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Silva FernandoCesarDa TCC

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

UNICAMP
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

Fernando Cesar da Silva

Advento das Massas:

Um Olhar às obras de José Ortega Y GASSET (1987) em “A

Rebelião das Massas” e Jean BAUDRILLARD (1985) em “À


Sombra das Maiorias Silenciosas - O Fim do Social e o Surgimento
das Massas”

Campinas

2008

1
TCC/UNICAMP
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Fernando Cesar da Silva

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Advento das Massas:

Um Olhar às obras de José Ortega Y GASSET (1987) em “A Rebelião das

Massas” e Jean BAUDRILLARD (1985) em “À Sombra das Maiorias


99

Silenciosas - O Fim do Social e o Surgimento das Massas

Monografia apresentada ao Instituto de Geociências


da UNICAMP como requisito parcial para obtenção

do título de bacharel em Geografia

Orientador:

Prof.^ Di^ Silvia F. de M. Figueirôa

Campinas

2008

2
\

Fernando Cesar da Silva

Advento das Massas:

Um Olhar às obras de José Oríega Y GASSET (1987) em “A Rebelião das

Massas” e Jean BAUDRILLARD (1985) em “À Sombra das Maiorias


9?
Silenciosas - O Fim do Social e o Surgimento das Massas

Monografia apresentada ao Instituto de Geociências


da UNICAMP como requisito parcial para obtenção

do título de bacharel em Geografia

Orientador:

Prof."* Dr" Silvia F. de M. Figueirôa

Aprovado emí^/^C^

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Prof.^ Dr" Silvia F. de M. Figueirôa

Campinas

2008

3
3

Agradecimentos

Agradeço a instituição Unicamp e a todos os elos não mencionados abaixo, mas que a

constituem e colaboram (mesmo que inconscientemente) à sobrevivência e manutenção dela

como tal. Minha gratidão aos funcionários da Gi*aduação e da Biblioteca do IG, aos professores,

aos amigos e a Prof.® Dr® Silvia F. de M. Figueirôa pela orientação.

Agradeço a minha família e a todos os lugai*es que me acolheram no decorrer desses anos.

Obrigado.

4
Sumário

,6
Introdução

7
Capítulo 01

Principais Idéias e Conceitos da Obra de José Ortega Y GASSET (1987) em “A Rebelião das
Massas
●5^
7

25
Capítulo 02

Principais Idéias e Conceitos da Obra de Jean BAUDRILLARD (1985) em A Sombra das


^9
,25
Maiorias Sil^ciosas — O Fim do Social e o Surgimento das Massas
,41
Considerações Finais
,45
Referências Bibliográficas

5
Introdução

Esse trabalho está dividido em três capítulos: primeiro, uma interpretação da obra de José
Ortega Y GASSET (1987) em “A Rebelião das Massas”; segundo, uma interpretação da obra de
Jean BAUDRILLARD (1985) em “À Sombra das Maiorias Silenciosas - O Fim do Social e o
Surgimento das Massas” e um último (Considerações Finais) que consiste em estabelecer um
eixo comparativo e dialógico (não exatamente sincrônico) entre as duas obras mencionadas
anteriormente. Tal eixo resulta entre similaridades e divergências de acordo com o objetivo

específico da pesquisa - o que seria o “advento das massas’ ?


A obra de Ortega Y GASSET foi pubücada no final da década de 1930. A mesma foi
composta, conforme o autor menciona, de uma junção de artigos publicados deste a década
anterior a sua composição final. Com um estüo próprio e peculiar, o autor apresenta sua tese
numa linguagem detalhada em justificativas, porém de maneira de “fácil” compreensão. Sendo
assim, o autor se utiliza de termos de uso cotidiano e carregado de ambigüidades, além de uma

constante adjetivação. Caso retirado trechos do livro e não contextualizados, inevitavelmente o


sentido apresentará uma inadequada e antiquada visão do autor sobre o tema, algo que,
obviamente, não é verdade. Tentamos suavizar esse problema inserindo uma parte que antecipa
modelo de interpretação da obra. Esta parte (e as demais) apresenta algumas idéias e concepções
introdutórias, mas que foram extraídas da mesma obra, ou seja, não foram utilizados outros
trabalhos do autor nem interpretações ou biografias sobre o mesmo.
Para análise da obra de Jean BAUDRILLARD seguimos os mesmos procedimentos
efetuados para a obra de Ortega Y GASSET. Porém, na parte introdutória fez-se necessário
utilizamos de trechos pertencentes a dois outros üvros do mesmo autor (O Sistema dos Objetos.
São Paulo: Editora Perspectiva S.A,1989 e A Sociedade de Consumo. Lisboa: Edições 70, 1995)
e que antecedem a obra em questão.
Nosso modelo de análise das obras apresenta um sentido hierárquico conforme o gráfico
abaixo:

Tese Central Processo Histórico—» Argumentação Empírica-» Implicações Futura^

6
Tese Central - seria o assunto de que trata a obra e uma definição do objeto;
Processo Histórico - os fatos históricos (culturais, políticos, econômicos) que resultaram na
tese central e a justificam;
Argumentação Empírica — exemplos citados pelo autor que corroborem o elemento central
de sua argumentação;

Implicações Futuras - prognóstico apresentado pelos autores.

7
Capítulo 01.

Principais Idéias e Conceitos da Obra de José Ortega Y GASSET (1987) em


“A Rebelião das Massas”

Concepções do Autor e Alguns Conceitos.

Para o autor toda e qualquer sociedade é aristocrática e a divisão dela em maiorias e


minorias não significa divisão em classes sociais. O tema (homem-massa) e o título da obra (A
Rebelião das Massas) justificam-se, respectivamente por duas razões:
o homem é, queira ele ou não, um ser constitutivamente forçado a procurar uma
instância superior. Se consegue encontrá-la por si mesmo, é um homem excelente; se não, é um
homem-massa e precisa recebê-la daquele.
A massa pretender atuar por si mesma é, portanto, rebelar-se contra seu próprio destino, e,
como é isso que está acontecendo agora, eu falo de rebelião das massas.
A preocupação do autor consiste em saber se pode mudar esse tipo de homem, se a razão
histórica “deixará” de ser vista como legado, que a evolução ou revolução sejam históricas e que
não sobressaia um tipo de homem conservador, nem radical; afinal ambos são categorias do
homem-massa.

Esta preocupação surge por uma diferença básica e fundamental entre o homem moderno
e 0 antigo. Este procura no passado um modelo para a situação presente, o outro, tende sempre
para o futuro e sente-o sempre como a dimensão mais substancial. Além disso, o autor destaca e
problematiza o tempo moderno como:
“E eu concluía destacando o fato muito evidente de que nosso tempo se caracteriza por
uma estranha pretensão de ser mais que qualquer outro tempo passado; mais amda: por se
desligar de todo o passado, não reconhecer épocas clássicas e normativas, e ver-se a si mesmo
como uma vida nova superior a todas as antigas e irredutível a elas.” (Rebelião das Massas, p.64)

' GASSET, José Ortega Y. A Rebelião das Massas. São Paiüo: Livraria Martins Fontes Editora LTDA, 1997. Página
127/128. Nas citações que se seguem será dado apenas o número da página.

8
f

f
>
E ainda, resumidamente, para o autor a vida compõe-se de dois elementos fundamentais:
as possibilidades ou circunstancias (mundo de fato) e as decisões ou o que podemos ser (vida
A meta não é meu caminhar.
«(

possível). Sendo assim, viver é caminhar em direção a uma meta, e


não é tninlia vida; é algo em que coloco esta última e que, portanto, está fora dela, mais
além.” (Rebelião das Massas, p.l53).
Sobre a realidade, o modelo e o conceito, o autor expõe que é impossível conhecer
diretamente a plenitude do real, portanto tem-se o modelo e o conceito (construção arbitrária de
uma realidade).
Depois desta breve introdução sobre algumas concepções do autor, segue uma lista de
1
conceitos (idéias) utilizados na obra e que se apresentarão no decorrer desta anáhse:
● Sociedade -
convivência.
44

Sociedade é o que se produz automaticamente pelo simples fato da


Espontânea e inexoravelmente origina costumes, usos, língua, direito, poder público.” (Rebehão
das Massas, p.8);
submetido à
\ “... sociedade é um conjunto de indivíduos que mutuamente se sabem
vigência de certas opiniões e valores” (Rebelião das Massas, p.215);
44
A sociedade é sempre uma unidade dinâmica de dois fatores: minorias e

massas." (Rebelião das Massas, p.37)


● História como Sistema -
44
A história é a realidade do homem. Ele não tem outra. Nela se chegou a fazer tal como é.
Negar o passado é ‘o natural do homem que volta a galope’. O passado não existe mais, e não se
deu ao trabalho de passar para ser negado, mas para ser integrado.” (Rebelião das Massas, p.l6);
“O saber histórico é uma técnica de primeira ordem para conservar e continuar uma civilização
provecta.” (Rebelião das Massas, p.l05);
● Tempo Vital e Nível Histórico -
Ambos baseiam-se em conceitos comparativos e não seguem uma ordem contínua:
crescente ou decrescente, ou seja:
“Nem todas as idades sentiram-se inferiores a alguma do passado, e nem todas se
acreditaram superiores às que sucederam.” (Rebelião das Massas, p.52) e.

9
“Diz-se, por exemplo, que isso ou aquilo não é próprio da altura dos tempos. De fato: não
0 tempo abstrato da cronologia, que é todo plano, mas o tempo vital, o que cada geração chama
de ‘nosso tempo’, tem sempre certa altura, eleva-se hoje sobre ontem, ou se mantém igual, ou cai
abaixo”. (Rebehão das Massas, p.51)
No entanto, como se avaliam ou se diferenciam os diferentes tempos? A resposta não é
clara, mas parece estar na idéia de decadência:
uma vida que não prefere nenhuma
“Para mim não há dúvida quanto ao sintoma decisivo:
outra de antes, de nenhum antes, portanto, que prefere a si mesma, não pode ser chamada de
decadente em nenhum sentido sério.” (Rebelião das Massas, p.57);

● Nível Vital contemporâneo à obra -


superior a todos os tempos idos e
“Não é plenitude dos tempos e, no entanto, sente-se
acima de todas as plenitudes já conhecidas. A impressão que nossa época tem de si mesma não é
fácil de expressar: julga-se melhor que as outras, e ao mesmo tempo sente-se como um início,
sem ter a certeza de não ser uma agoma. Que forma escolheriamos? Talvez esta: superior
aos outros tempos e inferior a si mesma. Fortíssima e ao mesmo tempo insegura de seu destino.
Orgulhosa de suas forças e ao mesmo tempo temerosa delas.” (Rebehão das Massas, p.58);
● Revolução -
118

“... entendo como tal o que Leibniz já chamava de ‘revolução geral , a vontade de
transformar de uma só vez tudo e em todos os gêneros*^” (Rebelião das Massas, p.26)
Quanto à revolução russa:
“... dentre as muitas frases já feitas pela velha experiência humana sobre as revoluções.
nenhuma que não seja uma deplorável confirmação quando aplicada a ela. ‘A revolução devora
seus próprios filhos! A revolução começa por um partido moderado, em seguida passa para os
9 6

extremistas e logo começa a retroceder para uma restauração’ etc., etc.” (Rebehão das Massas, p.
107);
● Reforma -

“Pois bem: o melhor que humanamente pode ser dito de alguma coisa é que precisa ser
reformada, porque isso indica que ela é imprescindível e que é capaz de uma nova
vida.” (Rebelião das Massas, p. 157);
● Multidão -

10
B

“O conceito de multidão é quantitativo e visual. Se o traduzirmos para a terminologia


sociológica, sem alterá-lo, encontraremos a idéia de massa social.” (Rebelião das Massas, 37);
● Massas -

“A massa é o conjunto de pessoas não especialmente qualificadas. Portanto não se deve


entender por massas, nem apenas, nem principalmente, ‘as massas operárias’. Massa é ‘o homem
médio’. Desse modo conveite-se o que era apenas quantidade - a multidão - em uma

determinação qualitativa; é a qualidade comum, é o monstrengo social, é o homem enquanto não


diferenciado dos outros homens, mas que representa um tipo genérico.” (Rebelião das Massas, p.
37);

“A rigor, a massa pode definir-se como um fato psicológico, sem necessidade de esperar o
aparecimento dos indivíduos em aglomeração. Diante de uma só pessoa, podemos saber se é
massa ou não. Massa é todo aquele que não atribui a si um valor - bom ou mau - por razões
especiais, mas que se sente ‘como todo mundo’ e, certamente, não se angustia com isso, sente-se
bem por ser idêntico aos demais.” (Rebelião das Massas, p.38);
“Por ‘massa’ - adverti no início - não se entende especialmente o operário; não se designa
aqui uma classe social, mas uma classe ou modo de ser homem que acontece hoje em todas as
classes sociais, que por isso representa o nosso tempo, no qual predomina e impera” (Rebehão
das Massas, p.l22);
● Minorias -

As mmorias são indivíduos ou grupos de indivíduos especialmente

qualificados” (Rebelião das Massas, p.37);


Caracterizado pelo autor como:
“... o que exige mais de si mesmo que a maioria, ainda que não consiga atingir essas
exigências superiores.” (Rebelião das Massas, p.38);
● Nobreza -

“Nobreza, para mim, é sinônimo de vida dedicada, sempre disposta a superar a si mesma,
a transcender do que já é para o que se propõe como dever e exigência” (Rebehão das Massas, p.
82);
● Cultura e Barbárie -

11
o autor perpassa ambas à impertinência da norma, sejam elas quais forem, mas que sejam
uma instância de regulação. Sendo assim:
“Não há cultura onde não há princípios de legalidade civil a que se apelar. Não há cultura
onde não há respeito a certas posições intelectuais últimas a que se referir na disputa^ (...) A
barbárie é a ausência de normas e da possibilidade de apelação.” (Rebelião das Massas, p.88);
● Mando -

“Por ‘mando’ não se entenda aqui primordialmente exercício de poder material, de coação
física. Porque aqui se aspira a evitar enganos, pelo menos os mais grosseiros e patentes. Pois
bem: essa relação estável e normal entre homens a que se chama mando nuncã repousa
na

força, mas é justamente o inverso, porque é o fato de um homem ou um grupo de homens exercer
0 mando que põe à sua disposição esse apai*ato ou máquina social que se chama ‘força’. (...) O
mando é exercício normal da autoridade, o qual se fundamenta sempre na opinião pública -
sempre, hoje ou há dez mil anos, entre os ingleses ou entre os botocudos. Jamais alguém mandou
na terra baseando seu mando essencialmente em outra coisa que não na opinião
pública.” (Rebelião das Massas, p.l40);
● Estado -

Para o autor o Estado é sempre movimento, sempre projeto; mas a fim de que se “veja” o
Estado é preciso uma interpretação estática:
“... o Estado constituído é só o resultado de um movimento anterior de luta, de esforços,
que se voltavam para ele. Ao Estado constituído precede o Estado constituinte, e este é o
princípio de movimento.
Quero dizer que o Estado não é uma forma de sociedade que é dada de presente ao
homem, mas que precisa ser forjada penosamente.” (Rebelião das Massas, p. 162/163);
“O Estado, qualquer que seja sua forma - primitiva, antiga, medieval ou moderna -, é
sempre a conclamação que um grupo de homens faz a outros grupos humanos para executarem
uma empresa juntos. (...) Estado e projeto de vida, programa de trabalho ou de conduta humanos,
são termos inseparáveis.” (Rebelião das Massas, p.l76)
● Estado Moderno e/ou Estado-Nação -
O autor dá continuidade à concepção anterior de Estado, porém acrescenta as vertentes de
democrático e plebiscitário:
12
“Um Estado onde os povos mais diversos colaborem, ao qual todos se sintam solidános.
Não um centro que manda e uma periferia que obedece, mas um gigantesco corpo social, onde
cada elemento seja ao mesmo tempo sujeito passivo e ativo do Estado.” (Rebelião das Massas, p.
169);
“Mas os povos novos apresentam uma interpretação do Estado menos material. Se ele é
um projeto de empresas comum, sua realidade é puramente dinânuca: um trabalho, a
continuidade em atuação. Segundo isso, é paite ativa do Estado, é sujeito político, todo aquele
que dá sua adesão à empresa - raça, sangue, filiação geográfica, classe social ficam em segundo
plano. (...) O Estado nacional é democrático de nascimento, num sentido muito mais decisivo que
todas as diferenças nas formas de governo.” (Rebelião das Massas, p.l77);
“Vejo 0 Estado nacional, pois, uma estrutura histórica de caráter plebiscitário.” (Rebelião
das Massas, p.l80);
● Nação -
O autor inicia suas indagações expondo, segundo suas palavras, a conhecidíssima
sentença de Renan:

“Ter glórias comuns no passado, uma vontade comum no presente; ter feito grandes
coisas juntos, querer fazer mais outras; eis aqui as condições essenciais para ser um povo... No
passado, uma herança de glórias e remorsos; no porvir, um mesmo programa a realizar... A
existência de uma nação é um plebiscito cotidiano.” (Rebelião das Massas, p.l78)
E, logo o autor traz a idéia de movimento (o estático apenas como desfinte de “ver”), a
mesma utilizada para o Estado:
“...0 âmago essencial de uma nação, que se compõe destes dois ingredientes: primeiro, um
projeto de convivência total numa empresa comum; segundo, a adesão dos homens a esse projeto
incitativo. (...) Porque, na verdade, uma nação nunca está feita. Nisso se diferencia de outros tipos
de Estado. A nação está sempre se fazendo ou se desfazendo.” (Rebelião das Massas, p.l81);
● Direito -

O autor enxerga o direito como, de fato, estático:


“O direito tradicional só serve de regulamento para uma realidade paralítica.” (Rebelião
das Massas, p.210);

13
Sendo assim, emprega - como anteriormente visto nas concepções de Estado e de Nação -
a idéia de movimento, propondo:
“O homem precisa de um direito plástico e em movimento, capaz de acompanhar a
história em sua metamorfose.” (Rebelião das Massas, p.210/211);
“É muito importante reduzir a conceitos claros essa situação efetiva de direito que
consiste em puras ‘margens’ e puras ‘elasticidades’. Porque a elasticidade é a condição que
permite a um direito ser plástico, e, se lhe é atiibuída uma margem, é porque se prevê seu
movimento.” (Rebelião das Massas, p.211);
No entanto, o autor alerta que esse direito não pode ser construído num vazio social, e sim
dirigido a uma sociedade portadora desse direito e anterior a ele.
● Vigências -
“As vigências são o autêntico poder social, anônimo, impessoal, independente de todo
grupo ou indivíduo determinado. (...) Quando uma opinião ou norma chega a ser verdadeiramente
‘vigência coletiva’, não recebe seu vigor do esforço que determinados grupos sociais fazem para
impô-la ou mantê-la.” (Rebelião das Massas, p.218).

Tese Central

Um fato formidável acontece em meados do século XX:


“Esse fato é o advento das massas ao pleno poderio social.” (Rebelião das Massas, p.35).
Adverte-se para que a compreensão deste fato não se faça dentro de um sentido
exclusivamente político. O assunto trabalhado na obra anseia a caracterização do homem médio
deste período em questão quanto à sua capacidade para continuar a civilização moderna e
quanto à sua adesão à cultura.” (Rebelião das Massas, p.32).
Portanto, o objeto estudado pelo autor é o que ele chama de homem-massa. Em tomo
deste tipo de homem gravitaii toda sua argumentação a fim de apreender uma característica do
europeu entre - gueiras, ou de um novo homem que se apontava no mundo, cuja definição é:
... um homem feito de pressa, montado simplesmente sobre poucas e pobres abstrações e

que, por isso, é idêntico de um extremo a outro da Europa. (Rebelião das Massas, p-12)

Processo Histórico

14
o viver, para o autor, não é mais do que lidar com o mundo. Portanto, no passado viver
significava dificuldades, limitações, escassez, etc.; no novo mundo as possibilidades são
praticamente ilimitadas. Esta análise surge a partir de três princípios que tomaram esse novo

mundo possível:
"... a democracia liberal, as experiências científicas e o industrialismo. Os dois últimos
podem ser resumidos num só: a técnica.” (Rebelião das Massas, p.75).
Segundo o autor, ambas resultam em dois séculos de educação progressista e um paralelo
crescimento econômico na Europa, mas cabe especificamente ao século XIX a formação das
grandes multidões.
Notemos que a estmtura de formação do homem-massa a que o autor se refere baseia-se
em dois pilares: democracia liberal e técnica, características da Europa do século XIX.
A técnica contemporânea é uma associação entre capitalismo e ciência experimental. Esta
progrediu de forma mecânica e baseada na especialização:
“A firmeza e exatidão dos métodos permitem essa transitória e práticas desarticuladas do
saber. (...) O especialista ‘sabe’ muito bem seu mínimo rincão de universo; mas ignora
radicalmente todo o resto.” (Rebelião das Massas, p.l24).
Esta mesma técnica permitiu que o mundo se mundializasse de fato em meados do século
XX, ou seja, que o homem médio vivesse habitualmente todo o planeta. Sendo assim, temos um
aumento espaço-temporal do mundo por conseqüência de se incluir mais coisas. Concluindo, a
técnica contemporânea tem feito crescer a vida do homem médio na dimensão das
potencialidades e o mesmo conta com um leque de possibilidades que aumentaram
significamente:
“... convencendo-nos que o organismo humano de nosso tempo possui capacidades

superiores às conhecidas anteriormente. (Rebelião das Massas, p.62)


Observa-se que o autor coloca o século XIX como o provedor da técnica contemporânea,
alertando que a tecnizaçâo do mundo é fato recente e inerente ao período da obra, cujas mudanças
são o assunto em questão. Além disso:

15
“...desde o século XVI toda a humanidade entrou num gigantesco processo de unificação,

que em nossos dias chegou a seu ponto insuperável. Já não há pedaço da humanidade que viva à
parte - não há ilhas de humanidade.” (Rebelião das Massas, p. 140)
)
A metáfora que o mundo aumentou é válida e o contrário também. Segundo o autor, a
técnica contemporânea provocou a seguinte situação:
“...para os efeitos da vida pública universal, o tamanho do mundo diminuiu subitamente.
Os povos se encontram de repente dinamicamente mais próximos. E isso acontece justamente no
momento em que os povos europeus mais se distanciaram moralmente.” (Rebehão das Massas, p.
221).
Quanto à democracia liberal, o princípio também é válido. Na época do sufrágio universal
as multidões escolhiam entre os programas propostos ao qual aderir, sabiam que existiam as
classes ou “castas”. No entanto, o homem médio “atual” aprende que todos os homens são iguais

e as massas passam a atuar diretamente, sem um mediador, sem uma representação:


“Hoje assistimos ao triunfo de uma hiperdemocracia na qual a massa atua diretamente
sem lei, por meio de pressões materiais, impondo suas aspirações e seus gostos.” (Rebelião das
Massas, p.40)
E o psicológico do homem-massa atua conforme:
“... a livre expansão de seus desejos vitais, portanto, de sua pessoa, e a radical ingratidão
para com tudo que tomou possível a facilidade de sua existência.” (Rebelião das Massas, p.76).
Outras razões também contribuíram à formação do homem-massa. Estas são inerentes e
estão subordinadas às duas anteriormente citadas. Primeira, a elevação geral do nível histórico
proporcionando que:
“Todo bem e todo o mal do presente e do futuro imediato têm sua causa e sua origem
nessa elevação geral do nível histórico.” (Rebelião das Massas, p.47)
Segunda, o crescimento quantitativo das multidões, a velocidade desse crescimento no
século XIX para o XX e o principal, o efeito dessa velocidade. Ou seja, o autor apresenta as
seguintes informações: do século VI até 1800 a Europa não ultrapassa a cifra de 180 milhões de
habitantes; de 1800 a 1914 a população cresceu de 180 para 460 milhões de habitantes e esta
aceleração impossibilitou prover uma educação tradicional:

16
! ii

E, com efeito, o tipo médio do homem europeu atual possui uma alma mais sã e mais
44

II
) forte que as do século passado, porém muito mais simples.” (Rebelião das Massas, p.70).
i) Concluindo:

Minha tese é, portanto, a seguinte: a própria perfeição com que o século XIX organizou
44

certas esferas da vida é a origem do fato de que as massas beneficiárias não a considerem como
organização, mas como natureza.” (Rebelião das Massas, p.77)
... tirar as seguintes conclusões: primeira, que a democracia liberal fundada na criação
44

}
conhecido; segimda, que esse tipo de vida não
técnica é o tipo superior de vida pública até agora
será 0 melhor imaginável, mas o que imaginarmos como melhor terá que conservar o essencial
daqueles princípios; terceira, que é suicida qualquer retomo a formas de vida inferiores à do
5 século XIX.” (Rebelião das Massas, p.71)
... o mundo organizado pelo século XIX, ao produzir automaticamente um homem novo,
44

deu-lhe apetites formidáveis, meios poderosos de toda ordem para satisfazê-los - econômicos,
corporais (higiene, saúde média superior à de todos os tempos), civis e técnicos (entenda-se por
)
estes a enormidade de conhecimentos parciais e de eficiência prática que tem hoje o homem
) médio e de que sempre careceu no passado). Depois de lhe ter dado essas potências todas, o
século XIX 0 abandonou a si próprio, e então, seguindo sua índole natural, o homem médio se
fechou dentro de si. Desse modo nos encontramos com uma massa mais forte do que a de

nenhuma outra época, mas diferente da tradicional, fechada em si mesma, que não atende a nada
e a ninguém, acreditando que se basta a si própria - em suma: indócil.” (Rebehão das Massas, p.
83).

Argumentação Empírica

O primeiro fator notável que inicia a análise do fenômeno estudado pelo autor é a
concepção do termo cheio”. Este fato está ligado diretamente às aglomerações (multidão), ou
44

seja, 0 cheio” tem relação com a percepção de concentração de pessoas em lugares que antes
44

sobravam e eram fi*eqüentados pelas minorias.

17
“Simples de se enunciar, mas não de se analisar, eu denomino o fato da aglomeração de
‘cheio’. (...) O que vemos, que nos surpreende tanto? Vemos a multidão como tal, de posse dos
locais e utensílios criados pela civilização”. (Rebelião das Massas, p.36)
“Há quinze anos existia aproximadamente o mesmo número de pessoas. (...) Os
indivíduos que integram essas multidões já existiam, porém não como multidão.” (Rebelião das
Massas, p.37)
Outra característica inerente ao processo e evidência do homem-massa é a homogeneidade
das situações - impossibilidade prática de opções entre possibüidades - conduzidas pelos
extremos que integram tudo de maneira hermética; politicismo integral praticadas pelo
reacionário ou pelo revolucionário, ambos considerados como exemplos claros de homem-massa:
“O politicismo integral, a absorção de todas as coisas e de todo o homem pela política é a
mesma coisa que o fenômeno da rebelião das massas descrito aqui.” (Rebelião das Massas, p.22)
“Por isso 0 bolchmsmo e o fascismo, as duas ‘novas’ propostas políticas que estão
surgindo na Europa e arredores, são dois claros exemplos de regressão substancial. (...)
Movimentos típicos de homens-massa, dirigidos, como todos que o são, por homens medíocres,
extemporâneos e sem grande memória, sem consciência histórica ... (Rebelião das Massas, p.
106)
Este novo homem do século XX fracassa não mais pela falta de técnica (como no passado
- queda do Império Romano; exemplo dado pelo autor), mas por não conseguir acompanhar o
progresso de sua civilização e por uma ignorância histórica incrível. Esta “alma hermética” do
homem-massa transita pela civilização como se fosse um primitivo, usufruindo-se para si próprio
dos avanços da ciência empírica (fator de sustentação das massas) como bárbaros:
“Pois repare-se qual é a situação atual: enquanto, de maneira evidente, todos os demais
campos da cultura tomaram-se problemáticos - a política, a arte, as normas sociais, a própria

moral há um que. a cada dia que passa, comprova, de forma indiscutível e adequada para
sua maravilhosa eficiência: a ciência empírica. ( Rebelião das
impressionar o homem-massa
Massas, p.99)
“Mas as ciência experimentais sim, essas necessitam da massa, como estas necessitam
delas, sob pena de sucumbirem, já que num planeta sem fisico-química não seria possível manter-
se o numero de homens hoje existentes.” (Rebelião das Massas, p.lOO)
18
Portanto, baseando-se nos adjetivos primitivo e bárbaro que qualificam o homem-massa,
0 autor estabelece a relação desse novo homem com o mundo difícil e complexo que o rodeia:
“O homem-massa acha que a civilização em que usa é tão espontânea e primigênia como
a Natureza, e ipso facto converte-se em primitivo”. (Rebelião das Massas, p. 104)
“...o europeu que começa a predominar seria, relativamente à civilização complexa em
que nasceu um homem primitivo, um bárbaro emergindo pela escotilha, um ‘invasor
vertical’.” (Rebelião das Massas, p.lOl)
Sendo assim, diante dessa aparente facilidade em que o mundo se apresenta, o autor
caracteriza a personalidade do homem-massa como ingrata, de grandes apetites e motivado por
necessidades externas:

“O mundo que rodeia o homem novo desde seu nascimento que não faz com que ele se
limite em nenhum sentido, não lhe apresenta nenhum veto nem contenção, mas, ao contrário.
fustiga seus apetites que, em princípio, podem crescer mdefinidamente. (...) uma segurança
inabalável de que amanhã será ainda mais rico, mais perfeito e mais amplo, como se gozasse de
um espontâneo e inesgotável crescimento. (...) dois primeiros traços: a livre expansão de seus
desejos vitais, portanto, de sua pessoa, e a radical ingraditão para com tudo que tomou possível a
facilidade de sua existência.”( Rebelião das Massas, p.76)
“Conforme se avança pela vida, vai-se notando indubitavelmente que a maior parte dos
homens - e das mulheres - são incapazes de qualquer esforço que não seja o estritamente
imposto como reação a uma necessidade externa.”(Rebelião das Massas, p.82/83)
Para o autor:

“... 0 homem da ciência é o protótipo do homem-massa” (Rebelião das Massas, p.l22)


Afinal:

“Porque convém insistir na extravagância desse fato inegável: a ciência experimental


progrediu, em boa parte, devido ao trabalho de homens incrivelmente medíocres, e até menos que
isso. (...) A firmeza e a exatidão dos métodos permitem essa transitória e prática desarticulação
do saber. (...) O especialista ‘sabe’ muito bem seu mínimo rincão de universo; mas ignora
radicalmente todo o resto”( Rebelião das Massas, p.l24)
“Não é um sábio, porque ignora formalmente tudo quanto não faz parte de sua

especialidade; mas tampouco é um ignorante, porque é ‘um homem da ciência’ e conhece muito
19
bem sua porciúncula de universo. (...) Em política, em arte, nos usos sociais, em outras ciências,
tomará posições de primitivo, de ignorantíssimo: mas as tomará com energia e suficiência, sem
admitir - e aí está o paradoxo - especialistas nessas coisas. (...) Eles simbolizam, e constituem em
grande parte, o atual império das massas, e sua barbárie é a causa mais imediata da
desmoralização européia.” (Rebelião das Massas, p.l25)
A vulgaridade, o direito à vulgaridade, a indocilidade, a especial vaidade, a falta de razão,
0 direito a não ter razão e a imposição de suas opiniões são outras características do homem-
massa:

"A característica do momento é que a alma mlgar, sabendo que é vulgar, tem a coragem
de afirmar o direito da \n.dgaridade e o impÒe em toda parte" (Rebelião das Massas, p.41)
“Era isso que no primeiro capítulo eu anunciava como característico de nossa época: não é
que 0 vulgo pense que é excepcional e não vulgar, mas sim que o vulgar proclama e impõe o
direito da vulgaridade, ou a vulgaridade como um direito.” (Rebelião das Massas, p.87)
“A análise de sua anatomia pode ser resumida em dois pontos: primeiro, as massas
executam hoje um repertório vital que coincide, em grande parte, com o que antes parecia
exclusivamente reservado às minorias: segundo, ao mesmo tempo, as massas se tomaram
indóceis diante das minorias; não as obedecem, não as seguem, não as respeitam, mas, ao
contrário, as ignoram e as suplantam.” (Rebelião das Massas, p.45)
“A massa - quem diria ao ver seu aspecto compacto e multitudinário? - não deseja a
convivência com o que não é ela. Odeia mortalmente o que não é ela.” (Rebeüão das Massas, p.
92)
'Mas o homem que estamos analisando está habituado a não apelar por si mesmo a
nenhuma instanciafora dele." (Rebelião das Massas, p.80)
“... distinguíamos o homem excelente do homem vulgar dizendo: que aquele é o que exige
muito de si mesmo, e este é 0 que não exige nada, mas está satisfeito com o que é, está encantado
consigo .
1 ”
(Rebelião das Massas, p.80/81)
Entre as espécies de sindicalismo e fascismo aparece pela primeira vez na Europa um
ter razão, mas que, simplesmente, mostra-se
tipo de homem que não quer dar razão nem quer ter razão, a razão da sem
decidido a impor suas opiniões. Aqui está o novo: o direito a não
razão.” (Rebelião das Massas, p.89)
20
“Resumo: O novo fato social aqui analisado é o seguinte: pela primeira vez a história
européia parece estai- subordinada à decisão do homem vulgar como tal. Ou, dito em voz ativa: o
homem vulgar, dirigido anteriormente, resolveu governar o mundo.” (Rebehão das Massas, p.
111)
Diante do poderio das massas, caiacterística da época em questão, a imposição de sua
opinião se dá pela “ação direta”, não apelando a nenhuma instancia fora dela:
“Mas o homem massa sentir-se-ia perdido se aceitasse a discussão, e instintivamente
rejeita a obrigação de acatar essa instancia suprema que se acha fora dele.” (Rebelião das Massas,
Rebelião das Massas, p.89)
“... quando a massa, independente do motivo, atuou na vida púbhca, o fez na forma de
‘ação direta’.” (Rebelião das Massas, p.90)
“Toda convivência humana vai entrando nesse novo regime em que são suprimidas as
instâncias indiretas,” (Rebelião das Massas, p.91)
Como última metáfora para descrever o homem-massa, o autor lança mão de outras
comparações, como com a da “criança mimada”, com a do primitivo rebelde e com o do
“senhorzinho satisfeito”:

'Esse conjunto de facetas nos fez pensar em certos modos deficientes de ser homem,
como a ‘criança mimada’ e o primitivo rebelde; isto é, o bárbaro. (O primitivo normal, ao
contrário, é homem mais suscetível a instâncias superiores que jamais existiu - religião, tabus.
tradição social, costumes.)” (Rebelião das Massas, p. 111/112)
“Acredito que isso mostre com suficiente clareza a superlativa anormalidade que
representa o ‘ senhorzinho satisfeito’. Porque é um homem que nasceu para fazer o que lhe dá
vontade. (...) Mas o ‘senhorzinho’ pensa que pode se comportar em qualquer lugar como em sua
casa, pensa que nada é fatal, irremediável e irrevogável.” (Rebelião das Massas, p.l 15)
“Porque esta é a tônica da existência do homem-massa; a falta de seriedade, a
‘brincadeira’.” (Rebelião das Massas, p. 118)
carência de moral e consecutivamente do
O poderio das massas é fruto (também) de uma
mando do dinheii o:

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21
Instituto de Geociências
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“O homem massa carece simplesmente de moral, que é sempre, por essência, um


D sentimento de submissão a algo, consciência de serviço e obrigação.” (Rebelião das Massas, p.
193)
“Parece mais verossímil que o dinheiro seja um fator social secundário, incapaz, por si
s
% mesmo, de inspirar a grande arquitetura da sociedade. (...) o dinheiro só manda quando não há
íí outro princípio que mande.” (Rebelião das Massas, p.235)
l Nem a religião nem a moral dominam a vida social e tampouco o coração da multidão. A
cultura intelectual e artística é menos valorizada que há vinte anos. Resta só o
dinheiro.” (Rebelião das Massas, p.236)
Sintetizando, a argumentação empírica do autor define-se em:

Estudando-se a estrutura psicológica desse novo tipo de homem, a partir de seus efeitos na vida
«4
1

tf
pública, encontra-se o seguinte: 1°, uma impressão inata e radical de que a vida é fácil,
6
superabundante, sem limitações trágicas; portanto, cada indivíduo médio tem em si a sensação de
domínio e triunfo que, 2°, leva-o a se auto-afirmar tal como é, a considerar seu haver moral e
\ intelectual como bom e completo. Esse contentamento consigo o induz a se fechar para qualquer
\
instância exterior, a não escutar, a não submeter suas opiniões a julgamento algum e a não contar
\
com a existência dos outros. Sua intime sensação de domínio faz com que exerça constantemente

predomínio. Portanto, agirá como se só ele e seus congêneres existissem no mundo; e, assim, 3°,
\ intervirá em tudo impondo sua opinião vulgar, sem considerações, contemplações, trâmites ou
reservas - isto é, segundo um método de ‘ação dii*eta’.” (Rebelião das Massas, p.l 11)

Implicações Futuras ou Prognóstico

O momento crítico que o autor destaca é o da rebelião das massas:


A rebelião das massas pode, de fato, ser o veículo de uma nova organização da
44

humanidade, ímpar, mas também pode ser uma catástrofe do destino humano.” (Rebelião das
Massas, p.93)
O advento do homem-massa significa uma potência do maior bem e do maior mal da
civilização, bastando apenas um breve descuido para que o homem-massa rebelde retroceda à

22
barbárie. Motivado por sua indocUidade e pela sua alma hermética não conseguirá seguir
ninguém e desejará ser senhor:
“Quer-se que o homem médio seja senhor. Então não se estranhe que ele atue por si e
diante de si, que reclame todos os prazeres, que imponha sua vontade com decisão, que se negue
a toda servidão, que não siga ninguém docilmente, que cuide de sua pessoa e de seus ócios, que
arrume sua indumentária: são alguns dos atributos perenes inerentes à consciência de senhorio.
Hoje encontram-se no homem médio, na massa.” (Rebelião das Massas, p.47)
(as massas) ...tenham um momento de boa vontade e aceitem a direção de minorias

especiais superiores, em certos assuntos de especial premência.


Mas mesmo assim essa vontade fracassará. Porque a textura básica de sua alma é feita de
hermetismo e indocilidade, porque lhes falta, por nascimento, a função de atender ao que está
além delas, sejam fatos ou pessoas. Quererão seguir alguém, e não poderão. Quererão ouvir, e
descobrirão que são surdas. (Rebelião das Massas, p.84)
No campo científico o autor prevê uma estagnação. Devido à especialização - que foi o
motivo do progresso da ciência experimental no século XIX - ocorrerá que a ciência não podei'á
avançar pela fragmentação e haverá a necessidade de superação do processo de especialização, o
que não acontecerá por si mesmo.
Também, inicia-se uma falta de mando no mundo consecutivo à “decadência” da Europa:
“Não me importaria em nada que o mando europeu cessasse, se existisse hoje outro grupo
de povos capaz de substituí-lo no Poder e na direção do planeta. Mas nem sequer isso eu pediria.
Aceitaria que ninguém mandasse, se isso não acarretasse a evaporação de todas as virtudes e
dotes do homem europeu.” (Rebelião das Massas, p.l54)
Os riscos dessa decadência também têm seus efeitos (ou causas?) em dois outros fatores
técnicas de comunicação e a aproximação dos povos:
que estão interligados: as
novas

“...os meios atuaisis de comunicação produzem seus efeitos, por ora, daninhos. Porque a
recebe constantemente sobre o que acontece com o outro é
quantidade de notícias que um povo
enorme. ’ (Rebelião das Massas, p.224)
Sustento, pois, que a nova
estrutura do mundo converte os movimentos da opinião de um
- movimentos que antes eram quase inócuos - em autênticas
país sobre o que acontece no outro
incursões. ” (Rebelião das Massas, p.228)

23
Assim como antes postulávamos uma nova técnica jurídica, reclamamos aqui uma
nova

técnica de relacionamento entre os povos." (Rebelião das Massas, p.228)


“Nesses meses tem-se falado muito sobre a intervenção ou não-intervenção de alguns
Estados na vida de outros países. Mas não se falou, pelo menos com ênfase suficiente, sobre a
intervenção hoje exercida de fato pala opinião de algumas nações na vida de outras, às vezes
muito remotas. E esta, a meu ver, é hoje muito mais grave do que aquela.” (Rebelião das Massas,
p.222)
“...é extremamente improvável que nos assuntos graves de seu país a opinião pública
careça de informações mínimas necessáiias para que seu juízo não corresponda orgamcamente a
realidade julgada. (...) Mas acontece exatamente o contrário quando se trata da opinião de um
país sobre o que acontece em outro. (Rebeüão das Massas, p.223)
Como 0 Estado também é uma técnica, assim, portanto, mereça uma constante vigilância;
encara o Estado:
0 autor faz referencia ao advento do homem-massa e como esse

“...o homem-massa vê o Estado um poder anônimo - vulgo crê que o Estado é coisa
sua." (Rebelião das Massas, p. 131)
■‘A massa diz para si mesma: ‘O Estado sou eu’, o que é um erro completo. O Estado só é
idênticos porque nenhum deles se
a massa no sentido em que pode dizer que dois homens são
S coincidem em ser anônimos. Mas acontece
rhama João. O Estado contemporâneo e a massa so
que 0 homem-massa pensa
. de fato, que ele é o Estado, e tenderá cada vez mais a fazê-lo
funcionar a qualquer pretexto, a esmagar com ele qualquer minoria criadora que o perturbe - que
indústria. (...) A sociedade terá que
o pertui'be em qualquer campo: na política, nas idéias, na
(Rebehão das Massas, p.l32)
viver para o Estado; o homem, para a máquina do Governo. mando do dinheiro será cada
uma sociedade estão em crise, o
Como os valores que regem
is coisas estiver a venda:
maior, tanto quanto mais
vez

“ o poder social do dinheiro - ceteris paríbus - será tanto maior quanto mais coisas
ão quanto maior for a quantidade do próprio dinheiro.” (Rebelião das
houver para se comprar, e nao
Massas, p.236)

24
Capítulo 02.

Principais Idéias e Conceitos da Obra de Jean BAUDRILLARD (1985) em “A


Sombra das Maiorias Silenciosas O Fim do Social e o Surgimento das
Massas”

Concepções do Autor e Alguns Conceitos.

a Ciência apresenta um axioma de


No processo de busca pela verdade, segundo o autor,
credibilidade que atravanca a compreensão do fenômeno (tese) trabalhado pelo mesmo - o fim
do social e o surgimento das massas.
ser não respondem ‘objetivamente’ às
“O cientista não pode acreditar que a matéria ou o
questões que ele lhes fonnula, ou que respondem muito objetivamente para que suas questões
sejam boas.
ão da dificuldade de como analisar um objeto
Prosseguindo , Baudrillard levanta a questão
que está além da representação.
“Ninguém sabe na realidade que relação pode se estabelecer entre dois elementos que
estão além da representação é um problema que nossa epistemologia do conhecimento não
a mediação de um sujeito e de uma linguagem, a
nermite resolver pois ela postula sempre
ledWo de un,a repee».*.». Sd »nhe.»o, be„ os enc<ie»en»s
encadeamentos analógicos, afinitários, imediatizados, irreferenciais e
sabemos gran e co. ^ ^^ ^
outros sistemas.” (A
Massas, p. 44)
Dessa forma, o autor faz sua
crítica à Sociologia quanto à impossibilidade da mesma de
conduzii* uma análise “diferente
do tema do social e das massas. Quanto ao social:

, À dãs Moiorios Silenciosas ● 0 Fim do Social e o Swgimento das Mossas. São


^ baudrillard Jean. A citações que se seguem será dado apenas o número da página.
Paulo: Editora Brasiliense, 1985. P gi
25
r

“A sociologia só pode descrever a expansão do social e suas peripécias. Ela vive apenas
da hipótese positiva e definitiva do social. A assimilação, a implosão do social lhe escapam. A
hipótese da morte do social é também a da sua própria morte.” (À Sombra das Maiorias
Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 11)
O mesmo acontece com o termo massa. Ele, na maioria das vezes, é concebido de forma a

classificar os grupos (ou classes) em categorias a fim de satisfazer determinadas prerrogativas.


Para o autor, o termo massa não é um conceito, e tal como é abordado tradicionalmente, o mesmo

não passará de noções fluidas e acríticas. Portanto, a combinação errônea de ambos os termos:
“São a obsessão de todo projeto social, mas todos malogram nelas, porque todos
permanecem enraizados na definição clássica de massas, a de uma esperança escatológica do
social e de sua realização. Ora, as massas não são o social, são a reversão de todo social e de todo
socialismo.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas,
p. 42)
Essa hipótese inverte tudo. Baudrillard anula a idéia de contrato, de ligação e de relação
social. Pai*a ele há apenas questões, desafios:
“O desafio não é uma dialética, nem uma oposição respectiva de um pólo ao outro, de um
termo ao outro, numa estrutura plena. Ele é um processo de exterminação da posição estrutural de
cada termo, da posição de sujeito de cada um dos antagonistas e em particular daquele que lança
o desafio: por isso mesmo ele abandona qualquer posição contratual que possa dar lugar a uma
iigação’.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p.
58)
Para a compreensão dessa proposta que o autor nos insere, faz-se necessário esclarecer um
tradicionais e a resistência à socialização:
ponto básico entre a massa, os grupos
“... a massa absolutamente constitui uma estrutura passiva de recepção das mensagens dos
meios de comunicação, sejam elas politicas. culturais ou publicitárias. Os microgrupos e os
indivíduos, longe de se alinharem a uma decodificação uniforme e imposta, decodificam as
mensagens à sua maneü'a, as
interceptam (através de Uderes) e as transpõem (segundo nível).
opondo ao código dominante seus sub-códigos particulares, e terminam de reciclar tudo que os
atinge em seu próprio ciclo...” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o
Surgimento das Massas, p. 37)
26
Sendo assim, para o autor, a maneira de resistência das massas (silêncio, benevolência,
etc.) para com o social (ou socialização) não deve ser confundida com as dos micrognipos. Esta
idéia é a base para o fim do social e será exposta nesse trabalho mais adiante; antes
apresentaremos algumas noções (do autor) que acreditamos ser condizentes para tal finalidade:
● O Social -

“Houve sociedades sem sociaL assim como houve sociedade sem história.” (A Sombra

das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 56)


”0 social não é um processo claro e unívoco.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O
Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 55)
“A energia ininterrupta do social surgiu há dois séculos com a desterritorialização e a
concentração sob instâncias cada vez mais unificadas. (A Sombra das Maiorias Silenciosas, O
Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 57)
Como as ciências sociais não conseguem definir o social, mas apenas suas peripécias
(conforme o autor) e aquilo que o produz (processo), ou seja, as instituições (urbanização,
concentração, produção, trabalho, medicina, escolarização, segurança social, seguros, etc.);então.
segue que o mesmo pertence a:
... um modelo de simulação entre outros, e que só tem por característica o fato de que
permite efeitos de verdade, de objetividade, inauditos e desconhecidos aos outros modelos. Ele
não é talvez um equívocol Em qualquer caso, tudo o que se tramou e se colocou nessa ‘cena à
italiana’ do social jamais teve importância profunda. As coisas, profundamente, jamais
funcionaram de modo social, mas sim simbolicamente, magicamente, irracionalmente, etc.” (À
Sombra das Maiorias Süenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 57)
Para o autor, as mesmas instituições que produzem o social também o destroem. Afinal,
se elas constroem o social sedimentando-se (talvez evoluindo) sobre sociedades anteriores
elas neutralizam a essência dessas sociedades em suas
(simbólico). Paradoxalmente, segue que
relações e seus contatos sociais, produzindo as massas. Segundo Baudrillard, esse processo atinge
ios de comunicação de massa e a informação. No entanto:
sua extensão máxima com os meios
“Mas, então se o social é ao mesmo tempo destruído por aquele que o produz (os mídia, a
informação) e reabsorvido pelo que produz (as massas), segue que a definição é nula, e que esse
termo que serve de álibi universal para todos os discursos não analisa nada, não designa nada. Ele

27
não é somente supérfluo e inútil - em toda a parte que aparece esconde outra coisa: desafio,
morte, sedução, ritual, repetição esconde que é abstração e resíduo, ou mesmo simplesmente
^eito de social, simulação e miragem.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o
Surgimento das Massas, p. 56)
● Funcionalidade -

funcionalidade não qualifica de modo algum aquilo que se adapta a um fim, mas
aquilo que se adapta a uma ordem ou a um sistema.
● Valor/Signo -
“... tanto a ‘fimção’ como a ‘racionalidade’ foram aos poucos mistificadas e a ‘função’, ao
emancipar>se do objeto, adquiriu um valor por si, valor-signo, para posteriormente retomar ele
objeto na condição de ‘exigência cultural’, exigência esta muitas vezes em choque com o
verdadeiro desenvolvimento do homem em sua relação com a tecnologia.” (O Sistema dos
Objetos, p. 220)
“A «ílmcionalização» de qualquer objecto constitui também uma abstracção coerente que
se sobrepõe e substitui em toda a parte à respectiva fimção objectiva (a «funcionalidade» não é o
valor de uso, mas valor/signo).
● Sistema -

Para entender a obra do autor, sistema deve ser entendido no sentido mais amplo do
termo. Não se deve associá-lo com as diversas concepções e construções científicas que o termo
ô-lo
carrega nem supo- como relações/combinações de variáveis, aproximando-se da idéia de
modelo. Afinal, modelo e realidade (combinação) são a base da crítica de Baudrillard para a
construção do que o autor chamou de hiper-realidade.
● Consumo -

’ RAi ÍDRIII ARD Jean. O Sistcnio dos Objetos,. São Paulo: Editora Perspectiva S.A,1989. Página 220. Nas citações
que s!S.em dl ap«a. o mauero da página.
de Consumo. Lisboa: Edições 70,1995. Página 89. Nas citações que
se

“ baudrillard, Jean. A Sociedade


seguem será dado apaias o numero da página.
28
“O consumo (ou, acrescento eu^ a imagem publicitária como ação) é encarado como
prática idealista total, que nada mais teria a ver (além de um certo limiar), ‘nem com a satisfação
de necessidades, nem com o princípio de realidade’.” (O Sistema dos Objetos, p. 225)
“A lógica do consumo - segundo vimos - define-se como manipulação de signos.
Encontram-se ausentes os valores simbólicos de criação e a relação simbólica de interioridade. O
objeto perde a finalidade objectiva e a respectiva função, tomando-se o termo de uma
combinatória muito mais vasta de conjuntos de objectos, em que o seu valor é de relação. Por
outro lado, desaparece o seu sentido simbólico e o seu estatuto antropomoforfico milenário,
tendendo a esgotar-se num discurso de conotações, também elas relativas umas às outras no
quadro de um sistema cultural totalitário, isto é, seja qual for a respectiva origem.” (A Sociedade
de Consumo. p.l20)
● Sociedade de Consumo -

“A nossa época é a pi-imeira em que tanto os gastos alimentares correntes como as


despesas de «prestígio» se apelidam de «consumir», sucedendo assim com toda a gente, segundo
um consenso total. A emergência histórica do mito do consumo no século XX é radicalmente

diferente da do conceito técnico na reflexão ou na ciência econômica, cujo uso tem origem
anterior. Esta sistematização terminóloga no uso corrente modifica a própria história: é sinal de
nova realidade social. Para falar com propriedade, só existe consumo a partir do momento em que

0 termo «entrou nos costumes». Mistificante e impraticável na análise, «anticonceito», significa,

no entanto, que se operou toda uma reestruturação ideológica dos valores. O facto de semelhante
sociedade se viver como sociedade de consumo tem de constituir o ponto de partida de uma
análise objectiva.”(A Sociedade de Consumo. p.208)
● Informação -
estímulos luminosos ou
(a massa) “Ela é inteiTOgada por ondas convergentes, pot
as estrelas distantes ou núcleos que são bombardeados com
lingüísticos, exatamente como
Isso é a informação. Não um modo de comunicação nem de sentido.
partículas num ciclotron
mas um modo de emulsão incessante, inpul-output e de reações em cadeia dingidas, exatamente
como nas câmaras de simulação atômicas. (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do
Social e o Surgimento das Massas, p. 25)
Posfádo, dos ObJetos. São Paulo: Editora Perspectiva S.A, 1989
29
● Sondagem e o Real -
“Descobre-se que o verdadeiro e o falso são aqui inseparáveis - como igualmente
acontece nas sondagens eleitorais, onde nunca se sabe se o voto real ratificará apenas as
sondagens (deixando de ser acontecimento real e sugerindo unicamente como sucedâneo das
sondagens que, de modelos de simulação indiciosos, se tomam agentes determinantes da
realidade) ou se são antes as sondagens que reflectem a opinião pública. Dá-se nesse caso uma
inextricável relação. Assim como a natureza imita a arte, também a vida quotidiana acaba por ser
a réplica do modelo.” (A Sociedade de Consumo, p.l35)
● O Hiper-real -
O hiper-real, segundo o autor, é:
“O espaço da simulação é o da conílisão do real e do modelo.” (A Sombra das Maiorias
Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 68)
“Curto-circuito fantástico: o real é hiper-realizado; nem realizado, nem idealizado: hiper-
realizado. O hiper-real é a abolição do real não por destmição violenta, mas pela afirmação,
elevação a potência do modelo. Antecipação, dissuasão, transfiguração preventiva, etc.: o modelo
Opera como esfera de absorção do real.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e

0 Surgimento das Massas, p. 68/69)


● Sistemas Implosivos e Sistemas Explosivos -
Para ambas as concepções, quando inserido o adjetivo “dirigidos”, dá-se a idéia de

controle do processo: quando não, entender o contrário, ou seja, catastrófica.


Sistemas Implosivos Dirigidos -
‘‘Configurações não-expansivas, não-centrífugas: centrípetas - pluralidades smgulares que
nunca visam o universal, centradas num processo cíclico, o ritual, e que tendem a mvoluir nesse
processo não-representativo, sem instância superior, sem polaridade, disjuntiva, sem entretanto se
arruinas a si mesma..." (À Sombra das Maiorias Silenciosas: O Fim do Social e o Surgimento das
Massas, p.49)
Sistemas Explosivos
Esse se refere ao modelo de expansão ocidental adotado após a ruptura com a Idade
fim” das sociedades primitivas (talvez, início da modernidade),
Média, na concepção quanto ao
do sistema de implosão dirigida para o da explosão:
cujo autor especifica como a passagem
30
“As sociedades primitivas vieram portanto de uma implosâo dirigida - morreram quando
para o da explosão (demográfica, ou
deixaram de controlar esse processo, e oscilaram então
excedentes de produção irredutíveis, processo de expansão incontrolável, ou simplesmente
quando a colonização as iniciou violentamente na norma expansiva e centrífixga dos sistemas
ocidentais).” (À Sombra das Maiorias Silenciosas: O Fim do Social e o Surgimento das Massas,
p. 49)
● Definição de Massa -
- é procurar um sentido
“Querer especificar o termo massa é justamente um contra-senso
no que não o tem. Diz-se: ‘massa de trabalhadores’. Mas a massa nunca é de trabalhadores, nem
de qualquer outro sujeito ou objeto social. As ‘massas camponesas de outrora não eram
exatamente massas: só se comportam como massa aqueles que estão liberados de suas obrigações
simbólicas, ‘anulados’(presos nas infinitas ‘redes’) e destinados a serem apenas o inumerável
terminal dos mesmos modelos, que não chegam a integrá-los e que finalmente só os apresentam
como resíduos estáticos. A massa é sem atributo, sem predicado, sem qualidade, sem referancia.
Ai está sua definição, ou sua indefinição radical. Ela não tem ‘reahdade’ sociológica. Ela não tem
nada a ver com alguma população real. com algum corpo, com algum agregado social específico.
Qualquer tentativa de qualificá-la é somente um esforço para transferi-la para a sociologia e
arranca-la dessa indistinção que não é sequer a da equivalência (soma Uimitada de indivíduos
é, nem um nem
equivalentes: i + 1 + 1 + 1 - tal é a definição sociológica), mas a do neutro, isto e
outro (ne-uter)." (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das
Massas, p. 11/12)
● Quatro Hipóteses para o Social -
1® - Na realidade o social nunca existiu:
“Nunca houve ‘ligação’ social. Nunca nada funcionou socialmente. Nessa base inelutável
de desafio, de sedução e de morte, sempre
houve somente simulação do social e de ligação. (À
Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 59)
Portanto, apenas houve o
simulacro do social, um espaço de referência e que atualmente
começa uma dissimulação brutal do social:
Na verdade é isso que assistimos hoje: à desagregação do pensamento social, ao
do simulacro social, verdadeiro
definhamento e aà involução do social, ao enfraquecimento
31
desafio ao pensamento construtivo e produtivo do social que nos domina.” (À Sombra das
Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 59)

2° - O social realmente existiu, ele até existe cada vez mais, ele investe tudo, só há social:
“Vé-se assim o social crescer no decorrer da história como gestão ‘racional’ dos resíduos,
e dentro em pouco produção racional de resíduos.
Em 1544 abriu-se o primeiro grande estabelecimento de pobres em Pai‘is: vagabundos,
dementes, doentes, todos aqueles que o grupo não integrou e deixou como sobras serão adotados
sob 0 signo nascente do social. Este se expandirá às dimensões da assistência pública no século
20. À medida que se reforça a razão social, é a coletividade toda que logo se toma residual e,
portanto, com uma espúal mais. é o social que se alarga, Quando a sobra atinge as dimensões da
sociedade toda, tem-se uma socialização perfeita.'’ Todo o mundo está perfeitamente excluído e
adotado, perfeitamente designado e socializado.” (À Sombra das Maiorias Süenciosas; O Fim do
Social e o Surgimento das Massas, p. 61)
Sendo assim, o ”... próprio social que é resíduo..r e ... não se pode mais dizer que o

social morre, pois ele è desde sempre acumulação do morto. (À Sombra das Maiorias
Silenciosas; O Fim do Social e o Sui*gimento das Massas, p. 60/61)
“Mas 0 que acontece quando tudo está socializado? Então a máquina pára, a dinâmica se
inverte, e é o sistema social que se torna resíduo. À medida que o social em sua progressão
elimina todos os resíduos, ele próprio se toma residual. Ao colocar sob a mbrica ‘Sociedade’ as
(À Sombra das Maiorias
categorias residuais, o próprio social se designa como resto.
Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 62)
Atualmente, o social se apresenta de.
„ forma degradada da socialidade lubrificante, assistencial, pacificamente e permissiva
- a forma mais baixa da energia social: a de uma utilidade ambiental, comportamental - essa é a
nossa imagem do social - forma entrópica outra imagem de sua morte.” (À Sombra das
Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 63)

3^- O social realmente existiu, mas nâo existe mais.

32
“Ora, o social só existe num espaço perspectivo, morre no espaço de simulação, que é
também um espaço de dissuasão.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o
Surgimento das Massas, p. 68)
Portanto, se o social se realiza no “real”, na sociabilidade dialética - a do Estado e da
sociedade civil, do público e do privado, do social e do individual -, no racional do contrato e se
o social é um “modelo” a ser aplicado, então o social se dissolve na hiper-realidade:
“Os signos da hiper-realidade do social estão em toda parte, os signos da repetição social
e de sua realização antecipada. Em toda parte a transparência da relação social é afixada,
significada, consumada. A história do social jamais teve tempo de levar à revolução: ela foi
rapidamente tomada pelos signos do social e da revolução. O social nunca teve tempo de levar ao
socialismo, ele teria sido cuilo-circuitado pelo hiper-social, pela hiper-realidade do social (mas
talvez o socialismo não seja isso?).” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o
Surgimento das Massas, p. 69/70)

4® - A implosâo do social nas massas,


Esta se assemelha à terceira hipótese, porém, conforme o autor coloca, sob outra forma -

a de simulação, dissuasão e implosâo com/no surgimento das massas, isto é, nas maiorias
silenciosas.

Tese Central

A tese central é a quarta hipótese (A implosâo do social nas massas), anteriormente citada.

Processo Histórico

Para Baudrillard, nem sempre as esferas do político, do social e do econômico estiveram


cenário das intrigas; sua utilização depende de
tão juntas. O político na Renascença pertencia ao
desenvoltura com relação aos fíns
virtuosismo e não de verdade, simbiose dos meios na

(Maquiavel). Não há sistemas de representação e:

33
... nesse momento em que o político é um jogo e ainda não se deu uma razão. (À
Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 20)
Um segundo momento se dá a partir do século XVIII (com a Revolução), quando o
político ganha uma referência social, ou o social se apodera dele. De instrumental que era de
início, aparece como verdade, como representação - surge o povo e sua vontade. No entanto:
“Mas durante muito tempo ainda haverá um equilíbrio entre a esfera própria do político e
as forças que nele se refletem: o social, o histórico e o econômico. (À Sombra das Maiorias
Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 20)
No fmal do século XIX uma mudança ríspida ocorre:
“É com o pensamento marxista em seus desenvolvimentos sucessivos que se maugura o
fim do político e de sua energia própria. Nesse momento começa a hegemonia definitiva do
social e do econômico, e a coação, para o político, de ser o espelho, legislativo, institucional,
ia do político é inversamente proporcional à crescente hegemonia
executivo, do social. A autonomia
do social.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fün do Social e o Surgimento das Massas, p.
20/21)
Depois de dois séculos de socialização acelerada esfria-se a energia social e tem-se o
surgimento das massas:
“O social triunfou..... 0 político se volatüizou, mas em que o próprio social não tem mais
nome. Anônimo. A MASSA AS MASSAS.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do
Social e 0 Surgimento das Massas, p. 21)
Recentemente , fim do sistema político representativo nas massas:
a massa é ao mesmo tempo a morte, o fim desse processo político que supostamente a
Na massa o político deteriora como vontade e representação. (À Sombra das
se
governa
Maiorias Silenciosas:● O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 24)

Argumentação Empírica

Para o autor, as massas não podem ser alienadas, visto que nelas há a impossibilidade de
mais
ão mais sujeito), e nós (como indivíduos) nos comportamos
circulação do sentido (não são
além do sentido - e somos apenas episodicamente condutores do
como massa - aquém ou
34
sentido, além de, nas maiorias silenciosas (massas) não haver mais a possibilidade da
representação, apenas a simulação. Na tentativa de salvai* a representatividade, os produtores de
sentido utilizam-se das estatísticas e das sondagens que são capazes apenas de esboçar uma
representação imagináiia das massas, explica Baudrillai*d, simulando uma forma as mesmas. E,
segundo o autor, a principal cai*acterística das massas está no seu silêncio, na sua indiferença;
cuja função não reside em se calar, mas consiste em proibir que se fale por elas. Sendo assim, o
autor, aponta para o fim da representação das massas, restando apenas as simulações.
Portanto, Baudrillard não está alertando para a crise do “real”, e sim para o hiper-real.
Atualmente, segundo o autor, é o tempo ífaco (o da banalidade, do cotidiano, do privado) que
começa a se sobrepor ao tempo forte (o da história, o da política):
“Os papéis se invertem: é a banalidade da vida, a vida comente, tudo o que se

estigmatizai*a como pequeno-burgués, adjeto e apolítico (inclusive o sexo) que se toma o tempo
forte; e é a história e o político que desenvolvem sua acontecimentalidade abstrata algures.” (À
Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 35) (sic)
Para esta inversão segue um alerta:
não entra numa dialética de
'Mas atenção! Esse universo privado e a-social, que
representação e de ultrapassamento para 0 universal, dessa esfera involutiva que se opõe a toda
revolução pelo alto e se recusa a jogar o jogo. alguns desejariam que se tratasse (em particular
uma versão sexual e de desejo) de uma nova fonte de energia revolucionária, desejariam lhe dar
sentido e o reconstituir como negatividade histórica em sua própria banaUdade. Exaltação de
microdesejos, de pequenas diferenças, de práticas cegas, de marginalidades anônimas. Último
sobressalto dos intelectuais para exaltai* a insignificância, para promover o não-sentido na ordem
do sentido. E revertê-lo à razão política. A banalidade, a inércia, o apoliticismo eram fascistas,
mudar o sentido, isto é, sem deixar de ter sentido. Micro-
agora se tornam revolucionários - sem
revolução da banalidade, transpolítica do desejo - mais um truque dos ‘libertadores’. A negação
do sentido não tem sentido.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o
Surgimento das Massas, p. 36) (sic)
Mas na verdade o que aconteceu foi mais um efeito do antagonismo entre a classe
residual) e a outra, portadora da história, do
despojada de sentido (de uma vingança da massa
político , do social e da cultura. Assim, a força da massa é atual, sem historia;
35
as massas não têm história a escrever, nem passado, nem íuUiro, elas não têm energias
virtuais para liberar, nem desejo a realizar: sua força é atual, toda ela está aqui, e é a do seu
silêncio.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p.
10)
Este silêncio seria a resistência das massas ao social. Diferentemente dos grupos
ti-adicionais que decodificariam as mensagens (anterionnente mencionado),
as massas:

“... aceitam tudo e desviam tudo em bloco no espetacular, sem exigência de outro código,
sem exigência de sentido, na realidade sem resistência, mas fazendo com que tudo passe para
a do não-sentido, mas a da
uma esfera indeterminada que não é nem mesmo

fascinação/manipulação de todos os azimutes. (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do


Social e o Surgimento das Massas, p. 38)
Fim do econômico e do social no valor/signo. Desta vez o social aparece como
mercadoria a ser consumida.
“Que maior ironia pode haver do que nesta exigência do social como bem de consumo
individual, submetido aoexcesso da oferta e da procura?” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O
Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 41)
Aliás, o social é visto hoje como:
rede orbital, intersticial. nuclear, textural, de controle e de segurança, que nos mveste
de todas as paites e nos produz, a nós todos, como maioria silenciosa. Socialidade hiper-real,
, mas pela infiltração de modelos, não
imperceptível, que não opera mais pela lei e pela repressão
(À Sombra das Maiorias SUenciosas; O Fim do
pela violência, mas pela persuasão/dissuação.
Social e o Surgimento das Massas, p. 43) ^
Sejundo BiudiUtard. o me.mo aco.teceu com a lécmca. com . ccoca e com o saber.
Woido * .alo, d. CO panr v.lo„sibno br,a,i„«o. o scmido foi abolido .. esto do
Irill.da.eccssidade.da..i,idmiedc.par.cc.Tbdodcoc.m.o,.oococbmo,
pela falta de produção do mesmo, mas sim pela
sentido não se esgota
Atualmente o
mais e é nas massas que ele
ausência da demanda. O sentido é produzido em toda parte, cada vez
se anula:

*‘0 que lhes dá são mensagens, elas querem apenas signos, elas idolatram o jogo de signos
conteúdos desde que eles se transformem numa seqüência
e de estereótipos, idolatram todos os
36
massas opõem ao ultimato do sentido a sua
espetacular. (...) que é em plena ‘liberdade que
as

recusa e sua vontade de espetáculo ” (À Sombra das Maiorias Silenciosas: O Fim do Social e o
Surgimento das Massas, p. 15)
Pai*a 0 autor, o povo de outrora se converteu num público, esta é a grande mudança de
nosso tempo Uma maioria silenciosa cuja essência é a indiferença:
“As massas elas não escolhem, não produzem diferenças, mas indiferenciação - elas
mantêm a fascinação do meio, que preferem à exigência crítica da mensagem. Pois a fascinação
ão depende do sentido, ela é proporcional à insatisfação com o sentido. Obtém-se a fascinação
ao neutralizar a mensagem era benefício do meio, ao neutralizar a idéia em proveito do ídolo, ao
neutralizar a verdade em beneficio do simulacio. (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do
Social e o Surgimento das Massas, p. 33) massas e o fím do social é o
um fenômeno que está em relação (simultaneidade) com
as

terrorismo:
massas e o terrorismo, entre esses dois nâo-pólos de um
... se poderia dizer que entre as uma energia inversa, energia não de
^ tçtmbém passa uma energia, mas
sistema não-representativo, tarnoem t
mas de dispersão do social, de absorção e anulação do
acumulação social e de transformação do Social e o Surgimento das Massas, p.
pohtico.” (À Sombra das Maiorias SUenciosas; O Fun
45) ~ é nem de sentido nem de
Todos os dois estão em
outro lugar, numa ordem que nao
dúvida simulacro ” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O
representação - talvez mítica, sem
Fim do Social e o Surgimento
das Massas, p. 46)
fala não deve ser coníiindido com o “banditismo” e com a
O terrorismo de que o autor
ação de comando, portanto.
a tomada de reféns e o jogo adiado da morte, não
"O tenorisino atual, inauguiado c ios ou inacessíveis, e, de qualquer maneira, é
tem objetivo (se ele pretende tê-los. são úrisórios ieo determinado.” (À Sombra das
i, ineficaz de atingi-los) sem inimigo
exatamente o método ma. ^^ das Massas, p. 4o)
Maiorias Silenciosas; O míticas, assemelham-se à catástrofe
O terrorismo e as massas, . Afinal, como nas catástrofes naturais, o
todas as representações
natural, inaugurando o fun de

37
único referencial possível está na esfera da divindade, ambos constituem reflexos de um social,
de uma política e de um sentido que não existem mais.
Nas maiorias silenciosas:

não há mais investidura política porque também não há mais referente social de
definição clássica (um povo, uma classe, um proletariado, condições objetivas) para atribuir uma
força a signos políticos eficazes. Simplesmente não há significado social para dar força a um
significante político.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das
Massas, p. 21/22)
Assim, a esfera política e o poder sobrevivera de uma hipótese de credibilidade - as
massas possuem uma opinião e estão presentes atrás das sondagens e das estatísticas - e que são
manipuladas, enganadas e mistificadas. Sim, segundo o autor, as massas possuem um süêncio,
mas:

“... esse silêncio é paradoxal - não é ura silêncio que fala, é um silêncio que proíbe que se
fale em seu nome. E, nesse sentido, longe de ser uma forma de alienação, é uma arma
absoluta.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p.
23)

Portanto, a massa é o fim desse processo político que supostamente a governa, nunca
houve manipulação, porque a massa é ao mesmo tempo um objeto e um sujeito de simulação, e
também por que:
ia social, mas não a refrata mais. (...) Ela dá a todas as
A massa abson^e toda a energia
questões que lhe são postas uma resposta tautológica e circular. (..) Ela não tem verdade e nem
razão. Embora lhe emprestem todas as palavras artificiais. Ela não tem consciência nem
inconsciente.” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas,
p. 28)
“Todo mundo a interroga, mas nunca enquanto silêncio, sempre para fazê-la falar.” (À
Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 29)
Finalizando:

“Mas constatamos que todos os poderes acabam por se arruinar silenciosamente nessa
maioria silenciosa, que não é nem
uma entidade nem uma realidade sociológica, mas a sombra

38
projetada pelo poder, seu abismo no vácuo, sua forma de absorção.” (À Sombra das Maiorias
Silenciosas; O Fim do Social e o Surgimento das Massas, p. 41/42)

Implicações Futuras ou Prognóstico

O processo de advento das massas, associado ao jogo de signos e à destruição do sentido


na fascinação, no espetacular, transformam e aniquilam todas as velhas concepções do poder, da
cultura, do saber e do social. Nossa sociedade está prestes a pôr fim ao social sob a simulaçao do
social. Já no campo político, Baudrillard esclarece que as massas despolitizadas não estariam
estaria no campo da dialética de
aquém, mas além da política. O transpolítico das massas não
ia,
representação, ou seja sem (ausência) alguém que fale em seu nome, porque sua força não está
na negação e sim no silêncio.
Segundo o autor, tal processo conduzirá.
“Assim, antes mesmo que a economia política leve à sua superação dialética, à resolução
de todas as necessidades e à organização ótima das coisas, antes que se tenha podido ver se havia
algum fundamento em tudo isso, ela terá sido captada pela hiper-realidade da economia (a
sobremultiplicação da produção, a precedência da produção da demanda sobre a das mercadorias.
0 ário indefinido da crise).” (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do Social e o
cenário

Surgimento das Massas, p. 70)


Quanto à revolução (explosivo-crítica), toda revolução de sentido se implodiria nas
massas. Tal implosão é caracterizada por:
afinidade, triangular, descrevem o
“Massas, meios de comunicação e taTorismo, em sua
ê afetado por uma violência que somente
processo de implosão hoje dominante. Todo o processo e
, violência do vazio (a fascinação é
começa violência orbital e nuclear, de aspiração e fascinação
. , ~ ««acaíioíp cA tx)de ser violenta e catastrófica,
a intensidade extrema do neutro). A implosão, para nos e hoje, so pouc
de expansão dirigida que foi o nosso no
porque ela resulta do fracasso do sistema de explosão e
ias Silenciosas; O Fim do Social e o
Ocidente há alguns séculos.” (À Sombra das Maiorias
Surgimento das Massas, p. 48/49)

39
assim nossas culturas começam a ser devastadas pela implosão por não terem sabido
controlar e equilibrar o processo explosivo. (À Sombra das Maiorias Silenciosas; O Fim do
Social e o Surgimento das Massas, p. 50)
Portanto, todas as análises esboçadas pelo autor convergem-se ao mesmo ponto, o
processo implosivo de nosso tempo . Este é o prognóstico decisivo e:
salvar os princípios de realidade, de
“A implosão é inelutável, e todos os esforços para
ios de evolução que dependem dos sistemas em
acumulação, de universalidade, os princípios
Inclusive todos aqueles que querem liberar as
expansão
^
são arcaicos, regressivos, nostálgicos travará
1 -aic aa imensidades fragmentanas, etc. (...) Mas nada travara o
o

eneraias libidinais, as energias pluiais. as mtensiaa s


■ 1 ■ e a única alternativa que resta é a de uma implosão violenta
processo unplosivo. e a unica ^
e catastrófica, ^ou^
de uma implosão lenta e progressiva. (A Sombia
Surgimento das Massas, p. 50)

40
Considerações Finais

chamamos de “■Advento das Massas ,


Como nossas análises concentram-se no evento que
efetivou-se no decorrer do século
acreditamos que ambos os autores concordam que tal processo
XX Em &SSO, o homem.rn.ss. »sel. « pieoo poderio social e sus oriticas b~.se qurno
à ovmidade desse oovo homem em oomio.m a eirihsaç.o «oden» e qunm à su. ades», a
colim. Apmxim.d-...e meio sée.lo depois de Oirise,. Bmidrillmd ap,™ o ím do soc^
na
ia,
simulação do social, ou seja fim do social no surgimento das massas (maiorias silenciosas).
divisor de águas.
Sendo assim, entre as obi as há um ponto culminante, um
Como mencionado anterioimente, a preocupação de Gasset consiste em saber se tó a
■hTH H H dar esse tipo de homem, homem que, pela perspectiva do social, Baudnllard
Ht! que stfreu tal trrnisformação em 1968 e, utilizando-se da analogia do ponto de não
retomo da “massa crítica” na explosão nuclear, o autor afirma que e muito tar e paia vo ar, o
limite já teria sido transposto.
das características do homem-massa é a completa ignorância quanto
Segundo Gasset, uma analisa esse homem a partir da formação e
, O autor
à História. Portanto, para atingir seu propósito dois pilares: democracia liberal e
análises fiindamentam-se em
da constituição das massas. Suas
base material para a formação das massas, temos a
técnica. Se considerarmos a técnica como a
industrialismo do século XIX como princípio correlacionado a uma
técnica experimental e i conformado apenas no século XX. Se
explosão demográfica e a tecnização do mundo, esta
ia liberal como a
base político/social de constituição das massas,
interpretada a democracia teóricos que sustentaram a
como uma organização de pensamentos
compreende-se a mesma Baudrillard parte da concepção que toda analise
rep™», <1.. «»» D,lbr..i.—. suas análises não necessariamente
●aocWaqe * . Aliás, ambos concordam
atual deva partir da ‘so.
acreditamos que as complementam
discordam daquelas de Gasset, mas massas, ou seja, as massas não são mais
na superaçao da esfera representativa pelas
representadas. massas dentro de um
, para que não se faça compreender as
Apesar de Gasset destaca a transição da democracia liberal para a
sentido exclusivamente político, o autor 41
hiperdemocracia, ou seja, do sufrágio universal para a atuação direta das massas. Em Baudrillard
temos as quatro fases da esfera política e suas relações com o social e o econômico. Primeira, o
poUtico como palco do jogo de poder na renascença; depois o político como referência
representativa (século XVIII); já no final do século XIX o político sede para a hegemonia do
social e do econômico e, por último, o fim do político e principalmente do social
nas maionas

silenciosas.

Supomos que tanto a hiperdemocracia como as maiorias silenciosas apresentam um ponto


de convergência - uma nova organização da sociedade, um momento ímpar da história; o advento
das massas. Porém, encontramos nos autores algumas divergências (não contradições) quanto às

evidências desse período. Gasset tem como fiindamento que toda sociedade é aristocrática e
Baudrillard acredita que as diferenças estão nos estamentos sociais, nas “castas . O primeiro
divide 0 mundo entre maiorias e minorias, o segundo propõe que a massa é um comportamento
social, uma organização da “sociedade de consumo”. Portanto, para Baudrillard as
massas senam

uma resposta ao antagonismo de classe: uma portadora da história, do político, do social, da


as massas não têm história
cultura e a outra despojada do sentido. Assim, Baudrillard afirma que
a escrever, sua força está no aqui e agora, no silêncio, na indiferença, ou seja, o povo de outrora

se tomou público. E, as principais cai^acterísticas desse período consistem na superação da


representação pela simulação, no hiper-real, na combinação do valor/signo, no espetáculo, na
similaridade da massa com o terrorismo e no fim de um processo político que supostamente a
governa; as massas não são nem uma entidade, nem uma realidade sociológica, apenas a sombra
projetada do poder.
evidências “mais palpáveis” e para ele o homem vulgar resolveu
Gasset trabalha com

governar o mundo A demonstração de tal evento parte da constatação do “cheio (concentração


de pessoas em lugares que antes eram freqüentados apenas pelas minorias) e do que tal fenomeno
provoca referindo-se a sua força transformadora até chegar à dissecação da personahdade desse
novo homem que desponta no século XX, o homem-massa. Como características desse período o
autor denuncia a homogeneidade de situações (impossibilidade prática de opçoes entre
direito à vulgaridade, o direito a não ter razão e a uma
possibilidades), o politicismo integral, o ^ .
Idmiração reciproca entre o homem-massa e a ciência empírica. P.a Gasset. o homem massa
não é um comportamento social, é o despontar na história de um novo tipo de homem, este com
42
necessidades externas, de alma
uma personalidade ingrata, motivado por grandes apetites e por
ia
hermética, de uma ignorância lústórica que permite a imposição de suas opmioes e caricaturada
bárbaro moderno”, que vê
pelo autor como uma ●‘criança mimada’, um primitivo rebelde” e um
a civilização como natureza.
dois autores acreditam numa ruptura drástica
futuro dessa nova organização
. os
Quanto ao
. Gasset admite um momento ímpar na história que poderá
com 0 processo histórico em curso
ão da humanidade ou conduzir a catástrofe do destino humano
elevar-se para uma nova organização
J Ò harbárie Em Baudrillard, as massas atuam pela força do silêncio e

aniquilam todas as
do advento das massas Qasset destaca alguns aspectos relevantes
Na lista sobre os riscos científico devido à especiahzação; uma
: uma estagnação no campo
para o período em questão
crescente falta de mando no
mundo- conflitos inerentes à aproximação dos povos proporcionada
crescente ameaça ao
Estado (tendendo a esmagar as minorias); alem de
pelas novas técnicas; uma do inevitável processo de implosão em
iro. Já Baudrülai-d está convicto
um maior poder do dinheiro
catastrófico ou lento e progressivo,
curso, seja ele violento e a compreensão desse novo tempo social^ promovido pelo
Concluindo, acreditamos que os dois autores - ajuda-nos a entender e
- mesmo que
baseado em apenas
advento das massas decoirer do século XXI, entre elas pode-
inauguradas no/para o
dialogar com as novas propostas
A Multidão

se citar Michael HARD e Antô


íoNEGRI-“império” especialmente
ele
a parte
chamou de
4.3- Popular da
“Período
através daquilo que
contra o Império” e MUton SANTO
História”. idéias contidas nas obras analisadas
Geografia, algumas
Especificamente para da Geopolítica, por exemplo,
contribuem à reflexão de tem
s de grande complexidade. No campo
do homem-massa e das
concepção de Estado a partir da ótica
Gasset nos alerta sobre a
além dos riscos
inerentes quanto à aproximação dos povos
consequências desta visão técnicas, atualmente reestruturadas e constituídas (reconstituídas) no
exemplo de contribuição dos autores, neste caso
Meio Científico-Técnico urbanos e das grandes
sócio-espacial dos novos centros
sobre a organização
ia -
Baudrillard, vei saria ponto de partida para uma análise
das Cidades-Globais). tendo como
metrópoles (principalmente antes antagônicas.
(le iniia época
(IC ex.igo-os e conciliações de propostas
^ Enteniiklo aimo o alvorecer 43
objetiva a constituição da Sociedade de Consumo e uma utilização do conceito de hiper-realidade
na interpretação das paisagens nesses grandes centros.
Finalmente, Gasset: com o advento do homem-massa ao pleno poderio social e,
Baudrillard: com a tese da implosão do social nas massas; estimulam a reflexão sobre a práxis da

Geografia, que segundo Milton Santos, amda percorre o espaço fragmentado dos geografos.

44
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAUDRILLARD, Jean. O Sistema dos Objetos. São Paulo, Editora Perspectiva S.A,1989.

. A Sociedade de Consumo. Lisboa, Edições 70, 1995.

. À Sombra das Maiorias Silenciosas: O Fim do Social e o Surgimento das


Massas. São Paulo, Editora Brasiliense, 1985.

GASSET, José Ortega Y. Á Rebelião das Massas. São Paulo, Livraria Martins Fontes Editora
LTDA, 1997.

HARD, Michael e NEGRI, Antônio. Império. Rio de Janeiro, Record, 2001.

SANTOS, Milton. Por Uma Geograifa Nova: Da Crítica da Geograifa a uma Geograifa Crítica.
São Paulo, Editora da Universidade de São Paulo, 2004.

Por uma Outra Globalização: do Pensamento único à Consciência Universal.


Rio de Janeiro, Record, 2001.

45

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