Acordão 1211-2021 - TCU
Acordão 1211-2021 - TCU
651/2020-8
RELATÓRIO
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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 018.651/2020-8
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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 018.651/2020-8
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expressamente, que a ata do certame deverá conter a decisão sobre o saneamento de erros
ou falhas na proposta ou na documentação, conforme art. 8º, inciso XII, alínea 'h'". Com
essa afirmação, entende que, em caso de verificação de ausência de documento de
habilitação exigido no edital, quando solicitado pelo pregoeiro, este pode ser
complementado com documento novo pelo licitante, e considerado saneamento de erro ou
falha.
12. Com a máxima vênia, esta unidade técnica não abriga a posição da subunidade
do TCU. Isso porque o Decreto 10.024, de 2019, traz expressamente que o saneamento dos
erros ou falhas recaem sobre o documento posto ou na proposta apresentada. Não se pode
forçosamente elastecer a regra para alcançar documentos que não constam do processo.
13. Chama-se atenção que a expressão no texto "sanear erros ou falhas que não
alterem a substância das propostas, dos documentos e sua validade jurídica", não tem o
condão, s.m.j., de extrapassar para os casos de ausência de documentos. Oras, como
sanear erro ou falha em documento inexistente/ausente? Assim, não se pode franquear o
pronunciamento da Subunidade neste item, salvo em caso de alteração semântica do art.
47 do Decreto 10.024, de 2019. O que esta unidade técnica antevê como medida que não
se coaduna no mundo jurídico em relação aos procedimentos para saneamento de ato
praticado, seja por erro material ou formal. Reforça-se que se trata de ato praticado, não
do ato inexistente (ou de documento novo).
14. O item 14 do pronunciamento reitera a possibilidade de envio de documentos
novos, com base no inciso VI do art. 17 do Decreto 10.024, de 2029. Nesse ponto, tonifica-
se o esposado acima. Todavia, na mesma toada, o pronunciamento assenta que não
haveria vedação ao envio de documento novo, que não altere, modifique, documento
anteriormente encaminhado. Significa dizer que se não foi apresentado, por exemplo,
atestado(s) suficiente(s) para demonstrar sua habilitação técnica no certame, talvez em
razão de conclusão equivocada do licitante de que os documentos encaminhados eram
suficientes, poderia ser juntado, após essa constatação no julgamento da proposta,
atestado(s) novo(s) de forma a complementar aqueles já enviados. Parte-se do pressuposto
de que a licitante detém a documentação exigida e apenas não foi encaminhada por erro
ou falha, e isso não deveria ser motivo para sua inabilitação no certame.
15. Entende-se perfeitamente que a norma, como posta, possa acarretar tais
problemas em detrimento do fornecedor detentor da proposta mais vantajosa, em face de
um formalismo exagerado, como bem anotado no pronunciamento. No modo como está
positivada, pode realmente privilegiar mais o aspecto procedimental em detrimento do
resultado. Não obstante, no vislumbrar desta unidade técnica, a problemática apontada
não se resolve com contornos normativos, acomodações ou emprego de paralelismos a
dispositivos que embora haja animus de que tenham vestes de saneamento de todos os atos
do processo, não as têm.
16. Conquanto entender a necessidade e pertinência do pleito requestado pela
Colenda Corte de Contas, indelével é a não assunção de uma "possível modulação" das
regras postas para atender ao caso noticiado no pronunciamento da subunidade -
"frequente a inabilitação de licitantes que deixam de juntar documento exigido, por uma
falha de verificação. Ante a ausência de previsão expressa no normativo que trata do
pregão eletrônico para que essa complementação seja possível (...)" -, considerando que
este munus não está sob a alçada regimental, nem institucional desta Secretaria de Gestão.
A Mens legis (Decreto 10.024, de 2019) na Administração Pública segue rito da estrita
legalidade, e nesse iter, ante a ausência de qualquer previsão expressa no referido
Decreto, não se pode acomodar tais motivadores em interpretação sistêmica alargada.
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desta Secretaria, haja vista ser um ato presidencial, cujos trâmites não são os mesmos de
uma norma expedida por este órgão central.
Análise:
21. A Secretaria de Gestão do Ministério da Economia, conforme informado acima,
parece concordar que os dispositivos atuais do Decreto federal 10.024/2019, referentes à
impossibilidade de aceitação de novos documentos a título de saneamento da proposta,
podem dificultar, ou até mesmo impossibilitar, em determinadas situações, a obtenção da
proposta mais vantajosa, em face de um formalismo exagerado, privilegiando mais o
aspecto procedimental em detrimento do resultado.
22. É de se enaltecer, nesse ponto, a flexibilidade e simplicidade com que a Seges
reconhece a possibilidade de evolução do decreto e se coloca a postos para avaliar
qualquer sugestão que venha a ampliar sua capacidade de trazer eficiência às
contratações públicas. Não por outro motivo a Secretaria tem sido importante vetor de
mudanças e aprimoramentos nessa seara.
23 Embora no pronunciamento da subunidade tenha sido mencionado o parágrafo
único do art. 40 do Decreto 10.024/2019, não se buscou tratar dos casos em que a
comprovação da habilitação da empresa pode ser verificada diretamente no Sicaf, ou até
mesmo sistemas semelhantes mantidos pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos
Municípios, mas sim destacar uma situação em que a ausência da documentação pode ser
superada por outros meios. A questão que se buscou verificar, de fato, é sobre a
possiblidade de complementação com documentos que não foram juntados pela licitante e
não podem ser verificados nos mencionados sistemas, porém existentes e aptos a serem
apresentados para fins de habilitação em momento posterior à fase competitiva.
24. A despeito da concordância com o entendimento exarado por esta unidade na
instrução de peça 41, a Seges visualiza impedimentos a essa interpretação no próprio
texto do decreto. Ressalva que o decreto permite apenas a inserção posterior de
documentos constantes do Sicaf (ou seus equivalentes nos entes subnacionais) conforme
abaixo:
Art. 26. Após a divulgação do edital no sítio eletrônico, os licitantes
encaminharão, exclusivamente por meio do sistema, concomitantemente com os
documentos de habilitação exigidos no edital, proposta com a descrição do
objeto ofertado e o preço, até a data e o horário estabelecidos para abertura da
sessão pública.
[...]
§ 2º Os licitantes poderão deixar de apresentar os documentos de habilitação
que constem do Sicaf e de sistemas semelhantes mantidos pelos Estados, pelo
Distrito Federal ou pelos Municípios, quando a licitação for realizada por esses
entes federativos, assegurado aos demais licitantes o direito de acesso aos
dados constantes dos sistemas.
25. A par dessa permissão, outros dispositivos do decreto, além do artigo 43, § 3º,
da Lei 8666/1993, são incisivos em somente permitir a inclusão de documentos para
saneamento de erros ou falhas na proposta já apresentada, conforme abaixo:
Art. 8º
[...]
XII - ata da sessão pública, que conterá os seguintes registros, entre outros:
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[...]
h) a decisão sobre o saneamento de erros ou falhas na proposta ou na
documentação;
[...]
Art. 17. Caberá ao pregoeiro, em especial:
[...]
VI - sanear erros ou falhas que não alterem a substância das propostas, dos
documentos de habilitação e sua validade jurídica;
[...]
Art. 47. O pregoeiro poderá, no julgamento da habilitação e das propostas,
sanar erros ou falhas que não alterem a substância das propostas, dos
documentos e sua validade jurídica, mediante decisão fundamentada, registrada
em ata e acessível aos licitantes, e lhes atribuirá validade e eficácia para fins de
habilitação e classificação, observado o disposto na Lei nº 9.784, de 29 de
janeiro de 1999.
26. Além da restrição normativa apontada, relativa ao fato de que uma
interpretação mais elástica em alguns de seus dispositivos poderia trazer insegurança
jurídica e comprometer a própria norma, a Seges argumenta que, em caso da adoção da
interpretação sugerida, o fornecedor não teria incentivo algum para avaliar os requisitos
do edital e realizar cautelosamente a inserção dos documentos necessários à sua
participação, tendo em vista que poderia incluir tais documentos faltantes posteriormente,
tornando a regra posta absolutamente ineficaz. Indo ao extremo, em não se colocando
limites para essa inclusão posterior, provavelmente os licitantes não precisariam incluir
documento algum junto com a proposta, pois teriam ainda oportunidade para essa
inclusão, sem serem alijados do certame.
27. Talvez seja o momento para, ao menos, refletir-se sobre a nova regra imposta,
referente ao envio da documentação de habilitação antes da abertura da sessão. Se a nova
regra visa a facilitar a identificação de empresa que participe para tão somente tumultuar
o certame, sem a real intenção de arrematá-lo, não parece suficiente, uma vez que não faz
distinção entre o licitante mal-intencionado e o que cometeu erros na juntada dos
documentos.
28. Além disso, apesar de induzir maior cautela dos licitantes com a preparação dos
documentos para o certame, cria-lhes obstáculos que podem desmotivar a participação
por inserir obrigação adicional até então não exigida. Em circunstâncias em que os
licitantes participam de diversos certames de forma concomitante, a reorganização
administrativa para cumprir o dispositivo legal pode inviabilizar a participação em
licitações e/ou elevar os erros cometidos, em função da ampliação do volume de
documentos com que agora têm que lidar e da impossibilidade de complementação
posterior.
29. Afigura-se, portanto, menos escusável a um licitante (de forma a verificar
possível má intenção) não encaminhar sua documentação tão logo requisitado o
complemento, do que nas circunstâncias atuais, em que se argumenta erro na juntada por
excesso de informações a serem colacionadas antes do início da sessão, sem a garantia de
alcance da vitória no certame.
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Análise:
35. Diante da resposta da Seges de que já havia identificado a necessidade de se
ajustar o sistema Comprasnet para se exigir a anexação da proposta somente após a fase
de lances, que inclusive tal alteração já constava do planejamento das futuras evoluções
do sistema, e, ainda, que após a referida recomendação essa alteração entrará como ação
prioritária da Secretaria, deixaremos de recomendar a medida proposta.
36. Diante do exposto, propomos a adoção de recomendação à Secretaria de Gestão
do Ministério da Economia para que avalie a conveniência e oportunidade de realizar
estudos com vistas a avaliar os impactos de uma mudança normativa para permitir, no
pregão eletrônico, a complementação da documentação exigida no edital para habilitação
no certame, em prazo que não comprometa a sua celeridade, quando no julgamento da
proposta for constatada a ausência de parte da documentação obrigatória, a fim de
melhor alinhar os dispositivos normativos com os princípios da seleção da proposta mais
vantajosa e do formalismo moderado.
37. Isso posto, submetem-se os autos à consideração superior, propondo reiterar a
proposta constante da instrução anterior (peça 40), à exceção dos pedidos de vista e
ingresso nos autos, uma vez já decididos pelo relator em despacho à peça 43, acrescida
das conclusões supra, nos seguintes termos:
37.1. conhecer da representação, satisfeitos os requisitos de admissibilidade
constantes no art. 113, § 1º, da Lei 8.666/1993, c/c os arts. 235 e 237, VII, do Regimento
Interno deste Tribunal, e no art. 103, § 1º, da Resolução - TCU 259/2014;
37.2. no mérito, com fundamento no art. 276, § 6º, do Regimento Interno deste
Tribunal, considerar a presente representação parcialmente procedente;
37.3. dar ciência à Diretoria de Abastecimento da Marinha, com fundamento no art.
9º, inciso I, da Resolução – TCU 315/2020, sobre as seguintes impropriedades/falhas,
identificadas no Pregão Eletrônico 11/2020, para que sejam adotadas medidas internas
com vistas à prevenção de outras ocorrências semelhantes:
a) abertura de nova oportunidade pelo Pregoeiro, no dia 5/5/2020, às
09:57:25hs, após iniciada a fase de julgamento de propostas, para que todos os licitantes
enviassem a documentação exigida no edital para fins de habilitação, em afronta ao
previsto nos arts. 19, inciso II, 25, e 26 §§ 6º e 9º do Decreto 10.024/2019;
37.4. recomendar à Secretaria de Gestão do Ministério da Economia, com
fundamento no art. 250, inciso III, do Regimento Interno/TCU, c/c o art. 11 da Resolução
– TCU 315/2020, que avalie a conveniência e oportunidade de adotar as medidas abaixo,
informando, no prazo de 120 dias as providências adotadas:
a) realizar estudos com vistas a avaliar os impactos de uma mudança normativa
para permitir, no pregão eletrônico, a complementação da documentação exigida no edital
para habilitação no certame, em prazo que não comprometa a sua celeridade, quando no
julgamento da proposta for constatada a ausência de parte da documentação obrigatória,
a fim de melhor alinhar os dispositivos normativos com os princípios da seleção da
proposta mais vantajosa e do formalismo moderado;
37.5. deixar de recomendar à Secretaria de Gestão do Ministério da Economia, com
fundamento no inciso I do parágrafo único do art. 16 da Resolução – TCU 315/2020,
tendo em vista que está em estudo a exclusão da funcionalidade de anexar proposta
quando do cadastro pela empresa licitante, sem prejuízo do preenchimento, nessa fase, de
informações básicas parametrizados no sistema, deixando a obrigatoriedade do envio da
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VOTO
públicas regidas pelo Decreto 10.024/2019 e realizadas por meio do Portal de Compras
Governamentais, tendo em vista que:
a) o Decreto 10.024/2019, que regulamenta a licitação na modalidade
pregão eletrônico no âmbito da administração pública federal, prevê que “as normas
disciplinadoras da licitação serão interpretadas em favor da ampliação da disputa entre os
interessados, resguardados o interesse da administração, o princípio da isonomia, a
finalidade e a segurança da contratação”;
b) apesar de a Lei 10.520/2002 tratar do pregão presencial, e, não, do
eletrônico, ao descrever a sua fase externa, não veda expressamente a complementação da
documentação de habilitação;
c) o art. 8º, inciso XII, alínea “h”, do Decreto 10.024/2019 estabelece que a
ata do certame deverá conter a decisão sobre o saneamento de erros ou falhas na proposta
ou na documentação;
d) o art. 17, inciso VI, do mesmo decreto dispõe que é dever do pregoeiro
sanear erros ou falhas que não alterem a substância das propostas, dos documentos de
habilitação e sua validade jurídica;
e) há, entretanto, vedação à complementação da documentação exigida com
documento novo, no art. 26, § 9º, do mesmo decreto, ao afirmar que a documentação
complementar que se permite é apenas a necessária à confirmação do que foi exigido no
edital e já foi apresentado.
A fim de proporcionar a construção da presente deliberação com a participação do
jurisdicionado, nos termos do art. 14 da Resolução-TCU 315/2020, alinhei-me à proposta da unidade
técnica e determinei a oitiva da Secretaria de Gestão do Ministério da Economia (Seges/ME).
Em sua manifestação quanto ao primeiro ponto da oitiva, a Seges/ME discordou da
sugestão de se admitir, expressamente e uma única vez, a complementação da documentação exigida
no edital para habilitação no certame, tendo em vista que o art. 26, § 9º, do Decreto 10.024/2019 prevê
que o saneamento dos erros ou falhas recaem sobre documentos exigidos no edital e já apresentados,
não sendo possível relativizar a regra para documentos que não constam do processo.
Aduziu que a semântica do art. 47 do mesmo Decreto admite “sanear erros ou falhas que
não alterem a substância das propostas, dos documentos e sua validade jurídica”, não se referindo a
casos de ausência de documentos. Portanto, a medida sugerida pela Selog não se coaduna com a norma
no que tange aos procedimentos para saneamento de atos praticados, ressaltando que o Decreto trata de
ato praticado, e, não, de ato inexistente, que é o caso documento não apresentado.
Argumentou que, caso seja adotada tal interpretação, o fornecedor não terá incentivo para
avaliar os requisitos do edital e realizar cautelosamente a inserção dos documentos necessários à sua
participação, tendo em vista que poderá incluí-los posteriormente, tornando a regra posta ineficaz.
Quanto ao segundo ponto da oitiva, relacionado à possibilidade de excluir a funcionalidade
de anexar proposta no momento do cadastro pela empresa licitante, afirmou que a alteração consta das
futuras evoluções do Comprasnet 4.0. A necessidade de excluir a funcionalidade de anexar o
documento de proposta (upload) no momento do cadastro já havia sido identificada. Assim,
permanecerão tão somente os elementos mínimos (descrição do objeto ofertado e o preço) que serão
cadastrados na plataforma pelo fornecedor, e o envio do arquivo da proposta será efetuado
posteriormente à fase de lances.
Após a avaliação da resposta à oitiva, a Selog, em uníssono, propôs:
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“ Art. 11. A fase externa do pregão será iniciada com a convocação dos interessados e observará as seguintes regras:
(...)
V - aberta a sessão, os interessados ou seus representantes legais entregarão ao pregoeiro, em envelopes separados, a
proposta de preços e a documentação de habilitação”.
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17, inciso VI, por sua vez, estabelece como dever do pregoeiro sanear erros ou falhas que não alterem
a substância das propostas, dos documentos de habilitação e sua validade jurídica.
No caso concreto, em 30/4/2020, às 11:58:36, o pregoeiro encerrou a fase de lances e
anunciou o início do julgamento das propostas. Às 14:03:22 do mesmo dia, suspendeu a sessão para
análise da documentação, já avisando a reabertura no dia 5/5/2020. Em 5/5/2020, às 9:55:25, reabriu a
sessão e, em seguida, iniciou o chat “para uma nova oportunidade para envio da documentação, no
prazo de 30 minutos”, informando que seriam convocadas todas as empresas (peça 1, p. 4).
Quatro empresas enviaram documentos, uma delas, que foi posteriormente declarada
vencedora, dentro do prazo estabelecido; e as demais com atrasos de até 51 minutos. Às 14:05:14 do
mesmo dia, o pregoeiro suspendeu a sessão para análise da nova documentação de habilitação
anexada, marcando a reabertura para o dia seguinte.
Como visto, o prazo de 30 minutos foi concedido a todas as licitantes para a apresentação
dos documentos exigidos, durante a fase de julgamento das propostas, antes da negociação do último
lance mais vantajoso e da avaliação da documentação de habilitação, conforme o previsto nos arts. 17,
inciso VI, e 47 do Decreto 10.024/2019.
Porém, o pregoeiro limitou-se a afirmar que “outrossim informo que será reaberto o chat
para uma nova oportunidade para envio da documentação no prazo de 30 minutos”, e não
fundamentou seu ato, conforme expressamente determinam o art. 8º, inciso XII, alínea “h” 2, e o art. 47,
parágrafo único, do Decreto 10.024/2019, bem como o item 26.4 do edital de licitação 3 (peça 6, p. 24 e
25).
A ausência da fundamentação, além de contrariar o Decreto 10.024/2019 e a regra
editalícia expressa, impossibilitou aos licitantes analisarem as razões do ato, tendo em vista que o
pregoeiro não declinou quais seriam os erros e falhas passíveis de saneamento, dentro da margem de
correção possibilitada pelos normativos incidentes. Destaco ainda que a fundamentação dos atos
administrativos é requisito essencial para a respectiva validade.
Procedentes, portanto, as alegações do representante no que concerne à irregularidade do
aludido ato.
Resta, ainda, identificar a abrangência do procedimento de saneamento de “erros ou falhas
que não alterem a substância das propostas, dos documentos e sua validade jurídica” previsto no art.
47 do Decreto 10.024/2019.
O art. 26, §9º, do mesmo normativo estabelece que “os documentos complementares à
proposta e à habilitação, quando necessários à confirmação daqueles exigidos no edital e já
apresentados, serão encaminhados pelo licitante melhor classificado após o encerramento do envio de
lances, observado o prazo de que trata o § 2º do art. 38”.
Já o art. 43, §3º, da Lei 8.666/1993, aplicado subsidiariamente ao Pregão, dispõe que “é
facultada à Comissão ou autoridade superior, em qualquer fase da licitação, a promoção de diligência
destinada a esclarecer ou a complementar a instrução do processo, vedada a inclusão posterior de
documento ou informação que deveria constar originariamente da proposta”.
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Art. 8º O processo relativo ao pregão, na forma eletrônica, será instruído com os seguintes documentos, no mínimo:
(...)
XII - ata da sessão pública, que conterá os seguintes registros, entre outros:
(...)
h) a decisão sobre o saneamento de erros ou falhas na proposta ou na documentação;”
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“26.4 No julgamento das propostas e da habilitação, o Pregoeiro poderá sanar erros ou falhas que não alterem a substância
das propostas, dos documentos e sua validade jurídica, mediante despacho fundamentado, registrado em ata e acessível a
todos, atribuindo-lhes validade e eficácia para fins de habilitação e classificação.”
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O art. 2º, §2º, do Decreto 10.024/2019, por sua vez, reproduziu o mesmo texto do art. 4º,
parágrafo único, do Decreto 3.555/2000: “as normas disciplinadoras da licitação serão interpretadas
em favor da ampliação da disputa entre os interessados, resguardados o interesse da administração, o
princípio da isonomia, a finalidade e a segurança da contratação”.
Como visto, a interpretação literal do termo “[documentos] já apresentados” do art. 26,
§9º, do Decreto 10.024/2019 e da vedação à inclusão de documento “que deveria constar
originariamente da proposta”, prevista no art. 43, §3º, da Lei 8.666/1993 pode levar à prática de atos
dissociados do interesse público, em que o procedimento licitatório (meio) prevalece e ganha maior
importância que o resultado almejado, qual seja, a obtenção da proposta mais vantajosa para a
Administração (fim).
Imperioso observar que, visto por este prisma, a interpretação literal desses comandos
legais vai contra o entendimento da jurisprudência deste Tribunal, no sentido de que o edital não
constitui um fim em si mesmo. Cito caso semelhante à situação ora tratada em que, por meio do
Acórdão 1.758/2003-TCU-Plenário, de minha relatoria, o TCU considerou regular a inclusão de
documentos no processo licitatório, no ato da sessão, conforme autorizado pela pregoeira, no exercício
de suas regulares atribuições, tratadas no art. 11, incisos XIII e XIV, do Decreto 3.555/2000.
O edital de licitação constitui instrumento para a consecução das finalidades do certame
licitatório, quais sejam, assegurar a contratação da proposta mais vantajosa para a Administração e a
igualdade de oportunidade de participação dos interessados, nos termos do art. 3º, caput, da Lei
8.666/93. Dessa maneira, a interpretação e a aplicação das regras estabelecidas devem ter por norte o
atingimento dessas finalidades, evitando-se o apego a formalismos exagerados, irrelevantes ou
desarrazoados, que não contribuam para esse desiderato.
As regras de licitações e a jurisprudência vêm evoluindo nesse sentido, sendo possível, por
exemplo, ante à falta de juntada de comprovantes de regularidade fiscal pelo licitante, a consulta, pelo
próprio agente público que conduz o certame, a sítios públicos em que constem tais documentos, nos
termos do art. 40, parágrafo único, do Decreto 10.024/2019.
Em alinhamento com esse entendimento, a vedação à inclusão de documento “que deveria
constar originariamente da proposta”, prevista no art. 43, §3º, da Lei 8.666/1993, deve se restringir ao
que o licitante não dispunha materialmente no momento da licitação. Caso o documento ausente se
refira a condição atendida pelo licitante quando apresentou sua proposta, e não foi entregue juntamente
com os demais comprovantes de habilitação ou da proposta por equívoco ou falha, haverá de ser
solicitado e avaliado pelo pregoeiro.
Isso porque admitir a juntada de documentos que apenas venham a atestar condição pré-
existente à abertura da sessão pública do certame não fere os princípios da isonomia e igualdade entre
as licitantes e o oposto, ou seja, a desclassificação do licitante, sem que lhe seja conferida
oportunidade para sanear os seus documentos de habilitação, resulta em objetivo dissociado do
interesse público, com a prevalência do processo (meio) sobre o resultado almejado (fim).
Cito ainda o disposto no art. 64 da nova Lei de Licitações (Lei 14.133 de 1º de abril de
2021), que revogará a Lei 8.666/1993 após decorridos 2 anos da sua publicação oficial:
Art. 64. Após a entrega dos documentos para habilitação, não será permitida a
substituição ou a apresentação de novos documentos, salvo em sede de diligência, para:
I - complementação de informações acerca dos documentos já apresentados pelos
licitantes e desde que necessária para apurar fatos existentes à época da abertura do
certame;
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1. Processo nº TC 018.651/2020-8.
2. Grupo II – Classe de Assunto: VII – Representação
3. Interessados/Responsáveis: não há.
4. Órgão/Entidade: Diretoria de Abastecimento da Marinha.
5. Relator: Ministro Walton Alencar Rodrigues.
6. Representante do Ministério Público: não atuou.
7. Unidade Técnica: Secretaria de Controle Externo de Aquisições Logísticas (Selog).
8. Representação legal: Graziela Marise Curado de Oliveira, OAB/DF 24.565
9. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de representação formulada pela empresa Basis
Tecnologia da Informação S.A., com solicitação de adoção de medida cautelar para suspensão do
certame, noticiando irregularidade no âmbito do Pregão Eletrônico SRP 11/2020, promovido pela
Diretoria de Abastecimento da Marinha,
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do
Plenário, ante as razões expostas pelo relator, em:
9.1. conhecer da representação, satisfeitos os requisitos de admissibilidade constantes no
art. 113, § 1º, da Lei 8.666/1993, c/c os arts. 235 e 237, VII, do RI/TCU, e no art. 103, § 1º, da
Resolução - TCU 259/2014, para, no mérito, considerá-la procedente;
9.2. considerar prejudicada a medida cautelar pleiteada, ante a revogação do certame em
26/5/2020;
9.3. dar ciência à Diretoria de Abastecimento da Marinha (DAbM) de que a abertura de
nova oportunidade pelo Pregoeiro, no dia 05/05/2020, às 09:57:25hs, após iniciada a fase de
julgamento de propostas, para que todos que os licitantes enviassem a documentação exigida no edital
para fins de habilitação, sem que o ato fosse devidamente fundamentado, com a especificação dos
erros e falhas passíveis de saneamento, dentro da margem de correção possibilitada pelos normativos
incidentes, afrontou o previsto no art. 8º, inciso XII, alínea “h”, e no art. 47 do Decreto 10.024/2019,
bem como os princípios da transparência e da equidade;
9.4. deixar assente que, o pregoeiro, durante as fases de julgamento das propostas e/ou
habilitação, deve sanear eventuais erros ou falhas que não alterem a substância das propostas, dos
documentos e sua validade jurídica, mediante decisão fundamentada, registrada em ata e acessível aos
licitantes, nos termos dos arts. 8º, inciso XII, alínea “h”; 17, inciso VI; e 47 do Decreto 10.024/2019;
sendo que a vedação à inclusão de novo documento, prevista no art. 43, §3º, da Lei 8.666/1993 e no
art. 64 da Nova Lei de Licitações (Lei 14.133/2021), não alcança documento ausente, comprobatório
de condição atendida pelo licitante quando apresentou sua proposta, que não foi juntado com os
demais comprovantes de habilitação e/ou da proposta, por equívoco ou falha, o qual deverá ser
solicitado e avaliado pelo pregoeiro;
9.5. indeferir o pedido de ingresso aos autos formulado por Graziela Marize Curado,
OAB/DF 24.565, em nome da empresa representante Basis Tecnologia da Informação S.A. para que
seja considerada como parte interessada, ante a ausência de demonstração de i) razão legítima para
intervir neste processo; ii) e da possibilidade de lesão a direito subjetivo próprio, à luz do art. 146 do
RI/TCU c/c o art. 2º, § 2º, da Resolução-TCU 36/1995, com redação dada pelo art. 1º da Resolução-
TCU 213/2008;
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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 018.651/2020-8
Fui presente:
(Assinado Eletronicamente)
CRISTINA MACHADO DA COSTA E SILVA
Procuradora-Geral
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