0% acharam este documento útil (0 voto)
74 visualizações171 páginas

Livro Legislacao Florestal

Enviado por

suelmonalvess
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
0% acharam este documento útil (0 voto)
74 visualizações171 páginas

Livro Legislacao Florestal

Enviado por

suelmonalvess
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
Você está na página 1/ 171

Uma Breve História da

LEGISLAÇÃO
FLORESTAL
BRASILEIRA
Contém a Lei nº 12.651, de 2012, com comentários críticos acerca da aplicação de seus artigos

RAONI RAJÃO
ROBERTA DEL GIUDICE
RICHARD VAN DER HOFF
ELY BERGO DE CARVALHO
Raoni Rajão
Roberta del Giudice
Richard van der Hoff
Ely Bergo de Carvalho

Uma Breve História da


LEGISLAÇÃO
FLORESTAL
BRASILEIRA
Contém a Lei nº 12.651, de 2012, com comentários críticos acerca da aplicação de seus artigos

1ª edição

Rio de Janeiro
2021
O Observatório do Código Florestal foi criado em maio de 2013 para
promover o controle social da implantação da Lei nº 12.651, de 25
de maio de 2012 (Código Florestal brasileiro) e garantir integridade
ambiental, social e econômica às florestas em áreas privadas. A rede
é composta de 34 organizações independentes, que se juntaram pelo
objetivo comum de proteção, restauração e uso sustentável das florestas.

Comitê Executivo: Amigos da Terra – Amazônia Brasileira; Fundação SOS Mata Atlântica; Iniciativa Verde; Instituto
Centro de Vida - ICV; Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia - IPAM; Instituto Socioambiental - ISA;
Laboratório de Gestão de Serviços Ambientais da UFMG - LAGESA; The Nature Conservancy - TNC e WWF-Brasil.

Secretária executiva: Roberta del Giudice PRODUÇÃO EDITORIAL


Diretor executivo: Rodrigo Coutinho
Comunicação: Simone Milach Projeto gráfico e diagramação: João Henrique Moço
Apoio: Bruna Poncioni Coordenação: Leandro Gauterio
Revisão de texto: Daise Ribeiro P. Carpes
Ilustrações: Ananda Nahu
Impressão: Gráfica Coan

COMENTÁRIOS CRÍTICOS ACERCA DA APLICAÇÃO DE ARTIGOS DA LEI FLORESTAL


Roberta del Giudice (Org.)
Alice Brites Kaline de Mello
Ana Luiza Ávila Peterlini de Souza Luís Fernando Guedes Pinto
Ana Paula Valdiones Marcelo Hugo de Medeiros Bezerra
André Lima Márcia Silva Stanton
Andrea Almeida Barros Marco Lentini
Annelise Monteiro Steigleder Maria José Zakia
Clarice Borges Matos Mauro Armelin
Fábio Fernandes Corrêa Paulo André Tavares
Gerd Sparovek Pedro Henrique Santin Brancalion
Jean Paul Metzger Sílvio Frosini de Barros Ferraz
Joara Marchezini Vinícius Guidotti
Com carinho, agradeço cada contribuição.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD


B846 Uma Breve História da Legislação Florestal Brasileira: contém a Lei nº 12.651, de 2012, com comentários
críticos acerca da aplicação de seus artigos / Raoni Rajão ... [et al.] ; ilustrado por Ananda Nahu. -
Florianópolis, SC : Expressão, 2021.
192 p. : il. ; 25cm x 17cm.
Inclui bibliografia e índice.
ISBN: 978-65-87095-03-5
1. Direito. 2. Direito ambiental. 3. Legislação Florestal Brasileira. 4. Lei nº 12.651, de 2012. I. Rajão,
Raoni. II. Giudice, Roberta del. III. van der Hoff, Richard. IV. Carvalho, Ely Bergo de. V. Nahu, Ananda.
VI. Título.
2021-746 CDD 341.347
CDU 34:502.7
Elaborado por Vagner Rodolfo da Silva - CRB-8/9410
Índice para catálogo sistemático:
1. Direito ambiental 341.347
2. Direito ambiental 34:502.7

CONTATO
[email protected]
www.observatorioflorestal.org.br
LICENÇA CREATIVE COMMONS CC BY-NC 4.0.
Esta licença permite a distribuição, remixagem,
Apoio financeiro: adaptação e criação para fins não comerciais, atribuindo
devido crédito pela criação original.
Mais informações sobre o texto da Licença:
https://creativecommons.org/licenses/by-nc/4.0/deed.pt_BR
Uma Breve História da
LEGISLAÇÃO
FLORESTAL
BRASILEIRA
Contém a Lei nº 12.651, de 2012, com comentários críticos acerca da aplicação de seus artigos
SUMÁRIO

PRIMEIRA PARTE

Prólogo ................................................................................................................................................... 6

I - A legislação florestal em uma sociedade de Antigo Regime (1500-1822) ............... 9

II - Independência do Brasil e o experimento liberal da


Primeira República (1822-1930 ) ................................................................................................ 12

III - A busca da modernização do campo durante a Era Vargas (1930-1964) ............. 14

IV - Conservação florestal e nacionalismo durante o regime militar (1964-1979) .... 19

V - O movimento ambientalista e seus efeitos na legislação florestal (1979-2008) ... 31

VI - A flexibilização do Código Florestal (2008-2012) ......................................................... 39

VII - Da lentidão de implementação do CF ao desmonte (2012-2020) ........................ 47

Reflexões finais ............................................................................................................................... 59

SEGUNDA PARTE

Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012 – texto compilado, incluindo decisões do


Supremo Tribunal Federal ............................................................................................................ 67

I - O Código Florestal, o artigo 225 da Constituição de 1988 e as leis específicas


por Bioma (Patrimônio Nacional), por André Lima ............................................................. 68

II - Borda da calha do leito regular: o novo parâmetro para medir a Área de


Preservação Permanente, por Andrea Almeida Barros ...................................................... 75

III - O manejo florestal para a produção de bens e serviços no Novo Código


Florestal, por Mauro Armelin e Marco Lentini ....................................................................... 90
IV - Transparência dos dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR), por Ana Paula
Valdiones, Joara Marchezini e Marcelo Hugo de Medeiros Bezerra .............................. 95

V - O uso de instrumentos econômicos para a proteção ambiental, por


Márcia Silva Stanton ..................................................................................................................... 104

VI - Identidade ecológica e compensação de Reserva Legal, por Kaline de Mello,


Clarice Borges Matos, Alice Brites, Paulo A. Tavares, Gerd Sparovek e
Jean Paul Metzger ......................................................................................................................... 111

VII - O decurso do prazo para adesão ao Programa de Regularização Ambiental


(PRA), por Fábio Fernandes Corrêa ......................................................................................... 118

VIII - Observações sobre a adequação ambiental de imóveis rurais localizados em


Unidade de Conservação de Uso Sustentável, por Roberta Rubim del Giudice .... 124

IX - Análise técnica do uso consolidado de Áreas de Preservação Permanente,


por Maria José Zakia e Luis Fernando Guedes Pinto ........................................................ 127

X - Recomendações para a regulamentação dos Programas de Regularização


Ambiental, por Vinicius Guidotti, Luís Fernando Guedes Pinto, Sílvio Frosini de
Barros Ferraz, Pedro Henrique Santin Brancalion e Gerd Sparovek ............................ 128

XI - Responsabilidade civil ambiental e a flexibilização do dever de recomposição


de Áreas de Preservação Permanente em áreas rurais consolidadas, por
Annelise Monteiro Steigleder ................................................................................................... 130

XII - A compensação ambiental de Reserva Legal, por Ana Luiza Ávila Peterlini
de Souza ........................................................................................................................................... 141

XIII - O prazo para a regularização ambiental do imóvel rural, por Fábio


Fernandes Corrêa .......................................................................................................................... 144

XIV - Efeitos do artigo 68 do novo Código Florestal sobre as áreas de Reserva


Legal, por Alice Brites, Kaline de Mello, Paulo André Tavares e Gerd Sparovek ...... 147

REFERÊNCIAS ................................................................................................................................. 156


PRÓLOGO

Quando os primeiros europeus chegavam ao litoral do país atualmente conhecido como


Brasil, os relatos contavam das maravilhas da vegetação nativa até então desconhecida, mas cuja
impressão “edênica” hoje evoca o principal motivo de orgulho de ser brasileiro (Carvalho, 1998).
Ao longo da história do país, essa natureza também foi a base de diferentes ciclos econômicos.
Nos primeiros dois séculos da colonização, o pau-brasil (Paubrasilia echinata) foi fundamental
para sustentar a colônia até a descoberta das riquezas auríferas do subsolo no século XVIII.
Na primeira metade do século XX, a extração de látex (Hevea brasiliensis) no norte do país era
recurso fundamental para a indústria e o esforço bélico nas guerras mundiais, além de fomentar
o desenvolvimento econômico da região amazônica. A araucária (Araucaria augustifolia), no sul
do país, sustentou a indústria madeireira nacional, fazendo com que as exportações de madeira
superassem as importações a partir da Primeira Guerra Mundial. Desde a década de 1960, e mais
ainda a partir dos anos 1990, a vegetação nativa1 começou a ser apreciada pela capacidade de
prover serviços ecossistêmicos. Principalmente a Amazônia foi reconhecida por seu importante
papel em regular o clima regional, com a manutenção da precipitação e a redução da temperatu-
ra, e o clima mundial, pela retenção de Gases de Efeito Estufa (GEE), bem como por sua vasta
diversidade biológica. Reconhecendo essa importância, a vegetação nativa foi admitida desde
o período colonial como um recurso natural fundamental, que merece a proteção do Estado.
A legislação florestal brasileira teve inicialmente como foco a conservação de recursos
naturais, como madeiras nobres, nutrientes do solo e água. Gradualmente, a legislação florestal
brasileira ganhou contornos ambientalistas, passando a considerar a vegetação nativa como “bem
de interesse comum”, cujos uso e proteção deveriam servir para garantir o bem-estar da população,
indo além do fornecimento de recursos naturais. Por outro lado, os efeitos dessa legislação florestal
foram limitados devido à sua concorrência com projetos de desenvolvimento regional. As proteções
jurídicas do pau-brasil e da araucária, por exemplo, não conseguiram evitar que, até meados dos
anos 1980, já houvesse desaparecido 93,2% da Mata Atlântica original (Fonseca, 1985).
Mais recentemente, a partir dos anos 1960, o desmatamento acelerado da Amazônia em
prol da expansão da produção florestal e agrícola tratava proteção florestal como um empecilho.
Essa tensão entre conservação da vegetação nativa e desenvolvimento regional se intensificou
no século XXI, com o fortalecimento político e econômico do agronegócio e a interseção do
desmatamento com questões de escala global.
O presente estudo tem como objetivo principal oferecer esclarecimentos sobre o desen-
volvimento da legislação florestal brasileira, desde as suas raízes na legislação portuguesa, no
século XV, até as mudanças recentes no Código Florestal e o desmonte das políticas de controle
do desmatamento durante o governo Bolsonaro. Ao traçar essa história, discutimos também os

1 Considera-se, neste livro, vegetação nativa e floresta como sinônimos, em linha com o Código Florestal de 1934, que se
aplicava a todas as formas de vegetação “de utilidade às terras que revestem”.

6
impactos dessa legislação no comportamento dos desmatadores e de seus representantes políticos,
bem como as consequências disso nos processos físicos de desmatamento e na mudança de uso de
terra. Assim, este estudo também busca extrair lições para a implementação de políticas públicas
mais eficazes para reverter a atual crise ambiental.
A narrativa apresentada nas próximas seções segue uma organização cronológica. As primeiras
duas seções elucidam o surgimento da legislação florestal brasileira, focada em madeiras nobres; a
chegada dos portugueses; o período imperial (1500-1822), até a sua expansão gradual, incluindo
as preocupações com solo e água, na Primeira República (1822-1930). As duas seções seguintes
retratam o fortalecimento dos interesses em modernização, desenvolvimento e nacionalismo a
partir do governo de Getúlio Vargas (1930-1964) e também sob o regime militar (1964-1985),
cujos debates influenciariam a legislação florestal desde então. Parcialmente coincidindo com
os últimos anos do regime militar, os movimentos ambientalistas que surgiram a partir de 1979
foram responsáveis pela advocacia de uma legislação florestal mais rígida a partir dos anos 1990 e
de políticas mais ambiciosas nos anos 2000, cuja dinâmica será discutida na quinta seção. Entre
2008 e 2012, houve uma grande mobilização política que desafiava os interesses ambientalistas
com êxito, resultando na aprovação de um novo Código Florestal (Lei no 12.651/2012), mais
flexível. Os debates políticos, que levaram a essa alteração, serão aprofundados na sexta seção.
Esse evento foi um ponto de inflexão que, como amplamente discutido na seção seguinte, teve
consequências degenerativas para a legislação florestal brasileira. Concluindo, a história amplamente
apresentada, abrangendo mais de 500 anos de desenvolvimento, oferece uma perspectiva para
entendermos melhor a atualidade, para refletirmos sobre os principais gargalos para a proteção
das florestas brasileiras e para enxergarmos novos caminhos promissores para avançar.

7
8
I - A LEGISLAÇÃO FLORESTAL EM UMA
SOCIEDADE DE ANTIGO REGIME (1500-1822)

Os antecedentes da legislação florestal em solo brasileiro podem ser identificados em formas


de direito diversos que antecedem até mesmo o início da colonização europeia do continente
americano. Em muitas sociedades ameríndias, os direitos consuetudinários têm um caráter mítico
que regula a derrubada das florestas ao atribuí-las um sentido religioso profundo. Desse modo, a
gestão da relação com o mundo natural implica algum regime coletivo de apropriação da floresta
(Berkes, 2005; Diegues, 2000). De modo similar, antes de chegarem à América, os portugueses
já contavam com uma legislação florestal fragmentada. Por exemplo, as Ordenações Afonsinas
(1446) foram uma compilação de leis, pautadas no Direito Romano e no Direito Canônico,
que estabeleciam punição para aquele que “acinte cortar arvores alheas, que dem fruito [sic]”.2
Menos de um século mais tarde, foram instituídas as Ordenações Manuelinas (1514), seguidas
pelas Ordenações Filipinas (1603), realizadas no contexto da União Ibérica e confirmadas, após a
independência de Portugal, por Dom João IV. Esta última proibia o corte de certas árvores, como
“Soveiro, Carvalho, Ensinho” “ao longo do Tejo”.3 Com a chegada dos portugueses ao Brasil, a
legislação florestal foi transferida em grande parte para a nova colônia.
Tal conjunto de normas jurídicas são citados como os embriões jurídicos da tutela de
alguns recursos naturais, em um contexto em que, contudo, o poder público atendia a interesses
particulares e subalternos e no qual o ciclo econômico se caracterizava justamente pela exportação
de madeiras e monoculturas (Milaré, 2020). As leis portuguesas surgiram para reverter um quadro
de crescente falta de recursos florestais que afetava grande parte da Europa Ocidental desde o
fim da Idade Média (Devy-Vareta, 1986). De modo similar, apesar de o Brasil ser abundante em
recursos florestais, a legislação era importante para a proteção das chamadas “madeiras de lei”: um
pequeno conjunto de espécies cuja exploração era estritamente regulada de modo a salvaguardar
interesses comerciais (por exemplo, exportação do pau-brasil para tinturaria) e estratégicos (como
madeira para construção de navios) (Hespanha, 2006). Finalmente, os recursos madeireiros eram
essenciais para a construção e a manutenção dos engenhos e para o aquecimento das caldeiras
que transformavam a cana no açúcar para exportação (Pádua, 2002).
Existe na historiografia do Brasil colonial uma controvérsia relativa à efetividade das
leis na gestão dos recursos florestais. Miller defende a tese de que a legislação, ao estabelecer
o monopólio real de certas árvores, levou a um maior desperdício de recurso, já que os pro-
prietários supostamente preferiam queimar toda a mata a fim de liberar a terra para o uso
agrícola, uma vez que lhes era vedado usar as madeiras de lei (Miller, 2000); desse modo, as

2 Portugual. Ordenações Afonsinas. Livro 5, Título LVIII, n. 7


3 Portugual. Ordenações Filipinas. Livro 5, Titulo LXXV.

9
normas seriam rígidas, mas com pouca aplicabilidade. De modo similar, Dean (1996) afirma
que a legislação foi descumprida e que o brasileiro foi péssimo em converter capital natural
em riqueza, enfatizando a destruição da Mata Atlântica no período colonial como expressão
da expansão predatória da agropecuária.
Outros autores questionam a imagem da gestão florestal colonial como sendo ao mesmo
tempo rígida e ineficaz. Com relação ao primeiro ponto, Cabral e Cesco questionam a tese
de Miller argumentando que “a política florestal metropolitana não era realmente rígida nem
mesmo nas suas intenções – quando tentou ser (a partir de 1797), sua derrocada foi estrondosa.
A interpretação e aplicação da instituição das ‘madeiras de lei’ eram muito flexíveis, gerando, na
prática, um regime de acesso preferencial e não de acesso exclusivo da Coroa” (Cabral, 2007,
grifo do autor). Na mesma linha, Castro trabalha contra a pecha de que o brasileiro é um péssimo
gestor e afirma que a gestão da atividade florestal no período colonial teve importante aspecto
conservacionista4. Essa tese também é confirmada por Cabral (2014, p. 466), que vai além, ao
argumentar que:

Na verdade, a Coroa portuguesa sempre demonstrou entender que o sucesso fiscal


de sua colônia americana dependia do uso sustentado das suas matas. Quem não
tem cão caça com gato e a decepção inicial com a ausência de metais preciosos
fê-la realizar – pelo menos até as descobertas auríferas de fins do seiscentos – que a
floresta era tudo que ela tinha nessas terras distantes.

Mesmo após a descoberta do ouro e a intensificação da derrubada da Mata Atlântica,


a legislação teve um papel na gestão dos recursos florestais, ainda que de modo restrito e
contraditório. Esse entendimento, segundo Cabral (2014, p. 462), busca superar a “crônica
de destruição” ambiental, que percebe no ser humano uma espécie de “erro da natureza”, que
esteve sempre a destruí-la5. O autor argumenta que a “riqueza florestal brasileira foi utilizada
mais como nutriente agrícola do que como biomassa integral (madeira)” (Cabral, 2014, p. 477).
Isso se deve a fatores determinantes como o alto custo de transporte e os arranjos de poder que
restringiam a poucos o acesso a contratos régios de exploração florestal. Ou seja, as obrigações e
os limites legais podiam ser facilmente descumpridos, pois os grandes proprietários ignoravam
a legislação (Cabral, 2014, p. 323). Ao mesmo tempo, as populações mais pobres dificilmente
obtinham autorização para utilizar os recursos florestais. Nesse sentido, Cabral reflete a respeito
da conjuntura social e política na efetividade da implantação da norma, da conservação e da
gestão florestal na América portuguesa:

4 Castro (2002), Dean (1996) e muitos outros trabalhos procuram questionar a imagem do brasileiro enquanto um gestor
florestal excepcionalmente “perdulário” (Carvalho, 2005).
5 Schama (1996, p. 23) denomina uma história de “penitência” aquela que vê o ser humano como agressor capaz de usar
toda sua inventividade para destruir a natureza, constituindo assim “nossa tragédia”, na qual estariam os seres humanos “presos
no mecanismo de nossa autodestruição”. McNeil (2005. p. 20), na mesma perspectiva apresentada por Schama, nomeia-a de
“história de decadência”.

10
Mas, o quão fracassado foi, exatamente, esse projeto “conservacionista”? Esta é
uma questão cuja resposta demanda uma boa dose de relativismo histórico. Um
ponto que parece claro é a extrema dificuldade do governo colonial em aplicar a
legislação, algo frequentemente também salientado pelos próprios agentes régios.
(Cabral, 2014, p. 347).

Além das normas de proteção das espécies florestais, é importante observar que ainda no
período colonial se pode apontar os primeiros sinais de uma futura proteção das margens de rios,
configurada atualmente nas Áreas de Preservação Permanente (APP), ao se declarar pela Carta
Régia de 13 de março de 1797 propriedade da Coroa “todas as matas e arvoredos à borda da costa,
ou de rios que desemboquem imediatamente no mar, e por onde em jangadas se possam conduzir
as madeiras cortadas até a praia” (Pereira, R. O, 2007). Para Osny Duarte Pereira, a investida
protetiva configurou-se na primeira proteção geral a florestas em território brasileiro (Pereira, O.
D, 1950). A declaração de propriedade da Coroa não chegou a ser implantada por não existirem
mais terras devolutas para compensar aqueles que foram desapropriados pelos termos da Carta
Magna de 1797.

11
II - INDEPENDÊNCIA DO BRASIL E O EXPERIMENTO
LIBERAL DA PRIMEIRA REPÚBLICA (1822-1930)

Depois da Proclamação da Independência do Brasil (1822), houve uma mudança


gradual das políticas públicas. A onda de legislação de inspiração liberal, que chegou à Amé-
rica Latina na segunda metade do século XIX, atingiu a legislação florestal brasileira, entre
outras áreas (Bethell, 2002). É possível notar um gradual desmonte da legislação florestal do
Brasil colonial, em que é dado o direito de mudar o uso do solo de sua propriedade de modo
irrestrito (Wainer, 1991). Isso não significou, porém, uma mudança substancial na prática,
visto que a descentralização e a desregulação serviram principalmente para dar legitimidade
a um antigo costume: “o controle das reservas florestais por parte dos potentados locais”
(Wainer, 1991, p. 347).
A fragilidade da legislação florestal perante os interesses rurais suscitara reações de
intelectuais desde o período do Império. Um dos principais defensores de uma legislação
florestal mais forte foi o estadista José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838). Da mesma
forma que denunciava as crueldades da escravidão, José Bonifácio também argumentava
que “destruir matos virgens […] e sem causa, como até agora se tem praticado no Brasil, é
extravagância insofrível, crime horrendo e grande insulto feito à natureza” (Andrada e Silva,
1821, in Neves e Martins, 2011). Além da preocupação com as florestas enquanto fornece-
doras de madeiras nobres (cuja legislação perdurou até o final do século), os defensores das
leis florestais também enfatizavam a importância da conservação para o fornecimento de
água e a proteção dos solos. Essa posição é clara na argumentação feita pelo advogado João
Arruda, já no final da Primeira República, sobre a necessidade de leis florestais mais rígidas
para proteger os rios e evitar as secas: “[A] sorte do Sul será muito semelhante à do Norte, ou
à da Palestina, se continuar a devastação das matas como sistematicamente tem sido feita até
hoje” (Arruda, 1925). Por isso, foram propostos planos de modernização em uma legislação
sistemática que visava a solucionar os problemas ambientais causados, como então se pensava,
pelo atraso tecnológico e pela escravidão enquanto vetores de uma agropecuária predatória.
Intelectuais progressistas do século XIX estavam convencidos de que copiar o modelo agrícola
“moderno”, com máquinas, apropriação privada e individual da terra e trabalho assalariado,
iria solucionar os problemas ambientais então diagnosticados:

A grande panaceia para estabelecer a sanidade ambiental da economia brasileira, após


séculos de colonialismo predatório, estava na modernização tecnológica e operacional
do sistema produtivo e das instituições sociais. A destruição do ambiente natural
não era entendida como um “preço do progresso”, como na visão hoje dominante,
mas sim como um “preço do atraso”. (Pádua, 2002)

12
Tal crítica não logrou influenciar a formação de uma legislação florestal mais restritiva no
período imperial (1822-1889), sendo que durante a Primeira República (1889-1930) políticas
liberais enfraqueceram ainda mais a legislação florestal. Inspirada no modelo norte-americano
de descentralização, a Constituição de 1891 rompeu a ordem política unitária e centralizadora
e conferiu autonomia às províncias. Nesse período, diversos fatores contribuíram para o en-
fraquecimento das leis florestais: a transferência do domínio das terras devolutas aos governos
estaduais; a transformação do meio rural, com os novos investimentos em beneficiamento da
produção; estruturas de transporte ampliadas; bancos e melhorias urbanas em geral (Costa,
1999, p. 14). Nesse cenário, a gestão das florestas tornou-se ainda mais fragmentada e vinculada
às elites locais.
Titulares das terras devolutas e com poderes legislativos, alguns estados regulamentaram
o uso das florestas de modo mais restritivo que o governo federal. O estado do Paraná, por
exemplo, criou um Código Florestal. A Lei no 706, de 1o de abril de 1907, já estabelecia como
de “utilidade pública” as “florestas protetoras”, conceituando-as como aquelas que influem:
sobre a manutenção das terras nas montanhas e encostas; sobre a defesa do solo contra os
transbordamentos de rios, córregos e torrentes; sobre a existência e a conservação das nascentes
e dos cursos de água; e “sobre a hygiene [sic] e salubridade públicas”, as quais eram proibidas de
ser convertidas em “campos”, salvo para a “exploração usual” ou com prévio “consentimento do
Governo”. Essa restrição tem, por sua vez, dois objetivos. Em primeiro lugar, ela busca melhorar
a produção madeireira ao incentivar a substituição de floresta nativa, áreas de campos, prados
ou pastagem por florestas “de madeira de lei”, autorizando o poder público a conceder prêmios
a tais proprietários, além de definir o período de corte e o diâmetro mínimo das árvores. Em
segundo lugar, a conservação da floresta era postulada como um fator de “defeza [sic] do solo
e um dos principais elementos da salubridade pública” (Martins, 1944, p. 103 e 104).
Em plena belle époque, intelectuais maravilhados com a capacidade técnica humana,
materializada nas máquinas que invadiam seu cotidiano, podiam acompanhar o deslumbre
com o “progresso” e pensar o ambiente como algo simples, em que a ingerência humana
era quase ilimitada. Qualquer norma instituída sob esse pensamento reduziria a natureza à
dimensão da produção, seja de madeira, seja do que se chama hoje de serviços ambientais,
como a proteção do solo6. Assim, mesmo sendo pouco restritivo e voltado para a racionali-
zação do uso econômico da terra, segundo Romário Martins, o Código Florestal paranaense
“ficou constituindo mera decoração da legislação” ao manter-se subjugado aos interesses das
elites locais (Martins, 1944, p. 101).

6 Se nesse momento Martins era capaz de fazer grandes elogios aos madeireiros paranaenses, no final de sua vida, em
1944, ele já tecia severas críticas à “pseudo indústria das serrarias” por sua devastação florestal, em uma retórica que lembra os
catastrofistas ambientais do terceiro quartel do século XX. Ver: CARVALHO, M. M. X, 2006. Um bom exemplo de como a
“crítica ambiental” desloca lentamente, no século XX, a causa dos “problemas ambientais” e consequentemente suas críticas do
“atraso” (as populações ditas hoje tradicionais e as práticas de gestão comunitárias) para o “progresso” (a indústria e o modo de
vida moderno).

13
III - A BUSCA DA MODERNIZAÇÃO DO CAMPO
DURANTE A ERA VARGAS (1930-1964)

A década de 1930 foi marcada pelo abandono do liberalismo, presente na Primeira Re-
pública, pelo golpe de estado, que levou ao poder Getúlio Vargas, e pela realização de reformas
modernizadoras que culminaram com a instituição do Estado Novo, em 1937. Durante esse
período, tornavam-se evidentes os efeitos negativos da desregulação do setor florestal, ocorrido
nas décadas anteriores. De acordo com o jurista Osny Pereira, o conceito liberal do direito de
propriedade absoluto contribuiu para o caos no setor madeireiro e para o grande desperdício de
madeiras nobres (em particular nas florestas de araucária) (Pereira, O. D, 1950, p.130).
A centralização política e a adoção de medidas de industrialização possibilitaram a conso-
lidação de regras de proteção e a forma de uso das florestas no âmbito federal. Foi nesse contexto
que, juntamente com os códigos de Águas e de Caça, foi promulgado o Código Florestal, por
meio do Decreto no 23.793, de 23 de janeiro de 1934. Indo frontalmente contra a posição libe-
ral até então prevalente, o primeiro código justificava a necessidade de limitações ao direito de
propriedade ao definir as florestas como “bem de interesse comum” (art. 1o) e estendia a proteção
florestal às demais formas de vegetação, reconhecidas como de utilidade às terras que revestem
(art. 2o). O primeiro Código Florestal classifica as florestas em quatro tipos:

1 - Protetoras, que, por sua localização, sirvam, conjunta ou separadamente, para qualquer
dos fins seguintes: a) conservar o regime das águas; b) evitar a erosão das terras pela
ação dos agentes naturais; c) fixar dunas; d) auxiliar na defesa das fronteiras, de modo
julgado necessário pelas autoridades militares; e) assegurar condições de salubridade
pública; f ) proteger sítios que, por sua beleza natural, mereçam ser conservados; e
g) asilar espécimes raros da fauna indígena;
2 - Remanescentes, que são aquelas que formam parques ou assemelhados;
3 - Modelo, que são “as artificiais constituídas apenas por uma, ou por limitado número de
essências florestais, indígenas ou exóticas, cuja disseminação convenha fazer-se na região”;
4 - todas as demais florestas eram consideradas de rendimento.

Ao analisar o debate “sobre o meio ambiente” na década de 1930, Zélia da Silva aponta,
por exemplo, que, na Constituição brasileira de 1937, a natureza é abordada “sob duplo enfoque:
enquanto monumento e, também, a partir de dispositivos que a subordinam à ordem econômica”
(Silva, 2005, p. 188). Dessa forma, a conservação da natureza “evoca um passado” e, enquanto tal,
se liga “ao poder de perpetuação” (Silva, 2005. p. 183). Por isso, essas leis podem ser entendidas
como conservacionistas, tomando tal termo como um tipo ideal (McCormick, 1992, p. 63-64).
Além disso, o Código Florestal de 1934 era parte do esforço do Estado em modernizar e buscar
a ordenação territorial. Consequentemente, a ação de explorar a floresta, onde e de que tipo de

14
floresta deveria existir, não poderia mais ser deixada nas mãos da iniciativa privada e, sim, deveria
ser regulada pelo Estado. Sendo assim, a legislação aprovada nesse período:

negava o direito absoluto da propriedade, proibindo, mesmo em propriedades


privadas, o corte de árvores ao longo de cursos d’água, árvores que abrigavam espé-
cies raras ou que protegiam mananciais. O Código de Águas, no mesmo sentido,
retirava dos proprietários o controle da água que fluísse através de suas propriedades.
Foi uma rejeição histórica do liberalismo e uma reversão para o controle estatal,
abafado desde os primeiros dias do império, mas agora revivido sob a bandeira de
um nacionalismo modernizante e tecnocrata (Dean, 1996, p. 275-6).

Todavia, o primeiro Código Florestal não era tão rigoroso com a propriedade privada
como aparentava à primeira vista. Seu foco era manter a cobertura florestal e não exatamente
as florestas. Isso se expressa na denominação de “modelo” às florestas artificiais, que hoje o
movimento ambiental chamaria de “desertos verdes”. Ou, ainda, no tratamento especial dado à
Mata de Araucária, com grande presença no Rio Grande do Sul, em Santa Cataria e no Paraná,
identificadas, então, como o único tipo florestal “homogêneo”, e de maior lucratividade do
Brasil. Nesses casos, o primeiro código previa que “o corte far-se-á de forma a não abrir clareiras
na massa florestal”7, ou seja, “não admitia, portanto, o corte raso. E no parágrafo único ficava
estabelecida a inadmissibilidade do uso das terras das florestas homogêneas para outro que não
o do reflorestamento, significando na prática que a área da floresta homogênea não poderia ser
reduzida” (Bohn, 1990, p. 139-140).
As demais áreas florestais do Brasil, que são, na maioria, heterogêneas, foram classificadas,
no Código Florestal de 1934, como de “rendimento”. Como se reconhecia que a exploração da
madeira dessas áreas era relativamente pouco rentável, permitia-se o corte raso de até 75% delas,
tendo em mente a sua substituição por atividades agropecuárias (Pereira, O. D, 1950, p.140). Além
disso, mesmo nas áreas protegidas pelo Decreto nº 23.793, de 23 de janeiro de 1934, era permitido
o desmate caso o proprietário se comprometesse a substituir a cobertura vegetal por florestas homo-
gêneas plantadas. Sendo assim, enquanto as florestas homogêneas deveriam ser “substituídas por
mudas da mesma espécie ou de outra essência florestal julgada preferível”, na floresta heterogênea
“a substituição poderá ser feita por espécie diferente das abatidas, visando a homogeneidade da
floresta futura e a melhoria da composição florística” (grifo nosso)8. A floresta melhorada era a floresta
controlada e produtiva, produzida pelos conhecimentos científicos da silvicultura.
O primeiro código permitia que um proprietário cortasse madeiras valiosas dentro de
florestas heterogêneas, contanto que ele replantasse a área ao deixar nascer capoeira em seu lugar.
Os tribunais muitas vezes permitiram a venda de frações da terra desenvencilhadas das obriga-
ções de manutenção de 25% de floresta. Desse modo, um proprietário poderia vender sua área
florestal (25% do imóvel) para um terceiro, que por sua vez poderia desmatar 75% de sua área

7 Brasil, Decreto nº 23.793, de 23 de janeiro de 1934, artigo 49.


8 Brasil. Decreto nº 23.793, de 23 de janeiro de 1934, artigo 50.

15
recém-adquirida, reduzindo, na prática, a área protegida. As florestas protetoras também estavam
em grande parte desprotegidas, visto que a norma não estabelecia regras para a definição das Áreas
de Preservação Permanente (APPs) às margens dos rios e lagos, e o Ministério da Agricultura não
regulamentou o assunto. O governo também não dispunha de recursos suficientes para criar a
Polícia Florestal, prevista no decreto, ficando a fiscalização a cargo do poder local e do interesse
dos latifundiários. E, ainda, de modo similar aos projetos de lei sobre licenciamento atualmente
em curso, o código permitia o desmate sem consentimento formal do governo, caso os órgãos
competentes demorassem mais de 30 dias para se manifestar (Dean, 1996, p. 277-8).
Nesse período de edição e vigência do Código Florestal de 1934, nascia o ativismo am-
biental brasileiro, com a fundação de organizações da sociedade com cunho conservacionista, a
exemplo da Sociedade de Amigos das Árvores, fundada em 1931, e da Sociedade de Amigos da
Flora Brasílica, em 1939 (Franco e Drummond, 2010). Contudo, destacam os autores, o discurso
conservacionista aglutinou-se apenas a partir do primeiro boletim da Fundação Brasileira para
Conservação da Natureza (FBCN, fundada em 1958, no Rio de Janeiro), de 1966, posteriormente
à edição do Código Florestal de 1965.

Código Florestal de 1934: uma ideia fora do lugar?

Drummond (1998–1999, p. 127), ao analisar uma “série relativamente longa de leis, decretos e
regulamentos de caráter ambiental, emitida pelo Governo Federal brasileiro entre 1934 e 1988”, constata
que a “legislação ambiental”, constituída no século XX, principalmente no período 1970-1990, formou
uma ampla e “moderna legislação ambiental” mas que sofria do mal de não ser cumprida. E afirma que
ambientalistas “inativos e governantes irresponsáveis formariam [...] uma combinação capaz de fazer
toda a nossa legislação ambiental parecer como muitas outras leis brasileiras – são as mais avançadas do
mundo, mas ‘não pegam’...” (Drummond, 1998–1999, p. 145, grifo do autor).
Dean (1996) também coloca essa questão e postula que o Código Florestal foi influenciado
por intelectuais de classe média preocupados com o impacto da ação humana sobre o mundo
natural. Intelectuais que, nos primeiros anos do governo Vargas, tiveram oportunidade de, como
burocratas, influenciar na legislação, com a instalação do Estado Novo (1937–1945), enquanto a falta
de democracia e os assessores militares menos sensíveis a tal problemática afastaram um pouco
o governo de tais questões (Dean, 1996, p. 272-279). Dean mostra que havia dezenas de grupos e
milhares de núcleos preocupados com árvores, pássaros, rios, entre outros, e Silva também enfatiza
que a “mobilização dessas forças seguramente interferiu nos rumos da formulação da legislação
ambiental no período inicial do governo Vargas, mesmo que alguma dessas leis nem sempre
contemplem as reivindicações dos ativistas em sua integralidade” (Silva, 2005, p. 214).
Entretanto, esses autores argumentam que tal legislação, influenciada pelos debates que
ocorriam nos Estados Unidos e na Europa, era inadequada ao contexto brasileiro. Não havia aqui
infraestrutura nem grupos de pressão para transformar a lei em prática. Seria uma ideia fora de lugar
em um momento histórico, em que o Brasil era rural, autoritário, caracterizado pela família patriarcal,

16
como formulado por Sérgio Buarque de Holanda, em Raízes do Brasil, publicado em 1936. Era
justamente a essa elite autoritária e agrária que a norma impunha obrigações.
Dean se pergunta “por que o governo fazia repetidos esforços retóricos para salvar seus
remanescentes?” (1996, p. 299).

Um dos motivos parece ser o de que estava crescendo a consciência entre os servidores
públicos de que a conservação, e mesmo a preservação da natureza era uma das
atribuições de um Estado digno. Tal como muitas outras novidades, a ideia despontava
no horizonte vinda dos mesmos países que também forneciam o modelo de
desenvolvimento econômico rumo ao qual o Estado ao mesmo tempo se empenhava.
Conservação e preservação eram duas outras atividades nas quais o Estado se engajava
para dar crédito à afirmação de que, de fato, era um Estado. Em grande parte, essas
medidas, como muitas outras que o Estado empreendia, eram, como dizia um ditado
tradicional, “para inglês ver” [...]. E as evidências mais flagrantes de atraso teriam de ser
camufladas ou negadas, para que o senso de superioridade dos estrangeiros não se
tornasse hostil e intervencionista [sic] ou, ainda pior, indiferente. (Dean, 1996, p. 299)

Aplicando-se as discussões tecidas por Roberto Schwarz no ensaio As ideias fora do lugar9, nas
quais se analisa o contexto histórico para a formulação da crítica literária, é possível afirmar que o
Decreto no 23.793, de 1934, era uma norma fora do lugar? Apesar da pouca eficácia dessa lei apontar
na direção de uma resposta afirmativa, não se pode menosprezar um aspecto desse argumento: o
poder simbólico de tal legislação tinha advindo do seu aspecto de “modernizadora” e, provavelmente,
foi um dos fatores que a fez ser aprovada pelos legisladores.10
Se, por um lado, for correto que em tal legislação apareçam posições que podem ser
classificadas como preservacionistas (que tinham aspectos para além da busca de maximização da
produção), por outro era uma legislação profundamente marcada pelo “produtivismo” (Carvalho,
E. B, 2008, p. 132), que visava a regular as relações humanas com florestas e rios, entre outros. O
que, todavia, não modifica o fato de tal legislação ter sido amplamente ignorada e de terem faltado
recursos e vontade para efetivar grande parte dos seus preceitos. Contudo, não foi uma legislação
inócua, pois, quando analisamos para além da letra fria da lei, percebemos como diferentes grupos
sociais e instituições, dentro e fora do Estado, se apropriaram da legislação florestal, em especial para a
gestão florestal e a disputa por apropriação de recursos naturais.11

9 Schwarz, 1977 (2012). Importante citar seus trechos iniciais: “Toda ciência tem princípios, de que deriva o seu sistema. Um
dos princípios da Economia Política é o trabalho livre. Ora, no Brasil domina o fato ‘impolítico e abominável’ da escravidão. [...]
Este argumento – resumo de um panfleto liberal, contemporâneo de Machado de Assis – põe fora o Brasil do sistema da ciência.
Estávamos aquém da realidade a que esta se refere; éramos antes um fato moral, ‘impolítico e abominável’.”
10 Outros defenderiam que a legislação florestal de 1934 é uma ideia “no lugar”, posto que está de acordo com o uso da lei na
cultura política brasileira (Carvalho, E. B, 2008, p. 161).
11 Por exemplo, no Paraná, em meados do século XX, o Código Florestal foi utilizado pelo governo estadual para excluir
camponeses do acesso à terra, enquanto permitia uma ampla especulação imobiliária; ao mesmo tempo em que a legislação florestal
era usada por lavradores para justificar a sua posse e, portanto, seu direito ao acesso à terra (Carvalho, E. B, 2016. p. 417-442).

17
IV - CONSERVAÇÃO FLORESTAL E NACIONALISMO
DURANTE O REGIME MILITAR (1964-1979)

A necessidade de uma nova norma florestal

O governo Getúlio Vargas estabeleceu limites à propriedade rural por meio do Código
Florestal, mas ao mesmo tempo incentivou a colonização desordenada do interior com políticas
como a “Marcha para o Oeste”. Desse modo, o código não conseguiu proteger de modo efetivo
nem mesmo as florestas homogêneas de araucária, que eram tratadas de modo particularmente
rígido. Por isso, nas décadas que se seguiram à promulgação do Código Florestal de 1934,
ficaram mais evidentes a ineficácia do código vigente e a necessidade de aprimorar a regulação
do uso do solo.
Foi nesse contexto que o governo criou, em 1941, o Instituto Nacional do Pinho (INP,
1941-1970), órgão oficial voltado à criação de políticas florestais, percursor do Instituto Brasileiro
de Desenvolvimento Florestal (IBDF, 1970-1989) e, posteriormente, do Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama, 1989-presente). De modo a
fornecer subsídios para o aprimoramento do Código Florestal, o INP solicitou “ao eminente juiz
de direito” Osny Pereira Duarte, a elaboração de um estudo sobre a legislação florestal brasileira
comparada às leis da França, da Alemanha, da Finlândia e de outros países tidos como exempla-
res nessa questão. Logo no prefácio da obra, publicada em 1950, o presidente do INP, Virgílio
Gualberto, lamenta que “as poucas leis florestais existentes [no Brasil] teimam em permanecer
no papel por falta de apoio e opinião pública indispensáveis ao seu respeito e à sua aplicação”.
Ele também ataca duramente a tendência dos agricultores e pecuaristas de verem a floresta como
um empecilho a ser destruído sem considerar as consequências a longo prazo, que vão além da
falta de madeira e da perda de fertilidade dos solos:

Cada um de nós vive o drama das terras cansadas e esgotadas e os nossos homens
de 50 a 60 anos testemunham a diferença no clima das áreas onde passaram a sua
meninice. [...] E começam a surgir grandes tragédias, como a de Volta Grande, em
Minas Gerais: morros que desabam e soterram povoados. (Pereira, 1950, p. IX-XV)

A proposta de um novo código era discutida no mesmo momento em que o exercício


do direito de propriedade passa a ser condicionado ao bem-estar social, com a promulgação
da Constituição de 194612. Embora já houvesse traços dessa questão na Constituição de 1934,
efetivamente, a expressão “função social da propriedade” somente apareceu na Constituição de
1967, apenas dois anos depois da edição do então novo Código Florestal.

12 Artigo 147 da Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946.

19
Em 1961, foi instituído um grupo de trabalho para elaboração da Lei Florestal13, composto
por Osny Pereira, como coordenador, Alceo Magnanini, agrônomo pioneiro na área de biogeografia,
e mais quatro autoridades no tema florestal14. Com a renúncia do Presidente Jânio Quadros, os
trabalhos foram interrompidos e retomados em 1962, com o ingresso de um especialista no grupo
de trabalho, Victor Farah, primeiro diretor executivo da Fundação Brasileira para a Conservação
da Natureza, organização ambientalista pioneira no país. Cada item foi estudado profunda e
exaustivamente, com pesquisas de campo, análise de legislações estrangeiras, consultas, debates,
até se alcançar o consenso no grupo após dois anos de trabalho (Magnanini, 2010).
Com o golpe militar em 1964, o tema florestal, juntamente com a integração territorial
da Amazônia, voltou a ganhar prioridade. Em consequência disso, Castelo Branco abraçou o
resultado do grupo de trabalho, enviando o texto para o Congresso Nacional em junho de 1965.
Na Exposição de Motivos (Brasil, Exposição de Motivos, nº 29-65, 1965) do projeto que propõe
o novo código florestal, fica claro o alinhamento entre o grupo de trabalho e os objetivos do
Ministério da Agricultura. O ministro da Agricultura, Hugo Leme, tece elogios ao novo texto
de lei e faz um paralelo entre as leis prediais, que buscam manter a salubridade ao estabelecer
áreas de ventilação, e a necessidade de respeitar os limites da própria natureza para garantir a
produtividade agrícola futura. Além disso, afirma que é imprescindível a aprovação de leis mais
rígidas, pois “ou impõe-se a todos os donos de terras [a obrigatoriedade de] defenderem à sua
custa a produtividade do solo, contra a erosão terrível e crescente, ou cruzam-se os braços, ante
a incapacidade, pela pobreza do poder público, na maioria dos Estados do Brasil, para deter a
transformação do país num deserto” (Brasil, Exposição de Motivos, nº 29-65, 1965).
O projeto foi bem recebido pelo Congresso, inclusive pelos setores que tradicionalmente
representam os interesses rurais. Exemplo disso é a afirmação proferida pelo deputado do
Amazonas, João Veiga, na plenária de apresentação do projeto, em nome “daqueles deputa-
dos que representam a Amazônia nesta Casa”. Veiga declarou que, ao trazer medidas mais
restritivas contra o desmatamento, o “novo Código Florestal brasileiro só poderá beneficiar o
Estado que tenho a honra de representar”. Na sequência, o deputado Wilson Chedid, eleito
pelo Paraná, elogiou a proposta como meio de proibir a agricultura predatória, que se utiliza
da “derrubada e da queima de matas, sem indagar se elas eram necessárias à conservação e à
fertilidade do solo ou do regime das águas” (Congresso Nacional, 1965, p. 5.305). Poucas
semanas depois, a Comissão de Agricultura e Política Rural da Câmara dos Deputados também
se pronunciou favoravelmente ao novo código, ao apresentar dados que apontavam para o

13 Memorando Presidencial G.P. / M. A. número 42, de 5 de abril de 1961, que ratificou a preposição número 4 do Senhor
Governador do Estado de São Paulo, aprovada na 4ª Reunião de Governadores realizada no Estado da Guanabara.
14 Adelmy Cabral Neiva, advogado, professor de Direito Internacional Público e Direito Comparado e procurador do
Instituto Nacional de Imigração e Colonização; Alceo Magnanini, engenheiro agrônomo, botânico do Ministério da Agricultura
e chefe do setor de Ecologia Florestal do Centro de Pesquisas Florestais e Conservação da Natureza do Estado da Guanabara
e conselheiro do Conselho Florestal Federal; Bernardo Pain, advogado e consultor jurídico substituto da Consultoria Jurídica
do Ministério da Agricultura; Henrique Pimenta Veloso, engenheiro agrônomo do Ministério da Saúde e chefe da Secção de
Ecologia do Instituto Oswaldo Cruz; Roberto de Mello Alvarenga, diretor do Serviço Florestal e vice-presidente do Conselho
Florestal do Estado de São Paulo; Osny Duarte Pereira, magistrado do Estado da Guanabara e autoridade mundialmente
reconhecida em direito florestal (presidente e coordenador do Grupo de Trabalho); e Victor Abdennur Farah, engenheiro
agrônomo, presidente do Conselho Florestal Federal.

20
rápido esgotamento das florestas brasileiras e para a expectativa de falta de madeira no futuro.
Inspirada no trabalho comparativo de Osny Pereira, a comissão afirmou que a então nova lei
colocaria o Brasil no mesmo patamar de países mais desenvolvidos, visto que “França, Itália,
Finlândia, proíbem expressamente a desmatação [sic]. Outros toleram-na mediante rigoroso
condicionamento, como Alemanha, Estados Unidos e México” (Câmara dos Deputados, 1965,
p. 30, dossiê p. 152). O parecer do deputado Ivan Luz, relator da Comissão de Constituição
e Justiça, foi ainda mais longe, ao avisar o que aconteceria se a nova lei não fosse aprovada:
“gerações não perdoarão, num futuro próximo, a nossa incúria e criminosa omissão” (Câmara
dos Deputados, 1965, p. 15, dossiê p. 137). Em suma, se desenhou no Congresso Nacional
o argumento de que se opor à aprovação do novo código implicaria também em defender de
forma antipatriótica a agropecuária predatória e a dilapidação do património natural do país
na forma de suas florestas, seus solos e seus recursos hídricos. Ao mesmo tempo, a adoção de
regras mais restritivas contribuiria para o plano de modernização do país, iniciado por Vargas
e que ganhara novo fôlego no período militar.
Mesmo defendendo a necessidade de uma nova norma, as dificuldades em sua im-
plantação já eram imaginadas, como bem demonstrou em seu discurso o deputado Oswaldo
Lima Filho, apontando o não atendimento ao Código Florestal de 1934 (Congresso Nacional,
1965, p. 5.371):

Nunca tivemos doutrina florestal, nem opinião pública interessada nos problemas
florestais. Este é um país em que o desprezo mais completo e cabal pesa sobre a flora e
os recursos naturais da nação. É país onde se pesca a dinamite e a timbó, extinguindo a
fauna. É país onde as queimadas constituem forma de cultura a mais primitiva, aquela
que data do homem do neolítico.

Contudo, via-se como urgente a alteração normativa, posto que a devastação florestal,
a perda da fertilidade dos solos e a degradação dos recursos hídricos eram atribuídas ao avanço
desordenado das atividades agrícolas. O objetivo, nas palavras dos próprios parlamentares, era
a perpetuidade da produtividade agrícola e pecuária, bem como a manutenção do suprimento
madeireiro, por meio da conservação do solo e da água.

Introduzindo as Áreas de Preservação Permanente (APPs)

Após apenas três meses de tramitação no Congresso Nacional, foi aprovada e sancio-
nada a Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965, que instituiu o novo Código Florestal. O
Código Florestal de 1965 fortaleceu diferentes aspectos da legislação anterior, ampliando
assim o conceito de florestas como “bens de interesse público”. Além disso, o novo código
fornecia regras precisas para o estabelecimento de Áreas de Preservação Permanente (APP)15.

15 Artigo 2º da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965.

21
Em particular, as APPs deveriam ser estabelecidas de acordo com a largura do rio, além de
proteger as áreas ao redor de lagoas, nascentes, topo de morros, encostas, restingas e áreas
com altitude superior a 1.800 metros. Esse alto nível de detalhamento é crucial, visto que,
de acordo com os relatores da então nova lei, a efetividade insatisfatória do primeiro Código
Florestal deu-se, em grande parte, pela necessidade de se definir, via decreto do Ministério
da Agricultura, as florestas protegidas em todo o território nacional. Com a alteração trazida
pelo Código Florestal de 1965, o poder público contava com critérios para a fiscalização no
nível da propriedade, sem a necessidade de recorrer a mapas que indicassem a localização
das APPs, realizados pelos órgãos oficiais.
Contudo, após a rápida aprovação do novo código, Castelo Branco realizou alguns
vetos que enfraqueceram a efetividade da nova lei. Em particular, retirou o artigo 26, que
estabelecia pena de três meses a um ano de prisão ou multa para quem desmatasse; e o artigo
40, que oferecia isenção do imposto da renda provinda de florestas plantadas. O balanço final
da precisão das normas, entretanto, era positivo.
O fortalecimento da função social da propriedade foi ampliado, com o estabelecimento
de limites internos e positivos à atuação do proprietário. Contrastando com o código anterior,
os proprietários perderam o direito à indenização pela limitação ao uso de APPs, mesmo que
a recuperação da área fosse realizada pelo poder público. Tal determinação foi defendida na
Exposição de Motivos pelo Ministro da Agricultura, Hugo Leme (Brasil, 1965a, p. 4.156):

[S]e o Poder Público pode criar restrições ao uso da propriedade, que dizer daquelas
que são impostas pela própria natureza, antes da existência daquele Poder?

Assim como certas matas seguram pedras que ameaçam rolar, outras protegem
fontes que poderiam secar, outras conservam o calado de um rio que poderia
deixar de ser navegável, etc. São restrições impostas pela própria natureza ao uso
da terra, ditadas pelo bem-estar social. Raciocinando deste modo os legisladores
florestais do mundo inteiro vêm limitando o uso da terra sem cogitar de qualquer
desapropriação para impor suas restrições ao uso. Fixam-nas em suas leis, como
um vínculo imposto pela natureza e que a lei nada mais fez do que declará-lo exis-
tente. O anteprojeto seguiu a regra internacionalmente aceita. A função protetora
da floresta não é restrição indenizável, mas decorrência da própria natureza que
preparou terras mais úteis e outras menos. É como se uma lei declarasse que as
terras roxas podem produzir café. A lei que considera de preservação permanente
as matas nas margens de um rio está apenas dizendo, mutatis mutandi, que um
pantanal não é terreno adequado para plantar café.

No mesmo sentido, o relatório da Comissão de Agricultura e Política Rural (CAPR), de


autoria de Newton Carneiro, advogado, deputado federal pelo Paraná e presidente do IBDF de
1970 a 1971, afirma que:

22
Na realidade, a ação preservadora do Poder Público se viu frustrada, nestes últimos
decênios, com a exigência da indenização, que o Código em vigor consigna em
seu capítulo II.
...A França adotou-a no princípio do século passado, quando pôs em vigor o Có-
digo Florestal de 1827. Curioso, aliás, que por mais de cem anos, isto é, até 1935,
nenhuma compensação fiscal ou de outra sorte era oferecida aos proprietários pela
manutenção das florestas, critério que só se modificou pela necessidade de estimular
as atividades silvicultoras (Câmara dos Deputados, 1965, p. 5, dossiê p. 104).

É importante notar que ambas as questões tratadas em 1965 como fragilidades e causas
de não implantação do Código Florestal de 1934, ausência de determinação clara dos limites
das APPs e determinação de indenização pelo não uso econômico dessas áreas atualmente são
apontadas como deficiências da nova Lei Florestal de 2012. Tal fato evidencia a necessidade de
conhecimento histórico das alterações legais antes da proposição de novas alterações.

Estabelecendo o precursor da Reserva Legal

Como na versão anterior, o Código Florestal de 1965 continua a destinar um trata-


mento especial às florestas de alto valor econômico e a vedar o desmatamento em corte raso
das florestas homogêneas, sendo permitida somente a “exploração racional destas, observadas
as prescrições ditadas pela técnica, com a garantia de permanência dos maciços em boas
condições de desenvolvimento e produção”16. Para essa finalidade, o Código Florestal de
1965 define um regime de utilização limitada do imóvel rural, com vistas a manter um
percentual mínimo de cobertura arbórea, cujas caraterísticas correspondem ao que a Lei
no 7.803, de 1989, veio a denominar “Reserva Legal”. O então novo Código Florestal alterou o
percentual de vegetação arbórea a ser mantida em cada propriedade de 25% para 20% na maior
parte do território nacional. Ao mesmo tempo, nas “áreas ainda incultas, sujeitas a formas de
desbravamento, nos trabalhos de instalação de novas propriedades”, o limite do desmate em
corte raso foi estabelecido em 50% do imóvel17, o que implica em uma distinção entre as áreas
já consolidadas e aquelas para além da fronteira agrícola, o que se aplica a qualquer bioma.
Especificamente no caso da Amazônia, a nova lei limitou o desmate em corte raso em
50% do imóvel. Além disso, estabelece que “fica proibida a exploração sob forma empírica
das florestas primitivas [...], que só poderão ser utilizadas em observância a planos técnicos de
condução e manejo”, com critérios a serem definidos no prazo de um ano18. Enquanto essas
regras de exploração sustentável não seriam regulamentadas pelo executivo, foi definido nas
disposições transitórias que na “região Norte e na parte norte da região Centro-oeste” somente

16 Artigo 16, alínea c, da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965.


17 Artigo 16, alínea c, da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965.
18 Artigo 15 da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965.

23
50% da área das propriedades poderão sofrer exploração a corte raso19. Desse modo, acabou
perdurando a interpretação de que as áreas que viriam a ser conhecidas como Reserva Legal
na Amazônia devem ser de, no mínimo, 50%.
É possível identificar três fatores principais que fundamentavam o estabelecimento
de uma Reserva Legal mais extensa na Amazônia e nas “áreas incultas”. Em primeiro lugar, a
partir dos anos 1950, as florestas nativas da Amazônia passaram a ser vistas como um recurso
econômico importante e que demandavam uma gestão racional. Entre o final do século XIX
e as primeiras décadas do século XX, o látex extraído da seringueira (Hevea brasiliensis) e do
caucho (Castilla ulei) para produção de borracha era o principal motor da economia da região.
Porém, com o sucesso das plantações de seringueira no sul da Ásia a partir de sementes roubadas
pelo governo britânico no início do século, o produto brasileiro perdeu competitividade no
mercado internacional. Durante a Segunda Guerra, houve um ressurgimento da economia da
borracha, porém, com o restabelecimento das rotas comerciais asiáticas e a criação da borracha
sintética, “deixara de ser remuneradora sua produção silvestre e encontrou-se a Amazônia com
a grande crise” (Bonfim, 1953, p. 7-8).
Foi nesse contexto que o governo brasileiro criou, em 1953, a Superintendência do
Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA) e pediu o auxílio da Organização para
Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO) para a realização de uma série de estudos
para identificar alternativas de desenvolvimento rural no país, com foco no setor florestal. Uma
das principais atividades na colaboração com a FAO foi a avaliação do potencial econômico da
produção madeireira na Amazônia. Desse modo, durante a década de 1950, foram instalados
centros experimentais de produção madeireira no Amapá e no Pará e foram realizados grandes
inventários florestais em uma área de 15 milhões de hectares na região entre os rios Tapajós e Xingu
(Heinsdijk, 1957; Day, 1960). Apesar da preocupação em estudar e utilizar de modo sustentável
os recursos florestais da Amazônia, esses projetos tinham um viés claramente produtivista. Isso
fica claro em um estudo da FAO para o governo brasileiro:

Soube-se por muito tempo, e foi confirmado por recentes pesquisas, que o
valor da produção madeireira de florestas nativas da Amazônia não pode ser
superestimado. Em primeiro lugar, o solo onde elas crescem é muito pobre, e
as partes com solos mais ricos devem ser reservadas para a agricultura. Além
disso, os conjuntos de espécies são tão misturados que a exploração de grandes
quantidades homogêneas de madeira da mesma espécie (ou grupos de espécies)
encontra dificuldades insuperáveis. Consequentemente, é importante encontrar
modos para melhorar o povoamento florestal, para dar a elas uma melhor
composição, para torná-las mais homogêneas. Esse é principalmente um pro-
blema de silvicultura, onde a definição se esse resultado deva ser alcançado pelo
melhoramento da floresta primária ou por plantações de árvores é uma questão
de importância secundária. (Drees, 1957, tradução nossa)

19 Artigo 44 da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965.

24
Sendo assim, o estabelecimento da Reserva Legal em 50% visava ao maior rendimento
econômico da floresta, mesmo que isso significasse a transformação da floresta nativa hete-
rogênea em florestas plantadas homogêneas. Para isso, bastava assinar, diante da autoridade
competente, um “termo de obrigação de reposição e tratos culturais”20, que então ficaria confi-
gurada a presença de uma “exploração racional” das florestas perante a lei. Essa lógica também
deveria estar na base das ações de “educação florestal”, com o objetivo de ressaltar o “valor das
florestas, face aos seus produtos e utilidade, bem como sobre a forma correta de conduzi-las e
perpetuá-las” em programas de rádio e TV21. Ou seja, a forma correta de conduzir a floresta
era, sem dúvida, explorando-a e a forma de perpetuá-la era replantando e, assim, “melhorando”
a caótica floresta (Bohn, 1990, p. 144).
O segundo motivo para a proibição do corte raso de 50% das áreas do norte do Brasil
tem relação com o projeto de integração econômica enquanto meio para garantir a integralidade
territorial do país. A região amazônica apresenta uma tumultuada história de conflitos entre
Portugal (e posteriormente Brasil), Espanha, Reino Unido, França, Holanda e, mais recen-
temente, Estados Unidos pelo domínio territorial da região. Esses traumas históricos foram
reavivados nos anos 1950, quando diferentes atores internacionais levantaram argumentos de
caráter neomalthusianos sobre a importância da internacionalização da Amazônia para produzir
alimentos para um planeta faminto. Em resposta a essas investidas, o ex-superintendente do
SPVEA (1953-1955) e então governador do Amazonas (1964-1967), Arthur Cezar Ferreira
Reis, argumenta que:

As pressões demográficas, as pressões da fome, as pressões do interesse econômico


em torno das matérias-primas regionais podem conduzir a soluções profunda-
mente humilhantes para o Brasil. Os perigos que rondam a Amazônia entram
pelos olhos da cara. Não afirmamos sem fundamento. (Reis, 1965, p. 213)

No contexto de uma política que buscava “integrar para não entregar” a Amazônia a outras
potências mundiais, era importante estabelecer um modelo de colonização que maximizasse a
área ocupada por um número relativamente pequeno de colonos. Assim, a legislação florestal,
que proibia o corte raso de 50% da floresta, permitia que áreas maiores fossem legalizadas e
incorporadas ao controle territorial privado (Siqueira, 2009).
Um terceiro e último fator está ligado à tentativa de extinguir práticas agropecuárias
tidas como predatórias. A partir dos anos 1930, surgiu no Brasil um intenso debate sobre
a relação entre a herança colonial portuguesa e a possibilidade de o país alcançar o nível de
desenvolvimento dos Estados Unidos da América e do Canadá, nações também jovens, porém
já destacadas em termos econômicos. Por exemplo, Holanda e Prado Junior argumentam
que a história do Brasil foi caracterizada por um processo de colonização voltado para a
exploração descontrolada e a exportação de recursos naturais e bens agrícolas de baixo valor

20 Artigo 19 da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965.


21 Artigos 42 e 43 da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965.

25
agregado (Prado Júnior, 1994; Holanda, 1995). Para isso, bastava aos colonos adotar a agri-
cultura primitiva, que faz uso intenso do fogo e que prefere desmatar novas áreas a manter a
fertilidade dos solos a partir de práticas em uso na Europa, consideradas mais sustentáveis.
Sendo assim, a restrição ao desmatamento era uma forma de superar a agropecuária colonial
e forçar o país a adotar práticas mais modernas que conservassem e fizessem uso sustentável
das áreas já desbravadas.

A perda de relevância econômica do Código Florestal

Ao discutir os efeitos do Código Florestal de 1965, diferentes autores argumentam que a


lei não foi implementada de forma efetiva por falta de vontade política e a influências ruralistas
no governo (Drummond, 1998-1999, p. 130). Porém, essa ideia não leva em consideração mu-
danças importantes que ocorreram na agricultura e na silvicultura nas décadas que se seguiram.
Primeiramente, enquanto o novo Código Florestal surge de uma preocupação com a falta de
madeira para o mercado nacional, a crescente demanda por madeira foi suprida de outra forma.
A produção de madeira das plantações de eucalipto, que no início dos anos 1960 não superava
os 5 m3/ha, com melhoramentos genéticos e manejo, atingiu 30 m3/ha nos anos 1990 (Carvalho,
Silva e Soares, 2012). Sendo assim, após algumas décadas de promulgação do novo código, ficava
cada vez mais distante a necessidade de manutenção da vegetação arbórea para suprir o mercado
interno brasileiro com produtos florestais nativos.
O segundo ponto concerne ao surgimento da Revolução Verde a partir dos anos 1950,
pois a agricultura brasileira, que por séculos foi predominantemente dependente da fertilidade
gerada pelo manejo do solo e pela queima de biomassa, passa a ser dependente dos produtos
provenientes da indústria de agroquímicos. Apesar de técnicas de enriquecimento dos solos e
irrigação terem existido por milênios, a introdução de novas tecnologias agrícolas produziu uma
grande transformação na percepção da relação entre a produção agrícola e o meio ambiente.
Em particular, enquanto antes havia um reconhecimento maior entre os promotores da agri-
cultura sobre a importância da vegetação nativa para a proteção e a regeneração dos solos, com
a Revolução Verde surge um entendimento equivocado de que a produção não depende da boa
gestão dos recursos naturais já presentes na propriedade. Na perspectiva do setor, a necessidade
de proteção de florestas, solos e água foi substituída em parte por insumos minerais e derivados
do petróleo e pelo uso de maquinário pesado e infraestruturas de captação e irrigação (Mitchell,
2011, p. 140-141). Com isso, a “moderna” gestão agrícola passou a conceituar o solo como
mero “suporte” aos insumos externos, tornando menos relevante a conservação dos recursos
naturais de dentro da propriedade rural.
Em terceiro lugar, apesar de as leis florestais remontarem ao período colonial e o primeiro
código ter sido promulgado em 1934, durante esses mais de cinco séculos a legislação não se
tornou amplamente conhecida e apropriada pela sociedade. Os códigos florestais surgiram
da visão de uma elite tecnocrática, que buscava modernizar o campo através da imposição de
práticas de uso mais racionais dos recursos. Mas, mesmo sendo esse grupo ligado ao setor rural
progressista, esses tecnocratas estavam distantes da realidade rural brasileira, ainda dominada por

26
famílias tradicionais de latifundiários. E essas elites locais, por sua vez, adotavam práticas desde
o período colonial de “enclausuramento normativo”, dominada pela “autoprodução de normas
pelos proprietários da terra, assim com sua não subordinação a uma normatividade mais ampla
instaurada pelo poder político” (Avaritzer, 2008, p. 155). Sendo assim, a própria estrutural social
e econômica, estabelecida historicamente no Brasil, servia de obstáculo para o conhecimento
e a apropriação das leis florestais, sem os quais se torna impossível a implantação de qualquer
norma (Santos, 2011).
Finalmente, a dimensão geopolítica da região amazônica tornou-se mais importante do
que o uso racional dos recursos naturais da região. Ao passo que as regiões Sul e Sudeste do país
tinham uma visão mais clara sobre as florestas enquanto bem escasso cuja destruição causava
problemas como a degradação dos solos, na região Norte a visão era oposta, e a floresta era tida
como um obstáculo ao desenvolvimento (Hecht e Cockburn, 2010). Sendo assim, os órgãos vin-
culados ao Ministério da Agricultura dedicaram grande parte de sua atenção ao desenvolvimento
produtivo e à conversão da floresta em áreas agrícolas em vez de sua preservação. Ao mesmo
tempo, por causa da abundância de áreas de floresta nativa na Amazônia, os militares puderam
alcançar seus objetivos conservacionistas ao criar unidades de conservação e florestas nacionais na
Amazônia sem precisar entrar em conflito com interesses privados no resto do país (Bacha, 1993,
p. 183). Esses elementos, considerados conjuntamente, ajudam a explicar o gradual desinteresse
do Ministério da Agricultura pela implementação do Código Florestal nos anos que se seguiram
à assinatura da nova lei.

27
Os Códigos Florestais e as vegetações nativas não florestais

Atualmente, alguns juristas buscam estabelecer uma interpretação das normas florestais que
eximiria os proprietários que desmataram no Cerrado e em outros biomas com vegetação nativa
não florestal antes de 1989 de restaurarem as suas áreas. Esse argumento tem como base o artigo 68
do atual Código Florestal (Lei no 12.651, de 2012), que será discutido nas próximas seções. Tal artigo
dispensa de adequação aos limites atuais os proprietários que desmataram legalmente, segundo a
legislação vigente à época do desmatamento. Assim, são encontrados dois argumentos principais.
O primeiro deriva da inclusão do termo Cerrado na legislação nacional somente em 1989, pela Lei
no 7.803. O segundo fundamenta-se em terminologias utilizadas pelos Códigos de 1934 e de 1965,
como mattas, vegetação arbórea e florestas, visto que em algumas fitofisionomias brasileiras, seja
no Cerrado, na Caatinga, no Pampa ou no Pantanal, pode não haver vegetação arbórea, como nas
formações savânicas e campestres. Argumentam, dessa forma, que os requisitos de Reserva Legal
não seriam aplicáveis a esse bioma, dados os termos, por exemplo, do artigo 16, alínea “a” do código
de 1965, que segundo a citada interpretação apenas confere proteção aos 20% da propriedade com
cobertura arbórea. Tais argumentos não procedem, apesar de terem ganhado fôlego em governos
estaduais e entre especialistas ligados ao agronegócio.
No primeiro caso, é importante lembrar que a definição dos biomas brasileiros é uma
construção recente (Latour, 2001; Carvalho, 2015). As primeiras classificações que identificam
em escala nacional os diferentes tipos de vegetação encontrados no Brasil remontam ao século
XIX. Desde então, sucederam-se diferentes classificações, em que a Mata Atlântica (nas diferentes
nomenclaturas) variou desde uma estreita faixa no litoral até vastas áreas no interior do país.
Desse modo, foi somente no final dos anos 1980 que a divisão entre biomas, na forma atualmente
conhecida, foi definida com base no mapa do IBGE, publicado em 1988, que mostra os tipos de
vegetação brasileira no início do século XVI (Brannstrom, 2002; Castro in: Cabral e Bustamante,
2016, p. 54-82). Isso indica que separar o Cerrado da Mata Atlântica, com base na legislação
vigente em um período anterior ao estabelecimento da definição oficial dos biomas, seria um
exercício anacrônico.
Quanto ao segundo argumento, existem também evidências na própria legislação que
desconstroem o argumento de que a exigência da Reserva Legal não se aplicava à vegetação natural
não arbórea. De fato, o anteprojeto do código, publicado em 1931, deixava ainda mais clara a intenção
dos legisladores de incluir todos os biomas brasileiros, ao explicitar que “para os efeitos deste Código,
consideram-se equiparadas às florestas todas as formas de vegetação que sejam de utilidade às terras
que revestem”22. Contudo, o Código Florestal de 1934 indicava com relevo, como escopo, não só as
“florestas como as demais formas de vegetação reconhecidas de utilidade às terras que revestem” (art.
2o) (Brasil, 1934). Sendo assim, até mesmo nas regiões de Caatinga do Nordeste, “assoladas pela seca”,
o Código de 1934 estabelecia a proibição da “derrubada das [vegetações] de folhagem perene como
o juazeiro, a oiticica e outras” (art. 29, alínea c). O mesmo ponto foi destacado no art. 1o do Código

22 Diário Oficial (DO), de 23 de novembro de 1931, Seção 1, p. 8 e seguintes.

28
Florestal de 1965, que especificava como objeto de sua aplicação as “florestas existentes no território
nacional e as demais formas de vegetação”.
Negar a proteção legal conferida às vegetações naturais não arbustivas vai de encontro
ao objetivo das normas florestais que, desde 1934, buscam não só salvaguardar a produção de
madeira, mas também garantir a provisão de água e a proteção dos solos. Nesse sentido, toda
cobertura vegetal que provê serviços ambientais, no sentido moderno do termo, já estava protegida
na norma de 1934, que exigia a manutenção não de 20% da propriedade, mas de 25%23.
No mesmo sentido, o IBDF já atuava, antes de 1989, na proteção de vegetação natural,
independentemente do bioma ou de sua fitofisionomia. O órgão considerava a proteção do
percentual da área total do imóvel, e não um percentual apenas da parte com fitofisionomia arbórea.
Tal fato pode ser comprovado na Instrução Normativa no 01, de 11 de abril de 1980, que tratava das
autorizações de desmatamento e especificava claramente que, para autorizações em áreas que não
fossem florestas ou destinadas ao florestamento e ao reflorestamento, havia a necessidade de se
apresentar um croqui ou uma planta com indicação das APPs e da Reserva Legal (Loubet, 2014).
Em relação ao código de 1965, a questão já havia sido analisa por diversos julgados durante
sua vigência. À época restou definido que o artigo 16 da Lei no 4.771, de 1965, se aplica à vegetação
nativa, fosse ela arbórea ou não, conforme acórdão proferido em Recurso Especial pelo Ministro
Herman Benjamin:

A partir de tal matriz conceitual assenta-se que a Reserva Legal: a) [...] d) é espaço de
proteção da flora nativa, e não exclusivamente de floresta nativa, daí a inexatidão do
termo “Reserva Florestal Legal”, como de resto da própria denominação de “Código
Florestal “, já que o campo de aplicação do diploma, nas palavras do legislador, são as
“florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação” (Código
Florestal, art. 1°, caput, grifos do autor). (STJ, 2012, p. 10).

23 “Art. 23. Nenhum proprietário de terras cobertas de mattas poderá abater mais de três quartas partes da vegetação existente,
salvo o disposto nos arts. 24, 31 e 52.” (Brasil, 1934).

29
30
V - O MOVIMENTO AMBIENTALISTA E SEUS EFEITOS
NA LEGISLAÇÃO FLORESTAL (1979-2008)

Questões ambientais antes e durante a redemocratização

Desde a revisão do Código Florestal em 1965 até o final dos anos 1970, foram feitas
somente alterações pequenas na legislação. Durante esse período, já existiam preocupações
com os impactos locais do desmatamento na redução das chuvas e na erosão dos solos, mas
desmatamento em larga escala na Amazônia ainda não era visto como um problema público,
tanto no Brasil quanto no exterior (Keck e Sikkink, 1998). Porém, os legisladores já tinham
preocupações com o exaurimento de recursos madeireiros locais, e endureceram as penas para
o desmatamento ilegal que visasse transformar “madeiras de lei em carvão, inclusive para
qualquer efeito industrial, sem licença da autoridade competente”24. Essa medida foi particu-
larmente importante sob o ponto de vista econômico e ambiental, dado o rápido crescimento
da siderurgia e a perda da Mata Atlântica, principalmente em Minas Gerais, um problema
que ainda persiste, principalmente na produção de ferro gusa (Sonter, Barrett, Soares-Filho e
Moran, 2014).
Ao mesmo tempo, a grande mídia nacional e internacional retratava a construção da
Rodovia Transamazônica, inaugurada em 1970, e os grandes projetos de colonização da Ama-
zônia como grandes avanços da civilização, desconsiderando seus impactos ambientais (Rajão,
2011). Nesse período, incentivos fiscais e creditícios a esse desenvolvimento regional foram
os principais condutores do desmatamento nas décadas de 1970 e 1980. A região atualmente
denominada “Amazônia Legal”25 ainda não fora dotada de importância ecológica, mas era vista
como carente de desenvolvimento, o que viria com a conversão da floresta em áreas agrícolas
(Hecht e Rajão, 2020). A reação do Brasil durante a Conferência das Nações Unidas sobre o

24 Lei nº 5.870, de 26 de março de 1973.


25 A expressão “Amazônia Legal” surgiu com base no artigo 199 da Constituição brasileira de 1946, que estabelecia o plano de valorização
econômica da Amazônia, com o objetivo de desenvolver economicamente a região. Nos termos da Lei nº 1.806, de 6 de janeiro de 1953,
que regulamentava o plano, este se constituía de “um sistema de medidas, serviços, empreendimentos e obras, destinados a incrementar o
desenvolvimento da produção extrativa e agrícola pecuária, mineral, industrial e o das relações de troca, no sentido de melhores padrões sociais
de vida e bem-estar econômico das populações da região e da expansão da riqueza do País”. A região abrangida pela Amazônia brasileira, referida
pela norma, compreendia os “Estados do Pará e do Amazonas, pelos territórios federais do Acre, Amapá, Guaporé e Rio Branco e ainda, a parte
do Estado de Mato Grosso a norte do paralelo de 16o, a do Estado de Goiás a norte do paralelo de 13o e a do Maranhão a oeste do meridiano de
44o”. A expressão “Amazônia Legal” começa a ter contornos ambientais com a criação do Programa de Defesa do Complexo de Ecossistemas da
Amazônia Legal, denominado Programa Nossa Natureza, pelo Decreto nº 96.944, de 12 de outubro de 1988, com a finalidade de “estabelecer
condições para a utilização e a preservação do meio ambiente e dos recursos naturais renováveis na Amazônia Legal, mediante a concentração de
esforços de todos os órgãos governamentais e a cooperação dos demais segmentos da sociedade com atuação na preservação do meio ambiente”.
Embora o Código Florestal já dedicasse especificações pormenorizadas à região Norte e parte norte da região Centro-Oeste, desde sua versão de
1965 (Lei nº 4.771), a expressão “Amazônia Legal” somente foi trazida para o texto da Lei em 2000, pela Medida Provisória nº 1.956-50, de 26
de maio de 2000.

31
Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, em 1972, somava-se ao cenário de pouca
mobilização social em prol do meio ambiente. Ali o país defendeu o direito ao desenvolvimento
econômico e à exploração dos recursos naturais para aliviar a pobreza e alarmou que países
desenvolvidos e altamente industrializados queriam assegurar a si próprios “o delicioso desfrute
da natureza e de outros recursos naturais” que, assim, perpetuaria o subdesenvolvimento dos
demais países (Lago, 2007). Tais manifestações refletiam, portanto, a forte continuação do
desenvolvimentismo notado nos períodos anteriores.
Uma contraposição começou a surgir nos anos finais do regime militar, porém, a sua
influência na política ambiental no Brasil foi restrita. Na década de 1970, em parte alimentados
pelas preocupações ambientais surgindo nos debates internacionais, movimentos ambientais
brasileiros começam a ganhar corpo. Alonso, Costa e Maciel (2007, p. 155), por exemplo,
destacam a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), de 1971, que
adotava uma estratégia de mobilização e disseminação de informação e manifestações públi-
cas, e o Movimento Arte e Pensamento Ecológico (Mape), que “se apropriou de estratégias
expressivas e simbólicas dos novos movimentos sociais europeus”. Criadas um pouco mais
tarde, a Associação Paulista de Proteção Natural (APPN), em 1976, e a Associação Mineira
de Desenvolvimento Ambiental (AMDA), de 1978, entre outras instituições, também foram
importantes para aumentar a visibilidade das questões ambientais. Na região Amazônica, des-
pontava o movimento ambientalista liderado por Chico Mendes, que começou seu ativismo
em 1976, através de manifestações pacíficas em que seringueiros protegiam as árvores com o
próprio corpo (Revkin, 1994).
Naquele momento, contudo, os movimentos ainda não possuíam a influência política
necessária para contestar a redução das florestas brasileiras (Viola, 1988). Olhando as dinâmicas
internas desses movimentos, essa influência limitada pode ser compreendida através de dois
fatores principais. Por um lado, esses movimentos ambientalistas tinham adotado estratégias
apolíticas para promover seus interesses em conservação ambiental, os quais, por outro lado, não
possuíam uma expressão uniforme e conectada. A desorganização dos movimentos ambientais
se refletia em “alta rotatividade dos seus membros, dificuldades em estabelecer regras da casa,
e dificuldades em tornar-se autossuficientes” (Viola, 1988). Ao mesmo tempo, a dificuldade
de influenciar a política ambiental no Brasil não foi meramente devido a questões internas
dos movimentos ambientais. Durante o regime militar, os movimentos sociais tinham sua
atuação limitada e a economia brasileira estava no final de um período extensivo de crescimento
econômico, apesar da crescente desigualdade de renda. Desse modo, os ambientalistas tinham
um espaço restrito no debate nacional.
Ao mesmo tempo, o regime militar apresentava uma certa abertura para discussões de
questões ambientais de um viés técnico-científico, e mantinham estreita colaboração com espe-
cialistas nacionais e internacionais através de acordos com entidades das Nações Unidas. Ainda
durante o regime militar, foram criadas as principais estruturas da governança ambiental do país
ainda em funcionamento. Em 1981, a Lei no 6.938, de 31 de agosto, cria a Política Nacional do
Meio Ambiente e, dentro dela, o Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama), tendo como
princípio considerar o “meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente

32
assegurado e protegido”. A mesma lei cria, como parte do Sisnama, o Conselho Nacional do
Meio Ambiente (Conama), principal instância de definição de normas ambientais infralegais,
com ampla participação da sociedade civil, que contava em 1983 com 11 dos 29 assentos
(Ipea, 2011). Além de estabelecer a estrutura da política ambiental, essa lei deu início ao
processo de transferência do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa)
para órgãos especializados em questões ambientais da responsabilidade de implementar o
Código Florestal, garantindo mais importância ao tema. Assim, em seu artigo 18, a Lei no
6.938, de 1981, estabelecia que a Secretaria Especial de Meio Ambiente (Sema), criada em
1973, no âmbito do Ministério do Interior, seria a responsável pela manutenção das APPs,
assim como das reservas e estações ecológicas e áreas de pouso de aves migratórias protegidas
por convênios, acordos ou tratados internacionais. Inclusive, durante esse período foram
criadas unidades de conservação que somam 12 milhões de hectares e demarcados 6 milhões
de hectares em terras indígenas.
A partir do fim dos anos 1970, o movimento ambientalista brasileiro começava a mudar
as suas estratégias (Drummond, 1998-1999; Viola, 1988 e 2004). Com a Lei da Anistia de 197926
a política de “descompressão” do regime militar buscou garantir maiores liberdades políticas,
tendo em vista a necessidade de uma transição pacífica para um regime democrático em meio
ao crescente descontentamento com a situação econômica do país. Nesse novo contexto, o
movimento ambientalista, até então com foco tecnocrático e uma abordagem apolítica, começou
a participar de processos políticos juntamente como novos apoiadores vindos principalmente
de movimentos de centro e de esquerda (Viola, 1988). Movimentos ambientais começaram a
estabelecer alianças entre si e, em 1986, formalizaram a Coordenação Interestadual Ecológica
para a Assembleia Constituinte (Ciec). Com o apoio dessa rede nacional, o ativista Fábio
Feldman tornou-se mais presente na política nacional e, a partir de 1987, liderou a Frente
Nacional de Ação Ecológica que, como veremos mais adiante, teria papel fundamental em
promover os interesses ambientais. Na Amazônia, Chico Mendes também simbolizou esse
envolvimento político cada vez mais forte, vinculando suas preocupações pela causa dos
seringueiros com os movimentos ambientais para pressionar as políticas públicas (Revkin,
1994). Em 1987, Mendes fez denúncias à Organização das Nações Unidas (ONU), ao Senado
americano e ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) de que projetos financiados
por bancos estrangeiros geravam desmatamento e expulsão das populações locais, levando à
suspensão de tais projetos. Acusado por “prejudicar o progresso”, ameaçado e perseguido pela
União Democrática Ruralista (UDR), foi morto em dezembro de 1988. Sua morte repercutiu
ainda mais seu movimento e colocou ainda mais em relevo a urgência da adoção de medidas
ambientais para a proteção das florestas.
A reorganização dos movimentos ambientalistas foi acompanhada por uma crescente
produção de evidências sobre os efeitos negativos da industrialização no Sudeste e da expansão
agropecuária descontrolada na Amazônia (Hecht e Cockburn, 1990). A preocupação com a de-
vastação do ecossistema amazônico foi impulsionada pela divulgação de dados e estudos realizados

26 Brasil, Lei nº 6.683, de 28 de agosto de 1979, que concede anistia (por exemplo, a pessoas que cometeram crime político
ou eleitoral ou que tiveram seus direitos poíticos suspensos) e dá outras providências.

33
pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e pelo Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia (Inpa), que apontavam no final da década de 1970 um aumento dos focos de incêndio
e de desmatamento (Tardin, 1980). Tais trabalhos inclusive deram origem à criação do Programa
de Avaliação de Desmatamento (Prodes) do Inpe, que tem monitorado o desmatamento da flo-
resta Amazônica por satélite desde 1988. Em decorrência das notícias na mídia sobre queimadas
e desmatamento, do aumento da mobilização e da pressão de lideranças, como Paulo Nogueira
Neto, então Secretário Especial de Meio Ambiente, foi instaurada a Comissão Parlamentar de
Inquérito sobre a devastação da Floresta Amazônica27. O Relatório final da CPI da Devastação
da Floresta Amazônica, entre outras causas do desmatamento, aponta falhas no Código Florestal
e a insuficiência ou a inexistência de recursos financeiros e de pessoal idôneo e qualificado para a
execução de todos os encargos atribuídos ao IBDF, indicando a necessidade de revisão imediata
da legislação florestal. A colaboração cada vez maior entre cientistas e organizações ambientalistas
locais e internacionais (Zhouri, 2004; Keck e Sikkink, 1998), que aflorou a partir da metade dos
anos 1980, contribuiu de forma significativa para dar maior relevo às causas ambientais no país.
Diante de um regime militar aberto para discutir questões ambientais e com as alianças
se formando entre cientistas, políticos e movimentos ambientais, o tema ambiental tornou-se
um dos mais centrais durante o processo de redemocratização. A Assembleia Constituinte
aprovou, em maio de 1988, capítulo específico de Meio Ambiente, com imposição de ações
aos governos federal, estaduais e municipais para manutenção do meio ambiente ecologica-
mente equilibrado, para as presentes e futuras gerações e alteração do status da proteção da
vegetação natural brasileira. Alonso, Costa e Maciel (2007) apontam que os movimentos
sociais tiveram papel preponderante nessa alteração e identificam duas estratégias principais.
Por um lado, a Frente Nacional de Ação Ecológica, liderada por Fábio Feldman, promoveu
as propostas que favoreceram os interesses ambientalistas entre parlamentares e, assim, con-
trabalançou a influência do chamado “Centrão”. Por outro lado, as “Iniciativas Populares”
possibilitaram a participação direta de movimentos sociais, através das quais o movimento
ambientalista também conseguiu promover os seus interesses. Com o apoio desses movimentos
sociais, a Frente Nacional de Ação Ecológica conseguiu dar “relevo aos temas conservacio-
nistas [por ser] mais palatáveis para deputados não-ambientalistas” (Alonso, Costa e Maciel,
2007, p. 162).

27 Senado Federal, Resolução (SF) n° 3, de 1979, instaura a CPI - Devastação da Floresta Amazônica.

34
O meio ambiente na Constituição Cidadã de 1988

Um momento significativo para o aumento das proteções ambientais no Brasil ocorreu com
a promulgação da Constituição da República, em 1988, que consolidou a transição do país para a
democracia. Nela, o meio ambiente equilibrado é tratado como bem jurídico autônomo, social e
unitário, tendo qualquer pessoa a titularidade desse direito subjetivo, fundamental e inalienável
(Giudice, 2007). Assim, com a nova ordem constitucional, fica clara a necessidade de compromisso
do estado brasileiro com políticas públicas, que assimilem e ampliem princípios de conservação e
preservação ambiental.
Entre os pontos mais relevantes para a proteção das florestas, trazidos pela Constituição
de 1988, estão a criação de espaços especialmente protegidos, dentre os quais as Unidades de
Conservação, a Reserva Legal e as APPs, como instrumento de política ambiental; a indisponibilidade
para outras finalidades das terras devolutas necessárias para a conservação ambiental; e o
estabelecimento da Floresta Amazônica, da Mata Atlântica e do Pantanal como “patrimônio nacional”.
Com relevo, a Constituição de 1988 estabelece a função social da propriedade como um
limite ao direito de propriedade (art. 5º, inciso XXII), um direito fundamental28 e um princípio da
ordem econômica (inciso III do art. 170), a ser cumprido na propriedade urbana e rural (artigos
182 e 184). Percorrendo as determinações constitucionais, tem-se que para “assegurar a todos
existência digna, conforme os ditames da justiça social” (art. 170) é preciso manter o “meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”,
que deve ser defendido e preservado para “as presentes e futuras gerações”. Assim, somente com a
necessária proteção do meio ambiente a propriedade privada cumpre sua função social. Dessa forma,
a degradação ambiental de um imóvel representa infração à Constituição, por descumprimento da
função social da propriedade, tornando ilegítimo o exercício desse direito. Na propriedade rural, a
função social é cumprida quando o exercício do direito de propriedade observa o seu aproveitamento
racional e adequado, a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e a preservação do meio
ambiente (incisos I e II do art. 186 da Constituição). No mesmo sentido, a atividade econômica deve
observar, além da função social, a defesa do meio ambiente (inciso VI do art. 170). Com fundamento na
inovação trazida pela Constituição, foram editadas em meados da década de 1990 diversas normas de
comando e controle ou incentivo à proteção ambiental.

28 Artigo 5º, inciso XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; Constituição da República de 1988.

35
A legislação ambiental ganhando corpo após a nova
Constituição Federal

Com ações mais eficazes dos movimentos ambientais e com fundamentos constitucionais
mais favoráveis, os interesses ambientais avançaram, principalmente, através de ajustes na legislação
florestal existente, com destaque para as alterações no Código Florestal de 1965. Tais avanços
começaram apenas um ano após a aprovação da Constituição da República, através da Lei no
7.803, de 1989, com a aprovação de regras mais rígidas para proteger (1) as APPs ao longo dos
rios ou cursos d’água, (2) nascentes, (3) bordas de tabuleiros ou chapadas e (4) áreas em altitude
acima de 1.800 metros (Tabela 1). Logo no início da década de 1990, é editada a Lei da Política
Agrícola (Brasil, 1991), que (1) estabelece incentivos aos proprietários rurais que preservarem,
conservarem ou recuperarem com espécies nativas, “ou ecologicamente adaptadas”, a cobertura
florestal da propriedade, (2) isenta de tributação as APPs e Reservas Legais e (3) determina a
recuperação de áreas erodidas e em processo de desertificação. A regra mais importante para a
implantação do Código Florestal contida nessa lei é a determinação da recomposição da Reserva
Legal pelo proprietário mediante o plantio, em cada ano, de pelo menos um trinta avos da área
total a ser recomposta.
Durante a presidência de Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), as regras do Código
Florestal foram editadas mais uma vez em uma direção mais rígida. Naquela época, os dados
gerados pelo Inpe, a partir do Prodes, indicavam que o desmatamento na Amazônia Legal teve
um aumento exponencial, saltando de 14.896 km2 em 1994 para 29.059 km2 em 1995. Então, o
governo Fernando Henrique Cardoso adotou medidas que buscassem dar uma resposta à opinião
pública e gerassem impacto para o controle do desmatamento. Em 1996, estabeleceu a Medida
Provisória (MPV) no 1.511, a qual, entre outras proposições, aumentou de 50% para 80% a
Reserva Legal nos imóveis localizados nas áreas de floresta da Amazônia Legal.
Em 2000, a Reserva Legal nas áreas de Cerrado na Amazônia Legal, que passavam por
um rápido processo de expansão agropecuária, foi reduzida de 50 para 35% pela MPV no
1.956-50. Tal percentual permanece inalterado até hoje, com alterações apenas em sua forma
de aplicação. Em outra alteração formulada no artigo 16 do Código Florestal pela mesma
MPV no 1.956-50, a Reserva Legal passa a incidir em imóvel de domínio público, o que
também permanece em vigor até hoje e afeta em especial as terras devolutas e assentamentos
ainda não titulados, uma vez que outros imóveis de domínio público, como as Unidades de
Conservação, já possuem outras formas mais restritivas de proteção. Os avanços da proteção
ambiental não se limitavam à ampliação dos percentuais de Reserva Legal. As definições das
APPs foram ampliadas mais uma vez em março de 2002, mediante a Resolução no 303 do
Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), cujo texto dobrava a proteção para lagoas
e lagos em áreas rurais e introduzia a proteção de veredas (faixa de 50 m), manguezais, dunas,
praias e outros locais de refúgio ou reprodução de animais.

36
Tabela 1 - Principais alterações nas obrigações de conservação da vegetação nativa

Áreas de Lei nº 4.771 Lei nº 7.803 MPV nº MPV nº 1.956-50


Preservação (1965) (1989) 1.511 (1996) (2000) e
Permanente e reedições reedições
APPs no entorno de
rios e cursos d’água
com largura de:
• <10 metros 5 metros 30 metros
• 10-50 metros Metade da largura 50 metros
• 50-200 metros Metade da largura 100 metros
• 200-600 metros 100 metros 200 metros
• >600 metros 100 metros 500 metros

Área localizada
no interior de
uma propriedade
ou posse rural,
pública ou privada,
necessária ao uso
sustentável dos
Definição de Reserva recursos naturais,
Florestas de domínio privado suscetíveis à exploração,
Legal ou Reservas à conservação
obedecidas restrições
Florestais e à reabilitação
dos processos
ecológicos, à
conservação da
biodiversidade
e ao abrigo e à
proteção de fauna
e flora nativas.

Região Norte Amazônia


Norte e Centro-
Norte e Centro- e norte do Legal: 80%
Oeste na Bacia
Oeste na Bacia Centro- (fitofisionomia
Amazônia:
Regras de Amazônia: Oeste: 80% florestal), 35%
50% (todas as
conservação da 50% (todas as (fitofisionomia (Cerrado), 20%
fitofisionomias)
Reserva Legal: fitofisionomias) florestal) e (campos gerais)
e 20% (Cerrado)
Restante do Brasil: 50% (outras) Todas as formas de
Restante do
20% Restante do vegetação restante
Brasil: 20%
Brasil: 20% do Brasil: 20%

A nova rigidez da legislação florestal brasileira foi acompanhada por outros avanços na
legislação ambiental que deram ímpeto ao seu cumprimento. Ainda em 1989, o Programa Nossa
Natureza une a Sema, o IBDF, a Superintendência do Desenvolvimento da Pesca (Sudepe) e a
Superintendência da Borracha (Sudhevea) foram reunidas em um único órgão, o Ibama, cujas
atividades de fiscalização seriam fundamentais nas décadas seguintes. Em fevereiro de 1998, foi
estabelecida a Lei dos Crimes Ambientais (Brasil, 1998), que determinava as penas para infrações
à legislação ambiental brasileira e, assim, dava orientações claras às atividades de fiscalização.
Por exemplo, fixou a pena de um a três anos e/ou multa em caso de destruição, danificação ou
corte de árvores em “floresta considerada de preservação permanente” (arts. 38 e 39). Em 2008,
o Decreto no 6.514, que estabelece infrações e sanções administrativas ambientais, determina

37
que, se o proprietário deixa de averbar e regularizar a Reserva Legal antes do prazo de “cento e
oitenta dias após a publicação do decreto” (art. 152), terá uma “multa de R$ 500,00 (quinhen-
tos reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais)” (art. 55). O decreto também criou regras para a
destruição de equipamentos como tratores e retroescavadeiras, utilizadas em crimes ambientais
na impossibilidade de apreensão dos mesmos (art. 111). Na prática, a definição dessas penas,
multas e possibilidade de destruição de equipamentos fortaleceu a fiscalização ambiental no Brasil,
competência principal do Ibama.
Outras frentes relevantes de avanços na legislação florestal incluíam, primeiramente,
desincentivos a práticas de desmatamento. Em 2006, o Decreto no 5.975, especificou o embargo
à prática de atividades econômicas em áreas ilegalmente desmatadas. Em 2008, o Banco Central
do Brasil estabeleceu a Resolução no 3.545, determinando que, a partir de 1º de julho de 2008, a
concessão de crédito rural ficaria condicionada à apresentação de documentação que demonstrasse
“que inexistem embargos vigentes de uso econômico de áreas desmatadas ilegalmente no imóvel”
ou “atestado de recebimento da documentação exigível para fins de regularização ambiental do
imóvel” (Manual de Crédito Rural 2-1, art. 12). Um segundo avanço nesse arcabouço normativo
também envolvia a ampliação da legislação florestal brasileira com a criação do Sistema Nacional de
Unidades de Conservação (SNUC), Lei no 9.985, de 2000, a instituição da Lei da Mata Atlântica,
Lei no 11.428, de 2006, e da lei que dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção
sustentável, Lei no 11.284, de 2006. De acordo com Sauer e França (2012), esse conjunto de
normas representou o auge dos avanços na legislação ambiental ao sinalizar que o desmatamento
ilegal em imóveis rurais (isto é, das Reservas Legais e das APPs) teria consequências punitivas e
econômicas para os proprietários e posseiros.
As mudanças na legislação também foram acompanhadas, a partir de 2004, pela criação
do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm),
o Plano Amazônia Sustentável (PAS), em 2008, e a Política Nacional da Mudança do Clima
(PNMC – Lei nº 12.187), em 2009. Como parte desse plano, o governo federal brasileiro investiu
em média um valor US$ 1 bilhão por ano para promover a conservação ambiental no Brasil e
a capacidade institucional de fiscalizar o cumprimento da legislação florestal brasileira (Cunha,
Börner, Wunder, Cosenza e Lucena, 2016). Devido em parte a essas medidas, a taxa de desma-
tamento na Amazônia caiu de 27.772 km2 em 2004 para 4.571 km2 em 2012, segundo dados
do Inpe. Esses resultados positivos permitiram ao governo federal estabelecer o Fundo Amazônia
(Decreto no 6.527), em 2008, cuja função é captar recursos financeiros com base na redução das
emissões provindas do desmatamento e reinvesti-los em programas e projetos que busquem sua
continuação (van der Hoff, Rajão e Leroy, 2018). Enquanto isso, as tentativas de modificar e
enfraquecer o Código Florestal não avançaram no Congresso por falta de apoio político do Poder
Executivo, com uma forte articulação de Marina Silva à frente do MMA. Sendo assim, durante o
fim dos anos 2000, o futuro das florestas brasileiras parecia promissor, e o “fim do desmatamento”
estava à vista (Nepstad et al., 2009), mas essa situação não se sustentaria na próxima década.

38
VI - A FLEXIBILIZAÇÃO DO CÓDIGO
FLORESTAL (2008-2012)

Tensões crescentes do agronegócio

O fortalecimento da legislação florestal brasileira, apesar de representar um avanço dos


interesses ambientais e econômicos, despertou fortes reações em diferentes níveis. No Poder
Executivo, nos âmbitos estadual e federal, o setor do agronegócio passou a buscar maior
representatividade e se intensificaram as disputas e tensões políticas entre os representantes
das pastas de meio ambiente e aquelas ligadas ao setor produtivo. No âmbito estadual, o
caso mais significativo foi a entrada na política de Blairo Maggi, um dos maiores produtores
de soja do país, que se elegeu governador de Mato Grosso entre 2003 e 2011. Maggi surge
como uma liderança orgânica junto à classe de produtores com uma agenda política que
claramente prioriza a expansão da fronteira agropecuária em relação às necessidades de
proteção ambiental (Azevedo, 2009). Nesse período, Maggi protagonizou uma tentativa de
deslegitimar dados de desmatamento com o objetivo de desconstruir políticas ambientais.
No final de 2007, o Sistema de Monitoramento em Tempo Real (Deter), do Inpe detectou
uma forte tendência de aumento do desmatamento, revertendo os resultados positivos ob-
tidos a partir de 2004. Reagindo a isso, a então ministra do Meio Ambiente, Marina Silva,
editou o Decreto no 6.321, de 21 de dezembro de 2007, que vetava a concessão de crédito
bancário para os produtores nos municípios com os maiores índices de desmatamento. A
medida afetou principalmente os sojicultores que dependem de modo mais direto dos juros
subsidiados do Plano Safra, mobilizando uma forte resposta do setor. Com o objetivo de
reverter as ações impostas pelo decreto, Maggi fez uma forte articulação com o presidente
Lula e foi aos jornais afirmar que existia uma conspiração contra o setor agropecuário e que
“o Inpe está mentindo a serviço de alguém” (Sant’Anna, 2008). O presidente Lula chegou a
pedir uma investigação no Inpe. Marina Silva e a comunidade científica, por sua vez, saíram
em defesa do instituto.
Mesmo não tendo logrado sucesso em derrubar o Decreto no 6.321, de 2007, o setor
liderado por Maggi passou a argumentar que seria necessário suspender as ações de comando
e controle a favor de um programa de “regularização ambiental” que viabilizasse a saída dos
produtores da ilegalidade. Para isso, o governo de Mato Grosso criou em 2008 o Programa
Mato Grosso Legal, cujo processo de regularização partia da inscrição em um Cadastro Am-
biental Rural (CAR), com escopo restrito à assinatura de um Termo de Ajuste de Conduta
para a recuperação das APPs no entorno dos rios (Lei Complementar do Estado do Mato
Grosso no 343, de 24 de dezembro de 2008). Desse modo, os produtores obtinham um
acordo para suspender o efeito das multas ambientais e alcançar um dos requisitos previstos
no Decreto nº 6.321, de 2007, para a retirada dos municípios da lista que proibia a conces-

39
são de crédito agropecuário. Posteriormente, a Lei Complementar do Mato Grosso (Mato
Grosso, 2010), foi modificada em 2010 para torná-la ainda mais leniente com as infrações
ambientais e para manter o benefício do programa, sem que fosse necessário recuperar ou
compensar as áreas de Reserva Legal.
O apoio de Lula ao pedido de Maggi serviu como um importante teste de força para
o setor, que passou a ter mais peso dentro do governo, principalmente após o escândalo do
Mensalão e o alinhamento do Partido dos Trabalhadores (PT) com o chamado “centrão” do
Congresso Nacional. Internamente no governo Lula, as tensões entre Marina Silva, de um
lado, e Dilma Rousseff (Ministra de Minas e Energia 2003-2005 e Casa Civil 2005-2010)
e Mangabeira Unger (Secretaria de Assuntos Estratégicos, 2007-2009), de outro, levaram à
renúncia de Marina Silva do Ministério do Meio Ambiente em maio de 2008. Nesse processo,
foram decisivas a pressão de Dilma Rousseff para a aprovação do licenciamento da Usina
Hidrelétrica de Belo Monte e a transferência para Mangabeira Unger da coordenação do Plano
Amazônia Sustentável, até então sob responsabilidade do Ministério do Meio Ambiente (Góis,
2010). Marina Silva foi sucedida por Carlos Minc (2008-2010), representante histórico do
ambientalismo, e posteriormente por Izabella Teixeira (2010-2016), servidora de carreira
do Ibama, com perfil técnico e gerencial. Tanto Minc quanto Teixeira obtiveram resultados
ambientais significativos. Merecem destaque a redução do desmatamento ao mínimo histórico
em 2012, a aprovação da Política Nacional sobre Mudança do Clima em 2009 e uma meta
ambiciosa de redução de emissões de gases de efeito estufa (i.e. a contribuição nacionalmente
determinada) para o Acordo de Paris em 2015, alcançados por Izabella Teixeira durante sua
longa gestão. Mesmo assim, com a saída de Marina Silva do Ministério do Meio Ambiente
e do PT, houve um importante esvaziamento do peso político da agenda ambiental, visto o
histórico de Marina Silva no partido e sua influência até então nas decisões do presidente
da República.
Logo após a saída de Marina Silva é possível observar uma série de decretos que indicam
a importância crescente dos pleitos do agronegócio dentro do governo PT. Em dezembro de
2009, o governo publicou o Decreto no 7.029, criando o chamado Programa Mais Ambiente,
inspirado no Programa Mato Grosso Legal, que suspende a cobrança das multas e o efeito
dos embargos para os produtores que se inscreverem no CAR. Também foi prorrogado cinco
vezes o prazo de averbação da Reserva Legal na matrícula do imóvel: 11 de dezembro de
2009 (Decreto no 6.686, de 2008), 11 de junho de 2011 (Decreto no 7.029, de 2009), 11 de
dezembro de 2011 (Decreto no 7.497, de 2011), 11 de abril de 2012 (Decreto no 7.640, de
2011) e 11 de junho de 2012 (Decreto no 7.719, de 2012). Mas foi com a eleição de Dilma
Rousseff, que trouxe uma forte agenda desenvolvimentista, e a consolidação da aliança entre
PT e PMDB (um partido historicamente ligado aos grandes latifundiários), que se abriu um
importante espaço de articulação do agronegócio com os poderes Executivo e Legislativo,
resultando na aprovação do novo Código Florestal em 2012.

40
A construção de um novo Código Florestal na Câmara dos Deputados

A Lei no 12.651, de 2012, conhecida como novo Código Florestal, é resultado da con-
fluência de diferentes projetos de lei, que buscaram reduzir as exigências ambientais previstas
na legislação. Um dos primeiros argumentos utilizados, como no caso de Mato Grosso, com
Blairo Maggi, foi o da crescente dificuldade de implementar o Código Florestal e fiscalizar o
seu cumprimento, já articulado na justificativa do Projeto de Lei no 1.876/1999 (p. 288), para
propor um novo Código Florestal:

Parte do obstáculo à fiel execução da lei deve-se ao aspecto formal, uma vez que o Código
Florestal apresenta dispositivos de difícil entendimento e por vezes contraditórios entre si.
Tal fato foi agravado por algumas alterações as quais, na maior parte, não tiveram a preocu-
pação de manter a coerência do texto legal. [...] A questão vê-se agravada pela rigidez da lei.

Uma outra argumentação também incitou críticas ao Código Florestal, mas ganhou mais
força após as definições das consequências econômicas e punitivas, citadas acima, de não cumprir
as exigências impostas pela legislação florestal brasileira (Sauer e França, 2012). Muitos projetos
de lei justificaram a necessidade de uma mudança na legislação florestal brasileira por existir
uma discrepância entre as normas vigentes e a realidade no campo, o que afeta a sua efetividade:

A legislação ambiental está obsoleta, em desacordo com a realidade, as necessidades


e os interesses do País tanto para a efetiva proteção do meio ambiente quanto para o
desenvolvimento. (PL 5.367/2009)

O excessivo número de diplomas que regulamentam o uso dos recursos naturais no


Brasil, bem como as sucessivas modificações, tanto no conteúdo como nos objetivos
das normas ambientais, só têm levado a uma inaceitável situação de irregularidade de
parte significativa dos imóveis rurais. (PL 6.227/2009)

Embora existam várias leis e iniciativas que visem à proteção ambiental, em geral elas não
contemplaram as realidades socioeconômicas existentes, nem a trajetória da ocupação
do Brasil. Por isso mesmo não são eficazes. (PL 6.238/2009)

Na argumentação de muitos deputados, a discrepância entre legislação e realidade, bem


como os altos custos de cumprimento, pesariam principalmente para os pequenos produtores
(Paulino, 2012; Sauer e França, 2012). Em alguns projetos de lei, essa argumentação foi expli-
citamente articulada:

As multas ambientais são hoje um empecilho aos pequenos produtores de toda a Ama-
zônia. Desprovidos de conhecimento apropriado, com falta de esclarecimento do poder
público, muitos dos pequenos agricultores e membros de populações tradicionais são
devedores de multas ambientais. (PL 6.313/2009).

41
Um passo crucial para a aprovação do novo Código Florestal foi a criação, em 2009, de
uma comissão especial para apreciar as múltiplas propostas de alteração do Código Florestal
vigente, que refletiam o grande volume de propostas tramitando na Câmara dos Deputados.
Como relator da comissão foi escolhido Aldo Rebelo, deputado do PCdoB com forte viés
ruralista, parte da base aliada do governo PT e político influente, que chegou a ocupar a
presidência da Câmara dos Deputados entre 2005 e 2007 e ser nomeado ministro em quatro
pastas durante os governos Lula e Dilma (Ciência e Tecnologia, Defesa, Esportes e Relações
Institucionais). A escolha de Aldo Rebelo para a relatoria da comissão do Código Florestal
foi significativa, pois deu voz à crescente insatisfação com a agenda ambiental não só vinda
de forças conservadoras de direita (representada por PMDB e demais partidos), mas também
dentro da própria esquerda.
O resultado do trabalho dessa comissão especial foi apresentado em junho de 2010,
por meio do parecer do relator Aldo Rebelo, cujo texto já deixava clara a intenção de redução
das exigências ambientais. Primeiramente, em linha com a argumentação anti-imperialista da
extrema-esquerda, o relatório apresenta o aumento das restrições ambientais e a implementação
do Código Florestal como parte de uma guerra comercial contra o Brasil, onde Organizações
Não Governamentais (ONGs) internacionais e a Organização Mundial do Comércio conspiram
para impedir o desenvolvimento do país. Aldo Rebelo também argumentava que somente a
legislação brasileira possui requisitos de conservação florestal como a Reserva Legal, ignorando,
por exemplo, as leis de zoneamento e a proibição de conversão de áreas florestais em outros países.
Finalmente, o relatório argumenta que seria economicamente inviável recuperar as Reservas Legais
já consolidadas e que as APPs impactam principalmente os pequenos produtores. Para solucionar
esses problemas, Rebelo propôs mudanças radicais no Código Florestal. Em primeiro lugar, e de
forma mais significativa, o relatório elimina a obrigação de Reserva Legal de pequenos imóveis,
que representam mais de 77% dos imóveis rurais e que podem chegar a ocupar até 440 hectares
na Amazônia (IBGE, 2017).
Pessoas envolvidas na negociação do novo Código Florestal no Congresso Nacional apontam
que essa mudança buscava, em última instância, revogar a exigência da Reserva Legal para todos
os imóveis durante a votação. Nessa mesma direção, o relatório de Aldo Rebelo reduz as APPs
no entorno de cursos d’água ao estabelecer como linha de base o leito mínimo (i.e. do período
seco), e reduz a margem da APP de 30 para 15 metros para os rios com até 5 metros de largura,
o que na prática retroage a legislação para antes das mudanças realizadas em 1989. Além disso,
o relatório propôs que a área total das APPs fosse somada à da Reserva Legal, o que na prática
reduz drasticamente a área de conservação em estados como Minas Gerais, que possuem uma
densa hidrografia e a exigência de conservar 20% para Reserva Legal. Outro ponto significativo
de flexibilização, proposto por esse parecer, foi o conceito de “área rural consolidada”, que se
refere a “áreas de imóvel rural com ocupação antrópica consolidada até 22 de julho de 2008,
com edificações, benfeitorias e atividades agrossilvipastoris” (Lei no 12.651/2012, art. 33, inciso
IV). Na prática, esse conceito implicava que qualquer ocorrência de desmatamento antes dessa
data, mesmo tendo ocorrido ilicitamente diante da legislação vigente na época, não seria sujeito
às medidas punitivas, desde que o deficit de área protegida fosse recuperado pelo proprietário.
Além disso, o relatório propunha que as exigências mínimas de recuperação ambiental para a

42
regularização do imóvel poderiam ser definidas pelos estados, possibilitando com isso inclusive
uma anistia total do desmatamento ilegal.
O parecer do relator Aldo Rebelo não somente incluiu flexibilizações para o uso econô-
mico da terra em área privada, mas também propôs novos instrumentos de regulamentação.
Além de recomposição e regeneração natural da vegetação, o proprietário teve uma ampliação
da possibilidade de compensar os deficits da Reserva Legal (art. 25, inciso III). O Código
Florestal vigente à época já previa a possibilidade de compensação de Reserva Legal, contudo,
a compensação proposta por Aldo Rebelo era mais ampla. Enquanto a MPV no 2.166-67
(a última reedição da MPV no 1.511, mencionada acima) restringia a compensação a áreas
equivalentes em importância ecológica e extensão, localizadas no mesmo estado, ecossistema
e microbacia ou, diante da impossibilidade e mediante análise técnica, na mesma bacia hi-
drográfica, o parecer do relator permitia a compensação com áreas de vegetação nativa ou em
qualquer estágio de regeneração no mesmo bioma. O relatório ampliava também as categorias
de Unidade de Conservação, onde pode acontecer a compensação de Reserva Legal, para fins
de regularização fundiária.
O relatório do deputado Aldo Rebelo foi determinante para a definição do texto final
aprovado pela Câmara dos Deputados em maio de 2011, mesmo que algumas de suas propos-
tas mais radicais tenham sido excluídas pela articulação de deputados da Frente Parlamentar
Ambientalista, liderada pelos deputados Sarney Filho, Alessandro Molon, Alfredo Sirkis, entre
outros. Em particular, foi alcançado um acordo para que as mudanças do Código Florestal
afetassem somente os requisitos de restauração para a regularização das áreas consolidadas (i.e.
desmatadas antes de 2008), enquanto as exigências para conservação futura seriam mantidas
com somente algumas mudanças pontuais. Apesar da redução das áreas a serem restauradas,
é preciso reconhecer que a previsão de um “processo de adequação”, com o CAR, o Programa
de Regularização Ambiental (PRA), o compromisso na regularização e a suspensão temporária
de multas trouxe, em tese, um ganho substancial ao Código Florestal. Contudo, ainda com
a previsão do processo de implantação da lei, é preciso prioridade política para que ela seja
realmente implantada.
Desse modo, a isenção total de Reserva Legal para os imóveis de até 4 módulos fiscais (MF;
uma medida que varia de acordo com o município em questão) transformou-se em uma isenção
de regularização do deficit de Reserva Legal para desmatamentos anteriores a 2008. Porém, de
modo a recompensar os pequenos produtores que ainda preservaram parte de sua Reserva Legal,
ficou permitida a emissão de Cotas de Reserva Ambiental (CRAs) em todo o remanescente, e
não só nas áreas excedentes à Reserva Legal. O cômputo da APP na Reserva Legal passa a só se
aplicar se o benefício não viabilizar novos desmatamentos. De forma similar, a redução da APP
das matas ripárias mínimas passa de 30 para 15 metros, no contexto do PRA, que passa a ter
regras mínimas, reduzindo a autonomia total dos estados na proposta de Rebelo. Indo além do
relatório de Rebelo, o texto aprovado pela Câmara incluiu também uma redução da necessidade
de restauração de Reserva Legal em áreas já desmatadas até 50% para imóveis localizados nos
municípios da Amazônia com mais da metade de sua área protegidas por unidades de conservação
de domínio público regularizadas e para terras indígenas demarcadas.

43
Últimos ajustes pelo Senado Federal e pelo Poder Executivo

Ao ser enviado para o Senado Federal, foi escolhido para relator do projeto o senador
Jorge Viana, do PT do Acre, que possui uma aproximação maior com a causa ambientalista.
Com a escolha de Viana, o governo parece ter buscado compensar alguns dos excessos cometi-
dos pelo relatório de Aldo Rebelo. Porém, a capacidade do Senado de retirar as flexibilizações
introduzidas pela Câmara dos Deputados foi limitada. Medidas que geraram grandes anistias
do desmatamento ilegal, como o perdão do desmatamento da Reserva Legal dos pequenos e
a soma de APP e Reserva Legal foram mantidas integralmente. Também no Senado houve a
inclusão de um mecanismo adicional, que permite a redução da Reserva Legal, inclusive para
desmatamentos futuros, nos estados que possuírem mais de 65% de sua área protegida por
unidades de conservação e terras indígenas, além da aprovação de um Zoneamento Ecológico
Econômico. Além disso, na mesma linha da proposta da Câmara de permitir a emissão de
CRAs em toda área de Reserva Legal dos pequenos imóveis e premiar aqueles que respeitaram
a lei, o texto do Senado incluiu um mecanismo que permite a emissão de CRAs nas áreas de
Reserva Legal acima de 50% de todos os imóveis localizados na Amazônia Legal. Desse modo,
a proposta do Senado reduz a integridade ambiental das cotas, já que a falta de Reserva Legal
em um imóvel poderá ser compensada com uma CRA emitida em uma área de Reserva Legal
de outro imóvel já protegida por lei (veja mais abaixo).
Por outro lado, o texto do Senado trouxe uma novidade importante que buscava contrabalan-
çar as concessões com medidas que permitiam mais controle ambiental. Como mencionado acima,
estados como o Mato Grosso e o Pará haviam criado o CAR com o objetivo de avançar na regula-
rização ambiental e atender às exigências do Decreto no 6.321, de 2007, para a liberação de crédito
agropecuário. Essa iniciativa fora expandida para o Brasil com o Programa Mais Ambiente, mas se
mantinha na esfera infralegal. O relatório do senador Viana introduz a obrigatoriedade da inscrição
no CAR e ao mesmo tempo simplifica o procedimento, buscando garantir mais transparência aos
dados ao estabelecer sua publicação na Internet. E o mais importante, a partir da proposta do relator,
o Senado aprovou um texto que estabelece que “após 5 (cinco) anos da data da publicação desta Lei as
instituições financeiras oficiais só concederão crédito agrícola, em qualquer de suas modalidades, para
proprietários de imóveis rurais que estejam inscritos no CAR e que comprovem sua regularidade aos
termos desta Lei” (art. 78 do Substitutivo do Senado ao Projeto de Lei da Câmara n° 30, de 2011).
Devido à alteração formulada no Senado, o texto teve de voltar à Câmara dos Deputados,
em dezembro de 2011, sob a relatoria do deputado Paulo Piau (PMDB-MG), e enviado para
sanção presidencial com diversas modificações, em maio de 2012. A modificação mais impor-
tante foi a retirada da vinculação da concessão de crédito agropecuário à inscrição no CAR e à
comprovação de regularidade ambiental.
Em paralelo ao debate no Congresso Nacional, o Ministério do Meio Ambiente, liderado
na época por Izabella Teixeira, elaborou e apresentou no mesmo dia da votação do Código
Florestal, a MPV no 571, de 25 de maio de 2012, que buscava abarcar a demanda de alguns
grupos sociais e reintroduzir no texto elementos trazidos pelo Senado e eliminados durante a
votação na Câmara dos Deputados. De um lado, o Poder Executivo deu voz aos movimentos
sociais que representam os pequenos produtores, introduzindo na lei pela primeira vez o

44
que veio a ser conhecido como “escadinha” da APP. No processo de discussão do Código
Florestal, representantes da agricultura familiar entenderam que suas demandas não estavam
sendo contempladas pelo Congresso Nacional, e por isso fizeram pressão para que o executivo
buscasse ampliar a flexibilização dos requisitos de regularização dos pequenos imóveis (Agência
Brasil, 2012). A solução proposta pelo Ministério do Meio Ambiente foi reduzir ainda mais
os requisitos de recuperação de APP, que na legislação original era de 30 metros e que, com a
proposta da Câmara, caiu para 15 metros para os rios até 10 metros de largura. Com a escadi-
nha, imóveis de até 1 MF (i.e. no máximo 110 hectares na Amazônia) precisam recuperar para
rios de 10 metros de largura só 5 metros; de 1 a 2 MFs, 8 metros; de 2 a 4 MFs, 15 metros.
Para os imóveis médios e de até 10 MFs, a faixa mínima a ser recuperada seria de 20 metros,
sendo que os imóveis com mais de 10 MFs precisariam recuperar os 30 metros já exigidos na
legislação anterior. Desse modo, foram relativizadas as exigências de restauração de APP para os
imóveis médios e grandes em relação ao texto original da Lei no 12.651, de 2012, e reduzidas
as exigências para os pequenos imóveis.
Por outro lado, a intervenção do Poder Executivo trouxe proteções ambientais importantes.
Embora com a necessidade de declaração de interesse social por ato do Chefe do Poder Executivo,
caso a caso, a MPV no 571, de 2012, incluiu entre as APP as áreas úmidas, especialmente as de
importância internacional, em linha com a Convenção de Ramsa das Nações Unidas. Além disso,
introduziu um novo capítulo regulando o uso sustentável de apicuns e salgados. O aspecto mais
importante dessa MPV foi a reintrodução no artigo 78-A do mecanismo introduzido inicialmente
no relatório do senador Jorge Viana, que diz que somente os produtores inscritos no CAR e que
comprovarem sua regularidade ambiental poderiam ter acesso a crédito agrícola cinco anos após
a aprovação do novo Código Florestal.
Durante sua tramitação no Congresso Nacional, o texto da MPV no 571, de 2012, foi
alterado, em sua aprovação para conversão na Lei no 12.727, de 17 de outubro de 2012. O texto
final do Congresso expandiu a proteção das APP para os cursos d’água intermitentes de modo a
proteger principalmente rios e nascentes de áreas com ciclos hidrológicos com grande variabilidade,
como do semiárido, do Pantanal e de regiões de várzea da Amazônia. Porém, os parlamentares
retiraram a exigência de APP no entorno de reservatórios artificiais de água que não decorram
de barramento ou represamento de cursos d’água naturais e permitiram o cômputo da APP no
percentual de Reserva Legal, ainda que isso implique em novos desmatamentos na Amazônia
Legal quando essa soma ultrapassar 80% do imóvel rural. Mas o ponto mais negativamente
impactante para a implantação do novo código, nas alterações realizadas no Congresso Nacional,
foi a retirada da necessidade de comprovação da regularidade do imóvel para o acesso ao crédito
agrícola, que ficou vinculado apenas à mera inscrição no CAR. Como veremos em seguida, essa
mudança indica que os sucessivos atrasos na implementação do Código Florestal ocorreram em
um contexto em que a falta de regularização não traria nenhum prejuízo concreto, levando de
fato a uma neutralização do Decreto no 6.321, de 2007, uma das motivações da mobilização
para mudar a legislação.

45
Os impactos da flexibilização

Os impactos da mudança do Código Florestal, principalmente nas exigências de restauração,


foram substanciais. Soares-Filho et al. (2014) estimam que a anistia do desmatamento em Reserva
Legal dos pequenos imóveis gerou uma perda de 17 milhões de hectares (Mha), sendo que os
imóveis de qualquer tamanho beneficiados pela redução de Reserva Legal em municípios com mais
de 50% de unidades de conservação e terras indígenas reduziram a exigência de recuperação em
mais 1 Mha. A exigência de restauração de APPs ripárias também foi afetada substancialmente,
com uma redução de 4 Mha por causa da possibilidade de somar áreas de APPs no cálculo da
Reserva Legal e de 8 Mha em consequência da regra da escadinha. Desse modo, a área total a ser
restaurada foi reduzida com o novo Código Florestal em 58%, caindo de 50 para 21 Mha. Freitas
et al. (2018) também alertam para o potencial das mudanças no Código Florestal de permitir
novos desmatamentos. Havendo a redução da Reserva Legal de 80 para 50% nos estados com
mais de 65% de áreas protegidas, os estados de Amazonas, Roraima e Amapá poderiam permitir
um desmatamento adicional de uma área entre 6,5 e 15 Mha, antes protegida pela Reserva Legal.
O novo Código Florestal também fez modificações que enfraquecem substancialmente
os benefícios ambientais dos mecanismos de compensação. Se de um lado a restrição da antiga
cota de reserva florestal à sua utilização dentro da mesma microbacia inviabilizou a formação
de um mercado, vários estudos apontam que ao ampliar para a escala do bioma, o novo Código
Florestal permitiria a compensação por áreas com baixo risco de desmatamento e, por isso, com
pouca adicionalidade ambiental. Por esse motivo, diferentes estudos enfatizaram a necessidade de
restringir o mercado de CRA aos mesmos bioma e estado (Rajão, Soares-Filho e Pacheco, 2018;
Soares-Filho et al., 2016) e limitar o acesso ao mercado a propriedades cuja área florestal está sob
pressão de desmatamento (Nunes et al., 2016). Outra opção de compensação de Reserva Legal
que não gera adicionalidade ambiental, introduzida pelo novo Código Florestal, é a possibilidade
de compensar em áreas já protegidas por Reservas Legais de pequenos imóveis ou de imóveis
localizados na Amazônia Legal que não desmataram 50% de sua área quando a lei assim permitia.
Rajão, Soares-Filho e Pacheco (2018), ao realizar a simulação do funcionamento do mercado
através de um modelo de equilíbrio parcial, concluíram que, mesmo em um cenário otimista
(com pressão do governo e do mercado para a regularização), 36% das CRAs vendidas seriam
oriundas de áreas já protegidas pela Reserva Legal. Desse modo, apesar de o novo Código Florestal
ter mantido as regras de conservação para futuras conversões, a soma de anistias, flexibilizações
e mecanismos sem adicionalidade ambiental aponta claramente para uma redução nos níveis de
proteção da vegetação nativa.

46
VII - DA LENTIDÃO DE IMPLEMENTAÇÃO
DO CF AO DESMONTE (2012-2020)

Solo infértil para contestações ambientalistas

O novo Código Florestal (Lei no 12.651, de 2012) despertou uma reação crítica ampla,
especialmente por parte do setor acadêmico e da sociedade civil organizada, expressando uma preo-
cupação com um texto legislativo fragilizado em termos de proteção ambiental (Antunes, 2013). A
primeira reação foi a promoção da campanha “Veta, Dilma”, que contou com a adesão das principais
instituições científicas, de organizações ambientalistas do terceiro setor, de artistas e até mesmo de
sindicalistas e representantes da agricultura familiar, que apoiaram a revisão do Código Florestal
(Arruda, 2012). Apesar de ter logrado um grande alcance, a iniciativa falhou, visto que os poucos
vetos finais feitos pela presidente não afetaram os pontos cruciais de flexibilização do Código Florestal.
A partir desse momento, houve uma cisão dentro do movimento ambientalista entre
aqueles que viam o novo Código Florestal como o menor dos males e argumentavam sobre a
necessidade de avançar na implementação e aqueles que entendiam que a nova lei trazia um
precedente perigoso para todo o ordenamento jurídico de proteção ao meio ambiente. Em
particular, para esse grupo crítico, a nova lei foi alterada sem fundamentos científicos, afetando
o princípio da vedação de retrocesso ambiental29 e causando uma erosão jurídica da função social
das propriedades privadas (Paulino, 2012; Sauer e França, 2012). Nesse contexto, as alterações
do Código Florestal comprometem essa responsabilidade constitucional de conservar o meio
ambiente. Afora a redução de proteção da vegetação natural por diversas formas, o conceito de
“área rural consolidada”, introduzido pelo parecer do relator deputado Aldo Rebelo, base da
concessão das “anistias” previstas na lei, configura a grande chancela ao retrocesso da proteção
ambiental e ao não cumprimento da função social da propriedade.
Outros pesquisadores enfatizaram as bases científicas das alterações propostas no Con-
gresso Nacional. Metzger (2010, p. 6), por exemplo, alertou para o fato de que as propostas pela
flexibilização da legislação florestal não têm base em conhecimento científico disponível, que
contrariamente sinalizava uma “necessidade de expansão da área de conservação definida por esses
critérios [definidos pelo Código Florestal], em particular na definição das Áreas de Preservação
Permanente”. Sparovek et al. (2011 e 2012) também notaram a falta de fundamento científico
para as alterações no Código Florestal, propostas no parecer do relator deputado Aldo Rebelo, que
“escolheu adequadamente os mecanismos para atingir o objetivo de tornar o código mais efetivo

29 O princípio da vedação ao retrocesso é aquele segundo o qual uma medida jurídica não pode reduzir o nível de
proteção socioambiental conferido por norma anterior, de modo a comprometer o direito fundamental ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações, assim, ele decorre do sistema jurídico constitucional.
Conforme expõe Barroso (2001, p. 158), se uma lei, “ao regulamentar um mandamento constitucional, instituir
determinado direito, ele se incorpora ao patrimônio jurídico da cidadania e não pode ser absolutamente suprimido”.

47
e eficiente” (Sparovek et al., 2011, p. 131), no entanto, a redução excessiva de exigências poderia
gerar impactos ecológicos negativos. Uma equipe de pesquisadores ligados à Sociedade Brasileira
para o Progresso da Ciência (SBPC) e à Academia Brasileira de Ciências (ABC) publicaram um
relatório científico sobre as potenciais consequências das alterações no Código Florestal, assim
defendendo uma nova legislação, que condiria com as evidências científicas (Silva et al., 2012).
Apesar da proliferação de avisos da comunidade científica, tanto sobre os seus impactos
quanto sobre o retrocesso dos conceitos, o clima político após 2012 não favorecia um renasci-
mento dos interesses ambientais. O governo Rousseff (2010-2016) pôs fim a qualquer pretensão
de uma coalizão política voltada à conservação ambiental ao implantar uma coalizão com
vínculos com o agronegócio (Aamodt, 2018; Viola e Franchini, 2014). No segundo mandato
de Rouseff, todavia, a política brasileira estava oscilando à beira do colapso ante a diminuição
do crescimento econômico e a exposição, através da operação Lava Jato, de ampla corrupção na
esfera federal, resultando afinal no impeachment da presidente em 2016. No mesmo sentido, o
governo de Michel Temer (2016-2018) estava ligado aos interesses do agronegócio, encarregado
com a restauração da economia brasileira e, portanto, permitiu propostas legislativas que não
favoreceram a conservação florestal (Leão Pereira et al., 2019). Um exemplo desse fato foi a
discussão em 2016 da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 65, de 2012, que diminuiria
a força dos estudos prévios de impacto ambiental no licenciamento de projetos de construção,
arquivado no final da legislatura em dezembro 2018 (Fearnside, 2016). Essa instabilidade política,
junto com a dominância dos interesses do agronegócio (veja abaixo), complicaria a implementação
do Código Florestal nos anos após sua adoção.

O julgamento da constitucionalidade pelo STF e a consolidação do retrocesso

O setor da sociedade mais crítico ao CF, com destaque para o Instituto Socioambiental (ISA), tomou
medidas jurídicas visando a reverter as perdas ambientais trazidas pela nova lei, ingressando em ações
já propostas, como Amicus Curae. Foram julgadas em conjunto pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em
sessão encerrada em fevereiro de 2018, as três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI), 4.901, 4.902
e 4.903, propostas pela Procuradoria Geral da República (PGR), em janeiro de 2013, a ADI 4.937, proposta
pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), em abril de 2013, e a Ação Declaratória de Constitucionalidade
(ADC) 42, proposta pelo Partido Progressista (PP), em abril de 2016. O conjunto desses processos jurídicos
no STF questiona 45 dispositivos do novo Código Florestal (Tabela 2), inclusive a redução nas percentagens
da Reserva Legal se tiver uma área significante de unidade de conservação (art. 12, § 4º e 5º), o cômputo da
APP no cálculo da Reserva legal (art. 15) e a instituição da Cota de Reserva Ambiental (art. 44).
O acórdão foi publicado apenas em 2019, com declaração de constitucionalidade de 36
dispositivos da lei, que determina a interpretação conforme a Constituição de sete dispositivos e
reconhece como inconstitucionais expressões contidas em dois dispositivos legais. No julgado,
o relator, ministro Luiz Fux, destaca o meio ambiente equilibrado como um dever e um direito
constitucionalmente estabelecidos, destacando a importância fática dessa proteção:

48
A capacidade dos indivíduos de desestabilizar o equilíbrio do conjunto de recursos
naturais que lhes fornece a própria existência tem gerado legítimas preocupações, que
se intensificaram no último século. Afinal, recursos naturais têm sido extintos; danos
irreversíveis ou extremamente agressivos à natureza tornaram-se mais frequentes;
disfunções climáticas são uma realidade científica; diversas formas de poluição
se alastram pelos grandes centros, entre outras evidências empíricas do que se
cognomina crise ambiental. Nesse ínterim, o foco no crescimento econômico sem a
devida preocupação ecológica consiste em ameaça presente e futura para o progresso
sustentável das nações e até mesmo para a sobrevivência da espécie humana. O
homem apenas progride como ser biológico e como coletividade quando se percebe
como produto – e não como proprietário – do meio ambiente. [...] No Brasil, não
obstante constituições anteriores tenham disciplinado aspectos específicos relativos a
alguns recursos naturais (água, minérios etc.), a Carta de 1988 consistiu em marco que
elevou a proteção integral e sistematizada do meio ambiente ao status de valor central
da nação. Não à toa, a comunidade internacional a apelidou de Constituição Verde,
considerando-a a mais avançada do mundo nesse tema.30

Contudo, adiante, o relator defende que conciliar valores democraticamente eleitos, como meio
ambiente equilibrado para as presentes e futuras gerações, mercado de trabalho, desenvolvimento
social, atendimento às necessidades básicas de consumo dos cidadãos, etc., cabe não só ao Judiciário,
mas às instâncias democráticas. Sobre esse ponto, Fux evoca a competência das instâncias democráticas
para estabelecer regras e políticas que harmonizem desenvolvimento econômico e proteção ambiental,
em suas diversas nuances, destacando a “justiça intergeracional”, excluindo aqui a “convicção de juízes,
por mais bem intencionados que sejam”, citando Revesz e Stavins (2007). E continua:

17. A Jurisdição Constitucional encontra óbice nos limites da capacidade institucional


dos seus juízes, notadamente no âmbito das políticas públicas, cabendo ao Judiciário
a análise racional do escrutínio do legislador, consoante se colhe do julgado da
Suprema Corte Americana FCC v. Beach Communications, Inc. 508 U.S. 307 (1993), em
que se consignou que “a escolha do legislador não está sujeita ao escrutínio empírico
dos Tribunais e pode se basear em especulações racionais não embasadas em provas
ou dados empíricos” (“Legislative choice is not subject to courtroom factfinding and may
be based on rational speculation unsupported by evidence or empirical data”).

18. A capacidade institucional, ausente em um cenário de incerteza, impõe auto-


contenção do Judiciário, que não pode substituir as escolhas dos demais órgãos dos
Estado por suas próprias escolhas (VERMEULE, Adrian. Law’s Abnegation. Cambridge:
Harvard University Press, 2016. p. 130, 134-135).31

30 Acórdão – STF – DC 42 - DF, Relator Ministro Luiz Fux, 2018. p. 4-5.


31 Acórdão – STF – DC 42 - DF, Relator Ministro Luiz Fux, 2018. p. 5-6.

49
Além de eximir o Supremo Tribunal Federal (STF) de uma interferência em prol do preceito
constitucional na vigência da lei de proteção da vegetação natural, o relator destaca as inúmeras
audiências públicas realizadas ao longo de dez anos (de 2002, após a edição da MPV nº 2.116-67, de
2001, a 2012, ano de edição do novo Código Florestal) para firmar seu entendimento de que o Código
Florestal foi fruto de um processo democrático, conduzido na instância apta para tal condução.
Sobre o princípio da vedação do retrocesso, o acórdão dispõe que tal princípio não permite
que o Poder Judiciário se sobreponha a funções inerentes aos poderes Legislativo e Executivo e afaste
“arranjos legais mais eficientes para o desenvolvimento sustentável do país como um todo”.
Tanto a respeito da competência da justiça para a análise de políticas públicas e normas
provenientes do parlamento quanto em relação ao princípio da vedação ao retrocesso ambiental,
em diversos trechos do relatório e dos diversos votos é possível aferir que o STF, embora reconheça
a redução da proteção legal vigente no passado, buscou manter vigente, com o julgamento de
constitucionalidade, a maioria dos artigos questionados, considerando tratar-se de um ponto de
inflexão, em que se passou de uma norma mais protetiva, pro natura, para uma norma que seria
implantada no campo, “mesmo que não promova os interesses ambientais no máximo patamar
possível” (trecho já citado do relatório).
Contudo, deve-se observar que os eminentes ministros não consideraram o cenário político de
implantação da norma e o potencial de influência do setor agropecuário para a sua não implantação,
bem como para sua futura alteração, em prol do seu não cumprimento.
Ainda, as decisões do próprio STF têm se aproximado cada vez mais do reconhecimento de
seu papel fundamental na manutenção do direito constitucional e intergeracional ao meio ambiente
equilibrado, ocorrendo o mesmo no âmbito do direito ambiental internacional.
Em decisão recente, a ministra Rosa Weber estabelece, com fundamento em outros julgados
do STF e na doutrina, que o retrocesso normativo, que não deve ser confundido com sua atualização,
“sugere agravamento da situação de inadimplência do Brasil para com suas obrigações constitucionais
e convencionais de tutela do meio ambiente”, deixando-se com a revogação, por ela analisada, o
arcabouço normativo de defender o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225,
caput, da CF) e os direitos fundamentais à vida (art. 5º, caput, da CF) e à saúde (art. 6º da CF). Cita,
então, a ministra relatora32, trechos de Michel Prieur e do ministro Herman Benjamin:

[...] junto com o princípio do desenvolvimento sustentável, não se pode esquecer


dos direitos à vida e à saúde das gerações futuras e, assim, há que se impedir que
se tomem medidas que causariam danos a elas. Reduzir ou revogar as regras de
proteção ambiental teria como efeito impor às gerações futuras um ambiente mais
degradado. (Prieur, 2012 apud STF, 2020, p. 17).

É seguro afirmar que a proibição de retrocesso, apesar de não se encontrar, com


nome e sobrenome, consagrada na nossa Constituição, nem em normas infracons-

32 STF - Medida cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 749. Distrito Federal (28/10/2020).
Relatora ministra Rosa Weber. Decisão monocrática submetida e mantida pelo Plenário do STF. Disponível em: <http://redir.stf.
jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=6019001>.

50
titucionais, e não obstante sua relativa imprecisão − compreensível em institutos de
formulação recente e ainda em pleno processo de consolidação −, transformou-se
em princípio geral do Direito Ambiental, a ser invocado na avaliação da legitimi-
dade de iniciativas legislativas destinadas a reduzir o patamar de tutela legal do
meio ambiente, mormente naquilo que afete em particular a) processos ecológicos
essenciais, b) ecossistemas frágeis ou à beira de colapso, e c) espécies ameaçadas de
extinção. (Benjamin, 2012 apud STF, 2020, p. 18).

Diferentemente do que foi decidido no julgamento da constitucionalidade de artigos do


Código Florestal, a recente decisão de Rosa Weber atualiza a posição do Supremo em relação às
últimas decisões tomadas por tribunais estrangeiros ainda quanto ao papel do Poder Judiciário,
quando a ministra relatora expõe que

embora não caiba ao Poder Judiciário se substituir à avaliação efetuada pelo Admi-
nistrador relativamente ao mérito das políticas ambientais por ele desenvolvidas,
insere-se no escopo de atuação dos Tribunais, por outro lado, forte no art. 5º, XXXV,
da CF, assegurar a adequada observância dos parâmetros objetivos impostos pela
Constituição, bem como preservar a integridade do marco regulatório ambiental
(STF, 2020).

No mesmo sentido, expôs Joana Setzer (professora da London School of Economics), em 22 de


setembro de 2020, na audiência pública para a instrução da Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental (ADPF) 708, a ser julgada pelo STF, que no âmbito do direito internacional há exemplos
atuais de tribunais que decidiram em prol da proteção social das mudanças climáticas, suprindo o
Poder Judiciário a omissão de outros poderes. Setzer cita a decisão de Suprema Corte da Holanda, no
caso Urgenda, que explicitou que os tribunais podem e devem proferir decisões declaratórias, que
certificam a ilicitude de uma omissão estatal. Cabe à Justiça, portanto, determinar que o órgão público
adote medidas no sentido de alcançar o equilíbrio ambiental e a justiça intergeracional.
Quanto ao Código Florestal, uma análise atualizada indicaria que não há afronta ao princípio
da separação dos poderes, quando o Supremo Tribunal Federal corrige falhas na legislação que
retroagem, retirando a proteção necessária ao equilíbrio ambiental. Não substituiria o papel do Poder
Legislativo, mas, sim, observaria o seu dever de agir, o Judiciário, caso, por exemplo, julgasse que 5
metros de APP, no entorno de um rio, não são suficientes para garantir biodiversidade, polinizadores e
segurança hídrica, essenciais à própria atividade agrícola.

51
Tabela 2 - Resultado do julgamento final do STF em 28 de fevereiro de 2018

i
s

sk
ae

er ow
or

so
Ce en e M

eb d
Lu to es
Ed ff o

W an
Fu rro

Ro o L io
Di de ia
To ell

Ro r M n
d
rm e d

rd rél
i

sa ew
c

be en
lm ch

iz Ba
so oli
as M
ls Lú
o

AD .901

I4 2

I4 3
ex 7

Ri Au
Cá ndr

Gi Fa
af

AD .90

AD .90

Al .93

x
AD 2
gr
In o

ea

co
n
4

r
a
so

a
RESULTADO

I4

I4

o
tig

ca
ín

ar
ci

AD
Pa
Ar

Al

M
3º VIII b i1 i i pv a a a v v a a a a a (M) Exp. inconst.
3º IX ii ii a a pv a a pv a a a a a (M) Int. conf. Const.
3º XVII iii a pv a a a v a a a a a (M) Constitucional2
3º XIX iii iv a pv a a a a a a a pv a (M) Constitucional3
3º ú iv v v a a a a v a a a a a (M) Exp. inconst.
4º III v vi a a a a a a a a a a a (U) Constitucional
4º IV vi vii a pv a a a v a a pv a a (M) Int. conf. Const.
4º 1º vii viii a v a a a a a a a v a (M) Constitucional
4º 4º viii ix a v a a a a a a a v a (M) Constitucional
4º 5º ix x a a a a a a a a a a a (U) Constitucional
4º 6º e inc. x xi a a a a a a a a a a a (U) Constitucional
5º xi xii a a a a a a a a pv pv a (M) Constitucional
7º 3º xii i ii a a a a v a v v v v a (M) Constitucional
8º 2º xiii xiii a a a a a a a a a a a (U) Constitucional
11 xiv a pv a a a a a a a pv a (M) Constitucional
12 4º xiv i a a a a v a v a v v v (M) Constitucional
12 5º xv ii a a a a v a v a v v v (M) Constitucional
12 6º xvi iii a v a a v a a a a a v (M) Constitucional
12 7º xvii iv a v a a v a a a a a v (M) Constitucional
12 8º xviii v a v a a v a a a a a v (M) Constitucional
13 1º xix vi iii a a a a v a a a a a a (M) Constitucional
15 xx a a a a v a a a pv pv v (M) Constitucional
17 3º xxi ii xv a a a a v a v v v v a (M) Constitucional
28 viii a a a a a a a a a a a (U) Constitucional
44 xxii iv a a a a a a a a a a a (U) Constitucional
48 2º xxiii ix v pv pv a a v pv pv pv a a a (M) Int. conf. Const.
59 4º xxiv iii vi a a a a v pv v v v v a (M) Int. conf. Const.
59 5º xxv iv vii a a a a v pv v v v v a (M) Int. conf. Const.
60 xxvi v viii a a a a a a v v v v a (M) Constitucional
61A xxvii vi ix a a a a pv a a a v v a (M) Constitucional
61B xxviii vii x a a a a v a a a v v a (M) Constitucional
61C xxix viii xi a a a a v a a a v v a (M) Constitucional
62 xvi a a a a a a a a a a a (U) Constitucional
63 xxx ix xii a v a a a a a a v v v (M) Constitucional
66 3º xxxi x a a a a v a a a v v v (M) Constitucional
66 5º xxxii xi a a a a v a a a v pv a (M) Constitucional
66 6º xxxiii xii a a a a v a a a v pv a (M) Constitucional
67 xxxiv xiii x a v a a v a a a v v v (M) Constitucional
68 xxxv xiv a a a a pv a a a a a a (M) Constitucional
78A xxxvi xi a a a a a a a a a a a (U) Constitucional
1 Número dos itens dos pedidos das Ações; 2 e 3 A decisão sobre o art. 4º, I, afeta por arrastamento a aplicação do inciso XVII do art. 3º;

Legendas: a - acompanha a maioria; v - vencido; pv - parcialmente vencido; (M) - maioria; (U) - unanimidade; Exp. Inconst. - expressões
consideradas inconstitucionais; Int. conf. Const. - Interpretação conforme a Constituição

52
Implementação retardada: questões técnicas e adiamentos

Os governos federal e estaduais progrediam a passos lentos na implementação do Código


Florestal. Pela lei, o prazo de inscrição do CAR seria de um ano, contado da implementação
do cadastro, e prorrogável por mais um, por ato do Poder Executivo (art. 29, § 3º, da lei nº
12.651, de 2012). Caso o governo optasse por determinar que o CAR, previsto na lei, seria
o CAR criado no contexto do Programa Mais Ambiente, ainda que houvesse a prorrogação,
o prazo final de inscrição no CAR seria maio 2014, exatamente dois anos após a aprovação
da lei. Mas foi somente em 2014 que o Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural
(Sicar) foi oficialmente inaugurado pela Instrução Normativa MMA nº 2, de 2014, na mesma
época em que a atribuição para gerir o Sicar foi transferida para o Serviço Florestal Brasileiro
(SFB). Foi também nesse ano que o Ministério do Meio Ambiente finalmente publicou o
Decreto nº 8.235, de 2014, estabelecendo normas para a implantação do CAR e do PRA.
Além de muitas dúvidas no setor privado e questionamentos da sociedade civil, esse
atraso de dois anos gerou uma grande confusão com os estados, muitos dos quais já haviam
iniciado a implementação de cadastros estaduais. Os processos tiveram de ser interrompidos,
com a necessidade de alinhar os sistemas estaduais aos dados ao Sicar ou adotar o sistema fe-
deral. Apesar das dificuldades e demoras no desenvolvimento do Sicar, o processo de inscrição
no CAR foi exitoso. O primeiro boletim do SFB trazia a informação de que somente 737 mil
imóveis haviam se inscrito no CAR, totalizando menos de 155 Mha. O prazo foi prorrogado
em 2015, por meio da Portaria nº 100, de 2015. Pela lei, não havia mais possibilidade de
prorrogação. Assim, próximo ao prazo final de inscrição em 2016, ocorreu um salto no nú-
mero de inscritos, chegando-se a 6,3 milhões de cadastros e cobrindo uma área de 543 Mha
(Figura 1). Esse sucesso pode ser explicado por diferentes fatores. Ao transferir a coordenação
do Sicar do Ibama para o SFB, primeiramente, foi possível gerar uma aproximação maior com
o setor agropecuário, ante a redução do temor de que o CAR aumentaria o risco de multas
aos produtores. Outro ponto foi a atuação dos sindicatos rurais e das ONGs, que se tornaram
um importante vetor na implementação do CAR. O Fundo Amazônia também teve uma
contribuição relevante ao investir R$ 332 milhões em projetos que apoiavam o cadastro de
pequenos imóveis (BNDES, 2019).

53
Número de imóveis rurais inscritos no Cadastro Ambiental Rural entre abril de 2015 e novembro de
Figura 1 -
2019 nas cinco regiões do Brasil.

Apesar de avanços na implementação do CAR, as demais etapas de implementação do


Código Florestal progrediram pouco, desde 2012. Por ser autodeclaratório e não conter filtros
que impeçam as sobreposições com unidades de conservação, terras indígenas e entre cadastros, os
órgãos ambientais necessitam validar o CAR antes de permitir ao produtor que exerça seus direitos
(por exemplo, autorização de desmatamento) e sejam cobrados de deveres (como restauração de
passivo ambiental). Um módulo de análise automatizado já vem sendo anunciado pelo SFB, desde
2014, levando vários estados à inércia na expectativa de um módulo único federal. Em 2020,
tal módulo foi apresentado aos estados, mas a sua implantação está apenas na fase de projetos
pilotos, e nenhum estado ainda dispõe dessa ferramenta para a implantação do Código Florestal.
Desse modo, com exceção de Mato Grosso e Pará, o processo de validação do CAR praticamente
não havia iniciado até o início de 2021. Além dessas questões técnicas, o distanciamento entre
governo federal e vários estados, ONGs e academia, após as eleições de 2018, retarda mais ainda
o processo de implementação, pois a transferência de conhecimento e experiências para o governo
ocorreu de forma mais limitada. Um terceiro gargalo significativo é a regulamentação do PRA.
O prazo inicial para a sua implantação era de um ano, cabendo à União ditar regras gerais no
prazo de 180 dias para os estados (art. 59 original da Lei nº 12.651, de 2012). Em dezembro
de 2019, somente 15 das 27 unidades federativas haviam publicado o decreto do PRA. Destas,
somente Rondônia, Pará, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Bahia conseguiram implementar
também os procedimentos de implementação do PRA (CPI, 2019; 2020).
Tanto o CAR quanto o PRA possuíam prazos legais a serem cumpridos, mas em ambos
os casos esses prazos foram prorrogados múltiplas vezes. Por fim, após a edição de duas MPVs
que tramitaram em 2019 (a MPV nº 867, de 2018, e a MPV nº 884, de 2019), o prazo foi
excluído pela Lei nº 13.887, de 2019. É importante destacar que ambas as MPVs tiveram um
trâmite muito conturbado no Congresso Nacional e que foi necessária uma mobilização intensa

54
da sociedade civil, da academia, do Ministério Público e de parlamentares ambientalistas para que
os danos à legislação não as inviabilizassem. Foram feitas diversas campanhas, onze audiências
públicas no Congresso Nacional, levantamentos de dados e estudos. Um desses estudos apontou
que relativamente poucos imóveis rurais têm algum descumprimento em relação aos requisitos de
Reserva Legal, e menos de 15% desmataram ilegalmente após 2008 no Cerrado e na Amazônia
(Rajão et al., 2020, p. 246-248).
A inscrição no CAR é “condição obrigatória para a adesão ao PRA” (art. 59, § 2˚), cujo
prazo original era de um ano a contar da implantação dos programas pelos governos estaduais,
prorrogável uma única vez por mais um ano. Na mesma linha e pelas mesmas normas que alte-
raram o prazo para a inscrição no CAR, o prazo para a adesão ao PRA vem sendo alterado desde
a edição da lei. Ainda, esse prazo foi vinculado ao prazo para a inscrição do CAR em 2016 (Lei
nº 13.335, de 2016) e posteriormente desatrelado pela Lei nº 13.887, de 2019. Essa série de
prorrogações se assemelha às prorrogações do prazo para a regularização e a averbação da Reserva
Legal, por diversas normas antes mesmo da revogação da Lei nº 4.771, de 196533, principalmente
nos quatro anos antes do novo Código Florestal, que foi discutido na seção anterior, e simbolizam
uma fragilização das intenções de implementar os instrumentos fundamentais do Código Florestal.
Os atrasos no desenvolvimento de plataformas para apoiar a validação do CAR e também
os atrasos dos estados na definição do PRA contribuíram para a criação de um ciclo vicioso. Com
as constantes mudanças de prazos, a implementação do Código Florestal perde prioridade política
nos órgãos estaduais e federais. Ao mesmo tempo, as mudanças no prazo do CAR e do PRA, através
da edição de Medidas Provisórias, também contribuíram para tentativas adicionais de enfraqueci-
mento do Código Florestal. Os “jabutis” (emendas fora do escopo da proposta original) incluídos
nas Medidas Provisórias de mudanças de prazo incluem extensões da anistia do desmatamento,
a extinção da Reserva Legal e até mesmo o fim do prazo para a adesão ao PRA, o que na prática
geraria uma anistia para todo o desmatamento ilegal anterior a 2008. A última modificação do
Código Florestal ocorreu por meio da Lei nº 13.887, de 2019, derivada da MPV nº 884, de 2019.
No dia em que o prazo de inscrição ao CAR se esgotaria, essa MPV estabeleceu que o CAR teria
“prazo indeterminado”, enquanto somente os inscritos até 31 de dezembro de 2020 acessarão os
benefícios do PRA, desde que a adesão a esse programa ocorra em até dois anos da edição da lei
(i.e. dezembro de 2021).
Outro aspecto que gera preocupação com relação à implementação do Código Florestal
são o atraso e os equívocos na regulamentação das Cotas de Reserva Ambientais (CRA). Afora
a discussão já amadurecida no governo federal para a regulamentação das CRAs, previstas no
Código Florestal de 1965, a discussão sobre a regulamentação do mercado de CRA teve início em
2013, sob a responsabilidade da Coordenação-Geral de Meio Ambiente e Mudanças Climáticas
do então Ministério da Fazenda (MF). Uma primeira versão da minuta de decreto chegou a ser
concluída em 2014, porém, com a transferência do CAR para o SFB, o Ministério do Meio
Ambiente passou a liderar a elaboração do decreto. A pedido do MF, a UFMG avaliou a

33 Lei nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991; MPV nº 1.956-50, de 26 de maio de 2000; MPV nº 2.166-67, de 24 de agosto de
2001; e artigo 55 do Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, alterado sucessivamente pelos Decretos nº 6.686, de 2008; nº
7.029, de 2009; nº 7.497, de 2011; nº 7.640, de 2011; e nº 7.719, de 2012.

55
viabilidade do mercado sob diferentes opções regulatórias (como a restrição ao estado/bioma
ou só ao bioma). O estudo chegou à conclusão de que, ao contrário do que se supunha
até então, havia um problema de excesso de oferta de CRAs, não de falta dessas para a
compensação de Reserva Legal. Desse modo, o estudo propôs também que as cotas deve-
riam ser utilizadas além da compensação, servindo como infraestrutura para programas de
pagamento de serviços ambientais (Rajão e Soares-Filho, 2015). A ideia do uso da CRA para
outras finalidades ganhou espaço nas discussões feitas entre SFB, Observatório do Código
Florestal e representantes do agronegócio a partir de 2015. Porém, somente em 2018, em
um dos últimos atos do governo de Michel Temer, o Ministério do Meio Ambiente publicou
o Decreto nº 9.640, de 27 de dezembro de 2018, regulamentando o mercado de CRA.
Por um lado, a regulamentação reconhece que as CRAs podem ser utilizadas para a remu-
neração de outros serviços ambientais; por outro, acaba por reduzir ainda mais a adicionalidade
ambiental das cotas. Sem fundamento na Lei nº 12.651, de 2012, a norma estabelece que a
compra de uma cota para compensação “não constitui pagamento pela adicionalidade ambiental
decorrente das atividades de manutenção das áreas vinculadas à CRA e não afeta a elegibilidade
dessas áreas para outros pagamentos ou incentivos devidos por serviços ambientais” (§ 9º do
art. 19). Desse modo, o decreto permite que a mesma CRA seja revendida para outros usos
(i.e. Pagamento de Serviços Ambientais (PSA) de carbono, biodiversidade, etc.), sem que seja
garantida uma adicionalidade ambiental nessa revenda, inflando um mercado que já sofre com
excesso de oferta e falta de demanda (van der Hoff e Rajão, 2020). Além disso, a norma estipulou
um sistema excessivamente burocrático, sem gerar maior controle ambiental sobre a área objeto
da CRA, dificultando o ingresso de diversos públicos no mercado, principalmente pequenos
produtores, assentados, povos e comunidades tradicionais. A norma possui ainda fragilidades
relacionadas a conflitos de competência entre estados e União e não confere garantias suficientes
ao comprador para que opte por esse mecanismo de compensação de Reserva Legal. Soma-se
a isso o julgamento do STF34 que, ao estabelecer a necessidade de “identidade ecológica” entre
o imóvel com deficit de Reserva Legal e a CRA que o compensaria, trouxe uma necessidade de
definição jurídica e científica do termo, ainda não enfrentada.

Desmatamento crescente e o desmonte


da política ambiental brasileira

A realidade vivida nos anos pós-aprovação do novo Código Florestal está distante do
“fim do desmatamento” anunciado em publicações realizadas no fim dos anos 2000 (Nepstad
et al., 2009). Os atrasos na implementação e as constantes demonstrações de força daqueles
que se negam a cumprir a lei, com as constantes prorrogações de prazo, contribuem para o
aumento do desmatamento, observado a partir de 2012. Assim, a taxa de desmatamento na

34 Conforme citado acima, foram interpostos embargos de declaração com vista a esclarecer esse ponto do acórdão do
STF. O acórdão permite interpretar que a identidade ecológica somente recai sobre a CRA, e não diz respeito a outros
instrumentos, como a doação de imóveis em Unidades de Conservação pendentes de regularização fundiária e servidão.

56
Amazônia, calculada pelo Inpe, saltou de 4.571 km2 em 2012 para 10 mil km2 em 2019,
voltando aos patamares só vistos antes de 2008. Essa tendência é fruto de um fenômeno
amplamente denunciado como “desmonte da política ambiental” (Leão Pereira et al., 2019);
(Ferrante e Fearnside, 2019) e está se consolidando particularmente durante governo Bolso-
naro (2019-presente). Sob a liderança de Ricardo Salles no Ministério do Meio Ambiente,
a política ambiental está cada vez mais orientada por um discurso que inverte os papéis ao
colocar fiscais do Ibama como “vilões”, e garimpeiros e grileiros como “heróis” nacionais
(Ferrante e Fearnside, 2019).
As evidências desse desmonte estão se acumulando tanto no Poder Executivo como
no Poder Legislativo. Em especial, o Ministério do Meio Ambiente enfraquece a fiscalização
ambiental. Após uma reação contundente da sociedade civil e de investidores no Brasil e no
exterior, o governo promoveu mudanças, como a criação do Conselho Nacional da Amazônia,
liderado pelo vice-presidente da República, General Mourão, e realizou ações pelas Forças
Armadas de combate às queimadas e ao desmatamento, as quais, contudo, se mostraram muito
mais onerosas e menos eficientes do que as ações dos órgãos ambientais de controle (Potter,
2020). Soma-se a esse cenário a lentidão das ações do SFB, que ficou sob responsabilidade do
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento desde 2019, distanciando-se das perspec-
tivas de implementação do Código Florestal. Por outro lado, percebe-se um risco crescente de
fragilização da legislação florestal brasileira no âmbito do Poder Legislativo. Primeiramente,
houve tentativas de revogar os dispositivos que regulam a Reserva Legal Capítulo IV, artigos
12 a 25 da Lei no 12.651, de 25 de maio de 2012, através dos Projetos de Lei no 1.551 e no
2.362, de 2019, mas ambos os projetos foram retirados pelos autores após pressão da ala mais
progressista do próprio agronegócio. Contudo, além de outras propostas, pequenas flexibilizações
e grandes “jabutis” em projetos de lei não relacionados ao Código Florestal continuam em tra-
mitação no Congresso Nacional. São projetos que flexibilizam de forma contundente o Código
Florestal, como o Projeto de Lei n° 5.186, de 2019, do senador Irajá (PSD/TO), que permite
a compensação de Reserva Legal desmatada a qualquer tempo, por área equivalente ao dobro
da área desmatada, o que levará a perda de biodiversidade, concentração de áreas conservadas
em locais de baixo custo e vazios de vegetação natural, comprometendo a disponibilidade de
água e polinizadores, essenciais à própria atividade agropecuária.
Em reação às taxas crescentes de desmatamento, houve reação dos mercados interna-
cionais com ameaças de boicote, desinvestimento e não ratificação do acordo comercial entre
União Europeia e Mercosul. Apesar desses sinais terem o potencial de se contrapor à tendência
de desmonte ambiental, a demanda crescente da China fez com que aumentassem as vendas e a
margem de lucro do agronegócio, gerando ceticismo sobre a efetividade da pressão internacional.
Tanto esses esforços de fragilizar o Código Florestal quanto as tentativas para implementá-lo e
fortalecê-lo, mencionadas acima, indicam que os dispositivos da legislação florestal brasileira
continuam altamente disputados ao entrar da década 2020.

57
REFLEXÕES FINAIS

A história apresentada neste estudo cobriu um período de cinco séculos de evolução da


legislação florestal brasileira, oferecendo uma perspectiva longitudinal. Tal perspectiva não é
relevante somente para conhecer o passado, mas para compreender melhor a situação no presente
e enxergar caminhos mais eficientes para a produção rural sustentável e a conservação das florestas.
Olhando o passado, é possível notar que os esforços de conservar as florestas brasileiras não se
originaram com o surgimento do ambientalismo, desde a década de 1960, mas surgiram durante
a colonização. Assim, podemos fazer reflexões altamente importante sobre as polêmicas políticas
que circulam nos debates atuais. Aqui destacamos três lições implícitas na história da legislação
florestal brasileira que enfatizam (1) as diferentes motivações no tempo para conservação flores-
tal, (2) a desconexão e, consequentemente, os conflitos perenes entre interesse social e interesse
individual, e (3) a sensibilidade a tendências exteriores do país.
Ao longo da história, as motivações para conservar as florestas brasileiras mudaram com
cada alteração de paradigma (veja Tabela 3). A proteção do pau-brasil e de outras madeiras nobres
de alto valor econômico durante a colonização do Brasil foi motivada principalmente pela sua
relevância para a metrópole no continente europeu, reservando-as para a sua indústria naval. Essas
proteções se mantiveram após a Proclamação da Independência do Brasil e durante a Primeira
República, apesar de os motivos terem perdido sua relevância e, portanto, sua eficácia perante o
então incipiente liberalismo econômico. No século XIX, as florestas começam a ser concebidas
como fornecedoras de chuvas e protetoras dos rios e solos, cuja salubridade era (e continua sendo)
imprescindível para sustentar o surgimento da produção agropecuária prevalente na época. Ao
mesmo tempo, esse modelo de expansão da agropecuária passou a ser questionado como sendo
predatório e primitivo, desconsiderando fundamentos da natureza. Por isso, a regulação do
uso da terra e a proteção das florestas, consolidadas no Código Florestal de 1934, funcionaram
como garantia dessa salubridade natural e, portanto, uma produção madeireira e agropecuária
sustentável a longo prazo. Essa visão perdurou durante o regime militar, que elevou a proteção
florestal a novos patamares através do novo Código Florestal de 1965 e, mediante a Constituição
Federal de 1967, ancorou a conservação florestal por proprietários privados no conceito da função
social da propriedade. Ao mesmo tempo, a maior parte das normas não saíram do papel em
consequência tanto do poder da elite rural como também pela percepção equivocada, difundida
pela Revolução Verde (i.e. introdução de insumos sintéticos) e com o aumento da produtividade,
de que os limites impostos pela natureza haviam sido superados.
Com o surgimento do ambientalismo no período 1960-1980 e seus efeitos na legislação
florestal nas décadas seguintes, pôde-se observar uma evolução paradoxal. Por um lado, as
motivações para conservar as florestas brasileiras não somente continuaram sendo fundamen-
tadas em uma perspectiva produtivista, mas foram amplamente expandidas e diversificadas
com o conceito de serviços ecossistêmicos, juntamente com a luta pelos direitos dos povos
da floresta. A proteção da biodiversidade, da polinização, da água e das formas de vida das
populações tradicionais abarcou rapidamente a ênfase no papel das florestas para esforços de

59
combater a mudança climática. Por outro lado, essa motivação mais ampla não encontrou
adesão na agenda desenvolvimentista nacional, o que levou ao equivocado argumento de que a
proteção florestal e ambiental, promovida nas décadas de 1990 e 2000, representa “empecilhos
ao desenvolvimento regional”, principalmente da Amazônia, e que seria resultado da “cobiça
internacional” e de outros interesses escusos. Tal argumento é evidente nos prolíferos projetos
de lei e nas propostas normativas que buscam mais leniência nas restrições ambientais e cujos
objetivos econômicos predatórios são irrestritamente defendidos no atual governo Bolsonaro.
Assim, além do paradoxo entre sua cientificamente explícita necessidade de implantação e
sua desconexão com relação às prioridades políticas nacionais, a conservação florestal ganhou
uma dupla face de Jano35, em que um lado busca um modelo de desenvolvimento econômico
retrógrado, superado pela ineficiência e pelas externalidades negativas da degradação das flo-
restas, e o outro avista um futuro sustentável, justo, moderno e promissor, mas ainda incapaz
de satisfazer as necessidades sociais no curto prazo.

35 Trata-se de uma metáfora com o deus da transformação Jano, que, segundo a mitologia romana, possui duas faces, uma
sempre voltada para trás, admirando aquilo que já aconteceu, nostalgicamente, e a outra, para frente, olhando o porvir, o futuro.

60
Tabela 3 - Sumário das principais legislações florestais no Brasil entre 1500 e 1979

Período Legislação Escopo Lógica Principais


principal restrições
Produtivista
Ordenações, cartas (proteção da Proibição do corte
Período colonial
régias, regimentos, Madeiras de lei indústria naval de madeiras de lei
(1500-1822)
alvarás, etc. e dos interesses sem autorização
do Estado)

Enfraquecimento
Independência do de leis federais
Brasil e Primeira em prol da Variável por Variável por
Liberal
República (1822- desregulamentação estado estado
1930) e/ou de uma
regulação estadual

Proteção das
matas ciliares
e proibição
Produtivista
Era Vargas e de corte raso
Código Florestal de Florestas e outras (produção
República de em 1/4 da área
1934 vegetações madeireira e
1946 (1930-1964) para produção
agrícola)
madeireira e
conservação dos
solos e da água

Proteção das
matas ciliares,
dedicar 20% da
Produtivista
área (50% na
(produção
Regime Militar Código Florestal de Florestas e outras Amazônia e em
madeireira
(1964-1979) 1965 vegetações áreas incultas)
e agrícola) e
para produção
nacionalista
madeireira e
conservação dos
solos e da água

Manutenção Aumento da
Código Florestal de de serviços proteção das
Surgimento do
1965, Constituição ambientais, matas ciliares
ambientalismo e Florestas e outras
Federal e Lei de biodiversidade, e, pós-2001, da
redemocratização vegetações
Crimes Ambientais mitigação das Reserva Legal na
(1979-2008)
de 1998 mudanças Amazônia de 50%
climáticas para 80%

Flexibilização
Adequação da
do Código Código Florestal de Florestas e outras Manutenção
lei à realidade
Florestal (2008- 2012 vegetações das restrições
(i.e. anistia)
2012) para conversões
Manutenção futuras, mas
Lentidão na Código Florestal anistia de
do status quo
implementação de 2012 e grande parte do
Florestas e outras e, após 2018,
e desmonte do modificações para desmatamento
vegetações questionamento
Código Florestal prorrogação de ilegal até 2008
da legitimidade
(2012-2020) prazos
da lei

61
A perda de prioridade da conservação florestal no âmbito da política federal está vinculada
a um segundo fenômeno, a falta de conexão entre interesse social e interesse individual. Apesar
de esse fenômeno estar se manifestando mais fortemente nas últimas décadas, ele esteve sempre
presente ao longo da história da legislação florestal brasileira.
No período colonial do Brasil as leis florestais não foram cumpridas pelas poderosas elites
agrícolas. Durante o Império até a Primeira República, o poder dessas elites rurais se intensificou,
acompanhado de um gradual desmonte da legislação florestal e de descentralização do poder inspirada
pelo liberalismo econômico. Com a Era Vargas e o regime militar, o poder político ficou cada vez
mais centralizado, o que possibilitou a promoção de agendas modernas, baseadas na recomendação
de especialistas, embora com o balanço negativo dos incentivos à colonização da Amazônia.
Até 2006, o contexto político era mais favorável para avançar os interesses ambientalistas,
o que levou ao consequente surgimento de leis e políticas ambientais mais avançadas e alinha-
das com o desenvolvimento sustentável. Os efeitos mais imediatos dessas políticas ambientais
materializaram-se entre 2004 e 2012, quando a taxa de desmatamento entrou em uma queda
sem precedentes. Contudo, como o presente estudo exaustivamente apresentou, demorou pouco
para que os interesses do setor produtivo se manifestassem mais fortemente nas arenas políticas,
resultando em uma enorme flexibilização da principal norma jurídica florestal e, como parte
disso, a erosão do conceito da função social das propriedades privadas.
Tanto a flexibilização do Código Florestal em 2012 quanto o desmonte da política am-
biental nos anos seguintes são fruto de um contexto histórico em que os interesses individuais
nunca cederam completamente às imposições da legislação florestal.
Algumas tendências recentes podem oferecer uma perspectiva mais otimista. Surge uma
ideia ainda incipiente de que o produtor rural pode ser remunerado pelos serviços ambientais
prestados pela manutenção da vegetação natural. Essa possibilidade é refletida no mecanismo
de Cotas de Reserva Ambiental (CRAs), cujo funcionamento ainda enseja muitas dúvidas. Mais
recentemente, foi editada a Lei nº 14.119, de 13 de janeiro de 2021, que institui a Política Nacio-
nal de Pagamento por Serviços Ambientais (PNPSA), dispondo de uma série de modalidades de
remuneração. Ao mesmo tempo, é possível observar que a demanda por produtos agropecuários do
Brasil está cada vez mais sensível a questões de sustentabilidade, o que vem inclusive impactando
na implantação do acordo comercial entre União Europeia e Mercosul, conforme destacado na
seção anterior. O setor financeiro cada vez mais enfatiza o desinvestimento em produções que
envolvam poluição ou degradação ambiental, bem como a ampliação dos investimentos em ativos
com alinhamento Ambiental, Social e de Governança (ASG). Essas tendências inclusive indicam
que o próprio conceito de “produção agrícola” pode ser expandido para que inclua atividades de
conservação florestal.
Uma terceira e última lição da longa história da legislação florestal brasileira é a sua susce-
tibilidade, ainda que indireta, a tendências, perspectivas e movimentos externos. Evidentemente,
as primeiras leis florestais do Brasil foram espelhadas nas Ordenações Afonsinas, Manuelinas e
Filipinas, utilizadas em Portugal, que por sua vez possuíam influência dos direitos romano, ca-
nônico e ibérico, transferidas para o contexto brasileiro. Da mesma forma, os fundamentos para
o Código Florestal de 1934 e o de 1965 foram inspirados por debates na Europa e nos Estados
Unidos, locais onde a conservação florestal já se iniciara algumas décadas antes.

62
A influência mais clara, porém, adveio da ratificação de acordos ambientais internacionais e
da repercussão das críticas às altas taxas de desmatamento. Em contrapartida, há reflexos do relevo
dado à proteção da soberania nacional, como a restrição de corte raso de 50% das propriedades na
Amazônia, derivada, entre outras razões, do interesse geopolítico do governo militar em estimular
o controle privado de áreas consideradas “vazios demográficos”.
Entre 2010 e 2020, a preocupação nacionalista retornava às arenas políticas do Brasil,
desconectada de um contexto histórico e científico, culminando na eleição do atual presidente
Jair Bolsonaro, que adotaria um discurso hostil nas negociações internacionais no âmbito de
questões ambientais, com evidentes laços com o setor agrícola.
Contudo, após séculos de legislação florestal brasileira, seria errado considerar esse assunto
estranho ao próprio projeto de nação. Mais adequado seria alegar que, nessa inevitável interação
entre o Brasil e o mundo externo, o país sempre buscou, ainda que de forma errática, um rumo
próprio, fundamentado em ciência e moderno, tendo as florestas, como reflexo, um papel que
caiba nessa visão.
As três lições aqui discutidas são altamente relevantes para determinar nova estratégia
para a conservação florestal no Brasil. Primeiramente, é preciso disseminar a informação de que a
ciência já comprovou que as florestas – e a natureza em geral – têm papel fundamental não só para
a sociedade, mas para a sustentabilidade econômica das atividades produtivas. Essa informação
precisa ser conhecida e apropriada pelos setores produtivos, que possuem papel preponderante no
êxito da implementação da legislação florestal brasileira. A segunda ação é levar ao conhecimento
da sociedade brasileira dados sobre a importância e o status de proteção florestal no país, além
da demonstração de que proteger florestas não é menosprezar desenvolvimento econômico,
tampouco bem-estar social. Por último, é importante levar o poder público a se apropriar da
oportunidade da proteção da vegetação natural como patrimônio nacional. A conservação florestal
é uma oportunidade estratégica para o Brasil.

63
Tabela 4 – Principais alterações ao longo do tempo
MPVs
Decreto Lei Lei
1.956-50 a
23.793 4.771 7.803
2.166-67
1934 1965 1989 2001
Área de Preservação Permanente
(conservação)
Rios:
• Leito Áreas específicas Não disp. Não disp.
• Mínimo (leito <5 m) definidas em 5m 30 m
• Máximo (Leito >600 m) decreto 100 m 500 m
Outras áreas:
• Lagos (zona rural) Não disp. 50 m
• Lagos (zona urbana) Não disp. 50 m
Áreas específicas
• Nascentes Não disp. 50 m
definidas em
• Topo de morros Não disp. 2/3 alt. mín.
decreto
• Montanhas >1.800 m > 1.800 m
• Áreas úmidas, apicuns e salgados Não disp. Não disp.
Área de Preservação Permanente (área
consolidada)
Rios por tamanho de imóvel:
• 0-1 módulos fiscais
• 1-2 módulos fiscais
NA Mesma regra que APP de conservação
• 2-4 módulos fiscais
• 4-10 módulos fiscais
• >10 módulos fiscais
Reserva Legal (RL)
Tamanho padrão:
• Amazônia Legal (bioma Amazônia) 25% * 50% 80%
• Amazônia Legal (bioma Cerrado) 25% ** 20% 35%
• Amazônia Legal (Campos Gerais) 25% ** 20% 20%
• Demais biomas 25% ** 20% 20%
Isenções:
• Pequenas propriedades (até 22/07/2008) Não disponível Não Não
• Municípios com UC em >50% da área Não disponível Não disponível Não disp.
• Estados com ZEE e UC em >65% da área Não disponível Não disponível Não disp.
• APP no cômputo da Reserva Legal Não Não Não
Compensação
Modalidades:
• Cota de Reserva Florestal/Ambiental CRF
• Servidão Ambiental Não disponível Não disponível Sim
• Doação Não
• Adquirir outra área Não
Oferta de Cota de Reserva Ambiental:
• Excedente de RL Sim
• Íntegra da RL da pequena propriedade Não
• Área sob regime de Servidão Ambiental Não disponível Não disponível Não
• Reserva de Patrimônio Privado Natural Não
• Propriedade no interior de UC Não
• Porção acima de 50% da RL Não
Exigências:
• Localização 1 Microbacia
Não disponível Não disponível
• Localização 2 Ecossistema
• Identidade ecológica Sim
Crédito Agrícola
Em SP crédito permitido Crédito
somente para imóveis prioritário para
Não disponível
que mantiverem florestamento e
Reserva Legal reflorestamento
* Percentual da vegetação remanescente e não da área total do imóvel.

64
Parecer do dep. Redação final Redação final Lei
Aldo Rebelo Câmara dos Dep. Senado 12.651
2010 2011 2011 2012

Menor Regular
15 m 30 m
500 m 500 m

50 m / 100 m 50 m / 100 m 50 m / 100 m


30 m 30 m 30 m
50 m 50 m 50 m
Não disp. 2/3 alt. mín. 2/3 alt. mín.
Não disp. > 1.800 m > 1.800 m
Não disp. Não disp. Sim

5m
Critério definido no
Qualquer tamanho de imóvel: 8m
PRA pelos estados
15 m (leito <10 m) 15 m
(podendo ser 0 m)
20 m - 100 m
30 m - 100 m

80% 80% 80% 80%


35% 35% 35% 35%
20% 20% 20% 20%
20% 20%

Isenção total Anistia passivo Anistia passivo Anistia passivo


Não disp. 50% 50% 50%
Não disp. Não disp. 50% 50%
Sim Sim Sim Sim

CRA CRA CRA CRA


Sim Sim Sim Sim
Sim Sim Sim Sim
Não Sim Sim Sim

Sim Sim Sim Sim


Não Sim Sim Sim
Sim Sim Sim Sim
Sim Não Sim Sim
Não Sim Sim Sim
Não Não Sim Sim

Bioma Bioma Bioma Bioma


Não disp. Estado (prior.) Estado (prior.) Estado (prior.)
Não Não Não Não

Para emissores de Incentivos no Crédito só para


CRA crédito rural crédito agrícola para inscritos no CAR e Crédito só para
facilitado com taxas imóveis com CRA e que comprovem sua inscritos no CAR
de juros menores regularizados regularidade

65
66
LEI Nº 12.651, DE 25 DE MAIO DE 2012 –
TEXTO COMPILADO, INCLUINDO DECISÕES
DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Texto compilado, incluindo decisões do Supremo Tribunal Federal (STF)36, 37

Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis nos 6.938, de 31 de agosto
de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga
as Leis nos 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida
Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências.

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1º-A Esta Lei estabelece normas gerais sobre a proteção da vegetação, áreas de
Preservação Permanente e as áreas de Reserva Legal; a exploração florestal, o suprimento de
matéria-prima florestal, o controle da origem dos produtos florestais e o controle e prevenção
dos incêndios florestais, e prevê instrumentos econômicos e financeiros para o alcance de seus
objetivos. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

36 BRASIL, 2012. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12651.htm>.


37 Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de Constitucionalidade 42 - Distrito Federal,
Plenário, Relator Ministro Luiz Fux, julgado em 28 de fevereiro de 2018. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/
paginador.jsp?docTP=TP&docID=750504737>.
Artigos analisados em cada ação:
(i) ADI 4.901/DF: art. 12, §§ 4º, 5º, 6º, 7º e 8º; art. 13, § 1º; art. 15; art. 28 (pedido de interpretação conforme); art. 48, § 2º;
art. 66, § 3º, § 5º, II, III e IV e § 6º; e art. 68;
(ii) ADI 4.902/DF: art. 7º, § 3º; art. 17, § 3º; art. 59, §§ 4º e 5º; art. 60, art. 61-A; art. 61-B; art. 61-C; art. 63; art. 67; e art. 78-A;
(iii) ADI 4.903/DF: art. 3º, VIII, “b”, IX, XVII, XIX e parágrafo único; art. 4º, III, IV, §§ 1º, 4º, 5º e 6º; art. 5º; art. 8º, § 2º; art. 11 e art. 62;
(iv) ADI 4.937/DF (além dos dispositivos já citados): art. 44 e § 2º do art. 59; e
(v) ADC 42: art. 3º, VIII, “ b”, XIX e parágrafo único; art. 4º, §§ 1º, 4º e 6º; art. 5º, expressões “de 30 metros e máxima” e “de
15 metros e máxima”; art. 7º, § 3º; art. 8º, § 2º; art. 12, §§ 4º, 5º, 6º, 7º e 8º; art. 13, § 1º; art. 15; art. 44; art. 48, § 2º; art.
59; art. 60; art. 61-A; art. 61-B; art.61-C; art. 63; art. 66, §§ 3º e 5º, II e III, e § 6º; art. 67; art. 68; e, por fim, o art. 78-A.

67
I - O CÓDIGO FLORESTAL, O ARTIGO 225 DA CONSTITUIÇÃO DE 1988
E AS LEIS ESPECÍFICAS POR BIOMA (PATRIMÔNIO NACIONAL)

Por André Lima

Uma questão da mais alta relevância jurídica para a proteção, a conservação e a recuperação da
vegetação nativa no Brasil diz respeito à tutela constitucional das florestas. A Constituição de 1988 trata
específica e expressamente da proteção das florestas no capítulo das competências administrativas e
legislativas, ao afirmar no artigo 23 (VII) a competência comum da União, dos estados, do Distrito Federal
e dos municípios para preservar as florestas, a fauna e a flora, e também no artigo 24 (VI), ao definir a
competência da União, dos estados e do Distrito Federal para legislar concorrentemente sobre florestas.
Quanto ao mérito, a tutela das florestas e demais formas de vegetação nativa está estabelecida
em vários dispositivos do artigo 225, como no próprio caput, quando estabelece o meio ambiente
“ecologicamente equilibrado” como bem de uso comum do povo. Meio ambiente ecologicamente
equilibrado pressupõe biomas e ecossistemas minimamente protegidos e conservados de acordo com
métricas e metas definidas em instrumentos tecnicamente apropriados considerando-se o estado da arte
científica, sem o que não há que se falar em equilíbrio ecológico ecossistêmico.
O parágrafo 1º do mesmo artigo define competir ao poder público, “para assegurar a efetividade
desse direito” ao meio ambiente “ecologicamente” equilibrado: I - preservar e restaurar os processos
ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas”. Mas quais são os
processos ecológicos essenciais? Quem os define? O que é prover o manejo ecológico das espécies e
ecossistemas? A quem compete fazê-lo? Que instrumentos há para tanto? Essas perguntas, elementares,
nos remetem a conteúdo normativo aberto a ser preenchido por legislação infraconstitucional, políticas,
programas e instrumentos de gestão pública específicos. Aqui reside naturalmente uma das fontes
normativas constitucionais fundamentais do nosso Código Florestal, lei geral, aplicável a todos os biomas
e ecossistemas nativos brasileiros. O Código Florestal estabelece normas gerais, pois aplicáveis a todos
os ecossistemas naturais, impondo diretrizes básicas obrigatoriamente aplicáveis a todos os biomas e
ecossistemas existentes em território brasileiro. As figuras da Reserva Legal, das áreas de preservação
permanente, das áreas de uso restrito (como os pantanais e as áreas com vegetação nativa em terreno com
declividade entre 25º a 45º), portanto, correspondem aos preceitos gerais definidos na legislação buscando
estipular os parâmetros dos processos ecológicos essenciais e o manejo ecológico dos ecossistemas.
No mesmo sentido, o inciso VII do parágrafo 1º do artigo 225 afirma caber ao poder público
“proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função
ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade”. Pode-se compreender
como práticas que colocam em risco a função ecológica da fauna e da flora, ou provoquem a extinção de
espécies, a exploração econômica de espécies vulneráveis e em extinção sem fundamento científico ou
ainda a supressão de vegetação nativa primária ou em estágio avançado de regeneração de Mata Atlântica
onde habitam espécies da fauna em extinção.
Ainda, o parágrafo 4º do artigo 225 define alguns biomas ou biorregiões, como a Floresta
Amazônica, o Pantanal, a Mata Atlântica, a Serra do Mar e a Zona Costeira, como “Patrimônio Nacional”.
Nesse aspecto merece destaque trecho do voto do ministro Sepúlveda Pertence, na Ação Direta de

68
Inconstitucionalidade que a Confederação Nacional das Indústrias moveu em face do então polêmico
Decreto 99.547, de 1990, que a pretexto de regulamentar o parágrafo 4º do artigo 225, proibiu toda e
qualquer supressão de vegetação de Mata Atlântica. Disse o ministro em seu despacho:

O que vejo é que, depois de afirmar no artigo 225 que o meio ambiente
ecologicamente equilibrado é bem de uso comum do povo, no §4º, o artigo 225
estabelece duas normas: a primeira, que a Floresta Amazônica, a Mata Atlântica e os
demais setores territoriais, ali mencionados, são patrimônios nacionais. A dificuldade
de identificação do alcance dessa declaração de que a Mata Atlântica constitui
patrimônio nacional, a meu ver, com todas as vênias, não permite, malgrado a
autoridade do Professor Reale, que se diga apenas que a Constituição o disse em
sentido retórico ou figurado. Isso tem de ter um sentido jurídico. E, a meu ver, pelo
menos não é de descartar, à primeira vista, o que nesse debate já se aventou: que
o patrimônio nacional está aqui no sentido de objeto de uma proteção
excepcionalíssima da ordem jurídica (STF, 1997, p. 69, grifo nosso).

Se o ministro Sepúlveda está correto em seu exame parcialmente transcrito acima, para a proteção
excepcionalíssima da ordem jurídica, a lei demandada pelo parágrafo 4º para disciplinar o uso e a proteção
dos ecossistemas (ou biomas) ali explicitados deve estabelecer proteção ainda mais forte do que lei geral
aplicável a todos os biomas ou ecossistemas, inclusive aqueles não previstos no parágrafo 4º do artigo
225. Significa, pois, então, afirmar que leis mais protetivas aos biomas ali previstos devem ser estabelecidas,
considerando-se obviamente as especificidades de cada bioma. Exemplo de especificidade é a proteção
especial do Pantanal. As figuras de lei geral (Código Florestal), Reserva Legal e Área de Preservação
Permanente têm limitações para proteger adequada e efetivamente esse sensível bioma, formado por
planícies extensas e sazonalmente inundáveis, que fogem às métricas previstas pela lei geral.
A integridade ecossistêmica (processo ecológico essencial e equilíbrio ecológico) do Pantanal
é estritamente dependente do fluxo sazonal de água oriundo de suas cabeceiras e respectivas áreas de
recarga de aquífero, mormente localizadas fora do próprio bioma, no seu entorno imediato, em áreas
de transição com outro bioma, o Cerrado, na mesma Bacia do Alto Paraguai. Isso significa dizer que
uma lei especial proteger o bioma Pantanal, nesse caso, deve necessariamente considerar a proteção e
o interfluxo hídrico entre os distintos biomas. Da mesma forma a Lei de Proteção do Cerrado, seja ela o
Código Florestal ou uma lei específica, deve necessariamente considerar a integridade do Pantanal, na sua
área de transição e interfluxo hídrico.
Quero dizer com isso que o parágrafo 4º do artigo 225, ao afirmar que “A Floresta Amazônica
brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio
nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação
do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais”, está a afirmar que a lei específica a
regulamentar a proteção e os usos sustentável de tais biomas deve considerar condições específicas
e peculiares que assegurem a integridade de cada ecossistema. Portanto, deve ir além ou considerar
aspectos peculiares de cada bioma ou ecossistema específico para viabilizar a integridade ecológica de tais
biorregiões, ecossistemas ou biomas constitucionalmente definidos como “Patrimônio Nacional”.

69
Parágrafo único. Tendo como objetivo o desenvolvimento sustentável, esta Lei atenderá aos
seguintes princípios: (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
I - afirmação do compromisso soberano do Brasil com a preservação das suas flo-
restas e demais formas de vegetação nativa, bem como da biodiversidade, do solo,
dos recursos hídricos e da integridade do sistema climático, para o bem estar das
gerações presentes e futuras; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
II - reafirmação da importância da função estratégica da atividade agropecuária e
do papel das florestas e demais formas de vegetação nativa na sustentabilidade, no
crescimento econômico, na melhoria da qualidade de vida da população brasileira e
na presença do País nos mercados nacional e internacional de alimentos e bioenergia;
(Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
III - ação governamental de proteção e uso sustentável de florestas, consagrando
o compromisso do País com a compatibilização e harmonização entre o uso pro-
dutivo da terra e a preservação da água, do solo e da vegetação; (incluído pela Lei
nº 12.727, de 2012).
IV - responsabilidade comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios,
em colaboração com a sociedade civil, na criação de políticas para a preservação
e restauração da vegetação nativa e de suas funções ecológicas e sociais nas áreas
urbanas e rurais; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
V - fomento à pesquisa científica e tecnológica na busca da inovação para o uso
sustentável do solo e da água, a recuperação e a preservação das florestas e demais
formas de vegetação nativa; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
VI - criação e mobilização de incentivos econômicos para fomentar a preservação e
a recuperação da vegetação nativa e para promover o desenvolvimento de atividades
produtivas sustentáveis. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

Art. 2º As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação nativa, reco-
nhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes
do País, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a legislação em geral e
especialmente esta Lei estabelecem.
§ 1º Na utilização e exploração da vegetação, as ações ou omissões contrárias às
disposições desta Lei são consideradas uso irregular da propriedade, aplicando-se
o procedimento sumário previsto no inciso II do art. 275 da Lei no 5.869, de 11
de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, sem prejuízo da responsabilidade
civil, nos termos do § 1º do art. 14 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, e
das sanções administrativas, civis e penais.
§ 2º As obrigações previstas nesta Lei têm natureza real e são transmitidas ao sucessor,
de qualquer natureza, no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural.

70
Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por:
I - Amazônia Legal: os Estados do Acre, Pará, Amazonas, Roraima, Rondônia,
Amapá e Mato Grosso e as regiões situadas ao norte do paralelo 13° S, dos Estados
de Tocantins e Goiás, e ao oeste do meridiano de 44° W, do Estado do Maranhão;
II - Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por
vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a
paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de
fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas;
III - Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural,
delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de
modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a
reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade,
bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa;
IV - área rural consolidada: área de imóvel rural com ocupação antrópica preexistente
a 22 de julho de 2008, com edificações, benfeitorias ou atividades agrossilvipastoris,
admitida, neste último caso, a adoção do regime de pousio;
V - pequena propriedade ou posse rural familiar: aquela explorada mediante o
trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural, incluindo
os assentamentos e projetos de reforma agrária, e que atenda ao disposto no art.
3º da Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006;
VI - uso alternativo do solo: substituição de vegetação nativa e formações sucessoras
por outras coberturas do solo, como atividades agropecuárias, industriais, de geração
e transmissão de energia, de mineração e de transporte, assentamentos urbanos ou
outras formas de ocupação humana;
VII - manejo sustentável: administração da vegetação natural para a obtenção de
benefícios econômicos, sociais e ambientais, respeitando-se os mecanismos de
sustentação do ecossistema objeto do manejo e considerando-se, cumulativa ou
alternativamente, a utilização de múltiplas espécies madeireiras ou não, de múltiplos
produtos e subprodutos da flora, bem como a utilização de outros bens e serviços;
VIII - utilidade pública:

As excepcionais intervenções em APP devem ser condicionadas à inexistência de alternativa técnica e/ou
locacional à atividade proposta, conforme decisão proferida nas ADI 4.901/DF, ADI 4.902/DF, ADI 4.903/
DF, ADI 4.937/DF e ADC 42/DF38.
a) as atividades de segurança nacional e proteção sanitária;
b) as obras de infraestrutura destinadas às concessões e aos serviços públicos

38 “ii) POR MAIORIA, dar interpretação conforme à Constituição ao art. 3º, VIII e IX, do Código Florestal, de modo a se
condicionar a intervenção excepcional em APP, por interesse social ou utilidade pública, à inexistência de alternativa técnica e/ou
locacional à atividade proposta, vencidos, em parte, os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello;” (STF, 2018)

71
de transporte, sistema viário, inclusive aquele necessário aos parcelamentos
de solo urbano aprovados pelos Municípios, saneamento, gestão de resíduos,
energia, telecomunicações, radiodifusão, instalações necessárias à realização
de competições esportivas estaduais, nacionais ou internacionais, bem como
mineração, exceto, neste último caso, a extração de areia, argila, saibro e cascalho;

As expressões “gestão de resíduos” e “instalações necessárias à realização de competições esportivas


estaduais, nacionais ou internacionais” foram declaradas inconstitucionais no julgamento conjunto das
ADI 4.901/DF, ADI 4.902/DF, ADI 4.903/DF, ADI 4.937/DF e ADC 42/DF39.
c) atividades e obras de defesa civil;
d) atividades que comprovadamente proporcionem melhorias na proteção
das funções ambientais referidas no inciso II deste artigo;
e) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em
procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica
e locacional ao empreendimento proposto, definidas em ato do Chefe do
Poder Executivo federal;
IX - interesse social:

As excepcionais intervenções em APP devem ser condicionadas à inexistência de alternativa técnica e/ou
locacional à atividade proposta, conforme decisão proferida nas ADI 4.901/DF, ADI 4.902/DF, ADI 4.903/
DF, ADI 4.937/DF e ADC 42/DF40.
a) as atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação
nativa, tais como prevenção, combate e controle do fogo, controle da erosão,
erradicação de invasoras e proteção de plantios com espécies nativas;
b) a exploração agroflorestal sustentável praticada na pequena propriedade
ou posse rural familiar ou por povos e comunidades tradicionais, desde que
não descaracterize a cobertura vegetal existente e não prejudique a função
ambiental da área;
c) a implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e
atividades educacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais
consolidadas, observadas as condições estabelecidas nesta Lei;
d) a regularização fundiária de assentamentos humanos ocupados predomi-
nantemente por população de baixa renda em áreas urbanas consolidadas,
observadas as condições estabelecidas na Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009;

39 “i) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Edson Fachin e Gilmar Mendes, e, em parte, o Ministro Alexandre de Moraes,
declarar a inconstitucionalidade das expressões “gestão de resíduos” e “instalações necessárias à realização de competições esportivas
estaduais, nacionais ou internacionais”, contidas no art. 3º, VIII, b, da Lei 12.651/2012 (Código Florestal);” (STF, 2018)
40 “ii) POR MAIORIA, dar interpretação conforme à Constituição ao art. 3º, VIII e IX, do Código Florestal, de modo a se
condicionar a intervenção excepcional em APP, por interesse social ou utilidade pública, à inexistência de alternativa técnica e/ou
locacional à atividade proposta, vencidos, em parte, os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello;” (STF, 2018)

72
e) implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e de
efluentes tratados para projetos cujos recursos hídricos são partes integrantes
e essenciais da atividade;
f ) as atividades de pesquisa e extração de areia, argila, saibro e cascalho,
outorgadas pela autoridade competente;
g) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em
procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica
e locacional à atividade proposta, definidas em ato do Chefe do Poder
Executivo federal;
X - atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental:
a) abertura de pequenas vias de acesso interno e suas pontes e pontilhões,
quando necessárias à travessia de um curso d’água, ao acesso de pessoas e
animais para a obtenção de água ou à retirada de produtos oriundos das
atividades de manejo agroflorestal sustentável;
b) implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e
efluentes tratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso da
água, quando couber;
c) implantação de trilhas para o desenvolvimento do ecoturismo;
d) construção de rampa de lançamento de barcos e pequeno ancoradouro;
e) construção de moradia de agricultores familiares, remanescentes de
comunidades quilombolas e outras populações extrativistas e tradicionais
em áreas rurais, onde o abastecimento de água se dê pelo esforço próprio
dos moradores;
f ) construção e manutenção de cercas na propriedade;
g) pesquisa científica relativa a recursos ambientais, respeitados outros
requisitos previstos na legislação aplicável;
h) coleta de produtos não madeireiros para fins de subsistência e produção de
mudas, como sementes, castanhas e frutos, respeitada a legislação específica
de acesso a recursos genéticos;
i) plantio de espécies nativas produtoras de frutos, sementes, castanhas e
outros produtos vegetais, desde que não implique supressão da vegetação
existente nem prejudique a função ambiental da área;
j) exploração agroflorestal e manejo florestal sustentável, comunitário e
familiar, incluindo a extração de produtos florestais não madeireiros, desde
que não descaracterizem a cobertura vegetal nativa existente nem prejudiquem
a função ambiental da área;
k) outras ações ou atividades similares, reconhecidas como eventuais e de
baixo impacto ambiental em ato do Conselho Nacional do Meio Ambiente
- CONAMA ou dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente;

73
XI - (VETADO);
XII - vereda: fitofisionomia de savana, encontrada em solos hidromórficos, usual-
mente com a palmeira arbórea Mauritia flexuosa - buriti emergente, sem formar
dossel, em meio a agrupamentos de espécies arbustivo-herbáceas; (Redação pela
Lei nº 12.727, de 2012).
XIII - manguezal: ecossistema litorâneo que ocorre em terrenos baixos, sujeitos à
ação das marés, formado por vasas lodosas recentes ou arenosas, às quais se associa,
predominantemente, a vegetação natural conhecida como mangue, com influência
fluviomarinha, típica de solos limosos de regiões estuarinas e com dispersão descon-
tínua ao longo da costa brasileira, entre os Estados do Amapá e de Santa Catarina;
XIV - salgado ou marismas tropicais hipersalinos: áreas situadas em regiões com
frequências de inundações intermediárias entre marés de sizígias e de quadratura,
com solos cuja salinidade varia entre 100 (cem) e 150 (cento e cinquenta) partes por
1.000 (mil), onde pode ocorrer a presença de vegetação herbácea específica;
XV - apicum: áreas de solos hipersalinos situadas nas regiões entremarés superiores,
inundadas apenas pelas marés de sizígias, que apresentam salinidade superior a 150
(cento e cinquenta) partes por 1.000 (mil), desprovidas de vegetação vascular;
XVI - restinga: depósito arenoso paralelo à linha da costa, de forma geralmente alongada,
produzido por processos de sedimentação, onde se encontram diferentes comunidades que
recebem influência marinha, com cobertura vegetal em mosaico, encontrada em praias,
cordões arenosos, dunas e depressões, apresentando, de acordo com o estágio sucessional,
estrato herbáceo, arbustivo e arbóreo, este último mais interiorizado;
XVII - nascente: afloramento natural do lençol freático que apresenta perenidade [ou
intermitência] e dá início a um curso d’água;

Os entornos das nascentes e dos olhos d’água intermitentes configuram área de preservação permanente,
por força de decisão proferida nas ADI 4.901/DF, ADI 4.902/DF, ADI 4.903/DF, ADI 4.937/DF e ADC 42/DF41.
XVIII - olho d’água: afloramento natural do lençol freático, mesmo que intermitente;
XIX - leito regular: a calha por onde correm regularmente as águas do curso d’água
durante o ano;42

41 Vide o inciso IV do art. 4º da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012.


42 “iii) POR MAIORIA, reconhecer a constitucionalidade do art. 3º, XIX, do Código Florestal, vencidos, em parte, os
Ministros Cármen Lúcia (Presidente) e Ricardo Lewandowski, que declaravam inconstitucional, por arrastamento, o art. 4º, I,
do Código Florestal;” (STF, 2018)

74
II - BORDA DA CALHA DO LEITO REGULAR: O NOVO PARÂMETRO
PARA MEDIR A ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

Por Andrea Almeida Barros

Segundo consta no parágrafo único do artigo primeiro da Lei nº 12.651, de 2012, o objetivo
dessa lei é o desenvolvimento sustentável, atendendo a diversos princípios, como, por exemplo, o
compromisso soberano do Brasil com a preservação das suas florestas e demais formas de vegetação
nativa, bem como da biodiversidade, do solo, dos recursos hídricos e da integridade do sistema
climático, para o bem-estar das gerações presentes e futuras, conforme descrito no inciso I (BRASIL, 2012).
A lei, ainda, traz como princípio a criação de políticas para a preservação e a restauração da vegetação
nativa e de suas funções ecológicas e sociais nas áreas urbanas e rurais, como descrito no inciso IV, além
do fomento à pesquisa científica e tecnológica na busca pela inovação para o uso do solo e da água, da
recuperação e da preservação das florestas e demais formas de vegetação nativa (inciso V) (BRASIL, 2012).
Os principais conceitos estão elencados no artigo terceiro, e aqui destacamos o da Área de
Preservação Permanente (APP), necessário para a correta compreensão do artigo quarto, objeto deste
estudo. Assim, a APP é a área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental
de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade. Além disso,
tem por finalidade facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das
populações humanas (BRASIL, 2012).
Outro conceito bastante importante para a correta compreensão do disposto no artigo em
destaque é o de leito regular, trazido no inciso XIX. Segundo ele, por leito regular se entende a calha
por onde correm regularmente as águas do curso d’água durante o ano. Em que pese esse dispositivo
ter sido objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.903, foi declarado constitucional, ainda
que por maioria, pois a Lei nº 12.651/2012, “tão somente modificou o marco para a medição da área
de preservação permanente ao longo dos rios e cursos d’água, passando a ser o seu leito regular
respectivo e não mais o nível mais alto”, (referindo-se às cheias) (STF, 2018, p. 37).
Essa simples alteração na forma de medir a APP diminuiu consideravelmente a área
protegida à beira dos corpos hídricos, mas isso é objeto para outro artigo. Pela lei anterior, era
necessário medir a média das cheias para daí contar a APP. Atualmente, são consideradas áreas
permanentemente protegidas as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e
intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, alterando-se a área
protegida de acordo com a largura rio.
Em que pese a discussão da constitucionalidade levada a efeito, o conceito de calha não a
integrou, tendo sido apenas repetida na decisão. Assim, é mister compreender no que consiste a calha
e, por conseguinte, a sua borda. Para que se chegue a tais conceitos, é imprescindível trazer à baila o
conceito de leito, que é o espaço que pode ser ocupado pelo escoamento das águas (Christofoletti,
1981). Ainda, existem três tipos de leito: o aparente (sulco por onde normalmente correm as águas e
os materiais por elas transportados); o maior (espaço inundável quando das cheias) e o menor (espaço
ocupado nas épocas de estiagem, em que diminui a quantidade de água) (Christofoletti, 1981). Ramos

75
e Tosi (2012) classificam-nos em leito maior, menor e canal de estiagem. Os limites laterais dos rios são
as margens e se relacionam com o leito aparente.
Calha, então, é a delimitação do espaço por onde corre o leito do rio em situação de
normalidade. Assim, a borda da calha do leito do rio significa o topo, a quebra, a crista do barranco, do
talude, ou, conforme Ramos e Tosi (2012), do dique marginal:

Cristas das margens

Leito maior Leito maior

Leito menor

APP APP

Dique Canal de Vazão de


marginal estiagem margem plena

Figura 1: Borda da calha do leito regular: leito maior, leito menor e canal de estiagem.

Assim sendo, a medida da APP deve começar no topo do talude e não na margem do rio, como
alguns defendem, num exercício forçado de interpretação e contrário ao espírito de proteção previsto
nos objetivos inicialmente citados. Destaca-se que a Lei de Proteção da Vegetação Nativa (LPVN), se
comparada com o antigo Código Florestal, já é menos protetiva, exatamente porque mudou a forma
de medição da APP. Se a APP vai ser medida a partir da margem do rio43, a área protegida vai ser ainda
menor do que já é, sem contar que, em cursos hídricos com barramento, o volume de água à jusante é
variável, alterando, assim, as margens e a APP, diariamente.

43 Nesses casos, eleva-se uma linha imaginária vertical na margem do rio até a altura do talude, e a partir daí mede-se a APP.
Trata-se de uma interpretação municipal, sem base legal.

76
XX - área verde urbana: espaços, públicos ou privados, com predomínio de vegeta-
ção, preferencialmente nativa, natural ou recuperada, previstos no Plano Diretor,
nas Leis de Zoneamento Urbano e Uso do Solo do Município, indisponíveis para
construção de moradias, destinados aos propósitos de recreação, lazer, melhoria
da qualidade ambiental urbana, proteção dos recursos hídricos, manutenção ou
melhoria paisagística, proteção de bens e manifestações culturais;
XXI - várzea de inundação ou planície de inundação: áreas marginais a cursos
d’água sujeitas a enchentes e inundações periódicas;
XXII - faixa de passagem de inundação: área de várzea ou planície de inundação
adjacente a cursos d’água que permite o escoamento da enchente;
XXIII - relevo ondulado: expressão geomorfológica usada para designar área ca-
racterizada por movimentações do terreno que geram depressões, cuja intensidade
permite sua classificação como relevo suave ondulado, ondulado, fortemente
ondulado e montanhoso.
XXIV - pousio: prática de interrupção temporária de atividades ou usos agrícolas,
pecuários ou silviculturais, por no máximo 5 (cinco) anos, para possibilitar a
recuperação da capacidade de uso ou da estrutura física do solo; (Incluído pela
Lei nº 12.727, de 2012).
XXV - áreas úmidas: pantanais e superfícies terrestres cobertas de forma periódica
por águas, cobertas originalmente por florestas ou outras formas de vegetação
adaptadas à inundação; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
XXVI - área urbana consolidada: aquela de que trata o inciso II do caput do art. 47
da Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009; e (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
XXVII - crédito de carbono: título de direito sobre bem intangível e incorpóreo
transacionável. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
Parágrafo único. Para os fins desta Lei, estende-se o tratamento dispensado aos
imóveis a que se refere o inciso V deste artigo às propriedades e posses rurais com
até 4 (quatro) módulos fiscais que desenvolvam atividades agrossilvipastoris, bem
como às terras indígenas demarcadas e às demais áreas tituladas de povos e comu-
nidades tradicionais que façam uso coletivo do seu território.

As expressões “demarcadas” e “tituladas” foram declaradas inconstitucionais, por força de decisão proferida
nas ADI 4.901/DF, ADI 4.902/DF, ADI 4.903/DF, ADI 4.937/DF e ADC 42/DF44. Importante destacar as razões
do relator das ADIs mencionadas em seu voto para fundamentar a declaração de inconstitucionalidade
das expressões demarcadas e tituladas:

44 “iv) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, declarar a inconstitucionalidade das
expressões ‘demarcadas’ e ‘tituladas’, contidas no art. 3º, parágrafo único, do Código Florestal;” (STF, 2018)

77
Por outro lado, constato vícios no trecho do dispositivo que garante o mesmo
tratamento especial “às terras indígenas demarcadas e às demais áreas tituladas
de povos e comunidades tradicionais que façam uso coletivo do seu território”.
A exigência de demarcação de terras indígenas e da titulação das áreas de povos e
comunidades tradicionais, como pressuposto para a aplicação do aludido regime
especial, viola o art. 231 da Constituição e o art. 68 dos Atos das Disposições
Constitucionais Transitórias. Afinal, a demarcação e a titulação de territórios têm
caráter meramente declaratório – e não constitutivo –, pelo que o reconhecimento
dos direitos respectivos, inclusive a aplicação de regimes ambientais diferenciados,
não pode depender de formalidades que nem a própria Constituição determinou.
Ex positis, declaro a inconstitucionalidade das expressões “demarcadas” e “titu-
ladas” do art. 3º, parágrafo único, da Lei n. 12.651/2012. Nesse ponto, julgo
parcialmente procedente a ADI 4903 e parcialmente improcedente a ADC 42.
(STF, 2018, p. 39)

CAPÍTULO II

DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

Seção I

Da Delimitação das Áreas de Preservação Permanente

Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos
desta Lei:
I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente,
excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima
de: (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;
b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a
50 (cinquenta) metros de largura;
c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta)
a 200 (duzentos) metros de largura;
d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (du-
zentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;

78
e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura
superior a 600 (seiscentos) metros;
II - as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de:
a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d’água com até 20
(vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal será de 50 (cinquenta) metros;
b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas;
III - as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento
ou represamento de cursos d’água naturais, na faixa definida na licença ambiental
do empreendimento; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).45
IV - as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes [e intermitentes],
qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta)
metros; (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).

Os entornos das nascentes (art. 4º IV) e dos olhos d’água (art. 3º, VII) intermitentes configuram área de
preservação ambiental, por força de decisão proferida nas ADI 4.901/DF, ADI 4.902/DF, ADI 4.903/DF, ADI
4.937/DF e ADC 42/DF)46.
V - as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100%
(cem por cento) na linha de maior declive;
VI - as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;
VII - os manguezais, em toda a sua extensão;
VIII - as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em
faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais;
IX - no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100
(cem) metros e inclinação média maior que 25°, as áreas delimitadas a partir da
curva de nível correspondente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação
sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano horizontal determinado
por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota do
ponto de sela mais próximo da elevação;
X - as áreas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que
seja a vegetação;
XI - em veredas, a faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima de
50 (cinquenta) metros, a partir do espaço permanentemente brejoso e encharcado.
(Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).

45 “v) POR UNANIMIDADE, reconhecer a constitucionalidade do art. 4º, III, do Código Florestal;” (STF, 2018)
46 “vi) POR MAIORIA, dar interpretação conforme ao art. 4º, IV, do Código Florestal, para fixar a interpretação de que os
entornos das nascentes e dos olhos d’água intermitentes configuram área de preservação ambiental, vencidos os Ministros Gilmar
Mendes e, em parte, Marco Aurélio e Cármen Lúcia (Presidente);” (STF, 2018)

79
§ 1o Não será exigida Área de Preservação Permanente no entorno de reservatórios artificiais
de água que não decorram de barramento ou represamento de cursos d’água naturais.
(Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).47
§ 2o (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 3o (VETADO).
§ 4o Nas acumulações naturais ou artificiais de água com superfície inferior a 1 (um)
hectare, fica dispensada a reserva da faixa de proteção prevista nos incisos II e III do caput,
vedada nova supressão de áreas de vegetação nativa, salvo autorização do órgão ambiental
competente do Sistema Nacional do Meio Ambiente – Sisnama. (Redação dada pela Lei
nº 12.727, de 2012).48
§ 5o É admitido, para a pequena propriedade ou posse rural familiar, de que trata o inciso
V do art. 3o desta Lei, o plantio de culturas temporárias e sazonais de vazante de ciclo
curto na faixa de terra que fica exposta no período de vazante dos rios ou lagos, desde que
não implique supressão de novas áreas de vegetação nativa, seja conservada a qualidade
da água e do solo e seja protegida a fauna silvestre.49
§ 6o Nos imóveis rurais com até 15 (quinze) módulos fiscais, é admitida, nas áreas de que
tratam os incisos I e II do caput deste artigo, a prática da aquicultura e a infraestrutura
física diretamente a ela associada, desde que:50
I - sejam adotadas práticas sustentáveis de manejo de solo e água e de recursos
hídricos, garantindo sua qualidade e quantidade, de acordo com norma dos Con-
selhos Estaduais de Meio Ambiente;
II - esteja de acordo com os respectivos planos de bacia ou planos de gestão de
recursos hídricos;
III - seja realizado o licenciamento pelo órgão ambiental competente;
IV - o imóvel esteja inscrito no Cadastro Ambiental Rural - CAR.
V - não implique novas supressões de vegetação nativa. (Incluído pela Lei nº
12.727, de 2012).
§ 7º (VETADO).
§ 8º (VETADO).
§ 9º (VETADO). (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

47 “vii) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Cármen Lúcia (Presidente) e Ricardo Lewandowski, reconhecer a
constitucionalidade do art. 4º, §1º, do Código Florestal;” (STF, 2018)
48 “viii) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Cármen Lúcia (Presidente) e Ricardo Lewandowski, reconhecer a
constitucionalidade do art. 4º, § 4º, do Código Florestal;” (STF, 2018)
49 “ix) POR UNANIMIDADE, reconhecer a constitucionalidade do art. 4º, § 5º, do Código Florestal;” (STF, 2018)
50 “x) POR UNANIMIDADE, reconhecer a constitucionalidade do art. 4º, § 6º, e incisos;” (STF, 2018)

80
Art. 5º Na implantação de reservatório d’água artificial destinado a geração de energia ou
abastecimento público, é obrigatória a aquisição, desapropriação ou instituição de servidão
administrativa pelo empreendedor das Áreas de Preservação Permanente criadas em seu entorno,
conforme estabelecido no licenciamento ambiental, observando-se a faixa mínima de 30 (trinta)
metros e máxima de 100 (cem) metros em área rural, e a faixa mínima de 15 (quinze) metros
e máxima de 30 (trinta) metros em área urbana. (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).51
§ 1º Na implantação de reservatórios d’água artificiais de que trata o caput, o empreendedor,
no âmbito do licenciamento ambiental, elaborará Plano Ambiental de Conservação e Uso
do Entorno do Reservatório, em conformidade com termo de referência expedido pelo
órgão competente do Sistema Nacional do Meio Ambiente - Sisnama, não podendo o uso
exceder a 10% (dez por cento) do total da Área de Preservação Permanente. (Redação
dada pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 2º O Plano Ambiental de Conservação e Uso do Entorno de Reservatório Artificial,
para os empreendimentos licitados a partir da vigência desta Lei, deverá ser apresentado
ao órgão ambiental concomitantemente com o Plano Básico Ambiental e aprovado até o
início da operação do empreendimento, não constituindo a sua ausência impedimento
para a expedição da licença de instalação.
§ 3º (VETADO).

Art. 6º Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando declaradas de interesse social


por ato do Chefe do Poder Executivo, as áreas cobertas com florestas ou outras formas de vegetação
destinadas a uma ou mais das seguintes finalidades:
I - conter a erosão do solo e mitigar riscos de enchentes e deslizamentos de terra
e de rocha;
II - proteger as restingas ou veredas;
III - proteger várzeas;
IV - abrigar exemplares da fauna ou da flora ameaçados de extinção;
V - proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico, cultural ou histórico;
VI - formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;
VII - assegurar condições de bem-estar público;
VIII - auxiliar a defesa do território nacional, a critério das autoridades militares.
IX - proteger áreas úmidas, especialmente as de importância internacional. (In-
cluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

51 “xi) POR MAIORIA, vencidos, em parte, os Ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, reconhecer a
constitucionalidade do art. 5º, do Código Florestal;” (STF, 2018)

81
Seção II

Do Regime de Proteção das Áreas de Preservação Permanente

Art. 7º A vegetação situada em Área de Preservação Permanente deverá ser mantida pelo pro-
prietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito
público ou privado.
§ 1º Tendo ocorrido supressão de vegetação situada em Área de Preservação Permanente,
o proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título é obrigado a promover a
recomposição da vegetação, ressalvados os usos autorizados previstos nesta Lei.
§ 2o A obrigação prevista no § 1o tem natureza real e é transmitida ao sucessor no caso de
transferência de domínio ou posse do imóvel rural.
§ 3o No caso de supressão não autorizada de vegetação realizada após 22 de julho de
2008, é vedada a concessão de novas autorizações de supressão de vegetação enquanto
não cumpridas as obrigações previstas no § 1o.52
Art. 8o A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Perma-
nente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo
impacto ambiental previstas nesta Lei.
§ 1o A supressão de vegetação nativa protetora de nascentes, dunas e restingas somente
poderá ser autorizada em caso de utilidade pública.
§ 2o A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente de
que tratam os incisos VI e VII do caput do art. 4o poderá ser autorizada, excepcionalmente,
em locais onde a função ecológica do manguezal esteja comprometida, para execução de
obras habitacionais e de urbanização, inseridas em projetos de regularização fundiária de
interesse social, em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda.53
§ 3o É dispensada a autorização do órgão ambiental competente para a execução, em
caráter de urgência, de atividades de segurança nacional e obras de interesse da defesa civil
destinadas à prevenção e mitigação de acidentes em áreas urbanas.
§ 4o Não haverá, em qualquer hipótese, direito à regularização de futuras intervenções ou
supressões de vegetação nativa, além das previstas nesta Lei.

Art. 9o É permitido o acesso de pessoas e animais às Áreas de Preservação Permanente para


obtenção de água e para realização de atividades de baixo impacto ambiental.

52 “xii) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Luiz Fux (Relator), Marco Aurélio, Edson Fachin, Roberto Barroso e Ricardo
Lewandowski, reconhecer a constitucionalidade do art. 7º, § 3º, do Código Florestal;” (STF, 2018)
53 “xiii) POR UNANIMIDADE, reconhecer a constitucionalidade do art. 8º, § 2º, do Código Florestal;” (STF, 2018)

82
CAPÍTULO III

DAS ÁREAS DE USO RESTRITO

Art. 10. Nos pantanais e planícies pantaneiras, é permitida a exploração ecologicamente susten-
tável, devendo-se considerar as recomendações técnicas dos órgãos oficiais de pesquisa, ficando
novas supressões de vegetação nativa para uso alternativo do solo condicionadas à autorização
do órgão estadual do meio ambiente, com base nas recomendações mencionadas neste artigo.
(Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).

Art. 11. Em áreas de inclinação entre 25° e 45°, serão permitidos o manejo florestal sustentável
e o exercício de atividades agrossilvipastoris, bem como a manutenção da infraestrutura física
associada ao desenvolvimento das atividades, observadas boas práticas agronômicas, sendo vedada
a conversão de novas áreas, excetuadas as hipóteses de utilidade pública e interesse social.

CAPÍTULO III-A

(Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)

DO USO ECOLOGICAMENTE SUSTENTÁVEL DOS APICUNS E SALGADOS

Art. 11-A. A Zona Costeira é patrimônio nacional, nos termos do § 4o do art. 225 da Consti-
tuição Federal, devendo sua ocupação e exploração dar-se de modo ecologicamente sustentável.
(Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
§ 1o Os apicuns e salgados podem ser utilizados em atividades de carcinicultura e salinas,
desde que observados os seguintes requisitos: (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
I - área total ocupada em cada Estado não superior a 10% (dez por cento) dessa
modalidade de fitofisionomia no bioma amazônico e a 35% (trinta e cinco por
cento) no restante do País, excluídas as ocupações consolidadas que atendam ao
disposto no § 6o deste artigo; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
II - salvaguarda da absoluta integridade dos manguezais arbustivos e dos processos
ecológicos essenciais a eles associados, bem como da sua produtividade biológica e
condição de berçário de recursos pesqueiros; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
III - licenciamento da atividade e das instalações pelo órgão ambiental estadual, cien-
tificado o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
- Ibama e, no caso de uso de terrenos de marinha ou outros bens da União, realizada
regularização prévia da titulação perante a União; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)

83
IV - recolhimento, tratamento e disposição adequados dos efluentes e resíduos;
(Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
V - garantia da manutenção da qualidade da água e do solo, respeitadas as Áreas
de Preservação Permanente; e (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
VI - respeito às atividades tradicionais de sobrevivência das comunidades locais.
(Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
§ 2o A licença ambiental, na hipótese deste artigo, será de 5 (cinco) anos, renovável
apenas se o empreendedor cumprir as exigências da legislação ambiental e do próprio
licenciamento, mediante comprovação anual, inclusive por mídia fotográfica. (Incluído
pela Lei nº 12.727, de 2012)
§ 3o São sujeitos à apresentação de Estudo Prévio de Impacto Ambiental - EPIA e Rela-
tório de Impacto Ambiental - RIMA os novos empreendimentos: (Incluído pela Lei nº
12.727, de 2012)
I - com área superior a 50 (cinquenta) hectares, vedada a fragmentação do projeto
para ocultar ou camuflar seu porte; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
II - com área de até 50 (cinquenta) hectares, se potencialmente causadores de signi-
ficativa degradação do meio ambiente; ou (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
III - localizados em região com adensamento de empreendimentos de carcinicultura
ou salinas cujo impacto afete áreas comuns. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
§ 4o O órgão licenciador competente, mediante decisão motivada, poderá, sem prejuízo
das sanções administrativas, cíveis e penais cabíveis, bem como do dever de recuperar os
danos ambientais causados, alterar as condicionantes e as medidas de controle e adequação,
quando ocorrer: (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
I - descumprimento ou cumprimento inadequado das condicionantes ou medidas
de controle previstas no licenciamento, ou desobediência às normas aplicáveis;
(Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
II - fornecimento de informação falsa, dúbia ou enganosa, inclusive por omissão,
em qualquer fase do licenciamento ou período de validade da licença; ou (Incluído
pela Lei nº 12.727, de 2012)
III - superveniência de informações sobre riscos ao meio ambiente ou à saúde
pública. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
§ 5o A ampliação da ocupação de apicuns e salgados respeitará o Zoneamento Ecoló-
gico-Econômico da Zona Costeira - ZEEZOC, com a individualização das áreas ainda
passíveis de uso, em escala mínima de 1:10.000, que deverá ser concluído por cada Estado
no prazo máximo de 1 (um) ano a partir da data da publicação desta Lei. (Incluído pela
Lei nº 12.727, de 2012)
§ 6o É assegurada a regularização das atividades e empreendimentos de carcinicultura e
salinas cuja ocupação e implantação tenham ocorrido antes de 22 de julho de 2008, desde
que o empreendedor, pessoa física ou jurídica, comprove sua localização em apicum ou

84
salgado e se obrigue, por termo de compromisso, a proteger a integridade dos manguezais
arbustivos adjacentes. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
§ 7o É vedada a manutenção, licenciamento ou regularização, em qualquer hipótese ou
forma, de ocupação ou exploração irregular em apicum ou salgado, ressalvadas as exceções
previstas neste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)

CAPÍTULO IV

DA ÁREA DE RESERVA LEGAL

Seção I

Da Delimitação da Área de Reserva Legal

Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de
Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente,
observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos
previstos no art. 6854 desta Lei: (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).
I - localizado na Amazônia Legal:
a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas;
b) 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de cerrado;
c) 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais;
II - localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento).
§ 1o Em caso de fracionamento do imóvel rural, a qualquer título, inclusive para assen-
tamentos pelo Programa de Reforma Agrária, será considerada, para fins do disposto do
caput, a área do imóvel antes do fracionamento.
§ 2o O percentual de Reserva Legal em imóvel situado em área de formações florestais, de
cerrado ou de campos gerais na Amazônia Legal será definido considerando separadamente
os índices contidos nas alíneas a, b e c do inciso I do caput.
§ 3o Após a implantação do CAR, a supressão de novas áreas de floresta ou outras formas
de vegetação nativa apenas será autorizada pelo órgão ambiental estadual integrante

54 “xxxv) POR MAIORIA, vencido, em parte, o Ministro Edson Fachin, reconhecer a constitucionalidade do art. 68 do
Código Florestal;” (STF, 2018)

85
do Sisnama se o imóvel estiver inserido no mencionado cadastro, ressalvado o previsto
no art. 30.
§ 4º Nos casos da alínea a do inciso I, o poder público poderá reduzir a Reserva Legal para
até 50% (cinquenta por cento), para fins de recomposição, quando o Município tiver mais
de 50% (cinquenta por cento) da área ocupada por unidades de conservação da natureza
de domínio público e por terras indígenas homologadas.55
§ 5º Nos casos da alínea a do inciso I, o poder público estadual, ouvido o Conselho Estadual
de Meio Ambiente, poderá reduzir a Reserva Legal para até 50% (cinquenta por cento),
quando o Estado tiver Zoneamento Ecológico-Econômico aprovado e mais de 65% (sessenta
e cinco por cento) do seu território ocupado por unidades de conservação da natureza
de domínio público, devidamente regularizadas, e por terras indígenas homologadas.56
§ 6º Os empreendimentos de abastecimento público de água e tratamento de esgoto
não estão sujeitos à constituição de Reserva Legal.57
§ 7º Não será exigido Reserva Legal relativa às áreas adquiridas ou desapropriadas por
detentor de concessão, permissão ou autorização para exploração de potencial de energia
hidráulica, nas quais funcionem empreendimentos de geração de energia elétrica, subes-
tações ou sejam instaladas linhas de transmissão e de distribuição de energia elétrica.58
§ 8º Não será exigido Reserva Legal relativa às áreas adquiridas ou desapropriadas com o
objetivo de implantação e ampliação de capacidade de rodovias e ferrovias. 59

Art. 13. Quando indicado pelo Zoneamento Ecológico-Econômico - ZEE estadual, realizado
segundo metodologia unificada, o poder público federal poderá:
I - reduzir, exclusivamente para fins de regularização, mediante recomposição,
regeneração ou compensação da Reserva Legal de imóveis com área rural conso-
lidada, situados em área de floresta localizada na Amazônia Legal, para até 50%
(cinquenta por cento) da propriedade, excluídas as áreas prioritárias para conservação
da biodiversidade e dos recursos hídricos e os corredores ecológicos;
II - ampliar as áreas de Reserva Legal em até 50% (cinquenta por cento) dos per-
centuais previstos nesta Lei, para cumprimento de metas nacionais de proteção à
biodiversidade ou de redução de emissão de gases de efeito estufa.

55 “xiv) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Marco Aurélio, Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber e Ricardo
Lewandowski, reconhecer a constitucionalidade do art. 12, § 4º, do Código Florestal;” (STF, 2018)
56 “xv) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Marco Aurélio, Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber e Ricardo
Lewandowski, reconhecer a constitucionalidade do art. 12. § 5º, do Código Florestal;” (STF, 2018)
57 “xvi) POR MAIORIA, reconhecer a constitucionalidade do art. 12, § 6º, do Código Florestal, vencidos os Ministros
Cármen Lúcia (Presidente), Edson Fachin e Rosa Weber;” (STF, 2018)
58 “xvii) POR MAIORIA, reconhecer a constitucionalidade do art. 12, § 7º, do Código Florestal, vencidos os Ministros
Cármen Lúcia (Presidente), Edson Fachin e Rosa Weber;” (STF, 2018)
59 “xviii) POR MAIORIA, reconhecer a constitucionalidade do art. 12, § 8º, do Código Florestal, vencidos os Ministros
Cármen Lúcia (Presidente), Edson Fachin e Rosa Weber;” (STF, 2018)

86
§ 1º No caso previsto no inciso I do caput, o proprietário ou possuidor de imóvel rural que
mantiver Reserva Legal conservada e averbada em área superior aos percentuais exigidos
no referido inciso poderá instituir servidão ambiental sobre a área excedente, nos termos
da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, e Cota de Reserva Ambiental. 60
§ 2o Os Estados que não possuem seus Zoneamentos Ecológico-Econômicos - ZEEs
segundo a metodologia unificada, estabelecida em norma federal, terão o prazo de 5
(cinco) anos, a partir da data da publicação desta Lei, para a sua elaboração e aprovação.

Art. 14. A localização da área de Reserva Legal no imóvel rural deverá levar em consideração os
seguintes estudos e critérios:
I - o plano de bacia hidrográfica;
II - o Zoneamento Ecológico-Econômico
III - a formação de corredores ecológicos com outra Reserva Legal, com Área
de Preservação Permanente, com Unidade de Conservação ou com outra área
legalmente protegida;
IV - as áreas de maior importância para a conservação da biodiversidade; e
V - as áreas de maior fragilidade ambiental.
§ 1º O órgão estadual integrante do Sisnama ou instituição por ele habilitada deverá
aprovar a localização da Reserva Legal após a inclusão do imóvel no CAR, conforme o
art. 29 desta Lei.
§ 2º Protocolada a documentação exigida para a análise da localização da área de Reserva
Legal, ao proprietário ou possuidor rural não poderá ser imputada sanção administrativa,
inclusive restrição a direitos, por qualquer órgão ambiental competente integrante do
Sisnama, em razão da não formalização da área de Reserva Legal. (Redação dada pela Lei
nº 12.727, de 2012).

Art. 15. Será admitido o cômputo das Áreas de Preservação Permanente no cálculo do percentual
da Reserva Legal do imóvel, desde que:
I - o benefício previsto neste artigo não implique a conversão de novas áreas para
o uso alternativo do solo;
II - a área a ser computada esteja conservada ou em processo de recuperação,
conforme comprovação do proprietário ao órgão estadual integrante do Sisnama; e
III - o proprietário ou possuidor tenha requerido inclusão do imóvel no Cadastro
Ambiental Rural - CAR, nos termos desta Lei.
§ 1º O regime de proteção da Área de Preservação Permanente não se altera na hipótese
prevista neste artigo.

60 “xix) POR MAIORIA, vencido o Ministro Edson Fachin, reconhecer a constitucionalidade do art. 13, § 1º, do Código
Florestal;” (STF, 2018)

87
§ 2º O proprietário ou possuidor de imóvel com Reserva Legal conservada e inscrita no
Cadastro Ambiental Rural - CAR de que trata o Art. 29, cuja área ultrapasse o mínimo
exigido por esta Lei, poderá utilizar a área excedente para fins de constituição de servidão
ambiental, Cota de Reserva Ambiental e outros instrumentos congêneres previstos nesta Lei.
§ 3º O cômputo de que trata o caput aplica-se a todas as modalidades de cumprimento
da Reserva Legal, abrangendo a regeneração, a recomposição e a compensação. (Redação
dada pela Lei nº 12.727, de 2012).61
§ 4o É dispensada a aplicação do inciso I do caput deste artigo, quando as Áreas de
Preservação Permanente conservadas ou em processo de recuperação, somadas às demais
florestas e outras formas de vegetação nativa existentes em imóvel, ultrapassarem: (Incluído
pela Lei nº 12.727, de 2012)
I - 80% (oitenta por cento) do imóvel rural localizado em áreas de floresta na
Amazônia Legal; e (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)
II - (VETADO). (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)

Art. 16. Poderá ser instituído Reserva Legal em regime de condomínio ou coletiva entre proprie-
dades rurais, respeitado o percentual previsto no art. 12 em relação a cada imóvel. (Incluído
pela Lei nº 12.727, de 2012)
Parágrafo único. No parcelamento de imóveis rurais, a área de Reserva Legal poderá ser
agrupada em regime de condomínio entre os adquirentes.

Seção II

Do Regime de Proteção da Reserva Legal

Art. 17. A Reserva Legal deve ser conservada com cobertura de vegetação nativa pelo proprietário
do imóvel rural, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito
público ou privado.
§ 1º Admite-se a exploração econômica da Reserva Legal mediante manejo sustentável,
previamente aprovado pelo órgão competente do Sisnama, de acordo com as modalidades
previstas no art. 20.
§ 2º Para fins de manejo de Reserva Legal na pequena propriedade ou posse rural familiar,
os órgãos integrantes do Sisnama deverão estabelecer procedimentos simplificados de
elaboração, análise e aprovação de tais planos de manejo.
§ 3 É obrigatória a suspensão imediata das atividades em área de Reserva Legal desmatada

61 “xx) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Edson Fachin e Rosa Weber e, em parte, os Ministros Marco Aurélio e
Ricardo Lewandowski, reconhecer a constitucionalidade do art. 15 do Código Florestal;” (STF, 2018)

88
irregularmente após 22 de julho de 2008. (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012). 62
§ 4o Sem prejuízo das sanções administrativas, cíveis e penais cabíveis, deverá ser iniciado,
nas áreas de que trata o § 3º deste artigo, o processo de recomposição da Reserva Legal em
até 2 (dois) anos contados a partir da data da publicação desta Lei, devendo tal processo
ser concluído nos prazos estabelecidos pelo Programa de Regularização Ambiental - PRA,
de que trata o art. 59. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012)

Art. 18. A área de Reserva Legal deverá ser registrada no órgão ambiental competente por meio
de inscrição no CAR de que trata o art. 29, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos
de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento, com as exceções previstas nesta Lei.
§ 1º A inscrição da Reserva Legal no CAR será feita mediante a apresentação de planta e
memorial descritivo, contendo a indicação das coordenadas geográficas com pelo menos
um ponto de amarração, conforme ato do Chefe do Poder Executivo.
§ 2º Na posse, a área de Reserva Legal é assegurada por termo de compromisso firmado
pelo possuidor com o órgão competente do Sisnama, com força de título executivo extra-
judicial, que explicite, no mínimo, a localização da área de Reserva Legal e as obrigações
assumidas pelo possuidor por força do previsto nesta Lei.
§ 3º A transferência da posse implica a sub-rogação das obrigações assumidas no termo
de compromisso de que trata o § 2º.
§ 4º O registro da Reserva Legal no CAR desobriga a averbação no Cartório de Registro de
Imóveis, sendo que, no período entre a data da publicação desta Lei e o registro no CAR,
o proprietário ou possuidor rural que desejar fazer a averbação terá direito à gratuidade
deste ato. (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).

Art. 19. A inserção do imóvel rural em perímetro urbano definido mediante lei municipal não
desobriga o proprietário ou posseiro da manutenção da área de Reserva Legal, que só será extinta
concomitantemente ao registro do parcelamento do solo para fins urbanos aprovado segundo a
legislação específica e consoante as diretrizes do plano diretor de que trata o § 1º do art. 182 da
Constituição Federal.

Art. 20. No manejo sustentável da vegetação florestal da Reserva Legal, serão adotadas práticas
de exploração seletiva nas modalidades de manejo sustentável sem propósito comercial para
consumo na propriedade e manejo sustentável para exploração florestal com propósito comercial.

Art. 21. É livre a coleta de produtos florestais não madeireiros, tais como frutos, cipós, folhas e
sementes, devendo-se observar:
I - os períodos de coleta e volumes fixados em regulamentos específicos, quando houver;

62 “xxi) POR MAIORIA , vencidos os Ministros Luiz Fux (Relator), Marco Aurélio, Edson Fachin, Roberto Barroso e
Ricardo Lewandowski, reconhecer a constitucionalidade do art. 17, § 3º, do Código Florestal;” (STF, 2018)

89
II - a época de maturação dos frutos e sementes;
III - técnicas que não coloquem em risco a sobrevivência de indivíduos e da espécie
coletada no caso de coleta de flores, folhas, cascas, óleos, resinas, cipós, bulbos,
bambus e raízes.
Art. 22. O manejo florestal sustentável da vegetação da Reserva Legal com propósito
comercial depende de autorização do órgão competente e deverá atender as seguintes
diretrizes e orientações:
I - não descaracterizar a cobertura vegetal e não prejudicar a conservação da vege-
tação nativa da área;
II - assegurar a manutenção da diversidade das espécies;
III - conduzir o manejo de espécies exóticas com a adoção de medidas que favoreçam
a regeneração de espécies nativas.

Art. 23. O manejo sustentável para exploração florestal eventual sem propósito comercial, para
consumo no próprio imóvel, independe de autorização dos órgãos competentes, devendo apenas
ser declarados previamente ao órgão ambiental a motivação da exploração e o volume explorado,
limitada a exploração anual a 20 (vinte) metros cúbicos.

Art. 24. No manejo florestal nas áreas fora de Reserva Legal, aplica-se igualmente o disposto nos
arts. 21, 22 e 23.

III - O MANEJO FLORESTAL PARA A PRODUÇÃO DE


BENS E SERVIÇOS NO NOVO CÓDIGO FLORESTAL

Por Mauro Armelin e Marco Lentini

Instrumentos para o gerenciamento do uso do solo no Código Florestal como o CAR e o


PRA já foram bastante discutidos para as áreas de uso agrícola, mas também são importantes
para o uso sustentável das áreas florestais da propriedade rural, como é o caso da Reserva Legal.
O Código Florestal destina uma seção completa para tratar do uso e da conservação da Reserva
Legal em propriedades rurais. Desde o artigo 17 até o 24, a proteção da Reserva Legal e os usos
permitidos nessas áreas são apresentados. Um dos usos possíveis é a condução do manejo
florestal sustentável, voltado à produção de madeira, de produtos não madeireiros e de
serviços ambientais.
A Reserva Legal sempre foi tema de intenso e acalorado debate. Isso ocorre porque, ao se
determinar que uma certa área da propriedade rural, conforme estabelecido no artigo 12, deve
ser mantida com cobertura de vegetação nativa, suscita-se a ideia de que o proprietário do imóvel

90
não detém poder de escolha relativo ao uso de sua Reserva Legal. Entretanto, isso está incorreto.
Historicamente, as áreas de Reserva Legal tinham por finalidade a conservação da vegetação nativa
como uma reserva estratégica de madeira, visto que esse material sempre teve papel importante
no desenvolvimento e na melhoria da infraestrutura local. Hoje, além da possibilidade de produzir
madeira e produtos florestais não madeireiros, a Reserva Legal também é amplamente reconhecida
como uma área que ajuda na estabilização do clima, na produção e na conservação de água, assim
como na proteção da fauna e da flora nativas.
Desse modo, por meio dos artigos 20 a 23 do Código Florestal, o manejo florestal para
fins madeireiros e a coleta de produtos florestais não madeireiros são permitidos nas áreas de
Reserva Legal e se encontram disponíveis como opção de renda e de desenvolvimento rural aos
produtores. A Lei nº 11.284, de 2 de março de 2006 (inciso VI do artigo 3º), assim define o conceito
de manejo florestal:

administração da floresta para obtenção de benefícios econômicos, sociais e


ambientais, respeitando-se os mecanismos de sustentação do ecossistema objeto do
manejo e considerando-se, cumulativa ou alternativamente, a utilização de múltiplas
espécies madeireiras, de múltiplos produtos e subprodutos não-madeireiros, bem
como a utilização de outros bens e serviços de natureza florestal.

Há para o produtor, portanto, duas formas de se beneficiar do manejo das florestas existentes
em sua propriedade, sendo na Reserva Legal ou fora dela. As atividades de exploração e de produção
florestal com finalidades não comerciais são livres de serem realizadas para a extração de madeira e de
produtos florestais não madeireiros (artigos 20, 21 e 24). No caso de exploração de madeira, há apenas
a necessidade de o produtor submeter ao órgão ambiental uma declaração prévia dos motivos e dos
volumes a serem explorados.
Já as atividades de cunho comercial de exploração florestal são detalhadas no Capítulo VII
do Código Florestal, nos artigos 31 a 34, referenciando-se também no detalhamento dos artigos
que tratam da proteção da Reserva Legal, já que a produção madeireira pode ser realizada tanto nas
áreas de Reserva Legal quanto fora delas. Isso vale para as florestas naturais remanescentes, incluindo
aquelas objeto de emissão de Cotas de Reserva Legal (CRA), e também para as florestas oriundas da
recomposição florestal para fins de reposição e/ou garantia de suprimento para as empresas de base
florestal ou que se utilizam intensamente de seus produtos como insumos, como o caso da madeira
para secagem de grãos ou produção siderúrgica.
O artigo 31 deixa claro que as atividades de manejo florestal com finalidades comerciais
devem ser previamente licenciadas pelos órgãos competentes que fazem parte do Sisnama, através
da aprovação do Plano de Manejo Florestal Sustentável (PMFS), que deve conter fundamentos básicos
como: (a) caracterização dos meios físicos e biológicos; (b) determinação do estoque existente; (c)
intensidade de exploração compatível com a capacidade de suporte da floresta; (d) ciclo de corte
compatível com o tempo de restabelecimento do volume extraído da floresta; (e) promoção da
regeneração natural da floresta; (f ) adoção de sistema de exploração adequado; (g) monitoramento
do desenvolvimento da floresta remanescente; e (h) adoção de medidas mitigadoras dos impactos
socioambientais (art. 31, inciso 1º, Lei nº 12.651, de 2012).

91
O PMFS pode ser visto como plano de gestão que, atendendo a todos os fundamentos
enunciados acima, irá estabelecer as atividades a serem executadas conforme os resultados das
análises da floresta a ser manejada e os aprendizados feitos pelo sistema de monitoramento
adotado ao longo do tempo. É elaborado por um engenheiro florestal e aprovado pelos órgãos
competentes do Sisnama, podendo ser na esfera estadual ou federal, (neste último caso, o
Ibama), e fiscalizado tanto pelos órgãos ambientais estaduais quanto federais. Assim como as
demais competências relacionadas ao Código Florestal, a definição de quem aprova e fiscaliza o
PMFS é definida pelos artigos 7º, inciso XV, e 8º, inciso XVI, da Lei Complementar nº 140, de 8 de
dezembro de 2011.
De fato, os fundamentos listados para o manejo florestal no Código Florestal compõem a base
das técnicas exaustivamente desenvolvidas pelas entidades de pesquisa e pelas empresas que adotam
padrões de manejo florestal verificados por terceira parte com alto desempenho, como é o caso dos
empreendimentos certificados pelo Conselho de Manejo Florestal (FSC), o mais relevante sistema de
certificação florestal do planeta.
Finalmente, é importante lembrar que o Código Florestal apenas fundamenta o manejo
florestal sustentável, mas os detalhes de como devem ser realizadas as operações, o planejamento,
e o monitoramento da exploração florestal são descritos em outras regulações, como decretos
estaduais, instruções normativas e portarias emitidas pelo Ibama e pelas agências estaduais, além
das resoluções do Conama.

Seção III

Do Regime de Proteção das Áreas Verdes Urbanas

Art. 25. O poder público municipal contará, para o estabelecimento de áreas verdes urbanas,
com os seguintes instrumentos:
I - o exercício do direito de preempção para aquisição de remanescentes florestais
relevantes, conforme dispõe a Lei no 10.257, de 10 de julho de 2001;
II - a transformação das Reservas Legais em áreas verdes nas expansões urbanas
III - o estabelecimento de exigência de áreas verdes nos loteamentos, empreendi-
mentos comerciais e na implantação de infraestrutura; e
IV - aplicação em áreas verdes de recursos oriundos da compensação ambiental.

92
CAPÍTULO V

DA SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO PARA USO ALTERNATIVO DO SOLO

Art. 26. A supressão de vegetação nativa para uso alternativo do solo, tanto de domínio público
como de domínio privado, dependerá do cadastramento do imóvel no CAR, de que trata o art.
29, e de prévia autorização do órgão estadual competente do Sisnama.
§ 1o (VETADO).
§ 2o (VETADO).
§ 3o No caso de reposição florestal, deverão ser priorizados projetos que contemplem a
utilização de espécies nativas do mesmo bioma onde ocorreu a supressão.
§ 4o O requerimento de autorização de supressão de que trata o caput conterá, no mínimo,
as seguintes informações:
I - a localização do imóvel, das Áreas de Preservação Permanente, da Reserva Legal
e das áreas de uso restrito, por coordenada geográfica, com pelo menos um ponto
de amarração do perímetro do imóvel;
II - a reposição ou compensação florestal, nos termos do § 4o do art. 33;
III - a utilização efetiva e sustentável das áreas já convertidas;
IV - o uso alternativo da área a ser desmatada.

Art. 27. Nas áreas passíveis de uso alternativo do solo, a supressão de vegetação que abrigue espécie
da flora ou da fauna ameaçada de extinção, segundo lista oficial publicada pelos órgãos federal
ou estadual ou municipal do Sisnama, ou espécies migratórias, dependerá da adoção de medidas
compensatórias e mitigadoras que assegurem a conservação da espécie.

Art. 28. Não é permitida a conversão de vegetação nativa para uso alternativo do solo no imóvel
rural que possuir área abandonada.63

63 Embora não conste do “Extrato do julgamento”, o artigo 28 foi unanimemente declarado constitucional, com a
observação, no voto do Relator Ministro Luiz Fux, de que “nos termos do art. 26 do novo Código Florestal, o requerimento de
autorização de supressão deverá ser submetido à análise do órgão ambiental competente, que considerará, dentre outros aspectos
“a utilização efetiva e sustentável das áreas já convertidas” (STF, 2018, p. 76, grifo nosso).

93
CAPÍTULO VI

DO CADASTRO AMBIENTAL RURAL

Art. 29. É criado o Cadastro Ambiental Rural - CAR, no âmbito do Sistema Nacional de Informação
sobre Meio Ambiente - SINIMA, registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para
todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades
e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental
e econômico e combate ao desmatamento.
§ 1o A inscrição do imóvel rural no CAR deverá ser feita, preferencialmente, no órgão
ambiental municipal ou estadual, que, nos termos do regulamento, exigirá do proprietário
ou possuidor rural: (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).
I - identificação do proprietário ou possuidor rural;
II - comprovação da propriedade ou posse;
III - identificação do imóvel por meio de planta e memorial descritivo, contendo
a indicação das coordenadas geográficas com pelo menos um ponto de amarração
do perímetro do imóvel, informando a localização dos remanescentes de vegetação
nativa, das Áreas de Preservação Permanente, das Áreas de Uso Restrito, das áreas
consolidadas e, caso existente, também da localização da Reserva Legal.
§ 2o O cadastramento não será considerado título para fins de reconhecimento do direito
de propriedade ou posse, tampouco elimina a necessidade de cumprimento do disposto
no art. 2o da Lei no 10.267, de 28 de agosto de 2001.
§ 3º A inscrição no CAR é obrigatória e por prazo indeterminado para todas as pro-
priedades e posses rurais. (Redação dada pela Lei nº 13.887, de 2019)
§ 4º Os proprietários e possuidores dos imóveis rurais que os inscreverem no CAR até
o dia 31 de dezembro de 2020 terão direito à adesão ao Programa de Regularização
Ambiental (PRA), de que trata o art. 59 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 13.887,
de 2019)

94
IV - TRANSPARÊNCIA DOS DADOS DO CADASTRO AMBIENTAL
RURAL (CAR)

Por Ana Paula Valdiones, Joara Marchezini e


Marcelo Hugo de Medeiros Bezerra

O direito de acesso à informação é um direito humano reconhecido por vários instrumentos


internacionais. No Brasil, esse direito é garantido por um amplo arcabouço legal, incluindo a
Constituição Federal de 1988. Para assegurar a implementação do direito à informação, foi
promulgada a lei 12.527/2011, chamada de Lei de Acesso à Informação (LAI). Em vigor desde maio de
2012, a LAI também assegura aos cidadãos o acesso aos dados produzidos e custodiados pelo Estado.
De acordo com o que está previsto na LAI, a transparência é a regra, e o sigilo deve ser a
exceção, tendo como base o princípio da máxima publicidade da informação pública. Na área
ambiental, também existem leis que versam sobre a transparência, como a Política Nacional de
Meio Ambiente (Lei 6.983/1981), que obriga os órgãos ambientais à prestação de informações e
estabelece instrumentos para sua produção e sua divulgação, e a Lei 10.650/2003, conhecida como
Lei da Transparência Ambiental. A Lei da Transparência Ambiental, entre outros pontos, garante o
acesso público aos dados e às informações existentes nos órgãos integrantes do Sistema Nacional do
Meio Ambiente (Sisnama).
Essas legislações comprovam a importância da transparência para a efetividade das políticas
ambientais. O próprio Código Florestal cria o Cadastro Ambiental Rural (CAR), no âmbito do Sistema
Nacional de Informação sobre Meio Ambiente (Sinima). O CAR tornou-se uma das mais relevantes
bases públicas de dados para o controle, o monitoramento e o combate ao desmatamento do
Brasil, criando a base de dados do Sicar. É importante frisar que os dados disponíveis pelo CAR são
originalmente autodeclarados pelos proprietários e que devem ser validados pelos órgãos ambientais
estaduais. Esses dados são fundamentais para a elaboração dos Programas de Regularização
Ambiental (PRAs) de cada imóvel.
Contudo, ainda que legalmente existam vários dispositivos que obriguem a transparência
da administração pública, alguns atos normativos têm limitado a transparência do Código Florestal.
Como exemplo, é possível citar a Instrução Normativa 03/2014 do Ministério do Meio Ambiente,
que impõe sigilo à parte das informações cadastrais inseridas no Sicar. A abertura integral dos dados
presentes no Sicar permitiria mais controle social sobre o cumprimento do Código Florestal e o
aprimoramento de políticas de compras sustentáveis, já que os compradores de produtos agrícolas
poderiam conhecer a situação ambiental de seus fornecedores. Ao mesmo tempo, essa abertura
permitiria também mais responsabilização dos produtores rurais que estão em desacordo com a
Código Florestal, bem como de todos os agentes das cadeias de seus produtos. Atualmente, essa
responsabilização e esse controle social não são factíveis, visto que a principal limitação da base é a
não disponibilização de todos os seus dados, como nome completo e CNPJ/ CPF dos proprietários,
nome da propriedade e informações do registro do imóvel – sendo essas categorias essenciais para a
identificação dos proprietários com alguma irregularidade.

95
Para além da necessidade de abertura integral da base do Sicar, existem ainda outras questões
de melhoria da gestão dos dados que poderiam promover mais acesso às informações públicas do
sistema. É possível visualizar e realizar o download do CAR de todos os municípios brasileiros, mas
existem outras limitações técnicas. Apenas é possível realizar o download por município, o que obriga
o usuário a fazer cerca de 5.570 downloads para ter acesso a todos os dados da base. O site do sistema
deveria permitir o download da base completa de uma única vez, além de outros filtros, como a opção
por estado e para um conjunto de municípios selecionados. Outro ponto negativo é a necessidade de
inserção de um e-mail válido e um código apresentado na tela para acessar os dados. Esse mecanismo
é uma restrição desnecessária e incoerente com a premissa de transparência ativa prevista na Lei de
Acesso à informação. Segundo a LAI, a transparência ativa deve ser disponibilizada sem solicitação
do usuário – ou seja, sem nenhum tipo de bloqueio ou exigência de identificação. Criar essa barreira,
considerando-se também o modelo de download apenas por município individualmente, gera
dificuldade excessiva para quem precisa ter acesso a todos os dados disponíveis. O CAR é a única base
que demanda algum tipo de registro para acesso a seus dados.
Conforme exposto, a não divulgação de uma informação é algo previsto nas leis, porém estas
determinam regras e critérios para a utilização do sigilo. Assim, a opacidade deve ser imposta com
cautela e considerar o interesse público da informação. O acesso às bases de dados completas do CAR
implica mais conhecimento sobre uso comercial da terra e dos recursos naturais, fator que permitiria
expor e inibir as práticas ilegais que ameaçam a Amazônia e os demais biomas brasileiros.
Exemplos positivos mostram que é possível seguir o caminho da transparência. Alguns
governos estaduais, comprometidos com a transparência e com o combate à ilegalidade, têm
disponibilizado as bases do CAR na sua integralidade. Por meio da lei complementar nº 592, o
estado de Mato Grosso definiu a disponibilização do CAR na íntegra para o público. De maneira
complementar, o decreto 1.071/2017 estabeleceu o detalhamento adicional desses dados, incluindo
localização geográfica e situação cadastral do imóvel rural (se ativo, suspenso ou cancelado). No
Portal de Transparência da Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Mato Grosso ainda é possível
encontrar informações sobre os cadastros validados, bem como os cadastros daqueles que firmaram
Termos de Compromisso para recuperação ou compensação de seus passivos.
O livre acesso às informações contidas no CAR será fundamental para garantir a
implementação do Código Florestal e da lei de acesso à informação, criando condições para que
sociedade civil, setor privado e agências de controle somem esforços com os demais órgãos
ambientais pela proteção da vegetação e pela regularização ambiental dos imóveis rurais no Brasil.
Também permitirá que exista maior circulação de informações ambientais para a sociedade em geral,
incentivando mais participação e accountability sobre as decisões das políticas ambientais.

96
Art. 30. Nos casos em que a Reserva Legal já tenha sido averbada na matrícula do imóvel
e em que essa averbação identifique o perímetro e a localização da reserva, o proprietário não
será obrigado a fornecer ao órgão ambiental as informações relativas à Reserva Legal previstas no
inciso III do § 1o do art. 29.
Parágrafo único. Para que o proprietário se desobrigue nos termos do caput, deverá
apresentar ao órgão ambiental competente a certidão de registro de imóveis onde conste
a averbação da Reserva Legal ou termo de compromisso já firmado nos casos de posse.

CAPÍTULO VII

DA EXPLORAÇÃO FLORESTAL

Art. 31. A exploração de florestas nativas e formações sucessoras, de domínio público ou privado,
ressalvados os casos previstos nos arts. 21, 23 e 24, dependerá de licenciamento pelo órgão com-
petente do Sisnama, mediante aprovação prévia de Plano de Manejo Florestal Sustentável - PMFS
que contemple técnicas de condução, exploração, reposição florestal e manejo compatíveis com
os variados ecossistemas que a cobertura arbórea forme.
§ 1o O PMFS atenderá os seguintes fundamentos técnicos e científicos:
I - caracterização dos meios físico e biológico;
II - determinação do estoque existente;
III - intensidade de exploração compatível com a capacidade de suporte ambiental
da floresta;
IV - ciclo de corte compatível com o tempo de restabelecimento do volume de
produto extraído da floresta;
V - promoção da regeneração natural da floresta;
VI - adoção de sistema silvicultural adequado;
VII - adoção de sistema de exploração adequado;
VIII - monitoramento do desenvolvimento da floresta remanescente;
IX - adoção de medidas mitigadoras dos impactos ambientais e sociais.
§ 2 A aprovação do PMFS pelo órgão competente do Sisnama confere ao seu detentor a
o

licença ambiental para a prática do manejo florestal sustentável, não se aplicando outras
etapas de licenciamento ambiental.
§ 3o O detentor do PMFS encaminhará relatório anual ao órgão ambiental competente
com as informações sobre toda a área de manejo florestal sustentável e a descrição das
atividades realizadas.

97
§ 4o O PMFS será submetido a vistorias técnicas para fiscalizar as operações e atividades
desenvolvidas na área de manejo.
§ 5o Respeitado o disposto neste artigo, serão estabelecidas em ato do Chefe do Poder
Executivo disposições diferenciadas sobre os PMFS em escala empresarial, de pequena
escala e comunitário.
§ 6o Para fins de manejo florestal na pequena propriedade ou posse rural familiar, os
órgãos do Sisnama deverão estabelecer procedimentos simplificados de elaboração, análise
e aprovação dos referidos PMFS.
§ 7o Compete ao órgão federal de meio ambiente a aprovação de PMFS incidentes em
florestas públicas de domínio da União.

Art. 32. São isentos de PMFS:


I - a supressão de florestas e formações sucessoras para uso alternativo do solo;
II - o manejo e a exploração de florestas plantadas localizadas fora das Áreas de
Preservação Permanente e de Reserva Legal;
III - a exploração florestal não comercial realizada nas propriedades rurais a que se
refere o inciso V do art. 3o ou por populações tradicionais.

Art. 33. As pessoas físicas ou jurídicas que utilizam matéria-prima florestal em suas atividades
devem suprir-se de recursos oriundos de:
I - florestas plantadas;
II - PMFS de floresta nativa aprovado pelo órgão competente do Sisnama;
III - supressão de vegetação nativa autorizada pelo órgão competente do Sisnama;
IV - outras formas de biomassa florestal definidas pelo órgão competente do Sisnama.
§ 1o São obrigadas à reposição florestal as pessoas físicas ou jurídicas que utilizam maté-
ria-prima florestal oriunda de supressão de vegetação nativa ou que detenham autorização
para supressão de vegetação nativa.
§ 2o É isento da obrigatoriedade da reposição florestal aquele que utilize:
I - costaneiras, aparas, cavacos ou outros resíduos provenientes da atividade industrial
II - matéria-prima florestal:
a) oriunda de PMFS;
b) oriunda de floresta plantada;
c) não madeireira.
§ 3 A isenção da obrigatoriedade da reposição florestal não desobriga o interessado da
o

comprovação perante a autoridade competente da origem do recurso florestal utilizado.


§ 4o A reposição florestal será efetivada no Estado de origem da matéria-prima utilizada,
mediante o plantio de espécies preferencialmente nativas, conforme determinações do
órgão competente do Sisnama.

98
Art. 34. As empresas industriais que utilizam grande quantidade de matéria-prima florestal são
obrigadas a elaborar e implementar Plano de Suprimento Sustentável - PSS, a ser submetido à
aprovação do órgão competente do Sisnama.
§ 1o O PSS assegurará produção equivalente ao consumo de matéria-prima florestal pela
atividade industrial.
§ 2o O PSS incluirá, no mínimo:
I - programação de suprimento de matéria-prima florestal
II - indicação das áreas de origem da matéria-prima florestal georreferenciadas;
III - cópia do contrato entre os particulares envolvidos, quando o PSS incluir
suprimento de matéria-prima florestal oriunda de terras pertencentes a terceiros.
§ 3o Admite-se o suprimento mediante matéria-prima em oferta no mercado:
I - na fase inicial de instalação da atividade industrial, nas condições e durante o
período, não superior a 10 (dez) anos, previstos no PSS, ressalvados os contratos
de suprimento mencionados no inciso III do § 2o;
II - no caso de aquisição de produtos provenientes do plantio de florestas exóticas,
licenciadas por órgão competente do Sisnama, o suprimento será comprovado
posteriormente mediante relatório anual em que conste a localização da floresta e
as quantidades produzidas.
§ 4o O PSS de empresas siderúrgicas, metalúrgicas ou outras que consumam grandes
quantidades de carvão vegetal ou lenha estabelecerá a utilização exclusiva de matéria-
-prima oriunda de florestas plantadas ou de PMFS e será parte integrante do processo de
licenciamento ambiental do empreendimento.
§ 5o Serão estabelecidos, em ato do Chefe do Poder Executivo, os parâmetros de utiliza-
ção de matéria-prima florestal para fins de enquadramento das empresas industriais no
disposto no caput.

CAPÍTULO VIII

DO CONTROLE DA ORIGEM DOS PRODUTOS FLORESTAIS

Art. 35. O controle da origem da madeira, do carvão e de outros produtos ou subprodutos


florestais incluirá sistema nacional que integre os dados dos diferentes entes federativos,
coordenado, fiscalizado e regulamentado pelo órgão federal competente do Sisnama.
(Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 1o O plantio ou reflorestamento com espécies florestais nativas ou exóticas in-
dependem de autorização prévia, desde que observadas as limitações e condições

99
previstas nesta Lei, devendo ser informados ao órgão competente, no prazo de até
1 (um) ano, para fins de controle de origem.
§ 2o É livre a extração de lenha e demais produtos de florestas plantadas nas áreas
não consideradas Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal.
§ 3o O corte ou a exploração de espécies nativas plantadas em área de uso alternativo
do solo serão permitidos independentemente de autorização prévia, devendo o plantio
ou reflorestamento estar previamente cadastrado no órgão ambiental competente
e a exploração ser previamente declarada nele para fins de controle de origem.
§ 4o Os dados do sistema referido no caput serão disponibilizados para acesso público
por meio da rede mundial de computadores, cabendo ao órgão federal coordenador do
sistema fornecer os programas de informática a serem utilizados e definir o prazo para
integração dos dados e as informações que deverão ser aportadas ao sistema nacional.
§ 5o O órgão federal coordenador do sistema nacional poderá bloquear a emissão de
Documento de Origem Florestal - DOF dos entes federativos não integrados ao sistema
e fiscalizar os dados e relatórios respectivos. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

Art. 36. O transporte, por qualquer meio, e o armazenamento de madeira, lenha, carvão e outros
produtos ou subprodutos florestais oriundos de florestas de espécies nativas, para fins comerciais ou
industriais, requerem licença do órgão competente do Sisnama, observado o disposto no art. 35.
§ 1o A licença prevista no caput será formalizada por meio da emissão do DOF, que deverá
acompanhar o material até o beneficiamento final.
§ 2o Para a emissão do DOF, a pessoa física ou jurídica responsável deverá estar registrada
no Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras
de Recursos Ambientais, previsto no art. 17 da Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981.
§ 3o Todo aquele que recebe ou adquire, para fins comerciais ou industriais, madeira,
lenha, carvão e outros produtos ou subprodutos de florestas de espécies nativas é obrigado
a exigir a apresentação do DOF e munir-se da via que deverá acompanhar o material até
o beneficiamento final.
§ 4o No DOF deverão constar a especificação do material, sua volumetria e dados sobre
sua origem e destino.
§ 5o O órgão ambiental federal do Sisnama regulamentará os casos de dispensa da licença
prevista no caput. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

Art. 37. O comércio de plantas vivas e outros produtos oriundos da flora nativa dependerá de
licença do órgão estadual competente do Sisnama e de registro no Cadastro Técnico Federal de
Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais, previsto no art.
17 da Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, sem prejuízo de outras exigências cabíveis.
Parágrafo único. A exportação de plantas vivas e outros produtos da flora dependerá de
licença do órgão federal competente do Sisnama, observadas as condições estabelecidas
no caput.

100
CAPÍTULO IX

DA PROIBIÇÃO DO USO DE FOGO E DO CONTROLE DOS INCÊNDIOS

Art. 38. É proibido o uso de fogo na vegetação, exceto nas seguintes situações:
I - em locais ou regiões cujas peculiaridades justifiquem o emprego do fogo em
práticas agropastoris ou florestais, mediante prévia aprovação do órgão estadual
ambiental competente do Sisnama, para cada imóvel rural ou de forma regionalizada,
que estabelecerá os critérios de monitoramento e controle;
II - emprego da queima controlada em Unidades de Conservação, em conformi-
dade com o respectivo plano de manejo e mediante prévia aprovação do órgão
gestor da Unidade de Conservação, visando ao manejo conservacionista da ve-
getação nativa, cujas características ecológicas estejam associadas evolutivamente
à ocorrência do fogo;
III - atividades de pesquisa científica vinculada a projeto de pesquisa devidamente
aprovado pelos órgãos competentes e realizada por instituição de pesquisa reco-
nhecida, mediante prévia aprovação do órgão ambiental competente do Sisnama.
§ 1o Na situação prevista no inciso I, o órgão estadual ambiental competente do Sisnama
exigirá que os estudos demandados para o licenciamento da atividade rural contenham
planejamento específico sobre o emprego do fogo e o controle dos incêndios.
§ 2o Excetuam-se da proibição constante no caput as práticas de prevenção e combate
aos incêndios e as de agricultura de subsistência exercidas pelas populações tradicionais
e indígenas.
§ 3o Na apuração da responsabilidade pelo uso irregular do fogo em terras públicas ou
particulares, a autoridade competente para fiscalização e autuação deverá comprovar
o nexo de causalidade entre a ação do proprietário ou qualquer preposto e o dano
efetivamente causado.
§ 4o É necessário o estabelecimento de nexo causal na verificação das responsabilidades
por infração pelo uso irregular do fogo em terras públicas ou particulares.

Art. 39. Os órgãos ambientais do Sisnama, bem como todo e qualquer órgão público ou privado
responsável pela gestão de áreas com vegetação nativa ou plantios florestais, deverão elaborar,
atualizar e implantar planos de contingência para o combate aos incêndios florestais.

Art. 40. O Governo Federal deverá estabelecer uma Política Nacional de Manejo e Controle de
Queimadas, Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais, que promova a articulação institucional
com vistas na substituição do uso do fogo no meio rural, no controle de queimadas, na prevenção
e no combate aos incêndios florestais e no manejo do fogo em áreas naturais protegidas.
§ 1o A Política mencionada neste artigo deverá prever instrumentos para a análise dos
impactos das queimadas sobre mudanças climáticas e mudanças no uso da terra, conservação

101
dos ecossistemas, saúde pública e fauna, para subsidiar planos estratégicos de prevenção
de incêndios florestais.
§ 2o A Política mencionada neste artigo deverá observar cenários de mudanças climáticas
e potenciais aumentos de risco de ocorrência de incêndios florestais.

CAPÍTULO X

DO PROGRAMA DE APOIO E INCENTIVO À PRESERVAÇÃO E


RECUPERAÇÃO DO MEIO AMBIENTE

Art. 41. É o Poder Executivo federal autorizado a instituir, sem prejuízo do cumprimento da
legislação ambiental, programa de apoio e incentivo à conservação do meio ambiente, bem
como para adoção de tecnologias e boas práticas que conciliem a produtividade agropecuária e
florestal, com redução dos impactos ambientais, como forma de promoção do desenvolvimento
ecologicamente sustentável, observados sempre os critérios de progressividade, abrangendo as
seguintes categorias e linhas de ação: (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).
I - pagamento ou incentivo a serviços ambientais como retribuição, monetária ou
não, às atividades de conservação e melhoria dos ecossistemas e que gerem serviços
ambientais, tais como, isolada ou cumulativamente:
a) o sequestro, a conservação, a manutenção e o aumento do estoque e a
diminuição do fluxo de carbono;
b) a conservação da beleza cênica natural;
c) a conservação da biodiversidade;
d) a conservação das águas e dos serviços hídricos;
e) a regulação do clima;
f ) a valorização cultural e do conhecimento tradicional ecossistêmico;
g) a conservação e o melhoramento do solo;
h) a manutenção de Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e
de uso restrito;
II - compensação pelas medidas de conservação ambiental necessárias para o
cumprimento dos objetivos desta Lei, utilizando-se dos seguintes instrumentos,
dentre outros:
a) obtenção de crédito agrícola, em todas as suas modalidades, com taxas
de juros menores, bem como limites e prazos maiores que os praticados
no mercado;

102
b) contratação do seguro agrícola em condições melhores que as praticadas
no mercado;
c) dedução das Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de
uso restrito da base de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Territorial
Rural - ITR, gerando créditos tributários;
d) destinação de parte dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso da
água, na forma da Lei no 9.433, de 8 de janeiro de 1997, para a manutenção,
recuperação ou recomposição das Áreas de Preservação Permanente, de
Reserva Legal e de uso restrito na bacia de geração da receita;
e) linhas de financiamento para atender iniciativas de preservação voluntária
de vegetação nativa, proteção de espécies da flora nativa ameaçadas de ex-
tinção, manejo florestal e agroflorestal sustentável realizados na propriedade
ou posse rural, ou recuperação de áreas degradadas;
f) isenção de impostos para os principais insumos e equipamentos, tais como:
fios de arame, postes de madeira tratada, bombas d’água, trado de perfuração
de solo, dentre outros utilizados para os processos de recuperação e manuten-
ção das Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de uso restrito;
III - incentivos para comercialização, inovação e aceleração das ações de recuperação,
conservação e uso sustentável das florestas e demais formas de vegetação nativa,
tais como:
a) participação preferencial nos programas de apoio à comercialização da
produção agrícola;
b) destinação de recursos para a pesquisa científica e tecnológica e a extensão
rural relacionadas à melhoria da qualidade ambiental.
§ 1o Para financiar as atividades necessárias à regularização ambiental das propriedades
rurais, o programa poderá prever:
I - destinação de recursos para a pesquisa científica e tecnológica e a extensão rural
relacionadas à melhoria da qualidade ambiental;
II - dedução da base de cálculo do imposto de renda do proprietário ou possuidor
de imóvel rural, pessoa física ou jurídica, de parte dos gastos efetuados com a
recomposição das Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de uso
restrito cujo desmatamento seja anterior a 22 de julho de 2008;
III - utilização de fundos públicos para concessão de créditos reembolsáveis e não
reembolsáveis destinados à compensação, recuperação ou recomposição das Áreas
de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de uso restrito cujo desmatamento
seja anterior a 22 de julho de 2008.
§ 2o O programa previsto no caput poderá, ainda, estabelecer diferenciação tributária para
empresas que industrializem ou comercializem produtos originários de propriedades ou
posses rurais que cumpram os padrões e limites estabelecidos nos arts. 4o, 6o, 11 e 12 desta
Lei, ou que estejam em processo de cumpri-los.

103
§ 3o Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais inscritos no CAR, inadimplentes
em relação ao cumprimento do termo de compromisso ou PRA ou que estejam sujeitos
a sanções por infrações ao disposto nesta Lei, exceto aquelas suspensas em virtude do
disposto no Capítulo XIII, não são elegíveis para os incentivos previstos nas alíneas a a e
do inciso II do caput deste artigo até que as referidas sanções sejam extintas.
§ 4o As atividades de manutenção das Áreas de Preservação Permanente, de Reserva
Legal e de uso restrito são elegíveis para quaisquer pagamentos ou incentivos por serviços
ambientais, configurando adicionalidade para fins de mercados nacionais e internacionais
de reduções de emissões certificadas de gases de efeito estufa.
§ 5o O programa relativo a serviços ambientais previsto no inciso I do caput deste artigo
deverá integrar os sistemas em âmbito nacional e estadual, objetivando a criação de um
mercado de serviços ambientais.
§ 6o Os proprietários localizados nas zonas de amortecimento de Unidades de Conservação
de Proteção Integral são elegíveis para receber apoio técnico-financeiro da compensação
prevista no art. 36 da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, com a finalidade de recuperação
e manutenção de áreas prioritárias para a gestão da unidade.
§ 7o O pagamento ou incentivo a serviços ambientais a que se refere o inciso I deste artigo
serão prioritariamente destinados aos agricultores familiares como definidos no inciso V
do art. 3o desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

V - O USO DE INSTRUMENTOS ECONÔMICOS


PARA A PROTEÇÃO AMBIENTAL

Por Márcia Silva Stanton

O artigo 41 inaugura o capítulo acerca do programa de apoio e incentivo à preservação e


à recuperação do meio ambiente, uma das grandes novidades introduzidas pelo Código Florestal.
Ao prever um programa federal de incentivos, o legislador dá um importante passo no uso de
instrumentos econômicos para a proteção ambiental, a partir da Teoria da Função Promocional
do Direito defendida por Norberto Bobbio (2007). Muito embora a utilização de instrumentos
econômicos estivesse prevista na legislação pátria desde a edição da Política Nacional de
Meio Ambiente (com a redação da Lei no 11.284/2006), foi muito pouco explorada até então,
prevalecendo a adoção de instrumentos de comando e controle. Com o objetivo de mudar esse
cenário e impulsionar o uso de instrumentos de incentivo, os incisos do artigo 41 estabelecem
algumas linhas de ação a serem utilizadas pelo Poder Executivo. São elas: i) Pagamento por Serviços
Ambientais (PSA); ii) crédito e seguro agrícola subsidiado e facilitado, isenções fiscais e destinação
de parte dos recursos de cobrança pelo uso da água para finalidades ambientais; iii) ações de

104
comercialização, inovação e aceleração para fins de recuperação, conservação e uso sustentável dos
recursos ambientais.
O inciso I prevê o uso de PSA, um mecanismo que oferece um incentivo a todo aquele que
presta um serviço ambiental através de proteção, recuperação ou incremento da produção de um
serviço ecossistêmico. Serviços ecossistêmicos são os benefícios obtidos dos ecossistemas, divididos
em serviços de provisão, de suporte, reguladores e culturais (MEA, 2003). A doutrina costuma
enquadrar esses serviços nas modalidades carbono, água, biodiversidade e beleza cênica (Guedes e
Seehusen, 2012, p. 19). Das alíneas “a” até “h” desse inciso são listadas oito modalidades de serviços
ambientais aptos a participar de um PSA, sendo todas elas passíveis de enquadramento em uma das
quatro categorias acima referidas.
Importante destacar a modalidade de serviço ambiental listada na alínea “h”, qual seja, a de
manutenção de Área de Preservação Permanente (APP), Reserva Legal (RL) e uso restrito (AUR). Por
se tratar de áreas sujeitas à limitação administrativa, cuja manutenção ou recuperação se constitui
em obrigação legal, defendem alguns não ser possível o uso de recursos públicos para tal tipo
de incentivo64. Com efeito, o artigo 12 da Lei no 6.938/1981 condiciona a concessão de incentivos
governamentais ao cumprimento das normas ambientais vigentes. Contudo, estando a propriedade
em processo de regularização, nos termos autorizados pela lei, nada impede que se beneficie de um
programa de incentivo, como forma de facilitar a sua regularização. O próprio parágrafo 1º, inciso III
do artigo 41 do Código Florestal prevê a possibilidade de utilização de crédito público, reembolsável
ou não, para as atividades de compensação, recuperação ou recomposição de APP, RL e AUR cujo
desmatamento tenha ocorrido até 22/07/2008.
Outro argumento recorrente contra a inserção de APP, RL e AUR em programas de PSA seria a
“ausência de adicionalidade” pela existência de uma prévia imposição legal quanto à conservação ou à
recomposição dessas áreas. A adicionalidade, no contexto de um PSA, é entendida como a capacidade
de aumento da provisão de serviços ambientais em comparação a um cenário sem o uso do PSA
(Wunder, 2009, p. 16). Analisando a questão, sob ponto de vista da eficiência, a adicionalidade deveria ser
perseguida pois, como ressalta Wunder (2007, p. 53), o provedor ideal de serviços ambientais é aquele
capaz de oferecer a maior adicionalidade possível. Contudo, buscar a maior eficiência possível não
significa tornar a adicionalidade um requisito essencial, pois, como destaca Leonardo Papp (2019, p. 193),
tal requisito apresenta problemas de ordem técnica e de equidade. Ana Maria Nusdeo (2012, p. 155)
elenca uma série de argumentos de ordem prática que justificam a adoção de PSA nessas áreas sujeitas à
limitação administrativa, dentre os quais a ausência de efetividade de alguns instrumentos de comando
e controle, além do reconhecimento do princípio do protetor-recebedor. Trata-se, portanto, de uma
opção política a ser exercida pelo Poder Legislativo. Diversos estados que já possuem legislação sobre
a matéria fizeram sua opção pelo uso de PSA em APP e RL, embora conferindo benefícios adicionais
àqueles que tivessem tais áreas conservadas (Stanton e Tejeiro, 2014, p. 55).

64 Essa discussão foi foco de intenso debate no Congresso Nacional, durante a tramitação dos projetos de lei que dispunham
sobre a Política Nacional e o Programa Federal de PSA. Iniciada durante a tramitação do PL 792/2007, a discussão foi
aprofundada na tramitação do PL 312/2015, cujo texto final foi aprovado na Câmara dos Deputados em setembro de 2019 e
remetido ao Senado Federal, alterado, aprovado e convertido na Lei nº 14.119, de 13 de janeiro de 2021, que institui a Política
Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais; e altera as leis nº 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.629, de 25 de fevereiro de
1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para adequá-las à nova política.

105
O parágrafo 4º do artigo 41, antecipando essa discussão, refere que as atividades de
manutenção de APP, RL e AUR são elegíveis para o recebimento de PSA e que tais atividades
configuram a adicionalidade para os mercados nacionais e internacionais de redução de gases de
efeito estufa. Embora seja questionável a validade e a eficácia dessa norma em relação aos mercados
internacionais, foi feita uma opção legislativa em relação aos mercados nacionais que deve ser
considerada quando se discute no Congresso Nacional a criação de uma Política Nacional e um
Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais (Brasil, 2019).
O parágrafo 5º dispõe que o Programa Federal de PSA a ser instituído deverá integrar os
sistemas de âmbito nacional e estaduais com a finalidade de criar um mercado de serviços ambientais.
Tal regra é de fundamental importância para dar sustentabilidade financeira aos programas, fazendo
com que aqueles que se favorecem dos inúmeros benefícios advindos da conservação ambiental
arquem com os seus custos, de maneira direta, e não apenas via financiamento público.
Já o parágrafo 7º do artigo 41 confere prioridade de participação no Programa Federal de
PSA ao agricultor familiar que atenda ao disposto no artigo 3º da Lei nº 11.326, de 24 de julho de
2006. Aqui temos novamente uma regra programática que reconhece o papel do produtor familiar
na realização do princípio da função social da propriedade, em sintonia com as boas experiências já
implantadas no Brasil nos diversos programas estaduais (Stanton e Tejeiro, 2014).
O inciso II institui diversas hipóteses de compensação para a proteção ambiental, divididas
em diferentes modalidades de instrumentos econômicos habitualmente utilizados para promover a
conservação ambiental e o uso sustentável dos recursos naturais:
a) crédito agrícola facilitado, com taxas de juros menores e prazos de pagamento maiores do
que os praticados no mercado.
b) seguro agrícola em condições mais favoráveis.
c) exclusão das áreas de APP, RL e UR da base de cálculo do Imposto Territorial Rural (ITR).
d) destinação dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso da água para manutenção,
recuperação ou recomposição das APPs, RLs e áreas de uso restrito na própria bacia
hidrográfica.
e) Linhas de financiamento direcionadas à atividade voluntária de preservação, conservação
ou recuperação de áreas degradadas e ao manejo florestal e agroflorestal sustentável.
f ) Isenção de impostos para insumos e equipamentos utilizados no processo de recuperação
e manutenção de APP, RL e AUR.

Algumas dessas medidas já eram amplamente utilizadas antes do advento do Código Florestal
e outras dependem de regulamentação. Dentre as medidas já utilizadas, destacamos a de exclusão
das áreas de APP e RL da base de cálculo do ITR, prevista na legislação desde o advento da Lei da
Política Agrícola (art. 104 da Lei no 8.171/1991) e da lei que regulamenta o ITR (art. 10, § 1º, II, “a” da
Lei no 9.393/1996). O crédito agrícola subsidiado e em condições mais favoráveis, um dos principais
instrumentos de política agrícola adotados no país, possui linhas específicas no Programa ABC
direcionadas às boas práticas ambientais, inclusive, para a recuperação de APP e RL, através da linha
ABC Ambiental (MAPA, 2012).
O parágrafo 3º do artigo 41 veda a possibilidade de acesso às linhas de financiamento
previstas nas alíneas “a” e “e” àqueles que estiverem inadimplentes em relação ao cumprimento das

106
obrigações estabelecidas no Programa de Regularização Ambiental (PRA) ou que tenham tido alguma
sanção pelo descumprimento de obrigações previstas no Código Florestal que não tenham sido
suspensas nas condições estabelecidas no Capítulo XIII desse diploma legal. Tal disposição se coaduna
com o espírito que norteou a redação do artigo 78-A do código e serve como um importante indutor
de regularidade ambiental.
O inciso III menciona algumas modalidades de incentivo para as ações de comercialização,
inovação e aceleração destinadas não apenas à conservação, mas também à recuperação e ao uso
sustentável das florestas e demais formas de vegetação nativa. A alínea “a” lista como incentivo,
exemplificativamente, a participação nos programas de apoio à comercialização da produção
agrícola (PAA), cujo programa foi instituído pela Lei nº 10.696/2003 e vem sendo utilizado pelo poder
público como forma de garantir renda e inserir produtores rurais familiares em cadeias produtivas.
A alínea “b” prevê a destinação de recursos para as pesquisas científica e tecnológica e a extensão
rural relacionadas à melhoria da qualidade ambiental. A destinação de recursos para as pesquisas
científica e tecnológica é fundamental para garantir que o Brasil aproveite o seu potencial como país
megabiodiverso e assuma a liderança que lhe cabe na bioeconomia. Também não podemos esquecer
o protagonismo das universidades públicas na pesquisa científica e o papel da Embrapa da difusão
das diversas técnicas de agricultura tropical conservacionista que o país detém. Precisamos, contudo,
fortalecer e melhor capacitar os serviços de assistência técnica e extensão rural, sem os quais os
avanços tecnológicos não chegarão ao produtor rural, especialmente o pequeno produtor.
O parágrafo 1º do artigo 41 enumera possíveis fontes de financiamento que o programa de
apoio e incentivo à conservação do meio ambiente poderá destinar para atividades de regularização
ambiental dos imóveis rurais, dentre as quais temos i) recursos para pesquisa e extensão rural
relacionadas à melhoria da qualidade ambiental; ii) dedução da base de cálculo do imposto de renda
do produtor rural de parte dos gastos efetuados na recomposição de APP, RL e AUR; iii) utilização
de fundos públicos na concessão de crédito, reembolsável ou não, utilizado na compensação, na
recuperação ou na recomposição de APP, RL e AUR cujo desmatamento seja anterior a 22/07/2008.
A dedução dos gastos efetuados com a recomposição de APP, RL e AUR no Imposto de Renda
do proprietário ou possuidor rural, embora configure um importante instrumento de incentivo
econômico mediante isenção fiscal, exige regulamentação, por meio de lei específica, e não se tem
notícia de grandes avanços nesse sentido65.
O parágrafo 2º prevê que o programa de apoio e incentivo poderá estabelecer diferenciação
tributária às empresas que industrializem ou comercializem produtos oriundos de propriedades que
cumpram com as obrigações legais relativas a APP e RL. Aqui surge uma grande oportunidade de utilizar a
extrafiscalidade como indutora de boas práticas ambientais e de regularização da cadeia de suprimentos,
a exemplo de outras medidas que já vêm induzindo mudança de comportamento, como é o caso da
“moratória da soja”, da certificação ambiental, do acesso a mercados mais exigentes, dentre outros.
Por fim, o parágrafo 6º alarga as hipóteses de destinação dos recursos oriundos da
compensação ambiental do artigo 36 da lei que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação (SNUC) estabelecendo um mecanismo de incentivo para que proprietários situados na

65 Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 5.974/2005, que dispõe sobre incentivos fiscais para projetos
ambientais. A esse PL foram apensados diversos outros tratando de matéria correlata.

107
Zona de Amortecimento de Unidades de Conservação de Proteção Integral promovam a recuperação
e a manutenção de áreas prioritárias para a gestão da Unidade de Conservação (UC). Esse incentivo
depende de regulamentação para ser implementado, mas pode ser uma importante ferramenta de
proteção de áreas relevantes para a UC em questão, normalmente sob intensa pressão. As restrições
ao uso econômico das propriedades situadas em zonas de amortecimento costumam ser fonte de
intensos conflitos, pois, ao mesmo tempo em que configuram autêntica limitação administrativa
ao direito de propriedade, não geram direito à indenização, já que, normalmente, não se verifica o
completo esvaziamento econômico da propriedade (AREsp 155.302/SP).
O decreto regulamentar da Lei do SNUC elenca as hipóteses de destinação dos recursos
oriundos da compensação ambiental, bem como a ordem de prioridades na aplicação dos recursos
(art. 33 do Decreto nº 4.340/2002). A essa relação de prioridades estabelecidas no decreto, e além dessa
hipótese prevista no parágrafo 6º do artigo 41 do Código Florestal, foi inserida a possibilidade de apoiar
a implantação de UC de Uso Sustentável localizada na Amazônia Legal, através da Lei no 13.668/2018.
Portanto, a partir da regulamentação desse dispositivo inserido pelo Código Florestal, a autoridade
licenciadora contará com mais uma hipótese para a gestão e a destinação dos recursos oriundos da
compensação ambiental, tarefa essa que já enfrenta inúmeros desafios, mas que é de fundamental
importância para a proteção e a conservação desses espaços tão relevantes (Salvador, 2020).

Art. 42. O Governo Federal implantará programa para conversão da multa prevista no art. 50 do
Decreto no 6.514, de 22 de julho de 2008, destinado a imóveis rurais, referente a autuações vinculadas
a desmatamentos em áreas onde não era vedada a supressão, que foram promovidos sem autorização
ou licença, em data anterior a 22 de julho de 2008. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

Art. 43. (VETADO).

Art. 44. É instituída a Cota de Reserva Ambiental - CRA, título nominativo representativo de
área com vegetação nativa, existente ou em processo de recuperação:66
I - sob regime de servidão ambiental, instituída na forma do art. 9o-A da Lei no
6.938, de 31 de agosto de 1981;
II - correspondente à área de Reserva Legal instituída voluntariamente sobre a
vegetação que exceder os percentuais exigidos no art. 12 desta Lei;
III - protegida na forma de Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN, nos
termos do art. 21 da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000;
IV - existente em propriedade rural localizada no interior de Unidade de Conservação
de domínio público que ainda não tenha sido desapropriada.

66 “xxii) POR UNANIMIDADE, reconhecer a constitucionalidade do art. 44, do Código Florestal;” (STF, 2018)

108
§ 1o A emissão de CRA será feita mediante requerimento do proprietário, após inclusão
do imóvel no CAR e laudo comprobatório emitido pelo próprio órgão ambiental ou por
entidade credenciada, assegurado o controle do órgão federal competente do Sisnama, na
forma de ato do Chefe do Poder Executivo.
§ 2o A CRA não pode ser emitida com base em vegetação nativa localizada em área de
RPPN instituída em sobreposição à Reserva Legal do imóvel.
§ 3o A Cota de Reserva Florestal - CRF emitida nos termos do art. 44-B da Lei no 4.771,
de 15 de setembro de 1965, passa a ser considerada, pelo efeito desta Lei, como Cota de
Reserva Ambiental.
§ 4o Poderá ser instituída CRA da vegetação nativa que integra a Reserva Legal dos imóveis
a que se refere o inciso V do art. 3o desta Lei.
Art. 45. A CRA será emitida pelo órgão competente do Sisnama em favor de proprietário de imóvel
incluído no CAR que mantenha área nas condições previstas no art. 44.
§ 1o O proprietário interessado na emissão da CRA deve apresentar ao órgão referido no
caput proposta acompanhada de:
I - certidão atualizada da matrícula do imóvel expedida pelo registro de imóveis
competente;
II - cédula de identidade do proprietário, quando se tratar de pessoa física;
III - ato de designação de responsável, quando se tratar de pessoa jurídica;
IV - certidão negativa de débitos do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR;
V - memorial descritivo do imóvel, com a indicação da área a ser vinculada ao título,
contendo pelo menos um ponto de amarração georreferenciado relativo ao perímetro
do imóvel e um ponto de amarração georreferenciado relativo à Reserva Legal.
§ 2o Aprovada a proposta, o órgão referido no caput emitirá a CRA correspondente,
identificando:
I - o número da CRA no sistema único de controle;
II - o nome do proprietário rural da área vinculada ao título;
III - a dimensão e a localização exata da área vinculada ao título, com memorial
descritivo contendo pelo menos um ponto de amarração georreferenciado;
IV - o bioma correspondente à área vinculada ao título;
V - a classificação da área em uma das condições previstas no art. 46.

§ 3o O vínculo de área à CRA será averbado na matrícula do respectivo imóvel no registro


de imóveis competente.
§ 4o O órgão federal referido no caput pode delegar ao órgão estadual competente atribui-
ções para emissão, cancelamento e transferência da CRA, assegurada a implementação de
sistema único de controle.

Art. 46. Cada CRA corresponderá a 1 (um) hectare:

109
I - de área com vegetação nativa primária ou com vegetação secundária em qualquer
estágio de regeneração ou recomposição;
II - de áreas de recomposição mediante reflorestamento com espécies nativas.
§ 1 O estágio sucessional ou o tempo de recomposição ou regeneração da vegetação
o

nativa será avaliado pelo órgão ambiental estadual competente com base em declaração
do proprietário e vistoria de campo.
§ 2o A CRA não poderá ser emitida pelo órgão ambiental competente quando a regeneração
ou recomposição da área forem improváveis ou inviáveis.

Art. 47. É obrigatório o registro da CRA pelo órgão emitente, no prazo de 30 (trinta) dias, contado
da data da sua emissão, em bolsas de mercadorias de âmbito nacional ou em sistemas de registro
e de liquidação financeira de ativos autorizados pelo Banco Central do Brasil.

Art. 48. A CRA pode ser transferida, onerosa ou gratuitamente, a pessoa física ou a pessoa jurídica
de direito público ou privado, mediante termo assinado pelo titular da CRA e pelo adquirente.
§ 1o A transferência da CRA só produz efeito uma vez registrado o termo previsto no
caput no sistema único de controle.
§ 2º A CRA só pode ser utilizada para compensar Reserva Legal de imóvel rural situado
no mesmo bioma da área à qual o título está vinculado.

Dada interpretação, conforme a Constituição, para o artigo 48, parágrafo 2º, do Código Florestal, para
permitir compensação apenas entre áreas com identidade ecológica, conforme decisão proferida nas
ADI 4.901/DF, ADI 4.902/DF, ADI 4.903/DF, ADI 4.937/DF e ADC 42/DF)67.

67 “xxiii) POR MAIORIA, dar interpretação conforme à Constituição ao art. 48, § 2º, do Código Florestal, para permitir
compensação apenas entre áreas com identidade ecológica, vencidos o Ministro Edson Fachin e, em parte, os Ministros Luiz Fux
(Relator), Cármen Lúcia (Presidente), Alexandre de Moraes, Roberto Barroso e Gilmar Mendes;” “Arts. 44; 48, § 2º; e 66, §§ 5º e
6º (Cota de Reserva Ambiental – CRA): A Cota de Reserva Ambiental (CRA) consiste em mecanismo de incentivos em busca da
proteção ambiental, não se limitando às tradicionais e recorrentemente pouco efetivas regras de imposições e proibições (command-
and-control), por meio da criação de ativos correspondentes à preservação dos recursos ecológicos, de modo que qualquer tipo
de degradação da natureza passa também a ser uma agressão ao próprio patrimônio. As soluções de mercado (market-based)
para questões ambientais são amplamente utilizadas no Direito Comparado e com sucesso, a exemplo do sistema de permissões
negociáveis de emissão de carbono (European Union Permission Trading System – ETS). Um grande caso de sucesso é o comércio
internacional de emissões de carbono, estruturado em cumprimento aos limites de emissões fixados pelo Protocolo de Kyoto. A
União Europeia, por exemplo, estabeleceu em 2005 um sistema de permissões negociáveis de emissão de carbono, especificando os
limites que cada poluidor deve atender, os quais são reduzidos periodicamente (European Union Permission Trading System – ETS).
Ao final de cada ano, as companhias devem possuir permissões suficientes para atender às toneladas de dióxido de carbono e outros
gases de efeito estufa emitidos, sob pena de pesadas multas. Dessa forma, a possibilidade de negociação (cap-andtrade) incentiva a
redução de emissões como um todo e, ao mesmo tempo, possibilita que os cortes sejam feitos em setores nos quais isso ocorra com o
menor custo. Nesse sentido, além de atender aos ditames do art. 225 da Constituição, no que se refere à proteção do meio ambiente,
esse instrumento introduzido pelo novo Código Florestal também satisfaz o princípio da eficiência, plasmado no art. 37, caput,
da Carta Magna. Por fim, a necessidade de compensação entre áreas pertencentes ao mesmo bioma, bem como a possibilidade
de compensação da Reserva Legal mediante arrendamento da área sob regime de servidão ambiental ou Reserva Legal, ou, ainda,
por doação de área no interior de unidade de conservação, são preceitos legais compatíveis com a Carta Magna, decorrendo de
escolha razoável do legislador em consonância com o art. 5º, caput e XXIV, da Constituição; CONCLUSÃO : Declaração de
constitucionalidade dos artigos 44, e 66, §§ 5º e 6º, do novo Código Florestal; Interpretação conforme a Constituição ao art. 48,
§2º, para permitir compensação apenas entre áreas com identidade ideológica (vencido o relator);” (STF, 2018)

110
VI - IDENTIDADE ECOLÓGICA E COMPENSAÇÃO DE RESERVA LEGAL

Por Kaline de Mello, Clarice Borges Matos, Alice Brites,


Paulo A. Tavares, Gerd Sparovek e Jean Paul Metzger

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em fevereiro de 2018 de restringir a compensação


de Reserva Legal (RL) entre áreas com identidade ecológica acrescentou incertezas e polêmica ao já
controverso mecanismo de compensar a vegetação nativa fora da propriedade. Nosso objetivo é explicar
o surgimento desse termo, seu entendimento pela ciência, sua importância, os desafios de adotá-lo e os
caminhos de sua implementação, equilibrando questões ambientais e agrícolas envolvidas.

O que o conceito de identidade ecológica procura resolver?


A compensação de RL fora da propriedade desprovida da vegetação nativa (VN) necessária
é prevista pelo Código Florestal desde sua versão anterior68. Pela lei de 1965, a compensação fora da
propriedade deveria ser efetuada dentro da mesma microbacia hidrográfica, restringindo bastante a
oferta de áreas para compensação. Na nova versão da lei, a área geográfica na qual a compensação
pode ocorrer foi alterada para o bioma69. A compensação é permitida em toda a área do bioma da
mesma Unidade Federativa (UF) da propriedade desprovida de RL e das áreas do mesmo bioma
em outras UFs que forem consideradas prioritárias em seus Programas de Regularização Ambiental
(PRAs). Essa regra trouxe uma enorme ampliação da área possível para compensação de RL, o que
pode levar a uma diminuição dos custos para o proprietário que precisa compensar, representando,
portanto, uma vantagem para quem precisa se regularizar. No Brasil todo, a oferta de áreas para
compensação de RL é de cerca de 154 Mha, enquanto o deficit estimado é de apenas 11 Mha (Freitas
et al., 2017), e esse padrão se mantém para todos os biomas, já que a oferta de áreas é bem maior
do que a demanda. Por outro lado, analisando essa decisão pelo lado ambiental, o Brasil é dividido
em apenas seis biomas muito extensos e compostos de diversos tipos de ecossistemas, o que pode
gerar compensações em condições totalmente diferentes do que foi perdido e muito distantes, não
assegurando a preservação da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos de todos os ecossistemas.
Dessa forma, o objetivo ambiental da compensação fica bastante comprometido. Assim, regiões onde
as RLs são importantes para assegurar serviços ecossistêmicos essenciais, como proteção de recursos
hídricos para agricultura e abastecimento público, poderão ficar em deficit, pois as compensações
poderão ser feitas em áreas muito distantes, onde tais serviços podem inclusive já estar assegurados.
Considerando que metade dos remanescentes de VN do Brasil estão em áreas privadas
(Brancalion et al., 2016), o Código Florestal tem papel crucial em assegurar um ambiente saudável,
equilibrando a manutenção dos serviços ecossistêmicos, a preservação da biodiversidade e a

68 “Compensar a Reserva Legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo
ecossistema e esteja localizada na mesma microbacia, conforme critérios estabelecidos em regulamento.” (Lei nº 4.771, de 15 de
setembro de1965, artigo 44, inciso III)
69 Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, artigo 48, parágrafo 2º, para a compensação com CRA, e artigo 66, parágrafo 6º,
inciso II, para as demais formas de compensação da Reserva Legal.

111
segurança alimentar, assegurando assim o desenvolvimento socioeconômico sustentável local,
regional e nacional. Nesse sentido, a identidade ecológica traz uma excelente oportunidade
de assegurar os objetivos primordiais do Código Florestal, propondo um novo contexto de
extensão geográfica da compensação de RL, possibilitando o equilíbrio entre uma área geográfica
extremamente restrita (microbacia) e uma extremamente ampla (bioma).

O que é identidade ecológica?


Apesar da polêmica sobre o termo identidade ecológica após a decisão do STF, esse termo
já havia sido mencionado na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.901, que deu origem ao
julgamento. Um estudo anterior do Grupo de Atuação Especial do Meio Ambiente do Ministério
Público do Estado de São Paulo (Gaema), que embasou a ADI 4.901, já utilizava o termo “equivalência
ecológica” ao se referir aos limites da compensação de RL. O termo “identidade ecológica” foi assim
utilizado na ADI 4.901 com o sentido de equivalência ecológica, que é um termo amplamente
utilizado na literatura científica. O entendimento é de que, por definição, só há compensação se
ela for feita entre áreas com equivalência ecológica, ou seja, entre áreas que possuem um grau (de
preferência elevado) de similaridade em termos de características e funções ecológicas (por exemplo,
espécies, relevo, clima).
A equivalência ou similaridade ecológica é um atributo quantitativo e pode ser representado
por um índice com valores contínuos. Em geral, índices de similaridade variam de 0 (sem
similaridade) a 1 (totalmente similar). Como a lei não estipula um limiar mínimo de similaridade,
há uma oportunidade, ao se definir na prática patamares desejáveis de similaridade, de escolher
valores que possam ao mesmo tempo garantir compensações em áreas ambientalmente
adequadas (em termos de biodiversidade e serviços ecossistêmicos), sem que haja prejuízos
importantes para as áreas produtivas.

Importância e desafios
A compensação ambiental é uma ferramenta de conservação utilizada mundialmente para
contrabalançar as perdas de biodiversidade e serviços ecossistêmicos de um lugar, gerando benefícios
equivalentes em outros lugares (IUCN, 2016). Em 2014, 39 países já haviam adotado equivalência
na legislação e 22 países a estavam implementando. Recomenda-se que a compensação incorpore
algum nível de equivalência ecológica para evitar perdas irreparáveis da biodiversidade e dos
serviços ecossistêmicos e contribuir para sua distribuição uniforme em um território (ten Kate e
Crowe, 2014). Tal mecanismo é importante para que não haja perda de um determinado ecossistema
diante da compensação em outro ecossistema muito distinto. Por exemplo, os remanescentes de
VN de Mata Atlântica estão concentrados na região costeira, onde se tem predomínio de Floresta
Ombrófila. Se deficits de RL em formações como as florestas estacionais, que ocorrem no interior dos
estados, são compensados nos remanescentes da costa, a formação do interior pode ter sua proteção
comprometida, impactando espécies endêmicas e serviços ecossistêmicos essenciais prestados por
essa vegetação.
Alguns desafios para implementação da compensação de RL com equivalência ecológica estão
ligados a como medir essa equivalência, qual o grau de equivalência a ser exigido e quais parâmetros
serão utilizados para medi-la. Há vasta literatura científica que apresenta métodos e parâmetros que

112
podem ser utilizados, dependendo dos objetivos. Portanto, a ciência pode subsidiar os métodos a
serem adotados para mensurar a equivalência de áreas para compensação de RL.
O desafio talvez mais debatido atualmente é que restringir a compensação de RL em áreas
equivalentes pode diminuir a oferta de áreas para compensação e, consequentemente, aumentar
os custos de transação. Essa afirmação é, em parte, verdadeira, se o aspecto econômico não for
considerado quando da definição do grau de equivalência requerido para as compensações, o que
pode ser evitado, como mostraremos a seguir.
Há ainda diferentes interpretações da decisão do STF, que menciona o artigo 48, referente à
compensação de Cotas de Reserva Ambiental (CRA). Alguns interpretam que a equivalência ecológica
seria aplicada apenas à compensação de RL via mecanismo de CRA, e não para outros mecanismos,
como arrendamento e aquisição de terras. Assim, a adoção de identidade ecológica apenas para CRA
resultaria em um enfraquecimento desse mecanismo, que possui vantagens em relação aos outros,
como baixo custo de transação via mercado de créditos ambientais.
Em nossa visão, a equivalência ecológica deveria ser adotada em todos os mecanismos de
compensação, para que se atenda às premissas de conservação da biodiversidade e dos serviços
ecossistêmicos previstas pelo Código Florestal. Não faz sentido para os objetivos do Código Florestal
diferenciar regras em função do mecanismo pelo qual a compensação será feita, restringindo os
objetivos ambientais em alguns mecanismos.

Como a identidade ecológica pode ser adotada de forma equilibrada?


A equipe do Projeto Temático Fapesp do Código Florestal vem trabalhando em alternativas
para a adoção de equivalência ecológica na compensação de RL sem comprometer as áreas
agrícolas produtivas. Uma alternativa é balancear o grau de equivalência ecológica a ser exigido
com a disponibilidade de áreas para compensação, incluindo excedentes de vegetação nativa, RL
de pequenas propriedades (art. 3º, V, c/c art. 44, § 4º, da Lei nº 12.651, de 2012) e restauração de
pastagens de baixa aptidão agrícola e alto potencial de regeneração natural, minimizando custos
para o proprietário que precisa fazer a regularização ambiental. Esse balanço impediria que a
compensação de RL fosse feita em áreas com nenhuma ou muito pouca similaridade ecológica
dentro do bioma, e ao mesmo tempo minimizaria os custos de operacionalização. A equipe de
pesquisadores elaborou uma ferramenta dinâmica para avaliar o balanço entre oferta e demanda de
áreas para compensação de RL nos dois biomas (Mata Atlântica e Cerrado) em diferentes cenários
de tomada de decisão considerando diferentes níveis de equivalência ecológica. Essa ferramenta
mostra que é possível incorporar equivalência ecológica mantendo oferta suficiente de áreas
para compensação70. Assim, entendemos que o conceito de equivalência ecológica é claro e bem
definido pela ciência e pode ser operacionalizado na compensação de RL sem prejuízo econômico
para os proprietários de terras.

70 Para mais informações, acesse: https://codigoflorestal.wixsite.com/tematico.

113
§ 3o A CRA só pode ser utilizada para fins de compensação de Reserva Legal se respeitados
os requisitos estabelecidos no § 6o do art. 66.
§ 4o A utilização de CRA para compensação da Reserva Legal será averbada na matrícula
do imóvel no qual se situa a área vinculada ao título e na do imóvel beneficiário da
compensação.

Art. 49. Cabe ao proprietário do imóvel rural em que se situa a área vinculada à CRA a respon-
sabilidade plena pela manutenção das condições de conservação da vegetação nativa da área que
deu origem ao título.
§ 1o A área vinculada à emissão da CRA com base nos incisos I, II e III do art. 44 desta
Lei poderá ser utilizada conforme PMFS.
§ 2o A transmissão inter vivos ou causa mortis do imóvel não elimina nem altera o vínculo
de área contida no imóvel à CRA.

Art. 50. A CRA somente poderá ser cancelada nos seguintes casos:
I - por solicitação do proprietário rural, em caso de desistência de manter áreas nas
condições previstas nos incisos I e II do art. 44;
II - automaticamente, em razão de término do prazo da servidão ambiental;
III - por decisão do órgão competente do Sisnama, no caso de degradação da
vegetação nativa da área vinculada à CRA cujos custos e prazo de recuperação
ambiental inviabilizem a continuidade do vínculo entre a área e o título.
§ 1o O cancelamento da CRA utilizada para fins de compensação de Reserva Legal só
pode ser efetivado se assegurada Reserva Legal para o imóvel no qual a compensação
foi aplicada.
§ 2o O cancelamento da CRA nos termos do inciso III do caput independe da aplicação
das devidas sanções administrativas e penais decorrentes de infração à legislação ambiental,
nos termos da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998.
§ 3o O cancelamento da CRA deve ser averbado na matrícula do imóvel no qual se situa
a área vinculada ao título e do imóvel no qual a compensação foi aplicada.

114
CAPÍTULO XI

DO CONTROLE DO DESMATAMENTO

Art. 51. O órgão ambiental competente, ao tomar conhecimento do desmatamento em


desacordo com o disposto nesta Lei, deverá embargar a obra ou atividade que deu causa ao
uso alternativo do solo, como medida administrativa voltada a impedir a continuidade do
dano ambiental, propiciar a regeneração do meio ambiente e dar viabilidade à recuperação da
área degradada.
§ 1o O embargo restringe-se aos locais onde efetivamente ocorreu o desmatamento ilegal,
não alcançando as atividades de subsistência ou as demais atividades realizadas no imóvel
não relacionadas com a infração.
§ 2o O órgão ambiental responsável deverá disponibilizar publicamente as informações
sobre o imóvel embargado, inclusive por meio da rede mundial de computadores,
resguardados os dados protegidos por legislação específica, caracterizando o exato
local da área embargada e informando em que estágio se encontra o respectivo pro-
cedimento administrativo.
§ 3o A pedido do interessado, o órgão ambiental responsável emitirá certidão em que conste
a atividade, a obra e a parte da área do imóvel que são objetos do embargo, conforme o caso.

CAPÍTULO XII

DA AGRICULTURA FAMILIAR

Art. 52. A intervenção e a supressão de vegetação em Áreas de Preservação Permanente e de


Reserva Legal para as atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental, previstas no inciso X
do art. 3o, excetuadas as alíneas b e g, quando desenvolvidas nos imóveis a que se refere o inciso
V do art. 3o, dependerão de simples declaração ao órgão ambiental competente, desde que esteja
o imóvel devidamente inscrito no CAR.

Art. 53. Para o registro no CAR da Reserva Legal, nos imóveis a que se refere o inciso V do art.
3o, o proprietário ou possuidor apresentará os dados identificando a área proposta de Reserva
Legal, cabendo aos órgãos competentes integrantes do Sisnama, ou instituição por ele habilitada,
realizar a captação das respectivas coordenadas geográficas.
Parágrafo único. O registro da Reserva Legal nos imóveis a que se refere o inciso V do art.
3o é gratuito, devendo o poder público prestar apoio técnico e jurídico.

115
Art. 54. Para cumprimento da manutenção da área de Reserva Legal nos imóveis a que se refere
o inciso V do art. 3o, poderão ser computados os plantios de árvores frutíferas, ornamentais ou
industriais, compostos por espécies exóticas, cultivadas em sistema intercalar ou em consórcio
com espécies nativas da região em sistemas agroflorestais.
Parágrafo único. O poder público estadual deverá prestar apoio técnico para a recomposição
da vegetação da Reserva Legal nos imóveis a que se refere o inciso V do art. 3o.

Art. 55. A inscrição no CAR dos imóveis a que se refere o inciso V do art. 3o observará procedi-
mento simplificado no qual será obrigatória apenas a apresentação dos documentos mencionados
nos incisos I e II do § 1o do art. 29 e de croqui indicando o perímetro do imóvel, as Áreas de
Preservação Permanente e os remanescentes que formam a Reserva Legal.

Art. 56. O licenciamento ambiental de PMFS comercial nos imóveis a que se refere o inciso V
do art. 3o se beneficiará de procedimento simplificado de licenciamento ambiental.
§ 1o O manejo sustentável da Reserva Legal para exploração florestal eventual, sem propósito
comercial direto ou indireto, para consumo no próprio imóvel a que se refere o inciso V do
art. 3o, independe de autorização dos órgãos ambientais competentes, limitada a retirada
anual de material lenhoso a 2 (dois) metros cúbicos por hectare.
§ 2o O manejo previsto no § 1o não poderá comprometer mais de 15% (quinze por cento)
da biomassa da Reserva Legal nem ser superior a 15 (quinze) metros cúbicos de lenha para
uso doméstico e uso energético, por propriedade ou posse rural, por ano.
§ 3o Para os fins desta Lei, entende-se por manejo eventual, sem propósito comercial, o
suprimento, para uso no próprio imóvel, de lenha ou madeira serrada destinada a benfei-
torias e uso energético nas propriedades e posses rurais, em quantidade não superior ao
estipulado no § 1o deste artigo.
§ 4o Os limites para utilização previstos no § 1o deste artigo no caso de posse coletiva de
populações tradicionais ou de agricultura familiar serão adotados por unidade familiar.
§ 5o As propriedades a que se refere o inciso V do art. 3o são desobrigadas da reposição
florestal se a matéria-prima florestal for utilizada para consumo próprio.

Art. 57. Nos imóveis a que se refere o inciso V do art. 3o, o manejo florestal madeireiro sus-
tentável da Reserva Legal com propósito comercial direto ou indireto depende de autorização
simplificada do órgão ambiental competente, devendo o interessado apresentar, no mínimo, as
seguintes informações:
I - dados do proprietário ou possuidor rural;
II - dados da propriedade ou posse rural, incluindo cópia da matrícula do imóvel
no Registro Geral do Cartório de Registro de Imóveis ou comprovante de posse;
III - croqui da área do imóvel com indicação da área a ser objeto do manejo seletivo,
estimativa do volume de produtos e subprodutos florestais a serem obtidos com o
manejo seletivo, indicação da sua destinação e cronograma de execução previsto.

116
Art. 58. Assegurado o controle e a fiscalização dos órgãos ambientais competentes dos respectivos
planos ou projetos, assim como as obrigações do detentor do imóvel, o poder público poderá
instituir programa de apoio técnico e incentivos financeiros, podendo incluir medidas indutoras
e linhas de financiamento para atender, prioritariamente, os imóveis a que se refere o inciso V do
caput do art. 3o, nas iniciativas de: (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).
I - preservação voluntária de vegetação nativa acima dos limites estabelecidos no art. 12;
II - proteção de espécies da flora nativa ameaçadas de extinção;
III - implantação de sistemas agroflorestal e agrossilvipastoril;
IV - recuperação ambiental de Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal;
V - recuperação de áreas degradadas;
VI - promoção de assistência técnica para regularização ambiental e recuperação
de áreas degradadas;
VII - produção de mudas e sementes;
VIII - pagamento por serviços ambientais.

CAPÍTULO XIII

DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

Seção I

Disposições Gerais

Art. 59.  A União, os Estados e o Distrito Federal deverão implantar Programas de Regularização
Ambiental (PRAs) de posses e propriedades rurais, com o objetivo de adequá-las aos termos deste
Capítulo. (Redação dada pela Lei 13.887, de 2019)
§ 1º Na regulamentação dos PRAs, a União estabelecerá normas de caráter geral, e os
Estados e o Distrito Federal ficarão incumbidos do seu detalhamento por meio da edição
de normas de caráter específico, em razão de suas peculiaridades territoriais, climáticas,
históricas, culturais, econômicas e sociais, conforme preceitua o art. 24 da Constituição
Federal. (Redação dada pela Lei 13.887, de 2019)
§ 2º A inscrição do imóvel rural no CAR é condição obrigatória para a adesão ao PRA,
que deve ser requerida em até 2 (dois) anos, observado o disposto no § 4º do art. 29 desta
Lei. (Redação dada pela Lei 13.887, de 2019)

117
VII - O DECURSO DO PRAZO PARA ADESÃO AO PROGRAMA
DE REGULARIZAÇÃO AMBIENTAL (PRA)

Por Fábio Fernandes Corrêa

Em 2019, mais uma vez a Lei nº 12.651/2012 foi objeto de modificação para alteração de
prazos nela previstos. As mudanças, trazidas pela Lei nº 13.887/2019, ocorreram exatamente nos
dois principais instrumentos da Lei de Proteção da Vegetação Nativa, que são o Cadastro Ambiental
Rural (CAR) e o Programa de Regularização Ambiental (PRA).
A Lei nº 13.887/2019 deu nova redação ao artigo 29, parágrafo 3º, estipulando que a
“inscrição no CAR é obrigatória e por prazo indeterminado para todas as propriedades e posses
rurais”. Ademais, inseriu o parágrafo 4º no artigo 29, estabelecendo que “os proprietários e
possuidores dos imóveis rurais que os inscreverem no CAR até o dia 31 de dezembro de 2020 terão
direito à adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA), de que trata o art. 59 desta Lei.”
O PRA é tratado no artigo 59 da Lei nº 12.651/2012. O caput do dispositivo previa que a
União, os estados e o Distrito Federal deveriam, no prazo de um ano, contado a partir da publicação
da Lei nº 12.651/2012, prorrogável por uma única vez, por igual período, por ato do chefe do Poder
Executivo, implantar os PRAs de posses e propriedades rurais, com o objetivo de adequá-los ao
capítulo em que está inserido (Capítulo XIII – Disposições transitórias).
Atualmente, pela redação conferida pela Lei nº 13.887/2019, há apenas a obrigação da
implantação do PRA pelos mesmos entes federados, sem o estabelecimento de um marco temporal
para tanto. No entanto, se os estados não implementarem o PRA até 31 de dezembro de 2020, o
proprietário ou posseiro rural poderá aderir ao PRA implantado pela União.
O parágrafo 2º do artigo 59 também sofreu uma série de modificações, porém, sempre
manteve a sua primeira parte, que determina que “a inscrição do imóvel rural no CAR é condição
obrigatória para a adesão ao PRA”. A sua redação atual, determinada pela Lei nº 13.887/2019,
complementa a frase: “A inscrição do imóvel rural no CAR é condição obrigatória para a adesão ao
PRA, que deve ser requerida em até 2 (dois) anos, observado o disposto no § 4º do art. 29 desta Lei”.
Uma conclusão clara da mudança legislativa é a de que não mais existe prazo para a
inscrição de imóveis rurais no CAR (art. 29, § 3º), atentando-se ao fato de que o desrespeito ao
seu caráter obrigatório pode gerar imediatas sanções em caso de descumprimento. Assiste razão
ao legislador ao proceder tal mudança, pois se coaduna com o objetivo do cadastro, que é a
necessidade de se ter um retrato da situação ambiental das propriedades e posses rurais. Confere-
se a todos a possibilidade de inserirem seus imóveis rurais no CAR a qualquer tempo, sendo que o
limite de prazo para a inscrição até 31 de dezembro de 2020 se refere à benesse de adesão ao PRA.
No entanto, podem pairar dúvidas quanto ao período de adesão ao PRA em razão da
redação da parte final do parágrafo 2º do artigo 59, já que a adesão do PRA “deve ser requerida em
até 2 (dois) anos, observado o disposto no § 4º do art. 29 desta Lei”.
A importância de se fixar o prazo limite para adesão ao PRA ocorre pela autorização da
continuidade das atividades em áreas rurais consolidadas em áreas de preservação permanente (art.
61-A, § 15) e para delimitar as chamadas anistias administrativas. Quanto às anistias, pelo artigo 59,

118
parágrafos 4º e 5º, da Lei nº 12.651/2012, aquele que aderiu ao PRA e enquanto estiver cumprindo
o termo de compromisso não poderá ser autuado por infrações administrativas decorrentes de
supressão irregular de vegetação em áreas de preservação permanente (APP), Reserva Legal (RL) ou
de uso restrito (UR) praticada antes de 22 de julho de 2008.
Se já tiver ocorrido a autuação pela citada supressão, após a adesão ao PRA as sanções serão
suspensas e, cumprido o termo de compromisso, as multas serão consideradas como convertidas
em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
Uma primeira interpretação é a que leva em conta o decurso do prazo de dois anos para
aderir ao PRA, a contar da vigência da Lei nº 13.887/2019, iniciada em 18 de outubro de 2019. Assim,
a adesão ao PRA deve ser requerida até 18 de outubro de 2021, desde que a inscrição no CAR
tenha sido feita até 31 de dezembro de 2020.
A segunda interpretação possível é a de que o período de dois anos para aderir ao PRA
será contado depois do decurso do prazo para inscrição do imóvel rural no CAR. Nessa linha de
entendimento, a adesão ao PRA pode ser realizada até 31 de dezembro de 2022. O decreto paulista
nº 64.842/2020, que regulamentou o seu PRA, previu esse prazo em seu artigo 2º.
Defendemos a primeira interpretação, pois a correlação dos artigos 29, parágrafo 4º, e 59,
parágrafo 2º, se dá porque a inscrição no CAR é condição e não limite inicial ou final para a adesão
ao PRA. Ademais, vige no Direito Ambiental o princípio in dubio pro natura e, restringindo-se a
concessão das anistias administrativas, há inegável ganho ambiental.

§ 3o Com base no requerimento de adesão ao PRA, o órgão competente integrante do


Sisnama convocará o proprietário ou possuidor para assinar o termo de compromisso,
que constituirá título executivo extrajudicial.
§ 4o No período entre a publicação desta Lei e a implantação do PRA em cada Estado e no
Distrito Federal, bem como após a adesão do interessado ao PRA e enquanto estiver sendo
cumprido o termo de compromisso, o proprietário ou possuidor não poderá ser autuado
por infrações cometidas antes de 22 de julho de 2008, relativas à supressão irregular de
vegetação em Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de uso restrito.71
§ 5o A partir da assinatura do termo de compromisso, serão suspensas as sanções decorrentes
das infrações mencionadas no § 4o deste artigo e, cumpridas as obrigações estabelecidas
no PRA ou no termo de compromisso para a regularização ambiental das exigências
desta Lei, nos prazos e condições neles estabelecidos, as multas referidas neste artigo serão

71 “xxiv) POR MAIORIA, dar interpretação conforme a Constituição ao art. 59, § 4º, do Código Florestal, de modo a
afastar, no decurso da execução dos termos de compromissos subscritos nos programas de regularização ambiental, o risco
de decadência ou prescrição, seja dos ilícitos ambientais praticados antes de 22.7.2008, seja das sanções deles decorrentes,
aplicando-se extensivamente o disposto no § 1º do art. 60 da Lei 12.651/2012, segundo o qual “a prescrição ficará interrompida
durante o período de suspensão da pretensão punitiva”, vencidos os Ministros Luiz Fux (Relator), Marco Aurélio, Edson Fachin,
Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski, e, em parte, o Ministro Gilmar Mendes;” (STF, 2018)

119
consideradas como convertidas em serviços de preservação, melhoria e recuperação da
qualidade do meio ambiente, regularizando o uso de áreas rurais consolidadas conforme
definido no PRA.72

Ocorrerá a interrupção da prescrição punitiva durante a execução do PRA, por força de interpretação
conforme o artigo 59, parágrafos 4º e 5º, de modo a afastar, no decurso da atuação de compromissos
subscritos nos Programas de Regularização Ambiental, o risco de decadência ou prescrição, seja dos ilícitos
ambientais praticados antes de 22 de julho de 2008, seja das sanções dele decorrentes, aplicando-se
extensivamente o disposto no parágrafo 1º do artigo 60 da Lei 12.651/2012 (ADI 4.901).

§ 6º (VETADO). (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).


§ 7º Caso os Estados e o Distrito Federal não implantem o PRA até 31 de dezembro
de 2020, o proprietário ou possuidor de imóvel rural poderá aderir ao PRA implantado
pela União, observado o disposto no § 2º deste artigo. (Redação dada pela Lei nº
13.887, de 2019)

Art. 60. A assinatura de termo de compromisso para regularização de imóvel ou posse rural
perante o órgão ambiental competente, mencionado no art. 59, suspenderá a punibilidade dos
crimes previstos nos arts. 38, 39 e 48 da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, enquanto o
termo estiver sendo cumprido.73
§ 1º A prescrição ficará interrompida durante o período de suspensão da pretensão punitiva.
§ 2º Extingue-se a punibilidade com a efetiva regularização prevista nesta Lei.

72 “xxv) POR MAIORIA, dar interpretação conforme à Constituição ao art. 59, § 5º, de modo a afastar, no decurso da
constitucionalidade do art. 12. § 5º, do Código Florestal ...e “no decurso da execução dos termos de compromissos subscritos
nos programas de regularização ambiental, o risco de decadência ou prescrição, seja dos ilícitos ambientais praticados antes de
22.7.2008, seja das sanções deles decorrentes, aplicando-se extensivamente o disposto no § 1º do art. 60 da Lei 12.651/2012,
segundo o qual “a prescrição ficará interrompida durante o período de suspensão da pretensão punitiva”, vencidos os Ministros
Luiz Fux (Relator), Marco Aurélio, Edson Fachin, Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski, e, em parte, o Ministro Gilmar
Mendes;” (STF, 2018)
73 “xxvi) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Luiz Fux (Relator), Marco Aurélio, Roberto Barroso e Ricardo
Lewandowski, reconhecer a constitucionalidade do art. 60 do Código Florestal;” (STF, 2018)

120
Seção II

Das Áreas Consolidadas em Áreas de Preservação Permanente

Art. 61. (VETADO).

Art. 61-A. Nas Áreas de Preservação Permanente, é autorizada, exclusivamente, a continuidade


das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas
até 22 de julho de 2008. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).74
§ 1º Para os imóveis rurais com área de até 1 (um) módulo fiscal que possuam áreas
consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais,
será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em 5 (cinco) metros,
contados da borda da calha do leito regular, independentemente da largura do curso
d´água. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 2º Para os imóveis rurais com área superior a 1 (um) módulo fiscal e de até 2 (dois) mó-
dulos fiscais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo
de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais
em 8 (oito) metros, contados da borda da calha do leito regular, independentemente da
largura do curso d´água. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 3º Para os imóveis rurais com área superior a 2 (dois) módulos fiscais e de até 4 (quatro)
módulos fiscais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao
longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas
marginais em 15 (quinze) metros, contados da borda da calha do leito regular, indepen-
dentemente da largura do curso d’água. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 4º Para os imóveis rurais com área superior a 4 (quatro) módulos fiscais que possuam
áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água natu-
rais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais: (Incluído pela Lei
nº 12.727, de 2012).
I - (VETADO); e (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
II - nos demais casos, conforme determinação do PRA, observado o mínimo de
20 (vinte) e o máximo de 100 (cem) metros, contados da borda da calha do leito
regular. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 5º Nos casos de áreas rurais consolidadas em Áreas de Preservação Permanente no
entorno de nascentes e olhos d’água perenes, será admitida a manutenção de atividades
agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, sendo obrigatória a recomposição
do raio mínimo de 15 (quinze) metros. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 6º Para os imóveis rurais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Per-

74 “xxvii) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, e, em parte, o Ministro Edson
Fachin, reconhecer a constitucionalidade do art. 61-A do Código Florestal;” (STF, 2018)

121
manente no entorno de lagos e lagoas naturais, será admitida a manutenção de atividades
agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, sendo obrigatória a recomposição
de faixa marginal com largura mínima de: (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
I - 5 (cinco) metros, para imóveis rurais com área de até 1 (um) módulo fiscal;
(Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
II - 8 (oito) metros, para imóveis rurais com área superior a 1 (um) módulo fiscal
e de até 2 (dois) módulos fiscais; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
III - 15 (quinze) metros, para imóveis rurais com área superior a 2 (dois) módulos
fiscais e de até 4 (quatro) módulos fiscais; e (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
IV - 30 (trinta) metros, para imóveis rurais com área superior a 4 (quatro) módulos
fiscais. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 7o Nos casos de áreas rurais consolidadas em veredas, será obrigatória a recomposição
das faixas marginais, em projeção horizontal, delimitadas a partir do espaço brejoso e
encharcado, de largura mínima de: (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
I - 30 (trinta) metros, para imóveis rurais com área de até 4 (quatro) módulos
fiscais; e (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
II - 50 (cinquenta) metros, para imóveis rurais com área superior a 4 (quatro)
módulos fiscais. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 8o Será considerada, para os fins do disposto no caput e nos §§ 1o a 7o, a área detida pelo
imóvel rural em 22 de julho de 2008. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 9o A existência das situações previstas no caput deverá ser informada no CAR para
fins de monitoramento, sendo exigida, nesses casos, a adoção de técnicas de conservação
do solo e da água que visem à mitigação dos eventuais impactos. (Incluído pela Lei nº
12.727, de 2012).
§ 10. Antes mesmo da disponibilização do CAR, no caso das intervenções já existentes,
é o proprietário ou possuidor rural responsável pela conservação do solo e da água, por
meio de adoção de boas práticas agronômicas. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 11. A realização das atividades previstas no caput observará critérios técnicos de conservação
do solo e da água indicados no PRA previsto nesta Lei, sendo vedada a conversão de novas
áreas para uso alternativo do solo nesses locais. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 12. Será admitida a manutenção de residências e da infraestrutura associada às atividades
agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural, inclusive o acesso a essas atividades,
independentemente das determinações contidas no caput e nos §§ 1o a 7o, desde que não
estejam em área que ofereça risco à vida ou à integridade física das pessoas. (Incluído pela
Lei nº 12.727, de 2012).
§ 13. A recomposição de que trata este artigo poderá ser feita, isolada ou conjuntamente,
pelos seguintes métodos: (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
I - condução de regeneração natural de espécies nativas; (Incluído pela Lei nº
12.727, de 2012).

122
II - plantio de espécies nativas;
III - plantio de espécies nativas conjugado com a condução da regeneração natural
de espécies nativas; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
IV - plantio intercalado de espécies lenhosas, perenes ou de ciclo longo, exóticas
com nativas de ocorrência regional, em até 50% (cinquenta por cento) da área
total a ser recomposta, no caso dos imóveis a que se refere o inciso V do caput do
art. 3o; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
V - (VETADO). (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

§ 14. Em todos os casos previstos neste artigo, o poder público, verificada a existência
de risco de agravamento de processos erosivos ou de inundações, determinará a adoção
de medidas mitigadoras que garantam a estabilidade das margens e a qualidade da água,
após deliberação do Conselho Estadual de Meio Ambiente ou de órgão colegiado estadual
equivalente. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 15. A partir da data da publicação desta Lei e até o término do prazo de adesão ao PRA
de que trata o § 2o do art. 59, é autorizada a continuidade das atividades desenvolvidas
nas áreas de que trata o caput, as quais deverão ser informadas no CAR para fins de
monitoramento, sendo exigida a adoção de medidas de conservação do solo e da água.
(Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 16. As Áreas de Preservação Permanente localizadas em imóveis inseridos nos limites
de Unidades de Conservação de Proteção Integral criadas por ato do poder público até
a data de publicação desta Lei não são passíveis de ter quaisquer atividades consideradas
como consolidadas nos termos do caput e dos §§ 1º a 15, ressalvado o que dispuser o
Plano de Manejo elaborado e aprovado de acordo com as orientações emitidas pelo órgão
competente do Sisnama, nos termos do que dispuser regulamento do Chefe do Poder
Executivo, devendo o proprietário, possuidor rural ou ocupante a qualquer título adotar
todas as medidas indicadas. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

123
VIII - OBSERVAÇÕES SOBRE A ADEQUAÇÃO AMBIENTAL DE
IMÓVEIS RURAIS LOCALIZADOS EM UNIDADE DE CONSERVAÇÃO

Por Roberta Rubim del Giudice

Este texto propõe uma perspectiva de adequação ambiental de imóveis rurais localizados em
Unidades de Conservação (UC), desmatados antes de 22 de julho de 2008, em relação aos limites de
uso e proteção das Áreas de Preservação Permanente (APP) e de Reserva Legal (RL) estabelecidos pelo
Código Florestal.
Para tal análise, é importante conhecer o que dispõe a Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000,
que regulamenta o artigo 225, parágrafo 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, que institui o
Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) e dá outras providências, incluindo
o domínio desses territórios, bem como o que dispõe a Lei no 12.651, de 25 de maio de 2012, o Código
Florestal, sobre a adequação das UCs.
Nos termos da Lei do SNUC (Lei no 9.985/2000, art. 2º, inciso I), as UCs são espaços territoriais
e “seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes,
legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime
especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção”. As UCs podem ser de
Proteção Integral, com o objetivo de “preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos
seus recursos naturais” ou de Uso Sustentável, com o objetivo “compatibilizar a conservação da natureza
com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais” (Lei no 9.985/2000, art. 7º, incisos I e II e
parágrafos 1º e 2º). Assim, as UCs de Proteção Integral têm um tratamento legal mais restritivo do que
as UCs de Uso Sustentável. Ambas devem ter suas regras de utilização, observados os limites legais,
estabelecidas em um plano de manejo (ou plano de gestão ambiental da UC).
De acordo com a Lei do SNUC, as UCs podem ser de domínio público ou privado, conforme
sua categoria. A propriedade de um bem imóvel compreende o seu domínio e a sua posse e envolve
a disposição, o uso, a fruição e a garantia desse bem. Assim, ser titular do domínio importa no direito a
reivindicar a posse (Barros, sem data). A expressão foi utilizada pela Lei do SNUC para diferenciar as UCs
que podem ter imóveis privados em seu interior e as que não podem. Os imóveis privados localizados em
UCs que têm domínio público devem ser desapropriados. Já a posse de áreas ocupadas por populações
tradicionais, cuja manutenção dos meios de vida foi um dos fundamentos da criação da UC, deve ser
concedida a essas comunidades, por isso, justificando o uso correto da expressão domínio público.
O conceito de dominialidade e os objetivos das UCs são importantes para a análise da
regularização ambiental frente ao Código Florestal, sobre o qual se passa a discorrer aqui. Quanto a
esse código, tem-se os seguintes conceitos de Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal
(Lei no 12.651/2012, art. 3º, incisos II e III):

II - Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por


vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a
paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de
fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas;

124
III - Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural,
delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de
modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a
reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade,
bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa;

Os artigos 4º, 5º, 6º e 12 do Código Florestal delimitam as APPs e as RLs, localizadas ou não em
Unidades de Conservação de Proteção Integral ou de Uso Sustentável, em imóveis públicos e privados.
As APPs têm restrição de uso maior do que as RLs, que podem ter uso sustentável.
O capítulo XIII do Código Florestal (Disposições Transitórias) estabelece a forma de
regularização ambiental de imóveis que não possuíam APP e RL adequados à Lei em 22 de julho
de 2008. Especificamente, sobre as APPs em UCs, o Código Florestal (Lei no 12.651/2012, art. 61-A,
parágrafo 16, grifo nosso) estabelece que:

As Áreas de Preservação Permanente localizadas em imóveis inseridos nos limites de


Unidades de Conservação de Proteção Integral criadas por ato do poder público
até a data de publicação desta Lei não são passíveis de ter quaisquer atividades
consideradas como consolidadas nos termos do caput e dos §§ 1o a 15, ressalvado o
que dispuser o Plano de Manejo elaborado e aprovado de acordo com as orientações
emitidas pelo órgão competente do Sisnama, nos termos do que dispuser
regulamento do Chefe do Poder Executivo, devendo o proprietário, possuidor rural
ou ocupante a qualquer título adotar todas as medidas indicadas.

Dessa forma, APP localizada em UC de Proteção Integral não poderá ter o uso considerado
consolidado, e a área desmatada além dos limites legais deverá ser recomposta ou regenerada.
Na verdade, nenhum uso intensivo e não sustentável poderá ser consolidado em desacordo com
os objetivos para os quais as UCs foram criadas, sob pena de sua criação não se justificar. Assim,
nas UCs de Proteção Integral, não há que se tratar da regularização de uso consolidado, uma vez
que tanto o desmatamento de APP quanto o de Reserva Legal não condizem com os objetivos
que justificam a criação e a manutenção dessas UCs. O mesmo acontece com o desmatamento de
APP e RL em UC de domínio público, se houve a definição de que a área é de relevante interesse
para a conservação ambiental, justificando não só sua proteção como UC, como também sua
desapropriação e sua titulação em nome do poder público. O desmatamento de áreas sensíveis
como as APPs ou de 20% a 80% de sua área, conforme sua localização, afronta o interesse público
em sua conservação.
Conclui-se, portanto, que embora não expresso no Código Florestal, mas com
fundamento na Constituição da República 75 e em sua regulamentação pela Lei do SNUC, não há
possibilidade jurídica de haver quaisquer atividades consideradas como consolidadas em APP

75 Art. 225, § 1º, “III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem
especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que
comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;”.

125
ou RL em imóveis localizados em UC de Proteção Integral, bem como em UC de Uso Sustentável
de domínio público.
Contudo, resta aqui a análise da regularização do uso consolidado antes de 22 de julho de
2008 de RL e de APP em imóveis localizados em UC de Uso Sustentável de propriedade privada. Essa
situação se restringe às Áreas de Proteção Ambiental (APA), uma vez que as Reservas Particulares do
Patrimônio Natural (RPPN) atualmente são consideradas de Proteção Integral, e as Áreas de Relevante
Interesse Ecológico (ARIE) são áreas muito pequenas cuja consolidação de uso não se justificaria.
Nos termos da Lei do SNUC (Lei nº 9.985/2000, art. 15), as APAs são áreas geralmente extensas,
com ocupação humana, dotadas de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente
importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas. Têm como objetivos
básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a
sustentabilidade do uso dos recursos naturais. Elas podem incidir em imóveis públicos e privados, que
terão regras de utilização, em geral, mais restritivas do que as de imóveis fora de seus limites. As regras
de utilização devem ser estabelecidas em seu plano de manejo (ou plano de gestão ambiental da UC),
depois de ouvido o seu conselho.
Em decorrência da ideia do legislador racional, tem-se que a lei não contém palavras inúteis.
Dessa forma, além de ressaltar a impossibilidade de consolidação de usos em APP em imóveis
localizados em UC de Proteção Integral, quis ainda o legislador definir que é possível que essa
consolidação ocorresse em situação diversa. Uma vez que não há a possibilidade jurídica de se
consolidar o uso em APP e RL em imóvel localizado em UC de Proteção Integral, bem como em UC de
Uso Sustentável de domínio público, essa possibilidade somente se aplica a UC de Uso Sustentável de
titulação privada, ou seja, em imóveis localizados em APA.
Assim, as APPs e as RLs localizadas em imóveis inseridos nos limites de Unidades de Conservação
de Uso Sustentável e de domínio privado são passíveis de ter atividades consideradas como consolidadas
nos termos do caput do artigo 61-A, da Lei no 12.651/2012, e de seus parágrafos 1o a 15, bem como nos
termos do artigo 66 da mesma lei. Ou seja, o parágrafo 16 do artigo 61-A, citado acima, retira a incidência
da consolidação do uso de APP, prevista no caput do artigo 61-A, nas UCs de Proteção Integral, mas não nas
UCs de Uso Sustentável e de domínio privado.
No mesmo sentido, cabe destacar que, em UC de Uso Sustentável de domínio privado, não há
na legislação dispositivo que impeça a utilização das regras de transição. Sobre o que cabe destacar o
princípio da autonomia da vontade, segundo o qual, nas relações privadas, pode-se fazer tudo o que
a lei não proíbe. Daí, o proprietário ou possuidor de imóvel privado dispõe do direito de utilizar os
mecanismos de adequação disponíveis no Código Florestal, tais como as regras de transição. Contudo,
a esses impõe-se o dever de se adequar ao Código Florestal, ainda que se utilizando de tais regras, e
observar os limites de utilização impostos pelo plano de manejo da UC.
Conclui-se, portanto, que as regras de transição dispostas no Código Florestal podem incidir
em imóvel privado localizado em APA, observando-se os limites impostos em seu plano de manejo. Ou
seja, a regularização ambiental de imóveis rurais localizados em UC de Uso Sustentável, na categoria
Área de Proteção Ambiental, estabelecida em conformidade com o artigo 15 da Lei nº 9.985/2000,
deve observar o disposto na Lei nº 12.651/2012, desde que não existam disposições contrárias no
respectivo plano de manejo da Unidade de Conservação, devidamente aprovado por seu conselho.

126
§ 17. Em bacias hidrográficas consideradas críticas, conforme previsto em legislação espe-
cífica, o Chefe do Poder Executivo poderá, em ato próprio, estabelecer metas e diretrizes
de recuperação ou conservação da vegetação nativa superiores às definidas no caput e nos
§§ 1o a 7o, como projeto prioritário, ouvidos o Comitê de Bacia Hidrográfica e o Conselho
Estadual de Meio Ambiente. (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
§ 18. (VETADO). (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

IX - ANÁLISE TÉCNICA DO USO CONSOLIDADO DE


ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE76

Por Maria José Zakia e Luis Fernando Guedes Pinto

As Áreas de Preservação Permanente (APPs) associadas a recursos hídricos naturais


(nascentes, cursos d’água, veredas e lagos e lagoas naturais) têm uma faixa mínima obrigatória
para recomposição, definida no artigo 61-A do Código Florestal, que varia em função do tamanho
do imóvel rural. As demais APPs (reservatórios, encostas, topo de morros e montanhas, chapadas,
mangues, restingas e altitudes acima de 1.800 m) não têm exigência de uma faixa mínima de
recomposição, aplicando-se a regra geral, estabelecida no artigo 4º da mesma lei.
A continuidade do uso consolidado em APPs, onde não for obrigatória a recomposição, só
poderá ocorrer se tiverem práticas que garantam a conservação da água e do solo. Essas práticas
possivelmente serão regulamentadas futuramente, mas dependem das espécies e das práticas de
cultivo. As práticas com menos riscos são:
I. Culturas perenes, sem uso de agrotóxicos ou fertilizantes solúveis em área total. A
aplicação de herbicidas e fertilizantes localizados deve ser extremamente cuidadosa;
II. Plantio de espécies arbóreas, com colheita de baixo impacto, ou para a produção de
produtos não madeireiros;
III. Para todos os casos, deve-se observar o risco de o cultivo da área consolidada se tornar
invasor da área nativa. Estradas com baixa manutenção e largura máxima entre 5 e 7 metros
devem ter saídas de água controladas, sem despejar água diretamente no curso d´água.

As práticas de alto risco e que devem ser evitadas nas APPs consolidadas são:
I. Culturas anuais ou semiperenes, que tenham aração ou dragagem para preparo de solo;
II. Uso de fungicidas, inseticidas e fertilizantes solúveis em área total;
III. Trânsito de máquinas pesadas, com risco de compactação do solo, limitando a necessária
infiltração de água;

76 Zakia e Pinto (2013).

127
IV. Estradas largas, com manutenção frequente e trânsito pesado, com descarga d´água sem
controle e despejo direto no curso d´água.
A parte da APP com vegetação nativa ou em recomposição pode ser contabilizada como RL,
porém a fração das APPs com uso consolidado e, portanto, não recomposta, não entra no cômputo da
Reserva Legal.

X - RECOMENDAÇÕES PARA A REGULAMENTAÇÃO DOS


PROGRAMAS DE REGULARIZAÇÃO AMBIENTAL77

Por Vinicius Guidotti, Luís Fernando Guedes Pinto, Sílvio Frosini de Barros
Ferraz, Pedro Henrique Santin Brancalion e Gerd Sparovek

A partir das considerações apresentadas sobre o uso consolidado em Áreas de Preservação


Permanente (APAs), seguem abaixo recomendações para a regulamentação dos Programas de
Regularização Ambiental (PRAs):
1. Incentivar a recuperação integral da cobertura florestal das APPs hídricas (nascentes e
cursos d´água);
2. Desincentivar a manutenção de atividades agropecuárias em APPs consolidadas;
3. Regulamentar as Boas Práticas Agronômicas (BPAs) para o eventual uso rural consolidado
em APPs, tomando-se como base os fundamentos das legislações existentes para a
conservação do solo.
4. Desincentivar culturas agrícolas que demandem práticas de manejo intensivas em APPs,
como a mecanização do solo e o uso elevado de pesticidas agrícolas, devido aos riscos
para a conservação do solo e da água, em especial os riscos associados à contaminação da
água por agroquímicos;
5. Incentivar a restauração de Reservas Legais (RLs) na própria bacia hidrográfica em
situações de cobertura florestal menor do que 30%, priorizando a sua alocação em áreas
declivosas que, normalmente, também são áreas com menor aptidão agrícola;
6. Desincentivar a compensação de RLs fora das bacias hidrográficas em situações de
cobertura florestal menor do que 30%;
7. Desenvolver mecanismos de incentivos econômicos para a conservação e a restauração da
vegetação nativa em quantidades adequadas para a provisão de serviços ambientais.

77 Vinicius Guidotti, Luís Fernando Guedes Pinto, Silvio Frosini de Barros Ferraz, Pedro Henrique Santin Brancalion,
Gerd Sparovek. Código Florestal: Contribuições para a Regulamentação dos Programas de Regularização Ambiental (PRA).
Sustentabilidade em debate. n. 4. Piracicaba: Imaflora, 2016.

128
Em adição ao PRA, acreditamos que a adoção de BPAs deve ser amplamente incentivada
em áreas rurais, o que poderia ser regulamentado via ações de comando e controle (visando
a evitar o uso predatório) e incentivos econômicos (visando à melhoria contínua e às melhores
práticas de produção).
Para tanto, uma importante referência é a Lei Paulista 6.171, de 4 de julho de 1988 (São Paulo,
1988), e suas alterações, que dispõe sobre o uso, a conservação e a preservação do solo agrícola
no estado de São Paulo. No seu artigo primeiro, a lei estabelece que “o solo agrícola é patrimônio
da humanidade, e por consequência, cabe aos responsáveis pelo seu uso a obrigatoriedade de
conservá-lo. [...] As omissões e ações contrárias às disposições desta lei, na utilização, exploração
e manejo do solo agrícola são consideradas danosas ao patrimônio do Estado de São Paulo”. A
Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado destaca que a aplicação da lei tem resultado
direto “no aumento da fertilidade dos solos recuperados, com consequente elevação da produtividade
e proteção das áreas de preservação permanentes, culminando assim na preservação do meio
ambiente”. A partir do exemplo de São Paulo, recomendamos que o desenvolvimento dos PRAs
estaduais sejam realizados de forma integrada e sinérgica com outras legislações já existentes, como
é o caso da Lei de Conservação do Solo e a Lei Proteção da Mata Atlântica (Lei Federal 11.428, de 22
de dezembro de 2006), para que o Código Florestal, ou oficialmente a Lei de Proteção da Vegetação
Nativa, cumpra de fato suas funções e seus objetivos, dentre os quais reforçamos sua contribuição
para o desenvolvimentos sustentável.

Art. 61-B. Aos proprietários e possuidores dos imóveis rurais que, em 22 de julho de 2008,
detinham até 10 (dez) módulos fiscais e desenvolviam atividades agrossilvipastoris nas áreas con-
solidadas em Áreas de Preservação Permanente é garantido que a exigência de recomposição, nos
termos desta Lei, somadas todas as Áreas de Preservação Permanente do imóvel, não ultrapassará:
(Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).78
I - 10% (dez por cento) da área total do imóvel, para imóveis rurais com área de
até 2 (dois) módulos fiscais; (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
II - 20% (vinte por cento) da área total do imóvel, para imóveis rurais com área
superior a 2 (dois) e de até 4 (quatro) módulos fiscais; (Incluído pela Lei nº 12.727,
de 2012).
III - (VETADO).

78 “xxviii) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Marco Aurélio, Edson Fachin e Ricardo Lewandowski, reconhecer a
constitucionalidade do art. 61-B do Código Florestal;” (STF, 2018)

129
XI - RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL E A FLEXIBILIZAÇÃO
DO DEVER DE RECOMPOSIÇÃO DE ÁREAS DE PRESERVAÇÃO
PERMANENTE EM ÁREAS RURAIS CONSOLIDADAS

Por Annelise Monteiro Steigleder

O presente artigo analisa a imputação do dever de os proprietários e possuidores


de áreas degradadas, onde há atividades agrossilvipastoris consolidadas em Áreas de
Preservação Permanente (APPs), antes de 22 de julho de 2008, marco temporal previsto nos
artigos 61-A e 61-B da Lei 12.651/2012 (Código Florestal Brasileiro), recuperarem integralmente
essas áreas, ainda que o STF tenha declarado a constitucionalidade desses dispositivos legais (STF,
2018), a fim de fazer cessar o agravamento dos danos ambientais ou o desencadeamento
de novos danos, adotando-se uma interpretação sistêmica, que tem por fio condutor o
pensamento complexo.
O ilícito administrativo ambiental perpetrado antes de 22 de julho de 2008, consistente na
intervenção não autorizada em APPs, seja por meio da implantação de obras ou da supressão de
vegetação, foi anistiado pelos artigos 61-A e 61-B da Lei 12.651/2012, e o dever de recomposição das
APPs foi flexibilizado, adotando-se por parâmetro o tamanho do módulo fiscal do município onde se
localiza o imóvel rural.
O artigo 61-A da Lei 12.651/2012 prevê que, “nas áreas de preservação permanente, é
autorizada, exclusivamente, a continuidade das atividades agrossilvopastoris, de ecoturismo e de
turismo rural em áreas consolidadas até 22 de julho de 2008”. Os parágrafos subsequentes tratam da
“escadinha”, ao estabelecerem a obrigatoriedade de recomposição das faixas marginais dos cursos
d’água conforme o tamanho do módulo fiscal e também da flexibilização para recomposição de
vegetação no entorno de nascentes e olhos d’água perenes (parágrafo 5º), no entorno de lagos e
lagoas naturais (parágrafo 6º) e de veredas (parágrafo 7º).
Por sua vez, artigo 61-B do mesmo diploma legal afirma que “aos proprietários e possuidores
dos imóveis rurais que, em 22 de julho de 2008, detinham até 10 (dez) módulos fiscais e desenvolviam
atividades agrossilvipastoris nas áreas consolidadas em áreas de preservação permanente é garantido
que a exigência de recomposição, nos termos desta lei, somadas todas as áreas de preservação
permanente do imóvel, não ultrapassará: I – 10% da área total do imóvel, para imóveis rurais com área
de até dois módulos fiscais; II – 20% da área total do imóvel, para imóveis rurais com área superior a
dois até quatro módulos fiscais”.
Essas normas versam sobre a responsabilidade administrativa do proprietário e do
possuidor rural que, antes de 22 de julho de 2008, possuíam atividades agrossilvipastoris
e edificações em APPs, contrariando o disposto no então Código Florestal (4.771/1965),
segundo o qual eram vedadas as intervenções em APPs, salvo em casos de utilidade pública,
interesse social e baixo impacto. Como consequência da anistia dos ilícitos administrativos
perpetrados nas APPs, a obrigação de recomposição, no âmbito do Programa de Regularização
Ambiental (PRA), foi minimizada, abdicando o Estado de exigir a integral restauração das áreas

130
degradadas, o que é imposto para todos que intervêm ilicitamente nessas áreas protegidas
após o marco legal de 22 de julho de 200879.
No entanto, tendo em vista o caráter complexo dos danos ambientais localizados em uma
bacia hidrográfica, que tendem a se agravar progressivamente, com a afetação de diversos serviços
ecossistêmicos que dependem do equilíbrio das interações entre os elementos bióticos e abióticos
dos sistemas naturais, é possível que, em determinado caso concreto, a remoção de novos danos
ambientais, denominada por Mirra (2002) de “supressão do fato lesivo”, dependa da recomposição de
APPs degradadas pela presença de ocupações consolidadas antes de 22 de julho de 2008, e, nesse
caso, sustenta-se a possibilidade de exigência de restauração integral mesmo para áreas consolidadas.
Por exemplo, processos erosivos que comprometam a qualidade do solo e, consequentemente,
o equilíbrio de sistemas naturais poderão demandar metas mais ambiciosas de restauração natural do
que aquelas previstas, genericamente, no artigo 61-A, pois as metragens fixadas nesse dispositivo, a
serem recompostas, poderão se revelar, em concreto, insuficientes para conter a erosão e recuperar os
atributos ambientais ameaçados.
Ainda, o fenômeno das mudanças climáticas está intensificando a ocorrência de desastres
naturais, provocados por eventos climáticos extremos, o que compromete a sustentabilidade das
sociedades. Enchentes, inundações e formação de ilhas de calor são algumas das consequências das
mudanças climáticas que podem ser mitigadas através da recomposição de áreas de preservação
permanente (Geneletti, Cortinovis, Zardo e Blal, 2019).
Diante disso, propõe-se como questão de pesquisa neste estudo a possibilidade de, a partir
da interpretação sistemática do direito, exigir a integral recuperação das APPs nas quais se localizam
atividades agrossilvipastoris consolidadas, afastando-se o hipotético permissivo dos artigos 61-A e 61-B
da Lei 12.651/2012, com vistas à reparação integral dos renovados danos ambientais, que se revelam
agravados justamente em virtude do deficit de áreas ambientalmente preservadas na bacia hidrográfica.

A coerência e a unidade do sistema jurídico


Um aspecto inicial a ser enfrentado diz com a compatibilização do atual entendimento do
Supremo Tribunal Federal, relativamente à constitucionalidade dos dispositivos da Lei 12.651/2012,
com o contexto mais amplo do sistema jurídico brasileiro. É preciso compreender que o julgamento
que reconheceu a constitucionalidade da redução do dever de recomposição das APPs onde
existissem atividades rurais consolidadas integra um conjunto de pré-compreensões que foram sendo
elaboradas ao longo de muitos anos, e que tem por referência, tanto em termos dogmáticos como
valorativos, o direito fundamental ao ambiente ecologicamente equilibrado, previsto no artigo 225,
caput, da Constituição Federal de 1988.
A importância do equilíbrio ecológico, da preservação e da restauração dos sistemas
ecológicos essenciais é objeto de destaque na Constituição (art. 225, § 1º, I), ao lado do princípio

79 O artigo 7º, parágrafo primeiro, da Lei 12.651/2012 trata do regime de proteção das áreas de preservação permanente,
afirmando que “tendo ocorrido supressão de vegetação situada em área de preservação permanente, o proprietário da área,
possuidor ou ocupante a qualquer título é obrigado a promover a recomposição da vegetação, ressalvados os usos autorizados
previstos nesta lei”. O parágrafo segundo do mesmo dispositivo afirma que essa obrigação é propter rem e o parágrafo terceiro
veda a concessão de novas autorizações de supressão de vegetação para supressões não autorizadas após 22 de julho de 2008,
enquanto não cumpridas as obrigações do parágrafo primeiro.

131
da proteção da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), pois se reconhece a interconexão entre
a qualidade dos sistemas naturais e a tutela da saúde e da vida de humanos e não humanos. Ao
se proteger os atributos dos sistemas naturais, garante-se a manutenção das bases materiais que
proporcionam a vida neste planeta.
O direito fundamental ao ambiente ecologicamente equilibrado impõe-se como um
princípio jurídico vinculante80, que atua como vetor axiológico na modelagem de políticas públicas
e na conformação conceitual de outros direitos, tais como o direito ao livre exercício de atividades
econômicas e à fruição de direitos de propriedade, dando origem a expressões como “função
social e ambiental da propriedade” e “desenvolvimento ecologicamente sustentável”. A partir dele,
estruturou-se o Direito Ambiental, que é composto não apenas por regras e princípios jurídicos, mas
pela jurisprudência que traduz o pensamento predominante, no contexto de uma cultura jurídica
compartilhada na sociedade. Portanto, a interpretação sobre os efeitos do posicionamento do
STF, relativamente ao dever de recomposição de APPs, deve ser feita a partir da noção de sistema
jurídico, de tal forma a buscar um sentido de coerência e de unidade para esse sistema, evitando-se
contradições (Freitas, 2010, p. 34; Platjouw, 2016, p. 190) e tendo em vista o conjunto de construções
jurisprudenciais historicamente elaboradas, sob uma abordagem que reconheça a complexidade das
relações sociais.
Não se pretende aqui retomar as críticas ao Código Florestal, que foram objeto das ações
diretas de constitucionalidade e, consequentemente, enfrentadas pelo Supremo. O que se quer
evidenciar é a importância da compatibilização desse entendimento com outras construções jurídicas
estruturantes do Direito Ambiental, tais como o princípio da reparação integral do dano ambiental, a
imputação da responsabilidade por obrigações propter rem, a imprescritibilidade da pretensão para
reparação dos danos ambientais e a vedação do reconhecimento de fato consumado e de direito
adquirido à manutenção de situações lesivas ao meio ambiente.

A posição do Supremo Tribunal Federal em relação às áreas rurais consolidadas em áreas


de preservação permanente – artigos 61-A e 61-B da Lei 12.651/2012
O STF anistiou as ocupações e atividades agrossilvipastoris em áreas rurais consolidadas,
desde que preexistentes a 22 de julho de 2008, ao considerar constitucionais os artigos 7º,
parágrafo 3º; 17, caput e parágrafo 3º; 8º, parágrafo 2º; 61-A; 61-B; 61-C; 63; e 67 do Código
Florestal. O argumento utilizado foi “que o legislador tem o dever de promover transições razoáveis
e estabilizar situações jurídicas consolidadas pela ação do tempo ao edificar novos marcos
legislativos”. Nesse contexto, o Código Florestal teria estabelecido “uma espécie de ‘novo marco zero
na gestão ambiental do país’”.
Especificamente ao tratar dos artigos 61-A e 61-B, que tratam das APPs, a Corte entendeu que o
estabelecimento de critérios para sua recomposição, de acordo com o tamanho do imóvel, é legítimo,
assinalando que “a própria lei prevê mecanismos para que os órgãos ambientais competentes realizem
a adequação dos critérios de recomposição para a realidade de cada nicho ecológico”. Dentre os
fundamentos utilizados para a declaração de constitucionalidade desses dispositivos, a Ministra Carmen

80 A respeito, ver Canotilho e Leite (2007) e Sarlet e Fensterseifer (2007).

132
Lúcia destacou a adoção, pelo legislador, de “critérios de proporcionalidade e razoabilidade adequados
ao meio ambiente da produção agrossilvipastoril e à diversidade da estrutura fundiária brasileira”
(STF, 2018, p. 303).
No entanto, o STF expressamente sinalizou para a possibilidade de os órgãos ambientais
competentes realizarem a adequação dos critérios de recomposição das APPs, diante da realidade
fática; e também reconheceu, ao apreciar a constitucionalidade do artigo 3º, inciso IX, da Lei
12.651/2012, que a intervenção em APPs é excepcional, por interesse social ou utilidade pública,
condicionada à inexistência de alternativa técnica e/ou locacional à atividade proposta. Disso se
depreende a assimilação pela Corte de que a conservação desses espaços territoriais representa uma
estratégia decisiva para a manutenção de serviços ecológicos essenciais, nos termos do artigo 225,
parágrafo 1º, I, da Constituição Federal de 1988.
Nessa perspectiva, cumpre observar que o artigo 61-A trata de faixas mínimas de
recomposição obrigatória, o que está expresso nos seus parágrafos 5º, 6º e 7º. Além disso, no artigo
61-A, parágrafo 14, consta que “em todos os casos previstos neste artigo, o poder público, verificada
a existência de risco de agravamento de processos erosivos ou de inundações, determinará a adoção
de medidas mitigadoras que garantam a estabilidade das margens e a qualidade da água, após
deliberação do Conselho Estadual do Meio Ambiente ou do órgão colegiado estadual equivalente”.
Por sua vez, o artigo 61-A, parágrafo 17, prevê que, nas bacias hidrográficas consideradas
críticas, conforme previsto em legislação específica, o chefe do poder executivo poderá, em ato
próprio, estabelecer metas e diretrizes de recuperação ou conservação da vegetação nativa superiores
ao previsto no caput, ouvidos o Comitê de Bacia Hidrográfica e o Conselho Estadual do Meio Ambiente.
Portanto, em uma interpretação sistemática e coerente desses dispositivos, à luz do que foi
enunciado pelo STF, tem-se que há um aspecto técnico-científico, de caráter substantivo, que precisa
ser considerado quando da definição das faixas de recomposição de APPs, sobretudo nos casos de
nascentes e olhos d’água, do entorno de lagos e lagoas naturais e de veredas, em que a lei estabeleceu
parâmetros mínimos de recomposição obrigatória.
Assim, o direcionamento da flexibilização em relação às ocupações consolidadas deve
ser interpretado como uma norma geral a respeito do regime de recomposição da vegetação
remanescente nessas áreas. Mas, em casos especiais, como nos processos erosivos, por exemplo, as
metas e as diretrizes de recuperação ou conservação poderão ser mais exigentes, o que deixa em
aberto uma brecha para que se possa compelir os proprietários e possuidores a repararem danos
ambientais associados ao deficit de recuperação das APPs.
O fundamento para essa interpretação é a necessidade de hermenêutica coerente, não
contraditória e sistemática do sistema jurídico constitucional, pois o Código Florestal deve ser
compatibilizado como o artigo 225 da Constituição Federal de 1988, segundo o qual incumbe ao
Estado “preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais”, “prover o manejo ecológico das
espécies e ecossistemas” e “recuperar o meio ambiente degradado”.
Poder-se-ia argumentar que o artigo 61-A, nos parágrafos 1º, 2º e 3º, prevê faixas em limites
taxativos, que variam de 5 a 15 metros, conforme o módulo fiscal, e que o artigo 61-B estabelece
percentuais máximos de recomposição. Porém, mesmo aqui, os parágrafos 9º e 10º do artigo 61-A
afirmam, respectivamente, a necessidade de adoção de técnicas de conservação do solo e da água
que visem à mitigação dos eventuais impactos e de “boas práticas agronômicas”. Tais dispositivos

133
devem ser interpretados à luz da realidade fática, em uma perspectiva evolutiva, segundo a qual
poderá haver situações concretas em que a mitigação dos impactos negativos somente será
concretizada através da recomposição da vegetação, em níveis adequados ao restabelecimento das
funções ecossistêmicas que se busca garantir.
O mesmo sentido consta do artigo 63, segundo o qual “nas áreas rurais consolidadas nos locais
de que tratam os incisos V, VIII, IX e X do artigo 4º, será admitida a manutenção de atividades florestais,
culturas de espécies lenhosas perenes ou de ciclo longo, bem como da infraestrutura física associada
ao desenvolvimento de atividades agrossilvipastoris, vedada a conservação de novas áreas para o uso
alternativo do solo. Esse artigo condiciona a manutenção de culturas e de infraestruturas em APPs à
“adoção de práticas conservacionistas do solo e da água indicadas pelos órgãos de assistência técnica
rural” (parágrafos 2º e 3º).
Por fim, o ambiente de aplicação desses dispositivos legais é a responsabilidade administrativa
ambiental, que é autônoma em relação à responsabilidade civil e à responsabilidade criminal,
nos termos do artigo 225, parágrafo 3º, da Constituição Federal de 1988. Isso significa que a
flexibilização do dever de recompor as áreas de preservação permanente incide no contexto do
Programa de Regularização Ambiental, a ser conduzido pelo Poder Executivo. Consequentemente, o
reconhecimento, pelo Supremo Tribunal Federal, da constitucionalidade dos artigos 61-A e 61-B não
impede a incidência da responsabilidade civil, para fins de reparação integral do dano, quando estes
se revelam atuais e graves, com vistas ao restabelecimento do equilíbrio ecológico. Há um imperativo
ditado pela realidade fática, que não pode ser ignorado, pois o dano ambiental é dinâmico e tende a
se agravar se não forem adotadas medidas de natureza inibitória e corretiva.

O regime objetivo de imputação da responsabilidade civil por danos ambientais


No Direito Ambiental brasileiro, a responsabilidade por danos ambientais consta do artigo
225, parágrafo 3º, da Constituição Federal de 1988 e da Lei Federal 6.938/1981 (Política Nacional do
Meio Ambiente), cujo artigo 14, parágrafo 1º, prescreve que, “sem obstar a aplicação das penalidades
previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar
ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”. Ainda,
merece referência o conceito de poluidor previsto no artigo 3º, inciso IV, segundo o qual poluidor é
“a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por
atividade causadora de degradação ambiental”.
Braga Netto, Rosenvald e Chaves de Farias (2015, p. 430), ao comentarem a expressão
“independentemente de culpa”, presente tanto no artigo 14, parágrafo 1º, da Lei 6.938/1981, como
no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, afirmam a irrelevância da licitude ou ilicitude do fato
jurídico danoso para a imputação da responsabilidade civil. Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça

134
ossui jurisprudência firme pela incidência da teoria do risco integral81, cuja formulação teórica, ao
rechaçar as excludentes de causalidade, evidencia o entrelaçamento entre o nexo de imputação e o
nexo de causalidade82.
Nesse contexto, o que é relevante para a imputação é o resultado da atividade, qual seja o
dano antijurídico, este sim conceituado como uma lesão a interesses juridicamente protegidos. Daí
que o que deve ser injusto é o dano, e não a atividade, que pode ser, ao menos sob o ponto de vista
formal, lícita e conforme com o licenciamento ambiental (Iturraspe, Hutchinson e Donna, 1999, p. 96),
com o que se conclui que o resultado da atividade é reputado antijurídico porque viola o princípio do
neminem laedere, segundo o qual a ninguém é dado o direito de lesar os direitos alheios83.
Nessa perspectiva, a anistia dos ilícitos administrativos anteriores a 22 de julho de 2008 e a
consequente flexibilização do dever de recomposição das áreas de preservação permanente não
apagam a ocorrência do dano ambiental e o seu caráter injusto.
Observe-se que mesmo na esfera criminal, a anistia, embora desconstitua a própria coisa
julgada, não impede a proposição da ação de reparação de danos; e, na esfera da improbidade
administrativa, ainda que ocorra a prescrição das ações destinadas a levar a efeitos as sanções
previstas na Lei 8.429/1992, subsiste o dever de reparação de danos ao erário84. Portanto, no Direito
brasileiro, a licitude da atividade não foi contemplada como excludente de responsabilidade civil, que
também repudia a tese do fato consumado, nos termos da Súmula 613 do Superior Tribunal de Justiça,
datada de 201985, e adota o entendimento de que os danos ambientais são imprescritíveis e de que
“não há direito adquirido à manutenção de situação que gere prejuízo ao meio ambiente”86. Além

81 Superior Tribunal de Justiça, Jurisprudência em Teses, Brasília, 18 de março de 2015, nº 30, Enunciado 10:
“10) A responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o
fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável
pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar sua obrigação de indenizar. (Tese julgada sob o rito do
art. 543-C do CPC). Em idêntico sentido é o Enunciado 01, da Edição 119 da Jurisprudência em Teses do Superior Tribunal
de Justiça, datada de 08 de fevereiro de 2019. Na interpretação de Roselvald, Chaves de Freitas e Braga Netto, a responsabilidade
civil por dano ambiental não se coaduna com o risco integral, mas projeta um risco agravado, que somente admite como defesa
a prova, pelo agente, se o dano provém de um fato desvinculado de sua atividade (Chaves de Farias, Rosenvald e Braga Netto,
2015, p. 462).
82 STJ, 2ª Turma, Resp. 650.728/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 23/10/2007.
83 Lucán (1992); e, no mesmo sentido: Lucarelli (1994), Pasqualotto (1993, p. 458) e Braga Netto (2019, p. 355).
84 Nesse sentido, ver o Informativo 0454, de 1º a 5 de novembro de 2010, da Primeira Turma, onde consta que “na espécie, o
tribunal a quo entendeu que, remanescendo, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa, o pleito ressarcitório,
este, por ser imprescritível, pode ser buscado em ação autônoma. É pacífico no STJ que as sanções previstas no artigo 12 e incisos
da Lei n. 8.429/1992 prescrevem em cinco anos, o que não ocorre com a reparação do dano ao erário por ser imprescritível a
pretensão ressarcitória nos termos do artigo 37, parágrafo 5º, da CF/1988. Assim, quando autorizada a cumulação do pedido
condenatório e do ressarcitório em ação por improbidade administrativa, a rejeição do pedido condenatório abarcado pela
prescrição não impede o prosseguimento da demanda quanto ao segundo pedido em razão de sua imprescritibilidade. Com essas
considerações, a Turma deu provimento ao recurso do MPF para determinar o prosseguimento da ação civil pública por ato de
improbidade no que se refere ao pleito de ressarcimento de danos ao erário. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.038.103-SP,
DJe 4/5/2009; REsp 1.067.561-AM, DJe 27/2/2009; REsp 801.846-AM, DJe 12/2/2009; REsp 902.166-SP, DJe 4/5/2009, e
REsp 1.107.833-SP, DJe 18/9/2009. REsp 1.089.492-RO, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 4/11/2010.
85 A respeito, ver Marchesan (2019).
86 Nesse sentido é o Enunciado 9 da Jurisprudência em Teses n. 119, do Superior Tribunal de Justiça. Disponível em:
<https://scon.stj.jus.br/SCON/jt/toc.jsp>.

135
disso, os passivos ambientais existentes nas áreas acarretam responsabilidade civil propter rem87, nos
termos do artigo 2º, parágrafo 2º, do Código Florestal.
Nessa linha de raciocínio, a amarração argumentativa, elaborada com amparo na
interpretação sistemática do direito, norteada axiologicamente pelo direito fundamental ao ambiente
ecologicamente equilibrado e pelo princípio da dignidade da pessoa humana, que reúne as ideias
de que a licitude da atividade e a anistia dos ilícitos não excluem o dever de reparação dos danos; do
repúdio ao fato consumado no direito ambiental; da imprescritibilidade da pretensão reparatória de
danos ao meio ambiente; e da imputação da responsabilidade objetiva e propter rem, permite que se
conclua pela possibilidade de afastar, no caso concreto, os artigos 61-A e 61-B, do Código Florestal, a
fim de garantir a plena reparação dos danos ambientais associados ao deficit de vegetação nas áreas
de preservação permanente. Será preciso apenas demonstrar a ocorrência do agravamento dos danos
existentes, ou o desencadeamento de novos danos ambientais.
Agrega-se ainda outro argumento, qual seja a complexidade (Johnson, 2011) do dano
ambiental, como realidade dinâmica, cuja causa pode residir no deficit de áreas de preservação
permanente íntegras, que cumpram plenamente as respectivas funções ecossistêmicas. A
compreensão dos danos ambientais a partir do pensamento complexo permite compreender a sua
multidimensionalidade (Morin, 2000), identificando-se a sua gravidade em curto, médio e longo
prazos, e também conforme as escalas espaciais, ultrapassando-se a percepção linear das relações de
causa e efeito (Martins, 2018, p. 59). Nessa perspectiva, o dano ambiental deve ser considerado como
uma realidade dinâmica, cuja face visível pode ocultar uma rede de elementos também impactados
que se relacionam e combinam, produzindo novas consequências, suscetíveis de se revelarem ao
longo do tempo e em espaços geográficos progressivamente ampliados.
Por exemplo, a supressão de espécies da flora nativa localizada em APP não atinge apenas a
vegetação, mas toda a gama de serviços ecossistêmicos prestados por esse específico componente
do ecossistema degradado (Westman, 1977)88. Para Westman, os ecossistemas desempenham
“gratuitamente” uma série de serviços ecossistêmicos, que permitem ao ser humano obter alimentos,
fibras, energia e todos os recursos necessários à sua sobrevivência. Portanto, quando ocorre a
degradação dos sistemas naturais, há impactos diretos e indiretos nas diversas atividades humanas,
com variações em seu bem-estar, o que suscita a necessidade de avaliação das oportunidades
de conservação e de restauração dos ecossistemas naturais, a fim de que objetivos voltados à
maximização de bem-estar sejam atingidos89. Em 2010, a relevância dos serviços ecossistêmicos foi

87 Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica, conforme se depreende do Enunciado 2, da
Edição 119 – Responsabilidade por dano ambiental, da Jurisprudência em Teses do Superior Tribunal de Justiça.
88 Westman (1977) é um ecologista norte-americano, que, nesse artigo, procura evidenciar que a natureza desempenha
funções ecossistêmicas relevantes para o bem estar humano, para a economia e para o desenvolvimento da sociedade em geral,
muito embora tais funções não sejam suscetíveis de serem precificadas e contabilizadas quando da tomada de decisões. Já nos
anos 1970, Westman apontava para o papel dos ecossistemas no equilíbrio das radiações e para a regulação do clima global,
sinalizando a relação causal não linear entre a supressão da vegetação, com subsequentes alterações na fixação de CO2, na
liberação de vapor d’água e no fluxo de radiação, e as alterações climáticas.
89 Em 2005, a Avaliação Ecossistêmica do Milênio, elaborada pelo Programa das Nações Unidas para o Ambiente e
Desenvolvimento, identificou os serviços ecossistêmicos desempenhados pelos ambientes naturais, com vistas à informação de
políticas públicas. O relatório está disponível em: <https://www.millenniumassessment.org/en/index.html>. Antes desse estudo,
Robert Constanza, em artigo publicado na revista Nature, estimou o valor econômico de 17 serviços ecossistêmicos para 16
biomas (Constanza et al., 1997).

136
reconhecida pelas Metas de Aichi, estabelecidas no contexto da Convenção da Biodiversidade da ONU
de 2010 (COP-10)90, e, em 2015, foi inserida nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS)91.
Um caso emblemático que explicita a necessidade da adoção do pensamento complexo
para rechaçar a pura incidência do artigo 61-A do Código Florestal é o caso da turbidez das águas
do Rio da Prata, localizado no município de Bonito, Mato Grosso do Sul, cujas principais cabeceiras
são formadas por uma rede complexa de nascentes, que formam um “brejão”, que se estende por
cinco mil hectares, localizados nos municípios de Jardim e Bonito. Trata-se de uma área de veredas,
definida pelo artigo 3º, inciso XII, da Lei 12.651/2012, protegida como de preservação permanente
(artigo 4º, XI, do mesmo diploma).
Ocorre que a partir de 2005, especialmente, o brejão foi alvo de drástica expansão do cultivo
de grãos, o que desencadeou um processo de destruição das áreas úmidas por meio da construção de
drenos. Além disso, essas áreas de veredas são desprovidas de cercamento, o que favorece o pisoteio
pelo gado. Há tanto situações ilícitas perpetradas antes de 22 de julho de 2008 como ilícitos recentes,
detectados pelos órgãos ambientais competentes. O fato é que o conjunto de práticas inadequadas de
manejo do solo, a implantação de drenos, o desmatamento e a redução das faixas de matas ciliares para
uso nas culturas e a substituição da vegetação nativa de vereda por espécies exóticas de pastagem ou
monoculturas concorreu para a degradação do brejão, com o subsequente carreamento de sedimentos
e resíduos de agrotóxicos para o Rio da Prata, cujas águas cristalinas, que encantam os turistas de todo o
mundo, passaram a apresentar turbidez quando do incremento de chuvas (Gris e Figueiredo, 2019).
Ainda que o estado do Mato Grosso do Sul, por meio de um decreto recente, preveja medidas
de governança e exigência de boas práticas, buscando regrar o futuro da bacia hidrográfica do Rio da
Prata92, os passivos deverão ser restaurados, pois há nexo causal entre a sua consolidação e os danos
atuais complexos que estão sendo observados. Ou seja, a estrutura causal exige uma abordagem
sistêmica e unitária, que compreenda tanto as situações consolidadas como os novos ilícitos
perpetrados, todos contribuindo para a degradação ambiental da bacia.

Conclusões

Por todo o exposto, tem-se que a flexibilização da exigência de recomposição das áreas
de preservação permanente onde há atividades agrossilvipastoris consolidadas, a que se referem
os artigos 61-A e 61-B do Código Florestal, por se relacionar, sobretudo, com a responsabilidade
administrativa por ilícitos ambientais, não exclui a possibilidade de responsabilização civil dos

90 Disponível em: <https://www.mma.gov.br/biodiversidade/conven%C3%A7%C3%A3o-da-diversidade-biol%C3%B3gica.html>.


91 O sub-objetivo 15.1 afirma: “até 2020, assegurar a conservação, recuperação e uso sustentável de ecossistemas terrestres e
de água doce interiores e seus serviços, em especial florestas, zonas úmidas, montanhas e terras áridas, em conformidade com
as obrigações decorrentes dos acordos internacionais”; e o sub-objetivo 15.9 afirma “integrar os valores dos ecossistemas e da
biodiversidade ao planejamento nacional e local, nos processos de desenvolvimento, nas estratégias de redução da pobreza e nos
sistemas de contas”.
92 Mato Grosso do Sul. Decreto nº 15.197, de 21 de março de 2019, que disciplina o procedimento de apresentação
de Projeto Técnico de Manejo e de Conservação de Solo e Água para implantação de atividades que demandem ações de
mecanização de solo nas Bacias de Contribuição do Rio da Prata e do Rio Formoso, nos municípios de Jardim e Bonito, e dá
outras providências.

137
causadores de danos ambientais complexos decorrentes do deficit de APPs íntegras em determinada
bacia hidrográfica, assim como para evitar o agravamento de processos erosivos que comprometam
as funções essenciais dos ecossistemas naturais e para mitigar os efeitos das mudanças climáticas.
Diante disso, inclusive com amparo no artigo 61-A, parágrafos 14 e 17, do mesmo diploma
legal, é possível impor metas mais exigentes de restauração dessas APPs degradadas antes de 22 de
julho de 2008, pois a obrigação é propter rem e imprescritível.
Entendimento diverso significaria ignorar a complexidade do dano ambiental, a necessidade
de interpretação sistemática, não contraditória e coerente do sistema jurídico, com afronta à
jurisprudência firme do Superior Tribunal de Justiça, que repudia o fato consumado e o direito
adquirido à manutenção de situações lesivas ao ambiente ecologicamente equilibrado.

Art. 61-C. Para os assentamentos do Programa de Reforma Agrária, a recomposição de áreas


consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo ou no entorno de cursos d’água,
lagos e lagoas naturais observará as exigências estabelecidas no art. 61-A, observados os limites
de cada área demarcada individualmente, objeto de contrato de concessão de uso, até a titulação
por parte do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra. (Incluído pela Lei
nº 12.727, de 2012).93

Art. 62. Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abasteci-
mento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização
assinados anteriormente à Medida Provisória no 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa
da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal
e a cota máxima maximorum.

Art. 63. Nas áreas rurais consolidadas nos locais de que tratam os incisos V, VIII, IX e X do
art. 4o, será admitida a manutenção de atividades florestais, culturas de espécies lenhosas,
perenes ou de ciclo longo, bem como da infraestrutura física associada ao desenvolvimento
de atividades agrossilvipastoris, vedada a conversão de novas áreas para uso alternativo
do solo. 94
§ 1o O pastoreio extensivo nos locais referidos no caput deverá ficar restrito às áreas de
vegetação campestre natural ou já convertidas para vegetação campestre, admitindo-se
o consórcio com vegetação lenhosa perene ou de ciclo longo.

93 “xxix) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Marco Aurélio, Edson Fachin e Ricardo Lewandowski, reconhecer a
constitucionalidade do art. 61- C do Código Florestal;” (STF, 2018)
94 “xxx) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Marco Aurélio, Cármen Lúcia, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski,
reconhecer a constitucionalidade do art. 63 do Código Florestal;” (STF, 2018)

138
§ 2o A manutenção das culturas e da infraestrutura de que trata o caput é condicionada
à adoção de práticas conservacionistas do solo e da água indicadas pelos órgãos de
assistência técnica rural.
§ 3o Admite-se, nas Áreas de Preservação Permanente, previstas no inciso VIII do art.
4o, dos imóveis rurais de até 4 (quatro) módulos fiscais, no âmbito do PRA, a partir de
boas práticas agronômicas e de conservação do solo e da água, mediante deliberação dos
Conselhos Estaduais de Meio Ambiente ou órgãos colegiados estaduais equivalentes, a
consolidação de outras atividades agrossilvipastoris, ressalvadas as situações de risco de vida.

Art. 64. Na Reurb-S dos núcleos urbanos informais que ocupam Áreas de Preservação Perma-
nente, a regularização fundiária será admitida por meio da aprovação do projeto de regularização
fundiária, na forma da lei específica de regularização fundiária urbana. (Redação dada pela Lei
nº 13.465, de 2017)
§ 1o O projeto de regularização fundiária de interesse social deverá incluir estudo técnico
que demonstre a melhoria das condições ambientais em relação à situação anterior com
a adoção das medidas nele preconizadas.
§ 2o O estudo técnico mencionado no § 1o deverá conter, no mínimo, os seguintes elementos:
I - caracterização da situação ambiental da área a ser regularizada;
II - especificação dos sistemas de saneamento básico;
III - proposição de intervenções para a prevenção e o controle de riscos geotécnicos
e de inundações;
IV - recuperação de áreas degradadas e daquelas não passíveis de regularização;
V - comprovação da melhoria das condições de sustentabilidade urbano-ambiental,
considerados o uso adequado dos recursos hídricos, a não ocupação das áreas de
risco e a proteção das unidades de conservação, quando for o caso;
VI - comprovação da melhoria da habitabilidade dos moradores propiciada pela
regularização proposta; e
VII - garantia de acesso público às praias e aos corpos d’água.

Art. 65. Na Reurb-E dos núcleos urbanos informais que ocupam Áreas de Preservação Perma-
nente não identificadas como áreas de risco, a regularização fundiária será admitida por meio
da aprovação do projeto de regularização fundiária, na forma da lei específica de regularização
fundiária urbana. (Redação dada pela Lei nº 13.465, de 2017)
§ 1º O processo de regularização fundiária de interesse específico deverá incluir estudo
técnico que demonstre a melhoria das condições ambientais em relação à situação anterior
e ser instruído com os seguintes elementos: (Redação dada pela Lei nº 13.465, de 2017)
I - a caracterização físico-ambiental, social, cultural e econômica da área;
II - a identificação dos recursos ambientais, dos passivos e fragilidades ambientais
e das restrições e potencialidades da área;

139
III - a especificação e a avaliação dos sistemas de infraestrutura urbana e de sanea-
mento básico implantados, outros serviços e equipamentos públicos;
IV - a identificação das unidades de conservação e das áreas de proteção de ma-
nanciais na área de influência direta da ocupação, sejam elas águas superficiais ou
subterrâneas;
V - a especificação da ocupação consolidada existente na área;
VI - a identificação das áreas consideradas de risco de inundações e de movimentos
de massa rochosa, tais como deslizamento, queda e rolamento de blocos, corrida
de lama e outras definidas como de risco geotécnico;
VII - a indicação das faixas ou áreas em que devem ser resguardadas as características
típicas da Área de Preservação Permanente com a devida proposta de recuperação
de áreas degradadas e daquelas não passíveis de regularização;
VIII - a avaliação dos riscos ambientais;
IX - a comprovação da melhoria das condições de sustentabilidade urbano-ambiental
e de habitabilidade dos moradores a partir da regularização; e
X - a demonstração de garantia de acesso livre e gratuito pela população às praias
e aos corpos d’água, quando couber.
§ 2o Para fins da regularização ambiental prevista no caput, ao longo dos rios ou de qual-
quer curso d’água, será mantida faixa não edificável com largura mínima de 15 (quinze)
metros de cada lado.
§ 3o Em áreas urbanas tombadas como patrimônio histórico e cultural, a faixa não edi-
ficável de que trata o § 2o poderá ser redefinida de maneira a atender aos parâmetros do
ato do tombamento.

Seção III

Das Áreas Consolidadas em Áreas de Reserva Legal

Art. 66. O proprietário ou possuidor de imóvel rural que detinha, em 22 de julho de 2008,
área de Reserva Legal em extensão inferior ao estabelecido no art. 12, poderá regularizar sua
situação, independentemente da adesão ao PRA, adotando as seguintes alternativas, isolada ou
conjuntamente:
I - recompor a Reserva Legal;
II - permitir a regeneração natural da vegetação na área de Reserva Legal;
III - compensar a Reserva Legal.

140
XII - A COMPENSAÇÃO AMBIENTAL DE RESERVA LEGAL

Por Ana Luiza Avila Peterlini de Souza

Todo imóvel rural do Brasil deve preservar parte de seu território a título de Reserva Legal (RL)
em percentuais que variam de 80% no bioma Amazônia até 20% nas demais regiões do país. Aqueles
produtores rurais que possuem deficit de Reserva Legal devem proceder à regularização de seus
passivos por meio de recomposição, regeneração ou compensação ambiental das áreas desmatadas
ilegalmente (art. 66 da Lei nº 12.651/2012).
A compensação ambiental é, portanto, uma modalidade de regularização dos deficits de Reserva
Legal e tem se mostrado a opção mais flexível, já que permite que seja realizada extra-propriedade, ou
seja, fora do imóvel rural.
Referido instituto surgiu no ordenamento jurídico brasileiro no ano de 1998, por meio da
Medida Provisória nº 1.605-30, que alterou o Código Florestal vigente na época, a Lei nº 4.771/1965.
Posteriormente, novas modificações foram feitas nos prazos, nos critérios e nas modalidades da
compensação através da Medida Provisória nº 1.956-50/2000, até alcançar o modelo trazido pelo
novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012).
Atualmente, todos aqueles que desmataram a Reserva Legal antes de 22 de julho de 2008
têm direito ao benefício da compensação. Se antes só era possível a compensação para aqueles que
desmataram a RL até 14 de dezembro de 1998, agora o benefício foi estendido em praticamente dez
anos (art. 66, caput da Lei nº 12.651/2012).
O Código Florestal alterou, também, os critérios para compensação. Antes, a área a ser
compensada precisava estar localizada na mesma microbacia, no mesmo ecossistema e no mesmo
estado da área com deficit de RL, além de ter igual extensão e equivalência ecológica. Atualmente,
a única exigência legal é estar localizada no mesmo bioma e possuir a mesma extensão territorial,
podendo, inclusive, se encontrar em outro Estado, desde que em áreas consideradas prioritárias
(art. 66, § 6º, I, II e III). A definição das áreas prioritárias pela União ou pelos estados deve favorecer
a recuperação de bacias hidrográficas excessivamente desmatadas, a criação de corredores
ecológicos, a conservação de grandes áreas protegidas e a conservação ou a recuperação de
ecossistemas ou espécies ameaçados (art. 66, § 7º).
Esse novo critério é criticado por diversos especialistas. Metzger (2010) diz que a
compensação só faz sentido quando feita em locais que sejam equivalentes em termos de
função, composição e estrutura ecológicas, entretanto, caso seja feita em qualquer região de um
mesmo bioma, poderá haver extinção das espécies em algumas áreas que possuem condições
ambientais e histórias evolutivas distintas. Brancalion et al. (2016) argumenta que o preço elevado
das terras em algumas regiões brasileiras tende a deslocar as áreas de compensação para outras
regiões com o objetivo de reduzir custos, priorizando-se o critério econômico e desconsiderando
o ambiental.
Contudo, com vistas a reduzir os efeitos deletérios dessa regra, o Supremo Tribunal Federal, no
julgamento da ADI 4.901 (STF, 2018), incorporou um novo critério às compensações ambientais, o da
“identidade ecológica” entre as áreas. Segundo o ministro Marco Aurélio Mello,

141
a compensação de áreas localizadas em pontos díspares do território nacional,
embora no mesmo bioma, surge inadequada para a tutela do meio ambiente,
contrariando o comando constitucional alusivo à preservação da diversidade
e integridade do patrimônio genético do País – inciso II do parágrafo 1º do
artigo 225 da Constituição Federal. Mostra-se necessário conferir aos preceitos
interpretação conforme à Constituição Federal para condicionar a compensação
de áreas de Reserva Legal desmatada à existência de identidade ecológica com o
espaço correspondente localizado no mesmo bioma.

Apesar de o STF não ter definido “identidade ecológica”, o estabelecimento desse novo critério
representa um ganho ambiental, que pode tornar a compensação um mecanismo mais justo para o
meio ambiente.
No que tange às modalidades de compensação ambiental, a Lei nº 12.651/2012 não trouxe
grandes modificações, e o produtor rural poderá optar por uma das alternativas previstas no artigo
66, parágrafo 5º do Código Florestal, como o arrendamento, feito sob a forma de servidão florestal ou
Reserva Legal.
Em ambos os casos, o proprietário renuncia ao direito de uso e exploração de parte de seu
imóvel, além de sua própria RL, destinando essa área para a compensação da RL de um terceiro,
mediante venda ou cessão, por prazo determinado ou definitivo (art. 9º-A da Lei nº 6.938/1981). O
contrato é realizado entre as partes e deve ser averbado na matrícula do imóvel e inscrito no Cadastro
Ambiental Rural (CAR). Nesse caso, o produtor que detém a posse da servidão é responsável por sua
manutenção (Agroícone, 2018).
A doação de área localizada em Unidade de Conservação (UC) (art. 66, § 5º, III) pode representar,
a um só tempo, uma grande oportunidade para a regularização fundiária desses espaços territoriais
legalmente protegidos em todo o país, já que o estado carece de recursos públicos para proceder à
indenização de seus ocupantes, e também um benefício para o produtor rural com passivo de RL que,
ao fazer a doação, se desonera ad perpetum da responsabilidade de manter a sua RL.
Contudo, a implementação dessa modalidade de compensação não nos parece fácil.
Além da dificuldade que o proprietário rural tem para identificar e adquirir imóveis rurais
em UCs, os órgãos ambientais responsáveis pela regularização deverão criar e manter um
eficiente sistema de cadastro, controle e fiscalização das áreas. Segundo Silva e Sambuichi
(2016), a precariedade e a falta de estrutura dos órgãos ambientais pode colocar em risco a
implementação dessa modalidade.
Com relação ao cadastramento de outra área equivalente e excedente à Reserva Legal (art.
66, § 5º, IV), a novidade trazida pela lei é a possibilidade da área compensada ter vegetação “em
regeneração ou recomposição”, o que alarga a proporção de áreas que podem ser utilizadas para
compensação, inclusive alocando-as em áreas de baixa produtividade e pouco retorno econômico.
Entretanto, a modalidade que nos parece a mais promissora para a compensação da RL é a
Cota de Reserva Ambiental (CRA) (art. 66, § 5º, I). Estudos indicam que a CRA pode criar um verdadeiro
mercado de conservação no Brasil, estimulando a preservação de áreas com vegetação nativa
excedente (Rajão e Soares-Filho, 2015; Gasparinetti e Vilela, 2018) e beneficiando economicamente
quem preservou além da exigência legal (Micol et al., 2013).

142
De fato, a CRA é um instrumento de mercado que possibilita a compensação entre passivos
e ativos de reservas legais. É um título nominativo de compensação, de caráter temporário ou
permanente, da área de RL. Cada cota equivale a um hectare. Um imóvel rural com déficit de RL pode
adquirir uma cota de outro imóvel, desde que situado no mesmo bioma e que possua excedente de RL
(arts. 44 e 66, § 6º). E, diferentemente da servidão, o produtor que compra a CRA não é responsável pela
sua manutenção, porém ela deve ser averbada à margem da matrícula do imóvel (Agroícone, 2018).
Embora se apresente como uma interessante alternativa para o proprietário ou possuidor, o
funcionamento do mercado de CRA é um grande desafio e depende de questões regulatórias, que
ainda não estão totalmente definidas. Em dezembro de 2018 o Governo Federal editou o Decreto
Federal nº 9.640, que regulamenta a CRA. Contudo, ainda não se tem notícias de sua implementação
em nenhuma Unidade da Federação, uma vez que a maioria dos estados ainda está no início do
processo de regularização dos imóveis rurais, e muitos nem começaram a analisar o CAR (Valdiones e
Bernasconi, 2019), a primeira etapa desse processo.
A demora e as dificuldades para se colocar em prática os Programas de Regularização
Ambiental (PRAs) nos estados interferem diretamente na implementação da compensação de RL,
afinal, a regularização dos passivos ambientais dos imóveis rurais é a última fase desse processo, que
ocorre somente após a análise e a validação do CAR pelo órgão ambiental. Diante disso, percebe-se
que o sucesso da compensação ambiental dependerá da implementação dos PRAs nos estados e de
políticas públicas que incentivem essa modalidade de recuperação dos passivos de Reserva Legal.

§ 1º A obrigação prevista no caput tem natureza real e é transmitida ao sucessor no caso


de transferência de domínio ou posse do imóvel rural.
§ 2º A recomposição de que trata o inciso I do caput deverá atender os critérios es-
tipulados pelo órgão competente do Sisnama e ser concluída em até 20 (vinte) anos,
abrangendo, a cada 2 (dois) anos, no mínimo 1/10 (um décimo) da área total necessária
à sua complementação.

143
XIII - O PRAZO PARA A REGULARIZAÇÃO
AMBIENTAL DO IMÓVEL RURAL

Por Fábio Fernandes Corrêa

A Lei nº 12.651/2012 foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) em 28 de maio de


2012. Vários de seus dispositivos foram vetados, e, após a edição da medida provisória 571, esta foi
convertida em projeto de lei que culminou com a edição da Lei nº 12.727/2012, cuja publicação no
DOU ocorreu no dia 18 de outubro de 2012.
A Lei de Proteção da Vegetação Nativa contém diversos prazos, como o previsto no artigo 13,
parágrafo 2º, que prevê a obrigatoriedade dos estados em elaborar e aprovar seus Zoneamentos Ecológico-
Econômicos (ZEEs) no prazo de cinco anos, “a partir da data da publicação desta Lei”. Como tal dispositivo
é oriundo da Lei nº 12.651/2012, o prazo começou a ser contado no dia 28 de maio de 2012 e encontra-
se vencido há mais de três anos.
O artigo 17, por sua vez, determina a imediata suspensão das atividades em área de Reserva
Legal (RL) desmatada irregularmente após 22 de julho de 2008 (§ 3º). O paragrafo 4º dispõe que
o processo de recomposição dessa área ambientalmente protegida deve ser iniciado em até dois
anos contados a partir da data da publicação da lei e concluído nos prazos previstos no Programa
de Regularização Ambiental (PRA). Como o parágrafo 4º foi incluído pela Lei nº 12.727/2012, a
recomposição da RL desmatada irregularmente após 22 de julho de 2008 deveria ter sido iniciada
até 18 de outubro de 2014.
Há uma questão importante envolvendo a RL que será recomposta em área rural consolidada,
entendida como a área de imóvel rural com ocupação antrópica preexistente a 22 de julho de 2008,
com edificações, benfeitorias ou atividades agrossilvipastoris, admitida, neste último caso, a adoção
do regime de pousio (art. 3º, inciso IV, Lei nº 12.651/2012). O artigo 66, parágrafo 2º, prevê que a
referida recomposição deverá ser concluída em até 20 anos, abrangendo a cada dois anos no mínimo
um décimo da área total necessária à sua complementação.
O artigo 66, parágrafo 2º não vinculou o início do prazo à publicação da lei, diferentemente
dos citados artigos 13, parágrafo 2º, e 17, parágrafo 4º. No entanto, isso não impede que se determine
o seu prazo inicial. O Decreto-lei nº 4.657/192, conhecido como Lei de Introdução às normas do Direito
Brasileiro (LINDB), é chamado de uma norma de sobredireito porque disciplina as próprias leis no
tempo e no espaço.
Logo em seu artigo 1º, a LINDB dispõe que, salvo disposição em contrário, a lei começa a vigorar
em todo o país 45 dias depois de oficialmente publicada. O artigo 6º, por seu turno, estabelece que a lei em
vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.
O artigo 66, parágrafo 2º, teve sua vigência com a Lei nº 12.651/2012, em 28 de maio de 2012,
com efeito imediato e geral. Portanto, o prazo de 20 anos para a recomposição de Reserva Legal em
área rural consolidada esgota-se em 28 de maio de 2032. É importante ressaltar que na Lei de Proteção
da Vegetação Nativa não há qualquer vinculação ou referência ao início de tal prazo à inscrição do
imóvel rural no Cadastro Ambiental Rural (CAR) ou à eventual adesão ao Programa de Regularização
Ambiental (PRA).

144
Os órgãos responsáveis pela implantação do PRA e pela gestão do CAR devem prever
mecanismos para que, nos cronogramas de recomposição da Reserva Legal, não se permita
que o prazo de 20 anos extrapole o dia 28 de maio de 2032. Ademais, o acompanhamento dos
Projetos de Recomposição de Área Degradada e Alterada (Prada) deve levar em consideração que
a cada dois anos, a partir de 28 de maio de 2012, no mínimo um décimo da área total necessária à
complementação da Reserva Legal esteja sendo recuperada, como mencionado anteriormente.

§ 3º A recomposição de que trata o inciso I do caput poderá ser realizada mediante o


plantio intercalado de espécies nativas com exóticas ou frutíferas, em sistema agroflorestal,
observados os seguintes parâmetros: (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).95
I - o plantio de espécies exóticas deverá ser combinado com as espécies nativas de
ocorrência regional; [ADI 4.901]
II - a área recomposta com espécies exóticas não poderá exceder a 50% (cinquenta
por cento) da área total a ser recuperada. [ADI 4.901]
§ 4o Os proprietários ou possuidores do imóvel que optarem por recompor a Reserva Legal
na forma dos §§ 2o e 3o terão direito à sua exploração econômica, nos termos desta Lei.
§ 5o A compensação de que trata o inciso III do caput deverá ser precedida pela inscrição
da propriedade no CAR e poderá ser feita mediante: 96
I - aquisição de Cota de Reserva Ambiental - CRA;
II - arrendamento de área sob regime de servidão ambiental ou Reserva Legal;
III - doação ao poder público de área localizada no interior de Unidade de Con-
servação de domínio público pendente de regularização fundiária;
IV - cadastramento de outra área equivalente e excedente à Reserva Legal, em

95 “xxxi) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Marco Aurélio, Edson Fachin, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski, reconhecer
a constitucionalidade do art. 66, § 3º, do Código Florestal;” – “Art. 66, § 3º (Possibilidade de plantio intercalado de espécies nativas
e exóticas para recomposição de área de Reserva Legal): Não existem elementos empíricos que permitam ao Judiciário afirmar, com
grau de certeza, que a introdução de espécies exóticas compromete a integridade dos atributos de áreas de Reserva Legal. Tampouco
há provas científicas de que utilização de espécies exóticas para o reflorestamento de biomas sempre prejudica as espécies nativas ou
causa desequilíbrio no habitat. A autorização legal para a recomposição de áreas de Reserva Legal com plantio intercalado de espécies
pode ser justificada em diversas razões de primeira e de segunda ordem: pode ser que o conhecimento da composição original da
floresta nativa seja de difícil apuração; a espécie exótica pode apresentar crescimento mais rápido, acelerando a recuperação da floresta;
a literatura científica pode conferir mais certeza sobre as características da espécie exótica, como a sua interação com outras espécies
ou resposta a pragas, em contraposição ao possível desconhecimento do comportamento da espécie nativa etc. Todos esses elementos
devem ser considerados pelo órgão competente do Sisnama ao estabelecer os critérios para a recomposição da Reserva Legal, consoante
o cronograma estabelecido pelo art. 66, § 2º, do novo Código Florestal. É defeso ao Judiciário, sob pena de nociva incursão em
tarefa regulatória especializada, impor ao Administrador espécies de plantas a serem aplicadas em atividades de reflorestamento.
CONCLUSÃO: Declaração de constitucionalidade do artigo 66, § 3º, do Código Florestal; ADI 4.901.” (STF, 2018)
96 “xxxii) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Marco Aurélio, Edson Fachin, e, em parte, o Ministro Ricardo
Lewandowski, reconhecer a constitucionalidade do art. 66, § 5º, do Código Florestal;”. (STF, 2018)

145
imóvel de mesma titularidade ou adquirida em imóvel de terceiro, com vegetação
nativa estabelecida, em regeneração ou recomposição, desde que localizada no
mesmo bioma.
§ 6º As áreas a serem utilizadas para compensação na forma do § 5º deverão:
I - ser equivalentes em extensão à área da Reserva Legal a ser compensada;
II - estar localizadas no mesmo bioma da área de Reserva Legal a ser compensada;
III - se fora do Estado, estar localizadas em áreas identificadas como prioritárias
pela União ou pelos Estados.97
§ 7o A definição de áreas prioritárias de que trata o § 6o buscará favorecer, entre outros,
a recuperação de bacias hidrográficas excessivamente desmatadas, a criação de corredores
ecológicos, a conservação de grandes áreas protegidas e a conservação ou recuperação de
ecossistemas ou espécies ameaçadas.
§ 8o Quando se tratar de imóveis públicos, a compensação de que trata o inciso III do
caput poderá ser feita mediante concessão de direito real de uso ou doação, por parte da
pessoa jurídica de direito público proprietária de imóvel rural que não detém Reserva Legal
em extensão suficiente, ao órgão público responsável pela Unidade de Conservação de
área localizada no interior de Unidade de Conservação de domínio público, a ser criada
ou pendente de regularização fundiária.
§ 9o As medidas de compensação previstas neste artigo não poderão ser utilizadas como
forma de viabilizar a conversão de novas áreas para uso alternativo do solo.

Art. 67. Nos imóveis rurais que detinham, em 22 de julho de 2008, área de até 4 (quatro) módulos
fiscais e que possuam remanescente de vegetação nativa em percentuais inferiores ao previsto no
art. 12, a Reserva Legal será constituída com a área ocupada com a vegetação nativa existente em
22 de julho de 2008, vedadas novas conversões para uso alternativo do solo.98

Art. 68. Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais que realizaram supressão de vegetação
nativa respeitando os percentuais de Reserva Legal previstos pela legislação em vigor à época em
que ocorreu a supressão são dispensados de promover a recomposição, compensação ou regeneração
para os percentuais exigidos nesta Lei.99

97 “xxxiii) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Marco Aurélio, Edson Fachin, e, em parte, o Ministro Ricardo
Lewandowski, reconhecer a constitucionalidade do art. 66, § 6º, do Código Florestal;”. (STF, 2018)
98 “xxxiv) POR MAIORIA, vencidos os Ministros Marco Aurélio, Cármen Lúcia (Presidente), Edson Fachin, Rosa Weber e
Ricardo Lewandowski, reconhecer a constitucionalidade do art. 67 do Código Florestal;”. (STF, 2018)
99 “xxxv) POR MAIORIA, vencido, em parte, o Ministro Edson Fachin, reconhecer a constitucionalidade do art. 68 do
Código Florestal;”(Art. 68 (Dispensa de os proprietários que realizaram supressão de vegetação nativa respeitando os percentuais
da legislação revogada se adaptarem às regras mais restritivas do novo Código Florestal): A aplicação da norma sob a regra tempus
regit actum para fins de definição do percentual de área de Reserva Legal encarta regra de transição com vistas à preservação
da segurança jurídica (art. 5º, caput, da Constituição). O benefício legal para possuidores e proprietários que preservaram a
vegetação de seus imóveis em percentuais superiores ao exigido pela legislação anterior, consistente na possibilidade de constituir
servidão ambiental, Cota de Reserva Ambiental e outros instrumentos congêneres, traduz formato de política pública inserido na
esfera de discricionariedade do legislador; CONCLUSÃO: Declarado constitucional)”. (STF, 2018)

146
§ 1o Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais poderão provar essas situações con-
solidadas por documentos tais como a descrição de fatos históricos de ocupação da região,
registros de comercialização, dados agropecuários da atividade, contratos e documentos
bancários relativos à produção, e por todos os outros meios de prova em direito admitidos.
§ 2o Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais, na Amazônia Legal, e seus herdeiros
necessários que possuam índice de Reserva Legal maior que 50% (cinquenta por cento)
de cobertura florestal e não realizaram a supressão da vegetação nos percentuais previstos
pela legislação em vigor à época poderão utilizar a área excedente de Reserva Legal também
para fins de constituição de servidão ambiental, Cota de Reserva Ambiental - CRA e outros
instrumentos congêneres previstos nesta Lei.

XIV - EFEITOS DO ARTIGO 68 DO NOVO CÓDIGO


FLORESTAL SOBRE AS ÁREAS DE RESERVA LEGAL

Por Alice Brites, Kaline de Mello, Paulo André Tavares e Gerd Sparovek

A Lei de Proteção da Vegetação Nativa (Lei Federal 12.651/2012), popularmente conhecida


como Novo Código Florestal, apresenta alguns mecanismos legais que permitem a redução das
áreas destinadas às Reservas Legais, como é o caso do artigo 68. Esse artigo garante que áreas
de vegetação nativa suprimidas antes de 22 de julho de 2008, mas seguindo as leis existentes na
época da supressão, não precisam ser recompostas, restauradas ou compensadas até o percentual
exigido atualmente.
As Reservas Legais representam cerca de um terço do remanescente de vegetação nativa do
Brasil e possuem um importante papel na conservação da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos,
além de servirem como meio de conectar a paisagem entre Unidades de Conservação, que
frequentemente se encontram em regiões remotas e distantes umas das outras (Metzger et al., 2019).
Portanto, conhecer os efeitos de possíveis reduções em suas áreas é importante para o planejamento de
estratégias de equilíbrio entre conservação dos recursos naturais e do uso agrícola da terra.
O estado de São Paulo é o único no qual os efeitos da aplicação do artigo 68 já foram
avaliados de forma quantitativa na escala da propriedade rural. No entanto, os métodos utilizados
podem ser aplicados para os demais estados brasileiros, uma vez que as bases de dados necessárias à
modelagem estejam disponíveis.

Os números da modelagem do artigo 68 no estado de São Paulo


Na análise realizada para São Paulo foram elaborados três cenários de aplicação do artigo 68 e
um cenário base (sem essa aplicação) (Tabela 5). O primeiro cenário considera um único marco legal
para as supressões ocorridas anteriormente a 2008, o Código Florestal de 1965, para todos os tipos

147
de vegetação nativa que ocorrem no estado. O segundo cenário considera as exigências de Reserva
Legal do Código Florestal de 1965 para fisionomias florestais e a Lei Federal nº 7.803 de 1989 para
fisionomias de vegetação aberta como, por exemplo, campo sujo e campo limpo. O terceiro cenário
inclui, além dos marcos já mencionados, o Código Florestal de 1934.
Os deficits de Reserva Legal, ou seja, a soma da área de Reserva Legal que falta para cada
propriedade se adequar ao Novo Código Florestal, para cada cenário, foi estimada com base em
modelagem na escala de propriedade rural. Para tanto, utilizou-se uma malha fundiária modelada
a partir do tratamento de sobreposição dos imóveis rurais privados entre dados de 17 fontes
fundiárias diferentes (Freitas et al., 2018; Sparovek et al., 2019) e dados de uso e cobertura do solo
para os diferentes marcos temporais. Para os períodos de 1965 e 1989 foram utilizados dados
espacialmente explícitos de uso do solo. Já para o marco de 1934 foi necessário desenvolver um mapa
da probabilidade da cobertura de vegetação nativa no estado nesse período, devido à inexistência de
dados espacialmente explícitos e precisos de uso do solo na escala de propriedade antes da década de
1960, quando foram feitos os primeiros sobrevoos para esse fim em São Paulo.
A aplicação do artigo 68 leva a uma grande redução no total estimado do deficit de Reserva
Legal no estado, independentemente do cenário adotado (Tabela 5).

Tabela 5. Deficits de Reserva Legal estimados por modelagem para o estado de São Paulo
Deficit de Reserva Legal (mil hectares)
Cenário Mata Atlântica Cerrado Total
Sem artigo 68 635 230 865

1965 294 149 443

1965/1989 283 75 358

1934/1965/1989 269 59 328

A redução é de no mínimo 49% do deficit comparando-se com o cenário sem a aplicação


desse mecanismo. Comparando-se os cenários de aplicação do artigo 68 (i.e. cenário 1965; cenário
1965/1989; e cenário 1934/1965 e 1989), a diferença do deficit total de Reserva Legal não apresenta
variações grandes na Mata Atlântica (Figura 2). No entanto, a inclusão do marco de 1989 reduz
em 50% o deficit de Reserva Legal no Cerrado em comparação com o cenário 1965 (Tabela 5).
Essa redução do deficit no Cerrado acarreta, consequentemente, a uma redução da exigência de
restauração da vegetação nativa desse bioma já extremamente fragmentado e ameaçado (Durigan
et al., 2004; Machado et al., 2004). A inclusão do marco legal de 1934 altera muito pouco os deficits
estimados de Reserva Legal dos dois biomas em comparação aos demais cenários de aplicação do
artigo 68 (Figura 2). Portanto, a inclusão desse marco legal pode trazer mais incertezas, devido à
natureza probabilística dos dados, do que benefícios aos proprietários de terra.

148
Diferença do deficit de Reserva Legal, em porcentagem, entre os
Figura 2.
cenários gerados e a não aplicação do artigo 68.

Para os três cenários de aplicação do artigo 68 gerados, os deficits de Reserva Legal apresentam
uma importante concentração geográfica, ou seja, sua distribuição no estado não é feita de modo
uniforme (Figura 3). Nos três casos, os deficits ocorrem em maior quantidade e frequência em algumas
regiões, como por exemplo o extremo oeste e a região central.

Distribuição do deficit de Reserva Legal por proprieade rural em hectares para


Figura 3.
os cenários gerados: A) sem aplicação do artigo 68; B) cenário 1965; C) cenário 1965/1989
e D) cenário 1934/1965/1989.

149
Em 2019, o Tribunal de Justiça do estado de São Paulo publicou o acórdão relativo ao
julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade do PRA paulista, confirmando a manutenção
do Código Florestal de 1934 como marco inicial para a análise do artigo 27 (equivalente estadual
ao artigo 68 da lei federal). Apesar da inclusão do Código Florestal de 1934 não provocar grandes
alterações nos números ou na distribuição dos deficits estimados de Reserva Legal em SP, a sua
manutenção exige a adoção de um mapa probabilístico, elevando a incerteza dos resultados e,
consequentemente, do processo de regularização das Reservas Legais.
Com isso, a tomada de decisão em relação ao direito ao artigo 68 para o período de 1934
poderá depender de uma análise caso a caso, o que pode atrasar ainda mais a implementação do
Código Florestal em SP (Tavares et al., 2019). Além do atraso, a necessidade de avaliações individuais e
não automatizadas pode levar a negociações de balcão, questionamentos e judicializações, gerando
insegurança tanto para os proprietários rurais quanto para os técnicos de instituições governamentais
responsáveis pelas análises.
Por fim, a decisão de São Paulo pode ter consequências para a aplicação do artigo 68 nos
outros estados brasileiros. Até o momento, nove estados ainda não determinaram as suas diretrizes
de implementação para o Novo Código Florestal (OCF, 2019). Além disso, mesmo os estados que já
possuem seus PRAs, em sua grande maioria ainda não possuem soluções técnicas robustas para a
implementação da lei e nem soluções para a regularização dos deficits de Reserva Legal (Valdiones e
Bernasconi, 2019). Caso esses estados sigam o exemplo de São Paulo e incluam o marco de 1934 em
suas análises do artigo 68, a implementação do Novo Código Florestal pode se atrasar ainda mais por
todo o Brasil, deixando, consequentemente, grandes áreas de vegetação nativa ameaçadas.

CAPÍTULO XIV

DISPOSIÇÕES COMPLEMENTARES E FINAIS

Art. 69. São obrigados a registro no órgão federal competente do Sisnama os estabelecimentos
comerciais responsáveis pela comercialização de motosserras, bem como aqueles que as adquirirem.
§ 1o A licença para o porte e uso de motosserras será renovada a cada 2 (dois) anos.
§ 2o Os fabricantes de motosserras são obrigados a imprimir, em local visível do equi-
pamento, numeração cuja sequência será encaminhada ao órgão federal competente do
Sisnama e constará nas correspondentes notas fiscais.

Art. 70. Além do disposto nesta Lei e sem prejuízo da criação de unidades de conservação da
natureza, na forma da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, e de outras ações cabíveis voltadas
à proteção das florestas e outras formas de vegetação, o poder público federal, estadual ou mu-
nicipal poderá:

150
I - proibir ou limitar o corte das espécies da flora raras, endêmicas, em perigo ou
ameaçadas de extinção, bem como das espécies necessárias à subsistência das popu-
lações tradicionais, delimitando as áreas compreendidas no ato, fazendo depender
de autorização prévia, nessas áreas, o corte de outras espécies;
II - declarar qualquer árvore imune de corte, por motivo de sua localização, raridade,
beleza ou condição de porta-sementes;
III - estabelecer exigências administrativas sobre o registro e outras formas de
controle de pessoas físicas ou jurídicas que se dedicam à extração, indústria ou
comércio de produtos ou subprodutos florestais.

Art. 71. A União, em conjunto com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, realizará o
Inventário Florestal Nacional, para subsidiar a análise da existência e qualidade das florestas do
País, em imóveis privados e terras públicas.
Parágrafo único. A União estabelecerá critérios e mecanismos para uniformizar a coleta, a
manutenção e a atualização das informações do Inventário Florestal Nacional.

Art. 72. Para efeitos desta Lei, a atividade de silvicultura, quando realizada em área apta ao uso
alternativo do solo, é equiparada à atividade agrícola, nos termos da Lei no 8.171, de 17 de janeiro
de 1991, que “dispõe sobre a política agrícola”.

Art. 73. Os órgãos centrais e executores do Sisnama criarão e implementarão, com a participação
dos órgãos estaduais, indicadores de sustentabilidade, a serem publicados semestralmente, com
vistas em aferir a evolução dos componentes do sistema abrangidos por disposições desta Lei.

Art. 74. A Câmara de Comércio Exterior - CAMEX, de que trata o art. 20-B da Lei nº 9.649,
de 27 de maio de 1998, com a redação dada pela Medida Provisória nº 2.216-37, de 31 de
agosto de 2001, é autorizada a adotar medidas de restrição às importações de bens de origem
agropecuária ou florestal produzidos em países que não observem normas e padrões de proteção
do meio ambiente compatíveis com as estabelecidas pela legislação brasileira.

Art. 75. Os PRAs instituídos pela União, Estados e Distrito Federal deverão incluir mecanismo
que permita o acompanhamento de sua implementação, considerando os objetivos e metas
nacionais para florestas, especialmente a implementação dos instrumentos previstos nesta Lei, a
adesão cadastral dos proprietários e possuidores de imóvel rural, a evolução da regularização das
propriedades e posses rurais, o grau de regularidade do uso de matéria-prima florestal e o controle
e prevenção de incêndios florestais.

Art. 76. (VETADO).

Art. 77. (VETADO).

Art. 78. O art. 9o-A da Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, passa a vigorar com a seguinte redação:

151
“Art. 9o-A. O proprietário ou possuidor de imóvel, pessoa natural ou jurídica, pode, por instru-
mento público ou particular ou por termo administrativo firmado perante órgão integrante do
Sisnama, limitar o uso de toda a sua propriedade ou de parte dela para preservar, conservar ou
recuperar os recursos ambientais existentes, instituindo servidão ambiental.
§ 1o O instrumento ou termo de instituição da servidão ambiental deve incluir, no mínimo,
os seguintes itens:
I - memorial descritivo da área da servidão ambiental, contendo pelo menos um
ponto de amarração georreferenciado;
II - objeto da servidão ambiental;
III - direitos e deveres do proprietário ou possuidor instituidor;
IV - prazo durante o qual a área permanecerá como servidão ambiental.
§ 2 A servidão ambiental não se aplica às Áreas de Preservação Permanente e à Reserva
o

Legal mínima exigida.


§ 3o A restrição ao uso ou à exploração da vegetação da área sob servidão ambiental deve
ser, no mínimo, a mesma estabelecida para a Reserva Legal.
§ 4o Devem ser objeto de averbação na matrícula do imóvel no registro de imóveis competente:
I - o instrumento ou termo de instituição da servidão ambiental;
II - o contrato de alienação, cessão ou transferência da servidão ambiental.
§ 5 Na hipótese de compensação de Reserva Legal, a servidão ambiental deve ser averbada
o

na matrícula de todos os imóveis envolvidos.


§ 6o É vedada, durante o prazo de vigência da servidão ambiental, a alteração da destinação
da área, nos casos de transmissão do imóvel a qualquer título, de desmembramento ou de
retificação dos limites do imóvel.
§ 7o As áreas que tenham sido instituídas na forma de servidão florestal, nos termos do
art. 44-A da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, passam a ser consideradas, pelo
efeito desta Lei, como de servidão ambiental.” (NR)

Art. 78-A. Após 31 de dezembro de 2017, as instituições financeiras só concederão crédito


agrícola, em qualquer de suas modalidades, para proprietários de imóveis rurais que estejam
inscritos no CAR.100 (Redação dada pela Lei nº 13.295, de 2016)

100 “xxxvi) POR UNANIMIDADE, reconhecer a constitucionalidade do art. 78-A.” Observação: a análise realizada no voto
não se relaciona à análise de regularidade do imóvel para a concessão do crédito, mas à possibilidade de a lei fixar a necessidade
de cadastro para a concessão do crédito, conforme parte do voto exposto a seguir: “Art. 78-A (Condicionamento legal da
inscrição no Cadastro Ambiental Rural – CAR – para a concessão de crédito agrícola): O condicionamento legal da inscrição
no Cadastro Ambiental Rural (CAR) para a concessão de crédito agrícola é um incentivo para que proprietários e possuidores
de imóveis rurais forneçam informações ambientais de suas propriedades, a fim de compor base de dados para controle,
monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento. Não há norma constitucional que proíba
a concessão de crédito para agricultores sem inscrição em cadastro de cunho ambiental, enquadrando-se a implementação do
aludido condicionamento em zona de discricionariedade legislativa; CONCLUSÃO: Declaração de constitucionalidade do
artigo 78-A do Código Florestal”. (STF, 2018)

152
Parágrafo único. O prazo de que trata este artigo será prorrogado em observância aos
novos prazos de que trata o § 3º do art. 29. (Redação dada pela Lei nº 13.295, de 2016)

Art. 79. A Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts.
9o-B e 9o-C:

“Art. 9o-B. A servidão ambiental poderá ser onerosa ou gratuita, temporária ou perpétua.
§ 1o O prazo mínimo da servidão ambiental temporária é de 15 (quinze) anos.
§ 2o A servidão ambiental perpétua equivale, para fins creditícios, tributários e de acesso
aos recursos de fundos públicos, à Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN,
definida no art. 21 da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000.
§ 3o O detentor da servidão ambiental poderá aliená-la, cedê-la ou transferi-la, total
ou parcialmente, por prazo determinado ou em caráter definitivo, em favor de outro
proprietário ou de entidade pública ou privada que tenha a conservação ambiental
como fim social.”

“Art. 9o-C. O contrato de alienação, cessão ou transferência da servidão ambiental deve ser
averbado na matrícula do imóvel.
§ 1o O contrato referido no caput deve conter, no mínimo, os seguintes itens:
I - a delimitação da área submetida a preservação, conservação ou recuperação
ambiental;
II - o objeto da servidão ambiental;
III - os direitos e deveres do proprietário instituidor e dos futuros adquirentes
ou sucessores;
IV - os direitos e deveres do detentor da servidão ambiental;
V - os benefícios de ordem econômica do instituidor e do detentor da servidão
ambiental;
VI - a previsão legal para garantir o seu cumprimento, inclusive medidas judiciais
necessárias, em caso de ser descumprido.
§ 2o São deveres do proprietário do imóvel serviente, entre outras obrigações estipuladas
no contrato:
I - manter a área sob servidão ambiental;
II - prestar contas ao detentor da servidão ambiental sobre as condições dos
recursos naturais ou artificiais;
III - permitir a inspeção e a fiscalização da área pelo detentor da servidão ambiental;
IV - defender a posse da área serviente, por todos os meios em direito admitidos.
§ 3o São deveres do detentor da servidão ambiental, entre outras obrigações estipuladas
no contrato:

153
I - documentar as características ambientais da propriedade;
II - monitorar periodicamente a propriedade para verificar se a servidão ambiental
está sendo mantida;
III - prestar informações necessárias a quaisquer interessados na aquisição ou aos
sucessores da propriedade;

IV - manter relatórios e arquivos atualizados com as atividades da área objeto


da servidão;
V - defender judicialmente a servidão ambiental.”
Art. 80. A alínea d do inciso II do § 1o do art. 10 da Lei no 9.393, de 19 de dezembro de 1996,
passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 10. .....................................................................


§ 1o ......................................…………………….............
.....................................................................................
II - ...................................................…………................
.............................................................................................
d) sob regime de servidão ambiental;
...................................................................................” (NR)

Art. 81. O caput do art. 35 da Lei no 11.428, de 22 de dezembro de 2006, passa a vigorar com
a seguinte redação:

“Art. 35. A conservação, em imóvel rural ou urbano, da vegetação primária ou da vegetação


secundária em qualquer estágio de regeneração do Bioma Mata Atlântica cumpre função social
e é de interesse público, podendo, a critério do proprietário, as áreas sujeitas à restrição de que
trata esta Lei ser computadas para efeito da Reserva Legal e seu excedente utilizado para fins de
compensação ambiental ou instituição de Cota de Reserva Ambiental - CRA.
...................................................................................” (NR)

Art. 82. São a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios autorizados a instituir, adaptar
ou reformular, no prazo de 6 (seis) meses, no âmbito do Sisnama, instituições florestais ou afins,
devidamente aparelhadas para assegurar a plena consecução desta Lei.
Parágrafo único. As instituições referidas no caput poderão credenciar, mediante edital de
seleção pública, profissionais devidamente habilitados para apoiar a regularização ambiental
das propriedades previstas no inciso V do art. 3o, nos termos de regulamento baixado por
ato do Chefe do Poder Executivo.

154
Art. 83. Revogam-se as Leis nos 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de
1989, e suas alterações posteriores, e a Medida Provisória no 2.166-67, de 24 de agosto de 2001.

Art. 84. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 25 de maio de 2012; 191o da Independência e 124o da República.

DILMA ROUSSEFF
Mendes Ribeiro Filho
Márcio Pereira Zimmermann
Miriam Belchior
Marco Antonio Raupp
Izabella Mônica Vieira Teixeira
Gilberto José Spier Vargas
Aguinaldo Ribeiro
Luís Inácio Lucena Adams

Este texto não substitui o publicado no DOU de 28.5.2012

155
REFERÊNCIAS
AAMODT, S. (2018). The Ability to Influence: A Comparative Analysis of the Role of Advocacy
Coalitions in Brazilian Climate Politics. Review of Policy Research, 35(3), 372-397. Doi: 10.1111/
ropr.12282.
AGÊNCIA BRASIL. (2012). Contag apoia regra da “escadinha”, que manda reflorestar conforme
tamanho da propriedade. Disponível em: <https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2012/05/25/
interna_politica,296549/contag-apoia-regra-da-escadinha-que-manda-reflorestar-conforme-tamanho-
da-propriedade.shtml>.
AGROÍCONE. (2018). Mercado de Terras para compensação de Reserva Legal. INPUT. Iniciativa
para o Uso da Terra. Disponível em: <https://www.inputbrasil.org/publicacoes/mercado-de-terras-para-
a-compensacao-de-reserva legal/#:~:text=A%20compensa%C3%A7%C3%A3o%20de%20RL%20
gerar%C3%A1,privadas%20e%20UCs%20n %C3%A3o%20regularizadas>.
ALONSO, A.; COSTA, V.; MACIEL, D. (2007). Identidade e estratégia na formação do movimento
ambientalista brasileiro. Novos estudos, 79, 151-167. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0101-33002007000300008&nrm=iso>.
ANDRADA E SILVA, J. B. (2011). Necessidade de uma academia de agricultura no Brasil. Consultado
em José Bonifácio: a defesa da soberania nacional e popular. In: SILVA, E.; NEVES, G. R.; MARTINS,
L. B. (2011). Coleção O Pensamento Político Brasileiro, v.6. Brasília: Fundação Ulysses Guimarães.
Disponível em: https://www.fundacaoulysses.org.br/wp-content/uploads/img-pdf/1398278574-
bonifacio-miolo-em-baixa.pdf
ANTUNES, P. d. B. (2013). Comentários ao Novo Código Florestal. São Paulo: Editora Atlas.
AREA LEÃO PEREIRA, E. J. et al. (2019). Policy in Brazil (2016–2019) threaten conservation of the
Amazon rainforest. Environmental Science & Policy, 100, 8-12. Doi: 10.1016/j.envsci.2019.06.001.
ARRUDA, J. (1925). Conservação de recursos naturaes. Revista da Faculdade de Direito de São
Paulo, n. 22, p. 129-147.
ARRUDA, R. (2012) Cientistas e sindicalistas pedem a Dilma para vetar texto do Código Florestal.
Estado de São Paulo. 11 de outubro de 2012. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/blogs/
roldao-arruda/cientistas-e-sindicalistas-pedem-a-dilma-para-vetar-texto-do-codigo-florestal>.
AVARITZER, L. (2008). Terra e cidadania no Brasil. In: STARLING, H. M. M.; RODRIGUES,
H. E.; TELLES, M. Belo Horizonte, Editora UFMG.
AZEVEDO, A. A. (2009). Legitimação da Insustentabilidade? Análise do Sistema de Licenciamento
Ambiental de Propriedades Rurais-SLAPR (Mato Grosso). Tese (Doutorado em Desenvolvimento
Sustentavél) - Universidade de Brasília, Brasília.
BACHA, C. J. C. (1993). A dinâmica do desmatamento e do reflorestamento no Brasil. Tese (Livre-
Docência). Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. Universidade de São Paulo.
BARROSO, L. R. (2001). O Direito Constitucional e a Efetividade de suas normas. 5. ed. Rio de
Janeiro: Renovar.
BENJAMIN, A. H. (2012). Princípio da Proibição de Retrocesso Ambiental. In: Princípio da Proibição
de Retrocesso Ambiental. Brasília: Senado Federal.

156
BERKES, F. (2005). Sistemas sociais, sistemas ecológicos e direitos de apropriação de recursos naturais.
In: VIEIRA, P. F.; BERKES, F.; SEIXAS, C. S. Gestão integrada e participativa de recursos naturais:
conceitos, métodos e experiências. Florianópolis: Secco/APED, p. 47-72.
BETHELL, L. (org.). (2002). História da América Latina: de 1870 a 1930. São Paulo: EDUSP.
BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL (BNDES).
(2019). Relatório de Meio Termo da Efetividade do Fundo Amazônia. Disponível em: <http://www.
fundoamazonia.gov.br/export/sites/default/pt/.galleries/documentos/monitoramento-avaliacao/
Relatorio-de-Estudo-CAR.pdf>.
BOBBIO, N. (2017). Da estrutura à função: novos estudos de Teoria do Direito. Barueri, SP: Manole.
BOHN, N. (1990). A legislação ambiental e sua implementação frente a degradação da cobertura
florestal no vale do Itajaí. Dissertação (Mestrado em Ciências Humanas - Especialidade Direito) -
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. p. 139-490.
BONFIM, S. (1953). Valorização da Amazônia e sua Comissão de Planejamento, Conferência da Escola
Brasileira de Administração Pública: Rio de Janeiro. 2015. Disponível em: <http://bibliotecadigital.
fgv.br/dspace/themes/Mirage2/pages/pdfjs/web/viewer.html?file=http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/
bitstream/handle/10438/13025/000050984.pdf?sequence=1&isAllowed=y>.
BRAGA NETTO, F. (2019). Novo manual de responsabilidade civil. Salvador: Editora Jus Podium.
BRANCALION, P. H. et al. (2016). Análise crítica da Lei de Proteção da Vegetação Nativa (2012),
que substituiu o antigo Código Florestal: atualizações e ações em curso. Natureza & Conservação, 14,
e1-e16. Disponível em: <https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1679007316300032>.
BRANCALION, P. H. S. et al. (2016) Balancing economic costs and ecological outcomes of passive
and active restoration in agricultural landscapes: the case of Brazil. Biotropica, v. 48, p. 856-867.
BRANNSTROM, C. (2002). Repensando a Mata Atlântica brasileira: cobertura vegetal e valor da
terra no Oeste Paulista, 1900 a 1930. Varia História, Belo Horizonte, n. 26, p. 58-76.
BRASIL, MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO (MAPA).
(2012). Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de
uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura. Brasília, DF.
BRASIL. (1934). Decreto nº 23.793, de 23 de janeiro de 1934. Disponível em: <https://www2.
camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-23793-23-janeiro-1934-498279-publicacaooriginal-
78167-pe.html>.
BRASIL. (1946). Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, 1946.
BRASIL. (1953). Lei nº 1.806, de 6 de janeiro de 1953, que dispõe sôbre o Plano de Valorização
Econômica da Amazônia, cria a Superintendência da sua execução e dá outras providências.
BRASIL. (1965a). Exposição de Motivos nº 29-65, 1965. Ministro da Agricultura, Hugo Leme. Diário
do Congresso Nacional - Seção 1 - 9/6/1965, p. 4.156. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/
legin/fed/lei/1960-1969/lei-4771-15-setembro-1965-369026-exposicaodemotivos-149358-pl.html>.
BRASIL. (1965b). Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, que institui o novo Código Florestal.
BRASIL. (1979). Lei nº 6.683, de 28 de agosto de 1979, que concede anistia e dá outras providências.
BRASIL. (1988a). Constituição da República Federativa do Brasil.

157
BRASIL. (1988b). Decreto nº 96.944, de 12 de outubro de 1988, que cria o Programa de Defesa do
Complexo de Ecossistemas da Amazônia Legal e dá outras providências.
BRASIL. (1991). Lei nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991, que dispõe sobre a política agrícola.
BRASIL. (1998). Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre as sanções penais e
administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências.
BRASIL. (2000a). Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, que regulamenta o art. 1 § ,225º, incisos
I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza e dá outras providências.
BRASIL. (2000b). Medida Provisória nº 1.956-50, de 26 de maio de 2000, que altera os arts. 1º, 4º,
14, 16 e 44, e acresce dispositivos à Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965, que institui o Código
Florestal, bem como altera o art. 10 da Lei nº 9.393, de 19 de dezembro de 1996, que dispõe sobre
o Imposto Territorial Rural, e dá outras providências.
BRASIL. (2001). Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, que altera os arts. 1º, 4º,
14, 16 e 44, e acresce dispositivos à Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965, que institui o Código
Florestal, bem como altera o art. 10 da Lei nº 9.393, de 19 de dezembro de 1996, que dispõe sobre
o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR, e dá outras providências.
BRASIL. (2008a). Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, que dispõe sobre as infrações e sanções
administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas
infrações, e dá outras providências.
BRASIL. (2008b). Decreto nº 6.686, de 10 de dezembro de 2008, que altera e acresce dispositivos ao
Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao
meio ambiente e estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações.
BRASIL. (2009). Decreto nº 7.029, de 10 de dezembro de 2009, que institui o Programa Federal
de Apoio à Regularização Ambiental de Imóveis Rurais, denominado “Programa Mais Ambiente”, e
dá outras providências.
BRASIL. (2011a). Decreto nº 7.497, de 9 de junho de 2011, que dá nova redação ao artigo 152 do
Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao
meio ambiente e estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações.
BRASIL. (2011b). Decreto nº 7.640, de 9 de dezembro de 2011, que altera o art. 152 do Decreto
nº 6.514, de 22 de julho de 2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio
ambiente e estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações
BRASIL. (2012). Decreto nº 7.719, de 11 de abril de 2012, que altera o art. 152 do Decreto nº 6.514,
de 22 de julho de 2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente e
estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações.
BRASIL. (2021). Lei nº 14.119, de 13 de janeiro de 2021, que institui a Política Nacional de Pagamento
por Serviços Ambientais; e altera as Leis nº 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.629, de 25 de fevereiro
de 1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para adequá-las à nova política.
CABRAL, D. C.; CESCO, S. (2007) Árvores do rei, floresta do povo: a instituição das ‘madeiras-de-
lei’ no Rio de Janeiro e na ilha de Santa Catarina (Brasil) no final do período colonial. Luso-Brazilian
Review, Wisconsin, v. 44, p. 50-86.

158
CABRAL, D. C. (2014). Na presença da Floresta: Mata Atlântica e história colonial. Rio de Janeiro:
Garamond.
CÂMARA DOS DEPUTADOS. (1965). Parecer da Comissão de Agricultura e Política Rural
no Projeto de Lei nº 2874/1965, que institui o nôvo Código Florestal, de autoria do Poder
Executivo. Relatores: Deputados Ivan Luz e Newton Carneiro. Constante do Dossiê Digitalizado
do Projeto de Lei nº 2874/1965. Disponível em: <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/
prop_mostrarintegra?codteor=1194507>.
CÂMARA DOS DEPUTADOS. (2005). Projeto de Lei nº 5.974/2005. Brasília. Disponível em:
<https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=301799>.
CÂMARA DOS DEPUTADOS. (2015). Projeto de Lei nº 312/2015. Brasília. Disponível em:
<https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=946475>.
CANOTILHO, J. J.; LEITE, J. R. M. (2007). Direito constitucional brasileiro. São Paulo: Saraiva.
CARVALHO, E. B. (2005). Os historiadores e as florestas: dez anos depois de A ferro e fogo. Esboços.
Florianópolis, v.13. p. 107-124.
CARVALHO, E. B. (2008). A Modernização do Sertão: Terras, Florestas, Estado e Lavradores na
Colonização de Campo Mourão, Paraná, 1939-1964. Tese (Doutorado em História) – Programa
de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina – USFC, Florianópolis.
CARVALHO, E. B. (2015). Problematizando as representações do mundo natural como delimitação
espacial em História Ambiental: Entre a Araucarilandia e a Floresta Ombrófila Mista. Revista de
História Regional, Ponta Grossa, v. 20, n. 2, p. 317-342.
CARVALHO, E. B. (2016). O Código Florestal brasileiro de 1934: a legislação florestal nas disputas
pelo território, um estudo de caso. Anos 90. Porto Alegre, n. 43, v. 23, p. 417-442, jul. 2016. Disponível
em: <http://seer.ufrgs.br/index.php/anos90/article/view/47974/39224>.
CARVALHO, F. V. (2012). The Brazilian position on forests and climate change from 1997 to 2012:
from veto to proposition. Revista Brasileira de Política Internacional, 55, 144-169.
CARVALHO, J. M. (1998). O motivo edênico no imaginário social brasileiro. Revista Brasileira de
Ciências Sociais. v. 13, n. 38, p. 63-79, out. 1998. p. 63. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/
rbcsoc/v13n38/38murilo.pdf>.
CARVALHO, K. H. A.; SILVA, M. L.; SOARES, N. S. (2012). Efeito da área e da produtividade na
produção de celulose no Brasil. Revista Árvore 36.6: 1119-1128.
CARVALHO, M. M. X. (2006) O desmatamento das florestas de araucária e o Médio Vale do Iguaçu:
uma história de riqueza madeireira e colonizações. Dissertação de Mestrado em História – Programa
de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, Florianópolis.
p. 88-89.
CASTRO, C. F. A. (2002). Gestão florestal no Brasil Colônia. Tese (doutorado). Brasília: UnB.
CASTRO, L. (2016). Da província ao bioma: representações da Mata Atlântica. In: CABRAL, D.
C.; BUSTAMANTE, A. G. (eds). Metamorfoses Florestais: Culturas, ecologias e as transformações
históricas da Mata Atlântica. Editora Prismas: Curitiba, p. 54-82.
CHAVES DE FARIAS, C.; ROSENVALD, N.; BRAGA NETTO, F. P. (2015) Curso de Direito
Civil, v. 3. Responsabilidade civil. 2. ed., São Paulo: Ed. Atlas.

159
CHRISTOFOLETTI, A. (1981). Geomorfologia Fluvial. São Paulo: Edgard Blücher.
CLIMATE POLICY INITIATIVE (CPI). (2019). Onde estamos na implementação do código florestal?
Radiografia do CAR e do PRA nos estados brasileiros. Disponível em: <https://climatepolicyinitiative.
org/wp-content/uploads/2019/12/Onde-estamos-na-implementacao-do-Codigo-Florestal.pdf>.
CONGRESSO NACIONAL. (1965). Discussão única do Projeto nº 2.874-A-65, que institui o
Nôvo Código Florestal. Diário do Congresso Nacional, Seção I, 6 de julho de 1965, ano XX, n. 91.
Disponível em: <http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD03JUL1965.pdf#page=39>.
CONSTANZA et al. The value of the world’s ecosystem services and natural capital. Nature, v. 387,
maio 1997, p. 253-260).
COSTA, E. V. (1999). Urbanização no Brasil no século XIX. Da monarquia à República: momentos
decisivos. São Paulo: Editora Unesp.
CUNHA, F. A. F. S. et al. (2016). The implementation costs of forest conservation policies in Brazil.
Ecological Economics, 130, p. 209-220. Doi: 10.1016/j. ecolecon.2016.07.007.
DAY, T. H. (1960). Report of the activities of the FAO/UNESCO mission to the Amazon during
1959. Rome: Food and Agricultural Organization of the United Nations.
DEAN, W. (1996). A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. São Paulo:
Companhia das Letras.
DEVY-VARETA, N. (1986). Para uma geografia histórica da floresta portuguesa: do declínio das
matas medievais à política florestal do Renascimento (séc. XV e XVI). Revista da Faculdade de Letras:
Geografia, I série, v. 1, Porto. p. 5-40. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10216/7785>.
DIEGUES, A. C. (2000). Etnoconservação: novos rumos para a proteção da natureza nos trópicos.
2. ed. São Paulo: NUPAUB-USP: Hucitec: Annablume.
DREES, M. E. (1957). Report to the Government of Brazil on The organization of a Forest Research
Center in the Amazon Region. Rome: Food and Agriculture Organization.
DRUMMOND, J. A. (1998-1999). A legislação ambiental brasileira de 1934 a 1988: comentários
de um cientista ambiental simpático ao conservacionismo. Ambiente & sociedade, 2(4).
DURIGAN, G.; FRANCO, G. A. D.; SIQUEIRA, M. F. (2004). A vegetação dos remanescentes
de Cerrado no Estado de São Paulo. In: BITENCOURT, M. D.; MENDONÇA, R. R.
(orgs.). Viabilidade dos remanescentes de Cerrado no Estado de São Paulo: Annablume,
FAPESP. p. 29–56.
FEARNSIDE, P. M. (2016). Brazilian politics threaten environmental policies. Science, 353(6301),
746-748. Disponível em: <https://doi.org/10.1126/science.aag0254>.
FERRANTE, L.; FEARNSIDE, P. M. (2019). Brazil’s new president and ‘ruralists’ threaten Amazonia’s
environment, traditional peoples and the global climate. Environmental Conservation, 1-3. Doi:
10.1017/S0376892919000213.
FIGUEIREDO, H. R.; GRIS, D.; DALMAS, F. B.; LOUBET, L. F.; PARANHOS FILHO, A. C.
(2020) Análise de impactos ambientais através de geotecnologias em área úmida do município de
Bonito – MS, Brasil. Enciclopédia Biosfera, Centro Científico Conhecer. Jandaia-GO, v.17 n. 31;
p. 13. Publicado em: 30 mar. 2020. Doi: 10.18677/EnciBio_2020A2.

160
FONSECA, G. A. B. (1985). The vanishing Brazilian Atlantic forest. Biological Conservation, 34(1),
17-34. Doi: 10.1016/0006-3207(85)90055-2.
FRANCO, J. L. A.; DRUMMOND, J. A. (2010). O cuidado da natureza: a Fundação Brasileira
para a Conservação da Natureza e a experiência conservacionista no Brasil: 1958-1992. T.E.X.T.O.S
DE H.I.S.T.Ó.R.I.A. Revista do Programa de Pós-graduação em História da UnB, 1(17), p. 59-84.
Disponível em: <https://periodicos.unb.br/index.php/textos/article/view/28053>.
FREITAS, F. L.; GUIDOTTI, V.; SPAROVEK, G.; HAMAMURA, C. (2018). Nota técnica: Malha
fundiária do Brasil, v.1.812. In: Atlas - A Geografia da Agropecuária Brasileira. Disponível em: <https://
www.imaflora.org/public/media/biblioteca/1594237486-imaflora_atlasagropecuario_documentacao_
malhafundiaria_v1812.pdf>.
FREITAS, F. L. et al. (2018). Potential increase of legal deforestation in Brazilian Amazon after Forest
Act revision. Nature Sustainability, 1(11), p. 665-670.
FREITAS, F. L. et al. (2017). Offsetting legal deficits of native vegetation among Brazilian landholders:
Effects on nature protection and socioeconomic development. Land use policy 68, p. 189–199. Doi:
10.1016/j.landusepol.2017.07.014.
FREITAS, J. (2010). A interpretação sistemática do direito. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editora.
GASPARINETTI, P.; VILELA, T. (2018). Implementando Mercados de Cotas de Reserva Ambiental
(CRA) nos Estados Brasileiros: Desafios e Oportunidades para as Regulamentações Estaduais. Disponível
em: <https://docplayer.com.br/74552378-Implementando-mercados-de-cotas-de-reserva-ambiental-
cra-desafios-e-oportunidades-para-as-regulamentacoes-estaduais-documento-de-discussao.html>.
GENELETTI, D.; CORTINOVIS, C.; ZARDO, L. e BLAL, A. E. (2020). Planning for Ecosystem
services in cities. Springer Briefs in Environmental Science. Disponível em: <https://doi.org/10.1007/978-
3-030-20024-4>.
GIUDICE, R. R. D. (2007). A sistematização dos instrumentos normativos florestais federais e os
indicadores de sustentabilidade da Floresta Amazônica brasileira do processo de Tarapoto. Dissertação
(Mestrado em Desenvolvimento Sustentável). Brasília: Universidade de Brasília.
GÓIS, F. (2010). Marina: “Mangabeira fez grande mal na Amazônia”. Congresso em Foco, 9 mar.
2010. Disponível em: <https://congressoemfoco.uol.com.br/especial/noticias/marina-mangabeira-
fez-grande-mal-na-amazonia>.
GUEDES, F. B.; SEEHUSEN, S. E. (2012). Pagamento por Serviços Ambientais na Mata Atlântica:
lições aprendidas e desafios. 2. ed. Brasília: MMA.
GUIDOTTI, V. et al. (2016). Código Florestal: Contribuições para a Regulamentação dos Programas
de Regularização Ambiental (PRA). Sustentabilidade em debate, n. 4. Piracicaba: Imaflora.
HECHT, S. B.; COCKBURN, A. (2010). The fate of the forest: developers, destroyers, and defenders
of the Amazon. University of Chicago Press.
HECHT, S.; RAJÃO, R. (2020). From “Green Hell” to “Amazonia Legal”: Land use models and the
re-imagination of the rainforest as a new development frontier. Land Use Policy, 96, 103871. Doi:
10.1016/j.landusepol.2019.02.030.
HEINSDIJK, D. (1957). Forest Inventory in the Amazon Valley. Rome: Food and Agricultural
Organization of the United Nations.

161
HESPANHA, A. M. (2006). Porque é que existe e em que é que consiste um direito colonial brasileiro.
Panóptica, v. 1, n. 3, p. 95-116.
HOLANDA, S. B. (1995). Raízes do Brasil. 26. ed. São Paulo: Companhia das Letras.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). (2017). Censo Agro
2017: população ocupada nos estabelecimentos agropecuários cai 8,8%. Disponível em: <https://
agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/25789-
censo-agro-2017-populacao-ocupada-nos-estabelecimentos-agropecuarios-cai-8-8>.
ITURRASPE, J. M.; HUTCHINSON, T.; DONNA, E. A. (1999). Daño ambiental. Tomo 1. Buenos
Aires: Culzoni Editores.
INTERNATIONAL UNION FOR CONSERVATION OF NATURE (IUCN). (2014) Technical
Study Group on Biodiversity offsets. Gland: IUCN.
INTERNATIONAL UNION FOR CONSERVATION OF NATURE (IUCN). (2016). Policy on
biodiversity offsets. Disponível em: <http://cmsdata.iucn.org/downloads/iucn_biodiversity_offsets_
policy_jan_29_2016.pdf>.
JOHNSON, N. (2011). Simply complexity. A clear guide to complexity theory. Oxford: Oneworld
publications.
KECK, M. E.; SIKKINK, K. (1998). Activists Beyond Borders: Advocacy Networks in International
Politics. New York: Cornell University.
LAGO, A. A. C. (2007). Estocolmo, Rio, Joanesburgo: o Brasil e as três conferências ambientais das
Nações Unidas. Brasília: Thesaurus Editora.
LATOUR, B. (2001). A esperança de Pandora: ensaios sobre a realidade dos estudos científicos.
Bauru: EDUSC.
LOUBET, L. F. (2014). Análise histórica do Instituto da Reserva Legal: interpretação do Art. 68 do
Novo Código florestal (Lei 12.651/2012). Revista de Direito Ambiental, v. 19, n. 76, p. 239-263.
LUCÁN, M. A. P. (1992). La protección al medio ambiente. Madrid: Editorial Tecnos.
LUCARELLI, F. D. (1994). Responsabilidade civil por dano ecológico. Revista dos Tribunais, São
Paulo. v. 700, p. 07-26.
MACHADO, R. B. et al. (2004). Estimativas de perda da área do Cerrado brasileiro. Conservação
Internacional, Brasília, DF. Disponível em: <https://jbb.ibict.br/bitstream/1/357/1/2004_%20
Conservacao%20Internacional_%20estimativa_desmatamento_cerrado.pdf>.
MAGNANINI, A. (2010). A história da Lei Federal n° 1965/4.771 (“Código” florestal brasileiro).
Publicado em Política Ambiental, Portal Rebia, em 17 fev. 2010. Disponível em: <http://portal.
rebia.org.br/artigos/artigos-e-opinioes/codigo-florestal/3299-a-historia-da-lei-federal-nd-47711965-
qcodigoq-florestal-brasileiro.html>.
MARCHESAN, A. M. M. (2019). O fato consumado em matéria ambiental. Salvador: Editora Jus
Podium.
MARTINS, G. S. (2018). Elementos da teoria estruturante do direito ambiental. Norma ambiental,
complexidade e concretização. São Paulo: Almedina.
MARTINS, R. (1944). Livro das árvores do Paraná. Curitiba: Empresa Gráfica Paranaense.

162
MATO GROSSO. (2010). Lei Complementar do Estado do Mato Grosso nº 412, de 13 de dezembro
de 2010, que dispõe sobre alterações na Lei Complementar nº 38, de 21 de novembro de 1995, na Lei
Complementar nº 232, de 21 de dezembro de 2005, Lei Complementar nº 233, de 21 de dezembro
de 2005, a Lei Complementar nº 343, de 24 de dezembro de 2008 e dá outras providências.
MATO GROSSO DO SUL. (2019). Decreto nº 15.197, de 21 de março de 2019, que disciplina o
procedimento de apresentação de Projeto Técnico de Manejo e de Conservação de Solo e Água para
implantação de atividades que demandem ações de mecanização de solo nas Bacias de Contribuição
do Rio da Prata e do Rio Formoso, nos Municípios de Jardim e Bonito, e dá outras providências.
MCCORMICK, J. (1992). Rumo ao paraíso: a história do movimento ambientalista. Rio de Janeiro:
Relume-Dumará.
McNEILL, John R. (2005). Naturaleza y cultura de la Historia Ambiental. Nómadas, Colombia, n.
22, p. 12-25.
MEA - Millennium Ecosystem Assessment. (2003). Ecosystem and human well-being: a framework
for assessment. Washington: Island Press.
METZGER, J. P. (2010). O Código Florestal tem base científica? Natureza & Conservação, n. 8 (1),
p. 92-99. Disponível em: <http://doi.editoracubo.com.br/10.4322/natcon.00801017>.
METZGER, J. P. et al. (2019). Why Brazil needs its Legal Reserves. Perspectives in Ecology and
Conservation, 17(3), 91–103. Doi: 10.1016/j.pecon.2019.07.002.
MICOL, L.; ABAD, R.; BERNASCONI, P. (2013). Potencial de aplicação da Cota de Reserva Ambiental
em Mato Grosso. Cuiabá: ICV. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/273578258>.
MILARÉ, É. (2020). Direito do ambiente [livro eletrônico]. 5. ed. e-book, baseada na 12ª ed. impressa.
São Paulo: Thomson Reuters Brasil.
MAGALHÃES, J. P. A evolução do direito ambiental no Brasil. 2. ed. ver. atual. e aumentada. São
Paulo: J. de Oliveira.
MILLER, S. W. (2000). Fruitless trees: portuguese conservation and Brazil’s colonial timber. Stanford:
Stanford University Press.
MIRRA, Á. L. V. (2002). Ação civil pública e reparação do dano ao meio ambiente. São Paulo: Juarez
de Oliveira.
MITCHELL, T. (2011). Carbon democracy: Political power in the age of oil. Lodon: Verso Books.
MORIN, E. (2000). Introdução ao pensamento complexo. 3. ed. Porto Alegre: Editora Sulina.
NEPSTAD, D. et al. (2009). The end of deforestation in the Brazilian Amazon. Science Magazine,
326(5958), 1350-1351.
NUNES, S. et al. (2016). Compensating for past deforestation: Assessing the legal forest surplus
and deficit of the state of Pará, eastern Amazonia. Land Use Policy, 57, 749-758. Doi: 10.1016/j.
landusepol.2016.04.022.
NUSDEO, A. M. O. (2012). Pagamento por serviços ambientais: sustentabilidade e disciplina
jurídica. São Paulo: Atlas.
OBSERVATÓRIO DO CÓDIGO FLORESTAL. (2019). Disponível em: <http://observatorioflorestal.org.br>.

163
PÁDUA, J. A. (2002). Um sopro de destruição: pensamento político e crítica ambiental no Brasil
escravista (1786-1888). Rio de Janeiro: J. Zahar.
PAPP, L. (2019). Direito e pagamento por serviços ambientais: fundamentos teóricos, elementos
técnicos e experiências práticas. Jaraguá do Sul: [s.n.].
PASQUALOTTO, A. S. (1993). Responsabilidade civil por dano ambiental: considerações de ordem
material e processual. In: BENJAMIN, A. H. (org.). Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão.
São Paulo: Editora RT. p. 444-470.
PAULINO, E. T. (2012). A mudança do Código Florestal Brasileiro: em jogo o princípio da função
social da propriedade. Campo-Território: Revista de Geografia Agrária, 7(13). Disponível em: <http://
www.seer.ufu.br/index.php/campoterritorio/article/view/13861>.
PEREIRA, O. D. (1950). Direito Florestal Brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Borsoi.
PEREIRA, R. O. (2007). O papel dos “ilustrados” da Comarca de Ilhéus na Regulamentação dos
Reais Cortes de Madeira: 1784-1799. Anais do III Encontro Estadual de História: Poder, Cultura e
Diversidade - ST 03: Arqueologia e História Ambiental, Organização Jairo Carvalho do Nascimento
e Luiz Henrique dos Santos Blume. Associação Nacional de História-Seção Bahia. Caetité: UNEB.
PLATJOUW, F. (2016) Environmental law and the ecosystem approach. Maintaining ecological
integrity through consistency in law. London and New York: Routledge.
PORTO, A. E. (sem data). ASPECTOS DE DOMINIALIDADE. Centro de Estudos da Procuradoria
Geral do Estado de São Paulo. Disponível em: <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/
bibliotecavirtual/regulariza2/doutrina1.html>.
PORTUGAL. (1449). Ordenações Afonsinas (Ordenações do Senhor Rey Dom Affonso V.) Livro 5,
Título LVIII, n. 7. Disponível em: <http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/afonsinas/l5pg229.htm>.
PORTUGAL. (1603). Ordenações Filipinas (Ordenações do Senhor Rey Dom Felipe II). Livro 5,
Título LXXV. Disponível em: <http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/l5p1222.htm>.
POTTER, H. (2020). Forças Armadas receberam orçamento 10 vezes maior que Ibama, mas
não conseguiram frear desmatamento. InfoAmazonia. Disponível em: <https://infoamazonia.
org/2020/07/09/portugues-forcas-armadas-receberam-orcamento-10-vezes-maior-que-ibama-mas-
nao-conseguiram-frear-desmatamento>.
PRADO JÚNIO, C. (1995). Formação do Brasil Contemporâneo. 23. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.
PRIEUR, Michel. (2012). O Princípio da Proibição de Retrocesso Ambiental. In: Princípio da
Proibição de Retrocesso Ambiental. Brasília: Senado Federal.
RAJÃO, R. (2011). Objects, boundaries and joint work: the role of geographic information systems in the
formulation and enforcement of deforestation control policies in Amazonia. Lancaster: Lancaster University.
RAJÃO, R.; SOARES-FILHO, B. (2015). Cotas de reserva ambiental (CRA): potencial e viabilidade
econômica do mercado no Brasil. Belo Horizonte: IGC. Disponível em: <https://csr.ufmg.br/
mercadocra/Rajao_Soares_15_CRA%20no%20Brasil_hires.pdf>.
RAJÃO, R.; SOARES-FILHO, B. S.; PACHECO, R. (2018). Mercado de Cotas de Reserva Ambiental
no Mato Grosso e Pará. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais.
RAJÃO, R. et al. (2020). The rotten apples of Brazil’s agribusiness. Science, 369(6501), p.246-248.

164
RAMOS, R. I.; TOSI, I. (2012). Código Florestal: apreciação atualizada. Relatório de Consultoria.
Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES). São Paulo, ago. 2012. p. 1-41.
Disponível em: <https://docplayer.com.br/634699-Associacao-brasileira-de-engenharia-sanitaria-e-
ambiental-abes-sp-codigo-florestal-apreciacao-atualizada.html>.
REIS, A. C. F. (1965). A Amazônia e a cobiça internacional. Rio de Janeiro: Edinova.
REVKIN, A. (1994). The Burning Season: The Murder of Chico Mendes and the Fight for the
Amazon Rain Forest. New York: Plume Book.
SALVADOR, A. et al. (2020). A compensação ambiental do SNUC: manual de atuação do Ministério
Público. Belo Horizonte: Abrampa.
SANT’ANNA, L. (2008). “Queremos saber a serviço de quem o Inpe está mentindo”. O Estado de S.Paulo.
27 de janeiro de 2008. p.28. Disponível em: <https://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20080127-
41739-nac-28-ger-a29-not>.
SANTOS, B. S. (2011). A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. In: SANTOS,
B. S. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição paradigmática. v. 1.
São Paulo: Cortez.
SARLET, I. W.; FENSTERSEIFER, T. (2017). Direito constitucional ambiental. 5. ed.; São Paulo:
Revista dos Tribunais.
SAUER, S.; FRANÇA, F. C. (2012). Código Florestal, função socioambiental da terra e soberania
alimentar. Caderno CRH, 25, 285-307. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0103-49792012000200007&nrm=iso>.
SCHAMA, Simon. (1996). Paisagem e Memória. São Paulo: Companhia das Letras.
SCHWARZ, R. (2012). As ideias fora do lugar. In: SCHWARZ, R. Ao Vencedor as batatas. 6. ed.
Coleção Espírito Crítico. São Paulo: Editora 34.
SENADO FEDERAL. (1979). Resolução (SF) n° 3, de 1979, instaura a CPI - Devastação da Floresta
Amazônica.
SENADO FEDERAL. (1982). CPI da Devastação da Floresta Amazônica. Disponível em: <https://
www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/40065>.
SENADO FEDERAL. (2019). Projeto de Lei nº 5.028/2019. Brasília. Disponível em: <https://
www25. senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/138725>.
SILVA, A. P. M; SAMBUICHI, R. H. R. (2016). Estrutura institucional brasileira para a governança
dos recursos florestais. In: Moura, A. M. M. (ed.) Governança e sustentabilidade das políticas públicas
no Brasil. Brasília: IPEA. p. 201-230.
SILVA, J. A. A. et al. (2012). O Código Florestal e a Ciência: Contribuições para o Diálogo. São
Paulo: Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
SILVA, Z. L. (2005). As percepções das elites brasileiras dos anos de 1930 sobre a natureza: das
projeções simbólicas às normas para o seu uso. In: ARRUDA, Gilmar. (Org.). Natureza, Fronteiras e
Território. Londrina: EDUEL. p. 177-215. p. 188.
SIQUEIRA, C. (2009). Aniversário do Código Florestal Brasileiro. Estado de São Paulo, São Paulo, set.

165
SOARES-FILHO, B. et al. (2014). Cracking Brazil’s forest code. Science, 344(6182), pp.363-364.
Disponível em: <https://www.inputbrasil.org/wp-content/uploads/2015/11/Cracking-Brazil-Forest-
Code.pdf>.
SOARES-FILHO, B. et al. (2016). Brazil’s Market for Trading Forest Certificates. PLOS ONE, 11(4),
e0152311. Disponível em: <hhtp://10.1371/journal.pone.0152311>.
SONTER, L. J.; BARRETT, D. J.; SOARES-FILHO, B. S.; MORAN, C. J. (2014). Global demand
for steel drives extensive land-use change in Brazil’s Iron Quadrangle. Global Environmental Change,
26, 63-72. Doi: 10.1016/j.gloenvcha.2014.03.014.
SPAROVEK, G. et al. (2011). A revisão do Código Florestal brasileiro. Novos Estudos - CEBRAP,
111-135. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
33002011000100007&nrm=iso>.
SPAROVEK, G.; BERNDES, G.; BARRETTO, A.; KLUG, I. (2012). The revision of the Brazilian
Forest Act: increased deforestation or a historic step towards balancing agricultural development and
nature conservation? Environmental Science & Policy, 16, 65-72. Disponível em: <http://dx.doi.
org/10.1016/j.envsci.2011.10.008>.
SPAROVEK, G. et al. (2019). Who owns Brazilian lands? Land Use Policy, Volume 87, 104062,
ISSN 0264-8377. Doi: 10.1016/j.landusepol.2019.104062.
STANTON, M.; TEJEIRO, G. (2014). Sistemas estaduais de pagamento por serviços ambientais:
diagnóstico, lições aprendidas e desafios para a futura legislação. São Paulo: IDPV.
STF - SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (1997). Ação Direta de Inconstitucionalidade 487 - Distrito
Federal, Tribunal Pleno, Relator Min. Octavio Gallotti, Data de Julgamento: 09/05/1991, Data de
Publicação: DJ 11-04-1997 PP-12177 EMENT VOL-01864-01 PP-00053 RTJ VOL-00162-03
PP-00832.Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur118503/false>.
STF - SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (2018). Ação Direta de Constitucionalidade 42 -
Distrito Federal. Tribunal Pleno. Relator Min. Luiz Fux. Data de Julgamento: 28/02/2018. Data
de Publicação: 13/08/2019, DJe-175. Ações Diretas de Inconstitucionalidade e Ação Declaratória
de Constitucionalidade julgadas parcialmente procedentes. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/
paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=750504737>.
STF - SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (2020). Medida cautelar na Arguição de Descumprimento
de Preceito Fundamental 749 – MC-Ref. - Distrito Federal, Tribunal Pleno. Relatora Min. Rosa Weber.
Data de Julgamento: 30/11/2020. Data de Publicação: 10/12/2020, DJe-289. Decisão monocrática
submetida e mantida pelo Plenário do STF. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/
jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=6019001>.
STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (2012) Embargos de divergência em Recurso
Especial nº 218.781 - Paraná (2002/0146843-9) Relator Ministro Herman Benjamin. Data de
Julgamento: 09/12/2009. - Data de Publicação: 23/02/2012 – Dje. Disponível em: <https://processo.
stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=934954&num_
registro=200201468439&data=20120223&peticao_numero=-1&formato=PDF>.
TARDIN, A. T. et al. (1980). Subprojeto desmatamento: convênio IBDF/CNPq-INPE. Relatório
Técnico INPE-1649-RPE, 103.

166
TEN KATE, K.; CROWE, M. L. A. (2014). Biodiversity Offsets: Policy options for governments. An
input paper for the IUCN Technical Study Group on Biodiversity offsets. Gland, Switzerland: IUCN.
VALDIONES, A. P.; BERNASCONI, P. (2019). Transparência Florestal Mato Grosso: do papel à
prática: a implementação do Código Florestal pelos estados brasileiros. Ano 6, n. 11. Cuiabá: Instituto
Centro de Vida – ICV. Disponível em <https://www.icv.org.br/publicacao/transparencia-florestal-do-
papel-a-pratica-a-implementacao-do-codigo-florestal-pelos-estados-brasileiros>.
VAN DER HOFF, R.; RAJÃO, R. (2020). The politics of environmental market instruments: Coalition
building and knowledge filtering in the regulation of forest certificates trading in Brazil. Land Use
Policy, 96. Doi: 10.1016/j.landusepol.2020.104666.
VAN DER HOFF, R.; RAJÃO, R.; LEROY, P. (2018). Clashing interpretations of REDD+ “results”
in the Amazon Fund. Climatic Change, 150(3), p. 433-445. Doi: 10.1007/s10584-018-2288-x.
VIOLA, E. (1988). The ecologist movement in Brazil (1974-1986): from environmentalism to ecopolitics.
International Journal of Urban and Regional Research, 12(2), 211-228. Doi:10.1111/j.1468-2427.1988.
tb00450.x.
VIOLA, E. (2004). Brazil in the context of global governance politics and climate change, 1989-
2003. Ambiente & Sociedade, 7, 27-46. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S1414-753X2004000100003&nrm=iso>.
VIOLA, E.; FRANCHINI, M. (2014). Brazilian climate politics 2005-2012: Ambivalence and
paradox. Wiley Interdisciplinary Reviews: Climate Change, 5(5), 677-688. Doi: 10.1002/wcc.289.
WAINER, A. H. (1991). Legislação ambiental do Brasil: subsídios para a história do Direito Ambiental.
Rio de Janeiro: Forense.
WESTMAN, W. (1977). How much are nature’s services worth? Science, 197 (4307), 960-964.
Doi:10.1126/science.197.4307.960.
WUNDER, S. (2007). The efficiency of Payments for Environmental Services in Tropical Conservation.
Conservation Biology, v. 21, p. 48-58.
WUNDER, S. (2009). Pagamentos por serviços ambientais. Perspectivas para a Amazônia Legal.
(coord.) 2. ed. Brasília: MMA.
ZAKIA, M. J.; GUEDES PINTO, L. F. (2013). Guia para aplicação da nova lei florestal em propriedades
rurais. Piracicaba, SP: Imaflora/IPEF. 32p.
ZHOURI, A. (2004). Global–Local Amazon Politics: Conflicting Paradigms in the Rainforest
Campaign. Theory, Culture & Society, 21(2), 69-89. Doi: 10.1177/0263276404042135.

167

Você também pode gostar