RDCC 38, P. 33-107 - Peteffi
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Resumo: O presente estudo visa analisar o concei- Abstract: The present study aims to explore the
to jurídico ou normativo de dano enquanto requi- multiple facets of the legal concept of damage,
sito essencial e independente da responsabilidade as an independent requirement for civil liability.
civil. Primeiramente, tendo em vista a grande in- First, since there is great uncertainty about the
certeza em relação ao conteúdo do termo “dano nomenclature used to designate recoverable
indenizável”, apresenta-se uma acepção ampla e damage, the contrast between a broad and a
outra estrita do instituto. Após a delimitação dos specific approach will help the reader assess the
principais termos utilizados no trabalho, serão content of the legal institute. Moreover, the most
estudadas as mais importantes teorias que res- important theories that underpin the legal con-
paldam o conceito de dano, conferindo destaque cept of damage will be analysed, highlighting the
para as teorias que se conectam com a evolução theories that are connected with the development
do id quod interest, concluindo-se pela possibili- of the id quod interest, leading to the conclusion
dade de um conceito de dano como interesse ou that the legal concept of damage can be related
como lesão a interesse. Por fim, serão analisadas to the idea of harm caused to an interest. Finally,
as possibilidades de convivência entre o conceito it will address the possibility of the legal concept
jurídico de dano encontrado no trabalho com as of damage supported in this study to coexist with
figuras do dano per se, injury as such e dano in legal figures such as dano per se, injury as such
re ipsa. and dano in re ipsa.
Palavras-chave: Dano – Prejuízo – Responsabi- Keywords: Damage – Loss – Civil liability – Tort
lidade civil – Requisitos da responsabilidade civil. Law requirements.
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 38. ano 11. p. 33-107. São Paulo: Ed. RT, jan./mar. 2024.
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Introdução
Um sistema justo e adequado de responsabilidade civil deve limitar, baseado em cri-
térios claros, excessos indenizatórios2. No intuito de restringir esses excessos, uma das
funções precípuas do instituto é selecionar, por intermédio de um rol de requisitos, os
danos ressarcíveis. A imposição de filtros ou balizamentos ao dever de indenizar coa-
duna-se com a noção contemporânea de responsabilidade civil, harmonizando-se com
a ideia de autonomia dos sujeitos de direito e evitando o “alargamento desmesurado da
responsabilidade perante cada actuação concreta”3.
1. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. Parte Especial. Di-
reito das Obrigações. Extinção das obrigações. Atual. Nelson Nery Jr.; Rosa Maria de Andrade
Nery. São Paulo: Ed. RT, 2012. t. 25. p. 285-286.
2. VON BAR, Christian. The common European law of torts. Oxford: Oxford University Press, v. 2,
2000. p. 1. No original: “The law of delict can only operate as an effective, sensible and fair system
of compensation if excessive liability is avoided”.
3. BARBOSA, Mafalda Miranda. Liberdade v. Responsabilidade: a precaução como fundamento
da imputação delitual?. Coimbra: Almedina, 2006. p. 194. No mesmo sentido, PAPAYANNIS,
Diego. Manual de Daños Extracontractuales. Cidade do México: Suprema Corte de Justicia de la
Nación, 2022. p. 61.
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
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Olivier y PÉRÈS, Cécile. Études offertes à Geneviève Viney. París: LGDJ. 2008. p. 145-171. Para o
autor, “[...] le centre de gravité de la responsabilité civile semble s’être déplacé du comportement
de l’auteur du dommage vers la situation de la victime. En conséquence, il n’est pas illogique de
chercher à borner l’étendue de la responsabilité en jouant sur ce qui est désormais son élément
premier, tant du point de vue de la genèse du droit à réparation que du point de vue théorique,
c’est-à-dire le préjudice”.
9. LE TOURNEAU, Philippe. Op. cit., p. 555.
10. WINIGER, Bénédict; KOZIOL, Helmut; KOCH, Bernhard A; ZIMMERMANN, Reinhard
(Orgs.). Digest of European Tort Law. Berlin: De Gruyter. 2011. v. 2. Essential cases on damage.
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
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Em uma primeira parte, a evolução da noção de id quod interest será apresentada, real-
çando-se a sua conexão teórica com as modernas teorias que utilizam a “hipótese dife-
rencial” como fundamento para a conceituação normativa do dano.
Considerando a impressionante polissemia que o termo “interesse” pode apresen-
tar, imprescindível centrar esforços, na segunda parte do segundo capítulo, na especí-
fica conceituação de interesse como elemento da teoria do dano, separando-o das mui
comuns análises do interesse juridicamente protegido como elemento intimamente im-
bricado com outros institutos ou com outros requisitos da responsabilidade civil, como
a antijuridicidade.
O terceiro e derradeiro capítulo abordará a construção contemporânea de um con-
ceito normativo de dano. As possibilidades conceituais apresentadas possuem conse-
quências diretas na operacionalidade da responsabilidade civil, tanto em relação aos
danos patrimoniais quanto em relação aos danos extrapatrimoniais, descortinadas pela
noção de interesse. Nesse sentido, na segunda parte do terceiro capítulo, será analisa-
da a compatibilidade do conceito jurídico de dano com algumas figuras observadas na
doutrina e na jurisprudência, tais como o dano per se, o dano in re ipsa e o injury as such.
Assim, percorrendo o caminho apontado, o presente estudo pretende traçar uma
noção de dano que possua conteúdo normativo próprio, permitindo que o dano rea-
firme o seu protagonismo com um dos principais requisitos da responsabilidade civil.
11. MARTINS-COSTA, Judith. A linguagem da responsabilidade civil. In: BIANCHI, José Flávio;
MENDONÇA PINHEIRO. Rodrigo Gomes de; ARRUDA ALVIM, Teresa (Coords.). Jurisdição
e direito Privado: estudos em homenagem aos 20 anos da Ministra Nancy Andrighi no STJ. São
Paulo: Ed. RT, 2020. p. 392.
12. NOLAN, Donal. Rights, Damage and Loss. Oxford Journal of Legal Studies, v. 37, p. 255-275,
Issue 2, Summer 2017. p. 275. O autor adverte sobre os perigos da utilização indiscriminada de
termos como ‘damage’, ‘loss’, ‘injury’ e ‘harm’, afirmando que “loose terminology both reflects
and generates loose thinking.”
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erro médico, caracterizando a conduta culposa, não for observado. Fenômeno idêntico
pode ser constatado em hipóteses de responsabilidade civil pelo fato do produto, caso o
defeito não seja verificado20.
Apesar da importância dos requisitos já referidos para a configuração dessa noção
ampla do chamado dano indenizável, a antijuridicidade possui o papel mais destacado
nesse cenário, pois é comum que os sujeitos de direito sofram inúmeras consequências
negativas, causadas por condutas expressa ou implicitamente autorizadas pelo Direi-
to. Danos causados por regular exercício de direitos – como a concorrência leal, o líci-
to protesto de um determinado título cambial e o normal rompimento de uma relação
amorosa – possuem o potencial de causar consideráveis consequências negativas, sem
que estas se configurem em “danos indenizáveis”, exatamente pela falta de conduta anti-
jurídica por parte do causador do prejuízo. Mesmo os prejuízos observados quando da
lesão a bens ou interesses jurídicos largamente protegidos, como a vida ou a integridade
física, poderão não ser reparados se alguma pré-excludente da antijuridicidade (ilicitu-
de)21 se fizer presente, tal como a legítima defesa22.
Essa situação pode ser facilmente notada no Direito inglês, em que a tradição jurídi-
ca centrou sua preocupação nas condutas antijurídicas (injuria), gerando um desenvol-
vimento atrofiado da teoria do dano, o que também propiciou destacada relevância aos
demais requisitos da responsabilidade civil. A falta de desenvolvimento de um sofisti-
cado conceito específico de dano acabou por intensificar o protagonismo de requisitos
como o nexo de causalidade e a ilicitude (antijuridicidade)23.
20. BASTOS, Daniel Deggau. Responsabilidade pelos riscos e o defeito do produto: uma análise com-
parada com o Direito norte-americano. Tese (Doutorado). Florianópolis: Curso de Direito,
Universidade Federal de Santa Catarina, 2020.
21. Para a identificação da legítima defesa dentro da categoria de pré-excludente da ilicitude, ve-
ja-se: PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. Bens. Fatos
Jurídicos. Atualização de Ovídio Rocha Barros Sandoval. São Paulo: Ed. RT, 2012. t. 2. p. 351 e
ss. Para um estudo da correlação dos termos antijuridicidade e ilicitude, veja-se: PETEFFI DA
SILVA, Rafael. Op. cit., p. 172-177.
22. GARCIA-RIPOLL MONTIJANO, Martín. La antijuridicidad como requisito de la responsa-
bilidad civil. Anuario de Derecho Civil. Madrid: Boletín Oficial del Estado, 2013. t. 66. p. 1539.
Em sentido semelhante, veja-se: PONTES DE MIRANDA, Francisco. Op. cit., t. 2, p. 351-353;
BUERES, Alberto. Derecho de Daños. Buenos Aires: Hammurabi, 2001. P. 500 e PETEFFI DA
SILVA, Rafael. Op. cit., p. 191.
23. Nas palavras dos autores: “[t]hough one finds a great deal of case law and literature on damages,
little effort has been devoted to defining damage. The common lawyer, unlike the civil lawyer,
rarely asks himself the question ‘What damage is redressable in a tort action?’ since his system,
for a long time, concentrated not on damnum but on injuria. The reason for this different em-
phasis is historical: damage awards lay, until comparatively recently, within the exclusive control
of juries once the defendant’s behaviour had been found to be tortious. Only where damage was
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 38. ano 11. p. 33-107. São Paulo: Ed. RT, jan./mar. 2024.
Doutrina Nacional 41
Como os sistemas jurídicos incluídos na tradição da Common Law contam com uma
multiplicidade de torts, cada qual com sua especificidade, não se pode afirmar que existe
um conceito único de dano, pois limites e características podem variar dependendo do
tort a ser analisado. A doutrina aponta que poderia haver mais de 70 conceitos distintos
de dano, relativos a cada um dos torts observados no Direito inglês24.
Em alguns trabalhos de harmonização da Responsabilidade Civil europeia observa-
-se a utilização dessa abordagem ampla de dano indenizável, em que a impossibilidade
da vítima exigir reparação pelas consequências negativas sofridas ocorre pela falta de
outros requisitos da responsabilidade civil.
O Draft Common Frame of Reference, de 2009, utiliza a noção de dano indenizável ou
do “dano juridicamente relevante” (legally relevant damage) em uma abordagem em que
dano e antijuridicidade aparecem imbricados. Destarte, ao dedicar o seu art. VI- 2:10125
an element of tort itself could judges formulate rules in terms of damage. So the task of fixing
the boundaries of liability had to be achieved through those concepts over which the judge
had exclusive control. Causation, remoteness and, later, duty, were the obvious devices. This
inheritance has still left its mark on modern law with the result that many issues of damages
still receive – and have received in this book – their main attention under the general heading of
causation” (DEAKIN, Simon; JOHNSTON, Angus; MARKESINIS, Basil. Markesinis & Deakin’s
Tort Law. 6. Ed. Oxford: Oxford University Press, 2008. p. 940).
24. Nas palavras do autor: “There is no general concept of ‘damage’ in English tort law, and academic
discussions of the topic have been few in number, but damage does play an important role in
most torts recognised by English law. As there are, according to one estimate, some 70 or more
torts recognised by the common law, it could be said that there are in fact 70 or more different
conceptions of damage in English tort law. That is to overstate the case somewhat, but it gives
some indication of the difficulty facing an English lawyer in this area. It by no means follows that
what is recognized as damage in Tort A is so recognized in Tort B.” (OLIPHANT, Ken. England
and Wales (Introduction). In: WINIGER, Bénédict; KOZIOL, Helmut; KOCH, Bernhard A;
ZIMMERMANN, Reinhard (Orgs.). Digest of European Tort Law. Berlin: De Gruyter, 2011. v. 2
(Essential cases on damage). p. 36).
25. Draft Common Frame of Reference VI. – 2: 101: “Meaning of legally relevant damage: (I) loss,
whether economic or non-economic, or injury is legally relevant damage if: (a) one of the fol-
lowing rules of this Chapter so provides; (b) the loss or injury results from a violation of a right
otherwise conferred by the law; or (c) the loss or injury results from a violation of an interest
worthy of legal protection. VI.-2:101 (2) In any case covered only by sub-paragraphs (b) or (c) of
paragraph (I) loss or injury constitutes legally relevant damage only if it would be fair and rea-
sonable for there to be a right to reparation or prevention, as the case may be, under V!. – I; !D!
(Basic rule) or I: 102 (Prevention). (3) In considering whether it would be fair and reasonable for
there to be a right to reparation or prevention regard is to be had to the ground of accountability.
To the nature and proximity of the damage or impending damage, to the reasonable expecta-
tions of the person who suffers or would suffer the damage, and to considerations of public
policy. (4) In this Book: (a) economic loss includes loss of income or profit, burdens incurred
and a reduction in the value of property: (b) non-economic loss includes pain and suffering and
impairment of the quality of life.”.
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 38. ano 11. p. 33-107. São Paulo: Ed. RT, jan./mar. 2024.
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26. MENEZES CORDEIRO, António. Tratado de Direito Civil português. Coimbra: Almedina,
2010. V. 2. T. 3.p. 352.
27. PETEFFI DA SILVA, Rafael. Op. cit., p. 193.
28. REGLERO CAMPOS, Luis Fernando. BUSTO LAGO, José Manuel (Coord.). Tratado de Res-
ponsabilidad Civil. Atualizado por Fernando Peña Lopez. 5. ed. Madri: Arandiz, 2014. T. 1. p. 80.
29. Artigo 2:101. Recoverable Damage: “Damage requires material or immaterial harm to a legally
protected interest.”
30. EUROPEAN GROUP ON TORT LAW. Principles of European Tort Law. Viena: Springer, 2005.
p. 26. Comentários por KOZIOL, Helmut.
31. Ibidem, p. 25. “The idea behind placing the emphasis on ‘legally protected interest”, is of im-
portance for the understanding of the fundamental concept of the Principles. Underlying the
notion of interference with protected interests is one aspect of the concept which the European
Group on Tort Law in its discussions has called ‘wrongfulness’.” Em sentido semelhante,
REGLERO CAMPOS, Luis Fernando. Op. cit., p. 80.
32. MOTA PINTO, Paulo. Interesse contratual negativo e interesse contratual positivo. Coimbra:
Coimbra Editora, 2008. V. 1. p. 503.
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
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Doutrina Nacional 43
Não restam dúvidas que o instituto do danno ingiusto, arquitetado pelo legislador
italiano do Código Civil de 1942, poderia ilustrar a utilização do “dano indenizável” em
seu sentido amplo, isto é, utilizando-se dos demais requisitos da responsabilidade
em sua caracterização. Contudo, pelo destaque que a importação da figura do “dano in-
justo” recebeu da doutrina brasileira nas últimas décadas, entende-se adequado dedicar
uma análise mais atenta para esse conceito em momento posterior.
No delineamento da noção de “dano indenizável” em seu sentido amplo, realizada
neste capítulo, restou evidente a sua capacidade de realizar a operação de seleção dos
prejuízos passíveis de indenização, o que justifica a sua existência na ciência do Direito.
Entretanto, essa abordagem do dano indenizável parece apenas ter o papel de destacar as
conexões do dano com os outros requisitos necessários para a gênese do dever de inde-
nizar, colocando em dúvida a existência de uma relevância normativa própria do dano
como requisito da responsabilidade civil33.
Na sequência do trabalho, portanto, observar-se-á a tentativa de demonstrar a pos-
sibilidade da teoria do dano, de acordo com uma noção estrita, contribuir de forma efe-
tiva para esse trabalho de seleção de prejuízos indenizáveis.
33. Autores que entendem o “conceito normativo de dano” na linha apresentada, ou seja, de acordo
com a acepção ampla de dano indenizável, admitem um problema de falta de conteúdo eficacial
próprio. Nesse sentido, CARNEIRO DA FRADA, Manuel. Direito civil/responsabilidade civil:
o método do caso. Coimbra: Almedina, 2010. p. 90: “o conceito normativo de dano não resolve
o problema do seu preenchimento. Embora evite as dificuldades de uma compreensão social
ou empírica de prejuízo, por si só é inoperante. Para o aludido preenchimento revelam os outros
pressupostos da responsabilidade, particularmente a ilicitude”. (grifou-se)
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
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entre dano e prejuízo e aceita que a noção jurídica de dano esteja bastante conectada
com uma noção vulgar ou naturalística. À esta ideia também estaria atrelada a noção
de desvantagem, de uma modificação fenomênica, seja no campo patrimonial, seja no
campo extrapatrimonial34.
Há parcela da doutrina35 que entende que essa abordagem de dano contrapõe-se à
ideia de dano como lesão a interesse protegido, que se encontra amplamente difundida
na doutrina brasileira36.
Para a avaliação adequada dessa corrente, que considera o dano como lesão a bens,
é importante recordar que o entendimento de bem é, para Francisco Cavalcanti Pon-
tes de Miranda, “aproximativamente o de objeto do Direito; mais amplo, pois, que o de
coisa”37. A amplitude dessa categoria jurídica alberga noções como a que estabelece ser
o bem jurídico “qualquer objeto de satisfação”38 ou “tudo que nos agrada”39. Para Jorge
Bustamante Alsina, bem jurídico é todo objeto material ou imaterial, seja de valor eco-
nômico ou não, que serve ao homem para satisfazer suas necessidades40.
O bem jurídico, como objeto de Direito, pode representar simplesmente uma pro-
messa, quando relacionado com os direitos de crédito, ou um simples objeto, ou até
mesmo elementos mais amplos e sem satisfação patrimonial como a vida, a liberdade, o
nome, a honra, a saúde, a integridade física, a intimidade e a própria pessoa41.
34. Doutrinadores entendem possível separar as correntes que consideram o dano como a lesão ou
deterioração de algum bem jurídico e as correntes que o vinculam a uma simples manifestação
fenomênica ou consequência negativa, nesse sentido, BUERES, Alberto. Op. cit., p. 290-292;
CALVO COSTA, Carlos A. Daño resarcible. Buenos Aires: Hammurabi, 2005. p. 79. O autor
relaciona a ideia de dano como consequência negativa a grande parte da doutrina argentina, en-
globando nomes como Iturraspe, Alterini, e Bustamante Alsina. No Brasil, com posicionamen-
to semelhante, veja-se: BASTOS, Daniel Deggau. Responsabilidade civil pela perda do tempo:
dano ressarcível e categorias indenizatórias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019.
35. Exemplificativamente, veja-se: AGUIAR DIAS, José de. Op. cit., , p. 715.
36. A abordagem doutrinária que agasalha essa noção de dano será analisada no próximo capítulo.
37. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. cit., t. 2, p. 80-81.
38. ZANNONI, Eduardo. A. El daño em la responsabilidade civil. 3. ed. Buenos Aires: Astrea: 2005.
p. 51; BASTOS, Daniel Deggau. Op. cit., 2019, p. 14-15.
39. PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil. Rio de Janeiro: Forense. 1995. v. 1.
p. 345.
40. BUSTAMANTE ALSINA, Jorge. Teoría General de la responsabilidad civil. 9. ed. Abeledo Per-
rot: Buenos Aires, 1993. p. 238. Nas palavras do autor: “Bien jurídico es todo objeto material o
inmaterial, sea de valor económico o no, que sirve al hombre para satisfacer sus necesidades”
(Ibidem, p. 238). No mesmo sentido, DE CUPIS, Adriano. El Daño: teoria general de la respon-
sabilidad civil. 2. ed. Barcelona: Bosch. 1975. p. 109.
41. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. cit., t. 2, 2012, p. 74; PEREIRA, Caio Mario
da Silva. Op. cit., p. 345, BUERES, Alberto. Op. cit., p. 285; ZANNONI, Eduardo. Op. cit., 2005,
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 38. ano 11. p. 33-107. São Paulo: Ed. RT, jan./mar. 2024.
Doutrina Nacional 45
Uma visão rígida de dano como mero menoscabo de bens gozou de grande prestí-
gio no Direito Romano clássico, quando se considerava que o dano estava intimamen-
te vinculado com o valor do bem lesado, normalmente entendido como coisa (quanti
aea res est)42. Essa abordagem em relação ao dano possuía, na concepção dos juristas da
época, a vantagem da praticidade e da certeza na quantificação do prejuízo43, tendo em
vista suportar uma visão estática do dano, sobretudo em um ambiente que normalmen-
te estabelecia a sinonímia entre bem e coisa. Essa noção de dano alinha-se com a obser-
vação naturalística do fenômeno danoso, equivalendo-se à acepção dominante do que
seria o dano.
Admite-se, entretanto, que esse período do Direito Romano já convivia com a ideia
de uma abordagem subjetiva e relacional do dano, representada pelo id quod interest44,
noção que está na base do desenvolvimento do conceito de “interesse” e que será melhor
desenvolvida nos capítulos posteriores.
Semelhante à linha de desenvolvimento observada no Direito Romano, a crítica dos
autores modernos à noção de dano como menoscabo de bens centra-se exatamente na
contraposição com a noção de dano como interesse ou como lesão a interesse45. Na hi-
pótese de destruição de uma residência, por exemplo, o valor de mercado do bem não
seria obrigatoriamente o único critério para se demarcar o dano, mas sim o valor que
essa casa teria para o seu proprietário, ou seja, um valor subjetivo extraído de uma con-
dição relacional e particular entre o bem lesado e seu titular46, traduzida pela noção de
interesse. Um mesmo objeto (bem) lesado, como uma casa ou um apartamento, pode
gerar, por exemplo, danos distintos para o seu proprietário e para o seu locatário, pois
eles possuem interesses distintos em relação a esse bem47.
p. 51. BASTOS, Daniel Deggau. Op. cit., , p. 14-15. Essa visão de bem não é unânime e podem
ser encontradas importantes vozes com pensamento distinto. Nesse sentido, exemplificativa-
mente, veja-se: RODRIGUES, Silvio. Direito civil: parte geral. 32. ed. São Paulo: Saraiva. 2002.
p. 116. “Com efeito, coisa é o gênero do qual bem é espécie. A diferença específica está no fato
de esta última incluir na sua compreensão a idéia de utilidade e raridade, ou seja, a de ter valor
econômico” (grifos no original)
42. ZIMMERMANN, Reinhard. The Law of Obligations: Roman Foundations of the Civilian Tradi-
tion. Cidade do Cabo: Juta & Co, 1990. p. 824, 970 e ss.
43. REINIG, Guilherme Henrique Lima. O problema da causalidade na responsabilidade civil: a teo-
ria do escopo de proteção da norma (Schutzzwecktheorie) e sua aplicabilidade no Direito Civil
brasileiro. São Paulo: Tese de Doutorado – Universidade de São Paulo, 2015. p. 43.
44. REINIG, Guilherme Henrique Lima. Op. cit., p. 43.
45. Todo o desenvolvimento da teoria do dano relacionada ao interesse será abordado nos próxi-
mos capítulos do presente trabalho.
46. BUERES, Alberto. Op. cit., p. 303.
47. NOLAN, Donal. Op. cit., 2017, p. 261. Para o autor, “While the issue of exactly what interest
is required need not detain us here, the fact that more than one person may have a sufficient
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interest to bring a claim in respect of damaged property–bailor and bailee, legal and equitable
owner–shows us that ‘damage’ in this context is a normative concept associated with a person, not
a factual concept associated with a particular physical entity.” (grifou-se). Em sentido semelhan-
te, veja-se: CALVO COSTA, Carlos A. Op. cit., p. 73.
48. BASTOS, Daniel Deggau. Op. cit., p. 17.
49. A própria noção de dano de Agostinho Alvim parece levar em consideração essa espécie de dano
intimamente conectado com a deterioração de bens e com as consequências negativas para a
vítima, veja-se: “Nós entendemos que o têrmo dano, em sentido amplo, vem a ser a lesão de qual-
quer bem jurídico, e aí se inclui o dano moral. Mas, em sentido estrito, o dano é, para nós, a lesão
do patrimônio; o patrimônio é o conjunto das relações jurídicas de uma pessoa, apreciáveis
em dinheiro. Aprecia-se o dano tendo em vista a diminuição sofrida no patrimônio” (ALVIM,
Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências. São Paulo: Saraiva, 1955. p. 187).
Há autores contemporâneos que replicam o entendimento do mestre, nesse sentido, veja-se o
comentário de Carlos Roberto Gonçalves à posição de Alvim, “Essa opinião sintetiza bem o
assunto, pois, enquanto o conceito clássico de dano é o de que constitui ele uma ‘diminuição
do patrimônio’, alguns autores o definem como a diminuição ou subtração de um ‘bem jurídi-
co’, para abranger não só o patrimônio, mas a honra, a saúde, a vida, suscetíveis de proteção.”
(GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo:
Saraiva. 2013. v. 4. p. 362). Em sentido semelhante tem-se a opinião de Maria Helena Diniz: “Co-
mo nos ensina Carlos Alberto Bittar, o dano é prejuízo ressarcível experimentado pelo lesado,
traduzindo-se, se patrimonial, pela diminuição patrimonial sofrida por alguém em razão da
ação deflagrada pelo agente, mas pode atingir elementos de cunho pecuniário e moral”. Para a
autora, a noção de diminuição ou destruição de bens (ainda que acrescida da lesão a “interesses
jurídicos”) harmoniza-se com o trecho transcrito, como se pode notar da seguinte passagem: “o
dano pode ser definido como a lesão (diminuição ou destruição) que, devido a um certo evento,
sofre uma pessoa, contra a sua vontade, e qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou
moral” (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: responsabilidade civil. 23. ed. São Paulo:
Saraiva, 2009. p. 63).
50. O autor, fazendo referência ao Direito português, leciona que nas últimas décadas não houve
grandes trabalhos monográficos sobre o tema e entende que “normalmente a doutrina fornece
uma noção geral de dano – como a lesão ou prejuízo real, sob a forma de destruição, subtracção
ou deterioração de um certo bem, lesão de bens juridicamente protegidos do lesado, patrimo-
niais ou não, ou simplesmente uma desvantagem de uma pessoa que é juridicamente relevante,
por ser tutelada pelo Direito – e refere-se, depois, especificamente para o dano patrimonial que
o dano é a ‘desvantagem que é causada a alguém no seu patrimônio, direitos ou na pessoa’ (for-
mulação do parágrafo 1293 do ABGB austríaco)” (MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 539-540).
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
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Doutrina Nacional 47
Importante notar que parcela da doutrina brasileira acaba por aliar a noção de da-
no como lesão a bem jurídico com a comparação entre a situação fática em que a vítima
se encontrava antes do fato danoso e a situação fática observada “imediatamente após a
sua prática”.51 No próximo capítulo será demonstrado que essa abordagem, que apenas
compara duas situações fáticas, não se confunde com a “hipótese diferencial” encontra-
da na teoria da diferença, que é normativamente construída.
Em França, a distinção entre dano e prejuízo possui relação com este estudo, pois
pode apresentar conexões conceituais e funcionais com uma visão naturalística de le-
são, deterioração ou menoscabo de bens. A visão que identifica o dano à lesão a uma
coisa, a uma pessoa ou a uma situação, enquanto o prejuízo seria apenas a consequên-
cia desta lesão, passou a ser considerada com maior seriedade depois da década de 50
do século passado. O prejuízo poderia ser patrimonial ou extrapatrimonial, indepen-
dentemente da natureza do bem lesado. Porém, considerável parcela doutrinária não vê
qualquer utilidade prática na distinção entre os dois conceitos.52.
Geneviève Viney e Patrice Jourdain entendem que a distinção entre dano e prejuízo
não traz maior interesse prático, sendo que ambos os termos são tratados, em sua obra,
como “les conséquences d’une atteinte a une personne ou a un bien, qu’on les nomme
préjudice ou dommage”53.
Essa visão do dano poderia parecer contraditória com a afirmação feita em momen-
to posterior da obra dos autores, em que encontramos a expressão “o prejuízo é a lesão
a um interesse”54, mas é importante notar que a noção de interesse utilizada pelos auto-
res guarda relação com o id quod interest que será desenvolvido no próximo capítulo55.
51. Nesse sentido, a lição de Araken de Assis: “o dano patrimonial consiste na perda, destruição
ou deterioração de algum bem inserido no patrimônio de alguém. Ele decorre da comparação
entre o estado patrimonial antes da ocorrência do ilícito e após a sua prática” (ASSIS, Araken de.
Liquidação do dano. Revista dos Tribunais, n. 759, p. 11-23, jan. 1999). Essa visão difere da siste-
mática apregoada pela teoria da diferença. Como será explicado no próximo capítulo, a teoria da
diferença apoia-se na “hipótese diferencial” constituída pela comparação do estado em que se
encontra a vítima após o evento danoso e o estado em que ela estaria se o este mesmo evento não
tivesse existido. Essa comparação não pode ser confundida com a que se efetua entre os estados
da vítima observados imediatamente antes e depois do estado danoso, uma comparação fática
que apenas retrata a deterioração do bem jurídico.
52. BORGHETTI, Jean-Sébastien. Op. Cit., , p. 4; LE TOURNEAU, Philippe. Op. cit., p. 556 “[...] Il
est d’usage, en droit français, de tenir pour synonyme les termes de dommage et de préjudice.”
Alerte-se que ambos os autores apenas trazem uma visão panorâmica do Direito francês, já que
são alguns dos maiores críticos da sinonímia entre dano e prejuízo.
53. VINEY, Geneviéve; JOURDAIN, Patrice. Traité de Droit Civil. 4. ed. Paris: L.G.D.J., 2013. V. Les
conditions de la responsabilité, p. 4.
54. VINEY, Geneviéve; JOURDAIN, Patrice. Op. cit., p. 25. No original: “Le préjudice est la lésion
d’un intèrêt”.
55. VINEY, Geneviéve; JOURDAIN, Patrice. Op. cit., p. 26.
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“como, para nós, é possível, como já insinuamos, exigir-se que a noção de dano se
restrinja à ideia de prejuízo, isto é, o resultado da lesão, só por isso se mostra mais
56. VINEY, Geneviéve; JOURDAIN, Patrice. Op. cit., p. 19. No original: “la lésion d’un intérêt légi-
time juridiquement protégé”.
57. As múltiplas acepções do termo interesse no âmbito da responsabilidade civil serão abordadas
no próximo capítulo.
58. VINEY, Geneviéve; JOURDAIN, Patrice. Op. cit., p. 18.
59. VINEY, Geneviéve; JOURDAIN, Patrice. Op. cit., p. 17. “En effet notre Code Civil n’a donné
aucune definition du dommage, ce qui a incité les juges à se référer au concept que désigne le
langage courant”.
60. BORGHETTI, Jean-Sébastien. Op. cit., 2008, p. 4; LE TOURNEAU, Philippe. Op. cit., p. 556.
61. VINEY, Geneviéve; JOURDAIN, Patrice. Op. cit., p. 20.
62. DOMINGO, Elena Vicente. El Daño. In: REGLERO CAMPOS, Luis Fernando. BUSTO LAGO,
José Manuel (Coord.). Lecciones de Responsabilidade Civil. 2. ed. Navarra: Aranzadi. 2013. p. 82.
63. O desenvolvimento da noção de interesse será abordado no próximo capítulo.
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Doutrina Nacional 49
adequada do que a de Carnelutti a definição de Fischer, que considera o dano nas suas
duas acepções, a) vulgar, de prejuízo que alguém sofre, na sua alma, no seu corpo ou
seus bens, sem indagação de quem seja o autor da lesão de que resulta; b) a jurídica,
que, embora partindo da mesma concepção fundamental, é delimitada pela sua con-
cepção de pena ou dever de indenizar, e vem a ser o prejuízo sofrido pelo sujeito de
direitos em consequências da violação destes por fato alheio.”64
A lição do autor citado aborda o dano como lesão a bens em uma noção ampliada
(alma, corpo e bens), mas próxima de ideia de manifestação fenomênica65 e, ato contí-
nuo, empreende a distinção entre um conceito vulgar e um conceito jurídico de dano.
Interessa notar que autores como Adriano De Cupis, ao contrário de Aguiar Dias,
apoiam a sua abordagem do dano na noção de interesse, pois este seria o objeto do dano.
Contudo, ambos possuem alguns entendimentos similares, pois o autor italiano realiza
a diferenciação entre um elemento material e substancial do dano, relacionado a uma
manifestação fenomênica ou vulgar, e o elemento formal, advindo da norma jurídica66.
A junção desses dois elementos bastaria para que o dano consubstanciasse verdadei-
ro fato jurídico, apto a atrair a atenção do jurista67. Com efeito, De Cupis afirma que nem
todo dano receberia a atenção do Direito e, portanto, somente seriam considerados co-
mo fatos jurídicos aqueles danos físicos que normalmente advêm de atos antijurídicos68.
O autor italiano está correto em afirmar que os prejuízos advindos de atos lícitos,
na imensa maioria das hipóteses, não gerarão sanção jurídica, isto é, não estarão aptos
a gerar o dever de indenizar em favor da vítima69, exatamente por não preencherem a
integralidade do suporte fático das normas que regulam o sistema de responsabilidade
civil, como os arts. 186, 187, 188 e 927 do Código Civil brasileiro. Muitas manifestações
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70. DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 92-94. O autor entende que, nos excepcionalíssimos casos em
que o dano reparável pode advir de atos lícitos, como no exemplo do estado de necessidade,
haveria dano em sentido jurídico porque o ordenamento confere relevância jurídica a esse tipo
de prejuízo.
71. AGUIAR DIAS, José de. Op. cit., 1997, p. 715; e DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 84. O autor
italiano utiliza-se, para realizar a diferenciação de dano em sentido amplo e dano em sentido
jurídico, exatamente do mesmo exemplo lembrado por Aguiar Dias. “El perjuicio que se sufre
por causa de uno mismo, se considera daño, en la acepción usual de la palabra; pero fácilmente
se descubre que tal perjuicio no tiene el valor de daño (entiéndase, por supuesto, em sentido
jurídico)” (Ibidem, p. 84).
72. GAMARRA, Jorge. Tratado de Derecho Civil Uruguayo. Montevidéo: Fundacion de La Cultu-
ra Universitária, 1992. T. XIX. P. 332-336. Em sentido semelhante CALVO COSTA, Carlos A.
Op. cit., p. 71. O próprio De Cupis admite que o dano, na situação narrada, não seria jurídico
exatamente porque a conduta de seu autor, que aqui se confunde com a figura da “vítima”, não
seria antijurídica. (DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 92).
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não atrair sanção jurídica de nenhuma espécie. Ainda assim, os elementos integrantes
da hipótese de incidência de um determinado dispositivo jurídico podem ser analisa-
dos de acordo com o seu conceito jurídico ou normativo, afastando-se de noções vulga-
res ou naturalísticas73.
São inúmeros os exemplos que poderiam ser fornecidos, mas é eloquente a análi-
se do termo “defeito” do produto ou do serviço, que se coloca como elemento essencial
de algumas normas do Código de Defesa do Consumidor brasileiro e tem o significado
construído juridicamente pela doutrina e pela jurisprudência, afastando-se de qualquer
noção vulgar. A conceituação de defeito, inclusive, é objeto de sofisticados “testes” e mo-
delagens de verificação74. O preenchimento da hipótese de incidência dessas normas e
a suas consequentes sanções indenizatórias somente ocorre com a observância, ex ante,
da categoria de defeito, normativamente construída pela ciência jurídica para ser o fa-
tor de atribuição da responsabilidade civil por fato do produto75.
Aliás, condicionar a existência do dano em sentido normativo ao surgimento do fa-
to jurídico (relação jurídica obrigacional entre ofensor e vítima) esbarra em uma im-
possibilidade lógica. Se o dano é um dos elementos para o próprio preenchimento da
hipótese de incidência das normas encontradas no ordenamento jurídico nacional (de-
signadamente o art. 927 do Código Civil) que darão sustentação para o surgimento do
fato jurídico, o conceito normativo de dano, detentor de conteúdo eficacial próprio, ne-
cessariamente precisa ser conhecido ex ante, sob pena de nunca se poder verificar a pró-
pria ocorrência da hipótese de incidência. Ademais, a aceitação de um conceito vulgar
de dano como apto a preencher a hipótese de incidência da norma pode gerar algumas
iniquidades evidentes76.
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Uma vez mais se afirma que a noção ampla de dano indenizável não sofre de nenhum
vício ontológico e pode se mostrar muito útil, principalmente em estudos de direito
comparado, quando será utilizada para determinar se algum dano específico (wrongful
conception, por exemplo) pode ser “indenizável” em determinado ordenamento jurídi-
co. A visão ampla apenas não é verdadeiramente útil para albergar um conceito jurídico
de dano enquanto requisito autônomo da responsabilidade civil.
el daño constituye, como se há expresado, una especie del daño entendido simplemente como
fenómeno de orden físico” (DE CUPIS, Adriano. Op. Cit., p. 82-84).
80. ZIMMERMANN, Reinhard. Op. Cit., 1990, p. 825.
81. ZIMMERMANN, Reinhard. Op. Cit., 1990, p. 932. No original: “The thief was liable for double,
and what had to be doubled was, generally speaking, not the plaintiff ’s interest in the object not
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being stolen (his ‘damages’, as we would put it), but the value of the stolen object at the time of
the commission of the delict.”
82. REINIG, Guilherme Henrique Lima. Op. cit., p. 42-43.
83. Em relação aos danos advindos de inadimplemento contratual, veja-se: ZIMMERMANN, Rei-
nhard. Op. Cit., 1990, p. 824-826.
84. REINIG, Guilherme Henrique Lima. Op. cit., p. 43; ZIMMERMANN, Reinhard. Op. cit., 1990,
p. 826.
85. Pontes de Miranda oferece exemplo análogo: “O dano é relativo, depende das circunstâncias
objetivas e subjetivas. O dano que se causa ao microbiologista, quebrando-se-lhe o microscó-
pio, não é o mesmo que se causaria ao sertanejo, ou ao trabalhador do campo, que, sem o usar
praticamente, tivesse um microscópio entre os objetos da sua casa” (PONTES DE MIRANDA,
Francisco Cavalcanti. Op. cit., t. 53, p. 154). Em sentido semelhante, Mariano Izquierdo, utili-
zando as expressões dano comum e dano próprio, sendo este último o dano como fenômeno
relacional (YZQUIERDO TOLSADA, Mariano. Op. cit., 2015, p. 161).
86. ZIMMERMANN, Reinhard. Op. Cit., p. 972. No original: “The same development from a stan-
dardized way of evaluating merely the diminution in value of the damaged object to a refined
evaluation of the individual plaintiff ’s damages took place with regard to the ‘quanti ea res erit’
clause in chapter three. Generally speaking, the plaintiff received compensation for what the
jurists of the ius commune dubbed damnum emergens and lucrum cessans”.
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87. REINIG, Guilherme Henrique Lima. Op. cit., p. 48. Para o autor: “os glosadores elaboraram um
conceito de interesse pormenorizado, tomando como ponto de partida as relações pessoais do
lesado” (Ibidem, p. 48).
88. ALMEIDA COSTA, Mário Júlio. Direito das obrigações. 12. ed. Coimbra: Almedina, 2009,
p. 596; ANTUNES VARELA, João de Matos. Das obrigações em geral. 10. ed. Coimbra: Almedi-
na, 2011. V. 1. P. 599. A teoria foi expressamente adotada em alguns diplomas jurídicos, como
o Código Civil português, art. 566, cujo número 02 dispõe que “a indenização em dinheiro tem
como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder
ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos”. Igualmente, o BGB,
em seu parágrafo 249, número 01, define que “a pessoa responsável pelos danos deve restaurar
a posição que existiria se a circunstância que a obriga a reparar os danos não tivesse ocorrido”
(Section 249 – Nature and extent of damages. (1) A person who is liable in damages must restore
the position that would exist if the circumstance obliging him to pay damages had not occur-
red. (2) Where damages are payable for injury to a person or damage to a thing, the blige may
demand the required monetary amount in lieu of restoration. When a thing is damaged, the mo-
netary amount required under sentence 1 only includes value-added tax if and to the extent that
it is actually incurred. (ALEMANHA. Bürgerliches Gesetzbuch. 1900. Disponível em: [www.
gesetze-im-internet.de/englisch_bgb/englisch_bgb.html]. Acesso em: 29.03.2023). Para uma
noção da teoria da diferença na hipótese de danos causados por inadimplemento contratual,
veja-se: LARENZ, Karl. Derecho Civil-Parte General. Trad. Miguel Izquierdo y Macías-Picavea.
Madri: Editorial Revista de Direito Privado. 1978. p. 820.
89. ANTUNES VARELA, João de Matos. Op. cit., p. 907 e REINIG, Guilherme Henrique Lima.
Op. cit., p. 61.
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
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90. REINIG, Guilherme Henrique Lima. Op. cit., p. 66- 67. “A teoria do interesse é a condensação
formal do princípio da reparação integral. [...] O damnum emergens e o lucrum cessans desig-
nam, dessa forma, a extensão possível do interesse a ser aferido concretamente.”
91. Na doutrina contemporânea, relacionado expressamente a indenização dos lucros cessan-
tes com a teoria da diferença, veja-se: WINIGER, Bénédict. Comparative Report (Subjective
Value). In: WINIGER, Bénédict; KOZIOL, Helmut; KOCH, Bernhard A; ZIMMERMANN,
Reinhard (eds). Digest of European Tort Law. Berlin: De Gruyter. 2011. V. 2: essential cases on
damage. P.165. “Several reports establish a link between subjective damage and loss of profit. [...]
Subjective damage can also serve the general principle that the victim should be placed into the
situation in which he or she would be without the damaging”; PEREIRA COELHO, Francisco
Manuel. O problema da causa virtual na responsabilidade civil. Coimbra: Almedina. 1998. p. 200
e ss.; e Parte da doutrina brasileira possui uma noção diversa e peculiar da Teoria da Diferença,
identificando uma incompatibilidade entre esta e a categoria dos lucros cessantes. Nesse senti-
do, veja-se: SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Op. cit., p. 141. Considerando que a Teoria
da Diferença representaria um óbice não apenas para a categoria de lucros cessantes, mas tam-
bém para a responsabilidade pela perda de uma chance, veja-se: SCHREIBER, Anderson. Novos
paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. São
Paulo: Atlas, 2007. p. 98.
92. DÍEZ-PICAZO, Luis. Fundamentos del Derecho Civil Patrimonial. Madri: Civitas/Thomson
Reuters, 2011. v. 5. p. 330.
93. Corretamente defendendo a aplicação de uma situação hipotética para a identificação dos da-
nos emergentes, veja-se: GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz. Lucros cessantes: do bom-senso ao
postulado normativo da razoabilidade. São Paulo: Ed. RT, 2011. p. 67.
94. BUSTO LAGO, José Manuel. La antijuridicidad del daño resarcible en la responsabilidad civil
extracontratual. Madri: Tecnos, 1998. p. 71.
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95. STEINER, Renata. Reparação de danos: interesse positivo e interesse negativo. São Paulo: Quar-
tier Latin. 2018. p. 43 e ss.
96. MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 541.
97. Nesse sentido, STEEL, Sandy. Damages without loss. Law Quaterly Review, v. 139, p. 129-242,
abr. 2023. p. 220 “First, it is comparative and counterfactual. It involves a comparison between
two conditions: an actual condition, and a counterfactual condition, the latter being the con-
dition the person would have been in had the wrong not occurred”. (...) “This counterfactual
concept of loss is adopted for two reasons. First, it can claim to be the dominant conception in
the law and has recently been endorsed by the Supreme Court”.
98. PIRES, Thatiane Cristina Fontão. Vorteilsausgleichung: a compensatio lucri cum damno na
responsabilidade civil alemã. Monografia (Graduação em Direito) – Universidade Federal de
Santa Catarina, Florianópolis, 2016. p. 55. e STEINER, Renata. Op. cit., p 54 e 55. Para quem: “O
alcance dessa afirmação pode ser elucidada na doutrina de Hans Fisher, bastante citada no Di-
reito Brasileiro por força de sua tradução ao português de 1938. Para Fisher – conforme lição até
hoje predominante na Alemanha – a construção da teoria da diferença é aclamada pela superação
da visão estrita do prejuízo natural, o qual confundia o damnum com o prejuízo concreto sofrido
por um bem específico;” (grifou-se). Em sentido contrário, SCHREIBER, Anderson. Op. cit.,
p. 97; MARTINS-COSTA, Judith. Comentários ao Novo Código Civil. Do inadimplemento das
obrigações. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense 2009. t. 2. p. 168-169; e SANSEVERINO, Paulo de Tarso
Vieira. Op. cit., p. 140.
99. MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 544.
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Doutrina Nacional 61
109. Tratou-se desse tema em PETEFFI DA SILVA, Rafael; LUIZ, Fernando Vieira. A compensatio
lucri cum damno: contornos essenciais do instituto e a necessidade de sua revisão nos casos
de benefícios previdenciários. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 13, ano 4, p. 281-312,
out.-dez. 2017. Entre os autores que admitem a necessidade da teoria da diferença levar em
conta a compensatio está DÍEZ-PICAZO, Luis. Derecho de Daños. Madri: Civitas. 1999. p. 319.
Para o autor, “Los sostenedores de la teoría de la diferencia en materia de conceptuación del
daño, no tiene más remedio que admitir la computación de beneficios.” Entretanto, o mesmo
autor adverte que a teoria da diferença propiciaria utilização automática e abstrata da compen-
satio, incompatível com a sua correta aplicação (DÍEZ-PICAZO, Luis. Op. cit., 1999, p. 335). No
mesmo sentido, PANTALEÓN, Angel Fernando. Comentário al art. 1029 del Código Civil. In:
Comentario del Código Civil. Madri: Ministério de Justicia, 1991. T. III, p. 1989 e ss.
110. MAGNUS, Ulrich. “Vorteilsausgleichung” – a typical German institute of the law of damages?.
In: VAN DIJK, Chris; MAGNUS, Ulrich (Coord.). Voordeelstoerekening naar Duits en Neder-
lands recht. Alphen aan den Rijn: Wolters Kluwer Nederland, 2015. P. 1. Importante lembrar
que, no Direito alemão, o instituto da compensatio lucri cum damno vem sendo analisado sob o
termo Vorteilsausgleichung.
111. MAGNUS, Ulrich. Op. cit.,, p. 3. Texto original: “A further and more precise borderline between
Vorteilsausgleichung and damages calculation may be of theoretical interest but appears to be
practically unnecessary. Even under the aspect of burden of proof there probably is – and should
be – no difference”.
112. MAGNUS, Ulrich. Op. cit., p. 2.
113. PIRES, Thatiane Cristina Fontão. Op. cit., , p. 118.
114. PETEFFI DA SILVA; LUIZ, 2017. Suportando esse entendimento MAGNUS, Ulrich. Op. cit.,
2015, p. 3 e ss.; LANGE, Hermann; SCHIEMANN, Gottfried. Schadensersatz. 3. Ed. Tübin-
gen: Mohr Siebeck, 2003. P. 486, Texto original: “Da der Schadensersatzanspruch nach der
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 38. ano 11. p. 33-107. São Paulo: Ed. RT, jan./mar. 2024.
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Pelo que foi exposto, pode-se considerar que a teoria da diferença não se coloca co-
mo efetivo fundamento primordial da teoria da compensatio lucri cum damno, mas tam-
pouco se mostra antinômica ou incompatível com a compensação dos prejuízos com as
vantagens sofridas pela vítima, tendo em vista que a hipótese diferencial não é necessa-
riamente construída sob o ponto de vista estritamente “matemático”, mas pode e deve
levar em conta elementos de ordem valorativa. Portanto, a construção normativa da hi-
pótese diferencial, levando-se em conta o patrimônio global da vítima, “existe apenas
na medida em que uma determinada vantagem individual possa ser atribuída a uma
correspondente desvantagem independente”115, na lição da jurisprudência germânica.
Eventual vantagem econômica, objetivamente auferida pela vítima em decorrência do
dano, somente será considerada na determinação do seu estado patrimonial global, ob-
servado após o evento danoso, se satisfizer os critérios erigidos pela teoria da compen-
satio lucrim cum damno.
Durante a análise da sua aplicabilidade prática, observou-se que a teoria da diferen-
ça é dependente de uma hipótese normativa e contrafática, fundamentando-se em uma
visão relacional de dano, que será igualmente observada quando se averiguar, no próxi-
mo item, outras abordagens contemporâneas da noção de interesse.
Portanto, admite-se que a teoria da diferença traduz uma noção normativa de dano
com conteúdo eficacial próprio, pois consubstancia um dos principais marcos no de-
senvolvimento da teoria da responsabilidade civil, responsável por um afastamento da
ideia de dano como mera manifestação fenomênica (naturalística), normalmente vin-
culada a uma noção de deterioração, perecimento ou destruição de bens.
Parcela da doutrina alerta que o conceito contemporâneo de interesse, na ambiên-
cia da responsabilidade civil, não se afasta da noção relacionada à evolução do id quod
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Doutrina Nacional 63
116. ZIMMERMANN, Reinhard. Op. Cit., 1990, p. 826. Para quem: “Quod actoris interest refers to
the plaint’ff ’s ‘interest’ (in the modern sense of the Word)”. (grifou-se).
117. STEINER, Renata. Op. cit., p. 43. Em relação ao dano patrimonial, esse também era o sentir de
Aguiar Dias: “a ideia de interesse (id quod interest) atende, no sistema de indenização, à noção
de patrimônio como unidade de valor. O dano se estabelece mediante o confronto entre o patri-
mônio realmente existente após o dano e o que possivelmente existiria, se o dano não se tivesse
produzido: o dano é expresso pela diferença negativa encontrada nessa operação” (AGUIAR
DIAS, José de. Op. cit., , p. 718).
118. MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 520-529. Este autor alerta que, no Direito português, a noção
de interesse goza de pouco prestígio na teoria geral da responsabilidade civil, mas identifica, na
doutrina alemã “uma predominância para a identificação do ‘interesse’ com o dano, medido nos
termos da fórmula mommseniana da diferença, ou como medida de indemnização (isto é, a
própria diferença).”.
119. sabe-se que na tradição da Comon Law são admitidas outras modalidades de indenizações,
como as meramente punitivas, chamadas de punitive damages.
120. A exata definição de termos como damage, loss, injury e harm está longe de ser consensual no
Direito inglês. Alguns julgados muito conhecidos da House of Lords admitem a hipótese da
diferença sendo albergada sob o conceito de damage. Nesse sentido, veja-se: NOLAN, Donal.
Op. cit., 2017, p. 256.
121. STEEL, Sandy. Op. cit., p. 242.
122. PEREIRA COELHO, Francisco Manuel. Op. cit., 1998, p. 7-8; CRUZ, Gisela Sampaio da.
O problema do nexo de causalidade na responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Renovar. 2005.
p. 207 e ss.
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123. Veja-se, para ampla análise do problema em Portugal e na Alemanha, MOTA PINTO, Paulo.
Op. cit., p. 639-710.
124. No Direito Brasileiro, de acordo com a lição de Gisela Sampaio da Cruz Guedes, são exemplos
das poucas situações em que o legislador confere relevância à causa virtual os arts. 399, 667, 862
e 1218 do Código Civil. (CRUZ, Gisela Sampaio da. Op. cit., 2005, p. 250-251).
125. PEREIRA COELHO, Francisco Manuel. Op. cit., 1998, p. 8.
126. MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 622.
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127. LE TOURNEAU, Philippe. Op. Cit., p. 556. Nas palavras do au tor : “Les auteurs saisissent les
préjudice à travers ses multiple variété (préjudice matériel, moral, corporel, comercial...) plutôt
que dans son essence, sauf à affirmer qu’il peut être défini d’une façon large comme étant l’atte-
inte à um intérêt, ce qui ne fait que déplacer la difficulté conceptuelle sans la résoudre”.
128. BETTI, Emilio. Interesse. In: Novissimo Digesto Italiano. Diretto da Antonio Azara e Ernesto
Eula. Torino: Editrice Torinense, 1962. P. 838. Para uma relação entre motivo, fim e interesse no
Direito Civil, veja-se: SACCO, Rodolfo. Motivo, fine, interesse. 2012. Acesso em: [http://bddx.
leggiditalia.it/cgi-bin/FulShow]. Acesso em: 03.09.2018.
129. BETTI, Emilio. Interesse. In: Novissimo Digesto Italiano. Diretto da Antonio Azara e Ernesto
Eula. Torino: Editrice Torinense, 1962. P. 838: “Certamente esatta é l’intuizione que muove dalla
relazione di um soggeto (immaginato carente) con un bene o con una situazione prospetati
siccome ad esso accessibili e valutati como idonei a colmarne la carenza e soddisfarne l’esigenza.
Di qui nasce l’idea di una inclinazione o vacazione di un soggeto verso un oggeto stimato idoneo
a soddisfarlo.” Para uma relação entre motivo, fim e interesse no Direito Civil, veja-se: SACCO,
Rodolfo. Motivo, fine, interesse. 2012. Disponível em: [http://bddx.leggiditalia.it/cgi-bin/Ful-
Show]. Acesso em: 03.09.2018.
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Tendo em vista os exemplos fornecidos, nota-se que, em alguns Códigos Civis, ape-
sar de ser encontrada inúmeras vezes138, a palavra interesse acaba por não respaldar o
significado empregado neste texto139. O direito privado utiliza-se do termo interesse,
portanto, em “contextos variados, com sentidos nem sempre coincidentes, e para efeitos
diversos140”, devendo o seu significado ser revelado em cada seara jurídica.
Como resolver os problemas trazidos por esses exemplos, em que a lesão a um inte-
resse é observada, mas não se verifica o surgimento de um dano a ser indenizado? Existe
a necessidade de se identificar o sentido exato da “lesão a interesse” na ambiência da res-
ponsabilidade civil, estabelecendo uma demarcação complementar aos limites do con-
ceito de dano indenizável, necessários para amenizar a vagueza semântica e operacional
da noção de interesse, que, como já alertado, é “aproximativa e imprecisa”141.
Em obras dedicadas ao “interesse contratual negativo” e ao “interesse contratual po-
sitivo”, categorias identificadas com os danos gerados na esfera dos incumprimentos
localizados na seara contratual e pré-contratual, alguns autores dão notícia de dois sig-
nificados possíveis para o interesse, sendo o primeiro afeto ao âmbito da ilicitude (anti-
juridicidade), ou seja, referente à situação jurídica tutelada; enquanto o segundo estaria
intimamente relacionado com o dano ou com sua forma de quantificação142, podendo-
-se admitir a criação de uma dicotomia entre um “interesse-posição jurídica” e o “inte-
resse-prejuízo” ou “interesse-dano”143.
138. MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 488. O autor indica que a palavra interesse aparece mais de
oitenta vezes no diploma civil português, mas em nenhum momento com o sentido de dano
ou prejuízo, que seria o “o candidato mais relevante para densificação do substantivo presente
na expressão ‘interesse contratual negativo’ ou ‘interesse contratual positivo’” (MOTA PINTO,
Paulo. Op. cit., p. 492 e 493).
139. STEINER, Renata. Op. cit., p. 28-30. A autora afirma que o termo interesse aparece 54 vezes no
Código Civil brasileiro. Ainda assim, as normas afeitas à responsabilidade civil não se utilizam
da expressão “interesse” de maneira expressa.
140. MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 491.
141. BETTI, Emilio. Op. Cit., p. 838.
142. MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 502. Apesar de constituir tema lateral ao presente trabalho, im-
porta notar que a simples lesão a interesse juridicamente tutelado, ainda que na sua conforma-
ção de “situação jurídica”, não é suficiente, em algumas situações, para a caracterizar a conduta
ilícita ou antijurídica do lesante. Com efeito, a lesão a interesses inegavelmente tutelados, como
a vida, pode não eivar de ilicitude a conduta do lesante, caso este esteja protegido por alguma das
pré-excludentes, tal como a legítima defesa. Para o assunto, veja-se: PETEFFI DA SILVA, Rafael.
Op. cit.
143. MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 507. A apresentação da dicotomia entre “interesse-situação
jurídica” e “interesse-dano” é grandemente baseada na obra de Claudio Turco. Interesse negativo
e resposabilità precontrattuale. Milano: Giuffré. 1990.
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Apesar da dúvida exposta pela doutrina sobre a necessidade desses conceitos para a
correta explicação da gênese do interesse-negativo e do interesse-positivo, parece que a
diferenciação entre as duas facetas do interesse, quer conectado com a antijuridicidade
(interesse-posição jurídica), quer conectado com o dano, apresenta-se como “indubi-
tavelmente interessante”144. A utilização original do termo interesse positivo e interesse
negativo, nas lições seminais de Jhering, restringiam-se à ideia de prejuízo, vinculada à
noção comparativa do id quod interest, não se imiscuindo com a noção de “interesse-si-
tuação jurídica” ou de direito subjetivo145.
Elastecendo o campo de análise e se afastando de um estudo circunscrito às catego-
rias de interesse contratual negativo e positivo, observa-se que a lesão a alguns interesses
vinculados à situação jurídica do seu titular pode não admoestar o “interesse-dano”, ou
seja, podem não atrair a pretensão indenizatória, como ilustrado pelo já analisado exem-
plo do terceiro interessado. Até mesmo dispositivos legais especificamente dedicados à
responsabilidade civil podem fazer referência ao interesse na sua acepção de mera situa-
ção jurídica146, o mesmo podendo ocorrer com diplomas de harmonização legal, como
ocorreu com a hipótese do art. 2:101 dos Princípios de Direito Europeu de Responsa-
bilidade Civil, de acordo com o explicitado no primeiro capítulo do presente trabalho.
No Direito Brasileiro, pode-se recordar do art. 81 do Código de Defesa do Consumi-
dor, em que os “interesses e direitos dos consumidores” aparecem como “objetos de pro-
teção da norma, ao lado ou em substituição à noção de direito subjetivo”147 e, portanto,
afastada da noção de dano ou prejuízo.
Ainda dentro das múltiplas possibilidades jurídicas do termo interesse na ambiên-
cia da responsabilidade civil, parcela da doutrina notou fenômeno típico da doutrina
144. MOTA PINTO, Paulo. Op. Cit., p. 517. O autor acredita que referenciar o interesse negativo
como situação jurídica e não apenas como manifestação prejudicial pode ser interessante no
contexto italiano, “em que a noção de interesse é autonomizada desde há muito como situação
jurídica tutelada e objecto do dano”. Porém, o autor entende que, diante das especificidades do
direito positivo português, a noção de interesse negativo como situação jurídica não se faz ne-
cessária. Steiner, apesar de igualmente afastar a solução proposta por Claudio Turco, entende
interessante a relação de simbiose que existiria entre as duas acepções de interesse (STEINER,
Renata. Op. cit., p. 63-64).
145. STEINER, Renata. Op. cit., p. 42-43. As correlações entre o interesse jurídico e os direitos subje-
tivos seriam desenvolvidos posteriormente pelo autor alemão. Em sentido semelhante, confira-
-se MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 519.
146. Veja-se o art. 483 do Código Civil português, com a interpretação encontrada em PIRES DE
LIMA, Fernando Andrade; ANTUNES VARELA, João de Matos. Código Civil anotado. 4. Ed.
Coimbra: Coimbra Editora. 2011. P. 472. “A ilicitude pode consistir também na violação de uma
disposição destinada a proteger interesses alheios” (grifos no original).
147. STEINER, Renata. Op. cit., p. 30.
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148. Com esse diagnóstico, MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 528.
149. Apesar de apresentarem distinções em suas análises, é possível identificar, com essa aborda-
gem, autores como SCHREIBER, Anderson. Op. cit., p. 97; MARTINS-COSTA, Judith. Op. cit.,
p. 168-169. Com visão parcialmente conciliadora, veja-se: Sanseverino “a teoria do interesse é
aquela que explica de modo mais completo a noção moderna de dano, abrindo portas para o
reconhecimento de novas modalidades de prejuízo, atendendo a uma exigência do princípio
da reparação integral. Nem por isso retira a utilidade da teoria da diferença, que continua a de-
sempenhar um importante papel no ressarcimento de parcela expressiva dos danos materiais”
(SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Op. cit., , p. 137-145).
150. STEINER, Renata. Op. cit., p. 64. Segundo a autora: “Com efeito, não basta compreender o que
acontece quando da ocorrência do dano – ou seja, a condução do lesado a uma situação hipotéti-
ca positiva ou negativa, marca da teoria da diferença –, mas, antes, determinar quando e por qual
razão a tutela recairá sobre o interesse positivo ou negativo. Isso diz respeito, essencialmente,
à compreensão da situação jurídica tutelada, o qual se confunde com o interesse protegido em
cada caso. Em outras palavras, a percepção do problema à luz da noção de interesse como objeto
de proteção da norma não coloca os acentos sobre a questão da consequência reparatória – não
serve à sua quantificação −, e sim no fundamento do dever de reparar, algo que se mostra tão
relevante quanto a primeira concepção antes vista” (Ibidem, p. 64).
151. ANTUNES VARELA, João de Matos. Op. cit., p. 532. O autor bem separa a esfera da ilicitude,
em que há a lesão a interesses ou “valores” tutelados pelo direito e a seara do dano, em que a con-
sequência dessa lesão é observada: “uma coisa é, com efeito, a calúnia ou a injúria (a difamação
de um facto que fere a honra ou afecta o bom nome de uma pessoa) e outra o dano que a calú-
nia ou injúria causou (o despedimento do empregado; a perda da clientela, o rompimento do
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Doutrina Nacional 71
as teorias referidas somente pode ser aceita, portanto, dentro dos limites da noção am-
pla do chamado dano indenizável, que se confunde com a observância de um conjunto
de requisitos relacionados com a responsabilidade civil e, portanto, com a formação do
vínculo obrigacional entre vítima e causador do dano.
Algo semelhante poderia ser observado na doutrina italiana majoritária, que enten-
de a lesão ao “interesse situação jurídica” como um elemento do conceito normativo de
dano (dano evento), devido à peculiar introdução da categoria de danno ingiusto pelo
legislador de 1942, somente admitindo a criação do dever de indenizar após a verifica-
ção de um prejuízo concreto e efetivo (dano consequência)152.
Esse panorama sistemático italiano foi responsável pela criação da igualmente pe-
culiar diferenciação entre “dano evento” e “dano consequência”153, sendo a primeira ca-
tegoria responsável pela identificação da ingiustizia do dano (verificação do interesse
juridicamente tutelado), relegando para a categoria de “dano consequência” a análise do
efetivo prejuízo sofrido pela vítima154.
noivado, etc.). E a ilicitude reporta-se ao facto do agente, à sua actuação, não ao efeito (danoso)
que dele promana, embora a ilicitude do facto possa provir (e provenha até as mais das vezes)
do resultado (lesão ou ameaça de lesão de certos valores tutelados pelo direito) que ele produz”
(Ibidem, p. 532).
152. SALVI, Cesare. La Responsabilitá Civile. In: IUDICA, Giovanni; ZATTI, Paolo. Trattato di Di-
ritto Privato. 2. ed. Giuffrè: Milão. 2005. p. 48 e 50; VISINTINI, Giovanna. Trattato breve della
responsabilitá civile. 3. Ed. Padova: Cedam. 2005. p. 435; e SIRENA, Pietro. O conceito de dano
na disciplina italiana e francesa da responsabilidade civil. Revista Ajuris, v. 47, n. 149, p. 383-408,
2020. p. 396. “Configurando-se, porém, apenas o dano injusto (dano-evento), outros recursos
civis (autoproteção, precaução etc.) poderão ser exercidos, mas não subsistirá nenhuma obri-
gação de ressarcimento. A base dessa abordagem conceitual é, mais uma vez, estabelecida na
função de responsabilidade civil, que, de acordo com a opinião mais difundida, não poderia
consistir em punir o infrator ou impedir o ato ilícito, mas exclusivamente na reparação da perda
sofrida pela vítima ou por outras pessoas próximas a ela, como seus parentes.”
153. Parcela da doutrina brasileira parece ter adotado a lógica observada no Direito italiano, utili-
zando-se do binômio dano-evento e dano-prejuízo. Segundo este entendimento, o dever de
indenizar necessitaria do dano-prejuízo. JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antônio. Cadastros de
restrição ao crédito: dano moral. Revista de Direito do Consumidor, n. 36, p.45-53, out./dez.
2000. p. 45-53. “O dano-evento é, pois, o dano imediato, enquanto que o dano-prejuízo é o
dano mediato. Ora, quando se fala em dano moral, é ao dano mediato, que se tem em vista.” (gri-
fou-se). Complementarmente, também é possível evidenciar que esse pensamento vincula do
dano-evento ao evento lesivo, na linha do pensamento italiano, nesse sentido, JUNQUEIRA
DE AZEVEDO, Antônio. O direito como sistema complexo e de 2ª Ordem; sua Autonomia,
Ato nulo e Ato Ilícito, Diferença de Espírito entre Responsabilidade Civil e Penal, Necessidade
de Prejuízo para Haver Direito de Indenização na Responsabilidade Civil. In: JUNQUEIRA DE
AZEVEDO, Antônio. Estudos e pareceres de Direito Privado. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 34.
154. VISINTINI, Giovanna. Op. Cit., p. 435; e SIRENA, Pietro. Op. Cit., p. 395. “Com base nessa
abordagem conceitual, o dano-evento (dano injusto) constitui um requisito do ato ilícito como
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tal, sendo que o dano-consequência (a perda sofrida pela parte lesada) constitui um outro requi-
sito de responsabilidade civil strictu sensu, qual seja, a obrigação de ressarcimento. Para que o
réu seja condenado a pagar uma indenização, é necessário, portanto, que dois requisitos distin-
tos sejam atendidos: primeiro, o fato que lhe é imputado (geralmente a título de dolo ou culpa)
deve ter causado a outros danos injustos (dano–evento), nos termos do art. 2.043 do Código
Civil italiano; além disso, como consequência desse evento, o autor deve ter sofrido uma perda
(patrimonial ou não patrimonial), conforme o disposto no art. 1.223 do Código Civil de 1942.”
155. Em sentido contrário, STEINER, Renata. Op. cit., p. 68.
156. NOLAN, Donal. Op. cit., p. 260. No original: “The first is that one occasionally comes across
instances where the word ‘damage’ is in effect being used (like ‘injury’) as a synonym for a rights
violation–in other words, a wrong. Again, this kind of usage is to be deprecated as, when ‘dama-
ge’ is collapsed into ‘wrong’, the utility of the damage concept as a distinct element of the cause of
action for negligence is lost.” (grifou-se)
157. Veja-se, CARRÁ, Bruno Leonardo Câmara; CARRÁ, Denise Sá Vieira. Dano in re ipsa, respon-
sabilidade civil sem dano e o feitiço de Áquila: ou de como coisas distintas podem coexistir sem
se tocar. Revista Jurídica da FA7, v. 16, n. 2, p. 115-131, jul.-dez. 2019. P. 123; SCHREIBER, An-
derson. Op. cit., p. 97; MARINO, Francisco De Crescenzo. Perdas e danos. In: LOTUFO, Renan;
NANNI, Giovanni Ettore (Orgs). Obrigações. São Paulo: Atlas, 2011. p. 655 (o autor utiliza-se da
divisão entre dano-evento e dano-prejuízo para marcar as distintas eficácias do interesse).
158. Em obra recente, Judith Martins-Costa manifesta entendimento desses aspectos, visualizando
o dano como a consequência da lesão a interesse e não como lesão a interesse: “Trata-se, pois, do
efeito (diminuição ou subtração) da lesão a interesse tutelado pelo direito” e “[...] o dano extra-
patrimonial diz respeito às repercussões não patrimoniais de lesões a interesses e a bens jurídicos
integrantes da esfera do lesado [...].” (grifou-se) (MARTINS-COSTA, Judith. Op. cit., , p. 407 e
409). No mesmo sentido, CARBONAR, Dante O. Frazon. Dano: uma nova abordagem para a
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161. NOLAN, Donal. Op. cit., , p. 261. Para o autor, “While the issue of exactly what interest is requi-
red need not detain us here, the fact that more than one person may have a sufficient interest to
bring a claim in respect of damaged property–bailor and bailee, legal and equitable owner–sho-
ws us that ‘damage’ in this context is a normative concept associated with a person, not a factual
concept associated with a particular physical entity.” (grifou-se). Em sentido semelhante, veja-
-se: CALVO COSTA, Carlos A. Op. cit., p. 73.
162. “O dano é relativo, depende das circunstâncias objetivas e subjetivas. O dano que se causa ao mi-
crobiologista, quebrando-se-lhe o microscópio, não é o mesmo que se causaria ao sertanejo, ou
ao trabalhador do campo, que, sem o usar praticamente, tivesse um microscópio entre os objetos
da sua casa” (PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. cit., t. 53, p. 154). Em sentido
semelhante, Mariano Izquierdo, utilizando as expressões dano comum e dano próprio, sendo
este último o dano como fenômeno relacional (YZQUIERDO TOLSADA, Mariano. Op. cit.,
p. 161).
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bem pertencente à esfera jurídica da alegada vítima. Ilustra-se essa característica ope-
racional com o mui conhecido exemplo de uma casa na beira de uma estrada que é
culposamente destruída por um caminhão desgovernado, mas que já estava com sua
demolição contratada para o dia seguinte ao acidente163. Nesse caso, a destruição defini-
tiva do bem (casa) poderia até mesmo gerar apenas uma vantagem para o seu titular164.
Nessa hipótese, nota-se a utilidade da noção de dano como interesse para o conceito
de dano, pois uma visão distinta do instituto, relacionada ao mero menoscabo de bens,
poderia gerar a incorreta conclusão de que o responsável pela destruição da casa tornar-
-se-ia igualmente responsável por uma obrigação de indenizar. O mesmo raciocínio é
utilizado na hipótese em que um ato ilícito absoluto causa a destruição de plantas que
seriam necessariamente ceifadas pelo proprietário, pois já não mais dariam frutos165: a
destruição do bem não gerou hipótese diferencial e, portanto, não há dano, no sentido
jurídico, a ser reparado. Seguindo-se o raciocínio que suporta a formação do interesse
(id quod interest), nota-se que não há diferença entre a situação fática do proprietário
do imóvel destruído ou das plantas ceifadas após o evento causado pelo indigitado res-
ponsável e a situação projetada (contrafática) em que ele estaria na ausência do referi-
do evento.
Nos exemplos apresentados, os requisitos clássicos da responsabilidade civil estão
presentes: ato antijurídico e até mesmo culposo do ofensor e o nexo de causalidade en-
tre este ato e a destruição material da casa ou das plantas (que equivaleria à noção natu-
ralística de dano, como menoscabo de bens ou como mera manifestação fenomênica).
A hipótese de incidência de algumas normas do ordenamento jurídico, especialmente o
163. DÍEZ-PICAZO, Luis. Op. Cit., , p. 336. Utilizando-se exatamente do mesmo exemplo, veja-se:
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. cit., t. 22, p. 296-297; BASTOS, Daniel
Deggau. Op. cit., p. 17; LE TOURNEAU, Philippe. Droit de la Responsabilité. Action Dalloz.
Paris: Dalloz, 2021-2022. p. 557.
164. LE TOURNEAU, Philippe. Op. cit., p. 557. “A la limite, un dommage peut même être source de
[...] bénéfice pour la ‘victime’: je devais procéder à la démolition d’un vieux bâtiment, quand un
poids lourd sort de la route [...] et m’évite de le faire”. Evidentemente que ainda se poderá obser-
var a lesão de interesse mesmo em alguns casos em que o titular não possa mais fruir ou gozar
do bem. Se o dono de uma bicicleta se tornou tetraplégico após um acidente, este ainda poderá
vendê-la, satisfazendo, deste modo, alguma necessidade específica sua. Na hipótese da casa
destruída, por se tratar de bem imóvel destinado à demolição, a possibilidade da venda inexistia.
165. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. cit., t. 53, p. 264. “O que é atingível não
são apenas direitos sobre coisas. Quaisquer direitos e interesses tais, que, feridos, diminuam o
patrimônio em que se aglutinam. Se o fato ilícito absoluto, lato senso, destrói ou deteriora algo
que é de alguém, porém tal destruição ou deterioração de modo nenhum causou prejuízo (e. g.,
a pedra jogada rolou pela ribanceira sem ofender qualquer planta, ou só ofendeu planta que ia ser
ou devia ser cortada, porque não mais daria frutos), não houve dano que se tenha de ressarcir.”
(grifou-se)
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art. 927 do Código Civil, somente não serão preenchidos pela existência de um conceito
normativamente construído de dano, baseado na noção de interesse. Como a destrui-
ção material do bem, além dos demais requisitos da responsabilidade civil, foi obser-
vada, somente a admissão de um dano com conteúdo eficacial próprio pode justificar a
inexistência de indenização. Uma vez mais nota-se que não se trata de um problema de
quantificação, mas de afirmação do dano como requisito da responsabilidade civil, ad-
mitindo-se a ausência do an debeatur.
Esta análise está alinhada com o desenvolvimento da noção de interesse e da teoria
da diferença, enfocado no item 3.1, em que se demonstrou que a “hipótese diferencial”
extraída da aplicação desta teoria também depende de uma análise contrafática e, por-
tanto, distanciada de uma mera noção naturalística, consubstanciando um “conceito
subjetivo e uma avaliação concreta do dano166”.
Contudo, em relação ao exemplo da casa destruída pelo caminhão desgovernado,
nota-se posição doutrinária inclinada a considerar a teoria da diferença insuficiente pa-
ra regular a espécie. Para Diez-Picazo, a hipótese diferencial estaria verificada, pois o
bem estava no patrimônio antes do ato ilícito do motorista do caminhão, que foi respon-
sável pelo seu desaparecimento (ainda que parcial)167.
Pereira Coelho, com acerto, contesta essa visão, ao apontar a suficiência da teoria da
diferença para produzir o resultado adequado em situações como a narrada, concluindo
pela inexistência de dano indenizável. A correta construção da hipótese diferencial ocor-
re entre a “situação real e a situação hipotética actual do patrimônio do lesado”168. Não se
admite, portanto, que a diferença seja auferida levando-se em conta duas situações fáti-
cas: a que foi verificada antes da destruição do bem e a situação imediatamente posterior
ao ato do ofensor. Uma vez mais, é imperioso afastarmos essa noção, tão comum em nos-
sa doutrina e jurisprudência, de acreditar que a indenização deveria transportar a vítima
166. PEREIRA COELHO, Francisco Manuel. Op. cit., , p. 194-195. Lembre-se que outras constru-
ções igualmente normativas podem ser consideradas pertencentes à teoria do dano, tal como
a compensatio lucri cum damno, que terá o condão de obstar a criação do dever de indenizar
(sanção jurídica) mesmo quando observados todos os outros requisitos da responsabilidade
civil. Nota-se, portanto, que a construção normativa ou jurídica do conceito de dano possui
amplo conteúdo eficacial, ainda que afastada de uma análise conjunta dos outros requisitos da
responsabilidade civil.
167. DÍEZ-PICAZO, Luis. Op. Cit., , p. 336.
168. PEREIRA COELHO, Francisco Manuel. Op. cit., , p. 197. “Em síntese, haverá que proceder
ao apuramento da ‘diferença’ entre a situação real e a situação hipotética atuais do patrimônio
do lesado – isto é, na data mais recente possível –, devendo o montante da indenização apagar
ou compensar a exata separação entre elas” (grifou-se). (ALMEIDA COSTA, Mário Júlio de.
Direito das obrigações. n. 65.3, B,. 4. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1984. p. 529). No Direito
brasileiro, veja-se: AGUIAR DIAS, José de. Op. cit., 1997, p. 718.
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para o status quo ante, quando o que se busca é que a indenização a conduza a um equiva-
lente da situação em que ela estaria se o evento danoso não tivesse ocorrido169.
O presente item demonstrou que a teoria da diferença apresenta-se como ferramen-
tal útil e adequada para informar um conceito normativo de dano. Entretanto, levan-
do-se em conta o raciocínio desenvolvido no item 2.1 do presente trabalho, nota-se que
algumas situações, como a representada pelo problema da irrelevância negativa da cau-
sa virtual, impõem desafios inegáveis.
Ademais, nota-se o posicionamento visceralmente refratário à teoria da diferença
por parte da maioria da doutrina nacional, levando a aproximações com uma noção
vulgar de dano. Ainda que não se concorde com o cerne das críticas endereçadas à teo-
ria, normalmente advindas de sua má compreensão170, reconhece-se que o Direito é um
fenômeno cultural e a opinião geral sobre a teoria da diferença constitui-se em barreira
importante para sua aplicação.
Diante do exposto, ainda que se continue a considerar que o conceito jurídico de da-
no permaneça alinhado com o racional alicerçado em hipóteses diferenciais, os motivos
declinados, mais conectados a questões pragmáticas do que científicas, apontam para
se considerar o conceito normativo de dano como lesão a interesse o candidato com im-
portantes chances de aceitação pela doutrina e pela jurisprudência brasileiras.
169. Esse tema já foi enfrentado no item 2.1 do presente trabalho. No Direito brasileiro, no mesmo
sentido CARNAÚBA, 2013, p. 53; STEINER, Renata. Op. cit., p. 47.
170. Essa análise foi realizada no item 2.1 do presente trabalho.
171. Para Francesco Carnelutti, “[...] in altre parole il danno riguarda sempre la situazione della per-
sona rispetto al bene, non il bene in sè. Appunto il concetto di lesione si attaglia all’interesse, non
invece al bene (considerato al di fuori dal suo rapporto con un uomo). Questo è il motivo, per cui
la formula può e deve essere semplificata in queste parole brevi: lesioni di interesse. Non credo
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lesar diferentes interesses, dependendo da idoneidade deste bem para satisfazer neces-
sidades específicas de determinada vítima.
Para os autores que possuem em Carnelutti forte inspiração, enquanto o bem pos-
sui a capacidade de satisfazer necessidades humanas, o interesse representa a possibi-
lidade de um sujeito de direito específico satisfazer as suas necessidades por intermédio
de determinado bem172, seguindo a ideia geral de interesse já enfrentada no item 2.2 do
presente trabalho173. O bem, portanto, conecta-se com a aptidão genérica para satisfazer
necessidades, de modo abstrato, enquanto o interesse aporta especificidade a essa apti-
dão, consubstanciando uma análise que obrigatoriamente inclui um ou vários sujeitos
determinados e a idoneidade do bem para satisfazer suas necessidades. Um bem não é
tutelado de maneira abstrata, pois somente os seus proprietários possuem interesses tu-
telados que se conectam com o bem174. Segundo o clássico exemplo de Carnelutti, o pão
é o bem, a fome é a necessidade e a capacidade ou aptidão do pão satisfazer essa neces-
sidade é o interesse175. Diante do exposto, poderia se afirmar que enquanto os adeptos
das modernas visões da teoria da diferença entendem o dano como interesse, os autores
alinhados com a visão carneluttiana vislumbram o dano como lesão a interesse.
Entretanto, alguns alertas necessitam ser feitos, pois não é possível ignorar que im-
portante doutrina indica que as lições de Carnelutti sobre o interesse não se conectam
especificamente com a noção de prejuízo esboçada neste trabalho, antes se relacionan-
do com o interesse como situação jurídica, ou seja, como elemento objetivo do ato ilíci-
to176, algo que em nossa tradição jurídica se convencionou chamar de antijuridicidade177.
che il danno possa essere definito più precisamente di così” (CARNELUTTI, Francesco. Il dan-
no e il reato. 2. Milão: Cedam, 1930. p. 14).
172. BUERES, Alberto. Op. cit., 2001, p. 290; CALVO COSTA, Carlos A. Op. cit., p. 65.
173. Veja-se, especificamente, a lição associada às notas de rodapé 127 e 128.
174. DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 111; CALVO COSTA, p. 73.
175. CARNELUTTI, 1930, p. 30. No original: “La fame è un bisogno; il pane è un bene; poter man-
giare il pane, questo è un interesse”.
176. Nesse sentido, em relação à abordagem de Carnelutti, veja-se: Visintini: “Egli peró non disco-
nosceva affatto que la parola ‘danno’ potesse venire usata anche per indicare il danno risarcibile,
cioè la perdita, il mancato guadagno e in genere il depauperamento di cui può essere chiesto il
risarcimento, ma aveva una chiara nozione della struttura del fatto illecito, caraterizzata, da un
lato, dall’elemento soggetivo della condotta antigiuridica, alias della colpa come disobbedienza
all comando, e dall’altro lato, dell’elemento oggettivo, l’atto contra ius, ovverosia la lesione di un
interese giuridicamente rilevante” (grifou-se) (VISINTINI, Giovanna. Op. cit., p.431-432). No
mesmo sentido, MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 530. Veja-se, do próprio CARNELUTTI,
Francesco. Pserseverare Diabolicum. Foro Italiano, 1952. IV. p. 97-101.
177. BIANCA, Massimo. Diritto Civile: La Responsabilità. 2 ed. Milão: Giuffrè. 2012. v. 5. p. 551, no-
ta 22. Veja-se a análise já feita da menção a interesse realizada pelos diplomas de harmonização
da responsabilidade civil, no item 2.1 do presente trabalho.
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178. O Código Civil italiano atual foi promulgado apenas em 1942. As ideias originais de Carnelutti,
portanto, precedem esse diploma legislativo.
179. VISINTINI, Giovanna. Op. cit., p. 430 e ss. A maior parte da doutrina italiana entende que o ar-
tigo 2043 efetivamente deslocou a análise da antijuridicidade para a seara do próprio dano, com
o advento da noção de danno ingiusto. Nesse sentido, BUSNELLI, Francesco D.; COMMANDÉ,
Giovanni. Wrongfulness in the Italian Legal System. In: KOZIOL, Helmut (Coord.). Unification
of Tort Law: Wrongfulness. Haia: Kluwer International, 1998. p. 69 e ss.; SIRENA, Pietro. Op. cit.,
p. 395 e LUDOVICO, Giuseppe. Danos não patrimoniais (direito italiano). In: MANUS, Pedro
Paulo Teixeira; GITELMAN, Suely (Orgs.). Enciclopédia jurídica da PUCSP. São Paulo: Editora
PUCSP, 2020. t. 7 (Direito do Trabalho e Processo do Trabalho), p. 4. “[...] o artigo 2.043 identifi-
cou no critério da injustiça o requisito indefectível do dano civilmente indenizável, vinculando
o conceito de dano juridicamente relevante à antijuridicidade do ato lesivo”.
180. De acordo com Pontes de Miranda: “O fato pode ser fato ilícito absoluto sem causar dano. En-
trou B na casa de A, sem permissão, mas nenhum prejuízo patrimonial ou não-patrimonial
resultou do seu ato imprudente” (PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. cit., t. 53,
p. 262).
181. DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 91; CALVO COSTA, Carlos A. Op. cit., p. 75 e 79.
182. DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 83 e 84. No mesmo sentido, CALVO COSTA, Carlos A. Op. cit.,
p. 62.
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
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183. BUERES, Alberto. Prefácio. In: CALVO COSTA, Carlos. Daño resarcible. Buenos Aires:
Hammurabi, 2005. p. 23-27.
184. VISINTINI, Giovanna. Op. cit., p. 431-432.
185. Análise semelhante foi realizada no item 2.2, ao mencionar a contraposição da teoria da diferen-
ça com a chamada “teoria do interesse”.
186. De acordo com De Cupis, “Aun en los supuestos en que a primera vista, el daño no parece deri-
varse de la violación del derecho, una atenta reflexión induce a reparar en su presencia. Así, por
ejemplo, la entrada abusiva em el fundo ajeno constituye siempre una violación dañosa de la
norma protectora del interés del propietario, aunque no se haya ocasionado perjuicio alguno al
cultivo, que pueda repercutir en la producción, sin embargo, con ello se ha lesionado el interés
del propietario del fundo, que no debe sufrir inmisiones o invasiones en 1a cosa propia, por
cuanto está reservada a su uso exclusivo. Se há perjudicado, por lo expuesto, el interés al goce ex-
clusivo, que constituye precisamente el interés protegido” (DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 91).
No mesmo sentido, CALVO COSTA, Carlos A. Op. cit., p. 75 e 79.
187. CALVO COSTA, Carlos A. Op. cit., p. 72. O autor, ao adotar a abordagem Carneluttiana de
interesse leciona “El interés – que etimologicamente es id quod interest: relación, conexion – no
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es más que la relación entre el sujeto que experimenta esa necesidad y el bien apto para satisfa-
cer-la” DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 110, também faz alusão direta ao id quod interest em suas
manifestações.
188. Apesar de estar baseado em algumas premissas distintas, pois se alinha com as críticas feitas
pela doutrina espanhola à teoria da diferença, encontra-se, no Direito brasileiro, pensamento
de apoio à ideia de lesão a interesse circunscrito à teoria do dano, sem se imiscuir com a ação
causadora do prejuízo. FLUMINGAM, Silvano José Gomes. Dano-evento e dano-prejuízo. Dis-
sertação de Mestrado – USP. Orient. Antonio Junqueira de Azevedo. 2009. p. 136 e ss.
189. PANTALEÓN, Angel Fernando. Comentario del Código Civil. Madri: Ministério de Justicia,
1991. t. 3. p. 1991. Igualmente admitindo que a noção de dano deve se pautar por um critério
subjetivo ou real-concreto, veja-se outras manifestações da doutrina espanhola: YZQUIERDO
TOLSADA, Mariano. Op. cit., 2016, p. 162; MARTÍN-CASALS, Miquel; RIBOT, Jordi. General
Overview (Spain). In: WINIGER, Bénédict; KOZIOL, Helmut; KOCH, Bernhard A; ZIMMER-
MANN, Reinhard (eds). Digest of European Tort Law. Berlin: De Gruyter. 2011. v. 2 (essential
cases on damage). p. 31. “the prevailing idea is that damage corresponds to the loss of the real
or specific interest the victim had in the damaged property, although the objective value of this
property can be taken as a valid yardstick for compensation unless specific circumstances chan-
ging the measure of damages upward or downward are proven.”
190. PANTALEÓN, Angel Fernando. Op. cit.,1991, p. 1991.
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concretas de uma vítima determinada como possível noção normativa de dano. Nessa
perspectiva, o dano poderia ostentar um conteúdo eficacial próprio, fundamental para
o nascimento do dever de indenizar, vinculado a uma tutela indenizatória.
Essa concepção de dano está alinhada com os mesmos padrões relacionais, concre-
tos e subjetivos já alicerçados pela construção histórica do id quod interest, alcançando
resultados operacionais adequados191. Nota-se que a lesão do “interesse real-concreto”
(interesse-dano) estará vinculada ao nascimento de uma pretensão indenizatória, dis-
tinta da plêiade de tutelas capazes de serem observadas quando da lesão a uma qualquer
situação jurídica da vítima (interesse “objetivo-típico”, na linguagem de Pantaleon).
Emilio Betti, que entende o interesse como a relação do sujeito com um bem ou uma
situação apta a satisfazer a suas necessidades ou carências, não identifica antagonismo
entre a noção de interesse e de diferença, já que esta ocorre entre a “situação de carência
ou de expectativa insatisfeita de um lado, e a situação projetada idônea a satisfazer a ex-
pectativa insatisfeita, com a qual o interesse restaria satisfeito”192. A contraposição entre
a situação fática em que se encontra a vítima após o evento danoso e a situação contrafá-
tica em que ela se encontraria sem o referido evento (hipótese diferencial) harmoniza-se
com a possibilidade concreta e específica de determinado bem satisfazer as necessida-
des de determinada vítima, frustrada pelo evento danoso, responsável pela indesejada
situação fática que impôs a vítima193.
Portanto, pode-se admitir a noção de dano em sentido estrito como lesão a interes-
se, desde que compreendido na visão real-concreta circunscrita à teoria do dano, con-
substanciando um conceito jurídico de dano com conteúdo normativo próprio e com
inegáveis pontos de contato com a tradição dogmática da construção de uma hipótese
diferencial.
A abordagem da noção de interesse aqui apresentada somente descortina uma con-
tínua evolução do conceito normativo de dano, sempre alinhada com as características
191. De acordo com Zimmermann, “Quod actoris interest refers to the plaintiff ’s ‘interest’ (in the
modern sense of the word): he has to get what he was interested in, what concerned him, what
was of consequence to him; for, interestingly, the expression is not derived from interesse (– to
be in between) but from the phrase ‘quod mea, tua, nostra etc.) in re est’ (what is in it for me, you,
us, etc.). Generally speaking, quod interest was the more modern and flexible counterconcept
to the somewhat crude and limiting idea of awarding “quanti ea res est”, and it signified a shift
from an objective, standardized point of view to a more sophisticated and equitable approach,
characterized by individualizing and, on the whole, subjective criteria.” (grifou-se) (ZIMMER-
MANN, Reinhard. Op. cit., 1990, p. 826).
192. BETTI, Emilio. Op. cit., p. 839.
193. MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 521, cita a opinião de Planck/Siber (BGB, II, 1, 1914, cit.,
par. 249, anot. 2, p. 67) “a diferença entre ambas as situações de facto faz o interesse, que o lesado
tinha na não verificação do fato lesivo. Por isso, o ressarcimento do dano é também ressarcimen-
to do interesse.”
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
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194. MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 520-529. Mota Pinto entende que a visão amplamente aceita
no Direito alemão, imantada pelo moderno entendimento da teoria da diferença e, portanto,
pela abordagem do dano como interesse, convive com abordagens doutrinárias que apenas vin-
culam o interesse a uma visão subjetiva que os bens possuem para as vítimas, contrapondo-se à
visão estática e objetiva de lesão a bens. Este autor alerta que, no Direito português, a noção de
interesse goza de pouco prestígio na teoria geral da responsabilidade civil, mas “Actualmente, na
doutrina alemã, distinguem-se vários significados da noção de interesse: o significado de “dano
patrimonial global’ (Gesamtvermogensshaden), apurado nos termos da hipótese da diferença,
pela comparação de situações patrimoniais; o sentido de valor subjectivo dos bens ofendidos
para o lesado (em contraposição aos valor objectivo); e um significado que se reporta às expec-
tativas juridicamente protegidas que o (futuro) lesado tem em relação aos seus bens afectados
pelo evento lesivo. Se tais diversas noções são por vezes criticadas e se considerou já, mesmo,
que são um obstáculo a uma ‘teoria geral do interesse’, a par, ou em lugar, da teoria do dano, com
préstimo para a responsabilidade civil, registra-se, porém, sem dúvida, uma predominância
para a identificação do ‘interesse’ com o dano, medido nos termos da fórmula mommseniana da
diferença, ou como medida de indemnização (isto é, a própria diferença)”.
195. NOLAN, Donald. Op. cit., , p. 260; ZAVALA DE GONZÁLEZ, Matilde M. Disminuciones psi-
cofísicas. Buenos Aires: Astrea, 2009. p. 5; e DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 83 “Si se quiere
considerar que el hecho productor del daño y el daño en sí, son elementos de un proceso com-
plejo, hay que convenir en que el elemento principal, determinante para la producción del efecto
jurídico – reacción del derecho – está constituido por el daño. La reacción del derecho, de hecho,
estando encaminada a reprimir el daño, se realiza solamente en cuanto aparece allí el daño en
sí; cierto, que es necesario que este daño derive de um hecho humano, pero lo decisivo, para que
actúe la reacción jurídica, es su existencia concreta” (Ibidem, p. 83). Em sentido semelhante, a
lição de Fernando Noronha: “Na relação do dano com o bem violado, é conveniente ressaltar
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
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que aquele não é propriamente a violação deste, e sim a consequência prejudicial resultante des-
sa violação. A violação do bem, em si mesma, configura o fato antijurídico, assim considerado
todo fato que se coloque em contradição com o ordenamento, deste modo afetando negativa-
mente quaisquer situações que eram juridicamente tuteladas” (NORONHA, Fernando. Op. cit.,
p. 580).
196. Essa crença é colocada em xeque, de maneira bastante contundente, pela doutrina contempo-
rânea. Nesse sentido, ver: PAPAYANNIS, Diego. Op. cit. p. xxxx e CARRÁ, Bruno Leonardo
Câmara; CARRÁ, Denise Sá Vieira. Dano in re ipsa, responsabilidade civil sem dano e o feitiço
de Áquila: ou de como coisas distintas podem coexistir sem se tocar. Revista Jurídica da FA7,
v. 16, n. 2, p. 115-131, jul.-dez. 2019. p. 120-121.
197. Durante o presente trabalho já se vaticinou que o dano é o alfa e o ômega da responsabilida-
de civil, com suporte em doutrina clássica e contemporânea. Posicionando-se especificamen-
te contra o surgimento de qualquer vertente de responsabilidade civil sem dano, consulte-se
MARTINS-COSTA, Judith. Op. cit., 2020. p. 406; JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antônio.
Op. cit., p. 32; CARRÁ, Bruno Leonardo Câmara. Responsabilidade civil sem dano: uma análise
crítica. São Paulo: Atlas, 2015 e ALBUQUERQUE JÚNIOR, Roberto Paulino de. Notas sobre
a teoria da responsabilidade civil sem dano. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 6. ano 3,
p. 89-103, jan.-mar. 2016. Mesmo os autores que entendem que a responsabilidade civil deveria
cumprir uma função puramente punitiva, em paralelo à função reparatória, admitem que o
ordenamento jurídico brasileiro precisaria de uma modificação legislativa para admitir a hi-
pótese (ROSENVALD, Nelson. O dano moral coletivo como uma pena civil. In: ROSENVALD,
Nelson (Coord.); TEIXEIRA NETO, Felipe (Coord.). Dano moral coletivo. Indaiatuba: Foco,
2018. p. 122).
198. REINIG, Guilherme Henrique Lima. Op. cit., p. 64. O autor, ao abordar a construção da ideia
de interesse na pandectística alemã assim se manifesta: “A descrição do fato do qual resulta o
dever de indenizar o interesse não integra, segundo MOMMSEN, este conceito”. Nesse aspecto,
sua obra desvincula o interesse do fundamento de origem da obrigação de indenizar: “são duas
questões totalmente diferentes e bem separáveis uma da outra, se no geral existe um interesse, e
se uma pretensão à reparação desse interesse é juridicamente fundada”. Em sentido semelhante,
ANTUNES VARELA, João de Matos. Op. cit., p. 532.
199. JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antônio. Op. cit., p 32-34. Para Atalá Correa, “uma separação
mais clara entre conduta ilícita e dano impede, ao mesmo tempo, que: (i) se veja dano onde ele
não existe e que (ii) se use a situação como pretexto para impor punição onde a lei previamente
não a estabelece” (CORREA, Atalá. Dano Moral: 20 anos de jurisprudência no Superior Tri-
bunal de Justiça. In: BIANCHI, José Flávio; MENDONÇA PINHEIRO. Rodrigo Gomes de;
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
Revista de Direito Civil Contemporâneo. vol. 38. ano 11. p. 33-107. São Paulo: Ed. RT, jan./mar. 2024.
Doutrina Nacional 85
geralmente também caracterizada como ilícita. Com efeito, os arts. 186 e 187 do Código
Civil Brasileiro definem, em grande parte, os limites do ato ilícito200, mas o surgimento
do dever de indenizar somente ocorre nos casos em que essa ilicitude seja causadora de
dano efetivo, como bem definido pelo caput do art. 927 do mesmo diploma.
Ademais, o art. 944 estabelece o princípio da reparação integral, ressaltando que o
dano será quantificado pela sua extensão. Não há margem, portanto, para a aceitação de
figuras que se consubstanciem em simples ato atentatório a direitos, sem qualquer tipo
de dano aferível, ainda que por intermédio de presunções201.
Como já explicitado nos itens anteriores, mesmo nos ordenamentos jurídicos em
que uma noção de “dano evento” foi aceita, o dever de indenizar surge somente na hipó-
tese de real verificação de dano (dano consequência). A resposta do ordenamento jurí-
dico ao ato ilícito ou à “lesão a interesse” que não dá origem a prejuízo resta circunscrita
a outras tutelas, tais como inibitória, possessória, restituitória, entre outras202.
No Direito Brasileiro, também se observa a mesma plêiade de tutelas para dar gua-
rida a lesões de situações jurídicas (interesses juridicamente tutelados), reservando-se
a tutela indenizatória para os casos de efetiva presença de dano. Fundamental exemplo
é fornecido pela Súmula 385 do Superior Tribunal de Justiça, que assim anuncia: “da
anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano
moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento”.
ARRUDA ALVIM, Teresa (Coords.). Jurisdição e direito privado: estudos em homenagem aos
20 anos da Ministra Nancy Andrighi no STJ. São Paulo: Ed. RT, 2020. P. 85).
200. Importante destacar que a menção ao dano no art. 186 é descabida, conforme lição de Fernando
Noronha: “O art. 159 do Código de 1916 referia a necessidade de ocorrência de um dano, mas
evidentemente este não entra na noção de ato ilícito, como dito no texto. No entanto, nesse
Código a referência era compreensível, porque o dispositivo, ao mesmo tempo que definia o
ato ilícito, estatuía a obrigação de reparar o dano que resultasse dele. Já no art. 186 do Código de
2002, que se limita a dar uma noção de ato ilícito, sem cuidar de suas consequências jurídicas,
que passaram a ser estabelecidas noutro lugar (art. 927, caput), a referência ao dano é injustifi-
cada” (NORONHA, Fernando. Op. cit., p. 387).
201. ZIMMERMANN, Reinhard. Non-pecuniary damage without harm (Comparative Report).
(in) WINIGER, Bénédict; KOZIOL, Helmut; KOCH, Bernhard A; ZIMMERMANN, Reinhard
(eds). Digest of European Tort Law. Berlin: De Gruyter. 2011. V. 2: essential cases on damage,
p. 709. Apesar de admitir que alguns poucos países europeus aceitam uma função punitiva para
o dano extrapatrimonial, a primazia da função compensatória parece ser um dos poucos con-
sensos do panorama europeu a respeito do dano extrapatrimonial. “In most countries covered
in this survey the damages award serves the purpose of compensation. This is supposed to be
the case also with regard to nonpecuniary damage, even if it is widely acknowledged that a sum
of money can hardly ‘compensate’ for the loss of an eye or a limb.”
202. SALVI, Cesare. Op. cit., p. 48; VISINTINI, Giovanna. Op. cit., p. 435; SIRENA, Pietro. Op. cit.,
p. 396. No mesmo sentido, em relação ao Direito brasileiro, veja-se: ALBUQUERQUE JÚNIOR,
Roberto Pauli de. Op. cit., p. 98.
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Note-se que o STJ admite que houve uma lesão a direito subjetivo ou interesse en-
quanto situação jurídica, tanto que concede à vítima a tutela jurídica necessária para
realizar o cancelamento do cadastro indevido. A possibilidade de indenização, entre-
tanto, somente ocorrerá quando um dano efetivo for comprovado203.
203. JUNQUEIRA DE AZEVEDO, Antônio. Cadastros de restrição ao crédito: dano moral. Revista
de Direito do Consumidor, n. 36, p. 45-53, out./dez. 2000. Utilizando-se da diferenciação entre
dano-evento e dano-prejuízo, o autor entende que “O dano-evento é, pois, o dano imediato,
enquanto que o dano-prejuízo é o dano mediato. Ora, quando se fala em dano moral, é ao dano
mediato, que se tem em vista.”
204. BIANCA, Massimo. Op. cit., p. 186-203; LUDOVICO, Giuseppe. Op. cit., p. 6 e ss.
205. Não é possível, nos limites do presente trabalho, realizar uma análise minudente a respeito do
longo e complexo caminho de criação doutrinária e jurisprudencial das categorias de dano bio-
lógico e de dano existencial.
206. SIRENA, Pietro. Op. cit., p. 398-399; LUDOVICO, Giuseppe. Op. cit., p. 7. Assim se manifesta
o autor em relação ao Leading case da Corte Constitucional italiana sobre o dano biológico “De
acordo com esta perspectiva, a lesão da integridade psicofísica constituiria o evento causado
pelo ilícito, enquanto as outras tipologias de dano representariam a consequência do mesmo.
Em outras palavras, a ressarcibilidade da lesão da saúde existiria independentemente do fato
que a lesão tivesse provocado uma perda efetiva, a ser ressarcida, portanto, seria a lesão em si do
interesse constitucionalmente tutelado” (Idem).
207. SIRENA, Pietro. Op. cit., p. 398.
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208. “La giurisprudenza ravviza un danno conseguenza nel danno esistenziale, che comunque
dev’essere provato, seppire con l’ausilio di presunzioni” (BIANCA, Massimo. Op. cit., p. 187,
nota 209).
209. Salvi assevera que a decisão de 31 de julho de 2003, da Corte de Cassação, ressaltou a necessi-
dade probatória do dano sofrido, afastando a modalidade de dano in re ipsa, abandonando a
“superada teoria do dano-evento” (SALVI, Cesare. Op. cit., p. 56). Sirena afirma ainda “segundo
o que estabelece o art. 2.697, 1, do Código Civil, o ônus de provar o dano reparável incide sobre
o lesado, não sendo reconhecidos danos normativos, ou in re ipsa, que sejam reparáveis inde-
pendentemente da prova da sua existência ou do seu montante. Todavia, provada a lesão de um
direito constitucionalmente garantido da pessoa, a jurisprudência presume, até que se prove o
contrário, que o autor tenha sofrido um correspondente dano não patrimonial (sem prejuízo
de um recurso a uma avaliação médico-legal, se se tratar de lesão psicofísica)” (SIRENA, Pietro.
Op. cit., p. 401).
210. Ludovico afirma “Nesse sentido expressaram-se em 2006 as Seções Unidas da Cassação, as quais
foram chamadas a dirimir o conflito surgido entre a orientação que, em caso de desqualificação,
considerava in re ipsa o dano existencial sofrido pelo trabalhador, e a orientação que conside-
rava necessária a demonstração da existência efetiva do dano. (...)A necessidade da prova da
existência efetiva do dano verifica-se sobretudo com relação ao dano existencial, razão pela
qual – como justamente assinalam as Seções Unidas – este tipo de dano não pode ser automati-
camente deduzido da desqualificação profissional, não sendo possível excluir que “a lesão dos
interesses relacionais, ligados à relação trabalhista, permaneça essencialmente sem efeitos, isto
é, não provoque consequência prejudiciais à esfera subjetiva do trabalhador” (LUDOVICO,
Giuseppe. Op. cit., p. 32). A doutrina brasileira dá conta de divergência jurisprudencial a esse
respeito. Nesse sentido, confira-se TEPEDINO, Gustavo; SILVA, Rodrigo das Guia. Notas sobre
o dano moral no Direito Brasileiro. Revista Brasileira de Direito Civil, v. 30, p. 33-60, out.-dez.
2021. p. 42: “Em que pese o amplo reconhecimento da possibilidade, em tese, de configuração de
dano existencial por imposição reiterada do trabalhador a jornada excessiva, identifica-se rele-
vante controvérsia, no âmbito do próprio TST, sobre a necessidade de o trabalhador reclamante
comprovar os prejuízos concretos que a jornada excessiva lhe teria causado.”
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
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215. EIDENMULLER, Horst Eidenmu et al. The Common Frame of Reference for European Priva-
te Law: Policy Choices and Codification Problems. Oxford Journal of Legal Studies, v. 28, n. 4,
p. 659-708, 2008. p. 683-684 “In contrast to Italian law, however, the DCFR does not limit com-
pensation for non-economic loss to the category of pain and suffering: Art VI.-2:101 (4) ex-
pressly declares loss of amenities–impairment of the quality of life–to be worthy of redress
independent of, and in addition to, pain and suffering in the narrow sense of the term. Therefo-
re, other than Italian law, the DCFR simply does not need the concept of ‘injury as such’ on top of
a broad concept of non-pecuniary loss that goes well beyond the pain actually felt by the victim.
In allowing compensation both for impairment of the quality of life (loss of amenities) and for
injury as such, the DCFR is in serious danger of reproducing identical loss under two separate
heads of damage. The risk of double compensation is imminent.”
216. Trabalhou-se essa abordagem em BASTOS, Daniel Deggau; PETEFFI DA SILVA, Rafael. A bus-
ca pela autonomia do dano pela perda do tempo e a crítica ao compensation for injury as such.
Civilistica.com, a. 9, n. 2, p.1-27, set. 2020.
217. Na tradição da Civil Law, a antijuridicidade sempre foi o filtro para admitir novas situações jurí-
dicas protegidas (interesses). Nesse sentido, veja-se: PETEFFI DA SILVA, Rafael. Op. cit., p.185-
186 e DE CUPIS, Adriano. Op. cit., p. 93. Para o último autor: “La antijuridicidad, repetimos,
es la expresión de la prevalencia concedida por el derecho a un interés opuesto.” Em sentido
semelhante, ZANNONI, Eduardo. Op. cit., 2005, p. 55. “No es objeto de esta obra el estudio de la
tipificación del ilícito relativo a la lesión o agravio a los derechos de la personalidad. Este estudio
corresponde, específicamente, a otra área del terna de la responsabilidad civil: la antijuridicidad.”
Silva, Rafael Peteffi da. Conceito normativo de dano: em busca de um conteúdo eficacial próprio.
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218. PETEFFI DA SILVA, Rafael. Responsabilidade civil pela perda de uma chance. 3. ed. São Paulo:
Atlas, 2013; PETEFFI DA SILVA, Rafael Peteffi da; RODRIGUES JR., Otavio Luiz. Daño reflejo
o por rebote: pautas para un análisis de derecho comparado. Revista de Direito Civil Contempo-
râneo, v. 7, ano 3, p. 207-240, abr.-jun. 2016; PETEFFI DA SILVA, Rafael. Wrongful conception,
wrongful birth e wrongful life: possibilidade de recepção de novas modalidades de danos pelo
ordenamento brasileiro. Revista Ajuris, n. 117, p. 311-341, mar. 2010; BASTOS, Daniel Deggau;
SILVA, Rafael Peteffi. A busca pela autonomia do dano pela perda do tempo e a crítica ao com-
pensation for injury as such. Civilistica.com, a. 9, n. 2, p.1-27, set. 2020.
219. Essa mesma constatação é feita por Borghetti: “On pourrait certes faire valoir que la violation
du droit constitue en elle-même un préjudice. Il s’agit cependant d’un préjudice abstrait, pour ne
pas dire virtuel. En tout état de cause, cette explication n’est guère satisfaisante, car elle ne dit pas
pourquoi cette solution ne s’applique qu’à certains droits bien particuliers. Ainsi, la jurispru-
dence n’a jamais affirmé, à notre connaissance, que la violation d’un droit de propriété entraî-
-nait nécessairement un préjudice pour le titulaire de ce droit” (BORGHETTI, Jean-Sébastien.
Op. cit., p. 6, nota 32, grifou-se).
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220. A favor da possibilidade de se utilizar uma fórmula comparativa na análise dos danos extrapa-
trimoniais, veja-se: STEINER, Renata. Op. cit., p. 51.
221. De acordo com Zavala de González, “La objeción fundamental que suscitan las teorías que ha-
cen coincidir el daño con la materia lesionada – sea que se atienda al derecho violado o al interés
menoscabado – es que no atienden al perjuicio en sí mismo, sino a su proveniencia; con ello y de
algún modo, el daño resarcible quedaría reducido a la antijuridicidad. Sin embargo, cuando el
Derecho se ocupa de reparar, no es relevante el exclusivo mal que entraña la lesión, intrínseca-
mente considerada, sino las concretas consecuencias – económicas o espirituales – que aquélla
infiere a la víctima” (ZAVALA DE GONZÁLEZ, Matilde M. Op. cit., p. 5); e JUNQUEIRA DE
AZEVEDO, Antônio. Op. cit., p. 33-34 e ss.
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222. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial 1.269.246/RS, rel. Min.
Luís Felipe Salomão, Órgão Julgador: 4ª T., j. 20.05.2014, Publicação: DJe 27.05.2014. “A verifi-
cação do dano moral não reside exatamente na simples ocorrência do ilícito, de sorte que nem
todo ato desconforme o ordenamento jurídico enseja indenização por dano moral. O importan-
te é que o ato ilícito seja capaz de irradiar-se para a esfera da dignidade da pessoa, ofendendo-a
de maneira relevante” (grifou-se).
223. CARRÁ, Bruno Leonardo Câmara; CARRÁ, Denise Sá Vieira. Op. cit., 2019, p. 122; ALMEIDA,
F. C. Inversão do ônus da prova, lesão a direitos de personalidade e dano imaterial: análise do
REsp 1.269.246/RS. Revista IBERC, v. 6, n. 1, p. 175-193, 2023.
224. Nesse sentido, parte da doutrina suíça que pensou que teria havido uma pura punição para o
médico anestesista que culposamente ministrou uma overdose de medicamentos que acabou
por deixar a vítima em um estado vegetativo. WINIGER, Bénédict; FLEURY, Patrick; FEHR,
Pierre-Emmanuel/ AVRAMOV, Philippe. Non-pecuniary damage without harm (Switzer-
land). (in) WINIGER, Bénédict; KOZIOL, Helmut; KOCH, Bernhard A; ZIMMERMANN,
Reinhard (eds). Digest of European Tort Law. Berlin: De Gruyter. 2011. v. 2: essential cases on
damage. p. 663. Discorda-se frontalmente da visão da doutrina suíça.
225. Essa é a leitura feita por parte da doutrina alemã em casos de lesão à saúde da vítima que, além das
lesões à sua integridade física, gera estado de coma. MARTENS, Sebastian; ZIMMERMANN,
Reinhard. Non-pecuniary damage without harm (Germany). (in) WINIGER, Bénédict; KO-
ZIOL, Helmut; KOCH, Bernhard A; ZIMMERMANN, Reinhard (eds). Digest of European Tort
Law. Berlin: De Gruyter. 2011. v 2: essential cases on damage. p. 659.
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demência, ainda que nos raros momentos de lucidez fosse possível aquilatar a morte do
ex-marido230. Uma argumentação baseada nas subjetividades da vítima também foi ela-
borada pela Suprema Corte da Áustria, que admitiu a indenização pela fratura nas duas
pernas da vítima cadeirante, apesar desta não poder sentir dor em decorrência da fra-
tura. Essa situação teria o condão de diminuir a indenização concedida à vítima, mas o
caso concreto demonstrou que a vítima sofreu com febres e vômito no dia do acidente,
assim como teve que se submeter a penosas cirurgias posteriores e alguns desconfortos
relacionados com a sua deficiência física. Portanto, a análise da condição concreta e sub-
jetiva da vítima pautou a ratio decidendi231 do Tribunal.
Não se pode ignorar que muitas cortes parecem admitir a existência de dano utilizan-
do-se das criticadas expressões “dano normativo” ou “dano objetivo”, em situações de lesão
de interesses-situações jurídicas no campo extrapatrimonial, como em algumas hipóte-
ses de lesão de direito da personalidade232, ou até mesmo no campo patrimonial, como se
reconhece em algumas jurisdições em hipóteses de dano por violação à concorrência233
230. PEREIRA, André; MANUEL VELOSO, Maria. Non-pecuniary damage without harm (Por-
tugal). In: WINIGER, Bénédict; KOZIOL, Helmut; KOCH, Bernhard A; ZIMMERMANN,
Reinhard (eds). Digest of European Tort Law. Berlin: De Gruyter. 2011. v. 2: essential cases on
damage. p. 679.
231. KARNER, Ernst. Non-pecuniary damage without harm (Austria). In: WINIGER, Bénédict;
KOZIOL, Helmut; KOCH, Bernhard A; ZIMMERMANN, Reinhard (eds). Digest of European
Tort Law. Berlin: De Gruyter. 2011. v. 2: essential cases on damage. p. 662. A Suprema Corte da
Áustria, entretanto, admitiu que uma soma mínima poderia ser deferida a título de indenização,
pela violação do direito de personalidade as such. Entende-se que Situação totalmente diferente
ocorreria se a vítima lesada já se encontrasse em estado de coma quando do ato danoso. Ima-
gine-se um paciente que se encontra em coma devido a uma patologia. Durante seu estado de
inconsciência, uma enfermeira, por imperícia, deixa cair um bisturi que acaba por causar um
corte na perda do paciente. Imagine-se que nenhuma dor ou desconforto tenha sido sentido pe-
la vítima e nem mesmo qualquer tipo de dano estético pode ser verificado no momento em que
a vítima recobra a consciência, um ano após o fato danoso. A lesão a direito da personalidade
parece inegável, permitindo, dependendo das circunstâncias do caso, imaginar-se até mesmo
consequências na seara criminal para a enfermeira. Entretanto, neste caso, não se vislumbra um
dano efetivo como lesão a interesse real e concreto.
232. LE TOURNEAU, Philippe. Op. cit., p. 558. Ao criticar a “desintegração do dano” em relação a
uma “teoria dos direitos subjetivos”, observada na atual jurisprudência francesa em caso de res-
ponsabilidade civil por lesão a direitos da personalidade, assim se manifesta o autor “il est vrai
qu’une mesure de cessation d’illicite peut être prononcée sans necéssité d’un préjudice, et que
la violation du droit consomme une illicéité, cependant, des dommages et intérêt présupposent
l’existence d’un préjudice et s’y mesurent, il fait donc remplir à la condamnation pécuniaire une
fonction autre que réparatrice”; com crítica semelhante, veja-se: JUNQUEIRA DE AZEVEDO,
Antônio. Op. cit., . p. 33-34 e ss.
233. BORGHETTI, Jean-Sébastien. Op. cit., p. 6, nota 32; LE TOURNEAU, Philippe. Op. cit., p. 557.
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ou no caso do chamado “dano de uso”234, ainda que seja complexo extrair da ratio deci-
dendi de muitas decisões se existe uma verdadeira indenização por mero fato antijurídi-
co ou se existiria uma forte presunção iuris tantum235 em relação ao dano pretensamente
sofrido pela vítima236.
É nesse sentido de se estabelecer presunções relativas que se admite, apesar dos eviden-
tes problemas terminológicos, a utilização da expressão dano in re ipsa em conformida-
de com as balizas do ordenamento jurídico brasileiro, pois se pode facilmente presumir,
em algumas situações de danos extrapatrimoniais, o dano efetivo sofrido pela vítima.
Parcela da doutrina identifica e critica uma contemporânea tendência do Superior Tri-
bunal de Justiça em respaldar o que seria uma “vertente subjetiva do dano moral”237,
234. MOTA PINTO, Paulo. Op. cit., p. 583-590. Concorda-se com a crítica do autor a alusão a um
chamado “dano normativo” ou “dano objetivo” para sustentar a indenização de um dano ocor-
rido pela privação de uso de determinado bem. Paulo Mota Pinto afirma que as consequências
específicas da privação do bem é que caracterizam o dano e não a mera lesão ao direito subjetivo:
“como concretizações dependentes de elementos subjectivos e contextuais, as vantagens concre-
tas do gozo autonomizam-se, quer do direito pessoal de gozo, por exemplo, de um locatário, quer
daquele ius utendi e fruendi do proprietário em que se traduz a faculdade de utilização” (MOTA
PINTO, Paulo. Op. cit., p. 588).
235. Alguns autores entendem que os danos, nos casos de concorrência desleal, seriam apenas presu-
midos, en raison des difficultés que susciterait sa preuve directe, ainda que essa ausência de provar
possa conferir a essas hipóteses um aspecto de pena privada. (VINEY, Geneviéve; JOURDAIN,
Patrice. Op. cit., p. 11-13).
236. Mesmo em relação aos danos morais coletivos, existe a necessidade de se verificar uma efetiva
consequência para a verificação do dano. Em relação a essa complexa categoria jurídica, alguns
autores entendem que a configuração do dano moral em perspectiva coletiva nem mesmo seria
possível. (Nesse sentido, ZAVASCKI, Teori Albino. Processo coletivo: tutela de direitos coletivos
e tutela coletiva de direitos. 3. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Ed. RT, 2008. p. 48 e ss. e ROSEN-
VALD, Nelson. Op. cit., p. 117 e ss.). Outros autores apoiam a sua indenização, mas indicam que
o dano moral coletivo não poderia se confundir com a mera antijuridicidade (Nesse sentido,
TEIXEIRA NETO, Felipe. Ainda sobre o conceito de dano moral coletivo. In: ROSENVALD,
Nelson (Coord.); TEIXEIRA NETO, Felipe (Coord.). Dano moral coletivo. Indaiatuba: Foco,
2018. p. 44 e ss.), entendendo pela necessidade de efeitos concretos sobre o patrimônio moral
da coletividade, (Nesse sentido, CARRÁ, Bruno Leonardo Câmara; CARRÁ, Denise Sá Vieira.
Op. cit., p. 128). Apesar de contar com jurisprudência pacífica, interessante a menção do autor
ao julgado: Superior Tribunal de Justiça. REsp 1.726.270/BA, rel. Min. Nancy Andrighi, rel. p/
Acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Órgão Julgador: 3ª T., j. 27.11.2018, DJe 07.02.2019,
em que o Ministro Ricardo Villas Boas Cueva entende que não basta a mera lesão à situação
jurídica (interesse) dos consumidores garantido pelo § 2º do art. 43 do CDC, asseverando ex-
pressamente que, apesar da ofensa ao comando legal, o ato ilícito “passou ao largo de produzir
sofrimentos, intranquilidade social ou alterações relevantes na ordem extrapatrimonial coletiva,
descaracterizando, assim, o dano moral coletivo.” (grifou-se)
237. TEPEDINO, Gustavo; SILVA, Rodrigo das Guia. Op. cit., , p. 45-46 citam as seguintes decisões
do STJ em confirmação à sua afirmação: STJ, 4ª T. AgInt no REsp 1.827.470/PR, j. 15.10.2019.
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caracterizada pela “dor psicológica sofrida pela vítima”238. De acordo com o exemplo da
vítima que adentra em estado comatoso logo após o evento danoso, acredita-se que a ju-
risprudência não adota uma noção simplória caracterizada somente pela dor psicoló-
gica sofrida pela vítima. Ao contrário, acerta a Corte brasileira ao adotar um conceito
subjetivo, relacional e sofisticado para a verificação do dano moral, na linha dos parâme-
tros impostos pelo ordenamento jurídico nacional e pela tradição do id quod interest239.
Durante o presente trabalho apresentaram-se possibilidades de noções normativas
de dano, afastadas de uma mera noção naturalística, mas vinculadas a um prejuízo efeti-
vo sofrido pela vítima. Levando-se em conta o arcabouço jurídico brasileiro, examinan-
do as normas dedicas à responsabilidade civil, acredita-se que a noção de dano baseado
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em uma mera lesão de direitos (situações jurídicas), sem a presença de dano efetivo so-
frido pela vítima, seria admitir um “dano anti-normativo”240.
Conclusões
Diante dos argumentos expostos no presente trabalho acredita-se que se possa ex-
trair algumas conclusões principais, que possibilitam a construção de um conceito nor-
mativo de dano para o direito civil contemporâneo:
1. Ainda que se tenha admitido que a noção ampla do termo “dano indenizável” pos-
sui utilidade dogmática, pois traduz a observância da totalidade dos requisitos para a
formação do dever de indenizar, a construção de uma noção estrita de dano indenizável
mostrou-se fundamental para a fixação de um conceito de dano com grau relevante de
autonomia e com conteúdo eficacial próprio.
2. A noção de dano como mera lesão ou menoscabo de bens aproxima-se de uma
noção naturalística, incapaz de absorver a riqueza e a multiplicidade das manifestações
danosas indenizáveis. Observou-se, portanto, desde o Direito Romano, a tentativa de
construção de uma noção sofisticada e relacional, baseada no id quod interest (interes-
se), apta a recepcionar os distintos e relativos efeitos sentidos pelas vítimas diante da le-
são a bens tutelados.
3. De acordo com o contexto da época, a pandectística alemã do século XIX traduziu
essa noção de interesse na chamada teoria da diferença, em que o dano em seu sentido
jurídico seria definido pela comparação da situação patrimonial real em que a vítima se
encontra após o dano e da situação hipotética (normativamente construída) na qual ela
estaria se o evento danoso não houvesse ocorrido.
240. Em sentido semelhante, ZIMMERMANN, Reinhard. Op. cit., , p. 716, ao comentar as decisões
que admitiam a reparação sem uma efetiva consequência danosa para a vítima: “These are all
somewhat helpless, occasionally speculative, and ultimately unconvincing attempts to rationa-
lise a decision that is based, ultimately, on a feeling of compassion with persons who have been
particularly severely injured rather than on strictly legal argument”. No Direito Brasileiro tam-
bém não passaram despercebidos pela doutrina os riscos em se admitir uma responsabilidade
civil afastada de seus elementos essenciais, determinados pelo ordenamento jurídico nacional.
Nesse sentido, TEPEDINO, Gustavo. Editorial. Revista Trimestral de Direito Civil – RTDC, v.6,
n. 24, out./dez. 2005): “E nem mesmo a caótica intervenção do Estado em áreas sociais críticas –
como saúde, transporte, segurança pública – autoriza o superdimensionamento do dever de
reparar para a promoção de justiça retributiva entre particulares. Tão grave quanto a ausência de
reparação por um dano injusto mostra-se a imputação do dever de reparar sem a configuração
de seus elementos essenciais, fazendo-se do agente uma nova vítima”. Em sentido semelhante,
pugnando pelo respeito aos elementos essenciais da Responsabilidade Civil, veja-se: RODRI-
GUES JR., Otavio Luiz. Nexo causal probabilístico: elementos para a crítica de um conceito.
Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 8, ano 3, p. 115-137, jul.-set. 2016.
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