0% acharam este documento útil (0 voto)
90 visualizações2 páginas

51sem Título-1

O documento é uma crônica que conta a história de um dentista respeitado que começa a usar um nariz de borracha. Sua família e pacientes reagem de forma negativa, levando-o a perder seu emprego e reputação. Ele argumenta que continua sendo a mesma pessoa, apenas com um nariz diferente.

Enviado por

Duli Gomes
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
0% acharam este documento útil (0 voto)
90 visualizações2 páginas

51sem Título-1

O documento é uma crônica que conta a história de um dentista respeitado que começa a usar um nariz de borracha. Sua família e pacientes reagem de forma negativa, levando-o a perder seu emprego e reputação. Ele argumenta que continua sendo a mesma pessoa, apenas com um nariz diferente.

Enviado por

Duli Gomes
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
Você está na página 1/ 2

Projeto de Vida – Profª.

Duliane Gomes
Leia a seguir uma crônica de Luis Fernando Verissimo e, na sequência, responda às questões
relacionadas.
O nariz

Era um dentista respeitadíssimo. Com seus quarenta — Mas isto não é brincadeira.
e poucos anos, uma filha quase na faculdade. Um ho- Sesteou com o nariz de borracha para o alto. Depois
mem sério, sóbrio, sem opiniões surpreendentes, mas de de meia hora, levantou-se e dirigiu-se para a porta. A
uma sólida reputação como profissional e cidadão. Um mulher o interpelou:
dia, apareceu em casa com um nariz postiço. Passado o — Aonde é que você vai?
susto, a mulher e a filha sorriram com fingida tolerân- — Como, aonde é que eu vou? Vou voltar para o con-
cia. Era um daqueles narizes de borracha com óculos de sultório.
aros pretos, sobrancelhas e bigodes que fazem a pessoa — Mas com esse nariz?
ficar parecida com o Groucho Marx. Mas o nosso den- — Eu não compreendo você — disse ele, olhando-a
tista não estava imitando o Groucho Marx. Sentou-se com censura através dos aros sem lentes. — Se fosse
à mesa de almoço — sempre almoçava em casa — com uma gravata nova, você não diria nada. Só porque é
a retidão costumeira, quieto e algo distraído. Mas com um nariz…
um nariz postiço. — Pense nos vizinhos. Pense nos clientes.
— O que é isso? — perguntou a mulher depois da sa- Os clientes, realmente, não compreenderam o na-
lada, sorrindo menos. riz de borracha. Deram risadas (“Logo o senhor, dou-
— Isto o quê? tor…”), fizeram perguntas, mas terminaram a consulta
— Esse nariz. intrigados e saíram do consultório com dúvidas.
— Ah, vi numa vitrina, entrei e comprei. — Ele enlouqueceu?
— Logo você, papai… — Não sei — respondia a recepcionista, que trabalha-
Depois do almoço ele foi recostar-se no sofá da sala va com ele há 15 anos. — Nunca vi “ele” assim.
como fazia todos os dias. A mulher impacientou-se. Naquela noite, ele tomou seu chuveiro, como fazia
— Tire esse negócio. sempre antes de dormir. Depois, vestiu o pijama e o
— Por quê? nariz postiço e foi se deitar.
— Brincadeira tem hora. — Você vai usar esse nariz na cama? — perguntou a
mulher.
— Vou. Aliás, não vou mais tirar este nariz.
— Mas, por quê?
— Porque não!
Dormiu logo. A mulher passou metade da noite
olhando para o nariz de borracha. De madrugada co-
meçou a chorar baixinho. Ele enlouquecera. Era isto.
Tudo estava acabado. Uma carreira brilhante, uma re-
putação, um nome, uma família perfeita, tudo trocado
por um nariz postiço.
— Papai…
— Sim, minha filha.
— Podemos conversar?
— Claro que podemos.
— É sobre esse seu nariz…
— O meu nariz, outra vez? Mas vocês só pensam nisso?
— Papai, como é que nós não vamos pensar? De uma
hora para outra, um homem como você resolve andar de
nariz postiço e não quer que ninguém note?
— O nariz é meu e vou continuar a usar.
— Mas por que, papai? Você não se dá conta de que se transformou no pa-
lhaço do prédio? Eu não posso mais encarar os vizinhos, de vergonha. A mamãe
não tem mais vida social.
— Não tem por que não quer…
— Como é que ela vai à rua com um homem de nariz postiço?
— Mas não sou “um homem”. Sou eu. O marido dela. O seu pai. Continuo o

Carlos Rodrigues/Agência Estado


mesmo homem. Um nariz de borracha não faz nenhuma diferença. Se não faz
nenhuma diferença, por que não usar?
— Mas, mas…
— Minha filha.
— Chega! Não quero mais conversar. Você não é mais meu pai!
A mulher e a filha saíram de casa. Ele perdeu todos os clientes. A recep-
cionista, que trabalhava com ele há 15 anos, pediu demissão. Não sabia o
que esperar de um homem que usava nariz postiço. Evitava aproximar-se
dele. Mandou o pedido de demissão pelo correio. Os amigos mais chegados,
numa última tentativa de salvar sua reputação, o convenceram a consultar
um psiquiatra.
— Você vai concordar — disse o psiquiatra depois de concluir que não havia
nada de errado com ele — que seu comportamento é um pouco estranho…
— Estranho é o comportamento dos outros! — disse ele. — Eu continuo o
mesmo. Noventa e dois por cento do meu corpo continua o que era antes. Não
mudei a maneira de vestir, nem de pensar, nem de me comportar. Continuo O gaúcho Luis Fernando
sendo um ótimo dentista, um bom marido, bom pai, contribuinte, sócio do Verissimo (1936) é escritor,
humorista, cartunista, tradutor,
fluminense, tudo como antes. Mas as pessoas repudiam todo o resto por causa
roteirista de televisão, autor
deste nariz. Um simples nariz de borracha. Quer dizer que eu não sou eu, eu
de teatro e romancista.
sou o meu nariz? Também é músico: já
— É… — disse o psiquiatra. — Talvez você tenha razão… tocou saxofone em alguns
O que é que você acha, leitor? Ele tem razão? Seja como for, não se entregou. conjuntos. Colunista
Continua a usar o nariz postiço. Porque agora não é mais uma questão de na- de sucesso em vários
riz. Agora é uma questão de princípios. periódicos, tem muitos livros
publicados.
VERISSIMO, Luis Fernando. O nariz e outras crônicas.
São Paulo: Ática, 1994. p.73-74. Coleção para gostar de ler.

Refletir e Argumentar
1) Qual é o assunto da crônica?
2) Como a mulher e a filha reagiram?
3) Como reagiram as outras pessoas que conviviam com o dentista?
4) Quando acusado de louco, que argumento o dentista apresentou em sua
defesa?
5) Tomando por base o caso do dentista, é possível afirmar que a sociedade
discrimina quem é diferente? Justifique
6) Na crônica, o narrador afirma que o dentista continua usando o nariz, mas agora
por uma questão de princípios. O que isso significa?
7) No final da crônica, o autor propõe a questão ao leitor. Qual é a sua opinião:
somos o que somos ou o que parecemos ser? Discuta com os colegas, depois
registre no caderno as principais conclusões do grupo.

Você também pode gostar