0 notas0% acharam este documento útil (0 voto) 181 visualizações11 páginasPor Que Não Ensinar Geometria Sérgio Lorenzato
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu,
reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF ou leia on-line no Scribd
POR QUE NAO
ENSINAR
GEOMETRIA?
1. A Omissao Geométrica
© ensino da Geometria, se comparado
‘com 0 ensino de outras partes da Matematica,
tem sido o mais desvairador, alunos, professo-
res, autores de livros didaticos, educadores &
pesquisadores, de tempos em tempos, tém se
deparado com modismos _fortemente
radicalizantes, desde o formalismo impregnado
de demonstragdes apoiadas no raciocinio logi
co-dedutivo, passando pela algebrizagéo e indo
até o empirismo inoperante. No Brasil, j4 fomos
mais além: a Geometria esta ausente ou quase
ausente da sala de aula. Varios trabalhos de pes-
quisadores brasileiros, entre eles Peres (1991)
e Pavanelo (1993), confirmam essa lamentavel
realidade educacional. E por que essa omiss&0?
‘Sao inimeras as causas, porém, duas delas es-
do atuando forte e diretamnente em sala de aula
a primeira é que muitos professores nao detém
os conhecimentos geométticos necessarios para
reaizago de suas praticas pedagégicas. Con-
firma essa afirmagéo a pesquisa “Os por qués
matematicos dos alunos e as respostas dos pro-
fessores” (Lorenzato, 1993) realizada com 255.
professores de 1*/4* séries com cerca de 10 anos
de experiéncia de magistério: submetidos a 8
quest&es(propostas por alunos) referentes &
Geometria plana eucldiana (conceitos de angu-
\o, paralelismo, perpendicularismo, crculo, per-
metro, area e volume), foram obtidas 2040 res-
postas erradas, isto ¢, o maximo possivel de er-
Tos. E mais: somente 8% dos protessores admi-
tram que tentavam ensinar Geometria aos alu-
1s, Considerando que o professor que néo co
nhece Geometria também nao conhece o poder, Sergio Lorenzato*
a beleza e a importancia que ela possui para a * racket Eerepta NA AMG
formas do futuro cidadao, entdo, tudo indica si
que, para esses professores, 0 dlema é tentarensinar Geometria sem conhecé-la ou entéo nao
ensiné-la. A segunda causa da omisso geo-
métrica deve-se @ exagerada importancia que,
entre nés, desempenha o livo didatico, quer
devido a ma formago de nossos professores,
quer devido a estafante jornada de trabalho a
que esto submetidos. £ como a Geometria ne-
les aparece? Infelizmente em muitos deles a
Geometria ¢ apresentada apenas como um con-
junto de definig6es, propriedades, nomes e f6r-
mulas, desligado de quaisquer aplicagdes ou ex-
plicagdes de natureza histérica ou l6gica; nou-
tros a Geometria é reduzida a meia dizia de for-
mas banais do mundo fisico. Como se isso no
bastasse, a Geometria quase sempre & apresen-
tada na itima parte do livro, aumentando a pro-
babilidade dela nao vir a ser estudada por falta
de tempo letivo. Assim, apresentada aridamen-
te, desligada da realidade, nao integrada com
as outras disciplinas do curriculo e até mesmo
nao integrada com as outras partes da propria
Matematica, a Geometria, a mais bela pagina do
livro dos saberes mateméticos, tem recebido efe-
tiva contribuigéo por parte dos livros didélticos
para que ela seja realmente preterida na sala de
aula
No entanto, a ca6tica situagao do ensino
da Geometria possui outras causas que embo-
ra mais distantes da sala de aula, no s80 me-
nos maléficas que as duas anteriores. Uma de-
las 60 ourriculo (entendido diminutamente como
conjunto de disciplinas): nos nossos cursos de
formagao de professores, que possibilitam ao
seu término o ensino da Matematica ou Didatioa
da Matematica (Licenciatura em Ciéncias, em
Matematica, em Pedagogia e Formagao para 0
Magistério), a Geometria possui uma fragilissima
posigao, quando consta. Ora, como ninguém
pode ensinar bem aquilo que no conhece, est
ai mais uma razao para 0 atual esquecimento
geométrico.
Eos programas e guias curriculares? Com
rarissimas excegGes, eles colocam a Geometria
‘como comple mento ou apéndice e cle modo for-
temente fragmentado, por assunto ou por série;
geralmente a Geometria é apresentada rigida-
mente separada da Aritmética e da Algebra. Isto
parece nao ser grave pois a maioria dos profes-
sores segue, na verdade, o livro didatico e no
a proposta curricular; no entanto os editores
exigem que os autores de livros sigam as pro-
postas curriculares. Dessa forma, os guias
curriculares afetam indiretamente 0 ensino da
Geometria em sala de aula.
&
© movimento da Matemética Moderna
também tem sua parcela de contribuigao no atual
caos_do ensino da Geomettia: antes de sua
chegada ao Brasil, nosso ensino geométrico era
‘marcantemente I6gico-dedutivo, com demons-
tragées, € nossos alunos o detestavam. A pro-
posta da Matemditica Moderna de algebrizar a
Geometria no vingou no Brasil, mas conseguiu
eliminar 0 modelo anterior, ctiando assim uma
lacuna nas nossas préticas pedagogicas, que
perdura até hoje.
Presentemente, esta estabelecido um oft-
culo vicioso: a geragao que nao estudou Geo-
metria nao sabe como ensiné-la.
Mas é preciso romper esse circulo de ig-
noraneia geométrica, mesmo porque jé passou
‘© tempo do “Ler, Escrever e Contar
2. Uma Questéo Geométrica?
Solugdes esporédicas ou pontuais nao
serdo suficientes para resolver a questéo da
omisséio geométrica, E preciso um amplo e con-
tinuo estorgo de diferentes areas educacionais
para que mudangas se efetivem no atual quadro
do ensino da Geometria escolar.
Muitas questdes esto para ser respondi-
das e, quase sempre, necessitando de prévias
pesquisas sobre a responsabilidade da recém-
nascida Educagao Matematica. Algumas delas
so: tendo em vista as possiveis exigéncias do
século XI sobre seus cidadaos, qual deveria
ser 0 curriculo geométrico minimo presente na
educagao? (Lorenzato e Vila, 1993). Qual é a
Geometria necesséria e conveniente para nds,
brasileiros? Ela deveria ser a mesma para todo
© continente brasileito? Como aproveitar os re-
Gentes @ enormes avangos tecnolégicos, psico-
lgicos e didaticos em favor do ensino e apren-
dizagem da Geometria?
Onde colocar o ponto de equillbrio dina-
mico entre o intuitivo € 0 dedutivo, o conereto e
© abstrato, o experimental e 0 ldgico, tendo em
vista uma aprendizagem significativa da Geo-
mettia?
Seré também necessério moditicar os
curriculos dos cursos de formagao de protesso-
tes, investir fortemente no aperfeigoamento do
professor em exercicio e langar novas publica-
‘ges tanto a alunos como a professores.‘Assim, a questo da renovagao ou res-
surreigao do ensino da Geometria nao ¢ infeliz~
mente apenas uma questo didatico-pedagog!
ca: 6 também social-epistemolégica, envolven:
do Universidades, Secretarias de Educagaio e
Editoras...e 6, ainda, uma questéo polltico-ad-
ministrativa, pois. 0 professor exerce uma fun-
a0 de vital importancia nesse processo de
transformagao e, com a atual remuneragao de
01 (um) real a hora-aula (ou 0.85 de délar/nov.
94), ele nao terd muitas condig&es para mudan-
gas, a ndo ser de profissao.
No entanto, fagamos nossa parte.
3. Pensamento Geométrico
E interessante observar que distintas so
as raz6es utilizadas pelos professores para jus
tificar a auséncia do estudo da Geometria nos
diferentes graus: “porque nao sel”, “porque nao
da tempo”, “porque os alunos preferem traba-
thar com numeros", “porque os problemas so
de contas”, etc. No entanto, nenhuma razao tenta
colocar em duivida os métitos proprios da Geo-
metria, Talvez, 0 maior de todos eles seja o fato
da Geometria exigir do aluno uma maneira es-
pecilica de raciocinar, isso quer dizer que ser
bom conhecedor de Aritmética ou de Algebra
nao é suficiente para resolver problemas de
Geomettia. Vejamos alguns exmplos:
1 exemplo: dado um circulo de raio co-
nhecidoe um reténgulo conforme a figura 1
quanto mede a diagonal 8D?
QK/ a
mm
2 exemplo: Compare as areas dos re-
tangulos escurecidos, na figura 2
@ exemple: na figura, quantos trian
gulls voce ve?
fig. 3
E muito comum, diante de questoes des-
te tipo, pessoas ficarem sem ago e se justitica-
rem dizendo que nao podem resolve-las porque
nao foram dados numeros ou medidas. Isso
denota a forte tendéncia que a nossa Educagao
Matematica tem imprimido aos alunos: a de
‘Aritmetizagao do raciocinio. Nos trés exemplos
citados, nao ha contas a fazer: as questées exi-
gem uma leitura diferente da Aritmética ou A
gébrica, na medida em que, para resolvé-las,
preciso ter percepgao geomeétrica, raciocinio
geomeétrico e linguagem geométrica, fatores
estes essenciais na relagao realformal e que
pouco tém sido desenwolvidos em nossas esco-
las devido & quase auséncia do estudo da Geo-
metria
4. Por que Aprender Geometria?
Na verdade, para justificar a necessida-
de de se ter a Geomettia na escola, bastaria 0
argumento de que sem estudar Geometria as
pessoas nao desenvolvem o pensar geométrico,
0 0 raciocinio visual e, sem essa habilidade,
elas dificilmente conseguiréo resolver as situa-
{goes de vida que forem geomettizadas; também
‘Nao poderao se utilizar da Geometria como fa-
tor altamente facilitador para a compreensao e
resolugao de questées de outras areas de co-
nhecimento humano. Sem conhecer Geometria
aleitura interpretativa do mundo torna-se incom-
pleta, a comunicagao das idéias fica reduzida e
a visao da Matematica torna-se distorcida
“A Geometria esté por toda parte”, desde
antes de Cristo, mas é preciso conseguir
enxergé-la...mesmo nao querendso, lidamos em.
nosso cotidiano com as idéias de paralelismo,
perpendicularismo, congruéncia, semelhanga,
proporcionalidade, medigao (comprimento, area
: volume), simetria: seja pelo visual (formas), seja
pelo uso no lazer, na profissao, na comunicagao
oral, cotidianamente estamos envolvidos com a
Geometria,
Pesquisas psicolégicas indicam que a
Sryaprendizagem geométrica 6 necessaia ao de-
senvolvimento da crianga, pois indmeras situa-
Ges escolares requerem percepeao espacial,
tanto em Matematica (por exempio: algoritmos,
medigées, valor posicional, séries, sequéncias...)
como na Leitura e Escrita,
‘A Geometria pode ser, ainda, um exce-
lente meio para a crianga indicar seu nivel de
compreensao, seu raciocinio, suas dificuldades
ou solugées. Um exempio interessante se refere
0 famoso problema: ‘entre coelhos € galinhas
tenho 7 cabegas e 20 pés, no total. Quantos
coelhos e quantas galinhas possuo?”. Os adul-
tos sempre esperam das criangas uma solugao
aritmética ou algébrica mas, eis o que uma cri-
anga fez apoiando-se em seu raciocinio visual
(figura 4):
7-~7orvsd
AAAA
AANA
ANA
ANA
3 4
fig. 4
‘Cada bicho tem sua casinha,..s80 7”
"2 pernas para cada bicho...sobraram
6 pernas...tem que ser dos coelhos'
“2 pernas mais para cada casinha.
"340 3 coelhos e 4 galinhas.
‘Aqueles que procuram um faciltador de
ptocessos mentais, encontrarao na Geomettia
© que precisam: prestigiando 0 processo de
construgao do conhecimento, a Geometria va-
loriza 0 descobrir, 0 conjecturar e 0 experimen-
tar.
Tomemos a faixa de Moebius (Figura 5) por
exemplo:
fig. 5
Criangas e adultos se surpreendem com
08 resultados do primeiro corte longitudinal, &
com 0 segundo também. E se a faixa for corta-
da longitudinalmente, mas deixando um tergo
da largura de um lado e dois tergos do outro? E
possivel continuar? Surpresas, conjecturas, su-
gestdes com imaginacao e criatividade é 0 que
invatiavelmente acontece na utilizagao desse
material didético, Nessa linha de pensamento,
98 livros de Gardner (1987) ou de Dudeney
(1970) so fontes inesgotdveis de sugestées
‘com quebra-cabecas, jogos, paradoxos, ilusGes
ticas, etc
A Geomettia é um excelente apoio as ou-
tras disciplinas: como interpretar um mapa, sem
© auxlio da Geometria? E um grafico estatisti-
0? Como compreender conceitos de medida
sem idéias geométricas? A hist6ria das civiliza-
es esta repleta de exemplos ilustrando 0 pa-
el fundamental que a Geometria (que é carre-
gada de imagens) teve na conquista de conhe-
cimentos artisticos, cientiticos e, em especial,
matematicos. A imagem desempenha importan-
te papel na aprendizagem e é por isso que a
feapresentagao de tabelas, formulas, enuncia-
dos, etc, sempre recebe uma interpretagao mais
{écil com 0 apoio geométrico.
‘A Geometria pode esclarecer situagdes
abstratas, facilitando a comunicagao da idéia
matematica. A figura 6, por exemplo, mostra a
prova geomeétrica intuitiva de que qualquer seg-
mento de reta possuii o mesmo numero de pon-
tos que um dado segmento AB, através da es-
tratégia de corresponder 1 a 1 todos os pontos
do segmento AB aos pontos da reta
Qual era sua expectativa, sendo a reta
mais comprida que o segmento?
Einstein tinha o habito de geometrizar suas
idéias: dizia que facilitava a comunicagao delas
e.a evolugao de seu pensamento; em 1921, ele
escreveu “Atribuo especial importancia a vis8o
que tenho da Geomettia, porque sem ela eunéo
teria sido capaz de formular a teoria da relati-
vidade”."
A Geometria é a mais eficiente conexaodidético-pedagogica que a Matematica possui
ela se interiga com a Arimética e com a Alge-
bra porque os objetos e relagdes dela
correspondem aos das outras; assim sendo,
conceitos, propriedades e questées aritméticas
ou algébricas podem ser claiicados pela Geo-
mitt, que reaiza uma verdadera tradugao para
O aprendiz, Vejamos alguns exemplos, sendo o
primeiro deles uma mera curiosidade
0123456789
(Quantos angulos cada numeral contém?)
q e
x'-1 = (x!) (&-1)
ged graet ded
8A Lenezeze3 o> 4
co
8.5 - x4
(Qs + 4x{+2+2
5. Tendéncias Recentes
Analisando propostas curriculares e livros
didaticos estrangelros pode-se notar algumas
tendéncias atuais referentes ao ensino da Geo-
metria,
5.1. A primeira tendéncia se
refere a questao:
“Quando como iniciar o longo processo
escolar de desenvolvimento do pensamento
escolar 7” E na Pré-Escola que esse proceso
deve se iniciar, sendo que a natureza do traba-
Iho a ser af desenvolvido deve basear-se numa
Geometria intuitiva e natural que promove a ob
servacdo ¢ a exploragao das formas presentes
1N0 espaco fisico imediato de ago e interacao
das criangas.
5.2 Tendéncias para 1°/4* Série
5.2.1 apresentagdo da Geometria como
elemento fortemente presente no meio ambien-
teda crianga; portanto, o conhecimento geoné-
trico escolar inicial ¢ natural, familiar;
5.2.2 as formas sao reproduzidas e
investigadas, independentemente de serem bi
0u tridimensionais;
5.2.3 especial atencao é dada as trans-
formagSes de forma (por combinagao de formas,
Por subdivisao de uma forma, por artefatos,...);
5.2.4 asidéias geométricas, sempre que
possivel, s40 associadas a idéias numéricas ou
a idéias sobre medidas,
5.2.5 vocabulario geométrico correto nao
6 exigido;
5.2.60 grande objetivo é favorecer 0 de
senvolvimento do senso espacial da crianga,
Para esta faixa etdtia da 1 4° séries, ha
recomedagées para que “sejam oferecidas mui:
tas oportunidades para que as oriangas
1. explorem Geometria em duas e em trés di-
mens6es;
2. deservolvam o senso espacial e estabelegam
relagdes espaciais;
3. resolvam problemas que envolvam Geome-
tria e suas aplicagdes a outros tépicos da Mate-
matica e a outros campos de conhecimento”.
‘Assim se expressou o Conselho Nacional
dos Protessores de Matematica dos Estados
Unidos (NCTM, 1989), em importante documen-
to.
Em termos de pratica pedagégica, as cri-
angas devem realizar inumeras experiéncias ora
‘com o proprio corpo, ofa com objetos e ora com
imagens; para favorecer o desenvolvimento do
senso espacial das criangas é preciso oferecer
situagdes onde elas visualizem, comparem
desenhem formas: 6 0 momento do dobrar, re
cortar, moldar, deformar, montar, fazer sombras
‘decompor, esticar...para, em seguida, relatar e
desenhar?; é uma etapa que pode parecer mero
passatempo, porém é de fundamental importan-
ciaNa verdade, podemos dizer que a ctian-
ga comega a adquirir 0 senso espacial a partir
do momento em que consegue exercer algum
dominio das relagdes dindmicas que se estabe-
lecem entre as partes do seu proprio corpo e/
ou entre seu corpo e os demas ao nivel do pen-
samento consciente, Nesse momento torna-se
possivel a aprendizagem de nogées espaciais
posicionais como as de direcao, sentido, atras,
perto, em cima de, etc.
A aprendizagem dessas nogdes espaci:
ais posicionais, juntamente com a de algumas
nogdes logicas elementares, so de fundamen-
tal importancia para a identilicagao, distingao e
representacao de formas geométricas muito tre-
quentes na Geometria elementar, identiicagao
esta que $6 se torna significativa quando a cri-
anga demonstra ter consciéncia dos atributos
espectficos necessarios que distinguem deter
minada forma de todas as demais formas espa
ciais possiveis.
E claro que, para atingir este estagio, a
ctianga precisa superar - ainda que locaimente
- algumas ilusdes que se manifestam no dom-
nio do espago perceptive. Uma delas é, por
exemplo, a crenga de que a forma de uma figu-
ra ou objeto varia em fungao da posigaio que
esse objeto ocupa no espago. Essa ilusdo é
gradativamente superada a medida que 0 es-
pago conceptual se constrdi interagindo com 0
‘espago perceptual. Tudo se passa como se as
nogdes desenvolvidas no ambito do espago
perceptivo, embora pedagogicamente necessé-
fias, livessem que ser retificadas e/ou substitu-
idas por aquelas que se processam no dominio
do espago conceptual
Nessa trajet6ria, o dominio do espago pela
ctianga se apresenta inicialmente Topolégico
(onde as linhas desenhadas ressaltam o dentro!
fora eo abertojtechado), depois Projetivo (onde
as propriedades espaciais invariantes so valo-
rizadas) e finalmente Euclidiano (onde surge a
métrica). Se as fronteiras entre essas “etapas”
de desenvolvimento geométrico nao estao bem
definidas, em compensagao suas caracterist-
cas se apresentam claramente nas criangas,
‘embora com variagées de tempo
Para desenvolver atividades geométricas
em sala de aula o professor encontrar inime-
ras sugestées em “Atividades Matematicas”
(Secretaria de Educagao/SP - 1989), em
“activités Géométriques a école élémentaire”
(Guibert, 1985) e, em parte, nos paradidaticos
das editoras Atual, Scipione e Atioa. Como au-
xiliares as atividades, surgem materiais, tais
como: sdlidos, poliminés, geoplanos, tangrans,
caleidoscépios, painéis, _ tecelagens,
dobraduras, quebra-cabegas, jogos, ilusdes oti-
cas... ¢ assim surgem as exposigdes de traba-
thos dos alunos, formam-se os laboratérios para
‘© ensino de Matematica.
5.3 Sugestées de Atividades
Seguem-se exemplos de atividades ou de
situag6es-problema_tteis para sala de aula
5.3.1 Com barbante, cordao ou fita, com
© inicio amarrado no fim, pedir para algumas
criangas que o segurem em pontos quaisquer:
poderao entéo formar distintas figuras de for
mas e tamanhos diferentes (figura 07), onde
poderdo ser exploradas entre outras, as nogdes
de diregao, orientagao, acima, abaixo, vertice,
lado, perimetro, angulo; poderao também ser
exploradas as consequéncias da alteragao do
numero de vértices da figura
fig. 7
Existe relagao entre o numero de vertices
0 ntimero de lados?
© aumento do nimero de vértices altera
© perimetro?
E possivel construir diferentes figuras com
perimetros iguais?
E possivel construir figuras com omesmo
perimetro mas com diferentes reas?
5.3.2 Um retangulo, por exemplo, dividi-
do por uma diagonal, gera dois triangulos com
(8 quais varias oulras figutas podem ser forma-
das (figura 08). Tente construi-las
fig. 08
Quantas figuras voce conseguiu?Qual 6 a maior e qual é a menor delas?
Como so 0s angulos internos dessas fi
guras?
5.3.3 Dados trés quadrados do mesmo
tamanho, forme figuras diferentes
Quantas voce conseguit/?
Quantas sao possiveis?
Agora tente com cinco quadrados: das
figuras que voce conseguiu, com quais dé para
montar uma caixa ?
5.3.4 Com um triangulo e um ponto (fora
dele) qualis) figura(s) vocé podera construir?
5.3.5 Uma figura escurecida esta sendo
mostrada somente em parte, como ¢ indicado
abaixo (figura 09):
fig. 9
Quais sao as possiveis figuras ?
5.3.6 Se uma pizza de 20 cm de raio cus-
ta igual a uma pizza de 12 cm de raio mais outra
de 14 cm de raio, como vocé faria o pedido ?
Por que vocé fez essa escolha ?
5.3.7 Como podemos construir um cerca-
do com 36 m de tela?
5.3.8 Na oficina de José, um cortedor de
6 mde largura deve ser guardado, A noite, por
um cdo; como José 86 dispée de uma corrente
de 4m de comprimento, como deve proceder
para que o cao tenha acesso a toda a largura
do corredor ?
5.4 Tendéncias para 5°/8* série
5.4.1 apresentar a Geometria como meio
de descrever 0 mundo fisico;
5.4.2 explorar as transformagdes de figu-
ras geométticas através de rotagao, translagao,
simetria e deformagao, ressaltando a semelhan-
ae a congruéncia,
5.43 utilizar a Geometria como auxiliar
para resolver problemas,
5.4.4 aplicar propriedades geomeétricas;
5.45 favorecer a emissdo e a verificagao
de hipoteses;
5.4.6 integrar a Geometria com a Aritmé-
tica e Algebra.
Qs estudos de Geometia da 5* a 8 série
devem favorecer as oportunidades para os alu-
nos realizarem suas primeiras exploragdes de
modo sistematico. E nessa fase que as primei-
ras dedugdes logicas sao construidas; os resul-
tados e 08 processos devem ser discutidos,
embora sem a preocupagao com sua
formalizagao,
© vocabulrio proprio da Geomettia tam-
bém deve ser empregado corretamente, com
vistas ao dominio das definigdes e das proprie-
dades. Longe de valorizar a memorizagao ou a
evocagao de definigSes, enunciados, demons-
tragées ou formulas, o objetivo é 0 processo pelo
qual se chega ao resultado visando & compre-
ensao e ao significado. Assim sendo, a explora-
G0 informal da Geometria ¢ muito adequada e
ecesséia para os estudantes da 51/8 séries,
para os quais devem ser olerecidas oportuni-
dades de comparacao, classiticagao , medica,
Tepresentagao, construgdo, transformagai,...O
apoio do material didatico, visual ou manipulavel,
ainda é fundamental. Alias, o material didéttico
sempre sera necessatio porque ele simplesmen-
te provoca a imaginagao em qualquer idade.
6. O Modelo van Hiele
Por questao de justiga, deve ser aqui ci-
tada a contribuicéo do casal van Hiele. Sob a
otientagao do eminente educador matematico
Hans Freudenthal, os van Hiele pesquisaram 0
ensino da Geometria com alunos de 12 e 13
anos; eles colocaram énfase na manipulacao de
figuras, acreditando que o procedimento did
0 adequado podia melhorar a aprendizagem
do aluno e que esta nao se dava quando o nivel
de ensino era superior ao nivel de pensamento
do aluno. No Brasil, 0 importante trabalho dos
van Hiele ainda ndo recebeu o devido reconhe-
cimento, mas quem pretende ensinar Geome:
tria ou pesquisar sobre o ensino da Geomettia
indo pode deixar de conhecer 0 “Modelo de Van
Hiele”, que concebe diversos niveis de aprendi
zagem geométrica (ou niveis de desenvolvimen-
to do pensamento geométrico) com as seguin-
tes caracteristicas: no nivel inicial (visualizacao),
as figuras so avaliadas apenas pela sua aparéncia: a ele pertencem os alunos que s6 con-
seguem reconhecer ou reproduzir figuras (atra-
vés das formas e ndo pelas propriedades); no
hivel seguinte (andlise) os alunos conseguem
perceber cacterfsticas das figuras e descrever
algumas propriedades delas; no outro nivel (or-
denacao), as propriedades das figuras $40 or-
denadas logicamente (inclusdo) e a construgao
das definig6es se baseia na percepgaio do ne-
cessério e do suficiente, As demonstragSes po-
dem ser acompanhadas, memorizadas, mas di-
ficimente elaboradas. Nos dois niveis seguin-
tes esto aqueles que constréem demonstragdes
que comparam sistemas axiomaticos®.
No Brasil muito do nosso ensino de Geo-
metria fica no nivel inicial, onde os alunos ju
gam que o quadrado nao ¢ retangulo s6 porque
possuem aparéncias diferentes.
7. Entrando na Sala de Aula
Além de dispor de bons materiais e sa:
ber usé-los corretamente, ¢ preciso que em sala
de aula, o professor assuma a postura de
orientador para a aprendizagem: assim, ele no
responderd ao aluno mas 0 conduziré a desco-
berta. A fim de facilitar essa tarefa, segue al-
gumas questées que deveriam estar sempre
Presentes as aulas, principalmente nas de Geo-
metria
- Por que voce pensa assim?
- Como vocé chegou a essa conclusao?
- Isso vale para outros casos?
- Como isso pode ser dito de outro modo?
- E possivel representar essa situagao?
- 0 que isto quer dizer?
- Por que vocé concorda?
Existem outras possibilidades?
=O que mudou?
= Como isto é possive!?
A fim de esclarecer methor algumas idéi-
as anteriormente apresentadas, pensando na-
queles que estao em sala de aula, seguem-se
algumas sugestées. Algumas delas possibilitam
diferentes estratégias ou caminhos para obten-
¢40 da solugdo; outras possuem varias solugées
que podem ser encontradas por apenas uma
estratégia; outras, propositalmente redigidas, in-
duzem os alunos & necessidade de estabeleci-
mento de critérios que definam 0 que pode ser
considerado como solugo; outras ilustram a
integragao de conhecimentos de éreas distin-
tas da Matematica. De modo geral elas favore-
cem a vizualizagao, exploragao, experimenta:
20, andlise, imaginagao, criatividade... e po-
dem ser adaptadas ao nivel dos alunos.
O objetivo é dar preferénoia a uma apren-
dizagem menos especitica ou pontual e mais
aberta, livre, integrada, prodtiva e principalmen-
te significativa para o aluno, legando a ele uma
visdo matematica diferente daquela que tradici-
‘onalmente temos sido autores e vitimas.
= Quantos quadrados vocé vé na figura
10 E retangulos?
fig. 10
- Tome um conjunto de palitos de mesmo
comprimento, Escolha s6 3 e forme um triangu-
lo. E possivel formar outros triangulos diferentes
deste s6 com 3 palitos? E,com 4? E com 5? E
com 6? com 7?
\weV
- Justapondo 6 quadrados de mesmo ta-
‘manho, quantos retangulos voce consegue cons-
truir, usando todos os 6 em cada vez? E com 12
quadrados? E com 7? Qual 6 0 assunto em ques-
to: Area, perimetro, fatoragao, divisores, nime-
ros primos, quadrados perfeitos ou comutativi-
dade?
- Marque 4 pontos sobre uma circunfe-
réncia e ligue-os. Compare o resultado com seus
colegas.
- Todos os meus Angulos sao iguais. Te-
nho 4 lados e eles ndo sao todos iguais. Quem
sou eu?
- Qual é 0 menor caminho de A para B
‘mas tocando na retar?- Como passar uma feta por P e pelo en-
contro de 1 com s se a intersegao cai fora do
desenho?
fig. 13,
a
- De quantos modos distintos & possivel
planificar um cubo?
- Corte um retangulo por uma de suas
diagonais. Quantas figuras distintas vocé con-
segue montar com essas partes? Dentre as fi
guras montadas, qual é a de menor perimetro?
Qual delas tem a maior area? Quais outras pro-
ptiedades vocé pode observar? E se vocé ti
vesse 2 retangulos cortados pelas diagonais,
que figuras poderia montar?
Compare os 3 quadrados (figurat4): a
questdo é sobre teorema de Pitagoras, propor-
ionalidade ou nimeros irracionais?
\J
VAI fig. 14
- Escolha um quadrado qualquer e cons-
trua um outro que tenha o dobro do lado do pri
meiro (figura 15). Compare o contorno do maior
com o do menor. Compare as areas doles.
que quando se duplicar o lado de uma figura
Para se produzir outra semelhante, a area € 0
volume também duplicarao?
ae
- Qual 6 o limite da série:
12+ 114 + 118 + 1/16 + 1192 + 1/647
AN
fig.16
8. Novos horizontes
geométricos
Felizmente nos tltimos anos tém surgido
contribuigées de boa qualidade para alunos e
para professores, com vistas ao ensino da Geo-
metria, Exemplos disso sao 0s dois videos “Ob-
setvando a Natureza” e *Na Trilha de
Arquimedes’, langados pela UNICAMP em nov!
94; 0s videos (6) Sobre “Geometria” dos Proje-
tos da Secretaria de Educagao de Sao Paulo
(TV Cultura) - SP; os (10) videos do projeto ensi-
no a distancia da Secretaria Extraordinaria de
Programas Especiais do Governo do Estado do
Rio de Janeiro - 1994 (TV Manchete); as cole:
¢6es paradidaticas das editoras Atica, Scipione
e Atual; as publicagdes de tradugées de obras
do NCTM (National Council of Teachers of
Mathematics) pela Atual Editora. Isso sem men-
cionar a revolugao que o computador vem pro-
vocando pelo menos em algumas escolas,
Esta lista omite muitas outras iniciativas
de professores andnimos, que acreditam poder
melhorar o ensino e a aprendizagem, que pro-
curam se aperfeigoar e constuir seus LEM (La
boratério de Ensino de Matematica), incluindo
desde aqueles que importam material didatico
até aqueles criativos que constréem figuras ge-
‘ométricas com folhas de bananeiras, como jé
vvimos em Rio Branco (AC), 1973.
No entanto, necessitamos de mais pes-
quisadores e de muito mais pesquisas sobre o
ensino da Geometria: das quase 270 pesquisas*
realizadas entre 1971/1994 (Fiorentini, 1994) no
Brasil referentes & Educagao Matematica, ape
nas 5% se referem a Geomettia e nenhuma de-
las investiga a faixa 1® a 4 séries!
Ao lado de novas pesquisas o ensino da
Geometria merece, ainda, um novo curriculo, e
novos livros didaticos,
E novos professores também?
Bibliografia
1, Barbosa, A, M., Descobrindo Padres
Pitagéricos, Editora Atual, S40 Paulo, 1993,
2, Castelnuovo, E, @ outros, Le Material pour
Venseignement das Mathematiques, Delachaux etNiestle, Paris, 1967
3. Dudeney, H. £., Amusements in
Mathematics, Dover Publications, New York, 1970.
4. Finetti, B., “Saber ver" da Matematica,
Conceptos de Matematica, n® 43, Buenos Aires, 1977,
5. Gardner, M., Mathematical Puzzles and
Diversions, University of Chicago Press, Chicago,
1987,
6. Guibert, A. ¢ outros, Activités Géométriques
{a fécole ekémentaire, Armand Colin, Paris, 1985.
7. Kalatf, A. M, ¢ outros, Desenvolvimento do
Pensamento Geométrico - 0 modelo. de Van Hiele
Bolema n® 10, UNESP, Rio Claro, 1994,
8. Lorenzato, S.. "Os “porques” Matematicos
dos Alunos e as Respostas clos Professores”, Pré-
posigées, vol. 10, Faculdade de Educagao,
UNICAMP, Campinas, 1993.
9. Lorenzato, S., Vila, M. C., Século 20%: qual
Matematica é recomendavel?, Zetetiké, n? 01
UNICAMP, Campinas, 1993.
10. Miguel, A., Miorim, M. A. - Ensino da
Matematica no Primeiro Grau, Editora Atual, S40
Paulo, 1986.
11. NCTM (National Council of Teachers of
Mathematics), Curriculum and Evaluation - Standards
for School Mathematics, Reston, 1989
12, NCTM (National Council of Teachers of
Mathematics), Professional Standards for Teaching
Mathematics, Reston, 1991
18, ©'Datler, P., Clements, S. R. - Geometry:
an investigative approach, Addison - Wesley P. C.
Minos, 1976.
14, Pavanelo, R. M., © Abandono do Ensino
da Geometria no Brasil: Causas e Consequéncias,
Zetetiké - n? 1, UNICAMP, 1993
15, Perez, G.,. Pressupostos e retlexdes te6r
cas e metodolégicas da pesquisa participante no
ensino da Geometria para as camadas populares (1?
¢ 2 graus), tese de doutorado, Faculdade de Edu:
‘eagao, UNICAMP, Campinas, 1991
16, Secretaria de Educagao/SP, Atividades
Matematica, $a0 Paulo, 1989
# da Conteréncia ‘tieometia e Experiéncia’, proter
dda a08 27/01/1921 na Academia Prussiana de Ciencia.
2 Coneuite Zatetiké (Revieta do Ckeulo de Estudo,
Meméria @ Pesquiea em Educagao Materdtica - Faculdade
{de Educagao)n* 2, UNICAMP, Campinas, 1984, oarligo de
Uc. Pais
2 veja em BOLEMA (Bolatim de Educagao Matersti-
ca) n# 10, UNESP, Rio Claro, 1994, 0 artigo de A. M. Kale ©
* suas cépias constituem 0 Banco de Teses do
CCEMPEM (Cireulo de Estudo, Memévia © Pesquisa) da Facul
dade de Edueagao da UNICAMP,