GÊNERO TEXTUAL: CONTO
O conto é um gênero literário que possui narrativa curta e tem sua origem
da necessidade humana de contar e ouvir histórias. Passa por narrativas orais
de povos antigos, trilhando pelos gregos e romanos, pelas lendas orientais,
parábolas bíblicas, novelas medievais, até chegar a nós como é conhecido
hoje.
A estrutura do conto é formada por situação inicial, desenvolvimento e
situação final. Essa divisão é parte importante para composição do enredo.
Dessa forma, na construção do conto, ocorrem os elementos da narrativa, que
são: foco narrativo, espaço, tempo e verossimilhança. Devido à necessidade de
contextualizar a narrativa, o conto sofreu diversas transformações ao longo
da história, originando tipos:
conto de ficção científica
conto infantil juvenil
conto fantástico
conto de fadas
Estrutura do conto
Ao escrever um conto, é necessário observar sua estrutura e as partes que
compõem o enredo. Enredo também é conhecido como trama ou intriga e tem
a função de dar sequência à narrativa e localizar o leitor em relação à sucessão
de acontecimentos, dando ênfase à causalidade.
Exemplo:
O príncipe morreu, e a princesa, de tristeza, foi viver sozinha numa velha
cidade longe do castelo.
Perceba a ocorrência de uma sequência temporal e a ênfase que se dá à
sequência de acontecimentos, dando ao leitor a percepção de como a princesa
sentiu-se diante da morte do príncipe. Dessa forma, o leitor fica na expectativa
do que virá adiante na narrativa. Essa construção — que conduz o leitor à
imaginação e ao estabelecimento de novos sentidos no texto — constitui
enredo.
O conto é composto basicamente por situação inicial, desenvolvimento e
situação final. Veja:
Situação inicial: evidencia a situação que dará início à narrativa,
apresentando os personagens, o tempo e o espaço descrevendo-os. Trata-se
de um trecho essencial para localizar e captar a atenção do leitor. Na
introdução também se apresenta a situação inicial, que será desenvolvida ao
longo do texto por meio do conflito, clímax e desfecho. Esses termos serão
explicados mais adiante.
Desenvolvimento: é nesse momento que surge a quebra do aspecto
predominantemente descritivo e o conflito começa a ser percebido pelo leitor.
Esse conflito resultará no clímax, o momento de maior tensão da narrativa.
Situação final: é o momento de desfecho do conto, quando o conflito é
resolvido, resultando na quebra ou confirmação de uma expectativa. Nesse
trecho, o conflito passou e os personagens são inseridos em uma nova
situação.
Após evidenciar a estrutura básica do conto, é preciso considerar os elementos
fundamentais que dão a ele boa estruturação da narrativa. Veja:
Conflito: trata-se do momento em que ocorre uma oposição entre os
elementos da narrativa, resultando em uma tensão que organiza os fatos. O
conflito instiga o leitor em relação à narrativa.
Clímax: é quando a narrativa alcança a tensão máxima. É o ponto culminante
do conflito. Trata-se também de uma técnica muito utilizada para despertar a
curiosidade do leitor.
Desfecho: trata-se da situação final, ou seja, a solução do conflito.
Elementos da narrativa
Apesar de o conto ser uma narrativa curta, esse gênero apresenta elementos
como foco narrativo, espaço, tempo e verossimilhança.
Foco narrativo
É a posição que o narrador assume para relatar os acontecimentos. O conto
pode ser narrado em 1ª pessoa ou 3ª pessoa.
Narrador em 1ª pessoa: trata-se do narrador personagem. Com esse foco
narrativo, o conto ganha mais subjetividade, pois o narrador está
emocionalmente envolvido na narrativa.
Narrador em 3ª pessoa: o narrador não participa ativamente dos
acontecimentos, com isso, a narrativa ganha mais objetividade. Nesse foco
narrativo, o narrador pode ser onisciente ou observador.
Narrador onisciente: é o narrador que conhece profundamente a história e
relata, inclusive, os pensamentos dos personagens.
Narrador observador: não está a par de toda a história e relata apenas os
fatos que vão acontecendo. Esse narrador não faz antecipações nem
intervenções no relato da história.
Espaço
Trata-se da composição espacial da narrativa em que ocorre a ação do
enredo, espaço onde os personagens movimentam-se. Normalmente, o
espaço é apresentado por meio de recursos descritivos que caracterizam o
lugar. Esse elemento da narrativa pode ocupar dois níveis: espaço físico,
também conhecido como geográfico, e espaço social.
Espaço físico: é literalmente o espaço físico em que ocorre a narrativa. O
espaço pode ser descrito detalhadamente ou suas características podem ser
evidenciadas ao longo do texto.
Espaço social: é o espaço que condiz com as condições socioeconômicas,
morais ou psicológicas dos personagens. Esses espaços podem determinar a
vida dos personagens ou servir apenas de parte da composição da narrativa.
Dessa forma, um espaço descrito como macabro, por exemplo, pode referir-se
à tristeza do personagem, a uma lembrança de morte etc.
Tempo
O tempo compõe as marcas cronológicas na narrativa, expressas por meio
de construções como dia, mês, ano, estações do tempo etc. Também pode
ocorrer por meio de marcas psicológicas do personagem ou narrador.
Esse elemento da narrativa possui três níveis: tempo cronológico, tempo
psicológico e a técnica do flashback.
Tempo cronológico: o tempo transcorre de forma linear em relação aos fatos,
do começo para o final. Trata-se de um tempo que pode ser medido em horas,
meses, anos, séculos.
Tempo psicológico: é o tempo “interior”, aquele que ocorre com base na
imaginação ou memória do narrador ou personagem e é marcado pelas
sensações experimentadas por ele em relação a um determinado momento.
Não é linear, pois os acontecimentos não ocorrem de forma natural.
A técnica do flashback: trata-se de uma marca que consiste em voltar no
tempo em relação ao que está sendo narrado. Ocorre quando o personagem
ou narrador relembra um fato ou compartilha esses acontecimentos
relembrados.
Verossimilhança
Verossimilhança possui o significado daquilo que é “provável”, ou seja,
um universo possível de ser realizado dentro de uma narrativa ficcional, dando
ao leitor a ideia de que tais acontecimentos são perfeitamente possíveis no
mundo real.
Tipos de conto
Devido à necessidade de contextualizar a narrativa, o conto sofreu
diversas transformações ao longo da história, originando tipos: conto de ficção
científica, conto infantil juvenil, conto fantástico e conto de fadas. Veja os tipos
de conto:
Conto de ficção científica: caracterizado por possuir elementos que não
fazem parte de uma realidade comum. Seu enredo é construído com base em
percepções científicas e tecnológicas.
Conto infantil juvenil: narrativa destinada a crianças e adolescentes. Possui
linguagem mais simples e elementos que fazem parte do mundo do seu
público-alvo.
Conto fantástico: construído com personagens e narrativas impossíveis na
realidade, é inspirado em narrativas clássicas, como Odisseia, de Homero.
Conto de fadas: caracterizado por iniciar com a expressão “Era uma vez...” e
apresentar alguma maldade feita por alguém, costuma ter desfecho favorável
aos personagens, podendo ou não ter interferência de seres encantados
(fadas, bruxas, duendes).
Leia o conto “
Uma ideia toda azul”, de Marina Colasanti.
Um dia o Rei teve uma ideia. Era a primeira da vida toda, e tão maravilhado ficou com aquela ideia
azul, que não quis saber de contar aos ministros. Desceu com ela para o jardim, correu com ela nos
gramados, brincou com ela de esconder entre outros pensamentos, encontrando-a sempre com igual
alegria, linda ideia dele toda azul. Brincaram até o Rei adormecer encostado numa árvore.
Foi acordar tateando a coroa e procurando a ideia, para perceber o perigo. Sozinha no seu sono, solta e
tão bonita, a ideia poderia ter chamado a atenção de alguém.
Bastaria esse alguém pegá-la e levar. É tão fácil roubar uma ideia: Quem jamais saberia que já tinha
dono?
Com a ideia escondida debaixo do manto, o Rei voltou para o castelo. Esperou a noite. Quando todos
os olhos se fecharam, saiu dos seus aposentos, atravessou salões, desceu escadas, subiu degraus, até
chegar ao Corredor das Salas do Tempo.
Portas fechadas, e o silêncio.
Que sala escolher?
Diante de cada porta o Rei parava, pensava, e seguia adiante. Até chegar à Sala do Sono.
Abriu. Na sala acolchoada os pés do Rei afundavam até o tornozelo, o olhar se embaraçava em gazes,
cortinas e véus pendurados como teias. Sala de quase escuro, sempre igual. O Rei deitou a ideia
adormecida na cama de marfim, baixou o cortinado, saiu e trancou a porta.
A chave prendeu no pescoço em grossa corrente. E nunca mais mexeu nela.
O tempo correu seus anos. Ideias o Rei não teve mais, nem sentiu falta, tão ocupado estava em
governar. Envelhecia sem perceber, diante dos educados espelhos reais que mentiam a verdade.
Apenas, sentia-se mais triste e mais só, sem que nunca mais tivesse tido vontade de brincar nos jardins.
Só os ministros viam a velhice do Rei. Quando a cabeça ficou toda branca, disseram-lhe que já podia
descansar, e o libertaram do manto.
Posta a coroa sobre a almofada, o Rei logo levou a mão à corrente.
Ninguém mais se ocupa de mim — dizia atravessando salões e descendo escadas a caminho das Salas
do Tempo — ninguém mais me olha. Agora posso buscar minha linda ideia e guardá-la só para mim.
Abriu a porta, levantou o cortinado.
Na cama de marfim, a ideia dormia azul como naquele dia.
Como naquele dia, jovem, tão jovem, uma ideia menina. E linda. Mas o Rei não era mais o Rei daquele
dia. Entre ele e a ideia estava todo o tempo passado lá fora, o tempo todo parado na Sala do Sono.
Seus olhos não viam na ideia a mesma graça. Brincar não queria, nem rir. Que fazer com ela? Nunca
mais saberiam estar juntos como naquele dia.
Sentado na beira da cama o Rei chorou suas duas últimas lágrimas, as que tinha guardado para a maior
tristeza.
Depois baixou o cortinado, e deixando a ideia adormecida, fechou para sempre a porta.
A chave prendeu no pescoço em grossa corrente. E nunca mais mexeu nela.
COLASANTI, Marina. Uma ideia toda azul. 19.ed. São Paulo: Global Editora, 1998.
O conto de Marina Colasanti dialoga com a narrativa mágica, próxima da
percepção dos contos de fada. Esse processo pode ser percebido na
construção personificada da “Ideia”, capaz de brincar e de adormecer.
Ao longo da leitura, é perceptível que se trata da história de um rei que não
tinha ideias, e quando teve uma, decidiu guardá-la por muito tempo, até que
ela se tornasse ultrapassada. Esse conto nos traz uma boa reflexão: a de que
boas ideias precisam ser executadas.
A situação inicial do conto de Marina Colasanti ocorre a partir do trecho “Um
dia o Rei teve uma ideia[…]”. Já o desenvolvimento, período em que se
estabelece o conflito, é configurado no trecho em que o Rei envelhece e
decide libertar a ideia. Fica evidente que o clímax pode ser manifestado no
momento em que o Rei reencontra a ideia ainda adormecida, pois é a partir
dessa circunstância que a situação final será estabelecida, o que significa que
o Rei, agora aposentado, percebe que a ideia já não tem mais serventia e
abandona-a no quarto, ainda trancafiado.
Quanto aos elementos da narrativa, o narrador é observador e o espaço é
configurado em um ambiente físico, ou seja, o castelo do Rei. Em relação aos
aspectos da verossimilhança, é possível entender que o fato de o Rei ter tido
uma grande ideia e tê-la escondido dos demais é perfeitamente executável em
um “mundo real”.