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EBOOK T3-Introdução Às Funções Executivas

Este documento discute as funções executivas e sua importância para a educação e aprendizagem. Em 3 frases: 1) Apresenta diferentes modelos teóricos de funções executivas, incluindo os modelos de Miyake, Diamond e Zelazo. 2) Discutem como as funções executivas estão presentes no nosso cotidiano através de uma história de ficção sobre um casal se preparando para o Dia dos Namorados. 3) Aborda a pesquisa crescente sobre funções executivas nas últimas décadas e conceit
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EBOOK T3-Introdução Às Funções Executivas

Este documento discute as funções executivas e sua importância para a educação e aprendizagem. Em 3 frases: 1) Apresenta diferentes modelos teóricos de funções executivas, incluindo os modelos de Miyake, Diamond e Zelazo. 2) Discutem como as funções executivas estão presentes no nosso cotidiano através de uma história de ficção sobre um casal se preparando para o Dia dos Namorados. 3) Aborda a pesquisa crescente sobre funções executivas nas últimas décadas e conceit
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Universidade Presbiteriana

Neurociência
Aplicada à
Educação e
Aprendizagem 3
módulo

Inteligência e Funções Executivas


Trilha 3 Introdução às Funções
Executivas
Sumário

1 Introdução ao estudo da trilha de aprendizagem p. 4


2 De que forma as funções executivas estão
presentes em nosso cotidiano? p. 6
3 Compreendendo o Conceito e Diferentes Modelos
de Funções Executivas p. 10
4 Síntese p. 20
5 Referências p. 22
4
Introdução ao
estudo da trilha de
aprendizagem

Olá, pessoal! Espero que vocês estejam bem e motivados


para a trilha dessa semana, denominada “Introdução às
funções executivas”. Nas próximas duas trilhas, iremos dar
uma pausa momentânea no tópico da inteligência, para nos
debruçarmos sobre este novo construto, que é bastante
relacionado à inteligência, como veremos a partir da trilha 5.

Iniciaremos o estudo desta trilha buscando compreender


como as funções executivas fazem parte do nosso cotidiano,
em todas as situações nas quais temos que agir com intenção
e não, simplesmente, com comportamentos automáticos.
Conheceremos a história de Marcela, uma moça romântica
e apaixonada, que planejou uma noite inesquecível para
o Dias dos Namorados com seu namorado João. Através
dessa história, veremos como as funções executivas são
fundamentais para que possamos nos organizar, fazer
planejamentos, resolver problemas, monitorar nosso
comportamento, pensar sob perspectivas diferentes,
raciocinar, e muitas outras coisas.

Tendo compreendido como as funções executivas


estão inseridas em nosso cotidiano, passaremos a uma
apresentação teórica sobre esse construto, iniciando pelas
suas conceituações e modelos, que ainda são objeto de
divergência entre os pesquisadores do assunto. Citamos,
como exemplo, uma revisão sistemática sobre os modelos de
funções executivas (BAGGETTA & ALEXANDER, 2016) que
mostrou a existência de 48 modelos sobre este construto.
Nesta trilha, abordaremos apenas três: os modelos de Miyake
e colaboradores (2000), Diamond (2013) e Zelazo (2016).
5 O primeiro modelo que abordaremos (MIYAKE et al., 2000)
é o mais citado entre os pesquisadores. Ele apresenta três
componentes centrais de funções executivas: inibição,
atualização e monitoramento da memória operacional,
e shifting, além de propor um fator executivo comum
subjacente a cada um dos componentes.

O modelo seguinte será o de Adele Diamond (2013), cujos


diferentes componentes das funções executivas são
basicamente os mesmos que os do primeiro, embora tenham
outros nomes: controle inibitório, memória operacional
e flexibilidade cognitiva. A inter-relação entre estes três
componentes principais dá origem aos componentes de
ordem superior. O modelo de Diamond nos interessará
não somente pelo atual reconhecimento da comunidade
científica, mas também pelas inúmeras pesquisas feitas por
esta autora associando funções executivas com educação
e aprendizagem, bem como analisando programas de
intervenção desenhados para a sua promoção.

Finalmente, o terceiro modelo será o de Zelazo, Blair e


Willouhby (2016), cujo foco não são os componentes das
funções executivas, mas, sim, os processos envolvidos
naquilo que denomina funções executivas frias e quentes
(MALLOY-DINIZ & DIAS, 2020). Consideramos este modelo
relevante porque sua proposta amplia o espectro deste
construto e destaca as habilidades socioemocionais,
tradicionalmente abordadas de forma discreta pelos demais
modelos.

Bons estudos e não se esqueça: se tiver dúvidas, entre em


contato com o seu professor(a)!
6
De que forma as
funções executivas
estão presentes em
nosso cotidiano?

Vamos dar início à nossa trilha, imaginando um casal de


namorados, Marcela e João, na manhã do Dia dos Namorados.
Marcela, uma moça muito romântica a apaixonada, já acorda
fazendo planos sobre todas as coisas que precisa fazer
para tornar aquela noite inesquecível! Pela manhã, planeja ir
ao salão de beleza para fazer um remake em seu o cabelo.
Depois, irá ao shopping comprar o presente que João deseja,
um relógio, e voltará para casa para fazer bombons especiais
que irão acompanhar o champagne bem gelado, à noite, na
casa de João.

Quando chega ao salão de beleza para colorir e cortar o


cabelo, Marcela descobre que Armando, seu cabeleireiro há
10 anos, está doente e não poderá atendê-la. Marcela entra
em pânico, porque só confia no trabalho de Armando para
cuidar de suas madeixas! Aos poucos, consegue sentar-se,
respirar e pensar. Quando Marcela volta a raciocinar com
clareza, pede para ver a lista dos cabeleireiros que estão
disponíveis para atendê-la. Escolhe o melhor possível e acaba
saindo do salão satisfeita.

Seguindo sua lista de atividades planejadas, Marcela vai ao


shopping comprar o relógio para João. Chegando lá, procura
com muita determinação em todas as lojas, mas não encontra
a marca desejada por João. Mais uma vez, Marcela precisa
decidir como resolverá esta questão. Resolve tomar um
cafezinho e, enquanto o faz, lembra-se de que João também
precisa muito de um novo par de sapatos. Decide então deixar
para dar o relógio no Natal e comprar com mais antecedência
para que o mesmo incidente não se repita.
7 No shopping, passa no supermercado e compra os melhores
ingredientes para seus bombons, além do champagne
favorito de João. Novamente, tece planos para chegar em
casa, colocar a bebida na geladeira e começar a produzir os
bombons dentro de uma organização que lhe possibilite dar
conta de todas as tarefas naquela tarde.

No início da noite, Marcela olha para tudo que fez e sente-


se feliz. Conseguiu fazer o máximo possível, que é sua meta
diária. Marcela toma banho, coloca a sua melhor roupa e
sai imaginando tudo o que acontecerá nesta noite mágica.
Quando chega ao porteiro eletrônico e fala com João, é
avisada de que a porta estará entreaberta para que ela possa
entrar sem entraves. No elevador, Marcela fantasia todas as
possibilidades que esta porta entreaberta pode esconder.
Entra devagarzinho no apartamento e depara-se com João, de
bermuda, camiseta do time, copo de cerveja na mão, deitado
no sofá, olhos vidrados na televisão (tanto que nem chega a
olhar para Marcela) e diz: “Amor, senta, fica à vontade, hoje
é dia de clássico do meu timão e não posso perder este jogo
por nada nesse mundo.” Nesse momento, Marcela se dá conta
de que João não se lembrara de que era Dia dos Namorados.
Mais uma vez, precisará de suas funções executivas para
ajudá-la a decidir o que fazer...

Você acaba de ler uma história de ficção para mostrar a


importância das funções executivas em nossa vida cotidiana.
Para compreender melhor o que são funções executivas, você
está convidado a assistir ao vídeo “Executive Function: Your
Brain’s Control Center”, disponível em: https://www.youtube.
com/watch?v=sZmElSGKBG8.

Depois de assistir ao vídeo, responda a si mesmo:


•  Com quem você se parece mais: Ann, Joe, ou com
nenhum dos dois?

+ Funções Executivas têm sido alvo de grande interesse


e pesquisa científica nas últimas décadas? Uma rápida
consulta à base de dados PsycInfo, utilizando os termos
8 “executive functions”, mostra um crescimento importante
do número de estudos publicados. Entre 1990 e 2000, 710
estudos foram publicados. Na década de 2000 a 2010, 3841.
Já, entre 2010 e 2020, houve publicação de 8792 estudos.

Para começarmos a construir um conceito amplo de funções


executivas, vamos assistir a mais um vídeo curto, da
pesquisadora Adele Diamond, disponível em: https://www.
youtube.com/watch?v=__8mV-7yAaE.

Vimos nesse vídeo que a pesquisadora conceitualiza funções


executivas da seguinte forma:

Funções executivas são uma


espécie de conceito guarda-chuva
para uma família de habilidades
mentais que você precisa dispor
quando não pode contar com
comportamentos automáticos
nem confiar em seus instintos ou
intuição para resolver determinada
situação. Portanto, você utiliza
funções executivas quando tem
que se concentrar, prestar atenção
e fazer aquilo que é necessário no
momento e não aquilo que seria
automático e intuitivo. (DIAMOND,
2016, tradução nossa)

! Você já se perguntou quais seriam as habilidades mais


importantes para que crianças possam ser bem-sucedidas
no século XXI?

Segundo Adele Diamond:


1.  Criatividade:
•  pensar de forma inovadora, fora dos padrões
convencionais;
•  conectar ideias, inventar.
9 2.  Flexibilidade:
•  ver novas oportunidades e ir em busca delas, ainda
que tenha que deixar de lado outros planos que foram
feitos anteriormente;
•  conscientizar-se de que se minha opinião era X,
mas recebi essas informações que não tinha, minha
opinião ficou Y.

3.  Autocontrole:
•  pensar antes de falar ou agir;
•  não falar pelos cotovelos;
•  não fazer algo de que você possa se arrepender;
•  resistir a tentações.

4.  Disciplina:
•  ter disciplina para permanecer em uma tarefa;
•  concluir uma tarefa, ainda que em alguns momentos
ela possa ter sido extremamente tediosa;
•  conseguir ficar focado, apesar das distrações;
•  continuar trabalhando em alguma coisa, mesmo
que a recompensa seja esperada para um futuro
distante.

Todas essas habilidades são funções executivas ou


dependem das funções executivas!
10
Compreendendo o
Conceito e Diferentes
Modelos de Funções
Executivas

Conceitualização de funções executivas

Como vimos na introdução, existe um extenso debate sobre


a conceitualização das funções executivas. De acordo com
Malloy-Diniz e colaboradores (2008), funções executivas
são um conjunto de processos mentais que, de forma
interdependente e conjunta, possibilitam que o indivíduo
direcione comportamentos a objetivos, simultaneamente
avaliando a eficiência e adequação desses comportamentos.
Estes processos mentais também ajudam a perceber que, se
as estratégias não forem eficazes, devem ser substituídas por
outras melhores.

Outros autores definem funções executivas como habilidades


cognitivas que possibilitam que o indivíduo mantenha o
foco de atenção, solucione problemas, organize-se, tome
decisões, planeje, corrija erros, estabeleça metas e controle
seus impulsos e comportamento (DIAMOND, 2013; DIAMOND
& LING, 2019; ZELAZO; BLAIR; WILLOUHBY, 2016). São,
portanto, alicerces para o desenvolvimento cognitivo, social
e moral. Além disso, possibilitam o gerenciamento de novas
situações e adaptação a mudanças, de forma rápida e flexível
(UEHARA; CHARCHAT-FICHMAN; LANDEIRA-FERNANDEZ,
2013 apud FLOR, 2020).

! Existe consenso entre os pesquisadores de que as funções


executivas seriam um construto multidimensional, formado
por componentes e processos distintos, porém, interligados.
A divergência entre profissionais refere-se ao número de
11 componentes e à forma como os componentes se organizam
e se inter-relacionam (BAGGETTA & ALEXANDER, 2016).

Muitas pesquisas também mostraram que as funções


executivas são preditoras de diferentes habilidades ao longo
da vida:
1.  Sucesso escolar, saúde, prosperidade, qualidade de
vida (MOFFITT, 2012);
2.  Prontidão escolar e desempenho acadêmico precoce
(BLAIR; RAVER, 2015);
3.  Desempenho acadêmico global (CLARK; PRITCHARD;
WOODWARD, 2010);
4.  Notas escolares (DUCKWORTH & SELIGMAN, 2005);
5.  Conclusão do Ensino Médio (VITARO et al., 2005);
6.  Habilidades matemáticas (VITTERBORI et al., 2015);
7.  Ganhos na leitura e alfabetização (SESMA et al., 2009;
LOCASCIO et al., 2010);
8.  Habilidade de fazer e manter amigos (HUGHS & DUNN,
1998);
9.  Harmonia conjugal (EAKIN et al., 2004 ).

Modelos de Funções Executivas

•  Modelo de Diversidade e Unidade de Friedman e


Miyake

Figura 1 - Akira
Miyake e Naomi
Friedman. Fonte:
UNIVERSIDADE
DO COLORADO –
BOULDER ([s./d.]).
12 Para Friedman e Miyake (2017), funções executivas são
! processos cognitivos de alta complexidade que, devido à
sua influência sobre os processos de baixa complexidade,
possibilitam a regulação de pensamentos e ações em
comportamentos direcionados a objetivos.

Utilizando um modelo de análise fatorial compreensivo,


Miyake e Friedman (2012) destacam três funções executivas
básicas: atualização (monitoramento constante e rápida
adesão/eliminação de conteúdo da memória operacional),
shifting (variação flexível de tarefas ou estados mentais) e
inibição (ignorar deliberadamente respostas predominantes).
Neste modelo, as funções executivas de ordem superior
resultariam da associação entre as funções executivas
básicas.

Por que o nome “Diversidade e Unidade”? Para estes autores,


cada função executiva individualmente (atualização, shifting
e inibição) seria uma combinação do que é comum às três
funções e do que é específico a cada uma delas. Ou seja, elas
não seriam completamente independentes entre si (DIAS et
al., 2015).

O modelo expresso no formato de esquema na Figura 1 mostra


na parte esquerda as três funções executivas individualmente.
Cada uma dessas funções seria decomposta em um fator
comum, chamado “Função executiva comum” e em um fator
específico (“atualização-específica”, “shifting-específico”).
O esquema não mostra um fator inibição-específico, porque,
quando se considera o fator comum (FE comum), não resta
variância exclusiva para o fator inibição-específico. Tal
fato permite concluir que o fator inibição se correlaciona
perfeitamente com o fator comum (FLOR, 2020).
Figura 2 -
13
Representação
esquemática
da unidade e
diversidade de três
FE. Cada FE resulta
da combinação de
um componente
comum a todas as
três FE (FE Comum)
e um componente
específico a si
própria. Nesta figura,
o componente
inibição-específico
está ausente, porque Para Miyake e Friedman (2017), o fator “FE comum” seria
correlaciona-se responsável por manter ativo o objetivo e as informações
perfeitamente com relacionadas à tarefa, além de utilizar tais dados na orientação
a FE comum, não do comportamento (DIAS et al., 2015).
restando variância
exclusiva de
inibição-específica. •  O Modelo de Diamond
Fonte: Adaptado
de MIYAKE &
FRIEDMAN (2012).

Figura 3 - Adele
Diamond. Fonte:
RESEARCHGATE
([s./d.]).

! Deixaremos a própria pesquisadora Adele Diamond


introduzir seu modelo e o tema, de forma ampla. Assista ao
vídeo “Adele Diamond: Executive Functions @ the Simms/
Mann Institute Think Tank” disponível em: https://www.
youtube.com/watch?v=39BYyfr3SeY.
14 Como vimos anteriormente, Diamond conceitua funções
executivas como uma família de habilidades mentais que você
precisa utilizar quando não pode contar com comportamentos
automáticos, nem confiar em seus instintos ou intuição
para resolver determinada situação. Seu modelo de funções
executivas destaca duas funções executivas primárias,
centrais: Controle Inibitório e Memória Operacional. Para
Diamond, a íntima inter-relação entre essas duas funções
primárias torna possível o funcionamento da terceira função
Figura 4 - principal, a Flexibilidade Cognitiva. A partir dessas três
Representação do funções, outros processos de funcionamento executivo
modelo de Diamond superiores são construídos, como, por exemplo, o raciocínio,
(2013), que mostra resolução de problemas e planejamento, conforme indica a
os componentes que
Figura 4.
constituem as FE e
a sua relação com
outros conceitos. A
inter-relação entre a
memória operacional
e o controle
inibitório possibilita
o funcionamento
da flexibilidade
cognitiva. A partir
dessas três funções,
outros processos
de funcionamento
executivo superiores
são construídos.
Fonte: DIAMOND
(2013) apud FLOR
(2020, tradução
Alessandra Seabra).

Diamond (2013) define o Controle Inibitório como


a habilidade de regular a atenção, comportamentos,
pensamentos e emoções para evitar respostas automáticas
e possibilitar escolhas embasadas na reflexão. É o controle
inibitório que permite o funcionamento da atenção seletiva
para focar em determinado objeto e desviar a atenção de
outros. Para Diamond, o controle inibitório está normalmente
a serviço da Memória Operacional. Além disso, o autocontrole
15 corresponde ao aspecto do controle inibitório que envolve
o controle dos comportamentos e emoções, resistindo a
tentações e evitando reações impetuosas. É o autocontrole
que mantém disciplina para manter uma tarefa, ignorando
distrações e tentações de fazer algo mais interessante,
mesmo quando a sua gratificação está distante.

Por sua vez, o conceito de Memória Operacional (MO)


envolve a sustentação de informações enquanto se trabalha
com elas mentalmente (BADDELEY & HITCH 1994). A
memória operacional é fundamental para dar sentido à
linguagem escrita e falada, seja em uma frase, parágrafo ou
texto. Da mesma forma, o raciocínio seria impossível sem
este componente, pois é ela que nos possibilita ver conexão
entre coisas aparentemente diferentes e fazer a síntese
dos elementos em um todo. Segundo Diamond (2013), a
Memória Operacional e o Controle Inibitório mostram-se
intimamente relacionados, necessitando um do outro para
o seu funcionamento. Instrumentos de intervenção para
a promoção de funções executivas como, por exemplo, o
PIAFEX (DIAS & SEABRA, 2013), utilizam estratégias em que
fica clara a íntima ligação entre estes dois componentes. Na
atividade denominada “Recontagem de História”, por exemplo,
as crianças são agrupadas em pares e uma das crianças deve
contar à outra uma história que ouviu na véspera. Para evitar
que as crianças falem no momento errado, PIAFEX utiliza
como mediador externo uma plaquinha com uma boquinha e
outra com uma orelhinha. O contador da história usa a placa
da boquinha e a criança que escuta a história, a orelhinha.
Desta forma, beneficiando-se de mediadores externos, o
controle inibitório evitará que a criança fale no momento
errado ou aja de forma indesejada, mantendo disponibilidade
de memória operacional para processar a história em sua
mente.

A terceira função executiva destacada por Diamond (2013)


é a Flexibilidade Cognitiva, habilidade que possibilita
a mudança de perspectivas. A Flexibilidade Cognitiva
mostra-se intimamente ligada à Memória Operacional e ao
16 Controle Inibitório, na medida em que, para usar uma nova
perspectiva, o indivíduo precisa inibir a perspectiva anterior
e ativar a nova perspectiva, a partir da Memória Operacional
(DIAS & SEABRA, 2013). Voltando ao exemplo do PIAFEX, as
crianças precisam alternar seus papéis, ora como contador,
ora como ouvinte. Nesse sentido, os mediadores externos
também poderão beneficiar o processamento da Flexibilidade
Cognitiva, lembrando à criança, via Memória Operacional, o
seu papel em determinado momento (FLOR, 2020).

Além das três funções executivas centrais, Diamond (2013)


também descreve em seu modelo as funções executivas de
ordem superior. Estas funções seriam o produto das inter-
relações entre Memória Operacional, Controle Inibitório e
Flexibilidade Cognitiva. A inteligência fluida seria uma delas.
Além desta, o modelo também cita a função de planejamento.

•  Modelo de Zelazo

Figura 5 - Phillip
Zelazo. Fonte:
REFLECTION
SCIENCES ([s./d.]).

! Zelazo define funções executivas como um conjunto de


habilidades neurocognitivas que sustentam o controle top-
down (orientação descendente do fluxo de informação)
dos pensamentos e emoções, sendo necessárias para
o raciocínio, ações intencionais, regulação emocional e
funcionamento social complexo (ZELAZO, 2020). Assim
17 como Diamond, este modelo destaca os três componentes
principais das funções executivas: Controle Inibitório,
Flexibilidade Cognitiva e Memória Operacional, que dão
origem às funções executivas complexas.

Este modelo sugere que os conflitos e incertezas seriam


gatilhos necessários para a ocorrência do processo de
reflexão (ou processo ativo de reprocessamento). No
momento de uma resposta, quando o indivíduo detecta
incertezas ou conflitos, ocorre uma interrupção do fluxo
do processamento automático e faz-se uma pausa. Este
processo permite que o indivíduo mantenha as informações
em mente e arquitete ações mais complexas, com maior
flexibilidade cognitiva e controle inibitório.

Assista a um vídeo de Zelazo, “Promoting EF Skills with


Reflection Training”, exemplificando esta questão: https://
www.youtube.com/watch?v=EoFN1InifD4.

Um aspecto importante do modelo de Zelazo é a


conceitualização de que as funções executivas (FE) variam
em um contínuo entre FE “frias e quentes”. As primeiras
envolvem processos que operam em contextos mais
neutros do ponto de vista afetivo, e as quentes envolvem
processos que atuam em situações significativas do ponto
de vista emocional e motivacional (ZELAZO & CARLSON,
2012). Segundo este autor, a maior parte das avaliações das
habilidades cognitivas em laboratório avalia as FE frias por
meio de tarefas descontextualizadas, sem um componente
afetivo ou motivacional importante. Problemas com FE frias
são associadas ao pobre desempenho acadêmico. Já as
FE quentes estão envolvidas na regulação das emoções de
forma deliberada, quando, por exemplo, um indivíduo se
esforça para diminuir a ansiedade, tristeza, raiva ou quando
ativa sua motivação para concluir uma tarefa (ZELAZO &
CUNNINGHAN, 2007). Além disso, as FE quentes operam nas
crenças e desejos, motivação, comportamento social, tomada
de decisão, experiência de recompensa/punição, teoria da
mente, interpretações pessoais e julgamento moral (UEHARA;
18 CHARCHAT-FICHMAN; LANDEIRA-FERNANDEZ, 2013 ).
Dificuldades com FE quentes estão associadas a problemas
de comportamento social e emocional.

Funções Executivas de Ordem Superior ou Habilidades


que Delas Dependem

Com os três modelos abordados, conhecemos os três
componentes centrais das funções executivas. A partir
destas, vimos que são formados os componentes de ordem
superior, fundamentais para os processos de ensino-
aprendizagem que serão discutidos nas trilhas vindouras.
Abordaremos alguns deles, assim como a sua importância
tanto para as atividades educacionais como para a vida do
indivíduo como um todo:

Organização: É um dos pilares da aprendizagem eficiente.


Segundo Meltzer (2014), a habilidade de sistematizar e
organizar informações subjaz a maior parte das atividades
acadêmicas e da vida cotidiana. Na escola, a organização
mostra-se como um processo multifacetado, que abrange
a organização dos materiais, do conhecimento, das
informações e das ideias (KRISHNAN & FELLER, 2010 ). Para
Dawson e Guare (2010), organização é uma habilidade que
possibilita a projeção e manutenção de sistemas cognitivos
para que se possa acessar informações e materiais.

Planejamento: De acordo com Meltzer (2014), a habilidade de


planejar implica em criar, organizar e executar as etapas de
uma tarefa, necessárias para que um objetivo seja alcançado.
Ela envolve o estabelecimento de objetivos específicos e
realistas, definição de atividades relevantes, previsão de
possíveis obstáculos, uso efetivo de estratégias, foco e
persistência.

Metacognição: Para Dawson e Guare (2010), metacognição


é a habilidade de olhar para dentro de si em um determinado
contexto e observar como se resolve um problema, o que
inclui as habilidades de automonitoramento e autoavaliação.
19 Os processos metacognitivos são a pedra fundamental
para a aprendizagem independente e autônoma. Através
deles, pode-se reconhecer quando, como e porquê usar
determinada estratégia, avaliar sua eficiência e continuamente
ajustar o seu uso, de acordo com a demanda da tarefa
(BAGNATO & MELTZER, 2010 ).

Autorregulação Emocional: O conjunto de habilidades de


regulação emocional envolve a capacidade de reconhecer
e nomear a própria emoção, entender os próprios gatilhos
emocionais, administrar a intensidade das próprias emoções
e saber quando e como expressá-las em contextos diversos
(STEIN, 2010 ). Segundo Meltzer (2010), na escola, o sucesso
acadêmico depende da habilidade do aluno de gerenciar
suas emoções de forma apropriada. Tanto o excesso de
demonstração como um controle rígido dos afetos podem
desencadear problemas no relacionamento aluno-professor
ou do aluno com seus pares.
20
Síntese

Após o estudo da conceituação e das bases neurobiológicas


da inteligência, esta trilha introduziu os estudos sobre as
funções executivas, construto altamente relacionado à
inteligência, como veremos na trilha 5.

Na introdução desse e-book, conhecemos a história do


planejamento de Marcela para o Dia dos Namorados junto
ao seu namorado João. Através dessa história, pudemos
perceber que as funções executivas estão presentes a todo o
momento em nossas vidas.

Nesta trilha, você conheceu três modelos que explicam


funções executivas: o Modelo de Miyake e Friedman, de Adele
Diamond e de Phillip Zelazo. Os dois primeiros destacam três
funções executivas centrais, o controle inibitório, a memória
operacional e a flexibilidade cognitiva. Segundo o primeiro
modelo, apesar de independentes, cada um dos componentes
também teria um fator “função executiva comum” que estaria
presente em cada componente, daí o nome do Modelo de
“Unidade e Diversidade”. Vimos também que o Modelo de
Zelazo é importante porque amplia a conceitualização das
funções executivas, as quais variam em um contínuo entre
funções executivas frias (envolvem processos que operam
em contextos mais neutros, do ponto de vista afetivo) e
quentes (envolvem processos que atuam em situações
significativas do ponto de vista emocional e motivacional).
Problemas com funções executivas frias são associados
ao pobre desempenho acadêmico. Já as dificuldades com
funções executivas quentes estão associadas a problemas de
comportamento social e emocional.

Finalizamos a introdução às funções executivas,


apresentando quatro componentes considerados de ordem
superior que são muito importantes para a nossa vida
21 em geral, especialmente, para as atividades escolares:
organização, planejamento, metacognição e autorregulação
emocional.

O conhecimento sobre funções executivas é fundamental


para educadores. Grande parte das dificuldades
apresentadas em sala de aula, muitas vezes diagnosticadas
como consequência de problemas de inteligência, familiares,
socioemocionais etc., tem origem em deficiências nas
funções executivas. Poder realizar um diagnóstico claro
e preciso torna o trabalho de reabilitação muito mais fácil
e eficiente. Porém, antes de entrarmos neste campo,
é necessário que conheçamos mais a fundo as bases
neurobiológicas das funções executivas e o seu processo de
desenvolvimento. Este será o tema de nossa próxima trilha.

Neste momento, após a leitura do e-book e dos textos


indicados para a trilha, oriento você a assistir à videoaula.
Para se preparar para os exercícios de fixação, releia suas
anotações e resumos que o ajudarão a compreender melhor
os conteúdos e ainda memorizar com mais facilidade.
Quando tiver concluído esta tarefa, passe à Atividade de
Aprofundamento sobre as funções executivas utilizadas por
Marcela no tão sonhado Dia dos Namorados. Nesta atividade,
você deverá assinalar os momentos no texto em que Marcela
fez uso de diferentes componentes executivos para executar
seu planejamento para a noite do Dia dos Namorados. Além
disso, também deverá apontar quais foram os componentes
executivos que ela utilizou, justificando o porquê, a partir de
exemplos do texto.

Bom trabalho e até a próxima semana!


22
Referências

BADDELEY, A. D.; HITCH, G. J. Developments in the concept


of working memory. Neuropsychology, v. 8, n. 4, p. 485,
1994.

BAGGETTA, P.; ALEXANDER, P. A. Conceptualization and


operationalization of executive function. Mind, Brain, and
Education, v. 10, n. 1, p. 10-33, 2016.

BAGNATO, J.; MELTZER, L. Self-monitoring and self-


checking: The cornerstones of independent learning.
Promoting executive function in the classroom, p. 160-174,
2010.

BLAIR, C.; RAVER, C. School Readiness and Self-Regulation: A


Developmental Psychobiological Approach. Annual Review
of Psychology, v. 66, p. 711-731, 2015.

CLARK, C. A.C.; PRITCHARD, V. E.; WOODWARD, L. J.


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