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MARICATO para Entender A Crise Urbana Cap 1

Este livro, composto por três artigos e uma entrevista, é marcado por uma perspectiva clara – visível também em toda trajetória política e teórica da autora: a de que com o desenvolvimento do capitalismo gesta-se uma “crise urbana”, cuja saída só pode ser pensada e realizada a partir da luta dos trabalhadores.

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MARICATO para Entender A Crise Urbana Cap 1

Este livro, composto por três artigos e uma entrevista, é marcado por uma perspectiva clara – visível também em toda trajetória política e teórica da autora: a de que com o desenvolvimento do capitalismo gesta-se uma “crise urbana”, cuja saída só pode ser pensada e realizada a partir da luta dos trabalhadores.

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ERMINIA MariIcaTo PARA ENTENDER a CRISE PR uate Copyright 2015 © Editor Expressto Popular Revisto: Miguel Makoro Cavaleantt Yoshida Hidigte; Rafael Borges Pereira Foto: pg. 2 Midia Ninjas pl 15: Marcelo Camargo/A ty pndg, 19: Henrique Yasuda, pg 65: Eduardo Jorge Voto da capa: Média Ninja 1 ¢ diagramagho: ZAP Design anella, pdg. 101: Felipe Can, Projeto grafico, ¢ Impressa bamento: /mergraf Dados Internacionais de Catalogagtio na Publicagto (CIP) Maricato, Erminia M333p Para entender a orise urbana. / Erminia Maricato J.ed,—-Sto Paulo : Expresstto Popular, 2015 112p. Al Indexadlo em GeoDados - hitp:/www.goodados, vem. br. ISBN 978-85-7743-258-5 4, Crise urbana, 2. Lutas de olasse - Brasil. 3. Quostao ‘urbana ~ Brasil. 4. Movimentos ‘socials ~ Brasil. |, Titulo. COU 316.42 lane M.S. Jovanovich CRB 9/1250 iho na Publioapbo: El ‘Todos os direitos reservados, Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida sem a aurorizagio da edicora. Wedigto: maio de 2015 EDITORA EXPRESSAO POPULAR Rua Aboligao, 201 ~ Bela Vista CEP 01319-010 ~ Sio Paulo ~ SP Fone: (11) 3522-7516 / 3105-9500, editora.expressaopopular.com.br [email protected],br wwwfacebook,com/ed.expressaopopular SUMARIO APRESENTACAO CIDADES E LUTA DE CLASSES NO BRASIL Introdugac Cidade e conflit abordagem marxista Cidade na periferia do capitalismo: a urbanizacao dos baixos salarios.... luta social pela Nas décadas perdida: cidade democratica . Cidades na conjuntura atual: a retomada do investimento publico e a surpreendente subordinagao do espaco urbano ao capital . ao0) O império do automével. Transporte coletivo em ruina: Quando novissimos personagens entram em cena ..... TERROR IMOBILIARIO OU A EXPULSAO DOS POBRES DO CENTRO DE SAO PAULO.. GLOBALIZAGAO E POLITICA URBANA NA PERIFERIA DO CAPITALISMO. Globalizagao e poder... O impacto da globalizacao nos paises periféricos O legado do patrimonialismo.. Os paradoxos das cidades periféricas Planejamento urbano e globalizacao .. Do “Consenso de Washington” ao “Plano Estratégico Que fazer’... MOVIMENTOS E QUESTAO URBANA NO BRASIL... 103 CIDADES E LUTA DE CLASSES NO BRASIL’ O urbano da conjuntura do inicio do século XXI Com muita frequéncia, (...) 0 estudo da urbanizagio se separa do estudo da mudanga social ¢ do desenvolvimento econdmico, como se 0 estudo da urba- nizagao pudesse, de algum modo, ser considerado um assunto secundério ow produto secundario passivo em relagio as mudangas sociais mais importantes € fundamentais. Harvey, 2005, p. 166 Introdugao Nunca é demais lembrar, como ja fizeram numerosos au- tores, que a existéncia das cidades precede o capitalismo. No entanto, com ele as cidades mudam. E mudam a tal ponto que é impossivel pensé-lo sem elas. Especificidades no processo de urbanizagao acompanham as diferentes fases do capitalismo colonial-industrial ou global financeiro nos paises centrais ou periféricos. Em algum momento da primeira década do século XXI o mundo passou a ser predominantemente urbano ¢ essa crescente concentragao de populagao nas cidades traz novas caracteristicas para as sociedades ¢ para a humanidade. Um * Este texto resultou da edigéo de virios trabalhos publicados, mas especialmente do artigo de mesmo nome que integra a coletinea organizada pelas Fundacio Perseu Abramo ¢ Fundagéo Friedrich Ebert (orgs). Clases? Que classes? Sio Paulo: Editora da Fundagdo Perseu Abramo, 2013. bom exemplo estd na concentragio de pobreza em inéditos (Davis, 2006). Desde 0 periodo da revolugao industrial, quando og F de aglomeragdo nas cidades ofereceram condigbes indispersively para o processo de acur 40 de base fabril até as chamadas i “cidades globais”, que concentram poder internacional oe pago urbano e, mais recentemente, metropolitano € regional, constitui forga produtiva fundamental, além de partic ipar do processo de dominagao hegemdnica. Os capitais, em cada momento histérico, buscam moldar as cidades aos seus interesses, ou melhor, aos interesses de um con- junto articulado de diferentes forgas que podem comport uma alianga. Mas esse modelo de paisagem, ou ambiente construlda, nio resulta sem contradigées (Harvey, 1982). O que pode set interessante aos promotores imobilidrios ¢ proprievirios de terra também pode contrariar os interesses dos capitais industrials, apenas para lembrar um cxemplo importante que marcow# histéria das cidades nos paises centrais do capitalismo. O air ramento da luta social por melhores salirios, ou melhores cond g6es de trabalho, ou ainda melhores condiges de vida (moradia, satide, transporte etc.), aprofundam essas contradigées. Um aumento salarial pode ser engolido pelo aumento da tarifa de transportes ou do prego dos aluguéis das moradias. Durante o* anos do Welfare State (Estado providéncia) os trabalhadores com quistaram (como resultado de um processo de lutas) a em massa de moradias. Essa politica determinou os capitals , irlam perder espaco na disputa pelos lucros, juroserendas ‘havia necessidade de alojar os trabalhadores, diminuir 0 pre@? da forga de trabalho e di rentistas — fundidrios ¢ imobilidrios ~ foram subordinados ou iro prego da moradia, Os capitais regulados diante dos interesses do capital industrial. E dentre os capitais que participam da producao do espago (nos quais Harvey inclui a propriedade da terra) 0s capitais especulativos perderam espago para o capital produtivo’. A cidade pode ser objeto de diversas abordagens: pode ser lida como um discurso (como querem os semidlogos e semidti- cos); pode ser abordada pela estética — ambiente de alienagao € dominagao por meio da arquitetura ¢ urbanismo do espeticulo; como manifestagao de praticas culturais e artisticas mercadolé- gicas ou rebeldes; como legado histérico; como palco de con- flitos sociais; como espaco de reprodugao do capital e da forga de trabalho, entre outras. Essas diferentes ou dispersas formas de ver as cidades certamente tornam mais dificil situd-las como um objeto central estruturador das relagées sociais. A midia do mainstream trata de cidades 0 tempo todo, entretanto raramente a toma como um produto, ou mercadoria que intermedia os conflitos entre as classes sociais. Afinal, o capital imobilidrio é um grande anunciante, patrocinador da grande midia. No entanto, isso nao é suficiente para explicar porque a politica urbana esta tao ausente dos debates da esquerda ¢ das propostas de politicas puiblicas, em especial, politicas nacionais de desenvolvimento econdmico e social, nas tiltimas décadas do século XX e primeira do XX1. De fato, essa invisibilidade é maior a partir da globalizagao™ neoliberal (apés a década de * Ibid, p. 145-176. ** Iremos utilizar 0 conceito de globalizagao para referirmo-nos ao conjunto das mudangas (incluindo a ideologia, a cultura ea politica) ocorridas no mundo, a partir do que Harvey chama de reestruturagao produtiva do capitalismo, que tem inicio nos anos 1970. 19 essa invisibilidade é historica. J4 mostramos em balhos que, nesses paises, a habitacao dos trab problema para o capital e, na maior parte das veres, 0 Estado, Por isso, os bairros de moradia dos construidos por eles mesmos, nos seus hordrios de dese: também por isso, as favelas fazem parte da reproducio da de trabalho formal. Foi assim durante o Processo de i lizagao por substituicao de importagées ¢ é assim atualmente, nas cidades conhecidas como globais. As favelas integram as cidades de paises como o Brasil’. A incrivel auséncia do estudo da questo urbana nos cursos académicos de economia, sociologia, engenhariae — direito, além do desconhecimento dos setores de esquerda, Nos remetem as muitas consideracées feitas por intérpretes da “formacao nacional”, para adotar a expressao de Plinio Sampaio Jr. (Sampaio Jr., 1999) sobre a alienagao do inte- lectual brasileiro em relacao a realidade do pais (Fernandes, 1977; Viorti da Costa, 1999; Schwarz, 1973; Furtado, 2008). E inconcebivel que o BNDES (Banco Nacional de Desenvol- vimento Econémico e Social), um dos maiores fomentadores de desenvolvimento econdmico ¢ social na América Latina, em um governo de centro-esquerda, ignore o impacto de _ investimentos nas cidades ou regides, mas é 0 que acontect » Esse conceito de “desenvolvimento” parece nao passat peo ; mode * Temos desenvolvido esse conccito — as favelas ou moradias ilegais: i — ‘geral, sio parte estrurural de nossas cidades, nao constituem excegio Ver em especial Maricato, 1996. ** Conforme relaco de Tania Bacelar A autora em 2012. 20 rs constraido ¢, 0 que é mais impressionante, nem pela | questio fundiiiria. Além da alienacio decorrente da aaiens _ de dependéacia cultural, a maquina ideoldgica midiatica também ocupa a funcdo de um entorpecente das massas de baixa escolaridade. Dai usarmas frequentemente a expressio analfabeusmo urbanistico ou geografico para expressar essa ignorincia predominante sobre a realidade ¢, em especial, a realidade do ambiente construido (Maricato, 2002). A produco do ambiente construido nos paises capitalistas foi objeto prestigiado de estudos ¢ pesquisas durante a década de 1970, apés as revoltas estudantis do final dos anos de 1960. Merece destaque 0 esforco da chamada Escola Francesa de Ur- banismo integrada por marxistas que tratavam de desenvolver © explicar a producéo do espaco urbano ¢ os conflitos entre capitais ¢ trabalho. Os estudos se detiveram em mostrar que a producio do espaco urbano ou, de um modo geral, do ambiente construido envolvia alguns tipos especificos de capitais. Os con- frontos néo se dao apenas no chao da fabrica, como pretendia a heranca histérica do movimento operrio. A perda de prestigio da fun¢ao social das cidades, no capitalismo central, coincide com a ascensao das ideias neoliberais ¢ concomitante perda de espaco do Welfare State, acompanhando o enfraquecimento dos sindicatos de trabalhadores ¢ perda de espago das forgas de esquerda. O presente texto vai tratar rapidamente: 1) da abordagem marxista sobre o tema da cidade; 2) da cidade no capitalismo periférico; ¢ 3) a cidade na conjuntura brasileira. Portanto, vamos evitar um extenso € abstrato texto acadé- ‘mico ¢ buscar, dentre os marxistas que estudaram a questio urbana, algumas formulagbes que poderio ajudar a reconhecer o que parece ébvio, mas nao é tomado como tal, Cidade ¢ conflitos: a abordagem marxista A cidade é 0 lugar por exceléncia de reprodugao da forca de trabalho. Nao h4 como nao entender essa formulag4o. O munde est se urbanizando crescentemente e, nas cidades, a moradia, a energia, a 4gua, o transporte, o abastecimento, a educagio, a satide, o lazer nao tém solugao individual. Cada vez mais 4 reprodug4o da populag4o que compée a forga de trabalho, em sua maioria, se faz de modo coletivo ou “ampliado”, dependen- te do Estado, como desenvolveu Castells no classico livro La question urbaine, de 1972. Transporte coletivo, infraestrutura € equipamentos sociais s4o necessidades que, apesar do fim do Welfare State ou apesar da tendéncia a privatizacao dos servigos piiblicos aps a década de 1980, ainda permanecem como quer t6es cruciais da luta social nos paises periféricos ou centrais da atualidade. Diferentemente da chamada reproducao simples da forga de trabalho, a reprodu¢ao ampliada nao depende apenas do salario ~ ou, em termos mais precisos, da taxa de saldrio~ _ mas também das politicas ptiblicas, parte das quais sao espe cificamente urbanas, como se estas constituissem um salario indireto. Um aumento de salario pode ser absorvido pelo alto custo do transporte ou da moradia, por exemplo. Como ja foi mencionado, o capital em geral busca mi o ambiente urbano As suas necessidades, mas interessa destacat aqui um conjunto dos Capitais que tem interesse especifico produg4o do espaco urbano, por meio do qual se reproduzem obtendo lucros, juros ou rendas, Faz parte desse grupo especifico os seguintes capitais incorporacao imobilidria (um tipo de capital comercial inict mente estudado por Christian Topaloy em 1974); 2) capital construcao de edificagées; 3) capital de constru¢4o pesada de infraestrutura; ¢ 4) capital financeiro imobiliario- Hai 22 localiza nesse grupo também os proprietarios de terra que podem constituir obstaculos ao processo de reproducao desses capitais ou se associar a eles’, A classe trabalhadora — entendida aqui num sentido amplo, incluindo os informais e domésticos — quer da cidade, num primeiro momento, o valor de uso. Ela quer moradia e servi- gos pliblicos mais baratos e de melhor qualidade. Entenda-se: mais barato e de melhor qualidade, referenciados ao seu estagio historico de reprodugio. Os capitais que ganham com a produgao e exploragéo do espago urbano agem em fungao do seu valor de troca. Para eles, acidade é a mercadoria. E um produto resultante de determi- e lembramos que a terra urbana, nadas relag6es de produgao. ou um pedaco de cidade, constitui sempre uma condicao de monopélio — ou seja, nao ha um trecho ou terreno igual a ou- tro, e sua localizacao nao é reproduzivel — estamos diante de uma mercadoria especial que tem 0 atributo de captar ganhos sob a forma de renda. A cidade é um grande negécio ¢ a renda imobilidria, seu motor central. A renda fundiria ou imobilidria aparenta ser uma riqueza que flutua no espago e aterrissa em determinadas propriedades, gracas a atributos que podem estar até mesmo fora delas, como por exemplo um novo investimento ptiblico ou privado feito nas proximidades. A legislagao e os investimentos urbanos sao centrais para “gerar” essa riqueza que ira favorecer (valorizar) determinados iméveis ou bairros. Esse ¢ um dos principais * Poderiamos lembrar outros capitais envolvidos com os servigos urbanos ou que disputam os fundos puiblicos, como transporte coletivo ¢ individual, iluminacao publica, comunicacio, limpeza, merenda escolar, arendimento a satide etc. Mas para 0 que nos interessa vamos nos restringir Aqueles ligados 4 produgao do ‘espaco fisico. localiza nesse grupo também os proprietarios de terra que podem constituir obstaculos ao processo de reprodugao desses capitais ou se associar a cles’. A classe trabalhadora — entendida aqui num sentido amplo, incluindo os informais e domésticos — quer da cidade, num primeiro momento, o valor de uso. Ela quer moradia ¢ servi- ¢0s piblicos mais baratos ¢ de melhor qualidade. Entenda-se: mais barato ¢ de melhor qualidade, referenciados ao seu estagio historico de reproducao. Os capitais que ganham com a produgio e exploragio do espaco urbano agem em fungio do seu valor de troca. Para eles, a cidade é a mercadoria. E um produto resultante de determi- nadas relac6es de producao. Se lembramos que a terra urbana, ou um pedaco de cidade, constitui sempre uma condi¢ao de monopélio — ou seja, nao ha um trecho ou terreno igual a ou- tro, ¢ sua localizagao nao é reproduzivel — estamos diante de uma mercadoria especial que tem o atributo de captar ganhos sob a forma de renda. A cidade é um grande negécio ¢ a renda imobilidria, seu motor central. A renda fundidria ou imobilidria aparenta ser uma riqueza que flutua no espago ¢ aterrissa em determinadas propriedades, gracas a atributos que podem estar até mesmo fora delas, como por exemplo um novo investimento publico ou privado feito nas proximidades. A legislacao ¢ os investimentos urbanos sio centrais para “gerar” essa riqueza que ird favorecer (valorizar) determinados iméveis ou bairros. Esse é um dos principais * Poderiamos lembrar outros capitais envolvidos com os servigos urbanos ou que disputam os fundos pablicos, como transporte coletivo e individual, ihuminagio publica, comunicagéo, limpeza, merenda escolar, atendimento a satide etc, Mas Re eee ee ee wate ‘espago morivos para as disputas sobre os fundos publicos em, ihe Por exemplo: 0 que sera construldo e, especialmente, onde Abvercura de avenidas, pontes, viadutos, parques, pode muggy 6 prego do metro quadrado nas suas p oxim ] vy cree A : € Logislativos de todos os niveis , a Como | apontou inicialmente Marx ¢ desenvolvey Ha ‘enue o valor de troca da cidade mercadoria ¢ 0 valor de us lade condigto necessiria de vida para a classe trab profunda oposigho que gera um conflito basico (Harvey, ‘Ao lado deste, outros conflitos (secundarios?) sia gi pela forma andrquica como o ambiente construido cresee pendendo das circunstincias histéricas, podem ser notive divergénncias entre: a) o capital em geral ¢ o capital imobilid {como o exemplo que demos no inicio deste texto); geneias internas a fragdes do capital imobilidrio pela d dos ganhos; ¢ ¢) divergéncia entre proprictirios de in capital imobilidrio pelo mesmo motivo”. Podem ser notiveis ainda as divergéncias entre os trabalhadores, especialmente entre os que sio propriet os que no sto, Todos nds ja testemunhamos a oposigao feita por pequenos proprictirios de iméveis populares a favelas qu localizadas na vizinhanga, podem causar depreciagio no de sua propriedade. Evidentemente a capacidade de “ab dessa riqueza que, aparentemente, paira no ar e s¢ cola” a propriedade imobilidria sob a forma de renda ou de sua valo rizacio é maior por parte dos capitalistas do ramo imobilidrio do que pelo trabalhador que tem uma modesta moradia, Mas ela pode chegar até mesmo nos ¢ émodos das favelas, isto é, dria em uma favela se valoriza com as mesmo uma ¢ yantagens crescentes de localizagio e pode propiciar ao seu dono rendimentos com aluguel. E sempre é bom lembrar, ha uma parte dos trabalhadores es capitais que ganham com pree explorados diretamente por es a produgao do espago urbano: construgao que estao entre as categori classe trabalhadora e, segundo alguns autores, 840 fontes extraordinarias de extragaio de mais-valia (Ferro ¢ Arantes, 2006; Maricato, 1984). Para completar esse quadro esquemé 0 papel, cada vez mais importante, do Estado na produgio do espago urbano. E dele o controle do fundo piiblico para inves timentos, e cabe a ele, sob a forma de poder local, a regulamen tacao e o controle sobre o uso e a ocupagio do solo (seguindo, hipoteticamente, planos e leis aprovados nos parlamentos). E, portanto, o principal intermediador na distribuigdo de lucros, juros, rendas ¢ saldrios (direto ¢ indireto), entre outros papéis. Ha, portanto, uma luta surda pela apropriagio dos fundos publicos, que é central para a reprodugio da forga de trabalho ou para a reproducao do capital. Podemos citar como exemplo uta entre investimentos para a circulagio de se dos trabalhadores de as mais exploradas da ico, resta relembrar importante a disp’ automéveis ou investimentos para o transporte coletivo. As megaobras sempre, na histéria das cidades, tiveram um papel especial na afirmagio do poder religioso ou simplesmente politico, mas a associagao entre a arquitetura ¢ 0 urbanismo 25 ¢40 do atraso, modernizacao conservadora, capitalismo tavada, sinnlgosem clas definigées que explicam o paradoss esi do por um processo que se moderniza alimentando-se de formas atrasadas ¢, frequentemente, n4o capitalistas, strictu senso. As dades sao evidéncias notaveis dessa formulacao teérica, ¢, melas, © melhor exemplo talvez seja a construgao da moradia (€ pane das cidades) pelos proprios moradores (trabalhadores de baiza renda). Essa construcao se da aos poucos, durante seus horarios de folga, ao longo de muitos anos, ignorando toda e qualquer legislacao urbanistica, em areas ocupadas informalmente. Francisco de Oliveira forneceu a chave explicativa para gigantesca pritica da autoconstrucio da moradia ilegal (am espécie de produc doméstica) pelos trabalhadores ou pela P™ pulagao mais pobre de um modo geral. Elaesté no rebaixamen? do custo da forca de trabalho, que ocupa seus fins de (horarios de descanso) na construcao da casa (Oliveira. “ Vamos nos concentrar no caso do Brasil para acompanhat a acumulacéo capitalista durante todo periodo de ‘¢fo no Brasil, particularmente de 1940 a 1980, quand? le “eresceu a taxas aproximadas de 7% a0 ano. °——— ‘banizacSo cresceu 5,5% ao ano (IBGE). Ai baixos saldrios correspondeu a urbanizac4o com baixos salérios (Maricato, 1976, 1979, 1996). O exemplo revela que uma certa modernizacao e um certo desenvolvimento ( industrializac4o de capital intensivo, produgao de bens duraveis) dependeram de um modo pré-moderno, ou mesmo pré-capitalista (a autoconstrucso da casa), de producao de uma parte da cidade. Essa imbricacao foi (¢ ainda é) fundamental para o processo de acumulacao ca- pitalista nacional e internacional. Ela se aplicou perfeitamente a producao das cidades que receberam a indtistria automobilistica a partir de 1950 — Volkswagen, Chrysler, Mercedes Benz ~ ese aplica hoje nas cidades que sao chamadas de globais. A terra urbana (assim como a terra rural) ocupa um lugar central nessa sociedade. O poder social, econdmico ¢ politico sempre esteve associado a detencao de patriménio, seja sob a for- ma de escravos (até 1850), seja sob a forma de terras ou iméveis (de 1850 em diante). Essa marca — patrimonialismo ~ se refere também 4 privatizacao do aparelho de Estado, tratado como coisa pessoal. O patrimonialismo esté ligado a desigualdade so- cial historica, notavel e persistente, que marca cada poro da vida no Brasil. E essas caracteristicas, por outro lado, estao ligadas ao processo de exporta¢ao da riqueza excedente para os paises centrais do capitalismo. Celso Furtado mencionou varias vezes em seus trabalhos o convivio da exportacdo da riqueza excedente com uma estreita elite nacional consumidora de produtos de luxo. Esse quadro forneceria as caracteristicas de um mercado, por assim dizer, travado (Furtado, 2008). Recente relatério da ONU-Habitat “Estado de las Ciudades de América Latina y el Caribe 2012” mostra que o Brasil, a sexta economia do mundo, mantém uma das piores distribuigdes de renda no continente, mesmo apés 0s avangos nesse sentido verificados nos governos do presidente Lula ¢ da presidente te repeessora. Além da podeross maquina mididcica, a generale Taso do déban politico € 0 favor como mediaczo uniwenal ae selacées que cxplicam muito a cidade ¢ uma sui generis fooma alguas, cidade para alguns. (Castro ¢ Sthva, 1997). Nem todos os indicadores sociais s40 negatives no pases de usbanizacso concomixante 2 industrializacso que xe demas decomrer do século XX, mais exatamente a partis de 1930.8 mortalidade infaseil, a expectativa de vida, o nivel de escola eo aceso 3 agua tratada, 2 coleta do lino ¢ 2 taxa de festadade feminina apsesentam uma cvolucso positiva a partis de aaé mossos dias. exztamente devide 2 mudanca de vida com? wrbanizacio (IBGE, 2008). No encanto, os clexos da dou neoliberal que acompanhou 2 chamada globalizacéo sae 2 perspectiva de crescimenso, zinda que scompanhade deo cemeragao de renda (Schwarz, 2007). A populace moradors de fzvelas cresceu mais do Oe populacie total ou do que a populac’c urbana nos Slee anos, io é, de 1960 2 2010 (IBGE). en a anuéncia das elites nacionais, as metrépoles brasileiras nas caminho contrério ao interesse ¢ necessidades da maior parte da populac4o (Cano, 1995; Tavares ¢ Fiori, 1997). As trés politicas Pablicas urbanas estruturais (ligadas & produczo do ambiente Construido) — transporte, habitacao e saneamento — foram igno- radas ou tiveram um rumo errético, i mados em 2003, na gestao do presidente Lula (Maricato, 20116). Talvez, 0 indicador que mais evidencia 0 que podemos chamar de tragédia urbana é a taxa de homicidios, que cresceu 259% no Brasil entre 1980 ¢ 2010. Em 1980, a média de assas- sinatos no pais era de 13,9 mortes para cada 100 mil habitantes, em 2010 passou para 49,9 (Weisclfise, 2013). Certamente essa ocorréncia nao se deveu apenas a esses fatores ¢ nem se limita as cidades brasileiras. Nao € possivel abordar um assunto t4o estudado em poucas palavras. Mas nao hd divida de que ela compée 0 quadro de abandono do Estado provedor, ainda que tratemos do provedor na periferia Nas décadas perdidas: luta social pela cidade Movendo-se contra a corrente mundial de en} dos partidos de esquerda, do declinio do crescimento eda retragao do Estado provedor, o Brasil dos anos 1980, va um quadro contrastante. Enquanto a economia ap, uma queda acentuada, ao mesmo tempo que lutavam contra governo dirarorial, movimentos sociais ¢ operirios claboravam plataformas para mudangas politicas com propostas programs. tieas, Na década de 1980, foram criados novos partidos, outros partidos de esquerda sairam da clandestinidade, novas entidades openirias foram fundadas ¢ ainda havia os movimentos sociais urbanos — uma novidade na cena politica brasileira, pelo menos com a expressao que ganharam na ocasido. Um vigoroso Movimento Social pela Reforma Urbana recuperou as propostas elaboradas na década de 1960, no con- texto das lutas revoluciondrias latino-americanas. Trataya-se de construir a ponte com uma agenda que a ditadura havia inverrompido a partir de 1964. Na década de 1960, o Brasil tinha 44,67% da populagao nas cidades (censos IBGE), Em 1980, ja eram 67,59%, Houve um acréscimo de cerca de 50 milhes de pessoas nas cidades, e os problemas urbanos s¢ aprofundaram, Esse movimento reunia entidades profissionals (arquitetos ¢ urbanistas, engenheiros, advogados, assistentes sociais), entidades sindicais (urbanirarios, sanitaristasy seror de transportes), liderangas de movimentos sociais, om pesquisadores, professores, intelectuais, entre outros. Por 7 influéncia, foram criadas comiss6es parlamencares € fora eleitos prefeitos, vereadores ¢ deputados. tea No que se refere ao destino das cidades, na ag} ‘ind litiea estavam presentes: a) as mobilizag6es sociais a partidos politicos; b) a produgao académica q a desvendar a cidade real (com diagndsticos sobre as estratéyias de reprodugao dessa forca de trabalho de baixos salérios), des montando as construgées simbélicas ¢ ideolégicas dorninantes sobre as cidades; ¢ c) governos municipais inovadores que ¢ pe rimentaram novas agendas com programas sociais, econdmica e politicamente includentes ¢ participativos. Durante o regime de excecao (1964-1985), os prefeitos das capitais eram indicados pelos governadores, que eram indicados pelo presidente da Reptiblica, que era indicado pelas Forgas Armadas e forcas econdmicas que lhes davam sustentag4o. Portanto, as experimentagées de gestao local democrdtica se davam nos demais municipios onde havia elei¢4o direta para prefeito. Entre os urbanistas, ganharam importancia nessa fase as experiéncias de Diadema, municipio operdrio da Regiao Me- tropolitana de Sao Paulo, com suas propostas de inclusao social e urbana elaboradas por profissionais ativistas em contexto de forte luta social. Apés 1985, com eleigées livres para prefeito nas capitais, duas mulheres foram eleitas para o governo do municipio de Sao Paulo, com um intervalo entre elas — Luiza Erundina (1989-1992) e Marta Suplicy (2001 ¢ 2004). Suas administrac6es deixaram marcas profundas nas 4reas do trans- porte, da cultura, da assisténcia social, que permanecem como paradigma apés muito anos. Chamam a atenc4o as experiéncias de Belém, democratizan- do a participagao com o Congresso da Cidade ¢ modernizando aadministragao com 0 cadastro multifinalitario urbano; de Belo Horizonte, com as propostas de abastecimento doméstico que permitiram baratear o preco da comida; de Recife, com a poli- tica de forte afirmagao das raizes multiculturais, em especial da miisica afro-brasileira, além das aces de prevencao contra riscos por desmoronamento nas dreas de moradias pobres; de Santo 31 Aniliré, com a politica de saneamento ¢ habltagio; Sul, com a insergao até mesmo das eriangas na di © futuro da eldade, entre outras, Mas foi 0 orgamento: pativo de Porto Alegre que constituiu a mudanga mais 3 de Fame nas administragdes urbanas ¢ ne seu planejamen, O Orgamente Participative praticado durante quase duas décadas em Porto Alegre constituiu uma mudanga no paddle dos investimentos urbanos, Ele significou a ruptura como investimento publico submetido aos interesses do mercado imobilidrio, © que, por sua ves, alimenta a segregagdo rerrite- rial eas desigualdades, Outros /abéies muito bem organizades, que indefectivelmente acuam junto as Camaras Municipals, encontram dificuldades em agir. Os excluidos passam a sujet tos politicos que participam diretamente das decisées. Podem, portante, exercer algum controle sobre o Estado, que se toma mais praximo ¢ mais transparent, Rompe-se também com & indefectivel clientelisme politico, embora isso dependa do grat de democracia exercida no proceso, pois © risco da coopragle eda relagdo de toca de favores esta sempre presente, O Ongar mento participative muda o lugar ea naturera do planeament urbana, Os governos municipais que inauguraram gestOes! ras, autodenominadas “democraticas ¢ populares” =se pela “inversko de prioridades” na discuss do, priblico ¢ a participagdo social em todos os niveis, OF} do PT foram tao bem-sucedidos que passaram a st sob a marca do “modo petista de governar™. As eram ctiativas ¢ ofetivas, respondendo com 0 problemas colocados pela realidade local. Nesse projetos arquitetdnicos, urbanisticos ¢ legais relat a enenaet (cidade ilegal, auroconstruida, ¢ » ubanizads) ganhs importincia, pois ses utanismo do mainsream, Vor isso, o programas de se dividiam entre 06 que buscevam secuperas « cide consAidada (onde nhc houvesse dorboulo andbhencs para ieee © produgio de novas moradias nova Apen: due st, $ para fegisttar um exemy portante, wax iniciativas mais bem-sucedidas em Sho Paulo buscava das 4 qualidade para a vida de criangas ¢ adolescentes nos lyaixce: pobres, por melo da construgho « operagan de (CFM 9) Cenasax Educacionais Unificados, Vratava-se de criar us destacada qualidade arquitethnica, bem “4 vipado, auc cher cursos regulates, cinema, gindstica, artes isticas, programs teatrais ¢ musicais, inéditos na periferia urbas no centro dos baittos periftric« um pedaco de um universo discrepante, modernizante, em relacho a0 entorne Imagem 1s CRY da Var ~ Brreibandia, Gi Pesdey, 2012 Ke: Gone Maps, 212 que atuou como partido politico representando a elise do Com o passar do tempo. durante as décadas de 9 1990, pesquisadores, professores unrversicaris ¢ proGissionaitsde diwersas dreas, socialmente engajados. criuzram o que podemas chamar de Nova Escola de Urbanismo. Se antes esses ageames exam criticos do Estado ¢ das politicas publicas, a partirdacam 7 quista das novas prefeiruras ¢ com o crescimento dos partidios de esquerda, notadamente do PT, eles foram se apropriando de parcelas do aparetho de Estado nos Executivas, nos parlameans €, com menos importincia. até mesmo do Judiciiria. Novas programas, novas priticas, novas leis, nowos projetos, BOWE procedimentos, sempre com participacio social, permitinam @ desenvolvimento também de quadros téonicas e de fonoae-haae sobre como perseguir maior qualidade ¢ justica urbama’. As travas da macroeconomia estavam colocadas como obsticalos ‘a serem resolvides no futuro. Esse movimento pela Reforma Urbana avancou conqunsa _ do importantes marcos institucionais. Dentre des a) um conjunto de leis que, a partir da Constituiggo ‘Ver algumnas referencias bibliogrificas em Maricano, 2011, 2011. a mais importante delas; b) um conjunto de entidades, como o Ministério das Cidades (2003) ¢ as secretarias nacionais de habitacao, mobilidade urbana ¢ saneamento ambiental, que retomavam a politica urbana agora de forma democratica; e ©) consolidagao de espagos dirigidos 4 participacao direta das liderangas sindicais, profissionais, académicas e populares como as Conferéncias Nacionais das Cidades (2003, 2005, 2007) e Conselho Nacional das Cidades (2004). Cidades na conjuntura atual: a retomada do investimento publico e a surpreendente subordinacao do espaco urbano ao capital Nao ha dtivida de que as politicas sociais implementadas pelos dois governos de Luis Inacio Lula da Silva fizeram dife- renga na vida de milhdes de brasileiros. Os principais programas sociais do governo Lula que tiveram continuidade na gestao de Dilma Rousseff foram: Bolsa Familia, Crédito Consigna- do, Programa Universidade para todos (ProUni) — bolsa de estudo em universidades privadas trocadas por impostos —, Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) ¢ Programa Luz para Todos. Garantiu-se um aumento real do salério minimo (de cerca 55%, entre 2003 ¢ 2011, conforme Dieese). Além desses programas, o crescimento da economia e do emprego, propiciado por condigées de troca internacional, trouxeram alguma perspectiva de esperanca de dias melhores. Em vez de reforgar explicagées que veem no aumento da renda de uma grande camada, a emergéncia de uma nova classe média, Marcio Pochmann classifica o fendmeno como um reforco das camadas que se encontram na base da pird- mide social. Estes aumentaram sua participagao relativa na renda, que estava abaixo de 27%, para 46,3% entre 1995 ¢ a5 2009. Os classificadas em “condigéo de pobreza” diminuiram sua representacdo de 37,2% para 7,2% nesse mesmo periodo, Parte dessa populagio que migrou da condigéo de pobreza para a base da pirimide empregou-se na construgao civil (Pochmann, 2012), O grifico abaixo mostra os ntimeros de queda do desemprego nas atividades em geral em relagio a este setor da economia. Grifico 1: Taxa de Desemprego (%) ~ Conjunto de 6 RMs Total de atividades x Construgéo, 2014 Hii ‘ares ox somcupeyte no semana ofr, pense ena ma ee 8 a Ge ‘+ Tana 6 aesacupare na semana eric, ox perme 10 ars ox ma ae seer Fone: PME/IBGE Elaborate: Banco de Dados ~ CIBIC, 2014/Rafael Borges Pereirs, A construgio civil foi um dos gutomobilistica. Vamos tratar dessa trinca de capitais — capital jmobilidrio, capital de construc4o pesada ¢ industria automotora — que garantiram uma reacao anticiclica positiva em relacao 4 crise internacional de 2008, mas conduziram as cidades para uma situacao tragica apés quase 30 anos de baixo investimento. A retomada dos investimentos ptiblicos comecou lentamen- te, freada pelas travas neoliberais que proibiam gastos sociais. Mas a partir de 2007 0 governo federal lancou o Programa de Aceleracao do Crescimento (PAC) e, em 2009, o Programa Mi- nha Casa Minha Vida (MCMV). Com o primeiro, a atividade de construcao pesada comega a decolar e, com o segundo, é a construcio residencial que decola (CBIC, 2015). O PAC se destina a financiar a infraestrutura econdmica (rodovias, ferrovias, portos, aeroportos ¢ toda a infraestrutura de geracao € distribuicao de energia) ¢ a infraestrutura social (4gua, esgoto, drenagem, destino do lixo, recursos hidricos, pavimentacio). Ele federalizou o Programa de Urbanizacao de Fayelas: finalmente 0 governo federal no Brasil reconhecia a cidade ilegal € 0 passivo urbano, buscando requalificar e regu- larizar 4reas ocupadas ilegalmente. Muitos bairros pobres de um universo gigantesco passaram por projetos de recupera¢ao urbanistica, elevando a condic¢ao sanitaria e de acessibilidade, entre outras. Jéo MCMV € diferente. Retoma-se a visio empresarial da politica habitacional, ou seja, de construgao de novas casas, apenas, sem levar em considera¢ao 0 espaco urbano em seu conjunto ¢ muito menos a cidade j4 comprometida pela baixa qualidade. Com a finalidade explicita de enfrentar a crise econdmica de 2008, o MCMV apresenta pela primeira vez uma politica habitacional com subsidios do governo federal. Desenhado 37 pelo Ministério da Casa Civil do governo federal Rowsseff 4 frente), em parceria com os maiores do setor, 0 programa inclui regras para a sec empréstimo. Buscava-se evitar 0 saldo desastrose caracterizado © fm do sistema realizado durante 0 hag a com as instiruigbes centrais - Banco Nacional de Hating. ao, Plane Nacional de Sancamento ¢ Agéncia Nacional de Transporte Urbano. O programa concluiu uma reforma de financiamento imobilidrio que vinha sendo ensaiada, com virias medidas, desde a década de 1990; mas, nuncaédemais lemibrar, a questio fundidria ficou invocada (Royer, 2014) 6 MCMV formalizou as condicées para um boom imobilidsie no Brasil Grihco 2: Financiamento habitacional privado, 2014 (RS bithées) Vivemos um paradoxo: quando finalmente @ Esade " co investimento em habitacso, seas ino de forma mais decisiva, uM fundiiria ¢ imobilidrla a elevacao do prego da terra e dos iméveis, considerada a “mais alta do mundo”. Entre janeiro de 2008 e janeiro de 2015, 0 prego dos iméveis subiu 265,2%, no Rio de Janei- ro; ¢ 218,29, em Sao Paulo, liderando o aumento, entre as capitais do pais (Fipe ZAP, 2015). E tudo, especialmente, porque a terra se manteve com precario controle estatal, apesar das leis e dos planos que objetivavam o contrario. No mais dos casos, as Camaras Municipais e Prefeituras flexibilizaram a legislacao ou apoiaram iniciativas ilegais para favorecer empreendimentos privados (Fernandes, 2012). Uma simbiose entre governos, parlamentos e capitais de incorporacao, de financiamento e de construgéo promoveu um boom imobilidrio que tomou as cidades de assalto. Se nos EUA 0 mote da bolha imobilidria se deu no contexto especial da especulacao financeira, cremos que, no Brasil, o core do boom aliou ganhos financeiros a histérica especula¢ao fundidria (patrimonialista), que se manteve — provavelmente ainda como espao reservado & burguesia nacional — agora no contexto da financeirizagao". O “né da terra” continua como trava, revisitada na globalizagao, para a superacao do que podemos chamar de subdesenvolvimento urbano. Pela primeira vez na histéria do Brasil, o governo federal reservou subsidios em volume significativo, para que as ca- madas de mais baixa renda nao ficassem de fora da produgéo habitacional. Mas como a moradia é uma mercadoria especial (porque é vinculada a terra, uma condi¢ao nao reproduzivel), os subsidios incidiram no aumento do prego da terra. * Para Lessa e Dain, 0 setor imobilidrio ¢ de construgao pesada esto historicamente reservados & burguesia nacional. Cf. Lessa e Dain, 1998. Sobre a bolha americana, cf. Fix, 2011. 39 --uttel Wain Palen Poet Ramen 0/12/11 (Abon i 2011 Karmen: Rata! Barges Price Para no remeter todas as criticas ao governo federal, é pre. ciso lembrar que a questio urbana/fundiaria é de competénela constitucional dos municipios ou do governo do Estado, quan do se trata de regido metropolitana. Mas nenhuma instincts de governo tocou nas propostas da Reforma Urbana, sequer em discurso. Em relagdo ao poder local, houve um retroceme. © “modo petista de governar” recuou. A centralidade da terra urbana para a justica social desapareceu. Aparentemente a po- litica urbana se tornou uma soma de obras descomprometidas com @ processo de planejamento. Os planos, como sempre, cumpriram o papel do discurso ¢ no orientaram os invest mentos (Villaga, 2012). Outros fatores como os interesses do mercado imobiliario, o interesse de empreiteiras, a prioridade As obras vidrias ou de grande visibilidade deram o rumo par aplicagio dos recursos. O que mais se vé na conjuntura atual sho planos sem obras obras sem planos, seguindo interes de articulagdes de capitais, proprietarios de iméveis ¢ 0 finan- damento de campanhas eleitorais”. Qs motives do enfraquecimento das forgas que lutaram Reforma Urbana ou que puseram de pé ¢ implementaram uma politica urbana que contrariou, ainda que por um periodo Jimitado, a cidade selvagem, ainda esto 3 espera de melhores anillises, Mas, sem diivida, muitos dos participantes dessa luta foram engolidos pela esfera institucional. Atualmente, a maior parte deles esti em cargos piblicos ou ao redor deles (Maricato, 2011a). Gom os megaeventos da Copa do mundo em 2014 ¢ das Olimpiadas em 2016 (no Rio de Janeiro), vemos uma radica- lizagdo da febre que acompanha 0 atual “deem” imobilidrio. Seguindo a trajetdria dos paises que sediam esses grandes eventos, a “maquina do crescimento” (uma articulagio de entidades internacionais, governos ¢ capitais) é posta a fun- cionar, buscando legitimar, com 0 urbanismo do espeticulo, gastos pouco expliciveis para um pais que ainda tem enorme precariedade nas dreas da satide, da educagio, do saneamento e dos transportes coletivos. Muitos exemplos poderiam ser dados sobre a truculéncia com que as grandes obras expulsam moradores das redonde- zas para viabilizar um processo de expansio imobilidria ¢ de construcao de um pedago do cendrio urbano global. Boa parte dessas grandes obras resta subutilizada apés abocanhar um significative naco dos cofres publicos em sua construgio. A dindmica que acompanha os megaeventos articula, de um modo * O fimanciamento de campanhas cleitorais resulta em grande definiddor da politica urbana: 62% do financiamento nbo partidirio na cleicdo de 2012 da ‘Camara Municipal de Séo Paulo veio dos setores empresariais imobiliirio e de constructa. Ver a respeito © site Arquiretura da Gentrificagio, 2015. ar geral, os arquitetos do star system, como not y legisladores que acertam um conjunto de regras de & satisfazer as exigéncias das entidades internacionais x ou culturais; governos de diversos niveis, que investem e buscando maior visibilidade ¢ 0 retorno financeiro € sob a forma de apoio 4 futura campanha eleitoral; e emp privadas locais ¢ internacionais, A bibliografia repete a recelta dessa nova frente de acumulagao de determinados capitais, ana lisando casos de diferentes paises (Jennings, Rolnik etal... 2014), : P O império do automével. Transporte coletivo em ruinas Apés muitos anos de auséncia de investimentos nos trans portes coletivos (de 1980 até 2009, aproximadamente), com algumas exceg6es, a condigio de mobilidade nas cidades tornou- -se um dos maiores problemas sociais ¢ urbanos. E importante dar alguns dados para qualificar esse quadro de inacreditavel irracionalidade para a mobilidade social, mas de efetiva racio~ nalidade para certos capitais. © tempo médio das viagens em Sao Paulo era de 2 horas ¢ 42 minutos, Para um terco da populagao, esse tempo er de mais de 3 horas. Para um quinto, era mais de 4 horas, ou sea, uma parte da vida é vivida nos transportes, seja cle um carro de Juxo, ou, o que é mais comum e atinge os moradores da periferia metropolitana, num dnibus ow trem superlotado (ANTP-SIM, 2012), Estresse, transtornos de ansiedade, depressio sio doengas que acometem 29,6% da populagio de Sao Paulo, segund? pesquisa do Nuicleo de Epidemiologia Psiquidtrica daU : Dentre cidades de 24 pafses pesquisados, Sao Paulo ¢ a 4! presenta o maior comprometimento da satide da populas’ da ao trafege nportante dessas mazelas ¢ atribui rade, 2012). a2 Os congestionamentos de tréfego nessa cidade chegam a atingir 763,79 km de vias. A velocidade média dos automéveis em Sao Paulo, entre 17h e 20h em junho de 2012, foi de 7,6 km/h, ou seja, quase a velocidade de caminhada a pé. Durante a manhi, a velocidade passa a ser de 20,6 km/h, ou seja, a de uma bicicleta (ANTP-SIM, 2012). Todas as cidades de porte médio e grande estao apresentando congestionamentos devido a avalanche de automéveis que entra nelas a cada dia. O con- sumo ¢ incentivado pelos subsidios dados pelo governo federal e alguns governos estaduais para a compra de automéveis. Em 2003, o numero de automéveis em 12 metrépoles brasileiras era de 23,7 milhées e, em 2013, era de 45,4 milhdes, ou seja, praticamente dobrou. Nesse mesmo periodo e nessas mesmas cidades, o ntimero de motos passou de 5,3 milhées para 18,1 milhes, ou seja, quase quadruplicou (Anudrio da Fenabrave, 2013). O governo brasileiro deixou de recolher impostos no valor de R$ 26 bilhdes desde o final de 2008 (nesse mesmo periodo foram criados 27.753 empregos) e US$ 14 bilhoes (quase o mes- mo montante dos subsidios) foram enviados ao exterior, para as matrizes das empresas que estao no Brasil aliviando a crise que estavam vivendo na Europa e Estados Unidos (Affonso, 2009). Sabemos que, em todo o mundo, mesmo cidades com boa rede de transportes apresentam congestionamentos de trafego devido ao conforto ¢ ao fetiche representado pelo automével. Mas é preciso conhecer os impactos econdmicos, ambientais € na satide que esse modo de transporte implica, nas cidades brasileiras, para compreender e passar& perplexidade inevicavel. Comparado com os demais modos, os automéveis sao res- ‘ponsaveis por 83% dos acidentes (Weiselfisz, 2013) ¢ 68% das i poluentes (ANTP-SIM, 2012). em Sao Paulo, entre 17h ¢ 20h em junho de 2012, foi de 7,6 ken/h, on seja. quase a yelocidade de caminhada a pé. Durante amanhi, a velocidade passa a ser de 20,6 km/h, ou scja, ade sama bicicleta (ANTP-SIM, 2012). Todas as cidades de porte mitdio ¢ grande estéo apresentando congestionamentos devido 4 avalanche de amoméveis que entra nelas a cada dia. O con- alguns gowernos estaduais para a compra de automoveis. Em 2003, o mimero de auroméveis em 12 metropoles brasileiras xa de 23,7 milhées ¢, em 2013, era de 45,4 milhées, ou seja, Peaticamense dobrou. Nesse mesmo periodo ¢ nessas mesmas Gidades, © mimero de motos passou de 5,3 milhées para 18,1 midhoes, ou seja, quase quadruplicou (Amuario da Fenabrave, 2013). (O govemo brasileiro deixou de recolher impostas no valor de RS 26 bilhdes desde 0 final de 2008 (nese mesmo periodo foram criados 27-753 compregos) ¢ USS 14 bilhdes (quase o mes- ‘mo montante dos subsidios) foram enviados ao exterior, para as matrizes das empresas que estao no Brasil aliviando a crise que Grafico 4: EmissGes totais de poluentes por modo, 2012 (milhées de toneladas/ano) bana 2012, ANTP-SIM ¢ oa. Re Ultimos 5 anos, Segundo o Ministério da Satide, nos tltim Morreram em diae acidentes de transite 110 Pessoas por “proximadamente 1.000 ficaram feridas, Quase o dobro numero de tos ¢ fazer entregas rapidamente, Ri + tamados ™otoboys respeitam regras de tramsit® 3 tapider ¢ sua Vantagem competitiva. > Brifico abaixg, tetirado do “Relatério Geral d& lidade Urbana 2012” da Associacao Nacional de Ti Paiblicos (ANTP) traz dados sobre o modo das viagens nas 438 cidades brasileiras com mais de 60 mil habitantes; o que mais chama a atenc’o € 0 numero de viagens nao motorizadas, ou seja, pelo menos um terco dos moradores das cidades com mais de 1 milhao de habitantes. Esse dado nao indica que as cidades atingiram 0 equilibrio de aproximar casa, trabalho, estudo ¢ demais equipamentos € serv cos urbanos que demandam viagens didrias. Ao contrario, nas periferias metropolitanas, raramente ha bons equipamentos de sade, abastecimento, educacao, cultura, esporte etc., e, como o transporte é ruim € caro, os moradores, em especial os jovens, ivem o destino do “exilio na periferia”, como cunhou Milton Santos (Santos, 1990). Nunca é demais lembrar que pobreza e imobilidade é receita para a violéncia. Grafico 5: Diviso modal, 2012 4% moto 4% Fonte: Relatéeio Geral de Mobilidade Urbana 2012, ANTP-SIM. Elaboracie: Rafael Borges Pereira 45 Em que pese a ainda baixa participacao dos a mumero de viagens ¢ 0 estimulo dado 20 seu r lembrar que as obras viarias ganham prioridade exemplo, as obras de saneamento, nos orcamentos influenciar os votos nas eleicées. O impacto da poluicao do ar promovida por tal condicao de mobilidade sobre a satide vem sendo estudado por Paulo Saldiva, professor da USP, e sua equipe. Vamos reproduzir suas proprias palavras: De acordo com a OMS, os elevades niveis de poluicao ma cidade de Séo Paulo sio responsiveis pela reducio da expectativa de wid em cerca de um ano e meio. Os trés motives que encebecamaliea | sic: cancer de pulmo ¢ vias aéreas superiores: infarto agadode miocirdio c arritmias ¢ bronquite casma. Estimasequea cada 10 microgramas de poluicao retiradas do ar hi um sumeame de oiso meses na expectativa de vida (Saldiva, 2008). Aproximadamente 12% das internacées respirarorias So Paulo sao atribuiveis 2 poluicao do ar. Um em cada det infartos do miocirdio sio 0 produto da associaggo entre wifes € poluicao. Os niveis atuais de poluicao do ar respondem pet quatro mil mortes prematuras ao ano na cidade de Sao Paulo Trata-se, portanto, de um tema de satide publica. de baseada no automével acarreta para a qualidade de vidae® da urbanizaczo ou outras mazelas que ocuparam longas hor itatesirins acad®rnicos ou profiscionais. Maite papel Se andlisescritcas muita propostas foram claboradas PA Phoraresse quadro, mas essa prioridade indiscutivel queé ¢ anette bana nc csci a firmed 0 documento, discurso ou plano, no Brasil. Ao contrdrio, todos os anos as autoridades comemoram o “dia mundial sem carte” (22 de setembro), com repetidas énfases sobre a importaneia da bicicleta ¢ da caminhada para a satide. Tanta irracionalidade, como foi descrito aqui, haveria de merecer uma resposta. E ela veio nas ruas, a partir de J) de junho de 2013 quando tem inicio manifestagbes saciais contra o aumento da tarifa dos transportes coletivos. Desde entao, até o momento em que essas paginas sao escritas, novernbro de 2014, manifestantes de diversas causas ¢ matizes nao deixaram as ruas, especialmente nas cidades do Rio de Janeiro ¢ Sao Paulo Quando novissimos personagens entram em cena Para os que acompanham as condig6es de vida das cidades brasileiras, a adesao massiva aos primeiros charmados do Mo- vimento Passe Livre (MPL), contra o aumento da tarifa dos transportes coletivos, em junho de 2013, nao surpreendew. Mas as conquistas sim, a comegar pelo fato de que mais de 100 cidades voltaram atrés no reajuste das tarifas € est4 colocada uma forte tensao sobre o sisterna de mobilidade € 05 aurnentos dos préximos anos. Organizados em rede ~ negando a hierarquia ¢ a centra- lizacéo — informados, politizados, persistentes (o MP1. luta contra o aumento das tarifas nos transportes publicos h4 oito anos), criativos, inovadores, bem humorados, apartidarios mas nao antipartidos, criticos a politica institucional, formados especialmente por integrantes de classe média (mantendo, porém, forte vinculo com movimentos da periferia). Essas sao algumas das caracteristicas dos novissimos personagens, grupos organizados de forma fragmentada ¢ reunidos sob dificulta uma andlise conclusio deste texto, vamos nos ocUpar para mudangas de cardter progressista. Talver, 0 fato de ser constituldo por integrantes de média 60 que explica a decivio do MPL, naquele 11 de junhe de 2013, de enfrentas a policia. Dessa ver, como em anes ane terioves, a policia nao iria tira os manifestantes das ruas, Bes se am ¢ voltavam a se encontrar ha quadra ao lado. Os celulares ajudaram muito nessa ttica, H4 um movimento ‘culuural febril nas periferias urbanas, mas cada proletirio sabeo the custa enfrentar a policia. Nao ¢ nec essdrlo decidirse pela confromagio, Bla se dé todos os dias. ‘Ao comnshrio da esquerda tradicional, os novissinos perso nagens querer mudangas aqui ¢ agora, em vez das abordagens hholleticas consiruldas em torno das grandes reformas ou sever hes, As demandas podem ser pontuais, mas referidas a pomtos de grande impacto politico ¢ social. A recuse ao reajuste das rarifas est ligada a urn radicalissimo mundo sem catracas, Vasila xe10, Vhobilidade woral para todos. O que é malt ina vida urbana do que ter mobilidade? Acessas 4 independente do local de at Algumas conquistas das jornadas de junho ea urgéncia com que elas foram atendidas seriam impensdveis antes de junho de 2013. Para dar um salto na compreensao do que esta acon- tecendo e diante da dificuldade de andlise, vamos apresentar alguns fatos, uma lista de conquistas surpreendentes a partir das chamadas jornadas de junho que tocam no cora¢ao das cidades. ‘Além de recuperar a discussao sobre o transporte urbano na sociedade brasileira, apés quase 30 anos de ter sido banido pelas politicas neoliberais, outros temas de politicas publicas foram despertados. Um deles, 0 mais paradigmético foi sobre a politica de seguranga. Por milhares de registros fotograficos e videos, evidenciou-se que a policia cria, frequentemente, a inseguran¢a 0 panico. (Como nao ver muitos dos policiais como vitimas de uma politica que prioriza o patriménio ao ser humano? De uma corporagao que tem tradi¢ao de torturar e matar negros € pobres?). O sumigo de um morador, 0 pedreiro Amarildo, que havia sido preso pela Unidade de Policia Pacificadora (UPP) da favela da Ro- cinha no Rio de Janeiro, foi transformado em caso exemplar pelas manifestacdes em varias partes do pats. Criou-se um movimento to avassalador, uma verdadeira campanha espontinea — “Cadé o Amarildo?” — que o governo do Rio de Janeiro nao teve outra alternativa senao investigar 0 caso. Este culminou numa revelacao, antes impensével, de morte sob tortura € ocultagao de cadaver. Os Amarildos s4o muitos. O precedente foi aberto. Outras conquistas sob o clamor das ruas em Sao Paulo: 1. foi criada a CPI dos Transportes Puiblicos na Camara Municipal de Sao Paulo — votada sob pressio de 60 jovens ma- nifestantes que tomaram a CMSP. Eles prometem acompanhar os trabalhos da CPI; 2. foi suspensa a licitagao do transporte coletivo sobre énibus no valor aproximado de R$ 43 bilhoes. Esté dada a chance de 49 ordenar os trajetos de cada companhia de énibus Na cidag le subordinando-as a um plano municipal e metropolitan, Ne fa deverd decorrer desse novo arranjo administratiyo espacial 3, foi suspenso pelo prefeito Fernando Haddad 9 inicig de obra de tiinel (que 0 exprefeito se apressou em deixar licitado com antecedéncia) no valor inicial de R$ 3 bilhdes (equivalente 250% do orgamento da Secretaria Municipal de Satide), 9 projeto, que tem légica mais imobilidria que vidria, nao admitia acirculacao de énibus, mas tao somente de automéveis, Aleida Operacao Urbana Aguas Espraiadas, que contém 0 Projeto do tinel, contraria principio basico do Plano Diretor de prioridade ao transporte coletivo; 4. os corredores de 6nibus passaram a ser implantados imediatamente, mostrando que nem tudo depende de obras e grandes recursos. O tempo gasto no transporte coletivo em alguns trajetos j4 diminuiu; 5. a Prefeitura rejeitou alvaré de licenga para um aeroporto privado em area ambientalmente fragil — Area de Protegao aos Mananciais — ao sul do municipio’. Sobre a cidade do Rio de Janeiro, muito haveria para dizer, mas, do ponto de vista urbano, para comegar nossa lista, ha dois eventos importantes que merecem destaque: 1, desisténcia da privatizacao do Maracana. A privatizagao previa a destruicao de um parque aquatico, de uma praca ¢- portiva e de uma escola publica fundamental, que servem 20 j jovens da regiao. Ao desistir de demolir esses equipamentos el ‘ O Rodoanel— obra biliondria de trajeto questiondvel qu tucanos esto promovendo nos arredores da Reg Paulo —cortou a Area de Protesao dos Manancia ‘entam “plugar” na megaobra viéria, a a privatizagao perdeu a atracao para os capitais privados (ao menos por enquanto); 2, fim do despejo da Comunidade do Autédromo. Apés uma longa queda de braco entre os moradores, que contaram com a ajuda do IPPUR da UFRJ, ea prefeitura, esta desistiu de remové-los. Enfim, a partir de 11 de junho jé foram desmontadas muitas tentativas de assalto as cidades brasileiras ¢ os direitos sociais se afirmaram em muitas ocasi6es, 0 que estava ficando raro. Para explicar os acontecimentos, analistas lembraram a faléncia das representag6es politicas, o completo despreparo da policia para se relacionar com manifestacdes democraticas (embora a presenga dos blackblocs questione essa classificagao), a exigéncia de melhores condigées de vida por parte de uma classe média que emergiu com as politicas sociais dos tltimos anos, entre outras causas, Para nés, faz parte dessa explica¢ao a piora nas condigées de vida urbana, como foi visto aqui, causada, prin- cipalmente por: 4) a disputa pelo ) fund puiblico que, em vez dese dirigir a reprodugao da forca de trabalho, se dirige a reprodugdo do capital; ¢ b) ao esquecimento da Reforma Urbana, cuja centra- lidade é a fungao social da propriedade, prevista na Constituicao Brasileira, no Estatuto da Cidade e em todos os Planos Diretores dos municipios brasileiros. 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