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“Aquela triste e leda madrugada”
Aquela triste e leda madrugada,
Cheia toda de mágoa e de piedade,
Enquanto houver no mundo saudade
Quero que seja sempre celebrada.
Ela só quando, amena e marchetada,
Saía, dando ao mundo claridade,
Viu apartar-se d’ua outra vontade,
Que nunca poderá ver-se apartada.
Ela só viu as lágrimas em fio,
que duns e doutros olhos derivadas,
s'acrescentaram em grande e largo rio.
Ela viu as palavras magoadas,
que puderam tornar o fogo frio,
e dar descanso às almas condenadas.
Tema: Saudade.
Assunto: A madrugada assistiu à separação de duas pessoas que nunca se deveriam ter
afastado.
Outras informações:
-Neste soneto, assiste-se à personificação da madrugada.
Recursos de Estilo
Anáfora: “Ela (inicio 2ª,3ª e 4ª estrofe)
Antítese: “triste e leda”
Dupla Adjectivação: “triste e leda madrugada” “grande e largo rio”
Hipérbole: “grande e largo rio”
Perguntas:
1-Especifica o desejo expresso pelo sujeito poético na primeira estrofe.
R: O sujeito poético pretende chamar que aquele amor não foi esquecido por ninguém:
“Quero que seja sempre celebrada”
2-Sabendo que o poeta desenvolve o tema da dor da separação, qual é o papel da
madruga nessa separação?
R: O papel da madrugada nessa separação é de testemunha ou cenário.
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3-Justifica a caracterização da madrugada como “triste e leda”.
R: A madrugada sentia-se triste porque estava a assistir à separação de duas pessoas que
nunca deveriam ter sido separadas, e também se sentia alegre porque estava a dar lugar
a uma manhã alegre e amena.
Um mover de olhos, brando e piadoso,
Um mover de olhos, brando e piadoso,
Sem ver de quê; um riso brando e honesto,
Quase forçado; um doce e humilde gesto,
De qualquer alegria duvidoso;
Um despejo quieto e vergonhoso;
Um repouso gravíssimo e modesto;
Üa pura bondade, manifesto
Indício da alma, limpo e gracioso;
Um escolhido ousar; úa brandura;
Um medo sem ter culpa; um ar sereno;
Um longo e obediente sofrimento:
Esta foi a celeste fermosura
Da minha Circe, e o mágico veneno
Que pôde transformar meu pensamento.
Tema: mulher ideal
Assunto: O sujeito poético descreve os valores morais da mulher ideal.
Recursos de Estilo
Metáfora: “mágico veneno”
Perguntas
1-Explica o poder que essa mulher tem sobre o sujeito poético
R: Com toda esta beleza, ela consegue transformar-lhe o pensamento, o que significa
que ele fica apaixonado.
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Ondados fios de ouro reluzente
Ondados fios de ouro reluzente,
Que agora da mão bela recolhidos,
Agora sobre as rosas estendidos
Fazeis que sua graça se acrecente;
Olhos, que vos moveis tão docemente,
Em mil divinos raios encendidos,
Se de cá me levais alma e sentidos,
Que fora, se de vós não fora ausente?
Honesto riso, que entre a mor fineza
De perlas e corais nace e parece,
Se n'alma em doces ecos não o ouvisse!
Se imaginando só tanta beleza,
De si, em nova glória, a alma se esquece,
Que será quando a vir? Ah! Quem a visse!
Recursos de Estilo
Hipérbole: “Em mil divinos raios”
Metáfora: “Fios de ouro reluzente” “De perlas e corais”
Perguntas
1-“Honesto Riso”, interpreta a expressão transcrita.
R: O honesto riso, transmite a sua honestidade. Uma qualidade social que ela possui.
2-Lábios e dentes são representados de forma poética e valorativa. Explica como.
R: São representados de forma poética e valorativa através da utilização da metáfora
“perlas e corais” que são dois elementos da natureza de excepcional e extraordinária
beleza.
3-Este soneto apresenta o retrato de uma mulher bela? Ou o retrato da beleza?
Qual das sugestões te parece mais de acordo com o poema? Justifica a tua opinião.
R: O retrato da beleza, considerando que aqui estão presentes características que
apontam para um ideal de beleza no seu todo e não propriamente para a beleza de uma
única mulher.
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Amor é um fogo que arde sem se ver
Amor é um fogo que arde sem se ver,
É ferida que dói, e não se sente;
É um contentamento descontente,
É dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata, lealdade.
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Tema: Amor
Assunto: O sujeito poético faz a definição do amor, mas no
ultimo terceto conclui que não o sabe definir.
Outras informações
Neste soneto, toda a caracterização do amor é feita com paradoxos, ideias que se
excluem, o que nos mostra as duas faces do amor. Por um lado um sentimento puro e
reconfortante e por outro lado, um sentimento capaz de produzir as maiores mágoas e o
mais forte sofrimento.
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E enfim converte em choro o doce canto.
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E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.
Tema: mudança
Assunto: O sujeito poético fala sobre as mudanças que se vão sucedendo.
Recursos de Estilo
Anáfora: “Mudam-se/Mudam-se/muda-se/muda-se”
O dia em que eu nasci, moura e pereça
O dia em que eu nasci, moura e pereça,
Não o queira jamais o tempo dar,
Não torne mais ao mundo e, se tornar,
Eclipse nesse passo o sol padeça.
A luz lhe falte, o sol se lhe escureça,
Mostre o mundo sinais de se acabar,
Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,
A mãe ao próprio filho não conheça.
As pessoas pasmadas, de ignorantes,
As lágrimas no rosto, a cor perdida,
Cuidem que o mundo já se destruiu.
Ó gente temerosa, não te espantes,
Que este dia deitou ao mundo a vida
Mais desgraçada que jamais se viu!
Tema: Desconcerto pessoal
Assunto: O sujeito poético fala sobre o tempo em que nasceu, revelando sentimentos
disfóricos de que esse acontecimento nunca se devia ter acontecido.
Recursos de Estilo
Anáfora: “Não/ Não”
Hipérbole: “Mais desgraçada que jamais se viu” “Nasçam-lhe monstros, sangue chova
o ar”
Metáfora: “Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar”
Perguntas
1-Nas duas primeiras estrofes sucedem-se, por acumulação, “pragas”,
“maldições”. A quem se dirigem?
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R: Dirigem-se ao tempo (dia) em que o sujeito poético nasceu.
Oh, como se me alonga, de ano em ano
Oh, como se me alonga, de ano em ano,
A peregrinação cansada minha!
Como se encurta, e como ao fim caminha
Este meu breve e vão discurso humano!
Vai-se gastando a idade e cresce o dano;
Perde-se-me um remédio, que inda tinha;
Se por experiência se adivinha,
Qualquer grande esperança é grande engano.
Corro após este bem que não se alcança;
No meio do caminho me falece,
Mil vezes caio, e perco a confiança.
Quando ele foge, eu tardo; e, na tardança,
Se os olhos ergo a ver se inda parece,
Da vista se me perde e da esperança.
Tema: Desconcerto Pessoal
Assunto: Fala sobre a esperança que o sujeito poético teve ao longo da sua vida e
respectivas consequências
Recursos de Estilo
Paradoxo: ”Como se me alonga/Como se encurta”
Enquanto quis Fortuna que tivesse
Enquanto quis Fortuna que tivesse
Esperança de algum contentamento,
O gosto de um suave pensamento
Me fez que seus versos escrevesse.
Porém, temendo Amor que aviso desse
Minha escritura a algum juízo isento,
Escureceu-me o engenho co tormento,
Para que seus enganos não dissesse.
Ó vós que Amor obriga a ser sujeitos
A diversas vontades! Quando lerdes
Num breve livro casos tão diversos,
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Verdades puras são, e não defeitos...
E sabei que, segundo o amor tiverdes,
Tereis o entendimento de meus versos!
1. Assunto: Enquanto o destino (Fortuna) permitiu que alimentasse a esperança
de alguma felicidade, o poeta dedicou-se a escrever os efeitos da mesma,
naturalmente em versos amorosos. Porém, o Amor, temendo que seus enganos
fossem divulgados, secou-lhe a inspiração. Assim, aqueles a quem o Amor
sujeita às suas insconstâncias, mesmo que, em tais versos, leiam casos tão
diferentes (quiçá contraditórios), deverão considerá-los verdades puras, e não o
contrário, sendo que as compreenderão tanto melhor, quanto mais larga for a sua
experiência amorosa.
2. Estrutura interna bipartida:
1ª parte, constituída pelas quadras.
Esta 1.ª parte está, igualmente, subdividida: na primeira quadra,
observamos o papel coadjuvante do destino (Fortuna) e, na
segunda, confrontamo-nos com o carácter oponente do Amor
(nome também atribuído a Cupido, filho de Vénus).
Note-se que a transição da primeira para a segunda quadra é feita
através do conector (conjunção) adversativo "porém", o que,
desde logo, antecipa a adversidade nela contida.
2ª parte, constituída pelos tercetos, em que o poeta, apostrofando os que
se sujeitam aos caprichos do Amor, adverte para a autenticidade de seus
versos, cujo entendimento será tanto melhor quanto maior a experiência
(porventura dolorosa) do mesmo amor.
3. A estrutura interna bipartida também se faz notar ao nível da progressão das
formas verbais: nas quadras, o tempo dominante é o pretérito perfeito do
indicativo, que nos dá conta das posições assumidas por cada uma das entidades
("quis" (Fortuna); "fez" (o gosto de um suave pensamento); "escureceu-me"
(Amor)); nos tercetos, a par do presente do indicativo ("obriga"; "são") e do
futuro imperfeito do conjuntivo ("lerdes"; "tiverdes"), sobressaem o imperativo
("sabei") e o futuro do indicativo ("tereis"), associados à apóstrofe utilizada ("Ó
vós").
4. Algumas figuras de estilo: anástrofe (vv. 1, 4, 5, 8, 11, 12); hipérbato (vv.
5/6); metonímia (v. 5 (Amor, o Cupido, tomado pelo próprio sentimento do
amor); antítese (estabelecida entre a atitude adjuvante da Fortuna, na primeira
quadra, e a de oponente, por parte do Amor, na segunda); apóstrofe (v. 9).