NUTRIÇÃO, PROFISSÃO E
ÉTICA
AULA 4
Profª Carolina Bulgacov Dratch
CONVERSA INICIAL
Quando falamos de ética, ao pensarmos no atendimento em saúde, logo
chegamos à bioética. Vendo que as questões de ética não eram suficientes para
abarcar as questões relativas à saúde humana, pensadores e profissionais
trouxeram à tona a bioética. Esse conceito procura auxiliar profissionais e a
sociedade em geral no enfrentamento das questões sobre a vida humana que
possam promover o maior bem-estar possível.
Conceitos como autonomia, beneficência, justiça e respeito à vida estão
presentes na bioética para estabelecer parâmetros mínimos nos atendimentos à
saúde, nas pesquisas e em outras esferas relativas à vida. Além disso, ao
refletirmos sobre os cuidados à saúde, passamos também a verificar questões
sobre a morte. Os cuidados paliativos passam a figurar na atenção aos pacientes
terminais ou que necessitam de cuidados especiais, além de considerar qual é
o melhor tratamento para esses casos.
Finalizaremos nossas discussões falando sobre os conceitos de
alimentação, pois essa área, além de influenciar na saúde, também traz muitos
conceitos e questões que necessitam de uma reflexão bioética. O direito humano
à alimentação adequada nos leva até estas questões: quem deve receber auxílio
para conseguir efetivar esse direito? Quem deve proporcionar esse direito e de
que maneira? Iremos responder essas questões neste capítulo. Sistemas
agroalimentares, agrotóxicos, transgenia, propagandas de alimentos entre
outros assuntos fazem parte das discussões bioéticas sobre alimentos e
alimentação humana.
TEMA 1 – ÉTICA E BIOÉTICA
A ética, como verificamos no módulo anterior, é a base das ações
humanas para que todos possam colher benefícios, com vistas na moral e
costumes das sociedades. Quando pensamos na conservação da vida, podemos
eleger a bioética como a ética da vida. A bioética, então, é a disciplina que traz
os conceitos da vida saudável que refletem sobre o bem-estar social.
As questões que estão contidas no escopo da saúde humana, inclusive
da morte, são discutidos na bioética, a fim de que os valores sobre a vida,
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norteados nas experiências, vivências, cultura, ciências e religião, possam ser
respeitados. A bioética surge como área de conhecimento no ano de 1971, com
a publicação do bioquímico e professor americano, Van Rensselaer Potter,
intitulada Bioética: Ponte para o Futuro. Esse livro trouxe à tona a problemática
da bioética, ou seja, da ética aplicada às questões da saúde.
Uma das principais discussões da bioética diz respeito à humanização do
atendimento em saúde. Esse atendimento é realizado por seres humanos para
seres humanos (Figura 1). Logo, esse cuidado deve ser ético, para que os
julgamentos pessoais e outros fatores não interfiram na saúde dos pacientes. O
termo discricionariedade é um dos pontos a ser ressaltado neste momento:
escolher entre atender um ou outro paciente prioritariamente, definir quem é mais
urgente, ou ainda na necessidade em escolher quem recebe atendimento ou
não. Todas essas questões nos trazem reflexões sobre os quesitos bioéticos.
Figura 1 – Complexidade da Bioética
Créditos: Shutterstock.
Segundo Reich (1995), bioética é o estudo sistêmico das dimensões
morais – moral, decisões, condutas e políticas – das ciências da vida e atenção
à saúde, utilizando uma grande gama de metodologias éticas de maneira
interdisciplinar. Ele ainda define a moral como o conceito múltiplo que estabelece
regras que serão adotadas pelos humanos na sociedade, garantindo o bem-
estar e convivência harmoniosa. É a garantia de que todos os seres humanos
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serão tratados da mesma maneira, independentemente de sua condição social,
racial, ou qualquer outro fator.
Segundo Junqueira (2011), os princípios da bioética são baseados nos
seguintes conceitos: autonomia, beneficência, justiça e respeito à vida. Por
autonomia, podemos dizer, na bioética, que nos referimos ao direito de qualquer
pessoa, ao ser atendido, sobre si mesmo e sobre sua liberdade de escolher e ter
poder de decisão. A beneficência é definida como um princípio que impõe aos
profissionais da saúde a promoção do bem ao paciente no desempenho de suas
funções, garantindo assim um atendimento humanizado. A justiça tem a função
de garantir que as necessidades de saúde sejam atendidas sem preconceitos ou
segregações. E o respeito à vida versa sobre o fato de que não se infrinja mal
ao outro, intencionalmente, durante o atendimento de saúde.
Com o passar do tempo e a modernização, questões impossíveis para
Aristóteles, como a fertilização in vitro, clonagem, uso de células tronco, por
exemplo, passam a figurar o campo das ciências. Logo, os parâmetros da
bioética necessitam de atualização, respondendo a essas questões e a outras
tantas que delas possam derivar.
TEMA 2 – BASES DA BIOÉTICA
Nem todas as ações tidas como em benefício da ciência podem ser
consideradas aceitas, ou éticas, pela sociedade. O atendimento à saúde gera
reflexões sobre como agir sem interferir na dignidade das pessoas. Ressalta-se
que os profissionais devem saber os parâmetros (Figura 2) utilizados nesse
atendimento, para que o objetivo seja cumprido, sem interferir nas questões
humanas prioritárias. Nós somos holísticos, ou seja, formados por questões
sociais, psicológicas, biológicas, espirituais e físicas, por exemplo. Podemos
perceber a bioética como um campo de atuação multidisciplinar, no qual diversos
profissionais unidos buscam atuar de maneira ética no trato dos problemas
relativos à vida humana e ao bem-estar.
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Figura 2 – Balança da justiça bioética
Créditos: Shutterstock.
Quando nos espraiamos pelo atendimento na atenção básica em saúde
fornecido pelo SUS, podemos trazer o que estabelece a seguinte política pública:
A Atenção Básica considera o sujeito em sua singularidade, na
complexidade, integralidade e na inserção sociocultural e busca a
promoção de sua saúde, a prevenção e tratamento de doenças e a
redução de danos ou de sofrimentos que possam comprometer suas
possibilidades de viver de modo saudável (Brasil, 2006, p. 10).
As questões principais envolvidas no atendimento em saúde, muitas
vezes, não estão relacionadas diretamente ao paciente. Podemos trazer a
família, o sigilo das informações de saúde, as pesquisas em seres humanos,
relações com outros profissionais, cuidados paliativos, aborto, eutanásia entre
outros, fatores que interferem na globalidade do atendimento. Como agir?
Possivelmente, os conceitos próprios de cada ser não são suficientes para
resolver essas questões de maneira equânime. Precisamos seguir parâmetros
para que não haja discrepâncias no atendimento.
Uma maneira de garantir o cumprimento das normas de bioética é manter
a perspectiva de que o ser humano é único e deve ser tratado de tal maneira.
Profissionais responsáveis, quando aliados a pilares éticos, podem preservar a
vida sem ferir o outro.
TEMA 3 – DILEMAS BIOÉTICOS
No século XX, durante o nazismo, com a permissão de Adolf Hitler, os
prisioneiros, judeus, políticos e militares foram colocados à disposição dos
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médicos para pesquisas biológicas de todos os campos, éticas ou não. Após a
divulgação das imagens dessas pesquisas, as quais tratavam o ser humano
apenas como objeto de pesquisa e experimentos, sem nenhum apreço à vida, o
mundo percebeu a existência de graves conflitos entre ciência e sociedade.
Com o fim da 2ª Guerra Mundial, o Tribunal Militar Internacional, em
Nuremberg, julgou vários médicos que realizaram pesquisas com seres
humanos nos campos de concentração nazistas. Essas pesquisas foram
consideradas crimes contra a humanidade. As Diretrizes Internacionais para
Pesquisa Biomédica Envolvendo Seres Humanos, conhecido como “O Código
de Nuremberg”, trouxeram luz a essa questão. Esse documento traz dez
princípios básicos, como o direito à autonomia, sendo considerado um
referencial da bioética, determinando as normas do consentimento informado,
regulamentando a experimentação científica e defendendo o princípio da
beneficência (Reich, 1995). Cabe elencar os dez princípios do Código de
Nuremberg (Nuremberg, 1947):
Necessidade de consentimento voluntário do sujeito da pesquisa, ou seja,
direito de livre escolha e sem intervenção de força, mentira, coação,
astúcia e coerção;
Produção de resultados vantajosos para a sociedade;
Deve ser baseada em resultados de experimentação animal e no
conhecimento da evolução da doença;
A pesquisa deve evitar sofrimento e danos desnecessários, físicos ou
mentais;
A pesquisa não deve ser conduzida caso haja risco de morte ou invalidez
permanente;
O risco deve ser aceitável e limitado pela importância humanitária;
Cuidados de proteção de dano;
Deve ser conduzida por pessoas qualificadas e com habilidades
específicas;
Prevê a liberdade do paciente se retirar quando quiser.
Dessa maneira, fica claro que a pesquisa, em qualquer estágio, deve ser
suspensa se houver a possibilidade de causar danos ou invalidez.
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Figura 3 – Pesquisa Cientifica
Créditos: Shutterstock.
Dessa forma, cabe destacar, neste momento, as Normas para Pesquisa
com Seres Humanos no Brasil. A Resolução n. 466/2012, do Conselho Nacional
de Saúde (Brasil, 2012), trata sobre o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE) e ainda traz informações sobre os Comitês de Ética em
Pesquisa e da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. Veja, a seguir, os
quatro itens essenciais de ética para a realização de pesquisas com seres
humanos:
Respeito ao participante da pesquisa em sua dignidade e autonomia,
reconhecendo sua vulnerabilidade, assegurando sua vontade de
contribuir e permanecer ou não na pesquisa, por intermédio de
manifestação expressa, livre e esclarecida;
Ponderação entre riscos e benefícios, tanto conhecidos como potenciais,
individuais ou coletivos, comprometendo-se com o máximo de benefícios
e o mínimo de danos e riscos;
Garantia de que danos previsíveis serão evitados;
Relevância social da pesquisa, o que garante a igual consideração dos
interesses envolvidos, não perdendo o sentido de sua destinação sócio
humanitária.
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Cabe ressaltar também que pesquisas que envolvam seres humanos,
ainda que não se tratem de experimentos científicos, podendo ser somente uma
pesquisa com aplicação de questionários, devem passar pelos Comitês de Ética,
sempre vinculados a instituições de ensino superior.
TEMA 4 – BIOÉTICA NA SAÚDE: CUIDADOS PALIATIVOS
Os cuidados paliativos estão envolvidos nas discussões sobre bioética por
se tratarem de um cuidado especial em doenças terminais. A palavra paliar
deriva da palavra latina pallium, termo que nomeia o manto que os cavaleiros
usavam para se proteger nas lutas e batalhas. Portanto, consideramos paliar
como proteger (ANCP, 2019).
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (2002), os cuidados
paliativos consistem na assistência ativa e integral a pacientes cuja doença não
responde mais ao tratamento curativo. Seu principal objetivo é garantir a melhor
qualidade de vida para os pacientes e familiares. Os cuidados paliativos
destinam-se a controlar a dor e demais sintomas, evitando assim o sofrimento
do paciente e de seus familiares.
Assim, segundo a Academia Nacional de Cuidados Paliativos (2019), os
cuidados paliativos podem ser compreendidos como a prática de aliviar o
sofrimento e melhorar a qualidade de vida do paciente e de seus familiares. O
tratamento paliativo deve ser fornecido ao paciente independentemente do
estágio em que a doença se encontra e das reais chances de cura, tendo como
objetivo minimizar o sofrimento e oferecer dignidade ao paciente.
Dados da Economist Intelligence Unit (Sociedade Brasileira de Geriatria e
Gerontologia, 2015) apontam que o Brasil ainda é um país com cuidados
paliativos esparsos, ficando em 42º lugar no ranking mundial. Os cuidados
paliativos são de suma importância, levando bem-estar aos pacientes e a seus
familiares, além de auxiliarem na redução de gastos com saúde pública
associados às internações hospitalares.
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Figura 4 – Cuidados Paliativos
Créditos: Shutterstock.
A bioética se alia aos cuidados paliativos, pois seus pilares são
fundamentados na beneficência. Logo, os cuidados em saúde devem almejar o
menor sofrimento possível, promovendo um atendimento humanizado,
respeitoso e com obtenção da maior qualidade de vida possível. Para que isso
ocorra, deve-se seguir os princípios elencados anteriormente, trazendo
autonomia ao paciente com informações que possam esclarecer e permitir que
os pacientes ou os familiares opinem efetivamente sobre o tratamento.
Os cuidados paliativos não se restringem a pacientes terminais. Podemos
discutir alguns dos conceitos e questões nas seguintes áreas:
Eutanásia: é o ato intencional de proporcionar a alguém uma morte
indolor para aliviar o sofrimento causado por uma doença incurável e
dolorosa;
Distanásia: significa o prolongamento exagerado do processo de morte.
Pode também ser empregado como sinônimo de tratamento inútil;
Mistanásia: relaciona-se à omissão de socorro estrutural, normalmente
direcionada às camadas mais vulneráveis da sociedade.
Os cuidados paliativos, no Brasil, ainda demandam atenção, amplas
discussões e investimentos. Esses cuidados podem promover os direitos de
pacientes em situações de doenças terminais ou em tratamentos de doenças
graves.
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TEMA 5 – NUTRIÇÃO E BIOÉTICA
A alimentação é uma condição inerente ao ser humano e promove a sua
sobrevivência. Diversas discussões acerca desse fato estão no escopo da
bioética: como devemos nos alimentar? Quem é responsável pelos alimentos?
Devo me preocupar com agrotóxicos e transgenia? O que causa a fome? Todas
as pessoas têm direito à alimentação?
Figura 5 – Profissão de nutricionista
Créditos: Shutterstock.
Além das questões de sobrevivência, outras preocupações quanto à
nutrição humana nos vem à mente, como a questão dos alimentos transgênicos
e os agrotóxicos, a criação e o abate de animais, as doenças alimentares,
alergias e intolerâncias, a fome, as políticas públicas, a segurança alimentar e
nutricional (SAN), a cultura alimentar, a religiosidade, a industrialização, a
propaganda de alimentos, a rotulagem e a relação da alimentação com doenças
crônicas não transmissíveis e os agravos de saúde, por exemplo. Todos esses
assuntos têm implicações bioéticas e estão relacionadas à profissão de
nutricionista.
Podemos falar sobre a Declaração Universal dos Direitos Humanos,
promulgada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1948. A partir desse
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documento, passamos a refletir sobre os direitos fundamentais que garantem o
bem-estar social dos indivíduos e da coletividade.
A Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos prevê que os
avanços e progressos científicos e tecnológicos devem promover o acesso
adequado à alimentação e à água, garantindo assim a manutenção da vida. O
Artigo 14 determina que cabe ao poder público a responsabilidade pelas
questões sociais e de saúde. É especialmente por esse aspecto que a bioética
se relaciona ao Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA).
Esse direito é garantido pela Constituição Federativa Brasileira de 1988,
a qual, na Emenda n. 64, traz a inclusão da palavra alimentação em seu texto.
Portanto, podemos perceber que toda a sociedade está relacionada à garantia
do direito à alimentação e à SAN. Cabe ao Estado estabelecer políticas que
possam garantir o DHAA, com parâmetros estabelecidos dentro do conceito da
SAN:
Consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e
permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem
comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como
base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a
diversidade cultural e que sejam sociais, econômica e ambientalmente
sustentáveis (Brasil, 2006).
Quanto à produção e ao acesso aos alimentos, podemos destacar algumas
discussões que relacionam bioética, alimentação e o DHAA:
Acesso ao alimento: como se dá o acesso dos povos aos alimentos?
Essa questão se relaciona à equidade e à justiça social que baseiam os
direitos fundamentais.
Segurança dos produtos alimentares: não bastaria aos governantes e
à indústria de alimentos fornecer alimentos, mas um fornecimento que
garantam alimentos seguros ao consumo humano.
Bem-estar animal: a alimentação dos animais e seu bem-estar envolvem
questões bioéticas, visto que eles são seres vivos e merecedores de
respeito. Além do mais, o bem-estar animal influencia diretamente na
qualidade dos alimentos que consumimos.
Aspetos éticos: o mercado de alimentos, o acesso justo e igualitário e as
políticas públicas permeiam os conceitos bioéticos.
Aspectos legais: marcos jurídicos que visam garantir, pela força de leis,
decretos e resoluções, que os cidadãos obtenham o DHAA.
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Todos esses assuntos têm implicações no campo da nutrição e devem
ser pauta de estudos que possam promover bases sólidas para a garantia do
DHAA e da SAN, garantindo também o bom desempenho das atividades
profissionais na área da saúde e afins.
A regulação em propaganda, para proteger a sociedade e nortear a
promoção e divulgação de alimentos, faz parte da bioética. No Brasil, a regulação
das propagandas acontece no sistema de auto regulação. Porém, quando se
trata de alimentos infantis, temos a Norma Brasileira de Comercialização de
Alimentos para Lactentes e Crianças de Primeira Infância, Bicos, Chupetas e
Mamadeiras (NBCAL). Essa norma traz as diretrizes para a comercialização e a
proibição de determinadas ações no campo da propaganda de alimentos infantis.
A participação social no campo da alimentação pode englobar assuntos
como a regulação da propaganda de alimentos, rotulagem, ações de educação
alimentar e nutricional e a participação do governo na regulação da indústria
alimentícia relacionados à bioética. Essas discussões garantem maior acesso à
informação de qualidade sobre alimentos e promovem acesso e escolhas
alimentares que geram melhor qualidade de vida.
Num mundo em que a produção de alimentos é abundante, situações de
total insegurança alimentar são ultrajantes. Mas não são apenas esses dilemas
que envolvem alimentação e conceitos de bioética. Cirurgias, enfermidades
graves ou comprometimento de capacidade do trato gastrointestinal, estudos
patrocinados por indústrias de alimentos com interesse em resultados
específicos, propagandas, uso de agrotóxicos e transgenia são algumas das
questões bioéticas que podem ser encontradas ao longo da carreira do
profissional de nutrição e devem ser enfrentadas de maneira ética.
NA PRÁTICA
De maneira geral, a bioética vem mudando junto com as mudanças na
história; a ciência evolui a passos largos, e a cada dia novas descobertas são
incorporadas à sociedade. A fertilização in vitro é um bom exemplo disso. O
primeiro bebê concebido pela fertilização nasceu em 1978. A partir dos estudos
e avanços dessa técnica, muitas questões éticas surgiram: doação de
espermatozoides, óvulos, pré-embriões e embriões; uso de barriga de aluguel;
escolha do sexo do bebê; escolha de um embrião em detrimento do outro;
congelamento de embriões e o destino dos embriões após a fertilização. Nos
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dias atuais, o uso dos embriões para doação de células tronco ou o nascimento
de um feto para doar órgãos para um parente próximo compatível são questões
que aparecem no noticiário, mas pensar como devemos refletir sobre elas é uma
ação bioética.
Já na área da nutrição, as propagandas de alimentos influenciam o
consumo. Quanto aos alimentos para consumo na primeira infância, estes são
regulados por uma resolução específica, citada no texto anteriormente. Porém,
é fácil encontrar o descumprimento da norma. Promoções em supermercados
ou farmácias de “compre 2, leve 3” para fórmulas artificiais, proibido por lei, são
vistas com frequência. Devemos promover, como profissionais de saúde, o
aleitamento materno e respeitar as regulações nesse âmbito de maneira ética.
Outras regulações de alimentos no Brasil relacionadas a alimentos infantis
são observadas na Lei n. 11.265/2006 e na Lei n. 8.552/2015, que preveem a
proibição da distribuição de amostras de fórmulas infantis, mamadeira ou
chupetas, além da distribuição gratuita desses produtos. Nas décadas de 70/80,
era comum a propaganda de fórmulas infantis, mamadeiras, chupetas e outros
apetrechos, sendo esses itens distribuídos em maternidades, no momento da
alta hospitalar de mães e bebês. Esse fato desestimulava o aleitamento materno
e criava mitos como o do leite materno fraco e dos bebês que choravam por
sentir fome. Você acredita que as propagandas ou promoções na área da
alimentação infantil podem influenciar a adesão ao aleitamento materno?
FINALIZANDO
Nos aproximamos, durante esta aula, dos conceitos de ética da saúde, e
nos espraiamos pela bioética. Esses conceitos são indispensáveis para a
atuação de qualquer profissional da área da saúde, inclusive da nutrição.
Guerras, condições que interferiram na dignidade humana e outras questões
relacionadas à ciência colocaram a bioética no foco de grandes discussões
internacionais, com o objetivo de chegar a consensos sobre o modo correto de
intervir na vida humana.
Princípios como a autonomia, beneficência, justiça e respeito à vida são
as bases da bioética, sendo usadas como reflexão nas ações que dizem respeito
à manutenção da vida e ao seu fim. Eutanásia, cuidados paliativos e outros
assuntos são norteados por questões de ética para que possam exprimir o maior
bem-estar possível.
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Pesquisas em animais e em humanos, por exemplo, foram tratadas em
normas internacionais como o Código de Nuremberg e em leis nacionais como
aquelas que versam sobre as normas para pesquisas em humanos e comitês de
éticas. Todos esses marcos legais visam garantir a segurança e atender aos
princípios de bioética aos seres humanos.
Quando passamos para a alimentação humana, temos diversos dilemas
que necessitam de parâmetros. Acesso aos alimentos, segurança alimentar em
todos os seus aspectos, transgenia e uso de agrotóxicos, políticas públicas entre
outras são foco de discussão. Os profissionais de nutrição devem estar atentos
às mudanças que ocorrem, tanto na sociedade quanto na ciência, procurando
agir em conformidade com as questões éticas.
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REFERÊNCIAS
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