instituto Oswaldo Cruz - FIOCRUZ
² Doutoranda em Biologia Parasitária. Laboratório de Virologia Molecular , Instituto Oswaldo Cruz - FIOCRUZ
³ Doutorando em Medicina Tropical. Laboratório de Desenvolvimento Tecnológico em Virologia, Instituto Oswaldo
Cruz – FIOCRUZ
4 Médica infectologista pediátrica. Departamento Materno-Infantil da Faculdade de Medicina. Universidade Federal

Fluminense – UFF
5 Pesquisadora em Saúde Pública. Laboratório de Desenvolvimento Tecnológico em Virologia, Instituto Oswaldo Cruz

– FIOCRUZ
6 Pesquisadora em Saúde Pública. Laboratório de Virologia Molecular , Instituto Oswaldo Cruz - FIOCRUZ

RESUMO

A prevalência dos Herpesvírus nos casos pediátricos de doenças exantemáticas ainda


não é clara no Brasil, e faz-se necessária sua elucidação num contexto em que diversas
doenças virais apresentam a mesma sintomatologia (sarampo, rubéola e arboviroses),
dificultando o diagnóstico e escolha da abordagem adequada para o tratamento. Neste
estudo foi avaliada a infecção pelos vírus Epstein-Barr, Citomegalovírus e Herpesvírus
Humano 6 e 7 em crianças e adolescentes com doenças exantemáticas atendidos em
dois hospitais públicos de Niterói, Rio de Janeiro, no período de dezembro de 2018 a
dezembro de 2019. Amostras de soro de 54 participantes foram analisadas por qPCR
multiplex para os Betaherpesvírus e monoplex para o vírus Epstein-Barr. A detecção do
DNA viral encontrado foi de 6 (11,1%) para HHV-6; 3 (5,5%) para HCMV e 2 (3,7%) para
o EBV, nenhuma amostra foi positiva para o HHV-7. Entre os participantes infectados,
63,6% pertenciam ao sexo masculino e a média da faixa etária foi de 2 anos (± 2,3). Em
11 (20,4%) dos casos sem etiologia definida foi detectado o DNA viral para um dos
Herpesvírus. Os resultados ressaltam a importância do diagnóstico diferencial para
doenças exantemáticas sem etiologia definida em crianças e adolescentes.

Palavras-chave: Doenças exantemáticas. Betaherpesvírus. Vírus Epstein-Barr. qPCR.

35
1. INTRODUÇÃO

Doenças exantemáticas (DE) são caracterizadas pelo surgimento de erupções


cutâneas localizadas ou disseminadas, associadas ou não a enantemas, febre, mal-estar,
prurido e demais sinais e sintomas sistêmicos (DRAGO et al. 2017). Os vírus Epstein-Barr,
Citomegalovírus, Herpesvírus Humano 6, Herpesvírus Humano 7, Chikungunya, Dengue,
Parvovírus Humano B19, Rubéola, Sarampo, Varicela e Zika são os principais agentes
etiológicos de doenças exantemáticas virais. As DE constituem um grave problema de
saúde pública, pois costumam ser a principal causa de procura por atendimento médico
em hospitais e clínicas pediátricas (SUGA et al. 1997; MENDELSON et al. 2006;
MAGALHÃES et al. 2011).
O vírus Epstein-Barr (EBV) pertence à subfamília Gammaherpesvirinae e infecta
cerca de 90% dos adultos em todo o mundo. No Brasil, foi encontrada uma
soroprevalência de 71% em crianças e adolescentes de famílias de baixa renda e menor
escolaridade (FIGUEIRA-SILVA et al. 2004), fatores socioeconômicos têm influência
sobre a aquisição do vírus (BALFOUR et al. 2013). A infecção primária por EBV é
usualmente assintomática, mas pode também manifestar-se como mononucleose
infecciosa. Após replicação lítica em células epiteliais, o EBV infecta linfócitos B onde um
conjunto distinto de genes e transcritos associados à latência são expressos (STANFIELD
et al. 2017). A infecção por EBV tem início na mucosa oral. A replicação em células
epiteliais é tipicamente lítica, contudo, infecções latentes de células epiteliais podem
resultar em carcinoma nasofaríngeo ou câncer. Após a replicação no epitélio, o vírus
infecta os linfócitos B, onde fatores de crescimento transitório levam à maturação da
célula infectada (HENLE et al. 1966; POPE et al. 2009). Grande parte das infecções em
crianças são benignas e ocorrem de maneira subclínica, porém quando sintomática,
apresenta sinais e sintomas semelhantes a outras doenças do trato respiratório
superior, como faringite e amigdalite (NOWALK et al. 2016). A mononucleose infecciosa
foi inicialmente descrita em 1889 por Pfeiffer como “febre glandular” e em seguida
denominada de “doença do beijo”. Trata-se de uma doença de baixa mortalidade e
letalidade, de manifestações agudas e geralmente benignas, apresentando um grande
espectro clínico, porém, pode resultar em casos graves quando acomete indivíduos

36
imunocomprometidos ocasionando potencialmente elevada morbidade (DUNMIRE et
al. 2015).
O Citomegalovírus Humano (HCMV), o Herpesvírus Humano 6 (HHV-6) e o
Herpesvírus Humano 7 (HHV-7) pertencem à subfamília Betaherpesvirinae. Os vírus
classificados dentro desta subfamília têm como principais características um número
restrito de hospedeiros, são citomegálicos, apresentam crescimento lento e infecções
latentes nas glândulas secretórias, nos rins e outros tecidos (REZAEI et al. 2016). São
vírus de fácil transmissão entre crianças no período pré-escolar (creches) e escolar por
via oral (secreções salivares) e a transmissão por transplantes de órgãos já foi observada
(LE et al. 2013; MOCARSKI 2004; POTENA et al. 2007). As infecções causadas pelo HCMV
demonstram alta prevalência no mundo todo, em crianças de 1 a 5 anos, pode ser baixa
(20,7%), mas em adultos de países em desenvolvimento se aproxima de 100% (DIOVERTI
et al. 2016). No Brasil foi encontrada uma soroprevalência para o HCMV de 96,4% em
estudo com doadores de sangue (SOUZA et al. 2010). O HCMV é transmitido
amplamente através da saliva, sangue, secreções genitais, urina e leite materno
(TRAVAN et al. 2016). Após a primo-infecção, geralmente assintomática ou como uma
síndrome semelhante à mononucleose infecciosa, o HCMV pode estabelecer latência
celular em monócitos e linfócitos, permanecendo no hospedeiro durante sua vida, com
possibilidade de ser reativado (IIDA et al. 2016). No entanto, são nos indivíduos
imunodeprimidos que este vírus causa doença clínica significativa e, ocasionalmente,
pode levar à morte se não tratada (DRAGO et al. 2014; SUN et al. 2015; SAI TIN et al.
2015; ADAMSON-SMALL et al. 2016). Embora exista tratamento com o fármaco
ganciclovir, o tratamento não representa uma cura para a infecção latente do HCMV
(DRAGO et al. 2015).
O HHV-6 e HHV-7 pertencem ao gênero Roseolovirus, são linfotrópicos (embora
possam infectar outros tipos celulares), altamente prevalentes e associados a doenças
exantemáticas (TANAKA et al. 1994; TOMOIU et al. 2006). Reativações são
intrinsecamente relacionadas ao estado imunológico do indivíduo, sendo comuns em
pacientes imunodeprimidos. A infecção pelo HHV-6 usualmente ocorre de maneira
assintomática na infância, e pode resultar em quadros de febre alta, diarreia, prurido e
exantema súbito (ES). Estudos mostram que 95% dos adultos possuem sorologia positiva
para HHV-6 (FREITAS et al. 1997; DE BOLLE 2005). Aos dois anos de idade, oito em cada

37
dez crianças já entraram em contato com o vírus, com pico de incidência entre 9 e 21
meses de idade (CLARK et al., 2002). Embora de uma forma mais rara, essa infecção
também pode causar convulsões febris e encefalite (ABLASHI et al. 2014 ONGRÁDI et al.
2017). No ES, ocorre febre alta nos primeiros 3 a 4 dias. Metade das crianças cursa com
temperatura acima de 40°C, que é uma das principais causas de convulsão febril. Após
o declínio da febre, as erupções cutâneas aparecem, iniciando-se no tronco ou região
cervical e disseminando-se para as extremidades.
O HHV-7 foi isolado pela primeira vez em 1990 de linfócitos TCD4+ por Frenkel e
colaboradores. É um vírus ubíquo com tropismo mais seletivo por células TCD4+, sendo
este o seu receptor. O HHV-7 pode ser observado em pele, glândulas salivares e outros
tecidos, assim como outros Betaherpesvírus (AGUT et al. 2017). O HHV-7 é transmitido
pela saliva, e alguns estudos apontam o aleitamento materno como uma potencial via
de transmissão (FUJISAKI et al. 1998). A prevalência deste vírus é bem alta, acima de
90% na população adulta (BENITO et al. 2003). A infecção primária por HHV-7 pode ser
assintomática, assim como para o HHV-6, mas já foi relatada sua associação a doenças
exantemáticas febris no Brasil (OLIVEIRA et al. 2003; FREITAS et al. 2004) e em casos
mais raros de encefalites e convulsões (embora menos documentadas). A infecção em
crianças ocorre gradualmente até quinto ou sexto ano de vida. No Reino Unido a maioria
dos casos de infecção por HHV-7 avaliada ocorreram aos 3 anos de idade (WARD et al.
2005), e no Brasil casos mais precoces (<1 ano) já foram relatados (OLIVEIRA et al. 2003).
As infecções causadas por Herpesvírus são muitas vezes assintomáticas,
benignas e autolimitadas, sendo a capacidade de permanecer em latência no
hospedeiro uma característica intrínseca a todos os integrantes da família Herpesviridae.
Em consonância com a latência viral, é esperada maior gravidade e reativações das
infecções herpéticas em pacientes imunossuprimidos, em faixas etárias específicas
como infância e senilidade, assim como durante a gravidez. Nos casos graves e não
tratados, as infecções por Herpesvírus podem levar o paciente ao óbito. O número
elevado de agentes etiológicos é um desafio para o diagnóstico exato, e
consequentemente para escolha adequada do tratamento do paciente com doença
exantemática. No contexto brasileiro em que diversos vírus emergentes como o vírus
Dengue, Chikungunya e Zika e a crescente elevação no número de casos de Sarampo
demandam a devida atenção dos órgãos públicos de saúde, as infecções herpéticas são

38
subestimadas e pouco diagnosticadas, afetando diretamente a saúde do paciente.
Apesar da maioria dessas doenças serem benignas e autolimitadas, algumas
representam um risco importante para certos grupos etários e situações clínicas
específicas, uma vez que podem evoluir com curso clínico mais grave. Por isso, é de
grande importância averiguar o diagnóstico etiológico que pode estar implicado nas
doenças exantemáticas virais, a fim de garantir um tratamento adequado e estabelecer
as medidas necessárias para o controle da doença.

2. METODOLOGIA

2.1. Desenho do estudo

Trata-se de estudo de corte transversal, aprovado pelo Comitê de Ética em


Pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e da Universidade Federal Fluminense
(UFF), com CAAE 80635017.4.3001.5243 e número de aprovação 3.020.225. Foram
incluídos no estudo 54 crianças e adolescentes, com idades entre 0 a 18 anos, atendidos
no Hospital Getúlio Vargas Filho (HGVF) e Hospital Universitário Antônio Pedro da
Universidade Federal Fluminense (HUAP-UFF), ambos na cidade de Niterói-RJ, no
período de dezembro de 2018 a dezembro de 2019. A amostra foi obtida por
conveniência, sendo incluídos soros de participantes que apresentaram doenças
exantemáticas sem etiologia definida. Responsáveis e pacientes que concordaram em
participar do estudo foram entrevistados pessoalmente por profissionais treinados,
assinaram os termos de consentimento e assentimento livre e esclarecido,
respectivamente, e preencheram seus dados em um questionário epidemiológico para
posterior coleta de sangue. Amostras com volume inferior a 200uL foram excluídas. Os
Herpesvírus HCMV, EBV, HHV-6 e HHV-7 foram testados por meio da técnica de PCR em
tempo real, e os resultados foram disponibilizados em formulários impressos e
encaminhados para o arquivo do paciente nos hospitais correspondentes.

2.2. Amostras de soro

As amostras foram coletadas e processadas na unidade de origem (HUAP-UFF ou


HGVF). Os participantes eram encaminhados para coleta de sangue, realizada por
profissionais do próprio hospital. Após a coleta, a amostra de sangue era encaminhada

39
ao laboratório de análises clínicas da unidade, onde foi centrifugada a 2500xg por 15
minutos a temperatura ambiente para a obtenção do soro. As amostras de soro obtidas
foram armazenadas a uma temperatura de -20°C até o transporte para unidade
destinatária. As amostras biológicas foram acondicionadas, rotuladas, etiquetadas e
transportadas para o Laboratório de Virologia Molecular no Instituto Oswaldo Cruz de
acordo com as recomendações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária para
substâncias biológicas de categoria B (UN 3373).

2.3. Extração de ácidos nucléicos

O DNA viral foi extraído utilizando o kit comercial High Pure Viral Nucleic Acid Kit
(Roche, New Jersey, EUA) para as amostras de soro, de acordo com o protocolo do
fabricante. As amostras extraídas foram armazenadas a -70 ° C até o processamento.

2.4. PCR em tempo real (qPCR) multiplex e monoplex

O EBV foi detectado e quantificado através de PCR em tempo real (qPCR) e os


Betaherpesvírus (HCMV, HHV-6 e HHV-7) através de qPCR multiplex (RAPOSO et al.
2019). Para amplificação do HCMV, HHV-6 e HHV-7 foram utilizadas sondas e
oligonucleotídeos específicos para a região UL54 (referente a síntese de DNA, com
130bp), região U56 (referente ao capsídeo viral, com 150 bp) e para região U37
(referente ao tegumento do vírus, com 312 bp), respectivamente. A detecção e
quantificação do EBV foi realizada por qPCR monoplex (FELLNER et al. 2014), utilizando
oligonucleotídeos e sonda para a região alvo EBNA-1, referente ao antígeno nuclear EB
(100 bp). Iniciadores (oligonucleotídeos) e sondas TaqMan são apresentados na tabela
1.

Tabela 1. Sequências de oligonucleotídeos e sondas utilizadas para qPCR.


HCMV UL54 (5´-3´) HHV-6 U56 (5´-3´) HHV-7 U37 (5´-3´) EBV EBNA-1 (5’-3’)

FAM- VIC- NED- FAM-


Sonda CCGTATTGGTGCGCGATC TTAGATGGTGGTGAGCTGG CTCGCAGATTGCTTGTTG TGCAGCTTTGACGAT
TGTTCAA GATCGGT GCCATG GG

Oligonucleotí GGCCGTTACTGTCTGCAG AAAGACCTAAATTGCCGCTA CGGAAGTCACTGGAGTAA CCGCTCCTACCTGCAA


deos (Senso) GA CCT TGACAA TATCA 3

Oligonucleotí GGCCTCGTAGTGAAAATT GCAAGCTCATGAACATCGTC CCAATCCTTCCGAAACCG GGAAACCAGGGAGG


deos AATGGT A AT CAAATC
(Anti-senso)
Fonte: Autoria própria.

40
2.5. qPCR multiplex para Betaherpesvírus

O kit AgPath-ID PCR (Life Technologies, Carlsbad, EUA) foi utilizado para
realização da qPCR. Foi preparado um mix com volume final de 25 µL, contendo 12,5 µL
de PCR Buffer 1x, 0,4 µL de oligonucleotídeos senso (3 µM) e 0,4 µL de oligonucleotídeos
anti-senso (3 µM) (HCMV/HHV-6/HHV-7) simultaneamente, além de 0,4 µL de sonda
específica (0,4 µM) para cada um dos Betaherpesvírus e 1 µL da enzima 25x, por amostra
testada. O volume de DNA incluído na reação foi de 5µL, 1uL da curva sintética padrão
(101-108 cópias/µL) para cada vírus e controles negativos também foram utilizados para
quantificação absoluta das cargas virais (Raposo et al., 2019)

2.6. qPCR monoplex para EBV

A reação foi preparada utilizando o kit AgPath-ID PCR (Life Technologies,


Carlsbad, EUA), o mix com volume final de 25 µL, continha 12,5 µL de PCR Buffer 1x, 2,5
µL de oligonucleotídeos senso (1µM), 2,5 µL de oligonucleotídeos anti-senso (1µM), 2
µL de sonda específica (0,4 µM) e 1 µL da enzima 1x para qPCR por amostra. O volume
de DNA incluído na reação foi de 5µL, 1 µL da curva sintética padrão (101-108 cópias/µL)
EBV-curva
(5´TTCGTGGAAACCAGGGAGGCAAATCCGTATCCATCGTCAAAGCTGCAATGCGTTGATATTG
CAGGTAGGAGCGGCTGATA 3’) e controles negativos também foram utilizados.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram incluídos neste estudo 54 participantes, com idade média de 1,95 ± 2,3
anos, sendo 34 (63,6%) do sexo masculino. Onze (20,37%) amostras foram positivas para
um dos Herpesvírus avaliados. O HHV-6 foi o vírus mais prevalente, sendo detectado em
6 (11,11%) das 54 amostras, seguido pelo HCMV que foi detectado em 5,5% (3/11) e o
EBV detectado em 3,7% (2/11) das amostras. O HHV-7 não foi detectado em nenhuma
das amostras. A distribuição da detecção dos herpesvírus, assim como a média da carga
viral de cada vírus, está descrita na tabela 2. Os exantemas foram observados em todos
os pacientes incluídos no estudo, o local de início e a progressão das lesões foram
avaliadas nos pacientes positivos e descritos na tabela 3. No momento da entrevista
foram relatados os sinais e sintomas dos pacientes. Os sinais e sintomas mais

41
prevalentes entre os pacientes infectados foram febre (81,8%), prurido (36,4%), diarreia
(27,3%), cefaleia, náuseas, vômito e mialgia (18,2%) e linfadenomegalia (9,1%).

Tabela 2. Prevalência e carga viral média para EBV, HCMV, HHV-6 e HHV-7 nos casos de doenças
exantemáticas.
Agente n positivos Prevalência Carga viral Idade média Sexo
etiológico (n/54) (%) média (anos)
(cópias/mL)
Feminino Masculino

EBV 2 3,4 7,10 x104 4,0 - 100%

HCMV 3 5,5 3,92 x104 2,91 33,3% 66,7%

HHV-6 6 11,1 6,44 x105 0,79 50% 50%

HHV-7 0 - - - - -

Total 11 20,37 - 1,95 36,4% 63,6%

Fonte: Autoria própria.

Tabela 3. Características dos exantemas nos pacientes positivos para EBV, HCMV e HHV-6.
Agente Dias com exantema Início do exantema Progressão do exantema
etiológico (média)
EBV (n=2) >2 dias 50% Difuso pelo corpo 50% Difuso pelo corpo
50% Membros inferiores 50% Tronco
HCMV (n=3) >1 dia 33,3% Cabeça/Pescoço 100% Difuso pelo corpo
66,7% Tronco
HHV-6 (n=6) >2 dias 66,7% Cabeça/Pescoço 100% Difuso pelo corpo
33,3% Tronco
Fonte: Autoria própria.

Este trabalho pesquisou simultaneamente todos os betaherpesvírus e o vírus


Epstein-Barr em casos pediátricos de doenças exantemáticas, não foi encontrado na
literatura outro artigo que avaliasse todos os mesmos Herpesvírus para DE em uma
população infantil e infanto-juvenil. Dos 11 pacientes positivos para um dos Herpesvírus,
3 receberam diagnóstico clínico no momento da coleta. Um dos pacientes foi
diagnosticado como infecção por HHV-6, e o diagnóstico molecular confirmou a
presença do HHV-6 na amostra de soro. Contudo, dois pacientes foram diagnosticados
por vínculo epidemiológico e apresentação clínica com infecção por vírus Chikungunya

42
e Sarampo, respectivamente, mas o diagnóstico molecular detectou a presença dos
vírus Epstein-Barr e HHV-6. Evidenciando a importância do diagnóstico diferencial e
laboratorial em pacientes com doença exantemática. A detecção qualitativa dos
Herpesvírus em soro é considerada suficiente para diagnosticar a infecção (GÄRTNER et
al. 2010; AGUT et al. 2015), no entanto, uma carga viral elevada tem sido relacionada a
maior gravidade da infecção nos casos pediátricos de ES (ASANO et al. 1991). No nosso
estudo, as cargas virais médias observadas para o EBV e HCMV foram maiores que
70.000 e 30.000 cópias/mL, respectivamente, e para o HHV-6 maior que 600.000
cópias/mL.
Este é o primeiro trabalho que retrata as cargas virais de herpesvírus em
pacientes com doenças exantemáticas. As cargas virais foram consideradas altas em
comparação as amostras de tecidos de doadores que detectaram cargas entre 102-103
cópias/µg para HHV-6 e EBV (SECCHIERO et al. 1995; CUI et al. 2020) , e em soro de
recém nascidos, 103-104 cópias/µL de HCMV (SCHÄFER et al. 1996).
Os pacientes positivos para EBV não apresentaram sintomas associados ao
exantema, exceto um paciente com linfadenomegalia. O exantema iniciou-se
disseminado ou nos membros inferiores, progrediu espalhando-se por todo o corpo. A
mononucleose infecciosa por EBV com surgimento de exantemas e febre, embora seja
mais comum em adolescentes e jovens adultos, pode ser vista também em crianças
(MUZUMDAR et al. 2019). Pacientes positivos para HCMV apresentaram febre (100%),
cefaleia, prurido e náuseas (66,6%); vômitos, mialgia e diarreia (33,3%). Os exantemas
surgiram nas regiões do tronco e da cabeça, progredindo de maneira disseminada pelo
corpo.
O Herpesvírus Humano 6 obteve a maior frequência de detecção entre os três
Herpesvírus avaliados, contudo, não foi possível fazer a comparação com outros
trabalhos no Brasil e no mundo, pois a maioria dos trabalhos que analisam doenças
exantemáticas fez apenas a detecção sorológica . Em 2008, Vianna e colaboradores
encontraram uma soroprevalência de 43,5% para HHV-6 de um total de 223 amostras,
na cidade de Niterói-RJ, com febre (93,8%) e exantema disseminado (90,7%) na maioria
dos casos. O perfil de sintomas associados a infecção por HHV-6 encontrado no atual
estudo conteve febre (100%), prurido e diarreia (33,3%); mialgia e vômitos (16,6%)
corroborando com os achados de Vianna e colaboradores. A maioria dos exantemas

43
(66,7%) nas infecções por HHV-6 teve início na cabeça ou pescoço e progrediu para todo
o corpo de maneira difusa, confirmando a descrição encontrada na literatura. Em nosso
estudo o HHV-7 não foi detectado, contudo Magalhães e col. em 2011, por meio da
técnica de Nested PCR, o detectou em 6,4% (9/141) de casos de DE em crianças (<4
anos). As diferenças encontradas na prevalência do HHV-6 e na ausência de detecção do
HHV-7 pode ter relação com número amostral maior utilizado nos estudos de 2008 e
2011, outro ponto relevante foi a triagem das amostras analisadas, pois ambos estudos
excluíram amostras previamente positivas para sarampo, rubéola, dengue e parvovírus
B19 no diagnóstico sorológico, diferente do nosso estudo que incluiu todos os pacientes
exantemáticos, sem diagnóstico etiológico prévio. A idade média encontrada para HHV-
6 (0,79), HCMV (2,91) e EBV (4,0) refletem os dados relatados na literatura, a infecção
por HHV-6 foi observada na maioria dos casos entre 6 meses e 3 anos em um estudo na
França (AGUT et al. 2017), o HCMV pode acometer crianças logo em seus primeiros anos
de vida (1 a 5 anos), devido a sua capacidade de transmissão por diferentes fluídos e alta
prevalência na população adulta, podendo ocorrer também a infecção congênita
durante a gravidez ou parto (DIOVERTI et al. 2016), na China foi relatada idade mediana
de 6 anos, com picos entre 4 e 6 anos para o EBV (GAO et al. 2011). É comum para o EBV
a ocorrência da infecção em uma faixa etária juvenil, por contato com secreções
salivares durante o beijo, porém o compartilhamento de objetos e alimentos entre
crianças pode ser uma via de transmissão, embora ainda não confirmada (DUNMIRE et
al. 2018).

4. CONCLUSÕES

A detecção do EBV, HCMV, HHV-6 e 7 foi possível por meio da qPCR,


demonstrando a importância do diagnóstico molecular na identificação do agente
etiológico em casos de DE em pacientes pediátricos com etiologia não definida. A
prevalência encontrada para os Herpesvírus ressalta a importância do diagnóstico
diferencial destas infecções diante das doenças exantemáticas, não apenas para fins
epidemiológicos, mas também para o manejo adequado do paciente.

44
AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer ao apoio financeiro realizado pelo CNPq e pela CAPES. As


instituições participantes desta pesquisa, a Fundação Oswaldo Cruz, a Universidade
Federal Fluminense e as equipes do Hospital Getúlio Vargas Filho e Hospital
Universitário Antônio Pedro. Aos autores e colaboradores, pela orientação durante o
desenvolvimento do estudo.

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Novembro de 2020.

50
CAPÍTULO IV

UTILIZAÇÃO DA SALIVA E DA URINA COMO ESPÉCIMES DE DIAGNÓSTICO DA


DENGUE: ANÁLISE DA PRODUÇÃO LITERÁRIA
Ana Carolina de Jesus Souza 1
Natalia Moysés 2
Gabriela Cardoso Caldas 3

¹ Centro de Ciências da Saúde – Universidade Católica de Petrópolis, Rio de Janeiro, RJ.


² Centro de Ciências da Saúde – Universidade Católica de Petrópolis, Rio de Janeiro, RJ.
³ Laboratório de Morfologia e Morfogênese Viral/Laboratório de Patologia – Instituto Oswaldo Cruz – FIOCRUZ, Rio
de Janeiro, RJ.

RESUMO

Introdução: As amostras de urina e saliva possuem diversas características vantajosas,


sendo coletadas de maneira rápida, indolor e não invasiva. Além disso, vêm se mostrado
espécimes promissores no diagnóstico da dengue (DEN). Contudo, existe uma
defasagem de estudos que revisem os resultados primários existentes sobre uso destes
espécimes na investigação desta doença. Objetivo: O objetivo deste trabalho foi
sistematizar os dados brutos existentes sobre o uso desses fluidos no diagnóstico da
DEN. Material e métodos: A busca pelos trabalhos foi realizada no período de junho de
2019 a março de 2020. Foram consultadas as bases de dados PubMed, Lilacs e Scielo, e
utilizados os descritores “dengue”, “urine” e “saliva”. Após a triagem, realizada a partir
de critérios de inclusão e exclusão pré-estabelecidos, 30 artigos foram separados para
leitura íntegra. Resultados: Trabalhos de DEN e urina foram publicados entre os anos de
2007 e 2019, enquanto trabalhos de DEN e saliva apresentaram período de publicação
entre 1998 e 2017. A idade dos participantes foi de 6 meses até 55-61 anos em ambas
as buscas. Em relação à quantidade de participantes incluídos, estudos de DEN e urina
abrangeram entre 1 a 293 participantes, enquanto estudos de DEN e saliva contaram
com a participação de até 7.048 indivíduos. Este fato pode estar relacionado à maior
facilidade da coleta de saliva em relação à de urina. A maioria dos estudos analisou os
fluidos em questão juntamente com o soro/plasma. Os anticorpos foram as moléculas
de preferência no diagnóstico e, deste modo, a metodologia escolhida pela maioria dos
trabalhos foi a sorologia. Porém, a metodologia de preferência nos trabalhos de DEN e
urina foi a combinação entre sorologia e a RTqPCR, pois a excreção do RNA viral nesta
amostra é mais prolongada. Em relação aos sorotipos detectados, notou-se o
predomínio de DENV-1, DENV-2 e DENV-3, em comparação com o DENV-4, somente
detectado junto aos outros três sorotipos. Conclusão: Conclui-se, portanto, que diversos
métodos de diagnóstico na DEN podem utilizar de maneira satisfatória a saliva e a urina
e, embora a urina apresente excreção de RNA viral mais prolongada que a saliva, a
utilização desta mostra-se mais consolidada no diagnóstico até então.

51
Palavras-chave: Análise de literatura. Dengue. Saliva. Urina

1. INTRODUÇÃO

A ocorrência de surtos de arboviroses com espectro clínico semelhante, como a


dengue (DEN), febre do zika, febre do chikungunya e febre amarela nos últimos anos,
somada ao contexto atual da pandemia do novo coronavírus (SARS-CoV-2), suscitou
diversos questionamentos a respeito da rapidez e confiabilidade dos testes de
diagnóstico para a verificação dos casos suspeitos (BALMASEDA et al., 2003; MUSSO et
al., 2015; 2016; AZZI et al., 2020).
Frequentemente, no curso da investigação de uma infecção, uma amostra de
sangue é coletada para a análise de parâmetros sanguíneos, bem como para a detecção
de antígenos do patógeno ou de anticorpos específicos. As desvantagens da coleta de
sangue incluem o caráter minimamente invasivo, a necessidade de um venipunturista
treinado e da separação do soro antes do teste diagnóstico, além da dificuldade e risco
adicional da punção venosa em crianças, idosos, pacientes hemodialisados e indivíduos
que residem em áreas de difícil acesso. Neste contexto, o diagnóstico a partir da coleta
de espécimes não invasivos, como a saliva e a urina, pode representar uma alternativa
valiosa na investigação de infecções virais. Apesar do uso dessas amostras no
diagnóstico de arboviroses ser relatado na literatura, essas não são comumente
utilizadas no diagnóstico de rotina (NIEDRIG et al., 2018).
Em relação ao diagnóstico da infecção por DENV, os espécimes clínicos
normalmente utilizados são o sangue total, plasma, soro e, em alguns casos, o líquido
cefalorraquidiano e o leite materno (GUZMAN & HARRIS, 2015; MULLER et al., 2017).
Porém, mais recentemente, diversos trabalhos vêm descrevendo o progresso do uso da
saliva e urina como amostras não invasivas para o diagnóstico de DEN (NIEDRIG et al.,
2018).
Apesar do aumento do interesse pelo uso dessas amostras, encontra-se uma
lacuna na literatura no que diz respeito à compilação dos resultados dos estudos
primários existentes no tema. A análise dos trabalhos correlatos existentes e a
realização de revisões sistemáticas atuais sobre o uso destas amostras no diagnóstico
tornam-se então de crucial importância para evidenciar quais perguntas ainda precisam

52
ser respondidas e auxiliar na criação de novos protocolos de diagnóstico, que sejam mais
rápidos, baratos e menos invasivos para o paciente.
Neste trabalho, buscou-se realizar o levantamento dos estudos publicados nas
três principais bases de dados de ciências médicas a respeito do uso da saliva e da urina
no diagnóstico da DEN.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

A análise de literatura foi realizada seguindo a recomendação PRISMA (Liberati


et al., 2009) e, a elaboração da pergunta da mesma foi elaborada diante do acrônimo
PICOT onde P (população) são indivíduos com DEN, I (intervenção) é o diagnóstico
através de fluidos alternativos, C (comparador) é o diagnóstico padrão (sangue), O
(outcome/desfecho) é o diagnóstico da DEN e T (tipo de estudo) são estudos
epidemiológicos observacionais.
A busca pelos trabalhos foi realizada no período de junho de 2019 a março de
2020, através das bases de dados PubMed, Lilacs e Scielo. Foram utilizados como
descritores os termos “dengue”, “saliva”, “urina” e “urine”. Não foi obtido resultado
com o uso do termo “urina”, em português, na base de dados PubMed, portanto fez-se
necessária a inserção do termo somente em inglês nesta base de dados.
O critério de inclusão consistiu em trabalhos referentes à pesquisa em humanos
que investigavam amostras de urina ou saliva no diagnóstico da DEN. Os critérios de
exclusão foram: trabalhos de revisão, artigos cuja população era formada de pacientes
com coinfecção (DEN e algum outro agente infeccioso), ou com infecção/doença de
etiologia distinta, trabalhos que não utilizavam saliva e/ou urina como espécimes
diagnósticos e, por último, artigos com modelos experimentais. Não foram inseridos
nesta pesquisa artigos em chinês (N=1) e artigos de difícil acesso (N=2).
Após a exclusão inicial de artigos que não se enquadravam nos critérios de
inclusão, a partir da leitura dos títulos e resumos disponibilizados, foi feito o upload de
todos os artigos elegíveis restantes em Formato Portátil de Documento (PDF) para
leitura completa. As seguintes informações foram extraídas dos artigos selecionados:
país das amostras citadas no trabalho, ano de publicação, ano ou intervalo de tempo em
que o estudo fora realizado, população estudada, N amostral e idade dos participantes,

53
molécula e método de pesquisa, sorotipo e o tipo de infecção (primária ou secundária).
Todas as informações, bem como o título e autores dos trabalhos, foram inseridas na
base de dados Microsoft Excel. Após a montagem do banco de dados, foram
confeccionados os gráficos, tabelas e feitas as inferências.

3. RESULTADOS

Foram encontrados 329 artigos mediante os descritores anteriormente citadas,


sendo 12 encontrados na base de dados Scielo, 18 no Lilacs, e 299 no PubMed, dos quais
foram excluídos os duplicados (N=21), sobrando 308 artigos para análise. Após observar
estes estudos, foram selecionados apenas aqueles que se tratavam de pesquisa do
DENV em amostras de saliva e urina em humanos, totalizando 30 artigos. Os demais não
se encaixaram nos critérios de inclusão (N=299). Portanto, foram selecionados para a
realização deste trabalho, 30 artigos.

3.1. Dengue e urina

Após a busca com os termos “dengue”, “urina” e “urine”, foram encontrados 166
artigos, sendo 87.3% na base de dados PubMed, 5.4% no Scielo e 7.2% no Lilacs. Do total,
14 trabalhos estavam duplicados e as cópias foram excluídas da análise, totalizando 152
artigos. Deste resultado, 135 trabalhos foram excluídos, principalmente terem como
foco outra infecção que não a DEN. Somente 17 trabalhos se enquadravam no critério
de inclusão e foram separados para posterior leitura na íntegra. A totalidade de artigos,
bem como os critérios de exclusão está explicitada no gráfico abaixo (Gráfico 1).

54
Gráfico 1 - Totalidade dos artigos encontrados utilizando os termos “dengue”, “urina” e “urine”,
duplicados, selecionados e excluídos.

Fonte – Autoria própria

Em relação ao período de publicação, observou-se uma produção entre os anos


de 2007 a 2019, com ausência de publicações no tema nos anos 2008, 2009, 2013 e
2017. O gráfico 2 mostra o volume de publicações distribuída do período entre 2007 e
2019.

Gráfico 2 - Volume de publicações no tema distribuído no período entre os anos de 2007 e 2019
(“dengue” AND “urine”).

Fonte – Autoria própria

O número de indivíduos incluídos nos trabalhos variou de 1 a 293 pacientes, com


idades entre 6 meses a 61 anos. Os pacientes pertencentes aos estudos provinham da
Europa (1), América Central (1), América do Sul (3) e, principalmente Ásia (N=12). Dois

55
trabalhos utilizaram amostras provenientes de indivíduos brasileiros, mais
especificamente do estado de São Paulo. A tabela 1 detalha o país de origem dos
indivíduos incluídos nos trabalhos selecionados.

Tabela 1 - Origem dos indivíduos incluídos nos estudos selecionados (“dengue” AND “urine”).

Fonte – Autoria própria

A maioria dos trabalhos utilizou a urina como espécime diagnóstico associada a


análises com soro ou plasma (N=12). Desses, quatro artigos também incluíram a saliva
como amostra de análise. Quatro trabalhos realizaram o diagnóstico da DEN somente
em amostras de urina e saliva e apenas um trabalho utilizou a urina individualmente
para o diagnóstico. Os alvos mais pesquisados foram anticorpos IgM, IgG, IgA e IgE,
porém também se observou a pesquisa da proteína NS1 e do RNA viral. Dois trabalhos
basearam-se somente na pesquisa da proteína NS1 e um trabalho optou apenas pela
detecção do RNA viral. A metodologia diagnóstica mais utilizada pelos grupos foi a
combinação entre o método sorológico (ELISA) com o molecular (RTPCR) (N=9). Em
quatro trabalhos optou-se apenas pela utilização de testes sorológicos (principalmente
ELISA). Um trabalho utilizou biossensor como método de diagnóstico. A tabela 2 mostra
as informações pareadas referentes à amostra utilizada, molécula pesquisada e
metodologia escolhida.

56
Tabela 2 - Informações pareadas referentes à amostra utilizada, molécula pesquisada e método
diagnóstico escolhido (“dengue” AND “urine”).

Fonte – Autoria própria

Todos os sorotipos tiveram detecção descrita, porém os sorotipos 1, 2 e 3 foram


detectados sozinhos em 2 trabalhos cada. A detecção do DENV-4 somente foi citada em
conjunto aos demais sorotipos (N=6). A maioria dos trabalhos não informou se o
diagnóstico foi realizado em amostras provenientes de uma infecção primária ou
secundária por um sorotipo heterólogo (N=10). A tabela 3 traz as informações
referentes aos sorotipos detectados e o tipo de infecção.

Tabela 3 - Sorotipos detectados e tipo de infecção (“dengue” and “urine”). NI: Não informado.

Fonte – Autoria própria

57
3.2. Dengue e saliva

Após a busca com os termos “dengue” e “saliva”, foram encontrados 163 artigos,
sendo 94.4% na base de dados PubMed, 1,8% no Scielo e 3,6% no Lilacs. Do total, 16
trabalhos estavam duplicados e as cópias foram excluídas da análise, totalizando 147
artigos. Deste resultado, 134 trabalhos foram excluídos, principalmente utilizarem a
saliva do vetor como amostra de pesquisa. Ao final da triagem, 13 trabalhos foram
separados para posterior leitura na íntegra. A totalidade de artigos, bem como os
critérios de exclusão está explicitada no gráfico abaixo (gráfico 3).

Gráfico 3 - Totalidade dos artigos encontrados utilizando os termos “dengue” e “saliva”, duplicados,
selecionados e excluídos.

Fonte – Autoria própria

Em relação ao período de publicação, observou-se uma produção entre os anos


de 1998 a 2017, com ausência de publicações no tema nos anos 2001/2002, 2004-
2006, 2009/2010 e 2016. O gráfico 4 mostra o volume de publicações distribuída do
período entre 1998 e 2017.

58
Gráfico 4 - Volume de publicações no tema distribuído no período entre os anos de 1998 e 2017
(“dengue” AND “saliva”).

Fonte – Autoria própria

O número de indivíduos incluídos nos trabalhos variou de 1 a 7.048 pacientes, com


idades entre 6 meses a 55 anos. Os pacientes pertencentes aos estudos provinham da
América do Norte (N=2), América do Sul (N=2), América Central (N=3) e, o maior número
pertencia ao continente asiático (N=6). Apenas um trabalho utilizou amostras
provenientes de indivíduos brasileiros. A tabela 5 detalha o país de origem dos
indivíduos incluídos nos trabalhos selecionados.

Tabela 5 - Origem dos indivíduos incluídos nos estudos selecionados (“dengue” AND “saliva”).

Fonte – Autoria própria

Dez trabalhos utilizaram a saliva como amostra para o diagnóstico associada a


análises com soro, plasma ou sangue total. Os outros três trabalhos restantes utilizaram

59
somente a saliva como amostra de análise. Onze trabalhos pesquisaram anticorpos nas
amostras, com predomínio da pesquisa por IgM e IgG, esta última pesquisada sozinha
em três trabalhos. Dois trabalhos investigaram a presença de NS1 nas amostras e apenas
um voltou-se para a pesquisa do RNA viral. Por conta da predominância da pesquisa por
anticorpos, a metodologia mais utilizada foi a sorológica, representada em sua maioria
pelo ELISA. Apenas dois estudos utilizaram a metodologia de RT-PCR para as análises. A
tabela 6 mostra as informações pareadas referentes à amostra utilizada, molécula
pesquisada e metodologia escolhida.

Tabela 6 - Informações pareadas referentes à amostra utilizada, molécula pesquisada e método


diagnóstico escolhido (“dengue” AND “saliva”).

Fonte – Autoria própria

Apenas dois trabalhos relataram os sorotipos detectados, um com detecção de


DENV-1, DENV-2 e DENV-3 e outro apenas com detecção de DENV-1. Dois trabalhos
analisaram amostras provenientes de infecções recentes, mas a maioria (N=6) utilizou
amostras provenientes de uma infecção primária e secundária por um sorotipo
heterólogo. Cinco trabalhos não indicaram o tipo de infecção. A tabela 7 traz as
informações referentes aos sorotipos detectados e o tipo de infecção.

60
Tabela 7 - Sorotipos detectados e tipo de infecção (“dengue” AND “saliva”). NI: Não informado.

Fonte – Autoria própria

4. DISCUSSÃO

A saliva e a urina mostram-se fluidos promissores no diagnóstico da DEN. A


literatura descreve que os anticorpos IgA, IgG e IgM encontrados na saliva, são
semelhantes aos valores encontrados no soro (VÁZQUEZ. et al., 2007; KORAKA et al.,
2001; TALARMIN et al., 1998) e, neste fluido, se é possível quantificar também o RNA
viral e o antígeno NS1. A urina é um fluido que apresenta concentrações mais baixas de
anticorpos, porém, mensuráveis sendo mais facilmente detectado o antígeno NS1 e, o
RNA-DENV que segundo a literatura, é detectável por um tempo mais prolongado do
que no soro (KORHONEN et al., 2014). Há a necessidade de mais estudos utilizando estes
fluidos no diagnóstico da DEN, visto que há trabalhos que comprovam sua eficiência,
entretanto, são escassos os mesmos que fazem uma comparação quantitativa detalhada
dos fluidos alternativos e o fluido de diagnóstico padrão, com um número significante
de pacientes, fazendo-se necessário mais pesquisas sobre estes espécimes.
Notou-se também a ausência de trabalhos que sistematizam a utilização da saliva
e da urina no diagnóstico da DEN, já que, apesar de terem sido encontradas 6 revisões
na busca total realizada neste trabalho, somente dois abordam especificamente este
tema (COLONETTI et al., 2018; NIEDRIG et al., 2018). Por conta disso, torna-se de crucial
importância que a pesquisa realizada neste trabalho sirva como base para a elaboração
de um robusto artigo de revisão sistemática sobre o assunto.

61
Após a triagem dos resultados da busca com os mediadores “dengue” e “urine”,
a maioria dos artigos foi excluída por ter como foco outra infecção que não a DEN. Esses
trabalhos tratavam quase que em sua totalidade da associação do ZIKV com a amostra
de urina e essa informação pode ser entendida por conta da forte associação desse
arbovírus com fluidos, como o sêmen, secreção vaginal e a própria urina (LAMB et al.,
2016; KURSCHEID et al., 2019). Em comparação, após o mesmo processo utilizando as
palavras chave “dengue” e “saliva”, a exclusão da maioria dos trabalhos encontrados se
deu pelo fato dos mesmos utilizarem a saliva do vetor, o mosquito Ae. aegypti, como
base das análises. De fato, diversos estudos já demostraram a importância de proteínas
presentes na saliva do vetor para o sucesso da infecção e da imunopatogênese, sendo
investigadas também para atuar em formulações vacinais (PINGEN et al., 2017;
MANNING et al., 2018).
Quando analisados os períodos de publicação, notou-se que trabalhos de DEN e
urina foram publicados entre os anos de 2007 e 2019, com média de 1 artigo por ano.
Observou-se um aumento na publicação no tema entre os anos de 2014 a 2016, com
média de 3 artigos por ano. Este dado pode estar relacionado à epidemia de ZIKV
ocorrida no mesmo período, que aumentou o interesse dos pesquisadores pela
utilização de secreções, como o sêmen, como amostras de diagnóstico (GORNET et al.,
2016). Já em relação aos trabalhos de DEN e saliva, observou-se um período de
publicação um pouco mais longo, entre 1998 e 2017. O volume de publicações mostrou
tendência contínua, com média de 1 trabalho por ano. Este fato pode estar relacionado
a já conhecida associação entre diversas infecções virais e a saliva, como no caso do
vírus da hepatite C, vírus da síndrome da imunodeficiência humana e vírus Epstein-Barr
(HERMIDA et al., 2002; CORSTJENS et al., 2016).
Em relação à localidade das amostras, pode-se observar que o continente
asiático concentrou o maior número de trabalhos. Além disso, não foram encontrados
trabalhos que utilizaram amostras de indivíduos africanos ou foram publicados no
continente africano. Esta informação pode estar associada ao fato que o perfil mundial
de produção científica é historicamente enraizado e pouco se alterou no decorrer das
décadas, embora o aumento de redes de colaboração tenha tido grande impacto no
desempenho de países emergentes, como os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África
do Sul). Apesar de apresentarem alto volume de publicação científica ao longo das

62
décadas, foram encontradas poucas produções com amostras oriundas da América do
Norte e da Europa. Este fato pode estar relacionado ao clima destas regiões, que não é
favorável à disseminação do vetor, embora a dinâmica da DEN venha mudando nos
últimos anos por conta dos efeitos do aquecimento global e da própria globalização
(WHO, 2014; WILSON & CHEN, 2015).
A idade dos participantes não apresentou diferenças relevantes, mantendo-se
entre 6 meses até 55-61 anos. Porém, quando analisada a quantidade de participantes
incluídos, notou-se uma grande diferença entre as buscas: em comparação com os
estudos de DEN e urina, cuja quantidade de participantes variou entre 1 a 293, estudos
de DEN e saliva contaram com a participação de até 7.048 indivíduos. Este fato pode
estar relacionado a facilidade maior da coleta de saliva em relação à de urina, já que não
necessita da higienização prévia do local e nem de um banheiro próximo (AQUINO et
al., 2020). Além disso, o recrutamento dos pacientes é também facilitado, uma vez que
costuma ocorrer na espera do atendimento para a coleta de sangue, quando o mesmo
já está em jejum (uma das únicas exigências para a coleta de saliva).
Após a seleção dos estudos relacionados à DEN e saliva, notou-se que a grande
maioria dos trabalhos analisou este espécime em conjunto ao plasma/soro ou sangue
total e três trabalhos utilizaram somente a saliva como amostra para o diagnóstico. Já
nos trabalhos relacionados à DEN e urina, notou-se que, além do soro e plasma e da
própria urina, a saliva também foi utilizada como amostra. Apenas um trabalho utilizou
somente a urina como amostra (VASANWALA et al., 2014). Infere-se, portanto, que a
maioria dos trabalhos que optam pela utilização de fluidos alternativos como amostras
de urina para o diagnóstico da DEN o fazem em conjunto com a saliva.
Como resultado de ambas as buscas, percebeu-se que os anticorpos foram as
moléculas de preferência no diagnóstico, com a presença também da pesquisa por NS1
e RNA viral. De fato, a pesquisa de anticorpos por ensaios imunoenzimáticos é a mais
utilizada na rotina, sendo vantajosa no diagnóstico quando não se sabe precisar o início
da infecção, fato que é comum no manejo de pacientes infectados pelo DENV, além de
ser menos custosa (MARTINS et al., 2014; SEKARAN & SOE, 2017). Portanto, já se
esperava que a metodologia escolhida pela maioria dos trabalhos de DEN e saliva fosse
a sorologia, representada na maioria dos casos pelo ELISA. Porém, nos trabalhos de DEN
e urina, percebeu-se também a detecção do RNA viral associada à pesquisa de

63
anticorpos. Isso está relacionado ao fato da excreção do RNA viral neste espécime
ocorrer de forma mais prolongada que na maioria dos fluidos (BARZON et al., 2013; MA
et al., 2014; GOURINAT et al., 2015). Portanto, nesses casos a metodologia de
preferência dos trabalhos foi a combinação entre sorologia e a RTqPCR.
Em relação aos sorotipos detectados, notou-se o predomínio de DENV-1, DENV-
2 e DENV-3. De fato, esses sorotipos são historicamente mais detectados nas pesquisas,
por conta das características epidemiológicas e da maior associação a quadros mais
graves (BALMASEDA et al., 2006; HERINGER et al., 2017), em comparação com o
sorotipo 4, que só foi detectado em conjunto aos outros três sorotipos.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se, portanto, que diversos métodos de diagnóstico na DEN podem


utilizar de maneira satisfatória a saliva e a urina e, embora a urina apresente excreção
de RNA viral mais prolongada que a saliva, a utilização desta mostra-se mais consolidada
no diagnóstico até então.

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66
CAPÍTULO V

REVISÃO DA LITERATURA: LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA –


MÉTODOS DIAGNÓSTICOS
Elizabeth Cristina Araujo Ferreira da Silva 1

¹ Mestranda em Pesquisa Clínica em Doenças Infecciosas do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI) -
FIOCRUZ.

RESUMO

Leishmanioses são antropozoonoses causadas por protozoários do gênero Leishmania


com distribuição mundial em 98 países. A doença humana acomete a pele e/ou as
mucosas das vias aero-digestivas superiores. As lesões mucosas geralmente aparecem
depois de meses ou mesmo vários anos após a cura espontânea ou terapêutica da lesão
cutânea primária, ou ainda podem se manifestar simultaneamente. A transmissão é
através da picada da fêmea de insetos flebotomíneos. O gênero Leishmania
compreende protozoários parasitas, com um ciclo de vida digenético (heteroxênico),
vivendo alternadamente em hospedeiros vertebrados e insetos vetores, estes últimos
sendo responsáveis pela transmissão dos parasitos de um mamífero a outro. Nas
Américas existem dois tipos da doença: Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA), que
afeta pele e mucosas, e Leishmaniose Visceral Americana, que afeta principalmente
baço e fígado. A epidemiologia das leishmanioses é complexa, e pode ser alterada pela
ocorrência de mudanças em qualquer posição no ciclo: vetor-reservatório-homem. O
desmatamento e a urbanização são exemplos característicos das alterações que são
seguidas por mudanças principalmente em reservatórios e na população de insetos
vetores. No Brasil, já foram identificadas seis espécies do subgênero Viannia e duas do
subgênero Leishmania. As principais são: L. (V.) braziliensis, L. (V.) guyanensis e L. (L.)
amazonensis e, mais recentemente, L. (V.) lainsoni, L. (V.) naiffi, L. (V.) lindenbergi, L. (V.)
shawi e L. (L.) infantum (forma visceral), encontradas em estados das regiões Norte e
Nordeste. No Rio de Janeiro, a maioria dos primeiros casos descritos foi proveniente de
outras regiões endêmicas do país, sugerindo uma doença importada. Por possuir uma
ampla variedade de espécies com manifestações distintas, faz com que o diagnóstico
seja complexo. Dos métodos utilizados para o diagnóstico temos a Intradermorreação
de Montenegro, a cultura, que se apresenta como o padrão de referência, exame
parasitológico direto, testes sorológicos como teste de aglutinação direta (DAT),
imunofluorescência indireta (IFA) e o teste imunoenzimático (enzyme linked
immunosorbent assay, ELISA), exame histopatológico como imunocitoqúimica e imuno-
histoquímica e o diagnóstico molecular. O tratamento para essa doença é hepatotóxico,
por isso um diagnóstico preciso é importante. O objetivo deste trabalho é elucidar cada
um dos métodos utilizados para o diagnóstico e esclarecer alguns aspectos de cada um
deles.

67
Palavras-chave: Leishmaniose Tegumentar Americana. Métodos Diagnósticos. Revisão
da Literatura.

1. INTRODUÇÃO

As leishmanioses são doenças infecciosas parasitárias causadas por protozoários


flagelados pertencentes ao gênero Leishmania (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2017; WORLD
HEALTH ORGANIZATION, 2010). A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que
existam 700.000 a um milhão de casos novos ao ano (WORLD HEALTH ORGANIZATION,
2020).
São transmitidos pelas fêmeas de insetos dos gêneros Phlebotumus ou Lutzomia
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2017; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010). Os insetos do
gênero Phlebotomus spp. são comumente encontrados na Europa, norte da África,
Oriente Médio e Ásia, já Lutzomia spp. são encontrados do sul dos Estados Unidos até o
norte da Argentina. (CATAÑO; PINZÓN, 2019; REITHINGER et al., 2007). São pequenos
insetos de aproximadamente 2-3 milímetros de comprimento. Há cerca de 500
flebotomineos conhecidos, mas apenas 30 destes são incriminados na transmissão da
doença (BATES, 2007; SRIVASTAVA et al., 2016).
A taxonomia é complexa, abrangendo mais de 20 espécies agrupadas em dois
subgêneros, Leishmania (Leishmania) e Leishmania (Viannia). (BAÑULS, 2002; FRAGA et
al., 2010; Lainson e Shaw, 1987; ODIWUOR et al., 2011). Originam doenças
negligenciadas que causam importante morbidade em áreas endêmicas, principalmente
nas áreas tropicais e subtropicais (CANTACESSI et al., 2015; SALES et al., 2019) e
afetando predominantemente populações pobres (WORLD HEALTH ORGANIZATION,
2020). As manifestações clínicas da doença em seres humanos dependem de interações
complexas entre as características de virulência da Leishmania spp. e as respostas
imunológicas do hospedeiro. As leishmanioses podem se manifestar de diversas formas,
desde lesões cutâneas até quadros com envolvimento do fígado e de outras vísceras.
(SINGH; DEY; SIVAKUMAR, 2005; SRIVASTAVA et al., 2016).
A diversidade clínica e epidemiológica da leishmaniose leva à complexidade da
taxonomia (FRAGA et al., 2010, ODIWUOR et al., 2011; ROUGERON et al., 2009;
TIBAYRENC et al., 1993). As Leishmanias têm um ciclo de vida dimórfico, onde existem

68
formas promastigotas extracelulares, que se multiplicam no trato alimentar do vetor, e
formas amastigotas intracelulares que se multiplicam nas células mononucleares do
hospedeiro. O acúmulo gradual de mutações por divisão celular mitótica e/ou por
recombinação sexual produzem misturas de genomas (INBAR et al., 2019; ROUGERON;
DE MEEUS; BANULS, 2015). A ampla diversidade genética dos parasitos do gênero
Leishmania, sobretudo L. (V.) braziliensis, espécie de maior prevalência no Brasil, é
conhecida (CUPOLILLO et al., 2003; ISHIKAWA et al., 2002; PACHECO et al., 1990). Esses
organismos mostram plasticidade inter e intraespécies quanto ao número e tamanho
dos cromossomos (cariótipo molecular), e também no genoma mitocondrial, variando,
principalmente, no tamanho e organização dos maxicírculos. Diferentes padrões
epidemiológicos poderiam influenciar os níveis de variabilidade: amostras de L. (V.)
braziliensis da Amazônia demonstraram elevada heterogeneidade genética, o que foi
relacionado ao grande número de vetores e animais que atuam nos ciclos de
transmissão ali, ao contrário da Costa Atlântica do Brasil, onde as amostras indicaram
baixo nível de heterogeneidade (CUPOLILLO et al., 2003). No Rio de Janeiro, L. (V.)
braziliensis parece ser bastante homogênea (BAPTISTA et al., 2009).
O diagnóstico da LTA se baseia na apresentação clínica, no isolamento
parasitário por cultura, exames moleculares, sorologia e na visualização dos
protozoários através de exame direto ou de avaliação histopatológica, (CAVALCANTI et
al., 2013; PEDRAL-SAMPAIO et al., 2016; TSUKAYAMA et al., 2013).
O diagnóstico diferencial clínico e laboratorial para doenças como esporotricose,
tuberculose, paracoccidioidomicose entre outras, deve ser considerado (MINISTÉRIO DA
SAÚDE, 2017).

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA – MÉTODOS DIAGNÓSTICOS

2.1. Teste intradérmico de Montenegro

O teste intradérmico de Montenegro representa o principal exame


complementar para o diagnóstico da Leishmaniose Tegumentar Americana, entretanto,
o antígeno para realização da IDRM não está disponível no Brasil há alguns anos, sem
previsão de fornecimento pelo Ministério da Saúde. Trata-se de uma reação de
hipersensibilidade tardia ocasionada após a inoculação de antígenos extraídos de

69
culturas de leishmania spp. na derme do paciente. (CERUTTI et al., 2017; JOSÉ et al.,
2001).
A resposta imune celular se manifesta por um endurecimento cutâneo
resultante da aplicação intradérmica do antígeno de Leishmania, que pode ser medido
em milímetros (ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2012; GUEDES et al.,2017). É utilizado como
método complementar ao diagnóstico por apresentar alta sensibilidade e especificidade
(ANTONIO et al., 2014; GUEDES et al., 2017), que variam de 86 a 100%, porém a
especificidade diminui pelo fato de ocorrerem reações cruzadas do coquetel de antígeno
utilizado. (ANDRADE et al., 2005; CERUTTI et al., 2017). E é de fácil execução e de baixo
custo, pelo fato de não requerer equipamentos sofisticados. (ANTONIO et al., 2014;
GUEDES et al., 2017).

2.2. Cultura

A cultura é um método de confirmação da presença do parasito, pois permite a


visualização das formas promastigotas através do microscópio ótico. O fragmento de
tecido é inoculado em meio de cultura bifásico NNN (McNeal, Novy e Nicolle), acrescido
de meio líquido Schneider e incubado entre 26ºC e 28ºC, temperatura ideal para o
crescimento do parasito. A partir do quinto dia podem ser observadas as formas
promastigotas. Serão realizados exames semanais até 1 mês para liberação do resultado
negativo (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2017).
Permite a identificação das espécies, porém, como dito anteriormente é uma
técnica que demanda tempo de crescimento. É um método específico pois permite a
visualização do parasito, porém sua sensibilidade está em torno de 50%. Casos crônicos,
como aqueles com baixa carga parasitária na lesão, diminuem a sensibilidade deste
método. (ANDRADE et al., 2005).

2.3. Exame parasitológico direto

O exame direto, através da escarificação da lesão que consiste na disposição do


material coletado em lâmina, coloração, e visualização em microscópio ótico representa
um método simples e acessível mesmo em condições de escassez de recursos
laboratoriais em áreas endemicas (MELLO; MADEIRA, 2015). O ‘imprint’ de um
fragmento de lesão cutânea coletado através de procedimento de biópsia também

70
constitui método simples com sensibilidade superior à do exame histopatológico
(SOUSA et al., 2014), embora necessite de anestesia local e constitua um procedimento
exclusivo do profissional médico (MELLO; MADEIRA, 2015).
É o exame de primeira escolha para o diagnóstico de leishmaniose no Brasil. A
coleta do material pode ser feita pelo raspado da lesão, aspirado por agulha fina (PAF)
ou pelo lavado da cavidade nasal e oral. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2017).
Apresenta melhores resultados logo nas primeiras semanas da doença pelo fato
da contagem do parasito ser maior, porém sua sensibilidade diminui após a evolução
das lesões. (CERUTTI et al., 2017; HOSSEINZADEH; OMIDIFAR; LOHRASB, 2012).

2.4. Testes sorológicos

Os testes sorológicos são considerados como método de rotina para o


diagnóstico da leishmaniose visceral (LV), entretanto esses métodos são pouco
utilizados para o diagnóstico da LTA devido à limitada manifestação sistêmica (ROCHA
et al., 2006; SARKARI et al., 2014). Entre os testes sorológicos mais frequentemente
utilizados para o diagnóstico da LTA estão o teste de aglutinação direta (DAT),
imunofluorescência indireta (IFA) e o teste imunoenzimático (enzyme linked
immunosorbent assay, ELISA) (PORFIRIO-PASSOS et al., 2012; SZARGIKI et al., 2009;
SARKARI et al., 2014).
A sensibilidade e a especificidade desse teste variam dependendo do teste
utilizado. Os testes de Western blot, ELISA (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay) e
imunoflorescência indireta (IFI) são mais citados nos trabalhos, com o ELISA e o IFI
atingindo cerca de 90% de sensibilidade e o Western blot atingindo 100%, porém este
apresenta maior complexidade e custo. A utilização dos teste3s em paralelo pode
aumentar a sensibilidade. (CERUTTI et al., 2017; SZARGIKI et al., 2009).

2.5. Exame histopatológico

As técnicas de imunocitoqúimica e imuno-histoquímica ampliam a sensibilidade


do teste. É uma boa opção para o diagnóstico de lesões recentes e crônicas. (CERUTTI
et al., 2017; DUARTE; ROCHAEL, 2006).
O exame histopatológico pode demonstrar os parasitos nos tecidos em 44% a
53% dos casos (QUINTELLA et al., 2009; SOUSA et al., 2014), sendo fundamental para o

71
diagnóstico diferencial com outras enfermidades. A imunohistoquímica é mais sensível
que a histopatologia convencional na visualização dos parasitos (QUINTELLA et al.,
2009).
Para a obtenção das biópsias é utilizado o “punch”, no qual fragmentos de 3 a 5
mm são retirados facilmente. O local deve ser limpo e o fragmento deve ser manipulado
sem que as estruturas sejam danificadas. Deve ser conservado em álcool. (MINISTÉRIO
DA SAÚDE, 2017), facilitando a visualização do parasito, aumentando a especificidade
do teste. (CERUTTI et al., 2017; VIANA et al., 2013).

2.6. Diagnóstico molecular

De todos os métodos apresentados, a Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) é


considerado o método de maior sensibilidade e especificidade, porém é de uso limitado,
por ser caro e de execução complexa. (BOGGILD et al., 2008; CERUTTI et al., 2017).
Os minicírculos do DNA do cinetoplasto (kDNA) foram os primeiros alvos
moleculares a serem estudados em parasitos do gênero Leishmania pela técnica de PCR
(PACHECO et al., 1990). Pela análise das regiões variáveis dessas moléculas, foram
desenvolvidos iniciadores, utilizados na PCR, que identificam as espécies responsáveis
pela LTA, em nível de subgêneros ou complexos. Por estar presente em múltiplas cópias
e por ser composto por regiões conservadas e variáveis nos minicírculos, o kDNA é
excelente para o diagnóstico da LTA (MARCUSSI et al., 2008).
A PCR permite o estudo de variabilidade genética entre as espécies de
Leishmania através da amplificação do fragmento de DNA, com ajuda de técnicas
auxiliares (MARCUSSI et al., 2008).

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Leishmaniose é uma doença negligenciada que afeta principalmente pessoas


mais necessitadas. O diagnóstico preciso é indispensável pois o tratamento dessa
doença é hepatotóxico, e é imprescindível que haja um bom prognóstico. As escolhas
do melhor teste podem ser definidas de acordo com a forma de apresentação da
doença, a disponibilidade do teste no local onde este paciente está sendo atendido, o
tempo de doença e a imunidade do indivíduo.

72
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76
CAPÍTULO VI

NÍVEIS DE CITOCINAS TNF-α, IFN-γ, E TGF-β E O PERFIL CLÍNICO-


EPIDEMIOLÓGICO DE INDIVÍDUOS COM CORIORETINITE POR TOXOPLASMOSE,
SUL DO BRASIL
Fernanda Ferreira Evangelista ¹
Cristiane Maria Colli ²
Ariella Andrade Marchioro 1
Érika Cristina Ferreira 1
Ana Lúcia Falavigna-Guilherme 1
¹ Programa de pós-graduação - Ciências da Saúde, Universidade Estadual de Maringá (UEM), Brasil.
² Departamento de Análises clínicas e biomedicina, UEM, Brasil.

RESUMO

As infecções pós-natais por Toxoplasma gondii podem ser responsáveis por lesões
retinianas, incluindo a América do Sul, onde há desfechos mais frequentes e graves
devido à diversidade genética do parasita. Objetivo: Descrever os níveis das citocinas
TNF-α, IFN-γ e TGF-β e o perfil clínico-epidemiológico de indivíduos com coriorretinite
por toxoplasmose no Sul do Brasil. Métodos: Foram avaliados doze pacientes com
coriorretinite, atendidos em serviços de oftalmologia da cidade de Maringá, Paraná,
submetidos a fundoscopia e análise sorológica para anti-T. gondii IgM e IgG, usando Elisa
MEIA e dosagem de TNF-α, IFN-γ e TGF-β usando ELISA. O grupo controle foi composto
por indivíduos saudáveis descritos por Conde et al 2013. Foram registrados dados
clínico-epidemiológicos. Resultados: Os pacientes avaliados tinham idade média de 29
anos, predomínio de acometimento unilateral, e três indivíduos com IgM anti-T.gondii
reativo, sendo duas crianças, com transmissão congênita e um, do sexo feminino, 20
anos, com infarto nodular. Os demais apresentavam apenas a presença do anticorpo IgG
anti-T.gondii. Os níveis médios de TNF-α e IFN-γ foram menores quando comparados
aos controles. O TGF-β, por outro lado, estava em níveis mais elevados, destacando-se
em um indivíduo adulto com IgM reativa e em outro paciente com imunodeficiência.
Todos eles tinham pelo menos um fator de risco. Conclusão: Indivíduos com
coriorretinite por toxoplasmose, geralmente unilateral e na idade adulta, com visão
turva, apresentaram diminuição dos níveis de citocinas inflamatórias e aumento das
citocinas antiinflamatórias. Estudos como esses são relevantes para auxiliar no
entendimento da evolução da coriorretinite toxoplasmática na América do Sul.

Palavras-chave: Toxoplasma gondii. Coriorretinite. Citocina. TGF-β. TNF-α. IFN-γ.

77
1. INTRODUÇÃO

A toxoplasmose, causada pelo protozoário Toxoplasma gondii, é geralmente


assintomática em indivíduos imunocompetentes, mas casos graves podem ocorrer em
fetos por transmissão vertical de mulheres grávidas na fase aguda e em indivíduos
imunossuprimidos (Frenkel, Dubey, & Miller, 1970) . Porém, infecções pós-natais também
podem ser responsáveis por casos de lesões retinianas, com sintomas clínicos no início, meses
ou anos após a infecção, principalmente na população que vive na América do Sul. (Grigg et al.,
2015; Silveira et al., 2015). Este fato, até então desconhecido, costumava ser atribuído a
infecções congênitas (Wilson et al., 2011). No entanto, os resultados mais frequentes e
graves da coriorretinite na América do Sul são atribuídos à diversidade genética de T.
gondii (Grigg et al., 2015; Silveira et al., 2015), com polimorfismos únicos que não podem
ser agrupados em nenhum dos 12 haplogrupos descritos (Higa et al., 2014). No Brasil,
os genótipos circulantes geralmente variam de moderada a alta virulência (Peyron et al.,
2006). Com o objetivo de contribuir para o entendimento da toxoplasmose ocular em
indivíduos residentes no Sul do Brasil, este estudo descreveu os níveis das citocinas TNF-
α, IFN-γ e TGF-β e o perfil clínico-epidemiológico de indivíduos com coriorretinite por
toxoplasmose.

2. MÉTODOS

Entre janeiro e dezembro de 2015, dez pacientes com queixas clínicas de visão
turva e história de toxoplasmose, e duas crianças cujas mães tiveram soroconversão
dessa zoonose durante a gravidez, foram atendidas em serviços de oftalmologia na
cidade de Maringá, Paraná. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em
Envolvimento de Seres Humanos (COPEP) do Centro Universitário Ingá (UNINGÁ), sob o
nº 301.312.
O exame oftalmológico consistiu na avaliação do fundo do olho por meio de
mapeamento retiniano, utilizando oftalmoscópio indireto Eyetec e lente Volk de 20
dioptrias, realizado por oftalmologista especializado. O exame foi realizado sob
midríase, utilizando colírio tropicamida 1% e fenilefrina 10% (Aleixo et al., 2009). Foco
de coriorretinite em atividade, caracterizado por lesões brancas na coróide e retina, com
ou sem exsudação vítrea, foram considerados características da toxoplasmose. O

78
sangue dos pacientes foi coletado para avaliação sorológica anti-T. gondii IgM e IgG, pelo
método Elisa MEIA (Abbot Diagnostics AxSYM®) e para dosagem de citocinas de TNF-α,
IFN-γ e TGF-β. Essas citocinas foram analisadas por meio do kit ELISA (Human / Mouse
ELISA Ready-Set Go, Bioscience, EUA), seguindo as recomendações do fabricante. As
sensibilidades de detecção do kit foram as seguintes: TNF-α: 4 pg / mL, IFN-γ 4 pg / mL
e TGF-β: 8 pg / mL. No momento da coleta, os pacientes não estavam em tratamento
quimioterápico.
Para a comparação entre os níveis de citocinas no soro de pacientes e indivíduos
saudáveis, usamos como grupo controle os dados publicados por Conde et al., 2013, que
mediram as mesmas citocinas no soro de indivíduos saudáveis usando o mesmo kit
usado neste estudo. A análise estatística foi realizada por meio da média aritmética e
desvio padrão das citocinas investigadas por meio do teste paramétrico T, com auxílio
do software Statistica Single User. Os valores considerados outliers foram
desconsiderados para a análise estatística. Dados clínico-epidemiológicos, como
lateralidade da infecção, queixa clínica, sexo, idade, hábitos alimentares como consumo
de frescal (leite in natura, queijo fresco), carnes mal cozidas, hortaliças ou frutas in
natura, fonte de água, local de residência, contato com gatos e manejo do solo.

3. RESULTADOS

Dos pacientes investigados, cinco eram do sexo masculino e sete do feminino,


com média de idade de 29 anos, variando de 9 meses a 64 anos (Tabela 1). Houve apenas
um caso com infecção bilateral (Tabela 1). Em três pacientes, foi detectada a presença
de IgM anti-T.gondii. Os pacientes eram duas crianças, uma com 9 meses e a outra
criança com um ano, correspondendo a casos de transmissão congênita. O terceiro caso
de IgM positivo foi uma mulher de 20 anos com infarto nodular. Os demais pacientes
(9/12) apresentavam apenas anticorpo IgG anti-T.gondii reativo.

79
Tabela 1: Dados clínico-laboratoriais de indivíduos com coriorretinite, Sul do Brasil.

TNF-α INF-γ TGF-β Coriorretinite Lateralidade


Caso Idade Sexo IgM IgG Queixa principal
pg/mL pg/mL pg/mL recoreente da infecção
1 9m F R R 6,26 23,01 2,85 Visão embaçada Não Unilateral
2 1a F R R 13,67 24,63 60,51 Visão embaçada Sim Bilateral
17470# InNd** Não
3 20a F R R 6,81 0,62 Unilateral
88 e Visão embaçada
4 6a F NR R 6,58 6,01 16,52 Visão embaçada Sim Unilateral
5 20a F NR R 6,89 9,57 106,78 Visão embaçada Sim Unilateral
22669# Visão embaçada Sim
6* 24a F NR R 7,02 11,3 Unilateral
74
7 24a F NR R 6,55 23,74 94,25 Visão embaçada Sim Unilateral
8 30a M NR R 5,71 25,52 72,36 Visão embaçada Sim Unilateral
9 38a M NR R 5,89 23,38 88,89 Visão embaçada Sim Unilateral
10 55a M NR R 6,78 24,88 36,92 Visão embaçada Sim Unilateral
11 63a M NR R 6,02 21,34 49,8 Visão embaçada Sim Unilateral
Sim
12 64a M NR R 6,25 21,04 9,34 Visão embaçada Unilateral
m: meses de idade; a: anos / *: Paciente com histórico de imunodeficiência / R: Reativo / NR: Não Reativo
/ ** InNd: Infarto nodular/ #: O valor não pode ser calculado com precisão por extrapolação linear da
curva padrão.

A Tabela 1 mostra os níveis de TNF-α, IFN-γ e TGF-β em cada um dos pacientes


investigados. Os níveis médios de citocinas e o desvio padrão encontrados em pacientes
com toxoplasmose ocular e em 97 controles, descritos por Conde et al 2013, são
apresentados na tabela 2. Os níveis médios de TNF-α, IFN-γ e TGF-β no o soro dos
pacientes foi significativamente menor quando comparado ao grupo controle (p <0,01,
Tabela 2). Os níveis de TGF-β estavam especialmente aumentados em uma paciente
adulta do sexo feminino, com anti-T. gondii IgM positivo, e em outra paciente adulta do
sexo feminino, com histórico de imunodeficiência (Tabela 1).
Todos os indivíduos eram residentes em áreas urbanas, utilizavam água da
Estação de Tratamento de Água (ETA) e apresentavam pelo menos um fator de risco
para a infecção, principalmente hábito de ingestão de vegetais crus consumidos,
ingestão de carne mal cozida e frescal. Nove (9/12, 75%) desses pacientes tinham dois
ou mais fatores de risco.

80
Tabela 2. Níveis de citocinas (pg / mL) TNF-α, IFN-γ e TGF-β no soro de
indivíduos com toxoplasmose ocular recorrente, carnes mal cozidas e frescal do sul do
Brasil.
Controle* Casos
Citocina (n=97) (n=12) P
Média ± SD Média ± SD
TNF-α 21,4 ± 15,8 7,0 ± 2,1 0,0022**
INF-γ 136,8 ± 84,4 17,9 ± 8,6 0,0001**
TGF-β 422,4 ± 210,5 53,8*** ± 37,0 0,0001**
* Os sujeitos controle foram descritos por Conde et al 2013.
** Teste t significativo considerando nível de significância de 5%.
***Desconsiderou dois outliers de amostras

4. DISCUSSÃO

Os indivíduos deste estudo eram em sua maioria adultos com episódios crônicos
de reativação da coriorretinite por toxoplasmose, sendo a queixa principal
embaçamento unilateral da visão. Níveis séricos diminuídos de citocinas inflamatórias,
IFN-γ e TNF-α e antiinflamatórios, citocina TGF-β em comparação com indivíduos
saudáveis foram observados entre os pacientes investigados. Além disso, De-la-Torre et
al., 2013 observaram níveis reduzidos de IFN-γ no humor aquoso de pacientes com
toxoplasmose ocular na América do Sul, enquanto em pacientes europeus essa citocina
estava elevada. Meira et al., 2014, no Brasil, também observaram diminuição dos níveis
de IFN-γ no soro de pacientes com toxoplasmose ocular, mas aumento dos níveis de
TNF-α. Tais achados são consistentes com a hipótese de que cepas sul-americanas
podem causar toxoplasmose ocular mais grave devido à inibição do efeito protetor do
IFN-γ. Deve-se lembrar que as cepas de T. gondii observadas na América do Sul são
consideradas mais agressivas (Silveira et al., 2015), e as citocinas IFN-γ e TNF-α são
essenciais para a resposta imune do hospedeiro, no que se refere ao controle da latência
de infecção crônica e diminuição da carga parasitária (Goldszmid et al., 2012). A resposta
imune Th1 produz IFN-γ, TNF-α e outras citocinas, que têm a função de ativar
macrófagos (Costa-Silva et al., 2012) e controlar a replicação de taquizoítos, tanto na
fase aguda quanto na crônica da infecção (Leng et al., 2009). Já o TGF-β, com ação
antiinflamatória, é capaz de promover a redução da resposta Th1, o que pode aumentar
a patogênese do T. gondii.

81
No entanto, neste estudo, os níveis de todas as citocinas investigadas foram
diminuídos quando comparados aos controles. Os níveis de uma citocina podem ser
alterados de acordo com o patógeno que pode estimular as vias imunológicas Th1, Th2
ou Th17. A variabilidade genética do hospedeiro também é um componente altamente
relevante para a resposta imune individual e contribui para a suscetibilidade, evolução
e patogênese de várias doenças infecciosas.
Uma possível falha em nosso estudo foi a comparação dos dados das citocinas
com o grupo controle publicado anteriormente (Conde et al., 2013). Entretanto,
acreditamos que esse fato não influenciou, uma vez que os indivíduos controle
geralmente são pessoas saudáveis, sem processos inflamatórios, doenças autoimunes
ou imunodeficiências.
Os pacientes apresentavam pelo menos um fator de risco para infecção e não foi
possível estabelecer a provável causa da infecção. No entanto, o consumo de vegetais
crus, carnes cruas / mal cozidas, bem como leite cru e fresco são consumidos com
frequência. Além disso, Higa et al., 2010, também verificaram a prevalência desse
consumo entre gestantes com suspeita de infecção aguda por toxoplasmose na mesma
região. A maioria dos pacientes deste estudo não tem confirmação se a infecção foi
congênita, com início dos sintomas de reativação na idade adulta.

5. CONCLUSÃO

Pacientes com coriorretinite por toxoplasmose, principalmente adultos,


costumavam consumir vegetais crus, carnes cruas / mal cozidas e / ou frescal. A
dosagem sorológica de algumas citocinas evidenciou baixos níveis de citocinas, IFN-γ,
TNF-α e TGF-β. Estudos como esses são relevantes para auxiliar no entendimento da
evolução da doença. Porém, conhecer o genótipo de T. gondii envolvido, identificar
polimorfismos em genes de citocinas, que possam interferir na sua ação e / ou produção,
associados a um maior número de amostras analisadas são fatores necessários para um
melhor entendimento da coriorretinite causada pelo T. gondii.

82
AGRADECIMENTOS

Agradecemos aos pacientes que aceitaram participar da pesquisa e aos


profissionais que colaboraram. Agradecemos também ao programa Ciências da Saúde e
a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela
concessão de bolsas de estudos.

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84
CAPÍTULO VII

NEUROCISTICERCOSE: ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS, CLÍNICOS E LABORATORIAIS


- UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Brenda Costa Prado ¹
Henrique Soares de Lima ¹
Isabela Ribolli Caumo ¹
Marcélia Oliveira da Costa ¹
Renan Araujo dos Reis ¹
Vinicius de Moraes Leite ¹
¹ Graduando(a) do curso de Medicina. Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT

RESUMO

Esta revisão bibliográfica acerca da Neurocisticercose (NCC), uma infecção do Sistema


Nervoso Central (SNC) causada pelo alojamento da larva da Taenia solium, objetiva
abordar a doença dos pontos de vista epidemiológico, clínico e laboratorial, usando
artigos das plataformas PubMed e SciELO, em um recorte temporal das duas últimas
décadas. Essa doença, intimamente ligada a precárias condições sanitárias, intensificou-
se recentemente devido ao aumento dos fluxos migratórios e ao êxodo rural. A infecção
ocorre por meio da ingestão de alimentos contaminados com os ovos da T. solium. A
doença apresenta formas distintas e as manifestações, nos casos sintomáticos,
dependem de fatores diversos, como quantidade e localização dos cistos e resposta
imunológica individual do hospedeiro. Pode, ainda, desencadear doenças secundárias.

Palavras-chave: Neurocisticercose. Taenia solium. Sistema Nervoso Central.

1. INTRODUÇÃO

A NCC é caracterizada por uma infecção do SNC causada pela larva da Taenia
solium. Trata-se de uma doença negligenciada, diretamente relacionada a condições
sociossanitárias precárias, sendo prevalente em países subdesenvolvidos e em
desenvolvimento (AGAPEJEV, 2011).
O diagnóstico da patologia em questão é realizado por meio da TC e da RM da
cabeça. Vale ressaltar que além do diagnóstico por imagem, há também a análise
laboratorial do líquido cefalorraquidiano (LCR) (LANGE, 2019).
Existem quadros clínicos assintomáticos e sintomáticos. Dentre estes, a
convulsão é o sinal clínico mais característico da doença. No mais, o paciente também

85
pode apresentar cefaleia, náuseas, aumento da pressão intracraniana e até
acometimento do aparelho locomotor (DEL BRUTTO, 2013; SYMEONIDOU et al., 2013).
Diante do exposto, este artigo objetiva caracterizar os aspectos clínicos,
epidemiológicos e laboratoriais da NCC, discorrendo sobre a fisiopatologia da doença e
seu panorama no Brasil e no mundo, além de identificar critérios de avaliação e
diagnóstico com base em achados nas duas últimas décadas.
Foi realizada uma revisão de literatura, nos idiomas português, inglês e espanhol,
de produções científicas indexadas nas bases de dados eletrônicas SciELO e PubMed. Os
descritores utilizados foram “Neurocysticercosis”, “Clinical aspects”, “Epidemiological
aspects” e “cyst formation”. O período considerado foi de 2000 a 2020. A seleção dos
artigos deu-se, inicialmente, por meio da leitura e julgamento de títulos e resumos das
produções. As obras relevantes ao estudo foram lidas integralmente, restando 25
artigos norteadores.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1. Epidemiologia

A zoonose conhecida por NCC caracteriza a infecção do SNC pela forma larval da
Taenia solium (MORALES et al., 2000). Essa doença está atrelada às condições
sociossanitárias precárias populacionais, sendo, dessa forma, considerada endêmica em
países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, como América Latina, África
Subsaariana, Índia e sudoeste da Ásia (CHAGAS et al., 2003). Cabe, ainda, destacar que,
devido aos fluxos migratórios globais, tem aumentado a incidência de casos em regiões
desenvolvidas, tais quais Estados Unidos e Europa (GARCIA et al., 2003).
Nesse sentido, em razão das crises socioeconômicas mundiais ocorridas nos
últimos anos, houve intensificação das migrações de populações, oriundas de regiões
historicamente endêmicas, as quais, na maioria das vezes, portadoras da Taenia solium,
acabam por levar a verminose para países em que não há grande incidência
(SYMEONIDOU et al., 2018).Ilustrativamente, temos o aumento da infecção por NCC em
crianças norte-americanas devido ao contato contínuo com babás contaminadas
provenientes do México (OLIVEIRA et al., 2018).

86
Além disso, conforme estudos realizados por Chagas MGL et al., a intensificação
do êxodo rural promoveu o aumento do número de casos em áreas urbanas. Isto é
favorecido pela baixa cobertura sanitária nas cidades. Outro fator também apontado
pelo referido autor é que o perfil do portador de NCC avaliado em sua pesquisa não
condiz com o perfil comum dos portadores dessa doença. A identificação de um
estudante universitário e um profissional liberal reproduz esse fato controverso
(CHAGAS et al., 2003).
A NCC acomete ambos os sexos em qualquer faixa etária, mas apresenta ligeiro
predomínio em homens. No entanto, quando afeta mulheres, o curso da doença
costuma ser mais agressivo em decorrência da resposta imunológica mais acentuada
nesse grupo devido a questões hormonais. Outrossim, quanto maior a idade do
paciente, menor a resposta imunológica, pois ocorre diminuição da quantidade de
leucócitos presentes no líquido cefalorraquidiano (LCR), o que pode implicar maior
quantidade de vermes encapsulados (cistos) (AGAPEJEV et al., 2007; FLEURY et al.,
2004).
A perpetuação da NCC deve-se ao saneamento básico ineficiente bem como aos
hábitos inadequados de higiene pessoal, que se relacionam diretamente com a
contaminação dos recursos hídricos e, consequentemente, com o surgimento de novos
casos (AGAPEJEV, 2003; WINKLER et al., 2009).Roman et al. estimam que a taxa de
mortalidade, em escala mundial, devido à NCC seja de 50.000 pessoas por ano (ROMAN
et al., 2000).

2.2. Aspectos clínicos

2.2.1. Ciclo de vida da Taenia solium


Após a ingestão, os ovos são eclodidos no estômago pela ação do suco gástrico,
liberando a larva, que migra para o intestino, onde conclui seu processo de
desenvolvimento, com cerca de 3 metros de comprimento. Aproximadamente dois
meses depois, o verme adulto passa a liberar proglótides gravídicas contendo milhares
de ovos, o que caracteriza a teníase (WINKLER et al., 2009).
Insta salientar que a larva, ao atingir a corrente sanguínea, pode alcançar
qualquer tecido do corpo humano, tendo, contudo, maior afinidade pelos tecidos do

87
SNC, onde desencadeia a NCC (AGAPEJEV, 2003). A figura 1 ilustra o complexo teníase-
cisticercose.
Figura 1 – Ciclo da Taenia solium

Fonte: (GARCIA et al., 2003).

2.2.2. Manifestações clínicas


Em razão de ser considerada um grave problema de saúde pública mundial, a
NCC foi incluída na agenda da Assembleia Mundial de Saúde de 2003 (GARCIA et al.,
2003). Prova disso é o fato de a NCC ser a maior causa de epilepsia tardia, de acordo
com Silva AV et al (SILVA et al., 2006).Além das convulsões características da epilepsia,
outros sintomas comuns são a cefaleia e os distúrbios psiquiátricos (WINKLER et al.,
2009).
A sintomatologia da NCC depende de múltiplos fatores, tais como o número de
cistos, sua localização no SNC e fase evolutiva e a resposta imunológica do hospedeiro.
Estes, quando associados, irão determinar o quadro clínico do paciente (CHAGAS et al.,
2003).
Um estudo, realizado por Morales NMO et al., identificou que crianças
diagnosticadas com NCC, ainda que seja incomum, apresentaram déficit de atenção.

88
Entretanto, quando ocorre em crianças, o período de incubação pode variar de poucos
meses a até 30 anos. Nesse grupo de pacientes, os sintomas mais frequentes são as
crises epiléticas, hipertensão intracraniana, encefalite e distúrbios psiquiátricos e
cognitivos (MORALES et al., 2000).Dentre os sinais psíquicos, temos depressão,
nervosismo, ansiedade e irritabilidade (AGAPEJEV, 2011).
Conforme a pesquisa de Rodrigues CL et al., o prejuízo cognitivo da NCC pode,
ocasionalmente, variar do prejuízo em um único domínio até a demência, a qual ocorre
apenas em pacientes com a doença ativa. Esse dano é mais notável durante a fase ativa
vesicular e menos predominante no estágio calcificado. Verificou-se, contudo, que pode
haver remissão dos sintomas cognitivos desde que os pacientes com lesões ativas sejam
tratados com farmacologia regular (anti-helmínticos), deixando de se enquadrar no
diagnóstico de demência (RODRIGUES, 2012).
A depender da localização do cisto, a NCC pode ser classificada como intra ou
extraparenquimal. A forma intraparenquimal é considerada a manifestação benigna da
doença, que mediante o elevado número de cistos, porém, pode caracterizar a NCC
massiva (Figura 2). Esta provoca convulsões descontroladas e deficiência cognitiva.
Quando o cisto invade o sulco lateral (fissura de Sylvian), ele se desenvolve a um cisto
gigante (Figura 3), causando hemiparesia. Já a forma extraparenquimal, caracterizada
pela fixação dos cistos nas cisternas basais (Figura 4 - A e B), ou seja, na região
ventricular, culmina em NCC racemosa, que pode desencadear doenças secundárias
como meningite neurocisticercótica e hidrocefalia (ODASHIMA e TAKAYANAGUI , 2006).

89
Figura 2 – NCC massiva

Fonte: (ODASHIMA e TAKAYANAGUI , 2006).

Figura 3 – Cisto gigante

Fonte: (ODASHIMA e TAKAYANAGUI , 2006).

90
Figura 4 – Cistos extraparenquimais

Fonte: (ODASHIMA e TAKAYANAGUI , 2006).

2.2.3. NCC espinal


Há também, além dos tipos supracitados e mais frequentes da doença, a NCC
espinal (Figura 5), em que os indivíduos acometidos apresentam dor radicular,
parestesia, distúrbios do esfíncter, disfunção sexual, dormência progressiva e fraqueza
nas extremidades inferiores e, consequentemente, dificuldades para locomoção. Esse
tipo, porém, é raro, englobando de 1 a 5,8% dos casos registrados da doença (NOGUERA
et al., 2015).
A baixa incidência relaciona-se ao baixo fluxo sanguíneo na região da medula
espinal, ou seja, a ocorrência de lesões é diretamente proporcional ao fluxo de sangue,
o que inclusive explica o fato de lesões em regiões cerebrais promovidas pelo curso da
NCC serem muito mais frequentes, visto que a corrente sanguínea no cérebro é cerca
de 100 vezes maior (GUEDES-CORREA et al., 2006; LACOANGELI et al., 2013).

91
Figura 5 – NCC espinal

Fonte: (GUEDES-CORREA et al., 2006).

2.2.4. Fases da NCC


A NCC, apesar de apresentar um diagnóstico clínico relativamente difícil devido
a seu polimorfismo, possui características progressivas de acordo com o estágio em que
o cisto se encontra. Estes estágios são denominados: fase vesicular, fase coloidal, fase
nódulo-granular e fase calcificada (AGAPEJEV, 2017; LANGE et al., 2017; WHITE JR,
2000).
Após a instalação do cisto no parênquima cerebral, espaço subaracnóideo ou nas
cavidades ventriculares, o hospedeiro ainda passa um longo tempo sem apresentar
sintomas aparentes. Isso se deve ao fato de que o cisto emprega várias funções
modulatórias que permitem que ele permaneça sem ser afetado pelo sistema
imunológico do hospedeiro. Esse primeiro estágio, no qual o cisto pode ser referido
como "cisto viável", é denominado estágio vesicular (AGAPEJEV, 2017; LANGE et al.,
2017; WHITE JR, 2000).
Na fase vesicular, a resposta inflamatória é nula para quase todos os casos. Nos
poucos em que ocorrem manifestações clínicas, o hospedeiro apresenta sintomas como
convulsões, aumento da pressão intracraniana, hidrocefalia e meningite (AGAPEJEV,
2017; LANGE et al., 2017; WHITE JR, 2000).
Especificamente, as crises convulsivas da fase vesicular são explicadas pela
relação direta das transmissões sinápticas com a mudança significativa nas

92
concentrações de neurotransmissores. Essas manifestações acompanham o aumento
de glutamato, aspartato e ácido gama-aminobutírico (GABA) no LCR de pacientes com
cistos viáveis (BERTOLUCI e CAMARGO, 2015).
Com o decorrer do tempo, o cisto perde sua capacidade de modular a resposta
imunológica do hospedeiro e sua parede passa a ser atacada por células inflamatórias
do indivíduo; este momento é denominado estágio coloidal. Nesse, o hospedeiro passa
a apresentar convulsões e a resposta inflamatória muda ligeiramente, passando a ser
muito mais aguda (AGAPEJEV, 2017; LANGE et al., 2017; WHITE JR, 2000).
Decorrido este período, a resposta imune do indivíduo passa a ser extremamente
intensa, fazendo com que o cisto seja circundado por colágeno, ocasionando uma gliose
perilesional; este período é denominado estágio nódulo-granular. Juntos, o estágio
coloidal e o estágio nódulo-granular, formam o chamado período transicional
(AGAPEJEV, 2017; LANGE et al., 2017; WHITE JR, 2000).
Finalmente, o cisto é todo revestido em decorrência do processo de fibrose,
posteriormente é calcificado e então morre. Neste momento o hospedeiro permanece
apresentando convulsões frequentes e, além de gliose perilesional, também passa a
apresentar edema na região encefálica; este último estágio é conhecido como fase
calcificada (AGAPEJEV, 2017; LANGE et al., 2017; WHITE JR, 2000).
Segundo Christensen NM et al., em uma pesquisa envolvendo porcos, a presença
de cistos no tecido nervoso do hospedeiro estimula a resposta imunológica e, assim,
promove a deposição de colágeno do tipo I em torno do cisticerco, que pode estar
relacionada ao desenvolvimento de crises convulsivas. Desse modo, é possível inferir
que a quantidade de colágeno é diretamente proporcional ao grau de degeneração do
cisto (CHRISTENSEM, 2016).

2.2.5. Casos assintomáticos


Além dos casos sintomáticos clássicos da NCC, há também os casos
assintomáticos, nos quais o indivíduo é portador do parasita, mas não manifesta
nenhum sintoma. Nestes, só é sabido da condição do portador após seu óbito,
decorrente de fatores diversos não relacionados à doença. Conforme Lino-Junior RS et
al., em pesquisa, realizada no hospital escola da Universidade Federal do Triângulo
Mineiro (UFTM), acerca de protocolos de 2218 autópsias entre os anos de 1970 e 2003,

93
detectou-se a NCC em 2,4% deles. Insta salientar, no entanto, que o referido percentual
pode ser subestimado, visto que nem todos os óbitos são submetidos a exames
necroscópicos. Cabe, ainda, destacar que, em pacientes assintomáticos, o cisticerco vivo
pode causar supressão ativa da resposta imunológica (LINO-JUNIOR et al., 2007;LINO
JUNIOR, 2002;SINGH et al., 2003).

2.3. Aspectos laboratoriais

A princípio, a detecção da tênia ocorria por meio de exames microscópicos com


o intuito de identificar os ovos do parasita. Todavia, a semelhança com outros ovos
parasitários torna o método pouco eficaz no âmbito da NCC (LANGE, 2019).
É pertinente destacar o exame ELISA, que, pelas alterações do LCR com a
presença de pleocitose mononuclear, somado com eosinófilos e anticorpos, constata o
estágio degenerativo do cisto. Contudo, diante de cistos isolados e diferenciação entre
T. saginata de T. solium, o recurso mostra-se falho (ODASHMA e TAKAYANAGUI , 2006;
SYMEONIDOU, 2018).
Além disso, a utilização de soro pela técnica de imunoeletrotransferência ligada
a enzima EITB demonstra uma efetividade eminente quando o paciente apresenta mais
de dois cistos extraneurais viáveis. Entretanto, o resultado negativo no teste não elimina
a possibilidade de NCC, haja vista que na fase de calcificação não ocorre identificação
do cisto (OLIVEIRA et al., 2018).
Atualmente, os métodos mais utilizados são a RM e a TC, que detectam o escólex
invaginado. Sendo assim, o primeiro é mais efetivo quando o cisto não se encontra em
estágio de calcificação, tendo em vista a membrana fina do cisto e a densidade do LCR.
Em contrapartida, a TC evidencia a calcificação com maior precisão (CHAGAS et al., 2003;
ODASHMA e TAKAYANAGUI , 2006).

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se, portanto, que, apesar da NCC apresentar diferentes quadros clínicos


que variam conforme a região de alojamento do cisto, atualmente o diagnóstico da
doença pode ser ligeiramente associado a sintomas comuns entre os mais variados
casos. A partir dos estudos realizados em populações com grande taxa de indivíduos
acometidos pela NCC, foi possível identificar, como aspecto clínico da doença, sintomas

94
frequentes à maior parte destes indivíduos. Dentre as manifestações estão a epilepsia
de início tardio e o aumento da pressão intracraniana, além de doenças secundárias à
NCC, como hidrocefalia e meningite.
Por outro lado, embora os avanços acerca do que se sabe a respeito da doença
helmíntica que mais acomete o SNC no mundo tenham sido significativos, infelizmente
não são suficientes para erradicar a NCC em regiões endêmicas. Este fator decorre do
baixo investimento em mecanismos intervencionistas relacionados à saúde pública e ao
saneamento básico, haja vista que os exames laboratoriais necessários para
identificação da doença possuem custo elevado, e mesmo que essas aplicações fossem
viabilizadas, ainda não seriam suficientes para sanar a problemática em questão, posto
que é imprescindível a implementação de estruturas sociossanitárias dignas a todos os
indivíduos vulneráveis.

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97
CAPÍTULO VIII

APLICAÇÃO DE FERRAMENTAS MOLECULARES PARA O DIAGNÓSTICO DE


LEISHMANIOSE TEGUMENTAR AMERICANA
Giulia Ribeiro Fernandes ¹
Ricardo Lucas de Abreu da Cruz²
Aline Fagundes da Silva ³
Yasmin da Silva Santos4
¹ Graduanda do curso de Biomedicina. Universidade Castelo Branco – UCB
2 Graduando do curso de Biomedicina. Universidade Estácio de Sá- UNESA
3 Doutora Aline Fagundes da Silva. LaPClinVigiLeish/INI-FIOCRUZ
4 Mestre em Ciências Yasmin da Silva Santos. LaPClinVigiLeish/INI-FIOCRUZ

RESUMO

As Leishmanioses são doenças causadas por protozoários do gênero Leishmania,


caracterizadas por serem infecciosas e não contagiosas acometendo animais e seres
humanos. Sua distribuição é global e, no Brasil, o Nordeste tem a maior prevalência de
casos. As técnicas utilizadas para o diagnóstico são fundamentadas em exames clínicos,
testes parasitológicos, moleculares e imunológicos. Com a busca de metodologias mais
sensíveis, o uso da biologia molecular tem sido promissor no diagnóstico da
Leishmaniose tegumentar Americana. Os Protocolos de PCR (Reação em cadeia da
polimerase) baseados nos diferentes alvos moleculares disponíveis constituem
atualmente a principal abordagem, permitindo a detecção da Leismania e sua
caracterização em pesquisa. Existe uma ampla diversidade de primers que atendem a
pesquisa e ao diagnóstico comportando metodologias simplificadas de biologia
molecular a metodologias específicas para a pesquisa científica. Sendo assim este
trabalho propõe a descrição dos principais alvos moleculares utilizados no diagnóstico
das Leishmanioses e pesquisa científica, abordando suas principais vantagens. Para
elaboração do presente estudo foram utilizadas as plataformas SciELO, PubMed, Google
Acadêmico, MEDLINE e Lilacs como base de dados científicos. Foram selecionados
artigos e dissertações redigidos nos idiomas inglês, português e espanhol publicados nos
períodos de 2010 a 2020. A partir desta revisão, é possível constatar que a biologia
molecular auxilia no desenvolvimento de novas metodologias para pesquisa e
diagnóstico, com tempo de execução reduzido e possibilidade de execução de várias
amostras por vez além de, possibilitar a caracterização sem a dependência de outra
técnica.

Palavras-chave: Leishmaniose Tegumentar Americana. Diagnóstico. PCR. Alvos


Moleculares.

98
1. INTRODUÇÃO

As Leishmanioses são doenças infecto-parasitárias classificadas como


antropozoonoses causada pelo protozoário do gênero Leishmania que acometem o
homem, animais silvestres e domésticos, sendo o cão um dos principais reservatórios
(BRASIL, 2017; LAINSON, 1985).
O parasito Leishmania divide se em dois subgêneros principais: Leishmania (L) e
Viannia (V), e o parasita apresenta duas formas evolutivas: a forma promastigota, sendo
essa flagelada e extracelular, e a forma amastigota sendo intracelular e sem movimento,
vivendo alternadamente entre os hospedeiros vertebrados e insetos vetores,
conhecidos como flebotomíneos sendo estes responsáveis pela sua transmissão
(BRASIL, 2017; COURA, 2013; GONTIJO & CARVALHO, 2003; REY, 2008).
As fêmeas dos flebotomíneos se infectam ao picar um hospedeiro infectado com
a forma amastigota. As amastigotas se diferenciam em promastigotas no tubo digestivo
do flebotomíneo, que se multiplicam migrando para as glândulas salivares do inseto. Ao
realizarem um novo repasto sanguíneo em hospedeiros vertebrados, são injetadas as
formas promastigotas junto com a saliva, que são fagocitadas pelos macrófagos e assim
retomam a sua forma amastigota, onde se multiplicam a ponto de romper a célula
hospedeira, sendo fagocitadas novamente por macrófagos. Então o inseto vetor
realizará um novo repasto sanguíneo nesse indivíduo infectado, completando assim o
ciclo evolutivo e favorecendo a sua propagação (BASANO & CAMARGO, 2004; GONTIJO
& CARVALHO, 2003; REY, 2008).
Existem duas principais apresentações clínicas: a Leishmaniose Tegumentar (LT)
nas Américas é conhecida como Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA), e a
Leishmaniose Visceral (LV) (Figura 2), com diferentes formas clínicas que se diferem de
acordo com a espécie envolvida (BRASIL, 2017). Ainda assim a LTA pode apresentar
diferentes padrões, sendo estas cutâneas localizadas, cutânea difusa, cutânea
disseminada e mucocutânea (BRASIL, 2017; MORAES, 2015).
A Leishmaniose é descrita em 88 países e são amplamente distribuída em todas
as regiões brasileiras com predominância nas regiões norte e nordeste. Em 2019 foram
confirmados 18.962 casos de LTA e LV de acordo com os dados disponíveis no DATASUS.

99
A Leishmaniose apresenta caráter ocupacional, sendo prevalente em homens com
transmissão domiciliar e/ou peridomiciliar (BRASIL, 2017; DATASUS, 2019; OMS, 2014).
No Brasil o tratamento é realizado utilizando o antimoniato pentavalente (Sb5+)
disponível sob a formulação de N-metilglucamina e administrado em miligramas por
quilograma de acordo com o peso corporal do paciente por dia (mg Sb5/Kg/dia). Por
produzir efeitos adversos bem significantes devido a sua composição química em alguns
casos onde não se obtém uma boa resposta ou seu uso seja impossibilitado deve ser
recorrido um esquema terapêutico com um fármaco alternativo geralmente utilizados
a anfontericina e a pentamidina porém ambos os fármacos apresentam reações
adversas frequentes tais como complicações renais, alterações cardíacas,
nefrotoxidade, hipoglicemia e diabetes mellitus (AGUIAR & RODRIGUES, 2017; BRASIL,
2017, GONTIJO & CARVALHO, 2003; SAMPAIO, 2013 FIOCRUZ, 1997).
As técnicas utilizadas para o diagnóstico são fundamentadas em exames clínicos,
testes parasitológicos, moleculares e imunológicos. O exame clínico é baseado nos
aspectos da lesão e nos sintomas apresentados pelo paciente, geralmente uma lesão
característica da patologia apresenta borda bem definida com aspecto granuloso sendo
confrontado com os aspectos epidemiológicos e o diagnóstico diferencial da lesão
(SCHUBACH et al., 2001; SKRABA et al., 2014).
O isolamento em cultura é feito com o material da biópsia inoculado em meio de
cultura NNN bifásico, utilizando Schneider suplementado com soro fetal bovino e,
antibióticos (penicilina e estreptomicina), acompanhadas diariamente. Na cultura é
possível observar formas infectantes ao vertebrado, a promastigota, sendo este método
o padrão de referência diagnóstica, contudo o tempo de execução pode chegar até
quatro semanas, além da possibilidade de contaminação por fungos (BRASIL, 2017;
GONTIJO & CARVALHO, 2003).
Na pesquisa direta das formas amastigotas utilizam-se os procedimentos de
escarificação da borda da lesão, ou impressão do fragmento de biópsia em lâmina nos
casos de LTA e, então observado em um microscópio óptico (BRASIL, 2017). No exame
histopatológico o material da biópsia é armazenado em formol e posteriormente corado
com hematoxilina-eosina, para análise baseada na presença do parasito no tecido.
Existem também testes sorológicos tais como, o ELISA e imunofluorescência indireta
(IFI) que avaliam a reação de anticorpos presentes no soro do paciente com antígeno de

100
Leishmania visualizados por espectrofotometria (BRASIL, 2017; MINISTÉRIO DA SAÚDE,
2000).
Os ensaios baseados em PCR (Reação em cadeia da polimerase) constituem
atualmente a principal abordagem no diagnóstico molecular permitindo a detecção da
Leismania e sua caracterização em pesquisa. A técnica se baseia na amplificação de
determinada sequência de DNA através da enzima Taq DNA polimerase que sintetiza
seletivamente milhões de cópias. Para que a reação de PCR ocorra além do DNA das
amostras a serem analisadas são acrescentados os dNTP’s (desoxirribonucleotídeos
fosfatados) junto com o par de iniciadores e a enzima Taq DNA polimerase. Ainda são
adicionados o cloreto de magnésio (MgCl2) e o cloreto de potássio (KCl) que permitem
as condições necessárias para o funcionamento da enzima taq-polimerase. Esse mix de
reagentes é diluído em um tubo com a água ultrapura, e em seguida é colocado no
termociclador que regula as temperaturas adequadas para cada etapa da PCR (MULLIS,
1990; NOVAIS & PIRES-ALVES, 2004; SANTOS et al., 2014).
A PCR é dividida em três etapas: na primeira etapa a sequência de DNA é
desnaturada por um aquecimento de aproximadamente 95º C, em seguida a
temperatura diminui e se inicia a etapa de anelamento dos primers que se ligam as
regiões específicas e por último ocorre a adição das bases nitrogenadas através da
enzima Taq-polimerase, e esse processo ocorre na temperatura de 72ºC. O ciclo inteiro
se repede com o resultado da primeira reação gerando novas cópias do DNA (SANTOS
et al., 2014). No caso da cPCR (PCR Convencional), os resultados da amplificação são
revelados por eletroforese em gel e posteriormente visualizados por um equipamento
que emite luz ultravioleta (NOVAIS & PIRES-ALVES, 2004; SANTOS et al., 2014).
Com o avanço da tecnologia foram desenvolvidas diferentes variações baseadas
nos ensaios de PCR. A PCR em tempo real (qPCR) surgiu como uma metodologia
inovadora permitindo a visualização direta dos resultados durante a amplificação de
forma mais rápida e mais sensível em relação a PCR convencional, podendo até detectar
DNA em amostras com baixa carga parasitária (CABRAL, 2007; BRASIL, 2017; GONTIJO &
MELO, 2004).
As etapas da reação são baseadas no mesmo princípio do método convencional
o que difere é justamente a obtenção dos resultados, que são revelados através do
termociclador acoplado com um sistema que permite a detecção e quantificação da

101
fluorescência proveniente da amostra, após a extração do DNA, gerando curvas de
amplificação. Além de um computador com um software especifico para análise final,
dispensando assim o uso da eletroforese (AGNE et al., 2009; ARYA et al., 2005; NOVAIS
& PIRES-ALVES, 2004).
A qPCR garante menor risco de contaminação em comparação com outras
técnicas como o isolamento em cultura, na qual a sensibilidade acaba sendo afetada
pela frequente contaminação por bactérias e fungos, tanto pela manipulação, como da
própria microbiota proveniente da pele nas amostras de biópsia (MORAIS, 2015;
SANTOS, 2019).
Além da pequena quantidade necessária de material biológico, outro ponto
importante da PCR é a diferenciação dos agentes infecciosos, que pode ser feita pela
análise de polimorfismo dos alvos através da técnica do polimorfismo de comprimento
de fragmento (RFLP) (BHATTARAI et al., 2009). Os alvos são importantes pelas suas
sensibilidade e especificidade, características do ensaio que são intrínsecas a escolha
dos iniciadores, que podem resultar em falso positivo ou falso negativo (DENIAU et al.,
2003).
O Laboratório de Pesquisa Clínica e Vigilância em Leishmaniose (LaPClinVigiLeish)
utiliza na sua rotina diagnóstica o mecanismo da PCR baseado na amplificação de uma
região conservada dos maxi e mini círculos do cinetoplasto do parasito (KDNA) de 120
pares de base (PB), conhecida como KDNA PCR (FAGUNDES, 2010) sendo capaz de
evidenciar a presença do parasito na amostra de pacientes sem o amparo do cultivo in
vitro (BASANO & CAMARGO, 2004; BRASIL, 2017; MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2000).
A GP63 é uma glicoproteína encontrada na membrana das duas formas
evolutivas de diferentes espécies de Leishmania, e estão ligadas principalmente no grau
de virulência do parasito e no reconhecimento dos receptores de macrófagos. Além de
conferir proteção ao parasito contra enzimas citolíticas, este alvo molecular e suas
subpopulações (MSP) proporcionam a identificação da Leishmania sendo capaz de
discriminar as espécies do subgênero Viannia (SANTOS 2019; SILVA, 2010).
Outro alvo molecular disponível é a subunidade do rNA ribossomal (SSU-rNA)
que possui múltiplas cópias com uma alta conservação, presente em todas as espécies,
o que confere maior sensibilidade na detecção da Leishmania descartando assim casos
de falsos negativos. Como SSU-rNA possui regiões muito conservadas, ocorre uma

102
dificuldade frente a relações de filogenias principalmente as espécies do subgênero L.
(Vianna), sendo estas necessária à realização de sequenciamento como complemento
(SILVA, 2010; WINTER, 2010). A região dos espaçadores internos transcritos (ITS1 e ITS2)
é um alvo mais comum na identificação de espécies do Velho mundo como Europa e
Ásia. Com o auxílio de enzima de restrição é possível diferenciar algumas espécies que
circulam nas Américas, não sendo possível a diferenciação completa do subgênero
Viannia (SANTOS, 2019).
Muitos estudos mostram a eficácia da utilização de proteínas de choque térmico
como alvo molecular na caracterização específica de Leishmania. A HSP70 possui em
torno de 10 a 15 cópias podendo variar de uma espécie para outra. Graça e
colaboradores (2012) ainda descreveram quatro primers iniciadores ao longo do gene
HSP70, com sensibilidades variantes. Esta proteína está intimamente ligada a síntese de
proteínas, no controle de diferenciação entre as formas evolutivas, e desempenha um
papel fundamental na proteção do parasito contra fatores tóxicos, prevenindo sua
apoptose (GRAÇA et al., 2012; MONTALVO et al., 2017; SANTOS, 2019).
Com a ampla diversidade das técnicas e alvos moleculares disponíveis na biologia
molecular este trabalho propõe a descrição dos principais alvos moleculares utilizados
no diagnóstico das Leishmanioses e pesquisa científica, abordando suas principais
vantagens e finalidades aos seus propósitos.

2. METODOLOGIA

O estudo consiste em busca bibliográfica, não fazendo uso de amostras de


humanos ou animais, portanto, não foi necessário o aval de um Comitê de ética em
pesquisa (CEP). A elaboração desta revisão visou buscar na literatura ferramentas
moleculares usadas no diagnóstico de leishmaniose tegumentar empregando as
plataformas SciELO, PubMed, Google Acadêmico, MEDLINE e Lilacs como base de dados
científicos. Na busca pelos materiais disponíveis na literatura através das plataformas
utilizadas foram empregados os descritores Leishmaniose Tegumentar Americana,
diagnóstico molecular e alvos moleculares juntamente com o operador AND. Foram
previamente selecionados artigos, dissertações e teses redigidos nos idiomas inglês,
português e espanhol publicados nos períodos de 2010 a 2020 a partir da análise dos

103
títulos e concordância com os descritores empregados. Em seguida foi realizada a leitura
completa dos textos e então selecionados aqueles em que a abordagem realmente se
relacionou ao diagnóstico molecular da LTA e os diferentes tipos de alvos moleculares
utilizados, sendo esse o principal critério de inclusão.
A estratégia de exclusão levou em consideração o período de publicação (2010 a
2020) e aqueles estudos que de certa forma não atendiam a temática. Ao final da análise
de dados foram utilizados 8 artigos em língua portuguesa e 10 em língua estrangeira
(inglês e espanhol). Entre os materiais selecionados para a composição utilizou-se
também 4 dissertações em português. As informações para a composição da revisão
foram obtidas primeiramente por uma pré-leitura seguida de uma leitura seletiva com
o intuito de analisar as informações fundamentais onde foram incluídas em um
apontamento contendo os dados importantes para a elaboração da revisão.

3. RESULTADOS

Com o avanço das tecnologias nas metodologias moleculares muitas pesquisas


têm utilizado como foco o desenvolvimento de ferramentas mais sensíveis objetivando
a rapidez no diagnóstico das leishmanioses. De acordo com os estudos disponíveis na
literatura os ensaios de PCR convencional e PCR em tempo real geralmente associada
com enzimas de restrição são as principais abordagens diagnósticas para as
leishmanioses dentro do campo da biologia molecular (GOES, 2019; SANTOS, 2019).
Tanto a sensibilidade quanto especificidade da reação de PCR variam de acordo
com o alvo molecular utilizado e a espécie envolvida. Dentre os alvos mais utilizados na
identificação de Leishmania através da PCR, o DNA presente nos minicírculos do
cinetoplasto do parasito, conhecido como kDNA, se destaca por estar presente em
maior parte, possuindo em sua composição 500 a 2.500 pares de bases com
aproximadamente 10.000 a 20.000 cópias permitindo uma maior sensibilidade, porém
quando se trata de caracterização este alvo não
é bem aplicável (CABRAL, 2007; GONTIJO & MELO, 2004; NUNES et al., 2007).
Procurando avaliar o desempenho da PCR na identificação e na caracterização
de Leishmania, os protocolos de cPCR-kDNA utilizados nos em três dos estudos
analisados, demostraram alta sensibilidade de detecção do DNA de Leishmania com o

104
alvo kDNA sendo capaz de caracterizar as espécies L. (L.) infantum chagasi e L. (V)
braziliensis. Esse alvo mostrou algumas limitações em caracterização espécie-específica
não sendo possível caracterizar todas as espécies (COSTA, 2014; MARTINS, et al., 2010;
SATOW, et al., 2013).
Muitos estudos vêm propondo a utilização do protocolo HSP70PCR tanto na
detecção de Leishmania como a sua caracterização. GRAÇA, et al., (2012) desenhou
quatro primers iniciadores no gene HSP70 (A, B, C e D), ao qual a região C de 234 pares
de base apresentou maior desempenho em relação aos demais. Utilizando o alvo
HSP70c junto a PCR convencional seguido de enzimas de restrição (HSP70c PCR RFLP)
foi possível caracterizar espécies de Leishmania dos subgêneros Viannia e Leishmania.
Seguindo essa mesmo raciocínio MONTALVO, et al., (2016); MONTALVO, et al., (2017) e
SANTOS, (2019), utilizaram os protocolos de cPCR-HSP70 mostrando ainda um ótimo
desempenho em caracterização espécie-específica, identificando as espécies L.
panamensis, L. braziliensis, L. infantum e L. guyanensis.
Dos alvos disponíveis a região IGS rRNA parece possuir um bom potencial para
ser utilizado com alvo molecular e consiste em um dos alvos mais analisados
destacando-se o SSU-Rrna para caraterização e o ITS muito evidenciado pelo seu poder
discriminatório principalmente nas espécies do complexo L. mexicana, L. guyanensis e
L. braziliensis (GOES, 2019). Dois estudos utilizaram os ensaios baseados em cPCR-ITS
que mostraram alta sensibilidade para identificação dos gêneros sendo capaz de
discriminar o complexo donovani e complexo brasiliensis, mas assim com o kDNA, esse
alvo apresento limitações em caracterização espécie-específica (MOUTTAKI, et al., 2014;
SILVA, et al., 2017).
Além da eficácia em detectar DNA de Leishmania, a PCR tem sido largamente
utilizada na caracterização por meio de ensaios utilizando alvos específicos para a
espécie ou por meio da análise de RFLP (Polimorfismo do comprimento do fragmento
de restrição). A técnica de RFLP utiliza enzimas de restrição que digerem o produto
amplificado por PCR onde é possível analisar e distinguir as diferentes espécies
existentes de Leishmania bem como as suas variações genéticas (GOES, et al., 2019;
MONTALVO et al., 2012; SANTOS, et al., 2019).
Os estudos conduzidos por SANTOS, et al., (2019) e BONI, et al., (2017)
evidenciaram a eficácia dos protocolos qPCR-kDNA/HSP70 seguido de RLFP em

105
confirmar o gênero Viannia e caracterizar a espécie L. brasiliensis. O ensaio com qPCR-
kDNA/HSP70 apresentou em ambos os estudos alta sendibilidade de detecção do DNA
de Leishmania. SANTOS, et al., (2019) ainda permitiu a quantificação de DNA de
diferentes profundidades da lesão.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho comprovou a utilidade dos métodos moleculares no


diagnóstico de leishmaniose Tegumentar Americana, consistindo em uma metodologia
mais sensível e com maior rapidez em sua execução. Foi possível observar que os ensaios
de PCR também foram muito eficazes em diferentes tipos de amostra, permitindo uma
coleta menos agressiva, e como menos risco de contaminação com os ensaios de qPCR
por exemplo, onde os resultados podem ser analisados diretamente do equipamento
permitindo ainda sua quantificação. Como evidenciado na maioria dos artigos
analisados, a associação da PCR com a técnica RFLP compreendeu em uma metodologia
precisa para caracterização mostrando concordância com a eletroforese de izoenzimas,
técnica considerada padrão ouro na caracterização, resultando em uma boa alternativa
diante das limitações dos métodos convencionais.
Diante dos diferentes alvos moleculares, o kDNA demostrou maior percentual de
sensibilidade para o gênero leishmania, mas em relação a caracterização este alvo
apresentou algumas limitações não sendo possível a diferenciação de todas as espécies.
Já os alvos ITS e HSP70 mostraram um grande desempenho em caracterização espécie-
específica. Os alvos G6pd e SSU rRNA obtiveram um maior êxito na quantificação de
carga parasitária.
As desvantagens das técnicas que envolvem a biologia molecular são o custo
elevado para sua implantação e por serem técnicas com alta sensibilidade demanda de
um treinamento específico, por isso tem sido mais utilizada para pesquisas e estudos
epidemiológicos do que em rotina laboratorial, além de uma estrutura física própria
para sua execução. Ainda assim as ferramentas moleculares proporcionam grande
vantagem tanto no diagnóstico como para caracterização espécie-específica podendo
ser bastante útil principalmente na avaliação de padrões epidemiológicos importantes
para o controle da leishmaniose.

106
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110
CAPÍTULO IX

ESTUDO COMPARATIVO DE PROTOCOLOS DE EXTRAÇÃO DE DNA EMPREGADOS


NA DETECÇÃO DE TRYPANOSOMA CRUZI EM DOIS AMBIENTES: LABORATÓRIO
DE ENSINO E DE PESQUISA
Thais Cordeiro da Silva¹
Dário Eluan Kalume ²
Fernanda de Oliveira Bottino ³
Tainah Silva Galdino 4

¹ Técnica em Análises Clínicas pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio - Fiocruz
² Pesquisador do Laboratório Interdisciplinar de Pesquisas Médicas (LIPMED) do Instituto Oswaldo Cruz - Fiocruz
³ Professora-Pesquisadora do Laboratório de Educação Profissional em Técnicas Laboratoriais em Saúde (LATEC) da
Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio - Fiocruz
4 Professora-Pesquisadora do Laboratório de Educação Profissional em Técnicas Laboratoriais em Saúde (LATEC) da

Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio - Fiocruz

RESUMO

Segundo a OMS a doença de Chagas é considerada uma enfermidade negligenciada


geralmente veiculada a pobreza. Seu agente etiológico é o Trypanosoma cruzi e sua
detecção em indivíduos acometidos pode ser por meio de métodos parasitológicos,
sorológicos e moleculares. Esse trabalho objetivou avaliar diferentes metodologias de
extração de DNA, usando o T. cruzi como modelo biológico na fase epimastigota em dois
ambientes distintos: laboratório de ensino de uma Escola Federal de Ensino Médio
Integrado ao Técnico e laboratório de pesquisa. Foram cultivadas células no estágio
epimastigota de cepas de CL-Brener em uma estufa B.O.D. a 28°C usando o meio de
cultura BHI (Brain Heart Infusion) suplementado com 10% de soro fetal bovino. Os
protocolos de extração foram baseados nas metodologias in house, DNAzol® (Thermo
Fisher Scientific) e Trizol®. O DNA extraído foi quantificado através do espectrofotômetro
NanoDrop®e visualizado em gel de agarose. A viabilidade das moléculas extraídas foi
averiguada a partir da amplificação dos DNA extraídos pela técnica de PCR com os
iniciadores da cisteíno-peptidase. Os produtos foram analisados por meio de gel de
agarose 1,5% e de poliacrilamida 10,5%. Os resultados obtidos mostram que apesar do
laboratório de ensino não conter as especificações destinadas à realização de técnicas
de Biologia Molecular, mostrou-se apto à realização de tais procedimentos voltados
para a capacitação profissional, bem como para o estímulo à pesquisa.

Palavras-chave: Trypanosoma cruzi. Extração de DNA. Doença de Chagas.

111
1. INTRODUÇÃO

No ano de 1909, em Lassance, Carlos Chagas descreveu o protozoário flagelado


pertencente à família Trypanosomatidae, de ordem Kinoplastidae, de gênero
Trypanosoma denominado Trypanosoma cruzi, conhecido como o agente etiológico da
doença de Chagas Além disso, foi descrito o inseto vetor hematófago (triatomíneo) da
família Reduviidae, o qual possui quatro espécies relevantes no ciclo de transmissão:
Triatoma infestans, Rhodnius prolixus, Panstrongylus megistus e Triatoma dimidiata
(Chagas, 1909; González, 2010).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o mal de Chagas acomete cerca
de 6 a 7 milhões de pessoas no mundo e é considerada uma enfermidade negligenciada
geralmente veiculada a pobreza (WHO, 2015). No entanto, há um crescimento de casos
em países não endêmicos devido ao deslocamento de indivíduos infectados por meio
das migrações internacionais (Requena-Mendez et al., 2015; Dias, 2016).
O ciclo biológico do T. cruzi é caracterizado como complexo, do tipo heteróxeno,
com uma fase de multiplicação intracelular no hospedeiro vertebrado mamífero e
extracelular no inseto vetor, tendo como principal característica as modificações
morfológicas em diferentes estágios: amastigotas, epimastigotas, tripomastigotas
sanguíneas e tripomastigotas metacíclicas (Nagajyothi et al., 2012).
Geralmente, a infecção é associada à via vetorial, no entanto, como mecanismos
de transmissão, citam-se: transfusões sanguíneas, via transplacentária, transplante de
órgãos e, em especial, a transmissão oral. Esta última mostrou-se de grande relevância
médica após a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) ter declarado a interrupção
da transmissão através da via vetorial na região amazônica (Yoshida, 2009; Toso et al.,
2011).
A detecção de T. cruzi em indivíduos acometidos pela doença de Chagas pode
ser realizada por meio de métodos parasitológicos (identificação direta por microscopia
ou indireta por xenodiagnóstico e hemocultura); métodos sorológicos (identificação dos
anticorpos IgG anti-T.cruzi ou antígenos); e metodologias moleculares (detecção do DNA
do patógeno) (Barreto-de-Albuquerque, 2015).
Devido à infecção do T. cruzi possuir distintos níveis de parasitemia (fase aguda
e crônica), as metodologias de diagnóstico devem ser coerentes quanto ao nível de

112
sensibilidade da infecção presente no hospedeiro. A utilização de metodologias
moleculares, tais como a PCR (Reação da Polimerase em Cadeia) e o sequenciamento de
DNA (Ácido Desoxirribonucleico) são empregadas na detecção deste parasita, visto que
permitem a identificação do DNA em ambas as fases da infecção chagásica (Avila et al,
1993; Moser et al, 1989).
Diante disso, este estudo teve como objetivo avaliar diferentes metodologias de
extração de DNA, usando o T. cruzi como modelo biológico na fase epimastigota em dois
ambientes distintos: laboratório de ensino de uma Escola Federal de Ensino Médio
Integrado ao Técnico e laboratório de pesquisa. Foi desenvolvida uma análise
comparativa entre as práticas de extração de DNA (DNAzol®, Trizol® e um método in
house baseado no artigo de Rotureau e colaboradores (2005)) a fim de verificarmos a
qualidade das técnicas desenvolvidas nestes dois ambientes distintos (Rotureau et al.,
2005). Para isto, a metodologia de escolha foi à extração de DNA, uma vez que a pureza
deste implica no sucesso das demais práticas na área da Biologia Molecular.

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1. Cultivo de células

Foram cultivadas células no estágio epimastigota de cepas CL-Brener,


proveniente da coleção de Protozoários do Instituto Oswaldo Cruz (COLPROT). As células
foram crescidas em uma estufa B.O.D. a 28°C usando meio de cultura BHI (Brain Heart
Infusion) suplementado com 10% de soro fetal bovino (Cultilab, Campinas, SP, Brasil).
O crescimento das células de T. cruzi foi analisado por meio de contagem na
câmara de Neubauer e acompanhado por análise microscópica (microscopia óptica). No
meio da fase logarítmica de cultivo, 107 células foram obtidas por centrifugação da
cultura a 800 g durante 15 minutos, lavadas três vezes com PBS 1X (tampão fosfato-
salino).

2.2. Extração de DNA - Método in house

A metodologia utilizada foi baseada no artigo de Rotureau e colaboradores


(2005) em triplicata experimental, na qual teve início a partir da obtenção de massa
celular de T. cruzi, sendo a mesma de aproximadamente 107 células/ mL (Rotureau et

113
al., 2005). Foi adicionado 200 µL de solução tampão de lise celular com incubação de 30
minutos a 65°C sob agitação de 1000 rpm.
Posteriormente foi adicionado 2 volumes (400 µL) de etanol absoluto (100%)
(SigmaAldrich®, EUA) à amostra. Após homogeneização, foi centrifugada durante
15minutos, a 4°C e 14000 rpm, com descarte do sobrenadante. O pellet foi seco a 65°C
por 15 minutos e foi adicionado 200 µL de tampão de ressuspensão.

2.3. Extração de DNA - Método DNAzol® (Thermo Fisher


Scientific)
Essa metodologia foi realizada em triplicata experimental. Após a obtenção da
massa celular de T. cruzi (cerca de 107 células/mL) foi iniciado o processo de lise celular
no qual consistiu na adição de 1mL da solução de DNAzol® seguida de homogeneização
por meio da inversão do tubo.
Posteriormente, o DNA foi precipitado em 500 µL de etanol absoluto (100%)
(SigmaAldrich®, EUA) para cada 1mL de DNAzol®. Após a inversão do tubo, cerca de 10
vezes, as amostras foram incubadas por 3 minutos em temperatura ambiente (T.A:
25°C). A partir disso, pôde-se observar a formação de uma “nuvem” na qual constituiu
o DNA precipitado.
Foi realizada a lavagem do DNA duas vezes consecutivas, de forma homogênea,
por inversão do tubo cerca de 10 vezes, utilizando 1 mL de etanol a 75% (v/v). Após uma
incubação de 5 minutos em agitação (1000 rpm) a T.A, o etanol a 75% foi removido
cuidadosamente. Por fim, foi feito o processo de solubilização do DNA, por meio da
ressuspensão do DNA entre 100 - 300µL de NaOH 8mM, de acordo com pellet formado,
para então armazenamento a -20°C.

2.4. Extração de DNA - Método Trizol®

Todas as amostras foram feitas em triplicata experimental. Após obtenção da


massa celular de T. cruzi (cerca de 107 células/mL) foram realizadas duas lavagens com
PBS 1X antes da adição de 1 mL do reagente Trizol® (Thermo Fisher Scientific). Na etapa
de lise celular, foi adicionado 200 µL de clorofórmio (Sigma-Aldrich®, EUA) com
incubação de 3 minutos e posterior centrifugação por 15 minutos a 4°C e 12000g.

114
Centrifugada a amostra, observaram-se três fases da solução: a primeira, aquosa
(incolor), contendo o RNA; a interfase branca e leitosa contendo principalmente DNA e
a fase inferior rósea contendo proteínas. A fase aquosa (fase superior) foi transferida
para outro tubo limpo para posterior extração de RNA. À fase orgânica (rosa), referente
à fase do nosso interesse, foram adicionados 300 µL de etanol absoluto (100%) (Sigma-
Aldrich®, EUA), com posterior homogeneização por inversão do tubo. As amostras foram
incubadas durante 3 minutos em T.A e centrifugadas durante 5 minutos a 4°C e 2000g.
O sobrenadante foi descartado após a centrifugação. Posteriormente, foi realizada a
fase de lavagem do DNA (pellet), na qual foi feita com 1 mL de solução de citrato de
sódio e etanol (0,1 m de citrato de sódio em 10% de etanol, pH 8,5), com posterior
incubação de 30 minutos a T.A. Passado o período de incubação, as amostras foram
centrifugadas durante 5 minutos a 4°C com velocidade de 2000g com subsequente
remoção do sobrenadante. Uma nova etapa de lavagem do DNA com solução de citrato
de sódio e etanol (0,1 m de citrato de sódio em 10% de etanol, pH 8,5) foi realizada
conforme supracitado.
Logo depois, foi adicionado 1,5 mL de etanol 75%, homogeneizado por inversão
e incubação durante 15 minutos a T.A, seguido de centrifugação por 5 minutos a 4°C sob
velocidade de 2000 g. O sobrenadante foi descartado e o pellet foi ressuspendido com
volume variando de 300-600 µL de NaOH 8mM (até que todo o material tenha sido
homogeneizado), homogeneizado e centrifugado por 10 minutos a 4°C de velocidade de
12000 g. Finalmente, o sobrenadante foi armazenado a - 20°C.

2.5. Adaptações dos protocolos de Extração de DNA

Algumas alterações foram necessárias para a realização do procedimento


metodológico no laboratório de ensino, a fim de substituir equipamentos inexistentes
no mesmo. Sendo assim, durante a extração de DNA na metodologia in house a
incubação foi realizada sem agitação em Banho-Maria e a centrifugação foi feita à
temperatura ambiente.
Já nas extrações realizadas pelo método de DNAzol® (Thermo Fisher Scientific),
durante o procedimento da etapa de lavagem do DNA, não houve agitação uma vez
que a instituição não possui agitador.
Nas extrações realizadas pelo método de Trizol®, a centrifugação refrigerada não

115
pôde ser realizada uma vez que instituição não possui centrífuga que permite tal
prática. Nesse caso, as amostras foram centrifugadas em T.A. Além disso, a prática de
extração de Trizol deve ser executada no interior de uma capela de exaustão e, nesse
caso, houve uma modificação no protocolo, uma vez que a capela disponível para uso
na instituição não possui luz ultravioleta (UV) e funciona como armazenamento de
reagentes de técnicas histológicas, fato de grande relevância quanto à uma possível
contaminação.

2.6. Quantificação por Nanodrop®

A quantificação das amostras de DNA extraídas foi realizada em um


espectrofotômetro NanoDrop®. Inicialmente foi feita toda higienização do instrumento,
adicionando 1,5µL de H2O. O tampão de ressuspensão de cada metodologia foi usado
como branco: in house foi adicionado 1,5µL de H2O; Trizol® e DNAzol® foram adicionados
1,5µL de NaOH 8mM. Após esse procedimento foi realizado leitura de cada amostra de
DNA (1,5µL), sendo que, aquelas que apresentaram partículas em meio ao
sobrenadante, foram centrifugadas previamente.

2.7. Eletroforese das amostras de DNA

O tampão de preparo do gel e de corrida foi o TBE (Tris Borato EDTA) 0,5X. Os
géis foram corados com GelRed® 3X e posteriormente visualizados sob luz UV, e assim,
fotografados.

2.8. Reação em Cadeia da Polimerase (PCR)

Para a realização da PCR, foi adicionado 1µL de dNTP (10mM), 2 µL de Mg +2


(50mM), 5µL de Buffer (10X), 37,8µL de H2O e 0,2µL de Taq recombinant (Invitrogen®).
Os iniciadores uasados (primers) foram desenhados para a região do gene da cisteíno-
peptidase - 1µL de cada iniciador (10mM) no preparo do mix da reação. As sequências
dos iniciadores desenhadas foram as seguintes: Forward:
5’GTGCGACAAAACGGACTCTG3’ e Reverse: 5’CGACGCATAAGGGTAGCTGT3’. Ao final do
preparo do mix da reação de PCR, foi acrescentado 2 µL de DNA. A amplificação foi feita
obedendo ao perfil térmico de 96°C por 10 min, seguidos por 35 ciclos das seguintes
condições: 96°C por 30 seg, 58°C durante 45 seg e 72°C durante 45 seg., finalizando com
uma extensão térmica de 72°C durante 10 min.

116
2.9. Gel de agarose

Os produtos amplicados (amplicons) foram analisados em gel de agarose a 1,5%


usando tampão TBE 0,5X. Após a corrida, os géis foram mantidos durante 10 minutos na
solução de GelRed®. Posteriormente foram colocados sobre um transiluminador de luz
UV para a visualização e fotografia dos fragmentos.

2.10. Gel de poliacrilamida

Os amplicons foram aplicados em gel de poliacrilamida 10,5%, contendo 3,5 mL


de bis - acrilamida 30%, 1mL de TBE 10 X, 1,5mL de Glicerol 100%, 3,6 mL de H 2O, 400
µL de APS 1,6% (Persulfato de Amônia) e 3,5µL de TEMED. Para visualização foram
mantidos durante 10 minutos no GelRed® e foram colocados sobre um transiluminador
de luz UV para a visualização e fotografia dos fragmentos.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Quantificação por Nanodrop® do DNA extraído

Após a extração de DNA em ambos ambientes por meio das metodologias


selecionadas, foi realizada a quantificação e análise do material através do grau de
pureza pelo uso do espectrofotômetro NanoDrop®. A relação de absorbância
A260/A280 foi utilizada com intuito de verificar se no DNA extraído houve contaminação
por proteínas ou reagentes químicos. O valor referencial de um DNA puro apresenta
valores de DO260/DO280 (densidade óptica) de 1,8 a 2,0. Onde razões inferiores a 1,8
indicam possível contaminação por proteínas e razões maiores que 2,0 indicam possível
contaminação por fenóis (Nicklas & Buel, 2003) (Tabela 1).

117
Tabela 1 - Quantificação por NanoDrop® do DNA extraído pelas diferentes metodologias nos ambientes
distintos
Laboratório de Ensino Laboratório de Pesquisa
Metodologias Amostra ng/µL 260/280 Amostra ng/µL 260/280
1 98,3 1,58 1 73,7 1,86
Trizol® 2 74,0 1,54 2 124,4 1,94
3 96,7 1,32 3 1087,8 1,88
1 351,5 1,97 1 554,2 1,80
2 308,6 1,98 2 1410,5 1,94
DNAzol®
3 399,4 2,00 3 1316,3 1,84
1 462,9 1,02 1 425,4 1,99
2 315,2 1,94 2 364,0 1,60
In house
3 377,8 1,90 3 212,2 1,66
Fonte: Elaborado pelo autor.

O protocolo de extração de DNA pelo Trizol® feito no laboratório de ensino, nas


triplicatas, apresentou a razão A260/280 menor do que o valor de referência.
Possivelmente essa alteração foi decorrente de contaminação durante a manipulação
dos tubos, visto que o ambiente não dispõe de local propício destinado exclusivamente
para a execução de tal técnica. No entanto, as amostras extraídas no laboratório de
pesquisa apresentaram razão A260/280 dentro do limite imposto pelo valor referencial.
O método de extração pelo DNAzol® nos dois locais apresentaram triplicatas dentro do
limite imposto pelo valor referencial, o que indica que mesmo que haja diferenças entre
os ambientes, o DNA se mostra puro.
O método de extração de DNA in house realizado no laboratório de pesquisa, em
duas das triplicatas, apresentou a razão A260/280 menor do que o valor de referência e
em comparação à extração feita no laboratório de ensino. Possivelmente, essa alteração
foi decorrente de contaminação de proteínas durante a manipulação dos tubos. No
entanto, apesar do ambiente não ser o ambiente específico para práticas relacionadas
à Biologia molecular, a razão das triplicatas de amostras extraídas no laboratório de
ensino apresentaram razão A260/280 dentro do limite imposto ao valor de referencial.

3.2. Análise Qualitativa do DNA extraído por eletroforese

Um gel de agarose foi realizado com o intuito de estabelecer uma padronização


da técnica de eletroforese, bem como identificar o nível de detecção visual através da
variação de 0,4 a 3 µg de concentração de DNA (Figura 1).

118
Figura 1 - Análise de Extração de DNA de T.cruzi na metodologia in house em gel de agarose Lowmelting
1%

Legenda: Análise por eletroforese em gel de agarose 1% (p/v) da extração de DNA de Trypanosoma cruzi,
cepa CL Brener, os quais foram extraídos com a metodologia in house. Poço M - marcador de peso
molecular de 1000 pares de bases (1 kb – DNA Ladder Sinapse Inc). Poço 1 DNA correspondente a 439, 26
ng; Poço 2 a 649,33 ng; Poço 3 a 859, 41 ng; Poço 4 a 1088,58 ng; Poço 5 a 1623,33 ng; Poço 6

correspondente a 2998,40 ng. A seta indica a região das bandas correspondentes ao DNA genômico.

A análise do gel, indicou que, apesar das concentrações 0,46 µg, 0,64 µg, 0,85
µg, 1,0 µg, 1,6 µg terem intensidades visuais próximas, a concentração de 1 µg foi
escolhida em virtude das metodologias usadas nesse trabalho fornecerem diferentes
graus de concentração de DNA.
Após a padronização da técnica, foi realizado um novo gel contendo as extrações
de DNA referente às três metodologias selecionadas , com a mesma concentração (1 µg)
a fim de comparar a qualidade dos fragmentos extraídos (Figura 2).

119
Figura 2 – Análise de Extração de DNA de T.cruzi nas metodologias DNAzol®, Trizol® e in house em gel de
agarose 1 %

Legenda: Análise por eletroforese em gel de agarose 1% (p/v) da extração de DNA de Trypanosoma cruzi,
cepa CL Brener, os quais foram extraídos pelos métodos DNAzol ®, Trizol® e in house. O poço M
corresponde ao marcador de peso molecular de 1000 pares de bases (1 kb – DNA Ladder Sinapse Inc).
Poço 1-3 Extração de DNA in house laboratório de pesquisa; Poço 4-6 Extração de DNA in house no
laboratório de ensino; Poço 7-9 Extração de DNA por DNAzol® no laboratório de ensino; Poço 10-12
Extração de DNA por DNAzol® no laboratório de pesquisa; Poço 13-15 Extração de DNA por Trizol® no
laboratório de pesquisa; Poço 16-18 Extração de DNA por Trizol® no laboratório de ensino. A seta indica
a região das bandas correspondentes ao DNA genômico.

Feita a análise do gel, observamos que as amostras extraídas pelo protocolo in


house, tanto no laboratório de ensino, como no de pesquisa, se mostraram íntegras na
detecção visual, no entanto, os fragmentos de DNA derivados do método de extração
pelo DNAzol® realizados no primeiro ambiente não foram detectados em gel de agarose.
Possivelmente, a concentração não foi suficiente para a detecção por dessa
metodologia.
O protocolo de extração de DNA por Trizol ® demonstrou que as triplicatas
extraídas, em ambos os locais de estudo, apresentaram qualidade inferior. Esse
resultado era esperado uma vez que no laboratório de ensino as amostras foram
manipuladas em ambiente inadequado, ou seja, com o uso de capela de exaustão sem
lâmpada UV e contendo resíduos de materiais de outras práticas.

3.3. Análise Qualitativa da PCR por eletroforese

Em seguida, a amplificação dos fragmentos de DNA genômico foi realizada pela


técnica da PCR para averiguarmos a viabilidade dessas moléculas extraídas por meio de
todas as metodologias (Trizol®, DNAzol® e in house). A síntese foi feita com o iniciador

120
(primer) da cisteíno-peptidase, uma enzima que possui um papel importante no fator de
virulência dos tripanossomatídeos relacionada à interação com as células de mamíferos
na relação parasito-hospedeiro (Mottram et al., 1998). O produto obtido foi um
fragmento de 115pb. A Figura 3 representa o conjunto de DNA extraído pela
metodologia in house e amplificado com os iniciadores da cisteíno-peptidase.

Figura 3 – Análise de Produto de PCR Extração in house em gel de agarose 1,5%

Legenda: Análise de Produto de PCR do gene cisteíno-peptidase por eletroforese em gel de agarose 1,5%
(p/v). As amostras de DNA de Trypanosoma cruzi, da cepa CL Brener, foram obtidas de acordo com o
protocolo da metodologia in house. Poço M - marcador de peso molecular de 100 pb (Thermo Fisher
Scientific); Poço 1-3 amostras de DNAextraídos no laboratório de Pesquisa; Poço 4-6 amostras de DNA
extraídos no Laboratório de Ensino; Poço 7: Controle positivo (não apareceu); Poço 8: Controle negativo.
A seta indica a posição da banda esperada de 115 pb.

Devido a diferença entre as técnicas, realizamos géis de poliacrilamida com o


intuito de verificarmos se os produtos amplificados teriam o mesmo comportamento,
ou seja, se as amostras não detectadas no gel de agarose permaneceriam não
visualizadas no gel de poliacrialamida, uma vez que o mesmo é mais sensível à detecção
dos fragmentos de DNA quando comparado ao gel de agarose (Figura 4).

121
Figura 4 – Análise de Produto de PCR Extração in house em Gel de poliacrilamida 10,5%

Legenda: Análise de Produto de PCR do gene cisteíno-peptidase por eletroforese em gel de


poliacrilamida 10,5% (p/v). DNA de Trypanosoma cruzi, cepa CL Brener, foram extraídos com a
metodologia in house. Poço M- marcador de peso molecular de 100pb (Thermo Fisher Scientific);
Poço 1-3 DNA extraídos no laboratório de pesquisa; Poço 4- Branco Poço 5-7 DNA extraídos no
laboratório de ensino; Poço 8: Controle positivo (não detectado); Poço 9: Controle negativo. A
banda esperada possui 115 pb.

Em vista disso, foi possível observar que o fragmento de uma das triplicatas que
foi extraída no laboratório de pesquisa não apareceu no gel de agarose, porém pôde ser
visualizada no gel de poliacrilamida. Além disso, o rastro presente em uma das amostras
extraídas no laboratório de ensino no gel de agarose, não apareceu no gel de
poliacrilamida, eliminando a ideia de uma possível contaminação ou excesso de DNA
(Figuras 3 e 4).

Posteriormente, a análise da viabilidade da metodologia de extração de DNA por


Trizol® foi realizada a partir da amplificação (PCR) de DNA extraídos com os iniciadores
da cisteíno-peptidase (Figura 5).

122
Figura 5 – Análise de Produto de PCR Extração de DNA por Trizol ® em gel de agarose 1,5%

Legenda: Análise de Produto de PCR do gene cisteíno-peptidase por eletroforese em gel de agarose 1,5%
(p/v). DNA de Trypanosoma cruzi, cepa CL Brener, foram extraídos com a metodologia Trizol®. Poço M -
marcador de peso molecular de 100pb (Thermo Fisher Scientific); Poço 1-3 DNA extraídos no laboratório
de pesquisa; Poço 4-6 DNA extraídos na ESPJV; Poço 7: Controle positivo (não foi detectado); Poço 8:
Controle negativo. A banda esperada possui 115 pb.

Ao passo que foi realizado o gel de poliacrilamida, observou-se que o fragmento


de uma das triplicatas que foi extraída no laboratório de pesquisa não foi detectado no
gel de agarose, porém no gel de poliacrilamida se mostrou amplificado. Além disso,
pôde-se observar que todas as outras amostras foram corretamente amplificadas,
incluindo o controle positivo, fato esse que comprova que as amostras estão viáveis para
posteriores análises (Figuras 5 e 6).

Figura 6 – Análise de Produto de PCR Extração de DNA por Trizol ® em Gel de poliacrilamida 10,5%

Legenda: Análise de Produto de PCR do gene cisteíno-peptidase por eletroforese em gel de poliacrilamida
10,5% (p/v). DNA de Trypanosoma cruzi, cepa CL Brener, foram extraídos com a metodologia Trizol ®. Poço

123
M - marcador de peso molecular de 100pb (Thermo Fisher Scientific); Poço 1-3 DNA extraídos no
laboratório de pesquisa; Poço 4-6 DNA extraídos na ESPJV; Poço 7: Controle positivo; Poço 8: Controle
negativo. A banda esperada possui 115 pb.

Por fim, foi feita a análise da viabilidade dos produtos obtidos por amplificação
com iniciadores da cisteíno-peptidase das amostras extraídas pelo protocolo de
extração de DNA por DNAzol® (Figura 7).

Figura 7 – Análise de Produto de PCR Extração de DNA por DNAzol ® em gel de agarose 1,5%

Legenda: Análise de Produto de PCR do gene cisteíno-peptidase por eletroforese em gel de agarose 1,5%
(p/v). DNA de Trypanosoma cruzi, cepa CL Brener, foram extraídos com a metodologia DNAzol®. Poço Poço
M - marcador de peso molecular de 100pb (Thermo Fisher Scientific); Poço 1-3 DNA extraídos no
laboratório de pesquisa; Poço 4-5 amostra DNA extraídos no laboratório de ensino; Poço 6: Controle
positivo; Poço 7: Controle negativo. A banda esperada possui 115 pb.

A mesma análise foi feita por meio do gel de poliacrilamida, no qual podemos
observar que os produtos amplificados que foram detectados no gel de agarose,
também foram detectados no de poliacrilamida, com exceção do DNA extraído no
laboratório de ensino, na qual não foi aplicada por motivos de não possuir volume
suficiente. Além disso a amostra do poço 4, não foi detectada no gel de agarose, porém
no gel de poliacrilamida foi detectada de forma fraca, enquanto todas as outras
amostras foram amplificadas, o que confirma a viabilidade das amostras em questão
(Figuras 7 e 8).

124
Figura 8 – Análise de Produto de PCR Extração de DNA por DNAzol® em Gel de poliacrilamida 10,5%

Legenda: de Produto de PCR do gene cisteíno-peptidase por eletroforese em gel de poliacrilamida 10,5%
(p/v). DNA de Trypanosoma cruzi, cepa CL Brener, foram extraídos com a metodologia DNAzol®. Poço M -
marcador de peso molecular de 100pb (Thermo Fisher Scientific); Poço 1-3 DNA extraídos no laboratório
de ensino; Poço 4-6 DNA extraídos no laboratório de pesquisa; Poço 7: Controle positivo; Poço 8: Controle
negativo. A banda esperada possui 115 pb.

Com o intuito de fazer uma comparação entre a viabilidade do DNA extraído


pelas distintas técnicas em questão (Trizol ®, DNAzol® e in house), foi realizado um gel
de agarose para tal comprovação (Figura 9).

Figura 9 – Análise de Produto de PCR Extração de DNA por todas as metodologias (Trizol®, DNAzol® e in
house) em Gel de agarose 1,5%

Legenda: Análise da Produto de PCR do gene cisteíno-peptidase por eletroforese em gel de poliacrilamida
10,5% (p/v). DNA de Trypanosoma cruzi, cepa CL Brener, foram extraídos pelos métodos DNAzol®, Trizol®
e in house. Poço M - marcador de peso molecular de 100pb (Thermo Fisher Scientific); Poço 1-3 Extração
de DNA DNAzol® realizada no laboratório de pesquisa; Poço 4-6 Extração de DNA DNAzol® realizada no
laboratório de ensino; Poço 7-9 Extração de DNA por Trizol® realizada no laboratório de ensino; Poço 10-

125
12 Extração de DNA por Trizol® realizada no laboratório de pesquisa; Poço 13-15 Extração de DNA in house
realizada no laboratório de pesquisa; Poço 16-18 Extração de DNA in house realizada no laboratório de
ensino. Poço 19- Controle positivo; Poço 20 – Controle negativo. A banda esperada possui 115 pb.

Feita a análise do gel, podemos observar que houve amplificação, de modo


geral, em todas as extrações em algumas das triplicatas, com exceção do DNAzol e do
Trizol, no laboratório de ensino, por falta de volume e por baixa concentração de DNA.
O fragmento de DNA extraído pelo método in house, no laboratório de pesquisa,
também não foi amplificado por erro de manipulação ou baixa sensibilidade no gel de
agarose. Além disso, o fragmento do poço 13, apesar de não ter sido visualizado no gel
de agarose, foi visualizado com sucesso no gel de poliacrilamida.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos resultados descritos, verificamos que todos os protocolos foram


capazes de extrair o DNA do T. cruzi com qualidade, obedecendo aos parâmetros
impostos para avaliação do grau de pureza (A260/A280) com concentração suficiente
para a realização de técnicas posteriores (eletroforese em géis de agarose e
poliacrilamida e PCR). Apesar do laboratório de ensino não haver área específica
destinada à realização de técnicas de Biologia Molecular, o mesmo mostrou-se apto à
realização de tais procedimentos voltados para a capacitação profissional, bem como
para o estímulo à pesquisa ao aluno.

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CAPÍTULO X

CORYNEBACTERIUM STRIATUM: PATÓGENO MULTIRRESISTENTE NEGLIGENCIADO


PELA DIFÍCIL E INCORRETA IDENTIFICAÇÃO
Giorgio Silva de Santana1,2
Bruna Ribeiro Sued Karam2
Laís Menegoi de Oliveira Fernandes2
Igor Ferreira da Silva2
Cassius de Souza2
Ana Luíza de Mattos Guaraldi1,2
¹ Instituto de Microbiologia Paulo de Góes, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil.
² Laboratório de Difteria e Corinebactérias de Importância Clínica, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil.

RESUMO

Corynebacterium striatum faz parte da microbiota normal da pele humana e tem sido
cada vez mais envolvido em várias doenças nosocomiais, incluindo infecções invasivas
fatais em pacientes imunossuprimidos e imunocompetentes. Entretanto, os casos de
infecções por C. striatum ainda são negligenciados, mesmo quando recuperados em
cultura pura de locais que deveriam ser estéreis, como o sangue. O isolamento de C.
striatum em laboratórios clínicos é difícil, por seu crescimento relativamente lento e
metodologia de identificação complexa, necessitando de uma grande quantidade de
métodos fenotípicos. O aprimoramento de técnicas microbiológicas e o estudo da
sobrevida de pacientes com doença de base e/ou imunossupressão, têm comprovado
que C. striatum é um agente etiológico de infecções nosocomiais, em diferentes níveis
de gravidade. A capacidade de alguns clones C. striatum de produzir biofilme, pode
contribuir para a persistência do patógeno e a disseminação da resistência
antimicrobiana no ambiente hospitalar. Além disso, a antibioticoterapia empírica pode
selecionar cepas multirresistentes e transferir horizontalmente genes intra e
interespécies. Esta revisão objetiva certificar o papel de C. striatum como patógeno
hospitalar multirresistente, cada vez mais associado a infecções graves com tratamentos
antimicrobianos recorrentes em pacientes hospitalizados, imunocompetentes e
imunocomprometidos, com doenças subjacentes.

Palavras-chave: Corynebacterium striatum. infecção. patógeno negligenciado.


resistência antimicrobiana.

1. INTRODUÇÃO

O gênero Corynebacterium, descrito por Lehmann e Neumann (1896), pertence


à classe Actinobacteria, ordem Actinomecetales e família Corynebacteriaceae

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(LEHMANN e NEUMANN, 1896, p. 1907). Corynebacterium spp. são caracterizadas pela
presença de arabinose, galactose, ácido meso-diaminopimélico e cadeias curtas de
ácido micólico na parede celular, são aeróbicas, catalase-positivas, não esporuladas e
imóveis, que podem ser observadas por microscopia de luz como bastonetes Gram-
positivos irregulares (com morfologia celular pleomórfica, apresentando as formas
cocoides, bacilares ou filamentosas), individualizados ou agrupados em pares e/ou em
forma de paliçadas. Algumas espécies podem apresentar ácidos corinomicólicos e
grânulos metacromáticos como reserva de fosfato de alta energia (ex.: Corynebacterium
diphtheriae) (BIBERSTEIN e ZEE, 1994, p. 157-161; FUNKE e BERNARD, 2011, p. 413-442).
Durante muitas décadas, o potencial patogênico das corinebactérias foi
negligenciado, principalmente pela dificuldade na identificação e distinção entre
colonização e infecção, esses motivos levaram a escassez de relatos de infecções por
corinebactérias produtoras de toxina não-diftérica (difteróides - DT) (CAMELLO et al.,
2003; MARTINS et al., 2009). Corinebactérias DT isoladas de cultura pura tem sido
consideradas como patógenos oportunistas, que prevalecem em inúmeras condições
orgânicas, produzindo infecções graves. Entretanto, microbiologistas clínicos
erroneamente, ainda consideram DT como contaminantes de amostras clínicas, dando
importância apenas a C. diphtheriae o agente etiológico da difteria clássica, como a
única espécie patogênica do gênero. A atual valorização de corinobactérias como
agentes etiológicos, está intimamente relacionada a crescente atuação como agente
etiológico em doenças humanas, decorrente do uso de procedimentos invasivos, bem
como condições de pacientes hospitalizados por períodos prolongados, como idade
avançada, doenças neoplásicas, transplante de órgãos, síndrome de imunodeficiência
adquirida (AIDS), diabetes, antibioticoterapia prologada, além de procedimentos como
cateterismo, implantes protéticos e de válvulas cardíacas (MARTINS et al., 2009).
Até o presente momento, foram descritas 115-129 espécies do gênero
Corynebacterium (PARTE, 2014; ZASADA e MOSIEJ, 2018), distribuídas em diferenciados
ambientes, como solo, esgoto e superfícies de plantas (BAIO et al., 2013). Embora a
maioria das espécies estejam disseminadas no ambiente e como parte da microbiota
humana (anfibiôntica), pelo menos 50 espécies foram relatadas como agente etiológico
de infecções humanas (BERNARD et al., 2013; ZASADA e MOSIEJ, 2018), e estão

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amplamente difundidas no ambiente hospitalar, possuindo grande importância médica
(FUNKE e BERNARD, 2011, p. 413-442; BAIO et al., 2013).
As corinebactérias vêm adquirindo crescente importância epidemiológica, em
países mais desenvolvidos e em desenvolvimento, pois as infecções causadas por esses
micro-organismos podem levar a óbito, tanto pacientes imunocomprometidos quanto
imunocompetentes. Além das corinebactérias produtoras de toxina, que são
amplamente conhecidas como patógenos humanos e animais como C. diphtheriae
(difteria humana) (JANDA, 1998; SCHRÖDER et al., 2012), C. pseudotuberculosis
(linfadenite caseosa em ruminantes) e C. ulcerans (difteria humana e zoonótica) (BAIO
et al., 2013), cepas DT tem demonstrado grande relevância clínica, por apresentarem
clones multirresistentes (MDR, multidrug resistant profile) e causarem infecções
hospitalares graves, entre elas, destacam-se C. afermentans, C. amycolatum, C.
jeikeium, C. pseudodiphtheriticum, C. striatum e C. urealyticum (RENOM et al., 2007;
MARTINS et al., 2009). Constantemente têm sido identificados clones apresentando
resistência natural e/ou adquirida a antimicrobianos como C. macginleyi, C.
minutissimum e C. xerosis, tanto em ambientes comunitários quanto em hospitalares
(RENOM et al., 2007; REDDY et al., 2012). Estudos tem demonstrado que a prevalência
desses clones MDR dependem da localização geográfica, além da constante aquisição
de genes de outras espécies, que conferem os fenótipos de resistência a novos
antimicrobianos (ZASADA e MOSIEJ, 2018).
Esta revisão objetiva certificar o papel de C. striatum como patógeno hospitalar
multirresistente, cada vez mais associado a infecções graves com tratamentos
antimicrobianos recorrentes em pacientes hospitalizados, imunocompetentes e
imunocomprometidos, com doenças subjacentes.

2. INFECÇÕES POR CORYNEBACTERIUM STRIATUM

Corynebacterium striatum foi descrito inicialmente como partícipe da microbiota


natural da pele e mucosa nasal em humanos, tendo sido, por muito tempo, reconhecido
como contaminante e sistematicamente desconsiderado durante o diagnóstico clínico-
laboratorial (LEE et al., 2005; BERNARD et al., 2013). Contudo, clones MDR têm sido
isolados do trato respiratório em humanos com infecções comunitárias e em pacientes

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hospitalizados, sua disseminação entre pacientes através das mãos contaminadas de
profissionais de saúde tem sido um dado preocupante (MOORE et al., 2010; DÍEZ-
AGUILAR et al., 2013).
Um número crescente de casos de infecções invasivas por C. striatum são
relatados em indivíduos imunocomprometidos e imunocompetentes, incluindo:
bacteremia e sepse (RENOM et al., 2007; WONG et al., 2010), artrite séptica (CONE et
al., 1998; SCHOLLE, 2007), endocardite, meningite (WEISS et al., 1996; OLIVA et al.,
2010), osteomielite (FERNÁNDEZ-AYALA et al., 2001; SCHOLLE, 2007), sinusite
(HEIDEMANN et al., 1991), infecção pulmonar (RENOM et al., 2007; WONG et al., 2010)
e sinovite (CONE et al., 1998; SCHOLLE, 2007). Também tem sido identificado como
agente etiológico de abscessos hepáticos (STONE et al., 1997) e em mama (BOLTIN;
MARTINS et al., 2009), queratites/ceratite (HEIDEMANN et al., 1991), feridas em pele e
cirúrgica (MOORE et al., 2010), infecções intrauterinas (BOLTIN; CAMPANILE et al.,
2009), peritonites (BHANDARI et al., 1995), em pacientes acometidos por Síndrome da
Imunodeficiência Adquirida (SIDA), câncer e transplantados (TARR et al., 2003; MARTINS
et al., 2009), por esse motivo atualmente é considerado por muitos pesquisadores um
patógeno muito virulento (OLIVA et al., 2010; DÍEZ-AGUILAR et al., 2013).
A identificação de C. striatum pode ser realizada através de métodos bioquímicos
convencionais (Anexo I), também disponíveis em sistemas semi-automatizados
(CAMELLO et al., 2003; JORGENSEN et al., 2015). Métodos moleculares como o
sequenciamento de genes 16S rRNA e rpoB geralmente são utilizados em Laboratórios
de Referência (BAIO et al., 2013). Atualmente, a identificação de espécies bacterianas
por espectrometria de massa oferece protocolos mais práticos e rápidos como o MALDI
(Matrix Assisted Lazer Desorption Ionization), seguido pela detecção em um analisador
do tipo tempo de vôo (TOF) e mass spectrometry (MS) (MALDI-TOF MS) (DÍEZ-AGUILAR
et al., 2013).
Avanços tecnológicos levaram a melhorias nas condições de sobrevivência de
pacientes imunocomprometidos, assim como o desenvolvimento de tecnologias de
identificação, possibilitaram o crescente número de relatos de casos na literatura sobre
infecções causadas por corinebactérias (LEE et al., 2005; BERNARD et al., 2013).
Na primeira década do século XXI (entre 2001 a 2010), C. striatum foi associado
a infecções nosocomiais, principalmente em pacientes imunodeprimidos, internados

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por longos períodos em unidades de terapia intensiva (UTIs) e pelo uso de dispositivos
médicos invasivos como cateteres intravenosos (SUPERTI et al., 2009; WONG et al.,
2010). A utilização de múltiplos dispositivos médicos propiciou a colonização do trato
respiratório superior, com subsequente infecção invasiva. Portanto, esse microrganismo
deve receber atenção especial, principalmente quando isolado em cultura pura de
materiais clínicos, coletados de pacientes cronicamente debilitados e/ou fazendo uso
de dispositivos invasivos (RENOM et al., 2007; WONG et al., 2010). Esta bactéria foi
descrita como agente etiológico de infecções no trato respiratório inferior em pacientes
hospitalizados com doença respiratória crônica e imunossupressão (DÍEZ-AGUILAR et al.,
2013).
C. striatum é um patógeno capaz produzir surtos em ambiente hospitalar (BAIO
et al., 2013), sendo constantemente isolado em pacientes e em diversos materiais
hospitalares, como de assistência respiratória, urológicos, broncoscópios, cateteres,
colonoscópios, laparoscópicos e nasofibroscópios (SCHOLLE, 2007; OLIVA et al., 2010).
Infecções causadas por esse microrganismo já foram relatadas em pacientes do setor de
oncologia pediátrica do St. Jude Children's Research Hospital (Tennessee, EUA), com
progressão para bacteremia (ADDERSON et al., 2008). Estes pacientes tiveram
complicações decorrentes dessas infecções, com recorrência e progressão para artrite
séptica (ADDERSON et al., 2008). Sendo o primeiro caso de infecção no trato urinário
por C. striatum em paciente ambulatorial, com ausência de fatores predisponentes foi
relatado por López et al. (2009) (LÓPEZ et al., 2009).

3. RESISTÊNCIA ANTIMICROBIANA NOS AMBIENTES NOSOCOMIAIS

A incidência de bactérias resistentes aos antimicrobianos isoladas em infecções


adquiridas na comunidade e nos hospitais, constitui um dos problemas mais graves em
Saúde Pública mundial, que desperta a atenção de órgãos governamentais nacionais e
internacionais como a Organização Mundial de Saúde (OMS), Centers for Disease
Control and Prevention (CDC/USA), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)
além de Comissões de Controle e Prevenção a Infecções Hospitalares (CCIH) de diversas
instituições de saúde (OLIVEIRA et al., 2009). O desenvolvimento de resistência aos
antimicrobianos tem evoluído rapidamente, levando à falha terapêutica e,

132
consequentemente, a limitações nas opções de tratamento, por esse motivo, a
descoberta de novos fármacos com propriedades bactericidas torna-se cada vez mais
necessária. Nos últimos 40 anos, apenas dois medicamentos foram introduzidos no
mercado: a linezolida e daptomicina (CAUMO et al., 2010).
A disseminação de microrganismos multirresistentes no ambiente hospitalar
tem sido motivo crescente de preocupação, devido ao aumento na taxa de resistência
adquirida aos antimicrobianos β-lactâmicos, clindamicina, eritromicina, ciprofloxacino e
gentamicina por espécies de Corynebacterium, tornando a utilização da vancomicina
último recurso terapêutico. Até o momento, a vancomicina, teicoplanina e linezolida são
as drogas mais ativas in vitro contra as corinebactérias (YOON et al., 2011; REDDY et al.,
2012). Exceto pela eficaz atividade da vancomicina contra as corinebactérias, a
variabilidade na aquisição da resistência a outras classes de antimicrobianos ressalta a
necessidade de contínua vigilância dos perfis de resistência dessas espécies (WEISS et
al., 1996).
Embora a maioria das cepas C. striatum descritas até o momento sejam
suscetíveis a uma ampla variedade de antibióticos (WEISS et al., 1996), foi relatado que
a pressão seletiva exercida pelos tratamentos prévios com antimicrobianos, induziu o
crescimento de C. striatum como segundo microrganismo corineforme mais prevalente
em pacientes imunocomprometidos. Neste sentido, a identificação de cepas MDR é
motivo de grande preocupação (ADDERSON et al., 2008; CAMPANILE et al., 2009).
Entretanto, os critérios de avaliação de susceptibilidade aos antimicrobianos para as
corinebactérias ainda não são padronizados, alguns autores sugerem que sejam
relatados os casos de resistência total aos antibióticos, ou seja, ausência de qualquer
zona (halo) de inibição em teste de susceptibilidade a antimicrobianos (TSA), pelo
método de disco-difusão em meio ágar Mueller-Hinton (MHA), a fim de entender o
comportamento das diferentes espécies desse gênero sob exposição as drogas utilizadas
no tratamento de infecções (DÍEZ-AGUILAR et al., 2013).
Um número crescente de relatos de infecções por clones de C. striatum
multirresistentes tem sido documentado em pacientes hospitalizados (BOLTIN et al.,
2009; WONG et al., 2010) em diversos países, como: Itália, Espanha, Holanda, Estados
Unidos, China e Japão (ADDERSON et al., 2008; CAMPANILE et al., 2009). Entretanto, em
países em desenvolvimento, incluindo os países da América Latina, as notificações de

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infecções por C. striatum permanecem ocasionais (CAMELLO et al., 2003; SUPERTI et al.,
2009). Este fato pode estar relacionado com a dificuldade que a maioria dos laboratórios
desses países enfrentam, para realizar a identificação precisa de bastonetes Gram-
positivos irregulares, devido à necessidade de profissionais capacitados para o
isolamento e identificação de microrganismos de crescimento lento. Adicionalmente, a
exigência da utilização de muitos testes fenotípicos e a necessidade de procedimentos
sofisticados e onerosos de difícil acesso, dificultam e, por vezes, impossibilitam a
identificação de espécies corineformes em laboratórios desprovidos de recursos
(PIMENTA et al., 2008; TORRES et al., 2013).
No Japão, Otsuka et al. (2006) relatam taxas variáveis da susceptibilidade de C.
striatum aos β-lactâmicos e aminoglicosídeos, além de elevados níveis de resistência à
eritromicina, tetraciclina, rifampicina e ciprofloxacina, embora todas as cepas isoladas
tenham sido suscetíveis à vancomicina. Através da análise por Pulsed-field Gel
Electrophoresis (PFGE) foram identificados 14 pulsotipos de C. striatum, onde os
pulsotipos descritos como A, D e E foram associados a surtos nosocomiais de origem
respiratória, e os subtipos A1, A2, D2 e E foram associados a resistência a ampla
variedade de antimicrobianos (OTSUKA et al., 2006).
Na Espanha, Renom et al. (2007) observaram que 100% das cepas de C. striatum
isoladas de surtos nosocomiais eram multirresistentes, ou seja, apresentavam
resistência a três ou mais antimicrobianos de diferentes classes, dos quais 65% eram
resistentes a quatro ou cinco classes de antibióticos, sendo 6,9% suscetíveis apenas a
imipenem e vancomicina, 11% suscetíveis somente à vancomicina (RENOM et al., 2007).
Na América do Sul, o Brasil tem notificado o isolamento de C. striatum em
materiais hospitalares utilizados por pacientes internados com sinais e sintomas de
infecção (MARTINS et al., 2009). Em 2009 este agente deflagrou um surto no Hospital
Universitário Pedro Ernesto, Rio de Janeiro, Brasil; onde cepas C. striatum foram isoladas
em UTIs e enfermarias cirúrgicas, principalmente em aspirados traqueais de pacientes
submetidos a procedimentos de intubação endotraqueal e, em sua maioria foi
multirresistente. Cerca de 87% das cepas pertenciam aos pulsotipos I e II, e foram
relacionadas com óbito de 5 pacientes infectados. Surpreendentemente, apenas os
pacientes adultos encontravam-se colonizados por cepas multirresistentes e 50%
tinham idade superior a 50 anos. As infecções por esses clones multirresistentes

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assustadoramente foram correlacionadas com óbito dos pacientes (BAIO et al., 2013).
Outra investigação no Brasil, revelou que cepas clínicas oriundas de pacientes com
câncer sob tratamento, em um centro de referência no Rio de Janeiro, foram
identificadas como C. striatum, isoladas de diferentes sítios de colonização, incluindo o
trato respiratório superior e inferior, e feridas cirúrgicas, comprovando assim a
eficiência desse microrganismo como um patógeno nosocomial (MARTINS et al., 2009).
Atualmente não há nenhum banco de dados disponível para C. striatum, tais
como PulseNet (http://www.cdc.gov/pulsenet), que permita a comparação dos padrões
de PFGE observados em diferentes surtos nosocomiais. Estudos realizados por
Campanile et al. (2009), demonstraram perfis SwaI-PFGE de C. striatum com bandas
variando de tamanho entre 48.5 a 533.5 kb (CAMPANILE et al., 2009). Baio et al. (2013),
demonstraram perfis SwaI-PFGE de C. striatum com bandas variando de tamanho entre
97.0 a 533.5 kb (BAIO et al., 2013). Uma análise comparada entre os dois surtos, revela
ausência de bandas variando de tamanho entre 48.5 a 97.0 kb, sugerindo que as cepas
MDR isoladas no surto brasileiro por Baio et al. (2013) diferem das cepas MDR isoladas
no surto italiano por Campanile et al. (2009) (CAMPANILE et al., 2009; BAIO et al., 2013).
Além disso, a análise dos perfis fenotípicos das cepas C. striatum brasileiras,
demonstram diferenças ao serem comparadas com cepas isoladas em um surto na
Holanda (biótipo: nitrato/pyz - positivos e sacarose - negativo) (BRANDENBURG et al.,
1996).
Os mecanismos de tolerância e resistência de C. striatum ainda não estão
completamente elucidados, entretanto, sabe-se que a baixa permeabilidade da parede
externa, o grande conteúdo lipídico e a capacidade de formar biofilme podem contribuir
para a tolerância a diversos agentes antimicrobianos (FONTANA, 2008; LORENA et al.,
2009).

4. CONTROLE DO CRESCIMENTO MICROBIANO NO AMBIENTE


HOSPITALAR

As infecções hospitalares têm grande relevância epidemiológica, tanto no


contexto da Saúde Pública, quanto na assistência hospitalar. Elas elevam as taxas de
morbimortalidade, ampliam o tempo de permanência dos pacientes nos hospitais e,

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consequentemente, elevam os custos no tratamento, com consequências irreparáveis
do ponto de vista humano, econômico e social. Costumeiramente, nas UTIs os índices
de infecções são mais elevados do que nos demais setores hospitalares, como resultado
da interação entre microrganismos, superfícies infectadas que servem de reservatório
de patógenos e deficiência imunológica dos pacientes (ANVISA, 2000).
O ambiente hospitalar destina-se a recuperação da saúde do paciente,
entretanto há uma preocupação mundial com o controle desses ambientes em razão
das recorrências de surtos de infecções, causadas por várias espécies microbianas
multirresistentes. A eliminação de surtos epidêmicos, requer uma rigorosa
descontaminação do ambiente hospitalar, dependente de procedimentos e rotinas
específicos, empenho e treinamento técnico especializados para essa finalidade
(ANVISA, 2014).
Para o combate das doenças infecciosas responsáveis por surtos epidêmicos, é
necessário ter um ambiente controlado, devendo levar em consideração o controle de
terapias antimicrobianas com uso racional de antibióticos, possuir gerenciamento ou
gestão por uma Comissão de Controle de Infecções Hospitalar (CCIH) responsável por
padronizar rotinas e protocolos com treinamento de funcionários, selecionando agentes
químicos descontaminantes, aplicando técnicas atualizadas de limpeza,
descontaminação e desinfecção, com a constante avaliação da eficácia desses agentes
com testes padronizados pela ANVISA (ANVISA, 2004).
Dentre os fatores que contribuem para que C. striatum possa causar infecções
hospitalares destacam-se: transferência de genes de resistência, uso inadequado e
irracional de antimicrobianos promovendo a seleção de bactérias resistentes,
ineficiência na limpeza e descontaminação das superfícies hospitalares e materiais
utilizados nas áreas críticas (centro cirúrgico, de esterilização, hemodiálise, lactário,
tratamento de queimados, necrotério, laboratório e expurgo) e semi-críticas
(enfermarias, quartos, ambulâncias, ambulatórios) (RUTALA et al., 1996; VERMELHO et
al., 2008). Procedimentos invasivos realizados em ambientes nosocomiais,
especialmente em setores críticos, podem contribuir para infecções relacionadas à
assistência à saúde (IRAS). Apesar dos procedimentos de esterilização e de técnicas de
assepsia mais avançadas, as infecções associadas a dispositivos hospitalares ainda
representam um grave problema, em parte, pelo desenvolvimento de resistência aos

136
antimicrobianos pelas bactérias (RENOM et al., 2007). Relatos constantes de
transmissão de agentes infecciosos em procedimentos invasivos, são decorrentes de
ineficiência na limpeza e desinfecção do ambiente cirúrgico, mas principalmente da
reutilização de materiais hospitalares sem a devida descontaminação (HOWIE et al.,
2008).
Diversos agentes químicos podem ser utilizados para controlar o crescimento
bacteriano nos ambientes hospitalares, tanto na presença quanto na ausência de
matéria orgânica, contudo, nenhum deles isoladamente são capazes de eliminar 100%
dos microrganismos e nem todos são apropriados para todas as circunstâncias, seja em
superfícies bióticas ou abióticas (VERMELHO et al., 2008). A escolha dos agentes
químicos apropriados para cada tipo diferente de desinfecção, bem como o modo de
desinfecção utilizado para cada tipo de superfície é fundamental para obtenção de um
ambiente hospitalar controlado com mínimo risco de infecções (RUTALA et al., 2008, p.
6).
Dentre os componentes que podem ser utilizados como desinfetantes no
ambiente hospitalar, destaca-se o glutaraldeído (GA) pelo seu amplo espectro, atuando
contra bactérias, Gram-positivas, Gram-negativas, micobactérias (especialmente,
Mycobacterium tuberculosis), alguns vírus, fungos e seus esporos causadores de
infecções hospitalares. A atividade microbicida desse agente advém da alquilação de
grupos sulfidrila, hidroxila, carboxila e amino dos microrganismos, alterando seu DNA,
RNA e síntese de proteínas, com consequente ação inibitória sobre o transporte e
sistemas enzimáticos, onde o acesso do substrato à enzima é comprometido. Por outro
lado, a atividade esporicida do glutaraldeído está relacionada a interação com a
superfície do esporo, provocando o endurecimento das camadas externas. A solução a
2%, em pH 8.0 (glutaraldeído ativado/alcalino) tem sido utilizada em muitos hospitais,
para desinfecções de materiais com fins cirúrgicos nos ambientes críticos e semicríticos,
que não podem ser submetidos ao calor (borracha e plásticos), principalmente por ser
um produto químico não corrosivo, mas infelizmente, sua utilização é limitada a
desinfecções de alto nível devido a sua toxicidade (LORENA et al., 2009).
Outro agente químico de destaque é o ácido peracético, que possui alto poder
oxidante em componentes celulares, agindo sobre a membrana citoplasmática e
desativando as funções fisiológicas, incluindo a barreira osmótica. O seu uso foi sugerido

137
como alternativa para substituir o gluteraldeído na desinfecção de materiais em
ambientes críticos e semicríticos, pela eficácia contra diversos microrganismos, ação
bactericida, tuberculocida, virocida, fungicida e esporocida, mesmo na presença de
matéria orgânica (SATTAR e SPRINGTHORPE, 2001, p. 80-86; McDONNELL, 2007).
Entretanto, possui como desvantagens, o tempo reduzido de ação pós-diluição (uma
solução a 1% perde a atividade em seis dias por hidrólise ou oxidação na presença de
ferro e cobre), baixa estabilidade em estoque e manuseio especializado, por possuir
atividade corrosiva podendo provocar irritação na pele (BLOCK, 2001, p. 185-204).
O hipoclorito de sódio é um sal do ácido hipocloroso, em equilíbrio com o ânion
hipoclorito possui alto poder oxidante devido à carga neutra, difunde-se facilmente pela
parede celular das bactérias. Sua utilização se limita a superfícies abióticas e outros
materiais que não entram em contato direto com o paciente. Devido ao seu alto poder
corrosivo, não deve ser utilizado na desinfecção de materiais no ambiente crítico e
semicrítico, uma vez que estes são constituídos de materiais sensíveis como plástico,
borracha e metais leves (ANDRADE, 1988).
O monopersulfato de potássio é um agente químico novo, que atua oxidando os
grupos sulfidrilas presente nas proteínas, eliminado os microrganismos, sua
característica mais importante é a atividade na presença de matéria orgânica, além de
não ser corrosivo para metais. Entretanto, tem sido mais utilizado em materiais no
ambiente não crítico (consultório médico, farmácia, ou seja, onde não há risco de
transmissão de infecção e não exista pacientes), devido a sua baixa eficácia em
micobactérias, a perda de atividade após sete dias de ativação, a necessidade de
profissionais tecnicamente capacitados para diluição mantendo sua coloração, pois a
redução da intensidade na cor significa diminuição da eficácia (RUTALA et al., 1996;
SILVA et al., 2013).
O ortoftalaldeído foi considerado desinfetante de alto nível pelo FDA (Food and
Drug Administration) em outubro de 1999, por interagir com proteínas e aminoácidos
dos microrganismos, possui vantagens quando comparado com glutaraldeído em
relação à toxicidade, odor, boa estabilidade em pH ~3.0-9.0, não é irritante aos olhos
nem às vias aéreas, não é teratogênico nem mutagênico. Entretanto, possui as
desvantagens de manchar a pele, mucosas e superfícies expostas ao meio ambiente,
pode causar hipersensibilidade em pacientes com exposições repetidas e possui custo

138
mais elevado que o glutaraldeído, além de possuir baixa atividade esporocida
(PSALTIKIDIS et al., 2014).
A glucoprotamina é oriunda de uma reação de conversão do aminoácido ácido
L-Glutâmico com a cocosamina, uma substância extraída do coco. Seu mecanismo de
ação ainda não é completamente elucidado, mas sua eficácia é comprovada, muitos
acreditam que tem relação com a oxidação de substância vitais dos microrganismos,
possui vantagens ecologicamente importantes, pois é biodegradável e seu descarte não
agride o meio ambiente, não sendo necessária sua neutralização. Outro ponto positivo
é seu alto espectro de ação contra microrganismos, não é corrosivo e tem afinidade com
grande parte dos metais como aço inoxidável, latão, alumínio e outros (WIDMER et al.,
2003).
São escassos os trabalhos relatando a resistência a agentes biocidas em
corinebactérias. Corinebactérias estão listadas entre os microrganismos resistentes
detectados em ensaios de análise de eficiência de protocolos de desinfecção utilizados
em instrumentos e ambientes de assistência à saúde, especialmente as espécies C.
striatum e C. amycolatum. Corinebactérias foram detectadas após o reprocessamento
de endoscópios gastrointestinais submetidos à desinfecção com soluções de ácido
peracético a 2% ou glutaraldeído a 2%, por períodos de exposição de até 30 minutos.
Ensaios comparativos entre diversos agentes biocidas, demonstraram a atividade
microbicida in vitro da povidone iodine a 5%, do digluconato de clorexidina a 4% e do
ácido hipocloroso a 0.01% para C. striatum e C. amycolatum indicando seu uso na
antissepsia pré-operatória (ANAGNOSTOPOULOS, 2018).
Nas superfícies bióticas (pele, conjuntiva ocular e mucosas) submetidas a
procedimentos pré-operatórios tratadas com solução de clorexidina 0.05% a 0.5%, foi
observada redução significativa no isolamento de corinebactérias, contudo não houve
efeito microbicida esperado para este agente in vivo (GILI et al., 2018). Recentemente,
uma análise comparativa da eficiência de desinfecção entre duas associações de
biocidas (clorexidina 0.5% e álcool etílico 70% versus iodine 1% e álcool etílico 70%)
utilizadas em cirurgias ortopédicas, foi possível identificar corinebactérias entre os
microrganismos mais isolados da superfície da pele após o procedimento cirúrgico
(SHADID et al., 2019).

139
Os artigos compilados apenas relatam a ocorrência da resistência aos agentes e
buscam sua correlação com falhas nos procedimentos durante da desinfecção, sem
levar em consideração aspectos microbiológicos específicos.

5. FATORES QUE INTERFEREM NO PROCESSO DE DESINFECÇÃO

A matéria orgânica está diretamente relacionada com a ineficácia de agentes


químicos, pois alguns agentes químicos têm a ação reduzida na presença de cadeias
carbônicas. Avaliar a influência da matéria orgânica no processo de desinfecção é muito
importante, uma vez que materiais dos ambientes crítico e semicrítico estão em contato
direto com substâncias orgânicas com pus, sangue, soro e outras (LEWIS e ARENS, 1995).
A limpeza mecânica com água e sabão, realizada manualmente com auxílio de
escova e com uso de equipamento de proteção individual (EPI), visa a remoção de todo
material orgânico e a redução dos microrganismos presentes nos materiais cirúrgicos,
para que não haja a interferência na atividade antimicrobiana dos desinfetantes, ou não
constitua uma barreira física de proteção aos microrganismos durante os processos de
desinfecção e esterilização por meios físicos e químicos. A limpeza meticulosa dos
materiais cirúrgicos, antes de submetê-los à desinfecção ou esterilização é um
procedimento unânime e universal (SOUZA et al., 1998).
A parede celular das bactérias Gram-positivas possui alta concentração de
diversos compostos bioquímicos como lipopolissacarídeo (LPS), lipídios com perfil
hidrofóbico muito intenso, conferindo propriedades favoráveis a tolerância aos agentes
químicos hidrofílicos e de adesividade a superfícies hidrofóbicas. Adicionalmente,
mecanismos de adesividade e persistência apresentados por microrganismos,
especialmente sob condições de estresse, como a expressão de adesinas e invasinas,
enzimas capazes de neutralizar a ação de agentes oxidantes e sequestrar
micronutrientes e a habilidade de produzir biofilme colaboram para a resistência a ação
de agentes biocidas (COSTERTON et al., 1999).
Outros fatores também podem alterar a ação dos agentes químicos nos
processos de desinfecção, como a aquisição de genes de resistência através de
transferência genética, mecanismos de bombeamento de substâncias químicas para
fora do citoplasma bacteriano (bombas de efluxo), proteínas de grande peso molecular

140
encontradas na membrana externa de bactérias (canais de porinas), que favorecem a
entrada de substâncias hidrofílicas, entretanto, quando estes canais são irregulares há
uma diminuição de substâncias e nutrientes hidrofílicos, a própria composição da
membrana bacteriana, composta por lipídeos e pepitideoglicano que são bastante
impermeáveis (COSTERTON et al., 2003). Deficiências nos canais de purinas (proteínas
expostas nas superfícies da célula bacteriana, que geralmente transportam moléculas
como antibióticos e desinfetantes para o interior da célula), também podem representa
um mecanismo de tolerância a agentes químicos, sobretudo com agentes a base de
aldeído, como glutaraldeído e ortoftaladeído (SVETLÍKOVÁ et al., 2009).
Corynebacterium striatum é um microrganismo potencialmente patogênico que
causa surtos nosocomiais. No entanto, pouco se sabe sobre seus fatores de virulência
que podem contribuir para Infecções Relacionadas à Saúde (IRAS). Publicações recentes
revelam a capacidade de C. striatum aderir a várias superfícies abióticas e formar
biofilmes em modelos de cateter in vitro. Identificando uma associação entre o aumento
na formação de biofilme, multirresistência antimicrobiana e clonalidade das cepas. Os
isolados clínicos desses tipos de PFGE, expressaram uma alta capacidade de formar
biofilmes em superfícies abióticas hidrofílicas (vidro; carga positiva) e hidrofóbicas
(poliestireno; carga negativa), incluindo superfícies de cateter de poliuretano (carga
positiva) (SOUZA et al., 2015; RAMOS et al., 2019).

6. DISCUSSÃO

Atualmente, mais da metade das doenças infecciosas que afetam pacientes


imunocomprometidos, estão relacionadas a espécies bacterianas encontradas no meio
ambiente e na microbiota normal do corpo humano. Patógenos como C. striatum,
podem resistir aos agentes antimicrobianos empregados no tratamento das infecções.
Seu isolamento a partir de amostras clínicas de pacientes com diferentes graus de
imunocomprometimento e infecções graves, vem aumentando tanto em países mais
desenvolvidos quanto em países em desenvolvimento. Esse fato se agrava pela ausência
de vacinas eficazes contra a maioria desses patógenos (CAMPANILE et al., 2009).
Portanto, profissionais da saúde e laboratoristas devem estar atentos para a coleta
adequada do material biológico, procedimentos de cultivo e de identificação das

141
espécies corinebactérias, particularmente devido ao fato desses microrganismos serem
encontrados em associação com outros em culturas bacterianas (RIEGEL, 1998).
C. striatum está constantemente relacionado com quadros infecciosos, por vezes
fatais em indivíduos imunocomprometidos e imunocompetentes, apesar de poderem
ser encontrados na pele e trato respiratório superior de indivíduos sadios. É um
patógeno que possui clones multirresistente, capazes de causar infecções nosocomiais
e colonizar o trato respiratório de pacientes com doenças pulmonares avançadas e
graves (CAMELLO et al., 2003; RENOM et al., 2007). Relatos descrevem C. striatum tem
sido isolado de cultura pura de secreção traqueal em pacientes submetidos a
procedimentos de intubação endotraqueal, devendo-se intensificar as medidas
universais de higiene para evitar a sua propagação e surtos (CAMPANILE et al., 2009).
Cepas MDR, tem sido preocupação constante dos epidemiologistas e de toda a
comunidade médica, por serem isoladas tanto no ambiente hospitalar, quanto na
comunidade (SANTOS, 2004; ANVISA, 2007). A busca por estratégias para diminuir a
disseminação das IRAS, hoje é uma preocupação mundial (SANTOS, 2004; ANVISA,
2007). Os mecanismos envolvidos na resistência a antimicrobianos são cada vez mais
bem compreendidos. A resistência pode ser uma propriedade natural de um
microorganismo (intrínseca), ou adquirida por mutação, aquisição de plasmídeos e
transposons. Estudos relacionados ao desenvolvimento de multirresistência em C.
striatum, tem foco na presença de genes de resistência, como erm(X), que codifica
resistência à eritromicina e clindamicina, tetA e tetB, que codifica resistência à
tetraciclina, oxitetraciclina e oxacilina, cmx e aphA1, que codifica a resistência à
aminoglicosídeos e cloranfenicol (CAMPANILE et al., 2009). Muitas medidas estão sendo
tomadas no Brasil para controlar o surgimento de cepas MDR de C. striatum (SANTOS,
2004; ANVISA, 2007).
Em laboratórios de bacteriologia clínica, cepas C. striatum ainda são descartadas
como contaminantes, inclusive quando isoladas a partir de amostras de sangue (SAVINI
et al., 2013). Considerar este microrganismo como contaminante é um erro grave,
especialmente quando isolado de pacientes cronicamente debilitados que utilizam
dispositivos invasivos (BRANDENBURG et al., 1996; RENOM et al., 2007). Nos casos de
infecções respiratórias, tem crescido o número de isolamentos de C. striatum a partir de

142
cultura pura, indicio de sua importância como patógeno (BAIO; DÍEZ-AGUILAR et al.,
2013).
São muitas as promessas para o desenvolvimento de novos antimicrobianos e
produtos de desinfecção para materiais médicos-cirúrgicos. Entretanto, muitas
barreiras devem ser transpostas, os benefícios da implementação de uma nova droga
devem sobrepor as desvantagens. Novos estudos têm procurado investigar alternativas
terapêuticas para infecções causadas por bactérias multirresistentes, como as
combinações sinérgicas de dois ou mais antibióticos, ampliar a eficácia e diminuir
toxidade do medicamento (SOARES, 2001; MITSUGUI et al., 2008).
Desinfetantes e antissépticos são usados extensivamente em hospitais e outras
instituições de saúde para uma variedade de aplicações tópicas em diversas superfícies.
Em particular, eles são uma parte essencial das práticas de controle de infecção e ajuda
na prevenção de infecções nosocomiais. O uso disseminado de produtos antissépticos e
desinfetantes tem levado a algumas investigações sobre o desenvolvimento de
resistência microbiana, em especial uma resistência cruzada aos antibióticos. A
atividade antimicrobiana pode ser influenciada por muitos fatores, tais como
formulação química, presença de resíduos orgânicos, temperatura, diluição e método
de descontaminação (RUTALA et al., 2008, p. 6; VERMELHO et al., 2008). Os biocidas
quando adequadamente utilizados e aliados a outros procedimentos no controle de
infecções, são essenciais no combate as IRAS e na erradicação de microrganismos MDR.
Dentro de uma gestão ineficiente, o uso inadequado dos biocidas durante os processos
de limpeza no ambiente hospitalar pode contribuir para a persistência e disseminação
de patógenos oportunistas, tanto em hospitais, quando na comunidade (McDONNELL e
RUSSELL, 1999).

7. CONCLUSÃO

Diante deste panorama, vale ressaltar a importância de C. striatum e outros


microrganismos corineformes, durante a elaboração de estratégias para o controle e
prevenção da disseminação da resistência a antimicrobianos nos ambientes de
assistência à saúde e no monitoramento de infecções por agentes multirresistentes
tanto nos ambientes nosocomiais quanto comunitários.

143
AGRADECIMENTOS

Gostaríamos de agradecer ao Instituto de Microbiologia Paulo de Góes,


Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil. Laboratório de Difteria e
Corynebacteria de Relevância Clínica, Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ),
Brasil. Este estudo foi financiado em parte pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES) Código Financeiro 001 e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do
Rio de Janeiro (FAPERJ).

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472-483, 2018.

150
ANEXO I

Tabela 1 - Características bioquímicas utilizadas na identificação das principais espécies


do gênero Corynebacterium.
Parâmetros

DNase
CAMP
Espécies

FRUT

HEM
MAL
MET

GLIC
URE

GAL
CAT

SAC
GEL

PYZ
ESC
NIT

TIR
GLI
LIP

C. N
+ O V – – – – V – + – – – – V V –
afermentans D
C.
+ F – + – – V V + – + – V V – – – –
amycolatum
C.
N N N
diphtheriae + F V V – V – – + V + V – – +
D D D
sub. belfanti
C.
N N
diphtheriae + F – + – V – – + + + + V – V +
D D
sub. gravis
C.
diphtheriae N N N
+ F + + – V – – + – + – – – +
sub. D D D
intermedius
C.
N N N
diphtheriae + F – + – V – – + – + V – V +
D D D
sub. mitis
N N N
C. jeikeium + O + – – – – + – + + V – – –
D D D
N N N N N
C. macginleyi + F + + – – – + + + – – +
D D D D D
C.
N N
minutissimu + F – – – – – + + + V V V – V +
D D
m
C.
N N N N
pseudodipht + O – + – – + + – – – – – –
D D D D
heriticum
C.
N RE N
pseudotuber + F – V – V + – – + V + V + –
D V D
culosis
N N
C. striatum + F – V – – – + V V + – V V – +
D D
N RE N
C. ulcerans + F – – – V + – + + V + – + +
D V D
C. N N N N N
+ O + – – – + + – – – – –
urealyticum D D D D D
N N N N N
C. xerosis + F – V – – + V + + + – –
D D D D D
Legendas: positivo (+); negativo (–); positivo fraco (±); variável (V); reação reversa (RER); dados não
declarados (ND); subespécie (sub); catalase = CAT; metabolismo = MET; oxidativo = O; fermentativo = F;

151
lipofilia = LIP (multiplicam-se bem em meio de cultura contendo 1% de Tween 80); redução de nitrato
(NO3–) = NIT; hidrólise de esculina = ESC; hidrolise de gelatina = GEL; uréase = URE; atividade
pirazinamidásica = PYZ; produção de ácido a partir do metabolismo da frutose = FRUT; da galactose = GAL;
da glicose = GLI; do glicogênio/amido = GLIC; da maltose = MAL; da sacarose = SAC; hemólise sinérgica
com β-hemolisina de S. aureus em sangue de ovelha = CAMP; hemólise em meio nutritivo contendo
sangue de ovelha = HEM; produção de desoxirribonuclease = DNase; tirosina = TIR (FUNKE e BERNARD,
2011; ANVISA, 2014).

152
CAPÍTULO XI

BIOFILME FORMADO POR STAPHYLOCOCCUS AUREUS: CAUSA ALARMANTE DE


INFECÇÕES NOSOCOMIAIS
Giorgio Silva de Santana 1,2
Paula Marcele Afonso Pereira Ribeiro 2
Barbara Araújo Nogueira 2
Dryelle Rodrigues de Oliveira 2
Guilherme Goulart Cabral de Oliveira 2
Ana Luíza de Mattos Guaraldi 1,2
¹ Instituto de Microbiologia Paulo de Góes, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil.
2 Laboratório de Difteria e Corinebactérias de Importância Clínica, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil.

RESUMO

Estudos relacionados à formação de biofilmes bacterianos são de extrema relevância,


pela associação constante com doenças humanas graves. A organização dessa
comunidade microbiana séssil, proporciona aos microrganismos que a constitui
proteção contra opsonização e a fagocitose, tornando o sistema imunológico do
hospedeiro incapaz em combatê-las, assim como a ineficácia da terapia antimicrobiana.
Staphylococcus aureus faz parte da microbiota da pele e cavidade nasal em indivíduos
saudáveis, entretanto, muitas estirpes tornam-se patógenos oportunistas,
principalmente pela capacidade de formar biofilme em diversos tipos de implantes e
dispositivos médicos, utilizando-os como via de acesso à corrente sanguínea. Sua
habilidade em formar biofilme é amplamente conhecida, tornando responsável por
diversas infecções graves como endocardite, bacteremia e sepse. Vários são os fatores
que contribuem para a formação de biofilme bacteriano, como a expressão de genes
específicos e a interação entre proteínas envolvidas na adesão ao substrato. Este
trabalho objetiva explorar os principais aspectos relacionados à formação de biofilme
por S. aureus, utilizando os principais bancos de indexação da literatura científica Esta
revisão fornecerá melhor compreensão sobre a formação de biofilme e seu impacto na
saúde do hospedeiro.

Palavras-chave: Biofilme. Infecção sistêmica. MRSA. Staphylococcus aureus.

1. INTRODUÇÃO

Staphylococcus aureus faz parte da família Staphylococcaceae (GARRITY, 2006),


do gênero Staphylococcus e do grupo dos cocos Gram-positivos, pode medir entre 0,5 a
1,5 µm de diâmetro e geralmente encontram-se agrupados semelhantes a “cachos de

153
uvas” (BANNERMAN e PEACOCK, p. 390-410; JONGERIUS et al., 2007; KATEETE et al.,
2010), são imóveis, não esporulados e anaeróbios facultativos. Nesse gênero foram
diferenciadas 33 espécies até o momento, nas quais 17 podem ser isoladas de materiais
biológicos humano (SANTOS et al., 2007; PAHARIK e HORSWILL, 2016). Entre as
principais características bioquímicas estão à capacidade de produzir as enzimas
catalase e coagulase, que podem ser utilizadas como método de identificação da espécie
em laboratório (BANNERMAN e PEACOCK, 2007, p. 390-410; KATEETE et al., 2010). O
seu cultivo em meio sólido contendo 5% de sangue, torna possível visualizar colônias
com aspecto mucoide, de coloração esbranquiçada à levemente amarelada, decorrente
de pigmentos carotenóides gerados durante seu metabolismo, e também a formação
de um halo de hemólise total ao redor da colônia (β-hemólise), gerado a partir da
produção de hemolisina (CARROLL, 2014, p. 199-207). O meio de cultura seletivo
comumente utilizado é denominado ágar manitol-salgado, possui em sua composição o
açúcar D-manitol e cloreto de sódio (NaCl), sua hipertônicidade é capaz de selecionar
espécies do gênero Staphylococcus e indicar outras espécies capazes de fermentar o D-
manitol (BANNERMAN e PEACOCK, 2007, p. 390-410).
Este microrganismo pode ser encontrado em 27 a 50% dos seres humanos
(YOUNG et al., 2012) de forma assintomática na pele, superfície de mucosas, narina,
axilas e períneo (GIAROLA et al., 2012; KIM et al., 2014; PAHARIK e HORSWILL, 2016).
Aproximadamente 20 a 40% dos humanos adultos saudáveis são colonizados
permanentemente, enquanto 75 a 80% são colonizados de forma intermitentemente
(alternando períodos colonizados e períodos não colonizados) ou não fazem parte de
sua microbiota (OTTO, 2010; AMALARADJOU e VENKITANARAYANAN; KIM et al., 2014).
Esse percentual pode variar de acordo com a demografia do local onde é efetuado o
estudo de identificação, qualidade das amostras e técnicas utilizadas para coleta dos
microrganismos (WERTHEIM et al., 2005).
Nesta revisão abordaremos os principais aspectos estruturais, morfológicos e
características bioquímicas de S. aureus que diferencia esse microrganismo dos outros
Gram-positivos, e seus fatores de virulência, responsáveis por várias infecções
nosocomiais e na comunidade. Enfocando a formação de biofilme, os métodos de
prevenção e tratamento, com o objetivo de aumentar a compreensão sobre essa

154
bactéria, para melhor orientar pesquisadores e profissionais da área de saúde sobre as
patologias por ela provocada.

2. PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS PATOGÊNICAS

Staphylococcus aureus possui grande importância clínica, é um dos patógenos


mais prevalentes em infecções graves, relacionadas à comunidade ou em ambiente
hospitalar (OTTO, 2010; KIM et al., 2014; RAMSEY et al., 2016). A transmissão ocorre
através de fômites, secreção nasal e principalmente pelo contato direto entre
profissionais da área de saúde e lesões expostas de pacientes infectados (MICHELIM et
al., 2005; ARCHER et al., 2011; Koch et al., 2014). Essa fácil transmissão torna a
erradicação das infecções hospitalares estafilocócicas extremamente difíceis
(MICHELIM et al., 2005).
Esse patógeno oportunista é capaz de se adaptar com grande facilidade a
diversas temperaturas, níveis de pH e osmolaridade (STAPLETON et al., 2002;
CARVALHO et al., 2010; MARTINS et al., 2012; RAMSEY et al., 2016). Entretanto, para
estabelecer uma infecção, a bactéria precisa expressar várias moléculas que
determinam sua patogenicidade (fatores de virulência) (KONG et al., 2006), alguns
desses fatores fazem parte da estrutura da parede celular, como os polissacarídeos,
proteínas antigênicas entre outras, com potencial para induzir uma resposta
imunológica no hospedeiro (MAMIZUKA, 2005). Porém, nem todas as estirpes
necessariamente possuem as mesmas propriedades antigênicas, possibilitando a
descobertas de novas características patogênicas (MACHADO et al., 2005; KUEHL et al.,
2009).
Sua grande versatilidade e seu extenso arsenal de fatores de virulência garantem
o sucesso durante a infecção, que influenciam diretamente em sua capacidade de aderir
e colonizar, infectar e evadir do sistema imune do hospedeiro (TAVARES, 2002; OTTO,
2012). Os fatores de virulência podem ser classificados em três categorias: (I)
relacionados com adesão a células do hospedeiro, fibrinogênio, fibronectina e colágeno
por meio de proteínas de superfície do microrganismo. Podemos destacar como
principais as MSCRAMMs (microbial surface components recognizing adhesive matrix
molecules), que são componentes de superfície microbiana capazes de reconhecerem

155
moléculas adesivas da matriz celular do tecido, resultando em maior adesão do
patógeno ao hospedeiro (WALSH et al., 2001); (II) relacionados com a evasão do sistema
imunológico, como a cápsula (estrutura polissacarídica que envolve a parede celular
bacteriana), mais precisamente os polissacarídeos do tipo 1, 5 e 8, que protegem a
bactéria contra fagocitose pelo sistema complemento e neutrófilos. A proteína A
associada ao peptideoglicano, além de atuar como uma adesina, pode também ligar-se
a porção Fc da imunoglobulina G (IgG) impedindo sua ação como opsonina (LUTZ et al.,
2003; OTTO, 2010). Também podemos ressaltar as enterotoxinas estafilocócicas (SEs) e
a toxina da síndrome do choque tóxico (TSST-1). Um dos principais fatores de evasão é
o biofilme, constituído por uma matriz extracelular (glicocálix) composta por proteínas,
ácidos nucléicos, lipídeos e polissacarídeos, que confere aos microrganismos no seu
interior proteção contra o sistema imune e antimicrobianos (OTTO, 2006; MADIGAN et
al., 2016), prolongando o período de colonização no epitélio e em superfícies de
dispositivos médicos, como sondas e cateteres (OTTO, 2012; XIA et al., 2013); (III)
relacionados com a invasão na célula do hospedeiro e penetração nos tecidos, como as
proteases, nucleases, hialuronidase, lipase, colagenase, toxinas alfa, beta, gama e delta
hemolisinas, as leucocidinas, como por exemplo de Panton-Valentine (PVL) (WALSH et
al., 2001; TAVARES, 2002; OTTO, 2012). A PVL tem como alvo principal os neutrófilos
humanos, em altas concentrações formam poros na membrana dos neutrófilos,
alterando a permeabilidade e causando lise celular, em baixa concentração promovem
a apoptose por se ligarem a membrana mitocondrial resultando na liberação de espécies
reativas do oxigênio (reactive oxygen species, ROS) (GENESTIER et al., 2005; BOYLE-
VAVRA et al., 2007; SILVA-SANTANA et al., 2016).
As doenças causadas por S. aureus podem estar relacionadas à invasão direta do
microrganismo nos tecidos através da bacteremia. Entretanto, as toxinas secretadas são
os fatores determinantes de sua virulência (BUKOWSKI; NOVICK et al., 2010; KIM et al.,
2014). Este microrganismo é considerado o agente mais comum das infecções
pirogênicas, as quais podem se localizar em um ou em múltiplos sítios tendo como
origem primária a pele, mas também pode ser associado à pneumonia, endocardite,
choque tóxico e sepse, incluindo aqueles associados a dispositivos intravasculares
(ANDRIOLO, 2005; BOLES e HORSWILL, 2008; RUDKIN et al., 2012), que propicia o acesso
do patógeno a tecidos subjacentes e a corrente sanguínea (LOWY, 1998). Tem sido

156
comum o isolamento de S. aureus em 80% das infecções relacionadas com bacteremia
(RAMSEY et al., 2016), entretanto o microrganismo está comumente associado a
infecções em tecidos moles (LOWY, 1998; KIM et al., 2014). As infecções possuem como
características patológicas a formação de lesões purulentas e abcesso por infiltração de
neutrófilos ao redor do local infectado (CHENG et al., 2009; KIM et al., 2014), não são
capazes de produzir resposta imune específica, por esse motivo é comum infecções
persistentes ou recorrentes (LESSA et al., 2010; KIM et al., 2014).
Em infecções sistêmicas, duas proteínas de superfície produzidas por S. aureus
desempenham um papel chave na patogênese da sepse: adenosina sintetase A (AdsA) e
a proteína de ligação a fibrinogênio A (fator de aglutinação, ClfA). Ao invadir a corrente
sanguínea, S. aureus produz AdsA, aumentando o nível extracelular de adenosina que
se associa aos receptores de adenosina do tipo A2a, expresso perifericamente em
células imunes/inflamatórias, mediando às cascatas de sinalização anti-inflamatórias e
de resolução da inflamação. Isso resulta em inibição da agregação plaquetária,
degranulação de neutrófilos e aumento da produção de interleucina 10 (IL-10), uma
citocina anti-inflamatória, contribuindo como fator de evasão dos mecanismos de
defesa inato e adaptativo. Também podem interagir com receptores A2b resultando na
potencialização da resposta inflamatória (KIM et al., 2014). A presença da proteína AdsA
na bactéria é necessária para sua sobrevivência no interior dos neutrófilos,
possibilitando o escape dos atributos bactericidas da célula imune, incluindo: ROS,
enzimas hidrolíticas e defensinas peptídicas (GARZONI e KELLEY, 2009; KIM et al., 2014).
A ClfA na superfície bacteriana (McADOW et al., 2011; KIM et al., 2014) promove
a junção com o domínio D do fibrinogénio e fibrina, revestindo-as e impedindo o
reconhecimento pelas opsoninas. Isso reduz a opsonofagocitose por neutrófilos e
macrófagos (McDEVITT et al., 1997; GANESH et al., 2008; KIM et al., 2014), também
promove oclusões vasculares por bactérias aglutinadas nos tecidos dos órgãos
(McADOW et al., 2011; KIM et al., 2014).

157
3. RESISTÊNCIA ANTIMICROBIANA

No início de 1940, o uso da penicilina na terapia antimicrobiana acreditou ser o


fim das infecções bacterianas, entretanto, mas em 1942 a resistência foi detectada em
vários hospitais (MOELLERING, 2012; KOCH et al., 2014). Seu mecanismo de ação
consiste na desestabilização da síntese da parede celular bacteriana, pela associação às
proteínas de ligação a penicilinas (penicillin-binding proteins, PBPs) (GEISEL et al., 2001;
AGUAYO-REYES et al., 2018). Mas a aquisição de plasmídeos contendo os genes blaZ,
blaI e blaRI possibilitou que estirpes produzissem beta-lactamase, uma enzima
extracelular responsável por causar danos ao anel beta-lactâmico da penicilina
tornando-a inativa, gerando resistência ao antimicrobiano (RAMMELKAMP e MAXON,
1942; EAST e DYKE, 1989; OLIVEIRA et al., 2002; KOCH et al., 2014).
Diferentemente ocorreu com a meticilina, uma penicilina semi-sintética
desenvolvida em 1959 inatingível às penicilinases (DEURENBERG e STOBBERINGH,
2009). Entretanto, a resistência foi conferida a S. aureus através da aquisição do gene
mecA inserido em um elemento genético móvel denominado cassete estafilocócico
cromossômico mec (staphylococcal cassette chromosome mec, SCCmec) (HIRAMATSU
et al., 2014; STEFANI et al., 2015; BAIG et al., 2018), presente em todas as estirpes
resistentes à meticilina (methicillin-resistant S. aureus, MRSA) (MEHNDIRATTA e
BHALLA, 2012). Até o momento foram descritos treze SCCmec, classificados em
diferentes tipos através de análises genéticas das regiões internas do cassete, com a
capacidade de transportar genes de resistência a múltiplas drogas, incluindo
sulfametoxazol-trimetoprim, doxiciclina e rifampicina (multiple-resistant S. aureus)
(DERESINSKI, 2005; RUDKIN et al., 2012). Os SCCmec tipo III e IV são prevalentes em
infecções humanas no Brasil (CABOCLO et al., 2012), os tipos I, II e III são grandes e estão
associados a cepas multirresistentes, comumente encontradas no ambiente hospitalar,
denominadas HA-MRSA (hospital-associated, MRSA), os tipos IV e V são menores,
habitualmente encontrados em estirpes da comunidade, denominados CA-MRSA
(community-associated, MRSA) e geralmente carreia poucos genes de resistência (IWG-
SCC, 2009; RUDKIN et al., 2012).
O gene mecA codifica a proteína de ligação a penicilina 2 (PBP2) com
modificações em sua estrutura molecular (PBP2a) (ALEKSHUN e LEVY, 2007), conferindo

158
resistência a meticilina pela baixa afinidade dos receptores proteicos em relação ao
antimicrobiano. As PBPs são proteínas ligadas à membrana que catalisam a
transpeptidação e transglicosilação do peptidoglicanos, o principal componente da
parede bacteriana (RUDKIN et al., 2012).
As linhagens de MRSA se espalharam pelo mundo desde 1960, atualmente as
estirpes deixaram de ser exclusivas do ambiente hospitalar e passaram a ser isoladas
também em infecções comunitárias (HAGIHARA; RUDKIN et al., 2012). As infecções por
MRSA causam aumento da mortalidade (HAGIHARA et al., 2012), maior tempo de
internação e aumento dos custos em comparação com infecções causadas estirpes
suscetíveis (methicillin-susceptible S. aureus, MSSA) (HAGIHARA; RUDKIN et al., 2012).
Os fatores de risco associados à bacteremia causada por MRSA incluem: idade
(susceptibilidade de pacientes ≥ 60 anos) (SOUZA e FIGUEIRED, 2008), hospitalização
prolongada, tratamento prévio com antimicrobianos, cateterização e uso de sonda
nasogástrica (BUTTERLY et al., 2010; DHAND e SAKOULAS; RUDKIN et al., 2012). A alta
dificuldade em tratar as infecções por MRSA classifica-o como altamente patogênico
(RUDKIN et al., 2012).
A vancomicina (glicopeptídeo) representa a melhor escolha no tratamento de
infecções por MRSA. Entretanto, o uso de forma incorreta levou ao aparecimento de
várias estirpes com suscetibilidade reduzida à vancomicina, o primeiro relatado foi no
Japão em 1996 (KOCH et al., 2014). Estas estirpes são denominadas S. aureus intermédio
para vancomicina (vancomycin-intermediate S. aureus, VISA), embora seu nível de
resistência seja mais próximo de ser classificada como moderada por possuir
concentração mínima inibitória (minimum inhibitory concentration, MIC) entre 4 a 8
µg/ml, em comparação com as estirpes resistentes à vancomicina (vancomycin resistant
S. aureus, VRSA) com CIM ≥ 16 mg/ml (KOCH et al., 2014).
Nas estirpes VRSA a resistência é conferida plenamente pela expressão do gene
vanA, após ser regulado por vanS e vanR (HONG et al., 2008, p. 200-213), culminando
na produção de D-Ala-D-Lactato ou D-Ala-D-serina, que substituem o terminal D-Ala-D-
Ala no peptidoglicano da parede celular bacteriana, propiciando menor afinidade à
vancomicina (HOLMES; XIA et al., 2013; KUMAR, 2016). Atualmente, a resistência à
vancomicina representa uma grande ameaça no tratamento de infecções nosocomiais

159
causadas por S. aureus levando o paciente a óbito (HOWDEN et al., 2010; KOCH et al.,
2014).

4. BIOFILME E SUA FUNÇÃO NA PATOGENICIDADE

O biofilme definido como uma comunidade microbiana, encapsulada em uma


matriz polimérica formada por polissacarídeo aderido ao substrato (séssil) (WU et al.,
2011; PAHARIK e HORSWILL; SILVA-SANTANA et al., 2016).
Inicialmente é formado por uma monocamada de bactérias que aderem e se
acumulam em superfície biótica ou abiótica, produzindo uma matriz polimérica
extracelular contendo bactérias, polissacarídeos e proteínas (ATSHAN; REVDIWALA et
al., 2012). Quando um microrganismo infecta um dispositivo médico, inúmeras variáveis
determinam a formação de biofilme: (I) o microrganismo deve permanecer em contato
com a superfície do substrato tempo necessário para promover adesão irreversível
(fixação). Características químicas e moleculares do substrato podem influenciar na
formação de biofilme (REVDIWALA et al., 2012), (II) colonização, (III) adesão célula-
célula, (IV) multiplicação mediada pós-regulação de alguns genes como ica, agr e
proteínas adesinas, (V) destacamento/dispersão (DONELLI; O'GARA, 2007; PAHARIK e
HORSWILL, 2016).
Este fator de virulência aumenta 1.000 vezes a resistência e sobrevivência dos
microrganismos, quando comparados com bactérias planctônicas. Mais de 80% das
infecções bacterianas estão relacionadas à formação de biofilme (KARAOLIS et al., 2005;
YEAGLEY et al., 2013; PAHARIK e HORSWILL, 2016) e 25% levam a doença crônica e óbito
(ARCHER; KIEDROWSKI e HORSWILL, 2011; PAHARIK e HORSWILL, 2016). Na maioria das
vezes, o tratamento dessas infecções não é bem-sucedido, pela dificuldade da
penetração do antimicrobiano e do sistema imune inato do hospedeiro na complexa
matriz polimérica (ARCHER; KIEDROWSKI e HORSWILL, 2011; SILVA-SANTANA et al.,
2015), prolongando o tempo de internação do paciente e aumentando
consideravelmente os custos hospitalares (KARAOLIS et al., 2005; FALORD et al., 2011;
YEAGLEY et al., 2013).

160
4.1. Adesão inicial ao substrato e colonização bacteriana

Staphylococcus aureus é capaz de aderir em superfícies abióticas (dispositivos


médicos) como também em bióticas (tecido cardíaco, cartilagem e feridas crônicas) para
colonização inicial. O implante médico (cateter) em contato com o tecido humano
rapidamente é recoberto por proteínas da matriz, como fibrinogênicas A e B (FnBPA e
FnBPB), de aglutinação e aglomeração das proteínas fibrinogênicas A e B (ClfA e ClfB),
proteína de ligação ao colágeno (Cna) e sialoproteína óssea (Bbp), possibilitando a
adesão e colonização bacteriana através de adesinas que estão ligadas covalentemente
ao peptidoglicanos da parede celular das bactérias como as MSCRAMMs, fator
importante na produção de biofilme (BEENKEN et al., 2004; KIEDROWSKI et al., 2011;
PAHARIK e HORSWILL, 2016).

4.2. Adesão mediada por polissacarídeo

O locus ica é essencial para a formação de biofilme, constituído pelos genes icaR
(regulador/repressor) e icaADBC (biossintéticos) induzidos em anaerobiose pelo
regulador da resposta respiratória estafilocócica (SrrAB), mas também podem ser
regulados por outros fatores ambientais como glicose, etanol, osmolaridade,
temperatura e alguns antimicrobianos como tetraciclina (GÖTZ, 2002; BEENKEN et al.,
2004; ARCHER et al., 2011).
Esses genes são responsáveis pela expressão de adesina intercelular
polissacarídica (PIA), também denominada Poli-N-Acetil Glucosamina (PNAG), essencial
para a adesão célula-célula, que em conjunto com proteínas de superfície formam e
fixam o biofilme (O'GARA, 2007; ATSHAN; POZZI et al., 2012).
Estudos demonstraram que biofilmes podem ser formados independentes de
PIA, através de proteínas de adesão a fibronectina (FnBPs) que se ligam através de
autolisinas (AtlA e AtlE) (ARCHER et al., 2011; PAHARIK e HORSWILL, 2016), pela
agregação celular mediada pela proteína associada a biofilme (biofilm-associated
protein, Bap) (ARCHER et al., 2011), pela proteína associada a acúmulo (Aap) após ser
proteoliticamente clivada (ROHDE et al., 2005), ou pela regulação do gene sigB (ARCHER
et al., 2011). Os processos pelos quais S. aureus pode formar biofilme independente de
PIA ainda não estão bem elucidados, entretanto, relatos sugerem algumas proteínas
podem desempenhar a mesma função na ausência de ica (ARCHER et al., 2011).

161
4.3. Comunicação mediada por peptídeos auto-indutores
(Quorum-Sensing)

Bactérias gram-positivas e gram-negativas são capazes de sintetizar moléculas


sinalizadoras de natureza química variável, denominadas peptídeos autoindutores
(autoinducing peptides, AIP). Durante a divisão celular, os AIPs acumulam-se no meio
extracelular atingindo uma determinada densidade ou "quorum", ativando uma cascata
reguladora responsável por controlar tipos específicos de processos celulares, esse
fenômeno chama-se quorum-sensing (QS), mecanismo pelo qual bactérias podem
“perceber” a quantidade de microrganismos no meio, funcionando como sensor de
densidade populacional no interior do biofilme, estabelecendo algo semelhante à
“comunicação” entre células (KONG et al., 2006; O'GARA, 2007; THOENDEL et al., 2011).
Em S. aureus o locus gene regulador acessório (accessory gene regulator, agr) é
formado por um sistema composto por quatro genes agrB, agrD, agrC e agrA (agrBDCA)
e está localizado no cromossomo em uma ilha de patogenicidade. O locus agr é
determinante na patogênese e no desenvolvimento do biofilme através de um quorum,
codificado por dois operons divergentes controlados pelos promotores P2 e P3
relacionados aos QS1 e QS2 respectivamente (VUONG et al., 2000; THOENDEL et al.,
2011; YOUNG et al., 2012; SILVA-SANTANA et al., 2016).
O promotor P2 induz o locus agr a produzir mRNAII responsável pela biossíntese
do PIA em três passos: (I) o gene icaA expressa a proteína IcaA que atua como N-
acetilglicosaminil-transferase utilizando UDP-N-acetilglucosamina como substrato
(semelhante a quinase NodC), IcaA se associa a proteína IcaD formando IcaAD e gerando
oligômeros de N-acetilglucosamina com 10 a 20 resíduos, aumentando 20 vezes sua
ação transferase. A proteína IcaD orienta o desdobramento e inserção de IcaA na
membrana, e também como elo de conexão entre IcaA e IcaC, (II) a proteína IcaC
expressa pelo gene icaC, sintetiza cadeias longas de oligômeros que se associam com
IcaAD forma oligômeros completos com 130 resíduos, prontos para serem exportados
no meio extracelular formando PIA, (III) acredita-se que a proteína IcaB seja responsável
pela desacetilação do PIA, predominante na fase de acumulo do biofilme e importante
na virulência de muitas estirpes (FRANK; VUONG et al., 2004)

162
O promotor P3 induz o locus agr a produzir o mRNAIII responsável pela
biossíntese de δ-hemolisina e hdl (KONG et al., 2006; THOENDEL et al., 2011). As
proteínas AgrB e AgrD formadas pelos genes agrB e agrD se unem produzindo um AIP,
que se liga ao receptor de AgrC (proteína transmembrânica - histidina quinase)
fosforilando e ativando AgrA. A ativação da proteína AgrA aumenta a transcrição de
genes de virulência como exotoxinas, simultaneamente reduz a produção de proteínas
de superfície (MSCRAMMs) (THOENDEL et al., 2011; LINDSEY; YOUNG et al., 2012). A
produção da proteína IcaR formada pelo gene icaR regula negativamente a expressão
de polissacarídeos de adesão, acredita-se que sua ausência pode aumentar
consideravelmente a produção de PIA (CRAMTON et al., 1999; GÖTZ, 2002). Em
associação com o sistema agr negativo, pode ocorre a expressão do gene luxS, também
capaz de regular negativamente a produção de PIA, diminuído a adesão celular e
contribuído para a fase de destacamento (KONG et al., 2006; KUEHL et al., 2009; TSUJI
et al., 2011).
Ao longo do tempo a função do locus agr mostrou ser controversa, a expressão
dos genes agrBDCA nem sempre se mostra favorável à formação de biofilme, isso
dependerá de qual promotor (P2 ou P3) atuará como indutor (SHIRTLIFF et al., 2002;
KONG et al., 2006). Portanto, o locus agr ao regular negativamente genes associados à
produção de proteínas da parede celular bacteriana relacionadas à adesão,
indiretamente reduz a formação de biofilme e fazendo com que as células voltem ao
estado planctônico (SANTOS et al., 2007). Por esse motivo, propõe-se que estirpes
expressando níveis elevados de agr teriam a capacidade reduzida em formar biofilme, e
que quanto maior for a produção de δ-hemolisina por uma estirpe, menor será
produção de MSCRAMMs e menos aderente a bactéria será no substrato. Alguns
pesquisadores consideram a δ-hemolisina como um bom marcador para o fenótipo
relacionado a pouca produção de biofilme (VUONG et al., 2000; NOVICK, 2003).

5. TERAPIA ANTIMICROBIANA CONTRA INFECÇÕES ASSOCIADAS A


BIOFILME

O tratamento mais eficaz para doenças relacionadas a biofilme é a remoção


cirúrgica do tecido, drenagem e limpeza do local infectado. Principalmente com a

163
retirada do implante médico contendo o biofilme responsável pela doença (ARCHER et
al., 2011). Entretanto, em pacientes debilitados incapazes de resistir ao processo
cirúrgico, e em usuários de próteses articulares a remoção torna-se inviável (DONELLI et
al., 2007).
Atualmente, a terapia antimicrobiana sozinha não é eficaz, devendo ser
associada quando possível à cirurgia de remoção do implante. Os agentes β-lactâmicos
(por exemplo, penicilina G, oxacilina) são frequentemente utilizados para o tratamento
de estirpes sensíveis, mantendo a concentração plasmática em 4× a MIC. Nos casos de
resistência aos β-lactâmicos a alternativa é a vancomicina (ARCHER; KIEDROWSKI e
HORSWILL, 2011).
A vancomicina pertence à classe dos glicopeptídeos, sua utilização foi aprovada
no ano 1.950 e por mais de 50 anos foi considerada a principal escolha no tratamento
de infecções por MRSA (RODVOLD e McCONEGHY, 2014). Em infecção sistêmica e nos
casos de sepse, recomenda-se que sua administração seja combinada com um β-
lactâmico e um inibidor de β-lactamases, essa combinação é capaz de incluir patógenos
gram-negativos como tratamento empírico (LEVINE, 2008; DILWORTH et al., 2014).
Dentre as limitações intrínsecas desse antimicrobiano, está à baixa penetração nos
tecidos com eliminação lenta do patógeno, alta toxicidade renal (nefrotoxicidade),
ototoxicidade e a administração deve ser parenteral (BOUZA, 2009; GIULIANO et al.,
2010; NEELY et al., 2014).
A daptomicina e a linezolida são alternativas para o tratamento de infecções
associadas a biofilme por MRSA (ARCHER; KIEDROWSKI e HORSWILL, 2011). A
daptomicina é considerada a principal opção no tratamento de infecção na corrente
sanguínea (ICS) por MRSA em casos de susceptibilidade reduzida à vancomicina, hetero-
VISA (hVISA) e VISA (WERTH et al., 2013; GUDIOL et al., 2017). Entretanto, não é indicada
no tratamento de pneumonia por interagir com o surfactante pulmonar, levando à
inibição seletiva da atividade do antimicrobiano (CARPENTER e CHAMBERS, 2004). A
linezolida é o primeiro antimicrobiano da classe das oxazolidinonas utilizado para o
tratamento de infecções causadas microrganismos gram-positivos, incluindo amostras
MRSA, hVISA, VISA e VRSA (KAISER et al., 2007), uma alternativa de substituição à
vancomicina. No entanto, sua atividade bacteriostática faz com que ela não seja a

164
primeira escolha para tratamento de ICS ou endocardite, apesar de apresentar eficácia
em pneumonias por MRSA (TACCONELLI e CATALDO, 2007).
No tratamento da endocardite causada por biofilme formado por MRSA em
cateter intravascular, os antimicrobianos indicados são a vancomicina e a daptomicina
(RODVOLD e McCONEGHY, 2014). Nos casos de falha no tratamento pela utilização
individual desses antimicrobianos, se faz necessário a utilização dos mesmos em
conjunto formando sinergismo ou com um β-lactâmico cessando a bacteremia
persistente (STEFANI et al., 2015; CHAMBERS et al., 2016).
A teicoplanina pertence à mesma classe da vancomicina, seu uso em maior
escala se deu apenas em 1980 pela similaridade com a vancomicina em espectro de ação
e eficácia (AHMED; HOLMES e HOWDEN, 2014; GUDIOL et al., 2017), tornando-se uma
opção no tratamento de ICS, endocardite, osteomielite e outras infecções por MRSA
(PACE e YANG, 2006).
Este patógeno ainda apresenta susceptibilidade à associação entre
sulfametoxazol-trimetoprim (SXT) (KRIEGESKORTE et al., 2015; GUDIOL et al., 2017), por
esse motivo tem sido usados com frequência no tratamento de ICS por MRSA com
prognóstico de sucesso (GOLDBERG e BISHARA, 2011; RODVOLD e McCONEGHY, 2014),
também em infecções de pele e partes moles por VISA e em outros tipos de infecções
por VRSA (NURJADI et al., 2014).
Estudos demonstraram grande eficácia no pré-tratamento com tetraciclinas
contra a formação de biofilme. Pacientes usuários de cateteres revestidos com
minociclina ou rifampicina não desenvolveram ICS, quando comparados com pacientes
sem o pré-tratamento (KIEDROWSKI e HORSWILL, 2011).
Pesquisas atuais demostraram o ressurgimento de estirpes S. aureus suscetível
à penicilina, talvez pela redução do seu uso clínico, melhorando assim o prognóstico das
infecções e favorecendo a utilização dos β-lactâmicos no tratamento das infecções
estafilocócicas (CHENG; RESMAN et al., 2016).

165
6. NOVAS PROPOSTAS TERAPÊUTICAS CONTRA A FORMAÇÃO DE
BIOFILME

A grande dificuldade no desenvolvimento de medidas de tratamento para as


infecções decorrentes da formação de biofilme, atualmente incentiva novos estudos na
tentativa de gerar compostos com atividade antimicrobiana e antibiofilme, gerando
modelos que ampliem as terapias existentes atualmente. Alguns desses estudos
realizados com S. aureus estão representados na Tabela 1.

Tabela 1 - Estudos realizados com o propósito de desenvolver novas estratégias terapêuticas


contra a formação de biofilme.
Atividade Antimicrobiana e Antibiofilme
Perspectivas
Composto/Derivados Resultados Obtidos Referências
futuras
Inibição da agregação, diminuição Utilização como
da interação célula-célula (perda bloqueador da
do aspecto em “cacho de uvas”) e formação de
redução em 66% da adesão em biofilme. Síntese KARAOLIS
Cyclic di-GMP
células HeLa. Possivelmente, é de análogos com et al., 2005
internalizado ocasionando propriedades
mudanças na expressão de semelhantes a
proteínas de superfície. fármacos.
Redução do biofilme em 3,1 log10
(99,9%) após único tratamento BIEL et al.,
com fotossensibilizador 1,25 mM Dados não 2011
Terapia Fotodinâmica
de EDTA + 5% de EtOH + 0,03% MB declarados. BIEL et al.,
na presença de luz 670 nm com 2013
2
taxa de fluência de 150 mW/cm .
Inibição da formação de biofilme
em 90% utilizado puro, como Inclusão no
adjuvante em meio de cultura na arsenal de
CHAIEB et
Timoquinona concentração 75 a 51 μg/ml inibi substâncias
al., 2011
em 90% e superior a 90% bioativas após
respectivamente a formação de estudos in vivo.
biofilme.
Desenvolvimento
Ambos superaram os resultados de produtos
obtidos em comparação com antissépticos,
BisBAL e antimicrobianos, BisBAL inibiu a atividade FOLSOM et
BisBDT/PYR* formação de biofilme ~40-80 antimicrobiana al., 2011
−1
μg/ml (>7,7) e BisBDT/PYR ~40- em feridas e
200 µg/ml−1 (log 4,9). antibiofilme em
feridas crônicas.

166
Potencial agente
terapêutico ou
adjuvante em
Susceptibilidade da estirpe clínica concentrações
JIA et al.,
Cinamaldeído e efetiva remoção do biofilme sub-MIC na
2011
com 5× a MIC. prevenção de
infecções
causadas por
biofilme.
Na concentração 100 mg/L inibiu
atividade metabólica em 23,0% (± Dados não COBRADO
Hamamelitannina
10,7%) e o sistema quorum- declarados. et al., 2012
sensing do biofilme.
Nova abordagem
para
revestimento de
Completa inibição da formação de superfícies
LELLOUCHE
Nanoparticulas (NPs) biofilme quando associadas a 0,1 estéreis de
et al., 2012
mg/ml de fluoreto de ítrio III (YF3). aplicação médica,
impedindo a
adesão
bacteriana.
Inibição da formação de biofilme
Dados não LINDSEY et
2-aminopirimidina por MSSA ~64-89% e por MRSA
declarados. al., 2012
~80,1-85,5%.
Alvo principal as células bacterianas no interior do
biofilme ou a matriz polissacarídica (PIA). Utilizando
como método a identificação de antígenos putativos
em proteínas de superfície “vacinologia reversa”,
análise transcriptômica de patógenos através de ARCHER et
Vacina
Microarranjos ou tecnologias baseadas em al., 2011
recombinação de expressão in vivo (RIVET), como
identificação de antígenos expressos in vivo durante
infecção. Entre as limitações está a seleção de
antígenos apropriados.
*Bismuto-2,3-dimercaptopropanol (2:3) (BisBAL); N-óxido de bismuto-2,3-
butanoditiol/bismuto-2-mercaptopiridina (2:1:2) (BisBDT/PYR).

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Staphylococcus aureus é um patógeno oportunista associado a infecções graves,


clinicamente alarmante devido à resistência a múltiplos antimicrobianos em especial os
β-lactâmicos. Os múltiplos fatores de virulência que possui são responsáveis pelo
agravamento da doença e evasão do sistema imune, entre os mais importantes está a
formação de biofilme, responsável por causar inúmeras infecções crônicas e
recalcitrantes. As terapias atuais para tratar e prevenir as infecções são limitadas e

167
insatisfatórias, levando a intervenção cirúrgica para retirada do implante contendo o
biofilme e assim implementação da terapia antimicrobiana, até o momento esse é o
melhor meio de cura.
A escassez de medidas terapêuticas, tem conduzido gradualmente a busca por
novas abordagens no tratamento dessas infecções. Atualmente pesquisadores
consideram hipóteses para o desenvolvimento de vacinas, tendo como alvo moléculas
e antígenos específicos combinando técnicas genômicas e proteômicas. Entretanto,
essas abordagens devem ser avaliadas cuidadosamente, necessitando investigação
aprofundada.

AGRADECIMENTOS

Gostaríamos de agradecer ao Instituto de Microbiologia Paulo de Góes, Universidade


Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil. Laboratório de Difteria e Corynebacteria de
Relevância Clínica, Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Brasil. Este estudo
foi financiado em parte pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
(CAPES) Código Financeiro 001 e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de
Janeiro (FAPERJ).

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180
CAPÍTULO XII

INFECÇÕES DO TRATO URINÁRIO CAUSADAS POR CORYNEBACTERIUM SPP.


Igor Ferreira da Silva1
Lincoln de Oliveira Sant’Anna2
Giorgio Silva de Santana3
Fellipe de Oliveira Cabral4
Louisy Sanches dos Santos Sant’Anna5
Ana Luíza Mattos-Guaraldi6
1 Graduando do curso de Ciências Biológicas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ
2 Doutorando em Microbiologia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ
3 Doutorando em Ciências (Microbiologia) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ
4 Mestrando em Microbiologia Médica Humana pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ
5 Pós-doutoranda da Faculdade de Ciências Médicas, Universidade do Estado do Rio de Janeiro – FCM/UERJ
6 Professora Doutora da Faculdade de Ciências Médicas, Universidade do Estado do Rio de Janeiro – FCM/UERJ

RESUMO

As infecções do trato urinário (ITU) acometem homens e mulheres de todas as faixas


etárias, afetando cerca de 150 milhões de pessoas por ano no mundo. Dentre as
espécies bacterianas mais frequentemente associadas às ITU está a Escherichia coli. Por
muitas décadas, o potencial patogênico da maioria das espécies do gênero
Corynebacterium foi subestimado. Atualmente, diversas espécies de Corynebacterium
têm sido descritas como agentes causadores de infecções humanas, sobretudo em
ambiente hospitalar. O objetivo do presente trabalho foi realizar um levantamento das
infecções no trato urinário por Corynebacterium spp. nos últimos cinco anos. A
estratégia de consulta utilizou o PubMed e a partir disso foram avaliados os artigos que
reportavam relatos de casos ou informações de ITU por Corynebacterium spp. Após o
levantamento bibliográfico, se iniciou a análise de dados direcionada para as variáveis:
espécie causadora, classificação da ITU e perfil de susceptibilidade aos antimicrobianos.
A partir das 80 referências fornecidas, 16 foram selecionadas após análise do abstract.
As espécies Corynebacterium coyleae e Corynebacterium urealyticum foram as mais
reportadas em ITU. Todas as espécies foram susceptíveis à vancomicina. Com base
nestes dados, torna-se imprescindível o aprofundamento no conhecimento das espécies
de Corynebacterium como agente etiológico de ITU, uma vez que estas estão entre as
infecções mais frequentes no ambiente hospitalar e na comunidade.

Palavras-chave: Bactérias. Corynebacterium spp. Infecção. ITU. Trato urinário.

1. INTRODUÇÃO

O gênero Corynebacterium caracteriza-se por bacilos Gram-positivos irregulares,


imóveis, não álcool-ácido resistente, aeróbios ou anaeróbios facultativos, não

181
formadores de esporos, catalase positiva e com elevado conteúdo G + C em seu DNA
(CRESCI, 2016; FUNKE et al, 1997; GHERARDI, 2015). Além destas características, a
presença de uma camada lipídica na parede celular constituída de ácido micólico está
presente na maioria das espécies desse gênero. Curiosamente, essa característica se
assemelha funcionalmente à membrana externa das bactérias Gram-negativas
(BURKOVSKI, 2013).
Por muitas décadas, o potencial patogênico das corinebactérias foi subestimado
e negligenciado. Atribui-se a isso o fato de muitas espécies pertencerem a microbiota
residente de pele e mucosas. Contudo, nas últimas décadas têm sido crescente o relato
de casos de infecções em humanos causadas por Corynebacterium spp. em diversos
sítios, além de surtos nosocomiais em países industrializados e em desenvolvimento
(BAIO, 2013; IARIA et al, 2007; SANT’ANNA, 2016). Dentre os quadros infecciosos
associados a corinebactérias, destacam-se: infecções respiratórias, endocardite,
infecções ortopédicas e infecções do trato urinário (ITU) (COSTALES et al, 2019; KALT et
al, 2018; LEE et al, 2018; SHARIFF et al, 2018). É preciso ressaltar que ainda são poucos
os estudos acerca do potencial patogênico e perfis de multirresistência aos agentes
antimicrobianos (MDR) destas espécies.
As ITU podem ocorrer em indivíduos do sexo masculino e feminino,
independente da faixa etária (DUBBS; SOMMERKAMP, 2019; MILLNER; BECKNELL,
2019). As ITU consistem na invasão do trato urinário por microrganismos, podendo
apresentar sinais e sintomas variados que, em casos mais graves, podem evoluir para
infecção sistêmica (COLLINS, 2019; KAUFFMAN, 2014; NICOLLE, 2013). As ITU podem ser
classificadas de acordo com a posição anatômica do órgão acometido: ITU inferior -
uretrite, cistite e prostatite; ITU superior - pielonefrite, nefrite intersticial e ureterite
(ANVISA, 2004; SMELTZER; BARE, 2005). A principal via de infecção utilizada pelos
uropatógenos é a via ascendente ou transuretral, em que o acesso à bexiga acontece
através da uretra. Adicionalmente, este pode ser dar pela via hematogênica ou por
extensão direta, em que o patógeno consegue acesso à bexiga através de uma fístula
formada pelo intestino (FLORES-MEIRELES, 2015; SMELTZER; BARE, 2005).
As ITU também podem ser classificadas como complicadas e não complicadas,
para as quais são recomendadas terapias diferenciadas. As ITU complicadas geralmente
ocorrem em indivíduos portadores de: anormalidades anátomo-funcionais no trato

182
urinário; diabetes mellitus; anemia falciforme; e cálculos renais. Podem ainda ocorrer
em pacientes submetidos a transplante renal, procedimentos cirúrgicos e/ou
instrumentação no trato urinário, e em mulheres grávidas. Na Alemanha, cerca de 21,6%
de todas as infecções nosocomiais ocorrem no trato urinário e em mais de 60% dos casos
desse tipo de infecção estão associadas com cateteres urinários. O número de pacientes
com bacteriúria, aumenta de 3 a 8% por cada dia que um paciente utiliza o cateter,
sendo que após 30 dias utilizando o cateter, praticamente todos os pacientes
apresentam bacteriúria (KRANZ et al, 2020; FENELEY et al, 2015).
As ITU não complicadas geralmente acometem indivíduos hígidos, incluindo
mulheres não grávidas. Observa-se que as ITU complicadas estão relacionadas ao
ambiente hospitalar, enquanto as ITU não complicadas são comumente observadas na
comunidade (ANVISA, 2004; GEERLINGS, 2016). Cerca de 20 a 30% das mulheres que
apresentam cistite aguda possuem casos recorrentes e apresentam esse quadro, em
média, de duas a três vezes por ano (MCLELLAN; HUNSTAD, 2016). A uretra é o canal de
eliminação da urina e ao redor do introito uretral externo, além da microbiota residente,
é possível que uropatógenos colonizem e consigam desencadear uma ITU. Esse cenário
é comumente observado em indivíduos imunocomprometidos. Há uma diferença
anatômica em relação ao tamanho da uretra de homens e mulheres favorecendo esse
tipo de infecção em indivíduos do sexo feminino. A uretra feminina por ser mais curta,
facilita os microrganismos patogênicos em alcançarem a bexiga e estabelecer a infecção.
Além disso, a entrada da uretra nas mulheres está mais próxima ao reto, o que
possibilita a contaminação e infecção por enterobactérias (FOXMAN, 2010; GEERLINGS,
2016).
Nos Estados Unidos da América, casos de ITU são frequentemente reportados,
afetando aproximadamente 7,5 milhões de mulheres por ano (COLLINS, 2019). No
mundo, o número de pessoas infectadas por ano ultrapassa 150 milhões. As infecções
podem ser causadas por diversos patógenos e muitos apresentam perfis MDR, sendo
considerados um grande problema para o sistema de saúde mundial, pois estão
associados à letalidade, hospitalização prolongada e, consequentemente, ao aumento
de custos (MCLELLAN; HUNSTAD, 2016; STAPLETON, 2016; TRENTIN et al, 2013).
As ITU podem ser causadas por diversos patógenos, estando a Escherichia coli
relacionada com 65 e 75% dos casos complicados e não complicados, respectivamente.

183
Enterococcus spp. e Candida spp. também têm sido capazes de causar ITU em pacientes
que utilizam dispositivos invasivos urinários. Ainda que em menor frequência, outros
patógenos Gram-negativos e Gram-positivos também podem causar ITU tanto no
ambiente nosocomial quanto na comunidade. Dentre esses patógenos, destacam-se
bactérias pertencentes a família Enterobacteriaceae, Pseudomonas aeruginosa,
Acinetobacter spp., Stenotrophomonas spp., além de Staphylococcus aureus,
Streptococcus do grupo B, Enterococcus spp. e Corynebacterium spp. (CHIN et al, 2011;
FLORES-MIRELES et al, 2015; MARTINS et al, 2009; CAMELLO et al, 2003; NICOLLE, 2013).
O presente trabalho teve como objetivo analisar os dados clínicos e
microbiológicos de casos de ITU causadas por Corynebacterium spp. reportados na
literatura internacional nos últimos cinco anos (2015-2019).

2. METODOLOGIA

A estratégia de consulta utilizou o PubMed como banco de indexação de


resumos da literatura científica de nível acadêmico, entre janeiro e agosto de 2020. Os
descritores utilizados foram: “Corynebacterium”, “urinary tract infection”,
“Corynebacterium and cystitis”, “Corynebacterium and pyelonephritis”,
“Corynebacterium and urethritis” e “Corynebacterium and prostatitis”. Como critérios
de inclusão foram avaliados os artigos que reportavam relatos de casos ou informações
de ITU por Corynebacterium spp. Após o levantamento bibliográfico, a análise de dados
foi direcionada para as variáveis: espécie causadora, classificação da ITU e perfil de
susceptibilidade aos antimicrobianos.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Diversas espécies de Corynebacterium têm sido descritas como agentes


causadores de infecções humanas, sobretudo em ambiente hospitalar. No presente
estudo, a partir das 80 referências fornecidas seguindo a metodologia descrita, foram
selecionados 16 artigos contendo relato de casos de ITU por Corynebacterium spp. Os
artigos selecionados, bem como os dados das variáveis investigadas, podem ser
visualizados na Tabela 1.

184
Tabela 1. Casos de infecções do trato urinário por Corynebacterium spp. relatados na
literatura internacional entre 2015 e 2019

No do Casos
Artigos Espécie isolada Topografia Multirresistência
artigo reportados

ACOSTA et al. Corynebacterium


1 NI* NI 1
(2017) riegelii
BARBERIS et al. Corynebacterium
2 NI* MDR 1
(2018) coyleae
COSTALES et Corynebacterium
3 NI NI 1
al. (2019) urealyticum
GHERARDI et Corynebacterium
4 Uretrite MDR 1
al. (2015) glucuronolyticum
GILA et al. Corynebacterium
5 NI* MDR 1
(2018) jeikeium
LANSALOT-
Corynebacterium
6 MATRAS et al. Cistite* NI 4
urealyticum
(2016)
Corynebacterium
7 LO et al. (2015) NI MDS 1
aurimucosum
MARTÍNEZ et Corynebacterium
8 Prostatite* NI 1
al. (2018) urealyticum
MARTÍN-
Corynebacterium
9 NAVARRO et NI* NI 1
urealyticum
al. (2015)
MEŠTROVIĆ Corynebacterium
10 Uretrite NI 3
(2019) glucuronolyticum
OZKAN et al. Corynebacterium
11 Cistite* NI 1
(2018) urealyticum
PERRUCCI et Corynebacterium
12 Cistite* NI 1
al. (2016) simulans

185
PICHON et al. Corynebacterium
13 NI* NI 1
(2019) riegelii
SAKHI et al. Corynebacterium
14 NI* NI 1
(2018) urealyticum
SALJOGHI et al. Corynebacterium
15 NI* NI 1
(2016) urealyticum
SOKOL-
Corynebacterium
16 LESZCZYNSKA NI NI 39
coyleae
et al. (2019)
Legenda: NI, não informado; MDR, multidroga resistente; MDS, multidroga sensível; *, ITU complicada.
Fonte: Autoria própria.

Como observado na Tabela 1, nos últimos 5 anos, 59 cepas, pertencentes a 7


espécies de Corynebacterium spp., foram isoladas de ITU e reportadas na literatura.
Dentre estas espécies, Corynebacterium coyleae foi a predominante (n=40, 67,80%),
seguida de Corynebacterium urealyticum (n=10, 16,95%). É preciso ressaltar que três
trabalhos (LANSALOT-MATRAS et al, 2016; MEŠTROVIĆ, 2019; SOKOL-LESZCZYNSKA et
al, 2019) relataram mais de um caso de ITU causada por Corynebacterium spp. Quanto
à topografia das ITU, foi possível observar que a maioria dos trabalhos (n=10, 62,50%)
não especifica a região acometida. Contudo, dentre os 11 casos em que a topografia é
especificada, a cistite foi a mais frequente (n=6, 54,54%), seguida da uretrite (n=4, 36,36
%) e prostatite (n=1, 9,10%). Este dado corrobora a literatura, segundo a qual a cistite é
considerada um dos tipos mais comuns de ITU (KOLMAN, 2019). Dentre os artigos
analisados, o de SOKOL-LESZCZYNSKA et al. (2019) não permitiu a classificação das ITU
em complicada e não complicada, pois não descreve os casos individualmente. As ITU
complicadas corresponderam a 11 dos 20 casos restantes (55%).
Na Tabela 1 é ainda possível observar que dos 16 trabalhos selecionados, apenas
4 investigaram o perfil de susceptibilidade dos isolados aos antimicrobianos (25%). Os
perfis de susceptibilidade dos isolados estão apresentados na Tabela 2.

186
Tabela 2. Perfis de susceptibilidade aos antimicrobianos das cepas de
Corynebacterium spp. isoladas de casos de infecção urinária relatados na literatura
internacional entre 2015 e 2019
Antimicrobianos

No do
Pe Te
artig Amp Rif Gen Lzd Ceft Cefo Imi Cip Eri Cli Van Sxt Nit Fos Lev Mem
n t
o

2* R NT NT NT NT NT R NT NT I NT NT S R NT NT NT NT

4* S NT NT S R S NT S NT S R R S NT NT NT NT NT

5* R S NT NT S NT NT R NT NT NT NT S NT NT R R R

7 R S NT NT NT NT NT S S NT S NT S R NT NT NT NT

Legenda: Pen, penicilina; Tet, tetraciclina; Amp, ampicilina; Rif, rifampicina; Gen, gentamicina; Lzd,
linezolida; Ceft, ceftriaxona; Cefo, cefotaxima; Imi, imipenem; Cip, ciprofloxacina; Eri, eritromicina, Cli,
Clindamicina; Van, vancomicina; Sxt, sulfametoxazol com trimetoprima; Nit, nitrofurantoína; Fos,
fosfomicina; Lev, levofloxacino; Mem, meropenem; S, sensível; R, resistente; I, intermediário; NT, não
testado, *, Multirresistência.

Fonte: Autoria própria.

Na Tabela 2, é possível observar que, embora os isolados clínicos tenham sido


isolados de ITU, para as quais os principais antimicrobianos preconizados são as
sulfonamidas, fluoroquinolonas e beta-lactâmicos (MCLELLAN; HUNSTAD, 2016),
apenas penicilina e vancomicina foram testadas por todos os autores. Este fato pode ser
explicado pelas divergências entre os comitês utilizados para as análises. Além disto, em
nenhum dos trabalhos, a susceptibilidade à ampicilina, principal beta-lactâmico indicado
em casos de ITU, foi investigada.
O aparecimento de cepas resistentes de Corynebacterium spp. vem sendo
descrita há alguns anos por diversos pesquisadores (BAIO et al, 2013; CAMPANILE et al,
2009; DRAGOMIRESCU et al, 2020; RAMOS et al, 2020; ZOU et al, 2020.). Dentre os
antimicrobianos para os quais tem sido observada elevada resistência, está a penicilina.
Conforme observado na Tabela 2, apenas um dos isolados apresentou sensibilidade a
este antimicrobiano.
O fenótipo MDR também já foi descrito na literatura para algumas espécies deste
gênero, como: Corynebacterium striatum, C. urealyticum e Corynebacterium jeikeium. É

187
preciso destacar que alguns isolados desta última espécie foram encontrados
apresentando sensibilidade apenas à vancomicina (MARTINS et al, 2009). Dentre as
cepas testadas nos trabalhos investigados no presente estudo, 3 apresentaram perfil
MDR (75%) e pertenciam às espécies: C. coyleae, Corynebacterium glucuronolyticum e
C. jeikeium. Ressalta-se a preservação da susceptibilidade à vancomicina entre as cepas
testadas, incluindo naquelas com perfil MDR.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As ITU são consideradas um grave problema de saúde pública em todo mundo.


Embora os principais uropatógenos sejam bactérias Gram-negativas, espécies Gram-
positivas, como do gênero Corynebacterium, vêm emergindo como agentes causadores
destas infecções. Contudo, dificuldades no isolamento e identificação laboratorial, em
parte devido à carência de testes e procedimentos padronizados para caracterização
destes isolados em laboratórios microbiológicos de rotina, levam à perda dos isolados
e, assim, à subnotificação dos casos. Além disto, estas espécies têm seu potencial como
uropatógenos subestimado devido à descrição como componentes da microbiota
residente humana e à carência de dados acerca dos seus mecanismos de virulência.
Como observado neste levantamento, diferentes espécies do gênero Corynebacterium
apresentam a capacidade de causar ITU, inclusive do tipo complicada. Ressalta-se o
isolamento de cepas com fenótipo MDR. Estudos adicionais com enfoque na
investigação do potencial de virulência, bem como na aquisição e evolução da
resistência aos antimicrobianos, permanecem necessário para o melhor manejo clínico
destas infecções.

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193
CAPÍTULO XIII

IDENTIFICAÇÃO DE BACTÉRIAS NOCIVAS DECORRENTES DO MANUSEIO


INCORRETO DO KEFIR
Inaam Al Hafi ¹
Camila Valéria Da Silva ²
Monica Chen ³
¹ Graduanda do curso de Farmácia. Centro Universitário Dinâmica Das Cataratas – UDC
² Graduanda do curso de Farmácia. Centro Universitário União Das Américas – UniAmérica
³ Graduanda do curso de Farmácia. Centro Universitário União Das Américas – UniAmérica

RESUMO

O presente artigo apresenta um estudo feito a partir de amostras de grãos de Kefir,


produto esse, originário das montanhas do Cáucaso, localizado na Rússia. Este alimento
possui valores nutricionais significativos ao que diz respeito à qualidade de vida e saúde.
Desta forma, nos últimos anos a procura por esse produto aumentou, porém não há
normas que regem padrões de higiene em sua manipulação por ser um produto de
cultivo domiciliar sem nenhum órgão fiscalizador. Diante disso, a presente pesquisa
evidenciou a presença e a identificação de bactérias patogênicas nas amostras
analisadas e a elaboração de um manual de boas práticas para um correto cultivo dos
grãos.

Palavras-chave: Kefir. Bactérias. Identificação. Manipulação. Contaminação.

1. INTRODUÇÃO

O Kefir é uma associação simbiótica de leveduras, bactérias e ácidos láticos,


envoltos por uma matriz de polissacarídeos, apresentando forma irregular e cor
amarelada ou esbranquiçada. Rico em bactérias dos gêneros 41 lactobacilos, lactococos
e leuconostoc, seu consumo melhora a digestão de proteínas, absorção de vitaminas e
minerais, reduzindo significativamente os níveis de colesterol total com diminuição do
LDL colesterol. Decorrente de seus benefícios nutricionais significativos,
consequentemente houve aumento de seu consumo, desencadeando um progressivo
cultivo domiciliar, carente de normas que regem padrões de higiene em sua
manipulação. Tal fato adjunto à escassa de informação da população culmina em um
elevado número de indivíduos que desconhecem a maneira correta de manipulá-lo,

194
ocasionando contaminação por bactérias patogênicas. O presente artigo, por meio da
realização de provas bioquímicas e análises microbiológicas buscou a identificação de
bactérias presentes em três amostras de Kefir, bem como a legitimação da necessidade
de seguir corretamente um manual de boas práticas na manipulação desse probiótico.

2. METODOLOGIA

Para a elaboração desse manual de boas práticas no manuseio de Kefir, foram


feitas análises de materiais coletados na cidade de Foz do Iguaçu-PR, voluntariamente
cedidos por cultivadores, entre os meses de agosto e setembro de 2018.
Posterior à coleta do material, foi feito o cultivo das amostras por sete dias pelo
método tradicional (www.kefir.com.br) antes de sua semeadura em meios sólidos de
ágar em placas de Petri para verificação da presença de microrganismos patogênicos.
A partir dessa semeadura foram realizadas análises microbiológicas e
bioquímicas, com o objetivo de identificar cepas bacterianas patogênicas presentes nas
amostras.
A coleta foi realizada do material congelado e transportado em recipiente
esterilizado.
Seu preparo e armazenamento ocorreram da seguinte forma:
• Iniciou-se o descongelamento da amostra em temperatura ambiente;
• Após completo descongelamento, os grãos passaram por peneiramento
e posterior enxague com leite.
• Houve esterilização de recipiente de vidro com água fervente, e após
resfriamento, foram depositados os grãos em seu interior, seguido de
500 ml de leite integral UHT em temperatura ambiente.
• Os recipientes foram tampados com uma folha de papel toalha, preso
com borracha, evitando que adentre algum inseto ou poeira na amostra,
e permitindo também a respiração do Kefir.
• As amostras foram deixadas em local arejado, com temperatura em torno
de 25° C, por um prazo de 24 horas;
• Após o prazo estabelecido, o leite foi coado, separando dos grãos, e a
partir desse leite fermentado foram realizadas as análises.

195
Para visualizar a presença de microrganismos, foram realizadas semeaduras nos
seguintes meios: Ágar Sangue, Ágar MacConkey e Ágar Nutritivo. Posteriormente, feito
o Teste de Coloração de Gram para visualizar a sua morfologia e Prova da Catalase para
diferenciar estreptococos e estafilococos. Foram realizadas também Provas Bioquímicas
em meios: Citrato Simmons, SIM (Sulfato Indol Motilidade) e TSI (Triplo Açúcar Ferro). E
como testes confirmatórios, utilizaram-se caldo BHI e Ágar Manitol.
Após a identificação das bactérias prejudiciais presentes, elaborou-se um manual
contendo o passo a passo no manuseio do Kefir, bem como de seu armazenamento,
doação e descarte, a fim de reduzir riscos decorrentes de contaminação, para que seus
benefícios sejam amplamente aproveitados.

3. RESULTADOS

A partir dos testes feitos na amostra de número 1 foram encontradas bactérias


do tipo cocos gram-positivo (figura 1), não apresentando crescimento no ágar sangue,
TSI, SIM e Citrato Simmons (figura 2). Catalase negativa, com crescimento apenas no
Caldo BHI, confirmando a presença de bactérias da espécie Enterococos faecalis. Na
amostra de número 2 foram encontradas bactérias do tipo cocos gram-positivo (figura
3), prova de catalase e TSI positivos. Sendo os resultados dos testes SIM e Citrato
Simmons negativos (figura 4). No entanto, houve crescimento no ágar Manitol,
confirmando resultado positivo para a presença de Staphylococcus aureus. No que tange
a amostra de número 3 foram encontrados bacilos gram-negativo (figura 5), além da
prova da catalase, TSI, SIM e Citrato Simmons também com resultados positivos (figura
6), assim evidenciando bactérias do gênero da Salmonella spp, e demais bactérias como
Enterobacter aerogenes, Enterobacter cloacae e Klebsiella oxytoca.
Figura 1 - Microscopia com Cocos Gram positivos

196
Figura 2 - Na ordem: TSI, SIM e Citrato Simmons

Figura 3 - Cocos Gram Positivo

Figura 4 - Na ordem: TSI, SIM e Citrato Simmons

Figura 5 - Bacilos Gram negativos

Figura 6 - Na ordem: TSI, SIM e Citrato Simmons

197
4. CONCLUSÃO

Os resultados obtidos demonstraram que todas as amostras analisadas


apresentavam algum grau de contaminação decorrente da falta de boas práticas no
manuseio dos grãos de Kefir. Contaminações essas, que comprometem o bom
funcionamento do organismo de quem o consome, acarretando no desenvolvimento de
patologias.
Pois de nada adianta consumir um probiótico de alto poder nutricional, que
dentre vários benefícios, conta com capacidade de equilíbrio da flora intestinal, porém
paralela a toda essa benesse ocorrer a ingestão associada de bactérias prejudiciais a
saúde.
De acordo com os resultados, fica claro também a falta de conhecimento da
população quanto à manipulação correta desse alimento. Evidenciando a necessidade
da implantação do manual elaborado a partir do presente artigo onde o mesmo
apresenta um padrão de normas a serem seguidas, a fim de evitar o comprometimento
nutricional do Kefir.

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199
CAPÍTULO XIV

INFECÇÃO POR TREPONEMA PALLIDUM E DANOS NO DESENVOLVIMENTO


EMBRIONÁRIO E FETAL
Neusa Loíse Nunes Albuquerque ¹
Maria Nicolle Pereira da Silva ²
Maria Lusia de Morais Belo Bezerra ³
¹ Graduanda do curso de Ciências Biológicas. Universidade Federal de Alagoas – UFAL
² Graduanda do curso de Ciências Biológicas. Universidade Federal de Alagoas – UFAL
³ Professora da Universidade Federal de Alagoas – UFAL

RESUMO

A sífilis é causada pelo Treponema pallidum e transmitida, principalmente, por via sexual
desprotegida e por via materno-fetal, culminando com a Sífilis Congênita (SC). Nessa forma de
infecção ocorrem danos no embrião/feto, ocasionando aborto, natimorto, prematuridade ou
um amplo espectro de manifestações clínicas. Diante deste contexto, este trabalho teve por
objetivo realizar uma revisão integrativa acerca dos principais fatores que promovem a infecção
e danos causados por T. pallidum durante o desenvolvimento embrionário e fetal. Trata-se de
uma revisão integrativa, realizada nas bases de dados LILACS e Scielo, considerando o intervalo
de 2010 a 2019. Foi conduzida em consonância com a questão norteadora, utilizando os
descritores: “sífilis congênita” e “Treponema pallidum” com o operador booleano "AND". Os
estudos foram pré-selecionados obedecendo aos critérios de inclusão e exclusão, no qual
totalizaram 13 estudos, destes, 08 artigos foram selecionados. Observou-se que as gestantes
realizam o pré-natal inadequado desencadeando danos que podem ser irreversíveis ao filho,
quando infectado durante a gestação. O T. pallidum pode atingir a placenta e o cordão umbilical
e, ainda, alcançar órgãos importantes para o desenvolvimento, principalmente, pós-
nascimento. E ainda, causar anomalias, como a hepatoesplenomegalia e hidrocefalia
comunicante, no sistema nervoso, entre outros sintomas, podendo inviabilizar ou prejudicar a
qualidade de vida e bem-estar do indivíduo.

Palavras-chave: Espiroquetas. Microrganismo. Neurologia. Sífilis

1. INTRODUÇÃO

As Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) atingem um grande número de


indivíduos de várias faixas etárias anualmente em todo o mundo, onde, se diagnosticada
tardiamente, pode ocasionar, no mínimo, ineficácia de medicamentos que atenuam as
manifestações e, no máximo, morte. Indivíduos de regiões em desenvolvimento são os
mais vulneráveis, principalmente, pela falta de informação disseminada entre a

200
população e isenção de assistência médica (CESAR et al., 2020; SVIDLER LÓPEZ et al.,
2019). De acordo com informações contidas na Pesquisa Assistência Médico-Sanitário
(BRASIL, 2002), dentre as capitais brasileiras, o Rio de Janeiro é a capital onde existem
mais indivíduos que não procuram atendimento médico pelo SUS (Sistema Único de
Saúde) em nenhum momento do ano.
Uma das IST mais destacável por sua prevalência é a sífilis que possui como
agente etiológico a bactéria gram-negativa e espiralada, Treponema pallidum. Na
maioria dos casos, a sífilis é transmitida por via sexual desprotegida, entretanto, outras
vias podem participar no processo de contágio, bem como contato direto com feridas
principalmente localizadas na boca e mãos de indivíduos hospedeiros do T. pallidum
(SÁNCHEZ et al., 2019).
Ademais, a sífilis apresenta quatro fases ou estágios distintos característicos,
denominadas: primária, secundária, latente e terciária. A sífilis primária é a primeira
forma de manifestação da presença da bactéria no organismo, onde é demonstrada com
feridas ricas em bactérias dispostas em algumas regiões do corpo, porém, são
comumente encontradas nos lábios (AVELLEIRA; BOTTINO, 2006).
Quando não tratada, a sífilis pode evoluir para sua fase secundária que, além das
feridas típicas, notam-se outros sintomas, por exemplo, a dor muscular e febre
(SÁNCHEZ et al., 2019). Anterior à fase terciária, o indivíduo pode entrar em um quadro
de latência, entretanto, ainda é soropositivo para sífilis mesmo sendo assintomático e,
ainda, pode permanecer nessa fase durante meses ou até 30 anos sequenciais (KALININ
et al., 2016).
A fase terciária é o último estágio de evolução da infecção que, além dos
sintomas já citados, a infecção atinge outros órgãos importantes, o que causa
desestabilização das funções vitais exercidas pelo corpo, bem como o fígado com o
desenvolvimento de hepatomegalia, ou seja, ocasiona o aumento anormal das
proporções do tamanho desse órgão (TORTORA et al., 2016; AVELLEIRA; BOTTINO,
2006).
Outrossim, a sífilis não é exclusivamente partilhada entre indivíduos já nascidos,
ela também pode ser transmitida por via vertical entre a portadora, a genitora, e o feto
em desenvolvimento nos primeiros três meses da fase gestacional. E, dependendo da
fase da infecção em que se encontra a gestante, pode alterar o estado normal de

201
crescimento e, consequentemente, resultar em mudanças importantes durante a
formação dos órgãos do feto em questão (BOLDRINI et al.,2020; SILVA et al., 2019).
Na última década, a sífilis congênita (SC) teve um aumento significativo no Brasil,
que ultrapassou o número de 9 casos de SC a cada 1.000 indivíduos nascidos vivos
(BRASIL, 2019). Entre os anos de 2010-2015, as cinco regiões do Brasil tiveram o
aumento contínuo das taxas de SC, para cada ano, o Nordeste e o Sudeste foram as
regiões que mais apresentaram aumento dos casos de SC, de 2,7 a 6,9 / 1.000 nascidos
vivos. Já as taxas na região Sul em 2015 eram consistentes com as do Nordeste e
Sudeste, com a estimativa de 6,9/ 1.000 nascidos vivos (BEZERRA et al., 2019). Esse
resultado mostra uma estatística cada vez mais crescente em casos diagnosticados de
SC e relembra os principais riscos para os nascidos que, logo, se tornarão adultos com
problemas, já que pode desencadear imediatamente ou futuramente um amplo
espectro de manifestações clínicas importantes e possivelmente crônicas (OPAS, 2019).
De acordo com Rocha e colaboradores (2020), quando não há a manifestação
prévia, o indivíduo pode desencadear esses sintomas e outros ao longo da vida
refletindo nos estágios da sífilis, entretanto, o indivíduo pode nascer com um quadro de
morte prematura ou, em muitos casos, em abortos.
Portanto, para conduzir o presente estudo, desenvolveu-se a seguinte questão
norteadora: O que mostram as pesquisas científicas sobre as causas e consequências da
infecção por T. pallidum no desenvolvimento embrionário e fetal? Nesse sentido, o
objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão integrativa acerca dos fatores que
promovem a infecção e danos causados por T. pallidum durante o desenvolvimento
embrionário e fetal.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

A SC é uma condição na qual o indivíduo do sexo feminino, com um quadro de


gravidez confirmado e com a presença do T. pallidum no organismo, contamina o
embrião/feto por meio da placenta principalmente na fase latente da sífilis, entretanto,
também é possível a infecção nas fases primárias e secundárias, normalmente, resulta
em natimorte (TORTORA et al., 2016).

202
Por conta das manifestações visíveis da sífilis adquirida, pode haver a
desconfiança da genitora e sua confirmação por meio de exames laboratoriais realizados
durante o pré-natal, porém, quando não há o tratamento adequado da gestante, haverá
uma grande chance do feto nascer com SC e, dessa forma, a prevalência da SC em
gestantes tornou-se um indicador de qualidade da assistência e acessibilidade à saúde
(MARASCHIN et al., 2019).
Segundo o Sistema de Informações de Agravos de Notificação (SINAN) em
conjunto com o Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções
Sexualmente Transmissíveis - DCCI, nos anos de 2005 a 2020, os casos totais de sífilis em
gestantes no Brasil foi quantificado em 384.411 casos, sendo que a maioria ocorreu em
2019, 25,1% dos casos foram classificados clinicamente como pertencentes à sífilis
primária. Com relação à SC, os números também são elevados sendo registrados
236.355 casos no mesmo intervalo de tempo já citado.

2.1. Características da sífilis em recém nascidos

Cerca de 90% dos casos de sífilis gestacional desenvolve-se em congênita em


todo o globo e os principais sintomas podem manter-se em um período de latência ou
manifestar-se logo após os três primeiros meses de vida (ECHAVEZ SÁNCHEZ; BULA
ROMERO, 2019). No recém-nascido, a sífilis pode manifestar-se visualmente em feridas
cutâneas que geralmente estão localizadas nas mãos e, além disso, no desenvolvimento
também em complicações bem como, anemia e baixo peso corporal (TREVISAN et al.,
2018).
Segundo Ocampo-Chaparro e colaboradores (2019), a sífilis sem
diagnóstico e tardia pode causar sérios danos neurais, bem como o AVC (Acidente
Vascular Cerebral), problemas auditivos, deficiências motoras, disfunção cognitiva e
entre outros, já que o T. pallidum possui a capacidade de adentrar as barreiras protetivas
existentes na entrada do cérebro, onde uma das funções, teoricamente, é inviabilizar a
entrada de invasores nocivos, dessa forma, a invasão da bactéria ocasiona danos ao
Sistema Nervoso Central e condições subjacentes.
Segundo Barros et al. (2005), essa invasão pode ocorrer durante a sífilis em seu
estágio precoce, entretanto, o sistema imunológico presente no indivíduo pode agir
contra a infecção e quando isso não acontece, a neurossífilis (Infecção por T. pallidum

203
ao SNC, meninges e medula espinhal) pode desencadear, entre os 5 e 12 anos, em
complicações na regulação e controle das células imunológicas, já na neurossífilis em
sua versão tardia, entre os 18 e 25 anos, o quadro pode evoluir para atrofia cerebral e
outras complicações ao indivíduo.
As lesões ósseas, geralmente, são diagnosticadas após o quinto mês de
desenvolvimento da gestação e são uma das primeiras formas de manifestação da SC
antes do nascimento, ainda, as lesões podem varias de acordo com a fase da SC, precoce
e tardia, uma vez que são, respectivamente, periostite e a osteólise, onde a segunda
pode evoluir para necrose do osso na vida adulta ( MOREIRA-SILVA et al., 2009).
Ademais, ainda por ser um desenvolvimento ósseo considerado doloroso, uma
vez que a criança está com alterações radiológicas importantes e possivelmente um
deslocamento, faz com que os movimentos das extremidades do corpo seja bastante
reduzida, o que leva ao desenvolvimento de pseudoparalisia de Parrot e, por fim, na
maioria dos casos de SC, os ossos humanos mais atingidos são aqueles que possuem
estaturas longas, bem como a tíbia (GAMEIRO et al., 2017).

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Trata-se de uma revisão integrativa de literatura, compreendendo o período de


2010 a 2019, acerca da infecção por T. pallidum e os danos que esta bactéria pode
ocasionar durante o desenvolvimento embrionário e fetal no. A revisão integrativa é um
método de pesquisa que permite a síntese de múltiplos estudos publicados, no qual
inclui a análise de pesquisas relevantes que dão suporte para a tomada de decisão e a
melhoria da prática clínica do estado de conhecimento de determinado assunto
(MENDES; SILVEIRA; GALVÃO, 2008).
A revisão integrativa seguiu passos para a construção, do qual iniciou-se pela
questão norteadora, em sequência pela escolha dos descritores, que foram: “sífilis
congênita” e “Treponema pallidum” utilizando o operador booleano “AND” nas
estratégias de busca. A coleta de dados foi realizada nas bases de dados LILACS
(Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde) e SCIELO (Scientific
Electronic Library Online). Os critérios de inclusão foram: publicações disponíveis on-line
e gratuitas, com idioma em português, com texto completo, com intervalo de tempo

204
compreendido entre 2010 a 2019 e documentos do tipo artigos originais e de revisão.
Os critérios de exclusão foram: publicações fora do foco da temática após a leitura de
título e resumo, com idioma inglês, espanhol, alemão e francês, estudos incompletos,
indisponíveis e duplicados.
A partir das buscas padronizadas nas bases de dados realizadas em julho de 2020,
foram encontrados 103 estudos, os quais após aplicação dos critérios pré-definidos
foram excluídas 90 publicações. Após a leitura de título e resumo das 13 publicações
pré-selecionadas, conservaram-se 08 para análise detalhada.
Para a análise dos estudos selecionados, todos foram lidos com atenção voltada
para o foco da temática e atendendo as exigências, procurando responder a questão
norteadora. Desta forma, foram organizadas duas categorias temáticas: a) Fatores
relacionados à transmissão vertical do T. pallidum; e, b) Danos causados pelo T. pallidum
durante o desenvolvimento embrionário e fetal.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A maioria das publicações (07 artigos) foi localizada na base Lilacs,


representando 87,5% dos estudos coletados, enquanto 12,2% (01 artigo) foi encontrado
na base Scielo. Dentre os artigos incluídos, foram identificados alguns tipos de estudos,
caracterizados pelos autores como: ecológico (2), exploratório-descritivo (1), revisão de
literatura (1), descritivo e retrospectivo (2), epidemiológico descritivo (1) e estudo de
caso (1). Quanto ao ano de publicação se obteve a seguinte distribuição: 2018 (2), 2017
(2), 2016 (1), 2014 (1), 2012 (2). Essas informações podem ser visualizadas no quadro 1.

205
Quadro 1- Caracterização dos trabalhos selecionados para análise crítica.

N° AUTOR (ES) / TÍTULO TIPO DE ESTUDO BASES DE


ANO DADOS

01 Galatoire; Incidência de sífilis Ecológico LILACS


Rosso; Sakae congênita nos estados do
(2012) Brasil no período de 2007 a
2009

02 Mesquita et al Análise dos casos de sífilis Exploratório- LILACS


(2012) congênita em Sobral, Ceará: descritivo
contribuições para
assistência pré-natal

03 Romanelli et Abordagem neonatal nas Revisão de LILACS


al (2014) infecções congênitas - literatura
toxoplasmose e sífilis

04 Lafetá et al Sífilis materna e congênita, Descritivo e SciELO


(2016) subnotificação e difícil retrospectivo
controle

05 Silva; Sousa; Incidência da sífilis Ecológico LILACS


Sakae (2017) congênita no estado de
Santa Catarina no ano de
2012

06 Lima et al Perfil epidemiológico dos Epidemiológico, LILACS


(2017) casos de sífilis congênita em descritivo
um município de médio
porte no nordeste brasileiro

07 Ramos; Boni Prevalência da sífilis Descritivo LILACS


(2018) gestacional e congênita na retrospectivo
população do município de
Maringá –PR

08 Andrade et al Diagnóstico tardio de sífilis Estudo de caso LILACS


(2018) congênita: uma realidade na
atenção à saúde da mulher
e da criança no Brasil

Fonte: Dados da pesquisa.

206
4.1. Fatores relacionados à transmissão vertical do T. pallidum

Ocorrências dos casos de SC estão intrinsecamente ligadas às falhas do


tratamento das gestantes infectadas, focando na detecção precoce da gestante, no
diagnóstico, e tratamento da sífilis adquirida, assim como na captação dos parceiros
(LIMA et al., 2017). Há falhas no acompanhamento dos parceiros sexuais com sífilis
adquirida recente, que atuam como casos-fontes de disseminação da doença, da
transmissão vertical da bactéria (MESQUITA et al., 2012). Para intervir com a doença
durante a gestação com a finalidade de evitar a infecção do concepto, a forma mais
simples de possibilitar o diagnóstico precoce é com o pré-natal (RAMOS; BONI, 2018).
Elementos fundamentais no enfrentamento da sífilis por transmissão vertical são
ações de diagnóstico e prevenção, que precisam ser reforçados especialmente no pré-
natal e no parto (GALATOIRE; ROSSO; SAKAE, 2012). Vale ressaltar, a excelência da
realização do exame não-treponêmico VDRL (Venereal Disease Research Laboratory)
para a detecção da infecção da bactéria, no que resulta no diagnóstico, podendo iniciar
o tratamento contra a doença. Os reagentes dos exames de VDRL pode dar resultados
1:1, e outro 1:4, a titulação em recém-nascido é maior que a da mãe, que indica que foi
infectado, diagnosticado com SC (ANDRADE et al., 2018; MESQUITA et al., 2012; SILVA;
SOUSA; SAKAE, 2017). A detecção do DNA do T. pallidum pela reação da cadeia da
polimerase (PCR) destaca-se também como técnica promissora para o diagnóstico pré-
natal e pós-natal (ROMANELLI et al., 2014). Adicionalmente, para o teste confirmatório
de SC consiste na pesquisa de espiroquetas em anexos embrionários, em amostras da
placenta e cordão umbilical dos recém-nascidos (RAMOS; BONI, 2018).

4.2. Danos causados pelo T. pallidum durante o


desenvolvimento embrionário e fetal

A transmissão ao concepto é bem maior nas etapas iniciais da doença, quando


há mais espiroquetas na circulação. Com isso, a infecção por T. pallidum desencadeia
danos que podem ser irreversíveis à portadora e, principalmente, ao filho. A bactéria
atinge os anexos embrionários, como a placenta e o cordão umbilical (MESQUITA et al.,
2012).

207
De acordo com os estudos de Lafetá et al. (2016) as gestantes entre 20 e 30 anos
estão mais propensas a desenvolver fetos com SC e as suas consequências. No estudo
de Silva, Sousa e Sakae (2017) foi possível observar que cerca de 80% dos casos
apresentavam-se assintomáticos, porém os casos que apresentavam sintomas,
manifestam na forma, principalmente, icterícia, anemia, esplenomegalia,
hepatomegalia e lesões cutâneas nos recém-nascidos.
A sífilis adquirida durante a gravidez pode resultar na reabsorção do embrião,
aborto, natimorto, malformação dentre outras sequelas pós-natais variáveis de
apresentação precoce ou tardia. Considera-se SC quando é diagnosticado no período
durante a gestação, parto ou puerpério. E apesar da existência da sífilis recente (até dois
anos de vida) que apresenta diversas anomalias que o bebê desenvolve ao nascer, como
lesões bolhosas, condiloma latum etc, a tardia (após dois anos de vida), por ter sintomas
como ceratite intersticial, surdez dentre outros sintomas, mostra-se agressiva e mais
prejudicial (ROMANELLI et al., 2014).
Alguns sintomas como alterações ósseas importantes, icterícia, lesões cutâneas,
função hepática alterada e alterações musculares, relacionados à SC são destacados por
Ramos e Boni (2018). Além disso, a SC também pode afetar o sistema nervoso central,
onde há a possibilidade do indivíduo nascer com diversas anomalias, bem como a
hidrocefalia comunicante, dentre outros (ROMANELLI et al., 2014; SILVA; SOUSA; SAKAE,
2017).
Segundo Andrade et al. (2018) o exame da placenta na hora do parto é
importante para a investigação de diagnóstico da sífilis, uma vez que a placentite
causada pelo T. pallidum apresenta-se clinicamente por placenta pálida, grosseira e de
grande dimensão.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os estudo analisados corroboram que a infecção por T. pallidum durante a


gestação está relacionado aos fatores associados, principalmente, o manejo inadequado
do pré-natal, que provoca o aumento de casos de SC por não viabilizar o diagnóstico
precoce, com isso, ocasiona em diversos danos, desde o aborto a natimorto e, quando
há a possibilidade de nascimento, o indivíduo pode desenvolver complicações sérias que

208
comprometem alguns órgãos, bem como o fígado e o baço, e ocasionam condições
relacionadas ao sistema nervoso central.
No entanto, o estudo ora apresentado possui limitações, tais como: não ter sido
realizada a buscar de artigos em outros idiomas, ficando restrito à língua portuguesa,
bem como a utilização de apenas duas bases de dados para busca das publicações. Mas,
a literatura incluída neste estudo ressalta a SC como uma grande problemática na saúde
pública, especialmente no Brasil.

REFERÊNCIAS

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atenção à saúde da mulher e da criança no Brasil. Revista Paulista de Pediatria,
v. 36, n. 3, p. 376-381, 2018.

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Transmissíveis - DCCI, 2020. Disponível em: indicadoressifilis.aids.gov.br. Acesso
em: 30 de nov. de 2020.

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Assistência Médica Sanitária, 2002. Disponível em:
tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe
?ams/cnv/uamsmbr.def/. Acesso em: 30 de nov. de 2020.

BRASIL. Ministério da Saúde. Boletim Epidemiológico Sífilis 2019. Secretaria de


Vigilância em Saúde, Departamento de Doenças de Condições Crônicas e
Infecções Sexualmente Transmissíveis. – Brasília: Ministério da Saúde, 2019.

209
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transmissão, manifestações orais, diagnóstico e tratamento. Odonto, v. 23, n.
45-46, p. 65-76, 2016.

211
CAPÍTULO XV

PERCEPÇÕES DOCENTES E DISCENTES SOBRE FEEDBACK EM ESTÁGIOS


PRÁTICOS NO CURSO DE MEDICINA
Simone Stagini ¹
Lena Vânia Carneiro Peres ²
¹ Mestranda. Programa de Pós Graduação Inovação do Ensino Superior em Saúde - USCS
² Professora do Programa de Mestrado Profissional Inovação no Ensino Superior em Saúde. Universidade Municipal
de São Caetano do Sul - USCS

RESUMO

Introdução: No ensino médico, o feedback é um dos componentes principais da


avaliação formativa. Feedback é definido como transmissão de uma informação ao
observar os alunos em ação a fim de propiciar melhorias para aquisição de competências
médicas. O objetivo desse estudo foi avaliar se há dificuldades de transmissão e
recepção de feedback pelos preceptores e alunos durante os estágios práticos do curso
de medicina. Método: Este estudo teve delineamento qualitativo quantitativo, sendo o
feedback avaliado utilizando questões categóricas e abertas. Foi utilizada análises
descritivas nos dados quantitativos e técnica de conteúdo nos dados qualitativos.
Resultados: Objetivos do feedback são: apontar melhorias, promover reflexão crítica,
oportunizar adequações, esclarecer dúvidas e detectar pontos positivos. Preceptores
afirmaram fornecer feedback muito frequente, porém os alunos gostariam de receber
feedback mais frequentemente. Metade dos preceptores tem dificuldade em dar
feedback negativo, porém, 60% dos alunos relataram lidar bem com críticas. Conclusão:
Os preceptores afirmaram ter conhecimento e saberem dos objetivos do feedback,
porém eles têm dificuldades em como transmiti-los, principalmente quando envolve
críticas para correções de comportamentos ou atitudes. Os alunos aceitam críticas e
requerem que o feedback seja transmitido com mais frequência. Há necessidade de
melhorar o processo de fornecer e receber feedback.

Palavras-chave: Ensino médico. Feedback. Estágios práticos. Medicina.

1. INTRODUÇÃO

Desde a instalação da corte portuguesa no Brasil diversas modificações


ocorreram no ensino médico brasileiro, dentre elas destacam-se a reforma flexeneriana
implementada durante o regime militar, a qual propunha uma escola médica embasada
em universidades, que apresentasse um programa pedagógico com bases científicas e o
curso com duração de quatro anos, sendo dois destinados às áreas básicas e dois às

212
atividades práticas. Nesse período, o ensino médico era baseado nas doenças e na
medicalização para a cura das mesmas, não considerando os aspectos psicossociais do
indivíduo (PAGLIOSA; DA ROS, 2008).
Em 1988 com a criação do Sistema Único de Saúde, o modelo de saúde
implantado passou a abranger toda população, valorizando as necessidade de saúde
individuais e o caráter psicossocial do indivíduo (BRASIL, 1990), com isso houve a
necessidade de formar médicos que atendessem essas necessidades, o que se
concretizou com as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) de graduação médica de
2001 e de 2014. Estas DCNs propunham a formação do médico generalista, para atuar
na prevenção, promoção, recuperação e reabilitação do paciente (BRASIL, 2001; BRASIL
2014). Devido as DCNs, as quais passaram a vigorar a partir de 31 de Dezembro de 2018
(BRASIL, 2014), o aluno tornou-se o principal ator do seu aprendizado, sendo o professor
um coadjuvante, facilitador do processo de ensino e aprendizagem, através das quais o
aluno passa a ser avaliado pelas competências adquiridas no aprendizado, além de
utilizar as metodologias ativas de ensino (BRASIL, 2001; PAGLIOSA; DA ROS, 2008;
PANÚNCIO-PINTO; TRONCON, 2020).
Para determinar se o aluno atingiu ou não as competências desejadas à
formação médica há necessidade de uma avaliação. Com a implantação das DCNs, as
avaliações deixaram de visar apenas uma graduação através de notas para saber se o
aluno está apto ou não a passar para outra etapa do curso, passando a ser uma avaliação
formativa com a preocupação em averiguar falhas no decorrer das atividades práticas,
para que sejam refletidas pelos alunos através de assimilação de conceitos e de cenários
já vivenciados e promovam mudança de comportamento para que sejam obtidas as
competências desejadas (HARDAVELLA et al, 2017). A principal característica desse tipo
de avaliação é o uso do instrumento de aprendizado chamado feedback ou devolutiva,
o qual é realizado imediatamente após uma atividade ( TRONCON, 2020).
Devolutivas ou Feedback na prática médica pode ser definido como a
transferência de dados observados pelos preceptores durante a prática médica,
contextualizando o saber cognitivo, a habilidade prática, a tomada de decisão e se os
objetivos do aprendizado foram atingidos, visando uma reflexão do estudante para que
ele reconstrua seus conhecimentos e altere seu modo de agir, melhorando sua
performance para que atinja as competências necessárias à profissão em prol do

213
paciente (ALBANO et al, 2019). As devolutivas são importantes para os alunos refletirem
sobre como está sendo sua performance, qual é o desempenho desejado e buscarem
suporte para melhorarem suas desenvolturas em ambientes de prática. De forma
secundária, as devolutivas são importantes para os alunos atuarem de forma autônoma,
através da autorreflexão e da aprendizagem contínua (HARDAVELLA et al, 2017). Seu
objetivo consiste em enfatizar as boas práticas médicas, valorizando o que os alunos
desempenharam bem e promovendo uma reflexão crítica sobre os aspectos que
necessitam de melhorias, além de como podem melhorá-los (CANTILLON; SARGEANT,
2008; HARDAVELLA et al, 2017) .
Para as devolutivas serem efetivas é necessário que haja um entrosamento entre
professor e o aluno, clareza na transmissão, entendimento do aluno e identificação de
quais os objetivos do aprendizado desejados tanto pelo aluno quanto pelo preceptor
(ALBANO et al, 2019). Além disso, também influencia na efetividade da devolutiva o
tempo destinado à observação, o local que a devolutiva foi realizada, o conteúdo e a
forma de transmissão da devolutiva (JAMSHIDIAN et al, 2019). Sendo assim, há vários
obstáculos para o fornecimento e recebimento de uma evolutiva efetiva. Há relatos de
que muitos preceptores desconhecem ou não estão acostumados a transmitir
devolutivas aos alunos ( BERNARD; KMAN; KANDELWAL, 2011; DENT; HARDEN, 2009).
Além disso, muitos alunos não entendem que estão recebendo devolutivas8. Portanto,
visando construir propostas de melhorias para o fornecimento e recebimento das
devolutivas o principal objeto do estudo foi avaliar a percepção dos preceptores e alunos
da USCS - Bela Vista, sobre as devolutivas nos estágios em Diadema.

2. MÉTODOS

2.1. Tipo de estudo

Foi conduzido um estudo transversal qualitativo-quantitativo com o intuito de


analisar a percepção de um grupo de discentes e docentes de medicina sobre feedback.
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Municipal
de São Caetano do Sul (USCS). Número do Parecer: 3.551.101 e protocolo do CEP:
17717019.8.0000.5510.

214
2.2. Local

Os dados dessa amostra foram coletados a partir de quatro locais públicos de


saúde, sendo o Hospital Municipal de Diadema (HMD), o Pronto Socorro Municipal de
Diadema (PS Central), o Sistema de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) da
prefeitura de Diadema e o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), ambos localizados na
cidade de Diadema, município de São Paulo, região sudeste do Brasil.

2.3. Critérios de elegibilidade

Foram incluídos estudantes graduandos de medicina da USCS da sétima etapa e


oitava etapa (Campus Bela Vista) e que havia passado pelos seguintes estágios práticos
em Diadema: Clínica Médica - HMD, Pediatria - PS Central, SAMU e CAPS, no período de
05 de março de 2018 a 21 de agosto de 2019, que aceitaram participar da pesquisa e
assinaram o termo de consentimento. Também foram incluídos nesse estudo os
preceptores contratados e/ou concursados pela USCS que são responsáveis pelos
estágios práticos nos mesmos locais e períodos citados acima e que aceitaram participar
da pesquisa.
Não foram incluídos nesse estudo os alunos da sétima etapa que não tinham
passado por todos estágios (Clínica Médica, Pediatria, SAMU e CAPS), no período da
avaliação do estudo. Foram excluídos do estudo os alunos e/ou preceptores que não
assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido ou que não aceitaram participar
da pesquisa.

2.4. Procedimentos

Os potenciais sujeitos selecionados para esse estudo foram convidados por


Whatsapp. Os questionários para avaliação foram fornecidos aos alunos na secretaria
da USCS e fornecido aos preceptores nos respectivos locais de trabalho. No período de
05 de março à 21 de agosto, cinco grupos de alunos passaram pelos quatro estágios
práticos, totalizando cinquenta alunos. Destes, trinta alunos aceitaram participar do
estudo e responderam ao questionário. Dentre os nove preceptores responsáveis pelos
estágios práticos, oito aceitaram e foram incluídos.

215
Os questionários foram baseados nas perguntas de Maia e colaboradores (2018).
As perguntas foram adaptadas para questões categóricas e qualitativas em dois
questionários, um para os preceptores e outro para os alunos. O questionário adaptado
para a avaliação dos alunos continha 11 itens que avaliaram o feedback. Já para a
avaliação dos preceptores foi aplicado um questionário sócio demográfico e em seguida
a versão do questionário modificado e adaptado, contendo nove questões (MAIA, 2018).
As variáveis primárias do estudo foram perguntas referentes as dificuldades
encontradas pelos alunos e preceptores em receberem e fornecerem devolutivas,
respectivamente. Como varáveis secundárias estavam a frequência do recebimento e
da oferta das devolutivas, experiência dos preceptores com as devolutivas, mudança de
comportamento dos alunos e quais características devem ter o preceptor e o aluno.

2.5. Análise estatística

Os dados quantitativos desse estudo foram analisados utilizando análise de


frequência para dados categóricos que calcula os números absolutos e percentuais para
cada questão avaliada; e por análise descritiva para dados contínuos, que a média e
desvio padrão de cada variável.
A análise estatística qualitativa foi realizada utilizando a técnica de conteúdo.
Essa técnica analisa os dados através do método de dedução frequencial e também por
análise por categorias temáticas (CAREGNATO; MUTTI, 2006). Para auxiliar na análise de
conteúdo e identificar termos chaves foi utilizado o método Natural Language Tookit
(NLTK, disponível em https:// 3. www.nltk.org/).

3. RESULTADOS

Um total de 58 sujeitos foram convidados a participar desse estudo, sendo nove


preceptores e 50 alunos. Destes, 38 sujeitos aceitaram participar e foram incluídos para
a análise dos dados deste estudo, sendo oito preceptores e 30 discentes. Os principais
motivos que alguns sujeitos convidados não participaram do estudo foram: não foi
possível o contato via e-mail ou WhatsApp porque o sujeito não respondeu. Os
preceptores eram 4 homens e 4 mulheres com média de idade de 39 anos (DP = 5,4). A
maioria eram médicos (75%), o nível de escolaridade variava entre pós-graduação e
residência, ambos atingindo 75% dos docentes, a mestrado (37,5%) e doutorado (25%).

216
Um total de 75% dos preceptores apresentou ter experiência com educação na saúde e
destes, o tempo de experiência era em média de 23 meses (DP=39,9).

3.1. Resultados preceptores

O autorrelato dos docentes sobre o conhecimento por feedback variou de


nenhum conhecimento (13%) a muito conhecimento (25%). Nenhum docente se
classificou com extremo conhecimento, sendo que a maioria dos docentes se classificou
como pouco conhecimento sobre feedback (38%).
Sobre a clareza dos docentes em relação aos objetivos de fornecer feedback, 25%
dos docentes nem concordaram e nem discordaram de a terem, o maior percentual
(75%) concordou. De forma qualitativa, os objetivos que os docentes relataram sobre
fornecer um feedback, foram agrupados entre motivação ao aluno, clareza de
informações e reflexão do aluno.
Os resultados sobre a frequência com que os docentes forneceram o feedback
variou muito de acordo com cada docente, por exemplo, enquanto 13% dos docentes
nunca forneceram devolutivas, 25% deles forneceram em todas as aulas práticas.
Metade dos docentes relataram conhecer os diferentes modos de fornecer
feedback aos alunos, apenas 25% dos docentes relataram não conhecer.
Qualitativamente, os docentes responderam que os tipos de feedback que mais
costumam oferecer são feedbacks orais (o qual predominou), feedbacks breves e
construtivos.
Enquanto 35% dos docentes relataram não terem dificuldade em oferecer
feedback, 25% e 13% concordaram e concordaram completamente sobre terem
dificuldades em oferecer feedback aos alunos. As situações que deixaram os docentes
com mais dificuldade foram à respeito de devolutivas sobre aspectos subjetivos do
aluno, ou quando houve necessidade de correção do aluno e de serem dependentes da
interpretação do mesmo.
Apenas 25% dos docentes concordaram de conseguirem avaliar se o feedback foi
efetivo para os alunos. Enquanto 50% deles nem concordaram e nem discordaram com
a afirmação e os outros 25% discordaram, relatando que não conseguiram avaliar se o
feedback foi efetivo ou não. Quando perguntados como eles fazem esta avaliação, os

217
docentes responderam que perguntam ao aluno, ou que observam as atitudes do aluno
durante as próximas aulas práticas.
Um total de 63% dos docentes relatou que os alunos precisam ter características
específicas para se beneficiar de um feedback, sendo que apenas 12,5% dos docentes
discordaram dessa afirmação. As características citadas pelos docentes de forma
qualitativa foram ter interesse, saber escutar, ter resiliência, respeito e empatia.
Quando os docentes foram questionados sobre a frequência que solicitavam
feedback sobre a sua conduta como professor, 13% responderam que nunca solicitaram,
25% solicitaram raramente, 38% e 25% solicitaram feedback ocasionalmente e muito
frequentemente, respectivamente. Adicionalmente, 50% e 25% dos docentes
concordaram e concordaram completamente em modificar a sua conduta como
professor os alunos após receber um feedback.

3.2. Resultados alunos

Os alunos reportaram ter moderado conhecimento (40%), muito conhecimento


(53%) ou extremo conhecimento (7%) sobre feedback. Além disso, os alunos também
relataram ter clareza sobre os objetivos de receberem um feedback, sendo que 63% dos
alunos concordaram com essa afirmação e 33% concordaram completamente. Na visão
deles os objetivos do feedback estão relacionados a identificar pontos fortes e fracos
para melhorar a prática clínica e crescimento pessoal.
Nenhum aluno relatou ter recebido feedback em todas as aulas práticas, sendo
que 3% dos alunos relatou que não receberam nenhum feedback durante os estágios
práticos. A maioria dos alunos relatou que a frequência que receberam feedback variou
entre 33% que receberam raramente, 37% ocasionalmente e 27% dos alunos que
receberam feedback muito frequentemente.
De acordo com os alunos o feedback trouxe impacto positivo para o aprendizado
deles, sendo que 53% dos alunos concordaram com a afirmação e 40% concordaram
completamente. Os impactos positivos mais relatados pelos alunos foram conseguir
identificar os erros que eles não percebiam antes, mudanças de comportamento
durante o atendimento e o aprimoramento da prática clínica.
Quando questionados sobre o impacto negativo do feedback no aprendizado,
30% e 43% dos alunos discordaram completamente ou discordaram dessa afirmação.

218
Na avaliação qualitativa muitos alunos deixaram de responder essa questão,
provavelmente, devido a não repararem em aspectos negativos do feedback, aqueles
que responderam relataram se sentirem desmotivados após um feedback, dependendo
da forma como ele foi realizado, outros se sentiram agredidos com um feedback rude
ou então relatam que o impacto negativo foi que eles não mudaram de atitude na
prática clínica porque não receberam um feedback eficaz.
Sobre a dificuldade do aluno em receber o feedback 37% e 47% discordaram
completamente e discordaram, respectivamente, em sentir desconforto de receber
feedback após performance na prática. Apenas 3 % dos alunos relataram sentir
desconforto em receber feedback. As únicas situações que deixaram os alunos
desconfortáveis foram a exposição, quando o feedback é dado frente ao paciente ou
dos colegas, ou então quando receberam apenas feedback negativo sem apontar pontos
de melhorias. Um total de 60% e 13% dos alunos concordou, ou concordou
completamente que lidam bem com críticas negativas durante um feedback. Nenhum
aluno relatou que não lida bem com críticas negativas.
A maioria dos alunos concordaram (57%) ou concordaram completamente (37%)
que observaram mudanças na prática clínica após receber feedback dos preceptores.
Foram diversas as mudanças relatadas pelos alunos tanto sobre mudança de conduta
clínica como mudança de relacionamento pessoal, com colegas, equipe de trabalho e
até mesmo os pacientes.
Metade dos alunos 53,33% concordaram que há necessidade de o preceptor ter
características específicas para oferecer um bom feedback. De forma qualitativa os
alunos relataram que um bom feedback é aquele fornecido pelo preceptor com clareza
em sua fala, sem julgar, ser um bom observador e coerente com as competências
pretendidas, individualizar o grau de conhecimento de cada aluno, ser respeitoso e ser
qualificado para usar técnicas de feedback e propor correções e melhorias nas
competências pretendidas e ter empatia.
A maioria dos alunos concordaram (53%) e concordaram completamente (37%)
que o feedback deveria ser uma prática constante em seu curso. As preferências dos
alunos sobre a forma em que o feedback seja fornecido é oral e que seja realizado com
mais frequência, adicionalmente, a preferência sobre local é individualizada em local

219
privado e como preferência sobre os tipos de feedback foram eleitos os feedbacks
construtivos que apontam críticas construtivas.
Os alunos foram questionados se conseguiam fazer um feedback ao preceptor e
as respostas foram variadas, alguns conseguiram e até viram mudança na prática do
professor, porém a maioria não conseguiu ou não conseguiu espaço e se sentem
inseguros para oferecer um feedback ao professor.

4. DISCUSSÃO

Sendo o feedback o componente de avaliação formativa, com caráter contínuo


e com o intuito de detectar aspectos que necessitam de melhorias, esse método se torna
um importante instrumento para o treinamento da prática médica. O presente estudo
teve como objetivo principal avaliar a percepção e dificuldades dos preceptores e dos
alunos sobre a transmissão e recebimento de feedback durante os estágios práticos do
ensino no curso de medicina. Para isso, foram realizadas perguntas sobre o
conhecimento do que é feedback, quais são seus objetivos, tipos, modelos de
transmissão, frequência com que é dada para alunos e preceptores. Para os alunos além
das perguntas acima, também foram perguntados o grau de aceitação de críticas, a
efetividade, sobre como gostariam de receber o feedback e quais mudanças foram
percebidas.
Sobre os objetivos do feedback, os preceptores e os alunos estavam de acordo e
relataram, por exemplo, que o esclarecimento de dúvidas é um dos objetivos, assim
como reforçar os aspectos positivos da atividade prática, além de motivar reflexão
crítica das ações realizadas. Esses conceitos vão de acordo a literatura, as devolutivas
devem enfocar o desenvolvimento do aluno na prática, informando-o sobre
modificações necessárias que contribuam para melhorar o desempenho, além de
motivar estudantes a refletirem para solucionarem os problemas detectados (BURGESS;
MELLIS, 2015). Os objetivos das devolutivas também são de conscientizar os alunos
sobre as suas boas práticas durante o estágio e quais domínios de conhecimento, seja,
cognitivo, psicomotor e comportamentais precisam de melhorias para auxiliar o aluno a
obter as competências desejadas durante o estágio (HARDAVELLA et al, 2017). Além

220
disso, o feedback deve conter informações com orientações para que os alunos
desempenhem melhores performances em atividades futuras (CARR et al, 2019).
A frequência do feedback é muito importante para garantir efetividade na
avaliação, enquanto na visão dos preceptores as devolutivas foram ofertadas com alta
frequência ou em todas aulas práticas, porém, nenhum estudante relatou ter recebido
devolutiva em todas aulas práticas e poucos alunos disseram as terem recebido com
frequência. Este achado se assemelha ao que ocorreu no estudo de Liberman e
colaboradores (2005), no qual os autores relataram que 86,2% dos cirurgiões deram
feedback imediatamente após a atividade prática e apenas 12,5% dos residentes
perceberam esta frequência (LIBERMAN et al,2005). Os professores não têm
compreensão sobre a prática do feedback e de como transmiti-lo, por isso a frequência
de transmissão pode ser menor do que os preceptores relataram (BURGESS; MELLIS,
2015). Isso reforça o fato de que ser especialista no assunto a ser transmitido, bem como
o tempo de atuação no campo da educação médica não significa, necessariamente, ser
um bom preceptor, ou seja, aquele que estimula a reflexão do aluno e promove
informações a respeito das necessidades de melhorias. Existem médicos preceptores
que não se atualizam, nestes casos, eles transmitem o conteúdo de acordo como
aprenderam, por acreditarem que seu tempo de experiência seja capaz de suprir suas
necessidades pedagógicas, não havendo o engajamento necessário para modificações
em seu comportamento perante a realização das devolutivas. Essa dificuldade de
transmissão das devolutivas pode repercutir na percepção do estudante, o fato das
devolutivas não apresentarem uma informação específica de qual comportamento deve
ser modificado e não conter sugestões de como melhorá-las fazendo com que os alunos
não percebam as devolutivas (CARR et al, 2019). Assim, há necessidade de melhorar a
interação entre professor e aluno, necessidade de feedback claros e direcionados para
que haja a efetividade.
Há dados que mostram que sozinho, o aluno tem dificuldade de perceber onde
e como pode melhorar suas competências clínicas, sendo assim a habilidade de dar
devolutivas específicas, oportunas e claras são habilidades fundamentais ao preceptor
(CARR et al, 2019). Para Nottingham e colaboradores (2014) , os preceptores com menos
experiências promoveram menor número de feedback aos estudantes, enquanto os
mais experientes promovem mais, o que também é notado nesse estudo onde

221
preceptores com maior tempo de experiência na área de educação em saúde (dois anos
e 10 anos) ofereceram devolutivas em todas aulas práticas.
No presente estudo, os tipos de devolutivas utilizadas pelos preceptores foram
a oral, breve e construtiva. Apesar de existirem diversas maneiras de realizar o feedback,
os alunos preferiram os feedbacks orais, provavelmente, devido a facilidade de serem
ofertados e recebidos imediatamente (BRANCH; PARANJAPE, 2002). Outras formas de
feedback que poderiam ser incorporadas são: (1) o Brief feedback (Breve) que visa
fornecer a informação da necessidade de mudança de alguma ação no momento em
que é observada; (2) formal, no qual a informação é dada ao final da atividade, focando
em uma ou duas habilidades específicas com duração de 5 a 20 minutos; (3) maior
(Major) que é a orientação dada no meio do estágio ou no final a respeito de
performances e comportamentos mais complexos, culminando com um plano de ação
para se obter melhorias antes do término do ciclo do estágio com duração de 15 à 30
minutos (BRANCH; PARANJAPE, 2002).
Sobre a avaliação da efetividade de um feedback, apenas um quarto dos
preceptores relataram saber como avaliar. Esse resultado se difere de um estudo prévio,
no qual 90,9% dos preceptores cirurgiões relataram avaliar efetividade no feedback
oferecido aos residentes (LIBERMAN, 2005)..A efetividade da devolutiva pode ser
avaliada através da observação das tarefas e ações para as quais foram propostas
melhorias e se essas foram realizadas, além do grau de motivação do aluno para
reconstruir seu conhecimento em desempenhar as alterações necessárias. Nem sempre
o feedback é aceito pelos alunos, levando à autorreflexão e mudanças
comportamentais, principalmente quando as informações dadas pelos preceptores
entram em conflito com os pensamentos dos alunos. Quando isto acontece, pode haver
prejuízo na aquisição de competências clínicas e portanto, não atingir a efetividade que
o feedback se propõe (TELIO; AJJWAI; REGEHR, 2015). No presente estudo, metade dos
preceptores sentiram dificuldades em fornecer devolutivas negativas para os alunos. Os
professores têm a percepção de que ao fornecer devolutivas negativas ocasionem um
rompimento do relacionamento professor/aluno, além de terem sua popularidade
afetada. Para amenizar esses efeitos os preceptores abordam críticas de forma mais
amena, transmitindo mensagens de maneira indireta. A falta de um feedback

222
direcionado de forma clara para o aluno pode não ser um feedback eficaz (TELIO;
AJJWAI; REGEHR, 2015).
Por outro lado, o percentual de impactos negativos com as devolutivas ofertadas
nesse estudo foi pequeno. Para que esse impacto negativo seja reduzido, a transmissão
do feedback precisa ser clara, de maneira respeitosa, sem julgamentos, basear-se no
que foi observado no momento e o que é passível de alteração para que se promova a
reflexão e a motivação e, assim, favorecer as na mudanças na prática clínica (RAMANI;
KRACHOV, 2012). O local em que essa devolutiva é dada parece ser a principal razão
para o desconforto. Em local privado as devolutivas podem ser dadas de maneira clara,
oportuna e específica, propiciando um incremento na aprendizagem do aluno, pois
facilita a comunicação entre o aluno e o preceptor sem receio de ser ridicularizado pelos
colegas (NTULI; SEPTEMBER; SITHOLE, 2018). Além disso, as mudanças
comportamentais ocorrem mais quando há concordância do que foi falado pelo
professor com o modo de pensar do estudante, adicionalmente, o grau de aceitação das
devolutivas está associado ao poder de auto-avaliação do estudante (SCHARTEL, 2012).
Com relação aos impactos positivos do feedback, os resultados observados
nesse estudo foram positivos e assemelham-se a outro estudo na literatura em que 95%
dos estudantes tentaram mudar o comportamento com as devolutivas recebidas
(BERNARD; KMAN; KHANDELWAL, 2011).
Outro ponto importante a destacar foi que maioria dos estudantes relataram
desejo de que as devolutivas sejam práticas rotineiras nos estágios práticos. Os alunos
reportam que embora os preceptores tenham conhecimento e clareza sobre os
objetivos do instrumento de avaliação, ele não é usado nos estágios de forma constante.
Concordando com os nossos resultados, entre 60 a 75% dos estudantes do estudo de
Al-Mously e colaboradores (2014) consideraram a frequência de recebimento do
feedback baixa à adequada, atribuindo a falta de uma base estrutural para que a
transmissão do feedback fosse realizada (AL-MOUSLY et al, 2014).
As devolutivas dos alunos ao preceptor não parecem ser frequentes na prática
dos estágios. Estudantes podem promover aos preceptores devolutivas sobre sua
percepção à respeito dessa transmissibilidade, propiciando uma troca de informações
para serem refletidas e propiciarem as mudanças necessárias, constituindo uma
aprendizagem bidirecional (CARR et al, 2018). Notou-se que preceptores preferem

223
receber devolutivas de pessoas que tenham competências para avaliarem sua
desenvoltura na prática profissional, o que também é percebido com os alunos, os quais
preferem receber feedback de professores que consideram como modelos profissionais
(JAMSHIDIAN et al, 2019).
Preceptores que recebem devolutivas e as utilizam para melhorarem seu
desempenho profissional, seja como médico ou professor, estão mais engajados a
fornecerem devolutivas para o aluno (MENACHERY et al, 2006).

5. CONCLUSÃO

Conclui-se que há necessidade de aprimoramento dos preceptores para a


realização de uma avaliação efetiva por feedback. Apenas um quarto dos preceptores
relataram ter muito conhecimento sobre o feedback, enquanto mais da metade dos
alunos afirmaram ter de muito a extremo conhecimento sobre essa estratégia de
aprendizado. Os alunos têm maior clareza sobre os objetivos do feedback,
demonstrando que estão habituados com esse instrumento de aprendizado por
receberem feedback não só nos estágios práticos, mas também, em outras atividades
de aprendizagem. Isso também explica o fato dos estudantes não sentirem desconforto
ao receberem devolutivas as quais constituem práticas deliberativas em outras
atividades. Outro ponto a destacar é que embora a maioria dos preceptores relatem que
transmitem as devolutivas com frequência, mais da metade dos alunos afirmam as
terem recebido raramente e ocasionalmente, podendo configurar falta de comunicação
efetiva entre o preceptor e o aluno. Além disso, a pouca solicitação dos preceptores por
devolutivas pode caracterizar o medo de que têm a respeito de receberem devolutivas
criticando sua atuação pedagógica, podendo haver resquícios da superioridade
atribuída aos professores durante o uso das metodologias tradicionais. Este fato deve
ser banido, pois para haver melhor aceitação das devolutivas deve haver uma aliança
educacional, o que significa maior proximidade entre preceptor e aluno. Os alunos lidam
bem com críticas e aceitam as devolutivas gerando impactos positivos em seu
aprendizado, percebendo maior confiança em si no que se refere a atuação médica,
raciocínio clínico, percepção de erros e requerem que as devolutivas sejam uma prática
constante nos estágios práticos. Uma pequena porcentagem de alunos relatou impactos

224
negativos e desconforto devido problemas na transmissão das devolutivas e foram
relacionados ao local, exposição frente a outras pessoas ou forma de falar. Para que as
devolutivas sejam efetivas, os alunos relatam que o professor precisa ser claro em sua
fala, não fazer julgamentos, ser respeitoso, propor correções, melhorias, ter didática
para o ensino médico e qualificação para sua transmissão. Isso pode ser obtido por meio
de informações de como estruturar um feedback através da criação de um guia sobre
devolutiva, treinos para habilitação da transmissão das devolutivas, bem como uma
verificação de como estão sendo realizadas e interpretadas na prática. Já no ponto de
vista dos preceptores, os alunos devem ter habilidades de fala e escuta, empatia,
respeito, interesse e com essas qualidades se tornarem pró-ativos no processo para o
aperfeiçoamento das competências designadas, tornando o feedback uma estratégia
efetiva de aprendizado.

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227
CAPÍTULO XVI

O CAFÉ E SUAS PROPRIEDADES FUNCIONAIS: UMA BREVE REVISÃO DE


LITERATURA SOBRE O USO DA CAFEINA E SEUS BENEFICIOS
Anna Luiza Santana Neves ¹
Anna Carolinne Santana Neves ²
¹ Graduando do curso de História. Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN
² Mestrando em Recursos Hídricos. Programa de Pós-Graduação em Engenharia – UFBA
³ Professor Adjunto do Departamento de Artes. Universidade Federal do Amazonas – UFAM

RESUMO

O alto índice de consumo de café, em nível mundial, tem despertado o interesse de


muitos pesquisadores no que tange a relação entre a qualidade da bebida e compostos
bioativos, ligados ao café verde, e, mas principalmente ao torrado, que é a forma mais
comumente consumida. Entre os compostos do café, destaca-se a cafeína, classificada
como metilxantina, sem valor nutricional, e lipossolúvel. Ultimamente, devido a
mudança no estilo de vida da população, a busca por estimulantes fez a cafeína ser uma
das substâncias mais consumidas do mundo possivelmente devido a seus recursos
recurso farmacológicos. Diversos estudos investigaram os efeitos positivos da cafeína
sobre a saúde humana, e o objetivo dessa revisão é reunir os últimos trabalhos que
englobem os estudos sobre cafeína tanto na forma manipulada como in natura e suas
propriedades funcionais. Para a realização da revisão de literatura, foram utilizados
artigos contidos no “PubMed”e Portal de “Periódico da CAPES”, praticada uma busca
sistemática com os seguintes descritores: “caffeine” “coffee”, “benefits”, “functional
properties” “effects”. Foram encontrados mais de 1000 artigos, após leitura dos títulos
e resumos foram selecionados 15 registros. Os artigos demonstraram diferentes
aplicações da cafeína, a maioria dos artigos encontrados associando seu uso
principalmente a melhora da função cognitiva e melhora da performance física, mas
muito se fala também sobre tratamento de doenças, inclusive do câncer.

Palavras-chave: Benefícios. Efeitos. Metilxantina. Propriedades funcionais.

1. INTRODUÇÃO

Sem dúvidas, o café é uma paixão por grande parte da população brasileira.
Conforme apresenta a Associação Brasileira da Industria de Café – ABIC, o Brasil é o
maior produtor de café do mundo com 58,5 milhões de sacas produzidas em 2018,
tendo Minas Gerais como o maior produtor de café entre os estados (ABIC, 2019).

228
O café é uma mistura complexa de milhares de componentes químicos, incluindo
hidratos de carbono, lipídios, componentes nitrogenados, vitaminas, minerais e
alcaloides. Os grãos de café verde contêm o complexo de antioxidantes, principalmente
ácidos clorogênicos (ácidos cafeoilquinóicos), e mostram propriedades antioxidantes in
vitro (JESZKA-SKOWRON et al., 2016)
A fermentação do café, incluindo a de grãos torrados, também contém ácidos
clorogênicos e cafeína e outros compostos bioativos com capacidade antioxidante,
como teofilina e teobromina, tocoferóis, cafestol, kahweol e trigonelina, além de
produtos da reação de Maillard (JESZKA-SKOWRON et al., 2015)
Mas é a cafeína e os seus efeitos no organismo que deram popularidade ao café
(ALMEIDA, 2015). Indubitavelmente o café serve como fonte primária de cafeína para
o adulto, sendo consumido em diferentes níveis e segmentos pela maioria da população.
A cafeína é uma droga classificada como metilxantina, sem valor nutricional, e
lipossolúvel. Essa substância pode ser encontrada em diversos produtos de alto
consumo mundial como o guaraná, o chocolate, o mate, entre outros, sendo uma das
drogas mais consumidas do mundo (VAZ, 2016)
O café possui de 1 a 2,5 % de cafeína , que é o componente mais conhecido por
seus efeitos estimulantes sobre o sistema nervoso central, e geralmente é associada a
uma melhora no estado de alerta, na capacidade de aprendizado e resistência ao esforço
físico. Após ser transformada pelo organismo humano, ela pode contribuir para a
atividade antioxidante da bebida (ABIC, 2019)
Do ponto de vista alimentício, todos esses componentes fazem do café uma
bebida natural e saudável e se ingerido em doses moderadas, pode fazer muito bem
para a saúde, além de outros benefícios. Com esse foco em mente, o objetivo do
trabalho é buscar na literatura artigos que confirmem os benefícios do café e
principalmente da cafeína do ponto de vista funcional e de saúde.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

O fruto do café origina-se de um arbusto da família Rubiaceae, ordem


Gentianales, que se desenvolve em regiões tropicais ou subtropicais e está presente na
natureza em mais de sessenta espécies. É nativo da Etiópia, país do continente africano

229
e apresenta distribuição nas Américas Central e do Sul, na África e leste da Ásia, sendo
cultivado principalmente no Brasil (DE CARVALHO OLIVEIRA et al., 2018; (BAGYARAJ et
al., 2015)
O cultivo do café evoluiu de maneira significativa ao longo do desenvolvimento
histórico e econômico do Brasil, especialmente em termos de localização da produção.
Entre as espécies mais cultivadas está o café arábica (Coffea arábica L.), que responde
por cerca de 60% a 70% da produção mundial, sua expansão geográfica está
concentrada na América Latina, na América Central, na África Oriental, na Índia e, até
certo ponto, na Indonésia (CARVALHO et al., 2017).
Desde os primórdios das transações mercantis simples, o café tem sido um
produto de extrema relevância nas economias mundiais se destacando como o segundo
produto mais comercializado no mundo depois do petróleo (DE CARVALHO OLIVEIRA et
al., 2018) Os grãos de café arabica são tidos como sendo mais caros e valiosos pelas suas
características organoléticas únicas (BAGYARAJ et al.,2015) O segmento do café
representa, atualmente, aproximadamente 12% do mercado internacional da bebida
(SEBRAE, 2019)
Sua popularidade pode estar associada a complexidade da bebida, resultado do
grande número de compostos químicos contidos nos grãos de café verde. A composição
química dos grãos crus é determinada por aspectos genéticos, ambientais, adubação,
trato fitossanitários, ligados à maturação dos frutos, cuidados durante a colheita,
secagem e por fim no beneficiamento, armazenagem e modo de preparo. (SILVA, 2005;
SIMOES et al., 2008).
As transformações sofridas por essa composição química em todas as fases do
processamento do grão e da extração do café, originam uma grande diversidade de
estruturas complexas que se podem encontrar numa xícara de café (ROTHFOS, 1980).
Uma alimentação rica em produtos vegetais sempre esteve associada a uma vida
mais saudável, com isso, diversos estudos sobre as funcionalidades dos vegetais no
organismo estão abrangendo o conhecimento sobre os compostos bioativos que
também recebem diversos nomes como fitoquímicos, nutracêutico e compostos
bioprotetores (TORTORA; DERRICKSON, 2012) Nos últimos anos houve um aumento no
interesse por alimentos com atividades biológicas, principalmente com propriedades
antioxidantes (NEWMAN; CRAGG, 2012).

230
As bebidas de café são reconhecidas pelas características sensoriais de aroma,
acidez, corpo, amargor e adstringência, e os atributos aroma doce, de café e sabor ácido
se apresentaram como diferencial durante safras e processamentos (SCHOLZ et al.,
2019).
Uma particularidade da bebida do café é o facto de apresentar um valor
nutricional irrelevante, sendo consumida pelos efeitos fisiológicos, nomeadamente a
sua atividade estimulante, psicológicos e pelas propriedades sensoriais resultantes do
aroma e sabor que a cafeína proporciona. O efeito estimulante da cafeína tem levado a
que os consumidores reduzam a frequência do seu consumo, devido a possíveis efeitos
colaterais sobre o sistema nervoso central, endócrino e cardiovascular (GAWLIK-DZIKI
et al., 2014).

2.1. Café e seus componentes

As estatísticas mostram que o consumo moderado de café (3 a 5 xícaras / dia)


reduz o risco de doença cardiovascular. Há evidências crescentes de que o café pode
prevenir algumas doenças crônicas, como câncer, doenças cardiovasculares, doenças
metabólicas e cirrose (WANG et al., 2016; SHANG et al., 2016 ; BRAVI et al., 2017)
O café apresenta mais de 800 compostos de várias classes já identificados, Os
principais compostos ativos no café que desempenham esses papéis incluem cafeína,
ácido clorogênico, cafestol e kahweol (SILVA et al., 2018)
As pessoas acreditam que o café possui apenas cafeína em sua composição. No
entanto, o mesmo contém apenas 1 a 2,5 % de cafeína, que faz parte dos grupos das
xantinas, além de diversas outras substâncias em maior quantidade com funções
nutricionais, com destaque não apenas para a cafeína em sua composição, mas por sua
alta concentração de polifenóis que são ricos em vitaminas do complexo B, nutrientes
esses tão importantes comparados a cafeína (EMBRAPA, 2011)
Podemos encontrar em um grão de café minerais como: potássio (K), magnésio
(Mg), cálcio (Ca), sódio (Na), ferro (Fe), manganês (Mn), rubídio (Rb), zinco (Zn), Cobre
(Cu), estrôncio (Sr), cromo (Cr), vanádio (V), bário (Ba), níquel (Ni), cobalto (Co), chumbo
(Pb), molibdênio (Mo), titânio (Ti) e cádmio (Cd); aminoácidos como alanina, arginina,
asparagina, cisteína, ácido glutâmico, glicina, histidina, isoleucina, lisina, metionina,
fenilalanina, prolina, serina, treonina, tirosina, valina; lipídeos como triglicerídeos e

231
ácidos graxos livres , açúcares como sucrose, glicose, frutose, arabinose, galactose,
maltose e polissacarídeos
2.1.1. Kahweol
Furstenau et al (2019) relatam que o kahweol (1,2 didesidrocafestol) é o
diterpeno presente em maior quantidade em cafés não filtrados, como o café turco e
seus efeitos protetores são descritos como antioxidantes, anti- inflamatórios,
antitumorais e quimioprotetores em diferentes modelos experimentais ( LEE,
2007 ; CÁRDENAS et al., 2011 ; CÁRDENAS et al., 2014 ; CHOI et al., 2019 ; IWAMOTO et
al., 2019)

2.1.1. Cafestol
A única diferença entre o cafestol e kahweol em termos estruturais é que o
kahweol possui uma ligação dupla extra (HALVORSEN et al., 1998)
Cafestol e kahweol podem regular uma variedade de mediadores inflamatórios
para reduzir a inflamação. Além disso, os dois diterpenos do café podem impedir a
ocorrência de câncer, bloqueando a ativação de agentes cancerígenos e melhorando a
função de desintoxicação do fígado. Eles também podem inibir a proliferação e a
angiogênese das células tumorais e fornecer uma nova abordagem para a prevenção e
tratamento do câncer (REN et al., 2019).

Figura I. Estrutura e características químicas de cafestol e kaweol. São diterpenos


naturais extraídos de grãos de café.

Fonte: ALVES (2009)

2.1.2. Ácidos clorogênicos


Os ácidos clorogênicos são polifenóis de ação antioxidante, que na torração
formam quinídeos, os quais causam efeito antagonista ao opióide, que bloqueiam no
sistema límbico, levando o indivíduo insatisfeito à depressão. O consumo diário de 4

232
xícaras de café pode evitar à depressão. (Fonseca et al., 2011) Outro importante
constituinte do café são os ácidos clorogênicos que quando hidrolisados dão origem aos
ácidos cafeico e quínico. O ácido cafeico representa cerca de 50% dos ácidos
clorogênicos presentes no café. Ou seja, em uma xícara de 200 mL de café é possível
encontrar entre 70 a 350mg de ácidos clorogênicos e de 35 a 175mg de ácido cafeico
(FOOD-INFO, 2014).
Figura II: Principais compostos bioativos do café: ácidos clorogênicos.

Fonte: ALVES (2009)

2.1.3. Cafeína
A cafeína é um alcaloide natural (1,3,7-trimetilxantina) dos grãos de café, que
está presente também em chá e em outras bebidas cafeínadas amplamente
consumidas, assim como no chocolate e em alguns medicamentos (REIS et al., 2014).
Tem ação principalmente como inibidor no sistema nervoso central, sistema
cardiovascular e na homeostase do cálcio, resultando na elevação da pressão sanguínea,
aumento do metabolismo e na produção de suco gástrico. É absorvida pelo trato
gastrointestinal e principalmente metabolizado pelo fígado. Esse alcaloide exerce certa
influência sobre as funções cognitivas e físicas, uma vez que a maioria das atividades do
mundo real exige complexas tomadas de decisão, processamento e movimento
motor. A cafeína exerce seus efeitos bloqueando os receptores de adenosina. (ROSA et
al., 2018)

233
Após a ingestão de baixa ( ∼40 mg ou ∼0,5 mg kg −1 ) a moderada (∼300 mg
ou 4 mg kg −1) doses de cafeína, a vigilância, atenção e tempo de reação melhoram,
mas efeitos menos consistentes são observados na memória e na função executiva de
ordem superior, como julgamento e tomada de decisão. Efeitos sobre o desempenho
físico em uma vasta gama de métricas de desempenho físico, como força e resistência
muscular e sprints de alta intensidade típicos de esportes coletivos, são evidentes após
doses que excedem cerca de 200 mg (∼3 mg kg −1) Muitas ocupações, incluindo
militares, socorristas, trabalhadores de transporte e trabalhadores em turnos noturnos,
exigem funções físicas e cognitivas ideais para garantir o sucesso, a segurança e a
produtividade no local de trabalho. Nessas circunstâncias, que podem incluir sono
restrito, a administração repetida de cafeína é uma estratégia eficaz para manter as
capacidades físicas e cognitivas (MCLELLAN et al., 2016)

Figura III: Estruturas química da cafeína (1,3,7-trimetilxantina)

Fonte: ALVES (2009)

A empregabilidade ativa da cafeína é amplamente utilizada pela população


em geral nas mais diversas formas, seja pelo efeito estimulante do sistema nervoso
central quando ingerida, ou mesmo de utilizações cosméticas com objetivo de promover
lipólise local (ALTERMANN et al., 2008). Estimulantes são substâncias psicoativas
eficientes em modificar a fisiologia do organismo e são usados principalmente por
esportistas e indivíduos que desejam aumentar a resistência física, ter uma maior
concentração, evitar o sono e aumentar a sensação de bem estar (MARIA ; GOMIDE,
2019)
No entanto novas ações terapêuticas, além das usuais, estão sendo
rotineiramente estudadas e atribuídas ao consumo da cafeína, assim mostrando-se
necessário o aprofundamento literário neste assunto (TROMBINI ; OLIVEIRA, 2013)

234
2.1.4. Mecanismos de ação da cafeína
Podemos encontrar aproximadamente 47 a 134 mg de cafeína em uma xicara de
café. A cafeína é uma substância absorvida de modo rápido e eficiente, via
administração oral, através do trato gastrointestinal com aproximadamente 100% de
biodisponibilidade, alcançando um pico de concentração máxima na corrente sanguínea
após 15 a 120 minutos de sua ingestão (SINCLAIR; GEIGER, 2000)
O pico plasmático da cafeína ocorre de 30 minutos a 2 horas após seu consumo,
potencializando seu efeito através da ingestão de alimentos. Sua absorção ocorre no
trato intestinal, de forma completa, com grande biodisponibilidade e elevada
solubilidade em água. Sua principal ligação com proteínas plasmáticas acontece com a
albumina, de 10 a 35 % com um volume de distribuição de aproximadamente 0,6 a 0,07
L.kg-11. Seus efeitos biológicos são resultantes da sua ação em variados sítios de ligação:
Receptores de adenosina, fosfodiesterases, canais de cálcio, receptores de GABAA entre
outros (TAVARES; SAKATA, 2012).

3. METODOLOGIA

3.1. Delineamento do estudo

Trata-se de uma revisão descritiva da literatura. Neste estudo, foram descritas


informações contidas em estudos originais e de revisão sobre os estudos realizados com
cafeína e suas propriedades funcionais.

3.2. Fontes de dados

A busca foi realizada eletronicamente, utilizando as bases de dados PubMed e


Portal de Periódico da CAPES.

3.3. Descritores

Os descritores utilizados nas fontes de dados selecionadas foram:


“caffeine”,“coffee”, “benefits”, “functional properties” “effects”

3.4. Critérios de inclusão e exclusão

Foram incluídos os artigos disponíveis gratuitamente na íntegra (open acess),


com data de publicação entre novembro de 2015 e novembro de 2019, e escritos nos

235
idiomas português, espanhol ou inglês. Foram excluídos os artigos com apenas o resumo
disponível, estudos que não se referissem ao tema de interesse, ou que não
descrevessem bem como com data de publicação anterior a novembro de 2015, ou
escritos em outros idiomas que não o português, inglês ou espanhol. Foram encontrados
mais de 1000 artigos, após leitura dos títulos e resumos foram selecionados 15 registros.

3.5. Pesquisa bibliográfica

Foi então realizada a pesquisa de dados e a leitura cuidadosa dos títulos e


resumos dos artigos recuperados pela estratégia de busca, respeitados os devidos
critérios de inclusão e exclusão. Esta foi a pré-seleção de artigos. Então, os trabalhos
pré-selecionados passaram por avaliação mais rigorosa, na qual não só os títulos e
resumos foram lidos e examinados, mas todo o artigo. Após esta análise, mais artigos
foram considerados inadequados, de forma que apenas os artigos restantes foram
incluídos no estudo. Os dados obtidos dos artigos selecionados foram utilizados para a
construção dos resultados e discussões.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Há alguns benefícios estudados que aproximam a atividade da cafeína como


adjuvante no controle glicêmico em indivíduos portadores do diabetes tipo 2. Apesar de
essa xantina promover, indiretamente, a ativação do sistema adrenérgico no organismo,
o que a princípio promoveria o aumento do glucagon e, consequentemente, a
glicogenólise, disponibilizando glicose no sangue. Existem estudos que identificam tal
substância como capaz de reduzir a resistência periférica no tecido muscular esquelético
de maneira a auxiliar, mesmo que em taxas discretas, o controle glicêmico. (CAZARIM;
UETA, 2015)
As atuais evidências de Silvestre et al (2018) mostram que a utilização da cafeína
como recurso ergogênico nutricional promove melhora do desempenho físico,
principalmente em modalidades de endurance, e essa melhora no desempenho é
devido aos mecanismos de ação da cafeína no sistema nervoso central.
Um estudo realizado no ano de 2015 por Nirmala e colaboradores sobre a
ingestão de cafés e a sua relação com câncer de mama na pós menopausa sugeriu que

236
a ingestão de cafeína pode estar associada a menor risco de desenvolvimento de câncer
de mama na pós-menopausa.
Em um trabalho publicado no ano de 2018 por Estevam et al., foi possível
concluir que houve uma tendência no aumento de força máxima proporcionado pela
cafeína em homens adultos ativos, comprovado pelo teste de 1RM, o mesmo resultado
foi apresentado para o retardo da fadiga, comprovado pelo teste de Repetições
máximas. Em outro estudo que estudava a percepção de dor durante um treinamento
de força, foi concluído que os efeitos da suplementação de cafeína demonstraram-se
com uma menor percepção de dor durante o treinamento de força (OLIVEIRA et al.,
2017)
A ingestão de 5 mg.kg-1 de CAF por atletas juniores de futebol após uma semana
de abstinência, segundo Lima et al., (2017) exerce efeito ergogênico durante o teste de
prioridade aeróbia de alta intensidade, principalmente quanto a parâmetros de melhora
no consumo máximo de O2 e redução no tempo individual de execução de teste.
Há indícios científicos de que a cafeína, através da interação com os sistemas
dopaminérgico, glutaminérgico e GABA-érgico, altera o curso clínico do Parkinson e do
Alzheimer. Devido à sua ação central, através da diminuição da atividade da adenosina
e do GABA, a cafeína apresenta alguns efeitos neuroprotetores em injúrias cerebrais
associadas ao sistema glutaminérgico, como os efeitos observados nos modelos
experimentais da doença de Alzheimer e do Parkinson (CAZARIM; UETA, 2015)
Carvalho (2019) evidenciou em seus estudos que o café possui potencial
neuroprotetor por ser antagonista do receptor A2A, de caráter excitatório, promovendo
redução no risco de desenvolver a Doença de Parkinson (DP). Além disso, a cafeína
também foi associada com a diminuição de tremores concatenados ao
comprometimento motor e não motor ao longo da evolução dessa patologia.
Entretanto, o estudo em questão também mostrou controvérsias na correlação entre o
uso da cafeína e o desenvolvimento da DP, visto que em alguns pacientes o efeito se
mostrou inexistente, enquanto em outros o consumo do café apareceu como um fator
de risco, denunciando a interferência da interação entre a cafeína com o genótipo do
indivíduo.
Hauschild & Adami (2018) relataram em seu estudo que a cafeína contribi para
um menor consumo de carboidratos como também na perda de % gordura corporal e

237
consumo de carboidratos, cafeína, proteína e calorias totais, associaram se com o
aumento do peso magro.
Além das aplicações nas áreas de saúde, cafeína provou em um trabalho de
MIRANDA (2019) ter potencial para utilização como larvicida natural, uma vez que os
efeitos dela foram semelhantes a de inseticidas conhecidos. Os tratamentos também
afetaram o intestino médio das larvas de A. aegypti, causando estresse oxidativo,
ativando a apoptose, inibindo a proliferação de células-tronco e reduzindo o número de
células enteroendócrinas FMRFamida. Além do mais, a borra de café usada no estudo
apresenta menor toxicidade ao meio ambiente e a organismos não-alvos, em relação
aos inseticidas químicos, e é um produto livre de custos, por ser de uso cotidiano e de
descarte, transformado em ferramenta de controle alternativo de vetores.
Um estudo prospectivo realizado na Finlândia demonstrou que o consumo de
quatro ou mais xícaras de café por dia poderia ser um fator de risco para artrite
reumatóide com fator reumatóide positivo (OLIVEIRA, 2011).
Em uma revisão sistemática desenvolvida por Silva et al (2015) acerca da
associação entre consumo de cafeína na gestação e ocorrência de TDAH nos filhos,
foram identificados apenas cinco estudos que avaliaram os efeitos do consumo materno
de cafeína durante a gestação e a ocorrência de TDAH na infância, sendo seus achados
controversos. Dentre os quatro estudos mais bem delineados e analisados apenas um
encontrou associação entre consumo de cafeína e hiperatividade aos 18 meses de idade.
Assim, a evidência atualmente disponível é insuficiente para que se possa afirmar ou
refutar a associação entre o prevalente hábito de consumir alimentos ricos em cafeína
na gestação e a ocorrência de TDAH entre os filhos.
Em um estudo no ano de 2015 com 539.577 participantes sobre consumo de café
e risco de câncer de próstata, Liu et al. concluíram que o risco relativo apontava para
uma associação inversa. O risco de câncer de próstata diminuiu 2,5% para cada 2 xícaras
de café consumidas por dia Liu et al. ( 2015 ) acreditavam que são necessários mais
estudos para confirmar ainda mais os achados.
Em uma outra metanálise, Liu et al. ( 2016 ), agora sobre melanoma maligno que
incluíram estudos de caso e estudos de coorte. Um total de 844.246 participantes foram
incluídos no estudo. Foi estabelecido que participantes com mais ingestão de cafeína
podem ter um risco reduzido de melanoma. Os resultados do estudo indicaram que as

238
bebidas com cafeína podem ter alguns efeitos quimio-preventivos em relação ao
melanoma, e concluiu-se que mesmo uma xícara de café com cafeína por dia diminui o
risco de melanoma.
Xie et al. ( 2016 ) em um estudo com mais de 1.000.000 de participantes.
descobriram forte associação entre beber café e uma redução no risco de câncer
gástrico. Um aumento no consumo de café mostrou que houve uma diminuição no risco
de câncer gástrico
Em um estudo em 2017, cujo objetivo era investigar os efeitos modificadores da
cafeína na lesão hepática induzida pela administração de tioacetamida (TAA) em ratos
machos, no grupo de co-tratamento os animais receberam uma dose de TAA de 200 mg
/ kg b.w e 37,5 mg / kg de cafeína. Após oito semanas de tratamento, foi observado que
o TAA induziu toxicidade hepática, e aumentou consideravelmente os níveis de citocinas
pró-inflamatórias (TNF-a, IL-1β e IL-6) no soro. O co-tratamento com cafeína e TAA
restaurou a estrutura e função normal do fígado. Deste modo, a cafeína forneceu um
efeito anti-fibrogênico, antiinflamatório e antioxidante que foi associado à recuperação
de alterações hepáticas histológicas e funcionais da hepatotoxicidade induzida por TAA
(AMER et al., 2017)

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio da pesquisa, pode-se concluir que a cafeína apresenta uma grande
variedade de efeitos benéficos, como melhora da atenção; melhora no rendimento
físico; quebra de gorduras; menor consumo de carboidratos, entre outros, em outras
palavras, a cafeína apresenta um leque de aplicabilidades. Embora esta substância
apresente efeitos benéficos, seu uso deve ser feito de maneira cautelosa, pois como
toda droga, a cafeína, também apresenta efeitos colaterais de dependência e
toxicidade. Por ser uma substância muito consumida necessita de mais estudos para
caracterizar esses efeitos adversos. O aprofundamento literário em alguns aspectos
pode contribuir para a elucidação de mecanismos ainda desconhecidos ou controversos,
pelo qual a cafeína interage com os diversos sistemas fisiológicos.

239
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244
CAPÍTULO XVII

CONTROLE DE QUALIDADE EM MEDICAMENTOS CONTENDO O PRINCÍPIO ATIVO


MELOXICAM
Kezia R. Bassi Zacarkim ¹
Natalia Irala Chun ²
Fernando Augusto Freitas ³
¹ Acadêmica do Curso de Farmácia do Centro de Ensino Superior de Foz do Iguaçu (Cesufoz), Foz do Iguaçu, PR.
² Acadêmica do Curso de Farmácia do Centro de Ensino Superior de Foz do Iguaçu (Cesufoz), Foz do Iguaçu, PR.
³ Professor do curso de Farmácia do Centro de Ensino Superior de Foz do Iguaçu (Cesufoz), Foz do Iguaçu, PR.

RESUMO

O Meloxicam é um anti-inflamatório não esteroidal que possui atividades anti-


inflamatórias, antipiréticas e analgésicas, sendo que para a obtenção dos respectivos
registros na ANVISA, é necessário estabelecer a intercambialidade entre os
medicamentos genéricos e similares, com aqueles de referência. Este trabalho teve
como objetivo efetuar o controle de qualidade e equivalência farmacêutica em
medicamentos na forma de comprimidos que contêm o meloxicam como princípio ativo.
O medicamento de referência (R) foi utilizado em comparação com dois similares (MX e
ML) e dois genéricos (MM e MT), todos com 15 mg. As análises parciais realizadas foram
peso médio, dureza e friabilidade, seguindo as normas da Farmacopeia Brasileira 5ª Ed.
A avaliação de peso-médio mostrou boa uniformidade nos resultados obtidos, onde o
medicamento R apresentou o coeficiente de variação (CV) e desvio-padrão (DP) iguais a
1,4 % e ±0,0025, respectivamente. Ainda, os valores de CV e DP para os medicamentos
similares e genéricos foram: MX (1,61% e ±0,0027), ML (1,43% e ±0,0029), MM (0,72%
e ±0,0022) e MT (1,07% e ±0,0018). No teste de friabilidade todos os medicamentos
foram aprovados, já que as perdas verificadas foram iguais a R (0,0028%), MX (0,2185%),
ML (0,1477%), MM (0,1170%) e MT (0,2989%). Os testes parciais mostrados até o
presente momento, mostraram que os medicamentos genéricos e similares examinados
apresentaram-se equivalentes ao medicamento de referência correspondente.

Palavras-chave: Controle de qualidade. Equivalência Farmacêutica. Meloxicam.

1. INTRODUÇÃO

Os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) estão entre as classes


medicamentosas mais difundidas no mundo, para tratar inflamação, dor e edema,
osteoartrites e artrite reumatoide. Dentre as principais causas para esse crescimento,
destacam-se a grande facilidade de acesso ao fármaco e uma população mais idosa com

245
doenças reumatológicas. Os anti-inflamatórios não esteroidais são inibidores da enzima
cicloxigenase (COX), seletivos ou não, o que impede a formação de prostaglandinas
(PGs). Existem duas isoformas da enzima cicloxigenase, designadas COX-1 e COX-2, com
estruturas químicas similares. A isoforma COX-1 é expressa de forma constitutiva na
maioria dos tecidos, enquanto a COX-2 é induzida nas inflamações. A COX-1 é essencial
para a manutenção do estado fisiológico normal de muitos tecidos, incluindo a proteção
da mucosa gastrointestinal, controle do fluxo sanguíneo renal, homeostasia, respostas
autoimunes, funções pulmonares e do sistema nervoso central, cardiovasculares e
reprodutivas, enquanto a COX-2, induz a inflamação por vários estímulos, como
citocinas, endotoxinas e fatores de crescimento (BATLOUNI, 2010).
As prostaglandinas são produzidas a partir de fosfolipídios da membrana celular
por uma cascata enzimática. Em uma primeira etapa ocorre a conversão de fosfolipídios
da membrana em ácido araquidônico pela enzima fosfolipase A2, o qual é liberado no
citoplasma. O ácido araquidônico, por sua vez, pode servir de substrato para duas vias
diferentes, uma baseada na ação das cicloxigenases e a outra relacionada com a enzima
lipoxigenase, conforme mostrado na Figura 1.

Figura 1 - Cascata do Ácido araquidônico.

Fonte: Baseado em HILÁRIO; TERRERI; LEN (2006) e DIETRICH; CARRIS; PANAVELIL (2016), com
modificações.

246
O Meloxicam é um anti-inflamatório não esteroidal que possui comercialmente
três formas farmacêuticas, injetável, suspensão oral e comprimido. Pertence à classe do
ácido Enólico, que tem como finalidade atividades anti-inflamatórias, antipiréticas e
analgésicas. Este fármaco é indicado para tratamento dos sintomas da artrite
reumatoide e osteoartrite, amenizando a dor e a inflamação. Sua fórmula estrutural está
mostrada na Figura 2.

Figura 2 - Fórmula estrutural do Meloxicam.

Fonte: Autoria própria.

O mecanismo de ação do Meloxicam consiste em inibir a biossíntese de


prostaglandinas, mediadores da inflamação, como consequência da inibição da COX-1
em menor extensão e COX-2, embora recentes estudos informem na bula do Meloxicam
que este ativo seja seletivo para COX-2, agindo diretamente na inflamação e resultando
em maior segurança na sua utilização.
A Política Nacional de Medicamentos (PNM) teve como objetivo garantir a
segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos, racionalizar seu uso e garantir o
acesso da população aos considerados essenciais. Nela está inclusa a promoção do uso
dos medicamentos genéricos, envolvendo a produção, comercialização, prescrição e
uso, para consolidá-los no Brasil e permitir maior inclusão dos medicamentos para a
população (ARAÚJO et al., 2010). Sendo assim, com a Lei nº 9.787 de 10 de fevereiro de
1999, foi implantada no Brasil a política de medicamentos genéricos, para a melhoria da
qualidade dos medicamentos e a facilitação ao acesso do público ao tratamento
medicamentoso. Esse produto deve ser intercambiável com os medicamentos de
referência ou também conhecidos como éticos. Os genéricos são produzidos após a

247
expiração ou renúncia da proteção da patente ou de outros direitos de exclusividade,
cuja proteção é determinada pela Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996.
A Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 47, de 28 de março de 2001,
determina que os medicamentos genéricos devem ser identificados com uma faixa
amarela contendo a letra G em azul em suas embalagens externas. Já o medicamento
similar é aquele que contém a mesma forma farmacêutica, concentração, princípio
ativo, via de administração, posologia e indicação terapêutica, preventiva ou diagnóstica
do medicamento inovador, mas diferem nas características relativas ao tamanho e
forma do produto, prazo de validade, embalagem, rotulagem, excipientes e veículos. A
identificação deve ocorrer por meio do nome comercial ou marca (ANVISA, 2009).
O conceito de equivalência farmacêutica, de acordo com a RDC nº 31, de 11 de
agosto de 2010, refere-se aos equivalentes farmacêuticos como medicamentos que
contém a mesma forma farmacêutica, a mesma via de administração e mesma
quantidade de substancia ativa. Devem seguir os requisitos da monografia da
Farmacopeia Brasileira 5ª Ed. (2010), ou seguir as especificações de outros códigos
oficiais, normas ou regulamentos aprovados pela ANVISA. Na ausência desses, devem
cumprir os requisitos com outros padrões de qualidade. Os testes realizados para a
comprovação dos equivalentes farmacêuticos são avaliados por meio dos testes in vitro
(ANVISA, 2010).
Após a implantação da PNM, o perfil de consumo de medicamentos genéricos
pela população tem mudado consideravelmente com o passar dos anos, conforme
relatado por Araújo (2010). A autora relata que houve um crescimento de
aproximadamente 249,42% entre junho de 2000 e agosto de 2001 e em abril de 2004
havia um total de 1.124 medicamentos genéricos registrados, o que torna evidente a
necessidade de garantir a bioequivalência com os medicamentos de referência. Desta
forma, este trabalho teve como objetivo efetuar o controle de qualidade e equivalência
farmacêutica em medicamentos na forma de comprimidos não revestidos que contêm
o meloxicam como princípio ativo.

248
2. MATERIAIS E MÉTODOS

Os testes efetuados de peso médio, dureza e friabilidade seguiram as


orientações determinadas pela Farmacopeia Brasileira 5ª Ed. Para a realização dos
testes, foi utilizado um total de 50 comprimidos de cada medicamento, incluindo os
medicamentos de referência (R), dois similares (MX e ML) e dois genéricos (MM e MT),
todos com 15 mg do princípio ativo, sendo que tais medicamentos foram adquiridos em
uma farmácia comercial na cidade de Foz do Iguaçu, PR. Todos os testes foram efetuados
com comprimidos pertencentes a um mesmo lote para cada medicamento.

2.1. Peso Médio

Para a avaliação do peso médio, utilizou-se uma balança analítica da marca


SHIMADZU, modelo AUY220 (precisão de 0,0001 g), sendo que a média foi obtida pela
razão entre o peso total obtido e a quantidade de 20 comprimidos utilizados.

2.2. Dureza

O teste de dureza foi efetuado utilizando-se o aparelho durômetro da marca


Ethik, modelo 298/DGP (precisão de 0,1 N), sendo a força calculada em newtons (N).
Foram utilizados 10 comprimidos para cada medicamento e, conforme orientação da
Farmacopeia Brasileira 5ª Ed., todos os comprimidos foram posicionados com a mesma
orientação no equipamento durante a realização do experimento.

2.3. Friabilidade

Conforme as especificações da Farmacopeia Brasileira 5ª Ed., o teste de


friabilidade deve ser efetuado somente nos comprimidos não revestidos. O
equipamento utilizado trata-se de um friabilômetro da marca Ethik Technology, modelo
300-2 (versão II), o qual foi regulado para uma velocidade de 25 rotações por minuto
(rpm) e um tempo de 4 minutos. Os 20 comprimidos de cada medicamento foram
inicialmente pesados e posteriormente submetidos às condições descritas. Após o
período de 4 minutos no friabilômetro, os comprimidos foram pesados novamente
depois da remoção de qualquer resíduo de pó da superfície. Os cálculos da friabilidade
foram efetuados observando-se as diferenças dos pesos iniciais e finais para cada
medicamento, sendo que os resultados foram expressos em porcentagem de perda.

249
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A avaliação do peso médio permite avaliar a homogeneidade relacionada à


quantidade do princípio ativo para um mesmo lote de um determinado medicamento
(BUZZI et al., 2006). Conforme as orientações da Farmacopeia Brasileira 5ª Ed., a
variação máxima permitida para o Coeficiente de Variação (CV) em comprimidos não
revestidos com peso médio entre 80 e 250 mg (medicamentos R, MX, ML e MT) é de ±
7,5%. De maneira similar, o limite para os comprimidos não revestidos com peso médio
superior a 250 mg (medicamento MM) é de ± 5%. Além dessa primeira limitação,
também não podem ser toleradas mais do que duas unidades fora dos limites de ± 1 CV,
bem como também não pode haver nenhuma unidade fora dos limites de ± 2 CV.
Os resultados obtidos para a avaliação de peso-médio mostraram boa
uniformidade e foram aprovados nos critérios estabelecidos, conforme mostrado na
Tabela 1. Observa-se que o medicamento similar MX apresentou os maiores valores
para o CV (1,61%) e DP (±0,0027), mas ainda assim, verifica-se que estes valores se
encontram bem abaixo dos limites permitidos.

Tabela 1 – Resultados obtidos no teste de peso médio nos comprimidos de meloxicam.


Medicamento Peso médio DP CV Nº de comprimidos Avaliação
(mg) (%) fora dos limites
± 1CV ± 2CV
R 180,35 0,0025 1,40 0 0 Aprovado
MX 168,22 0,0027 1,61 0 0 Aprovado
ML 200,71 0,0029 1,43 0 0 Aprovado
MM 303,91 0,0022 0,72 0 0 Aprovado
MT 165,00 0,0018 1,07 0 0 Aprovado
Fonte: Autoria própria.

O teste de dureza consiste em observar a resistência do comprimido ao


esmagamento e, conforme consta na Farmacopeia Brasileira 5ª Ed., os resultados
obtidos nestes testes são apenas informativos. No entanto, o teste de dureza permite
constatar se o medicamento examinado possui a resistência adequada, tendo em vista
que as diversas etapas relacionadas à produção, transporte e manuseio posterior,
podem causar desgaste por fricção em função de choques mecânicos (MEDEIROS;

250
MOTA; ALVIM, 2019). Os valores médios observados em 10 comprimidos utilizados para
cada medicamento, em Newtons (N), foram R (44,0 N), MX (41,9 N), ML (79,0 N), MM
(62,8 N) e MT (31,8 N).
No teste de friabilidade o limite tolerado de perdas é de 1,5% no máximo, sendo
que os resultados de perdas obtidos para os 20 comprimidos de cada medicamento
foram iguais a R (0,0028%), MX (0,2185%), ML (0,1477%), MM (0,1170%) e MT
(0,2989%). Observa-se que o medicamento genérico MT apresentou a maior variação
de peso, mas mesmo assim está bem abaixo do limite máximo permitido, de modo que
os resultados demonstraram que todos os medicamentos foram aprovados.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho descreve os resultados parciais do conjunto de testes


determinados pelas normas da Farmacopeia Brasileira 5ª Ed. para comprovar a
equivalência farmacêutica. No entanto, os resultados obtidos até este momento
mostraram que os medicamentos genéricos e similares examinados apresentaram-se
equivalentes ao medicamento de referência correspondente. Nas próximas etapas
serão realizados os ensaios complementares, cujos resultados poderão garantir a
equivalência farmacêutica e intercambialidade dos medicamentos avaliados.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Centro de Ensino Superior de Foz do Iguaçu (Cesufoz)


pelo apoio logístico institucional.

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252
CAPÍTULO XVIII

POTENCIAL ANTIOBESOGÊNICO DO EXTRATO DE FEIJÃO-BRANCO (PHASEOLUS


VULGARIS L.)
Jardel Alves da Costa 1
Clécia Maria da Silva 2
Sâmia Karine de Moura Martins 3
Amanda de Andrade Alencar Ramalho 4
Bruna Virgínia da Silva Santos 5
Nara Vanessa dos Anjos Barros 6
1, 2, 4, 5
Graduando do curso de Nutrição. Universidade Federal do Piauí – UFPI.
3 Pós-graduando em Nutrição Oncológica (Especialização). Programa de Pós-Graduação do Hospital São Marcos–
HSM.
6 Professor Adjunto da Coordenação do Curso de Nutrição. Universidade Federal do Piauí– UFPI.

RESUMO

A ocorrência de obesidade é atualmente considerada uma pandemia global e é


amplamente fundamentado que, além dos seus distúrbios metabólicos associados, por
exemplo, doença hepática gordurosa não alcoólica, essa patologia também aumenta o
risco de uma série de doenças crônicas não transmissíveis, incluindo diabetes tipo 2,
doenças cardiovasculares e câncer. Atualmente, os remédios para o tratamento da
obesidade baseados em suplementos dietéticos são populares, sugerindo que a
etnofarmacologia e a fitoterapia podem servir como estratégias no tratamento e
prevenção da patologia. A faseolamina é uma proteína constituinte do feijão branco
comum (Phaseolus vulgaris L.) e tem sido destacada como um importante inibidor de
alfas- amilases, usada para reduzir a glicemia e a absorção de calorias por meio da
prevenção ou retardo da digestão de carboidratos complexos, agindo como anti-
hiperglicêmico e anti-obesogênico. Diante do exposto, este estudo objetivou revisar a
literatura acerca de estudos relevantes e atuais que relataram o uso do extrato de feijão-
branco como composto com ação antiobesidade. O extrato de feijão-branco apresentou
elevado potencial antiobesidade, pois é capaz de promover a redução da digestão de
amidos da dieta e desta maneira a energia derivada dos carboidratos e a taxa de
absorção corporal da energia na forma de glicose pode ser amenizada, reduzindo a
formação de tecido adiposo, além de diminuir colesterol e triglicérides prevenindo a
obesogênese.

Palavras-chave: Phaseolus Vulgaris. Obesidade. Alfa-amilase.

253
1. INTRODUÇÃO

Atualmente a obesidade é considerada uma pandemia global e é amplamente


fundamentado que, além dos seus distúrbios metabólicos associados, por exemplo,
doença hepática gordurosa não alcoólica, essa patologia também aumenta o risco de
uma série de doenças crônicas não transmissíveis, incluindo diabetes tipo 2, doenças
cardiovasculares e câncer (HEYMSFIELD e WADDEN, 2017).
O controle da dieta e dos exercícios são os pilares do controle do excesso de
peso. Alimentos com baixo índice glicêmico podem reduzir o risco de diabetes e doenças
cardíacas, bem como suas complicações. Como alternativa a uma dieta de baixo índice
glicêmico, há um crescente corpo de pesquisas em produtos que retardam a absorção
de carboidratos por meio da inibição de enzimas responsáveis por sua digestão
(BARRETT e UDANI, 2011).
Existem inúmeras práticas integrativas e complementares para a prevenção e
tratamento da obesidade, incluindo terapias medicinais e o uso de plantas e derivados.
Atualmente, os remédios para obesidade baseados em suplementos dietéticos são
populares, sugerindo que a etnofarmacologia e a fitoterapia podem servir como
estratégias no tratamento e prevenção da patologia (CASTILLO, GONZÁLEZ e MOORE-
CARRASCO, 2019).
O inibidor da alfa-amilase pancreática isoforma 1 (alfa-AI 1), também conhecido
como faseolamina, é uma proteína constituinte do feijão branco comum e do feijão
vermelho (Phaseolus vulgaris L.). Ao lado dela, existem duas outras isoformas e um
inibidor da alfa-amilase (alfa-AI 2, alfa-AI 3 e alfa-AIL, respectivamente). O mais
amplamente distribuído na planta é o alfa-AI 1, que representa cerca de um décimo do
conteúdo total de proteína da semente (OBIRO, ZHANG e JIANG, 2008).
O gênero Phaseolus vulgaris (Figura 1) inclui todas as espécies de sementes de
leguminosas normalmente chamadas de feijão comum. Atualmente, P. vulgaris é
considerado um importante alimento funcional: extratos de P. vulgaris têm sido
repetidamente relatados para reduzir a ingestão de alimentos, peso corporal, depósito
de lipídios e glicemia em uma série de modelos animais com obesidade, diabetes e
síndrome metabólica (LOI et al., 2013).

254
Figura 1: Feijão branco (Phaseolus vulgaris L)

Fonte: https://www.semo.cz/en/nazev-latinsky/phaseolus-vulgaris-l/

Diante do exposto, este estudo objetivou revisar a literatura acerca de estudos


relevantes e atuais que relataram o uso do extrato de feijão-branco como composto
com ação antiobesidade.

2. MÉTODOS

Trata-se de um estudo de revisão narrativa da literatura, com a seguinte


pergunta de pesquisa: o extrato do feijão-branco tem ação antiobesidade? A busca de
artigos incluiu a pesquisa em bases eletrônicas indexadas e busca manual de citações
nas publicações selecionadas. As bases eletrônicas pesquisadas foram LILACS (Literatura
Latino Americana e do Caribe em Ciências de Saúde), e literatura internacional em
Ciências da Saúde (MEDLINE). Foram utilizados os seguintes descritores: Phaseolus
Vulgaris, Obesidade, Alfa-amilase, ambos nos idiomas português e inglês. O período de
abrangência da busca foi entre janeiro de 2015 a dezembro/2020.

3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.1. Obesidade

Desde a década de 1970, a prevalência global da obesidade quase triplicou em


adultos e aumentou ainda mais dramaticamente em crianças e adolescentes. A
obesidade contribui para uma expectativa de vida reduzida de até 20 anos devido ao
aumento da mortalidade por doenças não transmissíveis, incluindo doenças
cardiovasculares ateroscleróticas, diabetes tipo 2 e certos tipos de câncer. Além das

255
consequências da patologia no nível individual, a pandemia da obesidade pode criar um
enorme fardo para a saúde pública da sociedade (SWINBURN et al., 2011).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), obesidade é definida como
“acúmulo anormal ou excessivo de gordura que apresenta risco à saúde”. Em contraste
com a visão de que esta representa apenas um fator de risco para doenças, a World
Obesity Federation declarou a própria obesidade como uma doença crônica, recorrente
e progressiva (BRAY et al., 2017).
Isso tem sido justificado por uma abordagem de modelo epidemiológico que
considera a fisiopatologia da obesidade como uma interação de fatores ambientais
(disponibilidade e acessibilidade de alimentos ricos em energia, baixa necessidade de
atividade física), com susceptibilidade genética, resultando em um balanço energético
positivo e maior peso corporal. Os fortes mecanismos que promovem o ganho de peso
e defendem um peso corporal mais elevado, mesmo contra intervenções direcionadas
para a perda de peso, argumentam ainda mais a visão de que a obesidade é uma doença
crônica e não uma decisão (MÜLLER e GEISLER, 2017).

3.1.1. Obesidade como fator de risco para outras


patologias
A obesidade foi bem identificada como uma condição pró-inflamatória em que o
excesso de adiposidade visceral resulta em efluxo de citocinas pró-inflamatórias que
afetam os processos celulares sistêmicos, sendo bem fundamentado que adultos obesos
têm aumento das citocinas pró-inflamatórias circulantes com aumento da leptina e
diminuição da produção de adiponectina, causando resistência sistêmica à leptina e
potencial impacto no perfil imunológico padrão dos indivíduos obesos, abrindo uma
janela de ampla gama para instalação de diversas comorbidades metabólicas associadas
(RICHARD et al., 2017).
A obesidade é correlacionada a diversas comorbidades que não são menos
prejudiciais à saúde do que a própria obesidade, como diabetes mellitus tipo 2,
hipertensão arterial sistêmica, doenças da artéria coronária, aterosclerose, osteoartrite
e acidente vascular cerebral (AFOLABI et al., 2020).
Sattar, Mcinnes e Mcmurray (2020) relataram que a obesidade aumentou vários
fatores de risco cardiovasculares, como o desenvolvimento prematuro de doença

256
cardiovascular e efeitos adversos cardiorrenais. Em pessoas com diabetes ou com alto
risco de diabetes, a obesidade e a gordura ectópica acumulada frequentemente
resultaram em diminuição da resistência à insulina e da função das células beta do
pâncreas. Ambos limitaram a capacidade de alguns pacientes com diabetes de produzir
uma resposta metabólica adequada aos problemas imunológicos, levando a uma
enorme necessidade de insulina em infecções graves.

3.1.2. Inibidores de alfa-amilases na terapêutica da


obesidade
Atualmente, há uma variedade de alvos terapêuticos disponíveis para redução
de peso, como lipase pancreática, alfa-amilase, receptor de peptídeo-1 semelhante ao
glucagon (GLP-1) e receptor de serotonina. Junto com a redução geral do uso de
supressores de apetite que atuam no sistema nervoso central (SNC), por exemplo,
fenfluramina, d-fenfluramina e
rimonabanto (TUCCI, BOYLAND e HALFORD, 2010).
Em humanos, várias formas de carboidratos são responsáveis por entre 40% a
80% da ingestão calórica total. Alimentos com baixo índice glicêmico (IG) (valor IG <55),
a forma polimérica de carboidratos que são absorvidos lentamente, têm sido associados
ao controle glicêmico e perda de peso. Uma alternativa aos alimentos de baixo IG são
os produtos que podem diminuir a absorção de carboidratos por meio da supressão de
enzimas relacionadas, como a α-amilase pancreática (MARRELLI et al., 2013).
Com o aumento do número de pacientes com obesidade e diabetes, as pesquisas
sobre a inibição da digestão do amido e absorção de carboidratos têm chamado muita
atenção. Os inibidores da amilase podem bloquear a digestão de certos amidos, o que
pode ser útil no controle dos níveis de açúcar no sangue. Portanto, a inibição da digestão
do amido catalisada por amilase em ambiente gastrointestinal complexo é uma
estratégia eficaz para a digestão controlada (LIU, 2020).

3.2. Extrato do feijão branco (Phaseolus vulgaris L.) como


composto antiobesidade

Os estudos dispostos no quadro 1 demonstram as evidências do efeito


antiobesidade desempenhado pelo extrato de feijão branco.

257
Quadro 1: Descrição dos estudos que evidenciaram o efeito antiobesidade do extrato de feijão
branco (Phaseolus vulgaris L.).

Estudo Objetivo Resultados


SONG et al. (2016) Avaliar a influência do extrato de feijão A suplementação de extrato de
branco na obesidade e na resistência à feijão branco reduziu
insulina associada à obesidade e na significativamente o ganho de peso
esteatose hepática em camundongos corporal induzido por dieta rica em
alimentados com dieta rica em gordura, bem como o peso relativo
gordura. do tecido adiposo branco visceral e
resultou em um peso corporal final
mais baixo nos camundongos
tratados com extrato de feijão
branco.
Foi relatado retardo da digestão de
amidos da dieta por meio da inibição
da alfa amilase pancreática.
MICHELI et al. (2019) Avaliar a eficácia de um tratamento A suplementação de extrato de
crônico com um extrato de semente feijão branco reduziu o peso
padronizado de feijão branco, corporal ao longo do tempo, bem
contendo 6% do composto bioativo como reduziu efetivamente a
não nutritivo faseolamina. glicemia, os triglicerídeos e o
colesterol em camundongos obesos.
Foi relatado retardo da digestão de
amidos da dieta por meio da inibição
da alfa amilase pancreática.
WANG et al. (2020) Avaliar a influência do extrato de feijão A administração de extrato de feijão
branco administrado em forma de branco promoveu redução do índice
cápsula antes das refeições diárias de massa corporal (IMC) em média
sobre a perda de peso de indivíduos 0,79 e redução da gordura corporal
obesos. em 1,53% em humanos obesos.
Foi relatado retardo da digestão de
amidos da dieta por meio da inibição
da alfa amilase pancreática.
CASTILLO, GONZÁLEZ e Investigar a atividade antiobesidade A administração de extrato de feijão
MOORE-CARRASCO do extrato de feijão branco por meio branco promoveu aumento da
(2019) da quantificação da lipólise em libertação de glicerol de forma
significativa e redução do acúmulo

258
adipócitos maduros e em tecido de triglicerídeos no meio
adiposo branco de ratos. intracelular.
Foi relatado retardo da digestão de
amidos da dieta por meio da inibição
da alfa amilase pancreática.
Fonte: Autoria própria

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O extrato de feijão-branco (P. vulgaris L.) apresentou elevado potencial


antiobesidade pois é capaz de promover a redução da digestão de amidos da dieta, e
desta maneira a energia derivada dos carboidratos e a taxa de absorção corporal da
energia na forma de glicose pode ser amenizada, reduzindo a formação de tecido
adiposo, além de diminuir colesterol e triglicérides prevenindo a obesogênese.

REFERÊNCIAS

AFOLABI, Hafeez Abiola et al. The relationship between obesity and other medical
comorbidities. Obesity Medicine, v. 17, p. 100164, 2020.

BARRETT, Marilyn L.; UDANI, Jay K. A proprietary alpha-amylase inhibitor from white
bean (Phaseolus vulgaris): a review of clinical studies on weight loss and glycemic
control. Nutrition Journal, v. 10, n. 1, p. 24, 2011.

BRAY, G. A. et al. Obesity: a chronic relapsing progressive disease process. A position


statement of the World Obesity Federation. Obesity Reviews, v. 18, n. 7, p. 715-
723, 2017.

CASTILLO, Felipe; GONZÁLEZ, Daniel R.; MOORE-CARRASCO, Rodrigo. Effects of


phaseolus vulgaris extract on lipolytic activity and differentiation of 3T3-L1
preadipocytes into mature adipocytes: a strategy to prevent obesity. Journal of
nutrition and metabolism, v. 2019, 2019.

HEYMSFIELD, Steven B.; WADDEN, Thomas A. Mechanisms, pathophysiology, and


management of obesity. New England Journal of Medicine, v. 376, n. 3, p. 254-
266, 2017.

LIU, Qi-Zheng et al. Inhibition of starch digestion: The role of hydrophobic domain of
both α-amylase and substrates. Food Chemistry, v. 341, p. 128211, 2020.

LOI, Barbara et al. Reducing effect of an extract of Phaseolus vulgaris on food intake in
mice—Focus on highly palatable foods. Fitoterapia, v. 85, p. 14-19, 2013.

259
MARRELLI, Mariangela et al. Inhibition of key enzymes linked to obesity by preparations
from Mediterranean dietary plants: effects on α-amylase and pancreatic lipase
activities. Plant foods for human nutrition, v. 68, n. 4, p. 340-346, 2013.

MICHELI, Laura et al. Phaseolus vulgaris L. Extract: alpha-amylase inhibition against


metabolic syndrome in mice. Nutrients, v. 11, n. 8, p. 1778, 2019.

MICHELI, Laura et al. Phaseolus vulgaris L. Extract: alpha-amylase inhibition against


metabolic syndrome in mice. Nutrients, v. 11, n. 8, p. 1778, 2019.

MÜLLER, M. J.; GEISLER, C. Defining obesity as a disease. European Journal of Clinical


Nutrition, v. 71, n. 11, p. 1256-1258, 2017.

OBIRO, Wokadala Cuthbert; ZHANG, Tao; JIANG, Bo. The nutraceutical role of the
Phaseolus vulgaris α-amylase inhibitor. British journal of nutrition, v. 100, n. 1,
p. 1-12, 2008.

RICHARD, Caroline et al. Individuals with obesity and type 2 diabetes have additional
immune dysfunction compared with obese individuals who are metabolically
healthy. BMJ Open Diabetes Research and Care, v. 5, n. 1, 2017.

SATTAR, Naveed; MCINNES, Iain B.; MCMURRAY, John JV. Obesity a risk factor for severe
COVID-19 infection: multiple potential mechanisms. Circulation, 2020.

SONG, Haizhao et al. Dietary Phaseolus vulgaris extract alleviated diet-induced obesity,
insulin resistance and hepatic steatosis and alters gut microbiota composition in
mice. Journal of Functional Foods, v. 20, p. 236-244, 2016.

SWINBURN, Boyd A. et al. The global obesity pandemic: shaped by global drivers and
local environments. The Lancet, v. 378, n. 9793, p. 804-814, 2011.

TUCCI, Sonia A.; BOYLAND, Emma J.; HALFORD, Jason CG. The role of lipid and
carbohydrate digestive enzyme inhibitors in the management of obesity: a
review of current and emerging therapeutic agents. Diabetes, metabolic
syndrome and obesity: targets and therapy, v. 3, p. 125, 2010.

WANG, Shenli et al. Regular intake of white kidney beans extract (Phaseolus vulgaris L.)
induces weight loss compared to placebo in obese human subjects. Food Science
& Nutrition, v. 8, n. 3, p. 1315-1324, 2020.

260
CAPÍTULO XIX

AVALIAÇÃO DO CONHECIMENTO DOS ALUNOS INGRESSOS DE UMA INSTITUIÇÃO


DE ENSINO TÉCNICO PRIVADO DA ÁREA DA SAÚDE SOBRE ISTS NO MUNICÍPIO
DE SÃO GONÇALO/RJ
Agatha Chrystie dos Santos Ribeiro ¹
Mariana Fernandes da Rocha ²
Paula Monnerat Floriano ²
Yasmin da Silva Santos³
¹ Aluna do curso técnico em Análises Clínicas. Senes/UNETEC-São Gonçalo/RJ
² Bióloga docente do curso técnico de Análises Clínicas. Senes/UNETEC-São Gonçalo/RJ.
3 Mestre em ciências, biomédica docente do curso técnico de Análises Clínicas. Senes/UNETEC-São Gonçalo/RJ.

RESUMO

As infecções sexualmente transmissíveis (IST) podem ser transmitidas por diversos


microrganismos patogênicos, com maior conhecimento público sendo o HIV/AIDS. O
objetivo deste trabalho é avaliar o conhecimento de alunos da área da saúde sobre ISTs
em uma instituição de ensino através de uma pesquisa descritiva de natureza
qualitativa, com questionário fechado sobre o perfil do candidato e conhecimento sobre
ISTs dos alunos de uma instituição de ensino privado do município de São Gonçalo/RJ.
Os dados foram analisados pela técnica de análise de Conteúdo de Bardin. Foram
coletados 46 questionários onde, 87% são do sexo feminino, com média de idade de 28
anos, 49% moram com parceiros. 80,4% possuem o ensino médio completo e, 50% dos
participantes afirmaram ter aula e palestra de educação sexual na escola. 58,7 % nunca
realizaram algum teste diagnóstico para detecção de IST, mas somente 45,7% utilizam
o preservativo em todas as relações sexuais. 8% dos participantes afirmam não ter medo
de se infectar e, 13% acreditam que todas as ISTs apresentam sintomas clínicos.
Podemos observar que os candidatos afirmam ter algum tipo de conhecimento sobre
IST, contudo, os resultados confrontam uma realidade diferente, podendo ser explicada
pela presença de um parceiro fixo. A confiança em não adquirir doença descarta o uso
do preservativo, mas, muitos candidatos nunca realizaram nenhum teste diagnóstico o
que pode ser preocupante para a saúde do indivíduo e de terceiros.

Palavras-chave: Conhecimentos, Infecção sexualmente transmissível, Orientação


sexual, Sexualidade.

261
1. INTRODUÇÃO

O município de São Gonçalo pertence à Região Metropolitana do Rio de Janeiro


e possui uma população estimada de 1.084.839 habitantes (IBGE, 2019), sendo o
segundo mais populoso do estado. A maioria da população encontra-se na faixa etária
de 25 a 34 anos, são majoritariamente católicos apostólicos romanos seguidos da
população evangélica com salário médio mínimo, 81,4% da população tem acesso ao
saneamento básico adequado e 96,7% das crianças de 6 a 15 anos estão na escola (IBGE,
2019). O município possui promoção à atenção primária de saúde reconhecida no
estado (ALVES, 2019), principalmente voltada para a população idosa que apresenta
comorbidades crônicas relevantes (FIOCRUZ, 2017). As infecções sexualmente
transmissíveis (ISTs) são tratadas com a devida atenção pelo Centro de testagem e
acolhimento do município (CTA/SAE), realizando testes laboratoriais para Sífilis, HIV, e
teste rápido para HIV (BRASIL, 2020).
Reconhecemos que Infecções sexualmente transmissíveis (IST) são patologias
transmitidas por microrganismos (bactérias, vírus, fungos e protozoários),
principalmente, pelo contato sexual desprotegido com um indivíduo infectado. Também
podem ser transmitidos em poucos casos por transfusão de sangue, compartilhamento
ou acidentes com perfuro cortantes e de forma congênita. As ISTs mais conhecidas pela
população são o HIV e a sífilis graças às campanhas de prevenção constantemente
vinculadas e pelos exemplos em indivíduos conhecidos na mídia. Contudo, não são as
únicas que promovem riscos à saúde do indivíduo (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2019).
As ISTs podem se apresentar com diferentes manifestações clínicas. A avaliação
clínica realizada por um profissional médico é de extrema relevância para o diagnóstico.
A identificação das diferentes vulnerabilidades, histórico do paciente, o exame físico e
coleta de material biológico para a realização de testes laboratoriais ou rápidos mantém
a acurácia diagnóstica aplicada às ISTs, esta abordagem se baseia nos aspectos clínicos
para classificar os principais agentes etiológicos e definir o tratamento sem o apoio de
testes laboratoriais ou rápidos. (BRASIL, 2020). Sempre que possível nos serviços
especializados em ISTs e/ou doenças infecciosas devem ser realizadas exames para
triagem de gonorreia, clamídia, sífilis, HIV e hepatites B e C (MINISTÉRIO DA SAÚDE,
2018).

262
O controle das infecções assintomáticas está atrelado às novas tecnologias
diagnósticas como os testes rápidos para sífilis e para o HIV, além de outras mais
elaboradas aplicadas ao diagnóstico molecular, mas que contam com a possibilidade de
implantação, como os testes para gonorreia e clamídia. Vale ressaltar que ISTs são de
notificação compulsória, e devem ser sinalizadas através do SINAN (MINISTÉRIO DA
SAÚDE, 2018).
A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) é uma doença crônica causada
pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), ocasionando perda progressiva da
imunidade celular e, consequentemente, o aparecimento de infecções oportunistas.
Estima-se que 38 milhões de pessoas em todo mundo possuam o vírus, contudo o acesso
a medidas profiláticas tem representado uma ótima medida controle a incidência.
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018; UNAIDS, 2020).
Atualmente o indivíduo portador do vírus possui vida normal graças ao
controle e manejo da doença ao usar os medicamentos indicados e acessíveis
através do Sistema único de saúde (SUS), o que possibilita indivíduos de baixa renda
a não comprometerem seu orçamento, e manter o tratamento sem interrupções
além dos frequentes acompanhamentos clínicos. (BRASIL,2020).
Existem atualmente duas estratégias de tratamento preventivo que favorecem
novas campanhas de combate a transmissão do HIV, diminuindo de forma relativa a
transmissão do vírus, a profilaxia Pré-exposição (PrEP) e a Profilaxia Pós-Exposição
(PEP). A PrEP é uma estratégia de prevenção que utiliza medicamentos antirretrovirais
de forma contínua por pessoas não infectadas a fim de reduzir o risco de aquisição do
HIV através de relações sexuais. O PrEP também é utilizado por casais para prevenção
de um indivíduo que não possui positividade a doença. Já a PEP, é uma estratégia de
prevenção que utiliza medicamentos antirretrovirais durante 28 dias em pessoas que
tiveram risco de contato com o HIV através de relações sexuais desprotegidas ou
acidentes de trabalho com exposição a material biológico, com a finalidade de impedir
que o HIV se instale no organismo de forma definitiva. Este tratamento deve ser iniciado
logo após a situação de risco dentro do prazo máximo de 72 horas. (MINISTÉRIO DA
SAÚDE, 2018; PREP BRASIL, 2020)
O uso de preservativos em todas as relações sexuais (orais, anais e vaginais) é o
método mais eficaz para evitar a transmissão das ISTs além de ser um importante

263
método contraceptivo. O indivíduo que realiza sexo desprotegido pode contrair uma IST,
sem predileção por idade, classe social, orientação sexual ou religião. Um indivíduo
aparentemente saudável pode estar infectado por uma IST (DIVE, 2020)
No município de São Gonçalo o atendimento realizado a pessoas portadoras de
alguma ISTs é realizado em três locais diferentes: pelo Centro de testagem e
acolhimento, na parada 40, atuando na testagem laboratorial para HIV e sífilis, além do
teste rápido para HIV, com ferramenta de triagem; na Clínica Municipal Gonçalense, no
barro vermelho fornecendo a PrEP; e o Centro de Referência, Polo Sanitário Hélio Cruz
com equipe de infectologistas e enfermagem para atendimento da população (O SÃO
GONÇALO, 2020).

2. MÉTODOS

A pesquisa é descritiva de natureza qualitativa, utilizando questionário on-line


(SURVIO) com questões fechadas e semiabertas sobre o perfil do candidato (Idade, Sexo,
Local de moradia e Escolaridade) e perfil de conhecimento sobre ISTs (Educação sexual,
Meios de transmissão, Métodos contraceptivos e Métodos profiláticos) dos alunos de
uma instituição de ensino privado do município de São Gonçalo/RJ (OKOMOTO ET AL,
2016; LINHARES ET AL, 2018). Todos os participantes assinaram um termo de
consentimento livre e esclarecido para serem incluídos no trabalho. O projeto foi
apresentado ao Comitê de ética em pesquisa (CEP), aprovado com o número CAAE:
32503520.6.0000.5237.
Os dados recolhidos do trabalho estão dispostos em uma planilha do software
Excel onde as variáveis foram analisadas pela técnica de Conteúdo de Bardin (SANTOS
2012; BARDIN, 2016). A instituição de ensino particular onde foi analisada a pesquisa
está situada no município de São Gonçalo, mas recebe alunos de regiões vizinhas como,
por exemplo, Niterói e Itaboraí, portanto foram elegíveis os participantes da pesquisa
devidamente matriculados na instituição. Como critério de exclusão adotou-se
participantes que já concluíram o curso, que estavam realizando somente a disciplina
de estágio ou menores de idade. Devido à situação de pandemia de Sars-CoV-2 que
acontece no momento, a equipe concluiu que o andamento dos questionários poderia

264
ser realizada on-line através da plataforma Survio. O presente trabalho é o produto de
um Trabalho de conclusão de curso.
O benefício oferecido por este estudo está na resposta à comunidade sobre a
qualidade da informação dos participantes para o mercado de trabalho.
Esperávamos que neste trabalho fosse possível avaliar a qualidade do
conhecimento dos alunos de uma instituição privada e divulgar estes resultados através
de um trabalho científico para a comunidade.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram coletados quarenta e seis questionários onde, 87% são do sexo feminino,
com média de idade de 28 anos, 49% moram com parceiros e são residentes do
município de São Gonçalo (87%) e Niterói (13%).
Possuem o ensino médio completo e, 50% dos participantes afirmaram ter aula
e palestra de educação sexual na escola (ensino fundamental ou médio). 58,7 % nunca
realizaram algum teste diagnóstico para detecção de IST, mas somente 45,7% utilizam
o preservativo em todas as relações sexuais. Aproximadamente 8% dos participantes
afirmam não ter medo de se infectar e, 13% acreditam que todas as IST’s apresentam
sintomas clínicos.
Podemos observar que o perfil dos candidatos é de jovens que afirmam ter algum
tipo de conhecimento sobre ISTs. Contudo, os resultados confrontam uma realidade
diferente, podendo ser explicada pela presença de um parceiro fixo. A confiança em não
adquirir doença também pode ser explicada por este fato que descartaria o uso do
preservativo. No entanto muitos candidatos nunca realizaram nenhum teste diagnóstico
o que pode ser preocupante para a saúde do indivíduo e de terceiros.
Apesar da metade dos participantes afirmarem ter tido aula ou palestras de
educação sexual, os mesmos não se protegem através do sexo seguro. Como propósito
original deste trabalho era compreender o conhecimento dos alunos em torno das ISTs,
foi possível constatar que os participantes necessitam de uma reciclagem sobre o
assunto em sala de aula e em projetos pedagógicos aplicados à carreira dos mesmos.

265
Como alunos da área da saúde, devem se conscientizar sobre o assunto a fim de
preservar os mesmos na rotina de trabalho com amostras e pacientes, além do papel
como possível disseminador de informação para a população.

AGRADECIMENTOS

As autoras do trabalho agradecem a todos os participantes que responderam o


questionário on-line voluntariamente, possibilitando o desenvolvimento deste trabalho.

REFERÊNCIAS

ALVES, T. Atenção Básica de São Gonçalo foi destaque na efetivação de políticas públicas
em 2019. Portal São Gonçalo, disponível em:
https://www.saogoncalo.rj.gov.br/noticiaCompleta.php?cod=10250&tipoNotici
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Bardin, L. (2006). Análise de conteúdo (L. de A. Rego & A. Pinheiro, Trads.). Lisboa:
Edições 70. (Obra original publicada em 1977)

Você sabe o que é HIV e o que é AIDS?- disponível em:


https://unaids.org.br/2017/03/voce-sabe-o-que-e-hiv-e-o-que-e-aids/

Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente


Transmissíveis MINISTÉRIO DA SAÚDE disponível em:
http://www.aids.gov.br/pt-br/profissionais-de-saude/ist/diagnostico-das-ist

Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Atenção Integral às Pessoas com


Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) disponível em:
http://www.dive.sc.gov.br/index.php/d-a/item/infeccoes-sexualmente-
transmissiveis

Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) de Risco


à Infecção pelo HIV disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-
br/pub/2017/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-profilaxia-pre-
exposicao-prep-de-risco

BRASIL. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Atenção Integral às Pessoas com
Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST)/Ministério da Saúde, Secretaria de
Vigilância em Saúde, Departamento de Doenças de Condições Crônicas e
Infecções Sexualmente Transmissíveis. – Brasília: Ministério da Saúde, 2020.

CARVALHO, O; PINTO, R.G.S., SANTOS, M.S. Conhecimento sobre as infecções


sexualmente transmissíveis por estudantes adolescentes de escolas públicas.

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Revista oficial do núcleo de estudos da saúde do adolescente/UERJ. Vol. 15 nº
1 - Jan/Mar – 2018

FIOCRUZ. Atenção básica à saúde construção da linha de cuidado à pessoa idosa do


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Educação, v. 6, n. 1, mai. 2012.

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Epidemiológico de HIV e Aids Dez. 2019

UNAIDS, disponível em https://unaids.org.br/estatisticas/?gclid=Cj0KCQiAtqL-


BRC0ARIsAF4K3WGFvmEPC6rWpFC9nbxJUbEQHfxlMC5K5XnDlviuuFupXFGmiG
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PrEP BRASIL, disponível em http://prepbrasil.com.br/entendendo-a-prep/ Acessado em


03/12/2020

DIVE- DIRETORIA DE VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA, 2020. Disponível em


http://www.dive.sc.gov.br/index.php/d-a/item/infeccoes-sexualmente-
transmissiveis Acessado em 03/12/2020.

O São Gonçalo ,2020. Disponível em


https://www.osaogoncalo.com.br/servicos/79873/sao-goncalo-inaugura-novo-
centro-de-referencia-e-testagem-goncalense Acessado em 03/12/2020.

267
CAPÍTULO XX

USO RACIONAL DAS PANCS: UM RESGATE NA REGIÃO NA REGIÃO DE


AMERICANA/SP
Osmar Azol Fernandes ¹
¹ Especialista em Biologia. Universidade de São Paulo – USP

RESUMO

A educação ambiental deve ser implementada no currículo da educação básica e


desenvolvida de modo que promova a interação entre as disciplinas, contextualizando
as características da comunidade. Trabalho estabelecido com a finalidade de propiciar
uma atividade de educação ambiental com foco na questão da sustentabilidade,
possibilitando que os envolvidos desenvolvessem seu protagonismo num tema que
abrange diversas áreas de conhecimento, favorecendo uma interação que desperte a
formação de alunos críticos e conscientes com os problemas ambientais. O projeto foi
desenvolvido na Escola Estadual Professora Clarice Costa Conti em Americana, Estado
de São Paulo, destacando que possibilitou uma aprendizagem prática, um laboratório a
céu aberto. Os resultados e ações colaboraram para que a educação ambiental
possibilitasse condições em que os envolvidos entendessem o contexto em que estão
inseridos, focando na melhora do processo de ensino e aprendizagem. O Projeto Uso
Racional das PANCs: Um Resgate na Região de Americana possibilitou o envolvimento
de todos favorecendo um processo de aprendizagem mais interessante e prático, com
a parte teórica trabalhada em sala de aula e a prática contribuindo como um recurso
fundamental para a compreensão dos temas que referem ao seu desenvolvimento.

Palavras-chave: Educação ambiental. PANCs. Sustentabilidade.

1. INTRODUÇÃO

Ao deparar com atividades de Educação Ambiental, o individuo passa a ser


sensibilizado sobre a importância das ações que preservam o ambiente em que está
inserido e percebe a inter-relação entre os seres vivos.
O desenvolvimento de atividades de Educação Ambiental deverá sempre
abordar a importância de promover o entusiasmo de analisar e enxergar o meio
ambiente de maneira diferente, sentindo-se como parte integrante do mesmo.
O Projeto Uso Racional das PANCs: Um Resgate na Região de Americana,
elaborado com a finalidade de integrar várias fontes e recursos de aprendizagem,

268
visando estabelecer possibilidades para o desenvolvimento de ações pedagógicas por
associar práticas em equipe abordando diferentes formas de aprender, desenvolvida no
ano letivo de 2020 com a finalidade de recuperar um terreno ocioso com entulhos e
vegetação alta no entorno da Escola Clarice, município de Americana-SP, para evitar a
proliferação de animais peçonhentos, principalmente o escorpião amarelo, devido á alta
incidência no bairro onde a escola está inserida.
Diante dessa situação, o Projeto elaborado e proposto visou despertar o
interesse dos envolvidos no contato com o ambiente, atuando com comprometimento
e responsabilidade, em diversas etapas de desenvolvimento, tais como: limpeza do
local, construção dos canteiros, escolha das PANCs (plantas alimentícias não
convencionais) a serem cultivadas, processo de plantio, rega e manutenção, entre
outras, com a orientação e supervisão do professor.
Com o desafio lançado, buscou-se desenvolver nos envolvidos habilidades de
investigação e espírito cientifico com atividades direcionadas ao uso do solo,
envolvendo-os na implementação, com técnicas articuladas promovendo um
aprendizado significativo com o contato direto na terra, priorizando a importância do
trabalho em equipe.
A execução do Projeto originou da necessidade de despertar um novo olhar e
respeito com o meio ambiente, a elaboração, manejos, cuidados, dedicação e
comprometimento, elementos fundamentais para a eficiência que resultaram no
sucesso.
O projeto foi estabelecido para que os envolvidos tivessem conhecimento de
todas as etapas, participando de cada uma delas, contribuindo para sua execução, desde
o preparado do terreno até a colheita das PANCs.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1. Elaboração e configuração do projeto

Com o cronograma elaborado e metas planejadas, acreditando que os


envolvidos são capazes de entenderem a importância da educação ambiental e

269
acreditando em fazer uma educação de qualidade, partimos para o desenvolvimento do
projeto com a finalidade de um aprendizado significativo.
Considerando a ideia que por meio do conhecimento da educação ambiental é
possível promover alterações na comunidade no que se refere ao cultivo de PANCs, à
saúde e melhor qualidade de vida, participando coletivamente numa atividade que gere
interesse e ao mesmo tempo tendo a possibilidade de ser o agente de tais mudanças.
Considerando que os Parâmetros Curriculares Nacionais estabelecem que os
conteúdos de Meio Ambiente inter-relacione aos demais, num envolvimento de
transversalidade dentro de uma situação motivadora dentro do tema, proporcionando
uma abrangência geral do problema ambiental.
Concordando que o mundo contemporâneo proporciona novas perspectivas e
tendências e que a escola aporta o papel de nicho apropriado por desenvolver as
habilidades e competências que colaborem para a formação dos alunos como cidadãos
conscientes para enfrentarem o novo século, com suas escolhas.
Tais ações são importantes para alcançar a principal finalidade da educação, que
é o pleno desenvolvimento do indivíduo, preparando o aluno para o exercício da
cidadania, conforme estabelece a LDB.
Nessa perspectiva de mudanças e transformações, o professor possui papel
fundamental de agente colaborador, e nesse contexto a sustentabilidade surge como
parâmetro para uma interação presente e futuro.
O projeto tem por finalidade implementar o cultivo de PANCs na unidade escolar,
relacionando sua execução como alavanca de proposta de ensino para Educação
ambiental, além de promover uma reflexão sobre a melhor qualidade dos alimentos
servidos na merenda escolar e ao mesmo tempo propiciar aos envolvidos uma atividade
prática.
Após a escolha do local para implementação, o ponto de partida foi limpeza com
remoção de entulhos e corte da vegetação. Com o terreno limpo, capinado, iniciamos a
preparação do local para os primeiros plantios.

270
2.2. Planejamento

Discutimos com os envolvidos a importância de se estabelecer o planejamento,


analisando os tipos de cultivo, medidas dos canteiros, modo de regar e manutenção,
essa etapa foi debatida em sala de aula.
“A horta inserida no ambiente escolar pode ser um laboratório
vivo que possibilita o desenvolvimento de diversas atividades
pedagógicas em educação ambiental e alimentar unindo teoria
e prática de forma contextualizada, auxiliando no processo de
ensino-aprendizagem e estreitando relações através da
promoção do trabalho coletivo e cooperado entre os agentes
sociais envolvidos”. (MORGADO, 2006. p.1).
De acordo com Silvia Lucilia Fonseca de Souza Tavares – 2014, a alimentação é
essencial para o bom desenvolvimento dos alunos, dessa maneira o estímulo da
alimentação saudável propiciará um desenvolvimento.
“O plantio, os cuidados e a colheita serão realizados com os
demais alunos, podendo perceber o interesse e empolgação dos
alunos na confecção da horta, que tem como objetivo
enriquecer a merenda escolar com diferentes nutrientes. A
horta inserida no ambiente escolar torna-se um laboratório vivo
que possibilita o desenvolvimento de diversas atividades
pedagógicas em educação ambiental e alimentar, unindo teoria
e prática de forma contextualizada, auxiliando no processo de
ensino-aprendizagem e estreitando relações através da
promoção do trabalho coletivo”.
Uma das etapas do projeto constituía-se de uma pesquisa contendo algumas
questões visando obter informações relativas cultivo de horta em casa, consumo e
interesse em ter conhecimento sobre as técnicas de iniciar um cultivo.
De acordo com a cartilha Horta Solidária, Cultivo de Hortaliças, organizada pela
Embrapa – 2010, na página 05, destaca que:
“Ter uma horta em casa não é somente uma forma de
economizar. É ter facilidades para preparar as refeições com
diversos produtos, enriquecendo a mesa e variando os sabores.
É aprender a cuidar de plantas. É fazer exercícios físicos. É ter
alegria, prazer e saúde. Pensando em saúde, as hortaliças são
importantes fontes de vitaminas e sais minerais que, aliadas às
propriedades medicinais que muitas possuem, ajudam a regular
e a manter o bom funcionamento do organismo”.

271
2.3. Levantamento de dados

Visando a obtenção de informações, no prosseguimento das atividades,


efetuamos uma pesquisa envolvendo 305 pessoas da comunidade escolar, que
possibilitando mapear os dados em gráficos.

Figura 01: Fonte autoria própria - Cultivo de hortaliças em casa.

Cultivo de hortaliças em casa.

22,22%

77,78%

Sim Não

Notamos que um número elevado de pessoas não cultivam hortaliças em


casa, figura 01, principalmente se tratando de uma região carente do município. Em
relação ao consumo de hortaliças, figura 02, chamou atenção índice alto de pessoas que
não possuem o hábito de consumir hortaliças. No quesito sobre a obtenção de
informações sobre o cultivo de hortaliças, figura 03, apontou um grande interesse.

272
Figura 02: fonte autoria própria - Consumo de hortaliças

Consumo de hortaliças

12% Consumo diariamente


2%

29% Consumo uma ou duas


vezes por semana
Não tenho hábito de
consumir
57% Não opinou

Figura 03: fonte autoria própria - Obtenção de informações sobre cultivo de hortaliças

Gostaria de ter informações sobre cultivo de hortaliças

Não opinou
2%0%
Não
32%

Sim
66%

Sim Não Não opinou

Figura 03: fonte autoria própria - Obtenção de informações sobre cultivo de hortaliças

No questionamento sobre o porque não cultiva hortaliças em casa? (figura 04),


a maioria apontou falta de conhecimento, sabemos que muitas hortaliças exigem
poucas técnicas e são cultivadas em pequenos espaços ou até mesmo em vasos.

273
Figura 04: fonte autoria própria - Porque não cultiva hortaliças em casa?

Porque não cultiva hortaliças em casa?

Outros
18%
Falta de
interesse
Falta de espaço
1%
31%

Falta de
conhecimento
50%

Figura 05: fonte autoria própria - Você conhece o que são PANCs!

Você conhece o que são PANCs!

17%

Sim
Não
83%

Referente ao conhecimento sobre o que são as PANCs? Figura 05, indicou um


alto desconhecimento, após essa analise e verificando a necessidade da discussão sobre
a importância de debatemos sobre o tema, com respeito ao meio ambiente, momento
que o aluno perceberá seu papel como cidadão responsável pela manutenção do meio
em que está inserido.

274
Esse campo de informações com certeza possibilitará ao aluno a escolha correta,
no que refere a respeito dos alimentos a serem escolhidos para consumo e desse modo,
colaborar para a adoção de uma alimentação saudável.
Segundo Campos, 2017, a escola tem o papel da discussão sobre o cuidado com
o meio ambiente.
“A escola deve abordar os princípios da educação ambiental de
forma sistemática e transversal em todos os níveis de ensino.
Abordando o tema horta na escola dará oportunidade não só de
oferecer alimentos que satisfaçam as necessidades nutricionais
dos educandos no período em que estão na escola, mas também
de contribuir para a melhoria do processo de ensino
aprendizagem e a formação de hábitos e práticas alimentares”.
Após o preparo da área, prosseguimos nas discussões dos materiais, ferramentas
e utensílios necessários para realização, além de técnicas de regas e adubação.
Num levantamento nas proximidades da Escola encontramos algumas espécies
de plantas alimentícias não convencionais, cultivadas como ornamentais, cerca viva,
outras tidas como mato, nascidas em calçadas ou terrenos baldios, entres elas, ora-pro-
nóbis, peixinho da horta (figura 06), almeirão roxo, serralha, caruru, beldroega, taioba,
vinagreira, bertalha, trapoeraba, azedinha e capuchina.

275
Figura 06: Fonte autoria própria – peixinho da horta

2.4. CONCRETIZAÇÃO DO PROJETO

Debatemos sobre diversos vídeos sobre cultivo de PANCs disponibilizados no site


da Embrapa com a finalidade obtermos informações sobre os cuidados e técnicas de
manuseio para aplicarem na prática os conhecimentos adquiridos.
Reconhecida área de efetivação, iniciou a elaboração do primeiro canteiro para
cultivo, cavando o local para afofar solo.
Promovendo a participação e a interação entre os alunos na dinâmica do
trabalho de construção da horta, considerando a fundamentação da educação
ambiental, a Embrapa destaca que:
“Um dos principais objetivos da Educação Ambiental consiste em
contribuir para a compreensão da complexidade do ambiente em suas
dimensões ecológicas, econômicas, sociais, culturais, políticas, éticas e
tecnológicas, de maneira a sensibilizar a coletividade quanto à
importância de sua organização e participação na defesa de todas as
formas de vida. Pretende-se, assim, incentivar a mobilização dos
cidadãos a partir do reconhecimento das causas e das consequências

276
dos impactos socioambientais que afligem o planeta, buscando
satisfazer as necessidades fundamentais da humanidade ao mesmo
tempo em que são respeitados os direitos das gerações futuras terem
acesso a um ambiente saudável” (EMBRAPA, 2011).

Antes de qualquer procedimento prático, foi discutido as normas e técnicas para


serem aplicadas com segurança em todas as etapas das atividades, para seu
desenvolvimento.
Debatemos que o cultivo de uma PANC é uma maneira natural de produzir
alimento, aplicando métodos adequados, utilizando adubos orgânicos, sem aplicação de
agrotóxicos ou qualquer outro produto que possa provocar danos à saúde de quem irá
consumi-la e ao meio ambiente, criando um cultivo sem defensivos químicos possibilita
interagir com a natureza, contribuindo na preservação dos recursos naturais,
protegendo a biodiversidade e mantendo o equilíbrio da diversidade biológica.
O desenvolvimento da horta escolar possibilita ao educando um
melhor e mais proveitoso aprendizado, onde á a necessidade do
toque na terra, contato com as plantas, diferenciação de formas,
texturas, cheiro e da cor. Estimulando a inteligência, os sentidos
e a interação com o meio ambiente, desenvolvendo também a
consciência ambiental (OLIVEIRA, 2005).
Considerando que o ensino com atividade prática, demanda mudanças e
acreditando que essas mudanças só terão real significado se entre os envolvidos a
interação e o diálogo forem estreitados.
É certo que o saber cientifico e suas ações alteram nossa realidade,
principalmente com atividades práticas, promovem uma nova maneira de analisar sobre
tudo o que está ao nosso entorno.
O estudo com a PANCs possibilitou compreender fenômenos naturais, a
diversidade, os processos de manutenção com ferramentas especificas e por outro lado
como o ser humano pode transformar o mundo, começando por ele mesmo e por sua
comunidade, explorando recursos e solucionando problemas.
As ações são fundamentais para atingir os principais objetivos do projeto, que é
a interação do aluno, preparando para o desenvolvimento do seu protagonismo e para
o exercício da cidadania. Nesse sentido cabe á escola promover e planejar atividades
que privilegie a interação dos conhecimentos para uma aprendizagem significativa.

277
O projeto foi uma possibilidade e um processo para o desenvolvimento de metas
pedagógicas, por conceder o comprometimento dos participantes, permitindo novas
maneiras de ensinar e aprender.
A horta inserida no ambiente escolar pode ser um laboratório
vivo que possibilita o desenvolvimento de diversas atividades
pedagógicas em educação ambiental e alimentar unindo teoria
e prática de forma contextualizada, auxiliando no processo de
ensino-aprendizagem e estreitando relações através da
promoção do trabalho coletivo e cooperado entre os agentes
sociais envolvidos. (MORGADO, 2006. p.1).
Satisfação de dever cumprido, sensação observada nos alunos, quando
perceberam que as hortaliças estavam prontas para o consumo, resultado obtido com
a formação de valores, com ensino e aprendizagem de habilidades e metodologia
aplicada utilizando saberes adquiridos durante o desenvolvimento das atividades e que
puderam ser socializados.
Buscou com o cultivo a complementação da alimentação com a inserção de
plantas sem adição de agrotóxicos, produzidas apenas com insumos orgânicos e
acompanhadas do plantio a colheita, pelos alunos.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente projeto possibilitou aos alunos a partir do processo de construção da


horta, manutenção, cuidados, organização do espaço, preparo do solo, adubação,
plantio e interesse com o desenvolvimento das hortaliças, entendessem de modo
dinâmico os conteúdos e a metodologia envolvida despertou o interesse pela educação
ambiental, gerando aprendizagem significativa.
O projeto foi elaborado com a finalidade de integrar várias fontes e recursos de
aprendizagem, visando estabelecer possibilidades para o desenvolvimento de ações
pedagógicas por associar práticas em equipe abordou diferentes formas de aprender.
Recuperou um terreno ocioso com entulhos e mato alto no entorno da escola,
evitando a proliferação de animais peçonhentos, principalmente o escorpião amarelo,
devido á alta incidência no bairro onde a escola está inserida.
Diante do problema construiu a horta e as plantas produzidas foram utilizadas
para enriquecer a alimentação. Na implantação, o local passou por uma limpeza com a
remoção de entulhos, corte do mato alto, construção dos canteiros e plantio.

278
O desafio foi atingido, pois os alunos puderam gradativamente desenvolver
habilidades de desenvolver e ter um olhar crítico, elaborando opiniões esclarecedoras,
propondo soluções para determinadas questões levantadas, com fundamento nos
conteúdos abordados durante o decorrer das atividades, destacando a importância do
trabalho em equipe.

REFERÊNCIAS

Manual para Escolas A Escola promovendo hábitos alimentares saudáveis. Artigo


disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/horta.pdf. Acesso
em: 12 fev. 2020.

Entrevista especial sobre Projeto Horta nas Escolas. Artigo disponível em: <
www.coocafe.com.br/noticia/entrevista-especial-sobre-projeto-horta-nas-
escolas/415.html. Acesso em: 03 mar. 2020.

Projeto Horta Solidária – Cultivo de Hortaliças. Artigo disponível em:


<https://www.cnpma.embrapa.br/down_site/horta/cartilha_horta_final2010.p
df. Acesso em: 10 mar. 2020.

Documentário Plantar Saber- Horta Didática na Escola. Disponível em:


<https://www.youtube.com/watch?v=tw5_zpXiuL4. Acesso em: 10 mar. 2020.

Educando com a Horta Escolar. Disponível em:


<https://www.youtube.com/watch?v=bmzNPFUiyn4. Acesso em: 15 mar. 2020.

- https://www.youtube.com/watch?v=VGaYEPrMWFs. Acesso em: 20 mar. 2020.

Projeto Educando com a Horta Escolar I Terra Sul. Disponível em:


<https://projetohortaescolardasmegoiania.blogspot.com/2017/05/a-
importancia-da-horta-na-escola.html. Acesso em: 22 mar. 2020.

MORGADO, F.S. A horta Escolar na Educação Ambiental e Alimentar: experiencia do


Projeto Horta Viva nas Escolas Municipais de Florianópolis. Florianópolis (SC).
2006 (Monografia).

279
CAPÍTULO XXI

PREVALÊNCIA DOS TRANSTORNOS MENTAIS COMUNS ENTRE OS ESTUDANTES


DO CURSO TÉCNICO EM ADMINISTRAÇÃO
Danilo Lucena Chagas ¹
Carla Caroliny de Almeida Santana ²
Aurenice Pontes Loio Vaz ³
Reginete Cavalcanti Pereira 4
¹ Graduando do curso de Letras. Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE
² Professora do Colégio Dom Agostinho Ikas da UFRPE. Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE
³ Professora do Colégio Dom Agostinho Ikas da UFRPE. Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE
4 Professora Titular do Colégio Dom Agostinho Ikas da UFRPE. Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE

RESUMO

INTRODUÇÃO: Transtornos Mentais Comuns (TMC) caracterizam-se pela presença de


sintomas de irritabilidade, fadiga, insônia, dificuldade de concentração, esquecimento,
ansiedade e queixas somáticas, porém não implica em um diagnóstico psiquiátrico
formal. OBJETIVO: Investigar a prevalência dos TMC nos estudantes do Curso Técnico
de Administração em uma Instituição Pública. MÉTODO: Pesquisa de abordagem
quantitativa. Dos 322 alunos matriculados em 2019 no curso, apenas 96 alunos, maiores
de 18 anos, participaram do estudo. Para isso utilizou-se um questionário
sociodemográfico e o Self Report Questionnaire (SRQ – 20). RESULTADOS: 37,5% dos
alunos apresentaram sintomas dos TMC, predominando mulheres (72,9%), 54% se
autodeclararam pardos, a idade variou entre 18 e 55 anos, 66,6% evangélicos, 78%
solteiros, 65,6% tem pais não separados. Apenas 32,2% compreenderam o estudo como
uma forma de crescimento pessoal. Foi encontrada associação significativa nas variáveis
status marital dos pais dos alunos e a etnia dos participantes. Quando se autodeclaram
de cor preta, a prevalência de TMC foi menor e ter pais não separados diminui a
probabilidade do estudante apresentar sintomas dos TMC. CONCLUSÃO: Os resultados
encontrados demonstram uma elevada prevalência de TMC na população estudada.
Espera-se que os resultados desta pesquisa venham subsidiar ações para prevenção e
cuidado com a saúde mental dos estudantes.

Palavras-chave: Epidemiologia. Estudantes. Saúde mental.

1. INTRODUÇÃO

Transtornos Mentais Comuns (TMC) termo criado por Goldberg e Huxley em


1992 para caracterizar um conjunto de sintomas não psicóticos como: insônia,

280
irritabilidade, ansiedade, fadiga, dificuldade de concentração, esquecimento, e queixas
somáticas levando a situações de sofrimento emocional.
Os Transtornos Mentais Comuns (TMC) não preenchem os critérios para um
diagnóstico psiquiátrico formal de acordo com os dois manuais de diagnósticos: Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - 5a edição (DSM- 5) organizado pela
Associação Americana de Psiquiatria em 2014, e a 10a revisão da Classificação
Internacional de Doenças (CID-10) da Organização Mundial de Saúde, no entanto, ter os
sintomas dos Transtornos Mentais Comuns pode levar a sofrimentos e a prejuízos.
Não sendo na maioria das vezes notificados, os transtornos mentais comuns
trazem um grande impacto na qualidade de vida das pessoas. A identificação precoce e
um diagnóstico correto dos transtornos mentais comuns têm grande relevância para
evitar prejuízos físicos e psicológicos à pessoa acometida (PARREIRA et al., 2017).
Para Skapinakis et al., (2013) as expectativas é que em 2030 a depressão esteja
entre as perturbações mentais mais incapacitantes. Diante das projeções de aumento
do transtorno mental na população geral percebe-se que é necessário estudar mais
sobre a incidência e prevalência dos TMC em diversas populações. Uma investigação
realizada com 3.597 pessoas em uma população urbana de um município localizado no
nordeste do Brasil revelou uma prevalência para o TMC de 29,9%. (ROCHA et al., 2010).
Considerando o impacto que os TMC possam ocasionar na população de
estudantes e em especial nos alunos dos cursos técnicos que têm expectativas de entrar
no mercado de trabalho e ter autonomia financeira assim que terminar o curso, essas
variáveis podem levar esses discentes a desenvolver sintomas de TMC.
Este estudo tem como objetivo investigar a prevalência dos sintomas dos
transtornos mentais comuns nos estudantes do curso técnico de administração em uma
instituição pública, neste sentido a realização do presente estudo se justifica pela
importância da identificação dos sintomas dos transtornos mentais comuns entre
estudantes, porque mesmo não sendo tão grave como os transtornos psicóticos, a alta
prevalência dos sintomas dos transtornos mentais comuns podem trazer graves efeitos
na população estudantil.

281
2. MÉTODO

Trata-se de uma pesquisa de corte transversal de natureza descritiva e de


abordagem quantitativa. Em uma população de 322 discentes matriculados no Curso
Técnico em Administração do Colégio Agrícola da Universidade Federal Rural de
Pernambuco, aceitaram participar do estudo 96 alunos maiores de 18 anos e que
assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Foi utilizado um
questionário com dados sociodemográficos e o Self Report Questionnaire (SRQ – 20)
validado para o contexto brasileiro com apenas 20 questões para rastreamento de
Transtornos Mentais não-psicóticos (MARI e WILLIAMS, 1986), com questões de
respostas "sim"/"não". No presente estudo foi considerado como escore SRQ-20
positivo para TMC, a soma de sete ou mais respostas afirmativas. A coleta dos dados foi
realizada, durante as atividades acadêmicas, antes ou logo após as aulas. Estudo
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da UFPE e
registrado sob CAAE Nº 09206019.1.0000.5208. Os dados foram analisados usando o
pacote estatístico IBM SPSS versão 24.0.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A amostra foi representada por 96 alunos do curso técnico de administração,


como pode ser observado na Tabela 1, a grande maioria dos participantes foram
mulheres (72,9%), 54,2% se autodeclararam pardos, a idade variou entre 18 e 55 anos
(M = 23,64; DP = 6,81), 50,5% evangélicos, 78,1% solteiros, 64,6% com pais que viviam
juntos e 8,3% faziam uso de bebidas alcoólicas.
No que se refere à idade dos alunos que frequentam o curso técnico observa-se
na Tabela 1 que o maior percentual ficou na faixa dos 21 a 30 anos de idade (42,7%),
considerados adultos jovens, esse aspecto pode representar uma população que ainda
não entrou no mercado de trabalho e o curso técnico terá relevância para a construção
da sua vida profissional e financeira. Por outro lado, este cenário mostrou-se diferente
da pesquisa de Musse e Machado (2013): a maioria dos alunos que cursavam educação
profissional no Brasil estavam na faixa etária de 19 a 24 anos (31,13%).

No tocante a etnia conforme a tabela abaixo em maior percentual se


autodeclararam pardos (54,2%) e pretos (27,1%), também em desacordo com o estudo

282
de Musse e Machado, 2013 que apresentou um número maior de brancos e amarelos
que frequentam educação profissional. Proporcionalmente, 4,46% dos brancos e
amarelos, contra 3,64% dos pretos e pardos.

A Tabela 1 apresenta as características sociodemográficas da amostra.


Tabela 1 – Características sociodemográficas dos participantes (N = 96)
Variável N %
Sexo
Masculino 26 27,1
Feminino 70 72,9
Idade (anos)
< 20 40 41,7
21-30 41 42,7
31-40 13 13,5
41-50 1 1,0
51-60 1 1,0
Qual religião?
Não possui religião 21 22,1
Católica 19 20,0
Evangélica 48 50,5
Espírita 2 2,1
Outra 5 5,3
Etnia
Branco 14 14,6
Preto 26 27,1
Pardo 52 54,2
Amarelo 3 3,1
Indígena 1 1,0
Estado civil
Solteiro(a) 75 78,1
Casado(a) 16 16,7
União estável (juntos) 2 2,1
Divorciado(a) 2 2,1
Viúvo(a) 1 1,0
Separação dos pais
Sim 34 35,4
Não 62 64,6
Uso de álcool e outras drogas*
Sim 8 8,3
Não 88 91,7
Significado de estudar
Adquirir conhecimento 64 66,7
Uma forma de crescimento pessoal 31 32,3
Uma obrigação 1 1,0
Total 96 100
Nota. * = nesta variável houve dados ausentes (i.e., missings = pessoas que não
responderam). N = número amostral; % = porcentagem. Fonte: autores (2020).

283
A Tabela 2 mostra as respostas dos participantes com relação às dimensões
avaliadas pelo SRQ-20. Observa-se os sintomas mais prevalentes apresentados pelos
estudantes com relação aos Transtornos Mentais Comuns foram: nervosismo, estado de
tensão ou preocupação (61,5%), dificuldade na tomada de decisões (47,9%), e tristeza
(42,7%).

Chama atenção o percentual de 61,5% dos alunos apresentarem preocupação,


pressupõe que a opção por uma qualificação profissional técnica possibilite à inserção
no mercado de trabalho, que em 2019 o IBGE revelou um contingente de 12,6 milhões
de pessoas desocupadas, de certo que esse percentual de sintomas de preocupação
pode está relacionado a diversas variáveis, entretanto o desemprego juvenil é uma
característica de preocupação em muitos países.

Tabela 2 – Respostas dos participantes em relação às dimensões do SRQ-20


Respostas
Dimensões (SRQ-20)
Sim Não
Humor depressivo-ansioso % %
Sente-se nervoso(a), tenso(a) ou preocupado(a)? 61,5 38,5
Assusta-se com facilidade? 35,4 64,4
Tem se sentido triste ultimamente? 42,7 57,3
Tem chorado mais do que de costume? 16,7 83,3
Sintomas somáticos
Você tem dores de cabeça frequente? 35,4 64,6
Dorme mal? 30,2 69,8
Tem sensações desagradáveis no estômago? 36,5 63,5
Tem má digestão? 15,6 84,4
Tem falta de apetite? 22,9 77,1
Tem tremores nas mãos? 21,9 78,1
Decréscimo de energia vital
Você se cansa com facilidade? 33,3 66,7
Tem dificuldades para tomar decisões? 47,9 52,1
Encontra dificuldades para realizar com satisfação suas atividades diárias? 34,4 65,4
Tem dificuldades no serviço (seu trabalho é penoso, causa-lhe sofrimento)? 6,3 93,8
Sente-se cansado(a) o tempo todo? 34,4 65,4
Tem dificuldade de pensar claramente? 37,5 62,5
Pensamentos depressivos
É incapaz de desempenhar um papel útil em sua vida? 5,2 94,8
Tem perdido o interesse pelas coisas? 28,1 71,9
Tem tido ideia de acabar com a vida? 8,3 91,7
Sente-se inútil em sua vida? 9,4 90,6
Nota. % = porcentagem válida.

284
De acordo com o Gráfico 1 dentre o universo amostral de 96 participantes do
curso técnico de administração, 37,5% dos sujeitos apresentaram Prevalência de
Transtornos Mentais Comuns (TMC). Por outro lado, uma investigação publicada no
início de 2020 com estudantes universitários 39,9% apresentaram TMC (GOMES, 2020).
Mesmo se tratando de população diferente o percentual encontrado de TMC nesses
estudantes mostram similitude. Em uma avaliação realizada por Silva e Costa em 2012
com estudantes universitários da área de saúde 41% dos discentes no início do curso e
28% ao final do curso apresentaram sintomas do TMC. Esses percentuais de sintomas
de TMC entre estudantes, sendo do curso técnico ou curso superior apontam para uma
preocupação importante nesta população.
O Gráfico 1 apresenta a prevalência de TMC entre os sujeitos.

Gráfico 1 – Prevalência de Transtornos Mentais Comuns entre os participantes.

Fonte: autores (2020).


Na tabela 3 apresenta a prevalência de TMC com base nas características da
amostra, Foi encontrada associação significativa nas variáveis status marital dos pais dos
alunos e a etnia dos participantes. Quando se autodeclaram de cor preta, a prevalência
de TMC foi menor e ter pais não separados diminui a probabilidade do estudante
apresentar sintomas dos TMC.

285
Tabela 3 – Prevalência de Transtornos Mentais Comuns (TMC) em estudantes do curso
de Administração de acordo com a caracterização sociodemográfica
Prevalência de TMC
Variável
N % p
Sexo 0,72
Masculino 9 34,6
Feminino 27 38,6
Idade (anos) 0,32
< 20 40 41,7
21-30 41 42,7
31-40 13 13,5
41-50 1 1,0
51-60 1 1,0
Qual religião? 0,81
Não possui religião 7 33,3
Católica 7 36,8
Evangélica 20 41,7
Espírita 0 0,0
Outra 1 20,0
Etnia 0,02*
Branco 6 42,9
Preto 4 15,4
Pardo 24 46,2
Amarelo 2 66,7
Indígena 0 0,0
Estado civil 0,11
Solteiro(a) 28 37,3
Casado(a) 4 25,0
União estável (juntos) 2 100,0
Divorciado(a) 1 50,0
Viúvo(a) 1 100,0
Separação dos pais 0,02*
Sim 18 52,9
Não 18 29,0
Uso de álcool e outras drogas 0,70
Sim 2 25
Não 34 38,6
Significado de estudar 0,78
Adquirir conhecimento 23 35,9
Uma forma de crescimento pessoal 13 41,9
Uma obrigação 0 0,0

Total 96 100
Nota. f = frequência relativa à prevalência do TMC em cada variável; % = porcentagem
relativa; p = p-valor associação entre as variáveis e a prevalência de TMC na amostra.
*p<0,05.

286
Como apresentado na Tabela 3, o cálculo do teste exato de Fisher demonstrou
haver associação significativa entre a etnia dos participantes e a prevalência de TMC na
amostra [χ2 (4) = 9,32; p < 0,05]. Ao se observar os contrastes, verifica-se que a principal
diferença ocorreu entre os participantes autodeclarados pretos, de modo que a
probabilidade de prevalência de TMC foi menor entre esse grupo de sujeitos na amostra,
como demonstra o Gráfico 2. Dito de outra forma, os estudantes autodeclarados como
pretos exibiram uma probabilidade menor de apresentar TMC do que os participantes
brancos, pardos, amarelos e indígenas. Em discordância com o estudo de GOMES et al.
(2020) que revelou que a cor da pele dos estudantes que se declaram preta (42,9%),
branca (41,2%) e parda (36,2%) compõem os maiores índices de casos suspeitos de TMC.

Um dos fatores que podem justificar a emergência desse resultado é a atual


corrente de empoderamento étnico-racial da população negra, cuja importância tem
sido muito debatida e difundida entre a juventude. Diante de uma sociedade
extremamente desigual, cujas disparidades sociais e econômicas são demarcadas por
questões de raça e etnia, como ocorre no Brasil, é provável que a autoidentificação dos
estudantes como sendo parte de uma minoria social esteja funcionando como um fator
de manutenção de sua identidade. Mais especificamente, levanta-se a hipótese de o
fato de se reconhecerem como negros, em um contexto socialmente racista, esteja
levando os estudantes a avaliarem positivamente a sua autoimagem e,
consequentemente, esse processo psicológico venha acarretando uma estratégia de
proteção à organização psíquica.

287
Gráfico 2 – Associação entre etnia e prevalência de transtornos mentais comuns.
Fonte: autores (2020).

O teste de qui-quadrado também demonstrou a associação estatística entre a


variável separação dos pais e a prevalência de TMC [χ2 (1) = 5,35; p < 0,05]. Esse
resultado demonstra que a probabilidade de um estudante não apresentar TMC é maior
quando os seus pais não são separados (Gráfico 3). Ou seja, os participantes que
declararam conviver com os pais na mesma casa apresentaram uma prevalência de TMC
estatisticamente menor que aqueles cujos pais são separados.
Estudos têm demonstrado que o convívio com os pais pode ser um fator
protetivo para a saúde mental de crianças e adolescentes. Nesse sentido, os resultados
encontrados nesse estudo corroboram com a literatura ao demonstrar que estudantes
cujos pais estão juntos apresentaram menor probabilidade de apresentar TMC do que
aqueles cujos pais são separados.

288
Gráfico 3 – Associação entre a separação dos pais e a prevalência de transtornos
mentais comuns. Fonte: autores (2020).

Após a análise de associação entre variáveis, foi verificada as diferenças


individuais dos participantes com relação ao nível de sintomatologias relacionadas à
prevalência de TMC (escore total). Para isso, foram realizados cálculos de diferenças
entre médias por meio dos testes t de Student para amostras independentes e da análise
de variância (ANOVA). Os resultados demonstraram que não houve diferenças
significativas em relação à pontuação total no SRQ-20 quanto ao sexo [t (94) = -0,52; p
= 0,60], à faixa etária [F (4,91) = 0,53; p = 0,71], à religião [F (4,90) = 0,59; p = 0,67], à
etnia [F (4,91) = 1,97; p = 0,10], ao estado civil [F (4,91) = 2,02; p = 0,09], à separação
dos pais [t (94) = 1,61; p = 0,10], ao uso de álcool e outras drogas [t (94) = 0,18; p = 0,85]
e ao significado de estudar dos estudantes [F (2,93) = 0,01; p = 0,98]. Além disso, através
do cálculo de correlação r de Pearson, verificou-se que não houve relação entre a idade
e a pontuação dos participantes no instrumento (r = -0,01; p = 0,91).
É provável que esses resultados estejam refletindo uma limitação amostral. Dado
que o número reduzido de participantes, as diferenças entre médias não foram grandes
os suficientes para serem consideradas estatisticamente significativas. Nesse sentido,

289
recomenda-se que em estudos posteriores sejam priorizadas amostras mais robustas, e
de preferência com cálculo amostral realizado a priori.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados desta investigação permitem traçar o perfil dos estudantes do


curso técnicos de administração do Colégio Agrícola Dom Agostinho Ikas da
Universidade Federal Rural de Pernambuco - CODAI/UFRPE em relação aos Transtornos
Mentais Comuns (TMC). Os resultados revelaram um percentual elevado de TMC, entre
os 20 sintomas apresentados no questionário da pesquisa, receberam destaque:
nervosismo, estado de tensão, preocupação; dificuldade na tomada de decisões e
tristeza. Foi encontrada associação significativa nas variáveis status marital dos pais dos
alunos e a etnia dos participantes. Quando se autodeclaram de cor preta, a prevalência
de TMC foi menor e ter pais não separados diminui a probabilidade do estudante
apresentar sintomas dos TMC. As informações desta pesquisa vêm suprir uma lacuna
quanto à investigação relacionada à saúde emocional dos discentes do ensino técnico
profissionalizante e aponta para a necessidade de subsidiar ações de prevenção à saúde
mental nesta população.

REFERÊNCIAS

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https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-
catalogo?view=detalhes&id=2101743. Acesso em 22 de novembro de 2020.

GOMES, Carlos Fabiano Munir et al. Transtornos mentais comuns em estudantes


universitários: abordagem epidemiológica sobre vulnerabilidades. SMAD, Rev.
Eletrônica Saúde Mental Álcool Drogas. (Ed. port.), Ribeirão Preto, v. 16, n. 1, p.
1-8, mar. 2020.

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Porto Alegre: Artmed, 2014.

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290
MUSSE, Isabel; MACHADO, Ana Flavia. Perfil dos indivíduos que cursam educação
profissional no Brasil. Econ. soc. Campinas, v. 22, n. 1, pág. 237-262, 2013.

PARREIRA, Bibiane Dias Miranda et al. Transtorno mental comum e fatores associados:
estudo com mulheres de uma área rural. Rev. esc. enferm. USP, São Paulo, v. 51,
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ROCHA, Saulo Vasconcelos et al. Prevalência de transtornos mentais comuns entre


residentes em áreas urbanas de Feira de Santana, Bahia. Rev. bras. epidemiol.,
São Paulo, v. 13, n. 4, p. 630-640, dez. 2010.

SILVA, Rodrigo Sinnotti; COSTA, Letícia Almeida. Prevalência de Transtornos Mentais


Comuns entre estudantes universitários da área de saúde. Encontro Revista de
Psicologia. Volume 15, Nº 23, ano, 2012.

SKAPINAKIS, Petros et al. Prevalence and sociodemographic associations of common


mental disorders in a nationally representative sample of the general population
of Greece. BMC Psychiatry, 4(13), 163, 2013.

291
CAPÍTULO XXII

COMPREENSÃO EXISTENCIAL-FENOMENOLÓGICA DO SUICÍDIO DURANTE A


PANDEMIA
Bruna Rafaela da Silva Miguel ¹
Evellyn Cássia Barbosa de Santana ²
Jakelyne Ribeiro de Souza Raposo ³
Zirlana Menezes Teixeira ⁴
¹ Graduanda em Enfermagem. Centro Universitário Mauricio de Nassau - UNINASSAU
² Graduanda em Psicologia. Faculdade de Ciências Humanas de Olinda - FACHO
³ Graduanda em Psicologia. Faculdade de Ciências Humanas de Olinda - FACHO
⁴ Docente orientadora. Faculdade de Ciências Humanas de Olinda - FACHO

RESUMO

Em março de 2020, a sociedade brasileira foi pega de sobressalto com o isolamento


social estabelecido pela pandemia do Covid-19. Diante disso, o homem como um Dasein,
isto é, Ser-no-mundo, Ser-aí lançado às possibilidades, mas, também, Ser-para-morte,
finito e temporário se encontrou diante de algumas situações que requerem reflexão. A
partir disso, questões existenciais como a solidão, investimento interior e sentido de
vida, antes delegadas tiveram espaço para eclodirem. Nesse sentido, este trabalho tem
como objetivo investigar como o contexto atual no Brasil de Pandemia do Covid-19
influencia no número de suicídios. Com isso, ficou evidente que o fato de o mundo estar
diante de um vírus desconhecido é um agravamento para desdobramentos existenciais,
ao considerar que as incertezas e o medo aumentam diariamente. Consequentemente,
as pessoas podem acabar por encontrar na morte voluntária a solução para todos os
seus problemas. Ressalta-se que alguns fatores no contexto brasileiro para o suicídio
são: o uso abusivo de álcool e outras drogas, sofrimento psíquico e vulnerabilidade
financeira, pois houve um aumento no número de desempregados e aumento da
violência doméstica. Assim, ao considerar as desigualdades antes já vistas no Brasil e
que ficaram mais evidentes na pandemia, percebe-se que o medo da contaminação e
morte dos entes queridos tendem a gerar angústia, dificultando que as pessoas
encontrem e cumpra um sentido de vida ou superem este “absurdo” existencial.

Palavras-chave: Pandemia. Covid-19. Fenomenologia-existencial. Sentido. Absurdo.

1. INTRODUÇÃO

A pandemia causada pelo Covid-19 pegou o mundo de surpresa e mudou o modo


de todos viverem e se relacionarem consigo e com os outros. Salienta-se que o suicídio
é um problema de saúde pública no Brasil e que segundo dados da Organização Mundial

292
de Saúde (OMS) 800 mil pessoas se suicidam, além disso, nesse dado não está incluso o
número de tentativas mal sucedidas e dos casos que não são computados.
O homem para Heidegger (1977) é um Dasein, isto é, Ser-no-mundo, Ser-aí
lançado às possibilidades. Este homem também é um Ser-para-morte, isto é, finito e
temporário, entretanto, contudo muitos têm medo desse momento por gerar angústia
e tendem a tentar fugir.
Em março, a sociedade brasileira foi pega de sobressalto com o Covid-19 tendo
como origem Wuhan- China. Por conseguinte, um grande número de pessoas passou a
morrer com esse vírus. A OMS decretou estado de pandemia e a principal recomendação
foi ficar em casa, isolados, distantes do contato pessoal com os outros.
A partir disso, questões existenciais como a perda de sentido na vida, antes
negligenciadas tiveram espaço para eclodirem. Sobre esta questão, sociólogo Durkheim
(2000) o suicídio é um ato realizado pela própria vítima, toda morte que resulta mediata
ou imediatamente de ato positivo ou negativo. Segundo a Fundação Oswaldo Cruz
(FIOCRUZ), 51% dos casos de autoextermínio acontecem dentro de casa e, com o
isolamento social, A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) alertou para o fato de
que o número de casos e de tentativas de suicídios poderiam aumentar.
Além disso, Heidegger (1977) também considera que o Dasein é constituído em
um tempo, pois ele é um ser temporal e que se mostra como possibilidade frente ao
mundo. Desse modo, é possível observar como os tempos hodiernos influenciaram e
mudaram a vida das pessoas.
Assim, este estudo tem como objetivo investigar como o contexto atual no Brasil
de Pandemia pelo Covid-19 influencia o suicídio. Para tal, se utilizará da psicologia
fenomenológica-existencial, que, por sua vez, considera o homem em sua totalidade,
suspende os seus pré-conceitos e conhecimentos para compreendê-lo em movimento.
Além disso, tem a proposta de “voltar às coisas mesmas”, ou seja, deixar o fenômeno se
apresentar como é, e às vezes, compreender que ele permanecerá velado, de forma a
não ser possível uma compreensão completa, mas apenas aquilo que ele permite
mostrar (HEIDEGGER, 1977).

293
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1. Impactos da pandemia na saúde mental

Na compreensão do filósofo coreano Byung-chul Han (2015), a população


contemporânea é marcada como a “sociedade do desempenho” ou do cansaço, ou seja,
empresários de si mesmos. Nela impera o poder ilimitado e a permissividade, além da
alta produção, por outro lado, gera sujeitos depressivos e insatisfeitos. Diante disso, Han
(2015, p. 24) enfatiza: “Nada promete duração e subsistência. Frente a essa falta do Ser
surgem nervosismos e inquietações”, como são tempos de instabilidade, na pandemia
isso se intensificou mais ainda trazendo prejuízos a saúde mental das pessoas.
Ao se considerar que esta sociedade não se permite sofrer, pensar suas angústias
e buscar sentido para sua existência, os tempos atuais se instalaram como um desafio
diário. Além do mais, Heidegger (1977) entende que o Dasein também é ser-com-os-
outros, ou seja, se constitui a partir e com o relacionamento com as demais pessoas.
Porém, foi imprescindível para a segurança de todos que houvesse um distanciamento
social.
Nesse sentido, pesquisas já apontam para o seguinte fato:
[...] algumas formas de mal-estar são comuns, como a sensação de
impotência, tédio, solidão, irritabilidade, tristeza e medos diversos (de
adoecer, morrer, perder os meios de subsistência, transmitir o vírus),
podendo levar a alterações de apetite e sono, a conflitos familiares e a
excessos no consumo de álcool ou drogas ilícitas (LIMA, 2020, p. 10).

Em outras palavras, o estar sozinho, inquieta o homem que na maioria das vezes
não sabe como lidar com a solidão, com o estar consigo mesmo e cuidar de si, além do
medo trazido pela própria pandemia. Sem contar com o fato de que o homem é social e
necessita do contato com os outros até para elaborar suas angústias. Em virtude disso,
May (1991) defende que os homens usam uns aos outros como espelhos, com os quais
podem afirmar sua própria existência. Diante disso, o sentimento de temor em ficar
distantes dos demais revela o fato de a solidão se manifestar como uma ameaça que
pode aniquilar o próprio eu.
Naturalmente, a solidão em si é ontológica do ser, ajuda-o em seu
desenvolvimento pessoal e não seria capaz de causar tamanho impacto, contudo
levando em consideração o isolamento estabelecido repentinamente como uma medida

294
de segurança pública é possível notar o porquê de tanta resistência de alguns em se
manter distantes do contato social físico. Antes desse fenômeno mundial, as pessoas
tinham uma rotina e maneiras específicas de se relacionar com os outros, agora distante
deles a solidão encontra espaço para se inserir e se torna a via possível para refletir
sobre questões elementares que há muito foram delegadas (MAY, 1991).
Ainda segundo May (1991, p. 28):
Todo ser humano adquire grande parte do senso de sua própria realidade
pelo que os outros dizem e pensam a seu respeito. Mas quem foi longe
demais nessa dependência alheia acabou temendo que se ela faltasse
perderia o senso de sua própria existência, ficaria “disperso”, como água
escorrendo na areia. Muita gente vive assim, tateando como cego, tocando
uma sucessão de pessoas.

Em outras palavras, algumas pessoas experimentaram a possibilidade de


isolamento pela primeira vez com a pandemia, sem que tivesse a liberdade de escolher
por tal. Com isso, sem poder contar com a orientação que os outros ofereciam no
cotidiano precisaram enfrentar a situação com recursos próprios, cujo desenvolvimento
anterior não foi plenamente iniciado. Assim, ficam temerosas quanto à própria
capacidade de enfrentar a situação sem se perder, principalmente em um contexto no
qual a morte do outro e a sua própria se revela como um acontecimento possível.
A partir disso, a solidão se revela como ameaçadora, uma vez que aponta para
um vazio e coloca a pessoa diante de seu ser mais próprio, logo de uma parte de si que
foi há muito esquecida em troca de uma convivência coletiva. Quanto a isso, May (1991,
p. 20) afirma:
Quando a pessoa está cercada de cordialidade, imersa no grupo, é reabsorvida,
como se voltasse ao ventre materno, em simbologia analítica.
Temporariamente esquece a solidão, embora ao preço da renúncia à sua
existência como personalidade independente. Perde assim a única coisa que a
ajudaria positivamente a vencer a solidão a longo prazo, isto é, o
desenvolvimento de seus recursos interiores, da força e do senso de direção,
para usá-los como base de um relacionamento significativo com os outros
seres humanos.

Em consequência, ao se notar pela primeira vez sozinha, a pessoa tende a se


encontrar perdida, de modo que sua saúde mental pode ser negativamente afetada
durante esse período. Destarte, o fato de que somente aqueles que investiram em si
próprios de antemão são capazes de se isolar torna compreensível à ocorrência do
sofrimento psíquico em decorrência do distanciamento, ainda que provisório, dos
outros.

295
Nesse seguimento, o tempo integral em casa também ocasionou em um
aumento da violência doméstica, seja física ou psicológica e do consumo de
álcool/drogas (ORSINI, 2020). Além do mais, o filósofo Kierkegaard ao ser citado por Da
Silva; Alves; Do Couto (2016) já salientava que por vezes o ser humano pode se encontrar
desesperado frente às escolhas e acontecimentos que permeiam a vida. Estando em
isolamento aconteceu o que os existencialistas já discutiam:

O tédio existencial, ao ser percebido como uma forma de desespero, pode ser
compreendido como a situação em que a pessoa sofre a dor de ver o tempo
passar e não estar colocando em prática o desenvolvimentos de suas
possibilidades existenciais (DA SILVA; ALVES; DO COUTO, 2016, p.186).

Consequentemente, o não desenvolvimento das possibilidades tem suas


consequências e com a consciência atingida pelo não “poder-ser”, as pessoas podem
acabar por encontrar na morte a solução para todos os seus problemas. Destarte, o
isolamento tem posto a prova à capacidade da população de encontrar no sofrimento
um sentido para continuar e cuidar da vida mental (Lima, 2010). Sob esta ótica, também
acontece de distúrbios psiquiátricos se intensificarem, como a depressão, ansiedade e
o estresse pós-traumático (ORSINI, 2020).
Atrelado a isso tem um cenário político e econômico incerto, no qual a
desigualdade antes já existente foi escancarada, gerando muito sofrimento a população
menos favorecida.
Esses fatores podem ser entendidos como riscos para uma pessoa que já tenha ideações
suicidas, mas não devem ser levados como definidores, uma vez que o ser pode escolher
em pôr fim a sua vida independente de ter um transtorno, pois é livre.
Além disso, o ser da presença está originariamente familiarizada com o contexto
em que ela foi posta e por isso é fundamentada em uma interpretação ontológica-
existencial, conforme afirma Heidegger (1977, p. 131): “Tal possibilidade pode ser
apreendida expressamente quando a própria pre-sença assume a tarefa de interpretar
originariamente o seu ser e suas possibilidades ou até o sentido do ser em geral”. Isso
significa que as circunstâncias impostas pela pandemia oferecem uma abertura para o
ser, sua angústia e relação com esse novo mundo que se revela.

296
2.2. Compreensão existencial do suicídio

Segundo a analítica existencial heiddegeriana, é inerente ao ser pensar a sua


existência e questioná-la, porém, este não pode ser simplesmente dado, isto é, lançado
no mundo (HEIDEGGER, 1977). É importante que ele se posicione e escolha se deseja ou
não questionar o ser, e para isso pode recorrer às relações, tendo em vista que elas o
constitui também. Mas, posto a pandemia sem aviso e matando muitas pessoas
rapidamente, a angústia precisou ter um novo significado, tendo em vista que sua fuga
pode ocasionar um estreitamento das possibilidades do ser.
Por conseguinte, o Ser-aí pode optar por não mais lidar com o sofrimento, a
morte surge como saída e solução para todos os problemas. Nesse sentido, é possível
compreender que embora a morte seja a única certeza do ser humano e possibilidade
de abertura para uma vida autêntica. As questões existenciais como transitoriedade e
angústia, inerentes ao processo da morte e da perda são afastados pelo ser. Porém,
assim como ele está lançado a facticidade, em um mundo que não escolheu, a pandemia
surgiu como uma situação de privações, trazendo o luto para o mundo inteiro.
A partir desse momento, as questões antes tidas como tabu foram evidenciadas.
O homem passou a precisar lidar com o luto: de seus entes queridos, da sua rotina,
situação financeira e afim. Ao passo que a possibilidade de ressignificação do Dasein no
contato com-o-outro e com-o-mundo lhe foi negado, Heidegger (1977, p. 170) infere
que esse ser-no-mundo: “[...] é determinado pelo com, o mundo é sempre o mundo
compartilhado com os outros”.
Mas esse novo horizonte permeado pela falta pode ter levado o homem a sua
angústia de ser-para-morte e a incapacidade de lidar com ela intensifica sua falta de
sentido em existir e a exigência de novas formas de ser-no-mundo (HEIDEGGER, 1977).
Além disso, por ele estar vivendo de maneira impessoal, pode recorrer ao suicídio,
decorrente de uma intensa angústia com sua finitude e a culpa por não ter aproveitado
como deveria. Como aponta a analítica heideggeriana, a angústia é originária do ser e
se desvela a procura de um sentido.
No entanto, o Ser-aí pode optar por continuar imerso em sua cotidianidade e
absorvido na impessoalidade em vez de se apropriar de uma existência autêntica
(HEIDEGGER, 1977). Isso porque a divisa entre os dois modos de existir, isto é, próprio e

297
autêntico ou impessoal e inautêntico, é a própria angústia. Logo, ao optar por fugir dela,
o homem acaba por fugir de si mesmo, caindo em um modo de existir distante de si
próprio.
Em outro sentido, se o Ser-aí escolher o caminho da consciência, ele poderá está
aberto à angústia e assim se libertar do impessoal, podendo ser mais autêntico, o que
pode ser compreendido como resolução. Com ela, aceita seu destino, ou seja, assume
que também é um ser-para-morte e desempenha seu papel no mundo como autônomo
(HEIDEGGER, 1977). O poder-ser e o se apropriar da existência dependem das escolhas
que se fazem na vida e por vezes o ser pode se defrontar com a frustração de não se
está vivendo de modo próprio. No qual a imposição dos outros põe o ser no que pode
ser a sua última escolha: o suicídio
Nesse sentido, Sartre (1970) entende que o homem a princípio não é passível de
definição por não ser nada para depois ser o que ele fizer, escolher de si. Além do mais,
o filósofo difere liberdade do senso comum e do sonho: conseguir o que quiser sem
barreiras. E a liberdade baseada na realidade: está fundamentada na autonomia de
escolha. Essa liberdade é atuante mesmo que haja oposições, independente do local e
posição que ocupe na sociedade, o homem é livre ou não, a partir das posições que se
coloca e como se projeta, ele é o único responsável por isso.
Só será possível agir se ele tiver essa compreensão de que ele próprio precisa
planejar como será sua vida na terra. Mesmo que esteja imerso na cotidianidade, “O
homem é tão-somente, não apenas como ele se concebe, mas também como ele se
quer; como ele se concebe após a existência, como ele se quer após esse impulso para
a existência” (SARTRE, 1970, p. 10). Embora nem sempre o Ser-aí se der conta disso e
do fato de que suas escolhas afetam além de si mesmo: a esfera social, deixando marcas.
O suicida, por sua vez, deixa uma mensagem para sociedade que ele não
suportava mais esse sistema que adoece e é conhecida como sociedade do cansaço,
conforme Byung-chul Han (2015). Infere-se que na inexistência de um lugar próprio, o
suicídio se mostra como a escolha assertiva, faz o ser se apropriar de si nem que seja a
última coisa que faça.
Por sua parte, Frankl (1987; 2015), assim como Heidegger e Sartre, defende que
o homem é um ser livre, porém essa liberdade é na realidade circunstanciada por sua
situação concreta, isto é, contexto no qual se insere, e relação com o mundo e os outros.

298
Esse fato fica nítido, ao notar que durante o curso existencial as pessoas passam por
uma série de situações nas quais muitas vezes não escolheram, mas que ainda sim
precisam se posicionar diante da vida.
Nesses casos, porém, “o que realmente conta é a firmeza e a atitude com que
ele vai ao encontro de um destino inevitável e irrevogável” (FRANKL, 2015, p. 26). Em
outras palavras, mesmo diante de adversidades que acabam por causar sofrimento,
como se apresenta o fenômeno da pandemia do Covid-19, o distanciamento social e a
mudança na rotina, o homem ainda tem liberdade para se interrogar e se posicionar
diante da situação.
Diante disso, Frankl (1987; 2015) defende o fenômeno da transcendência, que
revela o fato de o homem sempre apontar para algo além de si mesmo, algo que não é
ele próprio, mas um sentido que precisa cumprir seja no serviço a uma causa ou no amor
a outra pessoa. Logo, a autotranscendência é a possibilidade de a pessoa realizar-se a si
própria enquanto se volta para fora de si. Com isso, a vontade de sentido acompanha o
todo o percurso existencial do homem e expressa a possibilidade dele poder se realizar
ao entregar algum trabalho ao mundo, experimentar algo ou se posicionar diante do
sofrimento.
Quanto ao sentido, é expresso como o algo que emerge a partir do
posicionamento do homem diante da vida, por isso sempre há diferentes sentidos para
diferentes pessoas em todos os momentos e contextos da vida (Frankl, 1987).
Em complemento, Frankl (2015, p. 15) defende:

[...] Não há nenhuma situação na qual a vida cesse de oferecer uma


possibilidade de sentido, e não há nenhuma pessoa para quem a vida não
coloque à disposição um dever. A possibilidade de realização de um sentido
é, em cada caso, única, e a personalidade que pode realizar-se é igualmente
singular em cada caso.

Em outras palavras, é sugerida uma mudança de postura diante das situações,


com a qual em vez de se questionar sobre o que se espera da vida se deve indagar
quanto ao quê ela espera de você, isto é, o que ainda é necessário realizar. Com isso, a
pessoa tem a possibilidade de encontrar e cumprir o sentido daquela situação
específica, aprender e autotranscender. Visto que em todas as situações é possível
encontrar e cumprir um sentido, com a pandemia do Covid-19 não seria diferente,

299
embora o isolamento social, a mudança de rotina e maior contato com os outros
virtualmente impostos por ela não tenha sido uma escolha pessoal.
Assim, é preciso encontrar e cumprir o sentido mesmo diante do sofrimento
advindo desse fenômeno mundial, pois na impossibilidade de fazê-lo a pessoa pode cair
no vazio existencial e o suicídio se apresenta como uma possibilidade. Quanto a isso,
Frankl (2015) declara que o surgimento desse vazio vem do fato de que, diferentemente
dos animais, o homem não tem quem dizer o que deve fazer ou ser, de modo que não
possui orientações do que fazer com a própria vida. Em consequência, tem dificuldade
em projetar um projeto de vida e esse sentimento de vazio existencial pode se
manifestar através do tédio, agressividade, criminalidade, uso de drogas e,
principalmente em jovens universitários, suicídio.
Diferentemente do que se pode pensar, “o suicida também crê num sentido,
ainda que não de vida, de continuação da vida, mas ao menos no sentido da morte. Se
não acreditasse realmente em nenhum sentido, não teria forças sequer para mover um
dedo e, portanto, cometer o suicídio” (FRANKL, 2015, p. 80). Com isso em mente, é
possível notar que até mesmo ao arquitetar a própria morte a pessoa acredita que exista
um sentido, embora não o tenha conseguido de fato encontrá-lo, e utiliza essa lógica
para sustentar sua última ação diante da vida.
No decorrer de seus casos clínicos e vivências nos campos de concentração,
Frankl (1987; 2015) notou que não eram poucos os causos de tentativas de suicídio em
decorrência do sentimento de vazio existencial. Nesse seguimento, ao se deparar com
aqueles que expressavam a ideação costumava questionar “por que você não opta pelo
suicídio?”. A partir da resposta apresentada, seu trabalho seguia no intuito de
possibilitar que a pessoa compreendesse que existia algo para além dela, que se desse
conta de que a vida sempre espera algo dela que estava para além daquela situação.
Fica nítido com Frankl (1987; 2015), seja por experiência própria ou suas
atuações clínicas, que é possível que o homem supere qualquer adversidade contanto
que consiga encontrar e cumprir um sentido, que se interrogue sobre o que a vida
espera dele e aprenda com aquela vivência, superando a si e a situação. Isto posto, o
mais defendido é que, embora nem todo ato de suicídio advenha especificamente do
sentimento devastador de falta de sentido, sempre existe uma possibilidade dele ser

300
evitado caso a pessoa tome consciência de algum sentido e propósito para além dela
pelo qual valha a pena manter sua vida.
Por sua vez, a perspectiva de Albert Camus (1979) se propõe a investigar o
fenômeno do suicídio não em um panorama social, mas em um quadro de pensamento
individual, no qual alerta que há inúmeras situações no qual a pessoa pode optar por
arquitetar a própria morte. À vista disso, diferentemente de Frankl, sua reflexão permeia
a questão “A vida vale a pena ou não ser vivida?”.
Nesse seguimento, o homem contemporâneo é cada vez mais absorvido por
um contexto em que precisa dar conta muitas atividades ao longo da semana e a vida
cotidiana se apresenta cada vez mais corrida e automática, no qual a reflexão surge
desproporcional ao cansaço diário. Diante disso, Camus (1979) defende que é o cansaço
que constrói a base necessária para a consciência começar a se manifestar e que
apresenta a pessoa duas opções: “a continuação é o retorno inconsciente à mesma
trama ou o despertar definitivo. No extremo do despertar vem, com o tempo, a
consequência: suicídio ou restabelecimento” (p.13).
Ante o exposto, o homem compreende que a existência não tem sentido, que
não há esperança para si, tampouco uma lógica que governe os acontecimentos do
mundo, que a vida é fantasiosa e absurda. A partir de então, surge o intenso conflito
humano: sua luta diária em relação ao mundo, essa permeada através do absurdo.
Todavia, é necessário salientar que essa descoberta do absurdo não convoca a pessoa a
assumir uma visão negativista e outorgada em relação à existência. Muito pelo
contrário, ao surgir em um mundo absurdo e se dar conta disso, resta ao homem ter
consciência de sua existência, revoltar-se e libertar-se (CAMUS, 1979).
É a partir disso que surge a verdadeira reviravolta, tão bem apresentada no mito
de Sísifo. No mito, Sísifo foi condenado pelos deuses a rolar um rochedo incessante e
inutilmente até o alto de uma montanha, onde a pedra caía de novo por seu próprio
peso e ele precisava fazer tudo novamente por toda a eternidade. Por isso, Sísifo é o
chamado Herói do absurdo, uma vez que é consciente de sua tragédia e revolta-se
diariamente, mesmo sem esperanças para si enfrenta o rochedo como seu desafio
pessoal e consegue levá-lo sempre ao alto, fazendo-o dono do próprio destino (CAMUS,
1979).

301
Em outras palavras, ao enfrentar o seu destino, o homem se dirige para o mundo
com uma atitude completamente nova, não mais irrefletida, automática e voltada
sempre para o amanhã, mas aceita o desafio diário de se rebelar contra o absurdo.
Destarte, essa insatisfação em relação ao mundo é o que o mantém não somente senhor
do próprio destino como também dá valor à vida e responde ao porquê de mantê-la.
É ilógico, pois, pensar que há uma forma mais efetiva de lidar com o absurdo
senão com a revolta, como se apresenta o fenômeno do suicídio. É preciso destacar,
assim, que mesmo diante de situações adversas, como crises, morte de um ente
querido, isolamento em decorrência da pandemia do Covid-19, o homem ainda tem
apego à própria vida e tende a tentar mantê-la (CAMUS, 1979).
Isso evidencia que o que está em jogo na verdade é o que fazer com o
reconhecimento de que essa não possui esperança ou significado: tentar evitar ou
superar? Nesse seguimento, Camus (1979, p. 35) declara que “ele escapa ao suicídio à
medida que é, ao mesmo tempo, consciência e recusa da morte”, de modo que não há
como o homem resolver o absurdo e a única forma de vencê-lo é dizer sim diariamente
à vida, à insatisfação em relação ao mundo e ao seu confronto. Assim, fica nítido que
apesar de o suicídio se apresentar como a tentativa de escape desse absurdo, na
realidade em vez de exprimir a mais pura forma de libertação acaba por aprisionar o Ser,
evidenciando o fato de que o mundo ganhou no jogo da vida.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi possível constatar que a facticidade do mundo traz angústia para o Ser e
embora ela seja originária dele próprio busca formas na cotidianidade de terceirizar a
responsabilidade de suas escolhas se diluindo no impessoal. Porém, a pandemia causada
pelo Covid-19 obrigou o homem a isolar-se e defrontar-se consigo mesmo, necessitando
de muito esforço para continuar encontrando sentido na sua existência. Posto que o
Dasein, como ser-no-mundo e ser-com-os-outros, também tem a oportunidade de
ressignificar seus sofrimentos e inquietações. Contudo, a partir de março de 2020 ele
precisou responder a outras questões, inclusive se tinha um sentido pelo qual viver e se
sua vida valia a pena ser vivida.

302
Por outro lado, percebe-se que os sujeitos também se diferenciam ao entrar em
contato com os outros, como entende Rollo May (1991) que os homens são como um
espelho. E nessa falta do outro, transtornos como ansiedade, depressão e estresse pós-
traumático se intensificaram. Além da violência contra mulheres e crianças, além do
abuso de álcool e outras drogas. Muitos se viram desesperados frente ao tédio, tendo
em vista que a sociedade do século XXI se caracteriza pela alta produção e grande
número de estímulos que acelera suas atividades.
A inconstância também foi exacerbada, o medo da contaminação, de não saber
como seria o dia seguinte, se ainda teria um emprego ou não. O ser-para-morte que
antes conseguia ignorar essa possibilidade foi obrigado a encará-la numa escala mundial
e o sentimento de impotência despertou sua angústia. Diante disso, o sujeito pôde se
colocar numa posição de abertura, poderia optar por assumir sua existência autêntica e
oferecer um sentido a esse sofrimento ou continuar perdido no impessoal.
Mesmo que o homem não tenha tido a possibilidade de escolher onde e quando
nasceria ou se iria vivenciar uma pandemia, isto se deu e ele precisa realizar escolhas
frente a isso. Porém, primeiro é necessário que tenha consciência e responsabilidade
por suas escolhas, além de considerar as implicações que podem acarretar na sociedade.
Muitos ao se depararem com a finitude como uma possibilidade concreta, antes
negligenciada, pode ter se angustiado ao ter consciência das consequências de suas
escolhas.
Além de perceber que em sua existência não há sentido ou propósito a ser
cumprido, o Ser, por sua vez, não consegue entender que, como salientou Frankl (2015),
embora ele não tenha controle sobre as circunstâncias da pandemia, é imprescindível
que se posicione e busque o algo para além de si mesmo e desse momento. Caso
contrário, ao se deparar diariamente com o luto das famílias ou da sua própria,
desigualdades e crises de caráter social, econômico e na saúde, talvez ele não consiga
encontrar um lugar em que se apoie. Consequentemente, pôr fim a própria vida surge
como uma clara solução e possibilidade de escolher, mesmo que esta seja a sua última
e irrevogável.
Foi possível, também, constatar que mesmo diante de situações adversas, como
crises, morte de um ente querido, isolamento em decorrência da pandemia do Covid-
19, o homem ainda tem apego à própria vida e tende a tentar mantê-la. Diante disso,

303
resta a escolha do que fazer diante do reconhecimento de que a vida não possui
esperança ou significado. Se a pessoa opta por confrontar o absurdo, dizendo sim à vida
e à insatisfação perante o mundo, ou ceder a ele ao escolher a morte voluntária, é uma
escolha que cada um precisa se responsabilizar.
Salienta-se que é importante que a sociedade seja influenciada a pensar as
questões da sua existência e que sentido tem atribuído a ela, como tem se posicionado.
O ser autêntico escolhe baseado nas suas necessidades e anseios, ou seja, não atribui a
outrem a sua responsabilidade e não seria diferente no caso do suicídio. Por fim, esse
fenômeno não deve ser negligenciado, mas debatido a fim de que haja uma abertura do
Ser para suas possibilidades e sentidos de existência.

REFERÊNCIAS

BRAGA, Tatiana Benevides Magalhães; FARINHA, Marciana Gonçalves. Heidegger: em


busca de sentido para a existência humana. Revista da Abordagem Gestáltica:
Phenomenological Studies, v. 23, n. 1, p. 65-73, 2017.

CAMUS, Albert. O MITO DE SÍSIFO: ensaio sobre o absurdo. Lisboa: Livros do Brasil,
1979.

DA SILVA, Karina de Fátima Aparecida; ALVES, Mariany Aparecida; DO COUTO, Daniela


Paula. Suicídio: Uma escolha existencial frente ao desespero humano. Pretextos-
Revista da Graduação em Psicologia da PUC Minas, v. 1, n. 2, p. 184-203, 2016.

DURKHEIM, Émile. O suicídio. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

FRANKL. Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração. Trad.


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FRANKL, Viktor E. O sofrimento de uma vida sem sentido: caminhos para encontrar a
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HAN, Byung-Chul. Sociedade do cansaço. Editora Vozes Limitada, 2015.

HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Tradução Márcia de Sá Cavalcante. Petrópolis: Editora


Vozes, 1977.

304
LIMA, ROSSANO CABRAL. Distanciamento e isolamento sociais pela Covid-19 no Brasil:
impactos na saúde mental. Physis: Revista de Saúde Coletiva, v. 30, p. e300214,
2020.

MAY, Rollo. O homem à procura de si mesmo. 18ª ed. Petrópolis: Vozes, 1991.

ORSINI, Marco et al. Danos psíquicos durante pandemia por COVID-19 no Brasil.
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Pandemia de COVID-19 aumenta fatores de risco para suicídio. Organização Pan-


Americana de Saúde, 10 de set. de 2020. Disponível em:
<https://www.paho.org/pt/noticias/10-9-2020-pandemia-covid-19-aumenta-
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SARTRE, Jean-Paul. O Existencialismo é um Humanismo. Tradução de Rita Correia Gudes.


Paris, 1970.

SUICÍDIO: principais fatos. Organização Pan-Americana de Saúde. Disponível em:


https://www.paho.org/pt/topicos/suicidio. Acesso em 19 de nov. de 2020

305
CAPÍTULO XXIII

ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM NO DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO


FOTOTERÁPICO DA ICTERÍCIA FISIOLÓGICA EM NEONATOS PRÉ-TERMO
Jhônata Santos Brito ¹
João Nilton Barreto Andrade ²
¹ Graduando do curso de Enfermagem. Faculdade de Ciências e Empreendedorismo – FACEMP
² Professor Adjunto do curso de Saúde. Faculdade de Ciências e Empreendedorismo - FACEMP

RESUMO

Introdução: A icterícia neonatal fisiológica, é definida pela coloração amarelada da pele


em consequência o aumento da bilirrubina indireta (não conjugada), presente na
corrente sanguínea. Em média 80% dos prematuros (pré-termo) desenvolvem algum
grau de icterícia. Na maior parte das vezes a mesma representa um fenômeno fisiológico
transitório. É resultante da presença anormal de pigmentos biliares, podendo ser
fisiológica ou patológica, influenciando diretamente no seu tratamento que dependerá
do tipo e intensidade da mesma. A bilirrubina é um composto resultante da degradação
da hemoglobina proveniente da destruição das hemácias. Na fase fetal a bilirrubina é
filtrada pela placenta e excretada pelo fígado da mãe. Após o nascimento, é
imprescindível que o fígado do recém-nascido seja capaz de fazer o processo da
metabolização e excreção. Os neonatos que desenvolvem icterícia na primeira semana
de vida extrauterina (fora do útero) passam por uma série de situações, dentre as quais
a prematuridade, pode fazer com que os níveis de bilirrubina cresçam exageradamente,
alastrar para vários tecidos, inclusive o sistema nervoso central. A presença de grande
quantidade de bilirrubina por tempo prolongado pode lesar permanentemente
estruturas como globo pálido, núcleos subtalâmicos, hipocampo e núcleo óculor-motor,
dando origem ao chamado Kernicterus ou encefalopatia bilirrunínica, evidenciando a
importância do diagnóstico precoce e tratamento imediato. Contudo, é importante que
o tratamento seja realizado imediatamente após sua descoberta, para tanto, faz-se
necessário maior qualificação dos profissionais de enfermagem, e nessa conjuntura, é
observado o papel dos enfermeiros junto a equipe de enfermagem, pois, os mesmos
estão ligados diretamente ao cuidado do binômio mãe-bebê, prestando os cuidados nas
primeiras horas de vida do RN, sendo tais profissionais primordiais na detecção e
tratamento de RN ictéricos. Desta maneira, o objetivo do trabalho é analisar a
importância do profissional de enfermagem no diagnóstico e tratamento fototerápico
da icterícia fisiológica em neonatos pré-termo. Revisão Bibliográfica: Icterícia neonatal
fisiológica, é definida pela coloração amarelada da pele em consequência o aumento da
bilirrubina indireta (não conjugada), presente na corrente sanguínea. Na fase
intrauterina, o desenvolvimento fetal requer altas concentrações de hemoglobina para
extrair efetivamente o oxigênio da circulação materna e entrega-la para os tecidos
fetais. De imediato após o nascimento, com o provimento de oxigênio pelo próprio
pulmão do RN, esta necessidade de hemoglobina declina consideravelmente.

306
Considerando que a vida média das hemácias fetais é menor do que a dos adultos, logo
após o nascimento os RN têm uma alta carga de hemoglobina para ser convertida em
bilirrubina e excretada no período pós-natal imediato. A assistência de enfermagem
proporciona o surgimento dos métodos e instrumentos do trabalho da enfermagem.
Uma das metodologias utilizadas pelo enfermeiro para implantação e operacionalização
do cuidado é a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE), que contempla a
coleta de dados (histórico de enfermagem), diagnóstico de enfermagem, planejamento
de enfermagem, implementação de enfermagem e avaliação de enfermagem, o qual
oferta um cuidado organizado, sistematizado, contínuo e seguro ao recém-nascido. O
cuidado de enfermagem em neonatologia é o meio pelo qual se conduz a recuperação,
adaptação e o bem estar, sendo que, este cuidado encontra-se fundamentado em
conhecimentos científicos e na autonomia do profissional de enfermagem. Sendo seus
principais objetivos na neonatologia: identificar as situações de saúde-doença; as
necessidades de cuidados de enfermagem; subsidiar as intervenções de promoção,
prevenção, recuperação e reabilitação da saúde do recém-nascido. No exame físico, a
detecção depende principalmente da análise da pigmentação da pele e dos olhos do
recém-nascido, sendo que icterícia por hiperbilirrubinemia indireta apresenta
progressão céfalo-caudal, denominada zona de Kramer. O tratamento fototerápico é a
terapêutica mais utilizada, no mundo, para tratar a icterícia neonatal, devido à sua
elevada eficácia e falta de efeitos colaterais que expliquem o não usa da mesma. É uma
terapêutica que usa a energia luminosa para modificar a bilirrubina acumulada no
sangue, em produtos mais hidrossolúveis, expelido ligeiramente pela bile e pela urina.
No tratamento fototerapia o(a) enfermeiro(a) desenvolve cuidados na proteção ocular,
distância e posicionamento da fonte luminosa da fototerapia, prevenção de
queimaduras, controle de perda hídrica, observação de eliminação, pesagem, mudança
de decúbito a cada duas horas e cuidados com higiene. A atuação do enfermeiro junto
ao recém-nascido pré-termo, portador da icterícia fisiológica deve iniciar-se na detecção
precoce da mesma, durante o exame físico do recém-nascido e estendendo-se durante
a terapêutica proposta. Conclusão: Nesta perspectiva, nos cuidados envolvidos a saúde
do recém-nascido, percebe-se a importância das ações de enfermagem na atenção e
sistematização do cuidado aos neonatos pré-termo com icterícia fisiológica. Pois, a
assistência de enfermagem, possui atribuições importantes desde o exame físico,
contribuindo para o diagnostico, até no tratamento da icterícia neonatal. Fazendo-se,
necessário a qualificação do atendimento, para proporcionar um diagnóstico precoce e
dar início ao tratamento escolhido.

Palavras-chave: Ictéricia nenatal. Ictéricia fisiológica. Fototerapia. Assistência de


Enfermagem.

1. INTRODUÇÃO

A icterícia é frequente no período neonatal, em média de 60% a 70% dos recém-


nascidos a termo e 80% dos prematuros (pré-termo) desenvolvem algum grau de

307
icterícia. Na maior parte das vezes a mesma representa um fenômeno fisiológico
transitório (PAGANINI, 2009).
Em torno de 1,5 milhão de recém nascidos (RNs) apresentam icterícia nos
primeiros dias de vida por ano, cerca de 250 mil encontra-se em estado crítico e com
maior risco de neurotoxicidade, kernicterus ou óbito (FONTES, 2019).
É resultante da presença anormal de pigmentos biliares, podendo ser fisiológica
ou patológica, influenciando diretamente no seu tratamento que dependerá do tipo e
intensidade da mesma. A bilirrubina é um composto resultante da degradação da
hemoglobina proveniente da destruição das hemácias. Na fase fetal a bilirrubina é
filtrada pela placenta e excretada pelo fígado da mãe. Após o nascimento, é
imprescindível que o fígado do recém-nascido seja capaz de fazer o processo da
metabolização e excreção (SACRAMENTO, 2017).
O recém-nascido tem várias limitações no metabolismo da bilirrubina que
evidencia a icterícia em pacientes saudáveis, tais como sobrecarga de bilirrubina ao
hepatócito e a menor capacidade de captação, conjugação e excreção hepática de
bilirrubina (POVALUK, 2017).
Os neonatos que desenvolvem icterícia na primeira semana de vida extrauterina
(fora do útero) passam por uma série de situações, dentre as quais a prematuridade,
pode fazer com que os níveis de bilirrubina cresçam exageradamente, alastrar para
vários tecidos, inclusive o sistema nervoso central. A presença de grande quantidade de
bilirrubina por tempo prolongado pode lesar permanentemente estruturas como globo
pálido, núcleos subtalâmicos, hipocampo e núcleo óculor-motor, dando origem ao
chamado Kernicterus ou encefalopatia bilirrunínica, evidenciando a importância do
diagnóstico precoce e tratamento imediato (SACRAMENTO, 2017).
A icterícia fisiológica manifesta-se após as 24 horas de vida. No récem-nascido a
termo, que nasceram entre 37 a 41 semanas e 06 dias de gestação, há aumento de
bilirrubina sanguínea nos primeiros 3 dias de vida de até 6-8 mg/dl, sendo que níveis
inferiores a 12 mg/dl são considerados dentro dos limites fisiológicos. No recém-nascido
pré-termo, nascido antes de completar 37 semanas de gestação, o valor máximo de
bilirrubina pode ser de cerca de 10-12 mg/dl no 5° dia, podendo atingir 15 mg/dl sem
anomalia no metabolismo (1).

308
É necessário que os enfermeiros sejam qualificados e capazes de realizar o
diagnóstico clínico de icterícia bem como proporcionar adequada assistência de
enfermagem durante o tratamento (SENA, 2015)
Contudo, é importante que o tratamento seja realizado imediatamente após sua
descoberta, para tanto, faz-se necessário maior qualificação dos profissionais de
enfermagem, e nessa conjuntura, é observado o papel dos enfermeiros junto a equipe
de enfermagem, pois, os mesmos estão ligados diretamente ao cuidado do binômio
mãe-bebê, prestando os cuidados nas primeiras horas de vida do RN, sendo tais
profissionais primordiais na detecção e tratamento de RN ictéricos (POVALUK, 2017).
Desta maneira, o objetivo do trabalho é analisar a importância do profissional de
enfermagem no diagnóstico e tratamento fototerápico da icterícia fisiológica em
neonatos pré-termo.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Icterícia neonatal fisiológica, é definida pela coloração amarelada da pele em


consequência o aumento da bilirrubina indireta (não conjugada), presente na corrente
sanguínea (REGINATTO, 2016).
Na fase intrauterina, o desenvolvimento fetal requer altas concentrações de
hemoglobina para extrair efetivamente o oxigênio da circulação materna e entrega-la
para os tecidos fetais. De imediato após o nascimento, com o provimento de oxigênio
pelo próprio pulmão do RN, esta necessidade de hemoglobina declina
consideravelmente. Considerando que a vida média das hemácias fetais é menor do
que a dos adultos, logo após o nascimento os RN têm uma alta carga de hemoglobina
para ser convertida em bilirrubina e excretada no período pós-natal imediato (POVALUK,
2017)
A bilirrubina é um dos produtos da quebra da hemoglobina que resulta na
destruição das hemácias. Quando há uma quebra das hemácias, seu produto é liberado
na circulação, onde a hemoglobina se divide em heme e globina. A porção da globina é
usada pelo corpo, e a porção heme é convertida a bilirrubina não conjugada (substância
insolúvel que se liga a albumina) (HOCKENBERRY, 2018)

309
Desde o fígado, a bilirrubina separa da albumina, e através da enzima glicuronil
transferase, é conjugada com ácido glicurônico para produzir a bilirrubina conjugada
(solúvel) sendo excretada pela bile. No intestino sofre uma ação bacteriana, reduzindo
a bilirrubina conjugada a urobilinôgenio. Dessa maneira grande parte da bilirrubina
reduzida (urobilinogenio) é excretada pelas fezes e uma quantidade pequena é
eliminada na urina, como mostra o esquema de como é feita a metabolização no
organismo do recém-nascido, na figura 1 (HOCKENBERRY, 2018).

Figura 1: Metabolização da Bilirrubina

Fonte: CALVACANE, 2013.


A assistência de enfermagem proporciona o surgimento dos métodos e
instrumentos do trabalho da enfermagem. Uma das metodologias utilizadas pelo
enfermeiro para implantação e operacionalização do cuidado é a Sistematização da
Assistência de Enfermagem (SAE), que contempla a coleta de dados (histórico de
enfermagem), diagnóstico de enfermagem, planejamento de enfermagem,
implementação de enfermagem e avaliação de enfermagem, o qual oferta um cuidado
organizado, sistematizado, contínuo e seguro ao recém-nascido. O cuidado de
enfermagem em neonatologia é o meio pelo qual se conduz a recuperação, adaptação
e o bem estar, sendo que, este cuidado encontra-se fundamentado em conhecimentos
científicos e na autonomia do profissional de enfermagem (SARLI, 2018).
No diagnóstico da icterícia neonatal por meio da história clínica, é de fundamental
importância colher dados sobre o histórico e fatores epidemiológicos, pois permitem
detectar a possibilidade de desenvolvimento de hiperbilirrubinemia significante na
primeira semana de vida. Dessa maneira, evidencia a importância do processo de

310
enfermagem no atendimento ao recém-nascido de uma maneira fundamental na
construção do desfecho clínico (WILLIAMSON, 2017).
No exame físico, a detecção depende principalmente da análise da pigmentação
da pele do recém-nascido sendo que icterícia por hiperbilirrubinemia indireta apresenta
progressão céfalo-caudal. Kramer no final de 1960 descreveu a progressão céfalo-caudal
da icterícia, dividindo o corpo do RN de termo em cinco zonas, como descreve na figura
2, associando estas zonas com a concentração de bilirrubina sérica (SACRAMENTO,
2017).

Figura 2: Zonas Dérmicas de Kramer

Zona 1: cabeça e pescoço


Zona 2: até cicatriz umbilical
Zona 3: até o joelhos e cotovelos
Zona 4: até tornozelos e punhos
Zona 5: até região plantar e palmar

Fonte: CALVACANTE, 2013.

Os neonatos ictéricos devem ter uma dosagem de bilirrubina sérica (que pode
ser feita através do hemograma) e/ou uma aferição transcutânea (BTC), já que a
estimativa visual como parâmetro diagnóstico depende da experiência profissional, do
tipo e da pigmentação da pele do RN, da luminosidade, podendo ser submetida em peles
pigmentadas em ambientes claros e prejudicada em locais escuros. A dosagem sérica de
bilirrubinas é o exame mais recomendado, quando na BTC os níveis forem superiores a
12-14 mg/dl (SARLI, 2018).
Para definição do tipo de tratamento adequado deve-se observar diversos
fatores que corroboram para o diagnóstico, a fim de garantir que seja instituída a
terapêutica mais eficaz. Preconiza-se que, primeiramente, observe-se o histórico
materno e o histórico neonatal, analisar o aparecimento e a evolução da icterícia por
meio do exame físico minucioso no recém-nascido e em seguida realizar a coleta de

311
sangue do recém-nascido para análises. Deve-se, por fim, determinar se a
hiperbilirrubinemia enquadra-se no tipo fisiológico ou patológico (CALVACANTE, 2013).
O tratamento fototerápico é a terapêutica mais utilizada, no mundo, para tratar
a icterícia neonatal, devido à sua elevada eficácia e falta de efeitos colaterais que
expliquem o não usa da mesma. É uma terapêutica que usa a energia luminosa para
modificar a bilirrubina acumulada no sangue, em produtos mais hidrossolúveis, expelido
ligeiramente pela bile e pela urina (FONTES, 2019).
A realização dos cuidados ao neonato pelo(a) enfermeiro(a) tem como principais
objetivos a identificação de situações de saúde-doença; as necessidades de cuidados de
enfermagem; ajudar nas intervenções de promoção, prevenção, recuperação e
reabilitação da saúde do recém-nascido. Possibilitando o desenvolvimento de ações
neonatais que modificam o estado do processo de vida e de saúde-doença e promove a
saúde do recém-nascido (FONTES, 2019).
Nesta perspectiva, os recursos tecnológicos, a capacitação profissional, os
avanços na profissão de Enfermagem e o uso de instrumento de controle, proporcionam
uma assistência à saúde do recém-nascido de qualidade, reduzindo a mortalidade
infantil, promovendo a qualidade de vida declinando as desigualdades em saúde
(PAGANINI, 2009).
O enfermeiro (a) é responsável pelo recebimento e preparação do recém-
nascido na unidade de saúde para a realização da terapêutica, que muita das vezes o
diagnóstico é feito dentro da maternidade após horas do parto, bem como, preparam
os aparelhos que serão usados para a fototerapia, como os focos de luz, as incubadoras,
entre outros. Além disso, é de fundamental importância a humanização da assistência
nesse processo por meio do profissional para com o neonato e a família (CALVACANTE,
2013).
A atuação do enfermeiro é essencial e indispensável, diante da assistência
integral e individualizada prestada por esses profissionais sendo estes o responsável por
receber e programar ações voltadas ao neonato, tendo como cuidados a proteção
ocular, distância e posicionamento da fonte luminosa da fototerapia, prevenção de
queimaduras, controle de perda hídrica, observação de eliminação, pesagem, mudança
de decúbito a cada duas horas e cuidados com higiene (CALVACANTE, 2013).

312
Ainda assim, vem a existir uma fragilidade entre os enfermeiros quando se trata
da implementação aos cuidados com o recém-nascido portador da icterícia, possuindo
dificuldades no manuseio da fototerapia, na realização do balanço hídrico, mudança de
decúbito e pesagem, na qual as dificuldades vem a ser relacionada com a fragmentação
da assistência dos profissionais de enfermagem e a falta de elaboração das rotinas de
assistência criada pelas instituições (PAGANINI, 2009).
O trabalho do enfermeiro em neonatologia é um desafio constante, um caso de
icterícia neonatal, exige vigilância, capacidade, respeito e sensibilidade, porque o
paciente assistido é muito vulnerável e altamente depende da equipe de enfermagem,
que lhe proporciona assistência direta. A atuação do enfermeiro junto ao recém-nascido
portador da icterícia fisiológica deve iniciar-se na detecção precoce da mesma, durante
o exame físico do RN e estendendo-se durante a terapia proposta (SENA, 2015).
A equipe de enfermagem necessita conhecer e estar atenta para todos os sinais
e sintomas exibidos pelo recém-nascido, com vista a prevenir complicações e aumentar
a eficácia da terapêutica (WILLIAMSON, 2017)

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta perspectiva, nos cuidados envolvidos a saúde do recém-nascido, percebe-


se a importância das ações de enfermagem na atenção e sistematização do cuidado aos
neonatos pré-termo com icterícia fisiológica. Pois, a assistência de enfermagem, possui
atribuições importantes desde o exame físico, contribuindo para o diagnostico, até no
tratamento da icterícia neonatal. Fazendo-se, necessário a qualificação do atendimento,
para proporcionar um diagnóstico precoce e dar início ao tratamento escolhido.
Portanto, é perceptível a importância do diagnóstico da icterícia fisiológica logo
nas primeiras horas de vida do RN, pois evita terapias clínicas desnecessárias, separação
de pais-recém-nascido e diminui risco de um diagnostico tardio, que compromete ainda
mais a saúde do recém-nascido podendo leva-lo a óbito.

REFERÊNCIAS

CAVALCANTE, Francisca Farias. Tratamento Alternativo Associado com Fototerapia em


Recém-Nascidos Ictéricos. 2013. Dissertação (Mestrado em Bioengenharia) -
Universidade Camilo Castelo Branco, [S. l.], 2013.

313
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Atenção a Saúde do Recém-nascido com Icterícia Neonatal: Uma Revisão
Integrativa. Universidade Tiradentes - UNIT, [s. l.], 9 maio 2019.

HOCKENBERRY, Marilyn J. et al. Problemas de Saúde dos Recém-Nascidos:


Hiperbilirrubinema. In: Fundamentos de Enfermagem Pediátrica. 10. ed. [S. l.: s.
n.], cap. 8, p. 255 -263, 2018

PAGANINI, Camila Bianca Lecciolle; FERREIRA , Aleksandro Belo; GLACCI, Clery Bernadi.
Icterícia Neonatal: Fatores de Riscos para Reinternação em uma População de
Recém-nascidos Vivos na Cidade de São Paulo. Arq Med Hosp Fac Cienc Med
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POVALUK, Patrícia. Acurácia do Biliufpr - Um Analisador de Bilirrubina Transcutânea na


Avaliação da Icterícia Neonatal. 2017. Dissertação (Mestrado em Saúde da
Criança e do Adolescente) - Universidade Federal do Paraná, [S. l.], 2017.

REGINATTO, Flávia Pereira et al. Prevalência e caracterização das afecções cutâneas


neonatais nas primeiras 72 horas de vida. Jornal de Pediatria (Rio J). , [s. l.], 16
jun. 2016.
SARLI, Yone de Oliveira Di. Associação entre Tempo de Clampeamento do Cordão
Umbilical e Icterícia Neonatal Precoce em Récem-Nascidos a Termo. 2018.
Dissertação (Mestrado em Ciências da Saúde) - Universidade Santo Amaro, [S. l.],
2018.

SENA, Divina T. Carvalho de; REIS , Rosane Pereira dos. A Importância da Atuação do
Enfermeiro no Tratamento da Icterícia Neonatal. Revista Eletrônica Estácio
Saúde, [s. l.], 2015.

SACRAMENTO, Larrissa C. Araújo; LEAL, Gabriele de Andrade; RIBEIRO , Joathan Borges;


SANTOS, Josefa Jadiane dos.. Icterícia Neonatal: O Enfermeiro Frente ao
Diagnóstico e a Fototerapia como Tratamento. INTERNATIONAL NURSING
CONGRESS, [s. l.], 9 maio 2017.

WILLIAMSON, Mary A. et al. Doenças do Sistema Digestório: Ictéricia. In: Interpretação


de Exames Laboratoriais. 10. ed. [S. l.: s. n.]. cap. 10, p. 438-441, 2017.

314
CAPÍTULO XXIV

PRÉ-NATAL HUMANIZADO E EDUCAÇÃO EM SAÚDE PARA O PARTO ATIVO:


PERCEPÇÃO DOS MÉDICOS E ENFERMEIROS DE UMA UNIDADE BÁSICA DE
SAÚDE
Regina Dias Pereira ¹
Neudson Johnson Martinho ²
¹ Enfermeira na área de saúde da mulher.
² Doutor em Educação. Professor Associado da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Mato Grosso
(UFMT). Pesquisador na área de Educação em Saúde.

RESUMO

O parto ativo trata-se de uma forma adequada em se descrever o trabalho de parto,


como a parturiente reage aos seus próprios instintos e a lógica fisiológica do seu corpo.
É uma maneira de dizer que a gestante realmente está no controle do seu corpo durante
o processo de parir e que não é o objeto de uma “conduta ativa” do parto pela equipe
obstétrica (BALASKAS, 1993). Mas, para que a gestante possa ter esse tipo de parto, se
faz necessário que esta tenha um pré-natal humanizado que a eduque quanto a
importância deste tipo de parto para sua saúde e do filho, assim como, que se trata de
um direito seu optar por ser a protagonista do ato de parir. Frente a este fenômeno,
desenvolvemos esse estudo objetivando desvelar saberes / fazeres de profissionais da
saúde quanto ao significado e significância sobre pré-natal humanizado e promover
processos educativos quanto a educação em saúde durante o pré-natal visando educar
a gestante, companheiro e família para o parto ativo. O mesmo foi desenvolvido em
uma Unidade de Saúde da Família do Município de Cuiabá-MT, com base no método
qualitativo. Consideramos a partir dos fenômenos identificados neste estudo, que se faz
necessário repensar a formação acadêmica nos curso nos cursos de medicina e
enfermagem, os quais devem introduzir em seus respectivos currículos teoria e prática
sobre pré-natal humanizado e parto ativo, assim como, educação em saúde para o parto
ativo durante as consultas de pré-natal, visando a diminuição da elevada incidência de
partos iatrogênicos, violências obstétricas e realização de procedimentos cirúrgicos de
cesáreas desnecessárias, consequentemente baixando a morbimortalidade materna
no Brasil.

Palavras-chave: Pré-natal Humanizado; Parto Ativo; Educação em Saúde.

1. INTRODUÇÃO

O movimento de mulheres, enfermeiras obstetrizes e obstetras para a promoção


do parto ativo, liderado por uma educadora perinatal sul-africana, chamada Janet

315
Balaskas, hoje ressignificado como parto natural ou humanizado, teve início na década
de 70 em Londres, gerando grandes conflitos nas salas de partos, o que resultou em sua
proibição. Entretanto, a luta continuou e o movimento foi resgatado através de uma
manifestação realizada por seus simpatizantes em um dia de domingo, mais
precisamente 11 de abril de 1982, denominada de "Comício pelos direitos de parir". Em
seguida, esse movimento se expandiu por outros países. (BALASKAS, 1993).
No Brasil, esse movimento ressurge com mais força na década de 90, através da
Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiros Obstetras (ABENFO), a qual incentiva
a criação dos centros de parto natural e/ou casas de parto, tendo apoio da fundação
Japonesa JICA.
Mas, até a presente data, a luta e aceitação do parto ativo ainda é uma realidade
distante e até certo ponto utópico para muitos profissionais da saúde e para muitas
gestantes, tendo em vista a visão distorcida que se disseminam quanto ao mesmo com
a finalidade em atender demandas mercadológicas e corporativas de profissões
hegemônicas da saúde, de modo específico em hospitais e maternidades do mundo
ocidental (MARTINHO, 2005).
Ainda se pode observar empiricamente nas unidades básicas de saúde e em
hospitais / maternidades que a maioria dos profissionais pré - natalistas concentram as
ações executadas durante a consulta pré-natal no foco biologicista, sem uma
abordagem efetivamente holística que considere e prepare a gestante como sujeito
ativo do processo de gestar e parir (MARTINHO, 2005).
Nessa perspectiva, o Grupo de Pesquisas Multiprofissionais em Educação e
Tecnologias em Saúde - PEMEDUTS/UFMT sentiu a necessidade em desenvolver um
Projeto de Pesquisa com interface na extensão intitulado: “Pré-natal humanizado:
Educação em saúde para o parto ativo”, do qual emergiu este estudo como recorte deste
processo construtivo de conhecimentos na área da saúde da mulher.
Objetivamos com esse estudo desvelar saberes / fazeres de profissionais da saúde
quanto ao significado e significância sobre pré-natal humanizado, visando promover
processos educativos quanto a educação em saúde durante o pré-natal para a gestante,
o companheiro e a família quanto ao parto ativo.
Enfatizamos que fenômenos observados empiricamente durante práticas
acadêmicas curriculares em unidades básicas de saúde (UBS) do município de Cuiabá –

316
MT e em um hospital público universitário, analogizados à leituras flutuantes em
literaturas pertinentes sobre parto ativo/humanizado, nos despertou a necessidade em
desenvolver este estudo visando desmistificar paradigmas que impedem profissionais
da saúde pré-natalistas, assim como usuárias gestantes, em compreenderem o
verdadeiro significado e significância do parto ativo para saúde e vida das mulheres,
filhos e consequentemente da família.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1. Pré- natal humanizado

A humanização do pré-natal se caracteriza por um atendimento à gestante de


forma holística, dando atenção aos aspectos biopsicossociais da mesma, ouvindo-a
atentamente e possibilitando que ela tome decisões conscientes a partir de saberes
adquiridos na consulta, os quais culminarão na decisão desta em optar por parto
natural, vaginal, erradicando os pré-conceitos e tabus inerentes aos mesmo
(CARVALHO, 2007).
O sucesso do pré-natal humanizado dependerá bastante da atuação do pré -
natalista, o qual deve ser competente para orientar convenientemente a gestante
reconhecendo a tempo os problemas ocorridos durante a gravidez e conduzindo-os
corretamente. Deve ser humano para entender e viver com a mulher as emoções da
gravidez orientando-a e esclarecendo as dúvidas para diminuir suas tensões e dedicado
ao ponto de dispensar todo tempo necessário para um atendimento adequado
(MARTINHO, 2005).

2.2. Parto ativo

Uma mulher dá a luz ativamente quando ela é capaz de secretar seus próprios
hormônios ou, em outras palavras não precise de hormônios sintéticos e/ou outras
intervenções médicas. Nesse contexto, o conceito de parto ativo foi introduzido para
mulheres que querem ter de volta o controle e a responsabilidade sobre o parto
(BALASKAS, 1993).
O parto ativo trata-se de uma forma de parturição no qual a parturiente reage
aos seus próprios instintos e a lógica fisiológica do seu corpo. Nesse tipo de parto a

317
gestante realmente fica no controle do seu corpo durante o processo de parir, não sendo
objeto de uma “conduta ativa” do parto pela equipe obstétrica (BALASKAS, 1993).
Balaskas (1993) enfatiza que as ações do Parto Ativo contribuirão para diminuir
a probabilidade de complicações na gravidez, assegurando que a gestante chegue ao
processo de parturição em ótimas condições de saúde, além de melhorar e apressar sua
recuperação, independente do que tenha acontecido.
No início da gravidez a mulher terá que se adaptar as transformações hormonais,
físicas e psicológicas que são normais nesse período inicial da concepção, sendo que ela
poderá em alguns momentos precisar conviver com cansaço ou náuseas incomodas.
Porém, depois de passado algum tempo, a gestante começará a sentir-se mais disposta,
confiante e desfrutará de uma sensação de vitalidade, saúde e bem-estar onde poderá
exercer as condutas preconizadas para o parto ativo para auxiliar a gestante no período
da gestação, pode-se utilizar exercícios de yoga. Tais exercícios são originários da Índia
e atualmente é praticado em todo o mundo (BALASKAS, 1993).
O conceito e os propósitos inerentes ao parto ativo se adaptaram conforme as
mudanças paradigmáticas que ocorreram no setor saúde e foram influenciadas pelas
transformações ocorridas nos processos pedagógicos da formação profissional e
educação escolar de maneira geral. Portanto, podemos dizer que se trata de um sistema
conceitual aberto (MACIEL, 2009).

2.3. Educação em saúde no pré-natal

Educar em saúde não se legitima pela realização de uma palestra, porque o


processo educativo não deve ser um monólogo, mas, um diálogo. Educação em saúde
é sobretudo mobilizar saberes existentes para transformações positivas à partir das
vivências e visão de mundo do educando (MARTINHO, 2014).
Na arte de educar em saúde saberes, fazeres e vivências são imbricados numa
construção de conhecimento para a práxis, ou seja, uma prática transformadora
(MARTINHO, 2014).
Educação em saúde no pré-natal é sobretudo uma ação dialógica entre as
mulheres e profissionais pré-natalistas (enfermeiros e médicos), visando o despertar da
consciência crítica à partir de saberes intercambiados quanto a importância dos
cuidados à saúde no período da gestação e do parto (MARTINHO, 2005).

318
A saúde é uma construção social, um conceito amplo e subjetivo, está imbricada
na educação, não havendo a existência de uma sem a presença da outra. Portanto, ações
para a manutenção e resgate da saúde devem ser precedidas por processos dialógicos
educativos (MARTINHO, 2014).

3. MATERIAL E MÉTODO

Este é um estudo descritivo, exploratório, com abordagem qualitativa.


Sampieri, Collado e Lucio (2006), descrevem que o enfoque qualitativo da
pesquisa em geral é utilizado para descobrir e refinar as questões da mesma. Esse
enfoque baseia-se em métodos de coleta de dados com descrições e observações,
nesses processos surgem questões flexíveis que se alternam entre os eventos e a forma
de interpretação, também entre as respostas e o desenvolver da teoria, tendo como
propósito a reconstrução de uma realidade tal qual observada pelos atores de um
sistema social predefinido.
Para Gil (2010) o estudo exploratório tem como objetivo tornar mais explicito o
problema, na tentativa de aprofundar as ideias sobre o objeto de estudo, enquanto a o
processo descritivo busca delinear as características da população ou de um fenômeno.
O planejamento deste tipo de estudo é flexível, pois deve considerar os mais variados
aspectos relativos ao fato ou fenômeno estudado.
O lócus desta pesquisa foi uma Unidade Básica de Saúde (UBS) da cidade de
Cuiabá – MT, cujo desenvolvimento da mesma se deu no período compreendido entre
dezembro de 2016 a junho de 2017, cujos participantes foram médicos e enfermeiros
que atavam na referida unidade, selecionados aleatoriamente com base nos critérios
descriminados abaixo:
Critérios de inclusão:
- Profissionais da saúde que estejam ativos e realizem consultas pré-natal na UBS
lócus do estudo;
Critérios de inclusão:
- Profissionais que não atuem na unidade lócus desta pesquisa ou que estejam
afastados do serviços por motivos diversos.

319
A coleta de dados ocorreu nos meses de abril e maio de 2017, logo após a
aprovação do referido projeto pelo Conselho de Ética em Pesquisas com seres Humanos
(CEP) do HUJM, tendo parecer aprovado com o nº 2.046.110/2017, conforme Resolução
466/2012 da CONEP/CNS/MS.
Esta etapa foi feita com base em um roteiro com temas geradores sobre pré-natal
humanizado e parto ativo (Apêndice A). Os referidos temas foram dialogados durante
rodas de conversa, perfazendo um total de três (03) rodas de conversa.
Ressaltamos que esta pesquisa foi desenvolvida obedecendo as recomendações
éticas inerentes à pesquisas em seres humanos preconizadas pela CONEP/CNS/MS.
Nesse contexto, antes do início da mesma, foi solicitado a assinatura do termo de
anuência pela representante da Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá (Apêndice B)
e do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) pelos profissionais da saúde da
UBSF lócus do estudo, sendo entregue uma via aos mesmos (Apêndice C).
Para compreensão dos resultados foi utilizada a técnica de análise temática e
processo de categorização segundo Bardin (2011), além, da triangulação com a
literatura e observações realizadas durante as rodas de conversa.
Esse processo sistemático de sistematização e análise dos dados seguiu as
seguintes etapas de execução:
1ª. Realização das rodas de conversa para coleta e transcrição dos dados
apreendidos nos discursos dos participantes;
2ª. Pré-análise: Esta etapa consistiu na leitura flutuante dos discursos transcritos.
A partir desta leitura emergiram os fenômenos significantes, possibilitando identificar
potenciais categorias discursivas a partir dos relatos dos profissionais;
3ª. Realização de leituras exaustivas dos conteúdos das falas agrupadas por
homogeneidade de semelhanças de sentidos, para a organização e sistematização dos
conteúdos, permitindo o agrupamento em grandes categorias;
4ª. Análises dos conteúdos das falas que foram reunidas por categorias,
identificando unidades de significados, procedendo-se aos agrupamentos finais;
5ª. Análise e compreensão dos dados, descrevendo as significâncias (sentidos)
dos conteúdos.
Franco (2007) ressalta que esses são pontos de partida para a análise, sejam elas
verbais, figurativas, gestuais ou diretamente provocadas, para que assim se identifique

320
o significado e sentido que os fenômenos expressos nas falas tiveram para os
participantes do estudo.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

O processo de organização e classificação dos dados permitiu a elaboração das


unidades temáticas: “Percebendo a humanização no pré-natal”, “(in)viabilidade do pré-
natal humanizado para o parto ativo”, “percepção dos profissionais sobre parto ativo” e
“Educar para o parto ativo”, as quais emergiram da análise das falas do profissionais
médicos, enfermeira e residentes de medicina nas três (03) oficinas supracitadas na
coleta de dados.

4.1. Categoria 1 - Percebendo a humanização no pré-natal

Nessa categoria os profissionais ressaltaram a importância de se estabelecer um


vínculo com as gestantes e familiares destas. Sendo a escuta ativa nas consultas uma
forma de legitimar esse elo de confiança e vínculo.
“(...) o pré-natal humanizado se dá através de uma parceria com a gestante (...)”
- Med. 01;
“(...) durante o pré-natal o profissional precisa preocupar-se com o contexto
familiar (...)” - Enfa. 02;
“(...) o pré-natal começa com o acolhimento na condução das consultas (...)”
Enfa. 01;
“(...) o pré-natal é humanizado quando a gestante é protagonista do cuidado (...)”
- Prof. 02;
“(...) esclarecendo as dúvidas e respeitando as escolhas das gestantes, gera
vínculo e humaniza o pré-natal(...)” - Med. 02;
“(...) desenvolvendo o diálogo de forma horizontal e dando espaço para a fala da
gestante, escutando-a atentamente, cria vínculo e humaniza o pré-natal (...)” -
Enfa. 01.
Zampieri & Erdmann (2010) corroboram as falas supracitadas, afirmando que é
importante devolver à mulher o protagonismo na gestação, no parto e pós-parto,
considerando-os como situações normais da vida e não como doenças, eventos
femininos que apresentam significados diferentes para as mulheres dos atribuídos pelos

321
profissionais. Nestes processos, o profissional deveria fazer parte da rede de apoio à
gestante, sem substituí-la, os autores fundamentam a percepção dos profissionais
quanto a importância da autonomia da mulher desde a pré concepção até o pós-parto.
Os atendimentos oferecidos as gestantes durante a consulta pré-natal precisam
contemplar a dimensão biopsicossocial das mulheres. Além da realização das manobras
de Leopold, solicitação dos exames laboratoriais e suplementação de sulfato ferroso
recomendada nas cartilhas do Ministério da Saúde.

4.2. Categoria 2 - Pré-natal humanizado para o parto ativo:


para que?

Os profissionais relataram certa frustração ao realizarem consultas de pré-natal


humanizadas. Apresentam séria críticas ao atendimento hospitalar e nas maternidades,
cujo modelo de atendimento destas instituições desconstrói o processo humanizado
proporcionado durante o pré-natal, tendo em vista que nestes cenários os profissionais
médicos não aceitam e nem aderiram ao parto ativo, desrespeitando os direitos das
gestantes no momento destas parirem.
“(...)é possível realizar o pré-natal humanizado apenas nas unidades de atenção
primaria, porém nos hospitais não vemos a humanização no atendimento(...)” -
Enfa. 01;
“(...) é possível fazer um pré-natal humanizado, porém tem sido muito
fragmentada a assistência, acredito que deveria haver uma conexão entre a
assistência primaria, secundária e terciaria.” – Med. 02;
“(...)a gente até orienta as gestantes sobre os seus direitos e sobre as vias do
parto, mas, quando elas chegam nos hospitais e maternidades são “obrigadas” a
parir conforme determina a rotina médica hospitalar(...)” – Enfa. 02;
“(...)O pré-natal humanizado ocorre na unidade básica de saúde, mas quando as
gestantes chegam na atenção hospitalar elas se deparam com uma assistência
impositiva (...)” - Med. 02.
As narrativas dos profissionais demonstram a inexistência de integralidade entre
a atenção primária, secundária e terciária. Sendo este fenômeno apontado como um
fator limitador para o empoderamento feminino e suas possíveis escolhas relacionadas
ao seu corpo, convicções e/ou cultura quanto ao momento de parir.

322
Segundo Pinheiro & Mattos (2001), a integralidade das ações de saúde em nível
micro deve ser fruto do esforço e da confluência dos vários saberes de uma equipe
multiprofissional para traduzir e atender as necessidades de saúde. Sendo plena quando
há articulação entre os serviços de saúde e destes com outras instituições sociais,
portanto, a integralidade ampliada é a relação articulada, complexa, complementar e
dialética entre o cuidado dado pelo profissional, pela equipe e rede de serviços de
saúde.
Os sentimentos de descontentamento e desmotivação implícitos nas narrativas
dos profissionais que realizam o pré-natal na UBS lócus desta pesquisa, nos fez
compreender a urgente necessidade de mobilização social para que se criem políticas
públicas estruturantes nos sistemas de saúde municipais, estaduais, tendo em vista que
mesmo tendo sido instituído pelo Ministério da Saúde através da Portaria/GM nº 569,
desde o ano de 2000 o Programa de Humanização no Pré-natal e nascimento, fato é
que na maioria dos hospitais e maternidades do país ainda prevalecem práticas
desumanas e violências obstétricas, além da prevalência da alta taxa de realização de
cesáreas desnecessárias. O que demonstra a inexistência de políticas estruturantes que
garantam um atendimento obstétrico humanizado e o direito das gestante em optarem
por qual tipo de parto querem parir seu filho e que esta seja respeitada e cumprida pelas
maternidades e hospitais.
Nesse contexto, consideramos também que é factual a necessidade dos cursos
de graduação em medicina repensem seus currículos, de modo a possibilitar aos futuros
médicos uma formação mais humanizada no contexto da ginecologia-obstetrícia,
respeito ao trabalho em equipe considerando os saberes e fazeres dos enfermeiros
obstetras nas salas de partos, considerando o protagonismo das mulheres no ato de
pariri e direito destas em optarem quanto a que profissional querem neste momento
singular de suas vidas, se querem um médico ou enfermeiro obstetra.

4.3. Categoria 3 - Parto ativo: realidade ou utopia?

Esta categoria corroborou a anterior, considerando que os relatos dos profissionais


reforçam o que afirmaram anteriormente quanto a não ser viável um pré-natal
humanizado. Entretanto, apresentaram dúvidas sobre o parto ativo e expressaram seus
descontentamentos com o sistema de saúde no nível atenção secundária.

323
“(...) O parto ativo está mais relacionado ao sentido obstétrico ou em relação à
gestante?” (Dúvida!) - Med. 02;
“(...)O parto ativo não é quando a mulher escolhe a via do parto que ela irá
querer? (Dúvida!)” - Enfa. 01;
“(...) na minha opinião o vínculo entre a atenção primária, secundária e terciária
é fraco no Brasil, impossibilitando o parto ativo. Não existe a tal integralidade.”
– Med. 01;
“(...) na unidade básica tem sido uma realidade o atendimento onde a gestante
é protagonista da sua concepção, mas, em centros hospitalares não é possível, é
mais difícil” - Enfa. 02;
“(...) há uma complexidade entre o que a gestante quer e o sistema de saúde
oferece no Brasil, principalmente aqui no Estado de Mato Grosso” - Med. 01;
“(...) durante o pré-natal fazemos um trabalho humanizado, porém, quando
chega a hora do parto a gestante não tem na maioria das vezes um bom
atendimento nas maternidades e hospitais” – Enfa. 02.
É evidente nesta categoria que os profissionais demonstram certa desmotivação
quanto a educar as gestante quanto ao parto ativo, por considerarem que a rede
hospitalar e maternidades não aderem ao mesmo. Sendo frustrante para eles saberem
que a mulher não terá o seu direito garantido quanto ao parto ativo ao chegar nestas
unidades de saúde para parir. Outra evidência é que existem lacunas quanto a
conhecimentos sólidos sobre parto ativo, assim como, em relação a sua viabilidade. Fato
que nos leva a inferir a latente necessidade de se repensar a formação dos profissionais
da saúde (médicos e enfermeiros) que poderão futuramente ser pré – natalistas, quanto
ao pré-natal humanizado com enfoque no parto ativo.
Segundo Silva, Strapasson & Fischer (2011), as práticas e os serviços de atenção
ao parto são influenciados pelos papéis desempenhados pela parturiente, pelos
profissionais que a assistem e pelo ambiente onde ocorre o evento. Sendo que, locais
com atendimento voltado a fisiologia do nascimento, onde a atuação de enfermeiros
obstetras e obstetrizes é garantida e respeitada, o parto ativo é mais preconizado,
ocorrendo práticas menos intervencionistas.
Em instituições nas quais somente médicos obstetras podem realizar o parto, a
parturiente na maioria das vezes é tratada apenas como mero objeto de manipulação e

324
intervenção médica, sem direito a ser protagonista do ato de parir. Portanto, o
comportamento das gestantes (ativa ou passiva frente a equipe), dos profissionais e o
ambiente físico, influenciam diretamente no ato de parir (MARTINHO, 2005).
Mudanças comportamentais só ocorrem a partir de um processo educativo
eficaz, daí a necessidade de mudanças na formação acadêmica dos profissionais da
saúde quanto a humanização do parto, este é o caminho para que políticas públicas
sejam efetivadas e transformações organizacionais ocorram nas instituições de saúde
no que tange ao respeito ao direito das mulheres e maior atuação dos enfermeiros
obstetras nas maternidades e hospitais.

4.4. Categoria 4 – Estratégias para educação em saúde de


gestantes no pré-natal

Os pré – natalistas (médicos e enfermeiras) participantes das rodas de


conversas, mencionaram algumas estratégias viabilizadoras para que se possa educar
em saúde para o parto ativo, sendo unânime entre eles a implantação de grupos de
gestantes nas unidades básicas de saúde e mais escuta qualificada e diálogos.
“(...)montar um grupo de gestantes e usar de tecnologias disponíveis na unidade
seria importante para troca de experiências entre elas, mais diálogo e escuta. Até
porque, devido à alta demanda de atendimento, muitas vezes não dá tempo de falar nas
consultas de pré-natal” – Enfa 1;
“A válvula de escape para as gestantes é a orientação fornecida nas consultas de
pré-natal (...)” - Med. 02;
“Orientar as pacientes, compreendendo que cada uma tem suas particularidades
e que cada parto se dá conforme o fisiológico da mulher” - Enfa. 02;
“Perguntar para a gestante no início do pré-natal, quem será o seu ou sua
acompanhante durante o parto e recomendar que esta pessoa participe de algumas
consultas, para que saiba como agir quando iniciar o trabalho de parto. Isso, acho que é
importante e humaniza o pré-natal” - Enfa. 01.
Nesta categoria é perceptível que na concepção dos profissionais participaram
deste estudo, que a formação de grupos de gestantes é uma estratégia para educá-las
quanto ao pré-natal e parto, considerando a escassez de tempo para um diálogo mais

325
profícuo com as mulheres durante as consultas de pré-natal, em consequência da alta
demanda de atendimentos.
As participantes enfermeiras em suas falas demonstraram uma visão mais
humanizada quanto ao pré-natal, as quais trouxeram elementos importante do
processo de humanização do cuidado a saúde, como: o diálogo e a participação de
alguém que seja do afeto da gestante (familiar ou não) durante o pré-natal, para poder
saber agir e dar suporte a gestante durante o processo de trabalho de parto.
Maldonado et al (1997), corrobora as enfermeiras afirmando que considerar a
participação e envolvimento da família ou outra pessoa do afeto da gestante no
processo gestacional é necessário e importante. A família passa a vivenciar e sentir a
gravidez de forma indireta junto com a mulher grávida, tornando-se “grávida” também,
além da segurança que a gestante sente ao ter ao seu lado alguém de sua confiança e
afeto.
Zampieri & Erdmann (2010), enfatizam que o cuidado humanizado no pré-natal
consiste em encontros terapêuticos, educativos e interdisciplinares para maior
compreensão das vivências, expressão de sentimentos e dúvidas. Além da avaliação do
bem-estar materno fetal, deve haver preparação para o parto, a maternidade e
paternidade, envolvendo as relações familiares, conjugais, os diálogos entre gestantes
e com os profissionais.
O sucesso do pré-natal dependerá bastante da atuação do pré - natalista, o qual
deve ser: Competente para orientar convenientemente a gestante reconhecendo em
tempo hábil os problemas ocorridos durante a gravidez e conduzindo-os corretamente;
ser humano para entender e viver com a mulher as emoções da gravidez, orientando-a
e esclarecendo as dúvidas para diminuir as tensões e dedicado ao ponto de dispensar
todo tempo necessário para um atendimento adequado (MARTINHO, 2005).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo nos possibilitou desvelar como os profissionais da atenção primária


em saúde, mais especificamente, de uma unidade de saúde da família, percebem e
desenvolvem as consultas de pré-natal sob o ponto de vista da humanização do cuidado.

326
Ficou evidenciado que existe um certo nível de desconhecimento entre os
profissionais em relação ao que seja um parto ativo na sua essência e que mesmo sem
esta compreensão os mesmos referem ser difícil as mulheres conseguirem nas
maternidades e hospitais este tipo de parto, consequência da formação e prática
principalmente dos médicos obstetras e das políticas organizacionais das instituições de
saúde.
As consultas de pré-natal nas unidades básicas de saúde ainda estão
centralizadas em procedimentos técnicos que contemplam pouco ou não consideram a
educação em saúde para o parto ativo como parte da conduta do pré-natalista. A
maioria das consultas tem enfoque apenas biologicista e buscam atender somente o que
preconiza as normas e rotinas dos manuais disponibilizados pela rede de atenção à
saúde.
Os fenômenos desvelados apontam que ainda existem lacunas na formação dos
profissionais pré-natalistas (médicos e enfermeiros), no que tange a realização de um
pré-natal essencialmente humanizado que prepare a gestante e família para um possível
parto ativo.
Consideramos a partir dos fenômenos identificados neste estudo, que se faz
necessário repensar a formação acadêmica nos curso nos cursos de medicina e
enfermagem, os quais devem introduzir em seus respectivos currículos teoria e prática
sobre pré-natal humanizado e parto ativo, assim como, educação em saúde para o parto
ativo durante as consultas de pré-natal, visando a diminuição da elevada incidência de
partos iatrogênicos, violências obstétricas e realização de procedimentos cirúrgicos de
cesáreas desnecessárias, consequentemente baixando a morbimortalidade materna
no Brasil.

AGRADECIMENTOS

Aos colegas do Grupo de Pesquisas Multiprofissionais em Educação e


Tecnologias em Saúde (PEMEDUTS) da Faculdade de Medicina da Universidade Federal
de Mato Grosso (UFMT), pelas discussões e aprendizagem coletiva;
Aos profissionais de Saúde que aceitaram colaborar com esta pesquisa,
participando deste estudo e socializando seus saberes e fazeres;

327
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além das divergências e convergências. Rev. Bras. Saúde Matern. Infant., Recife,
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328
CAPÍTULO XXV

AVALIAÇÃO HIGIÊNICO-SANITÁRIA DE ALFACE (LACTUCA SATIVA L.)


COMERCIALIZADA IN NATURA EM RESTAURANTES SELF-SERVICE NO MUNICÍPIO
DE MARINGÁ-PR
Polyana de Souza Costa ¹
Augusto Curione ²
Sara Macente Boni ³
¹ Mestranda em Ciências da Saúde. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde – UEM
² Especialista em Diagnóstico por Imagem. Hospital Israelita Albert Einstein
³ Docente do Departamento de Biomedicina. Unicesumar

RESUMO

Atualmente, a preocupação com a saúde e a rotina acelerada vem obrigando o


consumidor a optar por alimentos mais saudáveis e variados. Assim, os restaurantes se
tornaram ótima opção para as principais refeições do dia. As frutas, verduras e legumes
vêm ganhando muito espaço no prato da população. A alface é uma hortaliça rica em
diversos tipos de vitaminas e em fibras, além de ter um baixo teor calórico. Servida in
natura, necessita de grandes cuidados em sua manipulação e higienização. Este estudo
objetivou fazer avaliação higiênico-sanitária de folhas de alface servidas em
restaurantes self-service do município de Maringá- PR. Para isso, foram coletas 20
amostras da hortaliça em restaurantes distintos e analisadas quanto a presença de
coliformes totais e termotolerantes, Staphylococcus aureus e Salmonella spp. Dezenove
amostras apresentaram-se positivas para coliformes totais e termotolerantes,
apresentando colônias características de E.coli, 10 para Staphylococcus aureus e uma
amostra apresentou resultado positivo para Salmonella spp. Os resultados indicam que
os estabelecimentos analisados necessitam de medidas higiênico-sanitária mais
rigorosas para o manuseio e higienização destes alimentos.

Palavras-chave: Doenças Transmitidas por Alimentos. Inspeção de Alimentos. Alface.


Restaurante. Contaminação de Alimentos.

329
1. INTRODUÇÃO

A rotina acelerada e cansativa da atualidade, a grande concentração de pessoas


nos centros urbanos, a crescente participação da mulher no mercado de trabalho e a
distância existente entre a moradia e o trabalho, acabam interferindo muito na
alimentação da população, levando ao aumento de refeições feitas fora de casa.
Associado a este cenário, a busca ativa de melhores hábitos de saúde faz com que as
pessoas optem por restaurantes que propiciam uma alimentação mais saudável e
balanceada (AKUTSU et al., 2005; BALTAZAR et al., 2006).
Como os alimentos servidos em restaurantes já se encontram prontos para o
consumo, acredita-se em sua qualidade higiênico-sanitária e que não oferecerão riscos
à saúde de seus consumidores. Entretanto, alguns estabelecimentos acabam por não
seguir rigorosamente as boas práticas de fabricação estabelecidas pela legislação
brasileira, seja pela grande demanda ou pela falta de treinamento do manipulador dos
alimentos. Além das contaminações poderem ocorrer na hora do preparo e manuseio
dos alimentos, esta também pode advir da exposição em que os alimentos sofrem,
podendo ser a causa de Doenças Transmitidas por Alimentos (DTA’s) (BALTAZAR et al.,
2006; SILVA JR., 2014).
Os alimentos têm várias funções no organismo, dentre elas a manutenção,
prevenção e recuperação da saúde. Por isso, a escolha da dieta deve ser cuidadosa,
optando por alimentos saudáveis, variados, agradáveis ao paladar e, principalmente,
seguros de acordo com as características higiênico-sanitárias regulamentadas (AMSON,
G. V.; HARACEMIV, S. M. C.; MASSON, M. L, 2006; MARTINS, 2011).
A inclusão de frutas, verduras e legumes no cardápio diário da população está
cada vez maior (CALIL et al., 2013). A alface (Lactuca sativa L.), é uma das hortaliças mais
consumidas em todo o território brasileiro. Originária da Europa e Ásia, é fonte de
diversas vitaminas, fibras e sais minerais, além de ter baixíssimo teor calórico. Porém,
sua ingestão na forma in natura pode favorecer a transmissão das DTA’s (BRASIL, 2011;
CALIL et al., 2013). Entre 2000 e 2011, estas hortaliças foram responsáveis por 12,5%
dos surtos alimentares ocorridos no Brasil (BRASIL, 2011).
As DTA’s constituem um dos maiores problemas de saúde pública da
contemporaneidade, causando grandes perdas econômico e sociais, acarretando em

330
incapacidade laboral, gastos com tratamento e estudos epidemiológicos, prejuízos na
área de turismo e no comercio de alimentos. Esta enfermidade abrange sintomas como
náuseas, vômitos, dores de cabeça, prostrações, diarreias, cólicas abdominais, variando
de incômodos leves e passageiros até consequências graves e letais dependendo da
reação do organismo, da bactéria causadora e vários outros fatores (NYACHUBA, 2010;
WELKER et al., 2010; FLORES & MELO, 2015).
A incidência destas doenças está em constante aumento (MARINHO, 2015).
Dentre os principais patógenos relacionados a estas enfermidades estão Salmonella spp,
Escherichia coli e Staphylococcus aureus (SANTOS et al., 2015). Staphylococus aureus
pertence ao grupo das bactérias Gram positivas, que possuem disposição em cachos.
Sua parede celular possui cápsulas que a protegem inibindo a quimiotaxia e fagocitose,
além de ser rica em peptídeoglicano proporcionando maior rigidez a parede desse
micro-organismo (ALMEIDA et al., 2016). Esta espécie bacteriana é produtora de
enterotoxinas, encontrado na microbiota dos seres humanos em locais como a pele,
boca e orofaringe e sua presença em alimentos indica contaminação advinda de seus
manipuladores ou até dos próprios consumidores ao irem se servir (SANTOS et al., 2015;
FLORES & MELO, 2015).
Salmonella é um bacilo Gram negativo, anaeróbio facultativo, capaz de produzir
ácido e gás utilizando carboidratos, além de ser catalase positiva e oxidase negativa e
poder crescer utilizando citrato como única fonte energética. (HENTZ & SANTIN; 2010).
Esta destaca-se com grande importância clínica, pois apresenta alta endemia e
mortalidade relevante, além de ser de difícil controle por existir em uma grande
variedade de alimentos. Escherichia coli, da família das Enterobactérias, apresenta
caráter Gram negativo na forma de bastonete, encontrado principalmente no intestino
de animais de sangue quente. O seu encontro em alimentos está diretamente
relacionado com a falta dos processos higiênico-sanitárias, principalmente em seu
processamento (LIMA & SANTOS; 2016).
A contaminação da alface por bactérias pode ocorrer desde o início de sua
produção, onde, por muitas vezes, é utilizado adubo orgânico e água sem tratamento
para o cultivo, contribuindo para a contaminação com bactérias e parasitos. O
transporte demonstra ser outro fator de contaminação dessas hortaliças por ser feito
em engradados abertos. Há, ainda, as condições higiênico-sanitárias errôneas às quais

331
essas hortaliças são expostas em seu manuseio no estabelecimento onde será
comercializada para o consumo (QUEIROZ et al 2016). Diante disso, o presente estudo
buscou avaliar a qualidade microbiológica da alface (Lactuca sativa L.) servida nos
restaurantes self-service no município de Maringá - PR.

As ilustrações deverão estar assinaladas no texto, com identificação na parte


superior, precedida da palavra Figura, centralizada, seguida de seu número de ordem
de ocorrência no texto, em algarismos arábicos, do respectivo título. Na parte inferior,
deve ser indicada a fonte, legenda, notas e outras informações necessárias.

2. METODOLOGIA

Foram coletadas amostras de alface de 20 restaurantes do tipo self-service do


município de Maringá-PR. A coleta se deu no balcão de exposição do alimento, como
consumidores que optaram por levar o alimento para consumir em casa. Os
restaurantes foram escolhidos por estarem inseridos em regiões universitárias, onde há
grande fluxo de consumidores. As amostras foram acondicionadas em embalagens de
isopor, sem contato manual, e transportadas em caixa térmica contendo gelo ao
Laboratório de Microbiologia da Unicesumar, para pesquisa de coliformes totais,
coliformes termotolerantes, Salmonella ssp. e Straphylococcus aureus. As análises
ocorreram em até 2 horas após a coleta.
No laboratório, as amostras foram homogeneizadas assepticamente e uma
unidade analítica de 25g da amostra transferida para 225 ml de água peptonada
esterilizada (0,1%) e homogeneizadas por 2 minutos. A partir desta solução mãe, foram
preparadas diluições até 10-3 e posteriormente incubadas por 24 horas para
enriquecimento (PINHEIRO et al., 2005).
As análises microbiológicas foram realizadas segundo metodologias descritas em
American Public Health Association (APHA, 2001). Para a pesquisa de coliformes totais
e termotolerantes foi utilizado à técnica do Número Mais Provável (NMP), usando Caldo
Lauril Sulfato de Triptose (LST), Caldo Lactosado Verde Brilhante (VB) e Caldo Escherichia
coli (EC). A prova presuntiva para análise de coliformes totais e termotolerantes baseou-
se na inoculação das amostras em LST. Os tubos foram incubados a 35-37ºC por 24 a 48

332
horas para verificar o crescimento e produção de gás. Para a confirmação de coliformes
totais, as amostras nos tubos com caldo Lauril positivos foram transferidas para tubos
com Caldo VB sendo incubado a 35-37ºC por 24 horas para verificação do crescimento
e produção de gás. Para a detecção de coliformes termotolerantes, uma alíquota de
cada tubo de LST positivo foi transferida para os tubos de Caldo EC e incubadas a 45-
45,5ºC por 24 horas para análise de crescimento microbiano e produção de gás.
A contagem de Staphylococcus aureus (UFC/g) foi realizada por espalhamento
em superfície em meio de ágar Manitol e incubado a 35-37°C, por 24-48 horas. A
confirmação das colônias foi efetuada pelos seguintes ensaios: coloração de Gram, teste
de catalase e teste de coagulase.
A pesquisa de Salmonella spp em 25 g de amostras foi realizada com pré-
enriquecimento, em Água Peptonada Tamponada (APT), com incubação a 35°C, por 24h,
seguida de enriquecimento seletivo, em caldo Selenito Cistina, Caldo Tetrationado e
caldo Rappaport incubados, respectivamente, a 35°C e 42°C, por 24h. O isolamento de
Salmonella sp foi realizado em ágar Xilose Lisina Desoxicolato (XLD) e ágar Hektoen
incubados a 35°C, por 24-48h. A partir das colônias suspeitas que cresceram nos meios
seletivos, foi realizada a identificação de Salmonella spp, através da metodologia do kit
de enterobactérias (Newprov®) conforme orientações do fabricante.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Das 20 amostras de alface analisadas, 1 (5%) estava contaminada com


Salmonella spp. e 5 (25%) apresentavam coliformes termotolerantes em valores
superiores a 103 NMP/g, com características de colônia de E. coli. Estas contaminações
indicam que 30% (6/20) do total das amostras estavam impróprias para o consumo
humano, segundo a RDC N°12 de 02 janeiro de 2001 (Brasil, 2001). Esta resolução
estabelece que hortaliças, legumes e similares in natura prontos para o consumo devem
conter no máximo 10² NMP/g de coliformes termotolerantes e ausência de Salmonella
spp. em 25 gramas do alimento analisado (BRASIL, 2001).
Os resultados aqui encontrados são inferiores aos dados apresentados por
Pereira & Hoffmann (2011), que demonstraram positividade para coliformes
termotolerantes em 80% das amostras de verduras minimamente processadas

333
comercializadas na cidade de São José do Rio Preto - SP. Essa diferença de valores pode
ser atribuída ao baixo número de amostras avaliadas em nosso estudo, ou devido ao
fato do desrespeito às normas de manipulação de alimentos serem bem mais severas
na cidade de São José do Rio Preto - SP. Estudos apresentam resultados próximos aos
obtidos pela presente pesquisa, no qual parte das amostras também encontravam-se
inaptas para o consumo humano, com 30% e 15,3% respectivamente, de positividade
para coliformes termotolerantes (ARAÚJO et. al., 2014; MENDES, COELHO E AZEREDO,
2011).
As amostras da hortaliça analisada apresentaram a alta incidência de coliformes
totais (70%), sendo que 60% (12/20) apresentaram concentração superior a 1,1 x 103
NMP/g. Foi observada a presença de Staphylococcus aureus em 10 (50%) amostras
analisadas. Embora não exista legislação específica para estas bactérias na alface,
demostra-se uma considerável contaminação microbiana que pode ser justificada pela
manipulação e/ou acondicionamento inadequados destes alimentos, indicando
deficiência na qualidade higiênico-sanitária das folhas servidas nesses restaurantes.
Considerando os resultados obtidos, os estabelecimentos que comercializam a
alface para ser consumido de imediato e in natura em Maringá – PR apresentam déficit
de padrões higiênico-sanitário. Deve-se ter cuidado maior durante a preparação e
manuseio do alimento, que pode estar passando por procedimento de lavagem
incorreta das folhas, condições inadequadas dos utensílios utilizados em sua
higienização, ou, ainda, sendo contaminados através do manipulador de alimentos e
pelos clientes que ali frequentam.
Dos surtos relacionados com a alimentação, 88% tem comprovada origem em
restaurantes (MARMENTINI, R. P.; RONQUI, L.; ALVARENGA, V. A, 2015). Portanto, faz-
se necessário a tomada de medidas para a efetiva redução de contaminação dos
alimentos servidos fora do domicílio. Estas ações devem envolver o consumidor, com
adoção de práticas seguras na alimentação (MAGNONI et al., 2016) e o estabelecimento
comercial, com os devidos cuidados no manuseio das folhas de alface. Além disso, a
ação de fiscalização dos locais de produção, transporte e comercialização dos alimentos,
objetivando a promoção das boas práticas de fabricação, deve ser efetiva por parte do
governo (SAÚDE, 2017).

334
A falta de coerência na utilização dos Equipamentos de Proteção individual
(EPI’s), principalmente por reutilização de material descartável ou falta de treinamento
para sua correta utilização, e a incorreta higienização das mãos dos manipuladores de
alimentos, são considerados fatores de risco para um possível surto alimentar
(MEDEIROS et al., 2015). Para minimizar estas falhas, a Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (ANVISA) lançou, em 2004, a Cartilha sobre Boas Práticas para Serviços de
Alimentação que devem ser seguidas por todos os estabelecimentos alimentícios.
Treinamentos contínuos, a fim de manter o funcionário atento aos riscos de
contaminação dos insumos e a constante tentativa de evitá-la, tem se mostrado
bastante eficaz no controle microbiológico dos alimentos (FORTES et al., 2018).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se que a alface servida em parte dos restaurantes do tipo self-service de


Maringá-PR encontra-se em desacordo com o que preconiza a legislação brasileira sobre
contaminação mínima permitida em alimentos, o que os torna impróprios para
consumo. As altas taxas de coliformes totais e termotolerantes encontradas, além da
presença de Salmonella spp e S. aureus em algumas amostras, tornam este alimento um
risco à saúde de seus consumidores. Desta forma, se torna necessário que estes
estabelecimentos adotem medidas para redução dessa contaminação, bem como
realizar treinamentos aos manipuladores dos alimentos a fim de evitar ao máximo a
contaminação das hortaliças e dos demais alimentos.

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transmitidas por alimentos (DTA) ocorridos no estado do Rio Grande do Sul,
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338
CAPÍTULO XXVI

ATUAÇÃO DO ENFERMEIRO FRENTE AO CÂNCER DA MAMA MASCULINA NA


ATENÇÃO BÁSICA
Loraine Silva Ferroni ¹
Fabíola Vieira Cunha ²
Rosana Maria Faria Vador ³
Maria Cristina Martins Alvarenga 4
Andreara de Almeida e Silva 5
¹ Graduanda do curso de Enfermagem. Instituto Taubaté de Ensino Superior – ITES
² Coordenadora e Professora Titular do Departamento de Enfermagem. Instituto Taubaté de Ensino Superior – ITES
³ Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem. Instituto Taubaté de Ensino Superior – ITES
4 Enfermeira Mestre e Coordenadora do Programa de Imunização do Município de São José dos Campos - SP
5 Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem. Instituto Taubaté de Ensino Superior – ITES

RESUMO

Introdução: O câncer de mama é uma neoplasia predominante no sexo feminino, porém


pouco é abordado pelos serviços preventivos de saúde e escasso nas literaturas quanto
ao aparecimento deste tipo de câncer na população masculina. Logo, reforça-se a
importância de realizar investigações acerca dessa temática, sobretudo com enfoque no
nível primário, por se constituir porta de entrada para os serviços de saúde. Neste
contexto o enfermeiro, tem papel fundamental no desenvolvimento de ações de
promoção e prevenção de agravos quanto ao câncer da mama masculina. Objetivo:
Identificar as ações à serem realizadas pelos enfermeiros frente ao câncer da mama
masculina na atenção básica. Metodologia: Revisão integrativa da literatura. Realizou-
se uma busca e foram selecionados 20 artigos publicados em português e espanhol, no
período de 2015 a 2020, nas bases de dados LILACS, SciELO, CAPES. Resultados: As
principais dificuldades identificadas quanto à atuação do enfermeiro na atenção básica
foram o desconhecimento do câncer da mama masculina pelo homem, falta de recursos
(políticas públicas, protocolos), resistência do homem em frequentar serviços de saúde,
desconhecimento do autoexame das mamas pelo homem, déficit de estudos e
literaturas científicas, construções socioculturais masculinas, falta de reconhecimento
da mama como parte do corpo masculino e desconhecimento do câncer da mama
masculina pelos enfermeiros. Portanto, foi proposto um fluxograma que busca auxiliar
o atendimento do homem pelo enfermeiro da atenção básica quanto à prevenção e
diagnóstico precoce do câncer da mama masculina. Conclusão: No que se refere ao
enfermeiro, verificou-se que o papel desse profissional na atenção básica à saúde
precisa ser ampliado. A definição de suas ações na atenção primária deve ser regida pela
política vigente. Para tal foi proposto um modelo fluxograma visando apoiar o
enfermeiro no plano de assistência aos usuários com câncer da mama masculina.

Palavras-chave: Enfermeiro. Neoplasias da Mama Masculina. Atenção Primária à Saúde.

339
1. INTRODUÇÃO

Câncer é o resultado da multiplicação descontrolada de células de um tecido ou


órgão, que podem vir a invadir locais vizinhos, por meio da circulação sanguínea ou do
sistema linfático. O câncer de mama (CM) é uma neoplasia predominante no sexo
feminino, porém pouco é abordado pelos serviços de saúde e escasso nas literaturas
quanto ao aparecimento deste tipo de câncer na população masculina. (Costa, Adorno,
Araújo, Saback, Gomes, 2019; Guimarães, 2015).
Apesar de raro, o câncer da mama masculina (CMM) tem aumentado em todo
mundo, correspondendo a 0,5 - 1% de todos os canceres de mama. No ano de 2017,
causou 203 mortes na população masculina, além de que quando comparados com
outras neoplasias no sexo masculino, o de mama não tem valores tão expressivos,
entretanto, com o crescimento do número de casos pela má qualidade de vida e pela
dificuldade de se efetuar diagnóstico precoce, há necessidade de ações voltadas para
seu controle. (Azevedo, Monteiro, 2018; Guimarães N, 2015; INCA, 2020).
Através de sua prevenção, seja pelo autoexame, prática de hábitos saudáveis,
comparecimento aos serviços de saúde para detecção precoce é possibilitado ao
portador desta neoplasia, um tratamento efetivo e com menor chance de mortalidade.
Para isto, o homem deve aprender a reconhecer a mama como parte de si e ser
implementadas diversas ações na atenção primária à saúde quanto à sua prevenção,
para que o identifique nos estágios iniciais e dê início ao tratamento o mais
precocemente possível. (Sousa, 2020).
Entretanto, a inserção do homem na atenção básica (AB) que é a porta de
entrada preferencial do Sistema Único de Saúde (SUS) é árdua e associada a impasses,
que variam nos âmbitos sociais, culturais, ocupacionais, institucionais, o que leva a
mantê-los distante das medidas preventivas e acostumados a buscar serviços de saúde
somente quando adoecem, além de impossibilitar atingir os objetivos da Política
Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem que visam o aumento da expectativa
de vida e a redução dos índices de morbimortalidade por causas preveníveis e evitáveis
na população em questão. (Azevedo, Monteiro, 2018).
Tendo em vista diversos empecilhos, a atuação do enfermeiro acerca da
prevenção e diagnóstico precoce do câncer da mama masculina fica dificultada e

340
custosa, visto que neste contexto, este profissional tem papel fundamental no
desenvolvimento das ações de promoção e prevenção de agravos do câncer da mama
masculina. (Dantas, Pereira, Alencar, Sousa, Farias, 2015).
Pela falta de atenção desta neoplasia no homem, foi levantado o seguinte
questionamento: Por que o câncer da mama masculina na atenção básica é tão pouco
abordado pelos enfermeiros? Assim, o presente estudo trata-se de uma revisão
integrativa da literatura com o objetivo de identificar as ações à serem realizadas pelos
enfermeiros frente ao câncer da mama masculina na atenção básica. Realizou-se uma
busca nas bases de dados LILACS, SciELO e Portal CAPES de artigos publicados no período
de 2015 a 2020 e foram selecionados 20 artigos em português e espanhol.
Portanto, através deste estudo objetivou-se levantar as principais dificuldades
da atuação do enfermeiro da atenção básica frente à prevenção e diagnóstico precoce
do câncer da mama masculina e propor estratégias direcionadas aos mesmos para
correta e efetiva abordagem do homem, visando promoção e a educação a respeito
desta neoplasia, minimizando a falta de informação e conscientização por parte dos
homens, além de estimular o seu autocuidado.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1. Câncer da mama masculina

Quanto ao câncer, podemos defini-lo como um conjunto patologias que


apresentam como principal característica o crescimento desordenado das células do
corpo humano. Estas células acabam multiplicando-se de uma maneira muito veloz,
agressiva e incontrolável, acarretando o desenvolvimento de tumores, que muitas
vezes, acabam se espalhando do seu ponto inicial de formação para outras regiões do
corpo. Logo, quando este processo de multiplicação desordenado ocorre nas mamas,
gera-se o câncer de mama. Sendo apontado pelo INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER
(INCA), a neoplasia que mais causou morte em mulheres no ano de 2017, totalizando
16.724 óbitos. (INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER- INCA, 2019).
Entretanto, o câncer de mama também pode acometer o sexo masculino,
mesmo que raramente e representando apenas 1% do total de casos desta neoplasia e
0,17% de todos os carcinomas no sexo masculino, visto que a mama é encontrada em

341
ambos os sexos, sendo semelhantes, mas somente nas mulheres que elas se
desenvolvem e apresentam funcionalidade. No homem, a mama se apresenta muito
rudimentar, em menores dimensões, constituída de tecido subcutâneo, tecido
gorduroso, ductos mamários, mamilo e aréola. Sendo que atrás do mamilo, podemos
encontrar uma pequena porção de tecido glandular. (INCA, 2019; Rodrigues, Bezerra,
Passos, 2018; Ramos, Rodrigues, Silva, Balbino, Souza, Silvino, 2017).
O CM, revela-se por meio de uma massa indolor e firme, tendo como sinal
primário, na maioria dos casos, o nódulo mamário, além da retração ou inversão
mamilar, o espessamente da pele, a formação de crostas e a ulceração, já a secreção
mamilar pode ser encontrada nos aspectos serosa e/ou serosanguinolenta. (Sousa,
Martins, Freitas, Guimarães, 2017).
A causa do CMM ainda não foi definida, porém uma série de fatores como os
extrínsecos, comportamentais e genéticos elevam o risco de desenvolvimento. No que
tange aos fatores de riscos desta patologia, podemos citar a idade, pois a incidência de
CMM está intimamente ligada ao avanço da idade, tendo a maior incidência na década
dos 60 anos, a etnia, visto que os negros são os mais afetados. Além do histórico familiar
que contribui consideravelmente para o desenvolvimento da doença, pois os indivíduos
que apresentam casos na família possuem um risco de aquisição de 2 a 3 vezes mais do
que os que não possuem histórico. Os distúrbios hormonais, como o aumento do
estrogênio, propiciam a proliferação de células malignas no tecido mamário. (Salomon,
Mendonça, Pasqualette, Pereira, Sondermman, 2015; Araujo, Julião, Leite, Jabbar, Neto,
Freitas, 2019).
Para os aspectos epidemiológicos voltados ao CMM de uma forma geral, a
relação de incidência da neoplasia entre os ambos os sexos, permite estimar que a cada
1000 novos casos de CM apenas 1 ocorrerá em homens. A Organização Mundial Da
Saúde (OMS), por meio da Agência Internacional para Pesquisa do Câncer (International
Agency for Research on Cancer - IARC) estimou para o CMM em 2012, uma incidência
global estimada em cerca de 8 mil casos por ano. (Barros, 2016).
No continente africano, nos deparamos com uma alta incidência de CMM, sendo
fundamentada pelos africanos manifestarem um elevado número de doenças hepáticas
endêmicas, que na maioria da vezes, acarretam à insuficiência hepática, elevando o nível
de estrogênio na corrente sanguínea devido à alteração na metabolização hormonal,

342
com números de casos que variam de 5 a 15 por 100 mil habitantes. Na Europa e EUA a
quantidade de casos é considerada baixa, tendo em média, um caso para cada 100 mil
habitantes, enquanto no Japão, os números de casos se apresentam ainda mais baixo,
0,5 para cada 100 mil habitantes. (Barros, 2016).
No Brasil, enquanto aos aspectos epidemiológicos do CMM, os estudos
mostram-se escassos, associado com a inexistência de estimativas pelo INCA, pois o
máximo de informação que obtemos ao consulta-lo sobre CMM é que trata-se de um
câncer raro, representando apenas 1% do total de casos da doença. Entretanto, o
Sistema De Informação De Câncer (SISCAN) permite visualizar o número de casos de
CMM em algumas cidades das 5 regiões do nosso país. (Barros, 2016).

Tabela 2- Número de casos de câncer da mama masculina de 2014 a 2018 em São Paulo/Sudeste
consultados em 16/03/2020
SÃO PAULO/SUDESTE
ANO NÚMERO DE CASOS
2014 14
2015 15
2016 14
2017 12
2018 15
Fonte: SISCAN (2020)

Tabela 3- Número de casos de câncer da mama masculina de 2014 a 2018 em Rio Grande Do Sul/Sul
consultados em 16/03/2020
RIO GRANDE DO SUL/SUL
ANO NÚMERO DE CASOS
2014 7
2015 5
2016 1
2017 1
2018 0
Fonte: SISCAN (2020)

343
Tabela 4- Número de casos de câncer da mama masculina de 2014 a 2018 em Mato Grosso/Centro-
Oeste consultados em 16/03/2020
MATO GROSSO/CENTRO-OESTE
ANO NÚMERO DE CASOS
2014 2
2015 1
2016 2
2017 1
2018 1
Fonte: SISCAN (2020)

Tabela 4- Número de casos de câncer da mama masculina de 2014 a 2018 em Bahia/Nordeste


consultados em 16/03/2020
BAHIA/NORDESTE
ANO NÚMERO DE CASOS
2014 1
2015 5
2016 0
2017 10
2018 16
Fonte: SISCAN (2020)

Tabela 5- Número de casos de câncer da mama masculina de 2014 a 2018 em Amazonas/Norte


consultados em 16/03/2020
AMAZONAS/NORTE
ANO NÚMERO DE CASOS
2014 0
2015 0
2016 0
2017 0
2018 1
Fonte: SISCAN (2020)

Enquanto ao diagnóstico do CMM, ele ocorre da mesma maneira que o câncer


da mama feminina (CMF). Consistindo em um conjunto de análise da história clínica,
exames de imagem e estudo anatomopatológico. A mamografia é um exame muito

344
utilizado para diagnosticar o CM em mulheres, visto que quando aplicada ao CMM,
apresenta sensibilidade e especificidade de, respectivamente, 92% e 90%, porém, para
os homens é escusável, uma vez que há existência de indícios que apontam a eficiência
apenas da suspeita clínica a partir do exame físico aliado a confirmação histológica por
meio de biópsia, além de que devido ao tamanho da mama masculina apresentar-se
muito menor que a das mulheres, dificulta sua manipulação durante o exame, sendo
preferencialmente realizada apenas em homens obesos, por possuírem um maior
volume de mama. Podemos também contar com a ultrassonografia, como um
instrumento de auxilio no diagnóstico, pois permite a avaliação do comprometimento
linfonodal. (Cypriano, 2017; Guimarães C, 2019; Lima, 2015).
O tratamento para CMM é estabelecido por intervenções cirúrgicas que engloba
a ressecção completa do tecido mamário, dos mamilos e o esvaziamento axilar, seguidas
ou não de radioterapia e quimioterapia, além de hormonioterapia, seguindo a mesma
vertente do tratamento para CMF. Tendo em vista, que a eficiência dos tratamentos
para CM e sua recuperação total anda ao lado da descoberta precoce. (Araújo, Leite,
Amorin, Silva, Fernandes, Carmo 2018; Guimarães C, 2019).

2.2. Política Nacional De Atenção Básica

Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) através da Portaria nº 2.436 de 21


de setembro de 2017, estabelece a revisão de diretrizes para organização da AB, no
âmbito do SUS.
A PNAB é definida por um conjunto de ações de saúde, considerando o sujeito
em sua singularidade, na complexidade, na integralidade e na inserção sócio-cultural,
desde o âmbito individual até o coletivo, visando a busca da promoção de sua saúde, a
prevenção e tratamento de doenças até a redução de danos ou de sofrimentos que
possam comprometer suas possibilidades de viver de modo saudável. (Zapponi,
Tocantins, Vargens, 2015).
Essas ações de saúde são baseadas em alguns princípios como a universalidade
que visa garantir o acesso universal do usuário aos serviços de saúde, a equidade que
consiste na oferta de cuidado de acordo com as carências dos indivíduos, reconhecendo
suas diferenças e a integralidade que disponibiliza um conjunto de serviços executados

345
pela equipe de saúde que visa atender as necessidades do indivíduo ou comunidade de
forma integral. (Ministério da Saúde, 2017).
Segundo a Política Nacional Atenção Básica de 2017 referente a atribuições
específicas do Enfermeiro:
I- Realizar atenção à saúde aos indivíduos e famílias vinculadas às
equipes e, quando indicado ou necessário, no domicílio e/ou nos
demais espaços comunitários (escolas, associações entre outras),
em todos os ciclos de vida;
II- Realizar consulta de enfermagem, procedimentos, solicitar exames
complementares, prescrever medicações conforme protocolos,
diretrizes clínicas e terapêuticas, ou outras normativas técnicas
estabelecidas pelo gestor federal, estadual, municipal ou do Distrito
Federal, observadas as disposições legais da profissão;
III- Realizar e/ou supervisionar acolhimento com escuta qualificada e
classificação de risco, de acordo com protocolos estabelecidos;
IV- Realizar estratificação de risco e elaborar plano de cuidados para as
pessoas que possuem condições crônicas no território, junto aos
demais membros da equipe;
V- Realizar atividades em grupo e encaminhar, quando necessário,
usuários a outros serviços, conforme fluxo estabelecido pela rede
local;
VI- Planejar, gerenciar e avaliar as ações desenvolvidas pelos
técnicos/auxiliares de enfermagem, ACS e ACE em conjunto com os
outros membros da equipe;
VII- Supervisionar as ações do técnico/auxiliar de enfermagem e ACS;
VIII- Implementar e manter atualizados rotinas, protocolos e fluxos
relacionados a sua área de competência na UBS; e
IX- Exercer outras atribuições conforme legislação profissional, e que
sejam de responsabilidade na sua área de atuação. (Ministério da
Saúde, 2017).

2.3. Política Nacional De Atenção Integral à Saúde do Homem


(PNAISH)

Tradicionalmente, considera-se o sexo masculino mais forte quando comparado


ao feminino. Desde o nascimento, é estipulado ao homem, o desenvolvimento de um
perfil competitivo, corajoso, destemido, poderoso, violento, invulnerável, provedor e
protetor, além de obrigatoriamente, suportarem, sem chorar, suas dores físicas e
emocionais. (Coelho, Schwar, Bolsoni, Conceição, 2018).
Pelos motivos citados acima atrelados a outras condições, como o pensamento
mágico dos homens que rejeita a possibilidade de adoecer, constata-se que a população
masculina frequenta menos os serviços de Atenção Primária à Saúde quando comparada
a feminina. Podemos confirmar este fato por meio de um estudo transversal, realizado
em serviços de saúde do município de Ribeirão Preto/SP, com 320 participantes, onde

346
concluiu-se que as mulheres buscam os serviços de saúde quase duas vezes a mais do
que os homens. E também pela porcentagem de consultas em que os homens
comparecerem por ano, sendo que em 2010, o número total de consultas médicas para
homens entre 20 e 59 anos de idade registrado no SUS foi de 3.217.197, resultou uma
média de 0,06 consulta/homem/ano. (Carneiro, Santos, Macena, Vasconcelos, 2016;
Coelho, Schwar, Bolsoni, Conceição, 2018).
Comportamento no qual é influenciado por diversos fatores como o estereótipo
de gênero, julgar-se invulnerável, posição de papel provedor e responsabilidade pelo
sustento da família. Além disso, os serviços e as estratégias de comunicação nitidamente
privilegiam as ações de saúde voltadas para as crianças e adolescentes, as mulheres e
os idosos, além de que o horário de funcionamento dos serviços de saúde coincide, na
maioria das vezes, com o horário de trabalho dos homens. Portanto, essas barreiras
socioculturais e institucionais acabam contribuindo com a elevação da
morbimortalidade do homem. (Ministério da Saúde, 2009).
No ano de 2009, passou-se a reconhecer as condições de saúde do sexo
masculino no Brasil como um problema de saúde pública. Implementando então, a
Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), pela Portaria
GM/MS nº1944, de 27 de agosto de 2009 voltada prioritariamente para a população
masculina na faixa 20 a 59. (Carneiro, Santos, Macena, Vasconcelos, 2016).
A PNAISH implantada em 2009 busca viabilizar a melhora das condições de saúde
e vida do homem no Brasil, contribuindo com a diminuição dos índices da morbidade e
mortalidade dessa população. Por meio do enfrentamento dos fatores de risco e
mediante a facilitação ao acesso, às ações e aos serviços de assistência integral à saúde
garantindo a universalidade e equidade nas ações e serviços de saúde voltados para a
população masculina. (Ministério da Saúde, 2009).

2.4. Dificuldades da atuação do enfermeiro quanto à


prevenção e diagnóstico precoce do câncer da mama masculina
na Atenção Básica

A atenção básica é responsável por promover ações de promoção e prevenção


de saúde através de programas destinados a toda população. O sexo masculino é
caracterizado por ser o público que menos frequenta os serviços de saúde dificultando

347
a assistência pelos profissionais enfermeiros no âmbito da AB, além de elevar o índice
de morbimortalidade desse grupo por diversas doenças, inclusive as neoplasias
mamárias. Situação na qual, sendo realizado exames e consultas periódicas pode ser
evitada ou minimizada e através de um diagnóstico precoce as chances de um
tratamento eficaz aumenta consideravelmente. (Macêdo, Ribeiro, Oliveira, Bezerra,
Lima, Sousa, 2016; Vaz, Souza, Filho, Santos, Cavalcante, 2018).
As atribuições dos enfermeiros na AB são previstas através da Portaria nº 2.436,
de 21 de setembro de 2017 que aprova a Política Nacional de Atenção Básica, e visam
desde a promoção, prevenção, proteção, o diagnóstico, tratamento, reabilitação,
redução de danos, até os cuidados paliativos e vigilância em saúde a todas as
populações. (Ministério da Saúde, 2017)
Logo, os enfermeiros para cumprirem suas reais delegações determinadas pela
PNAB, necessitam ser treinados, capacitados e ter sua abordagem direcionada pelo
setor governamental responsável pela administração e manutenção da saúde pública
do país, no caso, o Ministério da Saúde (MS) para correta condução da prevenção e
diagnóstico precoce do CMM desde a realização de orientações sobre a existência da
neoplasia e importância do autoexame até a suspeita clínica propriamente dita, após o
exame físico na consulta de enfermagem. (Ministério da Saúde, 2017).
Entretanto ao consultar o Consenso para Controle do Câncer de Mama publicado
publicada pelo MS em 2004 e as Diretrizes para Detecção Precoce do Câncer de Mama
no Brasil publicada pelo INCA em 2015 não é possível encontrar diretrizes e ações
específicas para o CMM, mostrando a falta de material teórico para conduzir as
condutas dos enfermeiros voltadas a prevenção de CM em homens, os deixando
despreparados. (Cypriano, 2017).
O fato do CMM ser relativamente raro quando comparado ao câncer da mama
feminina associado ao baixo índice de suspeita clínica acarretam ao atraso do
diagnóstico e, consequentemente, o mesmo ocorre geralmente em estágios mais
avançados, levando a um prognóstico não tão positivo quando descoberto
precocemente. (Azevedo, Monteiro, 2018).
Sabe-se que a suspeita clínica ocorre após o exame físico por um profissional de
saúde ou após o autoexame das mamas, porém a atenção a mama masculina se dá
somente quando o homem relata sinais e sintomas intensificados, graves e tardios como

348
a presença de nódulo doloroso, retração ou ulceração do mamilo, sinais inflamatórios
como o edema mamário devido a sua ausência nas instituições de promoção e
prevenção de saúde e visto que, por tratar-se de uma neoplasia com baixa expressão
epidemiológica, não há, atualmente, programas de rastreio a nível populacional.
(Azevedo, Monteiro; 2018; Oiticica, 2016).
Outra fator que leva a dificuldade da abordagem do homem na AB quanto a
prevenção e diagnóstico precoce do câncer da mama masculina é que desde
antigamente, as instituições privilegiam as ações de saúde voltadas a criança, o
adolescente, a mulher e o idoso por serem classificados como os indivíduos mais frágeis
de toda a população, o que acabou gerando o hábito dos homens a evitar o contato com
os espaços da saúde, aversão à prevenção e ao autocuidado, além de levar os
enfermeiros e os demais profissionais de saúde ao costume de desenvolverem ações de
saúde com foco nas populações mais vulneráveis. (Ministério da Saúde, 2009; Oiticica,
2016).
Assim, o despreparo dos profissionais de saúde para lidar com essa problemática
específica atrelado a inexistência de atenção ao CMM pelos órgãos governamentais e
raridade de sua ocorrência evidenciam que esta patologia não vem recebendo a atenção
que deveria, além de que sua ascensão aos logos dos anos está acontecendo
gradativamente, e que a propagação de informações sobre o CM ao homem não está
ocorrendo, dificultando o processo de identificação precoce de casos e como
consequência, diminuição das chances de cura, além da sobrecarrega dos demais níveis
de saúde. (Trajano, Menezes, Caldas, Souza, Lima, Alves; 2018).

2.5. Atuação do enfermeiro quanto à prevenção e diagnóstico


precoce do câncer da mama masculina na atenção básica

Por intermédio da prevenção, o profissional enfermeiro se adentra no âmbito da


saúde como aliado poderoso à redução dos índices de acometidos pelo CMM.
Denominada como a arte do cuidar, a assistência de enfermagem fornece um cuidado
pleno, científico e com caráter preventivo, pois são importantes multiplicadores das
ações de prevenção, além de nenhum profissional de saúde ter um contato tão
prolongado e próximo com o cliente como o enfermeiro. (Pereira, Oliveira, Andrade,
2018).

349
A atuação do enfermeiro quanto à prevenção e detecção precoce do CMM na
atenção primária à saúde (APS) é fundamental para estimular à adesão do homem a
realizar ações preventivas contra esta neoplasia. Levando em consideração a PNAB e a
PNAISH, o enfermeiro possuí um papel fundamental na AB, pois à ele é encarregado o
atendimento integral ao homem, a consulta de enfermagem, o exame clínico e a
realização de visita domiciliar. (Braga, Silva, Paiva, Targino, Gomes, Pinto et al., 2017;
Teixeira, Goldnan, Gonçalves, Guitiérrez, Figueiredo, 2017).
Destacam-se como atribuições do enfermeiro no controle do CM: realizar
consulta de enfermagem onde o profissional fará o levantamento do histórico do
paciente, incluindo fatores de risco; o exame clínico das mamas, além de solucionar
empecilhos no ato exame, como por exemplo, a vergonha, devido à exposição das
mamas, levando-o ao desconforto do homem; examinar e avaliar sinais e sintomas
relacionados à neoplasia; solicitar e avaliar exames de acordo com os protocolos locais;
encaminhar e acompanhar nos serviços de referência para diagnóstico e/ou tratamento;
realizar e participar das atividades de educação permanente como palestras educativas,
orientação com relação aos fatores de riscos, incentivando a prática de alimentação
saudável e de exercícios físicos, o distanciamento de vícios e o autoexame das mamas.
(Fonseca, Rodrigues, Nóbrega, Nobre, França, 2016; Teixeira, Goldnan, Gonçalves,
Guitiérrez, Figueiredo, 2017).
Quanto ao desenvolvimento de ações educativas para o autoexame das mamas
(AEM) é oportuno para o enfermeiro realizá-la durante a consulta de enfermagem, cujo
momento é fundamental, pois o profissional de enfermagem possui autonomia em
acentuar as orientações, abordando aspectos mamários normais e aspectos
característicos do CMM. (Cunha, Almeida, Fontinele, Junior, Oliveira, 2018).
Portanto, a participação efetiva do profissional enfermeiro na AB referente ao
CMM está diretamente ligada ao desenvolvimento de ações de autocuidado, tornando
o homem participativo, consciente de seu potencial quanto a prevenção do CMM, logo,
promovendo saúde. (Fonseca, Rodrigues, Nóbrega, Nobre, França, 2016).
Diante do exposto, foi proposto um modelo de fluxograma visando apoiar o
enfermeiro no plano de assistência aos usuários com câncer da mama masculina na rede
básica de saúde, conforme Figura 1:

350
Figura 1 - Proposta de fluxograma quanto à abordagem do homem acerca da prevenção e diagnóstico
precoce do câncer da mama masculina na consulta de enfermagem na atenção básica.

351
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio desta pesquisa, pode-se observar que a ocorrência do câncer da mama
masculina vem aumentando gradativamente ao longo dos anos e em consequência
demandando mais atenção, não obstante, diversas dificuldades impedem a atuação do
enfermeiro do primeiro nível de atenção à saúde contra esta neoplasia no homem.
A neoplasia mamária no homem acarreta em consequências fatais na maioria
dos casos, mostrando-se a necessidade de mais pesquisas para disseminação do tema e
desenvolvimento de programas de rastreio precoce de câncer na mama masculina,
visando o diagnóstico precoce.
No que se refere ao enfermeiro, verificou-se que o papel desse profissional na
atenção básica precisa ser ampliado. A definição de suas ações na atenção primária deve
ser regida pela política vigente. Para tal, foi proposto um modelo fluxograma visando
apoiar o enfermeiro no plano de assistência aos usuários com câncer da mama
masculina.

REFERÊNCIAS

COSTA, Mário Clodoaldo Batista da, ADORNO, Stefano dos Santos, ARAÚJO, Sebastião
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