0 notas0% acharam este documento útil (0 voto) 530 visualizações20 páginasEls Lagrou - Arte Ou Artefato
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Amerindias;
Arte ou artefato?
Agéncia e significado nas artes indigenas{1}
Els Lagrou
Um texto que busca esbogar 0 quadro da arte indigena brasileira nio pode
Beso comesar com um paradoxo: trata-se de povos que nao partilham nossa
Pesto de arte. Nao somente nao tém palavra ou conceito equivalente aos de arte
E ssittica em nossa tradicio ocidental, como parecem representar, no que fizem
Sselorizam, o pélo contrério do fazer e pensar do Ocidente neste campo. Dois
Peeblemas centrais e interligados ressaltam desde o comeco da discussio: a tradi-
Sonal distingao entre arte e artefato o papel da inovacao na producio seleciona-
como “artistica’
Estas quest6es, no entanto, dizem muito mais respeito a discussées internas as
Pantes historia, flosofiae critica da arte eda estética de tradicéo ocidental do que
#3 hiporética impossibilidade, em outras sociedades, de a percepgao sensorial
$=" apreciacdes qualitativas parecidas com o que vem a ser chamado de “frui¢go
Pesca’ entre nds. Ou seja, nao é porque inexistem 0 conceito de estética e os va-
B= quc o campo das artes agrega na tradicio ocidental, que outros povos nao te-
formulado seus préprios termos e critérios para distinguir e produzit beleza.
Por outro lado, ¢ importante frisar que toda sociedade produz um estilo de
7 que vai acompanhado de um estilo de gostar ¢, pelo fato de o set humano se
Beear enquanto ser social por meio de objetos, imagens, palavras e gestos, os
$Ssmos se tornam vetores da sua aco ¢ de seu pensamento sobre seu mundo.
Ps mancira, a importancia dada & busca da beleza pode variar enormemente ¢
Bese mio adquirir a aura de “veneragio quase religiosa” que adquiriu no Ocidente
Peeiluminisca[2]. Visto que as razbes que levaram a tal culto so historicamente
Heccificas, fica dificil saber onde esti o perigo do etno- ou eurocentrismo: na
sPewsio que defende a universalidade da sensibilidade estética como apanigio da
Bemanidade, ou na posigao contréria que denuncia 0 “esteticismo” como atitude
Secéntrica por ser essencialmente valorativa, apreciadora e
sri; € impossivel gostar sem desgostar(3].
E também sabido que, ha varias décadas,
Peeducio artistica nos centros metropolitanos ¢ k
jSedica pouco tem a ver com a procura e apreciagio do “Belo” que marcou a
$eeem da flosofia moderna sobre arte e estética no século XVIII, Muito do que é
Peedurido na vertente, hoje em dia dominante, da arte conceicual tem mais a ver
Som © questionamento de tal definigio do que com sua afirmacao, O que estes
Sess visam com sua obra é provocar um processo cognitivo no espectador que
seug] OU euaS;pU eLIDUID op ssoueULIOpI94
portant, discrimi-
a parcela mais significativa da
legitimadores do mercado de artePerformances do cinema indigena no Brasil Arte ou artefato?
werindias:
Al
28
se torna, desta maneira, participante ativo na construgio da obra, & procura de
possiveis chaves de leitura. Quanto mais complexas e menos evidentes as alusées
presentes na obra, mais esta sera conceituada.
A obra de arte, portanto, nao serve somente para ser contemplada na pura
beleza e harmonia das suas formas, ela age sobre as pessoas, produzindo reagées
cognitivas diversas. Se fssemos comparar as artes produzidas pelos indigenas
com as obras conceituais dos artistas contemporineos, encontrariamos muito
mais semelhangas do que a primeira vista suspeicariamos (Gell, 1996). Pois muitos
artefatos ¢ grafismos que marcam o estilo de diferentes grupos indigenas sio
materializagoes densas de complexas redes de imeragdes que supGem conjuntos
de significados, ou, como diria Gell, que levam a abdugées, inferéncias com
relagao a intengbes ¢ ages de outros agentes[4]. Sio objetos que condensam ages,
relagdes, emogées ¢ sentidos, porque ¢ através dos artefatos que as pessoas agem,
se relacionam, se produzem e existem no mundol5].
Se objetos indigenas cristalizam agdes, valores ¢ ideias, como na arte conceitual,
ou provocam apreciagées valorativas da categoria dos tradicionais conceitos de
beleza e perfeicio formal, como entre nés, por que sustentar que conceitualmente
esses povos desconhecem o que nés conhecemos como “arte”? E preciso enfatizar
este ponto para melhor entender o que exatamente as produgées artisticas provin-
das de contextos originalmente auténomos de produgio tém a nos oferecer ¢ por
que sua tradugio para o contexto metropolitano tem provocado tanta discussio
entre connaisseurs e criticos de arte de um lado ¢ antropélogos de outro,
Como mencionado anteriormente, a grande diferenca reside na inexisténcia,
centre 0s povos indigenas, de uma dis
jetos produzidos para serem usados ¢ outros para serem somente contemplados,
distingio esta que nem a arte conceitual chegou a questionar entre nés, por ser tio
Gio entre artefato ¢ arte, ou seja, entre ob-
crucial & definigio do préprio campo, Somente quando o design vier a suplancar
as “artes puras” ou “belas-artes” teremos nas metrépoles um quadro similar ao das
sociedades indigenas(6].
A inexisténcia da figura do artista enquanto individuo criador ~ cujo compro-
isso com a invengio do novo é maior que sua vontade de dar continuidadea uma
tradigio ou estilo artistico considerado ancestral ~ é outra diferenca crucial. Nao
que artistas contemporineos metropolitanos nao trabalhem dentro de tradigdes
estilisticas bem definidas. Vale lembrar que o fundador da arte conceitual, Marcel
Duchamp, instalou seu urinol hé praticamente um século, em 1917, e, desde en-
tio, o paradigma do fazer artistico nao mudou. deologicamente a figura do artista
se projeta como inventor do seu préprio estilo, como inovador incessante, a
modo de um Picasso, emblema do Modernismo na arte. A fonte de inspiragio ¢
legitimagio se encontra no génio do artista, que ¢ visto como agente principal no
processo de relages ¢ interagdes que envolvem a produgao de sua obra, produzida
Els Lagrou
com o tinico fim de ser uma
Por mais que a arte mod
bre a sociedade, ela tem sid
dominios da vida social. “A
gue pretendem levar a arte
nossa dificuldade ocidental «
id.
artista assume a imagem do
seal juntamente com a
comum’ sociocéntrico. O pe
© se vé, desta maneira, obris
sociedade.
Segundo Lévi-Strauss, um
moderno teria perdido, em v
sua capacidade de comunicag
cedida a Charbonnier no co
91), Lévi-Strauss propée un
moderna ¢ arte “primitiva’.
por trés diferengas entre a a
are moderna tenta superar |
diz respeito & individualizag
sua clientela, que provoca ¢
em nossa cultura = um prob
socialidade. A segunda se r¢
(posessiva enquanto a arte “f
reside na tendéncia de a arte
les maitres” (pintar seguindo
problema através da “pesq
significando em vez de tent
solugbes estrucurais oferecida
ada arte divorciada do seu p
© teria resultado em um “
seus proprios estilos ¢ linguag
Na maior parte das socied
do constititi uma especializa
eupagdes do grupo nao se col
seu género, cada membro da
lizagdo. Porém, sempre hé os
Assim, entre os Kaxinawa (g
chamada de ainbu keneya, “n
“dona dos japins”, ou seja, iArte ou artefate? ts Eagrou Amerindias
‘com o tinico fim de ser uma obra de arte.
Por mais que a arte moderna sempre se constitua como lugar de reflexdo so-
obra, 4 procura de
widentes as alusoes
Bre 2 sociedade, cla tem sido enfitica na defesa de sua independéncia de outros
“Pominios da vida social. “A arte pela arte” é um credo tanto de artistas quanto dos
“gee pretendem levar a arte a sério, ¢ reflete, segundo Overing (Overing, 1991),
‘goss: dificuldade ocidental de pensar a criatividade individual ¢ a autonomia pes-
juncamente com a vida em sociedade, Em nossa tradicio pés-iluminista 0
sa assume a imagem do individuo desprendido, livre das limitagdes do “senso
sum” sociocéntrico. O pensamento ocidental associa coletividade com coergio
% v6, desta mancira, obrigado a projetar o poder da criatividade para fora da
atemplada na pura
sroduzindo reacées
fas pelos indigenas
ontrariamos muito
, 1996). Pois muitos
upos indigenas sio
- supdem conjuntos
Iseag ou eua%ypuy eusoUr> op ssoueu0ps9q
es, inferéncias com
Segundo Lévi-Strauss, um resultado deste estatutosolitirio de génioé que oartista
10 tetia perdido, em virtude de um uso idiossincratico de signos ¢ simbolos,
condensam ages,
ue as pessoas agem,
scapacidade de comunicagio: nao hi linguagem fora da sociedade. Em entrevista
o na arte conceitual, da a Charbonnier no comego dos anos sessenta (Charbonnier,1989, pp. 63-
sionais conceitos de ), Lévi-Strauss propée uma interpretagao antropolégica da diferenca entre arte
a € arte “primitiva’. Nossa tradigéo intelectual ocidental seria responsével
sés diferencas entre a arte “académica” e a arte “primitiva’; diferencas que a
que conceitualmente:
? E preciso enfatizar
6es artisticas provin- moderna renta superar desde 0 comego do século XX. A primeira diferenca
a nos oferecer € por sespeito a individualizapao do artista ocidental, especialmente com relagio &
cado tanta a dlientela, qué provoca e reflete uma rupcura entre o individuo ea sociedade
feossa cultura — um problema inexistente para o pensamento indigena sobre
dade. A segunda se refere a0 fato de a arte ocidental ser representatina €
esiva enquanto a arte “primitiva’ somente pretenderia significar. A terceira
s de outro.
side na inexisténcia,
rte, ou seja, entre ob-
nente contemplados,
na tendéncia de a arte ocidental se fechar sobre si mesma: “peindre aprés
sealtres” (pintar seguindo os mestres). Os impressionistas atacaram o terceito
entre nés, por ser tio
esign vier a suplancar através da “pesquisa de campo” ¢ os cubistas o segundo, recriando ¢
Geando em vez de tentar imitar de maneira realista ~ aprenderam com as
quadro similar a0 das
es estruturais oferecidas pela arte africana; mas a primeira e crucial diferenca,
iador — cujo compro arte divorciada do seu piiblico, nao péde, segundo Lévi-Strauss, ser superada
rcontinuidade a uma (§eeeria resultado em um “academicismo de linguagens”: cada artista inventando
lferenga crucial. Nao proprios estilos e linguagens ininteligiveis
a dentro de tradigées Na maior parte das sociedades indigenas brasileiras, 0 papel de artesdo/artista
rte conceitual, Marcel constitii uma especializagio e a possivel desconexao entre seu fazer e as preo-
sm 1917, ¢, desde en- ces do grupo nao se coloca. Se a téc
ente a figura do artista ummm enero, cada membro da sociedade pode se tornar um especialista na sua rea
ovador incessante, a0
fonte de inspiracio €
10 agente principal no
fe sua obra, produzida
a em questio compete is pessoas de
. Porém, sempre hi os que se sobressaem, estes so considerados “mestres”.
. entre os Kaxinawa (grupo pano, Acre), a mestre na arte da tecelagem é
de ainbu keneya, “mulher com desenho” ou ainda de tana ibu ainbu,
dos japins’, ou seja, lideranga ritual feminina da aldeia, responsivel pelaAmerin
_, Performances do cinema indigena no Brasil
Ante ou arifte? We Lagrou
organizacio do trabalho coletivo do preparo do algodio. Este mesmo titulo, “dona
dos japins’, é dado as mulheres que lideram o canto feminino durante a perfor-
mance ritual. O japim & um passaro que tece elaborados ninhos alongados, pen-
durados nos galhos das érvores. Em cantos rituais seu ninho é chamado de xana
disi, “rede do japim” ¢ assim 0 passaro serve de metéfora para indicar a exceléncia
na tecelagem,
Agosto Feitosa Kaxinawa, suana
oouvindo sua prépra gravasio (f
Existem também grupe
grupo de lingua Jé do |
producto artistica nio de
mento das capacidades pr
‘ada género respectivament
fabricacao dos diferentes en
Bracadeiras a0s cocares, se
‘Teceld kaxinawa (Fotografia de Els Lagrou, 1995)
O lider de canto masculino é igualmente chamado de txana ibu, “dono dos
japins’. O japim, além de ser um passaro tecelio, é também aquele que imita 0
maior niimero de cantos de outros pissaros ¢ animais. Mulheres aprendem cantos § eom uma légica clanica, res
de determinados ingredier
ide aves especificas e de de
= producao de certos obje
sical, procurada e emulada pelos cantores da aldeia, que absorvem as qualidades [grupos rituais (Dorta, 198
desse pissaro no rito de consagragio do novo lider de canto[7], importa antes por 2006).
causa do seu valor “produtivo”, do que “representativo”. O canto masculino torna
que as ajudam a aprender a tecer com desenho, assim como a desenvolver outras
atividades produtivas da vida em comunidade, enquanto homens aprendem can-
tos ligados a sua esfera especifica de produtividade. A capacidade mimética mu-
Enfeite de cabelo b
possivel a caca: ao imitar o canto dos animais, o cacador os chama para perto de
ite a0 ritual as
entidades donas das substincias utilizadas para “refazer” 0 corpo da crianga, indo
si, os seduz para poder capturé-los. O canto feminino torna pre
do milho ¢ da agua utilizados para produzir a caiguma as plantas medicinais e J _ Entre os Kayapé-Goroti
tintas utilizadas na sua decoracio.
Tecer ¢ cantar sio duas atividades produtivas, constitutivas do cotidiano kaxi-
nawa, cuja estética consiste em uma arte de produzir a vida de modo préprio,
eondicionado pelo nome d:
com 0 pertencimento a gr
nao corresponde ao que se «
s2nal ou profissional, visto q
de produzir algum tipo de ¢
O faror considerado es
de arte em questao: pintur
producio de mascaras ou art
kuin, a0 modo dos Kaxinawa. O japim seria 0 modelo de artista a emular pelos
humanos, pois além das capacidades de recelao e cantor, o japim compartilha com
os humanos o habito de viver em comunidade, um conhecimento considerado
condigio para qualquer outra habilidadeArte ou artefate?
Amerindias
no titulo, “dona
urante a perfor-
alongados, pen-
amado de tana
soouruoyiag
jcar a exceléncia
Agosto Feitosa Kaxinawa, teana ibu de Moema, com esposa ¢ netos,
SSevindo sua propria gravacio (Forografia de Els Lagrou).
Existem também grupos, como os Bororo,
grupo de lingua Jé do Brasil Central, cuja
producto artistica nio deriva do aperfeicoa-
mento das capacidades produtivas acessiveis a
ada género respectivamente. Entre os Bororo a XY
Ebricacao dos diferentes enfeites plumérios, das
Bracadeiras aos cocares, se organiza de acordo ‘.
eom uma légica clanica, reservando a utilizacio =
de determinados ingredientes (tipos de penas a
ide aves especificas e de determinadas cores) € Ww
2 producao de certos objetos a determinados ANS
gFupos rituais (Dorta, 1986; Caiuby Novaes,
2006).
: Els Lagrou, 1995)
ibu, “dono dos
uele que imita 0
prendem cantos
senvolver outras
s aprendem can-
¢ mimética mu-
m as qualidades
nporta antes por
masculino torna
Repairs perto'da Enfeite de cabelo bororo (Foro Els Lagrou),
ual as
a Acervo Museu do Indio,
da crianca, indo
Entre os Kayapé-Gorotire, por outro lado, o direito de uso de certos enfeites é
eondicionado pelo nome da pessoa. Essa divisio de privilégios e tarefas de acordo
om 0 pertencimento a grupos sociais dentro de uma comunidade, entretanto,
Ao corresponde ao que se entende comumente entre nds por especializacio arte-
Sanal ou profissional, visto que todos os membros de todos os grupos tém o direito
ide produzir algum tipo de enfeite ou artefato.
O fator considerado responsivel pelo éxito de um artefato depende do tipo
de arte em questéo: pintura corporal, tecelagem, trangado, cerimica, escultura,
producio de méscaras ou arte pluméria. Quando predomina a dificuldade técnica,
tas medicinais ¢
» cotidiano kaxi-
modo préprio,
aa emular pelos
mpartilha com
nto considerado_, Performances do cinema indigena no Brasil Arte ow artefito?
Amerindias:
serdo prezadas a concentracio, habilidade, perfeicao formal e disciplina do mestre.
Mas quando predomina a expressividade da forma, a fonte de inspiracio é quase
sempre atribuida a seres nao-humanos ou divindades que aparecem em sonhos
c/ou visées. Dificilmente se responsabilizard a “criatividade” do artista pela pro-
dugio de novas formas de expresso. O artista é antes aquele que capta ¢ transmite
a0 modo de um radio transistor do que um criador. Prezam-se mais suas capaci-
dades de didlogo, percepgio ¢ interagio com seres nao-humanos, cuja presenca
se faz sentir na maior parte das obras de aspecto figurativo, do que a capacidade
de criagao ex nihilo, ctiagao do nada. Esta ideia de ser mais receptor, tradutor
transmissor do que ctiador vale para a misica, a performance ea fabricagao de ima-
gens visuais e palpaveis. O complexo processo de criagio artistica e performance
do xamé entre os Araweté é descrito por Viveiros de Castro nos seguintes termos:
“O xami é como um ridio”, dizem. Com isto querem dizer que ele é um veiculo, €
{que 0 corpo-sujeito da vor esté alhures, que nao esti dentro do xami. O xama nao
incorpora as divindades ¢ os mortos, ee conta-canta 0 que vé € ouve: os deuses no
«sto “dentro de sua carne”, nem ocupam 0 sau hiro (corpo). Excorporado pelo sonho,
‘ xami ou seu “ex-corpo” (hiro pe) fica na rede, enquanto sua # — aquela que seri do
cu sai ¢ viaja, Mas é quando ele volta que 0 xama canta. E, quando os deuses des-
‘cem & terra com ele — que é quem “fur descet ...] os deuses -, descem em corpo, nio
em scu corpo... Um xama encena ou representa os deuses ¢ mortos, ele corna visiveis
¢ audiveis suas ages, mas nao os encarna em sentido ontolégico (Viveiros de Castro,
1986, p. 543).
Brinco kayapé-gorosire ((ovwyrafia de Els Lagrou).
Acervo do Museu do indio, B=
‘Tradutora dos mundos dos seres invisiveis, a figura do xama muitas vezes coin-
cide com a do artista entre os amerindios. Entre os Araweté, a arte do xama reside
nna evocagéo de imagens mentais através do canto: “Como um todo, os cantos
Lagrou
sSmanisticos sio uma fi
10s uma definigao
is ou sensoriais” (i
lucéo artistica de ou
possibilidade de difer
no exemplo citad
‘movimento é 0 canto,
através da fabricagao de
Entre os Wayana, 0 j
‘2250, porque 0 modo «
‘pelos demiurgos dos ter
-de lingua karib lembra
Alto Xingu), produtore
que a relagao intrinsec:
‘ama empreitada arrisca
eta pode se vingar
= 2 confeccio for
‘axtisticamente mal
‘ita, enquanto en-
‘se 05 Wayana existe
-© risco da tradugio
do ser em artefato
“sr tdo completa que
‘de ganhe agéncia ¢
sida préprias (Van
Velthem, 2003).
(Cesto wayana
Acervo¢
Assim como os Pirak
‘arresanal como um “far
como modelo a perfeica
piraha, somente Igagai,
umanos nio fariam ou
‘xperimento que produ
‘produzem diferencas.
O “experimento” [..
sentarem sua cosmolArte ow artefase? Te Lagroxs
Amerindias
ropeia — projecio de imagens visuais sobre a mente, para
de Pound -, evocagées vividas mas elipticas de situagées
Puss ou sensoriais” (idem, p.548). Teremos a oportunidade de voltar ao tema da
Pedusio artistica de outros mundos, importa notar aqui que esta a
PPossibilidade de diferentes énfases e processos de transposicao: em al
Satio no exemplo citado acima,
disciplina do mestre. J amanisticos sio uma fi
de inspiracdo é quase
Sarmos uma definica
uparecem cm sonhos
"do artista pela pro-
que capta e transmite
idade prevé
Iguns casos,
© meio privilegiado de expressio das imagens em
Movimento € o canto, em outros os seres invisiveis ganham existéncia material
Seravés da fabricacdo de imagens, “roupas” ¢ instrumentos,
Enire os Wayana, o peso do “modelo” rem sentido cosmolégico. Inovaré peri-
s. porque o modo certo de se produzirem corpos e artefitos foi estabelecido
BPs demiurgos dos tempos de criacio. O conservadorismo estilistico d
lingua karib lembra o dos Wauja (autodenominacio dos Waura,
Pho Xingu), produtores de méscaras rituais,
Fe 2 relacéo intrinseca entre 0 modelo es
Ss empreitada arriscada. N
Hefa0 pode se vingar
2 confeccio for
dcamente mal
Be, enquanto en-
‘05 Wayana existe
isco da traducio
ser em artefato
& tao completa que
ganhe agéncia ¢
propria (Van
em, 2003).
-se mais suas capaci-
nanos, cuja presenca
do que a capacidade
ioBspur euroU> op saouewopi9g
receptor, tradutor €
sa fabricagao de ima-
tistica e performance
10s seguintes termos:
este grupo
grupo anawak,
no sentido de que ambos acreditam
tua c6pia torna a producio artesanal
fo caso wauja o ser parcialmente reproduzido no ar-
jue ele € um veiculo, e
do xama. O xami nao
€ ouve: os deuses nao
corporado pelo sonho,
- —aquela que seri do
quando os deuses des-
descem em corpo, no
ort0s, ele torna visiveis
(Viveiros de Castro,
(Cesto wayana com motivo palap,“espécie de andorinha’ (fotografia de Els Lagou).
‘Acervo do Museu do fndio. Fonte deidentificagio da pega,
Van Velthem 1995:
Assim como os Piraha (Gonsalves, 2001), os Wayana se referem & produgio
al como um “fazer, experimentar”: wkuktop (Van Velthem, 2009), que tem
mo modelo a perfe
io tecnol6gica dos deuses criadores ou demiurgos. No caso
} somente Igagai, o deus criador, saberia criar todas as coisas,
nos nao fariam outra coisa que tentar imité-lo através do expei
[perimento que produz o evento e assim o mund.
Produzem diferencas.
enquanto os
rimento. E 0
Jo é feito de semelhancas que
14 muitas vezes coin-
1 arte do xami reside
© “experimento” [..] um conceito importante na forma de os Piraha apre-
emtarem sua cosmologia. Nada é feito de uma s6 ver: tudo passa por etapas,
um todo, os cantosPerformances do cinema indigena no Brasil Arte ou artefto? WS Eis Lagrou
testes e experimentagées. Faz-se sempre algo pequeno, um modelo em minia- Os objetos sio [..] c¢
pos primevos porqu
seres ¢ elementos do
tura, ¢, se der certo, concretiza-se o que se tencionava executar, O “experimen-
‘Amerindias:
to”, a0 mesmo tempo que indica 0 modo de criacéo, explicita o risco de nao
dar certo ¢ permite a criagao de novas coisas. A quase totalidade das coisas e dos Taka pimogis
seres do Cosmos é percebida como resultado de atos, de processos: as nuvens
sio produtos da interferéncia dos humanos ao usarem fogo; 0 vento, os raios,
a lua, o sol, as estrelas, os animais e os vegetais foram e continuam sendo pro-
duzidos pelos seres abaisi (deuses) a partir da légica do “experimento”, modo
de fabricagao que utiliza distintos materiais como areia, tetra e vegetais ~ dos
quais so extraidas as tinturas € madeiras -, os quais, misturados, possibilitam
a emergéncia da diferenga (Gongalves, 2001, p. 33).
circular pomkeari tem
tora enrolada, Os ob
apresentam, portant
(Van Velthem, 2009,
A énfase wayana é,
al, tanto no que diz
‘quanto aos mitos que s
"=xplicam as afinidades
sebrenacurais. A afinid
decoragio, de um |
eapacidade agentiva
Seuem o objetivo prim
sio produzidas” (i
‘Como os cantores
bem, de desenhos
‘em sonhos sua in
is causadores de do
grandes festas em s
nadas na forma de
xamis ou pajés da a
ge modo, os xam
wem com os apap
Animais de diferentes patamares,
desenho piraha (Marco Antonio Goncalves, 2001)
que serio materi
visualizados pelo p
ites patogénicos e f
Desde Kant, 0 Oci
A partir de diferentes experimentos que produzem efeitos sempre novos de
setes que se parecem, mas nunca so iguais, os Piraha constroem uma imagética
altamente estética, precisa ¢ detalhada dos diferentes corpos de seres que habitam,
0s varios patamares que compéem seu cosmos. A importancia do ato ¢ do evento,
é responsivel pelo fato de o mundo nunca estar acabado, estando em constante
processo de fabricacio ¢ transformagio por causa dos atos que produzem efeitos ¢
novos setes. Elemento especialmente marcante desta cosmologia é 0 fato de serem
os acidentes que acontecem com os seres humanos os responsaveis pelo surgimen-
to dos deuses imperfeitos que povoam o cosmos e vivem a lamentar suas imper-
feigGes nos cantos xamanisticos. Se os Piraha tendem a enfatizar a imperfeigao
tanto da criagao quanto da imitacao, entre os Wayan:
” € ao “sublime”,
tiva das expresséc
olhar marcado por
‘em lugares que ap
no Ocidente ou «
culturas, produré
icadas”, eram na s
mais ou meno!
éricas, o Império InArte ou arefate? Lagrou
modelo em minia-
ar. O “experimen-
Peobjetos si [..] compreendidos enquanto cépias dos elementos existentes nos tem-
BS Primevos porque os substicuem, porque tomam o lugar, no presente, daqueles
=< clementes do passado. Assim, a rede de dormir, état reproduz/consttui w ree
Sscanha primordial, um determinado banco muie-ré
“ita o risco de nao
cde das coisas e dos
ocessos: as nuvens
© vento, os raios,
inuam sendo pro-
yerimento”, modo
a e vegetais ~ dos
ados, possibilitam
encarna o urubu rei, a peneira
specto do corpo de uma scrpente constri-
fee enrolada. Os objetos, tanto os de uso cotidiano como os empregados em rituais
@Prsentam, portanto, as carac-teristi
Wan Velchem, 2009, pp. 213-236).
Straular pomari tem exatamente 0 mesmo as
s formais de scus modelos, seres corporificados
p> énfase wayana é, portanto, na reprodugio fiel de um conhecimento ances-
fanto no que diz respeito as técnicas de producio de artefatos ¢ pessoas,
ai 208 mitos que sio compreendidos como pertencentes aos demiurgose que
Sam as afinidades existentes entre determinados artefatos ¢ animais ou serea
Hurais. A afinidade entre um artefto, sua forma, a técnica de produgdo e
Secoracio, de um lado, co se vivo que Ihe serve de modelo, de ourro, tenete
Spacidade agentiva de ambos, artefaro ¢ modelo, “Eficicia ¢ utilidade cons-
© objetivo primeiro de toda e qualquer criacao,
Sio produzidas” (ibidem)
Como os cantores araweté, os artistas wauja, autores de mascara, panelas e,
em, de desenhos em papel de grande apelo plistico (Barcelos, 1999) locs,
€m sonhos sua inspirasdo para a representasio dos apapaata, seres sobrens,
B Stsadores de doencase pasiveis de seem apaziguados através da promocio
Grandes festas em sua homenagem, Neste caso, sio fabricadas suse “roupas”
das na forma de mascaras de grandes proporcées. Os desenhistas wauja sio
Sins ou pajés da aldeia, os que sabem sonhar com estes seres sobrenatutais
modo, os xamas tornam-se Os maiores artistas desta soci
M Com os apapaatai, seres invisiveis a olho nu, criam
= que sero materializadas na forma de méscaras rituai
visualizados pelo pajé em mit
uma vez que coisas intiteis
dade, pois, a0
nnovas imagens destes
Esses mesmos seres
iatura dentro do paciente, onde atuam como
Bass Patogénicos ¢ precisam ser retirados como parte do processo de cura.
Desde Kant, o Ocidente tem associado o fendmeno artistico so
€ a0 “sublime”, além de dar grande én
tiva das expressoes plisticas. Nao é di
oduzem efeitos ¢ olhar marcado por uma cultura
é.0 fato de serem em lugares que apresentavam cara
s pelo surgimen-
empre novos de
n uma imagética
eres que habitam
“extraordi-
fase 4 modalidade representativa
le se estranhar que este “olhar educado”,
ual especifica, foi procurar a arte dos ou.
» ato e do evento.
do em constante
cteristicas afins aos objetos de arte conhe-
Sno Ocidente ou descobertos pelos arquedlogos nas “altas culturas” antigas.
nrar suas imper- MMs culturas, produtoras do que eram consideradas produgées artisticas “mais
ar a imperfeicio iigefisticadas”, eram na sua maior parte marcadas pelo desenvol
Sais mais ou menos absolutistas como a China, fndia,
icas, o Império Incaico e Asteca.
lvimento de aparatos
Mesopotamia, ¢, nas
Amerindias
2Performances do cinema indigena no Brasil
Arte ou ariefto? Be agro.
BR precisa ser bela, ne
Be=sobre 0 mundo a st
mundo no qual viver
Assim, os colecionadores de arte “primi
wa” muitas vezes s6 reconheciam pecas
no como candidatas a serem inclui-
incomuns, “espetaculares” e de uso nao coti
es de arte nao ocidental, desconhecendo o fato de a maior parte da
das nas coleg
produgio artistica indigena se encontrar no campo da chamada “arte decorativa’
de uso cotidiano (Gell, 1998, p. 73), assim como desconsiderando a realidade da
avaliagao nativa da qualidade das pecas, que nem sempre segue a l6gica da valori-
zagio do incomum (Overing, 1996; Lagrou, 1998, 2007)
Menino com “desenh
Mascaras wauja, apapaataiatujuava (orografia de Aristteles Barcelos Neto)
Por exemplo, 0 que caracteriza a pintura corporal e facial ritualmente mais efi-
care, portanto, mais apreciada no ritual de passagem de meninos € meninas kaxi-
nawa é 0 fato de ela ser mal feita em vez de bem feita: as linhas grossas aplicadas
com 0s dedos ou sabugos de milho, com rapidez e pouca precisio, permitem uma
permeabilidade maior da pele & acio ritual quando comparadas com as pinturas
dlicadas aplicadas com finos palitos enrolados em algodio, pinturas estas que si0
consideradas bem feitas ¢ esteticamente mais agradaveis € que sio usadas pelos
adultos nessa ¢ em outras ocasides. Estas representariam a roupa do cotidiano ow
das festas e contrastam com a “roupagem” liminar dos neéfitos por causa de sua
menor suscetibilidade a processos de transformagio.
A apreciagio valorativa nao esti, assim, necessariamente nos aspectos comu-
preciag: ‘Ps BMenina sendo pintada com J
mente considerados como padrées estéticos nativos; pode estar condensada, pelo Wille (focografia de Fs Lagro
contririo, na sua temporaria distorgio. A licio metodolégica tirada desta cons-
tatacéo é a impossibilidade de isolar a forma do sentido e o sentido da capacidade
agentiva; o sentido e efeito de imagens ¢ artefatos mudam conforme o contexto
em que estes se inserem. Constatamos a partir deste exemplo que a “eficécia da
arte” reside na capacidade agentiva da forma, das imagens e dos objetos. A forma
Esta nova énfase na
IB abdusio de agéncia
isis interagem expressa
Alfred Gell, Art and AgeArte ou artefato? Ty Wie Lagrow Amerindias:
Bk. fei precisa ser bela, nem precisa representar uma realidade além dela mesma, ela
as a sei
iam pecas “ 2 zs
See sobre o mundo & sua maneira e surte efeitos. Deste modo, cla ajuda a fabricar
nclui-
m
" se mund al vivernos
a maior parte da ono qual vivemos.
“arte decorativa”
do a realidade da
:légica da valori
Menino com “desenho grosso” (huku kene) ou “desenho mal feito" (tubo kene) de uso ritual,
motivo naan kene, desenho de estrangeito/inimigo (Fotografia de Els Lagrou).
sualmente mais efi-
os € meninas kaxi~
as grossas aplicadas
sio, permitem uma
jas com as pinturas
nturas estas que S40
xe sio usadas pelos
pa do cotidiano otf
os por causa de sual
nos aspectos coms sendo pintada com kene hun, no estilo pua kene(desenho cruzado) com motivo nawan
ar condensada, pelo orografia de Els Lagrou).
a tirada desta cons
ntido da capacidademy Esra nova énfase na agéncia de imagens e artefatos € no processo cognitive
Bducio de agéncia e intencionalidade que provocam nas pessoas que com
Tmteragem expressa a grande influéncia exercida pelo trabalho péstumo de
onforme o contexto}
jo que a “cficacia dat
fos objetos. A formal
Gell, Art and Agency (Gell, 1998), que veio coroar um processo de quinzePerformances do cinema indigena no Brasil Aree ox artefato? WS Bis Lagrou
anos de criticas ao modelo representacionalista nas ciéncias humanas ¢ sociais, O Danto permite que os
deslocamento da atengio do significado para a eficicia do artefato tem um rendi- ‘ver com o valor ¢ 0 sig
mento parricularmente interessante no contexto da anilise de artefatos e imagens Gell critica de form
amerindias porque permite fugir do segundo dos pressupostos que definem a dis- por Danto (Gell, 2001
cussio no campo das artes no Ocidente.
Se, como afirmamos acima, a prépria historia da arte no Ocidente se incumbiut
de questionar 0 critétio de beleza como definidor do estatuto de obra de arte, 0
Peso do critério interpretativo no diminuiu. Assim, na definigao do importante
fil6sofo de arte Arthur Danto, pode ser considerado arte aquele objeto que foi
produzido em didlogo com a histéria da arte. No caso das artes produzidas fora
do contexto metropolitano, este contexto seria substituido, em termos claramente
hegelianos, pelo discurso religioso ou cosmolégico do lugar (Danto, 1989, pp.
18-32). A arte, portanto, para se distinguir do “mero” artefato de uso cotidiano ¢
uutiliério, deve ser obra de reflexio, expressando o “Espirito do seu Tempo” (Zeit-
$eist), ou, no caso, 0 “Espirito do seu povo” (Kulturgeis).
Reconhecendo que no contexto nativo todos os objetos podem possuir varias
fungoes, inclusive utilitérias, Danto afirma que mesmo assim ¢ preciso possivel
distinguir entte “meros objetos utilitirios”, os artefatos, ¢ “objetos especiais", can-
didatos ao estatuto de obra de arte, Para deixar claro como se pode fazer esta dis-
Amerindias:
Gall, foi uma exposica
‘uma exposi¢ao chamad
‘expunha uma rede de:
sconceitual. A curadora
piiblico, que se equivo
‘era para ser visto come
‘ingio conceitual entre
‘ama obra de arte por
possuindo o poder de i
‘eritérios que justificam
2 exclusio de outras
execugio sio, segundo
‘leiro © 0s cestos do pe
‘sua associacao com a ct
Argumentando con
tingio, o autor propde um exemplo imagindrio para o qual procurou inspiracio na fea rede Zande coloca
etnografia africana. Ou seja, em verde procurar exemplos na etnologia existente, 0
fl6sofo produz uma hipétese plausivel sobre dois povos de uma mesma regido que
rante nessa ideia), q
mutuamente exclud
Poderiam existir em termos légicos. Os dois povos produziriam cestose panelas de ra. Logo, uma arma
barro que em termos formais seriam indistinguiveis para um observador externo. », poderia representa
Um dos povos, o povo cesteiro, teria uma telagio privilegiada com seus cestos, scara, visto que nao
que seriam considerados como possuindo um significado e poder especial, Segun
do os sibios da tribo, o préprio mundo é (como) um cesto, tecido de grama, ar €
gua pela deusa criadora do povo, uma tecela. As pessoas, a0 procluzirem cestos,
“estariam imitando a criatividade divina, assim como escultores e pintores imitam
Deus na Sua Criatividade, segundo Giorgio Vasari” (Danto, 1989, p.23). Para 0 eficacia onde a definig
Povo oleiro, as panelas que sio “densas em significados’. “Os sibios do povo Gell sempre se inter
oleiro dizem que Deus € oleiro, por ele ter moldado o universo a partir do barro MN ferias londrines Tal en
informe, ¢ os oleiros, que sio artistas, sio agentes inspirados que reencenam na ‘propor uma mudanga
sua arte 0 processo primevo através do qual a simples desordem de mera sujeita preendente para a antr
recebe graga, significado, beleza e até uso” (Danto, 1989, pp. 23-24). Deste modo, arte nao se define mais
“encontrando-se na encruzilhada entre arte, filosofia e religido, as panelas do povo ‘zemadilha conceitual, p
oleiro pertencem ao Espirito Absolut, Seus cestos, bem recidos para garantir uti- por que continuar avali
lidade duradoura, sao insipidos componentes ma prosa do mundo” (ibidem). Com mais no nosso préprio +
© Povo cesteiro acontece 0 contritio. Entre eles sio os cestos que ganham em ‘so as pegas que mais se
valor, enquanto as panelassdo meros objetos utltiios. Vemos neste exemplo que Gell sugere associat, nur
is nada, a apo do an
¢ reside na relagio ¢
avés do artefato, cor
ira, Gell supera acArte ow artefata?
yanas e sociais. O
co tem um rendi-
tefatos ¢ imagens
ue definem a dis-
ente se incumbiu
le obra de arte, 0
10 do importante
le objeto que foi
s produzidas fora
srmos claramente
Yanto, 1989, pp.
le uso cotidiano &
eu Tempo” (Zeit-
em possuir varias
preciso € possivel
3s especiais”, can-
nde Fazer esta dis-
rou inspiragao na
slogia existente, 0
mesma regio que
estos ¢ panelas de
servador externo,
com seus cestos,
r especial. Segun-
do de grama, ar e
roduzirem cestos,
> pintores imitam
89, p.23). Para o
s sibios do povo
a partir do barro
ue reencenam na
n de mera sujeira
24). Deste modo,
s panelas do povo
para garantir uti-
0” (ibidem). Com
que ganham em
este exemplo que
Bs Lagrou Amerindias:
Danto permite que os artefatos tenham u
‘yer com 0 valor e 0 significado do objeto.
Gell critica de forma contundente a definicao interprecativa da arte defendida
por Danto (Gell, 2001). O que produziu a reflexio, tanto de Danto quanto de
‘Gell, foi uma exposicéo em que Suzan Vogel, historiadora da arte e curadora de
sem exposicao chamada “Arv/Artifact no Center for African Art” em Nova lorque,
S=punha uma rede de caca amarrada dos Zande como se fosse uma obra de arte
Senceitual. A curadora plantou, desta maneira, uma verdadeira armadilha para 0
Pablico, que se equivocou totalmente acerca do que viu, sem saber se 0 exposto
= para ser visto como uma obra de arte conceitual ou néo. Defendendo a dis-
ss40 conceitual entre arte e artefato, Danto argumenta que a rede nao pode ser
idade, mas esta utilidade nada tem a
ysesq Ou eUDBpUY PULDUID op soouEMUO}IEg
Joma obra de arte porque ela foi feita meramente para um uso instrumental, néo
essuindo o poder de invocar um significado mais clevado ou transcendental. Os
srtérios que justificam a inclusio de certas panelas e cestos no “Museu de arte”
2 exclusio de outras panelas e cestos, aparentemente iguais a estas em forma ¢
cio sd, segundo Danto, unicamente interpretativos. As panelas do povo
ro € 0s cestos do povo teceléo ganhavam estatuto de obra do espirito gracas a
#2 associa¢ao com a criatividade divina e apesar da sua utilidade.
Atgumentando contra Danto, Gell vai mostrar, a partir da ideia da armadilh:
2 rede Zande colocada na exposi¢ao é um exemplo singular do tipo de légica
inte nessa ideia), que instrumentalidade e arte nao necessariamente precisam
Er mutuamente excludentes (ibidem). Muito pelo contritio, se reforcam uma &
gra. Logo, uma armadilha feita especialmente para capturar enguias, por exem-
p, poderia representar muito melhor ancestral dono das enguias, do que sua
ara, visto que no representa somente sua imagem, mas presentifica, antes de
is nada, a acdo do ancestral: sua eficdcia & tanto instrumental quanto sobrenatu-
¢ reside na relagio complexa entre intencionalidades diversas interconectadas
savés do artefato, como aquelas da enguia, do pescador e do ancestral, Desta
sancira, Gell supera a clissica oposicio entre artefato ¢ arte, introduzindo agéncia
sficicia onde a definigao clissica s6 permite contemplacio.
Gell sempre se interessou pela “arte conceitual” e era assiduo visitante das ga-
londrinas. Tal envolvimento com 0 mundo da arte conceitual levou-o a
Propor uma mudanga de perspectiva muito bem-vinda ¢ ao mesmo tempo sur-
Preendente para a antropologia da arte: se no mundo da arte contemporinea a
no se define mais pelo critério do belo e sim pela légica do trocadilho ou da
=Smadilha conccitual, pelo complexo entrelagamento de intencionalidades sociais,
Per que continuar avaliando a arte de outros povos com critérios que néo valem
mais no nosso préprio mundo artistico? Por que achar que as mascaras afticanas
#0 as pecas que mais se aproximam da nossa nocéo de arte? E neste momento que
Gell sugere associar, numa exposi¢ao imaginzria, obras conceituais ocidentais comAmerindias:
Performances do cinema indigena no Brasil
Arte ou arta? WN Els Lagrou
armadilhas de povos sem tradicio artistica institucionalizada. As armadilhas afti- [) fando a simultaneidad
canas, oceanicas ¢ amazdnicas se aproximariam mais da arte conceitual contem- imagem tenaisll
porinea do que as méscaras ou esculturas, por causa da complexidade cognitiva WN smagem sintetiza os el
envolvida na montagem das arma
as; por causa da maneira como agem sobre a WN opera e é por esta rar
‘mente do receptor, sugerindo uma complexa rede de intencionalidades, em que 0 ks ccu racdelll
cagador mostra conhecer bem os hébitos da sua presa através da propria estrutura tore, poitodll
da armadilha (Gell, 2001). para nao se torn
E exatamente esta distingao entre arte e artefato que a maioria das etnogrefias fo que compart
sobre a produgio de artefatos e artes indigenas vem negando ha mais de dez anos: i cmcr fuser
nao hé distingéo entre a beleza produtiva de uma panela feita para cozinhar ali- Diese modal
‘mentos, uma crianga bem cuidada e decorada e um banco esculpido com esmero. i cfstos imam
Como afirmam os Piaroa (Venezuela), todos estes itens, de pessoas a objetos, sio eircom cfcicnaltil
frutos dos pensamentos (a’kws) do seu produtor, além de terem capacidades agen- ecparacioiciial
tivas préprias: sio belos porque funcionam, nio porque comunicam, mas porque anocio de arte
agem (Overing, 1991). cde no mundo in
Na classificagio piaroa, toda criagio pela qual um
derada seu altwa (pensamente). Portanto, os produtos do trabalho de uma pessea, 0
filho do mesmo ¢ uma transformagio xamanistica, como a transformagio do xama
«em jaguar ou anaconda, sio todos considerados os “pensamentos” desta pessoa, Os
ividuo & responsivel é consi-
produtos do rogado de uma mulher sio seu awa, assim como a zarabatana feita por
um homem é seu awa, ¢ um ralador feito por uma mulher é seu awa (Oveting,
1986, pp. 148-149).
‘wayana (fotografia d
Tintas, pinturas e objetos agem sobre a realidade de maneiras muito especiticas
que precisam ser analisadas em seu contexto. No caso do grafismo na pele dos Na tradigao pictér
jovens kaxinawa, a qualidade das linhas, sua grossura, era 0 que interessava as do modelo. A
pintoras, mais do que os nomes dos motives. O grafismo que cobria 0s corpos
das criangas nao servia de sistema de comunicagao, a informar por meios visuais
mam 0 modelo
de manecira que 3
producio, por xen
sobre 0 pertencimento desta pessoa a determinadas metades ou secdes; visava,
los no quadro. |
pelo contrério, unificar 0s corpos ¢ cobrir as peles. Sua fungao era performativa €
tuir 0 corpo, sua
produtiva, dizia respeito & dindmica relagao entre grafismo e suporte. © desenho
cobrindo a pele agia como filtro a deixar penetrar na pele € no corpo os cantos
€ os banhos medicinais sobre ele aplicados. O desenho abria a pele para uma in- tas vezes considera
tervencio ritual e coletiva sobre 0 corpo da crianca, que estava sendo moldado, produzida através d
ilo, representécl
fabricado, transformado. Como a maioria dos ritos de passagem amerindios, as ae ee. entee ang
interveng6es sobre o corpo visam moldar tanto a pessoa quanto o corpo do futuro tos. Na medida ¢
adulto. A reclusao, a dieta, 0 uso de eméticos e banhos medicinais, os testes de tual que acompa
resisténcia, ou seja, todo um conjunto de intervengées objetiva moldar um corpo pode ser redefin
forte, um “corpo pensante”, como dizem os Kaxinawa, “com coragio forte” — reve-ou artefato?
dilhas afri-
al contem-
e cognitiva
em sobre a
em que 0
a estrutura
etnografias
je dez anos:
yzinhar ali-
om esmero,
sbjetos, so
fades agen-
mas porque
ivel € consi-
na pessoa, 0
do do xama
1 pessoa. Os
ana feita por
va (Overing,
» especificas
na pele dos
reressava as
a 0s corpos:
clos visuals
Ses; visava,
formativa
O desenho:
0 0s cantos
ara uma in-
0 moldado,
erindios, as
0 do futuro
0s testes de
ir um corpo
orte” — reve-
Els Lagrou Amerindias:
Lando a simultancidade dos processos de modelagem fisica, mental e emocional.
A imagem tem sentido porque funciona e nao apesar do fato de ter utilidade. A
Jmagem sintetiza os elementos minimos que caracterizam a forma como 0 modelo
‘epera ¢ € por esta razdo que uma imagem é um indice e néo um simbolo ou um
Kone do seu modelo. Entre os Wayana, o tipiti, prensa de mandioca, é uma cobra
eonstritora, pois constringe como a cobra. No entanto, ele nao possui cabeca nem
sabo, para nao se tornar um ser independente que devora humanos. © ripiti é um
srefito que compartilha com a cobra a capacidade agentiva de constringir e ¢ isto
‘que se quer fazer com a mandioca (Van Velthem, 2003, p. 130). O tipiti wayana
702, deste modo, a légica da armadilha de enguia invocada por Gell. O que
5 artefatos imitam é muito mais a capacidade dos ancestrais ou outros seres de
produzirem efeitos no mundo do que sua imagem. Podemos entender, entio, por
Be 2 separagio entre capacidade produtiva e reflexo, proposta por Danto para
salvar a nocao de arte ¢ protegé-la da contaminagio pelo conceito de artefato, néo
procede no mundo indigena.
Fp swayana (forografia de Els Lagrou). Acervo do Museu do Indio.
Na tradicdo pictorica ocidental, temos que a cépia tende a ser de natureza
Sera do modelo. A pintura na tela ¢ feita de materiais distintos daqueles que
formam o modelo ¢, na sua confecgio, sio utilizadas técnicas préprias & pin-
+ dle maneira que as técnicas de producéo de um quadro difiram das técnicas
produgio, por exemplo, do corpo humano ou entao do vaso com flores repre-
eerados no quadro. Uma escultura de um torso humano também nao visa re
tituir 0 corpo, sua estrutura, nem seu modo de funcionar; somente pretende
Slo, representié-lo, No universo artefatual amerindio, no entanto, a cépia é
tas veres considerada como sendo da mesma natureza que o modelo, e tende a
= produzida através das mesmas técnicas que o original. Por essa raz4o, podemos
lar que, entre os amerindios, artefatos sio como corpos ¢ corpos séo como
tos, Na medida em que a etnologia comeca a dar mais atencio 20 mundo
sefarual que acompanha a fabricacio do corpo amerindio, a propria nocio de
0 pode ser redefinida
Isb1g] OU LUdB|pul eUIZUID Op ssouEULO,EgPerformances do cinema indigena no Brasil Arte on artefato?
Conclusio
Propusemos, nesse artigo, a exploragio das conseqiiéncias teéricas de langar
uum olhar etnol6gico para as artes indigenas. A especificidade deste olhar etnolég
co reside em no tomar como referéncia nenhuma definigao de arte previamente
dada, seja ela estética, interpretativa ow institucional. Visamos a uma espécie de
revolucéo copernicana para a arte, equivalente aquela operada por Pierre Clas-
tres em relacdo & politica, Em A Sociedade contra o Estado, Clastres mostra que
poderemos entender as estruturas politicas do igualitarismo amerindio apenas se
invertermos a perspectiva através da qual olhamos para as politicas amerindias.
Ao tentar entendé-las a partir de nossa politica, centrada na figura do Estado e da
coergio, somente poderemos vé-las sob a ética da falta: sua politica (ainda) nio &
como a nossa. Se, no entanto, invertermos a perspectiva, poderemos ver as nossas
sociedades com Estado enquanto construgées histéricas particulares e, portant,
passiveis de desaparecer. Ao olhar para nossa prépria sociedade tendo as sociedades
amerindias como referéncia, os critérias de avaliagio necessariamente mudam,
Els Lagrou
relagao, Belo Horizon
adaptada do primeiro
[2] Gell, 1998; Be
[3] Com relagao 3
t0 que o desejo de ve
nossa propria ideolog
talismis estéticos, do
indigena’ é essencialm
téticas do piblico dea
de outras culturas poc
Jado, considera etnocé
‘al moderno: “O pont
2 tradicio ocidental e
Amerindias:
sociedades primitivas
peu” (Severi, 1992, p.
século dezenove para
hhoje também ser usad
mundial de povos igus
[4] Gell, 1998, py
refere-se a uma operag
‘uma hiptese que se f
de incerteza. Quando
‘0 entanto, pode poss
© mesmo pode ser feito com aarte. Se olharmos para a arte como um proceso
de construgéo de mundos ~ e nao mais como um fendmeno a ser distinguido do
artefato, ou como uma esfera do fazer associada ao extraordindrio, que, para man-
ter sua aura de sacralidade, precisa ser separada do cotidiano ~ a relagao cognitiva
é alterada. Ao inverter figura e fundo, revels-se outta figura, outro fundo. Nada
na forma, nem no sentido ou contexto das coisas as predispoe a serem classifica~
das como arte ou nao. Podem ser obras de crte corpos humanos esculpidos pela
intervengio ritual, cuja forma é moldada tanto pelo canto quanto pelo banho
‘medicinal, pela dieta e ainda pela modelagem mais propriamente fisica (que pode
consistir em diferentes técnicas de producéo de corpos/pessoas considerados be-
los/éticas ¢ esteticamente corretos).
Um resultado é que 0 corpo se torna artefato conceitual ¢ o artefato um quase
corpo ¢ que os caminhos seguidos por corpos ¢ artefatos nas sociedades vio se
assemelhando cada vez mais. Outro resultado é que funcionalidade e contem- finda & pessoa represen
plagao se tornam inseparaveis, resultando a efick da capacidade de uma como indice da co
imagem agir sobre e, deste modo. criar e transformar 0 mundo. Esta possibilidade (5) A inferenciaab
da coexisténcia e sobreposicio de diferentes mundos que nao se excluem mutua-
mente é ligio a ser aprendida com a arte das amerindios.
wa de incerteza, dife
luctiva de Gell par
cia de alguém. O
campo da experién
sta que a fez com de
de alguém a partir
jtivos que podem faz
sjetos, ou obras de ar
igdo de agente-paci
objetos de arte, pre
‘=2do recipiente. Cada
Sente, Da combinacio
‘cnisas mediam relagdes
de relagées entre o sige
Els Lagrou, “Arte ou artefato? Agéncia e significado nas artes indigenas”, Revis-
ta Proa, n.° 02, vol. 01, 2010.
Notas
[1] © argumento deste artigo foi desenvolvido de modo mais completo
em livro recém-publicado, chamado Arte indigena no Brasil: agéncia, alteridade,Arte ou artefato?
Amerindias
: Editora C/Arre, 2009. O presente texto é uma versio
daptada do primeiro capitulo desta obra.
[2] Gell, 1998; Bourdieu, 1979; Overing, 1991, 1996.
13] Com relacao a definicdo da arte em termos estéticos Gell afirma: “Acredi
ue o desejo de ver a arte de outras culeuras esteticamente nos
a propria ideologia e sua veneracio quase religiosa de objetos de arte como
Hsmas estéticos, do que diz sobre estas outras culturas. © projeto de ‘estética
digena’ € cssencialmente equipado para refinar e expandir as sensibilidades es-
do piiblico de arte ocidental produzindo um contexto cultural no qual artes
Sutras culturas podem ser incorporadas” (Gell, 1998, p. 3). Severi, por outro
do, considera etnocéntrica a atribuicdo restritiva do conceito a0 mundo ociden-
moderno: “O ponto de vista etnocéntrico reserva o tert
sradicio ocidental ¢ nega
te6ricas de langar
ste olhar ctnoligi-
spouewuopiag
e arte previamente
a uma espécie de
a por Pierre Clas-
lastres mostra que
nerindio apenas se
liticas amerindias,
ura do Estado e da
itica (ainda) nao é
emos ver as nossas
iseig ou euadipur ewaur o
‘mo ‘arte’ somente para
que as produgées plisticas e figurativas das chamadas
dades primitivas possam refletir uma atitude comparivel a do artista euro-
Bs" (Severi, 1992, p.82) ¢ Morphy afirma: “Assim como arte podia ser usada no
lo dezenove para distanciar ‘outros’ povos dos Europeus civilizados, ela pode
também ser usada como instrumento ret6rico para inclui-los num:
dial de povos igualmente civilizados” (Morphy, 1997, pp. 648).
G4] Gell, 1998, pp. 13-16. Abdugao é um termo derivado da semidtica ¢
Ssre-se a uma operacéo cognitiva particular. A abducéo é um tipo de inferéncia,
hipétese que se formula a partir de uma percepgio que comporta certo grat
Bncerteza. Quando vejo fumaga, posso abduzir a existéncia de fogo. A fumaca,
atanto, pode possuir outras causas. A abducdo comporta, portanto, uma drea
¢ fisica (que pode ja de incerteza, diferentemente da lingua falada ou da matemitica. A inferéncia
considerados be- ductiva de Gell parte de um objeto que é interpretado como um indice da
pacia de alguém. O modo de a arte agir sobre a pessoa se situa, segundo Gell,
Sampo da experiéncia intersubjetiva em que uma imagem sempre remete a um
@sta que a fez. com determinadas intengdes, ou a alguém que a encomendou, ou
4 pessoa representada na imagem. A obra age na vizinhanca de pessoas e sera
i como indice da complexa rede de agéncias & sua volta.
15) A inferéncia abductiva de Gell, ou, em outras palavras,
de alguém a partir de um indice,
alares e, portanto,
endo as sociedades
mente mudam.
Mo uM processo
ser distinguido do
0, que, para man-
| relacdo cognitiva
utro fundo. Nada
a serem classifica-
os esculpidos pela
tanto pelo banho
a cultura
artefaro um quase
sociedades vio se
lidade e contem-
apacidade de uma
Esta possibilidade
excluem mutua-
a abdugao da agén-
tefere-se a muitos tipos de processos cog-
que podem fazer o objeto agir sobre a pessoa. Os indices sio artefatos,
05, ou obras de arte que estio inseridos numa cadeia interativa que alterna a
sisto de agente-paciente. O art nexus, 0 nd candnico de relagdes na vizinhanga
sobjetos de arte, prevé quatro posigées: a do artista, a do indice,
= do recipiente. Cada um destes pode se encontrar em posicéo de
|nte, Da combinacio destasrelag6es surgem todas as situagdes possiveis em que
medliam relagdes entre pessoas. A semidtica de Peirce (1977) prevé tréstipos
elagbes entre 0 signo eo objeto ao qual o signo se reporta: a
indigenas”, Revise
a do protétipo
agente ou pa-
mais completo
féncia, alteridade,
relacdo entre 0Performances do cinema indigena no Brasil Arte ou arefato? Rerou
referente e 0 simbolo é da ordem da convencio; assim, a relagio entre o simbolo CLASTRES, Pier
linguistico ¢ o objeto significado ¢ totalmente arbitraria. A relagio entre o refe- 2903.
rente ¢ 0 cone supée alguma relacio de semelhanca; jd a relagio entre 0 objeto ¢ DANTO, Arthur
seu indice é uma relagao de contiguidade em que o fndice participa da natureza do a Ase, ppl
objeto ao qual se refere. Gell decide na sua abordagem agentiva eliminar os dois DICKSTEIN, An
outros termos do sistema, o icone ¢ 0 simbolo, para ficar somente com o indice. lee seus conceit
que o autor quer enfatizar é que na perspectiva pragmatica ¢ interacionista do é2)/IFCS, UFRJ, Ri
seu modelo, nao é preciso distinguir indice de icone. Todo icone ja é, na verdade, DORTA, Sonia |
uum indice. Tendo em vista que a imagem age sobre a pessoa, ela partilha das quali- iro, Berta (Org,
dades daquilo de que ¢ imagem. Aqui, Gell segue Taussig em Mimesis and Alterity GELL, Alfred. A
(1993), que mostra como o envolvimento sensorial com o percebido estabelece 10 armadilhas. A
um contato entre o percepto e aquele que percebe, uma copresenga, por esta raz40 Visuais. Escola
Amerindias
ver e tocar sio experiéncias muito préximas. I's Net: Trap:
[6] Uma polémica surgida em torno de uma das instalagées do Arte-Cdade = I/l: 15-38, 199
em Sao Paulo (1994-2002) ajuda a esclarecer a questo. O artista estrangeiro Ac- .Artand A
conci construiu um confortavel abrigo para os moradores de rua. Quando a ex- 8.
posicéo terminou, a prefeitura retirou o abrigo do local sob intensos protests dos GONCALVES, }
moradores ¢ simpatizantes (Dickstein, 2006, p. 127). Caso tivesse sido permitido Cosmologia Ari
a obra efetivar de forma permanente sua utilidade para os moradores, ela deixaria GORDON, Cés:
de ser obra de arte e se tornaria projeto urbanistico. in-Mebéngokré.
{7] Ao chegar ao fim de um longo processo de aprendizado, o aspirante ao sta~ GUSS, David. T
tus de dono de canto captura um japim, come seu miolo cru ¢ leva 0 crinio com rican Rain Fore
bico para a aldeia. Ao chegar na aldeia, o mestre pega 0 bico do péssaro eo molha , 1989.
com pimenta-malagueta, depois toca repetidamente a lingua de seu discipule com INGOLD, Tim (
© bico, Enquanto procede deste modo, o lider canta para seu discipulo cuja lingua wropology, pp. 24%
saliva abundantemente. © mestre ¢ o japim fortalecem a saliva e a vor do novo KINDL, Olivia. |
lider de canto, transferindo para este seu préprio conhecimento e meméria. « pour voir”, In:
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Arte ow artefato?
Amerindias
A floresta de cri
Notas sobre a ont
Eduardo Viveiro
Introdugio
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