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Modalização em Artigos Científicos

A dissertação discute a modalização em artigos científicos. O autor apresenta a dissertação como requisito parcial para obtenção do título de mestre em linguística pela Universidade Federal da Paraíba, sob a orientação do professor Camilo Rosa Silva. O trabalho analisa o percurso funcional da modalização em artigos científicos.
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Modalização em Artigos Científicos

A dissertação discute a modalização em artigos científicos. O autor apresenta a dissertação como requisito parcial para obtenção do título de mestre em linguística pela Universidade Federal da Paraíba, sob a orientação do professor Camilo Rosa Silva. O trabalho analisa o percurso funcional da modalização em artigos científicos.
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0

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA


CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA

JACKSON CÍCERO FRANÇA BARBOSA

PERCURSO FUNCIONAL DA MODALIZAÇÃO EM


ARTIGOS CIENTÍFICOS

JOÃO PESSOA – PB
2018
1

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA


CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA

JACKSON CÍCERO FRANÇA BARBOSA

PERCURSO FUNCIONAL DA MODALIZAÇÃO EM ARTIGOS


CIENTÍFICOS

Dissertação apresentada ao Programa


de Pós-graduação em Linguística da
UFPB, como requisito parcial para
obtenção do título de mestre em
linguística.

Área de Concentração: TEORIA E ANÁLISE LINGUÍSTICA


Linha de Pesquisa: DIVERSIDADE E MUDANÇA LINGUÍSTICA
Orientador: CAMILO ROSA SILVA

JOÃO PESSOA – PB
2018
2

JACKSON CÍCERO FRANÇA BARBOSA

PERCURSO FUNCIONAL DA MODALIZAÇÃO EM ARTIGOS


CIENTÍFICOS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Linguística da UFPB, como


requisito parcial para obtenção do título de mestre em linguística.

Aprovado em ___/___/____

BANCA EXAMINADORA

______________________________________
Prof. Dr. Camilo Rosa Silva (PROLING/UFPB)
Orientador

______________________________________
Profa. Dra. Iara Ferreira de Melo Martins (UEPB)
Examinadora Externa

______________________________________
Prof. Dr. Pedro de Farias Francelino (PROLING/UFPB)
Examinador Interno

______________________________________
Profa. Dra. Marta Anaíza Bezerra Ramos (UEPB)
Suplente
3

Dedico a Glória e a Irací:

as duas mulheres mais importantes da minha vida!


4

AGRADECIMENTOS

Cada palavra uma folha


no lugar certo.
Uma flor de vez em quando
no ramo aberto.
Um pássaro parecia
pousado e perto.
Mas não: que ia e vinha o verso
pelo universo.

Cecília Meireles. In: Metal Rosicler.

Nas memórias da infância, a poesia de Cecília Meireles marca minha


entronização na vida linguística (literária). A descoberta mágica que se
transfigurava além do que a codificação fonológica das letras me proporcionava:
era meu primeiro exercício de discernimento.
“Ou isto, ou aquilo” representa minha primeira desilusão amorosa: eu não
podia tê-lo comigo da escola. Eu amava tanto aquele livro que o queria tanto... Eu
pedi à Dona Zélia – secretária da minha escola primária – para passar alguns dias
com ele. Antes disso, ensaiei uma cara de necessidade, uma espécie de dengo,
candura... algo que impossibilitasse o recebimento do mais que provável “não”.
Para meu desgosto, ele veio. Ele veio para que eu sentisse mais vontade de ter
comigo aquele livro encantado. Cheio de palavrinhas ordenadas que me faziam
um menino feliz.
Aquele preci(o)so “não” despertou, em mim, uma vontade sustentada na
seguinte questão: será que outros livros me farão feliz? A cada três dias, limite da
minha curatela com os escritos, eu sentia a felicidade gradativa e a vindoura, ao
passo que o próximo (livro) pudesse ser lido. Vanuza Braz, minha primeira
professora, sorria a cada escolha, a cada livro, a cada cuidado... E sentia minha
tristeza no momento da devolução.
Com esse registro mnemônico, eu inicio minhas letras de gratidão.
Agradeço, assim, aos meus primeiros educadores, que me incentivaram - mesmo
com um não (mesclado de doçura instrutiva) – a buscar novos horizontes.

Quem sobe nos ares, não fica no chão,


quem fica no chão, não sobe nos ares.

Cecília Meireles. Ou isto, ou aquilo.

Em toda educação básica o amor pela língua portuguesa só crescia... Sou,


por isso, grato às professoras: Sônia, Celia Mota, Eliete Guerra, Candice
Nogueira. A forma como estas senhoras conduziam as aulas de língua me fez
querer fazer como elas, com maestria, simplicidade e precisão no sentido de
despertar aprendizagem nos alunos.
Na universidade, no curso de Letras, conheci os meus melhores super-
heróis docentes. Agradeço às queridas Sandra Sueli Carvalho Bezerra, Maria
5

Angélica Oliveira, Maria Augusta Reinaldo e Luciene Patriota, que me fizeram


“sair do chão e conquistar os ares”.

Evidentemente sou um sujeito feliz. Hem? Feliz e imóvel.


Se alguém comprimisse ali o botão do comutador, eu veria
no espelho uma cara sossegada, a mesma que vejo todos
os dias, inexpressiva, indiferente, um sorriso idiota
pregado nos beiços.

Graciliano Ramos. Insônia.

Noites mal dormidas sinonimizam-se com as atividades do curso de


Letras. Mas eu nunca estive sozinho. Clima soturno, lamparinas (ou luminárias,
para não ser tão anacrônico) acesas. Canetas. Canetas sim, porque a gente ainda
fazia trabalhos manuscritos. A gente, meus amados irmãos que se transformaram
amigos e que lutam e vibram junto, até hoje, a vitória da gente. A Mateus Oliveira,
Raniere Marques, Jonas Leite, Ana Paula Castro, Amanda Samira e Tássia
Tavares, todo meu carinho e toda minha gratidão.
Escolhi esse excerto do livro de contos “Insônia”, do Graciliano Ramos,
porque acho que ele representa tudo o que há de mais humano nas pessoas: as
amizades (Como a de Luciana e Minsk, por exemplo), as vulnerabilidades
humanas, ciúmes, causos verossímeis do cotidiano... Vejo como a metáfora do
retrato da contemporaneidade. Claro que não sou nenhum especialista, trato
como mera interpretação, mera e vil perspectiva... Ah, Já que falei em Leitura
literária, porque não agradecer às lições ofertadas pelos grandes José Mario e
Antônio Morais?!
Mesmo dada à imobilidade conferida à transmutação do reflexo no espelho
da vida, eu me sinto feliz. Feliz por ter chegado até aqui. “Eu penei, mas aqui
cheguei”, como cantava o Luiz Gonzaga. Sem o incentivo de minha mãe, e sem as
reclamações de saudades dos meus sobrinhos, eu não estaria hoje, defendendo
um título tão sonhado, o de mestre em linguística. Minha família, não tenho
palavras para agradecer!

É preciso estudar volapuque,


é preciso estar sempre bêbado,
é preciso ler Baudelaire,
é preciso colher as flores
de que rezam velhos autores.

Drummond. Poema da necessidade.

As “necessidades” compõem os “sentimentos do mundo”. A antologia mais


linda do poeta (no meu ponto de vista [sorrisos]). Continuar sempre foi
necessário. A pós-graduação surge nesse ínterim. A grande incentivadora foi
minha orientadora-amiga Marli Hermengilda Pereira, que sempre acreditou que
eu seria capaz. Mas no meio do caminho tinha uma... Rosa! Se o Camilo, que
também é Rosa, não tivesse acreditado e confiado em mim, a realização desse
sonho não seria possível. Sou muito grato a estas duas pessoas. Meus anjos
linguísticos (tomara que seja esta não considerada uma metáfora esdrúxula).
6

Agradeço também às professoras Regina Celi e Beliza Áurea e, também, ao


professor Márcio Leitão. Sinto-me lisonjeado por ter aprendido coisas incríveis a
partir de suas contribuições.
Seria justo agradecer a quem sempre está conosco, nos aperreios diários
da pós-graduação. Assim, exponho minha gratidão aos queridos Andréia
Escarião, Fabianne Ramos, Luanna Vaz, Caroline Sandrise, Lívia Teixeira,
Henrique Miguel e Kamila Nogueira.
Aos queridos colegas do Grupo de Investigações Funcionalistas (GIF),
meus queridos Macélio Macedo, Raíssa Gonçalves, professora Maria José,
professora Noelma Santos, professora Marta Anaísa e professora Josefa Jacinto.

Ora (direis) ouvir estrelas! Certo


Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

Olavo Bilac. Via láctea.

Às minhas mais preciosas estrelas, exponho meus próximos


agradecimentos. Aos amigos que a vida me deu: Sandro Marques, Diniz Meira,
Isaac Leite, Diógenes Maciel, Ricardo Soares, Suellen Ribeiro, Guilherme
Queiroz, Bruno Maiorquino, Johnny Martins, Larissa Sousa, Tiago Araújo,
Raimundo Cézar e Francicleide Liberato.

O mundo é grande e cabe


nesta janela sobre o mar.

Drummond. O mundo é grande.

Termino as minhas “gratas memórias” com a recordação mais pura e


avassaladora que os estudos linguísticos me proporcionaram: o dia em que fui
recebido no PEUL/UFRJ pela professora Maria da Conceição Paiva... Eu achava
que ia parar de respirar... meu coração acelerava inúmeras vezes... E eu fui bem
recebido, afagado e incentivado. Obrigado, professora, pelas palavras
direcionadoras mais importantes da minha vida!

Ao colega de grupo de pesquisa ELMEP, Gabriel Limprice, pelas inúmeras


trocas e debates a respeito do corpus desta pesquisa. Ah, falando em corpus, mais
uma vez agradeço à professora Marli Hermenegilda Pereira (UFRRJ), líder do
referido grupo, pela disponibilização dos corpora para constituição dos dados da
minha pesquisa.

Aos professores Iara Martins e Pedro Francelino, pelas importantes


contribuições no exame de qualificação. Também, por se mostrarem disponíveis
à apreciação desta nova versão.

À coordenação, professores e funcionários do PROLING/UFPB.

À CAPES, pela resistência e por ainda estar presente na vida de pós-


graduandos, sobretudo através dos incentivos e de fornecimentos de bolsas.
7

BARBOSA, Jackson C. F. Percurso funcional da modalização em artigos


científicos. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-graduação em Linguística.
João Pessoa: UFPB, 2018.

Essa pesquisa, assim como os postulados do funcionalismo linguístico, verifica a


língua em sua função de serviço à comunicação, observando as motivações que
exercem influências sobre as estruturas linguísticas. Nesse campo de observação,
investigamos o fenômeno da modalização, numa trajetória que parte da
consideração deste fenômeno como uma categoria semântico-pragmática
relacionada à forma de envolvimento do enunciador com o que é dito, ou com os
estados de coisas descritos (LYONS, 1977; NARROG, 2012; PALMER, 1986,
2001), até a concepção, do ponto de vista funcional, de que trata-se de uma
“gramaticalização de atitudes e opiniões dos falantes” (OLIVEIRA, 2003, p. 245).
Investigamos a modalidade na escrita de artigos científicos publicados em anais
de eventos acadêmicos, traçando um percurso dos mecanismos linguísticos que
expressam a modalização no gênero em relevo, objetivando verificar se eles
constituem estratégias discursivas distintas de argumentação, à luz dos
pressupostos funcionalistas. O corpus é constituído com amostras de dez artigos
da áreas de pedagogia e dez de engenharia. Por acreditarmos que este é vinculado
ao discurso acadêmico, nossa pesquisa também investiga mecanismos de
persuasão conferidos pelo recurso das modalidades, partindo da hipótese de que
estas (e os modalizadores que as expressam) têm profícuo uso argumentativo na
construção do gênero artigo científico, contribuindo para o convencimento e
persuasão do leitor do texto quanto às ideias expostas. O marco teórico que nos
impulsionou a realizar reflexões ancora-se nos estudos de Givón (1979, 1983,
1984), Croft (1990, 2001), Hopper e Traugott (1991), Neves (1994, 2004, 2011,
2013), Gonçalves (2007), entre outros. Identificamos que algumas estruturas se
especializam em alguns casos de modalidade a despeito de continuarem
exercendo suas funções primárias. Atestamos, com base no que os dados revelam,
que há regularidade de uso da modalidade epistêmica. Ao propor sua análise, na
parte do desenvolvimento da superestrutura do artigo científico, a intenção do
autor é comprovar a veracidade de sua pesquisa, e assim reveste-se de autoridade.
Para tanto, utiliza da certeza em grande porcentagem, e ao mesmo tempo, em
uma atitude estratégica, deixa transparecer a dúvida, por meio dos advérbios
modalizadores e das modalidades epistêmicas de certeza combinadas às aléticas
de possibilidade, a fim de ganhar a adesão do leitor em relação àquilo que diz.

Palavras-chave: funcionalismo. gramaticalização. modalização. artigo


científico.
8

BARBOSA, Jackson C. F. Modality’s functional route in scientific articles. MSc.


Dissertation. Programa de Pós-graduação em Linguística. João Pessoa: UFPB,
2018.

This research, as well as the postulates of linguistic functionalism, verifies the


language in its function to aid communication, observing the motivations that
exert influence on the linguistic structures. In this field of observation, we
investigate the phenomenon of modalization, in a trajectory that starts from the
consideration of this phenomenon as a semantic-pragmatic category related to
the way the enunciator is involved with what is said, or with the states of things
described (LYONS, 1977; NARROG, 2012; PALMER, 1986, 2001), to the
conception, from the functional point of view, of a "grammaticalization of the
attitudes and opinions of the speakers" (OLIVEIRA, 2003, p. 245). We investigate
the modality in the writing of scientific articles published in annals of academic
events, tracing a course of the linguistic mechanisms that express the
modalization in this specific genre, aiming to verify if they constitute distinct
discursive strategies of argumentation, in light of the functionalist assumptions.
The corpus was constituted with samples of ten articles of the areas of pedagogy
and ten of engineering. As we believe that this is linked to academic discourse,
our research also investigates mechanisms of persuasion conferred by the use of
modalities, starting from the hypothesis that these (and the modalizers that
express them) have valuable argumentative use in the construction of the
scientific article genre, contributing to the convincing and persuasion of the
reader of the text regarding the ideas exposed. The theoretical framework that led
us to make reflections is anchored in the studies of Givón (1979, 1983, 1984),
Croft (1990, 2001), Hopper and Traugott (1991), Neves (1994, 2004, 2011, 2013),
Gonçalves (2007), among others. We have identified that some structures
specialize in some modality cases despite continuing to perform their primary
functions. We attest, based on what the data reveal, that there is regular use of
the epistemic modality. In proposing his analysis, in the part of the development
of the superstructure of the scientific article, the intention of the author is to prove
the veracity of his research, and thus gain authority. To do so, it is used certainty
in a large percentage, and at the same time, in a strategic attitude, it leaves the
doubt, through the modifying adverbs and the epistemic modalities of certainty
combined with the alethic of possibility, in order to gain the adherence of the
reader in relation to what it says.

Keywords: linguistic functionalism. grammaticalization. modality. scientific


articles.
9

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ............................................................................ 12

2. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS FUNCIONALISTAS ......................... 17


2.1. FUNCIONALISMO LINGUÍSTICO ..............................................................17
2.2. MUDANÇA LINGUÍSTICA ......................................................................... 20
2.2.1. Mudança por gramaticalização .................................................................. 25
2.2.2. Iconicidade ................................................................................................ 29
2.2.3. Unidirecionalidade ..................................................................................... 31
2.2.4. Prototipicidade ........................................................................................... 34
2.2.5. Marcação ................................................................................................... 37
2.3. MODALIZAÇÃO NA PERSPECTIVA FUNCIONAL .................................... 38

3. ESTUDOS DE MODALIDADE: REVISÃO DA LITERATURA ....... 42


3.1. MODALIZAÇÃO NOS COMPÊNDIOS GRAMATICAIS ............................. 42
3.1.1. Gramática Houaiss da língua portuguesa .................................................. 42
3.1.2. Gramática pedagógica do português brasileiro ......................................... 43
3.1.3. Gramática de usos do português ............................................................... 44
3.2. MODALIZAÇÃO E OS ESTUDOS SOBRE TEXTO ..................................... 49
3.2.1. Indicadores modais ou índices de modalidade ......................................... 49
3.2.2. Um estudo textual-discursivo do verbo no português do Brasil .............. 50
3.2.3. Modalização nos artigos científicos da área de linguística ....................... 52
3.3. MODALIZAÇÃO PARA O INTERACIONISMO SOCIODISCURSIVO ....... 53
3.3.1. Atividades de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo
sociodiscursivo .................................................................................................... 49
3.4. MODALIZAÇÃO EM TERMOS FUNCIONAIS ........................................... 53
3.4.1. Imprimir marcas do discurso no enunciado. Ou: A modalização na
linguagem ............................................................................................................ 56
3.4.2. Modality ..................................................................................................... 57
3.4.3. Tempo, aspecto e modalidade: estudos de linguística portuguesa ........... 58
3.4.4. Advérbios modalizadores ........................................................................... 59
3.4.5. Construções modais com ter: gramaticalização e variação ....................... 60
3.4.6. Gênero textual na metodologia de pesquisa em gramaticalização ........... 61
10

3.4.7. Argumentação em redações escolares: Análise de elementos modalizadores


e avaliativos na perspectiva sistêmico-funcional................................................. 62
3.4.8. Modalidade epistêmica e evidencialidade: um exercício de análise
funcionalista em textos acadêmicos e em entrevistas com pesquisadores ......... 64
3.4.9. A categoria modalidade e a (in)determinação de fronteiras ..................... 65
3.4.10. A modalidade epistêmica nos discursos políticos.................................... 67

4. CONDUÇÃO DA PESQUISA SOBRE MODALIZAÇÃO .................. 68


4.1. PERCURSO METODOLÓGICO ................................................................... 68
4.1.1. Preparando a análise ...................................................................................71
4.2. RESULTADOS E DISCUSSÕES ................................................................... 74
4.2.1. Aléticos de necessidade ............................................................................. 79
4.2.2. Aléticos de possibilidade ............................................................................80
4.2.3. Aléticos /Epistêmicos ................................................................................. 81
4.2.4. Epistêmicos de certeza .............................................................................. 82
4.2.5. Epistêmicos de probabilidade ................................................................... 84
4.2.6. Epistêmicos/ deôntico ............................................................................... 84
4.2.7. Deônticos – dever/permissibilidade .......................................................... 85
4.2.8. Deônticos/ aléticos ..................................................................................... 86

5. ASPECTOS FUNCIONAIS SUBJACENTES À NOÇÃO DE


MODALIDADE: ANÁLISE .............................................................. 87
5.1. DAS RELAÇÕES ICÔNICAS E PROTOTÍPICAS ......................................... 87
5.2. À GUISA DE PRODUTIVIDADE E MARCAÇÃO ........................................ 93

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................... 109

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................ 111


11

Nunca dês um nome a um rio:


Sempre é outro rio a passar.
Nada jamais continua,
tudo vai recomeçar!

E sem nenhuma lembrança


das outras vezes perdidas,
atiro a rosa do sonho
nas tuas mãos distraídas...
Mário Quintana. Das utopias (fragmento).
12

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Os estudos linguísticos oferecem-nos um aparato teórico-metodológico


que nos permite refletir sobre diversificadas questões que permeiam o universo
da lingua(gem), no âmbito de sua estrutura, uso e de sua relação com a sociedade.
Dentro dessa relação entre língua, sociedade e usos, temos os postulados
alçados pela teoria funcionalista - com as contribuições de Givón (1983), Hopper
(1991; 1996; 1998; 2003), Hopper e Traugott (2005), Traugott (1980), Heine e
Kuteva (2005), entre outros.
Os referidos estudos veem a língua estando sempre a serviço da
comunicação, bem como um fenômeno que se encontra em constante
transformação, não devendo ser considerada um objeto autônomo, mas uma
estrutura submetida às pressões provenientes das situações comunicativas que
exercem grande influência sobre sua estrutura linguística.
Dessa maneira, a corrente linguística em relevo analisa a estrutura
gramatical tendo como referência a situação comunicativa em sua completude: o
propósito do ato de fala/produção de enunciados, seus participantes e seu
contexto discursivo.
Face às concepções descritas, acreditamos que o estudo de uma língua
exige que se leve em conta a variedade das funções linguísticas e dos seus modos
de realização e, uma vez que consideramos o texto escrito como resultado de
realizações factuais, analisamos como se realiza o processo de modalização nas
produções de artigos científicos publicados em anais de congressos. Dessa
prerrogativa, expomos nosso objeto de estudo.
A modalização, ou modalidade1, é tida como uma categoria semântico-
pragmática relacionada à forma de envolvimento do enunciador com o que é dito,
ou com os estados de coisas descritos (LYONS, 1977; NARROG, 2012; PALMER,
1986, 2001) e, também, do ponto de vista funcional, é tida como a
“gramaticalização de atitudes e opiniões dos falantes” (OLIVEIRA, 2003, p. 245).
Nesses termos, este trabalho investiga fenômenos acerca da produção de
modalidade na escrita científica, mais especificamente nos artigos publicados em
anais de eventos acadêmicos da área de pedagogia e engenharia, com o propósito

1Modalização e modalidade são termos tratados, em literatura especifica (Neves, 2013; Oliveira,
2003), como sinônimos. Aqui, também, 0s trataremos na mesma perspectiva.
13

de descrever o comportamento da modalização objetivando identificar recursos


linguístico-discursivos mobilizados pelos usuários da língua em contexto de
produção do gênero artigo acadêmico.
Serão abordadas, em perspectivas teóricas e metodológicas, as
modalidades aléticas, deônticas e epistêmicas, por lidarem, respectivamente, com
critérios semântico-enunciativos que relacionam – à medida que a enunciação
argumentativa é construída – aspectos de possibilidade e/ou necessidade;
relações que envolvem o dever moral e da obrigatoriedade e; por último, as
relações de crença do autor com a verdade do que diz e o que pode ser visto como
certo ou provável, em um determinado campo do saber (contexto).
Nos breves exemplos a seguir, retirados do corpus instituído para essa
pesquisa, ilustrando algumas ocorrências de modalização:

a) Alética

(1) Para esta nova realidade, nem sempre a universidade está preparada,
necessitando um repensar nas ações. Conforme Hengemühle (2007) estas
crises e mudanças exigem uma resposta nova e urgente das Instituições de
Ensino Superior, em especial dos professores formadores de novos
professores.
(PED_03)2

b) Deôntica

(2) Este aspecto independe da velocidade média do vento Vm, pois, no litoral do
Ceará, são registrados valores de Vm superiores àqueles da Inglaterra.
Embora isto seja favorável à produção de energia no litoral cearense, deve-
se notar que a existência de ventos de grande intensidade (rajadas) favorece
o conteúdo energético da distribuição.
(ENG_01)
c) Epistêmica

2Essa codificação representa área e a ordem do artigo em que o exemplo foi retirado. Por exemplo
PED, corresponde à área de Pedagogia e ENG, à Engenharia. Na sequência do código, os números
de 01 a 10, correspondem à numeração de identificação do artigo. Assim, PED_01, significa que
o exemplo foi retirado do primeiro artigo lido do corpus desta área.
14

(3) Para que consigamos realizar essas ideias, criar essa escola é fundamental
o cultivo rigoroso e crítico da leitura, do estudo, do pensamento, da
sensibilidade, da imaginação, da autonomia, da liberdade, do direito.
(PED_02)

A partir de um estudo de cunho funcionalista, verificamos as funções


discursivo-pragmáticas que as modalidades exercem nos artigos científicos das
áreas investigadas e em que medida essas funções se relacionam com o caráter
argumentativo nesse gênero, a partir do que os mecanismos linguísticos
provedores dessas modalidades nos oferecem de elementos funcionais para
nossas análises.
Como o corpus está vinculado ao discurso3 científico, nossa pesquisa
também investiga mecanismos de persuasão conferidos pelo recurso das
modalidades, partindo da hipótese de que estas (e os modalizadores que as
expressam) têm um uso argumentativo na construção do gênero artigo científico,
contribuindo para o convencimento e persuasão do leitor do texto quanto às
ideias expostas.
Acreditamos, também, que cada área de conhecimento apresente
especificidades de usos em relação à mobilização de modalidades, como também
em relação aos mecanismos linguísticos usados na elaboração de suas exposições
argumentativas.
Por conseguinte, se o propósito comunicativo é o fator que molda o gênero
(SWALES, 1990), determinando sua estrutura interna e impondo limites quanto
às possibilidades de ocorrências linguísticas e retóricas, consideramos, pois, que
o artigo científico é o locus capaz de abrigar todas as realizações discursivas
investigadas nesta pesquisa.
Consideramos, também, que determinado gênero textual4 traz consigo
uma infinidade de usos linguísticos passíveis de análise, principalmente porque

3
Nossa concepção de discurso é baseada nos postulados de Du Bois (2003) por acreditarmos
válida a compreensão de que se trata de um evento de construção e troca intersubjetiva de
sentidos, onde ainda se incluem estratégias sociopragmáticas orientadas de sua configuração em
uma situação intercomunicativa.

4 Tratamos os gêneros textuais, ou mesmo gêneros de textos, como “produtos da atividade de


linguagem em funcionamento permanente nas formações sociais: em função de seus objetivos,
interesses e questões específicas [...]” (BRONCKART, 2012, p. 137).
15

não há um critério rigoroso em relação à sua elaboração e não são realizadas, de


forma obrigatória, revisões pautadas no padrão formal da língua.
Ao traçar, nesse contexto, um percurso funcional dos mecanismos
linguísticos que expressam a modalização no gênero artigo científico acadêmico,
de anais de eventos de áreas distintas, objetivamos verificar se eles constituem
diferenciadas estratégias discursivas de argumentação, à luz dos pressupostos
funcionalistas.
Especificamente, buscaremos atestar a recorrência de modalidades em
contextos monitorados de escrita de artigos científicos de anais de eventos;
identificar, no discurso escrito, mecanismos de expressão da modalidade, alética,
deôntica e epistêmica – esta última como fenômeno funcional mais profícuo da
constituição do corpus – aferidos por diversos mecanismos linguísticos, visando
a compreender seus condicionamentos contextuais e seus propósitos
comunicativos; também, analisar o processo de gramaticalização das construções
modais com o verbo poder nas estratégias discursivas utilizadas na composição
escrita do corpus.
Em se tratando de Metodologia, a pesquisa realizada foi operacionalizada,
nos termos de Gil (2008), em relação a seus objetivos, como de natureza
descritiva: uma vez que esta descreve um fenômeno – linguístico – através de
observação sistemática. Ainda, quanto aos procedimentos técnicos, a
caracterizamos como Documental.
Ressaltamos, também, que esta pesquisa é de caráter qualitativo e
quantitativo, e sua realização focaliza os aspectos linguísticos, discursivos e
sociais do gênero artigo acadêmico.
A amostra é composta de vinte (20) artigos acadêmicos, extraídos de anais
de eventos científicos, publicados a partir de 2009, e são representativos das
áreas de Pedagogia e Engenharia5.
Investigamos, a partir dessa premissa, os recursos de modalidade,
verificando as ocorrências mais frequentes no gênero selecionado e suas funções

5O corpus do qual recortamos a amostra foi coletado por pesquisadores e alunos participantes do
antigo grupo de pesquisa ESAELP (Estudos Sociolinguísticos Aplicados ao Ensino de Língua
Portuguesa), da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, onde fizemos parte, à época, na
condição de aluno da graduação. Hoje esse grupo ainda pesquisa os mesmos interesses
linguísticos, mas sob o nome de ELMEP (Estudos Linguísticos, Multiletramentos e Ensino de
Português), do qual participamos na condição de pesquisador.
16

pragmáticas e comunicativas, a partir das categorias de modalidade elaboradas


por Travaglia (1991), Oliveira (2003) e Neves (2013).
A estrutura deste trabalho está organizada em capítulos, incluindo esta
introdução. No primeiro, discorremos sobre os fundamentos que compõem a
teoria funcionalista, partindo do conceito de gramaticalização até chegar ao de
modalidades, de acordo com a perspectiva teórica em tela.
No segundo capítulo, apresentamos algumas pesquisas que se debruçaram
sobre este tema, a fim de promover um diálogo sobre os percursos teórico-
metodológicos elaborados nestas com os da nossa pesquisa.
O terceiro capítulo contempla a metodologia utilizada para esta
investigação, bem como o tratamento dos dados, a análise e a discussão dos
resultados.
Por fim, tecemos as considerações finais, apresentando conclusões acerca
do fenômeno investigado neste trabalho, esperando que este possa contribuir
para uma melhor descrição e compreensão do fenômeno da modalidade.
17

2. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS FUNCIONALISTAS

2.1. FUNCIONALISMO LINGUÍSTICO

As línguas são manifestações humanas que, no decorrer dos tempos,


sofrem modificações, acarretando em seus processos de evolução, diversificados
usos oriundos das relações interpessoais, considerando, também, os potenciais
textos (co)produzidos nesses contextos nos quais a comunicação é o fator
propulsor de sistematização linguística.
A partir das relações interacionais entre usuários-falantes, muitos
pesquisadores (CROFT, 1990, 2001; DU BOIS, 2003; GIVÓN, 1984; HOPPER,
1996, entre outros) se propõem a compreender e descrever o funcionamento da
língua, examinando as produções em contextos reais de uso.
A Linguística Funcional acolhe a possibilidade da não estaticidade da
gramática, descartando concebê-la como acabada, imutável, uma vez que esta se
ajusta continuamente mediante pressões internas e externas ao sistema
linguístico.
As observações de Furtado da Cunha (2012), ao citar Halliday como
defensor de uma teoria não apenas extrínseca, mas também intrínseca das
funções da linguagem, são contribuições relevantes para a abordagem que
propomos nesta pesquisa. Aqui compartilhamos a noção de multiplicidade
funcional a que esses autores aludem, defendendo que ela se reflete na
organização interna da língua, ficando a serviço das variadas necessidades a que
esta serve.
Para Neves (2013, p. 15), o funcionalismo é uma “teoria que se liga, acima
de tudo, aos fins a que servem as unidades linguísticas, o que é o mesmo que dizer
que tal corrente teórica se ocupa, exatamente, das funções dos meios linguísticos
de expressão”.
A autora, como outros estudiosos ligados à área (PAIVA & DUARTE, 2003;
GONÇALVES & CARVALHO, 2007; MARTELOTTA, 2011; entre outros), mesmo
preterindo as abordagens formalistas, não abandonam a noção de “unidades
estruturais da língua”, considerando que estas podem sofrer alterações
determinadas por vários fatores que não se ambientam no aspecto de imanência,
sofrendo pressões exteriores em suas análises.
18

Diante disso, tratamos, nesta pesquisa, de uma corrente linguística que se


debruça sobre a formação e transformação de estruturas gramaticais a partir de
contextos comunicacionais. A linguagem, nesse propósito, é tida como objeto de
interação, ou seja, o aspecto social está incutido nas reflexões que priorizam a
relação entre língua e sociedade. (FURTADO DA CUNHA, 2012)
Primeiras ventilações às reflexões de cunho funcionalista são provenientes
do Círculo Linguístico de Praga, em 1929. Segundo Kenedy e Martelotta (2015),
Franz Boas não influenciou apenas o descritivismo, principal vertente linguística
dos EUA, mas também a tradição etnolinguística de Sapir e Worf, assim como os
trabalhos de Bolinger, Kuno, Del Himes, Labov e muitos outros etno-
sociolinguistas. Neves (2004) defende que a aproximação do funcionalismo à
escola de Praga deve-se por esta preocupar-se com a função como centro
condutor de reflexão, não a entendendo, apenas, como entidade sintática, mas a
partir de sua união com os elementos estrutural (sistêmico) e funcional.
Ainda, tal ligação pode ser considerada pela crença de dinamismo da
linguagem, “pela qual as relações entre estrutura e função são vistas como
instáveis, dada a força dinâmica que está por detrás do constante
desenvolvimento da linguagem” (GEBRUERS, 1987, p. 129).
Dessa forma, as investigações de base funcionalista verificam as relações
entre discurso e gramática. De acordo com Neves (2013), o discurso conforma a
gramática, mas principalmente, ele não é encontrável despido da gramática,
constituindo um esquema que também envolve a pragmática:

[...] a pragmática deixa de entrar como simples perspectiva para


integrar uma gramática regulada por funções da linguagem,
entendido que os componentes fundamentais do significado são
os componentes funcionais. Ficam abrigadas na teoria as
relações naturais entre discurso e gramática, tudo a partir da
noção de que a produção do enunciado resulta da complicada
troca que é a interação linguística. (NEVES, 2013 p. 20).

Ao elencar pressupostos de investigação funcionalista, Neves (2013) fala


sobre as relações entre discurso e gramática chamando a atenção para a
intrínseca relação entre ambos, pois para ela o discurso conforma à gramática e
o primeiro não se estabelece sem o uso da segunda. Destacam-se aqui, em
consonância com a autora, os fluxos de informação e de atenção, primeiramente,
19

porque o discurso sempre aborda uma informação que flui guiada pelo falante e
que por meio da atenção comporta a informação a ser apresentada. Assim, esses
conceitos defendidos reafirmam o discurso efetivado na interação social,
indicando que no cerne dessas relações está o desenvolvimento da linguagem.
A perspectiva funcional, aqui adotada, ainda crê que questões ligadas à
significação não se restringem à decodificação de símbolos e dados de um mundo
real independente, mas, de acordo com Martelotta e Kenedy (2015), no fato de
que as palavras e as frases assumem seus significados no contexto, o que implica
a noção de que os conceitos decorrem de padrões criados culturalmente.
Conhecemos, pois, tal prerrogativa como Linguística Cognitiva, a qual, nos
termos de Furtado da Cunha, Bispo e Silva (2013, p. 14), é uma área que

Vê o comportamento linguístico como reflexo das capacidades


cognitivas que dizem respeito aos princípios de categorização, à
organização conceptual, aos aspectos ligados ao processamento
linguístico e, sobretudo, à experiência humana no contexto de
suas atividades individuais, sociointeracionais e culturais.

Com base no exposto, os autores defendem que itens/construções são


concebidos como esquemas cognitivos que o usuário adquire à medida que
aprende a usar a língua.
Dessa maneira, o Funcionalismo é uma teoria ligada, acima de tudo, aos
fins que servem às unidades linguísticas, ou seja, a função desempenhada pela
língua em meio aos falantes e como estes intervêm de forma ativa a construir
expressões que renovam a língua e seu uso, atendendo aos seus propósitos
comunicacionais. (NEVES, 2013; MARTELOTTA, 2011; FURTADO DA CUNHA,
2011, entre outros)
Apontamos, nas seções a seguir, as concepções de língua e de gramática,
subjacentes ao que propomos como pressupostos dentro da teoria que
fundamenta nossa pesquisa.

2.2. MUDANÇA LINGUÍSTICA

Martelotta (2011) analisa a natureza dinâmica das línguas, a partir de


reflexões que veem seu funcionamento, em eventos de interação nos quais a
20

comunicação é um fator responsável pela dinâmica inerente à mutabilidade dos


sistemas linguísticos.
O sistema linguístico, sob uma perspectiva holística, está atrelado à ideia
de gramática como elemento procedural: delimita normas, organiza um padrão,
se reveste como tradição. Geralmente se acrescentam, ainda, à acepção de língua-
gramática, outras características originadas de uma influência estrutural: de
homogeneidade, arbitrariedade, autonomia, estaticidade e regularidade, dentre
outras.
Abordagens mais atuais sustentam fatores atrelados à dinamicidade das
línguas, como dito anteriormente, reconhecendo que os sistemas correntemente
mudam, a partir de elementos externos ligados intimamente a razões cognitivas;
nessa concepção, estruturas assumem novos papéis na empreitada sintático-
organizacional da língua, e até mesmo se recriam e se especializam, reanalisam...
Tudo isso a partir de escolhas linguísticas nos usos interativos dentro de um
determinado tempo.
A mudança linguística, e o que dela se entende, não se revela dentro de um
construto recente. Desde as primeiras reflexões sobre sistema e estrutura das
línguas, esse processo se apresenta em diversificadas abordagens. Saussure já
previa que esse aspecto deveria ser considerando:

A primeira coisa que surpreende quando se estudam os fatos da


língua é que, para o indivíduo falante, a sucessão deles no tempo
não existe: ele se acha diante de um estado. Também o linguista
que queira compreender esse estado deve fazer tabula rasa de
tudo quanto produziu e ignorar a diacronia. [...] A intervenção da
História apenas lhe falsearia o julgamento. (SAUSSURE, 2012 ,
p. 123)

A diferença, em se tratando de análise (nesse excerto), é que diacronia e


sincronia, necessariamente, não seriam elementos intercambiáveis, mas, por
critérios de imanência, suficientemente completos para atender demandas de
investigação metodológica. A análise pancrônica é timidamente válida. Todavia,
possibilitados pela leitura do “Curso”, percebemos que a mudança linguística é
contemplada “conforme o arbítrio dos interessados”. (SAUSSURE, 2012, p. 118)
Para Lucchesi (2004, p. 54), em se tratando de mudança, é importante
verificar o conceito de estaticidade dentro das reflexões estruturalistas, uma vez
que
21

o estabelecimento da noção de estado da língua – ou projeção


sincrônica – constitui uma operação crucial na construção de
língua como um sistema homogêneo e unitário, porque toda a
dinamicidade inerente à relação entre língua e sociedade se
efetiva através do tempo, na dimensão sócio-histórica do
fenômeno linguístico, através do binômio variação e mudança.

Nesse viés, a variação constitui a atualização a cada momento dos


processos de mudanças possíveis na língua, enquanto a mudança constitui uma
resultante dos processos de variação linguística. (LUCCHESI, 2004)
Nessa linha de raciocínio, se sustentam os postulados da Sociolinguística
Variacional: um avanço nos estudos de língua, mas que contempla, geralmente,
pluralidade de estruturas linguísticas que competem dentro de um mesmo
sistema linguístico, como é colocado por Weinreich, Labov e Herzog (2006, p.
18), a respeito do processo em relevo ser abordado na mencionada corrente
linguística:
usando o Idioleto como objeto, a mudança linguística será
entendida como mudança no interior do idioleto, seja por
processos espontâneos (de dentro pra fora), seja por adoção
seletiva pelo indivíduo de traços de idioletos de seus
interlocutores.

No exposto, os autores levantam um termo caro à Sociolinguística


(idioleto) e o colocam como objeto de investigação linguística, definindo a língua
como objeto inerentemente psicológico.
Em relação ao desenvolvimento “histórico” de uma língua, as abordagens
pós-estruturalistas rompem com a ideia de sua representação a partir de uma
sucessão de sistemas discretos, unitários, homogêneos e autônomos. Desse
modo, passam a considerar um contínuo processo de variação e mudança dentro
do sistema, agora encarado como heterogêneo, julgando contexto sócio-histórico
e cultural da comunidade de fala como elemento importante. Segundo Lucchesi
(2004, p.181):

supera-se, assim, a dicotomia sincronia e diacronia, no sentido


que esta havia adquirido no estruturalismo, pois a análise
sincrônica da língua, fora do devir histórico, não encontra mais
fundamentação empírica. Em todo momento em que se
considere a língua no presente, o sistema linguístico deve ser
concebido como um sistema de regras e unidades variáveis, como
a atualização do contínuo processo de variação e mudança que se
opera ao nível da estrutura linguística.
22

Nessa perspectiva, existe a defesa de que as línguas naturais apresentam


um dinamismo inerente, o que vale dizer que elas são heterogêneas por natureza.
Não é raro encontrar mais de uma forma equivalendo a um mesmo significado,
em termos funcionais, em competição, ao nível do vocabulário, da morfossintaxe
e/ou da fonético-fonologia de uma língua. (MOLLICA; BRAGA, 2008)
Nesse diapasão, a mudança está atrelada à noção de variação e, embora
esta última seja reconhecida pelos pesquisadores da linguagem há alguns séculos,
somente a partir da década de 70 é que ela começa a ser estudada de forma
sistemática pela Sociolinguística Variacionista a partir dos trabalhos de William
Labov (1975). Nos termos de Mollica e Braga (2008, p. 9-10):

A Sociolinguística considera em especial como objeto de estudo


exatamente a variação, entendendo-a como um princípio geral e
universal das línguas, passível de ser descrita e analisada
cientificamente. Ela parte do pressuposto de que as alternâncias
de uso são influenciadas por fatores estruturais e sociais. Tais
fatores são também referidos como variáveis independentes, no
sentido que os usos de estruturas linguísticas são motivados e as
alternâncias configuram-se por isso sistematicamente e
estatisticamente.

Em outras palavras, o pressuposto básico do estudo da variação e uso da


língua é o de que a heterogeneidade linguística, tal como a homogeneidade, não
é aleatória, mas regulada, isto é, governada por um conjunto de regras. Regras
que se enquadram, ainda, numa perspectiva sistemática, estrutural, destacando-
se pela inserção de outros aspectos, no interior dos sistemas linguísticos, que
refutam a precisão unívoca da homogeneidade.
Ao enfatizar a heterogeneidade das línguas, o modelo variacionista rompe
com pressupostos clássicos da Linguística, instaurados a partir de Saussure, tais
como o de identificação entre sistema e homogeneidade e estrutura e estudo
sincrônico.
Os parâmetros contextualizadores da variação e/ou mudança constituem
um complexo estrutural de origens e níveis diversos. Há variáveis internas e
externas à língua. No primeiro tipo, podemos arrolar os fatores
fonomorfossintáticos, os discursivos e os lexicais. Esses condicionamentos levam
em conta o nível do significado e do significante, bem como os diversos
subsistemas da língua.
23

Quanto à noção de mudança, também são considerados aspectos ligados à


fluidez de categorias gramaticais, considerando os critérios semânticos e
pragmáticos nas reflexões sintáticas. O discurso é um dos pontos importantes
nesse contexto, fazendo com que a noção de mudança ganhe um status funcional.
Os aspectos sincrônicos e diacrônicos, como mencionados acima, são
critérios que propiciam o evento que trataremos na seção subsequente, chamado
de gramaticalização, nos termos de Hopper e Traugott (2005). Na análise
sincrônica, o processo em relevo se legitima quando se verifica a trajetória por
meio da qual um item lexical, em determinados contextos, torna-se gramatical,
observando as origens das formas gramaticais e cline das mudanças que as
afetam.
Em relação à analise diacrônica, o fenômeno sintático é colocado em
destaque, a partir de um molde discursivo-pragmático, visto que envolve padrões
fluidos de uso linguístico. Nessa perspectiva, Barros (2012) aponta para as
evidências acumuladas em diferentes estudos (como em KUTEVA, 2001) que
ressaltam a importância de uma visão pancrônica, para que seja viabilizada uma
maior generalização acerca das mudanças por gramaticalização.
A acepção de pancronia a que recorrem muitos estudiosos (COSERIU,
1967; LABOV, 1995; FURTADO DA CUNHA et al., 1999; FERREIRA et al., 2000;
entre outros), como prevista por Saussure (2012, p. 111), diz respeito à
consideração de aspectos contínuos na análise gramatical, em que as ocorrências
diacrônicas correspondem a um conjunto de sincronias que não são olhadas
discretamente, tanto como isoladas, estanques.
Vicente (2009, p. 25) ressalta que, nessa perspectiva, “há possibilidade de
utilizar o recurso de estudar obras sincrônicas e inferir, no conjunto, uma
regularidade pancrônica. É o que normalmente se faz com obras lexicográficas
representativas de variadas sincronias”.
Para Martelotta (2014, p. 36) acreditar nesta noção é “possível já que
aceitamos o fato de que se produzem transformações fonéticas regulares, por
exemplo, podemos admitir que esse fenômeno se apresenta como um aspecto
constante da linguagem, ou seja, uma de suas leis”.
Na perspectiva da corrente denominada Linguística Funcional Baseada no
Uso, o aspecto correspondente à concepção de mudança linguística se instaura a
partir do reconhecimento do dinamismo conferido ao sistema linguístico,
24

deixando de lado acepções que se restringem às noções de autonomia,


heterogeneidade e imutabilidade, para conferir status às que caracterizam as
línguas como dinâmicas, icônicas, motivadas e em constante transformação.
É importante, nessa abordagem, focalizarmos o componente criativo da
linguagem humana, indicando o papel primordial, no desenvolvimento e no uso
da linguagem, desempenhados por determinados processos mentais que são
inerentes à nossa espécie (MARTELOTTA, 2014). Constatamos essa relação
quando o autor levanta um diálogo entre sociolinguística e mudança,
apresentando conceitos pertinentes ao campo, situando a questão da variação e
sua familiaridade com o fenômeno da mudança e assemelhação com a
gramaticalização.
Quando fala em Linguística Centrada no Uso e mudança, Martelotta
(2014) lança conceitos sobre como esta área se revela, enfatizando o fator
interativo-conversacional, a habilidade linguística dos indivíduos e os momentos
de uso/interação.
O papel da cognição é também colocado, refletindo uma “preocupação com
os processos de gramaticalização e com a relação entre esse fenômeno e o
desenvolvimento das construções gramaticais, que refletem as regularidades de
uma língua” (MARTELOTTA, 2014, p. 73). Disso, surgem questões como a noção
de regularidade da mudança, a teoria da inferência sugerida na mudança
linguística e algumas considerações sobre a noção de construção gramatical.
Martelotta (2011, p. 32) assegura que a mudança é “um fator inerente às
línguas naturais que se desenvolvem para veicular a comunicação entre os seres
humanos”. Com base nesses pontos, suas reflexões tornam evidentes processos
naturais relacionados ao dinamismo dos sistemas linguísticos, considerando a
perspectiva acerca das trilhas teórico-metodológicas relativas ao processo de
mudança por gramaticalização, como trataremos a seguir.

2.2.1. Mudança por gramaticalização

Como é sabido, as primeiras ventilações que originaram a incorporação do


termo gramaticalização, são atribuídas a Meillet, por volta de 1912, quando este
assegurava que havia um “processo gradual de transição entre as classes de
25

palavras”, apontando a “atribuição de um caráter gramatical a um termo outrora


autônomo” (PEREIRA, 2005, p. 29).
Pereira (2005) afirma que a noção mais difundida de gramaticalização é a
que prevê o desenvolvimento de formas gramaticais a partir de itens lexicais
plenos. Diacronicamente, as categorias secundárias (preposição, conjunção,
pronome etc.) originaram-se de categorias primárias como substantivos e verbos.
Uma extensão dessa definição admite a possibilidade de que formas menos
gramaticais evoluam para formas mais gramaticais.
Para Neves (2004, p. 17), “o estudo do processo de gramaticalização
encontra abrigo privilegiado no funcionalismo por refletir influência do sistema
gramatical do funcionamento discursivo”. A autora estende sua reflexão ao que
postula Du Bois (1985), sobre a gramaticalização ser um fator de equilíbrio entre
forças em competição, equilíbrio, afinal, que permite a própria existência da
gramática.
Martelotta (2011), no estudo em destaque, quando trata sobre
gramaticalização e lexicalização, revela que esses fenômenos são específicos da
mudança. O autor enfatiza-os como processos graduais distintos, mas que
apresentam características semelhantes no que diz respeito à direção natural da
mudança que veiculam. Para o primeiro, a definição é sustentada como um
“processo de mudança linguística unidirecional”, no qual itens lexicais e
construções sintáticas, a depender do contexto, passam a assumir funções
gramaticais e quando estão gramaticalizados, continuam a desenvolver novas
funções gramaticais. São colocados alguns exemplos para categorizar o processo
de gramaticalização através de tópicos como (i) passagem de vocábulo para afixo;
(ii) passagem de verbo pleno para auxiliar; (iii) passagem de advérbio para
conjunção; (iv) passagem de advérbios de modo para modalizador; (v) passagem
de advérbios de modo para marcador discursivo; (vi) fenômenos de mudança
consequentes de gramaticalização.
Já a lexicalização realiza-se como um processo contrário do que é
verificado na gramaticalização (o item lexical > gramatical), sendo defendida
como processo criador de novos itens lexicais, de forma referencial, menos
produtivo.
A noção de gramaticalização está atrelada à de constante transformação do
sistema linguístico a partir da dinamicidade da gramática e de sua emergência.
26

Nesse sentido, Barros (2012, p. 20) defende que, numa perspectiva funcionalista,
o interesse pela mudança decorre do próprio pressuposto de que “as línguas
naturais são sistemas flexíveis, heterogêneos, constantemente moldados pelas
exigências comunicativas dos usuários e pela forma de organização do discurso”.
Atribuímos aos estudos de gramaticalização o surgimento da noção de
gramática emergente, atestada por Hopper (1998), que indica a necessidade de
volver-se para as questões relacionadas ao discurso, pois a partir deste as análises
gramaticais são moldadas levando em consideração os componentes funcionais
oriundos de usos em momentos de interação.

A noção de Gramática Emergente significa que a estrutura, ou


regularidade, vem do discurso e é moldada por ele em um
processo contínuo. Nesse sentido, gramática é simplesmente o
nome de certas repetições de categorias observadas no discurso.
A gramática não é um pré-requisito para o discurso. Suas formas
não são fixas e emergem da interação face-a-face, no sentido de
que refletem a experiência individual passada que os falantes têm
dessas formas, e sua avaliação no contexto atual, incluindo
especialmente seus interlocutores, cujas experiências e
avaliações podem ser bem diferentes. (HOPPER, 1998, p. 156)6

Associada a tal perspectiva, a mudança por gramaticalização, além de ser


motivada por aspectos envolvidos na comunicação, portanto funcionais, se dá
pela observância do surgimento de novas funções para formas que já existem, ou
formas existentes perdem sua unicidade categorial e passam a assumir categorias
mais fluidas, ou ainda, formas passam a fixar-se em lugares – na ordenação
sintagmática –, que outrora não condiziam com sua característica de constante
deslocamento. São estes, apenas, alguns exemplos de como esse fenômeno se
manifesta em um sistema linguístico.
Assim, Hopper e Traugott (2005, p. 15) conceituam gramaticalização como
um “processo pelo qual itens lexicais e construções gramaticais passam, em

6 “The notion of Emergent Grammar is meant to suggest that structure, or regularity, comes out
of discourse and is shaped by discourse in an ongoing process. Grammar is, in this view, simply
the name for certain categories of observed repetitions in discourse. It is hence not to be
understood as a prerequisite for discourse, a prior possession attributable in identical form to
both speaker and hearer. Its forms are not fixed templates but emerge out of face-to-face
interaction in ways that reflect the individual speakers’ past experience of these forms, and their
assessment of the present context, including especially their interlocutors, whose experiences and
assessments may be quite different.” (HOPPER, 1998, p. 156).
27

determinados contextos linguísticos, a servir a funções gramaticais, e, uma vez


gramaticalizados, continuam a desenvolver novas funções gramaticais”.
Em outras palavras, o exposto subjaz ao entendimento deste processo ser
atrelado a uma concepção de língua como atividade no tempo real e a postulação
de que, a rigor, não há gramática como produto acabado, mas sim em constante
gramaticalização (GONÇALVES, et. al. 2007)
A noção de língua emergente é herdada dos postulados de Hopper (1991).
O autor sugere que novas formas para novas funções estão sempre emergindo.
Nesse caso, defende que os processos que levam à gramaticalização não são
distintos dos que possibilitam uma mudança semântica. Sendo assim, apresenta
ferramentas que auxiliam na aferição dos graus de gramaticalização e fixa estas
como importantes critérios e pontos de partida para análises de itens lexicais.
Hopper (1991) propõe cinco princípios que relacionam aspectos
sincrônicos e diacrônicos a processos pragmático-discursivos relativos à
competência comunicativa, que regem a gramaticalização em sua forma inicial:
 Estratificação (layering): Em um domínio funcional amplo, novas
“camadas” estão sempre emergindo e coexistindo com as antigas. Essa
diversidade decorreria do fato de que, ao surgirem as novas formas
funcionais, a substituição das equivalentes preexistentes não é imediata ou
pode até mesmo não vir a acontecer, trazendo, como consequência, a
interação e a coexistência de “camadas” novas e antigas em um mesmo
domínio.
 Divergência: Se superpõe ao princípio anterior e dita que a unidade lexical
que dá origem ao processo de gramaticalização pode manter suas
propriedades originais, preservando-se como item autônomo e, assim,
estar sujeita a quaisquer mudanças inerentes a sua classe, inclusive sofrer
um novo processo de gramaticalização.
 Especialização: Tem relação com o estreitamento da escolha de formas
pertencentes a um mesmo domínio, ou seja, relaciona-se com o
estreitamento de opções para se codificar uma determinada função, à
medida que uma dessas opções começa a ocupar mais espaço porque mais
gramaticalizada. Uma consequência, indício, portanto, dessa
especialização, é o aumento na frequência de uso da forma mais adiantada
no processo de gramaticalização.
28

 Persistência: O princípio da persistência é o que prevê a manutenção de


alguns traços semânticos da forma fonte na forma gramaticalizada, o que
pode ocasionar restrições sintáticas sobre o uso da forma gramaticalizada.
 Descategorização: Remete à perda, por parte da forma em processo de
gramaticalização, dos marcadores opcionais de categorialidade e de
autonomia discursiva.
Quando Hopper (1991) constitui uma espécie de “passos empíricos” que
possibilitam a identificação de nuances de gramaticalização, é instaurado um guia
para aferição dos processos que envolvem o fenômeno em discussão. O autor
ressalta que os processos de mudança principiados por seus estudos não se
restringem meramente a mudanças gramaticais, mas condizem ao seu empenho,
na tentativa de mostrar que os limites entre fenômenos lexicais e gramaticais são
muito difusos.
Gonçalves e Carvalho (2007, p. 79) relatam que os princípios propostos
por Hopper
acentuam o caráter gradual da gramaticalização, uma vez que
conferem aos elementos analisados o grau de “mais” ou “menos”
gramaticalizados, não visando, portanto, verificar se eles
pertencem ou não à gramática. Em outras palavras, esses
princípios não discriminam entre os processos de mudança que
resultam em gramaticalização e os que não resultam.

Esses princípios que até aqui foram elencados, geralmente, estão


associados a outros processos inerentes à mudança por gramaticalização, não
acontecendo de forma abrupta, mas considerando o que se modifica em cada
sincronia, em casa uso, em cada frequência, respeitando, ainda, a produtividade
aferida por ocasião da modalidade ou gênero em que a forma faz-se presente e
descrita.
Ainda nas abordagens de Gonçalves (2002), os fatores que motivam a
gramaticalização são, principalmente, de ordem cognitiva – aqueles que levam
em consideração os aspectos contextuais, inclusive. Estes estão fortemente
vinculados a estratégias de comunicação, nos processos de interação, em que as
formas linguísticas são instauradas e submetidas à análise do uso e frequência,
entre as quais a conjugação do desejo de ser expressivo com o "princípio da
criatividade".
Nesses termos, os falantes buscam ideais em comum que os façam ser
compreendidos, de maneira que tenham fluência e domínio da linguagem
29

utilizada em eventos de comunicação. Estes eventos criam novos instrumentos


de comunicação, inovação que, baseada no "princípio da economia", recruta
formas antigas para novos propósitos, através da extensão de significados pré-
existentes, uma vez que uma forma para cada significado seria disfuncional no
sistema. Os principais desencadeadores da relação entre os múltiplos sentidos de
uma única forma são os mecanismos cognitivos da metáfora e da metonímia, com
o predomínio da primeira. (GONÇALVES, 2002, p. 31).
Mobilizando tais princípios e fenômenos, trataremos, na sequência, sobre
a questão da iconicidade, para demarcar as motivações responsáveis pelo
desenvolvimento de mudança e transformação dos itens gramaticais.

2.2.2. Iconicidade

De acordo com o que Givón (1984) defende, a iconicidade é uma correlação


linguística que considera como fator principal o pareamento entre forma e
função, como também entre o código linguístico e seu designatum.
Os linguistas funcionalistas defendem a ideia de que a estrutura da língua
reflete, de algum modo, a estrutura da experiência, ou seja, admitem a relação
entre cognição e gramática. Segundo Furtado da Cunha (2013, p. 167), “como a
linguagem é uma faculdade humana, a suposição geral é a de que a estrutura
linguística revela o funcionamento da mente, bem como as propriedades da
conceitualização humana do mundo”.
Há a compreensão de que na língua existem formas correlatas que se
aproximam dos sentidos que elas designam, fazendo com que traços entre forma
e função sejam perceptíveis. Estudiosos acreditam ainda que essa correlação,
muitas vezes, não é tão visível, fazendo com que a relação entre forma e conteúdo
(função) seja, aparentemente, arbitrária (FURTADO DA CUNHA, 2013;
FURTADO DA CUNHA, BISPO e SILVA, 2013, p. 22) já que “o significado
original do elemento linguístico se perdeu total ou parcialmente, assim como a
motivação para sua criação”.
Segundo Givon (1984), este fenômeno se realiza a partir de três
subprincípios: i) quantidade; ii) proximidade e; iii) ordenação linear.
30

i) O subprincípio da quantidade defende que quanto maior a


quantidade de informação, maior a quantidade de forma, de tal
modo que a estrutura de uma construção gramatical indica a
estrutura do conceito que ela expressa. Em outros termos, quanto
mais imprevisibilidade da informação e importância na
continuidade temática: maior forma. (VOTRE, 1999). Para Furtado
da Cunha (2013, p. 168), a atuação desse subprincípio pode ser vista
no comprimento maior das palavras derivadas (que tendem a
veicular mais informações semânticas e/ou gramaticais) em
comparação com as palavras primitivas de que se originam,
refletindo na forma a ampliação do seu campo conceitual:
Ex.: Grande > grandeza > engrandecer > engrandecimento

ii) O subprincípio da proximidade ressalta que os conceitos mais


integrados no plano cognitivo, também se apresentam com graus
elevados de aderência morfossintática, ou seja, diz respeito à
contiguidade estrutural, entre morfemas, constituintes
sintagmáticos e, ainda, entre enunciados em um texto (FURTADO
DA CUNHA, BISPO e SILVA, 2013). Para Bybee (1994, p. 11),
“elementos que estão semanticamente juntos tendem a vir próximo
um dos outros na cláusula”.

iii) O subprincípio da ordenação linear se caracteriza por dois aspectos


básicos: a) a informação mais tópica tende a vir em primeiro ligar;
b) a ordem das orações no discurso segue a sequência temporal em
que os eventos são conceitualizados. (FURTADO DA CUNHA,
BISPO e SILVA, 2013)

Estes subprincípios auxiliam na compreensão do fator geral que implica o


estabelecimento da iconicidade como fenômeno, uma vez que estão
emparelhadas, em termos comunicativos, a importância da informação e a
quantidade de forma utilizada para expressá-la. (Cf. Martelotta, 2010)
Ao considerarmos que os fenômenos se processam em continuum, é
importante refletirmos sobre unidirecionalidade como um dos mecanismos
31

possibilitadores para a gramaticalização. A função da próxima seção é justamente


abordar esse quesito.

2.2.3. Unidirecionalidade

Martelotta (2010, p. 140), ao conceituar a teoria da gramaticalização,


defende que esta não seja uma teoria da linguagem nem da mudança, mas “uma
teoria do desenvolvimento das formas gramaticais”, tendo seu estudo centrado
na descrição do modo como os elementos gramaticais surgem através dos
tempos.
Essa noção de mudança através dos tempos é associada ao princípio da
Unidirecionalidade. Trata-se de um processo contínuo, no qual a mudança se dá
através da passagem de uma categoria +autônoma >+dependente.

Entendendo princípio como um preceito, uma lei geral,


determinante da constituição/identificação de um fenômeno,
parece que ao processo de gramaticalização só poderia ser
atribuído um único e fundamental princípio: o princípio da
unidirecionalidade, verificável, como hipótese, por meio da
atuação dos vários mecanismos, partes constitutivas do
fenômeno da gramaticalização, que, num sentido "lato", podem
também ser entendidos como suas causas ou motivações. Em
outras palavras, os mecanismos considerados atuantes num
processo de gramaticalização (bleaching, reanálise, analogia,
"erosão" fonética, gradualidade do processo, aumento de
frequência de uso etc), se concluído ou em curso, são regidos pelo
princípio da unidirecionalidade, este único e essencial, aqueles
variáveis em número e espécie e, portanto, não necessários e nem
suficientes para caracterizar um processo de gramaticalização
como tal. Assim, necessária se faz a apresentação conjunta dos
mecanismos e do princípio que regem a gramaticalização.
(GONÇALVES, 2007, p. 37)

Barros (2012) delega à gramaticalização um processual percurso pelo qual


expressões de significado concreto (formas-fontes) são usadas em contextos
específicos para a expressão de significados gramaticais (formas-alvos). Daí
decorre uma das principais premissas associadas aos processos de
gramaticalização: a unidirecionalidade da trajetória: léxico > gramática, ou seja,
do [+ concreto > + abstrato] (cf. HOPPER & TRAUGOTT, 2003), entendida como
um processo irreversível, que só pode desenvolver-se da esquerda para a direita.
32

Assume-se, basicamente, que a um estágio A deve seguir-se um estágio B, e não


o contrário.
Já Gonçalves (2003, p. 32), para reforçar a compreensão de tal princípio,
o relaciona a um bisturi – metaforicamente – “que recorta um tipo específico de
mudança, a que promove o rebaixamento de categoria de um elemento, rumo a
uma estrutura mais gramatical, e nunca o contrário”.
O autor ainda enfatiza que existem pesadas críticas formuladas ao
processo de gramaticalização a respeito da noção de unidirecionalidade.
Podemos adiantar que uma delas deve-se ao fato de que alguns estudiosos
defendam um “caminho inverso” para o processo de mudança. (GONÇALVES,
2003, p. 31)
A unidirecionalidade, como princípio, implica estágios de mudança já
citados, compreendidos como fases que caracterizam a mudança do [lexical] >
[gramatical] ou do [-gramatical] >[+gramatical].
Em seu estudo, Gonçalves (2003, p. 42) apresenta um quadro esquemático
de como se resume o processo de gramaticalização, com ênfase nos seus
mecanismos atuantes, com foco na unidirecionalidade.

Quadro 01: Unidirecionalidade vs. mecanismos de gramaticalização.


Nível Mudança unidirecional Processo
Fonologia mais material fonológico > menos material redução fonológica
fonológico
Morfologia lexical > gramatical> mais gramatical Recategorização
(forma livre > forma presa) (morfologização)
Sintaxe menor coesão > maior coesão Reanálise
(alteração da
fronteira de
constituintes)
Semântica concreto > abstrato Dessemantização
Pragmática estruturas pragmáticas> estruturas sintáticas Sintaticização
Fonte: Gonçalves (2003, p. 42).

Pereira (2005, p. 32) defende que esse movimento de um item lexical em


direção a uma função gramatical, como insistimos em assegurar, “ocorre de
forma gradual e contínua e tem recebido, na literatura especializada, vários
rótulos ("cline", "continuum," "pathway," "channel”, "chain”)”, o que, de acordo
com o que sugerem Hopper e Traugott (1993; 2003), constituem-se como
metáforas para rotular fenômenos gramaticais, e não supostos elementos
neurológicos ou outros elementos de capacidade da língua.
33

Gonçalves (2002) destaca que Hopper e Traugott, na definição da


unidirecionalidade, enfatizam a especificidade dos contextos discursivos que
propiciam a gramaticalização e que a passagem de um item em sua forma [lexical]
> [gramatical] não é direta.

Assim, a escala [item lexical usado em contextos linguísticos


específicos] > [sintaxe] > [morfologia] representa que itens
lexicais que se tornam gramaticalizados cumprem,
primeiramente, funções necessariamente discursivas, tornando-
se em seguida fixos sintaticamente e [...], posteriormente, vindo
a constituir um morfema. (GONÇALVES, 2007, p. 37)

Nesses termos, Hopper e Traugott (1993, p. 95) defendem uma postulação


básica, sobre a existência de “uma relação entre dois estágios A e B, tal que A
ocorre antes de B, mas não vice-versa”. Para eles, isso é o que se entende por
unidirecionalidade".
Depreendemos de todo o exposto que a unidirecionalidade, como um
princípio importante ao fenômeno de gramaticalização, é considerada uma
característica básica do processo de mudança, que se realizam em direção única.
Compondo a abordagem dos fenômenos relevantes à nossa pesquisa, a
prototipicidade, questão que será tratada no próximo tópico. Esta se desdobra
sobre a natureza primária das categorias, sendo, geralmente, considerada em
análises quando o fenômeno trata da recategorização de um item.

2.2.4. Prototipicidade

Aristóteles, baseado em um pensamento objetivista, acreditava ser


possível compreender o mundo através de nosso pensamento lógico, na intenção
de deflagrar a essência das coisas e falar corretamente sobre elas.
Essa concepção de mundo condiz, por exemplo, com o ato de nomear
coisas, onde é traçado um perfil para que o objeto seja diferenciado de outras
categorias, de outras denominações.
Nesta perspectiva clássica, Santos (2010) afirma que isso seria possível
através da nossa capacidade de distinguir os traços essenciais das coisas e, dessa
forma, revelar a qual categoria pertence um elemento.
34

O referido autor julga como interessante para essa concepção categorial o


entendimento de que os traços acidentais das coisas (formas individuais de cada
um; ex.: cabelo, cor do olho, altura) não eram importantes às reflexões
aristotélicas, mas sim os chamados traços essenciais (formas gerais; ex.:
masculino, bípede, dotado da razão), pois eles é que diriam se um elemento
pertenceria ou não à determinada categoria, de uma forma dicotomizada
(pertence ou não pertence).
Nessa perspectiva, o intuito de Aristóteles era o de afirmar “a essência
como algo anterior a própria linguagem. O que competia a nós era entender essa
essência a priori e deflagrá-la para o conhecimento da verdade” (SANTOS, 2010,
p. 02). Essa verdade demarcada no exposto seria um critério determinantemente
universal e, associada a tal noção, nossas estruturas lógicas nos capacitariam a
entender a essência das coisas. Dessa forma, as categorias seriam então
preenchidas por elementos que tivessem todos os traços essenciais e, caso não os
tivessem, não seriam mais pertencentes a tal categoria.
Outros autores repensaram a questão da formulação clássica das
categorias. Um bom exemplo é Wittgenstein (1953), não acreditando nas
categorias “fechadas” da perspectiva aristotélica, propõe que existam
“semelhanças por familiaridade”, na defesa de que não existem traços idênticos
compartilhados pelos elementos dentro de uma mesma categoria. Para Santos
(2010), o filósofo nos convida a começarmos a analisar o uso que fazemos da
linguagem para retratarmos essas referidas categorias.
Na retificação das propostas clássicas, Rosch (1975 apud Lima, 2010)
transformou a categorização numa questão de pesquisa criando o modelo de
protótipo baseado na tese de que, “se no modelo clássico as categorias são
definidas somente pelas propriedades que todos os membros da classe possuem,
então nenhum membro pode exemplificar a categoria melhor que outro”.
Dessa forma,
o princípio fundamental deste modelo sustenta que as categorias
são organizadas em torno de protótipos centrais. Um item é
considerado como membro de uma categoria não por se saber
que ele possui um determinado atributo ou não, mas por se
considerar o quanto as dimensões desse membro se aproximam
das dimensões ideais para ele. Em outras palavras, um exemplo
representativo de uma classe seria aquele que compartilhasse
com os outros membros da categoria do maior número de
características e que, por outro lado, compartilhasse de poucas
35

características (ou nenhuma) com elementos provenientes de


fora da classe. (LIMA, 2010, p. 116)

A autora sustenta a hipótese de que em concordância com o modelo de


protótipo, conceitos são representados por um grupo de características, e não por
suas definições. “Um novo membro é categorizado como um tipo de conceito se é
suficientemente similar ao seu protótipo” (LIMA, 2010, p. 117). O agrupamento
de conceitos em uma dada categoria se daria, segundo Rosch (1978), não pela
alternância dos traços binários, mas pela semelhança com o protótipo, em que o
membro condensasse os traços mais característicos da categoria.
O trabalho seminal de Rosch, contributivo às nossas reflexões, foi a
pesquisa das cores, chamado “estudo das cores básicas”. Esse estudo evidenciou
que as cores têm um foco central primário e nossa percepção cognitiva capta o
ponto mais salutar da cor, ou seja, o ponto prototípico.
Lima (2010) nos oferece, como ponto de reflexão, o verde: esta cor tem seu
ponto prototípico e as demais tonalidades seriam a sua continuação; por
exemplo: verde-água, verde-esmeralda etc. A autora afirma que apesar de sua
base biológica, essa pesquisa revela a nossa percepção cognitiva frente aos
conceitos e, assim, confirmaria, que categorizamos as coisas baseados em um
elemento prototípico dentro de uma categoria. Desse estudo é que se derivou a
Teoria dos Protótipos propriamente dita.
Atrelada à noção de categorização, a Prototipicidade, herdada da teoria dos
protótipos, é geralmente encarada, nas abordagens em Linguística Funcional,
como um processo cognitivo, quando categorias são criadas a partir da
experiência humana e, nesse domínio linguístico, condiz à semelhança ou
identificação que ocorre com termos, sintagmas, formas (e suas partes)
reconhecidas e formas armazenadas ou produzidas em contextos de uso.
De acordo com Neves (2013, p. 22), é na admissão da relação entre
cognição e gramática que se assenta a noção de protótipo, decorrente da admissão
da existência de vaguidade nos limites entre categorias.
Esse processo pode ser verificado dentro dos fenômenos que encerram o
princípio da unidirecionalidade, já que tal trajetória é acompanhada por
mudanças categoriais, como atesta Pereira (2005, p. 34), ao assegurar que

Na medida em que se gramaticaliza, uma forma vai perdendo


características prototípicas de classes primárias e adquirindo
36

traços de classes secundárias, passando por um processo de


descategorização que não significa deterioração, já que ela
adquire novas funções discursivas.

Segundo Furtado da Cunha, Bispo e Silva (2013), cada categoria é


conceitualizada em termos do representante prototípico, aquele que reúne os
traços recorrentes de que se compõe essa categoria. Podemos compreender que
as escolhas que legitimam a classificação de uma forma são movidas pelo
elemento que exemplifica o protótipo. Ou seja, na medida em que os outros
elementos são classificados, são consideradas características mais próximas e as
mais distantes em relação ao modelo, ou exemplar, prototípico, respaldadas pela
noção de similaridade, que considera outros fatores, como a ação da analogia e a
interpretação metafórica com redefinição de sentidos (NEVES, 2013, p. 23).
Subsequentemente, abordaremos a marcação, no hall dos princípios
importantes à concepção de gramaticaização.

2.2.5. Marcação

A marcação é um princípio que se estabelece na relação entre formas


concorrentes, propondo a existência de formas marcadas em oposição a formas
não marcadas, ou mais ou menos marcadas, sem implicar, restritamente, às
questões de uso, mas em descrever os fenômenos linguísticos, em sentido lato.
(Cf. MARTELOTTA, 2010, p. 146)
Outros autores acreditam que tal conceito corresponde à noção de “valor
linguístico”, sugerida por Saussure (FURTADO DA CUNHA, BISPO & SILVA,
2013, p. 24), nas distincões binárias entres pare contrastivos. Já Givon (1990)
formula três critérios para o estabelecimento de categorias (não)marcadas: i)
complexidade cognitiva; ii) complexidade estrutural e; iii) distribuição de
frequência.

Complexidade cognitiva: a categoria marcada tende a ser


cognitivamente mais complexa - em termos de esforço mental,
demanda de atenção ou tempo de processamento – do que a não
marcada.
Complexidade estrutural: a estrutura marcada tende a ser mais
complexa ou maior do que sua correspondente não marcada.
37

Ditribuição de frequencia: a categoria marcada tende a ser


menos frequente nos textos e, assim, cognitivamente mais
perceptivel do que a categoria correspondente não marcada.
(GIVON apud FURTADO DA CUNHA, BISPO e SILVA, op. cit,
p. 24-25).

Há, ainda, quem prefira ver a marcação numa perspectiva escalar. É o caso
de Croft (1990), por acreditar que determinados fenômenos não devem ser
encarados dicotomicamente. Furtado da Cunha, Bispo e Silva (2013) alargam
essa noção, alegando que o determinado princípio se estende a outros fenômenos,
como a distinção entre discursos formal e informal (conversação espontânea).
É importante destacar que não é regra que o contraste seja verificado nas
categorias linguísticas preexistentes. Esse passo investigativo é atributivo às
formas “em ebulição”.
Continuaremos nossas reflexões apresentando a questão da modalidade
atrelada às perspectivas dentro da linguística funcional, com base em estudos,
diálogos e pressupostos gramaticais.

2.3. MODALIZAÇÃO NA PERSPECTIVA FUNCIONAL

Segundo Oliveira (2003, p. 245), “do ponto de vista linguístico, podemos


considerar que a modalidade é a gramaticalização de atitudes e opiniões dos
falantes”. Em consonância com o exposto, apresentamos uma reflexão de Barros
(2012, p. 47), que delimita a modalidade como sendo “uma categoria semântico-
pragmática relacionada à forma de envolvimento do enunciador com o que é dito,
ou seja, com os estados de coisas descritos”. Dessa forma, a partir de um critério
sêmio-lexical verificado nas abordagens de Lyons (1977), a modalidade é definida
como “uma forma utilizada pelo falante para expressar sua opinião ou atitude a
partir de uma proposição que a sentença expressa ou a situação que a proposição
descreve”7 (cf. LYONS, 1977, p. 436).
Segundo Barros (2012, p. 49), a atitude do falante/escritor quanto ao
conteúdo proposicional pode ser expressa através de diversos recursos

7“A means used by a speaker to express his opinion or attitude towards the proposition that the
sentence expresses or the situation that the proposition describes” (LYONS, 1977, p. 436).
38

linguísticos: verbos plenos indicadores de crença ou saber, adjetivos em posição


predicativa, verbos auxiliares ou semi-auxiliares, advérbios, substantivos e,
ainda, através das categorias gramaticais de tempo/aspecto/modo.
Essa gama de formas, funções, proposições discursivas que são inerentes
à modalização, faz com que a tarefa para defini-la seja dificultosa, como assegura
Neves (2011), porque não há um consenso entre os diversos estudiosos sobre o
tema. Além do mais, a autora ainda lança a provocação calcada na possibilidade
de questionar se há enunciados não-modalizados8. Assim,

pode-se dizer que, se a modalidade é, essencialmente, um


conjunto de relações entre o locutor, o enunciado e a realidade
objetiva, é cabível propor que não existam enunciados não-
modalizados. Do ponto de vista comunicativo-pragmático, na
verdade, a modalidade pode ser considerada uma categoria
automática, já que não se concebe que o falante deixe de marcar
de algum modo o seu enunciado em termos da verdade do fato
expresso, bem como que deixe de imprimir nele certo grau de
certeza sobre essa marca. (NEVES, 2013, p. 152)

Narrog (2012), em se tratando de modalidade, primeiramente se refere às


atitudes do falante, ou seja, faz relação ao componente subjetividade; numa outra
ótica, é essa questão entendida em termos de factualidade, atualidade, ou
realidade. O autor defende, com base em seus estudos, que a primeira abordagem
não é muito significativa, porque os atos dos falantes, especialmente na língua
falada, são expressos, no âmbito da sentença, através de uma grande variedade
de categorias gramaticais e lexicais9.
Palmer (2001) também considera a modalidade/modalização como um
tipo de gramaticalização referente às atitudes e opiniões (subjetivas) do falante.
Para ele, as construções linguísticas utilizadas na mobilização da argumentação,
no contexto de produção escrita (no nosso caso, de artigos científicos), são

8Consideramos, pois, a princípio, o que postula Ducrot (1993) como elucidativo sobre a oposição
entre objetivo e subjetivo, que se funda, também entre a descrição das coisas e a tomada de
posição a respeito dessas coisas. O autor reflete que o aspecto não-modal dos enunciados se
origina da descrição das coisas, das informações a propósito delas, da informação objetiva; já o
que há de modal na linguagem é relativo às tomadas de posição, às atitudes morais, intelectuais e
afetivas expressas ao longo do discurso.

9 In current linguistics, there are two major approaches to the definition of the modality. One is
in term of 'speaker attitudes' or 'subjetivity', and the other in terms of the 'factuality', actuality',
or 'reality'. As I have argued at lenght elsewhere, the first approach is not very meaningful because
speakers attitudes, especially in spoken language, are expressed throughout the setence through
a great variety of grammatical and lexical categories. (NARROG, 2012, p. 05)
39

elementos produtivos no que se remete à análise da estrutura gramatical tendo


como referência a situação comunicativa inteira: o propósito do ato de
fala/produção de enunciados, seus participantes e seu contexto discursivo.
Para Ducrot (1993), Narrog (2012) e Palmer (2001), o ponto em comum
está na concepção de “atitude” referente à realização do uso da língua. Outros
autores (TRAVAGLIA, 1991; OLIVEIRA, 2003) ainda comungam de tal
perspectiva, mas o que há de ponto de interseção entre todos os estudos que
partem de uma perspectiva tradicional se direciona às noções de “necessidade” e
“possibilidade”. Neves (2013, p. 159), justamente por considerar tais categorias
importantes na mobilização conceitual que encerra a abordagem em tela, sugere
uma interdependência entre elas, para que se resolvam em “subcategorias modais
(alética, epistêmica, deôntica, bulomaica, disposicional)”.
Abaixo, elaboramos um quadro que expõe classificações a respeito das
modalidades de acordo com alguns dos mais importantes estudos recorridos à
área:

Quadro 02: Esquema de modalidades em alguns autores.


Alética Epistêmica Deôntica Bulomaica Disposicional
Neves Ou lógica. Está Está Ou Volitiva. Ou habilitativa.
(2013) Está relacionada relacionada Diz respeito à Refere-se à
exclusiva- com a com necessidade e disposição,
mente necessidade e a obrigações e à habilitação,
relacionada possibilidade permissões. possibilidade capacitação (no
com a epistêmica, que (p. 160) relacionadas fundo, uma
verdade são expressas ao desejo do possibilidade
necessária ou pelos próprios falante (no deôntica). (p.
contingente contingentes, fundo, uma 160)
das isto é, necessidade
proposições. dependem de deôntica). (p.
Tem relação como o mundo 160)
com o mundo é. (p. 160)
ontológico
[...] (p. 159)
Oliveira acerca da relacionadas Relacionadas relacionadas Avaliativas e
(2003) própria noção com conheci- com com desejo Causais
de verdade mento e cren- obrigação e X*
ça temporais permissão
Travaglia Referem-se Comprometime Têm a ver Volitivas Imperativas
(1999) ao fato de o nto do falante a com a moral, Originada na Encara o que é
locutor ver a respeito do o tratado dos vontade, dito como uma
realização da status factual deveres, das desejo, situação sobre
situação, do que ele está normas de emotividade, cuja realização
como algo dizendo, elas conduta ou em ele tem controle
possível, revelam crença (p.68) elementos ou poder. (p. 67)
viável. (p. 68) do locutor na profundos da
verdade do que psique. A
diz no volição inclui
momento da a Optação e a
enunciação. Intenção.
Certeza e (p.68)
probabilidade.
40

Hipótese e
dúvida. (p. 69)

Fonte: Elaboração própria, 2018.


* A autora apenas menciona, mas não apresenta classificação para essas modalidades.

Percebemos que, de acordo com a disposição das classificações, é comum


que a maioria dos estudos abordem modalidades aléticas, epistêmicas e
deônticas, e os autores, quase numa constante, dialogam com o que subscrevem
como classificação. Com base numa leitura mais apurada a respeito dessas
classificações, cogitamos a possibilidade, em momento de pesquisa, de que as
modalidades, mesmo com seus propósitos classificatórios, avaliativos e
discursivo-enunciativos distintos, não devem ser analisadas sem que sejam
apreciadas em conjunto no que se refere às intenções discursivo-argumentativas
dos gêneros em análise.
Com exceção de Neves, os autores elencados não têm uma inclinação
teórica demarcada na linguística funcional. Eles se comprometem a descrever a
língua e de certo modo se aproximam no que defendemos como perspectiva
teórica. Todos se debruçam sob um determinado uso da língua, seja oral ou
escrito, avaliam as atitudes que permeiam a modalização através das intenções
dos usuários. Na maioria dos casos, as análises são pautadas no texto escrito, que
possibilita a constatação dessas ocorrências, corroborando a defesa de Neves
(2013, p. 26) de que seja necessária a inserção da linguística de texto em
perspectiva funcional, no que condiz à interpretação dos textos, que “são tidos
como unidades de uso – portanto, discursivo-interativas”.
Em diálogo, a noção de que os gêneros são formas textuais estabilizadas,
histórica e socialmente situadas, embora maleáveis e dinâmicas, pois atendem às
necessidades comunicativas humanas imediatas que variam a cada comunidade
e período de tempo (TAVARES, 2007) corresponde, basicamente, ao que
entendemos como produção de intenções e atitudes nos contextos de produção e
materialização dos textos. Nossa pesquisa reflete a desenvoltura de mecanismos
discursivos-enunciativos na elaboração do texto acadêmico, mais precisamente o
artigo científico cujo comprometimento com a produção epistemológica, de
acordo com a área de conhecimento, assume aspectos linguísticos passíveis de
descrição e de reflexão.
41

Na compilação teórica em que a normatização gramatical está inserida, a


produção de gramáticas, das mais diversas abordagens e perspectivas, radiografa,
através da descrição linguística, os processos gramaticais da língua. Pensando
nisso, nos debruçamos sobre algumas produções gramaticais da língua
portuguesa, com intuito de coletar dessas produções o que há de abordagem em
se tratando da temática da modalização.
42

3. ESTUDOS DE MODALIZAÇÃO: REVISÃO DA LITERATURA

Esta seção se compromete a fazer um apanhado dos trabalhos mais


importantes da agenda linguística (funcional) sobre modalidade nas suas mais
diferentes interfaces. Concordamos, com muitos autores e estudiosos, que
conceituar tal fenômeno é uma tarefa ainda que exprime complexidade, uma vez
que o referido “conceito envolve não apenas significado das expressões
modalizadas, mas, ainda, a delimitação das noções inscritas no domínio
conceptual implicado”. (NEVES, 2013, p. 151)
Na linguística contemporânea, muitas vertentes têm se debruçado por essa
questão. O fato é que, como já mencionamos, as reflexões acerca desse fenômeno
se desdobram desde a época da filosofia escolástica, com o dictum e o modus
como componentes da construção de enunciados.
A gramática, enquanto elemento que regula os procedimentos que devem
ser padronizados em uma língua, deve, nesse contexto, descrever fenômenos que
revelam tendências linguístico-pragmáticas o âmbito de produção discursiva.
Assim, iniciamos nosso estado de conhecimento a partir de um levantamento
sobre o tema/conteúdo/fenômeno gramatical da modalização.
Em relação ao discurso científico, especificamente, ou sobre o divulgado
cientificamente, o empenho não é inédito. A semiótica greimasiana se dedicou a
investigar trabalhos científicos produzidos na grande área de letras, sobre a
modalização nesses escritos, fazendo com que, em perspectiva gerativa, esse
estudo fosse o trabalho considerado seminal para área.
A perspectiva greimasiana “parte da hipótese de que é possível lançar mão
de estruturas narrativas, tais como foram inferidas do discurso literário, para com
elas propor um modelo do discurso científico” (GREIMAS, 1976, p. 08). O mote
gerativo para tal perspectiva se dá na imposição da modelagem para realização
da modalização, não revelando, factualmente, usos reais da língua.
A Linguística Textual e a Línguística Aplicada também vêm se dedicando
a explorar os mecanismos de modalidade através de material que fornecem
reflexões de uso real da língua. Ambas, comumente, são exploradas nas reflexões
sobre o ensino de língua portuguesa. Estudos como o de Koch (2012) visam
informar uma visão panorâmica acerca do tratamento discursivo-argumentativo
de textos de diversificados gêneros.
43

Em “A inter-ação pela linguagem”, Koch (2012, p. 50)) aborda, entre


outras questões, os “indicadores modais ou índices de modalidade” enfatizando
a questão destes “na construção dos sentidos do discurso”.
Por tratar de situações em que os usos/ escolhas dos alunos revelam
problemas de aprendizagem ou internalização linguística, a Linguística aplicada
muito vem dialogando com a Linguística Funcionalista, pois a centralização no
uso permite intervenções reflexivas sobre os déficits formais dos alunos.
A perspectiva chamada de Interacionismo sócio-discrusivo, preconizada
por Jean-Paul Bronckart, está inserida nas questões de linguística aplicada,
ultrapassando os limites das temáticas relacionadas ao ensino. Bronckart (2012)
elabora um esquema para designar alguns processos textuais onde a modalização
está inserida. Este esquema é chamado de “folhado textual”.
Em se tratando de Linguística Funcional, os trabalhos de Neves (1996) e
de Castilho e Castilho (1993) revelam-se como os primeiros mais citados nos
estudos sobre modalização. Ambos os autores já reelaboraram esses estudos,
estandardizando suas contribuições à área. Outros importantes nomes também
se dedicaram à tal perspectivação. Trataremos a seguir, de forma sistematizada.
Panoramicamente, citamos esses primeiros direcionamentos para situar o
propósito deste capítulo. A seguir, apresentaremos importantes estudos,
contribuições e publicações importantes no que se refere ao tratamento do
fenômeno da modalidade em língua portuguesa.

3.1. MODALIZAÇÃO NOS COMPÊNDIOS GRAMATICAIS

O tratamento da modalização nas gramaticas do português brasileiro não


representa um consenso por parte dos autores. Muitos nem a mencionam como
uma representação ou fenômeno gramatical nas materializações da língua.
Mesmo assim, algumas gramáticas10 com conteúdos que contemplam
questões mais próximas das realidades factuais da língua abordam essa questão.

10 Nesta seção, tratamos “gramatica”, num sentido lato, para designar produtos em que
encontram-se publicados descrições dos fenômenos da língua, seja de maneira descritiva,
prescritiva, de uso e, normativa.
44

Para a construção desta seção, consultamos dez gramaticas 11 que


normalmente circulam nos meios acadêmicos, mas apenas três destas trouxeram
– mesmo que de alguma forma sintetizada – questões sobre modalidade na língua
portuguesa.

3.1.1. Gramática Houaiss da Língua Portuguesa

Azeredo (2011), em suas contribuições para a gramática do português, traz,


mesmo que de forma tímida, tópicos sobre os processos sintáticos que refletem
situações reais de uso. O bom exemplo é o tratamento da gramaticalização (p.
200), na seção correspondente ao período simples – predicação e as categorias
do verbo. Como nossa abordagem, ao longo do trabalho, considera a modalização
como um fenômeno de gramaticalização, nos chamou atenção a disposição, na
mesma seção da gramática, de um tópico intitulado “modalidade, modos do verbo
e verbos modais”.
Os apontamentos do autor são iniciados com menções à tradição descritiva
decorrente da Idade Média, inspirada na filosofia escolástica, que faz com que
reconheçamos os componentes na construção dos enunciados: “dictum – aquilo
que é objeto da comunicação – e o modus – a atitude ou ponto de vista do
enunciador relativamente ao objeto de sua comunicação” (AZEREDO, 2011, p.
209).
Para complementar a noção de modalidade que o autor tenta imprimir,
sem apresentar tipos/categorias, ele remonta características de alguns verbos e
alguns advérbios, para designar atitudes do usuário da língua em atitudes
enunciativas/discursivas.

A expressão do modus é realizada de várias maneiras. Uma delas


consiste em variar a entoação da frase para exprimir certeza,
admiração, dúvida, ceticismo etc. Também se pode recorrer a
verbos que exprimem atitudes, como saber, duvidar e supor, e
advérbios como talvez, sinceramente, obviamente etc. Trata-se
do recurso da modalização ou modalidade. (AZEREDO, 2011, p.
209)

11Gramáticas consultadas: Almeida (1979); Azeredo (2011); Bagno (2011); Bechara (2009);
Castilho (2014); Cunha e Cintra (2013); Neves (2011); Perini (2010); Rocha Lima (2008); Said Ali
(1966);
45

A gramática de Azeredo inova na intenção de relatar processos em


constante evidência dentro do que se chama de descrição da língua. Entretanto,
o autor apresenta exemplos que não têm referências ao que se conhece por
situação real do uso. Servem, apenas, para designar situações em que ocorram
“permissões” ou “obrigatoriedade”, concluindo sua abordagem do fenômeno,
mesmo que en passant.

3.1.2. Gramática pedagógica do português brasileiro

A gramática de Bagno (2011) apresenta seções temáticas que tratam de


conteúdos gramaticais, oferecendo uma reflexão com base no uso real e
sincrônico da língua. Claro que com isso a mudança não deixa de ser enaltecida
e, muitas vezes, são mencionados percursos diacrônicos de algumas categorias
gramaticais abordadas.
A questão de modalidade na gramática, pelo que foi percebido, se restringe
aos verbos. Não há, por exemplo, menções a respeito dessa articulação com
substantivos, adjetivos, ou, no caso mais comum, com advérbios. Bagno (2011, p.
572) apresenta a modalização como fenômeno expresso por um “pequeno
número de auxiliares”, dando o exemplo do poder como prototípico para o
assunto em tela.
O autor apresenta, em sua abordagem, uma “escala” na qual a modalização
é exercida por verbos que partem da possibilidade/probabilidade até a
necessidade/obrigatoriedade, tendo como intermediaria, nesse processo, a
vontade/desejo. Transcrevemos, a título de exemplo, o esquema elaborado pelo
autor para explicar essa “trajetória”.

Esquema 01: Escala de modalização.

+ possibilidade/ +vontade +necessidade/


probabilidade desejo obrigação
PODER QUERER DEVER

Fonte: Bagno (2011, p. 572)


46

A partir do exposto, o autor apresenta as modalidades, seus conceitos e


verbos prototípicos:

Com esses verbos, portanto, buscamos conferir ao enunciado


uma modalização epistêmica – expressando o grau maior ou
menor de certeza que se tem do estado de coisas enunciado; uma
modalização volitiva – expressando vontade ou desejo e; ou
deôntica – expressando o dever, a obrigação etc. Dessa forma os
verbos modais prototípicos são poder, querer, dever. (BAGNO,
2011, p. 572)

Nessa perspectiva da prototipia, Bagno (2011) elabora um quadro com os


principais verbos modais, ilustrando com exemplos do projeto NURC12,
enaltecendo a produtividade do verbo poder nas ocorrências, em dados reais de
uso.

3.1.3. Gramática de usos do português

A gramática assinada por Neves (2011) não segue a linearidade da alocação


de classes de palavras, como notamos nas tradicionais. A proposta, segundo a
autora, é constituir uma gramatica do uso referencial do português e seu ponto
de partida é a “Formação básica das predicações: predicados, argumentos e os
satélites”. Levando em consideração o verbo como núcleo da oração e todos os
termos que (re)agem em volta dele, o primeiro capítulo aborda questões inerentes
ao elemento predicador das orações, no que concerne às analises sintáticas,
semânticas e pragmáticas, já que toda observação dos fenômenos referentes a
essa classe (ou categoria, nos seus termos) é movida em perspectiva funcional.
A partir da ressalva de que os verbos modalizadores não constituem
predicados, a autora (2011) desenvolve sua contribuição sobre essa categoria que
aqui colocamos em relevo. É também informado que os verbos modais não têm
complementos e que estão enquadrados no subgrupo dos verbos implicativos,

12 Projeto NURC (Norma Urbana Culta), iniciado em 1970 e em desenvolvimento até hoje,
Investiga as variedades prestigiadas do Português Brasileiro, reunindo dados de cinco capitais
brasileiras - São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Salvador e Recife - em três tipos de inquérito:
(a) diálogo entre dois informantes, (b) elocução formal e (c) diálogo entre informante e
documentador.
47

cujo envolvimento está na noção de condição necessária e suficiente para


determinar se o estado das coisas descrito na oração completiva ocorre ou não.
Segundo Neves (2011), os modalizadores se constroem13 com outros
verbos para modalizar enunciados, especialmente para indicar modalidade
epistêmica (ligada ao conhecimento) e deôntica (ligada ao dever). Com isso, a
autora arrola as principais funções desses verbos, no intuito de indicar
necessidade e possibilidade epistêmicas, necessidade deôntica (obrigatoriedade)
e possibilidade deôntica (permissão).
A autora ainda chama a atenção para aqueles verbos que exprimem a
chamada modalidade habilitativa, que indicam capacidade, na verdade
constituem predicados.
A continuação do conteúdo de modalidade se dá pela abordagem dos
substantivos, dentro do hall das subclassificações de base morfológica, uma vez
que a autora reúne as características de todas as palavras lexicais, nos conjuntos
dos substantivos simples, compostos, primitivos e derivados. Neste último,
ressalta que a derivação, além de ocorrer a partir de um substantivo ou adjetivo,
é verificada a partir de palavras derivadas de verbos.
Ainda nessa perspectiva, os substantivos derivados de verbos podem ser
de diversos tipos, dependendo da entidade ligada ao verbo que esteja sendo
denominada. Na denominação da natureza semântica14 dos verbos que
derivaram substantivos, temos: “nomes de ação; nomes de processo; nomes de
estado”. (NEVES, 2011, p. 77)
Entre os nomes de estado, designados pela autora, são incluídos os de
modalidade:

- Há possibilidade de se venderem lotes premiados durante os


julgamentos da mostra. (AGF)
- Sinto necessidade de refletir, de medir bem a decisão que vou
tomar. (A)
- Há muito se fazia sentir em nossa estrutura econômica a
necessidade de uma grande indústria alcalina (JK-O)
- Já é mais que tempo para que empreendamos (...) o trabalho de
homogeneização da capacidade de todos e de cada um. (JK-O)
(NEVES, 2011, p. 78)

13 Grifo nosso.
14 Destaque nosso.
48

Outra categoria que diz respeito aos modalizadores, de acordo com a


gramática em tela, é a dos Adjetivos. Quando a abordagem se volve à apreciação
dos qualificadores, Neves (2011, p. 188) coloca que estes expressam “diversos
valores semânticos”, entre eles, o de modalização: i) epistêmica, quando os
adjetivos exprimem conhecimento ou opinião do falante, sendo de certeza ou de
asseveração; ii) eventualidade; iii) deôntica, os adjetivos exprimem
consideração, por parte do falante, de necessidade por obrigatoriedade;
Concluindo a abordagem da modalidade, a última categoria é a dos
Advérbios, cujos modalizadores são enquadrados na subclasse dos
modificadores, sendo estes:
- Epistêmicos ou Asseverativos: indicam uma crença, uma opinião, uma
expectativa sobre a asserção:
- Delimitadores ou Circunscritores: delimitam o ponto de vista sob o qual
uma asserção pode ser considerada verdadeira:
- Deônticos: apresentam como obrigação uma necessidade:
- Afetivas ou Atitudinais: indicam estado de espírito do falante em relação
ao conteúdo da asserção:
Para Neves (2011, p. 244), os advérbios modalizadores

compõem uma classe ampla de elementos que têm como


característica “básica” expressar alguma intenção do falante na
definição da validade, do valor de seu enunciado: modalizar
quanto ao valor de verdade, modalizar quanto ao dever,
restringir o domínio, definir a atitude e, até, avaliar a própria
formulação linguística.

Dessa forma, a autora, por julgar importante a questão da modalidade, a


retoma em seção específica e trabalha suas tipologias de maneira mais acurada,
ratificando os conceitos em relação às modalizações.
A seguir, apresentaremos como se dá a modalização epistêmica, a partir de
leituras que indicam sua realização e que dialogam com a nosso direcionamento
teórico.
49

3.2. MODALIZAÇÃO E OS ESTUDOS SOBRE O TEXTO

3.2.1. Indicadores modais ou índice de modalidade (KOCH, 2012)

Em “A inter-ação pela linguagem, Koch (2012) apresenta reflexões sobre a


linguística de texto e suas interfaces com questões de discurso, enfatizando as
manifestações linguísticas, produzidas por indivíduos concretos em
diversificados contextos de produção.
A autora justifica que seu estudo se baseia em sequencias textuais e/ou
textos inteiros, como objetivos de estudos na tentativa de abordar a capacidade
do ser humano de interagir socialmente por meio da língua.
A obra trata de temáticas diversificadas que vão desde a explanação das
teorias da enunciação, atos de fala, atividade verbal; passando por questões a
respeito da argumentação: operadores argumentativos, marcadores de
pressuposição e, chegando ao nosso interesse, indicadores modais ou índice de
modalidade (p. 50).
Nesta seção, a autora apresenta o conceito de modalidade, mencionando
sua origem na retórica clássica e ambientação na semântica moderna,
justificando que sua intenção é “apontar os meios linguísticos por meio dos quais
as modalidades se apresentam (“lexicalizam”) no discurso” (KOCH, 2012, p. 50).
A autoria não apresenta tipologias para as modalidades, como abordamos
em nossa pesquisa, mas retoma os sentidos abordados na lógica: i)
necessário/possível; ii) certo/incerto, duvidoso e; iii) obrigatório/facultativo.
Enfatiza que um mesmo conteúdo proposicional pode ser veiculado sob
modalidades diferentes e que esse recurso da linguagem se lexicaliza por meio de
expressões “cristalizadas” do tipo “é +adjetivo”.
Para a concepção ou leitura de textos, Koch (2002, p. 82) traz-nos a
reflexão de que é muito comum a existência de modalizadores, de forma implícita,
nos textos, e que isso é uma estratégia argumentativa:

A ocultação da modalidade epistêmica, contudo, deixa sempre


um traço: a enunciação aí está, o locutor apenas finge esquecê-la
para dar a impressão de que seu ato é neutro, de que ele não
manifesta nenhuma atitude com relação a ela, de que o valor de
seus enunciados é objetivo.
50

O foco se dá para as contruções frasais que devem/são modalizadas e


reconhecidas num texto escrito. Para cada situação que exprime modalização, a
autora elenca uma série de exemplos que servem de modelagem e ilustração para
o aprendiz das questões enaltecidas no tópico em discussão.

3.2.2. Um estudo textual-discursivo do verbo no português do Brasil


(TRAVAGLIA, 1991)

O trabalho de doutoramento de Travaglia se performa como um estudo de


linguística textual e análise discursiva do verbo, soba intenção de evidenciar os
usos realizados das formas e categorias verbais e como esses dois aspectos
designam generalizações do funcionamento verbal. A partir dessas questões, a
tese identifica e explana a contribuição verbal no estabelecimento da
textualidade.
Em seu estudo, a modalidade é abordada dentro de um tópico que
segmenta formas e categorias verbais, tida como forma, junto a “tempo” e
“aspecto”. Em conceito, o fenômeno é enfrentado como categoria “que reflete a
atitude do falante em relação ao que é dito, bem como a atitude de outrem, mas
que o falante insere, por alguma razão, no que diz.”. (TRAVAGLIA, 1991, p. 66).
As modalidades deôntica, epistêmica e alética, assim como em nosso
trabalho, são analisadas, mas outras duas são também abordadas em sua
pesquisa: as imperativas e volitivas.
Enfatizamos que este trabalho mapeia as desenvolturas linguísticas que
permeiam o ambiente verbal. Nossa pesquisa aborda outros mecanismos que são
mobilizados em contextos de produção de modalidade.
Em relação às modalidades que abordamos em pesquisa e que são
baseadas nesse estudo, os conceitos apresentados nessa tese encontram-se em
confluência teórica com o que explicitamos.
Sobre modalidade deôntica, Travaglia (1991) revela ser aquela que tem a
ver com a moral, os deveres, as normas de conduta. A determinação de realização
é intrínseca à própria situação; a ênfase é no executar, não no executante. Como
exemplos, ele utiliza:
51

- “É obrigatório o uso15 de crachá nas dependências da fábrica.


(obrigatoriedade).”.

- “É permitido fumar. (permissibilidade).”.

- “É proibido fumar neste recinto. (não permissibilidade).”.

Em se tratando de modalidade alética, a abordagem indica que esta tem a


ver com o fato de o locutor ver a realização da situação como possível ou viável
(possibilidade) ou necessário, essencial, indispensável, inevitável (necessidade).
Travaglia (1991), para ilustrar, utiliza, dentre outros, tais exemplos:

“Infelizmente não posso ajuda-lo neste caso.”. (possibilidade).

- “É possível tirar esta mancha?”. (possibilidade).

- “Eu preciso falar com seu irmão.”. (necessidade).

- “É necessário estar bem consigo mesmo.”. (necessidade).

Em relação à modalidade epistêmica, existe a defesa de que esta tem a ver


com o comprometimento do falante sobre o status factual do que diz: se ele
acredita na verdade, temos a certeza; se ele duvida da verdade, temos a
probabilidade, que inclui hipótese e dúvida. Exemplos mostrados:

- “Ela tem 30 anos.”. (certeza)

- “É provável que José chegue hoje do exterior.”. (probabilidade).

Travaglia (1991) alerta, em seu estudo, que as modalidades se organizam


em dois grandes grupos: as que têm a ver com a determinação da realização da
situação (imperativas, volitivas e deônticas) e as que têm a ver com a própria
realização da situação (epistêmicas e aléticas). Sua pesquisa ainda CITA outras
mecanismos em que as modalidades podem ser expressas: verbos performativos,
auxiliares modais, predicados do tipo “é + adjetivo”, advérbios, modos e tempos
verbais, alguns verbos de atitude proposicional, questões de prosódia alegadas
por entoação e, por fim, também se realizam a partir da utilização do sufixo -vel
formador de adjetivos.

15 Destaques do autor.
52

3.2.3. Modalização nos artigos científicos da área de linguística


(ANDRADE, 2010)

Em sua dissertação de mestrado, Andrade (2010) se empenha na


investigação de modalidades em artigos da área de Linguística, considerando,
primordialmente, que tal fenômeno se realiza como uma estratégia
argumentativa no discurso em relevo, e verificando possíveis regularidades entre
tipos de modalidade e a superestrutura deste gênero.
O trabalho confirma a hipótese de que as modalidades epistêmicas e
aléticas são predominantes no gênero investigado. A pesquisa ainda revela
índices de alternância entre questões de possibilidade e incerteza: na parte inicial
do artigo, o autores levantam questionamentos acerca da temática abordada e
“relativizam suas afirmações para não perder, logo de início, a credibilidade do
leitor”. (ANDRADE, 2010, p. 141).
Observa-se, entretando, que nas seções de análise, a intenção do autor é
voltada à comprovação da veracidade de suas afirmações. Com isso, lança mão de
mecanismos de modalidade epistêmica de certeza combinada às aléticas de
possibilidade “a fim de ganhar a adesão do leitor em relação àquilo que diz”.
(idem, p. 142).
A pesquisa conclui que existe certa regularidade entre as modalidades
epistêmicas e aléticas, bem como das aléticas combinadas com as deônticas. Estas
últimas são mais frequentes nas diferentes partes dos artigos do que as volitivas
e imperativas, por exemplo.

3.3. A MODALIZAÇÃO PARA O INTERACIONISMO SOCIODISCURSIVO

Considerando o texto como ponto de partida, consideramos válidas as


reflexões de Coutinho (2012), que apresenta em seus estudos uma hipótese
central no que corresponde às relações entre gramática e texto, defendendo que
estas não podem se resumir a uma mera aplicabilidade de fenômenos gramaticais
previamente descritos, a serem revistos no nível de análise superior à frase que
seria o texto.
53

Essa prerrogativa fundamenta-se na Linguagem como produto das


interações sociais, ou seja, como conduz a reflexão sobre textos a partir do
Interacionismo Socio-Discursivo e de seu quadro teórico-metodológico, situado
na área da Línguística Aplicada.

3.3.1. Atividades de linguagem, textos e discursos: por um


interacionismo sociodiscursivo (BRONCKART, 2012)

Nessa abordagem, o foco se dá para o contexto e produção de


textos/gêneros de textos a partir de atividades comunicativas/interativas
respaldadas por mecanismos psi-filo-antropo-linguísticos no tratamento
discursivo desses pré-construídos (os textos).
Bronckart (2012), em sua teoria correspondente ao “folhado textual”, visa
mostrar como os mecanismos de produção e interpretação das entidades verbais
contribuem para a transformação permanente das pessoas agentes e ao mesmo
tempo dos fatos sociais e, nesse diapasão, lança mão de reflexões a respeito do
gênero de texto, com base no que a teoria chama de folhado textual.
Nesses termos, o folhado constitui-se como um recurso importante no
tratamento do texto/gênero de texto, uma vez que revela direcionamentos
analíticos para uma reflexão profunda de aspectos, além de linguísticos, sócio-
subjetivos, verificados no contexto de produção a partir das Vozes (marcas de
subjetividade) e da Modalização.
Segundo Bronckart (2012, p. 131), “as avaliações formuladas sobre alguns
aspectos do conteúdo temático têm sido designadas, na tradição, pelo termo
modalização”. Ainda, para o estudioso, o autor de um texto – seja oral ou escrito
– é o responsável pela concretização de um texto empírico e quem decide sobre o
conteúdo temático a ser semiotizado. Sendo essa “ação de linguagem”
empreendida pelo autor, vários recursos da língua natural “em uso” são colocados
à disposição para reflexão.
A seguir, apresentamos um quadro com os tipos de modalizações
apresentados na teoria bronckartiana para que possamos, à frente, promover um
diálogo com o que postula nossa abordagem de pesquisa.
54

Quadro 03: Modalização no ISD.


TIPOS DE
MODALIZAÇÕES PLANIFICAÇÃO CONCEITUAL MODALIDADES

Consistem em julgamento sobre o valor Tempos verbais no condicional,


de verdade das proposições enunciadas, advérbios, auxiliares e orações
LÓGICAS que são apresentadas como certas, impessoais: É evidente que..., É
possíveis, prováveis, improváveis, etc. improvável que..., etc.;
certamente, evidentemente
Avaliam o que é enunciado à luz dos Tempos verbais no condicional,
DEÔNTICAS valores sociais, apresentando os fatos advérbios, auxiliares e orações
enunciados como (socialmente) impessoais: É preciso que...; É
permitidos, proibidos, necessários, necessário que... etc.; poder,
desejáveis, etc. ser obrigado a, dever etc.
Traduzem um julgamento mais Preferencialmente marcadas
APRECIATIVAS subjetivo, apresentando os fatos por advérbios ou orações
enunciados como bons, maus, adverbiais: felizmente,
estranhos, na visão da instância que infelizmente, e lamentável
avalia. que... etc.
Introduzem um julgamento sobre uma Preferencialmente marcadas
PRAGMÁTICAS das facetas da responsabilidade de um pelos auxiliares de modo:
personagem em relação ao processo de querer, poder, dever etc.
que é agente, principalmente sobre a
capacidade de ação (o poder-fazer), a
intenção (o querer-fazer) e as razões (o
dever-fazer).
Fonte: Elaboração própria, com base em Bronckart (2012, p. 132).

O quadro acima apresentado não aprecia a modalização epistêmica, como


é verificado em outras abordagens. O que há de mais próximo desse tipo de
modalidade, se realiza a partir de construções com auxiliares modais verificados
nas modalidades lógicas e pragmáticas. O enquadramento pragmático celebra a
enunciação epistêmica sob auxílio dos mecanismos linguísticos que possibilitam
sua realização.
Consideramos, ainda, no eixo das discussões, questões atreladas à
capacidade de ação de linguagem, situando os aspectos que englobam o conteúdo
temático e a representação do gênero textual, constituindo a base de orientação
da produção de todo e qualquer texto, a balizar todas as escolhas discursivas e
linguístico-discursivas para a materialização empírica da ação de linguagem
(LEITE, 2012).
Leite (2012) reflete, nesse contexto, sobre o desenvolvimento das
capacidades discursivas, como nível que engloba uma série de elementos (tipos
55

de discurso e sua articulação, sequências e outras formas de planificação e plano


geral) que corresponde à camada mais profunda da arquitetura textual descrita
por Bronckart (2012).
Esse tratamento em relação à produção de gênero de texto envolve uma
série de atitudes de locução manifestadas pela interface entre o mundo da pessoa
e as coordenadas dos mundos sociais, transcendendo a questão da estruturação
sequencial e linear do texto e a organização do conteúdo temático.
Em continuidade, abordaremos a temática a partir do conceitual
estabelecido no construto teórico referente ao funcionalismo linguístico, com
intenção de atestar que modalidades, são realizações factuais reais da língua e são
produzidas em contextos de interação, na mobilização de discursos, muito
dialogando com o que explanamos neste tópico.

3.4. A MODALIZAÇÃO EM TERMOS FUNCIONAIS

Os estudos de modalidade transitam em várias vertentes da linguística,


mas no funcionalismo se abriga quando o olhar é voltado para produções factuais
da língua, seja no âmbito oral ou escrito.
A intenção de se analisar um corpus constituídos por usos reais da língua
fundamenta o propósito funcionalista que a maioria dos trabalhos sobre
modalização, nessa perspectiva, recorre. Nesta seção, apontaremos, em ordem,
os estudos mais importantes produzidos acerca desta temática.

3.4.1. Imprimir marcas do discurso no enunciado. Ou: A modalização


na linguagem (NEVES, 2013)

O livro intitulado “Texto em gramática” é uma importante produção que


reúne “reflexões sobre os processos de constituição de enunciados, dirigindo a
atenção para a gramática que organiza as relações, constrói as significações e
define os efeitos pragmáticos, eu fazem do texto uma peça em função” (NEVES,
2013, p. 11). A autora revela uma nova possibilidade em analisar os usos reais da
língua: o escrito.
56

Há uma tendência em se investigar as mudanças gramaticais a partir do


que é oferecido pelas interações orais, sobretudo na análise multissistêmica
funcional da língua.
A predicação ainda é o ponto de concentração mais importantes dentro das
análises linguísticas, mas Neves (2013, p. 11) explica que devemos olhar “para o
que acontece fora dela”.
Muitos estudos acerca de modalidade verificam a predicação por estarem
ainda fixos à ideia de que este fenômeno corresponde a uma tipologia da categoria
TAM (Tempo, Aspecto e Modalidade). A verdade é que este recurso enunciativo-
discursivo-argumentativo utiliza-se de diversificados mecanismos linguísticos
para sua realização.
Neste capítulo, Neves enfoca que enunciar é modalizar, uma vez que os
meios que o usuário (falante) ajusta a modalidade, são os que marcam seus
enunciados. Dessa forma, a autora inicia seu estudo apresentando
perspectivações sobre a temática relacionadas à “opcionalidade da categoria
modalidade nos enunciados” (p. 152); o tratamento lógico (p. 155); as “propostas
de equacionamento da inter-relação entre lógica e linguística no exame da
modalização” (p. 157); até chegar propriamente no tratamento das diferentes
noções de modalidade, desembocando em suas especificidades em relação às
realizações resultantes do uso de verbos, mecanismos e fatores de interpretação,
polissemia, entre outros.
Neste estudo, fica evidente que a autora se debruça de forma veemente às
questões de modalidade epistêmica. Como foi mencionado, outras tipologias
acerca do fenômeno são abordadas.
Em Neves (2013, p. 164), a modalidade epistêmica é estudada
relacionadamente à evidencialidade, por envolver-se com a fonte do
conhecimento, com a qual o usuário pode não estar comprometido, conforme
postulados que pregam a importância de se conhecer a fonte da informação na
construção de uma base epistêmica. Para a autora, essa “informação epistêmica”
é definida como a qualificação da informação em termos de sua origem ou da
própria atitude do falante (crença, dúvida etc.).
A referida modalidade pode, ainda, ser expressada por diferentes meios
linguísticos, como verbo, auxiliar modal ou de significação plena; por um
advérbio, que ainda pode se associar a um verbo modal; por um adjetivo em
57

posição predicativa; por um substantivo e; pelas próprias categorias gramaticais


(tempo, aspecto, modo) do verbo da predicação.
As tipologias, ou categorias de modalidade, de forma geral, utilizadas
nessa pesquisa inspiram-se, aliás, são exatamente as que Neves (2013) apresenta
neste estudo. Nossa postura enquanto pesquisador, sugeriu, para oferecer mais
possibilidades panópticas da questão, que buscássemos outras perspectivas, mas
que fossem convergentes com o que é preconizado nesta obra.

3.4.2. Modality and subjectivity (NARROG, 2012)

Basicamente tratado como capítulo “abre-alas”, o capítulo 02 do livro


“Modality, subjectivity, and semantic change” reflete sobre especificidades da
categoria modalidade e focaliza a modalização epistêmica como sendo a mais
produtiva em analises que consideram aspectos procedurais da gramática das
línguas.
Para Narrog (2012), modalidade epistêmica (e os modalizadores que as
expressam) tem um uso argumentativo na construção dos artigos acadêmicos,
nosso objeto, contribuindo para o convencimento e persuasão do receptor do
texto quanto às ideias propostas.
As reflexões oriundas deste capítulo direcionam que ao tratarmos de um
fenômeno linguístico observado em suporte de produção científica, estamos
lidando, também, com a recursividade epistemológica que concerne aos discursos
produzidos nesse gênero, uma vez que o propósito comunicativo é o fator que
molda o gênero, segundo Swales (1990), determinando sua estrutura interna e
impondo limites quanto às possibilidades de ocorrências linguísticas e retóricas.
A modalidade, na perspectiva de Narrog (2012, p. 06), é tida como uma
categoria linguística que se refere ao status factual da proposição, ou seja, a
proposição é modalizada se for marcada para ser indeterminada em relação ao
seu status factual, em sincronia atual. No passado, essa concepção era
repetidamente ligada a conceitos de “subjetividade” e “atitudes de falantes”. É
difícil negar uma conexão entre modalidade e subjetividade em linguagem
natural, especialmente se os dados do idioma falado forem levados em
consideração. Por outro lado, essa conexão por vezes foi mal interpretada como
58

uma associação categórica, ou mesmo como equivalência entre as duas noções.


(NARROG, 2012)
Nesse mote cognitivo, Narrog (2012) conceitua modalidade epistêmica
referindo-se ao conhecimento de mundo de alguém, tipicamente o do falante. Se
a proposição for relacionada com o world knowledge16 desta pessoa, então, o
discurso trata, necessariamente, de verdade; Se for compatível com o seu
conhecimento, é possivelmente verdade. Para o autor, não há acordo na literatura
sobre a forma como a modalidade epistêmica, estreita ou amplamente, deve ser
conceituada.

3.4.3. Tempo, aspecto e modalidade: estudos de linguística


portuguesa (CAMPOS, 1997)

Como indicia o título, o livro de Campos (1997), uma compilação de artigos


produzidos pela autora, trata da categoria TAM, tratando de cada uma, sob o
destaque de que em muitos casos “a análise dos valores aspectuais é inseparável
dos valores temporais, sendo a modalidade passível de um estudo separável,
criando, assim, um binômio tempo-aspecto e modalidade” (CAMPOS, 1997, p.
07).
A autora apresenta trabalhos que tratam das questões (iN)perfectivas dos
verbos nos âmbitos aspectuais e temporais, tratados sobre enunciação na
perspectiva abordada na obra, modalização e referência nominal, e análises sobre
alguns “marcadores modais”.
Destacamos o artigo “Para a caracterização do marcador modal dever”
como elucidativo de algumas questões. Campos (1997, p. 173) aborda que dentre
as questões mais controversas que envolvem os estudos de modalidade “é o que
diz respeito ao seu estatuto de auxiliaridade”.
A autora revela que as análises realizadas em torno do verbo dever podem
ser também relacionadas ao verbo poder, uma vez que ambos têm um importante
papel semântico em relação aos discursos epistêmicos.
Neste estudo, para o verbo dever, a autora considera importante a
“existência de uma nova localização temporal que permite a interpretação

16 Conhecimento de mundo.
59

deôntica” (CAMPOS, 1997, p. 175) para que se ao valor subjacente de todas as


ocorrências deônticas de dever. Já na interpretação epistêmica, coincidem os
tempos de validação e o tempo de enunciação.
O artigo é claro quando conclui que o objetivo é separar categorias para
que as interpretações sejam claras em relação à verificação de um elemento
modalizador.

3.4.4. Advérbios modalizadores (CASTILHO; CASTILHO, 1993)

Os autores deste capítulo do volume 01 da “Gramática do português


falado”, como indicia o título, verifica a modalização a partir dos mecanismos
adverbiais, revisitando um seminal trabalho de Ilari e outros, objetivando
reavaliar as realizações adverbiais abordadas naquela proposta. Os autores
também inserem o trabalho como uma importante investigação dentro da agenda
de pesquisa que origina as compilações intituladas de “gramáticas do português
falado”.
O estudo de Castilho e Castilho (1993), como muitos outros, após
abordarem todas as tipologias de modalidade, se volta para a categoria
epistêmica, dada sua produtividade nos eventos linguísticos que envolvem
mecanismos adverbiais.
Assim, modalização epistêmica, segundo Castilho e Castilho (1993, p.
222), como indicia o termo, ocorre quando usuário expressa uma avaliação sobre
o valor de verdade da proposição. Esta, na contribuição em tela, se divide em
asseverativa (quando o falante considera verdadeiro o conteúdo da proposição),
quase-asseverativa (quando o falante considera o conteúdo da proposição quase
certo ou como uma hipótese a ser confirmada e, por isso, não se responsabiliza
pelo valor de verdade da proposição), e delimitadora (quando são estabelecidos
os limites dentro dos quais se deve considerar o conteúdo da proposição).
60

3.4.5. Construções modais com ter: gramaticalização e variação


(BARROS, 2012)

A tese de Barros (2012), inserida nos ditames da Linguística funcional


centrada no uso, de base construcionalista, investiga o uso das construções
modais [ter que + infinitivo] e [ter de + infinitivo] realizadas no âmbito do
português brasileiro contemporâneo, firmando uma pesquisa pautada em duas
perspectivas: na primeira, focalizando a construção [ter que + infinitivo],
soberana na modalidade falada, através de um estudo em tempo real de curta
duração do tipo tendência, procurando verificar a emergência de novos valores
modais para essa perífrase e as diversas propriedades a elas associadas.
A segunda perspectiva da pesquisa focaliza a variação entre as duas
construções na modalidade escrita, com o objetivo principal de identificar os
contextos de resistência de [ter de + infinitivo]. Para essa análise a autora utilizou
uma amostra do discurso jornalístico constituída de textos representativos de
diversos gêneros, publicados durante o período de 2000 a 2004.
A pesquisa obteve resultados que comprovam que a construção em
destaque é produtiva e passível de ocorrência no domínio epistêmico, dada a
constatação de realização em contextos de primeira pessoa, de sujeito [+ humano,
+ animado], de verbos cognitivos, compreendendo o percurso funcional num
cline de significados [-subjetivo] > [+ subjetivo].
Ainda dentro dos resultados desta investigação, há a verificação da
correlação, segundo a autora, entre os valores modais das construções com “ter”
e os diversos gêneros da mídia jornalística. A pesquisa, por fim, conclui que a
construção [ter de + infinitivo] te alto teor de produtividade em contextos de
produção de gêneros mais formais, como os editoriais, por exemplo.

3.4.6. Gênero textual na metodologia de pesquisa em


gramaticalização (LOBATO, 2009)

Lobato (2009), em sua pesquisa, seleciona gêneros textuais para base de


corpora para investigações diacrônicas da língua. Objetivando demonstrar que
diferentes gêneros favorecem determinados usos, fazendo com que torne-se
61

rigorosa a seleção de textos nos estudos acerca de processos de gramaticalização.


Dai, a proposta da autora é que os textos selecionados devem pertencer a gêneros
funcionalmente equivalentes.
A dissertação fundamenta uma empírica para a verificação do tema
proposto, direcionada à gramaticalização dos verbos modais poder, dever e
querer, por, diacronicamente, poderem ser observados e hodiernamente vêm
produzindo importantes estudos e reflexões a cerca de temáticas confluentes a
esta.
O capítulo 04 desta dissertação, intitulado “Os verbos modais poder, dever
e querer” é iniciado a partir da exploração do conceito de modalidade, para
justificar o alcance mais eficiente dos objetivos comunicativos dos falantes.
O trabalho defende que é por meio da modalização que se expressam as
diversas modalidades do sistema discursivo. A modalidade, como abordada nessa
pesquisa, é uma categoria gramatical bastante frequente na interação verbal e
tem a função de expressar linguisticamente as atitudes humanas em face das
proposições emitidas, o que acaba sendo um consenso em relação ao que se expõe
como conceito e propósito linguístico do fenômeno.
É interessante destacar o diálogo entre a linguística funcional e a
linguística aplicada impresso na dissertação. Para delimitar os horizontes
demarcadores de modalidade nos gêneros de texto, a autora escolhe o conceito
de modalização abordado por Bronckart (2012) em sua teoria, cruzando com o
trabalho de Travaglia (1991).
No tocante aos processos históricos que são demarcados como caros à
pesquisa, é selecionada a proposta de Bybee et al. (1994) para descrever as
relações diacrônicas entre algumas noções modais. “Por exemplo, o uso de uma
forma que originalmente expressa a noção de necessidade pode passar a
expressar também obrigação e desejo” (LOBATO, 2009, p. 80). A autora explicita
que ambas as formas são noções modais orientadas para o agente. Há
Sincronicamente, as diferentes leituras se misturam, cabendo ao contexto o papel
de atualizar a sentença da maneira mais adequada a cada situação.
Assim, a modalidade, tratada em toda pesquisa, é tida como o meio pelo
qual o falante verbaliza, na sentença, sua atitude em relação ao grau de verdade
do próprio enunciado, imprimindo na proposição matizes de necessidade,
possibilidade, certeza, dúvida, obrigação, permissão, etc.
62

A investigação e constatação dos processos de gramaticalização dos


referidos verbos foi realizada com base em um corpus constituído por quatro
gêneros textuais do período contemporâneo e quatro gêneros funcionalmente
equivalentes a eles do século XVIII. A autora alega que, no momento da
apreciação dos resultados quantitativos, foi observada a influência dos gêneros
nas escolhas linguísticas.
A autora conclui que após esse procedimento, para que se tenham dados
realmente equilibrados, é essencial que, no momento de seleção de textos para a
formação de corpora para pesquisas linguísticas desse tipo, sejam controlados os
gêneros textuais a que pertencem os textos.

3.4.7. Argumentação em redações escolares: Análise de elementos


modalizadores e avaliativos na perspectiva sistêmico-funcional
(MIGUEL, 2013)

A pesquisa de Miguel (2013) observa processos de argumentação em


redações escolares de alunos do Ensino Médio da rede pública estadual do Rio de
Janeiro, objetivando a investigação de funções modalizadoras a partir do estudo
de elementos lexicais e de sequências textuais que se apresentam com valor de
julgamento.
A base teórica para este estudo se alinha nas perspectivas da Linguística
Sistêmico-Funcional (Halliday, 1994), com vistas à análise da modalidade
(Halliday, 1994; Eggins, 2004; Thompson, 2004), em cruzamento com a Teoria
da Avaliatividade (Martin & White, 2005; Hunston & Thompson, 1999, Stubbs,
1996), no tocante à questão do o subsistema de Julgamento. Este aporte foi
utilizado para a observação dos regimes de avaliação que os autores das redações
assumem e expressam por meio do texto como mensagem.
Miguel (2013), em uma pesquisa qualitativa, selecionou redações de
alunos do ensino médio que foram produzidas atendendo dois processos: i)
descrição e observação dos elementos lexicogramaticais que auxiliavam as
estratégias argumentativas pretendidas pelos alunos e; ii) descrição, observação
e interpretação das sequências e progressão argumentativas com base nos
elementos de julgamento identificados nas redações.
63

O capítulo 04, de sua pesquisa, se dedica à abordagem das modalidades


enquanto tópico teórico da teoria sistêmico-funcional. Mencionando o período da
lógica clássica como ponto de partida para as reflexões dessa categoria, o autor
chega aos postulados de Palmer, para justificar a ampliação do “escopo da
modalidade” e inclusão, “além do eixo da possibilidade e da necessidade, os
conjuntos proposicionais que abarcavam as modalidades epistêmicas (aspectos
de crença) e deônticas (aspectos da conduta), essencialmente” (MIGUEL, 2013,
p. 38).
Em relação à Modalidade na Linguística Sistêmico-Funcional, Miguel
(2013) destaca os estudos de M.A.K. Halliday, que classificam a modalidade como
o espaço intermediário entre os níveis positivo e negativo das proposições. Tal
proposta sugere que o evento comunicativo se realiza em três campos funcionais
diferentes e interativos. O autor enfantiza que Halliday (1994) propõe que a
modalidade se encontra no campo da metafunção interpessoal já que os aspectos
modais dizem respeito às relações de troca entre os interlocutores.
Miguel (2013), a partir das observações detalhadas realizadas em seu
estudo, sob auxílio dos dados, concluiu que os textos selecionados apresentam
estratégias argumentativas relacionadas aos elementos modalizadores e
avaliativos, tais como a polarização e o uso de sequências textuais de julgamento.
Assim como os resultados da análise, que apontam também para o que o autor
chama de “uma variação na linearidade argumentativa dos textos” (p. 06), como
possibilitadora de reflexão sobre as práticas pedagógicas no tocante ao ensino de
gêneros argumentativos no contexto escolar.

3.4.8. Modalidade epistêmica e evidencialidade: um exercício de


análise funcionalista em textos acadêmicos e em entrevistas com
pesquisadores (SANTOS, 2008)

A proposta de Santos (2008) investiga os efeitos comunicativos


produzidos pelas categorias evidencialidade e modalidade epistêmica na fala e na
escrita a partir de um corpus composto por dez artigos acadêmicos e dez
entrevistas orais concedidas pelos autores dos textos escritos mencionados.
64

Na análise, uma questão nos chama atenção. A autora utiliza como


pressuposto teórico-metodológico os estudos sobrea tipologia dos evidenciais em
língua portuguesa, que são desenvolvidos por Dall’Aglio-Hattnher (2007) e a
estrutura da oração em camadas de orientação funcionalista holandesa (DIK
1989, 1997; HENGEVELD 1988, 1989).
A pesquisa leva em consideração que diferentes condições de produção de
texto são determinadoras para a mobilização das estratégias linguísticas que são
usadas. Dessa forma, nos textos que compõem o corpus, procura-se investigar o
que se conhece como “indicação da fonte da informação (domínio evidencial)” e
a “avaliação que o falante faz sobre o valor de verdade de sua afirmação (domínio
modal)” (SANTOS, 2008, p. 70).
Esta dissertação é totalmente pautada na compreensão de que
modalidades são categorias textuais-discursivas relevantes no processo de
produção de um gênero oral ou escrito. Para isso, a autora já inicia evidenciando
na questão da modalidade epistêmica para produção de argumentatividade nos
gêneros escritos acadêmicos.
São investigados nessa pesquisa os modalizadores epistêmicos que
incidem sobre a predicação e a proposição, uma vez que tem-se a oração como
uma estrutura hierárquica constituída por várias camadas.
Assim, o tratamento com os dados a partir de análise constatou que, nos
textos acadêmicos, há produtividade de modalizadores epistêmicos no nível da
predicação menos marcada do que no nível da proposição, por ocasião dos fatores
composicionais do gênero analisado.
Trabalhos como o nosso e o de Santos (2008) têm como primordial a
premissa de que o artigo acadêmico deve transparecer objetividade e
imparcialidade, mas nesse contexto, as entrevistas orais demonstram uma
situação inversa. Nessa modalidade (oral), a produtividade de modalizadores
epistêmicos sobre a proposição foi maior, confirmando a hipótese de que discutir
e avaliar textos já publicados implica um grau de comprometimento maior por
parte do falante.
65

3.4.9. A categoria modalidade e a (in)determinação de fronteiras


(PESSOA, 2014)

Pessoa (2014), em seu artigo, discute os limites – considerando-0s tênues


– que se estabelecem entre os tipos de modalidade, uma vez que se torna
extremamente difícil dizer onde termina uma e inicia outra.
Trata-se de uma pesquisa em torno da corrente teórica funcionalista, mas
trabalha com outras perspectivas da categoria em relevo, postuladas na
semântica e na pragmática.
Ao citar Cervoni (1989), a autora justifica que na linguística
contemporânea, a problemática das modalidades recuperou seu lugar pelos
seguintes fatos: (i) desenvolvimento das pesquisas sobre lógica da linguagem; (ii)
interesse na análise a partir da noção de Atos de Fala; e (iii) desenvolvimento da
Semiótica.
O trabalho sugere uma confluência teórica a partir dos pontos destacados
para a (re)inserção das reflexões linguísticas em torno da produção de
modalidade nos discursos orais e escritos.
Destacamos como interessante a abordagem “polissêmica” realizada pela
autora. A questão da fluidez categorial é enaltecida quando enfoca que pode
relações entre os tipos de modalidade, por exemplo, entre alética e deôntica, uma
vez que “uma necessidade lógica determina uma lei moral”, como ressalta a
autora. (PESSOA, 2014, p. 01)
A autora destaca “um outro ponto de interseção de fronteiras” (p. 06) como
sendo a consideração de que alguns elementos modais não apresentariam o
elemento subjetividade. A partir desta questão, para suas reflexões, faz-se mister
o reconhecimento de uma nova tipologia em se tratando de modalidade, a
dinâmica.
A problemática que envolve a subjetivização da modalidade está inserida
nas modulações nocionais a respeito de modalização epistêmica, considerando
que uma mesma forma pode ter diferentes interpretações, podendo esta questão
ser resolvida a partir da visão de que o contexto é um fator proeminentemente
decisivo para resolução.
66

3.4.10. A modalidade epistêmica nos discursos políticos


(GUIRADELLI et alli, 2011)

O trabalho de Guiradelli et al. (2011, p. 353) se propõe a analisar as “as


manifestações da modalidade epistêmica na língua portuguesa, especificamente
no português escrito do Brasil”, levando em consideração que o recurso de
modalização em destaque está relacionado ao comprometimento do falante com
a verdade do que se enuncia.
Os autores põem em destaque o caráter não procedural da modalização,
por não terem uma relação totalmente restrita às classificações sintáticas,
justificando que as escolhas analíticas para as reflexões expostas nesse trabalho,
englobarão sintaxe, a semântica e a pragmática, que referenda a perspectiva de
âmbito funcional inserida na envergadura teórica do trabalho.

As modalidades têm sido tratadas por diferentes estudiosos de


acordo com diversos pontos de vista, ora privilegiando a sintaxe,
ora a semântica e ora a pragmática. E têm sido tradicionalmente
classificadas segundo o campo semântico no qual se assenta a
avaliação feita pelo falante. Ainda que nem sempre essa tipologia
seja consensual, quatro são as modalidades mais frequentemente
identificadas nos muitos estudos sobre o tema: modalidades
alética, volitiva, deôntica e epistêmica. (GUIRADELLI et alli,
2011, p. 355)

Dessa forma, a pesquisa engloba a perspectiva funcionalista da linguagem,


por abarcar, imbrincadamente, aspectos sintáticos, semânticos e pragmáticos em
relação à competência comunicativa dos falantes.
Para a análise, os autores constituíram um corpus de “discursos políticos”,
pronunciados pelo presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, retirados
de sites que tratam da temática, em diferentes momentos de seu governo. Os
autores justificam a escolha do corpus “pelo fato de os discursos políticos
assumirem um papel importante na persuasão e também pelo fato de
favorecerem o surgimento de valores epistêmicos”. (GUIRADELLI et alli, 2011, p.
354)
O artigo mostra definições e conceitos para a modalidade relaciona-os a
alguns pressupostos teóricos a respeito de discurso político; em seguida, analisa
efeitos de sentido reproduzidos pelos modalizadores nos discursos selecionados
67

no corpus e observa a função que as “manifestações do saber” – categoria


analítica - exercem na organização discursiva dos textos analisados.
Por fim, através do que é permitido concluir por intermédio da análise do
corpus, os autores constatam que os modalizadores epistêmicos são produtivos,
enquanto ocorrência, pela determinação das intenções comunicativas do falante.
É característica desta tipologia a necessidade de convencimento e
comprometimento do falante em praticamente todos os momentos políticos
representados, por conseguinte, é comum que os dados apontem um maior grau
de certeza e um menor grau de possibilidade/incerteza na fala do presidente Lula.
68

4. CONDUÇÃO DA PESQUISA SOBRE MODALIZAÇÃO

Neste capítulo, como nos indicia o título, apresentaremos os dados obtidos


na pesquisa sobre modalidades e seus respectivos instrumentos linguísticos, a
partir de informações quantitativas que alicerçarão a discussão qualitativa.
Verificaremos sob quais mecanismos linguísticos a modalização se realiza
no gênero artigo acadêmico e, ainda, quais são as estratégias discursivo-
argumentativas elaboradas a partir de categorias gramaticais mobilizadas pelos
autores e aqui identificadas como elementos de construção persuasiva.
Julgamos importante enquadrar os aspectos observados sob a perspectiva
icônica, visto que buscaremos refletir sobre as motivações de uso que se revelam
na tessitura textual e se especializam como tendências gramaticais nos aspectos
linguísticos do gênero em tela.

4.1. PERCURSO METODOLÓGICO

Em relação aos primeiros procedimentos da pesquisa, que envolvem, entre


outros, a coleta de dados, constituímos uma amostra composta por dez artigos de
Engenharia e outros dez de Pedagogia, todos retirados de anais de congressos de
2009 e 2010, respectivamente.
Sobre o tratamento dos textos, na constituição do corpus, ainda, lançamos
mão do que se conhece por “metodologia de filtragem do corpus” (SARDINHA,
2004), uma vez que existem, nos artigos, seções que não são escritos de
propriedade do autor: referências, citações diretas, com mais de três linhas e
outras informações textuais que são de origens alheias foram retiradas.
Assim, explicamos que a metodologia adotada para realizar esta pesquisa
foi de caráter qualitativo e quantitativo, focalizando os aspectos linguísticos (em
seu sentido amplo) do gênero artigo acadêmico através de técnica
interpretativista, “por representar um método de investigação que revela novas
descobertas a partir de processos de uso de linguagem” (MOITA LOPES, 1996, p.
22).
Dessa forma, investigamos os tipos de modalidade que ocorrem no gênero
citado, priorizando formas de expressão linguística utilizadas por usuários
69

(autores) no contexto de produção e arquitetura textual. Reiteramos, a partir do


objetivo geral desta pesquisa, que é importante refletir se as diferentes áreas
(Pedagogia e Engenharia) mobilizam de formas diferenciadas esse recurso
discursivo no empenho de autorizar o uso de uma linguagem própria de área
acadêmica.
Para tanto, utilizamos, a partir do quadro de modalidades elaborado com
base em pesquisas profícuas, em relação ao tratamento funcional, categorias,
como citadas em nosso capítulo de fundamentação teórica (pág. 40), que
demarcam modalidade epistêmica, alética e deôntica, por apresentarem
diferentes facetas enunciativas quando expressas por diversificados recursos
linguísticos.
Para a observação do fenômeno linguístico estudado, foram desenvolvidas
as seguintes etapas:
a) levantamento e digitação dos trechos em que ocorrem mecanismos
linguísticos que expressam a modalidade;
b) codificação de cada uso a partir de critérios que contemplam variáreis
linguísticas, textuais e discursivas;
c) análise quantitativa das expressões de modalidade estudadas;
d) interpretação dos resultados obtidos na quantificação dos dados;
e) análise e descrição dos resultados encontrados.
Em relação à coleta de dados, selecionamos artigos de áreas distintas,
humanas e exatas, para aferição dos fenômenos que hipoteticamente
demarcamos.
A pesquisa, em sua origem, desde os idos do grupo de pesquisa
ESAELP17/CNPq/UFRRJ18, cuja nossa participação se deu no âmbito da
graduação em Letras, selecionou artigos de oito áreas distintas (Engenharia,
Pedagogia, Letras, Química, História e Computação).
Inicialmente, as investigações realizadas nos grupos de pesquisas
mencionados atestaram que os artigos das áreas de humanas trazem,
praticamente, o mesmo perfil, em se tratando de recursos discursivo-
enunciativos, nos quais enquadramos o recurso da modalidade. Nos cursos de
engenharia também se observa essa característica. Então, nossa intenção em

17 Estudos Sociolinguísticos Aplicados ao Ensino de Língua Portuguesa.


18 Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
70

analisar áreas tão distintas, deve-se ao propósito de descrever o comportamento


do fenômeno estudado, a modalização, em áreas tecnicamente distanciadas,
tentando identificar (retomando objetivos específicos) recursos linguísticos e
discursivos que servem aos usuários, quando esses têm objetivos semelhantes
(divulgação científica), mas objetos distintos. Especialmente, porque se
convencionou que as áreas das chamadas ciências exatas fazem uso de uma
linguagem pretensamente mais impessoal, neutra, o que torna importante a
análise comparativa entre os dois domínios.
As investigações partiram da reflexão sobre a composição do gênero
acadêmico e verificaram a mobilização de elementos linguísticos na construção
semântico-enunciativa das modalizações como estratégias discursivo-
argumentativas nos textos que correspondem ao gênero.
As áreas de Engenharia e Pedagogia já haviam sido objeto de reflexão
através de trabalho de iniciação científica, sob a perspectiva da Linguística
textual, que muito dialoga com o Funcionalismo Linguístico. No contexto de
nossa inserção como pesquisador no grupo ELMEP19/CNPq/UFRRJ, surgiu-nos
o interesse em verificar as mesmas áreas, sob o prisma funcional, por entender
que os artigos correspondem a produções factuais de uso da língua e, assim,
merecem atenção por retratarem tendências atuais em relação à produção escrita
do gênero em relevo.
Do empreendimento investigativo de que esse trabalho é remanescente,
existem amostras de outras quatro áreas (química, computação, letras, história).
Por questões de escopo, coletamos 10 artigos para cada área, daí que nossa
amostra também é constituída por essa quantidade, porque segue os mesmos
parâmetros de quantificação de amostras das demais áreas de conhecimento.
Além disso, para os propósitos deste trabalho, esse universo oferece um
quantitativo consistente de dados, materializando um panorama funcional do
fenômeno em análise.
Assim, quando da organização do corpus, no grupo de pesquisa já
mencionado, buscamos diversos eventos e deles verificamos as publicações, em
anais, de artigos acadêmicos. Coletamos os arquivos em pastas separadas e,
inicialmente, utilizamos os softwares Adobe Acrobat e Microssoft Word para
leitura e retirada de partes que não correspondiam ao texto essencialmente

19 Estudos Linguísticos, Multiletramentos e Ensino de Português.


71

produzido pelo autor (citações longas, cabeçalhos, rodapé), partindo para a


demarcação de partes do texto que fossem formulações próprias.
O passo seguinte foi estabelecer uma lista de códigos e verificar a
elaboração do quadro de modalidades estabelecido dentro dos pressupostos
teóricos, para que a leitura e a marcação dos dados fossem respaldadas a partir
de critérios preestabelecidos. Para que o manejo com os dados acontecesse de
forma mais simplificada, marcamos de amarelo as modalidades que não
representavam dúvidas a respeito de suas classificações e, de azul, aquelas que
geravam dúvidas. Posteriormente, recorremos à literatura técnica para que
pudéssemos classificar os fenômenos de acordo com suas especificações.

4.1.1. Preparando a análise

Apresentamos, nesta seção, o que chamamos, por questões técnicas,


“grupos de fatores”, mas esta denominação não se compromete com o que
preconizam as análises labovianas. Os códigos utilizados nesta pesquisa são
resultados de investigação anterior (pesquisas oriundas do ESAELP, ELMEP –
CNPq -, PROIC20/UFRRJ, de 2009 a 2014) que passaram por diferentes
reformulações em relação às definições das variáveis, chegando finalmente a uma
lista mais completa e confiável.

Quadro 03: Códigos utilizados para análise


ITEM/ CONSTRUÇÃO
MODALIDADES ÁREAS
GRAMATICAL
Deôntico d Pedagogia P Advérbio 1
Epistêmico/certeza c Engenharia E Adjetivo 2
Epistêmico/probabilidade p Const. com poder 3
Alética/necessidade a Const. com dever 4
Alética/possibilidade n Verbo no presente 5
Epistêmico/Deôntico E Ser + adjetivo 6
Alético/Epistêmico A Locução Adverbial 7
Deôntico/Alético e Futuro do pretérito 8
Loc. Verbal com ter 9
Gerúndio #
Subjuntivo =
Const. com Permitir &
Substantivo $
Outro 0
Futuro presente @

20 Programa de Iniciação Científica.


72

Fonte: Elaboração própria, 2018.


Para consideração dos dados quantitativos, fez-se necessário, então, o
estabelecimento de códigos que foram colocados em ordem, de acordo a
ocorrência de cada evento textual em que apareceu um caso de modalidade,
observando a ocorrência de um fator específico, sendo iniciado e marcado pela
abertura de parênteses.
A título de fixação conceitual, apresentamos, brevemente, os conceitos de
modalidades:
a) Deônticas: têm a ver com a moral, com o tratado dos deveres e das normas
de conduta. Quando revela possibilidade, se cruza com características
aléticas:

(4) Segundo Maluf (2003), é necessário apontar o papel do professor na garantia


e enriquecimento das brincadeiras como atividades de interação social do
mundo infantil. As atividades lúdicas precisam ter lugar garantido na
educação infantil. Entendemos assim, que o professor tem um papel
primordial para que isso aconteça, pois é ele que possibilitará às crianças
assimilarem a cultura de forma criativa e participativa.
(PED_01)

b) Epistêmicas: revelam crença do locutor na verdade do que diz no momento


da enunciação. Apresenta-se caracterizando certeza, probabilidade,
hipótese e dúvida:

(5) Segundo Soares (2001-2002), ao se falar da Educação Física escolar


acredita-se que ela deverá abarcar todas as formas da cultura corporal –
jogos e brincadeiras, esporte, dança, ginástica e lutas – e, ao mesmo tempo
abranger todos os alunos.
(PED_01)

c) Aléticas: referem-se ao fato de o locutor ver a realização da situação, como


algo possível, viável. Expressa-se caracterizando necessidade e
possibilidade. Ainda pode trazer traços epistêmicos, quando revela
probabilidade e dúvida:
73

[alética de necessidade]
(6) Segundo Debortoli, Linhales e Vago (2001-2002), para a consolidação da
Educação Física na educação infantil, é preciso uma qualificação
permanente dos educadores para que se possa constituir uma ação educativa
capaz de identificar e enfrentar os problemas já arrolados, apresentando-se
também como estratégia de superação das fragmentações presentes na
Educação Física.
(PED_01)

[alética de possibilidade]
(7) Segundo Debortoli, Linhales e Vago (2001-2002), para a consolidação da
Educação Física na educação infantil, é preciso uma qualificação permanente
dos educadores para que se possa constituir uma ação educativa capaz de
identificar e enfrentar os problemas já arrolados, apresentando-se também
como estratégia de superação das fragmentações presentes na Educação
Física.
(PED_01)

A partir de nossas observações, percebemos que algumas ocorrências


apresentavam uma natureza ambígua, parecendo sobrepor duas modalidades ao
mesmo tempo. Por isso, decidimos analisar, separadamente, esses dados.
No exemplo seguinte, a construção ser + adjetivo tem ao mesmo tempo
valores de certeza (expresso pelo verbo no futuro do presente) e possibilidade
(expresso pelo adjetivo possível). Ainda, verificamos no mesmo período, outra
ocorrência de modalidade, posta por outro elemento linguístico:

(8) A partir da construção da ATT, será possível realizar uma caracterização


qualitativa dos RCC para investigar a possibilidade de reciclagem.
(ENG_08)

Verificamos que a modalização, na condução discursiva, mobiliza


elementos irrestritos que se unem para referendar a intencionalidade textual na
construção argumentativa. A partir da análise, perceberemos esse fenômeno de
maneira mais clara.
74

4.2. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Após o levantamento estatístico dos dados, abrimos a seção apresentando


detalhamentos acerca do conteúdo quantitativo obtido, através de tabelas e
gráficos que apresentam a porcentagem de dados por área.
Observamos que a maior quantidade de dados encontra-se na área de
pedagogia. Podemos depreender que esse fenômeno se revele pelo maior uso dos
recursos modais em artigos voltados à área de educação. Nos dados de Pedagogia,
verificamos 667 ocorrências de modalidade, enquanto nos de Engenharia, 216.

Gráfico 1: Quantidade de dados por área.

QUANTIDADE DE DADOS POR ÁREA

ENGENHARIA
24.5%

PEDAGOGIA
75.5%

Fonte: Elaboração própria, 2018.

Na tabela abaixo, verificamos o detalhamento dos percentuais ilustrados


no gráfico anterior, entendendo, principalmente, os grupos de modalidade
enquadrados como fatores, na rodada do programa.
75

Tabela 01: Distribuição geral das ocorrências por tipos de modalidade em artigos nas áreas de
Pedagogia e Engenharia21.

MODALIDADE

EPISTÊMICA DEÔNTICA ALÉTICA TOTAL

ÁREAS

PEDAGOGIA 463/667 164/667 40/667 667/883


(69.4%) (24.6%) (6%) (75.5%)

ENGENHARIA 169/216 12/216 35/216 216/883


(78.2%) (5.6%) (16.2%) (24.5%)

TOTAL 632/883 176/883 75/883 883/883


(71.6%) (19.9%) (8.5%) (100%)
Fonte: Elaboração própria, 2018.

Embora saibamos que a produção acadêmica, em diversas áreas, tem


tendências fixadas, com proibições tácitas em relação à condução da composição
dos textos de divulgação científica, os discursos, eventualmente, são construídos
a partir de especificidades do ato comunicativo (alguns recursos utilizados pelos
usuários para asseverar, dar grau de certeza e credibilidade ao seu texto e/ou, até
mesmo, fixar a atenção do interlocutor), mesmo que no texto escrito. Estes,
muitas vezes, são propósitos necessários, mas a função argumentativa inerente a
cada área assume pistas para que possamos refletir se há certa regularidade ou
mecanismos próprios, nos artigos, para produção semântico-enunciativa
revestida de persuasão.
O fato é que os discursos se realizam de acordo com critérios que já são
cristalizados nos meios enunciativos em que são produzidos, por exemplo,
ideologia e historicidade discursivas, conferidas às construções linguísticas
ligadas ao contexto social onde o texto circula e/ou é produzido.
O que defendemos é que, na escrita, quando se lança mão de mecanismos
de modalidade, há vários elementos que legitimam as escolhas do
usuário/escritor. Nossa pesquisa verifica, justamente, como as áreas de
conhecimento influenciam os usos das modalizações em seus produtos
linguísticos escritos, especificamente, os artigos acadêmicos de produção

21 Para a rodada de dados estatísticos e um possível cruzamento destes com fatores de


investigação, foi cogitada a plena utilização do Varbrul. Entretanto, como nossas investigações
não se ancoram em perspectivas da sociolinguística variacional, julgamos que menções ao
software não seriam relevantes para o desenvolvimento da análise.
76

científica.
Há, de fato, uma subjetividade que cerca as produções dos artigos. De
acordo com a área, existirão mais ou menos elementos de subjetividade ou
objetividade inseridos nos mecanismos de argumentação e persuasão. Há, ainda,
áreas em que os discursos científicos propõem elementos mais epistêmicos,
corroborando, metodologicamente, o comprometimento científico das pesquisas
publicadas, outras em que o fator epistemológico surge de uma realidade
concreta, refletida, de uma experiência que necessariamente precisa ser exposta
e adotada como metodologia para promoção do saber, ciência e aprendizagem.
Cada uma das áreas investigadas nesta pesquisa tem suas idiossincrasias
textual-discursivas. Verificamos os resultados apresentados no Gráfico 01, bem
como na Tabela 1, que endossam a diferença em relação às duas áreas de
conhecimento no que tange a estratégia de modalidade na escrita acadêmica.
Observamos que, dos 883 dados codificados, 75,5% ocorrem,
predominantemente, na área de pedagogia, enquanto que 24.5% na área de
engenharia.
Percebemos, com isso, que, em relação às estratégias de argumentação, a
área de Pedagogia apresenta marcas subjetivas atreladas ao recurso persuasivo
de maneira mais acentuada que na área de exatas.
Em ambas as áreas, constatamos a especialização da modalidade
epistêmica através da predominância de elementos linguístico-discursivos que
referendam este fenômeno no evento enunciativo. De certa forma, já havíamos
avaliado que isso aconteceria por ocasião desta modalização ser própria do
domínio do conhecimento, do saber/fazer científico, que são inerentes à
composição do gênero artigo científico.
Com relação à modalidade deôntica, os dados nos informam sobre sua
concentração ser mais encontrada na área de Pedagogia. A maioria dos artigos
dessa área aborda uma temática mais ligada a ensino e aprendizagem, muitas
vezes a partir de injunções metodológicas, possibilitando a produtividade de
expressões alçadas no domínio do dever, da obrigatoriedade, prototípicos desse
tipo de modalidade. Em Engenharia, a produtividade está concentrada na
77

descrição sobre o estado de coisas22, o que não motiva, de maneira significativa,


o uso desse tipo de modalidade. Vejamos como os exemplos (9) e (10) ilustram
essa afirmação:

(9) Com o brinquedo, a professora deveria saber onde chegar, o que


desenvolver. Assim, o objetivo educacional deveria ser o de criar atividades
que facilitem à criança tomar consciência de seu corpo e de suas ações.
(PED_02)

Neste exemplo, o autor expõe sua crença em relação à obrigatoriedade da


ação da professora, respaldada pelo uso da forma verbal em futuro do pretérito,
do auxiliar modal, revelando uma modalidade deôntica na primeira enunciação.
O segundo período revela certa ambiguidade acerca da classificação da
modalidade: muito além do dever, a locução exprime a condição de verdade que
o objetivo educacional exerce e, ao mesmo tempo, com significação menos
atenuada, o dever desse objetivo.
Para ilustrar uma ocorrência plena da modalização deôntica, o dado
abaixo, da área de Engenharia, faz uso da modalidade quando respaldada pela lei,
a partir de um trecho da Constituição Federal, em que a questão não está mais
voltada para um julgamento particular do autor, como pudemos depreender do
último exemplo.

(10) Por fim, a incidência de Impostos sobre Serviços (ISS) sobre as operações
relativas a comercialização de energia elétrica devem ser consideradas
por força do §3º do Art. 155 da Constituição Federal.
(ENG_02)

A modalidade alética, como revelam nossos dados, é pouco recorrente,


tendo 8.5% do total de dados. Na área de Pedagogia, encontra-se a maior
quantidade de ocorrências desse percentual.

22“Um estado de coisas indica que algo pode ocorrer em um mundo real ou pode ser criado no
mundo mental do falante e do destinatário, é localizado no tempo e no espaço, pode ter uma certa
duração, pode ser visto, ouvido ou percebido de alguma maneira”. (SANTOS, 2008, p. 26)
78

(11)A interação para Vigotsky pode ser estendida também para o campo
tecnológico, uma vez que as ferramentas possibilitam interagirmos nos
comunicando de diversas maneiras virtual como presencialmente.
(PED_10)

Na recomendação orientada pelo autor do artigo, o conceito presente na


teoria de Vigotsky apresenta-se como algo necessário, ou possível, no campo
tecnológico. Para isso, é utilizada uma expressão com o modal poder para reforçar
sua afirmação.
O nível de subjetividade aferido na escrita do autor determina a diferença
em relação à quantidade de dados por área. O tema também auxilia na
mobilização das modalidades no contexto de escrita acadêmica.
A área de Pedagogia traz, no seu discurso, além de elementos oriundos de
seu saber, aspectos volitivos, ligados às experiências dos autores. Isso determina
a utilização dos mecanismos linguísticos e implica, também, no valor modal
conferido às suas argumentações.
Na área de Engenharia, a condução da argumentação, além de elementos
linguísticos, se utiliza de gráficos, tabelas, quadros, que auxiliam no respaldo
persuasivo do qual o texto se intenciona, mais do que na área de Pedagogia, como
percebemos em nosso corpus. Isso não quer dizer que estes sejam recursos
próprios de “exatas”, mas que são mais recorrentes do que em outras áreas.
Podemos observar, na próxima tabela, o quantitativo referente aos tipos
de modalidade identificados em cada área investigada. As modalidades
Epistêmicas de Certeza revelaram-se como a modalização mais produtiva no
gênero produzido em ambas áreas. Nesse tipo de discurso, essa modalidade está
diretamente comprometida com o valor de verdade ideacional na produção das
argumentações, teses e defesas de pontos de vistas.

Tabela 02: Frequência dos tipos de modalidade por área.


QUANTIDADE DOS TIPOS DE MODALIDADE POR ÁREA
PEDAGOGIA ENGENHARIA
ALÉTICA/ NECESSIDADE 7 (0,7%) 5 (1,8%)
ALÉTICA/ POSSIBILIDADE 12 (1,6%) 20 (11,6%)
ALÉTICA/EPISTÊMICA 21 (3,1%) 10 (6,9%)
EPISTÊMICA/ CERTEZA 453 (69%) 160 (72,2%)
79

EPISTÊMICA/ PROBABILIDADE 1 (0,1%) 1 (0,5%)


EPISTÊMICA/DEÔNTICA 9 (1,2%) 8 (1,4%)
DEÔNTICA - DEVER/PERMISSIVIDADE 163 (24,3%) 11 (5,1%)
DEÔNTICA/ALÉTICA (necessidade) 1 (0,1%) 1 (0,5%)
TOTAL 667 (100%) 216 (100%)
Fonte: Elaboração própria, 2018.

Explicitaremos, a seguir, cada um dos tipos de modalidades expressos na


tabela acima, sob auxílio de exemplos retirados do corpus.

4.2.1. Aléticos de necessidade

Os aléticos de necessidade, conforme observação dos dados, apresentam-


se, frequentemente, através de adjetivos, substantivos, construções [Cop+S.adj],
construções com dever, entre outras, na intenção de expressar necessidade em
seus enunciados. Vejamos:

(12) Ao se falar de fins naturais, Chateau considera os aspectos biológicos do


ser humano, mas não se pode esquecer que para se formar um cidadão é
preciso referenciar os fatores sociais e os valores expressos
intencionalmente por cada sistema educativo.
(PED_01)

A construção ser + adjetivo indica necessidade, a partir do que considera


o autor referido no exemplo. A modalidade é realizada através de predicação
constituída por verbo copulativo23 e sintagma adjetival (COP+S.Adj), uma
estrutura comum em casos de modalidade alética com sentido de necessidade.
Julgamos importante frisar que nos discursos da área de Pedagogia, o uso
dessa modalidade, muitas vezes, se relaciona com ações de futuro e mudança de
atitudes, através de enunciados próprios de algumas metodologias adotadas

23 Geralmente conhecidos por “verbos de ligação”. Encontram-se em posição entre o sujeito e o


predicativo do sujeito e, segundo Azeredo (2011, p. 213), “jamais exprimem ação [...], formam um
conjunto limitado de elementos e indicam basicamente diferenças aspectuais no sentido de
‘conceptualização do estado de coisas’”.
80

nesse campo de saber.


Em Engenharia, quando a argumentação trata de procedimentos
experimentais, também verificamos essa “mudança” elementar. Na descrição dos
fenômenos, o autor regimenta procedimentos, sendo, nesse contexto, produtivo
o uso de locuções verbais com dever.

(13) Estes valores têm influência diretamente no valor da energia produzida,


porém pouco significam sob o ponto de vista qualitativo. Neste aspecto,
deve-se observar que a potência Pm mantêm constante em Pr quando
x≥xr.
(ENG_01)

Neste exemplo, o auxiliar modal dever (em estrutura não contigua: a


construção é intercalada por partícula apassivadora), sob função discursiva que
determina necessidade, é revestido também, de uma semântica procedural, já que
o enunciado no qual se encontra acionado trata de procedimento metodológico
em relação a experimento.
No gênero artigo, quando o a construção da argumentação muitas vezes se
faz de forma impessoal, é comum que construções injuntivas sejam mobilizadas
a partir de partícula apassivadora, para indicar a impessoalidade discursiva.

4.2.2. Aléticos de possibilidade

A situação descrita nessa modalidade é tida como algo possível, tendo


como marca linguística especializada as locuções verbais com poder, o recurso de
modalização alética tem esse principal traço que indica possibilidade.

(14) A Figura 6 apresenta o coeficiente de potência e o coeficiente de torque


em função do λ. A curva de Cq x λ apresenta um trecho reto que pode ser
facilmente modelado.
(ENG_01)

(15) Para valores de n<2, o valor de Cp pode se tornar muito reduzido


quando a turbina está operando com velocidades de vento elevadas. No
81

intervalo xin≤x≤xr, a condição de operação pode ser determinada


fazendo Tm= Tc.
(ENG_01)

(16) Assim, sabendo quais precipitações apresentam semelhanças qualitativas,


torna-se possível submeter águas provenientes de precipitações distintas,
porém, com características semelhantes, a diferentes meios filtrantes,
possibilitando a comparação entre as performances dos filtros.
(ENG_01)

Nos exemplos (14) e (15), encontramos descrição de fenômenos


(modelagem e velocidade, respectivamente), mas condicionado à realizações
algébricas sugeridas. A locução (PODER+SER), nesse caso de modalidade,
explora o sentido de possibilidade que envolve todo discurso empreendido.
Em (16), o excerto apresenta dois modalizadores responsáveis pela
argumentação. Na primeira ocasião, o verbo tornar, acompanhado de possível
(forma nominal de característica adjetival), caracteriza o sentido de possibilidade
do mecanismo linguístico, assim como acontece com a forma em gerúndio.
Ambos elementos linguísticos se relacionam com sentido de possibilidade
conferido ao tipo de modalização em relevo.

4.2.3. Alético/epistêmico

A ocorrência desse tipo de modalidade, nas áreas investigadas, mostra-se


pouco representativa em relação à totalidade dos dados. Em Pedagogia,
concentra-se sua maior produção. Este recurso utiliza-se de uma ambiguidade
modal que une possibilidade ou necessidade a valores de certeza.

(17) Pode-se citar as dificuldades de aprendizado, de socialização e a


delinqüência não como fator central, mas como um problema de
personalidade que poderia ser remediado, já que nas séries iniciais a
educação tem forte impacto sobre o desenvolvimento cognitivo da
criança.
(PED_08)
82

A construção verbal com poder, no exemplo acima, transcende o sentido


de possibilidade, significando, também, necessidade. O recurso apassivador
referenda o teor argumentativo objetivando valor de verdade do conteúdo
enunciado.

4.2.4. Epistêmicos de certeza

A argumentação, nessa modalidade, utiliza-se de verbos no presente, no


futuro do presente e no futuro do pretérito, no intuito de indicar certeza ou
incerteza.

(18) Entretanto, para que se atendam às metas estabelecidas por tal resolução,
é imprescindível um diagnóstico da atual situação desses resíduos no
município.
(ENG_08)

No exemplo acima, verificamos a presença de uma construção – verbo ser


+ adjetivo – que, a partir de nossas observações, assume uma amálgama alética
(mostra-se produtiva nessa modalidade), mas o todo discursivo revela a crença
do autor referendada pela construção copulativa.
Como os epistêmicos de certeza estão relacionados com a crença do autor,
no que pode ser visto o certo ou provável, dentro do campo do saber, a construção
utilizada no exemplo acima, reforça o comprometimento do usuário, “através do
status factual do que se está dizendo” (TRAVAGLIA, 1999, p. 69), de forma
pontual com uma certa verdade incutida no discurso, garantidas pelo
conhecimento de mundo do autor do texto.

(19) Caillois (1967) nos explica que o jogo possui algumas características que
são definidas essencialmente como uma atividade: Livre, uma vez que, se o
jogador fosse a ela obrigado, o jogo perderia de imediato a sua natureza de
diversão atraente e alegre; Delimitada, circunscrita a limites de espaço e
tempo rigoroso e previamente estabelecidos; Incerta, pois o seu desenrolar
não pode ser determinado, nem o resultado pode ser obtido previamente;
Improdutiva, porque não gera nem bens nem riqueza, nem elementos novos
de espécie alguma; Regulamentada, pois está sujeita a convenções que
83

suspendem as leis normais e que instauram momentaneamente uma


legislação nova, a única que conta; Fictícia, acompanhada de uma consciência
específica de uma realidade outra, ou de franca irrealidade em relação à vida
normal.
(PED_01)

Em (18), temos a modalidade epistêmica verificada pela ocorrência da


possibilidade associada ao status informacional de certeza lançado pelo autor que
constrói sua argumentação em torno das características dos jogos no ambiente
escolar. Lançando mão de uma construção verbal com poder, utiliza-se da
negação, uma vez que a argumentação não circula apenas nas afirmações, como
bem sabemos e, ainda, tal recurso atesta a veracidade de sua exposição.
As duas ocorrências de construções com poder modal + ser auxiliar
(pleno) revelam verdade, mas com asseveração equidistante, visto que os
sentidos de possibilidade e necessidade assumidos pelo modal estão mais
direcionados ao campo da crença.
A asseveração de um discurso se realiza através de

(20) Esta investigação preliminar será útil quando da investigação em escala


plena, dada a dificuldade de armazenamento de água pluvial em volume
suficiente para que cada precipitação coletada seja submetida à filtração em
cada um dos três meios filtrantes distintos.
(ENG_03)

Constatamos, em análise, que este se trata de um dos raros recursos,


verificados em realização de modalização epistêmica, a partir da utilização do
verbo no futuro do presente, não revestido, somente, de sentido de necessidade,
mas como algo que revela certeza em relação à sua prática no determinado campo
do saber.
Apresentamos, a seguir, outra possibilidade de modalidade epistêmica que
acarreta sentido na intenção de reforçar a sua regularização no empreendimento
da condução argumentativa do enunciado e que, produtivamente, se revela de
forma parca no corpus.
84

4.2.5. Epistêmicos de probabilidade

Nesta seção, temos uma modalidade que representa raridade em relação a


algumas ocorrências na escrita do gênero investigado. Esta modalização,
geralmente, indica chances de algo acontecer ou não, baseada em
possibilidade(s).

(21) Sendo assim, o objetivo educacional da utilização dos brinquedos seria a


busca do equilíbrio entre estas duas funções, entretanto, um desequilíbrio
entre elas ocasionaria duas situações prováveis: perder-se-ia a função
lúdica e haveria só ensino ou, o lúdico predominaria havendo apenas
“passatempos”, perdendo a ação pedagógica.
(PED_01)

O autor indica, no texto, o que está considerando provável, ou passível de


realização, no tratamento de atividades lúdicas que utilizam o brinquedo no
desenvolvimento de metodologias de ensino na área de Pedagogia.

4.2.6. Epistêmico/deôntico

Esta modalidade é mais uma das que apresentam baixa quantidade de


dados no corpus. Caracteriza-se por unir valores de certeza a valores de
obrigatoriedade ou permissibilidade.

(22) Quando brincam em aula, geralmente o objetivo é passar o tempo. Porém,


o jogo realizado dentro da escola deveria ser aquele que se inclui em um
projeto, que tem objetivos educacionais. Com o brinquedo, a professora
deveria saber onde chegar, o que desenvolver. Assim, o objetivo educacional
deveria ser o de criar atividades que facilitem à criança tomar consciência de
seu corpo e de suas ações.
(PED_01)
85

Neste caso, o exemplo revela três ocorrências nas quais a obrigatoriedade


e o efeito de certeza, empreendidos no discurso, são amenizados pela ocorrência
do futuro do pretérito do verbo dever.

4.2.7. Deônticos – dever/permissibilidade

Nesse campo de modalidade, o aspecto da obrigatoriedade se coaduna ao


permissível. A construção verbal com dever revela-se produtiva nesse contexto.

(23) Essa maneira da professora Érica ministrar suas aulas vem de acordo com
o que Kishimoto (2006) diz, que nas situações de jogos e brincadeiras, o
professor deve propor às crianças perguntas que agucem sua curiosidade,
seu papel será o de orientar as crianças a descobrir todas as possibilidades
oferecidas pelos jogos, de pensar juntos, porém respeitando o momento de
aprendizagem dos alunos.
(PED_02)

Em seu relato, o autor aborda a estratégia do professor em conduzir a


interação em sala de aula como um dever metodológico, permitido pela
observação de uma prática eficaz.
Da locução (DEVER+PROPOR), focamos a predicação permissiva ao
sentido que o auxiliar instaura. O tipo de modalidade em questão preconiza,
justamente, uma enunciação que produz sentido de dever e/ou permissibilidade.
Textos que tratam de procedimentos metodológicos que devem ser
adotados em sala de aula são propensos à realização desta modalidade, pois têm,
normalmente, um teor injuntivo.

4.2.8. Deôntico/Alético

Na utilização desta modalidade, o autor acaba por associar valores de


obrigatoriedade ou permissibilidade a valores de necessidade ou possibilidade. A
86

realização dessa modalização é, também, considerada rara em termos de


ocorrência no corpus.

(24) O E10 é o padrão máximo de mistura (blending cap) atualmente permitido


pela agência ambiental americana Environmental Protection Agency – EPA.
O Renewable Volume Obligation - RVO, determina o percentual que as
refinadoras devem adicionar, baseando-se no volume de combustível
(gasolina e diesel) produzido por cada empresa nos EUA.
(ENG_04)

O verbo dever, nesse caso, tem valor de necessidade. Observamos que ele
se acopla a um valor de obrigatoriedade verificado no contexto, que demonstra
um padrão sobre uma conduta técnica de mistura de gasolina e diesel nas
refinadoras.
Vimos que as modalidades podem ser organizadas por duas polaridades:
primeiro, a que tem a ver com a determinação de realização da proposição
(deôntica) e; segundo, as que têm a ver com a própria realização da situação: a
crença ou não do usuário na sua verdade (epistêmica) e sua possibilidade ou
necessidade (alética). (Cf. TRAVAGLIA, 1999, p. 70)
Expressas por uma gama de elementos linguísticos, as modalidades, no
campo das predicações, manifestam-se produtivamente a partir de auxiliares
modais, seguidas de predicados copulativos e sintagmas adverbiais. No nível da
proposição, é realizada, principalmente, por advérbios.
Dando continuidade às nossas reflexões mediante as observações
coletadas dos dados no corpus, no próximo capítulo trataremos, analiticamente,
dos recursos de modalidade sob a ótica funcionalista.
87

5. ASPECTOS FUNCIONAIS SUBJACENTES À NOÇÃO DE MODALIDADE

A pesquisa funcionalista, que se baseia em elementos linguísticos


disponibilizados pela constituição de um corpus, objetiva descrever a língua a
partir de uma relação icônica entre forma e conteúdo, ou forma e função,
considerando que a forma assumida pela estrutura gramatical tem uma relação
intrínseca com o sentido empreendido no mecanismo linguístico que desemboca
na instituição discursiva de um texto.
O corpus, em pesquisa funcionalista, representa o uso real da língua. No
nosso caso, o texto escrito, tem comprometimento com a factualidade do que
realmente é produzido no contexto acadêmico, com o propósito de divulgação da
produção científica.
Muitos pesquisadores, quando consideram o texto escrito como passível de
observação de usos reais, propõem um diálogo – válido – das teorias
funcionalistas com as de linguística de texto, ou ainda, considerando as relações
interacionistas que encerram a produção e análise de um gênero textual, sugerem
um olhar sócio-discursivo (por exemplo, o que postula Bronckart, 2012) para
essas “matérias-primas”.
Desse modo, apresentaremos esses “diálogos” para reforçar a validade
funcional da nossa pesquisa sobre o texto acadêmico, apresentando exemplos
oriundos de nosso corpus na intenção de ilustrar os fenômenos listados em
seções.

5.1. DAS RELAÇÕES ICÔNICAS

Como já mencionado, a noção de Iconicidade, como um dos princípios


basilares à nossa condução teórica, já se ambienta nos escritos de Aristóteles, nas
explanações em que os fatores inerentes à condução da linguagem refletem o
pensamento e, por sua vez, estes refletem a realidade impressa no ordenamento
das frases.
Dentro dessa elocubração cognitiva, enquadramos a possibilidade de
mobilização de diversos recursos linguísticos como sendo os mesmos para
designar finalidades comunicativas distintas, onde a modalidade, ou
88

modalização, por assim dizer, é apenas um deles. Assim como muitos meios se
usam para o mesmo fim.
Como tratamos de mecanismos linguísticos – e esses se manifestam a
partir de constituintes/ formas da linguagem – que representam espécies de
conceitualização humana do mundo, nos baseamos nos postulados de Croft
(1990), defendendo que, cognitivamente, a estrutura gramatical reflete, de certo
modo, a estrutura do conceito que ela expressa.
Essa pesquisa aborda formas de modalidade expressas nos âmbitos
alético, deôntico e epistêmico, que mobilizam conteúdos possibilitados pelo
empreendimento de verbos, advérbios e adjetivos, por exemplo.
A manipulação dos dados do corpus sugere que existem formas que
indicam várias funções. A partir disso, cabe-nos refletir como essas formas se
enquadram em suas funções de origens, se/como mudam prototipicamente, ou
se apresentam tendências inovadoras para a fixação em uma nova função.
Antes de refletirmos sobre o enquadramento dos subprincípios da
Iconicidade (nos termos de Givon, 1984) nos contextos de modalidade, é
importante esclarecer que julgamos como importante levar em consideração a
informação completa nos períodos/textos, uma vez que nesses conteúdos, formas
diversas podem ilustrar contextos diversificados nos eventos em que se
constroem modalizações.
Observamos a recorrente ocorrência do subprincípio da proximidade, ou
integração, uma vez que os conceitos mais integrados no plano cognitivo, também
se apresentam com graus elevados em relação à contiguidade estrutural
verificada através dos elementos mais próximos aos itens que possibilitam
modalização, como muito ocorre em nosso corpus, referendando a constituição
semântica da proximidade dos mecanismos que favorecem a argumentação
(BYBEE, 1994; FURTADO DA CUNHA, BISPO e SILVA, 2013).
Ilustramos abaixo a referida ocorrência:

(25) As formas descritas no plano C podem ser consideradas fundamentais


para a realização do experimento.
(ENG_10)
89

(26) Determinação da Percentagem de Vazios Comunicantes: que podem ser


definidos como poros contínuos, ou seja, são vazios que propiciam a
percolação de água pelo concreto asfáltico, sendo por este motivo de grande
importância.
(ENG_05)

(27) Com os valores de percolação horizontal e vertical, pôde-se concluir que a


água demora mais tempo para penetrar a camada drenante do que para deixá-
la, pois a percolação horizontal é mais eficiente, porém, os valores podem
ser considerados bastante eficientes para intensidades de chuva da região,
que segundo dados do Simepar, raramente ultrapassam os 100mm/h, ou seja,
0,003cm/s.
(ENG_03)

(28) Os brinquedos podem ser compreendidos como objetos que servem para
as crianças brincarem, ou seja, um suporte para as brincadeiras.
(PED_01)

A construção verbal contígua - sem inserção de elemento entre os verbos


que a constituem – depende do elemento mais próximo, particípio (forma
nominal que assume status adjetival), para designar a planificação epistêmica do
enunciado.
Em se tratando de construções gramaticais, esse fenômeno ainda é
passivel de verificação, corroborando o que Bybee (1994) defende, por julgar que
os elementos de uma cláusula que estão semanticamente juntos, tendem a vir
próximos um dos outros. Esse tipo de reflexão, como muitas outras, tende refletir
a estreita relação entre diversos mecanismos linguísticos (itens, construções,
termos etc.) no nível conceitual.
Dos 229 casos de construções verbais com poder, nas duas áreas
investigadas, 176 encontravam-se sucedidas de forma nominal verbal, com a
mesma função pragmática de complementar a contiguidade estrutural que
precede o enunciado modalizado, como demarcamos no exemplo (sublinhado),
correspondendo a um percentual de 77% do total geral das ocorrências.
90

Nesse caso, a simples ocorrência da construção com poder não significa


fator unívoco para constituição do conteúdo modalizado, uma vez que conteúdo
adjetival do partícipio complementa, de forma propulsória, o sentido do que está
modalizado no enunciado.

Para caracterizarmos o subprincípio da ordenação linear, vejamos o


exemplo a seguir:

(29) Entretanto, é valido afirmar que o autor preocupa-se com a classe


proletária, e, seus escritos a partir do cárcere muitas vezes não o permitiram
expressar com as palavras que desejasse.
(PED_04)

Neste dado, verificamos que a construção [COP + SAdj] precede a


informação modalizada fazendo com que seja necessária contiguidade com o [SV]
sublinhado para conferir status de modalização ao enunciado. Toda essa
ordenação é responsável pela formatação do conteúdo informacional do período.
Ao tratar sobre educação e seus temas afins, notamos que a mobilização
das modalidades funciona como marcas da intenção do falante, como já dito,
expressando subjetividade. Numa avaliação análoga, verificamos que quanto
maior for a necessidade de demarcar a intenção do falante, mais modalidades –
ou modalizadores - vão surgir no decorrer do texto, revelando uma característica
própria das estruturas frasais mais longas. Assim, atestamos o subprincípio da
quantidade, em termos icônicos. Vejamos:

(30) O biodiesel pode substituir total ou parcialmente o óleo diesel de


petróleo em motores do ciclo diesel, e pode ser usado puro ou misturado
em diversas proporções (Petrobras, 2010). Como produto, pode-se dizer
que o biodiesel apresenta as seguintes propriedades em comparação ao óleo
diesel comercial:
(ENG_04)

O exemplo acima corresponde a um excerto de uma parte de


desenvolvimento de um artigo da área de engenharia. Verificamos que as duas
primeiras ocorrências de modalizadores correspondem à condução enunciativa
91

de modalidade alética, mas que aciona características argumentativas com


valores epistêmicos, pois o aspecto imperativo revestido nas sugestões moldadas
em torno das construções com poder, revelam experiência e crença do ator em
relação à verdade (inerente ao campo do saber) do que diz. Na última ocorrência,
a modalidade alética assume valor de possibilidade, já que percebemos certa
necessidade de se compreender o que é defendido em tese.
As ocorrências dos mecanismos linguísticos que designam essas
modalidades atestam, além da produtividade, aspectos de prototipicidade a partir
da característica semântica que reveste esses elementos, como dito
anteriormente. É certo que os mecanismos descritos não são restritos a um único
tipo de modalidade, conforme informações oferecidas pelos dados da pesquisa.
Essas questões atreladas à produtividade dos elementos, ou ainda mesmo
da modalidade verificada através da intenção discursiva, serão abordadas na
próxima seção, uma vez que merece uma certa atenção no tratamento da
organização argumentativa do gênero investigado.
Tanto a literatura quanto a pesquisa mostraram que as modalidades são
categorias semânticas que mobilizam classificações a partir de domínios
discursivos que indiciam seus tipos. Mesmo assim, faz-se necessária à sua
realização enunciativa a associação semântica de alguns elementos linguísticos
que se revelam decisivos no enquadramento das ocorrências pragmático-
discursivas, como ocorre com qualquer domínio funcional.
Refletimos, a partir disso, sobre quais são os elementos prototípicos
referentes às modalidades investigadas nesta pesquisa. Esse tipo de abordagem
sugere que boa parte das análises sejam construídas com o auxílio de dados
diacrônicos, mas aqui inferimos que o próprio componente semântico, conferido
ao mecanismo linguístico, possa legitimar sentido prototípico.
As estruturas empreendidas para realização da modalização nos sugerem
que há elementos linguísticos prototípicos para cada tipo de modalidade. Por
exemplo, a modalidade alética que apresenta sentido ligado à situação descrita
como algo possível ou necessário se realiza, primariamente, em torno do verbo
poder, que, analogamente, se desbota para outros tipos de modalizações.

(31) O biodiesel pode substituir total ou parcialmente o óleo diesel de petróleo


em motores do ciclo diesel, e pode ser usado puro ou misturado em diversas
92

proporções (Petrobras, 2010). Como produto, pode-se dizer que o biodiesel


apresenta as seguintes propriedades em comparação ao óleo diesel comercial:
(ENG_04)

Outros modalizadores competem com o verbo poder. É o caso de


construções [cop+S.Adj), substantivos, adjetivos, respectivamente, conforme
ilustramos nos exemplos abaixo:

(32) Contudo, se a educação, sobretudo escolar, pode contribuir para a


emancipação, é preciso compreender como e em que medida isso pode
ocorrer, “já que não é todo e qualquer processo educacional que emancipa.”
(SOUZA, 2007, p. 32)
(PED_05)

(33) Para alcançar a dimensão de ensinante e aprendente requer-se um


preparo aprofundado durante o curso de graduação, com aprofundamento
teórico e vivências práticas da futura profissão. Contudo, é importante que o
aluno-professor tenha clareza da necessidade da formação continuada para
aperfeiçoar-se como profissional e tornar o espaço da sala de aula num
ambiente de aprendizagem em vez de ser um lugar de reprodução de saberes
fragmentados.
(PED_03)

(34) As contribuições e experiências dos professores jovens formados pelo


Curso de História – a partir de suas práticas educativas – poderão contribuir
para o re-pensar do currículo que é ensinado aos alunos, servindo de
parâmetro para as políticas que serão implantadas para aperfeiçoar e
promover as melhorias necessárias na formação inicial dos professores.

(PED_03)

Em relação às deônticas, que se desenvolvem a partir de um estatuto moral


relacionado ao campo do dever e da obrigatoriedade, se constituem
prototipicamente a partir do verbo dever e das construções em que este se faz
presente.
93

Ao nos referirmos à modalidade epistêmica, defendemos que essa está


relacionada à crença do autor em relação à verdade do que se diz, ou ainda, o que
pode ser tomado como certo em relação ao campo do saber, ou provável, de
acordo com sua crença.
Se partirmos para a coleta dos elementos linguísticos, baseados
unicamente pela classificação dada, é normal que enxerguemos construções com
ser + adjetivo que, geralmente, têm a função de demarcar veracidade aos fatos
descritos nos enunciados. Ou ainda, se a busca exigir elementos de natureza
deôntica, a produtividade será em torno de construções com dever, visto à
classificação da modalidade.

(35) Em que faixa de velocidade o conteúdo energético se concentra é um


parâmetro fundamental no projeto de turbinas eólicas, pois, fora de condições
de operação ideais, isto é, com coeficiente de potência variável, a turbina
deve operar com máximo aproveitamento na faixa de maior densidade
energética. Assim sendo, o projeto do sistema eólico depende do tipo de
distribuição. Deve-se observar que o projeto da turbina eólica também
depende de outros parâmetros tais como: o tipo do rotor eólico, o tipo de
carga que será acoplada ao eixo do rotor e a velocidade média Vm.
(ENG_01)

5.2. À GUISA DE MARCAÇÃO E PROTOTIPICIDADE

Além do enquadramento que demos às ocorrências, dentro das


modalidades, elencamos outras observações que corroboram os resultados da
pesquisa. A produtividade em relação à diversidade de usos de recursos modais
utilizados é verificada na área com ocorrência mais subjetiva, que carrega, além
de terminologias científicas, volições, relatos, e outras características em relação
à planificação discursiva.
Através dos dados, percebemos diversos trechos em que se verificam
diferentes usos modais nas duas áreas. Em engenharia, a argumentação é mais
concisa, tendo nessa área, a utilização de trechos mais curtos e que representam,
diretamente, os recursos de modalidade.
Ainda, identificamos ocorrências de estruturas linguísticas ligadas a mais
94

de um tipo de modalidade. A pesquisa tem revelado que área, modalidade e


recursos linguísticos possuem características (não) discretas, no que compete à
avaliação deste processo. Por isso, faz-se necessário, segundo postulados de
Furtado da Cunha (1999), a observação de parâmetros de gradualidade na análise
da marcação, advertindo sobre o risco de tomarmos as categorias observadas a
partir de uma ótica meramente binária. Vejamos:

(36) Este Estatuto, de certo modo, pode ser um importante auxílio para os
educadores que têm um cotidiano de trabalho marcado pelos inúmeros e
complexos problemas sociais, aos quais estão envolvidos crianças e
adolescentes.
(PED_04)

(37) O ECA, enquanto conjunto de normais jurídico-legais, serve justamente


como um instrumento que pode orientar professores e funcionários em
suas atividades diárias.
(PED_04)

(38) Em linhas gerais, pode-se dizer que as leis menoristas anteriores ao


Estatuto da Criança e do Adolescente foram marcadas por alguns pontos em
comum.
(PED_04)

Para discutirmos a noção de gradualidade aferida pelo princípio da


marcação, apresentamos os três exemplos acima. Em (36) destacamos a
construção verbal com poder como mecanismo modalizador de possibilidade,
conceituado, plenamente, como alético por gerar, no plano discursivo,
(pragmático) sentido referente a coisas possíveis ou necessárias.
Se de imediato mirarmos a construção verbal com poder em (37),
corremos o risco de analisá-la sob os parâmetros de uma modalidade alética,
devido a prototipicidade do verbo. A planificação discursiva auxilia a
compreensão de que o sentido empreendido à perífrase é deôntico, uma vez que
o verbo enfraquece a significação de possibilidade e adquire características de
dever, obrigatoriedade modalizadas.
95

Em (38) ainda há construção verbal com poder, mas em categoria


diferenciada dos exemplos anteriores. Temos um caso de modalidade epistêmica
conferida pela certeza do autor constatada por sua experiência sobre o estado da
coisa descrita.
Nas modalizações de ordem epistêmica há um entendimento de que esta
parte de uma intencionalidade subjacente ao objetivo do enunciador de causar
impressão de objetividade, neutralidade e, consequentemente, favorecer a
veracidade do conteúdo asseverado. Considerar que o sentido transcende às
noções de modalidades alética e deôntica corresponde a uma certa complexidade
cognitiva.
Neste diapasão, julgamos válida a reflexão de Santos (2008), no sentido
de colocar que os autores, quando se utilizam dos turnos intencionais
mencionados, refletem certa dedicação a um tema, uma vez que estudaram,
compararam dados, chegaram a conclusões, e, por isso, a partir da familiaridade
com seus estudos, julgam-se competentes para asseverar seus enunciados.
A partir da percepção de que unidades conceituais aléticas e deônticas
fornecem acesso ao conceito epistêmico, verificamos a gradiência dos elementos
linguísticos que conduzem as modalizações. Essa contiguidade conceitual é o que
compreendemos por metonímia, fator que oportuniza, cognitivamente, a
reanálise das construções com poder na modalidade epistêmica.
Com base nisso, é possível afirmar que a manifestação da certeza
modalizada, mediante ocorrência do tipo de construção acionada nos exemplos,
acontece de forma marcada, uma vez que sua parca ocorrência nos textos,
cognitivamente, é mais perceptível do que as categorias correspondentes não
marcadas (alética e deôntica), justificando seu enquadramento ao subprincípio
da distribuição de frequência.
A determinação da diversidade de mecanismos linguísticos e a
sobreposição de valores modais sugerem que a adoção de medidas analíticas não
se restrinja a avaliações em que sejam levadas em considerações polaridades
restritas das classificações de modalidades, ou seja, é preciso observar a não-
discretude das categorias de modalização.
A marcação é, ainda, um princípio ligado à noção de produtividade. Nossa
pesquisa, além de atestar os propósitos enunciativos nos discursos acadêmicos,
sugere um mapeamento dos recursos linguísticos utilizados para a constituição
96

semântica das modalidades.


As informações que compõem o corpus desta investigação, juntamente aos
critérios de análise da marcação, nos possibilitou determinar, mediante as
motivações que regem o principio em relevo, aspectos como:

a) complexidade estrutural

Discursos modalizados moldados pelo empreendimento de diversas


construções (construções com verbo poder [constPoder]; construções com verbo
dever [constDever]; Construções com verbo ser junto a adjetivo/predicativo
[cop+S.adj]; Locução adverbial [S.Prep(adv.)]) utilizam mais formas nos
enunciados. Vejamos:

(39) Este Estatuto, de certo modo, pode ser um importante auxílio para os
educadores que têm um cotidiano de trabalho marcado pelos inúmeros e
complexos problemas sociais, aos quais estão envolvidos crianças e
adolescentes.
(PED_04)

(40) Estética: Passarelas em que há preocupação com a apresentação estética


atraem mais pedestres do que as com mau aspecto. As passarelas mais
atraentes usam uma estrutura colorida e leve, contribuindo positivamente
para o cenário urbano. Deve-se considerar também a visão urbanística do
entorno, escolhendo materiais e um desenho que permitam incorporar a
passarela ao conjunto arquitetônico de forma harmônica;

(END_07)

(41) O biodiesel é proveniente de gorduras animais ou de óleos vegetais e estes


são produtos naturais constituídos por um grupo de compostos orgânicos, os
ésteres, que por sua vez são produzidos pela união entre ácidos graxos e um
álcool. Ele pode ser obtido através de diferentes processos como o
craqueamento ou a esterificação, mas a reação mais utilizada é a
transesterificação.
(ENG_04)
97

No exemplo (39), a utilização da [constPoder] rege a versão de veracidade


em que o argumento modalizado explana a certeza do articulista na defesa de seu
ponto de vista. A principio, podemos avaliar a expressão como demarcadora de
possibilidade (sob perspectiva alética, por exemplo), mas a experiência do
interlocutor escritor com o tratamento da temática referenda uma condição de
verdade, em relação ao exposto.
A forma em destaque, de acordo com a quantificação dos dados da
pesquisa, mesmo sendo uma estrutura não básica, é não-marcada,
correspondendo a 189 ocorrências, caracterizando significativo teor de
complexidade estrutural e cognitiva.
Outrossim, destacamos a questão da contiguidade da construção. No
referido exemplo, dois mecanismos são utilizados na formação perifrástica do
item destacado.
Mesmo que tenhamos defendido que as modalizações elaboradas por meio
de construções, em suas diversas faces, têm maior complexidade estrutural, ainda
existem os mecanismos de modalidade não contíguos, que podem aparecer no
meio de uma locução/perífrase, como podemos perceber no exemplo (40), sendo
estas no corpus desta pesquisa, mais complexas e, por conseguinte, mais
marcadas , tanto no âmbito estrutural, quanto no cognitivo.
Em (41) temos uma estrutura marcada formada por [constPoder]+[S.adj].
A forma em particípio não participa da estrutura da locução, mas é necessária
para a compreensão da modalidade que encerra o discurso. Temos uma
modalização alética de possibilidade, uma vez que são apresentadas alternativas
para realização da ação sugerida na enunciação.
Embora este último exemplo apresente um número maior de formas,
consideramos, pela necessidade da vinculação dos itens na planificação dos
discursos, uma construção realizada por contiguidade. Ainda, é preciso levar em
consideração que este critério acaba, de certa forma, dialogando com o
subprincípio da quantidade, em termos de iconicidade.
Ao contrário disso, as modalizações que utilizam-se de itens, ou sintagmas
básicos, mobilizam menos forma (Substantivo [S.N (básico)]; formas verbais no
subjuntivo [S.V(básico)]; Adjetivos [S. Adj]; gerúndio etc.):
98

(42) Estas travessias podem ser em nível (semaforizadas ou não) ou em


desnível (passarelas e passagens subterrâneas), sendo que este último tipo de
travessia é, certamente, a forma mais segura de o pedestre vencer o espaço
da rua, pois não há nenhuma possibilidade de conflito com os veículos.
(ENG_07)

(43) Neste artigo apresentamos as contribuições dos jogos, brinquedos e


brincadeiras como possível recurso para o desenvolvimento do
processo ensino-aprendizagem, uma vez que acreditamos que eles
podem ajudar o indíviduo a se desenvolver enquanto ser criativo e
participante da sociedade, favorecendo o raciocínio, as condutas
estéticas, entre outros.
(PED_01)

Nos exemplos (42) e (43), as modalidades epistêmica e alética,


respectivamente, são alicerçadas a partir de sintagmas básicos [S.Adj] e [S. Adv].
São modalidades que mobilizam menos forma e, como aborda o próximo critério
de marcação, é menos complexa no tratamento de sua interpretação e até mesmo
em relação à sua classificação como tipo de modalização.
Julgamos importante destacar um apontamento de Neves (1996, p. 165)
sobre “o fato que muitos meios se usam para os mesmos fins”, ou seja, uma forma
pode gerir várias modalidades. O que vai determinar sua classificação é a
condução da argumentação e a intencionalidade discursiva.

b) complexidade cognitiva

Como adiantamos, esse critério é responsável por enquadrar formas como


sendo menos ou mais complexas em relação a suas interpretações. É fato que boa
parte das formas maiores – com maior complexidade estrutural – são mais
complexas cognitivamente (com exceção das [constPoder], segundo sugerem os
dados da pesquisa) e, as formas com menos complexidade estrutural, são menos
complexas cognitivamente, uma vez que demandam menos esforço mental, em
relação à sua compreensão e interpretação, ocasionando mais fluidez em relação
99

à atenção e projetando menos tempo de processamento. Para essa compressão,


convidamos para uma revisita aos exemplos de (39) a (43).
Disto depreendemos que os exemplos (39), (40) e (41) são menos
marcados, nos critérios de estrutura e cognição, até mesmo de frequência, dada a
observância da facilidade da mobilização e compreensão da estrutura e a alta
frequência dessas formas no corpus.

c) índice de frequência.

Nesse contexto, verificamos qual a modalização que usa mais e menos


estrutura, bem como a que se revela mais ou menos perceptível, subjetiva e,
obviamente, a mais frequente, nos mesmos critérios de quantificação. Pensando
nisso, elaboramos o quadro 04 na intenção de quantificar e viabilizar a
compreensão da produtividade dos mecanismos linguísticos por tipo de
modalidade.

Quadro 04: Mecanismos linguísticos por modalidade.


ALÉTICA DEÔNTICA EPISTÊMICA
Verbos no presente* 25 32 55
Construção verbal com poder 60 38 91
Construção verbal com dever 13 45 36
Futuro do presente 10 16 24
Ser + Adjetivo 4 19 41
Advérbio 6 13 33
Futuro do pretérito 1 17 3
Substantivo 3 6 4
Adjetivo 4 10 16
Loc. Adverbial 0 1 4
Subjuntivo 0 2 1
Gerúndio 2 3 1
Construção verbal com permitir 2 3 5
Construção verbal com ter 0 1 3
Pretérito perfeito 0 0 0
Outros 1 2 2
Total: 137 208 313
Fonte: Elaboração própria, 2018.
100

Notamos, a partir da disposição dos dados, que [constPoder] é a forma


mais frequente e perceptível nos exemplos de modalidade em todas as tipologias.
Como a modalização epistêmica é a mais produtiva, ela acaba acarretando a
maioria dos índices de mecanismos linguísticos para sua elaboração.
Em termos de asseveração, a modalidade epistêmica também apresenta
uma relevante ocorrência de estruturas [cop.+S.Adj]. Isso revela, sobretudo, a
intenção do escritor em se fazer reconhecido na sua área de conhecimento.
Construções verbais com “poder” e “dever”, têm grandes ocorrências nas
modalidades alética e deôntica, respectivamente. As altas frequências em
modalizações epistêmicas revelam a especialização dessas construções nesta
tipologia.
Os números em relação à frequência de advérbios de modo no corpus
também despertam certa atenção para todas as tipologias, fazendo com que
percebamos a fluidez categorial de tal mecanismo. Na modalidade epistêmica, a
maioria dos advérbios de modo, mobilizados na composição argumentativa,
indicam certeza e probabilidade em relação ao que se assevera na enunciação.
Destarte, a “soma” dos critérios de marcação, junto às ocorrências
verificadas no corpus desta pesquisa, possibilita um “resultado” que chamamos
de cline de marcação da modalização:

Esquema 02: Cline de marcação da modalização


Modalização A ...............................Modalização B ........................ Modalização
C
Alética Deôntica Epistêmica
+ marcada + ou – marcada - marcada
Fonte: Elaboração própria, 2018.

O cline de marcação da modalização (resultante dos dados da pesquisa)


impetra a leitura de que a modalidade alética é a menos frequente dentre as
ocorrências verificadas no corpus. Existe uma explicação de base teórica em
relação a esta parca ocorrência. Neves (2013, p. 159) explica que

a modalidade alética é dificilmente detectada nas línguas


naturais, já que o comprometimento da modalização alética com
a verdade relacionada a mundos possíveis torna pouco claros no
101

discurso comum casos de sentenças que sejam apenas


aleticamente modalizadas.

Alguns estudiosos, como Slobin (1980), por exemplo, defendem que a


complexidade de pensamento tende a refletir-se na complexidade de expressão,
ou seja, aquilo que é mais simples se expressa com o mecanismo linguístico
menos complexo. Avaliamos que as formas mais marcadas não têm relação direta
com a complexidade cognitiva da modalização empreendida. Nesse contexto, a
hipótese de que as formas mais complexas são mais frequentes na modalização
mais complexa não se aplica.

Todos os quadros, tabelas e esquemas elaborados a partir dos dados


(ocorrências) verificados neste trabalho apontam para a modalidade epistêmica
como a mais produtiva no gênero investigado. Em termos funcionais, os
mecanismos linguísticos, embora por classificação dos tipos de modalização
tenham fonte em determinada tipologia, estão se especializando em nova
modalidade e assumindo contextos específicos desta.
Por exemplo, em termos categoriais, a modalidade alética indica
argumentos de possibilidade e necessidade, em relação ao que está sendo
defendido/descrito pelo articulista. A partir disto, é comum que formas ou
construções com os verbos poder e com substantivo necessidade apareçam para
designar a tipologia. Os dados informam (quadro 04) que [constPoder] têm sido
produtivas em relação à composição da modalidade epistêmica.
Os dados também atestam que a modalidade deôntica é a intermediária
dentro do cline de modalização. Os mecanismos que têm formas alvo em
categoria epistêmica visitam, ainda, tal modalização. Nesta, seguindo ainda a
questão da classificação, os dados nos permitem conjecturar que [constDever]
(45 ocorrências) são prototípicas desta modalidade, que se relaciona a
atitudes/argumentos revestidos de dever moral e obrigatoriedade.
Sem anunciar, adentramos na questão da prototipicidade como um dos
princípios caros à verificação da gramaticalização de itens e construções – no
nosso caso, das modalizações.
Os esquemas elaborados para compreensão analítica da marcação no
fenômeno que estamos investigando, também estão pertinentes a resultados que
indicam aspectos de prototipicidade dos itens coletados no corpus.
102

Antes de tudo, esclarecemos que nossa vertente teórica, ligada a


observação dos mecanismos linguísticos, sugere que a função dos mecanismos,
em termos de prototipicidade, indique a forma, “na defesa ou no resgate das
marcas icônicas” do uso investigado (ROSÁRIO; OLIVEIRA, 2016, p. 235). Nesse
contexto, nossa pesquisa vislumbra análises mais holísticas acerca do fenômeno
linguístico, uma vez que tem a modalização/modalidade como uma função que
ultrapassa o nocional da categoria TAM24, restritamente voltada à predicação.
(GONÇALVES, 2015; CAMPOS, 1997)
Considerando o exposto, a análise da Prototipicidade será realizada a
partir da constatação de algumas questões critérios:
(a) Que atributos ou traços são inerentes à modalização de uma maneira
universal?
(b) Qual a modalidade prototípica?
(c) A modalização é uma categoria fechada em relação aos mecanismos
linguísticos que a realiza?
(d) Existem formas prototípicas para cada tipo de modalização?

A noção propedêutica de modalidade encontra abrigo nas relações entre


dictun e modus, como preconiza a retórica clássica. O nocional mais buscado
refere-se à sua perspectivação semântica que junta à pragmática, insistem e
defendem que é um fenômeno garantido pela atitude do falante/escritor.
A literatura em modalidade explana que “necessidade e possibilidade são
as noções que se colocam tradicionalmente na base da subtipologização das
modalidades” (NEVES, 2013, p. 159). Ou seja, embora estas formas representem
categorias/sentidos diferentes, são fluidas, não independentes e são mobilizadas
a partir de “subcategorias modais, a saber, alética, deôntica, epistêmica,
bulomaica e disposicional25.
No pareamento forma x função – que rege nossa envergadura teórica
funcional – é laborioso determinar Prototipicidade, compreendida no quesito (b),
de um fenômeno, em categoria, tão subjetivo como a modalização. A modalidade
tem uma relação direta com o propósito discursivo do usuário (falante ou

24Tempo, aspecto e modalidade.


25Nossa pesquisa não compreende as duas ultimas categorias de modalidade. Neves (2013, p.
219), em nota (9), questiona se estas são realmente modalidades, já que, segundo ela, há consenso
de que a epistêmica, por ser mais abrangente, seja o único tipo de modalização.
103

escritor). Dessa forma, confere-se a esta o status de alto teor subjetividade e/ou
intersubjetividade tão apontado em literatura específica, como em Lyons (1976),
que considera a subjetividade como expressão do agente locucionário, o “self”, e
este, segundo Dias (2015, p. 130) refere-se aos “papéis sociais e interpessoais que
são manifestados no modo identificável socialmente, ou seja, no papel do locutor
numa situação de fala”. Para Dias (2015), os graus de subjetividade vão estar
atrelados às expressões dos estilos do agente locucionário, bem como às variadas
situações conversacionais de que ele faça parte.
Mesmo assim, no critério de universalidade exposto em (a), onde
“necessidade e possibilidade” são as noções que ancoram as subcategorias de
modalização, a modalidade alética, como fator de observação, se desdobra,
justamente, sob as funções de necessidade e possibilidade (como verificamos na
seção de descrição dos fenômenos de modalidade, na parte de metodologia desta
pesquisa, nas páginas 79 e 80). Dessa forma, consideramos a modalização alética,
numa escala de gradiência, como a modalidade fonte (8.5% das ocorrências 26), ,
apontando uma direção para a especialização de outras formas em outras
tipologias (alvo), como a epistêmica, por exemplo, que se demonstra como a
modalidade especializada (71,6% das ocorrências).
Em relação aos mecanismos linguísticos que repercutem modalização (c),
a disposição dos types do quadro 04 (mecanismos linguísticos por modalidade)
indicam que a modalização não é uma categoria fechada. A fluidez categorial
desse fenômeno é ilustrada pela dinamicidade das formas que são empreendidas
nos contextos de enunciação. Nossa pesquisa mapeou 17 mecanismos distintos –
formas – modalizadores no gênero textual investigado. Assim, 95% das formas
são encontradas em todos os tipos de modalidade.
A partir da verificação das formas linguísticas que atuam nos dados do
corpus, elaboramos clines de prototipicidade para cada categoria.

Quadro 05: Clines de prototipicidade das modalizações


MODALIZAÇÃO ALÉTICA
Const. c/poder Const. c/ dever Futuro do
pretérito
+mais prototípico + ou- prototípico - prototípico

26 Vide Tabela 01.


104

MODALIZAÇÃO DEÔNTICA
Const. c/ dever Ser + adjetivo Loc. Adverbial
+mais prototípico + ou- prototípico - prototípico
MODALIZAÇÃO EPISTÊMICA
Const. c/poder Advérbio Subjuntivo
+mais prototípico + ou- prototípico - prototípico
Fonte: Elaboração própria, 2018.

De acordo como o que observamos, preliminarmente, no tratamento da


modalidade no discurso acadêmico, a mobilização de mecanismos linguísticos
não se dá de maneira arbitrária, fixa e autônoma. Existem motivações sêmio-
pragmáticas que são responsivas para a realização do tipo de modalidade, ligada
à intencionalidade discursiva dos usuários.
Abaixo, apresentamos os principais itens/construções linguísticas
verificados na mobilização das modalidades nas áreas investigadas.

Quadro 06: Mecanismos linguísticos por área.


PEDAGOGIA ENGENHARIA
Verbos no presente* 80 Verbos no presente* 32
Construção verbal com Construção verbal com
poder 128 poder 61
Construção verbal com Construção verbal com
dever 53 dever 41
Futuro do presente 33 Futuro do presente 17
Ser + Adjetivo 45 Ser + Adjetivo 19
Advérbio 37 Advérbio 15
Futuro do pretérito 21 Futuro do pretérito 0
Substantivo 11 Substantivo 2
Adjetivo 27 Adjetivo 3
Loc. Adverbial 5 Loc. Adverbial 0
Subjuntivo 3 Subjuntivo 0
Gerúndio 6 Gerúndio 1
Construção verbal com Construção verbal com
permitir 1 permitir 8
Construção verbal com ter 4 Construção verbal com ter 0
105

Pretérito perfeito 0 Pretérito perfeito 0


Outros 3 Outros 2
Total: 457 Total: 201
Fonte: Elaboração própria, 2018.
* Dessas ocorrências são retirados os verbos poder, dever e ser, uma vez que são analisados a
partir de critérios nos quais são verificadas as desenvolturas das construções em que aparecem.

A leitura do quadro permite-nos identificar uma significativa ocorrência


de modalização possibilitada pelo uso de epistêmicos de certeza nas duas áreas.
Isso ocorre devido à predominância de verbos no presente, no futuro do presente,
algumas especificidades no tratamento de construções ser + adjetivo e por
advérbios.
Em relação às construções com poder, identificamos um dinamismo na
mobilização deste recurso em ambas as áreas. O mecanismo se especializa em
outras modalidades, se desbotando da categoria alética, onde ainda é muito
produtivo, como por exemplo, ocorrências de modalidade epistêmica com valor
de probabilidade.
Com isso, atestamos que a construção com verbo poder é,
qualiquantitativamente, a principal forma de demonstrar possibilidade, seguida
pela construção ser + adjetivo, como em é possível. Pelos motivos explicitados na
análise do quadro 4, os aléticos de possibilidade mostraram-se os mais comuns
na área de Pedagogia. Em engenharia, os aléticos de possibilidade, mesmo não
sendo um uso característico da área, também são importantes quando a
argumentação é construída em torno de deveres e obrigações.
Por conseguinte, nos termos de produtividade, temos a modalidade
deôntica, seguida das epistêmicas merecendo destaque na área de Pedagogia. Em
exemplificação, abordamos que esse recurso discursivo-argumentativo prima por
direcionamentos que envolvem metodologias educacionais, nas relações de
ensino-aprendizagem que são temáticas próprias do campo de saber em relevo.
Daí, destacamos as construções com dever como mecanismo produtivo
nesse contexto enunciativo, geralmente relacionadas a uma preocupação, ou
melhor, uma responsabilidade com a educação.
Outras considerações que podemos fazer sobre os dados são as
aproximações em porcentagem de ocorrências entre cada área em: verbos no
futuro do presente; construção ser + adjetivo; verbos no futuro do pretérito;
advérbio; substantivo e locução verbal com permitir.
106

Constatamos, a partir das análises, que os elementos textual e discursivo


estão intimamente conectados ao gramatical, apresentando nuances
comportamentais responsáveis pela articulação entre diversas informações que
compõem o texto. (Cf. SILVA, 2016)
Nossa analise mapeia as modalidades enquanto função, através dos
conteúdos linguísticos que se estabelecem como formas possibilitadoras para
realização do fenômeno discursivo em relevo. Apresentamos cada modalização,
as interfaces classificatórias inerentes à condução linguístico-enunciativas dos
discursos, os elementos linguísticos modalizadores que compõem as
argumentações, o comportamento dos itens e construções na mobilização das
modalidades e o conteúdo funcional verificado nas ocorrências identificadas no
corpus.
107

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nossa pesquisa analisou artigos científicos das áreas de Pedagogia e


Engenharia objetivando, em linhas gerais, observar como se realizava a condução
discursivo-enunciativa das modalidades na construção dos textos.
Ao atestarmos a recorrência de modalidades em contextos monitorados
de escrita de artigos científicos de anais de eventos, o debruçamento sobre o
corpus possibilitou que fosse mapeada uma gama de elementos linguísticos que
são mobilizados como mecanismos de modalização. O índice semântico
constatou que algumas dessas estruturas são prototípicas à significação verbal e
adequada à classificação da modalidade.
Com relação à identificação, no discurso escrito, de mecanismos de
expressão da modalidade, alética, deôntica e epistêmica, constatamos que
algumas estruturas se especializam em alguns casos de modalidade a despeito de
continuarem exercendo suas funções primárias. É o caso do verbo poder e das
construções de que ele participa. Este elemento linguístico ganhou espaço das
enunciações modais de ordem epistêmica.
Em se tratando de modalidade epistêmica, verificamos que sua ocorrência
é bastante profícua nas áreas investigadas e, a partir disso, podemos concluir que
essas áreas parecem estar usando com mais intensidade esse recurso de
persuasão, demonstrando envolvimento dos pesquisadores com o que estudam,
já que estes expõem discursos relacionados às suas crenças adquiridas a partir do
envolvimento com o campo do saber.
Dessa forma, atestamos, com base no que os dados revelam, que há
regularidade de uso da modalidade epistêmica. Ao propor sua análise, na parte
do desenvolvimento da superestrutura do artigo científico, a intenção do autor é
comprovar a veracidade de sua pesquisa, e assim reveste-se de autoridade. Para
tanto, utiliza da certeza em grande porcentagem, e ao mesmo tempo, em uma
atitude estratégica, deixa transparecer a dúvida, por meio dos advérbios
modalizadores e das modalidades epistêmicas de certeza combinadas às aléticas
de possibilidade, a fim de ganhar a adesão do leitor em relação àquilo que diz.
Conseguimos atestar tais ocorrências a partir de princípios funcionalistas
que referendam a inserção de nosso trabalho na área. Dialogamos com outros
campos de saber linguístico para reforçar que a condução da pesquisa sob
108

critérios funcionais, que leva em consideração interações teóricas e empíricas a


partir de um evento pragmático.
Nossa pesquisa constatou que as modalidades epistêmicas têm despertado
atenção de diversos estudiosos de várias áreas da linguística. Já que é um
fenômeno recorrente na língua, nosso trabalho, fundamentado nos pressupostos
do funcionalismo, comprovou que este recurso discursivo se revela frequente nos
artigos científicos publicados em anais de eventos.
Consideramos, ainda, outros fatores importantes para determinação dos
percursos analíticos desta pesquisa. A investigação dos artigos, nas áreas
selecionadas convida-nos a pensar como são construídos alguns aspectos, como
conteúdo temático, mobilização do discurso teórico e como o contexto de
produção influencia na organização dos mundos discursivos27.
O corpus, formando por artigos científicos publicados em anais de eventos,
é um importante registro de como a escrita acadêmica, no setor de produtividade
científica, vem sendo desenvolvida e, dentro de tal prática linguageira, facilita o
mapeamento de mecanismos linguístico-discursivos empreendidos em seu
contexto de produção.
Verificamos que na área de Pedagogia há certo distanciamento do que se
conhece como discurso teórico. É óbvio que, por questões composicionais do
gênero, existe uma seção pertinente à organização desse tipo de discurso
(geralmente denominada “desenvolvimento”), mas preenchida com as próprias
impressões do autor, em detrimento a esquematizações e mobilizações teóricas
na defesa de um postulado puramente teórico-epistemológico.
A área de engenharia, como revela nossa pesquisa, traz mais elementos de
comprometimento teórico e estabelece uma organização textual do
desenvolvimento argumentativo, empreendendo mais elementos teóricos do que
a área de pedagogia, para fundamentar as abordagens defendidas.

27 Duas questões são caras ao ISD: i) existe uma postura em lidar com o termo discurso o
substituindo por “atividade de linguagem” (linguageira), justificada pela utilização do termo
“tipos de discurso” para definição dos recursos utilizados pelos interactantes, apresentando
brevemente os mundos do narrar e do expor (disjunção e conjunção, respectivamente) e seus
desdobramentos tipológicos.
109

No tocante aos mundos discursivos, como impetra a teoria bronckartiana,


o gênero em tela utiliza-se mais de exposições, uma vez que as composições lidam
com divulgação científica de pesquisas acadêmicas.
A presença de elementos modalizadores atestam a ideia de que o discurso
teórico também mobiliza mecanismos persuasivos que auxiliam a compreensão,
por parte do leitor, do que está sendo defendido na composição do gênero em
relevo.
A condução do conteúdo temático é especifica de cada área e é responsável
pela produção, em larga escala, de material científico correspondente a pesquisas
e experiências oriundas de cada campo de saber.
A pesquisa funcionalista também leva em consideração os aspectos sociais
de produção dos gêneros textuais – já que estes também são concebidos a partir
de eventos interacionais – e como estes se consolidam como formas reais de uso
da linguagem. A materialização escrita da língua tem, ao longo dos anos,
produzido muitos elementos que merecem reflexão por parte de estudos
linguísticos e muitos estudiosos da área, como os citados ao longo deste trabalho,
andam se comprometendo com a descrição desses fenômenos que surgem de usos
da língua.
Acreditamos que nosso trabalho se insere na agenda de pesquisas que
contribuem para descrição da língua portuguesa no sentido de demarcar
mecanismos linguísticos utilizados para composição argumentativa e
mobilização de modalidades, no gênero artigo científico.
110

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