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MR 8.1 - Diarreia - Fev2013

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Módulo 8

Patologia Digestiva
Associada ao HIV
Introdução ao Módulo 8

Os problemas gastrointestinais (diarreia, parasitose intestinal, dor abdominal, hepatite e outros) são
comuns tanto na população seropositivas como seronegativa. Porém, o diagnóstico diferencial destas
patologias é diferente na presença do HIV/SIDA.

O doente HIV+ pode ter qualquer tipo de problema gastrointestinal, incluindo a diarreia causada por
amebas ou vibrião colérico (cólera), dor abdominal causada por apendicite ou complicações obstétricas,
bem como hemorragia causada por úlcera gástrica. Mas, para além dos problemas “correntes”, os
doentes seropositivos podem contrair doenças gastrointestinais causadas por infecções oportunistas,
reacções adversas a medicamentos (anti-retrovirais e outros), Síndrome de Imuno-reconstituição (SIR),
ou pelo próprio HIV. De referir que, nos doentes com CD4 baixo (< 200 cels/mm 3), as causas
oportunistas mais frequentes podem incluir parasitas intestinais do estadio IV que são difíceis de
diagnosticar em Moçambique.

O TMG deve fazer uma abordagem sistemática para avaliar os problemas gastrointestinais nas pessoas
seropositivas, tendo em conta os factores acima mencionados para além dos problemas correntes que
também ocorrem na população em geral.

O diagnóstico dos problemas gastrointestinais no doente com SIDA tem sido muito difícil em
Moçambique devido à escassez de técnicos especializados e de meios apropriados para diagnóstico.

No presente módulo serão abordados alguns problemas gastrointestinais relacionados apenas à


infecção pelo HIV e às complicações do tratamento do SIDA.

Este módulo está dividido em duas unidades, que serão apresentadas a seguir:
 8.1 - Diarreia no doente HIV+
 8.2 - Dor abdominal no doente HIV+

Manual de Referência do Técnico de Medicina 224


Patologia Digestiva Associada ao HIV
Manual de Referência do Técnico de Medicina 225
Patologia Digestiva Associada ao HIV
Unidade 8.1 – Diarreia no Doente HIV+

Introdução
A diarreia é um problema comum em Moçambique, que afecta tanto as pessoas seronegativas como as
seropositivas. Contudo, nos doentes infectados pelo HIV, ocorre com mais frequência e é mais
complicada.
O Técnico de Medicina, além de manejar correctamente a técnica de reidratação oral e endovenosa,
deve saber quando suspeitar da diarreia oportunista ou da diarreia que pode indicar uma reacção
adversa a medicamentos ou da diarreia como condição de estadio III ou IV.

Nesta unidade serão apresentados os seguintes conteúdos:


 Incidência da diarreia em pessoas HIV+
 Possíveis causas da diarreia no doente HIV+
 Abordagem da diarreia
 Medidas para a prevenção da diarreia

Incidência da Diarreia na Pessoa Seropositiva

Alguns estudos realizados em certos países africanos mostram que os episódios da diarreia afectam
mais da metade dos doentes seropositivos por ano, por exemplo:
a) Num estudo realizado em Nairobi (Quénia) em pessoas seropositivas, a incidência da diarreia foi
de 529,5/1000 pessoas/ano, ou seja, mais ou menos 1 caso de diarreia em cada 2 pessoas por
ano.1
b) Num estudo realizado em Uganda em pessoas seropositivas, a incidência da diarreia foi
semelhante à incidência reportada em Quénia: 661/1000 pessoas/ano2

A incidência da diarreia pode ser ainda mais alta se não houver água potável, ou durante surtes de
cólera ou outra doença contagiosa.

Muitas vezes a diarreia pode ser acompanhada de náuseas, vómitos, febre e/ou dor abdominal.

Possíveis Causas da Diarreia no Doente Seropositivo


As possíveis causas da diarreia (com ou sem náuseas ou vómitos ou dor abdominal) no doente
seropositivo são múltiplas e de categorias distintas. As categorias importantes das causas da diarreia
são:
 Diarreia causada por infecções oportunistas (Cryptosporidium, microsporidium, Isospora, etc);
 Diarreia causada por reacções adversas a medicamentos;
 Diarreia causada pelo Síndrome de Imuno-Restauração (SIR);
 Diarreia causada pelo próprio HIV;
 Diarreia causada por outras doenças que também afectam pessoas não infectadas pelo HIV.

Por exemplo, num estudo realizado na cidade de Lima no Peru sobre as causas da diarreia em doentes
seropositivos, foi constatado que existe uma variedade de causas infecciosas, nomeadamente,
oportunistas, não oportunistas, parasitas, vírus, bactérias, vermes, etc.3:

1
Mwachari et al. Nairobi, Quénia
2
Brink A-K et al. Diarrhoea, CD4 Counts and Enteric Infections in a Community-Based Cohort of HIV-Infected Adults in
Uganda. Journal of Infection 2002;45:99-106.
3
Carcamo C et al. Etiologies and Manifestations of Persistent Diarrhea in Adults with HIV-1 Infection: A Case-Control
Study in Lima, Peru. Journal of Infectious Diseases 2005:191:11-19.
Manual de Referência do Técnico de Medicina 226
Patologia Digestiva Associada ao HIV
% Casos de Diarreia Infecciosa, Pacientes
Seropositivos, Lima, Peru (* Causas
Oportunistas)
25.00%
20.00% % Casos de Diarreia Infecciosa,
15.00% Pacientes Seropositivos, Lima,
Peru (* Causas Oportunistas)
10.00%
5.00%
0.00%
s a* es ia s a* *
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Numa pesquisa realizada em Uganda, também encontrou-se uma mistura de causas infecciosas
oportunistas e não oportunistas em doentes seropositivos com diarreia4:

% Causas de Diarreia Infecciosa, Uganda (*


Causas Oportunistas)
30.00%

20.00%
% Causas de Diarreia Infecciosa,
Uganda (* Causas Opor-
10.00% tunistas)
0.00%
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Além da classificação etiológica das causas acima descritas, nos locais com poucos meios diagnósticos
como em Moçambique, existe a possibilidade de classificar a diarreia segundo a forma de apresentação
clínica. As categorias mais comuns são:
 Diarreia com febre ou com sangue;
 Diarreia sem febre e sem sangue.

A tabela abaixo mostra as possíveis causas da diarreia em relação à sua apresentação clínica.

4
Brink A-K, Mahe C, Watera C, Lugada E, Gilks C, Whitworth J, French N. Diarrhoea, CD4 Counts, and Enteric Infections
in a Community-Based Cohort of HIV-Infected Adults in Uganda. Journal of Infection 2002;45:99-106.
Manual de Referência do Técnico de Medicina 227
Patologia Digestiva Associada ao HIV
Tabela 1: Classificação Clínica da Diarreia e Possíveis Causas

Exemplos de possíveis causas


Doenças e infecções Reacções adversas a Outras causas (por exemplo,
Características oportunistas; ou medicamentos causas que também afectam as
mais comuns da causadas pelo próprio pessoas seronegativas)
diarreia HIV
Oportunistas: CMV* Infecção com C. difficile Campylobacter, Clostridium
Cryptosporidium* causada pelo tratamento difficile*
Diarreia com Isospora* com antibióticos*. Shigella, Salmonella
febre ou com MAC* E. histolytica*, Malária
sangue TB* Schistosomiase

Causada pelo próprio HIV:


Strongyloides stercoralis
Síndrome de caquexia de
SIDA*
Oportunistas: Antibióticos (muitos) Anti- Cólera
Cryptosporidium*, retrovirais: nelfinavir*, Giardia lamblia*,
Diarreia sem Isospora*, outros IP, abacavir (com Schistosomiase, vírus intestinal
sangue e sem Microsporidia*, outros sinais de (adenovírus, astrovirus,
febre Cyclospora*; hipersensibilidade). rotavirus etc);
E. Coli, Clostridium dificile
Causada pelo próprio HIV:
Síndrome de caquexia*,
Diarreia de estádio III*
*Pode ser crónica.
** Qualquer causa da diarreia pode apresentar-se com ou sem febre ou com ou sem sangue; a tabela aqui só
descreve as características típicas.

Diarreia Causada pelo HIV


Alguns doentes HIV+ têm diarreia sem causa identificável além da própria infecção pelo HIV, havendo
melhoria com o tratamento anti-retroviral.

Antes de chegar ao diagnóstico da diarreia causada pelo HIV, o TMG deve investigar outras possíveis
causas. As definições da diarreia de estadio III ou IV são:

 Diarreia como condição de estadio III tem de reunir todos os critérios abaixo:
 Diarreia > ou = 3x por dia por mais de um mês;
 Não há outra causa aparente (estudo de fezes normais, se disponível);
 Não responde aos antibióticos (veja algoritmo).

 Diarreia como condição de estadio IV (Síndrome de caquexia de SIDA). Tem que reunir todos
os critérios abaixo:
 Perda >10% de peso com emagrecimento visível, ou IMC <18,5 kg/m2;
 Diarreia > ou = 3 x por dia por mais de um mês;
 Não há outra causa aparente (estudo de fezes normais, se disponível);
 Não responde aos antibióticos (veja algoritmo).

Além dos critérios acima mencionados, o doente com Síndrome da caquexia de SIDA pode ter febre ou
suores nocturnos (veja unidades de estadiamento e perda de peso).
Manual de Referência do Técnico de Medicina 228
Patologia Digestiva Associada ao HIV
Diarreia Causada por Infecções Oportunistas
São muitas as infecções oportunistas do estadio IV que podem causar diarreia (geralmente crónica) na
pessoa seropositiva. No entanto, ainda não é possível fazer testes específicos para diagnosticá-la na
maioria das Unidades Sanitárias da rede nacional. O TMG que suspeitar a diarreia causada por uma
infecção do estadio IV deverá referir o doente se a mesma não responder aos tratamentos com os
antibióticos recomendados (veja algoritmo de diarreia).

Os parasitas oportunistas que podem causar diarreia de estadio IV pertencem às famílias de


Cryptosporidium, Isospora, Cyclospora, e Microsporidia.
A tuberculose extrapulmonar e as infecções causadas por micobactéria atípica podem causar diarreia.
Estas são infecções de estadio IV e não respondem ao tratamento com antibióticos comuns nem a
albendazol em dose única. Às vezes, os parasitas intestinais oportunistas respondem ao TARV, ou ao
tratamento de longo prazo com outros antibióticos ou com albendazol em dose alta. A tuberculose
intestinal só responde ao tratamento para TB (veja na secção abaixo).

Diarreia Causada por Medicamentos


Alguns medicamentos anti-retrovirais frequentemente causam diarreia mais do que os outros. Os anti-
retrovirais mais usados e as percentagens aproximadas de doentes afectados são:
 Abacavir (7%),
 Didanosina (28%),
 Lamivudina (18%),
 Estavudina, Indinavir (5%),
 Lopinavir/Ritonavir (14-24%),
 Nelfinavir (20%).

A diarreia causada por anti-retrovirais pode ser ligeira ou grave, transitória ou crónica. Se o doente tiver
diarreia que possa ter sido causada por anti-retrovirais, o técnico deve tratar os sintomas (reidratação,
etc.), investigar outras possíveis causas (veja o algoritmo da diarreia e as tabelas de reacções
adversas) e determinar o grau da reacção adversa. (Veja o quadro abaixo)5.
Na presença de uma possível reacção de grau I ou II, o doente deve receber reidratação oral, nutrição
adequada e seguimento clínico. O doente deve ser reavaliado uma semana depois ou antes, caso não
registe melhoria ou piore. Na presença de uma possível reacção de grau III ou IV, o doente deve ser
reidratado e encaminhado, ou em caso de sinais de perigo, deve ser internado urgentemente.

Antibióticos – Quase todos podem originar diarreia. Muitas vezes, a diarreia causada por antibióticos
resolve-se quando o doente suspende o medicamento implicado. Porém, se a diarreia continuar após a
suspensão do antibiótico e/ou se for acompanhada de febre, sangue, e/ou dor abdominal pode ser
causada por Clostridium difficile.

5
Guia de Bolso: TARV e IOS em Adultos e Adolescentes, p.30, MISAU

Manual de Referência do Técnico de Medicina 229


Patologia Digestiva Associada ao HIV
O C. difficile é uma bactéria anaeróbica que muitas vezes multiplica-se no intestino quando o doente
toma antibióticos que matam a flora (bactérias comensais) do tracto gastrointestinal. Neste caso, é
preciso suspender o antibiótico que está a causar o problema e dar metronidazol para tratar o C.
difficile.
O Cotrimoxazol (CTZ) também pode causar diarreia. Existe um esquema diferente de classificação do
grau da reacção adversa à CTZ.

Esquema de classificação da diarreia causada por reacções adversas a CTZ


Grau I Grau 2 Grau 3 Grau 4
Dejecções Dejecções Dejecções líquidas com Shock hipotensivo ou
moles líquidas desidratação ligeira; diarreia com hospitalização necessária para o
sangue tratamento endovenoso (EV)

Outras Possíveis causas da Diarreia:


 Giardia lamblia
 Entamoeba histolytica
 Schistosomiase
 Cólera
 Rotavirus, norovirus
 E. coli
 Malária
 Shigella
 Salmonella
 Campylobacter
 Estrongyloides stercoralis

Abordagem da Diarreia: Uso do Algoritmo da Diarreia


1. Identificar sinais de perigo (caixa 2) - Desidratação severa e shock:

 Taquicardia (FC>120b/m), hipotensão (T/A<90/60mmHg), coma, letargia, fraqueza,


oligúria/anúria, hemorragia gastrointestinal.
 Na presença de sinais de perigo, comece com a reidratação endovenosa e o tratamento
endevenoso com antibióticos conforme as normas nacionais e encaminhe o doente.

2. Na ausência de sinais de perigo, faça avaliação completa (caixa 3):


 Procure a causa da diarreia. Se a diarreia for aguda com suspeita de malária, faça despiste para
plasmódio.
 Se identificar a causa da diarreia na avaliação inicial (por exemplo, cólera ou malária confirmada
com teste rápido e/ou hematozoário positivo), trate a causa e faça o seguimento indicado pelo
diagnóstico (caixa 4).
 Todo doente com diarreia deve receber: reidratação, dose única de Albendazol (se não tomou
nos últimos 6 meses), reabilitação ou apoio nutricional, se indicado.

3. Na ausência de outra causa confirmada, classificar (caixas 5, 8, 9, 11 e 12):


 Diarreia com febre ou com sangue
 Diarreia sem febre e sem sangue
 Aguda
 Crónica

Manual de Referência do Técnico de Medicina 230


Patologia Digestiva Associada ao HIV
Diarreia com febre ou com sangue, sem sinais de perigo (caixa 8):
 Tratar com Cotrimoxazol ou Ciprofloxacina. (No doente que está a tomar Cotrimoxazol diário,
de preferência tratar com Ciprofloxacina se disponível e na mulher não grávida) (caixa 10)
 Se o doente não responder ao CTZ ou Ciprofloxacina + Abendazol + reidratação oral, trate
com Metronidazol (caixa 15)
 Se o doente não responder a CTZ/Ciprofloxacina, Metronidazol, Albendazol, e reidratação
(caixa 18):
 Avalie a reacção adversa se estiver a fazer o TARV;
 Se a diarreia tiver um mês ou mais de duração, e o doente ainda não estiver a fazer o
TARV, avalie indicações para começar o TARV. (Doente com critérios para diarreia
de estadio III ou síndrome de caquexia de estadio IV);
 Considere Loperamida e/ou Codeína para controlar sintomas;
 Se possível, realize estudo de fezes para procurar parasitas;
 Encaminhar ou referir se indicado.

Diarreia sem febre e sem sangue, sem sinais de perigo (caixa 9)


Na ausência de febre e de sangue, e na ausência de outra causa confirmada, é importante classificar a
diarreia como crónica ou aguda. Normalmente, a diarreia crónica é diarreia com cinco dias ou mais de
duração, mas as definições variam:

1. Aguda (normalmente, cinco dias ou menos) (caixa 11):


 Reidratação oral, dose única de Albendazol (se não tiver tomado recentemente – nos últimos 6
meses)
 Se não houver melhoria em cinco dias: (Ciprofloxacina ou Cotrimoxazol) + Metronidazol – ou
seja, dois antibióticos: Metronidazol+Ciprofloxacina, ou Metronidazol+Cotrimoxazol. Na mulher
grávida, deve-se evitar o uso da Ciprofloxacina. Para as pessoas que estão a tomar o
Cotrimoxazol diariamente, é mais aconselhável o uso de Ciprofloxacina, se estiver disponível.

2. Crónica (normalmente, cinco dias ou mais) (caixa 12):


Reidratação oral, dose única de Albendazol (se não tiver tomado nos últimos 6 meses), e dois
antibióticos: Metronidazol + Ciprofloxacina (evitar na mulher grávida) ou Cotrimoxazol (evitar na pessoa
que está a tomar CTZ profiláctico, se a Ciprofloxacina estiver disponível). Em ambos casos, se o doente
não responder a CTZ/Ciprofloxacina, Metronidazol, Albendazol, e reidratação (caixa 14):
 Avalie a reacção adversa se estiver a fazer o TARV;
 Se a diarreia tiver um mês ou mais de duração, e o doente ainda não estiver a fazer o TARV,
avalie indicações para começar o TARV. (Doente com critérios para diarreia de estadio III, ou
síndrome de caquexia de estadio IV) (caixa 18);
 Considere Loperamida e/ou codeína para controlar sintomas;
 Se possível, realize estudo de fezes para procurar parasitas;
 Encaminhar ou referir, se indicado.

Indicações para o TARV no doente com diarreia - No doente preparado para a adesão, na ausência
de contra-indicações
 Diarreia crónica com outra indicação para o TARV (CD4 <350 cel/mm3, Estadios III ou IV, etc);
 Diarreia crónica por mais de um mês de duração sem causa aparente, sem critérios para
síndrome de caquexia, sem resposta a reidratação oral, CTZ ou Ciprofloxacina, Metronidazol,
Albendazol
 Síndrome de caquexia (veja os capítulos de estadiamento e perda de peso).

Posologia de medicamentos usados no tratamento da diarreia:


 Cotrimoxazol 480mg 2/0/2 x 10 dias
 Ciprofloxicina 500mg 1/0/1 x 10 dias
 Eritromicina 500mg 1/1/1/1 x 5 dias
Manual de Referência do Técnico de Medicina 231
Patologia Digestiva Associada ao HIV
 Metronidazol 250mg 2/2/2 x 10 dias
 Albendazol 400mg dose única

Outras medidas de tratamento sintomático da diarreia (não tratam a causa, só aliviam o


desconforto):
 Loperamida 2 mg: 2/1/1/1(max 16mg/dia)
 Difenoxilato de atropina 5 mg 1/1/1/16*
 Codeína 30 mg 1/1/1/1 (max 240 mg)*

Diarreia e nutrição:
Lembre-se que o doente com diarreia crónica está a perder nutrientes. Estes doentes precisam de mais
aporte alimentar, para além da reidratação. O aconselhamento sobre nutrição é recomendável.

O técnico deve avaliar a indicação para apoio nutricional, se disponível, ou reabilitação nutricional se o
doente reunir critérios de elegibilidade. (Veja mais informação na unidade sobre malnutrição).

Medidas para a Prevenção da Diarreia

Os princípios da prevenção da diarreia (e também da parasitose intestinal) são idênticos nas pessoas
seropositivas como nas seronegativas. Contudo, na pessoa com CD4 baixo e no estadio avançado da
doença, a profilaxia com Cotrimoxazol também ajuda a prevenir a diarreia causada por parasitas
oportunistas. As medidas a seguir mencionadas podem ajudar na prevenção da diarreia:

1. Medidas de higiene
2. Lavagem das mãos
3. Isolamento das fezes dos doentes
4. Água potável
5. Profilaxia com Cotrimoxazol no doente com critérios

Parasitas Intestinais no Doente HIV+


Os parasitas intestinais (oportunistas e não oportunistas) são comuns nas pessoas seropositivas. Por
exemplo, um estudo realizado na Tanzânia revelou que 59% dos doentes seropositivos avaliados
tinham algum tipo de parasita intestinal comum, no mesmo estudo foram detectados 15 parasitas
diferentes.1

Este estudo também mostrou que mais da metade destes doentes tinham algum tipo de parasita
oportunista (principalmente Cryptosporidium). Portanto, podemos observar que a parasitose oportunista
comum na população seronegativa é também frequente nos doentes HIV+, mas o seu diagnóstico em
países com recursos limitados, como é o caso de Moçambique, é difícil.

6
* Ref. British National Formulary, September 2006
Manual de Referência do Técnico de Medicina 232
Patologia Digestiva Associada ao HIV
Tabela 2: Causas da parasitose intestinal no doente HIV+ na Tanzânia (adaptado de Atzori et al)

% doentes HIV+ com Detectável no exame


Parasita Detectado Parasita oportunista
parasitose intestinal usual das fezes
Cryptosporidium Oportunista (de estadio 55,3% Não (precisa de
parvum IV, normalmente com CD4 técnicas especiais)
< 200 cels/mm3)
Isospora belli Oportunista (de estadio 27,7% Não (precisa de
IV, normalmente com CD4 técnicas especiais)
< 200 cels/mm3)
Strongyloides Não oportunista, mas 14,9% Sim
stercoralis mais comum nas pessoas
seropositivas
Entamoeba coli Não oportunista 40,4% Sim
Blastocystis hominis Não oportunista 36,2% Sim
Entamoeba histolytica Não oportunista 19,1% Sim
Ancylostoma Não oportunista 17,0% Sim
Iodameba butschlii Não oportunista 12,8% Sim
Giardia Não oportunista 6,4% Sim
Schistosoma mansonii Não oportunista 4,3% Sim
Ascaris lumbricoides Não oportunista 2.1% Sim
Trichuris trichiura Não oportunista 2.1% Sim
Enterobius vermicularis Não oportunista 2,1% Sim
Taenia Não oportunista 2,1% Sim

É possível que a presença de parasitas intestinais afecte o nível dos CD4, carga viral, ou sintomas de
SIDA. Numa pesquisa realizada em Quénia, o CD4 subiu para 109 cels/mm 3 e a carga viral baixou em
doentes seropositivos infectados com Ascaris e tratados com Albendazol. 2

Como já foi referido acima, o diagnóstico e o tratamento dos parasitas intestinais oportunistas
(Cryptosporidium, Isospora, Cyclospora, etc) ainda é complicado no país, porque os testes laboratoriais
relevantes não estão disponíveis na maioria das unidades sanitárias. O Técnico de Medicina que
suspeita de alguma parasitose oportunista no doente que não responde ao tratamento com antibióticos
ou antiparasitários indicados para cada caso deve encaminhar o doente.
A higiene e o uso de água potável são importantes como medida profiláctica.

Manual de Referência do Técnico de Medicina 233


Patologia Digestiva Associada ao HIV
Pontos-Chave
• A diarreia é frequente e pode ser oportunista ou não no doente HIV+.

• É preciso ter uma abordagem sistemática para avaliar a diarreia nas pessoas seropositivas. A
abordagem sistemática deve ter em conta com a possibilidade de infecções oportunistas,
reacções adversas a medicamentos, SIR, e condições causadas pelo HIV (condições de estadio
III e IV), além de problemas comuns da população geral.

• No doente com CD4 baixo (<200 cel/mm3), as causas oportunistas da diarreia e outras
condições gastrointestinais são mais frequentes, e podem incluir parasitas intestinais
oportunistas do estadio IV que são difíceis de diagnosticar em Moçambique.

• A diarreia crónica que não responde ao tratamento pode ser uma condição de estadio III ou IV
mas nem todo caso de diarreia indica que o doente já está no estadio III.

• É preciso incentivar o uso da água potável e a aplicação de medidas higiénicas para prevenir a
diarreia e os parasitas intestinais no doente seropositivo.

Anexos

Em anexo a esta unidade encontra-se o seguinte documento:


1. Algoritmo da Diarreia
2.

Manual de Referência do Técnico de Medicina 234


Patologia Digestiva Associada ao HIV
Manual de Referência do Técnico de Medicina 235
Patologia Digestiva Associada ao HIV
Referências Bibliográficas

Manual de Referência do Técnico de Medicina 236


Patologia Digestiva Associada ao HIV
1
Atzori C et al. HIV-1 and Parasitic Infections in Rural Tanzania. Annals of Tropical Medicine and Parasitology
1993;87:585-593.
2
Walson JL et al. Albendazole Treatment of HIV-1 and Helminth Co-infection: A Randomized, Double-Blind,
Placebo-Controlled Trial. AIDS 2008;22:1601-9.

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