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Iv) 3::rc: f
Copyright by © Editorial Gustavo Gili. S. A.. Rosellón 87-89. Barcelona, 1987.

Título original
'- De los medios a Ias mediaciones. Comunicación, cultura e hegemonia

Ficha Catalográfica elaborada pela Divisão


de Processamento Técnico - SIBIfUFRJ

M 379m Martín-Barbero. Jesús


Dos meios às mediações: comunicação. cultura e
hegemonia I Jesús Martín-Barbero; Prefácio de Néstor
García Canclini; Tradução de Ronald Polito e Sérgio
Alcides. Rio de Janeiro: Editora UFRJ. 1997.

360 p.; 15 X 20.5 cm

1. Comunicação de massa 2. Sociedade de massa


Para meus pais
, L Título
CDD 302.23 e minha filha alga
ISBN 85-7108-208-1

Capa
Tita Nigrí

Revisão

Cecília Moreira
Josette Babo
Maria Guimarães
LO
Projeto Grdfico e ~
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Editoração Eletrônica :i
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Editota UFRJ

Universidade Federal do Rio de Janeiro


Forum de Ciência e Cultura
Editora UFRJ
Av. Pasteur. 250 I sala 106
Rio de Janeiro - RJ
CEP 22295-900
Te!': (021) 295 1595 r. 124 a 127
Fax: (021) 542 3899

Apoio:

"b.
1II José
Fundação
Bonirácio
Universitária

I
SUMÁRIO

Prefácio 11

Introdução 15

PRIMEIRA PARTE
POVO E MASSA NA CULTURA:
OS MARCOS DO DEBATE

Capítulo 1
Afirmação e negação do povo como sujeito 23
o povo-mito: românticos versus ilustrados 23
Povo e classe: do anarquismo ao marxismo 31
Emergência do popular nos movimentos anarquistas 32
Dissolução do popular no marxismo 36

Capítulo 2
Nem povo nem classes: a sociedade de massas 43
A descoberta política da multidão 44
A psicologia das multidões 47
Metaflsica do homem-massa 52
Antiteoria: a mediação-massa como cultura 57

Capítulo 3
Indústria Cultural: capitalismo e legitimação 63
Benjamin versusAdorno ou o debate de fundo 64
Do lagos mercantil à arte como estranhamento 65
Uma iconografia para usos plebeus 152
A experiência e a técnica como mediações das
massas com a cultura 71 Melodrama: o grande espetáculo popular 157

Da crítica à crise 80 Entre o circo e o palco 159


Estrutura dramdtica e operação simbólica 162
Capítulo 4 f
Redescobrindo o povo: a cultura como Capítulo 3
Das massas à massa 167
espaço de hegemonia 90
Inversão de sentido e sentidos da inversão 167
91
o povo na outra história
Memória narrativa e indústria cultural 169
104
Cultura, hegemonia e cotidianidade 171
O aparecimento do meio
173
SEGUNDA
MATRIZES
PARTE
HISTÓRICAS DA
i
"
Dispositivos de enunciação
Dimensões do enunciado 185
MEDIAÇÃO DE MASSA Formato e símbolo 189

Continuidade e rupturas na era dos meios 191


Capítulo 1
O longo processo de enculturação 127
Estado-Nação e os dispositivos de hegemonia 127 TERCEIRA PARTE
128 MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE
Centralização política e unificação cultural
MASSA NA AMÉRICA LATINA
130
Rupturas no sentido de tempo
Transformações nos modos do saber
132
Capítulo 1
135 Os processos: dos nacionalismos
Cultura política da resistência popular
136 às transnacionais 213
A dimensão política da economia
138 Uma diferença que não se restringe ao atraso 213
A dimensão simbólica das lutas
O descompasso entre Estado e Nação 215
Capítulo 2 220
Do folclore ao popular 142 Massificação, movimentos sociais e populismo
142 Os meios massivos na formação das culturas nacionais 228
Uma literatura entre o oral e o escrito
143 Um cinema à imagem de um povo 231
O que dispõe o mercado
148 Do circo criollo ao radioteatro 234
O que dispõe o povo
A legitimação urbana da música negra 238 PREFÁCIO
O nascimento de uma imprensa popular de massas 242

Desenvolvimentismo e transnacionalização 247


O novo sentido da massificação 248
A não-contemporaneidade entre tecnologias e usos 252
Se achamos que os livros mais necessários são os não com-
Capítulo 2 placentes, este é um dos indispensáveis nos anos noventa. Ao se propor
Os métodos: dos meios às mediações 258
a entender essas indústrias das respostas e da consolação que são os
Crítica da razão dualista, ou as mestiçagens meios de massa, não s6 as assedia com perguntas e perguntas; dedica-
que nos constituem 258 se a trocar as interrogações que haviam organizado os estudos sobre a
A impossível pureza do indígena 260 comunicação nos anos precedentes.
A mistura de povo e massa no urbano 265 Os primeiros investigadores dos meios buscavam saber como
eles fazem para manipular suas audiências. A súbita expansão do rádio,
A comunicação a partir da cultura 277
do cinema e da televisão levou a crer que substituíam as tradições, as
O que nem o ideologismo nem o injórmacionismo crenças e solidariedades hist6ricas, por novas formas de controle social.
permitem pensar 278 Este livro se afasta de tais supostos. Com uma visão menos ingênua de
Cultura e política: as mediações constitutivas 282 como se alteram as sociedades e do que fazem com seu passado quando
irrompem tecnologias inovadoras, indaga como se foi desenvolvendo
Mapa noturno para explorar o novo campo 287
a massificação antes que surgissem os meios eletrônicos: através da
Sobre a cotidianidade, o consumo e a leitura 288
escola e da igreja, da literatura de cordel e do melodrama, da organi-
A televisão a partir das mediações 291 zação massiva da produção industrial e do espaço urbano.
Alguns sinais de identidade reconhecíveis no melodrama 303 Ao estabelecer que as sociedades modernas foram tendo os
308 traços atribuídos aos meios muito antes que estes atuassem, desmoro-
O popular que nos interpela a partir do massivo
naram vários lugares-comuns do aristocratismo e do populismo. A
cultura contemporânea não pode desenvolver-se sem os públicos
Bibliografia 335
massivos, nem a noção de povo -que nasce como parte da massificação
social- pode ser imaginada como um lugar autônomo. Nem a cultura
de elite, nem a popular, há tempos incorporadas ao mercado e à
comunicação industrializada, são redutos incontaminados a partir dos
quais se pudesse construir outra modernidade alheia ao caráter mer-
cantil e aos conflitos atuais pela hegemonia. Ao estudar a reformulação
DOS MEIOS ÀS MEDIAÇÕES
MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE MASSA ..•

cação", O problema agora passa por uma renovação da cultura política


de símbolos; e, por último, o fato de que, graças à dinâmica da escola-
capaz de assumir aquilo que está em jogo hoje nas políticas culturais.
Naquelas em que não se trata muito da administração de instituições rização e à dos meios massivos, a cultura se colocou no centro do
ou da distribuição de bens culturais, e sim de "um princípio de cenário político e social. Abre-se assim ao debate um novo horizonte
organização da cultura, algo interno à constituição do político, ao de problemas, no qual estão redefinidos os sentidos tanto da cultura
espaço de produção de um sentido da ordem na sociedade, aos prin- quanto da política, e do qual a problemática da comunicação não
cípios de reconhecimento mútuo".144 participa apenas a título temático e quantitativo - os enormes inte-
resses econômicos que movem as empresas de comunicação - mas
A história das relações entre política e cultura está cheia de
também qualitativo: na redefinição da cultura, é fundamental a com-
enganos espalhados por toda parte. De um lado, uma concepção
espiritualista da cultura, que vê na política uma contaminação, pela preensão de sua natureza comunicativa. Isto é, seu caráter de processo
invasão de interesses materiais; de outro, uma concepção mecanicista produtor de significações e não de mera circulação de informações, no
de política que nada vê na cultura senão o reflexo superestrutural do qual o receptor, portanto, não é um simples decodificador daquilo que
que acontece de fato em outra parte. Entre ambas as posições, não pode o emissor depositou na mensagem, mas também um produtor.
haver outra relação além da instrumentalização. "A verdade é que a O desafio representado pela indústria cultural aparece com
política suprime a cultura como campo de interesse a partir do mo- toda a sua densidade no cruzamento dessas duas linhas de renova-
mento em que aceita uma visão instrumental do poder. O poder se ção - que inscrevem a questão cultural no interior do político e a
constitui dos aparatos, das instituições, das armas, do controle sobre comunicação, na cultura. Não se trata de reviver dirigismos autoritá-
os meios e os recursos, das organizações. Tributária dessa visão de rios, é certo, mas tampouco se pode entender a expansão da pluralidade
poder, a política não pôde levar a cultura a sério, exceto onde ela se de vozes na democracia "como um aumento da clientela dos consumos
encontra institucionalizada."145 A partir daí, a conversão da cultura em culturais" .146O que já não fará sentido é continuar programando polí-
gestão burocrática, monopólio de agentes especializados, é apenas uma ticas que separem aquilo que acontece na Cultura - maiúscula -
conseqüência lógica. Nos últimos anos, contudo, uma série de acon-
daquilo que acontece nas massas - na indústria e nos meios massivos
tecimentos ocorridos na América Latina parecem apontar para uma
de comunicação. Estas não podem ser políticas à parte, já que o que
nova compreensão das relações entre política e cultura. Tais aconteci-
acontece culturalmente com as massas é fundamental para a democra-
mentos, segundo José Joaquín Brunner - um dos investigadores
cia, se é que a democracia tem algo a ver com o povo.
latino-americanos de maior contribuição para a nova visão das polí-
ticas culturais - são três: a experiência dos países sob regimes auto- MAPA NOTURNO PARA
ritários, de que os modos de resistir e opor-se procederam em boa parte EXPLORAR O NOVO CAMPO
de espaços outros que não os considerados pela análise tradicional,
Sabemos que a luta através da mediações culturais não dá resultados
como as comunidades cristãs, os movimentos artísticos, os grupos de
imediatos nem espetaculares. Mas é a única garantia de que não vamos
direitos humanos; a compreensão de que mesmo o autoritarismo mais
passar do simulacro dahegemonia para o simulacro da democracia: evitar
brutal nunca se esgota nas medidas de força nem responde somente a
que uma dominação derrotada ressurja nos hábitos cúmplices que a
interesses do capital, e de que há sempre uma tentativa de mudar o
hegemonia instalou em nosso modo de pensar e de nos relacionarmos.
sentido da convivência social transformando o imaginário e os sistemas
N García Canclini
286
287
DOS MEIOS ÀS MEDIAÇÕES
MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE MASSA •..

Perdidas as garantias buscadas pela inércia e deslocadas as


resto - as práticas que constituem o viver cotidiano, juntamente com
balizas que demarcavam as instâncias, o que precisamos redesenhar é
aquelas que dão cabo da subsistência e dão sentido à vida - foi
o mapa dos "conceitos básicos" de que fala Williams. Entretanto, não considerado mais como obstáculo à tomada de consciência do que
creio que isto seja possível sem mudar de lugar, sem mudar o lugar a como ação politicamente conseqüente. "Sua concepção da família é
partir do qual as perguntas são formuladas. É o que tem mostrado, nos
tida por conservadora; suas tradições, resquícios fragmentados de uma
últimos anos, a tendência a levantarem-se questões que rebaixam a cultura rural e pré-capitalista; seus gostos estão moldados pela influ-
"lógica diurna"147 e a desterritorialização implicadas ao se assumirem
ência dos meios massivos, seu lazer não passa de escapismo, sua
as margens não como tema, e sim como enzima. Não se trata de carna-
religiosidade, um fator de alienação, e seus projetos de vida, tentativas
valizar a teorial48 - mas não que isto não seja necessário -- e sim de frustradas de ascensão social." 151A cotidianidade, que não está inscrita
aceitar que os tempos não favorecem a síntese, que só podemos pres- imediata e diretamente na estrutura produtiva, é despolitizada e assim
sentir e suspeitar que existem áreas ainda inexploradas mesmo na considerada irrelevante, in-significante. Mesmo assim, uma outra reali-
realidade mais próxima. Como afirmou Laclau, "hoje notamos que a dade nos é descortinada pelos relatos que começam a contar o que
historicidade do social é mais profunda do que aquilo que nossos acontece por dentro da vida dos bairros populares, não para avaliar,
instrumentos teóricos permitem pensar e nossas estratégicas políticas mas para compreender o funcionamento da sociedade popular. Ne-
permitem encaminhar" .149A tentação do apocalipse e a volta ao cate-
la - que escândalo! - o apego dos setores populares à família não está
cismo não deixam de estar presentes, mas a tendência mais secreta
necessariamente relacionado, ou pelo menos não apenas, à conservação
parece ser outra: avançar tateando, sem mapa ou tendo apenas um ma- do passado, e sim, como E. Durham propõe tão lúcida e corajosamen-
pa noturno. Um mapa que sirva para questionar as mesmas coisas _
te, à "superação de um estado generalizado de desorganização familiar
dominação, produção e trabalho - mas a partir do outro lado: as bre-
associado a uma exploração muito mais brutal e direta da forma de
chas, o consumo e o prazer. Um mapa que não sirva para a fuga, e sim trabalho" .152
para o reconhecimento da situação a partir das mediações e dos
sujeitos. Na percepção popular, o espaço doméstico não se restringe
às tarefas da reprodução da força de trabalho. Pelo contrário, e frente
Sobre a cotidianidade, o consumo e a leitura a um trabalho marcado pela monotonia e despojado de qualquer
atividade criativa, o espaço doméstico representa e possibilita um mí-
"A ótica do mercado não perpassa apenas a sociedade, mas nimo de liberdade e iniciativa. Da mesma forma, nem toda forma de
também as explicações da sociedade." 150Isto explica por que as teorias consumo é interiorização dos valores das outras classes. O consumo
críticas privilegiaram as dimensões que têm a ver com a figura do pode falar e fala nos setores populares de suas justas aspirações a uma
trabalhador-produtor de mercadorias não somente na hora. de compre- vida mais digna. Nem toda busca de ascensão social é arrivismo; ela
ender sua situação, mas também na hora de despertar sua consciência. pode ser também uma forma de protesto e expressão de certos direitos
Da mesma forma, o que verdadeiramente interessou à maioria das elementares. Daí a grande necessidade de uma concepção não-repro-
organizações de esquerda na vida das classes populares foram as ações dutivista nem culturalista do consumo, capaz de oferecer um marco
de reivindicação e as associações que organizaram essa luta. Todo o para a investigação da comunicação/cultura a partir do popular, isto

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289
DOS MEIOS ÀS MEDIAÇÕES
MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE MASSA ...

é, que nos permita uma compreensão dos diferentes modos de apro- Outra vertente teórica que é necessário integrar a esta reflexão
priação cultural, dos diferentes usos sociais da comunicação.
é a nova concepção de leitura, desenvolvida na América Latina parti-
Em vários de seus últimos trabalhos, N. Garda Canclini vem cularmente nos trabalhos de Beatriz Sarlo,156nos quais leva adiante as
reunindo elementos para a configuração desse marco,153acompanhan- linhas de pensamento de Hans-Robert Jauss, propondo uma aborda-
do de perto a concepção de Bourdieu, mas ultrapassando-a para abrir gem dos diversos leitores sociais possíveis. Se entendemos por leitura "a
passagem para a práxis, para a transformação e suas formas de produ- atividade por meio da qual os significados são organizados num
ção nas culturas populares da América Latina. Devemos começar sentido",157 resulta que na leitura - como no consumo - não existe
situando o verdadeiro alcance do que procuramos, sua diferença frente apenas reprodução, mas também produção, uma produção que ques-
às teorias funcionalistas da recepção: "Não se trata apenas de medir a tiona a centralidade atribuída ao texto-rei e à mensagem entendida
distância entre as mensagens e seus efeitos, e sim de .construir uma como lugar da verdade que circularia na comunicação. Levar a
análise integral do consumo, entendido como o conjunto dos processos centralidade do texto e da mensagem à crise implica assumir como
sociais de apropriação dos produtoS' .154Não estamos nem no terreno da constitutiva a assimetria de demandas e competências encontradas e
tão combatida "compulsão consumista" nem no do repertório de negociadas a partir do texto. Um texto que já não será máquina unifi-
atitudes e gostos recolhidos e classificados pelas pesquisas de mercado, cadora da heterogeneidade, um texto já não-cheio, e sim espaço globu-
mas tampouco no vago mundo da simulação e do simulacro baudri- lar perpassado por diversas trajetórias de sentido. O que afinal restitui
llardiano. O espaço da reflexão sobre o consumo é o espaço das práticas à leitura a legitimidade do prazer. Não apenas à leitura culta, à leitura
cotidianas enquanto lugar de interiorização muda da desigualdade so- erudita, mas também a qualquer leitura, às leituras populares com seu
cial, 155desde a relação com o próprio corpo até o uso do tempo, o prazer da repetição e do reconhecimento.158 Nas quais falam tanto o
hábitat e a consciência do possível para cada vida, do alcançável e do gozo quanto a resistência: a obstinação do gosto popular por uma
inatingível. Mas também enquanto lugar da impugnação desses limites narrativa que é ao mesmo tempo matéria-prima de formatos comer-
ciais e dispositivo ativador de uma competência cultural, terreno no
e expressão dos desejos, subversão de códigos e movimentos da pulsão
qual a lógica mercantil e a demanda popular às vezes lutam, e às vezes
e do gozo. O consumo não é apenas reprodução de forças, mas também
negociam. O que vem a seguir é um mapa noturno para explorar esse
produção de sentidos: lugar de uma luta que não se restringe à posse
território na encruzilhada formada na América Latina por televisão e
dos objetos, pois passa ainda mais decisivamente pelos usos que lhes melodrama.
dão forma social e nos quais se inscrevem demandas e dispositivos de
ação provenientes de diversas competências culturais.
A televisão a partir das mediações
Prova da importância desse novo terreno é a relevância po-
lítica hoje adquirida pelos "novos conflitos", as lutas contra as formas Em um momento em que o meio televisão se encontra no
de poder que perpassam, discriminando ou reprimindo, a vida coti- centro das transformações provenientes da informática - os satélites,
diana e as lutas pela apropriação de bens e serviços. A articulação entre a fibra ótica etc. - a proposta que apresentarmos aqui poderá para
ambas se fez bastante clara nas histórias que recolhemos para estudar muitos parecer anacrônica. Mesmo assim, vamos nos atrever a formulá-
o popular urbano. Ia, porque estamos convencidos de que se o meio sofre o processo de
numerosas mudanças, a mediação159 a partir da qual esse meio opera
290
291
DOS MEIOS ÀS MEDIAÇÓES MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE MASSA ...

A cotidianidade familiar
social e culturalmente não parece estar sofrendo na América Latina
modificações de fundo. Nem as milhares de câmeras de vídeo que Se a televisão na América Latina ainda tem a família como
anualmente invadem o mercado, nem as antenas parabólicas semeadas unidade básica de audiência é porque ela representa para a maioria das
pela cidade, nem a rede a cabo estão afetando substancialmente o pessoas a situação primordial de reconhecimento. E não se pode entender
modelo de produção de televisão que já conhecemos. Quanto à relação o modo específico que a televisão emprega para interpelar a família sem
dos "usuários" com a televisão, no que diz respeito às grandes maiorias, interrogar a cotidianidade familiar enquanto lugar social de uma
não só na América Latina, mas também na Europa, as mudanças de interpelação fundamental para os setores populares. Motivo de escân-
oferta, apesar da propaganda sobre a descentralização e a pluralização, dalo, como dizíamos acima, para uma intelectualidade que se compraz
parecem apontar para um aprofundamento da estratificação social, em denunciar os aspectos repressivos da organização familiar e para
pois a oferta diferenciada dos produtos de vídeo está ligada ao poder uma esquerda que não vê nisso nada além daquilo que porta como
aquisitivo dos indivíduos. 160 A única coisa que parece importar deci- contaminação da ideologia burguesa, a análise crítica da família foi até
sivamente para os produtores e "programadores" das tecnologias de agora incapaz de pensar a mediação social que constitui. Âmbito de
vídeos é a inovação tecnológica, enquanto o uso social daquelas conflitos e fortes tensões, a cotidianidade familiar é ao mesmo tempo
potencial idades técnicas parece estar fora de seu interesse. 161 Parado- "um dos poucos lugares onde os indivíduos se confrontam como pes-
xalmente a modificação que parece afetar mais profundamente a soas e onde encontram alguma possibilidade de manifestar suas ânsias
televisão que conhecemos é a que segue a linha que estamos propondo e frustrações". 163
aqui: "É preciso abandonar o mediacentrismo, já que o sistema da mídia
Rompendo com as ultrapassadas considerações moralistas -
está perdendo parte de sua especificidade para converter-se em elemen-
a televisão corruptora das tradições familiares - e com uma filosofia
to integrante de outros sistemas de maior envergadura, como o
que atribui à televisão uma função puramente reflexa, começa a se
econômico, cultural e político". 162 Só que na América Latina o aban-
estabelecer uma concepção que vê na família um dos espaços funda-
dono do mediacentrismo está sendo produzido menos pelo impacto mentais de leitura e codificação da televisão.164 Contudo, a mediação
da reconversão industrial dos meios - sua função comunicativa
que a cotidianidade familiar cumpre na configuração da televisão não
relegada como produto residual das opções econômico-industriais -
se limita ao que pode ser examinado do âmbito da recepção, pois
do que pela força com que os movimentos sociais tornam visíveis as inscreve suas marcas no próprio discurso televisivo. Da família como
mediações. Por isso, em vez de fazer a pesquisa partir da análise das
espaço das relações estreitas e da proximidade, a televisão assume e forja
lógicas de produção e recepção, para depois procurar suas relações de
os dispositivos fundamentais: a simulação do contato e a retórica do
imbricação ou enfrentamento, propomos partir das mediações, isto é, direto.165
dos lugares dús quais provêm as construções que delimitam e confi-
Denominamos simulação do contato aos mecanismos medi-
guram a materialidade social e a expressividade cultural da televisão.
ante os quais a televisão especifica seu modo de comunicação orga-
À guisa de hipótese, recolhendo e dando forma a uma série de procuras
nizando-a sobre o eixo da função jática Qakobson), isto é, sobre a
convergentes, embora muitas delas não tenham como "objeto" a
manutenção do contato. Função que opera não apenas pela dispersão
televisão, propõem-se três lugares de mediação: a cotidianidade fami-
da atenção que se apresenta na cotidianidade privada -,-- diante da
liar, a temporalidade social e a competência cultural.

292 293
DOS MEIOS ÀS MEDIAÇÕES
MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE MASSA ••.

concentração da atenção na sala pública e escura do cinema. Trata-se


de Greta Garbo, Barthes sintetizou assim a magia do cinema e de seu
de algo menos psicológico, que talvez requeira o aporte da antropo- espaço próprio: "O rosto constituía um tipo de estado absoluto da
logia para seu estudo, da irrupção do mundo da ficção e do espetáculo carne que não era possível alcançar nem abandonar".167 Diante desse
no espaço da cotidianidade e da rotina.166 E a necessidade, então, de
espaço, fascinante e portanto distanciador, o espaço da televisão é do-
intermediários que facilitem o trânsito entre a realidade cotidiana e o
minado pela magia do ver: por uma proximidade construída mediante
espetáculo ficcional. A televisão recorre a dois intermediários funda-
uma montagem que não é expressiva, e sim funcional, sustentada na
mentais: um personagem retirado do espetáculo popular, o animador base da "gravação ao vivo", real ou simulada. Na televisão, a visão
ou apresentador, e um certo tom que fornece o clima exigido, coloqui- predominante é aquela que produz a sensação de imediatez, que é um
al. O apresentador-animador - presente nos noticiários, nos
dos traços que dão forma ao cotidiano. E isto vale inclusive para a
concursos, nos musicais, nos programas educativos e até nos "cultu-
publicidade, porque se trata da síntese entre a cotidianidade e o espe-
rais", para reforçá-Ios - mais do que um transmissor de informações, táculo, embora viva num equilíbrio instável que lhe dá um certo ar de
é na verdade um interlocutor, ou melhor, aquele que interpela a família transgressão. Na televisão, nada de rostos misteriosos ou encantadores
convertendo-a em seu interlocutor. Daí seu tom coloquial e a simula- demais; os rostos da televisão serão próximos, amigáveis, nem fascinan-
ção de um diálogo que não se restringe a um arremedo do clima
tes nem vulgares. Proximidade dos personagens e dos acontecimentos:
"familiar". Durante muito tempo se criticou apredominância do verbal um discurso que familiariza tudo, torna "próximo" até o que houver
na televisão latino-americana como a melhor prova de seu subdesen- de mais remoto e assim se faz incapaz de enfrentar os preconceitos mais
volvimento: era o rádio com imagens. Mas hoje, quando o desenvol- "familiares". Um discurso que produz seus efeitos a partir da mesma
vimento técnico e expressivo da televisão em boa parte de nossos países forma com que organiza as imagens: do jeito que permitir maior
torna impossível essa explicação, começamos a suspeitar de que a transparência, ou seja, em termos de simplicidade, clareza e economia
predominância do verbal na televisão se inscreve na necessidade de
narrativa. A marca da hegemonia trabalha aí, nessa forma, na constru-
subordinar a lógica visual à lógica do contato, dado que é esta que ção de uma interpelação que fala às pessoas a partir dos dispositivos
articula o discurso televisivo sobre o eixo da relação estreita e a
que dão forma a uma cotidianidade familiar, que não é apenas
preeminência da palavra em culturas tão fortemente orais.
subproduto da pobreza e das artimanhas da ideologia, mas também
Por retórica do direto entendemos o dispositivo que organiza espaçode algumas formas de relação primordial e de algumas vivências
o espaço da televisão sobre o eixo da proximidade e da magia de ver, que não são menos fundamentais só por serem ambíguas.
por oposição ao espaço cinematográfico dominado pela distância e
pela mágica da imagem. No cinema, a função comunicativa central é A ternporalidade social
a poética - e isto, ao menos como intenção, até nos filmes mais
Enquanto em nossa sociedade o tempo produtivo, valorizado
baratos -, quer dizer, a transfiguração arquetípica da realidade. Daí
pelo capital, é o tempo que "transcorre" e é medido, o outro, consti-
que, embora preso pelo argumento e fascinado pelos rostos em primei-
tuinte da cotidianidade, é um tempo repetitivo, que começa e acaba
ro plano, o espectador permaneça distante. Os objetos, as ações e os
rostos no cinema estão carregados de valor simbólico. Falando do rosto para recomeçar, um tempo feito não de unidades contáveis, mas sim
de fragmentos. 168E a matriz cultural do tempo organizado pela televi-

294
295
DOS MEIOS ÀS MEDIAÇÕES MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE MASSA ...

são não seria justamente esta, a da repetição e do fragmento? E não A competência cultural
seria ao se inserir no tempo do ritual e da rotina que a televisão inscreve
Poucos mal-entendidos são tão persistentes e intricados
a cotidianidade no mercado? O tempo com que organiza sua progra- quanto esse que sustenta e no qual desemboca a relação televisão/
mação contém a forma da rentabilidade e do palimpsesto, um
cultura. De um lado, os críticos que encaram a televisão a partir do
emaranhado de gêneros. Cada programa, ou melhor, cada texto
paradigma da arte - que para eles seria a única coisa que valeria a pena
televisivo remete seu sentido ao cruzamento de gêneros e tempos. chamar de cultura - e que denunciam dia após dia, com os mesmos
Enquanto gênero, pertence a uma família de textos que se replicam e
fatigados argumentos, a decadência cultural que a televisão representa
reenviam uns aos outros nos diferentes horários do dia e da semana.
e acarreta intrinsecamente. Os poucos que, dentre estes, se arriscam a
Enquanto tempo "ocupado", cada texto remete à seqüência horária
abandonar a denúncia e partir para a ação propõem uma elevação
daquilo que o antecede e daquilo que o segue, ou àquilo que aparece
cultural da televisão que se materializa quase sempre num insuportável
no palimpsesto nos outros dias, no mesmo horário.
didatismo. De outro lado, os folclóricos, que situam a verdadeira
Visto a partir da televisão, o tempo do ócio encobre e desvela cultura no povo, mas no povo-povo, ou seja, naquele que conserva a
a forma do tempo do trabalho: o fragmento e a série. Dizia Foucault verdade sem contaminações ou mestiçagens, quer dizer, sem história.
que "o poder se articula diretamente sobre o tempo".!69 Porque é nele E quanto à sua proposta cultural? Tornar televisivo o patrimônio de
que se faz mais visível o movimento de unificação que perpassa a danças e canções, indumentárias e iconografias nacionais. Sobre outro
diversidade do social. Assim, o tempo do seriado fala a língua do sistema eixo, aparece a oposição entre os comerciantes, defendendo à moda
produtivo - a da estandardização - mas por trás dele também se populista as demandas manifestadas pela coletividade através das pes-
pode ouvir outras linguagens: a do conto popular, a canção com refrão, quisas de audiência, e o setor público falando à moda paternalista em
a narrativa aventuresca, aquela serialidade "própria de uma estética em nome das verdadeiras necessidades culturais das pessoas. 172
que o reconhecimento embasa uma parte importante do prazer e é, em
O pior do enredo é que acaba encobrindo o culturalismo em
conseqüência, norma de valores dos bens simbólicos".l?O E mais: aque-
que se movimentam todas essas visões e propostas, ao se situarem fora
la em que, segundo Benjamin, torna possível a reprodutibilidade
do sentido social das diferenças culturais e assim encobrindo os inte-
técnica, aquele sensorium ou experiência cultural do novo público, que
nasce com as massas. resses envolvidos na própria idéia de cultural com que operam. Talvez
em nenhum outro lugar o contraditório significado do massivo se faça
Pode-se falar, então, de uma estética da repetição que, traba-
tão explícito e desafiante quanto na televisão: a junção possivelmente
lhando a variação de um idêntico ou a identidade de vários diversos,
inextricável daquilo que nele é desativação de diferenças sociais e,
"conjuga a descontinuidade do tempo da narrativa com a continuidade
portanto, integração ideológica, e daquilo que ele tem de presença de
do tempo narrado".!?! O que nos permite retomar o que foi dito sobre
uma matriz cultural e de um sensorium que às elites produz asco.
a importância do sentimento de duração inaugurado pelo folhetim do
Desconhecer essa tensão, vendo apenas a eficácia do mecanismo
século XIX, permitindo que o leitor popular transite entre o conto e
integrado r e o jogo de interesses comerciais, é o que justificou e
o romance "sem se perder". A série e os gêneros fazem agora a mediação
continua a justificar que a televisão nunca seja considerada quando se
entre o tempo do capital e o tempo da cotidianidade. Mas isto será
tcmatizado em particular mais adiante. trata de discutir políticas culturais, nem por parte dos governos, nem

296 297
DOS MEIOS ÀS MEDIAÇÕES
MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE MASSA •.•

por parte das oposições. A televisão não seria assunto de cultura, só de


cultural da televisão atua pelos seus gêneros. A partir deles, ela ativa a
comunicação. E, como prova, argumentam: onde estão as obrasprimas competência cultural e a seu modo dá conta das diferenças sociais que
produzidas pela televisão? seriam por acaso as versões inglesas de a atravessam. Os gêneros, que articulam narrativamente as serialidades,
clássicos da literatura, ou os melodramas pseudo-históricos norte- constituem uma mediação fundamental entre as lógicas do sistema
americanos? Mais uma vez, como afirmou Benjamin a propósito da produtivo e as do sistema de consumo, entre a do formato e a dos
fotografia, os mandarins da Cultura continuarão a se perguntar se a modos de ler, dos usos.
televisão pode ser considerada como cultura enquanto - gostemos ou
não, para bem ou para mal - é a própria noção de cultura, sua Lógicas da produção e dos usos
significação social, o que está sendo transformado pelo que a televisão
produz e em seu modo de reprodução. Para que a entrada na lógica, isto é, na estrutura e na dinâmica
da produção televisiva, de onde viemos, não signifique a recaída numa
Escapando dessa cegueira, um trabalho singular e pioneiro de
generalidade vazia, devemos nos ater a um critério: o que importa é
P. Fabri introduzia há alguns anos no debate algumas chaves para a
o que configura as condições específicas de produção, o que da estru-
compreensão da especificidade cultural do massivo que, sem desconhe-
cer a caracterização de Abraham A. Moles,173 vai além de seu tura produtiva deixa vestígios no formato, e os modos com que o
funcionalismo sistêmico. Eis aqui a proposta básica de Fabri: "En- sistema produtivo - a indústria televisiva - semantiza e recicla as
demandas oriundas dos "públicos" e seus diferentes usos. Aparece
quanto na cultura culta a obra está, ao menos hoje, em contradição
então uma série de instâncias e dispositivos concretos por estudar. A
dialética com seu gênero, na cultura de massa a regra 'estética' é aquela
competitividade industrial como capacidade de produção manifesta no
da maior adequação ao gênero. Pode-se afirmar que o gênero é justa-
grau de desenvolvimento tecnológico, capacidade de risco financeiro
mente a unidade mínima do conteúdo da comunicação de massa (pelo
para a inovação e grau de diversificação-especialização profissional de
menos no nível da ficção, mas não apenas) e que a demanda de
uma empresa. Essa competitividade não deve ser confundida com a
mercados por parte do público (e do meio) aos produtores se faz no
competência comunicativa alcançada em termos de reconhecimento
nível de gênero. Para os investigadores, é através da percepção do
gênero que se alcança o sentido latente dos textos dos massmedia".174 pelos públicos aos quais se dirige, e que nem está baseada apenas na
Na base desta proposta encontramos a tipologia das culturas elaborada competitividade industrial, nem é inteiramente mensurável pelos ín-
dices de audiêncía. Os níveis e fases de decisão na produção de cada
por Iuri M. LotmanYs sua distinção entre uma cultura gramatica-
lizada, - aquela que remete a intelecção e a fruição de uma obra às gênero: quem, em que momentos, e com que critérios decide o que é
regras explícitas da gramática de sua produção - e uma cultura produzível. As ideologiasprofissionais como componentes e campo de
tensão entre as exigências do sistema produtivo, as regras do gênero,
textualizada, na qual o sentido e a fruição de um texto remete sempre
as demandas sociais, e a iniciativa e criatividade - as formas de
a outro texto, e não a uma gramática, como ocorre no folclore, na
resistência - dos produtores, diretores, atores, cenógrafos, operadores
cultura popular, na cultura de massa. Assim como a maior parte das
etc. As rotinas de produção ou a seriedade vista a partir dos hábitos de
pessoas vai ao cinema para ver um filme, ou seja, um filme policial ou
de ficção científica ou de aventuras, do mesmo modo a dinâmica trabalho que ela requer, tanto nas exigências de rentabilidade sobre o
tempo da produção e das formas de atuação, quanto nas distorções

:l°,a
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DOS MEIOS ÀS MEDIAÇÕES MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE MASSA ...

através das quais o "estilo" se incorpora às práticas de trabalho. E, por a televisão na casa, central ou marginal? preside a sala onde se leva a
último, as estratégias de comercialização, que não são algo que se vida "social", ou se refugia no quarto de dormir, ou se esconde no
acrescenta "depois", para vender o produto, mas algo que deixou suas armário, de onde a retiram apenas para ver algo muito especial? A
marcas na estrutura do formato, seja na forma tomada pelo corte leitura da topografia possibilita o estabelecimento de uma topologia
narrativo para a publicidade, na qual dita seu lugar no palimpsesto, ou simbólica configurada pelos usos de classe. Do mesmo modo, é pos-
nos ingredientes diferenciais introduzidos pela diversificação daquilo sível traçar uma tipologia social dos tempos: desde a tela que fica ligada
que só será visto "dentro" de um país ou também fora dele. o dia inteiro até aquela que ligam só para ver o noticiário ou o seriado
Para abordar as lógicas (no plural) dos usos devemos começar da BBC, pode-se observar uma gama de usos que não tem a ver
diferenciando nossa proposta daquela análise denominada "dos usos unicamente com a quantidade de tempo dedicado, mas com o tipo de
.
e gratificações", já que estamos tratando de retirar o estudo da recepção tempo, com o significado social deste tempol77 e com o tipo de
Q.. do espaço limitado por uma comunicação pensada em termos de demanda que as diferentes classes sociais fazem à televisão. Enquanto
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mensagens que circulam, de efeitos e reações, para re-situar sua pro- uma classe normalmente só pede informação à televisão, porque vai
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blemática no campo da cultura: dos conflitos articulados pela cultura, buscar em outra parte o entretenimento e a cultura - no esporte, no
•.........
teatro, no livro e no concerto -, outras classes pedem tudo isso só à
:t: das mestiçagens que a tecem e dos anacronismos que a sustentam, e por
U fim do modo com que a hegemonia trabalha e as resistências que ela
televisão.
.-.1 mobiliza, do resgate, portanto, dos modos de apropriação e réplica das Não somente a classe social é que fala nos usos, mas também
!..L
U~ classes subalternas. Há, contudo, tentativas de repensar a partir da a competência cultural dos diversos grupos que atravessa as classes, pela
--- comunicação o espaço da recepção, mas re-situando-o, como lucida- via da educação formal, com suas distintas modalidades, mas sobretu-
c; mente propôs Miquel de Moragas, no terreno dos desafios levantados do pela via dos usos que configuram etnias, culturas regionais, "dia-
rCI pela transformação tecnológica à democratização da sociedade. letos" locais e distintas mestiçagens urbanas em relação àqueles. Com-
(,,!;
Moragas introduz, para isso, a proposta de uma tipologia com base na petência que vive da memória - narrativa gestual, auditiva - e tam-
noção de âmbito de recepção, que permite pensar os distintos tipos de bém dos imagindrios atuais que alimentam o sujeito social feminino ou
competência comunicativa enquanto "ativação ou freio da participa- juvenil. O acesso a esses modos de usos passa inevitavelmente por um
ção social, questão fundamental para uma política democrática dos ver com as pessoas que permita explicitar e confrontar as diversas moda-
meios, e que não consiste somente na democratização de seu controle, lidades e as competências ativadas por aquelas, e pelas narrativas-
mas também na democratização de seu USO".176 histórias de vida - que deles nos contam e dão conta deles.
O plural das lógicas do uso não se esgota na diferença social Entre a lógica do sistema produtivo e as lógicas dos usos,
das classes, mas essa diferença articula as outras. Os habitus de classe medeiam os gêneros. São suas regras que configuram basicamente os
atravessam os usos da televisão, os modos de ver, e se manifestam _ formatos, e nestes se ancora o reconhecimento cultural dos grupos.
observáveis etnograficamente - na organização do tempo e do espaço Claro que a noção de gênero que estamos trabalhando tem pouco a ver
cotidianos: de que espaços as pessoas vêem televisão, privados ou com a velha noção literária do gênero como "propriedade" de um
püblicos, a casa, o bar da esquina, o clube de bairro? e que lugar ocupa texto, e muito pouco também com a sua redução taxonômica, empre-

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endida pelo estruturalismo.178 No sentido em que estamos trabalhan- diferentes conteúdos semânticos das diversas matérias significantes.
do, um gênero não é algo que ocorra no texto, mas sim pelo texto, pois Um gênero funciona constituindo um "mundo" no qual cada elemen-
é menos questão de estrutura e combinatórias do que de competência. to não tem valências fixas. Mais ainda no caso da televisão, onde cada
Assumimos então a proposta de uma equipe de investigadores italianos
gênero se define tanto por sua arquitetura interna quanto por seu lugar
segundo a qual um gênero é, antes de tudo, uma estratégia de na programação: na grade de horários e na trama do palimpsesto. Daí
comunicabilidade, e é como marca dessa comunicabilidade que um a terceira exigência envolvida na abordagem dos gêneros: a necessidade
gênero se faz presente e analisável no texto.179 A consideração dos de construir seu sistema em cada país. Pois, em cada país, esse sistema
gêneros como fato puramente "literário" - não cultural - e, por responde a uma configuração cultural, a uma estrutura jurídica de
outro lado, sua redução a receita de fabricação ou etiqueta de classi- funcionamento da televisão, a um grau de desenvolvimento da indús-
ficação nos têm impedido de compreender sua verdadeira função e sua tria televisiva nacional, e a alguns modos de articulação com a
pertinência metodológica: chave para a análise dos textos massivos e, transnacional.
em especial, dos televisivos.
Enquanto estratégias de interação, isto é, "modos em que se Alguns sinais de identidade
reconhecíveis no melodrama
fazem reconhecíveis e organizam a competência comunicativa, os
emissores e os destinatários",180 os gêneros não podem ser estudados Vendo como vivemos no pleno melodrama - já que o melodrama
sem uma redefinição da própria concepção que se teve de comunica- é o nosso alimento cotidiano - cheguei muitas vezes a me perguntar se
ção. Pois seu funcionamento nos coloca diante do fato de que a o nosso medo do melodrama (como sinônimo de mau gosto) não seria
competência textual, narrativa, não se acha apenas presente, não é uni- devido a uma deformação causada pelas muitas leituras de romances
camente condição da emissão, mas também da recepção. Qualquer psicológicos franceses escritos nos primeiros anos do século. Mas a
telespectador sabe quando um texto/relato foi interrompido, conhece verdade é que alguns dos escritores que mais admiramos jamais tiveram
medo do melodrama. Nem Sábato nem Onetti temeram o melodrama.
as formas possíveis de interpretá-Io, é capaz de resumi-Io, dar-lhe um
Mesmo Borges, quando se aproxima do mundo do gaúcho ou do
título, comparar e classificar narrativas. Falantes do "idioma" dos
fanfarrão, aproxima-se voluntariamente do âmbito de Juan Moreira e do
gêneros, os telespectadores, como nativos de uma cultura textualizada,
tango suburbano.
"desconhecem" sua gramática, mas são capazes de falá-Io. O que, ao
Alejo Carpentier
mesmo tempo, implica uma redefinição do modo de nos aproximar-
mos dos textos da televisão. Momentos de uma negociação, os gêneros O melodrama francês não é igual ao gringo, nem o soviético ao
não são abordáveis em termos de semântica ou sintaxe: exigem a espanhol, mas em compensação se pode estudar a unidade melodramá-
construção de uma pragmática, que pode dar conta de como opera seu tica latino-americana que percorre o continente desde o Rio Grande até
reconhecimento numa comunidade cultural. Assim mesmo, o texto do a Patagônia, porque gemendo, botando a culpa nos outros, cantando
rancheiras mexicanas ou tangos argentinos quando se embebeda, é com
gênero num estoque de sentido que apresenta uma organização mais
isso que o território se identifica plenamente.
complexa do que molecular, e que portanto não é analisável seguindo
Rernando Saleedo
lima lista de presenças, mas buscando-se a arquitetura que vincula os

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DOS MEIOS ÀS MEDIAÇÕES
MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE MASSA ...

Duas expressivas citações, para nos introduzir no gênero em mesmo tempo sujeito para alguém. É a dimensão viva da sociabilidade
que se reconhece a América Latina popular, mas também a culta ... atravessando e sustentando a dimensão institucional, a do "pacto
quando se embriaga. Nenhum outro gênero conseguiu agradar tanto social".
nesta região quanto o melodrama, nem mesmo o de terror - e não
Podemos agora retomar ao melodrama, ao que nele está em
por falta de motivos - ou o de aventuras - ainda que tampouco
jogo, que é o drama do reconhecimento.182 Do filho pelo pai ou da mãe
faltem selvas e rios. É como se estivesse nele o modo de expressão mais
pelo filho, o que move o enredo é sempre o desconhecimento de uma
aberto ao modo de viver e sentir da nossa gente. Por isso, para além
identidade e a luta contra as injustiças, as aparências, contra tudo o que
de tantas críticas e leituras ideológicas, e também das modas e dos
revivals para intelectuais, o melodrama continua a constituir um ter- se oculta e se disfarça: uma luta por sefazer reconhecer. Não estará aí
a secreta conexão entre o melodrama e a história deste subcontinente?
reno precioso para o estudo da não-contemporaneidade e das mesti-
Em todo caso, o des-conhecimento do "contrato social" no melodrama
çagens de que estamos feitos. Como nas praças de mercado, no me-
lodrama está tudo misturado, as estruturas sociais com as do senti- fala, em alto e bom som, do peso que têm, para aqueles que nele se
reconhecem, essa outra sociabilidade primordial do parentesco, as so-
mento, muito do que somos - machistas, fatalistas, supersticiosos-
lidariedades locais e a amizade. Seria então sem sentido indagarmos até
e do que sonhamos ser, o roubo da identidade, a nostalgia e a raiva.
que ponto o sucesso do melodrama nesses países testemunha sobre o
Em forma de tango ou telenovela, de cinema mexicano ou reportagem
fracasso de certas instituições políticas que se desenvolveram des-
policial, o melodrama explora nestas terras um profundo frlão de nosso
conhecendo o peso dessa outra sociabilidade, incapazes de assumir sua
imaginário coletivo, e não existe acesso à memória histórica nem pro- densidade cultural?
jeção possível sobre o futuro que não passe pelo imaginário. 181De que
filão se trata? Daquele em que se faz visível a matriz cultural que É claro que a compreensão dessa pergunta nos recoloca no
alimenta o reconhecimento popular na cultura de massa. âmbito dos movimentos sociais que chamamos acima de movimentos
de bairro e no sentido do cotidiano familiar nas culturas populares.
Dentre os planos de significação, ou isotopias, articulados
Aquelas em que o tempo familiar é "esse tempo a partir do qual o
pela noção de reconhecimento, o racionalismo imperante só atribui
homem se pensa social, um homem que é antes de mais nada um
sentido a um: o negativo. Porque no plano do conhecer, re-conhecer
parente. Daí que o tempo familiar se reencontre no tempo da coleti-
é pura operação de redundância, ônus inútil. E se uma tal isotopia é
vidade".183 De modo que entre o tempo da história - que é o tempo
projetada sobre a questão ideológica, então o resultado se torna ainda
da Nação e do mundo, o dos grandes acontecimentos que se dão na
mais radical: estamos no reino da alienação, onde re-conhecer consiste
comunidade - e o tempo da vida - que é aquele que vai do
em des-conhecér. Existe, porém, outro sentido, bem diferente: aquele
nascimento à morte de cada indivíduo, balizado pelos ritos que assi-
no qual re-conhecer significa interpelar, uma questão acerca dos sujei-
nalam a passagem de uma idade a outra - o tempo familiar é o que
tos, de seu modo específico de se constituir. E não só os sujeitos
medeia e possibilita sua comunicação. A propósito dos setores operá-
individuais, mas também os coletivos, os sociais, e inclusive os sujeitos
rios na cidade, e não mais de camponeses distantes do tempo do
políticos. Todos se fazem e refazem na trama simbólica das interpe-
progresso, Hoggart afirma que "os acontecimentos só são percebidos
la~:ões, dos reconhecimentos. Todo sujeito está sujeito a outro e é ao
quando afetam a vida do grupo familiar".184 Uma guerra, assim, é

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DOS MEIOS ÀS MEDIAÇÕES MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE MASSA •..

percebida como "a época em que meu tio morreu", e a capital, como tratam, nas anedotas que apresentam, que não seriam senão
"o lugar onde mora minha cunhada". Desse modo, família e vizinhan- epifenômenos da mensagem transmitida?" 186Começamos a suspeitar
ça - pois esta tem sido hoje uma espécie de "família aumentada" nos de que o que faz a força da indústria cultural e o que dá sentido a essas
bairros populares das grandes cidades, dada a brutal migração, o narrativas não se encontra apenas na ideologia, mas na cultura, na
desenraizamento e a precariedade econômica - representam no dinâmica profunda da memória e do imaginário.
mundo popular os modos da sociabilidade mais verdadeira, mesmo
Como nos velhos tempos do folhetim, agora, em sua versão
com todas as suas contradições e os seus conflitos.
mais nova e mais latino-americana - tanto que junto com os grandes
Diante dessa concepção e dessa vivência, as transformações textos do realismo mágico, a telenovela é o outro produto cultural que
operadas pelo capitalismo no âmbito do trabalho e do ócio, a a América Latina conseguiu exportar para a Europa e os Estados
mercantilização do tempo da rua e da casa e até das relações mais Unidos - o melodrama se acha mais próximo da narração, no sentido
primárias, pareceriam ter abolido aquela sociabilidade. Na verdade, que lhe deu Benjamin, que do romance, ou seja, do livro, e mais
não fizeram mais do que torná-Ia anacrônica. Mas esse anacronismo é próximo da literatura dialógica tal como Bakhtin a entende, que da
precioso, é ele que hoje, em "última instância", dá sentido ao melo- monológica. Investiguemos minimamente essas pistas.
drama na América Latina - desde a permanência da canção romântica
Da narração, o melodrama de televisão conserva uma forte
até o surgimento da telenovela - o que lhe permite mediar entre o
ligação com a cultura dos contos e das lendas, 187a literatura de cordel
tempo da vida, isto é, de uma sociabilidade negada, economicamente brasileira,188 as crônicas cantadas nas baladas e nos vallenatos.189 Con-
desvalorizada e politicamente desconhecida, mas culturalmente viva,
serva o predomínio da narrativa, do contar a, com o que isso implica
e o tempo da narrativa que a afirma e permite que as classes populares
de presença constante do narrador estabelecendo dia após dia a conti-
se reconheçam nela. E que a partir dela, melodramatizando tudo, nuidade dramática; e conserva também a abertura indefinida da narra-
vinguem-se à sua maneira, secretamente, da abstração imposta à vida
tiva, sua abertura no tempo - sabe-se quando começa mas não quan-
pela mercantilização, da exclusão política e da despossessão cultural.
do acabará - e sua permeabilidade à atualidade do que se passa en-
Mas onde ficam a alienação, a ideologia e as argúcias dos quanto a narrativa se mantém, e as condições mesmas de sua efetivação.
comerciantes? Também aí, como parte da trama de desconhecimentos Uma telenovela peruana acabou incorporando como um fato da vida
e reconhecimentos. Trabalhando não a partir do exterior e menos real uma greve dos taxistas de Lima, que tinha impedido a gravação de
ainda como os "verdadeiros" protagonistas de um drama em que o algumas cenas, incorporou-se à telenovela como um fato de vida.
pobre povo não seria outra vez mais do que o coro. E o coro se rebelou Funcionamento paradoxal é a de uma narrativa que, produzida segun-
há muito tempo.185 Depõe sobre essa rebelião, muito a seu modo, o do as regras mais exigentes da indústria, e incorporando a tecnologia
desconcertante prazer que as pessoas do povo continuam a procurar no mais avançada, responde no entanto a uma lógica oposta à que rege
melodrama. "Que tipo de masoquismo de massa, ou que comporta- seu modo de produção: a qualidade da comunicação que alcança tem
mento de classe suicida pode explicar tal fascínio?", pergunta-se Michel pouco a ver com a qualidade de informação que proporciona.
Mattelart, que responde com outra pergunta: "Será possível que o
Segunda pista: o melodrama como literatura dialógica ou,
poder das indústrias culturais não resida inteiramente nos temas de que
segundo uma versão brasileira ancorada na proposta bakhtiniana,

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DOS MEIOS ÀS MEDIAÇÕES ~ MODERNIDADE E MEDIAÇÃO DE MASSA ...

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como gênero carnavalesco, aquele "onde autor, leitor e personagens Continuar pensando o massivo como algo puramente exte-
trocam constantemente de posição".190 Intercâmbio que é confUsão rior ao popular - como algo que só faz parasitar, fagocitar,
entre narrativa e vida, entre o que faz o ator e o que se passa com o vampirizarl92 - só é possível, hoje, a partir de duas posições. Ou a
I

espectador, sinal de identidade de uma outra experiência literária que i


partir da posição dos folcloristas, cuja missão é preservar o autêntico,
se mantém aberta a reações, desejos e motivações do público. Não no I

cujo paradigma continua a ser rural e para os quais toda mudança é


sentido de transferir para a narrativa as coisas da vida, pois "não é a desagregação, isto é, deformação de uma forma voltada para sua pureza
representação dos fatos concretos e particulares o que produz o sentido original. Ou a partir de uma concepção da dominação social que não
de realidade na ficção, mas uma certa generalidade que visa ambos os pode pensar o que produzem as classes populares senão em termos de
lados e dá consistência tanto aos fatos particulares do real quanto ao reação às induções da classe dominante. O que essas duas posições
mundo fictício".191 Que nessa abertura e confusão acha-se imbricada "poupam" é a história: sua opacidade, sua ambigüidade e a luta pela
a lógica mercantil e que por ela passam "funcionando" as estratégias constituição de um sentido que essa ambigüidade recobre e alimenta.
do ideológico, é algo inegável. Mas de afirmar esse entrecruzamento E a "poupam" saltando da etnografia para a militância, ou da
de lógicas diferentes a dissolver nas solicitações do mercado qualquer fenomenologia para a grande política. Curiosamente, os mais fervoro-
indício de outra experiência ou matriz cultural, a distância é, além de sos defensores de uma concepção puramente exterior das relações entre
metodológica, política. É sem dúvida outra cultura política a que pode o popular e o massivo se acham menos entre os que se aproximam da
aceitar que o melodrama seja ao mesmo tempo forma de recuperação cultura de massa a partir da arte ou da literatura do que entre os
da memória popular pelo imaginário fabricado pela indústria cultural profissionais da "sociologia da comunicação", área ainda dominada
e metáfora indicativa dos modos de presença do povo na massa. por aquilo que José Nun chamou de "o outro reducionismo", e a
Dedicaremos nossos últimos capítulos a alguns desses mo- propósito da qual ele escreve: "Na América Latina, em geral, a litera-
dos, não sem antes advertir que se o mapa traçado era "noturno", o tura sobre os meios de comunicação se dedica a demonstrar sua
que se segue não poderá ser outra coisa que o assinalamento do trajeto qualidade (inegável) de instrumentos oligárquico-imperialistas de
teórico e a narrativa de algumas experiências pioneiras dessa investi- penetração ideológica, mas quase não se ocupa em examinar como são
gação na América Latina. recebidas as mensagens e com que efeitos concretos: é como se fosse
condição de entrada no tópico que o pesquisador se esquecessedas conse-
o
POPULAR QUE NOS
INTERPELA A PARTIR DO MASSIVO
qüências não desejadas da ação social para instalar-se num
hiperjuncionalismo de esquerda" .193
Realidade contraditória e desafiadora de uma sociedade de massa São bem pertinentes para a questão que estamos tentando
que, na lógica perversa de um capitalismo selvagem, do velho cria o propor as precauções do historiador Luis A. Romero no uso da noção
novo e do novo refaz o velho, fazendo coexistir e juntar-se, de modo de "cultura popular" quando fala da cultura dos setores populares em
paradoxalmente natural, a sofisticação dos meios de comunicação de Buenos Aires, já desde 1930. Pois trata-se de uma noção que traz uma
massa e massas de sentimentos veiculados pela cultura mais tradicio- certa conotação essencialista, que freqüentemente alude a um sujeito
nalmente popular.
homogêneo pensado em termos de "pólo íntegro e resistente", ou de
Marlyse Meyer "mero produto da manipulação, versão degradada e funcional da

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