0% acharam este documento útil (0 voto)
89 visualizações25 páginas

Índice-Socioliguistica. 2024

Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato DOCX, PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
0% acharam este documento útil (0 voto)
89 visualizações25 páginas

Índice-Socioliguistica. 2024

Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato DOCX, PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
Você está na página 1/ 25

Índice

I. INTRODUÇÃO.................................................................................................................2

II. POLÍTICA LINGUÍSTICA DE ÀFRICA E DE MOÇAMBIQUE....................................3

2.1. Lidando com a “ Questão linguística” em África............................................................3

2.1.1. Exoglossia vs. Endoglossia.......................................................................................3

2.2. Alguns modelos recentes de política linguística: Bamgbose (1991) e Laitin (1992)......4

III. POLÍTICA LINGUÍSTICA EM MOÇAMBIQUE.........................................................7

3.1. Considerações históricas..................................................................................................7

3.1.1. A política linguística que emergiu depois da independência em 1975.....................7

3.1.2. Reivindicação para a revisão da política linguística que emergiu depois da


independência em 1975.........................................................................................................10

3.2. Algumas indicações prospectivas..................................................................................15

3.3. Nacionalização do Português e das línguas autóctones.................................................16

3.4. Oficialização do Português e das línguas autóctones....................................................18

3.5. Possíveis Línguas Regionais..........................................................................................20

3.5.1. Província de cabo Delgado.....................................................................................20

3.5.2. Província de Niassa................................................................................................21

3.5.3. Província de Nampula............................................................................................21

IV. CONCLUSÃO...............................................................................................................23

V. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..............................................................................24
I. INTRODUÇÃO
Um tema polémico ligado a sociolinguística relacionada com os países africanos é o da
chamada “questão linguística” a mesma refere-se ao dilema que emerge de coexistência
assimétrica e competitiva das línguas ex-coloniais com as línguas autóctones. Apesar da
ideologia da africanização que caracterizou as etapas iniciais do movimento nacionalista em
África, que se acreditava poder estimular a promoção das línguas autóctones africanas, as
políticas linguísticas exoglóssicas ainda predominam na maioria dos países africanos.

A perspectiva sobre a qual os analistas consideram a situação linguística em alguns


países africanos pós-coloniais exige uma revisão. As visões sobre a coexistência das línguas
ex-coloniais e as línguas autóctones têm sido influenciadas por considerações ideológicas que,
se por um lado podem ser justificadas por posições anticoloniais, pelo outro falham no
reconhecimento do cenário linguístico tal como ele se tem desenvolvido nos últimos anos.

Por esta razão, conceber a coexistência das línguas autóctones com as línguas
coloniais como sendo necessariamente conflituosa, na base da Assunção de que elas podem
ser contrastadas em termos de legitimidade, endogenização e utilidade para o
desenvolvimento nacional, parece ser uma simplicação exagerada da situação actual.

Falar deste ponto, inclui também falar de Moçambique, em que após a sua
independência, foi conferido o estatuto de língua oficial o português, o que significa que, tal
como no período colonial, o português continua a ser a única língua usada em funções
oficiais. Porém, o facto do português, a língua do inimigo, ser apropriado pela FRELIMO no
início da luta de libertação deu uma forte legitimidade à sua adopção no Moçambique
independente.

Todavia, essa adopção não poderia assim ser percebida, aos olhos do público, como
sinal de nostalgia colonial. O português tornou-se, consequentemente, meio primário de
comunicação nos domínios públicos, não somente nos cenários institucionais mas também nas
interações quotidianas urbanas, em espaços públicos.

É nesse setido que pretendemos falar da Política Linguística de África e de


Moçambique, na qual temos como objectivo geral abordar detalhadamente a questão da
política linguísica de África assim como de particularmente de Moçambique, trataremos ainda
nesse estudo os objectivos específicos que irão incendir na relevância cultural das línguas
3

autoctonas; falar também da relevância funcional das línguas em África e particularmente em


Moçambique.

II. POLÍTICA LINGUÍSTICA DE ÀFRICA E DE MOÇAMBIQUE

II.1. Lidando com a “ Questão linguística” em África


II.1.1. Exoglossia vs. Endoglossia
Duas considerações principais dominam o debate sobre a política linguística em
África. Tomando a formulação de Treffgarne (1986), estas considerações são a “relevância
cultural” (que se refere a promoção das identidades nacionais, sobretudo na base de
tradições, costumes e línguas autóctones) e a “relevância funcional” (que se refere ao
funcionamento das instituições do estado, tais como a administração, o sistema escolar, os
tribunais e os meios de comunicação social). Na base da relevância funcional, muitos países
africanos independentes oficializaram as línguas ex-coloniais, o que levantou uma discussão
sem fim sobre os méritos e os deméritos dessa opção.

Assim, a maioria dos Estados africanos segue políticas “exoglóssicas” (Heine 1990,
1992), isto é, oficializaram uma língua ex-colonial que, na maior parte dos casos, é usada nas
actividades tuteladas pelo governo, tais como a administração, a educação, a justiça, a
comunicação social.

De acordo com Heine (1990), apenas cinco países africanos: Tanzania, Somália,
Sudão, Etiópia e Guiné-Konacry (até 1984, cf. Calvet 1987) seguem uma endoglossia
activa, cujo objectivo é promover a(s) línguas (s) local (ais) ao estatuto de meio de
comunicação em actividades oficiais. As línguas estrangeiras, quando não são totalmente
excluídas, vêem o seu uso altamente restringido a domínios específicos, tais como o ensino
superior e as relações internacionais.

Heine (1990) distingue também os países africanos que seguem uma política
linguística “endoglóssica não activa”, tais como o Botswana, Burundi, o Lesotho, o
Malawi, o Ruanda e a Suazilândia. De acordo com Heine (1990), a diferença entre estes
dois tipos de política endoglóssica podem ser encontradas na forma como elas são
implementadas:

“Os Estados que seguem uma política endoglóssica activa estão totalmente
empenhados na promoção da língua ou línguas autóctones ao estatuto de
4

meios viáves para toda a comunicação importante, com o efeito de que o


cidadão médio não precisa de aprender uma língua estrangeira. Nos estados
de endoglossia não activa, por outro lado, tende a existir um fosso significativo
entre a política linguística declarada e os padrões reais de usos linguísticos. A
promoção da língua autóctone a todos os níveis pode ser o objetivo declarado
da sua política, mas a mais importante comunicação linguística tutelada pelo
governo continua confinada a uma língua estrangeira, que é também a única
ou uma das várias línguas oficiais. Sem um domínio suficiente da língua
estrangeira, a participação activa no processo de governação parece
impossível, mas os escritores, cantores e outros actores não governamentais
continuam a promover as línguas [autóctones].” (p.171).

Assim, mesmo em países com políticas endoglóssicas, as línguas ex-coloniais podem


continuar a ter papéis proeminentes. Apesar das políticas linguísticas oficialmente declaradas,
a verdadeira promoção das línguas autóctones para contextos oficiais e a substituição das
línguas ex-coloniais é mais uma excepção do que uma regra.

II.2. Alguns modelos recentes de política linguística: Bamgbose (1991) e Laitin


(1992)
Algumas propostas recentes para a gestão linguística em África avançam para além da
controvérsia tradicional associada à coexistência das línguas ex-coloniais com as autóctones,
através de uma abordagem que reconhece a natureza multilingue das sociedades africanas, nas
quais todas as línguas estão de diferentes maneiras ligadas à vida nacional. Bamgbose (1991),
por exemplo, sugeriu um modelo de três línguas, com as diferentes línguas a serem usadas aos
níveis local/regional, nacional e internacional (cf.p.54).

Partindo do pressuposto de que nas situações africanas multilingues as pessoas têm de


aprender mais do que uma língua para sobreviverem e se integrarem nas suas comunidades
regionais, o modelo prevê que as línguas maternas e/ou línguas da comunidade circundante
servirão como línguas internas de grupos sociais, simbolizando a solidariedade local no seio
destes grupos.

A língua conhecida pela maioria como língua segunda servirá também como língua
regional e de comércio. O modelo propõe a adopção de uma língua africana autóctone como
“língua nacional para comunicação nacional” (p.121), embora uma língua ex-colonial possa
5

ser usada como língua nacional adicional de transição. Para a comunicação internacional, o
modelo propõe o uso de uma língua ex-colonial.

Em termos de política educacional, este modelo sugere o uso de três línguas: a língua
materna ou da comunidade circundante, uma língua segunda africana (geralmente a língua
nacional) e uma LWC. No caso dos países em que todos os cidadãos têm a língua autóctone
africana comum, apenas duas línguas serão necessárias como meio de ensino: a língua
africana comum e a LWC. O modelo não exclui o ensino numa outra língua nacional ou
internacional, ou o seu ensino como matérias opcionais ou obrigatórias.

Bamgbose (1991) ilustra o modelo das três línguas com o caso da Tanzânia. Este país
usa várias línguas maternas para as actividades tradicionais; a língua nacional, o Swahili, é
usada no ensino, em algumas funções do governo e do partido no poder, e na comunicação
interétnica; e o inglês é usado no ensino superior, na administração e na comunicação
internacional (cf. P. 121).

O modelo das três línguas tem alguma flexibilidade. Por exemplo, num país que não
tenha nenhuma língua autóctone comum, pode ser promovida uma língua dominante como
língua nacional. No entanto o modelo torna-se rígido ao pre-definir funções para as diferentes
línguas como se as situações linguísticas em toda a África pudessem ser reduzidas às mesmas
características. Consequentemente, não pode dar conta das complexidades da situação
linguística de muitos países africanos. Apesar de reconhecer a natureza multilingue das
sociedades africanas, o modelo não leva em consideração o facto de esta natureza multilingue
poder ter diferentes configurações, e, por isso, não pode ser sujeita a soluções equivalentes.

Para além disso, estabelece um papel subsidiário para as línguas ex-coloniais, uma vez
que toma como dado adquirido a capacidade de as línguas autóctones cobrirem muitas
actividades nacionais. O único contexto que o modelo assume como apropriado para as
línguas ex-coloniais é o da comunicação internacional. Como modelo assume que as línguas
ex-coloniais são necessariamente menos legítimas do que as línguas autóctones, subestima a
endogenização daquelas línguas em alguns países.

Por outro lado, Laitin (1992) propõe a análise dos efeitos da variedade de forças que
configuram a situação linguística contemporânea em África através de um modelo que
assume que a racionalização linguística que ocorreu, por exemplo, nos países europeus com a
“especificação territorial de uma língua comum para propósitos de administração e lei”
6

(Laitin 1992: 9) não será a norma em África. O modelo prevê uma situação trilingue, em que
os cidadãos normalmente precisam de conhecer três línguas:

a) Uma língua europeia usada nos “domínios em que a burocracia central ou o sistema
educacional é tenaz” ( p.117);
b) Uma língua nacional autóctone, isto é, uma língua franca autóctone que servirá como elo
de ligação de todo o país e que vai substituir a língua europeia em muitos domínios;
c) A sua própria língua vernacular, a ser usada como meio de ensino na escola primária e
como língua para administração local nas regiões de origem.
Aqueles cidadãos cuja língua materna coincide com a língua nacional que serve de
língua franca não precisam de aprender mais do que duas línguas: a sua língua materna (que
é também a língua nacional) e a língua ex-colonial. Por outro lado, os cidadãos que emigram
no território nacional podem precisar de aprender uma quarta língua, isto é a língua nativa da
região para onde migraram ( cf.p.117).

Para Laitin (1992, nos países sem uma língua nacional potencial, isto é, onde nenhuma
língua vernácula, língua franca ou pidgin pode simbolizar os valores nacionais, os cidadãos
precisam de duas línguas: a língua europeia, como lingua de ligação inter-regional, e a
língua vernácula local, como meio de comunicação regional ( cf.p. 118).

O modelo de D. Laitin pressupõe situações e ideais, com cidadãos ideiais, que se


conformam regidamente à norma, e, por essa razão, assume que os efeitos linguísticos podem
ser regidamente previstos. Já que o modelo se funda na noção weberiana de racionalização do
Estado, vê o processo de planificação linguística apenas na perspectiva da autoridade do
Estado, isto é, do topo para a base, subestimando o poder actuante daqueles para quem as
políticas são direccionadas.

Tal como os actores sociais podem aceitar as políticas do Estado, também podem
manifestar resistência, contorná-las ou, simplesmente, rejeitá-las. Isto significa que a
planificação linguística também requer uma perspectiva da base para o topo, em combinação
com uma abordagem caso a caso. Mesmo em Estados com cenários linguísticos similares, as
autoridades do Estado não estarão necessariamente interessadas nos mesmos resultados e,
portanto, as políticas estatais podem não ser seguidas de forma igual, contrariamente ao que
parece sugerir um modelo de D. Laitin.

As complexidades de um mercado linguístico têm subjacente uma variedade de facetas


políticas, sociais e económicas que o podem afectar de maneiras distintas. Basta mencionar os
7

casos da Tanzânia e de Quénia, ambos com cenários linguísticos idênticos, mas abordagens
distintas. Ambos são países multilingues com um bom número de línguas autóctones
“étnicas”, mas com Swahili surgindo como língua da comunicação interétnica. Ambos
herdaram o inglês da antiga potência colonial.

Na Tanzânia, o Swahili pôde ascender ao estatuto de língua nacional, promovida e


aceite pela política do Estado e pela sociedade geral (Abdulaziz 1980; Whiteley 1968,1969).
No Quénia, entretanto, o uso do Swahili como língua nacional enfrentou muitas barreiras,
apesar de ser largamente usado como língua franca (Bamgbose 1991; 120). Embora o inglês
permaneça como uma importante língua em ambos os países, ele tem um papel mais
influente nos domínios oficiais no Quénia, onde se tornou, de facto, a língua oficial
(Abdulaziz 1980; Gorman 1974). As orientações políticas e económicas diferentes são
assumidas como sendo as causas destes resultados diferentes ( Leys1975: 196-7).

Dada a actual situação linguística em Moçambique, não há motivos para assumir que
os modelos propostos por A. Bamgbose ou D. Laitin se possam adoptar.

Segundo Firmino, Gregório p. 163) em Moçambique, conjectura uma situação em que,


por um lado, muitos cidadãos irão conduzir as suas vidas ou numa (uma ou mais) língua
autóctone ou em português. Alguns moçambicanos, no entanto, Irão usar uma língua
autóctone e o português. Nenhuma das línguas autóctones será alargada para maioria dos
moçambicanos num futuro próximo. Assim, uma língua autóctone largamente falada como
língua nacional não pode emergir, nem o português se vai tornar instrumento de comunicação
para todos os moçambicanos no país inteiro, apesar de haver condições sociais e esforços do
Estado para favorecer a sua expansão para um maior número de cidadãos. A discussão que se
segue orienta-se para esta situação e propõe medidas para inverter algumas das suas
consequências negativas.

III. POLÍTICA LINGUÍSTICA EM MOÇAMBIQUE

III.1. Considerações históricas


III.1.1.A política linguística que emergiu depois da independência em 1975
Conforme mencionado no capítulo precedente, quando Moçambique se tornou
independente em 1975, o português foi adoptado como língua oficial e como símbolo da
unidade nacional. A definição destes papéis para o português foi um resultado natural. O
8

português já tinha assumido esses papéis, tanto no Moçambique colonial, em que era a língua
oficial, como na FRELIMO, onde foi adotado como instrumento da unidade nacional.

Para além disso, a atmosfera ideológica prevalecente nos anos que se seguiram à
independência também favoreceu e legitimou a oficialização do português e o seu uso como
símbolo de unidade nacional. Nesse período, a ideologia oficial entendia as divisões étnicas e
regionais como grandes ameaças à consolidação da nova Nação-Estado moçambicana. O
português apareceu como instrumento adequado não só para se sobrepor às diferenças
linguísticas entre os moçambicanos, mas também para promover a consciência da unidade
nacional.

Acrescente-se que, na altura em que Moçambique ficou independente, só Português


estava em posição de funcionar como uma linguagem do Estado e superar a maior parte dos
problemas colocados pelas línguas autóctones, que incluíam:

a) As línguas autóctones serem deficitárias em termos de planificação linguística do corpus


(careciam de gramáticas, estudos descritivos, ortografias padronizadas, dicionários, etc.);
b) Nenhuma das línguas autóctones podem cobrir o país inteiro, razão pela qual são
regionalmente e etnicamente marcadas;
c) As elites integradas nas instituições do Estado, de um modo geral, não conhecerem
suficientemente bem as línguas autóctones a ponto de as usarem como línguas de trabalho
em actividades oficiais;
d) Nenhuma língua autóctone ter precedentes de uso em domínios “altos”.
Em contrapartida, o português tinha uma história de uso institucional, era conhecido
pelas pessoas ligadas ao trabalho em actividades institucionais e era uma língua de prestígio,
funcionando como uma marca distintiva da identidade dessas pessoas.

Como as línguas autóctones estavam associadas a filiações étnicas divisionistas, tais


como tribalismo e regionalismo, as autoridades do Estado não contemplaram o seu uso em
domínios oficiais, excepto nas transmissões radiofónicas. Pode argumentar-se, como
justificação, que a sociedade em geral, e as elites, em particular, não as viam como estando
adaptadas a funções sociais.

O discurso oficial, no entanto, frequentemente reconhecia o seu papel como criadoras,


veículos e parte integrante daquilo que era considerada a cultura moçambicana genuína.
9

O raciocínio subjacente a esta afirmação, feita no 1° seminário nacional sobre o ensino


de língua portuguesa, realizado em Maputo em 1979, levou à ideia de que a difusão do
português no Moçambique independente não deveria obstruir o desenvolvimento das “línguas
moçambicanas”.

Na sequência disto, uma das recomendações do 1° seminário nacional sobre o ensino


da língua portuguesa chegou mesmo a sugerir o estudo científico destas línguas. Este estudo
científico foi, no entanto, proposto no sentido de ajudar na concepção de materiais e
metodologias do ensino de português e não em prol das línguas autóctones em si. Por esta
razão, no período que se seguiu ao 1° seminário nacional sobre o ensino da língua portuguesa,
não houve passos singificativos dados pelo estado para assegurar o desenvolvimento das
“línguas moçambicanas”, com excepção feita ao trabalho levado a cabo pelo (NELIMO), uma
pequena unidade de investigação integrada na universidade Eduardo Mondlane, em Maputo,
que se especializa em línguas autóctones.

Não obstante, funcionários superiores do Estado continuaram a reiterar a ideia de que


as línguas autóctones eram parte essencial da cultura moçambicana. O Ministro da Educação,
num discurso de abertura do seminário de padronização das ortografias das línguas
moçambicanas organizado pelo NELIMO em 1988, recordou os participantes do seguinte:

A nossa independência foi feita para afirmar a nossa cultura, a nossa personalidade
moçambicana. As exigências da unidade e do desenvolvimento passam pelo conhecimento e
reconhecimento das identidades e das formas de consciência cultural particulares, de como se
manifestam através de práticas culturais concretas. O fortalecimento de unidade cultural não
implica necessariamente a obliteração dos diferentes aspectos que traduzem a variedade e as
diferenças que enriquecem a nossa sociedade.

Na multiplicidade de expressões em que o tecido da nossa identidade cultural se


consubstancia, uma das suas expressões mais privilegiadas é, sem dúvida, a das nossas
línguas nacionais. Os valores éticos, morais e estéticos implícitos na concepção de
organização social, no pensamento religioso, nas tradições políticas, militares e judiciais do
nosso passado, foram-nos transmitidos essencialmente pela transmissão oral. É no riquíssimo
depositário das línguas moçambicanas que residem e se preservam os principais elementos
constitutivos da nossa singularidade cultural. (NELIMO 1989: 4).

Desta visão das línguas autóctones como a marca genuína da moçambicanidade surge
uma das maiores contradições da política oficial que emergiu em Moçambique depois de
10

1975. Apesar do facto de nenhuma função significativa ter sido definida para as línguas
autóctones, a retórica oficial associava-se às raízes da identidade nacional moçambicana. Por
outro lado, adopção do português como língua oficial e o seu reconhecimento como língua de
unidade nacional foram percebidos como estratégias políticas para facilitar a integração
nacional de Moçambique. O português nunca era, no entanto, associado à expressão da
“moçambicanidade” autêntica, nem às línguas autóctones era permitido o acesso às
actividades oficiais.

Uma ilustração viva desta contradição é visível nas expressões usadas para referir
tanto as línguas autóctones como o português. Frequentemente, o discurso oficial designa as
línguas autóctones como línguas moçambicanas ou línguas nacionais, mas nunca línguas
étnicas. Em contraste, o português é referido como língua oficial ou língua de unidade
nacional, mas nunca como uma língua moçambicanidade ou mesmo nacional. A expressão
língua indígenas nunca foi usada para referir as línguas autóctones devido às suas conotações
colóniais. O discurso colonial usava a palavra indígena para designar a população africana
vista como “incivilizada” e não assimilada à cultura portuguesa.

Assim, na política linguística prevalecente em Moçambique, o português é


oficializado mas não nacionalizado, enquanto as línguas autóctones são nacionalizadas mas
não oficializadas.

Considera-se que o principal problema da actual política linguística deriva desta


contradição. As autoridades de Estado concebem as línguas autóctones como veículos da
identidade nacional moçambicana, e, no entanto, estás línguas não permitem a participação no
sistema nacional.

Embora o português seja a língua oficial e a língua de unidade nacional e permita a


participação no sistema nacional continua a não ser, no discurso oficial, um “ perfeito”
veículo da genuína identidade nacional. FIRMINO, Gregorio , 2006, p. 166

III.1.2.Reivindicação para a revisão da política linguística que emergiu depois da


independência em 1975

O facto de a política linguística que emergiu em Moçambique em meados dos anos 70


poder ser explicada tomando em conta o contexto sociopolítico da altura não evitou que certos
intelectuais a vissem como incapaz de satisfazer todas as necessidades da nova Nação-Estado,
do ponto de vista quer instrumental quer sentimental. Como consequência, nos anos 80,
surgiram novas perspectivas, algumas das quais vindas de funcionários superiores do Estado,
11

sugerindo alguns ajustamentos na política seguida de facto oficialmente. Sem questionar a


oficialização do português, esses intelectuais defendiam a atribuição de funções sociais mais
relevantes às línguas autóctones.

O principal pressuposto destas perspectivas era o de que a construção da nação era


impossível sem a integração de todos os segmentos da sociedade moçambicana, o que só
poderia ser alcançado com o uso das línguas autóctones em complementaridade com o
português.

Ao mesmo tempo que previlegiava o português como língua étnica e regionalmente


neutra, o discurso oficial subestimava outras diferenças sociais que eram reforçadas e
indicadas pelo conhecimento e pelo uso (de formas específicas) do português. Tal era o caso
da diferenciação entre segmentos da população moçambicana rural ou não
escolarizada/analfabeta versus urbana e ou escolarizada/ alfabetizada.

O conhecimento e o uso (de formas específicas) do português era o principal factor


diferenciador dos últimos relativamente aos primeiros. Como consequência, mais do que
reforçar a unidade nacional, o português era um factor de exclusão de muitos moçambicanos
do sistema nacional, uma vez que a participação nos domínios político e social e, em alguns
domínios económicos formais, dependia largamente do conhecimento e do uso (de formas
específicas) desta língua. idem

A argumentação a favor de um uso mais alargado das línguas autóctones atingiu o


auge em 1988, com a organização do 1° seminário sobre a padronização das línguas línguas
moçambicanas. No discurso de abertura, o então Ministro da Educação sugeriu publicamente,
pela primeira vez, o uso das línguas autóctones em alguns domínios públicos. A sugestão foi
sustentada nestes termos:

“… o Nosso desenvolvimento linguístico, em vez de antagonismos,


deverá dar lugar à unidade, à interacção no desenvolvimento da língua de
unidade nacional e das outras línguas nacionais. E aí, o que será determinante
não será tanto o factor linguístico em si, mas a natureza das relações entre as
pessoas na sociedade, a maneira como formos construindo a Nação
moçambicana. Será uma construção onde não haja espaço à repressão
cultural, onde não haja redução, nem uniformização da multiplicidade de
expressões, mas afirmação e respeito pela capacidade de conviver na
variedade, na liberdade de expressão e criação na pluralidade cultural. É
12

nesse contexto que teremos de perspectivar o uso social das línguas


moçambicanas, quer nas áreas de uso imediato, como : A informação, o
trabalho ideológico partidário, a expressão artística e literária, quer nas de
uso que requer mais longa preparação, como a alfabetização e o ensino, para
que elas assumam uma verdadeira dimensão Nacional”

(Extracto do Discurso de abertura proferido por s. Ex.ª o Ministro da Educação, in NELIMO 1989:4).

As mudanças de perspectivas sobre a matéria linguística nos anos 80 foram motivadas


pelo trabalho dos investigadores do NELIMO, que mostraram que a diversidade linguística
em Moçambique não era tão complexa e pronunciada como se pensava. Alguns investigadores
do NELIMO acreditavam que em Moçambique havia quatro línguas autóctones principais
(Makua, nyanja-sena, shona e tsonga), que ram mutuamente inteligíveis e faladas por 90% da
população. A reivindicação era a de que estas línguas podiam cobrir a população inteira de
Moçambique da seguinte forma (cf. Marina 1981):

a) O Makua, nas províncias nortenhas de Niassa, cabo delgado e Nampula;

b) O Nyanja-sena, em parte das províncias nortenhas e centrais de Tete, Zambézia, Manica e


Sofala;

c) O Shona, em parte das províncias centrais de Manica e Sofala;

d) O Tsonga, nas províncias do sul, nomeadamente Inhambane, Gaza e Maputo.

Isto significaria que Moçambique abarcava quatro áreas linguísticas dominadas pelo
Makua, Nyanja-sena, Shona e Tsonga, nas quais outras línguas autóctones estariam incluídas.
Disto resultou a inferência de que cada uma destas quatro línguas podia ser usada em funções
oficiais na sua área linguística, de tal forma que a promoção das línguas autóctones podia ser
concretizada com o recurso apenas a quatro línguas. Um argumento subjacente era o de que,
na base destas “quatro línguas principais”, a promoção das línguas autóctones não iria
constituir perigo para a integridade da Nação-Estado moçambicana.

Os investigadores do NELIMO defendiam um plano a longo prazo que considerasse os


seguintes aspectos:

a) Promoção do português como língua de ligação nacional;

b) A promoção de algumas línguas autóctones ao estatuto de línguas nacionais;

c) A criação de uma comunidade de falantes bilingues de português e línguas autóctones;


13

d) A introdução de línguas autóctones nas escolas como meio de ensino ou objecto de


estudo;

e) O uso tanto do português como das línguas autóctones nas actividades culturais e
artísticas.

Segundo o autor, p.168, os investigadores do NELIMO associaram as línguas


autóctones e as a expansão do português a uma número maior de falantes. A assunção de base
era a de que as pessoas que conheciam uma das línguas autóctones teriam maior facilidade em
aprender as outras já que todas pertencem à mesma família linguística e partilham aspectos
gramáticas e semânticos comuns. Por anologia, as pessoas teriam também dificuldades e erros
típicos semelhantes na aprendizagem do português e, portanto, poderiam ser usados materiais
e métodos semelhantes para o ensino do português a todos os moçambicanos. Para além disso,
Moçambique poderia tirar proveito da experiência dos países vizinhos no uso de materiais de
ensino, uma vez que todas as “línguas principais”, excepto o Makua, são também faladas
nesses países, onde já tinham sofrido um tratamento linguístico adequado e eram usadas em
actividades escolares.

Embora um exame mais profundo tenha mostrado que algumas das conclusões dos
investigadores do NELIMO eram questionáveis, elas tiveram muita influência, sobre tudo
porque estavam carregadas de autoridade científica. Por exemplo, o gabinete do secretário do
Estado da Cultura, então tutelado pelo Ministro da Educação e cultura, emitiu um documento
que sugeria uma política linguística que preconizava funções mais proeminentes para as
línguas autóctones (cf. Mec-gabinete do secretário de estado da cultura 1983).

A justificação era a de que uma política linguística moçambicana deveria exprimir a


identidade Moçambique e eliminar quaisquer vestígios da alienação e despersonalização
coloniais que contribuiam para o repúdio dos traços culturais essenciais africanos. O
documento defendiam também que o uso das línguas autóctones iria permitir o envolvimento
dos cidadãos moçambicanos sem conhecimento do português no processo de reconstrução
Nacional.

Katupha (1985) apoiou este ponto, com base do facto de haver uma discrepância entre
a política oficial e as práticas linguísticas reais, devido o seguinte:

a) O português era mais falado nas cidades do que no campo;


b) As línguas autóctones eram mais faladas no campo do que nas cidades;
14

c) O português era menos falado no campo do que às línguas autóctones eram faladas nas
cidades.
Para Katupha (1985) citado por FIRMINO, Gregorio p.169, a discrepância tornava-se
mais perniciosa se se considerasse que aqueles que assumem o papel mais relevante nas
actividades económicas, os camponeses, eram os que com menor probabilidade falavam
português.

O documento emitido pelo Gabinete do Secretário de Estado da Cultura, não


questionava o papel do português como a língua oficial de ligação ede unidade nacional
(p.12), embora enfatizasse que a adopção do português não deveria ocorrer "à custa da
amputação cultural que poderá vir a significar a desaparição das línguas moçambicanas"
(MEC- Gabinete do Secretário de Estado da Cultura, 1983: 13) ou ignorar que "o português
falado em Moçambique há-de necessariamente transformar-se e distanciar-se do português
de Portugal porque a realidade moçambicana, a partida diferente da de Portugal, tem o seu
próprio curso de desenvolvimento" (MEC- Gabinete do Secretário de Estado da Cultura,
1983:14).

Por está razão, o documento defendia que a institucionalização do português deveria


ser mais um processo de apropriação do que de alienação. Em conformidade com estes
argumentos, o documento propunha as seguintes acções:

 Promoção do bilinguismo através do incrementar do estudo, do ensino e da difusão do


português e das línguas moçambicanas;
 Avaliação da influência das línguas moçambicanas sobre o português;
 Definição de um novo padrão para o português usado em Moçambique;
 Selecção das línguas moçambicanas a que se podia atribuir o estatuto de línguas nacionais
e que estivessem preparadas para servir em actividades oficiais tais como o ensino formal;
 Uso das línguas autóctones na alfabetização e educação de adultos nas regiões onde o
português não é normalmente usado;
 Criação de um Centro de Estudo das Línguas Moçambicanas, que se encarregaria de todas
as actividades relacionadas com as línguas moçambicanas.
Ao longo dos anos 80 e até ao presidente, outros intelectuais e estudiosos continuaram
a discussão sobre a questão da linguística em Moçambique. Na verdade, a discussão estendeu-
se agora aos domínios públicos, como testemunha os enúmeros debates na empresa local.
Embora a pressão em favor das Línguas autóctones tenha crescido nos últimos anos, e um
15

significativo segmento da sociedade e da nomeclatura política pareça estar receptivo ao


princípio geral da promoção das línguas autóctones, as autoridades de estado têm tomado
poucas medidas concretas para abordar o problema. Isto apoia a conclusão de que a política
linguística em Moçambique está minada por um dos problemas apontados por Bambose
(1991): “a declaração da política sem a sua implementação", em combinação com uma
espécie de" evasivas” (p. 111).

III.2. Algumas indicações prospectivas


Uma vez que discurso público e o discurso oficial acerca da política linguística em
Moçambique parecem convergir, tal como se mostrou na secção anterior, alguns passos
prospectivos podem ser conjecturados. Tais passos deveriam garantir os seguintes resultados
ao nível da relevância funcional:

 Funcionamento eficiente das instituições do estado;


 Implementação das políticas preconizada pelo estado;
 Oportunidade de participação de todos os cidadãos no sistema nacional.
Ao nível da relevância cultural, a política linguística em Moçambique devera garantir
os resultados seguinte:

 Promoção de um símbolo linguístico unificador;


 Protecção da identidade cultural moçambicana.
Para antigir estes objectivos, a política linguística em Moçambique dever-se-á
procurar uma nacionalização e oficialização equilibradas do Português e das línguas
autóctones. A nacionalização e a oficialização tanto do Português como das línguas
autóctones poderia ultrapassar o principal problema associado ao uso de português como
única língua oficial e como símbolo da unidade nacional, enquanto se impede as línguas
autóctones o acesso aos domínios institucionais, apesar de serem encaradas como depositárias
da herança cultural moçambicana de raiz. Por outras palavras, a ediologia oficial deveria
promover a construção quer dos Português, quer das línguas autóctones como índices das
expressões culturais nacionais moçambicana.

As autoridades dos estados deveriam também estabelecer funções oficiais tanto para o
Português como para as línguas autóctones. Na opinião do autor, tal objectivo poderia ser
antigido se fosse tomadas as seguintes medidas:
16

 Concessão de um estatuto claro (não ambíguo) de língua nacional tanto ao Português


como as línguas autóctones;
 Concessão do estatuto de principal língua oficial em todo território moçambicano ao
Português;
 Concessão do estatuto de língua oficial regional às diferentes lingua autóctones dominante
nas suas áreas.
Como será argumentado nas secções que se seguem, essas medidas poderiam manter
os aspectos positivos e ao mesmo tempo superar os defeitos que têm sido associados à política
linguística seguida de facto em Moçambique. O Português continuaria a ser a principal língua
oficial no país inteiro e se símbolo da unidade nacional. FIRMINO, Gregório (p. 170) afirma
ainda que, receberia por tanto o seu reconhecimento como língua de ligação nacional. Ao
mesmo tempo, as línguas autóctones não só teriam o devido reconhecimento como língua
nacionais, mas também poderiam ganhar acesso nos seus domínios Regionais às actividades
institucionais.

Por outras palavras, estas medidas são parte dos procedimentos da planificação do
estatuto que iria nacionalizar e oficializar tanto o Português como as línguas autóctones.

III.3. Nacionalização do Português e das línguas autóctones


A motivação imediata para considerar o Português e as línguas autóctones como
línguas nacionais está na necessidade de lhe atribuir paridade ao nível do estatuto, o que,
segundo Firmino Grégorio, não é sugerido pela política linguística de facto seguida em
Moçambique. Além do mais, atribuir o estatuto de língua nacional ao Português e às línguas
autóctones seria uma medida que não só preenche uma lacuna legal, mas também tem efeitos
simbólicos que reforçam a consciência de uma Nação-Estado unificada em Moçambique, ao
mesmo tempo que reconhece a diversidade sociocultural do país. De facto, para além da
declaração que na Constituição de 1990 estabelece o Português como a língua oficial em
Moçambique, as autoridades do Estado não tomaram nenhuma decisão legal a respeito de
qualquer outro aspecto da situação linguística no país.

Uma vez que, de acordo com os dados do senso de 1980, a maioria dos
moçambicanos (98,8%) fala pelo menos uma das línguas autóctones como língua materna,
estás línguas têm um papel fundamental na socialização da esmagadora maioria dos
moçambicanos. O universo sociocultural da maioria dos moçambicanos é concebido através e
na base de línguas autóctones. Ademais muitos, moçambicanos constroem a sua identidade
17

principalmente através do valor simbólico das línguas autóctones, como veículo das tradições
culturais genuínas.

A concessão do estatuto de línguas nacionais a estás línguas seria um reconhecimento


oficial deste facto. Com efeito, trata-se de uma anormalidade a não concessão do estatuto de
línguas nacionais a línguas que a vasta maioria dos cidadãos vêm como veículos das suas
tradições culturais genuínas.

A associação da identidade sociocultural moçambicana apenas com as línguas


autóctones, excluindo o Português, podem, no entanto, ser inexacta. A história do uso do
Português em Moçambique, a seguir da sua promoção como língua da unidade nacional
mostra que ela tem sido um instrumento de reforço do sentimento de pertença comum
(Anderson, 1991 [1983]).

Conforme referido anteriormente, os autores sociais em Moçambique usam o


Português para se incluírem numa comunidade nacional moçambicana. Assim, o Português é
um factor determinante na construção social de uma comunidade pan-étnica definida pelo seu
uso; identifica Moçambique como um país. Transcendeu já o papel de uma pragmática língua
que serve como elo de ligação, escolhidas por razões práticas, e está a tornar-se uma língua
culturalmente endogenizada. Para mais, torna-se irónico que uma língua considerada pelo
discurso oficial e pelo discurso público como símbolo de unidade nacional não seja
reconhecida como língua nacional.

A situação sociocultural e linguística de Moçambique torna impraticável o pressuposto


de que uma, língua nacional devia ser uma e única língua ou necessariamente uma das línguas
autóctones, como por exemplo, prevê Bamgbose no seu modelo de três línguas. Antes, o caso
de Moçambique assemelha-se ligeiramente a sugestão de Laitin (1992) de que “uma língua
exógena pode servir como símbolo nacional”. De facto, Laitin (1992) até indica, por exemplo,
que o Português em Moçambique é uma língua "nacional" (p.133).

Assim, o caso de Moçambique mostra também que o papel de língua nacional não
precisa de ser atribuído a uma língua, seja uma língua autóctone ou uma língua ex-colonial.
Como se referiu nesta sessão em Moçambique, tanto às línguas autóctones como o Português
deviam ser, vistas como línguas nacionais, pois fora nacionalizadas de formas distintas mas
complentares:
18

 As línguas autóctones, por serem nativas da realidade moçambicana e estarem associadas


às tradições africanas;
 O Português, devido as funções que lhes são atribuídas pelo discurso oficial e por causa da
sua apropriação social (isto é, nativização).

III.4. Oficialização do Português e das línguas autóctones


Apesar de a maioria da população moçambicana não falar Português, está é a língua
com o maior grupo de falantes espalhados por todo o país, principalmente entre às elites
escolarizadas. Estás elites adquiriram a língua através da instrução escolar e do seu trabalho
em instituições oficiais. Assim, as línguas autóctones estão em desvantagem relativamente ao
Português em termos de associação as elites escolarizadas ou ao mesmo em termos de
neutralidade no contexto da diversidade multiétnica do paí. Para além do mais, o Português
facilita a mobilidade docial e o prestígio social daí resultante.

Este conjunto de factores fazem do Português um perfeito candidato ao papel de


língua oficial nacional, o que, conforme referido pelo autor nas sessões anteriores, foi
sancionado pelas autoridades e consensualmente aceite pela sociedade, especialmente pelas
elites. O Português não só é a língua oficial de Moçambique de júri como também foi
acolhido pela sociedade como uma opção natural e lógica para está função.

Não obstante o facto de o Português ser o melhor candidato para essa função, muitos
cidadãos sem um conhecimento razoável da língua são postos fora do sistema nacional. Eles
são desencorajados de articular adequadamente os seus pontos de vista, porque não entendem
ou não conhecem a língua do sistema nacional. Dado que estes cidadãos são apenas fluentes
nas línguas autóctones e, para muitos deles, a possibilidade da aprendizagem do Português no
futuro próximo é irrealista, o seu acesso aos domínios oficiais e aos “produtos” facultados
pelo estado só pode ser facilitado pelo uso das línguas autóctones.

Recentemente, as decisões sobre política linguística têm sido vistas não só em termos
de unificação dos mercados linguísticos, o que enfatiza as políticas integracionistas e as
ideologias de assimilação, mas também em termos de preservação dos direitos linguísticos em
conformidade com a ideológia do pluralismo linguístico e da vernacularização. A segunda
perspetiva vê a diversidade linguística em conexão com orientações do tipo língua-como-
recurso, língua-como-direito e direito-á-língua (Akinnaso 1994), bem como em conexão a
19

legitimação dos estados após-coloniais através do aumento da eficiência do governo e da


participação popular ( Phillipson & Skutnabb-Kangas 1994).

De acordo com a proposta do autor Firmino Grégorio, a unificação linguística poderia


ser seguida em Moçambique com a oficialização do Português a um nível nacional e a
oficialização de línguas autóctones ao nível regional/local. A oficialização de línguas
autóctones poderia também responder às preocupações com os direitos linguísticos, de acordo
com a ideológia do pluralismo linguístico e da vernacularização. Ou seja, a unificação
linguística não implica uma unificação do mercado linguístico através do uso de uma única
língua. Pelo contrário, encarra-se uma situação em que a participação no sistema nacional não
é limitada ao acesso desigual aos recursos linguísticos. Por esta razão, propõe-se o uso de
diferentes línguas conhecidas pelos cidadãos em diferentes actividades sociais, isto é, o
Português e as línguas autóctones.

A distribuição regional e a predominância de cada língua autóctone é limitada a áreas


específicas do país, onde o Estado deveria autorizar o seu uso como línguas oficiais regionais.
Uma das razões para apresentar os dados sobre as línguas autóctones faladas nos diferentes
distritos do país foi a de permitir comparações no tocante à distribuição regional de todas elas.
Assim, mostrou-se que cada língua autóctone identificada no Censo de 1980 tem o domínio
regional onde virtualmente todos os residentes a usam como uma língua nativa.

Há razões para crer que no domínio regional de uma língua autóctone é muito difícil a
penetração de qualquer outra língua autóctone. As línguas autóctones estão associadas a
domínios intra-étnicos da interação social, embora em algumas áreas, especialmente em
centros urbanos, algumas delas sejam usadas na comunicação interétnica. Em muitas áreas
rurais uma das línguas autóctones é o principal, se não o único, instrumento de comunicação,
o que apoia a assunção de um alto grau de monolinguismo nessas áreas. O facto de as
percentagens de falantes de algumas línguas autóctones serem relativamente altas a nível
nacional ou mesmo em algumas áreas regionais diz pouco sobre a sua aquisição e o seu uso
por falantes nativos de outras línguas autóctones.

A hipótese de um alto grau de monolinguismo nas línguas autóctones implica que


podem ser alocados domínios regionais exclusivos para todas as línguas, independentemente
da percentagem de falantes que cada um possa ter no país como um todo. As tabelas e os
gráficos apresentados, corroboram este facto. Os domínios regionais representam um espaço
territorial onde uma língua autóctone específica é predominante. Muitos dos residentes que
20

consideram esse espaço territorial como a sua terra irão, em geral, falar a a respectiva língua
autóctone como sua língua nativa e vê-la-ão como a sua terra como endógena a essa área.

Mas ainda, muitos dos residentes irão considerar qualquer outra língua falada na zona
como pertencendo a outro domínio regional e os respectivos falantes como recém-chegados
ou não originários. Sociolinguísticamente, os domínios regionais podem ser vistos como áreas
onde uma língua autóctone tem o seu "habitat" natural, de tal forma que, inter alia:

 O seu uso é não-marcado;


 É normalmente aprendida por aqueles que se mudam para essa área;
 A ocorrência de mudança de língua resulta na sua aquisição e perda ou enfraquecimento
do conhecimento da língua que não é da área;
 Os empréstimos ao Português e a mistura linguística e alternância de código valem-se dos
seus recursos lexicais.

III.5. Possíveis Línguas Regionais


Tomando em conta os dados do Censo 1980, conforme reportado em os Distritos em
Números, publicados pelo concelho coordenador do recenseamento (1983b), os distritos e as
cidades em que cada uma das línguas autóctones faladas em Moçambique é predominante
podem ser localizados. Estes distritos e cidades representam o domínio regional das diferentes
línguas autóctones. As tabelas que se seguem (6.1-6.10), organizada por província, mostram
os domínios regionais que podem ser hipostaseados para as diferentes línguas cada tabela
indica as línguas largamente faladas em cada província e os distritos e/ou cidades em que
seus falantes nativos são numericamente predominantes.

Insere-se também entre parênteses os distritos ou cidades em que uma língua


autóctone tem uma percentagem relativamente alta de falantes nativos e, portanto, pode
funcionar como uma língua segunda regional. Para facilitar o entendimento dos dados que
guiaram a identificação das línguas regionais, recorda-se também as tabelas com as
percentagens de falantes nativos das diferentes línguas autóctones e os gráficos que
representam a predominância de cada uma delas nas diferentes províncias e distritos.

III.5.1.Província de cabo Delgado


TABELA 6.1

Línguas regionais nos distritos/cidades de Cabo Delgado


21

Macua Maconde Mwani


Cidade de Pemba (Mocomia) Ibo
Ancuabe Mocímboa (Mocímboa)
Chiúr Mueda (Quissanga)
Mocomia Palma (Palma)
Mecúfi
Meculo
Montepuez
Namuno
Pemba
Quissanga

III.5.2.Província de Niassa
TABELA 6.2

Línguas regionais nos distritos/cidades

Macua Yao Nyanja


Amaramba Cidade de Lichinga Lago
Majune Lichinga
(Mandimba) (Majune)
Manupa Mandimba
Maúa Mavago
Macanhelas Mecula
Cidade de Lichinga Sanga
(Lago)

III.5.3.Província de Nampula
TABELA 6.3
Línguas regionais nos distritos/cidades de
Macua Koti
Cidade de Nampula (Angoche)
Cidade de Nacala
22

Angoche
Eráte
Ilha de Moçambique
Maiaia
Malema
Meconta
Mecubúre
Memba
Megovolas
Moma
Monapo
Mongicual
Mossuril
Muecate
Murrupala
Nacala
Nampula
Ribaué
23

IV. CONCLUSÃO

Após a apresentação da política linguística que problematiza a identidade nacional, são


tecidas as considerações à volta da situação linguística de Moçambique, abordou-se questões
relativas à definição de uma política linguística para o país. Defendemos uma política que
mantenha o equilíbrio entre as línguas de Moçambique usadas dentro do território nacional,
através da sua equiparação ao nível estatutário, embora o português deva também ser
considerado como língua oficial principal do país. Conluímos também que as línguas
autóctones deviam ter acesso a contextos institucionais
24

V. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FIRMINO, Gregório (2006). A apropriação da língua portuguesa no Moçambique pós-


colonial. In A questão linguística na África pós-colonial: O caso do Português e das linguas
autóctones em Moçambique (pp.123-128). Maputo: Texto Editores

Você também pode gostar