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A análise documental

André Cellard

As capacidades da memória são limitadas e ninguém conseguiria


pretender memorizar tudo. A memória pode também alterar
lembranças, esquecer fatos importantes, ou deformar
acontecimentos. Por possibilitar realizar alguns tipos de reconstrução,
o documento escrito constitui, portanto, uma fonte extremamente
preciosa para todo pesquisador nas ciências sociais. Ele é,
evidentemente, insubstituível em qualquer reconstituição referente a
uma passado relativamente distante, pois não é raro que ele
represente a quase totalidade dos vestígios da atividade humana em
determinadas épocas. Além disso, muito frequentemente, ele
permanece como o único testemunho de atividades particulares
ocorridas num passado recente.

O documento permite acrescentar a dimensão do tempo à


compreensão do social. Como o ressalta Tremblay (1968: 284), graças
ao documento, pode-se operar um corte longitudinal que favorece a
observação do processo de maturação ou de queda de indivíduos,
grupos, conceitos, conhecimentos, comportamentos, mentalidades,
práticas, etc., bem como o de sua gênese até os nossos dias.

Plano metodológico: A análise documental apresenta também


algumas vantagens significativas. Como o enfatizou Kelly (apud
GAUTHIER, 1984: 296-297), trata-se de um método de coleta de
dados que elimina, ao menos em parte, a possibilidade de qualquer
influência — a ser exercida pela presença ou intervenção do
pesquisador — sobre as interações, acontecimentos ou
comportamentos examinados, anulando a possibilidade de reação do
sujeito à presença do mediador.

Ainda que algumas características da análise documental possibilitem


minimizar a intervenção de certos vieses, deve-se admitir que seu
uso envolve igualmente algumas questões. Se, efetivamente, a
análise documental elimina uma parte das interações, dificilmente
mensurável, do pesquisador sobre o sujeito, é menos ainda certo que
o documento constitui um instrumento que se pode manipular como a
informação, aqui, circula em sentido único; pois, embora tagarela, o
documento permanece surdo, e o pesquisador não pode dele exigir
respostas suplementares.

O pesquisador que trabalha com documentos deve superar vários


obstáculos, decorrentes de inúmeras armadilhas, antes de estar em
condição de fazer uma análise em profundidade de seu material. Em
primeiro lugar, ele deve localizar os vestígios pertinentes e avaliar a
sua credibilidade, assim como a sua representatividade. O autor do
documento consegue reportar fielmente os fatos? Ou ele exprime
mais as percepções de uma franja particular da população? Por outro
lado, o pesquisador deve compreender adequadamente o sentido da
mensagem contida no documento: se o que ele vê à mão; franjas
eventualmente, passagens difíceis de interpretar ou repletas de
termos e conceitos que lhe são estranhos e foram redigidos por um
pesquisador que lhe falava.

Conhecido, etc. E, portanto, em razão desses limites importantes, que


o pesquisador de todo tomar um certo número de precauções
previstas que lhe facilitarão a tarefa e serão, particularmente,
garantias da validade e da solidez de suas explicações.

Este artigo apresenta, num primeiro momento, uma breve descrição


do documento escrito, as principais categorias de documentos e dos
procedimentos que visam facilitar o acesso a eles. Em seguida,
examinamos os diferentes aspectos da análise preliminar, ou seja, o
estudo do contexto ao qual o texto em questão foi produzido, o autor
e os atores sociais em cena, a confiabilidade do documento, sua
natureza, sua lógica interna, etc. Depois, após algumas considerações
gerais referentes à análise, complementamos este breve exame com
um exemplo de análise aplicada a dois textos curtos datando da
época do Regime francês.

O documento escrito

Definir o documento representa em si um desafio. Pelo fato de o


documento constituir uma de suas principais ferramentas, a história
foi, de todas as ciências sociais, a que atribuiu maior importância a
essa definição. Desde o fim do século XIX, C.-V. Langlois e C.
Seignobos, em sua duradoura e célebre Introduction aux études
historiques (1898), fizeram dele, aliás, o objeto de uma onda de
metodologia cuja influência inspirou gerações de historiadores. Para
Langlois e Seignobos, contudo, a noção de documento se aplica
quase exclusivamente ao texto, e, particularmente, aos arquivos
oficiais. Esta definição decorre principalmente da abordagem
historiográfica praticada pela maioria dos autores da época: uma
abordagem dominante, focada, sobretudo, nos fatos e gestos dos
políticos e dos "maiores" desse mundo. Essa definição restrita seria
profundamente retificada em razão da evolução da própria disciplina
histórica, mais particularmente pela Escola dos Annales (LE GOFF;
MARCOS-ALVAREZ; LE PELLEC, 1994: 37). Privilegiando uma
abordagem mais globalizante, a história social multiplicou os
instrumentos e a natureza do documento. Ela falou, então, de que é
vestígio do passado, tudo o que serve de teste à ação humana e,
portanto, ao historiador. Esse conceito, contudo, foi estendido
igualmente para as demais ciências sociais, como os autores
"maiores" desse mundo.

Atualmente, as principais categorias de documentos são dos


procedentes que visam facilitar o acesso a eles. Em seguida,
examinamos os diferentes aspectos da análise preliminar, ou seja, o
estudo do contexto ao qual o texto em questão foi produzido, o autor
e os atores sociais em cena, a confiabilidade do documento, sua
natureza, sua lógica interna, etc. Depois, após algumas considerações
gerais referentes à análise, complementamos este breve exame com
um exemplo de análise aplicada a dois textos curtos datando da
época do Regime francês.

Os documentos públicos:

 Os arquivos públicos: Trata-se de uma documentação


geralmente volumosa e, por vezes, organizada segundo
princípios de classificação, complexos e variáveis no tempo.
Ainda que ela seja dita pública, ela nem sempre é acessível.
Esse tipo de arquivo compreende comumente os arquivos
governamentais (federais, regionais, estatais ou municipais); os
arquivos do estado civil, assim como alguns arquivos de
natureza notarial ou jurídica.

 Os documentos publicados no arquivamento, outras coleções,


jornais, revistas, periódicos e qualquer outro tipo de
documentos distribuídos: publicidade, anuários, tradições,
boletins paroquiais, anuários técnicos, etc.

 Os documentos privados:
o Os arquivos privados. Ainda que ela não pertença ao domínio público,
corresponde, por vezes, a uma massa documental arquivada. Ela pode
conter uma boa parte, do antigo direito consuetudinário francês. Essa
pista nos levou a observar que a França do Antigo Regime e,
consequentemente, a Nova França, possuíam um sistema de tutela
privada, interdito e tutelado, para as pessoas sob os efeitos do
deslumbramento. Esses depósitos de uma imensa riqueza, estão
conservados nos Arquivos Nacionais do Québec. Eles contêm,
sobretudo, os depoimentos de pessoas próximas aos presos loucos,
reportando seu comportamento, as reações provocadas por sua
"anormalidade", e assim por diante. Esses depoimentos eram "fontes
comuns", que haviam sido fielmente registrados por esses escrivães,
permitindo fazer uma análise muito acurada da situação vivida pelas
famílias e pelos conhecidos dos "loucos", seja qual fosse seu culto e sua
cultura (a maioria era literada).
Além dos “documentos públicos” e “documentos privados,” a
classificação também inclui:

 Os documentos pessoais:
Esta categoria reúne diários autobiográficos, diários íntimos,
correspondências, histórias de vida, documentos de família, etc.

Existem, de fato, uma multiplicidade de fontes documentais, cuja


variedade não se compara à informação que elas contêm. Isso porque
a pesquisa documental exige, desde o início, um esforço firme e
inventivo, quanto ao reconhecimento dos depósitos de arquivos ou
das fontes potenciais de informação, e isto não apenas em função do
objeto da pesquisa, mas também em função do questionamento. Uma
preparação adequada é também necessária, antes do exame
minucioso de fontes documentais previamente identificadas. Nesse
estágio, o principal erro consiste em se precipitar sobre o primeiro
bloco de documentos obtido, antes de realizar um inventário
exaustivo e uma seleção rigorosa da informação disponível. É
importante aprender a decifrar e utilizar os instrumentos de pesquisa
preparados pelos arquivistas, a fim de assimilar a lógica que preside a
classificação da documentação. Devem-se tomar as mesmas
precauções com os arquivos privados ou a documentação pessoal.

Um pesquisador que deseja empreender uma pesquisa documental


deve, com o objetivo de constituir um corpus satisfatório, esgotar
todas as pistas capazes de lhe fornecer informações interessantes. Se
seus predecessores deixaram vestígios documentais, eles raramente
o fizeram com vistas a possibilitar uma reconstrução posterior; tais
vestígios tendem a encontrar, portanto, em toda a sorte de locais, ou
mais heterogêneos. A experiência pessoal, a consulta exaustiva a
trabalhos de outros pesquisadores e a escolha segura dos objetos de
estudo adotados, bem como a imaginação e a originalidade, também
integram adequadamente a constituição das coleções.

Além do acesso aos arquivos e às fontes, a flexibilidade também


regerá o exame minucioso de alguns documentos ou base de
arquivos mais novos, em que é comum realizar novas pesquisas sobre
as ilhas da loucura no Quebec, de 1600 a 1850. A documentação
disponível para o período do Antigo Regime, parecia razoavelmente
rara. Assim, o lavrão constatado outros pesquisadores antes de 1880.
O conteúdo, assim, o ponto de vista de outros manuscritos mais
elevados, assim como o cotidiano vivido pelas pessoas necessitadas
de desordem mental.

No entanto, uma leitura mais crítica desses últimos documentos


possibilita construir uma imagem bem diferente dos habitantes da
Nova França. Assim, por exemplo, parece mais prudente concluir que
um bispo se puxa a seu clero para punir os “fiéis” de bebiam ou de
brigarem durante a missa, porque, efetivamente, alguns se
comportam dessa maneira na igreja. Se o bispo é obrigado, ano após
ano, a repetir os mesmos mandamentos, é porque os hábitos não
mudaram de comportamento, apesar das advertências, o que fornece
uma outra imagem do zelo e da autoridade exercida pela igreja sobre
seus “fiéis” (JAENEN, 1976). Sistematizando a referida leitura, e
completando-a com outras fontes documentais de apoio, o
pesquisador pode, portanto, delinear uma imagem da relação dos
primeiros canadenses com a religião, diferente daquela a qual nos
havíamos habituado no passado.

Autenticidade e confiabilidade do texto

Neste balanço, entretanto, informar-se sobre a origem social, a


ideologia ou os interesses particulares do autor ou um de seus
interlocutores. É também importante assegurar-se da qualidade da
informação transmitida, ou verificar, ainda que a “autenticidade do
documento em tal contexto, é fundamental ter presente em relação
ao documento. Em alguns casos, é também necessário considerar a
fonte de cada um dos dados que se referem ao autor ou outro
depositário, em diferentes arquivos específicos. Principalmente os
historiadores há muito já perceberam a necessidade da fonte.

Por outro lado, os relatos podem também provir da experiência direta


do autor ou de um intérprete que agrega sua visão pessoal e
conhecimento sobre o assunto em questão.

A análise documental, portanto, exige uma abordagem crítica que


permita ao pesquisador identificar os aspectos de autenticidade e a
confiabilidade do documento, distinguindo o que é uma percepção
subjetiva do autor do que é uma descrição factual. O pesquisador
deve observar as condições de produção do documento, o propósito
para o qual foi criado e as circunstâncias específicas que podem ter
influenciado seu conteúdo.

Ao se proceder com o exame dos documentos, torna-se igualmente


necessário que o pesquisador verifique as fontes complementares e
diversifique o corpus de análise, de modo a fortalecer a validade de
suas interpretações. Assim, a análise documental não consiste
somente em interpretar o que está registrado, mas também em
compreender o contexto, as motivações e as intenções por trás do
documento, o que exige um trabalho minucioso de interpretação
crítica.

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