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A Democracia No Mundo Digital - Wilson Gomes

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Robson Santos
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A Democracia No Mundo Digital - Wilson Gomes

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DADOS DE ODINRIGHT

Sobre a obra:

A presente obra é disponibilizada pela equipe eLivros e


seus diversos parceiros, com o objetivo de oferecer
conteúdo para uso parcial em pesquisas e estudos
acadêmicos, bem como o simples teste da qualidade da
obra, com o fim exclusivo de compra futura.

É expressamente proibida e totalmente repudíavel a venda,


aluguel, ou quaisquer uso comercial do presente conteúdo.

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poder, então nossa sociedade poderá enfim evoluir a
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AGRADECIMENTOS

Os originais deste livro foram generosamente discutidos


pelos pesquisadores do Centro de Estudos Avançados em
Democracia Digital e Governo Eletrônico da Universidade
Federal da Bahia. Agradeço imensamente a Dilvan Azevedo,
Rodrigo Carreiro, Maria Paula Almada, Lucas Reis, Tatiana
Dourado, Eurico Matos, Pedro Mesquita, Maria Dominguez,
Robson Carneiro e Samuel Barros pelas críticas, correções e
sugestões oferecidas.
NOTA DO EDITOR

Por se tratar de tema que reúne um grande número de


termos e expressões em inglês que são de uso universal
ou não contam ainda com tradução ideal para o
português, optamos por não usar itálico para tais
ocorrências ao longo do texto – exceção feita aos títulos
de obras citadas e às palavras que não fazem parte do
jargão relacionado ao assunto do livro. Consideramos
que o uso recorrente do formato itálico terminaria por
trazer desconforto à leitura.
SUMÁRIO

Apresentação
Prefácio
Introdução
Capítulo 1
1970-1995: as origens da ideia de democracia
eletrônica – a teledemocracia
À democracia, via tecnologia
A teledemocracia como projeto
As dimensões da democracia digital
O registro da opinião do público
Informações, dados
Debate, discussão, comunicação horizontal
A tomada de decisão
Capítulo 2
1996-2005: a consolidação da ideia de democracia
digital
A democracia digital decola
O impacto da tecnologia na democracia: a controvérsia dos
efeitos
A fase dos modelos de democracia
Enfrentando as últimas resistências
Capítulo 3
2006-2015: o estado da democracia digital
Uma nova internet
Temas e tendências nos últimos anos
Novas tendências na democracia digital
Para concluir
Referências
Sobre o autor
Créditos
ESDE FINS DOS ANOS 1990, com a difusão da
D internet, palavras como interação, colaboração, troca,
recombinação e compartilhamento passaram a organizar
não apenas a gramática das redes digitais, mas também
parte da própria dinâmica social. Trata-se de um conjunto de
expressões ligadas a formas de produção e distribuição de
informações e saberes que descortinam novos cenários,
cobrando-nos esforços reflexivos para compreender seus
efeitos, tanto pelas perspectivas da comunicação e da
cultura como pelos vieses da educação, da economia e da
política.
Hoje, é patente o alcance das redes de conexão digital
em um país de dimensões continentais como o Brasil. Se,
por um lado, a internet promove a dinamização sem
precedentes das interações remotas e o exponencial
incremento do acesso e da produção de conteúdo, por
outro, nota-se em seus ambientes uma acirrada disputa
pelas atenções (e adesões), que se vão revelando
concentradas em um leque limitado de plataformas, sites e
aplicativos.
Sob o crescimento do uso das redes no País, temas como
liberdade, direitos humanos, igualdade social, censura,
gênero e raça povoam o cotidiano dos fóruns virtuais, não
raro facultando alternativas ao tipo de abordagem
desenvolvida nos meios tradicionais de comunicação, como
o rádio, a TV e a imprensa escrita. Isto se deve, entre outros
fatores, à relativização da divisão entre aqueles que pautam
e aqueles que consomem a informação, na medida em que
essa fronteira vai sendo apagada.
Uma vez que a expansão da rede alavanca a
multiplicação do volume de dados e da sua correlata
disseminação na esfera pública, assim como estimula a
participação de crescente número de pessoas nas
discussões sobre assuntos de interesse comum, caberia nos
perguntarmos sobre o real impacto, no debate público,
dessa forma de circulação de informações e vozes.
Nesse sentido, é promissora a constituição de uma
coleção que se proponha a reunir autores brasileiros
dedicados a pensar as dinâmicas ensejadas pelas redes
digitais de conexão, investigando a sua influência sobre os
rumos da democracia. Organizada pelo sociólogo e doutor
em Ciência Política Sérgio Amadeu da Silveira, a coleção
Democracia Digital convida pesquisadores do campo da
cultura digital a se debruçarem, a partir de diferentes
abordagens, sobre a recente história dessa ambivalente
relação.
A presente obra, A democracia no mundo digital: história,
problemas e temas, de Wilson Gomes, torna-se, no rumo
desta coleção, um caminho mais seguro para nos guiarmos
pelo histórico desta democracia que se desenha em formato
que somente na contemporaneidade poderia se dar. Um
itinerário, como declara o autor, no acompanhamento da
formação de uma ideia nova e transformadora, quer seja
pelas tortuosidades do ineditismo, quer no peso da tradição
que muitos termos utilizados para a compreensão num
âmbito maior carregam.
Pautando-se por uma linguagem clara e direta, a coleção
pretende despertar, em igual medida, o interesse tanto de
pesquisadores da área de tecnologia e comunicação como
de um público leitor mais abrangente, que se vê envolvido
em seu cotidiano com aparatos tecnológicos
permanentemente conectados. Em formato digital, faz uso
de um suporte hábil em ampliar as possibilidades de acesso
a estudos acerca de aspectos centrais da vida
contemporânea. Dessa forma, reforça o papel da leitura
como expediente-chave da educação concebida em bases
emancipatórias, utilizando a tecnologia digital como
ferramenta propícia a um espaço social crítico, inventivo e
renovador.

Danilo Santos de Miranda


Diretor Regional do Sesc São Paulo
IDAS CONECTADAS EM FLUXOS de dados de altíssima
V velocidade a partir de dispositivos georreferenciados. No
passado, pareceria ficção. Atualmente parece uma
descrição banal, um lugar-comum. Nosso cotidiano está
repleto de tecnologias da informação que passaram a
intermediar grande parte de nossas interações sociais. As
esperanças tecnológicas se avolumam e viram peças de
marketing, criam lealdades e paixões às marcas das
grandes corporações que vendem aparelhos de última
geração. Mas os saltos das tecnologias descortinam
cenários de riscos e distopias. O temor da automação, da
predição algorítmica, da inteligência artificial ou do controle
das corporações sobre os viventes vem gerando pesquisas e
ficções.
Para discutir, a partir das ciências humanas e sociais, a
complexa relação entre tecnologia e as sociedades
democráticas, lançamos a coleção Democracia Digital, com
textos que abordam temas estreitamente ligados à
expansão das tecnologias, como a cultura hacker, a
produção do comum, a propriedade intelectual, os
algoritmos e a democracia. A coleção reúne reflexões sobre
as implicações das tecnologias digitais, basicamente
cibernéticas (Wiener), em sociedades que podem ser
denominadas de controle (Deleuze), em um capitalismo
informacional (Castells), de vigilância (Zuboff), estruturado
em plataformas (Srnicek), delimitado por uma ordem
neoliberal (Laval, Dardot).
Neste volume, um dos mais importantes da coleção, o
professor e pesquisador Wilson Gomes conseguiu reunir, de
modo crítico e criativo, abordagens teóricas da democracia
digital, das origens do conceito no século XX aos nossos
dias, articulando noções das disputas e das soluções
pensadas aos entraves e possibilidades abertas pelo
aparecimento de tecnologias mais recentes, mais ágeis e
mais pervasivas. Trata-se, por isso, de leitura indispensável
para quem pesquisa, estuda ou se interessa pelo tema,
pois, apesar do rigor teórico, foi escrito para ser lido e
compreendido por não especialistas.
Vale a pena acompanhar a jornada relatada por Gomes.
Particularmente, considero impressionante que se tenha
acreditado e depositado esperanças na televisão para
organizar a participação da sociedade. Hoje, a
teledemocracia pode parecer descabida, mas demonstra
que as tecnologias têm despertado a esperança de pessoas
que buscam superar ou resolver as questões das relações
de poder social pela técnica. Uma das principais heranças
da modernidade.
Articulando as teorias da democracia digital, o autor trata
da participação política nas redes digitais, da chamada e-
deliberação, da estruturação da esfera pública diante da
internet, dos entraves e dos avanços da e-transparência e
da exclusão digital como um dos limites do processo
democrático. Embora tentando se manter nos trilhos do
tema central, Gomes dificilmente poderia cumprir sua
missão sem tratar ou acenar para a participação política
online e para as questões dos governos e parlamentos
digitais.
Este livro vem preencher, portanto, uma lacuna na
literatura científica sobre democracia digital. Em tempos
sombrios, de grave crise, de dúvidas sobre as condições
democráticas do nosso país, esse livro nos faz pensar além
das possibilidades das tecnologias digitais para melhorar a
qualidade da democracia, da representação política e dos
processos de deliberação e participação.
É bom lembrar que as tecnologias digitais se realizam
pela cibernética, a ciência da comunicação e do controle. A
internet é uma rede em que os rastros digitais deixados
pelos seus usuários são agregados e analisados por
corretores de dados que os identificam e os vendem para as
empresas de marketing. As redes de relacionamento online
estão concentrando as atenções de cidadãs e cidadãos
conectados e nelas têm ocorrido os grandes embates das
disputas eleitorais nas democracias ocidentais nessa
segunda década do século XXI. Curiosamente, surgem
intensos debates sobre a corrosão das democracias em
ambientes tecnologicamente mediados devido à opacidade
dos algoritmos e códigos que os controlam, devido à
velocidade das chamadas fake news, da adesão aos rituais
da pós-verdade, enfim, à gigantesca concentração de
tráfego em poucas plataformas tecnológicas. Nesse sentido,
as questões aqui trazidas por Wilson Gomes podem nos
ajudar a compreender o papel ambivalente das tecnologias
para as democracias.

Sergio Amadeu da Silveira


STE LIVRO PRETENDE FORNECER UM ITINERÁRIO
E para que o leitor possa acompanhar a formação da ideia
de democracia digital, isto é, a concepção segundo a qual
recursos tecnológicos, projetos baseados em tecnologias da
comunicação e até as experiências de uso pessoal e social
das tecnologias de comunicação e informação podem ser
empregados para produzir mais democracia e melhores
democracias. A história da ideia de democracia digital é a
história da implementação da e-democracia em projetos e
experimentos, mas também, de forma não planejada, nos
usos sociais da tecnologia. Além disso, é também a história
da fala pública, nos ambientes políticos ou nos meios de
comunicação, na forma de discursos, publicações e debates,
sobre o que a tecnologia poderia ou deveria fazer pela
democracia, ou contra ela. Por fim, é a história da atenção
acadêmica ou científica à e-democracia, da bibliografia
sobre o tema desde as primeiras formulações até os
desenvolvimentos contemporâneos, da formação e
consolidação de linhas e tendências de pesquisa, da
constituição do campo científico da democracia digital.
Os três elementos estão mais ou menos documentados e,
até pela brevidade desta história, está ainda disponível em
grande parte a memória de todo o percurso. Mas o estudo
da atenção acadêmica fornece o caminho mais promissor,
por duas razões. Em primeiro lugar, artigos, capítulos, livros,
trabalhos em anais e papers são materiais mais confiáveis,
mais abundantes e mais disponíveis de forma completa. O
discurso científico tem a obrigação de ser sistemático,
cuidadoso e abrangente, o que não pode ser dito dos outros
dois tipos de materiais. Em segundo lugar, a publicação
científica reflete, trata e tem frequentemente como objeto,
durante todo o tempo, os projetos e o debate público sobre
a democracia digital. O contrário não seria verdadeiro, uma
vez que os experimentos e os debates na esfera pública,
por exemplo, não necessariamente refletem o estado da
arte da pesquisa e, como estão concentrados em responder
a funções específicas, dificilmente mantêm à vista a
totalidade dos problemas e-democráticos pertinentes
naquele momento.
A reconstituição das grandes linhas da história da ideia de
democracia digital, portanto, baseia-se diretamente na
atenção acadêmica dada ao tema nos últimos 45 anos. E,
indiretamente, no debate público e nos experimentos
conduzidos ao longo desses anos, uma vez que estes se
refletem na atenção científica. Foi usado um acervo de
pouco mais de dois mil títulos, coletado e classificado por
mim ao longo dos últimos dez anos, principalmente em
inglês e português1, que constitui, sob qualquer métrica
empregada, a literatura de referência da área de
democracia digital. Quando necessário, lancei mão de parte
de outro acervo, coletado do mesmo modo, com cerca de
2.500 títulos das áreas de governo digital e política online2.
A partir daí foi possível constituir uma representação gráfica
da área (seus temas, suas tendências), que, disposta numa
linha cronológica, nos revela o percurso da concepção de
democracia digital das suas origens até hoje.
Foi possível, assim, oferecer ao leitor que deseja um
reconhecimento desta área temática um mapa e uma
cronologia bastante confiáveis sobre as origens, o itinerário
e as direções futuras da democracia digital, assim como da
história dos seus principais problemas, debates e questões.
A abordagem cronológica, na forma de história do problema,
não deixa de ser uma novidade em se tratando de
democracia digital, muito afeita a discussões sistemáticas
sobre problemas gerais ou questões particulares, e, até
onde o meu conhecimento alcança, não conheço outro livro
que adote essa perspectiva.
O leitor merece, portanto, um argumento sobre por que
não tratei simplesmente dos temas principais e das
discussões mais decisivas da democracia digital, tomando
principalmente o estado da questão, hoje, como referência.
Muita confusão se instalou na área e ainda produz
considerável dano quando não se consegue estabelecer
adequadamente o vínculo entre conceitos,
problematizações e perspectivas adotadas em um
determinado momento e o estado da questão naquele exato
momento.
Uma compreensão adequada do estado da questão, ou
seja, uma que considere as mudanças ocorridas ao longo do
tempo, envolve entender:
• o padrão tecnológico que se tinha diante dos olhos
em determinado momento;
• o estágio de desenvolvimento, inovação e adoção
social da tecnologia naquele preciso instante;
• as especificidades da discussão desenvolvidas
naquele contexto, os “partidos” e os interesses
envolvidos;
• as referências intelectuais consideradas pelos autores
de um determinado momento.
Pois isso é diferente de entender, por exemplo, uma
proposição de democracia eletrônica quando alguém tem
em vista a televisão a cabo; ou de ciberdemocracia em uma
sociedade que está descobrindo computadores domésticos;
ou de democracia digital em uma sociedade de internet das
coisas, big data e mídias sociais. No mesmo sentido, uma
discussão sobre democracia baseada em tecnologia, em um
contexto em que a teoria democrática está preocupadíssima
com a democracia participativa, não pode ser semelhante a
outra em que a democracia deliberativa exerce atração
considerável sobre os imaginários democráticos. Parto da
hipótese de que, para se fazerem distinções mais refinadas,
análises mais justas e adequadas ou reconstruções
apropriadas dos problemas, é importante, pelo menos uma
vez, relacionar os problemas, temas e discussões aos
contextos históricos em que se localizam.
Trata-se de um livro curto, de forma que o percurso,
naturalmente, é sumário. Mas que tenta ser fiel à topografia
da área bem como às trajetórias nela presentes. Além disso,
foi pensado como um livro de introdução à e-democracia,
para apresentar o campo a um leitor não especialista, mas
interessado em uma compreensão substantiva da
democracia digital. Espero ter sido bem-sucedido nesse
propósito. Devo dizer que, mesmo para mim, que trabalho
desde 2001 em um campo que, como se verá, começou
para valer apenas em 1996, foi importante tentar formular
uma reconstrução da história e produzir um mapa confiável
do que, afinal de contas, aconteceu neste breve,
extremamente célere e definitivamente intenso vintênio da
democracia digital. Que, não por acaso, foi aquele que nos
apanha no século XX e nos lança no turbilhão de inovações
do novo século. A democracia digital é filha da curva do
milênio e, como não poderia deixar de ser, reflete a
vertiginosa velocidade que herdou desse momento. Neste
sentido, uma parada para nos acharmos no mapa,
entendermos de onde viemos e decidirmos para onde
queremos ir parece não apenas importante, mas necessária.
Espero sinceramente que o leitor aprecie o mapa que este
livrinho representa.
Este volume se divide em três partes, cada uma delas
correspondente a um dos períodos da história da
democracia digital:
• A primeira comporta o período de formação da ideia
de democracia via tecnologia, das primeiras
formulações dos anos 1970 até o período do grande
debate sobre a teledemocracia, entre o final da
década de 1980 e a metade da década seguinte. A
segunda e a terceira partes tratam da democracia
digital em seu sentido mais estrito, do período, que
chega até hoje, em que as esperanças na e-
democracia estão baseadas nas tecnologias da
internet.
• A segunda parte, mais extensa, recolhe os debates,
os temas, as questões típicas do decênio de 1996 a
2005, a curva do milênio em que se consolidou a
ideia de democracia digital. Debates, temas e
questões que marcarão definitivamente a área, até
aqui.
• A terceira parte, mais curta, cobre os problemas, as
alterações e as tendências próprias dos últimos onze
anos, até nós, portanto. Examina o comportamento
dos temas do decênio anterior, discute os novos
temas e aponta as tendências futuras e lacunas a
serem preenchidas nos estudos e projetos de
democracia digital. Essa seção é mais breve,
principalmente por ser em grande parte um
desdobramento das tendências, concepções e
premissas estabelecidas nos grandes debates da
virada do milênio.
Por fim, um esclarecimento conceitual importante para
introduzir adequadamente o leitor no universo das
interações entre democracia e tecnologia. Neste livro
tentou-se ao máximo a restrição temática à área da
democracia digital e aos seus temas, novos e tradicionais.
Em publicação anterior (Gomes, 2016a), acredito ter
demonstrado que a e-democracia se tornou, a partir
principalmente da virada do século, parte do campo mais
amplo que trata do impacto da tecnologia sobre a vida
pública.

TABELA 1
O campo da política, democracia e Estado digitais
Política online Democracia digital Estado digital

• Campanha e • Teoria da
• Governo digital
eleições democracia digital

• Governança
• Participação política • E-Participação • Participação e
colaboração

• E-Deliberação e • Entrega de serviços


• Notícias e política
esfera pública públicos

• Políticos, partidos e • Governo aberto e


• E-Transparência
instituições dados abertos

• Internet e
• Exclusão digital • Cidades inteligentes
sociedade

• Discussões políticas • Parlamento digital

Na Tabela 1, a democracia digital se coloca justamente no


meio, entre os subcampos da política online e do governo
(ou Estado) digital. As interfaces entre a democracia digital
e os outros dois campos são bastante significativas, antes
de tudo porque a e-democracia nasceu primeiro e porque
provê a maior parte da legitimidade social em que se funda
toda a grande área. Ou seja, governos digitais têm de ser
eficientes, econômicos e modernos, mas também têm de
ser democráticos; a política está quase inteiramente online,
mas continua comprometida com o horizonte normativo da
democracia liberal, ao menos em nossas sociedades. São
interseções, não são confusões nem indiferenças: cada uma
das áreas tem as suas peculiaridades, aspectos, dimensões,
propósitos. E os seus temas. Recorri a tais interações aqui,
quando pertinentes, mas é importante deixar claro que não
assumi que temas e problemas de governo digital ou de
política online fossem, automaticamente, partes do
repertório da democracia digital.
1 Mas há também literatura em espanhol, italiano, francês e alemão.
2 Trata-se de acervo de metadados, tratados na plataforma Mendel, resultado
de projeto permanente do Centro de Estudos Avançados em Democracia
Digital e Governo Eletrônico (CEADD) da Universidade Federal da Bahia,
laboratório central do Instituto Nacional de Ciência & Tecnologia em
Democracia Digital (INCT.DD).
Há uma crença generalizada de que seria impossível
que milhões de pessoas tivessem acesso ao mesmo tipo
de democracia participativa de que desfrutavam os
membros de pequenas comunidades como a polis grega,
os municípios da Nova Inglaterra e os kibutzim
israelenses. Nas modernas sociedades contemporâneas,
não há um meio efetivo pelo qual grandes grupos de
cidadãos, estejam eles espalhados pelo país ou reunidos
em uma única comunidade, possam interagir
regularmente uns com os outros ou com seus líderes. […]
Por fim, há uma concepção básica dos atributos
necessários para se criar um sistema tecnológico que
venha a permitir que um grande número de cidadãos,
dispersos por sua comunidade e pela nação, dialogue
entre si e forme suas opiniões sobre os assuntos públicos
coletivamente.
Amitai Etzioni

À democracia, via tecnologia

NOÇÃO DE DEMOCRACIA DIGITAL1 não chegou toda


A de uma vez; foi construída aos poucos. A ideia de que a
tecnologia poderia servir para construir sociedades mais
democráticas foi sendo paulatinamente construída por pelo
menos 45 anos. Nesse arco de tempo, muita coisa se
alterou, a começar pela denominação do fenômeno,
chamado, sucessivamente, de assembleias eletrônicas
(Etzioni, 1972), teledemocracia (Arterton, 1987),
democracia eletrônica (Varley, 1991), democracia virtual
(Hacker; Todino, 1996), ciberdemocracia (Ogden, 1994),
democracia informática (Buchstein, 1997), democracia
digital (Hale; Musso; Weare, 1999). Sem mencionar um
grande número de adjetivos e substantivos que bastavam
ser associados à palavra “democracia” para expressar a
mesma ideia: online, tecnologia, novas tecnologias,
tecnologias da informação e comunicação (TICs), web etc.
Naturalmente, a escolha do vocábulo que vai associado a
“democracia” não deixa de conotar algum sentido
específico (Porebski, 2002): o “à distância”, a cibernética, as
tecnologias eletrônicas, a conexão online, o método de
transmissão.
Além disso, foi preciso muito tempo para que se
gerassem consensos fortes sobre os elementos abrangidos
e, portanto, referidos pela ideia de democracia digital e, por
conseguinte, por seus experimentos, aplicações,
ferramentas, dispositivos, instituições e funções. Em
diferentes fases históricas, por exemplo, diferentes meios
de comunicação estiveram em questão, mas entre o
telégrafo e o smartphone em conexão permanente há uma
diferença enorme de alcance e sentido. E uma coisa é
pensar em mecanismos de televotação; outra bem diferente
é considerar big data e dados governamentais abertos.
Em terceiro lugar, a própria ideia de democracia é uma
noção complexa, pode ser polissêmica e admite uma
considerável dose de legítimo pluralismo mesmo no nível
conceitual mais rigoroso e sofisticado. Assim, por muito
tempo os problemas centrais de democracia digital foram
tratados como se, afinal de contas, tudo o que importava
era que tipo de democracia se entregava mediante
tecnologia. É democracia direta ou mais uma
suplementação à democracia representativa? É mais uma
versão do majoritarismo (no sentido de uma sociedade em
que a maioria pode oprimir e se impor à parte minoritária
da sociedade simplesmente em função do número) ou a
ênfase é posta na formação de consensos? É a democracia
como a entendem os liberais clássicos, os libertários, os
comunitaristas, ou é uma democracia eletrônica
deliberativista ou participativa?
Como se não bastasse, além da multidimensionalidade
intrínseca às teorias da democracia, temos dificuldades
relativas a que aspectos ou dimensões democráticas serão
chamados em causa na definição adotada. Estamos
interessados:
• em que o povo tenha a possibilidade de tomar
diretamente a decisão política?
• em ser consultados, quer dizer, ouvidos e
considerados, pelo sistema político?
• em interagir com os representantes eleitos?
• em participação? Em deliberação?
• em colaborar com o governo?
• em legislar?
E ainda temos de levar em conta o grau de exigência do
que desejamos: trata-se, afinal, de melhorar a democracia
liberal, de suplementar a democracia representativa
existente ou de modificá-la profunda e permanentemente
por meio de uma revolução tecnológica propriamente dita?
Por fim, há que se admitir que a intuição de que as
tecnologias da comunicação e da informação podiam ter
algum efeito democratizante de relevância em governos e
parlamentos, na atividade política e na vida pública em
geral; a intuição de que tecnologias tinham o potencial de
transformar, com propósitos democratizantes, o processo
político e de oferecer novas soluções para os clássicos
obstáculos de implementação da democracia vem de longe,
mas precisou de muito tempo para ganhar os contornos que
conhecemos. Vem de um tempo, por exemplo, em que o
que se tinha em mente quando se falava em tecnologias da
comunicação era muito diferente do que hoje empregamos
como referente dessa expressão – em geral aparelhos com
tela, algum dispositivo de input (que pode ser a própria
tela), algum tipo de processador e conexão à internet. Como
bem colocou Thierry Vedel, apesar da jovem idade deste e-
que funciona como sufixo da e-democracia, “a democracia
eletrônica tem uma história permanente de várias décadas,
das quais a discussão atual sobre mídia online é apenas a
extensão mais recente”2.
A história da ideia de que era possível melhorar processos
democráticos por meio de tecnologia da informação pode,
naturalmente, ir muito longe, porque é certo que a invenção
e, principalmente, a massificação de um novo meio de
comunicação sempre foram acompanhadas por um renovar
de esperanças em uma melhora na democracia e na vida
pública. Para muitos, é quase sempre válido o princípio de
que qualquer modificação importante, e para melhor, na
qualidade da vida pública, implica praticamente de forma
necessária uma requalificação da própria democracia. Assim
foi com a prensa móvel e a possibilidade, então tornada
real, de disseminar impressos e “democratizar” o acesso ao
livro, mas também, sucessivamente, com o telegrama, o
telefone, o rádio, o cinema, a televisão e até com os
aparelhos de fax. “Democratizar” podia muito bem significar
“massificar”, alcançar um público extenso para além dos
públicos presenciais e restritos, mas também formar novos
públicos para os assuntos políticos, oferecer mais e mais
atualizados insumos para a formação da opinião e do
debate públicos, dotar partidos e facções políticas de canais
de expressão, permitir que os cidadãos tenham novas e
mais eficientes formas de acesso à autoridade política etc.
A nossa história começa nos anos 1970, mais de vinte
anos antes de a internet se tornar uma experiência social
relevante, quando começa a especulação sobre as
interseções futuras entre democracia e tecnologia agora
materializada em alguns experimentos concretos. A atenção
acadêmica dada ao tema então, ainda esparsa em algumas
poucas publicações, consiste ou em uma especulação geral
sobre o efeito das “novas tecnologias” (cabos, satélites,
televisão interativa, computadores, fax, videoconferências
telefônicas) sobre a democracia ou na resenha de projetos
experimentais, conduzidos geralmente por acadêmicos e
membros de organizações sociais, projetadas para a
participação democrática via tecnologias eletrônicas (de
Sola Pool, 1973; Doty; Zussman, 1975; Etzioni, 1972).
Pensa-se principalmente em participação cidadã. Já o
modelo político e democrático derivava dos “town
meetings”3 ou “reunião de moradores de uma cidade”, das
vilas e municípios da idade do ouro da democracia
“tocquevilleana” da Nova Inglaterra (que, por sua vez,
replicava o modelo da ágora grega) (Etzioni, 1992).
Nos anos 1980, o volume de publicação duplica e a
atenção acadêmica ao tema é mais densa. Há claramente a
decisão de que a tecnologia a ser considerada é a televisão
a cabo, interativa, ficando os outros recursos tecnológicos
(computadores, telefones, fax) como auxiliares. Multiplicam-
se os experimentos, conduzidos por organizações e
movimentos sociais, mas também por empresas, quase
todos baseados em TV a cabo e voltados para a
participação dos cidadãos. Uma abordagem teórica da
contribuição da tecnologia para a democracia nesse período
basicamente lida com (ou promove) a polarização entre
defensores da teledemocracia (ou entusiastas da causa da
democracia via tecnologia) e os céticos, críticos ou
detratores, seja da proposta da teledemocracia, seja da
ideia de que a tecnologia possa promover ou modificar a
democracia existente.
Entre 1990 e 1995 publica-se o mesmo volume que em
todo o período anterior, o que indica que a atenção
acadêmica ao tema havia se consolidado. A discussão
conceitual basicamente dá continuação ao debate da
década anterior, só que agora com maior lucidez e com as
primeiras tentativas de se organizar o campo de debate
(Dutton, 1992). Uma diferença considerável no horizonte
precisa ser destacada: enquanto, nesses anos, ainda
reverbera a discussão sobre as possibilidades e limites da
teledemocracia, a discussão sobre democracia e tecnologia
crescentemente vai vendo apenas pelo retrovisor a
tecnologia preferida, televisão a cabo, enquanto
computadores domésticos com internet claramente se
firmam como a tecnologia do futuro. O centro da discussão
continua sendo a teledemocracia, mas já aparecem termos
como democracia eletrônica (Varley, 1991) e
ciberdemocracia (Ogden, 1994), que indicam que os olhos
se voltam para outras tecnologias.

A teledemocracia como projeto


A primeira fase da história da ideia de democracia
“eletrônica” se firma no termo “teledemocracia”. A
expressão ganha massa conceitual nos anos 1980, estende-
se pelos anos 1990 e, esporadicamente, pela década
seguinte. A época de ouro da teledemocracia são os anos
1980 e a primeira metade da década de 1990, quando se
multiplicaram os experimentos e a retórica acerca das
promessas democráticas das tecnologias eletrônicas
alcançou o ponto mais alto. Mas a crítica foi igualmente
acirrada, principalmente no final dos anos 1980 e na década
de 1990. Note-se, finalmente, que experiência a que se
refere é basicamente americana, embora tenha marcado a
história da democracia eletrônica mundo afora, ou como
exemplificação de experiências ou como contraexemplo em
alternativas de e-democracia.
O termo, como todos os outros que o sucederam, exprime
aquilo que se considera essencial na nova qualidade da
democracia baseada em tecnologias eletrônicas, com
destaque para o tele-, no sentido etimológico de “à
distância” e no sentido mais imediato de relação com
telefone e televisão. O que a tecnologia pode oferecer de
melhor à democracia, portanto, tem a ver com o que se
pode fazer à distância, colocando as pessoas em contato
umas com as outras ou com autoridades políticas.
Em todas as fases do desenvolvimento da história da
ideia de democracia baseada em tecnologias – e, portanto,
também no caso da teledemocracia –, três processos se
desenrolam ao mesmo tempo: a) experimentos
especialmente projetados para explorar possibilidades
democráticas da nova tecnologia; b) forte incremento
retórico, refletido nos discursos da mídia e da política, sobre
o impacto da tecnologia na democracia; c) discussão
acadêmica em que os termos são tratados conceitualmente
e as preocupações ganham a forma de problemas
conceituais4.
Os experimentos com teledemocracia normalmente
incluem:
• sondagens de opinião (ou projetos geralmente de
natureza plebiscitária);
• “televotação”, meio eletrônico de registro de votos;
• e encontros de cidadãos e representantes eleitos para
discutir e resolver problemas, agora projetados em
nível nacional, nos electronic town meetings (Etzioni,
1992), eventos realizados por meio de
teleconferências e de televisão a cabo interativa.
Um exemplo das experiências e iniciativas de democracia
via tecnologias eletrônicas é o projeto chamado Minerva,
desenvolvido pelo professor teuto-israelense-americano
Amitai Etzioni, então radicado no Center for Policy Research,
em Nova York, e documentado em artigo do início dos anos
1970 (Etzioni, 1972). O termo teledemocracia
aparentemente nem tinha sido ainda cunhado, mas a ideia
é de “uma tecnologia eletrônica que permitirá que grupos
massivos de cidadãos discutam uns com os outros e que
lhes possibilitará produzir decisões coletivas sem deixar os
seus lares e sem que seja preciso se aglomerar em
auditórios gigantescos”5. Esse “sistema de democracia
participativa” se baseia em diferentes tecnologias, a
depender do volume de pessoas alcançadas: para grupos de
até trinta pessoas, sistemas automatizados de
teleconferências telefônicas bastariam, mas, para pequenas
comunidades (até 2 mil pessoas), a TV a cabo interativa
seria o meio adequado, enquanto comunidades de tamanho
mediano (de 6 a 40 mil) precisariam se basear numa
combinação de rádio, televisão por antena e telefones. Por
fim, reuniões de alcance nacional ou internacional
precisariam ser baseadas em redes que conectam cabos,
ondas curtas, estações de televisão ou satélites.
Note-se que, embora articulasse múltiplas tecnologias, o
padrão tecnológico que mais movia as imaginações era a
televisão a cabo (e as suas possibilidades interativas), a
essa altura já presente em cada casa, escola, igreja, câmera
de vereadores e clubes políticos norte-americanos.
Um exemplo de sondagem eletrônica típico do início dos
anos 1980 foi o serviço de televisão interativa chamado
Qube, da empresa de TV a cabo Warner-Amex, cujo
propósito era oferecer aos governos um retorno rápido
sobre o que as pessoas pensavam sobre políticas públicas e
outros assuntos específicos de interesse público. O Qube foi
adotado por muitas prefeituras nos Estados Unidos para a
realização de “plebiscitos eletrônicos” extraoficiais sobre
questões locais. Tudo o que o cidadão precisava fazer era
apertar botões, em um console que ficava em cima do
aparelho de TV, para registrar o seu voto, que era coletado
a cada seis segundos pelo computador da empresa. Não
deu certo, por diferentes razões, como o custo da operação,
a baixa taxa de participação, a impossibilidade de se ter
uma amostragem cientificamente construída, entre outras,
mas alcançou relativo sucesso no pequeno período que
durou. E acendeu as imaginações.
No que tange à retórica sobre o uso de tecnologias
eletrônicas para ajudar a democracia, ou mesmo para
substituir a democracia existente, dois tipos principais de
materiais contribuem para isso: a) o discurso público
presente nos meios de massa e cuja fonte geralmente são
políticos influentes ou colunistas atuantes em jornais,
revistas e televisão; b) as “futurologias”, publicações que
tentam identificar e interpretar tendências do ambiente
social que lhes é contemporâneo e projetar o seu impacto
sobre um futuro mais ou menos iminente.
O ponto mais alto do primeiro tipo de discurso público foi
constituído em campanhas eleitorais norte-americanas nos
anos 1990, quando a retórica política finalmente compra a
ideia de tecnologias a serviço da renovação da democracia.
Primeiro, no modelo da mais antiga formulação de Ross
Perot, em 1992, e o seu electronic town hall meeting.
Depois, na versão mais moderna de Al Gore, por meio da
ideia de information superhighway (superinfovia ou super-
rodovia da informação), vendida na campanha eleitoral de
1996 (Oblak Črnič, 2012). Ambas atraem considerável
atenção dos meios de comunicação – e mais confusão para
o debate (Bradley, 1994; Brown, 1993; Etzioni, 1992).
Outra contribuição importante para vender a ideia de
democracia eletrônica veio de alguns ensaios que tiveram
razoável sucesso argumentativo (e de vendas) ao identificar
algumas tendências no uso e na aplicação social das
tecnologias, presentes na sociedade, e projetá-las para o
futuro, apontando direções e rumos e até calculando as
consequências do que o mundo se encaminhava para ser.
Antes, pois, dos artigos e livros sobre democracia eletrônica,
o discurso sobre as possibilidades da democracia baseada
em comunicações eletrônicas foi sustentado, com mais ou
menos ênfase, em ensaios em que se formulava uma
espécie de teoria geral da sociedade (ou do futuro das
nossas sociedades), no interior da qual se reservava espaço
para as constatações de que o estágio tecnológico a ser
atingido permitiria, enfim, a implementação de muito
melhores democracias do que aquelas que temos no
presente.
Autores com J. Naisbitt (1982) e Alvin Toffler (1980) são,
nesse sentido, muito importantes para cravar a democracia
eletrônica como ideia nos seus prognósticos sobre a
sociedade do futuro, atitude que será replicada por outros
teóricos gerais da sociedade, respeitadas as diferenças,
como Manuel Castells. Toffler, por exemplo, deixou muito
claro que os velhos problemas de comunicação não
atrapalharão mais o caminho de uma democracia direta
consistente e expandida6. Os anos 1990 acrescentaram a
comunidade virtual de Howard Rheingold (1993) e o
ciberespaço de John P. Barlow (1996) à vivacidade retórica
do momento. Esses ensaios atiçaram os imaginários sociais
e conseguiram razoável sucesso em determinados setores
intelectuais, com as suas apostas sobre o que deveria
funcionar em termos de democracia e tecnologia na
sociedade do futuro.
Este parecia o estado da questão entre o final dos anos
1980 e a metade da década 1990: a polarização retórica
entre entusiastas e céticos da democracia eletrônica e um
número crescente de experimentações no uso de
tecnologias para a participação política, para a consulta da
opinião dos cidadãos e para a interação entre cidadãos e
autoridades eleitas. É daqui que parte o tratamento
científico da questão. A discussão científica sobre as
chances de existir uma democracia eletrônica e sobre as
feições que esta deveria ter não tardou, pois, a se
apresentar. Muitos pesquisadores importantes vêm
contribuindo, nos últimos trinta anos, para nos fazer
compreender o significado do rápido desenvolvimento das
tecnologias de informação e comunicação para a vida
pública e o modo como afetam a vida em sociedade, as
instituições políticas e, particularmente, o nada simples
sistema democrático.
As respostas comportaram um pouco de tudo. Posições
moderadamente céticas, posições que francamente
apostavam no futuro da democracia baseada em tecnologia
e posições decisivamente céticas ou adversárias. Os céticos
moderados queriam verificar se havia alguma brasa
embaixo de tanta fumaça. Todo mundo está falando de
teledemocracia e de democracia eletrônica, e de forma
entusiasmada, mas isto é só retórica e diversionismo
político ou há alguma coisa realmente séria de que a ciência
política, a comunicação política e a sociologia dever-se-iam
ocupar?
F. Christopher Arterton é exemplo de um autor cético,
pelo menos quanto ao determinismo democrático da
tecnologia. Moderem as suas expectativas sobre a
requalificação da democracia decorrente do impacto das
tecnologias da comunicação, diz. De fato, conclui que o
padrão atual de comunicações proporcionou um importante
incremento nas interações diretas entre os detentores de
cargos públicos e a massa de cidadãos, o que é bom, mas,
infelizmente, em tais interações se verificam ainda
“desigualdades significativas entre os líderes e o público em
termos de controle sobre a iniciativa, o tempo apropriado e
o conteúdo das mensagens políticas”7. Além disso, depois
de resenhar vários projetos de teledemocracia, conclui que
as tecnologias, em si mesmas consideradas, não
demostram capacidade de realmente promover o
envolvimento dos cidadãos. O sucesso de um projeto
estaria, então, muito mais relacionado a escolhas
organizacionais de quem o projetou, isto é, de escolhas
baseadas em seus valores e nas suas premissas sobre
participação (o que esperam obter, com que meios, qual o
alcance), do que às possibilidades tecnológicas. A
democracia, portanto, não será “inevitavelmente induzida
pela revolução na tecnologia de comunicação”8. Assim, o
nosso autor conclui, visivelmente decepcionado, não ter a
democracia direta ainda assomado no horizonte: “Do meu
ponto de vista, a tendência em nossa política parece não
ser a eventual substituição das instituições representativas
por procedimentos de determinação direta das políticas
públicas por parte de cidadãos”. E remata, tristemente: “Na
melhor das hipóteses, a mudança pode levar a uma
revitalização dos processos representativos facilitada pelos
meios de comunicação”9.
No mesmo período, John Downing, de um outro ponto de
vista, considera que o excesso de precauções de Arterton
teria pouco apoio nos desenvolvimentos mais atuais das
tecnologias. Sobretudo, o segundo desconhece as
comunicações baseadas em computadores (computer
communications) para além do seu emprego em
teleconferências. O que Downing faz, então, é resenhar
experimentos que consistem em projetos com focos em
comunicações via computadores, principalmente os projetos
PeaceNet e Public Data Acces. O primeiro, fundado em
1986, na Califórnia, pretendia apoiar movimentos pela paz;
o segundo, também dos anos 1980, nasceu na era Reagan
para tornar a informação governamental acessível ao
público.
As conclusões de Downing são positivas na indicação de
potenciais aplicações pró-democracia de projetos de
comunicação via computadores, que ele sintetiza em quatro
dimensões:
• Tais projetos possibilitam a “coleta e análise direta de
dados sobre questões fundamentais que afetam
comunidades e subgrupos que, sem isso, seriam
negligenciados ou ignorados”.
• Por tornar desimportante a necessidade de que todos
estejam juntos ao mesmo tempo, esses projetos
permitem a mobilização de pessoas geralmente
separadas temporal e espacialmente, de modo a
juntar gente suficiente e publicidade o bastante “para
que se pressionem interesses políticos poderosos”.
• Além de centros nervosos, os projetos podem servir
“como fóruns para o desenvolvimento da linguagem e
das agendas necessárias para a ação política”.
• Porque conecta pessoas além das fronteiras
nacionais, tais projetos podem “começar a abordar os
problemas comuns da humanidade, como os direitos
humanos, o lixo tóxico e a paz, fortalecendo assim os
recursos e as reservas da cultura democrática”
(Downing, 1989).
Mas os adversários e detratores da teledemocracia
também foram numerosos e provenientes de pelo menos
dois lados.
A primeira frente de crítica vem dos que acham que a
teledemocracia superestima a tecnologia enquanto
subestima o sistema político ou negligencia a dominação da
tecnologia pelo sistema econômico. Trata-se dos
incomodados com a pretensão de se modificar o sistema
político “simplesmente” pelo acréscimo de ferramentas
eletrônicas ou com “ingenuidades” como:
a. a incompreensão da resistência à mudança própria
das instituições políticas;
b. uma premissa (errada) sobre a neutralidade da
tecnologia, que se deixaria, sem mais, plasmar por
intenções democráticas, dobrando a sua lógica
própria ao propósito social que se lhe quer dar.
A segunda frente de críticas vem dos que, embora
partilhem o descontentamento com o estado da democracia
e estejam também desejosos de mudanças no padrão da
democracia contemporânea, veem com desconfiança o
modelo de democracia que poderia emergir da
teledemocracia. Rapidamente se acusa a teledemocracia,
como veremos adiante, de propor uma espécie de
democracia direta alternativa, na qual a deliberação pública
e livre dos cidadãos entre si, do modelo ateniense, seria
substituída por um majoritarismo plebiscitário “à distância”,
baseado em tecnologias eletrônicas.
Scott London (1995) resumiu as críticas comuns até a
metade dos anos 1990 e encontrou 17 itens, que podem ser
distribuídos em problemas práticos da tecnologia,
problemas na implementação política e problemas
relacionados aos pressupostos democráticos e políticos por
trás dos experimentos.
São problemas práticos relacionados à tecnologia, por
exemplo, os seguintes fatos:
• a maioria dos experimentos teve baixa taxa de
participação;
• os custos para organizar essas experiências
tecnológicas são ainda proibitivos;
• a conversação por via eletrônica é, em geral,
desvinculada de contexto, portanto, de coisas que
podem conferir-lhe significado e propósito;
• a opinião pública é produzida sem a presença real
(física) dos interlocutores, o que a torna mais
facilmente leviana.
São problemas de implementação política, segundo
London, as dificuldades a seguir:
• consultar os cidadãos por meio de feedback pode ser
ineficiente e demorado para os parlamentares;
• não é correto presumir que os eleitores se sentem
compelidos a se envolver nos detalhes da formulação
de políticas;
• algumas questões públicas prestam-se mal a
discussões muito ampliadas, por serem
excessivamente técnicas ou demasiado específicas
ou de aplicação local;
• as questões de desigualdade de acesso, em virtude
da exclusão social ou da baixa alfabetização
tecnológica, não estão resolvidas.
Os problemas de base democrática incluem as seguintes
questões:
• dispositivos como os de registro de opinião não
deixam espaço suficiente para diálogos e debates
laterais e bem fundamentados;
• a compilação de opiniões resultantes de televotação
não pode ser considerada equivalente à voz pública;
• os indivíduos são atomizados nesse processo;
• o excesso de velocidade é adversário de uma
deliberação democrática consistente;
• os cidadãos não têm liberdade para enquadrar as
questões em seus próprios termos em
telessondagens ou televotações;
• nos casos em que não exista uma posição
preponderante clara da população acerca de uma
questão, soluções simplesmente majoritárias (por
margem mínima) não são adequadas;
• participação em consultas eletrônicas não envolve a
capacidade de os cidadãos agirem por iniciativa
própria, de forma que estes não se sentem, portanto,
responsáveis pelas políticas decididas;
• uma vez que não há propriamente oferta de
informação necessária para a decisão, a manifestação
da vontade se torna suscetível aos meios tradicionais
de comunicação e à publicidade;
• o mesmo acontece no que diz respeito à
suscetibilidade na constituição da pauta social e
política.

As dimensões da democracia digital


Para os autores desse período está claro que a
demonstração da relevância da tecnologia para a
democracia se dá por meio da indicação de pontos
realmente decisivos para a vida democrática em que a
incidência da tecnologia faz ou faria muita diferença. Esses
pontos deviam ser sumarizados em quatro dimensões:
registro ou consulta da opinião pública, informação, tomada
de decisão e deliberação. Claro, houve muita conversa
pública, desde a fase da teledemocracia, sobre participação
política, que não está nessa lista. Na verdade, ela é uma
premissa que se materializa em todas essas dimensões – a
participação política dos cidadãos desde sempre foi
considerada um fator decisivo para o efeito democrático da
tecnologia.
Além disso, essas dimensões podem ser organizadas em
dois âmbitos nos quais se distribuem as quatro dimensões:
a esfera dos cidadãos ou esfera civil (a sociedade) e a
esfera da decisão política (o Estado, o sistema político). No
caso da informação, temos a questão de como os cidadãos
podem obter informação sobre políticas públicas, governo e
sistema político para, justamente, tomar as decisões
políticas que lhes concernem no regime democrático, como
a decisão eleitoral, o acompanhamento da política e o
engajamento na defesa de seus interesses. Mas temos
também o fluxo de informações e dados provenientes do
Estado para uso dos cidadãos. No caso do registro da
vontade pública, por meio de voto, ou de consulta
governamental aos cidadãos, há novamente um fluxo com
vetores ascendentes e descendentes entre sociedade e
governo. A tomada de decisão política é prerrogativa dos
representantes eleitos, mas se há algum incremento
importante a se obter quanto a isto ele consiste em algum
modo de participação dos cidadãos na tomada de decisão.
Por fim, a deliberação pública é prerrogativa dos cidadãos,
mas, novamente, o que pode haver de relevante e inovador
consiste justamente em fazer com que os fluxos horizontais
da conversação entre os cidadãos de algum modo se
convertam em fluxos verticais destinados a influenciar o
sistema político e o governo.
O registro da opinião do público
A votação eletrônica foi uma das primeiras aplicações
políticas da tecnologia para fins democráticos. Defensores
de uma democracia eletrônica direta defendem que
soluções tecnológicas poderiam ser empregadas para que
os cidadãos votassem mais frequentemente e sobre uma
quantidade maior de questões de forma rápida, mais barata
e contínua (Hilbert, 2009). Quiçá mais de uma vez ao dia
(Berkeley, 1962). E, sobretudo, a partir do conforto do lar
(Hollander, 1985). Não haveria mais, segundo os mais
entusiasmados, qualquer limite tecnológico à democracia
direta no que diz respeito à verificação contínua da vontade
popular.
Na verdade, grande parte da disputa em teoria da
democracia eletrônica que acontece até metade dos anos
1990 está relacionada a como estimar o lugar de sistemas
eletrônicos de manifestação da vontade popular. Para os
defensores da teledemocracia não havia dúvida de que não
se podia negligenciar, em Estados de democracia liberal em
que o governo e o sistema político estavam cada vez mais
distanciados e desconectados da base popular e cada vez
mais fechados no seu funcionamento imanente, qualquer
meio de fazer chegar aos representantes um registro da
vontade do povo. Ainda mais se esse registro da opinião dos
cidadãos pudesse ser rápido, de baixo custo, atualizado,
capaz de acompanhar em tempo real o ritmo da discussão
parlamentar sobre políticas públicas e o ritmo
governamental de reação às questões sociais impostas
pelas circunstâncias do momento. Ante as novas
possibilidades abertas pelas comunicações eletrônicas –
telessondagens, telerreferendos e televotação realizados
por meio de telefone, redes de computadores, televisão
interativa a cabo –, a autoridade pública não podia mais
reclamar das dificuldades espaciais e temporais de
acompanhar a voz do povo, ou da baixa confiabilidade e do
alto custo de formas de auscultação da soberania popular
em referendos, plebiscitos e consultas. Por que deixar de
considerar o público se agora a sua voz está ao alcance do
ouvido dos representantes? O resultado é, naturalmente,
entusiasmo.
A reação não se fez esperar e foi responsável pela
primeira onda de ceticismo contra a ideia de democracia
eletrônica. Consistiu basicamente em dizer que não,
sistemas de registros de opinião não afetam qualquer
função realmente relevante da democracia. Que tal coisa,
se realmente vier a funcionar, mudará apenas
superficialmente o impermeável Estado liberal-democrático,
uma vez que a esfera da decisão política continuará
controlada por representantes eleitos e pelo governo, e
zelosamente protegida da “intromissão” da massa popular.
Que, se fosse capaz de mudar, o Estado mudaria para algo
ainda pior, uma espécie de plebiscitarismo ou de
majoritarismo eletrônico que produziria, no máximo, uma
agregação de interesses.
Benjamin Barber, que se debruçou longamente na crítica
da ideia de teledemocracia durante os anos 1980, firmou
sobretudo nesse ponto a sua trincheira. Sua crítica se
explica pelo fato de que, nesse mesmo período, ele
propunha um modelo em teoria democrática denominado
strong democracy (Barber, 1984), uma democracia baseada
em participação e em deliberação autônoma dos cidadãos,
que contrasta com a thin democracy, o modelo segundo ele
em uso na democracia liberal vigente, com fraca
participação e na qual a produção de decisão política é
monopolizada por atores sociais fortes. O problema dos
demagogos da democracia eletrônica baseada em registros
de opinião e dos fanáticos do automatismo democrático da
tecnologia, para Barber, “não é a compreensão que eles
têm da tecnologia, mas o modo como entendem a
democracia”10. A decisão de implementar tecnologicamente
uma democracia representativa, uma democracia
plebiscitária ou uma democracia deliberativa, por exemplo,
comporta implicações e requisitos radicalmente diferentes
com respeito às tecnologias. E com respeito ao que as
tecnologias podem ou não ser capazes realmente de
oferecer ou de oferecer com maior ou menor eficiência, eu
completaria.
Claro, alguns autores consideram que a melhor aplicação
das tecnologias consiste justamente em promover um
“majoritarismo plebiscitário”, um sistema baseado na
identificação de quais são as opiniões majoritárias (sem
considerar minimamente que se trata de agregação de
interesses privados de pessoas privadas). Nesse caso,
Barber expressa uma preocupação muito comum nos anos
1990: “A nova tecnologia pode ser um instrumento
perigosamente fácil de tal majoritarismo não controlado”11.
O que vai levar à afirmação de que “o tipo de democracia
que se propõe [na teledemocracia] é uma versão degradada
e empobrecida do verdadeiro ideal. A democracia se torna
um mero dispositivo para registrar preferências”12.
Outro filósofo, Michael Walzer, produzindo no mesmo
momento, viu-se compelido a encaixar no seu famoso livro
de teoria democrática, Spheres of Justice, uma crítica ao
que então considerou ser a representação dominante do
impacto da tecnologia moderna sobre a democracia:
indivíduos isolados, vendo televisão na sala de estar,
conversando apenas com seus cônjuges, votando em
referendos sobre questões cruciais da nação com um
simples toque no botão de algum aparelho. “Mas isso é o
exercício do poder? Estou inclinado a dizer, em vez disso,
que é apenas outro exemplo da erosão de valores – uma
maneira falsa e, no final das contas, degradante de
compartilhar a tomada de decisões”13.
Exemplo dessa mesma crítica está registrado em uma
resenha de Jean Elshtain sobre o serviço de sondagens
instantâneas via televisão interativa, o Qube, já mencionado
aqui. Segundo a autora, o erro dos então defensores da
teledemocracia consistia em uma compreensão equivocada
da democracia, confundida com um mero sistema de
plebiscitos. Mas não há comunidade política democrática,
afirma, sem que se incorporem “um processo deliberativo, a
participação com outros cidadãos, um senso de
responsabilidade moral com a própria sociedade e o
aprimoramento das possibilidades individuais por meio da
ação na e para a res publica”14. O plebiscito não é garantia
suficiente de democracia, uma vez que um regime
autocrático pode muito bem existir disfarçado de opinião
maioritária: “essa opinião pode ser registrada por
plebiscitos ritualizados facilmente manipulados”15.
A teledemocracia, na verdade, não se resumia aos
sistemas de registros de opinião, como insistiam alguns dos
seus defensores e muitos dos seus detratores, mas a
suposição de que havia ali um projeto de democracia
eletrônica direta (plebiscitária, baseada em agregação de
interesses e negligente quanto à deliberação pública)
provocou considerável reação. Aparentemente, a
democracia direta via plebiscitos eletrônicos precisava ser
exorcizada. A tal ponto que, reavaliando no final dos anos
1990 a polarização retórica e teórica dos anos da
teledemocracia, o professor Stephen Coleman descreve
que, por algum tempo, a estratégia discursiva habitual de
quem queria defender o papel democratizante das
tecnologias da informação e comunicação, mas ao mesmo
tempo escapar das objeções que eram feitas à ideia de
teledemocracia, consistiu “em afirmar de forma resoluta a
sua rejeição a qualquer coisa que se aproximasse da
democracia direta”16. A democracia direta sem deliberação
e baseada em mera agregação de inclinações foi
transformada na caricatura da teledemocracia (e, por
consequência, da democracia eletrônica) e no espantalho
teórico que se podia fácil e convenientemente destruir.
Informações, dados
“Informação” é um desses termos de pouca precisão
conceitual e de grande sucesso de público em teoria
democrática. Por isso mesmo, sempre comparece nas listas
de destaques seja das qualidades da democracia, entendida
como o regime em que a informação é gerada e flui mais
livremente, seja das necessidades para a implementação de
democracias saudáveis. Por essa razão, não poderia estar
ausente da breve lista das contribuições essenciais da
tecnologia para a democracia.
Primeiro, a informação comparece na forma de
“conteúdos politicamente relevantes, incluindo notícias,
opiniões e dados factuais – em grandes quantidades”17.
Nesse caso, a constatação comum é que as TICs em geral, e
a internet em particular, têm sido pródigas em “facilitar um
acesso mais rápido e completo do que o da mídia
convencional a informações políticas e governamentais
local, nacional e internacionalmente”18. Ora, como na
democracia é essencial que os cidadãos tomem decisões
políticas bem-informadas, e os meios e ambientes digitais
de informação e comunicação representam uma
contribuição significativa para o provimento das
informações de que os cidadãos precisam, torna-se muito
fácil justificar, por esse aspecto, a relevância da tecnologia
para a democracia.
Segundo, há que considerar as próprias informações
sobre os cidadãos, suas opiniões, disposições, crenças,
desejos, temores e atividades, fluindo para o sistema
político e o governo. O lado bom desse fluxo de informações
se pode imaginar na forma da “coleta e análise direcionada
de dados sobre questões-chave que afetam comunidades e
subgrupos da população, que, de outro modo, arriscariam a
ser esquecidos ou ignorados”19. Nesta acepção, a
informação é basicamente mais uma forma de registro da
opinião pública, necessário para políticas públicas e demais
decisões políticas para as quais se quer levar em
consideração a vontade política da maioria dos cidadãos. A
face negativa desta perspectiva de informação como “dados
dos cidadãos”, por outro lado, consiste no perigo que
aplicações para coleta e processamento deste tipo de
conteúdo representam para a privacidade dos indivíduos.
Terceiro, a informação comparece na forma de dados
governamentais. Já nos anos 1990 se firmava a convicção
de que documentos e demais dados provenientes de
governos e órgãos do Estado podiam ser colocados, online,
à disposição dos cidadãos, uma vez que as barreiras de
acesso podiam ser consideravelmente reduzidas ante o
estado das tecnologias de informação e comunicação. Entre
os efeitos previstos do acesso público a dados públicos
estão, desde então, a transparência governamental
mediada tecnologicamente.

Debate, discussão, comunicação


horizontal
É curioso como entrou bem cedo no debate sobre
democracia eletrônica a perspectiva de que as
comunicações eletrônicas bem poderiam servir à
democracia ao oferecerem a possibilidade de discussão
pública de problemas sociais e políticas. Trata-se de uma
dimensão não tão óbvia da democracia, que não rivaliza em
evidência com a necessidade de se ter em consideração a
opinião dos cidadãos ou a importância de informações
políticas e governamentais para uma cidadania esclarecida.
Mesmo em teoria democrática, é tardia a clareza de que a
deliberação pública é essencial para uma democracia bem
fundada.
Como então, na teoria da democracia eletrônica, a
imposição do tema veio tão “cedo”? Na minha hipótese, há
duas boas razões para isso. A primeira diz respeito à
produção de argumentos para contrapor ao famigerado
majoritarismo plebiscitário como forma de configurar uma
democracia densa, participativa, mais próxima do modelo
de democracia direta. O plebiscitarismo dos projetos de
teledemocracia foi devidamente combatido em território
teórico com a alegação de que havia um outro meio, mais
eficiente e mais em conformidade com um conceito
exigente de democracia, de formação da vontade e da
opinião públicas: a discussão aberta, horizontal, livre entre
os cidadãos. Afinal, como bem nos ensinou a democracia
clássica, ateniense, o voto e a regra da maioria são métodos
para encerrar discussões ao fim das quais decisões
precisam ser tomadas, mas apenas na circunstância em que
um consenso não tenha sido obtido e tão somente quando
os argumentos tenham sido esgotados.
Só um majoritarismo tosco saltaria a deliberação e iria
direto ao voto, dispensando tudo aquilo que constitui a base
da democracia: a busca de consensos esclarecidos, o
esclarecimento recíproco entre cidadãos em condição de
igualdade, o valor normativo do princípio do melhor
argumento, os ganhos em termos de cooperação e
corresponsabilidade de decisões geradas em discussões
livres, o fortalecimento dos vínculos horizontais entre os
cidadãos, a formação de uma cidadania ativa.
Outra provável razão para que reivindicações sobre a
importância do debate e de uma esfera pública atuante
tenham perpassado pela qualificação da democracia digital
está na coincidência temporal entre a fase inicial da
discussão sobre democracia eletrônica e o boom da
democracia deliberativa em teoria democrática, ambas dos
anos 1990.

A tomada de decisão
Regimes políticos se distinguem uns dos outros pelo
métodos e pressupostos adotados para se tomarem as
decisões que afetam a vida em comum. Regimes
autocráticos se caracterizam por reservar a tomada de
decisões a poucos ou a apenas um, enquanto no regime
democrático a decisão é tomada por todos, diretamente ou
por meio de representantes escolhidos para este fim. A
decisão política, portanto, desempenha papel importante na
definição da democracia, de forma que é natural que se
tenha procurado reservar um lugar para ela na democracia
eletrônica.
A questão do incremento da participação dos cidadãos na
tomada de decisão por meio de tecnologias da comunicação
envolve diferentes aspectos.
Primeiro, temos um conjunto de decisões para as quais,
mesmo em formas de democracia pouco porosas à vontade
do público – isto é, que fazem muita questão de reservar
aos eleitos e à burocracia estatal praticamente todas as
prerrogativas referidas à tomada de decisão –, demanda-se
participação dos cidadãos. Trate-se daquelas circunstâncias
em que o sistema parlamentar transfere aos cidadãos a
decisão sobre políticas públicas, ratificando ou não decisões
tomadas pelos congressistas ou escolhendo entre opções
predeterminadas, como em referendos e plebiscitos; ou
então aquelas circunstâncias em que o processo legislativo
regular determina que os cidadãos interessados sejam
ouvidos antes da decisão parlamentar, como em consultas
públicas. Em ambos os casos, a mediação da tecnologia
pode representar não apenas a diminuição dos custos
desses atos processuais de aferição da vontade popular,
mas também o oferecimento de oportunidade de
participação eficiente, acessível e mais adequada às
conveniências do cidadão.
Além disso, temos tomadas de decisão em que o sistema
político se abre para a colaboração dos cidadãos. É o caso,
por exemplo, da regulamentação de normas ou de políticas
públicas, da produção colaborativa de projetos de lei, da
formulação de políticas etc. Forçadas por constituições ou
leis específicas ou levadas a isso por políticas públicas
governamentais ou parlamentares acolhedoras da
colaboração cidadã, têm aumentado consideravelmente as
oportunidades de participação nestas formas intermediárias
de intervenção do cidadão. E as tecnologias de
comunicação são condição fundamental para que níveis de
participação que já foram considerados impensáveis
pudessem ser implementados. O que inclui, neste caso, um
esforço para envolver mais os cidadãos com a coisa pública.
Por fim, temos o centro da decisão política, na decisão
legislativa típica do trabalho parlamentar regular, ou na
decisão governamental, relacionada à implementação de
políticas públicas e às decisões da gestão pública. Esta é
uma dimensão normalmente reservada aos eleitos, e
apenas projetos de restauração da democracia direta
incluem a possibilidade de transferir a decisão política deste
nível para que os cidadãos a exerçam diretamente, sem
representação nem deputação. De forma alternativa, há
duas possibilidades usualmente reivindicadas com respeito
a este âmbito de tomada de decisão pela democracia
eletrônica:
• Monitoramento: o cidadão tem o direito de saber
como e por quem as decisões são tomadas, bem
como de saber a natureza e o alcance de tais
decisões. A mediação tecnológica está à disposição
justamente para jogar luz sobre os tomadores de
decisão, sobre as atividades dos agentes do Estado,
sobre o exercício da discricionariedade por parte de
funcionários públicos e autoridades políticas, mesmo
no uso de suas prerrogativas.
• Demanda de transparência do processo legislativo,
que se estende até o ponto de saber se algum fator
ilegítimo (como corrupção) afetou a decisão de algum
dos atores envolvidos na decisão tomada. Mas
também se exige transparência da inteira atividade
governamental – e das condições em que ela é
exercida –, da gestão pública, do exercício do poder
discricionário de cada funcionário. A transparência
pública, portanto, não se refere apenas aos negócios
públicos, mas também aos agentes envolvidos na
tomada de decisão e às circunstâncias em que as
decisões são tomadas.

***
Como se pode depreender da análise das quatro
dimensões da democracia eletrônica reconhecidas na fase
da teledemocracia, nem tudo é sujeito a contestação. O
centro das críticas se concentrou principalmente na questão
do registro de opiniões e posições dos cidadãos, que a
muitos dos detratores pareceu representar o núcleo duro da
proposta. As outras dimensões, igualmente reivindicadas
pelos advogados da teledemocracia, como informação,
deliberação e participação civil na decisão política, não
criaram polêmica. Isto é importante para se entender que
por trás da retórica adversária da teledemocracia estava
uma rejeição não da democracia eletrônica, mas de uma
democracia eletrônica que consistisse em agregação de
opiniões por meio de mecanismos de coleta de opiniões. O
Qube parece ter de tal modo monopolizado as fantasias
políticas que acabou condensando o que para muitos era a
quintessência da teledemocracia e da democracia eletrônica
em geral. Outros experimentos e ideias (como os town
meetings e os electronic town halls) que tinham em alta
consideração a deliberação e a participação cidadã em
tomadas de decisão, como não assombravam as
imaginações, não foram consideradas para mitigar as
críticas à teledemocracia. Assim, embora pareça, da leitura
da bibliografia, que o período da teledemocracia se conclua
com a vitória dos que rejeitaram a democracia eletrônica,
aconteceu uma coisa completamente diversa. O que houve
foi que se fechou a porta a uma dimensão do uso de
tecnologias de comunicação para fins políticos e
democráticos (as sondagens e plebiscitos), enquanto se
confirmou a importância das outras dimensões envolvidas,
como produção de informação, deliberação e participação
na decisão política. No futuro, como veremos, as funções
plebiscitárias serão substituídas por mecanismos de
consulta pública, fóruns de discussão e outras formas de
interação lateral e vertical envolvendo cidadãos e
autoridades.
Assim, não se pode absolutamente pensar que o período
em que se experimentou com teledemocracia e em que se
especularam meios de usar novas tecnologias no processo
democrático tenha sido um fracasso. Muitas das intuições
nascidas de experimentos baseados em uma tecnologia que
não prosperou, a televisão interativa a cabo, foram
recuperadas para serem aplicadas novamente, desde
meados da década de 1980, usando-se a tecnologia dos
computadores em rede. Do mesmo modo, os debates sobre
vantagens e desvantagens da aplicação de tecnologias no
processo político foram retomados quando a tecnologia à
vista já era a internet. O lugar da democracia digital, no
debate público e na discussão acadêmica, foi criado e
guardado pela discussão sobre a teledemocracia.

1 Como veremos, houve e ainda há denominações concorrentes de democracia


digital. Na medida do possível, “democracia digital” e “e-democracia” serão
os termos que adotarei geralmente para falar do fenômeno que é o nosso
objeto, quando não couberem designações contextuais mais específicas,
como no caso do período da teledemocracia. Quando, porém, tiver de
traduzir ou reproduzir a argumentação de algum autor, adotarei a expressão
por ele empregada. De toda sorte, o leitor deve considerar sinônimas as
expressões teledemocracia, democracia eletrônica, democracia virtual,
ciberdemocracia, eDemocracia, e-democracia e democracia digital. Usarei as
duas últimas em geral apenas por serem as mais empregadas atualmente.
2 T. Vedel, “The Idea of Electronic Democracy: Origins, Visions and Questions”,
Parliamentary Affairs, v. 59, n. 2, pp. 226-35, 10 fev. 2006, p. 226 (em
tradução livre, assim como as demais citações de obras estrangeiras).
3 Para a compreensão dos town meetings na história política americana, cf.
<https://en.wikipedia.org/wiki/Town_meeting>.
4 No caso específico, a retórica e os experimentos estão presentes desde o final
dos anos 1960 e a década de 1970 (de Sola Pool, 1973; Etzioni, 1972; Flood,
1978; Laudon, 1977; Smith, 1978), a discussão teórica é dos anos 1980
(Abramson; Arterton; Orren, 1988; Arterton, 1987, 1988; Bjerknes; Ehn; Kyng,
1987; de Sola Pool, 1983; Downing, 1989; Elshtain, 1982; Hollander, 1985),
estendem-se até o final dos anos 1990 (Barber, 1997; Becker, 1993, 1998;
Brants; Huizenga; van Meerten, 1996; Buchstein, 1997; Davies; Jegu, 1995;
Dutton, 1992; Etzioni, 1992; Fountain, 2003a; Grosswiler, 1998; London,
1995; Ogden, 1994; Street, 1997; Tsagarousianou, 1998; van Dijk, 1996;
Varley, 1991; Watson et al., 1999; Ytterstad; Watson, 1996) e, já em declínio,
até o início dos anos 2000 (Becker; Slaton, 2000; Kangas; Store, 2003; Whyte;
Macintosh, 2001).
5 A. Etzioni, “Minerva: An Electronic Town Hall”, Policy Sciences, v. 3, n. 4, pp.
457-74, dez. 1972, p. 457.
6 Cf. A. Toffler, The Third Wave, Toronto: Bantan Books, 1980, p. 429.
7 F. C. Arterton, “Political Participation and ‘Teledemocracy’”, PS: Political
Science and Politics, v. 21, n. 3, pp. 620-7, jan. 1988, p. 620.
8 Idem, Teledemocracy: Can Technology Protect Democracy, Newbury Park:
Sage, 1987, p. 623.
9 Ibidem, p. 621.
10 B. R. Barber, “The New Telecommunications Technology: Endless Frontier or
the End of Democracy?”, Constellations, v. 4, n. 2, pp. 208-28, out. 1997, p.
224.
11 Ibidem.
12 J. Street, “Remote Control? Politics, Technology and ‘Electronic Democracy’”,
European Journal of Communication, v. 12, n. 1, pp. 27-42, 1 mar. 1997, p. 32.
13 M. Walzer, Spheres of Justice, Oxford: Basil Blackwell, 1985, p. 307.
14 J. B. Elshtain, “Democracy and the QUBE Tube”, The Nation, pp. 108-9, 1982,
p. 108.
15 Ibidem.
16 S. Coleman, “Can the New Media Invigorate Democracy?”, The Political
Quarterly, v. 70, n. 1, pp. 16-22, jan. 1999, p. 18.
17 T. Vedel, op. cit., p. 231.
18 R. Hurwitz, “Who Needs Politics? Who Needs People? The Ironies of
Democracy in Cyberspace”, Contemporary Sociology, v. 28, n. 6, pp. 655-61,
1999, p. 657.
19 J. D. H. Downing, “Computers for Political Change: PeaceNet and Public Data
Access”, Journal of Communication, v. 39, n. 3, pp. 154-62, set. 1989, p. 162.
A internet é uma metáfora vasta e amorfa em busca de
tangibilidade. Uma rodovia, uma ágora, um centro
comercial, uma biblioteca, um portal, uma teia, um
cérebro, um universo etéreo de bits e bytes. Surfamos,
rolamos, pesquisamos, buscamos, navegamos, postamos,
batemos papo, espiamos, nos conectamos e
desconectamos.
Stephen Coleman
As pessoas geralmente se referem à e-democracia
como algo que se pode ser “contra” ou “a favor”. Como
não existe ninguém nos países democráticos que seja
contra a democracia (com exceção de grupos marginais),
deve ser então ao “e” que elas fazem objeção.
Åke Grönlund

POPULARIZAÇÃO DA INTERNET, a adoção massiva da


A computação doméstica com conexão à, como se dizia,
“rede mundial de computadores”, não se deu,
naturalmente, de uma vez só, mas aconteceu em uma
década. No início dos anos 1990 já era claro que
microcomputadores com internet eram a grande tendência
em adoção de tecnologias da comunicação e da informação,
mesmo em países então tecnologicamente periféricos como
o Brasil. A inovação tecnológica que tornou possível a
existência de computadores domésticos consolida-se na
década de 1980, mas não seria certamente como um
processador doméstico de dados (ou como uma máquina de
escrever sofisticada e cara) que os microcomputadores se
popularizariam na década seguinte. Se a popularização dos
computadores domésticos efetivamente colocou máquinas
de computar nas casas, o fato mais importante foi que abriu
as portas para a massificação de outra inovação, já
consolidada para fins militares e científicos: a internet. No
início dos anos 1990, a convergência da computação
doméstica com a internet parecia algo comparável com o
salto tecnológico que havia colocado primeiro rádios, depois
televisores por antenas, depois TV a cabo e satélite na casa
das pessoas. Mas a velocidade da inovação tecnológica e a
correspondente adoção massiva são casos ainda mais
surpreendentes do que o ocorrido no surgimento das
tecnologias anteriores.
No período entre 1990 e 1995, duas inovações em
particular foram determinantes para a popularização dos
computadores domésticos com acesso à internet. Ambas
tinham a ver com a invenção de interface gráfica para o uso
das novas tecnologias, o que tornou intuitivo, interessante e
divertido para as pessoas tanto o uso de computadores (o
caso do Windows e a invenção do padrão gráfico) como o
uso da internet (o caso da web e da internet de
“navegação” [Brugger, 2013, 2016]). A explosão na adoção
de computadores conectados à rede acontece na metade da
década e atinge padrões massivos já no final do período. O
século XXI já se abre tendo o padrão de computadores
domésticos e internet como um dos fenômenos sociais mais
importantes e característicos.

A democracia digital decola


A partir de 1996 temos algo muito peculiar acontecendo.
Em primeiro lugar, mudou rapidamente a perspectiva sobre
em que prestar atenção em termos tecnológicos: o foco se
desloca da televisão para o computador, e da tecnologia do
cabo para a internet. Não havia competição, nem no
sucesso comercial nem na velocidade de adoção. Estamos
agora, de forma autoconsciente, na “era da internet”
(Brants, 1996). Em projetos de experimentação, na retórica
e na pesquisa consolida-se a já iniciada substituição da
“democracia à distância” pela expressão mais geral
“democracia eletrônica” – ou pelas concorrentes, como as já
mencionadas “ciberdemocracia” e “democracia virtual”.
Se usarmos a atenção acadêmica como um marcador
confiável da importância social, científica e política atribuída
a um tema, então não há dúvida de que é a partir de 1996
que realmente se abre a era da democracia digital. A
primeira evidência arrolada em favor da hipótese é o fato de
que entre 1996 e 1999 publica-se sobre democracia e
tecnologia o mesmo volume de títulos que se publicou entre
1972 e 1995. Na comparação de publicações por década
(Gráfico 1) fica ainda mais evidenciada a demarcação
temporal da área e que a segunda metade dos anos 1990
representa efetivamente o seu marco inicial.

GRÁFICO 1
Distribuição de publicações sobre democracia digital por década –
1976-2015

Além disso, se observarmos a distribuição histórica da


atenção acadêmica, veremos que só a partir de 1996 há de
fato uma produção numericamente relevante, constante e
crescente sobre o nosso tema, como se pode ver na série
temporal que inclui toda a publicação até 2016 (Gráfico 2).

GRÁFICO 2
Distribuição de publicações sobre democracia digital por ano – 1996-
2016

O decênio que vai de 1996 a 2005 não é homogêneo,


nem do ponto de vista da inovação tecnológica nem dos
usos sociais da tecnologia, e tudo isso se reflete no tema da
democracia eletrônica. A segunda metade da década de
1990 é conhecida como o momento da “virada comercial”
da internet, em que o padrão da internet reservada a
acadêmicos é substituído pela internet popular, mas
também do boom da sua popularização. Multiplicam-se os
provedores de acesso à rede, caem consistentemente os
custos das máquinas e do acesso, explodem a curiosidade
pública sobre as coisas que se podia fazer, como se dizia, no
“mundo virtual” e o desejo de se estar “plugado”. A corrida
para o computador com internet é a ordem do dia até a
virada do milênio. Já no final do século, os novos usuários
estão muito interessados em interação online, abundante
na forma de fóruns eletrônicos e chats da web, mas
também em ferramentas digitais para comunicação
instantânea. Na primeira metade dos anos 2000, essa
tendência se consolida e vai resultar na internet de
relacionamentos, de compartilhamento e de mídias sociais,
de base web (Allen, 2013; Zimmer; Hoffmann, 2016), muito
popular nesse período. O Orkut é de 2004, o YouTube é de
2005, o Twitter e a versão para todos do Facebook são de
2006, mas há já sites para redes sociais desde 1997 (como
o Six Degrees.com) (Boyd; Ellison, 2007).
Do ponto de vista temático, a discussão sobre
fundamentos conceituais, a teoria da democracia eletrônica,
é o centro da atenção acadêmica ao impacto das
tecnologias na democracia na maior parte do período. Nos
dez anos entre 1995 e 2004, época de ouro da teoria da
democracia digital, mais de dois terços de toda publicação
adota uma abordagem teórica ou a incluem. Isto quer dizer,
antes de tudo, que a maior parte dos estudos, mesmo
daqueles destinados a análises de experimentos e à luta
retórica por modelos preferidos de implementação de
tecnologia na democracia, de uma forma ou de outra, tem
de enfrentar, especulativamente, questões relacionadas às
justificações dos impactos prováveis das mudanças
tecnológicas na democracia. Afinal, mesmo retóricas e
experimentos de democracia eletrônica têm de sustentar
suas pretensões ante públicos céticos com respeito à ideia,
eventualmente adversários dela ou das consequências que
conseguem antever. Praticamente todo mundo que escreve
no campo precisa ser um pouco teórico nesse período,
mesmo quando a formação e a perspectiva não têm uma
base conceitual consistente.
Nos anos anteriores, até metade da década de 1990, a
abordagem teórica sobre por quês e para quês da
teledemocracia assegura a possibilidade de sobrevivência
do tema da democracia eletrônica. Depois de 2006,
entretanto, a democracia digital foi desdobrada em
subtemas, que prosperaram em todo o período e
praticamente formaram áreas específicas. Cada um deles
com teoria própria, experimentos e retóricas
especificamente desenvolvidas e, como se verá depois, com
a sua própria história.
Os principais subtemas da democracia digital – a
participação, a esfera pública e a exclusão e, um pouco
mais tarde, a transparência – aparecem no período em tela,
mas até 2004 o tratamento conceitual da democracia digital
predomina sobre todos os subtemas. Depois de 2004, há, de
algum modo, uma inversão de tendência quando os outros
temas da democracia digital, em seu conjunto, começam a
predominar sobre a teoria geral da e-democracia, para
enfim superá-la singularmente, entre 2006-2008 (Gráfico 3).

GRÁFICO 3
Atenção acadêmica aos subtemas da democracia digital por ano – 1996-
2005
Isso se explica por se tratar de um momento em que
todos se fazem, explícita ou implicitamente, perguntas que
solicitam respostas em termos de teoria política e teoria
democrática. A pergunta inicial, da fase da teledemocracia,
indagava por exemplo se as novas tecnologias de
comunicação teriam um impacto importante na política, no
governo e, sobretudo, na democracia. Debate que
continuou, entre 1996 e 2005, por meio da discussão sobre
as possibilidades e as características pró e antidemocráticas
das tecnologias ou sobre a permeabilidades das
democracias liberais às novas possibilidades trazidas pela
tecnologia, por exemplo. E prosseguiu à medida que se
desejava entender que tipo de democracia poderia emergir
do impacto das novas tecnologias sobre o sistema político e
os governos, bem como entender as interações entre ambos
e a sociedade. Seguiram-se grandes debates sobre as
funções democráticas que poderiam ser melhoradas (ou
pioradas) pelas novas tecnologias, sobre se uma
democracia eletrônica direta é possível ou desejável, sobre
padrões democráticos resultantes, para o bem ou para mal,
da aplicação de tecnologias. Por fim, surge a indagação
sobre se o efeito das novas tecnologias sobre o sistema
político, o governo e a sociedade produziria o modelo de
democracia que desejamos ou de que precisamos.
Dos cinco grandes subtemas da democracia digital,
apenas dois estavam realmente presentes na segunda
metade da década de 1990: a teoria da e-democracia e a
deliberação pública por meio digital. Embora e-participação
já estivesse presente na fase anterior, nos projetos de
implementação e na retórica, isso não logrou transformar-se
em volume importante de bibliografia. Na verdade,
juntamente com o tema da exclusão digital (digital divide),
a e-participação é tipicamente um tema do século XXI,
como se depreende do Gráfico 3.
Mas por que a e-deliberação é tão precoce em relação aos
demais temas? Primeiramente convém dizer que, na
verdade, trata-se aqui da junção de dois subtemas,
próximos na sua origem intelectual, mas tratados de forma
relativamente independente pelos autores: esfera pública e
deliberação pública. O subtema da esfera pública, ou da
“nova esfera pública online”, deu seguimento às aplicações
que eram feitas do conceito habermasiano de esfera
pública, na área de comunicação política, ao universo das
comunicações de massa. A ideia de nova esfera pública,
agora não mais submetida aos limites da comunicação
massiva tão criticados por Habermas nos anos 1960,
baseava-se em uma representação da internet como um
espaço livre para a conversação horizontal entre os
cidadãos sobre os assuntos de interesse comum, e produziu
um incremento considerável na introdução de questões de
teoria democrática na avaliação da revolução digital. Desde
a sua origem, a internet sempre foi adaptável a ferramentas
e ambientes em que as pessoas podiam conversar umas
com as outras, dispensando agora as mediações – e os
constrangimentos – do jornalismo e da política, bem como
os limites impostos pela necessidade de que todos os
interlocutores estivessem presentes ao mesmo tempo no
mesmo lugar, sem contar as vantagens dadas pelo
anonimato, pela universalização dos contatos não mais
restritos ao território, pela ausência de controle político,
como se acreditava, da rede. A internet parecia, então,
projetada com o propósito de implementar o ideal da esfera
pública ou, no mínimo, de renovar as esperanças de
revitalização da experiência da esfera pública (Calhoun,
1998; Carpignano, 1999; Poster, 1997; Schneider, 1996).
Logo se multiplicaram as abordagens da internet a partir da
ideia de esfera pública, principalmente por autores que
atuavam na teoria política, na teoria democrática ou na
área de comunicação, em um crescendo que atingiu o seu
ápice no fim do período que estamos analisando (Brants,
2005; Dahlberg, 2001a, 2001b; Downey; Fenton, 2003;
Gimmler, 2001; Muhlberger, 2005; Papacharissi, 2002;
Stromer-Galley, 2003). Naturalmente, não faltaram os
céticos (Dean, 2003), mas o clima dominante fazia com que
os habermasianos da esfera pública realmente se sentissem
em casa na democracia digital.
A esfera pública não foi o único dos temas habermasianos
a se sentir à vontade na democracia digital nesse período. A
teoria da deliberação foi outro dos temas muito
frequentados entre 1996 e 2005. Há uma coincidência
temporal que talvez explique esse fato curioso. Por essa
época, houve o boom da democracia deliberativa em
filosofia e teoria política. Filósofos e cientistas políticos como
James Bohman (1996), Amy Gutmann (Gutmann;
Thompson, 1996), Seyla Benhabib (1996) e John Dryzek
(2000) publicaram então alguns dos livros mais importantes
sobre democracia deliberativa, sem mencionar que nesse
mesmo momento foi lançada nos EUA a tradução do livro
Faktizität und Geltung: Beiträge zur Diskurstheorie des
Rechts und des demokratischen Rechtsstaates1, de Jürgen
Habermas, que é a referência imediata dessa corrente de
teoria democrática. Os estudos na área se multiplicaram
nos anos seguintes, e as tentativas de verificar, na prática,
como funcionaria a chamada deliberação pública,
acompanharam o crescimento exponencial do campo, de
forma que a popularização da internet pareceu uma
oportunidade única para testar aplicações de democracia
deliberativa (Buchstein, 1997; Coleman; Gøtze, 2001;
Dahlberg, 2001c; Froomkin, 2003; Gastil, 2000; Graham;
Witschge, 2003; Janssen; Kies, 2005; Maia, 2002; Trechsel et
al., 2004; Witschge, 2002). Até mesmo alguns teóricos
deste modelo de democracia foram vistos indo a campo
para discutir aplicações da deliberação pública no universo
digital (Bohman, 2004; Chambers, 2005; Iyengar; Luskin;
Fishkin, 2003; Schlosberg; Dryzek, 2002).
Na verdade, a abordagem do tema da discussão pública
online fortemente marcada pela teoria democrática deriva
de três fontes, todas com raízes em Habermas, embora não
apenas nele:
a. da discussão sobre a esfera pública burguesa, em
Mudança estrutural da esfera pública (Habermas,
1962);
b. da teoria da ética da argumentação, em Consciência
moral e agir comunicativo (Habermas, 1983);
c. da teoria da democracia deliberativa formulada em
Direito e democracia (Habermas, 1992).
O segundo desses temas desaguou no terceiro, mas é ele
que dá origem às abordagens que até hoje procuraram
testar a qualidade deliberativa das interações
argumentativas online. De um modo ou de outro, o
importante é que essa corrente possibilitou que o tema da
discussão online fosse, para o tema da democracia digital
depois de 1996, o que a teledemocracia representou para
esse mesmo tema entre os anos de 1972 e 1995.
Já no início do século XXI dois novos subtemas entraram
em cena. Primeiro, o tema reconhecido pela expressão
inglesa digital divide, que considera como questão
democrática central as desigualdades políticas causadas
pela exclusão digital de membros de uma dada sociedade
ou pela desigualdade de acesso à tecnologia entre
diferentes países e regiões. Nesse momento, a inserção
digital de alguns e a exclusão digital de outros parece
simplesmente reproduzir, e aguçar, o problema importante
para a democracia contemporânea relacionado à
desigualdade social, causado por inclusão social de uns e
exclusão de outros. Sem igualdade política não há
democracia, é simples assim. E se a exclusão digital torna
ainda mais pobres partes da comunidade política e ainda
mais vulneráveis certos países e regiões afetados por outras
vulnerabilidades, é a democracia digital ainda democrática?
A exclusão digital precisava, então, ser tratada ao menos
como questão tão relevante quanto a exclusão social.
O tema já estava presente nos anos 1990, na retórica
política e dos meios de comunicação, mas chega com
consistência à produção acadêmica nos anos 2000 (Dewan;
Riggins, 2005; Dimaggio; Hargittai, 2001; Hargittai, 2002;
Jung; Qiu; Kim, 2001; Kennedy; Wellman; Klement, 2003;
Norris, 2001; OECD, 2001; Servon, 2002; van Dijk, 2005;
van Dijk; Hacker, 2003). Na verdade, o subtema cumpre um
papel curioso na discussão sobre e-democracia, pois
funciona como uma espécie de resistência constante e a
contrapelo da própria área, em constante desafio à ideia de
que pode haver, efetivamente, democracia digital. O
subtema da desigualdade ou exclusão, para ficarmos na
alegoria bíblica, é o próprio “espinho na carne” da ideia de
democracia digital, não para negá-la, mas para ser a sua
consciência moral a lembrar persistentemente que está ali e
precisa ser considerada.
O tema da e-participação, por outro lado, é um caso à
parte. Experimentos que envolvam participação dos
cidadãos sempre acompanharam, pari passu, a ideia de
democracia por meio da tecnologia. Em parte, porque
naturalmente o conceito à sua origem, participação política,
possui tal amplitude que, convenientemente explorado,
pode englobar praticamente todas as funções que a
tecnologia pode cumprir em favor da democracia: da
interação entre governantes e governados aos registros de
opinião, do televoto à discussão online entre cidadãos, da
mobilização à manifestação política. Além disso, desde a
origem da ideia sempre houve um vínculo claro entre o
anseio de que as tecnologias pudessem melhorar as
democracias e um diagnóstico altamente compartilhado de
que há um consistente déficit democrático dos Estados
liberal-democratas contemporâneos, déficit este
profundamente relacionado com a diminuição da
participação política dos cidadãos.
A corrente de teoria democrática chamada justamente de
democracia participativa (Barber, 1984; Pateman, 1970) há
muito tempo tem contribuído para disseminar a prescrição
de mais participação civil como remédio para democracias
que esvaziaram o conceito de soberania popular, que
contam com baixo interesse e baixo índice de cooperação e
com ainda menores cotas de capital social (Putnam, 2000) –
mas com muita apatia e igual dose de cinismo – dos seus
cidadãos. A participação política cidadã aparece, então,
como o caminho para a “redemocratização das
democracias”. O discurso público sobre o fato de
tecnologias da comunicação estarem vindo em socorro da
democracia é, portanto, típico dos ambientes que partilham
a ideia de que há um déficit democrático que só pode ser
resolvido com mais participação (Gomes, 2005a, 2005b). E
a democracia participativa é mais um dos pontos de contato
entre teoria democrática e democracia digital.
Assim, embora tenhamos já publicações sobre e-
participação nos anos 1970 (Doty; Zussman, 1975; Laudon,
1977), 1980 (Arterton, 1988; Mitropoulos, 1985) e 1990
(Streck, 1998; White, 1997), é nos anos 2000 que o tema
efetivamente decola. E o faz com tal consistência que em
2016 as publicações sobre participação digital
correspondem a 50% de tudo o que é produzido na área de
e-democracia. Uma das razões do sucesso do subtema já se
deixa claramente notar no período e consiste na pluralidade
de experimentos, projetos e fenômenos abrigados no
guarda-chuva da e-participação. Nesses anos, fala-se de e-
participação em geral, mas principalmente para:
• petições digitais (Macintosh; Malina; Farrell, 2002);
• orçamentos participativos, parcial ou integralmente
online (Rios et al., 2005; Roeder et al., 2005);
• consultas públicas eletrônicas (Ainsworth, 2005;
Pearce, 2001; Whyte; Macintosh, 2001);
• ferramentas de interação entre cidadãos e governos
(Coleman; Hall; Howell, 2002; Jensen, 2003; Lotov,
2003);
• recursos de colaboração civil em processos decisórios
relativos à regulamentação (Beierle, 2003; Brandon;
Carlitz, 2002; Fountain, 2003b);
• tomada de decisão política em termos genéricos
(Kersten, 2003; Macintosh, 2004);
• e, sobretudo, para o tema da moda no período, o voto
eletrônico (Biasiotti; Nannucci, 2004; Chevret, 2003;
Gibson, 2001; Houston et al., 2005; Lauer, 2004;
Oostveen; Van Den Besselaar, 2004; Smith;
Macintosh, 2003).
Muitas e mui variadas coisas, portanto, se resolvem na
expressão “e-participação”, a esse ponto já consagrada e
disseminada.

O impacto da tecnologia na
democracia: a controvérsia dos
efeitos
Do ponto de vista do tratamento teórico da democracia
digital, esses são anos em que se enfrenta o problema da
avaliação do impacto das tecnologias para produzir
democracia. Questão vital, uma vez que da sua resposta
depende a possibilidade de se continuar falando, com
consistência, de democracia digital.
Nesse percurso, encontramos em primeiro lugar a
percepção de que há considerável disputa e confusão no
que diz respeito à estimativa da intensidade do impacto da
tecnologia na democracia, de forma que muitos (ainda) se
sentem bastante confortáveis para entender a democracia
eletrônica “como algo que se pode ser a favor ou contra”2.
Pode-se ver muito e muito pouco na democracia eletrônica e
pode-se ver coisas boas e coisas ruins no emprego de
tecnologias, uma vez que no universo das comunicações
digitais há muitas coisas diferentes a serem vistas e
diferentes premissas que podem ser adotadas. O resultado?
Para alguns, isso simplesmente quer dizer que o significado
das novas tecnologias para a democracia “é pouco claro e é
controverso”3, que o vínculo direto entre novas tecnologias
e democracia é “controverso, palpavelmente perigoso, se
não inteiramente falso”4, que os que querem compreender
os prováveis efeitos das tecnologias da informação e
comunicação sobre os processos democráticos “se
encontram em um confuso emaranhado de proposições,
muitas das quais contraditórias e todas inter-relacionadas
de maneira não explicada”5.
O que isso quer exatamente dizer, podemos entendê-lo
examinando as listas de juízos contrastantes sobre os
efeitos da tecnologia na democracia. Temos desde as
estimativas modestas dos que veem a tecnologia como um
complemento à democracia até argumentos ambiciosos dos
que consideram que “os meios eletrônicos vencerão muitos
dos problemas de escala que fizeram da democracia direta
um ideal impraticável”6, só para ficarmos em um exemplo. E
temos, enfim, até quem sustente que a concepção mesma
de democracia eletrônica é resultante de uma colagem
improvável: “A ideia de democracia eletrônica ainda está
em sua infância. Parece um coquetel explosivo, misturando
uma dose de ágora ateniense, outra de Rousseau, batida
com pedaços de Jefferson e Mill, e mais uma pitada de
entusiasmo da ideologia californiana”7. Ou seja, acerca dos
efeitos da tecnologia sobre a democracia se disse de tudo e
mais um pouco.
Sobretudo é a lista de disparidades de temas e avaliações
o que explica a tensão interna do conceito:
Os temores da polarização social devido ao acesso
desigual às TICs ou à crescente invasão do governo em
nossas vidas privadas são contrapostos à promessa de
rejuvenescida participação política engendrada por
novos canais de comunicação. A visão de cidadãos
fortalecidos pelo acesso onipresente a informações
governamentais é moderada por advertências acerca
da sobrecarga de informações8.
Ou, em outro rol:
Os pesquisadores ligaram a ascensão da internet a
uma maior capacitação do cidadão e ao reforço das
divisões de poder existentes; ao aumento da
fragmentação social e ao surgimento de novas formas
de comunidade; a uma forma de revigorar o discurso
democrático e à fúria online que envenena o
engajamento cívico; a uma nova era de ouro da
democracia participativa e a ameaças de vigilância e
controle cada vez maiores dos indivíduos; a uma era
interativa da democracia que supera a apatia dos
eleitores e a uma comercialização da vida política que
torna secundárias as preocupações democráticas9.
Em suma, com a bibliografia à mão, somos forçados a
concluir que praticamente tudo de bom e democrático e
tudo de ruim, antissocial e antidemocrático pode ser feito
por meio das comunicações digitais e dos ambientes digitais
de comunicação.
Mas há até mesmo quem considere que não se trata de
escolher entre notar isso ou destacar aquilo, mas de
diferentes aspectos do mesmo fenômeno, e que, a rigor, a
democracia eletrônica tem mesmo pelo menos três faces,
cada uma das quais “reflete um aspecto diferente do
fenômeno político impulsionado pelas TICs e implica uma
visão distinta do processo democrático”10.
• A primeira face comportaria tudo aquilo que a
tecnologia faz para remediar a crise da democracia:
melhora – em custos, mobilização, articulação,
comunicação interna, construção de redes
internacionais – na dinâmica das organizações
políticas e na prestação de serviços públicos online e
facilitação da participação política, da mobilização
social e do engajamento cívico.
• A segunda face comportaria, por sua vez, o que a
democracia eletrônica faria, segundo os seus críticos,
para estimular a crise democrática: a insistência no
plebiscitarismo que enfraquece a cidadania e o
aumento da estratificação social e das estruturas de
poder em virtude da exclusão digital.
• A terceira face da aplicação da tecnologia à
democracia é a constatação da sua própria
irrelevância, provocada pelo fato de que o que se vê
online é a comercialização da internet, e mudanças
cosméticas na espetacularização da política, não
mudanças fundamentais. No dizer de Porebski: “Após
a década da revolução da informação,
experimentamos exatamente os mesmos problemas
de democracia que tínhamos nos tempos pré-
computadores. Novos odres não podem mudar o
sabor de um vinho velho”. E conclui, com
pessimismo, sobre a impossibilidade de reduzir a
controvérsia sobre o significado da democracia
digital: “Não é muito provável que, no futuro próximo,
apareça uma perspectiva incontestável sobre o
impacto da democracia eletrônica sobre a política”11.
Uma abordagem algo diferente é a de alguns autores que
defendem que uma decisão sobre o que as tecnologias
podem oferecer à democracia depende de decisões sobre a
própria democracia. Para alguns, por exemplo, a incerteza
quanto ao alcance democrático da tecnologia deve ser
creditada à ausência de uma decisão, prévia, sobre a ideia
de democracia presente nas aspirações dos diferentes
projetos e teorias da democracia eletrônica. Segundo
Benjamin Barber, por exemplo, é igualmente plausível
pensar que a tecnologia seja tanto um empecilho no
caminho da democracia quanto uma melhora na qualidade
da comunidade política, a depender, naturalmente, da
resposta à pergunta sobre o que a democracia representa
para nós. “Em outras palavras”, diz, “resulta que não existe
uma resposta simples ou geral à questão ‘a tecnologia está
democratizando?’ enquanto não esclarecermos que tipo de
democracia é a que temos em mente”12.
Diante desse quadro, algumas soluções se apresentam. E
também aqui há diferenças. Temos desde autores que
parecem sugerir que a face luminosa e as faces medonhas
do impacto da tecnologia sobre a democracia não são
circunstanciais nem provisórias, até os demandantes por
“modelos de democracia” como Benjamin Barber e Jan van
Dijk, para os quais a decisão sobre que modelo adotar
permitiria que o campo se tornasse menos ambíguo. Tem
quem ache que a democracia eletrônica está apenas na
infância e que é preciso dar tempo ao tempo para ver se ela
consegue materializar em sistemas práticos a
transformação da utópica “democracia forte”13, e quem
ache que talvez se deva até mesmo abandonar expressões
confusas como “democracia eletrônica”, substituindo-as por
designações mais precisas como “mobilização eletrônica”,
“participação eletrônica” ou “votação eletrônica”, que,
desobstruídas das conotações e confusões da primeira,
poderiam permitir que um debate mais tranquilo “sobre as
consequências políticas das novas tecnologias seja mais
racional e substancial”14.
A estimativa – e o prognóstico – da intensidade de efeitos
não progride historicamente. Na verdade, desde os anos
1980 até hoje, há defensores de efeitos fracos,
complementares ou incrementais. Naturalmente, é bom ter
presente que a estimativa de baixo impacto pode estar
correlacionada menos a uma subestimativa dos efeitos
exercidos pela tecnologia na democracia e mais ao
contraste entre a influência que se percebe e a influência
que se esperava. Assim, autores que descrevem impactos
consideráveis de experimentos podem, ainda assim, ver-se
frustrados em suas altíssimas expectativas, uma vez que o
efeito lhes parece muito menor do que o esperado. Convém,
portanto, não conferir normatividade às estimativas de
efeito, para além dos argumentos apresentados.
Dois pontos de partida diferentes, por exemplo, podem
nos levar a uma definição baseada em desapontamento.
Arterton, por exemplo, entusiasta dos projetos de
teledemocracia, talvez em virtude de altas expectativas ou
quem sabe porque lidou com um montante considerável de
crítica acadêmica à democracia eletrônica, conforma-se
com um argumento ao estilo “na melhor das hipóteses”:
“Na melhor das hipóteses, a mudança pode levar a um
revigoramento de processos representativos facilitados
pelos meios de comunicação”15. H. Buchstein, por sua vez,
um crítico até mesmo das posições moderadas sobre os
efeitos pró-democracia da internet, conclui com a mesma
retórica: “Na melhor das hipóteses, a internet suplementaria
as instituições políticas já existentes”16.
Os argumentos da suplementação e da melhora
incremental (ou revigoramento) da democracia por meio da
tecnologia são o modelo preferido da perspectiva de efeitos
fracos. Os efeitos são fracos por algumas razões. Uma delas
se prende ao fato de que a resistência a mudanças
profundas é da natureza das instituições políticas no estágio
em que estas se encontram. John Nugent é dessa opinião.
Para ele, vale a regra geral segundo a qual uma nova
tecnologia ou meio de comunicação (e ele tem em mente
nada menos que a internet) tem maior probabilidade de
refletir ou complementar a ordem política do que de
modificá-la.
Apesar de toda a sua importância, a internet não
recriou a paisagem política americana. Como outros
meios de comunicação, complementou o mundo em
que foi criada, e suas implicações políticas devem ser
consideradas no contexto desse mundo. [...] a principal
razão pela qual a tecnologia não está à altura de tais
predições audaciosas é que a participação política e o
processo governamental são estruturados por
instituições e processos estabelecidos por constituições
estaduais e federais, que são bastante resistentes à
mudança17.
A e-democracia, como ele a define, “refere-se a processos
realizados online – comunicar-se com os outros cidadãos e
com representantes eleitos sobre política, por exemplo”,
mas também a novas maneiras de o cidadão manter-se
informado e ou de participar politicamente. Mas, conclui,
uma nova maneira de conseguir informação ou de se
comunicar com as autoridades eleitas não muda o modo
como se dá o processo legislativo, por exemplo,
inteiramente fechado à participação dos cidadãos.
Na literatura do período, a relevância do impacto da
tecnologia na democracia está correlacionada ao que pode
estar incluído no conceito. A democracia digital consiste em
formas de comunicação com representantes eleitos e de se
conseguir informação política? Então tem efeito mínimo
sobre o sistema. É uma forma eficaz de sondagem da
opinião pública capaz de influenciar os tomadores de
decisão? O nível de efetividade aumenta. Mas, em geral,
aqueles que veem pouco efeito não estão dispostos a
conceder muito em termos das funções pró-democracia da
tecnologia. Se a democracia digital é usada “para se referir
ao uso de tecnologias de informação e comunicação (TICs)
para conectar políticos e cidadãos por meio de informações,
votação, sondagem de opinião ou discussão”18, o seu
impacto estimado é maior, porque o espectro do seu
alcance é mais amplo. Mas, se a referência é distribuída no
varejo democrático entre fortalecimento da participação
política, o crescente papel dos plebiscitos e debates on-line
na tomada de decisões ou simplesmente qualquer uso de
computadores e redes de computadores para a realização
dos processos democráticos básicos, é preciso ver o peso
que damos a cada um desses elementos. Se a sua
referência, por fim, são “a racionalização da organização
governamental, a melhoria dos processos políticos, a
restauração do primado do parlamento e do conselho da
cidade, a abertura de sistemas de informação pública
anteriormente acessíveis apenas para funcionários públicos
e a imprensa, de forma a melhorar o papel do cidadão como
eleitor”, neste caso, há impacto considerável. Mas ainda é
utilizada “principalmente de forma instrumental, como um
extra tecnológico que ajuda a melhorar e aperfeiçoar a
democracia representativa existente”19.
Em sentido contrário, contudo, a maior parte dos autores
do período e do decênio seguinte tem insistido em
expectativas muito altas a respeito da influência das
tecnologias sobre a democracia. Expressões como “forma
radicalmente nova de prática democrática modificada por
novas tecnologias” e “democracia substancialmente
alterada pela tecnologia”20, ou as convicções de que “essas
novas tecnologias da comunicação não apenas afetarão a
democracia, vão transformá-la”21, de que “as TICs modernas
são absolutamente essenciais para ajudar as democracias a
se transformarem em democracias fortes ou a alçarem uma
etapa mais participativa da evolução democrática”22,
refletem claramente essa mentalidade, ainda que com um
pouco de exagero retórico.
As abordagens da teoria da democracia eletrônica que
adotam uma perspectiva de efeitos fortes da tecnologia
sobre a democracia concentram-se na distinção entre
funções secundárias ou convencionais da influência da
tecnologia nas instituições políticas e funções substanciais e
consistentes. Então, tudo vai depender de como se avaliam
o que impacta ou impactaria profundamente um sistema
democrático e o que teria sobre ele um efeito secundário, o
que, diga-se de passagem, é ainda terreno para eventuais
divergências. Mas, em geral, aos teóricos da e-democracia
ela parece menos relevante quando as tecnologias são
usadas para fazer “a política como sempre” do que quando,
por exemplo, produzem formas intensas, que dificilmente
poderiam ser conseguidas de outro modo, de transparência
pública. É menos relevante, acreditam, a mera digitalização
de serviços públicos, orientada para baratear custos e
facilitar o trabalho da burocracia estatal, do que uma nova
era de prestação de serviços públicos online, orientada
pelos interesses da cidadania.

A fase dos modelos de democracia


No subcampo da teoria da democracia digital, a discussão
dominante nesses anos concentrou-se em torno da querela
sobre os modelos de democracia. A discussão conceitual
sobre democracia eletrônica se processou, sob muitos
aspectos, em considerável correlação com os
desdobramentos em teoria democrática. A questão dos
“modelos de democracia” é um desses pontos fortes de
interação, a partir sobretudo de duas obras cuja influência
se fez notar principalmente nos anos 1990 e 2000. Refiro-
me a Strong Democracy, de Benjamin Barber (1984), e a
Modelos de democracia, de David Held (1987), dois livros de
teoria democrática que elaboraram tipologias da
democracia muito bem-sucedidas para o fim de capacitar o
olhar das pessoas a interpretar e comparar padrões
democráticos no tempo e no espaço.
O próprio Barber tratou do tema da democracia
eletrônica, embora o seu horizonte de referência se restrinja
basicamente ao padrão de experimentos e à onda retórica
associados aos projetos de teledemocracia. Em nome da
sua visão de que uma democracia verdadeira precisa ser
forte, densa, e não fraca e delgada, o autor sempre pareceu
muito desconfortável com a ideia de que as tecnologias de
telecomunicação representassem um novo estágio na
democracia global. Bem, antes de tudo convém esclarecer
que em sua opinião há, sim, um potencial democrático nas
inovações em tecnologias da comunicação que merece ser
explorado, bem como há possibilidades que nelas se
oferecem, para republicanos cívicos e até para quem
defende um conceito exigente de democracia, “de
fortalecer a educação cidadã e melhorar a comunicação
deliberativa e direta entre os cidadãos”23. O que o incomoda
é o fato de “tecnoentusiastas” defenderem que, com as
novas tecnologias da comunicação, podemos superar todos
os déficits de comunicação e de democracia do nosso
sistema político, apenas tendo para demonstrar essa
pretensão sistemas eletrônicos plebiscitários e melhora na
obtenção de informação. Não é verdade, diz. Uma cultura
política baseada em um modelo de democracia pouco
consistente não deve ser a mais propícia para
determinismos democráticos, ainda mais pró-democráticos.
De forma que “mesmo onde se pode demonstrar que a
tecnologia mantém inerentemente a promessa de potencial
cívico e democrático, não é provável que reflita a versão
delgada, representativa e alienante da democracia que
atualmente domina o pensamento político?”, indaga,
cético24.
Não é que a tecnologia se encaminhe
deterministicamente para produzir democracias fracas,
finas, em vez de gerar uma democracia consistente,
participativa, forte. O que Barber afirma é que, dada uma
cultura de democracia fraca, a não ser que seja manifesta a
vontade de encaminhar as tecnologias para que produzam
um “sistema cívico robusto e mais baseado em participação
popular”, o resultado pode ser a produção “da mesma
incivilidade e cinismo que caracteriza a política baseada nas
tecnologias mais velhas de comunicação, como rádio e
cinema”25. Tome-se, por exemplo, a interatividade, a
capacidade de conectar pessoas e de permitir reciprocidade
entre elas, que todos reconhecem ser inerente às novas
tecnologias. O potencial que têm tecnologias interativas de
produzir deliberação pública e interação entre cidadãos e
entre cidadãos e governantes é evidente, mas, por si só,
tecnologias interativas não vão resolver o fato de que o
sistema político é crescentemente impermeável à vontade
popular e fechado à participação cidadã. A questão mais
importante, porém, diz respeito a que tipo de democracia
pode emergir do emprego das novas tecnologias de
telecomunicações. Para o nosso autor é claro: quem quiser
falar de democracia eletrônica deve primeiro dizer que tipo
ou definição de democracia tem em mente. Uma pergunta
que exige de quem a responda que se posicione acerca da
democracia real e do seu modelo ideal de democracia e
partir daí julgue o que pode ou não ser oferecido pelas
tecnologias eletrônicas da comunicação.
Adotando uma perspectiva parecida, Scott London, em
paper de 1995, elabora uma contraposição entre os
modelos da teledemocracia e da democracia deliberativa.
Sobre o que, segundo o autor, são “dois modelos de
conversação pública”. Parece exagerado contrapor um
conjunto de experimentos e algumas reivindicações, mais
retóricas que teóricas, envolvendo o impacto de tecnologias
na democracia com uma corrente, altamente elaborada em
nível conceitual, de teoria democrática, mas, como a
democracia deliberativa também foi uma inspiração
consistente para experimentações (e retóricas) em
democracia digital, a comparação tem alguma
rentabilidade.
Para ele, as justificativas dos dois modelos baseiam-se em
premissas distintas. A teledemocracia seria baseada em
abordagens que em teoria política são conhecidas como
escolha racional, liberalismo negativo ou lógica da ação
coletiva, entende o mundo político como um mercado livre
em que interesses competem e conflitam e, acrescento,
valoriza mais o fato de haver canais de expressão da
opinião do que o modo como ela é produzida. Por seu lado,
a democracia deliberativa considera que a vontade política
não pode simplesmente emergir do atrito de interesses
preestabelecidos, mas da discussão racional sobre questões
acerca do bem comum (London, 1995). A tabela a seguir
resume a contraposição proposta por London.
Naturalmente, o lado do autor já está escolhido.

TABELA 2
Teledemocracia vs. democracia deliberativa
Teledemocracia Democracia deliberativa
Opinião pública e feedback dos
Opiniões agregadas não constituem um
cidadãos são essenciais para a boa
juízo público.
governança.
O discurso público dinâmico Verdades políticas emergem de
promove um saudável mercado de deliberação pública, não da competição de
ideias. ideias.
A conversação política efetiva é
A conversação política mais efetiva é
vertical – entre cidadãos e quem
lateral – entre cidadãos.
decide as políticas públicas.
O autogoverno requer tomada coletiva de
Com novas tecnologias, os
decisão – portanto, mecanismos de diálogo
cidadãos podem se governar.
e colaboração.
A velocidade das novas
A velocidade é inimiga da deliberação
tecnologias pode melhorar a
pública.
democracia.
A liberdade de expressão é a pedra A democracia se funda no princípio do
angular da democracia. diálogo, não do monólogo.
A participação pública precisa A qualidade, não a quantidade, é a medida
aumentar. da participação democrática.
A informação, normalmente vista como
Os cidadãos precisam de
precondição do debate, será mais bem
acesso igualitário à informação.
entendida como seu subproduto.

Fonte: Scott London, “Teledemocracy vs. Deliberative Democracy: A


Comparative Look at Two Models of Public Talk”, Journal of Interpersonal
Computing and Technology, v. 3, n. 2, pp. 33-55, 1995.

Já o neerlandês Jan van Dijk adota uma perspectiva


inteiramente diferente. O nosso autor sustenta também que
pode haver um vínculo entre concepção de democracia e o
juízo sobre a contribuição das TICs para o sistema político
em geral e para a democracia em particular. Mas, à
diferença de Barber e London, não o faz a partir de uma
contraposição binária entre padrões democráticos nem para
dizer que só se podem avaliar os efeitos pró-democracia dos
meios eletrônicos à luz de uma concepção de democracia.
Van Dijk parte de outras premissas, inclusive da convicção
de que as tecnologias da informação e da comunicação
impactam positivamente a democracia sob vários aspectos.
As concepções de democracia devem entrar em questão,
isto sim, para evitar a abordagem “tudo ou nada” que havia
perdurado por duas décadas na retórica sobre o tema, na
forma da contraposição ou democracia direta ou
democracia representativa. Em sua opinião, se algo ficou
claro nesse longo debate, foi, em primeiro lugar, a
convicção de que “as concepções da democracia são muito
mais complicadas do que um simples dualismo entre
democracia direta e representativa”26.
Além disso, admite van Dijk, na metade dos anos 1990
não se está mais em uma fase em que a decisão sobre as
interações entre democracia e novas tecnologias dependam
apenas de retórica e teoria: as TICs alcançaram um nível de
maturidade consideravelmente avançado e foram
assimiladas às práticas cotidianas do sistema político; não
são mais apenas vistas como possibilidades projetadas no
futuro. Por isso é possível, então, trabalhar com um olho nas
concepções de democracia e outro nas aplicações de TICs
no sistema político, de forma que se pode plausivelmente
conectar diferentes concepções de democracia a aplicações
e soluções tecnológicas que podem ser implementadas nas
democracias reais. Por isso, em mais de uma reformulação
(2000, 2012, 1996) ele tenta traçar paralelos entre os
modelos de democracia e as aplicações e funções da
democracia eletrônica que lhes são mais adequados. Em
suas sucessivas reelaborações, van Dijk fica entre cinco e
seis visões de democracia eletrônica, subdivididas entre
perspectivas centradas no governo (modelos de democracia
legalista e competitiva) e perspectivas centradas no
cidadão (modelos de democracia plebiscitária, pluralista,
participativa e libertária).
Primeiro, há o modelo de democracia legalista, que é o
modelo clássico da democracia liberal: procedimentalista
(democracia tem a ver com as regras do jogo e não com o
resultado das decisões), baseado em governo
representativo, separação de poderes, sistemas de pesos e
contrapesos, direitos e garantias fundamentais para
proteger a liberdade dos indivíduos do poder autoritário,
regra da maioria, sufrágio universal. Democracia direta e
populismo são rejeitados e temidos. O déficit democrático
fundamental na implementação do modelo tem a ver com o
baixo suprimento da informação necessária para a
orientação e decisão dos cidadãos. “Assim, seguindo o
modelo legalista, as TICs são projetadas e usadas como
meio de eliminar a escassez de informação e reforçar o
sistema político atual por meio de formas mais efetivas e
eficientes de processamento e organização de informações.
As TICs também são aplicadas para aumentar a
transparência do sistema político.”27 O meio ou ferramenta
de comunicação preferido do modelo é aquele que resolve
duas funções: a) fornecer mais e melhor informação; b)
prover interação para que governos representativos se
tornem mais abertos e mais capazes de responder às
pessoas.
A democracia competitiva é uma versão do mesmo
padrão liberal-democrático, apenas com uma ênfase muito
forte na ideia de que a democracia, ao fim e ao cabo, é
principalmente um meio de seleção de líderes. A eleição de
representantes acaba por ser colocada no centro das
preocupações democráticas e “a política deve ser vista
como uma eterna competição entre os partidos e os seus
líderes pelo apoio do público eleitoral”28. Nesse modelo, as
TICs servem à democracia enquanto se prestam ao fim de
facilitar e qualificar eleições e campanhas e atuar na
distribuição e organização, geral e segmentada, de todas as
informações necessárias para uma decisão eleitoral
qualificada. Além disso, o uso de tecnologias para prover a
eficiência do governo não deixa de ter impacto sobre a
democracia.
A democracia plebiscitária, ao contrário dos outros
modelos, que fazem parte da tipologia proposta por Held, é
um modelo gerado especificamente por van Dijk para dar
conta da visão de democracia pressuposta nas aplicações
de teledemocracia. Neste construto, canais de comunicação
direta entre líderes políticos e cidadãos levam à ampliação
da voz da cidadania em políticas públicas. Valoriza-se,
portanto, a democracia direta como forma de tomada de
decisão e a auscultação sempre que possível da posição
individual de cada cidadão, por meio de plebiscitos. Neste
modelo, a função tecnológica mais importante para a
democracia são, portanto, os sistemas de registro de votos
e opiniões. As primeiras aplicações de teledemocracia foram
configuradas para atender a demandas provenientes deste
modelo que, entre outras coisas, teve como efeito o
renascimento de perspectivas plebiscitárias nos Estados
Unidos29.
A democracia pluralista, em conformidade com o nome,
se opõe a modelos de democracia baseados na
centralização da decisão política e em monopolização do
poder, que resultam ou da crença de que a democracia é
fundamentalmente um método em que muitos selecionam
os poucos que os lideram, ou da convicção de que a
distribuição da representação seja estritamente hierárquica
e piramidal. Ao contrário, a vida pública mais saudável
democraticamente é mais horizontal que vertical, com os
cidadãos engajados em associações e organizações da
sociedade civil, forçados a cooperar e a negociar na
resolução dos próprios problemas. E os sistemas políticos
consistem em vários grupos de interesse e de pressão e em
partidos políticos que formam múltiplos centros minoritários
de poder. Em uma perspectiva assim desenhada, as TICs
podem servir a duas funções. “Primeiro, a multiplicação de
canais e meios autônomos que apoiem a potencial
pluriformidade da informação política e da discussão.” De
modo tal que praticamente todas as perspectivas e todas as
organizações possam ter assegurada a possibilidade de
expressar a própria posição. “Em segundo lugar, o avanço
das redes de comunicação interativas, em contraste com a
alocução da radiodifusão, adequa-se perfeitamente a uma
concepção de política em rede.”30
A democracia participativa enfatiza a contribuição dos
cidadãos para a comunidade política, por meio da ativa
intervenção política em todas as fases do processo
democrático, da formulação dos problemas sociais até a
elaboração e implementação de políticas públicas. A
democracia participativa simplesmente requer que se
reserve espaço para a intervenção e a cooperação dos
cidadãos em todos os âmbitos em que o poder político for
exercido em nome do povo. O modelo, por outro lado,
repete o viés individualista presente em outras concepções
de democracia, assim como, por consequência, métodos de
aferição da vontade do povo por meio da agregação de
interesses individuais. A figura do cidadão informado é
peça-chave desta perspectiva. No que tange às funções
tecnológicas, preferem-se aquelas “capazes de informar e
ativar a cidadania”. Sob duas condições: a) projetos e
implementações devem incluir todos e não apenas contar
com a participação da elite da informação; b) o projeto deve
favorecer instrumentos de discussão31.
A concepção libertária de democracia foi o último modelo
introduzido por van Dijk (2000, 2012), mas se refere a uma
perspectiva muito difundida entre os primeiros defensores
da democracia no ciberespaço. Antiestatistas por excelência
e defensores radicais da liberdade e autodeterminação dos
indivíduos, incluída aqui a sua inviolável privacidade, os
libertários aceitam qualquer coisa que não viole (ou que
promova) os seus valores, inclusive a liberdade de
experimentar com tecnologias eletrônicas. Com efeito, entre
os que primeiro adotaram as tecnologias eletrônicas e a
internet estão os defensores da independência e autonomia
do ciberespaço e das novas fronteiras eletrônicas (Barlow,
1995, 1996). O quer que afirme a liberdade dos indivíduos,
da comunidade e das sociedades sobre Estados, governos,
sistemas políticos e corporações tem endosso do
libertarismo.
A conclusão de Jan van Dijk, depois de declarar que há
democracia eletrônica para praticamente todos os gostos, é
certamente pelo ecletismo: “O impasse entre os defensores
dos modelos de democracia não pode ser resolvido: a única
solução à vista é que se chegue a compromissos”, diz. A
sugestão do autor é que os compromissos que envolvam
todos os modelos de democracia eletrônica incluam a
introdução universal de três metas importantes: “(1) um
governo que responda mais aos cidadãos, (2) um melhor
fornecimento de informações em ambos os sentidos – o
governo e a administração pública, de um lado, e os
cidadãos, de outro – e (3) um sistema político mais
transparente”32.
Outra interessante tipologia é a proposta por Roger
Hurwitz (1999), do Massachusetts Institute of Technology
(MIT), baseada em três modelos – ou padrões – que ele
acredita serem comumente encontrados na história da
democracia: partidário, deliberativo e monitorial.
Na democracia partidária, “partidos organizam atividades
políticas principalmente para que seus candidatos sejam
eleitos e depois tenham seus projetos adotados, se tiverem
algum”, enquanto na democracia deliberativa os
propositores “organizam-se em torno de questões e
convocam as pessoas enquanto cidadãos concernidos para
que expressem suas opiniões aos tomadores de decisão”.
Por fim, no modelo de monitoramento, “a política ganha
vida quando há grande insatisfação com um estado
presente de coisas e se manifesta em movimentos de
protesto ad hoc, muitas vezes dirigidos a autoridades
eleitas”33.
Para o modelo da democracia deliberativa interessam
particularmente salas de bate-papo (estamos em 1999),
fóruns e outros dispositivos para conversação, instrumentos
por meio dos quais explora a disponibilidade de informação
e o eventual acesso online a autoridades. Já a presença
online de partidos, candidatos e campanhas serve ao
modelo de democracia partidária. O modelo monitorial se
reflete no uso de lobbies, campanhas para petições e
abaixo-assinados, encontros para protestos e mobilização,
que são a forma de os cidadãos reagirem ante crises ou
ante a percepção de problemas sociais urgentes. Porque
forma comunidades de interesses que transcendem os
óbices de tempo, espaço e a necessidade de apresentação
formal dos participantes, a internet seria uma ferramenta
poderosa para esse tipo de ação democrática, segundo
Hurwitz34.
Baseada em uma perspectiva muito diferente é a
tipologia proposta por Lincoln Dahlberg, então professor na
Nova Zelândia. Dahlberg é um leitor de Jürgen Habermas e
reflete uma das influências mais antigas na subárea da
democracia digital, situadas ao redor da obra de Habermas,
particularmente Mudança estrutural da esfera pública e
Direito e democracia, e dos habermasianos da democracia
deliberativa. Em comum com as classificações precedentes,
há a premissa de que as perspectivas descritas na tipologia
devem dar conta de discursos e práticas (projetos políticos
online e experimentos com democracia na internet), além
de modelos teóricos. É assim que Dahlberg identifica os três
campos dominantes no âmbito da democracia eletrônica.
Em primeiro lugar, “um campo comunitário, que enfatiza a
possibilidade de a internet aumentar o espírito e os valores
comunitários”; depois, um “campo liberal-individualista, que
vê a internet como uma ajuda à expressão de interesses
individuais”. Por fim, o campo deliberativo, que apresenta
sob uma luz positiva a internet “como um meio para a
expansão de uma esfera pública do discurso cidadão
racional-crítico – discurso autônomo ante o poder estatal e
corporativo, por meio do qual se pode formar a opinião
pública que pode responsabilizar as autoridades que tomam
as decisões”35.
É possível identificar o propósito do autor com a sua
tipologia em três categorias. Os dois primeiros campos
representam dois dos pontos de vistas pioneiros na retórica
sobre a internet: o comunitarismo dos precursores das
comunidades virtuais e do uso da internet para uma
democracia baseada em capital social e integração
comunitária (Rheingold, 1993) e a perspectiva da
teledemocracia, com sua forte ênfase na provisão de
informações e em interações diretas entre cidadãos e
tomadores de decisão, presumindo um cidadão político
pronto e decidido que precisa apenas de uma quantidade
adequada de informação e de canais de expressão para,
então, tomar decisões apropriadas. Com isso, Dahlberg
reservou espaço para acomodar a perspectiva deliberativa
de matriz habermasiana, que tanto recusa a ideia
comunitarista de que a internet serve basicamente para a
“expressão pré-discursiva de valores
compartilhados”36 quanto refuta o liberal-individualismo
para o qual a internet serviria basicamente para canalizar
interesses individuais, também estabelecidos fora das
discussões horizontais entre cidadãos. À diferença de tais
perspectivas, os “democratas deliberativos argumentam
que um modelo de democracia ‘forte’ exige uma esfera
pública baseada em discussão crítico-racional”. Ou que
“uma deliberação respeitosa e reflexiva é exigida” para que
os indivíduos sejam transformados em cidadãos
publicamente orientados e para que possa se desenvolver,
enfim, uma opinião pública capaz de “alimentar os
processos formais de tomada de decisão”37.
O cientista político sueco Joachim Åström (2001), por sua
vez, partiu da taxonomia binária de Barber e acrescentou
uma terceira categoria, formulando três modelos de e-
democracia: quick, strong e thin democracy.

TABELA 3
Dimensões centrais da democracia segundo Åström
Quick Strong Thin
democracy democracy democracy
Eficiência/escolh
Propósito Poder para o povo Consenso
a
Base da Princípio da
Debate público Accountability
legitimidade maioria
Papel dos Tomador de Formador de
Cliente
cidadãos decisão opinião
Mandato do
Vinculado Interativo Aberto
eleito
Foco do uso da
Decisões Discussões Informação
TIC

Fonte: Joachim Åström, “Should Democracy Online Be Quick, Strong, or Thin?”,


Communications of the ACM, v. 44, n. 1, 1 jan. 2001.

A democracia rápida representa, para Åström, uma


posição possível no debate sobre democracia eletrônica.
Como outros modelos, considera positivo um incremento
significativo na participação direta dos cidadãos na tomada
de decisão política e requer uma cidadania ativa. O modelo
representativo é visto como uma necessidade prática ou
como um mal necessário, a ser evitado quando possível,
inclusive por meio das possibilidades oferecidas pelas TICs.
“Os defensores radicais desse modelo veem as TICs como
os meios decisivos pelo quais a democracia direta ao estilo
ateniense pode ser implementada na sociedade de hoje”,
segundo Åström. E acrescenta: “Mediante redes de
computadores, as visões e opiniões dos indivíduos podem
ser solicitadas, registradas, armazenadas e comunicadas,
de modo que a democracia direta pode ser implementada
não só em nível local como em nível nacional e
internacional”. Assim, a democracia representativa seria,
então, “substituída por cibercidadãos independentes que
atuam de forma responsável na ágora eletrônica, sem que
nenhum político atue como intermediário e guardião”38.
Os proponentes menos radicais, por sua vez, não desejam
a abolição completa do sistema representativo, mas o
“querem remontar e revitalizar com elementos diretos”. Há
quem pense em um governo baseado em partido político e
escolhido em eleições, mas que faria funcionar uma espécie
de democracia direta, “submetendo importantes projetos de
lei e outras decisões políticas ao voto popular, exatamente
como estes são submetidos ao voto legislativo em
democracias representativas”39. E há até mesmo quem
imagine simplesmente o uso consultivo de sondagens de
opinião por meio de tecnologia.
Diferentemente de outros modelos, com que compartilha
a convicção da importância da participação civil, na
democracia rápida se deseja “aumentar a velocidade dos
processos de tomada de decisão”. Como? Por meio de todas
as formas que permitam a aferição rápida da vontade da
maioria, através de votação ou outros meios de sondagem
de opinião mediados por tecnologia. Estaria o cidadão
habilitado para tanto? Aparentemente, não há dúvida:
“Nesta visão, presume-se que todos os cidadãos tenham
pelo menos a mesma quantidade de sabedoria que a
elite”40. Como se vê, a democracia rápida é a forma
encontrada por Åström para, de algum modo, reabilitar o
tão criticado majoritaismo plebiscitário da teledemocracia.
A democracia forte, já conhecida, é descrita como
participativa, mas, sobretudo, deliberativa. Teria surgido
como um contramodelo, para contrastar com a democracia
débil e fina do padrão dominante nos Estados de
democracia liberal, que requerem participação civil apenas
basicamente nos episódios eleitorais e que blindam e isolam
os tomadores de decisão política da esfera da cidadania. A
democracia forte requer mais legitimidade na decisão
política do que aquela conferida pela eleição de
representantes, mas tampouco considera que a vontade
predeterminada e não deliberada dos indivíduos possa
conferir a legitimidade necessária ao sistema. A única fonte
adequada de legitimidade democrática seria o processo de
formação da vontade e da opinião política por meio de
deliberação.
Como a democracia rápida, a versão forte presume uma
cidadania ativa, que age em questões de interesse comum,
mas, diferentemente da primeira, a democracia forte quer
“diminuir a velocidade” da tomada de decisão, “por meio do
envolvimento das pessoas nos processos de discussão e
deliberação”41. Os fóruns eletrônicos parecem apropriados
para isso. Há, neste modelo, simpatia por elementos de
democracia direta, mas com cautelas, uma vez que há aqui
algum ceticismo a respeito da “raw public opinion”, a
opinião pública bruta, integral mas ainda não tratada e
refinada. Na perspectiva de Åström, portanto, a democracia
forte reprovaria muita coisa da democracia rápida. Ademais,
considera precipitado o ritmo que esta propõe de tomada de
decisão e considera uma ilusão achar que há opinião
qualificada, acerca de problemas sociais complexos,
simplesmente pronta e disponível para ser automática e
facilmente coletada por meios eletrônicos. “A votação e a
sondagem devem ser baseadas em deliberação, e os
cidadãos devem ser esclarecidos por meio de informações,
discussões e debates”42.
A democracia fina, o terceiro modelo, é pouco interessada
no aumento da participação civil, uma vez que o cidadão
comum é considerado “desinteressado em política e não
qualificado para a participação”. A democracia tem
basicamente a ver com a escolha de líderes em eleições
abertas e com base em seus programas. A base de
legitimidade de quem governa se resolve com
accountability. O papel das tecnologias neste modelo
consiste em serem meios através dos quais as organizações
difundem informações e obtêm apoio, instrumentos para
facilitar o trabalho dos representantes e, por fim, canais
para a prestação de serviços públicos43.
Mas, afinal, o que se pretendia com a controvérsia dos
modelos de democracia e, por consequência, de e-
democracia? Em primeiro lugar, resolver o impasse que a
polêmica em torno da teledemocracia levou à área. As
pessoas que planejaram e executaram os primeiros projetos
eram ativistas da chamada New Left (Tsagarousianou, 1999,
p. 189), que acabaram por ser flanqueados à direita e à
esquerda.
À direita pelos defensores do padrão estrito da
democracia representativa, o que comporta,
tradicionalmente, sobretudo naquele momento, uma
considerável desconfiança quanto ao valor do aporte à
decisão política trazido pelas pessoas comuns. Uma vez
considerado que os cidadãos são pouco racionais e menos
ainda interessados em assuntos públicos (public affairs), e,
portanto, dificilmente alcançariam aquilo que Robert Dahl
chama de uma “compreensão adequada” das questões
políticas, dar maior peso ao cidadão comum no processo de
tomada de decisão política não é exatamente o que, nesta
perspectiva, se poderia entender como requalificação da
democracia. Parece justamente o contrário, isto é, um
perigoso populismo tecnológico.
O flanco esquerdo é ocupado pela perspectiva da
democracia forte, simpática a qualquer perspectiva de
democracia direta ou participativa, desconfiada, isto sim, do
governo representativo e da democracia anêmica que
oferece. A dimensão anticapitalista da perspectiva mais à
esquerda acende um alerta contra a televotação, mas as
suspeitas maiores (apresentadas anteriormente) atacam a
modalidade de apuração da vontade dos cidadãos por meio
dos artifícios da tecnologia, sem interação qualificada, sem
participação suficiente, sem esclarecimento aprofundado.
As formulações dos modelos de democracia têm dois
propósitos. O propósito de Barber e London é o de continuar
o assédio à teledemocracia em uma contraposição binária
entre uma posição adequada, a nossa, e a posição
equivocada, a deles. Mas o propósito mais comum, presente
nos demais autores, foi romper o cerco à democracia
eletrônica que o ataque à teledemocracia representou,
propondo uma alternativa eclética. A conclusão a que
chegam os autores pluralistas é que as tecnologias podem
entregar mais democracia, não importa o modelo de
preferência de quem formule os projetos de e-democracia.
Pode-se até não gostar do modelo predileto dos outros, e é
muito claro que cada autor tem as suas preferências, mas
pode-se dizer que a tecnologia pode fazer alguma coisa
para cada ênfase, padrão ou tipo de democracia preferido. E
que a democracia, como quer que seja concebida, ganha
com isso.

Enfrentando as últimas resistências


Como vemos, então, na década de 1996 a 2005 há
notável concentração de esforços na avaliação do impacto
da tecnologia sobre a democracia e na formulação de
modelos de e-democracia. Mas não se pode deixar de
mencionar o modo pelo qual algumas das críticas mais
duras contra a ideia de democracia digital, formuladas na
década anterior, são enfrentadas no período de
consolidação da área. Vamos aqui considerar algumas delas
e os contra-argumentos apresentados. As críticas de 1 a 3,
provenientes do período anterior e já conhecidas por nós,
serão tratadas resumidamente. A quarta, mais complexa,
terá um tratamento um pouco mais extenso.
1. É falsa a ideia mais geral de que o uso de
tecnologias de comunicação poderia resolver, por si
só, problemas da democracia. Não seria, por
exemplo, porque temos capacidade tecnológica de
tornar as decisões políticas mais compartilhadas, que
estas passariam a ser de responsabilidade dos
cidadãos e não da competência dos representantes
eleitos. Não é uma mera questão de tecnologia, mas
de desenho institucional (McLean, 1989): “A
tecnologia não resolve os problemas conceituais que
são gerados pela democracia”44.
Esta crítica parece enfrentar um espantalho retórico,
criado do nada só para ser facilmente vencido, que
sustentaria um automatismo tecnológico segundo o qual a
mera existência de canais e possibilidades levaria governos
e a burocracia a correr para transferir todos os dados
possíveis aos cidadãos e os cidadãos, por sua vez, a se
lançar sobre essas informações para consumi-las e elaborá-
las. Bem, na verdade, dados governamentais íntegros,
atualizados, abundantes e à disposição dos cidadãos, como
o sabemos hoje, são fundamentais para a democracia, para
melhorar a vida das pessoas e até para o progresso da
sociedade. Mas nada é automático na democracia, nem a
existência dos melhores meios tecnológicos à disposição.
Historicamente, a agregação de interesses foi a meta
incialmente mais visível dos projetos de democracia
eletrônica. Não só era a mais compatível com o estágio
alcançado pelas telecomunicações nos anos 1970-1990,
como era a que requeria menos alterações em sistemas
políticos consideravelmente fechados aos cidadãos. Não
podemos dizer se era exatamente o que queriam
desenvolvedores e defensores do uso das tecnologias para
promover democracia, mas podemos dizer que eram as
brechas de oportunidade para se conseguir mais
democracia por meio de tecnologia, dadas as
circunstâncias. Podia-se facilmente usar tecnologias para
aumentar a provisão de informações do seu interesse ou
para coletar a sua opinião ou o sentimento popular sobre
questões públicas, e estas possibilidades foram
frequentemente exploradas.
O lastimável é que defensores de um modelo
rapidamente se tornam detratores de padrões alternativos,
e rapidamente as metas que consideravam o interesse e a
manifestação dos indivíduos foram tratadas como formas de
trocas mercantis, e o cidadão, como um consumidor privado
e privatizado. Em alguns casos, decidiram jogar fora a
criança com a água do banho – a democracia eletrônica não
seria democracia.
2. O tipo de democracia que emergiria da democracia
eletrônica seria “uma versão rebaixada e
empobrecida do verdadeiro ideal. A democracia
torna-se um mero dispositivo para registrar
preferências”45.
O problema desta crítica é confundir a função que uma
determinada tecnologia pode prestar e um juízo geral sobre
a democracia como resultante apenas do cumprimento
dessa função. Se temos à disposição um canal de
comunicação que permite aferir votos, isso não significa que
daí decorre um tipo de democracia baseado na aferição
remota de preferências. Não há sequer proporção entre uma
coisa e outra. Significa apenas que agora temos uma
democracia que tem à disposição um recurso para se
registrarem as preferências dos cidadãos mesmo à
distância, o que, se não muda muita coisa na qualidade
democrática da sociedade, é ao menos mais uma coisa a se
incorporar ao repertório dos recursos democráticos dessa
sociedade.
3. Não se trata apenas da promoção de uma forma
rebaixada de democracia via tecnologia, mas do fato
de as tecnologias da democracia eletrônica acabarem
promovendo, ao fim e ao cabo, assimetrias
antidemocráticas. É o famoso argumento segundo o
qual, em virtude da desigualdade no acesso e no uso,
as tecnologias representam mais uma vantagem,
acrescentada ao repertório daqueles que já dominam
a sociedade. Os poderosos, assim, tornam-se ainda
mais poderosos, a prejuízo dos socialmente excluídos
que, além das outras formas de exclusão, também
sofrerão com a exclusão tecnológica.
Mas tampouco este argumento representa uma objeção
consistente à ideia de democracia eletrônica, a não ser que
se demonstre que foram os recursos democráticos da
tecnologia que causaram a desigualdade social de uma
determinada sociedade. Problemas de desigualdade e de
exclusão social se enfrentam lidando-se com as suas causas
verdadeiras, não impedindo que uma sociedade se
desenvolva apenas para não dar aos socialmente incluídos
ainda mais chances de desfrute a prejuízo dos excluídos.
Caso contrário, não apenas a exclusão social não diminuirá,
como a sociedade perderá oportunidades de se desenvolver.
Além disso, vinte anos depois da resenha de Street, vimos
que a exclusão digital se tornou consideravelmente menor
do que a exclusão social. De forma que atrofiar o
desenvolvimento da democracia digital não parece ter se
encaminhado, como previsto, para um aguçamento das
desigualdades sociais. Ao contrário.
4. Se a democracia digital não é capaz de produzir mais
e melhores participação civil e deliberação pública,
então ela não pode ajudar a melhorar a democracia.
No decênio de 1996 a 2005 ainda estamos à volta, ainda
que não com a mesma intensidade, com a sintomática
questão do alcance da e-democracia. Um interessante
argumento sobre o tema foi apresentado pela cientista
política anglo-americana Pippa Norris, em um importante
livro de 2001 chamado Digital Divide. É bem verdade que o
argumento de Norris é uma explícita crítica à concepção de
esquerda da e-democracia e que é uma crítica claramente
posicionada do outro lado, em um modelo schumpeteriano.
Mas finda por ser um argumento consistente contra quem
faz da participação e da deliberação os requisitos sem os
quais não haveria democracia digital, uma perspectiva que
ela considera excessivamente estreita. Para Norris, quem
adota um conceito de democracia direta, forte ou
plebiscitária tem que prever um papel direto para os
cidadãos no processo de tomada de decisão, o que se
define aí como a forma eminente de participação. Mas
participação política, assim como a deliberação pública, se
são apenas um elemento importante de qualquer conceito
de democracia, não podem ser transformadas no seu único
elemento.
O modelo alternativo oferecido por Norris destaca, então,
outros elementos que devem ser considerados, como
• “a concorrência pluralista entre partidos e indivíduos
para todos os cargos de poder governamental”;
• “as liberdades civis e políticas para falar, publicar,
reunir-se e se organizar, como condições necessárias
para assegurar uma concorrência e participação
efetivas”; e
• “a participação entre cidadãos iguais na seleção de
partidos e representantes por meio de eleições livres,
justas e periódicas”46.
Note-se que a participação aqui é apenas “participação
em eleições”. As outras duas dimensões são explicitamente
aspectos típicos da democracia liberal: liberdades políticas e
civis e democracia eleitoral. Participação e deliberação, no
sentido que lhes dão perspectivas à esquerda, “como a
tomada direta de decisões dos cidadãos e a deliberação
direta no processo político, ou o voto eletrônico”47, não
estão no horizonte. O que, por outro lado, não tornaria a
democracia digital menos necessária ou urgente, uma vez
que, na “maioria das sociedades mundo afora, as
instituições centrais do governo representativo e da
sociedade civil precisam urgentemente ser nutridas e
fortalecidas”48.
O juízo de Norris sobre as polêmicas e as controvérsias
acerca do papel das tecnologias digitais para a democracia,
traçadas como o debate sobre o papel das tecnologias para
a democracia direta ou forte, é que se trata de um debate
substancialmente defeituoso, uma vez que está centrado
em exigências de participação na decisão política, inclusive
na participação deliberativa. Para ela, toda essa discussão
pode ser considerada nada mais que “uma irrelevância que
nos tira o foco, um mosquito zumbindo, desviando a
atenção da função potencial da internet no fortalecimento
das instituições de governança representativa e das
sociedades cívicas em todo o mundo”49. A questão-chave, a
ser reposicionada ao centro, sobre a possibilidade de uma
democracia digital consiste, portanto, em quanto os dois
atores principais da democracia, governos e cidadãos,
utilizarão “as oportunidades oferecidas pelos novos canais
de informação e comunicação para promover e fortalecer as
principais instituições representativas que conectam os
cidadãos e o Estado”50.
A este respeito, as oportunidades de participação
pública e envolvimento cívico geradas através de novas
tecnologias são importantes, assim como o são a
capacidade da internet de fornecer informações que
promovam a transparência, a abertura e a
responsabilização das agências governamentais em
nível nacional e internacional, bem como de fortalecer
os canais de comunicação interativa entre cidadãos e
instituições intermediárias51.
Participação pública e engajamento cívico por via digital,
mas também e-transparência, governo aberto, e-
accountability e canais interativos de comunicação com as
instituições intermediárias do Estado são todas distintas
funções por meio das quais as tecnologias exercem impacto
sobre a democracia. E o estado atual da internet permite a
execução de algumas delas melhor do que outras. De forma
que mesmo que funções típicas da democracia forte ou
direta, como engajamento cívico e participação militante,
não pareçam bem resolvidas na democracia digital, podem-
se indicar funções típicas da democracia representativa
muito mais bem encaminhadas em meios digitais, como
apoio a partidos minoritários em suas campanhas, a
constituições de redes transnacionais de organismos do
terceiro setor, a oferta a jornalistas e interessados de mais e
melhor acesso a documentos oficiais e a propostas
legislativas. Assim, segundo Norris, a função de promover a
participação na decisão política não só é apenas mais uma
das funções que se podem exercer por meio da internet,
como também, inclusive, pode não ser a mais bem
executada pelas tecnologias digitais dentre as demais
funções que igualmente beneficiam a democracia
representativa.
Não é preciso disputar com Norris o valor atribuído à
participação e à deliberação para a qualidade democrática
de uma sociedade nem o grau de intensidade que se
demanda de cada uma delas para o nível de legitimidade do
Estado liberal-democrata. Schumpeterianos tendem a
considerar que sociedades com um volume muito alto de
participação política dos cidadãos são não apenas muito
difíceis de governar como, inevitavelmente, não entregam
valores democráticos importantes como igualdade,
liberdade, pluralismo, direitos. E, se em algum momento os
diversos fascismos, com sua participação civil massiva,
eram o contraexemplo do que se queria evitar, hoje em dia
os populismos de direita que se espalham pelas
democracias ocidentais constituem razão suficiente para
recomendar prudência na adesão à hipótese de que a
participação é boa em si mesma (Gomes, 2011). Por outro
lado, há um ponto em que Norris tem certamente razão,
que é a rejeição do argumento “ou tudo ou nada” da
democracia digital com base em requisitos muito exigentes
de democracia, como a participação e a deliberação na
decisão política institucional, coisa que não nos atrevemos a
exigir da sociedade em geral para que a reconheçamos
como efetivamente democrática, mas que se exige
constante e equivocadamente da e-democracia.
Por fim, a contraposição nítida e binária entre
participação e representação dificilmente tem todo o
sentido que alguns pretenderiam dar. Como bem disse
Norberto Bobbio, “entre a democracia representativa pura e
a democracia direta pura não existe, como creem os
defensores da democracia direta, um salto qualitativo, como
se entre uma e outra existisse um divisor de águas e como
se a paisagem mudasse completamente tão logo
passássemos de uma margem à outra”52. Trata-se bem mais
de um continuum, em que participação e deliberação são,
em geral, mais meios do que fins em si mesmos. Neste
caso, há que considerar que nem toda participação precisa
necessariamente ser participação na decisão política, mas
que há ganhos consideráveis em uma participação que
incida, por exemplo, na ampliação do processo de
democratização da sociedade. Sob este aspecto, há algo
muito interessante, para a democracia, no ar, quando a
democratização “consiste não tanto, como erroneamente
muitas vezes se diz, na passagem da democracia
representativa para a democracia direta quanto na
passagem da democracia política em sentido estrito para a
democracia social”53. Isso quer dizer que nem tudo o que
está em jogo na democracia é a democratização do Estado,
ou a ocupação da esfera em que as decisões políticas são
tomadas por cidadãos ativos, mas o aumento dos
participantes nas tomadas de decisões no interior da própria
sociedade, em sindicatos, conselhos, organizações,
instituições.
1 Publicado nos EUA como Between Facts and Norms: Contributions to a
Discourse Theory of Law and Democracy (Cambridge: MIT Press, 1996) e no
Brasil como Direito e democracia: entre facticidade e validade (Rio de Janeiro:
Tempo Brasileiro, 1997).
2 Å. Grönlund, “Democracy in an IT-framed Society: Introduction”,
Communications of the ACM, v. 44, n. 1, pp. 22-6, 1 jan. 2001, p. 25.
3 H. Buchstein, “Bytes that Bite: The Internet and Deliberative Democracy”,
Constellations, v. 4, n. 2, pp. 248-63, out. 1997, p. 248.
4 B. R. Barber, op. cit., p. 208.
5 C. Weare, “The Internet and Democracy: the Causal Links Between Technology
and Politics”, International Journal of Public Administration, v. 25, n. 5, pp.
659-91, 20 abr. 2002, p. 660.
6 H. Buchstein, op. cit., p. 248.
7 T. Vedel, op. cit., p. 234.
8 C. Weare, op. cit., p. 660.
9 Ibidem, p. 662.
10 L. Porebski, “Three Faces of Electronic Democracy”, Proceedings of the 10th
European Conference on Information Systems (ECIS), Gdansk, Polônia, 2002,
p. 1220, disponível em: <http://aisel.aisnet.org/cgi/viewcontent.cgi?
article=1082&context=ecis2002, acesso em: 11 dez. 2017.
11 Ibidem, p. 1225.
12 B. R. Barber, op. cit., p. 223.
13 T. Vedel, op. cit., p. 234.
14 L. Porebski, op. cit., p. 1225.
15 F. C. Arterton, “Political Participation and ‘Teledemocracy’”, op. cit., p. 621.
16 H. Buchstein, op. cit., p. 260.
17 J. D. Nugent, “If E-Democracy Is the Answer, What’s the Question?”, National
Civic Review, v. 90, n. 3, pp. 221-34, jan. 2001, p. 224.
18 Å. Grönlund, op. cit., p. 23.
19 K. Brants; M. Huizenga; R. van Meerten, “The New Canals of Amsterdam: An
Exercise in Local Electronic Democracy”, Media, Culture & Society, v. 18, n. 2,
pp. 233-47, 1 abr. 1996, p. 238.
20 L. A. Friedland, “Electronic Democracy and the New Citizenship”, Media,
Culture & Society, v. 18, n. 2, pp. 185-212, 1 abr. 1996, p. 185.
21 T. Westen, “E-Democracy: Ready or Not, Here It Comes”, National Civic
Review, v. 89, n. 3, pp. 217-28, 2000, p. 217.
22 T. Becker, “Rating the Impact of New Technologies on Democracy”,
Communications of the ACM, v. 44, n. 1, pp. 39-43, 1 jan. 2001, p. 39.
23 B. R. Barber, op. cit., p. 208.
24 Ibidem, p. 213.
25 Ibidem.
26 J. G. M. van Dijk, “Models of Democracy – Behind the Design and Use of New
Media in Politics”, Javnost – The Public, v. 3, n. 1, pp. 43-56, 7 jan. 1996, p.
44.
27 Ibidem, p. 48.
28 Ibidem.
29 Ibidem, p. 49.
30 Ibidem, p. 50.
31 Ibidem, p. 54.
32 Ibidem, p. 55.
33 R. Hurwitz, op. cit., p. 657.
34 Ibidem, p. 660.
35 L. Dahlberg, “The Internet and Democratic Discourse: Exploring The
Prospects of Online Deliberative Forums Extending the Public Sphere”,
Information, Communication & Society, v. 4, n. 4, pp. 615-33, 2001, p. 616.
36 Ibidem, p. 620.
37 Ibidem.
38 J. Åström, “Should Democracy Online Be Quick, Strong, or Thin?”,
Communications of the ACM, v. 44, n. 1, 1 jan. 2001, p. 50.
39 Ibidem.
40 Ibidem.
41 Ibidem.
42 Ibidem.
43 Outras tipologias de modelos de democracia foram exploradas nesses anos,
sem, contudo, alcançarem níveis mais sofisticados de taxonomia. Vale
mencionar a tipologia de Arthur Edwards (1995), que distingue três
concepções de democracia eletrônica: populista, liberal e republicana. E a de
Jens Hoff (Hoff; Horrocks; Tops, 2000), com quatro modelos de e-democracia:
consumista, plebiscitária, pluralista e participativa.
44 J. Street, op. cit., p. 32. As três críticas não são de John Street, mas foram por
ele resenhadas no artigo citado.
45 Ibidem, p. 32.
46 P. Norris, Digital Divide: Civic Engagement, Information Poverty, and the
Internet Worldwide, Nova York: Cambridge University Press, 2001, p. 102.
47 Ibidem, p. 103.
48 Ibidem, p. 104.
49 Ibidem.
50 Ibidem.
51 Ibidem.
52 N. Bobbio, Il futuro della democrazia, Turim: Einaudi, 1984, p. 15.
53 Ibidem, p. 66.
Não é fácil definir democracia. […] Nesse contexto, não
surpreende que haja tantas definições de democracia
digital. Para alguns, o termo se refere ao uso de
ferramentas digitais para fornecer informações e
promover a transparência; para outros, descreve os meios
pelos quais as tecnologias de informação e comunicação
(TICs) podem ampliar e aprofundar a participação; ao
passo que para outros, ainda, trata-se de favorecer o
empoderamento dos cidadãos, capacitando-os a tomar
decisões diretamente por meio de ferramentas online.
Definimos o termo simplesmente como “o exercício da
democracia mediante o uso de ferramentas e tecnologias
digitais”.
Julie Simon et al.

Uma nova internet

DECÊNIO DE 2006 A 2015 consolida a tendência da


O nova internet, que se caracteriza, em primeiro lugar,
pelo crescimento importante dos então sites de
relacionamentos (mais tarde popularizados como “sites de
redes sociais”) e sites de compartilhamento de fotos, vídeos
etc. (as hoje chamadas “mídias sociais”). A nova ideia
dominante no mercado nesse momento é a da web 2.0,
interativa e cooperativa, para onde convergem clássicas
ideias comunitárias do imaginário tecnológico. Entretanto, é
a própria ideia de site e da web clássica que entra em
questão com as duas inovações consolidadas nesse período:
a internet de aplicativos e a internet móvel. O último
decênio testemunhou uma nova “corrida às máquinas”
depois da ida à compra de computadores domésticos dos
anos 1990, que é a busca de dispositivos portáteis com
capacidade de processamento e conexão à internet. A
conexão começa a se libertar dos computadores domésticos
e de escritórios e passa a ser portável para onde quer que
nos movamos, por meio de máquinas portáteis e de
telefones celulares. Enfim, a expressão “computador
pessoal” passa realmente a fazer sentido. Além disso, o
aplicativo como padrão de uso da internet acompanha a
explosão do consumo de dispositivos móveis, que se
consolidaria na década de 2010 em nível global. Algumas
inovações icônicas nesses anos, como o McBook Pro (2006),
que popularizou o notebook realmente portátil, o iPhone
(2007) e o sistema operacional Android (2008), apenas
sinalizavam a corrente dominante em termos de consumo e
de adoção social de tecnologias da comunicação.
Além disso, a última década tem características tão
peculiares em relação ao decênio anterior que praticamente
se pode falar de uma nova internet. A internet baseada em
dispositivos móveis, conexão permanente e aplicativos de
mídias digitais quase não se parece com aquela baseada
em navegação web, dependente de desktops e com
conexões intermitentes, em que um “mundo virtual” se
desgarrava do “mundo real” e era preciso sair de um para
entrar no outro. O último decênio foram os anos da
ubiquidade das tecnologias digitais, em que o prefixo e-,
que designava o mundo novo das comunicações eletrônicas,
foi substituído pelos prefixos smart-, como em smart TV,
smartphone, smart gov, smart cities, smart democracy, e
m-, de mobile, como em m-government e m-democracy, e
pelos adjetivos 2.0 e 3.0. E são os anos em que se
descobrem os big data – os grandes bancos de dados
digitais coletados, processáveis e utilizáveis que prometem
nos revelar tudo sobre todas as coisas – e se estabelece o
horizonte normativo dos dados governamentais abertos e a
serviço não só da sociedade como também, vejam só, da
humanidade.
Do ponto de vista do uso social das comunicações
digitais, a última década é marcada pela hiperconexão
(Gomes, 2016b) e pelo que dela decorre. A hiperconexão é
um estado em que os indivíduos têm sempre à mão um
aparelho que geralmente não é desligado nem
desconectado da rede. Mais que isso, nesse estado, as
pessoas estão cada vez mais rodeadas por múltiplos
aparelhos, frequentemente com funções redundantes, por
meio dos quais satisfazem funções e necessidades como
estar em contato social, atualizar-se sobre fatos, coisas e
pessoas que lhe interessam, obter informação, conversar
com outras pessoas, transferir para redes sociais digitais
conteúdo de todo o tipo e formato, cumprir e agendar
compromissos, orientar-se no espaço e na vida, matar o
tédio, trabalhar, relacionar-se, entre outras coisas.
Outros fenômenos sociais importantes estão relacionados
à hiperconexão. O principal deles é a internet social ou a
internet baseada em mídias sociais, em redes sociais
digitais e no intenso consumo ou produção de conteúdo
digital. “Conteúdo” é a expressão que se refere
genericamente a qualquer tipo material escrito, gráfico,
audiovisual (e tudo isso ao mesmo tempo) disponível nas
comunicações digitais. A decorrência mais relevante da
internet social é a formação de ambientes sociais de
natureza digital, online, baseados em ferramentas e
aplicativos para redes sociais. Não é que cada um dos
websites, aplicativos e serviços para social networking
forme cada um deles um ambiente social, de forma que
possamos falar de um ambiente social para o Facebook,
outro para o Twitter, o Instagram, o YouTube etc. É que cada
pessoa tem a sua própria rede social no interior de cada um
dos serviços de redes digitais, formada pelos seus vários
amigos, seguidores, seguidos, fãs... ou o nome que se dê às
pessoas em contato com ela. Os ambientes digitais
cumprem funções de referência intelectual, afetiva, política,
ideológica, identitária etc. de acordo com a clivagem que
cada um considerar importante e usar como critério para
selecionar as conexões que manterá online. Além disso, no
estado de hiperconexão, está-se em contato com o próprio
ambiente digital sem que se precise sair ou “desconectar”
dos ambientes sociais tradicionais em que estamos
inseridos – família, amigos, colegas, membros da religião ou
do partido etc. Não há nada que imponha escolhas
excludentes, como fazer uma atividade familiar ou estar
com amigos ou estar ligado no seu próprio ambiente digital.
Por fim, o ambiente digital é portátil e realmente pessoal, no
sentido de que, uma vez que os dispositivos de conexão
estejam funcionando, o acesso ao ambiente digital se
desloca com a gente, todas as horas do dia e em todas as
circunstâncias que se desejar: pode-se ler, ver, publicar,
compartilhar e interagir com o ambiente digital durante a
aula, no silêncio da cama, no banheiro, na reunião, na praia,
nas férias, no aeroporto, conforme a nossa conveniência e
interesse.
Antes de tudo, convém notar que, na explicação dos
movimentos internos da democracia digital, alguns eventos
sociais têm grande importância. Assim como os
ciberlibertários dos anos 1990 tiveram os seus imaginários
profundamente impactados pelo uso da internet pelos
zapatistas em 1993 e pelas manifestações contra o
encontro da Organização Mundial do Comércio (OMC) em
Seattle, em 1999, os primeiros usos bem-sucedidos de
campanhas políticas online (Howard Dean em 2004 e
Barack Obama em 2008) influenciaram muito o tema das
eleições e campanhas digitais, e os protestos no Irã em
2009 e a chamada Primavera Árabe, que começa no ano
seguinte, tiveram profundo impacto nos temas da
participação política online e no papel da internet em
protestos, na ação política, na mobilização social, na
organização da sociedade civil e, até mesmo, em
revoluções.
No mundo dos telefones celulares que nunca desligam
nem se desconectam, em uma época em que todos vivemos
ao mesmo tempo, e complementarmente, online e offline,
em um universo em que as nossas necessidades básicas de
informação e orientação se resolvem tocando em telas,
clicando e digitando em dispositivos, parece absolutamente
plausível a ideia de que os meios para comunicações
digitais, as próprias comunicações e os ambientes online
criados por estas tenham um considerável impacto sobre a
democracia, a política e o governo. Afinal, não há coisa mais
evidente para um sujeito do século XXI do que a crescente
digitalização da vida.
Nada há de metafísico na constatação. Qualquer pessoa
percebe, por exemplo, que, na sociedade contemporânea, o
setor de serviços que envolve interação vai, pouco a pouco,
trocando ou suplementando as suas interfaces tradicionais
(o balcão, o guichê, o atendente, o vendedor, o formulário)
por interfaces digitais. A compra, a transação bancária, o
contrato, o contato, tudo se faz cada vez mais online. Nesta
mesma conta deve ser incluída a prestação de serviços do
próprio governo, cada vez mais digitalizado mundo afora.
Além disso, as próprias interações sociais, familiares e
privadas se tornam cada vez mais mediadas por
tecnologias, dispositivos, aparelhos, meios e ambientes de
comunicações digitais. Desde as formas mais cotidianas da
conversa, da troca de afeto e informação pública, privada e
íntima, até o consumo e produção de informação, a troca de
opiniões, interpretações do mundo e pontos de vista, a
satisfação das necessidades de orientação, o
acompanhamento do dia e da vida de quem nos é caro ou
de quem é apenas objeto da nossa curiosidade. Assim,
grande parte do que fazemos no dia a dia, como consumir,
orientar-nos e nos manter informados, fazer transações
comerciais ou nos relacionar, depende cada vez mais da
mediação de tecnologias digitais.
Não é de surpreender, portanto, que outras atividades e
interesses, menos cotidianos, mas igualmente importantes,
também sofram um impacto semelhante dos meios e
ambientes digitais que nos circundam. Se nos servimos de
redes sociais digitais para acompanhar a política, se nos
orientamos politicamente via informação disponível online,
se hoje as nossas redes de contatos e relacionamentos
políticos são em geral baseadas em sites e aplicativos de
interação, por que haveria surpresa no fato de que também
seja digital a mobilização para os protestos políticos em que
nos engajamos, que se apoiem em mídias digitais grande
parte das ações políticas que praticamos, que tenham uma
base online as campanhas sociais e políticas em que nos
envolvemos?
Na mesma linha, se admitimos com relativa tranquilidade
que há considerável impacto da digitalização das interações
e relacionamentos em praticamente tudo o que fazemos,
estamos igualmente prontos para admitir que esse impacto
se estende para outros âmbitos da vida. Inclusive da vida
em comum, no interior da comunidade política. Afinal,
vivemos em comunidades e em Estados, sob a lei e os
regimes de vida comum, ao alcance de constrangimentos e
de condições de possibilidade de natureza política que
estabelecem os limites do que são direitos e do que são
deveres para cada um de nós. Em outros termos, a nossa
vida inteira se desenrola nos limites do contrato social e da
comunidade política e, naturalmente, do modo como essa
comunidade política é regida. Uma vez que se admite que
há uma digitalização progressiva da vida privada e das
interações sociais, parece uma consequência natural
admitir que há mediação tecnológica crescente da vida
pública, isto é, daquele âmbito da vida em sociedade que
tem a ver com os assuntos ou negócios públicos, com o
regime de funcionamento da comunidade política e com a
sua forma institucional, o Estado.
A vida pública comporta necessariamente uma dimensão
normativa, isto é, não relacionada às coisas como
efetivamente são, mas ao modo como as coisas deveriam
ser. Uma boa parte das energias despendidas na política,
por exemplo, tem a ver com visões, com perspectivas sobre
como se deveriam tomar as decisões que afetam a vida de
todos, com que políticas públicas são preferíveis e em como
elas deveriam ser implementadas para a realização deste
ou daquele fim. Assim como há em geral também uma
dimensão normativa, quer dizer, baseada em visões e
perspectivas orientadas por valores, a sustentar e motivar
protestos, manifestações, revoluções.
Por fim, na esfera do regime de funcionamento do Estado,
essa dimensão normativa é ainda mais imperativa, uma vez
que a democracia é uma resposta a preferências sobre a
escolha de líderes, a organização, a alocação e a limitação
do poder político, a tomada das decisões que afetam a vida
de todos, a produção de leis, a configuração da
magistratura e a aplicação da justiça, os tipos de direitos e
garantias e a quem são assegurados.
O reconhecimento de que política e democracia envolvem
também preferências e visões com base em valores não
comporta, contudo, qualquer diminuição da percepção
pública de que a digitalização de todas as esferas parece
um caminho natural. O fato de a vida pública ser
constantemente atravessada por disputas de valores não
altera a nossa percepção comum de que a mediação digital
nos fornece canais, instrumentos e recursos que afetam
decisivamente a política, os governos e a democracia. Ao
contrário, parece bem natural aos nossos contemporâneos
que os ambientes digitais forneçam cenários especialmente
aptos para a disputa de valores e para interpretações dos
problemas sociais, para a resposta a tais problemas na
forma de políticas públicas, para que se dê forma e vazão a
demandas provenientes do mundo da vida cotidiana, para o
atrito de visões de mundo, agendas e preferências. Assim
como canais digitais servem apropriadamente ao fim de
pressionar e monitorar governantes e autoridades públicas,
questionar decisões tomadas pelas esferas constituídas
para esse fim, desafiar as hegemonias políticas e
intelectuais de qualquer um dos poderes do Estado.
Por fim, e apenas para encurtar a conversa, é cada vez
mais compartilhada a certeza de que meios, ambientes,
projetos e dispositivos digitais podem servir para transferir
poder aos cidadãos, à arraia-miúda da democracia, diante
das formas sociais (instituições, corporações, organizações)
que com eles disputam: a) a capacidade de impactar
políticas públicas, legislação e regulamentação; b) a
influência sobre eleições e toda a forma de escolha dos
líderes e de suas agendas; e c) a possibilidade de
constranger ou dirigir quem governa nesta ou naquela
direção.
De forma que praticamente tudo aquilo que parece
compor o que se entende como materialização ou
implementação do regime democrático parece hoje de
algum modo entrelaçado com meios, ambientes e usos de
tecnologias digitais. Não importa se tais tecnologias são
entendidas como meros instrumentos ou canais, ou, de
forma mais exigente, como meios e mediadores, ou, enfim,
na forma ainda mais exigente, como condição de
possibilidade de haver mais e melhor democracia.
A ideia de que a democracia, em particular, e a vida
pública, em geral, estão de algum modo entrelaçadas com o
universo das comunicações digitais decorre, conforme o
argumento que venho desenvolvendo, da percepção social
da digitalização da vida cotidiana. Uma vez que a vida
íntima e a vida social estão tão digitalizadas, isto é,
baseadas em interações mediadas por tecnologias digitais,
parece um corolário que daí deflui naturalmente que a vida
pública esteja submetida ao mesmo regime. As tecnologias
digitais nos circundam de modo tão natural que quase se
confundem com o panorama e vão deixando de ser
tematizadas ou questionadas. Cada vez mais as tecnologias
digitais se assemelham com aquelas habilidades adquiridas
em tempos remotos, como a escrita ou fala, que não mais
pensamos nelas; bem mais, pensamos por meio delas,
através delas. Torna-se, portanto, cada vez mais incomum e
extravagante imaginar que possamos fazer qualquer coisa
sem o meio ambiente das nossas tecnologias digitais. O que
nos conduz de forma direta às seguintes indagações: se
tudo em nossa vida é crescentemente digital, por que
apenas a democracia deveria ser analógica? Se a
onipresente tecnologia nos permite fazer online uma grande
parte do que nos interessa, por que somente a democracia
deveria restar offline?

Temas e tendências nos últimos anos


Mantendo a tendência que se apresentou no fim do
decênio anterior, o nível de atenção direta dado à teoria da
e-democracia manteve-se bem abaixo daquele merecido até
2004. Aparentemente, a função para que surgiu a teoria da
e-democracia, a discussão sobre possibilidade, modelos,
problemas e perspectivas da democracia em meios e
ambientes digitais, já não se revelava tão necessária ou tão
urgente quanto o foi até metade dos anos 2000. Até então,
como vimos, a fundamentação teórica e a justificação
conceitual das expectativas de uso da tecnologia para
produzir mais e melhores democracias pareciam decisivas
para que se firmasse um lugar para a e-democracia na
sociedade, na política e na ciência. No que tange aos
ambientes políticos e à sociedade em geral, a teoria da e-
democracia tinha a função de proporcionar legitimidade e,
com isso, mobilizar fundos e apoio, para que se
experimentasse com projetos de teledemocracia ou de
democracia eletrônica, para que as pessoas e organizações
se sentissem estimuladas a projetar e implementar
iniciativas de democratização por meio de tecnologia. Em
sociedades como a nossa, o que teria maior capacidade de
transferir legitimidade a um fenômeno novo, e cercado por
suspeitas e ceticismo, do que a própria democracia
enquanto ideia e horizonte normativo?
No que se refere à ciência, sucedeu com a democracia
digital o mesmo que com qualquer nova disciplina ou novo
campo científico, principalmente nas humanidades: foi
preciso abrir caminho com muitas justificativas
argumentadas e fundamentadas, até que o terreno
estivesse desobstruído dos desafios mais céticos e das
críticas mais severas. No caso em tela, de onde poderia
advir maior legitimidade do que colocar a e-democracia no
colo da teoria democrática? A discussão conceitual sobre
possibilidades e limites da e-democracia, portanto, tinha um
propósito, mas não era um fim em si mesma; a sua redução
a um nível menor, mas consistente e constante, parece,
portanto, um sintoma de que o campo se encaminha para a
consolidação científica e de que, aparentemente, a ideia de
que a democracia pode se beneficiar, e muito, da
tecnologia, não é mais desafiada ou incompreendida como
já o foi em um passado recente.
Mas para onde foi a e-democracia uma vez que saiu dos
títulos dos artigos e capítulos e do centro da cena? Ela foi
simplesmente assimilada, de forma mais ou menos
explícita, à estrutura dos produtos. Trate-se de artigos,
relatórios ou projetos de democracia digital, uma parte
destes costuma ser despendida na defesa argumentativa da
e-democracia ou na justificação da iniciativa, experimento
ou fenômeno, a partir de algum dos requisitos e valores da
democracia, como igualdade, justiça, participação,
soberania popular, transparência, pluralismo, deliberação.
Na segunda década do século XXI, a democracia digital é
uma dessas ideias cujo tempo aparentemente chegou e
basicamente tudo o que resta como tarefa de justificativa
dos projetos, iniciativas ou fenômenos é justamente
reivindicar o fato de que são projetos, iniciativas ou
fenômenos e-democráticos.
Além disso, e diferentemente dos períodos anteriores, nos
últimos dez anos da democracia digital a discussão não está
mais concentrada nas possibilidades gerais da democracia
eletrônica, mas se desdobrou em diferentes questões sobre
os diversos subtemas, cada um deles com suas peripécias e
histórias de consolidação, inclusive de forma marcadamente
interdisciplinar. Em vez de questões simplesmente sobre se
a internet pode ter, com efeito, um impacto sobre a
democracia, a política e o Estado, cada uma das linhas
agora se pergunta como podemos ter mais e melhor
participação, deliberação, transparência, pluralismo, defesa
de direitos etc. por meio de tecnologias digitais. Ou como
podemos enfrentar e superar os limites dos vários níveis de
exclusão digital.
Por outro lado, emergiu nesse período algo como um novo
modelo de democracia digital, com o adensamento de uma
literatura que parte de ou assume pressupostos de algo
que, na ausência de nome melhor, poder-se-ia chamar de
democracia de base (grassroots democracy), uma tendência
em teoria política que valoriza a comunidade, os grupos
minoritários, os interesses da base da sociedade, a
participação, a ação política de protestos, mobilização,
manifestações e, eventualmente, confronto. Uma tendência
em geral de esquerda, representada por pesquisadores das
áreas de sociedade civil e movimentos sociais, que por
muito tempo permaneceu a uma razoável distância da e-
democracia, considerada elitista, capitalista, consumista e
incapaz de resolver sequer os problemas de exclusão
digital, quanto mais de exclusão social e de injustiças. O
espantalho da tecnologia opressora ou elitista os espantava
do campo da democracia digital e os mantinha céticos ou
adversários. Nos anos 2010, contudo, houve uma virada
grassroots nos estudos de internet e política que levou a um
considerável aumento no interesse do valor democratizante
das tecnologias digitais. A julgarmos pela atenção
acadêmica dedicada aos subtemas, houve um
extraordinário crescimento de atenção a protestos digitais,
ativismo online, e-movimentos, ação coletiva digital e
engajamento online desde a Primavera Árabe e a explosão
de protestos com base digital mundo afora (ver Gráfico 4). A
base disso tudo, naturalmente, são os ambientes digitais e
os sites e aplicativos de redes sociais digitais.
O âmbito de estudo de maior incidência dos defensores
da democracia de base é aquele agrupado como “internet e
sociedade” e que representa a grande novidade no
cruzamento em política e democracia no campo da
democracia digital nos últimos anos. Em geral, a abordagem
desses diversos tópicos traz consigo um considerável teor
normativo frequentemente referido a questões
democráticas: lutas por justiça e direitos, soberania popular,
reação a opressões, luta por liberdade e contra iniquidades,
defesa de minorias e de grupos vulneráveis, protestos
contra violações de direitos e injustiças. Assim, os últimos
seis anos, principalmente, foram tomados por um novo élan
e-democrático em que a tecnologia se põe a serviço dos
oprimidos, injustiçados, dos que lutam e protestam por
justiça, direitos, reconhecimento, igualdade e liberdade.

GRÁFICO 4
Publicações sobre os subtemas de internet e sociedade – 2006-2015
Mas, além da incidência da e-democracia sobre assuntos
de políticas online, como se verificou na atenção dedicada
aos temas políticos tradicionais da esquerda, é necessário
entender com precisão o comportamento dos temas
tradicionais da democracia digital nos últimos onze anos
(ver Gráfico 5). O tema da participação, por exemplo,
também confirmando a tendência do fim do decênio
precedente, cresceu exponencialmente e predomina sobre
todos os outros. No pico da produção aferida, em 2012,
chegou a 55% da produção da área de e-democracia,
mantendo-se em um nível muito elevado desde então,
apesar de breve oscilação para baixo. Se resolvêssemos
aferir a importância do uso de tecnologias para a
participação dos cidadãos pela quantidade de projetos,
volume de fundos investidos, relatórios ou estudos de
organismos multilaterais que resenham e incentivam a e-
democracia, provavelmente chegaríamos aos mesmos
resultados.
Há muitas razões para o sucesso da e-participação no
campo da democracia digital, a começar pela já
apresentada composição do tema, envolvendo um feixe
muito grande de atividades importantes para a democracia
e, não convém esquecer, para o governo: consultas
públicas, petições, participação na tomada de decisão, voto
eletrônico e/ou online, mobilização dos cidadãos por parte
das autoridades públicas, regulamentação etc. Muitas e mui
variadas coisas podem e são objetos de projetos de e-
participação ou são preocupações de governos, da
sociedade, de organizações sociais e empresariais e de
organismo multilaterais, todos convencidos de que, no
estágio atual do uso e disseminação das tecnologias, podem
ser equacionadas ou resolvidas por meio de instrumentos
digitais.
Uma segunda razão do destaque da e-participação no
conjunto das preocupações com democracia digital tem a
ver com o aumento da diversificação da área científica dos
pesquisadores no campo da e-democracia. Pesquisadores
da comunicação, cientistas políticos e teóricos da
democracia predominaram na área de e-participação no
primeiro decênio, mas a partir dos anos 2000 a área de
administração pública e, principalmente, a das ciências da
computação passaram a representar um percentual
importante da área. No último decênio, por exemplo, os
pesquisadores da área de computação garantiram quase
metade das publicações sobre o tema. Este provavelmente
é o fator mais relevante a explicar o crescimento da e-
participação em relação aos demais temas da democracia
digital.
Há, além disso, um tema novo e, aparentemente, muito
consistente no campo da e-participação, que é o
crowdsourcing, a colaboração coletiva, geralmente na
interface com o governo digital ou parlamento eletrônico,
que vem crescendo de maneira exponencial desde 2010.
Aqui podem ser incluídas coisas como e-participação
coletiva
• em políticas públicas (Charalabidis et al., 2012;
Macintosh, 2004; Rethemeyer, 2006);
• na tomada de decisão governamental (Garcia;
Vivacqua; Tavares, 2011; Linders, 2012);
• na promoção da transparência (Bertot; Jaeger;
Grimes, 2010; Carlo Bertot; Jaeger; Grimes, 2012;
Zinnbauer, 2015);
• no procedimento legislativo (Christensen; Karjalainen;
Nurminen, 2015; Heikka, 2015) etc.
Como é típico desse período, a crowdsourcing, ou citizen-
sourcing (Nam, 2012), é muito atenta aos novos recursos
digitais de participação, baseada em mídias sociais, web 2.0
e dispositivos móveis (Brovelli; Minghini; Zamboni, 2016;
Charalabidis et al., 2014; Hellström, 2012; Linders, 2012;
Nam, 2012; Spiliotopoulou et al., 2014; Wang et al., 2017).
Aliás, pelo crescimento rápido e intenso da atenção, pode-
se prognosticar um incremento considerável do tema nos
próximos anos.

GRÁFICO 5
Atenção acadêmica aos subtemas da democracia digital por ano – 2006-
2016
A e-deliberação é um tema que teve um comportamento
consideravelmente variado no período, atingindo o seu pico
em 2009 e enfrentando algum declínio desde então. Embora
tenha-se mantido como subárea importante da democracia
digital, principalmente no estudo de projetos aplicados à
discussão dos cidadãos entre si e com autoridades públicas,
a área tem se distanciado, mormente no fim do decênio, da
sua referência tradicional de democracia deliberativa. Talvez
isso reflita o próprio movimento interno da democracia
deliberativa, que perdeu parte do seu élan na teoria
democrática, tendo se desdobrado em direções muito mais
aplicadas e pragmáticas. Aparentemente, os autores desses
novos desdobramentos do campo demonstram menos
interesse no que acontece na internet móvel, em aplicativos
de mídias sociais e 2.0 do que os autores da primeira onda
da democracia deliberativa.
Curiosamente, no que se refere especificamente ao
subcampo “política online”, é notável o crescimento do
interesse em discussões travadas em ambientes digitais. O
estudo da discussão online, subdividido em três grandes
temas – discussão e conversação política, divergência e
polarização, exposição seletiva e heterogeneidade –, é uma
peculiaridade do atual momento da pesquisa, com uma
produção crescente e intensa desde, pelo menos, 2008. Não
se trata, contudo, de uma metamorfose da área de
deliberação pública própria da democracia digital, uma vez
que em geral a bibliografia não reflete uma abordagem
normativa do tipo democrático. Os pesquisadores estão
muito curiosos com o fato de que as pessoas cada vez mais
conversam umas com as outras sobre política, com
frequência para ferozmente divergir e polemizar, gerando
com isso uma tendência à polarização e à formação de
câmeras de eco ou bolhas digitais que se fecham em
ambientes de alta afinidade entre os seus membros. O
referencial teórico não vem da tradição habermasiana, nem
sequer da teoria democrática, mas de modelos teóricos e
metodológicos da comunicação e da psicologia, como a
teoria da espiral do silêncio e a hipótese da exposição
seletiva.
Por fim, temos o caso da e-transparência, um tema típico
deste último período. O tratamento da transparência pública
na área de democracia digital não recebe, à primeira vista,
a importância que o tema tem merecido em teoria
democrática, na ciência política e na administração pública.
Para as áreas de governo, para a sociedade, para
organismos multilaterais e até para o campo científico, a
transparência, principalmente a transparência pública, foi
tema central na virada do século e continua a sê-lo. A
transparência, de um lado, e as suas contrapartes que
formam o pavor das democracias liberais, a corrupção, o
fisiologismo, a opacidade do Estado, são hoje objeto
generalizado de preocupações. Por que, então, o tema da e-
transparência continua modesto mundo afora e, se tem
alguma importância no Brasil, isso decorre basicamente de
uma resposta a uma lei que força a própria administração
pública à e-transparência fiscal? Por que a e-transparência
não tem a mesma força da e-deliberação ou, sobretudo, da
e-participação?
Não encontrei uma resposta satisfatória para essa
questão. Mas posso dizer, para mitigar a sensação de que a
e-transparência não tem o tratamento que mereceria, que,
na verdade, questões de transparência pública digital têm
prosperado consideravelmente na forma dos temas do
governo aberto e dos dados abertos governamentais. Que é,
portanto, na interface das áreas de democracia digital e de
governo digital que a transparência, enfim, encontra a
importância que estaria a merecer, como se pode
depreender do Gráfico 6.

GRÁFICO 6
Atenção acadêmica à e-transparência e ao governo aberto

Isso nos dá a ocasião de fechar esta reconstrução do


percurso da democracia digital com a hipótese da interface
entre e-democracia e governo digital. Como explicitou A.
Chadwick, há aqui até mesmo uma divisão social do
trabalho entre as duas áreas. “Os estudiosos da
administração pública, os analistas de políticas públicas e os
especialistas em gestão pública se concentram no governo
eletrônico, enquanto os especialistas em comunicação
política, os estudiosos dos movimentos sociais e os teóricos
da democracia aprimoram suas ferramentas analíticas sobre
a democracia eletrônica”1, mas, no fundo, o vínculo entre as
duas áreas, se bem que não seja direto, é certamente
realizável.
O tema do governo eletrônico é mais recente que o tema
da democracia eletrônica. Aparece apenas lá por 1996
(Milward; Snyder, 1996), mas realmente constitui uma
disciplina apenas no início deste século. À fase da
teledemocracia, por exemplo, não correspondeu uma fase
de algo como telegoverno, embora, naturalmente, o
governo, em particular, e o Estado, em geral, tenham sido
sempre uma das dimensões a serem consideradas toda vez
que se falava de empregar tecnologia para resolver déficits
democráticos da democracia liberal. Mas a abordagem
dominante sempre foi apoiada no horizonte normativo da
democracia, seus requisitos, valores e princípios.
E sempre manteve uma interface forte com a democracia
digital, de onde, supostamente, retira grande parte da sua
legitimidade social. Naturalmente, nem tudo o que há de
valor na ideia de um governo apoiado em tecnologias
digitais se refere a requisitos democráticos, como
transparência, participação ou deliberação, ou a valores da
democracia. Em grande parte, é bastante que se refira a
requisitos e valores sociais que provêm de outros horizontes
normativos, como as ideias de eficácia, eficiência,
racionalidade e economia. Ou ao princípio de que o papel do
governo digital, de um parlamento eletrônico, de uma
cidade inteligente etc. é simplesmente melhorar a vida das
pessoas. “Melhorar a vida das pessoas” pode ser outra coisa
que não aumentar a igualdade política ou a transparência
pública, incrementar a participação ou levar os
representantes eleitos a compartilharem o poder com os
cidadãos, que são gatilhos democráticos importantes, vez
que podem significar algo como melhorar a qualidade de
vida dos cidadãos, diminuindo-lhes o peso da burocracia ou
a precariedade no recebimento dos serviços públicos a que
têm direito.
Mas há que pensar também, por outro lado, que valores
como o aumento da eficiência do governo digital ou
princípios como “governos precisam melhorar a vida dos
cidadãos por meio da tecnologia” podem ganhar um
considerável reforço proveniente do horizonte normativo da
democracia. Assim, é óbvio que governos que prestam bons
serviços públicos por meio digital são ótimos, mas, se o e-
public service delivery for projetado tendo como foco e
centro o cidadão, o soberano do Estado, e não a burocracia
estatal, seria ainda melhor. O mesmo vale, por exemplo,
para as smart cities. E, se o Estado digital, além de
eficiente, moderno, racional e econômico, for também
transparente e participativo, não haverá perda de nenhum
dos valores intrínsecos da nova administração pública e
ainda haverá um considerável incremento da sua qualidade
democrática. Introduzir um “vírus” e-democrático no
sistema do governo eletrônico parece, portanto, um
imperativo contemporâneo importante para termos
sociedades melhores. E “melhor” hoje significa também
mais democrático. Mais e-democrático.

Novas tendências na democracia


digital
Uma vez que chegamos aqui, para onde vamos? Há duas
formas de encarar essa pergunta, ainda que brevemente. A
primeira consiste em constatar para onde nos estamos
encaminhando, quais são os temas e campos de aplicações
que estão, neste momento, atraindo a atenção de
pesquisadores, de gestores e da sociedade. A segunda
consiste em eventualmente indicar os temas para onde
deveremos nos encaminhar, se a democracia digital há de
oferecer respostas consistentes a demandas da democracia.
No primeiro caso, a identificação das tendências
dominantes é o fator central, enquanto no segundo é mais
importante identificar eventuais lacunas no campo.
Para onde estamos indo? Identificamos sumariamente
algumas tendências importantes que merecem a atenção
das pessoas já envolvidas ou que se envolverão com
democracia digital nos próximos anos.
• Com a consolidação da ideia de democracia digital, a
idade de ouro da teoria da e-democracia já passou e
a abordagem tende a ser cada vez mais prática,
aplicada e segmentada. A não ser que apareça no
horizonte alguma espécie de novo desafio à
legitimidade da democracia digital, é mais provável a
manutenção dessas tendências. Problemas concretos
relacionados a modelos tecnológicos, a
características específicas de soluções digitais
empregadas ou estudos de experimentos (projetos,
iniciativas implementadas) e de experiências (formas
de usos das tecnologias digitais, espontâneas, com
incidência ou aplicação para a democracia) tendem a
concentrar a atenção nos próximos anos. Além disso,
deve persistir a tendência à autonomia dos temas,
transformando-se ao menos alguns deles em campos
específicos, a exemplo do que vem acontecendo com
a e-participação, com a e-deliberação e com a
subárea de internet e sociedade. A tendência à
fragmentação, contudo, poderá gerar, se não
corrigida, a perda da perspectiva geral da democracia
digital. O que levaria, como já vem acontecendo no
caso da e-participação, a ver índices de participação
digital em que países autocráticos pontuam muito
alto, como se para a e-participação fosse dispensável
a qualidade democrática do tipo de participação
envolvido (Lidén, 2012; 2015). Ou confusões, como as
de quem vê a democracia digital como um dos
subtemas do governo digital, invertendo
completamente não só a história da grande área, mas
o bom senso em teoria política. O risco, portanto, é
que os temas autonomizados se desgarrem da ideia
de democracia digital, que envolve tecnologia, sim,
mas para a qual a democracia é imprescindível. Não
haveria ganhos nisso.
• Neste sentido, a busca da reconexão à democracia
digital, por parte de aplicações e campos em
crescente autonomização, poderá se transformar
numa contratendência importante na área de e-
democracia. Essa necessidade já tem sido
particularmente sentida na área de governo digital,
onde uma considerável concentração de atenção em
prestação de serviços eletrônicos ou em soluções
digitais para smart cities e smart government tende a
levar a uma desconexão com a e-democracia e seus
requisitos, denunciada por muitos autores (Anderson;
Bishop, 2005; Chadwick, 2003; Hoff; Scheele, 2014;
Kardan; Sadeghiani, 2011). Com isso se fortalece a
tendência a forçar a introdução de critérios
democráticos em iniciativas e projetos de e-governo
para reconduzir, por exemplo, soluções e aplicações
digitais de prestação de serviços públicos à e-
democracia (Chen, 2010; King; Cotterill, 2007; Lee;
Lee, 2014; van Velsen et al., 2009). Parece natural
imaginar que essa tendência se reforce à medida que
a fragmentação se consolide.
• Outra tendência clara, já esboçada acima, refere-se
ao novo padrão tecnológico sm+m, quer dizer, social
media + mobile. Esta vem sendo a tendência
dominante na década de 2010 e nada parece indicar
que poderá arrefecer nos próximos anos. A ideia de
que mídias sociais constituem o novo padrão do uso
social da internet já está presente com muita força
em algumas subáreas, como governo digital (Bonsón
et al., 2012; Feroz Khan et al., 2014; Mossberger; Wu;
Crawford, 2013; Porumbescu, 2016; Small, 2012),
internet e sociedade (Breuer; Landman; Farquhar,
2015; Kaun, 2016; Valenzuela, 2013), crowdsourcing
em políticas públicas (Charalabidis et al., 2012; 2014;
Spiliotopoulou et al., 2014), governo aberto
(Gunawong, 2015; Stamati; Papadopoulos;
Anagnostopoulos, 2015; Wirtz; Daiser; Mermann,
2017) e e-participação (Alarabiat; Soares, 2016; Dini;
Saebo, 2016; Vogt; Förster; Kabst, 2014). Social
media pode ser substituído eventualmente pelo
designador 2.0 (Henman, 2013; Nam, 2012;
Pankowska, 2016; Sun; Ku; Shih, 2015), com sentido
semelhante. Da mesma forma, o m-, como
designador de tecnologias digitais móveis para
comunicação, vai se tornando o concorrente mais
atual do clássico e-, de eletrônica, que se mantém há
quarenta anos. O m- já é claramente visível como
tendência nas várias subáreas de governo digital
(Gouscos; Drossos; Marias, 2005; Lee; Tan; Trimi,
2006; Ogunleye; van Belle, 2014; Sheng; Trimi, 2008;
Trimi; Sheng, 2008) e no tema da e-participação
(Thiel et al., 2015; Thiel; Lehner, 2015). Na próxima
década, a grande área de política, Estado e
democracia digitais será cada vez mais sm+m.
• Por fim, parece haver unanimidade na convicção de
que o tema da vez são os big data. Estamos todos, de
teóricos da democracia a cientistas da computação,
de estudiosos da comunicação política a
matemáticos, de profissionais e pesquisadores da
área de saúde a cientistas políticos, de scholars da
bioinformática a economistas e físicos, imaginando as
fantásticas aplicações, para resolver problemas
específicos de cada área ou questões
multidisciplinares, que resultarão do acesso a
quantidades massivas de dados digitais, informações
sobre as pessoas, suas circunstâncias e condições,
sobre a sociedade, sobre os governos, sobre a
economia, sobre coisas e, sobretudo, sobre as
relações entre elas. Não é simplesmente uma questão
de dimensão dos dados, mas da adição de
inteligência computacional na coleta e no uso destes.
Como bem assinalaram Danah Boyd e Kate Crawford,
em artigo recente: “Big data tem menos a ver com o
fato de os dados serem grandes e mais com a
capacidade de busca, agregação e referência cruzada
de grandes conjuntos de dados”2. De um ponto de
vista tecnológico, isto implica que temos cada vez
mais de lidar com questões relacionadas “ao
aumento do poder da computação e da precisão dos
algoritmos empregados para coligir, correlacionar e
comparar grandes bases de dados”3, mas, do ponto
de vista da política e da democracia, temos dúvidas
sobre se tudo isso nos ajudará a criar melhores
sociedades, melhores governos e a melhorar a vida
das pessoas ou se será o contrário disso o mais
provável a acontecer. Esta é uma questão candente
que a pesquisa apenas começa a enfrentar.
• Os big data, contudo, são apenas o começo de uma
fieira temática. Os open data são o tema que vem em
sequência. Não se trata apenas de termos grandes
bases de dados, mas do fenômeno político e
democrático dos dados abertos e da abertura de
dados. Dados abertos podem ser definidos, seguindo
Marijn Janssen e colegas, como “dados sem restrição
de acesso e não confidenciais, que são produzidos
com dinheiro público e oferecidos sem quaisquer
restrições à sua utilização ou distribuição”4. A
premissa por trás da ideia de dados abertos é que os
órgãos públicos são geralmente os maiores criadores
ou coletores de dados na maior parte dos âmbitos da
vida social e devem ser compelidos a colocar esses
dados à disposição da sociedade, para os fins que
indivíduos e grupos considerarem adequados.
• O que nos leva inevitavelmente ao terceiro tema da
tétrade, os dados abertos governamentais (ou
públicos). A abertura de dados governamentais tem
algumas implicações importantes, antes de tudo
sobre o próprio governo. Ao abrir suas extensas bases
de dados ao acesso público, os órgãos públicos e
agências governamentais, de certo modo, admitem
abrir mão do controle que lhe dava um poder
discricionário que não respondia ao público, mas
apenas à hierarquia interna do próprio setor público.
O que significa compartilhar poder e, em última
instância, expor-se.
• E assim chegamos ao quarto tema, profundamente
interligado com o terceiro, a questão do chamado
governo aberto. A expressão se tornou extremamente
popular nos últimos anos, principalmente depois que
o presidente Barack Obama transformou em um ato
do seu primeiro dia de mandato a publicação do
famoso Memorandum on Transparency and Open
Government e, em setembro de 2011, assinou a Open
Government Partnership, iniciativa multilateral, ainda
vigente, com a intenção de incentivar e comprometer
governos na promoção da transparência, no combate
à corrupção e no emprego de tecnologias para
fortalecer a governança democrática. Conforme
definição de Albert Meijer e colegas, a abertura do
governo “é a extensão da medida que os cidadãos
têm para monitorar e influenciar os processos
governamentais por meio do acesso à informação
governamental e do acesso às arenas em que são
tomadas as decisões”5. O que implica ao menos duas
dimensões importantes da democracia digital: a e-
transparência e a e-participação. Além de uma
terceira dimensão, já enunciada acima: governos
abertos devem ser colaborativos (McDermott, 2010).
De todo modo, o fato é que a atenção acadêmica, a
atenção política e os esforços normativos acerca da
abertura do governo por meios digitais cresceram
aceleradamente nesses anos (como se depreende
do Gráfico 6).
Ao encerramos este percurso, depois de termos visto
como chegamos até aqui, como a ideia de democracia
digital se desenvolveu e se consolidou e as novas
tendências nessa área, temos tempo ainda de nos
perguntar como a e-democracia está nos ajudando a lidar
com os problemas da democracia. Vimos o avanço dos
temas da participação, da deliberação pública em meios e
ambientes digitais e, enfim, da e-democracia de base, de
forma que o déficit correlacionado à baixa participação
política da população e à apatia cívica tem merecido a
consideração devida. O problema liberal dos governos
invisíveis e Estado opaco e o problema, de novas e velhas
democracias, relacionado ao patrimonialismo, fisiologismo e
clientelismo e, em última instância, à corrupção só podem
ser enfrentados com mais transparência, mais
responsabilização dos agentes políticos, mais
monitoramento pelos cidadãos. Estamos em cheio na
agenda mais recente relacionada à e-transparência, às
formas de participação de uma e-democracia monitorial e,
enfim, às questões da abertura de dados e abertura do
governo. Ainda é cedo para dizer o quanto os governos
avançarão nessa direção, mas o rumo parece muito
promissor.
Há, contudo, uma lacuna não devidamente preenchida no
que tange à contribuição da e-democracia para as
democracias existentes, que diz respeito ao modo de
enfrentar a questão dos limites do Estado de direito e a
problemas na extensão igualitária de direitos, garantias e
liberdades a todos os cidadãos. Não se pode dizer que o
tema da violação de direitos, das injustiças e opressões
estruturais e do acesso igualitário e eficaz à justiça não seja
objeto de consideração. Mas há que admitir que não é ainda
uma tarefa central da democracia digital, documentada na
atenção acadêmica, o aprofundamento e a consolidação de
uma sociedade de direitos, especificamente de direitos e
liberdades políticas, e o papel dos recursos digitais no
monitoramento e denúncia de violações de direitos. Esta é
uma linha de pesquisa e de ação que precisa ainda ser
construída.

Para concluir
Enfim, estamos todos reconciliados com a ideia
democracia digital? Certamente, não. Ainda provêm de
múltiplas fontes alguns desafios à ideia de que algo que
realmente valha democraticamente a pena possa vir da
aplicação de soluções digitais para produzir soluções
políticas, governamentais, legislativas e sociais. Na verdade,
trata-se frequentemente, como vimos na história da
literatura sobre o tema, de exigir da democracia digital que
ela seja mais democrática que as democracias reais. Isso
não faz o menor sentido, uma vez que a e-democracia não é
um tipo de democracia, mas o uso de tecnologias para
reforçar, corrigir ou melhorar as democracias existentes.
Ou, até, para implantar ou melhorar dimensões
democráticas de Estados autoritários. Se a sociedade ou
seus governantes decidem melhorar a sua democracia ou
tornar mais democráticas determinadas instituições e
processos, o estado atual da tecnologia e os usos que dela
fazem os cidadãos são hoje recursos indispensáveis para
alcançar tais objetivos. A tecnologia tanto pode entregar
participação e deliberação quanto pode entregar
transparência pública, pluralismo, governos abertos,
interação entre cidadãos e autoridades, reforço no acesso a
direitos e justiça, defesa de direitos e garantias, denúncia
de violações e abusos, mobilização, engajamento.
A democracia digital é simplesmente o conjunto dos
recursos, ferramentas, projetos, experimentos, experiências
e iniciativas em que se usam tecnologias para produzir mais
democracia e melhores democracias. É simples assim. Em
um sistema político com baixo interesse em participação,
por exemplo, a democracia digital daquela sociedade será
pouco participativa porque os recursos tecnológicos serão
usados preferencialmente para outras aplicações. Isso nada
tem a ver com a tecnologia, mas com as preferências da
sociedade, dos seus governantes, das suas instituições.
Neste caso, não seria razoável criticar tal democracia digital
por não entregar tanta participação quanto alguém gostaria.
Mais sensato seria criticar o baixo interesse em participação
por parte de governos e instituições.
Além do mais, quem demanda soluções digitais unicistas
para o déficit democrático de determinados Estados e
sociedades, por mais amplas que sejam, parece ter
dificuldade de compreender que democracias complexas e
pluralistas dificilmente podem ser construídas com base na
aposta em um único elemento. É curioso, neste sentido,
como as críticas à democracia digital são sempre mais
simplórias do que as listas dos complexos problemas da
democracia contemporânea na teoria democrática. Frases
como “precisamos de uma democracia mais vivaz,
participativa e sob o controle do cidadão” nem tocam em
obstáculos complicados que se interpõem no caminho da
democracia, como a necessidade do crescimento da
tecnocracia (decisões baseadas em especializações e
competência técnica), de aumento da burocracia, da
“ingovernabilidade” das democracias de massa, entre
outros. Democracias complexas têm tantas necessidades
que cogitar que tudo possa ser resolvido com mais recursos
tecnológicos para participação ou deliberação chega a soar
ingênuo. Por outro lado, diminuir o valor da pletora de
soluções digitais para melhorar a democracia, tão somente
porque no kit de democracia digital empregado em
determinada sociedade a função x ou y não tem o destaque
que em minha concepção seria o remédio adequado para a
maioria dos déficits democráticos daquela sociedade, não
me parece razoável ou justificado. As nossas são sociedades
que, além de complexas, são consideravelmente pluralistas,
de forma que não há “modelo” de democracia em que
pareça cabermos todos ou ênfase democrática que satisfaça
a todas as nossas necessidades.
Por fim, os obstáculos à realização da democracia são tão
diversos e de tal monta que qualquer ajuda da tecnologia,
em qualquer dimensão, há que ser considerada bem-vinda.
O conjunto mais simples de recursos de democracia digital
já significaria incremento na qualidade da democracia
existente, quanto mais quando se verifica uma e-
democracia consistente e realmente produzindo um impacto
considerável, pró-democracia, sobre a vida pública, o
sistema político e o Estado.

1 A. Chadwick, “Bringing E-Democracy Back in: Why It Matters for Future


Research on E-Governance”, Social Science Computer Review, v. 21, n. 4, pp.
443-55, 1 nov. 2003, p. 444 (grifos meus).
2 D. Boyd; K. Crawford, “Critical Questions for Big Data”, Information,
Communication & Society, v. 15, n. 5, pp. 662-79, jun. 2012, p. 663.
3 Ibidem.
4 M. Janssen; Y. Charalabidis; A. Zuiderwijk, “Benefits, Adoption Barriers and
Myths of Open Data and Open Government”, Information Systems
Management, v. 29, n. 4, pp. 258-68, set. 2012, p. 258.
5 A. J. Meijer; D. Curtin; M. Hillebrandt, “Open Government: Connecting Vision
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Consultation’”. Journal of Information Science, v. 27, n. 4, pp. 187-98, 2001.
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Administration, pp. 1-14, 9 mar. 2017.
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Enhance Political Work”. MISQ, v. 20, n. 3, p. 347, set. 1996.
ZIMMER, M.; HOFFMANN, A. L. “Preface: A Decade of Web 2.0 – Reflections,
Critical Perspectives, and Beyond”. First Monday, v. 21, n. 6, 10 jun. 2016.
ZINNBAUER, D. “Crowdsourced Corruption Reporting: What Petrified Forests,
Street Music, Bath Towels, and the Taxman Can Tell Us About the Prospects for
Its Future”. Policy & Internet, v. 7, n. 1, pp. 1-24, mar. 2015.
SOBRE O AUTOR

Wilson Gomes é doutor em Filosofia e pesquisador nas


áreas de comunicação política e democracia, governo e
política em ambientes digitais. É professor titular de teoria
da comunicação na Faculdade de Comunicação da
Universidade Federal da Bahia (Ufba). Publicou artigos e
livros na área de comunicação e política, entre eles
Transformações da política na era da comunicação de
massa (Paulus, 2004), Jornalismo, fatos e interesses (Insular,
2009) e A política na timeline (Eufba, 2014). Coordena o
Centro de Estudos Avançados em Democracia Digital
(CEADD), da Ufba, e o Instituto Nacional de Ciência e
Tecnologia em Democracia Digital (INCT.DD).
SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO
Administração Regional no Estado de São Paulo

Presidente do Conselho Regional


Abram Szajman
Diretor Regional
Danilo Santos de Miranda

Conselho Editorial
Ivan Giannini
Joel Naimayer Padula
Luiz Deoclécio Massaro Galina
Sérgio José Battistelli

Edições Sesc São Paulo


Gerente Marcos Lepiscopo
Gerente adjunta Isabel M. M. Alexandre
Coordenação editorial Jefferson Alves de Lima
Produção editorial Rafael Fernandes Cação
Coordenação de comunicação Bruna Zarnoviec Daniel
© Wilson Gomes, 2018
© Edições Sesc São Paulo, 2018

Preparação Silvana Vieira


Revisão Richard Sanches
Projeto visual e diagramação Werner Schulz
Capa Werner Schulz
Foto do autor Heitor Oliveira

G585d
Gomes, Wilson
A democracia no mundo digital: história, problemas e temas / Wilson Gomes. –
São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2018. –
6.200 Kb; e-PUB. – (Democracia Digital).
Bibliografia
ISBN 978-85-9493-105-4 (e-book)
1. Tecnologias digitais. 2. Interações digitais. 3. Democracia digital. 4.
História. I. Título. II. Gomes, Wilson da Silva.
CDD 004.019

Edições Sesc São Paulo


Rua Cantagalo, 74 – 13º/14º andar
03319-000 – São Paulo SP Brasil
Tel. 55 11 2227-6500
[email protected]
sescsp.org.br/edicoes
Reflexões sobre Shakespeare
Brook, Peter
9788594930323
128 páginas

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Peter Brook é um dos mais renomados diretores de teatro


de todos os tempos. Em Reflexões sobre Shakespeare, ele
reflete sobre uma fascinante variedade de temas
shakespearianos, da atemporalidade da obra do dramaturgo
inglês à maneira de como os atores devem abordar seu
verso. Como o próprio autor afirma, este não é um trabalho
acadêmico. Aos 91 anos de idade ele apresenta uma série
de impressões, memórias, experiências e conclusões
temporárias sobre uma repleta vida dedicada ao fazer
teatral.

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Um fantasma leva você para
jantar
Capozzoli, Ulisses
9788594930545
80 páginas

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Qual relação pode existir entre a utilização de um GPS para
circular no trânsito das cidades e astros cósmicos que se
encontram numa distância de bilhões de anos-luz do
planeta Terra? A resposta, por mais intrigante que pareça, é:
toda -- e ela passa por séculos de conhecimento científico,
quasares localizados há bilhões de anos-luz da Via Láctea e
nomes como Galileu Galilei, Max Planck, Tycho Brahe,
Newton, Kepler, Copérnico, Herschel e Albert Einstein. Numa
narrativa inventiva e rica de informações, o jornalista,
mestre e doutor em Ciências, Ulisses Capozzoli, parte neste
trabalho do uso dos já corriqueiros sistemas de
geolocalização controlados por satélite para ilustrar como a
ciência se revela em boa parte de nossa vida cotidiana. O
livro é o primeiro título da coleção Ciência no Cotidiano,
desenvolvida exclusivamente para o formato digital.

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Tudo sobre tod@s
da Silveira, Sergio Amadeu
9788594930286
74 páginas

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Considerando as tecnologias cibernéticas como tecnologias


de comunicação mas também de controle, o sociólogo e
professor Sergio Amadeu da Silveira aborda neste trabalho
as implicações entre o crescimento das redes digitais e o
estabelecimento de um mercado de coleta e venda de
dados pessoais que avança nestes ambientes. Apoiado
tanto em autores de referência como em exemplos práticos,
o livro traz à luz o modo como este chamado 'mercado de
dados', representado por empresas e sistemas, tem se
esforçado em apresentar a questão da privacidade dos
indivíduos como algo a ser superado. Intimamente ligado ao
conteúdo abordado, o livro tem edição exclusivamente para
o formato digital.

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O comum entre nós
Savazoni, Rodrigo
9788594931320
140 páginas

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No terceiro volume da coleção Democracia Digital, o


jornalista e mestre em Ciências Sociais Rodrigo Savazoni
investiga a construção da ideia de commons (ou bens
comuns, na tradução sugerida pelo autor) a partir da
expansão das redes digitais de conexão, em fins dos anos
1990. Parte da experiência humana e da vida em grupo, a
ideia de bens comuns (ou os commons) é definida pelo
autor tanto pela gestão e compartilhamento de recursos
dentro de uma comunidade como pela relação entre
natureza e cultura que se estabelece na prática desta
partilha. Para localizar o potencial e a extensão da ideia de
bem comum, Savazoni busca exemplos que vão dos
espaços públicos de convívio nas cidades até os recursos
naturais, como os oceanos e o ar, chegando aos softwares
livres e os protocolos abertos e gratuitos sob os quais se
organiza uma rede como a internet. Junto à produção de
autores como Antonio Negri, Michael Hardt, Christian Laval,
Pierre Dardot, Eduardo Viveiros de Castro, Bruno Latour,
Silvia Federici e Elinor Ostrom, Rodrigo Savazoni apoia sua
observação em exemplos práticos colhidos em cidades
como São Paulo, Recife, Madri, Nápoles, Bolonha e nas
diferentes culturas ameríndias. Editada exclusivamente para
o formato digital, a coleção Democracia Digital é organizada
pelo professor e sociólogo Sergio Amadeu da Silveira.

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Para além das máquinas de
adorável graça
Evangelista, Rafael
9788594931030
90 páginas

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Com um recorte histórico que parte dos anos 1950, o
jornalista, cientista social e doutor em Antropologia Rafael
Evangelista traz uma abordagem original das ações e do
pensamento hacker, esses apaixonados por tecnologia que
adquirem prestígio entre seus pares a partir do
enfrentamento de problemas complexos e suas ações
criativas no desenvolvimento de software. O autor mostra
como o hacking se consolidou no movimento do software
livre e como essa mobilização tecnológica, enraizada nas
práticas colaborativas e na produção do comum, obteve no
Brasil um terreno fértil para a sua expansão. Segundo
Evangelista, a ação e a ética hackers foram determinantes
na construção dos sistemas que organizam as redes de
comunicação digital e nos usos que fazemos delas hoje.
Longe de uma apologia às potencialidades das grandes
calculadoras que recebiam, então, o nome de
computadores, Rafael Evangelista dedica parte do livro aos
riscos à democracia abertos com as possibilidades de
controle e vigilância dos cidadãos. Com título que remete ao
poema de Richard Brautigan (Todos assistidos por máquinas
de adorável graça), o livro é o segundo volume da coleção
Democracia Digital, organizada pelo professor e sociólogo
Sergio Amadeu da Silveira, com edição exclusivamente para
o formato digital.

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