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SUMÁRIO

GT 08
LINGUAGENS, LETRAMENTO E ALFABETIZAÇÃO
ISBN: 978-65-86901-84-9

DOI: 10.46943/VIII.CONEDU.2022.GT08.015

PRÁTICAS DE ENSINO DE PRODUÇÃO


TEXTUAL E ANÁLISE LINGUÍSTICA NA
ESCOLA: OS SABERES DOCENTES EM AÇÃO

Sirlene Barbosa de Souza


Professora Adjunta do Curso de Licenciatura em Pedagogia – Universidade Federal
Rural de Pernambuco – UFRPE, [email protected];

Abda Alves Vieira de Souza


Professora Adjunta do Curso de Letras e Pedagogia da Universidade de Pwrnambuco
- UPE, [email protected];

RESUMO
O ensino da língua escrita na escola deve possibilitar ao indivíduo uma
melhor comunicação, tanto oral como escrita, em diversas situações
de uso, bem como o desenvolvimento da capacidade de refletir sobre
a própria língua. Nessa conjuntura, o trabalho com a análise linguística
deve acontecer de forma articulada ao ensino da leitura, da oralidade
e da produção de textos, buscando-se, desse modo, superar uma tra-
dição centrada na memorização de regras como um fim em si mesmo
e o rompimento com a artificialidade quanto ao uso da linguagem na
sala de aula. Assim, nesse estudo temos como objetivo refletir sobre a
construção das práticas pedagógicas de duas professoras que leciona-
vam nas séries iniciais do ensino fundamental, envolvendo atividades
de produção textual e o ensino de alguns conteúdos pertendecentes às
práticas de análise linguística semiótica. Como discussão teórica, nos
apoiamos nas ideias de autores contemporâneos que buscam refletir
sobre o ensino da gramática e de produção de textos na escola e as
metodologias adotadas pelos docentes em suas práticas pedagógicas.
Numa abordagem qualitativa a pesquisa foi realizada em duas escolas
da rede pública de ensino das cidades do Recife e de Olinda/PE. Para

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coletarmos os dados, realizamos observações participantes e entrevis-


tas semiestruturadas, durante todo o processo investigativo, no interior
das salas de aula. Os dados apontaram, os constantes movimentos
e esforços das professoras de aproximar o ensino referente ao eixo
da análise linguística daquilo que vem sendo apregoado a partir das
mudanças/transformações originadas nos anos 1980: o texto como
objeto principal do ensino de língua e o ensino da análise linguística
atrelado ao texto.
Palavras-chaves: Produção de textos. Ensino de análise linguística;
Fabricação docente.

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INTRODUÇÃO

PARA INICIAR A CONVERSA...

N
o Brasil, nas últimas décadas, o ensino de Língua Portuguesa
na escola vem sofrendo reestruturações, passando por
redefinições bastante marcantes quanto à sua concepção
e objetivos. Tais mudanças têm ocorrido tanto no âmbito do saber
acadêmico, como nos textos do saber, repercutindo nas prescrições
para o tratamento da produção de textos e da análise linguística,
configurando-se, ainda que de forma tímida, em novas propostas
curriculares e, por conseguinte, influenciado, de uma forma ou de
outra, a prática pedagógica (SILVA, 2008).
Atualmente, pretende-se que o ensino do português se realize
através de práticas de leitura e de produção de textos em situações
o mais possivelmente reais e concretas de interlocução e através
da prática de análise desses textos lidos e produzidos, ampliando
os conhecimentos que o aluno já possui, conhecimentos esses
vinculados às suas práticas linguísticas, culturais e sociais, viven-
ciadas dentro e fora da sala de aula (BATISTA, 1991; LEDUR, 1996;
TRAVAGLIA, 1999 & GERALDI, 2003).
Uma vez que compartilhamos da ideia de que o ensino da lín-
gua deve possibilitar ao indivíduo uma melhor comunicação tanto
oral como através da escrita em diversas situações de uso e o
desenvolvimento da capacidade do usuário de refletir sobre a pró-
pria língua, entendemos que o trabalho com os eixos de ensino da
Língua Portuguesa (oralidade, leitura, produção de textos e análise
linguística) devem acontecer de forma articulada, a fim de superar
uma tradição de ensino centrada nos aspectos gramaticais , ou seja,
na memorização de regras como um fim em si mesmo (GERALDI
2003a). Desse modo, as práticas de ensino devem ter como prin-
cipal objetivo o rompimento com a artificialidade quanto ao uso da
linguagem que se instaura na sala de aula, oportunizando assim, a
aquisição e o domínio efetivo da língua padrão tanto na modalidade
oral como escrita.
Em relação ao trabalho de produção de textos na escola –
antes denominada redação – compreendeu-se que o seu objetivo
deve ser o de desenvolver no aluno uma competência discursiva,

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marcada por um bom domínio da modalidade escrita sem, no


entanto, criar situações artificializadas possibilitando o usuário da
língua utilizar os recursos linguísticos que julga mais apropriados
para a manifestação verbal, aqueles que melhor atendam aos seus
objetivos.
Dentro desse contexto, buscamos refletir sobre a construção
das práticas pedagógicas de duas professoras que lecionavam
nas séries iniciais do ensino fundamental, envolvendo atividades
de produção textual e o ensino de alguns conteúdos pertencentes
às práticas de análise linguística semiótica, conforme preconiza a
BNCC (2018).

Entre o ensino de gramática e as práticas de análise


linguística

O trabalho com a gramática normativa/prescritiva, objeto de


ensino da Língua Portuguesa na maioria das escolas brasileiras,
tem sido um assunto de grande polêmica e tem dividido opiniões,
sobretudo de professores, quanto à importância/validação do seu
ensino para a formação de leitores/escritores proficientes.
Sabe-se que hoje, o principal objetivo do ensino de língua
materna é o desenvolvimento da capacidade de comunicação
tanto oral como escrita do usuário de uma língua que ele mesmo já
domina, no entanto, o que se vê nas escolas ano após ano, é que ela
tem se preocupado em ensinar a forma “correta” de falar e escrever
e busca fazer isso através de regras e exemplos tidos como bons
para serem imitados na expressão do pensamento (LEDUR, 1996).
Desse modo, o objetivo do ensino de língua materna era cumprir
um programa pré-estabelecido, mas que não leva em conta as difi-
culdades dos sujeitos envolvidos no processo nem o uso efetivo da
língua numa situação de interação verbal.
Mesmo em face dessas questões, não é lícito afirmar que a
gramática não deve ser ensinada; na verdade, temos que nos
perguntar sobre “para que e como ensiná-la”. Mendonça (2006)
corroborando com Geraldi (2003) pontua que o termo análise lin-
guística “surgiu para denominar uma nova perspectiva de reflexão
sobre o sistema linguístico e sobre os usos da língua” (p.205).

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Assim, corroborando com a autora supracitada, esse autor


esclarece que a análise linguística seria ao lado da leitura e da
produção de textos, a unidade de ensino em que se analisam os
recursos expressivos da língua, considerada esta como uma produ-
ção discursiva.
Vale salientar que, no ensino da análise linguística, o trabalho
com a gramática normativa não está descartado, pelo contrário.
Porém, não se constituí como seu objeto de ensino, está sim, englo-
bada no ensino assim como outros aspectos, mas num paradigma
diferente, já que os objetivos a serem alcançados são outros.
Levando em consideração que as crianças, antes mesmo de
frequentarem a escola, já fazem uso da gramática e o falante usa
as regras gramaticais, mesmo sem saber identificá-las, pois é capaz
de operacionalizá-las ou pensar sobre elas, além de derivarem
regularidades presentes no sistema gramatical, o ensino da gra-
mática tradicional perde completamente a sua relevância (MURRIE,
1994). Partindo do pressuposto, de que o estudo puro e simples
da gramática não é condição para a formação de leitores e escri-
tores competentes, conclui-se que a aquisição da linguagem e a
organização do discurso se darão a partir da vivência de diferentes
práticas simbólicas. Para Ledur (1996) é mergulhada no texto que
a criança naturalmente conhecerá a gramática; é com criatividade
que o professor fará com que o aluno encontre na leitura e na prá-
tica do texto escrito o prazer de aprender e dominar o idioma.
Conforme o autor referendado, Geraldi (2003) e Travaglia
(1999), a transformação do ensino da língua materna, no sentido
de um trabalho que possibilite ao aluno apropriar-se dos recursos
expressivos da língua de forma reflexiva, significativa e contextuali-
zada, não é uma tarefa simples, mas possível e fundamental para a
formação de escritores proficientes.

Produção de textos: construção de significado(s) e


condições de produção

Até a década de 1970, as práticas de leitura e escrita consis-


tiam no uso e na produção de textos curtos, construídos com as
famílias silábicas. Tratava-se de textos vazios de significação, na
maioria das vezes um amontoado de frases, enfim, textos que não

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existiam fora do ambiente escolar. Com isso, passava-se aos alunos


a ideia de que “ler e escrever não tem função fora da escola”. As
crianças não viam praticidade ou utilidade nesses atos e o trabalho
com a leitura e a escrita centrava-se unicamente na codificação e
decodificação de palavras e frases.
Apesar de nos anos 1980, com a virada pragmática no ensino
de Língua Portuguesa, o texto vir a se tornar o objeto de estudo
dessa disciplina, o que se tem assistido ao longo dos anos, na maior
parte das escolas brasileiras, é que o trabalho com o texto tem se
constituído como “gancho” pra se trabalhar aspectos gramaticais
e não como condição de produção de sentidos. Sobre esse fato,
Mendonça (2006) aponta que alguns professores, ao afirmarem
trabalhar com a gramática de forma contextualizada, parecem
estar, na verdade, mascarando uma prática de análise morfossin-
tática de palavras, expressões ou períodos abordados a partir do
texto, ou seja, o trabalho com a texto parece estar servindo de pre-
texto para o trabalho da análise da gramática tradicional. Dessa
forma, as práticas de produção de texto têm servido para avaliar
as competências linguística dos alunos, quase que exclusivamente,
quanto aos aspectos gramaticais, sem levar em consideração o
objetivo fundamental dessa prática, que é o de formar escritores
competentes, que façam uso da escrita para interagir nos diversos
contextos em que ela está inserida.
É necessário, portanto, desde as séries iniciais, conscientizar
o aprendiz de que o ato de escrever pressupõe, segundo Geraldi
(2003) a existência de cinco aspectos a serem considerados: ter o
que dizer; ter motivos para dizer o que se tem que dizer; ter um inter-
locutor; constituir-se como interlocutor enquanto sujeito que diz o
que diz para quem diz; e escolher as estratégias certas para reali-
zar estas ações. De posse dessas informações, o aluno-escritor terá
mais condições de elaborar melhor um texto.
Ao dar início ao processo de produção de um texto se faz
necessário entender que ele é uma unidade de linguagem em uso,
isto é, que escrever é o ato de produzir textos em uma situação
real de comunicação. Para formar um escritor competente é pre-
ciso apostar numa proposta educativa com base no diálogo, na
formação de cidadãos que tenham liberdade para ler, escrever e
interpretar o mundo, para refletir e criticar a realidade. Ao entrar

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na escola o aluno já apresenta uma enorme bagagem de conheci-


mentos prévios, e é utilizando esse saber extraescolar como ponto
de partida que o professor o ajudará a ampliar seu potencial lin-
guístico. Quanto mais as crianças convivem em ambientes letrados
antes e depois de iniciar a educação formal, mais cedo elas se moti-
vam para escrever. A vivência com diversos textos irá ajudá-las a
conhecer e a interagir com diferentes tipos, possibilidades e mani-
festações da língua escrita.
Escrever é interagir. Geraldi (2003) afirma que interage aquele
que tem o que dizer (sequência de afirmações em relação ao mundo
que o cerca), a quem dizer (interlocutor real), o porquê e o para quê
dizer (objetivos a que se propõe e aos assuntos tratados). O aluno
deve adquirir progressivamente uma competência em relação à lin-
guagem, a fim de que possa resolver problemas da vida cotidiana,
ter acesso aos bens culturais e alcançar a liberdade de uma parti-
cipação no mundo letrado, para que possa assumir a sua própria
palavra produzindo textos coerentes, coesos e eficazes.

Produção de textos e análise linguística: tecendo


conexões

Ao iniciar o trabalho de produção de textos, é necessário com-


preender que a aprendizagem da língua não se faz rompendo com a
oralidade do aluno. Segundo Nóbrega (2000), aprender a escrever
é quase que aprender uma outra língua, já que a escrita não corres-
ponde à fala de ninguém. A criança precisa conhecer as diferenças
existentes entre a língua que ela fala e a língua escrita, é escrevendo
que vai aprender a escrever, é participando de situações comunica-
tivas a distância que construirá as representações de como escrever.
É preciso, se ter em mente, ainda, que ao produzir um texto, esse
processo não começa e termina com as primeiras e últimas pala-
vras registradas - ele é decorrente de um curso de eventos cujas
atividades antecedem a produção (desencadeamento) e vai além
da produção escrita propriamente dita (repercussão).
Desse modo, faz-se necessário que o aluno conheça os ele-
mentos que caracterizam um texto, que fazem dele uma ocorrência
linguística escrita ou falada, de qualquer extensão, dotada de uma
unidade sócio comunicativa, semântica e formal (Costa Val, 1991).

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Propor atividades que antecedam a produção do texto escrito


possibilita ao aluno pensar, refletir, coletar informações sobre o tema
proposto, sobre o gênero a ser produzido, a estética adequada ao
texto que se pretende escrever... Tais atividades podem centrar-se,
ainda, no diálogo, no levantamento dos conhecimentos prévios, na
leitura, nos exercícios escritos, nas dramatizações, etc.
Outro fator imprescindível que oportuniza ao aluno refletir
sobre a língua é o trabalho de revisão, reescritura e avaliação do
texto. Muitas vezes o aluno costuma escrever seu texto sem ter feito
um esboço, sem pensar sobre o que vai apresentar – contenta-se
com uma única versão. É necessário que ele rascunhe o que está
pensando, que perceba a “provisoriedade dos textos” e que reflita
sobre o que está produzindo, analisando todo o processo de (re)
escrita. A revisão de texto permite ainda ao produtor ver seu texto
numa outra perspectiva uma vez que ao produzir inicialmente tem
sua atividade reflexiva voltada para determinados aspectos que
após serem revistos ele poderá centrar seus esforços em ques-
tões mais pertinentes ao plano textual discursivo, além de focalizar
questões relativas às normas gramaticais e às convenções gráficas
para que reflitam sobre possíveis alternativas de grafia, comparem
com a escrita convencional e tomem progressivamente consciência
do funcionamento da ortografia.
Segundo Rocha (1999), a reescritura de um texto oportuniza
a criança a reelaborar concepções acerca da estrutura do texto,
reescrevendo-o, ela pode analisá-lo e verificar se faltam ou não
informações, se a letra está legível, se a estética e a estrutura estão
adequadas.
Acreditamos que as habilidades necessárias que devem adqui-
rir o escritor são construídas ao longo do tempo, o aluno aprende
a escrever, escrevendo sendo ensinado a fazê-lo. Através das prá-
ticas de leitura e de produção de textos ele terá condições reais de
desenvolver seu potencial crítico-reflexivo, adquirindo novas formas
de expressão e interação com seu interlocutor de maneira adequada
e criativa; assim, um texto escrito é o resultado de um processo em
que ocorreu a transformação de um significado em forma.

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METODOLOGIA

Nesse estudo, investigamos as práticas de ensino de duas


professoras que lecionavam em turmas do 5º Ano do Ensino
Fundamental, com o objetivo de conhecer e refletir sobre a cons-
trução das suas práticas pedagógicas no tocante às atividades de
produção textual e o ensino de alguns conteúdos pertencentes às
práticas de análise linguística semiótica. Destacamos que a escolha
por esses anos se deu porque, em se tratando do ensino da aná-
lise linguística, esse trabalhado fica mais evidente nas séries mais
avançadas, uma vez que, nas séries iniciais, o trabalho com a língua
escrita encontra-se mais voltado para a aquisição da escrita, pro-
priamente dita.
As observações das aulas das professoras ocorreram em duas
escolas distintas, sendo uma delas, pertencente à rede de ensino
municipal da cidade de Recife/PE e, a outra, à rede municipal de
Olinda/PE. Foram realizadas um total de 12 observações na sala de
aula da professora Elieci e 10 observações na classe da professora
Ana, no período compreendido entre os meses de agosto a novem-
bro de 2009.
Nesse estudo, optamos pela abordagem qualitativa por essa
envolver a apreensão de dados descritivos, os quais são obtidos
no contato direto do pesquisador com a situação estudada, retra-
tando, desse modo, a perspectiva dos sujeitos que dela participam
(BOGDAN
BIKLEM, 1982). Também fizemos uso de alguns instrumentos
de coleta de dados da etnografia da pesquisa escolar, etnografia
essa que, desde o final da década de 1970, vem ganhando cres-
cente aceitação na área de Educação. É importante destacar que,
o termo “etnografia” ao adentrar no campo educacional, sofreu
adaptações, o que o afastou um pouco, do sentido original adotado
por antropólogos e sociólogos, obtendo assim, um sentido próprio
(ANDRÉ, 2005).
Com o objetivo de conhecermos mais de perto a forma pela
qual as professoras construíam as suas práticas de ensino e as ati-
vidades que propunham para o trabalho com a análise linguística
e a produção de textos, fizemos a opção pela observação partici-
pante pelo fato de esta possibilitar “um contato pessoal e estreito do

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pesquisador com o fenômeno pesquisado” (LÜDKE & ANDRÉ, 1986,


p. 26) e por estarem relacionadas “à valorização do instrumental
humano, característica da tradição etnográfica” (ALVES-MAZOTTI
& GEWANDSZNADJER, 1999; p. 166).
Para tal, fizemos uso de gravação em áudio e de anotações no
diário de campo. Durante a entrevista com as docentes, solicitáva-
mos às mesmas que explicitassem as suas opções tanto em relação
aos assuntos abordados e aos materiais e recursos didáticos uti-
lizados como em relação às metodologias adotadas na condução
das atividades.

Quem eram as professoras investigadas?

A professora Elieci1 à época, lecionava em uma escola perten-


cente à rede municipal de Recife. Na ocasião da realização da coleta,
a docente estava com 38 anos de idade e atuava como professora
polivalente (pelo oitavo ano consecutivo) em turmas de 5º Ano nos
turnos da manhã e da tarde, ambas na mesma escola, totalizando
40 horas semanais de regência. Por ocasião da entrevista, ela nos
informou que estava no exercício do magistério desde 1997 e que
havia cursado o magistério na Escola Estadual de Olinda no período
de 1992 a 1996, possuía licenciatura plena em Letras (curso iniciado
em 1998 e concluído no ano de 2002).
A docente nos contou que a admiração que tinha desenvol-
vido por um de seus professores da disciplina de Língua Portuguesa
a havia imensamente motivado e auxiliado na aprendizagem dos
conteúdos gramaticais e que o estudo das regras e de seus usos
era muito “desafiador”. Ainda segundo ela, foi a prática desenvol-
vida pelo seu antigo professor (embasada no ensino da gramática
normativa) que lhe possibilitou o ingresso imediato na universidade.
A segunda professora investigada, Ana, no período da nossa
coleta estava com 32 anos de idade e trabalhava como professora
polivalente nas redes de ensino de Jaboatão dos Guararapes e de
Olinda, ambas em Pernambuco. Na rede de Jaboatão, ela lecionava
em uma turma de EJA no período noturno e na rede de Olinda, por

1 Salientamos que a explicitação dos nomes das professoras nesse trabalho foi uma opção
das mesmas.

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sua vez, ministrava aulas em uma turma do 5º Ano, no horário da


tarde, perfazendo nas duas redes de ensino, um total de 40 horas
de regência semanais.
A docente possuía uma experiência de 15 anos de regência
em salas de aula, iniciada em 1995, todos eles exercidos no sistema
municipal de ensino. Ana nos informou que havia concluído o magis-
tério no ano de 1994, na Escola Estadual de Olinda e que já no ano
seguinte, submeteu-se ao vestibular da UFPE, onde foi aprovada
para cursar Pedagogia, curso esse, concluído no ano de 2000. No
mesmo ano em que ingressou na universidade, a docente afirmou
que se submeteu ao concurso público para professores da rede de
ensino de Jaboatão dos Guararapes, que foi aprovada e deu início
à sua carreira docente, conforme pontuamos anteriormente. Ana
especializou-se em Gestão Escolar pela mesma instituição que fez
sua graduação e concluiu o curso no ano de 2002. Sobre a sua opção
pela formação acadêmica que possui, afirmou que suas escolhas se
pautaram no desejo de se especializar na área que atuava.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nessa seção, apresentaremos alguns resultados acerca dos


doados por nós coletados. Buscaremos refletir sobre as atividades
de produção de textos propostas pelas professoras em suas salas
de aula e como estas se aproximavam/afastavam-se da proposta
de um ensino articulado entre com o trabalho de análise e reflexão
sobre a língua.
Com a intenção de conhecermos, analisarmos e refletirmos
sobre as práticas de ensino desenvolvidas pelas docentes iniciare-
mos apresentando algumas colocações das docentes em relação
às suas concepções de língua e ao trabalho com a língua portu-
guesa nas suas classes, como um todo e, sobre o ensino da análise
linguística e produção textual, de forma particular.

O que pensavam e diziam as professoras?

Quando indagada quanto aos objetivos que possuía ao tra-


balhar Língua Portuguesa em sua sala de aula, a professora Elieci
pontuou que o seu ensino deve ter como objetivo principal, levar os

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alunos a ler e escrever corretamente e acrescentou que buscava


trabalhar, principalmente, as regras gramaticais e a ortografia com
seus alunos porque acreditava que o domínio de tais habilidades
oportuniza o aluno a escrever bem e corretamente, condição essa,
fundamental para que o indivíduo “sobreviva” no mercado de traba-
lho competitivo como o nosso.
“Acho que é indispensável ensinar as regras e a questão da orto-
grafia aos alunos para que eles possam aprender a escrever
certo. Numa redação pra conseguir uma vaga de emprego, né?
Por exemplo... quem não sabe escrever certo, tem um bocado de
erro... já tá desclassificado, né?”

Em relação ao ensino dos conteúdos gramaticais, ela declarou:


“É preciso trabalhar os aspectos da gramática para que os alu-
nos saibam a forma adequada de se escrever. Hoje em dia existe
uma discussão de que não se deve ensinar gramática, mas nos
concursos públicos, nos vestibulares... ela é cobrada.e aí? Se os
meninos não souberem?... Os meninos têm que saber pronome,
verbo, plural... a questão da pontuação... essas coisas... Agora, o
ensino da gramática deve acontecer de forma contextualizada...
dentro do texto...”

A fala de Elieci parece confirmar a ideia de Batista (1991) de


que a gramática normativa tem sido vista, ao logo dos anos, como
a responsável por orientar as práticas linguísticas, com o objetivo
de tornar mais eficaz à comunicação dos usuários tanto oralmente,
como através da escrita.
A docente afirmou, ainda, acreditar no trabalho com a gramá-
tica de forma contextualizada, a partir do texto, no entanto, o que
evidenciamos através de exemplos que a mesma apresentou sobre
como fazia para trabalhar nessa perspectiva em sua sala de aula,
podemos perceber que o texto parece estar servindo como pre-
texto para trabalhar aspectos gramaticais, como aponta Mendonça
(2006).

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“Eu faço assim... por exemplo, eu trabalho o texto, faço a leitura,


converso com eles (alunos), faço perguntas sobre a história, sobre
o gênero, o autor, perguntas de compreensão e SÓ (pronuncia
com bastante ênfase) depois é que eu trabalho a gramática...
peço pra eles procurarem palavras com certo número de sílabas,
classificarem algumas frases... se é afirmativa, negativa... aí apro-
veito pra trabalhar a pontuação... identificar se a concordância tá
certa, circular os verbos... tudo dentro do texto e só depois que eu
já trabalhei toda a parte de leitura e compreensão.”

No que concerne ao trabalho com a produção textual, Elieci


explicitou que para propor esse tipo de atividade é necessário criar
condições para que os alunos escrevam sobre o gênero e a temá-
tica que lhe for solicitado. A mestra, discorrendo sobre esse assunto,
elencou que o trabalho com a escrita de textos começa antes e vai
além da escrita propriamente dita.
“Quando a gente pede para o aluno escrever um texto, a gente
tem que dar subsídio pra ele escrever... como é que ele vai falar de
uma coisa que ele não sabe? Primeiro a gente trabalha um texto,
faz leitura, discute e só depois é que pede para eles escreverem.”

Sobre a articulação entre o trabalho de produção de textos e


análise linguística, a docente afirmou que após a escrita dos alunos,
é possível trabalhar os aspectos gramaticais e a coerência do texto,
levando os alunos a refletirem sobre o que escreveram e fazer os
ajustes que forem necessários para a fluidez do mesmo Vejamos,
a seguir, como ela diz trabalhar nessa perspectiva, na sua sala de
aula:
Pedir para as crianças fazerem texto é muito importante porque
é nele que a gente pode ver se eles aprenderam direito, mas isso
a gente faz analisando, pega o texto do próprio aluno pra poder
trabalhar... Por exemplo, eu trabalho a gramática a partir do texto.
Depois que os alunos terminam de escrever os textos, seleciono
alguns deles para escrever no quadro, sem identificar a quem per-
tence. Aí, vou fazendo a correção junto com a classe... Observamos
a ortografia, a pontuação, os parágrafos, os substantivos... se o
plural das palavras tá correto, eu leio o texto do aluno que tá no
quadro e os alunos mesmos já vão dizendo se tá faltando letra
ou se tem alguma letra errada, se o artigo tá combinando ou não
com a palavra... tudo aquilo que a gente viu de gramática pode
ser trabalhado no texto... também observamos se o título está
coerente com o que ele escreveu, se num foge da ideia do texto...
essas coisas.
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Como podemos perceber na fala da mestra, que, embora a


mestra aborde outros aspectos que oportunizem o trabalho de
análise e reflexão da língua, há um privilegiamento dos aspectos
gramaticais. Diante da análise dos dados coletados na entrevista
com a mestra, percebemos a tentativa da mestra em se aproximar
da proposta atual para o trabalho articulado entre os eixos da lín-
gua, mais precisamente, entre o trabalho com a produção textual e
a práticas de análise e reflexão da língua.
A professora Ana, por sua vez, ao apontar os seus objetivos
para o trabalho com a língua materna na sala de aula, afirmou
que sua pretensão era fazer com que os alunos percebessem a
funcionalidade da língua e tivessem a oportunidade de conhecer e
interagir com os diversos textos que circulam socialmente, a fim de
estabelecer uma comunicação mais eficaz entre os seus usuários,
nas mais diversas situações:
“A gente tem que pensar por que é que a língua existe, qual é a
funcionalidade da Língua Portuguesa. Então o menino não está
na escola só pra aprender o substantivo, o adjetivo [...]. Então a
língua tem uma funcionalidade. Primeiro qual o meu objetivo para
o ensino de Língua Portuguesa? É estabelecer uma comunicação
entre as pessoas de uma forma geral... Para que os indivíduos pos-
sam se comunicar, interagir... Então é a linguagem oral e escrita,
para que o indivíduo seja capaz de estabelecer essa comunicação
nas mais diversas situações da vida. O que eu pretendo? Que os
alunos conheçam os diversos textos sociais, né? E que possam
interagir entre eles (indivíduos) de forma lida e de forma escrita, ou
seja, tenha capacidade de conhecer, reconhecer e interagir com
ele, tanto oralmente como por escrito, né? Assim, que eles saibam
qual é a função daquele texto na vida deles. Saber como utilizar
esses diversos textos nas situações do dia-a-dia.

As colocações da professora nos apontam que a concepção


subjacente à sua prática de ensino parece estar baseada numa
perspectiva sociointeracionista da língua. Ao expor suas intenções
para o trabalho com a língua, percebemos que há em sua fala, uma
preocupação em levar os seus alunos a interagir de modo eficiente
nas diversas situações comunicativas vivenciadas no seu dia-a-dia,
levando-os, desse modo, a compreender a função social da leitura
e da escrita.

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Em relação ao trabalho com o eixo da análise linguística na


sala de aula, Ana declarou:
“A gramática tem que ser enfocada, porque quando a gente lê,
quando a gente escreve, tem regra, tem norma... Eu parto do
pressuposto de que o aluno sabendo a gramática vai escrever
melhor e vai cometer menos erros ortográficos, então ele não vai
só organizar esse texto melhor por escrito e oralmente, mas ele
também vai ler melhor, escrever melhor e falar melhor. Eu acho
que aprender as nomenclaturas e os conceitos vai surtir uma
melhor compreensão dos textos orais e escritos”.

As colocações da mestra em relação à aprendizagem de


nomenclaturas e conceitos dos aspectos gramaticais expressas no
último trecho de sua fala parece refletir a tradição que se instau-
rou ao longo da história do ensino de língua em nossas instituições
escolares: a preocupação da escola, ano após ano tem sido a de
ensinar aos discentes a forma “correta” de falar e escrever, atra-
vés de regras e exemplos tidos como bons para serem imitados na
expressão do pensamento (LEDUR, 1996 e TRAVAGLIA, 1997).
No entanto, em outro momento da entrevista, a professora
explicitou que as suas experiências enquanto docente demonstra-
vam que a aprendizagem da gramática não garantia a formação de
bons produtores de textos. Contrariando as afirmações que havia
feito anteriormente, a docente disse acreditar que a formação de
bons leitores e escritores de texto se dava através da prática, dito
em outras palavras, a partir do exercício constante da leitura e da
escrita de textos. Eis o trecho do seu depoimento, a seguir:
“Eu acho que a gramática devia ajudar a escrever mais e escre-
ver melhor, mas a minha experiência tem mostrado que não, que
necessariamente, assim, num tem essa coisa de causa-consequ-
ência: Então estuda muita gramática, sabe muita gramática, sabe
escrever muito bem... eu acho que não tem essa relação de causa
-efeito, não! Eu acho que não garante que os alunos serão bons
leitores e bons escritores, não! A minha prática tem mostrado isso!
Pra você escrever melhor e ler melhor, é um exercício constante.
Se eu quero ler melhor, eu vou ter que tá lendo sempre, se eu
quero escrever melhor, também tenho que tá escrevendo sempre.
Na própria leitura eu vou tá aperfeiçoando tanto a leitura, como
também aperfeiçoando a minha escrita.”

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O fato de a mestra explicitar que em suas experiências docen-


tes o ensino dos aspectos gramaticais não tem atendido ao objetivo
de formar leitores e escritores proficientes, mas ainda assim investir
nesse ensino, parece-nos ter uma estreita relação com a forma de
conceber a língua de um conjunto de formadores de opinião que
atuam no sentido de reforçar os valores de senso comum: “a escola
ensina assim porque a sociedade exige – e a sociedade exige por-
que a escola ensina assim” (BRITTO. 1997; p. 185).
Uma análise mais ampla dos depoimentos das duas docentes
nos leva a corroborar com as afirmações de Chartier (2007) de que
os professores, ao falarem sobre o seu ofício, situam suas ações no
terreno da moral (altruísta ou idealista) e do testemunho pessoal,
em detrimento da avaliação objetiva das mesmas e/ou dos saberes
teóricos.

O que as professoras faziam em suas salas de aula? As


atividades propostas para o ensino da produção textual
e análise e reflexão sobre a língua

Ao explorarem as questões relacionadas ao eixo da análise e


reflexão sobre a língua articulada ao ensino de produção textual,
Elieci e Ana buscavam conciliar em suas práticas os modelos de
ensino tradicional da gramática e o estudo da língua através das
práticas de análise linguística. Tais comportamentos evidenciam o
momento de mudanças/transformações vivenciadas por elas em
relação aos objetivos que possuíam para o trabalho com a língua e
com a gramática, na escola.
Assim, observamos que ao trabalharem com diversos gêneros
textuais, as professoras buscavam criar situações onde a reflexão
acerca dos recursos linguísticos empregados nos textos pudesse
ser suscitada, levando os aprendizes a perceberem os efeitos de
sentido provocados pelos mesmos e sua importância na/apara
a construção do sentido do texto. No tocante ao trabalho com a
produção de textos, as docentes fizeram uso dos momentos de pro-
dução de textos para explorar alguns aspectos linguísticos, os quais
se constituíram como ricas oportunidades para promover a reflexão
sobre os aspectos da textualidade, oportunizando aos alunos em
condições reais, o desenvolvimento do seu potencial crítico-reflexivo

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e de adquirir novas formas de expressão e interação com seu inter-


locutor (GERALDI, 1997).
Percebemos na prática da professora Elieci, um cuidado em
criar condições de produção antes, durante e após a escrita de
textos. As estratégias utilizadas eram variadas e partiam sempre
do levantamento dos conhecimentos prévios dos alunos acerca do
gênero trabalhado - estrutura, finalidade, funcionalidade, suporte
textual, entre outros -, da temática a ser abordada, da explora-
ção de aspectos referentes à textualidade – fatores pragmáticos,
semânticos e formais (COSTA VAL, 1991) -, bem como das dinâmi-
cas de revisão e refacção desses textos.
Vale salientar que ao sugerir atividades de escrita de textos,
a mestra também procurou criar situações de circulação social
para essas produções e de apresentar aos discentes, interlocu-
tores outros para os seus textos que não fossem apenas o grupo
de colegas de sua sala de aula ou ela mesma. Assim, fazendo uso
dessas táticas, Elieci dava conta de discutir alguns elementos apre-
sentados pelos alunos em seus textos, incitando-os a analisarem
suas próprias escritas e refletirem sobre a forma mais adequada
de apresentá-los aos seus leitores, através das práticas de revisão
e refacção dos mesmos.
Consideramos que tal direcionamento se configura como uma
rica oportunidade para, entre outras coisas, oportunizar aos alu-
nos a percepção sobre a função social da escrita. Em relação à
dinâmica de reescritura dos textos, Rocha (1999), explicita que tal
atividade oportuniza a criança a reelaborar concepções acerca da
sua estrutura, reescrevendo-o ela pode analisá-lo e verificar se fal-
tam ou não informações, se a letra está legível, se a estética e a
estrutura estão adequadas, se o emprego dos recursos linguísticos
está adequado, etc.
Outro ponto que merece destaque, diz respeito ao fato de que
nenhuma atividade de produção textual por ela proposta, aconte-
ceu de forma isolada. Pelo contrário! Estas eram resultados de uma
sequência de atividades que ela vinha propondo com um determi-
nado gênero e/ou temática discutida. Vejamos a seguir, como Elieci
conduziu uma dessas atividades em sua sala de aula:
• A professora Elieci, após a leitura e da exploração oral e
escrita da história “Um passeio no passado”, separou os

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alunos em grupos e entregou-lhes alguns folhetos informa-


tivos do DETRAN para que lessem e discutissem entre si, as
informações neles contidos.

P: Agora dando continuidade ao nosso projeto do trânsito2, nós


vamos fazer uma atividade em grupo. Cada grupo vai rece-
ber um folheto informativo desse aqui. Então, cada um tem
um título diferente, por exemplo, esse daqui tem: “Pequenos
pedestres, grandes cuidados”. Então o que vocês vão fazer?
Vão ler o que tem de informação nesse folheto, vão discutir
com o seu grupo o que acham que de mais importante tem
aqui que você pode repassar para a sua turma como orien-
tação. Nós ouvimos aqui as duas histórias, a da cidade de
Paraíso, num foi? E a viagem ao passado de Teco, né?

T: Foooooiiiii!

P: Teco viajou no passado e fez essa comparação: como era


o trânsito no passado e também a cidade de Paraíso com a
cidade de Piração. Então para que esses folhetos? Para que a
gente aprofunde mais os conhecimentos sobre como melhorar
o comportamento no trânsito, e tem essas informações aqui,
certo? Cada grupo vai receber um tipo diferente.

A: Tia, não entendi direito...

P: A atividade vai ser a seguinte: Vocês vão ler o texto, vão


discutir com o seu grupo quais são as informações que vocês
acham mais necessárias repassar para a turma, porque cada
grupo depois, vai confeccionar um cartaz com essas infor-
mações e vai apresentar para a turma toda, entenderam?
Vai repassar essas informações, de acordo com o tema do
folheto que vocês estiverem trabalhando. Esse aqui, por exem-
plo, é “Pequenos pedestres, grandes cuidados”, já esse aqui é

2 A escola onde Elieci trabalhava estava envolvida em um projeto sobre a conscientização


acerca dos cuidados no trânsito desenvolvido pelo DETRAN em parceria com algumas
escolas da rede municipal de Recife.

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“Necessidades especiais merece atenção especial”. Então você


vai ver as informações que tem aqui e vai tentar repassar para
o cartaz e, em outro momento, você vai apresentar para a sua
turma.
Depois eu vou expor esses cartazes com essas informações
num painel, para que essas informações não fiquem só aqui
na turma... além de vocês apresentarem aqui na turma, eu vou
fazer a exposição dos cartazes ali (apontou para o pátio) para
que essas informações cheguem aos outros colegas da escola
e para as outras pessoas que convivem aqui também.

A: Eita, a gente tem que caprichar, né tia? Para os outros


entenderem o que a gente escreveu, né?

P: Exatamente! Toda vez que a gente for escrever um texto,


tem que pensar em quem vai ler o texto! Vocês podem utili-
zar jornais, tem revistas, gravuras, desenhar... mas no primeiro
momento, agora, vocês vão fazer a leitura do texto, discutir
com o seu grupo e organizar as ideias no caderno. Vão pensar
em como é que vocês vão fazer o seu cartaz e quais as infor-
mações que serão colocadas, entendeu? Mas agora, antes de
vocês escreverem o texto, a gente vai pensar no que a gente
vai colocar nele. Lembrem-se que o texto é para ser escrito
num cartaz... não pode ser muito longo? Tem que ser objetivo,
apresentar todas aquelas características que eu já expliquei
pra vocês! O tamanho da letra, do título, essas coisas...Vocês
sabem porque já fizeram cartazes outras vezes e eu já expli-
quei como deveria ser organizado o texto. É só relembrar!

A: Tem que ter cuidado pra não botar muita coisa, muita infor-
mação, né?
Então depois a gente vai ver como está essa organização, aí
num outro momento, é e vocês vão fazer o cartaz, aí é que eu
vou dar a cartolina, entenderam? O primeiro momento é de
leitura e compreensão... depois a gente vê como deve ser feito
o cartaz.

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Conforme podemos verificar nos extratos apresentados, Elieci


buscou explorar a produção de textos a partir de situações que já
vinham sendo trabalhadas com os alunos na sala de aula (projeto
sobre o trânsito). Assim, ao dar o comando para a realização da
atividade, a mestra retomou os textos abordados por ela em outros
momentos como forma de ativar os conhecimentos prévios dos alu-
nos acerca da temática que eles iriam escrever.
Acreditamos que a tática utilizada pela mestra é de funda-
mental importância para levar o aluno a perceber que o processo
de produção textual não começa e nem termina com as primeiras
e últimas palavras registradas, pois que ele é decorrente de um
curso de eventos cujas atividades antecedem a produção (desen-
cadeamento) e vai além da produção escrita propriamente dita
(repercussão). Como bem coloca Smolka (1988), a situação que
desencadeia a atividade já começa a prefigurar o texto, pois carac-
teriza seus propósitos e destinação e antecipa as possibilidades de
repercussão
Observamos, também, que antes de solicitar que os alunos
escrevessem seus textos, a mestra sugeriu que os mesmos reali-
zassem a leitura dos panfletos distribuídos por ela, discutissem nos
grupos a temática a ser tratada e escrevessem uma primeira versão
daquilo que seria apresentado nos cartazes a serem confecciona-
dos em um momento posterior.
A condução da atividade por Elieci, também permitiu que os
alunos, ao rascunharem suas ideias, pudessem perceber a “provi-
soriedade dos textos” refletindo sobre o que estavam produzindo,
analisando todo o processo de (re) escrita.

P: Não esqueça minha gente, que ao terminar de escrever o


texto, não quer dizer que ele já tá pronto, lembrem o que eu
disse. É preciso reler o texto, ver se as ideias estão claras, se
tá coerente com o que foi pedido, verificar se está faltando
algum sinal de pontuação, olhar a ortografia das palavras, ver
a concordância, a repetição de palavras para substituir por
outras que tenham o mesmo sentido... tudo isso eu já expliquei
a vocês!

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Para Rocha (1999), o trabalho de revisão e reescrita do texto


é de fundamental importância por oportunizar a criança a reelabo-
rar concepções acerca da estrutura do texto, analisar e verificar se
faltam ou não informações, se a letra está legível, se a estética e a
estrutura estão adequadas. Segundo esse estudioso, a revisão de
texto também permite ao produtor ver seu texto numa outra pers-
pectiva, uma vez que ao produzir inicialmente tem sua atividade
reflexiva voltada para determinados aspectos que após serem
revistos ele poderá centrar-se em questões mais pertinentes ao
plano textual discursivo, além de focalizar questões relativas às nor-
mas gramaticais e às convenções gráficas para que reflitam sobre
possíveis alternativas de grafia, comparem com a escrita conven-
cional e tomem progressivamente consciência do funcionamento
da ortografia.
Salientamos que a exploração dos recursos linguísticos empre-
gados nos textos pelos discentes não aconteceu apenas no momento
de revisão e reescritura dos textos, mas, também, durante a escrita
dos mesmos a partir das dúvidas dos alunos quanto à melhor forma
de escrever as informações, o tipo de letra adequada a serem usa-
das nos títulos, o emprego dos sinais de pontuação mais adequados
para causar os efeitos de sentido pretendidos, a grafia de algumas
palavras, entre outros aspectos. Essa dinâmica desenvolvida por
Elieci é de suma importância para o trabalho de análise e reflexão
sobre a língua, pois como bem coloca Geraldi (2006) o trabalho com
essa unidade de ensino não pode restringir-se à higienização do
texto dos alunos quanto aos aspectos gramaticais e ortográficos,
limitando-se, assim, a correções, mas “trata-se de trabalhar com o
aluno o seu texto para que ele atinja seus objetivos junto aos leitores
a que se destina (p.74)
Ainda em relação aos comandos dados pela mestra para a
realização da atividade, verificamos que ela criou uma situação de
circulação social para as produções dos alunos, levando-os a pensar
nos seus interlocutores e a refletir sobre a maneira mais oportuna
de apresentar suas ideias ao leitor. Desse modo, após escreverem
a versão do texto em seus cadernos, Elieci entregou as cartolinas
para que os aprendizes confeccionassem os cartazes apresen-
tassem oralmente, o trabalho para toda a turma. Esse momento
também foi aproveitado por ela para refletir com os alunos questões

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relacionadas à organização dos textos em relação aos aspectos


discursivos, textuais e gramaticais.

• A professora Ana, por sua vez, em continuidade a aula em


que trabalhou o texto a leitura do texto “A casa” de Vinicius
de Moraes, propôs a produção coletiva de um poema no
quadro, utilizando este como modelo. Ela, então, solicitou
que os alunos escolhessem uma temática para ser abor-
dada na poesia a ser construída e chamou a atenção
deles acerca das palavras a serem usadas em sua com-
posição. Ana também enfatizou que os alunos deveriam,
ao pensar nas estrofes, escolher palavras que rimassem
e, ao mesmo tempo, fizessem sentido no contexto em que
seriam empregadas.
Assim, à medida que os discentes iam apresentando suas
sugestões, buscavam no poema “A casa” a referência para a
escrita, lendo-o várias vezes, comparando o quantitativo de versos
e estrofes usados pelo autor, o ritmo e a sonoridade causada pelas
palavras empregadas. A transcrição a seguir, nos mostra essa dinâ-
mica desenvolvida por ela:

P: Todo mundo aqui já conhecia esse texto, né? Muito bem,


agora o que é que a gente vai fazer? Nós vamos fazer a mesma
coisa que a gente fez com o texto das borboletas... (poema de
Vinicius de Moraes trabalhado em uma aula posterior) o que
foi que a gente fez com o texto das borboletas? A gente fez o
quê, Andreza?

A: Fez outra poesia.

P: A gente criou uma outra poe...?

T: siiiiiaaaaaaaa!!

P: Então vejam só! Com a casa (apontou para a poesia escrita


no quadro), a gente vai criar uma poesia coletivamente, obser-
vando as estrofes e versos dela. Eu vou começando, eu vou
escrevendo, vocês vão me dizendo e a gente vai construindo,

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ok? Vamos ajudar tia Ana agora? Vejam, aqui começa “A casa”
(referindo-se ao título da poesia), a gente vai falar sobre o que?

A: A maaaassa!

P: Vejam, Sara tá propondo falar sobre a massa. Massa de


quê, Sara? De bolo, de pão?... Todo mundo concorda que seja
a massa? (alguns alunos responderam afirmativamente, a
maioria de forma negativa).

A2: A sala tia!

P: A sala? E aí, o que vocês acham?

A3: É tia, é!

T: Éééééé!

P: Então vamos lá! Qual vai ser o título?

T: A salaaaaa! (a mestra escreveu o título no quadro)

P: Aqui começa... Era uma casa... vai ficar como?

A: Era uma sala...

A2: Era uma sala derrubada.

P: A gente vai usar o mesmo engraçada ou vai substituir por


outra palavra?

A professora, à medida que ia lendo os versos do texto, pedia


que os alunos adequassem as informações neles contidos à temá-
tica sugerida por eles para a escrita do texto coletivo. A mestra
aproveitou o momento da construção do texto para fazer perguntas
sobre questões relativas à coerência das informações empregadas,
quanto à grafia correta das palavras que estavam sendo escritas,

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para questionar se as palavras empregadas estavam rimando para


comparar e/ou substituir essas por outras, etc.
Ana, em continuidade à leitura dos versos do poema “A casa”,
solicitava que os alunos adequassem as informações neles conti-
dos à temática sugerida por eles para a escrita do texto coletivo. A
mestra aproveitou o momento da construção do texto para fazer
perguntas sobre questões relativas à coerência das informações
empregadas, quanto à grafia correta das palavras que estavam
sendo escritas, para questionar se as palavras empregadas esta-
vam rimando para comparar e/ou substituir essas por outras, etc.
Após esse momento, a professora formou duplas entre os
alunos e solicitou que produzissem agora uma poesia escrita, que
deveria ser apresentada para a turma, de forma oral. Ao dar os
comandos para a atividade, Ana informou aos discentes que a
escolha do tema para a escrita era livre, que os mesmos deviam
observar as poesias abordadas durante a aula (a de Vinicius de
Morais e a construída pela turma) tomando-as como modelo e
chamou a atenção acerca das palavras a serem usadas em sua
composição.
Ela também enfatizou que os mesmos, ao pensar nas estrofes,
precisariam escolher palavras que rimassem e, ao mesmo tempo,
fizessem sentido no contexto em que seriam empregadas. Nesse
sentido, após concluírem a escrita do texto, os alunos liam para toda
a turma enquanto a mestra a grafafa no quadro. Esse momento
foi aproveitado por Ana para explorar que ela, juntamente com os
alunos analisassem questões referentes ao emprego dos sinais de
pontuação, da escrita das palavras, além de outros aspectos rela-
cionados à coerência do texto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao finalizarmos essa conversa, podemos afirmar que as


docentes abordarem os conhecimentos linguísticos servindo-se
tanto de uma perspectiva mais prescritiva - baseada no ensino tra-
dicional da gramática normativa - como através de uma prática
mais funcional e reflexiva. Assim, concluímos que as professoras (re)
construíram suas táticas de ensino recorrendo a diversos caminhos
teórico-metodológicos, no ensejo de atender aos objetivos didáticos

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que possuíam em cada momento. Assim, suas práticas de ensino


dos conteúdos linguísticos misturavam perspectivas da gramática
tradicional normativa e da análise e a reflexão sobre a língua.
Um ponto que merece destaque diz respeito ao lugar que a
análise linguística ocupava nas aulas das mestras. Verificamos que
ambas destinavam o mesmo quantitativo de dias da semana para
o ensino da língua portuguesa, porém, o tempo destinado para esse
trabalho era diferente. A professora Elieci não tinha dias específicos
para trabalhar com os conhecimentos linguísticos e os explorava
sempre que havia oportunidade para tal, salvo as vezes em que
ela tinha planejado elegê-los como objeto de ensino nas aulas que
ministrou. A professora Ana também abordou os conteúdos da gra-
mática atrelada ensino da leitura e da produção textual, mas, ao
contrário da mestra de Recife, dedicou algumas aulas exclusiva-
mente para o trabalho com alguns fenômenos gramaticais.
No tocante ao trabalho com os assuntos pertencentes às
classes das palavras, observamos que os mesmos foram traba-
lhados pelas mestras a partir de uma perspectiva metodológica
mais “tradicional” enquanto que os conhecimentos referentes aos
aspectos ortográficos, à pontuação e aos sinônimos foram abor-
dados de forma articulada aos demais eixos didáticos da língua, na
perspectiva da análise linguística. Tais posturas assumidas foram
verbalmente por elas referendadas no momento de suas entre-
vistas, onde, ambas, declaram que, por não terem conhecimento
sobre como poderiam explorar alguns conteúdos da gramática de
maneira mais funcional, abordava-os numa perspectiva mais tradi-
cional de ensino.
Essas posturas assumidas pelas docentes também foram
observadas por pesquisadores que buscaram conhecer como se
dava o ensino dos aspectos linguísticos na sala de aula, como por
exemplo, os trabalhos desenvolvidos por Andrade (2003), Bastos
(2009) e Silva (2009) cujos resultados revelaram a necessidade de
um maior aprofundamento sobre o que propõe o ensino da análise
linguística – novos conteúdos, objetivos e procedimentos metodoló-
gicos mais adequados para o trabalho nessa perspectiva de ensino.
No que diz respeito ao trabalho com produção textual, mais pre-
cisamente, verificamos que essa prática ainda tem “servido”, muitas
vezes (principalmente nos primeiros anos do Ensino Fundamental I)

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como um meio de trabalhar os aspectos gramaticais e como forma


de avaliar a aprendizagem dos alunos quanto a esses aspectos.
No entanto, podemos concluir afirmando que há um movi-
mento constante das professoras em buscar um diálogo com aquilo
que seria o objetivo do ensino da língua na escola, evidenciando,
assim, a necessidade de formações iniciais e continuadas que
oportunizem o educando conhecer/refletir sobre o que supõe ser o
objetivo principal do trabalho com a produção de textos e a reflexão
sobre os fenômenos linguísticos.

REFERÊNCIAS

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Naturais e Sociais. Originalmente publicado em IATEFL: Pesquisa
Quantitativa e Qualitativa. São Paulo: Pioneira, 1998

ANDRÉ, M. Etnografia da Prática escolar. Campinas. SP: Papirus, 1995.

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Porto Alegre, junho, 1991, nº. 17, ano 10, pp. 29-37.

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