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Entre Vestes e Objetos

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DOI: 10.12957/transversos.2023.

79535

ENTRE VESTES E OBJETOS: GÊNERO E CULTURA MATERIAL NAS


RELIGIÕES AFRO-AMERÍNDIAS

BETWEEN VESTMENTS AND OBJECTS: GENDER AND MATERIAL


CULTURE IN THE AFRICAN-AMERICAN RELIGIONS

Larissa Sarmento Lira


Universidade Federal da Paraíba
[email protected]

Lucas Gomes de Medeiros


Universidade Federal Rural de Pernambuco
[email protected]

Resumo: Abstract
O texto que segue pretende expor e analisar as The following article aims to evidence and
dinâmicas de gênero e suas relações com a analyse gender dynamics and their relations
cultura material nas religiões afro-ameríndias with the material culture of African American
do município de Campina Grande-PB. Para tal, religions in the municipality of Campina
priorizamos as vestes e os objetos litúrgicos que Grande-PB. To do so, we prioritise vestments
integram o universo imagético sagrado dos and liturgical objects that are part of the
terreiros como forma de apontar que os sacred universe of imagery of terreiros as a way
marcadores sociais da diferença não estão of pointing out that the social markers of
circunscritos aos corpos e às diferenças sexuais. difference are not limited to bodies and sexual
As vestes e os objetos informam cosmologias; differences. Vestments and objects inform
reforçam dicotomias como cosmologies; reinforce dichotomies such as
masculino/feminino; subvertem ou reiteram masculine/feminine; and subvert or reiterate
dispositivos de controle caros ao mundo “control dispositifs” of paramount
ocidental. Antes de adentrar propriamente importance to the Western world. Before
nessas questões, analisaremos brevemente os properly delving into these issues, we will
motivos da massiva concentração de estudos briefly analyse the reasons for the massive
afro-ameríndios no campo da Antropologia se concentration of African American studies in
comparada à produção historiográfica. O texto the field of Anthropology compared to the
tem como base metodológica uma etnografia historiographic production. This paper has as
desenvolvida conjuntamente pelos autores its methodological basis an ethnography
entre os anos de 2021 e 2023 em terreiros que caried out by the authors between 2021 and
congregam os cultos do Candomblé nagô egbá 2023 in terreiros that simultaneously
e da Jurema Sagrada simultaneamente. congregate the cults of Nagó Egbá Candomblé
and Jurema Sagrada.
Palavras-Chave: gênero; cultura material;
religiões afro-ameríndias; Campina Grande-PB. Keywords: gender; material culture; african
american religions; Campina Grande-PB.

Revista Transversos. Rio de Janeiro, n. 29, dez. 2023.


Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

1. Introdução
O animismo fetichista dos negros baianos (2014 [1900]) do médico e antropólogo
maranhense Raimundo Nina Rodrigues, é considerada a obra inaugural nos estudos das religiões
afro-brasileiras. O caráter etnocêntrico da obra – que se manifesta, por exemplo, na compreensão
de que as religiões negras são animistas ou fetichistas e que os negros apresentam uma certa
incapacidade de adesão aos ditames do monoteísmo cristão – está diretamente relacionado às
posições político-epistemológicas do autor e da produção de conhecimento de sua época.
Rodrigues foi influenciado pela Antropologia Evolucionista, pela Antropologia Criminal de
Cesare Lombroso e pela Eugenia (pseudociência ou política de aprimoramento racial).
Paradoxalmente, o pioneiro da Antropologia à brasileira, evidenciou as práticas e representações,
os sistemas de crença e o complexo mitológico do Candomblé, tema pouco estudado no
perímetro científico do contexto. Desde então, uma tradição de estudos afro-brasileiros tem
gradativamente se consolidado, passando por autores que em muito reiteram o pensamento de
Nina Rodrigues como Arthur Ramos e pelos que criticaram suas teses como é o caso de Manuel
Querino.
Considerado um dos principais nomes no processo de institucionalização das ciências
sociais brasileiras, o médico e etnólogo Arthur Ramos (1903-1949) é também um continuador de
muitos aspectos do pensamento de Nina Rodrigues. A soberania dos iorubás perante outros
grupos de origem africana como os bantos defendida por Rodrigues em O animismo fetichista
dos negros baianos (2014 [1900]) é reiterada por Ramos em As culturas negras no Novo Mundo
(1979). Retornando aos estudos de Rodrigues, a quem se refere como mestre baiano, Ramos não
se intimida ao apontar a “supremacia numérica e talvez cultural dos nagôs” (1979: p. 204). A
defesa de uma superioridade nagô ou iorubá apresentada por Rodrigues e defendida por Ramos
é uma característica comum ao pensamento evolucionista dos fins do século XIX e início do XX
que costumava contrapor práticas, culturas e representações e formular uma verdadeira
estratificação entre os grupos.
Manuel Querino (1851-1923), historiador, etnólogo e artista baiano foi sem dúvidas o
intelectual contemporâneo a Nina Rodrigues que melhor problematizou o racismo explícito em
suas teses. Querino se contrapunha à crença da inferioridade das raças negras e apontava a
infinidade das contribuições dos negros à cultura brasileira. Sobre o negro, pondera: “foi com o
produto do seu trabalho que tivemos as instituições científicas, letras, artes, comércio, indústria

Revista Transversos. Rio de Janeiro, n. 29, dez. 2023.


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Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

etc, competindo-lhe, portanto, um lugar de destaque, como fator da civilização brasileira” (2018:
p. 30). O projeto de branqueamento social e epistêmico que tem origem nas primeiras décadas
do século passado no Brasil é responsável pela massiva divulgação da obra de Nina Rodrigues em
comparação ao silenciamento que por muito tempo vigorou em torno da produção de M.
Querino.
Não é difícil compreender o porquê de estudos como os dos autores citados acima
localizarem-se majoritariamente na seara antropológica. Desde a institucionalização da
Antropologia como ciência pretendeu-se investigar os agrupamentos e coletividades exteriores ao
chamado Velho Mundo. Esses grupos, que majoritariamente constituíram tradições por via da
oralidade, eram compreendidos como primitivos e os estudos sincrônicos a respeito dos seus
modos de existência acabaram por triunfar. A História, por sua vez, não menos etnocêntrica em
seu nascedouro científico, voltava-se aos sujeitos e grupos cuja escrita era uma realidade corrente,
fez isso porque lhe interessava quase que exclusivamente os estudos do passado, das experiências
distantes no tempo, cuja escrita era a única forma de acessá-las e resgatá-las tal como havia
acontecido.1
Estudar o passado dos povos dotados de escrita era o que cabia à História científica
emergente, enquanto a Antropologia encontrava-se comprometida com o tempo presente das
culturas de grupos ágrafos. Os propósitos de cada uma dessas ciências conduziram à formulação
de metodologias cabíveis aos problemas de investigação, desse modo, a produção historiográfica
converteu os arquivos (conservados em toda sorte de instituições públicas e privadas) em
mananciais de fontes para a escrita da História. Enquanto os/as antropólogos/as desde muito
cedo construíram pontes com os seus campos de investigação, o que permitiu observar práticas,
representações e interações dos grupos.
Graças, em grande medida, ao Movimento dos Annales na França dos fins da década de
1920, a produção historiográfica passou a reavaliar seus postulados, adotar novas fontes e estreitar
os laços com outras ciências humanas. Os movimentos de descolonização por volta da década de
1950 também possibilitaram valiosas reformulações na ciência antropológica. Gradativamente,
as investidas dos Annales – tais como a compreensão de que a História é retrospectiva (volta-se
ao passado a partir de questões do presente); a ideia de que os documentos não falam por si, mas

1
A crença de que era possível recompor o passado foi difundida por historiadores do século XIX como Leopold
von Ranke, expoente do Historicismo alemão.

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Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

quando são devidamente interrogados; que o passado não pode ser reconstituído tal como
ocorreu – vão se transformando em lugar-comum. A produção antropológica, por seu turno,
passou a questionar os etnocentrismos comuns ao fazer antropológico do século XIX reforçando
a ideia de que os sistemas simbólicos e culturais do outro devem ser compreendidos de modo
cada vez mais aproximados das lógicas de interpretação de mundo desse outro.
Desse modo, a História e a Antropologia ampliaram consideravelmente seus arcabouços
teóricos, metodológicos e temáticos, mas permanecem vigilantes às duas grandes principais
infrações que podem vir a ser cometidas por elas, respectivamente: o anacronismo (sínteses
explicativas que não respeitam as condições cronológicas) e o etnocentrismo (que naturaliza a
soberania das cosmologias e práticas ocidentais). Apesar das constantes reformulações pelas quais
passou a produção historiográfica, a valorização da análise de eventos passados e a soberania das
fontes escritas continuam uma realidade corrente. A manutenção do status quo em vista de não
comprometer o métier canônico implica na relegação de determinados temas de pesquisa e esses
acabam por encontrar espaço e valorização em outras áreas. Por isso, as religiões afro-ameríndias2
foram tornadas realidades mais próximas do universo discursivo antropológico do que da
produção historiográfica.
A antropóloga Lisa Castillo (2010) problematiza essa compreensão corrente na esfera
antropológica de que as religiões de terreiro se constituem exclusivamente com base nas tradições
orais. A autora nos dá exemplos de uma série de expressões escritas que poderiam ser facilmente
analisadas por historiadores/as, a saber, os bilhetes depositados nas oferendas, os cadernos de
fundamentos, os registros de institucionalização das casas, etc. Nos terreiros há uma valorização
da palavra falada em detrimento da grafada; a palavra falada é portadora do axé e veicula energias
sagradas (ELBEIN, 2012), no entanto, essa realidade majoritariamente circunscrita às cerimônias
não pode ser compreendida como justificativa para a crença no exclusivismo da oralidade.
Michelle Perrot (1989) em estudo sobre as “Práticas da memória feminina” em texto

2
Na cidade de Campina Grande-PB predomina o Candomblé (em sua modalidade nagô egbá) e a Jurema Sagrada
(religião de origem indígena acrescida de práticas associadas ao catolicismo e a Umbanda). Logo, o termo “religiões
afro-ameríndias” em substituição da expressão “religiões afro-brasileiras” propõe evidenciar os componentes
ameríndios dos cultos nessa localidade. O que chamamos de “componentes ameríndios” é um conjunto de
práticas, exercícios rituais e instrumentos de origem indígenas ou que resultam de uma integração entre as antigas
pajelanças e as práticas de procedência ibérica, a saber: os rituais de benzimento, a utilização de cachimbos e
maracás, o culto aos encantados e a ingestão da bebida chamada “jurema” ou “vinho de jurema”. Todos esses
elementos que indicam cosmologias de origem não africana nos terreiros convergem para a utilização do conceito
“religiões afro-ameríndias” como já fizeram Ferretti (2013) e Barros (2017).

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homônimo, expurga o silêncio dos arquivos públicos sobre as mulheres no século XIX e informa
que esses são constituídos por homens e sobre homens. A autora convoca os pares a uma imersão
mais profunda nos arquivos privados como as cartas de amor e os álbuns de família onde as
mulheres aparecem com mais frequência: a clássica distinção público e privado distante de se
restringir à seara política, informa quem pode figurar como sujeito entre as variadas fontes
históricas. Perrot ainda pontua que no século XIX as mulheres estavam limitadas quanto aos
aparatos escriturários, associados ao universo delas estavam os vestidos, bugigangas e fotografias
de família.
No que as provocações de Castillo (2010) e Perrot (1989) podem auxiliar no que diz
respeito às possibilidades do fazer historiográfico no quadro das religiões de terreiro? A primeira
autora informa que essas religiões não se restringem à oralidade e que registros escritos não
convencionais podem ser tomados como fontes; a segunda, quando aponta a variação daquilo
que os diferentes sujeitos da história costumam salvaguardar em seus acervos pessoais e coletivos,
faz refletir sobre a possibilidade de se tomar os elementos da cultura material como fontes. As
estampas de determinados tecidos, o valor de mercado dos porta-joias, o quantitativo de utensílios
domésticos em dado contexto temporal e espacial, por exemplo, podem revelar infinitas
realidades do ponto de vista econômico e simbólico.
A provocação da autora nos faz lembrar uma experiência etnográfica que em muito
conduziu às reflexões presentes nesse artigo: determinada sacerdotisa quando convidada a
integrar o corpo de interlocutores/as para o desenvolvimento de algumas pesquisas, informou
que não aceitaria gravar entrevistas por complicações vocais, mas que conversaria sobre tudo que
fosse necessário. Depois de algumas horas de diálogo e da apresentação de um conjunto de
fotografias que comprovavam sua longa trajetória religiosa, interrompeu o diálogo para trazer
determinado objeto que guardava com muito zelo. Tratava-se de um couro de bode ressecado
que foi retirado de um animal imolado em um ritual no terreiro do qual era sacerdotisa. O
couro contava com o nome completo de todos/as os/as religiosos/as antigos/as da cidade que
compareceram à cerimônia. A sacerdotisa se valia daquele instrumento como uma espécie de
documento de comprovação de que tudo foi feito dentro dos conformes da religião e que o
ritual ocorreu perante os olhos dos/as mais antigos/as e respeitados/as praticantes do culto em
seu município. Quando questionada sobre o fato de não ter pedido que as assinaturas fossem
reunidas em um caderno de anotações, a sacerdotisa sorriu e informou tratar-se de um

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fundamento, como também são chamados os segredos e ditames teológicos em várias práticas
religiosas de terreiro.
Desse modo, as seções que seguem pretendem considerar os instrumentos sagrados da
cultura material das religiões de terreiro a fim de compreender como as dinâmicas de gênero se
manifestam nesses espaços e objetos, reiterando ou subvertendo as dicotomias ocidentais
correntes. Para isso, serão analisadas imagens fotográficas e evocadas as experiências etnográficas
que mesmo não restritas ao município de Campina Grande evidenciam o complexo nagô egbá
associado à Jurema Sagrada comum ao município.

2. Cultura material nos terreiros: definições e contexto

Como sinalizado, as inquietações que aqui nos trazem se baseiam em experiências


etnográficas realizadas entre os anos de 2021 e 2023 em terreiros de Candomblé nagô egbá e
Jurema Sagrada de Campina Grande-PB ou em festividades fora dos terreiros, mas envolta nesse
mesmo conjunto de tradições. Deslocamo-nos aos espaços dos terreiros em circunstâncias
cerimoniais, ou não, e registramos através de fotografias 3 e diários de campo, observações sobre
os aspectos da cultura material e sua relação com as dinâmicas de gênero. Não foi realizada uma
história oral propriamente dita em termos de gravação de narrativas, transcrição e análise, porém,
as informações e fotografias captadas no campo foram em algumas circunstâncias apresentadas e
discutidas com os/as praticantes. Esses diálogos tinham por objetivo auxiliar no desenvolvimento
das etnografias realizadas em campo. Posteriormente, discutimos os nossos registros,
contrastamos as impressões e sistematizamos o debate com base nessas experiências a fim de
compreender as relações entre o gênero e a cultura material.
Por cultura material entende-se o estudo da cultura agregado aos objetos, a
instrumentalidade produzida que compõe, monta, veste, decora, adorna e identifica indivíduos e
grupos. “Trata-se da teoria que dará forma a ideia de que os objetos nos fazem como parte do
processo pelo qual os fazemos, não havendo separação entre sujeitos e objetos” (MILLER, 2013:
p. 92).
É a abordagem antropológica e a literatura etnográfica que irão fortalecer o valor dos

3
O equipamento utilizado para captação dos registros fotográficos foi uma Câmera Canon SL3. As imagens que
constam neste trabalho foram selecionadas do acervo da autora, registros feitos em variados terreiros da cidade de
Campina Grande – PB, fruto de um trabalho de campo que vem sendo realizado desde 2015.

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objetos como parte significativa dos estudos da cultura material, por mais que ao longo da história
da Antropologia nem sempre os estudos dos objetos tenham sido destaque como tema específico
de descrição e análise. A fotografia também tardou a ser reconhecida e valorizada como
instrumento de produção de conhecimento; apoio à pesquisa e informação multidisciplinar. As
indumentárias enquanto objetos de investigação e a moda enquanto área de pesquisa também
tardaram em ser reconhecidas, por vezes ignoradas por abordagens que se querem dominantes, é
o caso da Filosofia como aponta Lars Svendsen (2010). Em áreas como a Antropologia,
Arqueologia, Sociologia e História, além de outras disciplinas das ciências sociais e humanas, os
objetos vão ganhando espaços e sendo considerados como parte estruturante e úteis aos estudos
culturais, sociais e religiosos, por carregarem em si uma série de significados simbólicos, valores,
crenças, identidades étnicas e até mesmo estruturas econômicas. Não seria exagero afirmar que o
entendimento de qualquer forma de vida social e cultural demanda a compreensão da função
dos objetos materiais. (GONÇALVES, 2007, p. 15-16).
Os fundamentos nas religiões de terreiro marcam um modo particular de fazer, do uso
e da relação com determinados objetos que são funcionais, mas também ultrapassam essa função
de uso e atingem o campo simbólico. O exemplo do couro que serviu para assinaturas reflete a
complexidade e a elaboração de distinções rituais e simbólicas e de como o maior foco está na
relação da pessoa com a coisa criada e não no objeto em si.
Nas religiões afro-ameríndias há um zelo com a materialidade construída ao longo de
uma vida dedicada à realização e manutenção dos rituais, podemos dizer que não é uma meta das
religiões em questão o alcance de uma transcendência por meio do repúdio ao material, há uma
devoção aos objetos que passam por rituais e recebem a significância do sagrado, e a partir daí
ganham seus devidos cuidados. Nessa relação as pessoas passam a estar totalmente conectadas aos
objetos, essa nutrição é parte fundamental para a existência e manutenção dos ritos. Os objetos
intermediam a relação das pessoas com as deidades/entidades 4 dos cultos. “Na religião, o
principal propósito do material é expressar o imaterial” (MILLER, 2013: p. 110).
Há uma extensa lista de objetos a serem adquiridos pelo/o iniciado/a, um enxoval,
dentre outros materiais é parte do preparo para este fim. As pessoas capricham na construção
dessa materialidade, há uma crença de que, dando o seu melhor recebe-se prosperidades na vida

4
Nesse manuscrito utilizaremos a noção de entidades para os espíritos como exus, pombagiras, pretos/as
velhos/as, mestres/as da Jurema Sagradas etc. e deidade para as divindades associadas ao governo da
natureza, os orixás.

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espiritual e também material: quanto mais se doa, mais axé5 é recebido. Para Leda Maria Martins
(2021: p. 70) “Um dos pressupostos dos valores éticos nas culturas negras é a de que os bens
culturais, em última instância, são transmissores da energia vital que se esparge do sagrado e que
em tudo se manifesta”. Logo, nas religiões de terreiro não há um apelo ao desapego das coisas
materiais, há uma nutrição da relação pessoa-objeto, por exemplo: os copos, taças e quartinhas
que recebem água, estão nutridas e fortalecem o seu dono/a.
Na seção seguinte será analisado como os elementos da cultura material – as vestes e os
objetos, precisamente – se relacionam com as dinâmicas de gênero nos terreiros. É importante
frisar que essas religiões são extremamente complexas no que diz respeito às indumentárias e
instrumentos sagrados e que esses são revestidos de inúmeros significados. Esses significados
atribuídos às dinâmicas de gênero nas vestes e objetos, por serem múltiplos, resultam em
inúmeras disputas de memória e narrativa sobre o que é legítimo ou não no quadro religioso.

3. Dinâmicas de gênero, representações e cultura material


Desde a célebre publicação A cidade das mulheres (1947) da antropóloga americana Ruth
Landes tem se proliferado textos que analisam ou mencionam as dinâmicas de gênero em religiões
afro-ameríndias em suas mais variadas designações. O texto de Landes tão importante quanto
paradoxal postula a existência de uma espécie de aura feminina entre os terreiros de Candomblé
e isso se expressa na dicotomia estabelecida pela autora onde por um lado as mulheres são
majoritárias em terreiros de tradições iorubás (sobretudo os de nação ketu) enquanto é vultoso o
número de homossexuais comandando os chamados candomblés de caboclo (esses candomblés,
descritos na vasta literatura antropológica sobre o tema como mais versados nos sincretismos).
Em certa medida, a obra de Landes serviu para reforçar o entendimento corrente entre os
terreiros de que essas expressões religiosas são por excelência matrilineares. Analisando a
religiosidade afro-ameríndia, seja mediante a bibliografia possível ou por intermédio de
observações participantes, pode-se afirmar que em outras realidades territoriais o princípio de
centralidade feminina nos candomblés soteropolitanos estudados por Landes não encontra
maiores respaldos.6

5
Força vital.
6
As críticas aqui pontuadas não têm por objetivo suprimir a grandeza e o pioneirismo da obra de Ruth Landes. O
livro da autora não é só único e inovador pelas questões que trazem – questões essas, vilipendiadas pela
Antropologia convencional – mas pelas condições de possibilidade no desenvolvimento da pesquisa e da posterior
publicação. A investigação teve início em 1938 quando da chegada de Landes ao Brasil. Em 1939 ela é forçada a

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A tradição iorubá de Candomblé nagô egbá, pioneira e predominante na cidade de


Recife-PE, pode ser apontada como uma das manifestações religiosas afro-ameríndias onde os
homens se expressam massivamente. Numericamente, não podemos afirmar com precisão que o
número de sacerdotes (ou outros praticantes) masculinos é superior ao número de praticantes
femininos, mas as observações em momento cerimonial ou não, possibilita tomar nota da
expressiva presença masculina. Salientamos ainda que a casa matriz na tradição nagô egbá, o
Terreiro Obá Ogunté, local reconhecido como Patrimônio Cultural do Brasil, é até hoje mais
conhecida pelo nome do seu segundo sacerdote – Sítio de Pai Adão – do que pelo nome da sua
fundadora: a nigeriana Inês Joaquina da Costa/Ifá Tinuquê (?-1905). Outros sacerdotes
posteriores como Pai Malaquias (? - 1984); Pai José Romão (?-1971) e Manoel do Nascimento
Costa (Manoel Papai, 1941-) figuram no hall dos baluartes masculinos da tradição e são sem
dúvidas mais conhecidos que as não menos importantes sacerdotisas Mãe Lídia Alves (1893-1932)
e Mãe Glauce Mendes (?-?). Acrescenta-se aqui a trajetória das práticas afro-religiosas do nagô égbá
pernambucano e sua migração para Paraíba, inaugurando o primeiro terreiro de tradição nagô
egbá na cidade de Campina Grande-PB7, que vai ter como sacerdote Pai Vicente Mariano (1928
-).
Essas observações têm por objetivo não apenas apresentar a circunscrição espacial e
temporal das teses de Ruth Landes, mas também informar que suas conclusões, alcançadas
perante uma minuciosa etnografia dos terreiros soteropolitanos mais antigos, resultam de um
trabalho junto a espaços de candomblé ketu, majoritariamente. Outras nações de Candomblé
como o nagô egbá recifense e mesmo outras práticas religiosas afro-ameríndias como o Catimbó,
o Jarê e o Terecô não apresentam a centralidade feminina defendida pela autora. Não queremos
com essa análise, evidentemente, apresentar a vigência de um patriarcado nos terreiros, em vez
disso, complexificar o debate e apresentar as disputas, reiterações e subversões de dicotomias de
gênero a partir da análise dos elementos da cultura material.
Por gênero compreende-se aqui "um elemento constitutivo de relações sociais baseadas

deixar a Bahia sob suspeita de espionagem e filiação ao comunismo. O Brasil vivia sob o regime ditatorial varguista.
Certamente, o interesse nas práticas negras e a associação a Edison Carneiro (etnólogo comunista) são as causas de
tais desconfianças por parte da polícia. As críticas formuladas por Arthur Ramos (também expoente nos estudos
das religiões de origem africana, mas pouco afeito às imersões nos terreiros) à obra de Ruth Landes se direcionam
mais à condição de gênero da autora do que as ideias defendidas em A cidade das mulheres. Sobre a misoginia de
Ramos e suas investidas sobre a obra de Landes consultar Andreson (2019).
7
O Ilê Oxum Ajamin, inaugurado pelo Babalorixá José Romão e Iyalorixá Lídia Alves em 1955.

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nas diferenças percebidas entre os sexos; e o gênero é uma forma primeira de dar significado às
relações de poder” (SCOTT, 2019: p. 67). Esse elemento constitutivo permite interpretar
determinadas realidades sociais a partir das formas como os corpos são diferenciados, e muitas
vezes hierarquizados. Em uma direção bastante próxima a de Scott, Gayle Rubin discute a
existência de um “sistema de sexo-gênero” nas sociedades, que para ela, trata-se de “uma série de
arranjos pelos quais a matéria prima biológica do sexo humano e da procriação é moldada pela
intervenção humana, social e satisfeita de um modo convencional, por mais bizarras que algumas
dessas convenções sejam” (RUBIN, 1993: p. 10-11).
As ponderações das autoras permitem compreender o gênero como uma categoria
política e a complexidade das organizações sociais nas quais as diferenças sexuais apresentam
importância fundamental. Essas compreensões, entretanto, não podem resvalar em dicotomias
estáveis como sexo/gênero ou natureza/cultura como se cada um dos lados desses pares de
oposição pertencesse a ordens incomensuravelmente distintas, estando o sexo associado à
natureza (logo ao determinado), enquanto o gênero integraria o campo da cultura (e das
construções). Thomas Laqueur (2001) discute que o modelo do dimorfismo sexual entre as
espécies humanas foi descoberto no século XVIII no contexto de uma Europa que há muito
tempo já havia determinado o que competia aos homens e às mulheres. Laqueur, entretanto, não
nos induz a inverter a ordem convencional sexo/gênero e acreditar na precedência do gênero
sobre o sexo, em vez de pensar sexo e gênero em termos de antagonismos, questiona se eles de
fato possuem naturezas tão distintas, desse modo, atenta que o gênero enquanto ordem política
e mecanismo de marcação social ocidental formula narrativas sobre sexo e biologia.
Nas religiões afro-ameríndias essas distinções são bastante presentes e costumam tomar
supostos determinismos biológicos como referência. Existem cargos nos terreiros estritamente
masculinos como babalorixá (pai de santo), ogã (tocador dos atabaques sagrados), axogum
(responsável pelas imolações rituais) e outros. Assim como existem cargos femininos 8 como
iyalorixá (mãe de santo); ekedi (zelam pelos orixás), iaquequerê (segunda sacerdotisa, abaixo
apenas da iyalorixá)9. Esses cargos, que têm como base as diferenças sexuais, estão diretamente

8
Além dos cargos ainda existem confrarias onde determinada condição de gênero é exclusiva. Os cultos destinados
aos egunguns nos terreiros de tradição iorubá são exclusivamente masculinos, assim como as mulheres constituem
uma confraria em torno dos cultos à Ìyámi Oxorongá
9
Os exemplos aqui citados integram o quadro de cargos sacerdotais em candomblés de tradição iorubá, em outras
tradições, como nos candomblés de origem banto congolesa, essas distinções permanecem, mas com outros nomes
em função da língua e da dimensão teológica.

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Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

relacionados às vestes; instrumentos sagrados e outros elementos da cultura material que têm por
objetivo informar a condição de masculinidade ou feminilidade dos/as praticantes e divindades.
A ekedi veste, adorna e cuida da divindade, de forma que separar, lavar, passar e engomar as peças
de roupas que o orixá veste é uma função majoritariamente feminina nas casas de axé.
Atitudes como o “dobalé” também evidenciam as marcações de gênero em momentos
cerimoniais, diz respeito a um cumprimento ritual onde a pessoa estende o seu corpo no chão,
apresentando movimentos diferenciados para quem é filha/o de uma iabá 10 ou para quem é
filha/o de um oboró11, esse último apresenta um movimento mais simples, onde a pessoa se
estende por completo e bate a cabeça no chão, já para quem é filho/a de uma iabá, precisa deitar
no chão e virar seu corpo-tronco para esquerda e direita num movimento acompanhado com
uma mão na cintura e outra na cabeça. Os movimentos marcam o respeito à hierarquia, uma
ordem de cumprimentos fortemente presente na estrutura religiosa afro-ameríndia brasileira.
Desse modo, as seções que seguem têm por propósito investigar as dinâmicas de gênero
nos terreiros associadas a cultura material: vestes ditas masculinas e femininas; indumentárias
cabíveis a iabás e oborós, além dos instrumentos que por si só são compreendidos como
masculinos e femininos, cujo formato e a função simbólica costumam se relacionar com os
gêneros e narrativas míticas das entidades/deidades que representam. Como sinalizado, serão
contempladas as práticas do Candomblé em sua modalidade nagô egbá e da Jurema Sagrada, as
diferenças serão devidamente pontuadas.

4. Das vestes
O marcador de gênero nas religiões afro-ameríndias não se reduz aos corpos
sexualizados. Pontos cantados12, gestos sagrados e até objetos litúrgicos são imageticamente
associados aos universos masculinos e femininos, seja esse universo o das relações nos terreiros
ou dos planos míticos. Discursos como “Isso é coisa de homem e isso é coisa de mulher” são
muitas vezes utilizados para mencionar os objetos associados às entidades e deidades. Através
desse mesmo conjunto de elementos materiais, a naturalização do que seriam “coisas de homens
e coisas de mulheres” também é constantemente posta em xeque: o que ocasiona conflitos.
Como estilo cultural, essas práticas incorporam e ilustram valores, são um modo de
apreensão e interpretação do mundo e, ainda, um meio de permanência e de

10
Orixás de arquétipo feminino.
11
Orixás de arquétipo masculino.
12
Como são chamadas as músicas cerimoniais.

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pertencimento dos indivíduos por elas circunscritos no desejado prazer de ser, estar,
consonar, distribuir e irradiar. (MARTINS, 2021: p. 73)

Essas práticas e valores estão impressas nas peças de roupas, que, criadas num tempo
histórico distante, são objetos e também sujeitos de uma análise histórica e antropológica das
coisas. Nos modos de classificação habitualmente empregados na distinção de roupas para
homens e roupas para mulheres, o consumo aparece como mais uma fronteira que marca essas
distinções. São as mulheres as principais responsáveis por uma maior circulação de objetos e de
valores para a comercialização, isso se justifica na quantidade de peças que formam o conjunto
de suas indumentárias (variedade de saias em tecidos diversos, adornos, acessórios, etc.) que se
avolumam em tamanho e em maior variedade de estilos. Em entrevistas com costureiras/os de
Campina Grande13 , esse dado se confirma quando afirmam que o número de clientes mulheres
ultrapassam de forma considerável o número de homens. Nesse ínterim vale destacar que muitos
homens incorporam entidades femininas em seus corpos, esses homens produzem roupas para
suas mestras e pombagiras, e nesse sentido as religiões afro-ameríndias acabam por complexificar
as fronteiras dessas distinções.
Os suntuosos turbantes14 integram as indumentárias sacerdotais masculinas e
femininas em tradições como as nações de Candomblé ketu e angola. No nagô egbá os turbantes
não costumam integrar as indumentárias masculinas. Segundo Raul Lody:
Os turbantes possuem carga de importância para identificar a pessoa que o porta,
mostrando a presença dos “Orixás”. Exemplo: se a pessoa é dedicada às Iabás
(divindades femininas), os turbantes possuem as pontas à mostra, sendo mais farta a
quantidade de tecido. Sendo a pessoa dedicada aos “Aborós” (divindades masculinas),
os turbantes são mais enrolados na cabeça, não apresentando as pontas. (LODY, 1977:
p.3)

Figura 1: amarrações de turbantes que indicam divindades femininas.

13
Essas entrevistas constam como parte do acervo de uma pesquisa em andamento que tem a indumentária do
culto da Jurema Sagrada na Paraíba como objeto de análise, da doutoranda Larissa Lira do Programa de Pós-
Graduação em Ciências das Religiões (PPGCR/UFPB).
14
Pano de cabeça, ojá ou torço são as alcunhas dessa indumentária no espaço sagrado. O sentido simbólico dessa
indumentária também se relaciona com a divindade Orí (cabeça): um orixá pessoal que não ocupa necessariamente
o panteão das forças ligadas à natureza, trata-se do deus interior de cada praticante. Nas tradições iorubás o Orí diz
respeito à individualidade do/a religioso/a e ao destino traçado para ele/a no orun (céu). O pano de cabeça é
comumente usado para proteger o Orí de forças contrárias externas.

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Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

Legenda: A amarração dos turbantes informa o arquétipo do orixá ao qual a pessoa foi iniciada:
quando a disposição apresenta abas (também conhecidas como borboletas) indica que o orixá tem arquétipo
feminino. Nas imagens, uma filha de Iansã e uma filha de Iemanjá.
Fonte: fotografia e acervo Larissa Lira.
Local: Ilê Oxum Ajamin (2019) e Ilê Oyá Gigan (2022), Campina Grande-PB.

Figura 2 - amarrações de turbantes que indicam divindades masculinas.

Legenda: O turbante sem abas, indica que a pessoa foi iniciada a um orixá que apresenta arquétipo
masculino, nas imagens: duas filhas do orixá Oxalá e uma filha do orixá Ogum.
Fonte: fotografias e acervo Larissa Lira.
Local: Ilê Oyá Agandê (2022); Ilê Ogum Jobioó (2015); Ilê Oyá Agandê (2022), Campina Grande-PB.

As observações de Raul Lody nos transportam ao universo visual dos candomblés ketu
e angola, já a indumentária masculina que reveste a cabeça mais comum no nagô egbá é o eketé,
espécie de boina circular curta ou alongada. Não se pretende com isso afirmar que no nagô egbá
os homens só usam eketé enquanto que no Ketu e angola faz-se uso dos turbantes. A observação

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Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

aqui diz respeito à flexibilidade maior no ketu e angola para o uso dos turbantes por parte dos
homens.
Imagem 3: variações do eketé.

Legenda: O eketé é uma indumentária masculina que no nagô egbá está relacionada ao gênero do
sacerdote e não da divindade a qual ele foi iniciado.
Fonte: fotografias e acervo Larissa Lira.
Local: Ilê Oyá Gigan (2022), Campina Grande-PB.

Antes de seguir na apresentação de alguns elementos que compõem essas


indumentárias é importante mencionar que os modos como elas são utilizadas, e por quem,
estão entre os debates mais acalorados nos terreiros. As narrativas orais, pelas quais os
conhecimentos são majoritariamente transmitidos, são dispersas e múltiplas. A localização
temporal dos nascedouros de determinados consensos é quase sempre impossível. Nessas
disputas por legitimidade, os permitidos e interditos na África são recorrentemente citados,
porém as narrativas costumam unificar o continente e lhe atribuir certa estagnação cosmológica:
a África do contexto diaspórico, não é a mesma África contemporânea, muitas tradições
milenares são mantidas enquanto outros costumes são alterados. Oyèrónkẹ́ Oyěwùmí (2021)
ressalta que a atribuição de sexo/gênero às divindades não era comum na iorubalândia pré-
colonial. Desse modo, fica evidente que muitas práticas e sistemas de crença sofreram influências
coloniais e a incorporação das dicotomias de gênero pode ser apontada nesse contexto.
O chamado “pano da costa” é outro elemento considerado feminino no circuito do
Candomblé: consiste em uma peça na indumentária ritual confeccionada de tecido cortado em
formato retangular, é geralmente branco ou com leves estampas listradas ou quadriculadas. O
pano deve vestir as costas e as pontas se encontram na frente envolvendo os seios e os cobrindo.
Observa-se nos terreiros muitos panos da costa confeccionados com tecidos nobres como

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Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

cambraia bordada e richelieu ou outros tecidos mais simples como o algodão. Os panos nunca
apresentam estampas muito chamativas, cores vibrantes, tampouco são com tecidos leves como
a seda e o cetim.
Segundo Raul Lody (2006) a primeira grande questão dessa indumentária relaciona-se
à própria nomenclatura, podendo o pano ser assim chamado pelas procedências territoriais: a
Costa da Mina ou Costa do Ouro. O segundo motivo do nome seria por pender do ombro para
as costas quando posto no corpo. O autor ainda argumenta em volta dos sentidos simbólicos do
pano da costa que ao término do período de confinamento as iniciadas começam a manter
contato com o mundo fora dos terreiros e o pano representa um prolongamento do alá de Oxalá,
a iniciada mantêm-se envolta no pano como forma de manter os valores da sua iniciação religiosa
quando em contato com os valores profanos exteriores ao terreiro. Nos rituais fúnebres (axexê),
conforme o mesmo autor, o pano também guarda as noviças da energia de eguns (espírito de
pessoa falecida). A simbologia presente em indumentárias com a importância do pano da costa
reforça para o antropólogo o lugar de poder e destaque feminino nos terreiros.
Alguns/mas sacerdotes/isas afirmam que posicionado mais abaixo, na altura da
cintura, a finalidade é proteger órgãos como o ovário e o útero. Posicionado na altura da cintura
a indumentária passa a ser chamada por alguns/mas “pano de ventre”. Em determinados
terreiros, o pano da costa e o pano de ventre são duas indumentárias diferentes, em outros, trata-
se de um único pano e a denominação vai se relacionar com a parte do corpo sobre a qual é
disposto. A partir da argumentação de exclusivismo feminino para uso dessas indumentárias se
acirram debates sobre gênero e corporalidades nas casas, uma vez que as interdições para o uso
costumam incorrer em reducionismos que tomam como homens ou mulheres os corpos com
base unicamente em suas diferenças sexuais. Patrícia Ricardo de Souza (2007: p. 61) ainda
destaca que, se a divindades for feminina, o pano é atado ao peito e, quando possível,
arrematado com um laço, que pode ser para frente ou para trás; se a divindade for masculina, é
amarrado a tiracolo sobre o ombro.
Os turbantes, anteriormente citados como indumentárias do Candomblé, também
integram desde muito tempo as indumentárias da Jurema Sagrada, nessa prática religiosa os
tecidos utilizados costumam ser mais coloridos e simples como é o caso da chita ou chitão15 . Na

15
Na obra Uma festa das cores, Ronaldo Fraga e Anna Gobel (2019: p. 22-23) nos guiam por uma viagem às
memórias dos tecidos brasileiros, nos apresentando a chita, o chitão e até a chitinha. Tecidos conhecidos como
“Chintz” na Índia que chegaram ao Brasil pelas mãos dos portugueses na segunda metade do século XIX, quando a

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Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

Jurema Sagrada o turbante ou pano de cabeça não define o gênero das entidades e divindades
do/a praticante e as restrições no uso dessa indumentária são menos rígidas. Já o pano da costa
não costuma aparecer na Jurema e muitas vezes quando isso acontece, quem faz uso costuma ser
vítima de rechaços por incorporar de modo demasiado os elementos que integram o corpus
simbólico-doutrinário do Candomblé. Do mesmo modo, tecidos como o richelieu e a cambraia
– mais comuns às indumentárias do Candomblé – costumam provocar debates conflituosos
quando aparecem na Jurema Sagrada. Tudo isso evidencia que as vestes, os tecidos e outros
elementos da cultura material são indispensáveis ao estabelecimento de identidades e diferenças
nessas práticas religiosas.
Imagem 4: indumentárias da Jurema Sagrada.

Legenda: Na Jurema Sagrada os tecidos identificam a natureza do culto ligado às matas. Os temas
florais ganham evidência nas estampas das indumentárias e nos espaços, pois são ainda mais utilizados para
decoração dos terreiros.
Fonte: fotografias e acervo Larissa Lira.
Local: encontro de juremeiros/as em Alhandra-PB (2022).

Existe um interesse no culto da Jurema pela padronagem de estampas florais. Embora


haja predominância ao branco, principalmente em dias de rituais privados, ou também chamados
de “obrigações”; em dias festivos, de rituais públicos, um florescimento do colorido atinge as
indumentárias. De modo geral, não é através das cores que são reiteradas as distinções
relacionadas ao gênero, elas transcendem qualquer classificação, assim como as estampas que

indústria têxtil brasileira crescia a todo vapor. Alegre e afetuosa, a chita, logo caí no gosto das pessoas simples e
passa a ser utilizada na confecção de roupas masculinas e femininas, sobretudo nas festas populares do Norte e do
Nordeste brasileiros.

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estão presentes em trajes femininos e masculinos.


Imagem 5: estampas florais em trajes masculinos.

Legenda: As camisas que os juremeiros trajam são geralmente em estampas florais confeccionadas com
os mais variados tecidos (algodão, viscose e popeline) e atualmente podem ser facilmente encontradas nos
comércios populares das cidades.
Fonte: fotografias e acervo Larissa Lira.
Local: Ilê Axé Aira Bolomim Lodé (2023), Campina Grande-PB.

É no corpo, nos materiais, objetos utilizados e na produção imagética construída que se


identificam e preservam a memória do que os mestres e mestras foram no passado e continuam
a ser no presente. A Jurema é um campo fértil para se pensar o corpo como fonte de produção
de expressividades. Nesse ínterim, firmamos o ponto num corpo que desata o nó com a
normatividade e a monolinguagem, e atam-nos com as possibilidades de um corpo plural, aquele
que não é e não tem um único caminho possível, é um corpo-encruzilhada, dinâmico, ganha em
potência quando pode ser mais de um, sendo múltiplos. As incorporações trazem ao corpo a
positividade de um outro sagrado que toma forma no corpo do/religioso/a: é assim que o corpo
é permissível às múltiplas formas de se manifestar no mundo, o corpo é um processo de
performatização de saberes múltiplos, como menciona Luiz Rufino (2020, p. 27).

5. Dos objetos
Os objetos litúrgicos sagrados também parecem reforçar a ideia de que os gêneros podem
ser materialmente representados. Os/as dirigentes das casas informam que alguns instrumentos
e até frutas e hortaliças podem ser classificados como masculinos ou femininos. A depender da
nação de Candomblé sobre a qual se fala, as dicotomias de gênero podem ser mais flexíveis ou

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Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

mais reiteradas. Entre os candomblés de nação ketu (também de origem iorubá), as flexibilizações
são aparentemente mais evidentes quando os comparamos com o nagô egbá.
O exemplo do adjá é fundamental: nos candomblés ketu e angola, esse instrumento é
comumente utilizado por sacerdotes/isas e outros/as iniciados/as aptos/as ao transe que
ocupam funções de destaque nas casas. No nagô egbá os homens não costumam manusear o
adjá, o instrumento é geralmente utilizado nos rituais por ialorixás e ekedis e os sacerdotes
masculinos usualmente o manipulam na ausência de mulheres. Esse instrumento tem o poder
de convocar as divindades do plano do orun (céu) para o plano do aiye (terra) e o som que emana
do chacoalhar acompanha as danças das divindades quando incorporadas. É comum entre os
sacerdotes de Candomblé de nação nagô egbá a crítica aos babalorixás masculinos de outras
nações que costumam manusear os instrumentos.
Imagem 6: adjá em mãos femininas no Candomblé nagô egbá.

Legenda: sineta metálica utilizada nos rituais do Candomblé, cujo som é reconhecido pelo orixá no
momento do transe.
Fonte: fotografias e acervo Larissa Lira.
Local: Ilê Oxum Ajamin (2022), Campina Grande-PB.

Ainda na expressão musical, os ilús (tambores) dão o tom das batidas nos terreiros de
Candomblé nagô egbá e de Jurema. Geralmente estão dispostos em um trio que diferem em
nomes, tamanhos, sonoridades e funções. Em conversas com ogãs – homens que cuidam, zelam,
tocam e produzem os instrumentos rituais – eles informam que o yán, de tonalidade mais grave
e o melê ancó de tonalidade mais aguda são tambores de marcação, para chegarem a sua perfeita
afinação devem ser confeccionados com couro de cabra (fêmea); já no melê, é utilizado o couro

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Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

do bode (macho), é esse tambor responsável pelo repique. Dessa forma o som é marcado pelas
batidas harmônicas entre as categorias binárias do gênero (feminino e masculino).
Imagem 7: trio de ilús

Legenda: Os ilús no nagô egbá são instrumentos tocados exclusivamente por homens.
Fonte: fotografia e acervo Larissa Lira.
Local: Ilê Oxum Ajamin (2022), Campina Grande-PB.

Nos rituais de oferendas aos exus, pombagiras, mestres e mestras costumam ser
depositados nos assentamentos, antes da imolação animal, cebolas, maçãs e laranjas cortadas em
quatro pedaços cada. Em uma das observações participantes informou-se que as frutas e
hortaliças com formatos mais arredondados são “femininas”, logo, cabível às entidades de
arquétipo feminino.
As quartinhas que possuem “asas” pertencem aos orixás femininos, enquanto as que
não tem asas pertencem aos orixás masculinos. As pedras (otás) seguem a mesma lógica das frutas
anteriormente citadas: as mais arredondadas são cabíveis a entidades e divindades femininas
enquanto as mais ovaladas ou achatadas são associadas a entidades e divindades masculinas.
No culto da Jurema Sagrada traçada com Umbanda também se costuma usar nos
assentamentos taças cujo formato é compreendido como masculino ou feminino: taças de
champanhe são mais usuais entre mestras e pombagiras assim como os copos de whisky podem
ser vistos circulando os assentamentos dos mestres e dos exus.

6. Conclusões
Pontuamos, reiteradas vezes, as dinâmicas de gênero no âmbito das religiões afro-

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Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

ameríndias e como essas se relacionam com os objetos da chamada cultura material, as disputas
de memória e afins. Salientamos algumas complexidades comumente subsumidas em produções
que naturalizaram a compreensão de que os terreiros são necessariamente matriarcais. É
importante também reforçar que a análise desse quadro se limite às práticas religiosas do nagô
egbá e da Jurema Sagrada no município de Campina Grande-PB. A análise do Candomblé nagô
na cidade em comparação com outras modalidades de Candomblé evidencia que nessa
modalidade as dicotomias de gênero são mais assentadas: a convencional não utilização dos
turbantes por parte dos homens ou a manipulação do adjá, assim como a corrente distância das
mulheres com relação aos atabaques são prova disso.
Sinalizar essa complexidade é importante para que venhamos a romper minimamente
com as homogeneizações analíticas que resultam muitas vezes do transplante não problematizado
de categorias de análise, realidades sociais e cosmologias de uma localidade para outra. Foi o que
aconteceu significativamente com a supracitada obra de Ruth Landes, vertida em modelo que
inspirou estudos fora do contexto soteropolitano das primeiras décadas do século passado.
Observamos as propostas e limites da obra da antropóloga americana e a convocamos para o
debate de uma realidade outra.
O conjunto das provocações da socióloga nigeriana Oyèrónkẹ́ Oyěwùmí (2019) também
nos inspirou na reflexão sobre a incorporação da categoria gênero em sociedades não
ocidentalizadas. Para a autora, é mais producente, em vez de defender um matriarcado nas
sociedades pré-coloniais, observar que o triunfo das mulheres – suas participações nas chefias dos
grupos, na formulação das estratégias de guerra, nas instâncias comerciais – se relacionava com a
inexistência do gênero operando no modelo ocidental que cria dicotomias e sobreposições de
determinadas categorias de corpos sobre outras. Oyěwùmí (2019) segue na contramão de teses
que reiteraram determinados salvacionismos quando apontam a existência do patriarcado nas
sociedades ocidentalizadas e do matriarcado nas sociedades não ocidentalizadas. Umas das
provocações mais potentes da autora consiste na defesa de que afirmar a existência do
matriarcado em sociedades não ocidentalizadas significa a transposição do gênero (enquanto
categoria analítica) para realidades onde ele não existe como categoria nativa.
As compreensões sobre corpos nas religiões afro-ameríndias são múltiplas e reiteram ou
subvertem as dicotomias de gênero (e as hegemonias que costumam resultar da naturalização
dessas dicotomias) em variadas gradações. O que se entende por “coisas de homem”, “coisas de

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Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades nas tramas da história

mulher” de forma binária tem a ver com memórias coletivas que acionam saberes oriundos das
mais diversas influências. A inexistência de uma instituição que regulamente os modos de ser e
fazer nos terreiros confere autonomia aos/às sacerdotes/isas quanto aos modos de fazer e
compreender o culto em seus terreiros. Porém, determinados consensos são construídos e
propagados e o desrespeito para com esses pode ocasionar em querelas, acusações e
deslegitimações. Para Júlio Braga (2019), em certa medida, a prática do ejó16 aparece como um
mecanismo de regulamentação, posto que os/as religiosos/as que desvirtuam alguns modos
convencionais de proceder são descredibilizados pela ampla comunidade de cultos. É importante
perceber que o ejó enquanto uma prática comumente execrada em ambientes coletivos
transforma-se em mecanismo de controle para o estabelecimento de normas nos terreiros.
Assim, os instrumentos que integram a cultura material e se relacionam com o gênero
devem ser utilizados de modo coerente com os consensos estabelecidos oralmente. A
variabilidade das interpretações desses consensos, por outro lado, resulta em controvérsias que
nos permitem compreender que, nas religiões afro-ameríndias, o gênero é historicamente uma
das instâncias mais marcadas por conflitos.

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Como é chamada a fofoca nas religiões de terreiro.

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Tese (Doutorado em Sociologia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas,
Universidade de São Paulo, 2007.

***
Sobre os autores:
Larissa Sarmento Lira: Graduação em Filosofia - Licenciatura Plena (Universidade Estadual da
Paraíba) - 2008; Pós-graduada em Design de Moda - (SENAI Cetiqt - RJ) - 2014; Mestre em
Ciências das Religiões (Universidade Federal da Paraíba) - 2017; Integrante do Raízes desde 2015:
grupo de pesquisa sobre religiões mediúnicas e suas interlocuções, vinculado ao PPGCR- UFPB;
Especialização em Cinema e Produção Audiovisual (em andamento, com estimativa de término
para 2024); Doutoranda no Programa de Pós-graduação em Ciências das Religiões (PPGCR-
UFPB), desenvolvendo pesquisa sobre estética e indumentária no culto da Jurema. Membro da
Equipe Editorial - Revista Religare (Revista do Programa de Pós-graduação em Ciências das
Religiões da UFPB); tem experiência na área dos estudos de memória, etnografia e religiões afro-
brasileiras. Desenvolve trabalhos na linha de pesquisa: religião, cultura e sistemas simbólicos.
Lucas Gomes de Medeiros: Doutor em História Social da Cultura Regional pela Universidade
Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). Graduado em História pela Universidade Estadual da
Paraíba (UEPB). Desenvolve pesquisas com enfoque na história das religiões; cosmopercepções
afro-ameríndias; memória, oralidade e tradições orais. Outros temas de interesse são os
marcadores sociais da diferença, a saber, gênero, sexualidade, raça e território. Integrante do
NINETS (Núcleo de Investigações e Intervenções em Tecnologias Sociais - UEPB).
***
Artigo recebido para publicação em: 14 de outubro de 2023.
Artigo aprovado para publicação em: 23 de dezembro de 2023.

***
Como citar:
LIRA, Larissa Sarmento; MEDEIROS, Lucas Gomes de. Entre vestes e objetos: gênero e cultura
material nas religiões afro-ameríndias. Revista Transversos. Dossiê: Gêneros, poderes e sexualidades
nas tramas da história. Rio de Janeiro, nº. 29, 2023. pp. 55-77. Disponível em: https://www.e-
publicacoes.uerj.br/index.php/transversos/article/view/79535. ISSN 2179-7528. DOI:
10.12957/transversos. 2023.79535

Revista Transversos. Rio de Janeiro, n. 29, dez. 2023.


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