1. A noção de ser enquanto ser.
1.A) Em que consiste a noção de ser enquanto ser? O que, exatamente, a expressão “enquanto
ser” produz, ao ser aplicada à noção de ser?
A noção de ‘ser enquanto ser’ enunciada por Aristóteles em seu Livro IV de Metafísica,
adere/ impele-nos à necessidade de tomar o objeto estudado em sua maior generalidade,
compreendendo o conjunto de suas propriedades comuns e selecionando aspectos não parciais
da realidade: “Dado que procuramos as causas e os princípios mais elevados, evidentemente é
necessário que eles pertençam a uma natureza tomada em si mesma”.
Não deixemos de atentar a uma exigência para bem entender no que consiste essa noção,
sendo não só preciso abordar os elementos dos seres em sua maior universalidade, mas,
também, que “tais elementos pertençam ao ente não por concomitância, mas enquanto ele é
ente. Explico isso: ‘ser enquanto ser’ prescinde de dois panoramas de entendimento que lhe
devem ser aplicados a fim de realmente serem compreendidos, sendo 1) exame universal do
objeto de estudo, sem deslizar em recortes parciais e pré-selecionados; 2) os elementos
examinados sobre o objeto – os quais podem ser tomados por duas perspectivas: importante
(decisivo); e não-importante (não-decisivo)1 – devem ser, necessariamente, os aspectos
decisivos (essenciais, ou seja, não concomitantes) que lhe pertencem.
Ao fim, interessa-nos saber que a expressão ‘enquanto ser’, quando aplicada a ‘ser’, implica
falar no aspecto ou perspectiva sob a qual o objeto estudado importa ou interessa. Aqui
significa produzir uma noção de que a natureza – ou seja, o conjunto de propriedade comuns
daquele objeto – do ‘ser’ deve ser considerada em sua maior elevação – ou seja, numa maior
generalidade, implicando na aplicação de um domínio maior e, portanto, entendimento maior
do objeto.
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Distinguir os aspectos sobre o qual o objeto importa: essencial/ acidente, concomitante (p.13).
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1.B) Qual é a relação entre o ser enquanto ser e as “formas do ser” (p.ex., o princípio da não-
contradição, o Mesmo etc.) pelos quais a realidade se expressa na nossa linguagem, por meio
de sentenças declarativas?
Aqui, é importante percorrer um breve entendimento a respeito do que compete à filosofia
conhecer e, para tanto, distinguir a sofística e a dialética. Justifico tal metodologia pela
necessidade de entendermos como nossa linguagem pode apreender a realidade, implicando
em entender o que a filosofia conhece e o que não lhe compete conhecer. Acredito que isso
nos permite compreender, em maior totalidade, pela positivação e pela negação, a relação
entre ‘ser enquanto ser’ e ‘formas do ser’.
Pois, Aristóteles posiciona, em campos opostos, Filosofia e Sofística enquanto escolhas de
vida; e coloca a dialética como um instrumento neutro que pode ser usado tendenciosamente.
A dialética é uma habilidade (tal como a ginástica) argumentativa perpassando todas as
profissões que não serve para determinar o verdadeiro e o falso, mas pela qual uma
proposição inicial é refutada a partir de sentenças propostas pelo oponente e com as quais esse
concorda. Já a sofística é um ofício que intenta a produção de argumentos com aparência de
sucesso, mas falsos. É duplamente caracterizada pela: 1) aparente lógica, ou seja, falacioso,
premissas que não impõem tal conclusão; 2) promessa frustrada de que as premissas explicam
a conclusão.
A filosofia, então, enquanto ciência do ser enquanto ser, utiliza-se da dialética para
estabelecer o sucesso (verdade) do argumento a fim de aderir à verdade. Assim, tal ciência
refere-se às formas do ser, esmiuçando o funcionamento do objeto e propõe o entendimento
unificado, a partir do elemento comum do ser, que é múltiplo. O ser entende-se pelas
substâncias e propriedades que lhes pertencem, assim como pelas propriedades dessas tais
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substâncias. Isso porque além de ser necessário compreender o objeto estudado em si, também
é necessário buscar a compreensão daquilo pelo qual entendemos nosso objeto principal.
1.C) O que compete ao filósofo conhecer, em relação a essas “formas do ser”
(1004a22-1004b17)?
Ao filósofo compete conhecer o ser enquanto ser e as formas como tal ser expressa-se e
elucida-se na realidade. Também “compete a uma ciência única em gênero estudar todas as
formas do ente enquanto ente, bem como as espécies dessas formas”. Ou seja, essa ciência
única do filósofo estuda as formas do ente e as formas das partes desse ente. É importante
ressaltar aqui que em nada difere compreender o ente e parte desse ente, pois ambas
categorias guardam e denunciam algo em comum: sua essência.
Desse modo, a ciência do ente enquanto ente, a filosofia, preocupa-se em estudar ‘o que é’ e
tão simplesmente – não tão simples, mas objetivamente – isso, partindo da elencação e
depreendimento de certos princípios e causas das essências (ou seja, que a substâncias
possuem)