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Dossie Celso Furtado

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Universidade Estadual da Paraíba

Profª. Célia Regina Diniz | Reitora


Profª. Ivonildes da Silva Fonseca | Vice-Reitora

Editora da Universidade Estadual da Paraíba


Cidoval Morais de Sousa (UEPB) | Diretor

Conselho Editorial
Alessandra Ximenes da Silva (UEPB) José Luciano Albino Barbosa (UEPB)
Alberto Soares de Melo (UEPB) José Tavares de Sousa (UEPB)
Antonio Roberto Faustino da Costa (UEPB) Melânia Nóbrega Pereira de Farias (UEPB)
José Etham de Lucena Barbosa (UEPB) Patrícia Cristina de Aragão (UEPB)

Conselho Científico

Afrânio Silva Jardim (UERJ) Jonas Eduardo Gonzalez Lemos (IFRN)


Anne Augusta Alencar Leite (UFPB) Jorge Eduardo Douglas Price (UNCOMAHUE/ARG)
Carlos Henrique Salvino Gadêlha Meneses (UEPB) Flávio Romero Guimarães (UEPB)
Carlos Wagner Dias Ferreira (UFRN) Juliana Magalhães Neuewander (UFRJ)
Celso Fernandes Campilongo (USP/ PUC-SP) Maria Creusa de Araújo Borges (UFPB)
Diego Duquelsky (UBA) Pierre Souto Maior Coutinho Amorim (ASCES)
Dimitre Braga Soares de Carvalho (UFRN) Raffaele de Giorgi (UNISALENTO/IT)
Eduardo Ramalho Rabenhorst (UFPB) Rodrigo Costa Ferreira (UEPB)
Germano Ramalho (UEPB) Rosmar Antonni Rodrigues Cavalcanti de Alencar (UFAL)
Glauber Salomão Leite (UEPB) Vincenzo Carbone (UNINT/IT)
Gonçalo Nicolau Cerqueira Sopas de Mello Bandeira (IPCA/PT) Vincenzo Milittelo (UNIPA/IT)
Gustavo Barbosa Mesquita Batista (UFPB)

Editora indexada no SciELO desde 2012


Editora filiada a ABEU

EDITORA DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA


Rua Baraúnas, 351 - Bairro Universitário - Campina Grande-PB - CEP 58429-500
Fone/Fax: (83) 3315-3381 - http://eduepb.uepb.edu.br - email: [email protected]
Andreza Dantas Albuquerque
Ana Maria Vicente da Silva
Giovânia de Andrade Lacerda Lira
Luiza Iolanda Pegado Cortez de Oliveira
(Organizadoras)

Equipe Desafio Celso Furtado 2020


Luiza Iolanda Pegado Cortez de Oliveira
Giovânia de Andrade Lacerda Lira
Francisco Diassis de Araújo Soares
Jarleyde Andressa Santos Sales de Oliveira

Campina Grande-PB
2022
Editora da Universidade Estadual da Paraíba
Cidoval Morais de Sousa | Diretor

Expediente EDUEPB
Erick Ferreira Cabral | Design Gráfico e Editoração
Jefferson Ricardo Lima Araujo Nunes | Design Gráfico e Editoração
Leonardo Ramos Araujo | Design Gráfico e Editoração
Elizete Amaral de Medeiros | Revisão Linguística
Antonio de Brito Freire | Revisão Linguística
Danielle Correia Gomes | Divulgação
Gilberto S. Gomes | Divulgação
Efigênio Moura | Comunicação
Walter Vasconcelos | Assessoria Técnica

Depósito legal na Biblioteca Nacional, conforme decreto nº 1.825, de 20 de dezembro de 1907.


D724 Dossiê desafio Celso Furtado: os ares do mundo – escola, criatividade e desenvolvimento
regional [Recurso eletrônico]./Andreza Dantas Albuquerque, Ana Maria Vicente da Silva, Giovânia
de Andrade Lacerda Lira, Luiza Iolanda Pegado Cortez de Oliveira (Orgs). – Campina Grande/PB:
EDUEPB, 2022.
15000 kb. 176 p.
ISBN 978-85-7879-652-5 (Físico)
ISBN 978-85-7879-653-2 (Digital)
1. Celso Furtado. 2. Educação. 3. Dossiê vida Celso Furtado. 4. Biografia. 5. Desenvolvimento
Regional. I. Título. II. Albuquerque, Andreza Dantas. III. Silva, Ana Maria Vicente. IV. Lira, Giovânia
de Andrade Lacerda. V. Oliveira, Luiza Iolanda Pegado Cortez de (Orgs). VI. Furtado, Celso.
CDD B869
CDU 82.94
Ficha catalográfica elaborada por Jane Pompilo dos Santos

Copyright © EDUEPB
A reprodução não-autorizada desta publicação, por qualquer meio, seja total ou parcial, constitui
violação da Lei nº 9.610/98.
À Rosa Freire d'Aguiar, pela gentileza com a qual
recebeu a proposta do Desafio Celso Furtado.
Agradecimentos

Ao Governador do Estado da Paraíba, João Azevêdo


Lins Filho, pelo incentivo e pelo suporte a ações inovadoras
no âmbito da educação paraibana;

Ao Secretário de Estado da Educação e da Ciência e


Tecnologia do Estado da Paraíba, professor Claudio Benedito
Silva Furtado, pela confiança no trabalho realizado e pelo
apoio dado para que as ações do Desafio pudessem se tor-
nar o Programa Celso Furtado de Inovação Educacional e
Desenvolvimento Regional;

À FAPESQ, pelo financiamento das pesquisas desenvol-


vidas pelas equipes escolares contempladas com bolsa, no
Desafio Celso Furtado;

Aos professores Cidoval Moraes e Luciano Albino, pela


dedicação e participação ativa ao longo das ações desenvol-
vidas em conjunto;

À EdUEPB, pela revisão e publicação deste dossiê;

Aos/às especialistas que atuaram no Desafio de 2020, de


maneira voluntária, e desenvolveram um trabalho exemplar
de acompanhamento das equipes escolares;

Aos/às professores/as e estudantes da Rede Estadual de


Educação da Paraíba, assim como aos/às gestores/as e geren-
tes regionais, que abraçaram o Desafio e se envolveram na
divulgação das ações e no desenvolvimento de projetos tão
significativos.
“[...] qual a responsabilidade dos que criam e divulgam
conhecimentos no mundo atual, mais particularmente
na periferia deste mundo que é onde nos encontramos?
A profissionalização dos cientistas, sua transformação
em indivíduos que vendem serviços e procuram tirar
partido da escassez do que vendem, conforme as leis
do mercado, é o primeiro problema que se coloca.
Isso porque uma sociedade em que a criatividade está
subordinada às leis do mercado é uma sociedade em
que os que controlam os meios — os beneficiários dire-
tos da acumulação — ditam a lei da cidade. Os fins da
vida social não serão mais do que um reflexo da lógica
desses meios. Portanto, é indispensável que os cientistas
vejam naquilo que eles produzem valores, algo que tem
um sentido em si mesmo, que está relacionado com
os fins da vida humana. Produzir valores implica ter
consciência do contexto social em que vivemos, assumir
na plenitude a cidadania. E também significa organi-
zar-se como cientistas para contribuir decisivamente no
processo de reconstrução social”.

(FURTADO, 1979)
Sumário

Apresentação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
Claudio Benedito Silva Furtado
Elis Regina Neves Barreiro

Introdução. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
Andreza Dantas Albuquerque
Ana Maria Vicente da Silva
Luiza Iolanda Pegado Cortez de Oliveira

Parte 1 - Artigos

Desenvolvimento Regional de forma


sustentável e o pensamento de Celso Furtado . . 31
Jamilton Costa Pereira
Marialda Souza Bueno Ferraz

Instituições Eficientes e Eficazes: uma


análise dos Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável
a partir da perspectiva Furtadiana. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51
Ana Maria Vicente da Silva
Erielem Araújo do Nascimento
Andreza Dantas Albuquerque

Celso Furtado entre o Sertão e o Litoral


da Paraíba. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
Marcionila Fernandes
Parte 2 - Relatos de Experiência

Relato de experiência: Trilha


Desenvolvimento Regional Sustentável. . . . . . . . . . . . . 95
Andreza Dantas Albuquerque
Milena Barros Marques dos Santos

Desenvolvimento e educação: um olhar a


partir das contribuições de Celso Furtado . . . . . 113
Rafaela Dias
Thaís Marculino da Silva

Relato de Experiência: uma imersão como


especialistas e pesquisadores voluntários do
Desafio Celso Furtado em 2020 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135
Alexandre Silva de Lima
Marayza Alves Medeiros

Parte 3 - Projetos vencedores do Desafio 2020

TPN em ação - Engenheiro Arcoverde:


um potencial a serviço de Condado. . . . . . . . . . . . . . . . . . 147
Gerfferson Fernandes Linhares
Marcos Sérgio dos Santos
Martinho Mendes Gomes Neto
Gildimar Gomes Caetano
Rebeca Leandro de Lima
Hérica Araújo Ferreira
Bem viver - Fábrica de Água Doce. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151
Albertina de Farias Silva
Ezequiel Beserra Dos Santos
Kenia Hellen Pereira Costa
Lucas Farias Andrade

Os Sapiens - Teorema de Pascal aplicado


em Modelos Compactos e sustentáveis de
Aquaponia e Carneiro Hidráulico para
produtores e consumidores de Lagoa Seca. . . . . . . 155
Damião Raniere Queiroz
Paulo Deyvity Rodrigues
Arley Vieira Silva
Fabrício do Nascimento Araújo
Gilliard Duarte da Silva
Igor do Nascimento Silva
Mikael Firmino de Araújo
Thaissa Andrade do Nascimento

HL Sustentável - Biodigestores nos Centros


Urbanos: uma tecnologia, vários benefícios. . . . 159
Profª Drª. Geórgia Cristina de Sousa Oliveira
Prof. M.Sc. Joaldo Bezerra de Melo
Ana Lyvia da Silva Matias
Bianca Souto Granjeiro
Érika Carla de Sousa Silva
Jeslane Braz do Nascimento Santana
Kelvyn Pereira Gurgel
Trilhando o caminho da sabedoria -
Propostas de melhoria de condições dos
Catadores de Pedras de Fogo – PB. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163
Nataly Maria de Oliveira Souza
Jandira Ribeiro de Melo Ataide
Everton Silva do Nascimento
Joiciane da Silva Paulino
Larissa Kelly da Silva

Arte, Ação e Solução - Arte, ação e solução. . 167


Francineide de Lira Ferreira
Shirley Monteiro Cavalcante da Cunha
David Ricklaive V. dos Santos
Felipe da Silva Batista
Maria Ivanna Bento Silva
Maria Rafaela Pereira Gomes
Rômulo da Silva.

Sobre as Organizadoras. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 173


Apresentação

Celso Furtado é o nosso genial teórico do sub-


desenvolvimento. Natural da cidade de Pombal no sertão
paraibano, nascido em 26 de julho de 1920, foi jornalista,
funcionário público, advogado, doutor em economia,
tenente, ministro, embaixador e professor, além de integrante
da Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) e
Superintendente da Superintendência do Desenvolvimento
do Nordeste (SUDENE).
Intelectual de vasto conhecimento, pragmático e con-
temporâneo, Celso Furtado marca sua vida e obra com a
luta infatigável por melhores condições de vida dos países
subdesenvolvidos. A sua forma genuína de pensar as desi-
gualdades regionais e a exclusão social nos permite refletir
acerca de formas mais justas de desenvolvimento econômico,
que busquem mais equidade social. Neste contexto, o desen-
volvimento, segundo o pensamento de Furtado, deve trazer
de forma intrínseca e arraigada a igualdade e justiça sociais e
não apenas o crescimento das forças econômicas e políticas
dominantes que, na maioria das vezes, causam disparidades
entre as regiões e marginalização da população.
No ano de 2020, em consonância com as atividades
referentes ao centenário de nascimento de Celso, foi criado
o “Desafio Celso Furtado: os ares do mundo - escola, cria-
tividade e desenvolvimento regional” na Rede Estadual de
Ensino da Paraíba. O desafio teve como objetivo reunir pro-
fessores da educação básica e estudantes da etapa do ensino
médio, incluindo as modalidades da Educação de Jovens e
Adultos e da educação profissional, além disso, especialistas

15
em desenvolvimento regional e áreas afins, oriundos de insti-
tuições de ensino superior em torno de pesquisa, produções
audiovisuais que buscaram divulgar e expandir o alcance da
vida e obra do economista.
As atividades vinculadas ao Desafio foram pautadas em
uma proposta pedagógica que teve como base uma leitura
contemporânea dos estudos e reflexões promovidos por ele,
ressaltando a atualidade do seu pensamento a partir de uma
conexão com a Agenda 2030 da Organização das Nações
Unidas (ONU).
O resultado foi a mobilização de quase 1.300 estudantes
da etapa do ensino médio e suas modalidades; 424 docentes;
e 17 especialistas oriundos de instituições de ensino superior.
Assim, estava comprovado o êxito e alcance da proposta que
seria transformada, em 2021, no Programa Celso Furtado de
Inovação Educacional e Desenvolvimento Regional.
É oportuno destacar a importância do Programa para
os estudantes, visto que estimula a leitura, compreensão e
reflexão da obra furtadiana, possibilitando a formulação de
atividades de pesquisa e extensão nos anos finais do ensino
fundamental e ensino médio, contribuindo significativamente
com as práticas pedagógicas inovadoras desenvolvidas nas
escolas da Rede Estadual de Educação. Além da articulação
entre a Educação Básica e o Ensino Superior, estabelecendo
espaços de promoção do desenvolvimento regional econô-
mico e social, que aproximam os saberes provenientes das
pesquisas acadêmicas fundamentadas a partir das suas obras.
A publicação do Dossiê Celso Furtado é de extrema
importância, pois apresenta os resultados do Desafio Celso
Furtado - 2020, servindo precipuamente de fonte de pesquisa
para nortear os futuros trabalhos do Programa Celso Furtado
e, além disso, dar uma contribuição singular para o debate,
produção acadêmica e científica na área do desenvolvimento

16
regional e para os diversos atores institucionais e sociais,
ampliando o conjunto do conhecimento científico sobre o
tema.

Claudio Benedito Silva Furtado


Elis Regina Neves Barreiro

17
Introdução

Andreza Dantas Albuquerque


Ana Maria Vicente da Silva
Giovania de Andrade Lacerda Lira
Luiza Iolanda Pegado Cortez de Oliveira

No ano de 2019, o Governo da Paraíba instituiu o


ano de 2020 como o “ano Celso Furtado”, em homena-
gem ao centenário do economista natural do município de
Pombal, nascido em 1920, no Sertão do Estado. A aprovação
da proposta foi publicada no Diário Oficial do Estado, no
dia 16 de novembro de 2019, com a Lei nº 11.505/2019.
Em consonância a referida Lei, com destaque ao seu
artigo 2º, foram promovidas ações comemorativas pelo
Poder Público Estadual, envolvendo pesquisa, produções
audiovisuais e afins, que buscaram divulgar e expandir o
alcance da vida e obra de Celso Monteiro Furtado no ano
de 2020, alusivo ao centenário de nascimento do economista
paraibano.
O Desafio Celso Furtado: Os Ares do Mundo – Escola,
Criatividade e Desenvolvimento Regional foi uma pro-
posta do Governo do Estado da Paraíba, por intermédio da
Secretaria de Estado da Educação e da Ciência e Tecnologia,
realizado no ano letivo de 2020, tendo em vista as celebrações
do Centenário de nascimento de Celso Furtado supracitadas.
Em face da suspensão das atividades escolares presenciais
em virtude das ações preventivas a propagação do COVID

19
– 19, o Desafio foi desenvolvido de forma integrada às ativi-
dades no contexto de Regime Especial de Ensino.
O objetivo norteador do Desafio foi de proporcionar
às unidades escolares da Rede Estadual de Educação um
aprofundamento na obra do economista paraibano Celso
Monteiro Furtado, bem como de fomentar ações de desen-
volvimento regional, integrando escola e a comunidade local.
Como forma de sistematizar as temáticas que fundamentam
o desafio – Pensamento de Celso Furtado, Desenvolvimento
Regional e Sustentável, Agenda 2030 e os Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável - foi estabelecido três Trilhas de
Conhecimento, em que serviu como direcionamento teórico e
empírico para criação e submissão dos projetos pelas equipes.
As Trilhas de Conhecimento se dividem em: I. Bem-
estar socioambiental: viver, morar, aprender, cuidar, incluir
e interagir; II. Desenvolvimento regional sustentável: ideias
inovadoras que integrem economia e o meio-ambiente, de
maneira ética e sustentável. III. Instituições eficazes: como
aperfeiçoar nossas instituições e torná-las mais. Em cada tri-
lha se busca aprofundar e discutir as temáticas do desafio, de
acordo com as dimensões supracitadas. Além do mais, foram
desenvolvidos materiais didáticos em forma de cartilhas vir-
tuais, materiais áudio visuais e Fóruns de discussões online
sobre cada trilha de conhecimento, como forma de contri-
buir para formação intelectual dos membros das equipes.
O Desafio Celso Furtado é uma maratona escolar
onde as equipes formadas por alunos e professores da Rede
Estadual de Educação são motivadas a propor soluções
para a problemática local escolhida como relevante para a
comunidade.
A dinâmica ocorreu em duas etapas, sendo a primeira
no contexto de cada unidade escolar, por meio da submis-
são de propostas de projetos de intervenção por parte das

20
equipes, para serem avaliados e julgados por uma equipe de
especialistas. Cada equipe deveria, no projeto, propor solu-
ções para a problemática local escolhida e alinhada as trilhas
de conhecimento.
A segunda etapa, de caráter estadual, em que as equipes
dos 15 (quinze) melhores projetos avaliados submeteram sua
proposta em forma de vídeo, para uma segunda avaliação.
Por fim, duas equipes de cada Trilha de Conhecimento foram
selecionadas para desenvolverem suas propostas ao longo de
um ano, com auxílio financeiro para todos os membros das
equipes, fomentado pela Fundação de Apoio à Pesquisa do
Estado da Paraíba – FAPESQ.
O Desafio contou com a participação de diversos atores
que foram responsáveis pelo processo, desde a concepção e
planejamento até a execução e avaliação. Fizeram parte da
comissão organizadora e de acompanhamento do Desafio
os seguintes integrantes: Francisco Diassis de Araújo Soares,
Giovânia de Andrade Lacerda Lira, Luiza Iolanda Pegado
Cortez de Oliveira e Jarleyde Andressa Santos Sales de Oliveira.
Participaram da maratona, 212 equipes escolares, distri-
buídas entre 13 Gerências Regionais de Ensino da Paraíba.
As equipes são compostas por no máximo 6 estudantes e 02
professores mentores, assim, a primeira edição do Desafio
mobilizou aproximadamente 1.300 estudantes vinculados à
rede.
Além disso, o Desafio contou com a participação de 17
especialistas voluntários, que são pesquisadores vinculados
ao ensino superior e programas de pós-graduação e se desta-
cam por apresentar know how fundamental para contribuir
com as diversas áreas que englobam as temáticas das trilhas
de conhecimento. Esses especialistas prestaram consultorias
para as equipes escreverem seus projetos, além de comporem
a comissão de avaliação das duas etapas do Desafio.

21
Desse modo, busca-se promover a articulação entre a
Educação Básica e o Ensino Superior, como forma de esta-
belecer espaços de promoção do desenvolvimento regional
econômico e social, aproximando os saberes provenien-
tes das pesquisas acadêmicas fundamentadas a partir das
obras de Celso Furtado, bem como projetos de extensão
centrados em tecnologias sociais desenvolvidas no âmbito
das Instituições de Ensino Superior da Paraíba. Do mesmo
modo, nos aproximamos de Instituições de Ensino Superior
de outros Estados que fundamentam suas atividades de pes-
quisa e extensão nas teorias elaboradas por Celso Furtado,
contribuindo com as práticas pedagógicas desenvolvidas nas
escolas da Rede Estadual de Educação.
Constatamos, a partir dos objetivos dos 17 projetos
finalistas, que os saberes escolares foram movimentados no
espaço escolar, atuando em prol do bem comum, na medida
em que se pauta a resolução de problemas. Questões eco-
nômicas, sociais e ambientais foram trazidas de maneira
responsável, bem fundamentada e interdisciplinar. Vemos
que a escola é um espaço vivo, e que uma educação transfor-
madora, que dá espaço para o protagonismo juvenil, produz
resultados relacionados ao desenvolvimento de competên-
cias e habilidades, assim como contribuem para a formação
socioemocional e cidadã de cada indivíduo.
Tendo em vista dos resultados obtidos, o Governo
da Paraíba estabeleceu uma ação em cooperação entre a
Secretaria de Estado de Educação e da Ciência e Tecnologia
– SEECT e a Fundação de apoio à Pesquisa do Estado da
Paraíba – FAPESQ/PB, através do Termo de Cooperação,
de acordo com o disposto no Decreto no 33.884/2013,
para a execução das ações planejadas para a execução do
desafio para o ano de 2021 em diante. Consoante a isso,
a Medida Provisória N.300 de 14 de julho de 2021 insti-
tuiu o Programa Celso Furtado de Inovação Educacional e

22
Desenvolvimento Regional, publicada em Diário Oficial no
dia 15 de julho de 2021.
O Programa está no seu segundo ano de realização do
Desafio e primeiro enquanto programa público. O obje-
tivo norteador segue no intuito de levar o pensamento de
Celso Furtado para as escolas da rede Estadual de ensino.
Nossa meta, para 2021, é que haja a participação efetiva
das 14 regionais de ensino da Paraíba. Além disso, amplia-
mos o nosso público-alvo para que, além dos estudantes do
ensino médio, estudantes dos anos finais do ensino funda-
mental também participem. É essencial destacar que todo
o processo de concepção do Desafio Celso Furtado esteve
alinhado às metas trazidas no Plano Estadual de Educação
(2015 a 2025), instituído pela Lei nº10.488/2015.
Algumas parcerias estão sendo firmadas com a finali-
dade de contribuir para seu fortalecimento institucional,
por meio da construção de um protocolo de intenções com
o Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para
o Desenvolvimento, sediado no Rio de Janeiro, e com o
Ministério Público Estadual. Em breve, estreitaremos os
laços com a representação da Unesco no Brasil, assim como
com instituições do Terceiro Setor que trabalham no mapea-
mento da Agenda 2030 no Brasil e com ações voltadas para
o empreendedorismo social.
Como forma de registrar as ações do Desafio 2020, foi
pensado e redigido esse dossiê, em que contém relatos das
experiências empíricas dos especialistas que orientaram as
equipes na escrita dos projetos. Também de resumos dos
projetos aprovados, além dos frutos das discussões teóri-
cas que foram realizadas por cada trilha de conhecimento e
resultaram em artigos teóricos.
Assim, este dossiê se propõe a ser uma ferramenta de
busca para estudantes, professores e pesquisadores interessa-
dos em saber mais sobre a dinâmica do Desafio Celso Furtado

23
“Ares do Mundo”. Os textos aqui apresentados estão dis-
postos em três eixos: Artigos reflexivos (Parte I); Relatos de
experiência (Parte II) e Resumos expandidos (Parte III).
A parte I é composta por três artigos teóricos reflexivos,
escritos pelos especialistas que prestaram consultoria às equi-
pes da primeira edição do Desafio. Os textos apresentam os
aspectos centrais da obra do homenageado, Celso Furtado,
articulando os pilares do pensamento furtadiano com as
trilhas de conhecimento do Programa (Desenvolvimento
Regional, Bem-estar e Sustentabilidade e Instituições
Eficientes).
A ideia é que os artigos possam auxiliar os próximos
participantes do Programa Celso Furtado a compreender
os principais elementos do pensamento de Furtado sobre
Desenvolvimento Regional, Sustentabilidade e Planejamento
Institucional e as demais temáticas que englobam o pro-
grama, o Desenvolvimento sustentável e a Agenda 2030,
com seus objetivos para o milênio.
O Artigo que abre essa Parte I foi escrito pelos especialis-
tas Jamilton Costa Pereira e Marialda Souza Bueno Ferraz e
revisita as principais obras de Furtado apresentando as refle-
xões do economista sobre Desenvolvimento. Fundamentados
em Furtado, os autores ressaltam a importância de se adotar
um novo entendimento de desenvolvimento, se preocupando,
também, com a dimensão social e com a escassez dos recur-
sos naturais (renováveis e não renováveis) do planeta.
“Instituições Eficientes e Eficazes: uma análise dos
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável a partir da
perspectiva Furtadiana” é escrito pelas especialistas Ana
Maria Vicente da Silva, Erielem Araújo do Nascimento e
Andreza Dantas Albuquerque e apresentam discussões sobre
a relação das instituições e organizações para o desenvol-
vimento sustentável a partir da perspectiva Furtadiana de

24
Desenvolvimento. Em termos metodológicos se caracteriza
como uma revisão de literatura que considera os seguin-
tes construtos: instituições e organizações, à luz da teoria
institucional, a visão de Furtado sobre o desenvolvimento
corroborado pela atuação das instituições, a relação das
ideias de Furtado a Agenda 2030.
Fechando a primeira Parte I do Dossiê a especialista
Marcionila Fernandes propõe um ensaio que tem como
objetivo evidenciar alguns elementos do espírito científico
e político de Celso Furtado. O texto tem como fontes de
análises obras autobiográficas de Furtado acrescida da con-
tribuição inestimável dos seus Diários, guardados até 2019,
recém publicados em livro.
A segunda parte do Dossiê traz relatos de seis espe-
cialistas que optaram por escrever sobre a vivência como
mentores no Desafio Celso Furtado. Os textos apresentam
como ocorreu a dinâmica de consultoria, as temáticas dos
projetos acompanhados, além de trazerem considerações sig-
nificativas para o Programa.
A Parte II começa com o relato de experiência das
especialistas Andreza Dantas Albuquerque e Milena Barros
Marques dos Santos. O relato descreve atividades desen-
volvidas e apresenta reflexões sobre a experiência das
pesquisadoras, autoras deste relato, como consultoras/espe-
cialistas no Desafio Celso Furtado 2020. Pesquisadoras da
área do Desenvolvimento Regional, atuaram no Desafio
prestando consultoria a 17 equipes que concorriam na Trilha
2 – Desenvolvimento Regional Sustentável.
Rafaela Dias e Thaís Marculino da Silva expõem suas
vivências no relato “Desenvolvimento e educação: um olhar
a partir das contribuições de Celso Furtado”. As especialistas,
além de descrever o processo de orientação junto às equipes
do Desafio Celso Furtado, refletem sobre a importância do

25
processo de ensino aprendizagem para o desenvolvimento
acadêmico dos alunos do ensino básico.
Os especialistas Alexandre Silva de Lima e Marayza
Alves Medeiros finalizam a parte II do dossiê compartilhando
suas experiências com a consultoria de equipes participantes
da trilha Desenvolvimento Regional Sustentável.
A parte III deste dossiê é dedicada à apresentação das
equipes vencedoras do Desafio 2020. Ao todo, seis equipes,
duas por trilha de conhecimento, tiveram seus projetos sele-
cionados para prosseguirem no Programa Celso Furtado,
desenvolvendo suas propostas de inovações sociais.
Compõem a trilha 1 - Bem-estar socioambiental as equi-
pes TPN em Ação: trabalhe, pense e inove; e a equipe Bem
Viver. A equipe TPN em Ação, da escola EEEFM Dr. Trajano
Pires da Nóbrega na cidade de Condado -PB tem como
mentores os professores, Gerfferson Fernandes Linhares
e Marcos Sérgio dos Santos para o desenvolvimento do
projeto “Engenheiro Arcoverde: um potencial a serviço de
Condado” que propõe uma investigação sobre as potenciali-
dades do Açude Engenheiro Arcoverde, localizado na cidade
de Condado - PB, como fonte de desenvolvimento econô-
mico, turístico e rural.
Já a equipe Bem Viver, da escola ECIT Alcides Bezerra
na cidade de Cabaceiras, desenvolve o projeto “Fábrica de
água doce”, que tem por objetivo construir uma unidade
demonstrativa para dessalinizar água por destilação solar,
transformando água salobra em água potável para as famílias
residentes em comunidades rurais do município de Cabaceiras
- PB. O projeto está sob a mentoria da professora Albertina
de Farias Silva e visa assegurar a qualidade da água usada
para o consumo das famílias, promover a segurança hídrica
e desenvolver soluções de convivência com seca, que sejam
sustentáveis e que melhore a autoestima e qualidade de vida.

26
Representando a Trilha 2 - Desenvolvimento Regional
Sustentável temos as equipes Os Sapiens e HL Sustentável.
A equipe Os Sapiens, da escola ECIT Martiniano da Costa
na cidade de Lagoa Seca, recebe a mentoria dos professores
Damião Raniere Queiroz e Paulo Deyvity Rodrigues para
desenvolver o projeto que objetiva produzir um protótipo
compacto e sustentável de aquaponia e carneiro hidráulico
para os moradores da área urbana e rural do município de
Lagoa Seca. A ideia é que os alunos participantes do pro-
jeto possam aplicar os fundamentos da Matemática, Física,
Química e Biologia na vida da comunidade, possibilitando
um alimento saudável e uma renda extra para as comunida-
des rurais de Lagoa Seca.
Com o projeto “Biodigestores nos centros urbanos:
uma tecnologia, vários benefícios” a equipe HL Sustentável,
da escola EEEFM Senador Humberto Lucena na cidade de
Cacimba de Dentro, problematiza a destinação inadequada
de matéria orgânica, bem como seu desperdício. A proposta
é produzir um biodigestor para gerar biogás com restos de
matéria orgânica domiciliar e assim dá um destino útil à
matéria orgânica, gerando energia renovável e que pode ser
acessível a todos.
Já na Trilha 3 - Instituições Eficazes estão as equipes
Trilhando o Caminho da Sabedoria e Arte, Ação e Solução.
Sob a mentoria das professoras Nataly Maria de Oliveira
Souza e Jandira Ribeiro de Melo Ataide, a equipe Trilhando
o Caminho da Sabedoria, da escola ECIT João Úrsulo na
cidade de Pedras de Fogo, problematiza a questão do destino
dado ao lixo no município de Pedra de Fogo - PB. A proposta
é pensar melhores condições de trabalho para os catadores
de materiais reutilizáveis e recicláveis do município. A pro-
posta visa trazer dignidade aos trabalhadores e eficiência na
prestação do serviço à comunidade.

27
Já o projeto da equipe Arte, Ação e Solução é dirigido
a moradores da comunidade São José, na cidade de João
Pessoa -PB na escola ECIT Alice Carneiro. Entre as ações
do projeto, que tem mentoria das professoras Francineide
de Lira Ferreira e Shirley Monteiro Cavalcante da Cunha,
estão a realização de oficinas profissionalizantes, exposições
e atividades ligadas às artes e a cultura.

28
29
Desenvolvimento Regional de
forma sustentável e o pensamento
de Celso Furtado

Jamilton Costa Pereira1


Marialda Souza Bueno Ferraz2

1 Introdução
É a partir do conceito de desenvolvimento que
se pode afirmar que um homem é um elemento
de transformação, agindo tanto sobre o contexto
social e ecológico como sobre si mesmo.
(Celso Furtado, 2002)

Escrever um artigo teórico para o Dossiê Celso


Furtado tendo como referencial o rico e complexo pensa-
mento do economista e cientista social latino-americano
Celso Furtado (1920-2004) considerado um dos mais
influentes clássicos do século XX e autor indispensável para
pensar a problemática do desenvolvimento-subdesenvolvi-
mento acerca dos dilemas de países subdesenvolvidos, em

1 Doutorando em Engenharia e Gestão de Recursos Naturais - UFCG.


Mestre em Sistemas Agroindustriais - UFCG. Especialista em Gestão
Ambiental - UFCG. Graduado em Geografia - UEPB. E-mail: jcp_jamil-
[email protected].
2 Mestranda em Dinâmicas Regionais e Desenvolvimento - UFRGS.
Especialista em Controladoria - UFRGS. Graduada em Ciências
Econômicas - UFRGS. E-mail: [email protected].

31
especial sobre o Brasil, na perspectiva de que esse material
venha a servir de base teórica à formação de jovens da educa-
ção básica brasileira é antes de tudo desafiante e fortemente
gratificante.
Primeiramente, porque somos admiradores do pensa-
mento desse grande pesquisador brasileiro, natural da Cidade
de Pombal na Paraíba, que dedicou a sua vida intelectual, a
elaborar, analisar e apontar alternativas ao modelo capita-
lista perverso, destinado aos povos da periferia do sistema,
bem como, se tornou um homem de realizações, podendo
ainda que brevemente, colocar em prática seu desejo de uma
nação com um projeto de desenvolvimento que torna o país
menos desigual. Segundo, por podermos estar atuando na
elaboração de projetos voltados para trilha de conhecimento
“Desenvolvimento Regional” no Estado da Paraíba, que
está localizado no nordeste brasileiro - terra de Furtado -
num ousado e visionário projeto que aposta na juventude,
na sua criatividade, sonhos e desejos de fazer, tendo como
base um pensamento atualíssimo, nos motiva e faz crer no
que muitas vezes é visto como impossível: uma verdadeira
e estrutural mudança no país que nos retire da situação de
subdesenvolvimento.
Desta forma, propomos aqui, uma reflexão sobre alguns
conceitos importantes e trazemos a palavra do próprio autor,
acerca de questões fundamentais para pensarmos projetos
voltados para o desenvolvimento local, quiçá, refletir sobre
o desenvolvimento nacional, tendo por referencial os estu-
dos de Furtado ao longo de mais de meio século observando
as mazelas, avanços e retrocessos do país e principalmente,
pensando o desenvolvimento para além de conjunturas
passageiras e sim na perspectiva de mudanças estruturais,
portanto sólidas, a partir dos abundantes recursos naturais e
humanos dos quais dispomos.

32
O pensamento, a obra e a própria vida de Celso Furtado
revelam, antes de tudo, uma profunda esperança. Não a
esperança dos iludidos, mas aquela que busca por meio do
estudo e da reflexão, da realidade analisada e do compro-
metimento militante pelo Brasil, a superação dos grandes
obstáculos desde nossa formação colonial.
Com o objetivo de contribuir para o debate proposto
a partir do Desafio Celso Furtado “Ares do Mundo”, pro-
pomos aqui destacar sucintamente alguns dos principais
conceitos elaborados por Furtado, como a questão do sub-
desenvolvimento - aqui o caso brasileiro - a relação centro
versus periferia e a reprodução dos padrões de consumo (o
mimetismo cultural), bem como, situar que estas elaborações
ocorrem no contexto da formação da Comissão Econômica
para a América Latina e o Caribe (CEPAL) e tem como base
teórica o estruturalismo latino-americano.
Trata-se do tipo de pesquisa que classifica-se quanto: 1)
à natureza, como pesquisa básica, 2) aos objetivos, pesquisa
exploratória e pesquisa descritiva; 3) à forma de abordagem,
pesquisa qualitativa; 4) quanto às fontes de informações,
pesquisa bibliográfica por meio de fontes primárias e
documental por meio de fontes de dados secundários que se
deu a partir de uma sistemática revisão de literatura apoiada
em livros e artigos científicos, cuja operacionalização ocorreu
por meio da utilização de periódicos eletrônicos, e-books e
anais de eventos.

2 Centro-Periferia do Capitalismo Industrial e


o Subdesenvolvimento

O subdesenvolvimento, como o deus Jano, tanto


olha para a frente como para trás, não tem orien-
tação definida. É um impasse histórico que
espontaneamente não pode levar senão a alguma

33
forma de catástrofe social. Somente um projeto
político apoiado em conhecimento consistente
da realidade social poderá romper a sua lógica
perversa.
(Celso Furtado, 1990)

As visões sobre desenvolvimento e suas formas como as


conhecemos atualmente são baseadas em teorias difundidas
no decorrer dos séculos XIX e XX, oriundas do processo da
revolução industrial. Estas abordagens sustentaram os mode-
los debatidos e aplicados na sociedade, particularmente as
sociedades ocidentais dos países europeus capitalistas, a par-
tir da Escola Clássica, com Adam Smith e sua mais célebre
obra A Riqueza das Nações: Investigação sobre a sua natu-
reza e suas Causas, de 1776, e que tem como essência a visão
do livre mercado e do interesse individual - como um modelo
de equilíbrio econômico eficiente - que foram formadas as
bases conceituais das sociedades industriais desenvolvidas,
ricas, também identificadas como Primeiro Mundo3.
As ideias sobre desenvolvimento econômico sur-
giram a partir do século 18, simultaneamente
com a noção de evolução no campo das ciências
da natureza ponto dava-se como evidente que
o homem sempre aspira a ascender a melhores
condições de vida por seu lado a noção afim de
progresso de raiz religiosas ligava conquista do
bem-estar a ações meritórias que assumiu uma
forma de sacrifícios realizados no presente em

3 “Os chamados Primeiro Mundo e Segundo Mundo surgiram de uma


interpretação errônea por parte principalmente da mídia. Assim, convencio-
nou-se que o Primeiro Mundo seria o dos países capitalistas desenvolvidos,
enquanto o Segundo Mundo seria o dos países socialistas industrializados.
Restariam no Terceiro Mundo os países capitalistas economicamente sub-
desenvolvidos e geopoliticamente não-alinhados”. https://www2.senado.
leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/461185/noticia.htm?sequence=1

34
troca de recompensas futuras ponto esses sacrifí-
cios legitimaram a dominação social graças à qual
se se viabiliza a acumulação de riquezas, abrindo
caminho para a divisão social do trabalho e o
aumento da produtividade deste. (FURTADO,
2002, p. 45).

O Brasil identificado - assim como as demais nações lati-


no-americanas - como um país do chamado Terceiro Mundo
passa, a partir dos anos 30, a engendrar esforços de indus-
trialização, no entanto será a partir do pós II Guerra, já nos
anos 50, que se formula um diagnóstico das causas da con-
dição do atraso brasileiro e do restante da América Latina,
e um arcabouço teórico aprofundado sobre os impasses do
“desenvolvimento”, propondo-se a partir disso uma forma
de abordagem, de método de análise: o Estruturalismo lati-
no-americano, a partir da criação da Comissão Econômica
para a América Latina e o Caribe (CEPAL), em 1948, no
Chile.
O Estruturalismo Latino-americano nasce, portanto, do
entendimento de que o subdesenvolvimento não é uma com-
paração entre momentos históricos passados das economias
do “centro” em relação ao momento atual das economias da
“periferia”.
Não é desta forma, uma etapa necessária a ser percorrida
em um processo de desenvolvimento. São os desdobramen-
tos históricos específicos de cada país que determinam suas
posições nesse processo global de desenvolvimento, partici-
pando assim do mesmo processo de desenvolvimento.
Subdesenvolvimento e desenvolvimento são esferas que
se relacionam e interagem, são faces do mesmo processo
que se condicionam mutuamente. Uma face constituída
por países avançados, industrializados e desenvolvidos, e
a contraface composta por uma periferia subdesenvolvida,
atrasada e marginalizada. (MARCATO e SILVA, 2013).

35
Furtado se dedicaria a partir desse contexto de criação
da CEPAL, à análise das economias subdesenvolvidas, desta-
cadamente a brasileira, desde sua formação colonial inicial
marcada pela forte concentração econômica e consequente
desigualdade socioeconômica. Sendo um crítico do libera-
lismo, defendia que o Estado tinha um papel fundamental
no planejamento econômico e na habilitação4 da maioria da
sociedade com vistas a uma redistribuição mais justa do pro-
duto resultante do capitalismo ocidental.
Muitas foram as fontes teóricas as quais buscou para
formar seu pensamento singular, à medida que articula as
várias escalas onde se demonstravam os fenômenos econô-
micos e sociais aos quais debruçava-se em analisar. Segundo
Carlos Brandão (2013), Furtado:
(...) deixou claro de onde e de quem partiu para
construir sua agenda própria, explicitando sua
formação e perguntas-chave que orientariam
toda sua brilhante carreira acadêmica e política.
Também fica clara sua agenda permanente que,
ao mesmo tempo, ia sendo renovada e enrique-
cida. (...) sua genealogia intelectual é ampla: parte
e articula elementos teórico-conceituais do positi-
vismo, do marxismo, da sociologia americana, da
antropologia cultural, da filosofia e da história.
Na verdade, vai mobilizando conhecimentos do
conjunto das ciências humanas e sociais a partir de
múltiplos autores: Weber, List, Tönnies, Simmel,
Sombart, Schumpeter, Keynes, Mannheim,

4 Habilitação – ou enfoque da habilitação - foi o termo utilizado primeira-


mente por Amartya Sen, em seu livro Poverty and damines: na essay on
entitlement and deprivation, 1981 e em Hunger and entitlement, 1987, e ao
qual se refere Furtado em sua obra “O Subdesenvolvimento Revisitado”,
1992. Segundo Furtado (1992, p. 17) “Para participar da distribuição da
renda social é necessário estar habilitado por títulos de propriedade e/ou
pela inserção qualificada no sistema produtivo”.

36
Prebisch, Perroux, Myrdal, Hirschman, Marcuse,
entre muitos outros. Hoje, no século XXI, com
o avanço da literatura sobre as múltiplas esca-
las espaciais, impressiona como Furtado pensou
sempre em variados níveis escalares (planetário,
latino-americano, nacional, regional) e planos
analíticos (em um jogo dialético e dinâmico entre
o particular e o universal). A busca da visão glo-
bal. A América Latina e o Brasil e sua inserção no
mundo. O Nordeste e sua inserção no Brasil. O
retorno ao global, e assim por diante. Pensando,
recorrente e simultaneamente (em aproximações
sucessivas e em espiral), o movimento, o sentido e
a transformação das relações, estruturas e proces-
sos. (BRANDÃO, 2013, p. 11).

Para Furtado (1996) o subdesenvolvimento abarcava


inúmeras dimensões, por vezes difícil de se captar, dado que
o que era visível nem sempre era o mais significativo nessa
condição, mas o que assegurava era que, o subdesenvolvi-
mento nada tinha a ver com a idade de uma sociedade ou de
uma nação e sim o grau de acumulação de capital aplicado
aos processos produtivos, o grau de acesso aos bens finais
provenientes desse processo e a heterogeneidade da estrutura
produtiva e da capacidade tecnológica empregada.
Outra questão fundamental em sua obra seria a aborda-
gem sobre o estilo de vida moderno, o padrão de consumo
característico dos países ricos e a sua reprodução – inacessí-
vel – para os países pobres, subdesenvolvidos. (FURTADO,
1996).
Esta heterogeneidade estrutural que caracterizava as
economias subdesenvolvidas foi observada como um fator
fundamental de atraso, já que explica vários fenômenos visí-
veis do subdesenvolvimento, como a dependência em relação
às economias do centro, a reprodução dos padrões de con-
sumo, a deficiência tecnológica de nossa estrutura produtiva

37
e das características do nosso comércio internacional com os
países altamente industrializado - baseado na exportação de
produtos primários e a importação de manufaturados mais
sofisticados.
Um dos paradoxos da economia subdesenvolvida
está em que o seu sistema produtivo apresenta
segmentos que operam com níveis tecnológicos
diferentes, como se nela coexistissem épocas dis-
tintas. (FURTADO, 2013, p. 131).

Sobre especificamente essa questão do comércio inter-


nacional da periferia com o centro, é importante destacar
que passados mais de meio século das análises iniciais de
Furtado, o país ainda se encontra em situação similar.
Com a desindustrialização da economia ocorrida a
partir dos anos 80, chegamos atualmente a um processo de
acelerada (re)primarização, onde a exportação de produtos
primários agrícolas ocupa lugar de destaque e influência
enormemente as decisões governamentais para o conjunto
da economia – a política cambial, por exemplo – e, persiste
a baixa capacidade de uma produção de bens com maior
complexidade tecnológica – seja para o abastecimento do
mercado interno, quiçá, para a exportação nacional.
Foi nos anos 30 que se começou a questionar o
modelo da economia “essencialmente agrícola”
defendido pela classe dominante brasileira. Fui
dos primeiros a denunciar o agrarismo como
causa de nosso atraso. Um país da extensão
e heterogeneidade social do Brasil não podia
depender da agricultura extensiva para desen-
volver-se. Isso hoje parece elementar, mas meio
século atrás era motivo de polêmica acalorada. A
verdade é que mais de 90% das exportações bra-
sileiras eram constituídas de produtos primários
agrícolas e eram os interesses ligados ao comércio

38
exterior que ocupavam as posições de comando
no país. Não que o país fosse totalmente desti-
tuído de indústrias. O que não havia era sistema
industrial capaz de autogerar o seu dinamismo. O
ritmo da atividade econômica era comandado do
exterior, portanto, pelas atividades primárias. O
problema não se limitava a depender da importa-
ção de tecnologia e de equipamentos para crescer,
e sim dispor de uma classe dirigente capaz de
formular um projeto de transformação do país.
(FURTADO, 1998, pág.17).

Os países subdesenvolvidos sempre encontrarão dificul-


dades em se igualarem aos países desenvolvidos, pois estes
não querem aumentar a concorrência e nem perder supre-
macia, uma vez que as nações centrais não têm interesse em
facilitar essa transição, já que dentro dos países periféricos
muitos dependem dessas nações ricas.
No atual sistema econômico, essas relações de subor-
dinação entre ricos e pobres não têm como serem extintas,
pois ela é indispensável à circulação e manutenção do sis-
tema capitalista vigente. De forma que a perdurar o modelo,
sem as reformas estruturais necessárias, os países subdesen-
volvidos estarão sempre em desenvolvimento e os países
desenvolvidos serão sempre desenvolvidos. O tempo não se
encarregará de alterar tais condições.

3 O Mimetismo Cultural contra o


Desenvolvimento (Sustentável)
Nada choca tanto o observador da economia
brasileira como a contradição entre o formidá-
vel potencial de recursos do país e o baixo nível
de desenvolvimento alcançado por este até o
presente.
(Celso Furtado, 2002)

39
A partir do Mito do Desenvolvimento Econômico, lan-
çado em 1974, se estabelece uma maior preocupação sobre a
degradação do meio físico na obra do autor. Para Furtado a
reprodução de um determinado padrão de consumo, copiado
do centro e que era realizado, nos países periféricos, somente
pelas classes dominantes/pelas elites econômicas, é talvez
uma das faces mais visíveis do subdesenvolvimento.
O mimetismo cultural, portanto, se constitui como um
fator de concentração de renda (este conceito está intrinseca-
mente ligado à apropriação, por uma minoria, do excedente
na economia), bem como, um fator de alto impacto no meio
natural.
Essa apropriação do excedente que aprofunda a desi-
gualdade social e alimenta um determinado padrão de
consumo das classes dominantes, que em última análise
legitima, a partir do estilo de vida da minoria, um sistema
de dependência de decisões externas sobre a dinâmica eco-
nômica nacional e torna cada vez mais difícil a mobilidade
social dos estratos desfavorecidos.
Furtado demonstrou como o subdesenvolvimento
é uma estrutura com grande capacidade de persis-
tência e reprodução de estruturas tradicionais e
anacrônicas de dominação. Mesmo com aumento
do nível médio de vida da população, muitas vezes
não se conduz a um processo de homogeneização
social. Há a contínua reafirmação da dependên-
cia, posta a pretensão das elites de imitação da
cultura material do capitalismo avançado em um
contexto de privação, desfiliação e desabilitação
das massas populares. Dever-se-ia também pro-
curar frear o ímpeto dos “sistemas de símbolo
importados que com frequência ressecam nossas
raízes culturais” que buscam a “uniformização
dos padrões de comportamento, base da criação
de grandes mercados”. (FURTADO, 1985 apud
BRANDÃO, 2020, p.188-189).

40
Desta forma o mimetismo cultural impõe a reprodução
de um certo padrão de consumo, possível as economias do
centro moderno do sistema para as economias periféricas,
onde somente as classes de maior poder econômico podem
desfrutá-la, ainda que seja, justamente pela questão cultural
difundida e imposta, um padrão almejado – também – pelos
estratos excluídos.
Na economia periférica as modificações do sistema
produtivo são induzidas do exterior. [...] Em síntese, o que
caracterizou a formação da periferia foi a dinamização da
demanda — modernização — em condições de um rela-
tivo imobilismo social causado pelo lento desenvolvimento
das forças produtivas. O que veio a chamar-se subdesen-
volvimento não é outra coisa senão a manifestação dessa
disparidade entre o dinamismo da demanda e o atraso na
acumulação produtiva. Este último tem origem na forma de
inserção na divisão internacional do trabalho, e aquele, na
penetração dos padrões de consumo do centro. (FURTADO,
2013, p. 38).
Os padrões de consumo do centro e sua reprodução é
um tema fundamental para Furtado em sua tese de que o
desenvolvimento é um mito, uma vez que esse padrão seria
irrealizável em escala planetária e se realizado, colapsaria o
planeta, pelo uso, em escala gigantesca, dos recursos naturais
e não renováveis.
(...) Celso teorizou sobre os fatores culturais e sua
influência no processo de subdesenvolvimento
latino-americano. Excetuando-se a dominação
colonial, o fenômeno da dependência se mani-
festava inicialmente, a seu ver, na área cultural.
Trocando em miúdos: (a) o capitalismo periférico
gerava um mimetismo cultural, provocando uma
permanente concentração de renda e reforçando,
por sua vez, a dependência cultural; (b) os padrões

41
de consumo eram transplantados dos países mais
ricos para os mais pobres; (c) os padrões de con-
sumo conspícuo das elites latino-americanas eram
(são) um fator de perpetuação do subdesenvolvi-
mento. (d’AGUIAR, 2020, p. 69).

Quando Furtado lança as primeiras luzes sobre o


impacto da produção do sistema capitalista sobre os recur-
sos naturais e não renováveis, o termo “sustentável” ainda
não estava em voga expressando o conceito que mais tarde
se formaria entre os pensadores da ecologia e do meio
ambiente, mas a preocupação do autor já demonstrava, pelo
conteúdo da sua crítica, a necessidade de repensar o modelo
industrial do centro (industrializado e moderno) e da perife-
ria do sistema (fornecedora, sobretudo, de matéria prima e
de recursos naturais).
Desta forma, Furtado pode ser considerado um pioneiro
naquilo que iria ser difundido como desenvolvimento sus-
tentável, em contraponto ao desenvolvimento perseguido
pelas economias industriais e por aquelas que buscavam
industrializar-se.
Para Araújo, “percebe-se que ele vai refinando e
ampliando sua visão, sendo, a meu ver, precursor da con-
cepção contemporânea de desenvolvimento sustentável.”
(ARAÚJO, 2020, p. 16). Furtado entendia assim que o pro-
cesso de transformação não poderia apenas ser medido pelo
PIB, mas pelas condições sociais da sociedade, o que abar-
cava a riqueza cultural, bem como, pela relação saudável
com a natureza. (ARAUJO, 2020).
O que não se pode aceitar é a hipótese, também
implícita nessas projeções, segundo a qual os
atuais padrões de consumo dos países ricos tendem
a generalizar-se em escala planetária. Esta hipó-
tese está em contradição direta com a orientação

42
geral do desenvolvimento que se realiza atual-
mente no conjunto do sistema, da qual resulta a
exclusão das grandes massas que vivem nos países
periféricos das benesses criadas por esse desen-
volvimento. Ora, são exatamente esses excluídos
que formam a massa demográfica em rápida
expansão. A população do mundo capitalista está
formada nestes anos 1970 por aproximadamente
2,5 bilhões de indivíduos. Desse total, cerca de
800 milhões vivem no centro do sistema, e 1,7
bilhão em sua periferia. (FURTADO, 2013, p. 83).

O centro irradia para a periferia a sua produção esta-


belecendo novos padrões de consumo configurando assim
um quadro de dominação cultural assimilado pelas elites dos
países periféricos o que repercute nas importações da produ-
ção sofisticada do centro. Por sua vez isso acarreta processos
produtivos que lentamente absorvem novas técnicas, bem
como acarreta a reprodução local da produção anterior-
mente importada (industrialização tardia), para atender a
demanda interna dos estratos sociais de poder econômico.
(FURTADO, 2013).
Se deixamos de lado as conjecturas e nos limi-
tamos a observar o quadro estrutural presente
do sistema capitalista, vemos que o processo
de acumulação tende a ampliar o fosso entre
um centro em crescente homogeneização e uma
constelação de economias periféricas, cujas dis-
paridades continuam a acentuar-se. Com efeito,
a crescente hegemonia das grandes empresas na
orientação do processo de acumulação traduz-se,
no centro, por uma tendência à homogeneização
dos padrões de consumo e, nas economias peri-
féricas, por um distanciamento das formas de
vida de uma minoria privilegiada com respeito à
massa da população. Essa orientação do processo

43
de acumulação é, por si só, suficiente para que a
pressão sobre os recursos não reprodutíveis seja
substancialmente inferior à que está na base das
projeções alarmistas a que fizemos antes referên-
cia. (FURTADO, 2013, p. 82).

Desta forma a nova orientação do Desenvolvimento


deve buscar um sentido mais igualitário, às formas coleti-
vas de consumo, a redução do desperdício provocado pelo
padrão de consumo dos grupos privilegiados o que reduziria
a pressão sobre os recursos naturais.
Furtado aponta algumas hipóteses para os países perifé-
ricos: ao se manter o padrão atual que prevaleceu no último
quarto de século a concentração de renda em benefício da
minoria seria agravada, o fortalecimento das burocracias que
controlam os Estados na periferia e a possibilidade ainda,
de que sob pressão das crescentes massas excluídas dos fru-
tos do desenvolvimento ocorressem mudanças de fundo na
orientação do processo de desenvolvimento. (FURTADO,
2013).
O custo, em termos de depredação do mundo
físico, desse estilo de vida é de tal forma ele-
vado que toda tentativa de generalizá-lo levaria
inexoravelmente ao colapso de toda uma civili-
zação, pondo em risco a sobrevivência da espécie
humana. Temos assim a prova cabal de que o
desenvolvimento econômico – a ideia de que os
povos pobres podem algum dia desfrutar das
formas de vida dos atuais povos ricos – é sim-
plesmente irrealizável. Sabemos agora de forma
irrefutável que as economias da periferia nunca
serão desenvolvidas no sentido de similares às
economias que formam o atual centro do sistema
capitalista. Mas como desconhecer que essa ideia
tem sido de grande utilidade para mobilizar os
povos da periferia e levá-los a aceitar enormes

44
sacrifícios para legitimar a destruição de formas
de culturas arcaicas, para explicar e fazer com-
preender a necessidade de destruir o meio físico,
para justificar formas de dependência que refor-
çam o caráter predatório do sistema produtivo?
Cabe, portanto, afirmar que a ideia de desenvol-
vimento econômico é um simples mito. Graças
a ela, tem sido possível desviar as atenções da
tarefa básica de identificação das necessidades
fundamentais da coletividade e das possibilida-
des que abre ao homem o avanço da ciência, para
concentrá-las em objetivos abstratos como são
os investimentos, as exportações e o crescimento.
(FURTADO, 2013, p. 85).

Celso Furtado defende uma modificação de fundo na


orientação geral do processo de desenvolvimento. Para o
autor,
[...] a nova concepção do desenvolvimento teria
que ser num sentido muito mais igualitário,
favorecendo as formas coletivas de consumo e
reduzindo o desperdício provocado pela extrema
diversificação dos atuais padrões de consumo
privado dos grupos privilegiados. (FURTADO,
1974, p. 74).
Uma vez que no Desenvolvimento Sustentável
deve haver um equilíbrio entre diversos aspectos
(sociais, econômicos e ambientais). No social, por
exemplo, deve considerar a equidade de políticas
de educação, saúde, moradia, assistência, gênero,
etnia entre outras. No econômico, deve-se con-
siderar igualdade de classes sociais (geração de
emprego e renda). E no ambiental, deve-se con-
siderar o uso de recursos naturais (renováveis e
não renováveis) de forma racional com foco na
mitigação de impactos negativos.

45
4 Considerações Finais
[...] não há dúvida alguma de que toda a nossa
civilização é predatória, que ela vive de destruir o
planeta. Se deixarmos que continue o atual pro-
cesso civilizatório, o planeta se destrói.
(Furtado, 2007)

Compreende-se que a “nova concepção de desenvol-


vimento” que Celso Furtado defende, está diretamente
correlacionada à ideia de desenvolvimento de forma sus-
tentável. As palavras que Furtado utiliza para descrever a
nova concepção de desenvolvimento comprovam de fato a
hipótese de que o desenvolvimento está “posto ao alcance de
todos os povos e capaz de preservar o equilíbrio ecológico”;
um desenvolvimento que deve priorizar “as formas coletivas
de consumo” e que deve reduzir o “desperdício de recursos”.
A ideia de desenvolvimento sustentável aparece de
forma implícita quando o autor afirma que na civilização
industrial, a minoria da população “dispõe dos recursos
não renováveis do planeta sem se preocupar com as conse-
quências para as gerações futuras do desperdício que hoje
realiza.” (FURTADO, 1992, p. 76).
Ao se buscar o desenvolvimento deve-se deixar de lado
o desejo de reproduzir somente com foco na modernização
e economia, impondo dessa forma, a adoção de um novo
entendimento de desenvolvimento, ao se preocupar tam-
bém com a dimensão social (diminuição das desigualdades
socioeconômicas e espaciais) e com a escassez dos recursos
naturais (renováveis e não renováveis) do planeta.
Observa-se que Celso Furtado critica os fundamentos da
civilização industrial, ao denunciar o caráter insustentável,
antissocial e, sobretudo elitista do modelo de desenvolvi-
mento hegemônico no capitalismo.

46
Considerando a ideia de Celso Furtado de que o “ver-
dadeiro desenvolvimento” está diretamente relacionada com
a compreensão de desenvolvimento sustentável, entende-se
dessa forma, que o desenvolvimento não é a simples repro-
dução do estilo de vida dos países do centro para os países
periféricos.
Um desenvolvimento autônomo, criativo e sustentável
desse ser perseguido considerando as aspirações de seu povo
e com base no patrimônio histórico-cultural, concretizando
de fato a sua identidade nacional.

Referências

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Militante (Desafios). (Org) Souza, Cidoval Morais de. (et al).
Vol. 3. Campina Grande, Editora da UEPB, 2020.

BRANDÃO, Carlos. In: Celso Furtado: A Esperança Militante


(Interpretações). (Org) Souza, Cidoval Morais de. (et al). Vol.
1. Campina Grande, Editora da UEPB, 2020.

BRAGA, Saturnino. In: Celso Furtado: os combates de um


economista. (Org) Quintela, Adroaldo (et al). São Paulo, Ed.
Fundação Perseu Abramo, 2020.

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de Celso Furtado. Tese de Doutoramento. Universidade
Federal do Rio de Janeiro, RJ, 2013.

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Desenvolvimento como falácia. AAmbiente & Sociedade -
Vol. V - no 2 - ago./dez. 2002 - Vol. VI - no 1 - jan./jul. 2003.

47
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49
Instituições Eficientes e Eficazes:
uma análise dos Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável
a partir da perspectiva Furtadiana

Ana Maria Vicente da Silva5


Erielem Araújo do Nascimento6
Andreza Dantas Albuquerque7

1 Introdução

O ano de 2020 marcou o centenário de nascimento do


economista Celso Furtado, paraibano, nascido na cidade de
Pombal, no sertão da Paraíba, Furtado é considerado um dos
grandes intelectuais brasileiros do século XX. Para celebra-
ção, o Governo do Estado, por meio Secretaria de Estado da
Educação e da Ciência e Tecnologia (SEECT-PB), convidou
alunos e professores da Rede Estadual a participarem de uma

5 Mestre em Administração (PPGA UFPB), Graduação em Administração


(UEPB).
6 Mestre em gestão pública e cooperação Internacional (PPGCI UFPB),
Graduação em Administração (UFPB), atualmente participa como pesqui-
sadora do Núcleo de Estudos em Marketing no Interesse Social (MIS).
7 Jornalista, Doutora em Ciência, Tecnologia e Sociedade pela UFSCar,
Mestre em Desenvolvimento Regional (PPGDR UEPB), pesquisadora vin-
culada ao Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional da
Universidade Estadual da Paraíba na condição de estágio pós-doutorado.

51
maratona de inovação, o “Desafio Celso Furtado: Os ares do
mundo - Escola, Criatividade e Desenvolvimento Regional”.
O Desafio teve como objetivo aproximar os estudantes da
vida e obra de Celso Furtado, buscando estimular o interesse
por elementos históricos e econômicos que perpassam a rea-
lidade brasileira, utilizando-os como base para promover
reflexões sobre o contexto em que se encontra cada unidade
escolar, identificando problemáticas e propondo soluções.
Um total de 212 equipes escolares aceitaram o chamado
da SEECT-PB e se inscreveram para participarem do desafio
de propor soluções relevantes conectando o pensamento de
Celso Furtado à Agenda 2030 da Organização das Nações
Unidas (ONU). Destas, 103 submeteram seus projetos para
avaliação ao final da etapa escolar e 21 equipes foram sele-
cionadas para a etapa estadual. Seis foram campeãs do
Desafio Celso Furtado em 2020.
Com a receptividade das escolas, o Desafio foi, por meio
da Medida Provisória n.300, de 14 de julho de 2021, transfor-
mado no Programa Celso Furtado de Inovação Educacional
e Desenvolvimento Regional, que tem por objetivo incentivar
pesquisas sobre as contribuições das obras de Celso Furtado
para o desenvolvimento regional e local, capazes de dialo-
gar com os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
– ODS, que no Desafio, são agrupados em três trilhas de
conhecimento: Bem-Estar Socioambiental, Desenvolvimento
Regional Sustentável e Instituições Eficazes.
Desta forma, o presente ensaio teórico tem como
objetivo discutir teoricamente os principais construtos
norteadores da Trilha Instituições Eficazes: a relação das
instituições e organizações para o desenvolvimento sustentá-
vel a partir da perspectiva Furtadiana de Desenvolvimento.
Particularmente, a trilha tem como principal preocupação
investigar e propor estratégias para aperfeiçoar nossas insti-
tuições e torná-las mais eficientes e inclusivas.

52
Metodologicamente, se caracteriza como estudo biblio-
gráfico que pretende servir de material pedagógico para os
próximos alunos e professores que pretendem conhecer a
Trilha Instituições Eficazes e participar das próximas edições
do Desafio do Programa Celso Furtado. Com isso, buscamos
responder também: Como as ideias de Furtado se relacionam
com a Agenda 2030? Como a experiência da Superintendência
do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), criada por
Furtado em 1959, nos ajuda a refletir sobre o papel das insti-
tuições para o Desenvolvimento Regional?
O modelo de desenvolvimento pautado unicamente no
crescimento econômico já se mostrou ineficiente e incapaz de
responder às demandas da sociedade. Sustentado por ideo-
logias que pregam a necessidade de crescimento, como saída
para o sistema capitalista, é que essa concepção de desenvol-
vimento se torna preponderante na atual conjuntura política
econômica, mundialmente.
Furtado (2004) já alertava para os perigos em se pautar
o desenvolvimento de uma sociedade apenas a partir do cres-
cimento econômico, em que denominou como “o mito do
desenvolvimento” e título de umas das suas obras. Altvater
(2010) denomina essas formas de pensar como o fetichismo
do crescimento, em que afirma que, o crescimento desen-
freado cria diversos problemas para sociedade, mas não os
soluciona, ao passo que, não diminui a pobreza e desigual-
dade, mas colabora com ela.
Para Furtado:
“[...] o desenvolvimento não é apenas um
processo de acumulação e de aumento de produ-
tividade macroeconômica, mas, principalmente,
o caminho de acesso a formas sociais mais aptas
a estimular a criatividade humana e responder às
aspirações da coletividade.” (FURTADO, 2004,
p. 485).

53
Seria uma forma de desenvolvimento mais sustentá-
vel para a sociedade, mercado e natureza. Celso Furtado
não trabalha com o conceito de desenvolvimento sustentá-
vel propriamente dito, no entanto, suas aspirações e ideais
de desenvolvimento tem relação direta com o conceito de
desenvolvimento sustentável, ou seja, pautado na concepção
de relação tríplice - social, econômica e ambiental.
Na concepção de Furtado (2009), entender as especifici-
dades das regiões subdesenvolvidas, em sua dimensão social
e política, é de fundamental importância para entender a
dinâmica do subdesenvolvimento. Pois, considerando que
o subdesenvolvimento é um processo histórico e autônomo
no sentido que não necessariamente se tenha que passar por
ele, como uma etapa, para se chegar ao desenvolvimento,
não poderíamos então entender tão fenômeno isoladamente
sem levar em consideração suas nuances culturais e políticas,
visto que as decisões econômicas são, antes de tudo, decisões
políticas.
Furtado defendia um projeto político nacional que
priorizasse um crescimento econômico permanente, com
redistribuição de renda e redução de desigualdades regionais
e sociais como aposta de desenvolvimento para os países
subdesenvolvidos.
Do ponto de vista da contribuição teórica Furtado
denunciava que em regiões subdesenvolvidas como o Brasil
e demais países da América Latina não se pode alcançar o
desenvolvimento focando apenas nos fatores econômicos.
Furtado, defendia uma “nova concepção do desenvol-
vimento que teria que ser igualitário, favorecendo as formas
coletivas de consumo e reduzindo o desperdício provocado
pela extrema diversificação dos atuais padrões de consumo
privado dos grupos privilegiados.” (FURTADO, 1974, p. 74).

54
Essas discussões entram na pauta de preocupação a
respeito do futuro da humanidade e do sistema social con-
temporâneo, principalmente a partir de 1972 na Cidade de
Estocolmo, com a Primeira Conferência das Nações Unidas.
A conhecida Conferência de Estocolmo promove o início das
discussões sobre o Desenvolvimento Sustentável. A partir de
então, os países passaram a se reunir para tentar estabelecer
soluções viáveis para a sociedade e o mercado.
Em 2015, em uma reunião na cidade de Nova York,
representantes de 193 países membros da Organização das
Nações Unidas (ONU) estabeleceram uma agenda para
ser desenvolvida pelos países, intitulada “Transformando
o Nosso Mundo: A Agenda 2030 para o Desenvolvimento
Sustentável”.
A Agenda 2030 defende um estilo de desenvolvimento
que enfatiza o combate à desigualdade e à destruição do
meio ambiente, aos moldes do que defendia Furtado: um
crescimento econômico permanente, com redistribuição de
renda e redução de desigualdades regionais e sociais.
Como forma de operacionalização e avaliação da Agenda,
foram estruturados os Indicadores do Desenvolvimento
Sustentável - ODS, diante disso, a agenda é composta por
17 objetivos, 169 metas, em que pretende alcançar até 2030.
Na Agenda estão contidos indicadores que vão desde às
áreas de erradicação da pobreza, segurança alimentar, agri-
cultura, saúde, educação, igualdade de gênero, redução das
desigualdades, energia, água e saneamento, padrões susten-
táveis de produção e de consumo, entre outros.
Nesse cenário, a Agenda 2030 traz para o debate atual
o que Furtado defende em seu livro, escrito na década de
1970, “Mito do Desenvolvimento Econômico”: “A ideia de
que os povos pobres podem algum dia desfrutar das formas

55
de vida dos atuais povos ricos é simplesmente irrealizável.”
(FURTADO, 2013, p.174).
Outra relação que pode ser feita entre a Agenda 2030
e as ideias de Furtado, é a necessidade de se pensar a atua-
ção das instituições e organizações como corroboradoras
do desenvolvimento. São por meio das organizações e ins-
tituições que a vida em sociedade é regulada, independente
de natureza, características ou setor social. Parte-se do pres-
suposto de que, a atuação das instituições no sentido de
torná-las mais fortalecidas, inclusivas e solidárias, pode ser
contributivo para o processo de desenvolvimento regional e
local.
Reconhecido esses contornos, este artigo apresenta
nos próximos tópicos conceitos de instituições e desenvol-
vimento. Além disso, apresentamos a Trilha Instituições
eficazes, os ODS que a compõem e pontos chaves dos pro-
jetos que vêm sendo desenvolvidos pelas equipes vencedoras
do Desafio Celso Furtado, em 2020. Em seguida, apresenta-
mos nossas considerações.

2 O Papel das Instituições e Organizações na


promoção do Desenvolvimento

É convencionado a afirmação de que vivemos em um


mundo cercado de instituições e organizações que a todo
tempo regulam o comportamento das pessoas em sociedade,
sejam elas igrejas, organizações públicas privadas, do terceiro
setor, ou dos diversos formatos que o mundo pós-moderno
passou a apresentar. No entanto, vale ressaltar a diferença
entre instituições e organizações, e como ambas estão em
processo contínuo de transformação na sociedade.
De acordo com a Teoria Institucional, as instituições
são o conjunto de regras, normas, culturas, valores que são

56
imputadas nos indivíduos, afetando seu comportamento e
influenciando o subjetivo, na medida em que também rece-
bem a influência do meio externo em que são inseridas.
(SCOOT, 2014).
Para DiMaggio e Powell (1983, p.148) as “[...] organiza-
ções constituem uma área reconhecida da vida institucional:
fornecedores-chave, consumidores de recursos e produtos,
agências reguladoras e outras organizações que produzem
serviços e produtos.” Diante disso, observa-se a amplitude
do conceito de instituição e como as organizações fazem
parte dos arranjos institucionais.
Já para Selznick (1972) as organizações são instru-
mentos para atingir determinados objetivos, estas, numa
extensão variável ao longo do tempo, são transformadas
em instituições. Assim, ao perpetuar ao longo dos tempos,
as organizações passam a afirmar-se enquanto sua cultura,
absorvendo valores do meio e dos grupos em que estão inse-
ridas. Em outras palavras, o autor defende que o processo de
institucionalização é o de imputar valor às organizações ao
longo do tempo e de sua consolidação no ambiente em que
estão inseridos.
Com isso as organizações passam a refletir o campo
organizacional, assim como são constituintes do mesmo. Se
configurando na medida em que organizações por diversos
interesses incomum passam a se relacionar indiretamente ou
diretamente, para atender seus objetivos. Vale salientar que,
as organizações interagem mesmo geograficamente distantes
do campo e que não estão ligadas necessariamente por obje-
tivos, mas que reconhecem uma área de vida institucional.
Para atingir determinados fins, diversos atores organi-
zacionais desempenham esforços mútuos, o produto dessa
relação é a institucionalização, determinadas ações desenvol-
vidas pelos atores institucionais são praticadas para atender

57
seus interesses. Esses agentes podem ser: empreendedores
institucionais, Estado-Nação, corporações, outras organiza-
ções empresariais, organizações do terceiro setor, a imprensa,
entre outras.
No entanto, diversos fatores afetam o desempenho de
tais práticas, a exemplo dos arranjos institucionais específi-
cos, designers institucionais guiados por modas passageiras
e tendo horizonte de tempo curto, mudança no ambiente
externo que torna os projetos institucionais obsoletos.
Atentos a isso, os atores institucionais empregam ferra-
mentas reguladoras, normativas ou cognitivas para atingirem
seus determinados objetivos, agindo de forma individual ou
coletiva. (SCOTT, 2014).
Diante dessa conjuntura, as organizações são concebi-
das como agentes transformadores do seu meio, podendo
agir estrategicamente, alavancando recursos, criando ou
modificando estruturas já existentes.
Desta forma, a capacidade de agência institucional que
as algumas organizações possuem de acordo com DiMaggio
e Powell (1983), em que as organizações podem romper com
as pressões institucionais do seu meio, ao passo que também
podem ser propulsoras das mudanças.
Para efeito deste estudo, observa-se a atuação de insti-
tuições e organizações que são preponderantes no processo
de desenvolvimento da região nordeste, principalmente algu-
mas instituições que se destacam nesse processo.
Nesse sentido, que observa as aspirações do economista
Celso Furtado, na tentativa de promover certo desenvolvi-
mento para a região Nordeste por meio da atuação efetiva
entre diversas organizações e instituições, além do processo
de industrialização, pautado da atuação de corporações pro-
vedoras de renda e fomento econômico, mas também da
atuação da instituição Estado.

58
De certo que Furtado não se utiliza do instituciona-
lismo para desenvolver suas aspirações e concepções acerca
do desenvolvimento, no entanto, se considera aqui a estreita
relação entre sua crença na atuação interativa de instituições
e organizações com o desenvolvimento da região Nordeste
visto a sua aposta na criação da SUDENE.
Como frisa Colombo (2020), o capital político e sim-
bólico da Sudene é ainda hoje um dos principais legados do
pensamento político de Celso Furtado, sua criação marcou o
processo de institucionalização de suas ideias na promoção
do desenvolvimento regional.
Diante disso, no próximo tópico apresentamos o con-
texto de criação da SUDENE, sua atuação e o que ela
representou para o Desenvolvimento Regional do Nordeste
do Século XX.

2.1 Uma Instituição para Desenvolver o Nordeste:


experiência da SUDENE

Furtado faz parte da escola estruturalista da América


Latina, fundada pela Comissão Econômica para a América
Latina (CEPAL) com o propósito de contribuir com o desen-
volvimento dos países da região. A corrente estruturalista
é uma abordagem da economia que enfatiza a importância
de levar em conta características tipicamente estruturais ao
empreender a análise econômica.
A CEPAL surge no período correspondente ao pós-
guerra (1948) com um diagnóstico das implicações do
subdesenvolvimento na América Latina, que alertava para o
hiato entre as nações ricas (centro) e as nações pobres (peri-
feria), caso não fossem tomadas medidas concretas, o centro
continuaria cada vez mais rico e a periferia cada vez mais
pobre.

59
Entende-se por Centro, em grosso modo, os países
desenvolvidos, produtores de bens manufatura-
dos, e por Periferia, os países em desenvolvimento
ou subdesenvolvidos, produtores de bens primá-
rios.” (COUTO, 2007, p. 50).

Para a Comissão, na lógica da divisão internacional do


trabalho, que colocava os países subdesenvolvidos em posi-
ção de desvantagens econômicas nas relações com os países
desenvolvidos, os países subdesenvolvidos da periferia ten-
deriam a permanecer agroexportadores, se deixados à mercê
das ideias liberais do livre mercado.
Tendo feito parte da CEPAL, Celso Furtado apropriou-
se do conceito Centro-Periferia e o reproduziu em escala
regional, deixando claro que as relações comerciais entre
o Nordeste (Periferia) e o Sudeste (Centro) eram desiguais
devido ao baixo poder de compra da periferia em relação
ao centro que despontava como produtor de bens indus-
trializados, caracterizando-se assim como uma relação
Centro-Periferia em escala inter-regional.
Entre os problemas econômicos que representavam
o atraso do Nordeste no final dos anos 1950, em relação
ao quadro da economia brasileira, destacavam-se: a) renda
média da população era a mais baixa da América do Sul e
não representava um terço da renda média do Centro-Sul;
b) concentração de renda e disparidades dos níveis de vida
entre a população urbana e rural da região; c) um quarto da
população desempregada ou em condição de subemprego; d)
mais da metade da população é afetada pelo fenômeno das
secas periódicas. (FURTADO, 2009).
O cenário era agravado por uma falta de atenção do
Estado para a região, devido às periódicas secas, ações dos
governos se limitavam a gastos assistenciais que não tinham
resultados satisfatórios, no que se refere ao desenvolvimento
do Nordeste.

60
As elites reivindicam estradas de ferro, estas são
apresentadas como solução para a seca; se que-
rem estradas de rodagem, estas se tomam solução
para a seca; se hoje as elites do Nordeste querem
a instalação de Zonas de Exportação, elas são
também apresentadas como solução para a seca.
(ALBUQUERQUE JÚNIOR, 1995, p. 119).

Furtado contesta esse pensamento, para ele o problema


do Nordeste não está na seca e sim “como a região está inse-
rida nela.” (ARAÚJO, 2005, p. 217). A questão da seca não
era uma catástrofe ecológica e sim socioeconômica, devido à
formação histórica da região.
Essa concepção soava como denúncia e batia de
frente com a política regional da época. Não faltava água
no Nordeste, faltava intervenção política planejada. “Em
síntese, a ação do governo, sob o controle da classe latifun-
diária, reforçava as estruturas existentes e agrava os efeitos
sociais da seca.” (FURTADO, 1989, p.39).
É nesse contexto que nasce a SUDENE em dezembro de
1959. O seu modelo de desenvolvimento regional era abran-
gente, no sentido de que buscava tratar de vários setores
econômico-sociais ao mesmo tempo. Além da indústria e da
agricultura, o planejamento do Nordeste incluía os seguin-
tes setores de atividades: infraestrutura (energia elétrica,
transporte, saneamento básico), abastecimento irrigação,
pesca, habitação, pesquisa, saúde pública, educação de base,
cartografia. Essa abrangência se devia à concepção de plane-
jamento da época e à ausência do Governo federal em muitas
dessas atividades. (TAVARES, 2006, p. 11).
A abrangência da atuação da Superintendência, como
expõe Tavares (2006), só reforçava a fragilidade e a relação
de dependência da região, e para superar sua condição de
subdesenvolvida se fazia necessário uma presença maior do
Estado.

61
Em síntese, Furtado implantou, em escala regional, uma
política aos moldes das ideias cepalinas de que era preciso
substituir as importações através da industrialização. Nessa
direção, o plano de ação para desenvolver o Nordeste seguiria
pelos seguintes caminhos: a) Intensificação dos investimentos
industriais; b) Transformação da economia agrícola da faixa
úmida para proporcionar uma oferta adequada de alimen-
tos nos centros urbanos; c) Transformação das economias
das zonas semiáridas para elevação da produtividade e para
criar resistência aos impactos das secas; d) Deslocamento da
fronteira agrícola do Nordeste incorporando as terras úmi-
das maranhenses. (FURTADO, 2009, p. 88).
Furtado esteve à frente da SUDENE de 1959 a 1964,
quando a Ditadura Militar assumiu a condução do país.
A Superintendência funcionou até o ano de 2001 quando
foi extinta pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e
recriada em 2007 pelo Governo do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva.
Credita-se a atuação da Superintendência o começo
da consolidação da indústria nacional marcada pelo início
da desconcentração espacial da indústria paulista, que se
direcionou nessa década para os demais mercados regio-
nais, principalmente para a região Nordeste, como ressalta
Guimarães Neto:
A desconcentração ocorrida representou, em sín-
tese, a implantação e a consolidação de complexos
econômicos, polos ou áreas de modernização
nas economias regionais menos industrializadas,
que se integraram mais intensamente, por meio
de determinadas especializações, com o res-
tante da economia nacional, em particular com
as regiões mais desenvolvidas economicamente.
(GUIMARÃES NETO, 1997, p. 60).

62
Essa desconcentração foi proporcionada tanto pelas
políticas setoriais com foco nos incentivos fiscais para atra-
ção de novas indústrias, como pela ação de grandes empresas
estatais, que promoveram a localização de atividades em
áreas periféricas e oportunizaram um novo processo de inte-
gração produtiva inter-regional, refletida nos indicadores
da década de 1990, em que a participação do Sudeste no
peso das indústrias do país caiu de 81% em 1970 para 69%.
Nesse mesmo período, o Nordeste saiu de 5,7% para 8,4%
de importância na produção industrial brasileira na década
de 1990.
Com o Nordeste já inserido na economia nacional, o
país começa ainda na década de 1970 sua transição de pro-
dutor de bens de consumo não duráveis para especializar-se
em bens intermediários, o Nordeste por já estar associado
à dinâmica industrial nacional insere-se também nesse pro-
cesso modernizador.
Colombo (2020) considera que a principal inova-
ção institucional da Sudene foi a criação do seu Conselho
Deliberativo, que tinha como estratégia trazer os interes-
ses da região Nordeste para o centro dos debates políticos,
reunindo o Presidente da República, os governadores dos
estados nordestinos, os secretários e demais atores políti-
cos relevantes na elaboração de um plano de superação das
desigualdades regionais. “A Sudene, através de seu Conselho
Deliberativo, expressava a necessidade de consenso entre
os entes subnacionais, de forma que os interesses locais
fossem sobrepostos a interesses institucionais e regionais.”
(COLOMBO, 2020, p. 158).
À luz da teoria institucionalista, a SUDENE representa
uma estratégia de promoção e cooperação entre os atores.
A instituição possuía a prerrogativa de agregar as preferên-
cias dos gestores das esferas estaduais, condicioná-las a uma

63
agenda pública e garantir-lhes decisões acertadas, orientadas
pela promoção da estabilidade e pela redução dos custos de
transação. Cenário que favoreceu a cooperação, projetando
para o cenário nacional as necessidades e os desafios regio-
nais. (COLOMBO, 2020).
Colombo (2020) faz uma análise pertinente sobre
a importância da trajetória de Celso para a criação e o
progresso inicial da SUDENE. Pela vertente do instituciona-
lismo histórico argumenta que ações e decisões tomadas no
presente derivam e são dependentes de trajetórias passadas,
assim, a origem nordestina, os antecedentes de formação de
Celso Furtado e suas experiências internacionais junto a pro-
gramas de desenvolvimento regional serviram de amparo à
originalidade do autor, lhes possibilitando uma perspectiva
ampliada do entendimento da desigualdade, articulando as
desigualdades regionais à estrutura do subdesenvolvimento
e ao capitalismo dependente dos países latino-americanos.
(COLOMBO, 2020).

3 Trilha Instituições Eficazes

A Agenda 2030 trata-se de um plano de ação global para


um 2030 sustentável, configurando-se em um guia elaborado
coletivamente para nortear as ações de países, comunidade
internacional e pessoas. Para a construção da agenda 2030
levou-se em consideração o legado dos objetivos de desen-
volvimento do milênio (ODM) buscando obter avanços nas
metas não alcançadas e direcionar o mundo em um caminho
sustentável e robusto. (ONU, 2015).
Composta por 17 objetivos de desenvolvimento susten-
tável (ODS) e suas 169 metas, a Agenda 2030 conta com uma
seção a respeito dos meios de implementação e de parcerias
globais, como também um roteiro para acompanhamento

64
dos resultados e revisão. Os ODS são parte central da agenda
e deverão ser atingidos até o ano de 2030 para que o mundo
alcance um caminho mais sustentável e resiliente até o refe-
rente ano. Esses objetivos de desenvolvimento sustentável
possuem três dimensões do desenvolvimento sustentável
(econômica, social e ambiental), além disso, são integrados e
indivisíveis, e configuram-se em uma lista de tarefas a serem
realizadas pelos governos, sociedade civil, setor privado e
todas as pessoas. (ONU, 2020).
Dentre os 17 ODS está inserido o ODS 16, denominado
“paz, justiça e instituições eficazes”, o qual possui como
escopo “Promover sociedades pacífica e inclusivas para o
desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça
para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e
inclusivas em todos os níveis.” Dentre as metas relacionadas
a esse objetivo destaca-se a meta 16.6 que versa, “desenvol-
ver instituições eficazes, responsáveis e transparentes em
todos os níveis.” (ONU,2016).
No Brasil, os esforços estão empenhados em promover
a paz, justiça e instituições eficazes para garantir os direitos
fundamentais dos cidadãos. O objetivo central é assegurar
que as instituições forneçam respostas coletivas, coerentes e
integradas direcionadas às necessidades nacionais referente
aos ODS, superando os desafios por meio de uma conjun-
tura que propicie o desenvolvimento humano equitativo.
(STUCHI et al., 2018). Este ODS vislumbra um Brasil pací-
fico, justo, inclusivo que permita a seus cidadãos igualdade
no acesso à justiça, garantia dos direitos fundamentais com
boa governança estatal e instituições eficazes e responsáveis.
(IPEA, 2019).
Nesse intuito, o desafio Celso Furtado elencou como
uma de suas trilhas do conhecimento, a trilha denominada
“instituições eficazes: como aperfeiçoar nossas instituições e

65
torná-las mais eficientes e inclusivas?” possuindo como foco
os três poderes (legislativo, executivo e judiciário), a mídia
e o terceiro setor. Apesar de sua maior aproximação com o
ODS 16, essa trilha também possui aproximação com alguns
outros, todos eles estão expostos a seguir:
• ODS 1. Acabar com a pobreza em todas as suas for-
mas, em todos os lugares;
• ODS 10: Reduzir a desigualdade dentro dos países
e entre eles;
• ODS 16. Promover sociedades pacíficas e inclusivas
para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o
acesso à justiça para todos e construir instituições
eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis;
• ODS 17. Fortalecer os meios de implementação e
revitalizar a parceria global para o desenvolvimento
sustentável.

No entanto, vale salientar que embora esses sejam os


ODS mais diretamente relacionados com a trilha, eles em
sua essência são integrados e indivisíveis. Quanto a impor-
tância dessa abordagem dos ODS no contexto das escolas
estaduais da Paraíba, especificamente no âmbito do desafio
Celso Furtado, se dá por dois motivos principais: a impor-
tância de que todos os agentes da sociedade conheçam e
comprometam-se em contribuir para o alcance desses obje-
tivos; e propicia aos discentes e docentes desenvolverem
competências e habilidades necessárias para atuar nas ques-
tões complexas da sociedade. (BELLUZZO, 2018).
Nesse sentido, o tópico seguinte trata detalhadamente
como ocorre a relação entre ODS e os pensamentos de Celso
Furtado na prática do Desafio Celso Furtado. Ou seja, exem-
plifica por meio das proposituras das equipes selecionadas
para desenvolver seus projetos da trilha de conhecimento de

66
instituições eficazes, apontando como as equipes relacionam
esses elementos na construção de seus projetos.
Acredita-se que, por meio do fortalecimento das insti-
tuições, já defendido por Furtado, é que se pode chegar a um
modelo de desenvolvimento capaz de garantir o bem estar
da sociedade. Isso passa por garantir políticas que busquem
a redução da pobreza, das desigualdades de renda e garantir
a materialidade para a sociedade.
Também passa por um modelo de desenvolvimento
que leve em consideração as relações sociais com a natu-
reza, não apenas as relações de classe. Assim, a necessidade
de considerar um modelo de desenvolvimento pautado na
lógica da Sustentabilidade, colaboração e economia criativa.
Faz-se necessário uma reestruturação social, em termos de
produção, distribuição e consumo atualmente impostos pela
sociedade Pós-Moderna. O modus operandi do atual modelo
de crescimento, é pautado em um sistema de produção fossi-
lista de energias primárias não renováveis, que cada vez mais
põe a natureza em situação de risco. O capitalismo
não respeita leis da natureza, ele mesmo cria suas leis, quem
detém os fatores de produção ditam as regras do jogo, os
demais, vivem um incansável desafio de sobreviver, aos peri-
gos do mundo capitalista. Esses problemas na natureza são
acarretados pelo mal uso e transformação dos recursos natu-
rais, que geram problemas diretos e indiretos. (ALTVATER,
2010).
Diante disso, essa trilha de conhecimento busca reali-
zar a discussão, de como desenvolver ações voltadas para
a contribuição dos indicadores supracitados e como forta-
lecer as instituições para que elas sejam mais inclusivas e
eficazes, como forma de promover um desenvolvimento pau-
tado no bem estar social, crescimento justo, e cuidado com
a natureza. No item a seguir, são apresentados os projetos e

67
ações que o programa vem desenvolvendo como forma de
contribuir com a propagação das ideias de furtado e territo-
rialização da Agenda 2030 na Paraíba.

3.1 Projetos e ações que estão sendo desenvolvidos


pelo Programa Celso Furtado

Entre os diversos projetos inscritos pelas equipes esco-


lares, dois foram selecionados para serem desenvolvidos por
meio de apoio financeiro da Fundação de Apoio à Pesquisa
do Estado da Paraíba – FAPESQ, que são apresentados a
seguir.

3.1.1 Equipe: Trilhando o Caminho da Sabedoria

Título do projeto: Propostas de melhoria de condições


dos catadores de Pedra de Fogo: produção de adubo em
horta escolar.
A equipe tem como objetivo propor melhorias no
manuseio e destino do Lixo do município visando a sustenta-
bilidade e melhores condições de trabalho para os Catadores
de Pedras de Fogo - PB. Assim, em busca de fazer a rela-
ção do seu objeto de pesquisa com a temática do programa,
a equipe traçou as seguintes ações: Levantar informações
sobre vida e teorias de Celso Furtado relacionando com os
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS no campo
das Instituições Eficazes; Entrevistar e propor melhorias
para a Associação dos Catadores de Lixo de Pedras de Fogo
e Itambé – ASSOCAPF; Desenvolver uma parceria entre a
prefeitura, escola e associação de catadores para a produ-
ção de adubos que beneficie a horta escolar do curso de
Agronegócio.

68
3.1.2 Arte, ação e solução

A Equipe tem como objetivo a criação de um empreen-


dimento Artístico Cultural com reflexos sociais. Tendo como
lócus de pesquisa a comunidade em torno da escola. Além dos
objetivos, a equipe busca desenvolver estudos organizacio-
nais para estruturação da empresa, delinear potencialidade
de ação empresarial do grupo e novas áreas de atuação, pro-
jetar ações de parcerias e envolvimento da comunidade em
plano de expansão.
Além de desenvolver projetos que versam sobre a
temática das instituições eficazes, o Programa traçou
diversos objetivos e indicadores que buscam avaliar quan-
titativamente e qualitativamente sobre a Agenda 2030 e as
instituições e organizações, em diversos setores da Paraíba.
Entre eles se destacam, a necessidade de monitoramento de
estudos da agenda 2030 na Paraíba, a avaliação da interação
entre equipes escolares com outras instituições e parcerias
públicas privadas.
Assim, o Programa Celso Furtado de Inovação
Educacional e Desenvolvimento Regional assume o desafio
de consolidar o pensamento de Celso Furtado nas escolas da
rede Estadual de Educação da Paraíba ao passo que busca
fazer a consonância com a agenda 2030 do Desenvolvimento
Sustentável, as trilhas do conhecimento são uma forma
de operacionalizar isso, dentre elas a Trilha: Instituições
Eficazes.
Vale salientar que, as ações desenvolvidas no programa
têm como pretensão a colaboração com a propagação do
pensamento de Furtado nas escolas da Rede Estadual de
Ensino e a territorialização da Agenda 2030 na Paraíba,
tendo como visão o desenvolvimento do projeto e maior
alcance ao longo dos anos.

69
É por meio das instituições e organizações que as ações
em busca do desenvolvimento mais justo e sustentável
podem ser executadas. Seria o bom andamento dessas ins-
tituições, a ponto de torná-las mais inclusivas e eficientes,
para que sejam mais contributivas. No entanto, a eficiência
que se busca aqui não é do ponto de vista mercadológico,
viés voltado somente para busca de resultados quantitati-
vos, mas de uma eficiência voltada para uma gestão social
e solidária.
Diante disso, o Programa Celso Furtado motiva as
equipes escolares a pensarem e desenvolverem propostas de
intervenção que englobam a atuação das instituições que
fazem parte da realidade dos alunos, professores, escolas e
comunidades. Além do mais, busca desenvolver nos alunos
o protagonismo na busca de soluções viáveis para os pro-
blemas da região. Os resultados preliminares se mostram
positivos no sentido de atuação das equipes, a ideia é que
mais equipes possam ingressar no programa, e que venham
desenvolver pesquisas nas instituições de diversos setores.

3 Considerações Finais

Propomos com esse artigo discutir a relação das insti-


tuições e organizações para o desenvolvimento sustentável
a partir da perspectiva Furtadiana de Desenvolvimento. E a
partir da proposta e experiência do Programa Celso Furtado
compreender como as ideias de Furtado se relacionam com
a Agenda 2030 e como a trajetória de Furtado nos ajudar a
refletir sobre o papel das instituições para o Desenvolvimento
Regional.
À luz da teoria institucionalista, particularmente
pela vertente do institucionalismo histórico, a trajetória
de Furtado (sua atuação na CEPAL e no BNDES, além da

70
escrita do livro Formação Econômica) foi importante para
a construção do Projeto SUDENE. Com a experiência da
Superintendência Furtado revolucionou o Nordeste, não ape-
nas com suas ações, mas com a mudança de pensamento que
propôs. Furtado era enfático: a seca é um problema social e
não ambiental. O problema do Nordeste está na ausência do
Estado como propulsor do seu desenvolvimento.
O recorte histórico mostra o quanto é importante o papel
do Estado na condução de políticas de Desenvolvimento.
Como alertou Furtado, toda política de crescimento eco-
nômico é produtora de desigualdades. Sendo assim, é
fundamental que outras questões estejam alinhadas para
que a acumulação própria do crescimento econômico não
limite o progresso de uma região na busca pela superação do
subdesenvolvimento.
Reconhecido isso, o Programa Celso Furtado busca com
suas ações resgatar a compreensão de Furtado para pensar os
desafios atuais do desenvolvimento. Sendo a Agenda 2030,
um dos caminhos escolhidos para promover o debate, já que
ela expressa o “consenso” de que o mundo enfrenta hoje a
necessidade de mudar seu estilo de desenvolvimento. A ins-
tabilidade do sistema econômico, as desigualdades e tensões
causadas pela concentração da riqueza e da renda entre os
países e dentro deles e o risco de uma crise ambiental de
grandes proporções são fatores cada vez mais visíveis e pre-
sentes no debate público.
Busca-se um estilo de desenvolvimento que enfatize o
combate à desigualdade e à destruição do meio ambiente. À
luz do que já foi dito, caso queiramos um novo modelo de
desenvolvimento e sociedade, precisamos de uma nova meta-
narrativa. Uma utopia realista (como a que Furtado propôs
para o Nordeste), suficientemente utópica para ter condições
de desafiar a realidade, no entanto, realista para que não

71
haja o descarte das ideias. Uma utopia do “ainda não”, ainda
não existe, mas há sinais de que possa existir no futuro.

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74
Celso Furtado entre o Sertão
e o Litoral da Paraíba

Marcionila Fernandes8

1 Introdução

Neste capítulo, detemo-nos a tecer algumas con-


siderações sobre supostos nexos entre o mundo da infância
e a mocidade de Celso Furtado com sua ontologia social e
espírito científico. Ao observar sua história em retrospectiva,
é possível identificar vários momentos marcantes na sua tra-
jetória, inclusive o tempo vivido entre o Sertão e o Litoral
da Paraíba, sublinhado sempre, ao recorrer às lembranças,
daquele mundo que lhe parecia absurdo.
O objetivo é identificar a influência de traços bio-
gráficos no campo da ontologia e pensamento científico
de Celso Furtado, tendo como referências empíricas suas
obras autobiográficas, a exemplo do artigo Aventuras de
um economista brasileiro, de 1972 (Cf. FURTADO, 1997;
FURTADO, 2013), e da obra Diários intermitentes: 1937-
2002 (FURTADO, 2019).

8 Licenciada em Letras pela UFPB, Mestra em Planejamento e


Desenvolvimento pelo NAEA UFPA, Doutora em Sociologia pela UFPE,
realizou estágio pós-doutoral em Relações Internacionais na UNB. É
Professora da Universidade Estadual da Paraíba no curso de RI e Mestrado
em Desenvolvimento Regional.

75
As reflexões aqui desenvolvidas encontram-se ancora-
das, também, em entrevistas, documentários e palestras, além
de dois textos que contribuem para o entendimento sobre
formação social e visão de mundo, quais sejam, o artigo inti-
tulado Bourdieu, Chartier e os diálogos entre a Sociologia
e a História, de Oliveira (2013), e o artigo publicado por
Reis (2012), intitulado: Tempos futuros: Vidas Secas, de
Graciliano Ramos. Soma-se a isso a obra de José Américo de
Almeida, A Paraíba e seus problemas, de 1923, como teste-
munho da vida no Sertão da Paraíba entre os anos 20 e 30
(Cf. ALMEIDA, 2012).
Recorremos ainda à visão autobiográfica e intelectual
de Karl Popper (1986), marcada pelas reflexões sobre as
condições de pobreza reinantes em Viena no período de sua
infância, assim como o fez Celso Furtado.
Nesse contexto, consideramos que as experiências vividas
por Furtado associada à influência intelectual dos principais
pensadores modernos, dentre eles, destacamos os positivistas,
e Marx, antes dos seus 15 anos, são basilares nessa fase da
sua história pessoal que imaginamos refletir na sua visão de
mundo e na própria formação do seu pensamento científico,
para além de toda suas experiências intelectual em ambiente
epistêmico, como Paris, que o transformou no mais impor-
tante intelectual latino-americano do Século XX.

2 Formação da visão de mundo e do espírito


científico

Cada geração vive a própria vida, murada pelas


circunstâncias. É quando sai do centro dos acon-
tecimentos que o homem observa a própria vida
como história, algo que tem certa coerência, que se
cumpre num espaço com limites que com o tempo
se fazem mais facilmente perceptível. (FURTADO,
2019, p. 151).

76
Os Diários intermitentes de Celso Furtado (2019),
publicados às vésperas do Centenário do seu do Nascimento,
apresenta a singularidade de um jovem, cujos caminhos não
são obra do acaso. Neles, há um diálogo entre o eu e o outro
que se constituíra, ainda no cenário da juventude escolar.
A singularidade do jovem é mediada, primeiro, pela
necessidade de distanciamento do mundo do absurdo, cujas
marcas profundas seguiram-lhe e o acompanham ao Recife,
ao Rio de Janeiro, Chile e a Paris. O entendimento é que o
Nordeste, da sua infância, principalmente, levou-o ao mundo
e o trouxe de volta quando fora convidado para retornar ao
Brasil. Ao rever o convite para atuar no Banco Nacional de
Desenvolvimento - BNDE – o nosso personagem foi enfá-
tico ao dizer que aceitaria desde que fosse criada, dentro do
Banco, uma divisão que pudesse pensar o Nordeste.
Em outros escritos é permitido encontrar-lhe no tempo,
com suas lembranças do mundo que ele descreve como
“marcado pela incerteza e brutalidade em que poder e arbi-
trariedade estavam sempre juntos” (FURTADO, 1997, p.
12). E faz ainda o seguinte acréscimo:
Na minha infância, no Sertão, a família ampliada
constituía o quadro básico de formação do
indivíduo. A política absorvia parte impor-
tante da vida dos chefes de grandes famílias.
[...] e consistia especialmente em rivalidades e
conflitos, com apelo corrente à violência, entre
famílias e grupos familiares locais. As incursões
de cangaceiros eram frequentes. As histórias de
violência, relacionadas às pessoas conhecidas e
não simples mitologia, povoaram minha infân-
cia. (FURTADO, 1997, p. 12).

Ao observarmos sua vida e obras autobiográficas em


retrospectiva, compreendemos que o que moveu a vida de
Celso Furtado foi a teleologia da mudança, que tem como

77
pressuposto transformar o mundo, principalmente aquele
em que viveu. E essa foi, talvez, a força motriz maior que
ocupou toda a sua vida intelectual e política até os últimos
dias.
Para entender melhor os sentimentos e preocupações
manifestos de Celso Furtado, contamos com o livro de José
Américo de Almeida: A Paraíba e seus Problemas, de 1923,
ao descrever as condições de vida e trabalho da população
pobre dos sertões, além das teses eugenistas, pensamento
dominante relacionado a esse contexto. De modo que
algumas cidades da Paraíba assim foram classificadas pelo
próprio José Américo, onde ele inclui sua própria cidade,
Areia, Mamanguape e Sousa. Almeida (2012, p. 34) faz o
seguinte reconhecimento:
[...] que o que se atribui como desgraça heredi-
tária é, simplesmente, um mal social. E, assim,
descreve os camponeses Paraibanos: A incerteza
do destino, à mercê dos despejos caprichosos, não
lhe anima, sequer, o cuidado de uma estabilidade
cômoda [...] Mas esse homem, mal comido e mal
vestido, lida no eito, curvado sobre a enxada, de
sol a sol ou ao rigor das invernadas, com uma
infatigabilidade de que nenhum outro seria capaz.

Não havia direito assegurado para aqueles “párias”,


como são classificados por Almeida (2012, p. 34). Essa parte
da população da Paraíba vivia miseravelmente. É incrível
como seres humanos, na primeira infância sobrevivem a essa
precariedade.
Almeida (2012, p. 455) cita ainda o discurso de Epitácio
Pessoa feito no teatro Municipal de São Paulo, quando
anunciara que seu governo colocaria a salvo a vida dos
seus patrícios, à medida em que se defendia das críticas, e
prossegue o referido autor: “O sentimento de piedade, que

78
se aperfeiçoa além dos limites humanos, comovendo-se
pela sorte dos brutos, não poderia permitir a devastação da
mesma raça se tinha ao seu alcance os meios de evitar”.
Assim se manifesta o político José Américo ao demonstrar
a benevolência do seu presidente, como parte da articulação
política das elites agrárias – denominada de política do Café
com Leite. Segue parte do discurso proferido por Epitácio
Pessoa, transmitido por rádio para todo o Brasil, do Teatro
Municipal de São Paulo, dentro dos festejos e inauguração
daquela inovação tecnológica de comunicação:
[...] Ide e segui agora as estradas e vede aqui as
ossadas daqueles que não puderam fugir mais
longe ao horroroso flagelo e tombaram, inanidos
dos moribundos para servirem de pasto, ainda
com vida á ferocidade das feras e das aves pre-
sas, ide e vede mais longe os que acabam de cair,
alucinados e arquejantes, e, olhos cravados na
abóboda candente, numa última prece de com-
paixão e piedade [...] ide e vede, por fim, a fieira
infinita dos que ainda podem arrasta-se, andra-
josos, esquálidos, a fase decomposta, sem forças
mais para carregar os pequeninos, sem gota de
leite para lhes calar o choro triste, enfraquecido e
compungente, com o estômago torturado a con-
torcer-se na agonia da fome. (ALMEIDA, 2012,
p. 455).

Retirando a demagogia que se expressa na eloquência


do interlocutor, os interesses políticos que estavam em jogo e
o papel estratégico da Paraíba na política do Café com Leite.
Podemos dizer que essa narração radiofônica, que inaugu-
rava o rádio no Brasil faz parte do cenário da infância de
Furtado, que lhe marcara de modo indelével.
Portanto, é esta desumanização descrita de forma
marcante por Celso Furtado, no artigo Aventuras de um

79
economista brasileiro, escrito em 1972 (Cf. FURTADO,
1997; FURTADO, 2013), a que estava submetida a popu-
lação miserável no início do Século XX, na qual se inclui a
perversão e as práticas dos representantes políticos do seu
Estado, que são marcantes na biografia e história intelectual
desse ilustre paraibano.
Diante das duras experiências que rodeavam sua vida, ao
seu favor, foi deixado por um parente militar malas de livros,
de modo que Furtado logo cedo dialoga com os pensadores
modernos e pode compreender melhor aquele mundo que ia
do Sertão ao Mar. Inicia-se com os positivistas aos 15 anos,
cujos pressupostos, como a importância da Razão, a relação
entre conhecimento científico e progresso, impregnou-lhe
como evidente. Essa ideia ligada à do conhecimento como
arma do progresso permitiria superar o círculo fechado do
fatalismo do absurdo. E ao mesmo tempo “desembocava
numa responsabilidade moral”. Assim ele escreveu:
Olho para trás, percebo que essa preocupa-
ção tomou corpo de minha existência desde o
momento em que comecei a ter vida intelectual, e
sublinha comecei tarde, aí em torno de quatorze
anos de idade. [...] Antes de qualquer influência
ideológica, essa preocupação surgiu ao tomar
consciência de [que] a pobreza não era “natu-
ral” e que havia pessoas que lutavam contra ela
(FURTADO, 2019, p. 221).

Fala-se de um jovem que havia completado apenas


dezessete anos no início da primeira metade do Século
passado. Os tempos eram sombrios, no Brasil tinha-se a dita-
dura de Vargas e no cenário internacional o fascismo alemão
ameaçava a Europa. É essa fase da vida, do jovem Celso,
emoldurada nas primeiras páginas dos Diários, que nos esti-
mula a acompanhar sua história. Impossível alheiar da sua

80
consciência como sujeito do conhecimento em oposição ao
indivíduo. Ao se referir ao seu aniversário de 17 anos, se
autoproclama um homem completo no mundo, faz secun-
dárias as atividades diárias de um homem e demarca sua
completude diante do mundo; em seguida sinaliza o debate
sobre o individualismo e socialismo.
Sai da Paraíba para estudar no Recife até chegar ao Rio
de Janeiro, em 1940. Ainda como estudante do Liceu, a razão
eclode do jovem Celso, para revelar ao espírito suas inquie-
tações ontológicas e epistêmicas sobre as dinâmicas sociais
econômicas e relações de poder da sociedade brasileira.
É um homem do seu tempo, está em sintonia com aque-
les poucos brasileiros que buscaram, através das suas teorias
e conceitos, explicar e compreender o processo histórico do
período colonial e sua repercussão nas estruturas, sociais e
políticas condiciona ao atraso da sociedade. Deste cenário,
emerge o intelectual e onde se forja o ser ético e político.
Como visto, as experiências vividas desde a infância
pelo autor tiveram forte impacto na sua visão de mundo
e na formação de seu pensamento científico, conforme ele
diz: “Esses dados quiçá possam explicar a formação em meu
espírito de certos elementos que considero como invariantes,
dos quais dificilmente eu poderia libertar-me sem correr o
risco de desestruturar minha própria personalidade”9.

9 [1] “Eu ouvia crédulo, das domésticas da minha casa, as histórias desse
homem. Que se disfarçava de um homem qualquer para praticar o bem
nos bairros mais humildes. O assassínio brutal desse homem (exatamente
no dia em que completava os meus dez anos) provocou uma tal angústia
coletiva que ainda hoje não posso me recordar sem me emocionar. [...] A
perplexidade diante das forças que pairam por cima de tudo e uma resig-
nação que raia pelo masoquismo [...] foram as impressões mais profundas
que me ficaram das conversas que ouvia ao acompanhar essas procissões”
(FURTADO, 2013, p. 37).

81
São elementos que se manifestam como ideias-for-
ças, que enquadram meu comportamento na ação
e também minha atividade intelectual criadora. A
primeira dessas ideias é a de que a arbitrariedade
e a violência tendem a dominar o mundo dos
homens. A segunda é que a luta contra esse estado
de coisas exige algo mais que simples esquemas
racionais. A terceira é de que essa luta é como um
rio que passa: traz sempre águas novas, ninguém
a ganha propriamente e nem uma derrota é defi-
nitiva. (FURTADO, 1997, p. 13).

Essas marcas herdadas desse tempo estão sempre mani-


festas em momentos importantes de sua vida, por exemplo,
quando da cassação dos seus direitos políticos pelo regime
militar, enquanto estava na Superintendência da SUDENE,
em 1963; já em 2000, ao refletir sobre a manutenção da
política econômica do governo brasileiro e seu projeto de
Pensar o Brasil, lembra que nos seus diários de juventude há
uma página escrita aos dezessete anos em que “me atribuo a
missão de escrever um livro sobre o Brasil, para entender o
nosso país” (FURTADO, 2019, p. 48).
Reflete sobre os problemas fundamentais da sua vida, em
texto antológico, reflexivo, o interesse pelos homens, escrito
em 1964, publicado em 2019, nos Diários Intermitentes, no
qual sintetiza sua visão de mundo, seu espírito científico e
sua teleologia.
Toda minha vida tem sido marcada por essa
preocupação, [com os problemas do homem “em
geral”], como se me sentisse responsável pela
pobreza, pelos sofrimentos decorrentes dessa
pobreza, pela condição de animalidade em que
vive grande parte da humanidade. Não que o
sofrimento humano me preocupe em si mesmo.
E é por isso que percebo que minha natureza não
é religiosa. O imenso sofrimento que acabrunha

82
um número imenso de pessoas das classes altas,
vítimas de tantas neuroses características de nossa
civilização não me desperta interesse particular.
O que me preocupa é a deformação, a abjeção
humana, provocada pela organização social.
(FURTADO, 2019, p. 221).

A preocupação com os problemas sociais provocada


pela exploração e dominação “política de poucos por mui-
tos”, diz o autor, ao refletir sobre sua trajetória, “tem sido
tão profunda que condicionou minha vida até o presente”
(FURTADO, 2019, p. 221).
Furtado, portanto, foi um protagonista do seu tempo
com o inarredável compromisso de lutar pela redução das
desigualdades sociais, do mundo vivido e os mais longín-
quos, em que poder e arbitrariedade estavam sempre mais
juntos do que separados (FURTADO, 2013).
Dizia ele: “muitas vezes me pergunto se o desejo incan-
sável de penetrar na realidade própria do meu país não
encobre um outro desejo ainda mais fundamental: o de
conhecer-se a si mesmo”. Em outra manifesta introspecção,
se pergunta: “Até que ponto meu interesse pelo Nordeste
decorre pela simpatia profunda pelo mundo que eu mais
conheço (o mundo da minha infância e adolescência) [...]?”
(FURTADO, 2013, p. 48).
Sua trajetória na política, os postos que assumiu na
gestão pública, além da sua produção intelectual, foram
caminhos escolhidos para contribuir com a superação do
atraso secular de regiões pobres intrínseco ao sistema capita-
lista, em particular dos países do Hemisfério Sul. “No centro
das minhas reflexões estavam problemas reais, a pesquisa
econômica foi sempre para mim um meio para ação, minha
ou outros. Compreender melhor o mundo para agir sobre ele
com mais eficácia. Isso significa que os fins últimos devem
estar sempre no espírito” (FURTADO, 2013, p. 25).

83
Seu aniversário de 100 anos de nascimento foi comemo-
rado no ano passado, fazendo-o renascer para um público
mais jovem e reavivando-o para aqueles que já o guarda-
vam em suas bibliotecas. Nesse período, foram lançadas
mais duas importantes obras: Seus Diários Intermitentes e as
Cartas de Celso Furtado, que possibilitam ampliar a dimen-
são do homem e a formação do seu espírito científico.
A ampla divulgação e socialização de suas ideias impor-
tantes em eventos nacionais e internacionais dão a dimensão
da sua importância intelectual; centenas de livros sobre suas
obras foram publicadas. A força explicativa de sua teoria
e outras reflexões no campo da economia política permi-
tem explicar talvez o período mais difícil do Brasil, quando
assume o poder um governante inqualificável, com práticas
que se assemelham às dos fascistas, e eugenista, com apoio das
elites brasileiras que, subalternas, sem qualquer sentimento
de nacionalidade, atendem aos interesses do ordenamento
econômico internacional.
Nesse período de crise aguda do capitalismo, privati-
zaram as riquezas do nosso país e colocaram seu povo na
mendicância, miséria, desemprego, em pleno Século XXI, se
aproximando do mundo/tempo de Celso Furtado, observado
na sua infância e mocidade, quando viveu na Paraíba, des-
crito por ele como o mundo do absurdo.
Em 1981, volta à Paraíba, gostaria de relatar [no seu diá-
rio] o que fazia ali. É como se tivesse de cantar uma música e
não soubesse que tom entrar. [...] A política aqui nada tem que
ver com questões substantivas. E conclui: Ontem os jornais
publicaram uma fotografia de uma escola, que a polícia des-
truirá a pedido de um latifundiário para confirmar que a terra
lhe pertence e não a uma comunidade camponesa que dela
tem posse. E completa com um dos argumentos da sua teo-
ria: É na apropriação do excedente que geralmente nos damos
conta da política de um país (FURTADO, 2019, p. 270).

84
Marcas herdadas desses tempos são rememoradas e
sempre se manifestam em momentos dramáticos de sua vida,
por exemplo, quando da cassação dos seus direitos políticos
pelo regime militar. Ainda assim, continuou a acreditar na
ciência e nos intelectuais, juntamente a outros segmentos da
sociedade, como portadores de um projeto de sociedade, que
tanto almejou e não viu concretizar-se.
Na periferia, são os cientistas aqueles que mais
facilmente adquirem uma visão global do mundo,
pois a ciência é hoje um sistema de criação de
conhecimento organizado em escala planetá-
ria. A percepção da dependência em que nos
encontramos resulta naturalmente dessa visão
global. Isso aumenta a responsabilidade que cabe
naturalmente aos cientistas, como agentes de
transformação. Se os cientistas tomarem plena
consciência da significação última do que produ-
zem, como valores sociais e humanos, do contexto
social em que estão inseridos e da situação de
dependência a que tem sido relegado o nosso país,
terão necessariamente – como cidadãos ou como
força organizada – que contribuir de forma deci-
siva para colocar a ciência e a tecnologia a serviço
da solução dos imensos problemas que enfrenta
nossa sociedade. (FURTADO, 2013, p. 486).

Compreende-se que Celso Furtado é um dos poucos


teóricos brasileiros que impactaram o pensamento social e
econômico contemporâneo, signatário de um arcabouço teó-
rico – a teoria do subdesenvolvimento traz a dialética das
mudanças no interior do ordenamento sócio-histórico, eco-
nômico, político e cultural.
E apresenta as possibilidades de rupturas das heranças
históricas das estruturas socioeconômicas a partir das polí-
ticas prevalecentes no Brasil, em particular, mas também em
outros países da periferia do sistema capitalista.

85
Assim, surge a “Fantasia”, o fundamento do seu pro-
jeto de contribuir com as mudanças estruturais que o Brasil
requer, e o Nordeste em particular, onde se deve asseverar o
direito à cidadania, historicamente negado à grande maio-
ria da sua população. Crer no papel da ciência e na certeza
da importância do papel do intelectual nos destinos do país
sempre é lembrado aos jovens cientistas brasileiros.
Não devemos esquecer que a ciência, essa maravilhosa
criação do engenho humano está condicionada pelos valores
da sociedade onde é gerada. Basta lembrar que supostas teo-
rias científicas sobre as diferenças raciais, que prevaleceram
no século XIX, nada mais foram subproduto das doutrinas
imperialistas em voga (FURTADO, 2013, p. 490).
A filiação ao paradigma estruturalista reforça sua visão
de mundo e foi fundamental para fortalecer seu pensamento
e abnegação em busca de mudanças capazes de assegurar
às camadas pobres das regiões atrasadas do Brasil o acesso
aos bens econômicos, sociais e culturais produzidos com a
“modernização” do continente latino-americano. “Em certo
sentido, os estruturalistas retomaram a tradição do pensa-
mento marxista, na medida em que colocaram em primeiro
plano a análise das estruturas sociais para compreender o
comportamento dos agentes econômicos” (FURTADO,
2013, p. 61).
A experiência de Celso aproxima-se de intelectuais,
escritores e poetas que, oriundos das classes médias, não
foram indiferentes ao sofrimento, à miséria e à violência pra-
ticadas pelas classes dominantes. É o caso de Karl Popper
(1986, p. 15), nascido em Viena no início do século XIX,
em realidades tão distintas ao escrever sobre suas lembran-
ças da infância manifesta sentimentos semelhantes ao de
Celso Furtado ao escrever sobre suas lembranças de infân-
cia. “Conquanto a maioria de nós conheça a data e lugar de

86
nascimento [...], poucos sabem como e quando iniciaram sua
vida intelectual [...] e não há dúvida de que começou depois
de principiado meu desenvolvimento emocional e moral”.
(POPPER, 1986, p. 15).
Após destacar algumas lembranças nessa fase da vida,
como a admiração pelos mais velhos, e recordar o jardim de
infância, afirma: “A visão da pobreza abjeta, em Viena, foi
um dos principais problemas a me comoverem quando eu
era ainda criança – e a comoção era tanta que estava sempre
no fundo dos meus pensamentos”. (POPPER, 1986, p. 15).
Seu reconhecimento a Josué de Castro, por sua vez, vem
da preocupação compartilhada com a fome no Nordeste – a
fome e a miséria reinantes pelos sertões. Lá, viver era sorte.
Ambos, por caminhos distintos, dado que não pertenciam ao
mesmo estrato social (Josué nasceu nos mangues de Recife),
dedicaram o tempo em que viveram para que a região
pudesse submergir de seu atraso secular. Ambos, por cami-
nhos diferentes, eram homens obstinados e tinham anseio de
mudanças, se abrigavam na mesma ontologia social, vinham
de mundos diferentes.
Josué nasceu nos mangues de Recife, pertenciam a estra-
tos sociais diferentes. Ambos foram perseguidos pelo regime
militar, com direitos cassados. Encontram-se, ao nosso ver,
pela forma como eles veem o mundo.
As visões de mundo próximas e o mesmo inconfor-
mismo social desses dois importantes intelectuais brasileiros
talvez expliquem a aproximação dos dois e, ao mesmo
tempo, os distanciem de Gilberto Freyre e outros intelectuais
que contemplavam o mundo Nordestino por sua existência
imanente.
Na formação do espírito científico de Celso Furtado,
estão presentes as experiências pessoais em um laboratório
onde as antinomias econômicas, sociais, culturais e políticas

87
conformavam sua história na infância e mocidade entre o
Sertão e o Mar.
Seus trabalhos distanciam-se das produções tradicionais
sobre as trajetórias dos homens de ciências e das artes. Os
livros autobiográficos revelam o espírito que incessantemente
dialoga com intuições novas, com a crença na criatividade
humana para envidar esforços em favor das mudanças tão
requeridas para o país. Espera que os cientistas sociais, his-
toriadores, deem respostas às questões que mais de perto
afligem o nosso povo, fazendo com que a história registre o
destino que sua geração não alcançou, “portanto, havia de
olhar para frente, investir nas novas gerações” (FURTADO,
2013, p. 390).
Bresser Pereira (2001) sublinha a paixão de Celso como
um dos elementos basilares do seu pensamento: e assim
escreveu, não vou fazer uma avaliação geral da obra de Celso
Furtado. Vou apenas concentrar-me em três aspectos dessa
obra. Um bastante reconhecido – o da sua independência
de pensamento –, outro pouco estudado – o do método –, e
outro que está de alguma maneira presente em todas as aná-
lises da sua obra – o da paixão – mas que sempre aparece de
forma medida, através de expressões como amor pelo Brasil,
integridade pessoal a intelectual. Furtado é tudo isso, mas é
mais do que isto. Sua luta pelo desenvolvimento do Brasil
e pela superação do atraso da sua terra natal – o Nordeste
– foi realizada com uma intensidade e uma determinação
que só a paixão explica como missão, conforme completou
(BRESSER PEREIRA, 2001).
Reeditou seus escritos, como alertas às novas gerações
para que o Brasil não se transforme numa sub nação. Indicou
a necessidade de ensejar sua paixão pelo Brasil e atuar com a
esperança de que, em algum tempo histórico, a fantasia não
será desfeita.

88
A estada de Celso Furtado em Paris, onde consolidou
sua formação acadêmica, assumido a função de professor,
quando retorna exilado, consolida sua história intelectual,
conforme ele atesta nos seus diários. Suas produções mais
importantes foram produzidas durante sua permanência em
universidades francesas. Conforme ele descreve a importân-
cia de Paris, em dezembro de 1960 na sua história de vida,
podemos dizer que esta cidade é o seu berço intelectual.
Assim se refere a Paris:
Impressionante como esta cidade vive em mim.
Nem minhas recordações da infância e primeira
mocidade na Paraíba, calaram tão dentro de
minha alma como o período que aqui vivi como
universitário. Talvez por ter sido a primeira época
da minha vida que vivi diretamente e plenamente
para mim. (FURTADO, 2019, p. 197).

O autor da Formação econômica do Brasil compara as


duas realidades – o Sertão da sua infância e seu berço intelec-
tual, Paris, as suas universidades, são presentes na ontologia
social de Celso Furtado.

3 Considerações finais

A partir do exposto, percebemos o quanto sua infân-


cia teve impacto na sua visão de mundo, somando-se a essa
experiência de outrora, as que vivenciara em Paris. Contudo,
enquanto cidadão do mundo, seu pensamento encontra-se
impregnado de suas memórias desde o Sertão até o Litoral
Paraibano.
O Sertão da sua infância e seu berço intelectual asso-
ciam-se quando a referência é sua história intelectual. Para
efeito deste trabalho, focar na importância do que foi vivido

89
no período da sua infância e mocidade na Paraíba e no
quanto essa ideia que tem significado na ontologia social de
Celso Furtado e no seu pensamento científico, foi o exercício
a que nos propusemos fazer. E consideramos que consegui-
mos nos aproximar do nosso objetivo.

Referências

ALMEIDA, José Américo de. A Paraíba e seus problemas.


Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2012. 612 p.

BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Método e paixão em


Celso Furtado. In: BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos; REGO,
José Márcio (org.). A grande esperança em Celso Furtado.
São Paulo: Editora 34, 2001. p. 19-43.

FURTADO, Celso. Obra autobiográfica de Celso Furtado.


Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.

FURTADO, Celso. Aventuras de um economista brasileiro.


In: D’AGUIAR, Rosa Freire (org.). Essencial Celso Furtado.
São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2013
(A).

FURTADO, Celso. Ciência para quê e para quem?. In:


D’AGUIAR, Rosa Freire (org.). Essencial Celso Furtado. São
Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2013.

FURTADO, Celso. Diários intermitentes: 1937-2002. São


Paulo: Companhia das Letras, 2019.

OLIVEIRA, Amurabi. Bourdieu, Chartier e os diálogos entre


a Sociologia e a História. Revista Brasileira de História &
Ciências Sociais, v. 5, n. 9, jul. 2013.

90
POPPER, Karl. Autobiografia intelectual. Brasília: Editora
Universitária da UNB, 1986.

REIS, Zenir Campus. Tempos futuros: Vidas Secas, de


Graciliano Ramos. Estudos avançados, São Paulo, v. 26, n.
76, p. 187-224, 2012.

91
93
Relato de experiência: Trilha
Desenvolvimento Regional Sustentável

Andreza Dantas Albuquerque1


Milena Barros Marques dos Santos2

1 Introdução

O projeto “Desafio Celso Furtado: Os ares do


mundo – Escola, Criatividade e Desenvolvimento Regional”
foi desenvolvido pela Secretaria de Estado da Educação e da
Ciência e Tecnologia (SEECT-PB) no ano de 2020, em meio
às celebrações do centenário de nascimento do economista
paraibano Celso Furtado.
A iniciativa tinha por objetivo estimular docentes e dis-
centes da Rede Pública de Ensino (Ensino Médio e Educação
de Jovens e Adultos – EJA) a refletir sobre a realidade e
problemática local, identificando elementos históricos e eco-
nômicos. A partir desse contexto, os participantes deveriam
pensar soluções para o desenvolvimento regional sustentável
com base no pensamento e obra de Celso Furtado.

1 Jornalista, Doutora em Ciência, Tecnologia e Sociedade pela UFSCar,


Mestre em Desenvolvimento Regional (PPGDR UEPB), pesquisadora vin-
culada ao Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional da
Universidade Estadual da Paraíba na condição de estágio pós-doutorado.
2 Jornalista, Doutoranda em Política Públicas (PPGPP UnB), Mestre em
Desenvolvimento Regional (PPGDR UEPB), Especialista em Gestão
Pública, documentarista.

95
Para atuar junto a 212 equipes inscritas, todas da Rede
Pública, o Desafio Celso Furtado selecionou 16 especialistas
para prestarem consultoria, de forma voluntária, na ela-
boração de projetos em três trilhas de conhecimento: Bem
estar socioambiental, Desenvolvimento regional sustentável
e Instituições eficazes. O total de 103 equipes submeteram
projetos para a avaliação da etapa escolar.
Os especialistas foram convidados a participar dessa
etapa, sendo a avaliação impessoal, com critérios estabe-
lecidos em barema desenvolvido pela coordenação. Foram
selecionados 21 para a etapa seguinte (estadual). Ao final,
seis equipes (duas por trilha de conhecimento) foram ven-
cedoras. Após o encerramento do Desafios Celso Furtado,
os especialistas tiveram de elaborar relato de experiência ou
artigo científico.
Segundo a SEECT-PB, foram investidos mais de R$155
mil em bolsas de iniciação científica e bolsas-auxílio para
orientações e formações.

2 O intelectual Celso Furtado

Celso Monteiro Furtado foi um dos mais importantes


economistas e cientistas brasileiros. Nascido em Pombal, ser-
tão da Paraíba, em 1920, o republicano demonstrou em sua
obra a relação inseparável entre o pensar e o agir, entre o
rigor acadêmico e o engajamento político, tão necessários
para compreender o desenvolvimento dos países periféricos.
Com pensamento voltado à promoção de uma sociedade
mais igualitária, democrática e sustentável propôs mudanças
com objetivo de superar o subdesenvolvimento econômico,
as desigualdades regionais, os problemas sociais, as relações
de interdependência entre as nações desenvolvidas e subde-
senvolvidas (Referência).

96
Ao terminar o doutorado na França, em 1948, escreveu
diversos trabalhos sobre teoria da administração, Estado e
democracia, necessidade de implementação do planeja-
mento, a partir de três grandes influências: o positivismo, o
marxismo e a sociologia americana. Com a maturidade de
pensamento, percebeu a importância da História ou da vida
dos homens em sociedade para compreender os problemas
econômicos de um país. (D’AGUIAR, 2020, p. 38).
No final dos anos 1950, convidado pelo então Presidente
da República Juscelino Kubistchek a liderar o Grupo de
Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN),
elaborou o estudo “Uma política de desenvolvimento para o
Nordeste”, que culminou na criação da Superintendência do
Desenvolvimento do Nordeste. A instituição pretendia alte-
rar a realidade do Nordeste, mas não sob a crença de que o
problema era a seca. Para ele, a pobreza era má distribuição
da riqueza, portanto, era necessário combater privilégios,
concentração de renda e acumulação de riquezas. (SOUSA;
ALBUQUERQUE; 2020).
No início dos anos 1960, à frente da Sudene, o econo-
mista tinha como desafio proporcionar formação em bases
teórica e prática à equipe que formara. Reconhecendo a
diversidade e particularidade da região e valorizando a
identidade dos territórios nordestinos, possibilitou que a ins-
tituição pudesse trabalhar questões operacionais, práticas e
pragmáticas levando em consideração as questões políticas
e teóricas do desenvolvimento. (SANTOS; SOUSA, 2020).
Segundo o pensamento furtadiano, o desenvolvimento
nos moldes propostos pelos países centrais era um mito: “a
ideia de que os povos pobres podem algum dia desfrutar das
formas de vida dos atuais povos ricos é simplesmente irrea-
lizável.” (FURTADO, 1974, p.75). Isso por que, “o custo, em
termos de depredação do mundo físico, desse estilo de vida,

97
é de tal forma elevado que toda tentativa de generalizá-lo
levaria inexoravelmente ao colapso de toda uma civilização,
pondo em risco as possibilidades de sobrevivência da espécie
humana.” (FURTADO, 1974, p. 75). Porém, o “fetiche do
progresso” proporciona a mobilização e sacrifícios dos paí-
ses periféricos para atender aos interesses e necessidades dos
países centrais, justificando formas de dependência em nome
de um desenvolvimento irrealizável. (FURTADO, 1974).
Com o golpe da ditadura militar em 1964, Celso Furtado
teve os direitos políticos cassados e foi exilado. Nesse
período, foi convidado a ministrar seminários em Santiago
(Chile), New Haven (Estados Unidos) e Paris (França), onde
permaneceu na Sorbonne por 20 anos. Na década de 1970
fez diversas viagens à África, Ásia e América Latina, em mis-
sões das Nações Unidas.
Ele problematizava a vinculação da inovação aos pre-
ceitos do mercado e faz reflexão sobre inovação como
processo de desenvolvimento das forças produtivas no livro
“Criatividade e Dependência na Civilização Industrial”
(1978). O autor compreendia a inovação como um impulso
criador, “um processo de liberação de energias humanas”
que compõem “o fabuloso potencial de inventividade do
homem.” É essa criatividade a fonte do desenvolvimento, o
qual se diferencia do crescimento econômico por estar ligado
ao enriquecimento existencial do homem, característica que
se perde ao subordinar o impulso criador à lógica dos meios.
(FURTADO, 1978).
Em 1985, com a segunda Lei da Anistia, Furtado retorna
ao Brasil, e no ano seguinte é nomeado ministro da Cultura.
O paraibano era visto como um homem de pensamento e
ação, um teórico do desenvolvimento socioeconômico, um
pensador sobre o Brasil, um estadista que acreditava que cul-
tura e desenvolvimento deviam ser percebidos como fatores
de um mesmo processo. Sem a cultura, o desenvolvimento se

98
torna frágil e incapaz de responder à realidade. Também os
avanços e a transformação tecnológica deveriam ser obser-
vados para a superação da miséria e valorização do país.
(SOUSA; SANTOS, 2020).
Reconhecidos esses contornos, o Desafio propõe moti-
var as equipes a compreenderem o pensamento de Celso
Furtado sobre inovação, desenvolvimento, sustentabilidade,
instituições, dentre outros temas, e correlaciona-lo à pro-
posta do plano de ação global da Organização das Nações
Unidas (ONU), assumido por 193 países, o documento
“Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o
Desenvolvimento Sustentável”.
A Agenda 2030 estabelece 17 objetivos integrados e
indivisíveis, sustentados nas três dimensões do desenvol-
vimento sustentável: a econômica, a social e a ambiental.
Dentre os objetivos, destacamos: erradicação da pobreza;
fome zero e agricultura sustentável; educação de qualidade;
trabalho decente e crescimento econômico; redução das desi-
gualdades; indústria, inovação e infraestrutura; paz, justiça e
instituições eficazes.
Esse “consenso” expresso pela Agenda 2030 sobre a
necessidade de tornar o desenvolvimento mais sustentável,
com ênfase no combate à desigualdade e suas consequências,
reflete muito do pensamento de Furtado. E esse é o grande
desafio não apenas para as escolas da Rede Estadual de
ensino: observar a realidade local, identificar seus problemas
e gargalos, compreender as causas, refletir e contribuir com
inovações sociais que transformem essa realidade.

3 Dos especialistas

A seleção dos especialistas ocorreu por processo seletivo,


contendo duas etapas: análise de currículo e carta de inten-
ções. Houve duas chamadas, uma em outubro com início das

99
atividades em novembro de 2020, tendo sido selecionados
nove (9) especialistas, e a segunda chamada em novembro,
com início das atividades em dezembro do mesmo ano. Ao
todo, foram selecionados 16 especialistas para atuarem de
forma voluntária.
Dentre as atribuições dos especialistas, estavam previs-
tas atividades de prestação de consultorias para auxiliar as
equipes participantes a construírem seus planos de implemen-
tação, durante a primeira etapa do programa. A proposta foi
de que os especialistas ajudassem as equipes na articulação
entre os estudos de Celso Furtado, a Agenda 2030 e os 17
ODS e a aplicabilidade das propostas.
Destacam-se entre as principais atividades dos espe-
cialistas: acompanhamento das equipes, por meio de
videoconferências, para consultoria e ajustes dos projetos
elaborados pelas equipes; participação no Fórum Celso
Furtado; integração da comissão de avaliação da etapa esco-
lar e estadual; elaboração de relato de experiência ou artigo
científico.
A especialista Andreza Albuquerque é jornalista (UFPB),
com título de doutorado em Ciência, Tecnologia e Sociedade
(PPGCTS/UFSCar) e de mestra em Desenvolvimento
Regional (PPGDR/UEPB), sendo pesquisadora vinculada ao
Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional
da Universidade Estadual da Paraíba na condição de estágio
pós-doutorado. Foi selecionada em outubro. Prestou consul-
toria a 12 equipes e avaliou sete projetos.
A especialista Milena Santos é servidora pública em
Desenvolvimento Social há mais de 10 anos (Sedes/GDF) e
jornalista (UnB) com título de mestra em Desenvolvimento
Regional (PPGDR/UEPB). Foi selecionada em dezembro de
2020, prestou consultoria a três equipes – sendo uma delas
selecionada como finalista – e avaliou seis projetos.

100
3.1 Da trilha de conhecimento e da metodologia

Ambas as especialistas atuaram na Trilha 2 –


Desenvolvimento Regional Sustentável, em que as equipes
foram convidadas a pensar ideias inovadoras que integrassem
economia e o meio-ambiente, de maneira ética e sustentável,
a partir da observação das problemáticas locais. A essa obser-
vação, deveriam propor soluções inovadoras e relevantes
conectando o pensamento de Celso Furtado à Agenda 2030.
A proposta de solução deveria estar alinhada a ao menos
um dos seguintes objetivos do desenvolvimento sustentável
(ODS):
• ODS 2. Acabar com a fome, alcançar a segurança
alimentar e melhoria da nutrição e promover a agri-
cultura sustentável;
• ODS 6. Assegurar a disponibilidade e gestão susten-
tável da água e saneamento para todos;
• ODS 7. Assegurar o acesso confiável, sustentável,
moderno e a preço acessível à energia para todos;
• ODS 8. Promover o crescimento econômico sus-
tentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e
produtivo e trabalho decente para todos;
• ODS 9. Construir infraestruturas resilientes, pro-
mover a industrialização inclusiva e sustentável e
fomentar a inovação;
• ODS 12. Assegurar padrões de produção e de con-
sumo sustentáveis.

Para os atendimentos com as especialistas, a coordena-


ção do Desafio Celso Furtado divulgou calendário com as
datas em que as equipes da Rede de Ensino deveriam con-
tatá-las. O contato deveria ser realizado por e-mail ou por
telefone, sendo facultado o uso do aplicativo whatsapp.

101
A coordenação não tinha elaborado um padrão ou pla-
nejamento para atuação dos especialistas, de forma que ficou
a cargo de cada um estabelecer metodologia para as consul-
torias. Ocorreram duas chamadas de escolas participantes,
sendo um grupo com atendimentos em novembro, quando
nove (9) especialistas estavam atuando, e outro em meados
de dezembro, agora com os 16 especialistas.
Para a etapa seguinte, avaliação dos projetos, a coorde-
nação elaborou um barema com os critérios que deveriam
ser pontuados, dentre os quais mencionamos: consistência
pedagógica e conceitual, clareza nos objetivos, criatividade
e viabilidade de execução. A pontuação máxima a ser atin-
gida nessa etapa era de seis pontos. A equipe do Desafio
Celso Furtado foi a responsável por selecionar os projetos,
de forma que os especialistas não avaliassem os projetos que
haviam orientado.
Ao final do Desafio Celso Furtado, para recebimento do
certificado, os especialistas tiveram de escolher entre a ela-
boração de um relato de experiência ou um artigo científico.
O relato da experiência das especialistas será apresen-
tado em três etapas: metodologia das consultorias, percepções
das consultorias, e avaliações de projetos.

3.2 Experiência especialista Andreza Albuquerque

3.2.1 Metodologia das consultorias

As atividades com as equipes tiveram início em novem-


bro de 2020, durante a etapa escolar. Foram dois cronogramas
de atendimento entre 12 de novembro e 11 de dezembro de
2020, nesse período 12 equipes fizeram contato. Os encon-
tros de orientação seguiram até janeiro de 2021.

102
As equipes atendidas estavam espalhadas entre sete
gerências regionais de ensino, o que possibilitou interagir
com escolas localizadas no litoral, zona da mata, agreste e
sertão. A formação dos professores mentores eram as mais
diversas: letras, física, química, história, filosofia, geografia,
para citar alguns.
A metodologia das consultorias funcionou no seguinte
sistema: o primeiro contato foi feito por troca de mensagens
pelo aplicativo whatsapp onde a especialista solicitou que
fosse enviado uma cópia do projeto e relatório, por e-mail,
antes do primeiro encontro por vídeo chamada, utilizando
a plataforma google meet. A ideia era ter um conhecimento
prévio da proposta da equipe e assim ter mais objetividade
nos encontros de orientação. Em média os encontros dura-
vam entre 1h30min e 2h.

3.2.2 Percepções das consultorias

Após as primeiras reuniões com todas as equipes, a


especialista propôs um encontro coletivo para sanar dúvidas
comuns de escrita científica, normalização e para esclarecer
alguns pontos sobre a teoria de Celso Furtado. O encontro
aconteceu no dia 4 de dezembro, durou 2h e contou com a
participação dos professores mentores e alunos de 7 equipes.
Como já tinha sido verificado que o pensamento de Celso
Furtado era algo muito novo, desconhecido para todas as
equipes, a ocasião foi uma oportunidade para apresentar
pontos chaves da teoria de Furtado e dá direcionamentos às
equipes de como esses pontos poderiam ser trabalhados em
seus projetos. O encontro foi gravado e disponibilizado para
todas as equipes, inclusive as que não puderam participar no
dia e horário acordado.

103
Os projetos apresentados tratavam de ideias diver-
sas: reutilização de óleo de cozinha, criação de hortas no
ambiente escolar, instalação de bibliotecas móveis, difusão
de práticas agrícolas sustentáveis. Houve também, projetos
preocupados em tratar água ou propor reuso de águas cinzas.

3.2.3 Avaliações de projetos

Pela experiência de orientação e avaliação dos projetos


foi possível perceber que não havia um entendimento por
parte das equipes sobre inovação social. Muitas das propos-
tas caminhavam na direção das boas práticas relacionadas
aos ODS e não de iniciativas inovadoras, mas diante do
cronograma do Desafio não havia prazo para alterações
nas propostas, apenas ajustes e sugestões para adequações
metodológicas.
Reciclar o lixo, diminuir o consumo de energia, usar
água de maneira responsável, plantar seu próprio alimento,
são exemplos das boas práticas que foram problematizadas
pelas equipes durante o Desafio 2020. E, por mais que não
tenham alcançado o patamar de inovação, abriu espaço para
o debate sobre a necessidade de um novo estilo de vida, sus-
tentável e consciente. Cumpriu-se assim, um dos objetivos
da iniciativa: promover reflexões sobre o contexto em que se
encontra cada unidade escolar.
Mas também houve equipes que conseguiram, mesmo
não tendo sidos selecionadas, apresentar protótipos de
tecnologias sociais inovadoras como os projetos que propu-
seram um protótipo de fogão solar, tratar água utilizada pela
população ribeirinha com a criação de filtros ecológicos ou
tratar águas cinzas utilizando-se de filtro biológico e ener-
gias renováveis, para resolver a falta de água no banheiro
feminino da escola, por exemplo.

104
Apenas uma equipe, das 12 acompanhadas, chegou
até a etapa estadual. O projeto da equipe “Permacultura
na Escola”, da Escola Estadual de Ensino Fundamental e
Médio Senador Humberto Lucena, na cidade de Cacimba de
Dentro-PB, se classificou em terceiro colocado no resultado
final do Desafio.

3.3 Experiência da especialista Milena Barros

3.3.1 Metodologia das consultorias

As atividades foram iniciadas em 18/12/2020. Entraram


em contato seis equipes para orientação, sendo que apenas
três consultorias se efetivaram. Uma das equipes ressaltou
que o tempo para atendimento e possibilidade de ajustes/
alterações era bastante escasso, e que enviaria o projeto da
forma como estava, sem passar por especialista; uma das
equipes descumpriu os prazos estabelecidos com a espe-
cialista reiteradas vezes, não sendo possível atendimento;
a outra equipe disse que entraria em contato para agendar
horário, e não o fez.
As demais equipes que tiveram atendimentos eram de
três Regionais de Ensino diferentes, correspondendo à Região
Metropolitana do Vale do Piancó, Região Metropolitana de
Sousa, e Região da Mata Paraibana. A maioria das equipes
possuía apenas um professor orientador/mentor.
Em consulta ao currículo lattes na plataforma CNPq,
identificou-se que a metade deles tinham dados nessa pla-
taforma, com grau de pós-graduação. Também foi possível
identificar que uma das docentes foi contemplada com o
Prêmio Mestres da Educação edição 2018. Não foi identifi-
cada informação dos demais professores.

105
De todas as equipes, apenas uma respeitou o crono-
grama estabelecido pela coordenação do programa. A partir
do contato inicial, foi agendado data e horário, sendo soli-
citado o envio prévio do relatório de execução e plano de
implementação, principalmente, considerando-se o prazo
exíguo para atuação da especialista com as equipes.
Em um dos atendimentos, apenas o professor participou
da atividade, enquanto nas demais, os estudantes estavam
presentes. Os horários estabelecidos com a especialista
foram cumpridos e foi realizada ao menos uma reunião vir-
tual com cada equipe, utilizando-se na maioria das vezes a
plataforma google meet. Também houve suporte por contato
telefônico, e-mail e whatsapp, sempre que as equipes neces-
sitavam sanar dúvidas.

3.3.2 Percepções das consultorias

O contato com as equipes possibilitou à especialista


observar que, embora as equipes estivessem motivadas, a par-
ticipação, em uma delas, foi imposta pela direção da escola.
Outra dificuldade foi a falta de suporte das coordenações
escolares, principalmente nas equipes que possuíam apenas
um professor orientador. O contexto de Pandemia devido à
Covid-19 também se impôs como desafio para a articulação
e participação em atividades: alguns alunos interessados não
possuíam acesso à internet, ou o acesso era precário, o que
dificultou o contato entre os membros das equipes, e por
vezes, comprometeu o cumprimento dos prazos.
Durante as reuniões, a especialista pontuou os pontos
fortes e as fragilidades de cada projeto. Um ponto comum é
que o conhecimento sobre o pensamento de Celso Furtado
era limitado e as equipes não tinham clareza sobre os concei-
tos relacionados à inovação, fugindo do escopo do projeto

106
e aproximando-se de atividades de boas práticas, embora as
ideias fossem interessantes.
Também foi possível identificar dificuldade na delimita-
ção dos objetivos e na viabilidade de execução dos projetos.
Todos careciam de contextualização territorial, incluindo
dados estatísticos que corroborassem com os impactos dos
projetos. Todos estavam associados a algum dos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS). As temáticas estavam
relacionadas a reeducação ambiental e segurança alimentar
e nutricional.
Houve debate entre especialista e professores, e os estu-
dantes foram convidados a participar, o que fizeram de forma
ativa, demonstrando engajamento com as temáticas desen-
volvidas. A especialista também ponderou que havia, em
geral, divergência entre informações constantes no Relatório
de Execução e no Plano de Implementação. Da leitura dos
instrumentais, a especialista pôde perceber, que havia certa
dificuldade de adequação aos modelos, e que a escrita care-
cia de revisão (uma das equipes realizou, posteriormente).
As equipes demonstraram maturidade com as críticas
positivas e negativas apresentadas, refletindo e questionando
sobre alternativas possíveis. A especialista fez várias suges-
tões, incluindo, em alguns casos, referência bibliográfica e
sites de busca para obtenção de informações que corroboras-
sem com o alcance dos objetivos propostos, deixando claro
que a equipe era responsável pela decisão de quais sugestões
iria, ou não, acatar. De modo geral, grande parte das suges-
tões foram aceitas. O feedback das equipes foi positivo. Uma
das equipes foi selecionada entre as seis finalistas.
Anterior ao contato com a especialista, as equipes foram
convidadas a participar de um fórum sobre Celso Furtado.
Apenas uma equipe participou.

107
3.3.3 Das avaliações dos projetos

A especialista atuou na avaliação de seis projetos de


Regionais de Ensino distintas, que apresentavam grandes
diferenças de estruturação, elaboração e desenvolvimento
de ideias. Um dos projetos foi apresentado em apenas duas
páginas, enquanto o outro possuía 35. As propostas eram
diversas, desde a realização de webnários e debates locais, à
criação de cooperativas. As temáticas estavam relacionadas à
produção de sabão ecológico, temas relacionados a zoonoses
e animais e uso de recursos hídricos, para citar alguns.
A avaliação dos projetos foi feita a partir de critérios
estabelecidos em um barema, desenvolvido pela equipe de
coordenadores do programa Desafios. Dentre os critérios,
menciono: consistência pedagógica e conceitual, clareza nos
objetivos, criatividade e viabilidade de execução. A pontua-
ção máxima a ser atingida nessa etapa era de seis pontos.
Foi possível perceber que grande parte dos entraves
observados quando da consultoria às equipes era genera-
lizada. A delimitação e clareza no objetivo foi um grande
obstáculo para as equipes. Alguns projetos careciam de
contextualização e territorialização, e, principalmente, não
apresentavam dados que sustentassem a viabilidade de exe-
cução. Outro ponto é que, de forma geral, os projetos não
conseguiram apresentar o pensamento Furtadiano e em um
dos casos, não foi feita qualquer menção aos ODS.
Ressalte-se que as equipes apresentaram projetos bas-
tante criativos. As soluções para alteração e/ou melhoria
da realidade local eram muito interessantes. Entretanto, o
tempo para desenvolvimento dos projetos e atuação dos
especialistas foi bastante limitado, o que, certamente, impac-
tou na apresentação dos projetos.

108
4 Conclusões das especialistas
O “Desafio Celso Furtado: Os ares do mundo - Escola,
Criatividade e Desenvolvimento Regional” possibilitou a ela-
boração de projetos de desenvolvimento regional sustentável
com foco na problemática local por estudantes do Ensino
Médio e EJA da Rede Estadual de Ensino. Observou-se que
os participantes, de forma geral, estavam engajados na pro-
posta de alteração da realidade local, porém, o Desafio Celso
Furtado apresentou gargalos que precisam ser revistos.
A maioria das equipes não possuía conhecimento sobre
o pensamento e obra de Celso Furtado, o que impactou
negativamente na qualidade das reflexões das equipes partici-
pantes. Muitos professores, com as mais diversas formações,
não tinham tido contato com as ideias do economista parai-
bano. O tempo escasso para consultoria não permitiu às
especialistas que auxiliassem no preenchimento dessa lacuna,
mesmo os professores se mostrando plenamente capazes de
sustentar um debate teórico sobre o pensamento de Furtado.
Também restou clara a necessidade de que as equipes
tenham maiores informações e suporte quanto à elaboração
de projetos. O formalismo necessário nem sempre faz parte
do cotidiano dos professores, o que refletiu nas diferentes
apresentações dos projetos, principalmente no que tange
à delimitação do objetivo e na viabilidade de execução.
Também se percebeu a necessidade de maiores apresentações
sobre os conceitos de inovação social.
Embasadas nas experiências de consultoria, acredita-
mos que esses gargalos podem ser minimizados. As equipes,
de modo geral, não apresentaram resistência às críticas das
especialistas, e mostraram-se interessadas em realizar ajustes
e melhorias. Nesse sentido, sugerimos a realização de ativi-
dades temáticas prévias à elaboração dos projetos. Também

109
consideramos importante o desenvolvimento de cronograma
mais largo para atuação dos especialistas junto às equipes
participantes.
De modo geral, é possível concluir que as equipes esta-
vam engajadas com a problemática local, e apresentaram
soluções criativas para mitigar seus efeitos, tanto com inicia-
tivas inovadoras, quanto com ações de boas práticas. Nesse
sentido, a partir da experiência vivenciada no âmbito do
Desafios Celso Furtado, acreditamos que o projeto cumpriu
com o objetivo de promover a reflexão e o debate consciente
sobre a realidade local e, ainda que de forma um pouco mais
tímida, divulgar o pensamento de Celso Furtado.

Referências

D’AGUIAR, Rosa Freire. Celso Furtado – um retrato intelec-


tual. In SOUSA, C. M., THEIS, I. M., and BARBOSA, J. L. A.,
eds. Celso Furtado: a esperança militante (Interpretações):
vol. 1 [online]. Campina Grande: EDUEPB, 2020, 401 p.
Disponível em http://books.scielo.org/id/s5gx2/pdf/sousa-
9786586221695.pdf. Acessado em 21/09/2021.

FURTADO, C. O Mito do Desenvolvimento Econômico. São


Paulo: ed. Círculo do Livro, 1974. p.122.

FURTADO, C. Criatividade e Dependência na Civilização


Industrial, Rio de Janeiro; Paz e Terra, 1978. p. 181.

LINS FILHO, João Azevedo. Apresentação. In SOUSA, C. M.,


THEIS, I. M., and BARBOSA, J. L. A, eds. Celso Furtado: a
esperança militante (Depoimentos): vol. 2 [online]. Campina
Grande: EDUEPB, 2020, 392 p. Disponível em http://
books.scielo.org/id/2p9rw/pdf/sousa-9786586221671.pdf
Acessado em 20/09/2021

110
SANTOS, Milena Barros Marques; SOUSA, Cidoval Morais.
Não dá para imaginar um Nordeste (e o Brasil) sem Celso
Furtado. In SOUSA, C. M., THEIS, I. M., and BARBOSA, J. L.
A, eds. Celso Furtado: a esperança militante (Depoimentos):
vol. 2 [online]. Campina Grande: EDUEPB, 2020, 392 p.
Disponível em http://books.scielo.org/id/2p9rw/pdf/sousa-
9786586221671.pdf . Acessado em 21/09/2021

SOUSA, Cidoval Morais; ALBUQUERQUE, Andreza Dantas.


Um dinâmico pensador tecnológico. In SOUSA, C. M.,
THEIS, I. M., and BARBOSA, J. L. A, eds. Celso Furtado: a
esperança militante (Depoimentos): vol. 2 [online]. Campina
Grande: EDUEPB, 2020, 392 p. Disponível em http://
books.scielo.org/id/2p9rw/pdf/sousa-9786586221671.pdf .
Acessado em 21/09/2021

SOUSA, Cidoval Morais; SANTOS, Milena Barros Marques.


Sem cultura, o desenvolvimento se torna frágil e vulnerá-
vel. In SOUSA, C. M., THEIS, I. M., and BARBOSA, J. L.
A, eds. Celso Furtado: a esperança militante (Depoimentos):
vol. 2 [online]. Campina Grande: EDUEPB, 2020, 392 p.
Disponível em http://books.scielo.org/id/2p9rw/pdf/sousa-
9786586221671.pdf . Acessado em 22/09/2021.

111
Desenvolvimento e educação: um olhar a
partir das contribuições de Celso Furtado

Rafaela Dias3
Thaís Marculino da Silva4

1 Introdução

Todo o percurso que envolve a busca pelo conhe-


cimento, bem como, a forma como se dá o acesso a esse
conhecimento e como possibilitar que esse acesso seja
equitativo, é um assunto extensamente discutido entre os
estudiosos, pesquisadores e cientistas. Como disseminar o
conhecimento e torná-lo acessível a toda população, é um
questionamento que perdura no campo abstrato das discus-
sões e tem na sua práxis a sua efetividade.
Contribuir com a disseminação do conhecimento ainda
no processo de formação educacional é de suma importân-
cia tanto para os estudantes, quanto para os professores,
pois, é bem certo que ao ensinar se aprende ainda mais. E
no processo imbricado de ensino-aprendizagem a busca e

3 Administradora e Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade


Estadual da Paraíba. Especialista do Programa Desafio Celso Furtado
entre novembro de 2020 e maio de 2021.
4 Economista e Mestre em Recursos Naturais pela Universidade Federal
de Campina Grande. Doutoranda do Programa de Pós-graduação em
Economia pela Universidade Federal de Pernambuco. Especialista do
Programa Desafio Celso Furtado entre novembro de 2020 e maio de 2021.

113
ampliação de saberes se difundem e se consolidam, em vias
de mão dupla, onde aluno e professor/orientador promovem
continuamente a construção do conhecimento.
Associado aos aspectos socioeducacionais e à essencial
difusão do conhecimento, pensar o processo educacional é
temática pertinente e amplamente discutida aos olhos do
pensamento econômico e dentro desse contexto, ressaltam-
se as contribuições do pensamento furtadiano.
Embora o enfoque do pensamento furtadiano não
esteja em sua maioria relacionado diretamente ao debate da
educação, verifica-se que a educação é uma temática trans-
versal aos debates teóricos amplamente desenvolvidos pelo
teórico Celso Furtado. Assim, dentre os debates mais eviden-
tes, sobre os quais o teórico dedicou-se, cita-se como por
exemplo: pensar as disparidades regionais, refletir acerca da
relação da dependência periferia-centro, ou mesmo pensar
acerca do subdesenvolvimento e sua superação, trazem ine-
vitavelmente em seu bojo, as premissas para reflexão acerca
da educação enquanto caminho, estratégia e instrumento
para a formação e progresso de uma nação.
Assim, o presente trabalho refere-se a um relato de
experiência cujo objetivo é expor a experiência vivenciada
ao longo do processo de orientação junto às equipes do
Programa Desafio Celso Furtado, evidenciando a importância
do processo de ensino aprendizagem para o desenvolvimento
acadêmico dos alunos do ensino básico.
Nesse contexto, a Secretaria de Estado da Educação e da
Ciência e Tecnologia (SEECT-PB) lançou em 2020, o “Desafio
Celso Furtado: Os ares do mundo – Escola, Criatividade e
Desenvolvimento Regional”, com o intuito de estimular o
interesse de alunos e professores da rede básica, a desenvol-
verem projetos de pesquisa/extensão voltados à melhoria do
contexto em que vivem.

114
O Desafio foi uma das atividades comemorativas por
parte do Governo do Estado, em alusão ao centenário de
Celso Furtado e que, em 2021 tornou-se oficialmente5 um
programa educacional voltado para consolidar a atualidade
do pensamento de Celso Furtado em consonância com a
Agenda 2030, da ONU (Organização das Nações Unidas).
Uma das ações do programa, é oferecer às equipes par-
ticipantes o auxílio de especialistas que se comprometem a
transmitir para os alunos e professores da rede básica do
estado, o entendimento de quem foi Celso Furtado e as suas
contribuições para os estudos do desenvolvimento da região
e também do Brasil. Entendendo que saber sobre Celso
Furtado, é saber sobre a nossa história. Além das orientações
acerca do pensamento furtadiano, os especialistas oferecem,
também, orientações de base técnica, científica e normativa,
visando adequar os projetos das equipes às exigências do
programa.
Assim, no aspecto educacional, algumas atividades do
campo acadêmico ganham um diferencial por serem vol-
tadas para a comunidade que está situada no entorno das
instituições e a sociedade local. Dentre algumas políticas
educacionais, o ensino de extensão tem ganhado cada vez
mais espaço sendo desenhado do ambiente interno para o
externo, aplicando o conceito de Freire (1983) que afirma:
só aprende aquele que se apropria do aprendido, [...], sendo
capaz de aplicar o aprendido às situações existenciais e
concretas.
Ademais, torna-se pertinente assinalar que a estra-
tégia do programa ao inserir os alunos em atividades que

5 O Programa Celso Furtado, instituído pela Medida Provisória n.300, de


14 de julho de 2021.

115
promovam a aproximação dos mesmos, com aspectos da
área acadêmica, pode ser considerada essencial para que,
conforme conheçam sobre tais atividades, possam ser ante-
cipados de como é realizado os estudos em um ambiente
acadêmico na etapa subsequente de ensino (ensino superior),
e como se desenrolam as discussões, e a importância do tra-
balho em equipe, bem como a valorização do conhecimento
da história local, através da pesquisa científica.
Essa percepção corrobora com o entendimento de Celso
Furtado sobre desenvolvimento, quando ele afirma que o
mesmo é “[...] um processo de transformação que engloba
o conjunto de uma sociedade.” (FURTADO, 2000a, p. 41).
Nessa perspectiva e entendendo que o conhecimento possi-
bilita o avanço de um indivíduo em todos os aspectos de sua
vida, o Desafio Celso Furtado contribui de forma empírica
com aspectos intrínsecos ao desenvolvimento.
Além dessa breve introdução, o presente trabalho
encontra-se estruturado em quatro seções, a saber: a funda-
mentação teórica que visa, de modo breve, realçar a interface
entre educação e as contribuições teóricas de Celso Furtado,
evidenciando a importância do investimento em educação
como estratégia para o desenvolvimento. Em seguida, é
exposto a metodologia, que apresenta as características gerais
do processo de experiência de orientação junto às equipes do
programa. Logo após, os resultados e discussões que buscam
destacar os principais aspectos vividos ao longo do processo
de orientação a partir do olhar do pesquisador, e por fim, as
considerações finais, além das referências bibliográficas.

2 Fundamentação Teórica

A discussão que envolve aspectos do desenvolvimento


emerge frente aos índices que explicavam o crescimento
econômico e que não levavam em consideração, aspectos

116
intrínsecos à qualidade de vida e ao bem-estar dos indiví-
duos que vivem em sociedade.
De acordo com Furtado (1999), a partir do século XX, a
questão do desenvolvimento passou a ganhar cada vez mais
espaço nas pautas de eventos em universidades e demais insti-
tuições que procuram contribuir com o avanço da sociedade
de forma equitativa. Compreendendo que, no que concerne
ao crescimento econômico, os privilégios são observados e a
questão da desigualdade e distribuição de renda surge como
fator crítico. Por sua vez, quando falamos em desenvolvi-
mento estamos abrindo margem para conflitos, mesmo que
seja no campo abstrato, pois, estamos falando de quebra de
campos de dominação e concentração de decisão, incorpo-
rando em todas as esferas estratégias que contribuam para
uma articulação que envolvam todas as camadas sociais.
Todos esses aspectos de dominação por forças que
estruturam uma máquina de desigualdade são características
fundamentais do subdesenvolvimento e o Brasil vivencia isso
de maneira efetiva, tendo em vista que estruturas poderosas
contribuem para a ampliação de privilégio e como conse-
quência acirram a desigualdade social.
No campo econômico, grandes corporações avançam e
dominam vários segmentos industriais. Em paralelo, peque-
nos produtores ficam à margem desse crescimento. Nesse
aspecto, emerge como um desafio, a construção de políticas de
desenvolvimento que contribuam para uma homogeneização
social e possibilitem que atores sociais antes marginalizados,
possam protagonizar a sua história e avançarem no processo
que envolve aspectos de liderança e tomada de decisão.
Corroborando com essa ideia, Furtado (2000, p. 6)
exprime que: “[..] a superação do impasse com que nos con-
frontamos requer que a política de desenvolvimento conduza
a uma crescente homogeneização de nossa sociedade e abra
espaço à realização das potencialidades de nossa cultura”.

117
De modo que, para que o desenvolvimento aconteça, é
necessário que as potencialidades regionais sejam absorvidas
pelos atores ali inseridos e experienciadas, contribuindo para
o desenvolvimento local e estimulando o reconhecimento da
cultura, na qual, a sociedade está inserida. Valorizando o
local e o regional e preservando a identidade cultural e no
caso do Nordeste, um exemplo que pode ser explicitado é
a ampla necessidade de difusão acerca do economista Celso
Furtado, seus estudos e sua atuação na vida pública, uma vez
que, saber sobre Celso Furtado, é conhecer um pouco mais
da história local.
Compreendendo essas facetas que permeiam as entreli-
nhas do estudo do desenvolvimento, evidencia-se o que Celso
Furtado pontuou em seus primeiros estudos, as políticas de
desenvolvimento não devem ser implementadas da mesma
forma para todas as regiões do Brasil, mas, respeitando os
aspectos estruturais e históricos, devem ser inseridas a partir
do referencial local, é a partir do desenvolvimento das poten-
cialidades locais que se pode observar o desenvolvimento no
âmbito nacional.
Todo o esforço de Celso Furtado para contribuir com
um desenho político que explorasse fatores potenciais da
região Nordeste, por exemplo, ganha cada vez mais sentido
a partir do seu ingresso na SUDENE exercendo a função de
presidente da mesma e também sua atuação como Ministro
do governo de João Goulart, onde a sua presença inaugurou
a pasta do Planejamento (1961-1962). Com uma adminis-
tração voltada para o setor público e não a fim de superar as
expectativas do mercado, contribuindo assim para a discus-
são de estratégias que estimulassem o desenvolvimento com
um olhar específico para as potencialidades do Nordeste.
É evidente que para que as potencialidades sejam desen-
volvidas, o acesso a terra e a educação são essenciais, o

118
investimento nessas áreas são necessários e importantes para
que o desenvolvimento possa de fato se sobressair frente às
arestas deixadas pelo crescimento desordenado.
As pautas de discussão através das quais Celso Furtado
posicionava as suas estratégias desenvolvimentista, não tra-
tavam aspectos educacionais em específico, mas, é possível
observar através de seus estudos, que Celso Furtado enten-
dia a importância da valorização do ser humano e essa
valorização seria estimulada através do acesso à educação,
fazendo com que tais pessoas pudessem alavancar sua vida
profissional e através do conhecimento adquirido exerces-
sem atividades que gerassem renda para a comunidade local
culminando em um progresso que gerasse desenvolvimento.
Ainda nesse sentido, Celso Furtado constatou algumas
lacunas históricas que contribuíam para aspectos do sub-
desenvolvimento que o Brasil vivenciava e que impactava
com índices mais alarmantes algumas regiões, a exemplo da
região Nordeste. Dentre tantas questões, Furtado (1999, p.
34) exprime: “O Brasil acumulou historicamente um consi-
derável atraso em investimento no fator humano, ou seja,
na promoção do bem-estar da massa da população. A misé-
ria é a contrapartida do hiperconsumo praticado por uma
pequena minoria em termos relativos”.
Tal afirmação contribui para o entendimento que nos
é proposto de que para que o desenvolvimento aconteça,
um dos aspectos que devem ser considerados é a qualidade
de vida, é o capital humano e para que o mesmo possa ser
exercido, o ser humano precisa ter acesso ao conhecimento,
e isso acontece através da educação. Se a educação não for
estimulada para todos de uma população, então a miséria
e a desigualdade irão ganhar índices alarmantes e foi o que
aconteceu no Brasil ao longo de muitos anos. E o pensa-
mento furtadiano vem justamente para expor essas arestas

119
e procurar formas para que tais arestas sejam mitigadas e o
desenvolvimento possa de fato acontecer.
Desse modo, a essência do pensamento de Furtado passa
pelo reconhecimento da importância da educação, a partir
do melhoramento da qualidade do fator humano. De acordo
com Furtado (2002, p.11) “a educação interfere no tempo,
e, melhorando-se a qualidade do fator humano, modifica-se
por completo o quadro do país, abrem-se possibilidades de
desenvolvimento muito maiores”.
Logo, o investimento em educação enquanto fonte de
crescimento, torna-se também um impulsionador para o
desenvolvimento, inicialmente do próprio indivíduo que
amplia competências e habilidades, elevando a produtividade
do fator trabalho. No entanto, tal progresso não se limita ao
desenvolvimento humano, mas gera externalidades positivas
que contribuem para o desenvolvimento da sociedade, para
além do processo de acumulação de capital, “[...] esse é o
mais importante investimento a fazer, para que haja não só
crescimento, mas autêntico desenvolvimento.” (FURTADO,
2002, p. 11).
De acordo com Schultz (1967) a educação consiste em
um conceito mais abrangente, que engloba o processo de
instrução, mas que se refere também à evolução dos conhe-
cimentos, através da pesquisa. Nesse sentido, observa-se o
valor econômico da educação e a necessidade de amplia-
ção de políticas públicas eficazes que possam garantir a
democratização do acesso, permanência e sucesso do sis-
tema de educação que vise não apenas a inclusão, mas o
desenvolvimento humano e social, inclusive que visa a supe-
ração da dependência econômica e, assim, a superação do
subdesenvolvimento.
Não obstante, entendendo a importância que a educa-
ção e o acesso ao conhecimento têm para o desenvolvimento,

120
o pensamento furtadiano não se limitou apenas a esses aspec-
tos, conforme os seus estudos avançaram, compreendeu-se
que o cuidado com o meio ambiente e os aspectos ecológi-
cos tem impacto fundamental no que concerne a questão do
desenvolvimento.
Tal percepção pode ser entendida quando o autor
afirma que todo o crescimento que foi observado a partir
da revolução industrial e demais descobertas intrínsecas
ao processo produtivo “[...] provoca, na grande maioria
dos casos, processos irreversíveis de degradação do mundo
físico.” (FURTADO, 1974, p. 19). Danos muitas vezes irre-
paráveis e que causam impactos muitas vezes devastadores
ao meio ambiente. Impedindo que pequenas culturas possam
ser impulsionadas e tenham o seu desenvolvimento possibi-
litado. Demonstrando que existe um pilar inegociável entre
educação, meio ambiente e desenvolvimento.

3 Metodologia

Trata-se de um relato de experiência acerca do processo


de orientação junto às equipes do Desafio Celso Furtado.
Treze equipes foram orientadas6, entre novembro de 2020
e abril de 2021, através de encontros remotos. As temáticas
orientadas encontram-se distribuídas no Quadro 1.

Quadro 01 - Projetos orientados


Título Objetivo Geral
Aplicar o Projeto de Capacitação Empreen-
Aplicação do Procel no muni-
dedora Local – PROCEL no bairro de Cama-
cípio de Cabedelo/PB
laú, em Cabedelo na Paraíba.

6 Nove equipes foram orientadas pela especialista Thaís Marculino e quatro


equipes foram orientadas pela especialista Rafaela Dias.

121
Título Objetivo Geral
Elaboração e divulgação de podcast relatan-
Por um mundo melhor: Cons- do o problema com enchentes na comunida-
truindo o amanhã de local, buscando posicionamento e solução
do poder público.
Conscientização e orientação acerca da for-
Pegada sustentável ma correta do descarte dos resíduos sólidos
em uma feira local.
Promover o bem-estar e o (re) conhecimen-
O (re)inventar da instância to da identidade cultural para a comunidade
cultural: construindo sonhos Curralense de Cima a partir do entreteni-
no processo de resgate dos mento de forma inclusiva, por meio de saraus
costumes com os artistas regionais, incluído quermesse
com barracas de artesãos e de brechós.
Podcast Boqueirão 2030: a
Pôr em evidência pessoas que já contribuem
valorização de personalidades
para a melhoria e o desenvolvimento socioe-
que contribuem para o desen-
conômico, cultural, da região.
volvimento da cidade
Despertar nos alunos a curiosidade em re-
lação à realidade sobre a inclusão de alguns
Perspectiva de interação so-
alunos na escola e estimular o olhar deles
cioambiental visando a inclu-
para os problemas por diferentes perspecti-
são para todos e a progressão
vas e referenciais promovendo diálogos e tro-
ao futuro.
cas com vários atores na própria escola e na
comunidade.
Espaço para utopia em prol Criar um jogo sobre a vida e as contribuições
de um mundo mais justo de Celso Furtado
Realizar ações educativas e informativas que
Um semiárido possível melhore a vivência do homem com o semiá-
rido
Conhecer a vida e a obra de Celso Furtado
Os pensadores do saber e a sua contribuição para a sociedade nor-
destina
Aplicar minicursos sobre o manejo do solo,
Uso e ocupação do solo para utilização de água e práticas agrícolas aos
agricultura orgânica no Ma- agricultores localizados às margens do ma-
nancial de patos nancial da Barragem da Farinha, localizado
no município de Patos-PB.
Conscientizar os alunos da ECI Orlando Ve-
nâncio dos Santos e a comunidade sobre a
importância do plantio de árvores nativas
Árvores da minha terra
na zona urbana, buscando a preservação do
meio ambiente e a melhoria da qualidade de
vida da comunidade.

122
Título Objetivo Geral
Dispor de estratégias e decisões para conce-
Independência das mulheres der uma visão de progresso no processo pro-
na produção orgânica: deci- dutivo da Associação Comunitária de Mulhe-
sões e Estratégias res da Agricultura Familiar em Quixaba Picuí
e região.
Compreender as limitações, potencialidades e
necessidades impostas à região do nordeste, a
Automatização na Agricultura
fim de propor estratégias sustentáveis, para
do Semiárido
automatizar a agricultura no semiárido de
maneira sustentável e acessível

Fonte: Elaboração própria (2021)

As principais atividades realizadas ao longo do processo


de orientação foram:
a) sugestões/orientações para a construção do referen-
cial teórico;
b) fórum de dúvidas junto aos alunos e professores em
relação ao pensamento furtadiano;
c) fórum de dúvidas em relação às normas técni-
cas e padrão científico voltado para a produção
acadêmica;
d) orientações para o enquadramento do projeto as
normas do Programa;
e) orientações metodológicas, especialmente para
aprimoramento e domínio da metodologia design
thinking indicada via edital do programa;
f) orientação para desenvolvimento da fase da
prototipagem;
g) correção e revisão dos trabalhos escritos, exigi-
dos no edital do programa, a saber: Projeto de
Implementação e Minuta-relatório de ações.

Além dos encontros remotos via plataforma Meet,


as equipes também foram acompanhadas via e-mail e
WhatsApp. O método qualitativo utilizado para a construção

123
dos resultados pertinentes a este trabalho foi a observação
participante7, a partir da vivência do processo de orientação
enquanto especialistas, associado às falas e expressões dos
alunos e professores integrantes das equipes orientadas.

4 Resultados e Discussões

Ao longo do processo de orientação e experiência


vivida junto às equipes, do Desafio Celso Furtado, alguns
entraves foram observados e muitas vezes dificultaram o
progresso das equipes, e o objetivo desta seção não é ape-
nas identificar os problemas, mas, contribuir de certa forma,
para que os mesmos não venham a se repetir. Seja elimi-
nando ou criando maneiras para serem mitigados conforme
o avanço do programa. Assim como, o objetivo dessa seção
também é pontuar aspectos positivos que validam a ideia do
Desafio Celso Furtado e destacam a importância dele para
a educação.
O quadro 02 expõe os principais aspectos positivos e
os desafios enfrentados pelas equipes ao longo do desen-
volvimento da etapa de mentoria com os especialistas do
programa. O quadro 02 foi elaborado a partir de uma pers-
pectiva de similitude, ou seja, o intuito foi correlacionar os
desafios enfrentados aos pontos positivos apreciados, bus-
cando identificar a analogia entre os aspectos observados e
extrair os principais resultados e análises proporcionados
pela vivência profissional enquanto especialista do Desafio
Celso Furtado.

7 Vide Gil (2008).

124
Quadro 02 – Desafios e pontos positivos observados

DESAFIOS POSITIVOS
A surpresa de vários alunos em não Trazer para o debate a história e o
conhecerem Celso Furtado. Como pensamento de Celso Furtado, essen-
uma personalidade tão importante, cial para a compreensão do processo
também para a dinâmica regional, de formação econômica do Brasil e a
aliado ao fato de ser paraibano não questão desenvolvimento/subdesen-
era conhecida pelos alunos. volvimento.
O programa proporciona uma liga-
ção entre o ensino básico e o ensino
A dificuldade com a escrita formal
superior, especialmente desenvolven-
(mesmo sendo um projeto técnico) e
do o potencial dos alunos concernen-
o desenvolvimento de uma pesquisa/
te à pesquisa e extensão. Os alunos
extensão de cunho mais científico.
irão chegar no ensino superior mais
preparados.
Entusiasmo por parte dos alunos com
Não ter real dimensão e o controle do o desenvolvimento do projeto. A pro-
envolvimento de todos os alunos in- moção do espírito de competição e
tegrantes no desenvolvimento do pro- com isso a extração do potencial de
jeto, especialmente pelo fato de todos criatividade e mobilidade para a rea-
estarem trabalhando remotamente. lização do projeto (mesmo em tempo
de isolamento social).
Dificuldade em desenvolver o pen-
samento teórico acerca de Furtado e
fazer o link com os ODS e o desenvol- Dedicação dos alunos em promover
vimento da ideia do projeto, associa- ações que contribuíssem para uma
do a dificuldade em projetar as reais melhoria local beneficiando sua co-
condições para a implementação do munidade.
projeto (especialmente na parte finan-
ceira e de recursos necessários).
Oportunidade para ampliação de sa-
Dificuldade em desenvolver a proto-
beres e conhecimento, promovendo o
tipagem, bem como a dificuldade em
desenvolvimento de competências e
desenvolver um bom pitch.
habilidades.
Fonte: Elaboração própria (2021).

A partir da observação dos aspectos acima citados e


compreendendo que a construção do saber é um processo
que acontece a partir do empenho de vários personagens,

125
envolvidos direta ou indiretamente com a temática que está
sendo analisada. Entende-se que todos os esforços são neces-
sários para que a disseminação do conhecimento aconteça,
no entanto, não se pode esquecer que durante esse percurso
alguns embargos podem acontecer.
A dimensão da problemática não está em encontrar ou
nomear as questões que interferiram e muitas vezes dificul-
taram a disseminação do conhecimento, mas, a partir do
momento que as arestas são identificadas, faz-se necessário
que atitudes sejam tomadas para que esses problemas sejam
cada vez mais mitigados.
Um dos desafios que salta aos olhos, é o relato expresso
por professores e por vezes alunos acerca do não conheci-
mento sobre quem é Celso Furtado, e como um economista
de tão grande relevância, inclusive internacional, não era
conhecido pelos mesmos, sendo também nascido no estado
da Paraíba. A partir de então, como desenvolver com exce-
lência um projeto de pesquisa/extensão no qual, um dos
principais teóricos, requerido para a elaboração da análise,
não era conhecido, nem tampouco seus estudos?
O que apresentou-se como desafio de imediato trans-
formou-se em oportunidade, e nesse ínterim soou como
ponto positivo. Neste ensejo, é importante destacar a rele-
vância da ideia de trazer para os alunos do ensino básico, o
acesso à história e aos estudos de Celso Furtado, uma per-
sonalidade importante para a região Nordeste, bem como
para a Paraíba. O economista trouxe em sua pauta debates
importantes que são referenciais quando se fala por exem-
plo, em desenvolvimento, seja no âmbito regional, nacional
ou internacional.
Tal resultado, evidencia a necessidade de ampliar e esti-
mular ao longo do processo educacional, o conhecimento
acerca de personalidades locais, que promovem o pensar

126
sobre a região Nordeste e que essencialmente buscam contri-
buir com o processo de desenvolvimento dessa região.
Ademais, esse contexto valida os ideais furtadianos e
assim como o economista propôs em suas discussões, con-
tribui para o desenvolvimento local pois, sabe-se que a
educação ganha amplo espaço nos escritos de Celso Furtado,
e para o economista, a mesma, está intrínseca aos aspectos
desenvolvimentistas.
O envolvimento dos alunos, a curiosidade para saber
mais sobre o Economista, foi fundamental para que a inte-
ração professor e aluno acontecesse, entendendo que o
especialista estava no campo de assessoria e ainda assim,
estava interligado com a construção do projeto, podendo
acompanhar de perto o desenrolar das equipes, observando
o empenho dos mesmos.
A observação do quadro 2 ainda revela arestas como a
dificuldade com a escrita formal (mesmo sendo um projeto
técnico), dificuldade em desenvolver o pensamento teórico/
científico acerca de Furtado e fazer o link com os ODS e
com o próprio desenvolvimento da ideia do projeto. Soma-se
a isso, dificuldades com o desenvolvimento técnico do pro-
jeto, como por exemplo: qual o público-alvo a ser atingido?
Quais os recursos financeiros necessários para a implemen-
tação do projeto? Qual será a fonte financiadora? Qual é a
rede de apoio necessária para que o projeto se consolide?
Quais os recursos materiais necessários para o desenvolvi-
mento do projeto? Como/quando/onde divulgar? O que é
a prototipagem e como desenvolvê-la? O que é um pitch e
como desenvolvê-lo? Dentre outras questões.
Estes foram significativos desafios observados durante o
atendimento às equipes, e isso de certa forma comprometeu
o desempenho de algumas equipes que tiveram que com-
preender aspectos de escritas e da relação do pensamento

127
de Celso Furtado e dos ODS, em um tempo não tão longo,
implicando, de modo subjetivo, na escrita do trabalho e
consequentemente no desempenho das equipes ao longo
das duas etapas do Desafio. Em outras palavras, as equipes
apresentaram em linhas gerais, boas ideias que visavam aten-
der alguma necessidade da comunidade local, mas tiveram
grandes dificuldades em colocar de forma técnica, científica
e até mesmo factível, tais ideias no papel, mesmo diante do
acompanhamento e assessoria dos especialistas.
Uma possível resposta indutiva a esse resultado, pode
residir inicialmente no fato da pouca familiaridade e habi-
lidade inerente a elaboração de um projeto aos moldes
requeridos pelo Desafio por parte dos alunos do ensino
básico, associado ao fato da questão temporal, ou seja, as
equipes tiveram um tempo relativamente curto para desen-
volverem uma pesquisa científica sobre os estudos de Celso
Furtado e correlacionar aos ODS e aos objetivos do próprio
projeto, de modo que, fazer todo esse processo de ligação,
em si mesmo, já apresenta-se como sendo, um grande desafio
para os alunos e professores integrantes das equipes. Além
disso, as equipes necessitaram aprender como elaborar um
projeto eficiente e eficaz que, caso fosse um dos vencedores
do programa, seria executado junto à comunidade.
Assim, mesmo diante do aspecto positivo por vezes
relatado pelos professores e alunos com o entusiasmo dos
mesmos, voltado para o desenvolvimento do projeto e com
isso, a promoção do espírito de competição e esforço para
mobilizar a realização do projeto, bem como, a busca pelo
beneficiamento a comunidade local, observa-se que de modo
geral, as equipes enfrentaram os problemas anteriormente
observados, umas em maior, outras em menor grau.
É válido acrescentar a essa análise, outro fator contri-
butivo para a observação desse cenário e que também foi

128
bastante relatado pelos professores mentores dos proje-
tos, o qual está relacionado a ausência da real dimensão e
o controle do envolvimento de todos os alunos integrantes
no desenvolvimento do projeto, especialmente pelo fato de
todos estarem trabalhando remotamente.
Em meio aos desafios mencionados, emergiu a opor-
tunidade enquanto aspecto positivo para que os alunos e
professores da educação básica ampliassem saberes e conhe-
cimento, promovendo o desenvolvimento de competências e
habilidades. Assim, em meios as dificuldades para desenvol-
verem por exemplo, a prototipagem do projeto, observou-se
a evolução das equipes, que por sua vez, conseguiram avan-
çar no processo de ensino-aprendizagem. Como exemplo
prático dessa realidade, observa-se que das treze equipes
aqui assessoradas, duas avançaram para a etapa estadual,
ficando entre os dezessete finalistas do Desafio, em meio a
212 equipes inscritas na maratona.
Por fim, um dos principais resultados observados atra-
vés da experiência profissional de orientação, foi a imensa
contribuição que o programa proporcionou para que hou-
vesse uma ligação entre o ensino básico e o ensino superior,
especialmente desenvolvendo o potencial dos alunos concer-
nente a pesquisa e extensão, de modo que, os alunos terão a
oportunidade de ingressar no ensino superior estando fami-
liarizados com a didática de pesquisa e extensão comum a
esse estágio de ensino.
De acordo com a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de
1996, a qual estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional, em seu art. 22. afirma que, a educação básica tem
por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a for-
mação comum indispensável para o exercício da cidadania e
fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos
posteriores.

129
No entanto, é notório que ao adentrar no ensino supe-
rior o estudante da educação básica depara-se com uma série
de desafios, que envolve atividades relacionadas a tríade do
ensino, da pesquisa e da extensão, inerentes a essa etapa de
ensino. Assim, através da observação participante e relatos
dos professores e alunos, o Desafio Celso Furtado aspira um
caráter inovador mediante as políticas públicas educacionais
do Estado, não apenas pela sua formatação, mas essen-
cialmente por proporcionar ainda durante o ensino básico
vivências de pesquisa e extensão similares aos praticados ao
longo do ensino superior.
Todavia, cabe ressaltar que os resultados apontam para
a necessidade de ampliar ainda mais a relação ensino de
pesquisa e extensão e o ensino básico, compreendendo que
tal relação, impulsiona nos alunos e também professores,
a necessidade de investir em leituras mais complexas e que
despertem ainda mais o senso crítico investigativo.
Assim, a partir da compreensão da análise de Celso
Furtado, é patente que não é possível discutir sobre políticas
públicas educacionais distantes do debate da construção de
um projeto nacional de desenvolvimento. Como já mencio-
nado, para Furtado a educação gera a promoção da qualidade
do fator humano, e para o teórico o desenvolvimento socioe-
conômico passa necessariamente pelo desenvolvimento do
homem.
Vale ressaltar, que a dimensão ambiental, foi algo muito
presente nos projetos, além de estar inserida nos ODS, e em
seus escritos, Celso Furtado apontava para as implicações
que o crescimento desordenado poderia trazer para o meio
ambiente e a importância de construir um desenvolvimento
que levasse em consideração essa dimensão.
Partindo dessa perspectiva, “[...] não há dúvida alguma
de que toda a nossa civilização é predatória, que ela vive de

130
destruir o planeta. Se deixarmos que continue o atual pro-
cesso civilizatório, o planeta se destrói.” (FURTADO, 2007,
p. 57). Mais do que uma reflexão teórica a proposta é eviden-
ciar que a importância dos estudos que envolvem as análises
realizadas por Celso Furtado, não se limitam ao espectro do
desenvolvimento, insere-se em todas as esferas que causam
um impacto direto ao processo de desenvolvimento e que
devem ser estudadas e analisadas para que no caminho que
envolve o desenvolvimento econômico, o aspecto sustentável
seja incorporado e vivenciado, culminando em um desenvol-
vimento sustentável.

5 Considerações Finais

Como já mensurado, o presente trabalho teve por obje-


tivo expor a experiência vivenciada ao longo do processo
de orientação junto às equipes do Desafio Celso Furtado,
evidenciando a importância do processo de ensino apren-
dizagem para o desenvolvimento acadêmico dos alunos do
ensino básico.
Nesse sentido, observou-se que para além da consoli-
dação do pensamento de Celso Furtado e da Agenda 2030,
o Desafio Celso Furtado, proporcionou aos alunos da rede
básica do Estado da Paraíba, a possibilidade de desenvol-
verem novas competências e habilidades, ao envolver os
estudantes em pesquisas e projetos de extensão que abrangem
a comunidade escolar dentro do um contexto da pesquisa
científica. Ampliando a geração de conhecimento, bem-estar
social e ofertando condições para que os alunos adentrem ao
ensino superior mais preparados com a realidade dessa etapa
de ensino. Adicionalmente o Desafio estimulou o espírito
empreendedor e inovador, tendo em vista que, os estudantes
desenvolveram projetos para beneficiar a comunidade local.

131
Diante disso, evidenciou-se a importância do Desafio
Celso Furtado para impulsionar aspectos do desenvolvimento
local, estimulando os alunos e professores a identificarem os
problemas e as dificuldades da sua região de estudo e ana-
lisando meios para solucionar esses problemas, seja através
de projetos que tratem de aspectos práticos, ou projetos que
capacitem a população para atuar em algumas demandas
da região. E a partir da perspectiva furtadiana observou-
se que o investimento em educação que vise a melhoria do
fator humano em verdade, é fator essencial e contributivo
para a promoção de estratégias de desenvolvimento para a
sociedade.
Por fim, sugere-se que os resultados aqui apresentados
sejam alinhados às perspectivas de orientação dos demais
especialistas, bem como, as perspectivas dos alunos e profes-
sores da educação básica integrantes das equipes que venham
a participar das próximas edições da Maratona, para que
se possa ampliar o debate e consolidar ou mesmo refutar
as análises aqui expostas, a fim de proporcionar resultados
mais robustos que possam contribuir com o progresso das
futuras edições do Desafio.

Referências

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,


LDB. 9394/1996.

FREIRE, P. Educação e Mudança. 11. ed. Rio de Janeiro: Paz


e Terra, 1983

FURTADO, C. O mito do desenvolvimento econômico. Rio


de Janeiro: Paz e Terra, 1974.

132
FURTADO, C. O longo amanhecer: reflexões sobre e forma-
ção do Brasil. 2ª ed., Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999.

FURTADO, C. Introdução ao desenvolvimento: enfoque his-


tórico-estrutural. 3. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000a.
126p.

FURTADO, C. Reflexões sobre a crise brasileira. In: Revista


de Economia Política, 20 (4): 23-7, out./dez, 2000.

FURTADO, C. Em busca de novo modelo: reflexões sobre a


crise contemporânea. 2 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.

FURTADO, C. Foto de uma conversa. Paris: 1991. In:


BUARQUE, Cristovam. Entrevista

concedida a Cristovam Buarque. São Paulo: Paz e Terra,


2007.

GIL, A. C. Método e Técnicas de Pesquisa Social. 6.ed. São


Paulo: Atlas, 2008.

SCHULTZ, T. O valor econômico da educação. Rio de


Janeiro: Zahar, 1967.

133
Relato de Experiência: uma imersão como
especialistas e pesquisadores voluntários
do Desafio Celso Furtado em 2020

Alexandre Silva de Lima8


Marayza Alves Medeiros9

1 Introdução

“Ninguém ignora tudo. Ninguém sabe tudo.


Todos nós sabemos alguma coisa. Todos nós
ignoramos alguma coisa. Por isso aprendemos
sempre”.
(Paulo Freire)

A noção de Desenvolvimento para Celso Furtado


estava além de questões meramente econômicas, pois pau-
tava-se na defesa do papel estratégico do Estado, capaz de
promover reformas que possibilitem a distribuição de renda
e a redução das disparidades sociais, mas também a trans-
formação cultural no sentido de superar a submissão e a

8 Economista formado pela Universidade Federal de Campina Grande;


Mestrando em Desenvolvimento Regional pela Universidade Estadual da
Paraíba.
9 Advogada, bacharel em direito pela Unifacisa, Especialista em Processo
Cível pela Uninter e em Prática Judicante pela UEPB em parceria com
a Escola Superior da Magistratura da Paraíba. Mestranda vinculada aos
Pós Graduação em Desenvolvimento Regional (UEPB) e Ciência Politica
(UFCG). E-mail: [email protected] ORCID: https://orcid.
org/0000-0001-7752-5030

135
reprodução de padrões importados de cultura, ou seja, supe-
rar aquilo que denominou de “desenvolvimento mimético”.
(BARBALHO, 2011, p. 108). O autor nunca foi tão atual em
seu pensamento.
O ano de 2020 – momento em que se celebra o cen-
tenário de Celso Furtado - foi o mais desafiador do século
XXI, enfrentamos uma pandemia que instabilizou as estru-
turas mundiais e ensinou uma nova forma de viver e agir
em sociedade. Estima-se que a crise sanitária provocada
pela COVID-19 tenha ceifado mais de 4 milhões de vidas, o
número ainda comporta subestimação, podendo ser duas ou
três vezes maior se considerarmos as mortes indiretas oca-
sionadas pela falta de acesso hospitalar e as decorrentes da
restrição de locomoção e trabalho.
Importa ainda ressaltar que os efeitos da pandemia
se estendem muito além do processo saúde-doença, rever-
berando no sistema socioeconômico uma das suas maiores
chagas, uma vez que diante o aprofundamento da crise capi-
talista houve uma ampliação das desigualdades sociais.
O impacto refletido em esfera global escancarou as
mazelas produzidas por este hegemônico modelo econô-
mico, e mais, distanciou de suas resoluções falaciosas. Neste
contexto, valiosos são os ensinamentos de Celso Furtado
para compreender o nosso papel como país subdesenvol-
vido, com formação específica, reproduzida na relação
centro-periferia.
Vivida uma crise econômica-sanitária há de se notar
a dificuldade do consumo individual e da produção. Suas
consequências são diversas: miséria, desemprego, inflação,
superexploração do trabalho, conflitos sociais, e tantas
outras. As instituições que deveriam solucionar as causas das
crises são tomadas pela política cultural, que Celso Furtado
criticava por serem facilitadores dos consumos de bens

136
culturais que inibem e impõem barreiras à produção cria-
tiva. Encravadas dentro do modelo do modo de produção
capitalista, suas conexões com a rede global de produção
inviabilizam possíveis saídas da periferia do sistema pautado
pelo capital. Em todo o enredo, os governos, empresas pri-
vadas e instituições de inovação pautam o consumo de bens
culturais.
Em contraponto, encontra-se uma considerável parcela
da sociedade que não tem acesso à cesta de produtos bási-
cos e sobrevivem no mundo da subsistência, em um abismo
socioeconômico que foi acentuado com as novas dinâmicas
mundiais impostas pela pandemia.
Neste cenário caótico, brevemente delineado, os ensina-
mentos de Celso Furtado tornam-se ainda mais atuais, pois
emerge a necessidade de superação, da criatividade na busca
da sobrevivência com os poucos recursos disponíveis e, prin-
cipalmente, a urgência de se pensar desenvolvimento sob a
óptica do combate às desigualdades.

2 Reflexões sobre o Desafio

O primeiro e mais importante dos resultados foi


observar a mobilização, engajamento e propostas dos estu-
dantes secundaristas da rede estadual da Paraíba ao Desafio
Celso Furtado: Os Ares do Mundo – Escola, Criatividade e
Desenvolvimento Regional.
O Desafio, que teve a finalidade de conduzir uma
homenagem a um grande pensador brasileiro, que conhece e
compreende o funcionamento do capitalismo do global para
o local, abre uma janela para que o jovem, na sua escola,
obtenha uma consciência crítica da realidade que o pos-
sibilite ser autor na construção de uma alternativa para o
território pertencente. A proposta ainda combina elementos

137
que colocam a centralidade da territorialização e suas espe-
cificidades dentro da dinâmica global.
A escola, pensada a partir da concepção de educação
integral, é o local mais propício para mitigação das desi-
gualdades, pois é um ponto de encontro entre trabalhador,
iniciativa privada, governo e instituições de pesquisas que
possibilitam a interação entre inovação e mercado para que
ocorra o desenvolvimento econômico. No entanto, as esco-
las da rede pública são ambientes que canalizam o contexto
mais profundo das consequências provocadas pela desigual-
dade social, defasagem, enfrentando problemáticas ligadas a
fome, violência doméstica, trabalho infantil, drogas, ausên-
cias e relações familiares conflituosas, entre outros.
Com o agravamento da pandemia essas desigualda-
des são intensificadas, o jovem se distancia do espaço físico
da escola, do seu convívio com a comunidade escolar e
tem interrompida a comunicação tradicional do desenvol-
vimento metodológico de ensino. Embora as atividades
educacionais tenham sido continuadas através do ensino em
modelo remoto, foi prejudicada a interação transformadora
entre educando e educador, além de prejudicar a mensura-
ção da defasagem do estudante em seu aspecto psicossocial
e educacional.
Neste sentido, observou-se que a proposta do desafio,
ainda que totalmente remota, possibilitou o fortalecimento
de laços, o desenvolvimento de atividades práticas, o senti-
mento de pertença das equipes em relação a sua escola e ao
território em que estão inseridos.
O segundo resultado observado – e que merece destaque
- foi que as propostas analisadas pelos autores tratavam-se
de projetos de formulação e implementação de micro políti-
cas públicas voltadas a comunidade escolar – com reflexos
para toda a sociedade – que enfrentavam as problemáticas
acima delineadas, como por exemplo: acesso ao alimento,

138
desperdício do consumo humano, coleta de águas das chuvas
para manutenção da escola, arborização como alternativa
para redução da sensação térmica, fontes alternativas de
energia, acesso à cultura, fomento do turismo para gera-
ção de renda local, e demais problemas ocasionados pela
pandemia.
Em exemplos práticos, podemos citar o projeto que
apresentou a ideia do cultivo de uma horta comunitária den-
tro da escola como mecanismo de conscientização daquela
comunidade e ação multiplicadora, para que a experiência
obtida na escola possa ser replicada pelos alunos em suas
residências. Outra proposta apresentou o cultivo alternativo
de piscicultura agregado à produção de hortaliças, com a
finalidade de otimizar os recursos hídricos, energéticos e de
produtividade da terra, que são escassos na região.
Foram apresentadas ainda propostas de coleta e esto-
cagem das águas pluviais para utilização na manutenção do
prédio e do jardim escolar; arborização do entorno escolar
– quadra em que estava localizada o prédio - para propor-
cionar uma redução da sensação térmica para os alunos e
pais que precisam se deslocar andando até a instituição, bem
como no interior das salas de aula.
Pautando a conscientização contra o desperdício, as
propostas de solução foram diversificadas. Um projeto
propôs o mapeamento dos pontos de coleta de materiais e
resíduos eletrônicos, na intenção de conscientizar acerca dos
danos causados pelo rejeito inadequado e como forma alter-
nativa de renda; o reaproveitamento de garrafas pet para
a confecção de telhados alternativos para as residências de
baixa renda instaladas aos arredores da escola; o reapro-
veitamento do lixo produzido na cidade, e principalmente
no entorno da comunidade escolar, para produzir o biogás
e alimentar fontes de empreendedorismo que consumam o
produto do projeto.

139
Observou-se também uma preocupação com os proble-
mas que surgiram com a crise sanitária, a exemplo do projeto
que, sensibilizado com a dificuldade dos alunos em relação
ao acesso à internet para acesso a sala de aula, propôs uma
cadeia solidária de acesso virtual para estes estudantes. O
Desafio, neste aspecto, suscitou emancipação, solidariedade,
sensação de pertencimento, empatia e conscientização.
O terceiro resultado observado foi a consistência teórica
técnica utilizada nos projetos analisados pelos autores deste
relato. Analisando os projetos, em um primeiro momento,
foi verificado pouca fundamentação teórica e prática que
relacionam a temática do trabalho o pensamento de Celso
Furtado, porém as nuances utilizadas demonstraram um
grande avanço para os estudantes secundaristas que não
possuíam conhecimento da obra furtadiana e das suas con-
tribuições para o desenvolvimento.
Quanto ao embasamento técnico dos projetos avalia-
dos, observou-se informações complexas e interligadas,
evidenciando que o Desafio Celso Furtado promoveu uma
rede de cooperação e engajamento entre docentes e discen-
tes. Neste contexto, podemos intuir que a nova realidade de
ensino remoto, que distancia fisicamente os alunos, também
possibilitou novas dinâmicas de participação e contribuição
de outros profissionais da escola no projeto.
Um exemplo disso foi percebido em um projeto vol-
tado a produção de biogás, em que embora os professores
mentores fossem formados em geografia e educação física, o
projeto apresentou fundamentações específicas da biologia
e da química importantes para a compreensão do trabalho,
além de demonstrar segurança técnica quanto a forma que o
biogás seria produzido e distribuído.
Aliado a este fato, os alunos trouxeram informações
domésticas e da comunidade que possibilitaram auferir a usa-
bilidade e viabilidade da fonte alternativa de energia. Logo,

140
restou claro a contribuição de outros profissionais além dos
envolvidos diretamente no projeto, e essa, sem dúvidas, foi
uma das maiores contribuições do desafio para a educação
paraibana.
Com esse resultado restou evidente que existe uma cole-
tividade que acredita na proposta e que, com parcerias e os
recursos adequados, poderiam desenvolver o projeto em sua
comunidade escolar.
Para que um projeto consiga sair da abstração para o
concreto é preciso ter uma compreensão do contexto que ele
está inserido, e de parcerias que o viabilizem. Fatores como
a inexperiência do alunado, a especialização dos professo-
res e o ambiente escolar, em alguns casos, são refletidos em
um projeto audacioso, custoso, que extrapola a competência
e extensão escolar, principalmente no tocante ao financia-
mento para execução das ideias. Não se quer dizer com isso
que a equipe seja inapta ou que o projeto é inexequível, ao
contrário, sinaliza a possibilidade de sua concretização e
demanda um estudo minucioso para adequação e identifica-
ção de estratégias viáveis.
Neste cenário, o pensamento do economista paraibano
– utilizado como instrumento de contextualização – deve nor-
tear as equipes concorrentes, levando-os a ter uma noção mais
profunda da importância de suas ações na realidade que estão
inseridos. Esta reflexão possibilitará uma crítica mais aguda e
fará com que o projeto tenha mais capilaridade na sociedade.

3 Considerações Finais

O Desafio Celso Furtado: Os ares do Mundo – Escola,


Criatividade e desenvolvimento regional, no ano de 2020, foi
mais do que exitoso, pois rompeu a barreira mais importante
e difícil quando se trata da educação pública brasileira: sair
da inércia.

141
Quando da seleção para especialistas do Desafio Celso
Furtado não aguardávamos um cenário tão desafiador e
encantador quanto encontramos, vivenciar a transformação
do pensamento dos indivíduos e contribuir para elaboração
de projeto de intervenção social é gratificante, uma experiên-
cia rica de conteúdo técnico, mas sobretudo humano.
Nós, os especialistas, pesquisadores das instituições
e do desenvolvimento, vislumbramos a materialização do
pensamento de Celso Furtado. Não criamos as ideias, aper-
feiçoamos, alinhamos com o que exigia o edital, e igualmente
nos apaixonamos pelas iniciativas.
Embora as condições sanitárias mundiais não tenham
permitido uma experiência de proximidade e imersão na
comunidade acadêmica de cada equipe – o que ocasionou
inibição de algumas equipes no encontro com o especialista
-, o Desafio Celso Furtado nos permitiu conhecer diversas
realidades sociais do Estado da Paraíba, compartilhar ideias,
pensamentos de mudança e sermos transformados pelo entu-
siasmo dos participantes, o que pontuamos como positivo.
A culminância do projeto pode ser considerada o ponto
alto, e a verdadeira contribuição social, pois levou os alunos a
se engajarem na vida acadêmica, estudar, pesquisar, escrever,
debater, pensar, executar suas ideias e produzir experiências
que certamente levarão para a vida.
Contudo, como todo projeto inovador e pioneiro, o
Desafio também apresentou alguns percalços no desenvol-
vimento dos trabalhos, sendo o maior deles a questão da
simplificação ou aproximação da relação do projeto desen-
volvido pelas equipes e a teoria de Celso Furtado.
Apesar do Desafio ter disponibilizado aos participantes
– por meio de cartilhas e lives - o aporte teórico para a com-
preensão mínima da obra furtadiana, essa é uma atividade
complexa para estudantes secundaristas que não possuem

142
uma proximidade com a temática devido a base curricular.
Este é um processo que demanda tempo e estudo um pouco
mais aprofundado, o que extrapola o lapso temporal de
execução da proposta. Neste ponto, sugerimos para as pró-
ximas edições do Desafio uma abordagem mais focada nas
trilhas do conhecimento, com indicação de textos com uma
linguagem mais acessível e voltada à realidade prática dos
acadêmicos.
De igual forma, sugere-se que seja incluído uma recicla-
gem rápida relacionada a metodologia da pesquisa para os
professores mentores, já que muitos dos projetos analisados
– embora tenham sido disponibilizados modelos - possuíam
inconsistências em relação à adequação às normas científicas
de escrita dos trabalhos acadêmicos, a exemplo da delimi-
tação da temática, elaboração dos objetivos e formatação
nas normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas
(ABNT). Em conclusão podemos ressaltar que as falhas iden-
tificadas não diminuem a grandiosidade de um projeto que
pode ser ainda mais imponente, espera-se que essa pequena
partícula exploda numa condição que leve a criação de inú-
meros projetos que venham contribuir para a sociedade e
mudar a vida dos cidadãos paraibanos.
A experiência nos ensinou que quando se tem vontade
política e se dá os meios necessários para o desenvolvi-
mento individual, grandes feitos surgem. A desigualdade só
será erradicada quando, verdadeiramente, os indivíduos
conquistarem a isonomia de condições e oportunidades. A
educação é libertadora e um caminho seguro para mudança
de perspectiva.
Muito se tem a avançar, a chama da inquietação e trans-
formação foi acesa, novos desafios foram lançados e com
eles novas propostas de intervenções viáveis e transformado-
ras. Com isso, esperamos que os resultados obtidos possam

143
ser levados em consideração no desenvolvimento de políticas
públicas regionais que visem a mitigação das desigualdades,
a emancipação dos indivíduos com condições dignas de
sobrevivência e meios alternativos de geração de renda.
Parabéns aos envolvidos, e para o desafio Celso Furtado:
os ares do mundo - escola, criatividade e desenvolvimento
regional, vida longa!

Referências

BARBALHO, Alexandre. A política cultural segundo Celso


Furtado. In: Cultura e desenvolvimento: perspectivas políti-
cas e econômicas. Salvador: edufba, 2011.

144
145
Equipe: TPN em ação

Mentores
Gerfferson Fernandes Linhares
Marcos Sérgio dos Santos

Alunos (as)
Martinho Mendes Gomes Neto
Gildimar Gomes Caetano
Rebeca Leandro de Lima
Hérica Araújo Ferreira

147
Projeto: Engenheiro Arcoverde:
um potencial a serviço de Condado

O projeto possui a finalidade de levar a abordagem da


perspectiva do potencial produtivo para que ocorra o ali-
nhamento da sustentabilidade, juntamente com as ideias de
Celso Furtado e a Agenda 2030 da ONU. De início, faz-se
necessário uma imersão nas temáticas que englobam a trilha
de conhecimento da qual faz parte – Bem-estar socioam-
biental, para clarificar a discussão para a realização desse
projeto. Desta forma, o projeto se destaca ao visar o bem
-estar socioambiental em atividades para vivência, moradia,
inclusão e interação da população que vive nas proximida-
des do Açude Engenheiro Arcoverde, localizado na cidade de
Condado - PB. Objetiva-se a análise às potencialidades do
açude, como fonte de desenvolvimento para a cidade de con-
dado e região na esfera econômica, turística e rural. Dentre
os pontos trabalhados é destacado o aumento de potenciali-
zação turística, o aumento da pesca esportiva e artesanal e a
necessidade de implementar o uso de novas técnicas de irri-
gação e cultivo ofertadas aos agricultores, além de indicar de
forma sucinta os principais objetivos a serem atendidos pelo
Projeto. Este projeto deve ocorrer de forma conscientizadora
e prática, na busca de formar uma ação colaborativa com o
poder público para criar ações exclusivas para cada área do
desenvolvimento regional. Durante a visita in loco, a equipe
cadastral dos dados relata uma ausência de fiscalização e de
investimento para os recursos que o açude fornece. Ao longo
da execução do projeto, foi analisado o uso inadequado dos
recursos naturais do açude, sendo assim, a extensão do açude
Engenheiro Arcoverde está proibida a comunidade, fazendo

148
com que só a CAGEPA tenha acesso a água, para que seja
feito o abastecimento da cidade. Outro assunto que abrange
as discussões são as construções às margens do açude, que
deveria ser uma área dedicada aos pescadores para os cultivos
de tanques, para fornecer fonte de renda para determinados
trabalhadores. Com a realização deste projeto, pretende-se
promover uma conscientização da comunidade, com outros
aspectos importantes como a existência de uma fábrica para
implementar o beneficiamento de todo o pescado do açude,
produzindo também criadores artificiais para dar sustenta-
ção a demanda da fábrica, além da ocorrência de um resgate
do aproveitamento do sistema de irrigação, assim, utilizando
novas técnicas para o acompanhamento agrícola sustentável
e a implantação de fábrica responsável para a fabricação de
polpas de frutas, contribuindo para a geração de outra fonte
de renda sustentável.
Palavras-Chaves: Sustentabilidade; Recursos Naturais;
Desenvolvimento.

149
Equipe: Bem viver

Mentores (a)
Albertina de Farias Silva

Alunos (a)
Ezequiel Beserra Dos Santos
Kenia Hellen Pereira Costa
Lucas Farias Andrade

151
Projeto: Fábrica de Água Doce

O projeto” Fábrica de água Doce” nasceu em rodas de


conversa dos integrantes da equipe Bem viver, na qual dis-
cutimos sobre as principais problemáticas do município de
Cabaceiras. A partir de então, ficou consensuado abordar a
questão do acesso à água potável nas comunidades rurais
do município. Percebemos que grande parte do abasteci-
mento de água das famílias vem de água de poços artesianos,
ou seja, água subterrânea. No entanto, a qualidade não é
adequada ao consumo devido a grande quantidade de sais
contidos na água. Percebemos também que o poder público
tem trabalhado para mitigar os problemas, instalando des-
salinazadores nas comunidades rurais, ainda assim, essa
água não chega a todas as famílias. Diante disso, o projeto
Fábrica de água doce tem por objetivo construir uma uni-
dade demonstrativa para dessalinizar água por destilação
solar, transformando água salobra em água potável para
as famílias residentes em comunidades rurais do município
de Cabaceiras - PB. O dessalinizador visa assegurar a quali-
dade da água usada para o consumo das famílias, promover
a segurança hídrica e desenvolver soluções de convivência
com seca, que sejam sustentáveis e que melhore a autoestima
e qualidade de vida das famílias. O projeto tem as seguintes
etapas: 1. Levantamento bibliográfico: nesta etapa toda a
equipe irá pesquisar sobre as diversas tecnologias de dessali-
nização, tipos de coletores solares já existentes e que foram
bem sucedidas. 2. Brainstorming: contemplará a decisão
dos materiais a serem usados no projeto, que deverão ser de
baixo custo, resistente ao calor, durável, de fácil aquisição
local. 3. Instalação do modelo: esta última fase consistirá na

152
implantação do modelo em uma das residências de nossos
estudantes participantes. As pesquisas realizadas, baseadas
em equipamentos já instalados demonstraram que o des-
salinizador solar apresenta viabilidade para utilização na
dessalinização da água salobra da zona rural do município
de Cabaceiras – PB, tanto do ponto de vista da qualidade,
como demonstrado nas análises realizadas, quanto da efi-
ciência média do sistema. É uma tecnologia acessível porque
utiliza materiais comuns, de fácil aquisição e grande durabi-
lidade, além de ser socialmente viável para as populações de
baixa renda do semiárido nordestino, em que as condições
climáticas e de solo atrapalham o acesso e disponibilidade de
água doce de boa qualidade, como é o caso de Cabaceiras.
Como resultado pretendido com implantação desse projeto,
cada família terá sua própria “fábrica” de água doce, garan-
tindo o acesso à água potável, a segurança hídrica familiar e
desenvolvendo soluções sustentáveis e eficazes para a convi-
vência com a seca, nessa região que apresenta menor índice
pluviométrico do país.
Palavras-Chaves: Dessalinizador solar, Cabaceiras, Água
potável.

153
Equipe: Os Sapiens

Mentores
Damião Raniere Queiroz
Paulo Deyvity Rodrigues

Alunos (as)
Arley Vieira Silva
Fabrício do Nascimento Araújo
Gilliard Duarte da Silva
Igor do Nascimento Silva
Mikael Firmino de Araújo
Thaissa Andrade do Nascimento

155
Projeto: Teorema de Pascal aplicado em
Modelos Compactos e sustentáveis de
Aquaponia e Carneiro Hidráulico para
produtores e consumidores de Lagoa Seca

O município de Lagoa Seca na Paraíba possui uma pro-


missora atividade agrícola, especialmente de hortaliças e
fruteiras, movimentando o comércio local. Neste sentido,
a aplicação de uma agricultura sustentável, atrelada a uma
autonomia na produção, garantem o desenvolvimento e a
sustentabilidade para o município, pois a produção de ali-
mento é uma das maneiras de reduzir a fome e garantir a
segurança alimentar, tanto para áreas de produção comer-
cial, rural, quanto para subsistência, possível também em
área urbanas, associadas a pequenos espaços, tais como jar-
dins, alpendres e varandas. Assim, este projeto faz parte da
trilha Desenvolvimento Regional Sustentável, e tem como
objetivo produzir um protótipo compacto e sustentável de
aquaponia e carneiro hidráulico, fundamentado no pensa-
mento de desenvolvimento regional de Celso Furtado, que
posteriormente, seria precursor para as ideias de desenvol-
vimento sustentável, a moradores da área urbana e rural de
Lagoa Seca, permitindo terem um alimento saudável e uma
renda extra, assim como a aplicação dos fundamentos da
Matemática, Física, Química e Biologia a esse protótipo. O
projeto foi desenvolvido na Escola Cidadã Integral Técnica
Francisca Martiniano da Rocha em Lagoa Seca - Paraíba.
O projeto está de acordo com as características locais,
tais como: produção de hortaliças, leguminosas e a pis-
cicultura. Está relacionado com a Agenda 2030, por meio

156
dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Os
envolvidos são: a comunidade escolar, os produtores e con-
sumidores locais. Foi realizado o aprofundamento nas obras
de Celso Furtado, através de reuniões e atividades desenvol-
vidas e propostas pelos professores, além de debates para
analisar o desenvolvimento da cidade de Lagoa Seca, na
visão de Celso Furtado. Em seguida, foi realizada uma pes-
quisa através da plataforma IBGE CIDADES, para analisar
os dados agrícolas na cidade de Lagoa Seca. Para interagir
com a comunidade foi confeccionado um cartaz que ilus-
trava situações do cotidiano vivenciado na cidade. O cartaz
funcionou como um Brainstorming, técnica utilizada para
memorização e estudos, que consiste em relacionar pala-
vras e imagens para identificar determinado conteúdo. Foi
disponibilizado um questionário no Google forms, nele foi
solicitado a localização (rural ou urbana), e possuía uma
imagem, com uma pergunta que deveria ser respondida com
uma única palavra, “O que é possível observar nessa ima-
gem?”. Após a obtenção dos dados foi efetuada a filtragem
das palavras por meio do software Wordclouds, o qual pro-
duziu uma nuvem de palavras. Em seguida, foi construído
um protótipo para aquaponia compacto e carneiro hidráu-
lico. Para a integração entre a escola e a comunidade foram
apresentados os protótipos via Google Meet para represen-
tantes da Agência Executiva de Gestão das Águas (AESA),
do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência
(PIBID) de química da Universidade Estadual da Paraíba
(UEPB), da comunidade estudantil e a Empresa Paraibana
de Pesquisa, Extensão Rural e Regularização Fundiária
(EMPAER). Foi realizada uma visita a empresa Hortaliças
Sempre Verde, produtora nacional de hortaliças, para obter
informações a respeito da demanda de produção e da
cadeia produtiva. Desta forma, as ideias de Furtado foram

157
apresentadas à comunidade, os protótipos colaboram para o
Desenvolvimento Regional Sustentável de Lagoa Seca, sendo
modelos práticos e teóricos para explicar os princípios da
Física, Matemática, Química e Biologia. Atualmente, os pro-
tótipos se encontram no processo de melhoria, tanto estética,
quanto funcional, com o objetivo de torná-los mais eficientes
e estéticamente mais atrativos, sem perder seu design sim-
plista e econômico. A equipe se encontra orientando novos
integrantes para o Programa Celso Furtado 2021, apro-
fundando nas Obras de Celso Furtado e na Agenda 2030,
realizando lives sobre assuntos educacionais, tais como a
metodologia STEM (Science, Technology, Engineering and
Mathematics) / STEAM (Science, Technology, Engineering
Arts and Mathematics) as ODS e o método científico
hipotético-dedutivo.
Palavras-Chaves: Desenvolvimento regional, Agricultura e
Inovação.

158
Equipe: HL Sustentável

Mentores (as)
Profª Drª. Geórgia Cristina de Sousa Oliveira
Prof. M.Sc. Joaldo Bezerra de Melo

Alunos (as)
Ana Lyvia da Silva Matias
Bianca Souto Granjeiro
Érika Carla de Sousa Silva
Jeslane Braz do Nascimento Santana
Kelvyn Pereira Gurgel

159
Biodigestores nos Centros Urbanos: uma
tecnologia, vários benefícios

Este projeto tem como problemática a destinação inade-


quada da matéria orgânica, bem como seu desperdício. De
acordo com a Lei Federal n°12.305/2010, para o aterro sani-
tário deveria ser destinado apenas o rejeito. Mas, segundo
dados do IPEA (2017), a matéria orgânica compõe 57,41%
dos resíduos sólidos diários depositados em aterros no Brasil.
Diante disso, observou-se que em Campina Grande-PB é des-
cartado 400 toneladas/dia de resíduos sólidos, sendo 232.000
kg de matéria orgânica, capaz de gerar 3.248 m³ de biogás,
uma energia renovável e que pode ser acessível a todos, atra-
vés do uso de um biodigestor. Considerando os Objetivos
do Desenvolvimento Sustentável da trilha do conhecimento
2, Desenvolvimento Regional Sustentável, na qual o projeto
está inserido, no Programa Celso Furtado, observa-se que o
desenvolvimento de um biodigestor pode atender a todos os
objetivos propostos, além de representar o pensamento de
Celso Furtado (1974), de um desenvolvimento com menos
desperdício. Diante desta problemática, o principal objetivo
deste trabalho foi produzir um biodigestor para gerar biogás
com restos de matéria orgânica domiciliar. Para alcançar este
objetivo, foram considerados os seguintes objetivos específi-
cos: identificar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
2030 relacionados com a produção de um biodigestor, bem
como relacionar o uso do biodigestor ao pensamento de
Celso Furtado. Para alcançar os objetivos propostos, utili-
zou-se a metodologia design thinking. Essa metodologia foi
dividida em quatro fases, como disposto a seguir: Fase 1.
Compreensão do problema: De posse de vários problemas

160
socioeconômicos e/ou ambientais, considerou-se relevante
trabalhar a destinação inadequada da matéria orgânica do
município de Campina Grande – PB. Haja vista, com este
resíduo, ser possível gerar energia renovável (biogás) e bio-
fertilizante (adubo orgânico), subprodutos capazes de gerar
inúmeros benefícios para a população, além de reduzir o
volume disposto no aterro sanitário, economizando dinheiro
público, já que se paga para aterrar. Fase 2. Projeção de
Possíveis Soluções: Diante deste contexto, identificou-se
o biodigestor como a tecnologia ideal para o reaproveita-
mento da matéria orgânica, e após uma conversa com um
especialista, foram criados os primeiros esboços, utilizando-
se diferentes materiais e modelos, bem como elencados os
materiais necessários, entre eles: baldes, tubos e conexões.
Fase 3. Prototipagem: A partir dos esboços, foram criadas
plantas tridimensionais do modelo que apresentou a maior
viabilidade - fácil montagem e baixo custo, bem como, cons-
truído um protótipo para testagem, orçado em R $177,30.
Fase 4. Plano de implementação: Baseado em todas as etapas
desenvolvidas, foi construído um plano de implementação
para a construção de um biodigestor de grande porte, para
uso da comunidade escolar. De posse do biodigestor, e uti-
lizando restos de matéria – orgânica da cozinha realizou-se
os primeiros testes. Diante do orçamento, observou-se que
o valor total gasto com o biodigestor (R$177,30) é inferior
aos gastos com o gás de cozinha (GLP), já que este precisa
ser comprado mensalmente, o que torna o biodigestor um
produto mais acessível à população. Para comprovar a exis-
tência do biogás (gás metano), utilizou-se uma câmara de ar
conectada ao biodigestor. Ao pressioná-la, insuflando o ar ali
presente contra uma vela acesa, observou-se uma coloração
azul da chama, portanto, a presença do biogás. Diante disso,
notou-se que há viabilidade na produção de biogás, em

161
maior quantidade, com a construção futura de um biodiges-
tor de grande porte, que poderá gerar dados para cálculos de
custo – benefício e outras demandas científicas. Além disso,
esse resultado já indica que o biodigestor pode ser utilizado
como objeto pedagógico. Conforme os resultados de ques-
tionários aplicados na comunidade escolar, os Professores
indicaram diversos conteúdos que podem ser trabalhados
e confirmaram que a implantação de um biodigestor na
escola poderia melhorar a qualidade de vida da comunidade
(benefício social), reduziria impactos ambientais (benefício
ambiental), e geraria uma redução das despesas (benefício
econômico). Considerando os resultados preliminares deste
projeto, observou-se que o biodigestor atende na integrali-
dade os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da trilha
do conhecimento 2, com a geração de vários benefícios, entre
eles: reduzir o volume de matéria orgânica depositado nos
aterros; gerar um gás renovável; diminuir a poluição ambien-
tal; possibilitar a geração de biofertilizante e contribuir para
geração de renda e trabalho. Além disso, essa proposta
leva ao que Furtado (1974) sugere como nova orientação
do desenvolvimento: mais igualitária, coletiva e com menos
desperdício.
Palavras-Chaves: Biodigestor, matéria-orgânica

162
Equipe: Trilhando o caminho da sabedoria

Mentores (as)
Nataly Maria de Oliveira Souza
Jandira Ribeiro de Melo Ataide

Alunos (as)
Everton Silva do Nascimento
Joiciane da Silva Paulino
Larissa Kelly da Silva

163
Projeto: Propostas de melhoria
de condições dos Catadores de
Pedras de Fogo – PB

Este projeto fez parte do Desafio Celso Furtado, promovido


pelo Governo do Estado da Paraíba no ano de 2020, em
que se propôs o aprofundamento nas obras desse pensador
nas escolas da Rede Estadual de Ensino, a iniciativa se tor-
nou um programa, que conta atualmente com seis equipes
escolares desenvolvendo projetos de intervenção. O projeto
desenvolvido pela equipe Trilhando o caminho da Sabedoria
faz parte da trilha Instituições Eficazes. A principal moti-
vação para sua construção se deu pelo fato de que, viu-se
na comunidade, a qual a equipe faz parte, situações de desi-
gualdade social com catadores, despertando o interesse na
busca soluções, para gerar mais dignidade a essa parcela da
população. O projeto tem por objetivo propor melhorias no
manuseio e destino do lixo do município, visando a sustenta-
bilidade e melhores condições de trabalho para os catadores
de Pedras de Fogo – PB, para isso será necessário desenvol-
ver uma parceria entre a prefeitura, a escola e a associação
de catadores. O projeto está sendo desenvolvido em quatro
etapas, a primeira de cunho bibliográfico, em que pesquisou-
se sobre a vida de Celso Furtado e sobre os Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS), na segunda etapa foi
realizada entrevistas na Associação de catadores, a terceira e
quarta etapa foram iniciadas no ano de 2021 e seguirão até
o ano de 2022, em que busca-se principalmente abordar os
poderes executivos da cidade, formar parcerias com insti-
tuições de ensino superior e buscar melhorias na qualidade
de vida dos catadores. Diante disso, realizamos discussões a

164
respeito do pensamento de Celso Furtado, o mesmo defendia
uma globalização de maneira consciente, sem buscar uma
comparação com países desenvolvidos e subdesenvolvidos.
Celso também pensava além dos sociólogos e pesquisado-
res de sua época, no entanto, muito ainda tem que ser feito
para tirar do papel muitas de suas ideias, e o Brasil precisa
conhecer suas potencialidades a nível sustentável, antes de
desejar um crescimento puramente econômico, pois pode
gerar consequências desastrosas e irreversíveis para as gera-
ções futuras. Também discutimos sobre a Agenda 2030, em
que esta foi criada com seus 17 ODS para melhorar as con-
dições do mundo, no entanto ainda estamos muito longe do
equilíbrio econômico e ecológico. Em 2015 com a criação
da Agenda 2030 e seus ODS a discussão ganhou força, mas
muito pouco ainda foi feito, tanto a nível do Brasil quanto a
nível mundial. Sabemos que em 15 anos o mundo, com sua
economia focada apenas no crescimento exacerbado, dificil-
mente terá atingido todos os ODS. Após toda a discussão em
torno dos ODS, da Agenda 2030 e do pensamento de Celso
Furtado, realizamos a entrevista com a associação de catado-
res de lixo de Pedras de Fogo e Itambé - ASSOCAPF. Estamos
iniciando a fase três de nosso projeto e já identificamos que
os catadores de Pedras de Fogo precisam urgentemente do
retorno da usina, pois podemos perceber que a associação
sem a usina está longe de proporcionar o suficiente para o
sustento familiar. A associação já tem quinze anos de aber-
tura e possui cerca de 32 famílias, que vivem da coleta, além
disso, o centro de reciclagem que eles chamam de “usina”
está irregular, dificultando a vida dos catadores. A secretá-
ria da associação acredita que as coisas podem melhorar
futuramente, enquanto isso, as famílias continuam lutando
diariamente para colocar o pão na mesa. Observamos tam-
bém que, as irregularidades continuam dificultando a vida

165
dos catadores que vivem preocupados com o futuro, sem
saber o que será do dia seguinte, apesar de irregularmente,
eles ainda se arriscam indo ao lixão, com todas as insegu-
ranças e dificuldades de coleta, reciclagem e comercialização
dos materiais. O que esperamos com o resultado do projeto
é o retorno da usina, pois além de ajudar na vida financeira
daqueles catadores, irá contribuir para agilidade nas coletas
e promoção da segurança e saúde dos catadores, tudo isso,
com auxílio e parceria da Prefeitura Municipal de Pedras de
Fogo.
Palavras-Chaves: Desenvolvimento sustentável; Instituições
eficazes; Celso Furtado.

166
Equipe: Arte, Ação e Solução

Mentores (as)
Francineide de Lira Ferreira
Shirley Monteiro Cavalcante da Cunha

Alunos (as)
David Ricklaive V. dos Santos
Felipe da Silva Batista
Maria Ivanna Bento Silva
Maria Rafaela Pereira Gomes
Rômulo da Silva.

167
Projeto: Arte, ação e solução

O projeto é dirigido a moradores da comunidade São José, na


cidade de João Pessoa -PB, nos quais as principais atividades
são: a realização de oficinas profissionalizantes, exposições e
atividades ligadas às artes e a cultura, fortalecendo a constru-
ção indenitária, o sentimento de cidadania pleno e inclusão
social. Busca-se levar visibilidade para uma comunidade, que
historicamente tem sido atacada com preconceitos e fragili-
zada por seu isolamento no plano das políticas institucionais.
Faz parte da trilha do conhecimento, Instituições eficazes, do
Programa Celso Furtado, em que a mesma enfoca o aperfei-
çoamento e a forma de tornar as instituições mais inclusivas.
Essa proposta de trabalho abrange estudantes com potencial
dentro do empreendedorismo cultural, em uma comunidade
carente de ações governamentais e de poucas oportunida-
des no mercado de trabalho. Os objetivos do projeto visam
a criação de um empreendimento Artístico Cultural com
reflexos sociais, desenvolver estudos organizacionais para
estruturação da empresa, delinear potencialidade de ação
empresarial do grupo e novas áreas de atuação e projetar
ações de parcerias e envolvimento da comunidade em plano
de expansão. Quanto à metodologia, as ações terão como
finalidade a contribuição social por meio de empreendimen-
tos. Para que isso possa ser feito de forma eficaz, é preciso
planejar ações visando parcerias, apresentando os aspectos
econômicos, filosóficos, potencialidades, como compro-
misso coletivo, que serão mais bem dimensionados com
envolvimento de empreendedores nas diversas áreas ativas
na comunidade. Se pretende como principal resultado, con-
tribuir para a geração de lucros e a melhoria da qualidade de

168
vida da população. No entanto, de forma preliminar identi-
ficamos que, o empreendedorismo cultural enfrenta alguns
desafios, como o método de atração e captação de recur-
sos, esses desafios terão que ser constantemente avaliados e
repensados, de forma a criar soluções criativas e funcionais.
É fato que uma das grandes dificuldades de conseguir um
financiamento é por causa da condição imaterial do negócio,
porém os motivos e as potencialidades que fundamentam o
projeto, deverão sempre estar à frente das atitudes e renova-
ção das metas. Pensando como administrar essas situações,
projeta-se sustentar várias atividades ao mesmo tempo e por
meio deles construir uma rede de contatos. O projeto está na
fase inicial, envolvendo jovens, adolescentes e suas famílias
para as atividades que lhes possibilitem um maior acesso a
bens culturais, transformando seus sonhos em realidade. Um
grande diferencial que torna o projeto Arte, ação e solução
tão especial, é que envolve a comercialização de produtos
físicos, este tipo de empreendedorismo trabalha com o capi-
tal humano, ou seja, com a sensibilidade.
Palavras-Chaves: Empreendedorismo, Identidade social,
Protagonismo

169
Desafio Celso Furtado: Os Ares
do Mundo – Escola, Criatividade e
Desenvolvimento Regional

Resumo: O Dossiê da primeira edição do Desafio Celso


Furtado reúne a contribuição dos especialistas que atuaram
voluntariamente na maratona escolar, em 2020. Apresentado
em três partes, o texto traz reflexões teóricas sobre os aspec-
tos centrais da obra do homenageado, há também, relatos da
experiência dos especialistas sobre a atividade de mentoria
desenvolvida e como avaliadores dos projetos inscritos nas
duas etapas do Desafio. Por fim, o leitor irá conhecer as seis
equipes que venceram a primeira edição do Desafio, duas por
trilha de conhecimento (Desenvolvimento Regional, Bem-
estar e Sustentabilidade e Instituições Eficientes). A ideia
é que os textos possam auxiliar os próximos participantes
do Programa Celso Furtado a compreender, não apenas,
os principais elementos do pensamento de Furtado sobre
Desenvolvimento Regional, Sustentabilidade e Planejamento
Institucional, como também, possam conhecer como fun-
ciona a logística de acompanhamento pedagógico oferecidas
às equipes, através dos especialistas e ficar a par dos projetos
que já estão sendo desenvolvidos no Programa.

171
Sobre as Organizadoras

Andreza Dantas Albuquerque: possui graduação em comu-


nicação social pela Universidade Estadual da Paraíba (2009),
mestrado em Desenvolvimento Regional pela Universidade
Estadual da Paraíba (2014) e doutorado em Ciência,
Tecnologia e Sociedade pela Universidade Federal de São
Carlos (2019). Atualmente faz parte da Coordenação do
Programa Celso Furtado, na condição de especialista peda-
gógica. Tem experiência de pesquisa nos seguintes temas:
Desenvolvimento Regional e Políticas Públicas para Ciência
e Tecnologia.

Ana Maria Vicente da Silva: é graduada em Administração


pela Universidade Estadual da Paraíba (2018) e Mestra em
Administração pela Universidade Federal da Paraíba (2021).
É pesquisadora do Grupo de Estudos em Gestão, Inovação
e Tecnologia - GEGIT da Universidade Federal de Campina
Grande e tem experiência na área de Administração,
com ênfase em Administração Pública, Governança e
Indicadores de Governança Pública. Atualmente, faz parte
da Coordenação do Programa Celso Furtado, na condição
de especialista em acompanhamento e desenvolvimento de
projetos.

Giovânia de Andrade Lacerda Lira: possui Graduação em


Licenciatura em Química pela Universidade Estadual da
Paraíba (2007), Especialista em Fundamentos da Educação
e Práticas interdisciplinares pela Universidade Estadual da
Paraíba (2014). Docente concursada no Estado da Paraíba

173
desde 2012. Nos anos de 2017 e 2018, realizou treinamento
no exterior com foco em Empreendedorismo na Educação
Básica, na Universidade de Ciências Aplicadas de Tampere
(Tampere University of Applied Sciences - TAMK), na
Finlândia. Desde 2019, atua na elaboração, análise pedagó-
gica e gestão de políticas públicas da Secretaria de Estado
da Educação e da Ciência e Tecnologia. Em 2021, assu-
miu o cargo de Especialista em Gestão e Monitoramento
no Programa Celso Furtado de Inovação Educacional e
Desenvolvimento Regional, instituído pela MP n.300/2021.

Luiza Iolanda Pegado Cortez de Oliveira: é mestra em


História, Licenciada em História e Bacharela em Direito, com
formação acadêmica realizada na Universidade Federal da
Paraíba (UFPB). Docente concursada no Estado da Paraíba
desde 2013. Nos anos de 2017, 2018 e 2019, realizou trei-
namento no exterior com foco em Empreendedorismo na
Educação Básica, na Universidade de Ciências Aplicadas de
Tampere (Tampere University of Applied Sciences - TAMK),
na Finlândia. Desde 2019, atua na elaboração, análise peda-
gógica e gestão de políticas públicas da Secretaria de Estado
da Educação e da Ciência e Tecnologia (SEECT-PB). Integra a
Comissão Estadual do Programa de Apoio à Implementação
da Base Nacional Comum Curricular - ProBNCC, instituído
pela Portaria MEC no 331, de 5 de abril de 2018, na fun-
ção de redatora e formadora do componente curricular de
História para o Ensino Médio, assim como dos Itinerários
Formativos. Em 2021, assumiu a Coordenação Geral
do Programa Celso Furtado de Inovação Educacional e
Desenvolvimento Regional, instituído pela MP n.300/2021.

174
Fhelipy Arruda Rocha -Projeto
de Arte das capas;

175

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