TÓPICOS ESPECIAIS
EM EMERGÊNCIAS E
INTENSIVISMO
Elaboração
Erothildes Silva Rohrer Martins
Produção
Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO....................................................................................................................................................................................... 4
ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA.................................................................................................. 5
INTRODUÇÃO.............................................................................................................................................................................................. 7
UNIDADE I
TÓPICOS ESPECIAIS 1......................................................................................................................................................................................................... 9
CAPÍTULO 1
MANEJO DE FERIDAS........................................................................................................................................................................................... 9
CAPÍTULO 2
INFECÇÕES E SEPSEMIAS NA EMERGÊNCIA E NO INTENSIVISMO E SÍNDROME DA DISFUNÇÃO DE
MÚLTIPLOS ÓRGÃOS (SDMO)......................................................................................................................................................................... 23
CAPÍTULO 3
CHOQUE, SÍNDROME COMPARTIMENTAL E FALÊNCIA MÚLTIPLA DE ÓRGÃOS NA EMERGÊNCIA E NO
INTENSIVISMO...................................................................................................................................................................................................... 55
UNIDADE II
TÓPICOS ESPECIAIS 2....................................................................................................................................................................................................... 68
CAPÍTULO 1
FLUIDOTERAPIA................................................................................................................................................................................................... 68
CAPÍTULO 2
DESEQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE........................................................................................................................................................................ 77
UNIDADE III
TÓPICOS ESPECIAIS 3...................................................................................................................................................................................................... 86
CAPÍTULO 1
HEMORRAGIAS..................................................................................................................................................................................................... 86
CAPÍTULO 2
TRANSFUSÃO SANGUÍNEA............................................................................................................................................................................. 92
UNIDADE IV
INTOXICAÇÃO E ENVENENAMENTO........................................................................................................................................................................ 108
CAPÍTULO 1
INTOXICAÇÕES................................................................................................................................................................................................... 108
REFERÊNCIAS........................................................................................................................................................................................ 131
APRESENTAÇÃO
Caro aluno
A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se
entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade.
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como
pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia
da Educação a Distância – EaD.
Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos
conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos
da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional
que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-
tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.
Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de
modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal
quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.
Conselho Editorial
4
ORGANIZAÇÃO DO CADERNO
DE ESTUDOS E PESQUISA
Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas
em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio
de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que
visam tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes
de consulta para aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares.
A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos
Cadernos de Estudos e Pesquisa.
Provocação
Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto
antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente
para o autor conteudista.
Para refletir
Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma
pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em
seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas
experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida
para a construção de suas conclusões.
Sugestão de estudo complementar
Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do
estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o
caso.
Atenção
Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam
para a síntese/conclusão do assunto abordado.
5
Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa
Saiba mais
Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/
conclusões sobre o assunto abordado.
Sintetizando
Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo,
facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.
Para (não) finalizar
Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar
a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o
módulo estudado.
6
INTRODUÇÃO
Neste módulo, vamos discutir os tópicos especiais emergência e intensivismo.
Para iniciar esse tema, discutiremos sobre o manejo de feridas na emergência e no
intensivismo, as infecções sépticas e como agir nessas situações.
Na unidade II, falaremos sobre fluidoterapia e desequilíbrio ácido-base, sintomas
observados e condutas de acordo com cada desequilíbrio. Seguindo nosso
módulo, temos as alergias, hemorragias e transfusões sanguíneas, situações
muito encontradas em grandes traumas.
E, para terminar esse módulo, discutiremos sobre as intoxicações, que são muito
variadas, desde as mais convencionais por ingestão até aquelas que acontecem
de forma tópica.
Objetivos
» Conhecer os tipos de feridas, bem como as condutas a serem seguidas
no recebimento do paciente.
» Conhecer as infecções e septicemias, conhecendo como elas se
manifestam durante a emergência.
» Entender quais os tipos de fluidoterapia e os desequilíbrios encontrados
em um paciente descompensado.
» Identificar o que fazer com pacientes com hemorragias, bem como
o tratamento indicado, muitas vezes sendo necessária a realização de
transfusão.
» Conhecer como a transfusão deve ser feita, assim como seu
acompanhamento e riscos.
» Explicitar intoxicações e envenenamentos, sinais observados e
tratamento emergencial que deve ser instituído.
7
TÓPICOS ESPECIAIS 1 UNIDADE I
Diversos motivos levam o tutor a procurar o atendimento para o seu animal
na emergência, e, entre eles, os traumas costumam estar presentes em muitas
dessas ocasiões, sejam eles por quedas, atropelamentos ou brigas. Nesta unidade,
abordaremos vários tópicos importantes, tanto em trauma e feridas agudas
como em situações nas quais já há infecções e septicemias e até choque e falência
múltipla dos órgãos.
CAPÍTULO 1
Manejo de feridas
É muito comum, na clínica de pequenos animais, o atendimento devido a feridas,
mas determinar a gravidade dessas feridas determinará se aquele paciente
necessita de tratamento intensivo ou ambulatorial. Segundo Simas (2010), a
pele tem grande importância na defesa do organismo, e sua perda ou lesão pode
provocar danos severos, como incapacidade, desequilíbrio fisiológico, ou até o
óbito desse animal. A terapêutica que será adotada e os possíveis gargalos que
poderão acontecer precisam ser avaliados no momento da chegada do paciente
nas dependências hospitalares. O tamanho da lesão nem sempre é o parâmetro
para determinar a gravidade da situação, mas a profundidade dela é que se deve
observar, ou seja, se foram atingidos fáscias, músculos, aponeuroses, articulações,
cartilagens, órgãos cavitários, ossos, ligamentos, vasos etc.
Um cão pode chegar na clínica com histórico de atropelamento e estar apenas
com escoriações externas, ou seja, sua ferida estar limitada à epiderme, derme
ou hipoderme, mas, se ele estiver totalmente descompensado, significa que
existem lesões mais profundas, enquanto que outro paciente pode ter uma
ferida aberta de grande extensão, mas apenas de camadas externas e sem
alterações orgânicas visíveis. Sendo assim, o tratamento de ambos acontecerá
por caminhos diferentes. A figura 1 mostra um fluxograma para ajudar na
tomada de decisão, agilizando o atendimento.
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
Figura 1. Fluxograma para a tomada de decisão do início do manejo das feridas.
AVALIAÇÃO DO PACIENTE E DE
SUA FERIDA
Sim Não Estabilizar o paciente e
Paciente Paciente estável? proteger a ferida para
estável. que não lesione mais
Sim
- Ferida está limpa? Não - Lavar a ferida
- Os tecidos viáveis? - Fazer o desbridamento
inicial
Sim
Não Cirurgia?
Fonte: Critérios - Retalho ou enxerto Tecido de
- Técnica de alivio granulação está
- Técnica de tensão saudável?
- Incisões de
relaxamento?
- Possível fazer o
fechamento primário?
(até 24 horas)
- Possível fazer o
fechamento primário
retardado Considerar
(antes da formação do tecido cicatrização
de granulação) secundária
Cicatrização por
secunda intenção
Fonte: Lopes, 2016.
Ferida, segundo Geovanini (2014) e Perry (2010), conceitua-se como uma
ruptura estrutural (solução de continuidade) e fisiológica do tegumento cutâneo,
da membrana mucosa ou de qualquer parte do corpo, que tem por etiologias
agentes físicos, químicos ou biológicos.
A classificação das feridas pode ser: aberta – quando não tem continuidade de
pele, como, por exemplo, lacerações, úlceras e queimaduras (POPE, 2009) – e
fechada – quando a pele permanece intacta, promovendo proteção da ferida,
evitando riscos de contaminação, como, por exemplo, as contusões, hematomas
e lesões de esmagamento.
Para iniciar o atendimento do paciente com ferida, primeiro é necessário
verificar se ele está estável. Pacientes gravemente traumatizados normalmente
precisam ter prioridade no atendimento, e é necessário instituir o protocolo
de estabilização e, junto a ele, ter o cuidado em proteger a lesão para evitar
maiores danos e contaminações. Ela pode ser coberta por uma camada de
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
pomada ou gel ou coberta por gazes e uma faixa. Se houver sangramentos, fazer
a compressão ou sutura do vaso lesionado evitando perda grandes de sangue
que podem causar hipovolemia. Em feridas que envolvem fraturas ósseas, deve
ser feita imobilização com talas restringindo os movimentos desse local de
forma a evitar maior fragmentação ou mais lesões desses fragmentos. Depois
de estabilizado esse paciente, retomar a preocupação de qual será o caminho a
seguir para o tratamento daquela ferida.
Pacientes com dor não costumam ser colaborativos, então um controle de
dor eficiente irá ajudar no manuseio desses pacientes. Contudo, em algumas
situações, dependendo da gravidade do ferimento, é indicada a sedação para
conseguir avaliar ou mesmo fazer o primeiro atendimento ou estabilização da
região lesionada.
Segundo Williams (2009), algumas feridas são tão sérias que causam a perda da
função dos tecidos, e não é possível a recuperação. Quando isso acontece, se a
localização for mais externa, podemos pensar em amputação, mas, se os danos
forem ainda maiores, a eutanásia seria uma opção mais assertiva.
Se o paciente estiver estável, avalie como está a ferida, determinando o grau de
contaminação, conforme as divisões a seguir.
Tipos de feridas
» Feridas limpas: exemplos de feridas limpas são as feridas cirúrgicas
que são realizadas em condições de assepsia e não têm envolvimento
dos tratos respiratório, digestivo ou urogenital.
Figura 2. Incisão cutânea mostrando uma ferida limpa.
Fonte: elaborada pela autora.
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
» Feridas limpas-contaminadas: são aquelas feridas que são limpas, mas
têm envolvimento dos tratos respiratório, digestivo ou urogenital.
Exemplo: exérese tumoral oral, que, por mais que a assepsia seja
realizada, é um local que tem contaminação.
Figura 3. Ferida limpa-contaminada para extração de um dente que havia causado uma fistula.
Fonte: elaborada pela autora.
» Feridas contaminadas: essas feridas são aquelas traumáticas abertas,
incisões em regiões contaminadas ou inflamadas. A seguir, vemos um
exemplo de ferida contaminada, uma lesão traumática com bastante
edema ao redor.
Figura 4. Ferida contaminada – paciente foi mordida por outro cão.
Fonte: elaborada pela autora.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
» Feridas sujas/infectadas: feridas traumáticas não recentes ou
que envolvam ruptura de vísceras, geralmente já têm uma grade
quantidade de bactérias instaladas. A seguir, um exemplo de ferida
infectada – gato brigou na rua, foi atendido e fugiu novamente,
voltando cinco dias depois
Figura 5. Ferida contaminada em gato.
Fonte: elaborada pela autora.
A duração da contaminação é outra coisa que precisa ser determinada, ou seja,
quanto tempo se passou depois do ocorrido da lesão. Dessa forma, classificamos
as feridas abertas como 1, 2 e 3. A classe 1 são as feridas com menos de 6 horas;
a classe 2 são as feridas entre 6 e 12 horas; e a classe 3 são aquelas expostas
por 12 horas ou mais (PAVLETIC, 2010). Essa classificação tem um intuito
de prever um pouco do grau de contaminação bacteriana; podemos entender
melhor no quadro a seguir.
Quadro 1. Classificação de feridas abertas de acordo com o grau e duração de contaminação.
Grau de contaminação Duração de contaminação
Limpa – classe 1 Mínimo 0-6 horas
Limpa-contaminada – Classe 1 Mínimo 0-6 horas
Contaminada – Classe 2 Significante 6-12 horas
Contaminada – Classe 3 Elevado 12 horas ou mais
Suja/infectada – Classe 3 Elevado 12 horas ou mais
Fonte: Adaptado de Pavletic, 2010.
13
Unidade i | Tópicos Especiais 1
Observando o quadro, podemos concluir que, quanto antes o atendimento e
a avaliação forem realizados, menor será o risco de infecção, evitando, dessa
maneira, futuros problemas circulatório ou mesmo necróticos do tecido e
uma recuperação mais rápida do paciente. O manuseio da ferida sempre deve
ser interligado com uma avaliação geral do paciente (DERNELL, 2006), pois a
cicatrização e a estabilização devem ser pensadas antes de intervir, buscando
sempre bons resultados, sejam eles por meio cirúrgico ou conservador.
Após o paciente ser estabilizado, a ferida deve ser avaliada para ser definido
qual caminho tomar, ou seja, qual será o plano de tratamento a ser seguido para
aquela situação. Sendo assim, um exame detalhado determinará o grau das lesões
e se há mais tecidos envolvidos; junto com isso, a tricotomia pode ser realizada,
uma vez que ela ajudará a visualizar melhor o local, principalmente se o paciente
tiver muito pelo. Além disso, esse procedimento simples de tricotomia fará
com que não haja acúmulo de exsudado e consequentemente também não tenha
propagação bacteriana e ajudará nos curativos de enfermagem, quando a opção
for o tratamento conservador, ou servirá de preparo, se a opção for cirúrgica.
Depois da tricotomia realizada (importante fazer sempre a tricotomia de uma
região bem maior que a da localização da lesão), o local precisa ser lavado, o
que ajudará na visualização melhor da lesão, principalmente dos tecidos mais
internos (DERNELL, 2006).
O papel da lavagem, além de ajudar na visualização, é diminuir a carga
bacteriana e/ou material estranho presente na lesão (exemplo: terra, pedras),
reidratação do tecido necrótico, e remover também toxinas, citocinas e bactérias
quando as feridas já estão infectadas (ANDERSON, 2009). O mesmo autor
ainda recomenda que, para uma remoção completa das bactérias, é precisa a
utilização de uma seringa de 20-30ml acoplada em uma agulha de 18 g para
empregar uma pressão de 6-8 psi. Podem ser usados soro fisiológico, ringer
com lactato, soluções antissépticas (Iodopovidona, clorexidina) ou mesmo
água de torneira, mas essa última deve-se utilizar apenas em situações nas
quais a ferida está extremamente contaminada, mas nunca em feridas limpas
(HENGEL et al., 2013). Fossum (2013) defende ainda que, nessas situações, os
antissépticos são contraindicados por provocarem inflamações consideráveis
em feridas abertas.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Figura 6. Poodle com uma ferida cheia de terra, iniciando o processo de lavagem para depois ser encaminhada para cirurgia
de amputação.
Fonte: elaborada pela autora.
Em feridas abertas por mais tempo ou que já possuem necrose no tecido
e/ou resíduos ainda em seu interior, é recomendada a utilização da técnica
de desbridamento, na qual será realizada a remoção de todo esse tecido
contaminado e transformar-se-á a ferida em limpa, com bordas íntegras aptas
para um fechamento limpo e livre de contaminação, tornando, dessa maneira,
a cicatrização mais rápida e eficiente, mesmo em feridas cujo tratamento deverá
ser realizado como ferida aberta Segundo Williams (2009), essa técnica é a chave
do sucesso.
Para Fossum (2013), quando o paciente que possui trauma por mais de 48 horas,
é perceptível a necessidade de realizar a técnica do desbridamento, já que é
facilmente notada a presença de tecido necrótico na ferida.
Tipos de desbridamento
Existem várias técnicas de desbridamento que podem ser aplicadas; a escolha
delas vai depender do paciente e das características da ferida, ou seja, quanto
de tecido necrótico está instalado, a qualidade e elasticidade do tecido ao redor
da lesão, se o paciente está estável para ser anestesiado ou sedado – tudo deve
ser avaliado para a escolha de qual técnica de desbridamento será utilizada
(HENGEL et al., 2013).
O desbridamento pode ser dos tipos:
» cirúrgico;
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
» mecânico;
» químico;
» autolítico;
» enzimático;
» biocirúrgico.
Estes tipos podem ser classificados como seletivos ou não seletivos.
O não seletivo é uma forma rápida e agressiva de remover tecido necrótico;
ele pode remover junto tecido viável, mas, em um primeiro momento,
facilita o início da formação de tecido de granulação e, consequentemente,
uma cicatrização precoce. São técnicas não seletivas são os desbridamentos:
cirúrgico, mecânico e químico.
Já o desbridamento seletivo é uma técnica mais lenta, menos agressiva. Dessa
maneira, ela vai reavendo aos poucos o tecido necrótico, diminuindo o trauma
dos tecidos viáveis ao redor. São os tipos: autolítico, enzimático e biocirúrgico.
Vale lembrar ainda que, em casos de feridas muito contaminadas, às vezes é
preciso fazer o desbridamento e a lavagem vários dias seguidos até conseguir
uma ferida limpa e saudável.
Desbridamento cirúrgico
A técnica consiste na remoção cuidadosa do tecido necrosado ou contaminado.
A opção mais usada é iniciar a remoção por camadas, começando pelo tecido
superficial, que está desvitalizado, e progredindo para os mais profundos, de
acordo com a avaliação e necessidade. Pode ainda ser realizada em blocos, mas
apenas para aquelas feridas que estão visivelmente infectadas. O desbridamento
em bloco pode também ser usado quando existe superfície suficiente para
utilizar a técnica de reconstrução. É importante lembrar que, quando a lesão
está muito inflamada, é difícil determinar onde termina o tecido necrosado
e começa o saudável. Nesses casos, devemos optar por um desbridamento
periódico, de forma a remover os tecidos necróticos mais visíveis até conseguir
ter a visualização do tecido rosado ou vermelho indicando o tecido saudável.
16
Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Figura 7. Ferida não cicatrizante, ulcerada e com células de granulação ao redor.
Fonte: Lopes, 2016.
Figura 8. Desbridamento cirúrgico ao redor da ferida.
Fonte: Lopes, 2016.
Figura 9. Retirada de toda a parte ulcerada.
Fonte: Lopes, 2016.
Figura 10. Ferida após o desbridamento, mostrando tecido saudável e boa irrigação.
Fonte: Lopes, 2016.
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
Desbridamento mecânico
O desbridamento mecânico é realizado usando força física, ou seja, será
esfregado o local da ferida, podendo ser com uma gaze umedecida ou com jatos
de solução fisiológica, sempre com o intuito de remover o tecido necrosado.
Depois de limpo, pode ser colocada gaze limpa umedecida com soro e, na
próxima troca de curativo, ela pode ser removida de uma vez, depois de seca.
Apesar de ser uma boa forma de desbridamento, é muito doloroso e é um
método não seletivo, removendo também tecidos de cicatrização bons.
Desbridamento químico
Nessa técnica, são utilizadas soluções para fazer a lavagem da ferida; essas soluções
ajudam na remoção do tecido necrótico ou outros artefatos e da carga bacteriana
instalada que possa estar atrapalhando sua cicatrização. Exemplo de soluções que
podem ser usadas:
» clorexidina (0,05%);
» iodopovidona (1%);
» peróxido de hidrogênio.
Figura 11. Ferida com tecido necrosado, coloração com aspecto ruim.
Fonte: Lopes, 2016.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Figura 12. Após a lavagem, a coloração mais avermelhada e sem a presença de tecido necrótico; já pode ser observado
tecido de granulação ao redor.
Fonte: Lopes, 2016.
Desbridamento autolítico
É um tipo de desbridamento menos invasivo, indolor e seletivo, no qual o próprio
organismo ou substâncias naturais fazem a limpeza, ou seja, as enzimas e os
leucócitos que agirão. Ele também provoca reidratação dos tecidos, mantendo,
dessa maneira, o ambiente úmido. Alguns produtos podem ser usados nesse
processo, como:
» hidrogel;
» hidrocoloides;
» alginato de cálcio;
» mel;
» açúcar.
Todos esses produtos ajudam a manter o ambiente úmido, pois favorecem o
acúmulo de fluido (HENGEL et al., 2013).
Desbridamento enzimático
Semelhante ao desbridamento autolítico, é um método também seletivo e que
utiliza enzimas para degradar o tecido necrótico e liquefaz também coágulos,
mas essas enzimas não são do próprio corpo, são exógenas, como, por exemplo:
19
Unidade i | Tópicos Especiais 1
» colagenase;
» papaina.
Fechamento
Para finalizar, é preciso observar a possibilidade de fechar a ferida. Para
determinar isso, é preciso saber há quanto tempo aconteceu a lesão, se há muito
tecido lesionado, se tem circulação sanguínea que dará o suporte, como está o
grau de tensão nos tecidos, se tem presença de espaço morto etc. (FOSSUM,
2013). É preciso verificar se é possível fechar, se tem resíduos, se o tecido está
viável e com circulação e se não tem presença de infecção. Todas essas respostas
ajudam a determinar o tratamento escolhido para aquela lesão. O fechamento
primário é indicado apenas em ferimentos limpos, cujas bordas foram mantidas
fechadas.
Fechamento primário
» imediato ou quando tem menos de 24 horas (preferencialmente 6-8
horas);
» bordas limpas e próximas;
» pouco ou nenhum exsudato;
» ausência de infecção;
» pouco edema.
Fechamento primário atrasado
» É possível fazer o fechamento antes da formação de tecido de
granulação.
» Deve estar com mais de oito horas, mas máximo entre três e cinco
dias (HENGEL et al., 2013).
» É usado quando se precisa diminuir a inflamação.
» É preciso fazer tratamento com bandagens antes do fechamento,
possibilitando drenagem e desbridamento em fases e, só se o ferimento
estiver com características limpas ou seja tecido viável e sem sinais de
contaminação, é que poderá ser feito o procedimento para o fechamento.
20
Tópicos Especiais 1 | Unidade i
» Permite o desenvolvimento de uma linha que separa o tecido viável
do necrosado, facilitando o procedimento cirúrgico para realizar o
desbridamento.
A cicatrização primária tem o seu início das bordas para o centro, enquanto que a
cicatrização por segunda intenção tem o seu início do centro para as bordas.
Quadro 2. Tipos de cicatrização e o tempo para se fazer o fechamento da lesão.
Tipos de Fechamento Caracteristica e Tempo
Fechamento primário imediato. 6-8 horas “período ouro”.
Primário
Fechamento primário retardado. Antes da formação de tecido de granulação.
Secundário Fechamento secundário. Após a formação de tecido de granulação 3-5 dias.
Fechamento por segunda Quando já passou um tempo e o organismo deu início à
Por segunda intensão
intensão. formação de tecido de granulação.
Fonte: elaborada pela própria autora.
Figura 13. Ferimento por ataque de capivara, 14 horas depois de acontecido.
Fonte: elaborada pela autora.
Figura 14. Mesma ferida da figura 13, depois de lavada.
Fonte: elaborada pela autora.
21
Unidade i | Tópicos Especiais 1
Figura 15. Ferimento após dez dias.
Fonte: elaborada pela autora.
Figura 16. Ferimento após 14 dias, depois de tratamento por segunda intenção.
Fonte: elaborada pela autora.
Figura 17. Ferimento após 21 dias, depois de tratamento por segunda intenção.
Fonte: elaborada pela autora.
22
CAPÍTULO 2
Infecções e sepsemias na emergência
e no intensivismo e Síndrome da
Disfunção de Múltiplos Órgãos (SDMO)
Segundo dados do Instituto Latino-americano de sepse, ela é a principal
causa de óbitos nas unidades de terapia intensiva (UTI), chegando a 65% no
Brasil tendo a média mundial variando de 30-40% das mortes. Na medicina
veterinária, ela é responsável por um alto índice de mortalidade dentro das
UTIs veterinárias, o que torna necessária a intervenção imediata e início do
tratamento o quanto antes.
Com o intuito de salvar vidas e reduzir a mortalidade na medicina humana,
em 2003, começou uma campanha chamada Surviving Sepsis Campaign (SSC)
“Campanha Sobrevivendo à Sepse” que teve sua última versão em 2013
(DELLINGER et al., 2013). Na veterinária, muitas coisas são adaptadas da
medicina humana, então, usando Sepse 1 e SSC, foi adaptada uma tabela para a
veterinária com recomendações para o tratamento de sepse, como podemos ver
no quadro 3. O principal objetivo da SSC foi diminuir a taxa de mortalidade em
25% depois do início da aplicação dos guias de conduta em um total de 5 anos.
Em 2003, um grupo de especialistas se reuniu para desenvolver um pacote com
diretrizes para o tratamento em sepse grave que posteriormente foi publicado em
uma revista bastante conceituada na área de medicina intensiva.
Chegando em 2006, aconteceu nova reunião com o objetivo de revisar as
recomendações propostas em 2004 e, novamente, em 2012. Apenas em 2017,
porém, foram geradas as atuais diretrizes da Campanha Sobrevivendo à Sepse,
que foram aplicadas no mundo todo.
Quadro 3. Recomendações para o tratamento de sepse da Campanha Sobrevivendo à Sepse de 2012.
Manutenção de pressão arterial média (PAM) 65 mmHg
Débito urinário. Maior 0,5 ml/kg/h.
Pressão venosa central. Entre 8-12 cmH2O.
Saturação venosa veia cava superior. Maior que 70%.
Queda maior ou igual a 20% nas primeiras 2 horas do valor
Normalização do lactato sérico.
inicial medido.
Fonte: Surviving Sepsis Campaign (2012).
23
Unidade i | Tópicos Especiais 1
A classificação do doente séptico é uma coisa muito complexa para ser definida,
mas o consenso que foi preconizado é que esse doente precisa ser identificado
precocemente, além do que é preciso ter uma noção clara da situação dele. Dessa
maneira, podemos observar uma resposta inflamatória sistêmica sem infecção, e
infecção sem ter uma resposta inflamatória.
De acordo com Sociedades de Urgências e Cuidados Intensivos Veterinários,
para que o paciente seja classificado como um doente com resposta inflamatória
sistêmica, ele deve ter pelo menos três dos quatro critérios propostos na
avaliação que podemos ver na tabela 1:
Tabela 1. Critérios de SIRS em cães e gatos.
Cães Gatos
Tempo (TR ºC) <38,1 ou >39,2 <37,8 ou >40
Frequência cardíaca (bpm) >120 <140 ou >225
Frequência respiratória (mrm) >20 >40
Leucócitos (x10³); Bastonetes % <6 ou >16; >3% <5 ou >19,5; >5%
Fonte: Curso oficial de ABC cuidados intensivos (2019).
Para Rabelo (2013), algumas características podem estar associadas a disfunção
orgânica, como: a hipotensão (com a PAM menor que 80 mmHg ou PAS menor
que 90 mmHg), oliguria (com débito urinário inferior a 0,5 mL/Kg/h) ou níveis
de creatinina sérica superiores a 2 mg/dL, hiperbilirrubinemia sérica (maior
que 0,5 mg/dL), consciência alterada (Glasgow com pontuação inferior a 17
pontos ou AVDN menor que A – Alerta), disfunção respiratória, alterações
de coagulação, íleo paralitico, hipoalbuminemia (menor que 2,5 g/dL) e
hiperlactatemia (maior que 3,2 mmol/L).
Para saber como diagnosticar, existem alguns marcadores que devem ser
utilizados. Eles estão presentes nos seguintes sistemas: respiratório, circulatório,
gastrointestinal, geniturinário e sistema nervoso central. Observe no quadro abaixo:
Quadro 4. Marcadores que devem ser observados em cada sistema.
Sistemas Marcadores
Sistema nervoso central AVDN + sono
Digestório Presença de burburinhos
Geniturinário Débito urinário
Respiratório FR + padrão
Circulatório Hemodinâmica
Fonte: elaborada pela própria autora.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
No sistema nervoso central, a escala de Glasgow é utilizada com frequência na
neurologia da medicina humana, e a de coma de Glasgow pediátrica humana
pode ser perfeitamente adaptada para utilização na medicina veterinária,
pois, segundo Simpson e Reilly (1982), as crianças até dois anos possuem uma
resposta verbal limitada, podendo, dessa maneira, a mesma escala se encaixar
bem com nossos cães e gatos, como pode ser observado no artigo de Andrade e
colaboradores (2010), no qual eles transformaram a escala de Glasgow pediátrica
em uma veterinária (quadro 5).
Quadro 5. Escala de coma de Glasgow pediátrica modificada para cães.
Indicador Critérios/respostas Escore
Espontânea 4
Estímulo verbal/comando 3
Abertura ocular Estímulo verbal/comando/ao grito 3
Estímulo doloroso 2
Sem abertura 1
Latido/rosnado 5
Choramingo irritado 4
Melhor resposta à vocalização Choramingo à dor 3
Ganido a dor 2
Sem resposta 1
Movimento espontâneo 6
Reação ao toque 5
Reação a dor 4
Melhor resposta motora
Flexão anormal – descorticação 3
Extensão anormal – descerebração 2
Nenhuma 1
Total 15
Fonte: Andrade et al, 2010.
Podemos usar também o AVDN visualizado da seguinte forma: A para pacientes
que se encontram em alerta; V para aqueles que respondem verbalmente (latem,
miam etc.); D quando o paciente responde apenas com estimulo de dor; e N
quando paciente não responde a nada.
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Quadro 6. Significado do AVDN.
Sigla Significado
A Paciente encontra-se Alerta.
V Paciente responde Verbalmente.
D Paciente responde apenas com estimulo de Dor.
N Paciente Não responde a nada.
Fonte: elaborada pela autora.
O sistema digestivo precisa ser avaliado durante a palpação abdominal, para
verificar se não se encontra distendido visualmente ou se o paciente sente
dor à palpação. Auscultação de burburinhos pode ser pesquisada no primeiro
momento do exame, acompanhando se tem obstrução e ausência de peristaltismo.
Em caso de dor observar se é focal podendo está relacionado a intuscepção ou
corpo estranho, pancreatite, ulceras gastrointestinais. Caso a dor seja regional,
pode estar relacionada a uma pancreatite moderada a grave ou colicistite e, se
a dor for difusa, pode ser uma gastroenterite difusa, peritonite ou mesmo dor
vertebral. A presença do burburinho será usada como um marcador importante,
principalmente com a evolução do quadro do paciente na internação.
É importante lembrar também que a idade pode trazer informações
importantes – por exemplo, em pacientes jovens, é mais comum ter alteração
relacionadas a corpo estranho, infecções virais e parasitárias. Com gatos
jovens, é muito comum a ocorrência com corpo estranho linear (exemplo: uma
agulha com linha).
No sistema urinário, o marcador observado é o débito urinário, mas, durante a
triagem, algumas perguntas devem ser feitas aos tutores para direcionar quanto
ao possível problema instalado com a disfunção orgânica em questão. Por
exemplo:
» Qual a quantidade de urina que ele faz? Como está a coloração? Sente
algum cheiro diferente?
» Qual é a frequência que ele urina? Como é o seu comportamento antes,
durante ou depois (se ele força pra urinar, fica ensaiando antes de fazer
etc.)?
» Bebe muita água?
26
Tópicos Especiais 1 | Unidade i
» Come bem? Como é o apetite dele? (avaliar o escore corporal junto
– em pacientes com injúria renal instalada, ocorre o consumo da
musculatura)
» Quando ele tem alguma coisa costuma dar algum medicamento? Qual
costuma dar?
» Quando o tutor viaja, costuma levar o paciente? (alguns cães ficam
segurando para não urinar e, se a viagem for muito longa, com o tempo,
pode causar problemas).
Após essas perguntas, para direcionar qual a possível causa renal (pré-renal
ou pós-renal), a avaliação clínica vai ajudar a diferenciar o restante. No exame
físico, devem ser observados:
» hidratação;
» TPC (tempo de preenchimento capilar), bem como a sua coloração;
» FC e FR;
» pulso;
» observar a distensão da veia jugular;
» temperatura corporal;
» edema nos membros posteriores;
» presença de efusão pleural e/ou abdominal.
Quadro 7. Exemplos de problemas que causam alterações pré-renal e pós-renal.
Pré-renal Pós-renal
Função cardíaca com problema (insuficiência cardíaca congestiva, arritmias,
Ruptura da bexiga.
ventilação por pressão positiva após parada cardíaca, tamponamento cardíaco).
Alterações hormonais podem causar a diminuição da urina (secreção de ADH –
Herniação da bexiga.
hormônio antidiurético).
Ruptura, obstrução ou
Opioides (função semelhante ao ADH).
estreitamento da uretral.
Ligadura iatrogênica de ureteres
Doenças pulmonares.
ou uretra.
Pacientes ventilados. Urólitos.
Policitemia. Uretrite granulomatosa.
27
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Pré-renal Pós-renal
Hiperproteinemia/hiperglobulinemia. Doenças prostáticas.
Sepse.
Terapia com vasodilatador.
Fonte: elaborada pela própria autora.
O acompanhamento da produção urinária é uma ferramenta de avaliação e
acompanhamento para monitorar o sistema urinário. Com ele, conseguimos
monitorar a função renal nesses pacientes críticos. O normal é que essa
produção fique entre 1-2 ml/kg/h; quando o paciente está desidratado, porém,
esse débito estará diminuído e o contrário também pode acontecer – naquele
paciente que está recebendo fluido acima do necessário, o débito urinário irá
aumentar. Para o exame de urina, deve ser feita a coleta antes do início da
medicação e devem ser realizados cultura e antibiograma da urina.
Como marcador do sistema respiratório, precisam ser observados a frequência
respiratória e o padrão dessa respiração, olhar o paciente e verificar se respira
ou não, respira mal ou respira bem. O normal é 18 a 36 rpm em cães e 20
a 40 rpm em gatos (FEITOSA, 2004) A dispneia, quando presente, precisa
ser analisada para definir o quanto a respiração está comprometida. É muito
importante uma boa avaliação do paciente com angústia respiratória para
início do tratamento e definição do possível diagnóstico. Saber se o problema
está no pulmão ou no espaço pleural irá facilitar a estabilização desse paciente.
Na respiração normal, o tórax e o abdômen se movimentam em conjunto
durante a inspiração, mas uma desarmonia entre eles significa que alguma
coisa está errada. Outra forma de observar a dificuldade respiratória é avaliar
a postura do paciente: cães com dificuldade em respirar costuma abrir a boca
na intensão de buscar um conforto, além de esticar o pescoço e elevar um
pouco a cabeça, pois faz com que a traqueia se estenda, facilitando a entrada
do ar. Podemos ainda observar alguns cães preferem ficarem em estação ou
em decúbito esternal, buscando uma menor compressão do tórax. Em gatos,
porém, não é observada a posição de decúbito esternal nessas situações.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Figura 18. Filhote com dificuldade respiratória evitando compressão do tórax.
Fonte: elaborada pela autora.
Figura 19. Filhote, após receber a suplementação de oxigênio e iniciado o tratamento, voltou a respirar sozinho sem
dificuldades nem necessidade de oxigenar.
Fonte: elaborada pela autora.
A avaliação da coloração da mucosa pode nos passar informações importantes
sobre o início da causa dessa dificuldade respiratória, algumas delas listadas no
quadro a seguir.
Quadro 8. O que observar na coloração da mucosa durante o exame físico do paciente dispneico.
Coloração de mucosa Possíveis significados
Presença de toxinas.
Mucosa marrom
Ex.: cianeto e paracetamol.
Mucosa pálidas Anemia ou vasoconstrição periférica.
Mucosa cianótica Hipoxemia severa.
Vermelho vivo Monóxido de carbono (causa muito desconforto respiratório).
Fonte: elaborada pela própria autora.
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
Junto com a coloração da mucosa, a auscultação do tórax precisa ser realizada, e
podem ser ouvidos sons como crepitação, sibilos e estridores e cada um deles irá
nos direcionar para os prováveis problemas, como podemos ver no quadro a seguir.
Quadro 9. O que observar na coloração da mucosa durante o exame físico do paciente dispneico.
Sons Possíveis significados Observações
Estreitamento das vias Sibilos na inspiração – afecções no trato respiratório superior.
respiratórias pode ser por várias
Sibilos causar.
Sibilos na expiração – afecções no trato respiratório inferior.
Ex.: massa, edema, muco,
inflamação.
Presença de fluidos nas vias Crepitações suaves no fim da inspiração – edema pulmonar,
Crepitação
aéreas ou nos alvéolos. hemorragia, exsudato purulento no alvéolo.
Altos estridores Fibrose pulmonar ou bronquite.
Sons fracos,
Afecções no espaço pleural
abafados ou Pneumotórax, efusão pleural, hernia diafragmática, neoplasias.
devem ser pesquisadas.
difíceis de ouvir
Fonte: elaborada pela própria autora.
É importante lembrar que, durante a auscultação cardíaca, a palpação do pulso
ao mesmo tempo ajuda a decidir quanto o problema cardíaco é responsável pela
dificuldade respiratória. Entretanto, em gatos, isso é mais difícil de ser determinado.
Para estabilizar o paciente com angústia respiratória, é preciso melhorar a
qualidade da respiração dele. Sendo assim, é necessário aumentar a quantidade
de oxigênio que esse paciente inspira. A oxigenioterapia pode ser feita de várias
formas, como máscara (que nem todos os pacientes gostam), com o tubo próximo
a boca ou narinas, colar elizabetano com o papel filme na frente (tampa-se a
frente do colar deixando apenas um espaço de mais ou menos dois dedos para
sair o vapor de água e o dióxido de carbono, e o tubo de oxigênio é colocado
preso no colar elizabetano), uma boa opção para cães braquicefálicos e alguns
gatos. Essa técnica costuma diminuir um pouco o estresse desses animais, que
pode piorar o quadro respiratório. A gaiola de oxigênio também pode ser é uma
maneira fácil de administrar o oxigênio, mas é importante que a porcentagem
de oxigênio seja de 100%. Um dos problemas dessas gaiolas é que nem sempre
o percentual esperado é alcançado e, se o cachorro for muito grande, pode
não caber dentro da gaiola. E, quanto à cânula nasal, pode ser usado o cateter
em óculos, mas deve ser compatível com o tamanho das narinas do paciente;
cateteres urinários ou sondas gástricas podem ser usados para essa finalidade.
Em cães agitados ou muito ativos, é só colocar cerca de 1 cm dentro da narina e
30
Tópicos Especiais 1 | Unidade i
prender na parte de fora com esparadrapo ou suturado. Cães braquicefálicos e
gatos não reagem muito bem com essa técnica de oxigenação. Observe a melhora
do paciente ao início da oxigenioterapia. Caso ele ainda permaneça dispneico
mesmo com a suplementação de oxigênio, é possível que seja preciso realizar
uma toracocentese para retirada de ar ou líquido.
Figura 20. Paciente recebendo oxigenioterapia com o colar elizabetano com papel filme na frente, deixando um espaço em
cima.
Fonte: cedida por Christine S. Martins, UnB.
Figura 21. Paciente recebendo oxigenioterapia usando o tudo na frente da narina.
Fonte: Rabelo, 2020.
Figura 22. Paciente recebendo oxigenioterapia por meio de máscara.
Fonte: Rabelo, 2020.
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
Figura 23. Paciente recebendo oxigenioterapia com a sonda nasal.
Fonte: Rabelo, 2020.
Figura 24. Oxigênio via transtraqueal.
Fonte: Rabelo, 2020.
A toracocentese pode ser realizada tanto para diagnóstico como para
tratamento do paciente.
Figura 25. Paciente fazendo a toracocentese.
Fonte: elaborada pela autora.
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Sinais clínicos em vias aéreas superiores costumam afetar a laringe e causam
estridor bem alto que, mesmo sem o estetoscópio, pode ser ouvido. O estertor
ou estridor pode ser ouvido inicialmente durante a inspiração. Nos quadros a
seguir, podemos ver os sinais clínicos e diagnóstico diferencial que podemos
pesquisar.
Quadro 10. Sinais clínicos associados a obstrução de vias aéreas superior e o diagnóstico diferencial em cães e gatos.
Sinais clínicos e histórico associado com obstrução da via aérea superior
Dispneia:
» estertor ou estridor audível;
» aumento do esforço respiratório com inspiração prolongada (respiração laboriosa);
» mudança na vocalização;
» intolerância ao exercício – piora com exercício ou quando estressado;
» ofegar excessivo;
» hipertermia.
Fonte: adaptada de Waddell e King (1999) .
Quadro 11. Diagnóstico diferencial em cães e gatos.
Diagnóstico diferencial
» síndrome braquicefálica
» paralisia laríngea
» colapso de traqueia
» pólipo nasofaríngeo (gatos)
» aspiração de corpo estranho
» neoplasia de via aérea superior
» massa retrofaríngeas, abcesso ou hematomas
Fonte: adaptada de Waddell e King (1999).
O manejo do paciente com obstrução da via aérea superior começa fazendo com
que ele descanse na presença da oxigenioterapia e mais algumas coisas, como as
descritas abaixo:
» suplementação de oxigênio;
» descanso e sedação caso necessário (a acepromazina pode ser utilizada e
associada com algum opioide);
» se tiver sedado ou em colapso, colocar o paciente com o pescoço e
cabeça esticados, a boca aberta e a língua puxada para fora da boca;
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
» fazer o acesso, caso ainda não tenha sido realizado;
» evitar ao máximo o estresse;
» anti-inflamatório do tipo esteroide em dose imunossupressiva;
» monitorar temperatura e, em caso de hipertermia, resfriá-lo;
» fluidoterapia (avaliar se é para desidratação ou hipovolemia);
» traqueostomia emergencial ou entubação, se não responder ao manejo
medicamentoso.
Dizer que o paciente está com boa respiração significa que o oxigênio entra e sai
CO2, tudo isso de forma sincrônica e sem dificuldades; mas o paciente que respira
mal, em algumas situações, precisa de uma intervenção mais invasiva, situação
na qual a intubação é preconizada. Ela pode ser fácil, ou seja, o traqueotubo é
colocado sem problemas na traqueia, ou pode ter algumas resistências, de modo
que será necessário realizar uma crico ou traqueostomia.
O índice de Cormack-Lehane é muito usado na medicina humana para definir
o grau de dificuldade de intubação, sendo que grau I significa que existe
uma boa visualização, ou seja, consegue-se ver toda a anatomia da glote, sendo
assim provável que seja fácil a intubação. A de grau II tem a visualização parcial,
consegue-se ver apenas a região posterior da glote, mas a entubação pode
ser realizada. Já nos graus III (visualiza somente epiglote) ou IV (nenhuma
visualização), se tem pouca ou nenhuma visualização e é preciso fazer crico ou
traqueostomia, pois a intubação possui um alto grau de dificuldade. Esse índice é
facilmente adaptado para a medicina veterinária. O quadro a seguir mostra o
passo a passo para a traqueostomia de emergência.
Quadro 12. Passo a passo para uma traqueostomia de emergência.
Passo a passo para traqueostomia
1 Confirmar se não tem como fazer a intubação.
2 Com o paciente em decúbito lateral direito, estique o pescoço para melhor visualização da região.
3 Faça a tricotomia e assepsia na região cervical ventral.
4 A incisão deve ser feita desde a cartilagem cricoide até o sexto espaço da traqueia.
5 Os músculos esternais sevem ser separados lateralmente.
6 A traqueia é separada e a incisão é feita entre o terceiro e quarto anel traqueal.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Passo a passo para traqueostomia
7 A incisão deve ser de cerca de 50% da circunferência da traqueia.
8 O tubo de traqueostomia deve ser compatível com a incisão realizada.
É feita uma sutura no anel superior e no inferior da incisão para facilitar a colocação do tubo de
9
traqueostomia.
O tecido subcutâneo e pele são posicionados cranial e caudalmente, de modo que a abertura fique
10
grande se for precisa nova reintubação.
11 O tubo é fixado com esparadrapo e faixa ao redor do pescoço para dar mais segurança.
Fonte: elaborada pela própria autora.
Algumas síndromes da obstrução aérea superior:
» síndrome da obstrução braquicefálico;
» paralisia de laringe;
» colapso de traqueia;
» pólipos inflamatórios nasofaríngeos;
» aspiração de corpo estranho;
» massas em vias aéreas superiores.
Os problemas relacionados as vias aéreas inferiores que acometem os pacientes
normalmente estão relacionados a questões nos brônquios e de origem
inflamatória, e a tosse é muito observada como sinal clínico desses pacientes. A
broncopneumonia é uma complicação que pode acontecer nesses pacientes, que
acabam tendo a diminuição do sistema imunológico.
Quadro 13. Sinais clínicos observados em pacientes com enfermidades nas vias aéreas inferiores.
Sinais clínicos em pacientes com enfermidades nas vias aéreas inferiores
Tosse
Intolerância ao exercício
Dispneia
Aumento dos sons broncovesiculares
Sibilos
Fonte: King, 2013.
Os pacientes nesse quadro, quando chegam à emergência, costumam já estar
com a doença no último estágio ou em crise e, na maioria dos casos, apresentam
um quadro bem ruim e precisam ter prioridade no atendimento, tendo a
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
oxigenioterapia instalada imediatamente. Se o paciente estiver muito angustiado,
a sedação pode ser recomendada, mas precisa se confirmar antes se não existe
um problema cardíaco associado que impeça esse procedimento. Após colocar
o paciente em oxigenação, deixá-lo em repouso e evitar ao máximo qualquer
esforço, fazer o acesso vascular e iniciar com anti-inflamatórios esteroidais em
dose imunossupressiva – pode ser a dexametasona ou prednisolona –, visto
que a maioria das situações tem sua origem inflamatória. Na sequência, iniciar
com broncodilatadores – podem ser usadas a terbutalina ou hidrocodona –,
antitussígenos também são importantes nessa fase, seguidos de antibióticos.
Não esquecer de fazer a coleta de sangue para cultura antes de iniciar com essa
medicação. A radiografia torácica pode ser realizada para descartar doença
alveolar pulmonar, mas deve ser feita desde que o paciente aceite a manipulação
e o lavado transtraqueal para cães de grande porte ou lavado endotraqueal,
que é mais recomendado para cães de pequeno porte – ele é usado para cultivo
bacteriano e fúngico bem como o exame citológico.
A seguir, apresentamos o passo a passo dos lavados transtraqueal e endotraqueal.
O lavado transtraqueal pode ser feito com o paciente acordado, a menos que
ele esteja indócil. É mais usado para cães grandes usando cateter interno com
agulha 18 para coletar a amostra, sendo 30 cm de comprimento para esses
cães, e, se for realizado em cães de pequeno porte, deve ser usado com 20 cm
de comprimento.
Quadro 14. Passo a passo do lavado transtraqueal (LTT).
1. Realizar a tricotomia e assepsia da região ventral do pescoço, importante ser próximo da laringe.
2. Aplicar um anestésico local, pode ser a lidocaína, ele dever ser aplicado na região onde será
colocado o cateter, esse local costuma ser entre o 2ª e o 5ª anel traqueal.
3. Segure a traqueia com os dedos indicador e polegar, passe o cateter através da pele, e coloque a
ponta do cateter entre os dois anéis, a ponta do cateter é mantida perpendicular a traqueia e o bisel da
agulha par baixo e é empurrada para o lúmen da traqueia.
4. A agulha é inclinada parabaixo e o cateter é empurrado para o comprimento da traqueia.
5. Se o cateter não entrar com facilidade retirar a agulha e coloca-la novamente 0,25cm da ponta de
onde a agulha estava, em seguida coloque novamente dentro da traqueia para posicionar o cateter.
6. Depois que todo o cateter for posicionado dentro da traqueia a agulha então é removida do cateter.
7. Injetar de 5 a 10 ml de solução salina estéril dentro do cateter.
8. O cão é estimulado a tossir e produzir a amostra, por isso a importância do paciente está alerta.
9. Esse procedimento pode ser feito mais de 3 vezes até conseguir produzir uma amostra adequada.
10. A amostra é colocada e um recipiente estéril para a cultura e citologia.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
11. O cateter então é removido do pescoço e deve ser colocado uma gaze para evitar sangramento.
Problemas que podem acontecer:
» Enfisema subcutânea
» Pneumomediastino
» Pneumotórax
» Sangramento
» Quebra de cateter e aspiração do cateter na via aérea
» Piora do quadro respiratório do paciente devido ao estresse do mesmo durante o procedimento.
Fonte: King, 2013.
O lavado endotraqueal é mais indicado para cães de pequeno porte e gatos ou
para cães grandes que estão anestesiados; porém, a anestesia é leve e o paciente
precisa estar estabilizado o suficiente para evitar movimentação.
Quadro 15. Passo a passo do lavado endotraqueal (LET).
1. Um tubo endotraqueal estéril deve ser introduzido na traqueia de modo a evitar a contaminação oral.
2. Uma sonda uretral de cão ou um cateter padrão de borracha vermelha é usado para injetar a solução salina estéril
através do tubo endotraqueal.
3. A aspiração pelo cateter é feita enquanto animal é estimulado a tossir.
IMPORTANTE:
Pacientes devem ser monitorados durante toda a recuperação para ter certeza que não tem nenhum problema com
a oxigenação ou ventilação.
Fonte: King, 2013.
Quadro 16. Fármacos utilizados para tratamento de emergência dos pacientes com enfermidades na via área inferior.
Fármacos Dose e via de administração
Dexametasona 0,25 – 0,5mg/kg IV ou IM
Prednisolona 0,5 – 1mg/kg IV, IM ou via oral
Terbutalina 0,01 mg/kg IV ou IM ou 0,5 – 1 mg/kg via oral
Aminofilina 5,5 mg/kg IV
Butorfanol 0,2 – 0,4 mg/kg IV ou IM
0,5 – 1 mg/kg via oral
HIdrocodona 1,25 – 5 mg/kg via oral
Fonte: King, 2013.
A hemodinâmica é o marcador utilizado para o acompanhamento do
sistema circulatório. Essa monitorização é realizada buscando informações
da macrocirculação – que são as artérias e veias – e da microcirculação – que
são as arteríolas, capilares e vênulas pós-capilares. Para a realização desse
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
acompanhamento, existem técnicas invasivas, como a pressão venosa central
(PVC), e não invasivas, como o eletrocardiograma. Além disso, os sinais clínicos
verificados durante o exame físico ajudam a direcionar para a busca de possíveis
cardiopatias. Pacientes com problemas cardíacos costumam ter as mesmas
reclamações, como:
» dispneia;
» colapso;
» sincope;
» tosse;
» cianose;
» sinais de tromboembolismo periférico (principalmente em gatos).
Outros sinais podem estar presentes e devem ser pesquisados para ver se a
possível causa é cardíaca ou não, como pode ser melhor observado no quadro a
seguir.
Quadro 17. Causas cardíacas e não cardíacas de achados clínicos cardiovasculares anormais mais comuns encontrados.
Achados clínicos Possíveis causas cardíacas Causas não cardíacas
» Doenças respiratórias
» Obstrução de vias aéreas
» Edema pulmonar
» Tromboembolismo pulmonar
Dispneia » Efusão pleural
» Distúrbios ácido-básicos
» Efusão pericárdica
» Dor/ansiedade
» Hipertensão pulmonar
» Sobrecarga atrial esquerda » Doenças respiratórias primarias
Tosse em cães
» Edema pulmonar severo » Piotórax
» Doenças respiratória primaria
» Raramente está associada a
Tosse em gatos » Asma felina
insuficiência cardíaca congestiva
» Doença bronquial
» Edema pulmonar severo » Obstrução de vias aéreas
Cianose » Persistência do forame intraventricular » Doença respiratória severa
» Cardiopatia congênita » Meta-hemoglobinemia
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Achados clínicos Possíveis causas cardíacas Causas não cardíacas
» Hipoproteinemia
» Hipertensão portal
» ICC direta » Distensão abdominal secundária à
Ascite
» Obstrução de veia cava dilatação vólvulo-gástrica
» Peritonite
» Hemorragia abdominal
» Anemia (VG < 25%)
» Doença valvar
» Sopro “inocente” (cães com menos de 16
Sopro cardíaco » Doença miocárdica
semanas de idade
» Cardiopatias congênitas
» Pirexia
» Hipoglicemia
» Arritmias » Distúrbios eletrolíticos
Sincope ou colapso » Terapia inapropriada » Anemia
» Efusão pericárdica » Distúrbio neurológicos
» Anormalidade musculo esqueléticas
» Choque/hemorragia
» Hipotensão devido a diminuição do » Desidratação severa
Taquicardia sinusal débito cardíaco » Pirexia ou hipertermia
» Ativação simpática associada à ICC » Anemia
» Dor/ ansiedade
» Hipóxia sistêmica
» Distúrbios ácido-básicos
» Distúrbios eletrolíticos
» Distúrbios miocárdico primário/trauma
Taquicardia ectópicas » Sepse
» Hipoxia miocárdica
» Intoxicação por drogas
» Anormalidades do sistema nervoso
autônomo
» Tônus vagal aumentado
» Síndrome do nó doente
Bradicardia » Hipercalemia ou outros distúrbios
» Bloqueio átrio ventricular
eletrolíticos
» Anormalidades musculoesqueléticas
Paresia periférica » Tromboembolismo sistêmico
» Distúrbios neurológicos
» Hipoproteinemia
» Vasculite
Edema periférica » ICC direta ou bilateral severa
» Distúrbios linfáticos
» Obstrução vascular
Fonte: King, 2013.
39
Unidade i | Tópicos Especiais 1
Alguns equipamentos nos auxiliam no controle e avaliação desses parâmetros,
como o monitor de multiparamétrico, no qual conseguimos ter eletrocardiograma,
frequência respiratória, temperatura e pressão arterial.
O eletrocardiograma deve ser feito em todos os pacientes que chegam na
emergência. Estando eles instáveis ou não, ajudará na triagem e dará informações
da real situação, bem como auxiliará no diagnóstico e tratamento, além de fazer
parte do acompanhamento durante a internação. A frequência das aferições
depende da gravidade e da evolução do quadro de cada animal. É importante
ressaltar que o paciente crítico não deve estar em uma situação de estresse.
Figura 26. Paciente em decúbito lateral direito fazendo o eletrocardiograma.
Fonte: http://veterinariaigarape.com.br/wp-content/uploads/2020/05/eletro-eco.jpg.
A aferição da pressão sanguínea arterial (PSA) é outro exame muito útil na
avaliação do paciente, principalmente daqueles com a suspeitas cardíacas.
Essa mensuração pode se dar de forma direta ou indireta, sendo essa última a
mais comumente utilizada no manejo dos pacientes em estado crítico, por ser
facilmente aplicada – basta a utilização de doppler, manômetro e manguito de
tamanho apropriado, que deve ser de 40% da circunferência (em centímetros)
do local onde será colocado. No método direto, é precisa a colocação de um
cateter em uma artéria.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Figura 27. Doppler para aferição da pressão.
Fonte: elaborada pela própria autora.
As braçadeiras devem ser escolhidas de acordo com o diâmetro de cada braço,
sendo a correta de 40% do tamanho dela. A utilização de uma braçadeira errada
pode interferir consideravelmente no resultado da aferição; por isso, saber
escolher a melhor é importante.
Figura 28. Vários tamanhos de braçadeiras.
Fonte: elaborada pela própria autora.
A hemogasometria arterial é importante no manejo dos pacientes com dispneia
devido a ICC. O animal apresentar hipercapnia, ou seja, PaCO2 > 45mmHg,
significa um sinal crítico, causando muita disfunção respiratória. Os músculos
respiratórios ficam fadigados e corre um grande risco de óbito. Quando for
identificada essa situação, é recomendado encaminhar esse paciente para
ventilação assistida.
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
Figura 29. Analisador portátil de lactato (A) e hemogasometria (B).
Fonte: https://vet.ufmg.br/casos_clínicos/arquivo/7.
A avaliação de todos esses parâmetros é importante para definir se as disfunções
encontradas estão relacionadas a uma infecção ou a sepse.
Para entender melhor sobre a sepse, é importante entender que nem todo paciente
com infecção a tem. Se ele tem um foco de infecção – seja ele bacteriano, fúngico
ou viral –, mas não tem disfunção orgânica, significa que ele tem apenas uma
infecção. Mas, se o paciente tiver alguma disfunção que ameace a vida dele, é
possível que esteja com sepse, e é necessário que essa suspeita seja pesquisada
para iniciar tratamento imediatamente após essa identificação.
No choque séptico, o paciente continua hipovolêmico mesmo após iniciado o
tratamento com fluidos. Daí a importância de fazer o monitoramento depois
de o paciente ser internado.
Quadro 18. Conceitos utilizados pelo Instituto Latino-americano de Sepse na implementação de protocolos gerenciados de
sepse.
Classificação
Classificação atual Características
Antiga
Infecção sem Infecção suspeita ou confirmada, sem disfunção orgânica, de forma
Sepse
disfunção independente da presença de sinais de SRIS.
Infecção suspeita ou confirmada associada a disfunção orgânica, de
Sepse grave Sepse
forma independente da presença de sinais de SRIS.
Sepse que evoluiu com hipotensão não corrigida com reposição
Choque séptico Choque séptico volêmica (PAM ≤65 mmHg), de forma independente de alterações de
lactato.
Fonte: Instituto Latino-americano de Sepse, 2018.
42
Tópicos Especiais 1 | Unidade i
De acordo com o documento mais atual do sobre as definições e critérios clínicos
para o diagnóstico de sepse, Sepsis-3, de 2016:
» Sepse: é definida como disfunção orgânica causada por uma resposta
desregulada do hospedeiro frente a uma infecção.
» Choque séptico: é definido pela necessidade do uso de vasopressores
para manter a pressão arterial média acima de 65mmHg e
hiperlactatemia persistente após ressuscitação adequada de fluidos.
» Sepse grave: tal termo foi excluído.
» SDMO (síndrome da disfunção de múltiplos órgãos): falha orgânica
em mais de um sistema, na qual há necessidade de intervenção para
manutenção da homeostasia.
» SRIS (síndrome da resposta inflamatória sistêmica): critérios de
SRIS são preditivos de inflamação exagerada e que não necessariamente
indicariam a presença de infecção ou de uma resposta desregulada (até
mesmo com um quadro grave de anti-inflamação e imunossupressão)
(KAUKONEN et al., 2015; SINGER et al., 2016).
A SRIS pode ser usada como um mecanismo de triagem para a identificação de
possíveis pacientes com sepse ou choque séptico. Para avaliação dessa síndrome, é
preciso ter a presença de pelo menos dois dos sinais da tabela 2.
Costello (2010) e Silverstein e Sanotoro-Beer (2012) definiram alguns critérios
para o diagnóstico de SIRIS em cães e gatos, conforme podemos observar na
tabela a seguir.
Tabela 2. Critério para diagnóstico de SIRIS em cães e gatos.
Parâmetros a serem avaliados Cães Gatos
Temperatura (TR ºC) < 38,1 ou 39,2 < 37,8 ou > 40
Frequência Cardíaca (bpm) > 120 < 140 ou > 225
Frequência Respiratória (rpm) > 20 > 40
Leucócitos (x103); % Bastonetes < 6 ou > 16; > 3% < 5 ou > 19; 5%
Fonte: Costello, 2010; Silverstein; Sanotoro-Beer, 2012.
Seguindo os conceitos já descritos, na rotina de atendimento e triagem, qualquer
paciente que possua a suspeita de sepse ou choque séptico deve ser tratado usando
o protocolo de sepse. Dessa maneira, é esperado que o tratamento precoce
previna a disfunção orgânica. Quando a disfunção já está presente, existirá
uma priorização no atendimento desses pacientes.
43
Unidade i | Tópicos Especiais 1
Quadro 19. Critérios para o diagnóstico de disfunções orgânicas associadas a sepse.
Alteração da consciência Escala de coma de Glasgow < 17 ou AVDN menor que A.
Queda abrupta maior que 40 mmHg na PAS, ou ainda uma
Hipotensão ameaçadora
PAM < 65 mmHg ou PAS < 90 mmHg em cães ou < 100 mmHg em gatos.
Oligúria Débito urinário < 0,5 mL/kg/h ou creatinina >2,0 mg/dL.
Hiperbilirrubinemia > 0,5 mg/dL.
Disfunção respiratória PaO2/FiO2< 300 ou sinais graves mais bilaterais.
Trombocitopenia (<100.000/mm³ ou queda de 50% em 12h), aumento do TP/TTPA/D-
Coagulação
dímero ou queda no fibrinogênio.
Íleo paralítico Ausência de ruídos à ausculta.
Hiperlactatemia > 3,2 mmol/L em cães ou >2,5 mmol/L em gatos.
Fonte: adaptada de Bone (1992), Levy (2003) e Rabelo (2012).
Ainda existem muitos questionamentos sobre a utilização do Sepsis-3 e há
poucos estudos realizados nessa área na medicina veterinária, mas Rabelo (2017)
adaptou um organograma para identificação da sepse e do choque séptico.
Figura 30. Organograma com sistema operacional de identificação de critérios clínicos em pacientes com sepse e choque
séptico para uso veterinário.
Fonte: Rabelo (2017) adaptado de Singer et al. (2016).
44
Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Após essa atualização do Sepsis-3, foi feito um sistema de pontuação de gravidade
para definir se o paciente está séptico ou não, e o Sequential Sepsis-related Organ
Failure Assessment (SOFA) foi um desses sistemas de pontuação, que avalia
alteração do estado de consciência, hipotensão e taquipneia e serve para ajudar
na triagem de um possível paciente séptico (SEYMOUR et al., 2016), mas a
avaliação da disfunção é feita por meio de exames laboratoriais. Castro (2017)
lembra que não houve validação desse escore na medicina veterinária e que foi
adaptado da medicina humana. Uma variação do SOFA surgiu, que é conhecida
como quickSOFA (qSOFA); esse indicador busca a avaliação do paciente na
beira do leito como triagem em casos suspeita de infecção. A verificação é feita
por meio do estado mental, usando a escala de Glasgow, hipotensão sistólica
e taquipneia do paciente. Cada um desses sistemas tem uma pontuação e, caso
seja maior ou igual a 2, significa um maior risco de mortalidade.
Quadro 20. Escore de pontuação dos critério do qSOFA, com os parâmetros a serem avaliados.
Escore
Sistema O que observar
0 1 2 3 4
< 200 (26.7) com < 100 (13.3) com
Respiratório PaO2/FiO2 mmHg (kpa) > 400 (53.3) < 400 (53.3) < 300 (40)
suporte respiratório suporte respiratório
Coagulação Plaquetas, X103/ML > 150 < 150 < 100 < 50 < 20
Hepático Bilirrubina mg/dl (Mmol/L) <1.2 (20) 1.2 – 1.9 (20-32) 2.0-5.9 (33-101) 6.0-11.9 (102 – 204) > 12.0 (204)
Dopamina < 5 Dopamina 5.1-15 ou Dopamina > 15 ou
PAM >
Cardiovascular PAM < 70mmHg ou dobutamina epinefrina < 0,1 ou epinefrina > 0,1 ou
70mmHg
(qualquer dose) norepinefrina < 0,1 norepinefrina > 0,1
Sistema
Nervoso Escala de Glasgow 15 13 a 14 10 a 12 6a9 <6
Central
Creatinina mg/dl (Nmol/L) < 1,2 (110) 1,2 – 1,9 (110 – 170 ) 2,0-3,4 (171 – 299) 3,5 – 4,9 (300-440) > 5,0 (440)
Renal
Débito urinário (ml/dl) < 500 < 200
Fonte: SINGER et al., 2016.
Quanto mais rápido você descobre a sepse, mais chance o paciente tem de
sobreviver. A precocidade é a chave – o que pode ser e se existe a suspeita
de alguma disfunção orgânica deve ser investigado o máximo possível até
achar onde está o foco da infecção. O diagnóstico não é uma tarefa fácil, mas,
analisando os parâmetros clínicos, laboratoriais e hemodinâmicos do paciente, o
clínico conseguirá identificar se o paciente está em sepse ou mesmo em choque,
e a conduta terapêutica assertiva diminui as taxas de mortalidade dos pacientes
sépticos (RABELO, 2012).
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
Identificado a suspeita da sepse, pesquise e controle cada disfunção orgânica
presente – e classifique! Para isso, a triagem é a melhor forma para que, assim
que classificado, se inicie o protocolo de emergência de acordo com a necessidade
individual de cada um, com o pacote das primeiras três horas, durante as quais
será realizado simultaneamente um conjunto de procedimentos no paciente com
a suspeita de sepse, guiado pelo lactato, e depois o pacote das seis horas, buscando
sempre o tratamento precoce da sepse, como podemos observar no quadro a seguir.
Quadro 21. Pacote das primeiras três horas no tratamento da sepse e choque séptico buscando reanimação, baseado em
lactato.
Reanimar baseada no lactato
» 3,2 mmoL/L (cães) e 2,5 mmoL/L (gatos), e ponto de corte nos primeiros 30 min.
» Clarear 20 % em 2 horas e manter por pelo menos 8 horas sem o aumento.
» Atingir 2,3 mmoL/L e 2,5 mmoL/L em gatos.
» Medir a temp. no T0, após o ABC, T2, T10 e T24.
» Cultura imediata quando possível + antibioticoterapia precoce combinada.
Fonte: Rabelo, 2012.
O pacote inicial de reanimação deve ser iniciado assim que a suspeita de sepse é
observada. Esse pacote se inicia com a pesquisa das disfunções orgânicas, que é
feita usando os seguintes parâmetros:
» lactato sérico;
» pressão arterial (média e sistólica);
» níveis de consciência;
» análises laboratoriais;
» análises clínicas.
Avaliando esses parâmetros nas primeiras três horas de tratamento do doente
séptico, será possível reclassificar o doente em choque séptico caso seja necessário.
O lactato, segundo as novas diretrizes de 2017, foi confirmado como um
indicador, sendo usado como um parâmetro-guia para a reanimação do doente
em sepse, lembrando que, mesmo não tendo hipotensão, a mensuração do lactato
é importante.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Pacientes que têm baixa de oxigenação tecidual precisam entrar no processo de
reanimação, que é guiado por metas, ou seja, a meta é reduzir o lactato até níveis
normais, nas primeiras horas, tanto no tratamento da sepse como do choque
séptico.
A hemocultura precisa ser feita com a primeira amostra coletada sem o uso dos
antibióticos. Tanto o sangue como outros materiais, caso seja necessário, devem
ser encaminhados para exame microbiológico e cultura. As diretrizes de 2017
acrescentam, além da pesquisa bacteriana, também a fúngica.
A antibioticoterapia precoce é obrigatória e deve ser administrada via
endovenosa logo que o paciente é internado. O recomendado é que isso aconteça
até uma hora após internação, ou no máximo três horas em pacientes na UTI
que vieram de pronto-socorro. É importante que o antibiótico de escolha seja,
de modo geral, de fácil compra, custo reduzido e mínimo de risco de uso para o
animal. A ceftriaxona é um exemplo disso.
A reanimação hipovolêmica deve ser o início do resgate, com a presença
do lactato aumentado. Deve ser iniciada com carga de cristaloides na dose de
10 ml/kg em 30-60 minutos. Devem ser feitas no máximo três tentativas;
depois disso, é necessária a decisão do uso de vasopressores. Mas tome muito
cuidado com a capacidade de acomodação desse fluido. Se, mesmo assim, não
for suficiente, as pressões não se mantiverem estáveis e o lactato não baixar, a
correção precisa ser direcionada ao transporte do oxigênio e à contratilidade.
Dessa maneira, precisa-se verificar a estabilização da hemodinâmica e a
manutenção do déficit microcirculatório periférico através da hiperlactatemia e
do delta de temperatura. Se precisar, usar dobutamina 5 mcg/kg/min ou mesmo
a transfusão, caso o hematócrito e a hemoglobina estejam baixos. Lembramos
que a avaliação ecocardiológica precisa ser realizada para determinar a disfunção
do miocárdio da sepse e fazer o protocolo específico.
Se a pressão estiver estável e o lactato ainda permanecer alto, pesquisar outras
causas para a hiperlactatemia.
Os vasopressores são recomendados quando a hipotensão é uma ameaça ao
paciente, ou seja, PS menor que 90 mmHg e PAM menor que 65 mmHg. Quando
a reposição for feita e a hipotensão permanecer, o uso de vasopressores deve
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
ser instituído. Assim que hipotensão for corrigida, começamos a diminuir a
medicação. Segundo as recomendações de 2017, a noradrenalina é a primeira
opção e a adrenalina ou a vasopressina em infusão contínua (0,03 U/min) entram
como segunda opção. Se o paciente não responder a vasopressores e tiver uma
refratariedade, temos a indicação de protocolos a base de hidrocortisona.
No quadro a seguir, temos o pacote das primeiras 6 horas e, dano continuidade,
o das primeiras 24 horas. O das seis horas são as medidas obrigatórias que
devem ser feitas durante o tratamento emergencial do doente com sepse ou
choque séptico.
Quadro 22. Pacote das primeiras seis horas no tratamento da sepse e choque séptico.
Triagem bem feita
Diagnóstico do foco
Reanimação volêmica
Antibiótico IV imediato
Reanimação baseada em lactato (observar o ponto de corte)
» CÃES: 3,2 mmoL/L (corte: 2,3 mmoL/L nas 1as 24 horas)
» GATOS: 2,5 mmoL/L (corte: abaixo de 2,5 mmoL/L nas 1as 24 horas)
A diluição deve acontecer nos primeiro 30 minutos, diminuição de 20% em 2 horas e
manter sem aumento nas próximas 8 horas.
Temperatura (deve ser aferida na chegada T0)
Após o ABC
Cultura imediata, deve ser feito antes da administração do antibiótico.
Antibioticoterapia deve ser iniciada no máximo 1 hora após a admissão do paciente
Fonte: Rabelo, 2012.
A sequência deve sempre estar bem clara para não se esquecer de nada e resultar
em uma triagem bem realizada, buscando o foco do problema (infecção, trauma
etc.).
Se não responder bem apenas com essa reposição e for preciso o uso de
vasopressor, será classificado como choque. No resgate volêmico, até pouco
tempo atrás, preconizávamos uma carga de 10ml/Kg em 6 minutos ou 10ml/Kg
em 15 a 20 minutos, mas os novos estudos recomendam fazer essa reposição de
uma maneira mais lenta, aplicando esse bolus em 40 a 60 min, mesmo em casos
de desidratação. Uma reposição muita rápida pode gerar outros problemas no
paciente enfermo. E os parâmetros devem ser vigilados todo o tempo, bem como
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
o acompanhamento dos valores da pressão. Caso se tenha uma PAM menor que
65mmHg ou sistólica menor que 90 mmHg em cães ou 100 mmHg em gatos, esse
paciente deverá ser classificado como em choque séptico. Abaixo, vejamos um
quadro mostrando as alterações que devem ser observadas para correção e resgate
dos valores hemodinâmicos.
Quadro 23. Alterações que devem ser observadas para resgate da hemodinâmica do paciente.
O que observar Alterações Correção
PAM < 65mmHg
Sistólica < 90mmHg cães ou 100mmHg em gatos Correção do Transporte de oxigênio
> 3,2 mmol/L (Cães) e Contratilidade
Lactato
> 2,5 mmol/L (Gatos)
hematócrito 24% a 30%
Transfusão
Hemoglobina 7% a 10%
Fonte: adaptada de Rabelo (2012).
O resgate da pressão arterial média e a normalização do lactato devem acontecer
juntamente com a reanimação volêmica, e isso precisa se dar nas primeiras seis
horas. Além disso, precisam ser observados:
» pressão venosa central entre 8 e 12 mmHg;
» saturação venosa de oxigênio > 70%;
» débito urinário maior que 0,5 mL/kg/h.
Apesar do Sepsis-3 não ter incluído o lactato no processo, ele representa um
importante parâmetro para avaliação da evolução do paciente grave, e ter
sua redução nas primeiras 24 a 48 horas como meta terapêutica melhora o
prognóstico do paciente.
Para hemocultura, na primeira hora, deve ser colhido sangue para exames
usados no auxílio do diagnóstico e uma amostra deve ser encaminhada para
cultura e, se for positiva, servirá como referência para mudança do antibiótico
caso necessário. Após essa coleta, a medicação deve ser feita endovenosa.
O ideal é a escolha de um antibiótico de amplo espectro, então a Cefalotina
(30 mg/kg) acaba sendo uma ótima opção nesse primeiro momento, por ser de
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
baixo risco para o animal, ter um custo baixo e facilidade de compra. Nos guias
humanos, a recomendação é de aplicar antibiótico endovenoso em no máximo
uma hora para os pacientes já internados na UTI. Para evitar resistência ao
antibiótico, é definido que todos os pacientes com sepse utilizem a mesma
medicação e ela não seja usada em outros lugares da clínica (por exemplo, no
tratamento de rotina de outras patologias), tentando evitar, dessa maneira, a
resistência.
Seguindo a sequência, a reanimação volêmica é um tratamento imediato da
hipotensão e da elevação do lactato, visto que, em muitos casos, a desidratação
costuma estar instalada em resposta às perdas hidroeletrolíticas. Essa reanimação
deve ser guiada por metas, e a prova de cargas é muito utilizada na dose de 10
ml/kg em 6 minutos e pode ser repetida até 3 vezes. Novos estudos recomendam
que essa reposição seja mais lenta, mas essa referência ainda pode ser usada
como um norte inicial. A variedade de fluidos, hoje em dia, é grande, mas todos
buscam o mesmo objetivo, que é repor o volume e fazer a manutenção dos
líquidos presentes no corpo dos pacientes. Os tipos de fluido serão descritos
melhor na Unidade II desta apostila.
Naqueles pacientes que não obtiverem uma resposta a reposição volêmica e
permanecem com hipotensão arterial, devem ser utilizados vasopressores. A
pressão arterial média (PAM) precisa estar menor que 65 mmHg ou pressão
sistólica (PS) menor que 90 mmHg em cães e menor que 100 mmHg em gatos.
Após essa meta ser alcançada, o uso dos vasopressores deve ser desmamado. A
noradrenalina é a medicação de primeira escolha e a adrenalina como segunda
escolha. A dopamina apenas pode ser usada em pacientes com baixo risco de
arritmias.
Após a estabilização nas primeiras 6 horas, tem-se a manutenção das 24 horas,
mas, nas recomendações de 2012, não foi dada tanta importância a esse pacote, e
algumas medidas não são mais recomendadas, visto que nem todos os pacientes
precisam de todas as intervenções. Cada paciente, então, tem a sua demanda,
avaliando o caso individualmente, mas, no quadro a seguir, podemos ver o
tratamento da sepse e do choque que, de acordo com a necessidade, deve ser
aplicado.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Quadro 24. Tratamento com o pacote de 24 horas.
Tratamento Recomendação As diretrizes de 2012
Proteína C ativada - » não deve mais ser usado
» Paciente na UTI com sepse ou choque deve ser
acompanhado.
» Recomendado ter um protocolo de insulina
endovenosa, devido a suplementação. » Manter a glicemia em cães acima de
Controle glicêmico
160mg/dl e gatos acima de 250mg/dl.
» Cuidado com os níveis de glicemia a abaixo de
80mg/dl, recomendado mandar para laboratório
central para confirmar os dados do glicosímetro
portátil.
Pacientes com » Volumes correntes baixos (6mL/kg).
ventilação » Recomendado um protocolo de desmame.
mecânica » Limitação da pressão de platô (menor 30cmH2O).
» Se não tiver resposta após a infusão de
vasopressores (noradrenalina) pode iniciar
Esteroides » CHOQUE SEPTICO: o protocolo esteroidal.
» Fazer o desmame do corticoide.
» Cães: 110 – 160 mg/dl.
» Gatos: nunca acima de 250 mg/dl.
» Hipoglicemia: glicose junto com a manutenção.
Controle glicêmico
» Hiperglicemia: cães acima de 180mg/dl e gatos
acima de 250mg/dl iniciar com insulina (0,05UI/
Kg/h), checar a glicemia e o Potássio a cada hora
até estabilizar.
Estratégia » 6mL/kg máximo no caso de ventilação mecânica,
protetora com limitação de platô (menor 30cm H2O.
Fonte: adaptada de Rabelo (2012).
Quadro 25. fármacos utilizados no protocolo para sepse.
Fármaco Dose Manutenção
» Cada 6 horas por 4 dias.
Hidrocortisona Cães e gatos: 0,5 mg/kg/IV » Depois a cada 8 horas por 3 dias.
» Cada 12 horas por 3 dias.
Dexametasona Gatos: 0,08 mg/kg/IV Diariamente com desmame gradual.
Fonte: Rabelo, 2012.
O pacote de 6 horas juntamente com o de 24 horas são ferramentas utilizadas
para diminuir a mortalidade dos pacientes, mas, além deles, existem algumas
intervenções complementares que, somadas às dos pacotes, têm uns bons
resultados. Mas essas orientações devem ser praticadas em pacientes únicos,
cada caso precisa ser avaliado de forma individual. São elas:
» hemoderivados;
51
Unidade i | Tópicos Especiais 1
» ventilação mecânica;
» sedação, analgesia e bloqueio neuromuscular;
» diálise;
» prevenção de trombose venosa profunda;
» controle das ulceras de estresse;
» nutrição.
Hemoderivados
» Concentrado de hemácias: a recomendação é de se optar pela
transfusão de concentrado de hemácias e/ou uso de dobutamina se
SvcO2 > 70% não for atingida, após reposição volêmica suficiente para
atingir PVC > 8 mmHg. Após ressuscitação, transfusões de hemácias
apenas são recomendadas em pacientes com nível de hemoglobina < 7
g/dL (RABELO, 2012).
» Plasma fresco congelado (não fazer): recomendado não fazer.
» Plaquetas (não fazer): recomendado não fazer, mas, se for preciso,
na ausência de sangramentos, só se recomenda transfusão de plaquetas
para valores abaixo de 5.000/mm³.
› Em casos de aplasia medular aguda pós-QT, algumas referências são
mais liberais e concordam com valores < 10.000/mm³ (apenas para
esse caso específico).
› Em pré-cirurgias, transfundir se menor que 50.000/mm³ em pequenos
procedimentos.
› Em cirurgias nas quais sangramentos pequenos podem ser graves
(neurológicas e oftalmológicas), sugerem-se metas de 100.000/mm³.
› Em caso de sangramento, valores entre 5.000 e 50.000/mm³.
Quando não transfundir plaqueta:
› púrpura;
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
› trombocitopênica trombótica e idiopática;
› síndrome HELLP;
› síndrome hemolítico-urêmica;
› plaquetopenia secundária à heparina;
› púrpura pós-transfusão.
» Antitrombina: não é recomendada para tratamento de sepse; estudos
mostram riscos de sangramento na utilização junto com heparina.
» Eritropoetina: muito usado no tratamento da anemia de doentes
renais crônicos; os estudo não mostraram impacto no índice de
mortalidade dos pacientes com sepse.
Ventilação mecânica
Hipercapnia permissiva não causa prejuízos aos pacientes e não vem sendo mais
uma limitação como era no passado.
Cabeceira 45º é recomendada para todos os pacientes em ventilação mecânica,
salvo casos específicos que podem ser contraindicados, mas, via de regra, todos
devem utilizar.
Quando for necessário o desmame, um protocolo deve ser instituído. É
importante a clínica ter esses protocolos bem definidos e testes diários devem
ser feitos para ver se o paciente se defende sozinho, ou seja, se ele consegue
respirar sem o auxílio do aparelho, para que, dessa maneira, a extubação seja
realizada de forma segura e sem que ele precise voltar a utilizá-la.
Em paciente com edema agudo de pulmão, a utilização de ventilação mecânica
não invasiva costuma trazer felizes resultados no controle de hipoxia respiratória
e da hipercapnia.
Síndrome da disfunção de múltiplos órgãos (SDMO)
A SDMO ocorro quando o paciente tem uma descompensação multissistêmica
decorrente de uma SRIS ou sepse de forma a afetar organicamente mais de um
sistema de maneira que a homeostasia só consegue ser mantida por meio de
53
Unidade i | Tópicos Especiais 1
tratamento. Essa disfunção pode ser leve, mas pode também chegar a falência total
dos órgãos. Essa falência acontece dinamicamente, significando que uma acaba
levando à outra e assim por diante. Para avaliar, são utilizados os parâmetros de
oito sistemas chaves:
» respiratório;
» cardiovascular;
» nervoso central;
» renal;
» digestivo;
» metabólico;
» neurológico;
» coagulação.
Todos esses sistemas já foram explicados anteriormente, mas a coagulopatia
é uma alteração comum entre todos os sistemas por fazer parte da
microvascularização, que é o embasamento fisiopatológico para a síndrome da
disfunção de múltiplos órgãos.
A terapêutica para ambos os problemas abordados nessa unidade depende
muito do tempo. Dessa maneira, o tratamento sempre deve ser guiado com
um sequência clara, de fácil entendimento e padronizada, para que assim todos
os profissionais consigam executar da mesma maneira. Entendida a gravidade
clínica do doente, o protocolo deve ser acionado com as medidas iniciais
de urgência das primeiras horas de atendimento, como já foi descrito nessa
unidade, que é o instituído pelo Instituto Latino-americano de Sepse.
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CAPÍTULO 3
Choque, síndrome compartimental
e falência múltipla de órgãos na
emergência e no intensivismo
O que é o choque? Essa é uma pergunta que muitas pessoas se fazem e que ainda
causa muita discussão, mas, segundo Akamine (2002, p.11), em condutas no
paciente grave, define-se o choque como “síndrome conhecida pela incapacidade
do sistema circulatório de fornecer O2 e nutrientes aos tecidos de maneira que
possam alcançar suas necessidades”.
Dessa maneira, podemos entender que, se não chegar oxigênio suficiente nas
células, consequentemente os tecidos terão uma perfusão tecidual insuficiente,
o que irá gerar alterações metabólicas tão sérias que serão responsáveis pela
morte celular. Da mesma forma que acontece a diminuição da oferta de oxigênio,
porém, o organismo tenta compensar essa diminuição e, nesse processo, acaba
mostrando sinais clínicos que vão aumentando de acordo com a gravidade do
problema. E são esses sinais que o organismo manifesta que nos mostram onde
deve ser restabelecido para uma correção efetiva, sempre com o objetivo de levar
oxigênio suficiente aos tecidos.
Vamos relembrar um pouco de fisiologia para entender melhor como o
choque acontece. Quando sistema circulatório não consegue manter um
fluxo adequado para manter os tecidos, pode reduzir a quantidade de volume
circulante, diminuindo assim a pressão circulatória e levando ao choque. O
débito cardíaco (DC) é entendido como o volume sistólico multiplicado pela
frequência cardíaca. Hemodinamicamente, ele é muito importante por ser o
responsável pela entrega do oxigênio.
DC = VS x FC
Quanto maior for a pré-carga, mais força de contração e DC. Na figura a seguir,
está exemplificado como funciona a lei de Frank-Starling.
55
Unidade i | Tópicos Especiais 1
Figura 31. Curva de Frank-Starling.
Fonte: Curso oficial de ABC cuidados intensivos (2019).
Quando o coração não consegue manter ou elevar a contratilidade, o débito
cardíaco tende a diminuir. Dessa maneira, ele sofrerá maior elevação da
pós-carga sobre o DC. Nessas situações, podemos observar clinicamente:
» viscosidade sanguínea;
» complacência ventricular;
» distensibilidade dos grandes vasos;
» tônus arteriolar.
Para representar a quantidade de oxigênio que chega nas células (DO2), observe
a figura a seguir mostrando a representação da entrada do oxigênio desde a
inspiração até chegada na microcirculação.
56
Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Figura 32. Esquema representativo.
Hb = hemoglobina
DC = débito cardíaco
Fonte: elaborada pela autora.
Quando o oxigênio chega nas mitocôndrias, ele será usado no ciclo de Krebs
na cadeia respiratória e fosforilação oxidativa, que é como a energia é gerada.
Quando o oxigênio não é suficiente, o metabolismo anaeróbico é iniciado, e o
resultado dele é o lactato, como podemos ver na figura abaixo:
Figura 33. Esquema.
Pacientes críticos
Consumo de O2 (DO2 ml/min)
DO2 crítico
300
DO2 crítico Pessoas sadias
200
TeO2
100
Lactato
0 400 800 1200
Oferta de O2 (DO2 ml/min)
Fonte: Curso oficial de ABC cuidados intensivos (2019).
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Unidade i | Tópicos Especiais 1
Da energia produzida pelas mitocôndrias na cadeia respiratória, cerca de 60% é
utilizada para a manutenção de sódio (Na) e potássio (K) das células. No choque,
com a diminuição do oxigênio, gera-se uma queda na bomba de sódio/potássio,
provocando uma hipercalemia.
Quando se tem algum problema da chegada do O2 na microcirculação,
geram-se problemas no transporte de nutrientes e de oxigênio nos tecidos
e falha na remoção dos produtos da excreção celular, comprometendo os
mecanismos regulatórios do fluxo sanguíneo tecidual quando o paciente está
em choque.
O organismo sempre tenta compensar as alterações que são manifestadas; dessa
maneira, a resposta fisiológica já começa logo no início, mas nem sempre os
sintomas são manifestados de forma clinicamente visível. Entretanto, quando
o dano permanece, ele gera um processo inflamatório persistente, podendo
levar, dessa maneira, à síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SRIS), e,
se essa cascata que foi ativada permanece, pode-se gerar um quadro chamado
de síndrome da disfunção múltipla de órgãos (SDMO), e, nesse caso, é muito
comum o paciente vir a óbito.
Fisiologicamente, o organismo tenta compensar o choque pelos seguintes
mecanismos:
» taquicardia da contratilidade do miocárdio – tentativa de aumentar DC;
» vasoconstrição periférica – direciona o volume sanguíneo para a “linha
central” (coração, pulmão e SNC);
» ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona;
» liberação de hormônio antidiurético (ADH).
Nessa fase, o paciente não costuma apresentar alteração na pressão arterial; os
sinais manifestados são hipoperfusão e acidose. Apenas quando essas alterações
não são suficientes para compensar é que o paciente irá manifestar o “choque
clássico”, no qual a hipotensão está presente.
Mas, além do choque clássico, há aquele paciente que possui uma hipoxia oculta
macroscopicamente, ou seja, que só é descoberta com exames laboratoriais
(lactato, saturação venosa central), e podemos classificá-lo como “choque oculto”.
58
Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Figura 34. Esquema representativo de vários fatores e causas que contribuem para o choque.
Fonte: Dukes (1988).
Podemos classificar o choque em quatro tipos:
» hipovolêmico;
» cardiogênico;
» distributivo;
» obstrução circulatória.
O choque hipovolêmico é redução do conteúdo que está presente dentro do
lúmen do vaso, causando diminuição das pressões e volumes de enchimento
diastólico. Ele pode acontecer de duas maneiras:
» Hemorragias: é o choque provocado por meio de perda de sangue e
tem uma mortalidade alta quando perde 50% do volume circulante.
Vamos conversar melhor sobre isso na Unidade III, mas o objetivo
para resolver esse choque é identificar onde a hemorragia está para
fazer o controle completo ou diminuir para que a correção seja logo
realizada.
59
Unidade i | Tópicos Especiais 1
» Hemoconcentração: nesse caso, o choque acontece pela diminuição do
plasma circulante que podemos observar em:
› desidratações severas (vômito e diarreia);
› obstruções intestinais;
› queimaduras profundas;
› peritonite;
› pleurites;
› sequestro de líquidos.
Figura 35. Pastor alemão com quadro de hematoquezia.
Fonte: elaborada pela própria autora.
Figura 36. Pastor alemão com quadro de hematêmese.
Fonte: elaborada pela própria autora.
60
Tópicos Especiais 1 | Unidade i
O choque cardiogênico acontece devido a alteração na bomba, ou seja, no
coração. Observamos queda no DC e na pressão arterial, causando hipoxia
tecidual. O que pode causar esse problema:
» endocardiose;
» cardiomiopatia dilatada;
» ruptura de corda tendínea;
» arritmias:
› taquicardias;
› fibrilação;
› bloqueios cardíacos totais ou parciais;
» depressão do miocárdio devida a:
› acidose;
› distúrbios eletrolíticos;
› intoxicação por fármacos;
› intoxicação por produtos químicos;
› sepse;
› trauma.
O choque distributivo acontece devido à dificuldade de o vaso manter a
resistência vascular periférica, e os fatores que podem provocá-lo são:
» Choque séptico: severa anormalidade circulatória e do metabolismo
celular; clinicamente, observamos hipotensão mesmo depois de prova
de carga e hiperlactatemia, e, nesse caso, é preciso usar vasopressores.
» Choque anafilático: acontece liberação aguda de histaminas provocando
falha circulatória periférica. Pode ser causado por picadas de abelhas
ou vespas, neurotoxinas, transfusão de sangue, fármacos e animais
peçonhentos.
61
Unidade i | Tópicos Especiais 1
» Choque neurogênico: acontece de três formas:
› componente distributivo;
› componente cardiogênico;
› componente neuroendócrino.
O choque obstrutivo acontece quando se tem uma alteração na hemodinâmica
por conta de um impedimento completo ou parcial do retorno venoso na
circulação geral, fazendo com que ocorra a diminuição do débito cardíaco. Os
principais fatores que podemos observar nesses casos são:
» síndrome da dilatação vólvulo-gástrica;
» efusão pleural;
» pneumotórax;
» hernia diafragmática;
» tamponamento cardíaco;
» compressão da via cava;
» embolia pulmonar.
Quadro 26. Classificação dos tipos de choque.
Choque hipovolêmico Choque Choque Choque Choque Distributivo
Traumático obstrutivo cardiogênico
Obstrução do Falência do
Perdas de Perdas
Causas Trauma retorno venoso coração como Sepse Anafilaxia
sais e água sanguínea
ao coração bomba cardíaca
Tônus
constrição constrição constrição Constrição constrição Dilatação Dilatação
vasomotor
Débito cardíaco Diminuição Diminuição Diminuição Diminuição Diminuição Aumento Aumento
Resistencia
vascular Aumento Aumento Aumento Aumento Aumento Diminuição Diminuição
sistêmica
Mecanismo
Mediadores Mediadores
inicial de injuria Isquemia Isquemia Isquemia Isquemia Isquemia
Inflamatórios Inflamatórios
celular
Fonte: Aldrich, 2013.
62
Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Síndrome compartimental
A síndrome compartimental (SC) é entendida como o aumento crítico da pressão
em uma determinada região (compartimento), causando a diminuição da sua
pressão de perfusão. É considerada uma emergência cirúrgica.
Quando se tem aumento da pressão interna recorrente ou contínuo e ela
interfere na capacidade perfusão do local e na viabilidade dos tecidos ao redor,
acontecerá a síndrome compartimental. A pressão de perfusão de qualquer
compartimento deve estar acima de 60 mmHg. As principais causas de síndrome
compartimental são:
» fraturas;
» queimaduras;
» lesão por esmagamento;
» infecção/inflamação;
» hemorragias;
» extravasamento de drogas;
» traumas;
» curativos (cuidado com as ataduras compressivas);
» massas neoplásicas;
» efusão/ascite;
» prenhez;
» edema de terceiro espaço;
» cirurgias nas quais houve a remoção de uma grande quantidade de pele.
A síndrome compartimental no abdômen é muito conhecida e é medida através
da pressão intra-abdominal (PIA), ou seja, de dentro da cavidade abdominal. A
PIA é afetada diretamente pelo volume dos órgãos sólidos ou das vísceras ocas.
A medida da PIA em pequenos animais pode ser feita como relatado abaixo:
» Colocar o paciente em decúbito lateral direito.
63
Unidade i | Tópicos Especiais 1
» Sondar a uretra do paciente de forma asséptica.
» Acoplar uma torneira de três vias na ponta da sonda uretral.
» Conectar a coluna de água na torneira de três vias.
» A bexiga é então esvaziada e, na sequência, é preenchida com 0,5 a 1 ml/kg
de soro fisiológico ou Ringer morno.
» O sistema deve ser posicionado de forma que o ponto zero esteja
alinhado com a síntese púbica do paciente.
» A torneira de três vias é fechada para a fonte de fluido e estabelece-se
o fluxo da bexiga e coluna de água. Depois de equilibrar a PIA com a
pressão atmosférica, a PIA é medida usando uma régua em cm de H2O.
Abaixo, podemos ver o material utilizado, o esquema de como é feito e
a imagem de um felino fazendo a medição.
A PIA também pode ser medida por meio de pressão invasiva. Utilizamos a
torneira de três vias conectada no canal de pressão invasiva. Nesse caso,
mediremos em mmHg, considerando que 1 cm de H2O equivale a 0,736 mmHg.
A PIA normal precisa estar em:
» Cães: 0 a 5cm de H2O.
» Gatos: 7 cm de H2O.
Como, na veterinária, muitos conceitos são adaptados da medicina humana, a
Sociedade Mundial de Síndrome Compartimentalização Abdominal sugeriu um
conceito para padronizar a hipertensão intra-abdominal (HIA) dividindo-a em
quatro classes, conforme a tabela a seguir.
Tabela 3. Classificação da hipertensão intra-abdominal.
Classificação da HIA (Grau) PIA (mmHg) PIA (cmH2O)
I 12 a15 16 a 20
II 16 a 30 21 a 27
III 21 a 25 34
IV >25 >34
Fonte: Lopes, 2016.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
A síndrome compartimental abdominal acontece com a PIA acima de 20 mmHg
junto com falhas ou disfunções orgânicas, e a HIA, quando a PIA permanece maior
que 12 mmHg. É importante fazer essa avaliação para saber as consequências
que essa HIA pode causar, dentre as quais podemos citar:
» redução do retorno venoso das extremidades;
» obstrução no fluxo da veia cava caudal;
» aumento da pressão hidrostática venosa, provocando edema
periférico;
» risco de desenvolvimento de trombose venosa.
Figura 37. Material utilizado para aferição da PIA (torneira de três vias, régua, extensor de equipo e sonda uretral).
Fonte: Lopes, 2010.
Figura 38. Imagem ilustrativa do método transvesical em humanos.
Manometro de
água em centímetros
Zero da coluna de água Solução Salina
nivelado com a sínfise púbica
Cateter
de Foley
na bexiga 50 mililitros de solução
fisiológica inseridos no sistema
Fonte: Lopes (2010) adaptado de Asencio, Ceballos, Forno e Sava (2002).
65
Unidade i | Tópicos Especiais 1
Figura 39. Medição da PIA em felino.
Fonte: Lopes, 2010.
A aferição da pressão intratorácica (PIT) precisa da utilização de mecanismo
invasivo e acaba não sendo uma rotina na terapia intensiva, mas é importante
saber o que acontece quando ela aumenta, pois ela provoca:
» redução do retorno venoso e consequentemente do débito cardíaco;
» compressão cardíaca, que irá diminuir a complacência e a contratilidade
ventricular;
» resistência vascular sistêmica (pós carga) aumentada devido à
compressão da aorta e da vasculatura sistêmica e pulmonar;
» compressão pulmonar que irá resultar em uma disfunção orgânica;
» atelectasia alveolar e diminuição do transporte de oxigênio entre a
membrana capilar pulmonar, provocadas pela compressão.
Quando temos a PIC (pressão intracraniana), normalmente temos a PIA
aumentada. Dessa maneira, antes de tratar o paciente com craniotomia, é
recomendado diminuir a pressão da PIA clinicamente ou cirurgicamente, se for
o caso, e, somente depois disso, pensa em tratar com craniotomia.
Na síndrome compartimental em membros, qualquer inflamação pode
ocasionar o aumento dessa pressão e levar ao bloqueio do fluxo sanguíneo e
consequentemente à isquemia da região, levando o local a necrose em pouco
tempo.
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Tópicos Especiais 1 | Unidade i
Para aferição da pressão intramembro, utilizamos o sistema de coluna de água e
torneira de três vias semelhante ao usado na PIA, mas em vez de sonda uretral, é
inserida uma agulha de 40x1,2 mm no membro afetado do paciente conectada a
torneira de três vias.
67
TÓPICOS ESPECIAIS 2 UNIDADE II
CAPÍTULO 1
Fluidoterapia
A fluidoterapia é um dos primeiros procedimentos iniciados no paciente
de urgência por se tratar de um tratamento de suporte, tendo como objetivo
fazer as correções, sejam de desidratação, para restaurar volume ou correção
hidroeletrolítica, entre outras.
Primeiramente, é preciso saber aonde você pretende chegar com essa reposição.
sempre na busca do equilíbrio do paciente: precisa planejar qual a fluido escolhido,
a quantidade que será introduzida e por quanto tempo será realizada; calcular a
velocidade; prever se será preciso acrescentar algum componente junto à bolsa
escolhida; avaliar as possíveis mudanças nesse paciente.
Saber qual a melhor ferramenta para colocar o paciente na fluido é importante
– como, por exemplo, cateteres (calibre, vazão, cor, diâmetro e comprimento),
equipo (macrogotas e microgotas), extensor de equipo, equipamentos para
controlar a quantidade de soluto a ser introduzido (bomba de infusão, bomba
de seringa), qual fluido será utilizado (NaCl 0,9%, Ringer com lactato, Voluven,
bolsa de sangue total ou seus componentes). Além disso, é claro, devemos
monitorar esse o paciente para saber se o tratamento escolhido está tendo o
papel desejado, desde o monitoramento simples (TPC, FC, FR, burburinhos,
pulso, nível de consciência) até o uso de equipamentos (como capnografia,
lactato, Ht, PA, oximetria, entre outros).
O acesso precisa ter três características:
» rápido;
» seguro – para evitar complicações e perdas no futuro;
» bem-sucedido na primeira tentativa.
68
Tópicos Especiais 2 | Unidade ii
Conseguindo o venopunção com essas três características, o fluido juntamente
com as medicações que serão administradas levam apenas três segundos para
chegar no coração. Além disso, é preciso:
» cuidado para não ter a subida rápida do PH para não deslocar coágulos;
» cuidado com a hipotermia e hemodiluição;
» reanimação baseada em metas:
› PAM de 60 a 65 mmHG (exceto TECs);
› OS de 90-100 mmHg (cães e gatos).
O material do cateter é importante, juntamente com a avaliação do tempo
que o paciente vai precisar permanecer com o acesso. Os cateteres de cloreto
de polivinil são mais baratos, mas não podem ultrapassar 96 horas de uso, pois
possuem memória e podem se deformar; já os de poliuretano podem ficar até
10 dias. E temos o de silicone, que é feito do mesmo material do cateter venoso
central e pode ficar no paciente por tempo indeterminado, desde que a colocação
seja realizada de forma adequada e mais asséptica possível para evitar riscos de
flebites, por exemplo.
Outro fator importante é o tipo de fluido. Temos os cristaloides e os coloides.
» Cristaloides: são compostos pelos principais eletrólitos e podem ser
classificados como:
› hipotônicos;
› hipertônicos;
› isotônicos.
» Coloides: possuem moléculas maiores em sua composição e são
utilizados para expansão plasmática. Estudos mostram que é preferível
fazer o uso de cristaloides em vez de coloides em pacientes sépticos,
por ter um menor número de complicações e de mortalidade. Os
coloides são classificados em dois tipos:
69
Unidade ii | Tópicos Especiais 2
› Naturais (albumina e seus derivados):
• Só devem ser usados em pacientes hidratados e hemodinamicamente
estáveis (age movimentando o líquido que está na região do
glicocálix).
• Melhoram a expansão intravascular.
• Não devem ser usados em pacientes com trauma cranioencefálico.
• São benéficos em pacientes com peritonite bacteriana e síndrome
hepatorrenal.
› Sintéticos (hidroxietilamido): as gelatinas e dextrano são pouco usados
atualmente.
Saber qual é o tipo de perda líquida ajuda na escolha do fluido, por exemplo:
» Paciente com perda de água livre (febre, desidratação, hiperventilação) –
hipernatremia.
» Diarreia – perde muito bicarbonato, podendo causar acidose.
» Poliúria – alteração em sódio e potássio.
Conversaremos melhor sobre todas essas alterações no próximo capitulo.
Quanto aos cristaloides, a utilização do Ringer é mais recomendada. Estudos
mostram menos problemas com o uso do Ringer comparado à solução salina
0,9%, sendo essa última indicada apenas em duas situações:
» presença de êmese profunda sem diarreia;
» edema cerebral.
O volume ainda é muito discutido, mas usamos muito a curva de Frank-Starlin,
que fala o seguinte: aumento da pré carga aumenta o estiramento da parede do
ventrículo esquerdo, sendo que, quanto maior o estiramento ventricular, maior
será o volume sistólico.
As discussões sobre o volume ainda são muitas, mas uma nova abordagem na
medicina intensiva fala que o “menos é mais” (less is more); portanto, a quantidade
70
Tópicos Especiais 2 | Unidade ii
de fluido necessária vai de acordo com o equilíbrio hemodinâmico do paciente,
e esse restabelecimento por meio de fluidos precisa ser realizado com base na
avaliação da perfusão, ou seja, precisa ser acompanhado por parâmetros, que se
seguem:
» taquicardia;
» alteração na coloração de mucosa;
» aumento do TPC (tempo de preenchimento capilar);
» aumento no gradiente de temperatura do centro periférico (delta de
temperatura);
» nível de consciência alterado;
» queda de pressão sistêmica e/ou pressão arterial média;
» lactato aumentado.
A fluidoterapia pode seguir o método dos 5 Rs que foi desenvolvido pelo NICE
(Nacional Institute of Health and Care Excelence) no Reino Unido:
» reanimação;
» rotina de manutenção;
» reposição;
» redistribuição;
» reavaliação (a cada 24 horas em paciente de gravidade pequena, e com
intervalo menor em casos mais graves).
A utilização desses 5 Rs visa minimizar as chances de erros, lembrando ainda
que qualquer informação deve ser anotada no prontuário do paciente para
reavaliação.
A reanimação precisa restabelecer tanto a microcirculação como a
macrocirculação. O hematócrito e a albumina são parâmetros utilizados
como monitoramento da hemodiluição. A reanimação é feita de modo que a
quantidade que sai (urina, fezes etc.) deve ser a mesma quantidade que entra.
Assim, diminuímos a possibilidade de HIA. A redistribuição precisa avaliar
com cautela, para evitar complicações como edema.
71
Unidade ii | Tópicos Especiais 2
Figura 40. Acesso intraósseo.
Fonte: Rodrigo rabelo (2020).
Controle de danos
A identificação rápida de quais pacientes precisam de atendimento abreviado
e imediato para prevenir a falha metabólica e ter maiores perdas é essencial e,
quanto antes, melhor.
Aqueles que precisam de cirurgia longa e minuciosa são pacientes cujo prognóstico
pode piorar, pois perdas ainda maiores pode acontecer. Conversaremos melhor
sobre isso no capítulo sobre hemorragias.
Objetivo da cirurgia
Segundo Rodrigo Rabelo (2020), a cirurgia, na emergência, deve ter esses três
pontos para estabilizar o doente:
» foco;
» checar a irrigação;
» ser rápido e controlar contaminação.
Depois de o paciente estar estável, outras cirurgias mais elaboradas podem ser
realizadas. Um exemplo disso é um trauma no qual houve fratura e rompimento
de grande vaso. Se a hemorragia não for contida, o paciente vai morrer de
hemorragia, então o controle deve ser realizado imediatamente, seguindo os
três pontos citados a cima. Dessa maneira, o foco no problema e agilidade são
importantes para fazer a correção, evitando perda grandes e diminuindo pontos
de contaminação. Após esse controle, pode-se planejar como será resolvida a
fratura depois que o paciente estiver mais estável para um novo procedimento.
72
Tópicos Especiais 2 | Unidade ii
É importante conhecer o calibre dos cateteres, pois, em uma situação que precise
de transfusão, por exemplo, não conseguimos fazer se o cateter escolhido tiver
um calibre pequeno. No quadro a seguir, podemos ver o calibre dos cateteres
e sua vazão.
Quadro 27. Calibres de cateter, cores e vazão.
Calibre do Cor Vazão (ml/min) Vazão (ml/hora) Diâmetro x comprimento
cateter do cateter
N. 18G verde 105 6300 1,3x45mm
N. 20G rosa 60 3600 1,1x65mm
N. 22G azul 35 2100 0,9x25mm
N. 24G amarelo 22 1320 0,7x19mm
Fonte: adaptada de Portal Braun.
Figura 41. Um tipo de bomba de infusão.
Fonte: elaborada pela autora.
Figura 42. Um tipo de bomba de infusão de seringa.
Fonte: elaborada pela autora.
73
Unidade ii | Tópicos Especiais 2
Para uma terapêutica bem feita, entender o funcionamento é o início de tudo.
Já é de conhecimento que o corpo é constituído em sua maior parte de água,
podendo chegar a até 80% do peso corpóreo. Essa água é dividida em líquido
extracelular (LEC) – que, por sua vez, é dividido em espaço plasmático e espaço
intersticial, que são controlados pelas forças de Starlin – e líquido intracelular
(LIC), que são os líquidos presentes no interior das células.
Saber de onde está vindo o líquido é a base de tudo. Quando um paciente
está desidratado significa que ele perdeu líquido intersticial, ou seja, aquele
líquido que deveria estar dentro da células. Por outro lado, se observamos
hipovolemia, a perda se refere ao volume intravascular. Fazer essa avaliação
ajudará na determinação de qual fluido será escolhida, e pode ser também que
o paciente esteja desidratado e hipovolêmico, sendo necessária a utilização de
ambos, cristaloides e coloides, para o resgate volêmico.
Quando se tem um aumento de volume do líquido intersticial significa que existe
um edema.
Por fim, a fluidoterapia deve ser usada com base em metas, sempre na busca
do equilíbrio circulatório através da quantidade de fluido que aquele paciente
necessita.
Além da fluidoterapia convencional, temos também a fluidoterapia microenteral,
que foi desenvolvida em 1989 pelo Dr. Dennis Crower e posteriormente
melhorada por Devey e Rabelo. Ela consiste em administrar, por via digestivas,
através de bolus ou infusão contínua, uma quantidade pequena de uma solução
formada por aminoácidos, peptídeos pequenos e glicose, que tem como função
estimular o trato gastrointestinal para prevenir futuros problemas, caso o
paciente não possa ainda receber alimentação enteral. O seu objetivo é manter
os níveis proteicos ou calóricos no sistema gastrointestinal do paciente de forma
a manter a funcionalidade e o fluxo sanguíneo, buscando manter a integridade
da mucosa e protegendo ela de um mau funcionamento enzimático digestório.
Dessa maneira, o organismo terá condições melhores de responder à patologia
instalada, sem precisar se preocupar com a digestão de alimentos pesados e com
demora na digestão.
A microenteral é uma terapia nutricional auxiliar para ser usada em pacientes
que não podem se alimentar ou não aceitam a alimentação. Ela deve ser iniciada
74
Tópicos Especiais 2 | Unidade ii
a partir de 2 até 12 horas de internação. Em casos mais graves, ela chega a ser
mantida por até 36 horas, mas precisa ser sempre avaliada a necessidade de
mantê-la sozinha realmente. Como ela pode ser oferecida?
» com seringa direto na boca; ou
» por meio de sondas, que podem ser:
› nasogástricas;
› nasoesofágicas;
› sonda gástricas;
› esofagostomias;
› jejunostomias.
Ela é composta por pela junção do suplemento comercial Glicopan Gold® +
Ringer lactato, sendo que devem ser retiradaos 10 ml de Ringer, e, no lugar,
colocados 10 ml de Glicopan, como pode ser visto da figura abaixo.
Figura 43. Composição da fluido microenteral.
Fonte: elaborada pela autora.
O volume inicial é de 0,5ml/kg/h, e ele não pode provocar a estimulação dos
receptores do vômito presentes na região pilórica e antral. Esse volume inicial
pode ser aumentado para até 1 a 2 ml/kg/h durante 24 a 48 horas. Se o paciente
responder bem, pode ser iniciada a nutrição enteral.
75
Unidade ii | Tópicos Especiais 2
Conforme descrito no manual do curso de ABC Cuidados Intensivos, essa técnica
tem várias vantagens, conforme podemos ver descritas abaixo.
» estímulo mecânico;
» fornecimento de fluido, eletrólitos e aminoácidos;
» apoio nutricional parenteral;
» baixo custo;
» estimulação imunológica: IGA, previne atrofia do TGI;
» mantém a funcionalidade e integridade do trato digestivo;
» previne translocação bacteriana e suas consequências.
Quanto às indicações, podemos citar:
» níveis de consciência alterados;
» recuperação de doenças gastrointestinais;
» complementar a nutrição parenteral;
» pós-trauma para transição para nutrição enteral;
» úlcera gástrica;
» pacientes com pancreatite;
» início das pontes nutricionais.
Após 12 horas de internação, se o paciente tiver condições e aceitar, pode ser
iniciada a transição para alimentação enteral ou alimentação normal, a depender
da gravidade da patologia instalada.
Lembramos que a fluidomicroenteral é mais uma ferramenta para auxiliar o
manejo do paciente crítico e deve-se, assim que possível, iniciar a transição da
alimentação.
76
CAPÍTULO 2
Desequilíbrio ácido-base
Uma outra ferramenta muito importante é a avaliação dos eletrólitos e o
equilíbrio ácido-básico. Sua utilização ajuda no diagnóstico mais rápido
e consequentemente em um melhor manejo para o paciente crítico. Esses
parâmetros mudam em tempo muito curto, o que os diferencia como um
ótimo marcador da piora da doença ou da melhora do tratamento escolhido. A
hemogasometria vem, cada vez mais, sendo o queridinho entre os intensivistas,
pois é uma ferramenta ótima para o manejo daqueles pacientes agudos. Dessa
maneira, a decisão do tratamento de hora em hora é realizada de forma
consciente, de acordo com a resposta que o paciente está tendo, que conseguimos
mensurar através das mudanças dos eletrólitos e no status ácido-básico.
Vamos iniciar com avaliação dos eletrólitos, que são:
» sódio;
» potássio;
» cloreto;
» cálcio;
» magnésio.
O sódio dentro do fluido extracelular (FEC) é a partícula osmótica ativa mais
importante, pois ela participa ativamente no balanço hídrico. Dessa maneira,
temos os rins como o principal local de homeostasia de sódio e água.
Diversas são as causas que podem provocar o desequilíbrio do volume
intravascular do paciente, podendo causar hipernatremia (alta do sódio) ou
hiponatremia (baixa do sódio). No quadro a seguir, podemos observar as possíveis
causas de cada uma. O vômito e a diarreia podem causar qualquer umas dessas
possiblidades, bem como a resposta do paciente em recuperar a água perdida
por meio da ingestão de água, por exemplo.
Na hipernatremia, a hipervolemia acontece devido ao ganho de solutos
impermeáveis, e a hipovolemia, por perda de água em excesso de sódio. Já na
hiponatremia, a hipervolemia acontece por excreção inadequada de água.
77
Unidade ii | Tópicos Especiais 2
Quadro 28. Possíveis diagnósticos do paciente em hipernatremia ou hiponatremia.
Sintomia clínico Possíveis causas
» Intoxicação por sal
Hipervolemia
» Iatrogênica (administração de salina hipertônica)
» Hipertermia
» diabetes insipidus
Hipernatremia
Normovolemia
» acesso inadequado de água
» hipodipsia primária
» Falência renal (aguda ou crônica)
» vômito e diarreia
Hipovolemia
» queimaduras
» medicamentos (furosemida, manitol)
» Falência cardíaca congestiva
Hipervolemia » doença hepática
» doença renal (síndrome nefrótica)
» síndrome da secreção inadequada de ADH
Hiponatremia
Normovolemia » Administração de fluido hipotônico
» polidipsia psicogênica
» Hipoadrenocorticismo
» vômito e diarreia
Hipovolemia
» medicamentos (diuréticos)
» perda para o terceiro espaço
Fonte: Boag; King (2013).
Não é muito comum a apresentação de sinais clínicos nas alterações séricas de
sódio, a não ser quando esses distúrbios acontecem rapidamente:
» Hipernatremia: desidratação cerebral causando sinais neurológicos (água
sai das células cerebrais).
» Hiponatremia: edema cerebral (movimentação da água para dentro).
Se a mudança do sódio demora dias ou semanas, o organismo vai compensando
e os sinais clínicos não aparecem da mesma maneira, então a correção precisa ser
feita lentamente também, para não ter problemas sérios. O tratamento, tanto da
diminuição como do excesso, é colocar o paciente em fluidoterapia endovenosa
e, fazendo as correções da causa primária, a correção acaba acontecendo de
forma natural. Entretanto, se o paciente estiver apresentando sinais clínicos,
a correção precisa ser realizada lentamente, com 0,5 mmol/L de sódio
por hora em ambas as direções (BOAG; KING, 2013).
78
Tópicos Especiais 2 | Unidade ii
Tabela 4. Concentração de sódio em cada fluido.
Fluido Quantidade de Sódio Quantidade de Potassio
Solução salina 0,9% 150 mmol/L -
Ringer 147 mmol/L 4 mmol/L
Ringer – lactato 130 mmol/L 4 mmol/L
Ringer acetato 131 mmol/L 4 mmol/L
Solução de Hartmann 131 mmol/L 5 mmol/L
Fonte: Boag; King (2013).
O déficit de água aproximado do paciente é calculado usando a equação da
figura 44:
Figura 44. Equação para calcular o déficit de água livre e um exemplo para entender melhor a fórmula.
Fonte: elaborada pela autora.
No meio intracelular, o potássio é o cátion mais abundante – 95% dele está
presente dentro das células, tendo a sua concentração em aproximadamente 140
mmol/L. Na emergência, nos deparamos com frequência com a hipocalemia
(baixa de potássio), que pode levar risco de morte em pacientes críticos. Os
sinais clínicos são:
» fraqueza;
» letargia;
» íleo paralítico;
» anorexia;
» ventroflexão do pescoço (visto em gatos).
79
Unidade ii | Tópicos Especiais 2
Mesmo sendo leve, a hipocalemia precisa ser corrigida para não provocar
fraqueza muscular respiratória, que pode levar a hipoventilação e evoluir para
paralisia respiratória e morte.
Quadro 29. Diagnósticos diferenciais de hipocalemia.
Diagnóstico diferencial Possíveis causas
Trato gastrointestinal
» Vômito
» Diarreia
Trato urinário
» Falência renal crônica *
Aumento das perdas
» Diurese pós-obstrutiva
Medicamentosa
» Diuréticos
» Penicilinas
Excesso de mineralocorticoides
Fluidos contendo insulina/glicose
Translocação do compartimento
Alcalose
extracelular para o intracelular
Liberação de catecolaminas
Inapetência/anorexia
Consumo diminuído Administração de fluido intravenoso em longo
prazo com baixa concentração de potássio.
*Em gatos, muito comum
Fonte: King, 2013.
O tratamento da hipocalemia é feito de forma oral ou intravenosa – o que
vai determinar a conduta a ser seguida é a avaliação clínica do paciente. Para
pacientes críticos , com uma severa hipocalemia, possuem o potássio sérico
< 2,8mmol/L, é recomendada a reposição intravenosa. A tabela a seguir tem
algumas orientações para facilitar na hora da suplementação de cloreto de
potássio. Todos os pacientes que receberem cloreto de potássio em seu fluido
precisam ser identificados; não deve ser infundido mais que 0,5 mmol/Kg/h; e
o paciente precisa ser monitorado constantemente com o ECG.
Aqueles pacientes que estiverem comendo voluntariamente ou sondados podem
ser suplementados por via oral/sonda – é sugerido 0,5-1,0 mmol/kg por via oral
duas vezes ao dia.
80
Tópicos Especiais 2 | Unidade ii
Tabela 5. Suplementação de fluido intravenoso com o cloreto de potássio (KCl) para pacientes com hipocalemia.
KCl (mmol) para adicionar Taxa de infusão máxima recomendada para a
Potássio sérico (mmol/L)
em 1 L de fluido suplementação de fluido (mL/kg/h)
3,5 – 5,0 20 25
3,0 – 3,5 30 18
2,5 – 3,0 40 23
2,0 – 2,5 60 8
< 2,0 80 6
Fonte: King, 2013.
A hipercalemia raramente está relacionada a uma alta ingestão de potássio.
Geralmente, está relacionada à redução na excreção renal do potássio ou na
saída do potássio do meio intracelular para o extracelular. No quadro a seguir,
podemos ver as possíveis causas em cada uma delas.
Quadro 30. Diagnósticos diferenciais de hipercalemia.
Diagnóstico diferencial Possíveis causas
Uroabdome
Obstrução uretral
Hipoadrenocorticismo
Falência renal anúrica/oligúrica
Distúrbios efusivos
» Pleural
Excreção urinária diminuída » Peritoneal
» Pericárdico
Doenças gastrointestinais
» Ex.: tricuríase
Medicamentosas:
» Inibidores da enzima conversora de angiotensina
» Diuréticos poupadores de potássio
Morte celular massiva:
» Injuria de reperfusão seguida de tromboembolismo
» Trauma severo
» Síndrome da lise tumoral
Translocação do compartimento intracelular para o
» Insolação
extracelular
Acidose mineral aguda
Deficiência de insulina
Medicamentosa
» Betabloqueadores
Ingestão aumentada Iatrogênica
Fonte: King, 2013.
81
Unidade ii | Tópicos Especiais 2
Os sinais clínicos mais preocupantes do excesso de potássio são os que indicam
efeito na condução do miocárdio:
» bradicardia inadequada;
» mudanças características no eletrocardiograma (ECG).
A hipercalemia faz com que haja um intervalo prolongado de PR, diminuição
da amplitude da onda R e aumento da amplitude da onda T, evoluindo
posteriormente para uma paralisação atrial, com a ausência da onda P, fazendo
com que se tenha um alargamento do complexo QRS e bradicardia.
Na figura 45, observamos como exemplo o traçado eletrocardiográfico de dois
pacientes com hipercalemia. Ambos estão com 10 mml/L, mas apresentando
ECG diferentes. O animal A é um cão com hipoadrenocorticismo, e B, um gato
com tromboembolismo aórtico. Nas duas situações, está presente a bradicardia e
as ondas P não são identificadas.
Figura 45. Traçado eletrocardiográfico de dois pacientes com hipercalemia.
Fonte: King, 2013.
O tratamento é baseado na gravidade das mudanças no ECG juntamente com
os sinais clínicos do paciente ou a mensuração do nível de potássio sérico. No
quadro a seguir, temos o tratamento específico para hipercalemia:
82
Tópicos Especiais 2 | Unidade ii
Quadro 31. Medicações e doses para controle da hipercalemia.
Medicação Dose Modo de atuação
» Age rápido e os efeitos duram cerce de 20
minutos.
* Gluconato de
0,5-1,5mL/Kg em 10% de solução. IV » Neutraliza os efeitos do alto nível de potássio na
cálcio
condução miocárdica.
» Pode ser repetido se precisar.
0,25-0,5 UI/Kg, IV. » A insulina age não diminui do potássio sérico,
** Insulina pois provoca a absorção do potássio das células
regular Administrar com 2 g de dextrose por unidade de
junto com a glicose.
(solúvel) insulina e seguido de adição de dextrose 2,5%
em fluido intravenoso » Leva cerca de 20 minutos.
*** Bicarbonato » Age direcionando o potássio intracelular pela
1-2 mEq/kg. IV
de sódio mudança de pH.
* Ela não reduz o potássio sérico mas pela rapidez de sua ação é a primeira opção para o tratamento em casos severos de
hipercalemia.
** É importante a administração da glicose via fluido de 12 a 24 horas para prevenir hipoglicemia.
*** É deve ser usado somente quando o status ácido básico pode ser monitorado.
Fonte: King, 2013.
É importante lembrar que a causa primária precisa ser sempre pesquisada,
encontrada e corrigida.
O cloreto é o ânion extracelular principal e costuma mudar de forma, parecido
com o sódio sérico (KING, 2013). Ele é muito importante no equilíbrio
ácido-básico, nas interações com o sódio renal e a reabsorção do bicarbonato.
Casos de alta de cloreto (hipercloremia) são comuns de acontecer quando se tem
hipernatremia, e, quando ela é corrigida, o cloreto acaba sendo também.
É preciso ter cuidado com os pacientes epiléticos ou que estão em tratamento
para convulsão fazendo o uso do brometo de potássio, pois costumam ter
hipercloremia e sódio normal.
A hipocloremia pode ser vista em paciente desidratados, principalmente
naqueles com vômitos severos. Quando o paciente está com hipocloremia, possui
uma tendência grande a desenvolver alcalose metabólica, principalmente se a
desidratação também estiver presente.
Segundo King (2013), o cálcio é o principal componente do esqueleto, e ele pode
estar disponível de três formas:
» Cálcio ionizado (iCa2+) – é responsável por cerca de 55% do cálcio
total.
83
Unidade ii | Tópicos Especiais 2
» Cálcio complexado – 10% do cálcio e está na forma de lactato, ânions
de citrato e bicarbonato.
» Cálcio ligado as proteínas – 35% do cálcio total.
Na hemogasometria, é mais comum ser feita a mensuração do cálcio ionizado.
A ingestão de cálcio basicamente acontece através da alimentação, pela absorção
no trato gastrointestinal e eliminação renal.
Quadro 32. Diagnósticos diferenciais de hipercalcemia.
Diagnóstico diferencial Possiveis causas
» Linfoma
» Adenocarcinoma de saco anal
Neoplasias
» Mieloma múltiplo
» Adenocarcinoma de glândula mamária
Hipoadrenocorticismo
Doença renal aguda
Hipoadrenocorticismo
» Infecção por Angiostrongylus vasorum
Distúrbios granulomatosos
» Doença fúngica
» Alguns venenos de rato
Toxicose por vitamina D
» Cremes contra psoríase
Doenças ósseas não neoplásicas
Idiopáticas (gatos)
Fonte: King, 2013.
O tratamento emergencial apenas é indicado se o cálcio ionizado estiver
aumentado. Sinais clínicos da hipercalcemia podem ser não específicos, mas
alguns sinais mais comuns de serem observados:
» inapetência ou anorexia;
» letargia;
» poliúria/polidipsia;
» vômito;
» constipação;
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Tópicos Especiais 2 | Unidade ii
» arritmia cardíaca;
» contração muscular.
Se o paciente estiver com cálcio ionizado alto, o tratamento precisa ser iniciado
(quadro 33) para diminuir as chances de falência renal.
Quadro 33. Tratamento para pacientes com hipercalcemia.
Fármaco Dose Observações
Diuréticos com NaCl a 0,9% 4-6 mL/Kg/h Carga de sódio alta promove a calciurese.
1-2 mg/Kg 1ª fazer a correção da hidratação e só
Furosemida
A cada 6 a 8 horas depois iniciar com o diurético.
4-7 UI/Kg/SC
Calcitonina do salmão Cuidado com anafilaxia.
A cada 6 a 8 horas
10 mg/kg diluído em NaCl a 0,9%, infusão
Bifosfonato (Clodronato) Reduz a absorção óssea.
lenta durante 4 -6 horas
Dialise peritoneal ou
Caso de risco de morte por hipercalcemia.
hemodiálise
Usar apenas após o diagnóstico ter sido
Glicocorticoides Doses anti-inflamatórias
concluído.
Fonte: King, 2013.
A hipocalcemia provoca aumento da excitabilidade do tecido neuromuscular.
Os tutores chegam desesperados na clínica, pois o paciente manifesta tremores
musculares, prurido facial, postura rígida, palpitação e hipertermia. Em casos
mais sérios, tetania, alteração no ECG (intervalo prolongado de QT) e hipotensão
não sendo corrigida podem levar o animal a óbito.
Quadro 34. Tratamento para pacientes com hipocalcemia.
Conduta e fármacos Dose Observações
Durante 10 a 20 minutos e depois manter por via
Gluconato de cálcio 10% 0,5 – 1,5 mL/Kg
IV lentamente.
Acompanhamento ECG Se possível durante a infusão.
Pulso e Frequência cardíaca Monitorar quando não se tem ECG disponível.
5-15 mg de cálcio elementar/ O gluconato de cálcio pode ser diluído em NaCl
Gluconato de cálcio
kg/h a 0,9% (1:1) e administrado em dose SC **.
* Usado pelo KING
** Cuidado com risco de necrose/
mineralização tissular localizada.
Fonte: King, 2013.
85
TÓPICOS ESPECIAIS 3 UNIDADE III
CAPÍTULO 1
Hemorragias
A hemorragia significa uma perda de sangue causada por um trauma que
lesionou um vaso sanguíneo e provocou esse sangramento. Pode ser chama de
hemorragia interna quando está dentro do corpo, ou seja, dentro da cavidade,
tecidos ou órgãos, ou de hemorragia externa, quando essa hemorragia extravasa
para fora do corpo.
Normalmente, o corpo tenta combater essa perda por meio da coagulação
sanguínea, que bloqueia a perda do sangue, obstruindo o local onde aconteceu
a lesão até que aconteça a recuperação do tecido lesionado. Entretanto, se a
ruptura foi muito grande, a perda sanguínea pode ser muito rápida e considerável,
representando alta gravidade. A quantidade perdida e a velocidade de perda
podem ser tamanhas, resultando em uma hemorragia aguda grave e levando a
vários sintomas, como:
» choque hipovolêmico;
» quebra de tensão arterial;
» hipoxia;
» anoxia.
Dependendo do local, podem ser observados:
» aumento da pressão intracraniana;
» tamponamento cardíaco;
» asfixia.
86
Tópicos Especiais 3 | Unidade iii
Se a perda for lenta e prolongada, podem acontecer:
» anemia;
» fraqueza intermitente;
» úlceras gástricas;
» úlceras duodenais.
Todos esses sintomas são mais comumente observados em hemorragia internas.
Já nas hemorragias externas, observamos ferimentos cortantes e, quanto mais
funda a laceração, maior a gravidade, visto que, anatomicamente, os vasos mais
calibrosos costumam ser mais profundos. O tipo de vaso também influencia
na gravidade da hemorragia – as artérias têm uma pressão bem maior que
as veias, o que faz com que o sangramento saia jorrando de acordo com os
batimento cardíacos e dificulta a formação de coágulos para fechar o local
lesionado, tendo, portanto um controle mais complicado. Dessa maneira, o
controle precisa ser feito de forma clínica e/ou cirúrgica. Já nas lesões em
veias, como a pressão é bem mais baixa, torna-se mais fácil o controle do
sangramento.
As hemorragias internas, quando acontecem em locais que se comunicam com
o meio exterior, são mais fáceis de serem descobertas. Como exemplo disso,
podemos citar:
» pulmão;
» sistema urinário;
» sistema digestório.
Agora, quando acontecem em locais que não têm comunicação com meio
externo, tornam-se mais difíceis de serem detectáveis, e, muitas vezes, são
observados apenas quando já temos a presença de sintomas como:
» diminuição da tensão arterial;
» pulso fraco;
» cianose;
87
Unidade iii | Tópicos Especiais 3
» tonturas;
» sede;
» extremidades frias.
As causas das hemorragias são diversas, vão desde uma pancada violenta,
como atropelamentos, quedas, tumores hemorrágicos até doenças que
provocam alterações da parede vascular ou dos processos de coagulação do
sangue. O fato é que, visível ou não, a hemorragia irá provocar uma ou mais
falhas no mecanismo hemostasia. Esse sangramento pode provocar deficiência
nas plaquetas, sendo de quantidade ou função, ou pode interferir na cascata
de coagulação, intrínseca ou extrínseca (que iremos discutir mais à frente),
ou ainda na integridade vascular. Vamos entender um pouco mais sobre
hemostasia.
Segundo o dicionário Dicio, “hemostasia na Medicina significa: Estancamento do
sangue” (DICIO, s/d). Entretanto, ela vai muito além disso.
A hemostasia é a suspensão do sangramento. É uma resposta fisiológica
a um dano vascular e fornece um mecanismo para selar um vaso
danificado para prevenir a perda de sangue (hemo = sangue, estase =
parada, lento). A hemostasia é um processo finamente regulado que
envolve predominantemente interações entre endotélio, plaquetas e
fatores de coagulação. Isso normalmente ocorre somente em locais de
dano vascular, sem afetar a fluidez e o fluxo de sangue na vasculatura
não danificada normal.
A interrupção no delicado equilíbrio da hemostasia pode resultar em
estados patológicos de perda de sangue (hemorragia) ou formação
inapropriada de trombo (trombose).
RAISER, 2013, p.65.
Após o início do sangramento, o organismo tenta interrompê-lo por meio da
hemostasia. Acontece, então, uma sequência de eventos de que iremos falar agora.
Com a lesão no vaso, ocorre a perda de sangue para fora do lúmen do vaso,
dando início ao processo da hemostasia. Na fase primária, acontece a constrição
vascular e a presença das plaquetas formando a agregação plaquetária, fazendo
um tampão, que, entretanto, é relativamente instável. Temos, então, a segunda
88
Tópicos Especiais 3 | Unidade iii
fase, na qual as fibrinas formam uma rede e dão suporte à agregação plaquetária
para completar a hemostasia. A essa formação, damos o nome de coágulo. Mas,
para que a hemostasia secundária aconteça, é necessária uma concentração
plasmática adequada de proteínas pró-coagulantes e da interação correta entre
elas.
Figura 46. Processo de hemostasia, com a representação das fases primária e secundária.
Fonte: https://kasvi.com.br/wp-content/uploads/2019/03/hemostasia-1-768x1024.jpg.
A coagulação pode ser iniciada por uma via intrínseca, que envolve componentes
normalmente encontrados dentro da rede vascular e que são ativados por
contato com uma superfície estranha. A via extrínseca é um mecanismo
alternativo pelo qual a coagulação é iniciada. Ela envolve elementos comuns
no sangue e alguns não tão comuns no espaço intracelular.
89
Unidade iii | Tópicos Especiais 3
Figura 47. Explicando as vias intrínseca e extrínseca da coagulação.
Fonte: elaborada pela própria autora.
Agora que foi entendido o processo de coagulação, como isso será aplicado na
emergência? O clínico precisa pesquisar junto ao tutor se o paciente tem alguma
alteração clínica como:
» epistaxe;
» hematomas espontâneos, quando é possível ver;
» sangramento gengival frequente;
» hematúria;
» sangramentos anormais.
Tratamento
Em todo início de tratamento de hemorragias, é preciso saber de onde a
hemorragia está vindo, para que a contenção seja realizada. Quando a hemorragia
é muito intensa, a ventilação e as vias aéreas precisam ser inspecionadas,
bem como o débito cardíaco deve ser controlado em segundos ou minutos,
dependendo da gravidade.
Em filhotes de cães e gatos, diferente dos suínos, que devem receber
suplementação de ferro, não é recomendado receber o ferro via oral, pois pode
acontecer intoxicação.
90
Tópicos Especiais 3 | Unidade iii
O ABC deve ser utilizado como ferramenta de avaliação do animal, sendo sempre
a abordagem primária que deve ser feita: o A significa “ar” – “está entrando
oxigênio?” –; o B se refere a “boa respiração” – “como esse animal está respirando?
Está com angústia? Em qual a posição ele se encontra?” –; e o C representa
“circulação” – “como como está a parte cardíaca desse paciente?”.
91
CAPÍTULO 2
Transfusão sanguínea
A primeira transfusão sanguínea foi realizada no século XVII, pelo médico
britânico Richard Lower, em Oxford, no ano de 1665, com base em experimentos
realizados em animais. Naquela época, as transfusões eram heterólogas, ou seja,
com sangue de animais de espécies diferentes, pois acreditava-se que o sangue
dos animais era sangue mais puro, mas essa ação foi considerada criminosa e
foi então proibida na faculdade de Paris e posteriormente em Roma e na Royal
Society, na Inglaterra (INSTITUTO HOC, s/d).
Em 1665, o médico britânico Richard Lower sangrou um cão quase à morte e
então o reviveu, fazendo transfusão do sangue de um outro cão através de uma
artéria. Esse é o primeiro relato bem-sucedido (INSTITUTO HOC, s/d).
Mesmo sendo proibidas, as tentativas de transfusão não acabaram e, em 1788,
Pontick e Landois obtiveram resultados positivos realizando transfusões
homólogas (entre animais da mesma espécie), concluindo que elas poderiam
ser benéficas e inclusive salvar vidas. Entretanto, apenas em 1818, James
Blundell transfundiu sangue humano em mulheres com hemorragia pós-parto
(INSTITUTO HOC, s/d). E, em 1901, o médico austríaco Karl Landsteiner
observou que o soro do sangue de uma pessoa muitas vezes coagula ao ser
misturado com o de outra, o que culminaria em uma das mais importantes
descobertas, o sistema de grupos sanguíneos ABO (INSTITUTO HOC, s/d).
Na veterinária, a medicina transfusional teve seu início na década de 1950, com a
disponibilidade de equipamentos apropriados e pesquisas sobre o assunto, e foi
fundada a Associação para a Medicina Transfusional Veterinária (KRISTENSEN;
FELDMAN, 1995).
Agora que já conhecemos a história do início da transfusão sanguínea, quando
iremos fazer uso dessa ferramenta dentro da emergência? Começamos pela
indicação da diminuição na oferta de oxigênio.
» VG 21%;
» pós trauma;
» mucosas pálidas, “brancas”;
92
Tópicos Especiais 3 | Unidade iii
» correção de volemia;
» fatores de coagulação (plaqueta e PTNd da coagulação);
» doenças imunomediadas;
» entender a imuno-hematologia:
› presença de anticorpos;
› DEA 3 (20%);
› DEA 5 (23%).
Para a correção da volemia, podemos usar os componentes plasmáticos, albumina
e plasma.
O teste de compatibilidade é feito com o sangue do doador e o do receptor. Com
ele, conseguimos dizer que não foi detectado no soro do receptor anticorpos
contra as hemácias do doador. Mesmo tendo sido feita a tipagem sanguínea, o
teste de compatibilidade deve ser realizado antes da transfusão (GOMES, 2008).
Figura 48. Reação principal.
Fonte: Costa Jr., 2015.
Figura 49. Reação secundária.
Fonte: Costa Jr., 2015.
93
Unidade iii | Tópicos Especiais 3
Quadro 35. Teste de compatibilidade.
Quantificar e qualificar a reação
Graduação Característica
0 Sem aglutinação micro ou macroscópica
H Hemólise
+/- Micro Nenhum aglutinado visto macroscopicamente. Poucos aglutinados visto microscopicamente
+/- Macro Aglutinados fracos visto macroscopicamente. Muitos aglutinados visto microscopicamente
1+ Muitos aglutinados pequenos e um fundo de hemácias
2+ Aglutinados grandes e grumos menores
3+ Vários agregados grandes
4+ Um sólido agregado de hemácias
Fonte: Feldman; Sink, 2007.
Figura 50. Teste de compatibilidade macroscopicamente.
Fonte: Feldman; Sink, 2007.
Figura 51. Teste de compatibilidade microscopicamente.
Fonte: Feldman; Sink, 2007.
94
Tópicos Especiais 3 | Unidade iii
Figura 52. Teste de compatibilidade.
Fonte: Feldman; Sink, 2007.
Um doador canino pode doar 450 mL de sangue a cada 21 ou 28 dias sem
suplementação de ferro. Na maioria dos casos, não se precisa anestesiar o doador
para fazer a coleta, mas, se houver a necessidade para ajudar na contenção, pode
ser feita uma tranquilização (BROWN; VAP, 2006). Segundo Thrall (2006), a
acepromazina não pode ser usada, pois interfere na função plaquetária. Abaixo,
estão listadas algumas características necessárias para o doador:
» idade entre 1 e 8 anos;
» peso preferencialmente > 30 kg;
» Ht > 40%;
» nunca ter recebido transfusão (ou terapia com hemocomponentes);
» comportamento dócil;
» protocolo vacinal e vermifugação em dia;
» negativo para as principais enfermidades (observar as endemias de
cada região);
» não estar no proestro ou estro (ação hormonal; estrógeno);
» gestações anteriores (gestante X anticorpos).
Características um gato doador:
» tipagem e reação cruzada;
» Ht > 35% (40%);
95
Unidade iii | Tópicos Especiais 3
» peso > 4,5 kg (doação de 12 a 16 ml/kg e repor volume);
» necessidade de sedação;
» pesquisa de enfermidades:
› negativo para FeLV, Mycoplasma spp. etc.;
› observar as endemias de cada região.
Os cães possuem oito grupos sanguíneos, identificados como antígenos
eritrocitários caninos (DEA). Segundo Kristensen e Feldman (1995), são raros os
anticorpos pré-formados, mas a transfusão dos tipos sanguíneos incompatíveis
DEA 1.1 e 1.2 pode resultar em hemólise. A seguir, apresentamos um quadro
com os tipos sanguíneos caninos.
Quadro 36. Tipos sanguíneos caninos.
Nome atual Nome comum Incidência na população
DEA 1.1 A1 40%
DEA 1.2 A2 20%
DEA 3 B 5%
DEA 4 C 98%
DEA 5 D 25%
DEA 6 F 98%
DEA 7 Tr 45%
DEA 8 He 4%
Fonte: Kristensen; Feldman, 2008.
Figura 53. Quem pode doar para quem em cães.
Fonte: Costa Jr., 2015.
96
Tópicos Especiais 3 | Unidade iii
Figura 54. Quem pode doar para quem em gatos.
Fonte: Costa Jr., 2015.
Após o doador selecionado e todos os testes realizados, é preciso fazer a coleta e
seu processamento. Para a coleta, utilizamos bolsas de sangue que são vendidas
comercialmente para a linha humana. Dentro delas, tem 63 ml de CPDA-1
(citrato-fosfato-dextrose-adenina, o anticoagulante usado) para 450 ml de
sangue. Se for preciso fazer uma coleta menor, deve ser retirada a quantidade de
coagulante antes de realizar a punção venosa, bastando fazer uma regra de três
simples para saber a quantidade a ser retirada da bolsa, como podemos ver na
figura 55. Por serem um sistema fechado, isso reduz consideravelmente o risco
de contaminação bacteriana (GOMES, 2008).
Figura 55. Cálculo mostrando como identificar a quantidade a ser retirada de anticoagulante para uma coleta de 200 ml de
sangue.
Fonte: elaborada pela autora.
97
Unidade iii | Tópicos Especiais 3
Durante a coleta, alguns cuidados devem ser seguidos, como:
» jejum de 12 horas (reduz possibilidade de formação de rouleaux para não
interferir no teste de compatibilidade);
» assepsia no local onde será realizada a punção venosa;
» após a coleta do sangue, fazer pressão no local durante 2 a 5 minutos
para acelerar o processo de coagulação;
» observar o animal doador pelo menos até 30 minutos depois do término
da coleta quanto a:
› fraqueza;
› mucosas pálidas;
› pulso fraco;
› sinais de hipotensão.
» caso sintomas acima sejam observados, realizar soroterapia para repor
o volume coletado, mas com cuidado para não causar hemodiluição
imediata;
» oferecer alimento e água logo após a doação;
» orientar o tutor para que o paciente não faça exercícios físicos por
alguns dias.
Figura 56. Coleta de sangue de cão doador.
Fonte: Costa Jr., 2015.
98
Tópicos Especiais 3 | Unidade iii
Figura 57. Coleta de sangue de gato doador.
Fonte: Costa Jr., 2015.
Além da bolsa simples, existem outras bolsas de coleta, como pode ser observado
abaixo:
» Bolsa simples: é a mais conhecida para coleta de sangue.
» Bolsas múltiplas: é um sistema fechado conectado a várias outras
bolsas, de forma que uma coleta pode ser dividida e apenas uma bolsa
ser utilizada para um cachorro pequeno, por exemplo, diminuindo
assim o risco de contaminação.
» Bolsa pediátrica: é uma bolsa de coleta menor, pode ser usada para
felinos.
Figura 58. Bolsas de coleta para transfusão – bolsa simples, bolsas múltiplas, bolsa pediátrica e de transferência.
Fonte: Costa Jr., 2015.
99
Unidade iii | Tópicos Especiais 3
Após a escolha da bolsa e a coleta do sangue, começamos o processamento e, para
isso, precisamos conhecer os seus componentes:
» papa de hemácias;
» plasma fresco congelado;
» plasma congelado;
» crioprecipitado;
» crioplasma pobre;
» plasma rico em plaquetas.
Cada componente tem uma dose e uma indicação. Para visualizá-las mais
rapidamente, podemos ver tais informações no quadro a seguir.
Quadro 37. Produtos sanguíneos, indicações e doses.
Produto Indicações Dose Observações
Anemia.
Hipovolemia. Rosco de sobrecarga
20ml/Kg para elevar 10% o
Sangue total fresco de volume em animais
anemia com alterações hematócrito (Ht).
normovolêmicos.
hemostáticas (trombocitopenia e
coagulopatia).
Não preserva
20ml/Kg para elevar 10% o
Sangue total estocado Anemia hipovolêmica. plaquetas e nem
hematócrito (Ht).
fatores de coagulação.
10ml/Kg para elevar 10% o Ideal para pacientes
Concentrado de hemácias Anemia.
hematócrito (Ht). normovolêmicos.
1UI/10Kg, repetir se
Indicação terapêutica
Concentrado de plaquetas Trombocitopenia. necessário (dose geralmente
e profilática.
recomendada:10ml/Kg).
Risco de sobrecarga
Plasma rico em plaquetas Trombocitopenia. 1UI/10Kg.
de volume.
Coagulopatias hereditárias e
adquirida (CID, Sepse, hepatopatias,
neoplasias, coagulopatia dilucional,
Múltiplas transfusões
dicumarínicos).
podem ser
10 a 30 ml/kg, repetir,
Pancreatite aguda. necessárias em
Plasma fresco congelado se necessário (dose
razão da meia-vida
Expansor de volume (segunda recomendada: 10ml/kg).
reduzida dos fatores
opção).
de coagulação.
Hipoproteinemia.
Hipoglobulinemia.
100
Tópicos Especiais 3 | Unidade iii
Produto Indicações Dose Observações
Hipoproteinemia. Indicado no
10 a 30 ml/kg, repetir, se
tratamento das
Plasma congelado necessário (dose geralmente
Hipoglobulinemia. hipoproteinemias a
recomendada: 10ml/kg).
curto prazo.
Hemofilia. 1UI/10Kg (repetir se Administrar 30 min.
Crioprecipitado
Doença de Von Willebrand. necessário). Antes da cirurgia.
Fonte: Gomes, 2008.
Figura 59. Hemocomponentes.
Fonte: Costa Jr., 2015.
Além dos hemocomponentes, o sangue total é um meio extremamente rico.
Nele, temos hemácias, plaquetas, fatores de coagulação e proteínas. Temos
a opção de sangue total fresco e sangue total estocando. O fresco é assim
considerado até 8 horas após a coleta em temperatura ambiente de 20 a 24 ºC.
Depois desse tempo, passa a ser chamado de “sangue estocado” e precisa ser
mantido refrigerado em temperatura de 2 a 6 ºC, permanecendo viável por
até 35 dias, quando mantido em CPDA-1 (ABRAMS-OGG, 2001). Uma de
suas principais indicações é restabelecer volemia nas hemorragias agudas,
mas pode ser usado também em animais anêmicos e trombocitopênicos.
A administração do sangue total deve ser feita em até 4 horas, sendo recomendado
administrar 0,25 ml/kg na primeira hora e, não tendo reação, passar para 10 a
20 ml/kg/h em pacientes normovolêmicos. Segundo Gomes (2008), em pacientes
cardiopatas ou nefropatas, a dose deve ser reduzida para 2 a 4 ml/kg/h. Se a
quantidade total a ser tomada ultrapassar as quatro horas, deve ser dividida para
usar uma parte nesse período, e o restante refrigerado, para usar nas próximas
quatro horas. Dessa maneira, o risco de contaminação será reduzido.
101
Unidade iii | Tópicos Especiais 3
Figura 60. Sangue total fresco.
Fonte: Costa Jr., 2015.
A papa de hemácias deve ser mantida refrigerada entre 2 e 6 ºC, tendo sua
viabilidade por 20 dias, quando mantida em CPDA-1. Ela é obtida na primeira
centrifugação do sangue total, e é recomendada para os pacientes:
» com hemorragia crônica;
» com eritropoiese ineficiente;
» anêmicos normovolêmicos.
A indicação é para aqueles pacientes que estão com a hemoglobinas abaixo de
7 g/dL. A tabela abaixo exemplifica melhor, para ajudar na escolha da utilização
da papa de hemácias ou não.
Tabela 6. Reposição de hemácias em paciente crítico.
Transfusão de hemácias Nível de hemoglobina
Normalmente indicada < 7 g/dL
Discussão 7 a 10 g/dL
Raramente indicada > 10 g/dL
Fonte: Gomes, 2008.
O concentrado de plaqueta é obtido através da centrifugação do plasma rico em
plaquetas (KRISTENSEN; FELDMAN, 1995). Tem a sua viabilidade por cinco
dias e deve ser mantido em temperatura ambiente e em permanente agitação
(ABRAMS-OGG, 2000).
102
Tópicos Especiais 3 | Unidade iii
A concentração de plaqueta é especialmente para pacientes trombocitopênicos,
e, com ela, se consegue uma quantidade grande de plaquetas sem os eritrócitos,
diminuindo os riscos de reações transfusionais (GOMES, 2008). Ela pode ser
usada preventivamente para sangramento, quando paciente for passar por uma
cirurgia grande. Quando o sangramento já existe, usa-se quanto a contagem de
plaqueta for inferior a 50.000 μL.
Quadro 38. Quando fazer a transfusão de concentrado de plaquetas.
Trombocitopenia, tem sangramento?
Sim não
Plaquetas <50.000 Transfusão profilática
Paciente crítico Paciente cirúrgico
Transfusão terapêutica
<10,000/ μL <100.000/ μL
Fonte: Gomes, 2008.
Figura 61. Homogeneizador de plaquetas.
Fonte: Costa Jr., 2015.
Figura 62. Concentrado de plaquetas.
Fonte: Costa Jr., 2015.
103
Unidade iii | Tópicos Especiais 3
Plasma fresco congelado é obtido através da centrifugação do sangue total e
precisa ficar armazenado a -20 ºC por, no máximo, oito horas após a coleta, ou
perde as suas propriedades. Depois de centrifugado, para separar, ele é transferido
para uma bolsa satélite por meio de um extrator de plasma e fica viável por até
um ano. Depois disso, ele é denominado “plasma congelado” e preserva albumina
e imunoglobulinas. O plasma fresco descongelado lentamente em temperatura
1 a 6ºC com posterior centrifugação tem o nome de crioprecipitado (GOMES,
2008).
Figura 63. Plasma fresco congelado.
Fonte: Costa Jr., 2015.
Figura 64. Aparelho extrator de plasma.
Fonte: Costa Jr., 2015.
104
Tópicos Especiais 3 | Unidade iii
Quadro 39. Tabela de conservação de hemocomponentes.
Hemocomponentes Temp. Tempo Componente preservativo
Sangue total fresco Ambiente < 8 horas Qualquer
30 dias CPDA -I
Sangue total 4º C
41 dias CPD/SAG – M
20 dias CPDA -I
Concentrado de eritrócitos 4º C
37 dias CPD/SAG – M
Plasma fresco congelado – 30º C 1 ano
Plasma congelado – 30º C 4 anos
Criopreciptados – 30º C 1 ano
Criopobre – 30º C 4 anos
Concentrado Plaquetas 22º C 5 dias (movimentação)
Fonte: Costa Jr., 2015.
Reações transfusionais
A reação transfusional pode acontecer com qualquer paciente, mas existem
algumas maneiras de minimizar essas reações, e uma delas é utilização de
hemocomponentes. Novos estudos na medicina e na veterinária mostram que o
uso de hemocomponentes vem aumentando, da mesma que o sangue total vem
tendo seu uso diminuído (HOHENHAUS, 1992).
Podemos observar diversas reações transfusionais, que podemos classificar em
imunológicas ou não imunológicas e ainda dizer se foi de ocorrência aguda ou
tardia. A aguda acontece durante a transfusão ou em poucas horas, podendo
se manifestar até 48 horas depois. No quadro a seguir, temos as manifestações
clínicas e o tratamento das principais reações transfusionais.
Quadro 40. Manifestações clínicas e tratamento das principais reações transfusionais.
Reação Transfusional Manifestações Clinicas Tratamento
» Hipertermia » Interromper a transfusão.
» Taquipneia » Fluidoterapia.
» Taquicardia » Dexametasona (4 a 6mg/kg, IV).
Hemolítica Aguda
» Agente vasopressor: Dopamina e a 5 μg/kg/min. em
» Hemoglobinúria
infusão contínua.
» Choque » Furosemida: 2 a 4mg/kg/IV.
105
Unidade iii | Tópicos Especiais 3
Reação Transfusional Manifestações Clinicas Tratamento
» Taquipneia » Interromper a transfusão.
» Dispneia » Fluidoterapia.
» êmese » Dexametasona: 0,5 a 1mg/kg, IM ou IV.
» Diarreia » Difenidramina: 1mg/kg, IM.
Hipersensibilidade
» Salivação
aguda
» Urticária
» Prurido
» Angioedema
» Eritema
» Hipertermia » Interromper a transfusão.
Reações transfusionais
não hemolíticas febris » Êmese » Dexametasona: 0,5 a 1mg, IM ou IV.
(RTNF)
» Tremores
» Hipertermia » Interromper a transfusão.
» Taquipneia » Remover todos os materiais e produtos contaminados.
Contaminação
» Taquicardia » Realizar cultura de amostras.
Bacteriana
» Êmese » produto sanguíneo e do sangue do paciente.
» Choque » Antibióticos de amplo espectro.
» Taquipneia » Interromper a transfusão.
» Taquicardia » Diuréticos com ou sem vasodilatador.
Sobrecarga circulatória » Ascite » Reiniciar a transfusão sanguínea lentamente
» Edema pulmonar (preferência: concentrado de hemácias).
» Efusão pleural
» Hipocalcemia: tremores » Administrar gluconato de cálcio a 10% na dose de 0,5
» Hipertermia a 1,5 ml/kg, IV, durante 5 a 10min.
Intoxicação ao citrato
» Êmese » Monitorar com ECG.
» Arritmias cardíacas
ECG= Eletrocardiograma, IM= Intramuscular, IN= Intravenosa
Fonte: Gomes, 2008.
106
Tópicos Especiais 3 | Unidade iii
Quadro 41. Ficha de transfusão sanguínea.
FICHA DE TRANSFUSÃO SANGUINEA
Paciente: _______________________ sexo: _______________ Data: ____________
Proprietário: _________________________________________ Idade: ____________
Calculo de Transfusão: Peso: ___________
______________________________________________________________________
Início da Transfusão: _____________ Termino da Transfusão: ___________________
Hora FC FR P. sistólica P. Diastólica P. A. M. SPO2 Temp. Retal (Tº C)
Observações durante o procedimento: _____________________________________
____________________________________________________________________
Assinatura Veterinário: ___________________________________________________
Fonte: elaborada pela autora.
107
INTOXICAÇÃO E
ENVENENAMENTO UNIDADE IV
CAPÍTULO 1
Intoxicações
Os animais estão cada vez mais presentes dentro das casas das pessoas e não
mais em quintais como antigamente, e essa proximidade muitas vezes pode
causar ingestão de medicamentos, por exemplo, que caem no chão ou pegam
na bolsa ou mesmo venenos utilizados para controle de roedores ou outros
vetores. Dessa maneira, a ingestão pode acontecer na frente do tutor ou ele saber
que o seu animalzinho mexeu ali. Na maioria dos casos, o quadro é agudo, ou
seja, a intoxicação aconteceu pouco tempo antes, mas é grave, principalmente
dependendo do produto e da quantidade ingerida.
É importante saber qual o tipo de veneno ou medicação ingerida, e, nessas
situações, o desespero do tutor é tanto que ele acaba ligando na clínica a procura
de orientações. Quando isso acontecer, é importante filtrar algumas informações,
como:
» Qual o tipo de agente que foi ingerido ou com o qual teve contato?
» Levar a caixa do produto (podem ser plantas, medicamentos, produtos
de pintura, construção) ou tirar foto (isso ajuda para poder pesquisar
o antídoto, protocolo para descontaminação, qual o mecanismo de
ação etc.)
» O tutor viu quando aconteceu o contato? (assim tem-se a certeza da
ingestão e sua quantidade)
» Há quanto tempo aconteceu?
» O tutor sabe a quantidade ingerida?
» O animal está com algum sinal clínico?
108
Intoxicação E Envenenamento | Unidade iv
» Qual é a espécie e idade do paciente?
» É possível orientar o início de alguma terapia (Ex.: dar banho, induzir
vômito)?
Com essas informações, é possível pensar na estratégia que será utilizada para o
tratamento, bem como a conduta emergencial que se aplica àquele paciente.
Plantas
Geradoras de oxalato
Sinais clínicos:
» irritação na cavidade oral e esôfago;
» sialorreia;
» êmese;
» diarreia;
» coma;
» morte.
Tratamento:
» É sintomático.
» Pode ser feita lavagem, dependendo de há quanto tempo houve a
ingestão.
» Usar leite ajuda a precipitação do oxalato e, dessa maneira, diminui a
absorção.
Neurotóxicas
Sinais clínicos:
» taquicardia;
» êmese;
109
Unidade iv | Intoxicação E Envenenamento
» midríase;
» paralisia;
» taquipneia;
» convulsão;
» coma.
Tratamento:
» É sintomático.
» Pode ser feita lavagem dependendo de há quanto tempo houve a
ingestão,
» Usar fisiostigmina na dose de 0,02 mg/kg, IV lento (três a cinco
minutos).
Nefrotóxicas
Sinais clínicos:
» vômito;
» apatia;
» anorexia;
» oliguria e anuria quando evolui para insuficiência renal aguda.
Tratamento:
» É sintomático.
Cardiotóxicas
Sinais clínicos:
» depressão;
» letargia;
» sialorreia;
110
Intoxicação E Envenenamento | Unidade iv
» êmese;
» midríase;
» dor abdominal;
» distrição respiratória;
» hipotensão;
» arritmias cardíacas (taquiarritmias).
Tratamento:
» É importante fazer monitoramento com o eletro.
» Busca-se a correção das possíveis arritmias.
Quadro 42. Características das diferentes plantas cardiotóxicas.
Forma de
Nome popular Mecanismo de ação
intoxicação
» Grande quantidade de oxalato.
» Na corrente sanguínea, se liga ao cálcio e forma oxalato de cálcio,
Comigo-ninguém-pode Ingestão
causando uma hipocalcemia.
» Pode causar lesão vascular e renal.
» A toxina tem ação inibidora de colinesterase e ação inibidora
Dama da noite Ingestão
anticolinérgica (semelhante a intoxicação por atropina).
» Associada a insuficiente renal, causa necrose tubular aguda entre 48 e 92
*Lírio Ingestão horas após exposição.
» Não se sabe qual é a toxina.
» O agente toxico é semelhante a glicosídeos cardíacos como digoxina.
Dedaleira
Ingestão » Atua no aumento de cálcio para dentro da célula cardíaca, causando efeito
Boca-de-leão
inotrópico e aumentando a possibilidade de arritmias.
*Problema muito grave
principalmente para
gatos.
Fonte: elaborada pela própria autora.
Monóxido de carbono
A intoxicação por monóxido de carbono acontece quando o animal fica em locais
com pouca ventilação ou em casos de incêndio. Dessa maneira, ele fica inalando
altas concentrações de CO2.
111
Unidade iv | Intoxicação E Envenenamento
Sinais clínicos:
» hipoxia;
» apatia;
» ataxia;
» dificuldade respiratória;
» coma;
» morte.
Tratamento:
» suporte ventilatório;
» terapia hiperbárica, quando possível.
Analgésicos e anestésicos
Muitos tutores, na intenção de resolver a dor do animal, administram medicação
para dor, que, na maioria dos casos, também tem ação anti-inflamatória além
da analgesia e, como é para humanos, tem a dose maior e forma de administrar
diferente para os pacientes veterinários; dessa maneira, causam-se quadros
sérios de intoxicação. Os fármacos mais comuns de serem encontrado nas
emergências veterinárias são: acetaminofeno, diclofenaco e ácido acetilsalicílico
e a fenazopiridina.
Acetaminofeno (Tylenol®, paracetamol)
Sinais clínicos:
» Cães:
› apatia;
› anorexia;
› êmese;
› hipotermia.
112
Intoxicação E Envenenamento | Unidade iv
» Gatos:
› mucosas pálida;
› dificuldade respiratória;
› edema de face (comum);
› hipotermia;
› cianose;
› coma;
› morte.
Tratamento:
» Como antídoto, N-acetilcisteína na dose inicial de 150 a 200 mg/kg
IV, seguidos de 70 a 100 mg/kg IV, VO a cada 8 horas durante 3 a 5
dias de tratamento.
» S-adenosilmetionina (SAMe) na dose de 20 mg/kg (cão) e 90 mg (gato)
durante 10 a 20 dias também é efetiva.
» Fornecer suporte ventilatório de acordo com o paciente.
» Realizar correção hidroeletrolítica.
Fenazopiridina (Pyridium®)
É analgésico e antisséptico de vias urinárias usado na medicina humana. Usado
por clientes que usam nos pacientes com quadros de problemas urinários. Os
gatos são os mais envolvidos nessas intoxicações.
Sinais clínicos:
» Cães:
› apatia;
› anorexia;
› êmese;
› hipotermia.
113
Unidade iv | Intoxicação E Envenenamento
» Gatos:
› mucosas pálidas;
› dificuldade respiratória;
› edema de face (comum);
› hipotermia;
› cianose;
› coma ;
› morte.
Tratamento:
» Semelhante ao tratamento por acetaminofeno.
Diclofenaco e ácido acetilsalicílico (AAS)
Sinais clínicos:
» gastrite;
» úlcera ;
» demais efeitos sérios na mucosa gástrica;
» insuficiência renal aguda.
Tratamento:
» Antagonistas de receptores H2:
› famotidina 0,5 mg/kg, VO, IV, BID;
› ranitidina 2,2 a 4 mg/kg, VO, SC, BID, TID.
» Inibidores da bomba de prótons:
› omeprazol 1,0 a 2,0 mg/kg, VO, IV, SID;
› protetores gástricos: sucralfato 0,5 a 1,0 g/animal, VO, TID.
114
Intoxicação E Envenenamento | Unidade iv
» Antieméticos:
› maropitant (Cerenia®) 1 mg/kg, SC, SID em cães;
› ondansetrona 0,1 a0,2 mg/kg, VO, IV, BID, TID;
› metoclopramida 0,5 mg/kg, VO, SC, IV, BID, TID ou 2,0 mg/kg/24
horas em infusão contínua.
» Passar a sondagem nasogástrica e fazer aspiração gástrica e
administração de carvão ativado (Captor®-Inovet/Enterex® Vetnil)
auxilia no controle da inflamação e sangramento gástrico.
» Para a parte renal, fluidoterapia, a fim de corrigir o desequilíbrio
hidroeletrolítico
Psicofármacos
Os mais comuns de serem encontrados nas clínica em pacientes intoxicados são:
» antidepressivos tricíclicos (nortriptilina; amitriptilina);
» inibidores da monoamina oxidase (fenelzina; tranilcipromina);
» inibidores da recaptação de serotonina (fluoxetina).
Tratamento:
» É sintomático.
» Realizar correção hidroeletrolítica.
» Fornecer suporte ventilatório.
» Controlar as convulsões.
Drogas ilícitas
Esse tipo de intoxicação nem sempre é reconhecido no início. Ao contrário
das outras, nas quais o tutor já vem falando que o paciente pode ter ingerido
o fármaco que caiu ou que mexeu na planta, com as drogas ilícitas isso não
acontece muitas vezes por medo de serem denunciados, o que atrapalha no
andamento do tratamento inicial.
115
Unidade iv | Intoxicação E Envenenamento
As drogas mais comuns de termos intoxicações são:
» maconha
» cocaína.
Maconha
Sinais clínicos:
» euforia;
» excitação na fase inicial;
» depressão na fase seguinte;
» apatia;
» ataxia;
» incoordenação;
» coma (em casos graves).
Tratamento:
» É sintomático.
» Não existe antídoto.
» A terapêutica vai de acordo com a correção dos sinais clínicos
apresentados.
Cocaína
Sinais clínicos:
» excitação;
» sialorreia;
» hipertermia (causado por tremores musculares);
» midríase;
» taquicardia (pode ter arritmias);
116
Intoxicação E Envenenamento | Unidade iv
» hipertensão;
» taquipneia;
» parada cardiorrespiratória em casos graves.
Tratamento:
» Não existe antídoto.
» Realizar correção eletrolítica.
» Estabilizar a pressão arterial.
» Estabilizar as arritmias.
» Dar suporte ventilatório quando preciso.
Organofosforados
São muito usados em herbicidas, carrapaticidas e inseticidas. Além disso, podem ser
encontrados em várias formas de apresentação, desde pós, shampoos, sprays e até
coleiras; existem vários nomes comerciais, como, por exemplo:
» azinfós etílico (Gusathion A®);
» clorpirifós (Dursban®, Lorsban®);
» diclorvos (DDVP®; Nuvan®; Vapona®);
» dimetoato (Dimexion®; Perfektion®);
» diazinon (Basudin®, Diazitol®);
» fenitrotion (Sumigran®; Sumithion®);
» fention (Baytrex®, Lebaycid®);
» fosfamidon (Dimecron®);
» malation (Carbofós®, Malatol, Malaton®);
» metamidofós (Tamaron®);
» monocrotofós (Azodrin®, Nuvacron®);
» paration metílico (Folidol®).
117
Unidade iv | Intoxicação E Envenenamento
Sinais clínicos:
» miose;
» sialorreia;
» incontinência urinária;
» êmese;
» defecação e/ou diarreia;
» fasciculações musculares;
» tremores;
» bradicardia;
» convulsão;
» morte (casos graves).
Mesmo depois de tratada a infecção, algumas neuropatias periféricas podem
aparecer até duas semanas depois da estabilização inicial.
Tratamento:
» sulfato de atropina (antídoto) em dose inicial de 0,05 mg/kg IV
associado a 0,05 mg/kg IM;
» se não houver melhorar clínica, repetição das doses IV e IM;
» cloreto de pralidoxima (2-PAM) na dose de 20 mg/kg IV na velocidade
de 1mL por minuto;
» correção hidroeletrolítica;
» suporte ventilatório;
» controle de convulsões.
118
Intoxicação E Envenenamento | Unidade iv
Organoclorados, carbamatos e herbicidas
Organoclorados
São substâncias usadas como inseticidas, mas vêm tendo sua utilização diminuída
e sendo substituídos pelos organofosforados e carbamatos. Os nomes comerciais
são:
» Aldrin® (aldrina);
» Endrin®;
» DDT® (diclorodifeniltricloroetano);
» Endossulfan®;
» Heptacloro®;
» Lindane®;
» Mirex® (DDT).
Sinais clínicos:
» êmese;
» sialorreia;
» ataxia;
» hipersensibilidade;
» tremores;
» hiperestesia;
» depressão;
» alterações respiratórias;
» coma;
» morte.
119
Unidade iv | Intoxicação E Envenenamento
Tratamento:
» Não existe antídoto.
» Realizar correção hidroeletrolítica.
» Dar suporte ventilatório.
Carbamatos
São muito usados como inseticidas na agricultura, mas podem ser usados de forma
errônea como rodenticidas, o que pode provocar intoxicações nos animais, em
muitas situações de forma criminosa. Possuem o formato em grânulos também
conhecidos como chumbinho, que é o carbamato de aldicarb. A ação é mais rápida
que a dos organofosforados. Seus nomes comerciais são:
» Temik® (aldicarb);
» Metacil® (aminocarb);
» Sevin® (carbaril);
» Carboran®, Furadan® (carbofuran);
» Landrin® (landrin);
» Bux® (metacalmato);
» Mesurol® (metiocarb);
» Lannate®, Nudrin® (metomil);
» Zectran® (mexacarbato);
» Baygon®, Unden® (propoxur).
Sinais clínicos:
» Os mesmos apresentados em situação de intoxicação por organofosforado.
Tratamento:
» Antídoto: sulfato de atropina na dose de 0,05 mg/kg IV associado a
0,05 mg/kg IM, caso não melhore após a administração inicial (doses
de 0,5 mg/kg IM).
120
Intoxicação E Envenenamento | Unidade iv
» Não usar de cloreto de pralidoxima na terapia de intoxicação por
carbamatos, pois pode aumentar os efeitos tóxicos.
» Realizar correção hidroeletrolítica.
» Oferecer suporte ventilatório intensivo.
Herbicidas
Os herbicidas mais encontrados nessas intoxicações são glifosato e paraquat.
Quanto ao glifosato, cujo nome comercial é o Randup®, os sinais clínicos
dependem da área de contato e não tem muita significância. O tratamento é
sintomático.
Quanto ao paraquat, cujo nome comercial é Gramoxone 200®:
Sinais clínicos:
» dificuldade respiratória;
» cianose;
» insuficiência respiratória.
Tratamento:
» Não existe antídoto específico.
» A terapêutica é baseada nos sinais clínicos.
» Evitar o uso de oxigênio a 100%, durante o suporte ventilatório.
Rodenticida
São produtos usados para controle de roedores de um modo geral. A maioria
provoca intoxicações sérias, que são fatais se não diagnosticadas no início. Os
mais comuns são divididos em anticoagulantes, fluoracetato de sódio, estricnina
e brometalina.
Anticoagulantes
Os nomes comerciais são:
» Klerat®, Ratak® (brodifacum);
121
Unidade iv | Intoxicação E Envenenamento
» Bromoline®, Maki® (bromadiolona);
» Warfarin® (cumafeno);
» Racumin®, Fulmirat pó® (cumatretalil);
» Ratomet® (clorfacinona);
» Ramik® (difacinona).
Sinais clínicos:
» Hemorragias em qualquer parte do corpo.
Tratamento:
» Uso de vitamina K1 (fitomenadiona) na dose inicial de 5,0 mg/kg, SC,
distribuída em vários locais de aplicações. No segundo dia, reduz-se
para 1,0 a 2,0 mg/kg, SC, durante 10 a 15 dias.
» Sugere-se o monitoramento da terapêutica com testes de coagulação
(TP e TTPA).
Fluoracetato de sódio
Seu nome comerciais é Composto 1080 (tem o comércio proibido no Brasil). Os
sintomas já aparecem poucos minutos após a ingestão.
Sinais clínicos:
» êmese;
» inquietação;
» defecação;
» convulsão;
» dificuldade respiratória;
» cianose;
» coma;
» parada cardiorrespiratória;
» morte.
122
Intoxicação E Envenenamento | Unidade iv
Tratamento:
» monoacetato de glicerol na dose preconizada de 0,55 g/kg, IM;
» gluconato de cálcio (50 a 100 mg/kg IV, infusão contínua lenta), a fim
de controlar a hipocalcemia;
» correção hidroeletrolítica;
» suporte ventilatório;
» controle de convulsões.
Estricnina
Os produtos com estricnina são proibidos no Brasil.
Sinais clínicos:
» contrações musculares involuntárias;
» rigidez da musculatura cervical, facial e abdominal;
» convulsão;
» insuficiência respiratória;
» dificuldade respiratória;
» cianose;
» coma;
» morte.
Tratamento:
» Não tem antídoto.
» Oferecer suporte ventilatório.
» Controlar as convulsões.
» Fazer correção hidroeletrolítica.
123
Unidade iv | Intoxicação E Envenenamento
Brometalina
Sinais clínicos:
» edema em várias partes, principalmente no cérebro;
» tremores musculares;
» êmese;
» excitação;
» convulsão;
» midríase;
» anisocoria;
» alterações ventilatórias;
» paralisia;
» coma;
» morte.
Tratamento:
» Não tem antídoto.
» Fazer correção eletrolítica.
» Controle as convulsões.
» Tratar edema cerebral.
» Oferecer suporte ventilatório.
Rodenticida
São comuns intoxicações por esses produtos, mas elas tendem a ser menos
agressivas que os outros produtos citados anteriormente. A maioria dos
problemas está relacionada a reações locais na pele, mucosa oral e olho.
124
Intoxicação E Envenenamento | Unidade iv
Desinfetantes
Os nomes comerciais são:
» Zephiran® (amônia quaternária);
» Lysoform® (formol);
» Pinho Sol® (óleos de pinho).
Sinais clínicos:
» De acordo com a região onde teve contato:
› irritação;
› prurido;
› dor no local.
» Se for inalado:
› irritação das vias aéreas;
› tosse;
› dispneia;
› colapso respiratório (em casos graves).
» Se for ingerido:
› vômito;
› fasciculações musculares;
› incoordenação;
› convulsão;
› coma;
› morte.
125
Unidade iv | Intoxicação E Envenenamento
Tratamento:
» É deito de acordo com os sinais clínicos.
» Lavar bastante o local com água.
» Em caso de ingestão, não é recomendado induzir o vômito.
Alvejantes
Os nomes comerciais são Q boa® e água sanitária (ambos hipoclorito de sódio).
Sinais clínicos:
» irritação;
» prurido cutâneo.
Tratamento:
» É feito de acordo com os sinais clínicos.
» Em caso de ingestão, não é recomendado induzir o vômito.
Detergentes
Os nomes comerciais são:
» Solupan®;
» Ativado®.
Sinais clínicos:
» irritação;
» prurido cutâneo e de mucosas.
» Em caso de ingestão:
› náuseas;
› vômito;
› fraqueza muscular;
126
Intoxicação E Envenenamento | Unidade iv
› diarreia;
› dor abdominal.
Como exemplo de intoxicação: paciente com lesão na pele estava usando óxido
de zinco (usado para lesões externas) por conta própria da tutora e sem colar.
A cadela lambia todas as vezes que a medicação era usada. Após a intoxicação
medicamentosa, a paciente chegou na clínica com hemorragia severa, perdeu
muito sangue.
Figura 65. Óxido de zinco.
Fonte: elaborada pela própria autora.
Figura 66. Paciente vítima de intoxicação medicamentosa.
Fonte: elaborada pela própria autora.
127
Unidade iv | Intoxicação E Envenenamento
Chocolate
As intoxicações por chocolate é outra realidade na clínica médica atualmente; ele
possui muita metilxantina, que é um derivado da xantina, teobromina e cafeína.
Os sinais clínicos acontecem de quatro a seis horas após a ingestão, mas, para
pacientes mais sensíveis, esse tempo pode ser bem menor. Atua nos sistemas
nervoso e cardiovascular, mas os tutores devem ser informados sobre o risco de
pancreatite devido ao excesso de gordura. São os sinais:
» euforia;
» êmese;
» diarreia;
» ataxia;
» tremores;
» hipertermia;
» taquipneia;
» taquicardia (arritmias);
» hipertensão;
» morte.
Tratamento para:
» sinais clínicos manifestados;
» suporte eletrolítico;
» correção das arritmias;
» hipertensão.
128
Intoxicação E Envenenamento | Unidade iv
Quadro 43. Forma da intoxicação e mecanismo de ação para cada causa de contaminação.
Forma de
Produto Mecanismo de ação
intoxicação
» O CO se a hemoglobina (devido sua alta afinidade, até 250
Monóxido de carbono Inalação vezes).
» Impede a ligação do oxigênio, causando hipoxia.
» Depleção das reservas de glutationa (antioxidante).
Ingestão acidental » Susceptibilidade a lesões oxidativas.
Tylenol ®,
Administração do » CAES: Lesões mais em fígado, levando a uma hepatite aguda.
Paracetamol ®,
tutor
» GATO: hemácias são mais acometidas, levando hipóxia (meta-
hemoglobinemia).
» Semelhante a intoxicação por Acetaminofeno.
Administração do » Provoca quadros de hipoxia.
Pyridium@
tutor » Meta-hemoglobinemia.
» Hemólise.
» São anti-inflamatórios não esteroidais e inibem as enzimas
Cataflan®, ciclo-oxigenase 1 e 2 de forma não seletiva.
Administração do
voltarem®, tutor » A inibição da COX 1 diminui a produção de prostaglandina
benéfica, que diminui a produção de muco gástrico, aumento
AAS: Aspirina®, Ingestão acidental
das concentrações de íons de hidrogênio, além de reduzir o
fluxo sanguíneo renal.
Nortriptilina
amitriptilina
fenelzina;
tranilcipromina
fluoxetina
Ingestão acidental
» Inibição da recaptação de serotonina.
» Tetra-hidrocanabinol (THC) atua em vários receptores
maconha Ingestão acidental incluindo os dopaminérgicos, noradrenérgicos, colinérgicos,
serotoninérgicos e GABA.
» Inibição da recaptação das catecolaminas endógenas,
levando a estimulo do SNC.
Cocaína Ingestão acidental
» Estimulo de neurotransmissores dopaminérgicos devido ao
bloqueio na recaptação da dopamina.
» Inibição da enzima acetilcolinesterase (AChE), que tem a
Exposição cutânea função de degradar a acetilcolina (ACh).
Organofosforados Ingestão através de » ACh é um neurotransmissor do SN simpático e
lambidas parassimpático e se liga a receptores colinérgicos
(muscarínicos e nicotínicos).
» O mecanismo de ação ainda não foi totalmente elucidado.
Contato com a pele
» É sabido que ele aumenta a entrada de sódio e potássio para
Organoclorados Ingestão acidental ou dentro das células neurais.
proposital
» Diminui o potencial excitatório.
129
Unidade iv | Intoxicação E Envenenamento
Forma de
Produto Mecanismo de ação
intoxicação
» Semelhante aos organofosforados.
Ingestão proposital
Carbamatos » Ação na AChE é menos intensa e costuma ter uma reversão
Ingestão acidental
rápida quando tratada.
contato com a pele » Ainda não se sabe exatamente o mecanismo de ação, mas
glifosato (Randup®)
ingestão possui uma ação irritativa.
Exposição cutânea » Formação de radicais livres que fazem a degradação da
Paraquat (Gramoxone 200®) Inalação membrana fosfolipídica das células.
ingestão » Essa formação acontece nos pulmões.
» Inibição do sistema de ativação da vitamina K1.
Rodenticida Anticoagulantes Ingestão » Interfere nos fatores de coagulação que depende da vitamina
k1 (II, VII, IX e X).
Ingestão acidental » Inibição do ciclo de Krebs em todas as células.
Ingestão proposital » Ocorre diminuição significativa do metabolismo, com
Rodenticida Fluorascetato de sódio Inalação reduções da respiração celular e níveis de ATPs disponíveis.
Contato com a pele » Hipocalcemia grave devido à ligação do citrato em excesso
lesionada com íons de cálcio,
Ingestão acidental » Atua na membrana pós sináptica das células de Renshaw.
Rodenticida estricnina
Ingestão proposital » Inibe a ação do neurotransmissor inibitório, glicina.
» Interfere na fosforização oxidativa causando.
Ingestão acidental » Inibição da formação de ATP’s.
Rodenticida Brometalina
Ingestão proposital » A diminuição e ATP’s ocasionam a diminuição da atividade da
bomba de sódio e potássio.
Ingestão
Desinfetantes Inalação » Desnaturação das proteínas.
Contato com a pele
Ingestão
Alvejantes Inalação » Desnaturação das proteínas.
Contato com a pele
Ingestão
Detergentes Inalação » Ação corrosiva.
Contato com a pele
» Estimulação do sistema nervoso simpático.
» Aumento da liberação das catecolaminas.
Chocolate Ingestão
» Agem como inibidores de receptores de adenosina
(responsáveis por regular o ritmo cardíaco).
Fonte: Rabelo, 2012.
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