Horizontes Espiritanos
Volume 14 Issue 14 Article 8
Fall 2019
Desafios e Futuro da Missão Espiritana
John Maturin Mougheney
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Mougheney, J. M. (2019). Desafios e Futuro da Missão Espiritana. Horizontes Espiritanos, 14 (14).
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Jean Maturin Mougheney, C.S.Sp.
DESAFIOS E FUTURO DA
MISSÃO ESPIRITANA
Introdução
Num primeiro momento concreto da vida de Jesus, a
missão é apresentada por Lucas em um relato de sua visita
a Nazaré (Lucas 4: 16-20), citando Isaías (61: 1-2). Jesus é
Jean Maturin Mougheney, retratado como aquele que chega oferecendo a possibilidade
C.S.Sp. de vê-lo1. Na era apostólica, a Igreja recebeu a missão de
Jean Maturin Mougheney, C.S.Sp.,
pertence a circunscrição de Gabão.
levar a mensagem de Jesus a todos os homens2. Isso significa
Atualmente ele estuda teologia que a Igreja manifesta a sua natureza ao fazer missão. Nós,
na casa de formação em Langata, espiritanos, estamos envolvidos nessa missão da Igreja,
Nairobi. Ele partilhou o primeiro assumimos o dever de evangelização Ad gentes. Esta tarefa
lugar na competição de Missão não é fácil de executar. Quando a Igreja enfrentava desafios
Espiritano Hoje com a reflexão
seguinte.
na história, nossa Congregação enfrentava e continua
enfrentando desafios no que diz respeito à missão. Portanto,
Traduzido da inglês pelo P. Pedro K. podemos perguntar: O que é a missão espiritana e como
Iwashita, C.S.Sp. São Paulo, Brazil a Congregação atua na missão da Igreja? Quais podem ser
suas fontes, seus possíveis desafios e seu futuro neste mundo
desafiado pela ditadura da globalização?
Para uma melhor compreensão do nosso trabalho,
começamos falando sobre a missão espiritana vista por seus
fundadores, como ela está relacionada aos documentos
conciliares e pós conciliares e como é apresentada em
alguns documentos espiritanos. E a última parte quer estar
consagrada aos desafios da missão, em todos os níveis e no
seu futuro.
Ideias de missão dos fundadores
Poullart des Places
A missão espiritana nasceu em Pentecostes do ano de
1703, quando Poullart dedicou sua congregação ao Espírito
Santo sob a proteção de Maria Imaculada. Koren escreve:
“O senhor Poullart des Places ..., então apenas um aspirante
ao estado eclesiástico, iniciou o estabelecimento da referida
Comunidade e Seminário consagrado ao Espírito Santo sob
a invocação da Santíssima Virgem concebida sem pecado”3.
Poullart formou missionários que podiam se dedicar ao
Espírito Santo para completar a obra de Jesus.
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Os missionários formados por Poullart des Places
eram para aceitar a missão onde quer que fossem. Koren
apresenta as características dos missionários espiritanos na
expectativa de Poullart: “Claude queria que seus sacerdotes
estar dispostos a aceitar fossem sacerdotes no verdadeiro sentido do termo, bons
e até preferir as funções pastores, não mercenários. Esta foi a razão pela qual eles
mais humildes e difíceis na deveriam estar dispostos a aceitar e até preferir “as funções
Igreja, para as quais é difícil mais humildes e difíceis na Igreja, para as quais é difícil
encontrar trabalhadores encontrar trabalhadores”4. A ênfase está no verbo aceitar e na
expressão para as quais é difícil encontrar trabalhadores. Esses
dois elementos mostram o compromisso, a paixão que os
missionários espiritanos desenvolveram no tempo de Poullart
no que diz respeito à missão espiritana.
Francisco Libermann
Cento e trinta anos após Poullart, Libermann se
tornou o líder e preservou as ideias de missão desenvolvidas
por Poullart des Places. Mas ele substituiu a idéia de
“ir a qualquer lugar do mundo onde houvesse trabalho
missionário a ser feito” por “pelos escravos e negros”.
Escravos e negros se tornaram o coração da missão espiritana:
Oito dias após Hérard fechar os olhos na morte,
Libermann teve seu primeiro papel no trabalho
para os negros [...]. Os membros da Congregação
se consagraram inteiramente para pregarem as boas
novas de Jesus Cristo e estabelecer seu reino entre as
almas mais pobres e mais abandonadas5.
Francisco Libermann, ao dirigir sua missão aos negros,
também recomenda seus missionários serem conduzidos
pelo Espírito Santo a quem ele chama de protagonista
da missão. Padre Malinowski comenta sobre o ensino de
Libermann sobre o Espírito Santo da liberdade dizendo,
“Na complexidade de ir ao socorro dos pobres, fracos
e oprimidos, a pobreza de meios e a impotência do ser
humano, se esforçavam para ter maior confiança no Espírito
Santo. O Espírito agora é invocado para que seja uma luz
para o caminho missionário e uma presença consoladora no
labor e na fadiga do missionário”6.
Alguns desafios
O que podemos reter dos dois fundadores sobre a
missão dirigida aos pobres, os mais abandonados, os escravos
e o povo negro? Os primeiros missionários espiritanos
enviados tinham alguns desafios, como a barreira da língua,
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Jean Maturin Mougheney, C.S.Sp.
viagens em canoa que tomou um longo tempo para chegar
até o lugar da missão, o desafio de converter sociedades
Africanas consideradas colônias dos colonizadores por tanto
tempo, e finalmente, o desafio de estudar o caráter do povo
e examinar as tendências de seus corações, suas inclinações e
afeições7.
Documentos do Vaticano II e missão espiritana
O Vaticano II realmente influenciou a missão espiritana
desde que deu à Igreja uma missão. O que com certeza
podemos afirmar é que a missão Espiritana não se afastou
da nova direção dada à Igreja pelo Concílio. E por isso os
documentos do Vaticano II podem ser considerados como
uma das maiores fontes da missão Espiritana hoje.
Ad Gentes Divinitus
A Igreja encontra sua natureza fazendo missão, e essa
missão é conduzida pela terceira pessoa da Trindade, o
Espírito Santo (AG, 2). Esta visão do Espírito Santo como
o agente, par excellence, da missão já esteva a funcionar na
época de Libermann, especialmente quando ele convida
Schwindenhammer para ser conduzido pelo Espírito Santo:
“O Espírito Santo quer ser a alma de nossa alma. Nossa
tarefa é fazer dele um governante absoluto de nosso espírito.
Deixe-o agir em você como nosso corpo deixa nossa alma
agir por dentro, movendo-a como quiser...”8. Hoje nós,
espiritanos, consideramos o Espírito Santo como o agente,
par excellence, de nossa missão.
Na mesma perspectiva da missão ad gentes, a missão
Espiritana é ainda baseada no envio de Espiritanos
para os lugares onde a Igreja tem dificuldade de enviar
evangelizadores. A missão Espiritana se estende para o
mundo todo, incluindo países islâmicos, como no caso de
Paquistão, onde o Cristianismo não é ainda uma religião
reconhecida. Em resumo, podemos dizer que Ad gentes
realmente encorajou a Congregação no sentido de manter
a ideia missionária – para anunciar o Evangelho em áreas
difíceis.
Gaudium et Spes
Gaudium et spes fez com que algumas congregações
missionárias revisassem suas Constituições, a fim de
incorporar as ideias levantadas pelos Padres Conciliares
a respeito da missão. O alvo fulcral aqui é que a Igreja se
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mostre solidária a todos os homens e mulheres9. Relacionada
a isso, a missão espiritana é, portanto, trazer alegria e
esperança a todos, especialmente aos desesperados e aos sem
alegria encontrados na África imediatamente após o fim do
vergonhoso tráfico de escravos. O missionário espiritano tem
O alvo fulcral aqui é a missão de mostrar solidariedade às pessoas que encontra
que a Igreja se mostre na missão. Essa solidariedade deve ser expressa em ouvi-los,
solidária a todos os vivendo e caminhando com eles, e trazendo-lhes alegria
homens e mulheres e esperança. Foi isso que temos feito até agora em nossa
experiência pessoal em missão?
Evangelii Nuntiandi
É uma das primeiras Exortações Apostólicas do Papa
Paulo VI sobre Evangelização no Mundo Moderno expondo
sobre missão e o papel dos missionários na Igreja. Apenas
10 anos após o Vaticano II, Paulo VI esclareceu os diferentes
papeis do Povo de Deus: o Sucessor de Pedro (o Papa), Bispos
e Sacerdotes, Religiosos, Leigos, Família e Jovens. Teremos
que olhar para o papel dos religiosos, pois é mais relacionado
com nosso tópico. Para o Papa Paulo VI, há muitas tarefas
na Igreja cumpridas por diferentes grupos de pessoas no que
Toda a Igreja, portanto, diz respeito à missão: “Toda a Igreja, portanto, é chamada a
é chamada a evangelizar evangelizar e, contudo, dentro dela temos diferentes tarefas
e, contudo, dentro dela evangelizadoras a realizar. Essa diversidade de serviços na
temos diferentes tarefas unidade da mesma missão compensa a riqueza e a beleza da
evangelizadoras a evangelização”10. Além disso, a coisa mais importante é onde
realizar ele apresenta o papel dos religiosos dedicados à missão, o que
inclui nós os Espiritanos, ele afirma:
Outros religiosos, em grande número, se dão
diretamente à proclamação de Cristo. A atividade
missionária deles depende da hierarquia e deve ser
coordenada com o plano pastoral, que este último
adota [...]. Graças à sua consagração, eles estão
eminentemente dispostos e livres a deixar tudo e
a proclamar o evangelho até os confins da terra.
Eles são empreendedores e seus apostolados são
frequentemente marcados por uma originalidade,
por um gênio que exige admiração11.
Pela citação acima, observamos claramente que o papel
dos espiritanos é evangelizar todos os homens e as mulheres
e trabalhar em harmonia com a Igreja local. Agora vamos
analisar alguns documentos espiritanos sobre a missão.
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Jean Maturin Mougheney, C.S.Sp.
Missão espiritana após o Vaticano II: uma crise
na família espiritana
Considero este ponto muito importante, pois mostra
como nossa família Espiritana se tornou dividida no
despertar do espírito do Vaticano II. O espírito do Vaticano
II foi baseado no aggiornamento, na renovação da vida da
Igreja. A Congregação do Espírito Santo, compartilhando
a mesma missão da Igreja, também quis renovar suas
maneiras de fazer missão. Três anos depois do Vaticano II
(1968), um Capítulo Geral da Congregação foi realizado
quando Mgr. Lefebvre era o superior geral. Ele decidiu se
afastar da Congregação e da Igreja Católica, pois ele foi
contra a colegialidade e governo colegial12. Podemos parar por
um momento e pensar em como seria uma Congregação
sem pastor? Felizmente, um bom número de missionários
espiritanos não o seguiram, e o P. Joseph Lécuyer se tornou
superior geral e assumiu a liderança. Como a missão
espiritana sobreviveu?
Por meio de três Capítulos Gerais (1968-69, 1974 e
1980), a Congregação define progressivamente seu
papel na missão da Igreja [...]. A Congregação é uma
das células vivas da Igreja. Seu objetivo é a pregação
das Boas Novas de Cristo ao mundo13.
Alguns documentos espiritanos sobre a missão
Regra de Vida Espiritana (RVE):
A missão espiritana é bem definida pela RVE. Promove
a missão para os “pobres” (anawin, o “Pobre de Iaweh”)
conduzido pelo Espírito. Apresenta a missão espiritana como
Apresenta a missão
tendo a sua origem na pessoa da Trindade (nº 1), a missão é
espiritana como tendo
para os pobres (nº 14), para aqueles que ainda não ouviram
a sua origem na pessoa
a mensagem do evangelho ou que mal a ouviram, nº. 12, e o
da Trindade
Espírito Santo é o agente da missão (nº. 5).
Capítulo Geral 1968-69, Decisões e Diretrizes, e missão
espiritana
O espírito deste capítulo geral de 1968-69 foi para
atualizar o aggiornamento, ou revisar nossa atividade
missionária no espírito da Ad gentes. De acordo com este
documento espiritano, a missão espiritana é dirigida a
“pessoas que ainda não foram evangelizadas” (nº 380), a
não-cristãos (nº 381) e no nº 382 insiste na pregação da
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mensagem do Evangelho às pessoas ou grupos que ainda
não a ouviram. O Capítulo Geral também insiste no fato de
que os Espiritnos devem desenvolver um verdadeiro espírito
missionário, por exemplo, ensinando o catecismo não apenas
ao povo convertido, mas também aos considerados pagãos.
Relacionado à nossa atividade missionária, o Capítulo
Geral adverte todos os espiritanos sobre o uso do dinheiro.
De acordo com o nº. 384 deste documento, os espiritanos
devem dedicar igual porção de pessoal e dinheiro para
a evangelização e para aqueles ainda estão fora da Igreja
(cf. AG, 30). Isto efetivamente lembra-nos nossa vida de
pobreza com o propósito de avançar do Reino de Deus.
Quantos casos já Também lembra-nos que toda a congregação é para estar em
testemunhámos em que solidariedade com aqueles em missão, provendo fundos para
questões relativas ao dinheiro eles. A experiência hoje mostra a necessidade de escutar de
e à etnicidade estão a novo às instruções deste documento todos que se tornaram
arruinar as comunidades escravo, dependentes e viciados em dinheiro. Quantos casos
espiritanas no desempenho da já testemunhámos em que questões relativas ao dinheiro
sua missão e à etnicidade estão a arruinar as comunidades espiritanas
no desempenho da sua missão? Para Espiritanos, dinheiro
deveria somente ter sentido para o sucesso da missão e não
um objetivo em si.
Itaici 1992 e missão espiritana
Itaici (1992) acentua nossa capacidade para identificar
nós mesmos com o povo para o qual somos enviados, nosso
compromisso com os pobres, nosso apoio em tempo de crise,
e, em certa medida, ser a voz dos sem voz no que diz respeito
à justiça e à paz, a nossa capacidade de cuidar dos refugiados.
O mesmo documento vê a missão espiritana como diálogo
e evangelização ecumênica14. Também direciona a missão
Espiritana às crianças pobres e ao mundo asiático (números
5 e 7).
Maynooth (1998) e missão espiritana
Falando na missão espiritana, Maynooth enfatiza a
prática da missão entre os nômades da terra de Boranaland
A missão espiritana é, (Etiópia). A missão espiritana é, também orientada para
também orientada para a educação das pessoas, por exemplo, ensinando-lhes o
a educação das pessoas catecismo, dando-lhes novas opções, nova visão da vida e
fazendo-as voltarem para o devido lugar na sociedade, na
economia do país15. Na atividade missionária, os espiritanos
estão se esforçando para desenvolver o senso de pertença
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Jean Maturin Mougheney, C.S.Sp.
e união, ensinar aos povos de diferentes cores, e para viver
em harmonia perfeita. Em suma, a missão espiritana
é desenvolver pessoas à medida que as evangelizamos.
Maynooth também insistiu em nossa solidariedade com o
povo, para melhorar seu modo de vida e fazê-lo entender a
Palavra de Deus em seu idioma local, por exemplo:
Vamos em direção das pessoas não primeiramente
para cumprir uma tarefa, mas antes para estar com
elas, viver com elas, ouvindo-as, conversando com
elas. No coração de nossa relação está a confiança,
respeito e amor... Missão não é primeiramente
concebida em termos geográficos, mas como
cruzando fronteiras e alcançando grupos de pessoas
abandonadas, excluídas e oprimidas. À medida que
essas fronteiras da missão mudam, a linha da frente
da missão também deve se mover16.
Desafios potenciais e futuro da missão espiritana
Etnicidade e Nacionalidade dentro da Congregação
Segundo meu entendimento, o desafio da etnicidade a
e da nacionalidade constitui o primeiro soluço, o primeiro
obstáculo da missão espiritana. Não consigo imaginar esta
situação acontecendo em nossa Congregação com um
caráter internacional. É o caso de alguns de nossos confrades
o desafio da etnicidade ainda ignorando a preciosa herança deixada pelos nossos
a e da nacionalidade fundadores, que é a vida de comunidade. Esquecem o fato
constitui o primeiro de pertencerem à mesma família fundada por Poullart
soluço, o primeiro des Places e Francisco Libermann. Para mim, a etnia e a
obstáculo da missão nacionalidade são dois fatores principais que, se não formos
espiritana cuidadosos o suficiente, podem contribuir à queda de nossa
missão espiritana. É realmente um choque quando se nota
que em alguns países, a missão espiritana é reservada apenas
para os espiritanos nascidos naquele país. A etnicidade e a
nacionalidade são contra os valores da missão espiritana.
Durante os Capítulos Gerais em Itaici e em Maynooth, o
que fizemos sobre isso na Congregação? Uma instância é
tirada de um fato que é a situação nos Camarões. Alguém
pode nos dizer quantos irmãos espiritanos estrangeiros
estão trabalhando atualmente nos Camarões? Onde está o
nosso senso de internacionalidade? Outro caso é quando
dois missionários espiritanos são enviados para um local
específico para uma missão, é realmente lamentável ver
dois confrades fugindo um do outro porque não são do
mesmo lugar. Por que não podemos praticar o que nossos
89
antepassados nos deram? Quanto custa receber seu irmão
do exterior para pregar o evangelho em sua terra natal? A
congregação está morrendo? A missão espiritana é realmente
desafiada pela falta de vida comunitária entre nós. O que os
nossos fundadores estão pensando nos vendo assim? Você
já pensou em nossos fundadores? Finalmente, alguns de
nós ainda pensam que a Congregação pertence a eles, e é da
nossa conta, no sentido de que mudamos a direção da missão
espiritana. Se consideram os mestres da missão em vez de ser
de Jesus através da obra do Espírito Santo. A nova tendência
da missão não é mais recebida, mas escolhida. Nossa missão
espiritana está morrendo por causa de alguns de nós ter
perdido o sentido de pertença, de ter decidido não abraçar
nossa identidade espiritana.
Insegurança e missão espiritana
Esse é um dos maiores desafios da missão espiritana.
Embora a missão espiritana seja levar a mensagem de Jesus
aos confins do mundo, independente de suas identidades,
raças, tribos, culturas, origens, precisamos reconhecer que
não é uma tarefa fácil. Até a própria expressão “onde a
Igreja tem dificuldade de enviar operários” é um sinal de uma
questão séria. Longe de ser pessimista, estou tentado de dizer
que é muito difícil evangelizar pessoas de outra religião como
o Islã, ou pessoas que ainda estão apegadas às suas crenças,
Em Zanzibar, são como podemos ouvir do Padre Apolinaris: “Em Zanzibar,
os cristãos que se são os cristãos que se convertem ao Islão. É dificil trabalhar
convertem ao Islão com gente que não confia em você plenamente, mas esse
é o desafio e a chamada”17. Estes são os tipos de desafios
que os missionários espiritanos encontram fazendo missão.
Mas como dissemos, a missão Espiritana não é trabalho
para alguém sozinho, o Espírito Santo está sempre na nossa
frente para preparar o ambiente. O espiritano deveria aceitar
se esvaziar, deixar o Espírito tomar conta. Devemos então
sempre ter a iniciativa para encontrar e difundir o evangelho
entre os muçulmanos e as pessoas do local. Mas então, ser
conduzido pelo Espírito Santo é um desafio para ser aceito.
O problema das crianças de rua e a crise dos refugiados
Como a missão Espiritana é para levar o evangelho
nós, Espiritanos, somos
para os mais abandonados, nós, Espiritanos, somos
automaticamente
automaticamente desafiados pelo fenómeno das crianças
desafiados pelo fenómeno
de rua. A causa disso pode ser tanto o custo da educação de
das crianças de rua
crianças quanto a crise das famílias destruídas, especialmente
aqui no Quênia18. O missionário espiritano deveria ser
desafiado diante de uma criança pedinte, uma criança de rua,
uma criança carente, explorada, deprimida, porque elas são
90
Jean Maturin Mougheney, C.S.Sp.
aquelas para quem nós temos sido enviados desde o início
de nossa Congregação em 1703. Sempre que as vemos,
deveríamos sempre lembrar os primeiros seminaristas pobres
que Poullart des Places cuidou. Será que eles tinham um lar
na época? Não foi Poullart des Places o novo pai deles? Ele
era apenas um diácono quando realizou o seu projeto. Talvez
seja um chamado para nós para realizar algo na missão em
vista das crianças abandonadas porque não há lugar onde
possamos escapar delas, elas são os recipientes do evangelho.
A questão da crise dos refugiados é muito relevante aqui
na África e precisa ser abordada como um dos desafios da
missão espiritana. Não há necessidade de pesquisar isso no
google, todos conhecemos a maioria das regiões onde a crise
dos refugiados está crescendo, especialmente aqui na África,
como no sul do Sudão, Serra Leoa, Angola, Ruanda, Senegal,
Etiópia, Uganda, Burundi, e Somália. Para lembrar-nos, os
refugiados estão entre as populações para onde a nossa missão
está direcionada. Como espiritanos na missão, deveríamos
ser desafiados por eles, porque estão em necessidade, estão
sem esperança e sem alegria. Nossa tarefa é traze-los para
Jesus, a fonte da esperança e alegria. Mas isso não é feito com
palavra e boca. Isto implica compromisso, solidariedade,
acompanhamento. Não é uma alternativa, não temos escolha
nesta questão, é um dever para o qual fomos chamados.
Padre Patrick Roe nos lembra: “Isto nos lembra nossa tarefa
hoje como nos encontramos novamente desafiados pelo
movimento da história o que tem trazido o estranho para
nossas costas”19.
Missão espiritana e ditadura da globalização
Intrinsecamente, a globalização é algo bom. O mundo
se torna mais interconectado, em suma, é um processo
pelo qual as pessoas do mundo são incorporadas em um
único mundo. Mas os maus efeitos disso são, por exemplo,
quando afetam a soberania de um estado, quando permitem
Ele quer enfrentar que outras pessoas oprimam o resto, coloca algumas
as situações onde a culturas no topo e reduzem outras, quando promovem
dignidade humana é capitalismo e reduzem a dignidade humana ou quando não
menos valorizada que promove a igualdade na economia global. Como a missão
a economia do Estado espiritana é realizada neste mundo único, onde as pessoas
são incorporadas, o missionário espiritano é desafiado
por esse mundo. Ele quer enfrentar as situações onde a
dignidade humana é menos valorizada que a economia do
Estado. Tornou-se já um problema, exatamente como Padre
Mkulima previu: “Ainda está em nossas memórias isso, que
no final do século XX, a globalização transformou a ordem
mundial em um problema”20. Consequentemente, a missão
91
espiritana já é desafiada pelo fenômeno da globalização.
O aumento da pobreza urbana e a questão da fome
As pessoas para as somos Como a missão espiritana é desafiada pelas questões
enviados estão expostas à de pobreza e fome? A resposta está no campo para onde os
pobreza e à fome e, em missionários são enviados para a missão. As pessoas para
certa medida, à estiagem as somos enviados estão expostas à pobreza e à fome e, em
certa medida, à estiagem. Em sua atividade missionária, o
Espiritano deve estar habilitado para erradicar a causa que
escraviza o povo e ajudá-lo a recuperar suas necessidades e
direitos básicos. Isto é realmente um desafio que podemos
superar se nós mesmos nos deixamos ser guiado pelo Espírito
Santo, o agente da missão.
Alguns outros desafios, de acordo com os padres
Kimaryo e Mkulima
A lista dos desafios da missão espiritana não é exaustiva.
Alguns são brevemente mencionados pelo P. Kimaryo:
Já se falou sobre o fenômeno dos refugiados:
guerras tribais e étnicas, tribalismo, injustiças em
todos os níveis, má administração do bem comum,
crescente individualismo, apropriação indevida de
recursos públicos, violação de direitos humanos,
má liderança, corrupção desenfreada, sofrimento de
doenças como VIH / SIDA e malária, analfabetismo,
preguiça, crescimento da pobreza urbana, dívida
internacional, comércio de armas para guerras,
problemas demográficos, liberdade das mulheres e
prática moderna da escravidão21.
Padre Mkulima enfatiza quatro principais desafios da
missão espiritana. Eu os resumo conforme segue. Primeiro
é a hermenêutica intercultural, que faz a pessoa entender a
dinâmica do viver numa sociedade multicultural e o esforço
Espiritano que precisa fazer para penetrar o mundo cultural
do povo que está servindo. O missionário precisa entender
a linguagem e o sentido do símbolo cultural em vista de
mediar a palavra de Deus. Segundo, divulgar a Igreja, que é
um convite, um chamado para que nós espiritanos leiamos
os sinais dos tempos e estejamos atentos às tendências
emergentes; e terceiro, para tomar as opções positivas; e, por
fim, a pedagogia espiritana, que trata de como evangelizar
pessoas ou comunidades de maneira integral22.
92
Jean Maturin Mougheney, C.S.Sp.
Esses quatro desafios são muito relevantes no sentido de
que eles realmente desafiam o espiritano em como integrar
a cultura das pessoas para as quais eles têm sido enviados,
como ler os sinais dos tempos em termos de fazer decisões,
como foi orientado por Francisco Libermann; por último, o
impacto como nós espiritanos evangelizamos as pessoas para
os quais somos enviados e como consideramos o lugar do
Espírito Santo na missão.
O Futuro da Missão Espiritana
Por causa dos desafios acima, é objetivamente muito
difícil prever um futuro positivo para a missão espiritana
em um mundo explorado pela expansão da globalização,
no sentido de que as pessoas estão mais interessadas no que
está acontecendo nos EUA e na China do que naquilo que
o padre pregou na missa do dia. Mas o missionário é ainda
aquele que pode trazê-lo de volta para a Igreja. O sucesso e
O sucesso e o fracasso o fracasso da missão é mesmo o próprio missionário como
da missão é mesmo o podemos ler de K. Paul: “Em toda a formação para a missão,
próprio missionário a pessoa do evangelizador é o segredo do sucesso ou do
fracasso da missão23. No entanto, para o futuro da missão
espiritana, precisamos apontar as seguintes condições.
Viver a Solidariedade Espiritana
Para o futuro da nossa missão, precisamos, em primeiro
lugar, nos fortalecer voltando àquilo que Itaici (33.1;
33.2.1; 35.4) e Maynooth (Introdução 4.24-4.26) dizem:
solidariedade é também vivido dentro da congregação. Todos
sabemos de nossos fundadores que uma comunidade de
vida e uma comunidade de solidariedade são os dois pilares
parar de principais da nossa missão Espiritana. Precisamos aceitar
categorizar ou que o confrade de um outro país possa trazer algo novo
escolher o confrade e construtivo para a minha província nativa. Isto é a que
com quem o padre Mkulima se refere quando fala em atualização do
queremos viver comportamento missionário. Precisamos desenvolver o espírito
de abertura e parar de categorizar ou escolher o confrade com
quem queremos viver.
Formação de missionários
A partir dos desafios sobre os quais acabamos de falar,
todos sabemos que não somente estudos teológicos são
suficientes para a sobrevivência da nossa congregação no que
se refere à sua missão vivida dentro da Igreja. Precisamos
realmente formar, preparar e treinar nossos missionários em
vários campos onde a existência humana está ameaçada, e
93
isso antes de serem enviados para a missão. Com certeza,
teologia somente não ajudará a não ser que eles estarão em
um lugar onde não exista nenhum dos desafios mencionados
acima. Proponho uma via de treinamento futuro dos
uma especialização ou missionários: poderíamos dar para o confrade na formação
o profissionalização inicial a possibilidade de estudar algo mais enquanto estão
serão muito úteis estudando teologia. Alguns podem se especializar em diálogo
para o missionário inter-religioso, mecânica, eletricidade, encanamento, ou
superar alguns desafios outros em agricultura, solda, finanças, educação, liderança
potenciais e gestão, aconselhamento, cuidado da saúde, etc. Em
resumo, uma especialização ou o profissionalização serão
muito úteis para o missionário superar alguns desafios
potenciais encontrados na missão. Este programa pode ser
implementado durante o tempo da formação inicial ou no
ano depois.
Construindo uma espiritualidade espiritana JPIC
Com o fenômeno da globalização surge a tendência para
reunir países em torno do mundo da política, economia,
cultura e até em meio ambiente, há a necessidade de se
desenvolver uma espiritualidade espiritana da Justiça e
Integridade da Criação. Com certeza o mundo está ferido e
alguns países estão ainda afetados por aquilo que aconteceu
no passado, e por causa disso, recusam abraçar o processo de
unificação. Por exemplo, Sudão do Sul está hesitando em se
juntar a Comunidade da Africa do Leste (EAC) porque têm
sido oprimidos por tantos anos. Para esse caso particular,
precisamos de missionários espiritanos bem treinados em
JPIC, para viver com eles, falar e escutá-los e mesmo fazê-los
entender o caminho de Jesus de perdão e reconciliação.
Atenção às tendências emergentes
Este não é um tempo para sacerdotes ficarem sentados
confortavelmente em suas poltronas nos seus escritórios
esperando por alguma generosidade da parte dos cristãos. Já
Já não vivemos mais na não vivemos mais na época em que os cristãos respeitavam
época em que os cristãos a Bíblia ou eram apaixonados com a escuta dos sacerdotes.
respeitavam a Bíblia ou Com certeza hoje ainda encontramos alguns cristãos fazendo
eram apaixonados com isso. Em vez disso estamos em uma época de mudança
a escuta dos sacerdotes conduzido pelo fenômeno da globalização. Realmente os
espiritanos precisam ler os “sinais dos tempos”, precisamos
ser muito atentos e responsáveis quando algumas questões
surgem. Ainda, Padre Mkulina apresenta alguns casos, que
acho muito relevantes hoje e até para o futuro: “Como lidar
com a questão do divórcio? O que é o cuidado pastoral dados
aos homossexuais e lésbicas? Como lidar com as prostitutas?
94
Jean Maturin Mougheney, C.S.Sp.
Como lidar com as questões de pessoas ricas, mas corruptas
na paróquia?”24 Precisamos estar prontos para encarar
qualquer assunto que surja do povo para quem fomos
enviados para pregar a Boa Nova.
Conclusão
Este artigo analisou o tópico da missão espiritana
com foco em seus desafios atuais e no futuro. Começando
pelas ideias de missão de nossos fundadores, visitando
alguns documentos conciliares e pós-conciliares e alguns
documentos espiritanos, notamos que a missão espiritana
compartilha a missão da Igreja em geral, mas tem algumas
particularidades: está orientada para os pobres, para os mais
abandonados e marginalizados e focada naquilo onde a Igreja
encontra dificuldades para enviar trabalhadores. A missão
espiritana tem sua origem na missio Dei, com a solidariedade
e a vida comunitária sendo os dois principais pilares da
missão.
Em relação aos desafios da missão espiritana,
constatamos a etnia e a nacionalidade dentro da
Congregação, insegurança na missão, ditadura da
globalização, desafio das crianças de rua e crise de refugiados,
injustiças, entre outras, má gestão do bem comum,
corrupção desenfreada, falta de boa vontade política. E
para o futuro, dissemos que precisamos de solidariedade
na Congregação, os missionários precisam ser formados
em diferentes áreas da vida. Precisamos também construir
ou desenvolver nossa espiritualidade Espiritana JPIC, e
por último, precisamos ler os “sinais dos tempos”, mas não
menos importante, no que se refere a questões pastorais.
Jean Maturin Mougheney, C.S.Sp.
Casa espiritana de Teologia, Nairobi
95
Abreviações dos Documentos Eclesiásticos
AG Ad gentes divinus
EN Evangelii nuntiandi
GS Gaudium et spes
Abreviações dos Documentos Espiritanos
RVE Regra de Vida Espiritana
DD Capitolo Geral 1968-69: Directives and
Decisions
Itaici Capitolo Geral, 1992, Itaici, Brazil
Maynooth Capitolo Geral, 1998, Maynooth, Ireland
Referências
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Relations with Muslims in Zanzibar, Tanzania,”
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Slavery 1840-1850. Nairobi: Paulines Publications
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––––. No Longer Slaves. Dublin: The Columba Press, 2010.
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Eugene OR.: Wipf and Stock Publishers 2018.
Kimaryo, R. F., Venerable Fr. Francis Libermann’s “Project
of the Blacks,”: Challenges Facing the African
Missionary. Nairobi: One Stop Printers, 2005.
Koren, Henry, Essays on the Spiritan Charism and on the
Spiritan History. Bethel Park: Spiritus Press 1990.
––––. To the Ends of the Earth. Duquesne: Duquesne
University Press, 1983.
Mkulima, Eligius, Ethics in the Age of Globalization:
Opportunities or Threats? Arusha: Mweka Publishing
and General Supply LTD, 2018.
––––. 150 Years of Successful Evangelization in Zanzibar
and Mainland Tanzania: the Spiritan Missionary
Activities. Arusha: Spiritans Publications Tanzania,
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2012.
Paul, S. K., “Synod of Bishops, Special Assembly for Asia,
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Roe, Patrick, “Refugees and the Challenge of Horizons: A
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Midst. Refugees in Ireland: Causes, Experiences,
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Kimmage Mission Institute of Theology and
Cultures, 2001, 93–107.
Spiritan Anniversary Diary 1703–2003. Rome: Scuola
Tipografica S. Pio X, 2001.
The Stranger in our Midst, Refugees in Ireland: Causes,
Experiences, Responses, edited by Thomas Richard
Whelan. Dublin: Kimmage Mission Institute of
Theology and Cultures, 2001.
Notas de Rodapé
Traduzido da inglês pelo P. Pedro K. Iwashita, C.S.Sp. São
1
Paulo, Brazil.
AG, 2.
2
Koren, Até os confins da terra, 10.
3
Ibid., 15-16.
4
Koren, Essays, 21. Padre Hérard foi o último Espiritano
5
sobrevivente do século 18.
Cleary, Vida espiritana e missão, 22.
6
Veja Burke, Não mais escravos, 108.
7
Veja Spiritan Anniversary Diary 1703-2003, 19.
8
GS, 3.
9
10
EN, 66.
11
Ibid., 69.
12
Veja Mkulima, 150 anos de sucesso na evangelização, 30-31.
13
Ibid., 31.
14
Itaici, 4,6-7.
15
Maynooth, 18.
16
Ibid., 99-100.
17
Apolinaris, “Espiritanos na Missão,” 27. “Espiritano na
Missão
18
Eu credito esta informação a uma entrevista com alguns
nativos aqui no Quênia.
19
Roe, “Refugee and the Challenge of Horizons,” 104.
20
Mkulima, Ética na era da Globalização, 173.
21
Kimaryo, Venerável Padre Libermann, 78-79.
97
Veja Mkulima, 150 anos de sucesso na evangelização, 33-37.
22
Paul, “Synod of Bishops,” 232.
23
Mkulima, 150 anos de sucesso na evangelização, 42.
24
98