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Recursos Repetitivos e Incidente - Maria Cecilia-23102018

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Recursos Repetitivos

e Incidente de R esolução de
Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à
justiça e da participação no processo
www.lumenjuris.com.br

Editor
João Luiz da Silva Almeida

Conselho Editorial

Abel Fernandes Gomes Gisele Cittadino Luis Carlos Alcoforado


Adriano Pilatti Gustavo Noronha de Ávila Luiz Henrique Sormani Barbugiani
Alexandre Bernardino Costa Gustavo Sénéchal de Goffredo Manoel Messias Peixinho
Ana Alice De Carli Jean Carlos Dias Marcelo Ribeiro Uchôa
Anderson Soares Madeira Jean Carlos Fernandes Márcio Ricardo Staffen
André Abreu Costa Jeferson Antônio Fernandes Bacelar Marco Aurélio Bezerra de Melo
Beatriz Souza Costa Jerson Carneiro Gonçalves Junior Marcus Mauricius Holanda
Bleine Queiroz Caúla João Marcelo de Lima Assafim Maria Celeste Simões Marques
Daniele Maghelly Menezes Moreira João Theotonio Mendes de Almeida Jr. Océlio de Jesús Carneiro de Morais
Diego Araujo Campos José Emílio Medauar Ricardo Lodi Ribeiro
Firly Nascimento Filho José Ricardo Ferreira Cunha Salah Hassan Khaled Jr.
Flávio Ahmed José Rubens Morato Leite Sérgio André Rocha
Frederico Antonio Lima de Oliveira Josiane Rose Petry Veronese Simone Alvarez Lima
Frederico Price Grechi Leonardo El-Amme Souza e Silva da Cunha Valter Moura do Carmo
Geraldo L. M. Prado Lúcio Antônio Chamon Junior Vicente Paulo Barretto
Gina Vidal Marcilio Pompeu Luigi Bonizzato Vinícius Borges Fortes

Conselheiros Beneméritos

Denis Borges Barbosa (in memoriam)


Marcos Juruena Villela Souto (in memoriam)

Filiais
Sede: Rio de Janeiro Minas Gerais (Divulgação)
Rua Octávio de Faria - n° 81, sala 301 – Sergio Ricardo de Souza
CEP: 22795-415 [email protected]
Recreio dos Bandeirantes – RJ Belo Horizonte – MG
Tel. (21) 3933-4004 / (21) 3249-2898 Tel. (31) 9-9296-1764

São Paulo (Distribuidor) Santa Catarina (Divulgação)


Rua Sousa Lima, 75 – Cristiano Alfama Mabilia
CEP: 01153-020 [email protected]
Barra Funda – São Paulo – SP Florianópolis – SC
Telefax (11) 5908-0240 Tel. (48) 9-9981-9353
Maria Cecília de Araujo Asperti

Recursos Repetitivos
e Incidente de R esolução de
Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à
justiça e da participação no processo

Editora Lumen Juris


Rio de Janeiro
2018
Copyright © 2018 by Maria Cecília de Araujo Asperti

Categoria:

Produção Editorial
Livraria e Editora Lumen Juris Ltda.

Diagramação: Alex Sandro Nunes de Souza

A LIVRARIA E EDITORA LUMEN JURIS LTDA.


não se responsabiliza pelas opiniões
emitidas nesta obra por seu Autor.

É proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer


meio ou processo, inclusive quanto às características
gráficas e/ou editoriais. A violação de direitos autorais
constitui crime (Código Penal, art. 184 e §§, e Lei nº 6.895,
de 17/12/1980), sujeitando-se a busca e apreensão e
indenizações diversas (Lei nº 9.610/98).

Todos os direitos desta edição reservados à


Livraria e Editora Lumen Juris Ltda.

Impresso no Brasil
Printed in Brazil

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
________________________________________
Agradecimentos

Escrever uma tese de doutorado é, certamente, uma tarefa trabalhosa, que


demanda uma série de renúncias e de investimento emocional e intelectual.
Mas não deixa de ser um enorme privilégio, ainda mais quando se tem a chance
de fazê-lo em uma universidade pública. Por isso, mais do que exaltar o esforço
empreendido, o agradecimento vai no sentido de reconhecer as oportunidades
que se colocaram ao longo desse incrível percurso que foi a pós-graduação, e
principalmente as trocas e apoios generosos que recebi ao longo desses anos.
Agradeço à Universidade de São Paulo, um lugar em que me sinto em casa
desde a infância. Não sem as críticas necessárias – pois somente assim podere-
mos avançar – espero, sinceramente, que a USP seja uma sempre casa acolhe-
dora e que a oportunidade que tive seja efetivamente democratizada a todos e
todas, independentemente de suas origens, classes, raça ou gênero.
Agradeço também a minha atual casa, a Escola de Direito da Fundação
Getulio Vargas, que me acolheu desde 2007 como pesquisadora, gestora e hoje
como professora. O aprendizado que tive na FGV é incomensurável e contínuo,
com colegas, funcionários/as e com alunos/as, me fazendo ter a certeza de que
o caminho que passei a percorrer a partir do mestrado é o que me faz verdadei-
ramente feliz e realizada.
Sendo impossível agradecer a todos e todas que atravessaram meu caminho
ao longo desse processo, faço esse agradecimento em nome de alguns/algumas
que estiveram particularmente envolvidos nessa trajetória e que ajudaram fazer
desta algo tão especial e que tanto mudou a minha vida.
Primeiro, agradeço ao Professor Carlos Alberto de Salles, por quem eu
tenho o privilégio de ser orientada desde o mestrado. Talvez o Prof. Salles se-
quer saiba o quão é querido e admirado por seus/suas orientandos/as, e que é,
para nós, um verdadeiro exemplo de professor e de profissional. Sou grata não
só pela orientação neste trabalho, mas por todo convívio desde 2011, quando
ingressei no programa de pós-graduação. Com o Prof. Salles, aprendemos que
é possível ser um docente que dialoga com seus/suas alunos/as como colegas,
e que é nesse diálogo que conseguimos efetivamente crescer e nos mantermos
constantemente inspirados.
Com os/as orientandos/as do Prof. Salles – auto e carinhosamente denomi-
nados de “Sallesianos” – formamos um grupo de pesquisa, discussão e, princi-
palmente, de apoio mútuo, fazendo da experiência às vezes solitária da academia
uma vivência coletiva muito mais interessante. Agradeço aos/às amigos/as Alex
Alckimin, Amanda Guimarães, Bruna Braga, Bruno Megna, Bruno Takahashi,
Julio Bueno e o convidado especial Michel Roberto de Souza, por essa troca
maravilhosa, que espero que continuemos fazendo por muitos e muitos anos.
Não poderia também deixar de agradecer a todos os membros e mem-
bras do Departamento Jurídico XI de Agosto, com quem vivo aventuras e
sufocos semanais, na tentativa (às vezes bem sucedida, noutras frustrada)
de atender a invencível demanda por acesso à justiça e por acesso a direitos.
Agradeço a todos/as os/as colegas – funcionários/as, advogados/as e alunos/
as – que topam, por motivos as vezes incompreensíveis a nós mesmos/as,
continuar nessa infindável empreitada.
Um agradecimento mais do que especial é direcionado aos meus alunos e
alunas da FGV, tanto da pós-graduação quanto da graduação, com quem tenho
o privilégio cotidiano de dialogar não só sobre processo civil, mas sobre todos
os acontecimentos ao nosso redor, de forma crítica e sincera. Com eles/as, tenho
questionado muitos sensos e certezas, e por eles/as tenho sido constantemente
instigada a repensar minha visão sobre o Judiciário, a academia e o nosso papel
nessa sociedade tão desigual.
Durante essa trajetória, há algumas mulheres incríveis que servem de exem-
plo para mim em muitos sentidos. Assim, um agradecimento muito especial é
direcionado às amigas Bruna Braga, Catarina Barbieri, Cecilia Barreto, Clio
Radomysler, Cristina Cajuella, Daniela Gabbay, Karina Denari, Luciana Gross
Cunha, Manuela Leitão, Monica Sapucaia, Paula Zambelli, Rachel Ripardo,
Susana Henriques da Costa, Yonara Dantas, e a todas as inúmeras conversas
que tivemos sobre os dilemas da pesquisa e da docência, inclusive sobre o de ser
mulher nesses espaços. Como disse Catarina Barbieri, o momento é de estarmos
juntas e resistir. E eu não poderia estar em melhor companhia.
Agradeço também a generosa troca que tive a oportunidade de realizar no
exame de qualificação com os professores Paulo Eduardo Alves da Silva e Heitor
Vitor Mendonça Sica, cujas observações e questionamentos foram fundamen-
tais na elaboração desse trabalho e no aprofundamento do estudo desse tema.
Também com Daniela Gabbay e Susana Henriques da Costas, tive a chance de
compartilhar infindáveis inquietações e de construir, conjuntamente, algumas
das reflexões que foram fundamentais para o desenvolvimento deste trabalho.
Aproveitando um retorno ao texto após a banca de defesa, agradeço imen-
samente aos membros e membras da banca, Professora Luciana Gross Cunha,
Professora Daniela Gabbay, Professora Susana Henriques da Costa, Professor
Aluisio Gonçalves de Castro Mendes e Professor Heitor Vitor Mendonça Sica,
além, é claro, do Professor Carlos Alberto de Salles, e todos os/as amigos/as e
familiares queridos que acompanharam as quatro horas e meia de um diálogo
aberto e generoso sobre o tema. Foi uma troca maravilhosa ou, como disse o
Professor Heitor, um “banquete intelectual”, em que fiquei muito grata pela
leitura cuidadosa e pelas incríveis reflexões que me foram proporcionadas.
Aos meus/minhas queridos/as amigos/as, que sempre estiveram ao meu lado
nas muitas etapas dessa jornada. Agradeço a Letícia Martins, Marcela Bocchi,
Mariana Anjos, Mariana Bastos, Mariana Ferraz, Natália Felipe, Natali Santos,
Pollyana Soares, Vivian Calderoni, Pedro Carvalho e Silva, Tainá Munhoz e
Ana Luiza Westphalen pela incansável torcida.
Finalmente, reservo à minha família um especial agradecimento, não só
pelo apoio durante a tese, mas durante toda a minha formação. Ao meu pai,
que me instigou o amor pelos estudos, me fazendo prometer um dia ler para
ele todos os livros que ele leu para mim antes de dormir. À minha mãe e
minha melhor amiga, com quem dividi angústias diárias, desde a primeira
aula que tive no mestrado até a primeira que tive que dar como professora
(e tantas que se seguiram...). À minha irmã, meu cunhado e meu afilhado,
sempre ao meu lado, trazendo uma inestimável leveza e alegria para minha
vida. À família Morelli, que me acolheu de coração, e que me faz me sentir
tão parte deles como se tivesse nascido em Jaú. Ao Murilo, meu melhor
companheiro, parceiro e amigo, que pacientemente ouviu e discutiu comigo
essa tese e que compartilhou comigo todos os momentos importantes que
vivenciei desde que estamos juntos.

VII
Sumário

Agradecimentos.............................................................................................. V
Índice de Tabelas........................................................................................... XI
Índice de Gráficos........................................................................................XIII
Lista de Abreviaturas e Siglas......................................................................XV
Apresentação..............................................................................................XVII
Prefácio........................................................................................................ XIX
Introdução........................................................................................................ 1
Parte I
Acesso à Justiça e o
Processo na Atualidade
1. “Acesso à Justiça” e Litigiosidade Repetitiva nas Reformas Processuais..........9
1.1. Discursos, agendas e significados ............................................................ 9
1.2. Discussões acadêmicas e apropriação legislativa do tema “acesso
à justiça” ...................................................................................................... 10
1.3. Litigiosidade e litigiosidade repetitiva.................................................... 18
1.4. Prevalência da eficiência e da segurança jurídica sobre o acesso
à justiça........................................................................................................ 24
1.5. Litigiosidade repetitiva como problema e acesso à justiça como causa......... 31
2. Ainda Faz Sentido Falar em Acesso à Justiça?........................................ 37
2.1. Uma agenda ultrapassada?..................................................................... 37
2.2. Acesso à justiça enquanto perspectiva metodológica............................ 38
2.3. Acesso à justiça como direito social...................................................... 44
2.3.1. Fronteiras dinâmicas da injustiça e distribuição do acesso.............. 44
2.3.2. Desigualdade no acesso e na justiça que se acessa.......................... 46
2.4. Litigantes repetitivos, ocasionais e os ausentes...................................... 51
Síntese conclusiva da Parte I........................................................................ 69

IX
Parte II
Participação e Representatividade no Processo Civil
3. Participação e Representatividade no Processo Civil............................. 75
3.1. Participação no processo e acesso à justiça ........................................... 75
3.1.1. Participação e distributividade no processo civil.............................. 75
3.1.2. Devido processo legal e o direito de participar no processo............. 78
3.1.3. Excepcionalidade da mitigação da participação no processo........... 86
3.2. Participação e representatividade no processo civil .............................. 98
3.2.1. Representação e substituição processual.......................................... 98
3.2.2. Representatividade adequada no processo coletivo........................101
Síntese conclusiva da Parte II......................................................................110
Parte III
Acesso à Justiça e Técnicas de Julgamento de Casos Repetitivos
4. Participação e Representatividade nas Técnicas de Julgamento
de Casos Repetitivos.....................................................................................115
4.1. Técnicas de julgamento de casos repetitivos.........................................115
4.1.1. Diferentes racionalidades processuais relacionadas a
“casos repetitivos”.....................................................................................115
4.1.2. Julgamento por amostragem x Técnica processual objetiva............117
4.1.3. “Casos repetitivos” ou “questões repetitivas”?................................ 129
4.2. Decisão proferida no julgamento de casos repetitivos e seus efeitos.... 136
4.2.1. A tese jurídica é um precedente?................................................... 136
4.2.2. Aproximações com a issue preclusion da common law................. 148
4.2.3. Participação e efeitos da tese jurídica.............................................155
4.3. Dilemas da participação nas técnicas de julgamento de
casos repetitivos.......................................................................................... 158
4.3.1. Disparidade entre litigantes repetitivos e ocasionais...................... 158
4.3.2. Representatividade dos “litigantes-sombra”....................................162
4.4. Participação na instauração do procedimento .....................................172
4.4.1. Escolha do caso paradigma nos recursos repetitivos.......................173
4.4.1.1. Critérios para afetação do recurso representativo da controvérsia...... 173
4.4.1.2. Desistência do recorrente como estratégia do litigante habitual........180
4.4.2. Instauração e admissibilidade do IRDR......................................... 184
4.4.2.1. Caso originário e iniciativa de instauração do IRDR .............. 184
4.4.2.2. Desistência da parte/recorrente e a atuação do Ministério Público... 191
4.5. Sobrestamento de processos ............................................................... 193
4.6. Há uma efetiva possibilidade de “distinguishing”?.............................. 199
4.7. Participação no julgamento do recurso repetitivo e do IRDR.............. 201
4.7.1 Partes do caso paradigma: representatividade adequada?............... 201
4.7.2. Demais interessados (“sobrestados” e “ausentes”).......................... 206
4.7.3. Ministério Público e Defensoria Pública.........................................212
4.7.4. Amicus Curiae................................................................................214
4.7.5. Audiência Pública.......................................................................... 222
4.8. Recorribilidade das decisões proferidas no incidente ou no
recurso repetitivo ....................................................................................... 232
4.9. Revisão da tese jurídica (“overruling”)................................................ 235
5. Litigantes Repetitivos e Ocasionais no STJ........................................... 239
5.1. Estudo empírico-jurisprudencial: objetivo e metodologia.................... 239
5.2. Recursos representativos da controvérsia por tribunais de origem.......241
5.3. Partes (recorrente e recorrido)............................................................. 244
5.4. Questão submetida a julgamento e teses firmadas por área do Direito........248
5.5. Tempo de tramitação entre a afetação e o trânsito em julgado........... 253
5.6. Formação da tese jurídica e favorecimento de litigantes habituais
ou ocasionais.............................................................................................. 253
5.7. Considerações sobre a análise empírico-jurisprudencial...................... 257
6. Participação e Representatividade no Recurso Especial Repetitivo:
Um Estudo de Caso..................................................................................... 259
6.1. Estudo de caso: objetivos e metodologia ............................................. 259
6.2. O caso do sistema de scoring de crédito...............................................261
6.2.1. Descrição do caso...........................................................................261
6.2.2. Partes, seus representantes e principais alegações deduzidas......... 262
6.2.3. Provas e decisões proferidas nos casos paradigma..........................271
6.2.4. Escolha do Recurso representativo da controvérsia
e sobrestamento....................................................................................... 279
6.2.5. Amicus Curiae .............................................................................. 282
6.2.6. Ministério Público e Defensoria Pública....................................... 283
6.2.7. Participação de “sobrestados” e de “ausentes”................................ 283
6.2.8. Audiência Pública......................................................................... 284
6.2.9. Julgamento, fundamentação e tese jurídica................................... 294
6.3. Considerações sobre o estudo de caso................................................. 298
Conclusão..................................................................................................... 303
Bibliografia ...................................................................................................311
Anexo – Relação dos temas julgados pelo STJ analisados
no estudo empírico-jurisprudencial............................................................329
Índice de Tabelas

Tabela 1 – Vantagens usufruídas por litigantes habituais de acordo com


Marc Galanter e a partir das particularidades do contexto brasileiro.............66
Tabela 2 – Temas e recursos especiais repetitivos em que foram realizadas
audiências públicas no STJ até março/2017................................................... 228
Tabela 3 – Quadro comparativo com relação ao envolvimento de litigantes
habituais e ocasionais nos RRCs............................................................................248
Tabela 4 – Eixos de análise e questões do estudo de caso............................ 261
Tabela 5 – Entidades e pessoas participantes da audiência pública, em
que qualidade e manifestando qual posicionamento..................................... 285
Índice de Gráficos

Gráfico 1 – Número de processos sobrestados em razão da aplicação do


artigo 1.037, II, do CPC/2015 que foram contabilizados pelo STJ em
julho de 2017, a partir de dados disponibilizados pelos tribunais entre
julho de 2016 e junho de 2017....................................................................... 196
Gráfico 2 – Percentual de teses jurídicas firmadas a partir de recursos
representativos da controvérsia por tribunal de origem (considerando
o primeiro RRC afetado)............................................................................... 242
Gráfico 3 – Classificação da parte recorrente nos RRCs analisados............246
Gráfico 4 – Classificação da parte recorrida nos RRCs analisados.............. 247
Gráfico 5 – Classificação das questões submetidas a julgamento e teses
jurídicas por área do Direito.......................................................................... 250
Gráfico 6 – Percentual de teses jurídicas julgadas por cada órgão do STJ.... 252
Gráfico 7 – Percentual de teses firmadas em favor de litigantes repetitivos
ou ocasionais...........................................................................................................255
Gráfico 8 – Percentual de teses jurídicas firmadas em favor de litigantes
repetitivos ou ocasionais por área do Direito................................................ 256
Lista de Abreviaturas e Siglas

ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade


AMB – Associação de Magistrados Brasileiros
Anatel – Agência Nacional de Telecomunicações
CF – Constituição Federal
CNJ – Conselho Nacional de Justiça
CDC – Código de Defesa do Consumidor
CTBC – Companhia de Telecomunicações do Brasil Central
E.g. – exempli gratia
ENAJUD – Estratégia Nacional de Não Judicialização
FMI – Fundo Monetário Internacional
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IRDR – Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
I.e. – id est
GLO – Group Litigation Order
LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social
RE – Recurso Extraordinário
REsp – Recurso Especial
RRC – Recurso Representativo da Controvérsia
SEC – Securities and Exchange Comission
STF – Supremo Tribunal Federal
STJ – Superior Tribunal de Justiça
STFC – Serviço Telefônico Fixo Comutado
TJSP – Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
TJRS – Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul
v.g. – verbi gratia
Apresentação

A realidade atual do Judiciário não é mais de disputas entre vizinhos, mas


sim entre grandes entes, como o Estado e instituições financeiras, e pessoas
físicas, em casos que acabam veiculando questões jurídicas similares. Cláusulas
de contratos bancários, tarifas telefônicas, benefícios previdenciários, débitos
fiscais, são frequentemente objeto de demandas e recursos que se avolumam na
justiça, trazendo novos desafios ao estudo do direito processual civil.
É nesse contexto que são introduzidas técnicas como os recursos repetitivos
e o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, que estão dentre as mais
importantes apostas do Código de Processo Civil de 2015 para lidar com a mo-
rosidade do Judiciário. Nesses instrumentos, é formada uma tese jurídica a ser
nos casos individuais pendentes e futuros, sem que as partes desses participem
diretamente da formulação do entendimento. Haveria, então, uma mitigação de
seu direito de participação? Quais as consequencias disso, em se considerando o
desequilíbrio estratégico típico dessas demandas? São essas as questões que essa
obra analisa, por meio de um estudo teórico, dogmático e empírico, que busca
articular referências e dados para melhor compreender as tendências do direito
processual à luz da perspectiva metodológica do acesso à justiça.
Prefácio

A Professora Cecília de Araujo Asperti honra-me com o convite para prefa-


ciar esta obra, na condição de orientador da tese de doutorado que deu origem
a este livro. Com isso, desafia minha criatividade e capacidade de escrever novo
prefácio menos de seis meses depois de ter prefaciado sua primeira obra (Meios
consensuais de resolução de disputas repetitivas, 2018).
Este trabalho, defendido com grande sucesso na Faculdade de Direito da
USP, traz muito da personalidade e da formação de sua autora. A Professora Ce-
cília Asperti, como é de sua personalidade, tem uma posição inovadora em seus
trabalhos acadêmicos. Nesse sentido, a importância de uma postura crítica, a
exigir o embasamento do trabalho na própria realidade dos fatos, o que remete
o pesquisador, necessariamente, aos estudos empíricos. Os trabalhos elaborados
com esse espírito são os que podem, de forma efetiva, fazer a diferença na área
para os quais estão voltados.
Para dar unidade de sentido a uma abordagem problematizante do tema es-
colhido, a autora toma como polo metodológico a noção de acesso à justiça. Este
é visto, sobretudo, como o eixo metodológico do trabalho, como ferramenta
teórica apta a unificar a abordagem do tema, buscando um norte para identifi-
car como o sistema de justiça comporta-se em relação a litigantes e grupos que
lhe são colocados em condições assimétricas. Com isso, reaviva, como plano de
fundo, a importantíssima questão da igualdade no processo civil.
Nesse enfoque, para a autora, “compreende-se como elementos da pers-
pectiva metodológica do acesso à justiça a priorização de métodos empí-
ricos e de análises comparativas para investigação das experiências de di-
ferentes grupos e indivíduos no sistema de justiça e os impactos sociais da
atuação de seus agentes e instituições, com o propósito de problematizar o
papel do direito na sociedade”.
Importante que se diga, entretanto, que, diversamente de muitos traba-
lhos que vêm das ciências sociais sob esse enfoque, esta obra não se satisfaz
com a denúncia genérica das diferenças de acesso e de impacto em determi-
nados grupos sociais. Este trabalho, ao contrário, busca demonstrar como
instituto jurídico e processual estudado atua na prática, gerando efeitos para
a temática estudada.
Nesta obra, a autora retoma a temática dos casos repetitivos, que pautaram,
também, sem trabalho de mestrado. Agora, como se deve fazer em uma tese de
doutorado, vai ao coração do problema. Para tanto, posiciona-se de maneira crí-
tica em relação ao instituto estudado, mostrando como, nas técnicas processu-
ais de julgamento de casos repetitivos, o pequeno litigante, aquele usuário oca-
sional do sistema de justiça, sofre um déficit de representatividade. Afinal, como
demonstra a autora, o litigante habitual, de natureza empresarial ou estatal, se
faz representar de maneira mais efetiva e eficiente, possuindo evidente ganho
de escala no patrocínio de sua defesa, realizada com notória maior facilidade
para arregimentar recursos próprios e associativos para defesa de suas posições.
Claro, a denúncia da desigualdade nessa técnica processual não poderia
ficar apenas no plano analítico da conformação jurídica dos institutos envolvi-
dos. Para confirmação da crítica, era preciso verificar como os institutos estuda-
dos atuavam na prática, de maneira a confirmar se o tal déficit estava presente
no julgamento, em concreto, dos casos repetitivos. Daí os estudos empíricos
realizados pela autora, um para traçar um panorama do encaminhamento desse
tipo de julgamento no STJ e outro para examinar em detalhe o trâmite de um
caso específico, no julgamento da legalidade do scoring de crédito e sua compa-
tibilidade com o Direito do Consumidor.
Em suma, o livro aqui apresentado ao público traz uma avaliação de
fundamental importância sobre as técnicas de julgamento de casos repetitivos, pro-
piciando ao leitor, em texto agradável e bem organizado, um apanhado comple-
to e problematizante do instituto, colocado sob a perspectiva metodológica do
acesso à Justiça, pelo qual a autora enfatiza suas repercussões para a questão da
igualdade em nosso processo civil.
Seguramente, esta obra tem muito a engrandecer os debates sobre o
tratamento jurisdicional dos chamados casos repetitivos.
São Paulo, outubro de 2018

Carlos Alberto de Salles


Professor Associado da Faculdade de Direito da USP
Desembargador do TJSP
Introdução

Um dos dados mais conhecidos e frequentemente veiculados sobre o Judici-


ário brasileiro é o volume de processos em trâmite e de ações novas ajuizadas a
cada ano1. De acordo com a série histórica do relatório Justiça em Número, do
Conselho Nacional de Justiça, o número de processos e recursos (entre casos
novos e pendentes) ultrapassou, em 2013, a marca dos 100 milhões, chegando
em 2016 a um total próximo a 110 milhões2. Uma das consequências desse vo-
lume de processos seria, ao menos em tese, o congestionamento das instituições
judiciárias, e, por sua vez, a morosidade e inefetividade da tutela jurisdicional.
Ao lado de reformas institucionais3 e de medidas essencialmente geren-
ciais4, esse crescimento da litigiosidade e o (crônico) congestionamento das
instituições judiciárias – ainda que sem um diagnóstico claro de suas causas
– foram fatores que motivaram a criação de instrumentos processuais voltados
à otimização do julgamento de questões consideradas similares, por meio da
uniformização de entendimentos jurisprudenciais. É nesse contexto, e infor-
madas por esse intuito, que foram concebidas as técnicas processuais de jul-

1 CANÁRIO, Pedro. “Quase 110 milhões de processos passaram pelo Judiciário em 2016, segundo
CNJ”. Conjur. 4 set. 2017. Acesso em https://www.conjur.com.br/2017-set-04/110-milhoes-processos-
passaram-judiciario-2016, acesso em 20 dez. 2017; “Explosão de litigiosidade exige mudanças no
Judiciário, afirma Ricardo Lewandowski”. Notícias STF. 20 nov. 2014. Disponível em <http://www.
stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=280214>, acesso em 20 dez. 2017;
2 Em 2013, o volume de processos e recursos (“casos”) que tramitaram no Judiciário brasileiro (casos
pendentes somados casos novos) foi de 100,1 milhões. Esse número vem aumentando anualmente,
tendo atingido, em 2016, o total de 109,1 milhões, sendo destes 30,8 milhões de casos novos.
Conforme CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em Números 2017 (ano-base de 2016).
Disponível em <http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/pj-justica-em-numeros>, acesso em 8 set.
2017, p. 66-68.
3 Como a criação do Conselho Nacional de Justiça, pela Emenda Constitucional nº 45/2004. Vide
Capítulo 1, item 1.4.
4 Como as metas de produtividade do Conselho Nacional de Justiça, que vêm sendo traçadas desde
2009. Conforme site do CNJ, “as metas nacionais do Poder Judiciário representam o compromisso
dos tribunais brasileiros com o aperfeiçoamento da prestação jurisdicional, buscando proporcionar
à sociedade serviço mais célere, com maior eficiência e qualidade” (disponível em <http://www.cnj.
jus.br/gestao-e-planejamento/metas/sobre-as-metas>, acesso em 4 jan. 2017).

1
Maria Cecília de Araujo Asperti

gamento de casos repetitivos5, notadamente aquelas referidas pelo artigo 928


do Código de Processo Civil de 2015, quais sejam, o Incidente de Resolução
de Demandas Repetitivas (IRDR) e os recursos especial e extraordinário re-
petitivos. Tais técnicas seriam voltadas a conferir um entendimento uniforme
às questões de direito recorrentemente suscitadas em demandas e recursos
decorrentes do crescimento da litigiosidade repetitiva, tida como uma “pro-
blemática” central às reformas processuais que instituíram as técnicas de jul-
gamento de casos repetitivos6.
Entender os contornos e características dessa litigiosidade repetitiva é ful-
cral, portanto, ao estudo de instrumentos processuais que se prestem a lidar
com essa realidade. Tem-se, nesse sentido, que a litigiosidade repetitiva pode
ser associada a proliferação de demandas envolvendo entes públicos7 e pessoas
jurídicas de direito privado que, justamente em razão de seu porte e de terem
sua atuação regulada pelas mesmas leis e atos normativos, e por se utilizarem
de instrumentos contratuais padronizados, tendem a judicializar ou de serem
acionados judicialmente em decorrência questões de fato e de direito também
análogas, em volume compatível com a magnitude de suas atividades.
Por serem motivadas pela busca por eficiência, segurança jurídica e celeri-
dade da prestação jurisdicional, tais técnicas de julgamento de casos repetitivos
não costumam a ser analisadas da perspectiva daqueles para quem um processo
judicial considerado repetitivo pode ser o primeiro e único contato de um indi-
víduo com o Judiciário ou com o sistema de justiça. Há, para esse indivíduo, a
realização de seu direito de acessar à justiça? O que isso significaria, e o que a
realização desse direito implicaria?
O estudo aqui proposto parte, justamente, de uma inquietação sobre como o
Judiciário e o processo civil lidam com essa litigiosidade repetitiva e como se dá
o acesso à justiça daqueles que podem ser atingidos pelo julgamento de questões
jurídicas consideradas repetitivas. É nesses termos que se definiu, como prin-
cipal problema de pesquisa a relação entre essas técnicas processuais e a noção de
acesso à justiça.

5 Usa-se a expressão “casos” de modo coerente com a definição do artigo 928 do Código de Processo
Civil, ou seja, para se referir conjuntamente a processos e recursos.
6 Vide Capítulo 1, item 1.4.
7 Aqui entendidos como as pessoas jurídicas de direito público interno, conforme artigo 41 do Código
Civil, ou seja, entes da administração pública direta e indireta.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Como se verá mais detidamente nos primeiros capítulos da tese, a noção


de acesso à justiça é aqui entendida tanto um direito social, quanto como uma
perspectiva metodológica, pela qual propõe a priorização de métodos empíricos
e de análises comparativas que investiguem as experiências de diferentes grupos
e indivíduos no sistema de justiça os impactos sociais da atuação de seus agentes
e instituições, com o propósito de problematizar o papel do direito na sociedade
e a sua capacidade de superar (e não reproduzir) desigualdades. Como direito
social, o acesso à justiça tem de ser compreendido não só como o direito de
acessar, mas de efetivamente participar no sistema de justiça, para que seja pos-
sível, idealmente, utilizar esse sistema para promover as transformações sociais
necessárias para superação das desigualdades sociais, de raça, gênero, orienta-
ção sexual, etc., persistentes em nossa sociedade
Partindo-se da perspectiva metodológica do acesso à justiça, não seria sufi-
ciente analisar a técnica processual em si, sem investigar como os diferentes atores
a utilizam ou são atingidos pela sua aplicação. Isso é especialmente pertinente no
âmbito da litigiosidade repetitiva, em que se tem, de um lado, um litigante que
se envolve com frequencia em casos similares (o Estado, instituições financeiras,
concessionárias prestadoras de serviços público, empresas varejistas, etc.) e, de
outro, litigantes para quem a demanda é única, e que recorrem ao Judiciário ape-
nas circunstancialmente (segurados, consumidores, contribuintes).
Marc Galanter, em seu famoso texto o potencial distribuitivo do processo civil
e das instituições de justiça8, propôs a conhecida tipologia de litigantes repetitivos
(ou habituais), e litigantes ocasionais (ou eventuais), para conjecturar que aqueles
possuíriam significativas vantagens estratégicas em comparação a estes, tendo em
vista, justamente, a recorrência com que atuam no Judiciário com questões simi-
lares e os incentivos para possuem para angariar expertise, especialização e para
“jogar” pela mudança das regras e das instituições a longo prazo.
Trazendo essa reflexão para o âmbito do processo civil, faz-se pertinente
analisar como as diferentes técnicas processuais e as formas de participação por
elas propiciadas reproduzem, criam ou reduzem/desestabilizam desigualdades.
Para isso, é necessário compreender como os diferentes atores utilizam essas

8 GALANTER, Marc. “Why the haves come out ahead? Speculations on the limits of legal change”.
Law and Society Review, v. 9, n. 1, p. 95-160, 1974. Republicação (com correções) em Law and Society.
Dartmouth, Aldershot: Cotterrell, 1994, p. 165-230.

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Maria Cecília de Araujo Asperti

técnicas e como as diversas formas de participação no processo podem fortale-


cer ou enfraquecer as capacidades dos litigantes.
Sobre essa relação entre o acesso à justiça e as técnicas de julgamento de
casos repetitivos, foi formulada a pergunta sobre como os litigantes repetitivos e
litigantes ocasionais utilizam e como são afetados pela utilização dessas técnicas. Em
sendo a sistemática proposta por tais técnicas processuais justamente a de se
viabilizar a formação de uma tese jurídica a ser aplicada não somente no caso
originário (ou caso paradigma), mas em todos os casos pendentes e futuros em
que a mesma questão jurídica for suscitada, suscita-se também o questionamen-
to sobre como se dá a participação e a representação dos interesses daqueles que
serão atingidos pela tese jurídica no julgamento de casos repetitivos, mas que não são
parte do caso (ou casos) a partir do qual a tese será firmada. Esses sujeitos inte-
ressados são denominados “sobrestados” ou “ausentes”, a depender se são parte
em um processo já pendente ou se poderiam ser parte em processos futuros, aos
quais a tese será também aplicada.
Partiu-se, então, das seguintes hipóteses a serem pesquisadas: (i) as técnicas
de julgamento de casos repetitivos tendem a favorecer uma utilização mais es-
tratégica por parte dos litigantes repetitivos; e (ii) os interesses dos “ausentes” e
dos “sobrestados” são representados de forma deficiente (déficit de representati-
vidade) no julgamento de casos repetitivos, mesmo quando há a intervenção de
amicus curiae e/ou a realização de audiências públicas.
Para investigar essas perguntas e hipóteses, foi realizada tanto uma pesquisa
teórica, quanto empírica sobre o tema, esta última desenvolvida em duas etapas.
A primeira etapa consistiu em um levantamento quantitativo jurispru-
dencial sobre questões submetidas a julgamento e teses jurídicas firmadas
em sede de recurso especial repetitivo. Foi montado um banco de dados
contendo todos os temas julgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ)
desde a entrada em vigor da Lei nº 11.672/2008 e que tiveram seu trânsito
em julgado até 31.03.2017, para se extraírem informações sobre (i) as partes
envolvidas no recurso representativo da controvérsia; (ii) a questão submeti-
da a julgamento; (iii) o tribunal de origem; (iv) data de afetação, julgamento
e trânsito em julgado; (v) informações sobre eventual audiência pública; e
(vi) tese jurídica firmada. A partir desses dados, foi possível investigar as
características dos casos submetidos, principalmente, se as teses firmadas
favoreciam os interesses de litigantes repetitivos ou ocasionais, o que se
mostrou essencial para endereçar a pergunta e hipótese de pesquisa atinente

4
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

ao uso das técnicas de julgamento de casos repetitivos por litigantes com


diferentes capacidades estratégicas.
Em seguida, foi desenvolvido um estudo de caso relativo ao julgamento,
também pelo STJ, do tema nº 710 sobre “a natureza dos sistemas de scoring e
a possibilidade de violação a princípios e regras do Código de Defesa do Con-
sumidor capaz de gerar indenização por dano moral”, debatido em audiência
pública realizada em 25.08.2014. Por meio da análise em profundidade de um
caso específico, foi possível averiguar como se dá a participação dos litigantes
repetitivos e ocasionais, dos “sobrestados” e dos “ausentes”, desde a afetação
do recursos representativo da controvérsia até o julgamento da tese jurídica,
bem como do Ministério Público, Defensoria Pública, dos amici curiae e de-
mais participantes da audiência pública.
Para facilitar a discussão sobre todos esses pontos, o trabalho foi dividido em
três partes.
A primeira teve como foco analisar os diferentes significados atribuídos ao
acesso à justiça para se tentar chegar a algumas definições que pudessem ampa-
rar o desenvolvimento do estudo.
No Capítulo 1, investigou-se, inicialmente como a ideia de acesso à justiça
esteve presente nos discursos acadêmicos e legislativos, identificando-se uma
sensível mudança nos significados e na importância que lhe é atribuída. Tam-
bém nesse capítulo é que foram identificados alguns dos fatores causadores ou
propulsionadores da litigiosidade repetitiva, bem como o contexto e principais
influências das reformas que culminaram na introdução dos mecanismos de
julgamento de casos repetitivos no processo civil.
Ainda na Parte I, é no Capítulo 2 que se consolida a definição de acesso à
justiça como perspectiva metodológica e direito social, ratificando-se a impor-
tância dessa abordagem para o estudo do processo civil e para embasar as esco-
lhas políticas atinentes à distribuição dos recursos necessários para se assegurar
a realização do direito de acesso à justiça. Cuidou-se, também, da definição de
litigantes ocasionais e repetitivos, a partir do referencial de Marc Galanter, e
de como as reflexões do autor podem ser utilizadas para compreensão do atual
cenário do Judiciário brasileira, em especial no tocante à litigiosidade repetitiva.
Na Parte II, foi discutida, essencialmente, a relação entre o acesso à justiça
e o direito à participação no processo. O Capítulo 3 é dedicado, portanto, ao
estudo do direito à participação como elemento de legitimação do processo ju-
dicial e de seus resultados, bem como dos possíveis conflitos entre esse direito e

5
Maria Cecília de Araujo Asperti

outros valores também relevantes. Tratou-se, ainda, da substituição processual


e do controle de representatividade adequada no âmbito da ação coletiva, para
se discorrer sobre a excepcionalidade e os parâmetros que se colocam quando
há uma mitigação do direito de participação no processo.
Já na Parte III, o Capítulo 4 discorre sobre as técnicas de julgamento de casos
repetitivos, sempre com ênfase em aspectos atinentes à participação dos litigan-
tes repetitivos, ocasionais e dos demais interessados. Sem a pretensão de exaurir
todas as discussões atinentes a aplicação dessas técnicas, buscou-se tratar da sua
natureza e objeto, dos efeitos da tese jurídica, da participação na instauração do
procedimento e no julgamento da tese jurídica, bem como na recorribilidade das
decisões proferidas e na revisão da tese jurídica a ser firmada. É importante pon-
tuar que, embora este capítulo seja anterior à descrição dos resultados do estudo
empírico, os dados já haviam sido levantados e analisados antes de sua redação
final, o que permitiu articular as discussões teóricas com as reflexões decorrentes
da pesquisa jurisprudencial e do estudo de caso realizados.
O Capítulo 5 descreve a metodologia e os resultados do levantamento juris-
prudencial relativo às teses jurídicas firmadas no julgamento de recursos espe-
ciais, enquanto o Capítulo 6 trata do estudo de caso acerca do julgamento da
tese jurídica referente ao sistema de scoring de crédito, como mencionado.
Na conclusão, são retomados os principais pontos discutidos nas três partes
do trabalho para consolidar as respostas às perguntas propostas e às hipóteses
colocadas a partir das reflexões teóricas e constatações empíricas descritas ao
longo do trabalho.

6
Parte I

Acesso à Justiça e o
Processo na Atualidade

7
1. “Acesso à Justiça”
e Litigiosidade Repetitiva nas
Reformas Processuais

1.1. Discursos, agendas e significados


A expressão “acesso à justiça” é lugar comum nas discussões acadêmicas
em matéria de direito processual, adquirindo significados diversos, muitas ve-
zes em argumentações acríticas e até mesmo contraditórias9. Por ser um valor
com conotações essencialmente positivas, é de fácil apropriação em discursos
utilizados para motivar mudanças legislativas com propósitos variados, não só
diretamente relacionados ao ingresso ou a participação da parte no processo,
mas também da qualidade e a presteza da prestação jurisdicional.
Cabe, nessa primeira parte do trabalho, propor uma discussão sobre os sig-
nificados de “acesso à justiça”, especificamente para o processo civil, para se
lançar as bases para uma análise sobre a técnica processual de julgamento de
casos repetitivos que seja, a partir daí, orientada.
Como será visto, essa discussão está muito relacionada com o que se espera
do Judiciário enquanto ator político com um papel a desempenhar no processo
de redemocratização e reorganização da sociedade brasileira; como instância
responsiva às necessidades impostas pela globalização, abertura de mercados e
desenvolvimento econômico e, em um contexto mais recente, como prestador
de serviços, que deve atuar com transparência e eficiência, dinamizando a sua
atuação em casos repetitivos para exercer uma função verdadeiramente políti-
ca apenas nos casos de grande repercussão. Diferentes expectativas sobre esse

9 Uma consulta ao aplicativo GoogleCitations demonstra que foram localizadas 2.697 citações à
tradução brasileira do relatório Access to Justice: a world survey, de Mauro Cappelletti e Bryant Garth
do Projeto Florença (Tradução em português: CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à
justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988),
desde 1995, sendo essa a obra mais citada do pesquisador Bryant Garth. As citações são atuais:
somente no ano de 2016 foram 332 citações de trabalhos acadêmicos disponíveis online. A obra
original, em inglês, conta com apenas 221 no mesmo período (acesso em <https://scholar.google.
com/citations>, acesso em 23 ago. 2017.

9
Maria Cecília de Araujo Asperti

papel também influenciaram a concepção e aplicação de instrumentos proces-


suais, por sua vez influenciada por discursos políticos e agendas acadêmicas em
constante movimento.
Esse primeiro capítulo tenta construir um panorama de como a noção ou a
idéia de acesso à justiça foi utilizada nos discursos legislativos e na agenda de
pesquisas que influenciaram as recentes reformas processuais, principalmente
de institutos que tenham alguma relação com o julgamento de casos repetitivos.
É especialmente interessante, para essa pesquisa, compreender o histórico que
levou à consolidação do sistema de tutela coletiva no Brasil e, posteriormente,
de institutos voltados à uniformização de decisões e ao julgamento por amostra-
gem, conforme se discutirá a seguir.
Antes de adentrar nos tópicos dedicados a essa reflexão, convém esclarecer
a análise aqui proposta, muito embora centrada no Judiciário, lida com a no-
ção mais ampla de “sistema de justiça”, que será retomada também no capítulo
seguinte, quando há a proposta de uma ressigificação da noção de acesso à
justiça na atualidade brasileira. Como afirma Maria Tereza Sadek, o magistrado
é apenas um dos diferentes agentes que compõem esse sistema mais amplo que
envolve também o advogado, o delegado de polícia, funcionários do Judiciário,
membros do Ministério Público10 e da advocacia pública, inclusive da Defen-
soria Pública. O papel desses agentes e instituições também será discutidos em
diversos momentos deste trabalho.

1.2. Discussões acadêmicas e apropriação legislativa do


tema “acesso à justiça”
Temas relacionados ao acesso à justiça começaram a ser discutidos com
maior ênfase no Brasil em meados dos anos 1970 e, no âmbito do direito pro-
cessual, principalmente a partir dos anos 1980, com a publicação da versão
brasileira do relatório do “Access to Justice: a world survey”, de Bryant Garth e
Mauro Cappelletti, sobre as reflexões extraídas das pesquisas realizadas a partir
do chamado “Projeto Florença”11 ou access-to-justice movement. Não se pode di-

10 SADEK, Maria Tereza. “O Sistema de Justiça”. O Sistema de Justiça. SADEK, Maria Tereza (Org.).
Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2010, p. 1-23, p. 9.
11 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant, Access to Justice: a world survey, 1978.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

zer, contudo, que a discussão sobre acesso à justiça no Brasil teve sua gênese no
movimento internacional de acesso à justiça registrado pela obra em questão.
Como aponta Eliana Junqueira, enquanto o estudo de Garth e Cappelletti
ocupou-se do mapeamento do acesso em um contexto de expansão do Estado
de Bem Estar social e da necessidade de se assegurar direitos sociais, no Brasil
a discussão centrava-se no acesso da população aos direitos mais básicos, in-
clusive civis, em uma sociedade marcada pela marginalização político-social
imposta pelo regime militar, pela profunda desigualdade social e pelo fortaleci-
mento de movimentos sociais que buscavam colocar suas pautas no processo de
redemocratização e reorganização social, então em curso12.
A discussão acadêmica sobre o acesso a aparatos legais estatais e não estatais
de solução de conflitos ganha importância nesse momento histórico no Bra-
sil em estudos conduzidos por pesquisadores sociologicamente orientados que
sofrem significativa influência da noção de pluralismo jurídico, desenvolvida
na tese de doutoramento de Boaventura de Sousa Santos sobre os modelos e
instâncias decisórias13 de uma comunidade na periferia do Rio de Janeiro refe-
rida, ficcionalmente, como “Pasárgada” (posteriormente revelada como sendo
a favela de Jacarezinho), que vivia à margem do sistema oficial: o “direito de
Pasárgada”, em contraposição com o “direito do asfalto”14. Discutia-se, então,

12 JUNQUEIRA, Eliane. Acesso à justiça: um olhar retrospectivo. Revista Estudos Históricos, Rio de
Janeiro, n. 18, 1996, p. 390.
13 Para o estudioso do direito processual, as comparações entre o direito estatal e do “direito de
Passárgada” e reflexões sobre pluralismo jurídico são especialmente interessantes no que diz respeito
à “constituição do universo processual”, ou seja, sobre a processualidade dos modelos decisórios
de aplicação desse direito aos casos concretos. Enquanto no direito estatal há uma necessária
distância entre o objeto real e o objeto processado no litígio que se dá mediante a constituição de
uma estrutura organizativa processual rígida e necessariamente anterior ao conflito, haveria maior
precariedade e flexibilidade na fixação dessa estrutura e do próprio objeto do litígio, que é, por
si, objeto de negociação. A informalidade das interações, da linguagem e da divisão do trabalho
jurídico no “direito de Passárgada” também são elementos que levam ao questionamento de seus
correspondentes no direito oficial, o que é relevante para pensarmos em uma agenda de acesso à
justiça em que não somente o acesso seja democratizado, mas também a própria justiça, com maior e
mais efetiva participação de seus usuários.
14 Publicada originalmente na íntegra em inglês com o título Law against law: legal reasoning in Pasárgada
law” pelo Centro Intercultural de Documentación de Cuernavaca, México, em 1974. Em 1977,
Boaventura de Sousa Santos publicou um artigo com os principais resultados da pesquisa, também
em inglês (“The Law of the Oppressed: The Construction and Reproduction of Legality in Pasargada
Law”. Law and Society Review, n. 12, 5-126). A publicação em português de uma versão resumida
ocorreu somente em 1980 ( "O discurso e o Poder", Revista Forense, 272, 272, 1-40). Recentemente, o

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Maria Cecília de Araujo Asperti

como a exclusão, ou o não acesso de uma população oprimida ao aparato esta-


tal, culmina na convivência (e tolerância mútua) deste com um sistema jurídico
paralelo, informal e não oficial, que acaba se ocupando “dos conflitos entre as
classes oprimidas”, liberando as instâncias oficiais de resolução de conflitos e de
assistência jurídica de tal “fardo”15.
A marginalização da população face ao sistema jurídico estatal também foi
objeto de estudos sobre as interações entre os movimentos sociais de invasões
urbanas e a justiça estatal16. Esses trabalhos discorreram sobre como a eclosão
de conflitos sociais, principalmente por terras e moradias, revelariam um Poder
Judiciário conservador, elitista e ineficiente e, no todo, incapaz de atender e
equacionar as demandas sociais emergentes.
É nesse sentido que Joaquim de Arruda Falcão Neto criticava, à época,
aquilo que demonimou de “cultura jurídica dominante”, de cunho essencial-
mente liberal, que teria informado as características das normas em vigor, in-
clusive processuais, e que seriam decisivas para a seleção de conflitos a serem
apreciados pelo Judiciário e as possibilidades dessa apreciação17. Essa cultura
jurídica notadamente individualista seria responsável, por exemplo, por um
sistema de legitimação processual que reflete a “concepção de contrato, atra-
vés do qual o liberalismo vê as relações sociais” em que partes iguais e indi-
vidualizadas, relacionadas por um vínculo de coordenação (não hierárquico,
portanto), e autônomas podem levar suas disputas ao Judiciário18. No entanto,
as disputas individuais estariam deixando de ser a realidade predominante
no Brasil de então, onde se via emergir um novo padrão de conflituosida-
de, envolvendo um segmento da coletividade e um grande ente público, em

autor publicou a versão integral em português com o título O Direito dos Oprimidos: sociologia crítica
do direito, parte 1 (São Paulo: Cortez, 2014).
15 SANTOS, Boaventura de Sousa. O Direito dos Oprimidos: sociologia crítica do direito, parte 1, 2014, p.
342-344.
16 JUNQUEIRA, Eliane, 1996, op. citada, p. 393-394. A autora cita os estudos de Joaquim Falcão
sobre os conflitos urbanos em Recife (Conflito de direito de propriedade: invasões urbanas. Rio de
Janeiro: Forense, 1984) e de outros pesquisadores influenciados por essa conjugação entre a noção
de pluralismo jurídico e a busca por respostas estatais efetivas para demandas sociais emergentes na
sociedade brasileira.
17 FALCÃO NETO, Joaquim de Arruda. “Cultura Jurídica e Democracia: a favor da democratização do
Judiciário” In LAMOUNIER et al (org). Direito, Cidadania e Participação. São Paulo: T. A. Queiroz,
1980, p. 4-19.
18 FALCÃO NETO, Joaquim de Arruda, 1980, op. cit., p. 9.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

demandas travadas entre partes desiguais, não individualizadas, com graus


diferenciados de autonomia de vontades e relacionadas por vínculos de subor-
dinação econômica, política ou ambas19.
O padrão de conflituosidade social então emergente seria caracterizado
pela pulverização cada vez maior de seus danos para um número cada vez
maior de cidadãos20. Problematizava-se que a parcela do dano individual
pode trazer, para o autor da demanda judicial, benefícios menores do que
o custo de sua judicialização, especialmente em se considerando o porte da
parte contrária (ex.: indústria ou ente estatal). A cultura jurídica de cunho
liberal, ao condicionar o acesso ao Judiciário à individualização dos con-
flitos, acabaria privilegiando os interesses dos entes de grande porte, para
quem os custos do processo seriam diluídos, tornando os seus pequenos
ilícitos “estatísticamente suportáveis e estimulantes” 21.
Como se vê, algumas temáticas relevantes do access-to-justice movement,
como a tutela de direitos coletivos e a informalização das agências de solução de
conflitos, também fizeram parte da agenda de pesquisas brasileiras das décadas
de 1970 e 1980, muito embora os estudos então desenvolvidos dialogavam mais
com o contexto de transição democrática e com demandas dos movimentos

19 Em sentido similar, a literatura, principalmente a norte-americana, sobre reforma estrutural


(structural reform), critica o modelo tradicional e individualista de “solução de controvérsias”, que
pressuporia uma disputa entre indivíduos inseridos em uma sociedade essencialmente harmoniosa
em que um terceiro situado entre essas duas partes seria capaz de observar e decidir quem está certo.
Autores como Owen Fiss e Abram Chayes denunciavam, já nos anos 1970, a insuficiência desse
modelo para lidar com os conflitos sociais colocados perante as cortes, e descreviam um modo de
adjudicação denominado por Chayes por public law litigation, muito similar ao que, posteriormente,
se convencionou denominar por reforma estrutural, em que a estrutura subjetiva da demanda não
é bilateral, mas envolve grupos, por vezes, indefinidos e “amorfos”, a compensação não depende
de um ressarcimento, mas sim, de uma tutela executiva cuja efetivação depende da participação
das partes e a função do magistrado não se encerra no julgamento, mas compreende também o
acompanhamento da implementação da ordem judicial (CHAYES, Abram “The role of the judge
in public law litigation”. Harvard Law Review. n. 89, maio-1976, p. 1281-1316). Fiss argumenta que
essa nova forma de adjudicação seria necessária para responder às mudanças da estrutura social, e
seria marcada pela presença de organizações e entes de grande porte, para que seja possível, assim,
realizar a função da adjudicação de conferir significado aos valores públicos, e não a mera solução
de conflitos (FISS, Owen. “As Formas de Justiça” In Direito como Razão Pública: processo, jurisdição
e sociedade. Coord. trad. Carlos Alberto de Salles. Trad. Daniel Porto Godinho; Melina de Medeiros
Rós. Maria Cecilia de Araujo Asperti. 2ª Ed. revista e atualizada. São Paulo: Juruá, 2017, p. 21-80.
Publicado originalmente em 1979 na Harvard Law Review, v. 83).
20 FALCÃO NETO, Joaquim de Arruda, 1980, op. cit., p. 10-11.
21 FALCÃO NETO, Joaquim de Arruda, 1980, op. cit., p. 11.

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Maria Cecília de Araujo Asperti

sociais, então em ascensão, do que com as reivindicações decorrentes da crise


do modelo de Estado de Bem Estar Social europeu.
A tradução do relatório do estudo de Bryant Garth e Mauro Cappelletti é
decisiva para efetiva inserção da pauta de acesso à justiça no meio jurídico e nos
discursos legislativos, influenciando reformas políticas que se seguiram em meio
aos debates da Constituinte para promulgação da nova carta constitucional.
Há, notadamente, uma influência das noções de barreiras de acesso e ondas
renovatórias nos estudos de direito processual civil, possivelmente em razão do
fato de o Projeto Florença ter surgido como linha de pesquisa do núcleo de
Processo Civil da Universidade de Florença, coordenado por Cappelletti, cuja
influência nos estudos de processo no Brasil já era significativa22.
Em meio a esse debate acadêmico, a questão do acesso à justiça permeou im-
portantes transformações processuais e institucionais, marcadamente aquelas
introduzidas pela Lei dos Juizados de Pequenas Causas (Lei nº 7.244/1984) e na
Lei de Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/1985).
Luciana Gross Cunha assinala, no entanto, que esses institutos reflitiram
experiências e demandas sociais diversas no tocante ao tema do acesso à jus-
tiça23. A seu ver, enquanto a tutela de direitos coletivos seria uma resposta
aos anseios dos movimentos sociais atuantes ainda na década de 1970, sob a
ditadura militar, pela tutela de direitos difusos, os juizados especiais teriam
surgido mais como uma política pública do Poder Executivo para promoção de
maior eficiência na prestação jurisdicional, preocupada em “atender conflitos
de baixo custo, que não encontravam resposta no Judiciário”24 e aproximar a
justiça da população, conferindo ao Judiciário maior legitimidade como locus
de solução de conflitos sociais25.

22 Julia Pinto Ferreira Porto descreve a influência do Projeto Florença nos estudos de processo civil e
pondera, em sentido similar ao quanto afirmado na introdução deste capítulo, que o tema “acesso
à justiça” passou a ser amplamente veiculado em trabalhos de direito processual associados a quase
todos os institutos processuais, sem que as obras discutissem o tema propriamente dito, tampouco
explicassem a que concepção de acesso o autor se refere (Acesso à justiça: Projeto Florença e Banco
Mundial. Mestrado em Direito Político e Econômico: Universidade Presbiteriana Mackenzie. São
Paulo, 2009, p. 52).
23 CUNHA, Luciana Gross. Juizado Especial: criação, instalação, funcionamento e a democratização do
acesso à justiça. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 129-134.
24 CUNHA, Luciana Gross, 2008, op. cit., p. 130.
25 CUNHA, Luciana Gross, 2008, op. cit., p. 20.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

É o que se extrai, por exemplo, da noção de “litigiosidade latente”26 ou “liti-


giosidade contida”27 utilizada por Kazuo Watanabe para embasar a criação dos
juizados de pequenas causas:

“[Os juizados de pequenas causas têm por objetivo] reverter a


mentalidade segundo a qual a Justiça é lenta, cara e complicada (...)
resgatando ao Judiciário a credibilidade popular de que é ele merecedor
e fazendo renascer no povo, principalmente nas camadas média e pobre,
vale dizer, do cidadão comum, a confiança na Justiça e o sentimento de
que o direito, qualquer que seja ele, de pequena ou grande expressão,
sempre deve ser defendido”28

Sobre a tutela coletiva, uma análise da exposição de motivos dos projetos de


lei que culminaram na promulgação da Lei nº 7.347/1985 também demonstra
o intuito de viabilizar a tutela de interesses que “correspondem a um grupo,
uma comunidade ou à sociedade”29. No entanto, mais do que uma preocupa-
ção com a ampliação do acesso, o tema mais candente nesse debate legislativo
seria o da legitimação para propositura da ação civil pública, tendo prevalecido
o modelo de legitimação híbrida, porém essencialmente institucional30. Seria,

26 Kazuo Watanabe descreve a litigiosidade latente, ou contida, como aquela expressada por “conflitos
que ficam completamente sem solução, muitas vezes até pela renúncia total do direito do prejudicado”
e que, por falta de via adequada e em virtude dos custos do processo judicial, acabavam sendo
solucionados “de modo inadequado, em Delegacias de Política, ou pela atuação de ‘justiceiros’ ou
mesmo pela prevalência da lei do mais forte, etc.” (“Filosofia e características básicas do Juizado
Especial de Pequenas Causas” In WATANABE, Kazuo” (Org.). Juizado Especial de Pequenas Causas
(Lei 7.244, de 7 de novembro de 1984). São Paulo: RT, 1985. p. 2).
27 Léslie Shérida Ferraz diferencia a litigiosidade latente da contida e da estimulada. A litigiosidade
latente seria aquela em que o cidadão desconhece o direito e, por isso, acaba não agindo diante de
uma violação. Já na contida, o cidadão conhece o direito, porém não acessa o sistema de justiça
por não crer na capacidade deste de responder adequadamente a sua demanda, ou enfrenta óbices
financeiros, sociais, culturais e psicológicos. A litigiosidade estimulada seria aquela que ingressa no
sistema e é incentivada pelo conhecimento, pelas partes, das deficiências e da lentidão do Judiciário
(Acesso à justiça: uma análise dos Juizados Especiais Cíveis no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2010,
p. 89-90). A facilitação do acesso pela via dos juizados ou de outros meios de solução de conflitos,
como a mediação e a conciliação, visaria lidar, justamente, com a litigiosidade contida.
28 WATANABE, Kazuo, 1985, op. cit., p. 2.
29 Exposição de motivos do Anteprojeto da Lei de Ação Civil Pública. 4 de fevereiro de 1985.
30 Sobre os debates legislativos que motivaram as reformas processuais desde os anos 80, em especial
com a Lei de Ação Civil Pública, a Lei dos Juizados de Pequenas Causas e a Constituição Federal,
passando pela Reforma do Judiciário e pela Emenda Constitucional nº 45/2004 até chegar ao Código

15
Maria Cecília de Araujo Asperti

assim, reforçado o protagonismo do Ministério Público, já colocado pela Lei nº


6.938/1981, que lhe atribuia legitimidade para propositura de ação de responsa-
bilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente31, com a preva-
lência do discurso descrito por Rogério Bastos Arantes como “hipossuficiência
da sociedade brasileira”, pelo qual a sociedade civil seria “fraca, desorganizada e
incapaz de defender seus direitos fundamentais”, cabendo ao Ministério Público
o exercício deste papel32.
Há, sem dúvida, uma série de interesses políticos distintos envolvidos nessas
alterações legislativas que vão muito além das preocupações associadas com
o tema “acesso à justiça”. Contudo, ao menos no discurso que legitimou essas
mudanças, é presente a ideia de que seria necessário trazer para a justiça oficial
os usuários e as demandas por direitos outrora marginalizados marginalizados.
Essa busca pela universalização do acesso à justia como pressuposto para a
efetivação de direitos e para a justiça social é uma das premissas do movimento
por acesso à justiça do Projeto Florença (“the system must be equally accessible
to all”33). Como os autores do relatório observam, os obstáculos mais significati-
vos para o acesso seriam aqueles impostos às pequenas demandas de indivíduos
isolados, especialmente os mais pobres, enquanto aqueles que possuem mais
recursos conseguem, de forma mais efetiva, utilizar o sistema de justiça a seu
favor34. A igualdade perfeita seria uma utopia, pois essas diferenças não seriam
passíveis de total erradicação, mas reformas processuais deveriam visar uma
efetiva paridade de armas entre as partes, como forma de se atingir um direito
de “efetivo acesso à justiça”35.
Essa proeminência do tema “acesso à justiça” se fez refletir, ainda, nos
debates que culminaram na promulgação da Constituição Federal de 1988

de Processo Civil para refletir sobre a (in)visibilização da pauta de acesso à justiça, confira-se em
ASPERTI, Maria Cecília de Araujo; COSTA, Susana Henriques da; GABBAY, Daniela Monteiro.
“Acesso à justiça no Brasil: reflexões sobre escolhas políticas e necessidade de construção de uma
nova agenda”. 2017. No prelo.
31 ARANTES, Rogério Bastos. “Direito e Política: o Ministério Público e a defesa dos direitos
coletivos”. Revista brasileira de ciências sociais, v. 14, n. 39, p. 83-102, 1999.
32 ARANTES, Rogério Bastos,1999, op. cit. p. 96.
33 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant, Access to Justice: a world survey, 1978, p. 6.
34 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. “Access to Justice: The Newest Wave in the Worldwide
Movement to Make Rights Effective”. Buffalo Law Review, 27, n. 181, 1978, p. 181-292, p. 195
35 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant, Access to Justice: a world survey, 1978, p. 10.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

(CF), que consagra a inafastabilidade da jurisdição não somente individual,


mas também coletiva (artigo 5º, inciso XXXV)36, e a correlata obrigação do
Estado de assegurar a assistência jurídica integral e gratuita aos hipossufi-
cientes (artigo 5º, XXXI e LXXIV)37. Em conjunto com uma extensa carta de
direitos individuais, sociais e coletivos e com a consolidação dos institutos da
ação coletiva e dos juizados de pequenas causas, então recém-introduzidos, a
Constituição de 88 demarca o ápice das repercussões do movimento de acesso
à justiça do Brasil38. Entendido, definitivamente, como um direito de se fazer
uso do sistema de justiça para judicialização e efetivação de conflitos e defe-
sa dos direitos sociais recém-positivados no texto constitucional, esse acesso
precisaria ser assegurado a todos.
Compõem também o aparato legal e institucional delineado pela CF de 1988
a consolidação da Defensoria Pública e do modelo público de assistência jurídi-
ca gratuita integral para os hipossuficientes e vulneráveis, e o fortalecimento do
Ministério Público, que adquire independência e autonomia, detendo poderes
ampliados para atuação em prol dos interesses da sociedade, inclusive pela via
judicial da ação coletiva39. Prevalece a ideia de que a efetivação dos direitos e
garantias assegurados pela constituição dependeria de instrumentos processuais
adequados e passíveis de serem manejados por atores do sistema de justiça e

36 Importante pontuar que a Constituição de 1946 introduziu a garantia da inafastabilidade em seu


artigo 141, §4º: “A lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito
individual”. Referida previsão que não estava presente expressamente no texto das constituições
anteriores. Vide SALLES, Carlos Alberto de. “Mecanismos alternativos de solução de controvérsias
e acesso à justiça: a inafastabilidade da tutela jurisdicional recolocadas”. In FUX, Luiz; NERY JR.,
Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coord.). Processo e Constituição. Estudos em homenagem
ao Professor José Carlos Barbosa Moreira. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 780.
37 Carlos Alberto de Salles explica que a inafastabilidade do Judiciário não deve ser entendida como apenas
uma obrigação negativa do Estado, mas também positiva, ou seja, um dever do Estado de assegurar o
acesso de todos ao sistema de justiça, envidando recursos e implementando políticas púlicas para tanto.
Novamente, aqui, fica clara a noção de que acesso à justiça não se traduz mais pela perspectiva liberal
de simples ingresso no sistema de justiça, mas também enquanto direito social que demanda recursos
públicos para ser efetivamente implementado (op. cit., 2006a, p. 781-782).
38 CUNHA, Luciana Gross; GABBAY, Daniela Monteiro. Litigiosidade, morosidade e litigância repetitiva
no Judiciário: uma análise empírica. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 31-21.
39 Sobre as mudanças na estrutura e atuação do Ministério Público após a Constituição de 88 e
defendendo que a instituição passou de órgão público um ator político, vide CASAGRANDE,
Cássio. Ministério Público e judicialização da política: estudos de casos. Porto Alegre: Sérgio A. Fabris,
2008, p. 101-109.

17
Maria Cecília de Araujo Asperti

pela sociedade civil40, em um discurso coerente com as reflexões propostas pelo


movimento pela universalização do acesso à justiça, em especial a perspectiva
de que “as técnicas processuais servem às questões sociais”41.
A apropriação da agenda de acesso à justiça pelos processualistas é bem
traduzida pela expressão “acesso à ordem jurídica justa”, cunhada por Kazuo
Watanabe42, que conforma uma noção mais ampla de acesso do que o simples
ingresso no sistema de justiça estatal. Compreende-se, também, a necessidade
de estruturação de uma justiça capaz de responder adequadamente aos confli-
tos sociais, em que haja a efetiva participação da comunidade na administração
da justiça e que esta seja prestada por juízes capazes de compreender a realidade
e as transformações sociais ao seu entorno.

1.3. Litigiosidade e litigiosidade repetitiva


Essas mudanças realizadas no contexto da redemocratização política, aliadas
a uma conjuntura de transformações também sociais e econômicas, contribuí-
ram para que o Judiciário e demais atores do sistema de justiça assumissem um
papel de crescente protagonismo na arena política. No tocante, especificamen-
te, ao Judiciário, este passa a ser visto não só enquanto instância de conflitos
interindividuais, mas também de discussão de questões de alta relevâcia econô-

40 Algumas falas extraídas das atas das comissões da Constituinte são expressivas, como a Sra. Suely
Pletz Neder, então Defensora Pública na Bahia e depoente na Comissão da Organização e Sistema
de Governo e na Subcomissão do Poder Judiciário e do Ministério Público, quando discorre sobre
a necessidade de organização da carreira da Defensoria Pública, refletindo a importância conferida
ao acesso à justiça no debate e a sua associação com a efetivação dos direitos a serem previstos na
Constituição Federal: “O acesso à Justiça é instrumento indispensável para assegurar as conquistas
que a sociedade pretende ver insertas na Carta Constitucional. Se não estabelecermos o instrumental
de acesso de 80% do povo brasileiro ao Poder que decide os litígios, à tutela jurisdicional, tudo que se
fizer hoje na Assembléia Nacional Constituinte irá, na melhor das hipóteses, beneficiar apenas 20%
do povo brasileiro” (BRASIL. Ata da 4ª Reunião Ordinária, realizada em 15.04.1987, da Comissão
da Organização e Sistema de Governo. Assembléia Nacional Constituinte (Atas de Comissões).
Disponível em http://www.senado.leg.br/publicacoes/anais/constituinte, acesso em 1 set. 2017).
41 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça, 1988, p. 5.
42 WATANABE, Kazuo. “Acesso à Justiça e Sociedade Moderna” In GRINOVER, Ada Pellegrini;
DINAMARCO, Cândido Rangel; WATANABE, Kazuo, (coords.). Participação e Processo. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1988.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

mica, política e social43, ao passo que juízes e tribunais exercem cada vez mais
funções simbólicas e políticas de maior impacto44.
Os fatores que fincaram as bases para essa centralidade da justiça estatal
perpassam, como já discutido, pelo reconhecimento de direitos sociais e co-
letivos pela Constituição Federal e por outros importantes diplomas, como o
Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990, CDC); pela estruturação
de novos mecanismos processuais, como a já mencionada ação civil pública; e
por mudanças institucionais, como no fortalecimento da Defensoria Pública
e do Ministério Público e a implementação dos juizados de pequenas causas.
Além disso, é possível mencionar a própria conformação do sistema presiden-
cialista, calcado na noção de separação de poderes e de freios e contrapesos45,
o que compreende, no caso brasileiro, uma sistemática própria de controle de
constitucionalidade que permite que o Judiciário se debruce sobre importantes
questões políticas, econômicas e sociais.
Segundo Boaventura de Sousa Santos, se essa construção jurídico-institu-
cional tinha como intuito, ao menos em teoria, mitigar a desigualdade e a mar-
ginalização social e concretizar os direitos então reconhecidos, os anos 1990
foram marcados pela incapacidade do Estado brasileiro de prover as políticas
públicas necessárias para a efetivação desse arcabouço de direitos46, na medida
em que o modelo desenvolvimentista de Estado foi, na realidade, sucedido por
políticas próprias de um modelo neoliberal47, sem que as políticas públicas ne-
cessárias para concretização dos direitos sociais prometidos pela Constituinte
fossem, de fato, implementadas. A consequência seria o deslocamento da de-
manda social da arena política para o Judiciário, com a crescente judicialização
desses direitos, em ações judiciais manejadas pelos cidadãos ou por entes legiti-
mados contra o Poder Público48.

43 SADEK, Maria Thereza. “Judiciário e arena pública: um olhar a partir da ciência política” In
GRINOVER, Ada P.; WATANABE, Kazuo (coord). O Controle Jurisdicional de Políticas Públicas.
São Paulo: GEN, 2013, p. 2-3.
44 SANTOS, Boaventura de Souza, Para uma revolução democrática da justiça. Coimbra: Almedina,
2015, p. 22-23.
45 SADEK, Maria Thereza, 2013, op. cit., p. 4-5.
46 SANTOS, Boaventura de Souza, 2015, op. cit., p. 22.
47 SANTOS, Boaventura de Souza, 2015, op. cit., p. 14-15.
48 É interessante o ponto de vista sustentado por Mauro Cappelletti sobre a acessibilidade das
instâncias decisórias dos demais poderes no regime democrático. Para o autor, ainda que os

19
Maria Cecília de Araujo Asperti

A centralidade do Judiciário e a crescente litigiosidade também foram impul-


sionadas pela abertura econômica e pelas privatizações, com os desafios regulató-
rios inerentes a esse processo. É próprio também do período a expansão do acesso
à informação e aos serviços jurídicos e, principalmente, do mercado de consumi-
dores, agora protegidos por uma legislação consumeirista que visa facilitar a tutela
judicial de direitos dos consumidores, tanto pela via individual quanto coletiva.
Esses fatores contribuíram para a proliferação de demandas judiciais veicu-
lando questões regulatórias (ex.: cobrança de taxa de tarifa de telefonia fixa49)
e consumeristas (ex. ações judiciais de revisão de contratos bancários50), em
ações judiciais em que litigam de forma contraposta indivíduos e fornecedores
de bens e serviços, prestadores de serviços públicos e agências regulatórias.
Além da facilitação do acesso, positivação de direitos, expansão do mer-
cado de consumo e outros fatores51 que influenciaram o aumento gradual da
litigiosidade – aqui entendida como volume de demandas novas ingressadas
anualmente – esse quadro pode também ser atribuído ao crescente número de
advogados atuantes no país52, decorrente, dentre outros fatores, de uma expan-

obstáculos identificados para o “efetivo acesso à justiça” sejam complexos e de difícil superação,
o acesso ao processo judicial ainda é menos árduo do que o acesso ao processo legislativo e à
administração: “Como está dito, ‘a chave para abrir a porta de um tribunal é um simples ato de
demanda’; entretanto, bem poucos são aqueles que estão próximos àquilo que chamamos de acesso
à branche legislativa e administrativa; o processo jurisdicional é, em suma, uma linha de máxima,
mais acessível, ou ao menos digamos menos inacessível, ao cidadão comum do processo legislativo e
administrativo, nos quais é raro que o homem da entrada esteja em grau de fazer sentir a sua própria
voz” (“Constitucionalismo moderno e o papel do Judiciário na sociedade contemporânea”. Revista de
Processo. v. 15, n. 60, out./dez., 1990, p. 110-117, p. 115).
49 Sobre a litigância acerca da tarifa de telefonia, vide o relatório de pesquisa realizada pela Secretaria
de Reforma do Judiciário, com apoio do Centro Brasileiro de Pesquisas Judiciais (CEBEPEJ) e do
Banco Mundial, sobre ações coletivas em que o estudo de caso versa sobre “o contencioso das tarifas
básicas de assinatura de telefonia no Estado de São Paulo” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, Tutela
Judicial dos Interesses Metaindividuais Ações Coletivas. Brasília: 2007).
50 Outro importante marco foi a declaração de constitucionalidade da aplicação do Código de Defesa
do Consumidor, a prestação de serviços bancários, conforme previsito no artigo 3º, parágrafo 2º
(STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2591, julgada em 07.06.2006).
51 Sobre as causas do aumento da litigiosidade no Brasil, em especial da litigância repetitiva e de
seus impactos em termos de morosidade, confira-se o já citado estudo CUNHA, Luciana Gross;
GABBAY, Daniela Monteiro (Coords.). Litigiosidade, morosidade e litigância repetitiva: uma análise
empírica, 2013.
52 São, em 2016, 1.054.127 milhões de advogados habilitados pela Ordem dos Advogados do Brasil,
conforme dados obtidos no site do Conselho Federal da OAB. Disponível em <http://www.oab.org.
br/institucionalconselhofederal/quadroadvogados>, acesso em 7 jul. 2016.

20
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

são do ensino superior e do ensino do direito53. Disso decorre a proliferação de


uma advocacia especializada em demandas massificadas54 e no barateamento
desses serviços principalmente para empresas varejistas e prestadoras de ser-
viços55, cujas despesas para gerenciamento de um contencioso de volumosas
demandas repetitivas passam a ser relativamente baixos para empresas. Usar o
Judiciário passa a ser relativamente menos custoso para cobrar dívidas e execu-
tar contratos, ao mesmo tempo em que a defesa judicial pode também ser feita
em grande escala de forma massificada.
Esse conjunto de fatores, aliados a outros cujo estudo ainda merece ser apro-
fundado empiricamente, resultaram em um gradual aumento da litigiosidade
no Judiciário, em especial de processos envolvendo cidadãos contra o Estado
(referentes a direitos sociais), consumidores contra empresas ou prestadoras de
serviço público, instituições financeiras contra consumidores para cobranças
de dívida e, ainda, as sempre ineficientes execuções fiscais. Segundo relatório
Justiça em Números, divulgado anualmente pelo Conselho Nacional de Justiça
(CNJ), as execuções fiscais correspondiam, em 2016, a mais de 40% do acervo

53 Segundo dados de 2010, havia, então, no Brasil 1.240 cursos de Direito, ao passo que em países
da Europa, nos Estados Unidos e na China, conjuntamente, 1.100 cursos. Disponível em <http://
g1.globo.com/educacao/guia-de-carreiras/noticia/brasil-tem-mais-faculdades-de-direito-que-china-
eua-e-europa-juntos-saiba-como-se-destacar-no-mercado.ghtml>, acesso em 26 ago. 2017. Dados
levantados pelo Observatório do Ensino do Direito, da FGV DIREITO SP, apontam que em 2013
o curso de Direito contava com o segundo maior em quantidade de matriculados, com 769.889
alunos, o que correspondia a 10,5% do total de 7.305.977 alunos então matriculados em cursos de
ensino superior. FARIA, Adriana Ancona; GHIRARDI, José Garcez; FEFERBAUM, Marina. “O
financiamento estudantil federal nos cursos jurídicos brasileiros”. Observatório do Ensino do Direito.
Vol. 2, n. 2. São Paulo: FGV, 2015. Disponível em http://direitosp.fgv.br/sites/direitosp.fgv.br/files/
arquivos/relatorio_observatorio_do_ensino_do_direito_-_vol__2_n__2.pdf, acesso em 26 ago. 2017.
54 É sintomático, por exemplo, que mesmo diante da possibilidade de se litigar sem representação
jurídica nos juizados especiais cíveis em demandas de até 20 salários mínimos, que no Rio de Janeiro,
por exemplo, os autores se fazem representar por advogados particulares em 78,42% das demandas
(INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Diagnóstico sobre os Juizados Especiais
Cíveis. Brasília: 2013, p. 21).
55 A Ordem dos Advogados do Rio de Janeiro noticia, por exemplo, o trabalho dos advogados
“audiencistas”, que cobram entre R$ 30,00 e R$ 40,00 por audiência e dedicam-se quase que somente à
realização destas. Trata-se de opção de ingresso no mercado de trabalho daqueles que não conseguem
se inserir em escritórios, realidade esperada em um país com mais de 1.100 faculdades de direito
(FRAGA, Vitor. “Remuneração irrisória de audiencistas será pauta de debates no dia 21”. Tribuna
do advogado. Out/2013. Disponível em <http://www.oabrj.org.br/materia-tribuna-do-advogado/17876-
Remuneracao-irrisoria-de-audiencistas-sera-pauta-de-debates-dia-21>, acesso em 14 jul. 2017).

21
Maria Cecília de Araujo Asperti

de processos pendentes no 1º grau56 e apresentavam taxas de congestionamento


de 91%, o que significa dizer que menos de 10% das execuções fiscais foram
baixadas de 2015 para 2016, acumulando-se um acervo quase que integral57.
Ainda refletindo as características da litigiosidade recente, o levantamento
de dados mais difundido a respeito foi o Relatório dos 100 Maiores Litigantes
divulgado em 201158 e em 201259, também pelo CNJ. Tomando-se por base os
dados do último relatório divulgado, referente aos processos ingressados entre
janeiro e outubro de 2011, tem-se a relação dos 100 litigantes envolvidos com
mais frequência, tanto no polo passivo quanto ativo. Os dados consolidados da
Justiça Estadual, Federal e do Trabalho demonstram que os grandes litigantes
do setor público, do setor financeiro e de telefonia estão envolvidos em cerca
35,5% do total de processos60.
Similarmente, a pesquisa feita pela Associação dos Magistrados Brasileiros
(AMB), coordenada por Maria Thereza Sadek e publicada em 201561, tam-
bém demonstra a concentração dos litígios envolvendo os grandes litigantes:
extraindo-se uma média dos tribunais estudados62, os 100 maiores litigantes
estão envolvidos em 23,6% dos casos no polo ativo e 24,36% no polo passivo dos
processos em primeiro grau.

56 São 30.441.220 de execuções fiscais de um total de 73.317.349 processos pendentes em primeiro


grau, seguindo Relatório Justiça em Números de 2017 (ano-base de 2016), do CNJ (op. cit., p. 108).
Se considerarmos o total de casos pendentes (incluindo-se, portanto, os recursos), as execuções
fiscais correspondem a 38% do total (p. 111). Referido relatório discorre sobre a problemática das
execuções fiscais em termos de congestionamento e ineficiência da recuperação de créditos, mas
pondera que o aumento no acervo de executivos fiscais de 2015 a 2016 foi o menor desde o início
da série histórica do relatório em 2009, ainda que, desde então, se observe um aumento contínuo e
gradual na quantidade desse tipo de caso. Disponível em <http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/
pj-justica-em-numeros>, acesso em 8 set. 2017.
57 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2016, op. cit., p. 114.
58 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. 100 Maiores Litigantes. Brasília: Departamento de
Pesquisas Judiciária, 2011.
59 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. 100 Maiores Litigantes. Brasília: Departamento de
Pesquisas Judiciária, 2012.
60 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2012, op. cit., p. 8.
61 ASSOCIAÇÃO DE MAGISTRADOS BRASILEIROS. O uso da Justiça e o litígio no Brasil. Brasília, 2015.
62 Foram estudados os tribunais de justiça dos seguintes estados: Bahia, Distrito Federal, Espírito
Santo, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Rio de Janeiro, Roraima, Rio Grande do Sul, Santa Catarina,
Sergipe e São Paulo. (ASSOCIAÇÃO DE MAGISTRADOS BRASILEIROS, 2015, op. cit., p. 17).

22
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Ainda nesse sentido, os próprios juizados de pequenas causas (subsequen-


temente denominados juizados especiais cíveis, com a Lei nº 9.099/1995),
acabaram abrindo novas portas de acesso para essa conflituosidade própria
da massificação das relações de consumo, cujo tratamento, ao menos teori-
zava-se, seria essencialmente coletivo. Como aponta Leslie Shérida Ferraz, os
juizados pensados para lidar com problemas cotidianos e comunitários entre
indivíduos acabaram tendo suas atividades voltadas à resolução de disputas
entre consumidores e fornecedores63. Mais recentemente, o Instituto de Pes-
quisa Econômica Aplicada (IPEA), em pesquisa sobre os juizados especiais
cíveis, registra que nos três estados estudados (Amapá, Ceará e Rio de Janei-
ro), os conflitos consumeristas são predominantes, correspondendo a 78,57%,
51,38%, 92,89%, respectivamente64.
O que esses estudos – todos datando de meados dos anos 2000 até os dias
atuais – demonstram é que os litígios que despontam como característicos do
acervo judicial não se identificam necessariamente com o prognóstico de liti-
giosidade latente que Kazuo Watanabe descreve para justificar a criação dos
juizados de pequenas causas e a aproximação da população do Judiciário. Na
realidade, ao lado das demandas individuais e coletivas que visam à efetivação
dos direitos sociais assegurados pela Constituição Federal, a conjuntura eco-
nômica, social e política das décadas que sucederam a constituinte favoreceu
a proliferação de demandas envolvendo grandes entes, públicos e privados, as
quais suscitam discussões fáticas e jurídicas similares em virtude da amplitude
da atuação de tais entes.
A massificação das relações se traduziu, assim, em litígios individuais cuja re-
petição e similitude começaram a chamar a atenção do mercado e das instituições
do sistema de justiça nas décadas que se seguiram, muito embora as pesquisas
que, verdadeiramente, se preocuparam em levantar dados sobre as características
(perfil) e causas dessa litigiosidade sejam, como visto, bastante recentes.

63 Os dados analisados pela autora, coletados em 2006 pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Judiciárias
(Cebepej), demonstram que 37,2% dos processos dos juizados no Brasil tratavam de temas de direito
do consumidor, sendo que essa média atingia 50,8% nos juizados de São Paulo 79% nos do Rio de
Janeiro (FERRAZ, Leslie Shérida, 2010, op. cit., p. 120-121).
64 Interessante notar a parcela ínfima de conflitos de vizinhança: Amapá com 1,1%, Ceará com 5,5%
e Rio de Janeiro com 0,79% (INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA, 2013, op.
cit., p. 19-20).

23
Maria Cecília de Araujo Asperti

1.4. Prevalência da eficiência e da segurança jurídica


sobre o acesso à justiça
As alterações institucionais e legislativas que buscaram, em alguma medida,
responder a esse aumento de litigiosidade e o consequente incremento da mo-
rosidade da prestação jurisdicional, assim como os discursos que as embasaram,
também devem ser interpretadas em seu contexto sociopolítico. Essa análise
contextualizada é de suma importância ao desenvolvimento do presente traba-
lho, cujo objeto é a análise de técnicas de julgamento de casos repetitivos, in-
troduzidas, no Brasil, com o objetivo de promover maior celeridade e segurança
jurídica à prestação jurisdicional.
Se as mudanças processuais mais marcantes realizadas no contexto de re-
democratização foram orientadas pelo ideal da facilitação (e, quiçá, da univer-
salização) do acesso à justiça, os institutos implementados nas décadas que se
seguiram buscavam a racionalização da prestação jurisdicional, a padronização
decisória e o redirecionamento de demandas para outros meios de solução de
conflitos, partindo-se de uma concepção de acesso à justiça mais ligada à efi-
ciência e celeridade (“a justiça que tarda, falha”). A expressão dessa mudança
de orientação reflete-se de forma marcante no texto constitucional: enquanto a
constituinte originária consagra o direito de acesso como garantia de inafasta-
bilidade da jurisdição (artigo 5º, XXXV), a Emenda Constitucional nº 45/2004
preocupa-se em relacionar acesso com a garantia à duração razoável do processo
(artigo 5º, inciso LXXVIII)65.
Do ponto de vista acadêmico, a produção de pesquisas marcada, majori-
tariamente, por um enfoque sociológico, dá lugar a uma pauta economicista

65 Confira-se, nesse sentido, trecho do estudo realizado em 2005 pela Consultoria Legislativa da
Câmara dos Deputados sobre a Emenda Constitucional nº 45/2004, em que se associa “acesso à
justiça” com a duração razoável do processo e com a maior eficiência das instituições judiciárias:
“Com efeito, o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário consagrado no art. 5º, inciso XXXV,
já vinha sendo interpretado para abranger não somente o acesso ao Judiciário, com a garantia da
ação e dos meios de defesa adequados, mas também para assegurar que a tutela jurisdicional se
desse de forma efetiva, adequada e tempestiva. O princípio é, agora, com a aprovação da Emenda
Constitucional nº 45, de 2004, tornado expresso pelo Constituinte derivado, denotando a maior
importância dada ao tema. Dele decorre a celeridade de cada ato do processo, eis que a presteza na
realização de um ato processual acarreta a duração razoável do conjunto de atos que se sucedem para
assegurar a tutela jurisdicional” (BANDEIRA, Regina Maria Groba. A Emenda Constitucional nº 45,
de 2004: o novo perfil do Poder Judiciário brasileiro. Brasília: Câmara dos Deputados, 2005. Disponível
em http://bd.camara.gov.br/bd/handle/bdcamara/1587, acesso em 8 set. 2017).

24
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

de cunho quantitativo que objetivava mensurar a produtividade e eficiência


do Judiciário enquanto prestador de serviços66. O levantamento de dados es-
tatísticos se coloca como forma de viabilizar não só a fiscalização pública
do trabalho do Judiciário, mas também a demonstração de resultados para o
investidor estrangeiro e o empresário, de modo geral, sobre a previsibilidade e
confiabilidade das instâncias judiciárias67.
Denota-se uma significativa influência do discurso difundido por orga-
nismos internacionais, como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Inter-
nacional (FMI)68, que preconizam reformas em busca de maior eficiência e

66 “No que diz respeito à atividade judicial, o debate sobre a relação entre Judiciário e economia se
sustenta em estudos realizados no final da década de 1990 e primeira metade dos anos 2000. Tais
estudos partem do pressuposto de que o Judiciário, como prestador de serviço, deve ser imparcial,
eficiente e eficaz, a fim de promover o desenvolvimento e crescimento econômico. Nesse sentido,
o objeto de análise de tais trabalhos é o funcionamento do ordenamento jurídico nacional, os
números referentes às atividades das instituições do sistema de justiça e as pesquisas realizadas
por meio do cruzamento de dados relativos ao crescimento econômico e surveys aplicados com
empresários e magistrados. Nessa linha, é possível citar os trabalhos de Armando Castelar Pinheiro,
as Notas Técnicas do Banco Central – em especial a NTBC nº 35 de maio de 2003 – e os estudos
da Secretaria de Reforma do Judiciário, órgão do Ministério da Justiça” (ALMEIDA, Frederico de;
CUNHA, Luciana Gross; “Justiça e desenvolvimento econômico na reforma do judiciário”. Trabalho
apresentado no evento Direito e Desenvolvimento: um diálogo entre os BRICs. São Paulo: DIREITO
GV, Universidade de Winsconsin e ABDI, nov. 2010).
67 É nesse sentido, por exemplo, que se desenvolve a metodologia de coleta e análise de dados do
relatório anualmente emitido pelo Banco Mundial, denominado “Doing Business in Brazil”,
publicado desde 2004, com foco no estudo da regulação local pertinente para fins de investimento e
de empreendedorismo, rankeando os países e suas instituições de acordo com o nível de burocracia,
custos, tempo e previsibilidade das decisões: “Economic activity requires sensible rules that encourage
firm start-up and growth and avoid creating distortions in the marketplace. Doing Business focuses
on the rules and regulations that can help the private sector thrive—because without a dynamic
private sector, no economy can provide a good, and sustainable, standard of living for people. Doing
Business measures the presence of rules that establish and clarify property rights, minimize the cost
of resolving disputes, increase the predictability of economic interactions and provide contractual
partners with core protections against abuse” (WORLD BANK. “About Doing Business”. Doing
Business 2016. World Bank: 2016, p. 19. Disponível em http://www.doingbusiness.org/reports/
global-reports/~/media/GIAWB/Doing%20Business/Documents/Annual-Reports/English/DB16-
Chapters/DB16-About-Doing-Business.pdf, acesso em 7 de jul. 2016).
68 São referências dessa agenda de pesquisa os estudos coordenados pelo economista Armando
Castelar Pinheiro, que enfatizam os impactos da morosidade e da imprevisibilidade no Judiciário
no crescimento econômico no ambiente de mercado e que propagam a necessidade de reformas
nos moldes defendidos por esses organismos internacionais que, por sua vez, defendiam a maior
eficiência e segurança jurídica dos sistemas de justiça dos países em desenvolvimento: “Os problemas
decorrentes do mau funcionamento do judiciário tornam-se gritantes à medida que a economia
é liberalizada e uma parcela maior da responsabilidade pela alocação de recursos na economia é

25
Maria Cecília de Araujo Asperti

segurança jurídica do sistema, com o estabelecimento de metas de produti-


vidade69. São notórias, por exemplo, as recomendações do Banco Mundial
no Technical Paper Number 319 entitulado “The Judicial Sector in Latin Ame-
rica and in the Caribbean: elements of reform”70 para que os países da Améri-
ca Latina e do Caribe promovessem reformas em seus judiciários visando à
ampliação do acesso à justiça, porém essencialmente orientadas por valores
como credibilidade, eficiência, transparência, independência, previsibilidade
e proteção à propriedade privada e aos contratos71.
No Brasil, as diretrizes propagadas por tais organismos internacionais se ma-
terializaram na pactuação, entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário,
para criação de condições favoráveis para reformas judiciárias e processuais ti-
das por relevantes para o desenvolvimento econômico e atração de investimen-
tos. Os I e II pactos republicanos expressam o objetivo de promover o acesso à
justiça, com o fortalecimento das Defensorias Públicas e iniciativas de justiça
itinerante, mas enfatizam, de modo mais contundente, o enfrentamento do que

transferida para o mercado. Vale dizer que, na medida em que as economias em desenvolvimento
adotam políticas voltadas para o mercado, por exemplo, liberalizando o comércio e recorrendo a
privatizações, muitas das transações que antes se processavam no interior de grandes organizações
estatais ou sob a coordenação do setor público são transferidas para o mercado. Essa mudança põe
em relevo a importância do sistema judicial, do qual dependem, em última instância, a proteção e a
garantia dos direitos e contratos. É dentro desse contexto que instituições como o Banco Mundial
e o BID preconizam uma nova onda de reformas, na qual a reforma do judiciário ocupa um papel
de destaque” (PINHEIRO, Armando Castellar (org). Judiciário e Economia no Brasil. Rio de Janeiro:
Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2009, p. VI).
69 FREITAS, Graça Maria Borges. “Reforma do Judiciário, o discurso econômico e os desafios da
formação do magistrado hoje”. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Belo Horizonte,
v.42, n.72, jul./dez.2005, p. 31-44, p. 34.
70 DAKOLIAS, María, The Judicial Sector in Latin America and in the Caribbean: elements of reform.
Documento Técnico para o Banco Mundial n. 319S. Washington D.C: World Bank, 1997.
71 “The objective of these projects today is to provide a service that is efficient and equitable as well
as respected and valued by the community. In a market economy, an effective judicial system
is expected and needed by citizens, the government and the private sector in order to resolve
conflicts and order social relationships. As markets become more open and transactions more
complex, formal and impartial judicial institutions will be essential. Without such institutions,
private sector development as well as public sector modernization will not be complete. Similarly,
such institutions contribute to the economic efficiency and lead to growth which in turn alleviates
poverty. Judicial reform should especially be considered in tandem when contemplating any legal
reform because without a functioning judiciary, laws cannot effectively be enforced. As a result,
comprehensive judicial reform can have a tremendous impact on the success of the modernization
of the state as well as make an important contribution to the overall development process”
(DAKOLIAS, María, 1999, op. cit., p. xvi).

26
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

se denomina como um diagnóstico de morosidade e inefetividade das decisões


judiciais, que propiciariam a inadimplência, impunidade e descrença da popu-
lação no regime democrático72.
É importante mencionar que a Reforma do Judiciário não fui fruto de um
processo deliberativo uníssono, mas de um intenso debate entre atores institu-
cionais com interesses e preocupações distintos. Andrei Koerner distingue três
correntes: a “corporativo-conservadora”, sustentada pelos ocupantes de órgãos
de cúpula do Judiciário, que atribui a crise da Justiça a fatores de insuficiência
estrutural interna, afastando-se, pois, a necessidade de controle externo e de-
fendendo mudanças mais pontuais; a do “Judiciário democrático”, manifestada
por juízes, profissionais do direito e pesquisadores que questionavam a neutra-
lidade da atuação judicial e defendiam mudanças estruturais na carreira para
uma maior representação democrática e uma atuação mais politizada do Judi-
ciário; e a posição do “Judiciário mínimo”, defendida pelo governo federal e por
alguns juízes, juristas e pesquisadores, de viés neoliberal, entendendo-se que a
crise da Justiça seria decorrente de problemas estruturais e do crescimento da
demanda, decorrentes, por sua vez, do processo de urbanização próprio da épo-
ca e do amplo reconhecimento de direitos sociais pela Constituição Federal73.
Para o autor, essa última corrente teria sido prevalente nos debates da reforma,
entendendo-se pela necessidade de adaptar o Judiciário para favorecer o cresci-
mento econômico no contexto de globalização, reduzindo-se o custo e o tempo
do litígio e aumentando-se a eficiência gerencial das estruturas judiciais74.
Essas ideias estariam refletidas em pesquisas avalizadas pelo Poder Executivo
à época, como, por exemplo, no relatório divulgado em 2004 pelo Ministério
da Fazenda denominado “Reformas Microeconômicas e Crescimento de Longo
Prazo”. Tal relatório enfatiza a correlação entre a reforma do Judiciário e o de-
senvolvimento econômico e do mercado de crédito, que restaria inviabilizado

72 É o que se extrai do preâmbulo do I Pacto Republicano: “Poucos problemas nacionais possuem tanto
consenso no tocante aos diagnósticos quanto à questão judiciária. A morosidade dos processos
judiciais e a baixa eficácia de suas decisões retardam o desenvolvimento nacional, desestimulam
investimentos, propiciam a inadimplência, geram impunidade e solapam a crença dos cidadãos
no regime democrático” (BRASIL. “Pacto de estado em favor de um judiciário mais rápido e
republicano”, dez. 2004).
73 KOERNER, Andrei. “O debate sobre a reforma judiciária”. Novos Estudos. N. 54. jul.1999. São Paulo:
CEBRAP, 1999, p. 11-26.
74 KOERNER, Andrei, 1999, op. cit., p. 18.

27
Maria Cecília de Araujo Asperti

por um “processo moroso, custoso e com incentivos para ação protelatória por
qualquer uma das partes”75. Em sentido similar, o relatório “Judiciário e Econo-
mia”, divulgado em 2005 pela extinta Secretaria de Reforma do Judiciário, do
Ministério da Justiça, trazia dados sobre a visão dos empresários acerca do Judi-
ciário, taxas de litigiosidade e congestionamento, custos e prazo estimado para
recuperação de créditos via ação judicial76. Ao retratar os impactos econômicos
da atuação do Judiciário77, esses estudos foram utilizados para justificar mudan-
ças estruturais e a introdução de mecanismos processuais que contribuíssem
para uma “Justiça mais célere e eficiente” 78.
Como resultado, o texto final da Emenda Constitucional nº 45/2004 prevê,
dentre outras disposições, a inserção do princípio da duração razoável do pro-
cesso no texto constitucional; a criação do Conselho Nacional de Justiça (artigo
103-B)79 e da Súmula Vinculante (artigo 103-A, caput), como medidas voltadas
à promoção da eficiência e transparência do Judiciário e uniformização e segu-
rança jurídica em suas decisões80.

75 MINISTÉRIO DA FAZENDA. Secretaria de Política Econômica. Reformas microeconômicas e


crescimento de longo prazo. Brasília, 2004.
76 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Secretaria da Reforma do Judiciário. Judiciário e economia. Brasília, 2005.
77 Menciona-se, por exemplo, dado de relatório do Banco Mundial de 2003 do qual se extrai que os
bancos representariam 39% dos credores em execuções judiciais, justificando-se uma “relação direta
entre a eficiência do sistema de recuperação de crédito e as taxas de juros praticadas no mercado”
(WORLD BANK DOCUMENT. Brazil, Judicial performance and private sectors impacts: findings from
World Bank sponsored research, p. iv apud MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2005, op. cit., p. 9).
78 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2005, op. cit., p. 17.
79 A fala do Ministro Gilmar Mendes, então Presidente do STF, em conferência promovida pela
Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), realizada em 2009,
denota a compreensão do CNJ como órgão de controle administrativo do Judiciário, cuja atuação
seria voltada para promoção de sua eficiência enquanto prestador de serviços públicos: “Uma justiça
célere e eficiente é pressuposto necessário à concretização do princípio da segurança jurídica. Nesse
sentido, é possível afirmar que a ausência de decisão pode ser pior do que qualquer decisão. De outra
parte, o aperfeiçoamento do serviço público de prestação da justiça passa pela busca incessante de
melhoria da gestão administrativa, com a diminuição de custos e maximização da eficiência dos
recursos. Essa é a razão pela qual a criação do Conselho Nacional de Justiça significou tanto para
a definitiva modernização do Judiciário brasileiro” (“A Reforma do Sistema Judiciário no Brasil:
elemento fundamental para garantir segurança jurídica ao investimento estrangeiro no País”. Palestra
proferida na conferência promovida pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
Econômico (OCDE), em Paris, França. Disponível em http://www.stf.jus.br/repositorio/cms/
portalStfInternacional/portalStfAgenda_pt_br/anexo/discParisport1.pdf, acesso em 20 dez. 2017).
80 “A morosidade dos processos judiciais e a baixa eficácia de suas decisões retardam o desenvolvimento
nacional, desestimulam investimentos, propiciam a inadimplência, geram impunidade e solapam a

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

A Súmula Vinculante, especificamente, demarca o início de uma tendên-


cia de reformas processuais destinadas ao julgamento de casos considerados
repetitivos, fundadas em um diagnóstico de morosidade e de falta de segurança
jurídica que se mostrou predominante na Reforma do Judiciário81.
Em termos processuais, a Súmula Vinculante segue a tradição da prática fo-
rense brasileira de publicação de enunciados gerais e abstratos, com pretensões
universalizantes, para racionalização do julgamento de recursos82 após reitera-
das decisões sobre a matéria, porém com efeitos vinculantes para os demais
órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública, cabendo o manejo de
reclamação diretamente ao Supremo Tribunal Federal (STF) em caso de des-
cumprimento de seu teor.
Há uma nítida dimensão gerencial nesse instituto83, que visaria evitar a “re-
levante multiplicação de processos sobre questão idêntica” (artigo 103-A, §1º).
É o que se extrai, ainda, da motivação do Substitutivo pela Câmara dos Deputa-
dos às propostas de reforma, que consigna a Súmula Vinculante seria um “me-
canismo para diminuir demandas” e “apressar julgamentos”, contribuindo para
acabar com a chamada “loteria do judiciário”, pela qual respostas diversas são

crença dos cidadãos no regime democrático” (BRASIL, “I Pacto Republicano de Estado por um
Sistema de Justiça mais acessível, ágil e efetivo”, 2004).
81 Demonstrando alinhamento com a posição expressada pelo Legislativo, o relatório do Ministério da
Fazenda sobre Reformas microeconômicas e crescimento de longo prazo já mencionado, também discorre
sobre a súmula vinculante em sentido similar: “merece atenção especial o conjunto de medidas a
respeito do efeito condicionante das súmulas do Supremo Tribunal Federal, que visam equacionar
o excesso de recursos que, desnecessariamente, congestionam esses tribunais argüindo matérias já
tratadas em decisões sumuladas. Objetiva-se com isso dar maior poder efetivo à jurisprudência ao
condicionar, ou mesmo impedir, recursos aos Tribunais Superiores em temas já sumulados, evitando-
se, com isso, o desperdício de tempo e recursos de todas as partes envolvidas” (MINISTÉRIO DA
FAZENDA, 2004, op. cit., p. 74).
82 MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes Obrigatórios. 4ª Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016a, p. 309.
83 Ao se falar aqui em uma dimensão gerencial, quer se afirmar que os institutos referidos são
essencialmente pautados por uma lógica de eficiência e voltados para o aprimoramento da
administração da justiça. Não se trata de uma concepção mais ampla de práticas de gerenciamento,
que incluem práticas informais do juízo, mecanismos de resolução de conflitos variados, organização
diferenciada de servidores e ritos processuais diferenciados, como para Paulo Eduardo Alves da Silva
(Gerenciamento de processos judiciais. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 33).

29
Maria Cecília de Araujo Asperti

conferidas a “demandas idênticas”84. Os conceitos de “demandas idênticas”85


ou “repetitivas” entram em cena, passando a assumir grande importância nos
debates do direito processual civil a partir de então.
Seguindo essa tendência, o II Pacto consolida um ciclo de reformas que in-
troduziu no texto do Código de Processo Civil (CPC) de 1973 uma série de
instrumentos processuais com a justificativa de promover maior celeridade e se-
gurança jurídica por meio da sumarização de julgamento de causas repetitivas,
como no julgamento liminar de improcedência de mérito do artigo 285-A86 e a
instituição de filtros recursais, tais como repercussão geral para os recursos di-
recionados ao STF no artigo 543-A87 e a súmula impeditiva de recursos prevista
no artigo 518, §1º88. É, também, a partir dessa tendência que são introduzidas
as técnicas de julgamento por amostragem da repercussão geral e do recurso es-
pecial repetitivo, então previstas nos artigos 543-B89 e 543-C90, respectivamen-
te. As expressões “casos idênticos” e “multiplicidade de recursos” expressam a
finalidade desses institutos de racionalizar o julgamento de casos considerados

84 BRASIL, Congresso. Câmara dos Deputados. Parecer da Comissão Especial da Câmara dos
Deputados ao Substitutivo apresentado à PEC 96-B/92. 14 dez. 1999, p. 454.
85 Importante somente pontuar a imprecisão do conceito de “demandas idênticas”, aqui veiculado, e
que também aparecia no texto do artigo 285-A, do CPC/1973, visto que não se referem, em nenhum
dos casos, a demandas em que haja identidade entre os seus elementos, mas apenas uma similitude
na argumentação fática e jurídica a justificar a aplicação de técnicas processuais de padronização
decisória. Especificamente no tocante à interpretação da expressão “casos idênticos”, do artigo 285-
A do CPC/1973, confira-se CUNHA, Leonardo José Carneiro da, “Primeiras impressões sobre o art.
285-A do CPC - julgamento imediato de processos repetitivos: uma racionalização para as demandas
de massa”. Revista Dialética de Direito Processual. n 39, jun-2006, p. 93-104, p. 96).
86 Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido
proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação
e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada”.
87 Art. 543-A. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso
extraordinário, quando a questão constitucional nele versada não oferecer repercussão geral, nos
termos deste artigo.  
88 Art. 518. “Interposta a apelação, o juiz, declarando os efeitos em que a recebe, mandará dar vista ao
apelado para responder. § 1º O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em
conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal”.
89 Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a
análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal, observado o disposto neste artigo”.
90 Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de
direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo”.

30
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

semelhantes, cuja proliferação passa a ser vista como uma problemática a ser
enfrentada pela via do processo.
Como se vê, a litigiosidade é colocada como uma das principais causas do
congestionamento judicial e dos consequentes impactos negativos na economia
e no mercado de crédito. É nítida a mudança de perspectiva entre a necessida-
de de se absorver a “litigiosidade latente” e a problematização da litigiosidade
como causa da morosidade, em especial da litigiosidade repetitiva, objeto deste
trabalho. Há, em alguns documentos, um questionamento sobre se realmente
essa litigiosidade identificada é resultado das mudanças legislativas do período
anterior para facilitação do acesso e se, de fato, refletem uma democratização
das instâncias judiciárias91. No entanto, as preocupações mais fundantes da re-
forma, em especial no que diz respeito à litigiosidade repetitiva, são no sentido
de se assegurar maior segurança jurídica e eficiência a atores do mercado que
litigam em juízo para assegurar o cumprimento de contratos e a cobrança de
dívidas, revelando que a visão de acesso à justiça associada à tutela de direitos
excluídos e usuários marginalizados não havia prevalecido.

1.5. Litigiosidade repetitiva como problema e acesso


à justiça como causa
As alterações processuais em matéria de direito processual que se seguiram
à Reforma do Judiciário denotam uma prevalência do enfrentamento da litigio-
sidade, da morosidade e da busca da eficiência da prestação jurisdicional. São
esses os valores que também se mostram marcantes nos debates em torno da
consolidação do texto do CPC de 2015.
A comissão de juristas destacada para apresentar uma proposta de texto ao
Senado Federal, presidida pelo então Ministro do Superior Tribunal de Justiça
(STJ), Luiz Fux, apresentou, em 8 de junho de 2010, sua primeira versão do
texto do Anteprojeto de um novo Código de Processo Civil, a partir do qual

91 À exemplo, no relatório Justiça e Economia, da Secretaria de Reforma do Judiciário, pondera-se


que “a alta litigiosidade não implica em acesso à Justiça amplo, mas no fato de poucas pessoas ou
instituições utilizarem demais o Poder Judiciário, enquanto que a maior parte da população está
afastada dos mecanismos formais de resolução de litígios” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2005,
op. cit., p. 6).

31
Maria Cecília de Araujo Asperti

fora elaborado o Projeto de Lei ao Senado nº 166/201092. Já na carta de apre-


sentação do texto, assinada por Luiz Fux, a questão da litigiosidade aparece de
forma contundente:

“É que aqui e alhures não se calam as vozes contra a morosidade da jus-


tiça. O vaticínio tornou-se imediato: “justiça retardada é justiça denega-
da” e com esse estigma arrastou-se o Poder Judiciário, conduzindo o seu
desprestígio a índices alarmantes de insatisfação aos olhos do povo. (...)

Esse é o desafio da comissão: resgatar a crença no judiciário e tornar re-


alidade a promessa constitucional de uma justiça pronta e célere. Como
vencer o volume de ações e recursos gerado por uma litigiosidade de-
senfreada, máxime num país cujo ideário da nação abre as portas do
judiciário para a cidadania ao dispor-se a analisar toda lesão ou ameaça
a direito? (...) Como prestar justiça célere numa parte desse mundo de
Deus, onde de cada cinco habitantes um litiga judicialmente?”93

O texto do Anteprojeto foi aprovado pelo Senado Federal (PLS nº 166/2010)


em 1º de dezembro de 2010 e encaminhado para a Câmara dos Deputados (Pro-
jeto de Lei nº 8.046/10). Após um período de abertura para consulta pública, foi
instituída uma nova comissão de juristas, responsável pelo Substitutivo apresen-
tado, cuja discussão culminou na aprovação do texto em 26 de março de 2014,
remetendo-se novamente para o Senado Federal. O texto final foi sancionado
em 16 de março de 2015 e sofreu a sua primeira alteração antes mesmo do final
da vacatio legis, com a Lei nº 13.105/2016.
Assim como no texto do Anteprojeto proposto pelo Senado Federal, a ques-
tão da litigiosidade também se mostra presente no relatório elaborado pela co-
missão de juristas da Câmara dos Deputados, que trata especificamente das
“demandas de massa” como uma problemática a ser enfrentada pela nova lei
processual. Aqui, o acesso à justiça é expressamente percebido como uma das
causas da proliferação dessas demandas, “fenômeno” pelo qual o direito proces-
sual deveria ser responsivo:

92 BRASIL. Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil. Projeto de Lei n. 8.046, de 2010, do
Senado Federal, que trata do Novo Código de Processo Civil. Brasília: 2010. Disponível em <https://
www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf>, acesso em 23 ago. 2017.
93 BRASIL, Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil, 2010, p. 7-8.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

“O acesso à justiça foi muito facilitado nos últimos anos; o progresso eco-
nômico, com a incorporação de uma massa de consumidores, antes alheia
à economia, repercutiu diretamente no exercício da função jurisdicional,
com um aumento exponencial do número de processos em tramitação.

A massificação dos conflitos, fenômeno bastante conhecido e estu-


dado, é um dado de fato que não pode ser ignorado na elaboração de
um novo CPC” 94.

Percebe-se, nitidamente, uma mudança nos discursos no que diz respeito ao


papel e aos significados de “acesso à justiça”. De objetivo central da legislação
processual e da própria conformação institucional, como forma de absorção
de conflitos sociais e da litigiosidade latente pelo sistema judiciário, o acesso à
justiça passa a ser associado à litigiosidade, em especial a demandas de massa,
que seria uma problemática a ser enfrentada pela via do processo. É como se o
acesso à justiça tivesse ido longe demais.
Consolidam-se, então, outras conotações da noção de “acesso à justiça”,
frequentemente associadas à busca pela deformalização (inclusive com o uso
de outros meios de solução de disputas), previsibilidade e maior eficiência das
estruturas judiciárias. Antes associado a ideia de que todos os interesses devem
ser tutelados pelo sistema de justiça, o valor “acesso à justiça” passa a ser relacio-
nado com celeridade, eficiência e previsibilidade, valores estes que já ganhavam
prominência desde a Reforma do Judiciário, como visto no item anterior.
A partir da positivação do princípio da duração razoável do processo, pela
Reforma do Judiciário, o valor “eficiência” passa a ser considerado um dos co-
rolários do devido processo legal95. Parte-se da compreensão do Poder Judici-

94 BRASIL, Congresso. Câmara dos Deputados. Parecer da Comissão Especial da Câmara dos
Deputados ao Projeto de Lei n. 6.025, de 2005, ao Projeto de Lei n. 8.046, de 2010, ambos do Senado
Federal, e outros, que tratam do “Código de Processo Civil” (revogam a lei no 5.869, de 1973).
Brasília: 2012, p. 11.
95 Ainda no relatório da comissão especial para a Câmara dos Deputados, extrai-se essa visão de que o
código estaria refletindo uma agenda contemporânea do direito processual que valoriza a eficiência
enquanto princípio central: “O Código de Processo Civil deve espelhar o atual momento da ciência
jurídica brasileira. Os vários projetos em tramitação mostram que a Câmara dos Deputados sempre
esteve atenta para a necessidade de aprimorar as regras que impõem motivação adequada na
aplicação dos princípios jurídicos. Além disso, a Câmara dos Deputados tem discutido a possibilidade
de consagrar, em enunciados expressos, princípios processuais imprescindíveis para a construção
de um modelo de processo civil adequado à Constituição Federal, como os princípios da boa-fé
processual e da eficiência” (BRASIL, Congresso. Câmara dos Deputados, 2012, p. 10).

33
Maria Cecília de Araujo Asperti

ário como órgão incumbido de prestar um serviço público de justiça, gerindo


de modo eficiente e transparente seus processos, obedecendo às metas previa-
mente estabelecidas pelo CNJ e prestando informações periódicas sobre seu
rendimento e produtividade. Elevado ao status de princípio processual, a efici-
ência serviria para orientar a atuação judicial na condução do processo, o que
compreende a escolha de técnicas processuais (inclusive mediante aplicação de
medidas atípicas para efetivação de provimentos jurisdicionais, como se extrai
do artigo 139, IV, do CPC/2015) e o exercício da função interpretativa pelo jul-
gador, sempre norteada pela busca de resultados satisfatórios em termos quanti-
tativos, qualitativos e probabilísticos96
Segurança jurídica e eficiência seriam, portanto, os valores fundantes das
técnicas de julgamento de casos repetitivos, que objetivariam responder a um
diagnóstico de excesso de demandas e recursos similares, apostando no fortale-
cimento de entendimentos jurisprudenciais para redução de novas demandas e
facilitação, ou sumarização, do julgamento dos processos em trâmite. A agenda
do acesso à justiça, tal como elaborada no Brasil nos anos 70 e 80, não possui
mais a mesma relevância97, e quando se discute “acesso à justiça”, ora se verifica
o uso da expressão como causa do excesso de litigiosidade, ora como um valor
de significado volátil e indefinido, porém muito mais associado à eficiência e
previsibilidade, como já visto.
Não se nega a relevância da busca pela efetividade da tutela e eficiência da
prestação jurisdicional, tampouco do direito de se obter uma solução judicial
dentro de um prazo razoável98 e com um mínimo de previsibilidade. Contudo,
como alerta Carlos Alberto de Salles, a análise do direito orientada somente

96 DIDIER JR, Fredie. “Apontamentos para a concretização do princípio da eficiência do processo” In


FREIRE, Alexandre; DANTAS, Bruno; NUNES, Dierle; DIDIER JR., Fredie; MEDINA, José Miguel
Garcia; CAMARGO, Luiz Henrique Volpe; OLIVEIRA, Pedro de Miranda. Novas Tendências do
Processo Civil. Salvador: JusPodium, 2013, p. 433-439.
97 Sobre o acesso à justiça como um “não assunto” também no cenário internacional (“non-issue”),
confira-se MATTEI, Ugo. “Access to Justice. A Renewed Global Issue”. Electronic Journal of
Comparative Law, Vol. 11.3, 2007. Disponível em: http://works.bepress.com/ugo_mattei/34, acesso
em 25 mar. 2016.
98 “Nesse sentido, o direito de acesso à justiça só se efetiva quando a porta de entrada permite que
se vislumbre e se alcance a porta de saída em um período de tempo razoável. A morosidade na
solução dos conflitos é um importante entrave para alcançar a porta de saída e, em decorrência,
para a realização do acesso à justiça” (SADEK, Maria Tereza. “Acesso à justiça: um direito e seus
obstáculos”. Revista USP. n. 101, março/abril/maio 2014, p. 55-66, p. 55).

34
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

pelo critério da eficiência muito mais se aproxima de uma lógica de mercado do


que de justiça, podendo, no limite, levar à negação “da centralidade do conceito
de justiça como peça chave na interpretação e aplicação do direito”99. Assim, a
confusão ou o esvaziamento de significado do direito de acesso à justiça pode
conduzir à invisibilização dessa pauta, como se a busca pelo acesso enquanto
direito de acionar o sistema de justiça para efetivação de outros direitos já ti-
vesse sido superada, ou encontrasse como óbice, unicamente, a ineficiência e o
congestionamento das estruturas judiciárias. É essa a discussão que se propõe
no capítulo que se segue.

99 SALLES, Carlos Alberto de. “Entre a eficiência e a equidade: bases conceituais para um direito
processual coletivo”. Revista de Direitos Difusos. Vol. 36. Direito Processual Coletivo I, mar./abr. 2006,
p. 13-31, p. 17-22.

35
2. Ainda Faz Sentido Falar
em Acesso à Justiça?

2.1. Uma agenda ultrapassada?


A história recente das reformas legislativas em matéria de direito processual
e de conformação do sistema de justiça no Brasil revela a ascensão e a perda de
prestígio da noção de “acesso à justiça”. Esta, por sua vez, transmudou não só de
importância, mas também de significado ao longo das décadas.
Inicialmente, percebe-se uma identificação da temática com as investigações
sobre as interações entre a sociedade e o sistema de justiça e a responsibilidade
deste à conflituosidade coletiva, bem como com a legitimação de mecanismos
de tutela coletiva e políticas voltadas à informalização e desburocratização da
Justiça. No entanto, a incapacidade do Estado de efetivar os direitos previstos na
Constituição de 88, dentre outros fatores econômicos e sociais diversos, se fez
refletir em índices crescentes demandas ajuizadas anualmente. Sem que houvesse
um diagnóstico mais concreto das causas desse aumento e do perfil dos deman-
dantes da Justiça, essa litigiosidade foi prontamente colocada como um problema
a ser combatido, inclusive por meio da concepção de novos mecanismos proces-
suais. Aos poucos, de objetivo a ser perseguido, o acesso à justiça passa a ser visto
como uma das causas da propalada crise de eficiência do Judiciário.
Ainda que se entenda, como será melhor explicado adiante, que o acesso à
justiça é um direito social, não deixa de ser, também, uma perspectiva meto-
dológica que se volta para uso e para os usuários das instâncias de justiça, bem
como para os impactos das resposta conferidas por estas instituições. Esse já
era o ponto de vista sutentado pelo movimento por acesso à justiça do Projeto
Florença, que definia acesso à justiça como direito e como enfoque de estudo
de um direito processual que visa compreender como o sistema opera, em bene-
fício de quem e com qual impacto social, usando, para tanto, conhecimentos e
ferramentas de outros saberes e culturas100.

100 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant, 1978a, op. cit., p. 9.

37
Maria Cecília de Araujo Asperti

Responder à pergunta título desse capítulo implica, portanto, em pensar no


acesso à justiça sob duas vertentes. A primeira é enquanto perspectiva metodo-
lógica, mormente para o estudo do processo civil e das instituições do sistema
de justiça. A segunda é do acesso à justiça como direito social, compreendendo-
-se, mais a fundo, qual seria o conteúdo e os limites desse direito.

2.2. Acesso à justiça enquanto perspectiva metodológica


Entender o acesso não só como um direito, mas como uma perspectiva
metodológica, é algo central ao access-to-justice movement. Para os autores,
o foco no acesso à justiça poderia transformar o estudo do processo civil, ao
propor a superação da visão essencialmente dogmática das técnicas proces-
suais e a sua compreensão a partir das funções sociais que devem desempe-
nhar101. Assim, adotar esse enfoque significaria olhar para os impactos so-
ciais da regulação processual e de sua aplicação pelas instituições do sistema
de justiça e demais meios informais de solução de disputas que se estendem
para além das cortes. Isso demandaria do processualista a capacidade de
dialogar com outros saberes, como a sociologia, ciência política, psicologia,
economia, e com outras culturas.
Muitos foram os estudos protagonizados por juristas ou por cientistas so-
ciais em geral que tentaram adotar esse olhar para compreensão do sistema de
justiça, seu desenho e suas instituições102. Em um ensaio de sistematização de
diferentes linhas de pesquisa sociologicamente orientadas, Rebecca L. Sandefur
afirma que “acesso à justiça civil é a perspectiva de estudo empírico da lei que
foca nas experiências das pessoas com evento da justiça civil, organizações e
instituições”103 e que investiga quem consegue acessar o sistema e quais seriam
os resultados obtidos por meio desse acesso. Sua proposta é analisar estudos que

101 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant, 1978a, op. cit, p. 9.


102 Para uma sistematização dessa agenda, incluindo as produções brasileiras, explicando-se os
diferentes métodos e abordagens de pesquisa, vide CUNHA, Luciana Gross; OLIVEIRA, Fabiana
Luci de. “Medindo o acesso à Justiça Cível no Brasil. Opinião Pública. Campinas. V. 22, n. 2, agosto
2016, p. 315-347.
103 SANDEFUR, Rebecca L. “Access to Civil Justice and Race, Class, and Gender Inequality”. Annual
Review of Sociology, Vol. 34, August 2008, p. 339-358, p. 340. Tradução livre.

38
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

tentam mensurar o acesso à justiça e como essa abordagem lida com questões
relacionadas a desigualdades não só sociais, mas também de raça e gênero104.
Para a autora, a perspectiva metodológica do acesso à justiça representa-
ria, em si, um grande desafio às ciências sociais, dado o impulso normativo
característico de um momento histórico de grande otimismo acerca da ca-
pacidade do direito de superar desigualdades e concretização de ideiais de
justiça social. Buscando uma objetividade e imparcialidade na mensuração
do acesso à justiça, os variados estudos que trabalhavam com a ideia de
justiça subjetiva105, esta em si essencialmente normativa, partiriam ora da
investigação do comportamento dos indivíduos diante de eventos da justiça
civil (“behavioral approach”), ora das avaliações subjetivas destes de suas
experiências com atores e instituições do sistema (“perceptual approaches”).
Sandefur associa precipuamente a perspectiva metodológica do acesso à
justiça com a experiência do usuário no sistema, muito embora seu olhar
também se volte aos resultados ou a permeabilidade do sistema face a sua
utilização pelos diversos grupos de interesse.
Os estudos mapeados pela autora apontaram fatores diversos que repercu-
tiriam desigualdades nas experiências dos usuários na justiça. Ela pontua que
a disparidade na distribuição de recursos, informações, e conexões sociais afe-
taria o comportamento de potencial litigantes, assim como suas orientações
subjetivas e crenças sobre a legitimidade e efetividade do direito. Os diferentes
graus de institucionalização de interesses (a proteção legal de um direito ou de
uma ofensa) também impactariam a mobilização de grupos de indivíduos e a
resposta conferida ao sistema às suas demandas. Faltariam, contudo, estudos
mais direcionados, que efetivamente enfrentassem a questão da perpetuação de
desigualdades raciais, de classe e de gênero pelo sistema de justiça, sendo esta
uma preocupação fundamental que deveria permear estudos relacionados ao

104 Rebecca L. Sandefur pontua que as desigualdades de classe, raça e gênero, embora não sejam
certamente as únicas, são as principais vertentes identificadas por sociólogos que estudam sociedades
modernas complexas (2008, op. cit, p. 340). Acrescentaríamos aqui, também, as desigualdades
decorrentes de orientação sexual e, ainda no aspecto de gênero, as desigualdades enfrentadas pela
população transgênero. A esse respeito, confira-se ASPERTI, Maria Cecilia de A; GARROTE,
Marina G.; TOCANTINS, Matheus C. “The tortuous path for changing name and gender: the
challenges faced by transgender people in Brazilian Courts”. Artigo apresentado na conferência Law
and Society em junho de 2017. No prelo.
105 A idéia de justiça subjetiva ou substantiva é retomada no Capítulo 3, no item 3.1.3.

39
Maria Cecília de Araujo Asperti

acesso à justiça que sejam “empiricamente comparativos, teoricamente infor-


mados, e analiticamente precisos”106.
Ainda sobre a perspectiva metodológica do acesso à justiça e sua relevân-
cia na atualidade, Ugo Mattei a considera fundamental para compreensão do
próprio papel do direito da sociedade107. Mattei discute dimensões temáticas e
metodológicas diversas associadas a essa abordagem: o desequilíbrio de poder
entre as partes (notadamente relevante para as ciências sociais desenvolvidas
sob o mito da neutralidade e objetividade, como é o caso do direito e, mais pre-
cisamente, do direito processual civil); a interdisciplinariedade, permitindo-se
o diálogo entre o direito, sociologica, economia, antropologia e ciência política
– acrescentando-se, aqui, a psicologia e o serviço social, áreas fundamentais
para compreensão da experiência do usuário no sistema e para uma verdadeira
contextualização dos conflitos levados ao sistema de justiça –; a necessidade de
se transgredir a abordagem etnocentrista e ocidentalizada do estudo do direito,
oportunizando-se um aprendizado mais aprofundado e completo e; a compreen-
são da distância entre o direito “dos livros” e o direito “em ação”, o que se daria
mediante pesquisas empíricas que aferissem os problemas jurídicos na prática108.
Para os fins deste trabalho, compreende-se como elementos da perspectiva
metodológica do acesso à justiça a priorização de métodos empíricos e de aná-
lises comparativas para investigação das experiências de diferentes grupos e
indivíduos no sistema de justiça e os impactos sociais da atuação de seus agentes
e instituições, com o propósito de problematizar o papel do direito na sociedade.
A partir desses elementos, diferentes escolhas metodológicas podem ser realiza-
das, ora “de baixo para cima”, averiguando-se o comportamento ou percepção
dos atores que poderiam acessar esse sistema (ou a perspectiva do “acesso” ou
“demanda” por justiça), ora de “cima para baixo”, investigando-se a resposta
conferida (do ponto de vista da “justiça que se acessa, ou da “oferta”), dentre
outros diversos ângulos que se fazem possíveis quando se propõe um olhar que
dialoga com outros saberes para as problemáticas propostas109.

106 SANDEFUR, Rebecca L, 2008, op. cit., p. 352.


107 MATTEI, Ugo, 2007, op. cit., p. 1-2.
108 MATTEI, Ugo, 2007, op. cit., p. 4.
109 Embora o presente trabalho ocupe-se, essencialmente, da investigação de questões relacionadas
ao processo civil, entende-se que a perspectiva metodológica do acesso à justiça também oferece
importantes subsidíos para estudos sobre a justiça penal, a seletividade do sistema carcerário e

40
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Fala-se aqui no sistema de justiça como um todo, e não somente no Judi-


ciário, dado que a compreensão da experiência do usuário perpassa pela sua
interação com os mais diversos agentes (advogado, delegado, promotor, defen-
sor) e instituições, inclusive os mecanismos informais de solução de disputas,
vinculados ou não às cortes. Não se pode discutir o acesso à justiça, portanto,
sem se considerar as interações entre todos esses atores, a partir das diversas
abordagens possíveis que se insiram nessa chave metodológica.
Assim sendo, parece que o processo civil está longe de ter superado ou esgo-
tado as possibilidades que essa perspectiva metodológica oferece. Muito embora
o termo “acesso à justiça” seja citado à exaustão pelos acadêmicos do Direito,
poucos são os trabalhos que adotam métodos de pesquisa empíricos ou, ainda,
que problematizam o conceito de acesso como direito social e as diferentes co-
notações que podem ser adotadas, e que relacionem essa reflexão com o estudo
dos institutos de direito processual civil.
Especificamente no tocante ao estudo da litigiosidade pelo processo civil, o
aumento do volume dessas demandas e os custos delas decorrentes incentiva a
reprodução de discursos que retratam uma “litigiosidade desenfreada” ou uma
“explosão de litigiosidade”110, sem que fossem investigadas as causas e as carac-
terísticas das demandas e recursos similares que se avolumam no Judiciário,
tampouco as características, comportamento e percepções dos litigantes envol-
vidos nessas disputas. Apenas recentemente, alguns levantamentos de dados
sobre o perfil dessa litigiosidade, essencialmente quem são os principais liti-
gantes envolvidos, deram substrato para uma problematização mais consistente
desse aumento no volume de processos. Estaríamos diante de uma maior com-
batividade por parte dos indivíduos ou das consequências nocivas da ampliação

as respostas conferidas às instituições a inviduos pertencentes a diferentes grupos. São diversos


os estudos empíricos a esse respeito, mas convém mencionar pesquisa recente realizada pela
Conectas Direitos Humanos sobre as respostas conferidas pelos diferentes atores (juízes,
promotores, defensores públicos e advogados) frente a relatos de tortura nas audiências de
custódia (Tortura blindada: como as instituições do sistema de justiça perpetuam a tortura nas
audiências de custódia. São Paulo: Conectas, 2017).
110 Distingue-se aqui o uso da expressão “explosão de litigiosidade” reproduzida no contexto da reforma
do Judiciário e da discussão do CPC/2015, do seu estudo no âmbito da sociologia dos tribunais,
em que se problematizou, efetivamente, as causas do aumento da litigiosidade, decorrentes da
precarização das estruturas do Estado de bem-estar social. A exemplo: SANTOS, Boaventura de
Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. Porto: Afrontamento, 1994.

41
Maria Cecília de Araujo Asperti

do acesso à justiça ou, essa “explosão” decorreria de outros variados fatores,


dentre eles, um uso excessivo do sistema por alguns atores?
A veiculação da ideia de “explosão de litigiosidade” 111 associada, unicamen-
te, a combatividade e a um uso facilitado das instituições judiciárias, também
se fez presente nos Estados Unidos, principalmente no contexto da discussão da
tort reform, em que se defendia limites às condenações cíveis por responsabilida-
de civil de empresas, médicos, seguradoras, dentre outros. Os debates a respeito
remontam aos anos 1970, quando associações de classe, empresas e organiza-
ções sem fins lucrativos representativas de interesses corporativos defendiam
mudanças na legislação atinente à responsabilidade civil para limitar aquilo que
denominavam como abuso da litigância (litigation abuse)112. Deborah L. Rhode
argumenta que a mobilização promovida por esses atores veiculava narrativas
anedóticas de litígios retratados como frívolos, que acabariam recebendo des-
proporcional atenção dos operadores do direito e da mídia113, fomentando a
crença do norte-americano como um povo excessivamente litigioso114.
Um exemplo frequentemente citado é o do famoso caso da senhora Stella
Liebeck contra o McDonald’s115. A autora teria obtido um julgamento multimi-
lionário a seu favor contra a rede de fast food simplesmente em razão desta servir

111 Marc Galanter discute o discurso da “explosão de litigiosidade” a partir daquilo que chama de
uma visão preconceituosa do Judiciário (“jaundiced view”), segundo a qual essa “explosão” teria
efeitos nocivos para o tecido social e para a economia e seria causada por um uso indiscriminado
do processo por demandantes oportunistas, auxiliados por advogados gananciados e incentivados
por juízes ativistas e jurados tendenciosos, que decidem por condenar empresas inocentes ao
pagamento de imensas somas de dinheiro. Essa visão reforçaria estratégias para evitar o julgamento,
aumentando-se, com isso, o uso de outros meios de solução de disputas e a promoção do acordo
por juízes (“The Hundred Year Decline of Trials and the thirty years war”. Stanford Law Review,
v. 57, n. 1255, Stanford University Press: 2005, p. 1.266/1.267. Também a esse respeito, confira-se
GALANTER, Marc. “The Vanishing Trial: an examination of trials and related matters in Federal
and State Courts”. Journal of Empirical Legal Studies, v. 1, n. 459, 2004).
112 RHODE, Deborah L. Access to justice. New York: Oxford University Press, 2004, p. 28-29.
113 RHODE, Deborah L., 2004, op. cit., p. 39-41.
114 Ela cita, por exemplo, o discurso de George W. Bush que, conquanto ironicamente devesse seu
mandato a uma ação judicial, lamentava que: “We’re a litigious Society; everybody is suing, it
seems like. There are too many lawsuits in America”, e que seu pai também sustentara em debates
presidenciais que “Americans are suing each other too much and caring for each other too little”
(RHODE, Deborah L., 2004, op. cit., p. 26-27).
115 No. CV-93-02419, 1995 WL 360309 (N.M. Dist. Aug. 18, 1994). Um interessante relato sobre o caso
e uma análise crítica de sua repercussão pode ser conferido no documentário Hot Coffee, dirigido por
Susan Saladoff, que discute os impactos da tort reform no sistema judicial norte-americano (EUA, 2011).

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

um café em alta temperatura, o que retrataria a história típica de um advogado


ganancioso que teria se aproveitado de um incidente insignificante para utili-
zar o Judiciário de forma oportunista e com intuito de obter uma indenização
desproporcional116. A visão difundida na mídia e no imaginário popular, no
entanto, deixou de lado fatos essenciais do caso: a autora, uma idosa de 79
anos, sofrera queimaduras de terceiro grau pelo fato de o café estar em uma
temperatura altíssima, de cerca de 80 graus, muito embora o restaurante tivesse
conhecimento (como ficou comprovado no julgamento) que essa temperatura
poderia causar queimaduras na boca e no esôfago117, bem como o fato de que
havia outras 700 reclamações de queimaduras causadas pela temperatura do
café. A grande mídia e os apoiadores da tort reform também deixaram de evi-
denciar que a autora havia tentado previamente uma solução consensual com o
McDonald’s, propondo que a empresa arcasse apenas com seus custos médicos,
o que não foi aceito. Ao final, depois de toda a exposição e assédio, ela acabou
anuindo com um acordo em valor que nunca foi divulgado, a despeito da con-
denação de 2,3 milhões em seu favor.
Como se vê, questões relacionadas à litigiosidade envolvendo grandes
entes e indivíduos – como é o caso de demandas no âmbito do direito do
consumidor, por exemplo – possuem relevante repercussão social e econô-
mica e reverberam interesses conflitantes dos diferentes atores e grupos en-
volvidos. Daí a importância fundamental do substrato teórico e de análises
empíricas focadas no comportamento e nas experiências dos usuários no
sistema de justiça, bem como nos resultados por eles obtidos, para funda-
mentar reformas e a aplicação de institutos processuais voltados para o jul-
gamento de demandas e recursos repetitivos.

116 Sobre essa retratação da mídia à época, Marc Galanter traz trechos de reportagens veiculadas em
diferentes jornais, como nesse excerto do editorial do Oakland Tribune de 5 de maio de 1995: “Is
there any doubt in anyone's mind that our legal system is being badly abused? Greedy lawyers, victims
out to make a buck, and a culture that encourages people to sue instead of accepting their own
responsibility or working things out, have clogged courts with cases that don't belong there. Add
a growing public belief in ‘deep pockets’ - the notion that corporations and public agencies have
bottomless pits of money, so why not sue? - and you have a nation of victims who see going to court
as tantamount to buying a lottery ticket. You have nothing to lose, and may win big” (“A nation of
lawyers”, p. 14 apud GALANTER, Marc. “An Oil Strike in Hell: Contemporary Legends about the
Civil Justice System”. Arizona Law Review. Vol. 40, 1998, p. 717-752, p. 732-733).
117 CAIN, Kevin G. “The McDonald’s Coffee Lawsuit”. Journal of Consumer & Commercial Law, v. 11,
n. 1, 2007.

43
Maria Cecília de Araujo Asperti

Como discutido no capítulo anterior, os (poucos) dados existentes so-


bre as características do acervo de processos que atualmente se avoluma
no Judiciário brasileiro despontam para a constatação, enfatizada por Ma-
ria Tereza Sadek, de que “a porta de entrada atrai um tipo de litigante e
desencoraja ou se fecha para a grande massa de indivíduos incapazes de
manejar instrumentos de efetivação de seus direitos”118. A concentração de
processos envolvendo os 100 maiores litigantes do Judiciário demonstra que
a morosidade e ineficiência decorrem não de uma democratização do acesso
à justiça, mas de um uso em excesso das instituições oficiais por uma gama
reduzida de entes públicos e privados, que frequentemente a utilizam espe-
cialmente para recuperação de créditos ou são corriqueiramente acionados
por indíviduos em razão de suas condutas ou omissões.
Assim, conclui-se que o estudo dos discursos que embasaram a Reforma do
Judiciário e, principalmente, o CPC/2015, conforme descrito no capítulo ante-
rior, remetem a noções como “litigiosidade desenfreada” ou “massificação de
conflitos” desprovidas de maior aprofundamento teórico ou de dados empíricos
concretos. Quais seriam as causas e as características dessa litigiosidade? Quais
as matérias discutidas? Quais os atores envolvidos? O estudo aprofundado des-
sas questões, a partir da perspectiva metodológica do acesso à justiça, poderia
ter produzido enormes impactos nas reformas legislativas aqui discutidas.

2.3. Acesso à justiça como direito social

2.3.1. Fronteiras dinâmicas da injustiça e distribuição


do acesso
Discutida a perspectiva metodológica do acesso à justiça, aborda-se aqui,
também, o acesso à justiça enquanto direito social, tal como proposto no início
deste Capítulo.
Previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, esse direito
compreende não somente uma obrigação negativa, ou uma vedação constitu-
cional ao legislador, ao aplicador do direito, ao juiz ou ao administrador de
limitar de qualquer modo a prestação jurisdicional, mas também uma feição

118 SADEK, Maria Thereza, 2014, op. cit., p. 60.

44
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

prestacional, uma obrigação positiva por parte do Estado de prestar os serviços


necessários para prover o cidadão com os meios necessários para acessar o sis-
tema119. Essa compreensão do acesso à justiça como direito social é uma faceta
peculiar do direito brasileiro, que torna a prestação jurisdicional e os meios para
sua efetivação – inclusive a assistência jurídica integral prevista no artigo 5º,
LXXIV – ao menos em tese, exigíveis pelo cidadão que busca o Judiciário para
resolver seus conflitos120.
Entendendo-se ser o direito de acesso à justiça um direito social, é necessário
questionar se é possível a sua universalização, tal como proposto pelo movimen-
to de acesso à justiça.
Marc Galanter argumenta que não121. Para o autor, as fronteiras do acesso
à justiça estão em constante movimento, na medida em que, ao mesmo tempo
em que são institucionalizadas medidas para se aumentar a “justiça”, novas
“injustiças” são reconhecidas em decorrência do avanço do conhecimento e
da capacidade humana, em um ritmo provavelmente mais rápido do que a
possibilidade de se prover mais acesso e mais justiça. As fronteiras do acesso
à justiça se expandiriam não só para a inclusão de novos problemas, mas
também de pessoas que outrora não usufruíam dos recursos da “justiça”, com
novas demandas e conflitos para o sistema122. De outra parte, a prestação
dessa justiça demanda recursos que são limitados, já que os investimentos
dessa natureza implicam, inevitavelmente, em custos de oportunidade. Por
isso, seriam necessárias escolhas de cunho inegavelmente político para distri-
buir esse acesso, dissolvendo-se a “ilusão de que a justiça existe no reino da
legalidade técnica e é distinta da política” 123.
A análise das reformas institucionais e legislativas e os respectivos discursos
e pautas de pesquisa que as influenciaram permitem identificar escolhas políti-
cas realizadas nas últimas décadas que tiveram grandes impactos em termos de
distribuição do direito social de acesso à justiça. Propõe-se, no presente traba-

119 SALLES, Carlos Alberto de, 2006a. op. cit., p. 781-782.


120 ASPERTI, Maria Cecília de Araujo; COSTA, Susana Henriques da; GABBAY, Daniela Monteiro,
2017, op. cit, p. 4.
121 GALANTER, Marc. “Acesso à justiça em um mundo de capacidades em expansão”. Revista Brasileira
de Sociologia do Direito. Porto Alegre: ABraSD, v. 2, n. 1, p. 37-49, jan./jun., 2015, p. 37-49.
122 GALANTER, Marc, 2015, op. cit., p. 44.
123 GALANTER, Marc, 2015, op. cit., p. 46.

45
Maria Cecília de Araujo Asperti

lho, questionar como as escolhas realizadas para conformação das técnicas de


julgamento de casos repetitivos repercutem na distribuição do acesso à justiça,
especificamente para os excluídos ou ausentes do sistema de justiça, por meio
de mecanismos de participação e representatividade, conforme se verá mais
detidamente nos capítulos seguintes.

2.3.2. Desigualdade no acesso e na justiça que se acessa


Conquanto o ponto de vista adotado por Marc Galanter seja pertinente ao
afirmar a dinamicidade das fronteiras de justiça (atuação do sistema de justiça
capaz de efetivar direitos) e injustiça (percepção de negação de justiça) e a
necessidade de se realizar escolhas políticas para distribuição da justiça pelo
Estado, não parece que o movimento dessas fronteiras seja decorrente apenas
da expansão das capacidades sociais e humanas de reconhecer injustiças.
Há um importante elemento a ser considerado nessa tensão entre justiça e
injustiça, que é a persistente desigualdade, não só social, mas também de raça,
gênero, identidade de gênero e orientação sexual. Não se trata da elaboração
de novas injustiças, como Galanter propõe, mas do reconhecimento de velhas
injustiças e da persistência (e acentuação) dessas desigualdades, o que faz com
que sempre haja injustiças à margem do sistema.
Mesmo problematizando a essência “tremenduosamente otimista” da crença
do access-to-justice movement na capacidade da lei de reduzir desigualdades e do
processo ser distributivo, Rebecca L. Sandefur também afirma a importância
de se estudar a desigualdade no acesso (quem acessa e como se acessa) e a
reprodução ou até mesmo a possibilidade de desestabilização de desigualdades
pelo sistema (a justiça que se acessa), assinalando a importância da participação
social nas instituições do sistema de justiça nas sociedades contemporâneas124.
A esse respeito, e buscando, assim, quais seriam os valores que deveriam
orientar as escolhas distributivas inerentes à efetivação do direito social de aces-
so à justiça, há uma insuperável indagação de fundo sobre o papel e a capacida-
de do direito e o Judiciário de promover a superação dessas desigualdades125. Se-

124 SANDEFUR, Rebecca L, 2008, op. cit., p. 352.


125 “A justiça distributiva é a regra – e a virtude de aplicação desta regra -, segundo a qual os interesses
particulares (de indivíduos, de grupos, de classes, de corporações) são articulados para que uma
forma de produção de vida com liberdade seja possível. Digo vida com liberdade, porque produção

46
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

ria utópico pensar no potencial do acesso à justiça de evitar a reprodução e até


mesmo reduzir as iniquidades sociais, econômicas e até mesmo simbólicas126?
Tomando-se por base a análise institucional comparada de Neil Komesar,
temos que não é possível investigar a capacidade de uma instituição (no caso, o
sistema de justiça e, principalmente, o Judiciário) de atingir um objetivo social
(como a superação de desigualdades) sem se reconhecer a inevitável imperfei-
ção de todas as instituições, dentre as quais a Justiça, o processo político e o
mercado127. Discutir se o Judiciário e o processo adjudicatório são capazes de
atender a esse objetivo social perpassa, portanto, pela comparação do desempe-
nho das cortes judiciais e das demais instituições, identificando-se as falhas e
atributos de cada qual nas diferentes circunstâncias em que atuam128.
Para essa comparação, Komesar propõe que adote como parâmetro a pos-
sibilidade que as instituições oferecem de participação dos diferentes atores da
sociedade em seus processos decisórios, sendo este, a seu ver, o elemento que
melhor reflete como a instituição é capaz de atuar na persecução do objetivo
social proposto (participation-centered approach)129. Ele explica que certos ato-
res, como consumidores, produtores, eleitores (cidadãos), lobistas e litigantes,
interagem em todas as instituições, e que a avaliação das possibilidades parti-
cipativas proporcionadas por cada instituição é o que definirá se os resultados
obtidos foram condizentes com o critério social dos grupos envolvidos. Essa
participação seria influenciada pelos benefícios (e sua distribuição dentre os
integrantes de determinados grupos) e custos (de transação, de demandas judi-

de vida sem liberdade é até fácil de fazer. A justiça torna-se um problema só se a dominação, a
exploração e a discriminação forem males a se evitar. Se dominação, exploração e discriminação
forem aceitas em nome da produção material da vida – seja qual for a justificativa ideológica que se
dê à procedência da vida sobre a pessoa humana -, a justiça torna-se um não-problema” (LOPES, José
Reinaldo de Lima. “Justiça e Poder Judiciário ou a virtude confronta a instituição”. Direitos Sociais:
teoria e prática. São Paulo: Método, 2006, p. 119-139, p. 127).
126 FRASER, Nancy. “Social Justice in the Age of Identity Politics: Redistribution, Recognition, and
Participation”. The Tanner Lectures on Human Values. Stanford University: 1996, p. 7.
127 KOMESAR, Neil. Imperfect Alternatives: choosing institutions in law, economics, and public policy.
Chicago: University of Chicago Press, 1994.
128 “Each social goal requires difficult social determinations – often balancing or integrating aggregate
social impacts. Defining, realizing, and implementing these goals requires the operation of complex
and imperfect social decision-making processes or systems like the market, the courts, and the
political process” (KOMESAR, Neil, 1994, op. cit., p. 30).
129 KOMESAR, Neil, 1994, op. cit., p. 5.

47
Maria Cecília de Araujo Asperti

cialmente, da ação política, etc.) decorrentes, o que também deve ser analisado
de modo comparativo130.
Especificamente com relação ao Judiciário, Komesar afirma que existem três
importantes características a serem levadas em consideração para compreensão
dos fatores que influenciam a participação dos atores e grupos sociais: (i) a
necessidade de requerimentos formais para a participação dos litigantes (a for-
mulação da demanda), o que, em tese, implica em maiores custos (em sentido
amplo) de acesso do que para o consumidor acessar o mercado ou o cidadão
participar do processo político; (ii) uma dimensão e estruturas reduzidas, se
comparadas com as do mercado e do processo político; e (iii) uma maior inde-
pendência dos juízes do que dos agentes políticos ou de mercado, o que, por sua
vez, acarreta maiores custos e limitações no sistema (afinal, há um custo em se
manter uma estrutura com agentes independentes e imparciais)131.
Desses elementos extrai-se que o atingimento de qualquer objetivo social a
ser realizado pelo Judiciário tem como pressuposto a ação de partes litigantes,
que devem romper com a inércia da jurisdição e arcar com os custos de pro-
vocar a Justiça para enfrentamento das questões propostas. Esses fatores pro-
vocam o afunilamento das questões que são levadas ao sistema, que acaba só
tendo contato com as matérias para os quais os grupos de interesse conseguiram
superar os custos para demandar em juízo. Em outras palavras, a concretização
de determinado objetivo social pelo Judicíario pressupõe o acesso à justiça e
efetiva participação dos grupos afetados, o que tem como ponto de partida a
capacidade destes de arcar com os custos desse acesso.
A despeito das desvantagens e custos associados à escolha do Judiciário
como instituição que pretenda efetivar o objetivo social de superação de
desigualdades, há vantagens comparativas que merecem ser consideradas.
Komesar argumenta que, conquanto no processo judicial se está adstrito aos
pleitos e argumentos das partes (o que reduziria o escopo de atuação insti-
tucional), há maior equilíbrio e paridade na apreciação desses argumentos
pelo julgador. Em virtude de sua independência, juízes seriam menos susce-

130 “Each social goal requires difficult social determinations – often balancing or integrating aggregate
social impacts. Defining, realizing, and implementing these goals requires the operation of complex
and imperfect social decision-making processes or systems like the market, the courts, and the
political process” (KOMESAR, Neil, 1994, op. cit., p. 30).
131 KOMESAR, Neil, 1994, op. cit., p. 8.

48
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

tíveis à corrupção do que outros agentes, o que, ao menos em tese, contri-


buiria para a obtenção de resultados mais justos. Fica evidente, portanto,
que a realização de objetivos sociais pelo Judiciário está atrelada não só ao
acesso, mas à efetiva participação dos diferentes atores no sistema judicial
e à sua capacidade de submeter satisfatoriamente os assuntos, argumentos e
provas necessários para a tomada de decisão132.
As possibilidades de participação no sistema de justiça também são objeto
de investigação da sociologia jurídica, ou sociologia dos tribunais, na discussão
sobre o papel do direito e do Judiciário na superação de desigualdades. Boaven-
tura de Sousa Santos argumenta que o direito seria essencialmente hegemôni-
co, permeável aos interesses econômicos que reclamam por um Judiciário “efi-
ciente, rápido, que permita a previsibilidade dos negócios, dê segurança jurídica
e garanta a salvaguarda dos direitos de propriedade”133. Haveria, contudo, um
campo contra hegemônico dos cidadãos e grupos sociais que tomaram consci-
ência de seus direitos assegurados constitucionalmente e que se mobilizam para
usar o Judiciário para reivindica-los. É quando se verifica a possibilidade do
uso deste instrumento hegemônico de forma contra hegemônica, em especial
quando possibilidades não jurídico-judiciais (essencialmente políticas, portan-
to) não estejam acessíveis, ou estejam bloqueadas por agendas conservadoras, é
o Judiciário é capaz de promover a transformação social por meio da efetivação
de direitos já assegurados pela lei, usando-se “o direito e os tribunais como
arma”134. Tem-se aqui também a ideia de participação como ruptura da inércia
da jurisdição e como forma de pautar a atividade jurisdicional.
Relacionando essa possibilidade de uso dos instrumentos jurídicos e proces-
suais em favor de classes populares e movimentos sociais com a noção de acesso
à justiça, Boaventura defende uma revolução democrática da justiça, em que
não se acessa algo que já existe, mas, sim, se modifica a justiça a partir do acesso
daqueles que hoje se encontram à sua margem:

132 “By contrast, judges and juries stand aloof. They depend on others to convince them by evidence and
reason, but they do not depend on these others for their jobs and livelihood. The adversarial process
attempts to equalize the representation of positions and the delivery of information by assuring that
both positions are at least formally represented and that information reaching judge and jury are
confined to that brought them by opposing advocates” (KOMESAR, Neil, 1994, op. cit., p. 141).
133 SANTOS, Boaventura de Souza, 2015, op. cit., p. 34.
134 SANTOS, Boaventura de Souza, 2015, op. cit., p. 36-37.

49
Maria Cecília de Araujo Asperti

Faz sentido que se tome como ponto de partida uma nova concepção
do acesso ao direito e à justiça. Na concepção convencional busca-se
o acesso a algo que já existe e não muda em consequência do acesso.
Ao contrário, na concepção que proponho, o acesso irá mudar a justiça
a que se tem acesso. Há aqui um sistema de transformação recíproca,
jurídico-política, que é preciso analisar135.

Esses grupos e demais indivíduos que sequer acessam o direito e o Judiciário


representam uma “procura suprimida”, consequência da marginalização daque-
les que não conseguem adentrar um sistema que os faz se sentir impotentes e
intimidados por meio de seus rituais, linguagens e simbologias esotéricas e in-
compreensíveis. Seriam estes ausentes os titulares de uma procura invisibilizada
de direitos que, se for considerada, levará à grande transformação do sistema
judiciário e do sistema jurídico, em sua totalidade, que Boaventura defende ao
falar da revolução democrática da justiça.
Para além do questionamento sobre a capacidade do Judiciário de influir
na superação de desigualdades de matizes diversas, a perspectiva metodológica
do acesso à justiça leva à reflexão sobre como as desigualdades são reproduzi-
das pelo próprio sistema, pelo processo e pela tutela jurisdicional, pelas mais
variadas razões. Novamente citando Rebecca L. Sandefur, as experiências no
sistema de justiça tendem a refletir as desigualdades a que o usuário já está
sujeito, na medida em que a lei, as instituições de justiça e seus agentes estão in-
seridos na realidade desigual que existe independentemente do sistema136. Essas
experiências, contudo, podem também influir na criação de disparidades entre
litigantes ou, ainda, na destruição, redução ou desestabilização dessas iniquida-
des. Cabe aos estudos sobre acesso à justiça debruçarem-se sobre essa dinâmica.
Extrai-se desse importante (e talvez inesgotável) debate sobre o papel do
direito e das instituições do sistema de justiça na superação de desigualdades
que a participação efetiva de diferentes atores e grupos no sistema de justiça é
um importante fator nessa equação. Seria possível discutir essa participação das
mais diferentes formas, como no âmbito de formação e composição de quadros
das instituições e de participação ampliada na tomada de decisões institucio-
nais e legislativas, pertinentes ao sistema de justiça. No que concerne ao estudo

135 SANTOS, Boaventura de Souza, 2015, op. cit., p. 39.


136 SANDEFUR, Rebecca L, 2008, op. cit., p. 346.

50
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

e compreensão de técnicas processuais propriamente ditas, a ênfase será colo-


cada na participação dos titulares de direito no processo civil para se problema-
tizar as possibilidades de participação viabilizadas (ou mitigadas) pelas técnicas
de julgamento de casos repetitivos.

2.4. Litigantes repetitivos, ocasionais e os ausentes


Se o estudo da relação e das repercussões das desigualdades de classe, raça e
gênero no acesso à justiça e na justiça que se acessa ainda é incipiente, o estudo
da disparidade de capacidades estratégicas dentro do processo é central à pers-
pectiva metodológica do acesso à justiça.
O texto de Marc Galanter, publicado em 1974 intitulado “Why the Haves
Come Out Ahead?: Speculations on the Limits of Legal Change”137, é um dos
principais referenciais teóricos a esse respeito. O texto é conhecido, principal-
mente, pela tipologia proposta para os diferentes atores que litigam em juízo
de acordo com a frequência com que se envolvem em litígios similares. É dele
a referência aos repeat players, ou litigantes repetitivos (ou, ainda, “jogadores
habituais”) que, por recorrerem com mais frequência às cortes judiciais, pos-
suiriam vantagens estratégicas com relação àqueles que recorrem ao sistema
de justiça apenas ocasionalmente (one-shooters, os litigantes ocasionais, ou
“participantes eventuais”138):
Logo de início, Galanter propõe que se deixe de lado a análise jurídica tra-
dicional, que se volta para o estudo das regras e das instituições, e que se olhe
pelo “outro lado do telescópio”, para compreender como os atores, ou “jogado-
res”, que manejam essas regras nessas instituições conseguem ou não impactar a
forma como esse sistema funciona139. Seria um olhar “de baixo para cima”, para
se analisar as capacidades e os comportamentos dos jogadores e compreender

137 GALANTER, Marc, 1974, op. cit.


138 “Jogadores habituais” e “participantes eventuais” são as expressões utilizadas na tradução para o
português de Ana Carolina Chasin (Por que ‘quem tem’ sai na frente: especulações sobre os limites da
transformação no direito. São Paulo: 2014, no prelo). As referências às ideias do texto serão remetidas
ao texto original, ao passo que o uso de citações literais referenciará a tradução para o português de
Ana Carolina Chasin.
139 GALANTER, Marc, 1974, op. cit., p. 97.

51
Maria Cecília de Araujo Asperti

como o jogo funciona para, com isso, delimitar as possibilidades e as fronteiras


de utilização do sistema legal na promoção de transformações redistributivas140.
Veja-se, então, que Galanter entende que a resposta à indagação sobre as
possibilidades do Judiciário e do processo judicial de promover transformações
sociais – e, com isso, reduzir ou superar desigualdades – perpassa, necessaria-
mente, por entender as diferentes capacidades e vantagens posicionais dos liti-
gantes no processo. Essa perspectiva é fundamental ao presente trabalho, em
que se investiga como as técnicas de julgamento de casos repetitivos podem ser
compreendidas a partir da abordagem metodológica do acesso à justiça. Com-
preender, portanto, como o comportamento e as capacidades desses usuários
influi na sua experiência com a Justiça e nos resultados obtidos é fundamental
para a investigação aqui realizada.
Como mencionado, Galanter especula que certos atores, por atuarem mais
recorrentemente no Judiciário em casos similares, acabam angariando mais ex-
pertise e vantagens estratégicas, se comparados com litigantes que recorrem
apenas circunstancialmente à justiça estatal e para os quais sua demanda é úni-
ca141. Ele explica que a dicotomia entre repeat players e one-shooters é tipicamente
associada ao porte dos atores, sendo os litigantes repetitivos as partes com mais
recursos e capacidade de prever os riscos decorrentes do uso da justiça estatal,
além de uma série de vantagens estratégicas que podem ser atribuídas a sua
conformação e à frequência com que se envolvem em demandas similares142. O
próprio autor reconhece que identificação dessas vantagens não decorreria de
um trabalho empírico, mas de uma especulação sobre as diferentes possibilida-
des e limites de utilização do sistema legal pelos seus diferentes usuários.
Caberia aos trabalhos acadêmicos que utilizam esse referencial a verificação
empírica dessa hipótese, que é o que se pretende fazer nesta pesquisa, com foco,
especificamente, nas técnicas de julgamento de casos repetitivos143. É com base

140 GALANTER, Marc, 1974, op. cit., p. 95-97.


141 GALANTER, Marc, 1974, op. cit., p. 97-98.
142 Em uma análise posterior, Galanter afirma que os litigantes repetitivos tendem a ser cada vez mais
entes artificiais, ou pessoas jurídicas, capazes de tomar decisões estritamente racionais e de mobilizar
recursos de forma estratégica para defesa de seus interesses corporativos, confira-se “Planet of the
Aps: reflections on the scale of law and its users”, 53 Buffalo Law Review, 2006, p. 1369-1417.
143 Há, evidentemente, uma série de outros trabalhos que buscam verificar, empiricamente, as
especulações de Galanter, que começam, apenas recentemente, a também reverberar no estudo
do processo civil no Brasil. A obra In litigation: do the “haves” still come out ahead?, organizada por

52
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

nesse referencial, especificamente, que se traça da pergunta de pesquisa sobre


a utilização das técnicas de julgamento de casos repetitivos por litigantes habi-
tuais e ocasionais, hipotetizando-se que aqueles aferem vantagens por meio do
uso de tais instrumentos processuais.
É possível, nesse momento, relacionar outros elementos para aproximação
da análise de Galanter com o contexto atual do Judiciário brasileiro144, o que
será especialmente útil para as análises empíricas descritas nos capítulos 5 e 6.
As duas primeiras vantagens apontadas pelo autor são as seguintes:

1. “Os JHs [jogadores habituais], por já terem feito isso antes, têm co-
nhecimento prévio. Eles são capazes de estruturar a transação se-
guinte e construir um registro. O JH é aquele que redige o modelo
do contrato, que exige o depósito de garantia e assim por diante”.145
2. “JHs desenvolvem expertise e têm pronto acesso a especialistas.
Eles desfrutam de economias de escala e têm baixos custos ini-
ciais em qualquer caso”.146
Pondera-se, nesse ponto, que litigantes repetitivos (ou jogadores habituais)
conseguiriam atuar de forma mais estratégica tanto no litígio, quanto preven-
tivamente, possuindo recursos e incentivos para contratação de especialistas
(jurídicos e não jurídicos).

Humbert M. Kritzer Susan Silbey (Stanford: Stanford University Press, 2004), traz estudos de autores
diversos que justamente se propõem a testar, em diferentes contextos, a hipótese central de Galanter
de se aqueles que têm realmente saem na frente. O trabalho apresentado como requisito para
obtenção do título de mestre na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo também utilizou
esse referencial, porém para questionar como as disputas repetitivas impactam os programas judiciais
de conciliação e mediação, considerando suas características próprias, em especial a contraposição
entre litigantes repetitivos e habituais (ASPERTI, Maria Cecilia de Araujo. Meios consensuais de
resolução de disputas repetitivas: a conciliação, a mediação e os grandes litigantes do Judiciário. São Paulo:
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2014).
144 Para um maior aprofundamento da contextualização da obra de Galanter para o caso brasileiro,
confira-se ASPERTI, Maria Cecília de Araujo; COSTA, Susana Henriques da; GABBAY, Daniela
Monteiro; SILVA, Paulo Eduardo Alves da; “Why the 'Haves' come out ahead in Brazil? Revisiting
speculations concerning repeat players and one-shotters in the Brazilian litigation setting”. FGV
Direito SP Research Paper Series No 141. Jan./2016. São Paulo: FGV, 2016.
145 GALANTER, Marc, 2014, op. cit. (trad.), p. 25.
146 GALANTER, Marc, 2014, op. cit. (trad.), p. 25.

53
Maria Cecília de Araujo Asperti

É possível remeter, no contexto brasileiro atual, à estruturação de depar-


tamentos jurídicos e coordenadorias estratégias em procuradorias capazes de
angariar e analisar dados sobre as demandas e recursos judiciais em que estão
envolvidos de forma integral e panorâmica, com a possibilidade de prever riscos
e estruturar estratégias, inclusive negociais.
Aqueles que possuem maior expertise também se beneficiam mais dos re-
centes avanços tecnológicos, tais como a informatização dos processos, os siste-
mas de acompanhamento processual e compartilhamento de informações entre
escritórios e departamento jurídicos, processadores de dados capazes de realizar
análises de jurimetria e, de forma especialmente relevante, sistemas de inteli-
gência artificial que permitem, por meio de mecanismos de processamento de
linguagem, a articulação desses dados para elaboração automatizada de contra-
tos e peças processuais em apenas alguns minutos147.
Customizados por especialistas para os grandes litigantes, esses sistemas per-
mitem que os entes adotem estratégias judiciais e contratuais já coerentes com
o entendimento predominante em cada juízo em que litigam, minimizando seus
riscos e maximizando suas chances de ganho. A tendência é que os computa-
dores substituam não só as tarefas repetitivas e burocráticas desempenhadas
por escritórios, mas análises complexas e de larga escala, calculando riscos para
estruturação de negócios e articulando argumentos jurídicos para formulação
de novas teses jurídicas, já coadunadas com o comportamento dos órgãos de-
cisórios148. Conseguem ser capazes, inclusive, de escolher quando e onde (em

147 BERTÃO, Naiara. “Funções típicas de advogados já são feitas por softwares e robôs”. Exame. 20 jan.
2017. Disponível em https://exame.abril.com.br/revista-exame/deixa-que-o-robo-resolve/#, acesso
em 25 set. 2017; OLIVEIRA JR., Paulo Silvestre de. “Inteligência artificial é uma realidade e já afeta
a área jurídica”. Conjur. 15 set. 2017. Disponível em <http://www.conjur.com.br/2017-set-15/chiesi-
filho-inteligencia-artificial-afeta-area-juridica>, acesso em 25 set. 2017.
148 Alguns exemplos são bastante expressivos das possíveis vantagens estratégicas e econômicas de
escala que os litigantes que tiverem acesso a essas inovações tecnológicas poderão usufruir. O site de
tecnologia Tecmundo noticia, por exemplo, o lançamento de um assistente de inteligência artificial
habilitado para falar português e que seria capaz de reconhecer a responder, por meios diversos, a
demandas com clientes: “Nos escritórios de advocacia, o novo assistente de inteligência artificial é
capaz de atender e responder 70% da comunicação dos clientes por meio de telefone, e-mail, chat e
redes sociais, com eficiência e rapidez, considerando as mudanças de comportamento da sociedade.
Ele está apto para fazer o primeiro atendimento com um cliente, marcar reuniões, dar informações
processuais e responder a questões diversas, de acordo com a especialidade da banca” (VIEIRA,
Douglas. “BOT: conheça o robô-advogado que atende clientes em português”. Tecmundo. 14 set.
2017. Disponível em <https://www.tecmundo.com.br/software/122052-bot-conheca-robo-advogado-
atende-clientes-portugues.htm>, acesso em 25 set. 2017).

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

quais instâncias e foros) é mais conveniente transacionar, e quando (e como) é


possível obter êxito com determinadas teses jurídicas, construídas a partir das
decisões judiciais tomadas pelos órgãos jurisdicionais em análises de jurimetria.
Tudo isso pode ser feito de forma automatizada, extremamente rápida e barata,
o que reduz ainda mais os custos iniciais, e faz com que o processo individual
não seja um custo relevante para os litigantes repetitivos.
Prosseguindo-se nas vantagens apontadas por Galanter, tem-se que:

3. “JHs têm oportunidades para desenvolver relações informais faci-


litadoras com os encarregados institucionais” 149.

Como visto quando da análise dos dados de pesquisas sobre os maiores liti-
gantes do Judiciário brasileiro, certos atores do setor público e privado continu-
am sendo os principais “clientes” do sistema, o que faz com que sejam conheci-
dos por todos os seus agentes, mantendo uma reputação que pode lhes facilitar
o diálogo, tanto com julgadores quanto com os demais servidores da justiça.
Ainda que a crescente informatização dos processos tenha reduzido os con-
tatos informais entre partes e advogados e os agentes das burocracias judiciais,
é inegável que, com o aumento no volume de processo e recursos, esses agentes
– escreventes, escrivãos e assessores de desembargadores e ministros dos tribu-
nais superiores –, são, cada vez mais, os responsáveis pela análise dos autos e
elaboração de decisões judiciais nas variadas instâncias e foros do Judiciário.
Advogados e prepostos de grandes litigantes interagem com frequência com
esses atores, não só nos cartórios, mas em sustentações orais, audiências de
conciliação e de instrução e julgamento, audiências públicas, etc.
Isso é especialmente pertinente quando tratamos das técnicas de julgamento
de casos repetitivos, que deslocam o poder decisório para formulação da tese ju-
rídica para os órgãos de cúpula e para os tribunais superiores. Os litigantes habi-
tuais têm um acesso facilitado a essas instâncias, até pelo fato de poderem contar
com advogados atuantes nas capitais e em Brasília, os quais, muitas vezes, são
figuras conhecidas dos julgadores das instâncias superiores, por despacharam e
sustentarem oralmente, com frequência, em assuntos similares. É natural que haja
laços de informalidade que facilitem o acesso desses atores e de seus representan-

149 GALANTER, Marc, 2014, op. cit. (trad.), p. 26.

55
Maria Cecília de Araujo Asperti

tes legais aos agentes responsáveis pela tramitação e pela tomada de decisão, o
que, sem dúvida, representa uma vantagen estratégica a ser considerada.
Ainda sobre vantagens estratégicas, desssa vez relacionadas com o poder de
barganha do litigante repetitivo e de sua capacidade de adotar estratégias que
impliquem em perdas imediatas, porém em ganhos de longo prazo, Galanter
assinala que:

4. “O JH precisa estabelecer e manter sua credibilidade como um


combatente. O interesse que possui em sua “reputação de ne-
gociador” serve como um recurso para estabelecer “compromis-
sos” a respeito de suas posições. Sem uma reputação desse tipo
a manter, o PE tem mais dificuldade em se envolver de maneira
convincente na negociação.
5. JHs podem jogar com as probabilidades. Quanto mais o caso em
questão vai sendo revelado para o PE, mais provavelmente ele
irá adotar uma estratégia “minimax” (minimizar a probabilidade
de perda máxima). Uma vez que a aposta é relativamente menor
para os JHs, eles podem adotar estratégias calculadas para ma-
ximizar o ganho relacionado a uma longa série de casos, mesmo
quando isso envolve o risco de perda máxima em alguns deles” 150.

Convém relacionar essas vantagens com o notório incentivo dado à conci-


liação no Brasil, em casos repetitivos, por meio de mutirões e encaminhamento
obrigatório e massificado de processos para centros e setores de conciliação151.
É comum que os litigantes repetitivos realizem parcerias com o Judiciário para
realização dessas iniciativas, conseguindo influir na escolha de casos que serão
encaminhados aos mutirões. Como conseguem identificar estrategicamente os
casos em que possuem menores chances de êxito, os litigantes repetitivos po-
dem optar por negociar acordos nesses casos, prevenindo, inclusive, a formação
de precedentes desfavoráveis.
Os litigantes ocasionais, por seu turno, são estimulados a fazerem acordos
sem que possuam as mesmas informações sobre suas chances de êxito, o que

150 GALANTER, Marc, 2014, op. cit. (trad.), p. 27.


151 ASPERTI, Maria Cecilia de Araujo, 2014, op. cit., p. 82-87.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

os leva a adotar estratégias mini-max, preferindo um acordo para recebimento


imediato de parte de sua demanda a aguardar por uma sentença judicial152.
Ainda sobre a estratégia mini-max, é importante relembrar um fator já men-
cionado quando da discussão das causas que levaram a um aumento no volume
de processos ingressados no Judiciário e, em especial, dos casos repetitivos153,
que é o grande número de advogados e de bacharéis em Direito no Brasil. Em
2017, tal número já havia ultrapassado a marca de um milhão de advogados
inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil. Esse excesso de oferta de serviços
jurídicos não se traduz, necessariamente, em um maior acesso à justiça para “os
que não tem”, mas, certamente, implica em um barateamento de serviços massi-
ficados, para os quais a qualidade técnica é menos importante do que o controle
e a gestão de processos, o que é facilitado pelo uso de tecnologias em escritórios
de advocacia especializados em contencioso de massa154.
Essa redução dos custos dos serviços legais também é mais um fator de in-
centivo para adoção de estratégias de ganhos de longo prazo, como especulado
por Galanter:

1. “JHs podem disputar tanto regras quanto ganhos imediatos.


Para eles vale a pena, antes de tudo, despender recursos a fim
de influenciar a elaboração das regras relevantes por meio de

152 Esse é o caso típico dos acordos firmados pelo INSS na Justiça Federal e nos Juizados Especiais.
Identificando a probabilidade de perda, seja pela procedência da tese jurídica invocada, seja pelo
resultado da perícia realizada judicialmente, o INSS costuma oferecer propostas de acordos para
ativamento do benefício e recebimento de parte dos atrasados (em geral, 80%), o que implica em uma
renúncia de direitos por parte do segurado, com ganhos de longo prazo para a autarquia.
153 Vide Capítulo 1, item 1.3.
154 Veja, nesse sentido, o relato sobre a forma de trabalho no escritório JBM Advogados, apelidado pela mídia
de “salsicharia do direito”, em que 420 advogados cuidavam de 360 mil processos em 2016, contando
com um aparato tecnológico de ponta para elaboração de peças processuais e gestão de processos:
“Além disso, de acordo com o tipo de matéria que o processo discute, existe o robô que foi apelidado de
“clicador”. Ele é usado para casos repetitivos, em que a defesa costuma ser muito semelhante. Imagine
um caso clássico de pedido de indenização de um cliente que ficou mais de 30 minutos na fila de um
banco. Substituindo o ‘copia e cola’ das petições, ao identificar o cadastro (feito por outro robô), o
programa já monta uma defesa, preenchendo espaços com os dados daquele processo específico, com
os argumentos de defesa que o escritório usa. Cabe ao advogado simplesmente clicar nos trechos que
serão aproveitadas na peça em questão e dar o ‘ok’, gerando uma assinatura e enviando a peça ao sistema”
(CARDOSO, Maurício; VASCONCELLOS, Marcos de. “Com robôs, escritório atua em mais de
360 mil processos com 420 advogados”. Conjur. 5 mar. 2016. Disponível em https://www.conjur.com.
br/2016-mar-05/robos-escritorio-atua-360-mil-processos-420-advogados, acesso em 10 out. 2017)

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Maria Cecília de Araujo Asperti

métodos tais como o lobby (e a expertise que acumulam lhes


permite fazê-lo persuasivamente).
2. JHs também podem disputar as regras da própria litigância, ao
passo que é improvável que um PE o faça. Isto é, existe uma dife-
rença em relação ao que eles consideram como resultado favorá-
vel. Dado que sua aposta no resultado imediato é alta e que por
definição um PE é despreocupado com o resultado de semelhante
litígio no futuro, ele terá pouco interesse naquele elemento do re-
sultado que pode influenciar a disposição do julgador da próxima
vez. Para o JH, por outro lado, qualquer coisa que favoravelmente
influencie os resultados de casos futuros vale a pena (...)155.
Em virtude de sua experiência e expertise, JHs têm maior capa-
cidade de discernir quais regras têm maior chance de “penetrar”
e quais tendem a permanecer como meros compromissos simbó-
licos. JHs podem ser capazes de concentrar seus recursos em mu-
danças de regras que prometem produzir uma diferença real. Eles
podem compensar derrotas simbólicas com ganhos tangíveis.
Dado que a penetração depende em alguma medida dos recursos
das partes (conhecimento, atenção, serviços especializados, di-
nheiro), JHs têm mais condições de investir recursos necessários
para assegurar a penetração das normas favoráveis a eles” 156.

Ainda na análise das vantagens estratégicas que possibilitam ganhos a longo


prazo, Galanter trata aqui da capacidade dos litigantes repetitivos de envidar
esforços e recursos para mudanças de leis e de precedentes em seu favor, ainda
que isso implique em perdas em casos individuais.
Como já discutido, isso pode ocorrer com a realização de acordos em casos
individuais ou, ainda, com a desistência de recursos, evitando-se que determi-
nada matéria seja apreciada pelos tribunais superiores diante de uma tendência
jurisprudencial desfavorável.

155 GALANTER, Marc, 2014, op. cit. (trad.), p. 27.


156 GALANTER, Marc, 2014, op. cit. (trad.), p. 30.

58
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Essas vantagens se relacionam entre si, obviamente, pois se pode pensar


que a capacidade de influir na elaboração e penetração de normas (materiais e
processuais) também ocorre pela proximidade desses atores com os agentes do
Judiciário e com a expertise acumulada acerca da matéria.
Acresça-se o fato de que, no Brasil, juristas que influenciam os debates le-
gislativos são, frequentemente, advogados ou pareceristas contratados pelos liti-
gantes repetitivos. Tendo o parecer jurídico grande força em nossa cultura jurí-
dica, ainda muito calcada no argumento de autoridade, é necessário considerar
também a possibilidade de se influir na formação de teses jurídicas favoráveis
por meio da contratação desses especialistas, em especial no julgamento de ca-
sos repetitivos de grandes repercussões.
Para além das vantagens decorrentes da recorrência com que determinados
atores acessam o Judiciário, Galanter também discute a influência de (i) advo-
gados; (ii) das regras e (iii) das instituições na configuração da litigância entre
litigantes ocasionais e repetitivos.
Com relação aos advogados, ele afirma que é possível presumir que litigantes
repetitivos podem custear serviços jurídicos de forma mais frequente, em maio-
res quantidades e em escala, de modo a obter um serviço de melhor qualidade.
Eles teriam não somente o acesso aos advogados mais talentosos, mas também
a um serviço contínuo por parte destes, com a possibilidade de se manter regis-
tros de informações e dados que viabilizariam uma atuação preventiva também
mais eficiente157. Galanter conjectura que quanto mais estreita e continuada é
a relação entre advogado e cliente, maior a lealdade do advogado para com seu
constituinte, e menor com os órgãos de classe ou mesmo com o Judiciário. Ha-
veria, ainda, mais incentivos para especialização do advogado, que pode se dar
em razão da área do direito (ex.: propriedade intelectual, direito concorrencial,
contencioso regulatório), do tipo de parte que representa (ex.: empresas de tele-
fonia, bancos, empresas de tecnologia) e em ambos (ex.: propriedade intelectual
em empresas de tecnologia, contencioso regulatório para empresas de telefonia,
cobrança de dívidas para bancos)158.
De outra parte, a especialização na advocacia que atende litigantes ocasio-
nais seria mais difícil ou menos provável, dado que, por manterem um relacio-
namento mais pontual com seus clientes, teriam menos incentivos para realizar

157 GALANTER, Marc, 1974, op. cit., p. 114.


158 GALANTER, Marc, 1974, op. cit. p. 115.

59
Maria Cecília de Araujo Asperti

um aprofundamento verticalizado de sua atuação. Para o autor, esses advogados


seriam oriundos de escalões profissionais menos favorecidos, bacharéis de ins-
tituições de ensino menos prestigiosas, com maiores dificuldades de captar a
clientela, inclusive em razão de barreiras impostas pelos órgãos de classe. Esses
fatores resultariam em possibilidades mais restritas de desenvolvimento de uma
atuação mais mobilizadora, criativa e estratégica por parte desses advogados.
Comentando-se as vantagens atinentes à estrutura das partes, já foram le-
vantadas questões específicas relacionadas às particularidades da prestação de
serviços jurídicos no Brasil na atualidade, tais como o acesso e uso de tecnolo-
gia, o baixo custo dos serviços de massa e o acesso a advogados especializados,
inclusive de juristas atuantes na academia jurídica, cuja opinião (parecer) pos-
sui grande repercussão perante o Judiciário.
É oportuno acrescentar uma consideração própria da advocacia dos litigan-
tes ocasionais no Brasil: a existência da Defensoria Pública, enquanto institui-
ção do sistema de justiça, voltada para a prestação de assistência jurídica aos
hipossuficientes e vulneráveis.
A Defensoria Pública é capaz, ao menos em tese, de atuar como um ator
repetitivo, ou de aproveitar algumas das vantagens associadas à recorrência da
litigância, tais como a acumulação de informações e de expertise e a possibi-
lidade de estabelecimento de relações informais com agentes das instituições
com as quais interage (Judiciário, delegacias, Ministério Público).
Pensando nas vantagens mencionadas por Galanter, especificamente rela-
cionadas com o acesso a serviços jurídicos, a Defensoria Pública pode promo-
ver certo grau de especialização de sua atuação, como, de fato, faz por meio
da criação de núcleos especializados em áreas (ex.: direitos humanos, habita-
ção, consumidor) ou usuários específicos (ex.: mulheres, idosos, pessoas com
deficiência)159. Na Defensoria Pública do Estado de São Paulo, por exemplo, a
Lei Estadual Complementar nº 988/2006 trata dos núcleos especializados em
seus artigos 52 a 55, estabelecendo seu caráter permanente e sua função de pres-
tar “suporte e auxílio no desempenho da atividade funcional dos membros da

159 Na Defensoria Pública de São Paulo, os núcleos atuam nas seguintes especialidades: As áreas
previstas de atuação são (i) interesses difusos e coletivos; (ii) cidadania e direitos humanos; (iii)
infância e juventude; (iv) consumidor e meio ambiente; (v) habitação e urbanismo; (vi) situação
carcerária; (vii) segunda instância e Tribunais Superiores, conforme artigo 52, Parágrafo Único, da
Lei Estadual Complementar nº 988/2006. Vide relação de núcleos especializados conforme áreas e
usuários, conforme descrito, em </www.defensoria.sp.def.br>, acesso em 10 out. 2017.

60
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

instituição”. A vocação para uma atuação mais estratégica dos núcleos decorre,
ainda, de suas atribuições previstas na referida lei, dentre estas, a compilação
de informações técnico-jurídicas (ainda que sem caráter vinculativo) e a arti-
culação entre membros da instituição e outros entes para elaboração e unifor-
mização de teses jurídicas institucionais e a propositura (isoladamente ou em
conjunto com outros membros) de medidas judiciais e extrajudiciais para tutela
de direitos coletivos, bem como a atuação perante o Sistema Interamericano
dos Direitos Humanos e demais Cortes Internacionais.
Isso permite que a Defensoria Pública consiga atuar de modo mais eficiente
tanto nos litígios individuais repetitivos, quanto por meio do uso de práticas
associadas ao litígio estratégico de interesse público160, especialmente nas ações
coletivas manejadas pela instituição161. A advocacia issue-oriented ou policy-
-oriented, própria do litígio estratégico de interesse público, pressupõe que o
objetivo maior pode ser a mobilização social e política em torno do tema, e não
necessariamente o ganho do caso individual162. Ou seja, tal como a advocacia
do litigante repetitivo, o litígio estratégico pode se ocupar com a mudança das
regras e do direito mais do que com os ganhos e perdas individuais.
No entanto, é necessário questionar se a defesa de interesses pela Defensoria
Pública é realmente capaz de alçar os litigantes ocasionais ao status de litigantes
repetitivos, usufruindo das vantagens estratégicas por estes aproveitadas.

160 Sobre o conceito de litígio estratégico de interesse público, ainda que focado no sistema internacional
de direitos humanos, confira-se o artigo de Evorah Cardoso, entitulado “Ciclo de vida do Litígio
Estratégico no Sistema Interamericano de Direitos Humanos: dificuldades e oportunidades para
atores não estatais” (Revista Electrónica del Instituto de Investigaciones Ambrosio L. Gioja. Año V.
Número Especial, 2011, p. 363-378). A autora explica que o litígio estratégico se contrapõe à forma
tradicional de advocacia, na medida em que adota uma abordagem issue-oriented ou policy-oriented (e
não client-oriented), em que se “busca o impacto social que o caso pode trazer, como o avanço jurídico
em um determinado tema” (op. cit., p. 366). Essa atuação issue-oriented demanda a escolha prelminar
de um caso paradigmático, realizada a partir de uma análise de seu potencial de impacto social e dos
temas que sejam prioritários para a entidade para que, a partir de então, sejam utilizadas “técnicas
legais, políticas e sociais” que têm como destinatários não somente os agentes do Judiciário, mas
também “os tomadores de decisão (decision makers), os formuladores de políticas públicas (policy
makers) e a sociedade em geral” (op. cit., p. 367).
161 Para uma descrição das ações coletivas manejadas pelas defensorias públicas estaduais em temas
considerados socialmente relevantes, vide o II Relatório Nacional de Atuações Coletivas da
Defensoria Pública, organizado por Adriana Britto e publicado pela Associação Nacional de
Defensores Públicos (ANADEP) em 2015. Disponível em https://www.anadep.org.br/wtksite/
Preview_Livro_Defensoria_II_Relat_rio(1).pdf, acesso em 11 out. 2017.
162 CARDOSO, Evorah, 2011, op. cit., p. 368.

61
Maria Cecília de Araujo Asperti

Ainda que a Defensoria Pública seja capaz de atuar estrategicamente e de


modo mais especializado do que a advocacia comumente dedicada ao aten-
dimento de litigantes ocasionais, tem-se que as demais vantagens inerentes à
estrutura da própria parte não são alteradas quando esta é representada, indivi-
dualmente, pela Defensoria Pública. Isso porque o indivíduo continua tendo um
maior risco individual na demanda e menor poder de barganha, o que significa
que ele não será capaz de “jogar pelas regras” (“play for the rules”).
Ademais, diferentemente de uma entidade não governamental ou de um
núcleo de prática jurídica universitário, que pode direcionar seus esforços em
um único caso, levantando informações, realizando o lobby legislativo e mobi-
lização da opinião pública e dos atores políticos em torno do tema, e correndo
o risco de perda no caso individual, a advocacia individual da Defensoria
Pública é fundamentalmente client-oriented. A atuação estratégica em temá-
ticas socialmente relevantes – como frequentemente ocorre no julgamento de
casos repetitivos – é mais factível no âmbito coletivo, na qualidade de legiti-
mado extraordinário. É de se esperar que os recursos humanos da Defensoria
Pública sejam majoritariamente destinados ao atendimento individual, cuja
demanda é sabidamente grande e crescente, de modo que a atuação estraté-
gica e coletiva, porquanto relevante em termos de impacto social, tem de ser
relegada a um segundo plano.
Outra diferença relevante a ser apontada é a de que, enquanto o litigante
repetitivo pode direcionar a atuação estratégica de seus advogados, a definição
dos temas socialmente relevantes a justificar o manejo de práticas próprias do
litígio estratégico ou mobilização de recursos humanos é feita pela própria De-
fensoria Pública, e não pelos litigantes ocasionais que buscam os seus serviços.
As demandas sociais podem ser trazidas pela via dos atendimentos individuais,
mas é a instituição, e não os seus usuários, que têm a prerrogativa de escolher
em que casos e sobre quais temas irá atuar estrategicamente e em quais irá pres-
tar um serviço jurídico tradicional.
Para além de vantagens decorrentes do acesso e da qualidade dos serviços
jurídicos à disposição dos litigantes repetitivos, Galanter argumenta que as van-
tagens estratégicas dos litigantes repetitivos podem ser intensificadas em razão
de duas características essenciais das instituições do sistema de justiça: sua pas-
sividade e seu congestionamento163.

163 GALANTER, Marc, 1974, op. cit., p. 120-122.

62
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Por conta da passividade das cortes – traduzida no Brasil pelo princípio da


inércia da jurisdição, pelo princípio dispositivo e pelo impulso oficial do proce-
dimento164 –, a parte com mais informações e recursos terá mais condições de
provocar a jurisdição, decidindo quais temas e teses serão discutidos e a partir
de quais molduras jurídicas. Não somente isso, mas também no que diz respeito
à produção de provas e formação da convicção do julgador, cuja postura é es-
sencialmente reativa aos elementos trazidos nos autos. Nessas condições, aque-
les “que têm” provavelmente terão maiores condições de “pautar” o Judiciário
e de atuar de modo mais eficiente e estratégico pela via do processo judicial.
Essas vantagens são ainda mais expressivas em um Judiciário conges-
tionado (Galanter fala em um “congestionamento crônico”165), o que gera
maiores pressões para o litigante ocasional aceitar acordos em busca de uma
solução mais expedida, na medida em que o litigante de grande porte sofre
menos com a demora do processo e consegue usar o tempo como fator de
barganha em sua negociação166.

164 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido
Rangel. Teoria Geral do Processo. 30ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 83-85, 152-154, 389-392.
165 GALANTER, Marc, 1974, op. cit., p. 119-122.
166 Em artigo de fundamental importância para o estudo de meios consensuais de solução de disputas e
sobre o papel da adjudicação estatal, Owen Fiss traz um contundente argumento contra a promoção
do acordo pelo Judiciário baseado, justamente, na disparidade de recursos entre as partes e no ônus
do tempo do processo, mais gravoso para a parte mais pobre do que para a parte com mais recursos:
“A disparidade de recursos entre as partes pode influenciar o acordo de três formas. Primeiro, a
parte mais pobre pode ser menos passível de reunir e analisar as informações necessárias à previsão
da decisão do litígio, o que a deixaria em desvantagem no processo de negociação. Segundo, pode
necessitar, de imediato, da indenização que pleiteia e, desse modo, ser induzida à celebração de um
acordo como forma de acelerar o pagamento, mesmo ciente de que receberá um valor inferior ao
que conseguiria se tivesse aguardado o julgamento. Todos os autores de ações judiciais querem suas
indenizações imediatamente, mas um autor muito pobre pode ser explorado por um réu rico, pois sua
necessidade é tão grande que o réu pode compeli-lo a aceitar uma quantia inferior àquela a que tem
direito. Terceiro, a parte mais pobre pode ser forçada a celebrar um acordo em razão de não possuir
os recursos necessários para o financiamento do processo judicial, o que inclui tanto as despesas
previstas como, por exemplo, honorários advocatícios, quanto aquelas que podem ser impostas por
seu oponente por meio da manipulação de mecanismos processuais, como o da instrução probatória.
Aparentemente, o acordo beneficia o autor da ação, permitindo-lhe evitar os custos do processo
judicial, mas isso não é verdade. O réu pode calcular as despesas que o autor teria se o caso tivesse
ido a julgamento e diminuir sua proposta no valor dessa quantia. O autor muito pobre é uma vítima
dos custos do processo, mesmo quando aceita fazer o acordo” (“Contra o Acordo”. Direito como Razão
Pública: processo, jurisdição e sociedade. Coord. trad. Carlos Alberto de Salles. Trad. Daniel Porto
Godinho; Melina de Medeiros Rós. Maria Cecilia de Araujo Asperti. 2ª Ed. revista e atualizada. São
Paulo: Juruá, 2017, p. 143-150, p.135-136).

63
Maria Cecília de Araujo Asperti

Além disso, Galanter afirma que a morosidade do processo decorrente desse


congestionamento beneficia aqueles que negligenciam ou violam sistematica-
mente as regras, sendo-lhes possível protelar responsabilizações, “rolar dívidas”
e manter práticas que, embora legalmente e jurisprudencialmente condenáveis,
geram maiores ganhos para o ente violador do que as perdas decorrentes das
ações judiciais ajuizadas pelos lesados pela prática ou omissão.
Por outro lado, um sistema judicial ineficiente e moroso tende a ser alvo de
pressões de seus usuários para melhor alocação de recursos no aprimoramento
da máquina judiciária. Atores de grande porte e de maior influência tendem a
ter um acesso mais facilitado aos órgãos de cúpula do sistema de justiça, sendo
capazes de utilizar seus recursos para pressionar por políticas judiciárias que
favoreçam a tramitação de processos cujo julgamento seja de seu interesse, em
detrimento de outros protagonizados por litigantes ocasionais.
Finalmente, Galanter discute as prerrogativas que decorrem do próprio
conteúdo das normas jurídicas, que, a seu ver, também tenderiam a benefi-
ciar interesses mais antigos e culturalmente dominantes167. O autor também
questiona se, mesmo quando as regras beneficiam aqueles “que não têm”, estes
terão menos recursos para direcionar para efetivação dessas regras, inclusive
judicialmente. Tais regras são complexas o suficiente para que aqueles que pos-
suem mais recursos consigam investir em estratégias para conformação de uma
interpretação que lhes seja favorável.
Algumas observações podem ser feitas quanto à influência das instituições
e das regras sobre as vantagens dos litigantes repetitivos no cenário brasileiro.
Quanto à passividade e congestionamento das instituições judiciárias, trata-
-se de fator de suma relevância no nosso contexto atual. Os conhecidos índices
de congestionamento do Judiciário brasileiro apontam para um cenário bas-
tante coerente com o “congestionamento crônico” descrito por Galanter168. O

167 GALANTER, Marc, 19874, op. cit., p. 123-124.


168 O Relatório Justiça em Números, do CNJ, mensura a taxa de congestionamento dos tribunais, ano
a ano, como “o percentual de processos que ficaram represados, sem solução, comparativamente ao
total tramitado no período de um ano” de modo que “quanto maior o índice, maior a dificuldade do
tribunal em lidar com seu estoque de processos” (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2016,
op. cit., p. 76). A partir de uma série histórica trazida no relatório desde 2009 até 2016, verifica-
se que a taxa de congestionamento média dos tribunais sofreu pequena variação, permanecendo
sempre entre 70% e 73% (op. cit., p. 77), mesmo com todas as reformas institucionais e processuais
realizadas com o objetivo de reduzir a morosidade e promover a maior eficiência do Judiciário,
conforme analisado no Capítulo 1.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

fator “tempo” mostra-se de suma importância, principalmente nas ações em


que litigantes ocasionais são autores e que postulam, portanto, pela efetivação
de regras a seu favor.
Sobre a possibilidade de o litigante repetitivo exercer maior influência em
instituições passivas e congestionadas, há um interessante exemplo no caso bra-
sileiro que merece ser mencionado. Desde 2014, o Ministério da Justiça instituiu
a chamada “Estratégia Nacional de Não Judicialização” (ENAJUD), formali-
zada pela Portaria Interinstitucional nº 1.186, de 02.07.2014, e assinada pelo
Ministro da Justiça, pelo Ministro da Advocacia-Geral da União, pelo Ministro
da Previdência Social e pelo Presidente do Conselho Nacional do Ministério
Público. Essa iniciativa tinha por objetivo fomentar a articulação entre diversos
atores públicos e privados para “desenvolver, consolidar e difundir os métodos
autocompositivos de solução de conflitos, promover a prevenção e a redução
dos litígios judicializados, contribuir para a ampliação do acesso à justiça e para
a celeridade e a efetividade dos direitos e das garantias fundamentais” (artigo 1º
da Portaria nº 1.186/2014).
A análise das informações acerca das reuniões e tratativas realizadas ao lon-
go dos últimos anos demonstra o claro protagonismo dos grandes litigantes,
especialmente das instituições financeiras, empresas de telefonia e de varejo169,
que pautaram a elaboração de metas e de planos para a estratégia a partir de
seus próprios diagnósticos sobre as causas da litigiosidade e da morosidade da
justiça170. É sintomático, por exemplo, o uso dos termos “advogados captadores”
e os “litigantes profissionais” na definição de metas para se referir aos advogados
que atuam, de forma sistemática, em favor de consumidores que reclamam ou
litigam reiteradamente contra esses entes171.
Outro ponto relevante é a complexidade das regras, fator esse que beneficia
aqueles que podem articular recursos para obtenção de entendimentos jurispru-

169 “Setores público e privado discutem Estratégias de Não Judicialização de conflitos”. Site do Ministério
da Justiça e Segurança Pública. 7 dez. 2016. Disponível em <http://www.justica.gov.br/noticias/
lancamento-da-estrategia-de-nao-judicializacao-de-conflitos-reune-setores-publico-e-privado>,
acesso em 11 out. 2017. “Setor do Varejo discute metas para diminuir processos na Justiça”. Site
do Ministério da Justiça e Segurança Pública. 1 jul. 2015. Disponível em http://www.justica.gov.br/
noticias/setor-do-varejo-discute-metas-para-diminuir-processos-na-justica, acesso em 11 out. 2017.
170 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Estratégia nacional de não judicialização: 1º Relatório 2014-2015.
Brasília: Secretaria e Reforma do Judiciário, 2016.
171 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2016, op. cit., p. 15-17.

65
Maria Cecília de Araujo Asperti

denciais mais favoráveis. Especialmente no âmbito da litigiosidade repetitiva


no Brasil, há uma considerável margem interpretativa no que diz respeito aos
direitos constitucionais judicializados (individuais, sociais e coletivos), além de
um complexo “cipoal normativo” de leis e normas infralegais cuja interpreta-
ção e divergências na aplicação por agentes públicos e privados frequentemente
acarretam a formulação de teses jurídicas diversas, que acabam fomentando
o manejo de demandas judiciais172. Sob esse ponto de vista, os litigantes com
mais recursos têm melhores condições de “navegar” esse sistema complexo de
normas e de envidar esforços para a consolidação de interpretações por parte
dos agentes públicos e julgadores que lhes sejam mais favoráveis.
A partir das considerações de Galanter sobre as diversas vantagens dos li-
tigantes repetitivos sobre os ocasionais e reflexões aqui propostas para leitura
dessas especulações no cenário atual brasileiro, propõe-se uma versão própria
de uma das figuras do texto original que sistematiza os pontos problematizados,
contendo também uma breve síntese das ponderações aqui discutidas:
Tabela 1 – Vantagens usufruídas por litigantes habituais de acordo com
Marc Galanter e a partir das particularidades do contexto brasileiro

Elemento Vantagens Usufruídas por Particularidades do contexto


brasileiro atual
PARTES • Capacidade para es- • Jogador habitual • Avanços tecnológicos e
truturar transações (grande, profissional) sua utilização no conten-
• Expertise, especiali- cioso de massa empresarial
zação, economia de • Grande número de ad-
escala vogados e de bacharéis e
• Estratégia a longo baixo custo dos serviços
prazo jurídicos de massa e gran-
• Capacidade para de número de advogados
disputar as regras • Incentivos institucionais
• Reputação de nego- para promoção do acordo
ciador pelo Judiciário
• Capacidade para • Força do parecer jurídico e
investir em pene- atuação prática de juristas
tração em defesa de interesses de
litigantes repetitivos

172 O termo cipoal normativo é bastante expressivo quando tratamos de serviços públicos, beneficíos
assistenciais e mercados regulados, em que divergências entre a regulamentação administrativa
e a interpretação judicial da lei ou da Constituição Federal dão margem a longas discussões
jurisprudenciais e ao aumento da litigiosidade repetitiva. Vide CUNHA, Luciana Gross; GABBAY,
Daniela Monteiro, 2012, op. cit., p. 53-103, p. 66.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

SERVIÇOS • Prática, especializa- • Organizados, profis- • Baixo custo da advocacia


JURÍDICOS ção, continuidade sionais, ricos de massa empresarial
• Acesso a tecnologias, es-
pecialmente à inteligência
artificial e a sistemas de
jurimetria
• Acesso a advogados juris-
tas, atuantes na academia
do Direito, cuja opinião
jurídica é altamente res-
peitada pelos julgadores.
• Atuação da Defensoria
Pública
I N S T I T U I - • Passividade • Ricos, experientes, • Princípio dispositivo,
ÇÕES • Aparatos institu- organizados; princípio da inércia da
cionais • Proprietários, pos- jurisdição e impulso oficial
• Barreiras de custo e suidores do procedimento
atraso • Beneficiários de • Altos e constantes índices
• Prioridades favo- regras existentes; de morosidade (congestio-
ráveis • Organizados, atentos. namento crônico)
• Proximidade dos grandes
litigantes do sistema de
justiça
REGRAS • Regras favoráveis • Mais antigos, cul- • Complexidade normativa
• Barreiras do devido turalmente domi- (“cipoal normativo”) legal
processo nantes; e infralegal
• Proprietários, pos-
suidores

Fonte: Elaboração própria, adaptando-se a “tabela 3” do texto “Why the Haves Come Out
Ahead?: Speculations on the Limits of Legal Change” (“Por que quem tem tende a sair na frente”)
com as particularidades do contexto brasileiro atual173
Discutidas as vantagens conjecturadas por Galanter, é importante ressaltar
que, como ele próprio admite, a tipologia proposta e aqui adotada é uma simpli-
ficação que compreende nesses “tipos ideais” litigantes que se inserem ao longo
de um espectro, com suas respectivas particularidades.
Pode se questionar, por exemplo, se é adequado conceber o Ministério Pú-
blico como um litigante capaz de atuar de forma coordenada em casos simila-
res, em razão da independência funcional de seus membros (artigo 127, §2º, da
Constituição Federal), o que permite que as promotorias adotem estratégias

173 GALANTER, Marc, 2014, op. cit. (trad.), p. 52.

67
Maria Cecília de Araujo Asperti

sem que haja, necessariamente, uma centralização ou uma atuação coordena-


da174. Do mesmo modo, é possível também problematizar se o Poder Público
pode ser considerado um litigante repetitivo, dado que, em tese, não persegue
maximização de benefícios econômicos (estratégia minimax), mas a realização
do interesse público.
De todo modo, todos esses entes possuem a capacidade potencial de aferir
vantagens estratégicas – se não todas as aqui discutidas, a sua maioria, e de
forma significativa – em virtude de seu porte, recursos e da recorrência com
que litigam em casos similares175. Podem (como de fato muitas vezes o fazem)
estruturar promotorias ou coordenadorias especializadas por matéria, ou núcle-
os voltados para uma atuação mais estratégica em determinados temas, além
de terem membros qualificados e com uma atuação direcionada para os fins
institucionais. Com isso, conseguem antecipar a litigância e se estruturar para
atuar de modo mais responsivo e até mesmo proativo, com ações direcionadas
em todos os graus de jurisdição. Finalmente, conseguem manter relações muito
próximas, formais e informais, com outras instituições do sistema de justiça (em
especial com o Judiciário) e seus membros.
Tem-se, portanto, que os principais usuários do sistema (aqueles que pos-
suem uma maior “fatia” do acesso) são pessoas jurídicas de porte e recursos
significativos que conseguem, ao menos em tese, usufruir de vantagens no pro-
cesso judicial em razão desses recursos e da recorrência com que atuam em ca-
sos similares. De outro lado, há os usuários ocasionais (com uma menor “fatia”
do acesso), com menos recursos e que, em muitos casos, litigam contra esses
litigantes repetitivos. É nítida, portanto, a má distribuição do acesso à justiça,
que é usufruído, majoritariamente, por “aqueles que têm”.

174 Nesse sentido, Dicken William Lemes Silva comenta que o engajamento do Ministério Público em
uma atuação estratégica em conflitos de interesse público exige uma resignificação do princípio da
independência funcional, que deve ser entendido como um princípio instrumental e relativo que
deve coexistir com demais princípios de observância obrigatória para o Ministério Público, como
os princípios da unidade e da indivisibilidade da instituição, de forma a se viabilizar a realização
das atividades necessárias para concretização de seu “poder/dever irrenunciável direcionado à
transformação da realidade social, no contexto da concretização dos valores do Estado Democrático
de Direito” (“Litígio Estratégico de Interesse Público e Ministério Público: Reflexões sobre a
Natureza Instrumental da Independência Funcional”. Revista do Ministério Público do Distrito Federal
e Territórios. N. 7. Brasília: MPF, 2013, p. 73-108, 2013).
175 Analogamente, Marc Galanter menciona o public prosecutor como um típico exemplo de litigante
repetitivo, juntamente com seguradoras e instituições financeiras (1974, op. cit., p. 97).

68
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Por se propor a compreender apenas os atores que litigam (os litigantes), a


tipologia de Galanter não se ocupa dos atores que se encontram à margem do
sistema, os ausentes, como afirma Boaventura de Sousa Santos, representam a
procura suprimida ou potencial de cidadãos que podem ter a consciência de
seus direitos, mas não buscam o Judiciário quando sofrem violações176.
Processualmente, esses ausentes podem ser considerados terceiros177 que são
afetados direta ou indiretamente pelas repercussões da decisão judicial. Esses
terceiros podem (ou poderiam) litigar, futuramente, em casos similares, que
terão seu desfecho impactado pela aplicação de uma tese jurídica formada em
julgamento de casos repetitivos. Podem, ainda, ser indivíduos que sequer teriam
recursos e possibilidades de arcar com os custos e demandas judiciais, porém
que sofrerão os impactos das posturas institucionais e mercadológicas adotadas
a partir do entendimento judicial acerca das matérias discutidas em juízo.
Ao adotar-se a perspectiva metodológica do acesso à justiça, é coerente
problematizar não só o acesso à justiça dos litigantes que atuam no sistema, mas
também desses ausentes, questionando se há vias de participação, ainda que
indireta, para que seus interesses repercutam em julgamentos que, de alguma
forma, os atingirão. Em uma realidade em que instrumentos processuais pen-
sados para propiciar a formulação de teses jurídicas que orientem a atuação de
magistrados, dos litigantes e até mesmo de agências reguladoras178, essa discus-
são parece ganhar crescente relevância.

Síntese conclusiva da Parte I


Concluindo a Parte I do presente trabalho, que objetivou discutir a noção de
acesso à justiça e sua relação com o processo civil na atualidade, é possível de-

176 SANTOS, Boaventura de Souza, 2015, op. cit., p. 37.


177 No sentido de não serem parte da relação processual, ou do contraditório instituído perante o juiz,
conforme DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. Vol. II, 7ª Edição.
São Paulo: Malheiros, 2017, p. 287.
178 Conforme prevê o artigo 1.040, inciso IV, do CPC/2015, que trata do julgamento de recursos especiais
e extraordinários repetitivos, uma vez publicado o acórdão paradigma, “se os recursos versarem sobre
questão relativa à prestação de serviço público objeto de concessão, permissão ou autorização, o
resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para
fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada”

69
Maria Cecília de Araujo Asperti

limitar algumas ponderações que serão retomadas nos capítulos seguintes para
desenvolvimento do objeto de pesquisa proposto:

1. A noção de acesso à justiça se fez presente na agenda de pesquisas


e discursos legislativos no Brasil, especialmente a partir dos anos
1970, e informou mudanças institucionais e legislativas relevantes
que partiam de uma concepção de um papel da justiça estatal de
efetivar direitos individuais e sociais.
1.1. Essas mudanças, juntamente com outros fatores econômicos, políticos
e jurídicos, levaram não só a uma crescente demanda por acesso, mas também
a um uso mais intenso das instâncias judiciárias por certos entes públicos e
pessoas jurídicas de direito privado, seja na posição de autores, seja na de réus,
hoje reconhecidos como os grandes litigantes do Judiciário;
1.2. Diagnósticos dsse aumento de litigiosidade passaram a informar uma
agenda de pesquisa calcada em uma visão de que o Judiciário deve ser respon-
sivo às demandas do mercado e do crescimento econômico que, por sua vez,
influenciou decisivamente os discursos vencedores dos debates da Reforma do
Judiciário regulada pela Emenda Constitucional nº 45/2004. É nesse contexto
que o direito processual começa a se voltar ao julgamento de casos considerados
repetitivos, por meio de institutos como a Súmula Vinculante, a súmula impedi-
tiva de recursos, o julgamento liminar de mérito e o julgamento por amostragem
da repercussão geral e do recurso especial repetitivo.
1.3. Essa tendência do direito processual está presente também nos dis-
cursos que embasam o CPC/2015, nos quais, expressando uma concepção do
Judiciário enquanto prestador de serviço público, entendeu-se que o processo
deveria ser responsivo aos problemas de eficiência, inclusive o enfrentamento
da “problemática” dos processos repetitivos.

2. Essa mudança de importância e de significados da noção de acesso à


justiça leva ao questionamento sobre a sua relevância na atualidade.
2.1. Entende-se que o acesso à justiça deve ser compreendido tanto como
uma perspectiva metodológica quanto como um direito social a ser
assegurado mediante prestações positivas por parte do Estado.
2.2. A perspectiva metodológica do acesso à justiça propõe a priorização
de métodos empíricos e de análises comparativas que investiguem as

70
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

experiências de diferentes grupos e indivíduos no sistema de justiça


os impactos sociais da atuação de seus agentes e instituições, com o
propósito de problematizar o papel do direito na sociedade e a sua
capacidade de superar (e não reproduzir) desigualdades. Sem essa
perspectiva, reformas de direito processual correrão o risco de serem
embasadas em mera casuística ou pela simples prevalência de interes-
ses, sem o necessário embasamento em dados e análises produzidas a
partir do diálogo entre saberes e com o olhar voltado para a participa-
ção do cidadão e do usuário nas estruturas do sistema de justiça.
2.2.1. Como direito social, entende-se que os recursos para sua
efetivação são escassos e devem ser distribuídos por meio
de escolhas políticas, orientadas pela promoção da efetiva
participação de indivíduos e grupos no sistema para que es-
tes possam, idealmente, utilizar esse sistema para promover
as transformações sociais necessárias para superação das
desigualdades sociais, de raça, gênero, orientação sexual,
etc., persistentes em nossa sociedade.

3. Do ponto de vista do direito processual, a busca pela participação


efetiva no processo perpassa por compreender como diferentes ato-
res utilizam e influenciam a justiça que acessam.
3.1. Especula-se que diferentes atores possuam diferentes capacidades,
recursos e vantagens estratégicas ao utilizar o processo e o Judiciá-
rio. Utilizando a tipologia de Marc Galanter, é possível identificar,
também, no cenário de litigância brasileiro, a dicotomia entre liti-
gantes repetitivos e ocasionais, contextualizando as diferentes van-
tagens usufruídas por aqueles no “jogo da litigância”.
3.2. Em se discutindo acesso à justiça e técnicas de julgamento de ca-
sos repetitivos, é necessário refletir sobre aqueles que de algum
modo podem ser direta ou indiretamente impactados por decisões
proferidas em julgamentos dos quais não tiveram a possibilidade
de influir. A questão que se coloca é como os interesses desses au-
sentes são representados no julgamento de casos repetitivos, uma
das perguntas de pesquisa propostas pelo presente estudo.

71
Parte II
Participação e Representatividade
no Processo Civil

73
3. Participação e Representatividade
no Processo Civil

3.1. Participação no processo e acesso à justiça

3.1.1. Participação e distributividade no processo civil


Foram discutidos na primeira parte do presente trabalho os vários significa-
dos da noção de “acesso à justiça”, tanto como uma perspectiva metodológica
de estudo do direito (em especial do direito processual), quanto como direito
social, cuja realização depende de escolhas políticas orientadas pela promoção
da participação efetiva e paritária no sistema de justiça.
O relatório do Projeto Florença já tratava do acesso como direito e como
enfoque de estudo179. No entanto, o ideal de universalização e de realização
da justiça social do access-to-justice movement não levava em conta as esco-
lhas políticas que se fazem necessárias para efetivação desse direito, dado os
recursos escassos, as persistentes desigualdades e a dinamicidade das fronteiras
da injustiça. É a partir daí que se entende que a perspectiva metodológica do
acesso à justiça permanece relevante e atual, já que é necessária para conferir
embasamento não só teórico, mas também empírico às escolhas políticas de
distribuição do acesso e para permitir que a sociedade possa avaliar e cobrar
reformas legislativas e institucionais verdadeiramente distributivas.
Viu-se também que a perspectiva metodológica do acesso à justiça, enquanto
abordagem voltada para o usuário do sistema (sua experiência, comportamento
e resultados obtidos pela via da Justiça), deve se debruçar sobre a investigação
de como o sistema de justiça reproduz desigualdades de matizes diversas.
Ainda sob esse viés, o estudo do processo civil que adota essa perspectiva
deve buscar compreender como as desigualdades e as diferentes capacidades
estratégicas desses usuários influem nos resultados obtidos e na transformação
do próprio sistema. O porte dos diferentes atores que litigam judicialmente e a
recorrência com que acessam o Judiciário, a conformação das instituições (em

179 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant, 1978a, op. cit., p. 8-9.

75
Maria Cecília de Araujo Asperti

especial sua passividade e congestionamento) e as regras em si, tendem a favore-


cer aqueles que litigam com mais frequência em temas similares. Estes, por sua
vez, são, na maior parte dos casos, aqueles “que têm”. Aceitar esse argumento
como verdadeiro implica, então, em reconhecer que as desigualdades de recur-
sos podem, sim, ser reproduzidas pela dinâmica do processo judicial.
Seria possível pensar em técnicas ou em uma racionalidade processual capaz
de mitigar ou desestabilizar os impactos desse desequilíbrio de recursos e de
expertise entre os atores que acessam o Judiciário?
A pergunta de fundo de Galanter é justamente sobre essa potencialidade do pro-
cesso civil como instrumento de transformação social180. Examinando as diferentes
capacidades dos litigantes repetitivos e ocasionais, o autor conclui que mudanças
legislativas provavelmente terão pouco impacto em termos de se conferir maior re-
distributividade ao processo, dada a já discutida influência dos litigantes repetitivos
na conformação, interpretação e efetivação de normas que lhes sejam mais favorá-
veis. Seria necessário, segundo ele, buscar reformas também institucionais, na oferta
e qualidade dos serviços jurídicos181 e, em especial, na organização das partes, de
modo que estas sejam capazes de “gerar uma demanda efetiva para serviços jurídi-
cos de alto padrão – contínuos, especializados e orientados para o longo prazo – e
pressionar por reformas institucionais e regras favoráveis” 182. Ele enfatiza que as
mudanças de regras devem se voltar, portanto, à reorganização das posições estra-
tégicas das partes, para que litigantes ocasionais possam tambem exercer influência
sobre o sistema e o processo para utiliza-lo de modo efetivamente redistributivo:

180 “Eu gostaria de propor algumas conjecturas sobre o modo pelo qual a arquitetura básica do sistema
jurídico cria e limita as possibilidades de ele ser usado como um meio de transformação redistributiva (isto
é, sistemicamente equalizadora). Minha questão específica é a de saber sob quais condições a litigância
pode ser redistributiva, tomando litigância no sentido mais amplo de apresentação de demandas a serem
decididas pelos tribunais (ou órgãos equivalentes) e toda a penumbra de ameaças, subterfúgios e demais
circunstâncias que envolvem tal apresentação” (GALANTER, Marc, 2014, op. cit., p. 22).
181 Galanter trata bastante também do papel do advogado nessa transformação, defendendo uma
reorganização da cultura e da profissão jurídica para que a “alavancagem” distributiva que o processo é
capaz de gerar seja potencializada por uma atuação jurídica que transcenda os tribunais, compreendendo
também outras atividades por parte do profissional do direito, tais como o lobby legislativo e a mobilização
em prol dos interesses de litigantes ocasionais. Paradoxalmente, ele aduz, são os advogados dos litigantes
repetitivos os mais cotados para serem esses “agentes de mudança”, dado que já têm maior liberdade para
se identificar com o seu cliente e com suas “causas” e já atuam mediante uma definição menos estrita do
que vem a ser atividades profissionais do advogado (GALANTER, Marc, 2014, op. cit., p. 80).
182 GALANTER, Marc, 2014, op. cit., p. 79.

76
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

“Mudanças de regras que se refiram diretamente às posições estratégicas


das partes por meio da facilitação da organização; do aumento da oferta de
serviços jurídicos (em que esses, por sua vez, providenciem um ponto de
convergência para a articulação e organização de interesses comuns) e do
aumento dos custos dos oponentes (como é o caso da autorização de ações
coletivas, da fixação de custos e honorários advocatícios, e da concessão
de liminares): estes são os mais poderosos fulcros para a transformação” 183

Em termos de reformas direcionadas à “reorganização das partes”, Galanter


propõe sistemáticas de agrupamento daqueles que “não têm” em associações e
grupos de interesse para que possam atuar de forma coordenada, persistente e
estratégica, com acesso a serviços jurídicos de ponta e capacidade de angariar e
analisar informações, deter um maior poder de barganha, dentre outras vanta-
gens próprias daqueles “que têm” 184. Ele sustenta, ainda, que diversos aspectos
da advocacia de interesse público podem favorecer essas mudanças, tais como
as ações coletivas (que aumentariam os riscos para os litigantes repetitivos), a
mobilização comunitária e a utilização de outras práticas associadas ao litígio
estratégico185. Superar desigualdades pela via do processo judicial perpassaria,
portanto, por superar as desigualdades que existem dentro do próprio processo,
ou seja, entre os próprios litigantes, o que demandaria mudanças legislativas,
institucionais e nos serviços jurídicos voltados à “reorganização das partes”.
A discussão proposta por Galanter sobre a disparidade de capacidade estra-
tégica entre os litigantes e “reorganização das partes” para sua superação pode,
assim, ser elaborada sob a lente da participação no processo, como já proposto
no capítulo anterior. Galanter afirma que o foco nos usuários do sistema de
justiça é necessário para se entender como os jogadores se saem no “jogo da
litigância” e como são capazes (ou não) de utilizar as regras desse jogo a seu
favor. Daí a necessidade de se discutir, em maior profundidade, a forma, os

183 GALANTER, Marc, 2014, op. cit., p. 80.


184 GALANTER, Marc, 2014, op. cit., p. 70-72.
185 Vide Capítulo 2, item 2.3.3, quando trata das possibilidades e limitações da adoção, pela Defensoria
Pública, dessas práticas associadas à noção de litígio estratégico de interesse público, tais como
uma atuação orientada pelo impacto social e político da temática (issue-oriented ou policy-oriented),
mobilização da opinião pública, lobby legislativo e acesso ao sistema internacional de direitos humanos.

77
Maria Cecília de Araujo Asperti

limites e o conteúdo do direito de participação no processo, tendo estabelecido


a sua importância para realização do direito de acesso à justiça186.
Para desenvolver essa reflexão, é preciso adentrar no estudo sobre a partici-
pação e o devido processo legal, tanto no processo individual quanto no coleti-
vo, para se discutir, ainda, como se dá o controle de representatividade nos casos
em que há algum tipo de mitigação da participação direta do titular de direitos,
como ocorre, por exemplo, na substituição processual da ação coletiva.
É inevitável a comparação entre a tutela coletiva e a sistemática de julgamento
de casos repetitivos, porquanto nos dois cenários temos uma decisão de eficácia
expandida187 (a sentença de efeitos erga omnes ou ultra partes do processo coletivo
e a tese jurídica ou acórdão paradigma do caso repetitivo), proferida em um ou
mais processos ou incidente em que os demais afetados não participam diretamente.
Tem-se, ainda, o fato de que conflitos que versam sobre questões atinentes a direitos
sociais ou consumeiristas, passíveis de serem tutelados pela via coletiva, têm sido
objeto, também, de aplicação de técnicas de julgamento de casos repetitivos. Há,
como discutido no Capítulo 1, uma clara tendência de intensificação do uso de tais
técnicas, cuja aplicação poderá impactar o desfecho, inclusive, de ações coletivas em
trâmite e que veiculem questões jurídicas consideradas repetitivas188.
Em que medida os mecanismos processuais de julgamento de casos repeti-
tivos podem, legitimamente, mitigar as possibilidades de participação direta no
processo desses ausentes? É possível se pensar em formas representativas que
promovam a “reorganização das partes” e o incremento de sua capacidade de
litigar estrategicamente, tal como proposto por Galanter?

3.1.2. Devido processo legal e o direito de participar


no processo
O debate sobre participação no processo está invariavelmente associado à com-
preensão do significado e contornos da garantia do devido processo legal, prevista

186 SANTOS, Boaventura de Souza, 2015, op. cit., p. 39.


187 Vide a respeito dos efeitos da tese jurídica firmada em sede de julgamento de casos repetitivos no
Capítulo 4, item 4.2.
188 Como se vê no artigo 982, I e §3º, e o artigo 1.036, §1º, que tratam do sobrestamento de ações
coletivas quando da admissão do IRDR ou da afetação de recursos especial ou extraordinário
repetitivo, e o artigo 985, I e artigo 987, §2º, e o artigo 1.040, III, que dispõem sobre a aplicação da
tese jurídica firmada inclusive para as ações coletivas em curso.

78
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

expressamente na Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5º, inciso LIV. O


conteúdo desse princípio, no entanto, continua sendo objeto de discussões, em par-
ticular no que diz respeito à extensão do direito ao contraditório, dimensão elemen-
tar da noção de devido processo legal que, mais recentemente, passa a ser discutido
como um direito a um contraditório efetivo ou à participação, como aqui proposto.
Muito embora a expressão due process of law e a noção de devido processo legal
remontem à Idade Média e ao texto da Magna Carta, originalmente editada em 1215
e reeditada em 1354 (“no freeman shall be taken or imprisioned or disseised or exiled
or in any way destroyed, nor will we go upon him nor send upon him, except by the
lawful judgment of this peers or by the law of the land”189), é possível afirmar que, des-
de a antiguidade, há uma relação entre a processualidade de um julgamento a partir
de certos parâmetros pré-existentes e a justiça da decisão proferida190. A oportunidade
de ouvir e ser ouvido por um julgador imparcial antes da imposição de determinada
medida é a essência dos parâmetros mais rudimentares de processualidade.
Ainda assim, a expressão legal desses parâmetros processuais consolida-se
definitivamente com a introdução da expressão due process na Constituição
dos Estados Unidos191, conforme texto da 5ª192 e da 14ª193 Emendas, que tratam

189 Nenhum homem livre deverá ser deve ser levado ou encarcerado ou morto ou exilado ou de qualquer
forma destruído, nem iremos contra ele tampouco a sua busca, exceto por meio de um julgamento
realizado nos termos da lei por seus pares ou pela lei da terra (trad. livre).
190 Como explica Edilson Vitorelli a partir de análise da Apologia de Sócrates, de Platão, há no
julgamento do filósofo claras noções hoje associadas com o devido processo legal: o procedimento é
iniciado por um cidadão, e não de ofício; há regras preexistentes acerca da composição do tribunal
e Socrátes é cientificado da acusação feita contra si e tem a oportunidade de apresentar sua defesa
àqueles que irão lhe julgar (O devido processo legal coletivo: dos direitos aos litígios coletivos. São Paulo:
RT, 2016, p. 122).
191 VITORELLI, Edilson, 2016, op. cit., p. 123.
192 “No person shall be held to answer for a capital, or otherwise infamous crime, unless on a presentment
or indictment of a Grand Jury, except in cases arising in the land or naval forces, or in the Militia,
when in actual service in time of War or public danger; nor shall any person be subject for the same
offence to be twice put in jeopardy of life or limb; nor shall be compelled in any criminal case to be
a witness against himself, nor be deprived of life, liberty, or property, without due process of law; nor
shall private property be taken for public use, without just compensation”.
193 “Section 1. All persons born or naturalized in the United States, and subject to the jurisdiction
thereof, are citizens of the United States and of the State wherein they reside. No State shall make or
enforce any law which shall abridge the privileges or immunities of citizens of the United States; nor
shall any State deprive any person of life, liberty, or property, without due process of law; nor deny to
any person within its jurisdiction the equal protection of the laws”.

79
Maria Cecília de Araujo Asperti

do devido processo legal como direito do cidadão contra qualquer privação de


vida, liberdade ou de propriedade.
Foi no contexto do movimento de direitos civis, no final dos anos 1960, em
que se vivia a crença no uso do Judiciário para promoção de mudanças sociais,
que se pôde perceber uma correlação mais estreita entre o antigo corolário do de-
vido processo legal, a participação e a noção de acesso à justiça. O julgamento do
famoso caso Goldberg x Kelly pela Suprema Corte dos Estados Unidos em 1970194
é certamente uma das mais importantes decisões judiciais sobre a matéria.
O caso originou-se de uma ação coletiva (class action) proposta por um grupo
de nova-iorquinos que tiveram seus pedidos de concessão de benefícios assisten-
ciais negados, cancelados ou que foram submetidos a exigências tidas como abu-
sivas sem que lhes fosse dada a oportunidade de serem ouvidos pela autoridade
local (New York City’s Department of Social Services)195. A estratégia então adotada
por seus procuradores foi questionar a falta de devido processo legal no procedi-
mento administrativo de concessão e cancelamento desses benefícios, sob o argu-
mento de que a 14ª Emenda exigiria uma audiência prévia (preliminar evidenciary
hearing) com o beneficiário antes da negativa ou do cancelamento do benefício.
No julgamento pela Suprema Corte, o voto do Justice Brennan cita pre-
cedentes que tratam da oportunidade de ser ouvido como um requisito fun-
damental do devido processo legal, a ser assegurada em um momento e
de modo significativo196. Segundo seu entendimento, isso significaria, no

194 397 U.S. 254 (1970)


195 As autoras Esther Lett e Pearl McKinney eram beneficiárias do Aid to Families with Dependent Children
(AFDC), previsto no United States’ Social Secutiry Act, e o autor John Kelly recebia o benefício
chamado de Home Relief, dada sua incapacidade laboral decorrente de um acidente automobilístico.
Eles propuseram a ação com base na Federal Rule of Civil Procedure 23, alegando serem representantes
da classe de beneficiários que recebem benefícios assistenciais em todo os Estados Unidos. Por isso,
o caso também é um marco no uso mais amplo da class action, dado que até as revisões feitas em
1966 (que até então não deixavam claro que os membros da classe seriam afetados positivamente
ou negativamente pela sentença coletiva) expressamente que nas Federal Rules, não era claro se a
sentença de uma class action ser executada por membros de uma classe tão extensa (RESNIK, Judith.
“The Story of Goldberg: why this case is our shorthand” In CLERMONT, Kevin M. (ed.). Civil
Procedure Stories. 2ª Ed. Nova York: Thomson/Foundation Press, 2008, p. 473-508, p. 486-487).
196 “The fundamental requisite of due process of law is the opportunity to be heard’. Grannis v. Ordean,
234 U.S. 385, 394 (1914). The hearing must be ‘at a meaningful time and in a meaningful manner’.
Armstrong v. Manzo, 380 U.S. 545, 552 (1965). In the present context, these principles require
that a recipient have timely and adequate notice detailing the reasons for a proposed termination,
and an effective opportunity to defend by confronting any adverse witnesses and by presenting his
own arguments and evidence orally. These rights are important in cases such as those before us,

80
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

contexto do caso, que o beneficiário fosse devidamente cientificado (fair


notice) das razões para o cancelamento de seu benefício para que pudesse ter
uma oportunidade efetiva (effective opportunity to be heard) de se defender
perante a autoridade competente, com a realização de uma audiência prévia
e a possibilidade de produção de provas orais.
O voto também pontua que essa oitiva deve ser ajustada às circunstâncias
do caso concreto197, inclusive no que diz respeito às dificuldades dos beneficiá-
rios de formular manifestações técnicas e escritas, e opina pela prevalência da
oralidade e informalidade. Conclui, então, que a decisão por parte da autorida-
de administrativa deve estar fundamentada tão somente nas regras jurídicas e
nas provas produzidas em audiência198, relacionando, pois, o contraditório com
a fundamentação do ato administrativo consistente na avaliação da situação do
beneficiário pelo agente público.
O precedente formulado em Goldberg vs. Kelly demarca aquilo que Judith
Resnik chama de “revolução do devido processo legal” (“due process revolu-
tion”), por trazer lições que são centrais, até hoje, para os estudos de direito
processual nos Estados Unidos a respeito do direito de ação, a oralidade e o
contraditório no devido processo legal e o papel das cortes e do legislativo

where recipients have challenged proposed terminations as resting on incorrect or misleading factual
premises or on misapplication of rules or policies to the facts of particular cases” (397 U.S. 254
(1970), voto do Justice Brennan).
197 “It is not enough that a welfare recipient may present his position to the decisionmaker in writing
or second-hand through his caseworker. Written submissions are an unrealistic option for most
recipients, who lack the educational attainment necessary to write effectively and who cannot
obtain professional assistance. Moreover, written submissions do not afford the flexibility of oral
presentations; they do not permit the recipient to mold his argument to the issues the decisionmaker
appears to regard as important. Particularly where credibility and veracity are at issue, as they
must be in many termination proceedings, written submissions are a wholly unsatisfactory basis
for decision. The second-hand presentation to the decisionmaker by the caseworker has its own
deficiencies; since the caseworker usually gathers the facts upon which the charge of ineligibility
rests, the presentation of the recipient's side of the controversy cannot safely be left to him.
Therefore, a recipient must be allowed to state his position orally. Informal procedures will suffice;
in this context, due process does not require a particular order of proof or mode of offering evidence”
(397 U.S. 254 (1970), voto do Justice Brennan).
198 “Finally, the decisionmaker’s conclusion as to the recipient’s eligibility must rely solely on the legal
rules and evidence adduced at the hearing … To demonstrate compliance with this elementary
requirement, the decisionmaker should state the reasons for his determination and indicate the
evidence he relied on…though his statement need not amount to a full opinion or even formal
findings of fact and conclusions of law. And, of course, an impartial decisionmaker is essential” (397
U.S. 254 (1970), voto do Justice Brennan).

81
Maria Cecília de Araujo Asperti

na articulação de direitos sociais e de políticas públicas, bem como sobre as


diferentes capacidades das partes no sistema adversarial e as dificuldades de
se sustentar a transubstancialidade do processo em meio às particularidades e
complexidades dos conflitos sociais199.
Resnik também assevera que, paradoxalmente a sua enorme relevância
para o direito processual, Goldberg teve uma vida curta200. Apenas seis anos
após o julgamento do caso, a Suprema Corte viria a julgar o caso Mathews v.
Eldridge, em que também se discutia o cancelamento de beneficios assisten-
ciais (desta vez associados a deficiências físicas), firmando um precedente que
por restringir significativamente o alcance conferido à cláusula do devido
processo legal em Goldberg.
O argumento então prevalecente foi o de que uma análise de custo e bene-
fício da realização de audiência prévia em todos os procedimentos administra-
tivos de cancelamento de benefícios levaria à conclusão de que esse expediente
não seria efetivo e necessário em todos os casos.
Na sua opinião majoritária, Justice Powell fundamenta que o devido processo
legal não possui um “conteúdo fixo”, mas flexível, a ser adaptado conforme a
situação demandada, e propõe requisitos a serem observados para se prover o
“quanto” de devido processo deve ser assegurado em um processo administrati-
vo: (i) quais interesses serão afetados pelo ato administrativo; (ii) o risco de uma
privação equivocada desses interesses por meio dos procedimentos utilizados e
a probabilidade de se prover novas ou outras salvaguardas processuais e (iii) o
interesse governamental e os ônus fiscais e administrativos que essas salvaguar-
das processuais envolveriam201.
No Brasil, a cláusula do devido processo legal está contida expressamente no
texto constitucional, assim como a garantia do contraditório e ampla defesa em
processos judiciais e administrativos, a garantia do julgamento por um juiz na-
tural, proibição de provas ilícitas, publicidade dos atos processuais e fundamen-

199 RESNIK, Judith, 2008, op. cit., p. 475-476 e p. 498.


200 424 U.S. 319 (1976).
201 Vide trecho da decisão do Justice Powell: “First, the private interest that will be affected by the official
action; second, the risk of an erroneous deprivation of such interest through the procedures used,
and the probable value, if any, of additional or substitute procedural safeguards; and finally, the
Government's interest, including the function involved and the fiscal and administrative burdens
that the additional or substitute procedural requirement would entail” (424 U.S. 319 (1976)).

82
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

tação das decisões judiciais, todas estas também associadas a noção de devido
processo legal (artigo 5º, incisos LV, LIII, LVI, LX e artigo 93, IX).
Essa compreensão do direito ao contraditório na doutrina processual brasi-
leira é influenciada pelo pensamento processualista italiano, que considera este
um elemento fundamental à garantia constitucional a um “processo justo”202.
Nesse sentido, a conhecida conceituação de Elio Fazzalari coloca a participa-
ção dos destinatários do provimento jurisdicional, em contraditório, como ele-
mento essencial, ou ratio distinguendi, do processo203. Fazzalari argumenta que a
distinção entre o processo e um procedimento reside na possibilidade de partici-
pação de todos destinatários dos efeitos do ato final204 do processo, por meio de
uma estrutura dialética em que se assegure a paridade simétrica das posições dos
sujeitos e a influência de seus atos na tomada de decisões pelo julgador205.
Essa importância conferida à noção de contraditório e à participação dos
destinatários do provimento jurisdicional como elemento de legitimação do
processo e da atividade jurisdicional fez com que parte da doutrina passasse a
falar em efetivo contraditório, ou efetiva “participação” no processo, para sus-
tentar que o termo “contraditório”, por si próprio, não seria capaz de abarcar a
importância conferida ao direito das partes e dos interessados de influir signifi-
cativamente na atividade jurisdicional.

202 Conforme artigo 111 da Constituição Italiana, que também provê pela duração razoável do processo,
alçado a direito constitucional no Brasil pela Emenda Constitucional nº 45/2004, como visto no
Capítulo 1. O texto do dispositivo constitucional italiano assim dispõe: “La giurisdizion si attua
mediante il giusto processso regolato dalla legge. Ogni processo si svolge nel contraddittorio tra le parti,
in condizione di parità, davanti a giudice terzo e imparziale. La legge ne assicura la ragionevole durata”.
203 “Il ‘processo’ è um procedimento in cui partecipano (sono abilitati a partecipare) coloro nella cui
sfera giuridica l’atto finale à destinato a svolgere effetti: in contraddittorio, e in modo che l’autore
dell’atto non possa obliterar le loro attività” (FAZZALARI, Elio. Istituzioni di diritto processuale.
Padova: CEDAM, 1994, p. 82).
204 O autor chama de “ato final” o provimento jurisdicional como a determinação judicial que será
emanada no processo, ainda que não seja, temporalmente, seu último ato: “In non pochi casi,
il provvedimento non è l’ultumo atto del procedimento dal punto di vista temporale: talvolta il
procedimento si divide in più fase che sfociano, ciascuna, in um provvedimento (si pensi, ad
esempio, ala promulgazione dela legge). Anche in queste ipotese, il provvedimento resta l’atto cui
il procedimento cospira: in questo senso, può convenirsi di designarlo ancore come ‘atto finale’”
(FAZZALARI, Elio, 1994, op. cit., p. 79). A esse respeito, Carlos Alberto de Salles também explica
que “a idéia de um ‘provimento’, isso é, uma disposição imperativa por parte de um órgão estatal, é,
de fato, elemento essencial à caracterização de qualquer processo, judicial ou não” (Arbitragem em
Contratos Administrativos. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 100).
205 FAZZALARI, Elio, 1994, op. cit, p. 83.

83
Maria Cecília de Araujo Asperti

Mesmo antes do CPC de 2015, Carlos Alberto Alvaro de Oliveira vislum-


brava no direito de participação uma “dimensão intrinsicamente complemen-
tadora e integradora” do processo entendido como “instrumento funcional de
democratização e de realização do direito material”206. Entendia o autor que
essa participação não se esgotaria na ciência dos atos e na possibilidade de
contradita-los, uma vez que também implicava na possibilidade de participar
efetivamente na formação dos provimentos judiciais207.
Similarmente, Leonardo Greco utilizou a expressão “contraditório participa-
tivo” para arguir que o direito ao contraditório também contemplaria um direi-
to de todos os “interessados” e “contra-interessados” – em referência ao conceito
de Elio Fazzalari208 para se referir àqueles que “têm o direito de atuar como par-
tes e que não podem perder direitos em processos em que não participaram”209
– de intervir no processo e praticar todos os atos processuais próprios do exer-
cício da ampla defesa. Greco também associou o direito ao contraditório com
o princípio político da participação democrática, e atribuiu a este uma série de
pressupostos, tais como a audiência bilateral, mediante adequada e tempesti-
va notificação de todas as partes; o direito de apresentar alegações, propor e
produzir provas, contando, para tanto, com prazos suficientes e razoáveis; e o
direito ao contraditório prévio como regra, e o seu diferimento como exceção a
ser devidamente fundamentada a partir dos elementos do caso concreto (como
no caso das tutelas de urgência)210.
Também nessa linha, Luiz Guilherme Marinoni sustenta a existência de um
“direito de participar” que compreenderia não só o “direito de influir sobre o
convencimento do juiz, mas também o direito de estar junto a ele ou de cuidar

206 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. “O processo civil na perspectiva dos direitos fundamentais”.
Revista da Faculdade de Direito da UFRGS. N. 22. Porto Alegre: UFRGS, 2002, p. 31-42. Disponível em
<http://seer.ufrgs.br/index.php/revfacdir/article/view/72635/41107>, acesso em 9 out. 2017, p. 39-42.
207 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. “A Garantia do Contraditório”. Revista da Faculdade de
Direito da UFRGS. N. 15. Porto Alegre: UFRGS, 1998, p. 7-20. Disponível em <http://www.seer.
ufrgs.br/index.php/revfacdir/article/view/70385/39893>, acesso em 12 out. 2017.
208 “L’essenza stessa del contraddittorio esige che vi partecipino almeno due soggetti, un ‘interessado’
e un ‘contrainteressado’: sull’uno dei quali l’atto finale à destinato a svolgere effetti favorevoli e
sull’altro effetti pregiudizievoli” (FAZZALARI, Elio, 1994, op. cit., p. 86).
209 GRECO, Leonardo. “Garantias fundamentais do processo: o processo justo”. Novos estudos jurídicos,
v. 7, n. 14, 2008, p. 13.
210 GRECO, Leonardo, 2008, op. cit., p. 11-13.

84
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

para que a atividade jurisdicional não seja arbitrária”, além da importância da


publicidade e da fundamentação das decisões para que seja apurada a efetivi-
dade do exercício desse direito211. Associa-se, então, o direito à participação
com o direito de influir na formação da convicção do julgador, o que deverá ser
controlado por meio da adequada fundamentação das decisões judiciais.
Mais recentemente, o direito processual brasileiro passou a prever também
a noção de “efetivo contraditório”, previsto nos artigos 7º, 9º e 10 do CPC,
que contemplaria tanto o direito de ser ouvido quanto o de participar ativa e
concretamente na formação da convicção do julgador e na elaboração do pro-
vimento jurisdicional do seu caso212.
Segundo Humberto Theodoro Jr., esse contraditório previsto na lei proces-
sual tem de ser “dinâmico e efetivo”, o que significa assegurar (i) um tratamento
paritário entre as partes, em especial àquelas que se encontram em “condições
econômicas e técnicas desniveladas”, de modo a se estabelecer um “equilíbrio
processual”213; (ii) que não sejam proferidas decisões que surpreendam a parte
que terá de suportar as suas consequências, garantindo-se a oportunidade de
participar e influir na formulação da decisão judicial; e (iii) que todas as ques-
tões a serem decididas sejam submetidas à manifestação das partes, não po-
dendo o juízo utilizar fundamento em sua decisão que não tenha sido debatido
dialeticamente no processo214.
Tem-se, então, que o direito ao efetivo contraditório ou, de uma perspectiva
mais ampla, o direito de participar no processo, contempla uma série de ele-
mentos, tais como o direito de influir na formação da convicção do julgador,
usando-se de todos os expedientes processuais cabíveis; a oportunização de um
exercício verdadeiramente significativo desse direito, levando-se em considera-
ção, portanto, os desequilíbrios existentes entre os sujeitos; e a possibilidade de

211 MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 3ª Ed. São Paulo: RT, 2009, p. 408-409.
212 THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil, Vol. I. 56ª Edição. Rio de Janeiro:
Forense, 2015, p. 85-86.
213 Camilo Zufelato trata desse equilíbrio processual como sendo uma igualdade em sentido substancial,
o que implica também em se realizar “discriminações positivas” ao longo do processo, como no
caso da distribuição dinâmica do ônus da prova (“O princípio do contraditório no Projeto de Novo
CPC”. Jornal Carta Forense. 3 out. 2013. Disponível em <http://www.cartaforense.com.br/conteudo/
artigos/o-principio-do-contraditorio-no-projeto-de-novo-cpc/12140> acesso em 12 out. 2017).
214 THEODORO JR., Humberto, 2015, op. cit., p. 86.

85
Maria Cecília de Araujo Asperti

se assegurar que a participação foi de fato considerada pelo julgador, o que se dá


por meio de uma fundamentação adequada das decisões judiciais.
Além disso, fica claro que direito de participar deve ser assegurado a todos
que serão destinatários do provimento final do processo. Referenciando, nova-
mente, a obra de Elio Fazzalari, esses “interessados” são considerados hipoteti-
camente, estimando-se, ao início do processo, quem poderá ser afetado pelo pro-
vimento jurisdicional, ainda que, no caso concreto, apure-se que o seu resultado
não atingirá, de fato, tais sujeitos215. A estes potencialmente atingidos deverá ser
assegurado o direito de participar, em contraditório, dos atos do procedimento,
de modo a fornecer elementos para influir no resultado que poderá afetá-los.
Assim, percebe-se claramente a importância dessa reflexão para a inves-
tigação sobre a participação dos diferentes sujeitos no julgamento de casos
repetitivos. Como será discutido mais profundamente no Capítulo 4, a ra-
cionalidade dessas técnicas implica a fixação de uma tese jurídica a partir
dos elementos colhidos de alguns casos, a ser aplicada a diversos processos e
recursos que versem sobre as mesmas questões de direito decididas por meio
daquelas técnicas. Há importantes questionamentos sobre a participação das
partes dos processos pendentes (sobrestados) aos quais se aplicará a tese, bem
como para os interessados futuros ou potenciais (ausentes) no julgamento em
que se firma a tese jurídica. Todos esses sujeitos têm o direito de participar do
julgamento do caso repetitivo? Qual a relevância dessa participação na legiti-
mação do provimento jurisdicional e da própria atividade judicial envolvida
no julgamento de casos repetitivos? A busca pela efetividade e segurança jurí-
dica por meio do uso dessas técnicas pode justificar uma mitigação do direito
de participar no processo?

3.1.3. Excepcionalidade da mitigação da participação


no processo
Discutiu-se no tópico anterior a importância conferida pela doutrina proces-
sual ao direito ao contraditório e, em sentido mais amplo, ao direito de partici-
par (ou de exercer um contraditório participativo) no processo. A esse respeito,
segundo a lição de Elio Fazzalari, o valor contraditório seria ínsito ao próprio

215 FAZZALARI, Elio, 1994, op. cit. p. 85.

86
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

conceito de processo, pelo o que se extrai sua essencialidade para a legitimação


da atividade jurisdicional.
Saindo um pouco do âmbito estritamente jurídico, outra perspectiva interes-
sante de ser abordada é aquela proposta pela noção de justiça procedimental216,
pela qual a própria legitimação do processo, enquanto exercício de poder e de
autoridade pelo Estado, depende da possibilidade de participação e da percep-
ção subjetiva da justiça no processo.
A esse respeito, Edgar Allan Lind e Tom R. Tyler atribuem à justiça procedi-
mental uma dimensão objetiva, atinente às normas que disciplinam o que viria
a ser um procedimento adequado, e uma dimensão subjetiva, que consistiria no
estudo da percepção dos indivíduos quanto à justiça do processo217. Os autores
reconhecem que não há uma total coincidência entre os parâmetros objetivos
de justiça processual e a sensação de justiça que que advém da oportunidade
que o indivíduo tem de participar e de expressar determinado ponto de vista
a respeito da própria situação218. Haveria, portanto, potenciais conflitos entre
esses standards objetivos e os sentimentos das pessoas em relação ao processo
quando, por exemplo, o autor de uma demanda em um tribunal de pequenas
causas deseja “contar a sua história”, porém é impedido pelo juiz, que está pre-
ocupado com a eficiência do processo e com seu acervo de processos e acredita
que seu conhecimento sobre a lei é capaz de lhe assegurar o melhor juízo sobre
quais são as oportunidades que devem ser dadas às partes, e sobre quais partici-
pações serão irrelevantes ou inapropriadas.
De todo modo, seja em sua dimensão objetiva (normas procedimentais), seja
da subjetiva (percepção dos sujeitos), a abordagem da justiça procedimental en-
fatiza a importância de se avaliar os processos decisórios ou os modelos de solu-
ção de disputas sejam avaliados não somente por seus resultados, mas também

216 A obra seminal sobre justiça procedimental – ou procedural justice –, frequentemente citada por
teóricos norteaericanos, é o livro Procedural Justice: a Psychological Analysis, de John Thibaut e
Laurens Walker (Hillsdale, N.J.: Lawrence Erlbaum Associates, 1975). A obra posterior de Edgar
Allan Lind e Tom R. Tyler denominada The Social Psychology of Procedural Justice (Nova York:
Prelum Press, 1988), também é uma importante referência sobre o tema.
217 “Objective procedural justice concerns the capacity of a procedure to conform to normative standards
of justice, to make either the decisions themselves or the decision-making process more fair by,
for example, reduzing some clearly unacceptable bias or prejudice. Subjective procedural justice
concerns the capacity of each procedure to enhance the fairness judgments of those who encounter
procedures” (LIND, Edgar Allan; TYKER, Tom R., 1988, op. cit., p. 3).
218 LIND, Edgar Allan; TYKER, Tom R., 1988, op. cit, p. 3-5.

87
Maria Cecília de Araujo Asperti

pela sua aderência aos parâmetros normativos de justiça e sua capacidade de


proporcionar uma percepção de justiça aos seus destinatários. Como discuti-
do no capítulo anterior, essa é uma visão muito pertinente para a perspectiva
metodológica do acesso à justiça, que se propõe a estudar (inclusive de modo
comparado e por meio de estudos empíricos) o processo e as instituições a partir
das experiências de diferentes grupos e indivíduos no sistema de justiça e dos
impactos sociais da atuação de seus agentes e instituições
O que se extrai, portanto, dessa visão sobre a justiça procedimental, e mes-
mo da definição de processo proposta por Fazzalari, é que a participação dos
destinatários do provimento jurisdicional não teria apenas uma importância
finalística, ou seja, enquanto premissa necessária para se chegar ao resultado
desejado do processo219, mas também procedimental, enquanto valor essencial
à legitimidade do procedimento jurisdicional perante seus destinatários.
No entanto, a essencialidade do direito à participação não deve conduzir
a uma compreensão absolutamente irrestrita ou ilimitada de seu conteúdo,
que seja orientada tão somente pela sua relevância enquanto fim em si mesmo.
Como coloca Carlos Alberto de Salles, há outros valores processuais que muitas
vezes colidem, na prática, com o exercício do contraditório no caso concreto,
tais como a efetividade do provimento jurisdicional e a duração razoável do
processo220. Por isso, conceber o contraditório (ou a participação) como o úni-
co valor essencial ao processo, sem se considerar o conjunto de valores que se
projeta no procedimento, pode, no limite, conduzir a situações de desigualdade,
como em processos em que o contraditório seria pleno, porém o tempo de dura-
ção também extrapolaria o razoável221.
Neste sentido, o próprio CPC dispõe sobre limitações ao exercício do con-
traditório em seu artigo 9º, ou seja, nas normas consideradas fundamentais do
processo civil: (i) a tutela provisória de urgência, que pode ser deferida inaudita

219 VITORELLI, Edilson, 2016, op. cit., p. 193-196.


220 SALLES, Carlos Alberto de, 2011, op. cit., p. 99-104.
221 É a partir dessas ponderações que Salles discute que a caracterização do processo não pode ser
feita apenas em razão do contraditório no procedimento, mas a partir do “elemento normativo”
do procedimento, que consubstancia esse conjunto ou essa pluralidade de valores que se projetam
no procedimento, e que seriam representativos de terminada racinalidade normativa orientadora
da produção de decisões no Estado contemporâneo. O autor trabalha, então, com o conceito de
processo como o “procedimento decisório dotado de normatividade, pelo qual se expressa uma
racionalidade jurídica determinada, significativa dos valores aos quais a decisão a ser produzida deve
estar condicionada” (SALLES, Carlos Alberto de, 2011, op. cit., p. 103-104).

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

altera parte; (ii) a tutela de evidência em casos de tese firmada em julgamento


de casos repetitivos ou em súmula vinculante ou pedido reipersecutório fundado
em prova documental; e (iii) a expedição de mandado de pagamento em ação
monitória, em que o contraditório é eventual e diferido, a ser exercido via embar-
gos monitórios. Há, ainda, a limitação no escopo de cognição da impugnação ao
cumprimento de sentença e a assunção, no caso dos procedimentos executivos,
do caráter de eventualidade do exercício do contraditório222. De modo geral, essas
previsões têm por fundamento a celeridade e efetividade do processo, impondo-se
o ônus do tempo à parte requerida/executada diante da existência de elementos e
evidências a embasar a pretensão do requerente/exequente223.
São hipóteses que, de toda sorte, revestem-se de excepcionalidade e cuja
aplicação depende, como dito, da verificação, no caso concreto, de elementos
que despontem para a verossimilhança da pretensão de uma das partes, além de
não implicar uma supressão total do direito de participar.
A legitimação extraordinária do processo coletivo, por seu turno, também
poderia ser vista como restrição excepcional ao direito de participação direta do
sujeito de direitos (ou do destinatário da tutela jurisdicional), que se justificaria
em favor da possibilidade de uma tutela adequada de direitos coletivos e da pos-
sibilidade de prolação de provimentos jurisdicionais com efeitos mais amplos.
Como mencionado no Capítulo 1, quando se tratou das reformas proces-
suais que associavam a noção de “acesso à justiça” com a tutela coletiva de
direitos, diversas foram as justificativas teóricas dos defensores do processo
coletivo para sustentar essa flexibilização do “direito de ser ouvido” em prol
da possibilidade de se tutelar coletivamente direitos entendidos como difusos,
coletivos e individuais homogêneos.

222 Como afirma Cândido Rangel Dinamarco, a idéia de eventualidade do contraditório, embora possa
ser discutível no plano dos direitos indisponíveis (como no processo-crime), é plenamente cabível
quando tratamos de direitos patrimoniais disponíveis, especialmente no âmbito da execução civil.
Afirma, ainda, que “é inevitável reconhecer que a participação será de intensidade sempre variável
e que, sem descer abaixo da linha representativa do mínimo tolerável, ela terá satisfeito às exigências
do contraditório” (Execução civil. 7ª Edição, São Paulo: Malheiros, 2000, p. 171).
223 Humberto Theodoro Jr. dá também outros exemplos de legítima mitigação do contraditório, tais
como a possibilidade de ser relegado a um momento posterior quando do indeferimento da petição
inicial (artigo 330) ou da rejeição liminar do pedido (artigo 332), em que as partes terão oportunidade
de realizar o debate em contraditório em sede recursal. Menciona, ainda, as medidas liminares
inaudita altera parte em ações de procedimento especial, como nas possessórias (artigo 562) e nos
embargos de terceiro (artigo 678), defendendo que em todas essas hipóteses haveria uma ponderação
entre o contraditório e a efetividade jurisdicional em que esta teria prevalência (2015, op. cit., p. 88).

89
Maria Cecília de Araujo Asperti

As ondas renovatórias do access-to-justice movement propagavam a necessi-


dade de se superar os “obstáculos organizacionais” que se impõem aos membros
de grupos ou classes, compostos por pessoas “fracas ou anteriormente discrimi-
nadas”, na busca de reparação a danos coletivos, cujo fragmento individual mui-
tas vezes é insignificante224. Faltaria ao indivíduo os recursos e incentivos ne-
cessários para litigar contra o transgressor, um ente tipicamente mais poderoso
e com grandes incentivos para prosseguir com a atividade danosa. A superação
desses obstáculos demandaria a criação de normas processuais para tutela cole-
tiva, naquilo que Mauro Cappelletti descreveu como “uma revolução em curso
no direito processual civil”, em que se tornava necessária a superação da teoria
da ação judiciária, elaborada a partir de uma perspectiva essencialmente liberal
e individualista, em favor da tutela desses “novos direitos e deveres”, próprios de
uma realidade mais complexa225.
No Brasil, a construção de um modelo próprio de ação coletiva tam-
bém foi apoiada em uma crítica a concepção unicamente individual do processo
civil e na defesa de formas mediadas de participação.
Ada Pellegrini Grinover arguia que, enquanto o princípio da participação,
ínsito a qualquer processo, realiza-se no processo individual pela “participação
no processo”, em que o contraditório é exercido diretamente pelas partes da
relação jurídica processual, no processo coletivo se daria pela “participação pelo
processo”, em que haveria um “portador” de interesses transindividuais, o cha-
mado “representante adequado”226. Para Grinover, o processo coletivo, por não
viabilizar o exercício individual da participação, proporcionaria, de fato, uma
participação “menor” no processo. Contudo, essa seria a “única participação pos-
sível num processo coletivo”, e que se justificaria diante da necessidade de se
prover uma tutela mais adequada aos direitos coletivos227.

224 CAPPELLETTI, Mauro. “Os métodos alternativos de solução de conflitos no quadro do movimento
universal de acesso à justiça”. Revista de Processo, vol. 74 (abril-junho de 1994), p. 82-97, p. 84-85.
225 CAPPELLETTI, Mauro. “Formações sociais e interesses coletivos diante da justiça civil”. Trad.
CAMPOS, Nelson Renato Palaia Ribeiro de. Revista de Processo, v. 2, n. 5, jan./mar., 1977, p. 128-
159, p. 129-135.
226 GRINOVER, Ada Pellegrini. “Direito processual coletivo”. GRINOVER, Ada Pellegrini; MENDES,
Aluisio Gonçalves de; WATANABE, Kazuo. Direito Processual Coletivo e o Anteprojeto do Código
Brasileiro de Processos Coletivos. São Paulo: RT, 2007, p 11-15.
227 “Há, assim, no processo coletivo, em comparação com o individual, uma participação maior pelo
processo, e uma participação menor no processo: menor, por não ser exercida individualmente, mas a

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

É compreensível que nesse momento histórico e, particularmente, no Brasil,


em meio às restrições políticas e jurisprudenciais impostas à tutela coletiva a
partir dos anos 90228, tenha se tentado de todos os modos sustentar o modelo
representativo coletivo, a despeito das implicações em termos de mitigação da
participação direta e individual no processo pelo titular de direito.
Essa defesa pragmática da participação por meio da substituição processu-
al , no entanto, certamente não elimina os problemas e os questionamentos
229

atinentes à participação e à representatividade dos interesses dos grupos e in-


divíduos no sistema de justiça e a sua capacidade de influir no provimento
jurisdicional cujos efeitos também lhes sejam projetados.
Como mencionado no Capítulo 1, o modelo brasileiro de legitimação hí-
brida, porém essencialmente institucional, consolidado pela Lei nº 7.347/1985,
acabou por reforçar o protagonismo do Ministério Público e, com o tempo, res-
tringir a atuação da sociedade civil230, cuja articulação e mobilização também
não se mostraram compatíveis com as expectativas traçadas à época. São per-

única possível num processo coletivo, onde o contraditório se exerce pelo chamado ‘representante
adequado’ (GRINOVER, Ada Pellegrini, 2007, op. cit., p. 13).
228 “Na década de 1980, o processo coletivo conseguiu, não sem dificuldades, se estruturar no Brasil,
com inegável pioneirismo em um país de civil law. A modificação do cenário processual colocada em
marcha pelo novo regime foi tamanha que, já nos anos 90, o governo federal tentaria, por intermédio
de medidas provisórias, dificultar o seu exercício, exigindo, por exemplo, autorização assemblear
para o ajuizamento de ações coletivas pelas associações, com nomes e endereços dos associados.
Assim, os processualistas que defendiam o instituto se viam na contingência de não problematizá-lo
exageradamente, sob pena de, em um primeiro momento, impedir que ele fosse adotado e, em um
segundo, legitimar a mal-intencionada investida do Poder Executivo” (VITORELLI, Edilson, 2016,
op. cit., p. 120-121). Sobre as restrições impostas pela Medida Provisória nº 1.984-20, de 28 de julho
de 2000, e pela Medida Provisória nº 1.984-21 de 28 de agosto de 2000 (reeditadas pela Medida
Provisória nº 2.180-35, de 24 de agosto de 2001), em particular a restrição ao uso da ação civil
pública em matéria tributária, previdenciária, relativa ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
(FGTS) e “outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser individualmente
determinados” (artigo 1º, Parágrafo Único, da Lei nº 7.347/1985), confira-se BUENO, Cassio
Scarpinella. “Réquiem para a ação civil pública”. Disponível em http://www.scarpinellabueno.
com/cat-para-ler/62-25-requiem-para-a-acao-civil-publica.html, acesso em 31 ago. 2017. Publicado
originalmente em FIUZA, César Augusto de Castro; DE SÁ, Maria de Fátima; DIAS, Ronaldo
Brêtas C. (coord.). Temas atuais de direito processual civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 49-72.
229 VITORELLI, Edilson, 2016, op. cit., p. 32.
230 Como no julgamento do Recurso Extraordinário nº 573.232/SC, mencionado no item 3.2.1., a seguir,
em que apenas os associados que expressamente autorizarem o ajuizamento da ação civil pública
poderão executar individualmente a sentença coletiva (Relator Ministro Ricardo Lewandovski,
Redator do acórdão Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, Julgamento em 14.05.2014).

91
Maria Cecília de Araujo Asperti

tinentes (embora não tenham repercutido em termos de mudanças legislativas),


ainda, as críticas à sistemática vigente e os argumentos favoráveis à legitimidade
ativa do indivíduo231. Verifica-se, enfim, um significativo crescimento recente
no uso da via da ação popular232, disciplinada pela Lei nº 4.717/1965, o que
poderia corroborar com a idéia de que indivíduos teriam, de fato, condições de
levar ao Judiciário questões de grande importância política, econômica e social.
Com efeito, o caso do rompimento das barragens da Samarco, no Rio Doce
(Minas Gerais) é bastante elucidativo para a discussão da relevância do direito
de participação, da justiça procedimental, das limitações do modelo de repre-
sentatividade adequada da ação coletiva e demais entraves à participação direta
dos destinatários do provimento jurisdicional233.
O rompimento das barragens, ocorrido em novembro de 2015, acarretou
mortes e danos das mais diversas naturezas e colocou em xeque todas as pos-
sibilidades e limitações da tutela coletiva de direitos, especialmente no que diz
respeito à representatividade de interesses pelos legitimados legais. Enquanto o
Ministério Público Estadual, em razão da proximidade da promotoria com as
comunidades diretamente afetadas, cuidou de postular coletivamente pela in-
denização dos danos sofridos pelas vítimas, inclusive em caráter emergencial234,

231 À exemplo, vide MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro; SILVA, Larissa Clare Pochmann da. “A
legitimidade ativa do indivíduo nas ações coletivas” In GRINOVER, Ada Pellegrini (org.) et al.
Processo coletivo: do surgimento à atualidade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 1243-1254.
232 Para citar alguns exemplos de grande repercussão na mídia, tem-se as ações populares relativas ao
aumento as alíquotas da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, incidentes sobre a importação
e a comercialização de gasolina, óleo diesel, gás liquefeito de petróleo (GLP), querosene de aviação e
álcool (como o Processo nº 1007839-83.2017.4.01.3400, da 20ª Vara Federal da Seção Judiciária do
Distrito Federal); a ação popular que questionou a validade da Resolução nº 1/1990, do Conselho
Federal de Medicina, sobre a “atuação de psicólogos em relação à questão da orientação sexual”
(Processo nº 1011189-79.2017.4.01.3400, da 14ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal)
e a ação popular contra a nomeação dos ex-presidente Lula ao cargo de Ministro Chefe da Casa Civil
(como no Processo nº 0016542-54.2016.4.01.3400, da 4ª Vara Federal do Distrito Federal, no qual foi
proferida a primeira decisão liminar sobre o tema).
233 Para um estudo mais aprofundado sobre o desastre ambiental e suas consequencias econômicas,
sociais e jurídicas, confira-se SALINAS, Natasha Schmitt Caccia. “Caso Samarco: implicações
jurídicas, econômicas e sociais do maior desastre ambiental do Brasil” In FALCÃO, Joaquim;
PORTO, Antonio José Maristrello; ALCÂNTARA, Paulo Augusto Franco de. Depois da lama:
Mariana e as consequencias de um desastre ambiental construído. Belo Horizonte: Letramento,
2016, p. 197-233.
234 Processos n. 0039891-33.2015 e n. 0400.15.004335-6, distribuídos para a 2ª Vara da Comarca de
Mariana.

92
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

o Ministério Público Federal focou sua atuação na defesa dos danos ambientais,
propondo medidas de urgência, para conter o avanço da lama, e tutelas conde-
natórias para indenização e reparação dos incomensuráveis prejuízos ambien-
tais decorrentes do evento235. De outra parte, a União, os estados de Minas
Gerais e Espírito Santo ajuizaram ação coletiva, veiculando uma ampla causa de
pedir que contemplava tanto reformas socioambientais, quanto a reconstrução
das comunidades e indenização dos afetados236.
Foi nesta última ação que se firmou, inicialmente, um extenso acordo pelo
qual a empresa Samarco e suas principais acionistas, Vale e a BHP Billiton,
comprometeram-se a adotar uma série de medidas, dentre estas a elaboração
e implementação de planos de reconstrução socioeconômica e ambiental das
áreas afetadas e de programas de indenização individual das vítimas237.
Era colocada, com isso, a discussão sobre a legitimidade desse acordo, que
não teria contado com a participação das comunidades e grupos afetados238. É
o que ressaltou a Desembargadora Diva Malerbi, então convocada pelo STJ,
quando do julgamento de decisão liminar proferida na Reclamação suscitada
pelo Ministério Público Federal contra a juíza coordenadora do Núcleo Central

235 Dentre os quais o Processo n. 0002571-13.2016.4.02.5004, distribuído para 1º Vara Federal da


Subseção Judiciária de Linhares e o Processo nº 0060017-58.2015.4.01.3800, da 12ª Vara Federal de
Belo Horizonte
236 Processo n. 6975861.2015.4.01.3400, distribuído para a 3ª Vara Federal da Seção Judiciária do
Distrito Federal.
237 Uma das cláusulas do acordo estipulava, inclusive, que as partes buscariam a extinção das demais
ações judiciais relacionadas ao rompimento da barragem, entendendo-se que o acordo compreenderia
todas as demandas a serem atendidas pelas empresas envolvidas:
“CLÁUSULA 03: As partes reconhecem expressamente que o objeto das ações judiciais listadas no
ANEXO, ajuizadas pelo PODER PÚBLICO, está abrangido pelo presente Acordo, razão pela qual
buscarão sua extinção com resolução do mérito, nos termos da CLÁUSULA 254.
PARÁGRAFO PRIMEIRO: Os COMPROMITENTES manifestar-se-ão nos autos das ações
judiciais listadas no ANEXO e demais ações coletivas existentes, além das que venham a ser
propostas relativas ao EVENTO, desde que tenha objeto abrangido pelo presente ACORDO, para
fazer prevalecer as cláusulas e obrigações presentes neste ACORDO” (acordo firmado em 21 de
março de 2016).
238 Conforme fala procurador-regional da República, Dr. Felício Pontes Jr., em entrevista para o
jornal Valor Econômico: “Há pressupostos que não foram observados para o aperfeiçoamento do
acordo, entre eles a ausência de participação popular na sua formulação e a falta de legitimidade
dos entes federativos para dispor a respeito dos direitos das vítimas” (MOURA, Marcos. “MPF
impugna homologação de acordo entre Samarco, União, MG e ES”. Valor Econômico. 30 mai. 2016.
Disponível em http://www.valor.com.br/empresas/4581229/mpf-impugna-homologacao-de-acordo-
entre-samarco-uniao-mg-e-es, acesso em 30 out. 2017).

93
Maria Cecília de Araujo Asperti

de Conciliação do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que teria homolo-


gado o acordo em questão a despeito da atribuição da competência à 12ª Vara
Federal de Belo Horizonte para julgamento das ações civis públicas referentes
ao rompimento da barragem. Em sua decisão, a Ministra discute a crise de
legitimação relacionada à participação dos atingidos e dos demais entes legi-
timados para representação dos interesses envolvidos, asseverando, ainda, que
um acordo dessa natureza, embora celebrado por entes legitimados, demanda a
participação direta dos afetados:

“Deveras, mesmo que não haja dúvidas a respeito da impossibilidade


de o referido acordo limitar o acesso à Justiça dos indivíduos que se
sentirem prejudicados com o rompimento da barragem do Fundão, o
fato é que ainda devem ser respaldadas outras demandas de natureza
igualmente coletivas, as quais repercutem sobre a esfera de direitos de
entes federativos e entidades civis que sequer tiveram a oportunidade de
participar das tratativas para a autocomposição do litígio, a exemplo dos
Municípios atingidos e associações representantes dos interesses envol-
vidos na causa (...).
Ademais, diante da extensão dos danos decorrentes do desastre ocorrido
em Mariana/MG, seria rigorosamente recomendável o mais amplo deba-
te para a solução negociada da controvérsia, por meio da realização de
audiências públicas, com a participação dos cidadãos, da sociedade civil
organizada, da comunidade científica e dos representantes dos interesses
locais envolvidos, a exemplo das autoridades municipais”239.

As tratativas consensuais somente avançaram quando os entes legitimados


se articularam e buscaram ampliar a participação das vítimas, fomentando a
mobilização dos grupos de moradores das áreas prejudicadas, por meio de reuni-
ões, grupos de trabalho e audiências públicas contínuas.
Como se poderia prever, essa ampliação da participação dos atingidos oca-
sionou maiores delongas à efetivação dos pontos já acordados judicialmente.
Nesse sentido, a juíza da 12ª Vara Federal de Belo Horizonte ponderou que:

“Se por um lado, a participação da sociedade civil e a oitiva dos


movimentos sociais revela-se legítima, prudente e conveniente para fins

239 Reclamação nº 31.935-MG, Rel. Diva Malerbi (desembargadora convocada do Tribunal Regional
Federal da Terceira Região), Decisão liminar proferida em 30 jun. 2016.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

de legitimidade política-social do equacionamento de tema tão delicado


e complexo, por outro lado, frise-se, tal participação, sobretudo na seara
endoprocessual, encontra limites na própria ordem constitucional,
já que, no âmbito jurídico-processual, constitui função institucional
do Ministério Público (e não dos movimentos sociais ou do universo
acadêmico) zelar pela proteção do patrimônio público e social, do meio
ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, bem como defender
judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas. (CF/88,
artigo 129, incisos III e V)” 240.

A preocupação expressada pela magistrada poderia conformar um argumen-


to pela mitigação da participação dos atingidos em prol da maior presteza na
implementação das medidas negociadas entre as empresas e o Ministério Públi-
co e demais entes legitimados.
Parece, contudo, que essas restrições poderiam acarretar novas crises de
representatividade, exacerbando os inevitáveis conflitos de interesse que exis-
tem entre diferentes grupos afetados, entre indivíduos de um mesmo grupo e
entre estes e seus representantes (ex.: os interesses dos pescadores de retoma-
da da pesca x interesses difusos ambientais; interesses das vítimas à compen-
sação financeira x uso dos recursos das empresas para projetos de despoluição
das áreas afetadas, etc.).
Mais do que restringir a participação dos atingidos, seria pertinente repensar
os mecanismos participativos, aproximando os representantes dos representados
e estes do Judiciário, de modo a se viabilizar uma participação verdadeiramente
capaz de colocar esses grupos em uma situação estratégica compatível, de fato,
àquela dos atores institucionais contra os quais litigam. Essa é uma visão co-
erente com a ideia de se assegurar a possibilidade de um exercício significativo
do direito de participar no processo, em que as partes efetivamente se sintam
parte do procedimento e sejam capazes de influir na formação da convicção do
julgador. Em outras palavras, o modelo representativo não pode significar um
tolhimento absoluto do direito de participar dos destinatários da tutela jurisdi-
cional, sob pena de este perder a sua legitimidade (dimensão procedimental) e
efetividade (dimensão finalística).

240 Ação Civil Pública nº 69758-61.2015.4.01.3400 (apensados os processos 23863-07.2016.4.01.3800 e


69758-61.2015.4.01.3400. 12ª Vara Federal de Belo Horizonte. Decisão proferida em 15 mai. 2017.

95
Maria Cecília de Araujo Asperti

Pensando, novamente, na relação entre participação e acesso à justiça, é


pertinente retomar aqui o argumento de Marc Galanter de que uma reforma
capaz de realizar a capacidade distributiva do processo deveria se ocupar da
reorganização dos litigantes ocasionais, para que estes possam atuar de forma
coordenada, perseguindo estratégias consistentes e de longo prazo, com acesso
a serviços jurídicos de qualidade.
Desse ponto de vista, a participação direta e individual no processo pode-
ria ser mitigada em favor de reformas processuais ou institucionais que fossem
capazes de proporcionar àqueles que têm menos acesso (os litigantes ocasionais
ou os ausentes) verdadeiras vantagens estratégicas na litigância travada contra
aqueles que têm mais acesso (os litigantes repetitivos).
Não se pretende negar que as oportunidades de manifestação no processo,
em especial em casos de grande repercussão social e econômica e que envolvem
direitos e interesses por vezes conflitantes, podem gerar custos e entraves ao
trâmite processual241.
A esse respeito, no entanto, é pertinente a crítica de Judith Resnik, para
quem a análise de custo-benefício da participação e do devido processo legal
demandaria estudos empíricos que não são feitos, ou são impossíveis de serem
realizados242. Qual o nível de precisão dos julgamentos em relação às oportuni-
dades de manifestação proporcionadas? Como é possível valorar ou precificar
os impactos de um julgamento injusto que decorreu dessa falta de participação?

241 Isso é especialmente verdadeiro em processos em que se visa algum tipo de reforma estrutural, em
que a articulação dos diversos atores políticos e sociais demanda tempo e recursos, fazendo com que a
prolação de uma decisão e, principalmente, a sua efetivação, envolvam procedimentos participativos
complexos. Sobre o conceito de reforma estrutural, Owen Fiss comenta: “Essa nova forma de
adjudicação é definida fundalmentalmente por duas características. A primeira é a consciência
de que a principal ameaça aos valores constitucionais norteamericanos não é proveniente de
indivíduos, mas das operações das organizações de grande porte, as burocracias do Estado moderno.
Em segundo lugar, esse novo modo de processo judicial reflete a compreensão de que, a menos que
as referidas organizações sejam reestruturadas, tais ameaças não podem ser eliminadas (...). Esse
novo modo de processo judicial, o qual eu chamo de reforma estrutura, representa um importante
avanço para a compreensão da sociedade moderna e do papel da adjudicação” (FISS, Owen. “As
bases políticas e sociais da adjudicação”. Direito como Razão Pública: processo, jurisdição e sociedade.
Coord. trad. Carlos Alberto de Salles. Trad. Daniel Porto Godinho; Melina de Medeiros Rós. Maria
Cecilia de Araujo Asperti. 2ª Ed. revista e atualizada. São Paulo: Juruá, 2017, p. 81-93, p. 82-83).
Confira-se também ARENHART, Sérgio Cruz. “Decisões Estruturais no Direito Processual Civil
Brasileiro”. Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil. v. 10, n. 59, mar./abr. 2014. Porto
Alegre, 2017, p. 67-85,).
242 RESNIK, Judith, 2008, op. cit., p. 499-500.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Quanto que o processo e a participação realmente custam para o sistema? Para


Resnik, essa alegada ineficiência do processo em decorrência da ampliação da
participação individual nem sempre é corroborada com elementos factuais, sen-
do facilmente reduzida a um cálculo utilitarista que deixaria de lado outros
valores, como a dignidade individual, a igualdade na aplicação das regras e a
própria legitimidade dos processos decisórios.
Dessa forma, a solução para esses entraves não parece residir necessaria-
mente em medidas que impliquem no tolhimento ou na limitação do exercício
do direito de participação dos destinatários do provimento jurisdicional (cuja
excepcionalidade aqui se reafirma), mas na melhor estruturação de procedi-
mentos participativos (inclusive mediados pelos representantes adequados, no
caso da ação coletiva), até porque podemos pensar que essa participação é capaz
de influir não somente na formação da convicção do julgador, mas também na
efetiva implementação e cumprimento do provimento jurisdicional e na própria
legitimação do processo judicial.
É nesse ponto que cabe aprofundar a discussão sobre participação e repre-
sentatividade adequada, mesmo que no contexto do processo coletivo, para
se perquirir em que termos a mitigação à participação direta do destinatário
do provimento jurisdicional pode ser justificada. Como se verá também, esse
questionamento é ainda mais sensível no âmbito das técnicas de julgamento
de casos repetitivos, porquanto o entendimento firmado aplica-se aos proces-
sos pendentes e futuros qualquer que seja o resultado do julgamento, podendo,
inclusive, restringir a possibilidade de discussão da questão decidida por indiví-
duos que não puderam exercer o contraditório durante o processo que levou à
formação da tese jurídica243.

243 Para Georges Abboud e Marcos de Araújo Cavalcanti, a falta de controle de representatividade
adequada no IRDR consiste em violação ao princípio do contraditório do qual decorre a
inconstitucionalidade do dispositivo legal: “Para que a decisão de mérito desfavorável proveniente
do IRDR seja aplicada vinculativamente aos processos repetitivos, é preciso que o sistema processual
brasileiro assegure o devido processo legal e, por consequência, o princípio do contraditório aos
litigantes abrangidos pelo incidente processual coletivo. E a única forma de garantir a observância
desses princípios constitucionais é permitir o controle judicial da adequação da representatividade
dos interesses do grupo. A adoção dessa técnica processual nada mais é do que um método de
adaptação do princípio constitucional do contraditório ao devido processo legal social ou coletivo”
(“Inconstitucionalidade do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) e os riscos ao
sistema decisório” In Revista de Processo, vol. 240, fev./2015, 2015, p. 224). No presente trabalho, a
participação dos litigantes ocasionais e dos “ausentes” no âmbito das técnicas de julgamento de casos

97
Maria Cecília de Araujo Asperti

3.2. Participação e representatividade no processo civil

3.2.1. Representação e substituição processual


Reafirmada a importância do direito à participação como um fator (embora
não o único) de legitimação do exercício da atividade jurisdicional, é assente
também que a conciliação deste com outros valores processuais pode levar à ne-
cessidade de mitigação da participação direta dos destinatários do provimento
jurisdicional, a qual, como também visto, reveste-se de excepcionalidade, dada
a importância procedimental e finalística do direito de participar no processo e
de influir significativamente na convicção do julgador.
Muito embora o tema do presente trabalho seja o julgamento de casos
repetitivos, é oportuno tratar do direito de participação e sua relação com o
acesso à justiça no âmbito da tutela coletiva, em que já há uma reflexão mais
consolidada sobre os problemas que decorrem da mitigação da participação
direta dos destinatários do provimento jurisdicional no processo mediante
sistemáticas representativas.
Ao analisar, precisamente, os institutos do direito processual brasileiros rela-
tivos à representação e substituição processual, não se pode confundir a noção
de representatividade adequada, própria da tutela coletiva, com a representação
processual em si, assim entendida quando o “sujeito que está em juízo em nome
alheio defendendo interesse alheio”244. Afinal, especificamente no âmbito do
processo coletivo, tem-se, em realidade, uma hipótese de substituição proces-
sual, de acordo com o modelo de legitimação extraordinária adotado no Brasil
com a Lei de Ação Civil Pública e com o CDC.
Como aponta Cândido Rangel Dinamarco, a representação processual tem
lugar nos casos em que o direito material impõe que os interesses de uma pessoa
sejam geridos ou defendidos por outra, como na representação de incapazes por
seus curadores ou tutores e de pessoas jurídicas por seus prepostos, consoante
o disposto nos artigos 71 e 75 do CPC245. Dinamarco explica, ainda, que há
no âmbito “puramente processual” a representação feita exclusivamente pelo

repetitivos é o tema do Capítulo 4 e do estudo empírico descrito nos capítulos 5 e 6, a partir das
premissas estabelecidas nas partes I e II.
244 DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I. 18ª Ed. Salvador: Juspodium, 2016, p. 358.
245 DINAMARCO, Cândido Rangel, 2017, op. cit., p. 138-139.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

advogado, a quem pertence, em regra, a capacidade postulatória, e que atua


como representante processual da parte. Em suma, o representante processual
defende interesses alheios, mas quem é parte é o representado, que irá suportar
os efeitos da sentença e ficará adstrito aos limites subjetivos da coisa julgada.
Já na substituição processual, o substituto é parte, visto que atua em nome
próprio, ainda que na defesa de interesse alheio, tendo a sua legitimação extra-
ordinária lhe sido atribuída por lei246 (artigo 18, CPC). É o caso, por exemplo,
do terceiro interessado na extinção da obrigação que possui legitimidade para
ajuizar ação de consignação em pagamento, conforme artigo 539.
Essa substituição ocorre quando há uma convergência de interesses, a ser le-
galmente reconhecida, entre o substituído e o substituto processual, que justifique
a existência de interesse de agir por parte deste na defesa dos interesses daquele.
Como afirma Susana Henriques da Costa, seria a relação entre substituto e subs-
tituído ou entre o substituto e o objeto do processo que legitimaria a escolha do
legitimado extraordinário247. No âmbito da tutela coletiva, essa relação é conhe-
cida como representatividade adequada, conforme expressão oriunda do direito
norte-americano, e que é lá reconhecida como um dos pré-requisitos de certifica-
ção da das class actions248.
Há, contudo, algumas importantes diferenças entre a substituição proces-
sual no âmbito individual e no coletivo. Como aponta Rodolfo de Camargo
Mancuso, enquanto na ação individual o “efeito prático” da decisão se projeta
somente em face do substituído, no âmbito coletivo “esse efeito é bifronte, pro-
jetando-se em face da coletividade concernente ao conflito e, também, em face

246 DINAMARCO, Cândido Rangel, 2017, op. cit., p. 363.


247 COSTA, Susana Henriques da. O processo coletivo na tutela do patrimônio e da moralidade
administrativa. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 189.
248 Sobre os demais pré-requisitos de certificação, Carlos Alberto de Salles comenta: “Verificado,
portanto, que atende àquelas condições gerais para sua jurisdicionabilidade, deverá a class action
atender aos seguintes pré-requisitos: 1. numerosidade (numerosity) - a classe deve ser numerosa
o suficiente, de forma a tornar impraticável a reunião de todos os membros em uma única
ação; 2. questões comuns à classe (commonality) - devem existir questões de fato e de direito
comuns à classe; 3. tipicidade (typicality) - os pedidos ou defesas devem ser típicas de classe; 4.
representatividade (representativeness) - deve haver a presença de representantes da classe e de
advogados aptos a adequadamente representarem os interesses dos membros da classe ausentes ao
processo ou cujo nome não esteja indicado” (“Ações Coletivas: premissas para comparação com
o sistema jurídico norte-americano” In SALLES, Carlos Alberto de; SILVA, Solange Teles da;
NUSDEO, Ana Maria de Oliveira. Processos coletivos e tutela ambiental. Santos: EDUL–Editora
Universitária Leopoldiaum, p. 17-33, p. 24).

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Maria Cecília de Araujo Asperti

do autor ideológico”, porquanto a coisa julgada vinculará demais legitimados


para propositura de demandas coletivas acerca do mesmo objeto249. Isso quer
dizer que uma sentença de improcedência poderá fazer coisa julgada, obstando
a propositura de nova ação coletiva por outro ente legitimado, especificamente
na tutela de direitos difusos e coletivos stricto sensu, excetuada a hipótese de
improcedência por insuficiência de provas, conforme regra estabelecida pelo
artigo 103 do CDC.
É importante observar, ainda, que o STF, no julgamento do Recurso Ex-
traordinário nº 573.232/SC, manifestou-se no sentido de que no caso de ações
coletivas ajuizadas por associações civis, apenas os associados que autorizaram
expressamente o ajuizamento da demanda coletiva poderão executar individu-
almente a sua sentença coletiva250. Na fundamentação do acórdão, discorre-se
que as associações atuariam no processo coletivo como representantes, e não
substitutas de seus membros251, devendo falar em seu nome no processo coleti-
vo, em nome tão somente daqueles que expressa e comprovadamente conferi-
ram autorização para tanto252.

249 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Jurisdição coletiva e coisa julgada: teoria das ações coletivas. 3ª Ed.
São Paulo: RT, 2012, p. 298.
250 “Representação – Associados – artigo 5º, inciso XXI, da Constituição Federal. Alcance. O disposto
no artigo 5º, inciso XXI, da Carta da República encerra representação específica, não alcançando
previsão genérica do estatuto da associação a revelar a defesa dos interesses dos associados. Título
Executivo Judicial – Associação – Beneficiários. As balizas subjetivas do título judicial, formalizado em
ação proposta por associação, é definida pela representação no processo de conhecimento, presente
a autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial” (Recurso Extraordinário nº
573.232/SC, Relator Ministro Ricardo Lewandovski, Redator do acórdão Ministro Marco Aurélio,
Tribunal Pleno, Julgamento em 14.05.2014).
251 “Creio, e por isso disse que a situação sequer é favorável a elucidar-se a diferença entre representação
e substituição processual, a esclarecer o alcance do preceito do inciso XXI do artigo 5º, que trata
da necessidade de a associação apresentar autorização expressa para agir em Juízo, em nome dos
associados, e o do preceito que versa o mandado de segurança coletivo e revela o sindicato como
substituto processual. Nesse último caso, a legitimação já decorre da própria Carta – representação
gênero – e também da previsão do artigo 8º, do qual não me valho. Estou-me valendo apenas daquele
referente às associações” (Voto Ministro Marco Aurélio, p. 19).
252 Ainda que este não seja o objeto de discussão do presente trabalho, insta observar que esse
entendimento representa inegável retrocesso em termos do alcance da tutela coletiva e de sua
capacidade de efetivamente promover a reorganização de litigantes ocasionais para defesa, em juízo, de
direitos transindividuais e individuais homogêneos. Como já comentado, o processo coletivo partiu de
uma aposta em incentivos para mobilização e reorganização da sociedade civil para que articulasse, por
meio de associações representativas de seus interesses, demandas coletivas relativas a direitos difusos,
coletivos e individuais homogêneos. Com a exigência da autorização expressa e individualizada dos

100
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Assim, ao se falar em “representatividade” nesta tese, faz-se referência aos


modelos processuais em que o exercício do contraditório – ou, melhor dizendo,
do direito de participação – dos destinatários da tutela jurisdicional é realizado
de modo indireto, ou mediado por um substituto processual. Feitos esses escla-
recimentos terminológicos e conceituais, passa-se à análise da representativida-
de adequada no processo coletivo, aprofundando-se, com isso, a discussão sobre
os limites e as justificativas para mitigação da participação no processo.

3.2.2. Representatividade adequada no processo coletivo


Como já mencionado, a tutela coletiva implica em uma excepcional miti-
gação da participação do destinatário do provimento jurisdicional em favor de
uma determinadada sistemática representativa, instituída, no caso brasileiro,
por meio da legitimação extraordinária ou da substituição processual.
No processo coletivo brasileiro, a legitimação extraordinária é atribuída por
lei a órgãos e entidades da administração pública direta ou indireta, ao Ministé-
rio Público e à Defensoria Pública, e a associações, para que litiguem em nome
próprio, porém em defesa de direitos pertencentes a membros de um grupo ou
da coletividade. Sobre as possíveis soluções para a legitimação nas ações cole-
tivas, em paralelo com a escolha pela autonomeação da class action americana,
Ada Pellegrini Grinover assim descreve:

“1) Legitimação concorrente a qualquer dos co-titulares, que pode


agir em juízo, na tutela do interesse comum, isoladamente ou em
litisconsórcio; 2) legitimação de alguns portadores dos interesses difusos,
como as formações sociais, cujos objetivos institucionais coincidam com
os interesses a serem tutelados; 3) legitimação de órgãos estatais, dentre
eles o Ministério Público253”.

A autora também argumenta que haveria uma profunda relação entre o re-
gime da coisa julgada e a legitimação para a causa, na medida em que a coisa

membros da associação, cria-se mais um obstáculo para efetividade dessa via de acesso à justiça, além
de um desincentivo para atuação judicial de entidades sérias, que muitas vezes tem de fazer frente a
grandes litigantes ou ao próprio Poder Público em ações coletivas custosas e complexas.
253 GRINOVER, Ada Pellegrini. “As garantias constitucionais do processo nas ações coletivas”, Revista
de Processo, v. 11, n. 43 (jul./set. 1986), p. 24/25.

101
Maria Cecília de Araujo Asperti

julgada erga omnes ou ultra partes demandaria uma representação adequada dos
interesses daqueles afetados254. Segundo ela, a representatividade adequada teria
um fundamento constitucional, enquanto forma de se assegurar que os membros
do grupo (ausentes no processo) tiveram seus interesses plenamente representa-
dos em juízo, com o amplo exercício das garantias constitucionais à ampla defesa
e contraditório pelo ente legitimado. Em sentido similar, Susana Henriques da
Costa observa que a representatividade adequada é a garantia de que a coletivi-
dade tenha sido “satisfatoriamente ouvida e defendida”, o que se revela essencial
para legitimação da sentença e dos efeitos da coisa julgada coletiva255.
Há, portanto, uma importante relação entre as oportunidades de participação,
a adequação da representatividade e os efeitos e a imutabilidade da decisão judicial.
Aprofundando-se um pouco nesse ponto, verifica-se também que a sistemá-
tica brasileira de tutela coletiva se ancora na preservação do direito individual
de ação, estabelecendo a possibilidade de o sujeito de direitos (ou parte em sen-
tido material) continuar litigando ou demandar individualmente na hipótese de
uma decisão coletiva desfavorável.
Tal como nas ações individuais, o trânsito em julgado das sentenças coleti-
vas abarca seu efeito declaratório, que se torna imutável em face da relação jurí-
dica exposta no pedido com relação aos legitimados extraordinários, que podem
expor em juízo apenas uma única relação jurídica material, salvo no caso de
improcedência por insuficiência de provas256. A esse respeito, José Ignácio Bo-

254 [pela cláusula de representatividade adequada] a parte ideológica leva a juízo o interesse meta-
individual, ‘representando’ concretamente o grupo titular do interesse, que terá exercido seus direitos
processuais, através das garantias da defesa e do contraditório asseguradas ao ‘representante’. O
mecanimo baseia-se na concepção de que o esquema representativo é apto a garantir aos membros da
categoria a melhor defesa judicial, a ponto de afirmar-se que, nesse caso, o julgado não atuaria somente
ultra partes, nem significaria real exceção ao princípio dos limites subjetivos da coisa julgada, mas
configuraria antes um novo conceito de ‘representação substancial e processual’, adaptado às novas
exigências emergentes na sociedade” (GRINOVER, Ada Pellegrini. “As garantias constitucionais do
processo nas ações coletivas”. Revista de Processo, v. 11, n. 43, jul./set. 1986, p. 24/25).
255 COSTA, Susana Henriques da. “A representação adequada e litisconsórcio – o Projeto de Lei n.
5.139/2009” In GOZZOLI, Maria Clara (coord.). Em defesa de um novo sistema de processos coletivos:
estudos em homenagem a Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 627-628.
256 “O que se torna imutável e indiscutível não é a sentença, mas apenas a sua conclusão (art. 469), o
seu elemento declaratório. A imutabilidade e indiscutibilidade operam apenas em relação às partes
perante as quais a sentença foi pronunciada, não beneficiando nem prejudicando terceiros (art. 472)”
(MESQUITA, José Ignácio Botelho de. “Coisa Julgada no Código do Consumidor”. In Coisa Julgada.
Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 23). Cumpre assinalar que, no CPC de 2015, o artigo 506 dispõe
apenas que a coisa julgada não prejudicará terceiros, o que deu espaço para interpretações no sentido de

102
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

telho de Mesquita explica que, com relação aos membros da coletividade, são os
efeitos da sentença coletiva (e não os limites subjetivos da coisa julgada) que são
erga omnes ou ultra partes, dado que o indivíduo membro da coletividade sequer
possui legitimidade para rediscutir a matéria pela via coletiva257. É resguardado
a este o direito individual de ação, com exceção do litigante individual que
tenha optado por atuar como litisconsorte em ação coletiva que verse sobre
direitos individuais homogêneos (artigo 103, §2º, do CDC)258.
Desse modo, a sentença coletiva transitada em julgado, em regra, apenas beneficia
os membros da coletividade (partes materiais ou substituídos) representados pelo le-
gitimado extraordinário (ou a parte processual), resguardando-se o direito individual
de ação tanto antes do trânsito em julgado, conforme prevê o artigo 104 do CDC no
tocante à litispendência, quanto após este, ressalvada a exceção já mencionada259. A

que seria possível beneficiar terceiros que não participaram diretamente do processo em que se formou
a coisa julgada (conforme DESTEFENNI, Marcos. “Eficácia expandida da coisa julgada individual”.
Disponível em <http://estadodedireito.com.br/eficacia/>, acesso em 10 de maio de 2017).
257 MESQUITA, José Ignácio Botelho de. “Coisa Julgada no Código do Consumidor”, p. 34-42.
258 Como afirma José Ignácio Botelho de Mesquita, essa disposição chega a ser inútil: “Essa norma [do
artigo 103 do CDC] segue o sistema do Código de Processo Civil e era desnecessária. A conclusão
de que qualquer sentença só se torna imutável e indiscutível com relação ao pedido, identificado
pelo objeto e pela causa de pedir. As ações fundadas nos direitos e ações individuais terão sempre
objeto e causa de pedir distintos dos das ações coletivas. Nunca poderiam ser por elas prejudicadas
(MESQUITA, José Ignácio Botelho de, 2004, op. cit., p. 37-38).
259 Não se ignora aqui toda a discussão atinente à existência de conexão ou de prejudicialidade entre
ações individuais e coletivas, discutida no STJ quando do julgamento do caso da cobrança das tarifas
telefônicas no Conflito de Competência nº 47.731/DF, em 2005, em que voto vencedor do Ministro
Teori Zavaski consagrou entendimento contrário à reunião ou suspensão das ações individuais
para julgamento de demandas coletivas acerca da mesma matéria (“o pedido de suspensão das
ações individuais até o julgamento das ações coletivas, além de estranho aos limites do conflito de
competência, não pode ser acolhido, não apenas pela autonomia de cada uma dessas demandas,
mas também pela circunstância de que as ações individuais, na maioria dos casos, foram propostas
por quem não figura como substituído processual em qualquer das ações coletivas. Suspender o
curso dessas ações significa, portanto, negar, na prática, acesso ao Judiciário”). Esse entendimento
foi revisto pelo STJ, em 2011, quando do julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.110.549/
RS, no caso “Projeto Poupança”, em que juízes e desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Sul decidiram suspender todas as ações individuais relativas a expurgos inflacionários de
planos econômicos para julgamento das ações coletivas atinentes à matéria. Em seu voto vencedor,
o Ministro Sidnei Benetti argumenta pela necessidade de contextualizar a interpretação das
regras processuais que regulamentam o processo coletivo a partir das reformas processuais e dos
mecanismos de julgamento de casos repetitivos, que priorizam a efetividade e a segurança jurídica
por meio da agregação de julgamentos em casos similares (“O enfoque jurisdicional dos processos
repetitivos vem decididamente no sentido de fazer agrupar a macro-lide neles contida, a qual em
cada um deles identicamente se repete, em poucos processos, suficientes para o conhecimento e a

103
Maria Cecília de Araujo Asperti

eficácia dessa decisão se opera secundum eventum litis260, favorecendo, e nunca prejudi-
cando os membros da coletividade.
Enquanto o modelo brasileiro de tutela coletiva se relaciona com as possibili-
dades “2” e “3” descritas por Grinover, o sistema da class action norteamericana
pode ser associado com a hipótese de legitimação concorrente (“1”), na medida
em que permite que o indivíduo ajuize a ação em nome da classe, cabendo às
cortes a apreciação de sua representatividade adequada. Trata-se, como explica
Owen Fiss, de uma hipótese verdadeiramente excepcional de autonomeação do
representante, elemento que conferiria um caráter quase que revolucionário à
“criação processual” da class action261.
O controle da representatividade adequada nesse modelo é feito judicial-
mente (ope judicis), cabendo ao julgador o exame das condições técnicas, ex-
periência e capacidade de exercer plenamente o contraditório e representar os
interesses de todos os membros da coletividade que poderão ser afetados pela
sentença coletiva. No âmbito federal, tal controle é balizado pelos requisitos
da conhecida Rule 23, da Federal Rules of Civil Procedure, editada em 1937 e
emendada substancialmente em 1966262 e 2003. No item 23(a), que trata dos

decisão de todos os aspectos da lide, de modo a cumprir-se a prestação jurisdicional sem verdadeira
inundação dos órgãos judiciários pela massa de processos individuais, que, por vezes às centenas de
milhares, inviabilizam a atuação judiciária”). Esses casos são discutidos no Capítulo 4, no item 4.3.2.
260 José Ignácio Botelho de Mesquita também afirma que há uma restrição dos limites subjetivos da
coisa julgada no âmbito coletivo, porquanto, diversamente do que ocorre entre titulares de ações
individuais concorrentes, a improcedência de mérito para o caso de ações calcadas em direitos
difusos ou coletivos cercearia a possibilidade de tutela por outros legitimados, mesmo aqueles que
não foram parte (MESQUITA, José Ignácio Botelho de, 2004, op. cit., p. 36-37).
261 “A class action é, de fato, uma ação judicial de representação – como já foi notado, o autor identificado
está ingressando com uma ação judicial em favor de todos os membros não identificados da classe -,
mas ela emprega um conceito peculiar de representação: autonomeação. Contrariamente à situação
em que nomeio alguém como meu procurador; na class action o autor identificado nomeia a si mesmo
como representante da classe (...). Até agora, não há negação de que a autonomeação seja uma
forma anômala de representação, apenas uma forma justificada, se o for completamente, pelas mais
excepcionais circunstâncias. Seu uso na class action revela o caráter verdadeiramente excepcional –
talvez até mesmo revolucionário – dessa criação processual”. (“A teoria política das ações coletivas”
In Direito como Razão Pública: Processo, Jurisdição e Sociedade, p. 185-198, p. 191).
262 Sobre os termos das mudanças, que incluem definição mais clara das regras de notificação dos
membros da class e da aplicação dos efeitos do julgamento, favorável ou não, a todos, vide notes of the
advisory committee às Federal Rules of Civil Procedure Disponível em <https://www.law.cornell.edu/
rules/frcp/rule_23>, acesso em 29 out. 2017.

104
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

prerrequisitos para certificação da class action, é onde se verifica a principal


referência legislativa sobre representatividade adequada:

“(a) Prerequisites. One or more members of a class may sue or be sued as


representative parties on behalf of all members only if:
(1) the class is so numerous that joinder of all members is impracticable;
(2) there are questions of law or fact common to the class;
(3) the claims or defenses of the representative parties are typical of the
claims or defenses of the class; and
(4) the representative parties will fairly and adequately protect the inte-
rests of the class”

Sobre a convergência de interesses entre o representante e os membros da


classe representada (item “3”), é de grande relevância o precedente do caso
Hansberry v. Lee, em que o autor Carl Augustus Hansberry contestava, em sede
recursal, uma restrição contratual que impedia que negros comprassem ou ar-
rendassem terras em um determinado bairro de Chicago.
Em uma class action anterior (Burke v. Kleiman263), essa restrição havia sido
considerada válida, levantando a discussão sobre a oposição da res judicata à
ação proposta contra Hansberry, que teria adquirido um imóvel no bairro a
despeito da restrição contratual. No julgamento do recurso, a Suprema Cor-
te entendeu que vincular o autor ao julgamento anterior violaria o devido
processo legal do réu, cujos interesses não teriam sido adequadamente repre-
sentados na ocasião da class action anterior264. Afinal, a autora da class action
anterior representava os interesses dos proprietários que apoiavam a restrição
e que defendiam a validade da estipulação contratual, ao passo que Hans-
berry sustentava a sua inconstitucionalidade265. Em seu voto, o Justice Stone

263 277 Ill.App. 519, 520 (Ill. App. Ct. 1934)


264 “1. That others who were privy to the agreement, but not made parties to the litigation, and whose
substantial interest was in resisting performance of the agreement, could not be bound by the decree
upon the theory that the suit was a class suit in which they were duly represented. Pp. 311 U. S.
39, 311 U. S. 44.
2. That a decree of the state court in a second, similar suit, adjudging such other persons estopped
by the former decree as res judicata from defending upon the ground that the condition precedent
of the agreement had not been fulfilled, was in violation of the due process clause of the Fourteenth
Amendment. Pp. 311 U. S. 40, 311 U. S. 44”.
265 KAMP, Allan R. “The History Behind Hansberry v. Lee”. 20 U.C. Davis L. Rev. 481, 1986-1987, p.
481-499.

105
Maria Cecília de Araujo Asperti

assevera que nem os autores e tampouco os réus da class action anterior havia
atuado ou se colocado como efetivos representantes dos moradores contrários
à convenção, de modo que aplicar o entendimento firmado em tal demanda
ao caso individual subsequente seria conferir às partes da ação coletiva um
poder e uma responsabilidade que estas não se propuseram a assumir e que
não parecem ser aptos a exercer266.
Já com relação à capacidade técnica do autor da class action e de seu advo-
gado para representar de forma justa e adequada os interesses das partes (item
“4”), André Roque Vasconcelos explica que, por ser o advogado o principal
responsável pela tomada das principais decisões e, notadamente, pelo custeio
das despesas processuais atinentes à litigância coletiva, a aferição do critério de
capacidade acaba se voltando muito mais para o causídico do que para a parte
em si267. A esse respeito, a Rule 23 também passou a definir em sua alínea (g),
a partir da emenda de 2003, os critérios pertinentes à designação do advogado
que atuará em nome do representante da classe (class counsel), estabelecendo
que para aprovação do class counsel, o julgador deverá levar em consideração o
trabalho investigativo já realizado, a experiência em outras class actions simila-
res, o conhecimento da lei aplicável e o acesso a recursos a serem utilizados para
representação da classe268.

266 “In seeking to enforce the agreement, the plaintiffs in that suit were not representing the
petitioners here whose substantial interest is in resisting performance. The defendants in the first
suit were not treated by the pleadings or decree as representing others or as foreclosing by their
defense the rights of others, and, even though nominal defendants, it does not appear that their
interest in defeating the contract outweighed their interest in establishing its validity. For a court
in this situation to ascribe to either the plaintiffs or defendants the performance of such functions
on behalf of petitioners here is to attribute to them a power that it cannot be said that they had
assumed to exercise, and a responsibility which, in view of their dual interests it does not appear
that they could rightly discharge”.
267 ROQUE, André Vasconcelos. “O que significa representatividade adequada? Um estudo de direito
comparado”. Revista Eletrônica de Direito Processual. Vol. IV. N. 4, 2009, p. 171-198, p. 190.
268 “(g) Class Counsel.
(1) Appointing Class Counsel. Unless a statute provides otherwise, a court that certifies a class must
appoint class counsel. In appointing class counsel, the court:
(A) must consider:
(i) the work counsel has done in identifying or investigating potential claims in the action;
(ii) counsel's experience in handling class actions, other complex litigation, and the types of claims
asserted in the action;
(iii) counsel's knowledge of the applicable law; and
(iv) the resources that counsel will commit to representing the class;

106
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Esse sistema de legitimação ope judicis difere, portanto, do sistema brasileiro


de ope legis, em que há a presunção de que certos entes já possuem capacidade
de representar adequadamente os interesses da coletividade. O modelo brasi-
leiro se dinstigue, também, do norteamericano no que diz respeito aos efeitos
vinculativos da decisão judicial com relação aos ausentes. Enquanto no modelo
brasileiro a decisão coletiva não impede o ajuizamento de ação individual pelo
membro da classe ou da coletividade, exceto no caso em que o indivíduo aptou
por atuar como litisconsorte do legitimado extraordinário, no sistema norte-
-americano, uma vez certificada a classe e aferida a representatividade adequa-
da do autor e de seu advogado, a res judicata coletiva atingirá todos os integran-
tes do grupo, independentemente do resultado269, ressalvada a possibilidade de
auto-exclusão (opt out)270.
Daí a relevância da notificação (fair notice) para exercício desse direito
de opt out, conforme previsto na Rule 23(c)(2). Tal dispositivo, ao regular as
chamadas mandatory class action, descritos itens (b)(1) e (b)(2)271, em que são

(B) may consider any other matter pertinent to counsel's ability to fairly and adequately represent
the interests of the class;
(C) may order potential class counsel to provide information on any subject pertinent to the
appointment and to propose terms for attorney's fees and nontaxable costs;
(D) may include in the appointing order provisions about the award of attorney's fees or nontaxable
costs under Rule 23(h); and
(E) may make further orders in connection with the appointment.”
269 (3) Judgment. Whether or not favorable to the class, the judgment in a class action must:
(A) for any class certified under Rule 23(b)(1) or (b)(2), include and describe those whom the court
finds to be class members; and
(B) for any class certified under Rule 23(b)(3), include and specify or describe those to whom
the Rule 23(c)(2) notice was directed, who have not requested exclusion, and whom the court finds
to be class members.”
270 Importante consignar que, como visto nos comentários sobre o julgamento de Hansberry v. Lee,
a aferição da existência de coisa julgada sobre a matéria decidida em ação coletiva é realizada em
eventual demanda posterior em que se busque discutir os mesmos assuntos.
271 “
(b) Types of Class Actions. A class action may be maintained if Rule 23(a) is satisfied and if:
(1) prosecuting separate actions by or against individual class members would create a risk of:
(A) inconsistent or varying adjudications with respect to individual class members that would
establish incompatible standards of conduct for the party opposing the class; or
(B) adjudications with respect to individual class members that, as a practical matter, would be
dispositive of the interests of the other members not parties to the individual adjudications or would
substantially impair or impede their ability to protect their interests;
(2) the party opposing the class has acted or refused to act on grounds that apply generally to the
class, so that final injunctive relief or corresponding declaratory relief is appropriate respecting the
class as a whole; or (…)”

107
Maria Cecília de Araujo Asperti

discutidos, em regra, direitos indivisíveis, dispõe ser necessário apenas um


appropriate notice to the class, sem que seja preciso notificar individualmente
todos os membros da classe. Já nas chamadas class action for damages da Rule
23(b)(3), é necessária a realização de uma notificação pessoal, ainda que não
seja possível notificar invidualmente todos os membros do grupo, contanto
que se ateste que houve um esforço razoável para se atingir todos os membros
que puderem ser identificados272.
Por fim, é possível ponderar se, de fato, o sistema brasileiro não comporta a
análise judicial da representatividade adequada, dada a legitimação extraordi-
nária legalmente estabelecida e atribuída aos entes da administração direta e
indireta, ao Ministério Público, à Defensoria Pública e às associações constituí-
das há mais de um ano cujos fins institucionais sejam coerentes com a defesa de
direitos coletivos (artigo 81 do CDC). Susana Henriques da Costa argumenta,
por exemplo, que há situações concretas já discutidas na jurisprudência sobre
a coerência entre o direito postulado e o ente legitimado que atua em nome da
coletividade, o que demandaria, em última análise, um exame de representati-
vidade adequada273. São exemplos o debate jurisprudencial sobre a possibilida-
de de o Ministério Público representar direitos individuais homogêneos274, da

272 COSTA, Susana Henriques. “O controle judicial da representatividade adequada: uma análise dos
sistemas norte-americano e brasileiro” In SALLES, Carlos Alberto de. As grandes transformações do
processo civil brasileiro: homenagem ao Professor Kazuo Watanabe. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p.
953-978, p. 961-962.
273 COSTA, Susana Henriques da, 2009b, op. cit., p. 953-978.
274 Constitucional e Processual Civil. Ação Civil Coletiva. Direitos Transindividuais (Difusos e
Coletivos) e Direitos Individuais Homogêneos. Distinções. Legitimação do Ministério Público. Arts.
127 e 129, iii, da CF. Lesão a direitos individuais de dimensão ampliada. Comprometimento de
interesses sociais qualificados. Seguro Dpvat. Afirmação da Legitimidade Ativa (...). No entanto,
há certos interesses individuais que, quando visualizados em seu conjunto, em forma coletiva
e impessoal, têm a força de transcender a esfera de interesses puramente particulares, passando
a representar, mais que a soma de interesses dos respectivos titulares, verdadeiros interesses da
comunidade. Nessa perspectiva, a lesão desses interesses individuais acaba não apenas atingindo a
esfera jurídica dos titulares do direito individualmente considerados, mas também comprometendo
bens, institutos ou valores jurídicos superiores, cuja preservação é cara a uma comunidade maior
de pessoas. Em casos tais, a tutela jurisdicional desses direitos se reveste de interesse social
qualificado, o que legitima a propositura da ação pelo Ministério Público com base no art. 127 da
Constituição Federal. Mesmo nessa hipótese, todavia, a legitimação ativa do Ministério Público se
limita à ação civil coletiva destinada a obter sentença genérica sobre o núcleo de homogeneidade
dos direitos individuais homogêneos. 6. Cumpre ao Ministério Público, no exercício de suas funções
institucionais, identificar situações em que a ofensa a direitos individuais homogêneos compromete
também interesses sociais qualificados, sem prejuízo do posterior controle jurisdicional a respeito.

108
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Defensoria Pública litigar coletivamente275 ou, ainda, acerca da legitimidade do


Ministério Público Estadual ou Federal para litigar sobre questões atinentes a
bens da União276.
Conclui-se, assim, que a discussão sobre representatividade adequada deve
ser balizada pela excepcionalidade da limitação ao direito individual de parti-
cipação no processo e pela capacidade do processo coletivo de promover uma
tutela mais adequada dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.
Há, nesse tocante, um debate fundamental sobre os critérios a serem aferidos
(seja no modelo ope legis, seja no ope judicis), que versam, de modo geral, sobre o
envolvimento do representante com os representados e sua capacidade técnica
de atuar em favor dos interesses daqueles que serão afetados pela tutela jurisdi-
cional. Também é necessário se pensar em salvaguardas para esses sujeitos de
direitos, que poderão optar por buscar a tutela individual.
Sem embargo do também importante discussão sobre a legitimação do in-
divíduo para propositura da ação coletiva277 e da necessidade de se repensar os

Cabe ao Judiciário, com efeito, a palavra final sobre a adequada legitimação para a causa, sendo que,
por se tratar de matéria de ordem pública, dela pode o juiz conhecer até mesmo de ofício (CPC, art.
267, VI e § 3.º, e art. 301, VIII e § 4.º)”. (RE nº 631111, Relator Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno,
julgado em 07.08.2014).
275 “Ação Direta de Inconstitucionalidade. Legitimidade Ativa da Defensoria Pública para ajuizar Ação
Civil Pública (art. 5º, inc. II, da Lei n. 7.347/1985, alterado pelo art. 2º da Lei n. 11.448/2007). Tutela
de interesses transindividuais (coletivos strito sensu e difusos) e individuais homogêneos. Defensoria
Pública: instituição essencial à função jurisdicional. Acesso à Justiça. Necessitado: definição
segundo princípios hermenêuticos garantidores da força normativa da Constituição e da máxima
efetividade das normas constitucionais: art. 5º, incs. XXXV, LXXIV, LXXVIII, da Constituição da
República. Inexistência de norma de exclusividade do Ministério Público para ajuizamento de Ação
Civil Pública. Ausência de prejuízo institucional do Ministério Público pelo reconhecimento da
legitimidade da Defensoria Pública. Ação julgada improcedente (ADI 3943, Relatora Min. Cármen
Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 07.05.2015).
276 “1. O Ministério Público Estadual não possui legitimidade para a propositura de ação civil pública,
objetivando a tutela de bem da União, porquanto atribuição inserida no âmbito de atribuição do
Ministério Público Federal, submetida ao crivo da Justiça Federal, coadjuvada pela impossibilidade
de atuação do Parquet Estadual, quer como parte, litisconsorciando-se com o Parquet Federal, quer
como custos legis (...). STJ, REsp 876936-RJ, Primeira Turma, Relator Ministro Luiz Fux, julgamento
em 21.10.2008).
277 A esse respeito, confira-se BURGO, Vitor. “Em busca da legitimação perdida: a exclusão da pessoa
física do rol de legitimados do PL 5.139/2006” In GOZZOLI, Maria Clara (coord.). Em defesa de um
novo sistema de processos coletivos: estudos em homenagem a Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: Saraiva,
2010, p. 679-704 e LANGENEGGER. Natalia. Legitimidade ativa de pessoas físicas em ações coletivas:
incentivos e desincentivos institucionais. Dissertação de mestrado defendida na Escola de Direito da
Fundação Getulio Vargas. São Paulo: 2014.

109
Maria Cecília de Araujo Asperti

argumentos essencialmente pragmáticos que embasaram a escolha do modelo


representativo ope legis brasileiro, retoma-se, aqui, a perspectiva metodológica e
a compreensão do direito social de acesso à justiça, pela qual as escolhas políti-
cas, em matéria de direito processual, que impliquem na mitigação do direito de
participação, devem ter em conta os seus impactos distributivos. Se a participa-
ção pode ser custosa e os recursos são escassos, as escolhas devem ser orientadas
no sentido de assegurar mais acesso a quem pouco tem, ainda que isso implique
em reduzir o acesso de quem utiliza o Judiciário demasiadamente.
Em se pensando sobre o desequilíbrio de recursos e de capacidade estratégica
entre as partes, formas mediadas de participação – como no processo coletivo –
podem ser justificadas na medida em que proporcionem vantagens àqueles que
se encontram em uma posição menos favorecida. Seria, como propõe Galanter,
uma tentativa de reorganização das partes, para que litigantes ocasionais possam
agir de forma mais articulada para perseguir objetivos de longo prazo. Veja-se,
contudo, que essa visão de Galanter não implica no tolhimento da participação
desses sujeitos, mas na reconfiguração dessa participação, devendo ser assegurada,
de todo modo, a possibilidade de que esses indivíduos e grupos possam influir
significativamente na condução do processo cujo provimento lhes impactará.
Caminhando, assim, para a discussão central do trabalho – sobre o acesso à
justiça, participação e representatividade nas técnicas de julgamento de casos
repetitivos – caberá perquirir, daqui para frente, se há também nesse âmbito
limitações ou restrições ao direito de participar e se estas se justificam diante
de outros valores processuais relevantes ou da possibilidade de reorganização
estratégica daqueles que serão impactados pela tutela jurisdicional – no caso,
pela tese jurídica firmada.

Síntese conclusiva da Parte II


A Parte II desta tese teve por objetivo relacionar a discussão sobre acesso à
justiça com o direito de participação no processo:

1. Há uma importante relação entre o direito de acesso à justiça e a


participação no processo, sendo necessário investigar, por meio da
perspectiva metodológica proposta, como as diferentes técnicas
processuais e as formas de participação por elas propiciadas repro-

110
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

duzem, criam ou reduzem/desestabilizam desigualdades. Para isso,


é importante compreender como os diferentes atores utilizam essas
técnicas e como as diversas formas de participação no processo po-
dem fortalecer ou enfraquecer as capacidades dos litigantes.
1.1. O direito de participar no processo deve ser assegurado a todos
os destinatários do provimento jurisdicional (partes e interes-
sados), a quem deverá ser garantido o direito de influir signifi-
cativamente na convicção do julgador e de participar dos atos
processuais em condições de igualdade, levando-se em conside-
ração, portanto, os desequilíbrios existentes entre os sujeitos;
1.2. Embora seja um elemento essencial ao processo, o direito de
participar é colocado em conflito com outros valores também
relevantes, como a efetividade da tutela jurisdicional e a dura-
ção razoável do processo. No entanto, limitações a esse direito
devem ser excepcionais, dada a sua essencialidade tanto como
elemento legitimador da atividade jurisdicional em si (dimensão
procedimental) quanto de seu resultados (dimensão finalística).
1.3. Do ponto de vista do acesso à justiça, limitações ou restrições
ao direito de participação devem ser excepcionais, sendo justifi-
cáveis apenas quando efetivamente necessária para se promover
uma reorganização nas partes, de modo a se propiciar vantagens
estratégicas aos litigantes ocasionais no confronto com os liti-
gantes repetitivos, realizando-se, com isso, o potencial distribu-
tivo do processo.

2. Como as formas de substituição processual implicam em uma miti-


gação da participação direta no processo, são hipóteses excepcionais
a serem previstas em lei. No que diz respeito à tutela de direitos
coletivos, verifica-se a substituição processual ope legis (como no
modelo brasileiro) ou sujeitas a um controle judicial de representa-
tividade adequada (como no sistema norte-americano).
2.1. Em ambos os casos, há a preocupação com a convergência de inte-
resses entre o representante e os representados e a capacidade téc-
nica daquele para defender adequadamente os interesses tutelados.

111
Maria Cecília de Araujo Asperti

2.2. É necessário se observar, ainda, que as limitações na participação di-


reta também se refletem na extensão dos limites da coisa julgada coletiva. No
Brasil, assegura-se ao indivíduo que não atuou no processo coletivo seu direito
individual de ação, enquanto nos Estados Unidos, há a tentativa de se promover
a notificação adequada (fair notice) dos membros da classe, para que possam
optar por não ser atingidos pela coisa julgada coletiva.

112
Parte III
Acesso à Justiça e Técnicas de
Julgamento de Casos Repetitivos

113
4. Participação e Representatividade
nas Técnicas de Julgamento
de Casos Repetitivos

4.1. Técnicas de julgamento de casos repetitivos

4.1.1. Diferentes racionalidades processuais relacionadas


a “casos repetitivos”
Entendendo-se o acesso à justiça como perspectiva metodológica e direito
social, cuja realização depende de escolhas políticas capazes de assegurar o di-
reito à participação aos litigantes e aos destinatários do provimento jurisdicio-
nal, cabe agora adentrar no estudo das técnicas processuais de julgamento de
casos repetitivos, suas características e aplicação, a partir das premissas colo-
cadas nos capítulos anteriores. Para tanto, a ênfase será colocada em como os
diferentes sujeitos podem utilizar e/ou serem afetados pelo uso dessas técnicas
(normativo) e, em seguida, como de fato utilizam e/ou são afetados (descritivo)
por esses mecanismos.
Nesse primeiro momento, então, serão analisadas as previsões normativas
em si, articulando-se posicionamentos doutrinários e alguns dados já existentes
sobre os julgamentos de casos repetitivos para investigar como os destinatários
do provimento jurisdicional – no caso, a tese jurídica – podem participar dos
procedimentos e influir, direta ou indiretamente, da formação da convicção
dos julgadores, desde a instauração dos procedimentos do IRDR e dos recursos
repetitivos, até a possível revisão da tese jurídica firmada.
Já os próximos capítulos têm como objetivo verificar o uso dessas técni-
cas na prática, por meio de um estudo empírico realizado em duas etapas:
uma essencialmente quantitativa, com o objetivo de traçar um panorama
das teses jurídicas já firmadas em sede de julgamento de recursos especiais
repetitivos, os atores e questões discutidas, e uma segunda etapa qualitativa,

115
Maria Cecília de Araujo Asperti

em que, a partir de um caso específico, foi possível analisar como os diferen-


tes atores participam ou tem seus interesses representados no julgamento de
um recurso especial repetitivo.
Como discutido no primeiro capítulo, a Reforma do Judiciário e a introdu-
ção da Súmula Vinculante (artigo 103-A da Constituição Federal) demarcam
uma tendência de reformas processuais voltadas para a uniformização de enten-
dimentos jurisprudenciais e a introdução de mecanismos processuais de feição
gerencial, voltados à racionalização da tramitação e julgamento de demandas
(ou questões, como veremos a seguir) e recursos considerados repetitivos. Essa
tendência foi intensificada pelo texto do CPC/2015, que sistematiza esses ins-
trumentos e trata com maior ênfase do julgamento de “casos repetitivos”, con-
ceito que será trabalhado neste capítulo.
É possível, assim, identificar algumas técnicas processuais informadas por
esses propósitos de uniformização e eficiência que, por sua vez, têm por pano de
fundo os discursos sobre morosidade e litigiosidade:

(i) Formulação de enunciados jurisprudenciais de efeito vinculante


sobre matéria constitucional, de modo a se evitar que divergências
interpretativas acarretem “grave insegurança jurídica e relevante
multiplicação de processos sobre “questão idêntica” (Súmula
Vinculante, artigo 103-A da CF);
(ii) Sumarização de julgamentos, com a possibilidade de julgamentos
liminares de improcedência de mérito, em casos que dispensem
a fase instrutória, quando houver entendimento jurisprudencial
consolidado sobre a matéria de direito (improcedência liminar do
pedido, artigo 332 do CPC);
(iii) Antecipação dos efeitos da tutela pretendida sem o requisito da
urgência, quando houver prova documental e tese jurídica firmada
em julgamento de casos repetitivos (tutela provisória de evidência,
artigo 311, inciso II, do CPC);
(iv) Filtros recursais, como a possibilidade de julgamento liminar e
monocráticio pelo relator, quando houver entendimento firmado
em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção
de competência, súmula dos tribunais superiores ou do próprio
tribunal (artigo 932, incisos IV e V, do CPC); e
(v) Técnicas de julgamento de casos repetitivos, em que, identificada

116
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

a repetição de processos ou recursos com fundamento ou que


contenham controvérsia sobre a mesma “questão de direito”,
procede-se ao julgamento desta questão, firmando-se uma tese
jurídica a ser aplicada aos casos análgos (Incidente de Resolução
de Demandas Repetitivos, artigo 976, e recursos especial e
extraordinário repetitivos, artigo 1.036, do CPC).

Com relação às técnicas referidas neste último item, remete-se a definição


do artigo 928 do CPC, pelo qual se “entende como julgamento de casos repeti-
tivos a decisão proferida em (i) incidente de resolução de demandas repetitivas;
e (ii) recursos especial e extraordinário repetitivos”.
Suscita-se, então, a discussão sobre participação e representatividade pro-
posta no capítulo anterior, agora especificamente no âmbito das técnicas de
julgamento de casos repetitivos. Há uma possibilidade efetiva de participação
dos litigantes que serão atingidos pela tese jurídica na sua formação? As partes
do caso paradigma representam os interesses dos demais interessados? Há (ou
deveria haver) algum tipo de controle de representatividade?
Para responder a essas questões, que se colocam como desdobramentos das
perguntas de pesquisa propostas, serão abordados os diferentes posicionamentos
sobre o objetivo dessas técnicas e a natureza dos efeitos da tese jurídica. A partir
dessas colocações, são debatidas as formas (e os dilemas) de participação das par-
tes e daqueles que serão atingidos pela tese na afetação do recurso representativo
da controvérsia ou na instauração do IRDR, no sobrestamento dos casos e na
possibilidade de alegar a distinção (distinguishing), bem como no julgamento e na
possibilidade de se recorrer e de se incitar a revisão da tese jurídica (overruling).

4.1.2. Julgamento por amostragem x Técnica


processual objetiva
A expressão “julgamento por amostragem” foi utilizada de modo pioneiro por
José Carlos Barbosa Moreira ao se referir à técnica de julgamento introduzida
pela Lei nº 11.418/2006, ainda no contexto do II Pacto Republicano, nos artigos
543-A e 543-B do CPC/1973278. Há, também, a referência à expressão “amos-

278 MOREIRA, José Carlos Barbosa. “Súmula, jurisprudência, precedente: uma escalada e seus riscos”.
Revista Dialética de Direito Processual. V. 27, 2005, n. 4, p. 49-58.

117
Maria Cecília de Araujo Asperti

tragem” no pronunciamento do Ministro Sepúlveda Pertence na Câmara dos


Deputados, ainda durante os debates da Reforma do Judiciário sobre a Súmula
Vinculante, em que teria afirmado ser mais fácil atentar a um argumento novo
por meio de um mecanismo de revisão de súmula do que na massa de processos
que sobem ao STF, “até porque a sentença que contém o argumento novo tem
de ser sorteada, porque não dá para conferir mais do que por amostragem”279.
Nesse sentido, Eduardo Talamini observa que a técnica do julgamento por
amostragem teria sido inicialmente introduzida pelo próprio STF em uma
alteração em seu regimento interno, feita pela Emenda Regimental nº 12,
de 17.12.2003, que disciplinou, em seu artigo 321, §5º, sobre o julgamento de
recursos extraordinários provenientes dos Juizados Especiais Federais280. O
procedimento então estabelecido era o de concessão de medida cautelar de
ofício pelo relator ou mediante provocação, para sobrestamento de processos
até o julgamento do recurso extraordinário especialmente quando a decisão
recorrida contrariasse “súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tri-
bunal Federal”. Recebidas informações e manifestações de interessados e do
Ministério Público, o recurso em questão seria colocado em pauta, com o so-
brestamento de eventuais recursos que versassem sobre “idêntica controvérsia
constitucional”. Publicado o acórdão, contendo uma súmula sobre a questão
constitucional decidida, caberia às Turmas Recursais ou de Uniformização
exercer o juízo de retratação ou julgar os recursos prejudicados, comunican-
do-se todos os Juizados Especiais Federais e às Turmas Recursais e de Unifor-
mização sobre o entendimento firmado.
Com a promulgação da Lei nº 11.418/2006, a Emenda Regimental nº 21,
de 30.04.2007, viria a revogar essa previsão, normatizando procedimentos de
repercussão geral para todos os recursos extraordinários (art. 543-A e 543-B do
CPC/1973).
A sistemática do artigo 543-B, regulada pelo artigo 328 do Regimento In-
terno do STF281, passou a prever que, em havendo “multiplicidade de recursos

279 MENDES, Gilmar. “Novos aspectos do controle de constitucionalidade brasileiro”. Direito Público,
v. 6, n. 27, 2009, p. 40
280 TALAMINI, Eduardo. “A dimensão coletiva dos direitos individuais homogêneos” In DIDIER
JR., Fredie (coord.). Julgamento de Casos Repetitivos. Col. Grandes Temas do Novo CPC. Salvador:
Juspodium, 2017, p. 139-166, p. 157.
281 Art. 328. Protocolado ou distribuído recurso cuja questão for suscetível de reproduzir-se em múltiplos
feitos, a Presidência do Tribunal ou o(a) Relator(a), de ofício ou a requerimento da parte interessada,

118
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

com fundamento em idêntica controvérsia”, caberia ao tribunal de origem a


escolha de um ou mais recursos, tidos como “representativos da controvérsia”,
para análise de repercussão geral, nos termos do artigo 543-A. A relevância da
questão constitucional debatida seria, portanto, apreciada pelo STF por meio de
uma “amostra” definida pelo tribunal de origem.
Essa técnica ganha novos contornos com a promulgação da Lei nº
11.672/2008 e a inserção do artigo 543-C no CPC de 1973, passando a ser apli-
cável ao julgamento de recursos especiais pelo STJ. Analogamente à técnica do
artigo 543-B, o julgamento de recursos especiais repetitivos também partiria da
verificação de um volume de recursos fundados em questões similares para se
selecionar um ou mais processos considerados “representativos da controvérsia”,
sobrestando-se os demais até o pronunciamento do STJ sobre a matéria. Profe-
rido o acórdão paradigma, os recursos interpostos contra decisões convergentes
com o entendimento então firmado seriam denegados, enquanto naqueles em
que a decisão recorrida fosse dissonante seria dada a oportunidade de retrata-
ção aos tribunais de origem, retomando-se o trâmite processual recursal.
Da carta de apresentação do texto do projeto de lei, apresentado pelo Minis-
tério da Justiça à Câmara dos Deputados, extrai-se que referida proposta seguia
as diretrizes estabelecidas para Reforma do Judiciário, já discutidas no Capítulo
1, e objetivava “conferir racionalidade e celeridade ao serviço de prestação ju-
risdicional, sem, contudo, ferir o direito ao contraditório e à ampla defesa282.
Ainda segundo esse documento, o projeto em questão partiria de uma sugestão
do Ministro Athos Gusmão Carneiro e visava amenizar o “problema represen-
tado pelo excesso de demanda” do STJ, em especial de processos “fundados em
matérias idênticas”.
O CPC/2015 manteve as sistemáticas de julgamento da repercussão geral e
dos recursos especiais repetitivos, estabelecendo, ainda, a possibilidade de jul-
gamento de recursos extraordinários por amostragem (artigo 1.036). Pelo re-

comunicará o fato aos tribunais ou turmas de juizado especial, a fim de que observem o disposto no
art. 543-B do Código de Processo Civil, podendo pedir-lhes informações, que deverão ser prestadas
em 5 (cinco) dias, e sobrestar todas as demais causas com questão idêntica.
Parágrafo único. Quando se verificar subida ou distribuição de múltiplos recursos com fundamento
em idêntica controvérsia, a Presidência do Tribunal ou o(a) Relator(a) selecionará um ou mais
representativos da questão e determinará a devolução dos demais aos tribunais ou turmas de juizado
especial de origem, para aplicação dos parágrafos do art. 543-B do Código de Processo Civil.
282 BRASIL, Congresso. Justificativa ao Projeto de Lei nº 1.213/2007, submetido pelo Ministério da
Justiça à Câmara dos Deputados em 28 de maio de 2007.

119
Maria Cecília de Araujo Asperti

gramento processual, estabelece-se que deverão ser selecionados ao menos dois


recursos considerados “representativos da controvérsia” e que veiculem “abran-
gente argumentação e discussão a respeito da questão a ser decidida” (§6º). Do
julgamento resultará um “acórdão paradigma”, cuja conteúdo decisório deverá
ser observado no exame de admissibilidade dos recursos que versem sobre as
questões decididas, negando-se seguimento àqueles que impugnem decisões
convergentes com a orientação firmada. Da mesma maneira, ao órgão que pro-
feriu o acórdão recorrido caberá o reexame do julgado caso este divirja do en-
tendimento estabelecido. Estabelece-se, ainda, a possibilidade de sobrestamento
de processos em primeiro e segundo grau e para posterior aplicação, por estes,
da tese jurídica firmada pelo STJ.
Para além do julgamento por amostragem pelo STF e pelo STJ, o CPC/2015
introduziu o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), no qual
também se parte da verificação de um volume de processos discutindo as mes-
mas questões jurídicas para consolidação de um entendimento sobre a matéria.
Diferentemente do recurso especial e extraordinário repetitivos, cuja afetação
se dá unicamente por iniciativa do presidente ou vice-presidente do tribunal de
origem ou pelo relator do tribunal superior, o incidente poderá ser instaurado
de ofício pelo juiz ou relator, mas também por requerimento formulado pelas
próprias partes, pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública.
Do texto do Anteprojeto do CPC de 2015 é possível inferir a relação entre a
lógica procedimental do julgamento de recursos repetitivos e a do IRDR, sendo
ambos institutos que buscam conferir maior segurança jurídica, efetividade e legi-
timidade ao Judiciário e previsibilidade às suas decisões. Também se verifica que
essas técnicas possuem uma clara inclinação gerencial, na medida em que, por
meio da procedimentalização da formação e da aplicação de teses jurídicas, leva-
riam, ao menos em tese, a uma otimização do tramite processual e redução do vo-
lume de recursos a serem apreciados pelos tribunais de segundo grau e superiores:

“Proporcionar legislativamente melhores condições para operacionali-


zar formas de uniformização do entendimento dos Tribunais brasileiros
acerca de teses jurídicas é concretizar, na vida da sociedade brasileira, o
princípio constitucional da isonomia.

Criaram-se figuras, no novo CPC, para evitar a dispersão excessiva da


jurisprudência. Com isso, haverá condições de se atenuar o assoberba-

120
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

mento de trabalho no Poder Judiciário, sem comprometer a qualidade da


prestação jurisdicional.

Dentre esses instrumentos, está a complementação e o reforço da eficiên-


cia do regime de julgamento de recursos repetitivos, que agora abrange a
possibilidade de suspensão do procedimento das demais ações, tanto no
juízo de primeiro grau, quanto dos demais recursos extraordinários ou
especiais, que estejam tramitando nos tribunais superiores, aguardando
julgamento, desatreladamente dos afetados.

Com os mesmos objetivos, criou-se, com inspiração no direito alemão, o já


referido Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, que consiste na
identificação de processos que contenham a mesma questão de direito, que
estejam ainda no primeiro grau de jurisdição, para decisão conjunta283”.

É possível questionar se o IRDR também conformaria uma lógica pro-


cedimental de julgamento por amostragem, dado que culmina na formação
de uma tese jurídica, e não em um acórdão paradigma, como no julgamento
dos recursos repetitivos. Haveria, no incidente, a prolação de um julgamen-
to a partir de uma amostra de casos, ou seu intuito é de firmar uma tese
jurídica em abstrato?
Para os fins do presente trabalho, essa discussão é cabível (embora não
seja aqui esgotada) na medida em que se relaciona com a importância dos
elementos (subjetivos e objetivos) do caso originário para a fixação da tese
jurídica. Ao se entender que a tese jurídica é firmada a partir de uma amostra
de processos ou recursos, é fundamental verificar como os elementos desses
casos originários – e a participação das partes envolvidas – pode impactar a
solução a ser conferida. Por outro lado, se a formulação da tese jurídica estiver
desatrelada de casos específicos, será mais relevante investigar as demais for-
mas de participação viabilizadas pelo procedimento, como o amicus curiae e a
audiência pública, e sua capacidade de influir efetivamente na formulação do
entendimento abstrato firmado.

283 BRASIL. Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil, 2010, p. 20-21.

121
Maria Cecília de Araujo Asperti

A esse respeito, Antonio do Passo Cabral284 e outros autores285 têm se utili-


zado das expressões “causa-piloto” e “processos-modelo” para descrever os pro-
cedimentos das técnicas de julgamento de casos repetitivos, para diferencia-los
entre si e dos mecanismos de tutela coletiva, tais como a ação civil pública e o
mandado de segurança coletivo.
Para Cabral, nas técnicas processuais de “causas-piloto”, determinados pro-
cessos são selecionados para que se possa definir, em seu julgamento, uma so-
lução a respeito de uma questão que seja repetidamente veiculada em diversos
processos (ou seja, uma questão comum)286. Este seria o procedimento dos re-
cursos especiais e extraordinários repetitivos, bem como da repercussão geral
no recurso extraordinário (artigo 1.035 do CPC/2015). Segundo o autor, haveria
nessas técnicas uma “unidade cognitiva”, porquanto o mesmo órgão que aprecia
a questão comum julga também o caso originário.
Para o Cabral, o procedimento da “causa-piloto” também poderia ser as-
sociado com o Group Litigation Order (GLO) do sistema inglês287, previsto
da Part 19 das Civil Procedure Rules de 1998, conforme redação dada pela
emenda promulgada em 2000. Pelo procedimento da GLO, em se verificando
a existência de casos em que se discutam questões de fato ou de direito co-
muns ou relacionadas, os advogados atuantes nestes processos (solicitors) ou o
próprio juízo no qual tramita um ou mais processos, podem suscitar a emissão
de uma ordem de agregação de tais casos, que passariam a ser processados e
julgados conjuntamente288. A GLO poderá também determinar a seleção de

284 CABRAL, Antonio do Passo. “A escolha da causa-piloto nos incidentes de resolução de processos
repetitivos” In DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Julgamento de casos Repetitivos.
Coleção Grandes Temas do Novo CPC. Vol. 10. Salvador: JusPodium, 2017, p. 37-64.
285 Também utilizam essas expressões Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha (2017, op. cit, p.
593-594) e André Vasconcelos Roque (“Ações coletivas e procedimentos para a resolução de casos
repetitivos” In DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Julgamento de casos Repetitivos.
Coleção Grandes Temas do Novo CPC. Vol. 10. Salvador: JusPodium, 2017, p. 15-36.
286 CABRAL, Antonio do Passo, 2017, op. cit., p. 38-39.
287 Civil Procedure Rules Part 19, Section III. A definição está prevista no item 19.10: “A Group
Litigation Order (‘GLO’) means an order made under rule 19.11 to provide for the case management
of claims which give rise to common or related issues of fact or law (the ‘GLO issues’)”.
288 Sobre o Group Litigation Order, e propondo uma distinção entre esse mecanismo e as técnicas
representativas (em especial a class action), vide ANDREWS, Neil. “Multi–Party Proceedings in
England: Representative and Group Actions”. Duke Journal of Comparative & International Law.
Vol. 11, n. 2, 2001, p. 249-267. O autor afirma, inclusive, que a forma mais comum de instauração
desse procedimento é por iniciativa conjunta dos advogados (solicitors) dos processos que serão

122
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

uma ou mais “demandas-teste” (test claim)289, para que as decisões proferidas


nestas sejam vinculadas a todas as demandas similares que integrem o grupo
de processos agregados290.
Importante pontuar, contudo, que a GLO determina gerenciamento conjun-
to do contingente de processos em que a questão de fato ou de direito comum ou
relacionada é veiculada. Esses processos são cadastrados em um registro (group
register) e passam a ser gerenciados por um mesmo juízo (management court),
de acordo com os termos da ordem de agregação. Diversamente, a afetação de
recursos especiais e extraordinários repetitivos acarreta no sobrestamento de
recursos e de processos, e não na sua reunião para processamento conjunto291.
Não há, portanto, um gerenciamento da litigância repetitiva como um todo (ou
seja, do contingente total de processos em que determinada questão de direito
é discutida), cabendo a cada órgão julgador a identificação de casos a serem
sobrestados até o julgamento da tese292.

reunidos. Confira-se também MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. Incidente de Resolução de


Demandas Repetitivas: sistematização, análise e interpretação do novo instituto processual. Rio de
Janeiro: Forense, 2017, p. 55-62.
289 Conforme item 19.13 do Civil Procedure Rules, que dispõe sobre o gerenciamento do GLO, poderá
o juízo selecionar uma ou mais “demandas teste” para proferir seu julgamento: “Directions given by
the management court may include directions (a) varying the GLO issues; (b) providing for one or
more claims on the group register to proceed as test claims; (c) appointing the solicitor of one or
more parties to be the lead solicitor for the claimants or defendants; (d) specifying the details to
be included in a statement of case in order to show that the criteria for entry of the claim on the
group register have been met; (e) specifying a date after which no claim may be added to the group
register unless the court gives permission; and (f) for the entry of any particular claim which meets
one or more of the GLO issues on the group register”. Não há uma especificação de critérios para
escolha dessa “demanda teste” no direito inglês. Dispõe-se, contudo, sobre a hipótese de ser firmado
um acordo na “demanda teste”, quando então outra deverá ser selecionada, sendo certo que ordens
conferidas até então na demanda teste continuam válidas e vinculantes para as “demandas teste”
substitutas (item 19.5).
290 ANDREWS, Neil, 2001, op. cit., p. 261.
291 Na Group Litigation Order, para vinculação do julgamento é necessário que o processo seja cadastrado
em registro próprio (“Group Register”), a menos que a corte determine que casos registrados
posteriormente ao julgamento da GLO também sejam vinculados, conforme item 19.12. “(1) Where
a judgment or order is given or made in a claim on the group register in relation to one or more GLO
issues – (a) that judgment or order is binding on the parties to all other claims that are on the group
register at the time the judgment is given or the order is made unless the court orders otherwise; and
(b) the court may give directions as to the extent to which that judgment or order is binding on the
parties to any claim which is subsequently entered on the group register)”.
292 Em sentido diverso, ou seja, entendendo que as técnicas de julgamento de demandas repetitivas
seriam uma espécie de group action similar ao procedimento da GLO, confira-se BASTOS, Antonio

123
Maria Cecília de Araujo Asperti

Voltando aos conceitos da “causas-piloto” e de “processos-modelo” descritos


por Cabral, tem-se que, neste segundo, são apreciadas apenas as questões comuns
a todos os casos, reservando-se ao juízo de cada caso originário a competência
para prolação de uma solução própria para o caso concreto que incorpore a tese
jurídica definida. Haveria, assim, uma cisão cognitiva e decisória, ou uma divisão
de competências entre o órgão que julga a questão comum do processo-modelo e
o órgão que decide o caso concreto, aplicando a tese definida (e não apenas repro-
duzindo a solução conferida, como na sistemática da “causa-piloto”)293. A deci-
são do “processo-modelo” seria, portanto, uma decisão objetiva sobre as questões
colocadas, sendo esta, a seu ver, a técnica processual do procedimento-modelo
alemão (Musterverfahren)294, principal inspiração do IRDR.
Embora utilizem expressões similares as de Cabral, Fredie Didier Jr. e Leo-
nardo Carneiro da Cunha conferem significados ligeiramente diversos em suas
definições: para os autores, no procedimento de “causa-piloto”, há a seleção de
um caso a partir do qual será fixada a tese jurídica a ser aplicada aos demais ca-
sos similares, ao passo que na “causa-modelo”, seria instaurado um procedimen-
to apenas para se fixar a tese jurídica, não havendo a escolha de um caso a ser
julgado295. Diferentemente de Cabral, eles entendem que o IRDR também seria
um procedimento de “causa-piloto” (tal como os recursos repetitivos), visto que,
justamente por ser um “incidente”, não seria possível sua instauração sem que
houvesse uma causa pendente no tribunal, sendo, assim, imprescindível a esco-
lha de uma “amostra” para julgamento.
A despeito dessa diferença na classificação do IRDR, Didier Jr. e Cunha
também entendem haver uma cisão cognitiva e decisória no incidente: uma
vez instaurado o IRDR, ter-se-ia, de um lado, o processo originário, recurso ou
remessa necessária (o “caso-piloto”), e, de outro, o procedimento incidental (o

Adonias Aguiar. “Situações jurídicas homogêneas: um conceito necessário para o processamento das
demandas de massa”. Revista de Processo. n. 186, v. , 2010, p. 87-107.
293 CABRAL, Antonio do Passo, 2017, op. cit., p. 39-40.
294 Sobre a criação do Musterverfahren na Alemanha e principais aspectos normativos, confira-
se BAETGE, Dietmar. “Germany”. Class Actions, Group Litigation & Other Forms of Collective
Litigation. v. 15, 2014. Disponível em <http://www. law. stanford. edu/display/images/dynamic/
events_media/Germany_National_Report. pdf>, acesso em 07 dez. 2017.
295 DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 3. 13ª
Ed. Salvador: 2017, p. 593-594. Os autores utilizam a expressão “causa modelo” (e não “processo
modelo”), porém com o mesmo significado.

124
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

incidente em si) para definição da tese jurídica. Em havendo a desistência ou


abandono da “causa-piloto”, restaria caracterizada uma hipótese de “processo-
-modelo”, em que se prossegue com o julgamento do incidente apenas para
definição da tese a ser adotada, e não mais do “caso-piloto”. Essa seria uma
situação rara, visto ser aplicável ao IRDR a disposição do artigo 1.036, §§2º
e 5º, que estipula a escolha de ao menos dois casos para se proceder ao julga-
mento de casos repetitivos.
Mesmo com as divergências apontadas, o entendimento daqueles que traba-
lham com as noções de “causa-piloto” e de “processo-modelo” reafirma a im-
portância dos processos originários, seja como uma amostra para definição de
uma solução única a casos similares, seja para que a partir dos elementos destes
seja instaurado um incidente, ainda que de feições objetivas (para se firmar uma
tese in abstrato). Tanto assim que os autores que seguem essa linha de entendi-
mento reafirmam a importância dos critérios de escolha do caso paradigma296,
tanto no caso dos recursos repetitivos quanto para a instauração do IRDR297.
Em sentido diverso, e adentrando mais especificamente na importância dos
elementos do caso originário para o IRDR, Sofia Temer defende que os elemen-
tos do caso originário não seriam essenciais para a fixação da tese, tendo em
vista ser o incidente uma técnica processual essencialmente objetiva, própria de
uma atividade jurisdicional atípica, cujo intuito não seria resolver diretamente
“lides” ou conflitos sociológicos, mas sim questões jurídicas em comum298. Para
a autora, o IRDR deverá ser instaurado a partir de casos concretos e instruído
de modo a “representar fidedignamente a controvérsia, para que o tribunal pos-
sa analisar a maior amplitude de fundamentos e fixar a tese jurídica”299, porém
sem que órgão julgador esteja atrelado aos aspectos fáticos e jurídicos de um ou
alguns casos em particular.
Não se trataria, a seu ver, de uma cognição completamente abstrata e apar-
tada dos elementos fáticos dos casos em que a controvérsia é veiculada, mas

296 Utilizaremos essa expressão “caso paradigma” para que não haja confusão com as conceituações de
causa-piloto ou processo-modelo mencionadas.
297 CABRAL, Antonio do Passo, 2017, op. cit., p. 41-42. DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo
Carneiro. 2017, op. cit., p. 615-616.
298 TEMER, Sofia. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. 2ª Ed. Salvador: Juspodium, 2017, p.
65-89.
299 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 80.

125
Maria Cecília de Araujo Asperti

cuja realização se daria a partir de “fatos pressupostos, projetados, generaliza-


dos”, ou, como a autora denomina, de “fatos-tipo”, capazes de caracterizar a
“situação fática padrão”300. Os “fatos-tipo” deverão ser descritos pelo órgão jul-
gador tendo em conta os elementos extraídos dos casos nos quais a controvérsia
se repete, em uma atividade em que se mesclaria a concretude com a abstração.
Caberia aos julgadores, mediante observação dos padrões que se reproduzem
nesse processos, extrair os elementos tidos como homogêneos e relevantes para,
então, conceber um “modelo fático” que permitisse aplicar futuramente a tese
por meio da aproximação de fatos dos casos concretos com os “fatos-tipo” da
“situação fática padrão”, ou da “situação modelo”301.
Ainda com relação ao IRDR, a importância do caso originário e sobre a racio-
nalidade da técnica processual (julgamento por amostragem ou técnica processu-
al objetiva) é suscitada, por vezes, na discussão sobre a necessidade (ou não) de o
incidente ser instaurado a partir de um caso já em tramitação no tribunal.
Como sustenta Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, esse questionamento
decorre de uma mudança do texto legal, ocorrida durante o processo legislati-
vo, em que foram excluídos os dispositivos em que se exigia expressamente a
preexistência de processos em tramitação perante o tribunal302. Para ele, não
caberia perquirir a natureza do IRDR, mas sim a existência (ou não) de um
pressuposto processual de seu cabimento. Nesse sentido, o autor opina pela pos-
sibilidade de instauração do incidente independentemente da tramitação de
um recurso sobre a matéria, de modo que a apreciação do caso concreto seja
realizada pelo juiz natural, seja ele em primeiro ou em segundo grau. Mendes
defende, portanto, que haveria uma cisão cognitiva no julgamento do IRDR,
cabendo ao órgão competente para julgamento do incidente apenas a fixação da
tese jurídica, que deverá, por sua vez, ser aplicada pelo órgão competente para

300 “O incidente será instaurado a partir de alguns casos concretos, nos quais haja discussão sobre a
questão de direito. Tais ‘causas’, apesar de servire como substrato para o incidente, com ele não se
confudem. Instaurado o incidente, há uma separação em relação aos casos concretos, já que não há
no IRDR a resolução do conflito subjetivo. Essa separação é essencial para garantir a qualidade da
cognição operada no incidente, que deve analisar a controvérsia sem se vincular demasiadamente às
peculiaridades do caso concreto, de modo a estabelecer uma tese que possa ser usada como padrão
decisório” (TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 73-78).
301 TEMER, Sofia, 2017, op. cit.,, p. 75.
302 MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 105-106.

126
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

o julgamento do caso originário303. Esta seria uma opção política em matéria de


direito processual, coerente com o intuito do IRDR de responder a uma crise
de congestionamento e eficiência do Judiciário, visto que, caso a instauração
do incidente fosse limitada aos casos em que já houvesse recursos pendentes
em segundo grau, haveria um significativo comprometimento desses objetivos.
Como se pode ver, há, ainda, diversas questões processuais a serem debati-
das acerca da aplicação desses mecanismos processuais, em especial o IRDR,
dada a sua recente inserção no ordenamento brasileiro. Não é objeto do pre-
sente trabalho esgotar essas questões, mas apenas suscita-las na medida em que
sejam pertinentes para compreensão de como se dá a participação daqueles que
serão afetados pela tese jurídica a ser fixada.
Analisando-se esses diferentes pontos de vista sobre a racionalidade das téc-
nicas de julgamento de casos repetitivos, afigura-se mais assente que a discussão
da tese jurídica tenderá a uma abstração do arcabouço fático dos casos concre-
tos, na tentativa de formular um enunciado que possa ser aplicado para o maior
contingente de casos em que a questão decidida é veiculada.
No entanto, é importante levar em conta que tanto os recursos repetiti-
vos quanto o IRDR foram concebidos como instrumentos processuais vol-
tados ao “enfrentamento” da litigiosidade repetitiva, conforme debatido no
Capítulo 1 do presente trabalho. Assim, não há como se desvincular total-
mente o julgamento das questões consideradas repetitivas da compreensão
dos contornos dessa litigiosidade, cuja dinâmica interpartes e repercussões
socioeconômicas e interesses envolvidos são aspectos fundamentais para a
aplicação da técnica processual.

303 “Há, portanto, uma cisão cognitiva ainda que virtual e não física, firmando-se a tese jurídica
no procedimento incidental em que haverá se reproduzido o ‘modelo’ que melhor represente a
controvérsia jurídica que se repete em dezenas ou milhares de pretensões. A tese jurídica será aplicada
em seguida às demandas repetitivas, por ocasião do julgamento propriamente dito da causa perante o
juízo em que tramitar o processo, momento este em que será feita também a análise e julgamento das
questões éticas e das questões jurídicas não comuns pelo juízo competente, esgotando-se a análise da
pretensão ou demanda propriamente dita (MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. “O incidente de
resolução de demandas repetitivas no novo Código de Processo Civil”. Revista de Processo. V. 243,
maio/2015, p. 290). Também nesse sentido, quanto à cisão decisória, Sofia Temer assevera que “não
há, no IRDR, julgamento da causa, mas sim uma cisão decisória, que faz com que o tribunal aprecie,
no incidente, apenas a controvérsia de direito (num misto de abstração e concretude), sem julgar
nenhum conflito subjetivo. O tribunal, como órgão superior, responsável (também) por uniformizaçr
a aplicação do direito, exerce sua função de fuxar um entendimento sobre a mesma questão de direito
que se repete em diversos processos” (TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 111).

127
Maria Cecília de Araujo Asperti

A despeito da escassez de estudos empíricos sobre a litigiosidade repetitiva,


tem-se como traço característico o fato de essa litigiosidade surgir no bojo das
relações travadas entre indivíduos e o Estado e pessoas jurídicas de direito pri-
vado de grande porte, em que a repetição de questões jurídicas similares decor-
re, justamente, do fato de que essas relações são regidas pelas mesmas normas
e/ou por contratos padronizados, além de estarem inserida em um arcabouço
fático em comum. Deste modo, por mais que os recursos repetitivos e o IRDR
se proponham a firmar teses jurídicas sobre questões predominantemente de
direito, tem-se que aspectos não jurídicos e de grande repercussão econômica,
social e política são, frequentemente, centrais à discussão da tese jurídica.
Pense-se, por exemplo, na repercussão e nos impactos socioeconômicos da
consolidação do entendimento judicial em questões como a licitude do rea-
juste de contratos coletivos de plano de saúde por mudança de faixa etária
aos 59 anos304; a validade da cláusula de tolerância de 180 dias ordinariamen-
te inserida em contratos de compromisso de compra e venda de imóveis em
construção305; a possibilidade de cobrança, por instituições financeiras, de juros
remuneratórios superiores a 12% ao ano306; o direito do servidor público às dife-
renças salariais decorrentes de desvio de função307; a interpretação do requisito
de renda per capita familiar para fins de concessão do benefício assistencial
previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS)308; para apenas dar
alguns exemplos de questões já decididas ou pendentes de decisão em sede de
julgamento de casos repetitivos.

304 TJSP, IRDR nº 0043940-25-2017.8.26.0000, Desembargador Relator Grava Brazil, admissão em


26.10.2017.
305 TJSP, IRDR nº 0023203-35.2016.8.26.0000, Desembargador Relator Francisco Loureiro, admissão
em 18.08.2016, julgamento em 31.08.2017.
306 STJ, Recurso Representativo da Controvérsia REsp nº 1.061.530/RS, 2ª Seção, Relatora Ministra
Nancy Andrighi, Tema nº 12: “A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si
só, não indica abusividade”, julgamento em 22.10.2008.
307 STJ, Recurso Representativo da Controvérsia REsp nº 1.091.539/AP, 3ª Seção, Relatora Ministra
Maria Thereza de Assis Moura, Tema nº 14: “Reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às
diferenças salariais decorrentes”, julgamento em 26.11.2008.
308 STJ, Recurso Representativo da Controvérsia REsp nº 1.112.557/MG, 3ª Seção, Relator Ministro
Napoleão Nunes Maia Filho, Tema nº 185: “A limitação do valor da renda per capita familiar não
deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover
a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se
aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda
per capita inferior a 1/4 do salário mínimo”, julgamento em 28.10.2009.

128
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Ademais, do regramento processual se infere que há um grande peso na


participação das partes do caso originário, mesmo no âmbito do IRDR. Basta
verificar que o relator do incidente requisitará informações ao juízo no qual se
discute o objeto do incidente (artigo 982, inciso II) e assegurará às partes deste
um tempo de fala consideravelmente maior do que para os demais interessados,
que terão seu tempo de sustentação oral dividido entre si (artigo 984, inciso II),
além de as partes possuírem legitimidade para instauração do próprio incidente
e para provocar a revisão da tese jurídica (artigo 986).
Portanto, ainda que se entenda que a formação da tese jurídica seja fruto de
um processo objetivo e, portanto, desvinculado dos elementos dos casos para-
digma, é necessário questionar como se dá a participação daqueles que serão
afetados pela tese jurídica na discussão das questões jurídicas, mas também
do substrato fático e das implicações da solução judicial a ser conferida a tais
questões. Esse ponto será aprofundado no item a seguir e retomado também no
estudo empírico, em especial no estudo de caso descrito no Capítulo 6.

4.1.3. “Casos repetitivos” ou “questões repetitivas”?


A importância dos elementos fáticos e jurídicos dos recursos representativos
da controvérsia ou dos processos a partir dos quais é instaurado o IRDR tam-
bém depende da compreensão de qual seja, efetivamente, o objeto dessas técni-
cas: a apreciação de questões de direito que se repetem ou a formulação de teses
jurídicas para processos repetitivos que lidam com questões de direito similares?
Como colocado no Capítulo 1, a litigiosidade repetitiva decorre da prolife-
ração de demandas que reverberam a atuação de grandes entes públicos ou pri-
vados, que justamente em razão de serem regulados por leis, normas e contratos
similares, tendem a judicializar ou serem acionados judicialmente em demandas
que suscitam as mesmas questões de fato e de direito, em volume significativo
e compatível com a amplitude de sua atividade. A preocupação com a litigiosi-
dade repetitiva – embora não tenha sido embasada em um diagnóstico claro de
suas causas e contornos – foi central nas reformas processuais que instituíram
as técnicas de julgamento de casos repetitivos.
Ainda assim, como visto no item anterior, há divergências sobre o escopo
dessas técnicas: se se voltariam ao julgamento de casos efetivamente similares
ou se serviriam apenas para resolver questões jurídicas que sejam judicializadas

129
Maria Cecília de Araujo Asperti

repetidamente, ainda veiculadas em demandas em que não haja similitude en-


tre seus elementos fático.
Alinhando-se ao primeiro posicionamento, Luiz Guilherme Marinoni sus-
tenta que o objeto das técnicas de julgamento de casos repetitivos seria a re-
solução de questões veiculadas em demandas repetitivas, ou seja, em processos
em que haja similitude nos aspectos fáticos discutidos309. Para Marinoni, seria
fundamental verificar, em se tratando de questão de direito decorrente de fatos
incontroversos, se o substrato fático é o mesmo para todas as demandas con-
sideradas repetitivas, de modo que o objeto do julgamento seja, efetivamente,
somente a apreciação da questão jurídica comum.
Em sentido similar, e tratando especificamente do IRDR, Amanda de Araú-
jo Guimarães entende que o objeto do incidente deve ser compreendido levan-
do-se em conta sua denominação (notadamente a expressão “demandas repeti-
tivas”), propósitos e requisitos, e conclui ser esta uma “técnica decisória que visa
ao julgamento de questões predominantemente de direito que possam surgir no
contexto de litigiosidade repetitiva”310. A autora se distancia do posicionamento
(discutido no item anterior) de que o mecanismo seria uma técnica processual
objetiva, e entende que, ainda que o julgamento do incidente possa se resumir
a um enunciado acerca da questão predominantemente de direito discutida, a
análise desta deverá “estar atrelada à litigância repetitiva identificada, até por-
que a função jurisdicional não é propriamente a de formular teses, demonstran-
do-se questionável a atribuição de caráter normativo ao mecanismo”311.
De outra parte, outros autores312 sustentam que as técnicas de julgamento de
casos repetitivos têm por objeto somente a apreciação da questão jurídica co-
mum, ainda que ela seja extraída de processos com objetos (mérito) totalmente

309 MARINONI, Luis Guilherme. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas: decisão de questão
idêntica x precedente. São Paulo: RT, 2016b, p. 51-52.
310 GUIMARÃES, Amanda de Araújo. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. São Paulo:
Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito USP: 2017, p. 150-154.
311 GUIMARÃES, Amanda de Araújo, 2017, op. cit., p. 154.
312 Nesse sentido: TEMER, Sofia, 2017, op. cit.; DIDIER JR., Fredie; DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR.,
Hermes. “Ações coletivas e o Incidente de Julgamento de casos repetitivos” In DIDIER JR., Fredie
(coord.). Julgamento de Casos Repetitivos. Col. Grandes Temas do Novo CPC. Salvador: Juspodium,
2017, p. 181-191; MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro; RODRIGUES, Roberto de Aragão
Ribeiro. “Reflexões sobre o incidente de resolução de demandas repetitivas previsto no projeto de
novo Código de Processo Civil”. Revista de Processo. Vol. 211. Set/2012, versão digital.

130
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

diversos. Nesse sentido, traçam também comparações e diferenciações entre os


procedimentos de julgamento de casos repetitivos e a tutela coletiva313.
Como visto no item anterior, esta é, em linhas gerais, a posição de Sofia
Temer, que entende que o objeto do IRDR é a questão jurídica comum que
se repete em vários processos, não havendo a exigência de “uma relação subs-
tancial padrão e tampouco de uniformidade em relação às causas de pedir e
pedidos” considerados repetitivos ou que guardem alguma similitude entre
si314. O objeto do IRDR seriam as “questões repetitivas”, e não “demandas
repetitivas” propriamente ditas315.
A propósito da comparação das técnicas com a tutela coletiva, Sofia Te-
mer cuida também de distinguir o que seriam “questões comuns” de direitos
individuais homogêneos. Diferentemente de outros autores, que atribuem uma
dimensão híbrida (processual e material) à natureza coletiva dos direitos in-
dividuais homogêneos316, Sofia Temer entende serem estes direitos individuais
cuja dimensão coletiva se manifesta apenas da perspectiva processual, ou seja,

313 Muito embora esses institutos tenham sido inseridos no ordenamento jurídico brasileiro em
contextos bastante diversos e tenham sido embasados em discursos também distintos, como visto
no Capítulo 1. Também nesse sentido, André Vasconcelos Roque comenta: “Ao contrário do que
se poderia imaginar, o IRDR e a sistemática dos recursos repetitivos disciplina no novo CPC não
afastarão a necessidade de adequada tutela coletiva no Brasil. Isso porque os objetivos perseguidos
pelas ações coletivas são mais amplos que os almejados pela resolução de casos repetitivos. Tais
procedimentos têm por finalidade evitar a multiplicação de processos, proporcionando isonomia,
celeridade e segurança jurídica. Não está entre suas finalidades, todavia, promover o acesso à justiça,
nem assegurar a tutela de direitos ontologicamente coletivos e insuscteíveis de fracionamento – ou
seja, difusos e coletivos stricto sensu” (2017, op. cit., p. 31).
314 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 63.
315 “Então, apesar de a lei empregar o termo demandas repetitivas, o que se verifica é que há utilização
não técnica do termo ‘demanda’, nesse contexto. Isso porque, a rigor, ao falar em demandas
repetitivas deveríamos nos refereir a pretensões homogênas, relativas a relações-modelo. Ou seja,
atos de postulação constituídos de causa de pedir e pedidos similares, porque referentes a situações
análogas. Afinal, o termo demanda, apesar de ser empregado em contextos diversos, significa o ato
de postulação, relativo a uma relação jurídica material, o qual é identificado pelo pedido e causa
de pedir referentes a determinadas partes. Não obstante, para o sistema processual do CPC/2015,
demandas repetitivas também compreendem demandas que não se referem a relações substanciais-
modelo, não contêm causas de pedir e pedidos similares (demandas heterogênas, portanto), mas
possuem áreas de homogeneidade, relativas a uma ou algumas das questões discutidas em juízo. As
demandas são caracterizadas como repetitivas mesmo nos casos em que apenas algumas questões
nelas debatidas o sejam” (2017, op. cit., p. 61).
316 DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes, 2017, op. cit., p. 182-183.

131
Maria Cecília de Araujo Asperti

da possibilidade de seu tratamento pela via da ação coletiva317, que teria lugar
quando houvesse prevalência de questões comuns às particularidades de cada
caso318. Dessa forma, o objeto do IRDR não se confundiria, tampouco poderia
ser definido, a partir dessa categoria, havendo aproximações apenas circunstan-
ciais entre o instituto e a ação coletiva em situações em que há similitude com
relação às pretensões substanciais.
A esse respeito, e em sentido diverso do que sustenta Sofia Temer, Fredie
Didier Jr. e Hermes Zanetti Jr. argumentam que tanto as ações coletivas quan-
to os instrumentos de julgamento de casos repetitivos podem ser considerados
“processos coletivos”, visto que em ambos a relação jurídica litigiosa envolve,
em um de seus polos, um grupo (comunidade, categoria, classe, etc.), e se vei-
cula uma discussão acerca de uma “situação jurídica coletiva” comum a esse
grupo319. Na ação coletiva, esta “situação jurídica coletiva” seria o seu próprio
objeto, enquanto no julgamento de casos repetitivos, consistiria no direito à
“certificação da questão repetitiva”320. Admite-se, portanto (e aqui de forma
mais alinhada ao posicionamento da autora mencionada), o uso do IRDR e dos
recursos repetitivos mesmo em casos nos quais o objeto litigioso seja diverso
(“processos heterogêneos”), sendo comum apenas as questões jurídicas que, se-
gundo os autores, seriam normalmente de cunho processual.
Também discutindo a relação entre as técnicas de julgamento de casos repe-
titivos e as ações coletivas, André Vasconcelos Roque expressa entendimento
similar ao afirmar que os procedimentos de resolução de casos repetitivos têm
por objeto a solução de questões comuns (ele fala em “questões incidentais”),
que podem ser extraídas tanto de demandas que veiculam direitos individu-
ais homogêneos, quanto de demandas consideradas heterogêneas, ou seja, nas
quais as questões de mérito não são necessariamente similares321. O autor afirma
haver sobreposição entre os escopos das ações coletivas e das técnicas de julga-
mento de casos repetitivos, precisamente no tocante a apreciação de questões
comuns em demandas que tenham por objeto direitos individuais homogêneos.

317 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 45-52.


318 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 56-57.
319 DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes, 2017, op. cit. p. 181-191, p. 185-186.
320 DIDIER JR., Fredie; ZANETI JR., Hermes, 2017, op. cit., p. 186.
321 ROQUE, André Vasconcelos Roque, 2017, op. cit., p. 30-32.

132
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Esse também é o posicionamento expressado por Eduardo Talamini, que


afirma que os mecanismos de julgamento por amostragem podem ser empre-
gados para tutela de direitos individuais homogêneos, desde que a discussão se
resuma às questões de direito, mas também podem ter por objeto questões de
cunho processual, debatidas em processos com objetos distintos, ou até mesmo
questões de direito insertas em ações coletivas para tutela de direito difuso ou
coletivo em sentido estrito322.
O entendimento pelo qual os instrumentos processuais de julgamento de
casos repetitivos são aplicáveis a partir da aferição da identidade de questões
de direito, mesmo que em processos com objetos distintos, não coloca ênfase
no conceito de casos, demandas ou recursos repetitivos. A correlação entre os
processos considerados repetitivos residiria, por esse ponto de vista, tão somen-
te na existência de uma ou de mais questões jurídicas em comum, ainda que
inseridas em arcabouços fáticos diversos. Isso seria particularmente pertinente
no tocante às questões processuais, tais como prazos prescricionais, requisitos
de cabimento de recursos, pressupostos processuais, legitimidade processual e
interesse de agir, etc. (artigo 928, §1º, do CPC/2015).
Um primeiro ponto a ser colocado é a dificuldade de se distinguir questões
de fato e de direito, problematização esta que não se esgota no âmbito das técni-
cas de julgamento de casos repetitivos, mas que ocorre, precipuamente, no bojo
da análise de admissibilidade dos recursos especiais e extraordinários.
A esse respeito, Teresa Arruda Alvim Wambier afirma que seria impossível
fazer uma diferenciação absoluta entre questões de fato e de direito, porquanto
“o direito acontece quando se encontram o mundo dos fatos com o mundo das
normas”, podendo se falar, em realidade, em questões predominantemente de fato
ou de direito, a depender se o foco da atenção do julgador estará na aferição
dos fatos ou na interpretação do texto normativo, já que os aspectos fáticos não
seriam controvertidos323-324.

322 Eduardo Talamini dá como exemplo o caso em que seccionais da OAB de diferentes unidades da
Federação ajuizassem ações coletivas visando ao reconhecimento de determinado direito da classe
dos advogados (2017, op. cit., p. 160-162).
323 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. “Distinção entre questão de fato e questão de direito para fins de
cabimento de recurso especial”. Revista de Processo. v. 23, n. 92, out./dez., 1998, p. 52–70, p. 53.
324 Assim, fica evidente a conotação problemática da “questão unicamente de direito”, do artigo 976, I,
do CPC/2015, e outrora inserida no artigo 285-A no CPC/1973 (conforme BRESOLIN, Umberto.
“Considerações sobre o Artigo 285-A do Código de Processo Civil” In CARMONA, Carlos Alberto.

133
Maria Cecília de Araujo Asperti

Desse modo, pode se assumir que tanto o recurso especial e extraordiná-


rio repetitivo, quanto o IRDR, voltam-se à consolidação de teses jurídicas
acerca de questões predominantemente de direito, que podem ser conhecidas
de forma mais ou menos abstratas, a depender da complexidade de seu arca-
bouço fático. O foco da atenção dos julgadores residirá na interpretação do
direito, porém é impossível que interpretem a norma de maneira totalmente
desvinculada dos elementos dos casos concretos, os quais deverão extraídos,
em maior ou menor medida (a depender da abstração da questão), dos casos
paradigma. Entender em sentido diverso significaria admitir que interpreta-
ção dessas questões pode ser feita a partir de aspectos fáticos com os quais
os julgadores tiveram contato no julgamento de casos anteriores (em sua ex-
periência), acarretando consideráveis restrições em termos de participação e
contraditório, porquanto não seria possível refutar ou discutir o arcabouço
fático e jurídico extraído do repertório dos julgadores.
Além disso, a análise empírica da aplicação desses instrumentos processuais
é fundamental para compreender qual a interpretação que vem sendo dada pelos
tribunais sobre o seu objeto e sobre a própria concepção de “casos repetitivos”.
Segundo dados levantados por Amanda de Araújo Guimarães, que adota o
mesmo conceito de litigiosidade repetitiva aqui trabalhado – levando em consi-
deração, portanto, (i) o volume de processos; (ii) a existência de um litigante re-
petitivo ou habitual em um dos polos e; (iii) a prevalência de questões fáticas ou
jurídicas similares325 – investigou se os incidentes instaurados e os efetivamente
admitidos veiculavam questões inseridas em um caso considerado repetitivo e,
ainda, se referente a direitos individuais homogêneos.
Pelo seu levantamento, e considerando a definição por ela colocada, dentre
o total de requerimentos de instauração de IRDRs (113 até o final de 2016),
em 88% o caso subjacente poderia ser considerado um processo repetitivo, e
em 68% dos casos a discussão referia-se a direitos individuais homogêneos326.
Considerando apenas os incidentes admitidos (38, ou seja, 28%), tem-se que

Reflexões sobre a Reforma do Código de Processo Civil – Estudos em homenagem a Ada Pellegrini
Grinover, Cândido Rangel Dinamarco e Kazuo Watanabe. São Paulo: Atlas, 2007).
325 GUIMARÃES, Amanda de Araújo, 2017, op. cit., p. 129. Essa já era a definição adotada pela autora
deste trabalho em sua dissertação de mestrado, conforme ASPERTI, Maria Cecilia de Araujo. 2014,
op. cit., p. 45.
326 GUIMARÃES, Amanda de Araújo, 2017, op. cit., p. 246-247.

134
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

todos os casos poderiam ser caracterizados como demandas repetitivas, sendo


que dentre estes, 68% também se referiam a direitos individuais homogêneos.
Por esses dados, seria possível concluir que a despeito dos posicionamentos
doutrinários em sentido diverso, os tribunais têm associado, majoritariamen-
te, o IRDR com o julgamento de processos considerados repetitivos, e não
somente com questões jurídicas que se repetem em processos que não sejam
necessariamente similares327.
Ainda que não seja este o objeto do estudo empírico-jurisprudencial re-
alizado no presente trabalho, a análise dos recursos especiais repetitivos
julgados pelo STJ até março de 2017 também demonstra que os temas de-
cididos são, essencialmente, veiculados em casos envolvendo litigantes re-
petitivos e ocasionais em disputas em que se discutem questões jurídicas
comuns decorrentes de substratos fáticos também similares. À exceção, os
temas relativos a direito processual são, por vezes, debatidos em processos
com objetos diversos (não podendo ser consideradas “demandas repetiti-
vas”) e que não refletem, necessariamente, uma litigiosidade repetitiva 328.
Mesmo nesse âmbito, contudo, há também questões processuais decididas
em sede de recurso especial repetitivo que são claramente inseridas em pro-
cessos que discutem relações jurídicas similares329.
Entende-se, então, que muito embora questões predominantemente de di-
reito veiculadas em demandas que não possuam um substrato fático similar
possam ser dirimidas por meio da aplicação das técnicas de julgamento de casos

327 GUIMARÃES, Amanda de Araújo, 2017, op. cit., p. 251.


328 Vide, por exemplo, os seguintes temas: Tema 120 – “A Fazenda Pública pode recusar a substituição
do bem penhorado por precatório”; Tema 133 – “A autenticação de cópias do Agravo de Instrumento
do artigo 522, do CPC, resulta como diligência não prevista em lei, em face do acesso imediato aos
autos principais, propiciado na instância local. A referida providência somente se impõe diante da
impugnação específica da parte adversa”; e Tema 182 – “É dispensado o curador especial de oferecer
garantia ao Juízo para opor embargos à execução”.
329 Vide, por exemplo, os seguintes temas: Tema 76 – “Em demandas sobre a legitimidade da cobrança
de tarifas por serviço de telefonia, movidas por usuário contra a concessionária, não se configura
hipótese de litisconsórcio passivo necessário da ANATEL”; Tema 84 – “Tratando-se de fornecimento
de medicamentos, cabe ao Juiz adotar medidas eficazes à efetivação de suas decisões, podendo, se
necessário, determinar até mesmo o sequestro de valores do devedor (bloqueio), segundo o seu
prudente arbítrio, e sempre com adequada fundamentação”; e Tema 117 – “O art. 29-C da Lei
8.036/90, introduzido pela Medida Provisória 2.164-40/2001 (dispensando a condenação em
honorários em demandas sobre FGTS), é norma especial em relação aos arts. 20 e 21 do CPC e
somente se aplica às ações ajuizadas após a sua vigência, que se deu em 27.07.2001”.

135
Maria Cecília de Araujo Asperti

repetitivos, o principal objetivo dessas técnicas é lidar com casos considerados


repetitivos, ou seja, decorrentes de uma litigiosidade repetitiva, que se coloca
como o principal pano de fundo da criação desses institutos quanto de sua apli-
cação, na prática, pelos tribunais.
Assim, ainda que os recursos repetitivos e o IRDR possam tender a um
julgamento mais abstrato das questões jurídicas debatidas, há uma inegável
importância da compreensão do substrato fático dos casos repetitivos e da li-
tigiosidade repetitiva dentro da qual essa discussão está inserida. Por isso, é
necessário aprofundar o estudo dessas técnicas a partir das preocupações ex-
pressadas quanto às características dessa litigiosidade repetitiva, em especial a
participação dos litigantes com diferentes capacidades estratégicas de discutir
e traduzir aos julgadores o arcabouço fático dentro da qual a discussão jurídica
está inserida. Esses pontos serão tratados nos tópicos que se seguem, iniciando-
-se pela indagação a respeito da natureza e da extensão dos efeitos da tese jurí-
dica firmada em sede de julgamento de casos repetitivos.

4.2. Decisão proferida no julgamento de casos repetitivos


e seus efeitos

4.2.1. A tese jurídica é um precedente?


Como discutido no Capítulo 1, é possível observar que as escolhas políti-
cas em matéria de direito processual e de desenho institucional têm seguido
uma tendência de valorização da eficiência, isonomia e segurança jurídica,
por meio de técnicas de uniformização jurisprudencial, como a Súmula Vin-
culante, a repercussão geral, e outras estratégias de sumarização descritas no
início deste capítulo330.

330 Importante pontuar que, conquanto a tendência de conformação de instrumentos de uniformização


de jurisprudência tenha sido alçada à pauta das reformas legislativas de modo mais expressivo
com a Reforma do Judiciário, o movimento de consolidação e fortalecimento da força persuasiva
da jurisprudência no Brasil não é necessariamente recente. A esse respeito, José Carlos Barbosa
Moreira comenta que a evolução da importância da jurisprudência remonta à criação da Súmula
da Jurisprudência Predominante do STF, já calcada na preocupação com o “crônico problema
de sobrecarga de trabalho da Corte Suprema – e, indiretamente, do Judiciário como um todo
(MOREIRA, José Carlos Barbosa, 2005, op. cit., p. 50).

136
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

O CPC/2015 corrobora com essa tendência e dispõe, expressamente, que


os tribunais devem “uniformizar sua jurisprudência e a mantenham estável”
(artigo 926) e que “os juízes e tribunais observarão” (i) as decisões do Su-
premo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
(ii) os enunciados de súmula vinculante; (iii) os acórdãos em incidente de
assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em
julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; (iv) os enun-
ciados das súmulas do STF em matéria constitucional e do STJ em matéria
infraconstitucional; e (v) a orientação do plenário ou do órgão especial aos
quais estiverem vinculados (artigo 927).
Tal tendência suscita questionamentos diversos sobre uma possível aproxi-
mação entre o sistema brasileiro, pertencente à família jurídica da civil law, e
o sistema do direito costumeiro próprio da common law331. Não se pretende
aqui esgotar a discussão sobre se (e se sim, em que termos) o Brasil teria adota-
do um sistema de precedentes propriamente ou acerca da força vinculativa ou
persuasiva de decisões judiciais no nosso sistema. Há diversas razões históricas
e culturais332 que tornam problemática a importação para o Brasil do sistema
de precedentes da common law, ainda que a compreensão de seus predicados
seja fundamental para se interpretar os instrumentos processuais de pretensão
vinculativa aqui instituídos. O interesse pelo tema reside, essencialmente, na
compreensão da relação entre os efeitos da tese jurídica fixada a partir do julga-
mento de casos repetitivos e a participação daqueles que serão por esta afetados.
Um importante ponto de partida é a distinção entre jurisprudência, súmula e pre-
cedente, todas estas expressões utilizadas nos artigos 926 e 927, acima mencionados.

331 “A segurança jurídica, postulada na tradição do civil law pela estrita aplicação da lei, esta a exigir o
sistema de precedentes, há muito estabelecido para assegurar essa mesma segurança no ambiente do
common law, em que a possibilidade de decisões diferentes para casos iguais nunca foi desconsiderada
e, exatamente por isso, fez surgir o princípio, inspirador do stare decisis, de que os casos similares
devem ser tratados do mesmo modo (treat like cases alike)” (MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op.
cit., p. 80).
332 “Por diversos motivos, que compreendem questões históricas, culturais e opções legislativas claras, o
“sistema de precedentes” do Novo Código não é idêntico – e talvez não seja nem parecido – com aquele
construído e desenvolvido sobretudo no common law. Apesar de concordarmos com a necessidade
de amadurecimento e reflexão sobre tal sistema à luz das conquistas dos países como Estados Unidos
e Inglaterra, parece não ser possível ignorar os aspectos em que há distinções substanciais, sob pena
de criticarmos um instituto pelo que ele não é, nem pretende ser” (TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p.
213-214).

137
Maria Cecília de Araujo Asperti

Carlos Alberto de Salles salienta a diferença entre o conceito de jurispru-


dência, definido como um conjunto de julgados relacionados a uma situação de
fato específica durante um período de tempo, que expresse o posicionamento
jurídico de um órgão julgador sobre a matéria; e de precedente, entendido como
uma técnica decisória em que a ratio decidendi de uma decisão é utilizada para
julgamento de um caso subsequente333.
Para Salles, pode se dizer que determinado entendimento é jurisprudencial
quando remete a posicionamentos reiterados e à decantação que ocorre quando
uma corte se depara com frequência com as mesmas questões. A jurisprudência
seria utilizada como técnica persuasiva de fundamentação de uma decisão, ao
expressar, ao menos tentativamente, um “argumento de autoridade quanto aos
posicionamentos de um tribunal, câmara, grupo ou até mesmo de um julga-
mento monocrático”334. Já o precedente se conforma quando um segundo caso
utiliza-se da razão de decidir do primeiro, este assim entendido, então, como
o precedente da corte sobre a matéria335. Não é necessário que o precedente
reflita o conjunto de entendimentos pretéritos do órgão jurisdicional, mas sim-
plesmente que o seu ratio decidendi possa ser (e seja) aplicado em casos futuros.
Sobre o significado das súmulas, sua previsão em nosso ordenamento remon-
ta, como lembra José Carlos Barbosa Moreira, a uma iniciativa de redução de
sobrecarga de trabalho no STF, ao permitir que julgadores fundamentem suas
decisões fazendo simples referência a tais proposições336. Súmulas são, portanto,
enunciados abstratos e gerais voltados a uma solução mais expedita de casos

333 SALLES, Carlos Alberto de. “Precedentes e jurisprudência no Novo CPC: Novas técnicas decisórias”.
In GRINOVER, Ada Pellegrini [et al.]. O Novo Código de Processo Civil – Questões controvertidas.
São Paulo: Atlas, 2015, p. 77-88.
334 SALLES, Carlos Alberto de, 2015, op. cit., p. 81.
335 Também no sentido de que são as decisões posteriores que reconhecem um precedente como tal, vide
José Rogério Cruz e Tucci: “Seja como for, é certo que em ambas as experiências jurídicas [da common
law e da civil law] os órgãos judicantes, no exercício regular de pacificar os cidadãos, descortinam-se
como celeiro inesgotável de atos decisórios. Assim, o núcleo de cada um destes pronunciamentos
constitui, em princípio, um precedente judicial. O alcance deste somente pode ser depreendido aos
poucos, depois de decisões posteriores. O precedente então nasce como uma regra de um caso e, em
seguida, terá ou não o destino de tornar-se a regra de uma série de casos análogos” (Precedente judicial
como fonte do direito. São Paulo: RT, 2004, p. 11-12).
336 MOREIRA, José Carlos Barbosa, 2005, op. cit, p. 50.

138
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

concretos337, extraídos do repertório de julgamentos de determinado órgão ju-


risdicional após a decantação jurisprudencial da matéria338.
A partir dessas definições, discute-se se os pronunciamentos previstos nos
dispositivos mencionados seriam precedentes e, se sim, se teria natureza norma-
tiva e vinculante.
Segundo Salles, a despeito da redação dos artigos 926 e 927, tais decisões
judiciais não poderiam ser consideradas precedentes de natureza normativa, tal
como nos países de common law, onde são considerados uma fonte primária do
direito339. Não seria possível “importar” essa lógica, mesmo que se legisle sobre
o suposto caráter vinculante dos precedentes. Na common law, o precedente é
fonte do direito não por disposição legal, mas por tradição, enquanto nos países
de direito codificado nos falta esse elemento consuetudinário. Os precedentes
são e continuarão sendo entre nós essencialmente jurisprudenciais, ou seja, ele-
mentos de integração, interpretação e padronização de entendimentos sobre
determinada norma legal340.
O autor afirma, ainda, que o sistema instituído pelo CPC/2015 não seria tão
inovador quanto parece, pois mais estabelece objetivos e diretrizes genéricas do
que mecanismos efetivos de uniformização e de obrigatoriedade da observância
dos precedentes. Além disso, no tocante ao julgamento de casos repetitivos,
podem acarretar um preocupante “atalho processual”, em que teses jurídicas são
definidas sem que haja uma decantação do entendimento jurisprudencial sobre
as questões discutidas341.

337 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op. cit, p. 309.


338 SALLES, Carlos Alberto de, 2015, op. cit., p. 85.
339 SALLES, Carlos Alberto de, 2015, op. cit., p. 82-83.
340 “Buscamos neles, não a norma, mas uma unidade de sentido para aqueles preceitos normativos
encontrados em nossas leis. A finalidade dos precedentes em nosso sistema é, sobretudo,
interpretativa, com função de padronização do sentido emprestado a determinada norma legal”
(SALLES, Carlos Alberto de, 2015, op. cit., p. 83).
341 SALLES, Carlos Alberto de, op. cit., 2015, p. 78. Dierle Nunes também coloca uma preocupação
com o tempo de maturação do precedente judicial, na medida em que se torna uma técnica voltada
primordialmente a otimização do tramite do processo: “Padrões decisórios não podem empobrecer
o discurso jurídico, nem tampouco serem formados sem o prévio dissenso argumentativo e um
contraditório dinâmico, que imporia ao seu prolator buscar o esgotamento momentâneo dos
argumentos potencialmente aplicáveis à espécie. Não se trata de mais um julgado, mas de uma
decisão que deve implementar uma interpretação idônea e panorâmica da temática ali discutida.
Seu papel deve ser o de uniformizar e não o de prevenir um debate” (“Padronizar decisões sem

139
Maria Cecília de Araujo Asperti

Luiz Guilherme Marinoni também pontua diferenças entre os provimentos judi-


ciais do artigo 927342, e os precedentes, tal como entendidos em sistemas de common
law, e trabalha com uma distinção similar àquela adotada por Salles no que tange o
poder normativo do precedente em determinado sistema jurídico343. Para Marinoni,
o precedente pode ser compreendido como construtivo ou interpretativo a partir do
ponto de vista adotado para análise de decisões judiciais que afirmam princípios ou
direitos fundamentais: ao se entender que não se pode extrair o direito não expresso
de princípios, a decisão judicial que assim o fizer é vista como criadora do direito,
ao passo que, admitindo-se ser possível que o juiz considere princípios para afirmar
direitos, entende-se a decisão judicial como interpretativa do direito. Essa distinção
não se relaciona com a obrigatoriedade do precedente ou seu efeito vinculante, mas
com o papel desempenhado pelo precedente no ordenamento.
Ainda para Marinoni, o impacto do constitucionalismo no Brasil e a con-
sequente necessidade crescente de se interpretar princípios e cláusulas gerais
constitucionais, assim como a tendência de aproximação entre os sistemas de
civil law e common law contemporâneos344, evidenciariam a importância de
pensar sobre técnicas de formação e aplicação de precedentes e a sua obser-
vância no sistema judicial brasileiro. Todavia, os precedentes seriam, entre nós,
essencialmente interpretativos, visto que as decisões judiciais das cortes supe-
riores em recurso especial e extraordinário e em controle concentrado de cons-
titucionalidade não são estruturadas a partir dos fatos do caso, como ocorre
nos precedentes da common law, mas da valoração de questões de direito ou
de teses jurídicas (interpretar questões relativas à lei federal ou à Constituição

empobrecer o discurso jurídico?”. Consultor Jurídico. Edição de 06 ago. 06. Disponível em http://www.
conjur.com.br/, acesso em 28 mar. 2015).
342 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op. cit., p. 284-288.
343 MARINONI, Luiz Guilherme. “Elaboração dos conceitos de ratio decidendi (fundamentos
determinantes da decisão) e obiter dictum no direito brasileiro”. Instituto de Processo Comparado –
Núcleo de Direito Processual Comparado. Set-2012. Disponível em http://institutodeprocesso.com.br/
marinoni-elaboracao-dos-conceitos-de-ratio-decidendi-fundamentos-determinantes-da-decisao-e-
obiter-dictum-no-direito-brasileiro/, acesso em 28 mar. 2015.
344 “No atual direito estadunidense, além de existir grande profusão de leis, os precedentes passaram a
interpretar normas e, em especial, princípios, inclusive de natureza constitucional (...). Atualmente,
em virtude do impacto do constitucionalismo, não só há nítida aproximação entre as funções dos
juízes de common law e civil law, como visível proximidade entre os precedentes ditos de criação do
direito e os interpretativos. Mais do que tudo, esta proximidade permite evidenciar a importância
dos precedentes no sistema judicial brasileiro, em que os precedentes têm e terão nítida feição
interpretativa” (MARINONI, Luiz Guilherme, 2012, op. cit., p. 2).

140
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Federal)345. Não se prestariam a dizer o direito a partir de uma argumentação


(ratio decidendi) inserida em uma moldura fática, com a pretensão de aplicação
futura, mas a interpretar o direito expresso, ainda que sua fundamentação (ou
seus motivos determinantes) possa ser observada em decisões subsequentes.
Marinoni também critica a redação do artigo 927 do CPC/2015, argumen-
tando que o dispositivo indica provimentos de natureza e eficácia distintas e que
não podem ser consideradas em sua totalidade como precedentes346. As decisões
do STF em controle concentrado de constitucionalidade produzem coisa julga-
da erga omnes, pelo o que seria despiciendo disciplinar a obrigatoriedade de sua
observância, a não ser que se trate da eficácia obrigatória de sua ratio decidendi
(ou de seus motivos determinantes) em casos similares347. Quanto às súmulas do
STF e STJ, seriam meros enunciados de teses de direito extraídas de decisões (na
melhor das hipóteses, um resumo da tese sustentada na fundamentação), que não
exprimem a racionalidade argumentativa da decisão em si, o que as torna incapa-
zes de contribuir para a unidade do direito348. Similarmente, a súmula vinculante
também seria incompatível com o sistema de precedentes e com sua obrigatorie-

345 “Não é o momento de definir a natureza dos precedentes formados nestas hipóteses, se persuasiva - e
em que grau - ou obrigatória. Quer-se apenas deixar claro que tais precedentes não são estruturados
a partir dos fatos, como comumente sucede no âmbito do common law. Embora as decisões proferidas
em recurso especial e recurso extraordinário sejam tomadas em casos concretos, estes recursos são
restritos à valoração de questões de direito ou de teses jurídicas, o que confere a estes precedentes
natureza genuinamente interpretativa” (MARINONI, Luiz Guilherme, 2012, op. cit., p. 4-5).
346 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op. cit., p. 284-288.
347 Marinoni cita o julgamento da Reclamação nº 1.987, em que se decidiu que o ato impugnado estaria
“em confronto com os motivos determinantes” da decisão proferida na ADI nº 1.662, aplicando-se,
com isso, o entendimento consolidado da ratio decidendi da ação de controle de constitucionalidade
sobre o mesmo thema decidendum, qual seja, sobre as situações que justificam o sequestro de verbas
em caso de não pagamento de precatório judicial (Reclamação nº 1.987, Tribunal Pleno, Relator
Ministro Maurício Corrêa, julgamento em 01.10.2003).
348 “(...) a ratio decidendi ou os fundamentos determinantes de uma decisão espelham não apenas uma
tese de direito, mas, mais propriamente, a racionalidade da tese em face de determinada moldura
fática. Uma súmula obviamente não tem condições de refletir a racionalidade da argumentação
própria de um precedente. Pode, com alguma dificuldade, resumir a tese de direito sustentada numa
decisão” (MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op. cit., p. 287). Marinoni também pondera que a
redação do §2º do artigo 926 deixaria clara a distinção entre súmulas e precedentes, ao prever que “ao
editar enunciados de súmulas, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes
que motivaram a sua criação”. Ou seja, o precedente seria a decisão cuja racionalidade argumentativa
estaria, de algum modo, registrada no enunciado da súmula, ainda que – a seu ver – de forma
insuficiente para compreensão de seus fundamentos e da articulação destes com os aspectos fáticios
dos quais foram extraídos, o que seria fundamental para uma aplicação futura da ratio decidendi.

141
Maria Cecília de Araujo Asperti

dade, visto que pretende atribuir eficácia vinculativa somente a um enunciado, e


não à racionalidade argumentativa que levou a sua edição349.
Sobre as decisões proferidas no julgamento de casos repetitivos, Marinoni
afirma que a preocupação do sistema de precedentes é interpretar e dar sentido
ao direito, e não solucionar conflitos ou processos de massa, tal como se preten-
de por meio do IRDR e do julgamento de recursos repetitivos350. Essas decisões
poderiam, circunstancialmente, ser consideradas precedentes em julgamentos
subsequentes, a depender da sua fundamentação e da possibilidade de aplicação
futura da ratio decidendi. Especificamente para os recursos repetitivos, o autor en-
tende que poderiam conformar uma técnica de formação de precedentes, desde
que não seja voltada à otimização do trabalho das cortes, mas à sua função de
se atribuir sentido à norma em casos futuros por meio de sua fundamentação351.
O posicionamento deste autor – para quem o julgamento de casos repetitivos na
lógica atualmente regrada conformaria uma verdadeira coisa julgada de questão
prejudicial352 – será examinado mais detidamente no item seguinte.
Outros autores, no entanto, visualizam no artigo 927 o indicativo de uma
verdadeira mudança paradigmática no sistema processual brasileiro, que teria
sido efetivamente consolidada pelo CPC/2015, com a incorporação a lógica do
sistema de formação e aplicação de precedentes, inclusive no tocante às técni-
cas de julgamento de casos repetitivos353.

349 O autor também afirma que o requisito de que a controvérsia objeto da súmula acarrete a
“multiplicação de processos” expressada pelo artigo 103-A (como comentamos no Capítulo 1) não
consiste em uma preocupação direta do sistema de precedentes, o que seria mais um elemento
distintivo a ser considerado.
350 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016b, p. 19-20.
351 “Retenha-se o ponto: os precedentes formados em recursos extraordinário e especial repetitivos
devem ser respeitados por constituirem rationes decidendi elaboradas pelas Cortes Supremas e
não por constituirem resoluções de casos que derivam de recursos em massa” (MARINONI, Luiz
Guilherme, 2016a, p. 332).
352 “É óbvio que a resolução única da questão incidente nos casos repetitivos nada mais é do que uma
decisão que produz coisa julgada sobre a questão que interessa a todos os litigantes dos processos
pendentes. Significa que se está diante de coisa julgada que se estende a terceiros” (MARINONI,
Luiz Guilherme,, 2016a, p. 323).
353 Sobre essa mudança paradigmática, Aluisio Gonçalves de Castro Mendes afirma que a jurisprudência
e os precedentes representariam estágios de um movimento de fortalecimento do pronunciamento
judicial, que deixaria de ter uma importância apenas para fins de resolução de casos concretos para
também fixar “padrões de conduta” (MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 79-82).

142
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Nesse sentido, Patrícia Perrone Campos Mello e Luís Roberto Barroso


sustentam que a eficácia das decisões judiciais teria sido substancialmente
alterada no CPC/2015354. Afirmam que enquanto as decisões proferidas por
magistrados de primeiro grau continuariam tendo eficácia persuasiva, com
efeitos restritos às partes, certos precedentes teriam eficácia normativa, de-
vendo ser obrigatoriamente observados355. Essa eficácia normativa dar-se-ia de
diferentes formas: haveria a eficácia normativa em sentido forte, assim enten-
dida quando cabível a cassação de decisão contrária por meio de reclamação,
nos termos do artigo 988, e a eficácia intermediária ou em sentido fraco, cuja
inobservância não possibilitaria a cassação pela corte que consolidou o pre-
cedente356. Por esse entendimento, a decisão do IRDR (artigo 988, inciso IV)
e dos recursos repetitivos (artigo 988, §5º, inciso II) seriam precedentes de
eficácia normativa em sentido forte, cuja observância seria obrigatória pelos
órgãos jurisdicionais hierarquicamente inferiores.
Também afirmando que os provimentos indicados no artigo 927 seriam pre-
cedentes, Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira

354 MELLO, Patrícia Perrone Campos. BARROSO, Luís Roberto. “Trabalhando com uma nova lógica:
a ascensão dos precedentes no direito brasileiro”. Revista da AGU, Brasília, v. 15, n. 03, p. 09-52, jul/
set. 2016, p. 22-23.
355 É contundente a crítica de Lenio Luiz Streck e Georges Abboud ao artigo de Mello e Barroso,
apontando contradições na tese proposta, embasada, a seu ver, em “chavões” como uma pretensa
aproximação do sistema brasileiro do common law e uma apologia aos mecanismos vinculatórios
do direito brasileiro, que a seu ver não poderiam ser chamados de precedentes, cuja aplicação não
é forçada, mas contingencial. Criticam, assim, o “fetiche pelo precedente” da chamada nova “era
precedentalista” e fazem questão de distinguir súmula (que sequer é uma decisão) de precedente
(aqui considerado o “genuíno” precedente, do sistema de common law) e do julgamento de questões
repetitivas (que é imposto, e não aplicado contingencialmente pelo julgador). Conclui que a leitura
não respeita a Constituição, na medida em que a “lei ordinária não pode alterar o exercício da
jurisdição”, criando precedentes vinculantes, concluindo não existir um “sistema de precedentes”
no Brasil (“O solilóquio epistêmico do ministro Roberto Barroso sobre precedentes”. Conjur, 3
nov. 2016. Disponível em <http://www.conjur.com.br/2016-nov-03/senso-incomum-soliloquio-
epistemico-ministro-barroso-precedentes>, acesso em 15 mai. 2017).
356 MELLO, Patrícia Perrone Campos. BARROSO, Luís Roberto, 2016, op. cit., p. 19-20 e 22-23.
Seguindo-se a lógica dos autores, seriam precedentes as súmulas vinculantes, julgados produzidos
em controle concentrado de constitucionalidade, acórdãos proferidos em julgamento de repercussão
geral ou Recurso Extraordinário ou Especial repetitivos (lembrando que a reclamação aqui só é
cabível após o esgotamento das instâncias recursais), orientações oriundas do julgamento de
Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas e Incidente de Assunção de Competência.

143
Maria Cecília de Araujo Asperti

asseveram que a ratio decidendi357 de tais decisões conformaria um elemento


normativo aplicável por subsunção a outros casos similares, desde que os fun-
damentos determinantes tenham sido adotados pela maioria dos membros do
colegiado358. Os autores visualizam variados tipos de efeitos jurídicos que um
precedente poderia ter, de acordo com os mecanismos processuais que permi-
tem a aplicação da tese jurídica consolidada em casos sucessivos, que iriam
desde a obrigatoriedade propriamente dita (a partir do dever cogente estabele-
cido no artigo 927) até uma eficácia meramente persuasiva, ou seja, de caráter
interpretativo, já existente no regime anterior359. Tratando, especificamente, da
tese jurídica firmada em sede de julgamento de casos repetitivos, Didier Jr., Bra-
ga e Oliveira classificam-na como um precedente obrigatório, eis que arrolada
especificamente no artigo 927 do CPC/2015.
Os autores também trabalham com uma categorização relativa ao modo
pelo qual tais precedentes seriam formados360. Por este parâmetro, as decisões
decorrentes da aplicação de técnicas de julgamento de casos repetitivos se-

357 Conforme Enunciado n. 318 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “Para os autores, os
fundamentos prescindíveis para o alcance do resultado fixado no dispositivo da decisão (obiter dicta),
ainda que nela presentes, não possuem efeito de precedente vinculante”.
358 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito
processual civil, Vol. 2. 11ª Ed., Salvador: Juspodium, 2016, p. 466.
359 A gradação proposta contempla os seguintes tipos de precedentes: (i) vinculante ou obrigatória
(art. 927, CPC), devendo ser aplicados de ofício e mediante contraditório por todos os julgadores;
(ii) obstativa da revisão de decisões (art. 496, §4º, e art. 932, IV, do CPC, art. 105, III, c da CF),
na medida em que permitem negar provimento ou seguimento a recurso ou dispensar a remessa
necessária; (iii) autorizante (art. 311, II, e art. 932, V), sendo determinante para a admissão ou
acolhimento de ato postulatório (recurso, demanda ou incidente); (iv) rescindente/deseficatizante
(art. 525, §§12, 13 e 14 e art. 535, §§5º e 6º), em que reputam inexigível decisão judicial que se lastreie
em lei ou em ato normativo tidos pelo STF como inconstitucional; (v) de revisão da coisa julgada
(art. 505, I e art. 525, §15º), em que há uma relação jurídica sucessiva (precedentes em geral) e em
controle de constitucionalidade concentrado ou difuso e, ainda, a eficácia persuasiva, inerente ao
precedente judicial (DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de,
2016, op. cit., p. 467-476).
360 Para Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, os provimentos jurisdicionais previstos no artigo 927
seriam precedentes com efeitos vinculativos, com a diferença de que esta qualificação lhes teria seria
atribuída por lei, o que não ocorre, necessariamente, no direito constumeiro: “Com a edição do Novo
Código de Processo Civil, pode-se dizer que há um sistema de pronunciamentos qualificados, ou de
jurisprudência e de precedentes definido legalmente e que, nestes termos, não pode ser considerado
como um regime típico de stare decisis, ou seja, que os precedentes em geral passam a ter um caráter
inculativo no sentido vertical e horizontal. Mas, por outro lado, não existe apenas um mero efeito
persuasivo nas hipóteses indicadas nos cinco incisos do art. 927” (2017, op. cit., p. 97).

144
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

riam precedentes produzidos por meio de “incidentes processuais com nature-


za de processo objetivo”, ou de mecanismos de “formação concentrada”361, nos
quais se estabelece a necessidade de enfrentamento de todos os argumentos
favoráveis e contrários à tese jurídica e de ampliação do contraditório, com a
realização de audiências públicas e a participação de amici curiae. Esse proce-
dimento seria necessário para assegurar que o julgador “incorporar automa-
ticamente a fundamentação originária do julgamento o incidente à própria
decisão que o invoca” 362, obtendo-se, com isso, a racionalidade que se espera
de um sistema de precedentes.
A partir desses posicionamentos e conceituações, é possível identificar al-
guns traços na aplicação e na formação de teses jurídicas que afastam a lógica
do julgamento de casos repetitivos do sistema de precedentes. Isso não significa
que os fundamentos (ratio decidendi) da decisão de um IRDR ou de um recurso
repetitivo não possam ser aplicados em casos futuros, tal como em um sistema
de precedentes. Contudo, em termos de técnica processual, há incongruências
a serem pontuadas, as quais acentuam a importância de se discutir a participa-
ção dos diferentes atores na formulação da tese jurídica, algo que não seria de
especial relevância no âmbito do sistema de precedentes.
Nesse sentido, destaca-se: (i) o fato de a tese jurídica ter sua formação provo-
cada, e não consistir em um entendimento que surge naturalmente, a partir da
aplicação da ratio decidendi de uma decisão judicial em casos subsequentes; (ii) a
veiculação da tese jurídica por meio de enunciados normativos autônomos, cuja
aplicação induz a uma padronização decisória, dada a já discutida feição geren-
cial de tais mecanismos processuais; e (iii) a aplicação da tese jurídica em casos
previamente sobrestados, do que se denota, novamente, o intuito de resolução
de controvérsias interpretativas específicas, oriundas da litigiosidade repetitiva,
e não a interpretação do conteúdo da norma jurídica em si.

361 “Esses procedimentos formam um microssistema de formação concentrada de precedentes obrigatórios,


cujas regras se complementam reciprocamente – essa premissa é indispensável para a compreensão
desses incidentes (...). Trata-se de uma peculiaridade brasileira. Nem todo precedente pressupõe um
procedimento específico de produção” (DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA,
Rafael Alexandria de, 2016, op. cit., p. 479). No mesmo sentido, Aluíso Gonçalves de Castro Mendes
sustenta que os recursos repetitivos e o IRDR consistiriam em ums “técnica de concentração, a partir
de casos ou questões comuns, com a suspensão das demais” (2017, op. cit., p. 98).
362 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de, 2016, op. cit., p. 479.

145
Maria Cecília de Araujo Asperti

Quanto à formação da tese jurídica em sede de recursos repetitivos ou


IRDR, há, em verdade, um procedimento de formação concentrada, que não
se confunde com a lógica do sistema de precedentes. Essa poderia ser consi-
derada apenas uma particularidade de um “sistema brasileiro de precedentes”,
porém o que se verifica é que esse modo de formação provocada reflete um
claro objetivo de lidar com o volume de casos similares, ou de casos em que a
questão repetitiva é veiculada, o que acarreta implicações sensíveis em termos
de sua formatação, aplicação e efeitos.
Similarmente ao que ocorreu com a criação das súmulas jurisprudenciais,
tal propósito de racionalização da prestação jurisdicional faz com que a tese
jurídica seja formalizada por meio de enunciados normativos abstratos e sim-
plificados, para facilitar a sua incorporação “automática”, ou padronizada, ao
contingente de casos presentes e futuros em que a questão seja suscitada.
Sobre esse formato da tese jurídica, Sofia Temer defende que decisão do
IRDR em sua integralidade (com todos os fundamentos suscitados e debatidos)
– e não um enunciado dela extraído – deveria conformar a tese jurídica a ser
aplicada nos demais casos em que a questão jurídica decidida fosse suscitada363.
Nesse sentido, os artigos 984 e 1.038, §3º, no âmbito dos repetitivos, preveem,
expressamente, que o acórdão deverá abranger todos os fundamentos relevan-
tes à tese jurídica364, o que poderia se traduzir em julgados cuja ratio decidendi
pudesse ser aplicada futuramente de modo similar aos precedentes da common
law, como explanado.
No entanto, o que se verifica na prática é que os recursos repetitivos já são
organizados por temas enumerados e resumidos a enunciados essencialmente
normativos e abstratos365. As decisões dos IRDRs já julgados também vêm sen-
do veiculadas sob o formato de temas enumerados, em enunciados de redação

363 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 221-224.


364 Com a diferença de que, no IRDR, prevê-se que todos os fundamentos suscitados, favoráveis ou
contrários, deverão ser enfrentados pelo acórdão. Já nos recursos repetitivos, o artigo 1.038, §3º
foi alterado pela Lei nº 13.256/2016, deixando de estabelecer a obrigatoriedade de fundamentação
quanto aos demais argumentos suscitados, abrangendo-se apenas aqueles tidos como “relevantes”
para a conformação da tese jurídica.
365 Vide banco de teses de recursos especiais repetitivos no STJ em <http://www.stj.jus.br/repetitivos/
temas_repetitivos/>, acesso em 30 nov. 2017. As teses firmadas até março de 2017 são analisadas
no estudo empírico-jurisprudencial desenvolvido no Capítulo 5, a seguir. Sobre as teses firmadas
em sede de recurso extraordinário repetitivo no STF, confira-se <http://www.stf.jus.br/portal/cms/
verTexto.asp?servico=repercussaoRepresentativos&pagina=principal>, acesso em 30 nov. 2017.

146
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

imperativa, nos quais há a identificação genérica dos elementos fáticos a partir


dos quais decorreu a questões jurídica discutida366.
Ademais, o fato de ter sido destacado um enunciado acerca da tese jurídi-
ca justamente permite a sua aplicação simplificada, de forma desvinculada do
restante da decisão367. Esse modo de aplicação é – novamente – coerente com
o propósito das técnicas de julgamento de casos repetitivos, que visam conferir
maior eficiência na prestação jurisdicional para resolução de casos repetidos:
invoca-se o enunciado da tese jurídica (assim como se faz com a súmula) para
simplificar a fundamentação da decisão ou facilitar a prolação de decisões pa-
dronizadas, sem que seja necessário recorrer aos fundamentos fáticos e jurídicos
da decisão ou acórdão tido como paradigma.
Também de modo coerente com o intuito gerencial do julgamento por amos-
tragem de recursos repetitivos e do IRDR, a aplicação da tese jurídica ocorre
após o sobrestamento de casos tidos como similares, ou que veiculam a mesma
questão predominantemente de direito.
Não é isso que se verifica no sistema de precedentes, em que as decisões são
orientadas pela racionalidade argumentativa da decisão paradigma, mas sem
que se imponha um sobrestamento às partes. Afinal, não há uma relação de
prejudicialidade entre o caso em que o precedente fora ou será firmado e o
caso em que sua argumentação será veiculada. O precedente não é definido em
função dos casos em que a questão está sendo veiculada, ou com o intuito de
solucionar controvérsias reiteradas.
Entende-se, assim, que esses aspectos que distinguem – na teoria e na práti-
ca – a formação e aplicação das teses jurídicas fixadas em julgamento de casos
repetitivos e os precedentes tornam ainda mais relevantes a problematização da

366 Vide informações sobre os temas julgados em sede de IRDR no TJSP em <http://www.tjsp.jus.br/
Nurer/Nurer/Irdr>, acesso em 30 nov. 2017.
367 “No entanto, tal fenômeno de um ‘common law à brasileira’ se dá sem a preocupação científica de
consolidação de uma ‘teoria dos precedentes’ para nosso país. Isso porque, no Brasil, a referência às
súmulas e mesmo a processos anteriormente julgados se dá de forma desconectada com as questões,
debates e teses que lhes deram origem. Assim, ao se invocar certa súmula, esta é autônoma frente
à discussão subjacente – diferentemente do que ocorre com os precedentes dos países de stare
decisis” (THEODORO JR., Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre. “Breves considerações
sobre a politização do Judiciário e sobre o panorama de aplicação no direito brasileiro – Análise da
convergência entre o civil law e o common law e dos problemas da padronização decisória”. Revista de
Processo. v. 35, n. 189, São Paulo: RT, 2010, p. 9-52, p. 41).

147
Maria Cecília de Araujo Asperti

participação das partes e daqueles que serão afetados pela tese368. Levanta-se
a importância de se assegurar o direito de participação daqueles que terão de
aguardar a definição da tese jurídica com seu processo suspenso, ou que não po-
derão discutir judicialmente determinadas questões que já foram decididas pela
tese jurídica, a qual poderá ser “automaticamente incorporada” ao seu caso.
Pode se discutir, ainda, se os diferentes atores podem atuar estrategicamente
para provocar (ou evitar a provocação) da formação de uma tese jurídica em
uma temática que lhes seja relevante. Esses pontos serão ainda aprofundados
nos itens que se seguem.

4.2.2. Aproximações com a issue preclusion da


common law
Como discutido no item anterior, não se entende que a teoria dos preceden-
tes possa explicar satisfatoriamente como se dá a formação e a aplicação da tese
jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos. Resta saber, então, qual a
natureza dos efeitos dessa tese jurídica, e quais as implicações desta definição
em termos da participação daqueles que serão por atingidos pela tese firmada.
Primeiramente, não se pode negar que a tese jurídica adquire, além de uma
feição persuasiva ou interpretativa, uma eficácia que transcende aos casos jul-
gados, e que que decorre da articulação de mecanismos que orientam a sua
aplicação a casos sobrestados e futuros369. São diversas as formas que o código
buscou para orientar a aplicação das teses jurídicas firmadas em julgamento de
casos repetitivos, como aquelas que associam as teses jurídicas com a suma-
rização dos julgamentos, como a tutela de evidência (artigo 311, inciso II); o
julgamento de improcedência liminar (artigo 332); e a possibilidade de prolação

368 Em sentido diverso, Aluisio Gonçalves de Castro Mendes argumenta que a crítica acerca da mitigação
da participação das partes interessadas no procedimento do IRDR não teria cabimento justamente
por essa sistemática aproximar-se com àquela dos precedentes: “nunca se exigiu, nos precedentes,
até porque esta característica somente é revelada no futuro e não previamente, a representatividade
adequada ou outros requisitos tópicos de processos coletivos” (2017, op. cit., p. 127).
369 “O NCPC, a par do preceito geral estabelecido no art. 927, utiliza-se, basicamente, de dois
mecanismos processuais para dotar os precedentes desses casos de especial eficácia, o julgamento
de improcedência liminar e a decisão monocrática pelo relator, dando ou negando provimento ao
recurso. O legislador pretendeu, nos dois casos, uma sumarização do procedimento, de forma a
levar a um julgamento conforme ao que foi decidido naqueles incidentes ou na modalidade recursal
repetitiva” (SALLES, Carlos Alberto de, op. cit., 2015, p. 84-85).

148
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

de decisão monocrática pelo relator caso já haja precedente sobre a matéria


versada no recurso (artigo 932, IV e V). Pode se mencionar, ainda, a execução
provisória pela parte vencedora sem a necessidade de se prestar caução (artigo
521, IV, alínea “e”).
É possível discutir, porém, se essa aplicação da tese jurídica aos “sobrestados”
e aos “ausentes”, restringindo a possibilidade de se rediscutir questões jurídicas
decididas, também conformaria uma preclusão dessas questões, ou um efeito
preclusivo decorrente da fixação da tese jurídica que acabaria se estendendo a
terceiros interessados370. Esse ponto é de suma importância para a discussão so-
bre o acesso à justiça, participação e a representação dos interesses dos litigantes
excluídos no julgamento de casos repetitivos.
Como mencionado no item anterior, Luiz Guilherme Marinoni sustenta que
o julgamento de casos repetitivos se destina a conferir soluções a casos que sur-
giram ou que possam surgir de um determinado litígio veiculado em demandas
individuais similares. A tese jurídica, a seu ver, não se confundiria com um
precedente, mas poderia ser compreendida como algo próximo ao com o colla-
teral estoppel371, ou issue preclusion372, do sistema norte-americano, pelo qual, em
linhas gerais, há a vedação de se relitigar determinada questão já decidida em
processo anterior em que a parte que será prejudicada (ou a quem a preclusão
será aplicada) tenha tido a oportunidade de participar373, ainda que a ação sub-
sequente verse sobre um objeto diverso374. O autor aduz que o IRDR e os recur-

370 Adotando-se aqui uma das faces do fenômeno processual da preclusão, como conceitua Heitor Vitor
Mendonça Sica, que além de fulminar o direito da parte à prática de determinado ato processual,
também “torna imutável questão incidental individualmente decidida” (Preclusão processual civil.
Col. Atlas de Processo Civil. 2ª Edição. São Paulo: Atlas, p. 280)
371 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op. cit., p. 323-326; 2016b, op. cit., p. 21-25.
372 Segundo Lewis A. Grossman, o termo “collateral estoppel” é mais tradicional, tendo sido utilizado
no documento original do “Restatements of Judgments” (um importante compilado de tratados
organizado pelo American Law Institute sobre princípios gerais da common law) enquanto a tendência
mais recente, demarcada pelo “Restatements (Second) of Judgments seria de utilizar o termo issue
preclusion, que será também adotado neste trabalho (GROSSMAN, Lews A. “The Story of Parklane:
the litigation crisis and the efficiency imperative” In CLERMONT, Kevin M. (ed.). Civil Procedure
Stories, 2008, p. 405-443, p. 407)
373 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op. cit., p. 321-323.
374 Essa é a definição que pode ser extraída do Restatement (Second) of Judgements: “When an issue of
fact or law is actually litigated and determined by a valid and final judgment, and the determination
is essential to the judgment, the determination is conclusive in a subsequent action between the
parties, whether on the same or a different claim” (Section 27, §68).

149
Maria Cecília de Araujo Asperti

sos repetitivos acabaria produzindo coisa julgada acerca da questão prejudicial


que se repete nos casos pendentes, porém sem que se oportunize a participação
dos terceiros a quem será obstado o direito de rediscutir tais questões, o que
poderia macular a constitucionalidade desses institutos375.
Para melhor compreender esse entendimento, é necessário aprofundar o
estudo do instituto do issue preclusion, em especial após a significativa ressig-
nificação decorrente do julgamento dos casos Bernhard vs. Bank of America
National Trust and Savings Association376 e caso Blonder-Tongue Laboratories v.
University of Illinois Foundation377, quando então o Judiciário norteamericano
abandonou a critério de mutualidade (entre as mesmas partes) e passou a reco-
nhecer a possibilidade do non-mutual issue preclusion, ou seja, de se impedir a
relitigação de determinada questão já decidida em caso anterior envolvendo a
parte que a invoca, ainda que em ação contra terceiro.
No caso Bernhard, Helen Bernhard havia sido apontada como administra-
dora do espólio de Clara Sather, e nessa condição ajuizou uma ação contra o
Bank of America, alegando que a instituição financeira deveria restituir um
depósito realizado pela de cujus a Charles O. Cook, mediante a alegação de
que a Sra. Sather nunca teria autorizado essa movimentação. A ré levantou
o fato de que a discussão sobre essa quantia já teria sido resolvida pelo juízo
de sucessões (probate court), operando-se, assim, a res judicata acerca de tal
questão. Ao julgar o caso, a Suprema Corte da California decidiu ser possível
obstar a rediscussão da questão desde que seja, efetivamente, idêntica nos
dois processos, que o julgamento tenha sido de mérito e que a parte contra
quem a preclusão esteja sendo arguida tenha sido parte ou seja sucessora da
do caso anterior378. Como Bernard representava o espólio que fora parte no

375 Marinoni também assinala ser esta uma importante diferença entre o non mutual issue preclusion
e o sistema de precedentes, ao dizer que a preclusão decorre de um mesmo conflito de interesses,
colocado tanto no primeiro caso quanto no subsequente, em que uma questão jurídica referente a
esse conflito é resolvida. Não se trata, assim, de se afirmar o modo de ser do direito a partir de uma
ratio decidendi, mas de decidir uma questão de fato ou de direito propriamente dita, que pode ser
invocada em diversos casos ainda não julgados, em que uma das partes seja a mesma (MARINONI,
Luiz Guilherme, 2016a, op. cit., p. 325-326).
376 Supreme Court of California, 19Cal2d 807, 122 P2d 892, 1942.
377 402 U.S. 313 (1971).
378 “In determining the validity of a plea of res judicata three questions are pertinent: Was the issue
decided in the prior adjudication identical with the one presented in the action in question? Was
there a final judgment on the merits? Was the party against whom the plea is asserted a party or

150
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

procedimento da probate court, não lhe caberia rediscutir a questão já litigada


e decidida neste, ainda que contra outro réu379.
Já no caso Blonder-Tongue, julgado pela Suprema Corte dos Estados Unidos,
a University of Illinois Foundation arguia a violação de uma patente que havia
sido considerada invalida em ação anterior, manejada pela Foundation contra
outra parte380. Reconheceu-se, então, a preclusão da discussão sobre a violação
da patente com base no reconhecimento de sua invalidade em demanda ante-
rior, na qual a University of Illinois Foundation teria tido a oportunidade de
litigar a matéria381. Assim como no caso Bernhard, seria este um exemplo de
deffensive use of collateral estoppel, ou seja, a preclusão da matéria arguida pela ré
em sua defesa, para afastar o pedido da autora382.

in privity with a party to the prior adjudication?” (Supreme Court of California, 19Cal2d 807,
122 P2d 892, 1942)
379 “Since the issue as to the ownership of the money is identical with the issue raised in the probate
proceeding, and since the order of the probate court settling the executor's account was a final
adjudication of this issue on the merits (Prob. Code, sec. 931 [formerly Code Civ. Proc., sec. 1637];
see cases cited in 12 Cal.Jur. 62, 63; 15 Cal.Jur. 117, 120), it remains only to determine whether the
plaintiff in the present action was a party or in privity with a party to the earlier proceeding. The
plaintiff has brought the present action in the capacity of administratrix of the estate. In this capacity
she represents the very same persons and interests that were represented in the earlier hearing on the
executor's account. In [19 Cal. 2d 814] that proceeding plaintiff and the other legatees who objected
to the executor's account represented the estate of the decedent. They were seeking not a personal
recovery but, like the plaintiff in the present action, as administratrix, a recovery for the benefit of
the legatees and creditors of the estate, all of whom were bound by the order settling the account?”
(Supreme Court of California, 19Cal2d 807, 122 P2d 892, 1942).
380 University of Illinois Foundation v. Winegard Co., 271 F.Supp. 412, 419 (SD Iowa 1967).
381 O caso foi remetido novamente para a Court of Appeals para que a Blonder-Tongue deduzisse um
pedido de preclusão da matéria, abrindo-se o contraditório para a Foundation, sob o argumento
de que a preclusão não mutual, que não foi alegada pela recorrente e tampouco contestada pela
recorrida, não poderia ser reconhecida de ofício pela Suprema Corte: “Petitioner should be allowed
to amend its pleadings in the District Court to assert a plea of estoppel. Respondents must then be
permitted to amend their pleadings, and to supplement the record with any evidence showing why
an estoppel should not be imposed in this case. If necessary, petitioner may also supplement the
record. In taking this action, we intimate no views on the other issues presented in this case. The
judgment of the Court of Appeals is vacated and the cause is remanded to the District Court for
further proceedings consistent with this opinion”.
382 Como se vê, a interpretação da ratio decidendi de um precedente, ainda que relativo a matéria
processual, exige o conhecimento dos fatos concretos do caso decidido, a partir do qual a
racionalidade argumentativa do julgado pode ser efetivamente compreendida para aplicação em
casos subsequentes, algo bastante diferente do que ocorre com os enunciados normativos abstratos
das súmulas e do julgamento de casos repetitivos no Brasil.

151
Maria Cecília de Araujo Asperti

Outro importante precedente sobre issue preclusion é no caso Parklane Ho-


siery Company, Inc. v. Leo M. Shore (439 U.S. 322 1979), em que o acionista
Leo M. Shore suscita o julgamento de ação anterior, movida pela Securities
and Exchange Comission (SEC) contra a companhia, em que se decidiu que
esta havia emitido uma declaração de procuração (proxy statement) enganosa
em um processo de fusão. Com base nesse julgamento anterior, o autor pleiteou
um julgamento sumário (summary judgment) condenando Parklane a indenizar
os danos sofridos. A Suprema Corte então decidiu pela possibilidade, embora
excepcional, da offensive use of collateral estoppel (também sem mutualidade),
para se obstar a rediscussão de questão já decidida em caso anterior contra o
réu (e não em sua defesa).
A excepcionalidade do offensive use residiria no fato de não se promover a
economia processual, dado que o autor da segunda demanda teria de aguardar o
desfecho da primeira para ingressar em juízo, o que poderia, em verdade, incen-
tivar um aumento de litigiosidade. Além disso, a preclusão de assunto contra
o réu poderia ser uma medida injusta em casos em que, na ação anterior, o réu
estivesse sendo demandado por uma quantia menos expressiva, tendo, assim,
menos incentivos para envidar esforços na defesa de sua tese, sem saber que
a decisão então proferida poderia ser prejudicial a um julgamento posterior383.
Ainda em Parklane, o Justice Stewart assenta de forma mais clara a diferença
entre o collateral estoppel e a res judicata, asseverando que esta impede o julga-
mento de uma segunda ação entre as mesmas partes que veicule a mesma causa
de pedir de uma primeira que teve um julgamento de mérito, ao passo que, pela
doutrina do collateral estoppel, a segunda ação traria uma causa de pedir diversa,
sendo defeso rediscudir assuntos de fato e de direito já decididos e cuja solução
fora decisiva para o desfecho da primeira ação384.

383 “A second argument against offensive use of collateral estoppel is that it may be unfair to a defendant.
If a defendant in the first action is sued for small or nominal damages, he may have little incentive
do defend vigorously, particularly if future suits are not foreseeable (…). Allowing offensive collateral
estoppel may also be unfair to a defendant if the judgment relied upon as a basis for the estoppel
is itself inconsistent with one or more previous judgments in favor of the defendant. Still another
situation where it might be unfair to apply offensive estoppel is where the second action affords the
defendant procedural opportunities unavailable in the first action that deadily cause a different
result” (439 U.S. 322, 1979).
384 “Under the doctrine of res judicata, a judgment on the merits in a prior suit bars a second suit
involving the same parties or their privies based on the same cause of action. Under the doctrine
of collateral estoppel, on the other hand, the second action is upon a different cause of action and

152
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Como se vê, há, em todos esses precedentes, uma clara preocupação com
o exercício do devido processo legal pela parte que será impedida de relitigar
a questão decidida no julgamento subsequente, assim como com a impossibi-
lidade de se aplicar a preclusão para aqueles que não foram parte na ação an-
terior385. Fala-se em oportunidade ampla e efetiva (“full and fair opportunity”)
de participação, pelo o que se faz necessário aferir se no processo em que a
questão fora decidida a parte prejudicada pôde se valer de todos os expedientes
processuais cabíveis, e que não seria possível usufruir de um contraditório mais
amplo no segundo processo. À parte (ou à sua sucessora) também deverá ser
assegurada a oportunidade de se defender contra a aplicação da issue preclusion,
demonstrando, inclusive, que não teve essa oportunidade de participação ampla
e efetiva no caso em que a questão foi decidida.
Partindo das disposições do artigo 985 e do artigo 1.040, do CPC/2015, é
possível dizer que a aplicação da questão jurídica decidida no IRDR e no jul-
gamento de casos repetitivos aos casos pendentes e futuros386 implica em uma
restrição a possibilidade de se rediscutir a matéria versada pelos litigantes desses
casos, assim como na issue preclusion da common law.
Há, no entanto, uma diferença fundamental, que é o fato de o non mutual issue
preclusion somente poder beneficiar o terceiro que não participou do julgamento,
e nunca prejudicá-lo. Esse terceiro conserva seu direito de discutir a questão que
eventualmente já tenha sido decidida em processo anterior do qual não foram par-

the judgment in the prior suits precludes relitigation of issues actually litigated and necessary to the
outcome of the first action” (439 U.S. 322, 1979).
385 “Some litigants - those who never appeared in a prior action - may not be collaterally estopped
without litigating the issue. They have never had a chance to present their evidence and arguments
on the claim. Due process prohibits estopping them despite one or more existing adjudications of the
identical issue which stand squarely against their position” (402 U.S. 313, 1971, trecho do voto do
Justice White).
386 É relevante também o que dispõe o Regimento do STJ, em seu artigo 256-R do Regimento Interno
do STJ, pelo qual a tese jurídica deverá ser aplicada aos recursos especiais pendentes, ainda que
não tenham sido sobrestados: “Art. 256-R. O acórdão proferido no julgamento do recurso especial
repetitivo gerará as seguintes consequências nos demais recursos especiais fundados em idêntica
questão de direito:
I - se já distribuídos e não devolvidos à origem por trazerem outras questões além da afetada, serão
julgados pelo relator, observada a tese firmada no julgamento de mérito do respetivo tema;
II - se ainda não distribuídos e não devolvidos à origem, serão julgados pelo Presidente do STJ;
III - se suspensos nas instâncias de origem, aplicam-se os arts. 1.040 e 1.041 do Código de Processo Civil.
Parágrafo único. O disposto no inciso III aplica-se a todos os processos que tratem de idêntica
questão de direito, mesmo que não tenham sido objeto de suspensão”.

153
Maria Cecília de Araujo Asperti

te, sem qualquer limitação no exercício de seu contraditório387. Diferentemente, no


julgamento de casos repetitivos, a tese jurídica aplica-se a todos os casos que versem
sobre a questão de direito resolvida, ainda que de forma pro et contra àqueles que não
participaram de forma alguma no contraditório firmado a seu respeito.
Ademais, a non mutual issue preclusion só se aplica se uma das partes for a
mesma no julgamento em que a questão é decidida e no caso subsequente, es-
tando, assim, inserida em um mesmo conflito de interesses entre a parte contra
quem a preclusão será aplicada e as partes do primeiro e do segundo processo. É
o que se verifica em todos os exemplos dados: em Bernhard, o espólio fora parte
(ainda que representado por administradores diversos) nos dois processos, em
que fora discutida a titularidade da quantia depositada em nome da de cujus; em
Blonder-Tongue, a University of Illinois Foundation discutira a mesma patente
contra partes diversas e, em Parklane, tratou-se, nos dois processos, da mesma
proxy statement divulgada pela companhia.
Como discutido neste trabalho, nos casos repetitivos – como é próprio da
litigiosidade repetitiva – há, de um lado, um ou alguns litigantes mais recor-
rentes, que demandam ou são demandados por litigantes diversos em razão
de questão de fato e/ou de direito similares. Contudo, nem sempre esses casos
envolvem os mesmos litigantes habituais, como deveria ocorrer para se poder
invocar a issue preclusion. Pode se pensar, como exemplo, na tese sobre a limi-
tação de juros bancários, decidida pelo STJ em sede de recurso especial repe-
titivo envolvendo uma correntista e um banco388, mas cuja definição afetou o

387 É o que Luiz Guilherme Marinoni afirma como sendo a “coisa julgada sobre questão, inclusive em benefício
de terceiro”, consignando a diferença entre esta e o efeito obrigatório dos precedentes: “Quer isso dizer que
a coisa julgada em benefício de terceiros não pode ser confundida com o efeito obrigatório dos precedentes
das Cortes Supremas. Os precedentes obviamente não têm qualquer relação com terceiros nem com as
partes. Apenas orientam os jurisdicionados e vinculam os juízes dos casos futuros, sem que precisem ter
sido discutidos pelas partes dos novos processos, mesmo quando as prejudicam” (“Coisa julgada sobre
questão, inclusive em benefício de terceiro”. Revista de Processo. Vol. 256, set/2016, p. 97-116, p. 13, versão
digital). Em sentido similar, em sua obra especificamente dedicada ao IRDR, o autor também cuida de
distinguir a preclusão sobre questão e a issue preclusion (ou collateral estoppel) do stare decisis: “Ora, se
o stare decisis objetiva resguardar a coerência do direito, a igualdade e a segurança jurídica, é certo que
impedir a busca de uma decisão diferente acerca de uma mesma questão diante de outro litigante tutela os
mesmos valores, embora, como é óbvio, com uma intensidade distinta (...). Porém, o collateral estoppel tem
grande particularidade em relação ao stare decisis. O collateral estoppel apenas pode prejudicar os litigantes
que participaram do processo em que a decisão foi proferida, ao passo que o stare decisis vincula todos os
juízes e tribunais, afetando todos os jurisdicionados” (2016b, op. cit., p. 31).
388 Tema nº 24: “As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios
estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF”.

154
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

julgamento de processos envolvendo não só diversos correntistas, mas também


variadas instituições financeiras. Em suma, não há, nas técnicas de julgamento
de casos repetitivos, sequer o requisito de que uma das partes seja a mesma no
caso paradigma e nos processos posteriores.
Por fim, a non mutual issue preclusion aplica-se tanto questões de fato e de di-
reito, enquanto o julgamento de casos repetitivos presta-se à definição de ques-
tões predominantemente de direito. Nesse ponto, a preclusão de questões de
fato revela-se mais sensível, em termos de mitigação ao direito de participar em
contraditório, na medida em que implica na importação, para um caso futuro,
de elementos probatórios colhidos e valorados em outro processo, enquanto a
preclusão de questões de direito restringe-se à interpretação do enquadramento
jurídico conferido a uma situação fática incontroversa (ou cuja controvérsia a
respeito não será objeto de preclusão)389.
Assim, a tese jurídica firmada no julgamento de casos repetitivos pode ser
comparada com a issue preclusion, na medida em que restringe a possibilidade
de se rediscutir as questões decididas. No entanto, há uma diferença essencial,
que é o fato de que a tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos
também atinge aqueles que não foram parte no procedimento em que fora fir-
mada. Essa distinção apenas reforça a importância de se discutir a participação
dos sujeitos que serão atingidos pela tese jurídica.

4.2.3. Participação e efeitos da tese jurídica


Ao tentar explicar os efeitos da tese jurídica e suas implicações para
compreensão da racionalidade processual das técnicas de julgamento de ca-

389 “The epistemological grounds for preclusion as to issues of law are stronger than those for preclusion
as to issues of fact. In resolving issues of fact, the court endeavors to portray for itself a historical
transaction in the outside world of events. Its method is to infer an image of reality - a scenario
- from conflicting evidence. (If the evidence were not in conflict, there would not be an issue to
decide). In deciding fact questions the court necessarily works through the medium of extrajudicial
resources, for example, evidence from witnesses. That dependency on outside resources entails a
possible discrepancy between what the court believes was the fact and what actually was the fact. By
contrast, in the resolution of issues of law the court constructs a verbal formulation from materials
of which the court has direct knowledge. These materials include the relevant legal documentary
sources, such as precedents and statutes. They also include the general view of reality in which those
verbal materials take on meaning” (HAZARD JR., Geoffrey C. “Preclusion as to Issues of Law: The
Legal System's Interest”. Iowa Law Review, n. 70, v. 87, 1984-1985, p. 88).

155
Maria Cecília de Araujo Asperti

sos repetitivos, percebe-se que as tentativas de aproximação entre essas téc-


nicas processuais e outros institutos de direito processual do ordenamento
brasileiro ou de direito comparado são sempre insuficientes para explicar
totalmente esses mecanismos, cujos requisitos e efeitos são sui generis em
nossa sistemática processual.
Como se viu nos itens anteriores, não é possível afirmar que a tese ju-
rídica firmada em julgamento de casos repetitivos seja um precedente pro-
priamente dito, visto que não consiste em uma ratio decidendi veiculada em
casos subsequentes a partir de sua própria racionalidade, com o objetivo de
afirmar o direito, conformando-se, em verdade, em um enunciado norma-
tivo autônomo formado de modo provocado, com o intuito específico de
solucionar casos repetitivos.
Do mesmo modo, embora possa ser comparada com a non mutual issue
preclusion, sobretudo por acarretar também restrições na possibilidade de se
litigar a questão de direito decidida em sede de IRDR e recursos repetitivos,
há, também, uma diferença fundamental, que é o fato de que a tese jurídica
impede a rediscussão das questões decididas mesmo por aqueles que não par-
ticiparam de seu julgamento.
Dentro do nosso sistema, a única possibilidade de se estender a eficácia pre-
clusiva da coisa julgada a terceiros é se estes puderem de alguma forma intervir
no processo, seja diretamente (mediante alguma modalidade de intervenção de
terceiros, por exemplo), seja mediante de forma mediada, como ocorre no pro-
cesso coletivo, com a substituição processual. Nesse sentido, o processo coletivo
busca, justamente, viabilizar a extensão dos efeitos de seu julgamento a pessoas
que não participaram dele diretamente, ainda que isso implique em estender a
eficácia preclusiva da coisa julgada para os demais legitimados extraordinários.
Justamente por acarretar essa extensão dos efeitos de sua decisão e de sua
eficácia preclusiva, é necessário prover salvaguardas àqueles que serão atingidos
pela decisão coletiva, a começar pela aferição, ope legis ou ope judicis, da capa-
cidade de o representante falar em nome dos representados, como já discutido
no capítulo anterior. Ainda assim, deverá ser assegurada a estes representados
possibilidade de opt out, ou seja, de não serem atingidos pela autoridade da coisa
julgada sentença coletiva, seja mediante notificação (fair notice), como no siste-
ma nortemericano, seja resguardando o direito individual de ação daquele que
não atua diretamente do processo coletivo, como previsto no artigo 103, §§1º e
2º, do CDC, no processo coletivo brasileiro.

156
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Mesmo diante de todos esses paradoxos, parece claro que a tese jurídica, por
ser formulada como um enunciado de natureza sumular e aplicada de forma
padronizada aos casos pendentes e futuros, acaba obstando a rediscussão das
questões decididas, a menos que a parte demonstre que não se tratam das mes-
mas questões. Nesse sentido, aproxima-se de um efeito preclusivo que se estende
a terceiros, como na issue preclusion, com a fundamental diferença de que essa
vedação a relitigação da questão se dá, inclusive, em prejuízo àqueles que não
participaram do seu julgamento original. Além disso, é possível dizer que esse
efeito preclusivo da tese jurídica suscita as mesmas, ou mais graves390 preocupa-
ções em termos de devido processo legal e de participação daqueles que ficarão
impedidos de relitigar a questão decidida, do que a eficácia preclusiva inerente
à coisa julgada coletiva, conforme já discutido.
Ainda que não seja objeto deste trabalho esgotar a discussão sobre a na-
tureza da tese jurídica e de seus efeitos, o exame aqui realizado ratifica a im-
portância da participação dos destinatários de decisão judicial que culmina na
formulação da tese jurídica,

390 Na verdade, preocupações até mesmo mais graves, dado o fato, já discutido, de que na ação
coletiva o direito individual de ação é preservado, enquanto a tese jurídica é aplicada a todos
independentemente de sua orientação. Nesse sentido, são relevantes as preocupações levantadas
por Heitor Sica ao comparar as técnicas de julgamento de casos repetitivos com o que ele chama de
“tratamento coletivo de demandas individuais repetitivas”: “(a) lida-se com o efeito (multiplicidade
de processos) e não com a causa (litígios de massa originalmente levados ao Poder Judiciário de
maneira atomizada, em processos individuais, tal como o médico que combate apenas a febre, em
vez de tratar da infecção); (b) o foco desses mecanismos de aglutinação é a solução do problema
do Poder Judiciário (e não do conflito de massa, que pode ter sido judicializado apenas por uma
ínfima parte dos indivíduos atingidos); (c) compromete-se a representatividade adequada da
coletividade a ser atingida pela decisão proferida no ‘caso-piloto’, no qual há o combate desigual
do litigante individual eventual versus litigante habitual; (d) ordenamento não estabelece critérios
para escolha dos ‘casos-piloto’; (e) a decisão proferida no âmbito dos incidentes de aglutinação
se aplicam pro et contra a pluralidade de sujeitos titulares de direitos individuais homogêneos
(contrariando uma escolha que havia sido feita no CDC no tocante à ação coletiva de tutela dos
direitos individuais homogêneos e, portanto, instaurando uma evidente contradição no sistema);
(f) ao julgar o incidente de aglutinação, o tribunal considerará as circunstâncias fáticas presentes
no ‘caso-piloto’ para resolver a questão jurídica de modo que sem uma adequada e profunda
fundamentação, haverá uma enorme dificuldade de replicar a decisão nos casos sobrestados; (g) o
incidente não elimina o trabalho dos magistrados perante os quais haja processos sobrestados, que
deverão aplicar a decisão e expor-se a meios de impugnação quanto a essa operação” (SICA, Heitor
Vitor Mendonça. “Brevíssimas reflexões sobre a evolução do tratamento da litigiosidade repetitiva
no ordenamento brasileiro, do CPC/1973 ao CPC/2015”. Revista de Processo. RT: São Paulo, v. 41,
n. 257, jul. 2016, p. 269-281, p. 279-280).

157
Maria Cecília de Araujo Asperti

4.3. Dilemas da participação nas técnicas de julgamento


de casos repetitivos

4.3.1. Disparidade entre litigantes repetitivos e ocasionais


Ao se analisar os discursos que influenciaram as reformas processuais e sua
relação com a noção de acesso à justiça, foram discutidas, também, as cau-
sas e contornos da litigiosidade repetitiva, apontada como uma das principais
“problemáticas” a ser enfrentada pelo CPC/2015, em especial pelas técnicas de
julgamento de casos repetitivos. Como visto, essa litigiosidade repetitiva, dife-
rentemente da “litigiosidade contida” associada a reformas que visavam a facili-
tação do acesso à justiça, seria um sintoma da “crise” do Judiciário, ocasionando
congestionamento das estruturas judiciárias e insegurança jurídica, conquanto
diferentes soluções poderiam ser conferidas a casos considerados análogos.
Remontando-se ao contexto em que a litigiosidade repetitiva passou a ser
notada e problematizada, tem-se a sua caracterização a partir da proliferação
de demandas surgidas a partir de relações jurídicas travadas entre indivíduos
e entes públicos ou pessoas jurídicas de direito privado, sujeitas a um mesmo
(e complexo) arcabouço regulatório e amparada em instrumentos contratuais
padronizados. Daí porque as controvérsias jurídicas decorrentes dessas relações
também acabam sendo volumosas e similares.
Partindo das mesmas premissas quanto à caracterização da litigiosidade re-
petitiva, Amanda de Araújo Guimarães propõe uma classificação orientada pelo
polo em que o grande litigante (ou litigante habitual) se encontra. Distingue-se,
então, a litigiosidade em que o grande litigante está no polo passivo (“litígios
contra múltiplos sujeitos) e no polo ativo (“litígios dos múltiplos sujeitos”)391.
Na primeira categoria, Guimarães descreve que estariam inseridas as deman-
das para recuperação de créditos, como execuções (em especial as execuções
fiscais), ações monitórias e de cobrança, traduzindo, assim, o uso do Judiciário
pelos litigantes habituais para submeter cidadãos, contribuintes ou consumido-
res ao seu interesse. Na segunda encontram-se os processos manejados contra
esses litigantes habituais, refletindo a pretensão individualizada daqueles que

391 GUIMARÃES, Amanda de Araújo, 2017, op. cit., p. 92-107.

158
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

entendem terem sido lesados pela conduta (omissiva ou comissiva) destes entes.
A autora destaca três tipos característicos de litígios dessa natureza:

“i) aqueles que se fundam em questionamentos quanto à legalidade


ou constitucionalidade de contratos ou obrigações tributárias, ou seja,
em relações padronizadas; ii) aqueles que buscam a reparação civil
com fulcro em situação danosa que atinge negativamente interesses de
muitos indivíduos; iii) também há aqueles que buscam a implementação
de direitos sociais, tutelando em face do estado a realização de algo” 392

Essa configuração subjetiva da litigiosidade repetitiva em que se tem, de um


lado, um litigante que atua com frequência em casos similares e, de outro, um
litigante para quem a demanda é única, é um ponto fundamental para discussão
sobre acesso à justiça e participação por meio do uso das técnicas de julgamento
de casos repetitivos. Afinal, como já discutido, é possível conjecturar que esses
litigantes habituais ou repetitivos sejam capazes de usufruir vantagens estraté-
gicas por meio do processo judicial, aproveitando-se da escala com que litigam
e dos incentivos que possuem para investir na especialização de sua atuação,
desenvolvendo expertise, capacidade de barganha e de influência na elaboração
de leis ou formação de precedentes que lhes sejam mais favoráveis393.
Marcelo Abelha Rodrigues problematiza, especificamente, a capacidade dos
litigantes ocasionais de representar a coletividade adequadamente no julgamen-
to do caso paradigma diante dessa disparidade estratégica, e aponta o que ele
chama de uma tendência de substituição de “técnicas coletivas de repercussão
individual” (ação civil pública para defesa de direitos individuais homogêneos)
por “técnicas individuais de repercussão coletiva”394. Rodrigues dá o exemplo de
uma discussão entre uma multiplicidade de consumidores (os litigantes ocasio-
nais dos processos individuais) e entidades bancárias, e questiona se os indiví-
duos terão condições de “representar adequadamente toda a multidão que está
a aguardar a decisão a ser tomada no respectivo Tribunal que julgará o inciden-

392 GUIMARÃES, Amanda de Araújo. 2017, op. cit.,, p. 107.


393 Sobre as vantagens estratégicas dos litigantes repetitivos, confira-se a análise feita no Capítulo
2, item 2.4.
394 RODRIGUES, Marcelo Abelha. “Técnicas individuais de repercussão coletiva x técnicas coletivas
de repercussão individual. Por que estão extinguindo a ação civil pública para defesa de direitos
individuais homogêneos?”. In MILARÉ, Édis (Coord.). Ação civil pública após 30 anos. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2015, p. 555-567.

159
Maria Cecília de Araujo Asperti

te para que possam ser solucionadas suas causas”395. A seu ver, a resposta seria
negativa, havendo, nesse tocante, violações das garantias do contraditório e da
ampla defesa, em particular do corolário da paridade de armas396.
Além disso, argumenta que, enquanto na tutela coletiva há a preocupação
de se preservar o direito individual de ação, com a coisa julgada apenas alcan-
çando os indivíduos para beneficiá-los (e nunca para prejudica-los), no julga-
mento por amostragem a tese jurídica é aplicada a todos os processos individu-
ais e coletivos que versem sobre a questão jurídica decidida397:

“E isso sem que houvessem tido a menor oportunidade de influir em


seu teor e, o que é pior, sem qualquer garantia de que os fundamentos e
argumentos trazidos na causa escolhida para representar a controvérsia
serão realmente bem preparados, completos, adequadamente expostos,
ou se aqueles sujeitos que o representam neste incidente, podiam
fazê-lo, no momento em que foi requerido o incidente, de forma
representativa ou adequada398”.

A partir dessas considerações, conclui que as técnicas de julgamento de ca-


sos repetitivos seriam mais vantajosas para os litigantes habituais do que a tu-
tela coletiva, viabilizando que estes envidem seus esforços para fazer prevalecer
as teses que lhes são favoráveis “em discussões travadas com quem não tem a
mínima condição de enfrenta-los”399.

395 RODRIGUES, Marcelo Abelha, 2015, op. cit., p. 560.


396 Abelha Rodrigues argumenta contra a tendência de substituição das técnicas coletivas ou
mecnaismos de julgametno por amostragem por entender que a ação coletiva seria capaz de
proporcionar a representação mais adequada dos indivíduos interessados, por meio de entidades
com condições de “disputar, em condições de igualdade, com os litigantes habituais”. Além disso,
ele sustenta que a ação civil pública permite que a lesão individual em massa não fique impune,
ao prever que mesmo que os individuos lesados não tomem a iniciativa de liquidar e executar
seus danos individuais, a indenização seja revertida para um fundo de defesa de direitos difusos
(artigo 100 do CDC). Ressalva que somente a ação civil pública permitiria buscar o ressarcimento
coletivo de lesões cuja parcela individual seja pequena ou insignificante, mas com consideráveis
repercussões coletivas, nas quais a tutela individual não se justificaria economicamente
(RODRIGUES, Marcelo Abelha, 2015, op. cit., p. 563-565).
397 Especificamente sobre os efeitos da tese jurídica no julgamento de casos repetitivos e suas implicações
em termos da participação daqueles que serão atingidos, vide item 4.2, acima.
398 RODRIGUES, Marcelo Abelha, 2015, op. cit., p. 563-564.
399 RODRIGUES, Marcelo Abelha, 2015, op. cit., p. 564.

160
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Luiz Guilherme Marinoni também problematiza a participação dos litigan-


tes individuais (ou dos indivíduos lesados por quem “viola direitos em massa”) e
as vantagens aferidas pelos violadores400.
Como visto anteriormente neste capítulo, Marinoni sustenta que a decisão
proferida em técnicas de julgamento de casos repetitivos faz coisa julgada com
relação à “idêntica questão” de direito em comum, que seria uma questão preju-
dicial, o que a aproximaria do instituto do collateral estoppel, da common law401.
A partir dessa aproximação, discute que quando se utiliza o collateral estoppel em
casos de acidentes que ocasionam múltiplos danos, a decisão proferida não pode
prejudicar a vítima que não foi parte do processo individual, mas pode beneficia-la,
desde que a empresa a quem não será permitido relitigar tenha tido a oportunidade
adequada de exercer o contraditório (“full and fair opportunity”) 402. Ao ser suscitada
a discussão sobre os custos para a empresa violadora de se defender em todos os
processos individuais da mesma questão, há a possibilidade de chamamento dos
potenciais lesados (mandatory joinder), transformando-se as ações individuais numa
ação coletiva, de modo a garantir a participação individual de todos.
Para Marinoni, com as técnicas de julgamento de casos repetitivos o racio-
cínio seria “exatamente o oposto”, pois ao invés de abrir espaço para a partici-
pação dos litigantes individuais, confere-se ao infrator a oportunidade de estar
presente e de concentrar esforços em um único julgamento, que será travado
unicamente contra um ou alguns dos lesados, que inevitavelmente não terão
condições (ou sequer interesse) de representar os interesses dos demais403. O
autor também critica o desinteresse com relação à tutela coletiva e a preferência
pelo julgamento de casos repetitivos, arguindo que a ação coletiva seria capaz
de preservar direitos processuais constitucionais dos litigantes por meio do con-
trole de representatividade adequada dos substitutos processuais404-405.

400 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016b, op. cit., p. 43-44.


401 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op. cit., 323-326; 2016b, op. cit., p. 19-31.
402 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op. cit., 326-328; 2016b, op. cit., p. 35-43.
403 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016b, op. cit., p. 45.
404 “Esse sistema, além de preservar e garantir os direitos processuais constitucionais dos litigantes –
que têm a garantia de serem adequadamente representados e, portanto, têm preservado o direito
de participar e ser ouvido - , ainda representa um mecanismo que favorece uma posição ativa da
sociedade diante do Estado” (MARINONI, Luiz Guilherme, 2016b, op. cit., p. 45).
405 Em sentido bastante diverso, Antonio Cabral do Passo enxerga, especificamente no IRDR, uma
ampliação do acesso à justiça individual, visto que o incidente permite que os indivíduos preservem,

161
Maria Cecília de Araujo Asperti

Como visto, é colocada, então, a questão sobre a mitigação da participação


dos indivíduos que litigam ou são demandados por litigantes habituais e que
terão o desfecho de seu caso impactado pelo julgamento de um caso repetitivo.
Acrescemos, também a esse ponto, o déficit de representatividade dos interesses
daqueles não ingressaram no Judiciário, mas que também poderiam ser afetados
pela tese jurídica em uma demanda futura, ou mesmo pelos parâmetros a serem
definidos judicialmente para atuação do litigante habitual, quando este for um
prestador de serviço públicos regulados, como prevê o artigo 985, §2º, e o artigo
1.040, inciso IV, do CPC/2015.

4.3.2. Representatividade dos “litigantes-sombra”


Diversos aspectos das sistemáticas de julgamento de casos repetitivos de-
safiam concepções tradicionais do processo civil brasileiro no tocante à par-
ticipação e representatividade. Os litigantes individuais dos demais processos
sobrestados (sobrestados), ou os litigantes potenciais de uma eventual demanda
futura (ausentes) são de alguma forma representados no julgamento de casos
repetitivos ou exercem uma participação direta nos processos individuais de
que são partes, como se fosse em uma simples aplicação de um entendimento
jurisprudencial ou precedente no caso concreto? Qual o papel exercido pelas
partes do processo a partir do qual o incidente foi instaurado ou do recurso
representativo da controvérsia no tocante à representação dos interesses desses
litigantes individuais?
Como visto no capítulo anterior, a discussão sobre a representação dos in-
teresses daqueles que serão afetados pela decisão judicial é central aos estudos

em suas demandas individuais, sua identidade e as especificidades de seu caso individual, sendo
uma verdadeira parte, e não uma “parte-substituída”. Para o autor, as técnicas de julgamento de
casos repetitivos não podem ser consideradas como sucedâneos dos mecanismos de tutela coletiva,
mas sim como “meios concorrentes”, ou “armas que se somam ao arsenal” que pode ofertar ao
jurisdicionado opções para resolver os problemas de representatividade decorrentes do sistema de
legitimação extraordinária (CABRAL, Antonio do Passo. “A causa de pedir nas ações coletivas”.
In SOUSA, José Augusto Garcia de. (coord.) A Defensoria Pública e os Processos Coletivos. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 138). A esse respeito, é necessário ponderar se de fato os problemas de
representatividade são superados pelo IRDR e pelos recursos repetitivos, e se a ampla participação
dos indivíduos dos casos pendentes realmente ocorre ou se, na prática, as partes do caso paradigma
acabam representando, de forma “improvisada” e insuficiente, os interesses dos “sobrestados” e dos
“ausentes”. Essa discussão é aprofundada ao longo de todo esse capítulo, mas de forma mais direta
nos itens 4.7.1 e 4.7.2.

162
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

sobre tutela coletiva, orientando os modelos de controle ope legis e ope judicis da
representatividade adequada e a própria formatação da substituição processual
e legitimação extraordinária do processo coletivo brasileiro. O confronto entre
a proteção ao devido processo legal e ao direito de participação dos afetados
pela decisão judicial e a promoção da efetividade da tutela – que justificaria
(ou não) a mitigação dessa participação – está no cerne de qualquer modelo
processual representativo.
É possível perceber, no entanto, que essa discussão ganha novos contornos
na medida em que a tutela coletiva é colocada lado a lado com as técnicas de
julgamento de casos repetitivos como vias de “enfrentamento” da litigiosidade
repetitiva ou de massa. Há alguns importantes julgados do STJ que expressam
mudanças no entendimento sobre esse tema.
Um julgado bastante rememorado no estudo da tutela coletiva é o acór-
dão do Conflito de Competência nº 47.731/DF, julgado em 14.09.2005406
pela Primeira Seção do STJ, e que fora suscitado pela Agência Nacional de
Telecomunicações (Anatel) para apreciar se as diversas ações individuais
e coletivas em trâmite ao redor do país referentes à cobrança de tarifa de
assinatura básica de Serviço de Telefonia Fixo Comutado (STFC) deveriam
ser reunidas para julgamento conjunto em juízo prevento (ao qual fora dis-
tribuída a primeira ação coletiva).
O caso da assinatura básica de telefonia é um dos mais paradigmáticos para
compreensão dos contornos da litigiosidade repetitiva, suas causas e dificulda-
des de gestão processual. Foram mais de 94 mil ações individuais tramitando
apenas no Estado de São Paulo versando sobre a matéria407 e 26 ações cole-
tivas408, o que suscitou uma série de questionamentos processuais sobre a in-

406 “Processo Civil. Conflito de Competência. Demandas Coletivas e Individuais promovidas contra a
Anatel e Empresas Concessionárias de Serviço de Telefonia. Controvérsia a respeito da legitimidade
da cobrança de tarifa de assinatura básica nos serviços de telefonia fixa. Conflito não conhecido.
(...)”. (Conflito de Competência nº 47.731/DF, Rel. Ministro Francisco Falcão, Rel. p/ Acórdão
Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, julgado em 14.09.2005)
407 “Processos podem se sobrepor”, edição de 13 de janeiro de 2005. Disponível em <http://www1.folha.
uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1301200515.htm>. Acesso em 30 abr. 2016.
408 “Em 31 de maio de 2004, perante a Comarca de Bauru, foi ajuizada pelo Instituto Brasileiro de
Defesa do Consumidor e do Contribuinte uma ação coletiva, cujo pedido consistia na suspensão da
cobrança de tarifa de assinatura por parte da ré naquele processo, a empresa Telecomunicações de
São Paulo S/A (Telesp). Essa foi a primeira de uma série de outras 25 ações de idêntico objeto a serem
propostas contra a mesma empresa em virtude da cobrança de tarifas de assinatura na telefonia local,

163
Maria Cecília de Araujo Asperti

tervenção da Anatel, como litisconsorte necessária, a competência da Justiça


Federal, a existência de litispendência e conexão entre as ações coletivas e entre
estas e as ações individuais, culminando em um verdadeiro tumulto processual.
Em pesquisa do Ministério da Justiça sobre a “Tutela Judicial dos Interes-
ses Metaindividuais - Ações Coletivas”409, em que essa litigância é investigada
como estudo de caso410, relata-se que:

“uma [das ações coletivas] chegou a ser remetida de um juízo para outro
quatro vezes, tendo sido determinada, mas ainda não cumprida, mais
uma remessa. Dois casos foram remetidos três vezes e três casos foram
remetidos duas vezes. Em cinco casos houve duas remessas e há, pendente
de cumprimento, decisão ordenando mais uma remessa. Em dois
casos houve uma remessa, estando pendente de cumprimento decisão
ordenando mais uma remessa. Em dois casos ainda não houve remessa
alguma, mas já há decisão determinando nesse sentido. Finalmente,
em apenas 11 dos casos analisados, o juízo atualmente encarregado do
feito é o mesmo ao qual ele foi originalmente distribuído, sem qualquer
remessa a juízo distinto411”.

Diante desse cenário, a Anatel suscitou Conflito de Competência pe-


rante o STJ afirmando que o dano alegado pelos litigantes individuais e
pelos entes legitimados nas ações coletivas seria de âmbito nacional e que a
tramitação concomitante destes processos acarretaria insegurança jurídica
e ficando a agência “sem saber se deve proibir ou permitir a cobrança da
tarifa de assinatura básica”412.
Ao apreciar a medida liminar postulada pela agência durante o recesso
forense, o Ministro Edson Vidigal, então Presidente do STJ, entendeu pelo
sobrestamento das ações coletivas e a definição da 2ª Vara Federal da Seção

sendo a última dessas ações proposta em São Paulo em 1o de janeiro de 2006” (MINISTÉRIO DA
JUSTIÇA, Tutela Judicial dos Interesses Metaindividuais - Ações Coletivas. Brasília, 2007, p. 62).
409 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, Tutela Judicial dos Interesses Metaindividuais - Ações Coletivas. Brasília: 2007.
410 O estudo do Ministério da Justiça contextualiza a litigância das tarifas telefônicas em um cenário
mais amplo de “rediscussão e redefinição do modelo de remuneração e estruturação tarifária do
serviço de telecomunicações resultante da reorganização geral promovida previamente à própria
privatização” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2007, op. cit., p. 59-78).
411 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2007, op. cit., p. 64-65.
412 Conflito de Competência nº 47.731/DF. Relatório do Voto-vista do Ministro Teori Zavascki, p. 5.

164
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Judiciária do Distrito Federal como competente para medidas de urgência,


porém indeferiu a reunião das ações individuais, sob o argumento de que não
seria razoável obrigar o consumidor a se deslocar para litigar contra a conces-
sionária de serviço público413.
As empresas de telefonia Brasil Telecom S/A, Companhia de Telecomuni-
cações do Brasil Central (CTBC) Telecom e por CTBC Celular S/A ingres-
saram no processo na condição de assistentes litisconsorciais, pleiteando o
sobrestamento das ações individuais, o que foi deferido pelo Relator Ministro
Francisco Falcão, que determinou, inclusive, a suspensão das tutelas urgentes
até então conferidas414.
No julgamento do Conflito de Competência, o Ministro Francisco Falcão
manteve seu posicionamento em favor da reunião das ações coletivas junto ao
juízo da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal e do sobres-
tamento das ações individuais, como forma de evitar decisões conflitantes415.

413 “Podem, portanto, as ações individuais tramitar independentemente das ações coletivas. Ao depois,
vale realçar que o Código de Defesa do Consumidor veio para inovar, para proteger o direito do
consumidor, hipossuficiente, e, assim sendo, não se afigura razoável, pelo ângulo lógico e prático,
que seja o consumidor, pessoa física ou jurídica, obrigado a se deslocar de seu domicílio para litigar
com a concessionária de serviço público. Isso seria o mesmo que lhe negar acesso à Justiça, ao direito
de ação constitucionalmente assegurado” (Conflito de Competência nº 47.731/DF. Decisão proferida
pelo Ministro Edson Vidal, p. 6-7).
414 “O pleito está gravado no sentido de extender a liminar concedida para o sobrestamento das ações
coletivas e juízos federais suscitados, também em relação às ações individuais e demandas em curso
perante a justiça comum. Tendo em vista as circunstâncias factuais inerentes à hipótese versada,
envolvendo cerca de 15 mil ações individuais e o risco de decisões contraditórias e ainda, considerando
o princípio da segurança jurídica, defiro o pleito da requerente para determinar o sobrestamento das
ações individuais e outras demandas nos juízos federal e estadual, em conformidade com a relação
de processos constantes dos docs. 2 a 4 da petição de fls. 2.679. Determino também a suspensão das
tutelas urgentes concedidas, e designo, para resolver as medidas urgentes, em caráter provisório,
o MM. Juízo da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal” (Decisão interlocutória
proferida no Conflito de Competência nº 47731/DF em 10.03.2005).
415 “Não obstante tais considerações, ainda assim não estaria de todo afastado o risco de serem
prolatadas decisões conflitantes entre si, ameaçando a segurança jurídica. Assim sendo, levando
em conta os efeitos erga omnes resultantes do julgamento de mérito das ações coletivas já ajuizadas
e a possibilidade legal de que haja a suspensão de processos caso a sentença de mérito dependa do
julgamento de outra causa, conforme reza o art. 265, IV, 'a', do Código de Processo Civil, entendo
pela necessidade, in casu, de que as ações individuais ajuizadas sejam sobrestadas até o julgamento
das ações coletivas. A possibilidade de tal suspensão pode ser reforçada igualmente quando se
constata a previsão do Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 104, de que os autores das
ações individuais, caso queiram beneficiar-se dos resultados advindos de ações coletivas, requeiram a
suspensão das ações por eles ajuizadas. Posto isso, declaro competente o Juízo da 2ª Vara Federal da

165
Maria Cecília de Araujo Asperti

Ressalta em seu voto a necessidade de se evitar a prolação de decisões contradi-


tórias sobre a matéria, entendendo, ainda, que essa já seria a previsão constante
no artigo 104 do CDC, prevê que os litigantes individuais podem requerer a
suspensão de seus processos caso queiram se beneficiar da sentença coletiva.
A maioria, contudo, alinhou-se, naquela oportunidade, ao posicionamen-
to do voto-vista do Ministro Teori Zavascki, que, diferentemente do Relator,
entendeu que a possibilidade de prolação de decisões divergentes, embora
indesejável, é “evento previsível” na sistemática processual, não havendo
um “instrumento de controle, com eficácia erga omnes, da legitimidade (ou
da interpretação), em face da lei, de atos normativos secundários (v.g., re-
soluções) ou de cláusulas padronizadas de contratos de adesão”, mas apenas
mecanismos para minimizar os efeitos da divergência jurisprudencial, como
os embargos de terceiro e a afetação de julgamento a órgão colegiado para
fixação de precedentes e súmulas416. A seu ver, em se tratando de situações de
concomitância entre ações individuais e coletivas relativas a direitos indivi-
duais homogêneos, não haveria o risco de decisões antagônicas, uma vez que
a sentença coletiva só será aplicável aos litigantes individuais que optarem por
sobrestar suas ações individuais.
O Ministro Teori Zavascki também discute o direito de participação daqueles
que serão afetados pelas sentenças coletivas, afirmando que não se pode presumir
que as ações coletivas, manejadas pelos legitimados (Ministério Público Fede-
ral, Procon, Instituto de Defesa do Consumidor, entre outros) contemplariam
integralmente os interesses dos autores das ações individuais. Haveria, a seu ver,
importantes fatores limitadores da representatividade desses legitimados:

“(a) a representatividade do órgão ou entidade autor da demanda coletiva


(= substituto processual), (b) o pedido formulado na demanda e (c) a
eficácia subjetiva da sentença imposta por lei, que ‘abrangerá apenas os
substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicílio no
âmbito de competência territorial do órgão prolator’ (Lei 9.494/97, art.
2º-A, introduzido pela Medida Provisória 2.180-35/2001)”417.

Seção Judiciária do Distrito Federal para as ações coletivas e, em observância à segurança jurídica,
determino o sobrestamento das ações individuais ajuizadas, aí se incluindo as dos Juizados Especiais
Federais” (Conflito de Competência nº 47.731/DF, Voto-vencido do Ministro Francisco Falcão, p. 9).
416 Conflito de Competência nº 47.731/DF, Voto do Ministro Teori Zavascki, p. 8.
417 Conflito de Competência nº 47.731/DF, Voto do Ministro Teori Zavascki, p. 9.

166
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Em se considerando, então, que os titulares de direito não estão necessariamen-


te representados nas ações coletivas, a suspensão das ações individuais seria, na
opinião do Ministro, “negar, na prática, acesso ao Judiciário” a esses indivíduos418.
Três anos depois, em 2008, a discussão específica sobre a possibilidade de
tramitação concomitante de ações individuais e coletivas seria ressuscitada no
julgamento do Recurso Especial nº 1.110.549/RS419, em que se apreciou a pos-
sibilidade de sobrestamento de ações individuais para julgamento de demandas
coletivas que versavam sobre os expurgos inflacionários de planos econômicos.
Neste caso, o Ministro Relator Sidnei Benetti entendeu pela necessidade
de uma interpretação dos dispositivos do CDC atinentes à tutela coletiva à
luz das mudanças ocorridas na lei processual desde a Reforma do Judiciário,
em especial a introdução dos artigos 543-C e 285-A, ambos do CPC de 1973,
para viabilizar a suspensão das demandas individuais para julgamento das
demandas coletivas420:

“O enfoque jurisdicional dos processos repetitivos vem decididamente


no sentido de fazer agrupar a macro-lide neles contida, a qual em cada
um deles identicamente se repete, em poucos processos, suficientes para

418 Muito embora a discussão sobre acesso à justiça e efetividade também já permeasse os votos vencidos.
À exemplo, em trecho de seu voto, Luiz Fux, então Ministro do STJ, afirmou que: “Esta é uma ação
coletiva, que versa e que interessa a todos. Uma ação dessa tem gerado a repetição de inúmeras ações.
Nossa opção na vida é: ira ou amor. Temos que fazer uma opção. Vamos receber cem mil ações,
cada uma com uma decisão diferente e vamos bater no peito que somos um tribunal da cidadania,
mas violando a isonomia, ou daremos uma solução para essa questão, que é nacional?” (Conflito de
Competência nº 47.731/DF, p. 44).
419 “Recurso repetitivo. Processual civil. Recurso especial. Ação coletiva. Macro-lide. Correção de saldos
de cadernetas de poupança. Sustação de andamento de ações individuais. Possibilidade. 1.- Ajuizada
ação coletiva atinente a macro-lide geradora de processos multitudinários, suspendem-se as ações
individuais, no aguardo do julgamento da ação coletiva. 2.- Entendimento que não nega vigência aos
aos arts. 51, IV e § 1º, 103 e 104 do Código de Defesa do Consumidor; 122 e 166 do Código Civil;
e 2º e 6º do Código de Processo Civil, com os quais se harmoniza, atualizando-lhes a interpretação
extraída da potencialidade desses dispositivos legais ante a diretriz legal resultante do disposto no
art. 543-C do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei dos Recursos Repetitivos (Lei
n. 11.672, de 8.5.2008).3.- Recurso Especial improvido” (Recurso Especial Repetitivo nº 1.110.549/
RS, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Segunda Seção, julgado em 28.10.2009).
420 “O enfoque jurisdicional dos processos repetitivos vem decididamente no sentido de fazer agrupar
a macro-lide neles contida, a qual em cada um deles identicamente se repete, em poucos processos,
suficientes para o conhecimento e a decisão de todos os aspectos da lide, de modo a cumprir-se a
prestação jurisdicional sem verdadeira inundação dos órgãos judiciários pela massa de processos
individuais, que, por vezes às centenas de milhares, inviabilizam a atuação judiciária” (Recurso
Especial Repetitivo nº 1.110.549/RS, voto do Ministro Relator Sidnei Beneti, p. 4).

167
Maria Cecília de Araujo Asperti

o conhecimento e a decisão de todos as aspectos da lide, de modo a


cumprir-se a prestação jurisdicional sem verdadeira inundação dos
órgãos judiciários pela massa de processos individuais, que, por vezes às
centenas de milhares, inviabilizam a atuação judiciária (...)”421.

A análise dessas duas decisões – do caso da assinatura básica de telefonia e


dos expurgos inflacionários – demonstra uma clara mudança de entendimento
com relação à interpretação dos dispositivos que tratam da concomitância entre
ações individuais e coletivas a partir da inserção no ordenamento das técnicas
de julgamento de casos repetitivos.
Em um primeiro momento, a legislação sobre processo coletivo é interpre-
tada a partir de seu propósito de assegurar a tutela coletiva de direitos sem
tolhimento do direito individual de ação, problematizando-se os limites da re-
presentatividade dos legitimados, do pedido deduzido e do alcance da sentença
coletiva, para então ratificar a importância do acesso à justiça individual dos
titulares dos direitos individuais homogêneos.
Já no julgamento dos expurgos inflacionários, a ênfase foi colocada na ne-
cessidade de se conferir maior segurança jurídica na interpretação das questões
de direito colocadas para julgamento. Entendeu-se que o volume de processos
justificaria o sobrestamento das ações individuais em curso, justamente pelo
fato de que, a partir da inserção dos instrumentos processuais de julgamento
de casos repetitivos, essa possibilidade de suspensão de processos considerados
similares já estaria contemplada pela lei processual.
Se a discussão sobre a representatividade dos litigantes individuais no jul-
gamento de um processo coletivo ficou em segundo plano, o mesmo pode se
dizer com relação a questão da participação desses litigantes quando da aplica-
ção das técnicas de julgamento de casos repetitivos. À exceção, cabe examinar
os termos do voto vencido do Ministro Herman Benjamin no julgamento do
Recurso Especial nº 911.802/RS, também relativo à cobrança de assinatura bá-
sica de telefonia, em que a discussão sobre participação dos ausentes e acerca
das possíveis vantagens estratégicas dos litigantes habituais no julgamento por
amostragem foi devidamente colocada.
Em 18.04.2007, no julgamento de questão de ordem suscitada no Agravo
de Instrumento nº 845.784/DF, a Seção Especial do STJ entendeu pela com-

421 Recurso Especial Repetitivo nº 1.110.549/RS. Voto do Ministro Relator Sidnei Beneti, p. 6.

168
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

petência da Primeira Seção para julgamento de casos relativos à cobrança


mensal de “assinatura básica residencial” e de “pulsos excendentes” em servi-
ços de telefonia422, com o objetivo de uniformizar a jurisprudência relativa à
matéria então discutida. Em virtude dessa determinação, o Recurso Especial
nº 911.802/RS foi remetido para Primeira Seção do STJ, para se firmar um
entendimento consolidado sobre a questão da validade da cobrança da assi-
natura mensal básica de telefonia. Perceba-se que, muito embora não tenha
se tratado de afetação para fins de julgamento de recurso especial repetitiva,
a Primeira Turma do STJ encaminhou esse caso especifico para a Primeira
Seção com o fito “de se assentar necessidade de se assentar, de imediato,
posicionamento sem divergência sobre o tema, no campo jurisprudencial (...)
haja vista a existência de milhares de processos que estão tramitando sobre o
assunto nos juízos de primeiro e segundo graus”423.
Referido recurso fora interposto pela Brasil Telecom em ação declaratória
de nulidade ajuizada em 2006 cumulada com repetição de indébito ajuizada por
Camila Mendes Soares em face de Brasil Telecom, objetivando obstar a cobran-
ça da chamada “assinatura mensal básica” e a sua devolução em dobro. Neste
caso, diante de sentença de primeiro grau foi de improcedência, a autora inter-
pôs recurso de apelação ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS),
que reformou a decisão, acolhendo seus pedidos. No julgamento, entendeu-se
que seria “abusiva a exigência de contraprestação por serviço não fornecido,
[por] inexistir previsão legal para a cobrança e ter aplicação ao caso as normas
do Código de Defesa do Consumidor”424.

422 Conforme previsto nos artigos 12 (“Compete às Seções processar e julgar: (...) VII - as questões
incidentes em processos da competência das Turmas da respectiva área de especialização, as quais
lhes tenham sido submetidas por essas”) e 127 (“Quando convier pronunciamento da Corte Especial
ou da Seção, em razão da relevância da questão jurídica, ou da necessidade de prevenir divergências
entre as Turmas, o relator, ou outro Ministro, no julgamento de qualquer recurso, poderá propor a
remessa do feito à apreciação da Seção respectiva, ou da Corte Especial, se a matéria for comum às
Seções”) do Regimento Interno do STJ.
423 Recurso Especial nº 911.802/RS, Relatório do Ministro Relator José Delgado, p. 13.
424 “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. DIREITO DO CONSUMIDOR. ASSINATURA
BÁSICA MENSAL. TELEFONIA FIXA. Abusividade da exigência de contraprestação por serviço
não prestado. Nulidade absoluta em face da qual não se fala em ato jurídico perfeito. Condicionamento
quantitativo indevido; nulidade - CPC, 39, I. Ausência de previsão legal à cobrança e prevalência
das disposições da Lei 8078/90, de ordem pública. Devolução na forma simples. Prequestionamento
inviável. Demanda procedente. APELO PROVIDO. UNÂNIME” (Apelação nº 70015466048, 19ª
Câmara Cível, julgamento em 08.08.2006).

169
Maria Cecília de Araujo Asperti

A Brasil Telecom ingressou com Recurso Especial em que sustentou que os


direitos previstos no CDC não excluíriam os decorrentes da legislação ordiná-
ria, no caso, a Lei Geral das Telecomunicações (Lei nº 9.472/1997); que a tarifa
mensal não seria voltada apenas à cessão de linha ou de terminal telefônico,
mas também à infraestrutura fornecida; que o artigo 52 da Resolução nº 85 da
Anatel autorizaria a cobrança da tarifa de assinatura; e que somente caberia
a repetição do indébito quando demonstrado o erro do pagamento voluntário,
nos termos do artigo 877 do Código Civil.
O Recurso Especial da empresa de telefonia foi provido em 24.10.2007425,
consolidando-se entendimento favorável à cobrança da tarifa telefônica, inclu-
sive com a edição da Súmula 356426 e, posteriormente, com o julgamento do
Recurso Especial Repetitivo nº 1.068.944/PB427.
Entretanto, importantes questões processuais foram suscitadas durante o
julgamento, em especial no voto vencido declarado pelo Ministro Herman Ben-
jamin, que trabalha a problemática da representatividade dos litigantes ausen-
tes em julgamento de casos repetitivos.

425 “Recurso Especial. Ação Anulatória C/C Repetição de Indébito. Serviço de telefonia. Cobrança de
‘Assinatura Básica Residencial’. Natureza Jurídica: Tarifa. Prestação do Serviço. Exigência de Edital
de desestatização das empresas federais de telecomunicações MC/BNDES n. 01/98 contemplando a
permissão da cobrança da tarifa de assinatura básica. Contrato de Concessão que autoriza a mesma
exigência. Resoluções n. 42/04 e 85/98, da Anatel, admitindo a cobrança. Disposição na Lei n.
8.987/95. Política Tarifária. Lei 9.472/97. Ausência de ofensa a normas e princípios do Código de
Defesa do Consumidor. Precedentes da Corte admitindo o pagamento de tarifa mínima em casos
de fornecimento de água. Legalidade da cobrança da assinatura básica de telefonia. Provimento do
Recurso Especial (...)” (Recurso Especial nº 911.802/RS, Relator Ministro José Delgado, Primeira
Seção, julgado em 24.10.2007).
426 Súmula nº 356: “É legítima a cobrança de tarifa básica pelo uso dos serviços de telefonia
fixa”. (Referências: REsp 911.802/RS , REsp 870.600/PB , REsp 994.144/RS , REsp 983.501/RS e
REsp 872.584/RS)
427 “Administrativo. Processual civil. Serviços de telefonia. Demanda entre usuário e concessionária.
Anatel. Interesse jurídico. Litisconsórcio passivo necessário. Inexistência. Tarifa de assinatura
mensal. Legitimidade da cobrança. Súmula 356/STJ. 1. Pacificou-se a jurisprudência das Turmas
da 1ª Seção do STJ no sentido de que, em demandas sobre a legitimidade da cobrança de tarifas
por serviço de telefonia, movidas por usuário contra a concessionária, não se configura hipótese
de litisconsórcio passivo necessário da ANATEL, que, na condição de concedente do serviço
público, não ostenta interesse jurídico qualificado a justificar sua presença na relação processual. 2.
Conforme assentado na Súmula 356/STJ, ‘é legítima a cobrança de tarifa básica pelo uso dos serviços
de telefonia fixa’. 3. Recurso especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC
e da Resolução STJ 08/08” (Recurso Especial nº 1.068.944/PB, Relator Ministro Teori Zavascki,
Julgamento em 12.11.2008). Foi então fixado o tema nº 77: “É legítima a cobrança de tarifa básica
pelo uso dos serviços de telefonia fixa.

170
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

O Ministro afirma em seu voto que o caso em questão trouxe à tona uma
verdadeira “perplexidade político-processual”428, na medida em que se permitiu
que uma ação individual, pela via de um expediente interno do Tribunal “de
natureza pragmática” pudesse ter na prática a eficácia erga omnes da sentença
coletiva em um caso de grande complexidade e cujo desfecho afetaria direta-
mente mais de 30 milhões de consumidores.
Aponta o que seria, a seu ver, um paradoxo: enquanto ao consumidor é
defeso postular coletivamente por falta de legitimidade ativa, aceita-se que uma
demanda individual venha a cumprir “o papel de ação civil pública às avessas”,
em um ambiente mais favorável “à prevalência dos interesses do sujeito hiper-
poderoso”, com maiores chances de obter um posicionamento que lhe favoreça
e que sirva para acabar com as milhares de demandas similares (individuais e
coletivas) contra este manejadas.
Ao se referir aos consumidores afetados pela decisão, o Ministro Herman
Benjamin utiliza-se da expressão “litigantes-sombra”, arguindo que a sua ausên-
cia nos debates que culminaram na formação deste precedente representaria
uma violação ao princípio do acesso à justiça, em especial diante da constatação
da falta de condições da parte autora do caso individual afetado de fazer frente
aos argumentos trazidos pelas empresas de telefonia durante o julgamento429.
Isso porque a escolha do caso paradigma pelo STJ teria relegado a represen-
tação dos interesses desses “litigantes-sombra” a uma litigante individual “tri-
plamente vulnerável” (consumidora, mulher e negra), incapaz de fazer frente às
vantagens da parte contrária no processo, que sequer teria conseguido compa-
recer na sessão de julgamento, ao passo que as empresas de telefonia teriam sido
representadas pelos “melhores escritórios de advocacia do país”, que cuidaram
de apresentar memoriais, realizar sustentações orais e visitas aos gabinetes dos
ministros da Primeira Seção.

428 A que ele denomina de “Uma perplexidade político-processual inicial: a solução de conflitos coletivos
pela via de ação civil individual e a mutilação reflexa do direito de acesso à justiça de milhões de
consumidores” (Recurso Especial nº 911.802/RS. Voto-vista do Ministro Herman Benjamin, p. 8).
429 “Não lastimo somente o silêncio de D. Camila Mendes Soares, mas sobretudo a ausência, em
sustentação oral, de representantes dos interesses dos litigantes-sombra , todos aqueles que serão
diretamente afetados pela decisão desta demanda, uma gigantesca multidão de brasileiros (mais de
30 milhões de assinantes) que, por bem ou por mal, pagam a conta bilionária da assinatura-básica
(lembro que só a recorrente, Brasil Telecom, arrecada, anualmente, cerca de três bilhões e meio de
reais com a cobrança dessa tarifa - cfr. www.agenciabrasil.gov.br, notícia publicada em 8.6.2007)”
(Recurso Especial nº 911.802/RS. Voto-vista do Ministro Herman Benjamin, p. 10).

171
Maria Cecília de Araujo Asperti

Conclui esse ponto de sua argumentação afirmando que a vitória das em-
presas de telefonia seria sobretudo estratégica, violando-se o princípio do acesso
à justiça e mitigando o contraditório dos consumidores afetados pela decisão:

“Em síntese, a vitória das empresas de telefonia, que hoje se prenuncia,


não é exclusivamente de mérito; é, antes de tudo, o sucesso de uma
estratégia judicial, legal na forma, mas que, na substância, arranha o
precioso princípio do acesso à justiça, uma vez que, intencionalmente
ou não, inviabiliza o debate judicial e o efetivo contraditório, rasgando
a ratio essendi do sistema de processo civil coletivo em vigor (Lei
7347/85 e CDC)”430.

O voto do Ministro Herman Benjamin elucida a problematização de fundo


do presente trabalho acerca da participação dos litigante individuais (presentes
e futuros) que serão afetados pela tese jurídica firmada em sede de julgamento
de casos repetitivos. Mais precisamente, ele toca em questões atinentes à con-
formação subjetiva do caso afetado para julgamento, apontando que a dispari-
dade de capacidade estratégica entre as partes – no caso, a consumidora e as
empresas de telefonia – seria decisiva na formulação de um entendimento mais
favorável aos litigantes habituais. Esse ponto será aprofundado a seguir.

4.4. Participação na instauração do procedimento


Foi visto nesse capítulo que há divergências sobre a compreensão do IRDR
como um mecanismo de julgamento por amostra ou uma técnica processual ob-
jetiva, na qual os elementos do caso a partir do qual é instaurado teriam pouca
ou nenhuma relevância.
Sem embargo das diferenças entre o incidente e a técnica de julgamento de
recursos repetitivos (que serão aprofundadas nos itens seguintes), entende-se
que há uma inegável importância do papel exercido pelas partes do caso para-
digma na formação da convicção dos julgadores acerca da tese jurídica. Dessa
forma, ainda que se entenda que a formulação da tese jurídica não se restrinja
aos elementos do caso originário, não se pode afastar a sua importância de sua
conformação subjetiva, dada a influência que (ao menos em tese) pode ser exer-

430 Recurso Especial nº 911.802/RS. Voto-vista do Ministro Herman Benjamin, p. 11.

172
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

cida pelas suas partes no julgamento, bem como as já discutidas características


da litigiosidade repetitiva.
Em razão das particularidades procedimentais dos institutos, a discussão so-
bre a participação dos litigantes ocasionais e habituais na afetação do recurso
representativo da controvérsia e na instauração do IRDR será realizada separa-
damente, a fim de questionar em que medida a disparidade estratégica no caso
(ou casos) paradigma pode impactar a formulação da tese jurídica.

4.4.1. Escolha do caso paradigma nos recursos repetitivos

4.4.1.1. Critérios para afetação do recurso representativo da


controvérsia
Pela lógica dos recursos especial e extraordinário repetitivos, a tese jurídica
é formulada no julgamento de dois ou mais casos tidos por representativos da
controvérsia e que “contenham abrangente argumentação e discussão a respei-
to da questão a ser decidida” (artigo 1.036, §6º). A afetação é realizada pelo
Tribunal de origem ou pelo relator do processo no STJ ou no STF, pelo o que,
diferentemente do que acontece no IRDR, não há uma participação direta das
partes ou de interessados na escolha no recurso representativo da controvérsia.
No entanto, é certo que os critérios ou requisitos para escolha dos casos
paradigma pelo órgão jurisdicional podem ter significativos impactos em termos
da representatividade dos interesses daqueles que serão impactados pela tese
jurídica. Essa é uma das importantes questões suscitadas pelo Ministro Herman
Benjamin no julgamento do caso da cobrança de assinatura básica de telefonia,
ao problematizar a capacidade da consumidora que acabou representando todos
os assinantes/consumidores no caso individual que viria a consolidar o entendi-
mento da corte sobre o tema.
Sobre os critérios para afetação do recurso representativo da controvér-
sia nos recursos repetitivos, previu-se, durante a tramitação do projeto do
CPC/2015, na redação apresentada pela Comissão da Câmara dos Deputados,
que o recurso representativo da controvérsia deveria ser “originado de proces-
so em que tenha havido completa e diversificada argumentação e discussão
em torno da questão objeto do incidente” (artigo 1.059, §1º). Similar critério
era adotado na Resolução nº 8/2008 do STJ, promulgada para regulamentar

173
Maria Cecília de Araujo Asperti

os procedimentos de admissibilidade e julgamento de recursos especiais repe-


titivos, após a Lei n. 11.672/2008, que estabelecia em seu artigo 1º, § 1º, que
“serão selecionados pelo menos um processo de cada Relator e, dentre esses,
os que contiverem maior diversidade de fundamentos no acórdão e de argu-
mentos no recurso especial”.
Após a Emenda Regimental nº 24, de 2016, o Regimento Interno do STJ
passou a viger com a seguinte redação:

Art. 256. (...)


§ 1º Os recursos especiais representativos da controvérsia serão sele-
cionados pelo Tribunal de origem, que deverá levar em consideração o
preenchimento dos requisitos de admissibilidade e, preferencialmente:
I - a maior diversidade de fundamentos constantes do acórdão e dos
argumentos no recurso especial;
II - a questão de mérito que puder tornar prejudicadas outras questões
suscitadas no recurso;
III - a divergência, se existente, entre órgãos julgadores do Tribunal de
origem, caso em que deverá ser observada a representação de todas as
teses em confronto.

Esses critérios para escolha dos recursos especiais representativos da contro-


vérsia (critérios de representatividade dos casos paradigma, por se dizer), não
são de observação obrigatória – tanto assim a que o dispositivo usa o advérbio
“preferencialmente” – mas denotam uma tentativa de direcionar a seleção para
casos em que o debate argumentativo tenha se desenvolvido mais extensiva-
mente. Fossem estes verdadeiros requisitos legais, seria possível a impugnação,
pelos interessados, de decisões de afetação, proferidas pelo Tribunal de origem
ou pelo próprio relator do STF ou do STJ, em que não se fundamentasse expres-
samente a partir de tais fatores, com base no dever de fundamentação regulado
pelo artigo 489, §1º, do CPC/2015.
Pela redação atual, no entanto, infere-se que a afetação deverá ser motivada
tão-somente em razão da “diversidade de argumentos”, não se exigindo, ex-
pressamente, que todas as teses eventualmente confrontadas estejam adequa-
damente veiculadas na amostra a ser julgada, tampouco qualquer critério de
representatividade das partes dos casos paradigma.
Sobre a importância de uma melhor definição desses critérios de afetação,
Antonio de Passo Cabral propõe requisitos para escolha do “processo-modelo”

174
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

no IRDR, aplicáveis também para escolha da “causa-piloto” no caso dos recur-


sos repetitivos431, a partir de dois vetores: (i) a amplitude do contraditório, que
se traduziria na completude, qualidade e diversidade da argumentação, contra-
ditório efetivo e inexistência de restrições à cognição e à prova; e (ii) a plura-
lidade e representatividade dos sujeitos do caso-piloto ou do processo-modelo,
com a preocupação de se reduzir “déficits de contraditório”, assegurando-se
uma efetiva maturação do tema e confronto dialético entre teses antagônicas,
com clareza, logicidade, concisão e pluralidade432.
Com relação à amplitude do contraditório, Cabral pondera que ainda que
se considere que em processos que veiculem questões comuns os argumentos
possam ser, em certa medida, padronizados, há casos em que apenas alguns ar-
gumentos são colocados, o que pode prejudicar a formação da tese jurídica, tor-
nando-a equivocada ou incompleta, deixando espaço para que novas discussões
sejam suscitadas nos processos repetitivos433. Em outras palavras, os argumentos
dos casos paradigma tem que ser suficientes e diversos a ponto de se permitir
a formulação de uma ratio decidendi que efetivamente solucionará os dissensos
acerca da questão comum.
O autor também destaca que a amplitude do contraditório também deve
condizer com a qualidade da argumentação realizada no caso escolhido, tan-
to nas razões recursais quanto nas contrarrazões, que deverão ser, quanto ao
seu conteúdo, claras, lógicas e concisas434. Essa qualidade argumentativa diz
respeito não somente às peças das partes, mas também às decisões judiciais
prolatadas, sendo conveniente a escolha do caso em que as decisões de primei-
ro e segundo grau estejam mais bem fundamentadas. Para tanto, é necessário
que tenha havido um contraditório efetivo no processo em questão, com ampla
discussão, pelas partes e eventualmente por terceiros e intervenientes, sobre as
questões colocadas.
Já no que diz respeito à pluralidade e representatividade dos sujeitos, Cabral
defende a busca pela maior “pluralidade subjetiva” possível no debate do caso

431 Lembrando o posicionamento do autor quanto ao recurso especial e extraordinário repetitivo ser um
procedimento de “causa-piloto”, como visto no item 4.1.3.
432 CABRAL, Antonio de Passo, 2017, op. cit., p. 47.
433 CABRAL, Antonio de Passo2017, op. cit., p. 48-49.
434 CABRAL, Antonio de Passo, 2017, op. cit., p. 50-51.

175
Maria Cecília de Araujo Asperti

originário435. Nesse sentido, seria preferível a afetação de processos em que haja


litisconsórcio ativo ou passivo ou em que tenha ocorrido alguma intervenção
de terceiros, preferencialmente com a atuação de amici curiae e realização de
audiência pública, por exemplo.
Sustenta, ainda, que a escolha desses casos deveria se pautar pelo crité-
rio da representatividade, à semelhança das class action norte-americanas436,
ainda que, para o autor, as técnicas de julgamento de casos repetitivos se-
jam espécies do modelo de “ações de grupo”, e não das ações representativas
propriamente ditas437. Mesmo assim, para se assegurar a melhor representa-
ção dos interesses dos ausentes, seria preferível a afetação (ou instauração do
IRDR a partir) de ações coletivas a ações individuais e, em existindo diversos
processos coletivos, daqueles ajuizados por “órgãos independentes” de âmbito
nacional (assim entendidos como aqueles que “atuem com base no interesse
público e sem hierarquia”) àqueles que representem grupos específicos ou de
atuação apenas local (ex. associações).
Apesar de seu intuito de evitar os desvios decorrentes da escolha de casos
mal instruídos e direcionar a escolha de ações coletivas, os critérios normati-
vos e demais balizas interpretativas propostas não parecem ser suficientes para
superar as questões problematizadas quanto à participação e a representação
dos interesses dos sobrestados e dos ausentes no julgamento por amostragem de
recursos repetitivos.
Em primeiro lugar, não se pode assumir que sempre haverá uma ação cole-
tiva em trâmite e adequadamente instruída para afetação em sede de recurso
especial repetitivo. Referidas demandas têm uma tramitação mais complexa
e demorada, pelo o que é de se esperar que as cortes superiores já tenham se
deparado com uma multiplicidade de recursos especiais e extraordinários re-
lativos a casos individuais antes de receberem um apelo atinente a uma ação
coletiva438. Em segundo, há grande dificuldade em articular esses critérios na

435 CABRAL, Antonio de Passo2017, op. cit., p. 57-61.


436 Sobre a representatividade adequada na class action norte-americana, confira-se Capítulo 3, item 3.2.2.
437 Sobre a distinção entre ações de grupo e ações representativas, confira-se o já citado artigo de Neil
Andrews intitulado “Multi–Party Proceedings in England: Representative and Group Actions”
(2001, op. cit.).
438 A prof. Ada Pellegrini Grinover acreditava que o incidente de resolução de demandas repetitivas se
aplicaria unicamente para demandas individuais, assinalando que o STJ teria se posicionamento no
sentido de não mais limitar a coisa julgada erga omnes da ação coletiva à competência territorial do

176
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

prática, de modo a encontrar os “casos perfeitos”. Como os critérios não são


de observância obrigatória, não há clareza sobre como interpretar esses fato-
res, além de praticamente nenhuma preocupação com a representatividade
dos afetados pela tese jurídica, critério este que sequer encontra-se estabeleci-
do pelo Regimento Interno do STJ.
Tome-se de exemplo o julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº
1.061.530/RS439, relativo aos juros remuneratórios, da capitalização de juros e da
mora em contratos bancários.
Em seu voto, o Ministro João Otávio de Noronha pondera que a escolha do
recurso representativo da controvérsia – até então era possível (e muito comum)
a afetação de apenas um caso – não teria sido adequada, porquanto teses que
poderiam ter sido discutidas na oportunidade foram deixadas de lado, quais
sejam, a discussão sobre capitalização de juros e cobrança de comissão de per-
manência também nesses contratos440.
Extrai-se do relatório do julgado que o recurso representativo da controvér-
sia foi interposto pelo Unibanco S.A. contra acórdão que manteve sentença
proferida em ação de revisão contratual ajuizada por Rosemari dos Santos San-
ches, referente a contrato de financiamento para compra de uma motocicleta,
no valor de R$ 4.890,00 em 36 parcelas (em 2007)441. Consta, também, que a
autora (então recorrida) pleiteou o afastamento da capitalização de juros, da

órgão prolator da decisão: “Isso significa que, a partir desse momento histórico, os diversos processos
coletivos repetitivos de âmbito local que ainda possam existir serão absorvidos pelo processo coletivo
de âmbito nacional ou regional, em face do fenômeno processual da continência (aplicável aos
processos coletivos)” (“A coletivização de ações individuais após o veto” In MILARÉ, Édis (coord.).
Ação civil pública após 30 anos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 19-24, p. 23).
439 Recurso Especial nº 1.061.530/RS, Relatora Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgamento e
em 22.10.2008).
440 “
Tenho que reconhecer, outrossim, que, no caso em espécie, não fomos felizes na escolha do processo
tipo, ou seja, aquele afetado a julgamento da Seção nos termos do art. 543-C do Código de Processo
Civil. Com efeito, dois temas importantes não poderão ser analisados – quais sejam, capitalização de
juros e comissão de permanência –, pois, diante das peculiaridades do caso em concreto, afigura-se
impossível transpor a fase do conhecimento para analisar tais questões, que integram o núcleo do
mérito recursal. O que restou então para ser analisado? As teses relativas: a) às ‘disposições de ofício’;
b) ao limite dos juros remuneratórios; c) à configuração da mora – e, nesse ponto, parece-me termos
um problema de ordem técnica –; e d) à inscrição do nome do devedor no cadastro de inadimplentes”
(Recurso Especial Repetitivo nº 1.061.530/RS. Voto do Ministro João Otávio de Noronha, p. 51).
441 Processo nº 022/1.07.0000246-5, 1ª Vara Cível de Pelotas. Julgamento em primeiro grau em
16.04.2007.

177
Maria Cecília de Araujo Asperti

cobrança da comissão de permanência e da inclusão de seu nome em cadastro


de inadimplentes, o que foi integralmente provido em primeiro grau442. No jul-
gamento do recurso de apelação pelo TJRS443, foi, ainda, afastada de ofício a co-
brança de outros encargos444. Todavia, a questão acerca da capitalização mensal
de juros foi arguida com base em matéria constitucional445, inviabilizando sua
apreciação em sede de recurso especial, e a comissão de permanência não teria
sido adequadamente fundamentada446.
Em tese, poderia se arguir que melhor teria sido a escolha de um caso
em que todas essas matérias tivessem sido suficiente e adequadamente ar-

442 “Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE a presente ação para reduzir a 1% ao mês a taxa de juros
no contrato de financiamento firmado entre as partes, afastando a cobrança da comissão de
permanência, que deverá ser substituída pelo IGPM, e determinando a capitalização anual dos
juros” (Processo nº 022/1.07.0000246-5, 1ª Vara Cível de Pelotas. Julgamento em primeiro grau em
16.04.2007).
443 Apelação nº 70021397559 / 0008243-79.2007.8.21.7000, 14ª Câmara Cível, Relator Desembargador
Dorval Braulio Marques, julgamento em 22.11.2007.
444 Discutiu-se a legalidade da tarifa de emissão de boleto bancário (“A emissão de qualquer carnê ou
boleto para pagamento é obrigação do credor não devendo ensejar ônus algum ao devedor, já que os
arts. 319 do Código Civil/2002 e art. 939 do Código Civil/1916, não trazem no seu bojo a condição
de pagamento em dinheiro para ele receber o que lhe é de direito. Disposição de ofício”) e da taxa
de abertura de crédito (“Além de atender interesse exclusivo do mutuante, essa cláusula contratual
contraria o disposto no art. 46, parte final, do Código de Defesa do Consumidor, pois não fornece ao
mutuário todas as informações sobre sua finalidade e alcance. Disposição de ofício”).
445 “A minha divergência, contudo, está em que o recurso não pode ser conhecido porque o enfrentamento
da questão deu-se com base em fundamento constitucional, ou seja, o acórdão está respaldado em
norma constitucional; tanto é que o recorrente também aviou recurso extraordinário – inclusive
causou-me perplexidade o fato de esse recurso não ter sido admitido na origem, tendo em vista o
prequestionamento explícito da norma constitucional (...) Esta Corte teria condições de conhecer
da matéria se, no recurso especial, a questão da violação dos artigos 481 e 482 do CPC tivesse sido
agitada no acórdão recorrido. Como não foi, entendo que não temos como enfrentá-la, uma vez
que matérias que não foram prequestionadas não podem ser apreciadas por este Tribunal ante a
incidência das Sumulas ns. 282 e 356 do Colendo STF (Recurso Especial Repetitivo nº 1.061.530/
RS. Voto do Ministro João Otávio de Noronha, p. 51-52).
446 “A Segunda Seção, por maioria, deixou de conhecer do recurso especial quanto à comissão
de permanência, por considerar o recurso deficientemente fundamentado quanto à alínea ‘a’ do
permissivo constitucional e pelo fato de o dissídio jurisprudencial não ter sido comprovado, mediante
a realização do cotejo analítico entre os julgados tidos como divergentes. Quanto a este aspecto, fiquei
vencida juntamente com i. Desembargador Convocado Carlos Fernando Mathias, pois consideramos
que o especial neste ponto poderia ser apreciado em razão da notoriedade do dissídio jurisprudencial,
notadamente por se tratar de matéria repetitiva, objeto de questionamento em milhares de recursos
que ingressam neste STJ” (Recurso Especial Repetitivo nº 1.061.530/RS. Voto da Ministra Nancy
Andrighi, p. 42).

178
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

guidas, para formulação de uma tese jurídica abrangente e que encerrasse


todas as discussões atinentes à revisão de contratos bancários apontadas
pelo Ministro Noronha.
Porém, é importante refletir sobre o peso da amostra nesse caso: são estes
temas de grande complexidade e enorme abrangência seriam decididos de uma
só vez a partir dos elementos deste único caso, ou de alguns poucos.
Suponha-se que no recurso em questão o Unibanco tivesse instruído satisfato-
riamente o seu recurso especial, dando ensejo à apreciação de todas essas matérias.
Teria, de um lado, um banco com capacidade, inclusive, de se articular com
as demais instituições financeiras para organizar uma estratégia de conven-
cimento da corte, com visitas aos gabinetes dos ministros e apresentação de
memoriais. Ao Unibanco estaria assegurado o exercício do amplo contraditó-
rio, na condição de parte, com a possibilidade de apresentação de estudos e
documentos, bem como de realização de sustentação oral. Do outro lado, uma
consumidora beneficiária da Justiça Gratuita447, que teria de representar em
julgamento os interesses de todos os milhões de mutuários que recorrem a fi-
nanciamentos bancários.
A despeito das manifestações por escrito de entidades de defesa do consumi-
dor, sua sustentação oral foi rejeitada, sob o argumento de que a manifestação
oral caberia apenas às partes448. Consta do relatório do acórdão que a recorri-
da sequer apresentou contrarrazões ao recurso especial do Unibanco. Assim,
o contraditório amplo e efetivo somente estaria assegurado à Sra. Rosemeire,
muito embora ela e seu advogado nunca tivessem se arrogado ao papel de repre-
sentantes dos demais afetados pela tese jurídica.
Ainda assim, as incongruências persistem: a partir de um único caso, em
que a única litigante ocasional envolvida era a Sra. Rosemari, foram definidas
13 teses jurídicas relativas à matéria de grande relevância e repercussão para

447 Conforme consta na sentença: “Pede a procedência da ação, com as cominações legais, e o benefício
da justiça gratuita. Juntou documentos (fls. 13/16). Foi deferida a gratuidade processual e concedida
em parte a antecipação de tutela (fls. 17)”.
448 “A lei permite ao relator ouvir terceiros interessados, vale dizer, pessoas que, embora não se submetam
à eficácia da coisa julgada que derivará do acórdão no caso concreto, têm legítimo interesse na defesa
da tese apreciada, tendo em vista a repercussão que dela se extrairá para futuros julgamentos de
outros recursos. No caso, os terceiros interessados foram ouvidos e se manifestaram por escrito.
Portanto, penso que, para manter a boa ordem, deve-se cumprir o que ficou estabelecido nesta Seção
em julgamento anterior: a sustentação oral deverá ficar reservada apenas para as partes” (Recurso
Especial Repetitivo nº 1.061.530/RS. Voto do Ministro João Otávio Noronha, p. 50).

179
Maria Cecília de Araujo Asperti

os inúmeros processos envolvendo discussões sobre juros bancários, encargos e


inscrição em cadastro de inadimplência. 449 As teses jurídicas, praticamente em
sua integralidade, foram prejudiciais aos mutuários, revertendo o entendimento
até então prevalecente no julgamento do caso paradigma pelo TJRS. Ainda que
tenha havido no caso manifestações de diversas entidades450, há, sem dúvida,
um grande peso na manifestação das partes (no caso, não foi aberta sequer a
possibilidade de sustentação oral por parte dos intervenientes), o que reforça a
preocupação com o papel desempenhado pelas partes no julgamento do caso
paradigma e na definição da tese jurídica, tema esse que será explorado mais
detidamente ainda neste capítulo.

4.4.1.2. Desistência do recorrente como estratégia do


litigante habitual
Um último ponto a ser discutido no tocante à escolha do recurso represen-
tativo da controvérsia diz respeito a uma possível estratégia a ser utilizada por
aqueles que serão afetados pelo julgamento de desistir do recurso, caso este seja
selecionado, com intuito de dificultar a definição da tese ou direcionar a afeta-
ção para casos em que se julgue haver mais elementos favoráveis ao recorrente.
Isso porque, como se viu, uma das vantagens mais significativas dos litigan-
tes habituais é a sua capacidade de visualizar todo o panorama da litigância
repetitiva, o que lhe permite agir de forma estratégica e articulada. Essa foi,
justamente, a estratégia adotada no julgamento que foi objeto do estudo de
caso do Capítulo 6 sobre e a “natureza dos sistemas de scoring e a possibilidade
de violação a princípios e regras do Código de Defesa do Consumidor capaz de

449 São os temas nº 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35 e 36.
450 “Responderam aos ofícios expedidos com base no art. 3º, I, da Resolução 08/08 do STJ, as seguintes
entidades: (i) a Ordem dos Advogados do Brasil (fls. 286); (ii) o Banco Central do Brasil (fls. 288); (iii)
a Febraban – Federação Brasileira de Bancos e (iv) o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor –
IDEC, que trouxe pareceres de Cláudia Lima Marques e Cristiano Heineck Schmitt. Manifestaram-
se espontaneamente: (i) a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro; (ii) a Fundação de
Proteção e Defesa do Consumidor – Procon/SP; (ii) o Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa
do Consumidor – FNECDC; (iii) a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e
Poupança – ABECIP; (iv) a Serasa S/A, trazendo parecer de Luiz Rodrigues Wambier e José Miguel
Garcia Medina; (v) a Defensoria Pública da União, cujas manifestações foram juntadas, por linha, ao
processo e (vi) os professores Romualdo Wilson Cançado e Orlei Claro de Lima” (Recurso Especial
Repetitivo nº 1.061.530/RS. Trecho do relatório do voto da Ministra Nancy Andrighi, p. 11).

180
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

gerar indenização por dano moral”451 em que, quando da afetação pelo TJRS de
recursos de apelação das quatro empresas prestadoras do referido sistema, todas
desistiram de seus recursos quase que simultaneamente452.
A discussão sobre a possibilidade de o recorrente desistir do recurso já afe-
tado para julgamento foi suscitada no julgamento dos recursos especiais re-
petitivos nº 1.058.114/RS e 1.063.343/RS, afetados para discussão da questão
sobre “a legalidade da cláusula que, em contratos bancários, prevê a cobrança
da comissão de permanência na hipótese de inadimplência do consumidor”.
Os dois casos tinham como recorrente o Banco Volkswagen453 e como recorri-
das pessoas físicas, que haviam obtido decisões favoráveis no julgamento pelo
TJRS454. Os recursos da instituição financeira foram afetados para julgamento,
em 22.08.2008, pelo procedimento do então vigente artigo 543-C do CPC/1973.
Pouco tempo depois, os recursos foram incluídos na pauta para julgamento do
dia 26.11.2008 (conforme publicação de 19.11.2008). O Banco Volkswagen, em
21.11.2008, apresentou pedidos de desistência nos dois casos, o que levou a 2ª
Seção, por maioria de votos, a remeter à Corte Especial a Questão de Ordem re-

451 Tema nº 710. O caso em questão é analisado pelo método do estudo de caso no Capítulo 6, em
que são analisados integralmente os autos dos processos dos quais foram extraídos os recursos
em questão.
452 Boa Vista Serviços S/A, o Serasa S/A e a CDL, conforme item 6.2.4.
453 Importante pontuar que o Banco Volkswagen aparece em 40º lugar na lista dos 100 Maiores Litigantes
da justiça estadual, federal e do trabalho, referente ao ano de 2011 (CONSELHO NACIONAL DE
JUSTIÇA, 2012, op. cit., p. 18).
454 No Recurso Especial nº 1.058.114/RS, a recorrida Luciana Gonçalves da Costa havia obtido sentença
favorável em ação revisional de contrato de financiamento com alienação fiduciária em garantia, a
qual foi mantida pelo TJRS, condenando-se o Banco Volkswagen a “i) limitar os juros remuneratórios
em 12% ao ano; ii) afastar a cobrança da comissão de permanência; iii) fixar o IGP-M como índice
de correção monetária do contrato e iv) permitir a repetição/compensação de valores” e, de ofício,
o TJRS afastou ainda “a Tarifa de Abertura de Conta e considerou ilegal a forma de cobrança do
Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguros (IOF) prevista contratualmente” (conforme
trecho do Relatório do acórdão, p. 8-9). Já no Recurso Especial nº 1.063.343/RS, a recorrida Luciana
Maluche havia sido vencida em primeiro grau, mas teve seu apelo parcialmente provido, com a
condenação do Banco Volkswagen a “i) reduzir os juros remuneratórios a 12% ao ano; ii) proibir a
capitalização de juros em qualquer periodicidade; iii) afastar a comissão de permanência; iv) fixar
a multa moratória em 2% sobre o valor da prestação efetivamente em atraso; v) impedir a cobrança
de encargos moratórios; vi) definir o IGP-M como índice de correção monetária do contrato; vii)
determinar a repetição simples do indébito; e viii) declarar a nulidade da taxa de abertura de crédito
e tarifa de cobrança. Eis a ementa do julgado em comento” (Relatório do acórdão, p. 11-12).

181
Maria Cecília de Araujo Asperti

ferente aos pedidos de desistência em processos afetados para julgamento como


recurso repetitivo455.
No julgamento da Questão de Ordem, a Corte Especial decidiu pelo inde-
ferimento do pedido de desistência456. Em um primeiro momento, a Ministra
Relatora Nancy Andrighi afirma que chegou a considerar a possibilidade de
admitir a desistência do recurso, porém assegurando o prosseguimento do jul-
gamento para fins de definição da tese jurídica, para assim impedir que o recor-
rente possa manipular a atividade jurisdicional457.

455 Nessa oportunidade, o Ministro Aldir Passarinho sustentou que a conduta da parte e de seu litigante
seria atentatória aos deveres de lealdade e boa-fé processual, pelo o que caberia, até mesmo a sua
condenação em perdas e danos e a representação do patrono por violação ética: “Sra. Presidente,
isso, lamentavelmente, tem ocorrido, repetidamente, aqui na Seção. Entendo a posição da Sra.
Ministra Nancy Andrighi e quero propor uma coisa intermediária, ou melhor, votarei no sentido de
algo intermediário. Entendo que podemos deliberar sobre isso na própria Seção. Entendo que esse
procedimento vai contra a boa ordem da aplicação da justiça, e enquadro essa questão no art. 14 do
Código de Processo Civil, que diz: ‘São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma
participam do processo: (...) II - proceder com lealdade e boa-fé’. No caso dos autos, uma desistência
à última hora de um processo repetitivo em que há interesse público, sem dúvida, está caracterizada,
no meu entendimento, a falta de boa-fé e de lealdade da parte, com a máxima vênia. O que eu
vejo é que podemos fixar perdas e danos em função desse procedimento, e igualmente em relação
ao advogado que pratica, conscientemente, o ato. De modo que eu proporia, em primeiro lugar,
mandar oficiar a OAB, com cópia do processo, para que se investigue o procedimento do advogado
que sugere ou endossa um comportamento dessa natureza; em segundo lugar, aplicar à parte uma
penalidade nos termos dos arts. 14 e 17 do Código de Processo Civil. Realmente, é intolerável. Há
o tempo, o trabalho e o desgaste que existe na construção de um processo repetitivo que envolve
envio para o Ministério Público, as manifestações de instituições como amicus curiae, sobrelevando
o interesse do Tribunal nacional e do Poder Judiciário como um todo. Portanto, o comportamento do
advogado e da parte é nocivo e deve ser penalizado.” (Recurso Especial Repetitivo nº 1.058.114/RS,
Voto do Ministro Aldir Passarinho, p. 5-6).
456 “Processo civil. Questão de ordem. Incidente de Recurso Especial Repetitivo. Formulação de
pedido de desistência no Recurso Especial representativo de controvérsia (art. 543-C, § 1º, do
CPC). Indeferimento do pedido de desistência recursal. - É inviável o acolhimento de pedido
de desistência recursal formulado quando já iniciado o procedimento de julgamento do Recurso
Especial representativo da controvérsia, na forma do art. 543-C do CPC c/c Resolução n.º 08/08
do STJ. Questão de ordem acolhida para indeferir o pedido de desistência formulado em Recurso
Especial processado na forma do art. 543-C do CPC c/c Resolução n.º 08/08 do STJ” (Questão de
Ordem no Recurso Especial nº 1.063.343/RS, Relatora Ministra Nancy Andrighi, Seção Especial,
julgamento em 17.12.2008).
457 “
Entender que a desistência recursal impede o julgamento da idêntica questão de direito é entregar
ao recorrente o poder de determinar ou manipular, arbitrariamente, a atividade jurisdicional que
cumpre o dever constitucional do Superior Tribunal de Justiça, podendo ser caracterizado como
verdadeiro atentado à dignidade da Justiça. A todo recorrente é dado o direito de dispor de seu
interesse recursal, jamais do interesse coletivo. A homologação do pedido de desistência deve ser
deferida, mas sem prejuízo da formulação de uma orientação quanto à questão idêntica de direito

182
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Após os debates do julgamento, porém, alterou seu posicionamento, enten-


dendo que diante da importância do julgamento do recurso repetitivo para o
STJ e para os jurisdicionados, com o direcionamento de esforços e a mobili-
zação de todos os envolvidos, inclusive amici curiae e demais interessados, não
seria admissível a desistência, pelo recorrente, antes do julgamento. Dentre as
razões suscitadas pelos demais ministros para o indeferimento da desistência,
o Ministro Nilson Naves argumenta que acatar a primeira sugestão da relatora
(para que fosse julgada a questão de direito, firmando-se uma orientação do
STJ, mesmo diante da desistência pelo recorrente) implicaria decidir “em tese”,
o que não seria cabível ao STJ, mas somente ao STF em, por exemplo, ação
direta de constitucionalidade458.
Com o CPC/2015, o artigo 998 do CPC passa a prever expressamente que
mesmo em caso de desistência do recurso459, a matéria deverá ser apreciada
pelo STF ou STJ em julgamento. Prevaleceu, assim, entendimento consoante
com aquele sustentado na proposta original da Ministra Nancy Andrighi, o
que permitirá que o julgamento de um recurso repetitivo, no STJ e no STF,
assuma feições de um julgamento “em tese”, como colocado pelo Ministro
Nilson Naves, em caso de desistência ou de abandono pela parte recorrente
do caso paradigma.
Pelo texto da lei processual não fica claro quem representará os interesses
outrora sustentados pela parte que desistiu ou abandonou o recurso afetado
para fins de julgamento de recurso repetitivo, sendo plausível que se suceda,
tal como no IRDR, em que o Ministério Público assumirá a titularidade do
incidente nessas situações.
De todo modo, o interesse pela hipótese de desistência do recurso afeta-
do surge, justamente, da constatação da possibilidade de uso desse expediente
como estratégia processual, inclusive para instigar a afetação de outros casos.
Com efeito, essa hipótese não é no todo improvável, dada a possibilidade de o
litigante habitual (por si próprio ou articulado com demais litigantes habituais

existente em múltiplos recursos” (Questão de Ordem no Recurso Especial nº 1.063.343/RS, Voto da


Relatora Ministra Nancy Andrighi, p. 8).
458 Questão de Ordem no Recurso Especial nº 1.063.343/RS, Voto do Ministro Nilson Naves, p. 14-15.
459 Fredie Didier Jr e Leonardo Carneiro da Cunha assinalam que essa regra deve também se estender a
hipótese de abandono do recurso, devendo ser aplicada a regra do §1º do artigo 976, cuja aplicação
seria cabível em decorrência da necessária integração das normas que compõe o que os autores
denominam de “microssistema de gestão e julgamento de casos repetitivos” (2017, op. cit., p. 603).

183
Maria Cecília de Araujo Asperti

envolvidos) recorrente adotar como estratégia a desistência de desistir dos re-


cursos afetados, como visto nos exemplos mencionados e no próprio estudo de
caso aqui analisado.

4.4.2. Instauração e admissibilidade do IRDR

4.4.2.1. Caso originário e iniciativa de instauração do IRDR


Diferentemente do julgamento de recursos repetitivos, em que a afe-
tação se dá por iniciativa do tribunal de justiça ou pelo tribunal regional
federal ou, ainda, pelo relator do tribunal superior, o IRDR é instaurado
por iniciativa dos legitimados previstos no artigo 977, que incluem o juízo
de primeiro grau e o relator e, também, o Ministério Público, Defensoria
Pública e as próprias partes.
Trata-se de significativa diferença em termos de sistemática processual, na
medida em que se viabiliza a provocação da instauração do incidente não só
pelo Judiciário, cujo interesse repousa na otimização da administração da justi-
ça460, mas também pelo Ministério Público e pela Defensoria Pública, no exercí-
cio de suas atribuições constitucionais461, e pelas próprias partes, com interesse
jurídico próprio na definição de uma tese jurídica que lhes seja favorável.
Por isso, no âmbito do IRDR, é importante olhar não só para eventuais cri-
térios de escolha do caso paradigma (discutindo se é, sequer, relevante se pensar
em requisitos nesse sentido), mas também para a dinâmica que se coloca quan-
do se possibilita que outros atores que não somente o órgão julgador incitem a
instauração do incidente.
Defendendo a importância de se pensar em critérios para a escolha do caso
paradigma, mesmo para o IRDR, Antonio do Passo Cabral argumenta que os
elementos desse “processo-modelo” teriam grande influência no julgamento do
incidente, podendo impactar decisivamente na solução a ser conferia ao incidente

460 MARINONI, Luis Guilherme, 2016b, op. cit., p. 76.


461 Aluisio Gonçalves de Castro Mendes assinala que o interesse do Ministério Público na instauração
do IRDR encontra fundamento no artigo 127, caput, e no artigo 129, III e IX, na medida em que o
caráter uniformizador do incidente seria compatível com a defesa da ordem jurídica, e na promoção
dos interesses coletivos, nos casos em que a questão comum estiver relacionada a direitos individuais
homogêneos (MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 132-133).

184
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

e aplicada aos demais processos pendentes e futuros462. Ele coloca, com relação ao
IRDR, as mesmas proposições mencionadas para o julgamento por amostragem,
entendendo que o incidente deverá ser instaurado a partir de um caso paradigma
em que haja amplitude do contraditório e pluralidade e representatividade dos
interesses daqueles que serão afetados pelo julgamento da tese jurídica.
Sobre a legitimação para instauração e participação das partes do incidente,
Cabral ressalta o fato de que os litigantes habituais, por conhecerem o cenário
da litigância repetitiva, conseguem agir estrategicamente para provocar a instau-
ração do incidente em um caso em que seus interesses possam prevalecer – por
exemplo, em um processo em que os argumentos da parte contrária não estejam
integralmente ou adequadamente colocados463-464. Mais uma razão pela qual seria
necessário cuidar para que sejam selecionados mais de um “processo-modelo”, ou
um com pluralidade de partes, ou, ainda, uma ação coletiva ajuiada por um legi-
timado extraordinário, de modo que haja maior pluralidade e representatividade
no julgamento da tese jurídica.
Marinoni expressa também uma preocupação com o papel dos legiti-
mados e das partes do caso originário, sugerindo ser necessário “resgatar a
força da representatividade adequada”465 e conferir aos legitimados extraor-
dinários à tutela de direitos individuais homogêneos o dever de represen-
tação dos excluídos do incidente466. Para ele, o controle da adequação da
representatividade da parte que atuará em favor dos interesses dos litigantes
excluídos no IRDR é ainda mais relevante do que na ação coletiva, em que

462 CABRAL, Antonio de Passo, 2017, op. cit., p. 44-46.


463 CABRAL, Antonio de Passo, 2017, op. cit., p. 44-45.
464 Em sentido similar, Marinoni comenta: “Ora, se aquele a quem são atribuídos os ilícitos que deram
origem às demandas repetitivas pode requerer a instauração do processo e dele participação, mas
a mesma autorização de requerimento só oportuniza a participação do litigante-lesado de uma
das demandas repetitivas, o incidente certamente é o procedimento ‘dos sonhos’ daquele que
habitualmente viola direitos em massa, que, assim, deve estar muito agradecido à generosidade do
legislador” (2016b, op. cit., p. 48-49).
465 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016b, op. cit., p. 76.
466 Para ele, nos casos em que a instauração do IRDR seja requerida pelo Ministério Público ou pela
Defensoria Pública, tais instituições seriam as partes legitimadas para representar os interesses daqueles
que serão afetados pela tese jurídica, devendo exercer essa representação de forma ampla e adequada,
abrindo-se, ainda, a oportunidade de manifestação de associações que defendam os interesses em
discussão. Caso o incidente seja instaurado por iniciativa das partes, a oportunização da participação
dessas associações da sociedade civil tornar-se-ia ainda mais relevante para assegurar o “direito de
influir sobre o convencimento da Corte” (MARINONI, Luiz Guilherme, 2016b, op. cit., p. 48-49).

185
Maria Cecília de Araujo Asperti

a sentença de improcedência não obsta a propositura de ações individu-


ais pelos representados (ou substituídos). Caberia ao Judiciário realizar esse
controle (ope judicis), abrindo a oportunidade, quando da publicização da
instauração do incidente (de acordo com o artigo 979) para participação dos
entes legitimados e para todos os litigantes individuais, para que possam im-
pugnar a parte que atuará como seu representante adequado e, ainda, para
requerer seu ingresso no incidente.
Ainda sobre critérios a partir dos quais se escolheria o caso paradigma no
IRDR (ou o caso originário a partir do qual o incidente será instaurado), Aluísio
Gonçalves de Castro Mendes trata das regras atinentes ao Musterverfahren do
direito alemão, que ele explica existir em dois sistemas diferentes: um sistema
extraído da legislação sobre jurisdição administrativa e no regramento que ver-
sa sobre Previdência e Assistência Social467 e outro para litígios relacionados ao
mercado de capitais468.
No primeiro sistema, a escolha do caso paradigma é feita pelo próprio ór-
gão jurisdicional e, mesmo que não tenham sido definidos requisitos legais, a
jurisprudência alemã menciona (i) critérios objetivos, para escolha de um caso
paradigma que veicule um espectro amplo de questões a serem discutidas; (ii)
critérios subjetivos, no sentido de as partes do caso paradigma serem aquelas
que possuam um interesse mais significativo com relação ao objeto do inciden-
te (i.e. aqueles que serão afetados mais diretamente ou de modo mais intenso
pela decisão judicial469); e, ainda, um (iii) critério dito eletivo, pelo qual se deva
estabelecer um contraditório prévio para que as próprias partes dos processos

467 Conforme previsto no §93a do Estatuto da Jurisdição Administrativa (Verwaltungsprozessordnung) e


no §114a do Estatuto da Previdência e Assistência Social (Sozialgerichtsgesetz) (MENDES, Aluisio
Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 37-38).
468 De acordo com a Lei do Procedimento-Padrão no Mercado Imobiliário – KapMug, que dispõe
especificamente sobre o procedimento (Gesetz über Musterverfahren in kapitalmarktrechtlichen
Streitigkeiten) (MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 45).
469 O exemplo dado pelo autor é o do julgamento dos processos decorrentes da construção do aeroporto
de Munique, em 1980. Segundo Dietmar Baetge, esses procedimentos foram, em verdade, a inspiração
para a elaboração do procedimento previsto no §93a do Estatuto da Jurisdição Administrativa. Na
ocasião, a corte administrativa alemã (Verwaltungsgericht) selecionou 30 demandas-teste, de um total
de 5.700 processos, para julgamento do caso (BAETGE, Dietmar, 2014, op. cit., p. 10). O critério
teria sido de se escolher processos nos quais os autores fossem proprietários de imóveis situados
dentro da área do planejado aeroporto e no âmbito limítrofe da área de proteção.

186
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

sobrestados possam se manifestar quanto à escolha do dos processos-piloto


quanto dos representantes adequados470.
Já na esfera do mercado de capitais, a escolha é feita a partir de critérios
previstos expressamente em lei, e que em muito se assemelham com aqueles
discutidos na jurisprudência sobre o modelo da legislação administrativa e de
assistência social:

“(i) a aptidão do autor para conduzir de modo apropriado o procedimento-


padrão em consideração aos interesses das partes paralelas a afetadas;
(ii) o acordo da maioria dos autores em relação a quem deva conduzir o
procedimento; (iii) a dimensão da pretensão que está sendo deduzida em
cada processo relacionado com o procedimento modelo”471.

Mendes conclui que tais parâmetros da legislação e jurisprudência alemãs


podem balizar a interpretação do instituto brasileiro, pelo o que seria necessário
que o órgão judicial e, até mesmo a Defensoria Pública e o Ministério Público,
cuidassem para que o incidente fosse adequadamente instruído com as peças
necessárias para compreensão da controvérsia. A seu ver, porém, diferentemen-
te do que ocorre no procedimento alemão, não haveria no IRDR um controle
de representatividade daqueles que deverão intervir no incidente, uma vez que
a sistemática do IRDR deve se aproximar daquela própria do sistema de prece-
dentes, em que as partes interessadas na solução da questão jurídica não parti-
cipam do julgamento do qual se extrairá a ratio decidendi vinculante472.
Ainda sobre os critérios de escolha do caso paradigma e sua relevância,
Sofia Temer é uma das autoras que sustenta de modo mais contundente a “des-
subjetivação” do IRDR e a sua desvinculação dos elementos e das partes do
caso originário. Ela entende ser o IRDR uma técnica processual essencialmente
objetiva voltada à resolução de questões de direito que se repetem (e não de
demandas repetitivas) por meio da formação de precedentes. Sua instauração
partiria de casos em que a questão jurídica a ser apreciada se repete, mas que

470 MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 41-42.


471 MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 126.
472 “No IRDR, o procedimento poderá ser provocado, instaurado e julgado sem que haja a interferência
direta da maioria das partes interessadas na solução da questão a ser dirimida” (MENDES, Aluisio
Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 127)

187
Maria Cecília de Araujo Asperti

servem para construção de uma situação fática modelo, ou de “fatos-tipo”, que


representem de modo generalizado a controverésia jurídica473.
A autora discorre sobre uma estrutura subjetiva em que os sujeitos processu-
ais estariam assim definidos:

“sujeitos condutores, que liderarão o debate para fixação da tese; sujetos


sobrestados intervenientes, ou seja, as partes dos processos sobrestados,
porque classificados como repetitivos, que venham a exercer seu direito
à participação; amici curiae, sujeitos que, apesar de não serem partes em
processos repetitivos, possuem algum interesse na resolução da questão
de direito; Ministério Público e Defensoria Pública, cuja atuação decorre
expressamente de lei”474.

Os “sujeitos condutores” ou “sujeitos líderes” seriam os protagonistas do de-


bate, a quem caberia a condução da defesa de determinados interesses na fixa-
ção da tese jurídica. Sua “legitimidade” não se confundiria com a legitimidade
ordinária daqueles que são parte na relação jurídica de direito material475, mas
decorreria da própria legitimação para o ato de instauração (artigo 977) e da
sistemática processual em si, que pressupõe a escolha de alguns sujeitos para
representação de interesses alheios no julgamento do IRDR.
Sobre os critérios de escolha desses “sujeitos líderes”, Sofia Temer remonta
às construções doutrinárias acerca do tema da escolha dos casos paradigma –
analogamente ao que fizemos neste item – e propõe que os líderes (i) sejam as
partes de processos em que os argumentos apresentados tenham abrangência
e profundida em torno da questão de direito (amplo exercíci do contraditório)
e que sejam capazes de apresentar tantas perspectivas argumentativas quan-
to sejam necessárias para resolução da questão de direito; (ii) sejam capazes
(assim como seus advogados) de reconstruir a situação fática do incidente
(“situação-modelo”), recompondo o “fato-tipo” a partir dos elementos em co-
mum das diferentes demandas476.
A partir desses requisitos, deverão ser nomeados quantos “sujeitos conduto-
res” forem necessários, os quais poderão ou ser as partes dos processos a partir

473 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 73-78.


474 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 155-156.
475 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 136.
476 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 165-166.

188
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

do qual o incidente foi instaurado. Assim, a iniciativa da instauração do inci-


dente não definirá quem serão os protagonistas do debate que culminará na
fixação da tese jurídica477.
Para a autora, seria possível dizer que a escolha dos “sujeitos-condutores”
demanda alguma forma de um controle de representatividade, mas que não se
confundiria com a representatividade adequada própria dos modelos processu-
ais representativos, mormente da ação coletiva. Isso porque não seria relevante
perquirir a vontade do grupo de interessados (o qual sequer seria passível de ser
identificado) ou a existência de conflitos dentro do grupo de ausentes, visto
que as posições subjetivas desses sujeitos teria pouca ou nenhuma influência
para dirimir a questão jurídica. Além disso, em não sendo cabível a produção
de provas sobre questões de fato, não seria necessária a proximidade do sujeito
condutor com as situações fáticas concretas. Fala-se, então, em uma “represen-
tatividade argumentativa”478, pela qual se deverá se aferir se o sujeito líder e seus
advogados serão capazes de apresentar adequadamente todos os argumentos
pertinentes à solução da questão de direito.
Como se tem feito ao longo desse capítulo, abordam-se os pontos discutidos
doutrinariamente a respeito das técnicas processuia em questão sob o prisma pro-
posto pela abordagem metodológica do acesso à justiça, ou seja, com olhar voltado
para os usuários do sistema de justiça e para os impactos sociais das diferentes
escolhas políticas, em matéria de direito processual. O processo, por esse ponto
de vista, não é uma técnica neutra, podendo ser manipulada pelos diversos atores
de modo estratégico para favorecimento de determinados interesses.
Como se pode ver, apesar de partirem de premissas distintas, os posiciona-
mentos doutrinários acerca da legitimidade para instauração do IRDR conver-
gem quanto à relevância de se pensar em um controle de quem “fara às vezes”

477 “Também por isso, não enxergamos óbice para que os sujeitos condutores sejam nomeados a partir
de processos distintos. Não havendo a polaridade típica do processo civil individual, não havendo
conflito de interesses sobre direitos subjetivos específicos e não havendo defesa direta de relações
jurídicas substanciais, não parece haver razão para que os sujeitos eleitos para conduzir os debates
sejam autor e réu do mesmo processo” (TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 170).
478 A própria autora referencia que o termo “representatividade argumentativa” teria sido empregado
por Marinoni, porém para se referir à representação exercida pelos amici curiae e pelos demais
interessados nas audiências públicas (MARINONI, Luis Guilherme. “Comentários ao artigo 928” In
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et.al (coord). Breves comentários ao novo Código de Processo Civil.
São Paulo: RT, 2015, p. 2.082).

189
Maria Cecília de Araujo Asperti

da parte do caso originário ou que de alguma forma representará os diversos


interesses envolvidos na conformação da tese jurídica.
Diversos são os critérios trabalhados para esse controle, alguns inspirados
pela representatividade adequada das ações coletivas, particularmente das class
actions norte-americanas (capacidade técnica dos representantes e convergên-
cia dos interesses entre o representante e representados)479, e outros que seriam
próprios das técnicas de julgamento de casos repetitivos, especificamente quan-
do entendidas como instrumentos processuais de natureza objetiva, cujo objeto
seria unicamente a formulação da tese jurídica, e não a resolução do conflito
de interesses em si (amplitude dos argumentos e do contraditório deduzidos;
capacidade de reconstrução da “situação modelo” e a convergência de interesses
entre o representante e os representados).
No entanto, pensar em uma representatividade adequada ou argumentativa im-
plica em propor um controle, ou aferição da “capacidade” de determinados litigan-
tes de defender os interesses seus e de outros em posição similar na formulação de
uma tese jurídica que lhes seja favorável. Essa “capacidade” não pode ser discutida
em abstrato, sem se pensar na paridade participatória entre os diferentes sujeitos
que travarão esse debate (os sujeitos-líderes, como proposto por Sofia Temer). À
exemplo, teriam os sujeitos-líderes que se encarregarem da reconstrução da situa-
ção-modelo, da perspectivas dos litigantes ocasionais, a mesma capacidade técnica
e estratégica daqueles que atuarem em defesa dos interesses dos litigantes habitais?
Seria, de fato, irrelevante a proximidade com o arcabouço fático (e de suas reper-
cussões socioeconômicas) desnecessário para a reconstrução da situação-modelo?
Mais uma vez recorrendo ao estudo empírico de Amanda de Araújo Gon-
çalves, a autora coletou dados sobre as partes nos requerimentos de instauração
de IRDR, demonstrando que 39% dos pedidos foram formulados por pessoas
físicas; 30% por juízes; 27,8% por pessoas jurídicas e, em apenas 0,3% pelo Mi-
nistério Público e a Defensoria Pública480.
Poderia se conjecturar que as pessoas físicas, geralmente litigantes ocasio-
nais, estariam fazendo um uso estratégico do incidente.
Ocorre que o cenário muda significativamente quando analisamos os re-
querimentos que foram admitidos, deflagrando a instauração do incidente:
57% dos IRDR admitidos tiveram sua instauração requerida por juízes; 29%

479 Vide Capítulo 3, item 3.2.2.


480 GUIMARÃES, Amanda de Araújo, 2017, op. cit., p. 245.

190
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

por pessoas jurídicas; 25% pelo Ministério Público ou pela Defensoria e ape-
nas 5% por pessoas físicas481.
Esses dados colocam a problematização sobre o uso estratégico do IRDR por
entes artificiais (dentre estes, os litigantes habituais), que conseguem, de modo
bem mais efetivo, provocar a instauração de incidentes para discussão de teses
jurídicas que lhes interesse. Ratificam, portanto, a premissa de que uma inter-
pretação das técnicas de julgamento de casos repetitivos a partir da perspectiva
metodológica do acesso à justiça não pode ignorar a dinâmica entre os litigantes
ocasionais e habituais, e corroboram a hipótese de que estes conseguem aferir
vantagens estratégicas mediante o uso de tais instrumentos processuais.
Nesse sentido, os estudos empíricos realizados nos capítulos 5 e 6, embora
focados no julgamento de recursos repetitivos, também são úteis para embasar
as reflexões sobre o papel exercido pelas partes do caso paradigma e pelos de-
mais intervenientes – amicus curiae, Ministério Público e Defensoria Pública
– na definição da tese jurídica. Como se verá, as vantagens estratégicas dos liti-
gantes habituais se fazem sentir em diversas etapas do processo e do julgamento,
o que levanta questionamentos sobre a paridade participatória das partes do
caso paradigma (ou que sejam de alguma forma escolhidas para representar
os interesses dos ausentes) e sobre os critérios da discutidos pela doutrina para
controle da representatividade nas técnicas de julgamento de casos repetitivos.

4.4.2.2. Desistência da parte/recorrente e a atuação do


Ministério Público
Quanto à hipótese em que a parte ou recorrente desiste (ou abandona) da
causa, o regramento do IRDR é claro ao prever que o mérito do incidente será,
de todo modo, apreciado, cabendo ao Ministério Público assumir a titularidade
do caso (artigo 976, §§1º e 2º).
Argumenta-se, inclusive, que essa previsão atestaria a natureza objetiva do inci-
dente, na medida em que, mesmo sem a condução pelas partes do caso originário, o
feito teria prosseguimento para definição da tese jurídica. Seu objetivo seria, portanto,
não o de tutelar o direito subjetivo das partes, mas o direito objetivo em discussão482.

481 GUIMARÃES, Amanda de Araújo, 2017, op. cit., p. 250.


482 TEMER, Sofia, 2017, op. cit. p. 78-80.

191
Maria Cecília de Araujo Asperti

Como se viu no item anterior, a continuação do julgamento da tese jurídica,


mesmo em caso de desistência e abandono, também ocorre nos recursos repeti-
tivos, cabendo ao STJ e ao STF o julgamento da tese em abstrato. Esse proce-
dimento teve de ser adotado diante da constatação de que os recorrentes que
não estivessem interessados na formulação de determinada tese jurídica poderiam
(e de fato assim o faziam) desistir de seu recurso, obstando o julgamento da(s)
questão(ões) jurídica(s) postas. Trata-se de estratégia própria de litigantes habitu-
ais, capazes de perseguir interesses de longo prazo, e que poderia também ser ado-
tada no IRDR, não fosse a salvaguarda já prevista no regramento processual483.
Diante dessa possibilidade de desistência e de prosseguimento do julgamen-
to do incidente para definição da tese jurídica, cabe questionar como se dará a
condução e a representação dos interesses da parte desistente pelo Ministério
Público, tanto no julgamento do IRDR quando dos recursos repetitivos.
A esse propósito, há divergências quanto à justificação do exercício desse
papel pelo Ministério Público, que resvalam, novamente, na discussão sobre o
objeto do IRDR: se o incidente se presta ao julgamento tão somente das ques-
tões de direito em processos similares ou não, ou se tem por intuito a resolução
de conflitos homogêneos, que podem, por seu turno, veicular direitos aciden-
talmente coletivos. Do primeiro ponto de vista, o Ministério Público atuaria na
“defesa da ordem jurídica”, tal como ocorre em processos de natureza objetiva
como no incidente de arguição de constitucionalidade em controle difuso (ar-
tigo 948 do CPC/2015) e as ações de controle abstrato de constitucionalidade
(artigos 2º e 13 da Lei nº 9.868/1999)484. Pelo outro, defende-se a atuação do
Ministério Público como verdadeiro representante dos litigantes ausentes, com
fulcro em sua legitimidade para tutela de direitos individuais homogêneos485.
Mais importante do que o fundamento a partir do qual o Ministério Público
ira atuar no incidente e no julgamento de recursos repetitivos em caso de desis-
tência é ponderar se terá condições de fazê-lo adequadamente.

483 Confira-se o estudo de caso do Capítulo 6, em que os litigantes habituais a Boa Vista Serviços S/A,
o Serasa S/A e Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL) adotaram referida estratégia
quando da afetação de recursos especiais para julgamento de tese jurídica sobre a legalidade do
sistema de scoring de crédito.
484 TEMER, Sofia, 2017, op. cit. p. 197-198.
485 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016b, op. cit., p. 48-50, 84.

192
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Ainda que se afirme que esse controle de representatividade adequada diga


respeito, somente, ao controle de representatividade adequada do processo cole-
tivo486, não se pode negar que a capacidade de ampliar o contraditório e de tra-
zer elementos para reconstrução dos fatos a partir dos quais a questão jurídica
deverá ser interpretada (ainda que se entenda sejam estes “fatos-tipo” ou fatos
que tendem à generalização) não advém somente da habilidade técnica do ente,
mas também de sua próximidade com tais situações fáticas.
Assim, é de se questionar as condições nas quais o Ministério Público
vai assumir a condução do julgamento de um incidente ou de um recurso
repetitivo acerca do qual não tenha realizado qualquer tipo de diligência pre-
paratória, muito diferentemente do que ocorre quando o parquet atua como
legitimado extraordinário em ações coletivas, precedidas, inclusive, de inqué-
ritos civis (artigo 8º, §1º, da Lei nº 7.347/1985). Corre-se o risco de essa de-
fesa centrar-se, unicamente, nos argumentos jurídicos, sem que as questões
de ampla repercussão econômica, política e social, usualmente envolvidas na
litigiosidade repetitiva, sejam devidamente enfrentadas. Isso pode ser espe-
cialmente problemático se, do outro lado, houver litigantes eventuais com
fortes interesses no caso, e recursos para produção de dados e para uma re-
construção do arcabouço fático da litigância repetitiva conducente a uma
interpretação das questões jurídicas que lhe seja favorável.

4.5. Sobrestamento de processos


Um ponto crucial para compreensão da participação e do acesso à justiça
nas técnicas de julgamento de casos repetitivos é o sobrestamento dos proces-
sos, procedimento este previsto tanto no IRDR (artigo 982, I), quanto nos re-
cursos repetitivo (artigo 1.036, §1º).

486 “No IRDR, não será relevante perquirir a ‘vontade’ do grupo, porque sequer é possível (ou mesmo
necessário) identificar um grupo, já que a autonomia individual, que se liga a posições subjetivas e
disposições de direitos, tem pouca (ou nenhuma) influência para dirimir a controvérsia jurídica. Em
realidade, sequer se exige a existência de uma classe propriamente dita, o que é consequencia do
afastamento dos conflitos subjetivos e da aproximação do objetivo de se fixar uma tese. Também o
requisito da ausência de conflito entre os ‘ausentes’ (que, no caso, seriam os sobrestados) – requisito
este necessário para a escolha do rperesentante adequado no sistema estadunidense – é inviável, na
prática, porque sequer parece possível agrupar todos os sujeitos dos processos repetidos em ‘polos’
homogêneos, o que justifica a estrutura multipolarizada já defendida anteriormente” (TEMER, Sofia,
2017, op. cit., p. 176).

193
Maria Cecília de Araujo Asperti

Adotando-se, novamente, o prisma metodológico do acesso à justiça, a pri-


meira reflexão a ser colocada diz respeito ao fato de que o sobrestamento é
imposto, o que não ocorre, por exemplo, no processo coletivo, em que o litigante
individual pode optar por suspender seu processo individual, caso queira se
aproveitar dos efeitos da sentença coletiva487 (artigo 104 do CDC). Nesse senti-
do, da perspectiva do usuário (ou do litigante), o sobrestamento implica em um
tolhimento de sua participação individual no processo, sem que tenha partici-
pado da afetação do recurso representativo da controvérsia ou da instauração e
do exame de admissibilidade no incidente no qual a questão jurídica suscitada
no seu processo será resolvida488.
Com efeito, em ambas as técnicas de julgamento de casos repetitivos, o
sobrestamento é determinado pelo relator489, que profere ordem judicial a ser
cumprida pelos aos órgãos judiciais onde tramitem processos que versem sobre
referida questão, de acordo com a jurisdição do tribunal que irá julgar recurso
repetitivo ou o IRDR. Verifica-se, então, que a ordem de sobrestamento em si
não indica os processos a serem suspensos, dado que o órgão julgador sequer
tem conhecimento do volume e de quais processos e recursos discutem a ques-
tão jurídica afetada para julgamento.
Nesse tocante, as técnicas de julgamento de casos repetitivos diferem no-
vamente dos mecanismos de group litigation, em que há a identificação dos
processos agregados, para viabilizar a adoção de procedimentos gerenciais a
um contingente devidamente identificado. Na Group Litigation Order, há o

487 “Igualmente importante é o fato de que em respeito ao direito constitucional de ação a tutela
individual homogênea por meio da ação civil pública é um plus em relação à tutela individual, ou
seja, a coisa julgada pro e contra e apenas para beneficiar o titular do direito individual demonstra o
respeito do legislador pelo direito que o indivíduo tem de buscar, ele mesmo, a proteção de seu direito.
Não é o que se passa nas TIRC [técnicas individuais de repercussão coletiva], pois a ‘coletivização
de uma demanda/causa ou recurso individual’ lhe é imposta, e, nem mesmo pode ele decidir sobre a
suspensão da sua demanda individual” (RODRIGUES, Marcelo Abelha, 2015, op. cit., p. 564)
488 Essa foi uma preocupação levantada durante a tramitação do Projeto de Lei nº 1.213/2007, na Câmara
dos Deputados, quando então o Deputado Regis de Oliveira levantou o questionamento sobre
eventual “denegação da jurisdição” àquele que teve seu processo suspenso por ocasião do julgamento
do recurso repetitivo. O parlamentar conclui em seu parecer que não haveria inconstitucionalidade,
visto ser a suspensão temporária e justificável ante a possibilidade de economia de custos e
racionalização da atividade jurisdicional (Voto em separado à Comissão de Constituição e Justiça e
de Cidadania da Câmara dos Deputados, 02.10.2007).
489 Conforme artigo 982, inciso I, para o IRDR, e artigo 1.037, II, para os recursos especial e extraordinário
repetitivos.

194
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

“group register”, que se assemelharia a um cadastro judicial contendo infor-


mações sobre os processos que serão agrupados pela GLO e que estariam
vinculados ao julgamento das questões de fato e de direito em comum que
foram identificadas. Em regra, são as próprias partes que requerem a sua in-
clusão nesse registro, em uma sistemática que poderia ser descrita como de opt
in490, e, a partir de seu registro, têm o seu processo gerenciado por uma corte
específica, incumbida de tramitar todas as ações registradas no cadastro da
GLO (“management court”).
São perceptíveis, portanto, as distinções entre essa racionalidade da group
action britânica e as técnicas de julgamento de casos repetitivos, nas quais cabe
a parte arguir (e não somente requerer) pelo não sobrestamento e vinculação do
seu processo ao julgamento repetitivo, por meio da técnica de distinguishing des-
crita no item seguinte. Ademais, ao afetar um recurso representativo da contro-
vérsia ou se instaurar um IRDR, não se tem a dimensão do alcance da decisão
que irá determinar o sobrestamento dos casos em que a questão de direito a ser
decidida é veiculada.
Atualmente, não há entre as instâncias judiciárias um fluxo adequado de
dados que permita o conhecimento prévio do contingente de processos e recur-
sos que serão sobrestados e, por conseguinte, atingidos pelo julgamento da tese
jurídica. Mesmo os números sobre o sobrestamento de processos hoje divulga-
dos pelos tribunais são escassos e pouco consistentes: as informações divulgadas
pelo STJ sobre recursos especiais repetitivos e processos sobrestados, por exem-
plo, partem de dados disponibilizados pelos próprios tribunais, individualmente,
e em períodos distintos491. Por esta compilação, verificamos que, em julho de
2017, foram contabilizados um total de 525.595 processos suspensos nos tribu-
nais brasileiros, conforme gráfico abaixo:

490 Aluisio Gonçalves de Castro Mendes adverte, contudo, que embora o regime estabelecido seja de opt
in, as possibilidades de vinculação do julgamento da GLO são amplas, podendo atingir processos que
forem registrados após o julgamento da questão de fato ou de direito em comum, se a management
court assim determinar (2017, op. cit., p. 60).
491 Dados obtidos no site do STJ. Disponível em http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Processos/
Repetitivos-e-IAC/Saiba-mais/Processos-suspensos, acesso em 7 jul. 17. Dados disponibilizados em
diferentes datas por cada tribunal, em um período entre julho de 2016 e junho de 2017.

195
Maria Cecília de Araujo Asperti

Gráfico 1 - Número de processos sobrestados em razão da aplicação do artigo 1.037,


II, do CPC/2015 que foram contabilizados pelo STJ em julho de 2017, a partir de dados
disponibilizados pelos tribunais entre julho de 2016 e junho de 2017.

Fonte: Dados obtidos no site do STJ. Elaboração própria.


Sem clareza sobre o acervo de processos e de litigantes que serão impactados
pela ordem de sobrestamento, não é de se esperar uma ponderação adequada-
mente embasada sobre a pertinência da suspensão dos processos, tampouco
uma preocupação bem dimensionada com o tempo em que esses casos perma-
necerão suspensos.
Sobre o tempo do sobrestamento, tem-se que, decorrido o prazo de um ano
previsto no artigo 1.037, §4º, a suspensão não se cessará automaticamente, tal
como originalmente previsto no §5º do referido dispositivo, que foi revogado
pela Lei nº 13.256/2016. Similarmente, no âmbito do IRDR, após o decurso
do prazo também anual de suspensão, disposto no artigo 980, o sobrestamen-
to poderá ser prorrogado a critério do relator, mediante a prolação de decisão
fundamentada (Parágrafo Único). De acordo com os dados coletados no estudo
empírico-jurisprudencial acerca do julgamento de recursos especiais repetitivos
no STJ, descrito no Capítulo 5, a média de 474 dias, ou seja, aproximadamente
15 meses, sendo que de 2.448 dias o mais longo tempo transcorrido para julga-
mento de um tema por essa sistemática processual492.
Ainda que durante o período de sobrestamento seja possível requerer medi-
das de urgência (artigo 982, §2º), não há dúvidas de que a imposição da suspen-
são impõe uma limitação no exercício do direito de ação da parte autora, que
terá de aguardar o julgamento do caso repetitivo para conseguir dar prossegui-
mento ao seu processo. Verifica-se, portanto, que a suspensão é uma caracterís-

492 Tema nº 169: “Questão referente à incidência do imposto de renda sobre verba paga a título de ajuda
de custo pelo uso de veículo próprio no exercício das funções profissionais”.

196
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

tica das técnicas de julgamento de casos repetitivos que afeta, especialmente, os


autores dos casos repetitivos, para quem o ônus do tempo é mais sensível.
Tem-se, então, que o impacto mais contundente é sentido pelos litigan-
tes ocasionais – afinal, para estes, a demanda é única e o risco envolvido
é maior do que para o litigante habitual autor – nos chamados litígios dos
múltiplos sujeitos493, como em ações contra entes públicos e privados de-
correntes de um arcabouço fático similar e em que questões jurídicas em
comum podem ser identificadas, em decorrência, justamente, da atuação
de amplo alcance desses entes. São ações em que são arguidas violações em
massa, alegadamente perpetradas por um ou alguns entes contra um consi-
derável contingente de pessoas afetadas494.
A partir dessa consideração é que as disposições atinentes ao sobrestamento
devem ser interpretadas.
Em primeiro lugar, é de se questionar, como já mencionado, se de fato a
suspensão dos processos é sempre uma medida necessária ou se, a depender dos
impactos sociais e, até mesmo, da efetividade da suspensão dos processos e re-
cursos, opte-se pelo seu prosseguimento, aplicando-se a tese ao casos pendentes
quando de sua fixação495.

493 GUIMARÃES, Amanda de Araújo, 2017, op. cit., p. 104-107.


494 Lembrando aqui o nosso posicionamento no sentido de que as técnicas de julgamento de casos
repetitivos foram pensadas e são majoritariamente aplicadas no contexto da litigiosidade repetitiva, e
não somente para o julgamento de questões de direito que se repitam em casos que não remetam a uma
litigância repetitiva mais ampla. Há casos, especialmente em que são discutidas questões processuais,
em que as técnicas são aplicadas para resolução de questões jurídicas que não surgem no bojo da
litigiosidade repetitiva, mas não é essa a essência dessas técnicas, pensadas para “enfrentamento” do
crescimento desse tipo de litigiosidade.
495 À exemplo, a Turma Especial de Direito Privado 1, do TJSP, ao decidir pela admissibilidade do
IRDR para discussão de questões relativas aos requisitos e efeitos do atraso de entrega de unidades
autônomas em construção aos consumidores, entendeu não ser pertinente o sobrestamento em razão
do significativo volume de processos em trâmite que versam sobre essas matérias , diante : “São
dezenas de milhares de processos em andamento perante a Justiça Comum e os Juizados Especiais no
Estadode São Paulo, versando sobre os efeitos do atraso da entrega de unidades autônomas, produto
do período de extraordinária expansão imobiliária entre os anos de 2010 a 2014. (...) A paralisação
de todos os processos do Estado de São Paulo por até um ano provocaria efeito inverso à celeridade e
segurança que o instituto do IRDR almeja. Para fins de evitar a instabilidade e insegurança jurídica
de franca minoria de julgamentos dissonantes, seria suspensa a maioria dos julgamentos que se filiam
ao entendimento já sumulado. Em última análise, com o escopo de evitar o risco a isonomia e a
segurança jurídica de número não expressivo de feitos, se paralisaria pelo prazo de até um ano (sujeito
ainda a Recursos Especial e Extraordinário dotados de efeito suspensivo) a imensa maioria dos feitos
que já seguem a jurisprudência consolidada e sumulada do Tribunal de Justiça”. (IRDR nº 0023203-

197
Maria Cecília de Araujo Asperti

Em verdade, tendo em vista as características da litigiosidade repetitiva e o


fato de que os impactos do sobrestamento são sentidos, precipuamente, pelos
litigantes ocasionais que acionam o Judiciário para questionar condutas de liti-
gantes habituais, é preciso problematizar se nesses litígios contra múltiplos sujei-
tos o sobrestamento não deveria ser medida excepcional, a ser adotada somente
quando houver efetiva divergência jurisprudencial sobre a matéria de direito
discutida. Em outras situações, nas quais já houver súmula nos próprios tribu-
nais ou um entendimento mais consolidado em determinada direção, a suspen-
são ocasiona, em verdade, maior congestionamento às cortes e insegurança ju-
rídica às partes litigantes, principalmente àquelas para quem a demanda é única
e o risco envolvido é consideravelmente maior do que para a sua contraparte.
Ademais, é necessário colocar definitivamente a discussão sobre a possi-
bilidade de suspensão apenas parcial dos processos, dando-se prosseguimento
quanto ao julgamento de questões que não guardem uma relação de prejudi-
cialidade com a questão jurídica afetada para julgamento496, em interpretação
condizente com o julgamento parcial de mérito (artigo 356) e a consagração da
teoria da autonomia dos capítulos da sentença pelo CPC/2015. Não é razoável
que uma demanda em que diversos pedidos sejam cumulados fique paralisada
por um ano ou mais em virtude da afetação de questão jurídica prejudicial a
um ou a apenas alguns desses pedidos. Mais uma vez, interpretando-se o regra-
mento legal de modo lege ferenda, o sobrestamento deve ser interpretado como
uma medida excepcional, cuja pertinência e extensão deverão ser avaliados no
caso concreto pelo relator quando do juízo de admissibilidade do IRDR ou da
afetação do recurso representativo da controvérsia.
Por fim, haverá riscos de impactos ainda maiores aos sujeitos dos proces-
sos sobrestados caso a decisão que determine o sobrestamento ao caso con-
creto não seja adequadamente fundamentada, ou se pretenda promover a
suspensão de todo o contingente de processos ou recursos em que a questão

35.2016.8.26.0000, Relator Desembargador Francisco Eduardo Loreiro, Julgamento de Admissão em


19.08.2016. Julgamento do Mérito em 31.08.2017).
496 À exemplo, confira-se ALVIM, Teresa Arruda. “CPC abre debate sobre alcance de suspensão
de ações em repetitivos”. Conjur. Edição de 11 jun. 2017. Disponível em https://www.conjur.com.
br/2017-jun-11/teresa-alvim-cpc-abre-debate-suspensao-acoes-repetitivos, acesso em 8 dez. 2017,
além dos autores já estudados neste capítulo (MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro, 2017, op. cit.,
p. 130-131).

198
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

jurídica seja discutida de forma padronizada, ou em bloco, como frequente-


mente ocorre no Judiciário.
Quando se admite que essa decisão seja padronizada, ou seja, por meio de
decisões-modelo, reconhece-se, mais uma vez, o distanciamento da racionali-
dade das técnicas de julgamento de casos repetitivos do sistema de precedentes,
em que, para aplicação do entendimento firmado (ratio decidendi), faz-se im-
prescindível a aproximação dos fatos do caso paradigma com aqueles deduzidos
no caso concreto. Não há possibilidade de decisões padronizadas efetivamente
realizarem esse exercício de subsunção do caso concreto às questões afetadas
para julgamento497. Dificulta-se, com isso, que a parte prejudicada pelo sobres-
tamento argumente pelas particularidades de seu caso concreto, o que é ainda
mais difícil quando esse exercício de distinção tem que ser feito a partir da de-
cisão que determina o sobrestamento, e não da decisão que fixará a tese em si.

4.6. Há uma efetiva possibilidade de “distinguishing”?


Em uma tentativa de aproximar as técnicas de julgamento de casos repe-
titivos da sistemática dos precedentes da common law, passou-se a se prever,
no regramento atinente aos recursos repetitivos, a possibilidade expressa de se
alegar a distinção do caso sobrestado ou no qual a tese jurídica será aplicada
(artigo 1.037, §9º). Para tanto, cabe a parte elaborar requerimento específico
nesse sentido, direcionado ao órgão julgador perante o qual o processo estiver
em trâmite, que abrirá a oportunidade para manifestação pela parte contrária.
Reconhecida a distinção, o processo terá seu prosseguimento retomado. Caso o
requerimento seja indeferido, caberá agravo de instrumento ou agravo interno,
a depender se o caso estiver tramitando em primeiro ou em segundo grau.
Tomando-se por premissa o entendimento aqui sustentado de que a forma-
ção e a aplicação da tese jurídica distanciam-se da sistemática de precedentes, é
necessário também diferenciar o distinguishing previsto no artigo 1.037, §9º da-
quele próprio do regime de precedentes, de modo a suscitar as problematizações
cabíveis a partir desses predicados.

497 “A identificação das hipóteses de subsunção não é uma atividade mecânica, mas, sim, cognitiva,
no sentido de comparar a questão submetida ao IRDR com a existente no processo em tramitação”.
(MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 192).

199
Maria Cecília de Araujo Asperti

Como visto, a tese jurídica, diferentemente do precedente, não traduz uma


argumentação (ou ratio decidendi) cuja interpretação dependa da compreensão
das circunstâncias concretas do caso decidido498. Conforma, em realidade, um
enunciado normativo e autônomo acerca da interpretação conferida abstrata-
mente às questões jurídicas decididas. Nesse sentido, a tese jurídica dos repeti-
tivos reproduz a tradição das súmulas normativas do direito brasileiro, e assim
como estas legitimam-se pelo intuito de otimizar a atividade jurisdicional, e não
de conferir sentido à norma ou dizer o direito.
Tem-se, pois, que abstração ou objetivação pretendida pelas técnicas de jul-
gamento de casos repetitivos inviabiliza o exercício de distinção próprio do re-
gime de precedentes. Não há como realizar o exercício de aproximação entre os
fatos do caso concreto e do caso decidido se aqueles não fazem parte do exercí-
cio argumentativo que conduz à elaboração da tese jurídica, ou se sua descrição
limita-se à construção de uma “situação modelo” ou de “fatos-tipo”. Em outras
palavras, quanto mais se pretende distanciar o julgamento da tese jurídica dos
elementos do(s) caso(s) paradigma, mais difícil é a apropriação da lógica própria
do sistema de precedentes, em que os fatos concretos do caso paradigma são es-
senciais para interpretação dos fundamentos determinantes da decisão judicial.
Como já mencionado, a distinção possível de ser realizada pelo litigante so-
brestado também difere do distinguishing do sistema de precedentes na medida
em que a parte tem de arguir a particularidade do seu caso face à decisão de
sobrestamento, e não ao julgado final em si.
Ainda que se preveja, como no IRDR, que essa decisão tenha de conter “no
mínimo, os fundamentos determinantes da decisão e os dispositivos normativos
a ela relacionados” (artigo 979, §2º), o que se verifica, em essência, é apenas
uma análise da admissibilidade do uso da técnica de julgamento de casos re-
petitivos, e não do julgamento da questão jurídica versada. Afinal, a decisão
de sobrestamento discorre, em regra, sobre a admissibilidade do IRDR (preen-
chimento dos requisitos do artigo 976) ou sobre os pressupostos de cabimento
do julgamento de recursos repetitivos (artigo 1.037, caput), e sobre a questão
submetida a julgamento, mas não sobre os fundamentos de sua apreciação (que
ainda não ocorreu).
Sob a ótica daqueles que serão atingidos pela tese jurídica, é quesitonável se
a possibilidade de se arguir a distinção durante o sobrestamento proporciona

498 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op. cit., p. 180-182.

200
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

um direito efetivo à participação no seu processo, ou se há, também nesse pon-


to, uma mitigação desse direito.

4.7. Participação no julgamento do recurso repetitivo


e do IRDR

4.7.1 Partes do caso paradigma: representatividade adequada?


Há algumas importantes disposições na lei processual sobre o papel exercido
pelas partes do caso paradigma nas técnicas de julgamento de casos repetitivos.
No IRDR, possuem a legitimidade para requerer a instauração do incidente e
são ouvidas na etapa de preparação para o julgamento (ou etapa preparatória)499.
Durante a sessão, têm direito a um tempo consideravelmente maior para rea-
lização de sustentação oral do que os demais interessado, que deverão dividir
o tempo regimental (art. 984, II). Podem, ainda, recorrer do acórdão em que a
tese é firmada (art. 986).
No recurso especial e extraordinário repetitivo, os recursos representativos da
controvérsia são essencialmente instruídos com as peças e manifestações realiza-
das pelas partes ao longo da tramitação dos processos, podendo o relator solicitar
ou admitir a manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na ma-
téria, “considerando a relevância da matéria e consoante dispuser o regimento
interno” (artigo 1.038). Ou seja, a manifestação de amici curiae ou de outros in-
teressados está condicionada a um juízo de conveniência do tribunal superior500.
Porém, para efetivamente compreender esse papel desempenhado pela parte
do caso paradigma nas técnicas de julgamento de casos repetitivos, é preciso fir-
mar algumas premissas conceituais, já discutidas ao longo desse capítulo, sobre
a natureza e o objeto dessas técnicas.
Como visto, ao se entender que tais técnicas conformam racionalidades es-
sencialmente objetivas, poderia se arguir pela irrelevância dos elementos objeti-

499 Art. 983. O relator ouvirá as partes e os demais interessados, inclusive pessoas, órgãos e entidades
com interesse na controvérsia, que, no prazo comum de 15 (quinze) dias, poderão requerer a
juntada de documentos, bem como as diligências necessárias para a elucidação da questão de direito
controvertida, e, em seguida, manifestar-se-á o Ministério Público, no mesmo prazo.
500 Vide mais a esse respeito no item 4.7.4, abaixo.

201
Maria Cecília de Araujo Asperti

vos e também subjetivos do caso originário ou do recurso representativo da con-


trovérsia. De outra parte, caso se compreenda serem mecanismos de julgamento
por amostragem, é de se esperar que as partes seja fundamental, contemplando-
-se, inclusive, o exercício de alguma forma de representação ou de substituição
processual, em que a parte representará (ou falará em nome) de um contingente
de litigantes presentes ou potenciais que serão afetados pela tese jurídica.
Adota-se, no presente trabalho, o posicionamento pelo qual referidas téc-
nicas podem tender a uma objetivação, transcendendo aos elementos do caso
paradigma, mas que o julgamento da tese não é feito de forma totalmente de-
satrelada deste, especialmente no tocante aos seus elementos subjetivos. Desse
modo, não se pode entender que o julgamento da questão de direito seja desvin-
culado do processo ou recurso repetitivo. Isso porque, por mais que o procedi-
mento de julgamento de casos repetitivos assuma feições objetivas, as questões
jurídicas discutidas nos casos repetitivos são representativas de uma dinâmica
própria da litigiosidade repetitiva, em que litigantes habituais e ocasionais dis-
cutem, em ações individuais, matérias de ampla repercussão socioeconômica,
tais como benefícios previdenciários e assistenciais de amplo alcance, disposi-
ções usualmente inseridas em contratos de adesão, práticas comerciais difundi-
das no mercado, dentre outros.
Deste modo, mesmo que se entenda que a natureza das técnicas de julga-
mento de casos repetitivos sejam essencialmente objetivas, há uma manifesta
importância dos sujeitos do caso originário, ou de sujeitos de processos que
veiculem a questão jurídica a ser dirimida e que sejam escolhidos para arguir
perante o órgão responsável pela fixação da tese.
Sofia Temer chama esses sujeitos de “condutores”, e defende que não sejam,
necessariamente, as partes do processo em que o IRDR foi instaurado501.
A nosso ver, pouco importa se esses sujeitos eram partes do processo ou do
recurso representativo da controvérsia ou de outros processos sobrestados em
razão da instauração do IRDR ou da afetação do recurso extraordinário ou
especial repetitivo. O que se discute aqui é se conseguem de modo efetivo repre-
sentar os interesses ou defender os argumentos daqueles a o direito de participar
diretamente na decisão da questão jurídica em comum é mitigado.
Também nesse sentido, parece complicado traçar uma diferenciação entre
um sujeito que representa os interesses dos ausentes (o representante adequado)

501 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 168. Vide item 4.4.2.1., acima.

202
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

e aquele que argumenta em favor de determinada interpretação de uma ques-


tão jurídica (o representante argumentativo) ou, ainda, negar ou relativizar a
importância dos parâmetros de controle da representatividade adequada para o
âmbito das técnicas de julgamento de casos repetitivos.
Evidentemente que não se pode falar em representatividade adequada (ou
substituição) no mesmo sentido exato do processo coletivo, em que o represen-
tante fala em nome de uma classe ou da coletividade como um todo para obter
um provimento jurisdicional acerca de direitos transindividuais ou individuais
homogêneos. Nas técnicas de julgamento de casos repetitivos, um sujeito que
atue na arguição de questões pertinentes à tese jurídica não têm autorização
ope legis ou ope judicis para atuar em favor dos substituídos, podendo, inclusive,
sequer ter a intenção de fazê-lo, o que afasta até mesmo a hipótese de autono-
meação do representante, própria do sistema de class action norteamericano502.
No entanto, essas distinções não fazem do papel do chamado “sujeito con-
dutor” menos relevante ou decisivo. Pelo contrário: há diversas razões para se
crer que a atuação deste sujeito pode ter repercussões mais contundentes para
os “sobrestados” ou ausentes, ou seja, para quem será afetado pela tese jurídica.
Em primeiro, como já afirmado diversas vezes, a tese jurídica é aplicada,
inclusive, pro et contra, ou seja, mesmo contra os interesses daqueles que não
participaram diretamente do procedimento de julgamento de casos repetitivos.
Diferentemente da tutela coletiva503, ou mesmo da issue preclusion do sistema
norteamericano, a aplicação tese jurídica pode prejudicar terceiros que não par-
ticiparam do julgamento504.

502 FISS, Owen. “A teoria política das ações coletivas” In Direito como Razão Pública: Processo, Jurisdição
e Sociedade, 2017, op. cit., p. 191.
503 É interessante a crítica colocada por Edilson Vitorelli, fazendo menção aos conflitos intraclasse,
denotando uma perspectiva mais realista quanto à máxima de que, no Brasil, a sentença coletiva
apenas beneficia o membro da classe: “Se o processo coletivo ignora as posições dos ausentes, ele
corre o risco de assumir uma perspectiva paternalista ou mesmo autoritária, presumindo que o
autor da ação sabe o que é melhor para a sociedade e pode lhe impor essa solução. Mais do que
isso, a experiência vem demonstrando que a desconsideração das diferentes situações dos ausentes
é capaz de provocar graves consequencias sociais, prejudicando, com isso a qualidade da decisão e o
bom propósito que anima a tutela coletiva. O aperfeiçoamento do modelo representativo passa pela
criação de salvaguardas em favor dos ausentes, mas também pelo reconhecimento e tratamento dos
conflitos sociais subjacentes ao litígio” (2015, op. cit., p. 382).
504 Reitera-se, aqui, os argumentos pelos quais se entende que a tese jurídica não pode ser entendida
como um precedente, tanto no que diz respeito à sua formação quanto aplicação, conforme explanado
no item 4.2.1. deste capítulo.

203
Maria Cecília de Araujo Asperti

Além disso, o sobrestamento previsto pelas técnicas de julgamento de ca-


sos repetitivos é imposto aos litigantes individuais, em contraposição com a
faculdade prevista no artigo 104, do CDC, no tocante ao processo coletivo.
Não se tem a opção de prosseguir com a demanda individual: ao litigante
resta apenas acompanhar o julgamento do caso repetitivo ou do IRDR, e
confiar que o debate lá travado seja suficiente para a adequada compreensão
da matéria em disputa.
Outro ponto é que, com exceção do caso em que a parte requer a instaura-
ção do IRDR e este é admitido pelo órgão competente – o que é, como vimos,
pouco usual em se tratando de pedidos submetidos por pessoas físicas –, nas
demais hipóteses de legitimação do IRDR e nos recursos repetitivos de modo
geral as partes do caso paradigma não têm a intenção ou sequer a expectativa
de figurar como representantes (adequados ou argumentativos) no julgamento
da tese. Consiste essa em uma hipótese anômala de nomeação aleatória, não
prevista em lei e para a qual não há critérios claros de controle jurisdicional.
Indo além dos pontos já colocados nos itens anteriores deste capítulo, tem-se
que, se o papel desse “sujeito condutor” é o de apresentar ao órgão julgador os
fatos jurídicos essenciais, ainda que de forma genérica ou generalizada, há de se
convir que consiste em uma enorme responsabilidade para com aqueles que não
terão a oportunidade ou condições de fazê-lo.
E mais: o exercício desse papel de reconstrução do cenário fático, em toda a
sua complexidade, somente é possível de ser feito se o sujeito tem proximidade
e envolvimento com os fatos, o que o aproxima do substituto processual, cuja
legitimidade reside, justamente, na convergência de interesses com o substituí-
do. Todavia, diferentemente do substituto processual, cuja nomeação (legal ou
judicial) depende de sua capacidade de arguir adequadamente todo o cenário
fático e jurídico do caso em juízo, não se pode esperar que o litigante individual
tenha necessariamente os recursos necessários para compreender o amplo arca-
bouço fático de uma litigância repetitiva.
Aqui se tem um ponto fundamental: considerando a conformação subjeti-
va típica da litigiosidade repetitiva, é de se esperar que um dos litigantes que
possa ser compreendido como um litigante habitual possua melhores con-
dições de construir esse arcabouço fático, ou essa situação modelo do que
o litigante ocasional. E isso é especialmente pertinente em se tratando de
informações fáticas sobre os potenciais impactos socioeconômicos da decisão
acerca da tese jurídica.

204
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Pense-se no exemplo da discussão da legalidade de determinada prática de


empresas pertencentes a um mercado regulado, como o de telefonia505. Refe-
ridas empresas conseguem angariar e trocar informações sobre os impactos
econômicos de se considerar tal prática ilegal, podendo, inclusive, arguir de
forma articulada perante os tribunais ou cortes superiores que eventual tese
jurídica orientada pela ilegalidade de sua conduta implicará no repasse de
custos ao consumidor final506.
Mesmo com relação à argumentação das questões jurídicas, ou a um requi-
sito de representatividade que se relacione especificamente com a capacidade
técnica dos advogados dos representantes507, também é provável que os litigan-
tes habituais terão mais condições e incentivos para contratação de advogados
especializados que tenham não somente maior conhecimento técnico e aparato
para defesa dos interesses desses entes, mas também maior influência no cená-
rio jurídico. Litigantes habituais podem contratar juristas para representá-los,
ou para elaborar pareceres sobre as questões jurídicas em debate, os quais detêm
especial força persuasiva no Judiciário brasileiro.

505 Veja-se, apenas à título de exemplo, que no já mencionado julgamento sobre a legalidade da cobrança
da taxa de assinatura de tarifa de telefonia, as empresas de telecomunicações arguiram, perante o
STJ, que “A tarifa mensal de assinatura básica, incluindo o direito do consumidor a uma franquia
de 90 pulsos, além de ser legal e contratual, justifica-se pela necessidade da concessionária manter
disponibilizado o serviço de telefonia ao assinante, de modo contínuo e ininterrupto, o que lhe
exige dispêndios financeiros para garantir a sua eficiência” (REsp nº 911.802/RS, Relator Ministro
José Delgado, julgamento em 24.10.2007). Também foi nesse sentido a argumentação das empresas
mantenedoras de cadastros de inadimplência para defender o sistema de scoring de crédito, conforme
se abordará em maior profundida no estudo de caso descrito no Capítulo 6.
506 Vide outro exemplo da capacidade dos grandes litigantes de suscitar implicações socioeconômicas
do julgamento da tese jurídica, para fins de convencimento do julgador, no item 4.7.5, abaixo, em
que tratamos da audiência pública, em que tratamos do caso em que o STJ discutiu a “(i) prescrição
da pretensão de restituição das parcelas pagas a título de comissão de corretagem e de assessoria
imobiliária, sob o fundamento da abusividade da transferência desses encargos ao consumidor; e
quanto à (ii) validade da cláusula contratual que transfere ao consumidor a obrigação de pagar
comissão de corretagem e taxa de assessoria técnico-imobiliária (SATI).” (Tema nº 938, REsp
nº 1599511/SP e REsp nº 1551956/SP, 2ª Seção, Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino,
Julgamento em 24.08.2016).
507 Critério esse próprio da representatividade adequada das class actions norteamericas, como visto
no Capítulo 3, item 3.2.2., e também suscitado por Sofia Temer para defender a representatividade
argumentativa do sujeito condutor do IRDR: “o bom advogado, com formação acadêmica relevante,
atualizado e especializado na matéria em discussão, pode ser um dos fatores essenciais para evitar
distorções que possam decorrer do mau uso da linguagem técnica. A especialização do advogado
pode ser, então, mais um dos fatores que pode auxiliar na escolha dos condutores” (TEMER, Sofia,
2017, op. cit., p. 169).

205
Maria Cecília de Araujo Asperti

Levando em consideração esses fatores, entende-se que as partes do caso


paradigma (ou um sujeito que seja parte em outro caso sobrestado e seja desig-
nado o “sujeito condutor”) exercem, sim, uma representação508 dos interesses
dos litigantes excluídos ou dos ausentes que serão afetados pela tese jurídica, e
que sua atuação pode ser ainda mais decisiva do que aquela do legitimado ex-
traordinário da ação coletiva. Daí a pertinência de se compreender como essa
representação se dá, efetivamente, na prática, e quais os impactos da mitigação
da participação dos ausentes no julgamento das questões jurídicas em comum.
Esses últimos pontos serão enfrentados mais detidamente no Capítulo 6,
com o estudo de caso acerca do julgamento da legalidade do sistema de scoring
de crédito. Uma das perguntas que esse estudo de caso enfrenta é, justamente,
como os litigantes ocasionais e habituais do caso paradigma representam os
interesses daqueles que serão impactados pelo caso paradigma.

4.7.2. Demais interessados (“sobrestados” e “ausentes”)


Já se discutiu em diversos pontos deste capítulo a ausência, no julgamento
da tese repetitiva, das partes dos processos individuais que serão sobrestados,
ou mesmo dos ausentes propriamente ditos, assim entendidos como aqueles que
possuem uma demanda em potencial que verse sobre a questão jurídica a ser
discutida. Neste item, pretende-se analisar se há uma oportunidade de partici-
pação desses “excluídos” no julgamento, na condição de interessados, consoante
o quanto disposto o artigo 983 prevê que o relator do IRDR ouvirá “as partes e
demais interessados”, e no artigo 1.038, inciso I, que estabelece que o relator do
recurso repetitivo poderá solicitar ou admitir a manifestação de “pessoas com
interesse na controvérsia”.
Entende-se por “partes” aqui aqueles que assim figuraram no caso paradig-
ma (caso originário do IRDR ou recurso representativo da controvérsia nos
recursos repetitivos) que, como visto no item anterior, possuem uma partici-
pação assegurada no julgamento da tese jurídica, ainda que se entenda, como
no caso do incidente, que o caso originário será julgado pelo juízo em que o
processo tramita, e não pelo órgão competente para julgamento do IRDR. As

508 Representação aqui entendida em um sentido mais amplo – falar em nome de, ou representar os
interesses de – e não no sentido estritamente processual, como já discutido no Capítulo 3.

206
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

limitações e problemáticas relacionadas a essa participação foram devidamen-


te abordadas no item 4.7.1, acima.
Já os “interessados” são aqueles que serão atingidos pela tese jurídica509, po-
dendo ser assim compreendidos tanto as partes dos processos em andamento
(os “sobrestados”), quanto os sujeitos de direito que possuam uma demanda
em potencial (os “ausentes”, ou “litigantes-sombra”, conforme aludiu o Ministro
Herman Benjamin no seu voto sobre a legalidade da cobrança de assinatura
básica de telefonia). Cumpre, assim, tratar das possibilidades e as limitações da
participação desses interessados no julgamento de casos repetitivos.
Discute-se se esses interessados possuiriam efetivamente um interesse ju-
rídico que lhes permitiria atuar como assistentes no julgamento do caso para-
digma, ou se seriam apenas intervenientes no procedimento de formulação da
tese jurídica. Esse debate mostrou-se especialmente aprofundado no âmbito
do IRDR, dada a controvérsia já abordada neste trabalho quanto à natureza
de tal técnica processual.
Fredie Didier Jr. e Leonardo Cunha argumentam que haveria um interesse
jurídico propriamente dito por parte daqueles que buscam intervir no julga-
mento do caso paradigma, cabendo-lhes intervir no incidente e atuar como
assistentes simples das partes no julgamento da causa-piloto510. Sua admissão
como interveniente no julgamento da tese jurídica dependeria da demons-
tração da utilidade e de uma efetiva contribuição na discussão de formação

509 Antonio Adonias Aguiar Bastos sustenta que o interesse desses sujeitos seria direto e residiria
no estabelecimento de uma tese favorável: “Ocorre que, instaurado e admitido o incidente, resta
configurado o interesse público primário no estabelecimento de um posicionamento jurisprudencial,
que atingirá diretamente os processos que estejam pendentes e que versem sobre idêntica questão
jurídica, em determinado âmbito de competência territorial, nos termos do artigo 938 do NCPC
[artigo 976]. Assim todos os sujeitos que figuram como partes em feitos que tramitam em primeiro
e em segundo grau de jurisdição, dentro da competência territorial do tribunal no qual tramita o
incidente, possuem interesse direto na fixação da tese. Em outras palavras, embora não figurem
como partes no processo/recurso que deu origem ao incidente, serão considerados desta maneira
no incidente” (BASTOS, Antonio Adonias Aguiar. O devido processo legal nas demandas repetitivas.
Tese de Doutorado. Universidade Federal do Estado da Bahia: 2012, p. 173). Assinale-se que o
amicus curiae também é um interessado, cujo interesse é qualificado como institucional, conforme
se discutirá no item 4.7.4, abaixo.
510 DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da, 2016, op. cit., p. 607-609. Lembrando que,
para esses autores, o procedimento do IRDR seria uma técnica de causa-piloto, na qual a tese é fixada
a partir dos elementos do caso paradigma, como visto no item 4.1.2.

207
Maria Cecília de Araujo Asperti

da tese jurídica511. Os autores partem da premissa de que o artigo 119 do


CPC/2015 fala em terceiro “juridicamente interessado”, pelo o que não seria
necessário aferir se haveria uma relação jurídica conexa àquela discutida no
processo, mas somente se a orientação jurisprudencial a ser consolidada po-
deria servir de solução para o seu caso.
Já Sofia Temer, que não entende ser o IRDR um procedimento de causa-pi-
loto512, aduz que a assistência não seria inteiramente adequada para explicar a
intervenção dos sujeitos sobrestados no IRDR, dado que não haveria um vínculo
material entre os sujeitos. Em sendo o objeto do IRDR o julgamento de questões
de direito (e não de casos repetitivos), seria possível que as demandas sobrestadas
não sejam propostas contra o mesmo sujeito ou em razão do mesmo fato, o que
demonstra que não haveria, necessariamente, um vínculo entre as relações jurí-
dicas. Conclui, assim, pela possibilidade de se pensar em uma via internventiva
ainda não tipificada, fundada “pelo vínculo do sujeito e sua esfera de direitos com
o objeto do incidente, porque se trata de solução de uma questão de direito que
(também) lhe diz respeito” 513.
Nesse ponto, parece que mais importante do que definir se o interessado
pode ser considerado ou não um assistente é ter clareza acerca de seu direito
de participação efetiva nas diversas etapas do julgamento do recurso repe-
titivo e do IRDR. Concorda-se com a necessidade de se repensar e ressig-
nificar o conceito de interesse jurídico514, ressaltada pelos posicionamentos
acima referidos, especialmente ao se pretender conferir uma eficácia mais
expandida aos julgamentos de teses jurídicas e de precedentes propriamente
ditos. Isso se torna ainda mais pertinente quando se trata da eficácia pre-
clusiva do julgamento de questões de direito pela via das técnicas de julga-
mento de casos repetitivos.

511 DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da, 2016, op. cit., p. 608.
512 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 171-177.
513 TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 177.
514 Concordamos com Cassio Scarpinella Bueno quando este afirma que o conceito tradicional de
interesse juridico é calcado na forma espefícia do litígio individual, daí ser definido como um
vínculo ou uma intersecção entre relações jurídicas individuais. Entende-se, assim, que o interesse
jurídico seria aquele reconhecido expressamente na lei como causa da intervenção e que, por
definição, transcende um interesse privado, subjetivado, individualizado (BUENO, Cassio
Scarpinella. Amicus curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático. 3ª Edição. São Paulo:
Saraiva, 2012, p. 426-429).

208
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Com isso, deverá ser assegurado aos interessados o direito de ser intimado
(caso possua um processo em andamento) ou cientificado (mediante a ampla
divulgação da instauração do IRDR ou da afetação do recurso representativo
da controvérsia) do julgamento da tese jurídica e de intervir em todas as etapas
do procedimento, desde a sua instauração até o julgamento, inclusive com a
legitimidade para recorrer da decisão proferida ao final.
Tratando, especificamente, do direito de intimação e da oportunidade de
manifestação no IRDR, Aluisio Gonçalves de Castro Mendes defende, no caso
do IRDR, que a intimação e a oportunidade de intervenção no julgamento do
incidente são direitos subjacentes daqueles que ficarão vinculados pela tese ju-
rídica515. Essa participação incluiria a possibilidade de aditar argumentos, apre-
sentar peças e documentos, e de todo modo influir na formação da convicção
dos julgadores quanto aos fundamentos e interesses atinentes à questão jurídica
a ser apreciada. Mendes defende, inclusive, que a falta de notificação pode con-
duzir à ineficácia do efeito vinculativo da tese jurídica com relação à parte não
comunicada, similarmente ao que ocorre nas class actions, em que a notifica-
ção é necessária para possibilitar o exercício do direito de opt-out, podendo ser
avaliada, pelo julgador, a melhor forma e a extensão dessa notificação diante
de elementos do caso concreto516. Sua visão, portanto, sobre o direito de parti-
cipação direta é que esta consiste em elemento fundamental para a legitimação
do IRDR e da aplicação posterior da tese jurídica517.

515 MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 128-129.


516 Conforme dispõe a Rule 23: “(2) Notice. (A) For (b)(1) or (b)(2) Classes. For any class certified
under Rule 23(b)(1) or (b)(2), the court may direct appropriate notice to the class.(B) For (b)(3)
Classes. For any class certified under Rule 23(b)(3), the court must direct to class members the best
notice that is practicable under the circumstances, including individual notice to all members who
can be identified through reasonable effort. (…)”. Trata-se, especificamente, da notificação na class
action no Capítulo 3, item 3.2.2, acima.
517 “A oportunidade de manifestação das partes e interessados, especialmente considerados os titulares
de direitos que possam ser afetados pelo efeito vinculativo da decisão proferida no Incidente de
Resolução de Demandas Repetitivas, é ponto fundamental para a legitimação do procedimento
modelo estabelecido no ordenamento brasileiro. O seu ponto de partida, naturalmente, foi a
divulgação, ampla e específica, anteriormente estabelecida, especialmente a partir da intimação
das partes em relação à suspensão dos processos, fazendo com que tivessem ciência da existência
do respectivo IRDR, no sentido de possibilitar o seu acompanhamento e posterior participação.
Efetiva-se, portanto, nesta etapa, a oportunidade de intervenção e participação, para que se possa
suprir eventuais deficiências, aduzindo tudo o que se considerar necessário para o exercício do
pleno direito de acesso e defesa perante o Poder Judiciário” (MENDES, Aluisio Gonçalves de
Castro, 2017, op. cit., p. 201).

209
Maria Cecília de Araujo Asperti

Ainda a esse respeito, Luiz Guilherme Marinoni recorre novamente ao pa-


ralelo com o non mutual issue preclusion (ou collateral estoppel) norte-americano,
em que há a possibilidade de o réu que tenha a expectativa de ser acionado sub-
sequentemente pela mesma questão de requerer o chamamento dos potenciais
autores para estes que possam, desde logo, participar da ação ajuizada em que
tal questão em comum será decidida (mandatory joinder)518. Ele aduz, contudo,
que a convocação de todas as partes dos processos individuais a participar do
julgamento do IRDR ou do recurso repetitivo poderia efetivamente inviabilizar
o processo, a sessão ou até mesmo uma audiência pública designada pela corte
competente. A alternativa seria a intimação dos legitimados para tutela cole-
tiva, para que representem os interesses desses interessados nessa qualidade519.
Sendo coerente com as premissas teóricas sustentadas no Capítulo 3 so-
bre a essencialidade da participação para o processo, entende-se que a par-
ticipação direta dos interessados não poderá ser obstada de antemão, sem
que haja razões, verificadas no caso concreto, que tornem essa participação
efetivamente inviável.
Como se aduziu anteriormente, além de sua importância legitimadora da
decisão jurisdicional e do processo, a participação pode efetivamente impactar
os resultados do julgamento e até mesmo a efetivação da tutela jurisdicional,
especialmente em casos complexos. Daí a importância da oportunização do di-
reito apresentar manifestações por escrito, de sustentar oralmente, de participar
em audiências públicas e de praticar todos os atos processuais capazes de influri
na formação da tese jurídica. A participação dos interessados é, acima de tudo,
um direito que lhes é assegurado pela cláusula geral do devido processo legal, e
que é consistente com a eficácia preclusiva da tese jurídica face às questões ju-
rídicas decididas: não se poderia vincular esses sujeitos sem que lhes fosse dada
a oportunidade de serem ouvidos.

518 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op. cit., p. 328-329.


519 “Admitindo-se que o legislador cometeu um equívoco, ou seja, que não quis excluir a possibilidade
de participação indireta do litigante, porém apenas se esqueceu de regulá-la, há como aceitar a
possibilidade de a doutrina e os tribunais, mediante interpretação, corrigirem o desvio do legislador,
evitando-se, assim, a simples proclamação da invalidade ou da inconstitucionalidade do incidente,
cuja repercussão sobre o novo sistema processual civil certamente não seria boa (...). Os definidos
como legitimados à tutela dos direitos individuais homogêneos pela Lei da Ação Civil Pública e pelo
Código de Defesa do Consumidor devem ser vistos como aqueles que podem representar os excluídos
no incidente e, assim, resgatar sua legitimidade constitucional” (MARINONI, Luiz Guilherme,
2016b, p. 47-49).

210
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

É preciso ser realista, porém, quanto às possibilidades dessa participação e


quanto a quem irá aproveitar melhor essa oportunidade. A participação é, sem-
pre, custosa, e a decisão sobre participar ou não geralmente decorre de uma ava-
liação de custos e benefícios dessa participação520. Pense-se, por exemplo, que a
participação dos litigantes ocasionais (sobrestados) no julgamento de recursos
repetitivos depende, de pronto, de um deslocamento para a capital do Estado
ou para Brasília, ou da contratação de advogados que atuem nessas comarcas.
Não se concorda, no entanto, com as limitações feitas de antemão, jus-
tificadas pelos custos ou pela impossibilidade prática dessa participação, ou,
ainda, com o crivo a ser estabelecido quanto à capacidade de os interessados
de trazer novos argumentos ou de contribuir de forma relevante à formação
da convicção do julgador521.
Retoma-se, aqui, a crítica de Judith Resnik quanto às limitações impostas ao
exercício do devido processo legal com base em uma análise de custo-benefício,
que nunca é efetivamente embasada em evidências plausíveis dos custos ou da
ineficiência ocasionada pela viabilização da oportunidade de participação da-
queles que serão afetados por determinado julgamento522. Com relação às técni-
cas de julgamento de casos repetitivos, o que se verifica, em verdade, são obstá-
culos (e não incentivos propriamente ditos) à participação dos interessados (em
especial para os litigantes ocasionais), como o já mencionado deslocamento até
os tribunais e o escasso tempo de manifestação oral523.
De outra parte, não é possível aferir, de antemão, como os interessados serão
capazes de influir na formação da tese jurídica. São eles que estão diretamente
envolvidos na discussão, tendo, assim, elementos para ampliar o debate, para
que possam ser contemplados todos os argumentos e implicações do entendi-
mento a ser firmado.

520 Como se viu no item 2.3.2 do Capítulo 2, com o referencial de Neil Komesar (1994, op. cit.).
521 Conforme DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da, 2016, op. cit., p. 609-610.
522 RESNIK, Judith, 2008, op. cit., p. 499-500. Vide Capítulo 3, item 3.1.3.
523 No julgamento do já mencionado IRDR em que foram discutidas questões relacionadas ao atraso
na entrega de unidades autônomas, foi retumbante a ausência não só de interessados, mas mesmo
das partes do caso originário e até mesmo de quaisquer amicus curiae que falasse em nome dos
promitentes compradores, ainda mais em se considerando a enorme repercussão econômica e social
da decisão tomada neste incidente (IRDR nº 0023203-35.2016.8.26.0000, Desembargador Relator
Francisco Loureiro, admissão em 18.08.2016, julgamento em 31.08.2017).

211
Maria Cecília de Araujo Asperti

Com relação ao papel do Ministério Público e a Defensoria Pública, ao invés


de atuarem como representantes ou substitutos processuais, entende-se que o
seu papel deva ser, juntamente com o Judiciário, o de facilitar a participação
direta dos interessados e contribuir, também, para a ampliação do debate. Cabe-
-lhes articular e desenvolver os argumentos e elementos trazidos pelas partes e
interessados, porém sem obstar sua intervenção direta no julgamento.

4.7.3. Ministério Público e Defensoria Pública


A intervenção do Ministério Público e da Defensoria Pública já foi um pon-
to discutido ao longo desse capítulo, principalmente a partir dos argumentos
no sentido de que esses entes seriam capazes de representar os interesses dos
ausentes, tornando-se, assim, desnecessária ou descabida a participação direta
dos interessados no julgamento da tese jurídica. Também se discutiu no item
4.4.2.2., acima, o papel que o Ministério Público exercerá em caso de desistên-
cia da parte no IRDR, assim como as limitações a serem consideradas. Ainda
neste ponto, mencionou-se a divergência acerca da condições em que o Minis-
tério Público intervem no IRDR, se enquanto legitimado a promover a eeftiva
representação de interesses dos membros do grupo ou da coletividade ou na
“defesa da ordem jurídica” (artigo 127 da CF).
Com relação ao IRDR, há a obrigatoriedade de o relator intimar o Ministé-
rio Público, oportunizando-se sua manifestação no prazo de quinze dias (artigo
982, II). A Defensoria Pública, apesar de possuir legitimidade para requerer a
instauração do incidente, não será intimada dos incidentes dos quais não hou-
ver requerido a instauração, tomando conhecimento de sua existência por meio
da divulgação geral prevista no artigo 979.
No âmbito dos recursos repetitivos, a intimação do Ministério Público é
prevista expressamente no artigo 1.038, inciso III, cabendo a este manifestar-se
sobre as informações obtidas junto aos tribunais inferiores. A intervenção da
Defensoria Pública pode ser extraída também artigo 1.038, inciso I, que dispõe
que o relator “poderá” solicitar ou admitir a manifestação de entidades com
interesse na controvérsia.
Em se pensando nas desvantagens comparativas dos litigantes ocasionais, há
um papel de considerável importância a essas instituições do sistema de justiça,
que atuam na proteção de interesses sociais e na defesa dos hipossuficientes e

212
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

vulneráveis. Como discutido no Capítulo 2, em especial no item 2.4., e no Ca-


pítulo 3, no item 3.1.1., essas instituições têm a capacidade, ao menos em tese,
de atuar de modo mais estratégico, conseguindo usufruir de algumas das van-
tagens próprias dos litigantes habituais, como o levantamento de informações,
uma atuação mais especializada e voltada a obtenção de benefícios a médio e
longo prazo, em especial no âmbito da tutela coletiva ou da atuação por meio
de práticas próprias do litígio estratégico de interesse público.
Por outro lado, ao serem chamadas a intervir no julgamento de um caso
repetitivo, o Ministério Público e a Defensoria Pública não se encontravam,
necessariamente, engajados na discussão da matéria pertinente à questão colo-
cada a julgamento, tampouco envidaram esforços e recursos, previamente, para
compreensão do cenário mais amplo da litigiosidade.
Veja-se, por exemplo, determinado caso em que o INSS argumente con-
tra um reajuste de benefício previdenciário, ou a favor de uma interpretação
restritiva quanto a concessão de um benefício, usando-se, em suas alega-
ções, de informações sobre supostos impactos no orçamento da Previdência
Social. O Ministério Público Federal, ou a Defensoria Pública da União,
podem não estar preparados, de antemão, para produzir dados capazes de
fazer frente aos dados angariados pelo INSS, que acabariam sendo tidos
como incontroversos pelos julgadores.
Assim, é preciso fomentar a participação dessas instituições, porém sem
se assumir, genericamente, que terão condições de efetivamente suprimir
a disparidade de recursos e de atributos estratégicos que caracteriza a li-
tigiosidade repetitiva. Seu papel é o de tentar mitigar esse desequilíbrio,
articulando formas de ampliação da participação direta destes, angariando
informações, manifestações e pugnando pela consideração de todos os ele-
mentos fáticos e jurídicos pertinentes à definição da tese, mas sem se obstar
a participação direta dos interessados.
Aliás, com relação, especificamente, à Defensoria Pública, sua intervenção
no julgamento do IRDR e do recurso repetitivo deve ser a regra, e não uma
possibilidade a ser avaliada caso a caso pelo julgador. Dificilmente não se vis-
lumbrará, dentre os afetados pela tese jurídica, uma considerável parcela de
indivíduos hipossuficientes ou vulneráveis, podendo a Defensoria Pública atuar
para assegurar em máximo a representatividade de seus interesses e a viabili-
zação de sua participação direta e efetiva no julgamento da tese jurídica. Aqui
também devem ser relembradas as potencialidades e limitações da atuação es-

213
Maria Cecília de Araujo Asperti

tratégica desta instituição, para que não se aposte que a sua intervenção, por si
só, poderá garantir a paridade estratégica entre litigantes habituais e ocasionais
no julgamento de casos repetitivos.

4.7.4. Amicus Curiae


Como já colocado, para além do Ministério Público e da Defensoria Pública,
o CPC/2015 estabelece a possibilidade de intervenção de de outros órgãos ou
entidades interessadas, no julgamento das teses repetitivas. A lei processual faz,
nesse ponto, referência à figura do amicus curiae, também regulada pelo artigo
138 da lei processual e definida, na famosa expressão de Cassio Scarpinella
Bueno, como um “terceiro enigmático”524.
Bueno compara a atuação do amicus curiae com aquela do custos legis (no
sentido de defender um interesse público); do assistente (por ter um interesse
jurídico no desfecho do julgamento) e do perito (na medida em que pode trazer
informações fáticas ou técnicas à corte), porém conclui, a partir das singulari-
dades do instituto, que o amicus curiae pode ser considerado um sujeito pro-
cessual que auxilia o juízo525, orientado por um interesse institucional, ou seja,
um interesse jurídico que transcende o interesse individual das partes, sendo
considerado, também, um interesse público, conquanto diz respeito aos valores
perseguidos pelo Estado526.

524 BUENO, Cassio Scarpinella, 2012, op. cit.


525 “Podemos entender por ‘sujeitos do processo’ todos aqueles que, de alguma forma, atuam no processo
e que, consequentemente, têm, em alguma medida, legitimidade para a prática de atos processuais
(...)” (BUENO, Cassio Scarpinella, 2012, op. cit., p. 344). “(...) não há como negar seja o amicus
curiae um desses sujeitos. Ele participa de uma relção processual, pelas variadas e assistemáticas
razões que nosso direito positivo reconhece, ou que, com maior ou com menor clareza, é possível
extrair do nosso sistema processual civil, tendo, consequentemente, legitimidade para a prática de
alguns atos correlatos a sua prória razão de estar no processo” (op. cit., p. 395).
526 “O interesse institucional é público no sentido de que deve valer em juízo pelo que ele diz respeito
às instituições, aos interesses corporificados no amicus, externos a eles e não pelos interesses que ele
próprio amicus pode, eventualmente, possui e os possuirá, não há como negar isso, legitimamente.
Não é um interesse público do Estado, que caracteriza o Estado como tal, um ‘interesse estatal’, mas
pode haver um interesse público que também diga respeito ao Estado, mais especificamente aos
valores que o Estado representa e tem como mister primeiro cumpri-los. É, nessas condições, um
interesse público primário, para valermo-nos, aqui também, da dicotomia adotada, em geral, pelos
administrativistas” (BUENO, Cassio Scarpinella, 2012, op. cit., p. 461).

214
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Inicialmente previsto em leis esparsas527, a intervenção do amicus curiae ga-


nhou maior proeminência no Judiciário brasileiro com a Lei nº 9.868/1999528,
em que se previu expressamente a possibilidade de se manifestarem, perante o
STF, órgãos e entidades considerados representativos, caso se entendesse haver
relevância na matéria discutida. Como aponta Eloísa Machado de Almeida, o
percentual de ações de controle de constitucionalidade que apresentavam ao
menos um amicus curiae passou de 13,4%, no período entre 1999 a 2005, para
36%, entre os anos de 2007 a 2010529, corroborando uma tendência, ao menos
quantitativa, de crescimento da importância dos amici curiae nos julgamentos
de controle concentrado de constitucionalidade530.
Na esfera das técnicas de julgamento de casos repetitivos, já se verificava a
intervenção de amici curiae em julgamentos de recursos especiais repetitivos,
pelo rito do artigo 543-C, assim como no julgamento por amostragem da re-
percussão geral pelo procedimento do artigo 543-B, ambos do CPC/1973, ainda
que a única menção específica estivesse restrita ao §6º do artigo 543-A531, que
tratava somente da verificação da repercussão geral, e não do mérito do julga-
mento de recursos pelas cortes superiores532.
A atuação do amicus ganhou um regramento mais específico no CPC/2015,
em seu artigo 138 (ou seja, dentre as modalidades de intervenção de terceiros),
que estabelece um juízo de discricionaridade dos julgadores quanto à possibi-

527 Como na Lei nº 6.385/1976 (intervenção da Comissão de Valores Mobiliários – CVM – em processos
judiciais que versem sobre matéria relativa a sua competência); Lei nº 9.279/96 (intervenção do
Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI – em ações de nulidade de patente); e Lei nº
8.884/1994 e Lei nº 12.529/2011 (intervenção do Conselho Administrativo de Defesa Econômica –
CADE – em processos em que a legilsção de defesa da concorrência seja aplicada).
528 Art. 7º § 2º O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes,
poderá, por despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a
manifestação de outros órgãos ou entidades.
529 ALMEIDA, Eloisa Machado. Amicus Curiae no Supremo Tribunal Federal. Tese de Doutorado.
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo: São Paulo, 2015.
530 Essa tendência já havia sido pontuada pela autora em pesquisa anterior, conforme ALMEIDA, Eloisa
Machado. Sociedade civil e democracia: a participação da sociedade civil como amicus curiae no Supremo
Tribunal Federal. Dissertação de mestrado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2006.
531 Art. 543-A (...) § 6º. O Relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação
de terceiros, subscrita por procurador habilitado, nos termos do Regimento Interno do Supremo
Tribunal Federal.
532 Defendendo uma interpretação extensiva desse dispositivo para o julgamento de recursos repetitivos,
vide BASTOS, Antonio Adonias Aguiar, 2012, op. cit., p. 184-185.

215
Maria Cecília de Araujo Asperti

lidade de intervenção do amicus curiae, bem como quanto à extensão de seus


poderes, ou quanto aos atos processuais que poderão ser por estes ser realizados.
De acordo com esse regramento, o propósito do amicus curiae seria o
de proporcionar maior pluralidade533 e diversidade de argumentos e de am-
pliar o exercício do contraditório, ou, como assevera Bueno, para se dar voz
àqueles que não podem (ou não puderam) ser ouvidos no plano do direito
processual, em favor de um “aprimoramento e aprofundamento da qualida-
de da cognição jurisdicional”534.
A possibilidade de sua intervenção no julgamento de casos repetitivos po-
deria ser vista, assim, como um elemento de legitimação dessas técnicas, na
medida em que permitiria prover ao órgão julgador acesso a uma diversidade de
posicionamentos, além de se permitir que entes (institucionalmente) interessa-
dos contribuam para a melhor compreensão do substrato fático e das implica-
ções da tese jurídica a ser fixada535
A despeito do importante papel que o amicus curiae pode, sem dúvida, de-
sempenhar no julgamento de casos repetitivos, há importantes preocupações
a serem colocadas, as quais – novamente – estão calcadas na perspectiva me-
todológica do acesso à justiça adotada nesta tese e nas demais preocupações
relacionadas à participação e à distributividade no processo civil.
Os argumentos que sustentam que as técnicas de julgamento de casos re-
petitivos proporcionariam um efetivo contraditório, mesmo sem a participação
direta dos interessados, partem da crença de que, muito embora as partes do
caso paradigma (ou de outros processos sobrestados que seja indicada para o
exercício desse papel de “sujeito condutor”) possam ter dificuldades de represen-
tar os interesses ou argumentos dos demais interessados (excluídos e ausentes),
o Ministério Público, a Defensoria Pública e os amici curiae poderiam suprir

533 ALMEIDA, Eloisa Machado, 2015, op. cit., p. 33-39.


534 BUENO, Cassio Scarpinella, 2012, op. cit., p. 467.
535 Nesse sentido, Sofia Temer entende que se faz necessário, no IRDR, repensar o próprio exercício do
contraditório, assim entendido como um direito de influir na dialética argumentativa que culminará
na formulação da tese jurídica: “Sendo assim, no incidente, o contraditório foge à sua concepção
tradicional e não pode ser concebido como embate de teses antagônicas, nem como mero direito de
informação e reação, voltado à proteção de um direito subjetivo. No incidente, a participação não
é facultada apenas aos sujeitos que sofram ‘prejuízos’ com a aplicação da tese. Assume a condição
de direito de influência, que, aqui, expressa-se pela possibilidade de, através da apresentação de
informações e argumentos racionais, influir na convicção do órgão julgador e dos demais sujeitos no
debate relativo à resolução da questão de direito” (TEMER, Sofia, 2017, op. cit., p. 144).

216
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

essa lacuna, contribuindo para que a tese jurídica fosse formulada a partir de
um debate plural e participativo.
No entanto, não é colocada a preocupação (central ao presente trabalho)
com as diferentes capacidades daqueles que figuram em polos contrapostos, ou
cujos interesses estão em contraposição, nos casos repetitivos. Tampouco se
analisa se esses intervenientes conseguem, de fato, reequilibrar o debate, espe-
cialmente quando há questões de grande repercussão socioeconômica envolvi-
das. A compreensão dessa dinâmica é essencial para se entender quem pode
ser (e quem efetivamente é) amicus curiae e o papel que pode ser exercido (e o
papel que é de fato desempenhado) no julgamento de casos repetitivos.
Pensando, primeiramente, em quem podem ser os amici curiae no IRDR e
nos recursos repetitivos, tem-se que o artigo 138 do CPC/2015 estabelece um
juízo de admissibilidade da intervenção deste terceiro que levará em considera-
ção: (i) a relevância da matéria; (ii) a especificidade do tema objeto da deman-
da; (iii) a repercussão social da controvérsia; (iv) a especialidade da atuação do
órgão e entidade e; (v) sua “representatividade adequada”536.
Similarmente, a Lei nº 9.868/1999, em seu artigo 7º, §2º, também dispõe sobre
os critérios legais da relevância da matéria e da representatividade dos postulantes
que desejam intervir no julgamento de ações diretas de constitucionalidade.
Referidos critérios de representatividade e de especialidade também deve-
riam ser interpretados a partir da compreensão do interesse institucional do
amicus curiae, e da sua imparcialidade, ou seja, da ausência de um interesse
próprio ou subjetivo e um legítimo propósito de contribuir com a qualidade
do julgamento537. A intervenção do amicus, seja espontânea ou provocada pelo
julgador, somente terá legitimidade e credibilidade se verificado que ele não

536 Similar provisão esta inserta no Regimento Interno do STJ: “Art. 256-J. O relator poderá solicitar
informações aos Tribunais de origem a respeito da questão afetada e autorizar, em decisão
irrecorrível, ante a relevância da matéria, a manifestação escrita de pessoas naturais ou jurídicas,
órgãos ou entidades especializadas, com representatividade adequada, a serem prestadas no prazo
improrrogável de quinze dias”.
537 “A ‘imparcialidade’ do amicus curiae é uma necessidade do sistema jurisdicional. Não deriva de um
específico artigo de lei, ao contrário do que, para o nosso sistema jurídico, dá-se com relação ao
perito (art. 138, III, do Código de Processo Civil). Não há, contudo, como desconsideração que suas
alegações serão tanto mais críveis e, consequentemente, levadas em conta pelo magistrado na exata
proporção em que ele, amicus curiae, mostrar-se ‘confiável’, ‘idôneo’, ‘imparcial’, ‘neutro’, ‘respeitado’
no seu específico ramo de atividade, seja por entidades privadas ou públicas”. (BUENO, Cassio
Scarpinella, 2012, op. cit., p. 378).

217
Maria Cecília de Araujo Asperti

pertence pessoalmente à situação substancial litigiosa e não está sujeito aos


efeitos da decisão a ser proferida538.
A esse respeito, e a partir da interpretação conferida ao critério de repre-
sentatividade do amicus curiae no controle concentrado de constitucionalida-
de, Almeida aduz que tal requisito vem sendo interpretado considerando-se
a vinculação do requerente com as pessoas potencialmente afetadas e a sua
especialidade quanto ao tema discutido, assim entendida como autoridade, ou
conhecimento no assunto em debate539. A esse respeito, a autora critica a dis-
cricionariedade do juízo de admissibilidade dos amici curiae pelo STF, que em
um dos casos de maior relevância social dos últimos anos – a ADPF nº 54, que
discutia a não criminalização da antecipação terapêutica de partos de anence-
fálos – indeferiu a participação de importantes organizações representativas de
grupos e movimentos sociais interessados, sob o vago argumento de “tumulto
processual”540, porém permitiu a manifestação de entidades técnicas no julga-
mento. Como se pode ver, o critério da “especialidade” pode ser interpretado
inclusive em detrimento da “representatividade adequada”, principalmente em
casos de grande repercussão social, o que retrata a dificuldade e fluidez de tais
requisitos de admissibilidade da intervenção do amicus curiae.
Do mesmo modo, com relação ao interesse essencialmente institucional, tra-
ta-se, também, de requisito cuja aferição pode se revestir, na prática, de grande
incerteza ou de discricionariedade, especialmente no âmbito do julgamento de
casos repetitivos, em que as questões discutidas frequentemente atingem inte-
resses diretos de entes públicos e privados de grande porte. Nos Estados Unidos,
o interesse puramente institucional, que poderia ser compreendido como um

538 BUENO, Cassio Scarpinella, 2012, op. cit., p. 490-491. O autor assevera, ainda, que a aferição
do interesse institucional se aplica, inclusive, quando a União interfere nessa condição em
processos em que figurem como partes autarquias, fundações públicas, sociedades de economia
mista e empresas públicas federais, consoante o quanto disposto pelo artigo 5º, Parágrafo Único,
da Lei nº 9.469/1997. Ainda que referido dispositivo fale em reflexos de “natureza econômica” a
justificar a intervenção da União, Bueno entende que não se trataria de um interesse econômico
propriamente dito, mas de um interesse público primário por parte do ente federativo que tenha
eventuais reflexos indiretos econômicos.
539 ALMEIDA, Eloísa Machado. “O amicus curiae na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”. Revista
Brasileira de Estudos Constitucionais”. Nº 24, Belo Horizonte: Forum, 2012, pp. 1073-1098, p. 1.078.
540 “Esse caso é exemplo das idiossincrasias que envolvem a figura dos amicus curiae e de como o
entendimento de cada um dos ministros influencia no alcance que este instrumento pode ter na
jurisdição constitucional” (ALMEIDA, Eloisa Machado, 2015, p. 91-92).

218
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

“mito da neutralidade”541 do amicus curiae, já é há muito tempo colocado em


xeque542. Aponta-se que mudanças na natureza da litigiosidade transformaram
esse papel ao longo dos anos543 de um terceiro que provia informações essen-
cialmente jurídicas aos julgadores, em um contexto de muito menor escala e
dificuldades de registro, para um ente que oferece subsídios fáticos à corte544,
normalmente por ter um interesse claro e direto no desfecho do julgamento.
A esse respeito, seria possível se pensar que haveria aqui uma relevante dis-
tinção no papel exercido pelo amicus curiae no julgamento de casos repetitivos
e na Suprema Corte norte-americana e, até mesmo, no controle de constitucio-
nalidade realizado pelo STF, porquanto, no primeiro, sua participação estaria
restrita à discussão de matéria de direito.
No entanto, como já debatido, o julgamento das questões jurídicas repeti-
tivas não é realizado de forma totalmente desvinculada do arcabouço fático
próprio da litigiosidade repetitiva em que estão inseridas. Mesmo aqueles que
entendem serem esses mecanismos processuais de natureza objetiva reconhe-
cem que os julgadores deverão compreender a “situação fática modelo”, do que
se denota a importância dos elementos fáticos no julgamento das teses jurídicas,
em especial aqueles relativos aos impactos socioeconômicos de sua aplicação.

541 BANNER, Stuart. “The myth of the neutral amicus: American courts and their friends”, 1790-
1890. Constitucional Commentary, v. 20, p. 111, 2003. Referido autor classifica os amici curiae de
“partidários”, se sua atuação é representativa dos interesses de uma das partes ou de alguma entidade,
e de “neutros”, se não estivesse representando ninguém ou tampouco defendendo os argumentos de
nenhum dos lados em disputa (2003, op. cit., p. 116).
542 KRISLOV, Samuel. “The amicus curiae brief: from friendship to advocacy”. The Yale Law Journal, v.
72, n. 4, p. 694-721, 1963.
543 Stuart Banner que essas mudanças têm a ver como uma transição de uma prática jurídica
essencialmente oral e em menor escala, em que as cortes dependiam também do registro e da
memória de advogados atuantes quanto aos precedentes julgados (e nem sempre registrados) em
julgamentos futuros, para uma tradição mais calcalda em expedientes escritos e com largo acesso a
informações, na qual o papel do amicus curiae passa a ser muito mais o de fornecer subsídios factuais
ao julgamento, o que acaba sendo feito por aqueles que têm um interesse mais claro e direto no
desfecho do caso (BANNER, Stuart, 2003, op. cit., p. 121-122).
544 “Most relevant, the twentieth century saw the birth of amicus briefs filed to educate the Court on non-
legal matters. It is this role of the amicus—as factual experts —that has flourished in modern times and
is applauded by many scholars and jurists as the most valuable function an amicus can perform. Indeed
it is this role that is actually encouraged by the modern Supreme Court rules, which explicitly call for
amici to supplement information the parties provide (LARSEN, Allison Orr. “The Trouble with Amicus
Facts”. Virginia Law Review, p. 1757-1818, 2014, p. 1769).

219
Maria Cecília de Araujo Asperti

Assim, é de se esperar que os amici curiae exerçam, também, esse papel, que se
mostra extremamente relevante na conformação da tese jurídica.
Deste modo, e pensando especificamente no amicus curiae que pode intervir
no julgamento de casos repetitivos545, tem-se que, novamente, os litigantes ha-
bituais podem aferir significativas vantagens por meio da intervenção de amici
curiae no julgamento de teses repetitivas546.
Como já discutido, esses atores têm mais fácil acesso à especialistas tanto no
meio jurídico quanto não jurídico, bem como recursos para financiar levanta-
mento de informações (econômicas, técnicas, estatísticas, etc.) que poderão ser
apresentadas por eles mesmos ou por entidades que representem seus interes-
ses, como associações profissionais, sindicatos, institutos e órgãos de classe em
geral547. Logo, se o critério da especialidade for preponderante, tanto do ponto
de vista jurídico quanto fático, temos que os litigantes habituais terão maiores

545 Não levantamos no presente trabalho os dados sobre todos os amici curiae que interviram no
julgamento de casos repetitivos no STJ (estudo empírico-jurisprudencial) que será descrito no
Capítulo 5, a seguir, em razão da dificuldade e na não confiabilidade dos dados disponibilizados
pelo sistema do tribunal. Pudemos verificar, na análise dos casos, que nem sempre essa informação
constava no andamento do recurso, podendo ser extraída, de forma casuísta, do teor dos acórdãos
do julgamento dos casos paradigma. No estudo de caso descrito no Capítulo 6, discutimos em
profundidade quem foram e o qual o papel exercido pelos amici curiae no julgamento da questão
relativa à legalidade do scoring de crédito.
546 “Esclareça-se que os entes que podem intervir como interessados não necessitam estar do lado da
grande massa de litigantes excluídos, ou seja, daqueles que afirmam que seus direitos foram lesados.
Também cabe a intervenção de interessados na vitória daqueles que se colocam como adversários dos
litigantes que sustentam que os seus direitos foram violados nas várias demandas, especialmente par
aa formaçaõ de jurisprudênci ou precedente favorável (MARINONI, Luiz Guilherme, 2016b, p. 97).
547 Sobre o uso de pesquisas financiadas pelos próprios amicus que, por sua vez, são entes considerandos
“partidários”, ou seja, com interesses diretos no desfecho do julgamento ou alinhados com uma das
partes da disputa, Alisson Orr Larsen comenta: “In fact, a quick look at the tables of authorities in
the amicus briefs filed in the 2012–2013 Term reveal that it is not at all rare for an amicus to cite
a study it funded or conducted itself. Examples include: the Generic Pharmaceutical Association
presenting a study it sponsored on the money saved through generic drugs, the National Venture
Capital Association describing a study it funded about how investment drives medical innovation,
and a statistical survey about the erosion of the criminal intent requirements in federal law, co-
authored by an employee of the National Association of Criminal Defense Lawyers and then
presented to the Court by the same organization” (LARSEN, Allison Orr, 2014, op. cit., p. 1790-
1791). Para a autora, o fato de as pesquisas serem financiadas não seria, em si, um problema,
mas certamente a forma de apresentação dos dados não se dará de forma neutra (como em um
estudo independente), mas com intuito persuasivo, o que pode ser problemático, considerando,
especialmente, o peso que vêm sendo conferido pelas cortes americanas aos elementos fáticos
(técnicos, econômicos, estatísticos) em seus julgamentos.

220
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

chances de mobilizar entes capazes de intervir em favor de seus interesses do


que os litigantes ocasionais, que dependerão de entidades representativas de
seus interesses ou engajadas na defesa de direitos coletivos ou sociais, as quais
não possuem os mesmos recursos para contratação de especialistas (jurídicos ou
não) ou para financiamento de estudos que possam munir a corte de elementos
fáticos pertinentes à litigância repetitiva em discussão.
Por fim, esse ponto leva à reflexão acerca do que podem fazer (e o que de
fato fazem) os amici curiae no julgamento de casos repetitivos.
Bueno defende que ao amicus curiae seja assegurado o exercício amplo de
poderes meio, ou poderes verdadeiramente instrumentais548, que compreendam
a apresentação de informações e de memoriais escritos, a produção de provas549,
de recorrer de eventual decisão proferida (o que é assegurado expressamente
pelo CPC/2015 no tocante à decisão que julga o IRDR 550) e o de realizar sus-
tentação oral de suas razões perante o tribunal, nos termos de seu respectivo
regimento interno.
O autor lamenta, no entanto, o entendimento adotado pelo STJ quando do
julgamento da Questão de Ordem no Recurso Especial nº 1.205.946/SP551, em
que se entendeu que caberia à corte convocar ou não a sustentação oral dos (ou
de alguns) amici curiae, que não teriam o direito de sustentar oralmente. Nova-
mente, abre-se espaço para as discricionariedades mencionadas por Almeida, que
acabam por limitar o espaço de participação dos amici curiae nesses julgamentos.
Verifica-se, pois, que mesmo quando conseguem vencer os óbices que se
colocam para uma intervenção efetiva e significativa, os amici curiae que re-

548 BUENO, Cassio Scarpinella, 2012, op. cit., p. 505.


549 “Ao amicus curiae deve ser franqueada a possibilidade de produção de prova correlata de suas
alegações em juízo, viabilizando-lhe, com isso, que, de forma eficiente, possa participar ativamente
da formação do convencimento do magistrado” (BUENO, Cassio Scarpinella2012, op. cit., p. 509).
550 Art. 138, § 3o O amicus curiae pode recorrer da decisão que julgar o incidente de resolução de
demandas repetitivas.
551 “Em questão de ordem, a Corte Especial, por maioria, firmou a orientação de não reconhecer o direito
do amicus curiae de exigir a sua sustentação oral no julgamento de recursos repetitivos, a qual deverá
prevalecer em todas as Seções. Segundo o voto vencedor, o tratamento que se deve dar ao amicus
curiae em relação à sustentação oral é o mesmo dos demais atos do processo: o STJ tem a faculdade
de convocá-lo ou não. Se este Superior Tribunal entender que deve ouvir a sustentação oral, poderá
convocar um ou alguns dos amici curiae, pois não há por parte deles o direito de exigir sustentação
oral (Questão de Ordem no REsp nº 1.205.946/SP, Corte Especial, Relator Ministro Benedito
Gonçalves, em 17.8.2011)” – Informativo STJ nº 0481, 15 a 26 de agosto de 2011.

221
Maria Cecília de Araujo Asperti

presentam interesses convergentes com àqueles dos litigantes ocasionais terão


limitados poderes instrumentais para exercer, de fato, um direito de influir
no julgamento da tese repetitiva. Corre-se o risco de que essa via, voltada
à promoção de uma participação mais ampliada e plural, perca, na prática,
seu poder de influência, ou se transforme em mais uma oportunidade para
aferição de vantagens estratégicas para os litigantes habituais. Esse ponto será
abordado novamente no estudo de caso do Capítulo 6, em que são examina-
dos o perfil e o papel exercido pelos diferentes amici curiae que interviram no
julgamento em questão.

4.7.5. Audiência Pública


Finaliza-se esse item sobre a participação no julgamento de casos repetitivos
tratando da possibilidade de realização de audiências públicas, prevista expres-
samente no artigo 1.038, II, na esfera dos recursos repetitivos, e no artigo 983,
§1º, para o IRDR.
Embora revestida de certa novidade no STJ e no julgamento de casos repe-
titivos, a realização de audiências públicas não é uma inovação tão recente no
Judiciário brasileiro. Antes uma prática mais habitual do Poder Legislativo, as
audiências públicas tornaram-se mais frequentes na esfera administrativa (espe-
cialmente em questões relacionadas a estudos de impacto ambiental552) e, com
a Lei nº 9.868/1999, também no julgamento de controle de constitucionalidade
pelo STF553, ganhando espaço nas discussões acadêmicas sobre legitimação de-
cisória e representação democrática nos tribunais superiores554.

552 De acordo com a previsão inserta na Resolução nº 001/1986 do Conselho Nacional do Meio
Ambiente (CONAMA), em seu artigo 11, §2º: “Ao determinar a execução do estudo de impacto
ambiental e apresentação do RIMA, o estadual competente ou o IBAMA ou, quando couber o
Município, determinará o prazo para recebimento dos comentários a serem feitos pelos órgãos
públicos e demais interessados e, sempre que julgar necessário, promoverá a realização de audiência
pública para informação sobre o projeto e seus impactos ambientais e discussão do RIMA”.
553 Art. 20. § 1o Em caso de necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância de fato
ou de notória insuficiência das informações existentes nos autos, poderá o relator requisitar
informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a
questão ou fixar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas com experiência
e autoridade na matéria.
554 A esse respeito, vide, apenas à título de exemplo: MOREIRA, Diogo Rais Rodrigues. Audiência
Pública no Supremo Tribunal Federal. Dissertação de Mestrado em Direito. Pontifícia Universidade

222
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Conquanto a lei seja de 1999, a primeira audiência pública realizada no STF


foi apenas em 20 de abril de 2007, para discutir a Lei de Biossegurança na ADI
nº 3510. Como Diogo Rais Rodrigues Moreira comenta, até 2009 não havia um
procedimento normatizado na corte para realização das audiências, que foram
até então conduzidas “cada qual à maneira de seu relator”555.
Com a Emenda Regimental nº 29, de 18 de fevereiro de 2009, passou a se
prever a atribuição do Presidente ou do relator de convocar audiência pública
“para ouvir o depoimento de pessoas com experiência e autoridade em determi-
nada matéria, sempre que entender necessário o esclarecimento de questões ou
circunstâncias de fato, com repercussão geral e de interesse público relevante,
debatidas no âmbito do Tribunal”556. Quanto ao procedimento de designação e
condução da audiência, a emenda de 2009 também disciplinou, em seu artigo
154, Parágrafo Único, que:

i – o despacho que a convocar será amplamente divulgado e fixará prazo


para a indicação das pessoas a serem ouvidas;
ii – havendo defensores e opositores relativamente à matéria objeto da
audiência, será garantida a participação das diversas correntes de opinião;
iii – caberá ao Ministro que presidir a audiência pública selecionar as
pessoas que serão ouvidas, divulgar a lista dos habilitados, determi-
nando a ordem dos trabalhos e fixando o tempo que cada um disporá
para se manifestar;
iv – o depoente deverá limitar-se ao tema ou questão em debate;
v – a audiência pública será transmitida pela TV Justiça e pela Rádio Justiça

Em razão da delicadeza dos temas tratados e da publicidade dos deba-


tes, as audiências ganharam grande notoriedade, tranformando-se em uma
promessa de democratização do processo constitucional, ante a ampliação
da representação de interesses e o municiamento da corte com argumentos

Católica de São Paulo. São Paulo: 2012. DANTAS, Karoline Tarciane de Barros Campos. Jurisdição
Constitucional e Audiências Públicas: um instrumento a favor da democracia? Dissertação de Mestrado.
Universidade Católica de Pernambuco. Recife, 2014. TUSHNET, Mark. “New institutional
mechanisms for making Constitutional Law”. Social Science Research Network. Rochester: NY, 2
abr. 2015. Disponível em: <http://papers.ssrn.com/abstract=2589178>. Acesso em 11 dez. 2017;
SOMBRA, Thiago Luís Santos. “Supremo Tribunal Federal representativo? O impacto das audiências
públicas na deliberação”. Revista Direito GV. V. 31, n. 1, jan-abril 2017, FGV: São Paulo, p. 236-273.
555 MOREIRA, Diogo Rais Rodrigues, 2012, op. cit., p. 11-12.
556 Conforme redação do artigo 7º, inciso XVII, e do artigo 20, inciso XVII, do Regimento Interno do STF.

223
Maria Cecília de Araujo Asperti

não jurídicos relevantes557, contribuindo, ainda, para a melhor qualidade das


decisões judiciais558. Por meio das audiências, tinha-se a expectativa de uma
maior interação entre Estado e sociedade, além do rompimento do isolamento
do STF, permitindo o acompanhamento e, até mesmo, a fiscalização das ati-
vidades da suprema corte pela população559.
No entanto, passados mais de 10 anos desde a realização da primeira audi-
ência pelo STF, é possível assumir uma visão menos idealizada do seu papel,
identificando-se limitações e paradoxos, cuja análise, ainda que perfunctória
neste trabalho, pode ser proveitosa para se refletir sobre o uso dessa via no jul-
gamento de casos repetitivos.
Uma das críticas às audiências públicas realizadas pelo STF é quanto ao efe-
tivo acompanhamento das falas pelos demais ministros que comporão a turma
julgadora, juntamente com o relator. Conforme estudo empírico realizado por
Thiago Luís Santos Sombra, a média de ministros não relatores que frequentam
as sessões, é menor do que dois ministros por sessão, o que, a seu ver, corrobora
com o fato de a convocação das audiências ser um ato discricionário do relator,
não submetido à deliberação do colegiado560.
A consequência, naturalmente, é a pouca influência das exposições e
materiais apresentados na audiência nos votos dos ministros. Conforme o
mencionado autor, após realização de estudos de caso relativos às audiências

557 “Consideramos, todavia, que as audiências públicas têm funções ainda mais importantes.
Primeiramente, elas reduzem o isolamento do Tribunal, promovendo sua aproximação com a
sociedade civil e com a comunidade científica. Segundo, e tendo em vista inegáveis limitações no
que tange às capacidades institucionais da corte, as audiências reduzem as chances de decisões
equivocadas e mitigam o déficit de expertise dos ministros em questões de profundo conhecimento
técnico, já que, como agentes humanos, possuem eles limitações de conhecimento e também de
tempo, com prazos e questões formais envolvidas em suas atividades” (MEDINA, José Miguel Garcia;
FREIRE, Alexandre; FREIRE, Alonso. “Audiência pública tornou-se instrumento de legitimidade”.
Conjur. Edição de 4 jul. 2013. Disponível em <https://www.conjur.com.br/2013-jul-04/audiencias-
publicas-tornaram-stf-instrumento-legitimidade-popular>, acesso em 11 dez. 2017).
558 SOMBRA, Thiago Luís Santos, 2017, op. cit., p. 238-240.
559 SOMBRA, Thiago Luís Santos, 2017, op. cit., p. 239.
560 SOMBRA, Thiago Luís Santos. “Supremo Tribunal Federal representativo? O impacto das
audiências públicas na deliberação”, 2017, p. 245. Também nos estudos de caso realizados por Diogo
Rais Rodrigues Moreira é possível verificar a problemática da ausência dos ministros durante as
audiências públicas estudadas (MOREIRA, Diogo Rais Rodrigues, 2012, op. cit., p. 67-108).

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

sobre a proibição do amianto561 e proibição das queimadas em canaviais562, os


votos dos demais ministros fizeram, quando muito, menções pontuais às falas
e informações trazidas na audiência pública, que na sua maioria não foram
conclusivas e nem apresentavam o contexto e contrapontos aos argumentos
apresentados pelos expositores563.
Tem-se, portanto, que essa via de participação é colocada pela corte como
uma abertura para participação de especialistas (“pessoas com experiência e au-
toridade”), a serem convocadas mediante conveniência do relator (ou do Pre-
sidente) para esclarecimento de questões ou circunstâncias fáticas em casos de
grande repercussão e relevância social. No entanto, essa expectativa não se re-
aliza quando se verifica o pouco impacto das audiências públicas tiveram em
termos de qualidade e embasamento das decisões prolatadas nos casos em que
foram realizadas. A crítica que se faz é a de que as audiências correm o risco de
se tornar um mero instrumento de legitimação formal das decisões do STF, sem
que haja, de fato, uma efetiva ampliação da participação social ou um aprimo-
ramento das deliberações das cortes em assuntos técnicos ou não jurídicos564.
Tais considerações são de suma importância para analisarmos o papel que
as audiências públicas podem desempenhar no julgamento de casos repetitivos,
assim como as suas limitações e problemáticas.
A uma, porque o regramento interno do STF é aplicável aos recursos ex-
traordinários repetitivos, do que se denota que o critério para convocação de
audiências públicas nesse âmbito também deverá observar a relevância social e
especialidade da matéria, a serem avaliados à critério do relator. Também pode
se conjecturar que, ao âmbito desta corte, as práticas e críticas identificadas
nas audiências já realizadas sejam pertinentes, dado que as audiências dos casos

561 ADI nº 3.937, audiência realizada em 24 a 31 de agosto de 2012, Relator Ministro Marco Aurélio.
562 RE nº 586.224/SP, audiência realizada em 22 de abril de 2013, Relator Ministro Luiz Fux
563 SOMBRA, Thiago Luís Santos, 2017, op. cit., p. 250, 258-259.
564 “As audiências públicas, embora destinadas a esclarecer questões técnicas, administrativas,
políticas, econômicas e jurídicas, tornaram-se, de acordo com orientação hoje preponderante no
Tribunal, instrumento de legitimidade, menos por força dos argumentos colhidos em tais audiências
(muitas vezes desprezados, quando do julgamento da ação pelo Tribunal), e mais por propiciar
a participação de pessoas e entidades que, de algum modo, representariam a sociedade (ou os
destinatários da decisão a ser proferida pelo STF) na criação da solução jurídica no processo de
controle de constitucionalidade” (MEDINA, José Miguel Garcia; FREIRE, Alexandre; FREIRE,
Alonso, 2013, op. cit.).

225
Maria Cecília de Araujo Asperti

repetitivos seguirão o mesmo procedimento e aproveitarão da experiência do


histórico já existente.
Para além disso, as audiências públicas também são colocadas como elemen-
to de legitimação das técnicas de julgamento de casos repetitivos, como uma via
de ampliação da participação que permita a coleta de depoimentos e informa-
ções de especialistas na matéria discutida565. Assim, as ponderações realizadas
pelos estudos relativos às audiências públicas no STF permitem questionar se
essa via realmente é capaz de legitimar a mitigação da participação direta das
partes na formação provocada de uma tese jurídica, proporcionando um debate
verdadeiramente plural e aprofundado sobre a matéria.
Por fim, é possível os parâmetros do Regimento Interno do STF e o histórico
da corte podem ser úteis para se interpretar os critérios para designação, para
admissão dos expositores e demais procedimentos atinentes à audiência pública
no caso para os casos repetitivos.
Nesse sentido, o Regimento Interno do STJ também passou a prever,
com a Emenda Regimenal nº 22, de 2016, a possibilidade específica de de-
signação de audiência pública, a ser convocada pelo Presidente ou pelo re-
lator “para ouvir pessoas ou entidades com experiência e conhecimento em
matéria de interesse para a fixação ou alteração de tese repetitiva ou de
enunciado de súmula” (artigo 185).
Não se tem clareza se a experiência ou o conhecimento que se busca com a
audiência pública sobre a matéria de interesse seria pertinente às circunstâncias
fáticas nas quais a questão jurídica está inserida, tal como previsto no Regimen-
to Interno do STF, ou à matéria jurídica em si, ampliando-se o foro de discussão
sobre a interpretação das questões jurídicas afetadas para julgamento para além
dos autos. Os especialistas seriam, no caso dessa audiência dos repetitivos, de-
tentores de conhecimentos/experiência técnicos ou jurídicos?

565 DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro, 2016, op. cit., p. 610.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Ainda que a disposição expressa sobre audiências públicas em julgamen-


to de casos repetitivos tenha sido inserida somente com o CPC/2015, tem-se
que até a entrega do presente trabalho duas audiências públicas já haviam
sido realizadas no STJ em julgamento de recursos especiais repetitivos566:
a primeira referente ao Tema nº 710 (Recurso Especial nº 1.419.697/RS e
Recurso Especial nº 1.457.199/RS), sobre o sistema de scoring de crédito e
ao Tema nº 898 (Recurso Especial nº 1.483.620/SC), e a segunda acerca do
termo inicial da incidência de atualização monetária para as indenizações
do Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via
Terrestre (DPVAT).
Após a entrada em vigor do CPC/2015, foi realizada a audiência pública
atinente ao Tema nº 938 (Recurso Especial nº 1.599.511/SP e Recurso
Especial nº 1.551.956/SP), em que se discutiu a cobrança da taxa de cor-
retagem e da taxa SATI em contratos de promessa de compra e venda de
unidades autônomas.
Abaixo, seguem as informações a respeito dessas três audiências, com a des-
crição da questão submetida a julgamento e da tese jurídica firmada:

566 Há notícias de audiências públicas realizadas no julgamento de IRDRs nos diferentes


tribunais, muito embora esse dado não seja unificado para consulta. Alguns exemplos: (i)
TJMG, IRDR nº IRDR 1.0000.16.032797-9/000, para definir se se candidatos em concursos
para carreiras militares que estão respondendo a processo administrativo ou judicial podem
ou não se matricular em cursos especiais de formação (realizada em 08.05.2017); (ii) TRF4,
IRR nº 5026813-68.2016.4.04.0000, sobre a possibilidade de extensão do adicional de 25% para
beneficiários que necessitam de cuidador intermitente para outros tipos de benefícios (realizada
em 02.06.2017); (iii) TJMA, IRDR nº 53.983/2016, sobre questões atinentes a empréstimos
consignados (realizada em 16.10.2017); e (iv) TJCE, IRDR nº 8515565-07.2016.8.06.0000,
para discutir a possibilidade de admissão de médicos, sem processo seletivo, nos quadros de
cooperativa médica (realizada em 07.08.2017).

227
Maria Cecília de Araujo Asperti

Tabela 2 – Temas e recursos especiais repetitivos em que foram realizadas audiências


públicas no STJ até março/2017.

Tema e recurso representativo da Questão submetida Tese jurídica firmada


controvérsia a julgamento
Tema 710 “Discussão acerca da natureza dos “I - O sistema ‘credit scoring’ é um
sistemas de scoring e a possibilidade de método desenvolvido para avaliação
REsp 1419697/RS violação a princípios e regras do Código do risco de concessão de crédito,
de Defesa do Consumidor capaz de gerar a partir de modelos estatísticos,
REsp 1457199/RS indenização por dano moral”. considerando diversas variáveis, com
atribuição de uma pontuação ao
Audiência pública realizada em consumidor avaliado (nota do risco
25.08.2014. de crédito).

II - Essa prática comercial é lícita,


estando autorizada pelo art. 5º, IV, e
pelo art. 7º, I, da Lei n. 12.414/2011
(lei do cadastro positivo).

III - Na avaliação do risco de crédito,


devem ser respeitados os limites
estabelecidos pelo sistema de pro-
teção do consumidor no sentido da
tutela da privacidade e da máxima
transparência nas relações negociais,
conforme previsão do CDC e da
Lei n. 12.414/2011.IV - Apesar de
desnecessário o consentimento do
consumidor consultado, devem ser
a ele fornecidos esclarecimentos,
caso solicitados, acerca das fontes
dos dados considerados (histórico de
crédito), bem como as informações
pessoais valoradas.

V - O desrespeito aos limites legais


na utilização do sistema ‘credit
scoring’, configurando abuso no
exercício desse direito (art. 187 do
CC), pode ensejar a responsabilidade
objetiva e solidária do fornecedor do
serviço, do responsável pelo banco de
dados, da fonte e do consulente (art.
16 da Lei n. 12.414/2011) pela ocor-
rência de danos morais nas hipóteses
de utilização de informações exces-
sivas ou sensíveis (art. 3º, § 3º, I e II,
da Lei n. 12.414/2011), bem como nos
casos de comprovada recusa indevida
de crédito pelo uso de dados incorre-
tos ou desatualizados”

228
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

898 “Controvérsia referente à atualização “A incidência de atualização mone-


monetária das indenizações previstas tária nas indenizações por morte ou
REsp 1483620/SC no art. 3º da Lei 6.194/74, com reda- invalidez do seguro DPVAT, prevista
ção dada pela Medida Provisória n. no § 7º do art. 5º da Lei n. 6194/74,
Audiência pública realizada em 340/2006, convertida na Lei 11.482/07” redação dada pela Lei n. 11.482/2007,
09.02.2015 opera-se desde a data do evento
danoso”
938 “Discussão quanto à: (i) prescrição da “(i) Incidência da prescrição trienal
pretensão de restituição das parcelas sobre a pretensão de restituição dos
REsp 1599511/SP pagas a título de comissão de corretagem valores pagos a título de comissão
e de assessoria imobiliária, sob o funda- de corretagem ou de serviço de
REsp 1551956/SP mento da abusividade da transferência assistência técnico-imobiliária
desses encargos ao consumidor; e quanto (SATI), ou atividade congênere
Audiência pública realizada à (ii) validade da cláusula contratual que (artigo 206, § 3º, IV, CC). (vide REsp
09.05.2016. transfere ao consumidor a obrigação de n. 1.551.956/SP) (ii) Validade da
pagar comissão de corretagem e taxa de cláusula contratual que transfere ao
assessoria técnico-imobiliária (SATI)” promitente-comprador a obrigação
de pagar a comissão de corretagem
nos contratos de promessa de compra
e venda de unidade autônoma em
regime de incorporação imobiliária,
desde que previamente informado o
preço total da aquisição da unidade
autônoma, com o destaque do valor
da comissão de corretagem; (vide
REsp n. 1.599.511/SP)(ii, parte
final) Abusividade da cobrança pelo
promitente-vendedor do serviço
de assessoria técnico-imobiliária
(SATI), ou atividade congênere,
vinculado à celebração de promessa
de compra e venda de imóvel. (vide
REsp n. 1.599.511/SP)”

Fonte: Dados obtidos no site do STJ. Elaboração própria.


Esses três casos estavam sob relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseve-
rino567, da 2ª Seção do STJ, que motivou de forma idêntica as decisões em que
determinou a realização da audiência pública nesses três casos:

“Considerando o número elevado de demandas sobre o mesmo tema, a


necessidade de uma abordagem técnica, bem como o grande número de
interessados no julgamento da questão, considero valiosa e necessária a
realização de Audiência Pública, com vistas a municiar esta Corte com
informações indispensáveis para o deslinde da controvérsia”

567 O Ministro Paulo de Tarso Sanseverino foi presidente da Comissão Temporária Gestora de
Precedentes, conforme Portaria STJ/GV n. 475 de 11 de novembro de 2016. A Portaria STJ/GV
n. 299 de 19 de julho de 2017 altera a composição da comissão, porém mantém o ministro como
seu presidente.

229
Maria Cecília de Araujo Asperti

Como se vê, o ministro embasou sua decisão na (i) necessidade de se ouvir


especialistas técnicos (uma abordagem técnica seria, ao que tudo indica, distin-
ta de uma puramente jurídica) e (ii) de ampliar a participação dos interessados
no julgamento da questão.
Entretanto, tomando-se em conta os entes e pessoas que foram de fato admi-
tidos na audiência pública referente ao estudo de caso desenvolvido no Capítulo
6 (sobre o Tema nº 71), tem-se um predomínio entidades voltadas à defesa de
interesses coerentes com os litigantes habituais em contraposição com associa-
ções de defesa de direitos do consumidor, representadas, em sua maioria, por
advogados, que ficaram responsáveis pelas apresentações nas audiências, além
da participação do Ministério Público e da Defensoria Pública568. A análise dos
argumentos discutidos também demonstra que, embora a discussão tenha sido
predominantemente jurídica, foram apresentados elementos técnicos, especial-
mente acerca do funcionamento do sistema por parte das empresas que o dispo-
nibilizam no mercado, que foram decisivos ao julgamento da tese jurídica, acar-
retando, inclusive, uma sensível mudança no posicionamento até então adotado
nos julgamentos do próprio STJ e dos tribunais de justiça sobre a matéria.
Quanto à paridade de participação entre posicionamentos diversos nas
audiências, o Regimento do STJ prevê expressamente que “será garantida a
participação de pessoas ou de entidades que defendam diferentes opiniões
relativas à matéria objeto da audiência pública” (artigo 186, §4º, inciso II), o
que denota ao menos uma tentativa de assegurar a pluralidade representativa
na audiência pública.
Retomando novamente o histórico das audiências já realizadas no STF,
Thiago Luis Santos Sombra observa que a despeito da falta de clareza nos cri-
térios para convocação e admissão dos participantes, as audiências públicas até
então realizadas contaram com um número e perfil adequado de participantes,
que representaram, de forma paritária, os diversos posicionamentos em jogo,
sem que se pudesse observar o predomínio de determinados entes ou grupos
economicamente dominantes569.

568 A análise dos participantes da referida audiência pública é pormenorizada no Capítulo 6, no item 6.2.8.
569 “No tocante ao perfil, a pesquisa revelou que o número de participantes selecionados que se
manifesta em favor de um posicionamento ou de outro é bem distribuído e equilibrado pelos
próprios relatores antecipadamente, o que evidencia uma preocupação de paridade de armas. (...)
Ademais, os dados disponíveis não autorizam a conclusão em torno da existência de qualquer
situação de predomínio de poder econômico de alguns participantes em relação a outros. E, dentre

230
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Do mesmo modo, ao menos em termos da participação (e não da influência),


também pudemos verificar que na convocação e admissão dos participantes da
audiência pública realizada pelo STJ no caso analisado foi observado o critério
disposto na norma interna, permitindo-se a paridade de falas entre represen-
tantes, de um lado, das empresas prestadoras de serviços de score de crédito,
seguradoras e incorporadoras e construturas e, de outro, dos consumidores,
segurados e promitentes compradores, considerando que as matérias em que
foram realizadas audiências570.
Finalmente, em termos da qualidade da participação dos entes convocados e
admitidos, é pertinente a crítica de Edilson Vitorelli quanto ao “engessamento”
das audiências públicas e à reduzida oportunidida de participação efetiva da-
queles que serão afetados pelas deliberações a serem tomadas571. Em audiências
realizadas no âmbito administrativo, por exemplo, constata-se uma tendência
de autoritarismo em sua condução, com o predomínio de manifestações téc-
nicas, muitas vezes ininteligíveis aos presentes. Há, também, um problema de
condução quando o número de interessados é elevado, tumultuando o evento
e tornando a discussão improdutiva. Constata-se, ainda, a falta de diálogo nos
eventos, que acabam adquirindo uma estrutura expositiva, fazendo com que os
interessados sejam, no máximo, ouvintes de fatos e informações apresentados
com uma vestimenta de imparcialidade, muito embora trazidos por entes e or-

os selecionados para participar, os profissionais mais ouvidos se identificaram como médicos,


professores e engenheiros (“Supremo Tribunal Federal representativo? O impacto das audiências
públicas na deliberação”, 2017, p. 246).
570 É relevante, no entanto, a crítica de Edilson Vitorelli sobre a efetiva participação dos grupos
e indivíduos interessados em audiências públicas, ainda que no âmbito do processo coletivo,
questionando-se, com isso, o caráter efetivamente participativo da audiência pública: “Nesses termos,
é possível concluir que as audiências públicas têm limitações que impedem que sejam eficazmente
utilizadas em qualquer tipo de contexto, processual ou extraprocessual. Tais limitações decorrem
tanto de problemas inerentes ao modelo – impossibilidade de se colher opiniões de um grande
número de pessoas e de produzir uma discussão qualificada – quanto da forma como são conduzidas.
Outro elemento a ser considerado é a falta de interesse do público em participar da audiência, o qual
é reforçado pelos defeitos de organização. As autoridades encarregadas da convocação, quando se
fazem presentes, estão mais interessadas em expor seus pontos de vista do que em ouvir o que um
‘qualquer do povo’ tem a dizer. Assim, não é de se esperar que pessoas comuns deixem suas atividades
cotidianas para se envolver em eventos nos quais são vistas como participantes secundários, com
oportunidades de fala limitadas ou inexistentes. Fazer com que as pessoas compareçam exige que
elas saibam o que está em jogo no processo, bem como que acreditem que o tempo despendido será
justificado por uma possibilidade de efetivamente influenciar na decisão” (2016, op. cit. p. 481).
571 VITORELLI, Edilson, 2016, op. cit., p. 476-483.

231
Maria Cecília de Araujo Asperti

ganizações efetivamente interessados no desfecho da deliberação. O controle


e a discricionariedade da autoridade organizadora (no caso aqui discutido, os
tribunais) quanto à convocação, admissão de expositores e controle do tempo
de fala seria também um fator de desestímulo à participação dos interessados.
Essas limitações são, sem dúvida, de grande relevância para discutirmos
também as audiências públicas realizadas no âmbito do julgamento de casos re-
petitivos. Com efeito, o próprio Regimento Interno do STJ dispõe que “respeita-
da a prerrogativa dos advogados e dos membros do Ministério Público, nenhum
dos presentes se dirigirá ao Presidente da audiência, a não ser de pé e com a
sua licença” (artigo 186, §1º). Além disso, o relator têm total discricionariedade
para selecionar quem será ouvidor, atribuir tempos de fala, e conduzir, de modo
geral, a audiência (artigo 186, inciso III). Nas audiências analisadas, não houve
nenhuma particpiação por parte de um interessado diretamente.
Com isso, não se pode afirmar que a audiência pública servirá, no caso
do julgamento de casos repetitivos, como uma instância efetivamente par-
ticipativa e de debate, bem como de escuta e diálogo com aqueles que serão
diretamente afetados pela tese jurídica a ser firmada. O evento pode acabar
se tornando, em realidade, uma oportunidade de sustentação oral ampliada
daqueles que já poderiam intervir (e muitas vezes de fato o fazem) como ami-
cus curiae no processo. Resta investigar mais afundo o perfil dos participantes
e a natureza das informações por eles expostas, bem como a influência dessa
participação no julgamento das teses repetitivas. É o que se propõe no estudo
de caso realizado no Capítulo 6.

4.8. Recorribilidade das decisões proferidas no incidente


ou no recurso repetitivo
Outro ponto a ser abordado é quanto às possibilidades de revisão da tese jurí-
dica, seja pela via recursal, seja por meio do procedimento previsto no artigo 986.
Acerca da recorribilidade propriamente dita, uma questão central reside na
legitimidade dos interessados (os “sobrestados” e os “ausentes”) para interpor
recursos em face do acórdão que julga o IRDR ou o recurso especial ou ex-
traordinário repetitivo, bem como contra decisões proferidas no curso desse
procedimento, tais como a decisão de afetação do recurso representativo da

232
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

controvérsia ou de admissibilidade do IRDR 572, e que pode determinar (e em


regra o faz) o sobrestamento de processos e recursos sobre a matéria e eventuais
decisões acerca da sua própria intervenção no feito (como o indeferimento da
apresentação de manifestações escritas ou orais).
A esse respeito, retoma-se o posicionamento quanto à existência de interes-
se jurídico dos “interessados”, inobstante serem considerados ou não assistentes
ou qualquer outra figura interventiva reconhecida pela lei processual. Devem,
com toda razão, serem considerados terceiros prejudicados, consoante a locução
do artigo 996, a quem é conferida a legitimidade recursal, uma vez demonstrada
a possibilidade de a decisão atingir um direito que alegue ser titular, ou que
possa discutir na condição de substituto processual.
Como ensina Cândido Dinamarco, o conceito de “terceiro prejudicado”,
para fins de legitimação recursal, pode ser considerado ainda mais amplo que o
de terceiro juridicamente interessado (ainda que se adote a concepção de que
esse interesse jurídico reside na conexão entre as relações jurídicas substan-
ciais), na medida em que alude àqueles que poderão ser juridicamente prejudica-
dos pelos efeitos da sentença, decisão ou acórdão, ainda que indiretamente573.
Afirma que “o interesse jurídico do terceiro que recorre é a remoção de um
julgado que de algum modo constitua concreto precedente sobre seus interesses
jurídico-materiais (relação de prejudicialidade)” 574.
Fica claro, assim, que se os “sobrestados” e ausentes podem ser considerados
terceiros juridicamente interessados, que são também, para todos os fins, tercei-
ros prejudicados, possuindo legitimidade e interesse para recorrer das decisões
prolatadas no curso do IRDR ou do julgamento de recursos repetitivos. E isso
independentemente de se considerar que a decisão conformará um precedente
ou acarretará a preclusão da questão decidida. Qualquer que seja a perspectiva

572 Concordamos com Luiz Guilherme Marinoni quando este afirma a decisão que admite o IRDR deve
ser sujeita a recursos, inobstante o artigo 987 falar no cabimento de recurso especial e extraordinário
“do julgamento do mérito”: “Portanto, a norma constitucional atribui ao Superior Tribunal de
Justiça, mediante recurso especial, a incumbência de definir o sentido da lei federla e a intepretação
que deve prevalecer em caso de divergência entre tribunais é clara evidência de que uma norma do
Código de Processo Civil não pode graciosamente afirmar que, proferida uma decisão em processo
de larga importância, como o incidente de resolução de demandas repetitivas, não é possível tentar
discutir, mediante especial, decisão de caráter processual” (2016b, op. cit., p. 122).
573 DINAMARCO, Cândido Rangel, 2017, op. cit., p. 457-458.
574 DINAMARCO, Cândido Rangel, 2017, op. cit., p. 457.

233
Maria Cecília de Araujo Asperti

adotada a esse respeito, não há como negar o interesse recursal desse terceiro
que terá sua pretensão atingida pela tese jurídica a ser firmada.
Tal entendimento é convergente com a Enunciado nº 94 do Fórum Perma-
nente de Processualistas Civis, que, ao interpretar o artigo 982, §4º, e o artigo
987, consignou que “a parte que tiver o seu processo suspenso nos termos do
inciso I do art. 982 poderá interpor recurso especial ou extraordinário contra o
acórdão que julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas”. Entende-
-se, apenas, que essa legitimidade não é condicionada a intervenção anterior do
interessado na condição de assistente, tampouco ao sobrestamento do processo
em que o interessado seja parte ou, sequer ao fato deste já estar envolvido em
uma demanda em trâmite. Como se viu, a legitimidade e interesse de recorrer
decorre, nesse caso, da possibilidade de a tese jurídica afetar ou atingir “direito
de que se afirme titular” – ou seja, não há a necessidade de já haver uma de-
manda em trâmite ou de o terceiro já ter de algum modo intervido no procedi-
mento de julgamento de casos repetitivos575.
Também se evidencia que, caso se discuta uma questão de direito oriunda
de conflitos considerados coletivos, os legitimados para ação coletiva terão tam-
bém legitimidade para recorrer das decisões, na condição de substitutos proces-
suais576. Do mesmo modo, a legitimidade recursal é conferida ao amicus curiae,
como já discutido no item 4.7.5, dada a disposição expressa do artigo 138, §3º577,
do CPC/2015. É nesse sentido que Aluisio Gonçalves de Castro Mendes atribui
a legitimidade recursal, no âmbito do IRDR, ao Ministério Público e à Defen-
soria Pública (desde que existam interessados hipossuficientes); às partes dos
processos que deram origem ao IRDR; aos amici curiae; e aos demais interessa-

575 Sofia Temer também discute a peculiar hipótese de uma parte em outra demanda em que se discuta
a tese jurídica interpor um recurso (ou aquilo que poderia ser entendido como um requerimento”)
para estender a tese firmada em IRDR para o âmbito nacional, e sustena que poderia haver nesse
caso uma peculiar interpretação do interesse e da legitimidade recursal, calcadas no interesse de se
ver a tese firmada em determinado tribunal estadual ou regional sendo aplicada em âmbito federal,
consoante o disposto no artigo no artigo 982, §3º (2017, op. cit., p. 264-266). Mais uma razão, a
nosso ver, para se entender que os interessados possuem legitimidade recursal também quando a tese
jurídica atinge seu direito.
576 MEIRELES, Edilton. “Do incidente de resolução de demandas repetitivas no processo civil brasileiro”
In DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Julgamento de casos Repetitivos. Coleção
Grandes Temas do Novo CPC. Vol. 10. Salvador: JusPodium, 2017, p. 65-138, p. 130.
577 Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha acrescentam que a legitimidade recursal do amicus
curiae não ficaria restrita à decisão proveniente do IRDR, devendo também ser aplicada em caso de
decisão que julgue recurso repetitivo (2016, op. cit., p. 613).

234
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

dos, que seriam, a seu ver, as partes dos processos “que estejam dependendo da
resolução da questão controversa a ser decidida no IRDR” e “todos os titulares
de direito, deveres ou obrigações que possam depender da resolução da questão
posta a ser elucidade no incidente”578.
A despeito desses sólidos posicionamentos a favor de se conferir legitimidade
recursal aos intervenientes, aos “sobrestados” e aos ausentes, verifica-se, na prá-
tica, certa resistência dos julgadores às intervenções dos interessados, especial-
mente no tocante à recursos interpostos ao longo da tramitação do incidente
ou do recursos repetitivo. À exemplo, no caso sobre cobrança de taxa de corre-
tagem e taxa SATI, o ministro relator indeferiu a intervenção de pessoas físicas
que não fossem consideradas especialistas e negou conhecimento a recursos
apresentados por indivíduos (promitentes compradores579) no processo, sob o
argumento de que não seriam parte ou teriam a representatividade adequada
para figurar como amicus curiae no feito.

4.9. Revisão da tese jurídica (“overruling”)


Finalmente, cumpre abordar, ainda que pontualmente, as possibilidades de
participação no procedimento previsto para revisão da tese jurídica, conforme
disposto, precipuamente, no artigo 927, §§2º a 4º e no artigo 986 (com relação
ao IRDR, especificamente).
Da leitura desses dispositivos, extrai-se que a revisão da tese jurídica poderá
ocorrer incidentalmente e de ofício, ou mediante provocação do Ministério Pú-
blico ou da Defensoria Pública (que são os legitimados previstos no artigo 977,
inciso III), especificamente no caso do incidente. Fredie Didier Jr. e Leonardo
Carneiro da Cunha entendem, no entanto, que a legitmidade desses entes para
revisão da tese jurídica também pode ser aplicada ao julgamento dos recursos

578 MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 232.


579 “Não conheço dos embargos de declaração opostos por RODRIGO MARTINS DE SOUZA E
OUTRA (fls. 1745/1798), uma vez que os embargantes não são partes tampouco amici curiae neste
procedimento recursal” (Decisão de 03.11.2015 no Recurso Especial nº 1551956/SP). Compulsando
os autos, verifica-se que os Embargantes são autores em uma demanda individual em que pleiteiam
a "[...] devolução do valor pago a título de assessoria imobiliária, no valor de R$ 3.950,00 (três mil
novecentos e cinqüenta reais), devidamente atualizados” (Proc. nº 0036387-63.2014.8.16.0014), que
fora sobrestado pela 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Paraná em razão da afetação do
Recurso Especial Repetitivo em questão.

235
Maria Cecília de Araujo Asperti

repetitivos, consoante a visão dos autores de se haver um “microssistema de


julgamento de casos repetitivos” no CPC/2015580.
Assim como no caso da arguição de distinção prevista no artigo 1.037, §9º,
vislumbram-se também dificuldades de interpretação da possibilidade de revi-
são da tese jurídica, dadas as distinções, já arguidas, entre as técnicas de julga-
mento de casos repetitivos e o sistema de precedentes.
A revisão ou superação entendimentos jurisprudenciais ou de teses jurídicas
a que o artigo 927 faz referência alude ao overruling da common law, ou à possi-
bilidade de revogação de precedentes que deixem de corresponder aos “padrões
de congruência social e consistência sistêmica”, ou às proposições morais, polí-
ticas e de experiência, de tal modo que a sua preservação, em nome da estabili-
dade e da isonomia dos julgamentos, não se mostra mais justificável581. No caso
brasileiro, prevê-se a modificação de “enunciado de súmula, de jurisprudência
pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos”, o que deverá
ser avaliado em acordo com os “princípios da segurança jurídica, da proteção da
confiança e da isonomia” (artigo 927, §4º).
Como já discutido neste capítulo, não parece que o sistema de precedentes
possa explicar satisfatoriamente a racionalidade e procedimentos aplicáveis às
técnicas de julgamento de casos repetitivos. Uma das distinções fundamentais
– e que se aplica à questão da revisão da tese jurídica – é o fato de o precedente
ser fruto da autoridade dos fundamentos relevantes das decisões proferidas pe-
las cortes, não sendo formulado deliberadamente para resolver casos já existen-
tes: surge naturalmente, em decorrência da autoridade da corte, da pertinência
e da repercussão das rationes decidendi de suas decisões.
Assim, o precedente não se presta a conferir uma solução normativa e abs-
trata conformada a partir de múltiplos casos pendentes, mas a emprestar um
significado ao direito considerando os valores morais e sociais vigentes, com a
perspectiva de que esse significado será estável e perdurará até quando for con-
gruente com os padrões que conformaram a sua consolidação. Nestes termos, a
revogação de um precedente é inerente ao seu processo de formação e aplicação
– a Corte que o editou poderá avaliar, em um caso concreto e a partir dos de-
bates realizados pelas partes e entre estas e os julgadores, que seu entendimento

580 DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da, 2017, op. cit., p. 614.
581 MARINONI, Luiz Guilherme, 2016a, op. cit., p. 251-252.

236
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

precisa ser revisto, seja por estar superado, seja por um manifesto equívoco no
raciocínio que conduziu a sua elaboração582.
Daí porque, ao se raciocinar pela lógica do overruling, causa estranhamento
que as partes de um processo futuro não possam suscitar um debate sobre a
necessidade de revogação ou de superação do precedente no caso concreto,
demonstrando sua incongruência com os valores vigentes ou um equívoco em
sua formulação. E mais: que ao Ministério Público e à Defensoria Pública seja
assegurada essa prerrogativa, com fulcro em um interesse institucional, mas não
às partes, que possuem um interesse subjetivo na revisão da tese, como se esta
não fosse afetar concretamente a parte do processo em que é aplicada583.
Deste modo, a previsão do artigo 986 (e partindo-se aqui o entendimento
de que essa previsão pode ser aplicada também aos recursos repetitivos) parece
desafiar a lógica do sistema de precedentes, ao estipular que apenas os julgado-
res, o Ministério Público e a Defensoria Pública possam suscitar a necessidade
de revisão da tese jurídica.
Por óbvio que a análise da pertinência da revisão da tese jurídica cabe unica-
mente ao órgão que a firmou, mas a iniciativa de se provocar a revisão não pode
ficar restrita a esses órgãos. Veja-se, ainda, outra incoerência: o Ministério Público
e a Defensoria Pública, em tese, participaram do procedimento em que a tese ju-
rídica foi firmada, e mesmo assim detêm a prerrogativa de incitar a sua revisão, ao
passo que as partes de processos futuros não poderiam fazer o mesmo584.
Assim, retomando-se o entendimento pelo qual a tese jurídica aproxima-se
de uma eficácia preclusiva face às questões jurídicas decididas, parece claro que
a iniciativa de provocação de sua revisão ou superação não pode ficar restrita

582 MARINONI, Luis Guilherme, 2017b, op. cit., p. 109-111.


583 MARINONI, Luis Guilherme, 2017b, op. cit., p. 110.
584 Aluisio Gonçalves de Castro Mendes remonta ao histórico da tramitação do Projeto de Lei do Senado
nº 166, de 2010 (nº 8.046/2010, na Câmara dos Deputados) para apontar que, no texto efetivamente
aprovado pelo Senado Federal, o artigo 977 continha apenas dois incisos, sendo que o inciso II
arrolava como legitimados as partes, o Ministério Público e a Defensoria Pública. A mudança no
texto para desmembramento dos incisos II e III do artigo 977 teria ocorrido no interregno entre
a aprovação do texto e a sua submissão à sanção presidencial. Desse modo, a possibilidade de se
pleitear a revisão da tese também deveria ser estendida às partes, interpretação esta que o autor julga
ser mais consentânea com a intenção do legislador: “Portanto, salvo melhor juízo, a interpretação da
norma deve levar em consideração o teto efetivamente aprovado, em razão da modificação redacional
posteriomente realizada ter exorbitado em relação às mudanças efetuadas nos dois dispositivos, que
acabaram efetivamente alternado o alcance em termos de legitimidade para revisão (MENDES,
Aluisio Gonçalves de Castro, 2017, op. cit., p. 249-250).

237
Maria Cecília de Araujo Asperti

aos julgadores e às instituições do sistema de justiça. E ainda que se tente apro-


ximar as técnicas de julgamento de casos repetitivos com o sistema de prece-
dentes, essa conclusão também se confirma.
As partes de processos em que a questão jurídica seja discutida e a tese
jurídica aplicada têm de poder incitar a revisão do entendimento formulado585.
Caso o órgão julgador entenda pela necessidade de revisitar esse entendimento,
poderá instigar, de ofício, a instauração de um IRDR ou a afetação do recur-
so como representativo da controvérsia. Caso contrário, consoante o dever de
fundamentação regulado pelo artigo 489, §1º, do CPC/2015, deverá motivar
adequadamente a razão pela qual entende ser inadmissível a revogação da tese
jurídica, enfrentando os argumentos deduzidos pela parte.

585 Luiz Guilherme Marinoni também defende que as partes de processos futuros (ou seja, os ausentes)
possam instigar a revisão da tese jurídica firmada em IRDR, mas assevera que essa oportunidade
estaria aberta somente àqueles que não participaram diretamente ou indiretamente (mediante a
representação de algum legitimado para tutela coletiva, como ele propõe) no julgamento do incidente.
Para o autor, que entende que a tese jurídica produz coisa julgada quanto às questões prejudiciais
decididas, somente quem não participou do IRDR poderá arguir fundamentos que não tenham
sido discutidos e decididos durante o julgamento do IRDR. Os titulares de direitos que ajuizarem
demandas futuras (“processos futuros”, conforme locução do artigo 986 do CPC/2015) poderiam,
certamente, instigar a revisão da tese jurídica, não lhe sendo oponível a eficácia preclusiva da coisa
julgada quanto a matéria dedutível (artigo 508 do CPC/2015) (MARINONI, Luis Guilherme, 2017,
op. cit., p. 117).

238
5. Litigantes Repetitivos
e Ocasionais no STJ

5.1. Estudo empírico-jurisprudencial: objetivo


e metodologia
Se no capítulo anterior foram levantadas diversas questões problemáticas
atinentes à racionalidade processual das técnicas de julgamento de casos re-
petitivos, cabe, nessa etapa do trabalho, investigar empiricamente algumas
dessas preocupações.
Esse estudo empírico foi realizado em duas fases: um levantamento empíri-
co-jurisprudencial de todas as questões jurídicas apreciadas em sede de recurso
especial repetitivo pelo STJ desde a criação deste procedimento, em 2008, até
março de 2017, e um estudo de caso mais aprofundamento sobre o julgamento,
também em sede de recurso especial repetitivo, da questão atinente “à natureza
dos sistemas de scoring e a possibilidade de violação a princípios e regras do
Código de Defesa do Consumidor capaz de gerar indenização por dano moral”
(vide Capítulo 6, a seguir).
Nessa primeira etapa, objetivou-se o delineamento de um panorama da uti-
lização das técnicas do recurso especial repetitivo para analisar os temas discu-
tidos, atores envolvidos, tempo transcorrido entre a afetação do tema e a con-
solidação da tese jurídica com o trânsito em julgado. Também por meio dessa
análise é que se buscou apontar se as teses jurídicas firmadas foram, primordial-
mente, favoráveis aos interesses dos litigantes ocasionais ou dos litigantes repe-
titivos. Essa foi, sem dúvida, a questão mais complexa enfrentada nessa etapa da
pesquisa, e que demandou uma análise mais detida das questões submetidas a
julgamento, do perfil das partes envolvidas e das implicações das teses jurídicas
firmadas pela corte.
A opção por focar a pesquisa empírica no recurso especial repetitivo ad-
vém do fato de ser este um mecanismo de julgamento que já está em vigor
desde 2008 (Lei nº 11.672/2008), o que possibilita uma análise mais ampla
de sua dinâmica e impactos, se comparada com o IRDR ou mesmo com o

239
Maria Cecília de Araujo Asperti

julgamento do recurso extraordinário repetitivo pelo STF, que entraram em


vigor apenas em 2016.
Definido o foco no recurso especial repetitivo, procedeu-se ao recorte da
coleta dos dados, utilizando-se o banco de dados do site do STJ, que permite ex-
trair informações a partir dos seguintes filtros de pesquisa: data de julgamento;
órgão julgador; tribunal de origem; ramo do direito (“Direito Administrativo”,
“Direito Civil”, “Direito do Consumidor”, “Direito do Trabalho e Processual
Trabalhista”, “Direito Penal”, “Direito Processual Civil e do Trabalho”, “Direito
Processual Penal” e “Direito Tributário”); número do tema e situação (afetado,
em julgamento, acórdão publicado, sobrestado, sem processo vinculado, cance-
lado, revisado e trânsito em julgado)586.
Com a objetivo de realizar uma análise de todas as teses jurídicas firmadas
desde a entrada em vigor da Lei nº 11.672/2008, a única limitação inserida no
sistema de busca foi um termo final de pesquisa, qual seja, 31.03.2017. Até esta
data haviam sido julgados 657 temas587, definidos em acórdãos transitados em
julgado. Cada qual desses temas fora apreciado a partir da afetação de um ou
mais recursos representativos da controvérsia, em um total de 849 recursos
afetados. Isso permitiu analisar, ainda, o tempo de tramitação de um recurso
repetitivo, desde sua afetação até o trânsito em julgado do acórdão que firmou
tese jurídica sobre a matéria.
Os temas foram tabulados de modo a se obter as seguintes informações:

a) Número do tema;
b) Número do Recurso Representativo da Controvérsia (“RRC”);
c) Tribunal de Origem
d) Recorrente;
e) Recorrido;
f) Questão submetida a julgamento;

586 O banco de dados do STJ sobre recursos repetitivos está disponível no link: http://www.stj.jus.br/
repetitivos/temas_repetitivos/. Acesso em 31 mar. 2017.
587 A cada questão jurídica decidida em sede de recurso repetitivo é atribuída uma numeração de tema, o
que ratifica a percepção de que as teses jurídicas conformam enunciados normativos abstratos, sendo
assim mais próximas das súmulas do que de precedentes, com a diferença de que as súmulas em tese
refletem uma jurisprudência consolidada, enquanto a tese jurídica é formulada de forma provocada
e direcionada em um julgamento específico no qual pode ocorrer, inclusive, uma “guinada” no
entendimento outrora sustentado pela corte (vide mais a esse respeito no Capítulo 4, item 4.2).

240
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

g) Data de afetação;
h) Data de julgamento;
i) Data do trânsito em julgado;
j) Informações sobre eventual audiência pública; e
k) Tese firmada.

A partir desses dados, foi construído o banco de dados utilizado para as


análises descritas a seguir, tendo por objetivo as principais características dos
recursos representativos da controvérsia e os temas discutidos em sede recurso
especial repetitivo e da conformação das teses jurídicas alcançadas a partir
desses julgamentos.

5.2. Recursos representativos da controvérsia por


tribunais de origem
Cabe, inicialmente, destacar que, como o artigo 543-C, §1º do CPC/1973
permitia que fossem escolhidos “um ou mais recursos representativos da con-
trovérsia”, muitos casos foram decididos a partir do julgamento de um único
caso, o que, em tese, não é mais possível pelo novo código, que estabeleceu que
um mínimo do dois RRCs para definição de uma tese repetitiva. Por outro lado,
houve também situações nas quais, do julgamento de apenas um caso, foram
extraídas duas ou mais teses diferentes.
Há, portanto, duas variáveis com as quais os dados poderiam ser aqui traba-
lhados: os temas (e respectivas teses jurídicas) e os recursos representativos da
controvérsia (“RRCs”).
Como um dos principais objetivos desta análise empírico-jurisprudencial
era verificar se as teses firmadas privilegiam os interesses dos litigantes oca-
sionais ou dos repetitivos, optou-se por deixar o exame mais pormenorizado
da representatividade, do contraditório exercido por esses diferentes atores e
da fundamentação da escolha do recurso representativo para o estudo de caso
realizado na sequência.
Assim, o foco, neste capítulo, reside nas teses jurídicas, até porque, como já
discutido no anterior, referidas teses conformam enunciados normativos abstra-
tos e autônomos, cuja veiculação em casos futuros é feita, mormente, a partir da
questão colocada para julgamento e da tese jurídica decidida, não pelo coteja-

241
Maria Cecília de Araujo Asperti

mento dos fatos do processo futuro com aqueles do caso do qual a tese jurídica
emanou, como no sistema de precedentes norteamericano.
A partir dessas escolhas, foi possível verificar que, dos 657 temas julgados
entre 2008 e março de 2017, 287 (43,68%) partiram da afetação de recursos
representativos da controvérsia nos tribunais de origem e 370 (56,32%) foram
afetados no próprio STJ. Há, portanto, um volume maior de teses cuja consoli-
dação partiu da iniciativa do STJ, a partir da verificação, pelo tribunal superior,
da multiplicidade de recursos versando sobre uma mesma matéria de direito.
Considerando o tribunal de origem do primeiro (e muitas vezes único) RCC
afetado para cada caso, tem-se o seguinte cenário:
Gráfico 2 – Percentual de teses jurídicas firmadas a partir de recursos representativos
da controvérsia por tribunal de origem (considerando o primeiro RRC afetado)

Fonte: Dados obtidos no site do STJ. Elaboração própria


Há uma predominância de temas de competência da Justiça Federal, com
51,9% de teses definidas a partir de RRCs oriundos dos Tribunais Regionais
Federais (341 de 657). Essa informação se coaduna, como se verá a seguir, com
a participação significativa do Poder Público dentre as partes envolvidas nos

242
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

RRCs afetados. O dado também é condizente com a constatação de que há


uma parcela significativa de temas afetos ao Direito Tributário, Direito Admi-
nistrativo e Direito Previdenciário, conforme também se discutirá mais deta-
lhadamente no item 5.4., a seguir.
Dentre os tribunais estaduais, a ampla maioria dos temas foram afetados
a partir de julgados dos tribunais de justiça da região Sul e Sudeste (42%),
sendo particularmente significativo o volume de recursos afetados prove-
nientes do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), respondendo
por 14,67% dos temas, e do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
(TJSP), com 9,44%.
Percebe-se assim, que a utilização dessa técnica de julgamento de casos
repetitivos pelas cortes é mais frequente nas regiões e nos estados com o
maior Produto Interno Bruto (PIB) do país588. Ademais, os cinco tribunais
estaduais dos quais originaram o maior volume de RRCs são, precisamente,
os tribunais considerados “de grande porte” pelo Relatório Justiça em Nú-
meros, classificação que leva em conta o orçamento, o número de processos
em tramitação, o número de magistrados e a força de trabalho de modo
geral (auxiliares e servidores)589.
Tais dados são coerentes com o intuito gerencial da técnica do recurso re-
petitivo, aplicável quando há o requisito da multiplicação (ou seja, do volume)
de recursos versando sobre uma mesma matéria. Há mais recursos repetitivos
em grandes tribunais que, por sua vez, estão situados nos estados e regiões
mais ricos da federação.
Há, no entanto, uma interessante discrepância: embora o TJRS seja o quar-
to tribunal de maior porte no Brasil, com 4.491.617 de processos em trâmite,
é de lá que se tem o maior volume de RRCs afetados590. Das 97 teses jurídicas
firmadas a partir de RRCs do TJRS, apenas 12 foram afetadas pelo próprio

588 O Sudeste corresponde a 55,2% do PIB, enquanto o Sul representa 16,2%, conforme levantamento
das contas regionais feito pelo IBGE em 2012. Os seis estados com mais RRCs afetados também
correspondem aos seis estados com maior PIB no Brasil (disponível em https://ww2.ibge.gov.br/home/
estatistica/economia/contasregionais/2012/default_xls_1995_2012.shtm, acesso em 14 dez. 2017).
589 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2016, op. cit., p. 34.
590 Só para se ter uma base comparativa, no TJSP, que é o maior tribunal estadual do país, havia
25.943.503 processos tramitando em 2017, ou seja, 5,8 vezes mais processos do que o TJRS
(CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2016, op. cit., p. 34).

243
Maria Cecília de Araujo Asperti

tribunal, enquanto 85 foram afetadas pelo STJ591. Destas teses, 45 (46,39%) são
relativas a questões consumeiristas, contra uma média total de 14,16% de ques-
tões relativas a direito do consumidor dentre todos os temas julgados.
Esses dados levam a crer que o TJRS seja um tribunal com um contingente
particularmente expressivo de demandas decorrentes da litigiosidade repetitiva
(a ponto de chamar a atenção do STJ) caracterizada como litígios de múltiplos
sujeitos592, ou seja, em que o litigante habitual é réu em ações que questionam
sua conduta com base na legislação de direitos do consumidor.

5.3. Partes (recorrente e recorrido)


Partindo-se para a análise da conformação subjetiva dos RRCs, foi utilizada
uma classificação das partes que fosse aberta o suficiente para que o foco fosse
colocado nas questões submetidas para julgamento e nas teses firmadas, e não
nos casos afetados em si.
É importante lembrar que a tipologia de litigantes repetitivos e ocasionais
não é dicotômica, conformando, em verdade, um espectro contínuo, de acordo
com a recorrência com a qual os litigantes se engajam em litígios similares593.
Para o presente trabalho, foram utilizadas classificações próximas aos “tipos
ideais” descritos por Marc Galanter, atribuindo a caracteristica de litigante ha-
bitual aos atores que tipicamente se engajam em litígios repetitivos no Brasil,
considerando os dados existentes a respeito594.
Por isso, as partes, recorrente e recorrida, dos RRCs foram classificadas em
categorias mais amplas e algumas mais específicas, utilizando-se, na medida
do possível, os critérios adotados pelo relatório dos 100 Maiores Litigantes do

591 O que torna menos provável a hipótese de ser este um tribunal em que se tem mais presente a prática
de utilizar a técnica de julgamento de recurso repetitivos: na realidade, a repetição é aferida, mais
usualmente, pelo próprio STJ.
592 Como se viu no Capítulo 4, item 4.3.1, e de acordo com GUIMARÃES, Amanda de Araújo, 2017,
op. cit., p. 92-107.
593 GALANTER, Marc, 1974, op. cit., p. 97-98.
594 Retomam-se, aqui, todas as colocações explicadas no Capítulo 2, no item 2.4, sobre os tipos ideais de
litigantes repetitivos e ocasionais e as particularidades dessa tipologia aplicada ao contexto brasileiro atual.

244
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

CNJ595, na tentativa de se permitir, inclusive, a análise conjunta destes dados


com aqueles levantados pelo CNJ:

a) Setor público federal, municipal e estadual, incluindo-se entes


da administração pública direta e indireta, inclusive o INSS e
agências regulatórias;
b) Bancos e instituições financeiras;
c) Telefonia;
d) Seguros;
e) Empresas privadas diversas;
f) Previdência;
g) Ministério Público (como parte);
h) Juízo;
i) Conselhos profissionais;
j) Entidade esportiva;
k) Condomínio;
l) Associação;
m) Confederações e sindicatos; e
n) Pessoas físicas.

Nesse exercício, o Setor Público (federal, estadual e municipal), os bancos


e instituições financeiras, as empresas de telefonia, fundos de previdência pri-
vada, empresas de seguro, o Ministério Público (no âmbito penal), conselhos
profissionais e confederações e sindicatos foram considerados litigantes habitu-
ais. Já as pessoas físicas foram identificadas como litigantes ocasionais. Empresas
privadas de modo geral, associações, condomínios e entidades esportivas foram
categorizadas como “outros”, ainda que dentre as empresas privadas seja possí-
vel situar entes que litigam com maior frequencia.

595 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2012. op. cit. Outras classificações tiveram de ser
acrescidas, dado que em alguns casos os recorrentes não se encaixam em nenhuma das categorias
utilizadas para classificar os maiores litigantes.

245
Maria Cecília de Araujo Asperti

Gráfico 3 – Classificação da parte recorrente nos RRCs analisados.

Fonte: Dados obtidos no site do STJ. Elaboração própria.


Os dados demonstram a participação significativa de entes públicos, que
figuram como recorrentes, em 36,68% dos temas, com maior ênfase para o
setor público federal, que figura como recorrente em 26,64% dos casos. Dentre
os litigantes do setor privado, merecem destaque os bancos e instituições finan-
ceiras (15,83%) e as empresas de telefonia (5,02%). Pode-se inferir, portanto,
que os litigantes considerados habituais ou repetitivos são a maioria dentre os
recorrentes, figurando nessa condição em 57,39% dos RRCs
Pessoas físicas atuam como recorrentes em 20,09% dos casos, o que permite
aferir que nessa parcela de temas foram vencidos nos tribunais de origem, le-
vando a discussão para o STJ.

246
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Com relação às partes recorridas, tem-se a seguinte configuração:


Gráfico 4 – Classificação da parte recorrida nos RRCs analisados.

Fonte: Dados obtidos no site do STJ. Elaboração própria.


Com relação aos recorridos, o cenário é bastante diferente. Em 46,73% das
teses jurídicas firmadas, os RRCs afetados vieram de casos nos quais as pessoas
físicas (aqui classificadas como litigantes ocasionais) eram recorridas. De outra
parte, dentre os litigantes habituais, os entes do Poder Público figuravam desse
modo em 25,42% das teses. Bancos e instituições financeiras foram recorridos
em 3,81% e empresas de telefonia em 1,07% dos casos. Assim, verifica-se den-
tre os recorridos um total de 24,82% de litigantes habituais.

247
Maria Cecília de Araujo Asperti

A tabela abaixo facilita uma comparação desses dados:


Tabela 3 – Quadro comparativo com relação ao envolvimento de litigantes habituais e ocasio-
nais nos RRCs.

Recorrente Recorrido

Litigantes habituais 57,39% Litigantes habituais 24,82%

Litigantes ocasionais 20,09% Litigantes ocasionais 46,73%

Não se aplica 22,52% Não se aplica 28,45%

Constata-se, então, que há nitidamente um predomínio de litigantes habi-


tuais como recorrentes e de litigantes ocasionais como recorridos. Ou seja, os
litigantes habituais são aqueles que mais frequentemente levaram a discussão da
questão jurídica ao STJ pela via do recurso especial, do que se denota que eram
vencidos (ao menos em parte) nos respectivos tribunais de origem.

5.4. Questão submetida a julgamento e teses firmadas


por área do Direito
Analisada a configuração dos atores envolvidos, foram extraídos dados re-
lativos a classificação temática da questão de direito submetida a julgamento.
Como já mencionado, o próprio STJ trabalha com uma classificação temática,
utilizada para facilitar a busca de teses jurídicas pelo usuário que consulta o site.
Porém, um exame mais aprofundado das questões submetidas a julgamento e das
teses firmadas levantou a necessidade de se revisitar essa classificação, na tentati-
va de torná-la mais uniforme e coerente com os fins da pesquisa proposta.
Para tanto, fez-se o exercício de verificar, na medida do possível, qual clas-
sificação seria mais coerente com a aplicação futura da tese jurídica, conside-
rando a questão submetida à julgamento e os elementos dos casos repetitivos.
Por exemplo: a discussão travada no Tema nº 436, no julgamento do
REsp 1.114.398/PR 596, versou sobre a ilegitimidade ativa ad causam em ação
de indenização por danos materiais e morais em razão de acidente ambiental
ocorrido com o navio N/T Norma, que colidiu no Porto de Paranaguá, em

596 Recurso Especial nº 1.114.398/PR, Ministro Relator Sidnei Beneti, 2ª Seção, julgamento em
08.02.2012.

248
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

18.01.2001, provocando um derramento de ao menos 4 milhões de litros nafta,


um derivado de petróleo597. Tal fato acarretou a proibição da pesca no local por
um mês, o que levou pescadores da região a ajuizarem ações individuais pleite-
ando indenizações por danos morais e materiais em face da Petrobrás.
Durante o julgamento, o Ministro Relator Sidnei Beneti assinalou que:

“o julgamento das teses ora firmadas visa a equalizar especificamente o


julgamento das ações de indenização efetivamente movidas diante do
acidente ocorrido com o Navio N-T Norma, no Porto de Paranaguá,
no dia 18.10.2001, mas, naquilo que encerram teses gerais, aplicáveis
a consequências de danos ambientais causados em outros acidentes
semelhantes, serão, como natural, evidentemente considerados nos
julgamentos a se realizarem”598.

Assim, com relação à questão da legitimação ativa, não foi travada uma
discussão abstrata sobre o instituto de direito processual, mas sim proferida uma
decisão plenamente vinculada ao conflito coletivo599. Por se entender, então,
que a tese jurídica entao firmada versa sobre a responsabilidade e sobre os danos
decorrentes do evento, a classificação atribuída foi em “Direito Civil”, na qual
estão incluídas discussões sobre responsabilidade civil e danos ambientais.
De outra parte, desse mesmo julgado decorreu a discussão sobre a possibili-
dade de julgamento antecipado da lide ante a existência de prova documental
tida por suficiente pelo julgador (Tema nº 437). Nesse ponto, a questão jurídica
processual foi trabalhada abstratamente, cabendo sua aplicação a casos futuros
que não sejam necessariamente relacionados com o contexto fático do acidente
ambiental600. Daí a sua classificação como “Direito Processual Civil”.

597 SOARES, Ricardo. “Navio da Petrobras derrama nafta no Paraná”. Folha de São Paulo. 19 out. 2001.
Caderno Cotidiano. Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1910200111.htm>,
acesso em 16 dez. 2017.
598 Recurso Especial nº 1.114.398/PR, Ministro Relator Sidnei Beneti, 2ª Seção, julgamento em
08.02.2012, p. 21.
599 Trata-se, em verdade, de um claro exemplo de casos repetitivos em que são discutidos direitos
individuais homogêneos, passíveis de serem tutelados coletivamente.
600 Confira-se trecho do acórdão, em que o Ministro Relator Sidnei Beneti transcreve trecho do acórdão
recorrido para reafirmar a interpretação do TJPR sobre a questão de o julgamento antecipado não
implicar cerceamento de defesa ante a existência de prova documental: “O cerceamento de defesa
ocorre quando, havendo a necessidade de produção de provas, estas são ilegalmente indeferidas. No
caso em tela, não havia a necessidade de produção de provas, uma vez que os elementos constantes

249
Maria Cecília de Araujo Asperti

Utilizando-se esses parâmetros e cuidados, as questões submetidas a julga-


mento e respectivas teses jurídicas puderam ser assim classificadas:
Gráfico 5 – Classificação das questões submetidas a julgamento
e teses jurídicas por área do Direito.

Fonte: Dados obtidos no site do STJ. Elaboração própria.


A classificação por área do Direito reafirma a prevalência de questões en-
volvendo o Poder Público, como as relativas ao Direito Tributário (32%), Di-
reito Administrativo (21%) e Direito Previdenciário (6%) que, conjuntamente,

nos autos foram suficientes para a apreciação das alegações das partes. Assim, em sendo desnecessário
maior embate probatório, não restou dúvidas ao diligente Magistrado em relação à solução a ser dada à
lide, inexistindo qualquer cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado. A solução dada à lide é
legítima, se os aspectos decisivos da causa estão suficientemente maduros para embasar o convencimento
do magistrado. Sendo o juiz o destinatário das provas, é óbvio que lhe cabe aferir a necessidade ou não
de outros elementos probatórios a serem colhidos” (Recurso Especial nº 1.114.398/PR, Ministro Relator
Sidnei Beneti, 2ª Seção, julgamento em 08.02.2012, p. 12). Como se vê, a fundamentação que embasa
a tese jurídica relativa a essa questão não está vinculada ao conflito fático, ou à litigância repetitiva,
sendo aplicável a casos em que se suscite alegação de cerceamento de defesa em julgamento antecipado
sem qualquer relação com a colisão do Navio N-T Norma no Porto de Paranaguá.

250
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

representam 59% dos temas discutidos pelo STJ em sede de recurso especial
repetitivo no período analisado.
Dentre as questões classificadas como “Direito Tributário”, chamou a aten-
ção a quantidade de temas relativos a aspectos processuais específicos das
execuções fiscais, o que motivou a extração de uma sub-categoria específica.
Verificou-se, com isso, que 40 dos 208 temas relacionados a Direito Tributá-
rio versavam sobre questões relativas a execuções fiscais, o que corresponde a
6,09% do total de temas.
No âmbito do “Direito Administrativo”, o assunto mais expressivo foi o “reajuste
de remuneração, soldo, proventos ou pensão de servidor público”, que correspondeu
a 36 dos 141 temas nessa classificação, ao lado das discussões relativas à “prestação
de serviço público”, inclusive sobre valor de tarifas e restituição de empréstimo com-
pulsório sobre cobrança de energia elétrica, presente em 33 temas.
Além dos temas relacionados aos aspectos processuais específicos das execuções
fiscais, chamou atenção o volume de temas relacionados a questões de Direito Pro-
cessual Civil, que corresponderam a 18% do total. Uma análise pormenorizada dessa
categoria também trouxe à tona um percentual significativo de temas relacionados à
fase executiva do processo, em eram debatidos assuntos como ordem de penhora e pe-
nhorabilidade, multa cominatória em caso de descumprimento de obrigação de fazer,
não fazer e de entrega de coisa, defesas do executado, execução individual de sentença
coletiva, dentre outras matérias. Dentre os 120 temas de Direito Processual Civil, 49
teses relacionavam-se com atos executivos em geral (7,46% do total).
No âmbito do Direito do Consumidor (14%), de um total de 93 temas, 50
envolviam bancos e instituições financeiras, tais como a cobrança de juros em
contratos bancários, revisão de cláusulas contratuais, questões referentes aos
contratos do Sistema Financeiro de Habitação e cobrança de expurgos inflacio-
nários. Houve também temas relacionados à prestação de serviços de telefonia,
seguros, previdência privada, consórcio, dentre outros.
As teses relacionadas a Direito Civil (afora às relações de consumo)
equivaleram a 7% do total analisado, com temas diversos relacionados a
contratos em geral, títulos de crédito, direito de família e teses discutidas
no âmbito do DPVAT601.

601 “Diversamente do que se dá no âmbito da contratação de seguro facultativo, as normas protetivas do


Código de Defesa do Consumidor não se aplicam ao seguro obrigatório (DPVAT)” (Recurso Especial
nº 1.635.398/PR, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, julgamento em 17.10.2017).

251
Maria Cecília de Araujo Asperti

Finalmente, a categoria mais reduzida foi a de Direito Penal e Direito Pro-


cessual Penal, que corresponderam a apenas 4% dos temas.
Como o maior volume de temas decididos eram relativos à matéria de Direi-
to Público, a 1ª Seção foi responsável pelo julgamento de 57% das teses jurídicas
firmadas em sede de julgamento de casos repetitivos. A 2ª Seção, competente
para o julgamento de temas afetos ao Direito Privado, julgou 23% das teses
jurídicas e a 3ª Seção, a quem cabe o julgamento de matérias de Direito Penal,
firmou 9% das teses. Em 11% dos casos, as teses foram firmadas pela Corte
Especial, em razão de lidarem com matéria de sua competência, conforme pre-
visão do artigo 11 do Regimento Interno do STJ.
Gráfico 6 – Percentual de teses jurídicas julgadas por cada órgão do STJ

Fonte: Dados obtidos no site do STJ. Elaboração própria.

252
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

5.5. Tempo de tramitação entre a afetação e o trânsito


em julgado
Tendo sido levantada a data de afetação dos RRCs de cada tema e o seu
trânsito julgado, foi possível calcular que o tempo médio de tramitação para o
período analisado foi de 474 dias, ou seja, aproximadamente 15 meses.
O tema julgado mais rapidamente teve uma tramitação de 45 dias (Tema
nº 561: “Afigura-se absolutamente possível o reconhecimento do privilégio
previsto no § 2º do art. 155 do Código Penal nos casos de furto qualificado,
máxime se presente qualificadora de ordem objetiva, a primariedade do réu e,
também, o pequeno valor da res furtiva”), enquanto o tema cujo debate perdu-
rou por mais tempo demorou 2.448 dias entre a sua afetação e o trânsito em
julgado (Tema nº 169: “Questão referente à incidência do imposto de renda
sobre verba paga a título de ajuda de custo pelo uso de veículo próprio no
exercício das funções profissionais”).

5.6. Formação da tese jurídica e favorecimento de


litigantes habituais ou ocasionais
Como já mencionado, o estudo empírico-jurisprudencial objetivou traçar
um panorama da aplicação da técnica de julgamento de recursos especiais
repetitivos. Um de seus propósitos específicos foi o de investigar se haveria
realmente um favorecimento dos interesses dos litigantes repetitivos pelos me-
canismos de julgamento de casos repetitivos. Não se pretendeu encerrar aqui
a investigação dessa hipótese, que também é endereçada nos demais capítulos
e no estudo de caso, mas apenas levantar mais dados e elementos que pudes-
sem embasar essa reflexão.
Para esse objetivo específico, as questões e teses jurídicas foram analisadas
com o propósito de investigar (i) se o desfecho do debate então travado favore-
ceu primordialmente os interesses de determinados atores; e (ii) se esses atores
poderiam ser considerados litigantes repetitivos ou ocasionais.
Assim como na classificação dos recorrentes e recorridos, consideramos
repetitivos os entes que integram os setores apontados no Relatório dos 100
Maiores Litigantes do CNJ, quais sejam, o setor público federal, estadual e mu-

253
Maria Cecília de Araujo Asperti

nicipal, os bancos, as empresas de telefonia, seguros, os conselhos profissionais


e previdência602.
Além destes, foram considerados litigantes repetitivos as empresas e entes
que estivessem envolvidos em 100 ou mais recursos no STJ, partindo-se da
presunção que com esse volume referidos atores já fossem capazes, ao menos
em tese, de atuar de forma mais estratégica perante as cortes superiores. Tam-
bém, para os fins da análise aqui pretendida, o Ministério Público também foi
classificado como um litigante repetitivo, a despeito das particularidades de sua
atuação, visto que conseguem, ao menos em tese, aferir as vantanges decorren-
tes do envolvimento em demandas similares603.
Como litigantes ocasionais, foram consideradas todas as pessoas físicas e em-
presas com 10 ou menos recursos pendentes de julgamento no STJ. Entendeu-
-se que nessas situações dificilmente os litigantes teriam capacidade de reunir
informações, expertise e recursos para aferir as vantagens estratégicas próprias
dos litigantes repetitivos, especialmente no STJ. Criou-se, ainda, uma categoria
intermediária de empresas não pudessem ser classificados como litigantes repe-
titivos ou ocasionais.
Subsidiariamente, foi utilizada a categoria “outros” para casos em que não foi
possível identificar se a tese favoreceu os interesses de litigantes um litigante em
detrimento do outro. Isso ocorreu quando discutidos interesses institucionais da
Defensoria Pública ou do Ministério Público ou em casos de julgamento parcial
em que não houve o favorecimento de uma parte ou de outra de modo mais
marcante ou, ainda, quando a discussão foi travada em abstrato, sem contem-
plar os interesses de nenhum dos envolvidos diretamente.
O gráfico abaixo demonstra a associação feita entre as teses firmadas e os
atores cujos interesses tiveram primazia, apontando se a tese favorece primor-
dialmente interesses de litigantes repetitivos ou ocasionais, ou, ainda, empresas
ou outros atores que não puderam ser encaixados nesses tipos ideais:

602 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2012, op. cit., p. 8.


603 Como já discutido no Capítulo 2, item 2.4.

254
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

Gráfico 7 – Percentual de teses firmadas em favor de litigantes repetitivos ou ocasionais

Fonte: Dados obtidos no site do STJ. Elaboração própria.


Como se vê, os interesses dos litigantes considerados repetitivos prevalece-
ram em 56% das teses jurídicas firmadas, enquanto em 37% a tese foi prepon-
derantemente favorável aos litigantes ocasionais.
Ao se realizar essa mesma análise das teses firmadas e dos interesses prevale-
centes, porém por assunto (a partir da classificação por área do Direito descrita
no item anterior), foi possível verificar uma preponderância de interesses dos
litigantes repetitivos em todos os campos, em proporções mais ou menos signi-
ficativas, conforme gráfico abaixo:

255
Maria Cecília de Araujo Asperti

Gráfico 8 – Percentual de teses jurídicas firmadas em favor de litigantes repetitivos


ou ocasionais por área do Direito

Fonte: Dados obtidos no site do STJ. Elaboração própria.


A análise dos dados por tema demonstra uma vantagem mais nítida de
litigantes repetitivos no âmbito do Direito Tributário (62,98%) e Penal e Pro-
cesso Penal (60%).
Com relação às teses em matéria tributária, é necessário pontuar que, tanto
os entes públicos quanto grandes empresas contribuintes, foram consideradas
litigantes repetitivos, seguindo-se os critérios descritos. Vale consignar, contu-
do, que foram apenas 8 casos (3,85%) em que o litigante repetitivo cuja tese foi
prevalecente não foi um ente público (59,13%).
É importante notar também que mesmo em áreas nas quais há uma presun-
ção a favor da parte considerada hipossuficiente, como no Direito do Consumi-
dor, no Direito Previdenciário e no Direito Penal e Processo Penal, os litigantes
repetitivos foram favorecidos pelas teses jurídicas formuladas.
O âmbito em que se percebeu maior equilíbrio foi o Direito Administra-
tivo, com 48,23% das teses favoráveis aos litigantes repetitivos (no caso aqui
entes públicos) e 45,39% aos litigantes ocasionais. É possível conjecturar que
há nesses casos uma maior articulação de litigantes ocasionais em litígios
envolvendo questões relacionadas ao reajuste de vencimentos e previdência
de servidores públicos.

256
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

5.7. Considerações sobre a análise empírico-jurisprudencial


Feito o panorama das teses jurídicas firmadas em sede de julgamento de
casos repetitivos, alguns dados chamam a atenção.
Primeiramente, é importante reafirmar que as teses jurídicas fixadas pelo
STJ no julgamento de recursos repetitivos são, como já dito, enunciados nor-
mativos abstratos, assim organizados e catalogados pela própria corte em
temas numerados e sequenciais. Esses enunciados são formulados de modo
muito similar às súmulas jurisprudenciais, com a diferença de que especificam
a questão jurídica colocada para julgamento e que não refletem, necessaria-
mente, um histórico de entendimentos reiterados do órgão julgador, mas o
posicionamento firmado na ocasião específica do julgamento dos RRCs afe-
tados. Essa constatação corrobora com os argumentos discutidos no capítulo
anterior quanto às distinções entre as técnicas de julgamento de casos repeti-
tivos e o sistema de precedentes604.
Partindo-se para análise dos dados quantitativos propriamente ditos, pode
se dizer que os dados atinentes ao perfil das partes (recorrente e recorrido) e
temas discutidos corroboram com o argumento de que as questões jurídicas
decididas em sede de julgamento de recursos repetitivos, no STJ, refletem,
majoritariamente, conflitos próprios da litigiosidade repetitiva, assim ca-
racterizada pelo envolvimento de litigantes repetitivos e ocasionais em disputas
que refletem a atuação de grandes entes públicos e pessoas jurídicas de direito
privado. Em razão dessa atuação ser regulada pelas mesmas leis, normas e por
contratos similares, tendem veicular questões de fato e de direito similares, em
volume significativo e compatível com a amplitude da atividade de tais entes.
Também é relevante que a litigiosidade repetitiva discutida no STJ envol-
ve o Poder Público em uma significativa parcela dos casos (59%), em maté-
rias de Direito Tributario, Administrativo e Previdenciário. Percebe-se, assim, a
significância dessa litigiosidade para a corte e da técnica processual do recurso
especial repetitivo para essas áreas do direito.
No entanto, a constatação mais marcante do estudo empírico-jurispruden-
cial foi, sem dúvida, a de que os litigantes habituais são os recorrentes na maior
parte dos RRCs afetados para julgamento e que os litigantes ocasionais – mais
especificamente as pessoas físicas – são recorridos em quase metade dos casos.

604 Vide Capítulo 4, item 4.2.

257
Maria Cecília de Araujo Asperti

Tem-se, com isso, que os litigantes habituais estavam sendo vencidos nos
tribunais estaduais e federais quando então a questão foi levada ao STJ.
No embate que culmina com a fixação da tese jurídica, esses atores litigam,
na maior parte das vezes, contra pessoas físicas que, por seu turno, estavam
obtendo êxito até então, ao menos no que tange a questão jurídica levada a
julgamento pela via do recurso especial.
Quando se apura o resultado do julgamento, verifica-se que no cômputo
geral e em todas as áreas específicas, os litigantes habituais obtiveram enten-
dimentos favoráveis na maioria dos casos.
Poder-se-ia aduzir que a diferença percentual dos casos em que os litigantes
habituais obtêm uma tese jurídica favorável (56%) não é tão marcante, ou tão
discrepante. No entanto, tendo-se em mente que eles são, na maior parte dos
casos, a parte recorrente, é possível inferir que esses litigantes conseguem,
satisfatoriamente, reverter entendimentos que não eram favoráveis a seus
interesses nas instâncias inferiores (tanto assim que recorreram ao STJ).
Um estudo empírico de cunho essencialmente quantitativo não nos permite
aferir conclusões mais aprofundadas sobre as constatações aqui levantadas. Por
isso, parte-se para a segunda etapa da pesquisa empírica, em que será possível
estudar como os litigantes habituais e ocasionais participam efetivamente do
julgamento de teses jurídicas pela via do recurso especial repetitivo.

258
6. Participação e Representatividade
no Recurso Especial Repetitivo:
Um Estudo de Caso

6.1. Estudo de caso: objetivos e metodologia


Se o estudo empírico-jurisprudencial permitiu traçar um panorama da apli-
cação do recurso repetitivo pelo STJ, o estudo de caso tem por objetivo uma
análise mais aprofundada para investigar como se dá e quais são os impactos da
participação das partes do caso paradigma e a representação dos interesses dos
“sobrestados” e ausentes no julgamento dos recursos repetitivos.
Para melhor compreender se a racionalidade dessa técnica de julgamen-
to de casos repetitivos é capaz de assegurar a partiricipação dos diferentes
sujeitos, foi preciso selecionar um caso de ampla repercussão, com significa-
tiva intervenção de amici curiae e realizações de audiências públicas. Com
relação às audiências públicas, já havia sido identificada, na primeira etapa
do estudo empírico, a realização de três audiências públicas, pelo STJ, em
julgamento de recursos repetitivos:
a. Tema nº 710 – “Discussão acerca da natureza dos sistemas de
scoring e a possibilidade de violação a princípios e regras do
Código de Defesa do Consumidor capaz de gerar indenização por
dano moral” (Recurso Especial nº 1.419.697/RS e REsp 1.457.199/
RS) - Audiência pública realizada em 25.08.2014;
b. Tema nº 898 – “Controvérsia referente à atualização monetária das
indenizações previstas no art. 3º da Lei 6.194/74, com redação dada
pela Medida Provisória n. 340/2006, convertida na Lei 11.482/07”
(Recurso Especial nº 1.483.620/SC) - Audiência pública realizada
em 09.02.2015; e
c. Tema nº 938 – “Discussão quanto à: (i) prescrição da pretensão de
restituição das parcelas pagas a título de comissão de corretagem
e de assessoria imobiliária, sob o fundamento da abusividade
da transferência desses encargos ao consumidor; e quanto à (ii)

259
Maria Cecília de Araujo Asperti

validade da cláusula contratual que transfere ao consumidor a


obrigação de pagar comissão de corretagem e taxa de assessoria
técnico-imobiliária (SATI)” (Recurso Especial nº 1.599.511/SP e
Recurso Especial nº 1.551.956/SP) - Audiência pública realizada
09.05.2016.

O caso escolhido, então, foi o julgamento do Tema nº 710, referente ao sis-


tema de scoring de crédito e de sua compatibilidade com a legislação de Direito
do Consumidor. Optou-se por este caso tendo em vista a seguintes caracterís-
ticas: (i) o fato de ter sido realizada uma audiência pública para amplicação do
debate sobre o tema; (ii) a intervenção de diversos amici curiae no julgamento;
(iii) já ter ocorrido o trânsito em julgado da tese jurídica quando da realização
da pesquisa605 e; (iv) o julgamento ter ocorrido a partir de mais de um recur-
so representativo da controvérsia, o que passou a ser obrigatório a partir do
CPC/2015606.
Escolhido o caso, passou-se a coleta de dados a partir dos seguintes materiais:
(i) autos integrais dos processos dos quais foram afetados os RRCs, incluindo-
-se manifestações das partes, documentos, decisões e despachos judiciais; (ii)
informações disponíveis acerca das audiência pública, inclusive os memoriais
apresentados e as notas taquiográficas registradas nessa oportunidade; (iii) ma-
nifestações escritas apresentadas por amici curiae e outros entes interessados; e
(iv) demais informações obtidas na internet, tais como notícias jornalísticas,
informações sobre as partes e seus advogados.
Buscando refletir esses pontos e as perguntas de pesquisa, foi identificado
o perfil das partes dos RRCs e de seus representantes legais; o contraditório
(ou direito de participação) por elas exercido (oportunidades de manifestação,
alegações deduzidas e sua repercussão no julgamento); critérios para escolha do
RRC; participação de amici curiae; do Ministério Público e da Defensoria Públi-
ca; dos “sobrestados” e “ausentes”; e a influência destes e dos debates realizados
na audiência pública no julgamento e na formulação da tese jurídica.

605 Até a data da pesquisa (31.03.2017), não havia ocorrido o trânsito em julgado do Tema nº 938, a
respeito da cobrança de taxa de corretagem e taxa SATI.
606 O julgamento do Tema nº 898, referente à atualização monetária da indenização do DPVAT, se deu
a partir da afetação de apenas um recurso representativo da controvérsia.

260
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

A tabela abaixo sistematiza e detalha os eixos de análise e questões especí-


ficas endereçadas:
Tabela 4 – Eixos de análise e questões do estudo de caso
Questões específicas
Eixos de análise do estudo de caso
Quem são as partes dos recursos representivos da controvérsia?
Partes, litigantes repetitivos e Qual o perfil desses litigantes? Pessoa física, jurídica? Envolvida em outros casos similares?
litigantes ocasionais e seus Podem ser considerados litigantes ocasionais ou repetitivos?
advogados Quem são seus advogados? Atuam em casos similares? São especializados na matéria? São
especializados no perfil de cliente?
Quais foram as principais alegações de fato e de direito deduzidas ao longo do processo pelas partes?
Alegações das partes dos casos
Foram produzidas provas? Qual a sua relevância para as decisões proferidas e para a interpretação das
paradigma
questões jurídicas debatidas?
Quais os principais fundamentos da sentença? Como esses fundamentos se relacionam com os argumentos
Repercussão das alegações das
suscitados pelas partes ao longo do processo?
partes no julgamento do caso
Principais fundamentos do acórdão ou decisão monocrática? Como essses fundamentos se relacionam
paradigma
com os argumentos suscitados pelas partes ao longo do processo?
Quais os motivos declinados para afetação do caso como representativo da controvérsia?
Decisão da afetação do recurso
Há alguma consideração quanto ao perfil das partes ou sua representatividade?
representativo da controvérsia
A afetação levou em consideração todas as questões debatidas no caso?
Quem foram os amici curiae que participaram do julgamento do recurso?
Qual o perfil dos amici? Pessoa física ou jurídica? Entidade privada ou pública? Defesa de direitos?
Associação profissional?
Participação de amicus curiae Quais foram os dados e argumentos suscitados pelos amici ? Foram argumentos fáticos, técnicos ou
jurídicos?
Os amici trouxeram dados novos para o caso?
Os amici representavam instituições de alguma forma relacionadas com as partes?
Houve a participação do Ministério Público e/ou da Defensoria Pública?
Participação do Ministério Público
Qual o posicionamento adotado por essas instituições? Quais os argumentos suscitados ou defendidos?
e da Defensoria Pública

Participação de "sobrestados" e de Alguma parte de casos sobrestados ou de um processo futuro ("ausente") participou do processo em
"ausentes" algum momento? Via manifestação escrita? Memoriais? Na audiência pública?
Quem participou da audiência pública? Qual o perfil do participante?
Audiência Pública Qual o posicionamento defendido por cada participante?
Qual a repercussão dos debates da audiência pública no julgamento do caso?
Quais os principais argumentos do voto vencedor?
Julgamento (influência da Foram discutidos elementos fáticos extraídos dos recursos representativos da controvérsia?
participação das partes e dos Quais argumentos mais repercutiram na formação da convicção dos julgadores? Qual a origem desses
interessados) argumentos (suscitado pelas partes? Em julgados anteriores? Pelos amici curiae? Na audiência pública?
Por algum interveniente?)
Há notícia quanto a quantos recursos foram sobrestados?
Impactos do julgamento
Qual a repercussão na mídia do caso?

Fonte: Elaboração própria

6.2. O caso do sistema de scoring de crédito

6.2.1. Descrição do caso


Para julgamento da questão sobre “natureza dos sistemas de scoring e a pos-
sibilidade de violação a princípios e regras do Código de Defesa do Consumidor
capaz de gerar indenização por dano moral”, dois RRCs foram afetados pelo

261
Maria Cecília de Araujo Asperti

STJ, mais precisamente pelo Relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino: o


Recurso Especial nº 1.419.697/RS, interposto pela Boa Vista Serviços S/A (ré)
na ação individual proposta por Anderson Guilherme Prado Soares (autor) con-
tra a Boa Vista Serviços S.A.; e o Recurso Especial nº 1.457.199/RS, oriundo da
Ação Civil Pública proposta pela Promotoria de Justiça Especializada de Defesa
do Consumidor contra a Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL).
A própria definição do que consiste o sistema de scoring foi objeto de discus-
são nesses casos, concluindo tratar-se de “um método desenvolvido para ava-
liação do risco de concessão de crédito, a partir de modelos estatísticos, consi-
derando diversas variáveis, com atribuição de uma pontuação ao consumidor
avaliado (nota do risco de crédito)”607. Extrai-se do site da Boa Vista Serviços
S.A. ser scoring um sistema que “identifica de forma rápida e segura os consu-
midores que apresentam menor risco de crédito”, possibilitando à empresa que
contrata esse serviço a aferição de uma pontuação indicativa da “probabilidade
do consumidor pagar em dia”608.
Esse serviço de pontuação passou a ser comercializado por empresas como a
Boa Vista Serviços S.A. e a Serasa Experian para varejistas, instituições finan-
ceiras e empresários de modo geral. Diversos consumidores, tendo descoberto
que seu crédito havia sido negado ou restringido em razão de uma pontuação,
passaram a discutir judicialmente a legalidade do scoring, alegando violação ao
CDC, em especial os preceitos do artigo 43 desse diploma legal, tendo em vista o
fato de o consumidor não ter acesso aos dados que embasaram o cálculo de seus
pontos. Outro argumento suscitado era que as diretrizes da Lei nº 12.414/2011
também deveriam ser observadas, notadamente o acesso pelo consumidor às
informações a seu respeito e a obrigatoriedade de seu consentimento para ma-
nutenção destas no banco de dados.

6.2.2. Partes, seus representantes e principais alegações


deduzidas
a) Recurso Especial nº 1.419.697/RS: Boa Vista Serviços x
Anderson Guilherme Prado Soares

607 Trecho da ementa do acórdão prolatado por ocasião do julgamento dos RRCs mencionados.
608 Disponível em https://www.boavistaservicos.com.br/score-credito/, acesso em 17 dez. 2017.

262
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

O Recurso Especial nº 1.419.697/RS foi interposto pela Boa Vista Serviços


S/A (ré) em face de Anderson Guilherme Prado Soares (autor) em ação indi-
vidual por ele ajuizada, em que pleiteia (i) em sede de antecipação parcial dos
efeitos da tutela, o cancelamento da informação existente no sistema “SCPC
Score Credit”; (ii) a confirmação da antecipação de tutela, com a “declaração
de nulidade e ilegalidade da abertura, manutenção e divulgação do registro
(pontuação)”; e (iii) o pagamento de indenização por danos morais, em valor a
ser arbitrado pelo juízo (Processo nº 001/1.12.0110621-5, 10ª Vara Cível do Foro
Central de Porto Alegre).
O exame dos autos demostra que o autor é pessoa física, negro e auto-decla-
rado pobre, na acepção jurídica do termo, para fins de concessão do benefício
da Justiça Gratuita. Trata-se de profissional autônomo, cuja renda tributável,
segundo informações por ele prestadas, era de R$ 800,00. Além deste processo
judicial, encontra-se envolvido em apenas mais uma demanda judicial em Porto
Alegre, no Juizado Especial Cível, em que é réu.
A ré é a pessoa jurídica que gerencia o SCPC (Serviço Central de Prote-
ção ao Crédito) e que presta serviços em geral relacionados à fornecimento
de informações para concessão de crédito e decisões de gestão de negócios
em geral609. Na comarca de Porto Alegre, foram encontrados 260 processos
ativos envolvendo a empresa610. No STJ, foram identificados 496 recursos
envolvendo a empresa611.
É possível verificar, portanto, uma conformação de um litigante ocasio-
nal, para quem a demanda é única, e um litigante repetitivo, no caso a
Boa Vista Serviços S.A., que se encontra envolvida com frequência em ações
versando sobre bancos de dados e cadastros de consumidores.
Passando para a análise do perfil dos advogados que representam as partes,
tem-se que o advogado do autor, Lisandro Gularte Moraes, é sócio do escritório
Moraes & Moraes Advogados e da Abrace (Associação Brasileira dos Consumi-
dores Endividados) desde 2003, cujo nome fantasia é “S.O.S Consumidor”. Essa
associação administra o site www.endividado.com, que divulga informações de

609 Segundo informações de seu site, a base de dados do SCPC contém de 200 milhões de consultas por mês
e que armazena mais de 350 milhões de informações comerciais sobre seus consumidores. Disponível
em <https://www.boavistaservicos.com.br/sobre-a-boa-vista-scpc/>, acesso em 18 dez. 2012.
610 Dados atualizados até 18.12.2017. Disponível em http://www.tjrs.jus.br.
611 Dados atualizados até 18.12.2017. Disponível em https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/.

263
Maria Cecília de Araujo Asperti

interesse de consumidores, fornece modelos de petição e tira dúvidas pela in-


ternet. Referido advogado patrocina 165 processos ativos em Porto Alegre612 e
já atuou em 911 recursos no STJ, em sua grande maioria em contraposição a
instituições financeiras e de crédito613.
A ré, por seu turno, era representada pelo escritório Ramos & Rosa, Cos-
tabeber, Filipelli e Papadopol, de Porto Alegre. Após a afetação do recurso re-
presentativo da controvérsia, o patrocínio da ré foi transferido para o escritório
Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados que, inclusive, re-
presentou os interesses da empresa na ocasião da audiência pública.
Constata-se, assim, que os advogados de ambas as partes podem ser con-
siderados especialistas quanto à área do Direito (consumidor/empresarial)
e quanto ao perfil de sua clientela (consumidor/empresas mantenedoras de
cadastros de crédito). Podem (e o caso demonstrou que, de fato, o fazem) atuar
como ativistas de determinadas pautas e especialistas no debate proposto.
Em sua petição inicial, o autor alega ter sido sujeitado reiteradamente a
negativas de concessão de crédito (em lojas que possuem cartão próprio e
bancos) em razão de pontuação da qual não tinha conhecimento, mesmo não
possuindo nenhuma restrição de crédito. Aduz ter descoberto que a razão das
negativas seria a sua pontuação no sistema de scoring, (um “cadastro mantido
pelo réu e vendido às empresas”), a qual seria de 553, pontos em uma escala
máxima de 1.000, sendo assim taxado de “possível inadimplemente”. O autor
também relata não ter conseguido acesso aos dados existentes a seu respeito
no referido sistema, sob o argumento de serem “informações de caráter sigilo-
so de análise de crédito”.
Quanto às alegações essencialmente jurídicas, o autor alega que a ré teria
violado os seguintes dispositivos: (i) artigo 3º da Lei do Cadastro Positivo (Lei
nº 12.414/2011), que permite apenas informações acerca do adimplemento do
consumidor, na medida em que no caso em questão fora atribuído juízo de
valor negativo; (ii) artigo 4º, que demanda autorização expressa para abertura
do cadastro; (iii) artigo 5º, IV, que determina que os critérios de análise de
risco devem ser informados; (iv) artigo 6º, §1º, em virtude das dificuldades de
se obter informações sobre o sistema de pontuação; (v) artigo 43 do CDC (não

612 Dados atualizados até 18.12.2017. Disponível em http://www.tjrs.jus.br.


613 Dados atualizados até 18.12.2017. Disponível em https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/.

264
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

teve ciência do cadastro)614; e (vi) artigo 16 do CDC, que asseguraria o direito


de indenização em razão do caráter depreciativo das informações armazedadas.
Pede, ainda, a inversão do ônus da prova.
A ré, em sua contestação, sustenta que não pode ser responsabilizada por
eventuais danos alegadamente sofridos pelo autor, visto não ser sua a decisão
de concessão ou não do crédito615, e que o sistema de scoring não passaria de
uma análise de perfil do consumidor realizada a partir de dados cadastrais in-
formados pelo próprio consumidor e disponibilizados publicamente616. Não se
basearia em critérios subjetivos, tampouco poderia ser considerado um cadastro
positivo, visto que não armazena dados, mas apenas realiza uma análise estatís-
tica de dados pré-existentes.
A Boa Vista então sustenta: (i) sua ilegitimidade passiva, tendo em vista que
o crédito foi negado pelo comércio, e não pela Boa Vista, que presta um serviço
“meramente consultivo” (artigo 267, VI, CPC/1973); (ii) a inaplicabilidade da
Lei nº 12.414/2011 (Cadastro Positivo), visto que o SCPC Score utiliza apenas

614 “Em suma, O SCPC SCORE CRÉDITO, além do método kafkaniano de julgamento da credibilidade
do consumidor, da forma como é disponibilizado, sequer se mostra um cadastro positivo, mas sim
se revela um cadastro com caráter desabonatório muito mais danoso que os registros negativos
tradicionais (por inadimplência), que são de fácil compreensão, podem ser consultados sem
dificuldade e, após o prazo de 5 anos, adimplemento da obrigação ou ordem judicial, são cancelados,
ao contrário do SCPC SCORE CRÉDITO, que restringe o crédito sem critérios conhecidos pelo
consumidor, atribuindo juízo negativo de valor ao mesmo injustamente, induzindo comerciante
que consulta-o a negar crédito mesmo ao consumidor que está com o ‘nome limpo’” (Processo nº
001/1.12.0110621-5, 10ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, trecho da petição inicial, fls. 3).
615 “O serviço de consulta prestado pelo requerido limita-se a duas situações específicas: a) informar
ao comerciante a existência de atuais restrições financeiras em nome do solicitante do crédito e, b)
realizar a análise de crédito do consumidor mediante aplicação de critérios obietivos, posto que dita
análise parte justamente dos dados informados pelo próprio consumidor no momento em que solicita
o crédito (apenas quando solicitado pelo estabelecimento comercial). (...) Nessa medida, o mesmo
consumidor pode ter seu crédito analisado em dois estabelecimentos comerciais distintos, no mesmo
dia, e obter crédito em ambos, ou em apenas um deles ou em nenhum. As informações prestadas pelo
demandado ao comerciantesao as mesmas, contudo, a avaliação destes dados é restrita ao responsável
pela concessão do crédito, de acordo com sua política de vendas.” (Processo nº 001/1.12.0110621-5,
10ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, trecho da contestação, fls. 46-48).
616 “Ocorre Excelência, que os dados dos quais o aludido sistema estatístico se utiliza para formar o
perfil cadastral do consumidor são públicos, tais como, existência ou não de ações judiciais em
face do solicitante do crédito, títulos protestados, etc. ou ainda, dados de que dispõe o próprio
demandado, como por exemplo, o histórico de inadimplência, jamais superior a cinco anos, bem
como e principalmente, as informações prestadas pelo próprio consumidor quando solicita crédito,
a exemplo do valor de renda mensal, etc.” (Processo nº 001/1.12.0110621-5, 10ª Vara Cível do Foro
Central de Porto Alegre, trecho da contestação, fls. 49).

265
Maria Cecília de Araujo Asperti

dados públicos e dados informados pelo próprio consumidor para gerar a esta-
tística do score (seria este apenas um serviço de análise de informações); (iii)
ausência de prova acerca da negativa de crédito, ônus este que competia à parte
autora; e (iv) inexistência dos requisitos de configuração do dever de indenizar
(arts. 186 e 927 do Código Civil).
Ainda na contestação, a conduta do autor e dos demais litigantes que ques-
tionam judicialmente o sistema de scoring é criticada pela ré e taxada de opor-
tunista e de representativa da “indústria do dano moral”617.

b) Recurso Especial nº 1.457.199/RS: Ministério Público x CDL

A ação civil pública da qual se originou o segundo RRC afetado foi manejada
com base em elementos coletados no Inquérito Civil nº 157/2010. Este, por seu
turno, fora instaurado a partir de elementos do processo nº 001/1.09.0233781-9,
encaminhado pela 3ª Vara Cível do Foro Central da Comerca de Porto Alegre
ao Ministério Público618.
Concluído o Inquérito Civil, o Ministério Público ajuizou ação civil pública
contra a CDL pleiteando, em síntese: (i) a suspensão liminar do “Crediscore”
enquanto não este não se adequar ao quanto disposto na Lei nº 12.414/2011,
especialmente no que tange aos critérios de formação do banco de dados, acesso
destes ao consumidor e autorização prévia para cadastramento, excluindo-se

617 Conforme trecho da contestação em que a ré afirma que esta seria “mais uma medida característica
da indústria do dano moral, na qual se procuram brechas no sistema empresarial para obter vantagens
indevidas junto ao Judiciário” (Processo nº 001/1.12.0110621-5, 10ª Vara Cível do Foro Central de
Porto Alegre, trecho da contestação, fls. 51).
618 A ação em questão fora ajuizada por Carla de Deus Vieira contra a Câmara de Dirigentes Lojistas
de Porto Alegre - CDL e a Companhia Zaffari Bourbon, na qual a autora sustenta que não teria
conseguido obter crédito em razão de dados do sistema “Crediscore”. A autora dessa demanda foi
representada pelo mesmo advogado que representou os interesses do recorrido/autor do Recurso
Especial nº 1.419.697/RS (Dr. Lisandro Moraes), suscitando uma argumentação semelhante para
pleitear, também, o acesso aos dados do “Crediscore” e o pagamento de indenização por danos
morais. Importante pontuar que a despeito de serem suscitadas praticamente as questões jurídicas,
a narrativa dos fatos desse caso não se confunde com a da ação individual ajuizada em nome de
Anderson Guilherme Prado Soares. Nesse processo, explica-se como a autora tomou conhecimento
do sistema de Crediscore, mantido pela CDL, e quais as restrições que lhe foram aplicadas a partir
de sua pontuação. Narra-se, por exemplo, a informação obtida de que estabelecimentos que utilizam
o Crediscore apenas reavaliam o consumidor rejeitado 6 meses após a primeira análise, e somente se
houver alguma mudança nos dados avaliados. Novamente, se traz à tona o caráter confidencial da
pontuação e a tentativa da autora de obter informações a respeito (Processo nº 001/1.09.0233781-9,
3ª Vara Cível de Porto Alegre, fls. 2-7).

266
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

todos os dados existentes, sob pena de multa diária por descumprimento; (ii)
a confirmação da tutela concedida liminarmente; (iii) indenização ao paga-
mento de danos morais e materiais causados aos consumidores individualmente
considerados, na forma dos artigos 6º, VI, 91 e 95, do CDC; (iv) indenização
por danos difusos, no valor de R$ 300.000,00, a ser destinado ao “Fundo de
Reconstituição de Bens Lesados”, conforme previsto pelo artigo 13 da Lei nº
7.347/1985; e (v) cumprimento de obrigação de fazer consistente em publicar,
após o trânsito em julgado, uma mensagem em jornais de grande circulação
acerca da sentença proferida para que os consumidores possam postular a re-
composição individual pelos danos sofridos (Processo nº 001/1.12.0109378-4
– 15ª Vara Cível da Comarca de Porto Alegre).
A ação coletiva foi ajuizada pelo Ministério Público, pela Promotoria de Jus-
tiça Especializada de Direito do Consumidor. A ré, por sua vez, é uma associa-
ção comercial estabelecida em Porto Alegre que realiza serviços de consultoria
de negócios e de crédito, em parceria com a SCPC. Foram 5.890 recursos em
trâmite perante o STJ619 envolvendo a CDL.
Tanto o Ministério Público quanto a CDL podem ser considerados liti-
gantes repetitivos, assinalando-se a particularidade dessa tipologia aplicada
ao Ministério Público620 que, em realidade, atua nesse caso como substituto
processual e legitimado extraordinário para defesa de direitos de consumido-
res que tivessem restrições ou negativas de crédito em razão da pontuação do
sistema de score de crédito.
Quanto aos advogados das partes, tem-se, no polo ativo, a atuação de
uma promotoria especializada do Ministério Público e, representando a
CDL, o escritório Freitas, Macedo e Dalcin Advogados621, que elaborou a
contestação, e o escritório Frabris, Sittoni e Terra Advogados622, que passou

619 Dados atualizados até 18.12.2017. Acesso em https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/.


620 Sobre a compreensão do Ministério Público como litigante repetitivo, vide Capítulo 2, item 2.4., supra.
621 Pelo site, extrai-se que o escritório está estabelecido há mais de cinquenta anos e conta com cinco
sócios e sete associados. Dentre as áreas de atuação, informam que prestam assessoria nas áreas
de Direito Tributário, Civil, Trabalhista, recuperação de crédito, Direito do consumidor, contratos,
operações financeiras, Direito Público, seguros, e Direito Societário. Disponível em <http://
freitasmacedo.com/>, acesso em 19 dez. 2017.
622 Tal escritório atua há mais de vinte anos com atuação regional focada no Rio Grande do Sul. Conta
com dois sócios, dentre eles Fernando Smith Fabris, professor dos cursos de graduação e pós-graduação
da Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul - PUCRS e da Universidade do Vale do Rio dos Sinos
– UNISINOS. Disponível em <http://fabriseterralopes.com.br>, acesso em 19 dez. 2017.

267
Maria Cecília de Araujo Asperti

a atuar a partir do recurso. Pelo site das referidas bancas, pode se extrair que
enquanto a primeira possui um perfil full service, com atuação em diversas
áreas do Direito, a segunda poderia ser entendida como uma boutique de
serviços jurídicos623, tendo como um de seus dois sócios um professor de
prestigiosas universidades gaúchas.
Nesse caso, podemos afirmar que tanto no polo ativo, quanto passivo, atu-
aram promotores/advogados especializados de acordo com a matéria (con-
sumidor/empresarial) e com o perfil da clientela (consumidores/empresas
prestadoras de serviços).
Analisando-se as principais alegações deduzidos pelas partes, tem-se que
o Ministério Público sustenta que, após ter contato com o processo judicial
encaminhado à Promotoria, averiguou informações a respeito do sistema de
“Crediscore” da CDL, inclusive o teor do contrato firmado entre a associação
e as empresas que contrataram tal serviço, que consistiria em um “fornecimen-
to de dados de um consumidor, por meio de seu CPF”, para obtenção de três
pontuações: uma estimativa de adimplência, a probabilidade de o consumidor
ser negativado nos próximos seis meses e uma pontuação que avalia o risco da
transação diante da média do mercado624. Conclui, a partir dessas informações,
que o sistema é utilizado para subsidiar a concessão ou extensão de crédito a
partir de dados de comportamento do consumidor, pelo o que deverá estar su-
bordinado à Lei nº 12.414/2011.
Assim, a partir desse arcabouço fático, o Ministério Público alega que a
CDL estaria violando: (i) os critérios estabelecidos pela Lei nº 12.414/2011,
em seu artigo 3º, pois o sistema Crediscore possuíria critérios “obscuros”, na
medida em que, conforme seu próprio informativo, são analisadas “400 va-
riáveis comportamentais” e “126 variáveis relacionadas ao comportamento
do cheque”; (ii) ao artigo 43, §4º, do CDC, que estabelece que os bancos de
dados do consumidor são entidades de caráter público e que, portanto, não
podem armezenar informações que não possam ser compartilhadas com o

623 Sobre o perfil de prestação de serviços advocatícios conhecido como full service e boutique,
confira-se GABBAY, Daniela Monteiro; RAMOS, Luciana; SICA, Lígia Pinto. “Corporate Law
Firms: The Brazilian Case”. Paper apresentado no evento The Brazilian Legal Profession in the Age of
Globalization. 10 nov. 2015. Disponível em http://direitosp.fgv.br/evento/brazilian-legal-profession-
age-globalization, acesso em 19 dez. 2017.
624 Processo nº 001/1.12.0109378-4, 15ª Vara Cível da Comarca de Porto Alegre, fl. 3.

268
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

consumidor625; (iv) aos direitos previstos ao consumidor cujas informações são


armazenadas em cadastros positivos de crédito e obrigações das entidades que
gerem tais dados, tal como previsto nos arts. 5º e 6º, da Lei nº 12.414/2011,
inclusive de prover acesso ao consumidor, permitindo-lhe a impugnação das
informações e cancelar o seu cadastramento; (v) ao artigo 4º, também da Lei
nº 12.414/2011, que prevê a necessidade de consentimento prévio do consumi-
dor para abertura do cadastro, conforme entendimento sumulado pelo STJ626.
Citada, a CDL contestou a ação civil pública, arguindo, preliminarmen-
te, a existência de litispendência entre a demanda e a ação civil pública
ajuizada anteriormente pela Associação Gaúcha de Defesa dos Interesses
da Cidadania e do Consumidor (AGDICC), que aalegadamente veicularia

625 “Ademais, o sistema tem caráter mais do que sigiloso; é secreto, conforme mencionou o magistrado na
sentença que acolheu o pedido da reclamante (fl. 142). O contratante desse sistema não poderia sequer
informar sobre a celebração do contrato (item 6.5., fl. 71). Ao consumidor igualmente é subtraído o
direito à informação, conforme se lê na cláusula 6.4 (fl. 70)” (Processo nº 001/1.12.0109378-4, 15ª
Vara Cível da Comarca de Porto Alegre, trecho da petição inicial, fl. 3).
626 Súmula nº 359: “Cabe ao órgão mantenedor do Cadastro de Proteção ao Crédito a notificação
do devedor antes de proceder à inscrição” (editada em 13.08.2008). Referido entendimento
também foi ratificado em julgamento de Recurso Especial Repetitivo, conforme Tema nº 40:
“A ausência de prévia comunicação ao consumidor da inscrição do seu nome em cadastros de
proteção ao crédito, prevista no art. 43, § 2º, do CDC, enseja o direito à compensação por danos
morais” (julgamento em 10.12.2008).

269
Maria Cecília de Araujo Asperti

o mesmo pedido e causa de pedir (Processo nº 001/1.10.0244810-8)627-628.


No mérito, argumentou que o “Crediscan” (novo nome “Crediscore”) não
seria equivalente a um cadastro positivo, uma vez que se utilizaria de infor-
mações já disponíveis no cadastro do sistema SCPC, bem como de outras
fornecidas na própria operação de crédito, para pontuar essa operação em
questão, e não o consumidor em si629. O banco de dados utilizado (SCPC),
por seu turno, estaria em consonância com o artigo 43 do CDC, sendo ple-
namente acessível aos consumidores.
Aduz que essa análise de risco realizada pelo seu sistema seria plenamente
lícita e comum, tal como se faz em demais ramos da atividade econômica (como
em seguros), além de desejável para evitar o superindividamento.
Importante mencionar que antes do ajuizamento da ação civil pública
pelo Ministério Público, fora proferida decisão liminar pela 16ª Vara Cível

627 Há uma diferença essencial entre a causa de pedir dessa ação coletiva ajuizada pela AGDICC e a
ação proposta pelo Ministério Público: na primeira (Processo nº 001/1.10.0244810-8) a causa de
pedir se orienta, essencialmente, pela aplicação do CDC e para compreensão do score de crédito
como um cadastro de proteção ao crédito, enquanto na segunda (Processo nº 001/1.12.0109378-4),
argumenta-se pela aplicação da Lei de Cadastro Positivo, descrevendo-se o Crediscore como um
sistema que avalia o comportamento do consumidor, sendo, assim, aplicável os dispositivos atinentes
à lei em comento, inclusive quanto à clareza e objetividade das informações, consentimento prévio
do consumidor e acessibilidade das informações a seu respeito. Na ação da AGDICC, não havia
sido pleiteado, inicialmente, o reconhecimento da ilegalidade do Crediscore, mas somente que a
CDL providenciasse o acesso, aos consumidores, aos dados a seu respeito e que somente inserisse
novos dados após a notificação destes. O juízo da 16ª Vara Cível de Porto Alegre determinou que a
AGDICC emendasse a inicial para incorporar, efetivamente, a “macrolide” atinente ao Crediscore,
de modo que fosse também discutida nessa sede a questão da legalidade em si do sistema (decisão
proferida em 15.04.2013), porém tornou sem efeito referida determinação após constatar a existência
desta ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público. Também pelos autos do inquérito civil,
verifica-se que havia, ainda, outra ação coletiva também ajuizada pelo Ministério Público (Processo
nº 001.11.0164638-2) antes da ação afetada como RRC, na qual, do mesmo modo, a argumentação
e pedidos restringem-se à aplicação do CDC (sem mencionar a Lei do Cadastro Positivo). Nesta,
também foi deferida uma medida liminar para que os consumidores cujos dados estivessem
cadastrados no sistema fossem notificados, excluíndo-se os demais. Foram identificadas, portanto,
três ações coletivas ajuizadas contra a CDL referente ao Crediscore, sendo a afetada aquela que
contém uma argumentação mais completa.
628 Importante anotar que, com relação ao pedido indenizatório da ação coletiva da AGDICC, seriam
beneficiados apenas os seus associados, conforme artigo 2-A da Lei nº 9494/97 e de acordo com
decisão proferida pelo juízo da 16ª Vara Cível de Porto Alegre em 23.10.2010.
629 Argumenta-se serem avaliadas não só as características do consumidor, mas também do lojista, do
perfil do seu negócio, de sua carteira de crédito, etc. (Processo nº 001/1.12.0109378-4, 15ª Vara Cível
da Comarca de Porto Alegre, fl. 335).

270
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

de Porto Alegre, ajuizada pela AGDICC (Processo nº 001/1.10.0244810-8),


determinando que a CDL disponibilizasse aos consumidores, em postos de
atendimento e via telefone, informações sobre os dados que viessem a lhe
causar prejuízo em avaliação de crédito e que notificasse previamente o
consumidor caso um dado desabonador seja inserido no sistema, bem como
que se abstivesse de utilizar dados de pessoas cuja inadimplência seja ante-
rior a cinco anos. A ação civil pública da AGDICC foi julgada procedente
em 28.06.2013630.

6.2.3. Provas e decisões proferidas nos casos paradigma

a) Recurso Especial nº 1.419.697/RS: Boa Vista Serviços


x Anderson Guilherme Prado Soares

No Recurso Especial nº 1.419.697/RS, o autor apresentou um extrato


do Serasa, demonstrando não haver qualquer pendência em seu nome. A
ré, por seu turno, juntou um extrato de pesquisa ao sistema SCPC, em que
constavam cinco pendências financeiras (ainda que pretéritas) em nome do
autor, para arguir que o sistema de score utiliza-se de informações já exis-

630 “O sistema oferecido pela ré, verdadeiramente, é uma ferramenta de análise comportamental
de crédito do consumidor, que tem por objetivo possibilitar à empresa associada, através de uma
pontuação de crédito, identificar dentre os pretensos clientes aqueles que se encaixam em um
quadro de maior risco para contratação. Trata-se sim de um cadastro oculto realizado em nome
do consumidor, o qual mantém dados armazenados sobre determinada pessoa sem que esta tenha
conhecimento das informações, e, ainda, sem que a mesma possua qualquer restrição nos órgãos
de proteção ao crédito. O produto em questão, salvo melhor juízo, nada mais é do que uma análise
de “risco” da empresa contratante a disponibilizar crédito ao consumidor, utilizando-se de diversas
variáveis comportamentais elaboradas em nome do consumidor, tais como cadastros negativos
anteriormente realizados, cheques sem fundos devolvidos, demandas judiciais ajuizadas contra
empresas, etc. Ou seja, criou o CDL um mecanismo do qual empresa que adquirem o produto se
baseiam a fim de conceder ou não os créditos aos consumidores, sendo estes critérios subjetivos
e sigilosos, atitude esta que viola os princípios da Constituição Federal e do Código de Defesa do
Consumidor, especialmente o princípio da informação previsto no artigo 6º, inciso III, a qual deve
ser clara e adequada sobre os diferentes produtos com especificação correta de suas características.
O CREDISCORE, como frisado, nada mais é do que um banco de dados aberto em nome do
consumidor, sem observância, entretanto, daquilo que disposto no art. 43, do Código de Defesa
do Consumidor” (Sentença da ação da AGDICC contra a CDL, Processo nº 001/1.10.0244810-8,
proferida em 24.06.2013).

271
Maria Cecília de Araujo Asperti

tentes no cadastro de inadimplência, além de dados públicos ou informados


pelo próprio consumidor631.
Nesse caso, fora realizada audiência de instrução, com depoimento pessoal
do autor e da preposta da ré, em 11.12.2012. Nessa ocasião, o autor afirmou
que seu crédito fora negado por volta de abril daquele ano por varejistas e
instituições financeiras, muito embora não conseguisse ter acesso às informa-
ções e não tivesse conhecimento de inscrições de dívidas em seu nome. No
depoimento da preposta da ré, o juízo a questiona repetidamente sobre o fun-
cionamento do sistema de score e se o consumidor teria acesso às informações
e estatísticas produzidas a seu respeito632. A preposta não soube responder a

631 O autor argumenta em alegações finais orais não ter tido a oportunidade de se manifestar a respeito
do documento apresentado pela SCPC: “Em tese a documentação foi constituída de forma unilateral,
sem possibilitar a ampla defesa, o contraditório a respeito, violando a própria defesa do consumidor.
As informações que aqui estão são posteriores a data da negativa do crédito, consequentemente
não faz alusão no case, dessa forma peço a impugnação dessa documentação” (Processo nº
001/1.12.0110621-5, 10ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, fls. 93).
632 Conforme transcrição da audiência:
Juiz: O consumidor tem acesso aos dados do Score, ele diretamente?
Preposta: Não existe um banco de dados.
Juiz: Como é que fica registrado no Score, o que é o Score?
Preposta: É uma ferramenta estatística.
Juiz: E esses dados estatísticos o consumidor tem acesso?
Preposta: Não sei lhe informar.
Juiz: A senhora tem que saber, o art. 345 do Código de Processo Civil lhe coloca esse ônus, a senhora
vem como preposta, tem que saber responder, se não eu lhe aplico a pena de confissão agora! Eu vou
lhe refazer a pergunta e vou lhe dar uma chance de responder, a senhora já advertida, depois eu não
vou advertir de novo! O consumidor tem acesso a esses dados do Score?
Preposta: Sim.
Juiz: Como ele faz para acessar esse dado, ele pode entrar pelo site, ele tem alguma senha que vocês
fornecem, ele vai até a sede do local e pede essa informação?
Preposta: Sim, na sede do local.
Juiz: Ele teria acesso a esses dados estatísticos?
Preposta: Sim.
Juiz: Como ele fica sabendo disso, pela página da internet?
Preposta: Fica sabendo do que?
Juiz: Que tem esses dados estatísticos? A senhora disse que são dados estatísticos, como ele sabe que
tem os dados estatísticos, ele vai numa loja e negam o crédito, aí ele é informado que é no Crediscore
tem dados a teu respeito, é isso que acontece?
Preposta: Não.
Juiz: Então como ele sabe que os dados estão lá?
Preposta: Eu não entendi a sua pergunta, desculpa.
Juiz: Como o consumidor fica sabendo que existem dados no Crediscore a respeito dele?
Preposta: Eu não entendi.

272
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

essa pergunta, aplicando-se na sentença a pena de confissão, com fulcro no


artigo 345 do CPC/1973.
A sentença, proferida na própria audiência de instrução, adota como fun-
damentação o teor de decisão monocrática proferida pela 10ª Câmara Cível
do TJRS (nº 70051943249), que entendeu ser o sistema de score análogo a um
banco de dados e deveria estar sujeito ao artigo 43 do CDC, havendo violação
a ser indenizada. Caberia à ré, se quisesse vincular a negativa de crédito do
autor a registro anterior, fazer prova nesse sentido, dada a inversão do ônus da
prova prevista no CDC. Não só não o fez, como também não soube informar
(inclusive na audiência) como o consumidor poderia ter acesso aos dados que
embasaram a sua pontuação633. Com base nesses fundamentos, o juízo conde-
nou a Boa Vista ao cumprimento de obrigação de fazer, consistente em “excluir
o nome do autor do cadastro Crediscore de forma definitiva”, sob pena de multa,
e ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 6.220,00.
Tendo a Boa Vista S.A. recorrido da sentença, o recurso foi julgado mono-
craticamente Desembargadora Relatora Marilene Bonzanini, da 9ª Câmara Cí-
vel, que também se posicionou pela ilicitude do sistema, que violaria os artigos
5º, inciso XXXIII, da Constituição Federal, e o artigo 6º, III, do CDC, ao não
prover acesso pelo consumidor aos dados a seu respeito. Além disso, haveria
também violação ao artigo 43 do CDC, tendo em vista que são utilizadas infor-
mações referentes à débitos excluídos ou mais antigos do que cinco anos634. Para

Juiz: A senhora está brincando comigo?


Preposta: Não, eu só não entendi a pergunta.
Juiz: Como o consumidor descobre que têm dados a respeito dele no Crediscore, é a terceira vez que
eu estou lhe formulando a mesma pergunta? A senhora sabe responder, ou não?
Preposta: Não sei lhe dizer.
Juiz: Nada mais”. (Processo nº 001/1.12.0110621-5, 10ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre,
ata de audiência, fls. 90-92).
633 “A questão é clara, a prova para convencer o Juiz, quando seguida com a inversão do ônus da prova
porque pacífica a aplicação do código de Defesa do Consumidor ao Crediscore, com base no art. 6º,
inciso VIII, onde obriga a ré a fazer prova detalhada. Assim, se queria vincular a negativa de crédito do
autor ao registro anterior, deveria ter feito as perguntas completas, não sendo obrigação do magistrado
buscar tal prova, eis que questão eminentemente patrimonial. Além disso, a preposta não soube
informar como o consumidor tinha acesso a tais dados, sendo caso de aplicação do art. 345 do Código
de Processo civil, com a advertência que foi feita e a pergunta foi repetida três vezes” (Processo nº
001/1.12.0110621-5, 10ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, sentença, fls. 95-96).
634 “Sendo assim, é abusiva a prática comercial de utilizar dados dos consumidores, inclusive após
a exclusão das inscrições negativas pelo decurso do prazo de cinco anos, para lhe aí lançar uma
pontuação, de forma a verificar a probabilidade de inadimplemento. Sem dúvidas, este sistema

273
Maria Cecília de Araujo Asperti

a Desembargadora, o dano moral gerado nesse caso seria in re ipsa, não havendo
necessidade de sua comprovação no caso concreto. Considera, portanto, referi-
do sistema abusivo pela sua falta de transparência e de clareza.
Contra referida decisão monocrática, a Boa Vista Serviço S/A interpôs agra-
vo interno, ao qual a 9ª Câmara Cível negou provimento. Há, contudo, voto
vencido da Desembargadora Helena Medeiros Nogueira no sentido de que o
dano moral dependeria de comprovação da negativa de crédito, que configura-
ria o descumprimento do dever de informação e transparência, não podendo se
concluir pela existência de dano moral in re ipsa635.
Foram opostos embargos de declaração, que foram rejeitados, tendo o Re-
curso Especial sido interposto em 10.07.2013, por alegada violação ao artigo
535, I e II, (omissão e contradição no acórdão recorrido), ao artigo 267, VI (ile-
gitimidade passiva) e ao artigo 333, II (ônus do autor de comprovação de fatos
constitutivos de seu direito), do CPC/1973. Também alega inexistência de rela-
ção entre o score e o cadastro positivo, na medida em que aquele é apenas um
sistema estatístico que trabalha com dados fornecidos pelo próprio consumidor
e informações de acesso público.
A análise da sentença e do acórdão revela que a questão fulcral no julga-
mento do caso, até então, era a acessibilidade dos dados pelo consumidor,
que teria o direito de conhecer quais dados são armazenados a seu respeito
para fins de ranqueamento e concessão de crédito. Foi esse o objeto central da
instrução probatória conduzida pelo juízo de primeiro grau e da fundamentação
da decisão monocrática prolatada em sede de apelação.
Também pode se perceber que questões fáticas foram relevantes para o
julgamento do caso, em especial as negativas de crédito embasadas na pontua-

não é um mero serviço ou ferramenta de apoio e proteção aos fornecedores, como quer fazer crer
a demandada, mas uma forma de burlar direitos fundamentais, afrontando toda a sistemática
protetiva do consumidor, que inegavelmente se sobrepõe à proteção do crédito” (Apelação Cível nº
70053783122, 9ª Câmara Cível, fls. 139).
635 “Entrementes, no que tange ao pedido de indenizaçao por danos morais amparado na mera existência
e manutenção do nome da parte autora no serviço, entendo não deve prosperar a pretensão. Isso
porque, ainda que configurada a ilicitude do serviço nos moldes em que apresentado nos autos e a
caracterização do dano moral pelo descumprimento do dever de informação e transparência, não se
denota a configuraçõ do dano moral reclamado pela parte autora pela mera existência e manutenção
de seu nome no referido serviço, mormente porquanto sequer se vislumbra, no caso dos autos, tenha
efetivamento havido abalo de crédito conforme alegado em sua petição inicial, prova plenamente
cabível de produzir e ônus que lhe incumbia nos termos do artigo 333, I, do Código de Processo Civil”
(Apelação Cível nº 70053783122, 9ª Câmara Cível, fls. 136).

274
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

ção, o funcionamento do sistema e sua acessibilidade ao consumidor. As provas


produzidas (inclusive oral) influíram nas decisões proferidas subsequente-
mente, não se podendo dizer que as questões jurídicas foram discutidas abs-
tratamente, a partir de fatos incontroversos ou cuja comprovação documental
tenha sido considerada suficiente pelo julgador.
b) Recurso Especial nº 1.457.199/RS: Ministério Público x CDL
Na ação civil pública nº 001/1.12.0109378-4, o Ministério Público trouxe
aos autos todo as provas coletadas durante o Inquérito Civil: (i) reclamações
de consumidores junto ao PROCON; (ii) cópias de outros processos ajuiza-
dos contra a CDL acerca do “Crediscore”636; (iii) ata de reunião realizada com
representante legal do CDL; (iv) dados de duas ações coletivas anteriores, in-
clusive aquela em que fora deferida medida liminar para disponibilização de
informações aos consumidores sobre sua pontuação; (iv) ata de constatação,
via secretario de diligências da promotoria, sobre o cumprimento da decisão
liminar; (v) demais informações coletadas na internet que a CDL utiliza para
divulgar o sistema de Crediscore; e (vi) cópia do contrato de prestação de servi-
ços utilizado pela asssociação para com seus clientes.
Recebida a contestação, o juízo deferiu, em 26.09.2012, medida liminar para que
o “Crediscore” fosse suspenso até que se adequasse à Lei nº 12.414/2011, excluindo
todos os consumidores que não tivesse anuído com sua inclusão no cadastro637.
Na sentença, contudo, a magistrada de primeiro grau alterou seu posicio-
namento e julgou a ação improcedente, por entender que o sistema de scoring

636 Frise-se que todos os processos individuais cujas cópias foram juntadas na ação coletiva foram
ajuizados pelo Dr. Lisando Moraes, tal como na ação individual afetada para fins de julgamento de
recurso especial repetitivo.
637 “Dado o exposto, nos termos do art. 273, caput c/c § 1º, do Código de Processo Civil, defiro o
pedido de antecipação de tutela para: (a) Determinar que a ré efetue no prazo máximo razoável de
30 (trinta) dias, a suspensão do sistema Crediscan/Crediscore para a inclusão de novos cadastros
enquanto o mesmo não se adequar exatamente às imposições previstas na Lei nº 12.414/2011,
especialmente, mas não só relacionadas à formação do banco de dados (art. 3º, § 1º), inscrição
(art. 4º, caput) e divulgação das informações (art. 5º e 6º); (b) que exclua todos os registros dos
consumidores inscritos no sistema CREDISCAN/CREDISCORE, que não requereram a inclusão no
sistema; (c) se abstenha de prestar informações aos seus conveniados, sobre consumidores inscritos
em bancos de dados, enquanto não proceder à regularização referida no item ‘a’. (d) para o caso de
descumprimento das alíneas acima referidas, aplico multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais)
por hipótese de descumprimento, devendo eventual valor ser revertido ao Fundo de Reconstituição
dos Bens Lesados, de acordo com o artigo 13 da Lei nº 7.347/85 (Processo nº 001/1.12.0109378-4, 15ª
Vara Cível da Comarca de Porto Alegre, fls. 363-364).

275
Maria Cecília de Araujo Asperti

seria “um produto baseado em modelos estatísticos de pontuação de crédito”,


cuja contratação por empresas seria livre e lícita638. Não se confundiria, assim,
com um cadastro positivo, por ser uma metodologia quantitativa e objetiva.
Entendeu, assim, que não haveria danos a serem indenizados e que o Ministério
Público não teria se desimcumbido do ônus de provar os danos coletivos. Não
há, na sentença, a referência a qualquer prova produzida no Inquérito Civil, mas
somente a links de sites das próprias empresas que fornecem os serviços de score
de crédito a respeito do sistema639 e do cadastro positivo640.
O Ministério Público apelou da sentença, reiterando a aplicabilidade do
CDC e da Lei de Cadastro Positivo e a obscuridade dos critérios e variáveis do
sistema de scoring. Em contrarrazões, a CDL também ratifica que o sistema seria
apenas uma “ferramenta”, e não um banco de dados.
No julgamento do recurso de Apelação, realizado em 11.09.2013, o voto ven-
cedor do Relator Jorge Luiz Lopes do Canto acolheu as alegações do Ministério
Público, especialmente de que o score de crédito seria, sim, um banco de dados,
e que, como tal, deve ter seus critérios informados aos consumidores, à luz do
artigo 43 do CDC e da Lei do Cadastro Positivo. O longo acórdão (85 folhas)

638 A julgadora cita trecho do voto da Apelação Cível nº 70040483265 em que se considerou que “o SPC
Crediscore tem como objetivo definir um perfil de consumidor conforme a capacidade de crédito e/
ou contrair dívida, não se tratando de um registro negativo, mas sim uma ferramenta de análise do
comportamento do consumidor no mercado" (Processo nº 001/1.12.0109378-4, 15ª Vara Cível da
Comarca de Porto Alegre, fl. 399).
639 “Concentre Scoring é um produto baseado em modelos estatísticos de pontuação de crédito.
Fortemente apoiado em informações negativas, o produto compreende diversos modelos estatísticos,
cada um deles direcionado para um determinado perfil de histórico de crédito. Os modelos fornecem
uma pontuação que representa a probabilidade de um proponente de crédito tornar-se inadimplente
no mercado em um período de 12 meses. Por considerar informações tão abrangentes, o Concentre
Scoring agrega valor aos processos de gestão de risco, mesmo para empresas que já possuem modelos
internos de escoragem de crédito. A utilização conjunta de modelos internos com o Concentre
Scoring permite a otimização do uso das informações nas avaliações de risco de crédito (http://
www.serasaexperian.com.br/solucoes/concentre/concentre_concentrescoring.htm#ixzz1fsNLJJ00)”
(Processo nº 001/1.12.0109378-4, 15ª Vara Cível da Comarca de Porto Alegre, fl. 398).
640 “O Cadastro Positivo é um banco de dados no qual são registrados os compromissos financeiros
e de pagamentos relativos às operações de crédito e obrigações de pagamento liquidadas ou em
andamento por pessoa natural ou jurídica. Com isso, o consumidor cadastrado pode ser acompanhado
também pelo histórico de pagamentos que faz, tornando o processo de concessão de crédito mais
completo e eficaz (https://www2.boavistaservicos.com.br/consumidorpositivo/cadastro-positivo.
php). O Cadastro Positivo é um banco de dados com informações de consumidores que têm histórico
favorável de pagamento (http://www.spcbrasil.org.br/consumidor/cadastro-positivo)” (Processo nº
001/1.12.0109378-4, 15ª Vara Cível da Comarca de Porto Alegre, fl. 399).

276
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

discorre sobre o dever de informação de empresas mantenedoras de cadastros


de crédito641 e, diferentemente da sentença, coloca sobre a CDL o ônus de pro-
var os “fatos desconstitutivos” do direito alegado pela Promotoria.
Reconhecendo-se a irregularidade do sistema de score, a CDL e as empresas
de seu grupo econômico foram condenadas: (i) a suspender o “Crediscore” e à
exclusão dos consumidores que não tiverem sido notificados sobre sua inclusão
no banco de dados e a informar claramente os critérios utilizados para cálculo
da pontuação a cada consumidor642; (ii) ao pagamento de indenização por danos
morais aos consumidores que demonstrarem que tiveram o crédito negado, sem
necessidade de comprovar prejuízo, no valor de R$ 4.500,00; (iii) ao pagamento
de indenização por danos difusos, no valor de R$ 250.000,00; (ix) ao pagamento
de indenização por eventuais danos materiais experienciados pelo consumidor; e
(x) ao dever de publicação em jornais de grande circulação do teor da sentença.
O Relator determinou, ainda, suspensão das ações individuais até o trânsito
em julgado da ação coletiva, entendendo-se não haver violação à isonomia ou ao
direito de ação nessa medida643, e extensão nacional dos efeitos da sentença, con-
soante entendimento do STJ em Recurso Especial Repetitivo nº 1.243.887/PR644.

641 “Outro ponto que cabe destacar é que, se há banco de dados relativo aos consumidores, é dever
informar a estes quais os critérios utilizados para a divulgação dos dados registrados naquele, bem
como os parâmetros estabelecidos para a classificação e pontuação atribuída a cada consumidor para
o fim de cálculo de probabilidade de risco, sob pena de atentar ao direito de retificação” (Apelação
nº 70056228738, trecho do voto do Relator Ministro Jorge Luiz Lopes do Canto).
642 “(...) merece guarida em parte a pretensão de suspensão do sistema de avaliação de crédito em
questão, também denominado de “Crediscore”, e exclusão dos consumidores do referido cadastro
ou banco de dados, o qual poderá ser utilizado se houver comunicação previa, demonstrando os
critérios para auferir a pontuação atribuída a cada consumidor, especificando, ponto a ponto, os
itens considerados para chegar ao resultado final da avaliação, que deverá ser informada de maneira
clara, objetiva e adequada. Este dever legal ser para que não gere qualquer dúvida e possibilite a parte
hipossuficiente, em termos técnicos jurídico-econômicos, apresentar eventual discordância quanto
a determinado fator de risco ponderado na média que lhe foi atribuída” (Apelação nº 70056228738,
trecho do voto do Relator Ministro Jorge Luiz Lopes do Canto).
643 Ressalte-se, ainda, que a mera falta de interesse de dados titulares dos direitos individuais homogêneos
em buscar a tutela por meio da ação coletiva não pode implicar a violação dos princípios da isonomia,
da celeridade e da economia processual, acarretando a paralisação do Judiciário na solução de questões
que demandam decisão uniforme, quando eles somente poderão ser beneficiados pela decisão”
(Apelação nº 70056228738, trecho do voto do Relator Ministro Jorge Luiz Lopes do Canto).
644 “Para efeitos do art. 543-C do CPC: 1.1. A liquidação e a execução individual de sentença genérica
proferida em ação civil coletiva pode ser ajuizada no foro do domicílio do beneficiário, porquanto os
efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos
e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a

277
Maria Cecília de Araujo Asperti

Importante verificar que o acórdão transcendeu aos limites do pedido e da


causa de pedir da demanda coletiva, não só ao determinar a suspensão das
ações individuais, mas também ao estipular critérios probatórios para a liquida-
ção individual dos danos individuais, estipulando, inclusive, o que se chamou
de “presunção relativa em favor do consumidor”, a quem caberia:

“necessariamente indicar o nome da loja em que compareceu, a data,


o setor da empresa que informou a negativa ou restrição de crédito,
bem como o funcionário que prestou esta informação, se puder ser
identificado, além disso, se tal fato foi presenciado, comunicado a
pessoas que a acompanhavam ou estavam presentes nesta ocasião, as
quais poderão declarar este fato mediante instrumento particular”.

Após a oposição de Embargos de Declaração pela CDL e por outros interes-


sados (autores de ações individuais)645, que implicaram uma pontual correção
de erro material, a CDL interpôs Recurso Especial arguindo: negativa de vigên-
cia aos artigos 463, II e 535, I do CPC/2015; violação aos artigos 1º, 2º I, 4º e
5º da Lei nº 12.414/2011 e artigo 43 do CDC (“qualificação jurídica dos fatos
em desacordo com os referidos dispositivos de lei); violação ao artigo 43, §2º do
CDC (“imposição do dever de notificação prévia ao consumidor em hipótese
diversa daquela prevista em lei”; violação ao artigo 472 (“impossibilidade de
se opor a coisa julgada a terceiros que não participaram da relação processu-
al”); negativa de vigência ao artigo 195, XI da Lei nº 9.279/1996 (“violação
de segredo de negócio decorrente de excessivo dever de informação imposto
pelos vv. Acórdãos recorridos”); negativa de vigência ao artigo 16 da Lei nº
7.347/1985 (“indevida ampliação da eficácia da sentença para todo o território
nacional” e divergência jurisprudencial quanto à interpretação dos artigos da
Lei nº 12.414/2011 e do CDC.
Dentre os autores de ações individuais que buscaram intervir na ação co-
letiva, três (Carla, Acivaldo e Geni) chegaram a interpor recursos especiais
(autuados conjuntamente com o recurso da CDL), arguindo, em essência, a

qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103,
CDC)” (Recurso Especial nº 1.243.887/PR, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial,
julgamento em 19.10.2011).
645 Os recorrentes foram Carla de Deus Vieira Silveira (representada pelo Dr. Lisandro Goularte Moraes,
advogado também de Anderson Guilherme Prado Soares e de diversos autores de ações individuais);
Acivaldo Roger Pereira Ferreira e Geni Maria Teixeira Fermiano.

278
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

inadmissibilidade da suspensão dos processos individuais e o descabimento da


comprovação da negativa de crédito por parte dos consumidores, sendo sufi-
ciente a ausência de notificação, por parte das empresas prestadoras do serviço
de score de crédito, para que seja devida a indenização por danos morais.
Anote-se que o Ministério Público não recorreu e que, inclusive, apresentou
contrarrazões aos recursos dos interessados, mesmo no tocante à comprovação
da negativa de crédito.
Dessa análise da ação civil pública afetada para fins de julgamento de casos
repetitivos, temos então que a questão central foi a natureza do sistema de
score de crédito, divergindo-se sobre se consistiria em uma metodologia ou
uma simples ferramenta estatística ou se poderia ser considerada um banco de
dados, aplicando-se, assim, o CDC e a Lei de Cadastro Positivo.
Consigna-se, ainda, que a questão sobre a necessidade de se comprovar a
negativa de crédito, para fins de indenização por dano moral dos consumi-
dores, não havia sido discutida durante o processo em primeiro grau, sendo
apenas trazida no acórdão do recurso de Apelação, pelo próprio Tribunal, e
nos recursos especiais interpostos pelos interessados (autores de ações indi-
viduais que tramitavam concomitantemente à ação coletiva).
Do mesmo modo, a questão suscitada em Recurso Especial pela CDL, so-
bre a violação ao artigo 195, XI da Lei nº 9.279/1995 (proteção ao “segredo do
negócio” das empresas prestadoras do serviço de score) também não havia sido
discutida durante o processo.

6.2.4. Escolha do Recurso representativo da controvérsia


e sobrestamento
O Recurso Especial interposto pela Boa Vista no caso em que litigou contra
Anderson Guilherme Prado Soares, foi o primeiro a ser afetado como represen-
tativo da controvérsia, diretamente pelo STJ.
Inicialmente, a Terceira Vice-Presidência do TJRS, ao receber o processo
para o exame de admissibilidade do Recurso Especial, constatou que versava so-
bre “a natureza dos sistemas de scoring e a possibilidade de volação a princípios
e regras do Código de Defesa do Consumidor capaz de gerar indenização por
dano moral”, questão esta já repetida em múltiplos recursos julgados pelo tribu-
nal. Noticiou, ainda, que o TJRS já teria então encaminhado uma série de

279
Maria Cecília de Araujo Asperti

recursos sobre a matéria como representativos da controvérsia, conforme


artigo 543-C do CPC/1973646 e determinou a sua vinculação a estes, suspen-
dendo sua tramitação, a ser retomada após o julgamento da matéria pelo STJ.
No entanto, na sequencia, é trazida ao processo a informação de que foram
apresentados pedidos de desistência perante o STJ em 14 dos 15 recursos
especiais afetados como representativos da controvérsia. Os pedidos foram
acolhidos, restando apenas o Recurso Especial nº 1.378.138-RS647, que aguar-
daria julgamento. Em vista disso, e por cautela, entendeu-se pela admissão do
recurso, ainda que não como representativo da controvérsia648.
Analisando-se o andamento desses recursos no site do TJRS, verifica-se que
em todos são recorrentes a Boa Vista Serviços S/A, o Serasa S/A e a CDL649 e
mais da metade (8 recursos) eram patrocinados pelo mesmo advogado do autor
do caso paradigma, Dr. Lisandro Gularte Moraes. Todos os pedidos de desis-
tência foram apresentados entre junho e outubro de 2013. Ao que se verifica, as
três prestadoras de serviços de score agiram de forma coordenada para pleitear a
desistência de todos os demais recursos por eles próprios interpostos, o que pode
ter sido feito com intuito de tentar influenciar a escolha do caso representativio
ou impedir o julgamento de qualquer recurso e inibir a formação de precedente.
Posteriormente, verifica-se que também foi apresentado pedido de desistência
pelo recorrente CDL no Recurso Especial nº 1.378.138-RS, o qual foi julgado
prejudicado em razão do não conhecimento do recurso, tendo em vista que o

646 Conforme números atribuídos pelo TJRS: 70053228185, 70053556668, 70053502068, 70053539201,
70053239364, 70052441151, 70052731254, 70053223095, 70052711470, 70053243234, 700527843119,
70052773041, 70053243119, 70053170486, 70053225454.
647 Evani Pereira vs. CDL (Processo originário nº 001/1.11.0091605-0).
648 “Todavia, nos aludidos recursos foram deduzidos pedidos de desistência - já acolhidos -, e remanesce
na Corte Superior, como representativo da controvérsia, apenas o Recurso Especial n. 1.378.138-RS,
que aguarda julgamento. No entanto, mesmo não mais subsistindo os recursos especiais ofertados
como representativos da controvérsia, esta permanece, razão pela qual, por cautela, se mostra
conveniente a admissão do presente recurso, porém sem lastro no 1º do artigo 543-C do Código
de Processo Civil (...).Nesse contexto, considerando a peculiaridade da tese ora examinada - e não
havendo entendimento consolidado da Corte Superior sobre a tese -, razoável se mostra submetê-la
à análise da Corte Superior, viabilizando, assim, a melhor análise da matéria debatida” (Recurso
Especial nº 1.419.697/RS, fls. 277-279 do e-STJ).
649 A Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL) é acionista da Boa Vista Serviços S/A,
conforme informações disponíveis no site desta: <http://www.boavistaservicos.com.br/quem-somos/
acionistas/>, acesso em 12 jul. 2016.

280
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

advogado que subscreveu o recurso e o pedido de desistência não teria procu-


ração nos autos.
Assim, diante da homologação da desistência nos recursos afetados pelo
TJRS e do não conhecimento do único recurso que ainda tramitava, em
22.11.2013, o Relator Ministro Paulo Tarso Sanseverino, do STJ, selecionou o
Recurso Especial nº 1.419.697/RS como representativo da controvérsia, aduzin-
do, equivocadamente, que o TJRS já havia afetado referido apelo (o que, como
vimos, não ocorreu):

“O presente recurso foi admitido pela 3ª Vice-Presidência do Tribunal de


Justiça do Estado do Rio Grande do Sul como representativo de contro-
vérsia multitudinária, nos termos do que dispõem o § 1º do art. 543-C do
CPC e o art. 1º da Resolução 08/2008 deste Superior Tribunal de Justiça,
versando acerca da natureza dos sistemas de scoring e a possibilidade de
violação a princípios e regras do Código de Defesa do Consumidor capaz
de gerar indenização por dano moral.
Assim, considerando a multiplicidade de recursos com fundamento em
mesma questão de direito e estando, em princípio, presentes os requisitos
necessários ao exame do mérito do recurso especial, submeto seu julga-
mento à Segunda Seção, nos termos do art. 2º da Resolução n.º 8/2008
desta Superior Tribunal de Justiça”.

Em 27.11.2013, após notícia do TJRS de haveria 36.724 ações pendentes


sobre a matéria somente em Porto Alegre, o Relator determinou que a suspen-
são abrangesse todas as ações em trâmite no território nacional, mesmo as que
viessem a ser ajuizadas até o julgamento do caso paradigma650.
No caso do Recurso Especial da CLD e dos demais interessados (Carla,
Acivaldo e Geni) referente à ação coletiva do Ministério Público, a 3ª Vice-
-Presidência do TJRS admitiu todos os recursos e entendeu não ser cabível a sua
suspensão, a despeito da determinação do STJ, tendo em vista tratar-se de “ação

650 “Tendo em vista as informações prestadas pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul,
no sentido de, atualmente, estarem pendentes de distribuição - somente no Foro Central da Capital
- 36.724 ações que versam sobre a mesma matéria vertida no presente recurso especial, a exemplo do
decidido nos Recursos Especiais 1.060.210/SC (Rel. Min. Luiz Fux) e 1.251.331/RS (Rel. Min. Maria
Isabel Gallotti), cumpre esclarecer que: a) a suspensão abrange todas as ações em trâmite e que ainda
não tenham recebido solução definitiva; b) não há óbice para o ajuizamento de novas demandas, mas
as mesmas ficarão suspensas no juízo de primeiro grau; c) a suspensão terminará com o julgamento
do presente recurso repetitivo”.

281
Maria Cecília de Araujo Asperti

coletiva de consumo, com efeitos do acórdão estendidos a todo o território na-


cional”, cujo objeto não se confunde com o das ações individuais sobrestadas e
com o caso paradigma já afetado651. Entendeu-se, com isso, pela admissibilidade
do Recurso Especial e seu encaminhamento ao STJ, com a perspectiva de que
o caso pudesse “propiciar subsídios ao julgamento” da tese repetitiva, a despeito
das peculiaridades da ação coletiva.
Mesmo não tendo ocorrido a afetação pelo TJRS, identificada a relação en-
tre o caso e demais recursos atinentes ao tema do scoring pela Coordenadoria de
Registro de Processos Recursais do STJ, o recurso foi encaminhado ao Ministro
Paulo de Tarso Sanseverino, que prolatou decisão praticamente idêntica àquela
que determinou a afetação do recurso anterior, em 04.06.2014, quando então já
havia sido designada audiência pública para o dia 25.08.2014.

6.2.5. Amicus Curiae


Com a designação da audiência pública, os amici curiae que buscaram inter-
vir no processo realizaram exposições orais e submeteram slides de suas apre-
sentações para juntada ao processo652. Das transcrições da audiência, extraímos
que houve a participação de onze entidades nessa qualidade. Analisaremos o
seu posicionamento e os impactos de sua intervenção a partir das falas da audi-
ência pública, conforme item 6.2.8, a seguir.

651 “Tal particularidade, a rigor, parece tornar ainda mais abrangente e aprofundado o debate travado
nos presentes autos da ação coletiva, a autorizar entendimento de que se diferencia daquelas
demandas individuais em que comumente se aplica a suspensão no aguardo do julgamento do mérito
do REsp. n. 1.419.697/RS, destacando-se, aliás, que este versa ação indenizatória cumulada com
declaratória. Nesse contexto, em que pese a relação existente entre o caso dos autos (mormente
quanto à natureza do scoring) e o relativo ao Recurso Especial paradigmático n. 1.419.697/RS, penso
que não se justifica a suspensão do presente feito. Some-se a isso o fato de que, em razão da decisão
ora recorrida, outras demandas em tramitação neste Tribunal de Justiça, envolvendo a discussão
em tela, restaram atingidas pelos seus efeitos, não sendo demais acrescentar que o próprio REsp. n.
1.419.697/RS já identificara a multiplicidade de recursos versando a natureza dos sistemas de escore.
Assim, e também considerando que a análise dos recursos admitidos nos presentes autos poderá
propiciar subsídios ao julgamento, sob a sistemática dos Recursos Repetitivos, do REsp. n. 1.419.697/
RS, entendo, pelas razões expendidas, de prudência afastar a incidência da suspensão aos presentes
autos” (Processo nº 001/1.12.0109378-4, fls. 997-997v).
652 É possível que tenham sido apresentados memoriais escritos diretamente aos ministros, porém não
havia registros nos autos do processo, diferentemente dos memoriais apresentados pela Defensoria
Pública do Rio de Janeiro, por exemplo, que se encontra devidamente juntada aos autos.

282
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

6.2.6. Ministério Público e Defensoria Pública


Em memoriais apresentados após a audiência pública, o Ministério Público
Federal posicionou-se no sentido de ser o sistema de scoring um banco de dados
(e não apenas uma metodologia de cálculo de risco), pelo o que deveria ser
aplicado o CDC e a Lei de Cadastro Positivo. Aponta, ainda, que a pontuação
mantém-se baixa por meses após a exclusão de eventual pendência financeira
(mesmo em casos de negativação indevida), o que tem de ser revisto653.
A Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro argumenta que sis-
temas de pontuação de crédito tem de ser devidamente regulados. O score
seria análogo a um banco de dados, porém careceria de transparência, sendo
um serviço que não é exposto à ninguém (nem o consumidor, tampouco um
órgão público) sem qualquer garantia de que as informações utilizadas não
são ilícitas. Ressalta, também, a necessidade de se assegurar ao consumidor a
inviolabilidade de dados pessoais, violando-se a honra, intimidade e imagem
(artigo 5º , X, CF), dignidade (artigo 1º, CF) e a defesa do consumidor (artigo
5º, XXXII e artigo 7º, CF).
Os posicionamentos externados nas exposições realizadas na audiência pú-
blica serão examinados no item 6.2.8, a seguir.

6.2.7. Participação de “sobrestados” e de “ausentes”


Como já mencionado, alguns autores de ações individuais tentaram se ha-
bilitar nos autos da ação coletiva proposta pelo Ministério Público, com funda-
mento no artigo 94 do CDC. Foram eles: Emerson de Carlo Denardi Samuel,
Pedro Alberto Cardoso Samuel e Eduardo Hirt (litisconsortes em uma mesma

653 “O sistema em debate, nos moldes atuais, constitui verdadeira ‘caixa-preta’ já que capta informações
de vários sistemas, cujos dados não estão acessíveis nem aos usuários do sistema (empresas associadas),
nem aos consumidores cujos dados são analisados para a concessão de crédito e cujas variáveis ou
riscos não são informados aos consumidores (...). Assim, manifesta-se o Ministério Público Federal
pela aplicação dos artigos 4º, 5º e 6º da Lei do Cadastro Positivo e do artigo 43 do Código de Defesa
do Consumidor para que seja assegurado ao consumidor amplo acesso às informações do Crediscore
que lhe dizem respeito, para que possa saber de quais bancos de dados são retiradas as informações, o
peso de cada variável utilizada no cálculo, qual seu score, e ainda que seja a ele possibilitado corrigir
eventuais dados incorretos” (Parecer do Ministério Público Federal, e-STJ 1.461-1.462).

283
Maria Cecília de Araujo Asperti

ação individual); Natani Bettardi do Nascimento; Carla de Deus Vieira Silveira;


Acivaldo Roger Pereira Ferreira; e Geni Maria Teixeira Fermiano654.
O TJRS deferiu a habilitação dos três últimos, tendo em vista que os demais
litigavam contra outras empresas que prestam serviços de score que não são
pertencentes ao grupo da CDL. Os demais opuseram Embargos de Declaração
e Recursos Especiais face ao acórdão da ação coletiva, suscitando a discussão
sobre a suspensão dos processos individuais e a necessidade de comprovação
da negativa de crédito decorrente do acesso à pontuação do score para fins de
indenização por danos morais.
Após o encaminhamento dos recursos ao STJ, Acivaldo Roger Pereira Fer-
reira foi representado por seu advogado na ocasião da audiência pública. Anote-
-se que o Dr. Lisandro Gularte Moraes, advogado de Anderson Guilherme Pra-
do Soares, também representava os interesses de Carla de Deus Vieira Silveira
em sua ação individual.

6.2.8. Audiência Pública


A audiência pública foi a primeira realizada pelo STJ, tendo o Ministro
Relator Paulo de Tarso Sanseverino deferido a participação de 23 entidades
e representantes, sendo que alguns dividiram a fala em mais de uma pessoa,
totalizando 27 expositores.
Dentre as entidades e representantes, foram onze amici curiae, quatro inte-
ressados (três representantes de outras empresas prestadoras de serviços de score
e o advogado de um dos habilitados na ação coletiva), três representantes das
partes dos RRCs, Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, Minis-
tério Público Federal, Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul e a
Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro. A grande maioria dos exposi-
tores (25 de 27) eram juristas, sendo destes 19 advogados, o procurador-geral
do Banco Central, três defensores e dois membros do Ministério Público.
Analisando-se as falas realizadas, é possível extrair, em linhas gerais, os po-
sicionamentos adotados, classificados como “favoráveis” ou “não favoráveis” ao
sistema de score. Houve também expositores que defenderam a licitude do siste-
ma, desde que se adequasse às disposições do CDC e à Lei de Cadastro Positivo

654 Importante anotar que dentre esses sete indivíduos, quatro são advogados (Emerson, Pedro, Eduardo
e Natani).

284
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

quanto à acessibilidade, pelo consumidor, dos dados a seu respeito e à necessi-


dade de consentimento deste para inclusão no sistema de pontos.
Tabela 5 – Entidades e pessoas participantes da audiência pública,
em que qualidade e manifestando qual posicionamento
Amicus curiae,
Favorável ao score de
Entidade ou pessoa Expositor parte ou
crédito?
interveniente?
Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional do Dr. Fernando Martins (advogado) Amicus curiae Não
Distrito Federal
Associação Nacional de Informação e Defesa do Dr. Remi Molin e Dr. Deivti Dimitrius Amicus curiae Sim, desde que dentro dos
Consumidor - ANDICON (advogados) parâmetros do CDC e da Lei
do Cadastro Positivo
Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor - Dr. Walter Faiad de Moura (advogado) Amicus curiae Sim, desde que haja
IDEC transparência para o
consumidor quanto à origem
dos dados e que este possa
influenciar quais dados são
considerados.

Secretaria da Micro e Pequena Empresa da Dr. José Levi Mello do Amaral Jr (advogado) Amicus curiae Sim
Presidência de República - SMPE/PR
Federação Brasileira de Bancos - FEBRABAN Dr. Marcos de Barros Lisboa (advogado) Amicus curiae Sim
Instituto Brasileiro de Política e Direito do Dr. Bruno Miragem (advogado) Amicus curiae Sim, desde que dentro dos
Consumidor - BRASILCON parâmetros do CDC e da Lei
do Cadastro Positivo
Banco Central do Brasil Dr. Isaac Menezes Sidney Ferreira (procurador) e Amicus curiae Sim
Sr. Aílton de Aquino Santos (contador e auditor
do Banco Central)
Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional do Dr. Leandro Amaral Provenzano (advogado) Amicus curiae Não
Mato Grosso do Sul
Confederação Brasileira de Aposentados, Dr. Antonio Celso Nogueira Leiria (advogado) Amicus curiae Não
Pensionistas e Idosos - COBAP
Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor Dr. Raphael Atherino dos Santos (advogado) Amicus curiae Não
Bancário - IBDConb
Associação dos Poupadores da Caderneta de Dr. Josafar Augusto da Silva Guimarães Amicus curiae Não
Poupança e Assistência a Vítimas de Acidente de (advogado)
Trânsito - PROCOPAR
PROTESTE Associação de Consumidores Dra. Maria Inês Dolci (advogada) Amicus curiae Não
SPC/SC Dr. Rodrigo Titericz (advogado) Interessado Sim
Serasa Experian S/A Dr. Fabiano Robalinho Cavalcanti (advogado) e Interessado Sim
Sr. Vander Nagata (superintendente de
informações sobre consumidores da Serasa
Experian)
Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas - Dr. Nival Martins da Silva Júnior (advogado) Interessado Sim
CNDL
Acivaldo Roger Pereira Ferreira (parte) Fabiano Garcia Severgini (advogado) Interessado Não
Ministério Público Federal Dr. José Eleares Marques Teixeira (procurador) Interveniente Sim, desde que haja
transparência para o
consumidor quanto à origem
dos dados e metodologia
utilizada
Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro Dra. Larissa Davidovich e Dr. Fábio Ferreira da Interveniente Não
Cunha (defensores)
Ministério Público do Distrito Federal e Dr. Leonardo Roscoe Bessa (promotor) Interveniente Sim, desde que observados os
Territórios critérios de transparência para
o consumidor
Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Dra. Josane de Almeida Heerdt (defensora) Interveniente Não
Sul
Anderson Guilherme Prado Soares Dr. Lisandro Goularte Moraes (advogado) Parte Não
Boa Vista Serviços S/A Dr. Flávio Pereira Lima (advogado) Parte Sim
Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre - Dr. Fernando Smith Fabris (advogado) Parte Sim
CDL/RS

Fonte: Elaboração própria.

285
Maria Cecília de Araujo Asperti

Dentre os defensores do sistema de scoring, merecem destaque as falas


dos representantes das empresas que prestam esse serviço (Boa Vista S/A, SCP
S/A, a Serasa S/A e o CDL), que enfatizaram que se trataria de um software
ou de uma metodologia que realiza um cálculo estatístico a partir de dados de
acesso público, e não de um cadastro em si, além de ressaltarem que a decisão
de concessão de crédito é do lojista ou financeira, e não da mantenedora do
sistema655-656. Segundo esses expositores, os dados utilizados para o score não são
armazenados, o que tornaria sem sentido a necessidade de autorização prévia
por parte do consumidor657.
Os advogados que falaram em nome das empresas tentaram explicar o
funcionamento do sistema de scoring, com diversos exemplos e dados esta-
tísticos, usando, para tanto, de power points e gráficos disponibilizados no
anexo que passou a compor os autos do processo. Enfatizaram que as infor-
mações utilizadas para os cálculos seriam provenientes de bancos de dados
lícitos ou são fornecidas pelo próprio consumidor quando preenche uma
ficha de cadastro 658, e cruzadas com dados públicos (IBGE, órgãos de classe)

655 “Trata o Scoring de um software, jamais de um cadastro. Temos, inclusive, ações movidas por pessoas
que sequer têm um cadastro aberto. No nosso caso, no SPC, a pessoa entra com uma ação, você vai
fazer uma consulta no banco de dados, cadastro inexistente, ela jamais esteve no mercado, jamais se
foi possível construir qualquer avaliação sobre ela e, mesmo assim, ela demanda, porque ela ouviu
falar que existe um Scoring, e ela acha que está incluída nesse banco de dados”. (Dr. Rodrigo Titericz,
Representante do SPC S/A, Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 301).
656 “Um Sistema Scoring de Crédito é um modelo da estatística. Ele não é uma base de dados, não é
um cadastro. Ele utiliza informações de cadastros fornecidos ou de fontes públicas, como o IBGE,
ou de outras bases de dados, ou cadastro fornecido pelo próprio cliente, enfim, procura agregar as
informações para estimar qual é o risco de um cliente ou de uma operação de crédito. Este ponto
é particularmente importante: muitas vezes o que o Scoring de crédito avalia não é o cliente”
(Dr. Marcos de Barros Lisboa, representante da Febraban, Apenso de materiais e transcrição da
audiência, e-STJ fl. 305).
657 “Não se tratando de armazenar dados, mas de efetuar cálculos que mudam, como bem dito
anteriormente pelo meu antecessor, a cada participação do consumidor no mercado, não há que se
falar em comunicação prévia, pois literal e formalmente não se trata de cadastro, portanto não afeto
ao CDC ou à própria lei que regulamenta o cadastro positivo” (Dr. Rodrigo Titericz, Representante
do SPC S/A, Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 303)
658 “As informações que são trazidas são as informações negativas, com base nas regras que regem o Cadastro
Negativo; as informações - e isso é muito importante - trazidas pelo próprio pleiteante do crédito. Ao
assinar uma ficha de cadastro, a pessoa indica quanto ela ganha, indica a escolaridade, os seus documentos
e autoriza, em muitos casos, que esses dados sejam utilizados em transações futuras. Então, o ingresso dos
dados no banco de dados é regido por uma legislação. A utilização dessas informações é livre por parte
daqueles que queiram conceder crédito, porque justamente o erro na concessão implica uma situação de

286
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

sobre o perfil socioeconômico da localidade, rede de ensino, condição da


unidade familiar e renda mensal, setor do emprego, etc., e com informações
do próprio lojista, como o porte do estabelecimento, ramo de atividade e
quantidade média de consultas ao sistema.
Foram apresentados exemplos de informações levadas em consideração
para o cálculo, como histórico de crédito e de dívidas, ações judiciais já ajui-
zadas ou nas quais o consumidor foi acionado, títulos protestados, cheques
sem fundo, débitos ativos (inclusive telefonia, varejo, bancos, seguradoras),
perfil econômico da localidade em que reside, quantidade de consultas feitas
em seu nome no sistema, envolvimento em pessoa jurídica (Junta Comercial),
informações fornecidas pelo próprio consumidor (idade, sexo, tempo no em-
prego, escolaridade, profissão, renda)659:

“Por exemplo: verifica-se a quantidade de consultas nos últimos dias. Se


o consumidor consulta várias vezes, pede crédito por várias vezes, isso
implica um indício de que a inadimplência será elevada. É um indício
de superfaturamento. É quase um ímpeto consumista. A empresa que
descobriu isso, provavelmente teve um Scoring mais acurado durante um
certo tempo, depois outras empresas descobriram isso. A questão, por
exemplo, de ações de busca e apreensão. A existência de ações de busca
e apreensão, para uma empresa que concede crédito para automóvel,
é muito grave. As empresas que analisaram estatisticamente isso
indicam que um consumidor que deixou o seu carro ser apreendido é
um consumidor que tende a repetir esse comportamento. Então, isso
abaixa o Scoring para esse tipo de transação. Então, cada produto e cada
segmento do comércio e dos bancos faz a sua própria análise do que é
importante e do que não é importante” (Fala do representante da Boa
Vista Serviços S/A)660

Dentre os amici curiae que se manifestaram favoravelmente ao sistema, o


Banco Central e a Febraban realçaram os impactos positivos de um sistema de

risco diferente daquela combinada”. (Dr. Flávio Pereira Lima, representante da Boa Vista Serviços S/A,
Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 334).
659 Foi usado como exemplo para análise do score o autor da ação individual, Anderson Guilherme
Prado Soares (Slides da Boa Vista S/A, Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl.
137-138).
660 Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 335.

287
Maria Cecília de Araujo Asperti

rating de consumidores, como a possibilidade de tornar o crédito mais acessível


e reduzir as taxas de juros661, argumento este reverberado por outras entidades
ao longo de suas exposições. A Febraban assinala, em sua apresentação, que a
“restrição ao uso de modelos [de score de crédito] teriam impacto direto no PIB,
implicando também no rompimento da agenda de inclusão financeira” 662. O
Banco Central, por seu turno, afirma que o sistema de score é fundamental para
evitar crises de crédito e promover a livre concorrência663.
Assim, é possível verificar que essas manifestações favoráveis ao score,
apesar de realizadas por juristas, foram, essencialmente, de cunho técnico,
econômico ou estatístico664, tais como: (i) simulações de taxas de aprovação
de crédito e de adimplemento com o uso de sistemas de score, em comparação
com o uso de bancos de dados de cadastro de negativações (Febraban); (ii)
países do mundo que utilizam sistemas de score na América Latina (Febraban);
(iii) volume de crédito concedido a partir de avaliações de score (Febraban);
(iv) exemplos de informações que são consideradas para a pontuação (todas as
empresas); (v) volume de consultas realizadas ao sistema (Serasa); (vi) exemplos
de classificação de risco por idade e por CEP (SPC Brasil); (vii) expansão do

661 Texto do slide da Febraban, Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 81.
662 “Isso aqui é um pouco o impacto sobre os clientes. Este é o ponto importante. A escoragem
permite que mais crédito sejam concedidos, esses são dados internacionais e dados do Brasil. O
que a escoragem tem é um benefício para a sociedade como um todo. Ela amplia a concessão de
crédito. Esses são dados internacionais de trabalhos acadêmicos, sistematizados pela IFC. E elas
reduzem a inadimplência. A inadimplência é um custo para a sociedade. Todos nós pagamos o
custo da inadimplência. A inadimplência é um custo de produção de crédito. Isso gera maiores
spreads, menores inadimplências, operações de crédito com menor inadimplência são as operações
de crédito com menores taxas de juros para os clientes finais. Então, este não é um debate clientes
x escoragem de crédito. Este é um debate melhor mercado de crédito, com menores taxas de juros
e maior amplidão da oferta de crédito, ou mercado de crédito com maiores taxas de juros e menor
oferta de crédito”. (Dr. Marcos de Barros Lisboa, representante da Febraban, Apenso de materiais e
transcrição da audiência, e-STJ fl. 307).
663 Observações contundentes, ainda que não relacionada diretamente às questões em debate, foram
feitas pela Boa Vista Serviços S/A e pela Serasa Experian, que apresentaram na audiência pública
dados sobre a atuação dos escritórios do Rio Grande do Sul que estariam ajuizando ações similares
que, pela sua coleta, seria 120 mil ações judiciais concentradas em cinco escritórios, que realiza a
consulta ao score diretamente.
Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 168 e 176.
664 A empresa apresenta slide com o título “Oportunismo em Números”, e um gráfico com o volume de
ações relativas à matéria no TJRS (Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 99).

288
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

crédito e inadimplência nos últimos 15 anos (Banco Central); (viii) capitaliza-


ção das instituições financeiras brasileiras e ativos líquidos (Banco Central),
Quanto aos pronunciamentos contrários ao sistema de scoring, as partes,
interessados e amici curiae (em especial a OAB e as entidades de defesa de
consumidores) buscaram caracterizar esse sistema como um banco de da-
dos, de modo que o CDC e a Lei do Cadastro Positivo fossem plenamente
aplicáveis às prestadoras desse serviço. Para esses entes, o scoring seria ilegal
por não ser transparente quanto aos seus critérios665, não permitir o acesso ao
consumidor a respeito das informações e do método de cálculo utilizando e
manter tais dados sem o consentimento do consumidor.
A PROTESTE aduz, ainda, um potencial de subjetividade, discrimina-
ção e invasão de privacidade nas informações utilizadas para pontuação
(ex.: raça, histórico de compras, contas telefônicas, etc.)666. A ausência de
justificativa pelos órgãos de rating (sob a alegação de critérios complexos ou
sigilo industrial) poderia, a seu veri, impedir que o consumidor obtivesse
informações sobre seus dados.
O representante da OAB/DF, Dr. Fernando Martins, também sustenta a
necessidade de notificação do consumidor, analogamente ao Cadastro Positivo,

665 Sobre a falta de transparência de critérios, a Defensora Pública Dra. Larissa Davidovich narra o
seguinte exemplo: “A título de exemplo, conto uma experiência prática de uma Defensora Pública
de um determinado estado. Ao tentar contrair crédito, sendo ela uma funcionária pública, com
renda, sem jamais ter sido ‘negativada’, não conseguiu obter aquele crédito. Depois de muito
insistir, por conta de ser amiga de sua gerente, depois de muito tempo, a gerente lhe confidenciou,
morrendo de medo de perder o seu emprego, que existiam muitas ações judiciais propostas pela
Defensora. O que é cômico, porque ela de fato patrocina o interesse de diversos assistidos. Todas
aquelas ações judiciais eram interpostas por terceiros, mas constava o nome dela. Então, nesse
sistema, injustiças acontecem. Sabemos também que não é pouco comum que a negativação é
indevida. Eu, enquanto Defensora Pública, vejo isso todos os dias, pessoas sendo ‘negativadas’
indevidamente. Deve chegar também a este Tribunal esse tipo de coisa. Então, essa consumidora
foi penalizada por um sistema equivocado, violando todas as premissas” (Apenso de materiais e
transcrição da audiência, e-STJ fl. 266).
666 “A impossibilidade de acesso às informações pode fomentar a discriminação e o ilícito criminal (art.
73 do CDC), pois o sigilo impede que os consumidores afetados saibam se os critérios subjetivos
adotados resultam de comparações puramente objetivas ou se há critérios meramente subjetivos (em
nosso entender, ilegais), como questões raciais ou de compras passadas, em que o scoring considera
o objeto de consumo (tipo de carro, bebidas alcoólicas, fumante) para traçar o perfil do consumidor
ideal (...). É inaceitável, contudo, o uso de informações de natureza íntima do consumidor para
fomentar tais regras. A eficácia do mercado não pode se sobrepor aos valores de dignidade da pessoa
humana, previstos constitucionalmente (art. 1º, inciso III da Constituição Federal)” (Slide da
PROTESTE, Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fls.196-196).

289
Maria Cecília de Araujo Asperti

e suscita uma possível violação ao Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014)


“levando em consideração (..) [que] essas informações não foram autorizadas
pelo consumidor, e o Marco Civil da Internet é claro, de clareza solar, da neces-
sidade de prévia autorização”667.
Já o advogado do autor Anderson Guilherme Prado Soares destaca a falta
de transparência acerca da própria existência do sistema de scoring, acerca do
qual a maioria dos consumidores sequer têm conhecimento e que foi apenas por
meio da litigância manejada contra essas empresas que referido procedimento
tornou-se público668:

“Quem sabe somos nós, quem sabe são as pessoas que entraram com o
processo, que hoje seriam cem mil processos, mas o restante dos quase
duzentos milhões de habitantes do Brasil eles não sabem da existência.
Por que eles não sabem da existência? Exatamente porque a ferramenta é
oculta. Portanto, a ilegalidade do sistema de pontuação parte da afronta
a princípios básicos da Constituição Federal, pois ela é discriminatória e
preconceituosa, gerando juízo de valor sobre os consumidores e induzin-
do as empresas a negarem crédito, mesmo para quem está com o nome
limpo”
(Fala do Dr. Lisandro Goularte Moraes, advogado do autor Anderson
Guilherme Prado Soares)669.

Também merece uma análise mais pormenorizada – considerando o objeto


do trabalho – a manifestação do advogado Fabiano Garcia Severgini, repre-
sentante do consumidor Acivaldo Roger Pereira Ferreira, que se habilitou na
ação coletiva, interpôs um dos recursos especiais (que foram afetados pelo efeito
suspensivo decretado nessa ação). O advogado faz uma dura crítica a falta de
transparência não só dos dados utilizados, mas também do método de cálcu-
lo, cuja obscuridade conformaria um “cadastro objetivo, porém com efeitos de

667 Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 259.


668 Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 279.
669 “Todavia, nenhum consumidor, a menos que eu saiba, ao longo desses mais de cinco anos em que a
matéria está sendo discutida na Justiça, conseguiu obter, por meios próprios, diretamente com os serviços
de proteção ao crédito, uma certidão contendo a sua pontuação, muito menos as informações sobre
quais são os dados utilizados, como são utilizados, quais os critérios de valoração de cada dado e quais as
fontes dos dados utilizados, tendo que recorrer à Justiça para exigir a exibição dessa certidão e pedindo
informações relativas a mesma” (Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 280).

290
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

subjetivo, negatório e discriminatório”. Faz referência a elementos probatórios


do caso paradigma para afirmar que, de acordo com a prova documental pro-
duzida, a Boa Vista Serviços utiliza-se de histórico de restrições anteriores há
cinco anos, inclusive pendências já baixadas ou excluídas. Finaliza respondendo
à afirmação dos advogados das empresas prestadoras de serviços de score de que
se estaria diante de uma “indústria do dano moral” com a provocação de que
estas seriam especialistas na “indústria de desrespeito ao consumidor”670.
Tem-se, ainda, que nem todas as entidades que atuaram em defesa dos inte-
resses dos consumidores foram frontalmente contrárias a existência do sistema
em si, defendendo, inclusive, seus impactos positivos em termos de facilitação
do crédito, porém arguindo que sua utilização deverá observar os parâmetros
estabelecidos pelo CDC e pela Lei de Cadastro Positivo, provendo-se acesso, ao
consumidor, às informações cadastradas a seu respeito671-672.
É nesse sentido que se deu a fala com mais nítida influência no voto ven-
cedor, que foi aquela pelo promotor de justiça Dr. Leonardo Roscoe Bessa, do
Ministério Público do Distrito Federal e notório especialista na área de direito
do consumidor673. Ele destaca que a contrariedade ao score se refere não ao
sistema em si, mas à forma como ele está sendo utilizado, dado que, a seu ver, a
própria Lei do Cadastro Positivo prevê a possibilidade de um sistema de scoring,
argumento este expressamente acolhido pelo Ministro relator.

670 Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 351-355.


671 Conforme fala do representante do IDEC, Dr. Walter Faiad de Moura: “Então, o Idec entende,
superando a questão de transparência, superando o fato de que estou no STJ, não estou no Legislativo,
não estou no mecanismo de lege ferenda, mas o fato é que, se do fenômeno de armazenamento ou
manipulação das minhas informações, essa informação foi objetivada e foi utilizada para me negar
crédito, eu tenho o direito não só ao acesso - isso para mim é de uma obviedade ímpar -; e, em
segundo ponto, se a essa informação não puder agregar controle, agregar dados, contestar, se não
puder acrescentar, creio que estaremos caminhando para uma construção de um mercado de crédito
injusto” (Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 271-272).
672 Similarmente, o subprocurador do Ministério Público Federal, Dr. José Eleares Marques Teixeira,
manifestou visão favorável a modelos de avaliação e classificação de riscos no modelo do score,
porém assinala que “os dados utilizados e os critérios aplicados no modelo de scoring conferem
objetividade e análise na concessão do crédito, mas não são disponibilizados ao consumidor de forma
compreensível”. Considera, ainda, que a utilização de dados sobre pendências financeiras com mais
de cinco anos seria prática abusiva, o que deverá ser vedado, de acordo com o artigo 43, §§1º e 5º do
CDC (Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. 250).
673 O voto inclusive cita obra de autoria do promotor do MPDFT: Embora os sistemas europeu e norte-
americano sejam diferentes, apresentam pontos em comum, lembrados por Leonardo Roscoe Bessa
(‘Cadastro Positivo: comentários à Lei 12.414/2011’. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 59)”

291
Maria Cecília de Araujo Asperti

Ele discorre sobre as mudanças no mercado de crédito após o estabelecimen-


to de bancos de dados de proteção ao crédito, para aduzir que a tendência, nos
dias de hoje, é que se busquem outros dados que não apenas as dívidas pretéri-
tas. Isso seria, ao ver do promotor, desejável ao mercado como um todo, desde
que observados “os pressupostos da lei do cadastro positivo, em diálogo com
o CDC” 674 o que implicaria, portanto, que as informações do scoring fossem
objetivas (sem juízo de valor) e claras (sem termos excessivamente técnicos), e
que se assegurasse ao consumidor o acesso a essas informações e o direito de
requisitar sua revisão ou correção,
Diferentemente de outros expositores, contudo, Roscoe Bessa acolhe o ar-
gumento das empresas quanto à necesssidade de se resguardar seu knowhow
consistente na metodologia do cálculo, com base no artigo 5º, inciso IV, do
CDC, que fala em resguardo ao “segredo empresarial”:

“Quais são os principais elementos que o consumidor tem direito a saber?


No meu modo de ver, considerando todos esses outros fatores, os únicos
elementos e critérios que podem não ser divulgados ao consumidor talvez
seja o know how da nota, como a metodologia, o segredo industrial,
como chega a nota. Mas ele tem que saber tudo” (fala do Dr. Leonardo
Roscoe Bessa, do Ministério Público do Distrito Federal)675

Com relação aos critérios para indenização por danos morais, a única fala
que abordou esse ponto mais detidamente foi a do representante da Associação
Nacional de Informação e Defesa do Consumidor – ADICON, que ressaltou
que duas questões foram dirimidas na ação coletiva afetada: a discussão sobre a
ilegalidade do cadastro, que teria sido enfrentada exaustivamente pelo acórdão
recorrido676, e a questão atinente ao dano moral, ponto em que, a seu ver, o
tribunal teria sido contraditório ao determinar a indenização in re ipsa, porém
condicionada à comprovação da negativa do crédito677. Seria, na visão da as-

674 Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. p. 292-294.


675 Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fl. p. 295-296.
676 “E essa ação coletiva à qual me referia, seu Colega, ex-Colega de Tribunal estudou muito bem a
questão, em 84 laudas, desenvolvendo a questão para reconhecer a ilegalidade desse cadastro”
(Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fls. 277-278).
677 “Pois bem, essa ação coletiva, que, provavelmente, será julgada em conjunto com esse recurso
especial, que assim V. Exa. já determinou em despacho, tratou de dois temas que nos parecem aqui
importante destacar. Uma, embora, na sua essência, julgando pela procedência da ação coletiva

292
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

sociação, uma prova negativa complexa que acabaria por inibir seu direito de
questionar a idoneidade da sua pontuação:

“Todavia, e aqui vem a questão, cria estas condicionantes, a saber: ‘Ca-


berá à parte, diz S. Exa., necessariamente, indicar o nome da loja a que
compareceu, a data, o setor da empresa que informou a negativa ou a
restrição de crédito, bem como o funcionário que prestou essa informa-
ção, se puder ser identificado’. É a denominada prova negativa, e, talvez,
essencialmente, uma exigência demasiada em relação aos consumidores,
porque, talvez – e falo, aqui, pessoalmente, não sei a loja em que estive
há quinze dias, quem me atendeu –, e todos nós sabemos, pela máxima
experiência, que esses elementos não são fornecidos, Ministro”
(fala do Dr. Deivti Dimitrius, representante da Associação Nacional de
Informação e Defesa do Consumidor – ANDICON) 678

Como se verifica no voto vencedor, esse ponto, apesar de pouco debatido,


integrou a tese jurídica, entendendo-se que a falta de prova, pelo consumidor,
da recusa do crédito, obstacularizaria seu direito de questionar o score divulgado
pela Boa Vista Serviços S/A.
Percebe-se, assim, que as falas contrárias ao score, ou que sustentaram a
necessidade de sua compatibilização com o CDC e com a Lei do Cadastro
Positivo, expuseram argumentos essencialmente jurídicos, diferentemente
dos expositores favoráveis ao score, que também trataram de trazer dados eco-
nômicos, estatísticos e técnicos sobre o funcionamento do sistema.
Outro ponto que chamou a atenção durante a análise das transcrições foi
o de que não havia um alinhamento propriamente dito entre os posiciona-
mentos dos representantes dos litigantes ocasionais (do advogado da parte
do caso individual afetado e do representante de um dos consumidores que se
habilitou no caso coletivo) e aquele sustentado por alguns amici curiae que
atuaram em defesa dos direitos do consumidor e pelo Ministério Público.

proposta pelo Ministério público em desfavor da CDL, no mesmo sistema Credit Score, a questão
é idêntica, determinou a extinção das ações individuais, o que foi objeto de recurso e V. Exa. vai
decidir. (...) A outra situação é o dano moral. (...) Lá S. Exa. também inovou em relação ao dano
moral. E por quê? Porque criou condicionantes à fixação desse dano, muito embora, rogando a
máxima vênia ao Tribunal gaúcho, revelou uma contradição (Apenso de materiais e transcrição da
audiência, e-STJ fl. 276).
678 Apenso de materiais e transcrição da audiência, e-STJ fls. 277.

293
Maria Cecília de Araujo Asperti

Enquanto os primeiros (assim como a Defensoria Pública e algumas associa-


ções) foram frontalmente contrários ao score, os promotores e procuradores de
justiça que se manifestaram adotaram um posicionamento de “meio termo”,
sendo favoráveis ao sistema, porém com as mudanças tidas por necessárias.

6.2.9. Julgamento, fundamentação e tese jurídica


Como de praxe no STJ, os acórdãos do julgamento dos recursos representa-
tivos da controvérsia diferem quanto ao relatório e à fundamentação do julga-
mento do caso concreto, porém veiculam idêntica argumentação no tocante à
fundamentação da tese jurídica.
A primeira observação que deve ser feita quanto à análise do voto vencedor,
prolatado em 17.11.2014, é o reconhecimento expresso da influência exercida
pela oitiva dos advogados das partes interessadas, recebidas pelo Ministro
relator em seu gabinete, e das informações prestadas durante a audiência
pública, tidas como fundamentais para a formação do convencimento do julga-
dor sobre o funcionamento e licitude do sistema de score de crédito. Conforme
ele próprio declara em seu voto:

“Consigno, inicialmente, que este é um daqueles processos em cujo julga-


mento parte-se praticamente do “zero”, pois não tinha uma noção clara
acerca do que seria o chamado “credit scoring”, ou simplesmente “credscore”.
Após a afetação do primeiro recurso especial, em face da provocação fei-
ta pelo NURER (Núcleo de Recursos Repetitivos e Repercussão Geral)
do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, informando a existência
de cerca de oitenta mil recursos a respeito desse tema, passei a receber
advogados das partes interessadas em meu gabinete.
Nessas audiências, constatei que havia uma grande celeuma acerca da
própria natureza do sistema “score” e do regime jurídico aplicável por se
tratar de um tema novo no cenário jurídico. (...)
Ressalto que a audiência pública foi extremamente importante na formação
do meu convencimento acerca das principais questões controvertidas a se-
rem dirimidas para solução da controvérsia posta no presente processo679”.

679 Recurso Especial nº 1.419.697/RS, voto do Ministro Relator, fl. 8.

294
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

A fundamentação do julgamento perpassou pelos seguintes temas: a) con-


ceito de “credit scoring”; b) avaliação do risco de crédito nos contratos em geral;
c) regulamentação dos arquivos de consumo pelo CDC; d) a Lei do Cadastro
Positivo (Lei nº 12.414/2011); e) licitude do sistema “credit scoring”; f) limites:
privacidade e transparência; g) dano moral.
Com relação ao conceito de “credit scoring”, o julgador acata os argumentos
dos defensores do sistema no sentido de se tratar de uma “metodologia de cál-
culo do risco de concessão de crédito, a partir de modelos estatísticos”, e não de
um cadastro positivo ou negativo ou um banco de dados sobre o consumidor.
Essa definição se mostrou fundamental ao reconhecimento da licitude do pro-
cedimento e da desnecessidade de autorização prévia do consumidor:

“A avaliação da licitude do sistema “credit scoring” deve partir da


premissa de que não se trata de um cadastro ou banco de dados de
consumidores, mas de uma metodologia de cálculo do risco de crédito,
utilizando-se de modelos estatísticos e dos dados existentes no mercado
acessíveis via ‘internet’. Constitui, em síntese, uma fórmula matemática
ou uma ferramenta estatística para avaliação do risco de concessão do
crédito” (p. 23 do acórdão).

Para o relator, a essa metodologia deverão ser aplicadas as garantias pre-


vistas tanto no CDC quanto na Lei do Cadastro Positivo, que impõem que as
informações devem ser prestadas com transparência e clareza, conforme deve-
res previstos na Lei nº 12.414/2011: a) dever de veracidade; b) dever de clareza;
c) dever de objetividade; d) vedação de informações excessivas; e) vedação de
informações sensíveis.
Todavia, declara o voto vencedor que que a metodologia de cálculo em si
deverá ser resguardada, por se tratar “segredo empresarial” protegido pela Lei nº
12.414/2011, não se exigindo, ainda, a autorização do consumidor para avalia-
ção de seus dados, dado que o score não seria “um cadastro ou banco de dados,
mas um modelo estatístico”680.

680 “O fato de se tratar de uma metodologia de cálculo do risco de concessão de crédito, a partir de
modelos estatísticos, que busca informações em cadastros e bancos de dados disponíveis no mercado
digital, não afasta o dever de cumprimento desses deveres básicos, devendo-se apenas ressalvar dois
aspectos: De um lado, a metodologia em si de cálculo da nota de risco de crédito “credit scoring)
constitui segredo da atividade empresarial, cujas fórmulas matemáticas e modelos estatísticos
naturalmente não precisam ser divulgadas (art. 5º, IV, da Lei 12.414/2011: ..."resguardado o segredo

295
Maria Cecília de Araujo Asperti

Entende-se, assim, que há o direito de o consumidor ter acesso às informa-


ções consultadas para cálculo de sua pontuação681, notadamente de suas in-
formações pessoais para que possa exercer seu direito de controle acerca de
informações excessivas ou sensíveis, expressamente vedadas pelo artigo 3º, §
3º, I e II, da própria Lei nº 12.414/2011. Seriam vedadas, ainda, “informações
sensíveis, como as relativas à cor, à opção sexual ou à orientação religiosa do
consumidor avaliado, ou excessivas, como aquelas referentes a gostos pessoais,
clube de futebol de que é torcedor etc.”.
Superada a discussão sobre a licitude do score e os parâmetros a serem ob-
servados, o voto discorre muito suscintamente sobre o direito à indenização
por danos morais daquele que tem seu crédito recusado com base em pontu-
ação calculada com base em informações excessivas ou sensíveis ou, ainda,
incorretas ou desatualizadas682. Nesses casos, o dano será considerado in re
ipsa, mas caberá ao consumidor comprovar “uma efetiva recusa de crédito,
com base em uma nota de crédito baixa por ter sido fundada em dados incor-
retos ou desatualizados”.
Essa reparação de danos seria essencialmente individual, dada a necessidade
de comprovação da recusa de crédito pelo consumidor, sendo, assim, incompa-
tível com o dano moral coletivo.
Com base nesses argumentos, a tese jurídica formulada no julgamento restou
assim engendrada:

empresarial”). De outro lado, não se pode exigir o prévio e expresso consentimento do onsumidor
avaliado, pois não constitui um cadastro ou banco de dados, mas um modelo estatístico” (Recurso
Especial nº 1.419.697/RS, voto do Ministro Relator, fl. 37).
681 “Assim, essas informações, quando solicitadas, devem ser prestadas ao consumidor avaliado, com
a indicação clara e precisa dos bancos de dados utilizados (histórico de crédito), para que ele possa
exercer um controle acerca da veracidade dos dados existentes sobre a sua pessoa, inclusive para
poder retificá-los ou melhorar a sua performance no mercado” (Recurso Especial nº 1.419.697/RS,
voto do Ministro Relator, fl. 38).
682 “A simples circunstância, porém, de se atribuir uma nota insatisfatória a uma pessoa não acarreta,
por si só, um dano moral, devendo-se apenas oportunizar ao consumidor informações claras acerca
dos dados utilizados nesse cálculo estatístico. Entretanto, se a nota atribuída ao risco de crédito
decorrer da consideração de informações excessivas ou sensíveis, violando sua honra e privacidade,
haverá dano moral “in re ipsa”. No mais, para a caracterização de um dano extrapatrimonial, há
necessidade de comprovação de uma efetiva recusa de crédito, com base em uma nota de crédito
baixa por ter sido fundada em dados incorretos ou desatualizados” (Recurso Especial nº 1.419.697/
RS, voto do Ministro Relator, fl. 39).

296
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

“I - O sistema ‘credit scoring’ é um método desenvolvido para avalia-


ção do risco de concessão de crédito, a partir de modelos estatísticos,
considerando diversas variáveis, com atribuição de uma pontuação ao
consumidor avaliado (nota do risco de crédito);
II - Essa prática comercial é lícita, estando autorizada pelo art. 5º,
IV, e pelo art. 7º, I, da Lei n. 12.414/2011 (lei do cadastro positivo);
III - Na avaliação do risco de crédito, devem ser respeitados os limites
estabelecidos pelo sistema de proteção do consumidor no sentido da tu-
tela da privacidade e da máxima transparência nas relações negociais,
conforme previsão do CDC e da Lei n. 12.414/2011;
IV - Apesar de desnecessário o consentimento do consumidor consulta-
do, devem ser a ele fornecidos esclarecimentos, caso solicitados, acerca
das fontes dos dados considerados (histórico de crédito), bem como as
informações pessoais valoradas;
V - O desrespeito aos limites legais na utilização do sistema ‘credit sco-
ring’, configurando abuso no exercício desse direito (art. 187 do CC),
pode ensejar a responsabilidade objetiva e solidária do fornecedor do
serviço, do responsável pelo banco de dados, da fonte e do consulente
(art. 16 da Lei n. 12.414/2011) pela ocorrência de danos morais nas hipó-
teses de utilização de informações excessivas ou sensíveis (art. 3º, § 3º, I
e II, da Lei n. 12.414/2011), bem como nos casos de comprovada recusa
indevida de crédito pelo uso de dados incorretos ou desatualizados”.

Percebe-se, pois, que restou vencedora a tese de que o sistema de score consiste
em mera metodologia de cálculo que se usa de dados publicamente disponíveis,
do que seria descabida a arguição de sua ilicitude. Nesse sentido, prevaleceram
os argumentos técnicos apresentados pelas empresas mantenedoras de cadastros.
Muito embora não tenha sido objeto de ampla discussão na audiência pú-
blica, é de grande repercussão o entendimento formulado no caso quanto à ne-
cessidade de o consumidor comprovar a “recusa indevida de crédito pelo uso de
dados incorretos ou desatualizados”683. Não houve contraditório efetivo sobre

683 “Merece acolhida a alegação de inocorrência de dano ‘in re ipsa’ se não houver prova da negativação
do crédito do consumidor consultado, conforme já aludido na primeira parte do voto, no sentido de
que ‘o desrespeito aos limites legais na utilização do sistema ‘credit scoring’, configurando abuso no
exercício desse direito (art. 187 do CC), .... pode ensejar a ocorrência de danos morais nas hipóteses
de utilização de informações excessivas ou sensíveis (art. 3º, § 3º, I e II, da Lei n. 12.414/2011),
bem como nos casos de recusa indevida de crédito pelo uso de dados incorretos ou desatualizados’.
No caso, não tendo sido afirmada pelas instâncias ordinárias a comprovação de recusa efetiva do
crédito ao consumidor recorrido, não é possível o reconhecimento da ocorrência de dano moral.

297
Maria Cecília de Araujo Asperti

esse ponto, nem nos casos paradigma, tampouco no transcurso da audiência


pública, tendo sido discutido apenas no acórdão recorrido da ação civil pública,
nos recursos especiais interpostos pelos interessados habilitados em face deste e
muito pontualmente por um dos amicus curiae.
Os demais ministros da Segunda Seção acompanharam unanimamente
o voto do Relator. Dentre os que declararam voto, merece destaque a obser-
vação do Ministro João Otávio de Noronha quanto à litigância repetitiva
atinente ao tema de scoring, em que manifesta-se no sentido de ser este um
“tipo de indústria de ações de dano moral” a ser coibida pelo Judiciário, que
teria a responsabilidade de pensar nas repercussões de suas decisões para a
concessão de crédito 684.

6.3. Considerações sobre o estudo de caso


O estudo de caso, por seu viés qualitativo, permite que se extraiam ponde-
rações dessa natureza acerca das perguntas e hipóteses colocadas, bem como
sobre outras problematizações correlatadas discutidas ao longo do trabalho. Os
pontos mais relevantes são sintetizados a partir de alguns tópicos específicos,
condizentes com os quesitonamentos propostos pela tese e pelos eixos de análi-
se do estudo de caso em si:

Assim, deve-se reconhecer a violação pelo acórdão recorrido, nesse tópico, do disposto no art. 333,
II, do CPC, provendo-se o recurso especial para julgar improcedente a demanda indenizatória, com
inversão dos encargos sucumbenciais, ressalvada a concessão na origem do benefício da assistência
judiciária gratuita” (Recurso Especial nº 1.419.697/RS, voto do Ministro Relator, fls. 42).
684 “
Fico perplexo quando tomo conhecimento da existência de milhares de ações contra essa metodologia
de cálculo, com potencial para gerar milhões de reais de indenizações por danos morais. Acredito
que não podemos congestionar, mais uma vez, o Poder Judiciário. Temos noventa e dois milhões de
demandas em curso no país. E vamos chegar, daqui a pouco, a um bilhão se continuarmos a alimentar
esse tipo de indústria de ações de dano moral simplesmente porque foi feito um cálculo para estimar
limites de crédito. Como bem lembrado pelo eminente relator, nada impede que o cidadão compareça
ao banco ou ao cadastro e peça a retificação de seus dados se estiverem errados. Mas isso ele não quer.
Deseja a indenização por dano moral. Não busca o conserto da informação, e sim a indenização, a
quantificação monetária. Nós, julgadores, temos de medir a repercussão das nossas decisões judiciais
e não estaremos colaborando para a recuperação deste país de capital curto, embaraçando o sistema
de crédito, encarecendo-o, porque o custo dessas indenizações todas, no final, recairá sobre o próprio
consumidor” (Recurso Especial nº 1.457.199/RS, voto do Ministro João Otávio de Noronha, p. 59).

298
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

1. Disparidade entre litigantes ocasionais e repetitivos:

Olhando para os casos paradigmas, tem-se que em um deles restou con-


figurada a tipologia entre litigantes repetitivos (Boa Vista S/A) e ocasionais
(Anderson), enquanto no outro os interesses dos litigantes ocasionais (con-
sumidores) foram representados por um legitimado extraordinário (Ministé-
rio Público), em si um litigante repetitivo, que litigou contra outro litigante
repetitivo (CDL). As desvantagens entre as partes foram mitigadas pelo fato
de que os representantes legais que atuaram em prol de seus interesses eram
especializados por perfil e pela matéria.
Entretanto, uma vez afetados os recursos, percebeu-se que os litigantes repe-
titivos usufruíram de considerável vantagem estratégica ao conseguirem munir
os julgadores de informações técnicas, econômicas e estatísticas, que foram fun-
damentais para o julgamento.

2. Critérios de escolha dos casos paradigma e importância de seus elementos


para o julgamento da tese jurídica:

Com relação à escolha dos casos paradigmas, não foram declinados critérios
claros, o que poderia ser considerado, com o CPC/2015, como uma violação ao
dever de fundamentação do artigo 489, §1º.
Ainda que o contraditório exercido no caso individual tenha sido satisfató-
rio, é inegável que a ação coletiva encontrava-se melhor instruída, com maior
riqueza de argumentos fáticos e jurídicos.
Verifica-se, contudo, que os elementos fáticos discutidos nos casos pa-
radigmas, apesar de relevantes às decisões proferidas antes de sua afetação,
foram ignorados no julgamento do recurso repetitivo, em que foram ado-
tadas as informações prestadas na audiência. Evidências sobre o funciona-
mento do score, sua acessibilidade e dados utilizados não foram avaliados
durante o julgamento do recursos repetitivo, em que esses pontos foram
discutidos abstratamente.
Nesse sentido, foram deixados de lado as provas documentais e argumentos
deduzidos pelas partes quanto ao uso, pelo score, de informações sobre pendên-
cias financeiras anteriores a cinco anos, ou já excluídas dos bancos de dados.
Esse ponto, que havia sido de grande relevância nos casos paradigma, não foi
devidamente enfrentado no julgamento do recurso repetitivo.

299
Maria Cecília de Araujo Asperti

3. Contextualização das questões jurídicas na litigiosidade repetitiva


(natureza e objeto da técnica processual):

Como mencionado, os elementos fáticos levados em consideração para in-


terpretação das questões jurídicas foram, essencialmente, aqueles declinados
na audiência pública pelos litigantes repetitivos. Verifica-se, assim, uma con-
siderável vantagem estratégica destes em procedimentos que tendem a uma
objetivação (ou a um julgamento abstrato), na medida em que conseguem de
forma mais competente fornecer dados para os julgadores sobre elementos que
transcendam o caso individual, e que possam indicar os impactos econômicos
de determinada decisão judicial.
4. Participação das partes dos casos paradigma:
Sobre a participação das partes dos casos paradigma, tem-se que sua atuação
foi relevante para engendrar as questões jurídicas a serem decididas, porém foi
dado maior peso às manifestações da audiência pública do que aos argumentos
deduzidos pelas partes ao longo da tramitação dos casos paradigma e em seus
respectivos recursos especiais.
É muito importante salientar que os interesses externados pelo autor
do caso individual afetado não eram inteiramente coerentes com o po-
sicionamento adotado por diversos amici curiae e pelo próprio Ministério
Público do Distrito Federal e o Ministério Público Federal. Pode se dizer
que o advogado do litigante ocasional efetivamente sustentou os interesses
daqueles que litigam individualmente contra o score de crédito, enquanto
tais entidades se posicionaram a partir de sua interpretação a respeito da
legalidade do sistema.
A ausência do Ministério Público do Rio Grande do Sul, na qualidade de
autor da ação coletiva afetada, é marcante.

5. Participação dos demais interessados (partes dos processos pendentes):

Apesar de aparentamente discreta, a participação dos demais interessados


foi decisiva para o julgamento da tese jurídica em comento.
Tendo ingressado na ação civil pública na qualidade de assistentes litis-
consorciais, foi nos seus recursos que se impugnou, efetivamente, a imposição
da comprovação da negativa de crédito para fins de indenização por dano
moral. Essa questão fulcral, que acabou integrando a tese jurídica, não foi

300
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

defendida pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul, e foi sustentada por
apenas um dos amici curiae.
Note-se que a participação desses interessados foi admitida dentro do rito
do processo coletivo, e não do julgamento de casos repetitivos. Importaria
refletir se a intervenção teria sido obstada caso não houvesse, dentre os casos
paradigma, uma ação coletiva.

6. Papel do Ministério Público e da Defensoria Pública

Como já mencionado, nem sempre os posicionamentos sustentados pelo Mi-


nistério Público mostraram-se totalmente alinhados com aqueles externados
pelos litigantes ocasionais (partes e interessados). Com isso, ponderamos que a
participação da instituição, a despeito de sua legitimidade para defesa de inte-
resses coletivos, não substitui a participação direta das partes e dos interessados
no julgamento do recurso repetitivo.
A Defensoria Pública, por seu turno, manifestou posicionamento mais ali-
nhado com aquele sustentado pelas partes e interessados, porém não foi capaz
de fazer frente às informações técnicas, econômicas e estatísticas apresentadas
pelos litigantes repetitivos, pela Febraban e pelo Banco Central.

7. Papel dos amici curiae e audiência pública

Como demonstrado, os amici curiae que atuaram no caso eram, em sua


maioria juristas, tendo as exposições focado em aspectos jurídicos ou técnicos,
econômicos e estatísticos.
Sua participação foi efetiva na ampliação do debate, porém pode se perce-
ber que os amici que atuaram em favor dos interesses dos litigantes repetitivos
estavam munidos de informações técnicas relevantes sobre o sistema discutido.
Percebe-se, portanto, que a via do amicus curiae pode proporcionar vantagens
estratégicas ao litigante habitual, como já conjecturado.
Também se salienta que nem sempre os interesses dos amici estão plena-
mente alinhados com aqueles dos litigantes ocasionais. Parece mais fácil a
articulação entre litigantes repetitivos e entidades que representam interesses
convergentes com os seus do que entre litigantes ocasionais e entidades repre-
sentativas de seus interesses.

301
Maria Cecília de Araujo Asperti

É relevante pontuar, ainda, o peso do argumento de autoridade de um par-


ticipante da audiência pública (Dr. Leonardo Roscoe Bessa), amplamente vei-
culado no acórdão, do que se denota que a audiência pública funcionou mais
como um espaço para aprofundamento do debate técnico-jurídico do que para
participação dos sujeitos que serão afetados pela tese jurídica.
8. Tese jurídica e fundamentação
Finalmente, assim como no estudo empírico-jurisprudencial, a análise do
estudo de caso deixou claro que a tese jurídica assume o formato de uma súmula
normativa, para fins de aplicação a casos futuros.
Tem-se, ainda, que por se tratar de um julgamento de recurso especial,
que não são discutidas questões fáticas, e que a argumentação do acórdão
em si é essencialmente abstrata. Ademais, dado que a tese jurídica é con-
solidada em um enunciado, argumentos relevantes tecidos pelos julgadores
não são incorporados na tese. À exemplo, a Ministra Maria Isabel Galloti
fala em seu voto sobre a ilegalidade de se considerar, no score, pendências
financeiras já prescritas ou excluídas685, questão esta que não constou do
enunciado da tese jurídica firmada.

685 “Alega-se, todavia, que os dados utilizados para o cálculo da pontuação do escore são sigilosos, e
englobariam informações a respeito de ações judiciais prescritas e registros já excluídos dos cadastros
restritivos, dentre outras, o que é negado pela recorrida e não enfrentado pelo acórdão recorrido.
Neste ponto, tenho por cabível a aplicação analógica do art. 43, § 5º, do CDC, segundo o qual
"consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do consumidor, não serão fornecidas, pelos
respectivos Sistemas de Proteção ao Crédito, quaisquer informações que possam impedir ou dificultar
novo acesso ao crédito junto aos fornecedores” (Recurso Especial nº 1.457.199/RS, fl. 67).

302
Conclusão

Os dados apresentados na Introdução sobre litigiosidade e o volume de ações


judiciais ajuizadas anualmente poderiam levar a crer que o objeto desta tese – o
estudo de técnicas processuais e sua relação com o acesso à justiça – estaria
ultrapassado ou descontextualizado. Afinal, do que adiantaria falar em “acesso
à justiça” em um país em que já se tem processos demais? Não seria o “acesso à
justiça” também o acesso a um Judiciário eficiente e célere?
Ainda que se verifique uma tendência de invisibilização ou de esvaziamento
da pauta do acesso à justiça, sua importância está longe de ser superada. Afinal,
a litigiosidade e o excesso de processos não se traduzem, necessariamente, em
mais acesso à justiça ou, ainda, em uma participação efetiva de diferentes gru-
pos e indivíduos no sistema de justiça. O que se vê no Judiciário hoje é “uma
porta de entrada [que] atrai um tipo de litigante e desencoraja ou se fecha para
a grande massa de indivíduos incapazes de manejar instrumentos de efetivação
de seus direitos”686. A litigiosidade repetitiva é, justamente, a síntese desse para-
doxo de um acesso à justiça mal distribuído, em que poucos utilizam o sistema
recorrentemente, enquanto para outros a demanda é um contato apenas cir-
cunstancial com a justiça.
Assim, ao se problematizar a relação entre as técnicas processuais de julga-
mento de casos repetitivos e a noção de acesso à justiça, foi necessário definir
com maior clareza o que se entende por “acesso à justiça”.
Compreende-se que o acesso à justiça é um direito social a uma efetiva
participação no sistema de justiça que viabilize o seu uso para promoção das
transformações sociais necessárias para superação das desigualdades sociais,
de raça, gênero, orientação sexual, etc., persistentes em nossa sociedade. Além
disso, é também uma perspectiva metodológica pela qual são priorizados mé-
todos empíricos e de análises comparativas para investigação das experiências
de diferentes grupos e indivíduos no sistema de justiça e os impactos sociais
da atuação de seus agentes e instituições. Essa abordagem é necessária para
embasar as escolhas distributivas necessárias para efetivação do acesso à justiça

686 SADEK, Maria Thereza, 2014, op. cit., p. 60.

303
Maria Cecília de Araujo Asperti

ou, em outras palavras, para assegurar acesso a quem não tem (ou pouco tem),
ainda que isso implique em reduzir o acesso a quem já muito o tem.
Adotando-se a noção de acesso à justiça enquanto direito social e aborda-
gem metodológica para estudar uma técnica processual, tem-se por necessário
investigar as formas de participação e a experiência dos diferentes sujeitos, bem
como os impactos de sua aplicação. A partir do referencial teórico de Marc
Galanter e da tipologia de litigantes habituais e ocasionais687, foi possível apro-
fundar no estudo das vantagens estratégicas atribuídas àqueles que utilizam o
sistema de justiça de forma mais recorrente e em ações similares, algo próprio
da dinâmica da litigiosidade repetitiva.
Não se pode afastar a importância da participação das partes do caso
paradigma ou, ainda, dos interessados, sob o argumento de que a tese jurídi-
ca conformaria, em verdade, um precedente. As técnicas de julgamento de
casos repetitivos acarretam uma formação provocada de uma tese jurídica,
com o intuito de otimizar a prestação jurisdicional, o que é marcadamente
diferente do precedente, que surge naturalmente em decorrência da autori-
dade de sua ratio decidendi. Justamente em razão do intuito gerencial dessas
técnicas, a tese jurídica consiste em um enunciado normativo autônomo,
a ser aplicado de forma padronizada, e não a partir da aproximação do
arcabouço fático do caso paradigma (os quais sequer estão registrados no
enunciado) e aqueles do caso concreto.
Esse direito de participação não é, em verdade, absoluto, sendo colocado
em constante conflito com outros valores, como a própria duração razoável do
processo. Ainda assim, limitações ao seu exercício devem ser excepcionais, dada
a sua essencialidade tanto como elemento de legitimação da atividade jurisdi-
cional, quanto de seus resultados. Do ponto de vista da efetivação do direito de
acesso à justiça, uma mitigação ao direito de participar somente se justificaria
diante de uma efetiva possibilidade de se desestabilizar a desigualdade entre as
partes, realizando-se, com isso, o potencial distributivo do processo.
Nesse sentido, é necessário problematizar como se dá a participação dos des-
tinatários da tese jurídica considerando as suas diferentes capacidades de influir
na sua formação. Isso porque a definição da tese se dá em um julgamento de
casos paradigmas em que se tem, de um lado, um ou alguns litigantes habituais,
com mais recursos e vantagens estratégicas e, de outro, litigantes ocasionais,

687 GALANTER, Marc, 1974, op. cit.

304
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

para quem a participação é muito mais custosa e circunstancial. Quanto aos


“sobrestados” e “ausentes”, não há uma preocupação clara com a sua partici-
pação direta ou com a representatividade de seus interesses no julgamento da
tese jurídica, o que é agravado diante da possibilidade de esses interesses serem
representados, na prática, por litigantes ocasionais, que possuem menor capaci-
dade técnica e maiores dificuldades de se articular entre si.
Quanto à disparidade estratégica entre os diferentes atores, colocou-se ques-
tão sobre como os litigantes repetitivos e litigantes ocasionais utilizam e como
são afetados pela utilização dessas técnicas. A esse respeito, alguns pontos
discutidos ao longo da pesquisa teórica e do estudo empírico corroboram com
a hipótese de que o IRDR os recursos repetitivos podem ser utilizados de forma
mais estratégica por litigantes habituais do que ocasionais.
Primeiramente, em sendo assente que a apreciação de questões de direito
não é possível de ser feita de forma totalmente desatrelada de um substrato
fático, mesmo que se sustente que a tese jurídica seja formulada a partir de uma
“situação-modelo”, caberá as partes dos casos paradigma um papel essencial na
reconstrução desse cenário fático, em toda a sua complexidade. Isso é especial-
mente pertinente no âmbito da litigiosidade repetitiva, em que são discutidas
questões de grandes repercussões econômicas, sociais e políticas.
Ratificando-se, então, a importância dos elementos subjetivos e objetivos
do caso paradigma e da participação das partes no julgamento da tese jurídica,
tem-se que a falta de critérios claros de escolha do caso paradigma é preju-
dicial aos litigantes ocasionais, que poderão se ver incumbidos de representar
os interesses de uma vasta gama de interessados, sem que tenham se arrogado
a esse papel. Além disso, no caso do IRDR, os litigantes habituais conseguem
traçar estratégias e se articular entre si para fomentar a instauração do inciden-
te em casos e em teses que lhes sejam estrategicamente pertinentes.
Com relação às evidências empíricas, tem-se que, na maior parte das teses
jurídicas firmadas em sede de julgamento de recursos especiais repetitivos, os
litigantes habituais eram recorrentes, ou seja, estavam, até então, sendo ven-
cidos. Ainda, no quadro geral e em todas as temáticas específicas os litigantes
habituais obtiveram maior êxito. Mesmo que se possa arguir que o percentual
de teses favoráveis aos interesses desses litigantes não seja tão significativo, ao
articular esses dados é que se infere que os litigantes habituais conseguem,
de modo consideravelmente mais exitoso, reverter entendimentos que não
eram favoráveis a seus interesses.

305
Maria Cecília de Araujo Asperti

Olhando não só para os resultados obtidos, mas também para a partici-


pação do litigantes habituais no procedimento em si, verificou-se no estudo
de caso que estes foram capazes de atuar de forma estratégica para pleitear
conjuntamente a desistência de todos os recursos afetados para julgamento e
para apresentar na audiência pública dados técnicos e econômicos acerca do
caso, de forma concatenada, também, com amici curiae que representavam
interesses convergentes com os seus. Esses dados foram particularmente in-
fluentes no julgamento da tese.
Com relação à pergunta sobre como se dá a participação e a representação
dos interesses dos destinatários da tese jurídica, conjecturou-se que os interesses
das partes dos processos pendentes ou futuros (“sobrestados” e “ausentes”) são
representados de forma deficiente (déficit de representatividade) no julgamento
de casos repetitivos, mesmo quando há a intervenção de amicus curiae e/ou a
realização de audiências públicas.
Nesse sentido, tem-se que as partes dos casos paradigma acabam tendo
um papel relevante na reconstrução da “situação-modelo” ou do o arcabouçou
fático a partir do qual as questões jurídicas deverão ser apreciadas, além de um
espaço mais significativo de participação no julgamento da tese jurídica do que
os demais interessados. Acabam, assim, representando os interesses dos “so-
brestados” e dos “ausentes”, ainda que não tenham se arrogado a esse papel
ou tenham condições de exercê-lo, em uma atuação que pode ser até mesmo
mais decisiva que aquela dos representantes adequados da ação coletiva,
visto que a tese jurídica poderá ser aplicada inclusive pro et contra àqueles
que não participaram do seu julgamento.
Essa situação é agravada pelo fato de que se tem, de um lado, um litigante
com mais recursos e maior capacidade de se articular com os demais sujeitos
com quem seus interesses convergem e, de outro, os litigantes ocasionais dos
casos paradigma, que não conseguirão representar com as mesmas condições os
interesses daqueles que defendem posições jurídicas similares as suas.
Novamente recorrendo aos achados empíricos, tem-se que, no caso estuda-
do, os interesses dos litigantes ocasionais foram adequadamente representados
pelas partes do caso paradigma, dada a capacidade técnica de seus representan-
tes legais, sua especialidade e proximidade com os fatos do caso. No entanto,
mesmo assim, foram sensíveis as vantagens estratégicas obtidas pelos litigantes
repetitivos a partir do momento em que as questões passaram a ser discutidas
em sede de recurso especial repetitivo. Por essa sistemática, foi dada significati-

306
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

va importância aos argumentos técnicos e de autoridade (mais do que às provas


e demais alegações suscitadas ao longo do julgamento dos casos paradigma), aos
quais os litigantes ocasionais não tinham acesso, ou capacidade de fazer frente.
Assim, pode se concluir que, embora seja possível se pensar em algum tipo
de controle de representatividade adequada no âmbito do julgamento dos casos
repetitivos – embasado em critérios similares aos utilizados nas ações coletivas,
como capacidade técnica e proximidade e envolvimento com os fatos do caso
– este não será suficiente para se promover uma reorganização estratégica dos
litigantes ocasionais, a ponto de se justificar restrições ao direito de participação
direta dos “sobrestados” e dos “ausentes”. Casos repetitivos versam sobre maté-
rias de grande repercussão social e econômica, e são dirimidos em julgamentos
realizados por órgãos de cúpula do Judiciário, onde o acesso, a expertise e a ca-
pacidade estratégica dos grandes litigantes se fazem particularmente influentes
e vantajosos. Em outras palavras, nessa sistemática processual, os “represen-
tantes adequados” dos litigantes repetitivos tendem a ser mais bem sucedi-
dos do aqueles dos litigantes ocasionais.
Enfim, poderia se dizer que os mecanismos de ampliação da participação,
como a intervenção do amicus curiae e a audiência pública, seriam efetivos na
representação dos interesses dos “sobrestados” e “ausentes” no julgamento dos
casos repetitivos.
Essas formas de ampliação do debate e da diversidade de argumento são, sem
dúvida, importantes para aprimorar a qualidade das decisões que firmam teses
jurídicas em sede de julgamento de casos repetitivos. Entretando, não se pode
afirmar que os amici sejam capazes de representar, efetiva e adequadamen-
te, os interesses desses terceiros, especialmente se estes forem litigantes oca-
sionais em processos sobrestados ou mesmo em demandas futuras.
Litigantes habituais podem ter mais fácil acesso à especialistas tanto do meio
jurídico como não jurídico, bem como recursos para financiar o levantamento
de informações (econômicas, técnicas, estatísticas, etc.) que poderão ser apre-
sentadas por eles próprios ou por entidades que representem seus interesses, seja
como amicus curiae, seja na audiência pública.
No estudo de caso realizado, verificou-se um predomínio de entidades re-
presentativas de interesses dos litigantes habituais e, também, de defesa dos
direitos do consumidor. No entanto, a análise dos argumentos discutidos e da
decisão firmada demonstram que os elementos técnicos, especialmente acerca
do funcionamento do sistema por parte das empresas que o disponibilizam no

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Maria Cecília de Araujo Asperti

mercado, foram decisivos para julgamento da tese, acarretando, inclusive, uma


sensível mudança no posicionamento até então adotado pelo tribunal de origem
sobre a matéria.
Com relação ao Ministério Público e a Defensoria Pública, muito embora
possam, em tese, atuar de forma mais estratégica do que os litigantes ocasionais,
não se pode presumir a sua capacidade de representar os interesses destes. Isso
porque, diferentemente de quando atuam como legitimados extraordinários nas
ações coletivas, tais instituições não possuem, necessariamente, uma proximi-
dade o arcabouço fático do caso, tampouco com os atingidos. São chamados
a intervir apenas no julgamento da tese jurídica, e não no curso do caso para-
digma, e nem são instados a se articular com os “sobrestados” e “ausentes” para
representar seus interesses nos debates perante o órgão julgador.
Há outro ponto fundamental que é o de que, nem sempre, haverá um ali-
nhamento de interesses entre o Ministério Público, a Defensoria Pública e os
amici curiae, e os “sobrestados” e “ausentes”. Foi o que se verificou claramente
no estudo de caso, em que o Ministério Público e a maioria das entidades que
interviu no processo não defendeu as mesmas teses e argumentos do que os ad-
vogados dos litigantes ocasionais do caso paradigma e de outros casos sobresta-
dos. Novamente, fica claro que a participação dessas instituições e intervenien-
tes não pode substituir a participação dos “sobrestados” e “ausentes”, que deverá
ser fomentada, e não obstada, para se promover uma verdadeira ampliação do
debate acerca da tese jurídica.
Na tentativa de se resumir todas essas colocações, deixa-se, como observa-
ção final, que as técnicas de julgamento de casos repetitivos não podem ignorar
a importância de se pensar constantemente sobre acesso à justiça e sobre o
direito de participar no processo, o que implica em reconhecer que o processo
é utilizado por usuários com diferentes capacidades estratégicas. Especialmente
no âmbito da litigiosidade repetitiva, não se pode ignorar essa dinâmica exis-
tente entre as partes, sob o risco de que a promoção da eficiência e da seguran-
ça jurídica tenha como preço a acentuação da desigualdade já existente entre
aqueles que tem e aqueles que não tem. Não se nega que a busca pela eficiência
e pela duração razoável do processo também são, sem dúvida, valores relevan-
tes. Mas do que adiante se ter um Judiciário eficiente que seja excessivamente
utilizado por alguns, e ainda distante e de difícil acesso para outros?
Os mecanismos processuais existentes e aqui estudados certamente não
são suficientes para alterar ou reverter essa dinâmica, cabendo refletir se, de

308
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

fato, a solução para a litigiosidade repetitiva reside mesmo na esfera do direito


processual. Mais do que aperfeiçoar ou intensificar o uso dessas técnicas, seria
necessário dar alguns passos para trás para se suprir o já indicado déficit de
estudos sobre litigiosidade repetitiva, reconhecendo esta como uma realida-
de social complexa, cujas causas e características ainda não são plenamente
compreendidas. Ao se resgatar a perspectiva metodológica do acesso à justi-
ça, talvez seja possível caminhar para um entendimento mais aprofundado
e crítico a respeito, para então ser possível, verdadeiramente, aproximar o
processo civil dessa realidade.
Por fim, cabe alertar que a litigiosidade repetitiva é também uma realida-
de social em constante mudança, e que vem se moldando a largos passos aos
avanços tecnológicos impactam as profissões e instituições jurídicas. Se antes se
falava em meios de se reproduzir automaticamente peças processuais e decisões
judiciais, já é presente o uso de inteligência artificial para construção e aperfei-
çoamento de teses jurídicas, bem como para obtenção de dados de jurimetria
tanto do lado dos litigantes, quanto das instituições judiciárias. Em breve, não
se discutirão mais os problemas decorrentes da padronização decisória, mas sim
dos algoritmos utilizados para prolação das decisões jurídicas, levando a uma
verdadeira ressignificação do próprio conceito de justiça e da função de todos
os profissionais do sistema de justiça.
Quais serão os impactos desses avanços tecnológicos em termos de aces-
so à justiça? Quem terá acesso a essa tecnologia e “sairá na frente”? Como
esse acesso impactará na massificação da litigiosidade repetitiva, no bara-
teamento dos serviços jurídicos e na dinâmica entre litigantes repetitivos e
ocasionais? Esses temas certamente serão (e já são) extremamente canden-
tes, e demonstram, claramente, a importância de não se encarar o acesso à
justiça como pauta ultrapassada.

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328
Anexo

Relação dos temas julgados pelo STJ analisados


no estudo empírico-jurisprudencial

tema questao_submetida_a_jul- tese_firmada processo julgado_em


gamento
1 Questão referente à necessi- A substituição processual, no REsp 1091443/SP 02/05/2012
dade de anuência do devedor polo ativo da execução, do exe-
para substituição processual quente originário pelo cessionário
do polo ativo, decorrente de dispensa a autorização ou o con-
cessão de crédito, nos autos de sentimento do devedor.
ação de execução.
2 Questão referente à possibilida- Comprovada a validade do ato REsp 1102473/RS 16/05/2012
de de habilitação de cessionário de cessão dos honorários advo-
de crédito referente a honorá- catícios sucumbenciais, realizado
rios advocatícios sucumben- por escritura pública, bem como
ciais que integra precatório ex- discriminado no precatório o va-
pedido em nome do exeqüente lor devido a título da respectiva
e não dos advogados cedentes. verba advocatícia, deve-se reco-
nhecer a legitimidade do cessio-
nário para se habilitar no crédito
consignado no precatório.
3 Questão referente à conver- A imposição ao Estado do Rio REsp 970217/RS 14/10/2009
são dos vencimentos em URV Grande do Sul da conversão das
de servidores do Poder Exe- retribuições aos servidores pela
cutivo gaúcho, conforme a URV (Lei 8.880/94), apesar dos
Lei 8.880/94, deixando-se de reajustes voluntários já conce-
considerar os reajustes/ante- didos à categoria pelo Governo
cipações que foram objeto de Gaúcho a pretexto dessa mesma
várias leis estaduaus do Rio conversão, somente seria cabível
Grande do Sul. se evidenciado algum prejuízo
vencimental decorrente daquela
antecipação voluntária.
4 Questão referente ao per- O art. 1º-F, da Lei 9.494/97, que REsp 1086944/SP 11/03/2009
centual de juros moratórios fixa os juros moratórios nas ações
devido nas condenações im- ajuizadas contra a Fazenda Pú-
postas à Fazenda Pública para blica no patamar de 6%, é de ser
pagamento de verbas remune- aplicado tão somente às deman-
ratórias a servidores públicos, das ajuizadas após a sua entrada
nos termos do artigo 1º-F da em vigor.
Lei nº 9.494/97, acrescenta-
do pela Medida Provisória nº
2.180/2001.

329
Maria Cecília de Araujo Asperti

5 Questão referente à prescrição Na hipótese em que se preten- REsp 1073976/RS 26/11/2008


da pretensão de militares ina- de a revisão de ato de reforma
tivos da Polícia Militar do Es- de policial militar do Estado do
tado do Rio Grande do Sul ao Rio Grande do Sul, com base na
reconhecimento dos benefícios Lei Complementar Estadual nº
concedidos pela Lei Comple- 10.990/97, com sua promoção a
mentar Estadual nº 10.990/97. um posto superior na carreira mi-
litar e, como mera consequência
do deferimento do pedido de pro-
moção, a revisão de seus proven-
tos da inatividade, a prescrição
aplicável é de fundo do direito,
nos termos do artigo 1º do Decre-
to nº 20.910/32.
6 Questão relativa ao reajuste de Os servidores públicos militares, REsp 990284/RS 26/11/2008
28,86%, decorrente das Leis que foram contemplados com re-
nºs 8.622/93 e 8.627/93, no que ajustes inferiores (concedidos pe-
pertine à concessão do referido las Leis 8.622/1993 e 8.627/1993),
índice aos militares federais. têm direito às diferenças entre
estes e o índice de 28,86%.
7 Questão relativa ao reajuste de O reajuste de 28,86% incide sobre REsp 990284/RS 26/11/2008
28,86%, decorrente das Leis a remuneração do servidor, o que
nºs 8.622/93 e 8.627/93, no que inclui o vencimento básico (servi-
pertine à base de cálculo do dor público civil) ou o soldo (mi-
reajuste. litar), acrescido das parcelas que
não os têm como base de cálculo.
8 Questão relativa ao reajuste de A correção monetária deve inci- REsp 990284/RS 26/11/2008
28,86%, decorrente das Leis dir a partir da data em que deve-
nºs 8.622/93 e 8.627/93, no ria ter sido efetuado o pagamento
que pertine ao termo inicial da de cada parcela.
correção monetária.
9 Questão relativa ao reajuste de O reajuste de 28,86% não pode REsp 990284/RS 26/11/2008
28,86%, decorrente das Leis ser compensado com a rubrica
nºs 8.622/93 e 8.627/93, no que paga a título de complementação
pertine à compensação com de salário mínimo.
a complementação do salário
mínimo, pela aplicação do ar-
tigo 73 da Lei nº 8.237/91.
10 Questão relativa ao reajuste de Quanto a prescrição à pretensão REsp 990284/RS 26/11/2008
28,86%, decorrente das Leis dos servidores públicos militares
nºs 8.622/93 e 8.627/93, no que ao reajuste de 28,86%: i) se ajuiza-
pertine à contagem do prazo da a ação ordinária dos servidores
prescricional. até 30/06/2003, os efeitos finan-
ceiros devem retroagir a janeiro
de 1993.
11 Questão relativa ao reajuste de Quanto a prescrição à pretensão REsp 990284/RS 26/11/2008
28,86%, decorrente das Leis dos servidores públicos militares
nºs 8.622/93 e 8.627/93, no que ao reajuste de 28,86%: ii) se pro-
pertine à contagem do prazo posta após 30/06/2003, deve ser
prescricional. aplicado apenas o enunciado da
Súmula 85 desta Corte.

330
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

12 Questão relativa ao reajuste de Quanto a prescrição à pretensão REsp 990284/RS 26/11/2008


28,86%, decorrente das Leis dos servidores públicos milita-
nºs 8.622/93 e 8.627/93, no que res ao reajuste de 28,86%: iii) se
pertine à contagem do prazo ajuizada a ação pelo militar após
prescricional. 1º/01/2006, ocorre a prescrição de
todas as parcelas devidas ao mili-
tar a título de reajuste de 28,86%.
13 Questão relativa ao reajuste de A concessão do reajuste de REsp 990284/RS 26/11/2008
28,86%, decorrente das Leis 28,86% deve se limitar ao adven-
nºs 8.622/93 e 8.627/93, no to da Medida Provisória n. 2.131,
que pertine à limitação tem- de 28/12/2000, que reestruturou
poral do percentual de 28,86% a remuneração dos militares das
ao advento da primeira edi- Forças Armadas, com a absorção
ção da Medida Provisória nº das diferenças de reajustes even-
2.131/2000. tualmente existentes.
14 Questão referente ao paga- Reconhecido o desvio de função, REsp 1091539/AP 26/11/2008
mento de diferenças de venci- o servidor faz jus às diferenças sa-
mentos a professores do Estado lariais decorrentes.
do Amapá por força de desvio
de função.
15 Questão referente à admissibi- É obrigatória a observância pelos REsp 1101726/SP 13/05/2009
lidade da conversão dos valo- Estados e Municípios dos crité-
res de vencimentos/proventos rios previstos na Lei Federal nº
de servidor público municipal, 8.880/94 para a conversão em
recebidos em cruzeiros reais, URV dos vencimentos e dos pro-
para o equivalente em URV, ventos de seus servidores.
nos termos da Lei Federal nº
8.880/94.
16 Questiona-se a imposição de O INSS não está obrigado a efe- REsp 1101727/PR 02/08/2010
pena de deserção (não-conhe- tuar depósito prévio do preparo
cimento de recurso do INSS, por gozar das prerrogativas e pri-
na Justiça Estadual, por ausên- vilégios da Fazenda Pública.
cia de preparo).
17 Questiona-se o não conheci- A dispensa de reexame necessá- REsp 1101727/PR 04/11/2009
mento de reexame necessário rio, quando o valor da condena-
(valor da causa tido como pa- ção ou do direito controvertido
râmetro para aplicação do art. for inferior a sessenta salários mí-
475, § 2º, do CPC). nimos, não se aplica a sentenças
ilíquidas.
18 Questão referente à possibili- A majoração do auxílio-acidente, REsp 1096244/SC 22/04/2009
dade de aplicação da majora- estabelecida pela Lei 9.032/95 (lei
ção do percentual do auxílio- nova mais benéfica), que alte-
-acidente, estabelecida pela rou o § 1º, do art. 86, da Lei n.º
Lei n.º 9.032/95, independen- 8.213/91, deve ser aplicada ime-
temente da legislação em vigor diatamente, atingindo todos os
à época de sua concessão. segurados que estiverem na mes-
ma situação, seja referente aos
casos pendentes de concessão ou
aos benefícios já concedidos.

331
Maria Cecília de Araujo Asperti

19 Questiona-se a utilização do Os débitos previdenciários rema- REsp 1102484/SP 22/04/2009


IGP-DI como critério de corre- nescentes pagos mediante preca-
ção monetária incidente entre tório, devem ser convertidos, à
a data da elaboração dos cálcu- data do cálculo, em quantidade
los e a inscrição do precatório. de Unidade Fiscal de Referên-
Alega-se que, sobre os valores cia - UFIR ou em outra unidade
encontrados naquela data, não de referência oficial que venha a
mais incidem os índices de substituí-la.
correção monetária previden-
ciários, mas, sim, a UFIR ou o
IPCA-e.
20 Questiona-se se a prestação de É inadmissível a fixação de pena REsp 1107314/PR 13/12/2010
serviços à comunidade pode substitutiva (art. 44 do CP) como
ser fixada como condição para condição especial ao regime aber-
o cumprimento da pena em re- to.
gime aberto.
21 Questiona-se a imprescindibi- É devida a pensão por morte aos REsp 1110565/SE 27/05/2009
lidade do requisito "condição dependentes do segurado que,
de segurado do de cujus" para apesar de ter perdido essa qua-
os dependentes fazerem jus ao lidade, preencheu os requisitos
benefício de pensão por morte, legais para a obtenção de aposen-
situação somente excetuada tadoria até a data do seu óbito.
no caso daquele ter preenchido
em vida os requisitos necessá-
rios ao deferimento de qual-
quer uma das aposentadorias
previstas no Regime Geral de
Previdência Social - RGPS.
22 Questão referente à decisão Comprovados o nexo de causali- REsp 1095523/SP 26/08/2009
que, observando, única e ex- dade e a redução da capacidade
clusivamente, a perda míni- laborativa, mesmo em face da dis-
ma auditiva (inferior a índice cusão em grau inferior ao estabe-
previsto na tabela de Fowler), lecido pela Tabela Fowler, subsiste
nega a concessão do benefício o direito do obreiro ao benefício
de auxílio-acidente. de auxílio-acidente.
23 Questiona-se se as certidões Importa em interrupção da pres- REsp 1112114/SP 09/09/2009
expedidas pela Administração crição a confissão realizada por
não têm o condão de interrom- meio de certidão individual emi-
per a prescrição. tida pelo Tribunal de Justiça (...),
acerca da existência de dívida de
valor consolidado em favor de
servidor público integrante de seu
respectivo Quadro.
24 Discussão acerca dos juros As instituições financeiras não REsp 1061530/RS 22/10/2008
remuneratórios em ações que se sujeitam à limitação dos juros
digam respeito a contratos remuneratórios estipulada na Lei
bancários. de Usura (Decreto 22.626/33),
Súmula 596/STF.
25 Discussão acerca dos juros A estipulação de juros remune- REsp 1061530/RS 22/10/2008
remuneratórios em ações que ratórios superiores a 12% ao ano,
digam respeito a contratos por si só, não indica abusividade.
bancários.

332
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

26 Discussão acerca dos juros São inaplicáveis aos juros remu- REsp 1061530/RS 22/10/2008
remuneratórios em ações que neratórios dos contratos de mú-
digam respeito a contratos tuo bancário as disposições do
bancários. art. 591 c/c o art. 406 do CC/02.
27 Discussão acerca dos juros É admitida a revisão das taxas REsp 1061530/RS 22/10/2008
remuneratórios em ações que de juros remuneratórios em si-
digam respeito a contratos tuações excepcionais, desde que
bancários. caracterizada a relação de consu-
mo e que a abusividade (capaz de
colocar o consumidor em desvan-
tagem exagerada (art. 51, §1 º, do
CDC) fique cabalmente demons-
trada, ante às peculiaridades do
julgamento em concreto.
28 Discussão acerca dos juros re- O reconhecimento da abusivida- REsp 1061530/RS 22/10/2008
muneratórios, da capitalização de nos encargos exigidos no pe-
de juros e da mora em ações ríodo da normalidade contratual
que digam respeito a contratos (juros remuneratórios e capitali-
bancários. zação) descaracteriza a mora.
29 Discussão acerca da mora em A simples propositura da ação de REsp 1061530/RS 22/10/2008
ações que digam respeito a revisão de contrato não inibe a
contratos bancários. caracterização da mora do autor.
30 Discute matérias, quando Nos contratos bancários, não- REsp 1061530/RS 22/10/2008
ativadas em ações que digam -regidos por legislação específica,
respeito a contratos bancários: os juros moratórios poderão ser
a) juros remuneratórios; b) ca- convencionados até o limite de
pitalização de juros; c)mora; d) 1% ao mês.
comissão de permanência; e)
inscrição do nome do devedor
em cadastros de proteção ao
crédito; f) disposições de ofício
no âmbito do julgamento da
apelação acerca de questões
não devolvidas ao tribunal.

333
Maria Cecília de Araujo Asperti

31 Discussão acerca da mora e da A abstenção da inscrição/ REsp 1061530/RS 22/10/2008


inscrição do nome do devedor manutenção em cadastro de
em cadastros de proteção ao inadimplentes, requerida em an-
crédito em ações que digam tecipação de tutela e/ou medida
respeito a contratos bancário. cautelar, somente será deferida
se, cumulativamente: i) a ação
for fundada em questionamento
integral ou parcial do débito;ii)
houver demonstração de que a
cobrança indevida se funda na
aparência do bom direito e em ju-
risprudência consolidada do STF
ou STJ;iii) houver depósito da
parcela incontroversa ou for pres-
tada a caução fixada conforme o
prudente arbítrio do juiz. A ins-
crição/manutenção do nome do
devedor em cadastro de inadim-
plentes decidida na sentença ou
no acórdão observará o que for
decidido no mérito do processo.
Caracterizada a mora, correta a
inscrição/manutenção.
32 Discussão acerca da mora e da A abstenção da inscrição/ REsp 1061530/RS 22/10/2008
inscrição do nome do devedor manutenção em cadastro de
em cadastros de proteção ao inadimplentes, requerida em an-
crédito em ações que digam tecipação de tutela e/ou medida
respeito a contratos bancários. cautelar, somente será deferida
se, cumulativamente: i) a ação
for fundada em questionamento
integral ou parcial do débito; ii)
houver demonstração de que a
cobrança indevida se funda na
aparência do bom direito e em ju-
risprudência consolidada do STF
ou STJ; iii) houver depósito da
parcela incontroversa ou for pres-
tada a caução fixada conforme o
prudente arbítrio do juiz. A ins-
crição/manutenção do nome do
devedor em cadastro de inadim-
plentes decidida na sentença ou
no acórdão observará o que for
decidido no mérito do processo.
Caracterizada a mora, correta a
inscrição/manutenção.

334
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

33 Discussão acerca da inscrição A abstenção da inscrição/ REsp 1061530/RS 22/10/2008


do nome do devedor em ca- manutenção em cadastro de
dastros de proteção ao crédito inadimplentes, requerida em an-
em ações que digam respeito a tecipação de tutela e/ou medida
contratos bancários. cautelar, somente será deferida
se, cumulativamente: i) a ação
for fundada em questionamento
integral ou parcial do débito; ii)
houver demonstração de que a
cobrança indevida se funda na
aparência do bom direito e em ju-
risprudência consolidada do STF
ou STJ; iii) houver depósito da
parcela incontroversa ou for pres-
tada a caução fixada conforme o
prudente arbítrio do juiz. A ins-
crição/manutenção do nome do
devedor em cadastro de inadim-
plentes decidida na sentença ou
no acórdão observará o que for
decidido no mérito do processo.
Caracterizada a mora, correta a
inscrição/manutenção.
34 Discussão acerca da inscrição A abstenção da inscrição/ REsp 1061530/RS 22/10/2008
do nome do devedor em ca- manutenção em cadastro de
dastros de proteção ao crédito inadimplentes, requerida em an-
em ações que digam respeito a tecipação de tutela e/ou medida
contratos bancários. cautelar, somente será deferida
se, cumulativamente: i) a ação
for fundada em questionamento
integral ou parcial do débito; ii)
houver demonstração de que a
cobrança indevida se funda na
aparência do bom direito e em ju-
risprudência consolidada do STF
ou STJ; iii) houver depósito da
parcela incontroversa ou for pres-
tada a caução fixada conforme o
prudente arbítrio do juiz. A ins-
crição/manutenção do nome do
devedor em cadastro de inadim-
plentes decidida na sentença ou
no acórdão observará o que for
decidido no mérito do processo.
Caracterizada a mora, correta a
inscrição/manutenção.
35 Discussão acerca da mora e da A inscrição/manutenção do REsp 1061530/RS 22/10/2008
inscrição do nome do devedor nome do devedor em cadastro de
em cadastros de proteção ao inadimplentes decidida na sen-
crédito em ações que digam tença ou no acórdão observará
respeito a contratos bancários. o que for decidido no mérito do
processo. Caracterizada a mora,
correta a inscrição/manutenção.

335
Maria Cecília de Araujo Asperti

36 Discute matérias, quando Nos contratos bancários, é veda- REsp 1061530/RS 22/10/2008
ativadas em ações que digam do ao julgador conhecer, de ofí-
respeito a contratos bancários: cio, da abusividade das cláusulas.
a) juros remuneratórios; b) ca-
pitalização de juros; c)mora; d)
comissão de permanência; e)
inscrição do nome do devedor
em cadastros de proteção ao
crédito; f) disposições de ofício
no âmbito do julgamento da
apelação acerca de questões
não devolvidas ao tribunal.
37 Discussão sobre indenização Os órgãos mantenedores de ca- REsp 1061134/RS 10/12/2008
por danos morais decorrente dastros possuem legitimidade
de inscrição do nome do deve- passiva para as ações que buscam
dor nos cadastros de restrição a reparação dos danos morais e
ao crédito com ausência de materiais decorrentes da inscri-
comunicação prévia, em espe- ção, sem prévia notificação, do
cial nos casos onde o devedor nome de devedor em seus cadas-
já possua outras inscrições nos tros restritivos, inclusive quando
cadastros de devedores. os dados utilizados para a ne-
gativação são oriundos do CCF
do Banco Central ou de outros
cadastros mantidos por entidade
diversas.
38 Discussão sobre indenização Os órgãos mantenedores de ca- REsp 1061134/RS 10/12/2008
por danos morais decorrente dastros possuem legitimidade
de inscrição do nome do deve- passiva para as ações que buscam
dor nos cadastros de restrição a reparação dos danos morais e
ao crédito com ausência de materiais decorrentes da inscri-
comunicação prévia, em espe- ção, sem prévia notificação, do
cial nos casos onde o devedor nome de devedor em seus cadas-
já possua outras inscrições nos tros restritivos, inclusive quando
cadastros de devedores. os dados utilizados para a ne-
gativação são oriundos do CCF
do Banco Central ou de outros
cadastros mantidos por entidade
diversas.
39 Questão referente à reivindi- A mera existência de ação tendo REsp 990507/DF 10/11/2010
cação e posse das terras que por objeto a declaração de nuli-
o Espólio de Anastácio Perei- dade de registro imobiliário não
ra Braga e Outros alegam ser é suficiente para se concluir pela
de sua propriedade e que hoje ilegitimidade ativa daquele que,
formam o Condomínio Porto com base nesse mesmo registro,
Rico, em Santa Maria no Dis- ajuíza ação reivindicatória.
trito Federal.
40 Discussão sobre indenização A ausência de prévia comunica- REsp 1062336/RS 10/12/2008
por danos morais decorrente ção ao consumidor da inscrição
de inscrição do nome do deve- do seu nome em cadastros de pro-
dor nos cadastros de restrição teção ao crédito, prevista no art.
ao crédito com ausência de 43, § 2º, do CDC, enseja o direito
comunicação prévia, em espe- à compensação por danos morais.
cial nos casos onde o devedor
já possua outras inscrições nos
cadastros de devedores.

336
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

41 Discute-se sobre indenização Da anotação irregular em cadas- REsp 1062336/RS 10/12/2008


por danos morais decorrente tro de proteção ao crédito, não
de inscrição do nome do deve- cabe indenização por dano mo-
dor nos cadastros de restrição ral, quando preexistente legítima
ao crédito com ausência de inscrição, ressalvado o direito ao
comunicação prévia, em espe- cancelamento.
cial nos casos onde o devedor
já possua outras inscrições nos
cadastros de devedores.
42 Necessidade de prévio reque- Falta ao autor interesse de agir REsp 982133/RS 10/09/2008
rimento administrativo para para a ação em que postula a ob-
a demonstração de interesse tenção de documentos com dados
na cautelar de exibição de societários, se não logra demons-
documentos, preparatória de trar haver apresentado requeri-
demanda de complementação mento formal à ré nesse sentido.
de ações.
43 comprovação do pagamen- A comprovação do pagamento do REsp 982133/RS 10/09/2008
to do custo do serviço como 'custo do serviço' referente ao for-
requisito de procedibilidade necimento de certidão de assen-
da ação de exibição de docu- tamentos constantes dos livros da
mentos em face da sociedade companhia é requisito de proce-
anônima. dibilidade da ação de exibição de
documentos ajuizada em face da
sociedade anônima.
44 Incidência de prescrição nos A prescrição incidente nas ações REsp 1033241/RS 22/10/2008
contratos de participação fi- que visem à subscrição comple-
nanceira. mentar de ações rege-se pelo
prazo vintenário ou decenário,
conforme as regras do anterior ou
do atual Código Civil.
45 Incidência da prescrição nos Quanto aos dividendos, além do REsp 1033241/RS 22/10/2008
contratos de participação fi- que foi dito acima, só prescreveria
nanceira. o direito a partir do reconheci-
mento do direito à diferença das
ações.
46 Estabelecer o valor patrimo- Nos contratos de participação REsp 1033241/RS 22/10/2008
nial da ação de adquirentes de financeira para a aquisição de
linha telefônica. linha telefônica, o Valor Patri-
monial da Ação (VPA) é apurado
com base no balancete do mês da
integralização.
47 Questão referente à aplicação A presunção de veracidade con- REsp 1094846/MS 11/03/2009
do art. 359 do CPC nas ações tida no art. 359 do Código de
cautelares de exibição de do- Processo Civil não se aplica às
cumentos. ações cautelares de exibição de
documentos.

337
Maria Cecília de Araujo Asperti

48 Questão referente à legalidade Nos contratos celebrados no âm- REsp 1070297/PR 09/09/2009
do Sistema Francês de Amor- bito do Sistema Financeiro da
tização, também conhecido Habitação, é vedada a capitaliza-
com Tabela Price, em contrato ção de juros em qualquer perio-
celebrado no âmbito do Siste- dicidade, mas não cabe ao STJ,
ma Financeiro de Habitação. todavia, aferir se há capitalização
de juros com a utilização da Ta-
bela Price, por força das Súmulas
5 e 7.
49 Questão referente à limitação O art. 6º, e, da Lei n. 4.380/1964 REsp 1070297/PR 09/09/2009
dos juros remuneratórios ao não estabelece limitação aos ju-
percentual de 10% a.a., com ros remuneratórios nos contratos
base no art. 6º, "e", da Lei n. vinculados ao SFH.
4.380/64, em contrato cele-
brado no âmbito do Sistema
Financeiro de Habitação.
52 Questão referente à legalidade A cobrança de comissão de per- REsp 1058114/RS 12/08/2009
da cláusula que, em contratos manência - cujo valor não pode
bancários, prevê a cobrança da ultrapassar a soma dos encargos
comissão de permanência na remuneratórios e moratórios pre-
hipótese de inadimplência do vistos no contrato - exclui a exigi-
consumidor. bilidade dos juros remuneratórios,
moratórios e da multa contratual.
53 Questiona-se a substituição da No âmbito do Sistema Financei- REsp 969129/MG 09/12/2009
Taxa Referencial - TR - pelo ro da Habitação, a partir da Lei
Índice Nacional de Preço ao n. 8.177/1991, é permitida a utili-
Consumidor - INPC/IBGE -, zação da Taxa Referencial (TR)
como índice de atualização como índice de correção monetá-
monetária do saldo devedor. ria do saldo devedor, que também
será cabível ainda que o contrato
tenha sido firmado antes da Lei
n. 8.177/1991, mas desde que haja
previsão contratual de correção
monetária pela taxa básica de re-
muneração dos depósitos em pou-
pança, sem nenhum outro índice
específico.
54 Questiona-se a obrigatorieda- O mutuário do SFH não pode ser REsp 969129/MG 09/12/2009
de da contratação de Seguro compelido a contratar o seguro
Habitacional diretamente com habitacional obrigatório com a
o agente financeiro ou por se- instituição financeira mutuante
guradora por este indicada. ou com a seguradora por ela in-
dicada.

338
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

55 Questiona-se a possibilidade Em se tratando de contratos ce- REsp 1067237/SP 24/06/2009


de tutela cautelar com vistas a lebrados no âmbito do Sistema
suspender a execução extraju- Financeiro da Habitação, a exe-
dicial a que se refere o Decre- cução extrajudicial de que trata
to-lei n. 70/66, bem como de o Decreto-lei nº 70/66, enquanto
impedir a inscrição do nome perdurar a demanda, poderá ser
do devedor em bancos de da- suspensa, uma vez preenchidos
dos desabonadores, desde que os requisitos para a concessão da
o mutuário de contrato cele- tutela cautelar, independente-
brado no âmbito do Sistema mente de caução ou do depósito
Financeiro da Habitação con- de valores incontroversos, desde
signe os valores que entender que: a) exista discussão judicial
devidos. contestando a existência integral
ou parcial do débito; b) essa dis-
cussão esteja fundamentada em
jurisprudência do Superior Tribu-
nal de Justiça ou do Supremo Tri-
bunal Federal (fumus boni iuris).
57 Discute-se, em autos de ação A ação de cobrança de diferenças REsp 1110561/SP 09/09/2009
de cobrança, diferenças de de valores de complementação de
correção monetária incidentes aposentadoria prescreve em cinco
sobre valores recolhidos a fun- anos contados da data do paga-
do de previdência privada, en- mento.
tendeu que a prescrição inci-
dente à hipótese é vintenária,
bem como pela utilização do
IPC como fator de atualização
das parcelas restituídas.
58 Discute-se, em autos de ação A ação de cobrança de diferenças REsp 1110561/SP 09/09/2009
de cobrança, diferenças de de valores de complementação de
correção monetária incidentes aposentadoria prescreve em cinco
sobre valores recolhidos a fun- anos contados da data do paga-
do de previdência privada, en- mento.
tendeu que a prescrição inci-
dente à hipótese é vintenária,
bem como pela utilização do
IPC como fator de atualização
das parcelas restituídas.
59 Questiona-se sobre a neces- É dispensável o aviso de recebi- REsp 1083291/RS 09/09/2009
sidade de comprovação, me- mento (AR) na carta de comuni-
diante AR, do recebimento cação ao consumidor sobre a ne-
pelo devedor da correspondên- gativação de seu nome em bancos
cia mediante a qual ele é cien- de dados e cadastros.
tificado previamente da inscri-
ção de seu nome em cadastros
de inadimplentes.

339
Maria Cecília de Araujo Asperti

60 Questiona-se se diante de Ajuizada ação coletiva atinente a REsp 1110549/RS 28/10/2009


ajuizamento de ação coletiva, macro-lide geradora de processos
pode o Juízo suspender, ex offi- multitudinários, suspendem-se as
cio e ao início, o processo de ações individuais, no aguardo do
ação individual multitudinária julgamento da ação coletiva.
atinente à mesma lide, preser-
vados os efeitos do juizamento
para a futura execução. A sus-
pensão, no caso de ação multi-
tudinária, não ofende os dispo-
sitivos legais envolvidos (CDC
arts. 103 e 104, § 3º; CPC, arts.
2º e 6º; e CC, arts. 122 e 166).
61 Questiona-se a configuração Não resta caracterizada a de- REsp 886462/RS 22/10/2008
ou não de denúncia espontâ- núncia espontânea, com a con-
nea relativamente a tributo sequente exclusão da multa mo-
estadual sujeito a lançamento ratória, nos casos de tributos de-
por homologação (ICMS), de- clarados, porém pagos a destempo
clarado pelo contribuinte (em pelo contribuinte, ainda que o
Guia de Informação e Apura- pagamento seja integral.
ção - GIA), mas pago no devi-
do prazo.
62 Questiona-se, tendo em vista Por força da isenção concedi- REsp 1012903/RJ 08/10/2008
a Lei 7.713/88, a cobrança de da pelo art. 6º, VII, b, da Lei
imposto de renda sobre paga- 7.713/88, na redação anterior à
mento de benefício de comple- que lhe foi dada pela Lei 9.250/95,
mentação de aposentadoria, é indevida a cobrança de imposto
decorrente de plano de previ- de renda sobre o valor da com-
dência privada. plementação de aposentadoria
e o do resgate de contribuições
correspondentes a recolhimen-
tos para entidade de previdência
privada ocorridos no período de
1º.01.1989 a 31.12.1995.
63 Questiona-se a legitimidade É indevida a incidência de ICMS REsp 960476/SC 11/03/2009
da cobrança de ICMS sobre sobre a parcela correspondente
o valor pago a título de "de- à demanda de potência elétrica
manda contratada" de energia contratada mas não utilizada.
elétrica.
64 Questão referente ao emprésti- Quanto à pretensão da incidência REsp 1003955/RS 12/08/2009
mo compulsório sobre energia de correção monetária sobre os
elétrica, no qual se discute: juros remuneratórios de que trata
a) prescrição - termo a quo; o art. 2° do Decreto-lei 1.512/76
b) correção monetária plena (item 3), a lesão ao direito do con-
sobre o principal (a partir da sumidor ocorreu, efetivamente,
data do recolhimento até a em julho de cada ano vencido,
data do efetivo pagamento de no momento em que a ELETRO-
juros e de 31 de dezembro até BRÁS realizou o pagamento da
a data da assembléia de con- respectiva parcela, mediante
versão), bem como o reflexo compensação dos valores nas
dos juros de 6% ao ano sobre a contas de energia elétrica.
diferença de correção monetá-
ria; c) juros remuneratórios de
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e)
juros moratórios.

340
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

65 Questão referente ao emprésti- Quanto à pretensão de correção REsp 1003955/RS 12/08/2009


mo compulsório sobre energia monetária incidente sobre o prin-
elétrica, no qual se discute: cipal (item 2), e dos juros remune-
a) prescrição - termo a quo; ratórios dela decorrentes (item 4),
b) correção monetária plena a lesão ao direito do consumidor
sobre o principal (a partir da somente ocorreu no momento da
data do recolhimento até a restituição do empréstimo em va-
data do efetivo pagamento de lor 'a menor'. Considerando que
juros e de 31 de dezembro até essa restituição se deu em forma
a data da assembléia de con- de conversão dos créditos em
versão), bem como o reflexo ações da companhia, a prescri-
dos juros de 6% ao ano sobre a ção teve início na data em que a
diferença de correção monetá- Assembleia-Geral Extraordinária
ria; c) juros remuneratórios de homologou a conversão a saber:
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e) a) 20/04/1988 - com a 72ª AGE -
juros moratórios. 1ª conversão; b) 26/04/1990 - com
a 82ª AGE - 2ª conversão; e c)
30/06/2005 - com a 143ª AGE - 3ª
conversão.
66 Questão referente ao emprésti- Quanto à pretensão de correção REsp 1003955/RS 12/08/2009
mo compulsório sobre energia monetária incidente sobre o prin-
elétrica, no qual se discute: cipal (item 2), e dos juros remune-
a) prescrição - termo a quo; ratórios dela decorrentes (item 4),
b) correção monetária plena a lesão ao direito do consumidor
sobre o principal (a partir da somente ocorreu no momento da
data do recolhimento até a restituição do empréstimo em va-
data do efetivo pagamento de lor 'a menor'. Considerando que
juros e de 31 de dezembro até essa restituição se deu em forma de
a data da assembléia de con- conversão dos créditos em ações da
versão), bem como o reflexo companhia, a prescrição teve iní-
dos juros de 6% ao ano sobre a cio na data em que a Assembleia-
diferença de correção monetá- -Geral Extraordinária homologou
ria; c) juros remuneratórios de a conversão a saber: a) 20/04/1988
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e) - com a 72ª AGE - 1ª conversão; b)
juros moratórios. 26/04/1990 - com a 82ª AGE - 2ª
conversão; e c) 30/06/2005 - com a
143ª AGE - 3ª conversão.

341
Maria Cecília de Araujo Asperti

67 Questão referente ao emprésti- Quanto à pretensão de correção REsp 1003955/RS 12/08/2009


mo compulsório sobre energia monetária incidente sobre o prin-
elétrica, no qual se discute: cipal (item 2), e dos juros remune-
a) prescrição - termo a quo; ratórios dela decorrentes (item 4),
b) correção monetária plena a lesão ao direito do consumidor
sobre o principal (a partir da somente ocorreu no momento da
data do recolhimento até a restituição do empréstimo em va-
data do efetivo pagamento de lor 'a menor'. Considerando que
juros e de 31 de dezembro até essa restituição se deu em forma
a data da assembléia de con- de conversão dos créditos em
versão), bem como o reflexo ações da companhia, a prescri-
dos juros de 6% ao ano sobre a ção teve início na data em que a
diferença de correção monetá- Assembleia-Geral Extraordinária
ria; c) juros remuneratórios de homologou a conversão a saber:
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e) a) 20/04/1988 - com a 72ª AGE -
juros moratórios. 1ª conversão; b) 26/04/1990 - com
a 82ª AGE - 2ª conversão; e c)
30/06/2005 - com a 143ª AGE - 3ª
conversão.
68 Questão referente ao emprésti- Os valores compulsoriamente REsp 1003955/RS 12/08/2009
mo compulsório sobre energia recolhidos devem ser devolvidos
elétrica, no qual se discute: com correção monetária plena
a) prescrição - termo a quo; (integral), não havendo motivo
b) correção monetária plena para a supressão da atualização
sobre o principal (a partir da no período decorrido entre a data
data do recolhimento até a do recolhimento e o 1° dia do ano
data do efetivo pagamento de subsequente, que deve obedecer
juros e de 31 de dezembro até à regra do art. 7°, § 1°, da Lei
a data da assembléia de con- 4.357/64 e, a partir daí, o critério
versão), bem como o reflexo anual previsto no art. 3° da mes-
dos juros de 6% ao ano sobre a ma lei. Devem ser computados,
diferença de correção monetá- ainda, os expurgos inflacionários,
ria; c) juros remuneratórios de conforme pacificado na jurispru-
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e) dência do STJ, o que não im-
juros moratórios. porta em ofensa ao art. 3° da Lei
4.357/64. Entretanto, descabida a
incidência de correção monetária
em relação ao período compreen-
dido entre 31/12 do ano anterior à
conversão e a data da assembleia
de homologação.

342
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

69 Questão referente ao emprésti- Devida, em tese, a atualização REsp 1003955/RS 12/08/2009


mo compulsório sobre energia monetária sobre juros remunera-
elétrica, no qual se discute: tórios em razão da ilegalidade do
a) prescrição - termo a quo; pagamento em julho de cada ano,
b) correção monetária plena sem incidência de atualização
sobre o principal (a partir da entre a data da constituição do
data do recolhimento até a crédito em 31/12 do ano anterior
data do efetivo pagamento de e o efetivo pagamento, observada
juros e de 31 de dezembro até a prescrição quinquenal.
a data da assembléia de con-
versão), bem como o reflexo
dos juros de 6% ao ano sobre a
diferença de correção monetá-
ria; c) juros remuneratórios de
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e)
juros moratórios.
70 Questão referente ao emprésti- São devidos juros remuneratórios REsp 1003955/RS 12/08/2009
mo compulsório sobre energia de 6% ao ano (art. 2° do Decreto-
elétrica, no qual se discute: -lei 1.512/76) sobre a diferença de
a) prescrição - termo a quo; correção monetária (incluindo-se
b) correção monetária plena os expurgos inflacionários) inci-
sobre o principal (a partir da dente sobre o principal (apurada
data do recolhimento até a da data do recolhimento até 31/12
data do efetivo pagamento de do mesmo ano). Cabível o paga-
juros e de 31 de dezembro até mento dessas diferenças à parte
a data da assembléia de con- autora em dinheiro ou na forma
versão), bem como o reflexo de participação acionária (ações
dos juros de 6% ao ano sobre a preferenciais nominativas), a
diferença de correção monetá- critério da ELETROBRÁS, tal
ria; c) juros remuneratórios de qual ocorreu em relação ao prin-
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e) cipal, nos termos do Decreto-lei
juros moratórios. 1.512/76.
71 Questão referente ao emprésti- Os valores objeto da condenação REsp 1003955/RS 12/08/2009
mo compulsório sobre energia judicial ficam sujeitos a correção
elétrica, no qual se discute: monetária, a contar da data em que
a) prescrição - termo a quo; deveriam ter sido pagos: a) quanto
b) correção monetária plena à condenação referente às diferen-
sobre o principal (a partir da ças de correção monetária paga a
data do recolhimento até a menor sobre empréstimo compul-
data do efetivo pagamento de sório, e os juros remuneratórios
juros e de 31 de dezembro até dela decorrentes (itens 2 e 4 supra),
a data da assembléia de con- o débito judicial deve ser corrigido
versão), bem como o reflexo a partir da data da correspondente
dos juros de 6% ao ano sobre a assembleia-geral de homologação
diferença de correção monetá- da conversão em ações.
ria; c) juros remuneratórios de
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e)
juros moratórios.

343
Maria Cecília de Araujo Asperti

72 Questão referente ao emprésti- Os valores objeto da condenação REsp 1003955/RS 12/08/2009


mo compulsório sobre energia judicial ficam sujeitos a correção
elétrica, no qual se discute: monetária, a contar da data em
a) prescrição - termo a quo; que deveriam ter sido pagos: b)
b) correção monetária plena quanto à diferença de juros remu-
sobre o principal (a partir da neratórios (item 4 supra), o débito
data do recolhimento até a judicial deve ser corrigido a partir
data do efetivo pagamento de do mês de julho do ano em que os
juros e de 31 de dezembro até juros deveriam ter sido pagos.
a data da assembléia de con-
versão), bem como o reflexo
dos juros de 6% ao ano sobre a
diferença de correção monetá-
ria; c) juros remuneratórios de
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e)
juros moratórios.
73 Questão referente ao emprésti- ÍNDICES: observado o Manual REsp 1003955/RS 12/08/2009
mo compulsório sobre energia de Cálculos da Justiça Federal e
elétrica, no qual se discute: a jurisprudência do STJ, cabível
a) prescrição - termo a quo; o cômputo dos seguintes expur-
b) correção monetária plena gos inflacionários em substituição
sobre o principal (a partir da aos índices oficiais já aplicados:
data do recolhimento até a 14,36% (fevereiro/86), 26,06%
data do efetivo pagamento de (junho/87), 42,72% (janeiro/89),
juros e de 31 de dezembro até 10,14% (fevereiro/89), 84,32%
a data da assembléia de con- (março/90), 44,80% (abril/90),
versão), bem como o reflexo 7,87% (maio/90), 9,55% (ju-
dos juros de 6% ao ano sobre a nho/90), 12,92% (julho/90),
diferença de correção monetá- 12,03% (agosto/90), 12,76% (se-
ria; c) juros remuneratórios de tembro/90), 14,20% (outubro/90),
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e) 15,58% (novembro/90), 18,30%
juros moratórios. (dezembro/90), 19,91% (janei-
ro/91), 21,87% (fevereiro/91) e
1,79% (março/91).
74 Questão referente ao emprésti- Sobre os valores apurados em REsp 1003955/RS 12/08/2009
mo compulsório sobre energia liquidação de sentença devem
elétrica, no qual se discute: incidir, até o efetivo pagamento,
a) prescrição - termo a quo; correção monetária e juros mo-
b) correção monetária plena ratórios a partir da citação: a) de
sobre o principal (a partir da 6% ao ano, até 11/01/2003 (quan-
data do recolhimento até a do entrou em vigor o novo Códi-
data do efetivo pagamento de go Civil) - arts. 1.062 e 1.063 do
juros e de 31 de dezembro até CC/1916; b) a partir da vigência
a data da assembléia de con- do CC/2002, deve incidir a taxa
versão), bem como o reflexo que estiver em vigor para a mora
dos juros de 6% ao ano sobre a do pagamento de impostos devi-
diferença de correção monetá- dos à Fazenda Nacional. Segundo
ria; c) juros remuneratórios de a jurisprudência desta Corte, o
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e) índice a que se refere o dispositivo
juros moratórios. é a taxa SELIC.

344
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

75 Questão referente ao emprésti- Considerando que a taxa SELIC, REsp 1003955/RS 12/08/2009
mo compulsório sobre energia em sua essência, já compreende
elétrica, no qual se discute: juros de mora e atualização mo-
a) prescrição - termo a quo; netária, a partir de sua incidência
b) correção monetária plena não há cumulação desse índice
sobre o principal (a partir da com juros de mora.
data do recolhimento até a
data do efetivo pagamento de
juros e de 31 de dezembro até
a data da assembléia de con-
versão), bem como o reflexo
dos juros de 6% ao ano sobre a
diferença de correção monetá-
ria; c) juros remuneratórios de
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e)
juros moratórios.
76 Questona-se a existência ou Em demandas sobre a legitimi- REsp 1068944/PB 12/11/2008
não, de legitimidade ou não da dade da cobrança de tarifas por
cobrança da tarifa de assinatu- serviço de telefonia, movidas por
ra mensal relativa à prestação usuário contra a concessionária,
de serviços de telefonia, de li- não se configura hipótese de li-
tisconsórcio passivo necessário tisconsórcio passivo necessário da
entre a empresa concessioná- ANATEL.
ria de telefonia e a ANATEL.
77 Questiona-se a legitimidade É legítima a cobrança de tarifa REsp 1068944/PB 12/11/2008
ou não da cobrança da tarifa básica pelo uso dos serviços de
de assinatura mensal relativa telefonia fixa.
à prestação de serviços de te-
lefonia.
78 Questão referente ao emprésti- Cabível a conversão dos créditos REsp 1028592/RS 12/08/2009
mo compulsório sobre energia em ações pelo valor patrimonial
elétrica, no qual se discute: e não pelo valor de mercado, por
a) prescrição - termo a quo; expressa disposição legal (art. 4º
b) correção monetária plena da Lei 7.181/83).
sobre o principal (a partir da
data do recolhimento até a
data do efetivo pagamento de
juros e de 31 de dezembro até
a data da assembléia de con-
versão), bem como o reflexo
dos juros de 6% ao ano sobre a
diferença de correção monetá-
ria; c) juros remuneratórios de
6% ao ano; d) taxa SELIC; e e)
juros moratórios.

345
Maria Cecília de Araujo Asperti

79 Questiona-se se a forma de O art. 5º da Resolução 20/2001 REsp 1046376/DF 11/02/2009


intimação do ato que exclui do Comitê Gestor do Programa
o contribuinte do Programa prevê a notificação da exclusão do
de Recuperação Fiscal - RE- REFIS por meio de publicação no
FIS, a saber, se necessário ato Diário Oficial ou pela Internet,
publicado no DOU, ou sufi- o que torna desarrazoada a pre-
ciente comunicação pela via tensão de intimação pessoal para
da internet, nos termos da Lei esta finalidade.
9.964/00, art. 9º, III, c/c art. 5º
da Resolução 20/2001 do Co-
mitê Gestor.
80 Questão referente à legalida- A retenção de 11% (onze por REsp 1036375/SP 11/03/2009
de da retenção de 11% sobre cento) a título de contribuição
os valores brutos das faturas previdenciária, na forma do art.
dos contratos de prestação de 31 da Lei n. 8.212/91, não confi-
serviço pelas empresas toma- gura nova modalidade de tributo,
doras, conforme disposição do mas tão-somente alteração na sua
art. 31 da Lei 9.711/98. forma de recolhimento, não ha-
vendo nenhuma ilegalidade nessa
nova sistemática de arrecadação.
81 Questão referente à compen- É admissível, em embargos à exe- REsp 1001655/DF 11/03/2009
sação, em sede de embargos à cução, compensar os valores de
execução, de valores retidos na imposto de renda retidos indevi-
fonte, a título de imposto de damente na fonte com os valores
renda, com aqueles restituídos, restituídos apurados na declara-
quando do ajuste anual das de- ção anual.
clarações dos exeqüentes.
82 Questão referente à possibilida- A citação válida, ainda que por REsp 999901/RS 13/05/2009
de de interrupção da prescrição edital, tem o condão de interrom-
por meio de citação por edital per o fluxo do prazo prescricional.
em ação de execução fiscal.
83 Questão referente à exigibili- A parcela de 0,2% (zero vírgula REsp 977058/RS 22/10/2008
dade da contribuição adicional dois por cento) - destinada ao
destinada ao Instituto Nacional Incra não foi extinta pela Lei
de Colonização e Reforma Agrá- 7.787/89 e tampouco pela Lei
ria - INCRA, criada pela Lei nº 8.213/91.
2.613/55, cobrada no importe de
0,2% sobre folha de salário.
84 Questão referente ao forneci- Tratando-se de fornecimento de REsp 1069810/RS 23/10/2013
mento de medicamento neces- medicamentos, cabe ao Juiz ado-
sário ao tratamento de saúde, tar medidas eficazes à efetivação
sob pena de bloqueio ou seqües- de suas decisões, podendo, se ne-
tro de verbas do Estado a serem cessário, determinar até mesmo o
depositadas em conta-corrente. sequestro de valores do devedor
(bloqueio), segundo o seu pruden-
te arbítrio, e sempre com adequa-
da fundamentação.
85 Questão referente à aplicação A contribuição sindical rural im- REsp 902349/PR 24/06/2009
da multa, juros e correção mo- plementada a destempo sofre a
netária a partir do vencimento incidência do regime previsto no
da contribuição sindical rural, art. 2º da Lei 8.022/90, reiterado
no caso de seu recolhimento pelo art. 59 da Lei 8.383/91.
extemporâneo, conforme dis-
posição do art. 600 da CLT.

346
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

86 Questão referente ao proces- O depósito prévio ao recurso REsp 894060/SP 22/10/2008


samento de recurso adminis- administrativo, para a discussão
trativo sem o depósito prévio de crédito previdenciário, ante o
de 30% (trinta por cento) da flagrante desrespeito à garantia
exigência fiscal, instituído constitucional da ampla defesa
pelo § 1º, do artigo 126, da Lei (artigo 5º, LV, da CF/88) e ao
8.213/91, acrescentado pela direito de petição independen-
Medida Provisória nº 1.607- temente do pagamento de taxas
12/98, convertida na Lei nº (artigo 5º, XXXIV, "a", da CF/88)
9.639/98. é inexigível, consoante decisão
do Supremo Tribunal Federal,
na sessão plenária ocorrida em
28.03.2007, nos autos do Recur-
so Extraordinário 389.383-1/SP,
na qual declarou, por maioria, a
inconstitucionalidade dos §§ 1.º e
2.º, do artigo 126, da Lei 8.213/91,
com a redação dada pela Medida
Provisória 1.608-14/98, converti-
da na Lei 9.639/98.
87 Questão referente à legalidade A partir de 01 de Agosto de 2007, REsp 1074799/MG 27/05/2009
da cobrança de pulsos exce- data da implementação total do
dentes à franquia telefônica, sistema, passou a ser exigido das
sem a discriminação das liga- concessionárias o detalhamento
ções. de todas as ligações na modali-
dade local, independentemente
de ser dentro ou fora da franquia
contratada, por inexistir qualquer
restrição a respeito, conforme se
observa do constante do artigo 83
do anexo à Resolução 426/2005,
que regulamentou o sistema de
telefonia fixa.
88 Questiona-se o termo inicial Nos termos do art. 167, parágrafo REsp 1086935/SP 12/11/2008
da incidência dos juros mora- único do CTN e da Súmula 188/
tórios em demanda objetivan- STJ, 'Os juros moratórios, na re-
do a restituição de contribui- petição do indébito tributário, são
ção previdenciária de servidor devidos a partir do trânsito em
público inativo. julgado da sentença'. Tal regime é
aplicável à repetição de indébito de
contribuições previdenciárias, que
também têm natureza tributária.
89 Questão referente à existência As operações de importação de REsp 871760/BA 11/03/2009
ou não de isenção do ICMS so- bacalhau (peixe seco e salgado,
bre o bacalhau oriundo de país espécie do gênero pescado), pro-
signatário do GATT - General venientes de países signatários do
Agreement on Tariffs and Trade. GATT - General Agreement on
Tariffs and Trade, realizadas até
30 de abril de 1999, são isentas de
recolhimento do ICMS.

347
Maria Cecília de Araujo Asperti

90 Questiona-se, tendo em vista Por força da isenção concedi- REsp 760246/PR 10/12/2008
a Lei 7.713/88, a cobrança de da pelo art. 6º, VII, b, da Lei
imposto de renda sobre valores 7.713/88, na redação anterior à
recebidos em decorrência do que lhe foi dada pela Lei 9.250/95,
rateio do patrimônio de enti- é indevida a cobrança de imposto
dade de previdência privada. de renda sobre o valor da com-
plementação de aposentadoria
e o do resgate de contribuições
correspondentes a recolhimen-
tos para entidade de previdência
privada ocorridos no período de
1º.01.1989 a 31.12.1995. A quan-
tia que couber por rateio a cada
participante, superior ao valor das
respectivas contribuições, consti-
tui acréscimo patrimonial (CTN,
art. 43) e, como tal, atrai a inci-
dência de imposto de renda.
91 Questiona-se a incidência do As operações de composição grá- REsp 1092206/SP 11/03/2009
ICMS na operação de forneci- fica, como no caso de impressos
mento de embalagens sob en- personalizados e sob encomenda,
comenda associada ao serviço são de natureza mista, sendo que
de composição gráfica. os serviços a elas agregados estão
incluídos na Lista Anexa ao De-
creto-Lei 406/68 (item 77) e à LC
116/03 (item 13.05). Consequen-
temente, tais operações estão
sujeitas à incidência de ISSQN (e
não de ICMS). Confirma-se o en-
tendimento da Súmula 156/STJ:
'A prestação de serviço de com-
posição gráfica, personalizada e
sob encomenda, ainda que envol-
va fornecimento de mercadorias,
está sujeita, apenas, ao ISS.
92 Questão referente às OBRI- As OBRIGAÇÕES AO PORTA- REsp 1050199/RJ 10/12/2008
GAÇÕES AO PORTADOR DOR emitidas pela ELETRO-
emitidas pela ELETROBRÁS BRÁS em razão do empréstimo
na forma da Lei 4.156/62 compulsório instituído pela Lei
(com a redação dada pelo DL 4.156/62 não se confundem com
644/69), em que pleiteia a res- as DEBÊNTURES e, portanto,
tituição dos valores cobrados não se aplica a regra do art. 442
a título de empréstimo com- do CCom, segundo o qual pres-
pulsório sobre energia elétrica, crevem em 20 anos as ações fun-
acrescidos de correção mone- dadas em obrigações comerciais
tária plena e juros. contraídas por escritura pública
ou particular. Não se trata de
obrigação de natureza comercial,
mas de relação de direito admi-
nistrativo a estabelecida entre
a ELETROBRÁS (delegada da
União) e o titular do crédito,
aplicando-se, em tese, a regra do
Decreto 20.910/32.

348
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

93 Questão referente às OBRI- O direito ao resgate configura-se REsp 1050199/RJ 10/12/2008


GAÇÕES AO PORTADOR direito potestativo e, portanto,
emitidas pela ELETROBRÁS a regra do art. 4º, § 11, da Lei
na forma da Lei 4.156/62 4.156/62, que estabelece o prazo
(com a redação dada pelo DL de 5 anos, tanto para o consu-
644/69), em que pleiteia a res- midor efetuar a troca das contas
tituição dos valores cobrados de energia por OBRIGAÇÕES
a título de empréstimo com- AO PORTADOR, quanto para,
pulsório sobre energia elétrica, posteriormente, efetuar o resgate,
acrescidos de correção mone- fixa prazo decadencial e não pres-
tária plena e juros. cricional.
94 Questão referente às OBRI- Como o art. 4º, § 10, da Lei REsp 1050199/RJ 10/12/2008
GAÇÕES AO PORTADOR 4.156/62 (acrescido pelo DL
emitidas pela ELETROBRÁS 644/69) conferiu à ELETRO-
na forma da Lei 4.156/62 BRÁS a faculdade de proceder
(com a redação dada pelo DL à troca das obrigações por ações
644/69), em que pleiteia a res- preferenciais, não exercida essa
tituição dos valores cobrados faculdade, o titular do crédito
a título de empréstimo com- somente teria direito, em tese, à
pulsório sobre energia elétrica, devolução em dinheiro.
acrescidos de correção mone-
tária plena e juros.
95 Questão referente à legitimi- Os bancos depositários são res- REsp 1070252/SP 27/05/2009
dade passiva ad causam do ponsáveis pela correção mo-
Banco Central do Brasil-BA- netária dos ativos retidos até o
CEN para responder pela cor- momento em que esses foram
reção monetária dos cruzados transferidos ao Banco Central
novos retidos pela implantação do Brasil. Consequentemente, os
do Plano Collor. bancos depositários são legitima-
dos passivos quanto à pretensão
de reajuste dos saldos referente ao
mês de março de 1990, bem como
ao pertinente ao mês de abril do
mesmo ano, referente às contas de
poupança cujas datas de aniversá-
rio ou creditamento foram ante-
riores à transferência dos ativos.
96 Questiona-se a responsabilida- A entrega de declaração pelo REsp 1101728/SP 11/03/2009
de dos sócios para responder contribuinte reconhecendo débi-
por débitos da pessoa jurídica to fiscal constitui o crédito tribu-
devedora em execução fiscal. tário, dispensada qualquer outra
providência por parte do fisco.
97 Questiona-se a responsabilida- A simples falta de pagamento do REsp 1101728/SP 11/03/2009
de dos sócios para responder tributo não configura, por si só,
por débitos da pessoa jurídica nem em tese, circunstância que
devedora em execução fiscal. acarreta a responsabilidade sub-
sidiária do sócio, prevista no art.
135 do CTN. É indispensável,
para tanto, que tenha agido com
excesso de poderes ou infração à
lei, ao contrato social ou ao esta-
tuto da empresa.

349
Maria Cecília de Araujo Asperti

99 Questiona-se a incidência da Relativamente aos juros morató- REsp 1102552/CE 25/03/2009


Taxa SELIC a título de juros rios a que está sujeita a CEF - por
de mora na atualização da con- não ter efetuado, no devido tempo
ta vinculada do FGTS. e pelo índice correto, os créditos
de correção monetária das contas
vinculadas do FGTS -, seu cálculo
deve observar, à falta de norma es-
pecífica, a taxa legal, antes previs-
ta no art. 1062 do Código Civil de
1916 e agora no art. 406 do Código
Civil de 2002. (...) "atualmente, a
taxa dos juros moratórios a que
se refere o referido dispositivo
[art. 406 do CC/2002] é a taxa
referencial do Sistema Especial de
Liquidação e Custódia - SELIC",
que "não pode ser cumulada com
a aplicação de outros índices de
atualização monetária.
100 Questão referente à ofen- Ainda que a execução fiscal tenha REsp 1102554/MG 27/05/2009
sa ao art. 40, § 4º, da Lei nº sido arquivada em razão do peque-
6.830/80, por entender que o no valor do débito executado, sem
referido § 4º deve ser interpre- baixa na distribuição, nos termos
tado em consonância com o do art. 20 da Lei 10.522/2002,
caput do art. 40 e com os de- deve ser reconhecida a prescrição
mais parágrafos que o antece- intercorrente se o processo ficar
dem, razão pela qual não pode paralisado por mais de cinco anos
ser reconhecida a prescrição a contar da decisão que determina
intercorrente, nas hipóteses o arquivamento, pois essa norma
em que o arquivamento do fei- não constitui causa de suspensão
to ocorrer em razão do baixo do prazo prescricional.
valor do débito executado (art.
20 da Lei nº 10.522/02).
101 Questão referente à aplicação O instituto da denúncia espon- REsp 1102577/DF 22/04/2009
do instituto da denúncia es- tânea (art. 138 do CTN) não se
pontânea (art. 138 do CTN) aplica nos casos de parcelamento
aos casos de parcelamento de de débito tributário.
débito tributário.
102 Questiona-se o cabimento da A citação por edital na execução REsp 1103050/BA 25/03/2009
citação editalícia na execução fiscal é cabível quando frustradas
fiscal. as demais modalidades.
103 Discute-se a responsabilidade Se a execução foi ajuizada apenas REsp 1104900/ES 25/03/2009
do sócio-gerente, cujo nome contra a pessoa jurídica, mas o
consta da CDA, para responder nome do sócio consta da CDA, a
por débitos da pessoa jurídica. ele incumbe o ônus da prova de
que não ficou caracterizada ne-
nhuma das circunstâncias previs-
tas no art. 135 do CTN, ou seja,
não houve a prática de atos 'com
excesso de poderes ou infração de
lei, contrato social ou estatutos'.

350
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

104 Discute-se a responsabilidade A exceção de pré-executividade é REsp 1104900/ES 25/03/2009


do sócio-gerente, cujo nome admissível na execução fiscal re-
consta da CDA, para respon- lativamente às matérias conhecí-
der por débitos da pessoa jurí- veis de ofício que não demandem
dica. dilação probatória.
105 Questiona-se se há decadência O art. 281, parágrafo único, II, REsp 1092154/RS 12/08/2009
do direito de punir quando não do CTB prevê que será arquiva-
expedida a notificação do in- do o auto de infração e julgado
frator de trânsito no prazo de insubsistente o respectivo registro
trinta dias, com a impossibi- se não for expedida a notificação
lidade de reinício do procedi- da autuação dentro de 30 dias.
mento administrativo. Por isso, não havendo a notifi-
cação do infrator para defesa no
prazo de trinta dias, opera-se a
decadência do direito de punir do
Estado, não havendo que se falar
em reinício do procedimento ad-
ministrativo.
107 Questão referente à aplicação O encargo de 20% previsto no DL REsp 1110924/SP 10/06/2009
do encargo de 20% previsto n. 1.025/1969 é exigível na execu-
no Decreto-lei n. 1.025/69 nas ção fiscal proposta contra a massa
execuções fiscais manejadas falida.
contra massa falida.
108 Estabelecer se é cabível a ex- Não cabe exceção de pré-execu- REsp 1110925/SP 22/04/2009
ceção de pré-executividade tividade em execução fiscal pro-
para argüição de ilegitimidade movida contra sócio que figura
passiva, em execução fiscal como responsável na Certidão de
proposta contra os sócios da Dívida Ativa - CDA.
pessoa jurídica devedora.
109 Prazo prescricional para pleitear A prescrição da ação para pleitear REsp 1110547/PE 22/04/2009
os juros progressivos sobre saldos os juros progressivos sobre os sal-
de conta vinculada do FGTS. dos de conta vinculada do FGTS
não atinge o fundo de direito,
limitando-se às parcelas vencidas.
110 Prazo prescricional para pleite- Não estão prescritas as parcelas REsp 1110547/PE 22/04/2009
ar parcelas decorrentes da op- anteriores aos trinta anos que an-
ção pelo FGTS (Lei 5.958/73). tecederam a propositura da ação.
111 Discute-se o direito à taxa Os optantes pelo FGTS, nos REsp 1110547/PE 22/04/2009
progressiva de juros para os termos da Lei nº 5.958, de 1973,
optantes pelo FGTS (Lei têm direito à taxa progressiva de
5.107/1966). juros na forma do art. 4º da Lei
nº 5.107/66.
112 Discute-se a aplicação da taxa A taxa de juros moratórios a que REsp 1110547/PE 22/04/2009
SELIC para apuração de cor- se refere o art. 406 do CC/2002 é
reção monetária e juros nas a taxa referencial do Sistema Es-
ações para pleitear juros pro- pecial de Liquidação e Custódia
gressivos nas contas vincula- - SELIC.
das do FGTS.
113 Termo inicial dos juros de Incidem juros de mora pela taxa REsp 1110547/PE 22/04/2009
mora em ações ajuizadas para Selic a partir da citação.
pleitear juros juros progressi-
vos sobre saldos de conta vin-
culada de FGTS.

351
Maria Cecília de Araujo Asperti

114 Questiona-se se o executado O art. 166 do CTN tem como REsp 1110550/SP 22/04/2009
é parte ilegítima para pleitear cenário natural de aplicação as
a redução da alíquota, além hipóteses em que o contribuinte
de negar a existência de de- de direito demanda a repetição do
núncia espontânea, em caso indébito ou a compensação de tri-
de cobrança da majoração da buto cujo valor foi suportado pelo
alíquota do ICMS de 17% para contribuinte de fato.
18% no Estado de São Paulo.
115 Questão referente à necessi- Mostra-se suficiente para autori- REsp 1111003/PR 13/05/2009
dade da juntada dos compro- zar o pleito repetitório a juntada
vantes de pagamento da taxa de apenas um comprovante de
de iluminação pública junta- pagamento da taxa de ilumina-
mente com a petição inicial da ção pública, pois isso demonstra
ação de repetição de indébito que era suportada pelo contri-
tributário. buinte uma exação que veio a
ser declarada inconstitucional.
A definição dos valores exatos
objeto de devolução será feita por
liquidação de sentença, na qual
obrigatoriamente deverá ocorrer
a demonstração do quantum re-
colhido indevidamente.
116 Questão referente à notifica- A remessa do carnê de paga- REsp 1111124/PR 22/04/2009
ção do contribuinte acerca mento do IPTU ao endereço do
do lançamento do IPTU que contribuinte é ato suficiente para
pode dar-se por quaisquer atos a notificação do lançamento tri-
administrativos eficazes de co- butário.
municação, cabendo-lhe com-
provar que não possuía ciência
quanto ao lançamento do im-
posto pelo Município.
117 Questão referente à inaplica- O art. 29-C da Lei 8.036/90, in- REsp 1111157/PB 22/04/2009
bilidade do art. 29-C da Lei troduzido pela Medida Provisória
8.036/90, à execução de valo- 2.164-40/2001 (dispensando a
res correspondentes a honorá- condenação em honorários em
rios advocatícios. demandas sobre FGTS), é norma
especial em relação aos arts. 20 e
21 do CPC e somente se aplica às
ações ajuizadas após a sua vigên-
cia, que se deu em 27.07.2001.
118 Questão referente à compen- É necessária a efetiva comprova- REsp 1111164/BA 13/05/2009
sação de créditos provenientes ção do recolhimento feito a maior
do pagamento indevido de ou indevidamente para fins de
contribuição ao PIS e ao FIN- declaração do direito à compen-
SOCIAL com parcelas venci- sação tributária em sede de man-
das e vincendas dos mesmos dado de segurança.
tributos.

352
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

119 Questiona-se o índice dos ju- Incide a taxa SELIC na repetição REsp 1111189/SP 13/05/2009
ros moratórios em demanda de indébito de tributos estaduais
objetivando a restituição de a partir da data de vigência da lei
contribuição previdenciária de estadual que prevê a incidência
servidor público inativo. de tal encargo sobre o pagamento
atrasado de seus tributos e, rela-
tivamente ao período anterior,
incide a taxa de 1% ao mês, nos
termos do art. 161, § 1º, do CTN,
observado o disposto na súmula
188/STJ, sendo inaplicável o art.
1º-F da Lei 9.494/97.
120 Questiona-se a inadmissibili- A Fazenda Pública pode recusar REsp 1090898/SP 12/08/2009
dade da substituição de penho- a substituição do bem penhorado
ra já realizada por precatórios por precatório.
emitidos pela Fazenda do Esta-
do exequente.
121 Estabelecer se incide imposto São isentas de imposto de renda REsp 1111223/SP 22/04/2009
de renda sobre férias propor- as indenizações de férias propor-
cionais indenizadas e o respec- cionais e respectivo adicional.
tivo adicional.
122 Questão referente à possibili- 1-Tanto o promitente comprador REsp 1111202/SP 10/06/2009
dade de responsabilização do (possuidor a qualquer título) do
promitente vendedor e/ou do imóvel quanto seu proprietário/
promitente comprador pelo promitente vendedor (aquele
pagamento do IPTU na execu- que tem a propriedade registra-
ção fiscal, diante da existência da no Registro de Imóveis) são
de negócio jurídico que visa à contribuintes responsáveis pelo
transmissão da propriedade pagamento do IPTU; 2-cabe à
(contrato de compromisso de legislação municipal estabelecer o
compra e venda). sujeito passivo do IPTU.
123 Discute se é legítima a exigên- É lícito à autoridade administra- REsp 1104775/RS 24/06/2009
cia do pagamento de multa e tiva condicionar a liberação de
demais despesas decorrentes veículo, quando aplicada a pena
do recolhimento do veículo de apreensão, ao pagamento das
em depósito quando válida e multas regularmente notificadas
eficaz a autuação da infração e já vencidas.
de trânsito.
124 Discute se é legítima a exigên- É legal a exigência de prévio paga- REsp 1104775/RS 24/06/2009
cia do pagamento de multa e mento das despesas com remoção
demais despesas decorrentes e estada no depósito para libera-
do recolhimento do veículo ção de veículo apreendido, sendo
em depósito quando válida e que as taxas de estada somente
eficaz a autuação da infração poderão ser cobradas até os 30
de trânsito. primeiros dias.
125 Possibilidade de extinção de As execuções fiscais relativas a REsp 1111982/SP 13/05/2009
ofício de execução fiscal por débitos iguais ou inferiores a R$
carência de ação (interesse de 10.000,00 (dez mil reais) devem
agir) quando o valor excutido ter seus autos arquivados, sem
não superar o valor de alça- baixa na distribuição.
da previsto no art. 20 da Lei
10.522/2002.

353
Maria Cecília de Araujo Asperti

126 Questão referente à ação de Nas ações de desapropriação, os REsp 1111829/SP 13/05/2009
desapropriação por utilidade juros compensatórios incidentes
pública, em que o acórdão re- após a Medida Provisória n. 1.577,
corrido decidiu que os juros de 11/06/1997, devem ser fixados
compensatórios correspondem em 6% ao ano até 13/09/2001 e, a
a 6% ao ano a partir da imissão partir de então, em 12% ao ano,
na posse do imóvel. na forma da Súmula n. 618 do Su-
premo Tribunal Federal.
127 Questão referente à obrigação A responsabilidade pela apre- REsp 1108034/RN 28/10/2009
da Caixa Econômica Federal sentação dos extratos analíticos
em apresentar em juízo os ex- das contas vinculadas do FGTS
tratos analíticos das contas do é exclusiva da Caixa Econômica
FGTS anteriores à centraliza- Federal, inclusive com relação aos
ção, para fins de atualização extratos anteriores à migração
dos saldos. das contas que não tenham sido
transferidas à CEF.
128 Discute-se a possibilidade de Os honorários advocatícios não REsp 1108013/RJ 03/06/2009
condenar a municipalidade são devidos à Defensoria Pública
em honorários advocatícios quando ela atua contra a pessoa
quando a parte, representada jurídica de direito público à qual
por defensor público, restar pertença.
vencedora na demanda. O
julgado recorrido afastou a
ondenação por reconhecer a
existência de confusão entre
credor e devedor.
129 Discute-se a possibilidade de Reconhece-se à Defensoria Pú- REsp 1108013/RJ 03/06/2009
condenar a municipalidade blica o direito ao recebimento
em honorários advocatícios dos honorários advocatícios se
quando a parte, representada a atuação se dá em face de ente
por defensor público, restar federativo diverso do qual é parte
vencedora na demanda. O integrante.
julgado recorrido afastou a
condenação por reconhecer a
existência de confusão entre
credor e devedor.

354
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

130 Possibilidade de prossegui- O Supremo Tribunal Federal de- REsp 1111099/PR 25/08/2010
mento de ações ajuizadas para feriu medida cautelar na ADI nº
repetição de valores referentes 2.189-3 para suspender as nor-
ao pagamento de contribuição mas contidas na Lei Estadual
previdenciária estadual a pen- nº 12.398/98, que dispõe sobre
sionistas e servidores inativos as contribuições dos inativos e
diante da determinação do pensionistas para o fundo de pre-
STF de suspensão cautelar da vidência dos servidores públicos
norma estadual que estabelece do Estado do Paraná, sem, no
seu pagamento. entanto, atribuir-lhe efeito retro-
ativo. A cautela assim deferida
não impede o prosseguimento
dos processos visando justamente
afastar a aplicação da lei ou do ato
normativo suspenso em decisão
provida de eficácia erga omnes,
tampouco o ajuizamento de novas
ações que tenham por fundamen-
to a restituição dos valores cobra-
dos em virtude da norma excluída
do mundo jurídico, ainda que em
caráter precário.
131 Questão referente ao termo O termo inicial para a oposição REsp 1112416/MG 27/05/2009
inicial do prazo para ofereci- dos Embargos à Execução Fiscal
mento dos embargos à execu- é a data da efetiva intimação da
ção fiscal, quando a garantia penhora, e não a da juntada aos
consiste na penhora de bens autos do mandado cumprido.
ou de direitos.
132 Questão referente à possibili- É legítima a incidência de ISS REsp 1111234/PR 23/09/2009
dade de utilização de interpre- sobre os serviços bancários con-
tação extensiva dos serviços gêneres da lista anexa ao DL n.
bancários constantes da Lista 406/1968 e à LC n. 56/1987.
Anexa à Lei Complementar
116/2003 e, para os fatos ju-
rídicos que lhe são pretéritos,
da Lista Anexa ao Decreto-lei
406/68.
133 Questão referente à ausência A autenticação de cópias do Agra- REsp 1111001/SP 04/11/2009
de declaração de autenticidade vo de Instrumento do artigo 522,
das cópias pelo advogado. do CPC, resulta como diligência
não prevista em lei, em face do
acesso imediato aos autos princi-
pais, propiciado na instância local.
A referida providência somente se
impõe diante da impugnação es-
pecífica da parte adversa.

355
Maria Cecília de Araujo Asperti

134 Questão referente às provi- Em execução fiscal, a prescrição REsp 1100156/RJ 10/06/2009
dências indicadas no § 4º do ocorrida antes da propositura da
art. 40 da Lei 6.830/80 que ação pode ser decretada de ofício
somente se aplicam em caso (art. 219, § 5º, do CPC).
de prescrição intercorrente,
razão pela qual se revela pos-
sível a decretação de ofício da
prescrição verificada antes do
ajuizamento, com base no § 5º
do art. 219 do CPC.
135 Questão referente ao prazo É de cinco anos o prazo prescricio- REsp 1105442/RJ 09/12/2009
prescricional aplicável quando nal para o ajuizamento da execu-
o crédito fiscal for decorrente ção fiscal de cobrança de multa de
de multa administrativa. natureza administrativa, contado
do momento em que se torna exi-
gível o crédito, com o vencimento
do prazo do seu pagamento.
136 Questiona-se se é cabível o É cabível a interposição de agravo REsp 1101740/SP 04/11/2009
agravo de instrumento contra de instrumento contra decisão de
decisão concessiva ou dene- magistrado de primeira instância
gatória de liminar em sede de que indefere ou concede liminar
mandado de segurança. em mandado de segurança.
139 Questão referente à aplicação As verbas concedidas ao empre- REsp 1102575/MG 23/09/2009
por analogia do enunciado da gado por mera liberalidade do
Súmula 215 do STJ para abar- empregador, isto é, verba paga
car também as hipóteses de na ocasião da rescisão unilate-
indenizações pagas por libe- ral do contrato de trabalho sem
ralidade ao empregado, já que obrigatoriedade expressa em lei,
estas não possuem natureza convenção ou acordo coletivo,
indenizatória. implicam acréscimo patrimonial
por não possuírem caráter inde-
nizatório, sujeitando-se, assim, à
incidência do imposto de renda.
140 Questão referente à possibili- É imprescindível para a validade REsp 1107460/PE 12/08/2009
dade de comprovação, por ou- da extinção do processo em que se
tros meios idôneos, da existên- discute complementação de corre-
cia de acordo celebrado entre ção monetária nas contas vincula-
o FGTS, com intervenção da das de FGTS a juntada do termo
Caixa Econômica Federal - de adesão devidamente assinado
agente operador, e o titular de pelo titular da conta vinculada.
conta vinculada, para reaver
expurgos inflacionários ocor-
ridos entre dezembro de 1988
e fevereiro de 1989 (16,64%) e
abril de 1990 (44,08%).
141 Questão referente à movimen- O titular da conta vinculada ao REsp 1110848/RN 24/06/2009
tação de valores depositados FGTS tem o direito de sacar o sal-
em conta do FGTS e devolvi- do respectivo quando declarado
dos ao Município pela CEF, em nulo seu contrato de trabalho por
virtude de contrato de traba- ausência de prévia aprovação em
lho declarado nulo por ausên- concurso público.
cia de concurso público.

356
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

142 Questão referente ao termo O prazo de prescrição quinquenal REsp 1110578/SP 12/05/2010
inicial do prazo prescricional para pleitear a repetição tributá-
para ajuizamento de ação de ria, nos tributos sujeitos ao lan-
repetição de tributo instituído çamento de ofício, é contado da
por norma legal declarada in- data em que se considera extinto
constitucional pelo STF. o crédito tributário, qual seja, a
data do efetivo pagamento do tri-
buto. A declaração de inconstitu-
cionalidade da lei instituidora do
tributo em controle concentrado,
pelo STF, ou a Resolução do Se-
nado (declaração de inconstitu-
cionalidade em controle difuso)
é despicienda para fins de conta-
gem do prazo prescricional tanto
em relação aos tributos sujeitos
ao lançamento por homologação,
quanto em relação aos tributos
sujeitos ao lançamento de ofício.
143 Questão referente à contra- Em casos de extinção de execu- REsp 1111002/SP 23/09/2009
riedade aos artigos 535, I e II, ção fiscal em virtude de cancela-
do CPC, por entender não ter mento de débito pela exequente,
sido apurada a culpa do insu- define a necessidade de se perqui-
cesso da execução fiscal; art. rir quem deu causa à demanda a
26, da Lei n. 6.830/80, que fim de imputar-lhe o ônus pelo
prevê a extinção da execução pagamento dos honorários advo-
antes da decisão de primeira catícios.
instância sem qualquer ônus
para as partes; e art. 1º-D, da
Lei n. 9.494/97, que considera
indevidos os honorários advo-
catícios pela Fazenda Pública
também nas execuções fiscais
não embargadas. Considera
inaplicável ao caso a Súmula
n. 153, do STJ.
144 Questão referente à incidência Os descontos incondicionais REsp 1111156/SP 14/10/2009
do ICMS sobre produtos dados nas operações mercantis não se
em bonificação. incluem na base de cálculo do
ICMS.

357
Maria Cecília de Araujo Asperti

145 Questão referente aos períodos Aplica-se a taxa SELIC, a partir REsp 1111175/SP 10/06/2009
de aplicação da Taxa Selic nos de 1º.1.1996, na atualização mo-
juros de mora incidentes sobre a netária do indébito tributário,
repetição de indébito tributário. não podendo ser cumulada, po-
rém, com qualquer outro índice,
seja de juros ou atualização mo-
netária. Se os pagamentos foram
efetuados após 1º.1.1996, o termo
inicial para a incidência do acrés-
cimo será o do pagamento indevi-
do; havendo pagamentos indevi-
dos anteriores à data de vigência
da Lei 9.250/95, a incidência da
taxa SELIC terá como termo a
quo a data de vigência do diplo-
ma legal em tela, ou seja, janeiro
de 1996.
146 Cinge-se a controvérsia sobre É de cinco anos o prazo para a REsp 1112577/SP 09/12/2009
o prazo prescricional para co- cobrança da multa aplicada ante
brança de multa por infração à infração administrativa ao meio
legislação ambiental. ambiente, nos termos do Decreto
nº 20.910/32, o qual que deve ser
aplicado por isonomia, à falta de
regra específica para regular esse
prazo prescricional.
147 Cinge-se a controvérsia sobre Em se tratando de multa admi- REsp 1112577/SP 09/12/2009
o prazo prescricional para co- nistrativa, a prescrição da ação
brança de multa por infração à de cobrança somente tem início
legislação ambiental. com o vencimento do crédito
sem pagamento, quando se tor-
na inadimplente o administrado
infrator.
148 Questão referente à restrição O Plano de Benefícios da Pre- REsp 1112574/MG 26/08/2009
do valor do benefício previden- vidência Social - PBPS, dando
ciário de prestação continuada cumprimento ao art. 202, caput,
ao limite máximo do salário- da Constituição Federal (redação
-de-benefício na data de início original), definiu o valor mínimo
do benefício. do salário-de-benefício, nunca
inferior ao salário mínimo, e seu
limite máximo, nunca superior
ao limite máximo do salário-de-
-contribuição.
149 Questão referente à possibi- É cabível a fixação de multa - de REsp 1112862/GO 13/04/2011
lidade de imposição de multa forma proporcional e razoável
diária prevista no art. 461 do - pelo descumprimento de obri-
CPC, pelo não-cumprimento gação de fazer (astreintes), nos
da obrigação de fazer, qual termos do art. 461, § 4º, do CPC,
seja, correção de contas vincu- no caso de atraso injustificado
ladas do FGTS. no fornecimento em juízo dos
extratos de contas vinculadas ao
FGTS.

358
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

150 Discute que as verbas recebi- As verbas concedidas ao empre- REsp 1112745/SP 23/09/2009
das a título de "compensação gado, por mera liberalidade do
espontânea" e "gratificação empregador, quando da rescisão
não habitual", independente- unilateral de seu contrato de tra-
mente no nome que possuem, balho sujeitam-se à incidência do
são decorrentes de Programa Imposto de Renda.
de Demissão Voluntária -
PDV, havendo que ser aplicado
o enunciado da Súmula 215 do
STJ, que reconhece a não in-
cidência do imposto de renda
nessas hipóteses.
151 Discute que as verbas recebi- A indenização recebida pela ade- REsp 1112745/SP 23/09/2009
das a título de "compensação são a programa de incentivo à de-
espontânea" e "gratificação missão voluntária não está sujeita
não habitual", independente- à incidência do imposto de renda.
mente no nome que possuem,
são decorrentes de Programa
de Demissão Voluntária -
PDV, havendo que ser aplicado
o enunciado da Súmula 215 do
STJ, que reconhece a não in-
cidência do imposto de renda
nessas hipóteses.
152 Questão referente aos maiores Para efeito de apuração de sucum- REsp 1112747/DF 24/06/2009
índices expurgados do FGTS bência, em demanda que tem por
para fins de apuração de su- objeto a atualização monetária
cumbência. de valores depositados em con-
tas vinculadas do FGTS, 'deve-se
levar em conta o quantitativo de
pedidos (isoladamente conside-
rados) que foram deferidos em
contraposição aos indeferidos,
sendo irrelevante o somatório dos
índices'.
153 Questão referente ao reconhe- É legítima a cobrança da tarifa REsp 1113403/RJ 09/09/2009
cimento da inexigibilidade da de água fixada de acordo com as
tarifa cobrada pelo forneci- categorias de usuários e as faixas
mento de água e tratamento de consumo.
de esgoto, em que o Tribunal
de origem decidiu que (a) é
legítima a cobrança progres-
siva da tarifa de água e (b) a
prescrição aplicável ao caso é
qüinqüenal, nos termos do art.
27 do Código de Defesa do
Consumidor.

359
Maria Cecília de Araujo Asperti

154 Questão referente ao reconhe- A ação de repetição de indébito REsp 1113403/RJ 09/09/2009
cimento da inexigibilidade da de tarifas de água e esgoto sujeita-
tarifa cobrada pelo forneci- -se ao prazo prescricional estabe-
mento de água e tratamento lecido no Código Civil.
de esgoto, em que o Tribunal
de origem decidiu que (a) é
legítima a cobrança progres-
siva da tarifa de água e (b) a
prescrição aplicável ao caso é
qüinqüenal, nos termos do art.
27 do Código de Defesa do
Consumidor.
155 Questão referente ao reconhe- A ação de repetição de indébito REsp 1113403/RJ 09/09/2009
cimento da inexigibilidade da de tarifas de água e esgoto sujeita-
tarifa cobrada pelo forneci- -se ao prazo prescricional estabe-
mento de água e tratamento lecido no Código Civil.
de esgoto, em que o Tribunal
de origem decidiu que (a) é
legítima a cobrança progres-
siva da tarifa de água e (b) a
prescrição aplicável ao caso é
qüinqüenal, nos termos do art.
27 do Código de Defesa do
Consumidor.
156 Questão referente à alegação de Será devido o auxílio-acidente REsp 1112886/SP 25/11/2009
impossibilidade de condiciona- quando demonstrado o nexo de
mento da concessão do benefí- causalidade entre a redução de
cio acidentário à irreversibilida- natureza permanente da capa-
de da moléstia incapacitante. cidade laborativa e a atividade
profissional desenvolvida, sendo
irrelevante a possibilidade de re-
versibilidade da doença.
157 Discute-se a aplicação do prin- DESCAMINHO. Incide o princí- REsp 1112748/TO 09/09/2009
cípio da insignificância, tendo pio da insignificância aos débitos
em vista o valor dos tributos tributários que não ultrapassem o
devidos, nos termos da Lei nº limite de R$ 10.000,00 (dez mil
10.522/02. reais), a teor do disposto no art.
20 da Lei nº 10.522/02.
158 Questão referente à averigua- Também com relação ao recebi- REsp 1111177/MG 23/09/2009
ção da incidência do imposto mento antecipado de 10% (dez
de renda sobre os valores re- por cento) da reserva matemática
cebidos a título de antecipação do Fundo de Previdência Privada
("Renda antecipada") de 10% como incentivo para a migração
da "Reserva Matemática" de para novo plano de benefícios,
Fundo de previdência privada, deve-se afastar a incidência do
como incentivo para a migra- imposto de renda sobre a parce-
ção para novo plano de benefí- la recebida a partir de janeiro de
cios da entidade. 1996, na proporção do que já foi
anteriormente recolhido pelo
contribuinte, a título de imposto
de renda, sobre as contribuições
vertidas ao fundo durante o perí-
odo de vigência da Lei 7.713/88.

360
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

159 Questão referente à possibi- A ficção jurídica prevista no ar- REsp 860369/PE 25/11/2009
lidade de compensação dos tigo 11 da Lei nº 9.779/99, não
créditos de IPI relativos à aqui- alcança situação reveladora de
sição de matérias-primas, insu- isenção do Imposto sobre Produ-
mos e produtos intermediários tos Industrializados - IPI que a
tributados à alíquota zero, nos antecedeu.
moldes dos artigos 11 da Lei
9.779/99.
160 Questão referente à inclusão O valor do frete (referente ao REsp 931727/RS 26/08/2009
do valor do frete na base de transporte do veículo entre a
cálculo do ICMS nas vendas montadora/fabricante e a con-
sujeitas à substituição tributá- cessionária/revendedora) integra
ria (artigo 13, § 1º, II, "b", da a base de cálculo do ICMS inci-
Lei Complementar 87/96). dente sobre a circulação da mer-
cadoria, para fins da substituição
tributária progressiva ("para fren-
te"), à luz do artigo 8º, II, "b", da
Lei Complementar 87/96.
161 Questão referente à inclusão Nos casos em que a substituta tri- REsp 931727/RS 26/08/2009
do valor do frete na base de butária (a montadora/fabricante
cálculo do ICMS nas vendas de veículos) não efetua o trans-
sujeitas à substituição tributá- porte, nem o engendra por sua
ria (artigo 13, § 1º, II, "b", da conta e ordem, o valor do frete
Lei Complementar 87/96). não deve ser incluído na base de
cálculo do imposto.
162 Questão referente à legalidade A tributação isolada e autônoma REsp 939527/MG 24/06/2009
da sistemática prevista nos ar- do imposto de renda sobre os ren-
tigos 29 e 36 da Lei 8.541/92, dimentos auferidos pelas pessoas
que determinam a incidência jurídicas em aplicações financeiras
do imposto de renda na fonte, de renda fixa, bem como sobre os
de forma autônoma e isolada, ganhos líquidos em operações re-
nas aplicações financeiras das alizadas nas bolsas de valores, de
pessoas jurídicas, inobstante a mercadorias, de futuros e asseme-
ocorrência de prejuízos. lhadas, à luz dos artigos 29 e 36,
da Lei 8.541/92, é legítima e com-
plementar ao conceito de renda
delineado no artigo 43, do CTN,
uma vez que as aludidas entradas
financeiras não fazem parte da
atividade-fim das empresas.
163 Questão referente ao termo ini- O prazo decadencial quinquenal REsp 973733/SC 12/08/2009
cial do prazo decadencial para para o Fisco constituir o crédito
a constituição do crédito tribu- tributário (lançamento de ofício)
tário pelo Fisco nas hipóteses conta-se do primeiro dia do exercí-
em que o contribuinte não de- cio seguinte àquele em que o lan-
clara, nem efetua o pagamento çamento poderia ter sido efetuado,
antecipado do tributo sujeito a nos casos em que a lei não prevê o
lançamento por homologação. pagamento antecipado da exação
ou quando, a despeito da previ-
são legal, o mesmo inocorre, sem
a constatação de dolo, fraude ou
simulação do contribuinte, inexis-
tindo declaração prévia do débito.

361
Maria Cecília de Araujo Asperti

164 Questão referente à possibi- É devida a correção monetária REsp 1035847/RS 24/06/2009
lidade de correção monetá- sobre o valor referente a créditos
ria de créditos escriturais de de IPI admitidos extemporanea-
IPI referentes à operações de mente pelo Fisco.
matérias-primas e insumos
empregados na fabricação de
produto isento ou beneficiado
com alíquota zero.
165 Questão referente à legalidade É ilícita a exigência de nova cer- REsp 1041237/SP 28/10/2009
da exigência de Certidão Ne- tidão negativa de débito no mo-
gativa de Débito - CND, para mento do desembaraço aduaneiro
o reconhecimento do benefício da respectiva importação, se a
fiscal de drawback no "momen- comprovação de quitação de tri-
to do desembaraço aduaneiro". butos federais já fora apresentada
quando da concessão do benefício
inerente às operações pelo regime
de drawback.
166 Questão referente à possibili- A Fazenda Pública pode subs- REsp 1045472/BA 25/11/2009
dade de substituição da CDA tituir a certidão de dívida ativa
antes da sentença de mérito, (CDA) até a prolação da senten-
na forma do disposto no § 8º, ça de embargos, quando se tratar
do artigo 2º, da Lei 6.830/80, de correção de erro material ou
na hipótese de mudança de formal, vedada a modificação do
titularidade do imóvel sobre o sujeito passivo da execução.
qual incide o IPTU.
167 Questão referente à incidência Incide imposto de renda sobre a REsp 1049748/RN 24/06/2009
do imposto de renda sobre as verba intitulada 'Indenização por
verbas pagas pela PETRO- Horas Trabalhadas' - IHT, paga
BRÁS a título de "indenização aos funcionários da Petrobrás,
por horas trabalhadas" - IHT. malgrado fundada em acordo co-
letivo.
168 Questão referente à possibili- A aquisição de bens integrantes REsp 1075508/SC 23/09/2009
dade de creditamento de IPI do ativo permanente da empresa
relativo à aquisição de ma- não gera direito a creditamento
teriais intermediários que se de IPI.
desgastam durante o processo
produtivo sem contato físico
ou químico direto com as ma-
térias primas (bens destinados
ao uso e consumo).
169 Questão referente à incidência O auxílio condução consubstan- REsp 1096288/RS 09/12/2009
do imposto de renda sobre ver- cia compensação pelo desgaste do
ba paga a título de ajuda de cus- patrimônio dos servidores, que
to pelo uso de veículo próprio utilizam-se de veículos próprios
no exercício das funções profis- para o exercício da sua atividade
sionais (auxílio-condução). profissional, inexistindo acrésci-
mo patrimonial, mas uma mera
recomposição ao estado anterior
sem o incremento líquido neces-
sário à qualificação de renda.

362
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

170 Questão referente à possibi- Sob a égide do Convênio ICMS REsp 977090/ES 25/11/2009
lidade de creditamento de 66/88 (antes, portanto, da entra-
ICMS incidente na energia da em vigor da Lei Complementar
elétrica consumida em estabe- 87/96) não havia direito do contri-
lecimento comercial. buinte ao crédito de ICMS recolhi-
do quando pago em razão de opera-
ções de consumo de energia elétrica.
171 Questão referente à aplicação A retenção da contribuição para REsp 1112467/DF 12/08/2009
às empresas optantes pelo SIM- a seguridade social pelo tomador
PLES do art. 31 da Lei 8.212/91, do serviço não se aplica às empre-
segundo o qual a empresa con- sas optantes pelo Simples.
tratante de serviços executados
mediante cessão de mão de
obra, inclusive em regime de
trabalho temporário, deverá
reter 11% (onze por cento) do
valor bruto da nota fiscal ou
fatura de prestação de serviços.
172 Questão referente à fixação da Demanda envolvendo questões REsp 1111159/RJ 11/11/2009
competência da justiça federal referentes ao empréstimo com-
ou estadual para apreciar de- pulsório sobre energia elétrica
mandas referentes ao emprés- proposta unicamente contra a
timo compulsório estabelecido Eletrobrás, perante a justiça es-
em favor da eletrobrás, nos ca- tadual. (...) O pedido de inter-
sos em que a União manifesta venção da União realizado após
seu interesse no feito apenas a prolação da sentença enseja
após a prolação da sentença. tão somente o deslocamento do
Para tanto, a recorrente alega, processo para o Tribunal Regio-
além do dissídio jurispruden- nal Federal, para que examine o
cial, violação aos artigos 50, e requerimento de ingresso na lide
535, I do CPC, bem como ao e prossiga (se for o caso) seu jul-
artigo 5º da Lei 9469/97. gamento, sem a automática anu-
lação da sentença proferida pelo
juízo estadual.
173 Questão referente à legitimida- O 'contribuinte de fato' (in casu, REsp 903394/AL 24/03/2010
de ativa ad causam do substitu- distribuidora de bebida) não de-
ído (contribuinte de fato) para tém legitimidade ativa ad causam
pleitear a repetição de indébito para pleitear a restituição do in-
decorrente da incidência de IPI débito relativo ao IPI incidente
(tributo indireto) sobre os des- sobre os descontos incondicio-
contos incondicionais. nais, recolhido pelo 'contribuinte
de direito' (fabricante de bebida),
por não integrar a relação jurídica
tributária pertinente.
174 Questão referente à incidência Não incide IPTU, mas ITR, sobre REsp 1112646/SP 26/08/2009
de IPTU sobre imóvel em que imóvel localizado na área urbana
há exploração de atividade do Município, desde que compro-
agrícola, à luz do Decreto-Lei vadamente utilizado em explora-
57/1966. ção extrativa, vegetal, agrícola,
pecuária ou agroindustrial (art.
15 do DL 57/1966).

363
Maria Cecília de Araujo Asperti

175 Questão referente ao cabimento Seja porque o art. 530 do CPC REsp 1113175/DF 24/05/2012
de embargos infringentes relati- não faz restrição quanto à nature-
vamente a questões acessórias, za da matéria objeto dos embargos
a exemplo da fixação de verbas infringentes - apenas exige que a
honorárias, que tenham sido sentença de mérito tenha sido
decididas por maioria de votos. reformada em grau de apelação
Para tanto, alega-se violação ao por maioria de votos -, seja por-
artigo 530 do CPC, bem como que o capítulo da sentença que
dissídio jurisprudencial. trata dos honorários é de mérito,
embora acessório e dependente,
devem ser admitidos os embargos
infringentes para discutir verba
de sucumbência.
176 Discute-se se há, ou não, vio- Tendo sido a sentença exequenda REsp 1112743/BA 12/08/2009
lação à coisa julgada e à norma prolatada anteriormente à en-
do art. 406 do novo Código trada em vigor do Novo Código
Civil, quando o título judicial Civil, fixado juros de 6% ao ano,
exequendo, exarado em mo- correto o entendimento do Tri-
mento anterior ao CC/2002, bunal de origem ao determinar a
fixa os juros de mora em 0,5% incidência de juros de 6% ao ano
ao mês e, na execução do jul- até 11 de janeiro de 2003 e, a par-
gado, determina-se a incidên- tir de então, da taxa a que alude o
cia de juros pela lei nova (CC art. 406 do Novo CC, conclusão
de 2002). que não caracteriza qualquer vio-
lação à coisa julgada.
178 Questão referente à aplicação As diferenças de correção mone- REsp 1112413/AL 23/09/2009
dos expurgos inflacionários no tária resultantes de expurgos infla-
cálculo da correção monetária cionários sobre os saldos de FGTS
dos saldos de conta vinculada têm como termo inicial a data em
do FGTS, reconhecendo que que deveriam ter sido creditadas.
não restou configurado o ex-
cesso de execução, pois o valor
devido deve ser atualizado a
partir da data em que deve-
riam ter sido pagas as diferen-
ças cobradas.
179 Questão referente à alegada A perda da pretensão executiva REsp 1102431/RJ 09/12/2009
impossibilidade de decretação tributária pelo decurso de tempo
de prescrição intercorrente é consequência da inércia do cre-
nos casos de demora na cita- dor, que não se verifica quando a
ção, por motivos inerentes ao demora na citação do executado
mecanismo da justiça. decorre unicamente do aparelho
judiciário.
180 Questão referente à possibi- Inexiste qualquer ilegalidade/ REsp 1113159/AM 11/11/2009
lidade de dedução do valor inconstitucionalidade na deter-
referente à CSLL da base de minação de indedutibilidade da
cálculo da própria contribui- CSSL na apuração do lucro real.
ção para apuração do lucro
real e do Imposto de Renda
(discussão acerca das bases de
cálculo do IRPJ e do CSLL,
previstas nos artigos 43 do
CTN, 47 da Lei 4.506/64 e 1º
da Lei 9.316/96, além das Leis
6.404/76 e 7.689/88).

364
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

181 Questão referente à possibi- O farmacêutico pode acumular a REsp 1112884/MG 26/08/2009
lidade de acumulação, por responsabilidade técnica por uni-
farmacêutico, de responsabi- dade farmacêutica e por unidade
lidade técnica por drogaria e de drogaria, bem como a respon-
farmácia, à luz do que dispõe sabilidade por duas drogarias, es-
o art. art. 20 da Lei 5.991/73 e pécies do gênero 'farmácia'.
art. 15 da Lei 5.991/73.
182 Discussão acerca da exibilidade É dispensado o curador especial REsp 1110548/PB 25/02/2010
do depósito prévio para o co- de oferecer garantia ao Juízo para
nhecimento dos embargos apre- opor embargos à execução.
sentados pelo curador especial.
183 Questão referente à incidência O ICMS incide sobre o preço to- REsp 1106462/SP 23/09/2009
de ICMS sobre os encargos fi- tal da venda quando o acréscimo
nanceiros nas vendas a prazo. é cobrado pelo próprio vendedor
(venda a prazo).
184 Discute-se a fixação da verba O valor dos honorários advoca- REsp 1114407/SP 09/12/2009
honorária em 10% a recair so- tícios em sede de desapropriação
bre a diferença entre a oferta e deve respeitar os limites impostos
o montante fixado a título de pelo artigo 27, § 1º, do Decreto-
indenização. -lei 3.365/41 - qual seja: entre
0,5% e 5% da diferença entre o
valor proposto inicialmente pelo
imóvel e a indenização imposta
judicialmente.
185 BENEFÍCIO ASSISTEN- A limitação do valor da renda REsp 1112557/MG 28/10/2009
CIAL. POSSIBILIDADE DE per capita familiar não deve ser
DEMONSTRAÇÃO DA considerada a única forma de
CONDIÇÃO DE MISERA- se comprovar que a pessoa não
BILIDADE DO BENEFICIÁ- possui outros meios para prover
RIO POR OUTROS MEIOS a própria manutenção ou de tê-
DE PROVA, QUANDO A -la provida por sua família, pois
RENDA PER CAPITA DO é apenas um elemento objetivo
NÚCLEO FAMILIAR FOR para se aferir a necessidade, ou
SUPERIOR A 1/4 DO SALÁ- seja, presume-se absolutamente a
RIO MÍNIMO. miserabilidade quando compro-
vada a renda per capita inferior a
1/4 do salário mínimo.
186 BENEFÍCIO CONCEDIDO É incabível a correção monetária REsp 1113983/RN 28/04/2010
ANTES DA CONSTITUI- dos salários de contribuição con-
ÇÃO FEDERAL VIGENTE. siderados no cálculo do salário de
SA L Á R IO -DE - C ON T R I- benefício de auxílio-doença, apo-
BUIÇÃO. CORREÇÃO MO- sentadoria por invalidez, pensão
NETÁRIA. ou auxílio-reclusão concedidos
antes da vigência da CF/1988.
187 APOSENTADORIA POR É incabível a correção monetária REsp 1113983/RN 28/04/2010
INVALIDEZ. BENEFÍCIO dos salários de contribuição con-
CONCEDIDO ANTES DA siderados no cálculo do salário de
CONSTITUIÇÃO FEDE- benefício de auxílio-doença, apo-
RAL VIGENTE. SALÁRIO- sentadoria por invalidez, pensão
-D E - C O N T R I B U I Ç ÃO. ou auxílio-reclusão concedidos
CORREÇÃO MONETÁRIA. antes da vigência da CF/1988.

365
Maria Cecília de Araujo Asperti

188 BENEFÍCIO CONCEDIDO É incabível a correção monetária REsp 1113983/RN 28/04/2010


ANTES DA CONSTITUI- dos salários de contribuição con-
ÇÃO FEDERAL VIGENTE. siderados no cálculo do salário de
SA L Á R IO -DE - C ON T R I- benefício de auxílio-doença, apo-
BUIÇÃO. CORREÇÃO MO- sentadoria por invalidez, pensão
NETÁRIA. ou auxílio-reclusão concedidos
antes da vigência da CF/1988.
189 BENEFÍCIO CONCEDIDO É incabível a correção monetária REsp 1113983/RN 28/04/2010
ANTES DA CONSTITUI- dos salários de contribuição con-
ÇÃO FEDERAL VIGENTE. siderados no cálculo do salário de
SA L Á R IO -DE - C ON T R I- benefício de auxílio-doença, apo-
BUIÇÃO. CORREÇÃO MO- sentadoria por invalidez, pensão
NETÁRIA. ou auxílio-reclusão concedidos
antes da vigência da CF/1988.
190 Questão referente à fixação O critério trifásico de individuali- REsp 1117068/PR 26/10/2011
da pena abaixo do mínimo zação da pena, trazido pelo art. 68
legal na segunda fase da do- do Código Penal, não permite ao
simetria, bem como a deter- Magistrado extrapolar os marcos
minação de que o percentual mínimo e máximo abstratamente
de redução previsto no § 4º do cominados para a aplicação da
art. 33 da Lei n. 11.343/2006, sanção penal.
incida sobre o caput do mes-
mo artigo, caso seja mais be-
néfico ao paciente.
191 Questão referente à fixação É cabível a aplicação retroativa REsp 1117068/PR 26/10/2011
da pena abaixo do mínimo da Lei n. 11.343/2006, desde que
legal na segunda fase da do- o resultado da incidência das suas
simetria, bem como a deter- disposições, na íntegra, seja mais
minação de que o percentual favorável ao réu do que o advindo
de redução previsto no § 4º do da utilização da Lei 6.368/76, sen-
art. 33 da Lei n. 11.343/2006, do vedada a combinação de leis.
incida sobre o caput do mes-
mo artigo, caso seja mais be-
néfico ao paciente.
192 Questão referente a não abran- A pensão alimentícia incide sobre REsp 1106654/RJ 25/11/2009
gência na pensão alimentícia o décimo terceiro salário e o terço
da gratificação natalina e da constitucional de férias, também
gratificação de férias recebidas conhecidos, respectivamente, por
pelo alimentante. gratificação natalina e gratifica-
ção de férias.
193 Questão referente à legitimi- Os Estados da Federação são par- REsp 989419/RS 25/11/2009
dade passiva da União, em tes legítimas para figurar no pólo
demandas promovidas por passivo das ações propostas por
servidores públicos estadu- servidores públicos estaduais, que
ais, objetivando a isenção ou visam o reconhecimento do di-
não-incidência de imposto de reito à isenção ou à repetição do
renda retido na fonte, em que indébito relativo ao imposto de
o produto da arrecadação do renda retido na fonte.
tributo pertence aos Estados
da Federação.

366
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

194 Questão referente à impos- Opostos embargos declaratórios REsp 1049974/SP 02/06/2010
sibilidade de os embargos de de decisão colegiada, o relator
declaração opostos contra de- poderá negar seguimento mono-
cisão de órgão colegiado terem craticamente, com base no caput
seu seguimento obstado mono- do artigo 557 do CPC.
craticamente, ex vi do artigo
537 do CPC.
195 Questão referente à possibili- Os honorários advocatícios de- REsp 963528/PR 02/12/2009
dade de compensação de ho- vem ser compensados quando
norários, nos termos do art. 21 houver sucumbência recíproca,
do CPC, quando da ocorrên- assegurado o direito autônomo
cia de sucumbência recíproca, do advogado à execução do saldo
sem implicar violação ao art. sem excluir a legitimidade da pró-
23 da Lei 8.906/94 - Estatuto pria parte.
da Advocacia.
196 Questão referente à incidência A Contribuição para Financia- REsp 929521/SP 23/09/2009
de COFINS sobre as receitas mento da Seguridade Social - Co-
auferidas com as operações de fins incide sobre as receitas prove-
locação de bens móveis. nientes das operações de locação
de bens móveis.
197 Questão referente à tese de Os juros de mora na indenização REsp 1098365/PR 28/10/2009
que o termo inicial dos juros de do seguro DPVAT fluem a partir
mora, em ação a versar sobre o da citação.
pagamento de indenização re-
ferente ao seguro DPVAT, é o
da data da citação na ação de
cobrança.
198 Questão central trata da Em se tratando de construção REsp 1117121/SP 14/10/2009
competência tributária para a civil, antes ou depois da lei com-
cobrança de ISS, quando da plementar, o imposto é devido no
realização de serviço de enge- local da construção (art. 12, letra
nharia consultiva. O acórdão "b" do DL 406/68 e art. 3º, da LC
impugnado firmou entendi- 116/2003).
mento no sentido de que a
competência tributária para a
cobrança do sobredito imposto
é do município onde se situa o
estabelecimento do prestador.
199 Questão referente à utilização A Taxa SELIC é legítima como REsp 879844/MG 11/11/2009
da taxa SELIC como índice de índice de correção monetária e
correção monetária e de juros de juros de mora, na atualização
de mora, na atualização dos dos débitos tributários pagos em
débitos tributários pagos em atraso, diante da existência de Lei
atraso, diante da existência de Estadual que determina a adoção
Lei Estadual que determina a dos mesmos critérios adotados na
adoção dos mesmos critérios correção dos débitos fiscais.
adotados na correção dos débi-
tos fiscais federais.

367
Maria Cecília de Araujo Asperti

200 Questão referente à nulida- Estão revestidas de legalidade as REsp 1102578/MG 14/10/2009
de do auto de infração, por normas expedidas pelo CON-
considerar insubsistente mul- METRO e INMETRO, e suas
ta fundada em Resolução do respectivas infrações, com o obje-
CONMETRO, com conteúdo tivo de regulamentar a qualidade
material não previsto na nor- industrial e a conformidade de
ma regulamentada. produtos colocados no mercado
de consumo.
201 Questão referente à necessida- Conforme o disposto no artigo REsp 1120616/PR 25/11/2009
de de publicação do editais nos 605 da Consolidação da Leis do
moldes previstos no art. 605 da Trabalho, em respeito ao princí-
CLT para fins de cobrança da pio da publicidade, a publicação,
contribuição sindical rural. em jornais de grande circulação
local, de editais concernentes ao
recolhimento da contribuição
sindical é condição necessária à
eficácia do procedimento do re-
colhimento deste tributo, matéria
que consubstancia pressuposto
para o desenvolvimento regular
do processo e pode ser apreciada
de ofício pelo Juiz.
203 Questão referente aos índices No tocante à correção monetá- REsp 1111201/PE 24/02/2010
de reajuste das contas vincu- ria incidente no mês de fevereiro
ladas ao FGTS (fev/89, jun/90, de 1989, o Superior Tribunal de
jul/90, jan/91 e mar/91). Justiça firmou entendimento de
que deve ser calculada com base
na variação do IPC, ou seja, no
percentual de 10,14%. [...] Em
relação aos demais índices postu-
lados, firmou-se a jurisprudência
desta Corte no sentido de que
a correção dos saldos deve ser
de 9,61% em junho/90 (BTN),
10,79% em julho/90 (BTN),
13,69% em janeiro/91 (IPC) e
8,5% em março/91 (TR).
204 Discute-se a ilegitimidade Nas demandas que tratam da atu- REsp 1112520/PE 24/02/2010
passiva da Caixa Econômica alização monetária dos saldos das
Federal em ações ajuizada para contas vinculadas do FGTS, a le-
requerer a aplicação dos índi- gitimidade passiva ad causam é ex-
ces de atualização monetária clusiva da Caixa Econômica Fede-
dos saldos das contas vincula- ral, por ser gestora do Fundo, com
das ao FGTS. a exclusão da União e dos bancos
depositários (Súmula 249/STJ).
205 Discute-se a obrigatoriedade Nas demandas que tratam da atu- REsp 1112520/PE 24/02/2010
do litisconsórcio passivo ne- alização monetária dos saldos das
cessário da União em ações contas vinculadas do FGTS, a le-
ajuizada para requerer a aplica- gitimidade passiva ad causam é ex-
ção dos índices de atualização clusiva da Caixa Econômica Fede-
monetária dos saldos das con- ral, por ser gestora do Fundo, com
tas vinculadas ao FGTS. a exclusão da União e dos bancos
depositários (Súmula 249/STJ).

368
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

206 Discute-se a obrigatoriedade Nas demandas que tratam da REsp 1112520/PE 24/02/2010
de litisconsórcio passivo ne- atualização monetária dos saldos
cessário dos bancos depositá- das contas vinculadas do FGTS,
rios em ações ajuizada para re- a legitimidade passiva ad causam
querer a aplicação dos índices é exclusiva da Caixa Econômica
de atualização monetária dos Federal, por ser gestora do Fundo,
saldos das contas vinculadas com a exclusão da União e dos
ao FGTS. bancos depositários (Súmula 249/
STJ).
207 Discute-se o prazo prescrional É trintenária a prescrição para REsp 1112520/PE 24/02/2010
para cobrança de correção mo- cobrança de correção monetária
netária de contas vinculadas de contas vinculadas ao FGTS,
ao FGTS. nos termos das Súmula 210/STJ.
208 Estabelecer os índices aplicá- Os acréscimos monetários nas REsp 1112520/PE 24/02/2010
veis para correção monetária contas vinculadas ao Fundo de
de contas vinculadas ao FGTS Garantia do Tempo de Serviço,
nos meses de junho/1987, janei- nos meses de junho/87, janeiro/89,
ro/1989, abril/1990, maio/1990, abril e maio/90 e fevereiro/91 são,
julho/1990, e fevereiro/1991. respectivamente, 18,02% (LBC),
42,72%, 44,80% (IPC), 5,38
(BTN) e 7% (TR). Enunciado da
Súmula 252/STJ.
209 Questão referente à legitimi- O promitente vendedor é parte REsp 1073846/SP 25/11/2009
dade de ex-proprietário de legítima para figurar no pólo pas-
imóvel rural para integrar o sivo da execução fiscal que busca
pólo passivo de execução fis- a cobrança de ITR nas hipóteses
cal, que visa a cobrança de em que não há registro imobiliário
créditos tributários relativos do ato translativo de propriedade.
ao ITR, sendo certa a inexis-
tência de registro no cartório
competente a comprovar a
translação do domínio.
210 Questão referente à ação de O termo inicial dos juros morató- REsp 1118103/SP 24/02/2010
desapropriação por utilidade rios em desapropriações é o dia 1º
pública, em que o acórdão re- de janeiro do exercício seguinte
corrido decidiu que (a) os juros àquele em que o pagamento deve-
moratórios são incidentes a ria ser feito.
partir do trânsito em julga-
do; (b) a cumulação dos juros
compensatórios e moratórios
não implica em anatocismo
vedado pela Lei de Usura.
211 Questão referente à ação de Os juros compensatórios, em de- REsp 1118103/SP 24/02/2010
desapropriação por utilidade sapropriação, somente incidem até
pública, em que o acórdão re- a data da expedição do precatório
corrido decidiu que (a) os juros original (...), não havendo hipótese
moratórios são incidentes a de cumulação de juros moratórios
partir do trânsito em julga- com juros compensatórios.
do; (b) a cumulação dos juros
compensatórios e moratórios
não implica em anatocismo
vedado pela Lei de Usura.

369
Maria Cecília de Araujo Asperti

212 Questão referente à pretensão A extinção das ações de pequeno REsp 1125627/PE 28/10/2009
executória concernente aos ho- valor é faculdade da Administra-
norários advocatícios de valor ção Federal, vedada a atuação ju-
abaixo do estipulado no art. 1º dicial de ofício.
da Lei nº 9.469/97, porque se
configura a "ausência de inte-
resse de agir" do autor "para a
cobrança de verba honorária em
valor ínfimo, que sequer cobriria
as despesas com a execução".
213 AUXÍLIO-ACIDENTE. ART. Para a concessão de auxílio- REsp 1108298/SC 12/05/2010
86 DA LEI 8.213/91. REQUI- -acidente fundamentado na perda
SITO PARA A CONCES- de audição (...), é necessário que
SÃO DO BENEFÍCIO. ALE- a sequela seja ocasionada por
GAÇÃO DE NECESSIDADE acidente de trabalho e que acar-
DE COMPROVAÇÃO DA rete uma diminuição efetiva e
EFETIVA REDUÇÃO DA permanente da capacidade para
CAPACIDADE LABORATI- a atividade que o segurado habi-
VA DO SEGURADO. tualmente exercia.
214 REVISÃO DA RENDA Os atos administrativos praticados REsp 1114938/AL 14/04/2010
MENSAL INICIAL. INCI- antes da Lei 9.784/99 podem ser re-
DÊNCIA DO PRAZO DE vistos pela Administração a qual-
DECADÊNCIA INSTITUÍ- quer tempo, por inexistir norma
DO PELO ART. 103 DA LEI legal expressa prevendo prazo para
8.213/91, COM A REDAÇÃO tal iniciativa. Somente após a Lei
DADA PELA LEI 9.528/97, 9.784/99 incide o prazo decaden-
AOS BENEFÍCIOS CONCE- cial de 5 anos nela previsto, tendo
DIDOS EM DATA ANTE- como termo inicial a data de sua
RIOR À SUA VIGÊNCIA. vigência (01.02.99). (...) Antes de
decorridos 5 anos da Lei 9.784/99,
a matéria passou a ser tratada no
âmbito previdenciário pela MP
138, de 19.11.2003, convertida na
Lei 10.839/2004, que acrescentou
o art. 103-A à Lei 8.213/91 (LBPS)
e fixou em 10 anos o prazo deca-
dencial para o INSS rever os seus
atos de que decorram efeitos favo-
ráveis a seus beneficiários.
215 Questão referente à forma de Sob a égide da Lei n.º 8.212/91, é REsp 1066682/SP 09/12/2009
cálculo da contribuição pre- ilegal o cálculo, em separado, da
videnciária incidente sobre a contribuição previdenciária sobre
gratificação natalina. a gratificação natalina em relação
ao salário do mês de dezembro.
216 Questão referente à forma de A Lei n. 8.620/93, em seu art. 7.º, REsp 1066682/SP 09/12/2009
cálculo da contribuição pre- § 2.º autorizou expressamente a
videnciária incidente sobre a incidência da contribuição previ-
gratificação natalina. denciária sobre o valor bruto do
13.º salário, cuja base de cálculo
deve ser calculada em separado
do salário-de-remuneração do
respectivo mês de dezembro.

370
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

217 Questiona-se a forma de in- Para fins do pagamento dos tribu- REsp 1116399/BA 28/10/2009
terpretação e o alcance da tos com as alíquotas reduzidas, a
expressão serviços hospita- expressão 'serviços hospitalares',
lares, prevista no artigo 15, § constante do artigo 15, § 1º, in-
1º, inciso III, alínea "a", da Lei ciso III, da Lei 9.249/95, deve ser
9.429/95, para fins de recolhi- interpretada de forma objetiva
mento do IRPJ e da CSLL com (ou seja, sob a perspectiva da ati-
base em alíquotas reduzidas. vidade realizada pelo contribuin-
te), devendo ser considerados ser-
viços hospitalares 'aqueles que se
vinculam às atividades desenvol-
vidas pelos hospitais, voltados di-
retamente à promoção da saúde',
de sorte que, 'em regra, mas não
necessariamente, são prestados
no interior do estabelecimento
hospitalar, excluindo-se as sim-
ples consultas médicas, atividade
que não se identifica com as pres-
tadas no âmbito hospitalar, mas
nos consultórios médicos'.
218 Questão referente à necessida- A penhora on line, antes da REsp 1112943/MA 15/09/2010
de da comprovação do esgo- entrada em vigor da Lei n.
tamento das diligências para 11.382/2006, configura-se como
localização de bens de proprie- medida excepcional, cuja efeti-
dade do devedor para a realiza- vação está condicionada à com-
ção das providências previstas provação de que o credor tenha
no art. 655-A do CPC. tomado todas as diligências no
sentido de localizar bens livres e
desembaraçados de titularidade
do devedor.
219 Questão referente à necessida- Após o advento da Lei n. REsp 1112943/MA 15/09/2010
de da comprovação do esgo- 11.382/2006, o Juiz, ao decidir
tamento das diligências para acerca da realização da penho-
localização de bens de proprie- ra on line, não pode mais exigir
dade do devedor para a realiza- a prova, por parte do credor, de
ção das providências previstas exaurimento de vias extrajudi-
no art. 655-A do CPC. ciais na busca de bens a serem
penhorados.
220 Questão referente à impossibi- Descabe a prisão civil do deposi- REsp 914253/SP 02/12/2009
lidade de decretação da prisão tário judicial infiel.
civil do depositário infiel.
221 Questiona-se se o crime de A configuração do crime do art. REsp 1112326/DF 14/12/2011
corrupção de menores afigura- 244-B do ECA independe da pro-
-se formal: é que o resultado ín- va da efetiva corrupção do menor,
sito ao art. 1o. da Lei 2.252/54 por se tratar de delito formal.
- a corrupção, a degradação
moral do menor - evidencia-
-se da consumação ou mesmo
da tentativa, do próprio ilícito
perpetrado pelo agente ativo
com a colaboração - de qual-
quer espécie - de pessoa com
menos de 18 (dezoito) anos.

371
Maria Cecília de Araujo Asperti

222 Questão referente à impossibi- Os honorários sucumbenciais, REsp 886178/RS 02/12/2009


lidade de ajuizamento de ação quando omitidos em decisão
própria pelo advogado da parte transitada em julgado, não podem
cujo pedido foi julgado proce- ser cobrados em execução ou em
dente, objetivando a fixação ação própria.
de honorários advocatícios,
quando transitada em julgado
decisão omissa na condenação
em verba sucumbencial.
223 Questiona-se acerca da possi- A Taxa Referencial (TR) é o ín- REsp 1032606/DF 11/11/2009
bilidade da incidência da TR dice aplicável, a título de corre-
como índice de correção mo- ção monetária, aos débitos com
netária e juros de mora aos dé- o FGTS recolhidos pelo emprega-
bitos de FGTS não repassados dor mas não repassados ao fundo.
ao fundo pelo empregador.
224 Discute-se a possibilidade da O art. 22, § 1º, da Lei 8.036/90 REsp 1032606/DF 11/11/2009
incidência da TR como índice diz respeito a correção monetária
de correção monetária e juros e juros de mora a que está sujeito
de mora aos débitos de FGTS o empregador quando não efetua
não repassados ao fundo pelo os depósitos ao FGTS, verbis:
empregador. Art. 22. O empregador que não
realizar os depósitos previstos
nesta Lei, no prazo fixado no art.
15, responderá pela incidência
da Taxa Referencial - TR sobre
a importância correspondente.
§ 1º Sobre o valor dos depósitos,
acrescido da TR, incidirão, ain-
da, juros de mora de 0,5% a.m.
(cinco décimos por cento ao mês)
ou fração e multa, sujeitando-se,
também, às obrigações e sanções
previstas no Decreto-Lei no 368,
de 19 de dezembro de 1968.
225 Questão referente à restrição A inscrição e modificação dos REsp 1103009/RS 09/12/2009
do deferimento de modifica- dados no Cadastro Nacional de
ções no CNPJ, para incluir, no Pessoas Jurídicas - CNPJ devem
quadro societário da empresa, ser garantidas a todas as empresas
pessoa física com pendências legalmente constituídas, median-
perante a Receita Federal, nos te o arquivamento de seus esta-
termos dos limites impostos tutos e suas alterações na Junta
pela IN SRF 200/02, que re- Comercial Estadual, sem a impo-
gulamentou, em parte, a Lei nº sição de restrições infralegais, que
5.614/70. obstaculizem o exercício da livre
iniciativa e desenvolvimento ple-
no de suas atividades econômicas.
226 IPI - CRÉDITO-PRÊMIO - O crédito-prêmio do IPI, previsto REsp 1111148/SP 24/02/2010
DECRETO-LEI Nº 491/69 - no art. 1º do DL 491/69, não se
EXTINÇÃO EM 1983, POR aplica às vendas para o exterior
FORÇA DO DISPOSTO NO realizadas após 04.10.90.
DECRETO-LEI Nº 1.658/79,
COM REDAÇÃO DADA
PELO DECRETO-LEI Nº
1.722/79

372
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

227 Prazo prescricional nas de- O prazo prescricional das ações REsp 1111148/SP 24/02/2010
mandas onde se discute a uti- que visam ao recebimento do
lização do Crédito-Prêmio IPI. crédito-prêmio do IPI, nos termos
do art. 1º do Decreto 20.910/32, é
de cinco anos.
228 Questona-se se é facultado ao O contribuinte pode optar por REsp 1114404/MG 10/02/2010
contribuinte que detém cré- receber, por meio de precatório
dito contra a Fazenda Pública ou por compensação, o indébito
por tributo indevidamente tributário certificado por sen-
pago optar pela restituição via tença declaratória transitada em
precatório ou compensação, julgado.
conforme previsão legal do
ente tributante.
229 Questão referente ao prazo A ação de repetição de indébito REsp 947206/RJ 13/10/2010
prescricional quinquenal ado- (...) visa à restituição de crédito
tado em sede de ação decla- tributário pago indevidamente
ratória de nulidade de lança- ou a maior, por isso que o termo
mentos tributários (art. 1º do a quo é a data da extinção do cré-
Decreto 20.910/32). dito tributário, momento em que
exsurge o direito de ação contra a
Fazenda Pública, sendo certo que,
por tratar-se de tributo sujeito
ao lançamento de ofício, o prazo
prescricional é quinquenal, nos
termos do art. 168, I, do CTN.
230 Questão referente à possibilida- O recurso de apelação devolve, REsp 1030817/DF 25/11/2009
de de o Tribunal a quo se ma- em profundidade, o conhecimen-
nifestar acerca da base de cál- to da matéria impugnada, ainda
culo e semestralidade do PIS, que não resolvida pela sentença,
quando o pedido formulado na nos termos dos parágrafos 1º e 2º
inicial cingiu-se à declaração do art. 515 do CPC, aplicável a re-
de inexistência de relação jurí- gra iura novit curia. Consequen-
dica decorrente da incidência temente, o Tribunal a quo pode
dos Decretos-lei n.º 2.445/88 e se manifestar acerca da base de
2.249/88, sem incorrer em jul- cálculo e do regime da semestra-
gamento extra petita. lidade do PIS, máxime em face da
declaração de inconstitucionali-
dade dos Decretos-lei n. 2.445/88
e 2.249/88.
231 Questão referente ao reconhe- Os Procuradores Federais e os REsp 1042361/DF 16/12/2009
cimento do direito dos procu- Procuradores do Banco Central,
radores federais à intimação consoante preconizado no art. 17
pessoal das decisões proferidas da Lei 10.910, de 15 de julho de
no processo, nos termos do art. 2004, têm como prerrogativa o re-
17 da Lei 10.910/2004. cebimento da intimação pessoal.
232 Definir se a restituição dos Na repetição do indébito tribu- REsp 1125550/SP 14/04/2010
valores indevidamente reco- tário referente a recolhimento
lhidos a título de contribui- de tributo direto, não se impõe
ção previdenciária depende a comprovação de que não hou-
da comprovação de que não ve repasse do encargo financeiro
houve a transferência do custo decorrente da incidência do im-
para o consumidor, consoante posto ao consumidor final, con-
estabelece o art. 89, § 1º, da tribuinte de fato.
Lei 8.213/91.

373
Maria Cecília de Araujo Asperti

233 Discute sobre a legalidade da Nos contratos de mútuo em que REsp 1112879/PR 12/05/2010
cobrança de juros remunerató- a disponibilização do capital é
rios devidos em contratos ban- imediata, o montante dos juros
cários, desde que (i) não haja remuneratórios praticados deve
prova da taxa pactuada ou (ii) ser consignado no respectivo
a cláusula ajustada entre as instrumento. Ausente a fixação
partes não tenha indicado o da taxa no contrato o juiz deve
percentual a ser observado. limitar os juros à média de mer-
cado nas operações da espécie,
divulgada pelo Bacen, salvo se a
taxa cobrada for mais vantajosa
para o cliente.
234 Discute-se a legalidade da co- Nos contratos de mútuo em que REsp 1112879/PR 12/05/2010
brança de juros remunerató- a disponibilização do capital é
rios devidos em contratos ban- imediata, o montante dos juros
cários, desde que (i) não haja remuneratórios praticados deve
prova da taxa pactuada ou (ii) ser consignado no respectivo
a cláusula ajustada entre as instrumento. Ausente a fixação
partes não tenha indicado o da taxa no contrato o juiz deve
percentual a ser observado. limitar os juros à média de mer-
cado nas operações da espécie,
divulgada pelo Bacen, salvo se a
taxa cobrada for mais vantajosa
para o cliente. Em qualquer hipó-
tese, é possível a correção para a
taxa média se for verificada abu-
sividade nos juros remuneratórios
praticados.
235 Questão referente à possibili- A correção monetária é matéria REsp 1112524/DF 01/09/2010
dade ou não de inclusão dos de ordem pública, integrando o
expurgos inflacionários nos pedido de forma implícita, razão
cálculos da correção monetá- pela qual sua inclusão ex officio,
ria, quando não expressamen- pelo juiz ou tribunal, não caracte-
te postulados pelo autor na riza julgamento extra ou ultra pe-
fase de conhecimento. tita, hipótese em que prescindível
o princípio da congruência entre
o pedido e a decisão judicial.
236 Questão referente à legitimi- Em processo de execução, o ter- REsp 1091710/PR 17/11/2010
dade de terceiro prejudicado ceiro afetado pela constrição ju-
para interpor agravo de ins- dicial de seus bens poderá opor
trumento em execução na qual embargos de terceiro à execução
houve ordem de penhora de ou interpor recurso contra a de-
créditos de sua titularidade. cisão constritiva, na condição de
terceiro prejudicado.
237 Questão referente à possibili- É possível ao contribuinte, após REsp 1123669/RS 09/12/2009
dade de oferecimento de ga- o vencimento da sua obrigação
rantia, em sede de ação caute- e antes da execução, garantir o
lar, para a suspensão da exigi- juízo de forma antecipada, para
bilidade do crédito tributário, o fim de obter certidão positiva
cujo respectivo executivo fiscal com efeito de negativa.
ainda não foi ajuizado, visando
à obtenção de certidão positiva
com efeitos de negativa.

374
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

238 Questão referente à possi- A opção pelo Simples de estabele- REsp 1021263/SP 25/11/2009
bilidade de instituições de cimentos dedicados às atividades
ensino que se dediquem ex- de creche, pré-escola e ensino
clusivamente às atividades de fundamental é admitida somente
creche, pré-escolas e ensino a partir de 24/10/2000, data de vi-
fundamental optarem pelo gência da Lei n. 10.034/2000.
SIMPLES.
239 Questão referente à possibili- A Súmula 343, do Supremo Tribu- REsp 1001779/DF 25/11/2009
dade de apreciação, em sede de nal Federal, cristalizou o entendi-
ação rescisória (com o afasta- mento de que não cabe ação resci-
mento da Súmula 343 do STF), sória por ofensa a literal disposição
da questão relativa à isenção de lei, quando a decisão rescinden-
do imposto renda em relação da se tiver baseado em texto legal
às contribuições recolhidas sob de interpretação controvertida nos
a égide da Lei 7.713/88 para a tribunais. A ação rescisória resta
formação do fundo de aposen- cabível, se, à época do julgamento
tadoria, cujo ônus fosse exclusi- cessara a divergência, hipótese em
vamente do participante. que o julgado divergente, ao revés
de afrontar a jurisprudência, viola
a lei que confere fundamento jurí-
dico ao pedido.
240 Questão referente à incidência O imposto de renda incide sobre o REsp 58265/SP 09/12/2009
de imposto de renda sobre o re- resultado positivo das aplicações
sultado das aplicações financei- financeiras realizadas pelas coo-
ras realizadas pelas Cooperativas. perativas, por não caracterizarem
'ato cooperativos típicos'.
241 Questão referente à ilegitimi- O depósito prévio previsto no art. REsp 962838/BA 25/11/2009
dade da exigência de depósito 38, da LEF, não constitui condi-
prévio como condição de pro- ção de procedibilidade da ação
cedibilidade da ação anulató- anulatória, mas mera faculdade
ria de crédito tributário (art. do autor, para o efeito de suspen-
38 da Lei 6.830/80). são da exigibilidade do crédito
tributário, nos termos do art. 151
do CTN, inibindo, dessa forma,
o ajuizamento da ação executiva
fiscal.
242 Questão referente à possibi- As atividades de panificação e de REsp 1117139/RJ 25/11/2009
lidade de creditamento de congelamento de produtos pere-
ICMS incidente sobre a ener- cíveis", 'rotisseria e restaurante',
gia elétrica consumida em es- 'açougue e peixaria' e 'frios e lati-
tabelecimento comercial, à luz cínios' (...) por supermercado não
da Lei Complementar 87/96. configuram processo de industria-
lização de alimentos, (...) razão
pela qual inexiste direito ao credi-
tamento do ICMS pago na entrada
da energia elétrica consumida no
estabelecimento comercial.

375
Maria Cecília de Araujo Asperti

243 Questão referente aos requi- Para fins do art. 543-c do CPC, REsp 956943/PR 20/08/2014
sitos necessários à caracteri- firma-se a seguinte orientação:
zação da fraude de execução 1.1. É indispensável citação válida
envolvendo bens imóveis, ex- para configuração da fraude de
cetuadas as execuções de na- execução, ressalvada a hipótese
tureza fiscal. prevista no § 3º do art. 615-A do
CPC.1.2. O reconhecimento da
fraude de execução depende do
registro da penhora do bem alie-
nado ou da prova de má-fé do ter-
ceiro adquirente (Súmula n. 375/
STJ). 1.3. A presunção de boa-fé é
princípio geral de direito univer-
salmente aceito, sendo milenar
parêmia: a boa-fé se presume; a
má-fé se prova. 1.4. Inexistindo
registro da penhora na matrícula
do imóvel, é do credor o ônus da
prova de que o terceiro adqui-
rente tinha conhecimento de de-
manda capaz de levar o alienante
à insolvência, sob pena de torna-
-se letra morta o disposto no art.
659, § 4º, do CPC. 1.5. Conforme
previsto no § 3º do art. 615-A do
CPC, presume-se em fraude de
execução a alienação ou oneração
de bens realizada após averbação
referida no dispositivo.
245 Questão referente ao condicio- A suspensão da exigibilidade do REsp 1133710/GO 25/11/2009
namento da homologação da crédito tributário superior a qui-
opção pelo REFIS à prestação nhentos mil reais para opção pelo
de garantia no valor do débito Refis pressupõe a homologação
exequendo ou ao arrolamento expressa do comitê gestor e a
de bens, na hipótese em que a constituição de garantia por meio
dívida consolidada seja supe- do arrolamento de bens.
rior a R$ 500.000,00 (art. 3º,
§§ 4º e 5º, da Lei 9.964/00).
246 Questão referente à possibili- É permitida a capitalização de REsp 973827/RS 08/08/2012
dade ou não de capitalização juros com periodicidade inferior
de juros mensais em contratos a um ano em contratos celebra-
bancários, especialmente após dos após 31.3.2000, data da pu-
a entrada em vigor do art. 5° blicação da Medida Provisória
da Medida Provisória n. 2170- n. 1.963-17/2000 (em vigor como
36/2001. MP 2.170-36/2001), desde que ex-
pressamente pactuada.
247 Questão referente à possibili- A capitalização dos juros em pe- REsp 973827/RS 08/08/2012
dade ou não de capitalização riodicidade inferior à anual deve
de juros mensais em contratos vir pactuada de forma expressa
bancários, especialmente após e clara. A previsão no contrato
a entrada em vigor do art. 5° bancário de taxa de juros anual
da Medida Provisória n. 2170- superior ao duodécuplo da men-
36/2001. sal é suficiente para permitir a
cobrança da taxa efetiva anual
contratada.

376
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

248 Questiona-se se incumbe ao O envio da guia de cobrança REsp 1114780/SC 12/05/2010


Município o ônus da prova (carnê), da taxa de licença para
da remessa e recebimento do funcionamento, ao endereço do
carnê de cobrança da taxa de contribuinte, configura a notifi-
licença para funcionamento ao cação presumida do lançamento
endereço do contribuinte, sob do tributo, passível de ser ilidida
pena de nulidade da CDA. pelo contribuinte, a quem cabe
comprovar seu não recebimento.
249 Questão referente à possibi- O prosseguimento da execução REsp 1115501/SP 10/11/2010
lidade de alteração do valor fiscal (pelo valor remanescente
constante na Certidão da Dí- daquele constante do lançamento
vida Ativa, quando configura- tributário ou do ato de formaliza-
do o excesso de execução, des- ção do contribuinte fundado em
de que a operação importe me- legislação posteriormente decla-
ros cálculos aritméticos, sendo rada inconstitucional em sede de
certa a inexistência de mácula controle difuso) revela-se forçoso
à liquidez do título executivo. em face da suficiência da liquida-
ção do título executivo, consubs-
tanciado na sentença proferida
nos embargos à execução, que re-
conheceu o excesso cobrado pelo
Fisco, sobressaindo a higidez do
ato de constituição do crédito tri-
butário, o que, a fortiori, dispensa
a emenda ou substituição da cer-
tidão de dívida ativa (CDA).
250 Questão referente à nature- O conteúdo normativo do art. REsp 1116620/BA 09/08/2010
za do rol de moléstias graves 6º, XIV, da Lei 7.713/88, com as
constante do art. 6º, XIV, da alterações promovidas pela Lei
Lei 7.713/88 - se taxativa ou 11.052/2004, é explícito em con-
exemplificativa -, de modo a ceder o benefício fiscal em favor
possibilitar, ou não, a conces- dos aposentados portadores das
são de isenção de imposto de seguintes moléstias graves: molés-
renda a aposentados portado- tia profissional, tuberculose ativa,
res de outras doenças graves alienação mental, esclerose múlti-
e incuráveis. pla, neoplasia maligna, cegueira,
hanseníase, paralisia irreversível
e incapacitante, cardiopatia gra-
ve, doença de Parkinson, espon-
diloartrose anquilosante, nefro-
patia grave, hepatopatia grave,
estados avançados da doença de
Paget (osteíte deformante), conta-
minação por radiação, síndrome
da imunodeficiência adquirida,
com base em conclusão da medi-
cina especializada, mesmo que a
doença tenha sido contraída de-
pois da aposentadoria ou reforma.
Por conseguinte, o rol contido no
referido dispositivo legal é taxati-
vo (numerus clausus), vale dizer,
restringe a concessão de isenção
às situações nele enumeradas.

377
Maria Cecília de Araujo Asperti

251 Questão referente à definição A natureza jurídica da remunera- REsp 1117903/RS 09/12/2009
da natureza jurídica da remu- ção dos serviços de água e esgoto,
neração cobrada pelo forne- prestados por concessionária de
cimento de água e esgoto por serviço público, é de tarifa ou
concessionária de serviço pú- preço público, consubstanciando,
blico (se taxa ou tarifa/preço assim, contraprestação de caráter
público) para fins de fixação não-tributário, razão pela qual
do prazo prescricional. não se subsume ao regime jurídi-
co tributário estabelecido para as
taxas.
252 Questão referente à definição É vintenário o prazo prescricional REsp 1117903/RS 09/12/2009
da natureza jurídica da remu- da pretensão executiva atinente
neração cobrada pelo forne- à tarifa por prestação de serviços
cimento de água e esgoto por de água e esgoto, cujo vencimen-
concessionária de serviço pú- to, na data da entrada em vigor
blico (se taxa ou tarifa/preço do Código Civil de 2002, era
público) para fins de fixação superior a dez anos. Ao revés,
do prazo prescricional. cuidar-se-á de prazo prescricional
decenal.
253 Questão referente à definição A natureza jurídica da remunera- REsp 1117903/RS 09/12/2009
da natureza jurídica da remu- ção dos serviços de água e esgoto,
neração cobrada pelo forne- prestados por concessionária de
cimento de água e esgoto por serviço público, é de tarifa ou
concessionária de serviço pú- preço público, consubstanciando,
blico (se taxa ou tarifa/preço assim, contraprestação de caráter
público) para fins de fixação não-tributário, razão pela qual
do prazo prescricional. não se subsume ao regime jurídi-
co tributário estabelecido para as
taxas.
254 Questão referente à definição É vintenário o prazo prescricional REsp 1117903/RS 09/12/2009
da natureza jurídica da remu- da pretensão executiva atinente
neração cobrada pelo forne- à tarifa por prestação de serviços
cimento de água e esgoto por de água e esgoto, cujo vencimen-
concessionária de serviço pú- to, na data da entrada em vigor
blico (se taxa ou tarifa/preço do Código Civil de 2002, era
público) para fins de fixação superior a dez anos. Ao revés,
do prazo prescricional. cuidar-se-á de prazo prescricional
decenal.
255 Questão referente à possibili- Os créditos rurais originários de REsp 1123539/RS 09/12/2009
dade de cobrança dos créditos operações financeiras alonga-
provenientes de operações de das ou renegociadas (cf. Lei n.
crédito rural cedido à União 9.138/95), cedidos à União por
pelo Banco do Brasil, nos ter- força da Medida Provisória 2.196-
mos da MP 2.196-3/2001, pelo 3/2001, estão abarcados no con-
rito da execução fiscal. ceito de Dívida Ativa da União
para efeitos de execução fiscal -
não importando a natureza públi-
ca ou privada dos créditos em si.

378
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

256 Questão referente à legitimi- Declarado e não pago o débito REsp 1123557/RS 25/11/2009
dade da recusa de expedição tributário pelo contribuinte, é le-
de certidão positiva com efei- gítima a recusa de expedição de
tos de negativa, na hipótese certidão negativa ou positiva com
de existência de declaração de efeito de negativa.
tributo sujeito ao lançamento
por homologação (DCTF) sem
a antecipação do respectivo
pagamento.
257 Questão referente à forma de Na esfera judicial, a renúncia so- REsp 1124420/MG 29/02/2012
extinção da ação de embargos, bre os direitos em que se funda a
no caso de adesão a acordo de ação que discute débitos incluídos
parcelamento de dívida (RE- em parcelamento especial deve
FIS ou PAES) - se com ou sem ser expressa, porquanto o preen-
resolução de mérito. chimento dos pressupostos para
a inclusão da empresa no referido
programa é matéria que deve ser
verificada pela autoridade admi-
nistrativa, fora do âmbito judicial.
258 Questão referente à possibi- É incabível o mandado de segu- REsp 1124537/SP 25/11/2009
lidade de utilização do man- rança para convalidar a compen-
dado de segurança como via sação tributária realizada pelo
adequada à obtenção da decla- contribuinte.
ração do direito de compen-
sação, nos termos da Súmula
213 do STJ, em oposição à
utilização do mandamus como
meio de validação, pelo Poder
Judiciário, da compensação
anteriormente efetuada.
259 Questão referente à não-inci- Não constitui fato gerador do REsp 1125133/SP 25/08/2010
dência do ICMS sobre o mero ICMS o simples deslocamento
deslocamento de equipamen- de mercadoria de um para outro
tos ou mercadorias entre es- estabelecimento do mesmo con-
tabelecimentos da titularidade tribuinte.
do mesmo contribuinte, em ra-
zão da ausência de circulação
econômica para fins de trans-
ferência de propriedade.
260 Questiona-se a impossibilida- O reforço da penhora não pode REsp 1127815/SP 24/11/2010
de de deferimento ex officio de ser deferido ex officio, a teor dos
reforço da penhora realizada artigos 15, II, da LEF e 685 do
validamente no executivo fis- CPC.
cal, a teor dos artigos 15, II, da
LEF e 667 e 685 do CPC.
261 Questiona-se a cobrança de di- As empresas de construção ci- REsp 1135489/AL 09/12/2009
ferencial de alíquota de ICMS vil não estão obrigadas a pagar
sobre operações interestadu- ICMS sobre mercadorias adquiri-
ais, realizadas por empresa de das como insumos em operações
construção civil, na aquisição interestaduais.
de material a ser empregado na
obra que executa.

379
Maria Cecília de Araujo Asperti

262 Questina-se a possibilidade de A prescrição, causa extintiva do REsp 1136144/RJ 09/12/2009


argüição de prescrição em sede crédito tributário, é passível de
de exceção de pré-executivi- ser veiculada em exceção de pré-
dade, ainda que fundada na -executividade, máxime quando
inconstitucionalidade da lei fundada na inconstitucionalida-
ordinária que ampliou o prazo de.
prescricional (artigo 46, da Lei
8.212/91).
263 Questiona-se a legalidade da A contribuição social destinada REsp 1136210/PR 09/12/2009
aplicação da sistemática de ao PIS permaneceu exigível no
recolhimento da contribuição período compreendido entre ou-
destinada ao PIS, constante tubro de 1995 a fevereiro de 1996,
da Lei Complementar 7/70, no por força da Lei Complementar
período de outubro de 1995 a 7/70, e entre março de 1996 a
fevereiro de 1996. outubro de 1998, por força da
Medida Provisória 1.212/95 e suas
reedições.
264 Questão referente à impossi- A mera discussão judicial da REsp 1137497/CE 14/04/2010
bilidade de exclusão dos dados dívida, sem garantia idônea ou
do devedor do CADIN, ante suspensão da exigibilidade do
a mera discussão judicial da crédito, nos termos do art. 151
dívida, sem que sejam observa- do CTN, não obsta a inclusão do
dos os requisitos do art. 7º da nome do devedor no CADIN.
Lei 10.722/2002.
265 Questão referente à aplicabi- Em se tratando de compensação REsp 1137738/SP 09/12/2009
lidade das leis disciplinadoras tributária, deve ser considerado
dos regimes de compensação o regime jurídico vigente à época
relativos aos tributos admi- do ajuizamento da demanda, não
nistrados pela Secretaria da podendo ser a causa julgada à luz
Receita Federal. do direito superveniente, tendo
em vista o inarredável requisito do
prequestionamento, viabilizador
do conhecimento do apelo extre-
mo, ressalvando-se o direito de o
contribuinte proceder à compen-
sação dos créditos pela via admi-
nistrativa, em conformidade com
as normas posteriores, desde que
atendidos os requisitos próprios.
266 Questão referente ao prazo de- O prazo prescricional, no que REsp 1138159/SP 25/11/2009
cadencial das contribuições pre- tange às contribuições previ-
videnciárias, cujos fatos gerado- denciárias, foi sucessivamente
res são anteriores à vigência da modificado pela EC n. 8/77, pela
Constituição Federal de 1988. Lei 6.830/80, pela CF/88 e pela
Lei 8.212/91, à medida em que as
mesmas adquiriam ou perdiam sua
natureza de tributo. (...) O prazo
decadencial, por seu turno, não foi
alterado pelos referidos diplomas
legais, mantendo-se obediente ao
disposto na lei tributária.

380
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

267 Questão referente à ilegalidade O valor do frete configura parcela REsp 1138159/SP 25/11/2009
da inclusão do valor do trans- estranha ao produto rural, por isso
porte (frete) na base de cálculo que não está inserido na base de cál-
da contribuição previdenciá- culo da contribuição para o FUN-
ria ao FUNRURAL, por não RURAL, que consiste tão-somente
integrar o valor comercial do no valor comercial do produto rural,
produto rural. correspondente ao preço pelo qual é
vendido pelo produtor.
268 Questão referente à desneces- É desnecessária a apresentação REsp 1138202/ES 09/12/2009
sidade da instrução da petição do demonstrativo de cálculo, em
inicial da execução fiscal com execução fiscal, uma vez que a Lei
o demonstrativo de cálculo, n. 6.830/80 dispõe, expressamen-
uma vez não estar arrolado te, sobre os requisitos essenciais
entre os requisitos essenciais para a instrução da petição inicial
impostos pela Lei 6.830/80, e não elenca o demonstrativo de
sendo inaplicável à espécie o débito entre eles.
art. 614, II, do CPC.
269 Questão referente à fixação, Tanto para os requerimentos efe- REsp 1138206/RS 09/08/2010
pelo Poder Judiciário, de prazo tuados anteriormente à vigência
razoável para a conclusão de da Lei 11.457/07, quanto aos pedi-
processo administrativo fiscal. dos protocolados após o advento
do referido diploma legislativo,
o prazo aplicável é de 360 dias a
partir do protocolo dos pedidos
(art. 24 da Lei 11.457/07).
270 Questão referente à fixação, Tanto para os requerimentos efe- REsp 1138206/RS 09/08/2010
pelo Poder Judiciário, de prazo tuados anteriormente à vigência
razoável para a conclusão de da Lei 11.457/07, quanto aos pedi-
processo administrativo fiscal. dos protocolados após o advento
do referido diploma legislativo,
o prazo aplicável é de 360 dias a
partir do protocolo dos pedidos
(art. 24 da Lei 11.457/07).
271 Questão referente à impos- Os efeitos da suspensão da REsp 1140956/SP 24/11/2010
sibilidade de ajuizamento de exigibilidade pela realização
executivo fiscal enquanto pen- do depósito integral do crédi-
dente de julgamento ação anu- to exequendo, quer no bojo de
latória de lançamento fiscal, ação anulatória, quer no de ação
em face da suspensão da exi- declaratória de inexistência de
gibilidade do crédito tributário relação jurídico-tributária, ou
pelo depósito do montante in- mesmo no de mandado de segu-
tegral do débito, nos termos do rança, desde que ajuizados ante-
artigo 151, inciso II, do CTN. riormente à execução fiscal, têm
o condão de impedir a lavratura
do auto de infração, assim como
de coibir o ato de inscrição em
dívida ativa e o ajuizamento da
execução fiscal, a qual, acaso
proposta, deverá ser extinta.

381
Maria Cecília de Araujo Asperti

272 Questiona-se a higidez do O comerciante de boa-fé que ad- REsp 1148444/MG 14/04/2010
aproveitamento de crédito de quire mercadoria, cuja nota fiscal
ICMS, realizado pelo adqui- (emitida pela empresa vendedora)
rente de boa-fé, no que pertine posteriormente seja declarada ini-
às operações de circulação de dônea, pode engendrar o aprovei-
mercadorias cujas notas fiscais tamento do crédito do ICMS pelo
(emitidas pela empresa vende- princípio da não-cumulatividade,
dora) tenham sido, posterior- uma vez demonstrada a veracida-
mente, declaradas inidôneas, à de da compra e venda efetuada,
luz do disposto no artigo 23, da porquanto o ato declaratório da
Lei Complementar 87/96. inidoneidade somente produz
efeitos a partir de sua publicação.
273 Questão referente à possibili- A Fazenda Pública, quer em ação REsp 1123306/SP 09/12/2009
dade de expedição de certidão anulatória, quer em execução em-
de regularidade fiscal a pes- bargada, faz jus à expedição da
soa jurídica de direito público certidão positiva de débito com
quando ajuizada ação antiexa- efeitos negativos, independente-
cional (embargos à execução mente de penhora, posto inexpro-
fiscal ou ação anulatória), na priáveis os seus bens.
ausência de penhora ou causa
de suspensão de exigibilidade
prevista no art. 151 do CTN.
274 Questão referente à incidên- O arrendamento mercantil, con- REsp 1131718/SP 24/03/2010
cia do ICMS sobre a importa- tratado pela indústria aeronáu-
ção de aeronave sob o regime tica de grande porte para viabi-
de arrendamento simples (le- lizar o uso, pelas companhias de
asing operacional). navegação aérea, de aeronaves
por ela construídas, não constitui
operação relativa à circulação de
mercadoria sujeita à incidência
do ICMS.
275 Questão referente à possibili- As leis tributárias procedimen- REsp 1134665/SP 25/11/2009
dade da aplicação retroativa da tais ou formais, conducentes à
Lei Complementar 105/2001 constituição do crédito tributário
(que revogou o artigo 38, da Lei não alcançado pela decadência,
4.595/64, que condicionava a são aplicáveis a fatos pretéritos,
quebra do sigilo bancário à ob- razão pela qual a Lei 8.021/90 e
tenção de autorização judicial) a Lei Complementar 105/2001,
para fins de viabilização da cons- por envergarem essa natureza, le-
tituição do crédito tributário. gitimam a atuação fiscalizatória/
investigativa da Administração
Tributária, ainda que os fatos
imponíveis a serem apurados lhes
sejam anteriores.
276 Questão referente ao direito A aquisição de matéria-prima e/ REsp 1134903/SP 09/06/2010
de creditamento de IPI, no ou insumo não tributados ou su-
momento da saída de produto jeitos à alíquota zero, utilizados
tributado do estabelecimento na industrialização de produto
industrial, no que pertine às tributado pelo IPI, não enseja di-
operações de aquisição de ma- reito ao creditamento do tributo
téria-prima ou insumo isento, pago na saída do estabelecimento
não tributado. industrial.

382
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

277 Questão referente ao direito A aquisição de matéria-prima e/ REsp 1134903/SP 09/06/2010


de creditamento de IPI, no ou insumo não tributados ou su-
momento da saída de produto jeitos à alíquota zero, utilizados
tributado do estabelecimento na industrialização de produto
industrial, no que pertine às tributado pelo IPI, não enseja
operações de aquisição de ma- direito ao creditamento do tri-
téria-prima ou insumo sujeito buto pago na saída do estabele-
à alíquota zero. cimento industrial.
278 Questiona-se a legitimidade O ICMS incide sobre o forneci- REsp 1135534/PE 09/12/2009
da incidência da base de cálcu- mento de alimentação e bebidas
lo de ICM sobre o valor total em bares, restaurantes e estabe-
das operações de fornecimento lecimentos congêneres, cuja base
de alimentação e bebidas por de cálculo compreende o valor
bares, restaurantes e similares. total das operações realizadas, in-
clusive aquelas correspondentes à
prestação de serviço.
279 Questiona-se a inclusão ou não A base de cálculo do PIS e da REsp 1141065/SC 09/12/2009
das quantias recebidas a título COFINS, independentemente do
de pagamento de salários e en- regime normativo aplicável (Leis
cargos sociais dos trabalhado- Complementares 7/70 e 70/91
res na base de cálculo da con- ou Leis ordinárias 10.637/2002 e
tribuição social destinada ao 10.833/2003), abrange os valores
PIS e da COFINS devidas por recebidos pelas empresas presta-
empresas que, além da presta- doras de serviços de locação de
ção de serviço de locação de mão de obra temporária (regidas
mão-de-obra temporária (Lei pela Lei 6.019/1974 e pelo Decreto
6.019/74), exercem a atividade 73.841/1974), a título de pagamen-
de prestação de serviços espe- to de salários e encargos sociais
cializados de limpeza, portaria, dos trabalhadores temporários.
conservação, transporte, te-
lefonista, jardinagem, dentre
outros, fornecidos na forma de
mão-de-obra terceirizada.
280 Questão referente à incidência A eventual improdutividade do REsp 1116364/PI 26/05/2010
de juros compensatórios nas imóvel não afasta o direito aos
desapropriações para fins de juros compensatórios, pois esses
reforma agrária quando impro- restituem não só o que o expro-
dutivo o imóvel. priado deixou de ganhar com a
perda antecipada, mas também a
expectativa de renda, consideran-
do a possibilidade do imóvel ser
aproveitado a qualquer momento
de forma racional e adequada, ou
até ser vendido com o recebimen-
to do seu valor à vista.
281 Questão referente à incidência São indevidos juros compensa- REsp 1116364/PI 26/05/2010
de juros compensatórios nas tórios quando a propriedade se
desapropriações para fins de mostrar impassível de qualquer
reforma agrária quando impro- espécie de exploração econômica
dutivo o imóvel. seja atual ou futura, em decorrên-
cia de limitações legais ou da situ-
ação geográfica ou topográfica do
local onde se situa a propriedade.

383
Maria Cecília de Araujo Asperti

282 Questão referente à incidência Para aferir a incidência dos juros REsp 1116364/PI 26/05/2010
de juros compensatórios nas compensatórios em imóvel impro-
desapropriações para fins de dutivo, deve ser observado o prin-
reforma agrária quando impro- cípio do tempus regit actum, assim
dutivo o imóvel. como acontece na fixação do per-
centual desses juros. As restrições
contidas nos §§ 1º e 2º do art. 15-
A, inseridas pelas MP's n. 1.901-
30/99 e 2.027-38/00 e reedições, as
quais vedam a incidência de juros
compensatórios em propriedade
improdutiva, serão aplicáveis, tão
somente, às situações ocorridas
após a sua vigência.
283 Questão referente à incidência Para aferir a incidência dos juros REsp 1116364/PI 26/05/2010
de juros compensatórios nas compensatórios em imóvel im-
desapropriações para fins de produtivo, deve ser observado o
reforma agrária quando impro- princípio do tempus regit actum,
dutivo o imóvel. assim como acontece na fixação
do percentual desses juros. Pu-
blicada a medida liminar conce-
dida na ADI 2.332/DF (DJU de
13.09.2001), deve ser suspensa
a aplicabilidade dos §§ 1º e 2º
do artigo 15-A do Decreto-lei n.
3.365/41 até que haja o julgamen-
to de mérito da demanda.
284 Questão referente à possibi- O descumprimento das providên- REsp 1008667/PR 18/11/2009
lidade de reconhecimento ex cias enumeradas no caput do art.
officio da ausência de cópia da 526 do CPC, adotáveis no prazo
petição do agravo de instru- de três dias, somente enseja as
mento, do comprovante de sua consequências dispostas em seu
interposição, assim como da parágrafo único se o agravado
relação dos documentos que suscitar a questão formal no mo-
instruíram o recurso, nos ter- mento processual oportuno, sob
mos do art. 526 do CPC. pena de preclusão.
285 Questão referente à validade da A ausência ou o equívoco quanto REsp 1131805/SC 03/03/2010
intimação na qual, malgrado ao número da inscrição do advo-
conste o nome correto do ad- gado na Ordem dos Advogados
vogado, há equívoco quanto ao do Brasil - OAB não gera nuli-
número de inscrição na OAB. dade da intimação da sentença,
máxime quando corretamente
publicados os nomes das partes
e respectivos patronos, informa-
ções suficientes para a identifica-
ção da demanda.

384
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

286 Questão referente à validade da A ausência ou o equívoco quanto REsp 1131805/SC 03/03/2010
intimação na qual, malgrado ao número da inscrição do advo-
conste o nome correto do ad- gado na Ordem dos Advogados
vogado, há equívoco quanto ao do Brasil - OAB não gera nuli-
número de inscrição na OAB. dade da intimação da sentença,
máxime quando corretamente
publicados os nomes das partes
e respectivos patronos, informa-
ções suficientes para a identifica-
ção da demanda. Nada obstante,
é certo que a existência de homo-
nímia torna relevante o equívoco
quanto ao número da inscrição na
OAB, uma vez que a parte é in-
duzida em erro, sofrendo prejuízo
imputável aos serviços judiciários.
287 Questão referente à alegada É legítima a penhora da sede do REsp 1114767/RS 02/12/2009
impenhorabilidade absoluta de estabelecimento comercial.
bem imóvel, sede da empresa
individual executada, por for-
ça do disposto no artigo 649,
V, do CPC.
288 Questiona-se a possibilidade É admissível o ajuizamento de no- REsp 1116287/SP 02/12/2009
de ajuizamento de novos em- vos embargos de devedor, ainda
bargos à execução restritos que nas hipóteses de reforço ou
aos aspectos formais de nova substituição da penhora, quando a
penhora efetuada. discussão adstringir-se aos aspectos
formais do novo ato constritivo.
289 Questiona-se a configuração A renúncia ao crédito exequendo REsp 1143471/PR 03/02/2010
de renúncia tácita na hipótese remanescente, com a consequente
em que a exeqüente, intimada extinção do processo satisfativo,
a se manifestar pela satisfação reclama prévia intimação, vedada
integral do crédito exeqüendo a presunção de renúncia tácita.
ou pelo prosseguimento da
execução de sentença, queda-
-se inerte, dando azo à extin-
ção do processo, com arrimo
no artigo 794, I, do CPC.
293 Questão referente à aplicação O repasse econômico do PIS e da REsp 976836/RS 25/08/2010
do art. 42, § único, do CDC à COFINS realizados pelas empresas
hipótese de repetição dos valo- concessionárias de serviços de tele-
res indevidamente repassados comunicação é legal e condiz com
ao consumidor, nas contas de as regras de economia e de mercado.
telefone, a título de PIS/CO-
FINS, pelas concessionárias de
serviços de telecomunicações.

385
Maria Cecília de Araujo Asperti

294 Questão referente à possibili- A compensação efetuada pelo REsp 1008343/SP 09/12/2009
dade de alegação da compen- contribuinte, antes do ajuizamen-
sação nos embargos à execu- to do feito executivo, pode figurar
ção, em decorrência do adven- como fundamento de defesa dos
to da Lei n.º 8.383/91, desde embargos à execução fiscal, a fim
que se trate de crédito líquido de ilidir a presunção de liquidez e
e certo, como o resultante de certeza da CDA, máxime quan-
declaração de inconstitucio- do, à época da compensação, res-
nalidade da exação, bem como taram atendidos os requisitos da
quando existente lei específica existência de crédito tributário
permissiva da compensação. compensável, da configuração do
indébito tributário, e da existên-
cia de lei específica autorizativa
da citada modalidade extintiva
do crédito tributário.
295 Cinge-se a controvérsia sobre Na restituição do indébito tribu- REsp 1133815/SP 09/12/2009
a taxa de juros de mora a ser tário, os juros de mora são devi-
aplicada na repetição de in- dos, à razão de 1% ao mês, con-
débito da contribuição previ- forme estabelecido no artigo 161,
denciária estadual cobrada de § 1º, do CTN, não prevalecendo
inativos entre a EC 20/98 e a o disposto no artigo 1º-F da Lei
edição da Lei Complementar 9.494/97, acrescentado pela MP
Paulista n.º 954/03, se o art. 2.180-35/01.
1º-F da Lei 9.494/97, como en-
tendeu o aresto recorrido, ou o
art. 161 c/c 167, parágrafo úni-
co, do CTN, como afirmam os
recorrentes.
297 Questiona-se a inexistência A prova exclusivamente testemu- REsp 1133863/RN 13/12/2010
do início de prova material nhal não basta à comprovação da
a corroborar os testemunhos atividade rurícola, para efeito da
apresentados, impossibilitan- obtenção de benefício previden-
do, desta forma, o reconheci- ciário.
mento do trabalho rural, nos
termos da Súmula 149 do STJ.

386
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

303 Questão referente aos índices Quanto ao Plano Collor I (mar- REsp 1147595/RS 08/09/2010
aplicáveis para apuração de di- ço/1990), é de 84,32% fixado
ferenças de correção monetária com base no índice de Preços ao
de valores depositados em Ca- Consumidor (IPC), conforme
dernetas de Poupança, decor- disposto nos arts. 10 e 17, III, da
rentes de Planos Econômicos. Lei 7.730/89, o índice a ser aplica-
do no mês de março de 1990 aos
ativos financeiros retidos até o
momento do respectivo aniversá-
rio da conta; ressalva-se, contudo,
que devem ser atualizados pelo
BTN Fiscal os valores excedentes
ao limite estabelecido em NCz$
50.000,00, que constituíram
conta individualizada junto ao
BACEN, assim como os valores
que não foram transferidos para
o BACEN, para as cadernetas
de poupança que tiveram os pe-
ríodos aquisitivos iniciados após
a vigência da Medida Provisória
168/90 e nos meses subsequentes
ao seu advento (abril, maio e ju-
nho de 1990).
304 Questão referente aos índices Quanto ao Plano Collor II, é de REsp 1147595/RS 08/09/2010
aplicáveis para apuração de di- 20,21%* o índice de correção mo-
ferenças de correção monetária netária a ser aplicado no mês de
de valores depositados em Ca- março de 1991, nas hipóteses em
dernetas de Poupança, decor- que já iniciado o período mensal
rentes de Planos Econômicos. aquisitivo da caderneta de pou-
pança quando do advento do Pla-
no, pois o poupador adquiriu o di-
reito de ter o valor aplicado remu-
nerado de acordo com o disposto
na Lei n. 8.088/90, não podendo
ser aplicado o novo critério de
remuneração previsto na Medida
Provisória n. 294, de 31.1.1991,
convertida na Lei n. 8.177/91.
305 Discussão acerca da legitimidade A Brasil Telecom S/A, como suces- REsp 1034255/RS 28/04/2010
passiva da Brasil Telecom S/A sora por incorporação da Compa-
para responder pelas ações não nhia Riograndense de Telecomu-
subscritas da Companhia Rio- nicações (CRT), tem legitimidade
grandense de Telecomunicações. passiva para responder pela com-
plementação acionária decorrente
de contrato de participação finan-
ceira, celebrado entre adquirente
de linha telefônica e a incorporada.

387
Maria Cecília de Araujo Asperti

306 Discussão acerca da legi- A legitimidade da Brasil Telecom REsp 1034255/RS 28/04/2010
timidade passiva da Brasil S/A para responder pela chamada
Telecom S/A para responder 'dobra acionária', relativa às ações
pelas ações não subscritas da da Celular CRT Participações
Companhia Riograndense de S/A, decorre do protocolo e da
Telecomunicações, bem como justificativa de cisão parcial da
do prazo prescricional para se Companhia Riograndense de Te-
pleitear o pagamento dos di- lecomunicações (CRT), premissa
videndos relativos às ações a fática infensa à análise do STJ por
serem indenizadas. força das Súmulas 5 e 7.
307 Discussão acerca da legi- É devida indenização a título de REsp 1034255/RS 28/04/2010
timidade passiva da Brasil dividendos ao adquirente de li-
Telecom S/A para responder nha telefônica, como decorrência
pelas ações não subscritas da lógica da procedência do pedido
Companhia Riograndense de de complementação das ações da
Telecomunicações, bem como CRT/Celular CRT, a contar do
do prazo prescricional para se ano da integralização do capital.
pleitear o pagamento dos di-
videndos relativos às ações a
serem indenizadas.
308 Discussão acerca da legi- A pretensão de cobrança de inde- REsp 1112474/RS 28/04/2010
timidade passiva da Brasil nização decorrente de dividendos
Telecom S/A para responder relativos à subscrição comple-
pelas ações não subscritas da mentar das ações da CRT/Celular
Companhia Riograndense de CRT prescreve em três anos, nos
Telecomunicações, bem como termos do art. 206, § 3º, inciso III,
do prazo prescricional para se do Código Civil de 2002, somen-
pleitear o pagamento dos di- te começando a correr tal prazo
videndos relativos às ações a após o reconhecimento do direito
serem indenizadas. à complementação acionária.
309 Discussão acerca da legi- A pretensão de cobrança de inde- REsp 1112474/RS 28/04/2010
timidade passiva da Brasil nização decorrente de dividendos
Telecom S/A para responder relativos à subscrição comple-
pelas ações não subscritas da mentar das ações da CRT/Celular
Companhia Riograndense de CRT prescreve em três anos, nos
Telecomunicações, bem como termos do art. 206, § 3º, inciso III,
do prazo prescricional para se do Código Civil de 2002, somen-
pleitear o pagamento dos di- te começando a correr tal prazo
videndos relativos às ações a após o reconhecimento do direito
serem indenizadas. à complementação acionária.
310 Controvérsia subjacente diz Prescreve em 20 (vinte) anos, na REsp 1063661/RS 24/02/2010
respeito ao prazo de prescri- vigência do Código Civil de 1916,
ção para a cobrança de inves- e em 5 (cinco) anos, na vigência
timento feito por usuário em do Código Civil de 2002, a pre-
rede de eletrificação rural. tensão de cobrança dos valores
aportados para a construção de
rede de eletrificação rural, poste-
riormente incorporada ao patri-
mônio da CEEE/RGE, respeitada
a regra de transição prevista no
art. 2.028 do Código Civil de
2002.

388
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

311 Controvérsia subjacente diz Prescreve em 20 (vinte) anos, na REsp 1063661/RS 24/02/2010
respeito ao prazo de prescri- vigência do Código Civil de 1916,
ção para a cobrança de inves- e em 5 (cinco) anos, na vigência
timento feito por usuário em do Código Civil de 2002, a preten-
rede de eletrificação rural. são de cobrança dos valores apor-
tados para a construção de rede de
eletrificação rural, posteriormente
incorporada ao patrimônio da
CEEE/RGE, respeitada a regra de
transição prevista no art. 2.028 do
Código Civil de 2002.
312 Controvérsia subjacente diz É devida a restituição de valores REsp 1119300/RS 14/04/2010
respeito a restituição das parce- vertidos por consorciado de-
las pagas em consórcio em caso sistente ao grupo de consórcio,
de desfazimento do contrato. mas não de imediato, e sim em
até trinta dias a contar do prazo
previsto contratualmente para o
encerramento do plano.
314 Questão referente à viabilida- A inércia da Fazenda exequente, REsp 1120097/SP 13/10/2010
de da extinção ex officio do ante a intimação regular para
processo de execução fiscal promover o andamento do feito
não embargada, com base no e a observância dos artigos 40
art. 267, III, do CPC, restando e 25 da Lei de Execução Fiscal,
afastado o Enunciado Sumular implica a extinção da execução
240 do STJ. fiscal não embargada ex officio,
afastando-se o Enunciado Su-
mular 240 do STJ, segundo o
qual 'A extinção do processo, por
abandono da causa pelo autor,
depende de requerimento do réu'.
Matéria impassível de ser alegada
pela exequente contumaz.
315 Questão referente à inexis- A parte autora pode eleger apenas REsp 1145146/RS 09/12/2009
tência de litisconsórcio pas- um dos devedores solidários para
sivo necessário entre a União figurar no pólo passivo da deman-
e a Eletrobrás, em demanda da. (...) A possibilidade de escolha
que versa sobre questões rela- de um dos devedores solidários
tivas ao empréstimo compul- afasta a figura do litisconsórcio
sório de energia elétrica, em compulsório ou necessário.
face da faculdade de o contri-
buinte eleger apenas um dos
devedores solidários.
316 Questão referente à incidência A incidência do duplo grau de REsp 1144079/SP 02/03/2011
ou não da modificação do art. jurisdição obrigatório é imperiosa
475 do CPC, promovida pela quando a resolução do processo
Lei 10.352/2001, que limitou cognitivo for anterior à reforma
o cabimento da remessa oficial engendrada pela Lei 10.352/2001.
apenas às decisões desfavorá-
veis à Fazenda Pública que se-
jam superiores a 60 (sessenta)
salários mínimos.

389
Maria Cecília de Araujo Asperti

317 Questão referente à definição O devedor não tem assegurado o REsp 1120276/PA 09/12/2009
do foro competente para o direito de ser executado no foro
ajuizamento da execução fis- de seu domicílio, salvo se nenhu-
cal, à luz do art. 578 do CPC. ma das espécies do parágrafo úni-
co se verificar.
318 Discute-se a aplicação do pra- O prazo prescricional para ação REsp 1110321/DF 28/04/2010
zo prescricional previsto no ajuizada para reaver o quantum
Decreto-Lei n. 20.910/32. pago a maior, em decorrência da
majoração da tarifa de energia
elétrica pelas Portarias 38/86 e
45/86, é de 20 anos.
319 Discute-se a ilegalidade das A majoração da tarifa de energia REsp 1110321/DF 28/04/2010
Portarias do DNAEE n. 38/86 elétrica estabelecida pelas Porta-
e 45/86 e, de 4/3/1986, que ma- rias do DNAEE 38/86 e 45/86 é
joraram as tarifas de energia ilegítima, por terem desrespeitado
elétrica quando da vigência do o congelamento de preços insti-
Plano Cruzado, que instituiu o tuído pelo cognominado 'Plano
congelamento de todos os pre- Cruzado'. Ressalta-se, todavia, a
ços públicos e privados. legalidade dos reajustes das tari-
fas ocorridos a partir da vigência
da Portaria 153/86, de 27.11.86,
editada quando não mais vigiam
os referidos diplomas legais. (...) A
ilegalidade da majoração da tarifa
de energia elétrica estabelecida
pelas Portarias 38/86 e 45/86 deve
ser aferida da seguinte forma:
a) aos consumidores industriais
atingidos pelo congelamento,
devesse-lhes reconhecer o direito
à repetição da tarifa majorada, e;
b) aos consumidores residenciais
não assiste o direito à repetição.
320 Questiona-se a possibilidade É inadmissível a conversão, de REsp 1129938/PE 28/09/2011
de conversão, ex officio, de ofício ou a requerimento das par-
ação executiva que não preen- tes, da execução em ação monitó-
che os requisitos de certeza, li- ria após ter ocorrido a citação.
quidez e exigibilidade em ação
monitória.
321 Questiona-se a natureza jurí- O prazo do art. 284 do Código de REsp 1133689/PE 28/03/2012
dica do prazo estabelecido no Processo Civil não é peremptório,
art. 284 do Código de Processo mas dilatório, ou seja, pode ser
Civil, à luz da hipótese de justa reduzido ou ampliado por con-
causa prevista no art. 183 do venção das partes ou por determi-
mesmo diploma legal. nação do juiz.
322 Questiona-se a fixação de um Para fins de complementação pela REsp 1101015/BA 26/05/2010
VMAA nacional, a partir do União ao Fundo de Manutenção
menor valor encontrado em e Desenvolvimento do Ensino
cada Estado ou no Distrito Fe- Fundamental - FUNDEF (art. 60
deral, porquanto o FUNDEF do ADCT, redação da EC 14/96),
tem natureza de fundo regional. o 'valor mínimo anual por aluno'
(VMAA), de que trata o art. 6º, § 1º
da Lei 9.424/96, deve ser calculado
levando em conta a média nacional.

390
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

323 Questão referente à possibili- O Fundo de Compensação de REsp 1133769/RN 25/11/2009


dade, ou não, da segunda qui- Variações Salariais - FCVS é res-
tação do saldo residual relativo ponsável pela quitação do saldo
a contrato de financiamento residual de segundo financiamen-
para aquisição de residência to nos contratos celebrados até
própria, entabulado pelas re- 05.12.1990, ante a ratio essendi
gras do Sistema Financeiro da do art. 3º da Lei 8.100/90, com
Habitação - SFH, com a utili- o redação conferida pela Lei n
zação de recursos provenientes 10.150, de 21.12.2001.
do Fundo de Compensação de
Variações Salariais - FCVS,
nos termos da Leis 4.380/64,
8.004/99 e 8.100/99.
324 Cinge-se a controvérsia sobre É de cinco anos o prazo decaden- REsp 1115078/RS 24/03/2010
o prazo prescricional para a cial para se constituir o crédito
cobrança de multa administra- decorrente de infração à legisla-
tiva por infração à legislação ção administrativa.
do meio ambiente aplicada por
órgão ou entidade da Adminis-
tração Pública Federal, direta
ou indireta: se quinquenal,
nos termos do art. 1º do De-
creto 20.910/32, ou vintenária,
segundo o art. 177 do Código
Civil de 1916.
325 Cinge-se a controvérsia sobre O prazo decadencial para consti- REsp 1115078/RS 24/03/2010
o prazo prescricional para a tuição do crédito decorrente de in-
cobrança de multa administra- fração à legislação administrativa
tiva por infração à legislação 'conta-se da data da infração', 'caso
do meio ambiente aplicada por se trate de ilícito instantâneo'.
órgão ou entidade da Adminis-
tração Pública Federal, direta
ou indireta: se quinquenal,
nos termos do art. 1º do De-
creto 20.910/32, ou vintenária,
segundo o art. 177 do Código
Civil de 1916.
326 Cinge-se a controvérsia sobre O prazo decadencial para cons- REsp 1115078/RS 24/03/2010
o prazo prescricional para a tituição do crédito decorrente de
cobrança de multa administra- infração à legislação administra-
tiva por infração à legislação tiva, 'no caso de infração perma-
do meio ambiente aplicada por nente ou continuada, conta-se do
órgão ou entidade da Adminis- dia em que tiver cessado' o ilícito.
tração Pública Federal, direta
ou indireta: se quinquenal,
nos termos do art. 1º do De-
creto 20.910/32, ou vintenária,
segundo o art. 177 do Código
Civil de 1916.

391
Maria Cecília de Araujo Asperti

327 Cinge-se a controvérsia sobre Interrompe-se o prazo decadencial REsp 1115078/RS 24/03/2010
o prazo prescricional para a para a constituição do crédito de-
cobrança de multa administra- corrente de infração à legislação
tiva por infração à legislação administrativa: a) pela notificação
do meio ambiente aplicada por ou citação do indiciado ou execu-
órgão ou entidade da Adminis- tado, inclusive por meio de edital;
tração Pública Federal, direta b) por qualquer ato inequívoco,
ou indireta: se quinquenal, que importe apuração do fato; pela
nos termos do art. 1º do De- decisão condenatória recorrível;
creto 20.910/32, ou vintenária, por qualquer ato inequívoco que
segundo o art. 177 do Código importe em manifestação expressa
Civil de 1916. de tentativa de solução conciliató-
ria no âmbito interno da adminis-
tração pública federal.
328 Cinge-se a controvérsia sobre É de três anos o prazo para a con- REsp 1115078/RS 24/03/2010
o prazo prescricional para a clusão do processo administrativo
cobrança de multa administra- instaurado para se apurar a infra-
tiva por infração à legislação ção administrativa ('prescrição
do meio ambiente aplicada por intercorrente').
órgão ou entidade da Adminis-
tração Pública Federal, direta
ou indireta: se quinquenal,
nos termos do art. 1º do De-
creto 20.910/32, ou vintenária,
segundo o art. 177 do Código
Civil de 1916.
329 Cinge-se a controvérsia sobre Prescreve em cinco anos, contados REsp 1115078/RS 24/03/2010
o prazo prescricional para a do término do processo administra-
cobrança de multa administra- tivo, a pretensão da Administração
tiva por infração à legislação Pública de promover a execução da
do meio ambiente aplicada por multa por infração ambiental.
órgão ou entidade da Adminis-
tração Pública Federal, direta
ou indireta: se quinquenal,
nos termos do art. 1º do De-
creto 20.910/32, ou vintenária,
segundo o art. 177 do Código
Civil de 1916.
330 Cinge-se a controvérsia sobre O termo inicial do prazo prescri- REsp 1115078/RS 24/03/2010
o prazo prescricional para a cional para o ajuizamento da ação
cobrança de multa administra- executória 'é a constituição defi-
tiva por infração à legislação nitiva do crédito, que se dá com
do meio ambiente aplicada por o término do processo adminis-
órgão ou entidade da Adminis- trativo de apuração da infração e
tração Pública Federal, direta constituição da dívida'.
ou indireta: se quinquenal,
nos termos do art. 1º do De-
creto 20.910/32, ou vintenária,
segundo o art. 177 do Código
Civil de 1916.

392
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

331 Cinge-se a controvérsia sobre São causas de interrupção do pra- REsp 1115078/RS 24/03/2010
o prazo prescricional para a zo prescricional: a) o despacho
cobrança de multa administra- do juiz que ordenar a citação em
tiva por infração à legislação executivo fiscal; b) o protesto ju-
do meio ambiente aplicada por dicial; c) qualquer ato judicial que
órgão ou entidade da Adminis- constitua em mora o devedor; d)
tração Pública Federal, direta qualquer ato inequívoco, ainda
ou indireta: se quinquenal, que extrajudicial, que importe em
nos termos do art. 1º do De- reconhecimento do débito pelo
creto 20.910/32, ou vintenária, devedor; e) qualquer ato inequívo-
segundo o art. 177 do Código co que importe em manifestação
Civil de 1916. expressa de tentativa de solução
conciliatória no âmbito interno da
administração pública federal.
332 Questiona-se o afastamento da A transferência de domínio útil REsp 1165276/PE 12/12/2012
cobrança de laudêmio, na hi- de imóvel para integralização de
pótese de transferência do do- capital social de empresa é ato
mínio útil de imóvel da União, oneroso, de modo que é devida a
situado em terreno de marinha, cobrança de laudêmio, nos termos
para fins de integralização do do art. 3º do Decreto-Lei 2.398/87.
capital social de empresa.
333 Questão referente à possibilida- Na oportunidade da liquidação REsp 959338/SP 29/02/2012
de de juntada de documentos da sentença, por se tratar de re-
destinados à apuração do quan- conhecimento de crédito-prêmio
tum debeatur relativo ao benefí- de IPI, a parte deverá apresentar
cio do crédito prêmio do IPI, em toda a documentação suficientes
fase de liquidação de sentença. à comprovação da efetiva opera-
ção de exportação, bem como do
ingresso de divisas no País, sem o
que não se habilita à fruição do
benefício, mesmo estando ele re-
conhecido na sentença.

393
Maria Cecília de Araujo Asperti

334 Questiona se a responsabiliza- Também merece provimento REsp 1153119/MG 24/11/2010


ção pessoal dos sócios por dé- quanto à matéria de fundo, que
bitos previdenciários das socie- trata da responsabilidade dos só-
dades por quotas de responsa- cios em face do disposto no art.
bilidade limitada, com base no 13 da Lei 8.620/93. Na vigência
art. 13 da Lei 8.620/93, deve de tal dispositivo (posteriormente
ficar subordinada à verificação revogado de modo expresso pelo
das condições estabelecidas no art. 79, VII, da Lei 11.941/09), já
art. 135, III, do CTN. havia entendimento desta 1ª Se-
ção segundo o qual, mesmo em
se tratando de débitos para com a
Seguridade Social, a responsabili-
dade pessoal dos sócios das socie-
dades por quotas de responsabili-
dade limitada, prevista no art. 13
da Lei 8.620/93, só existe, quando
presentes as condições estabeleci-
das no art. 135, III do CTN. Há,
todavia uma razão superior, mais
importante que todas as outras, a
justificar a inexistência da respon-
sabilidade do sócio, em casos da
espécie: o STF, no julgamento do
RE 562.276, ocorrido em 03.11.10,
relatora a Ministra Ellen Gracie
(acórdão pendente de publicação),
declarou a inconstitucionalidade
do art. 13 da Lei 8.620/93, tanto
por vício formal (violação ao art.
146, III, da Constituição Federal),
como por vício material (violação
aos arts.. 5º, XIII, e 170, parágrafo
único, da Constituição Federal.
O julgamento do recurso extra-
ordinário se deu sob o regime do
art. 543-B do CPC, o que confe-
re especial eficácia vinculativa ao
precedente e impõe sua adoção
imediata em casos análogos, como
o aqui em exame.
335 Questiona-se se, na vigência da A partir da vigência do art. 31 REsp 1131047/MA 24/11/2010
Lei 9.711/98, a responsabilidade da Lei 8.212/91, com a redação
das empresas cedentes de mão- dada pela Lei 9.711/98, a empresa
-de-obra pelo recolhimento das contratante é responsável, com
contribuições previdenciárias exclusividade, pelo recolhimento
nos casos em que as empresas da contribuição previdenciária
tomadoras não realizem a reten- por ela retida do valor bruto da
ção e o pagamento ou o efetuem nota fiscal ou fatura de prestação
em valor menor que o devido. de serviços, afastada, em relação
ao montante retido, a responsabi-
lidade supletiva da empresa pres-
tadora, cedente de mão-de-obra.

394
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

336 Cinge-se a discussão em saber A simples declaração de compen- REsp 1157847/PE 24/03/2010
se a declaração de compensação sação relativa ao crédito-prêmio
relativa ao crédito-prêmio de IPI de IPI não suspende a exigibilida-
suspende, ou não, a exigibili- de do crédito tributário - a menos
dade do crédito para efeitos de que esteja presente alguma outra
expedição de certidão positiva causa de suspensão elencada no
com efeitos de negativa. art. 151 do CTN - , razão por-
que poderá a Fazenda Nacional
recusar-se a emitir a certidão de
regularidade fiscal.
337 Questão referente ao reconhe- O interesse de agir se caracteri- REsp 1121023/SP 23/06/2010
cimento do direito de efetuar a za pelos entraves rotineiramente
compensação de tributos inde- opostos pela Secretaria da Re-
vidamente recolhidos a título de ceita Federal àquele que postula
PIS com parcelas vincendas do a compensação tributária dos
próprio PIS e de outras contri- valores indevidamente recolhidos
buições arrecadadas pela Recei- a maior a título de PIS, sem as
ta Federal, decidiu pela ausência exigências que são impostas pela
de interesse de agir do impetran- legislação de regência, notada-
te, tendo em vista a edição da mente em relação ao critérios que
Instrução Normativa n. 21/97, envolvem o encontro de contas,
que eliminou quaisquer óbices à à aplicação de expurgos infla-
compensação tributária. cionários no cálculo da correção
monetária dos valores a serem
repetidos, à incidência de juros
moratórios e compensatórios,
bem como à definição do prazo
prescricional para o exercício do
direito à compensação, conside-
rando, em especial, o disposto no
artigo 3º da Lei Complementar
n. 118/2005. Assim, é inegável a
necessidade do contribuinte bus-
car tutela jurisdicional favorável,
a fim de proteger seu direito de
exercer o pleno exercício da com-
pensação de que trata o art. 66 da
Lei 8.383/91, sem que lhe fosse
impingidos os limites previstos
nas normas infralegais pela auto-
ridade administrativa.
338 Questão relativa à incidência O auxílio-creche funciona como REsp 1146772/DF 24/02/2010
de contribuição previdenciária indenização, não integrando o
sobre os valores recebidos a tí- salário-de-contribuição para a
tulo de auxílio-creche. Previdência. Inteligência da Sú-
mula 310/STJ.
339 Questiona a legitimidade do A liberação do veículo retido por REsp 1144810/MG 10/03/2010
ato que condiciona a libera- transporte irregular de passagei-
ção de veículo apreendido ros, com base no art. 231, VIII,
por transporte irregular de do Código de Trânsito Brasileiro,
passageiros ao pagamento de não está condicionada ao paga-
multas e de demais despesas mento de multas e despesas.
(Lei 9503/97, art. 231, VIII, c/c
Decreto 2521/98, art. 85, § 3º).

395
Maria Cecília de Araujo Asperti

340 Controvérsia sobre os limites Não é possível a cobrança da REsp 1118893/MG 23/03/2011
objetivos da coisa julgada, da- Contribuição Social sobre o Lu-
das as alterações legislativas cro (CSLL) do contribuinte que
posteriores ao trânsito em jul- tem a seu favor decisão judicial
gado de sentença declaratória transitada em julgado declarando
de inexistência de relação a inconstitucionalidade formal
jurídica tributária no tocante e material da exação conforme
à Contribuição Social sobre o concebida pela Lei 7.689/88, as-
Lucro Líquido instituída pela sim como a inexistência de rela-
Lei 7.689/88. ção jurídica material a seu reco-
lhimento. O fato de o Supremo
Tribunal Federal posteriormente
manifestar-se em sentido oposto
à decisão judicial transitada em
julgado em nada pode alterar a
relação jurídica estabilizada pela
coisa julgada, sob pena de negar
validade ao próprio controle difu-
so de constitucionalidade.
341 Questão referente à exclusão Em se tratando de ato que impede REsp 1124507/MG 28/04/2010
da sociedade empresária do a permanência da pessoa jurídi-
regime de recolhimento de tri- ca no SIMPLES em decorrência
butos denominado SIMPLES da superveniência de situação
deve produzir efeitos a partir impeditiva prevista no artigo 9º,
do mês subsequente à situa- incisos III a XIV e XVII a XIX,
ção excludente e não apenas a da Lei 9.317/1996, seus efeitos
partir da intimação do contri- são produzidos a partir do mês
buinte ou da data constante do subsequente à data da ocorrência
ato declaratório da exclusão. da circunstância excludente, nos
exatos termos do artigo 15, inciso
II, da mesma lei.
342 Questão referente à legalida- Não há ilegalidade no artigo 41 REsp 1127610/MG 23/06/2010
de da imposição do Decreto do Decreto n. 332/91, consonan-
332/91 no sentido de não admi- te com a Lei n. 8.200/1, artigo 1º,
tir a exclusão da parcela relati- que, ao cuidar da correção mone-
va à diferença entre o BTNF tária de balanço relativamente ao
e o IPC da base de cálculo da ano-base de 1990, limitou-se ao
CSLL, apesar de ser admitida IRPJ, não estendendo a previsão
tal exclusão da base de cálculo legal à CSLL.
do imposto de renda.
343 Questão referente à isenção de Nas ações em que representa o REsp 1151364/PE 24/02/2010
custas em favor da CEF, esta- FGTS, a CEF, quando sucumben-
belecida pelo art. 24-A da MP te, não está isenta de reembolsar
1984-23, não a desobriga de as custas antecipadas pela parte
ressarcir as custas adiantadas vencedora.
pelo autor da ação.
344 Questão referente ao cabimen- O especialíssimo procedimento REsp 1163643/SP 24/03/2010
to da dispensa da defesa prévia estabelecido na Lei 8.429/92, que
em ação de improbidade admi- prevê um juízo de delibação para
nistrativa, prevista no art. 17, recebimento da petição inicial
§ 7º, da Lei 8.429/92, quando (art. 17, §§ 8º e 9º), precedido de
instruído o processo com o notificação do demandado (art.
inquérito civil promovido pelo 17, § 7º), somente é aplicável para
Ministério Público. ações de improbidade administra-
tiva típicas.

396
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

345 Questiona a incidência do co- Em se tratando de compensação de REsp 1164452/MG 25/08/2010


mando inserto no art. 170-A crédito objeto de controvérsia judi-
do CTN, introduzido pela LC cial, é vedada a sua realização 'antes
104/01, relativamente à com- do trânsito em julgado da respecti-
pensação de tributo objeto de va decisão judicial', conforme prevê
ações já em curso quando da en- o art. 170-A do CTN, vedação que,
trada em vigor desse dispositivo. todavia, não se aplica a ações judi-
ciais propostas em data anterior à
vigência desse dispositivo, introdu-
zido pela LC 104/2001.
346 Questiona o alcance da expres- Nos termos do art. 170-A do CTN, REsp 1167039/DF 25/08/2010
são 'objeto de contestação judi- 'é vedada a compensação median-
cial pelo sujeito passivo' cons- te o aproveitamento de tributo,
tante no art. 170-A do CTN, objeto de contestação judicial pelo
introduzido pela LC 104/01, sujeito passivo, antes do trânsito
na hipótese de o crédito do em julgado da respectiva decisão
contribuinte apresentado para judicial', vedação que se aplica
compensação ser de tributo de- inclusive às hipóteses de reco-
clarado inconstitucional. nhecida inconstitucionalidade do
tributo indevidamente recolhido.
347 A controvérsia refere-se ao cri- Nas demandas de cunho declara- REsp 1155125/MG 10/03/2010
tério de fixação dos honorários tório, até por inexistir condenação
advocatícios em feito que ob- pecuniária que possa servir de base
jetiva a declaração do direito de cálculo, os honorários devem ser
à compensação tributária, se fixados com referência no valor da
deve ser adotado como base de causa ou em montante fixo.
cálculo o valor da causa - como
afirmado no aresto recorrido -
, ou o valor da condenação -
como defende a recorrente.
348 Cinge-se a discussão em saber A Câmara de Vereadores não pos- REsp 1164017/PI 24/03/2010
se a câmara de vereadores de- sui personalidade jurídica, mas
tém legitimidade ativa para dis- apenas personalidade judiciária,
cutir a incidência da contribui- de modo que somente pode de-
ção previdenciária sobre a re- mandar em juízo para defender os
muneração paga a vereadores. seus direitos institucionais, enten-
didos esses como sendo os relacio-
nados ao funcionamento, autono-
mia e independência do órgão. No
caso, a Câmara de Vereadores do
Município de Lagoa do Piauí/PI
ajuizou ação ordinária inibitória
com pedido de tutela antecipada
contra a Fazenda Nacional e o
INSS, objetivando afastar a inci-
dência da contribuição previden-
ciária sobre os vencimentos pagos
aos próprios vereadores. Não se
trata, portanto, de defesa de prer-
rogativa institucional, mas de pre-
tensão de cunho patrimonial.

397
Maria Cecília de Araujo Asperti

349 Discute a legalidade da exigên- É legal a exigência de prestação de REsp 1155684/RN 12/05/2010
cia de prestação de garantia pes- garantia pessoal para a celebração
soal (fiador) para a celebração de contrato de financiamento es-
de contrato de financiamento tudantil vinculado ao FIES.
estudantil vinculado ao FIES.
350 Discute a legalidade da co- Em se tratando de crédito educa- REsp 1155684/RN 12/05/2010
brança de juros capitalizados tivo, não se admite sejam os juros
para a celebração de contrato capitalizados.
de financiamento estudantil
vinculado ao FIES.
351 Questiona a forma de cálculo O Imposto de Renda incidente REsp 1118429/SP 24/03/2010
do Imposto de Renda na fon- sobre os benefícios previdenci-
te, na hipótese de pagamento ários atrasados pagos acumula-
acumulado de benefícios pre- damente deve ser calculado de
videnciários atrasados, vale acordo com as tabelas e alíquotas
dizer, se o IR deve ter como vigentes à época em que os valo-
parâmetro o valor de cada res deveriam ter sido adimplidos,
parcela mensal a que faria jus observando a renda auferida mês
o beneficiário, ou se deve ser a mês pelo segurado, não sendo
calculado sobre o montante legítima a cobrança de IR com
integral creditado. parâmetro no montante global
pago extemporaneamente.
352 Discute a possibilidade de o A exigência de comum acordo REsp 1160435/PE 06/04/2011
credor unilateralmente eleger o entre o credor e o devedor na
agente fiduciário no bojo de exe- escolha do agente fiduciário tão-
cução extrajudicial de contrato -somente se aplica aos contratos
regido pelas normas do Sistema não vinculados ao Sistema Finan-
Financeiro da Habitação (SFH) ceiro da Habitação - SFH.
com garantia hipotecária.
353 Discute-se a observância do Não se cogita perempção da exe- REsp 1160435/PE 06/04/2011
Decreto-Lei n. 70/66, precisa- cução extrajudicial na hipótese
mente acerca da notificação do não cumprimento do prazo
pessoal do devedor para purga- estabelecido pelo § 1º do art. 31
ção da mora. do Decreto-lei n. 70/66.
356 Questão referente ao prazo O prazo prescricional a ser apli- REsp 1086382/RS 14/04/2010
prescricional relativo das ações cado às ações de repetição de
de repetição de indébito relati- indébito relativas à contribuição
vas à contribuição ao Fusex. ao FUSEX, que consubstancia
tributo sujeito ao lançamento de
ofício, é o quinquenal, nos termos
do art. 168, I, do CTN.
358 Questão referente à legitimi- O descumprimento da obrigação REsp 1042585/RJ 12/05/2010
dade da recusa do fornecimen- acessória de informar, mensal-
to de certidão negativa de dé- mente, ao INSS, dados relaciona-
bito tributário, na hipótese em dos aos fatos geradores da contri-
que a autoridade administrati- buição previdenciária, é condição
va competente não procede ao impeditiva para expedição da
lançamento de ofício supletivo prova de inexistência de débito.
de suposta diferença advinda
da compensação efetuada pelo
contribuinte, por sua conta e
risco, de crédito vincendo ati-
nente a tributo sujeito a lança-
mento por homologação.

398
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

359 Questão à violação da coisa jul- A fixação de percentual relativo REsp 1136733/PR 13/10/2010
gada em decorrência da deter- aos juros moratórios, após a edi-
minação de incidência da taxa ção da Lei 9.250/95, em decisão
SELIC em sede de execução de que transitou em julgado, impede
sentença, quando esta deter- a inclusão da Taxa SELIC em fase
minou a aplicação de juros de de liquidação de sentença, sob
mora em 1%, posteriormente à pena de violação ao instituto da
vigência da Lei 9.250/95. coisa julgada, porquanto a refe-
rida taxa engloba juros e corre-
ção monetária, não podendo ser
cumulada com qualquer outro
índice de atualização.
360 Questão relativa à incidência do Os valores a serem pagos em ra- REsp 1142177/RS 09/08/2010
imposto sobre a renda em relação zão de decisão judicial trabalhis-
ao pagamento de verba decor- ta, que determina a reintegração
rente de reintegração do servidor do ex-empregado, assumem a
ao cargo por decisão judicial. natureza de verba remunerató-
ria, atraindo a incidência do im-
posto sobre a renda. Isso porque
são percebidos a título de salários
vencidos, como se o empregado
estivesse no pleno exercício de seu
vínculo empregatício.
361 Questão relativa à incidência Sendo a reintegração inviável, os REsp 1142177/RS 09/08/2010
do Imposto sobre a Renda em valores a serem percebidos pelo
relação ao pagamento de ver- empregado amoldam-se à indeni-
ba decorrente de reintegra- zação prevista no artigo 7°, I, da
ção do servidor ao cargo por Carta Maior, em face da nature-
decisão judicial. za eminentemente indenizatória,
não dando azo a qualquer acrés-
cimo patrimonial ou geração de
renda, posto não ensejar riqueza
nova disponível, mas reparações,
em pecúnia, por perdas de direi-
tos, afastando a incidência do Im-
posto sobre a Renda.
362 Questão referente à sujeição A contribuição para o salário- REsp 1162307/RJ 24/11/2010
passiva da relação jurídico- -educação tem como sujeito passi-
-tributária relativa ao salário- vo as empresas, assim entendidas
-educação, vale dizer, se o pólo as firmas individuais ou socie-
passivo da referida relação é dades que assumam o risco de
integrado por empresa em sen- atividade econômica, urbana ou
tido lato ou em sentido estrito. rural, com fins lucrativos ou não,
em consonância com o art. 15 da
Lei 9.424/96, regulamentado pelo
Decreto 3.142/99, sucedido pelo
Decreto 6.003/2006.

399
Maria Cecília de Araujo Asperti

364 Discute-se a subsistência da A Contribuição para Finan- REsp 826428/MG 09/06/2010


isenção da COFINS inciden- ciamento da Seguridade Social
te sobre o faturamento/receita - COFINS incide sobre o fatu-
das sociedades civis presta- ramento das sociedades civis de
doras de serviços de profissão prestação de serviços de profissão
legalmente regulamentada, legalmente regulamentada, de
prevista no artigo 6º, II, da Lei que trata o artigo 1º, do Decreto-
Complementar 70/91, tendo -Lei 2.397/87, tendo em vista a
em vista a revogação perpe- validade da revogação da isenção
trada pelo artigo 56, da Lei prevista no artigo 6º, II, da Lei
9.430/96. Complementar 70/91 (lei mate-
rialmente ordinária), perpetrada
pelo artigo 56, da Lei 9.430/96.
366 Questão referente à não in- A complementação da pensão REsp 1086492/PR 13/10/2010
cidência do Imposto sobre recebida de entidades de previ-
a Renda em relação à com- dência privada, em decorrência
plementação do benefício de da morte do participante ou con-
pensão recebida de entidades tribuinte do fundo de assistência,
de previdência privada, em quer a título de benefício quer de
razão da morte do participante seguro, não sofre a incidência do
ou contribuinte do fundo de Imposto de Renda apenas sob a
assistência, considerando-se o égide da Lei 7.713/88, art. 6º, VII,
disposto no art. 32 da Lei nº "a", que restou revogado pela Lei
9.250/95, que alterou o art. 6º, 9.250/95, a qual, retornando ao
VII, "a", da Lei nº 7.713/88. regime anterior, previu a incidên-
cia do imposto de renda no mo-
mento da percepção do benefício.
367 Discute-se a legalidade da au- Ainda que, em tese, o desloca- REsp 1116792/PB 24/11/2010
tuação fiscal do contribuinte mento de bens do ativo imobiliza-
que, ao proceder ao simples do e de material de uso e consumo
deslocamento de mercadoria entre estabelecimentos de uma
de um para outro estabeleci- mesma instituição financeira não
mento próprio (operação que configure hipótese de incidência
não constitui hipótese de inci- do ICMS, compete ao Fisco Es-
dência do ICMS), não cumpriu tadual averiguar a veracidade da
o dever instrumental consis- aludida operação, sobressaindo a
tente no transporte dos bens razoabilidade e proporcionalidade
acompanhados de documento da norma jurídica que tão-somen-
fiscal hábil (nota fiscal), tendo te exige que os bens da pessoa
em vista o disposto nos artigos jurídica sejam acompanhados das
113, §§ 2º e 3º, e 194, do CTN. respectivas notas fiscais.
370 Questão referente à incidên- Não incide Imposto de Renda REsp 1152764/CE 23/06/2010
cia ou não do imposto sobre a sobre verba percebida a título de
renda em relação às verbas de- dano moral.
correntes de indenização por
dano moral.

400
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

371 Questão referente à obriga- Há de se reconhecer o direito à REsp 1122387/DF 25/08/2010


ção de a União ressarcir ex- restituição de contribuições pagas
-congressistas, sem direito à ao extinto Instituto de Previdên-
pensão, em relação às impor- cia dos Congressistas - IPC, fundo
tâncias recolhidas a título de fechado de previdência, visto que
contribuição previdenciária ao os segurados, ex-contribuintes,
Instituto de Previdência dos após a extinção, nenhum benefí-
Congressistas - IPC, extinto cio receberão em contrapartida,
pela Lei 9.506/97. evitando-se, assim, o enriqueci-
mento ilícito da União, sucessora
nos direitos e obrigações do IPC.
372 Questão referente à possibi- Os hospitais podem optar pelo REsp 1127564/PR 09/08/2010
lidade de entidade hospitalar SIMPLES, tendo em vista que
optar pelo SIMPLES, em face eles não são prestadores de ser-
da vedação imposta pelo art. viços médicos e de enfermagem,
9º, IX, da Lei 9.317/96. mas, ao contrário, dedicam-se
a atividades que dependem de
profissionais que prestem refe-
ridos serviços, uma vez que há
diferença entre a empresa que
presta serviços médicos e aquela
que contrata profissionais para a
consecução de sua finalidade.
374 Discute-se a possibilidade de A dedução dos descontos incon- REsp 1149424/BA 28/04/2010
exclusão, da base de cálculo dicionais é vedada, no entanto,
do IPI, dos descontos incon- quando a incidência do tributo se
dicionais concedidos pelas dá sobre valor previamente fixado,
fabricantes de bebidas às em- nos moldes da Lei 7.798/89 (regime
presas distribuidoras. de preços fixos), salvo se o resulta-
do dessa operação for idêntico ao
que se chegaria com a incidência
do imposto sobre o valor efetivo da
operação, depois de realizadas as
deduções pertinentes.
375 Questão referente à impossi- A confissão da dívida não ini- REsp 1133027/SP 13/10/2010
bilidade de revisão judicial da be o questionamento judicial da
confissão de dívida, efetuada obrigação tributária, no que se
com o escopo de obter parce- refere aos seus aspectos jurídicos.
lamento de débitos tributários, Quanto aos aspectos fáticos sobre
quando o fundamento desse os quais incide a norma tribu-
reexame judicial é relativo à tária, a regra é que não se pode
situação fática sobre a qual in- rever judicialmente a confissão
cide a norma tributária. de dívida efetuada com o escopo
de obter parcelamento de débitos
tributários. No entanto, como na
situação presente, a matéria de
fato constante de confissão de dí-
vida pode ser invalidada quando
ocorre defeito causador de nulida-
de do ato jurídico (v.g. erro, dolo,
simulação e fraude).

401
Maria Cecília de Araujo Asperti

376 Questão referente à necessida- A intimação da parte agravada REsp 1148296/SP 01/09/2010
de de intimação do agravado para resposta é procedimento na-
para responder ao recurso, nos tural de preservação do princípio
termos do art. 527, I, do CPC. do contraditório, nos termos do art.
527, V, do CPC. (...) A dispensa do
referido ato processual ocorre tão-
-somente quando o relator nega
seguimento ao agravo (art. 527, I),
uma vez que essa decisão beneficia
o agravado, razão pela qual conclui-
-se que a intimação para a apresen-
tação de contrarrazões é condição
de validade da decisão que causa
prejuízo ao recorrente.
377 Questão referente à necessida- A intimação da parte agravada REsp 1148296/SP 01/09/2010
de de intimação do agravado para resposta é procedimento na-
para responder ao recurso, nos tural de preservação do princípio
termos do art. 527, I, do CPC. do contraditório, nos termos do art.
527, V, do CPC. (...) A dispensa do
referido ato processual ocorre tão-
-somente quando o relator nega
seguimento ao agravo (art. 527, I),
uma vez que essa decisão beneficia
o agravado, razão pela qual conclui-
-se que a intimação para a apresen-
tação de contrarrazões é condição
de validade da decisão que causa
prejuízo ao recorrente.
380 Discute-se a aplicação da mul- No caso de sentença ilíquida, para REsp 1147191/RS 04/03/2015
ta de 10%, prevista no caput a imposição da multa prevista no
do artigo 475-J, do CPC, na art. 475-J do CPC, revela-se indis-
hipótese em que o devedor, na pensável (i) a prévia liquidação da
fase de cumprimento de sen- obrigação; e, após, o acertamento,
tença ilíquida, efetua o depósi- (ii) a intimação do devedor, na fi-
to das quantias incontroversas gura do seu Advogado, para pagar
e apresenta garantias referen- o quantum ao final definido no
tes aos valores controvertidos, prazo de 15 dias.
objeto de impugnação.
381 Questão referente à possibili- A regra de imputação de paga- REsp 960239/SC 09/06/2010
dade ou não de aplicação das mentos estabelecida no art. 354 do
regras da imputação do paga- Código Civil não se aplica às hipó-
mento, previstas no Código teses de compensação tributária.
Civil, à compensação tributá-
ria, de modo que a amortiza-
ção da dívida da Fazenda pe-
rante o contribuinte, mediante
compensação, seja realizada
primeiro sobre os juros e, so-
mente após, sobre o principal
do crédito.

402
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

382 Questão referente à possibi- A responsabilidade tributária do REsp 923012/MG 09/06/2010


lidade ou não de extensão da sucessor abrange, além dos tribu-
responsabilidade tributária da tos devidos pelo sucedido, as mul-
empresa sucessora às multas, tas moratórias ou punitivas, que,
moratórias ou de outra espé- por representarem dívida de va-
cie, aplicadas à empresa suce- lor, acompanham o passivo do pa-
dida, e não apenas aos tributos trimônio adquirido pelo sucessor,
por esta devidos. desde que seu fato gerador tenha
ocorrido até a data da sucessão.
383 Discute-se o termo inicial do O prazo prescricional quinquenal REsp 1120295/SP 12/05/2010
prazo prescricional para o exer- para o Fisco exercer a pretensão
cício da pretensão de cobrança de cobrança judicial do crédito
judicial dos créditos tributários tributário conta-se da data esti-
declarados pelo contribuinte pulada como vencimento para o
(mediante DCTF ou GIA, en- pagamento da obrigação tributá-
tre outros), mas não pagos. ria declarada (mediante DCTF,
GIA, entre outros), nos casos de
tributos sujeitos a lançamento por
homologação, em que, não obs-
tante cumprido o dever instru-
mental de declaração da exação
devida, não restou adimplida a
obrigação principal (pagamento
antecipado), nem sobreveio quais-
quer das causas suspensivas da
exigibilidade do crédito ou inter-
ruptivas do prazo prescricional.
384 Discute-se a legalidade ou não A recusa, pela Administração REsp 1122959/SP 09/08/2010
da recusa do fornecimento de Fazendária Federal, do forne-
Certidão Negativa de Débi- cimento de Certidão Positiva
tos - CND ou Positiva com com efeitos de Negativa (CPD-
efeitos de Negativa - CPD-EN -EN), no período de 30.12.2004 a
ao contribuinte que, na seara 30.12.2005, revela-se ilegítima na
administrativa, pleiteou a re- hipótese em que configurada pen-
visão de lançamento, funda- dência superior a 30 (trinta) dias
do na alegação de pagamento do pedido de revisão administra-
integral do débito inscrito na tiva formulado pelo contribuinte,
dívida ativa, à luz do artigo 13, fundado na alegação de pagamen-
da Lei 11.051/2004. to integral do débito fiscal antes
de sua inscrição na dívida ativa,
ex vi do disposto no artigo 13, da
Lei 11.051/2004.
385 Discute-se a configuração de A denúncia espontânea resta REsp 1149022/SP 09/06/2010
denúncia espontânea (artigo configurada na hipótese em que
138, do CTN) na hipótese o contribuinte, após efetuar a
em que o contribuinte, após declaração parcial do débito tri-
efetuar a declaração parcial butário (sujeito a lançamento por
do débito tributário acom- homologação) acompanhado do
panhado do respectivo pa- respectivo pagamento integral,
gamento integral, retifica-a retifica-a (antes de qualquer pro-
(antes de qualquer procedi- cedimento da Administração Tri-
mento do fisco), noticiando butária), noticiando a existência
a existência de diferença a de diferença a maior, cuja quita-
maior, cuja quitação se dá ção se dá concomitantemente.
concomitantemente.

403
Maria Cecília de Araujo Asperti

387 Questão referente à alteração A retificação de dados cadastrais REsp 1130545/RJ 09/08/2010
de dados cadastrais do imó- do imóvel, após a constituição
vel não constitui erro de fato do crédito tributário, autoriza a
apto a ensejar a revisão do revisão do lançamento pela auto-
lançamento de IPTU, à luz ridade administrativa (desde que
do disposto nos artigos 146 e não extinto o direito potestativo
149, do CTN. da Fazenda Pública pelo decurso
do prazo decadencial), quando
decorrer da apreciação de fato
não conhecido por ocasião do
lançamento anterior, ex vi do
disposto no artigo 149, inciso
VIII, do CTN.
388 Discute-se a incidência ou não A Contribuição Provisória sobre REsp 1129335/SP 09/06/2010
da CPMF (Contribuição Pro- Movimentação ou Transmissão
visória sobre Movimentação de Valores de Créditos e Direitos
ou Transmissão de Valores de de Natureza Financeira - CPMF,
Créditos e Direitos de nature- enquanto vigente, incidia sobre a
za Financeira) sobre a conver- conversão de crédito decorrente
são de crédito decorrente de de empréstimo em investimento
empréstimo em investimento externo direto (contrato de câmbio
externo direto (contrato de simbólico), uma vez que a tributa-
câmbio simbólico). ção aperfeiçoava-se mesmo diante
de operação unicamente escritural.
389 Discute-se a responsabilidade O agente marítimo, no exercício REsp 1129430/SP 24/11/2010
tributária dos agentes maríti- exclusivo de atribuições próprias,
mos representantes de trans- no período anterior à vigência do
portadora, no que concerne ao Decreto-Lei 2.472/88 (que alte-
Imposto de Importação. rou o artigo 32, do Decreto-Lei
37/66), não ostentava a condição
de responsável tributário, nem se
equiparava ao transportador, para
fins de recolhimento do Imposto
sobre Importação, porquanto ine-
xistente previsão legal para tanto.
391 Discute-se a competência do O juízo do inventário, na modali- REsp 1150356/SP 09/08/2010
juízo do inventário (arrola- dade de arrolamento sumário, não
mento sumário) para apreciar detém competência para apreciar
pedido de reconhecimento de pedido de reconhecimento da
isenção do ITCMD (Imposto isenção do ITCMD (Imposto so-
sobre Transmissão Causa Mor- bre Transmissão Causa Mortis e
tis e Doação de quaisquer Bens Doação de quaisquer Bens ou Di-
ou Direitos), à luz do disposto reitos), à luz do disposto no caput
no artigo 179, do CTN. do artigo 179, do CTN.
392 Estabelecer se consubstancia A reunião de processos contra o REsp 1158766/RJ 08/09/2010
uma faculdade do Juiz a reu- mesmo devedor, por conveniência
nião de processos contra o da unidade da garantia da execu-
mesmo devedor por conveni- ção, nos termos do art. 28 da Lei
ência da unidade da garantia 6.830/80, é uma faculdade outor-
da execução, nos termos do gada ao juiz, e não um dever.
art. 28 da Lei 6.830/80.

404
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

393 Questão referente à possibili- O crédito tributário de autarquia REsp 957836/SP 13/10/2010
dade ou não de, em concurso federal goza do direito de prefe-
de credores, o crédito tributá- rência em relação àquele de que
rio de uma autarquia federal, seja titular a Fazenda Estadual,
in casu, o INSS, preferir os desde que a penhora recaia sobre
créditos da Fazenda Estadual, o mesmo bem.
considerando-se a coexistên-
cia de execuções e penhoras,
nos termos dos arts. 187, do
CTN, e 29, da LEF.
394 Discute-se a legalidade dos Os depósitos judiciais utilizados REsp 1168038/SP 09/06/2010
arts. 7º e 8º da Lei 8.541/1992 - para suspender a exigibilidade do
Vedação à dedutibilidade para crédito tributário consistem em
a apuração de base de cálculo ingressos tributários, sujeitos à
de Imposto de Renda. sorte da demanda judicial, e não
em receitas tributárias, de modo
que não são dedutíveis da base de
cálculo do IRPJ até o trânsito em
julgado da demanda.
395 Questão referente ao valor Adota-se como valor de alçada REsp 1168625/MG 09/06/2010
que representa 50 (cinqüenta) para o cabimento de apelação em
Obrigações Reajustáveis do Te- sede de execução fiscal o valor
souro Nacional - ORTN, à luz de R$ 328,27 (trezentos e vinte e
do disposto no artigo 34, da Lei oito reais e vinte e sete centavos),
n.º 6.830, de 22 de setembro de corrigido pelo IPCA-E a partir de
1980, para fins de alçada. janeiro de 2001, valor esse que
deve ser observado à data da pro-
positura da execução.
396 Discute-se a possibilidade de Ainda que a execução fiscal tenha REsp 1144687/RS 12/05/2010
expedição de carta precató- sido ajuizada na Justiça Federal (o
ria de penhora e avaliação e que afasta a incidência da norma
conseqüente determinação inserta no artigo 1º, § 1º, da Lei
de pagamento de custas e/ou 9.289/96), cabe à Fazenda Pública
despesas com o deslocamento Federal adiantar as despesas com
do oficial de justiça estadual, o transporte/condução/desloca-
no âmbito de execução fiscal mento dos oficiais de justiça ne-
ajuizada na Justiça Federal, à cessárias ao cumprimento da carta
luz dos artigos 42 e 46, da Lei precatória de penhora e avaliação
5.010/66 e da Súmula 190/STJ. de bens (processada na Justiça
Estadual), por força da princípio
hermenêutico ubi eadem ratio ibi
eadem legis dispositio.

405
Maria Cecília de Araujo Asperti

397 Questão referente à não-inci- A indenização decorrente de de- REsp 1116460/SP 09/12/2009
dência de Imposto de Renda sapropriação não encerra ganho
sobre indenização decorrente de capital, porquanto a proprie-
de desapropriação, seja por ne- dade é transferida ao poder públi-
cessidade ou utilidade pública co por valor justo e determinado
ou por interesse social, por- pela justiça a título de indeniza-
quanto não representa acrésci- ção, não ensejando lucro, mas
mo patrimonial. mera reposição do valor do bem
expropriado. (...) Não-incidência
da exação sobre as verbas aufe-
ridas a título de indenização ad-
vinda de desapropriação, seja por
necessidade ou utilidade pública
ou por interesse social, porquanto
não representam acréscimo patri-
monial.
398 Questão referente à legitimi- A pretensão repetitória de valores REsp 1131476/RS 09/12/2009
dade da exigência da prova indevidamente recolhidos a título
de ausência da repercussão fi- de ISS incidente sobre a locação
nanceira relativa ao ISS sobre de bens móveis (cilindros, má-
locação de bens móveis, ou a quinas e equipamentos utilizados
autorização de quem a tenha para acondicionamento dos gases
assumido, nos termos do art. vendidos), hipótese em que o tri-
166 do CTN, para fins de re- buto assume natureza indireta,
petição de indébito. reclama da parte autora a prova
da não repercussão, ou, na hipó-
tese de ter a mesma transferido o
encargo a terceiro, de estar auto-
rizada por este a recebê-los.
399 Questão referente à incidên- Os serviços postais e telemáticos REsp 1131872/SC 09/12/2009
cia ou não-incidência do ISS prestados por empresas franquea-
sobre os serviços prestados das, sob a égide da LC 56/87, não
por empresas franqueadas dos sofrem a incidência do ISS, em
Correios que realizam ativida- observância ao princípio tributá-
des postais e telemáticas. rio da legalidade.
400 Discute-se (i) a possibilidade A condenação, em honorários REsp 1143320/RS 12/05/2010
de o juiz decretar de ofício a advocatícios, do contribuinte,
extinção do feito "com" resolu- que formula pedido de desistência
ção de mérito, ao fundamento dos embargos à execução fiscal de
de que a adesão do devedor à créditos tributários da Fazenda
programa de parcelamento Nacional, para fins de adesão a
caracterizaria renúncia do di- programa de parcelamento fiscal,
reito sobre o qual se fundam configura inadmissível bis in idem,
os embargos à execução; e (ii) tendo em vista o encargo estipula-
a condenação do embargante do no Decreto-lei 1.025/69.
ao pagamento de honorários
advocatícios, a despeito do en-
cargo legal de 20% previsto no
Decreto-Lei 1.025/69.

406
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

401 Discute-se a legalidade da A exclusão do contribuinte REsp 1143216/RS 24/03/2010


exclusão do contribuinte do do programa de parcelamento
programa de parcelamen- (PAES), em virtude da extem-
to - PAES, tão-somente em poraneidade do cumprimento do
virtude da extemporaneidade requisito formal da desistência
do cumprimento do requisito de impugnação administrativa,
da desistência de impugnação afigura-se ilegítima na hipótese
administrativa, na hipótese em em que tácito o deferimento da
que houve o deferimento tácito adesão (à luz do artigo 11, § 4º, da
da adesão (não manifestação Lei 10.522/2002, c/c o artigo 4º,
da autoridade fazendário no III, da Lei 10.684/2003) e adim-
prazo de 90 dias - artigo 4º, III, plidas as prestações mensais esta-
da Lei 10.684/2003 c/c artigo belecidas por mais de quatro anos
11, § 4º, da Lei 10.522/2002) e e sem qualquer oposição do Fisco.
o efetivo pagamento das pres-
tações mensais estabelecidas.
402 Discute-se a legitimidade da Revela-se legítima a recusa da REsp 1143094/SP 09/12/2009
recusa do fornecimento, pelo autoridade impetrada em expe-
Fisco, de certidão de regula- dir certidão negativa de débito
ridade fiscal (Certidão Nega- (CND) ou de certidão positiva
tiva de Débitos - CND), em com efeitos de negativa (CPEN)
virtude da existência, por si quando a autoridade tributária
só, de apontada irregularida- verifica a ocorrência de paga-
de em Guias de Recolhimen- mento a menor, em virtude da
to do FGTS e Informações à existência de divergências entre
Previdência Social (GFIP's), a os valores declarados na Guia
despeito da ausência de lan- de Recolhimento do FGTS e In-
çamento de ofício da suposta formações à Previdência Social
diferença constatada. (GFIP) e os valores efetivamente
recolhidos mediante guia de pa-
gamento (GP).

407
Maria Cecília de Araujo Asperti

403 Questão referente à definição As empresas de mão-de-obra REsp 1138205/PR 09/12/2009


da base de cálculo do ISS in- temporária podem encartar-se em
cidente sobre a prestação de duas situações, em razão da na-
serviços de agenciamento de tureza dos serviços prestados: (i)
mão-de-obra temporária. como intermediária entre o con-
tratante da mão-de-obra e o ter-
ceiro que é colocado no mercado
de trabalho; (ii) como prestadora
do próprio serviço, utilizando
de empregados a ela vinculados
mediante contrato de trabalho.
A intermediação implica o preço
do serviço que é a comissão, base
de cálculo do fato gerador consis-
tente nessas "intermediações". O
ISS incide, nessa hipótese, apenas
sobre a taxa de agenciamento,
que é o preço do serviço pago ao
agenciador, sua comissão e sua
receita, excluídas as importân-
cias voltadas para o pagamento
dos salários e encargos sociais
dos trabalhadores. Distinção de
valores pertencentes a terceiros
(os empregados) e despesas com
a prestação. Distinção necessária
entre receita e entrada para fins
financeiro-tributários.
404 Questão referente à definição As empresas de mão-de-obra REsp 1138205/PR 09/12/2009
da base de cálculo do ISS in- temporária podem encartar-se
cidente sobre a prestação de em duas situações, em razão da
serviços de agenciamento de natureza dos serviços prestados:
mão-de-obra temporária. (i) como intermediária entre
o contratante da mão-de-obra
e o terceiro que é colocado no
mercado de trabalho; (ii) como
prestadora do próprio serviço,
utilizando de empregados a ela
vinculados mediante contrato de
trabalho. (...) Se a atividade de
prestação de serviço de mão-de-
-obra temporária é prestada atra-
vés de pessoal contratado pelas
empresas de recrutamento, resta
afastada a figura da intermedia-
ção, considerando-se a mão-de-
-obra empregada na prestação do
serviço contratado como custo do
serviço, despesa não dedutível da
base de cálculo do ISS.

408
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

406 Discute-se a legalidade da co- Os empregados, que laboram no REsp 1133662/PE 09/08/2010
brança das contribuições para o cultivo da cana-de-açúcar para
Fundo de Garantia por Tempo empresa agroindustrial ligada ao
de Serviço - FGTS, no período setor alcooleiro, detém a qualida-
de 1984 a 1988, de empresa de- de de rurícola, o que traz como
dicada a atividades agroindus- consequência a isenção do FGTS
triais no setor sucro-alcooleiro. desde a edição da Lei Complemen-
tar n. 11/71 até a promulgação da
Constituição Federal de 1988.
407 Discussão acerca do cabimen- São cabíveis honorários advoca- REsp 1134186/RS 01/08/2011
to de honorários advocatícios tícios em fase de cumprimento
em fase de cumprimento de de sentença, haja ou não impug-
sentença, bem como na sua nação, depois de escoado o prazo
impugnação, de acordo com a para pagamento voluntário a que
sistemática processual intro- alude o art. 475-J do CPC, que
duzida pela Lei nº 11.232/05. somente se inicia após a intima-
ção do advogado, com a baixa dos
autos e a aposição do 'cumpra-se'.
408 Discussão acerca do cabimen- Não são cabíveis honorários advo- REsp 1134186/RS 01/08/2011
to de honorários advocatícios catícios pela rejeição da impugna-
em fase de cumprimento de ção ao cumprimento de sentença.
sentença, bem como na sua
impugnação, de acordo com a
sistemática processual intro-
duzida pela Lei nº 11.232/05.
409 Discussão acerca do cabimen- Em caso de sucesso da impug- REsp 1134186/RS 01/08/2011
to de honorários advocatícios nação, com extinção do feito
em fase de cumprimento de mediante sentença (art. 475-M,
sentença, bem como na sua § 3º), revela-se que quem deu
impugnação, de acordo com a causa ao procedimento de cum-
sistemática processual intro- primento de sentença foi o exe-
duzida pela Lei nº 11.232/05. quente, devendo ele arcar com as
verbas advocatícias.
410 Discussão acerca do cabimen- O acolhimento ainda que parcial REsp 1134186/RS 01/08/2011
to de honorários advocatícios da impugnação gerará o arbitra-
em fase de cumprimento de mento dos honorários, que serão
sentença, bem como na sua fixados nos termos do art. 20, §
impugnação, de acordo com a 4º, do CPC, do mesmo modo que
sistemática processual intro- o acolhimento parcial da exceção
duzida pela Lei nº 11.232/05. de pré-executividade, porquanto,
nessa hipótese, há extinção tam-
bém parcial da execução.

409
Maria Cecília de Araujo Asperti

411 Questiona a obrigação ou não É cabível a inversão do ônus da REsp 1133872/PB 14/12/2011
de a instituição financeira exi- prova em favor do consumidor
bir documentos (extratos ban- para o fim de determinar às insti-
cários) comuns às partes. tuições financeiras a exibição de
extratos bancários, enquanto não
estiver prescrita a eventual ação
sobre eles, tratando-se de obriga-
ção decorrente de lei e de integra-
ção contratual compulsória, não
sujeita à recusa ou condicionan-
tes, tais como o adiantamento dos
custos da operação pelo correntis-
ta e a prévia recusa administrati-
va da instituição financeira em
exibir os documentos, com a res-
salva de que ao correntista, autor
da ação, incumbe a demonstração
da plausibilidade da relação jurí-
dica alegada, com indícios míni-
mos capazes de comprovar a exis-
tência da contratação, devendo,
ainda, especificar, de modo preci-
so, os períodos em que pretenda
ver exibidos os extratos.
412 Versa sobre a interpretação A base de cálculo do PIS, até a REsp 1127713/SP 09/08/2010
do art. 6º, parágrafo único, edição da MP n. 1.212/1995, era
da Lei Complementar 7/1970. o faturamento ocorrido no sexto
Discute-se, no caso, se tal dis- mês anterior ao do fato gerador.
positivo refere-se ao prazo para
recolhimento do PIS ou à sua
base de cálculo.
413 Discute-se a possibilidade de Admite-se que o preparo seja REsp 1122064/DF 01/09/2010
recolhimento das custas pro- efetuado no primeiro dia útil sub-
cessuais em dia útil posterior, sequente, quando a interposição
quando o agravo de instru- do recurso ocorrer após o encer-
mento tenha sido protocolado ramento do expediente bancário.
após o fim do horário de expe-
diente das agências bancárias.
414 Discute-se a possibilidade de Não é lícita a cobrança de tari- REsp 1166561/RJ 25/08/2010
cobrança de tarifa mínima de fa de água no valor do consumo
água, com base no número de mínimo multiplicado pelo nú-
economias, sem considerar o mero de economias existentes
consumo efetivamente registra- no imóvel, quando houver único
do no único hidrômetro local. hidrômetro no local. A cobrança
pelo fornecimento de água aos
condomínios em que o consumo
total de água é medido por único
hidrômetro deve se dar pelo con-
sumo real aferido.
415 Definir se a entrega de carnês A entrega de carnês de IPTU REsp 1141300/MG 25/08/2010
de IPTU, diretamente por ser- pelos municípios, sem a interme-
vidores municipais, violaria a diação de terceiros, no seu âmbito
exclusividade da Empresa Na- territorial, não viola o privilégio
cional de Correios e Telégrafos da União na manutenção do ser-
na prestação do serviço postal. viço público postal.

410
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

416 Discute-se a possibilidade de Exige-se, para concessão do REsp 1109591/SC 25/08/2010


concessão de auxílio-acidente auxílio-acidente, a existência de
independe do grau da incapa- lesão, decorrente de acidente do
cidade, sendo de rigor o deferi- trabalho, que implique redução da
mento, ainda que mínima a re- capacidade para o labor habitual-
dução da capacidade laborativa. mente exercido. O nível do dano
e, em consequência, o grau do
maior esforço, não interferem na
concessão do benefício, o qual será
devido ainda que mínima a lesão.
420 Cinge-se a discussão em saber O parágrafo único do art. 741 do REsp 1189619/PE 25/08/2010
se o art. 741, parágrafo único, CPC não se aplica às sentenças
do CPC, que criou hipótese transitadas em julgado em data
de inexigibilidade do título anterior à da sua vigência.
judicial, pode ser alegado em
embargos à execução pro-
postos pela CEF para excluir
percentuais de correção mone-
tária e expurgos inflacionários
considerados indevidos pelo
Supremo, por meio de recurso
extraordinário, para as contas
vinculadas ao FGTS.
421 EXECUÇÃO FISCAL. EXCE- É possível a condenação da Fa- REsp 1185036/PE 08/09/2010
ÇÃO DE PRÉ- EXECUTIVI- zenda Pública ao pagamento de
DADE. CONDENAÇÃO EM honorários advocatícios em de-
HONORÁRIOS. corrência da extinção da Execu-
ção Fiscal pelo acolhimento de
Exceção de Pré-Executividade.
422 PREVIDENCIÁRIO. APO- Permanece a possibilidade de REsp 1151363/MG 23/03/2011
SENTADORIA. CONVER- conversão do tempo de serviço
SÃO DE TEMPO DE SERVI- exercido em atividades especiais
ÇO ESPECIAL EM COMUM. para comum após 1998, pois a
FATOR MULTIPLICADOR partir da última reedição da MP
PREVISTO NA LEGISLA- n. 1.663, parcialmente conver-
ÇÃO EM VIGOR À ÉPOCA tida na Lei 9.711/1998, a norma
DA ATIVIDADE. TERMO tornou-se definitiva sem a parte
FINAL PARA CONVERSÃO do texto que revogava o referido §
EM 28/5/1998. NECESSIDA- 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991.
DE DE EXPOSIÇÃO PER-
MANENTE E HABITUAL.
VIOLAÇÃO DOS ARTS. 57,
§ 3º, LEI N. 8.213/1991 E 63, I,
DO DECRETO N. 611/1992.
CONTAGEM DE TEMPO
DE SERVIÇO POSTERIOR
À EMENDA CONSTITU-
CIONAL N. 20/1998.

411
Maria Cecília de Araujo Asperti

423 PREVIDENCIÁRIO. APO- A adoção deste ou daquele fator REsp 1151363/MG 23/03/2011
SENTADORIA. CONVER- de conversão depende, tão so-
SÃO DE TEMPO DE SERVI- mente, do tempo de contribuição
ÇO ESPECIAL EM COMUM. total exigido em lei para a aposen-
FATOR MULTIPLICADOR tadoria integral, ou seja, deve cor-
PREVISTO NA LEGISLA- responder ao valor tomado como
ÇÃO EM VIGOR À ÉPOCA parâmetro, numa relação de pro-
DA ATIVIDADE. TERMO porcionalidade, o que correspon-
FINAL PARA CONVERSÃO de a um mero cálculo matemático
EM 28/5/1998. NECESSIDA- e não de regra previdenciária.
DE DE EXPOSIÇÃO PER-
MANENTE E HABITUAL.
VIOLAÇÃO DOS ARTS. 57,
§ 3º, LEI N. 8.213/1991 E 63, I,
DO DECRETO N. 611/1992.
CONTAGEM DE TEMPO
DE SERVIÇO POSTERIOR
À EMENDA CONSTITU-
CIONAL N. 20/1998.
424 Discute-se a incidência do Im- Sujeitam-se a incidência do Im- REsp 1192556/PE 25/08/2010
posto de Renda sobre o abono posto de Renda os rendimentos
de permanência de que trata recebidos a título de abono de
o § 19 do art. 40 da Consti- permanência a que se referem o
tuição Federal, acrescentado § 19 do art. 40 da Constituição
pela Emenda Constitucional Federal, o § 5º do art. 2º e o § 1º
41/2003. do art. 3º da Emenda Constitu-
cional 41/203, e o art. 7º da Lei
10.887/2004.
425 Discute-se a quebra do sigilo A utilização do Sistema BACEN- REsp 1184765/PA 24/11/2010
bancário em execução fiscal, -JUD, no período posterior à
por meio do sistema BACEN- vacatio legis da Lei 11.382/2006
-JUD, viabilizadora do blo- (21.01.2007), prescinde do exau-
queio de ativos financeiros do rimento de diligências extraju-
executado (Lei Complementar diciais, por parte do exequente,
105/2001). a fim de se autorizar o bloqueio
eletrônico de depósitos ou aplica-
ções financeiras.
426 Questiona, no âmbito dos Salvo disposição contratual em REsp 1194402/RS 21/09/2011
contratos de financiamento sentido diferente, aplica-se aos
habitacional, a) a prática de contratos celebrados no âmbito
anatocismo em decorrência do Sistema Financeiro da Habita-
da utilização do Sistema de ção a regra de imputação prevista
Amortização Francês - "Tabe- no art. 354 do Código Civil de
la Price"; e b) a cobertura do 2002, que reproduz o art. 993 do
saldo devedor pelo FCVS, na Código Civil de 1916 e foi adota-
ausência de disposição contra- da pela RD BNH 81/1969.
tual a respeito.

412
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

427 Questão referente à ilegitimi- A incidência do ICMS, no que se REsp 1176753/RJ 28/11/2012
dade da incidência do ICMS refere à prestação dos serviços de
sobre serviços suplementares comunicação, deve ser extraída
ao serviços de comunicação da Constituição Federal e da LC
(atividade-meio), sob pena de 87/96, incidindo o tributo sobre
violação ao princípio da tipici- os serviços de comunicação pres-
dade tributária. tados de forma onerosa, através
de qualquer meio, inclusive a
geração, a emissão, a recepção,
a transmissão, a retransmissão,
a repetição e a ampliação de co-
municação de qualquer natureza
(art. 2º, III, da LC 87/96). A pres-
tação de serviços conexos ao de
comunicação por meio da telefo-
nia móvel (que são preparatórios,
acessórios ou intermediários da
comunicação) não se confunde
com a prestação da atividade fim
processo de transmissão (emissão
ou recepção) de informações de
qualquer natureza, esta sim, pas-
sível de incidência pelo ICMS.
Desse modo, a despeito de alguns
deles serem essenciais à efetiva
prestação do serviço de comuni-
cação e admitirem a cobrança de
tarifa pela prestadora do serviço
(concessionária de serviço públi-
co), por assumirem o caráter de
atividade meio, não constituem,
efetivamente, serviços de comu-
nicação, razão pela qual não é
possível a incidência do ICMS.
430 Definir se o mandamus não pode No pertinente a impetração de REsp 1119872/RJ 13/10/2010
ser impetrado contra lei em tese. ação mandamental contra lei
em tese, a jurisprudência desta
Corte Superior embora reconhe-
ça a possibilidade de mandado
de segurança invocar a incons-
titucionalidade da norma como
fundamento para o pedido, não
admite que a declaração de in-
constitucionalidade, constitua,
ela própria, pedido autônomo.

413
Maria Cecília de Araujo Asperti

431 Discute-se o cabimento da re- A retenção na fonte da contribui- REsp 1196777/RS 27/10/2010
tenção da contribuição previ- ção do Plano de Seguridade do
denciária prevista no art. 16-A Servidor Público - PSS, incidente
da Lei 10.887/2004, introdu- sobre valores pagos em cumpri-
zido pela Medida Provisória mento de decisão judicial, previs-
449/2008, pois não prevista no ta no art. 16-A da Lei 10.887/04,
título executivo. constitui obrigação ex lege e
como tal deve ser promovida in-
dependentemente de condenação
ou de prévia autorização no título
executivo.
432 Discute-se a legalidade da Ins- O benefício fiscal do ressarcimen- REsp 993164/MG 13/12/2010
trução Normativa 23/97 que to do crédito presumido do IPI re-
restringiu o direito ao crédito lativo às exportações incide mes-
presumido do IPI às pessoas mo quando as matérias-primas ou
jurídicas efetivamente sujeitas os insumos sejam adquiridos de
à incidência da contribuição pessoa física ou jurídica não con-
destinada ao PIS/PASEP e da tribuinte do PIS/PASEP.
COFINS, à luz do disposto na
Lei 9.363/96.
433 Sustenta a contrariedade ao Não são devidos honorários ad- REsp 1199715/RJ 16/02/2011
disposto no art. 381 do Código vocatícios à Defensoria Pública
Civil de 2002, ao argumento quando ela atua contra pessoa ju-
de que não é cabível a conde- rídica de direito público integran-
nação de autarquia estadual te da mesma Fazenda Pública.
ao pagamento de honorários
advocatícios nas demandas
patrocinadas pela Defensoria
Pública, por haver confusão
entre as qualidades de credor
e devedor.
434 Discute-se a legitimidade da O agravo interposto contra deci- REsp 1198108/RJ 17/10/2012
aplicação da multa prevista no são monocrática do Tribunal de
art. 557, § 2º, do CPC, ao funda- origem, com o objetivo de exau-
mento da necessidade de esgota- rir a instância recursal ordinária,
mento de instância para fins de a fim de permitir a interposição
acesso às Cortes Superiores. de recurso especial e do extraor-
dinário, não é manifestamente
inadmissível ou infundado, o que
torna inaplicável a multa previs-
ta no art. 557, § 2º, do Código de
Processo Civil.

414
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

435 Discute-se a contrariedade O art. 4º, do Decreto-Lei n. REsp 1201850/PE 24/11/2010


aos artigos 4º, do Decreto-Lei 2.462/88, ao dispor que o bene-
n. 1.564/77 (arts. 449 e 459, fício fiscal denominado 'depósito
do RIR/80); art. 19, §6º, do para reinvestimento' é de 40%
Decreto-Lei n. 1.598/77 (acres- (quarenta por cento) sobre o va-
centado pelo Decreto-Lei n. lor do imposto devido somado a
1.730/79) e ao art. 4º, do De- outros 40% (quarenta por cento)
creto-Lei n. 2.462/88. Alega de recursos próprios, não modifi-
que o lançamento suplementar cou a base de cálculo do benefício
foi calcado na legislação vigen- fiscal, permanecendo íntegra a
te segundo a qual na utilização exigência de que o benefício deve
do incentivo fiscal (depósito ser calculado com base no impos-
para reinvestimento) teria de to de renda incidente sobre o lu-
ser observado, além do limite cro da exploração (art. 19, §6º, do
de 40% (quarenta por cento) Decreto-Lei n. 1.598/77, incluído
do imposto devido, também o pelo Decreto-Lei n. 1.730/79).
limite de 40% (quarenta por
cento) do imposto calculado
sobre o lucro da exploração.
436 Discute-se a ilegitimidade ati- É parte legítima para ação de in- REsp 1114398/PR 08/02/2012
va ad causam em ação de in- denização o pescador profissional
denização por danos materiais artesanal, com início de atividade
e morais em razão de acidente profissional registrada no Depar-
ambiental ocorrido no Porto tamento de Pesca e Agricultura
de Paranaguá com o navio do Ministério da Agricultura e
N/T.Norma do Abastecimento anteriormente
ao fato, ainda que a emissão da
carteira de pescador profissional
tenha ocorrido posteriormente.
437 Discute-se o cerceamento de Não configura cerceamento de REsp 1114398/PR 08/02/2012
defesa em decorrência do jul- defesa o julgamento antecipado
gamento antecipado da lide. da lide, ante os elementos docu-
mentais suficientes.
438 Discute-se presença de culpa A alegação de culpa exclusiva de REsp 1114398/PR 08/02/2012
exclusiva de terceiro como ex- terceiro pelo acidente em causa,
cludente de responsabilidade, como excludente de responsa-
o que importaria na não apli- bilidade, deve ser afastada, ante
cação da teoria do risco inte- a incidência da teoria do risco
gral em acidente ambiental. integral e da responsabilidade
objetiva ínsita ao dano ambien-
tal (art. 225, § 3º, da CF e do
art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81),
responsabilizando o degradador
em decorrência do princípio do
poluidor-pagador.
439 Discute-se a inexistência de É devida a indenização por dano REsp 1114398/PR 08/02/2012
dano moral em razão de aci- moral patente o sofrimento in-
dente ambiental ocorrido no tenso do pescador profissional
Porto de Paranaguá com o na- artesanal, causado pela privação
vio N/T Norma. das condições de trabalho, em
consequência do dano ambiental.

415
Maria Cecília de Araujo Asperti

440 Discute o termo inicial da in- Os juros moratórios incidem a REsp 1114398/PR 08/02/2012
cidência dos juros moratórios partir da data do fato, no tocan-
para a reparação a título de te aos valores devidos a título de
danos morais e materias decor- dano material e moral.
rentes de acidente ambiental.
441 Discute-se a distribuição do A condenação em montante in- REsp 1114398/PR 08/02/2012
ônus da sucumbência de forma ferior ao postulado na inicial não
recíproca em em ação visando afasta a sucumbência mínima, de
reparação decorrente de aci- modo que não se redistribuem os
dente ambiental. ônus da sucumbência.
442 Discute-se forma de amortiza- Nos contratos vinculados ao REsp 1110903/PR 01/12/2010
ção do saldo devedor do siste- SFH, a atualização do saldo de-
ma financeiro de habitação. vedor antecede sua amortização
pelo pagamento da prestação. Sú-
mula 450/STJ
443 Questiona a possibilidade de É permitido ao juiz da execução, REsp 1145353/PR 25/04/2012
levantamento do depósito ju- diante da natureza alimentar do
dicial, em execução provisória crédito e do estado de necessida-
oriunda de ação de indeniza- de dos exequentes, a dispensa da
ção por danos morais e mate- contracautela para o levantamen-
riais, no valor não excedente a to do crédito, limitado, contudo,
60 (sessenta) salários mínimos, a 60 (sessenta) vezes o salário
sem a prestação de caução, nos mínimo.
termos do art. 475-O, III e § 2º,
I, do CPC (situação de necessi-
dade e créditos de natureza ali-
mentar ou decorrentes de ato
ilícito), mesmo havendo o risco
de irreversibilidade da medida.
446 Questão referente à legítima a O indivíduo não pode ser compe- REsp 1111566/DF 28/03/2012
recusa do suspeito a soprar o lido a colaborar com os referidos
etilômetro ou a fornecer san- testes do 'bafômetro' ou do exame
gue para a alcoolemia. de sangue, em respeito ao prin-
cípio segundo o qual ninguém
é obrigado a se autoincriminar
(nemo tenetur se detegere).

416
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

447 Discute-se o argumento de O tipo penal do art. 306 do Có- REsp 1111566/DF 28/03/2012
que a inclusão, efetivada pela digo de Trânsito Brasileiro é
Lei 11.705/08 ao artigo 306 formado, entre outros, por um
do CTB, de concentração elemento objetivo, de natureza
equivalente a 6 decigramas exata, que não permite a aplica-
de álcool por litro de sangue, ção de critérios subjetivos de in-
não significa, de forma algu- terpretação, qual seja, o índice de
ma, abrandamento da norma 6 decigramas de álcool por litro
penal. Cria, na realidade, de sangue. O grau de embriaguez
apenas maior dificuldade para é elementar objetiva do tipo, não
comprovação fática daquilo configurando a conduta típica o
que se contêm na denúncia. exercício da atividade em qual-
quer outra concentração inferior
àquela determinada pela lei, ema-
nada do Congresso Nacional. O
decreto regulamentador, poden-
do elencar quaisquer meios de
prova que considerasse hábeis à
tipicidade da conduta, tratou es-
pecificamente de 2 (dois) exames
por métodos técnicos e científi-
cos que poderiam ser realizados
em aparelhos homologados pelo
CONTRAN, quais sejam, o exa-
me de sangue e o etilômetro.
449 Discute-se a verificação da A decadência do art. 26 do CDC REsp 1117614/PR 10/08/2011
incidência da regra prevista não é aplicável à prestação de
no art. 26, II, do Código de contas para obter esclarecimentos
Defesa do Consumidor, à ação sobre cobrança de taxas, tarifas e
de prestação de contas ajuiza- encargos bancários.
da pelo cliente de instituição
financeira, visando a obter
esclarecimentos acerca de lan-
çamentos realizados em conta
corrente de sua titularidade, os
quais reputa indevidos.
450 Havendo acordo com a Fa- O § 2º do art. 6º da Lei n. REsp 1218508/MG 16/03/2011
zenda Pública, mesmo extra- 9.469/1997, que obriga à reparti-
judicial e sem participação do ção dos honorários advocatícios,
advogado, cada parte arcará é inaplicável a acordos ou transa-
com os honorários advocatí- ções celebrados em data anterior
cios devidos a seus respectivos à sua vigência.
patronos -, não prevalece sobre
o disposto no § 4º do art. 24
da Lei 8.906/04 (Estatuto da
Advocacia), norma especial
que assegura ao advogado o
direito autônomo a seus hono-
rários quando não participa do
acordo celebrado.

417
Maria Cecília de Araujo Asperti

451 Discute-se a majoração da No caso das taxas de ocupação REsp 1150579/SC 10/08/2011
taxa de ocupação de terreno dos terrenos de marinha, é despi-
de marinha pela revisão dos ciendo procedimento administra-
valores dos imóveis promovida tivo prévio com participação dos
pela SPU. administrados interessados, bas-
tando que a Administração Pú-
blica siga as normas do Decreto n.
2.398/87 no que tange à matéria.
452 Questiona a obrigação de rea- Na fase cognitiva, foi assegurado REsp 1217076/SP 28/09/2011
juste da remuneração dos ser- a servidores do Município de São
vidores públicos municipais, Paulo reajuste de vencimentos,
a partir de fevereiro/1995, em para o mês de fevereiro de 1995,
conformidade com as Leis Mu- com base nas Leis 10.668/88 e
nicipais 10.668/88 e 10.722/89, 10.722/89, sem fixação de per-
decidiu que não há falar em centual. A discussão, na fase de
violação à coisa julgada na liquidação, a respeito dos super-
aplicação da Lei Municipal venientes reajustes concedidos
12.397/97, motivo pelo qual pela legislação municipal (Lei
manteve a decisão que decla- 12.397/97) e seus reflexos no cál-
rara cumprida tal obrigação. culo do percentual devido e no
cumprimento da condenação im-
posta envolve exclusivamente in-
terpretação e aplicação de direito
local, insuscetível de reexame por
recurso especial. Aplicação, por
analogia, da Súmula 280 do STF.
453 Questão relativa à impossibili- As despesas relativas à remoção, REsp 1114406/SP 27/04/2011
dade de a empresa arrendante guarda e conservação de veículo
de veículo ser responsabiliza- apreendido no caso de arrenda-
da por valores cobrados pela mento mercantil, independen-
municipalidade, relativos à temente da natureza da infração
remoção, guarda e conserva- que deu origem à apreensão do
ção de veículo apreendido em veículo e ainda que haja posterior
decorrência do cometimento retomada da posse do bem pelo
de infrações pelo arrendatário, arrendante, são da responsabili-
tendo em vista a posterior re- dade do arrendatário, que se equi-
tomada da posse do bem ante a para ao proprietário enquanto em
efetivação de sua busca e apre- vigor o contrato de arrendamento
ensão pelo arrendante. (cf. artigo 4º da Resolução Con-
tran nº 149/2003).
455 Discute-se a incidência ou não Não incide PIS/COFINS sobre REsp 1104184/RS 29/02/2012
da contribuição social desti- o JCP recebido durante a vigên-
nada ao PIS sobre juros sobre cia da Lei 9.718/98 até a edição
capital próprio, à luz da Lei das Leis 10.637/02 (cujo art.
9.718/98 (regime cumulativo 1º. entrou em vigor a partir de
de tributação). 01.12.2002) e 10.833/03, tal como
no caso dos autos, que se refere
apenas ao período compreendido
entre 01.03.1999 e 30.09.2002.

418
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

456 Discute-se o método para A Lei 11.941/2008 remite os débi- REsp 1208935/AM 13/04/2011
a aferição do valor de R$ tos para com a Fazenda Nacional
10.000,00 (dez mil reais) para vencidos há cinco anos ou mais
fins da concessão da remissão cujo valor total consolidado seja
prevista no art. 14, da Lei n. igual ou inferior a 10 mil reais. O
11.941/2009. valor-limite acima referido deve
ser considerado por sujeito passi-
vo, e separadamente apenas em
relação à natureza dos créditos,
nos termos dos incisos I a IV do
art. 14.
457 Discute-se o método para A Lei 11.941/2008 remite os débi- REsp 1208935/AM 13/04/2011
a aferição do valor de R$ tos para com a Fazenda Nacional
10.000,00 (dez mil reais) para vencidos há cinco anos ou mais
fins da concessão da remissão cujo valor total consolidado seja
prevista no art. 14, da Lei n. igual ou inferior a 10 mil reais.
11.941/2009. Não pode o magistrado, de ofício,
pronunciar a remissão, analisan-
do isoladamente o valor cobrado
em uma Execução Fiscal, sem
questionar a Fazenda sobre a
existência de outros débitos que
somados impediriam o contri-
buinte de gozar do benefício.
459 Questão referente à possibili- O recurso adesivo pode ser in- REsp 1102479/RJ 04/03/2015
dade de a parte autora interpor terposto pelo autor da demanda
recurso adesivo de decisão que, indenizatória, julgada proceden-
em pedido de indenização por te, quando arbitrado, a título de
danos morais, fixa o valor da danos morais, valor inferior ao
condenação em patamar infe- que era almejado, uma vez con-
rior ao pleiteado. figurado o interesse recursal do
demandante em ver majorada a
condenação, hipótese caracteri-
zadora de sucumbência material.
462 Discute-se a necessidade de No agravo do artigo 522 do CPC, REsp 1102467/RJ 02/05/2012
juntada, no momento da inter- entendendo o Julgador ausente
posição do agravo de instru- peças necessárias para a compre-
mento previsto no artigo 522 ensão da controvérsia, deverá ser
do Código de Processo Civil, indicado quais são elas, para que
de peças necessárias à com- o recorrente complemente o ins-
preensão da controvérsia (art. trumento.
525, II, do CPC).
463 Discute-se a responsabilidade Só responde por danos materiais REsp 1063474/RS 28/09/2011
da instituição financeira que, e morais o endossatário que rece-
recebendo título por endosso- be título de crédito por endosso-
-mandato, leva-o indevida- -mandato e o leva a protesto se
mente a protesto. extrapola os poderes de manda-
tário ou em razão de ato culposo
próprio, como no caso de aponta-
mento depois da ciência acerca do
pagamento anterior ou da falta de
higidez da cártula

419
Maria Cecília de Araujo Asperti

464 Discute-se a responsabilidade Só responde por danos materiais REsp 1063474/RS 28/09/2011
da instituição financeira que, e morais o endossatário que rece-
recebendo título por endosso- be título de crédito por endosso-
-mandato, leva-o indevida- -mandato e o leva a protesto se
mente a protesto. extrapola os poderes de manda-
tário ou em razão de ato culposo
próprio, como no caso de aponta-
mento depois da ciência acerca do
pagamento anterior ou da falta de
higidez da cártula.
465 Discute-se a responsabilidade Responde pelos danos decorren- REsp 1213256/RS 28/09/2011
da instituição financeira que, tes de protesto indevido o endos-
recebendo título por endosso satário que recebe por endosso
translativo, leva-o indevida- translativo título de crédito con-
mente a protesto. tendo vício formal extrínseco ou
intrínseco, ficando ressalvado seu
direito de regresso contra os en-
dossantes e avalistas.
466 Discute-se a responsabilida- As instituições financeiras res- REsp 1197929/PR 24/08/2011
de civil de fornecedores de pondem objetivamente pelos da-
serviços ou produtos, por in- nos gerados por fortuito interno
clusão indevida do nome de relativo a fraudes e delitos prati-
consumidores em cadastros de cados por terceiros no âmbito de
proteção ao crédito, em decor- operações bancárias.
rência de fraude praticada por
terceiros.
467 Questão referente ao cumpri- A concessão da exploração do REsp 1120620/RJ 24/10/2012
mento de sentença proferida serviço de transporte ferroviário
em ação indenizatória ajuizada de passageiros em favor da SU-
em face da FLUMITRENS. PERVIA, mediante prévio proce-
Alegada ilegitimidade passi- dimento licitatório, não implicou
va ad causam da SUPERVIA sucessão empresarial entre esta e
CONCESSIONÁRIA DE a FLUMITRENS.
TRANSPORTE FERROVIÁ-
RIO S/A.
468 Questão referente ao cumpri- A SUPERVIA não tem legitimi- REsp 1120620/RJ 24/10/2012
mento de sentença proferida dade para responder por ilícitos
em ação indenizatória ajuizada praticados pela FLUMITRENS à
em face da FLUMITRENS. época em que operava o serviço
Alegada ilegitimidade passi- de transporte ferroviário de pas-
va ad causam da SUPERVIA sageiros.
CONCESSIONÁRIA DE
TRANSPORTE FERROVIÁ-
RIO S/A.
469 Discute-se a possibilidade de Em ação de reparação de danos REsp 925130/SP 08/02/2012
condenação solidária de segu- movida em face do segurado, a
radora que foi litisdenunciada Seguradora denunciada pode
pelo segurado, causador de ser condenada direta e solidaria-
danos a terceiros, em ação de mente junto com este a pagar a
indenização por este ajuizada. indenização devida à vítima, nos
limites contratados na apólice.

420
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

470 Discute-se a tributação pelo Não incide Imposto de Renda REsp 1227133/RS 28/09/2011
Imposto de Renda dos juros sobre os juros moratórios legais
de mora recebidos como con- vinculados a verbas trabalhistas
sectários de sentença conde- reconhecidas em decisão judicial.
natória em reclamatória tra-
balhista.
471 Questão referente à possibi- Descabe ação do terceiro preju- REsp 962230/RS 08/02/2012
lidade de a vítima de sinistro dicado ajuizada direta e exclusi-
ajuizar ação indenizatória di- vamente em face da Seguradora
retamente contra a seguradora do apontado causador do dano.
do pretenso causador do dano, No seguro de responsabilidade
ainda que não tenha feito par- civil facultativo a obrigação da
te do contrato de seguro. Seguradora de ressarcir danos
sofridos por terceiros pressupõe a
responsabilidade civil do segura-
do, a qual, de regra, não poderá
ser reconhecida em demanda na
qual este não interveio, sob pena
de vulneração do devido processo
legal e da ampla defesa.
472 Discute-se a necessidade da O depósito judicial do valor sim- REsp 1185583/SP 27/06/2012
prévia avaliação do imóvel plesmente apurado pelo corpo
para apuração do valor da justa técnico do ente público, sendo
indenização para a concessão inferior ao valor arbitrado por
de imissão provisória em ação perito judicial e ao valor cadastral
de desapropriação por utilida- do imóvel, não viabiliza a imissão
de pública em caráter e regime provisória na posse.
de urgência.
473 Questiona se a complementa- O art. 5º da Lei 8.186/91 assegu- REsp 1211676/RN 08/08/2012
ção de aposentadoria ou pen- ra o direito à complementação à
são de ex-ferroviário deveria, pensão, na medida em que deter-
em razão do princípio tempus mina a observância das disposi-
regit actum, observar a legis- ções do parágrafo único do art.
lação previdenciária aplicável 2º da citada norma, o qual, de
à concessão do benefício - art. sua parte, garante a permanente
41 do Decreto 83.080/79, que igualdade de valores entre ativos
estabelecia que a importância e inativos.
da pensão devida ao conjunto
dos dependentes do segurado
seria constituída de uma par-
cela familiar, igual a 50% do
valor da aposentadoria que o
segurado percebida ou daquela
a que teria direito se na data
do seu falecimento fosse apo-
sentado, e mais tantas parcelas
de 10% para cada dependente
segurado, até o máximo de 5
(cinco) parcelas.

421
Maria Cecília de Araujo Asperti

474 Questiona a aplicação exten- A petição inicial da ação moni- REsp 1154730/PE 08/04/2015
siva do óbice da Súmula 247/ tória para cobrança de soma em
STJ aos contratos de mútuo dinheiro deve ser instruída com
imobiliário. demonstrativo de débito atuali-
zado até a data do ajuizamento,
assegurando-se, na sua ausência
ou insuficiência, o direito da par-
te de supri-la, nos termos do art.
284 do CPC.
475 Cinge-se a discussão em saber Tratando-se de processo de co- REsp 1235513/AL 27/06/2012
se, julgados procedentes em nhecimento, é devida a compen-
parte os embargos à execução sação do índice de 28,86% com
para autorizar que o reajuste os reajustes concedidos por essas
de 28,86% nos vencimentos leis.
dos servidores públicos o mon-
tante obtido pode ser compen-
sado com aumentos concedi-
dos administrativamente, sem
qualquer previsão no título
executivo judicial, viola ou não
a coisa julgada.
476 Cinge-se a discussão em saber Transitado em julgado o título REsp 1235513/AL 27/06/2012
se, julgados procedentes em judicial sem qualquer limitação
parte os embargos à execução ao pagamento integral do índice
para autorizar que o reajuste de 28,86%, não cabe à União e
de 28,86% nos vencimentos às autarquias federais alegar, por
dos servidores públicos o mon- meio de embargos, a compensa-
tante obtido pode ser compen- ção com tais reajustes, sob pena
sado com aumentos concedi- de ofender-se a coisa julgada.
dos administrativamente, sem
qualquer previsão no título
executivo judicial, viola ou não
a coisa julgada.
477 Cinge-se a discussão em saber O servidor aposentado do ex- REsp 1244632/CE 10/08/2011
se ao servidor aposentado do tinto DNER, ainda que passe a
extinto DNER, que passou a integrar o quadro de inativos do
integrar os quadros do Minis- Ministério dos Transportes, deve
tério dos Transportes, deve, ou ter como parâmetro de seus pro-
não, ter assegurada a extensão ventos a retribuição dos servido-
do reajuste remuneratório pre- res ativos do DNER absorvidos
visto na Lei 11.171/05 para os pelo DNIT, pois esta autarquia é
servidores ativos do DNIT. que é a sucessora do DNER, não
havendo razão jurídica para justi-
ficar qualquer disparidade.

422
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

482 Discute-se o foro competente A sentença genérica prolatada no REsp 1247150/PR 19/10/2011
para a liquidação individual âmbito da ação civil coletiva, por
de sentença proferida em ação si, não confere ao vencido o atri-
civil pública. buto de devedor de 'quantia certa
ou já fixada em liquidação' (art.
475-J do CPC), porquanto, 'em
caso de procedência do pedido, a
condenação será genérica', apenas
'fixando a responsabilidade do réu
pelos danos causados' (art. 95 do
CDC). A condenação, pois, não
se reveste de liquidez necessária
ao cumprimento espontâneo do
comando sentencial, não sendo
aplicável a reprimenda prevista
no art. 475-J do CPC.
483 Demanda relativa à necessi- Não é obrigatória a presença de REsp 1110906/SP 23/05/2012
dade, ou não, nos termos da farmacêutico em dispensário de
legislação vigente, da atuação medicamentos.
de farmacêutico em dispensá-
rio de medicamentos, mantido
por clínica e/ou unidades hos-
pitalares, negou provimento ao
recurso de apelação do recor-
rente.
484 Discussão sobre a possibilida- Fora dos casos previstos no art. REsp 1213082/PR 10/08/2011
de de retenção de valor a ser 151, do CTN, a compensação de
restituído/ressarcido quando o ofício é ato vinculado da Fazenda
contribuinte manifesta a sua Pública Federal a que deve se sub-
discordância em procedimen- meter o sujeito passivo, inclusive
to de compensação de ofício sendo lícitos os procedimentos de
previsto no art. 73, da lei n. concordância tácita e retenção
9.430/96 e art. 7º, do decreto- previstos nos §§ 1º e 3º, do art. 6º,
-lei n. 2.287/86. do Decreto n. 2.138/97.
485 Discussão sobre a possibilida- De acordo com o art. 156, I, do REsp 1251513/PR 10/08/2011
de de pagamento mediante a CTN, o pagamento extingue o
transformação em pagamento crédito tributário. Se o pagamen-
definitivo (conversão em ren- to por parte do contribuinte ou
da) de depósitos judiciais vin- a transformação do depósito em
culados a ações já transitadas pagamento definitivo por ordem
em julgado. Discute-se ainda judicial (art. 1º, § 3º, II, da Lei n.
sobre a possibilidade de de- 9.703/98) somente ocorre depois
volução da diferença de juros de encerrada a lide, o crédito tri-
selic incidentes sobre o valor butário tem vida após o trânsito
depositado. em julgado que o confirma. Se
tem vida, pode ser objeto de re-
missão e/ou anistia neste ínterim
(entre o trânsito em julgado e a
ordem para transformação em
pagamento definitivo, antiga con-
versão em renda) quando a lei não
exclui expressamente tal situação
do seu âmbito de incidência.

423
Maria Cecília de Araujo Asperti

486 Discussão sobre a possibilida- A remissão/anistia das rubricas REsp 1251513/PR 10/08/2011
de de pagamento mediante a concedida (multa, juros de mora,
transformação em pagamento encargo legal) somente incide se
definitivo (conversão em ren- efetivamente existirem tais rubri-
da) de depósitos judiciais vin- cas (saldos devedores) dentro da
culados a ações já transitadas composição do crédito tributário
em julgado. Discute-se ainda cuja exigibilidade se encontra
sobre a possibilidade de de- suspensa pelo depósito.
volução da diferença de juros
selic incidentes sobre o valor
depositado.
487 Discussão sobre a possibilidade A remissão/anistia das rubricas REsp 1251513/PR 10/08/2011
de pagamento mediante a trans- concedida (multa, juros de mora,
formação em pagamento defi- encargo legal) somente incide se
nitivo (conversão em renda) de efetivamente existirem tais rubri-
depósitos judiciais vinculados a cas (saldos devedores) dentro da
ações já transitadas em julgado. composição do crédito tributário
Discute-se ainda sobre a possibi- cuja exigibilidade se encontra
lidade de devolução da diferença suspensa pelo depósito.
de juros selic incidentes sobre o
valor depositado.
488 Discussão sobre a possibilidade A remissão/anistia das rubricas REsp 1251513/PR 10/08/2011
de pagamento mediante a trans- concedida (multa, juros de mora,
formação em pagamento defi- encargo legal) somente incide se
nitivo (conversão em renda) de efetivamente existirem tais rubri-
depósitos judiciais vinculados a cas (saldos devedores) dentro da
ações já transitadas em julgado. composição do crédito tributário
Discute-se ainda sobre a possibi- cuja exigibilidade se encontra
lidade de devolução da diferença suspensa pelo depósito.
de juros selic incidentes sobre o
valor depositado.
489 Discussão sobre a possibilidade A remissão/anistia das rubricas REsp 1251513/PR 10/08/2011
de pagamento mediante a trans- concedida (multa, juros de mora,
formação em pagamento defi- encargo legal) somente incide se
nitivo (conversão em renda) de efetivamente existirem tais rubri-
depósitos judiciais vinculados a cas (saldos devedores) dentro da
ações já transitadas em julgado. composição do crédito tributário
Discute-se ainda sobre a possibi- cuja exigibilidade se encontra
lidade de devolução da diferença suspensa pelo depósito.
de juros selic incidentes sobre o
valor depositado.
490 Discussão sobre a possibilidade A remissão de juros de mora in- REsp 1251513/PR 10/08/2011
de pagamento mediante a trans- sertos dentro da composição do
formação em pagamento defi- crédito tributário não enseja o
nitivo (conversão em renda) de resgate de juros remuneratórios
depósitos judiciais vinculados a incidentes sobre o depósito ju-
ações já transitadas em julgado. dicial feito para suspender a exi-
Discute-se ainda sobre a possibi- gibilidade desse mesmo crédito
lidade de devolução da diferença tributário.
de juros selic incidentes sobre o
valor depositado.

424
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

493 Hospital conveniado ao SUS. Nas demandas que envolvem a REsp 1179057/AL 12/09/2012
Tabelas de preços. Fator de discussão sobre a conversão da
conversão em URV. Compe- tabela de ressarcimentos de ser-
tência. Prescrição. viços prestados ao Sistema Único
de Saúde - SUS de cruzeiro real
para real, (...) por se tratar de re-
lação de trato sucessivo, prescre-
vem apenas as parcelas vencidas
anteriormente ao quinquênio
que antecedeu ao ajuizamento da
ação (Súmula 85/STJ).
494 Hospital conveniado ao SUS. Nas demandas que envolvem a REsp 1179057/AL 12/09/2012
Tabelas de preços. Fator de discussão sobre a conversão da ta-
conversão em URV. Compe- bela de ressarcimentos de serviços
tência. Prescrição. prestados ao Sistema Único de
Saúde - SUS de cruzeiro real para
real, (...) deve ser adotado como
fator de conversão o Valor de Cr$
2.750,00, nos termos do art. 1º, §
3º, da MP 542/95, convertida na
Lei 9.096/95.
495 Hospital conveniado ao SUS. Nas demandas que envolvem a dis- REsp 1179057/AL 12/09/2012
Tabelas de preços. Fator de cussão sobre a conversão da tabela
conversão em URV. Compe- de ressarcimentos de serviços pres-
tência. Prescrição. tados ao Sistema Único de Saúde
- SUS de cruzeiro real para real,
(...) o índice de 9,56%, decorrente
da errônea conversão em real, so-
mente é devido até 1º de outubro
de 1999, data do início dos efeitos
financeiros da Portaria 1.323/99,
que estabeleceu novos valores para
todos os procedimentos.
496 Discute a exigibilidade da con- As empresas prestadoras de servi- REsp 1255433/SE 23/05/2012
tribuição para o SESC e SE- ços estão sujeitas às contribuições
NAC por empresa prestadora ao Sesc e Senac, salvo se integra-
de serviços educacionais. das noutro serviço social.
499 Questão referente à aplicação As administradoras de consórcio REsp 1114604/PR 13/06/2012
do artigo 42 do Decreto nº têm liberdade para fixar a res-
70.951/72 quanto ao limite do pectiva taxa de administração,
percentual da taxa de adminis- nos termos do art. 33 da Lei nº
tração cobrado pelas adminis- 8.177/91 e da Circular nº 2.766/97
tradoras de consórcio. do Banco Central, não havendo
falar em ilegalidade ou abusivida-
de da taxa contratada superior a
10% (dez por cento).

425
Maria Cecília de Araujo Asperti

500 Questão referente à obriga- Nas ações de reintegração de REsp 1099212/RJ 27/02/2013
ção do arrendador devolver posse motivadas por inadimple-
as quantias pagas antecipada- mento de arrendamento mercan-
mente a título de Valor Resi- til financeiro, quando o produto
dual Garantido - VRG, nos da soma do VRG quitado com o
caos em que o produto objeto valor da venda do bem for maior
do leasing for apreendido. que o total pactuado como VRG
na contratação, será direito do
arrendatário receber a diferença,
cabendo, porém, se estipulado no
contrato, o prévio desconto de
outras despesas ou encargos con-
tratuais.
501 Discute-se a incidência da Ainda que seja possível a incidên- REsp 1239203/PR 12/12/2012
contribuição do Plano de Se- cia de contribuição social sobre
guridade do Servidor Público quaisquer vantagens pagas ao
- PSS sobre os juros de mora. servidor público federal (art. 4º,
§ 1º, da Lei 10.887/2004), não é
possível a sua incidência sobre as
parcelas pagas a título de indeni-
zação (como é o caso dos juros de
mora), pois, conforme expressa
previsão legal (art. 49, I e § 1º, da
Lei 8.112/90), não se incorporam
ao vencimento ou provento.
502 Definir se Gratificação Elei- Os servidores estaduais, que REsp 1258303/PB 12/02/2014
toral recebida pelos Escrivães exerceram as funções de Escri-
e Chefes de Cartório Eleitoral vão Eleitoral e Chefe de Cartório
deve ser correspondente à in- das zonas eleitorais do interior
tegralidade da função comis- do Estado," não têm direito de
siona exercida. perceber" a gratificação eleitoral,
no período de 1996 a 2004, cor-
respondente à integralidade das
Funções Comissionadas FC-03 e
FC-01, respectivamente.

426
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

506 EXECUÇÃO DE SENTEN- Hipótese de ocorrência da pre- REsp 1252412/RN 06/11/2013


ÇA. ARBITRAMENTO DE clusão lógica a que se refere o
HONORÁRIOS SUCUM- legislador no art. 503 do CPC,
BENCIAIS REFERENTES segundo o qual 'A parte, que
À FASE EXECUTÓRIA DO aceitar expressa ou tacitamente a
JULGADO, APÓS PROMO- sentença ou a decisão, não poderá
ÇÃO DO ATO CITATÓRIO. recorrer'. Isso porque, apesar da
PRECLUSÃO. expressa postulação de arbitra-
mento dos honorários na inicial
da execução de sentença, não
houve pronunciamento do ma-
gistrado por ocasião do despacho
citatório, sobrevindo petição dos
recorridos em momento posterior
à citação apenas para postular a
retenção do valor dos honorários
contratuais, sem reiteração da
verba de sucumbência. (...) Ainda
que não se trate propriamente de
ação autônoma, por compreensão
extensiva, incide o enunciado da
Súmula 453/STJ quando a parte
exequente reitera o pedido for-
mulado na inicial da execução - a
fim de arbitrar os honorários ad-
vocatícios sucumbenciais - após o
pagamento da execução e o con-
sequente arquivamento do feito.
507 Questão referente à impos- A multa prevista no artigo 538, REsp 1250739/PA 04/12/2013
sibilidade da cumulação da parágrafo único, do Código de
multa aplicada em razão do Processo Civil tem caráter emi-
caráter protelatório dos em- nentemente administrativo -
bargos declaratórios com a punindo conduta que ofende a
imposição da indenização de- dignidade do tribunal e a função
corrente do reconhecimento pública do processo -, sendo pos-
da litigância de má-fé. sível sua cumulação com a sanção
prevista nos artigos 17, VII e 18, §
2º, do Código de Processo Civil,
de natureza reparatória.
508 Questão referente à necessidade O representante da Fazenda Públi- REsp 1268324/PA 17/10/2012
de intimação do representante ca Municipal (caso dos autos), em
da Fazenda Pública nos autos sede de execução fiscal e respecti-
de execução fiscal, inclusive no vos embargos, possui a prerrogati-
segundo grau de jurisdição. va de ser intimado pessoalmente,
em virtude do disposto no art.
25 da Lei 6.830/80, sendo que tal
prerrogativa também é assegura-
da no segundo grau de jurisdição,
razão pela qual não é válida, nessa
situação, a intimação efetuada, ex-
clusivamente, por meio da impren-
sa oficial ou carta registrada.

427
Maria Cecília de Araujo Asperti

509 Discute a possibilidade de a Com a atual redação do art. 475- REsp 1261888/RS 09/11/2011
concessionária de energia elé- N, inc. I, do CPC, atribuiu-se
trica promover cumprimento 'eficácia executiva' às sentenças
de sentença declaratória de 'que reconhecem a existência de
débito nos próprios autos em obrigação de pagar quantia'.
que julgado (in)exigível o cus-
to administrativo de 30% refe-
rente a cálculo de recuperação
de consumo.
510 Discute-se o pagamento pelo Não é possível se exigir do Minis- REsp 1253844/SC 13/03/2013
Ministério Público de despe- tério Público o adiantamento de
sas relativas à produção de honorários periciais em ações ci-
prova em demanda coletiva, vis públicas. Ocorre que a referida
na forma do art. 18 da Lei n. isenção conferida ao Ministério
7.347/85. Público em relação ao adianta-
mento dos honorários periciais
não pode obrigar que o perito
exerça seu ofício gratuitamente,
tampouco transferir ao réu o en-
cargo de financiar ações contra
ele movidas. Dessa forma, consi-
dera-se aplicável, por analogia, a
Súmula n. 232 desta Corte Supe-
rior ('A Fazenda Pública, quando
parte no processo, fica sujeita à
exigência do depósito prévio dos
honorários do perito'), a deter-
minar que a Fazenda Pública ao
qual se acha vinculado o Parquet
arque com tais despesas.
511 Discute-se a aplicação dos ex- É devida a restituição da deno- REsp 1177973/DF 14/11/2012
purgos inflacionários sobre os minada reserva de poupança a
valores recebidos a título de re- ex-participantes de plano de be-
serva de poupança de partici- nefícios de previdência privada,
pantes de plano previdenciário devendo ser corrigida monetaria-
que dele se desligaram antes mente conforme os índices que
do implemento das condições reflitam a real inflação ocorrida
necessárias para fruição dos no período, mesmo que o estatu-
benefícios. to da entidade preveja critério de
correção diverso, devendo ser in-
cluídos os expurgos inflacionários
(Súmula 289/STJ).
512 Discute-se a aplicação do IPC A atualização monetária das con- REsp 1177973/DF 14/11/2012
atualização das parcelas res- tribuições devolvidas pela enti-
tituídas a título de reserva de dade de previdência privada ao
poupança de participantes associado deve ser calculada pelo
de plano previdenciário que IPC, por ser o índice que melhor
dele se desligaram antes do traduz a perda do poder aquisitivo
implemento das condições da moeda."
necessárias para fruição dos
benefícios.

428
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

513 Possibilidade de aplicação dos A Súmula 252/STJ, por ser espe- REsp 1177973/DF 14/11/2012
índices de correção do FGTS cífica para a correção de saldos
sobre as parcelas de contri- do FGTS, não tem aplicação nas
buição restituídas aos partici- demandas que envolvem previ-
pantes desligados de plano de dência privada.
previdência privada.
514 Discute-se a validade da quita- A quitação relativa à restituição, REsp 1183474/DF 14/11/2012
ção dos expurgos inflacionários, por instrumento de transação, so-
por instrumento de transação. mente alcança as parcelas efetiva-
mente quitadas, não tendo eficácia
em relação às verbas por ele não
abrangidas. Portanto, se os expur-
gos inflacionários não foram pagos
aos participantes que faziam jus à
devolução das parcelas da contri-
buição, não se pode considerá-los
saldados por recibo de quitação
passado de forma geral.
515 Estabelecer se o prazo de pres- No âmbito do Direito Privado, é REsp 1273643/PR 27/02/2013
crição das execuções indivi- de cinco anos o prazo prescricio-
duais de julgamento de ações nal para ajuizamento da execução
coletivas seria o mesmo prazo individual em pedido de cumpri-
prescricional destas, ou seja, mento de sentença proferida em
de cinco anos. Ação Civil Pública.
516 Discute-se o termo inicial da A contagem da prescrição quin- REsp 1254456/PE 25/04/2012
prescrição para pleitear inde- quenal relativa à conversão em
nização referente a licença- pecúnia de licença-prêmio não
-prêmio não gozada. gozada e nem utilizada como lap-
so temporal para a aposentadoria,
tem como termo a quo a data em
que ocorreu a aposentadoria do
servidor público.

429
Maria Cecília de Araujo Asperti

517 Discute-se a responsabilida- A despeito de situações fáticas REsp 1210064/SP 08/08/2012


de civil da concessionária de variadas no tocante ao descum-
transporte ferroviário, por primento do dever de segurança
morte decorrente de atrope- e vigilância contínua das vias
lamento por trem, diante da férreas, a responsabilização da
existência ou não de culpa concessionária é uma constante,
concorrente. passível de ser elidida tão somente
quando cabalmente comprovada
a culpa exclusiva da vítima. Para
os fins da sistemática prevista no
art. 543-C do CPC, citam-se al-
gumas situações: (i) existência
de cercas ao longo da via, mas
caracterizadas pela sua vulnera-
bilidade, insuscetíveis de impedir
a abertura de passagens clandesti-
nas, ainda quando existente pas-
sarela nas imediações do local do
sinistro; (ii) a própria inexistência
de cercadura ao longo de toda a
ferrovia; (iii) a falta de vigilância
constante e de manutenção da in-
columidade dos muros destinados
à vedação do acesso à linha férrea
pelos pedestres; (iv) a ausência
parcial ou total de sinalização
adequada a indicar o perigo re-
presentado pelo tráfego das com-
posições.
518 Discute-se a responsabilida- A despeito de situações fáticas REsp 1172421/SP 08/08/2012
de civil da concessionária de variadas no tocante ao descum-
transporte ferroviário, por mor- primento do dever de segurança
te decorrente de atropelamento e vigilância contínua das vias
em via férrea, em virtude de férreas, a responsabilização da
alegada culpa concorrente. concessionária é uma constante,
passível de ser elidida tão somente
quando cabalmente comprovada
a culpa exclusiva da vítima. No
caso de atropelamento de pedes-
tre em via férrea, configura-se a
concorrência de causas, impon-
do a redução da indenização por
dano moral pela metade, quando:
(i) a concessionária do transporte
ferroviário descumpre o dever de
cercar e fiscalizar os limites da
linha férrea, mormente em locais
urbanos e populosos, adotando
conduta negligente no tocante às
necessárias práticas de cuidado
e vigilância tendentes a evitar a
ocorrência de sinistros; e (ii) a ví-
tima adota conduta imprudente,
atravessando a via férrea em local
inapropriado.

430
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

519 Discute-se o prazo prescricio- O prazo prescricional da ação REsp 1103224/MG 12/12/2012
nal da ação de cobrança relati- individual de cobrança relativa
va aos expurgos inflacionários a expurgos inflacionários inci-
incidente sobre saldo de pou- dentes sobre saldo de caderneta
pança manejada contra a MI- de poupança proposta contra o
NASCAIXA, que foi sucedida Estado de Minas Gerais, sucessor
pelo Estado de Minas Gerais: da MINAS CAIXA, é vintenário,
se quinquenal, consoante pre- não se aplicando à espécie o De-
visão do Decreto nº 20.910/32 creto nº 20.910/32 que disciplina
que disciplina a prescrição a prescrição contra a Fazenda
contra a Fazenda Pública, ou Pública.
se vintenária, nos termos da
legislação civil.
520 Discute-se a legitimidade do Tratando-se de contrato de mú- REsp 1150429/CE 25/04/2013
adquirente de imóvel por meio tuo para aquisição de imóvel
de "contrato de gaveta" para garantido pelo FCVS, avençado
demandar em juízo a revisão até 25/10/96 e transferido sem
de cláusulas pactuadas em con- a interveniência da instituição
trato de mútuo habitacional, financeira, o cessionário possui
firmado no âmbito do Sistema legitimidade para discutir e de-
Financeiro de Habitação, se re- mandar em juízo questões perti-
alizada a cessão sem a anuência nentes às obrigações assumidas e
da instituição financeira. aos direitos adquiridos.
521 Discute-se a legitimidade do Na hipótese de contrato originá- REsp 1150429/CE 25/04/2013
adquirente de imóvel por meio rio de mútuo sem cobertura do
de "contrato de gaveta" para FCVS, celebrado até 25/10/96,
demandar em juízo a revisão transferido sem a anuência do
de cláusulas pactuadas em con- agente financiador e fora das
trato de mútuo habitacional, condições estabelecidas pela Lei
firmado no âmbito do Sistema nº 10.150/2000, o cessionário não
Financeiro de Habitação, se re- tem legitimidade ativa para ajui-
alizada a cessão sem a anuência zar ação postulando a revisão do
da instituição financeira. respectivo contrato.
522 Questão referente à legitimida- No caso de cessão de direitos so- REsp 1150429/CE 25/04/2013
de do adquirente de imóvel por bre imóvel financiado no âmbito
meio de "contrato de gaveta" do Sistema Financeiro da Habita-
para demandar em juízo a revi- ção realizada após 25/10/1996, a
são de cláusulas pactuadas em anuência da instituição financei-
contrato de mútuo habitacio- ra mutuante é indispensável para
nal, firmado no âmbito do Sis- que o cessionário adquira legiti-
tema Financeiro de Habitação, midade ativa para requerer revi-
se realizada a cessão sem a anu- são das condições ajustadas, tanto
ência da instituição financeira. para os contratos garantidos pelo
FCVS como para aqueles sem a
cobertura do mencionado Fundo.

431
Maria Cecília de Araujo Asperti

523 Questão referente à legitimida- No caso de cessão de direitos so- REsp 1150429/CE 25/04/2013
de do adquirente de imóvel por bre imóvel financiado no âmbito
meio de "contrato de gaveta" do Sistema Financeiro da Habita-
para demandar em juízo a revi- ção realizada após 25/10/1996, a
são de cláusulas pactuadas em anuência da instituição financei-
contrato de mútuo habitacio- ra mutuante é indispensável para
nal, firmado no âmbito do Sis- que o cessionário adquira legiti-
tema Financeiro de Habitação, midade ativa para requerer revi-
se realizada a cessão sem a anu- são das condições ajustadas, tanto
ência da instituição financeira. para os contratos garantidos pelo
FCVS como para aqueles sem a
cobertura do mencionado Fundo.
524 Discute-se violação ao dispos- Após o oferecimento da contesta- REsp 1267995/PB 27/06/2012
to no art. 3º da Lei n. 9.469/97, ção, não pode o autor desistir da
que condiciona a concordân- ação, sem o consentimento do réu
cia do pedido de desistência à (art. 267, § 4º, do CPC), sendo que
renúncia do direito o qual se é legítima a oposição à desistência
funda a ação. com fundamento no art. 3º da Lei
9.469/97, razão pela qual, nesse
caso, a desistência é condicionada
à renúncia expressa ao direito so-
bre o qual se funda a ação.
526 APLICABILIDADE DO A atribuição de efeitos suspensi- REsp 1272827/PE 22/05/2013
ART. 739-A, §1º, DO CPC. vos aos embargos do devedor" fica
ANÁLISE DO JUIZ A RES- condicionada "ao cumprimento
PEITO DE OCORRÊNCIA de três requisitos: apresentação
DE GRAVE DANO DE DI- de garantia; verificação pelo juiz
FÍCIL OU INCERTA REPA- da relevância da fundamentação
RAÇÃO PARA A CONCES- (fumus boni juris) e perigo de
SÃO DE EFEITO SUSPENSI- dano irreparável ou de difícil re-
VO AOS EMBARGOS DO paração (periculum in mora).
DEVEDOR OPOSTOS EM
EXECUÇÃO FISCAL.
527 IMPOSTO DE RENDA DA Em sede de embargos à execução REsp 1298407/DF 23/05/2012
PESSOA FÍSICA. EMBAR- contra a Fazenda Pública cujo ob-
GOS À EXECUÇÃO MOVI- jeto é a repetição de imposto de
DA CONTRA A FAZENDA renda, não se pode tratar como
PÚBLICA. VALOR PRO- documento particular os demons-
BATÓRIO (PRESUNÇÃO trativos de cálculo (planilhas)
DE VERACIDADE) DAS elaborados pela Procuradoria-Ge-
PLANILHAS PRODUZIDAS ral da Fazenda Nacional - PGFN
PELA SECRETARIA DA RE- e adotados em suas petições com
CEITA FEDERAL E APRE- base em dados obtidos junto à
SENTADAS EM JUÍZO Secretaria da Receita Federal do
PELA PROCURADORIA- Brasil - SRF (órgão público que
-GERAL DA FAZENDA NA- detém todas as informações a res-
CIONAL PARA DEMONS- peito das declarações do imposto
TRAR A AUSÊNCIA DE de renda dos contribuintes) por
DEDUÇÃO DE QUANTIA se tratarem de verdadeiros atos
RETIDA NA FONTE E JÁ administrativos enunciativos que,
RESTITUÍDA POR CON- por isso, gozam do atributo de
TA DE DECLARAÇÃO DE presunção de legitimidade.
AJUSTE ANUAL.

432
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

528 Discute-se a existência de in- Nos contratos de mútuo e finan- REsp 1293558/PR 11/03/2015
teresse de agir do consumidor ciamento, o devedor não possui
para propor ação de presta- interesse de agir para a ação de
ção de contas, a fim de obter prestação de contas.
esclarecimentos a respeito da
evolução do débito, assim tam-
bém no tocante a certificação
quanto à correção dos valores
lançados e também apuração
de eventual crédito a seu favor.
530 Discute-se a validade de noti- A notificação extrajudicial re- REsp 1184570/MG 09/05/2012
ficação extrajudicial realizada alizada e entregue no endereço
por Cartório de Títulos e Do- do devedor, por via postal e com
cumentos de Comarca diversa aviso de recebimento, é válida
da do domicílio do devedor. quando realizada por Cartório de
Títulos e Documentos de outra
Comarca, mesmo que não seja
aquele do domicílio do devedor.
531 Discute-se a possibilidade de Quando a Administração Pública REsp 1244182/PB 10/10/2012
devolução ao Erário de valores interpreta erroneamente uma lei,
recebidos de boa-fé pelo servidor resultando em pagamento indevi-
público, quando pagos indevida- do ao servidor, cria-se uma falsa
mente pela Administração. expectativa de que os valores re-
cebidos são legais e definitivos,
impedindo, assim, que ocorra
desconto dos mesmos, ante a boa-
-fé do servidor público.
532 Discute-se a repercussão de O trabalho urbano de um dos REsp 1304479/SP 10/10/2012
atividade urbana do cônjuge membros do grupo familiar não
na pretensão de configuração descaracteriza, por si só, os de-
jurídica de trabalhador rural mais integrantes como segurados
previsto no art. 143 da Lei especiais, devendo ser averiguada
8.213/1991. a dispensabilidade do trabalho
rural para a subsistência do gru-
po familiar, incumbência esta das
instâncias ordinárias (Súmula 7/
STJ).
533 Discute-se a repercussão de Em exceção à regra geral (...), a REsp 1304479/SP 10/10/2012
atividade urbana do cônjuge extensão de prova material em
na pretensão de configuração nome de um integrante do núcleo
jurídica de trabalhador rural familiar a outro não é possível
previsto no art. 143 da Lei quando aquele passa a exercer
8.213/1991. trabalho incompatível com o la-
bor rurícola, como o de natureza
urbana.

433
Maria Cecília de Araujo Asperti

534 Discute-se a possibilidade de As normas regulamentadoras que REsp 1306113/SC 14/11/2012


configuração do trabalho ex- estabelecem os casos de agentes
posto ao agente perigoso ele- e atividades nocivos à saúde do
tricidade, exercido após a vi- trabalhador são exemplificativas,
gência do Decreto 2.172/1997, podendo ser tido como distinto
como atividade especial, o labor que a técnica médica e
para fins do artigo 57 da Lei a legislação correlata considera-
8.213/1991. rem como prejudiciais ao obreiro,
desde que o trabalho seja perma-
nente, não ocasional, nem inter-
mitente, em condições especiais
(art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991).
535 Discute-se a isenção do Impos- São isentos do Imposto de Ren- REsp 1306393/DF 24/10/2012
to de Renda dos rendimentos da os rendimentos do trabalho
recebidos pela parte, na con- recebidos por técnicos a serviço
dição de técnica a serviço das das Nações Unidas, contratados
Nações Unidas, contratada no no Brasil para atuar como con-
Brasil para atuar como consul- sultores no âmbito do Programa
tora no âmbito doo Programa das Nações Unidas para o De-
das Nações Unidas para o De- senvolvimento - PNUD. 'Peritos'
senvolvimento-PNUD. a que se refere o Acordo Básico
de Assistência Técnica com a
Organização das Nações Unidas,
suas Agências Especializadas e a
Agência Internacional de Energia
Atômica, promulgado pelo De-
creto 59.308/66, estão ao abrigo
da norma isentiva do imposto de
renda. O Acordo Básico de Assis-
tência Técnica atribuiu os bene-
fícios fiscais decorrentes da Con-
venção sobre Privilégios e Imu-
nidades das Nações Unidas, pro-
mulgada pelo Decreto 27.784/50,
não só aos funcionários da ONU
em sentido estrito, mas também
aos que a ela prestam serviços na
condição de 'peritos de assistência
técnica', no que se refere a essas
atividades específicas.
536 Discute-se a necessidade de Na fase de cumprimento de sen- REsp 1262933/RJ 19/06/2013
intimação pessoal do devedor tença, o devedor deverá ser inti-
em cumprimento de senten- mado, na pessoa de seu advogado,
ça, antes do que não poderá mediante publicação na imprensa
incidir a multa de 10% sobre o oficial, para efetuar o pagamento
valor da execução. no prazo de 15 (quinze) dias, a
partir de quando, caso não o efe-
tue, passará a incidir a multa de
10% (dez por cento) sobre mon-
tante da condenação (art. 475-J
do CPC).

434
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

537 Discute-se a legitimidade do Diante do que dispõe a legisla- REsp 1299303/SC 08/08/2012
consumidor para propor ação ção que disciplina as concessões
declaratória cumulada com de serviço público e da peculiar
repetição de indébito na qual relação envolvendo o Estado-
se busca afastar, no tocante -concedente, a concessionária e
ao fornecimento de energia o consumidor, esse último tem
elétrica, a incidência do ICMS legitimidade para propor ação
sobre a demanda contratada e declaratória c/c repetição de in-
não utilizada. débito na qual se busca afastar,
no tocante ao fornecimento de
energia elétrica, a incidência do
ICMS sobre a demanda contrata-
da e não utilizada.
538 Discute-se a concessão de aju- A fixação de limitação temporal REsp 1257665/CE 08/10/2014
da de custo a servidores públi- para o recebimento da indeniza-
cos, prevista no art. 51, I, da ção prevista no art. 53, I, da Lei
Lei 8.112/1990, e a legalidade 8112/1990, por meio de normas
da limitação temporal a sua infralegais, não ofende o princí-
concessão quando fixada em pio da legalidade.
norma regulamentadora (art.
7º, Resolução CJF 461/2005,
art. 101 da Resolução CJF
4/2008 ou norma supervenien-
te de igual conteúdo).
541 Discute a possibilidade de cre- O ICMS incidente sobre a energia REsp 1201635/MG 12/06/2013
ditamento do ICMS incidente elétrica consumida pelas empre-
sobre a energia elétrica utiliza- sas de telefonia, que promovem
da na prestação de serviços de processo industrial por equipa-
telecomunicações. ração, pode ser creditado para
abatimento do imposto devido
quando da prestação de serviços.
542 Questão referente ao paga- A indenização do seguro DPVAT, REsp 1246432/RS 22/05/2013
mento gradativo da indeni- em caso de invalidez parcial per-
zação securitária do seguro manente do beneficiário, será
DPVAT proporcionalmente ao paga de forma proporcional ao
grau da lesão apurada, na hi- grau da invalidez.
pótese de invalidez parcial, no
limite de R$ 13.500,00 (treze
mil e quinhentos reais).
544 Discute a aplicação da deca- O suporte de incidência do prazo REsp 1309529/PR 28/11/2012
dência prevista no art. 103 da decadencial previsto no art. 103
Lei 8.213/1991, com a redação da Lei 8.213/1991 é o direito de
dada pela MP 1.523/1997, so- revisão dos benefícios, e não o di-
bre o direito do segurado de reito ao benefício previdenciário.
revisar benefício concedido Incide o prazo de decadência do
antes da publicação deste últi- art. 103 da Lei 8.213/1991, ins-
mo preceito legal. tituído pela Medida Provisória
1.523-9/1997, convertida na Lei
9.528/1997, no direito de revisão
dos benefícios concedidos ou in-
deferidos anteriormente a esse
preceito normativo, com termo
a quo a contar da sua vigência
(28.6.1997).

435
Maria Cecília de Araujo Asperti

545 Questiona-se a aplicação do É de cinco anos o prazo prescri- REsp 1205277/PB 27/06/2012
prazo prescricional previsto no cional da ação promovida contra
art. 1º do Decreto 20.910/32 em a União Federal por titulares de
demanda promovida por titu- contas vinculadas ao PIS/PASEP
lares de contas vinculadas ao visando à cobrança de diferenças
PIS/PASEP em face da União de correção monetária incidente
pleiteando o pagamento de di- sobre o saldo das referidas contas,
ferenças de correção monetária nos termos do art. 1º do Decreto-
expurgos inflacionários no sal- -Lei 20.910/32.
do das referidas contas.
547 Discute-se o direito dos Audi- Havendo previsão no título exe- REsp 1318315/AL 11/09/2013
tores Fiscais da Receita Fede- cutivo de exclusão de percentuais
ral referente à impossibilidade já concedidos, a mencionada im-
de compensação do reajuste posição, em sede de embargos à
de 28,86% com outros títulos execução, não importa violação
de natureza diversa do reajus- da coisa julgada.
te previsto pelas Leis 8.622 e
8.627/93, sob pena de ofensa à
coisa julgada.
548 Discute-se a possibilidade O índice de 28,86% incide nor- REsp 1318315/AL 11/09/2013
de incidência do reajuste de malmente sobre a RAV.
28,86% sobre a Retribuição
de Adicional Variável - RAV,
devida aos Auditores Fiscais
posicionados no último padrão
de vencimento quando da edi-
ção da Lei 8.627/93.
549 Discute-se o direito dos Audi- É cabível a limitação ao pagamen- REsp 1318315/AL 11/09/2013
tores Fiscais da Receita Fede- to do reajuste de 28,86% à data
ral referente à fixação como li- de reestruturação da carreira pro-
mite temporal à incidência do movida pela Medida Provisória n.
reajuste de 28,86% a data da 1.915/99, a fim de que o percentu-
vigência da Medida Provisória al em comento seja absorvido pe-
n. 1.915/99. los novos padrões remuneratórios
estabelecidos.
550 Discute-se a necessidade de É despicienda a homologação REsp 1318315/AL 11/09/2013
homologação judicial para va- judicial do termo de transação
lidar os acordos extrajudiciais extrajudicial, posto que inviável
celebrados para percepção das a execução de tal providência,
vantagens, na forma do art. diante da inexistência, à época
7º da Medida Provisória n. da celebração do acordo, de de-
2.169/2001. manda judicial entre as partes
transigentes.
551 Discute-se a legitimidade pas- Legitimidade passiva da Brasil REsp 1322624/SC 12/06/2013
siva da BRASIL TELECOM Telecom S/A para responder pelos
S/A para responder pelas ações atos praticados pela Telesc, quan-
não subscritas da Telecomuni- to a credores cujo título não tiver
cações Santa Catarina-Telesc. sido constituído até o ato de in-
corporação, independentemente
de se referir a obrigações anterio-
res, ante a sucessão empresarial.

436
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

552 Questão referente ao prazo O termo final do prazo para o REsp 1112864/MG 19/11/2014
decadencial para a propositura ajuizamento da ação rescisória,
da ação rescisória previsto no embora decadencial, prorroga-se
art. 495 do Diploma Proces- para o primeiro dia útil subse-
sual deve ser prorrogado para quente, se recair em dia de não
o primeiro dia útil seguinte, funcionamento da secretaria do
quando cair em fim de semana Juízo competente.
ou feriado, nos exatos termos
do art. 184, § 1.º, inciso I, do
Código de Processo Civil.
553 Discute o prazo prescricional Aplica-se o prazo prescricional REsp 1251993/PR 12/12/2012
em ação indenizatória ajuizada quinquenal - previsto do Decreto
contra a Fazenda Pública. 20.910/32 - nas ações indenizatórias
ajuizadas contra a Fazenda Pública,
em detrimento do prazo trienal con-
tido do Código Civil de 2002.
554 Discute-se a possibilidade de Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A REsp 1321493/PR 10/10/2012
admitir prova exclusivamente prova exclusivamente testemu-
testemunhal (art. 55, § 3º, da nhal não basta à comprovação da
Lei 8.213/1991) para configurar atividade rurícola, para efeitos da
tempo de serviço rural para fins obtenção de benefício previden-
previdenciários no caso do tra- ciário') aos trabalhadores rurais
balhador denominado 'boia-fria'. denominados 'boias-frias', sendo
imprescindível a apresentação de
início de prova material. Por outro
lado, considerando a inerente difi-
culdade probatória da condição de
trabalhador campesino, a apresen-
tação de prova material somente
sobre parte do lapso temporal pre-
tendido não implica violação da
Súmula 149/STJ, cuja aplicação é
mitigada se a reduzida prova mate-
rial for complementada por idônea
e robusta prova testemunhal.
555 Discute-se a possibilidade de A acumulação do auxílio-acidente REsp 1296673/MG 22/08/2012
cumular auxílio-acidente com com proventos de aposentadoria
aposentadoria, diante do art. pressupõe que a eclosão da lesão
86, § 3º, da Lei 8.213/91, com a incapacitante, apta a gerar o direi-
redação dada pela Medida Pro- to ao auxílio-acidente, e a conces-
visória 1.596-14/97 (D.O.U. são da aposentadoria sejam ante-
11.11.1997), posteriormente riores à alteração do art. 86, §§ 2º
convertida na Lei n. 9.528/97. e 3º, da Lei 8.213/1991, promovida
em 11.11.1997 pela Medida Provi-
sória 1.596-14/1997, posteriormen-
te convertida na Lei 9.528/1997.

437
Maria Cecília de Araujo Asperti

556 Discute-se a possibilidade de Para fins de fixação do momento REsp 1296673/MG 22/08/2012
cumular auxílio-acidente com em que ocorre a lesão incapaci-
aposentadoria, diante do art. tante em casos de doença pro-
86, § 3º, da Lei 8.213/91, com a fissional ou do trabalho, deve ser
redação dada pela Medida Pro- observada a definição do art. 23
visória 1.596-14/97 (D.O.U. da Lei 8.213/1991, segundo a qual
11.11.1997), posteriormente 'considera-se como dia do aciden-
convertida na Lei n. 9.528/97. te, no caso de doença profissional
ou do trabalho, a data do início
da incapacidade laborativa para
o exercício da atividade habitual,
ou o dia da segregação compulsó-
ria, ou o dia em que for realizado
o diagnóstico, valendo para este
efeito o que ocorrer primeiro'.
558 Questiona-se a faculdade ou Prescreve o art. 38 da Lei nº REsp 1161522/AL 12/12/2012
obrigatoriedade de a institui- 10.150/2000 que as instituições
ção financeira promover o ar- financeiras captadoras de depósi-
rendamento imobiliário espe- tos à vista e que operem crédito
cial previsto no art. 38, caput imobiliário estão autorizadas, e
e § 2º da Lei nº 10.150/2000. não obrigadas, a promover con-
trato de Arrendamento Imobi-
liário Especial com Opção de
Compra, dos imóveis que tenham
arrematado, adjudicado ou rece-
bido em dação em pagamento por
força de financiamentos habita-
cionais por elas concedidos.
560 Questão referente ao prazo de Em se tratando de pedido relativo REsp 1249321/RS 10/04/2013
prescrição da pretensão de res- a valores para cujo ressarcimen-
tituição de valores pagos para to não havia previsão contratual
o custeio de extensão de rede (pactuação prevista em instru-
de energia elétrica. mento, em regra, nominado de
'TERMO DE CONTRIBUI-
ÇÃO'), a pretensão prescreve
em 20 (vinte) anos, na vigência
do Código Civil de 1916, e em 3
(três) anos, na vigência do Códi-
go Civil de 2002, por se tratar de
demanda fundada em enriqueci-
mento sem causa (art. 206, § 3º,
inciso IV), observada, igualmen-
te, a regra de transição prevista
no art. 2.028 do Código Civil de
2002.
561 FURTO QUALIFICADO PE Afigura-se absolutamente 'possí- REsp 1193194/MG 22/08/2012
LO CONCURSO DE AGEN- vel o reconhecimento do privilé-
TES. COMPATIBILIDADE gio previsto no § 2º do art. 155 do
COM A MODALIDADE PRI- Código Penal nos casos de furto
VILEGIADA PREVISTA NO qualificado (CP, art. 155, § 4º)',
ART. 155, § 2º, DO CP. máxime se presente qualificadora
de ordem objetiva, a primarieda-
de do réu e, também, o pequeno
valor da res furtiva.

438
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

564 Discute-se a necessidade de Em ação monitória fundada em REsp 1094571/SP 04/02/2013


descrição da causa debendi para cheque prescrito, ajuizada em
ajuizamento de ação monitória face do emitente, é dispensável
embasada em cheque prescrito. menção ao negócio jurídico subja-
cente à emissão da cártula.
572 Questiona se a existência/ine- A análise acerca da legalidade da REsp 1124552/RS 03/12/2014
xistência de juros capitalizados utilização da Tabela Price - mesmo
em contratos que utilizam a que em abstrato - passa, neces-
Tabela Price é matéria de fato sariamente, pela constatação da
- e por isso demandaria a rea- eventual capitalização de juros
lização de provas - ou exclusi- (ou incidência de juros compos-
vamente jurídica, dispensada a tos, juros sobre juros ou anatocis-
dilação probatória. mo), que é questão de fato e não
de direito, motivo pelo qual não
cabe ao Superior Tribunal de Jus-
tiça tal apreciação, em razão dos
óbices contidos nas Súmulas 5 e
7 do STJ.É exatamente por isso
que, em contratos cuja capitaliza-
ção de juros seja vedada, é neces-
sária a interpretação de cláusulas
contratuais e a produção de prova
técnica para aferir a existência
da cobrança de juros não linea-
res, incompatíveis, portanto, com
financiamentos celebrados no
âmbito do Sistema Financeiro da
Habitação antes da vigência da Lei
n. 11.977/2009, que acrescentou o
art. 15-A à Lei n. 4.380/1964. Em
se verificando que matérias de fato
ou eminentemente técnicas foram
tratadas como exclusivamente de
direito, reconhece-se o cercea-
mento, para que seja realizada a
prova pericial.
574 Estabelecer o prazo prescri- A pretensão de ressarcimento do REsp 1220934/RS 24/04/2013
cional para a pretensão de co- valor pago pelo custeio de Plan-
brança dos valores pagos pelo tas Comunitárias de Telefonia
consumidor a título de contri- (PCTs), não existindo previsão
buição para a construção das contratual de reembolso pecuni-
chamadas Plantas Comunitá- ário ou por ações da companhia,
rias de Telefonia. submete-se ao prazo de prescrição
de 20 (vinte) anos, na vigência do
Código Civil de 1916 (art. 177), e
de 3 (três) anos, na vigência do
Código Civil de 2002, por se tra-
tar de demanda fundada em enri-
quecimento sem causa (art. 206, §
3º, inc. IV), observada a fórmula
de transição prevista no art. 2.028
do mesmo diploma legal.

439
Maria Cecília de Araujo Asperti

575 Questão referente à pretensão 1. A participação financeira do REsp 1243646/PR 10/04/2013


de restituição dos valores pa- consumidor no custeio de cons-
gos para o custeio de extensão trução de rede elétrica não é,
de rede de energia elétrica. por si só, ilegal, uma vez que, na
vigência do Decreto n. 41.019/57,
havia previsão normativa de
obras que deviam ser custeadas
pela concessionária (art. 141),
pelo consumidor (art. 142), ou
por ambos (art.138 e art. 140).2.
Em contratos regidos pelo De-
creto n. 41.019/57, o consumidor
que solicitara a extensão da rede
de eletrificação rural não tem
direito à restituição dos valores
aportados, salvo na hipótese de
(i) ter adiantado parcela que ca-
bia à concessionária - em caso de
responsabilidade conjunta (arts.
138 e 140) - ou (ii) ter custeado
obra cuja responsabilidade era
exclusiva da concessionária (art.
141). Leva-se em consideração,
em ambos os casos, a normatiza-
ção editada pelo Departamento
Nacional de Águas e Energia
Elétrica - DNAEE, que definia os
encargos de responsabilidade da
concessionária e do consumidor,
relativos a pedidos de extensão de
redes de eletrificação, com base
na natureza de cada obra.3. À
míngua de comprovação de que
os valores cuja restituição se plei-
teia eram de responsabilidade da
concessionária, não sendo o caso
de inversão do ônus da prova e
não existindo previsão contratu-
al para o reembolso, o pedido de
devolução deve ser julgado impro-
cedente.
576 Discute-se a força executiva da A Cédula de Crédito Bancário REsp 1291575/PR 14/08/2013
Cédula de Crédito Bancário, é título executivo extrajudicial,
título de crédito disciplinado representativo de operações de
pela Lei n. 10.931/2004. crédito de qualquer natureza, cir-
cunstância que autoriza sua emis-
são para documentar a abertura
de crédito em conta-corrente, nas
modalidades de crédito rotativo
ou cheque especial.

440
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

577 Discussão referente à forma de Em contratos submetidos ao Có- REsp 1300418/SC 13/11/2013
devolução dos valores devidos digo de Defesa do Consumidor, é
ao promitente comprador (se abusiva a cláusula contratual que
imediatamente ou somente ao determina a restituição dos valo-
término da obra) em razão da res devidos somente ao término
rescisão do contrato de promes- da obra ou de forma parcelada, na
sa de compra e venda de imóvel. hipótese de resolução de contato
de promessa de compra e venda
de imóvel, por culpa de qualquer
dos contratantes.
578 Discute se a parte executada, Em princípio, nos termos do art. REsp 1337790/PR 12/06/2013
ainda que não apresente ele- 9°, III, da Lei 6.830/1980, cumpre
mentos concretos que justifi- ao executado nomear bens à pe-
quem a incidência do princípio nhora, observada a ordem legal. É
da menor onerosidade (art. 620 dele o ônus de comprovar a im-
do CPC), possui direito subjeti- periosa necessidade de afastá-la,
vo à aceitação do bem por ela e, para que essa providência seja
nomeado à penhora em Execu- adotada, mostra-se insuficiente a
ção Fiscal, em desacordo com a mera invocação genérica do art.
ordem prevista nos arts. 11 da 620 do CPC.
lei 6.830/1980 e 655 do CPC.
580 Discute-se a prerrogativa de Em execução fiscal ajuizada por REsp 1330473/SP 12/06/2013
o procurador de Conselho de Conselho de Fiscalização Profis-
Fiscalização ser intimado pes- sional, seu representante judicial
soalmente nos autos de execu- possui a prerrogativa de ser pesso-
ção fiscal, nos termos do art. almente intimado.
25 da Lei 6.830/80.
581 Questão relativa à natureza Os crimes de estupro e atenta- REsp 1110520/SP 26/09/2012
hedionda dos crimes de es- do violento ao pudor pratica-
tupro e atentado violento ao dos antes da edição da Lei nº
pudor quando praticados na 12.015/2009, ainda que em sua
forma simples. forma simples, configuram moda-
lidades de crime hediondo.
582 SERVIDOR PÚBLICO FE- A Lei n. 11.907/2009, que (...) REsp 1343065/PR 28/11/2012
DERAL. LEI 11.907/09. PLA- produziu efeitos financeiros re-
NO ESPECIAL DE CARGOS troativos a 1/7/2008, determinou
E SALÁRIOS DO MINISTÉ- a incorporação da GAE ao ven-
RIO DA FAZENDA. GRATI- cimento básico dos servidores a
FICAÇÃO DE ATIVIDADE partir de 1/7/2008 e estabeleceu
EXECUTIVA. GAE. INCOR- que, para evitar pagamento em
PORAÇÃO AO VENCI- duplicidade dos valores da GAE,
MENTO BÁSICO. a nova remuneração (que já con-
tinha os valores da GAE incorpo-
rados) não poderia ser cumulada
com os valores já percebidos an-
teriormente pelos servidores a
título de GAE.

441
Maria Cecília de Araujo Asperti

584 Discute-se, com base na Lei Em se tratando de demanda em REsp 1344771/PR 24/04/2013
de Diretrizes e Bases da Edu- que se discute a ausência/obstácu-
cação, a competência para lo de credenciamento da institui-
o julgamento de demandas ção de ensino superior pelo Minis-
referentes à existência de obs- tério da Educação como condição
táculo à obtenção do diploma de expedição de diploma aos estu-
após a conclusão de curso de dantes, é inegável a presença de
ensino a distância, por causa interesse jurídico da União, razão
da ausência/obstáculo de cre- pela qual deve a competência ser
denciamento da instituição de atribuída à Justiça Federal, nos ter-
ensino superior pelo Ministé- mos do art. 109, I, da Constituição
rio da Educação. Federal de 1988.
585 Discute-se a possibilidade de É possível, na segunda fase da REsp 1341370/MT 10/04/2013
compensação da atenuante da dosimetria da pena, a compen-
confissão espontânea com a sação da atenuante da confissão
agravante da reincidência. espontânea com a agravante da
reincidência.
589 Discute-se a possibilidade de Ajuizada ação coletiva atinente a REsp 1353801/RS 14/08/2013
suspensão, nos termos da legis- macro-lide geradora de processos
lação vigente, do andamento multitudinários, suspendem-se as
de inúmeros processos até o ações individuais, no aguardo do
julgamento em ação coletiva julgamento da ação coletiva.
da tese jurídica de fundo neles
indicada.
590 EXECUÇÃO FISCAL. RES- As informações sigilosas das par- REsp 1349363/SP 22/05/2013
POSTA DAS INSTITUIÇÕES tes devem ser juntadas aos autos
FINANCEIRAS AO OFÍCIO do processo que correrá em segre-
DE REQUISIÇÃO DE IN- do de justiça, não sendo admitido
FORMAÇÃO DE ATIVOS o arquivamento em apartado.
FINANCEIROS VIA BACEN-
-JUD. DOCUMENTOS SIGI-
LOSOS. DISCUSSÃO A RES-
PEITO DA NECESSIDADE
DE ARQUIVAMENTO EM
"PASTA PRÓPRIA" FORA
DOS AUTOS OU DECRETA-
ÇÃO DE SEGREDO DE JUS-
TIÇA. ART. 155, I, DO CPC.
591 GRATIFICAÇÃO DE ATI- Não prospera a tese dos autores REsp 1353016/AL 12/06/2013
VIDADE EXECUTIVA - de que a supressão da GAE pelo
GAE. PERCEPÇÃO PELOS art. 59 da MP 2.048-26/0000 diz
ADVOGADOS DA UNIÃO. respeito apenas aos cargos referi-
MP N. 2.048-26/2000. dos no art. 1º desta medida pro-
visória (artigo este que não cita
o cargo de Advogado da União).
Isso porque o art. 41 da MP
2.048-26/0000, que menciona
o cargo de Advogado da União,
deve ser interpretado sistemática
e teleologicamente com o art. 59
do mesmo diploma legal.

442
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

593 PENAL E PROCESSO PE- Considera-se "típica, formal e ma- REsp 1193196/MG 26/09/2012
NAL. RECURSO ESPECIAL. terialmente, a conduta prevista
OFENSA AO ART. 184, § 2°, no artigo 184, § 2º, do Código Pe-
DO CP. MERCANCIA DE nal, afastando, assim, a aplicação
CD'S E DVD'S "PIRATAS". do princípio da adequação social,
ATIPICIDADE DA CON- de quem expõe à venda CD's E
DUTA EM FACE DO PRIN- DVD's 'piratas'."
CÍPIO DA ADEQUAÇÃO
SOCIAL.
594 Discute-se a possibilidade de As empresas concessionárias de ve- REsp 1339767/SP 26/06/2013
recolhimento do PIS e da CO- ículos, em relação aos veículos no-
FINS, utilizando como base de vos, devem recolher PIS e COFINS
cálculo somente a diferença na forma dos arts.. 2º e 3º, da Lei
entre o valor de alienação dos n. 9.718/98, ou seja, sobre a receita
veículos novos que transaciona bruta/faturamento (compreenden-
e o respectivo custo repassado do o valor da venda do veículo ao
para a montadora que os for- consumidor) e não sobre a diferen-
nece ("margem de lucro"), e ça entre o valor de aquisição do ve-
não sobre o preço de venda ículo junto à fabricante concedente
fixado pela pessoa jurídica fa- e o valor da venda ao consumidor
bricante (montadora). (margem de lucro).
595 PIS/PASEP E COFINS. ART. Reconhecido o direito à repetição REsp 1354506/SP 14/08/2013
3º, §1º, DA LEI N. 9.718/98. de indébito com base na incons-
DISCUSSÃO A RESPEITO titucionalidade do art. 3º, § 1º,
DO CONCEITO DE FATU- da Lei n. 9.718/98, deve ser reco-
RAMENTO/RECEITA BRU- nhecido o mesmo direito após a
TA PARA AS PESSOAS JURÍ- vigência das Leis n. 10.637/2002
DICAS TRIBUTADAS PELO e 10.833/2003 para as pessoas ju-
IMPOSTO DE RENDA COM rídicas tributadas pelo imposto
BASE NO LUCRO PRESUMI- de renda com base no lucro pre-
DO OU ARBITRADO. ART. sumido ou arbitrado, diante da
8º, II, DA LEI N. 10.637/2002 aplicação do art. 8º, II, da Lei n.
(PIS) E ART. 10, II, DA LEI N. 10.637/2002 e do art. 10, II, da Lei
10.833/2003 (COFINS). n. 10.833/2003, que excluem tais
pessoas jurídicas da cobrança não-
-cumulativa do PIS e da COFINS.
596 Posse ilegal de arma de fogo de É típica a conduta de possuir REsp 1311408/RN 13/03/2013
uso permitido com numeração arma de fogo de uso permitido
raspada, suprimida ou adulte- com numeração, marca ou qual-
rada (art. 16, parágrafo único, quer outro sinal de identificação
IV, da Lei n. 10.826/2003). raspado, suprimido ou adultera-
Abolitio criminis temporária. do, praticada após 23/10/2005,
Prorrogações. Termo final. pois, em relação a esse delito, a
abolitio criminis temporária ces-
sou nessa data, termo final da
prorrogação dos prazos previstos
na redação original dos arts.. 30 e
32 da Lei n. 10.826/2003.

443
Maria Cecília de Araujo Asperti

598 Questão referente à possibili- À mingua de lei expressa, a ins- REsp 1350804/PR 12/06/2013
dade de inscrição em dívida crição em dívida ativa não é a for-
ativa de benefício previdenci- ma de cobrança adequada para os
ário indevidamente recebido, valores indevidamente recebidos
qualificado como enriqueci- a título de benefício previdenciá-
mento ilícito. rio previstos no art. 115, II, da Lei
n. 8.213/91 que devem submeter-
-se a ação de cobrança por enri-
quecimento ilícito para apuração
da responsabilidade civil.
599 Discute-se a possibilidade das O art. 53, inciso V, da Lei 9394/96 REsp 1349445/SP 08/05/2013
Universidades fixarem regras permite à universidade fixar nor-
específicas para o recebimento mas específicas a fim de discipli-
e processamento dos pedidos de nar o referido processo de revali-
revalidação de Diploma obtido dação de diplomas de graduação
em Universidade estrangeira. expedidos por estabelecimentos
estrangeiros de ensino superior,
não havendo qualquer ilegalidade
na determinação do processo se-
letivo para a revalidação do diplo-
ma, porquanto decorre da neces-
sidade de adequação dos procedi-
mentos da instituição de ensino
para o cumprimento da norma,
uma vez que de outro modo não
teria a universidade condições
para verificar a capacidade técni-
ca do profissional e sua formação,
sem prejuízo da responsabilidade
social que envolve o ato.
601 Questão referente à validade É válida a intimação do represen- REsp 1352882/MS 12/06/2013
da intimação da Fazenda Na- tante da Fazenda Nacional por
cional, feita por meio de carta, carta com aviso de recebimento
em razão de sua sede possuir (art. 237, II, do CPC) quando o
localização em cidade distinta respectivo órgão não possui sede
da Comarca em que tramita a na Comarca de tramitação do
Execução Fiscal (inteligência feito.
do art. 25 da Lei 6.830/1980,
do art. 38 da LC 73/1993 e do
art. 20 da Lei 11.033/2004).

444
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

602 Discute-se a constatação de A incorporação da PAM aos REsp 1336213/RS 12/06/2013


interesse processual e da ocor- vencimentos dos servidores con-
rência da prescrição do fundo tinua a gerar efeitos financeiros
de direito da pretensão de in- de trato sucessivo, de forma que a
cidência dos reajustes da Lei revisão daquela parcela repercute
Estadual 10.395/1995 sobre o continuamente na esfera jurídico-
percentual de 20% da Parce- -patrimonial do servidor. Incide
la Autônoma do Magistério no caso a regra geral da Súmula
(PAM) do Rio Grande do Sul. 85/STJ, segundo a qual 'nas rela-
ções jurídicas de trato sucessivo
em que a Fazenda Pública figure
como devedora, quando não tiver
sido negado o próprio direito re-
clamado, a prescrição atinge ape-
nas as prestações vencidas antes
do quinquênio anterior à proposi-
tura da ação.'
603 Discute-se a possibilidade de O militar anistiado tem direi- REsp 1357700/RJ 12/06/2013
promoção de anistiado políti- to a todas as promoções a que
co (art. 6º da Lei 10.559/2002) faria jus se na ativa estivesse,
para carreira militar diversa da considerando-se a situação dos
que ele integra. paradigmas (§ 4º do art. 6º da Lei
10.529/2002). A possibilidade de
promoção, contudo, é restrita ao
quadro de carreira a que o militar
pertencia à época da concessão
da anistia política.
604 Discussão a respeito da pos- A decadência, consoante a letra REsp 1355947/SP 12/06/2013
sibilidade de documento de do art. 156, V, do CTN, é forma
confissão de dívida tributária de extinção do crédito tributário.
poder constituir o crédito tri- Sendo assim, uma vez extinto o
butário mesmo após o prazo direito, não pode ser reavivado
decadencial previsto no art. por qualquer sistemática de lan-
173, I, do CTN. çamento ou auto-lançamento,
seja ela via documento de confis-
são de dívida, declaração de dé-
bitos, parcelamento ou de outra
espécie qualquer (DCTF, GIA,
DCOMP, GFIP, etc.).
606 Questão referente à possibi- Em ação de cobrança objetivando REsp 1357813/RJ 11/09/2013
lidade do o ajuizamento de indenização decorrente de Segu-
ação de cobrança referente ao ro Obrigatório de Danos Pessoais
seguro obrigatório DPVAT no Causados por Veículos Automo-
foro de domicílio da ré, não tores de Vias Terrestres - DPVAT,
podendo o Juízo declinar de constitui faculdade do autor esco-
ofício da competência para o lher entre os seguintes foros para
julgamento da ação. ajuizamento da ação: o do local
do acidente ou o do seu domicílio
(parágrafo único do art. 100 do
Código de Processo Civil); bem
como, ainda, o do domicílio do
réu (art. 94 do mesmo Diploma).

445
Maria Cecília de Araujo Asperti

608 Cinge-se a discussão em definir Não há impedimento constitucio- REsp 1347736/RS 09/10/2013
se o valor da execução pode ser nal, ou mesmo legal, para que os
fracionado, a ponto de permitir honorários advocatícios, quando
o pagamento dos honorários não excederem ao valor limite, pos-
advocatícios por meio de RPV sam ser executados mediante RPV,
e o crédito principal por meio ainda que o crédito dito 'principal'
de precatórios judicial. observe o regime dos precatórios.
610 Discussão sobre o prazo pres- Na vigência dos contratos de REsp 1360969/RS 10/08/2016
cricional para exercício da pre- plano ou de seguro de assistência
tensão de revisão de cláusula à saúde, a pretensão condena-
contratual que prevê reajuste tória decorrente da declaração
de plano de saúde e respectiva de nulidade de cláusula de rea-
repetição dos valores suposta- juste nele prevista prescreve em
mente pagos a maior. 20 anos (art. 177 do CC/1916)
ou em 3 anos (art. 206, § 3º, IV,
do CC/2002), observada a regra
de transição do art. 2.028 do
CC/2002.
611 Cinge-se a discussão em fixar O art. 1º-F da Lei 9.494/97, com REsp 1356120/RS 14/08/2013
o termo inicial dos juros mora- a redação da Lei 11.960/09, não
tórios incidentes sobre diferen- modificou o termo a quo de inci-
ças remuneratórias cobradas dência dos juros moratórios sobre
em juízo por servidor públi- as obrigações ilíquidas devidas
co. Para o acórdão recorrido, pela Administração ao servidor
com o advento do art. 1º-F da público, aplicando-se, conse-
Lei 9.494/97, redação da Lei quentemente, as regras constan-
11.960/09, os juros incidem a tes dos arts. 219 do CPC e 405 do
partir da data em que deveria Código Civil, os quais estabele-
ter sido adimplida cada par- cem a citação como marco inicial
cela, enquanto o recorrente da referida verba.
defende que o termo inicial é
a data da citação, nos termos
dos arts. 219 do CPC, e 405 do
CC, disciplina que não sofreu
qualquer alteração com o art.
1º-F, que nada dispõe sobre o
termo inicial dos juros.
612 Questão referente à possibilida- Da simples leitura do artigo em REsp 1363163/SP 11/09/2013
de de aplicação do artigo 20 da comento, verifica-se que a deter-
Lei 10.522/2002, que determina minação nele contida, de arquiva-
o arquivamento provisório das mento, sem baixa, das execuções
execuções de pequeno valor, fiscais referentes aos débitos com
às execuções fiscais propostas valores inferiores a R$ 10.000,00
pelos Conselhos Regionais de (dez mil reais) destina-se exclu-
Fiscalização Profissional. sivamente aos débitos inscritos
como dívida ativa da União, pela
Procuradoria da Fazenda Nacio-
nal ou por ela cobrados.
614 DÉBITOS TRIBUTÁRIOS Inexiste óbices à penhora, em REsp 1355812/RS 22/05/2013
DA MATRIZ. DISCUSSÃO face de dívidas tributárias da ma-
A RESPEITO DA POSSIBI- triz, de valores depositados em
LIDADE DE BLOQUEIO DE nome das filiais.
DEPÓSITOS DE TITULA-
RIDADE DAS FILIAIS.

446
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

615 Cinge-se a discussão em de- A Convenção Regional sobre o REsp 1215550/PE 23/09/2015
finir se diploma estrangeiro, Reconhecimento de Diploma de
expedido em um dos países Ensino Superior na América La-
signatários da Convenção Re- tina e no Caribe, aprovada pelo
gional sobre o Reconhecimen- Decreto Legislativo n.º 66/77 e
to de Diploma de Ensino Su- promulgada pelo Decreto Pre-
perior na América Latina e no sidencial n.º 80.419/77, possui
Caribe, aprovada pelo Decreto nítido caráter programático ao
Legislativo n.º 66/77 e promul- determinar que os países signa-
gada pelo Decreto Presidencial tários criem mecanismos para
n.º 80.419/77, deve ser registra- torná-la efetiva, inexistindo, por-
do automaticamente no país, tanto, determinação específica
independentemente de proces- de reconhecimento automático
so de revalidação. dos diplomas. Concluiu-se, no
presente julgado, que o Decreto
nº 80.419/77:1) não foi revogado
pelo Decreto n. 3.007/99;2) não
traz norma específica que vede
o procedimento de revalidação
dos diplomas que têm respaldo
nos artigos 48 e 53, V, da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação
Brasileira.
618 Questão referente à possibili- Nos contratos bancários celebrados REsp 1251331/RS 28/08/2013
dade de cobranças das taxas/ até 30/04/2008 (fim da vigência
tarifas administrativas para da Resolução CMN 2.303/96) era
abertura de crédito e de emis- válida a pactuação das Tarifas de
são de carnê e de pagamento Abertura de Crédito (TAC) e de
parcelado do Imposto sobre Emissão de Carnê (TEC), ou outra
Operações Financeiras (IOF), denominação para o mesmo fato
dentre outros encargos. gerador, ressalvado o exame de
abusividade em cada caso concreto.
619 Questão referente à possibili- Com a vigência da Resolução REsp 1251331/RS 28/08/2013
dade de cobranças das taxas/ CMN 3.518/2007, em 30/04/2008,
tarifas administrativas para a cobrança por serviços bancários
abertura de crédito e de emis- prioritários para pessoas físicas
são de carnê e de pagamento ficou limitada às hipóteses taxa-
parcelado do Imposto sobre tivamente previstas em norma
Operações Financeiras (IOF), padronizadora expedida pela
dentre outros encargos. autoridade monetária. Desde
então, não tem respaldo legal a
contratação da Tarifa de Emissão
de Carnê (TEC) e da Tarifa de
Abertura de Crédito (TAC), ou
outra denominação para o mesmo
fato gerador.
620 Questão referente à possibili- Permanece válida a tarifa de ca- REsp 1251331/RS 28/08/2013
dade de cobranças das taxas/ dastro expressamente tipificada
tarifas administrativas para em ato normativo padronizador da
abertura de crédito e de emis- autoridade monetária, a qual so-
são de carnê e de pagamento mente pode ser cobranda do início
parcelado do Imposto sobre do relacionamento entre o consu-
Operações Financeiras (IOF), midor e a instituição financeira.
dentre outros encargos.

447
Maria Cecília de Araujo Asperti

621 Questão referente à possibili- Podem as partes convencionar REsp 1251331/RS 28/08/2013
dade de cobranças das taxas/ o pagamento do Imposto sobre
tarifas administrativas para Operações Financeiras e de Cré-
abertura de crédito e de emis- dito (IOF) por meio de financia-
são de carnê e de pagamento mento acessório ao mútuo prin-
parcelado do Imposto sobre cipal, sujeitando-o aos mesmos
Operações Financeiras (IOF), encargos contratuais.
dentre outros encargos.
622 Discute-se a necessidade ou A aplicação da sanção civil do REsp 1111270/PR 25/11/2015
não de ajuizamento de ação pagamento em dobro por cobran-
autônoma ou de oferecimento ça judicial de dívida já adimplida
de reconvenção para que o réu (cominação encartada no artigo
faça jus à devolução em dobro 1.531 do Código Civil de 1916, re-
por cobrança de dívida paga produzida no artigo 940 do Código
(artigo 1.531 do Código Civil Civil de 2002) pode ser postulada
de 1916, atual artigo 940 do pelo réu na própria defesa, inde-
Código Civil de 2002). pendendo da propositura de ação
autônoma ou do manejo de recon-
venção, sendo imprescindível a
demonstração de má-fé do credor.
624 Discute-se a isenção da Co- As receitas auferidas a título de REsp 1353111/RS 23/09/2015
fins às atividades próprias das mensalidades dos alunos de insti-
entidades sem fins lucrativos tuições de ensino sem fins lucrati-
para fins de gozo da isenção vos são decorrentes de "atividades
prevista no art. 14, X, da MP próprias da entidade", conforme
n. 2.158-35/2001. Verificação o exige a isenção estabelecida no
da legalidade do art. 47, II e art. 14, X, da Medida Provisória
§ 2º, da Instrução Normativa n. 1.858/99 (atual MP n. 2.158-
SRF n. 247/2002. Sociedade 35/2001), sendo flagrante a ilici-
civil educacional ou de caráter tude do art. 47, § 2º, da IN/SRF n.
cultural e científico. 247/2002, nessa extensão.
625 Questão referente à isenção O benefício da isenção do prepa- REsp 1338247/RS 10/10/2012
das entidades de fiscalização ro, conferido aos entes públicos
profissional do preparo de re- previstos no art. 4º, caput, da Lei
cursos nos feitos que tramitam 9.289/1996, é inaplicável aos Con-
no âmbito da Justiça Federal. selhos de Fiscalização Profissional.
626 Questão referente ao termo A citação válida informa o litígio, REsp 1369165/SP 26/02/2014
inicial do benefício aposenta- constitui em mora a autarquia
doria por invalidez, deferido previdenciária federal e deve ser
na via judicial e sem requeri- considerada como termo inicial
mento administrativo anterior, para a implantação da aposen-
deve ser fixado na data do lau- tadoria por invalidez concedida
do médico-pericial. na via judicial quando ausente a
prévia postulação administrativa.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

628 Questiona se o transcurso do O prazo para ajuizamento de ação REsp 1101412/SP 11/12/2013
prazo prescricional previsto monitória em face do emitente
no artigo 61 da Lei do Cheque de cheque sem força executiva é
não impõe a perda da preten- quinquenal, a contar do dia se-
são, pois, embora a ação mo- guinte à data de emissão estam-
nitória não ostente natureza pada na cártula.
cambial, o cheque prescrito
serve como prova escrita do
crédito oriundo relação cau-
sal, que, para admissibilidade
da ação, não se submete ao
mesmo prazo prescricional da
obrigação cambiária.
630 Discute a possibilidade de redi- Em execução fiscal de dívida ati- REsp 1371128/RS 10/09/2014
recionamento da execução fis- va tributária ou não-tributária,
cal contra o diretor da empresa dissolvida irregularmente a em-
executada, por dívida de natu- presa, está legitimado o redirecio-
reza não tributária, diante de namento ao sócio-gerente.
indícios de dissolução irregular,
nos termos da legislação civil.
631 SERVIDOR PÚBLICO FE- À luz do art. 120, § 5º, da Lei n. REsp 1343128/SC 12/06/2013
DERAL. DOCENTE. CAR- 11.784/2008, até que fosse publi-
REIRA DO MAGISTÉRIO cado o regulamento, as regras de
DE ENSINO BÁSICO, TÉC- progressão dos docentes da carrei-
NICO E TECNOLÓGICO. ra do magistério básico, técnico e
PROGRESSÃO FUNCIO- tecnológico federal seriam regidas
NAL. LEI 11.784/08. CON- pelas disposições da anterior Lei
DIÇÃO DE EFICÁCIA. NE- n. 11.344/2006, que previa duas
CESSIDADE DE REGULA- possibilidades de progressão: por
MENTAÇÃO. LEI 11.344/06. interstício, com avaliação; e por
titulação, sem observância do in-
terstício.
633 Discute-se a legalidade da im- O artigo 6º, § 1º, da Lei nº 11.941, REsp 1353826/SP 12/06/2013
posição de honorários advoca- de 2009, só dispensou dos hono-
tícios de sucumbência à parte rários advocatícios o sujeito passi-
que renuncia ao direito ou de- vo que desistir de ação judicial em
siste da ação, na forma do art. que requeira 'o restabelecimento
6°, § 1°, da Lei 11.941/2009, de sua opção ou a sua reinclusão
para os fins de aderir ao parce- em outros parcelamentos'. Nas
lamento tributário regido por demais hipóteses, à míngua de
esse diploma legal. disposição legal em sentido con-
trário, aplica-se o artigo 26, ca-
put, do Código de Processo Civil,
que determina o pagamento dos
honorários advocatícios pela par-
te que desistiu do feito.
634 Discute-se a inclusão do ISS O valor suportado pelo benefi- REsp 1330737/SP 10/06/2015
na base de cálculo da CO- ciário do serviço, nele incluindo
FINS/PIS. a quantia referente ao ISSQN,
compõe o conceito de receita ou
faturamento para fins de adequa-
ção à hipótese de incidência do
PIS e da COFINS.

449
Maria Cecília de Araujo Asperti

636 Cinge-se a discussão em saber O disposto no art. 20 da Lei n. REsp 1343591/MA 11/12/2013
se a orientação jurisprudencial 10.522/2002 não se aplica às exe-
já sedimentada nesta Corte cuções de créditos das autarquias
de que "as execuções fiscais federais cobrados pela Procurado-
relativas a débitos iguais ou ria-Geral Federal.
inferiores a R$ 10.000,00 (dez
mil reais) devem ter seus autos
arquivados, sem baixa na dis-
tribuição" deve ser estendida
aos executivos fiscais movidos
pelas autarquias federais.
637 Discute-se a ordem na qual os I -os créditos resultantes de ho- REsp 1152218/RS 07/05/2014
créditos resultantes de honorá- norários advocatícios têm natu-
rios advocatícios devem ser sa- reza alimentar e equiparam-se aos
tisfeitos no processo falimentar. trabalhistas para efeito de habili-
tação em falência, seja pela regên-
cia do Decreto-Lei n. 7.661/1945,
seja pela forma prevista na Lei n.
11.101/2005, observado o limite
de valor previsto no artigo 83, in-
ciso I, do referido Diploma legal.
II - são créditos extraconcursais
os honorários de advogado resul-
tantes de trabalhos prestados à
massa falida, depois do decreto de
falência, nos termos dos arts. 84 e
149 da Lei n. 11.101/2005.
638 Controvérsia acerca da possi- Mostra-se possível o reconheci- REsp 1348633/SP 28/08/2013
bilidade de reconhecimento mento de tempo de serviço ru-
do período de trabalho rural ral anterior ao documento mais
anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por
antigo juntado como início de convincente prova testemunhal,
prova material. colhida sob contraditório.
640 Discute-se a possibilidade de Aplica-se o parágrafo único do REsp 1355052/SP 25/02/2015
concessão de benefício previ- artigo 34 do Estatuto do Idoso
denciário ou benefício assis- (Lei n. 10.741/03), por analogia,
tencial, no valor de um salário a pedido de benefício assistencial
mínimo, recebido por idoso feito por pessoa com deficiência a
ou deficiente que faça parte fim de que benefício previdenci-
do núcleo familiar, não deve ário recebido por idoso, no valor
ser considerado na aferição de um salário mínimo, não seja
da renda per capita prevista computado no cálculo da renda
no artigo 20, § 3º, da Lei n. per capita prevista no artigo 20, §
8.742/93 ante a interpreta- 3º, da Lei n. 8.742/93.
ção do que dispõe o artigo
34, parágrafo único, da Lei n.
10.741/03 (Estatuto do Idoso).

450
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

641 Discussão: se o prazo para O prazo para ajuizamento de ação REsp 1262056/SP 11/12/2013
ajuizamento ação monitória monitória em face do emitente de
fundada em nota promissória nota promissória sem força execu-
prescrita é o previsto no artigo tiva é quinquenal, a contar do dia
206, § 5º, I, do Código Civil, seguinte ao vencimento do título.
pois, em que pese a prescrição,
constitui instrumento repre-
sentante de dívida líquida, cer-
ta e exigível.
642 Questão referente à atividade O segurado especial tem que es- REsp 1354908/SP 09/09/2015
rural deve ser comprovada no tar laborando no campo, quando
período imediatamente ante- completar a idade mínima para se
rior ao requerimento. aposentar por idade rural, momen-
to em que poderá requerer seu be-
nefício. Ressalvada a hipótese do
direito adquirido, em que o segu-
rado especial, embora não tenha
requerido sua aposentadoria por
idade rural, preenchera de forma
concomitante, no passado, ambos
os requisitos carência e idade.
643 Discussão acerca da possibili- Não há falar em restabelecimento REsp 1369832/SP 12/06/2013
dade de manutenção de pen- da pensão por morte ao benefici-
são por morte a filho maior de ário, maior de 21 anos e não in-
21 anos e não inválido. válido, diante da taxatividade da
lei previdenciária, porquanto não
é dado ao Poder Judiciário legislar
positivamente, usurpando função
do Poder Legislativo.
644 Discussão acerca da possibili- APOSENTADORIA POR REsp 1352791/SP 27/11/2013
dade ou não de concessão de TEMPO DE SERVIÇO. AVER-
aposentadoria por tempo de BAÇÃO DE TRABALHO RU-
serviço/contribuição a traba- RAL COM REGISTRO EM
lhador urbano mediante o côm- CARTEIRA PROFISSIONAL
puto de atividade rural com re- PARA EFEITO DE CARÊNCIA.
gistro em carteira profissional POSSIBILIDADE. (...) Mostra-
em período anterior ao advento -se incontroverso nos autos que o
da Lei 8.213/1991 para efeito da autor foi contratado por emprega-
carência exigida no art. 142 da dor rural, com registro em carteira
Lei de Benefícios. profissional desde 1958, razão pela
qual não há como responsabilizá-
-lo pela comprovação do recolhi-
mento das contribuições.
645 Discussão acerca da possibili- A norma extraída do caput do art. REsp 1348301/SC 27/11/2013
dade ou não de aplicar o prazo 103 da Lei 8.213/91 não se aplica
decadencial previsto no art. às causas que buscam o reconhe-
103 da Lei 8.213/91 aos casos cimento do direito de renúncia à
de desaposentação. aposentadoria, mas estabelece pra-
zo decadencial para o segurado ou
seu beneficiário postular a revisão
do ato de concessão do benefício, o
qual, se modificado, importará em
pagamento retroativo, diferente do
que se dá na desaposentação.

451
Maria Cecília de Araujo Asperti

646 DIREITO PENAL. ART. 307 É típica a conduta de atribuir-se REsp 1362524/MG 23/10/2013
DO CP. PRISÃO EM FLA- falsa identidade perante autoridade
GRANTE. FALSA IDENTIFI- policial, ainda que em situação de
CAÇÃO PERANTE AUTO- alegada autodefesa (art. 307 do CP).
RIDADE POLICIAL. AUTO-
DEFESA. INEXISTÊNCIA.
TIPICIDADE DA CONDUTA
DE FALSA IDENTIDADE.
647 Questão referente à possibili- Ao profissional formado em REsp 1361900/SP 12/11/2014
dade, ou não, de profissional educação física, na modalidade
formado no curso de três anos licenciatura de graduação plena,
de educação física, licenciatu- somente é permitido atuar na
ra plena, exercer a sua profis- educação básica, sendo-lhe defe-
são em toda e qualquer área re- so o exercício da profissão na área
laciona à educação física, sem não formal.
a restrição imposta pelo con-
selho Regional de Educação
Física do Estado de São Paulo.
648 Discussão envolvendo ação A propositura de ação cautelar de REsp 1349453/MS 10/12/2014
cautelar de exibição de docu- exibição de documentos bancários
mentos, em que se questiona (cópias e segunda via de documen-
o interesse de agir da parte, tos) é cabível como medida prepa-
alegando-se que o pedido de ratória a fim de instruir a ação
exibição de documentos deve- principal, bastando a demonstra-
ria ser feito no bojo da própria
ção da existência de relação jurí-
ação principal. dica entre as partes, a comprova-
ção de prévio pedido à instituição
financeira não atendido em prazo
razoável, e o pagamento do custo
do serviço conforme previsão con-
tratual e normatização da autori-
dade monetária.
649 Questão referente à legitimi- A pessoa jurídica não tem legiti- REsp 1347627/SP 09/10/2013
dade ou ilegitimidade da pes- midade para interpor recurso no
soa jurídica, originariamente interesse do sócio.
acionada, para interpor recur-
so contra o redirecionamento
da execução contra os sócios.
650 Questão relativa ao pagamento O benefício especial de renda REsp 1331168/RJ 12/11/2014
do "Benefício Especial de Ren- certa, instituído pela Caixa de
da Certa" exclusivamente para Previdência dos Funcionários do
os aposentados que, no período Banco do Brasil - PREVI, é devido
de atividade, completaram o exclusivamente aos assistidos que,
mínimo de 360 contribuições. no período de atividade, contribu-
íram por mais de 360 meses (30
anos) para o plano de benefícios.

452
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

651 Questão referente à possibili- Considerando a prerrogativa que REsp 1383500/SP 17/02/2016
dade de se dispensar a juntada possui a Fazenda Nacional de ser
da certidão de intimação da intimada das decisões, por meio
decisão agravada para a forma- da concessão de vista pessoal e,
ção do agravo de instrumento, em atenção ao princípio da ins-
nos casos em que há vista pes- trumentalidade das formas, pode
soal à Fazenda Nacional. a certidão de concessão de vistas
dos autos ser considerada elemen-
to suficiente à demonstração da
tempestividade do agravo de ins-
trumento, substituindo a certidão
de intimação legalmente prevista.
654 Discute a possibilidade de ce- A legislação sobre cédulas de REsp 1333977/MT 26/02/2014
lebração de cláusula contratual crédito rural admite o pacto de
que preveja a capitalização dos capitalização de juros em periodi-
juros em periodicidade mensal. cidade inferior à semestral.
655 PRÁTICA DE CRIME DO- O reconhecimento de falta grave REsp 1336561/RS 25/09/2013
LOSO. FALTA GRAVE. decorrente do cometimento de
DISCUSSÃO ACERCA DA fato definido como crime doloso
NECESSIDADE DE TRÂN- no cumprimento da pena pres-
SITO EM JULGADO DA cinde do trânsito em julgado de
SENTENÇA PENAL CON- sentença penal condenatória no
DENATÓRIA PARA O RE- processo penal instaurado para
CONHECIMENTO DA IN- apuração do fato.
FRAÇÃO DISCIPLINAR.
660 O feito em que se busca a con- "(...)a concessão de benefícios pre- REsp 1369834/SP 24/09/2014
cessão de benefício previden- videnciários depende de requeri-
ciário deve ser extinto sem jul- mento administrativo", conforme
gamento do mérito, por falta de decidiu o Plenário do Supremo
interesse processual, sempre que Tribunal Federal, no julgamento
não houver prévio requerimento do RE 631.240/MG, sob o rito
ou comunicação desse pedido do artigo 543-B do CPC, obser-
ao INSS na via administrativa. vadas "as situações de ressalva e
fórmula de transição a ser apli-
cada nas ações já ajuizadas até a
conclusão do aludido julgamento
(03/9/2014) "
662 Discussão referente à possibi- Validade da utilização de tabela REsp 1303038/RS 12/03/2014
lidade de utilização da tabela do CNSP para se estabelecer a
do Conselho Nacional de Se- proporcionalidade da indenização
guros Privados - CNSP ou da ao grau de invalidez, na hipótese
Superintendência de Seguros de sinistro anterior a 16/12/2008,
Privados - SUSEP para se es- data da entrada em vigor da Me-
tabelecer a proporcionalidade dida Provisória 451/08.
da indenização, nos casos de
acidentes ocorridos anterior-
mente à entrada em vigor da
Medida Provisória nº 451, 15
de dezembro de 2008, conver-
tida na Lei 11.945/09.

453
Maria Cecília de Araujo Asperti

666 Discussão acerca da valida- É válida, no sistema de planta REsp 1391089/RS 26/02/2014
de da cláusula de contrato de comunitária de telefonia - PCT,
planta comunitária de telefo- a previsão contratual ou regula-
nia - PCT que isenta a com- mentar que desobrigue a com-
panhia de restituir ao consu- panhia de subscrever ações em
midor o valor investido ou de nome do consumidor ou de lhe
subscrever-lhe ações. restituir o valor investido.
667 Discussão sobre a possibilida- O cumprimento de sentença con- REsp 1387249/SC 26/02/2014
de de ser dispensada a fase de denatória de complementação de
liquidação de sentença nas de- ações dispensa, em regra, a fase
mandas por complementação de liquidação de sentença.
de ações.
668 Discussão sobre o termo ini- O termo inicial do prazo prescri- REsp 1388030/MG 11/06/2014
cial da prescrição nas deman- cional, na ação de indenização,
das por indenização do seguro é a data em que o segurado teve
DPVAT nos casos de invalidez ciência inequívoca do caráter per-
permanente da vítima. manente da invalidez.
669 Discussão: possibilidade de Cabimento da cumulação de divi- REsp 1373438/RS 11/06/2014
cumulação de dividendos e ju- dendos e juros sobre capital pró-
ros sobre capital próprio. prio nas demandas por comple-
mentação de ações de empresas
de telefonia.
670 Possibilidade de inclusão de Descabimento da inclusão dos REsp 1373438/RS 11/06/2014
juros sobre capital próprio nos dividendos ou dos juros sobre ca-
cálculos exequendos sem previ- pital próprio no cumprimento da
são no título executivo judicial. sentença condenatória à comple-
mentação de ações sem expressa
previsão no título executivo.
671 Discussão: atribuição do en- Na liquidação por cálculos do REsp 1274466/SC 14/05/2014
cargo de antecipar os honorá- credor, descabe transferir do exe-
rios periciais ao autor da liqui- quente para o executado o ônus
dação de sentença, no caso de do pagamento de honorários de-
perícia determinada de ofício. vidos ao perito que elabora a me-
mória de cálculos.
672 Possibilidade de atribuição do Se o credor for beneficiário da REsp 1274466/SC 14/05/2014
encargo ao réu, na hipótese em gratuidade da justiça, pode-se de-
que o autor seja beneficiário da terminar a elaboração dos cálcu-
gratuidade da justiça. los pela contadoria judicial.
673 Discussão: necessidade de in- Na hipótese do art. 475-L, § 2º, do REsp 1387248/SC 07/05/2014
dicação expressa do valor en- CPC, é indispensável apontar, na
tendido como correto, no caso petição de impugnação ao cumpri-
de impugnação fundada na mento de sentença, a parcela in-
tese de excesso de execução. controversa do débito, bem como
as incorreções encontradas nos
cálculos do credor, sob pena de
rejeição liminar da petição, não se
admitindo emenda à inicial.

454
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

674 Discussão: possibilidade de Cancela-se a distribuição da im- REsp 1361811/RS 04/03/2015


cancelamento da distribuição pugnação ao cumprimento de
da impugnação ao cumpri- sentença ou dos embargos à exe-
mento de sentença no caso de cução na hipótese de não reco-
não recolhimento das custas lhimento das custas no prazo de
no prazo de 30 dias. 30 dias, independentemente de
prévia intimação da parte.
675 Discussão: (i) possibilidade de Cancela-se a distribuição da im- REsp 1361811/RS 04/03/2015
cancelamento da distribuição pugnação ao cumprimento de
da impugnação ao cumpri- sentença ou dos embargos à exe-
mento de sentença no caso de cução na hipótese de não reco-
não recolhimento das custas lhimento das custas no prazo de
no prazo de 30 dias; (ii) neces- 30 dias, independentemente de
sidade de prévia intimação da prévia intimação da parte.
parte impugnante.
676 Discussão: (i) possibilidade de Não se determina o cancelamento REsp 1361811/RS 04/03/2015
cancelamento da distribuição da distribuição se o recolhimento
da impugnação ao cumprimento das custas, embora intempestivo,
de sentença no caso de não re- estiver comprovado nos autos.
colhimento das custas no prazo
de 30 dias; (ii) necessidade de
prévia intimação da parte im-
pugnante; (iii) efeitos do reco-
lhimento efetuado após o prazo
de 30 dias, mas antes do efetivo
cancelamento da distribuição.
677 Discussão sobre a responsa- Na fase de execução, o depósito REsp 1348640/RS 07/05/2014
bilidade do devedor pelo pa- judicial do montante (integral ou
gamento de juros de mora e parcial) da condenação extingue
correção monetária sobre os a obrigação do devedor, nos limi-
valores depositados em juízo tes da quantia depositada.
na fase de execução.
678 Discussão: aplicação de índi- Aplicam-se os índices de deflação REsp 1361191/RS 19/03/2014
ces de deflação na correção na correção monetária de crédito
monetária de crédito oriundo oriundo de título executivo judicial,
de título executivo judicial. preservado o seu valor nominal.
680 Questão referente à ação inde- Para demonstração da legitimida- REsp 1354536/SE 26/03/2014
nizatória por danos materiais e de para vindicar indenização por
morais promovida por pescado- dano ambiental que resultou na
res em razão de acidente am- redução da pesca na área atingi-
biental ocorrido no rio Sergipe, da, o registro de pescador profis-
em que se discute a legitimida- sional e a habilitação ao benefício
de processual do autor da ação. do seguro-desemprego, durante
o período de defeso, somados a
outros elementos de prova que
permitam o convencimento do
magistrado acerca do exercício
dessa atividade, são idôneos à sua
comprovação.

455
Maria Cecília de Araujo Asperti

681 Questão referente à ação inde- A responsabilidade por dano REsp 1354536/SE 26/03/2014
nizatória por danos materiais e ambiental é objetiva, informada
morais promovida por pescado- pela teoria do risco integral, sen-
res em razão de acidente am- do o nexo de causalidade o fator
biental ocorrido no rio Sergipe, aglutinante que permite que o ris-
em que se discute a aplicabilida- co se integre na unidade do ato,
de da Teoria do Risco Integral. sendo descabida a invocação, pela
empresa responsável pelo dano
ambiental, de excludentes de res-
ponsabilidade civil para afastar a
sua obrigação de indenizar.
683 Questão referente à ação in- Em vista das circunstâncias es- REsp 1354536/SE 26/03/2014
denizatória por danos morais pecíficas e homogeneidade dos
promovida por pescadores em efeitos do dano ambiental verifi-
razão de acidente ambiental cado no ecossistema do rio Sergi-
ocorrido no rio Sergipe, em pe - afetando significativamente,
que se discute os valores arbi- por cerca de seis meses, o volume
trados a título de dano moral. pescado e a renda dos pescadores
na região afetada -, sem que tenha
sido dado amparo pela poluidora
para mitigação dos danos morais
experimentados e demonstrados
por aqueles que extraem o sus-
tento da pesca profissional, não
se justifica, em sede de recurso
especial, a revisão do quantum
arbitrado, a título de compen-
sação por danos morais, em R$
3.000,00 (três mil reais).
686 Questão atinente à obrigato- O chamamento ao processo da REsp 1203244/SC 09/04/2014
riedade de chamamento ao União com base no art. 77, III,
processo (art. 77, III, do CPC) do CPC, nas demandas propostas
da União nas demandas que contra os demais entes federativos
envolvem a pretensão de for- responsáveis para o fornecimento
necimento de medicamentos. de medicamentos ou prestação de
serviços de saúde, não é imposi-
tivo, mostrando-se inadequado
opor obstáculo inútil à garantia
fundamental do cidadão à saúde.
687 Discussão acerca da incidência As horas extras e seu respectivo REsp 1358281/SP 23/04/2014
de contribuição previdenciária adicional constituem verbas de
sobre a seguinte verba traba- natureza remuneratória, razão
lhista: horas extras. pela qual se sujeitam à incidência
de contribuição previdenciária.
688 Discussão acerca da incidência O adicional noturno constitui REsp 1358281/SP 23/04/2014
de contribuição previdenciária verba de natureza remuneratória,
sobre a seguinte verba traba- razão pela qual se sujeita à inci-
lhista: adicional noturno. dência de contribuição previden-
ciária.
689 Discussão acerca da incidência O adicional de periculosidade REsp 1358281/SP 23/04/2014
de contribuição previdenciária constitui verba de natureza remu-
sobre a seguinte verba trabalhis- neratória, razão pela qual se su-
ta: adicional de periculosidade. jeita à incidência de contribuição
previdenciária

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

690 Discussão: se a declaração de A declaração de inconstitucio- REsp 1386229/PE 10/08/2016


inconstitucionalidade do art. nalidade do art. 3°, § 1°, da Lei
3°, § 1°, da Lei 9.718/1998, pelo 9.718/1998, pelo STF, não afasta
STF, afasta automaticamente automaticamente a presunção de
a presunção de certeza e de certeza e de liquidez da CDA, mo-
liquidez da CDA constituída tivo pelo qual é vedado extinguir
sobre essa base legal, de modo de ofício, por esse motivo, a Exe-
a autorizar a extinção de ofício cução Fiscal.
da Execução Fiscal.
693 Questionamento acerca da A competência para processar e REsp 1183604/MG 11/12/2013
competência para julgamento julgar as demandas que têm por
das ações que objetivam dis- objeto obrigações decorrentes
cutir contrato firmando entre dos contratos de planos de pre-
o segurado e a Fundação Rede vidência privada firmados com
Ferroviária de Seguridade So- a Fundação Rede Ferroviária de
cial - REFER, entidade fechada Seguridade Social (REFER) é da
de previdência privada, institu- Justiça Estadual.
ída pela extinta Rede Ferroviá-
ria de Seguridade Social - RFF-
SA, sociedade de economia
mista sucedida pela União.
694 Questão referente à possibi- O limite de tolerância para con- REsp 1398260/PR 14/05/2014
lidade de reconhecimento de figuração da especialidade do
tempo especial por exposi- tempo de serviço para o agente
ção ao agente ruído em nível ruído deve ser de 90 dB no pe-
inferior a 90dB no período ríodo de 6.3.1997 a 18.11.2003,
compreendido entre 5.3.1997 conforme Anexo IV do Decreto
e 18.11.2003, por força da apli- 2.172/1997 e Anexo IV do Decre-
cação retroativa do limite de to 3.048/1999, sendo impossível
85dB estipulado pelo Decreto aplicação retroativa do Decreto
4.882/2003 ao Anexo IV do 4.882/2003, que reduziu o pa-
Decreto 3.048/1999. tamar para 85 dB, sob pena de
ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-
-LICC).
696 Discussão quanto à aplicação É inaplicável o art. 8º da Lei nº REsp 1404796/SP 26/03/2014
imediata do art. 8º da Lei nº 12.514/11 ('Os Conselhos não
12.514/11 ("Os Conselhos não executarão judicialmente dívidas
executarão judicialmente dí- referentes a anuidades inferiores a
vidas referentes a anuidades 4 (quatro) vezes o valor cobrado
inferiores a 4 (quatro) vezes anualmente da pessoa física ou
o valor cobrado anualmente jurídica inadimplente') às execu-
da pessoa física ou jurídica ções propostas antes de sua entra-
inadimplente ") às execuções da em vigor.
propostas antes de sua entrada
em vigor.
697 Discussão: prescindibilidade da A ausência da cópia da certidão REsp 1409357/SC 14/05/2014
certidão de intimação da decisão de intimação da decisão agravada
agravada para a comprovação da não é óbice ao conhecimento do
tempestividade do recurso. Agravo de Instrumento quando,
por outros meios inequívocos, for
possível aferir a tempestividade
do recurso, em atendimento ao
princípio da instrumentalidade
das formas.

457
Maria Cecília de Araujo Asperti

698 Discussão quanto ao cabimen- Caracterizam-se como protelató- REsp 1410839/SC 14/05/2014
to da aplicação de multa em rios os embargos de declaração
Embargos de Declaração que que visam rediscutir matéria já
visavam suprir o requisito do apreciada e decidida pela Corte
prequestionamento viabiliza- de origem em conformidade com
dor do Recurso Especial, nos súmula do STJ ou STF ou, ainda,
termos da Súmula 98 do Supe- precedente julgado pelo rito dos
rior Tribunal de Justiça. artigos 543-C e 543-B, do CPC.
702 A falência da empresa executa- A mera decretação da quebra não REsp 1372243/SE 11/12/2013
da fora decretada antes do ajui- implica extinção da personalida-
zamento da execução fiscal; a de jurídica do estabelecimento
discussão é sobre a legitimidade empresarial. Ademais, a massa
passiva da sociedade e incidên- falida tem exclusivamente perso-
cia, ou não, da Súmula 392/STJ. nalidade judiciária, sucedendo a
empresa em todos os seus direitos
e obrigações. Em consequência, o
ajuizamento contra a pessoa jurí-
dica, nessas condições, constitui
mera irregularidade, sanável nos
termos do art. 284 do CPC e do
art. 2º, § 8º, da Lei 6.830/1980.
703 A falência da empresa executa- O entendimento de que o ajui- REsp 1372243/SE 11/12/2013
da fora decretada antes do ajui- zamento contra a pessoa jurídica
zamento da execução fiscal; a cuja falência foi decretada antes
discussão é sobre a legitimidade do ajuizamento da referida exe-
passiva da sociedade e incidên- cução fiscal "constitui mera irre-
cia, ou não, da Súmula 392/STJ. gularidade, sanável nos termos
do art. 284 do CPC e do art. 2º,
§ 8º, da Lei 6.830/1980 não viola
a orientação fixada pela Súmula
392 do Superior Tribunal Justiça,
mas tão somente insere o equí-
voco ora debatido na extensão
do que se pode compreender por
'erro material ou formal', e não
como 'modificação do sujeito
passivo da execução', expressões
essas empregadas pelo referido
precedente sumular.
704 Discussão acerca da forma de A aposentadoria por invalidez de- REsp 1410433/MG 11/12/2013
cálculo da aposentadoria por corrente da conversão de auxílio-
invalidez oriunda da conver- -doença, sem retorno do segurado
são do auxílio-doença, previs- ao trabalho, será apurada na forma
to no art. 29, II e § 5º, da Lei estabelecida no art. 36, § 7º, do
8.213/91, com a redação dada Decreto 3.048/99, segundo o qual
pela Lei 9.876/99. a renda mensal inicial - RMI da
aposentadoria por invalidez oriun-
da de transformação de auxílio-
-doença será de cem por cento do
salário-de-benefício que serviu de
base para o cálculo da renda men-
sal inicial do auxílio-doença, rea-
justado pelos mesmos índices de
correção dos benefícios em geral.

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Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

705 Possibilidade de cominação Descabimento de multa comina- REsp 1333988/SP 09/04/2014


de astreintes na determina- tória na exibição, incidental ou
ção incidental de exibição de autônoma, de documento relativo
documentos durante a fase de a direito disponível.
cumprimento de sentença.
706 Possibilidade de rediscussão A decisão que comina astreintes REsp 1333988/SP 09/04/2014
do cabimento das astreintes não preclui, não fazendo tampou-
após preclusão do decisum co coisa julgada.
que as cominou.
707 Questão referente à responsa- a) a responsabilidade por dano REsp 1374284/MG 27/08/2014
bilidade civil em caso de aci-ambiental é objetiva, informada
dente ambiental (rompimento pela teoria do risco integral, sendo
de barragem) ocorrido nos o nexo de causalidade o fator aglu-
Municípios de Miraí e Muriaé, tinante que permite que o risco se
Estado de Minas Gerais. integre na unidade do ato, sendo
descabida a invocação, pela empre-
sa responsável pelo dano ambiental,
de excludentes de responsabilidade
civil para afastar sua obrigação de
indenizar; b) em decorrência do aci-
dente, a empresa deve recompor os
danos materiais e morais causados;
c) na fixação da indenização por
danos morais, recomendável que o
arbitramento seja feito caso a caso
e com moderação, proporcional-
mente ao grau de culpa, ao nível
socioeconômico do autor, e, ainda,
ao porte da empresa, orientando-
-se o juiz pelos critérios sugeridos
pela doutrina e jurisprudência, com
razoabilidade, valendo-se de sua ex-
periência e bom senso, atento à re-
alidade da vida e às peculiaridades
de cada caso, de modo a que, de um
lado, não haja enriquecimento sem
causa de quem recebe a indenização
e, de outro, haja efetiva compensa-
ção pelos danos morais experimen-
tados por aquele que fora lesado.
708 Discussão referente à penhora É legítima a penhora de apontado REsp 1363368/MS 12/11/2014
do bem de família no contrato bem de família pertencente a fia-
de locação quando decorrente dor de contrato de locação, ante o
de fiança locatícia. que dispõe o art. 3º, inciso VII, da
Lei n. 8.009/1990

459
Maria Cecília de Araujo Asperti

709 Estabelecer se a prática de falta 1. A prática de falta grave inter- REsp 1364192/RS 12/02/2014
grave importaria na interrup- rompe o prazo para a progressão
ção dos prazos para a obten- de regime, acarretando a modi-
ção de benefícios na execução ficação da data-base e o início
penal, modificando, assim, a de nova contagem do lapso ne-
data-base da sua contagem. cessário para o preenchimento
do requisito objetivo.2. Em se
tratando de livramento condicio-
nal, não ocorre a interrupção do
prazo pela prática de falta grave.
Aplicação da Súmula 441/STJ.3.
Também não é interrompido au-
tomaticamente o prazo pela falta
grave no que diz respeito à comu-
tação de pena ou indulto, mas a
sua concessão deverá observar
o cumprimento dos requisitos
previstos no decreto presidencial
pelo qual foram instituídos.

460
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

710 Discussão acerca da nature- I - O sistema "credit scoring" é REsp 1419697/RS 12/11/2014
za dos sistemas de scoring e um método desenvolvido para
a possibilidade de violação a avaliação do risco de concessão
princípios e regras do Código de crédito, a partir de modelos
de Defesa do Consumidor ca- estatísticos, considerando diver-
paz de gerar indenização por sas variáveis, com atribuição de
dano moral. uma pontuação ao consumidor
avaliado (nota do risco de cré-
dito).II - Essa prática comercial
é lícita, estando autorizada pelo
art. 5º, IV, e pelo art. 7º, I, da Lei
n. 12.414/2011 (lei do cadastro
positivo).III - Na avaliação do
risco de crédito, devem ser res-
peitados os limites estabelecidos
pelo sistema de proteção do con-
sumidor no sentido da tutela da
privacidade e da máxima trans-
parência nas relações negociais,
conforme previsão do CDC e da
Lei n. 12.414/2011.IV - Apesar de
desnecessário o consentimento
do consumidor consultado, de-
vem ser a ele fornecidos esclare-
cimentos, caso solicitados, acerca
das fontes dos dados considera-
dos (histórico de crédito), bem
como as informações pessoais
valoradas.V - O desrespeito aos
limites legais na utilização do
sistema "credit scoring", configu-
rando abuso no exercício desse
direito (art. 187 do CC), pode en-
sejar a responsabilidade objetiva
e solidária do fornecedor do ser-
viço, do responsável pelo banco
de dados, da fonte e do consulen-
te (art. 16 da Lei n. 12.414/2011)
pela ocorrência de danos morais
nas hipóteses de utilização de
informações excessivas ou sensí-
veis (art. 3º, § 3º, I e II, da Lei n.
12.414/2011), bem como nos ca-
sos de comprovada recusa indevi-
da de crédito pelo uso de dados
incorretos ou desatualizados.
711 Discute-se a aplicação de juros Não se aplica a taxa progressiva REsp 1349059/SP 26/03/2014
progressivos nas contas de FGTS de juros às contas vinculadas ao
dos trabalhadores avulsos. FGTS de trabalhadores qualifica-
dos como avulsos.

461
Maria Cecília de Araujo Asperti

714 Cinge-se o debate trazido nos A indisponibilidade de bens e di- REsp 1377507/SP 26/11/2014
autos em saber se, para que o reitos autorizada pelo art. 185-A
juiz determine a indisponibi- do CTN depende da observância
lidade dos bens e direitos do dos seguintes requisitos: (i) cita-
devedor, na forma do art. 185- ção do devedor tributário; (ii)
A do CTN, faz-se necessária a inexistência de pagamento ou
comprovação do exaurimento apresentação de bens à penhora
dos meios disponíveis para lo- no prazo legal; e (iii) a não loca-
calização de bens penhoráveis lização de bens penhoráveis após
por parte do credor. Não se esgotamento das diligências reali-
trata, simplesmente, da penho- zadas pela Fazenda, caracterizado
ra on-line, mas da necessidade quando houver nos autos (a) pedi-
de esgotamento das diligências do de acionamento do Bacen Jud
para a adoção das medidas pre- e consequente determinação pelo
vistas no art. 185-A do CTN. magistrado e (b) a expedição de
ofícios aos registros públicos do
domicílio do executado e ao De-
partamento Nacional ou Estadual
de Trânsito - DENATRAN ou
DETRAN.
715 Discussão quanto à competên- Os Conselhos Regionais de Far- REsp 1382751/MG 12/11/2014
cia do Conselho Regional de mácia possuem competência para
Farmácia do Estado de Minas fiscalização e autuação das farmá-
Gerais - CRF/MG para fiscali- cias e drogarias, quanto ao cum-
zar e autuar estabelecimentos primento da exigência de mante-
que exercem atividade farma- rem profissional legalmente ha-
cêutica sem a presença de res- bilitado (farmacêutico) durante
ponsável técnico durante todo todo o período de funcionamento
o horário de funcionamento. dos respectivos estabelecimentos,
sob pena de incorrerem em infra-
ção passível de multa. Inteligência
do art. 24 da Lei n. 3.820/60, c/c o
art. 15 da Lei n. 5.991/73.
717 Legitimidade do Ministério O Ministério Público tem legiti- REsp 1327471/MT 14/05/2014
Público para o ajuizamento de midade ativa para ajuizar ação de
ações de alimentos em benefí- alimentos em proveito de criança
cio de crianças e adolescentes, ou adolescente. A legitimidade
sobretudo quando se encon- do Ministério Público independe
tram sob o poder familiar de do exercício do poder familiar dos
um dos pais - exegese dos arts. pais, ou de o menor se encontrar
201, inciso III, e 98, inciso II, nas situações de risco descritas no
ambos do Estatuto da Criança art. 98 do Estatuto da Criança e
e do Adolescente. do Adolescente, ou de quaisquer
outros questionamentos acerca da
existência ou eficiência da Defen-
soria Pública na comarca.
720 Possibilidade de saque de con- O trabalhador que teve seu con- REsp 1419112/SP 24/09/2014
ta vinculada ao FGTS por tra- trato de trabalho suspenso, per-
balhador que permaneceu fora manecendo fora do sistema do
do sistema, em razão da ocupa- FGTS em razão do exercício de
ção de cargo comissionado por cargo comissionado por mais de
mais de três anos. três anos, não possui direito ao
levantamento do saldo de FGTS.

462
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

721 A controvérsia consiste em A renúncia ao valor excedente ao REsp 1406296/RS 26/02/2014


verificar o cabimento da fixa- previsto no art. 87 do ADCT, ma-
ção de honorários advocatícios nifestada após a propositura da
em Execução promovida sob o demanda executiva, não autoriza
rito do art. 730 do CPC, não o arbitramento dos honorários,
embargada contra a Fazenda porquanto, à luz do princípio da
Pública, na hipótese em que a causalidade , a Fazenda Pública
parte renuncia posteriormente não provocou a instauração da
ao excedente previsto no art. Execução, uma vez que se reve-
87 do ADCT, para fins de lava inicialmente impositiva a
expedição de Requisição de observância do art. 730 CPC,
Pequeno Valor (RPV). segundo a sistemática do paga-
mento de precatórios. Como não
foram opostos Embargos à Execu-
ção, tem, portanto, plena aplica-
ção o art. 1°-D da Lei 9.494/1997.
722 Necessidade de, na busca e Nos contratos firmados na vigên- REsp 1418593/MS 14/05/2014
apreensão de bem alienado cia da Lei n. 10.931/2004, compete
fiduciariamente, ser paga a ao devedor, no prazo de 5 (cinco)
integralidade do débito para dias após a execução da liminar na
caracterizar-se a purgação da ação de busca e apreensão, pagar a
mora pelo pagamento, não sen- integralidade da dívida - entendi-
do suficiente o pagamento, tão da esta como os valores apresenta-
somente, das parcelas vencidas. dos e comprovados pelo credor na
inicial -, sob pena de consolidação
da propriedade do bem móvel ob-
jeto de alienação fiduciária.
723 Discute se a sentença profe- A sentença proferida pelo Juízo REsp 1391198/RS 13/08/2014
rida pelo Juízo da 12ª Vara da 12ª Vara Cível da Circunscri-
Cível da Circunscrição Es- ção Especial Judiciária de Brasí-
pecial Judiciária de Brasília/ lia/DF, na ação civil coletiva nº
DF na ação civil coletiva n. 1998.01.1.016798-9, que conde-
1998.01.1.016798-9 - e que nou o Banco do Brasil ao paga-
condenou o Banco do Brasil mento de diferenças decorrentes
ao pagamento de diferenças de expurgos inflacionários sobre
decorrentes de expurgos infla- cadernetas de poupança ocor-
cionários sobre cadernetas de ridos em janeiro de 1989 (Plano
poupança ocorridos em janei- Verão), é aplicável, por força da
ro de 1989 (Plano Verão) - é coisa julgada, indistintamente a
aplicável, por força da coisa todos os detentores de caderneta
julgada, indistintamente a to- de poupança do Banco do Brasil,
dos os detentores de caderne- independentemente de sua resi-
ta de poupança do Banco do dência ou domicílio no Distrito
Brasil, independentemente de Federal, reconhecendo-se ao
sua residência ou domicílio no beneficiário o direito de ajuizar
Distrito Federal, reconhecen- o cumprimento individual da
do-se ao beneficiário o direito sentença coletiva no Juízo de seu
de ajuizar o cumprimento in- domicílio ou no Distrito Federal.
dividual da sentença coletiva
no Juízo de seu domicílio ou no
Distrito Federal.

463
Maria Cecília de Araujo Asperti

724 Discute a legitimidade ativa Os poupadores ou seus sucessores REsp 1391198/RS 13/08/2014
dos poupadores, independen- detêm legitimidade ativa - tam-
temente de fazerem parte dos bém por força da coisa julgada -,
quadros associativos do IDEC, independentemente de fazerem
de ajuizarem o cumprimento parte ou não dos quadros asso-
individual da sentença coleti- ciativos do IDEC, de ajuizarem o
va proferida na referida ação cumprimento individual da sen-
civil pública. tença coletiva proferida na ação
civil pública nº 1998.01.1.016798-
9 pelo Juízo da 12ª Vara Cível da
Circunscrição Especial Judiciária
de Brasília/DF.
725 Discute se após o pagamento No regime próprio da Lei n. REsp 1339436/SP 10/09/2014
do débito, incumbe ao devedor 9.492/1997, legitimamente protes-
ou ao credor providenciar o tado o título de crédito ou outro
cancelamento do protesto ex- documento de dívida, salvo ine-
trajudicial regularmente efetu- quívoca pactuação em sentido con-
ado, à luz da Lei n. 9.492/1997. trário, incumbe ao devedor, após a
quitação da dívida, providenciar o
cancelamento do protesto.
728 Colocação das 'sociedades cor- As 'sociedades corretoras de segu- REsp 1400287/RS 22/04/2015
retoras de seguros' dentro do ros' estão fora do rol de entidades
bojo de um conjunto maior de constantes do art. 22, §1º, da Lei
'sociedades corretoras', a fim n. 8.212/91.
de que se aplique o art. 18, da
Lei n. 10.684/2003.
729 Discute-se a identidade entre Não cabe confundir as "socieda- REsp 1391092/SC 22/04/2015
as 'sociedades corretoras de des corretoras de seguros" com as
seguros' e os 'agentes autôno- "sociedades corretoras de valores
mos de seguros', a fim de que mobiliários" (regidas pela Resolu-
se aplique o art. 18, da Lei n. ção BACEN n. 1.655/89) ou com
10.684/2003. os "agentes autônomos de seguros
privados" (representantes das se-
guradoras por contrato de agên-
cia). As "sociedades corretoras de
seguros" estão fora do rol de enti-
dades constantes do art. 22, §1º,
da Lei n. 8.212/91.
735 Discute se incumbe ao credor, Diante das regras prevista no Có- REsp 1424792/BA 10/09/2014
em havendo regular inscrição do digo de Defesa do Consumidor,
nome do devedor em cadastro mesmo havendo regular inscrição
de órgão de proteção ao crédito, do nome devedor em cadastro de
excluir o apontamento efetuado órgão de proteção ao crédito, após
após o pagamento do débito. o integral pagamento da dívida,
incumbe ao credor requerer a ex-
clusão do registro desabonador,
no prazo de 5 (cinco) dias úteis,
a contar do primeiro dia útil sub-
sequente à completa disponibili-
zação de numerário necessário à
quitação do débito vencido.

464
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

736 Discute se o abono único sa- Nos planos de benefícios de pre- REsp 1425326/RS 28/05/2014
larial previsto em acordo cole- vidência privada fechada, pa-
tivo ou convenção coletiva de trocinados pelos entes federados
trabalho para os empregados - inclusive suas autarquias, fun-
da ativa deve integrar a com- dações, sociedades de economia
plementação de aposentadoria mista e empresas controladas di-
dos inativos paga por institui- reta ou indiretamente -, é vedado
ção de previdência privada. o repasse de abono e vantagens de
qualquer natureza para os benefí-
cios em manutenção, sobretudo a
partir da vigência da Lei Comple-
mentar n. 108/2001, independen-
temente das disposições estatutá-
rias e regulamentares.
742 Discute-se a condenação da É nula, por configurar julgamen- Rcl 12062/GO 12/11/2014
parte ré, em ação individual de to extra petita, a decisão que
indenização, ao pagamento de condena a parte ré, de ofício, em
danos sociais não requeridos em ação individual, ao pagamento
favor de terceiro estranho à lide. de indenização a título de danos
sociais em favor de terceiro estra-
nho à lide.
743 Possibilidade da execução pro- A multa diária prevista no § 4º REsp 1200856/RS 01/07/2014
visória da multa diária fixada do art. 461 do CPC, devida desde
em sede de antecipação de o dia em que configurado o des-
tutela nos autos da ação prin- cumprimento, quando fixada em
cipal, por se tratar de título ju- antecipação de tutela, somente
dicial líquido, certo e exigível. poderá ser objeto de execução
provisória após a sua confirmação
pela sentença de mérito e desde
que o recurso eventualmente in-
terposto não seja recebido com
efeito suspensivo.
793 Discute se o órgão de proteção ao Diante da presunção legal de ve- REsp 1344352/SP 12/11/2014
crédito tem obrigação de indeni- racidade e publicidade inerente
zar por incluir em seus registros aos registros do cartório de dis-
elementos constantes em banco tribuição judicial, a reprodução
de dados públicos de cartório de objetiva, fiel, atualizada e clara
distribuição do Judiciário. desses dados na base de órgão de
proteção ao crédito - ainda que
sem a ciência do consumidor-,
não tem o condão de ensejar obri-
gação de reparação de danos.

465
Maria Cecília de Araujo Asperti

794 Questão referente à validade, ou É competente o Juízo do local em CC 133244/RJ 11/06/2014


não, de uma só decisão tomada que situada a sede da entidade
no âmbito da Justiça Desportiva. organizadora de campeonato es-
portivo de caráter nacional para
todos os processos de ações ajui-
zadas em vários Juízos e Juizados
Especiais, situados em lugares
diversos do país, questionando a
mesma matéria central, relativa à
validade e à execução de decisões
da Justiça Desportiva, visto que
a entidade esportiva de caráter
nacional, responsável, individual
ou conjuntamente com quaisquer
outras entidades, pela organiza-
ção (no caso, a CBF), deve, neces-
sariamente, inclusive por decisão
de ofício, integrar o pólo passivo
das demandas, sob pena de não
vir ela ser ser ela atingida pelos
efeitos subjetivos da coisa julgada,
e de tornar-se o julgado desprovi-
do de efetividade.
804 Cinge-se a controvérsia a saber O pagamento do reajuste de REsp 1371750/PE 25/03/2015
até que data é devido o reajus- 3,17% está limitado à data da
te de 3,17% nos vencimentos reestruturação ou reorganização
ou proventos dos servidores da carreira, nos termos do art. 10
públicos do magistério supe- da Medida Provisória n. 2.225-
rior, tendo em vista a edição 45/2001, não configurando tal
da Lei n. 9.678/98. marco o advento da Lei n. 9.678,
de 3 de julho de 1998, que estabe-
leceu a Gratificação de Estímulo
à Docência - GED, uma vez que
esse normativo não reorganizou
ou reestruturou a carreira dos
servidores públicos do magistério
superior lotados em instituições
de ensino dos Ministérios da Edu-
cação e da Defesa.
806 Discussão: se o órgão de pro- Diante da presunção legal de vera- REsp 1444469/DF 12/11/2014
teção ao crédito tem obrigação cidade e publicidade inerente aos
de indenizar por incluir em registros do cartório de protesto, a
seus registros elementos cons- reprodução objetiva, fiel, atualiza-
tantes em banco de dados pú- da e clara desses dados na base de
blico de cartório de protesto. órgão de proteção ao crédito - ain-
da que sem a ciência do consumi-
dor - não tem o condão de ensejar
obrigação de reparação de danos.

466
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

834 Questão referente à ação inde- O dano material somente é inde- REsp 1354536/SE 26/03/2014
nizatória por danos materiais nizável mediante prova efetiva de
e morais promovida por pes- sua ocorrência, não havendo falar
cadores em razão de acidente em indenização por lucros ces-
ambiental ocorrido no rio santes dissociada do dano efeti-
Sergipe, em que se discute os vamente demonstrado nos autos;
valores arbitrados a título de assim, se durante o interregno
reparação por lucros cessantes em que foram experimentados os
e por dano moral. efeitos do dano ambiental houve
o período de 'defeso' - incidindo a
proibição sobre toda atividade de
pesca do lesado -, não há cogitar
em indenização por lucros cessan-
tes durante essa vedação.
835 Discute a validade ou não Nos contratos de financiamento REsp 1443870/PE 22/10/2014
de cláusula que estabelece o celebrados no âmbito do SFH, sem
pagamento de saldo devedor cláusula de garantia de cobertura
residual após o término do do FCVS, o saldo devedor residual
pagamento das prestações em deverá ser suportado pelo mutuário.
contrato de mútuo imobiliá-
rio não coberto pelo Fundo
de Compensação de Variação
Salarial-FCVS.
869 Discute-se a interrupção da "A citação válida em processo ex- REsp 1091539/AP 26/11/2008
prescrição do direito a pleite- tinto sem julgamento do mérito
ar diferenças de vencimentos importa na interrupção do prazo
a professores do Estado do prescricional, que volta a correr
Amapá por força do desvio de com o trânsito em julgado da sen-
função, na hipótese em que foi tença de extinção do processo."
ajuizada ação com o mesmo
pedido e causa de pedir pelo
Sindicato e a ação foi extinta
sem julgamento do mérito.
870 Discute-se a interrupção da A citação válida em processo ex- REsp 1091539/AP 26/11/2008
prescrição do direito a pleite- tinto sem julgamento do mérito
ar diferenças de vencimentos importa na interrupção do prazo
a professores do Estado do prescricional, que volta a correr
Amapá por força do desvio de com o trânsito em julgado da sen-
função, na hipótese em que foi tença de extinção do processo.
ajuizada ação com o mesmo
pedido e causa de pedir pelo
Sindicato e a ação foi extinta
sem julgamento do mérito.
871 Discute: (i) atribuição do en- Na fase autônoma de liquidação de REsp 1274466/SC 14/05/2014
cargo de antecipar os honorá- sentença (por arbitramento ou por
rios periciais ao autor da liqui- artigos), incumbe ao devedor a an-
dação de sentença, no caso de tecipação dos honorários periciais.
perícia determinada de ofício;
(ii) possibilidade de atribuição
do encargo ao réu, na hipótese
em que o autor seja beneficiá-
rio da gratuidade da justiça.

467
Maria Cecília de Araujo Asperti

872 Questão referente à distribui- Nos Embargos de Terceiro cujo REsp 1452840/SP 14/09/2016
ção dos encargos de sucum- pedido foi acolhido para des-
bência, à luz do princípio da constituir a constrição judicial,
causalidade, quando julgado os honorários advocatícios serão
procedente o pedido em Em- arbitrados com base no princípio
bargos de Terceiro que foram da causalidade, responsabilizan-
ajuizados com o objetivo de do-se o atual proprietário (em-
anular penhora de imóvel cuja bargante), se este não atualizou
transcrição, no Registro com- os dados cadastrais. Os encargos
petente, não está atualizada. de sucumbência serão suportados
pela parte embargada, porém, na
hipótese em que esta, depois de
tomar ciência da transmissão do
bem, apresentar ou insistir na im-
pugnação ou recurso para manter
a penhora sobre o bem cujo domí-
nio foi transferido para terceiro.
873 Discute: (i) possibilidade de Nas demandas por complementa- REsp 1373438/RS 11/06/2014
cumulação de dividendos e ção de ações de empresas de tele-
juros sobre capital próprio; fonia, admite-se a condenação ao
(ii) possibilidade de inclusão pagamento de dividendos e juros
de juros sobre capital próprio sobre capital próprio independen-
nos cálculos exequendos sem temente de pedido expresso.
previsão no título executivo
judicial.
874 Discute a possível responsabi- O Banco do Brasil, na condição REsp 1354590/RS 09/09/2015
lidade do Banco do Brasil, na de mero operador e gestor do Ca-
condição de gestor do Cadas- dastro de Emitentes de Cheques
tro de Emitentes de Cheques sem Fundos - CCF, não detém le-
sem Fundos (CCF), de noti- gitimidade passiva para responder
ficar previamente o devedor por danos resultantes da ausência
acerca da sua inscrição no alu- de notificação prévia do corren-
dido cadastro. tista acerca de sua inscrição no
referido cadastro, obrigação que
incumbe ao banco sacado, junto
ao qual o correntista mantém re-
lação contratual.
875 Discussão sobre o termo ini- Exceto nos casos de invalidez per- REsp 1388030/MG 11/06/2014
cial da prescrição nas deman- manente notória, ou naqueles em
das por indenização do seguro que o conhecimento anterior re-
DPVAT nos casos de invalidez sulte comprovado na fase de ins-
permanente da vítima. trução, a ciência inequívoca do
caráter permanente da invalidez
depende de laudo médico.

468
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

876 Discute a obrigatoriedade, ou Em ações de execução fiscal, des- REsp 1455091/AM 12/11/2014
não, da indicação do CNPJ cabe indeferir a petição inicial sob
para o recebimento da petição o argumento da falta de indicação
inicial de execução fiscal ende- do CPF e/ou RG da parte execu-
reçada contra pessoa jurídica. tada (pessoa física), visto tratar-
-se de requisito não previsto no
art. 6º da Lei nº 6.830/80 (LEF),
cujo diploma, por sua especiali-
dade, ostenta primazia sobre a
legislação de cunho geral, como
ocorre frente à exigência contida
no art. 15 da Lei nº 11.419/06.Em
ações de execução fiscal, descabe
indeferir a petição inicial sob o ar-
gumento da falta de indicação do
CNPJ da parte executada (pessoa
jurídica), visto tratar-se de requi-
sito não previsto no art. 6º da Lei
nº 6.830/80 (LEF), cujo diploma,
por sua especialidade, ostenta pri-
mazia sobre a legislação de cunho
geral, como ocorre frente à exi-
gência contida no art. 15 da Lei
nº 11.419/06.
877 Discussão alusiva ao termo ini- O prazo prescricional para a exe- REsp 1388000/PR 12/08/2015
cial da fluência da prescrição cução individual é contado do
quinquenal para o ajuizamento trânsito em julgado da sentença
da ação individual executiva coletiva, sendo desnecessária a
para cumprimento de sentença providência de que trata o art. 94
originária de ação civil pública. da Lei n.8.078/90.
881 Discussão alusiva à incidência Incide imposto de renda sobre o REsp 1459779/MA 22/04/2015
de imposto de renda sobre o adicional de 1/3 (um terço) de fé-
adicional de 1/3 (um terço) de rias gozadas.
férias gozadas.
883 Questão referente ao prazo A pretensão de cobrança e a pre- REsp 1418347/MG 08/04/2015
de prescrição das ações que tensão a diferenças de valores
buscam a indenização securi- do seguro obrigatório (DPVAT)
tária, bem como daquelas que prescrevem em três anos, sendo
buscam a complementação de o termo inicial, no último caso, o
pagamento, relativa ao Seguro pagamento administrativo consi-
de Danos Pessoais Causados derado a menor.
por Veículos Automotores de
Via Terrestre (DPVAT).

469
Maria Cecília de Araujo Asperti

885 Controvérsia alusiva à possi- A recuperação judicial do deve- REsp 1333349/SP 26/11/2014
bilidade do prosseguimento dor principal não impede o pros-
de ações de cobrança ou exe- seguimento das execuções nem
cuções ajuizadas em face de induz suspensão ou extinção de
devedores solidários ou coo- ações ajuizadas contra terceiros
brigados em geral, depois de devedores solidários ou coo-
deferida a recuperação judicial brigados em geral, por garantia
ou mesmo depois de aprovado cambial, real ou fidejussória, pois
o plano de recuperação do de- não se lhes aplicam a suspensão
vedor principal. prevista nos arts. 6º, caput, e 52,
inciso III, ou a novação a que se
refere o art. 59, caput, por força
do que dispõe o art. 49, § 1º, todos
da Lei n. 11.101/2005.
886 Controvérsia sobre quem tem a) O que define a responsabilida- REsp 1345331/RS 08/04/2015
legitimidade - vendedor ou ad- de pelo pagamento das obrigações
quirente - para responder por condominiais não é o registro do
dívidas condominiais na hipó- compromisso de venda e compra,
tese de alienação da unidade, mas a relação jurídica material
notadamente quando se tratar com o imóvel, representada pela
de compromisso de compra e imissão na posse pelo promissário
venda não levado a registro. comprador e pela ciência inequí-
voca do Condomínio acerca da
transação;b) Havendo compro-
misso de compra e venda não
levado a registro, a responsabi-
lidade pelas despesas de condo-
mínio pode recair tanto sobre
o promitente vendedor quanto
sobre o promissário comprador,
dependendo das circunstâncias
de cada caso concreto; c) Se res-
tar comprovado: (i) que o pro-
missário comprador imitira-se na
posse; e (ii) o Condomínio teve
ciência inequívoca da transação,
afasta-se a legitimidade passiva
do promitente vendedor para
responder por despesas condomi-
niais relativas a período em que a
posse foi exercida pelo promissá-
rio comprador.
889 Controvérsia alusiva à exe- A sentença, qualquer que seja sua REsp 1324152/SP 04/05/2016
quibilidade de sentenças não natureza, de procedência ou im-
condenatórias (de regra, de- procedência do pedido, constitui
claratórias), notadamente após título executivo judicial, desde
o acréscimo do art. 475-N, in- que estabeleça obrigação de pa-
ciso I, ao Código de Processo gar quantia, de fazer, não fazer
Civil, pela Lei n. 11.232/2005, ou entregar coisa, admitida sua
seja quando figura como exe- prévia liquidação e execução nos
quente o autor do processo de próprios autos.
conhecimento, seja quando
figura o réu.

470
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

890 Possibilidade de inclusão de Na execução individual de sen- REsp 1372688/SP 27/05/2015


juros remuneratórios na fase tença proferida em ação civil
de cumprimento individual de pública que reconhece o direito
sentença, na hipótese de não de poupadores aos expurgos in-
haver condenação a tal rubri- flacionários decorrentes do Plano
ca no título judicial formado Verão (janeiro de 1989), descabe
em sede de ação civil pública a inclusão de juros remunerató-
- no caso, sentença proferi- rios nos cálculos de liquidação
da na Ação Civil Pública n. se inexistir condenação expressa,
583.00.1994.700585-2, ajuiza- sem prejuízo de, quando cabível, o
da pelo IDEC em desfavor de interessado ajuizar ação individu-
Banco Meridional S/A, a qual al de conhecimento.
tramitou na 30ª Vara Cível da
Comarca de São Paulo/SP.
891 Controvérsia alusiva à pos- Na execução de sentença que re- REsp 1314478/RS 13/05/2015
sibilidade de, na hipótese de conhece o direito de poupadores
condenação referente aos ex- aos expurgos inflacionários de-
purgos inflacionários do Plano correntes do Plano Verão (janeiro
Verão (janeiro de 1989), inclu- de 1989), incidem os expurgos
írem-se nos cálculos de liqui- inflacionários posteriores a títu-
dação de sentença os expurgos lo de correção monetária plena
relativos aos planos econômi- do débito judicial, que terá como
cos subsequentes, a título de base de cálculo o saldo existente
correção monetária do débito. ao tempo do referido plano eco-
nômico, e não os valores de even-
tuais depósitos da época de cada
plano subsequente.
892 Controvérsia referente à inci- Incide o reajuste de 28,86% sobre REsp 1478439/RS 25/03/2015
dência do reajuste de 28,86% a Gratificação de Estímulo à Fis-
sobre a Gratificação de Estí- calização e Arrecadação - GEFA,
mulo à Fiscalização e Arreca- após a edição da Medida Provi-
dação - GEFA no período de sória 831/1995 e até a edição da
1995 a 1999. Medida Provisória 1.915-1/1999,
mais precisamente no período de
janeiro de 1995 a julho de 1999.
893 Controvérsia referente ao cabi- No âmbito do cumprimento de REsp 1102460/RJ 17/06/2015
mento ou não da multa do artigo sentença arbitral condenatória
475-J do CPC no âmbito de cum- de prestação pecuniária, a multa
primento de sentença arbitral. de 10% (dez por cento) do artigo
475-J do CPC deverá incidir se o
executado não proceder ao paga-
mento espontâneo no prazo de 15
(quinze) dias contados da juntada
do mandado de citação devida-
mente cumprido aos autos (em
caso de título executivo contendo
quantia líquida) ou da intimação
do devedor, na pessoa de seu ad-
vogado, mediante publicação na
imprensa oficial (em havendo
prévia liquidação da obrigação
certificada pelo juízo arbitral).

471
Maria Cecília de Araujo Asperti

894 Verificação do índice de atu- Até a data da retenção na fonte, a REsp 1470720/RS 10/12/2014
alização (SELIC ou FACDT) correção do IR apurado e em va-
aplicável sobre os valores origi- lores originais deve ser feita sobre
nais do imposto de renda apu- a totalidade da verba acumulada
rado pelo regime de competên- e pelo mesmo fator de atualização
cia até o recebimento da verba monetária dos valores recebidos
acumulada, a fim de se liquidar acumuladamente, sendo que, em
a repetição de indébito de im- ação trabalhista, o critério utili-
posto de renda indevidamente zado para tanto é o FACDT- fator
retido sob o regime de caixa. de atualização e conversão dos
débitos trabalhistas.
898 Controvérsia referente à atu- A incidência de atualização mo- REsp 1483620/SC 27/05/2015
alização monetária das inde- netária nas indenizações por mor-
nizações previstas no art. 3º te ou invalidez do seguro DPVAT,
da Lei 6.194/74, com redação prevista no § 7º do art. 5º da Lei
dada pela Medida Provisória n. 6194/74, redação dada pela Lei
n. 340/2006, convertida na Lei n. 11.482/2007, opera-se desde a
11.482/07. data do evento danoso.
901 Discute se o crime do art. 310 É de perigo abstrato o crime pre- REsp 1485830/MG 11/03/2015
do Código de Trânsito Brasi- visto no art. 310 do Código de
leiro seria de perigo abstrato Trânsito Brasileiro. Assim, não é
ou exigiria a demonstração de exigível, para o aperfeiçoamento
ocorrência de perigo concreto. do crime, a ocorrência de lesão
ou de perigo de dano concreto na
conduta de quem permite, confia
ou entrega a direção de veículo
automotor a pessoa não habilita-
da, com habilitação cassada ou
com o direito de dirigir suspenso,
ou ainda a quem, por seu estado
de saúde, física ou mental, ou
por embriaguez, não esteja em
condições de conduzi-lo com se-
gurança.
902 Definir se, em ação cautelar de A legislação de regência estabele- REsp 1340236/SP 14/10/2015
sustação de protesto, a presta- ce que o documento hábil a pro-
ção de contracautela é dispen- testo extrajudicial é aquele que
sável ao deferimento da limi- caracteriza prova escrita de obri-
nar para suspensão dos efeitos gação pecuniária líquida, certa e
do protesto. exigível. Portanto, a sustação de
protesto de título, por representar
restrição a direito do credor, exige
prévio oferecimento de contra-
cautela, a ser fixada conforme o
prudente arbítrio do magistrado.
903 Discussão: definição acerca do A notificação do contribuinte REsp 1320825/RJ 10/08/2016
momento em que verificado o para o recolhimento do IPVA
lançamento e a sua notificação perfectibiliza a constituição de-
quanto ao crédito tributário de finitiva do crédito tributário,
IPVA, com o escopo de fixar iniciando-se o prazo prescricio-
o termo inicial do prazo pres- nal para a execução fiscal no dia
cricional para a cobrança do seguinte à data estipulada para o
crédito respectivo. vencimento da exação.

472
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

913 Discute: I - se a nomeação à I - A cota de fundo de investi- REsp 1388642/SP 03/08/2016


penhora de cotas de fundo mento não se subsume à ordem de
de investimento, nos moldes preferência legal disposta no inci-
oferecidos pelo banco execu- so I do art. 655 do CPC/73 (ou no
tado, subsume-se à ordem de inciso I do art. 835 do NCPC).II
preferência legal disposta no - A recusa da nomeação à penho-
inciso I artigo 655 do Código ra de cotas de fundo de investi-
de Processo Civil (dinheiro mento, reputada legítima a partir
em aplicações financeiras); e das particularidades de cada caso
II - se a recusa da nomeação à concreto, não encerra, em si, ex-
penhora de cotas de fundo de cessiva onerosidade ao devedor,
investimento torna a situação violação do recolhimento dos
do devedor excessivamente depósitos compulsórios e volun-
gravosa, viola o recolhimento tários do Banco Central do Brasil
dos depósitos compulsórios e ou afronta à impenhorabilidade
voluntários ao Banco Central das reservas obrigatórias.
do Brasil e fere a impenhora-
bilidade das reservas bancá-
rias obrigatórias".
915 Discussão sobre "a existência Em relação ao sistema "credit REsp 1304736/RS 24/02/2016
de interesse de agir nas ações scoring", o interesse de agir para
cautelares de exibição de do- a propositura da ação cautelar de
cumentos e/ou dados relati- exibição de documentos exige,
vos a histórico de cadastro e/ no mínimo, a prova de: i) reque-
ou consultas concernentes ao rimento para obtenção dos da-
sistema scoring de pontuação dos ou, ao menos, a tentativa de
mantidos por entidades de fazê-lo à instituição responsável
proteção ao crédito". pelo sistema de pontuação, com
a fixação de prazo razoável para
atendimento; e ii) que a recusa
do crédito almejado ocorreu em
razão da pontuação que lhe foi
atribuída pelo sistema "scoring".
916 Discute se o crime de roubo, Consuma-se o crime de roubo REsp 1499050/RJ 14/10/2015
na situação em que o seu autor com a inversão da posse do bem,
não teve a posse mansa e pa- mediante emprego de violên-
cífica da coisa subtraída, deve cia ou grave ameaça, ainda que
ser considerado consumado ou por breve tempo e em seguida a
apenas tentado. perseguição imediata ao agente
e recuperação da coisa roubada,
sendo prescindível a posse mansa
e pacífica ou desvigiada.
917 Definir se é possível remir parte É possível a remição de parte do REsp 1381315/RJ 13/05/2015
do tempo de execução da pena tempo de execução da pena quan-
pelo desempenho de trabalho do o condenado, em regime fecha-
externo prestado por apenado do ou semiaberto, desempenha
em regime semiaberto. atividade laborativa extramuros.

473
Maria Cecília de Araujo Asperti

918 Discute se a aquiescência da Para a caracterização do crime REsp 1480881/PI 26/08/2015


vítima menor de catorze anos de estupro de vulnerável previsto
possui relevância jurídico-penal no art. 217-A, caput, do Código
a afastar a tipicidade do crime Penal, basta que o agente tenha
previsto no art. 217-A do Có- conjunção carnal ou pratique
digo Penal, acrescentado pela qualquer ato libidinoso com pes-
Lei n. 12.015, de 7 de agosto de soa menor de 14 anos. O consen-
2009 - estupro de vulnerável. timento da vítima, sua eventual
experiência sexual anterior ou
a existência de relacionamento
amoroso entre o agente e a víti-
ma não afastam a ocorrência do
crime.
920 Discussão: se a suspensão Se descumpridas as condições REsp 1498034/RS 25/11/2015
condicional do processo pre- impostas durante o período de
vista no art. 89, § 4º, da Lei n. prova da suspensão condicional
9.099/1995 pode ser revogada do processo, o benefício poderá
após o término do benefício, ser revogado, mesmo se já ultra-
se descumpridas, pelo réu, du- passado o prazo legal, desde que
rante esse prazo, as condições referente a fato ocorrido durante
impostas pelo magistrado. sua vigência.
921 Discute-se a validade do pro- 1. O tabelião, antes de intimar o REsp 1398356/MG 24/02/2016
testo do título por tabelionado devedor por edital, deve esgotar
localizado em comarca diversa os meios de localização, nota-
da de domicílio do devedor, damente por meio do envio de
para fins de comprovação da intimação por via postal, no en-
mora nos contratos garantidos dereço fornecido por aquele que
por alienação fiduciária. procedeu ao apontamento do
protesto;2. É possível, à escolha
do credor, o protesto de cédula
de crédito bancário garantida por
alienação fiduciária, no tabelio-
nato em que se situa a praça de
pagamento indicada no título ou
no domicílio do devedor.
924 Estabelecer se a existência de A existência de sistema de segu- REsp 1385621/MG 27/05/2015
sistema de vigilância, monito- rança ou de vigilância eletrônica
ramento ou segurança torna não torna impossível, por si só,
impossível a prática de furto o crime de furto cometido no
cometido no interior de esta- interior de estabelecimento co-
belecimento comercial. mercial.
926 Estabelecer se a materialidade É suficiente, para a comprovação REsp 1456239/MG 12/08/2015
do crime previsto no art. 184, da materialidade do delito pre-
§ 2º, do Código Penal pode ser visto no art. 184, § 2º, do Códi-
comprovada mediante laudo go Penal, a perícia realizada, por
pericial feito por amostragem do amostragem, sobre os aspectos
produto apreendido, se a falsida- externos do material apreendido,
de pode ser atestada por meio sendo desnecessária a identifi-
das características externas cação dos titulares dos direitos
desse material e se é necessária autorais violados ou de quem os
a Identificação dos titulares dos represente.
direitos autorais violados.

474
Recursos Repetitivos e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
Uma análise da perspectiva do acesso à justiça e da participação no processo

930 Estabelecer se o acordo proces- Não há óbice a que se estabele- REsp 1498034/RS 25/11/2015
sual, na forma do art. 89, § 2º çam, no prudente uso da facul-
da Lei n. 9.099/95, pode incluir dade judicial disposta no art. 89,
o cumprimento de condições, § 2º, da Lei n. 9.099/1995, obri-
aceitas pelo réu, consistentes gações equivalentes, do ponto de
em prestação pecuniária à ví- vista prático, a sanções penais
tima, fornecimento de cestas (tais como a prestação de servi-
básicas, prestação de serviços ços comunitários ou a prestação
à comunidade e outras injun- pecuniária), mas que, para os fins
ções que, do ponto de vista do sursis processual, se apresen-
prático, sejam equivalentes a tam tão somente como condições
penas restritivas de direitos. para sua incidência.
933 Discute-se a incidência do prin- Quando o falso se exaure no des- REsp 1378053/PR 10/08/2016
cípio da consunção quando a caminho, sem mais potencialida-
falsificação de papéis públicos, de lesiva, é por este absorvido,
crime de maior gravidade, assim como crime-fim, condição que
considerado pela pena abstra- não se altera por ser menor a pena
tamente cominada, é meio ou a este cominada.
fase necessária ao descaminho,
crime de menor gravidade.
934 Discussão: se o crime de furto, Consuma-se o crime de furto com REsp 1524450/RJ 14/10/2015
na situação em que o seu autor a posse de fato da res furtiva, ain-
não teve a posse mansa e pa- da que por breve espaço de tem-
cífica da coisa subtraída, deve po e seguida de perseguição ao
ser considerado consumado ou agente, sendo prescindível a posse
apenas tentado. mansa e pacífica ou desvigiada.
938 Discussão quanto à: (i) prescri- (i) Incidência da prescrição trie- REsp 1599511/SP 24/08/2016
ção da pretensão de restituição nal sobre a pretensão de restitui-
das parcelas pagas a título de ção dos valores pagos a título de
comissão de corretagem e de comissão de corretagem ou de
assessoria imobiliária, sob o serviço de assistência técnico-
fundamento da abusividade da -imobiliária (SATI), ou atividade
transferência desses encargos congênere (artigo 206, § 3º, IV,
ao consumidor; e quanto à (ii) CC). (vide REsp n. 1.551.956/SP)
validade da cláusula contratual (ii) Validade da cláusula contra-
que transfere ao consumidor a tual que transfere ao promitente-
obrigação de pagar comissão de -comprador a obrigação de pagar
corretagem e taxa de assessoria a comissão de corretagem nos
técnico-imobiliária (SATI). contratos de promessa de compra
e venda de unidade autônoma
em regime de incorporação imo-
biliária, desde que previamente
informado o preço total da aqui-
sição da unidade autônoma, com
o destaque do valor da comis-
são de corretagem; (vide REsp
n. 1.599.511/SP)(ii, parte final)
Abusividade da cobrança pelo
promitente-vendedor do serviço
de assessoria técnico-imobiliária
(SATI), ou atividade congênere,
vinculado à celebração de pro-
messa de compra e venda de imó-
vel. (vide REsp n. 1.599.511/SP)

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Maria Cecília de Araujo Asperti

942 Definir:I) qual deve ser o ter- Em qualquer ação utilizada pelo REsp 1556834/SP 22/06/2016
mo inicial para incidência de portador para cobrança de che-
atualização monetária de cré- que, a correção monetária incide
dito estampado em cheque.eII) a partir da data de emissão es-
o dies a quo para contagem de tampada na cártula, e os juros de
juros de mora, no tocante a mora a contar da primeira apre-
crédito oriundo de cheque. sentação à instituição financeira
sacada ou câmara de compensa-
ção.
944 Definir se o participante de Nos planos de benefícios de previ- REsp 1433544/SE 09/11/2016
plano de benefícios de previ- dência privada patrocinados pelos
dência privada patrocinado entes federados - inclusive suas
por entidade da administração autarquias, fundações, sociedades
pública pode se tornar elegível de economia mista e empresas
a um benefício de prestação controladas direta ou indireta-
programada e continuada, sem mente -, para se tornar elegível
que tenha havido a cessação a um benefício de prestação que
do vínculo com o patrocina- seja programada e continuada, é
dor. necessário que o participante pre-
viamente cesse o vínculo laboral
com o patrocinador, sobretudo a
partir da vigência da Lei Comple-
mentar nº 108/2001, independen-
temente das disposições estatutá-
rias e regulamentares.
945 Definir se: I) a pactuação ex- a) a pactuação da pós-datação REsp 1423464/SC 27/04/2016
tracartular da pós-datação do de cheque, para que seja hábil a
cheque tem eficácia, no to- ampliar o prazo de apresentação
cante ao direito cambiário; e à instituição financeira sacada,
II) é possível o apontamento a deve espelhar a data de emissão
protesto de cheque, ainda que estampada no campo específico
após o prazo de apresentação, da cártula;b) sempre será pos-
mas dentro do período para sível, no prazo para a execução
ajuizamento da ação cambial cambial, o protesto cambiário de
de execução. cheque, com a indicação do emi-
tente como devedor.

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