Esta pesquisa tem a intenção de fazer uma costura em torno da linha de trabalho do grafiteiro e artista
plástico, Cety Soledad, e alguns textos discutidos durante as aulas de antropologia. E partindo destes
dois pontos tentaremos tecer um paralelo de como o campo teórico explica algumas questões que hoje
estão sendo levantadas pelos artistas da contemporaneidade.
Vamos começar apresentando, Cety Soledad se apresenta em uma entrevista dada ao podcast, Casa da
Sogra, em 23 de novembro de 2023. Nesta entrevista ele fala sobre sua construção como artista e
começa nos situando sobre seu local de origem, e se apresenta como cria da zona oeste, Rio de
Janeiro. Podemos perceber com esta sua fala que ele dá ênfase ao território em que se encontra, e
partindo deste apontamento, nos leva a refletir sobre a questão de territorialidade ao levantar a
bandeira de luta de reconhecimento da zona oeste, região que se encontra fora da zona de mercado e
produção artística, mas que tem sujeitos produzindo Arte. E deste ponto podemos perceber que ele já
conhece o mercado das artes que existe no Brasil, com a demarcação de locais e espaços de produção
e circulação da Arte.
Também não podemos deixar de considerar que ele se apresenta como, grafiteiro, que iniciou seus
trabalhos em 2004. Nesta perspectiva ele vem buscando ampliar o seu conhecimento e suas técnicas na
arte urbana e que a partir dela ele está começando a transitar em novos espaços, e assim utilizando da
arte que o afetou e abriu seus olhos, a novos horizontes, chegar também a outros sujeitos da mesma
forma. a arte para ele entra no contexto de meio para chegar a outras pessoas do seu espaço, zona
oeste, para gerar uma transformação social. Podemos ver isso quando Cety nos apresenta o trabalho
que vem realizando como educador/artista em projetos sociais e centros culturais.
Com esta sua linha de trabalho podemos perceber que, Cety, sai do que seria apenas seu interesse e
amplia esta perspectiva ao inserir outros sujeitos na construção dele como artista, negro, e
representante social de sujeitos que se encontram na construção de suas identidades sociais, que assim
como Stuart Hall faz referente em seu texto em a identidade em questão, de um dos pensamentos de
Laclau sobre o deslocamento da identidade.
“...isso não deveria nos desencorajar: o deslocamento tem características positivas. Ele desarticula
as identidades estáveis do passado, mas também abre novas possibilidades de novas articulações: a
criação de novas identidades, a produção de novos sujeitos...” e que Laclau chama de “recomposição
das estruturas em torno de pontos nodais particulares de articulação” (Laclau, 1990, p.40). Deste
ponto, o trabalho como artista negro, cria da zona oeste, está para além do que ele busca como sujeito
individual, pois como coloca Laclau, Cety desarticula o que a sociedade o impôs como morador da
zona oeste ao mostrar para os que estão em seu entorno tem novas possibilidades, na inserção de
projetos sociais de arte urbana, dando a estes sujeitos novas possibilidades de representação social.
A construção desta identidade de artista urbano, negro, originário da cultura afrodescendente, nos dias
atuais, traz prerrogativas de novas possibilidades ao seu trabalho, como também para o trabalho de
outros sujeitos, e para como a sociedade no contexto geral enxerga essas novas representações
artísticas no contexto social.
O pesquisador Stuart Hall em seu livro A identidade cultural na pós-modernidade faz apontamentos
sobre a questão de que não podemos, nos dias atuais, pautarmos o nosso discurso em divisão de
classes, pois isso não da conta de explicar todas as questões que estão sendo levantas, e que como ele
bem coloca “nenhuma identidade singular – por exemplo, de classe social – podia alinhar todas as
diferentes identidades como uma “identidade mestra” única, abrangente, na qual se pudesse, de
forma segura, basear uma política.” E podemos bem perceber isso na entrevista do artista Cety
soledad quando ele fala sobre sua Retomada as suas origens, trazendo para discussão que a sua
construção como sujeito e artista está baseado na construção de um sujeito histórico que busca na sua
ancestralidade as referencias para construir a sua identidade e consequentemente pautar todo o seu
trabalho como um Artista que é da zona oeste, grafiteiro e Negro.
“As pessoas não identificam mais seus interesses sociais
exclusivamente em termos de classe; a classe não pode servir
como um dispositivo discursivo ou uma categoria mobilizadora
através da qual todos os variados interesses e todas as variadas
identidade das pessoas possa ser reconciliadas e representadas.”
(HALL, Stuart, 1992, p.20)
Cety fala em sua entrevista que a Arte não foi feita para o pobre, preto, e que já está em seu sistema
que ela não é para todos. E assim podemos perceber que ele não fala em sua entrevista somente a
questão de ser pobre, mas faz grande referencia o fato de ser preto, e com isso ele se desloca de um
âmbito para outro e traz consigo outros sujeitos que também se reconhecem nesta causa de Ser Preto.
E o que é, nos dias de hoje, ser uma representatividade artística negra, que retoma a sua
ancestralidade?
A partir dos textos debatidos em sala podemos dizer que ele, Cety, se coloca neste meio de produção
cultural e artista como um sujeito politizado e que entende que sua bandeira emerge da necessidade de
reconhecimento da Arte feita pelo preto pobre, que vai de encontro a um padrão hegemônico do
branco rico, que por décadas esteve neste patamar hegemônico, mas que hoje artistas como ele trazem
para a discussão na sociedade e nas universidades a contestação desses espaços e começam a fazer um
contraponto na história da Arte e do povo negro, mesmo que seja ainda de forma não tão abrangente,
mas possível de uma observação e discussão como vemos hoje acontecendo nos cursos de História da
Arte e Artes Visuais de algumas universidades do país.
“Uma vez que a identidade muda de acordo como a forma que o
sujeito é interpelado ou representado, a identificação não é
automática, mas pode ser ganhada ou perdida. Ela torna-se
politizada. Esse processo é, às vezes, descrito como
constituindo uma mudança de uma política de identidade (de
classe) para uma política de diferença.” (HALL, Stuart, 1992, p.
21)
E vamos perceber que a Arte feita por esses artistas na pós-modernidade elas se tocam por este eixo
politizado de preto que busca na sua ancestralidade recontar e contar a história que foi apagada e ao
mesmo tempo não contada no campo da Arte no Brasil.
A pesquisadora Alessandra ____, em uma de suas entrevistas a revista visual, que foi impressa, fala
que sempre houve uma resistência contra o silenciamento dos povos oprimidos, mas que nas últimas
décadas que o pensamento “decolonial” começou a ganhar um corpo nas artes que não terá mais volta.
E vemos que o artista aqui apresentado, tem todo o seu trabalho e filosofia que vão de encontro com as
discussões que estão acontecendo no campo teórico de produção da arte no que tange à produção de
artistas negros e afrodescendentes. Aqui não pretendemos aprofundar o conceito de decolonialismo,
mas a partir dele podemos levantar outras discussões que estão acontecendo no campo de pesquisa a
cerca das produções culturais e artísticas feitas por esta pequena parcela de artistas pretos da nossa
sociedade.
Este artista, Cety, foi escolhido como objeto de pesquisa por seu trabalho de Retomada ir de encontro
as temáticas realizadas em sala e por termos em textos lidos uma boa referencia as questões
emergentes a cerca da arte produzida por grupos não hegemônicos e com identidades que buscam seu
lugar de fala. E quando ele coloca que a sua filosofia dos “óculos de visão ancestral” é uma retomada a
cultura africana que diz, segundo ele, não existe o futuro sem o passado, você precisa voltar atras
para ter o conhecimento do seu passado, você sabe quem você é, a sua origem, e a partir daí você
pode viver o seu presente e executar o seu futuro.
Entrevista de Cety Soledad– Casa da Sogra Podcast. (à 5 meses ) Ele começa a entrevista falando
sobre a construção do seu nome artístico, que também marca a sua entrada neste meio. Ele começou
na arte a partir do grafite, segundo seu relato, o grafite sempre foi marginalizado e por ser
marginalizado ele precisava de um nome fictício. Ele ouviu na rádio que o número 7 era da perfeição,
então ele resolveu se espelhar nessa ideia. Ele diz que teve que aprender essa cultura também, e como
ele não conseguia fazer algumas letras no grafite (S) foi preciso adaptar a escrita para a forma que se
falava, e o Soledad ele só colocou quando fez o facebook e faz parte do seu nome. Nasceu na baixada
no km 32 de Cabuçu e depois foi para Zona Oeste, onde morou emvários bairros sendo o último deles
Senador Câmara, na comunidade do Sapo. Ele diz que teve sorte e privilégio, porque a arte não é feita
para o pobre, para o preto, e que já está no sistema dela que não é para todos, é para um certo público,
e isso só acontece, porque tem o mercado da Arte que cria barreiras e impede a pessoa de criar e fazer
as coisas , e para ele, isso a faz ser totalmente diferente, e se a pessoa não compreender isso pode
adoecer. Mas a Arte em si é aberta para todo mundo, ele a coloca como sendo algo espiritual e
ancestral-, que a pessoa nasce com esse sentido artístico, a Arte produz transformação para pessoa e
para todos que estão em volta, sua comunidade, seu país. Fiz um resumo só para chegar no ponto em
que ele fala um pouco do seu trabalho diretamente, mas pretendemos coletar mais informações. Ele
fala sobre o óculos de Visão Ancestral e o que essa filosofia traz para o seu trabalho. O óculos de
visão ancestral é para ele um processo de retomada foi elaborado a partir de sua pesquisa no óculos
VR, e também teve como referência a borda do benjamim. E oque este óculos representa? Para cultura
africana não existe o futuro sem o passado, você precisa voltar atrás para você ter o conhecimento do
seu passado, você saber quem você é a sua origem, e a partir daí você poder viver o seu presente e
executar o seu futuro. A filosofia africana nunca é para frente, o amanhã, ou o quando eu ganhar algo
serei feliz, para ele isso traz ansiedade e está ligado a uma recompensa, no quando. Na cultura africana
o futuro é hoje e não existe sem o passado, então o óculos VR é um olhar futurista e o de visão
ancestral é olhando para o seu passado que as escamas dos olhos se dissipam sobre quem você é, sobre
a cor da sua pele, o cabelo, e toda a cultura eurocêntrica que foi implantada na pessoa pelos livros. E a
partir deste momento a pessoa tem a visão real africana ancestral. O óculos ancestral representa tudo
aquilo que te traz a revelação de quem você é de verdade e te fortalece principalmente o povo preto. O
óculos de visão ancestral para ele é a pintura, a retomada, que fez ele voltar a sua ancestralidade, por
saber quem ele é o que eu represento. A literatura, os filmes (pantera negra) tudo isso são óculos de
visão ancestral que te faz enxergar não mais como enxergava antes, sua visão foi aberta pelo
conhecimento da ancestralidade é o que o óculos de visão ancestral representa. Além do óculos de
visão ancestral, o artista também utiliza de materiais elétricos que virariam sucata para fazer seus
trabalhos, que se conectam com essa ideia de REtomada como forma de retomar a sua existência, sua
ancestralidade