0% acharam este documento útil (0 voto)
42 visualizações14 páginas

2 A Ética e As Estratégias

Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
0% acharam este documento útil (0 voto)
42 visualizações14 páginas

2 A Ética e As Estratégias

Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
Você está na página 1/ 14

QUESTÃO SOCIAL,

DIREITOS HUMANOS
E DIVERSIDADE

Anderson Barbosa
Scheifler
A ética e as estratégias
de enfrentamento às
múltiplas expressões
da Questão Social
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Identificar as múltiplas expressões da Questão Social na sociedade


contemporânea.
 Descrever algumas das mais importantes estratégias de enfrentamento
da Questão Social na atualidade.
 Relacionar a ética, a práxis e o confronto às expressões da Questão
Social.

Introdução
Neste capítulo, você vai estudar a Questão Social. Ao longo do texto, a
perspectiva histórica vai estar em diálogo com o cenário contemporâneo.
Dessa forma, você vai refletir sobre as causas das expressões atuais da
Questão Social.
Além disso, você vai ver como a crise do capital e o avanço do neoli-
beralismo influenciam o trabalho do profissional de Serviço Social. Nesse
sentido, se destacam a crise do desemprego e a redução das políticas
públicas de enfrentamento colocadas em prática pelos assistentes sociais.
Por fim, você vai ver algumas estratégias para lidar com as expressões
da Questão Social e verificar a importância da ética profissional nesse
contexto.
2 A ética e as estratégias de enfrentamento às múltiplas expressões da Questão Social

Questão Social na contemporaneidade


O Serviço Social tem um projeto ético-político e teórico-metodológico que
objetiva enfrentar as expressões da Questão Social. Ele regula-se de forma
direta com o contexto social, cultural e econômico no qual se insere na socie-
dade. Por meio dessas relações, adquire a sua forma profissional e determina
a sua trajetória de atuação. Em tempos de crise, os assistentes sociais são
desafiados a criar, executar e monitorar ações para o enfrentamento das mais
variadas situações.
Em períodos críticos, avançam o desemprego e a precarização do trabalho,
expressões do sistema capitalista, que tem como executor contemporâneo o
modelo neoliberal. As formas de organização trabalhista e de mobilização
social surgem como possiblidade de resistência e devem ser incentivadas. Nesse
contexto, os assistentes sociais são muito importantes. Eles são profissionais
que, além de integrarem a massa operária, mediam as relações entre trabalhador
e patronato e entre trabalhador e políticas públicas e sociais.
É nesse cenário de globalização mundial sob o controle e a hegemonia do
capital financeiro, alinhado com o capital bancário e industrial, que Iamamoto
(1998) aponta o surgimento de uma revolução tecnológica. Tal revolução ins-
taura novos padrões de produção e de gerenciamento do trabalho. O crescimento
populacional, em contraponto à redução da demanda de trabalho, ocasiona
o surgimento de um exército de reserva. Formada por trabalhadores desem-
pregados, essa massa acaba exercendo uma função perversa: a de reguladora
em favor dos interesses do próprio capital.
Com a redução de vagas de emprego formal e com o aumento do número
de pessoas em situação de subempregos, na informalidade ou desempregadas,
o mercado se utiliza dessa massa para manipular as relações de trabalho,
reduzindo direitos e executando o arrocho salarial. Alguns dos representantes
dos interesses do capital afirmam que somente com a redução dos direitos
trabalhistas é que se criam as condições necessárias para a manutenção das
vagas de trabalho. Isso é uma falácia. Como empregadores não contratam mais
funcionários em virtude de uma possível redução de encargos trabalhistas, isso
reduz os custos de produção e amplia a mais-valia dos detentores do capital.
Exemplo disso são as privatizações ocorridas em larga escala no Brasil na
década de 1990, como a da Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima
(RFFSA). Após ser privatizada em 1998, a RFFSA reduziu de forma drástica
seu quadro de funcionários, mantendo até hoje o mínimo de empregados
necessários para a execução de suas operações.
A ética e as estratégias de enfrentamento às múltiplas expressões da Questão Social 3

Nesse cenário é que se instalam algumas das novas expressões da Questão


Social no mundo contemporâneo. Entre elas está a exclusão social, produto
do desenvolvimento do capital e do trabalho coletivo. A exclusão faz parte de
uma engrenagem maior que sustenta o desenvolvimento das forças produtivas
do mercado de trabalho. Além disso, essa engrenagem sustenta o avanço da
ciência e da tecnologia como possibilidade de redução do contingente traba-
lhador e de crescimento do mercado globalizado. Veja:

Estes novos tempos reafirmam, pois, que a acumulação de capital não é par-
ceira da equidade, não rima com igualdade. Verifica-se o agravamento das
múltiplas expressões da Questão Social, base sócio-histórica da requisição
social da profissão. A linguagem da exaltação do mercado e do consumo,
que se presencia na mídia e no governo, corre em paralelo ao processo de
crescente concentração de renda, de capital e de poder. Nos locais de trabalho,
é possível atestar o crescimento da demanda por serviços sociais, o aumento
da seletividade no âmbito das políticas sociais, a diminuição dos recursos, dos
salários, a imposição de critérios cada vez mais restritivos nas possibilidades
de a população ter acesso aos direitos sociais, materializados em serviços
sociais públicos (IAMAMOTO, 1998, p. 18).

Cabe a você, enquanto profissional de Serviço Social, analisar esse cenário


sócio-histórico — que afeta tanto você quanto a população usuária das po-
líticas públicas e sociais. Na contemporaneidade, o Serviço Social demanda
profissionais críticos que não somente visualizem as mudanças ocorridas no
mundo, mas também façam parte da criação de uma nova sociedade, com
mais justiça social, igualdade e harmonia. Para decifrar a realidade social, é
preciso desenvolver um trabalho pautado na qualidade, na defesa da univer-
salização dos serviços públicos, na luta por políticas públicas inclusivas (e
não assistencialistas) e na atualização dos compromissos ético-políticos em
benefício dos usuários.
Para isso, Iamamoto (1998) afirma que é fundamental que os assistentes
sociais entrem em sintonia com os tempos atuais. Eles devem romper com uma
visão focalista, propositivista, ou seja, que surge a partir do Serviço Social, de
dentro para fora. É necessário voltar sua visão para as relações do Estado com
a sociedade, para as classes sociais e para as políticas públicas, analisando o
movimento que surge da intercorrência dessas relações e que é causador do
bem-estar ou do caos social. Os profissionais devem se manter fiéis ao projeto
ético-político da profissão. Porém, devem também extrapolar os limites do
Serviço Social para apreendê-lo na história da sociedade em que ele se insere.
4 A ética e as estratégias de enfrentamento às múltiplas expressões da Questão Social

Além disso, o profissional do Serviço Social deve ter perfil propositivo,


decifrando a realidade para construir propostas de trabalho criativas e eficazes.
Tais propostas precisam enfrentar de modo qualificado as expressões da Questão
Social que emergem do cotidiano da vida em sociedade. O assistente social,
que historicamente tem sido um agente que trabalha na implementação ou na
execução das políticas, agora tem por demanda tornar-se também um formulador
de políticas sociais, responsável por todas as etapas — desde a criação, passando
pela execução e chegando ao monitoramento das ações. O que se almeja é um
assistente social proativo, que lidera e congrega equipes multidisciplinares com
o objetivo de melhorar as condições de vida dos usuários das políticas públicas.
Nas últimas décadas, o mundo do capital, que passa por profundas modi-
ficações em seu padrão de acumulação e produção, demandou novos desafios
tanto para si quanto para seus governos. A classe trabalhadora que vive nesse
sistema é, como sempre na história capitalista, a mais afetada quando se refere
à sua inserção na estrutura produtiva, na organização coletiva e na represen-
tação política. Ela é o elo mais fraco da cadeia social, visto que, em tempos
de crise, governos e empresas se unem na tomada de medidas de redução dos
custos sociais e encargos trabalhistas.
Grandes empresas costumeiramente são beneficiárias de programas de
refinanciamento de dívidas, recuperação fiscal e perdão de dívidas e tributos.
Trabalhadores, por sua vez, precisam adaptar-se aos tempos de crise. Para isso,
buscam oportunidades de subsistência na informalidade e nos subempregos.
Essa corrente que se rompe nas mãos da classe trabalhadora acaba por afetar
todos os demais segmentos da sociedade. O trabalhador precarizado vê reduzido
o seu poder de compra e consumo. Consequentemente, o mercado tem uma
diminuição nas vendas e na prestação de serviços, e o Estado reduz sua arre-
cadação, diminuindo assim investimentos sociais e realimentando esse ciclo.
Como afirma Pastorini (2004, p. 29):

A tese que aqui sustentamos é a de que as manifestações da “Questão Social”


contemporânea não são uma decorrência natural, irreversível e inevitável do
desenvolvimento tecnológico. Essas mudanças são expressão da crise que
enfrenta o sistema capitalista internacional, consequência do esgotamento
do modelo fordista-keynesiano que se estendeu até começo dos anos 70. O
processo de globalização financeira que caracteriza as relações internacio-
nais contemporâneas vê-se reforçado com a “queda do mundo socialista”,
que questionava a lógica do capital e atuava como contratendência política e
ideológica. [...] Essa globalização financeira não pode ser naturalizada, ela é
produto de uma estratégia norte-americana que levou ao controle quase ab-
soluto dos Estados Unidos, que submeteram o conjunto da economia mundial
capitalista à lógica financeira global.
A ética e as estratégias de enfrentamento às múltiplas expressões da Questão Social 5

O crescimento do desemprego é o problema mais crescente no mundo


inteiro. O desemprego, entendido como uma das mais importantes expressões
da Questão Social na sociedade moderna, representa um novo estágio do de-
senvolvimento capitalista. Aliado ao aumento da pobreza, ele forma uma massa
global de trabalhadores excluídos temporária ou definitivamente do mundo
do trabalho. Sem trabalho e sem perspectivas futuras, devido às políticas de
cortes na previdência, esses indivíduos atingem a miséria extrema, que leva
ao adoecimento e à morte.

Apontada como modelo pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), a privatização da


previdência social chilena, promovida pelo general Augusto Pinochet na década de
1980, continua vigente e cobrando um preço cada vez mais elevado. O colapso do
sistema tem ganhado maior visibilidade à medida que o arrocho no valor das pensões
e aposentadorias se reflete no aumento do número de suicídios.
De acordo com o estudo Estatísticas Vitais, do Ministério de Saúde e do Instituto
Nacional de Estatísticas (INE), entre 2010 e 2015, 936 adultos maiores de 70 anos tiraram
sua própria vida no país. O levantamento aponta que os maiores de 80 anos apresentam
as maiores taxas de suicídio — 17,7 por cada 100 mil habitantes —, seguidos pelos
idosos que têm de 70 a 79 anos — com uma taxa de 15,4, contra uma taxa média
nacional de 10,2. Conforme o Centro de Estudos de Velhice e Envelhecimento, são
índices mórbidos, que crescem ano a ano e representam a taxa de homicídios mais
alta da América Latina.
Uma das autoras da pesquisa ministerial, Ana Paula Vieira, acadêmica de gerontologia
da Universidade Católica e presidenta da Fundação Míranos, avalia que muitos dos
casos ocorrem simplesmente pelo desejo de acabar com o sofrimento, já que os
recursos para lidar com ele não são acessíveis.
O fato é que, à medida que a idade avança e os recursos para o acompanhamento
e o tratamento médico vão sendo reduzidos pela própria irracionalidade do projeto
neoliberal de capitalização da seguridade, os idosos passam a se sentir cada vez mais
como fardos para os seus familiares e entes queridos.
Fonte: Hora do Povo (2018).

Pastorini (2004) chama esse fenômeno de “nova pobreza”. Ele se relaciona


tanto à pobreza “convencional” — situação inerente ao sistema capitalista e
representada pela ausência de renda e pela desigualdade de classes — quanto
ao crescente empobrecimento da população — especialmente daquela faixa
que outrora esteve inserida na classe média, agora cada vez mais pauperizada.
6 A ética e as estratégias de enfrentamento às múltiplas expressões da Questão Social

Outros sintomas que apontam para o crescimento dessa “nova pobreza” são
a redução do número de trabalhadores maiores de 45 anos inseridos no mer-
cado formal de trabalho e o crescimento das famílias chefiadas por mulheres,
avós, aposentados e/ou pensionistas. Esses fenômenos caracterizam a “nova
Questão Social”. Você ainda deve notar que muitos dos trabalhadores expulsos
do mercado de trabalho são profissionais qualificados que até pouco tempo
atrás eram úteis, tinham proteção do Estado e lutavam por seus direitos. Hoje,
muitos deles lutam pela possibilidade de serem explorados (PASTORINI, 2004).

Enfrentamento da Questão Social


em tempos de crise
Como você pode imaginar, as mudanças no padrão de acumulação capitalista,
o sistema de acumulação flexível, a revolução tecnológica e as alterações
na gestão das forças de trabalho ampliam a competitividade intercapitalista
nos mercados mundiais e nacionais. Isso modifica as relações entre Estado
e sociedade civil, que passam a atuar de acordo com parâmetros ditados por
organismos internacionais. Esses parâmetros têm como marco o Consenso
de Washington, de 1989, que recomenda uma ampla reforma neoliberal dos
Estados. Assim:

Tais processos produzem novas mediações históricas na gênese e nas expres-


sões da Questão Social, assim como nas formas, até então vigentes, de seu
enfrentamento, seja por parte da sociedade civil organizada ou do Estado, por
meio das políticas sociais públicas e empresariais, dos movimentos sociais e
sindicais e demais iniciativas da sociedade civil. Implicam radicais mudanças
na divisão social e técnica do trabalho, afetando, além das políticas sociais,
as políticas de emprego e salário e o mercado de trabalho. Atingem, assim, de
forma particular, o Serviço Social, como uma das especializações do trabalho
na sociedade (IAMAMOTO, 1998, p. 113).

O Serviço Social vem há muitos anos desenvolvendo ações para fortalecer


um projeto político-profissional comprometido com a defesa dos direitos sociais
e com a democratização política e econômica da sociedade. Esse projeto se
materializou no Código de Ética Profissional do Assistente Social e na Lei de
Regulamentação da Profissão de Serviço Social (CONSELHO FEDERAL DE
SERVIÇO SOCIAL, 1993). Mais tarde, em 1996, foi homologada a nova proposta
de diretrizes para o Curso de Serviço Social da Associação Brasileira de Ensino
em Serviço Social (ABESS, 1996). Essas ações redimensionaram a formação
A ética e as estratégias de enfrentamento às múltiplas expressões da Questão Social 7

do assistente social e buscaram instrumentar os profissionais para enfrentar as


novas expressões da Questão Social. Nesse sentido, decodificar as expressões
da Questão Social é requisito primordial para enfrentá-las. Você pode, inclusive,
considerar que tais expressões são a razão da existência do Serviço Social.
Como você viu, a Questão Social é fruto das contradições geradas pela
sociedade. Esta, por sua vez, está em constante mutação, respondendo aos
estímulos e fenômenos característicos de cada época. Hoje, dar conta da Ques-
tão Social é interpretar as desigualdades sociais em seus recortes de gênero,
raça, etnia, religião, nacionalidade e outros. Além disso, os profissionais de
Serviço Social precisam reconhecer as formas de resistência e rebeldia dos
sujeitos sociais (IAMAMOTO, 1998).
O fortalecimento do projeto político-profissional tem relação direta com as
estratégias de enfrentamento às demandas surgidas a partir das novas relações
do capital e das novas formas de vulnerabilização dos sujeitos. Assim, é neces-
sário debater a formação profissional na contemporaneidade e verificar quais
são as exigências para criação de um perfil profissional capaz de enfrentar as
demandas atuais. Além disso, o profissional deve se aproximar das condições
de vida da classe subalterna e de suas formas de luta e organização. É nesse
meio que se encontram as mais variadas formas de expressão da Questão Social.
Portanto, as estratégias de enfrentamento devem surgir do debate horizontal
com as populações vulneráveis, rompendo com o perfil tutelar ainda existente
na profissão. Sobre isso, Iamamoto (1998, p. 197) destaca que, no contato com
essas populações, é fundamental:

Captar as formas de explicitação social, cultural e política de seus interesses e


necessidades, criadas no enfrentamento coletivo e individual de situações de
vida, de experiências vivenciadas. Interesses que não se manifestam apenas
em suas organizações político-partidárias, articuladas à construção do poder
de classes, mas também nas lutas organizativas por melhorias parciais de
vida (no cotidiano das fábricas, dos campos, nos demais locais de trabalho,
nos bairros, etc.), assim como no conjunto de suas expressões associativas e
culturais cotidianas que denotam os seus modos de viver e de pensar. Detectar
aí suas aspirações, os núcleos de contestação e resistência que vêm sendo
criados — muitas vezes situados no “simples” patamar de defesa da vida — e
amadurecimentos sob múltiplas formas, estimulando as lutas, a imaginação
e a invenção da vida em sociedade: o processo de constituição de sujeitos
sociais coletivos, na e a partir da historicidade da vida cotidiana.

A compreensão dessas formas de explicitação social é requisito necessário


para todos os profissionais de Serviço Social e estende-se também a outros
campos de conhecimento que têm como objetivo trabalhar para a emancipação
8 A ética e as estratégias de enfrentamento às múltiplas expressões da Questão Social

dos sujeitos em situação de fragilidade social. Esses são, portanto, desafios


que se colocam diante dos assistentes sociais e que devem ser trabalhados nos
meios de formação profissional. Afinal, é somente por meio de uma formação
acadêmica consistente que haverá sujeitos capacitados para o confronto das
situações de exploração e violência que marcam a sociedade contemporânea.

Com as novas expressões da Questão Social em pauta, alguns autores apontam para
um processo de ruptura com a “antiga Questão Social”, emergente no século XIX. Nessa
perspectiva, surge a crítica ao Estado ineficiente para combater as suas problemáticas,
o que leva à criação de alternativas para a reorganização do Estado capitalista.
Castel (1998), por exemplo, sugere o Estado estrategista. Esse seria um Estado pre-
ocupado com a proteção social, tendo como tarefa primordial a proteção social de
seus entes. O Estado estrategista realizaria intervenções estratégicas com foco em
políticas de inserção social, reparação e prevenção voltadas para as populações mais
precarizadas, inclusive pela conjuntura da crise.

Ética, práxis e a Questão Social


Barroco (2006) afirma que a ética profissional é um modo particular de objeti-
vação da vida ética. O Serviço Social, nesse contexto, é tido como um fenômeno
consequente da sociedade capitalista. Assim, a natureza ética da profissão só
adquire sentido se confrontada com as necessidades que surgem das relações
sociais. A ética no Serviço Social, portanto, somente se objetiva por meio das
respostas construídas pela ação profissional em determinado exercício.
A ética profissional pode ser influenciada por determinações ocorridas
antes mesmo da própria escolha da profissão. Afinal, a ética faz parte do pro-
cesso de reprodução comportamental que o indivíduo adquire ao longo de sua
formação social e que se expressa de forma mais ampla em sua vida adulta. Os
comportamentos de um profissional podem ser reforçados ou se contraporem
no momento em que ocorre a tomada de decisão diante de dilemas éticos.
Por isso, o assistente social necessita de uma formação ética consolidada, em
face do significado e das implicações causadas pelas escolhas feitas em sua
ação profissional. Por isso, você deve atentar à necessidade de se formarem
profissionais sintonizados com o projeto ético-político do Serviço Social, que
atuem sob a égide e os princípios do Código de Ética da profissão. Assim:
A ética e as estratégias de enfrentamento às múltiplas expressões da Questão Social 9

Dentre as determinações da ética profissional encontra-se o conhecimento,


dado pela base filosófica incorporada pela profissão. Esse aspecto também é
contraditório e conflituoso, uma vez que a formação profissional, mediante a
qual se adquire um conhecimento filosófico capaz de fundamentar as escolhas
éticas, não é o único referencial profissional; somam-se a ele as visões de
mundo incorporadas socialmente pela educação moral primária e por outras
instâncias educativas, tais como os meios de comunicação, as religiões, os
partidos políticos, os movimentos sociais, etc. (BARROCO, 2006, p. 68–69).

Você pode considerar que a ética profissional é o posicionamento pro-


fissional a ser tomado diante de um conjunto de ações contraditórias e
manifestações culturais e sociais. Assim, a ética profissional não pode ser
concebida como um conceito improgressivo, mas como algo em constante
transformação. Ela adquire forma frente às referências éticas e morais de
determinada sociedade.
Você também deve considerar as relações históricas que dão identidade
às profissões e os princípios éticos exercidos por cada categoria. Assim, é
possível compreender o chamado ethos profissional inerente a cada atividade
laboral. A palavra ethos é a representação das características e comportamentos
que determinam a identidade de certo grupo. O ethos profissional, então, é
o modo de ser resultante das relações contraditórias estabelecidas entre as
necessidades socioeconômicas e culturais e as ações ético-morais executadas
por determinado grupo profissional. Sobre isso, considere o seguinte:

O Serviço Social é um fenômeno típico da sociedade capitalista em seu estágio


monopolista; portanto, o desvelamento da natureza de sua ética só adquire
objetividade se analisado em função das necessidades e possibilidades inscritas
em tais relações sociais. Em face das demandas e respostas éticas construídas
neste marco é que a ética se objetiva, se transforma e se consolida como uma
das dimensões específicas da ação profissional (BARROCO, 2006, p. 68).

Essa ação ocorre por meio da coesão dos agentes profissionais que atuam
com objetivos e valores em comum para caracterizar a práxis profissional.
Portanto: “O trabalho é a práxis social que produz os meios de produção e
de subsistência sem os quais a sociedade não poderia sequer existir. Esta é a
função social do trabalho e isto é o que o distingue das outras práxis sociais
[...]” (LESSA, 2007b, p. 45).
A práxis se expressa de inúmeras formas. Na perspectiva marxista, a práxis
é entendida como toda atividade humana sensível e subjetiva. Portanto, ela
se expressa por meio da interação do homem com o ambiente externo, repre-
sentado, nesse caso, pela natureza e pelo meio social em que está inserido.
10 A ética e as estratégias de enfrentamento às múltiplas expressões da Questão Social

A práxis, para o assistente social, é resultado de todo o processo sócio-histórico


de concretização da profissão enquanto reflexo do sistema capitalista e en-
quanto combatente das desigualdades contemporâneas.

Para saber mais sobre o assunto deste capítulo, leia o artigo Trabalho, práxis e Serviço
Social, disponível no link a seguir.

https://goo.gl/NdA9Ew

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ENSINO E PESQUISA EM SERVIÇO SOCIAL. Diretrizes gerais


para o curso de serviço social. Rio de Janeiro: ABEPSS, 1996. Disponível em: <http://www.
abepss.org.br/arquivos/textos/documento_201603311138166377210.pdf>. Acesso em:
20 set. 2018.
BARROCO, M. L. S. Ética e serviço social: fundamentos ontológicos. 4. ed. São Paulo:
Cortez, 2006.
CASTEL, R. As metamorfoses da Questão Social: uma crônica dom salário. Petrópolis:
Vozes, 1998.
CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Código de Ética do/a Assistente Social Lei
8.662/93 de Regulamentação da Profissão. 10. ed. rev. e atual. Brasília: CFESS, 1993. Dis-
ponível em: <http://www.cfess.org.br/arquivos/CEP_CFESS-SITE.pdf>. Acesso em: 20
set. 2018.
HORA DO POVO. Sem previdência pública, Chile tem suicídio recorde entre idosos com
mais de 80 anos. 2018. Disponível em: <https://horadopovo.org.br/sem-previdencia-
-publica-chile-tem-suicidio-recorde-entre-idosos-com-mais-de-80-anos/>. Acesso
em: 20 set. 2018.
IAMAMOTO, M. V. O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profis-
sional. São Paulo: Cortez, 1998.
LESSA, S. Serviço social e trabalho: porque o serviço social não é trabalho. Maceió:
EDUFAL, 2007.
PASTORINI, A. A categoria “Questão Social” em debate. São Paulo: Cortez, 2004.
A ética e as estratégias de enfrentamento às múltiplas expressões da Questão Social 11

Leituras recomendadas
BRASIL. Lei nº. 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Dispõe sobre a organização da Assistência
Social e dá outras providências. 1993. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/LEIS/L8742compilado.htm>. Acesso em: 20 set. 2018.
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional
de Assistência Social. Norma operacional básica NOB/SUAS: construindo as bases para
a implantação do sistema único de assistência social. 2005. Disponível em: <http://
www.assistenciasocial.al.gov.br/sala-de-imprensa/arquivos/NOB-SUAS.pdf>. Acesso
em: 20 set. 2018.
BRASIL. Resolução CFESS nº. 469/2005, 13 de maio de 2005. Regulamenta o Estatuto do
Conjunto CFESS/CRESS, introduzindo as alterações e modificações aprovadas pela
Plenária Ampliada realizada em Brasília em março de 2005. Disponível em: <http://
www.cfess.org.br/arquivos/resolucao_469_05.pdf>. Acesso em: 20 set. 2018.
COSTA, R. G.; MADEIRA, M. Z. A. Trabalho, práxis e Serviço Social. Revista Katálysis,
Florianópolis, v. 16, n. 1, jan./jun. 2013. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S1414-49802013000100011&lng=en&nrm=iso>. Acesso
em: 20 set. 2018.
Conteúdo:

Você também pode gostar