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1.

A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PENA E DA PRISÃO E SEUS FUNDAMENTOS


Entende-se a pena e a prisão como instrumentos de punição para comportamentos considerados
inadequados pela sociedade. Embora os termos sejam semelhantes, possuem significados
distintos. A pena é definida como a consequência jurídica decorrente da prática de um ato ilícito,
com um caráter essencialmente punitivo, enquanto a prisão representa o local onde essa pena
será cumprida. Desde tempos imemoriais, as sociedades humanas têm lidado com esses
conceitos, que se tornaram intrínsecos à convivência social. Um exemplo claro, segundo a
tradição religiosa, é o relato de Eva que desobedeceu à ordem divina e consumiu o fruto
proibido; essa ação resultou em sua expulsão do Jardim do Éden ao lado de Adão.
Para muitos, a pena está ligada à noção de vingança ou castigo, enquanto a prisão é vista como
um mal necessário. César Roberto Bitencourt discute em sua obra a evolução das penas desde a
Antiguidade até os dias atuais. Este período foi caracterizado por sanções severas e cruéis,
incluindo penas capitais e corporais — como mutilações e açoites — além do temor que cercava
as prisões, locais onde torturas eram comuns na busca pela verdade.
Na Idade Média, essa realidade pouco mudou, continuou sendo uma época marcada por
violência, mantendo as mesmas práticas punitivas da antiguidade. A ideia de privação de
liberdade ainda não havia emergido plenamente; dominava o direito germânico que implicava
penas brutais e tormentos variados aos prisioneiros, muitas vezes levando à morte devido às
péssimas condições médicas da época.
O Código de Hamurabi, datado de 1754 a.C., é um dos primeiros exemplos formais de um
sistema jurídico estabelecido que impunha penas severas refletindo uma concepção retributiva
da justiça. As punições variavam desde perdas patrimoniais até execução capital conforme a
gravidade do crime cometido. Com o advento do Império Romano, o sistema judicial tornou-se
mais complexo; as penas morte e exílio tornaram-se práticas comuns enquanto as prisões
começaram a ser utilizadas para detenção preventiva.
Nesse mesmo contexto surgem as prisões eclesiásticas e estatais que introduziram novas
modalidades penais como detenção temporária ou perpétua. Carlos Roberto Bitencourt
menciona Hilde Kaufmann ao afirmar que a pena privativa de liberdade surgiu num contexto
social voltado para alcançar felicidade coletiva influenciado pelo pensamento calvinista cristão.
(pag. 15 – cap. 3.1 – falencia da pena de prisão).
Com o passar dos séculos XVI e XVII na Idade Moderna, observou-se uma diminuição na aplicação
da pena capital devido ao aumento das infrações relacionadas à pobreza disseminada pela
Europa — tornando inviável aplicar tal sanção em massa. Bitencourt destaca Hans von Henting:
““Os distúrbios religiosos, as longas guerras, as destruidoras expedições militares do século XVII,
devastação do país, a extensão dos núcleos urbanos e a crime das formas feudais de vida e da
economia agrícola haviam ocasionado um enorme aumento da criminalidade em fins do século
XVII e início do XVIII. Acrescenta-se a isso a supressão dos conventos, o aniquilamento dos
grêmios e o endividamento do estado. Tinha-se perdido a segurança, o mundo espiritualmente
fechado aos incrédulos, hereges e rebeldes tinha ficado para trás. Tinha de se enfrentar
verdadeiros exércitos de vagabundos e mendigos. Pode-se estabelecer a sua procedência:
nasciam nas aldeias incendiadas e nas cidades saqueadas, outros eram vítimas de suas crenças,
vítimas atiradas nos caminhos da Europa. Era preciso defender-se desse perigo social, mas não
era possível negar-lhe simpatia por razões religiosas ou sociais, diante dos danos que os exércitos
estrangeiros tinham feito” (pag. 16 – cap. 4. – falencia da pena de prisão).”
A partir da segunda metade do século XVI houve uma mudança nas penalidades com foco na
correção através da construção de prisões que futuramente se tornariam instituições
penitenciárias significativas.

1.1 CONCEITO DE PRISÃO PERPÉTUA E SUAS CARACTERÍSTICAS


A prisão perpétua é sancionada para delitos extremamente graves como homicídio ou
terrorismo. Como seu nome sugere, essa pena é vitalícia; o condenado permanece recluso sob
regime fechado sem possibilidade de redução ou reconciliação. Essa forma penal é considerada
um mecanismo de proteção social e tem sido adotada por vários países em substituição à pena
capital.
Nos Estados Unidos, por exemplo, aplica-se tanto prisão perpétua quanto pena de morte em
alguns estados; há também possibilidades condicionais após cumprimento parcial da sentença
sob monitoramento eletrônico dependendo do comportamento do infrator. Em contraste, na
Europa existem abordagens diferentes: na França permite-se revisão após certo tempo; já na
Alemanha geralmente ocorre uma nova análise após 15 anos com chance de liberdade
condicional.

Essas variações refletem uma abordagem mais humanizada em comparação com sistemas onde
não há revisão das sentenças perpetuarias. O debate sobre esse tema abrange não apenas
aspectos legais, mas também dilemas éticos e sociais; ao longo dos séculos e diante das
atrocidades cometidas contra humanidade ocorreu uma mudança no enfoque penitenciário
visando reabilitação e reintegração social considerando a capacidade humana para
transformação.

A comparação entre jurisdições revela percepções profundas sobre repercussões sociais: países
que adotam modelos alternativos com justiça restaurativa relatam redução significativa nas taxas
de reincidência bem como avanços na reintegração social dos apenados.

1.2 A PRISÃO PERPÉTUA NO MUNDO AO LONGO DO TEMPO


A necessidade humana por convívio social remonta à história das penas e prisões assim
apresentando os primeiros registros dessa forma penal perpétua. Desde épocas antigas já
existiam estruturas sociais organizadas estabelecendo regras essenciais para garantir uma
convivência harmônica entre seus membros.
Felipe Machado Caldeira observa: " O ser humano sempre viveu agrupado, em virtude de seu
nítido impulso associativo e lastreou, no seu semelhante, suas necessidades, anseios, conquistas,
enfim, sua satisfação. E desde os primórdios, o ser humano violou as regras de convivência,
ferindo os semelhantes e a própria comunidade onde vivia, tornando inexorável a aplicação um
castigo (sanção)’’ (Pag. 6 – cap. 1.1.2 – A Evolução Histórica, Filosófica E Teórica Da Pena)". Com o
tempo passou-se a considerar a prisão como medida corretiva apropriada para infringir
comportamentos inadequados. Platão delineou três categorias penais na Grécia Antiga:
prevenção contra reincidência, reabilitação para criminosos recuperáveis e sanções severas para
delitos graves.
“Segundo Platão, a primeira prisão servia para guardar as pessoas, prevenindo outros delitos. A
segunda seria para aqueles criminosos recuperáveis e não teria função punitiva, mas corretiva. A
prisão punitiva ficaria no local mais distante e seria destinada aos agentes dos crimes mais graves
e incorrigíveis. Nessa terceira prisão existiria um total isolamento do criminosos com o resto da
sociedade, que não terminaria nem com a morte, pois seus restos seriam jogados, sem sepultura,
fora das fronteiras do país.” (citação de Chiaverini – pag. 17 – cap. 1 Origem da pena de prisão)
Além disso, nesse mesmo período os gregos usavam prisões também como garantia contra
dívidas financeiras obrigando os credores inadimplentes à detenção até quitação total das
obrigações financeiras pendentes.
“Deve-se acrescentar que a Grécia também conheceu a prisão como meio de reter os devedores
até que pagassem as suas dívidas. Ficava, assim, o devedor à mercê do credor, como seu escravo,
a fim de garantir o crédito. Essa prática, inicialmente privada, foi posteriormente adotada como
pública, mas ainda como medida coercitiva para forçar o devedor a pagar sua dívida.” (Bitencourt
– pag. 13).
O Egito antigo documenta casos precoces dessa prática onde infratores eram mantidos presos
até o julgamento podendo vir a cumprir sentenças laborais forçadas caso condenados.
“No antigo Egito temos notícia da prisão não apenas como custódia, mas como pena. O governo
do faraó era divino e evitava penas cruéis e arbitrárias. As prisões conhecidas também impunham
aos encarcerados o trabalho forçado. As prisões são descritas como fortalezas contendo celas e
masmorras ou como casas de trabalho. A fuga da prisão consistia pena grave.” (Chiaverini – pag.
16)
“Nesses locais os prisioneiros não eram classificados nem separados de acordo com sua situação.
Conviviam presos aguardando julgamento e já condenados, condenados aguardando execução,
condenados à prisão perpétua ou indefinida, desertores do Estado ou oficiais que caíram em
desgraça, suspeitos de espionagem; sendo que todos os forçados a trabalhar” (CHIAVERINI –
PAG. 16).
Roma seguiu essa linha utilizando prisões por dívida semelhante aos casos gregos mantendo
indivíduos encarcerados até saldarem suas dívidas.
“[...] também em Roma existia a chamada prisão por dívida, penalidade civil que se fazia efetiva
até que o devedor saldasse, por si ou por outro, a dívida.
[...] Quando era necessário castigar um escravo, os juízes, por equidade, delegavam tal tarefa ao
pater familias, que podia determinar a sua reclusão temporária ou perpétua no referido
ergastulum. Se o senhor não desejasse assumir esse compromisso, ocorria a renúncia presumida
à propriedade do escravo. Este poderia ser condenado à pena perpétua de trabalhos forçados.’’
(bitencourt – pág. 13)
Durante o século XIII instaurou-se no Brasil colonial práticas inquisitoriais sob influência da Igreja
Católica buscando punir publicamente aqueles contrários aos preceitos religiosos estabelecidos.
‘’A Santa Inquisição, criada na Idade Média sob os auspícios da Igreja Católica Romana, contava
com tribunais que julgavam todos aqueles considerados ameaças ao Direito Canônico. Uma
simples denúncia poderia levar à perseguição e condenação, resultando em penas que variavam
de prisão temporária ou perpétua até a execução em praça pública.’’ (CHIAVERINI – pag. 43)
No Brasil moderno contemporâneo observa-se que desde 1934 existe proibição constitucional
referente à imposição desta forma penal perpetuadora evidenciando mudanças significativas nos
paradigmas punitivos refletindo compreensão evolutiva sobre direitos humanos fundamentais no
contexto jurídico atual.

‘’A primeira das nossas Constituições Federais a proibir a pena de prisão perpétua foi a de 16 de
julho de 1934. Dispôs ela no inc. 24, do art. 113, que (...) não haverá penas de banimento, morte,
confisco, ou de caráter perpétuo, ressalvadas quanto à pena de morte, as disposições da
legislação militar em tempo de guerra com País estrangeiro.” (Luisi, 2000 – online).

Essa análise histórica demonstra a evolução da sociedade em sua compreensão da punião e do


papel do Estado. A função da prisão mudou ao longo dos séculos, o que acarretou em drásticas
mudanças tanto nas concepções jurídicas, quanto na moralidade e compreensão dos direitos
humanos. É fundamental compreender tal panorama histórico para que possamos captar os
atuais desafios enfrentados pelos sistemas de justiça e a real necessidade de uma abordagem
humanizada e reabilitadora nas políticas penais.

2. A PENA NO BRASIL
2.1 Período Colonial
Logo no início do período colonial brasileiro (1500), as Ordenações Afonsinas foram
implementadas representando os códigos penais portugueses vigentes, mas rapidamente foram
substituídas pelas Ordenações Manuelinas (1512-1521) cuja aplicação visava atender interesses
políticos mais pessoais do rei D.Manuel sem consideração pelos direitos humanos fundamentais
existentes naquela época marcadas por severidades incisivas nas punições impostas aos
transgressores legais tendo culminado posteriormente no famoso Código Filipino (1603).
Este último era notório por suas duras consequências legais refletindo práticas medievais brutais
focadas mais no temor provocado pelas sanções aplicáveis aos condenados quando comparadas
com sistemas contemporâneos modernos menos opressivos.
‘’ Refletiam as Ordenações Filipinas o direito penal daqueles tempos. O fim era incutir temor pelo
castigo. O "morra por ello" se encontrava a cada passo. Aliás, a pena de morte comportava várias
modalidades. Havia a morte simplesmente dada na forca (morte natural); a precedida de torturas
(morte natural cruelmente); a morte para sempre, em que o corpo do condenado ficava
suspenso e, putrefazendo-se, vinha ao solo, assim ficando, até que a ossamenta fosse recolhida
pela Confraria da Misericórdia, o que se dava uma vez por ano; a morte pelo fogo, até o corpo ser
feito em pó.’’ (Noronha – pag. 55)
Nesse período, temos o emblemático exemplo de José da Silva Xavier, conhecido como
Tiradentes, um mártir da Inconfidência Mineira. Envolvido nesse movimento, ele foi condenado
pela Coroa Portuguesa em 1792, no Rio de Janeiro. Após a sentença, seu corpo foi esquartejado
em quatro partes e espalhado ao longo da estrada que levava a Ouro Preto; sua cabeça foi
exposta em uma estaca na praça central da cidade.
O período colonial brasileiro também é caracterizado pela presença da Inquisição, que chegou ao
Brasil no século XVIII. A Igreja Católica teve um papel fundamental ao impor a moral cristã; além
de regular a vida cotidiana, influenciou diretamente a legislação penal. As punições durante essa
época incluíam tortura, encarceramento e até a morte. Ademais, não se pode discutir este
período sem mencionar a escravidão: as populações escravizadas, compostas por africanos e
seus descendentes, assim como os indígenas, eram frequentemente submetidas a regimes de
extrema brutalidade pelos seus senhores. Qualquer tentativa de revolta ou fuga resultava em
castigos severos como chibatadas, empalamentos e execuções públicas; tais punições serviam
como advertências para os demais.
Esse sistema não apenas desumanizava os escravizados, mas também visava manter a ordem e
hierarquia social. As leis que regulavam a escravidão eram rigorosas e estabeleciam penas
específicas para os escravizados que eram significativamente mais severas do que aquelas
aplicadas aos brancos.
O período colonial brasileiro destacou-se por um sistema penal estrito que refletia as práticas e
valores da época. As penas duras, o poder da Igreja e a brutalidade do regime escravocrata foram
essenciais para o controle social em uma sociedade marcada por profundas desigualdades. Com
o advento do século XIX e as transformações sociais iminentes, o sistema penal colonial começou
a ser questionado, preparando assim o caminho para as reformas futuras.

2.2 Período Imperial


Este período começou em 1822, após a conquista da independência pelo Brasil. Já se
percebia a necessidade de um novo código penal, mas sua implementação não poderia
ser imediata. Assim, José Clemente Pereira e Bernardo Pereira de Vasconcelos foram
encarregados de elaborar projetos que, após serem apresentados às comissões do
Legislativo, levaram à seleção do projeto de Vasconcelos.

Nesse contexto, o Brasil passou por uma reavaliação de valores políticos, humanos e
sociais. O Iluminismo europeu exerceu influência na formulação dos princípios
fundamentais do nosso direito penal, culminando na promulgação da primeira
Constituição Brasileira em 1824.

A Constituição de 1824 é particularmente significativa por assegurar garantias das


liberdades públicas e dos direitos individuais. Em seguida, em 1830, D. Pedro I sancionou
o Código Criminal brasileiro. Este novo código trouxe mudanças notáveis, como a
limitação da pena máxima a 30 anos e a eliminação de penas infamantes. Foi nesse
período que surgiu a pena de privação de liberdade como substituto das punições
corporais. Esse marco histórico representou uma ruptura com conceitos antigos e
obsoletos, alinhando-se aos princípios dos Direitos Humanos.

O código de 1830 introduziu também alternativas penais, como detenção e reclusão, ao


invés da simples punição corporal. No entanto, a aplicação desse código variava
conforme as regiões e as autoridades locais, resultando em desigualdade no tratamento
dos condenados. As penas de morte continuaram a ser aplicadas, embora com menor
frequência e predominantemente em casos relacionados a crimes políticos e revoltas.

Além disso, persistia a cruel realidade da escravidão na sociedade brasileira; o sistema


penal contra os escravizados era severo e impunha punições rigorosas para qualquer
tentativa de rebelião ou fuga. Somente em 1850, com a promulgação da Lei Eusébio de
Queirós começaram a surgir indícios de mudança ao proibir o tráfico negreiro; contudo,
essa lei não alterou a brutalidade das penas aplicadas aos escravizados.
2.3 Período Republicano

O período republicano no Brasil começou em 1889, quando ocorreu a Proclamação da República.


Tal período proporcionou várias mudanças sociais, políticas e jurídicas, afetando diretamente o
sistema penal; ao mesmo tempo, as mudanças sociais exigiram a revisão da legislação penal
brasileira: ‘’ No último ano do regime imperial, fora o Conselheiro João Batista Pereira
encarregado, pelo Ministro da Justiça, de elaborar um projeto de reforma da legislação penal,
não só porque sua vetustez exigia, mas também porque a abolição da escravatura demandava
modificações inadiáveis.’’ (noronha – pag. 59).
A Primeira Constituição Republicana e o Novo Código Penal, elaborados em 1891,
fundamentaram a nova lei nacional. No entanto, as leis previamente introduzidas foram
alteradas; a nova constituição incluiu várias novidades relacionadas aos direitos individuais que
fizeram pensar sobre as práticas punitivas do período imperial. Em 1890, proibiu-se a pena de
morte e as leis de punição começaram a ser mais justas e menos subjetivas; a legislação procurou
ser mais moderna reformulando as penas e corrigindo os presidiários:
‘’ Era ele de fundo clássico. Procurou suprir lacunas da legislação passada. Definiu novas espécies
delituosas. Aboliu a pena de morte e outras, substituindo-as por sanções mais brandas, e criou o
regime penitenciário de caráter correcional. Outras inovações de toda oportunidade podem
ainda ser apontadas.’’ (Noronha, pág 59).
O surgimento de Getúlio Vargas ocorreu durante o Estado Novo (1937-1945), um período em que
o governo Vargas transmite mais repressão nas reformas e limita cada vez mais vários direitos e
garantias em favor do bem-estar público em detrimento da segurança estatal. A polícia tem mais
poderes judiciais; em 1940, foi promulgado um novo código penal que reintroduziu formas de
coerção e tortura para calar a repressão; em 1964, o país sofreu um golpe militar. Os ministros da
Marinha de Guerra aprovariam o novo código penal em 1969, na nova era da pena de morte,
prisão perpétua para crimes políticos de até trinta anos, assim as torturas e detenções arbitrárias
tornaram-se novamente comuns. Durante esse tempo, as pessoas são torturadas, outras
censuradas; apesar de as leis penais não serem realmente alteradas, o Estado militar é
responsável por muitas mortes e prisões. O Brasil só foi redemocratizado durante a década de
1980, a constituição mais recente foi promulgada em 1988.

3. A CONSTITUIÇÃO DE 1988 QUE PROÍBE A PRISÃO PERPÉTUA

A atual Constituição Federal assegura direitos fundamentais, como o direito a um


julgamento justo e a proibição de penas cruéis e degradantes. Considerando os eventos
históricos que precederam essa constituição, incluindo a Segunda Guerra Mundial e a
ditadura militar no Brasil, a Carta de 1988 está repleta de princípios e garantias
destinadas à proteção dos direitos individuais e à dignidade humana.
O ordenamento jurídico brasileiro adota a teoria de Hans Kelsen, conhecida como Norma
Hipotética Fundamental. Nessa perspectiva, as normas estão organizadas em diferentes
camadas e níveis hierárquicos, sendo a Constituição Federal a norma suprema. Assim,
qualquer norma que contrarie os preceitos constitucionais é considerada inconstitucional
e passível de anulação. A Constituição não apenas estabelece as funções e aplicações das
normas, mas também pode determinar o conteúdo que deve ser refletido em legislações
inferiores.
Kelsen afirma: ‘’ A ordem jurídica não é um sistema de normas jurídicas ordenadas no
mesmo plano, situadas umas ao lado das outras, mas é uma construção escalonada de
diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas. A sua unidade é produto da conexão
de dependência que resulta do fato de a validade de uma norma, que foi produzida de
acordo com outra norma, se apoiar sobre essa outra norma, cuja produção, por sua vez,
é determinada por outra; e assim por diante, até abicar finalmente na norma
fundamental - pressuposta. A norma fundamental - hipotética, nestes termos - é,
portanto, o fundamento de validade último que constitui a unidade desta interconexão
criadora’’. (hans kelsen, pág 155 cap 2).
O preâmbulo da nossa Constituição delineia seus fundamentos e objetivos,
caracterizando-se como soberana e comprometida em resguardar a cidadania e a
dignidade humana, além de valorizar os direitos sociais do trabalho, da livre iniciativa e
do pluralismo político.
‘’ Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte
para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos
sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a
igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e
internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de
Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.’’ (preambulo,
CF/88).
Prosseguindo com essa análise, o artigo 5º da nossa Constituição é extenso ao
estabelecer direitos fundamentais que visam proteger a dignidade da pessoa humana.
Além disso, proíbe tratamentos cruéis ou desumanos; por exemplo, o inciso XLVII veda a
pena de morte, exceto em caso de guerra declarada. Em outras circunstâncias, tanto a
pena capital quanto prisão perpétua são proibidas.
‘’ Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida,
à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;’’ (cf/88)

Este dispositivo é claro ao proibir penas perpétuas e outras sanções cruéis, evidenciando
o compromisso do Brasil com os direitos humanos e refletindo os princípios essenciais da
humanidade e dignidade que permeiam seu ordenamento jurídico. Tal entendimento
está diretamente ligado ao artigo 1º, inciso III da Constituição que consagra a dignidade
da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil. Dessa forma,
essa dignidade implica no direito à vida e na possibilidade de reabilitação dos
condenados—no entanto—é totalmente contraditória à aplicação da prisão perpétua.
Ademais, vale mencionar o Código Penal instaurado em 1940 sob o governo Getúlio
Vargas. Este código se configurou como um decreto-lei; todavia, com o advento da nova
constituição em 1988 e, considerando-se as hierarquias normativas, teoricamente
extinguiu-se tal possibilidade. A nova constituição institui uma sequência rigorosa para
criação de leis novas passando por diversas instâncias legislativas para análise
constitucional antes da votação final no Congresso Nacional.
Após promulgação da nova Carta Magna foi realizada uma análise minuciosa do Código
Penal por juristas brasileiros que concluíram pela sua compatibilidade com os preceitos
constitucionais vigentes; assim ele adquiriu status de Lei Ordinária.
Como destacado anteriormente pelo artigo 5º inciso XLVIII da Constituição Federal de
1988 que veda penas perpetuamente restritivas; essa cláusula pétrea não pode ser
alterada mesmo através de emendas constitucionais. Bitencourt afirma: “Efetivamente,
um Estado que se quer democrático de Direito é incompatível com um Direito Penal
funcional, que ignore as liberdades e garantais fundamentais do cidadão. Aliás, a própria
Constituição Federal adota a responsabilidade penal subjetiva, a presunção de inocência,
o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, preservando, inclusive, a
dignidade humana (art. 5o , III, CF). Ademais, a Carta Magna brasileira proíbe
expressamente as sanções perpétuas, capitais, cruéis e degradantes e elevou essas
garantias à condição de cláusulas pétreas (art. 60, § 4o , inc. IV, CF). Em outros termos,
referidas garantias não podem ser suprimidas ou revistas nem mesmo por meio de
emendas constitucionais.’’ (bitencourt, online, pág 15).

Essa disposição constitucional influencia diretamente o Código Penal ao impedir


imposições penais previstas nos artigos deste documento legal; permitindo apenas como
sanção viável a privação temporária da liberdade. Jamila Eliza Batistela e Marilda Ruiz
Andrade Amaral elucidam isso:
‘’Embora elaborado durante regime ditatorial, o Código Penal unifica fundamentalmente
as bases de um direito punitivo democrático e liberal. Na parte geral do Código, temos
por base o princípio da reserva legal; o sistema de duplo binário; a pluralidade de penas
privativas da liberdade; a exigência do início da execução para a configuração da
tentativa; o sistema progressivo para o cumprimento da pena privativa de liberdade; a
suspensão condicional da pena e o livramento condicional. Na parte especial, dividida em
onze títulos, a matéria se inicia pelos crimes contra a pessoa, terminando pelos crimes
contra a administração pública. Não há mais pena de morte e nem de prisão perpétua, e
o máximo da pena privativa de liberdade é de 30 anos.’’ (Batistela e Amaral, pag 11).

Luiz Benito Viggiano Luisi menciona esta proibição como uma regra consolidada dentro
do ordenamento jurídico brasileiro enfatizando sua natureza obrigatória:
‘’ Especificamente quanto à proibição constitucional das penas de caráter perpétuo é
preciso ressaltar a sua inserção no título dos direitos e garantias individuais. É de se
enfatizar que não se trata de um princípio, mas de uma verdadeira regra, embora esta se
embase em um princípio. É necessário relevar que no caput do art. 5º, da Constituição
vigente, no qual estão enumerados os direitos e deveres individuais e coletivos, está
consagrada a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade’’. (LUISI, ONLINE)

Embora haja vedação à prisão perpétua na Constituição vigente existem exceções para
delitos graves cometidos internacionalmente onde indivíduos podem ser submetidos ao
Tribunal Penal Internacional (TPI). Bitencourt explica:
“A previsão excepcional da pena de prisão perpétua, pelo referido estatuto internacional,
não o desqualifica e nem o caracteriza como desumano ou antiético, por duas razões
fundamentais: a) de um lado, porque teve, acima de tudo, o objetivo de evitar que, para
os mesmos crimes, se cominasse a pena de morte; b) de outro lado, porque a prisão
perpétua ficou circunscrita aos denominados crimes de genocídio, crimes de guerra,
crimes contra a humanidade e de agressão.” (bitencourt, online pag 16).

O TPI foi estabelecido pelo Estatuto de Roma em 1998 visando julgar crimes
internacionais graves desde sua operação em 2002 abrangendo genocídio entre outros
delitos severos enquanto complementa jurisdições penais nacionais.
O Brasil teve papel crucial na criação desse tribunal desde antes da conferência
celebrada em Roma devido seu compromisso expresso na Constituição acerca dos
direitos humanos conforme mencionado no artigo 7º das Disposições Transitórias
"propugnará pela formação de um tribunal internacional dos direitos humanos". Esse
mandamento constitucional reforçou o engajamento do país nas discussões
internacionais que culminaram na criação do TPI. (mazzuoli, pag 824).

O país possui uma posição clara sobre sanções promovidas pelo TPI especialmente
relativas à extradição quando um cidadão brasileiro comete crimes sob jurisdição
internacional podendo ser extraditado para cumprir pena.
Entretanto conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal há limitações se
houver solicitação relacionada à prisão perpétua tornando-a ajustável ao limite máximo
permitido pela legislação brasileira.

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