UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
Disciplina: Prática de Pesquisa e Ensino em Filosofia
Tarefa: Apresentar a Tese “a verdade é alcançável somente com a atividade filosófica”, bem como
defender uma tese mais fraca que essa, a saber: a busca pela verdade torna possível o filosofar.
Aluno: Valdir Oliveira Ramos Junior
Faz-se necessário esclarecer que a tese defende a opinião de que a verdade só é
alcançável segundo a atividade filosófica. Evidencia-se, pois, que a atividade filosófica é o
único pressuposto para se obter a verdade. No entanto, ao atribuir essa relação de
exclusividade à atividade filosófica, cria-se um problema: se a atividade filosófica se dá na
construção de pensamentos em função do que é apreendido da realidade, poder-se-á
questionar, portanto, quais pensamentos fariam alusão à verdade, uma vez que todos os seres
humanos são aptos à atividade filosófica? Outro problema surge quanto à confiabilidade
desses pensamentos: não poderia alguém em função da atividade filosófica concluir que o
mundo não exista, embora lhe seja próprio um corpo constituinte de visão, audição, tato,
olfato e paladar? Desse modo, a tese aqui defendida não será esta, posto que são várias suas
implicações, mas uma relação contrária a ela mesma: dado que se busque a verdade, então a
pessoa que o faz questiona a si e o mundo, e uma vez que se questione essas duas instâncias,
à vista disso é possível a atividade filosófica. Portanto, a busca pela verdade torna possível o
filosofar.
A busca pela verdade – o que nela há de mais intrínseco e completo – está presente
desde os seres humanos mais primitivos. A primeira relação que aproxima o homem desse
saber é com os deuses, fortemente expressos nas narrativas míticas. Vale dizer que a
apreensão da existência dos deuses, isto é, o conhecimento de que um deus ou vários deuses
existem surge diante do anseio do indivíduo com o mundo. Tal anseio só é possível porque o
ser humano é o único capaz de racionalidade, ou seja, capacidade de observar, interpretar,
refletir, apreender tudo que está a sua volta. Tem-se aqui, portanto, toda pedra angular da
verdade: sendo o ser humano dotado de razão, este buscará responder às perguntas “quem
eu sou” em uma análise de si mesmo e “o que é a vida” objetivando compreendê-la. Todavia,
quando partimos para o campo religioso, a relação entre verdade e questionamento de si e do
mundo parece ser ameaçada, porquanto não haveria motivo ao crente religioso o anseio por
tais questões. A verdade, nesse cenário, está estabelecida. Questioná-la comprometeria não
só a ordem, como também a fé. Mas será que é assim mesmo? A relação do homem com o
divino não surge antes por uma necessidade inerente em si mesmo por desejar descobrir o
real significado das coisas, o desconhecido? Mais ainda, não é na reflexão sobre quem eu sou
e o que é o mundo que nos aproximamos intimamente da verdade e, se for o caso de vir a ser
religioso, não é essa incerteza que solidificaria mais tarde esse contato íntimo com ela?
Podemos concluir que a busca pela verdade possibilita o questionamento de si e do mundo, e
em casos em que ela se apresente dada, pressupõe-se uma relação íntima anterior de busca
por ela, o que se constituirá como atividade filosófica.
Que o homem é próprio de racionalidade já o sabemos, mas como essa racionalidade
pode ser constituinte de uma atividade filosófica? Faz-se necessário, portanto, esclarecer o
que vem a ser atividade filosófica e como ela está intrinsecamente associada às questões do
indivíduo e do mundo. Embora sejam várias as abordagens quanto à atividade filosófica,
podemos contrapor duas perspectivas: a primeira relaciona a atividade filosófica como própria
de reflexão sobre a realidade em um processo puramente contemplativo; a segunda,
entretanto, defende que não basta à atividade filosófica somente a reflexão contemplativa,
que antes de tudo, esta necessita de fundamentação estimada. No que diz respeito a ambas
as abordagens, a atividade filosófica mantém-se intacta, e deve mesmo ser assim. O primeiro
contato com a atividade filosófica inicia-se com um simples espanto: o indivíduo apreende
algo que outrora não lhe era evidente e incomoda-se, como se entre o pé e o sapato houvesse
uma pequena pedra. Esse incômodo torna-se em uma ferida e para curá-la o indivíduo
necessitará de um processo árduo de maturação sobre ela. Percebe-se que a atividade
filosófica torna evidente cenários que antes não existiam ou que não eram um problema a
priori e paralelamente infere no indivíduo angústias, pois, embora seja possível refletir sobre
tudo que está a nossa volta, são poucas as respostas obtidas em elevadas reflexões. Por outro
lado, se o ser humano é passível de racionalidade, nota-se que nem todos exercem a atividade
filosófica, situação grave, pois o questionamento de si e do mundo é rompido. Assim, levanta-
se o seguinte problema: ou os indivíduos são naturalmente cegos à atividade filosófica ou
notam os problemas a sua volta e se recusam a exercer a atividade filosófica. Ora, vimos que
o ser humano é próprio de razão, capacidade intelectiva que o possibilita, através das
sensações, pensar o mundo a sua volta. Portanto, o estado intelectivo só seria rompido caso
o ser humano ou estivesse morto, porquanto nenhuma atividade filosófica seria possível, ou,
por não conseguir lidar com fortes questões da existência, pois elas são muitas e de várias
formas, o indivíduo se recusasse a pensar sobre tais questões, vivendo isento de qualquer
juízo próprio.
Portanto, a busca pela verdade torna possível a atividade filosófica não só porque o
indivíduo que reflete o faz filosoficamente sobre si e sobre o mundo, como também, nas
célebres palavras de Schopenhauer, “se nossa vida fosse sem fim nem sofrimento, talvez a
ninguém ocorresse perguntar por que o mundo existe e por que tem precisamente essa índole;
porém, tudo se entenderia por si mesmo”. É em função da própria noção de busca que é possível o
filosofar, porquanto nada basta a si mesmo.