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Pequeno S Guard I Ões Natureza

Este trabalho propõe o desenvolvimento de um processo de drama com crianças da educação infantil com o objetivo de intensificar o vínculo delas com a natureza. O processo foi realizado com atividades lúdicas que representaram os quatro elementos da natureza: fogo, terra, água e ar.

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Pequeno S Guard I Ões Natureza

Este trabalho propõe o desenvolvimento de um processo de drama com crianças da educação infantil com o objetivo de intensificar o vínculo delas com a natureza. O processo foi realizado com atividades lúdicas que representaram os quatro elementos da natureza: fogo, terra, água e ar.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

INSTITUTO DE ARTES – IARTE


CURSO DE TEATRO

JULIA MARIA SOUZA DA SILVA

OS PEQUENOS GUARDIÕES DA NATUREZA E A MAGIA DO PORTAL DOS


ELEMENTAIS:
PROCESSO DE DRAMA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

UBERLÂNDIA – MG
2023
JULIA MARIA SOUZA DA SILVA

OS PEQUENOS GUARDIÕES DA NATUREZA E A MAGIA DO PORTAL DOS


ELEMENTAIS:
PROCESSO DE DRAMA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


do Instituto de Artes UFU como requisito
básico para a conclusão do Curso de Teatro.

Orientadora: Profa. Dra. Mariene


Hundertmarck Perobelli

Banca examinadora:

Profa. Dra. Mariene Hundertmarck Perobelli – UFU

Prof. Dr. Wellington Menegaz – UFU

Profa. Dra. Janaína Träsel Martins - UFSC

UBERLÂNDIA – MG
2023
RESUMO

O presente trabalho propõe o desenvolvimento e a análise de um processo de Drama


com o propósito de intensificar o vínculo da criança com a Natureza. Nesse sentido, para a
sua concretização foram realizadas pesquisas bibliográficas acerca do processo de Drama e,
também, acerca do desenvolvimento infantil e imaginário fundamentado no contato com o
externo. A prática desenvolveu-se com as turmas do primeiro e segundo período da educação
infantil do Centro Educacional Eurípedes Barsanulfo, com o objetivo de utilizar a abordagem
do Drama como ferramenta artística pedagógica para estruturar o contexto ficcional com o
intuito de promover o contato com os quatro elementos naturais (fogo, terra, água e ar).
Como referência em relação ao Drama: Beatriz Ângela Cabral, Cecily O’Neill e Diego
Pereira. Com relação à natureza, criança e brincadeira: Gandhy Piorski, Mariene Perobelli e
Richard Louv.
Palavras – chaves: Natureza; Processo de Drama; Criança; Imaginário.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Roda para a descoberta do casulo com a carta convite para a aventura. 17
Figura 2 - Primeira carta: Convite mágico. 18
Figura 3 - Quebra-cabeça: O código do cadeado. 19
Figura 4 - Pequenos guardiões montando o quebra-cabeça casulo. 20
Figura 5 - Elementos presentes no baú misterioso. 21
Figura 6 - Baú misterioso com os materiais para construção dos amuletos da coragem. 21
Figura 7 - Segunda carta: A realização do amuleto de passagem. 22
Figura 8 - Amuletos da coragem. 23
Figura 9 - Roda para o ritual de passagem. 24
Figura 10 - Atravessando o portal mágico. 25
Figura 11 - Salamandra se apresentando como elemental do fogo. 26
Figura 12 - Salamandra iniciando o ritual de transmutação do medo. 26
Figura 13 - Mentalizando os medos nos gravetos. 27
Figura 14 - Desenhando e brincando com as sombras. 28
Figura 15 - Queimando as folhas com a lupa. 29
Figura 16 - Queimando os medos no fogo representados pelo graveto. 29
Figura 17- Ritual de passagem pelo portal. 30
Figura 18 - Elfo e Gnomo, elementais da terra. 31
Figura 19 - Apresentação dos elementais e contação. 32
Figura 20 - Cultivando sementes de girassóis. 34
Figura 21 - Plantando a árvore mágica. 35
Figura 22 - Cantando o canto da abertura do portal envolta da árvore. 35
Figura 23 - Foto dos pequenos guardiões da terra com os elementais. 36
Figura 24 - Conhecendo o poder da água. 38
Figura 25 - Fazendo escalda pés. 39
Figura 26 - Brincando de passar água de folha em folha para o balde. 40
Figura 27 - Fazendo perfumes com ervas e flores. 40
Figura 28 - Foto do pequenos guardiões da água com os elementais. 41
Figura 29 - Roda para fazerem os acordos. 42
Figura 30 - Atravessando o portal. 43
Figura 31 - Conhecendo a Fada do Ar. 44
Figura 32 - Terceira carta: Despedida do portal. 46
Figura 33 - Passando pela metamorfose: Ovo. 48
Figura 34 - Passando pela metamorfose: Lagarta. 48
Figura 35 - Passando pela metamorfose: Casulo. 49
Figura 36 - Passando pela metamorfose: Borboletas. 49
Figura 37 - Voando com asas de fitas ou tecidos. 50
Figura 38 - Carta de despedida. 51
Figura 39 - Recebendo os bastões de guardiões da Natureza. 52
Figura 40- Foto final do processo com as mestras, as aprendizes e os pequenos guardiões da
natureza. 52
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 5
2. PROCESSO DE DRAMA 8
3. A BORBOLETA, A NATUREZA E A CRIANÇA 14
3.1. OS PEQUENOS GUARDIÕES DA NATUREZA E A MAGIA DO PORTAL
DOS ELEMENTAIS: A história do processo de drama. 14
3.1.2. SEGUNDO EPISÓDIO - O OVO E O FOGO 23
3.1.3. TERCEIRO EPISÓDIO - A LAGARTA E A TERRA 30
3.1.4. QUARTO EPISÓDIO - O CASULO E A ÁGUA 36
3.1.5. QUINTO EPISÓDIO - A BORBOLETA E O AR 41
4. CONCLUSÃO 53
5. REFERÊNCIAS 55
5

1. INTRODUÇÃO

“Você tinha de quatro a cinco anos de idade e amava deitar em cima do capô do fusca
com o seu pai, lembro disso, que gostava de ficar lá olhando o céu. Observava a lua, contava
as estrelas e cantava a música “se essa rua fosse minha”. (Cristiane Paula de Souza Silva)

Esse foi um dos relatos que minha mãe fez ao contar sobre a minha infância. Minha
mãe conta que em nossa família existe uma crença que diz que a criança tem que brincar com
terra, porque quando a criança brinca com terra ela se desenvolve melhor, cria imunidade. Ela
sempre me deixou livre para brincar, pois queria que eu tivesse um desenvolvimento
saudável.
Eu era uma criança que gostava muito de histórias, pedia para os meus pais lerem ou
contarem histórias e estava sempre a inventar outras novas, misturava uma história com outra
e criava brincadeiras. Minha mãe conta que eu vivia no mundo do faz de conta, que em dias
eu dizia ser uma fada, em outros dizia ser uma princesa. Que eu me vestia com as roupas dela
e do meu pai, subia em cima do sofá e pulava de um para o outro, dizendo que estava voando.
Riscava, desenhava e coloria as paredes brancas de casa, e a minha justificativa para a arte era
dizer que estava dando aulas para os meus alunos.
Eu conversava muito comigo mesma, apesar de ter sido uma criança com muitos
amigos, não precisava de companhias para brincar, dava vida para os meus brinquedos e
falava com eles, passava dias e tardes brincando no mundo da imaginação. Preferia brincar
fora de casa, no quintal existiam todas as possibilidades que me interessavam. Era apaixonada
por brincar de casinha, com água, gostava quando meus pais enchiam um balde cinza grande
que tinha em casa, e eu entrava dentro e molhava todos ao meu redor. Gostava de brincar com
a terra no quintal, de fazer comidinhas, montanhas e desenhar no barro. Estava a todo
momento dançando e cantando, adorava abrir os braços e girar sentindo o vento.
Gandhy Piorski, no segundo Diálogos do Brincar, do canal Território do Brincar1 do
youtube, afirma que quando a criança se liga ao mundo, à materialidade dele, ela se liga por
um pensamento anímico, ela anima a vida. A criança encanta o mundo pela materialidade do
mundo. Essa força de encantamento é imaginária e quando a imaginação encontra a natureza,

1
TERRITÓRIO DO BRINCAR. Diálogos do Brincar #2: 'Criança e Natureza', com Gandhy Piorski. Brasil,
2016. 1 vídeo (59 minutos). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=L4u8pnqMkQQ. Acesso em: 21
dez 2022.
6

essa capacidade se potencializa, torna-se não só uma elaboração fantasiosa mas se torna
capacidade criadora, a imaginação criadora capaz de gerar conhecimento.
Dessa forma, analisando a minha infância, especificamente a primeira fase dela, em
que as experiências vividas nesse período ecoam durante toda a existência do ser humano,
percebo que o mundo natural, seus elementos, materialidades e comportamento tiveram a
capacidade de influenciar em meu desenvolvimento vital, biológico, cognitivo, motor e
psíquico. Por meio da potência imaginativa, do livre brincar e estar, é que se estabeleceu o
meu vínculo com o mundo natural.
Compreendo que foi por meio deste, que a minha criança desenvolveu a capacidade de
expressar, sentir e estar. E por fruto desse laço, essa criança se encontra na arte, na
sensibilidade, no contato e na necessidade de expressão e contemplação. Das diversas formas
que experienciei de expressar essa arte, conectei-me desde pequena com as visuais, como
desenho, pintura e artesanato.
Apesar disso, foi aos oito anos, quando meu pai me matriculou em um curso de teatro,
que me encontrei. Desde então, sempre estive em contato com a cena, pois me sentia muito
confortável para criar e usar minha imaginação. Aos catorze anos, participava de uma
companhia, chamada “Teatro de Sala”, coordenada por Murilo Gussi, na qual estudávamos
literatura infanto-juvenil e realizamos espetáculos para este público, em escolas e eventos.
Essa experiência contribuiu muito no aprofundamento do meu contato com as
crianças, mas foi na universidade que me reconheci na licenciatura. Vivenciando projetos e
disciplinas como o PIBID, orientado por Vilma Leite, os Estágios Supervisionados, orientados
por Wellington Menegaz e Mariene Perobelli, as Pedagogias do Teatro, orientadas por Paulina
Maria Caon, Maria de Maria e Mariene Perobelli, pude trocar experiências e saberes que me
encantaram e despertaram meu interesse para trabalhar e pesquisar no campo da educação.
De acordo com Paulo Freire, ensinar exige compreender que a educação é uma forma
de intervenção no mundo e que a mudança é possível. Eu acredito que é na transformação da
infância que essa mudança pode acontecer, e por isso, escolhi pesquisar o desenvolvimento da
criança em contato com a natureza, visto que esta foi determinante para traçar o meu caminho.
Unindo a prática teatral ao livre brincar, escolhi o Processo de Drama como via para vincular
a natureza e a criança e a natureza na criança através da imaginação.

Este trabalho de conclusão de curso, apresenta minha pesquisa acerca do Processo de


Drama realizado na disciplina de Estágio Supervisionado III. Eu e Júlia Félix fomos a dupla
responsável por realizar este processo, e com a orientação de estágio de Mariene Perobelli,
7

acompanhamos as turmas do 1º e 2º período do Centro Educacional Eurípedes Barsanulfo. A


turma do primeiro período era regida pela professora Geise Martins e recebia o auxílio da
professora Natália Mendonça, e a turma do segundo período era regida pela professora Maura
Almeida.

Pensando em unir a natureza ao ambiente escolar, utilizamos o Drama como recurso


pedagógico e criamos um pré-texto. Este estava atrelado a um assunto que as crianças
estudavam no momento, a metamorfose da borboleta. Sendo assim, optamos por relacionar os
quatro elementos (fogo, terra, água e ar) às fases da vida da borboleta, estando cada um deles
conectado a uma parte do ciclo da metamorfose. Foi dentro de cinco episódios que o contexto
se desenvolveu, possibilitando o contato sensorial e a potencialização imaginativa, criando um
ambiente seguro, no qual as crianças imergiram na magia do portal das borboletas através da
relação com os elementos.

Os quatro elementos habitam a imaginação, são um código de


expressão da vida imaginária. Imaginar pelo fogo é criar imagens e
narrativas quentes, calóricas, agitadas, guerreiras, apaixonadas,
acolhedoras (se fogo íntimo) e amorosas. Imaginar pela água faz
vicejar uma corporeidade fluida, entregue, emocional, saudosa e até
melancólica, cheia de sentimentos, lacrimosa pela alegria ou pela
saudade. Imaginar pelo ar é construir uma materialidade das
levezas, da suspensão, dos voos, fazer brinquedos expansivos, com
coisas leves, penas, setas, sublimações do brincar. Imaginar pela
terra é fazer coisinhas enraizadas no mundo, na vida social, no
interior das formas, buracos, miniaturas, esconderijos, numa busca
pela estrutura da natureza. (PIORSKI, 2016, p. X)

No primeiro capítulo abordo a metodologia do Drama, relacionando e associando o


referencial teórico acerca desta abordagem com a vivência do processo de Drama realizado
durante a disciplina de Estágio Supervisionado III. No segundo capítulo, relato o
desenvolvimento deste processo de Drama, “Os pequenos guardiões da Natureza e a Magia do
Portal dos Elementais”, o capítulo trata-se de uma história ficcional e real narrada pela
borboleta da asa amarela e preta, que partiu para outro plano. Por fim, finalizo com as
considerações finais, expondo minhas impressões, desafios e aprendizados, desta forma,
dialogo com a prática exercida por meio da abordagem artístico-pedagógica.
8

2. PROCESSO DE DRAMA

O Drama constitui-se como abordagem prática artística pedagógica, em que se


estrutura o contexto ficcional a partir de uma circunstância ou tema. Trata-se de uma prática
coletiva, imersiva e processual que acontece em episódios nos quais os integrantes podem
assumir personagens que transitam entre o contexto real e o contexto ficcional.
No artigo O espaço do jogo no Contexto do Drama, Cabral e Pereira2 citam Drama
Worlds de Cecily O’Neill:
Personagens, em Drama, fazem pronunciamentos, trazem notícias, narram eventos,
questionam, persuadem, suplicam, acusam, julgam e brigam uns com os outros. Eles
pregam peças, contam piadas, se envolvem em disputas físicas e verbais, dançam,
cantam, rezam, rogam pragas, ameaçam, elogiam, culpam, fazem profecias,
lamentam em luto, todas essas e outras coisas em uma grande variedade de formas.
No processo do Drama, todas essas possibilidades estão disponíveis aos
participantes e podem ser selecionadas como ações-chave em episódios específicos
da estrutura dramática.
(CABRAL, PEREIRA, 2017, p. 293 apud O’NEILL, 1995, p. 135).

Biange, Beatriz Ângela Vieira Cabral, professora e pesquisadora, foi a precursora do


Drama no Brasil. Ao realizar seu doutorado na University of Central England, participou de
projetos de Drama nos quais realizavam-se Processos de Drama em escolas de educação
básica e na universidade conduzidos por Dorothy Heathcote3. Durante esse período ela
conheceu outros pesquisadores que a influenciaram para a estruturação de seu trabalho com o
Drama, pelas referências citadas destaco Cecily O’Neill4 como a mais influente na prática de
Biange, levando em consideração suas semelhanças de concepções quanto às perspectivas e
contextos do método.
Contudo, o process drama, drama in education, drama-theater manifestou-se no
Brasil nos anos noventa, originado de países anglo saxônicos, e compreende-se como um
método vivo de teatro para o ensino. Uma prática com temática e contexto estabelecido pelo
orientador, com o roteiro, no entanto, construído por meio do efeito do coletivo com a
proposta. Tem o poder de criar atmosferas imaginativas infinitas, por contar com elementos de
proposições visuais, físicas, concretas, cênicas, dramatúrgicas, literárias e muitas outras

2
CABRAL, Biange; DE MEDEIROS PEREIRA, Diego. O espaço de jogo no Contexto do Drama.
Urdimento-Revista de Estudos em Artes Cênicas, v. 1, n. 28, p. 285-301, 2017.
3
Dorothy Heathcote foi a pioneira do método. Desenvolveu uma abordagem não ortodoxa para o drama
educacional que estimula a imaginação das crianças e inspira o trabalho de professores e pesquisadores pelo
mundo.
4
Cecily O’Neill teve seu trabalho voltado para a estruturação do Drama na sala de aula, sendo responsável por
tornar a prática do Processo de Drama acessível aos educadores.
9

diversas possibilidades que colaboram e instigam os participantes a imergirem no contexto


disposto.
Conforme Cabral (2006), o Drama como processo de aprendizagem, permite abordar e
desenvolver qualquer tema, gera interesse, possibilita trabalhar uma situação imaginária,
respondendo e realizando ações e atitudes que fazem parte ou não do cotidiano. Para a
pesquisadora, é necessário que as situações exploradas sejam convincentes, tanto no tema
trabalhado, quanto nos papéis e ambientes designados, para que possam proporcionar uma
experiência na qual os integrantes consigam interagir de forma simultânea, tanto como
participantes do contexto real, como do imaginário.
Durante o período pandêmico realizei a disciplina de Estágio Supervisionado II, na
qual tive a experiência de participar de um Processo de Drama remoto que transitava entre
algumas janelas do Google Meet e do mundo de “Alice Através do Espelho”.
Os professores responsáveis por essa aventura, Mariene Perobelli5 e Tom Menegaz6
com parceria de Flávia Janiaski7, nos levaram para uma viagem encantadora que me despertou
interesse pelo método de ensino e o desejo de realizar um Processo de Drama como
professora propositora do mesmo.
Estávamos no mundo Através do Espelho, com uma partitura de movimento e o
código de acesso atravessamos o portal, fomos divididos em grupos e tínhamos a missão de
definir o destino de Alice. Ela estava perdida em outra dimensão, então, nosso primeiro
desafio foi a busca por ela, e para encerrar o processo tivemos que decidir juntos se Alice
voltaria ou não para nossa dimensão. O pré-texto desse processo de Drama foi inspirado na
obra de Lewis Carroll, “Alice através do espelho”.
Foi uma vivência mágica, lembro-me de que alguns encontros reverberaram em mim
ao longo da semana, era extraordinário a dimensão que se estabelecia em cada episódio.
Estava na sala de casa, na frente do computador, mas estava também no mundo através do
espelho.

5
Mariene Perobelli é doutora em Artes Cênicas pela UNIRIO e professora do curso de Teatro da UFU. Atriz,
contadora de histórias, professora e pesquisadora com ênfase no desenvolvimento infantil, formação de
professores e parentalidade. Foi aluna de Beatriz Cabral, tendo participado dos primeiros processos de Drama no
Brasil.
6
Wellington Menegaz, carinhosamente conhecido como Tom, é pai do Joaquim. Pai do Carlson e da Capitu (os
filhos de 4 patas). Casado com o Du. Gosta de ser menino folha e menine vento. Ator. Professor. Sonhador.
Pesquisador. Artesão. Um curioso com a vida. E um apaixonado pelo Drama.
7
Flávia Janiaski é doutora em Artes Cênicas pela UFBA e professora pela UFGD. Tem experiência na área de
artes cênicas, com ênfase em Teatro-Educação, Produção Cultural, Contação de História, Orientação de Estágio,
Improvisação e Montagem Teatral. Foi aluna de graduação de Beatriz Cabral, tendo participado dos primeiros
processos de Drama no Brasil.
10

O Drama se mostrou vivo e orgânico, ele atravessa a experiência e ganha vida por
meio da imersão. É um contexto ficcional, mas uma vivência concreta, essas características
são o que o tornam fantástico.
Após o encantamento e atravessamento com a magia da experiência, me aproximei
dos conteúdos expostos na disciplina e, aconselhada pela minha orientadora, definimos que o
Drama seria o meio para estabelecer o vínculo da criança com a natureza. Ao iniciar o
processo da disciplina de Pesquisa I, determinamos que em estágio III deveria estruturar,
realizar e avaliar um processo de Drama com crianças de 4 a 6 anos de idade.
A turma de Estágio supervisionado III foi organizada em duplas e nossa tarefa era
desenvolver um plano de aula para realizarmos com as turmas nas escolas. Eu e parceira de
estágio, Júlia Felix8, com a orientação da professora Mariene Perobelli, acompanhamos as
turmas do 1º Período, supervisionada pela professora Geise, e 2º Período, supervisionada pela
professora Maura no Centro Educacional Eurípedes Barsanulfo9.
Observamos as turmas por cinco encontros, as aulas aconteciam das 13:00 às 17:00
horas. Júlia e eu revezamos as salas, e no final de cada encontro compartilhamos as memórias,
os diálogos e as histórias vivenciadas. Durante esses encontros tínhamos que conhecer as
crianças e nos vincularmos com elas, dessa maneira, seria possível desenvolver um pré-texto e
um contexto ficcional que iria conectá-las com o processo.
No primeiro encontro, ao conhecermos a professora Geise, ela nos apresentou o que
viria a inspirar o nosso contexto ficcional e pretexto, o conteúdo partilhado era o processo de
metamorfose das borboletas. As crianças estavam acompanhando a transformação de algumas
lagartas da folha de couve colhida na horta de Geise. O borboletário era formado por um pote
de vidro com uma rede fina na tampa, dentro do pote tinha um tronco grosso, muitas lagartas
comendo a folha da couve verdinha e um casulo formado pendurado no canto.
Os nossos olhos e os nossos corações brilharam nesse encontro, a professora havia
dito que estava procurando desenvolver algum trabalho a partir da experiência com o
borboletário e que nós poderíamos ajudá-la com esse projeto. No mesmo dia tivemos a
oportunidade de participar da reunião pedagógica da escola com o centro de convivência,
nessa amostra foram compartilhados alguns trabalhos realizados com as turmas, e ambas as
professoras apresentaram livros com contações de histórias criadas pelas crianças. Uma das

8
Júlia Silva Felix, graduanda de Licenciatura em Teatro pela Universidade Federal de Uberlândia.
9
O CEEB é um projeto espírita filantrópico educacional, que oferece educação infantil, ensino fundamental e
projetos sociais como centro de convivência.
11

histórias contava sobre a borboleta da asa amarela e preta, com uma asa maior que a outra que
havia falecido ao nascer.
Ao lermos as histórias e observarmos os desenhos, cores etc notamos que estávamos
lidando com crianças sensíveis e amorosas, crianças que já estavam conectadas com a
natureza.
Assim, delimitamos o contexto ficcional do Drama, uma aventura de descoberta e
vínculo com os quatro elementos da natureza, a convite da borboleta da asinha quebrada.
E definimos o pré-texto, a história a ser idealizada, partiria da borboleta que está em outro
plano, e recebe o chamado para transformar as crianças em pequenos guardiões da natureza.
Ao fazer um Processo de Drama, abre-se possibilidades de contexto que não se
restringe apenas à sala de aula com a percepção de adentrar no contexto ficcional. Para Cabral
(2006), a experiência de responder a situações realizando ações e assumindo atitudes,
transforma-se em aprendizagem, uma vez que essas abordagens possibilitam experiências de
respostas ou atitudes reais.
O(A) professor(a) estabelece um contexto ficcional a partir do momento em que
conduz e articula um processo por meio do pré-texto definido anteriormente (CABRAL,
2006). Assim, com o pré-texto, é possível formar um contexto ficcional que orientará o
percurso da situação escolhida.
Antes de iniciarmos a prática, durante o período de observação, seguimos
acompanhando as turmas do primeiro e segundo período, nos aproximamos das crianças,
conhecemos suas individualidades e particularidades e fomos desenvolvendo vínculo com
elas. Dessa forma, estabeleceríamos um ambiente seguro e acolhedor para instaurarmos o
drama.
Cabral (2006, p.15) define o pré-texto, como “o roteiro, história ou texto que fornecerá
o ponto de partida para iniciar o processo dramático, e que funcionará como pano de fundo
para orientar a seleção e identificação das atividades e situações exploradas cenicamente”.
Conforme a autora, o(a) professor(a) atua como maestro, apontando as situações e caminhos a
serem percorridos e, o pré-texto guiará os temas a serem trabalhados, o contexto e os papéis
dos participantes, criando expectativas, estipulando padrões de comportamento, despertando a
atenção, abrindo perspectivas e desafiando a participação.
Julia e eu tínhamos como fundamento para o processo instigar e aprofundar o vínculo
das crianças com a Natureza, de modificar a concepção de que a natureza é apenas provedora
de recursos, gerando a consciência de que ela é a força que nos constitui, que constrói nosso
ser e tudo que conhecemos do mundo. Reconhecer a Natureza que está fora e dentro de si.
12

Idealizamos que o roteiro e as atividades de cada encontro tinham como propósito


práticas que exercitariam a sensibilidade sensorial e afetiva das crianças. O processo ocorreria
em cinco episódios, sendo o primeiro o convite para a aventura e os seguintes abordariam
cada elemento da natureza: terra, água, fogo e ar.
De acordo com Cabral (2006), cada episódio será determinado pelo professor(a),
podendo centralizá-los em questionamentos e problemas a serem resolvidos, e, ainda,
conforme as situações e ações que podem emergir da atuação, permitindo assim focalizar
diferentes perspectivas. Por exemplo, no primeiro episódio desvendaram o pré-texto na busca
do baú misterioso e tiveram que construir os amuletos para passarem pelo portal, e em todos
os episódios seguintes haviam ações com o intuito de que as crianças se envolvessem cada
vez mais com cada elemento. Como no episódio do fogo, em que conheceram a Salamandra
como personificação elemental e queimaram seus medos na fogueira.
Cabral e Pereira (2017) explicitam que um episódio pode ser considerado como cada
nova situação e/ou atividade criada ou realizada no processo, ou seja, eventos que
fundamentam a narrativa em construção. “O sequenciamento ou composição dos episódios
para a eventual realização de um texto final ou sua apresentação vai depender da decisão ou
negociação dos participantes” (CABRAL, 2006, p. 18).
Para acompanhá-los por todos os episódios demos vida a duas mágicas borboletas
professoras que eram amigas da borboleta da asa amarela e preta, que foram enviadas por ela,
para abrirem o portal e levá-las até os guardiões elementais da natureza com a missão de
transformá-las em pequenos guardiões dos quatro elementos. E para cada episódio, após
atravessarem o portal, surgiam os grandes guardiões de cada elemento. Como elemental do
Fogo a Salamandra, como elemental da Terra, o Elfo e o Gnomo, da água tínhamos a Sereia
Azul e o Ondino e do Ar tínhamos a Fada.
O professor(a), ao atuar como personagem, conquista a atenção da turma, intensifica o
contexto dramático, questiona as atitudes, levanta implicações, introduz informações, bem
como desafia posturas e atitudes, conduz a leitura coletiva da cena, avalia o conhecimento e o
envolvimento, e ainda sugere aspectos a serem desenvolvidos, constrói o contexto da história
e introduz elementos de tensão e reflexão, desenvolvendo ainda, a responsabilidade pelo
processo (CABRAL, 2006; CABRAL; PEREIRA, 2017).
Cabral (2006, p. 20) coloca que “o papel assumido pelo professor pode ser
metaforicamente representado como o de um obstáculo, o qual os alunos precisam superar por
meio do argumento, da negociação ou do compromisso”. Do ponto de vista de Cabral e
13

Pereira (2017), a atuação do professor intervém no desenrolar da narrativa e propõe desafios


que levam os participantes a questionarem a vivência baseando-se em seu contexto.
Para além do professor-personagem que estimula a imersão e possibilidades no
contexto ficcional, há os estímulos compostos que, de acordo com Cabral (2006), abarcam a
interação entre tempo, espaço e presença, criando assim, diferentes tipos de significados, e se
fundamentam: nas ações que criam o contexto, nas ações poéticas e nas ações reflexivas.
Para apresentarmos o pré-texto fizemos o casulo, que foi pendurado na árvore da
escola e guardava a carta de convite da borboleta da asa amarela e preta, que as crianças
haviam acompanhado seu processo de metamorfose e que veio a morrer porque tinha uma asa
maior que a outra. A comunicação da borboleta da asa amarela preta com as crianças se dava
por meio de cartas para instigá-las e conduzi-las.
No primeiro episódio, as crianças vivenciaram desafios até encontrarem o baú
misterioso, com elementos naturais para que produzissem seus amuletos, necessários para a
travessia dos portais nos próximos episódios. O estímulo composto, aqui descrito, pode ser
visto como um foguete que conduz a nave principal - a história, tal seus personagens e o
mundo em que vivem em vôo, antes de se soltar. A energia e o interesse gerados pelo estímulo
composto promovem o 'reforço' inicial para a criação da história, e uma vez esta tenha sido
iniciada, serve como uma referência contínua no processo de criação (SOMERS, 2011).
A fim de retratar o Processo de Drama realizado na disciplina de Estágio
Supervisionado III, apresento no próximo capítulo a história: "Os Pequenos Guardiões da
Natureza e a Magia do Portal dos Elementais". Trata-se de uma autoficção10 na qual relato o
projeto de pesquisa realizado através da visão da borboleta das asas amarela e preta.

10
Autoficção é um termo usado na crítica literária para se referir a uma forma de autobiografia ficcional.
14

3. A BORBOLETA, A NATUREZA E A CRIANÇA

3.1. OS PEQUENOS GUARDIÕES DA NATUREZA E A MAGIA DO PORTAL


DOS ELEMENTAIS: A história do processo de drama.

O vento soprou para a chuva, a chuva pingou na terra, da terra raiou o sol e o sol
amanheceu o dia, iluminando a copaíba. Todos ali então já sabiam que uma história estava
para acontecer. Foi o Guardião deste lugar que pediu para que o vento soprasse e passasse a
mensagem.
Era chegada a hora dos pequenos seres de luz que brincam e aprendem em volta da
copaíba, conhecerem os elementos que formam todo universo: o Fogo, a Terra, a Água e o Ar,
a matéria presente em tudo que há, em tudo que é. O Grande Espírito do todo, por ser um
grande xamã, convocou a força de todos os elementais para começarem a escrever a história.
No dia destinado, estavam todos sintonizados na mesma frequência para planejarem o
que estava por vir. A calorosa Salamandra, elemental do fogo, estava em combustão de
entusiasmo e depositou a sabedoria da transmutação. Já o Elfo e o Gnomo, elementais da
terra, destinaram para os pequenos seres de luz a força e a energia da criação. A encantadora
Sereia Azul e seu companheiro Ondino, trouxeram a nutrição no movimento, na fluidez e na
purificação. A travessa, alegre e avoada Fadinha do Ar soprou a leveza e a criatividade para
os jovens coraçõezinhos.
Duas almas ainda aprendizes que estavam adormecidas no mundo do intelecto foram
sintonizadas na frequência encontro dos elementais com o Grande Espírito, e durante uma
aula receberam o chamado para ajudarem a escrever a história. Tinham elas três mestras que
as aconselhariam e orientariam, Mestra Mar, Mestra Gê e Mestra Ma. Aceitaram com muita
honra e entusiasmo a missão de acompanhar e proteger, os pequenos seres de luz, as crianças,
durante toda a jornada.
Estava um dia ensolarado e quente quando a Mestra Gê apanhou a folha de couve em
que eu estava morando e colocou em um grande pote de vidro. Lembro que depois de alguns
dias no escuro, ouvindo muitas vozes diferentes, o ovo, que era minha casinha, começou a
ficar pequeno e quando menos esperava, a casca quebrou. Acabava de nascer uma pequena
lagarta com listras amarelas e pretas, em um lugar conhecido como Centro Educacional
Eurípedes Barsanulfo.
15

Mestra Gê, sendo um ser muito sábio, colocou muitas folhas de couve para que eu
pudesse me alimentar. Eu sentia tanta fome que comia o tempo todo, e todos os dias era
prestigiada com folhas fresquinhas. Ao longo do tempo fui conhecendo meus companheiros
de jornada. Eles possuíam uma forma humana e tinham entre 4 e 6 anos de idade, eram
formados por luz, amor e alegria. Alguns mais espoletas que outros, mas todos me
observavam com carinho e graciosidade. Foram algumas semanas em que eu passei me
deliciando com as folhas e crescendo sem parar, me tornando uma lagarta grande e forte.
Como já havia atingido toda a potência que estava preparada para viver como lagarta,
comecei a construir a minha segunda morada: um poderoso casulo. Fui para o topo do pote e
me pendurei para tecer em volta do meu corpo uma seda. Grudei nela pedaços de folhas e
pequenos galhos secos, então meu corpo se transformou em pupa, estava nesse momento
metamorfoseando.
Foi durante esses dias no casulo que o Grande Espírito me revelou que a história
estava começando a acontecer. Acordamos que ao sair do casulo devia me apresentar para as
crianças em minha nova forma, mas teria que partir rapidamente para outro plano, pois nele
me tornaria a guardiã da missão da história.
As minhas asas cresceram e o casulo começou a ficar apertado, já me sentia preparada
para quebrar a parede e sair. Voei, ainda dentro do pote, e as crianças ficaram impressionadas.
“Olha! Ela tem uma asa menor que a outra!”,”Ela é tão linda! É amarela e preta”.
A Mestra Gê que acompanhava a turma aconselhou para que no final da tarde me
libertassem para voar livremente. Antes que pudessem voltar a atenção novamente para mim,
a matéria desassociou do meu ser, foi rápido como o bater de asas. Meu corpo ainda estava
ali, mas eu já não mais estava.
Me senti abraçada por todos quando fizeram na terra uma casa para o meu corpo e o
guardaram. Foi lindo vê-los escrevendo uma história sobre a minha passagem, estava cada vez
mais feliz por estar ali e já me sentia em casa quando adormecia nos galhos da copaíba. Voava
tranquila enquanto os observava, sem me dar conta que estava sintonizada na frequência da
elevada missão e tinha um grande poder em minhas asas, a capacidade de transformá-los em
guardiões da natureza. Meu propósito era preparar as almas aprendizes para serem a ponte
entre as dimensões e tecer toda a história a ser vivida.
Encaminhadas pela Mestra Mar, as almas despertadas foram conhecer os meus amigos
da copaíba. Ficaram encantadas com tudo, com o espaço, com as árvores, com as galinhas,
com as crianças e com as duas mestras fantásticas que ainda não conheciam, a Mestra Gê e a
Mestra Ma. Era fascinante como as mestras dominavam a magia do conhecimento, tinham
16

com elas histórias que falavam com a essência das crianças, possuíam o potente elixir da
imaginação e a grande capacidade de enxergar a alma de seus alunos.
Conheci as duas aprendizes que me ajudariam na missão. Elas compunham o clã de
estagiárias no mundo do intelecto, orientadas pela Mestra Mar, uma forte e corajosa xamã,
com a potência de resplandecer o poder de cada coração que por ela passa, dando o amparo
para florir o despertar das almas. Então, éramos eu, duas Julias e uma história. Uma era
orientada pelo ar, a outra, pela água, mas eram conectadas pelo poder da terra no tempo do
fogo. Os elementos constroem a vida e a vida faz do universo ser o universo. Tudo é inteiro e
tudo faz parte de tudo.
Como uma magia adormecida nos corações das Julias, brotou a semente que plantei.
Nesta semente estavam presentes todas as intenções e forças depositadas pelos elementais e
pelo Guardião de tudo que há. Nasceria ali a história construída pelo Grande Espírito com os
poderosos elementais. Fiz da história um processo de passagem com os quatro elementos pela
minha metamorfose. Tudo está ligado, como uma grande rede, tudo faz parte de tudo.
Com o passar dos dias, as aprendizes foram reconhecendo o brotinho, o propósito
presente em si e começaram a materializar as intenções. Trouxeram um conhecimento
adquirido durante os estudos e fizeram dele um dispositivo para que eu pudesse, de forma
segura, abrir os portais dos elementais para as crianças. O conhecimento era identificado no
mundo do intelecto como processo de drama, um efeito mágico que transita entre planos e
cria atmosferas imaginativas, capazes de transportar todos para uma viagem em qualquer
realidade.
A história traçada para acontecer se transformou no roteiro do processo, desta forma,
ela poderia se concretizar nesta dimensão humana. As jovens aprendizes transcorriam o
enredo do coração para a cabeça, da cabeça para o papel, e assim o roteiro foi se tornando
uma fantástica magia para transformar as crianças em pequenos guardiões da natureza. As
intenções manifestadas e transmitidas pelos guardiões eram a essência de tudo que estava para
acontecer.
O roteiro foi composto por cinco viagens: a primeira viagem se trata da apresentação
do propósito, do convite para a aventura e da criação do amuleto da coragem para a entrada
nos portais de cada elemento. A partir da segunda viagem, com o poder do amor e da
coragem, o portal surgiria e eu tinha o dever de atravessar todos para a dimensão dos espíritos
da natureza em segurança.
O poder da magia da missão transformou as duas almas aprendizes em borboletas. A
alma vinculada com a água se tornou a borboleta da asa de folhas, e a alma vinculada com o
17

ar se transformou na borboleta da asa de flores. Por terem se transformado, nós conseguimos


nos comunicar de maneira sutil, a intuição era o nosso canal. Estava presente o tempo todo,
mas em outro plano.

3.1.1. PRIMEIRO EPISÓDIO - O DIA DO CONVITE MÁGICO

As duas almas aprendizes ainda não tinham se transformado em borboletas, tudo


estava dependendo se o convite para a aventura seria aceito pelas crianças. As aprendizes
pareciam estar ansiosas, e o Grande Espírito encaminhou para a escola a Mestra Mar para
ajudá-las. Um dos seus poderes secretos era estabelecer atmosferas energéticas com o poder
da mente, a mestra criava um campo de força e luz capaz de tranquilizar e ampliar as
conexões.
Enquanto as crianças bebiam água e enchiam suas garrafas, em uma árvore em frente
ao corredor do bebedouro, pendurei o casulo que seria a semente para a história brotar. Dentro
dele, estava a carta do convite mágico. Foi o maior e mais lindo casulo que já vi em todo o
mundo dos seres de asas e dos seres humanos também.

Figura 1 - Roda para a descoberta do casulo com a carta convite para a aventura.

Créditos: Isabel Roza (2022).


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A árvore com o casulo estava no caminho para as salas, após se hidratarem e


encheram as garrafas de água, as mestras concentraram as crianças na sombra da árvore. E as
aprendizes, pediram que observassem o espaço e dissessem o que estavam vendo. Aos poucos
foram percebendo todo o espaço, falaram das plantas, da grama, das flores vermelhas e
amarelas, das folhas e acabaram descobrindo que havia um grande casulo entre nós.
Logo, começaram as perguntas sobre o que seria aquilo, quem teria o colocado ali e o
que poderia ter dentro. “Será que é da decoração da Festa Junina? Será que é uma fruta que
nasceu nessa árvore? Será que tem alguma coisa dentro?”
Estavam todas muito curiosas com o que poderia ser, as aprendizes, então, contaram
que aquilo se tratava de casulo mágico que guardava uma carta da borboleta da asa amarela e
preta. E com a ajuda de algumas crianças, tiraram o casulo da árvore e abriram a carta.

Figura 2 - Primeira carta: Convite mágico.

Fonte: acervo pessoal.


19

Aos poucos, as aprendizes foram lendo e conversando sobre o que se tratava a carta. O
que é fauna e flora? Para que existe a natureza? Quais são os quatro elementos? Disseram que
a natureza eram os animais, o céu e as árvores. Fomos surpreendidas quando apenas uma das
crianças respondeu sobre os elementos, disse ela que são a terra, fogo, água e vento.
Foi naquele momento, enquanto observava os corpinhos inquietos de entusiasmo e os
olhinhos brilhando, que pude entender: estávamos escrevendo uma história transformadora
com pingos de luz na terra.
Foram muitas perguntas, risadas e curiosidades. Ao finalizarem a leitura da carta,
juntos começaram a decifrar o enigma de onde poderiam encontrar o código do cadeado para
que pudessem abrir o tesouro misterioso. Era como um caça ao tesouro, em que primeiro,
teriam de desvendar o código do cadeado do tesouro e em seguida teriam que procurar pelo
baú misterioso.
Rapidamente perceberam que o enigma se tratava da sala de aula, então correram até
elas e cada turma entrou na sua sala. Encontraram pequenos casulos embaixo das mesas e
dentro de cada um tinha uma peça do grande quebra cabeça dos elementos, assim, precisariam
se unir para conseguirem montar e decifrar o código.
O código se apresentaria no desenho do quebra - cabeça, era uma imagem complexa
composta por uma grande quantidade de peças de tamanho pequeno e as crianças por serem
muitas, e estarem eufóricas e inquietas, tiveram dificuldade para montá-lo sozinhas. Percebi
que esse desafio levou mais tempo que o esperado, o grau de dificuldade estava alto para as
crianças e ficaram agitadas. A Mestra Mar, soprou para as aprendizes que uma delas deveria
sentar com as crianças e cantar, enquanto a outra auxiliava na montagem unindo as peças que
ainda não tinham encaixado. Aos poucos foram acalmando e concluindo a montagem.
20

Figura 3 - Quebra-cabeça: O código do cadeado.

Créditos: Isabel Roza (2022).

Figura 4 - Pequenos guardiões montando o quebra-cabeça casulo.

Créditos: Isabel Roza (2022).

Com o quebra-cabeça montado, observaram a imagem formada, perceberam que ali


estavam presentes os elementos que tínhamos falado anteriormente e identificaram o número
21

da senha, 724. Agora que já tinham o código para abrir o cadeado, precisavam encontrar o
baú. Na carta do convite mágico, contei para as crianças que poderiam procurar o baú
misterioso no jardim encantado. Um lugar com plantas mágicas e poderosas onde elas
cuidavam das plantas e flores, ideal para guardar o tesouro fantástico. Dentro dele tinha a
fórmula secreta para a passagem pelos portais, o grandioso amuleto da coragem. O amuleto
era feito com sementes de diversas árvores e um fio de algodão, poderia ser um colar ou
pulseira e a magia só atingia o amuleto se nele tivesse muito amor e cuidado.
A alma do ar lembrou os pequeninos o que indiquei na carta, sobre onde poderia estar
o baú, então, os pequeninos foram correndo até o jardim. Um deles rapidamente levantou a
caixa que estava cobrindo o baú e todos vibraram felizes com o que poderia ser o tesouro.
Foram todos para o galpão da escola desvendar juntos aquele mistério. Para que pudessem
abrir, as duas aprendizes foram à frente das crianças com o tesouro e pediram para todos
juntos dizerem o código do cadeado, mandando energias positivas com as pontas dos dedos.
E, assim, com a energia de todos, o baú se abriu.

Figura 5 - Elementos presentes no baú misterioso.

Créditos: Julia Mouza (2022).


22

Figura 6 - Baú misterioso com os materiais para construção dos amuletos da coragem.

Créditos: Julia Mouza (2022).

Nele tinham pedras coloridas encantadas como quartzos, ágatas, ametistas e tantas
outras transmitindo a virtude da terra. Várias conchas de diversos formatos e texturas
demonstrando a sabedoria da água. As folhas e pétalas secas pelo sol traziam a transmutação
do fogo. Por fim, as tiras de tecido mostravam a leveza e delicadeza do ar. Todos os elementos
juntos para se conectarem com os corações dos pequenos seres de luz.
Dentro do baú, também estava a segunda carta que escrevi. Nela, apresentei o potente
amuleto de passagem e anunciei que em breve teriam visitas. Contemplaram curiosos os
elementos presentes no baú e começaram a criar seus amuletos.
23

Figura 7 - Segunda carta: A realização do amuleto de passagem.

Fonte: Acervo Pessoal.


Assim, encerramos a primeira parte desta grande história, com todos felizes e ansiosos
para a abertura do portal e vista dos meus amigos guardiões elementais. Voei até a copaíba
confiante que tudo estava guiado para acontecer da melhor maneira possível, mal podia
esperar para ver meus amigos no portal dos guardiões.
24

Figura 8 - Amuletos da coragem.

Créditos: Isabel Roza (2022).

3.1.2. SEGUNDO EPISÓDIO - O OVO E O FOGO

Da grande explosão do astro rei, rochas se espalharam pelo espaço, e, atraídas pela
força gravitacional, passaram a girar em torno do sol. As mudanças geradas na atmosfera e na
crosta terrestre com a ação da terra, do fogo, da água e do ar possibilitaram a combinação para
que as primeiras células de vida pudessem existir. Nessa história, o fogo simboliza o momento
em que eu estava dentro do ovo, quando estava me tornando uma lagarta. Ele é a primeira
fonte de energia do Todo, é o que propicia o movimento, a ação, a explosão, o surgimento de
tudo.
Neste dia, com a magia da imaginação, transformei umas das aprendizes em uma bela
borboleta, assim, ela poderia transitar pelas dimensões, e, juntas, poderíamos com cautela
atravessar todas as crianças pelo portal até a dimensão dos elementais. A borboleta das asas
de flores foi até as salas de aula para convidar as crianças para a primeira aventura, e se
apresentou como minha grande amiga. Esclareceu que o portal se formaria no pergolado em
frente a copaíba e orientou que levassem os amuletos.
25

Figura 9 - Roda para o ritual de passagem.

Créditos: Murilo Invernizzi (2022).

Os corações foram juntos até o gramado da copaíba, formaram uma roda, e então a
borboleta apresentou o canto para o ritual de passagem. Em conjunto, saudaram os elementos
com o canto e ativaram o poder do amuleto com o calor do coração.

Terra meu corpo


Água meu sangue
Ar minha mente
Fogo meu espírito11

Como a energia transmitida pelos corações das crianças foram eminentemente


ingênuas e verdadeiras, tornou-se o portal capaz de materializar a forma humanóide de cada
elemento. Fogo, Terra, Água e Ar, um portal com quatro destinos diferentes na dimensão.
Meus pequenos amigos, ao passarem pelo portal, transformaram-se em diversos animais,
como macacos, elefantes, tigres, leões, coelhos, tinha bichos de todos os tipos.
11
Canção de origem Canção dos povos originários da américa aprendida por meio de cultura oral, cantada e
dançada com alguns professores e professoras do Curso de Teatro, como prof. Fernando Aleixo, profa. Paulina
Caon e profa. Mariene Perobelli
26

Figura 10 - Atravessando o portal mágico.

Créditos: Murilo Invernizzi (2022).

O Grande Espírito do tudo que é, os encaminhou para a dimensão dos guardiões


elementais, e então, destinou a Salamandra para abrir o portal do fogo. Atravessaram,
sentaram no chão de folhas secas e, aos poucos, ela foi se materializando. As crianças ficaram
encantadas, a Salamandra12 estava em forma humana, uma mulher com vestido vermelho de
chamas e o poder de fazer fogo com as mãos.

12 Dandhara Morena, nome artístico de Dandhara Morena Miranda Araújo Chagas, é atriz, diretora, arte
educadora, mãe e co-fundadora da Corpo HabitARTE. Seu campo de trabalho une tecnologia, artes e educação
objetivando a ativação do corpo por intermédio das diferentes linguagens artísticas, visando reavivar o fogo
interno da criatividade e do sentir.
27

Figura 11 - Salamandra se apresentando como elemental do fogo.

Créditos: Murilo Invernizzi (2022).

Figura 12 - Salamandra iniciando o ritual de transmutação do medo.

Créditos: Murilo Invernizzi (2022).


28

Ela conversou com as crianças, falou sobre o fogo e sua energia. Que o fogo é a
energia que corre dentro nós quando corremos, pulamos. Sobre a chama acesa dentro de nós, a
chama que reluz o brilho nos olhos e ilumina o caminho que devemos seguir pelo nosso
coração. É o calor que nos alimenta e nos mantém vivos. É a luz que nos permite viver e nos
nutre.
Usou a tinta do fruto do fogo para perpetuar nas crianças a sua força, com urucum fez
nelas um traço com o dedo na linha no queixo, representando uma marca de passagem pelo
portal. Depois de terem conhecido seu poder, tiveram a oportunidade de absorver suas
virtudes com o ritual do fogo. A Salamandra fez uma fogueira com grandes troncos e das
pontas dos dedos acendeu uma tocha que deu vida para a fogueira, começaram então o ritual
da transmutação do medo. A guardiã do fogo, cantou a canção de abertura, que vinculou o
movimento do corpo com a dança do fogo, de um lado para outro, como chamas vivas e
calmas.
Eu sou a salamandra do poder do fogo
E eu vim aqui te ajudar,
Coloque o seu medo no graveto que vamos juntos queimar
Queimar
Queimar
Queimar
Queimar13

Figura 13 - Mentalizando os medos nos gravetos.

Créditos: Murilo Invernizzi (2022)

13
Canção autoral da Dandhara Morena, realizada para a apresentação da elemental Salamandra.
29

Em seus gravetos, materializaram seus medos com a imaginação, e aos poucos foram
se desapegando e os colocando na fogueira. Foi emocionante ver o brilho dos corações
pulsando nos olhos das crianças, sentir o calor vibrar e fazer dos medos, poeira espacial.
Medo de barata, medo do escuro, medo de aranha e diversos outros foram queimados.
Vinculadas ao fogo, começaram a brincar com ele. Usaram do poder do sol para
queimar as folhas secas com lupas, as aprendizes mostraram que ao alinhar a luz, a lupa e a
folha conseguiam fazer buracos de queimadura. Com paciência e muita atenção as crianças
conseguiram não só fazer bolinhas de queimada, como começaram a desenhar nas folhas com
a lupa e o sol.
No papel kraft desenharam os traços feitos pelo sol, com a mágica da sombra traçaram
com gizes coloridos as formas que surgiam. Usaram diversos materiais naturais para fazerem
sombra, pedras, folhas, pedaços de madeira, sementes e até objetos plásticos como bonecas e
carrinhos. Exploraram as formas do corpo humano também, mãos, braços, pés, não tinha
limites para as possibilidades de desenhos com a sombra. Passaram horas se divertindo com a
Salamandra.
Figura 14 - Desenhando e brincando com as sombras.

Créditos: Murilo Invernizzi (2022).


30

Figura 15 - Queimando as folhas com a lupa.

Créditos: Murilo Invernizzi (2022)

Como guardiã da missão, eu me senti realizada ao perceber que os corações estavam


conectados, que haviam reestabelecido o vínculo com o primeiro elemento encaminhado pelo
Grande Espírito, e que entenderam o fogo como parte deles e do Todo. Os pássaros voaram
trazendo o fim do dia e a Salamandra se despediu das crianças os transformando em guardiões
do fogo.
Encerramos a viagem com o ritual de passagem, atravessaram o portal e voltaram para
a dimensão humana com a luz da virtude desse elemento vibrando dentro de si. Corações
radiantes e calorosos surgiram dentro de cada um.
Figura 16 - Queimando os medos no fogo representados pelo graveto.

Créditos: Murilo Invernizzi (2022).


31

3.1.3. TERCEIRO EPISÓDIO - A LAGARTA E A TERRA

Ao quebrar a casca do ovo, da proteção quentinha, a lagarta passa a caminhar se


conectando com o lugar em que está. No meu ciclo de metamorfose, a fase da lagarta
manifesta a força da terra, a nutrição, a permanência, a vitalidade.
O dia estava chuvoso, com o clima nublado e fazendo um frio de congelar as asinhas.
Nessa viagem, as duas almas aprendizes estariam presentes como borboletas, pois transformei
novamente a Julia do ar na bela borboleta da asa de flores e pela primeira vez a Júlia da água
se transformou na borboleta da asa de folhas. Meus jovens amigos passaram a semana
esperando a abertura do portal novamente, estavam curiosos quanto ao próximo elemental.
O Grande Espírito, sendo um poderoso xamã, fez da promessa de chuva raios de sol, e
o tempo abriu como mágica. As borboletas foram até as salas de aula buscar as crianças para a
próxima aventura. Todos iniciaram o ritual de passagem com a roda, o canto, a ativação do
amuleto e a transformação dos animais.

Figura 17- Ritual de passagem pelo portal.

Créditos: Maryah Lopes (2022).

Escutei uma pequena menina falando que suspeitava ser o dia da salamandra da água,
mas o Guardião com o poder do portal encaminhou todos para a dimensão da terra com a
presença de seus elementais. O Elfo14 e o Gnomo15 foram os primeiros de toda linhagem da

14
Diego Leonardo é capoeirista, ator-pesquisador, contador de histórias, arte-educador, palhaço e graduando de
Licenciatura em Teatro pela Universidade Federal de Uberlândia.
15
Kleber Maronezi é ator, palhaço e performer. Idealizador do núcleo de palhaçaria “Payaso sem Teto” e
graduando em Teatro pela Universidade Federal de Uberlândia.
32

vida, solidificando os corpos, fertilizam os solos e guardam o cristal da fonte da vida. São
seres elementais construídos pelas virtudes de seu elemento, e eles têm o poder da criação, da
abundância e do conhecimento ancestral.

Figura 18 - Elfo e Gnomo, elementais da terra.

Créditos: Maryah Lopes (2022)

Ao passarem para a forma humana, ficaram altos e vistosos. O Elfo tinha longas e
pontudas orelhas, vestia uma roupa bem verdinha com bordados de ouro e trazia um cajado
feito de grandes galhos unidos pelo fio da vida com pedras encantadas e sementes penduradas.
É um ser muito sábio, dizem que dentro de seu chapéu moram todas as histórias mágicas. Já o
Gnomo, tinha pele amarelada e um olhar profundo e curioso. Era alegre e ágil e se
movimentava rapidamente, tinha uma risada engraçada, um grande chapéu marrom e
carregava em seu cinto o chocalho com todas as sementes do mundo, o tambor com a batida
do coração da terra, o triângulo da saudação e o pandeiro feito de risadas.
33

Figura 19 - Apresentação dos elementais e contação.

Créditos: Maryah Lopes (2022).

Apanharam um mito de criação do livro de histórias de origem do mundo e


começaram a contá-lo. O mito de origem yorubá16, conta a criação do homem por Obatalá
com barro. E começaram a contar a história da criação do mundo cantando o canto da origem
da vida. Contaram que Oxalá, ao criar o homem, tentou usar todos os elementos, mas, foi
somente com o barro emprestado por Nãnã e o sopro de Oxalá que foi possível fazer o
homem. Cantaram a canção mágica da terra para as crianças usando os instrumentos
encantados, saudaram os pequenos seres com o símbolo da terra feito com argila e entregaram
para eles sementes de girassol para consagrar a terra.

O nosso Deus corrige o mundo


Pelo seu dominamento
Sei o que a terra gira

16
PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
34

Com o seu grande poder


Grande poder, com o seu grande poder
O nosso Deus corrige o mundo
Pelo seu dominamento
Sei o que a terra gira
Com o seu grande poder
Grande poder, com o seu grande poder
A terra deu, a terra dá, a terra cria
Homem a terra cria, a terra deu, a terra há
A terra voga, a terra dá o que tirar
A terra acaba com toda mal alegria
A terra acaba com inseto que a terra cria
Nascendo em cima da terra
Nessa terra há de viver
Vivendo na terra, que essa terra há de comer
Tudo que vive nessa terra
Pra essa terra é alimento
O homem planta um rebolinho de maniva
Aquela maniva com dez dias ta inchada
Começa nascer aquela folha orvalhada
Ali vai se criando aquela obra positiva
Muito esverdeada muito linda e muito viva
Embaixo cria uma batata que engorda e faz crescer
Aquilo dá farinha pra todo mundo comer
E para toda criatura vai servir de alimento
Deus corrige o mundo pelo seu dominamento
A terra gira com o seu grande poder
Grande poder com o seu grande poder

COMADRE FULÔZINHA. Grande Poder. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=vtH7myShldo.


Acesso em: 23 nov. 2022.
35

Contentes e cuidadosas, as crianças começaram a plantar as sementes em volta das


raízes da copaíba, meu grande lar. Estavam acolhendo as sementes e preparando o solo. A
magia da criação nas palmas das mãos e os pés amparados pelo chão.
Conectadas com o elemento, o Grande Espírito os presenteou com a árvore de frutos
mágicos, uma grande muda a ser semeada e cultivada, com o propósito de germinar dentro de
cada um o cuidado com a terra. Foi uma surpresa prazerosa, as crianças estavam
entusiasmadas e felizes com a missão recebida. Prometeram regar a árvore todos os dias, e a
plantaram no gramado verde, do lado do parquinho. Ao fim, colocaram folhas secas em volta
para proteger o solo.

Figura 20 - Cultivando sementes de girassóis.

Créditos: Maryah Lopes (2022).


36

Figura 21 - Plantando a árvore mágica.

Créditos: Maryah Lopes (2022).

Em volta da árvore mágica, as borboletas e os elementais cantaram o canto de abertura


do portal. Elfo e Gnomo, ao se despedirem, agradeceram pela pureza dos corações e
nomearam as crianças como guardiãs da terra, e deram um presente a elas, uma argila para
modelagem e tornarem real tudo o que quiserem. A terra pode tudo.

Figura 22 - Cantando o canto da abertura do portal envolta da árvore.

Créditos: Maryah Lopes (2022)


37

No fim do dia, posso dizer que cumpri parte da missão com sucesso. Passamos todo
nosso tempo juntos ritualizando o elemento da terra, as crianças não hesitaram em momento
algum, ao contrário, mostraram-se curiosas e conectadas desde o primeiro contato, enquanto
escutavam as histórias do Elfo e do Gnomo. Ao longo do dia, vincularam-se plantando,
dançando, sentindo e criando com o elemento, e agora, já eram guardiões do fogo, e da terra.

Figura 23 - Foto dos pequenos guardiões da terra com os elementais.

Créditos: Maryah Lopes (2022).

3.1.4. QUARTO EPISÓDIO - O CASULO E A ÁGUA

A água está presente em tudo que tem vida, para os humanos ela é capaz de nutrir e
proteger o feto na gestação, assim como na minha metamorfose, na qual o suco ácido
transforma o tecido do meu corpo de lagarta e desperta as células para produzir um novo
corpo. Ela é imprescindível à existência da vida na terra.
Estava um dia ensolarado e quente no cerrado, as crianças aguardavam a visita das
borboletas para a próxima viagem. Senti que o Grande Espírito havia elevado a influência da
água no campo energético de todos que estavam ali: as mestras, as crianças, as borboletas e
até eu estava tranquilizada e equilibrada. Estávamos harmonizadas em uma mesma
frequência.
As queridas borboletas da asa de flores e da asa de folhas, levaram as crianças mais
uma vez para o gramado em frente a copaíba. O portal se formou e o ritual de passagem
começou: cantaram, rodaram e se transformaram em novos animais. Ao atravessarem o portal,
38

depararam-se com os guardiões da água, a Sereia Azul17 e o Ondino18, seu companheiro. Os


olhinhos brilharam e os sorrisos começaram a desabrochar, estavam alegres e fascinados com
os elementais da água.

Figura 24 - Conhecendo a Sereia Azul e o Ondino.

Créditos: Nathália Mendes (2022).

Os guardiões do elemento água se apresentaram e foram cercados de muitas perguntas


e histórias, todos tinham memórias com peixes ou sereias e uma grande dúvida surgiu: “O que
você come, Sereia?”. Contaram como é a vida no fundo do mar, que comem muitas algas, que
nadam com vários tipos de peixe e que não precisam tapar o nariz para mergulhar.
Perguntaram para as crianças se elas gostavam da água, o que faziam com ela, para o que ela
poderia servir e se ela era importante para eles. Não precisou de muitas perguntas, as
respostas começaram a se manifestar. Você respira debaixo d'água? No mar tem cachorro?
Vocês vieram do filme do Lucca? Tem monstro no mar? Com as respostas e o canto da sereia
as crianças começaram a se encantar e foram se acalmando.

17
Maitê Máximo é atriz, cantora e dançarina com experiência em ballet clássico, ballet contemporâneo, jazz,
sapateado e vogue. Atualmente, graduando em Teatro pela Universidade Federal de Uberlândia.
18
Vinicius Severo graduando em Teatro pela Universidade Federal de Uberlândia com pesquisa voltada para
audiovisual.
39

Figura 24 - Conhecendo o poder da água.

Créditos: Nathália Mendes (2022).

Os elementais falaram sobre o poder da água, que pode nos limpar física e
emocionalmente, que transporta os nutrientes na terra e em nossas veias, que hidrata a vida,
que traz balanço e fluidez para a dança do universo, e que ela constitui a maior parte do nosso
corpo. A Sereia Azul nos presenteou com o seu canto, os olhares eram de contemplação e
admiração, as respirações foram acalmando e todos ficaram serenos.

A chuva vai cair


Cair de lá do céu
A água vai correr
E vai molhar o chão
O Rio vai encher
A água eu vou beber
A planta vai crescer
A fruta eu vou comer

GUALBERTO JR., João. A chuva vai cair: Flor de Luz. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=Ld4HQhk2668. Acesso em: 23 nov. 2022.
40

As borboletas, com a ajuda dos elementais, prepararam para as crianças bacias para o
escalda pés, com água e as ervas secas com sal grosso. Organizaram as crianças em trios, cada
grupo com a sua bacia, assim, todos teriam a oportunidade de terem seu pé lavado e de lavar o
pé do outro. As borboletas conduziram as massagens para que todos pudessem passar pelas
duas experiências, com os pés e com as mãos.

Figura 25 - Fazendo escalda pés.

Créditos: Nathália Mendes (2022).

Depois de relaxarem, começaram as brincadeiras com a água. Brincaram de passar


água com folhas de chapéu de sol, um balde no centro e duas filas, uma de frente para a outra.
Na ponta de cada fila tinha uma bacia com a mesma água do escalda pés, tinham que pegar a
água e ir passando de folha em folha. As duas filas tinham um mesmo objetivo, encher o
balde do centro.
Fizeram também um perfume mágico com água e ervas aromáticas encantadas, alguns
colocaram até flores para enfeitar o frasco, estavam concentrados e felizes. De repente
começou uma guerra de água e muitas gargalhadas. A leveza da água estava integrada nos
pequenos corações.
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Figura 26 - Brincando de passar água de folha em folha para o balde.

Créditos: Nathália Mendes (2022).

Figura 27 - Fazendo perfumes com ervas e flores.

Créditos: Nathália Mendes (2022).


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O dia se encerrou com muita diversão e corpos energizados da água, todos estavam na
mesma frequência enquanto sentíamos o elemento. Nos despedimos, e os elementais
batizaram as crianças como guardiões da água. Agora já eram guardiões da terra, do fogo e da
água. Estava em paz e grata com a história que estávamos construindo, é recompensador e
reconfortante ter em mim memórias de momentos como esses. Ainda bem que a Mestra Gê
me levou de encontro com os seres de luz.

Figura 28 - Foto do pequenos guardiões da água com os elementais.

Créditos: Nathália Mendes (2022).

3.1.5. QUINTO EPISÓDIO - A BORBOLETA E O AR

Ao passar pelo processo de metamorfose, no casulo, a lagarta desintegra seus tecidos e


começa a formação do seu novo corpo, antenas, pernas, olhos e asas. Estas, vão ficando
grandes e o casulo começa a ficar apertado até que se rompe, então a borboleta desenrola suas
asas e voa. O recém-nascido respira imediatamente após nascer, a vida física começa na
primeira respiração. Nós nascemos sabendo voar, assim como os seres humanos nascem
sabendo respirar, o ar nos conecta.
Havíamos chegado no último capítulo desta grande história, a metamorfose estava no
seu último estágio, foi neste dia em que todos aqueles seres de luz se transformaram em
grandes guardiões de toda natureza, não só dos elementos. Puderam entender que o Fogo, a
Terra, a Água e o Ar são tudo que temos, que fazem parte de nós, de todos os seres vivos e
não vivos.
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O Grande Espírito do tudo que é desejou que levássemos as crianças até a morada dos
guardiões elementais, e sinalizou que o portal se abriria no lar dos seres mágicos. Pela
primeira vez o portal se abriria em um lugar em que as crianças ainda não conheciam. As
crianças, junto a suas mestras, foram levadas para a casa dos elementais. Enquanto estavam a
caminho, as borboletas e a Mestra Mar já estavam na morada preparando todos os detalhes
para esse encontro.
Senti que seus corações estavam apreensivos por ser o último encontro, e eu também
estava assim, pois, estar nesta missão e ser guardiã da história foi para mim uma segunda
metamorfose. Transformá-los me transformou também. Agora sigo com o meu coração maior,
bem maior do que ele era.
Quando chegamos nos deparamos com um lugar deslumbrante, não só para as vistas,
mas para o coração também. Meu ser estava leve, havia muitas árvores, pássaros nos galhos e
dançando com o vento, insetos livres para serem, um grande gramado com coelhos, lindas
flores coloridas e muitas árvores de várias espécies. Estávamos todos amparados e protegidos
pela força da majestosa mãe natureza.
Fizemos uma grande roda, na frente da parede de flores roxas no gramado verde. As
borboletas conversaram com as crianças sobre o respeito e o cuidado que deveriam ter com
aquele lugar, pois era o templo onde manifesta-se a manutenção de todo planeta, um templo
de guardiões elementais, co-criadores da vida. O Reino elemental canaliza a energia através
das vibrações de pensamento e emoções, portanto deveriam nutri-lo com bons
comportamentos, com cuidado e com amor.

Figura 29 - Roda para fazerem os acordos.

Créditos: Luísa Della Nina Barrionovo (2022).


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As crianças estavam a admirar o espaço, tudo era mágico e fantástico. As borboletas,


junto das mestras, os levaram até o local onde abria o portal, passando pela árvore de cristal,
atravessando o caminho dos arcos de madeira com flores ao redor e enfim, chegando até a
entrada do portal, o maior portal de toda história.
Começamos, então, o último ritual de passagem. Formaram a grande roda, cantaram o
canto de passagem, aqueceram os corações ativando as intenções de atravessarem o caminho
até o elemental do ar e atravessaram o portal se transformando em vigorosos e diversos
animais. O portal era um caminho comprido com muitas fitas coloridas e estampadas que
dançavam com o vento.

Figura 30 - Atravessando o portal.

Créditos: Luísa Della Nina Barrionovo (2022).

Encontramos a árvore portal, uma árvore em que o tronco se dividiu em duas


ramificações formando uma janela, uma passagem entre dimensões. A serelepe Fada do ar19,
trazia uma asa azul com brilho mágico, vestia uma saia que voava com o vento e uma blusa de
folhas dançantes. Ela estava adormecida na espera dos pequenos seres de luz, e aos poucos foi
despertando com o entusiasmo das crianças. Voou, rodou pra lá, rodopiou pra cá e dançou
com o vento.

19
Fernanda Puttinick é atriz, pesquisadora da arte na infância e graduanda de Licenciatura em Teatro pela
Universidade Federal de Uberlândia.
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Figura 31 - Conhecendo a Fada do Ar.

Créditos: Luísa Della Nina Barrionovo (2022).

Ela conversou com as crianças sobre o poder do ar, falou do sopro, do assobio, da
frequência sonora da voz e dos sons que chegam. Contou dos ventos que limpam por onde
passam e espalham as sementes pela terra, da respiração, do oxigênio, dos pássaros e da
presença do ar. Depois de conhecerem a Fada, escutaram dela a canção do ar e desejaram
poder voar.
Tudo vem do ven-tudo vem

Do vento vem tu-do vento vem

Do vento vem tudo

Tudo bem

Alimenta o fogo

Atormenta o mar

Arrepia o corpo

Joga o ar no ar

Leva o barco a vela

Levanta os lençóis

Entra na janela
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Leva a minha voz

Nuvens de areia

Folhas no quintal

Canto de sereia

Roupas no varal

Tudo vem do ven-tudo vem

Do vento vem tu-do vento vem

Do vento vem tudo

Tudo bem

Sacode a cortina

Alça os urubus

Sai pela narina

Canta nos bambus

Cabelo embaraça

Bate no portão

Espalha a fumaça

Varre a plantação

Lava o pensamento

Deixa o som chegar

Leva esse momento

Traz outro lugar

TATIT, Paulo; PERES, Sandra; ANTUNES, Arnaldo. Do Vento. Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=RujTnAJUieE. Acesso em: 23 nov. 2022.

Enviei uma carta mágica para os meus amigos e as borboletas amigas a


compartilharam com toda a turma. Nela, eu os convidava para passarem pelo processo de
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metamorfose. A Mestra Gê nos presenteou com uma bela canção sobre a metamorfose, e
assim, as minhas amigas e a Mestra Mar começaram a conduzir, logo, as crianças foram
respondendo com o corpo.

Figura 32 - Terceira carta: Despedida do portal.

Fonte: Acervo pessoal.


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Lá lá lá, lá, lá, lá vai uma lagarta


Tá tá tá tá sempre a mastigar
Nhac, nhac, nhac
Como está com fome
Come come come sem parar
Lá,lá,lá lá lá, lá, lá vai borboleta
Tá tá tá tá livre a voar
Flap, flap, flap
Cor de violeta
Uma flor voando pelo ar
Flap flap flap flap flap flap flap
Nhac, nhac, nhac, nhac
Será que a borboleta lembra que já foi lagarta?
Será que a lagarta sabe que um dia vai voar?

TATIT, Paulo. A Borboleta E A Lagarta: Palavra cantada. Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=RjgABP-gMI8. Acesso em: 23 nov. 2022.

“Qual é a primeira fase da borboleta?”. Responderam: “O ovo!”. Então, foram


agachando, uns ficaram de cócoras, outras abaixaram e abraçaram os joelhos. Cada uma do
seu jeito, no seu ovo. “Como é dentro do ovo? É escuro? É quentinho?” Algumas contaram
como era dentro do ovo, já outras, estavam tão concentradas que foram mostrando com o
corpo, fechando os olhos, ficando mais encolhidos. “Esse ovo está ficando pequeno, será que
está na hora de sair?” Aos poucos, os ovos foram quebrando e nasceram muitas lagartas. “Sou
uma lagarta com muita fome”, “Vou comer uma folhinha”, “Nhac nhac nhac”, “Hmmm, que
delícia!", “Ainda estou com fome, vou comer mais”, “Nhac nhac”, “Mais uma”, “Ai eu não
consigo parar de comer”, "Estou me tornando uma lagarta tão grande”, “Nhac nhac”.
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Figura 33 - Passando pela metamorfose: Ovo.

Créditos: Luísa Della Nina Barrionovo (2022).

Figura 34 - Passando pela metamorfose: Lagarta.

Créditos: Luísa Della Nina Barrionovo (2022).


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Figura 35 - Passando pela metamorfose: Casulo.

Créditos: Luísa Della Nina Barrionovo (2022).

Figura 36 - Passando pela metamorfose: Borboletas.

Créditos: Luísa Della Nina Barrionovo (2022).


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Nesse momento estavam se arrastando pelo gramado como lagartas e mascando sem
parar fazendo o som do nhac nhac. “Ai que soninho, quero descansar, vou fazer um casulo”,
“Como a lagarta fica no casulo? Como ele é?”, ergueram os braços como se estivessem
pendurados, começaram a se esticar e se torceram. “Tá crescendo uma coisa nas minhas
costas”, “O que é isso? Uma asa?”, “Agora eu tenho uma asa?”, “Vou sair para voar”. As asas
foram simbolizadas com tecidos e arcos de fitas coloridas, as crianças escolheram suas asas e
foram voar livres pelo espaço.
Correram, saltaram, brincaram, levaram o vento e foram levados por ele. Estavam
livres e soltas, apesar de entusiasmadas estavam centradas, com os sentidos estimulados. Por
se tratar de um espaço amplo cheio de árvores, pássaros, com coelhos, e o rio, era um lugar
repleto de infinitas possibilidades. Podiam perceber e sentir as inúmeras texturas, descobrir
flores, cores, cheiros, poder correr e saltar, subir nas árvores, se esconder entre elas,
transformar galhos em varinhas e espadas.
Depois de muito explorar e brincar, fizemos um piquenique em volta de uma grande
árvore, alimentaram-se e acalmaram-se. Enquanto isso, estava encaminhando para as
borboletas a última carta dessa grande história. Junto dela, enviei também os bastões dos
guardiões para acompanhar as crianças pela jornada.

Figura 37 - Voando com asas de fitas ou tecidos.

Créditos: Luísa Della Nina Barrionovo (2022).


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Fizeram uma roda e sentaram para conversar, então, a borboleta da asa de flores
começou a ler a carta de despedida. Os corações que ali estavam foram atravessados e
sentiram o quanto esse processo tinha os transformado. “Será que as borboletas voltam
semana que vem?” .

Figura 38 - Carta de despedida.

Fonte: Acervo pessoal.

Agora eram guardiões dos quatro elementos e de toda natureza, estavam prontos para
proteger o nosso lar, e, o mais importante, estavam vinculados com os elementos que estão
condensados dentro de nós. Receberam seus bastões para sempre lembrarem da força que há
dentro e fora, e para evocarem a que existe em cada elemental e cuidarem do nosso lar.
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Figura 39 - Recebendo os bastões de guardiões da Natureza.

Créditos: Luísa Della Nina Barrionovo (2022)

Tiraram fotos todos juntos para registrar esse momento e o grande carro chegou para
buscá-los. Começaram a se despedir do templo dos guardiões, estavam comovidos com a
partida e abraçaram forte as borboletas. Já elas, estavam com o coração fora do peito, era
difícil pensar que essa missão estava concluída, nutriram muito amor pelos seres de luz e
prometeram estar sempre presentes.

Figura 40- Foto final do processo com as mestras, aprendizes e os pequenos guardiões da natureza.

Créditos: Luísa Della Nina Barrionovo (2022).

Eu confesso que vou guardar essa lembrança no fundo do meu coração para todo o
infinito. Agradeço as crianças pela alma ingênua e mágica que permitiram esse contato, agradeço
pelas mestras que tornaram esse encontro possível e que nutriram ele com o mais puro amor.
Por fim, agradeço profundamente o Grande Espírito pela missão, ela valeu toda a minha
existencia.
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4. CONCLUSÃO

A cognição se desenvolve a partir da imaginação, e o Drama na educação infantil


vincula a criança com a capacidade imaginativa. O indivíduo na infância, precisa desenvolver
o imaginário criativo, ter contato consigo mesmo e com a natureza, esta é a base para que ele
possa futuramente ser alfabetizado no ensino fundamental. Quanto mais vinculado o
aprendizado for com o pensar criador, melhor será o desenvolvimento. Ao invés de alfabetizar
na educação infantil, precisa-se fazer com que as crianças brinquem, explorem e imaginem,
pois é natural e saudável na infância que o façam. Quando criamos um ambiente seguro e
livre com seres fantásticos, elas podem expandir os sentidos para serem e estarem.
Ao conhecer o Processo de Drama, seu poder e efeito como ferramenta artístico-
pedagógica no ambiente escolar, concluo que este é potencializador, não só de atmosferas
imaginativas, mas, também, por tornar possível a transformação do contexto presente. Dentro
da circunstância educativa, o Drama torna-se um método eficiente para desenvolver saberes e
vínculos da criança, podendo abordar qualquer temática, sendo ele um recurso passível da
interdisciplinaridade.
O Centro Educacional Eurípedes Barsanulfo tratou-se de um ambiente seguro para os
estudantes, ao qual já estavam habituados, e, através deste vínculo, estruturou-se a capacidade
de transformação do espaço por meio da imersão no contexto ficcional. Para realizar o
processo desde o primeiro momento até a sua conclusão, foi essencial que eu e Júlia
criássemos uma grande teia de contatos. Nela, estiveram a nossa professora orientadora
Mariene Perobelli, as professoras supervisoras Maura Almeida e Geise Machado, os
professores-personagens elementais (atores e atrizes discentes da graduação em teatro na
Universidade Federal de Uberlândia), e a técnica figurinista do curso, Letícia Pinheiro20, que
colaborou muito para a nossa caracterização. Foi um processo que se concretizou por meio da
ação e colaboração coletiva.

20
Letícia Pinheiro, mestre em Artes Cênicas pelo Programa de Pós Graduação em Artes Cênicas na
Universidade Federal de Uberlândia (2018), Bacharel em Interpretação Teatral pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (2010) e Bacharel em Moda pela Universidade Feevale (2011). Figurinista dos cursos de Teatro e
de Dança da Universidade Federal de Uberlândia. Trabalha na concepção e criação de figurinos de espetáculos,
auxílio técnico em disciplinas e eventos, criação de conteúdo didático para colaboração em disciplinas, coordena
grupos de estudo, dentre outras atividades relacionadas ao figurino teatral e ao ensino.
55

Durante a estruturação e realização do roteiro do processo, tive a oportunidade de me


conectar com a minha criança interior, com seus impulsos e vontades, entrando no mundo da
fantasia para a criação. Isso possibilitou que meu vínculo com os estudantes se aprofundasse,
pois, enxergando e compreendendo minha criança, o processo de reconhecê-los foi fluido e
simples. Os impulsos estavam alinhados, o entusiasmo e o desejo de seguir explorando e
descobrindo cada vez mais sobre o portal dos elementais estava vivo em todos nós.
Percebo, então, que uma das principais tarefas no desenvolvimento deste Processo de
Drama, a qual tive facilidade em realizar, é a de acessar a infância de maneira pessoal e
particular, podendo transformar este contato em potência de criação através do vínculo. Em
contrapartida, outro aprendizado que carrego dessa experiência se deu de forma desafiadora: o
de conduzir atividades condizentes com as peculiaridades da faixa etária envolvida. Além
disso, existia também a preocupação de que os professores-personagens estivessem, de fato,
conectados com o elemento que representariam, pois um dos desejos no desenvolvimento do
processo, era de que todas as pessoas envolvidas nele já tivessem vínculo genuíno com a
natureza.
Encontrei no Drama o meio para aproximar e conectar as crianças à natureza pela
intensa capacidade criativa. Ao usar como estímulo as materialidades naturais, a natureza
sendo tudo que é e estando presente em tudo, faz-se com que os elementos reverberem para
fora do contexto ficcional e dos encontros. Foi um processo imersivo, e era impressionante e
encantador como parecia que tudo ao redor dialogava com o que estávamos vivenciando. De
forma intuitiva, demos vida para o que estava vivo em nossa imaginação, fomos levadas pelo
mundo que criamos e, portanto, foi um processo prazeroso para os adultos e crianças
envolvidas.
Vejo este Processo de Drama como uma metamorfose, uma transformação que se deu
pela magia real. Isso aconteceu, porque junto com as crianças nos tornamos amigos dos
guardiões elementais e conhecemos cada elemento dentro e fora de nós, por mergulharmos a
cada episódio na energia que traz cada um deles.
Por fim, conclui-se que as vivências não só geraram a aproximação com a natureza,
mas também o vínculo das crianças consigo mesmas, criaram laços entre elas, entre as outras
crianças e as professoras. Na relação com a poética da experiência artística e com a natureza,
as crianças encontram a Si e se vinculam com o Todo. De maneira sutil e fluida, nos
atravessaram e foram atravessadas.
56

5. REFERÊNCIAS

CABRAL, Beatriz. Drama como Método de Ensino. São Paulo: Ed. Hucitec, 2006.

CABRAL, Biange; PEREIRA, Diego de Medeiros. O espaço de jogo no Contexto do Drama.


Urdimento-Revista de Estudos em Artes Cênicas, v. 1, n. 28, p. 285-301, 2017.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.


Editora Paz e terra, 2014.

LOUV, Richard. A última criança na natureza: resgatando nossas crianças do transtorno


do déficit de natureza. São Paulo: Aquariana, 2016.

OLIVEIRA, Mônica Maria Souza; VELASQUES, Bruna Brandão. "Transtorno do Déficit


de Natureza na Infância-Uma perspectiva da neurociência aplicada à aprendizagem."
Lat. Am. J. Sci. Educ, v. 7, p. 22020, 2020.

PIORSKI, Gandhy. Brinquedos do chão: a natureza, o imaginário e o brincar. Editora


Peirópolis LTDA, 2016.

SOMERS, John. Narrativa, Drama e Estímulo Composto. Urdimento, n. 17, p. 175-185, set.
2011.

TERRITÓRIO DO BRINCAR. Diálogos do Brincar #2: 'Criança e Natureza', com


Gandhy Piorski. Brasil, 2016. 1 vídeo (59 minutos). Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=L4u8pnqMkQQ. Acesso em: 21 dez 2022.
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REFERÊNCIAS MUSICAIS

TATIT, Paulo. A Borboleta E A Lagarta: Palavra cantada. Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=RjgABP-gMI8. Acesso em: 23 nov. 2022.

TATIT, Paulo; PERES, Sandra; ANTUNES, Arnaldo. Do Vento. Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=RujTnAJUieE. Acesso em: 23 nov. 2022.

COMADRE FULÔZINHA. Grande Poder. Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=vtH7myShldo. Acesso em: 23 nov. 2022.

GUALBERTO JR., João. A chuva vai cair: Flor de Luz. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=Ld4HQhk2668. Acesso em: 23 nov. 2022.

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