0 notas0% acharam este documento útil (0 voto) 20 visualizações8 páginasEntre o Subjetivismo e o Objetivismo
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CAPITULO |
NTRE © SUBJETIVISMO E O OBJETIVISMO?
EM BUSCA DE UMA SUPERACAO,
Uma das possibilidades de se interpretar a obra de
Bourdieu consiste em concebé-la como orientada por um
desafio tedrico central: constituir uma abordagem socio-
lbgica capaz de superar, simultancamente, as distorcdes €
‘0s reducionismos associados ao que ele chama de formas
subjetivista ¢ objetivista de conhecimento, ou seja, por
um lado, evitar que a Sociologia restrinja-se, tomando-o
como independente, ao plano da experiéncia e consciéncia
pritica imediata dos sujeitos, as percepgdes, intengdes €
acéesdos membros da sociedade, e, por outro, que elrse
reduzindo a agio a uma execugio mecinica de determi
wigos struturais reiicados.
‘Bourdieu (1983a) argumenta que é possivel conhecer
‘© mundo social de trés formas: fenomenoldgica, objeti-
vista e praxiolégica, O conhecimento fenomenolégico,
representado na sociologia contemporinea por correntes
como a Etnometodologia ¢ o Interacionismo Simbélico,
restringir-se-ia, segundo o autor, a captar a experiéncia
primeira do mundo social, tal como vivida cotidianamente
pelos membros da sociedade. Essa forma de conhecimento,
segundo Bourdicu, excluiria do seu campo de investigagio
a questio das condigdes de possibilidade dessa experiénciag
subjetiva. Descrever-se-iam as agdes ¢ interagdes sociais,
aCOLEGAO “PENSADORES & EDUCACAo»
mm
mas nao questionar-se-ia a respeito das. condicdes, Obje
que poderiam explicar 0 curso dessas interagieqs
Blema dessa forma de conhecimento, segundo o ayy
seria apenas eu scopo limitado, 0 fato de ela nig 9
as bases soins que, supostamente, condionariag s &*
perienisprtics, mas, sobretudo oto dela cong
rau caicepeao Tria do mundo Socal que gape
y 5 Tajeitos excessiva autonomia € conscifncia nyo
a
Ho de sas ages einteragbes. AS escolhas, as peceprse
| ~asapreciagBes, as files, 05 estos, a agdes 2 inte
nio deveriam, sob o risco de se construit uma
CONCEP ig
“eaganosa do mundo social, er analisados em si mesmee
de forma independente em relacio a8 exruturs objet
‘que 0s constituem,” _ .
~~ Em contraposigio ao subjetivismo, o conhecimenty
objetivistacaracterizar-se-ia pela ruptura que promove en
relacio & experiéncia subjetiva imediata, Essa experi
seria entendida como estruturada por relagdes objetivas
que ultrapassam o plano da consciéncia ¢ intencionalidade
. Por um lado,
individuai ‘como sugerem suas criticay ag
subjetivismo, Bourdieu considera legitima e necessiia
ssa ruptura com a experincia imediata promovida pelo
objetivismo, Essa ruptura seria a condigo primeira para
um conhecimento cientifico do mundo social. Seria ne-
cessirio investigar as estruturas sociais que organizam,
que estruturam, a experiéncia subjetiva, inclusive para
escapar i concepcio ~ do senso comum e, em algum grau,
* Essascriticas de Bourdieu, na verdade, vio além das correnss
¢stritamente fenomenol6gicas eatingem um conjunto mais amplo
de teorias-rotuladas por le de subjetivistas—incluindo-se, muito
especialmente, as teorias da escolha racional.
* Essa recusa ¢ ess critica enérgica as correntes fenomenol6gicas, ot
tus amplamente, subjetivistas & apresentada de maneira clara fot
Bourdieu no apenas no texto acima citado, mas & algo que pe
Passa ~ de forma bastante coerente ~ 0 conjunto de sua obra. Vale
acompanhar, especialmente, as criticas que sio dirigidas a Sate
em Le sens pratique (Cf. BOURDIEU, 1980).BOURDIEU & A EDUCAGAO
também de certas abordagens cientificas que enfatizam a
dimensio racional do comportamento humano ~ de que os
individuos so seres autdnomos e plenamente conscientes,
do sentido de suas ages
Por outro lado, no entanto, segundo 0 autor, 0
objetivismo implicaria certos riscos bastante sérios. Fun-
damentalmente, Bourdieu mostra-se preocupado com a
dificuldade do objetivismo de construir uma teoria da
pritica, ou seja, de explicar como se di a articulagio entre
0s planos da estrutura e da agio, O objetivismo tenderia
a-conceber a pritica apenas como execugio de regras
estruturais dadas, sem investigar 0 processo concreto por
socialmente. Essa concepeio parcial, que reconheceria as
propriedades estruturantes da estrutura sem, no entanto,
analisar 0s processos de estruturacio, de operacio da estra~
tura no interior das pr6prias priticas sociais, conduziria &
tendéncia de se hipostasiare reificar a construgio cientifica
da estrutura social. © objetivismo tenderia a descrever as
regularidades que estruturam um espago social e a supor
que 0s sujeitos obedecem 2s regias dessa estruturagio, sem
demonstrar como essas regras, de fato, operam na pritica
como principios estruturantes das ages e representagdes
dos sujeitos e sio reproduzidas nesse processo. Em poucas
palavras, 0 conhecimento objetivista nio forneceria ins
“trumentos conceituais adequados para se compreender a
“Tnediacio entre estrutura e pritica. A pritica seria apresen-
“ada como decorréncia direta, mecanica, da estrutura, tal
como definida pelo socidlogo. Os mecanismos ou processos
intervenientes nessa passagem da estrutura para a pratica
nio seriam suficientemente expl
O terceiro tipo de conhecimento, chamado praxio-
logico, € apresentado e defendido, entio, por Bourdieu
como uma alternativa capaz de solucionar os problemas
30 € do objetivismo, Nos termos do autor
- 47), esse tipo de conhecimento “tem como
objeto mao somente o sistema das relagdes objetivas que 0
itados.coursAo “PENSADORES & EDUCAGAO”
Jo de conhecimento objetivista constr, mas tam,
mo
eee Fos dalicanentfe c08 STRUTITE Cas Tig
8
ee as quis els se atualizam € ques
Feproduzi-las”. O conhecimento praxiol6gico 135)
“earmigiria a wlentificar estruturas objetivas externa,
individuos, tal como © faz o objetivismo, mas buscariy
stigar como essas estrutuiras encontram-se inteig.
estigar como ¢s
Aes nos sujeitos constituindo um conjunto estave] de
“isposigdes estruturadas que, POF Sua vez, estruturam 3,
‘© plano das estruturas, ou, como repetidamente r
© autor, proceso de “interiorizacio da exterioridade ¢
‘de exteriorizagio da interioridade”.
Como jé foi dito, a questo fundamental de Bourdieu
é ade como entender 0 carter estruturado ou ordenado
das priticas sociais sem cair, por um lado, na concepeio
subjetivista segundo a qual essas priticas seriam organiza-
das aurénoma, consciente ¢ deliberadamente pelos sujitos
sociais, e, por outro, na perspectiva objetivista, que as
reduziria 4 execucdo mecinica de estruturas externas ¢
\ reificadas. Para resolver essa questio, o autor afirma (1983a,
P. 60) que seria “necessario e suficiente ir do opus opera~
tum 20 modus operandi, da regularidade estatistica ou da
estrutura algébrica ao principio de produgio dessa ordem
/ observada”. A esse principio de producio, incorporado
® Proprios sujeitos, Bourdieu denomina “habitus”, €0~|
“fendido como sistema de disposigdes duriveis estraurid3
He-acordo com 0 meio social dos sujeitos ¢ que seria.
l Predispostas a funcionar como estruturas estruturantes,
ce seam eecip gerador e estruturador das proves |
Ges a, p. 61). - \
“ hae babi serinasima ponte, a medias
Simplesmenna ne ei esubjetiva do: mundo socal of
de Bourdieu gn 1 Sstuttra ea pritica. O argumen
© de que a estruturacao das praticas socialsBOURDIEU 2 A EDUCAGAO
no é um processo que se faga mecanicamente, de fora para
dentro, de acordo com as condigées objetivas presentes
em determinado espaco ou situagio social. Nao seria, por
outro lado, um processo conduzido de forma auténoma,
consciente e deliberada pelos sujeitos individuais. As
priticas sociais seriam estruturadas, isto é, apresentariam
propriedades tipicas da posigio social de quem as produz,
‘porque a propria subjetividade dos individuos, sua forma
de perceber ¢ apreciar 0 mundo, suas preferéncias, seus
Bostos, s aspiracdes, estariam previamente estruturadas
“em relagio ao momento da acio.
(© argumento de Bourdieu € o de que cada sujeito,
em fungio de sua posigio nas estruturas sociais, viven-
ciaria uma série caracteristica de experiéncias que estru-
uaa insemasete subjetividade, constituindo
(uma espécie de “matriz de percepebes eapreciagbes
Orientaria, estruturaria, suas ages em todas as sit
subsequentes, Essa matriz, ou seja, o habitus, nio cor
responderia, no entanto, enfatiza 0 autor, a um conjunto
Icdes
inflexivel de regras de comportamento a ser indefinida-
mente seguidas pelo sujeito, mas, diferentemente disso,
constituiria um “principio x duravelmente armado_(
_de_improvisacdes regradas” (1983a, p. 65). O habitus \
seria formado por um sistema de disposigdes gerais que
precisariam ser adaptadas pelo sujeito a cada conjuntura
especifica de agio.
Bourdieu realga essa dimensio flexivel do habitus,
_o que ele chama de relacio dialtica ow nio mecinica do
habitus com a situagio, antes de mais nada, como forma de
“evitar uma recaida no objetivismo. O autor insiste que 0
habitus seria fruto da incorporacio da estrutura social e da
posicio social de origem no interior do proprio sujeito. Essa
cstrutura incorporada seria colocada em a¢io, no entanto,
ou seja, passaria a estruturar as ages e representagdes dos
sujeitos, em situagdes que diferem, em alguma medida,
das situagdes nas quais o habitus foi formado. O sujeito
precisaria entio necessariamente, ajustar suas disposigdes‘COLEGKO “PENSADORES & EDUCAGAoy
duiveis para ao, seu habitus, formado num ae
social anterior & conjuntura concreta na qual bat
E importante, entio, observar que Conceig
abitus desempenha, na obra de Bourdieu, oy, lat
prculador entre ts dimensBesfundameneeg ae
se: a estrutura das posigdes objetivas, 4 Subjetivdade ge
indvidos ea stuns eonctetas de aia, Ee se
ae que Bou aredia superar os income a.
subjetivimmo e do objtivismo. A posigio de ead SUjeito ny
extra dregs objetvs propiciaris mean a
vst ies qn tenderiam ase consoldarnaee
umbubienadequo ds posi soca. Ese hat i
sua ver, fin com que ese sujeto agi
stunes soit, nlo como um indivduo ques
comoummenbrotico dem grupo ou cases
cpa uma pesigio determinada nas estruturas oes Ao
ait desa forma, finlmente,osyjcitocolaborara og
suber, para reproduzir as propriedades do seu tupo social
4 origem e a propria estrutura das posigdes socian na gual
ele foi formado.
O conceito de habitus
© Nas mais diversas
ermite, assim, a Bourdi
sustemtar a existéncia de um: wtura social objetiv
1a_estrutura social objetiva,
“trutura social objetiva
e dominacio entre
das quais 0s sujeitos participam
< Bata cua perpetuacio colaboram através de sas agbes
1am plena consciéncia disso —sem
baseada em miiltiplasrelagdes de Ian
Btupos € classes sociais —
modo nig Intencion:
0s simbolos quey
fe stia posigao sockh
; erarquia
"stinguem e que a situam na hierarat ‘
43s posigdes sociais, as estratégias de ago e de “apienee
ue Ihe si0 efpicas, a5 Crengas, os gostos, as preferéncia
26BOURDIEU & AEDUCACAO
| que a caracterizam, em resumo, as proptiedades corres-
pondentes a uma posigao social especifica sio incorporadas
pelos sujeitos tornando-se parte da sua propria natureza. A
agio de cada sujeito tenderia, assim, a refletir e a atualizar
as marcas de sua posigdo social e as distingdes estruturais
que a definem, nio, em primeiro lugar, por uma estratégia
deliberada de distingZo e ou de dominagio, mas, principal
mente, porque essas marcas tornaram-se parte constitutiva
de sua subjetividade. Os sujeitos nao precisariam, portanto,
ter uma visio de conjunto da estrutura social e um conhe-
cimento pleno das consequéncias objetivas de suas ages,
particularmente, no sentido da perpetuacio das relagdes
de dominagio, para deliberadamente decidirem ou nio a
agir de acordo com sua posicio social. Eles simplesmente
agiriam de acordo com o que aprenderam ao longo de sua
socializacio no interior de uma posicio social especifica e,
dessa forma, nos termos de Bourdieu, confeririam as suas
ages um sentido objetivo que ultrapassa o sentido subjetivo
diretamente percebido ¢ intencionado.
\ceito de habitus seria, assim, o elemento central
_da proposta, desenvolvida por Bourdieu, de superasao do
_subjetivismo e do objetivism. O subjetivismo seria supers
do na medida em que as priticas dos sujeitos, suas atitudes
“© Comportamentos deixam de ser compreendidos como
_ “algo definido auténoma, consciente e arbitrariamente pelos
“proprios sujeitos, e passam a ser interpretados como algo
produzido segundo um conjunto mais ou menos extavel
=e diferenciado conforme a posigio social de origem do
ae
Tndividuo — de disposigdes incorporadas. Defender esse
argumento significa afirmar que a subjetividade dos su-
jeitos € algo socialmente estruturado — no sentido de estar
configurado de acordo com a posigio social especifica
ocupada originalmente pelo sujeito na estrutura social —
Jes € agdes refletem essa
estruturagio interna, ou seja, apresentam caracteristicas
€ que suas percepcies, aprecia
que indicam a vinculagio com determinada posigio social,
Essa afirmagio contraria frontalmente qualquer perspectivacoue¢Ao “PENSADORES & EDUCAGAo-
1 na medida em que nega, simultane
sciente ¢ auténomo da orientagio dent
0, Por outro lado, 0 objetivismo seria sats
vita acini debit ttf
mportamentos de uma forma wish
6 sujeito ocupa na estrutua social nis
mente, a agir em determinada diteiy
cle indogpoassoun cons Specie g
1 a¢io que oorientariam, 20 longo de
subjetivist
cariter con
duos na aca
porque as est
produzindo co!
A posigio que
conduziria, direta
‘mas faria com que
de disposigdes para
tempo, nas mais diversas situagbes socais*
"Para
‘um aprofundamento.
da discussio sobre o conceito de habit
ver: NOGUEIRA, 2002,
8