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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

Relações entre ciência, tecnologia e sociedade em museus de ciências

Djana Contier

Dissertação de Mestrado apresentada à


Faculdade de Educação da Universidade de
São Paulo para obtenção do título de Mestre
em Educação

Área de concentração:
Ensino de Ciências e Matemática

Orientadora:
Professora Doutora Martha Marandino

SÃO PAULO
2009
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

Catalogação na Publicação
Serviço de Biblioteca e Documentação
Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo

371.309(81) Contier, Djana

F222r Relações entre ciência, tecnologia e sociedade em museus de


ciências / Djana Contier; orientação Martha Marandino. São
Paulo : s.n., 2009.
154 p.

Dissertação (Mestrado – Programa de Pós-Graduação em


Educação. Área de Concentração : Ensino de Ciências e
Matemática) - - Faculdade de Educação da Universidade de São
Paulo.
Relações entre ciência, tecnologia e sociedade em museus de ciências
1. Museus de ciências e tecnologia – Educação - Brasil 2.
Djana Contier Fares
Educação não formal - Brasil 3. Ciências – Estudo e ensino 4.
Exposições museológicas – Análise I. Marandino, Martha ,
orient.
Agradecimentos

À Martha Marandino, pela orientação e amizade.

A todos que participaram do GEENF durante os últimos quatro anos, com quem pude
aprender e discutir sempre. Em especial às meninas Alessandra, Ana Maria Navas,
Luciana Martins, Luciana Monaco e Maria Paula por tudo que compartilhamos nesses
anos.

À Sandra Murriello, fiel revisora, por todo o aprendizado e pela amizade.

Ao Maurício Pietrocola, pela participação no exame de qualificação e pelas


contribuições informais feitas nos corredores, emails e telefone. Mas agradeço-o,
sobretudo, por ter me apresentado a Martha e, com isso, me possibilitado encontrar um
grupo que veio tão ao encontro dos meus interesses, e que tanto contribui para o meu
crescimento pessoal e profissional.

À Moema, pela atenta leitura do trabalho e pelas pertinentes sugestões feitas durante o
exame de qualificação.

À Fapesp, pela bolsa concedida durante os últimos dezoito meses do mestrado.

Aos colegas do Museu Exploratório de Ciências da Unicamp, pelo aprendizado na


prática, Sylla John, Marilisa, Sabine e, em especial, ao Marcelo Knobel, por sempre
ajudar a criar oportunidades.

Às instituições que abriram suas portas para serem sujeitos desta pesquisa: Museu da
Vida – Fiocruz, Estação Ciência – USP, Museu de Ciências e Tecnologia da PUC do
Rio Grande do Sul, e Universum-UNAM. E, em especial, aos elaboradores das
exposições que gentilmente cederam seu tempo e disposição para a realização das
entrevistas.

Ao Renato, por me acompanhar em todo este processo e compartilhar o interesse pela


ciência e pelos museus.

À família e aos amigos queridos, por todo o resto.


Resumo

CONTIER, D. Relações entre ciência, tecnologia e sociedade em museus de ciências,


Dissertação de Mestrado, Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, 2009.

Este trabalho analisa como museus de ciências no Brasil exploram as relações e as


interferências mútuas entre ciência, tecnologia e sociedade, utilizando como principais
referenciais a educação com enfoque ciência, tecnologia e sociedade (CTS), e a
comunicação pública da ciência. A escolha da educação com enfoque CTS está
relacionada à discussão sobre a importância da formação de cidadãos críticos diante das
questões de ciência e tecnologia (C&T), incluindo a abordagem ciência, tecnologia,
sociedade e meio ambiente (CTSA). Já a escolha da comunicação pública da ciência se
dá pelo seu debate sobre a mudança na forma de participação do público nas tomadas de
decisão sobre C&T. Esses dois referenciais desafiam as instituições que atuam na
interface ciência e público a repensar seus objetivos e propósitos. Um questionamento
ainda mais relevante, se levados em consideração o crescimento e o fortalecimento dos
museus de ciências no Brasil nos últimos anos. Para este projeto, foram selecionadas e
analisadas três exposições de diferentes museus de ciências nacionais: Educação
Ambiental, do Museu de Ciências e Tecnologia/PUC-RS; Reprodução e genética, do
Espaço Biodescoberta do Museu da Vida/Fiocruz, e Os Ciclos Biogeoquímicos e o Meio
Ambiente, do Planeta Terra e a preservação ambiental da Estação Ciência/USP. Para a
análise destas exposições foram construídos atributos que pudessem caracterizar uma
exposição como CTS ou CTSA. Esses atributos foram divididos em três conjuntos: o
primeiro refere-se aos atributos que exploram debates sociais externos à ciência; o
segundo refere-se aos que exploram debates sociais internos à ciência; e o terceiro, aos
que trazem debates históricos e filosóficos. Dessa forma, a análise foi conduzida
identificando esses atributos nos elementos expositivos (objetos, aparatos interativos,
painéis de textos, entre outros elementos cenográficos) em cada uma das exposições.
Tal análise levou à reflexão de que há diferentes formas de caracterização de uma
exposição como CTS ou CTSA. Uma gradação entre exposições que exploram apenas
um dos atributos de maneira pontual até as que exploram todos eles; entre esses
extremos, estariam aquelas que trazem apenas um atributo, mas em quase todos os
elementos expositivos; exposições que trazem mais de um atributo, mas de apenas um
dos conjuntos; ou ainda aquelas que abordam um número representativo deles, mas não
em sua totalidade. Devido ao desafio de encontrar exposições de cunho CTS no cenário
nacional, inclui-se, nesta análise, uma discussão, dirigida principalmente pelas
entrevistas realizadas com os elaboradores das exposições, que fizesse emergir
explicações para a baixa representatividade dessa categoria de exposições.

Palavras-chave: Museus de ciências. CTS. CTSA. Educação e museus. Análise de


exposições.
Abstract

CONTIER, D. Relations between science, technology, and society in science


museums Master’s Dissertation, Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo,
2009.

The present dissertation analyzes how science museums in Brazil explore the relations
and mutual interferences between science, technology, and society, using education
focused on science, technology, and society (STS), and public communication of
science as its main references. The election of STS-focused education is related to the
discussion about the importance of training critical citizens to face science and
technology (S&T) issues, including the science, technology, society, and environment
(STSE) approach. The election of the public communication of science is related to the
debate about the change in ways of public participation in S&T decisions. Those two
references challenge the institutions that work on the public-science interface to
reconsider their objectives and purposes. Those questions get even more relevant if
the growth and strengthening of science museums in Brazil in recent years are taken
into account. For this project three exhibitions from different national science museums
were selected and analyzed: Educação Ambiental [Environmental education], at the
Museu de Ciências e Tecnologia/PUC-RS; Reprodução e genética [Reproduction and
genetics], at the Biodiscovery Space at the Museu da Vida/Fiocruz; and Os Ciclos
Biogeoquímicos e o Meio Ambiente [The biogeochemical cycles and the environment],
at the Planet Earth and Environment Preservation at Estação Ciência/USP. In order
to analyze these exhibitions, attributes that could qualify an exhibition as STS or STSE
were composed. Those attributes were divided into three sets: the first applies to the
attributes related to external social science issues; the second applies to the attributes
related to internal social science issues; and the third applies to the attributes related to
historical and philosophical debates. In this manner, the analysis was directed
by identifying those attributes in the exhibit elements (objects, interactive displays, text
panels, and other scenographic elements) in each of the exhibitions. The analysis leads
to the idea of different ways to classify an exhibition as STS or STSE. A range from
exhibitions that explore only one attribute in a particular manner to the ones in which
all attributes are explored; between those two extremes there would be those exhibitions
that bring only one attribute but in almost all exhibit elements; the ones which bring
some attributes but only in one set; or, still further, those which explore many attributes
but not all of them. Due to the difficulty of finding STS-themed exhibitions in the
national scene, a discussion driven mainly by interviews with the exhibition elaborators,
aimed at finding reasons and explanations for that low representativeness, was included
in the analysis.

Key words: Science museums. STS. STSE. Education and museums. Exhibitions
analyses.
SUMÁRIO

Introdução ..................................................................................................................... 11

Capítulo I: Os museus de ciências no contexto brasileiro......................................... 15

1.1 Trajetória dos museus de ciências no Brasil .................................................... 15

1.2 Os museus de ciências e as políticas de incentivo no contexto atual............... 17

1.3 Desafios anunciados ........................................................................................ 20

Capítulo II: Ciência-Tecnologia-Sociedade, Comunicação pública da ciência,


Controvérsia científica: referenciais para análise ..................................................... 30

2.1 Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) .......................................................... 30

2.1.1 Educação com enfoque CTS .................................................................... 34

2.1.2 Ciência, Tecnologia, Sociedade e Meio Ambiente (CTSA) ..................... 38

2.2 Comunicação pública da ciência ...................................................................... 40

2.3 Controvérsias na ciência, controvérsias nos museus ....................................... 43

2.4 Interfaces entre CTS, Modelos de comunicação, Controvérsia e Museus ....... 48

Capitulo III: Abordagem metodológica ..................................................................... 51

3.1 Escolhas metodológicas ................................................................................... 51

3.2 Definição do objeto de estudo.......................................................................... 52

3.2.1 A escolha dos museus ............................................................................... 52

3.2.2 A escolha das exposições ......................................................................... 52

3.3 Instrumentos de coleta de dados ...................................................................... 54

3.3.1 Observação das exposições ...................................................................... 54

3.3.2 Entrevistas ................................................................................................ 59

3.3.3 Análise documental .................................................................................. 60

3.4 Condução da análise ........................................................................................ 61

3.4.1 Natureza das interações CTS e CTSA ...................................................... 61

3.4.2 Outros aspectos analisados ....................................................................... 67


Capitulo IV: As exposições analisadas ....................................................................... 68

4.1 Museu de Ciências e Tecnologia da PUC/RS .................................................. 68

4.1.1 Educação Ambiental, incluindo Nossa água, nossa vida.......................... 70

4.2 Museu da Vida – Fiocruz ................................................................................. 81

4.2.1 Espaço Biodescoberta ............................................................................... 85

4.2.2 Reprodução e genética – Espaço Biodescoberta ...................................... 85

4.3 Estação Ciência – USP .................................................................................... 93

4.3.1 O Planeta Terra e a preservação ambiental .............................................. 94

4.3.2 Os Ciclos Biogeoquímicos e o Meio Ambiente – O Planeta Terra e a


preservação ambiental............................................................................................. 96

Capitulo V: Sobre o que falam as exposições, e o que deixam de falar? ............... 109

5.1 Exposições CTS e CTSA ............................................................................... 110

5.1.1 Educação Ambiental, uma necessidade mundial ................................... 110

5.1.2 Reprodução e genética, de Mendel à Dolly ............................................ 116

5.1.3 Os Ciclos Biogeoquímicos e o Meio Ambiente, os problemas ambientais


causados pela interferência da humanidade......................................................... 123

5.2 Sobre as ausências e as intenções .................................................................. 128

Capitulo VI: Considerações ....................................................................................... 143

Referências .................................................................................................................. 147

Anexo I ......................................................................................................................... 151

Anexo II ....................................................................................................................... 153


11

Introdução

Este trabalho analisa como as exposições de alguns museus de ciências no Brasil


exploram as relações e as interferências mútuas entre ciência, tecnologia e sociedade,
utilizando como referencial os estudos sociais da ciência com ênfase na educação com
enfoque ciência, tecnologia e sociedade (CTS), a comunicação pública da ciência e a
controvérsia científica. A pesquisa foi norteada pelos seguintes questionamentos: se os
museus de ciências exploram essas relações em suas exposições; se exploram questões
de cunho político e sociológico relacionadas ao desenvolvimento da ciência e
tecnologia; de que maneira o fazem e com quais objetivos.

A formulação dessas questões foi influenciada tanto pelas discussões presentes


nos referenciais teóricos usados, que defendem uma abordagem crítica da educação em
ciências e problematizam o papel do público nas questões de C&T, quanto pelo
crescimento de museus de ciências e tecnologia no Brasil nas últimas décadas.

No campo da educação com enfoque CTS, diversos autores (AIKENHEAD,


1994; AULER, 2002; LUJÁN LÓPES et al., 1996) discutem a importância de formar
cidadãos que se coloquem criticamente diante das questões de ciência e tecnologia. Um
de seus principais objetivos está relacionado à formação de cidadãos com uma postura
crítica ante as questões políticas e sociais de C&T.

Autores que discorrem sobre a mudança de paradigma nos modelos de


comunicação da ciência (DURANT, 1999; LEWENSTEIN, 2005) chamam as
instituições que de alguma forma lidam com articulação entre ciência, tecnologia e
sociedade, incluindo os museus de ciências e tecnologia, a repensarem seus objetivos e
propósitos diante da sociedade contemporânea. Discutem também a importância da
participação pública nas tomadas de decisões sobre C&T, e a importância da existência
de espaços que propiciem e incentivem essa participação.

Essas discussões se tornam ainda mais pertinentes se levarmos em consideração


o crescimento e fortalecimento dos museus de ciências no Brasil nos últimos anos. Esse
crescimento não se dá isoladamente, mas faz parte de um movimento nacional mais
amplo de incentivo à área da divulgação científica, tanto no âmbito do governo, via
Ministério da Ciência e Tecnologia, como pelo incentivo de outras instituições, como a
12

Fundação Vitae, por exemplo. Esse crescimento também tem sido alvo de discussão e
debate por diferentes autores (CURY, 2000; MARANDINO, 2001; NAVAS, 2008;
VALENTE; CAZELLI; ALVES, 2005).

Essa pesquisa destaca a importância da problematização das relações entre


ciência, tecnologia e sociedade partindo do pressuposto de que os museus podem
contribuir para a formação de cidadãos mais críticos em relação às questões de C&T.
Para que as pessoas possam ser mais críticas é importante evidenciar os processos
envolvidos na construção do conhecimento científico e tecnológico nos diferentes locais
nos quais se entra em contato com temáticas de C&T, ou seja, é importante que as
instituições ligadas de alguma forma ao compromisso da educação e comunicação em
ciência exponham e debatam essas questões.

Apesar de uma inerente dificuldade – uma vez que a reconstrução histórica


normalmente simplifica as relações e divulga uma ciência de resultados (MATTEWS,
1994) – cidadãos que têm interesse (e oportunidade) podem ir atrás de informações e
tentar entender as forças envolvidas na construção de um conhecimento
científico/tecnológico ou ir atrás de informações sobre os riscos e benefícios do uso de
uma determinada tecnologia, como de um novo tratamento médico, por exemplo. No
entanto, para a grande maioria das pessoas, essas questões – que podem ser polêmicas e
problemáticas – passam despercebidas; e a grande maioria delas não deveria passar,
pois têm conseqüências diretas e indiretas na vida de todos. Diante disso, cabe aos
atores dessa mediação entre sociedade, ciência e tecnologia – incluindo os museus de
ciências – trazer à luz debates tanto da perspectiva de que a ciência é socialmente
construída, ou seja, que a sociedade interfere, sim, em seus processos, quanto sobre as
conseqüências socioambientais do desenvolvimento científico e tecnológico.

É claro que em um país com mais de 180 milhões de habitantes pode parecer
pretensioso chamar tanta responsabilidade para os museus de ciências que atendem um
público relativamente reduzido1. No entanto, este trabalho só faz sentido se
acreditarmos que semear essa discussão, mesmo que com esse alcance potencial restrito,
talvez faça diferença tanto na maneira como o público visitante encara a ciência e a
1
Pesquisa realizada no Brasil em 2006 pelo MCT nos mostra que apenas 4% dos entrevistados tinham
visitado um museu ou centro de ciências no último ano. Disponível em:
<http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/50875.html>. Acesso em agosto de 2008.
13

tecnologia quanto na maneira como se coloca diante dela. Vale também destacar que
existe um discurso muito claro no atual governo sobre a intenção de proliferar museus
de ciências em todas as regiões do país2 (MCT, 2007). Esse discurso e suas
conseqüentes ações mostram como se aposta na contribuição potencial dessas
instituições para a educação e comunicação em ciências.

A partir da problemática apresentada, este trabalho identificou e analisou


exposições de museus de ciências brasileiros que exploram relações e interferências
mútuas entre ciência, tecnologia e sociedade. O processo de identificação dessas
exposições leva ao reconhecimento da existência dessa categoria de exposições, e sua
conseqüente análise permite uma compreensão sobre a natureza das relações CTS, e
também das relações entre ciência, tecnologia, sociedade e meio ambiente (CTSA) por
elas exploradas.

O trabalho está dividido em seis capítulos. O primeiro, intitulado Os museus de


ciências no contexto brasileiro, pretende dar conta, numa abordagem panorâmica, da
história dos museus de ciências no país, além de trazer elementos de cunho político que
ajudam a entender a proliferação recente dessas instituições. Para concluir esse capítulo,
foi construída uma articulação entre diversos autores (CAMERON 2005;
MACDONALD; SILVERSTONE, 1992; PEDRETTI, 2004, entre outros) que têm
publicado pesquisas e reflexões numa perspectiva crítica, questionando qual deveria ser
o papel dos museus de ciências na sociedade contemporânea.

O segundo capítulo, intitulado Ciência-Tecnologia-Sociedade, Comunicação


pública da ciência, Controvérsia científica: referenciais para análise, traz os principais
aportes teóricos utilizados para construir o objeto de pesquisa e nortear a análise das
exposições. Como o próprio nome sugere, os aportes teóricos advêm do campo dos
estudos sociais da ciência, focando no movimento CTS e CTSA, e da comunicação
pública da ciência e do estudo das controvérsias científicas.

O terceiro capítulo trata das abordagens metodológicas utilizadas na pesquisa, no


qual se descreve, de forma detalhada, como o objeto de pesquisa foi sendo construído ao
longo do trabalho, como se deu a seleção dos museus e os desafios em relação à seleção

2
O Plano de Ação do Ministério da Ciência e Tecnologia está disponível no endereço
<http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/66235.html>. Acesso em dezembro de 2007.
14

das exposições. Nesse capítulo também está descrito como a análise foi conduzida em
relação à natureza das interações CTS. Para tal, foram elencados alguns atributos
capazes de mapear as diversas possibilidades de abordagens sobre essas interações. Os
atributos foram divididos em três grandes grupos: um referente aos debates sociais
externos à ciência; outro relacionado aos debates sociais internos à ciência; e o terceiro
relacionado aos debates de cunho histórico e filosófico sobre a ciência. A presença
desses atributos caracteriza uma exposição como CTS ou CTSA.

No quarto capítulo estão descritas as três exposições analisadas: Educação


Ambiental, incluindo Nossa água, nossa vida do Museu de Ciências e Tecnologia da
PUC/RS; a área expositiva Reprodução e genética do Espaço Biodescoberta do Museu
da Vida/Fiocruz; e a área expositiva Os Ciclos Biogeoquímicos e o Meio Ambiente da
exposição O Planeta Terra e a preservação ambiental da Estação Ciência/USP. A
descrição se inicia com um breve histórico sobre os museus em questão, suas estruturas
expositivas, e as descrições das exposições em si.

O quinto capítulo, Sobre o que falam as exposições, e o que deixam de falar?,


traz a análise das exposições, na qual são identificados e discutidos os atributos
presentes em cada uma das exposições. Neste capítulo também foi feita uma articulação
entre a natureza das interações CTS e as escolhas museográficas adotadas na tentativa
de identificar especificidades dos museus ao trazerem à luz discussões sobre CTS.
Baseada nos argumentos trazidos nas entrevistas com os elaboradores das exposições,
foi feita uma análise sobre a pouca representatividade de exposições CTS e CTSA, de
maneira geral, nos museus de ciências brasileiros, identificada durante a coleta dos
dados. Essa análise foi construída sob o título Sobre as ausências e as intenções, e tem
como objetivo ajudar na compreensão das dificuldades e desafios de se trabalhar com
exposições dessa natureza.

O sexto capítulo traz algumas considerações sobre os resultados desta pesquisa,


tanto em relação à análise das exposições sobre os conteúdos CTS, quanto em relação
aos atributos não identificados nessas exposições. Neste último capítulo existe a
intenção de responder o que caracteriza uma exposição como CTS ou CTSA: existiria
um mínimo de atributos necessários para uma exposição poder ser considerada CTS ou
CTSA?
15

Capítulo I: Os museus de ciências no contexto brasileiro

1.1 Trajetória dos museus de ciências no Brasil

A criação e/ou renovação dos museus de ciências no Brasil ao longo das últimas
décadas faz com que, cada vez mais, tornem-se espaços significativos de educação e
comunicação em ciências. Esse crescimento recente, que faz parte de um movimento
mais amplo de fortalecimento da divulgação científica no Brasil (MOREIRA;
MASSARANI, 2002), não deve ser visto de forma isolada. É importante para a
compreensão do momento atual buscarmos reconstruir, mesmo que de maneira
panorâmica, a trajetória desse campo.

De acordo com Valente, Cazelli e Alves (2005)3, mesmo numa abordagem


histórica panorâmica dos museus de ciências no Brasil, é possível perceber como a
trajetória desses espaços é marcada por diferentes perspectivas de educação e
comunicação de ciências de acordo com as épocas em que surgiram.

As primeiras instituições nacionais dessa categoria de museus foram o Museu


Nacional (1818), no Rio de Janeiro, o Museu Paraense Emílio Goeldi (1866), em Belém
do Pará, e o Museu Paulista (1894), em São Paulo, todos dedicados às ciências naturais.
Esses museus surgem no bojo do desenvolvimento de um projeto de modernização do
país e são criados a partir dos moldes europeus, como o Muséum National d’Histoire
Naturelle, de Paris (VALENTE; CAZELLI; ALVES, 2005). Os museus desse período
armazenavam grandes coleções, de botânica, de animais, de objetos, entre tantas outras,
podendo ser categorizados como museus-enciclopédia.

De acordo com as autoras (Ibid.), em meados do século XX se dá outra fase


relevante para a história dessas instituições no país. A década de 1950 foi marcada por
uma valorização da ciência e da tecnologia no contexto internacional por fatores como a
Segunda Guerra Mundial e o lançamento do Sputnik pelos russos. O país também reage
a esses fatores, e lança iniciativas para essa valorização. Para as autoras, nesse momento
acontecem duas iniciativas que de alguma forma influenciaram a história dos museus de
3
Existem diversas maneiras de narrar essa história e neste trabalho optou-se por utilizar como eixo
principal a trajetória descrita por Valente, Cazelli e Alves (2005).
16

ciências nacionais. A primeira foi a criação do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência


e Cultura (IBECC), que tinha como principal objetivo a montagem e distribuição de kits
de ciências de baixo custo para a melhoria do ensino de ciências. A outra iniciativa
importante foi a criação dos Centros de Ciências (CECIs) em diversos estados
brasileiros, financiados pelo Ministério da Educação (MEC). Esses Centros de Ciências
tinham também como principal objetivo a melhoria do ensino de ciências e a formação
de professores, por meio de curso de treinamento, especializações, aperfeiçoamento e
seminários.

Em resposta à transformação da relação entre ciência e sociedade, que marcou o


período pós-Segunda Guerra (AIKENHEAD, 1994; SEVCENKO, 2001),
principalmente nos Estados Unidos e na Europa, surgiram inúmeros museus de ciências,
os ditos ‘science centres’ – os museus de 3ª geração (MCMANUS, 1992). O surgimento
desses museus nesse período está relacionado justamente a uma proposta de valorização
da ciência e da tecnologia que ficou abalada depois dos acidentes nucleares e das
grandes catástrofes ambientais, como derramamento de petróleo, entre outros. As
propostas dos museus de ciências desse período estavam baseadas principalmente na
exploração de conceitos e fenômenos por meio de aparatos interativos e abertos ao
público em geral.

É na década de 1980, imbuído pelo contexto de abertura política e de


democratização do ensino, que surgem, no país, os primeiros museus de ciências e
tecnologia interativos (VALENTE; CAZELLI; ALVES, 2005) como instituições de
comunicação, educação e difusão cultural voltadas para o público geral. O Museu de
Astronomia e Ciências Afins-MAST (antes, do CNPq, e, hoje, do Ministério da Ciência
e Tecnologia – MCT) e a Estação Ciência (antes, do CNPq, e, hoje, da Universidade de
São Paulo-USP) são duas das instituições dessa geração que possuem como principal
enfoque a apresentação dos conceitos e fenômenos científicos baseados na
interatividade. Uma das referências importantes dessa escolha advém da valorização do
‘aprender fazendo’ no ensino de ciências vigente na época (Ibid.).

Historicamente, os Centros de Ciências no Brasil têm uma forte ligação com a


escola. Surgiram para favorecer um ensino de ciências mais interativo, disponibilizando
aparatos de laboratório e contribuindo com a formação de professores de ciências. Os
centros de ciências nesse contexto se diferem um pouco dos Science Centres anglo-
17

saxões que aparecem mais voltados para a divulgação da ciência para a população em
geral. No entanto, hoje em dia é comum encontrarmos os termos Centros de Ciências e
Museus de Ciências acoplados como se fossem sinônimos, ou até como uma tradução
de science centres. Porém, existem controvérsias em relação a esse sinônimo, nas quais
o principal argumento é em relação à posse de acervo e coleção (CURY, 2000). Para os
defensores das diferenças, como os centros de ciências não trabalham com coleções de
importância histórica e cultural, mas sim incorporam aparatos interativos, não estariam
na categoria dos museus.

Pela definição do ICOM4 (Conselho Internacional de Museus), um museu é uma


instituição permanente sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e de seu
desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, conserva, pesquisa, divulga e expõe,
para fins de estudo, educação e lazer, testemunhos materiais e imateriais dos povos e do
seu ambiente; incluindo os science centres, os planetários, reservas naturais, os
aquários, etc. Levando em conta essas considerações, nesta pesquisa não será feita
nenhuma diferenciação entre essas nomenclaturas, chamando todos os espaços
estudados de Museus de Ciências.

1.2 Os museus de ciências e as políticas de incentivo no contexto atual

O número de Museus de Ciências e Tecnologia no Brasil vem aumentando de


forma significativa ao longo dos últimos anos. Esse movimento foi apoiado durante
quase duas décadas pela VITAE (VITAE, 2006) e pelo Ministério da Ciência e
Tecnologia (MCT), recentemente via Secretaria de Inclusão Social e Popularização.
Essa política é materializada, entre outras ações, por meio de alguns editais lançados
nos últimos anos5.

4
Definição na página do ICOM, disponível em: <http://icom.museum/hist_def_eng.html>. Acesso em
julho de 2008.
5
Informações no site do CNPq, disponível em: <http://www.cnpq.br/editais/ct/2006/encerrados.htm>.
Acesso em junho de 2007.
18

O primeiro edital6 de incentivo à implementação de centros e museus de ciências


foi lançado pela Secretaria em 2003. Esse edital teve como objetivo apoiar atividades
que propiciassem a instalação e o fortalecimento institucional de museus e centros de
ciências visando promover a expansão e a melhoria da qualidade do ensino das ciências,
o desenvolvimento das inovações e aplicações da Ciência e da Tecnologia, bem como a
difusão e popularização da cultura científico-tecnológica junto à sociedade brasileira.

O segundo edital7 foi lançado três anos depois, em 2006. Com uma proposta
bem similar ao primeiro, visava apoiar atividades que propiciassem a difusão e
popularização da ciência e tecnologia junto à sociedade brasileira, a instalação e o
fortalecimento institucional de museus e centros de ciências, e outras iniciativas que
promovessem a divulgação científica e a melhoria da qualidade do ensino informal das
ciências.

Um novo edital8, lançado em 2007, teve como objetivo apoiar projetos de


popularização da Ciência e Tecnologia das universidades, instituições de pesquisa,
museus, centros de ciência, planetários, fundações, entidades científicas e outras
instituições. E, novamente, incentivar atividades que fomentassem a difusão e
popularização da ciência e da tecnologia junto à sociedade brasileira, a instalação e o
fortalecimento institucional de museus e centros de ciências, e outras iniciativas que
promovessem a divulgação científica e a melhoria da qualidade do ensino informal das
ciências.

Essa intenção de fortalecimento institucional dos museus de ciências foi


publicada oficialmente no Plano de Ação do Ministério da Ciência e Tecnologia 2007-
20109, no qual consta o objetivo de:

Ampliar e desenvolver a rede de popularização da ciência, da tecnologia e da


inovação no país e a articulação dos centros e museus de C,T&I entre si.
Aumentar a quantidade e melhorar a distribuição regional de centros e museus

6
(MCT/SECIS/CNPq nº 07/2003).
7
(MCT/CNPq nº 12/2006).
8
(MCT/CNPq nº 42/2007).
9
Plano de Ação disponível em: <http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/66235.html>. Acesso em
dezembro de 2007.
19

de C,T&I, planetários, observatórios, parques de ciência, OCCAs (Oficinas de


Ciência, Cultura e Arte), atividades itinerantes de divulgação de C,T&I etc.
Estimular universidades e instituições de pesquisa a se integrarem nas
atividades de educação e divulgação científico-tecnológica e de inovação. Essas
atividades serão executadas mediante editais, convênios e projetos de educação
científica e popularização da C,T&I.

Nesse mesmo documento, estão disponíveis algumas metas que valem ser
explicitadas, como implementar, até 2010, vinte unidades de ciência móvel, de forma a
atingir todos os estados da federação; apoiar trinta projetos de observatórios, planetários
fixos e móveis (novos ou reformas), para permitir que cada estado tenha pelo menos
uma unidade de divulgação e educação em astronomia, até 2010; apoiar a criação de
seis parques de ciência, em parceria com estados, municípios e empresas, em pelo
menos uma cidade por estado, até 2010.

Como já foi referido, também foram muito significativos para o crescimento dos
Museus de Ciências do Brasil, os recursos provenientes da Fundação VITAE na
categoria ‘Apoio a Centros de Ciências e Difusão Científica’, contabilizando um total
de quase 18 milhões de dólares distribuídos entre aproximadamente cinqüenta
instituições ao longo dos 21 anos de atuação no Brasil – de 1985 a 2006 (VITAE,
2006).

Sobre o fortalecimento e ampliação da rede dos museus em geral, vale destacar


também a gestão do Ministério da Cultura (MinC) e, de forma específica, do
Departamento de Museus e Centros Culturais (DEMU/IPHAN) que criou, a partir de
2003, as bases para discutir a formulação de uma política pública voltada para os
museus brasileiros. Esta ação encontrou suporte em um diálogo estabelecido entre
diferentes pessoas e entidades vinculadas à museologia, à academia e às secretarias
estaduais e municipais de cultura (MARANDINO [org.], 2008).

Como fruto da Política Nacional de Museus do MinC, foi criado, em 2004, o


Sistema Brasileiro de Museus (SBM), cujas funções se centram no apoio e
fortalecimento de sistemas regionais, estaduais e municipais de museus. O SBM
possibilitou o desenvolvimento de instrumentos voltados para esses espaços, como o
20

Cadastro Nacional de Museus (2006)10, o Observatório de Museus e Centros Culturais


(2006)11 e o lançamento de editais para o desenvolvimento de museus.

Diante de todos esses fatos, fica claro que a rede nacional de museus tem se
ampliado e se fortalecido ao longo dos últimos anos – de museus em geral, e não apenas
dos museus de ciências. Em virtude desse crescimento, é cada vez mais importante um
olhar crítico e cauteloso sobre as ações dessas instituições em todos os aspectos, desde o
uso dos recursos e preservação do patrimônio até a relação com seus públicos,
fidelidade aos seus objetivos, etc. É nesta perspectiva, de evidência dessas instituições,
que a presente pesquisa pretende mapear como os museus de ciências têm trabalhado,
em suas exposições, as relações entre ciência, tecnologia e sociedade, tão fundamentais
para a compreensão da sociedade contemporânea.

1.3 Desafios anunciados

Vemos hoje uma crescente valorização dos museus de ciências como


importantes espaços de educação em ciências ao longo da vida, juntamente com outros
canais de divulgação científica, como programas de TV, e jornais e revistas. De acordo
com Valente, Cazelli e Alves (2005), vale destacar que, junto com essa proliferação,
crescem também as críticas a essas instituições no sentido de reavaliar seus objetivos
ante a realidade contemporânea.

Em seguida, serão apresentadas idéias trazidas por alguns autores que vêm
discutindo de forma crítica o papel dessas instituições, tanto no contexto nacional
quanto internacional; são eles: Cazelli et al. (2002), Pedretti (2004), Cameron (2005),
Macdonald e Silverstone (1992), Mintz (2005) e Delicado (2007).

10
O Cadastro Nacional de Museus é um instrumento do Sistema Brasileiro de Museus, criado com o
objetivo de conhecer e integrar o universo museal brasileiro. Site institucional disponível em:
<http://www.museus.gov.br/cnm_apresentacao.htm>. Acesso em agosto de 2008.
11
O Observatório de Museus e Centros Culturais (OMCC) é um programa de pesquisa e serviços sobre os
museus e instituições afins. Site institucional disponível em:
<http://www.fiocruz.br/omcc/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?tpl=home>. Acesso em agosto de 2008.
21

No artigo “Tendências pedagógicas das exposições de um museu de ciências”,


os autores (CAZELLI et al., 2002) se propõem a construir uma pedagogia museal a
partir de um panorama das principais tendências pedagógicas da educação, focando na
educação em ciências. Com esse artigo, pretendem ampliar o trabalho de McManus
(1992), que propõe uma tipologia para os museus de ciências, classificando-os em três
gerações: os museus de primeira geração são aqueles que têm como eixo central a
história natural; os de segunda, mais relacionados a ciência e indústria – museus de
técnica; e os de terceira geração, focados na exposição dos fenômenos e conceitos
científicos – museus interativos.

Os autores (CAZELLI et al., 2002) sugerem que, numa quarta geração de


museus de ciências, algumas dimensões estariam contempladas. Entre elas, a
abordagem multidisciplinar da transposição museográfica; a problematização do
conceito de interatividade; e a abordagem social e cultural da ciência e da tecnologia.
Sobre esta última dimensão:

Uma terceira dimensão presente nas exposições contemporâneas é a abordagem


social e cultural da ciência e da tecnologia. Exemplos são aquelas apoiadas em
temáticas atuais e/ou polêmicas, entendidas como as que, na maioria das vezes,
não se constituem em conhecimento estável, estão presentes na mídia e geram
debates por causarem repercussões positivas e negativas em diferentes áreas
(...). (Ibid., p. 217).

Os autores complementam ainda que a inclusão dessas questões nos museus de


ciências tem se mostrado um caminho para que a ciência e a tecnologia sejam debatidas
pelo público, contribuindo para que o cidadão possa participar, de forma mais
consciente, dos debates políticos e sociais.

No artigo “Perspectives on learning through research on critical issues-based


science center exhibitions”, Pedretti (2004)12 traz dois bons exemplos de exposições que
cumprem esse papel. A autora denomina esse tipo de exposição como crítica, e mostra
como contribuem para a aprendizagem da ciência.

12
Esse artigo foi escrito para uma chamada especial da revista Science Education que tinha como
objetivo oferecer um panorama das pesquisas sobre aprendizagem nos museus ao longo da década de
1994 a 2004.
22

Pedretti inicia seu artigo afirmando que os locais de educação não-formal têm se
deparado com um crescente interesse social por assuntos de ciência e tecnologia, e
conseqüentemente esses locais têm tentado desenvolver exposições sobre assuntos
contemporâneos de C&T, com todas as suas nuanças sociais e políticas. Ao trazerem
questões socioculturais, os museus desafiam as tradicionais exposições dos science
centres baseadas em fenômenos e conceitos, criando experiências diferenciadas de
aprendizagem e significação para os visitantes.

Para contextualizar as exposições críticas, a autora categoriza o universo das


exposições científicas em três tipos: o primeiro tipo seria o das exposições
experimentais, nas quais o visitante pode ver e/ou interagir com os fenômenos; o
segundo seria o das exposições pedagógicas, nas quais o objetivo é que o visitante
aprenda algo; e o terceiro seria o das exposições críticas.

Apesar de um pouco controversa – pois existem inúmeras maneiras de


categorizar tipos de exposições – essa categorização se mostra útil por ajudar a mapear
o que vem sendo apresentado nos museus de ciências, e expõe a dominação da maneira
tradicional de representar a ciência. Os dois primeiros tipos representam o universo das
exposições convencionais, que costumam apresentar a ciência vazia de qualquer
contexto sociocultural e negam a existência de questionamentos sobre o conhecimento
científico, e o terceiro representa o universo das exposições emergentes, que exploram
criticamente a natureza da ciência (Nature of Science – NOS) e as relações entre
ciência, tecnologia, sociedade e meio ambiente (CTSA).

Se há uma ou duas décadas, a grande maioria das exposições era


prioritariamente dos dois primeiros tipos, hoje essa hegemonia é questionada. De acordo
com Pedretti (2004), durante a última década, alguns museus de ciências têm
desenvolvido exposições que vão num caminho mais provocativo, representando uma
mudança de paradigma no campo, priorizando o envolvimento, o ativismo e as idéias.
Conforme a autora, cada vez mais os museus de ciências estão se vendo como
importantes atores em contextos científicos, socioculturais e políticos, e evoluindo para
incluir, em suas exposições, discussões sobre responsabilidade social e conscientização.

Para mostrar como exposições críticas têm um forte potencial de envolvimento


do público, a autora apresenta duas exposições em museus de ciências no Canadá,
23

pesquisadas ao longo dos últimos dez anos, que considera particularmente interessantes
por conduzirem temáticas sociocientíficas de uma maneira diferente. A primeira – Mine
Games – seria uma exposição de cunho CTSA e a segunda – A Question of Truth –
explora questões sobre a natureza da ciência (NOS).

De acordo com a autora (Ibid.), essas exposições têm o potencial de aumentar a


aprendizagem por: humanizarem os conteúdos científicos; provocarem emoções;
estimularem o diálogo e o debate; e promoverem a reflexão. As exposições
experimentais e pedagógicas mostram a ciência de maneira abstrata, linear e vazia de
contexto e de significado, e as exposições críticas, ao contrário, apresentam a ciência de
uma maneira mais pessoal e humanizada. As exposições críticas oferecem algo mais do
que simples explicações sobre teorias e princípios, e tocam no cerne das controvérsias e
dos debates, fazendo com que os visitantes se envolvam intelectual e emocionalmente
com as questões apresentadas.

Mine Games, do Science World Museum, de Vancouver, é uma simulação 3D


gigante que explora os múltiplos impactos da potencial construção de uma mina numa
cidade imaginária. Através de vídeos e simulações, os visitantes encontram-se com
moradores dessa cidade fictícia de diferentes funções sociais (prefeito, representantes do
governo, homens de negócios, banqueiros, cidadãos comuns, etc.) e têm o desafio de
decidir se a mina deve, ou não, ser construída e, em caso afirmativo, qual é a maneira
mais segura, econômica e ambientalmente aceitável pela qual ela deva ser projetada.

De acordo com Pedretti, Mine Games captura a imaginação dos visitantes, e traz
à luz assuntos que são reais na vida das pessoas. Neste caso, se por um lado a indústria
da mineração sustenta as pessoas, por outro, provoca muita controvérsia, como com os
grupos de ambientalistas sobre os profundos impactos das minas. Ao participarem dessa
simulação, os visitantes experimentam um pouco da complexidade que requer uma
decisão como essa, os diversos interesses e jogos de poder envolvidos numa questão
dessa natureza.

O contato com a situação da decisão faz com que os visitantes se envolvam


emocionalmente com o problema. É possível ver isso nas falas, quando comentam os
depoimentos: “(...) sabemos que esse moço não tem dinheiro suficiente (...) então ele
24

precisa da mina para poder trabalhar e sustentar a sua família” (PEDRETTI, 2004, p.
41).

Os visitantes têm também a oportunidade de trocar opiniões a partir de


diferentes pontos de vista, e participarem de forma ativa de um problema fictício. No
final de visita, o público chega a um anfiteatro onde o mediador conduz um debate
sobre os diferentes assuntos tratados, usando, para isso, recursos visuais da própria
exposição. A partir do levantamento das diferentes opiniões e dúvidas dos visitantes, o
mediador tenta fazer com que o grupo chegue a um consenso sobre o que deve ser feito.
Pedretti afirma que essa oportunidade de participação não ocorre por acaso, uma vez
que a necessidade de conversar, escutar e comunicar direcionou o desenvolvimento
dessa exposição.

A Question of Truth pertence à exposição permanente do Ontario Science Centre


de Toronto. A exposição, inaugurada em 1996 – depois de cinco anos de planejamento e
negociação –, tem como principal objetivo discutir a natureza da ciência, como as idéias
são constituídas e como os fatores políticos e sociais afetam as ações dos cientistas.

De acordo com a autora, A Question of Truth atinge as pessoas ao trazer assuntos


sobre ciência, raça e preconceito, temas que, em geral, provocam conexões e reações
nas pessoas, ainda mais em uma cidade multicultural como Toronto. Assuntos como
esses, que normalmente despertam reações passionais nas pessoas, potencializam seu
envolvimento.

Essa exposição também desperta emoções nos visitantes e, na maioria das vezes,
sensações de incômodo e desconforto. Muitos visitantes a consideram forte demais,
inclusive expressam que algumas partes são ‘inapropriadas’ para o público. Outros
relatam o impacto de ver como a ciência pode ser mal-usada (nas palavras do próprio
visitante), como, por exemplo, ao falarem sobre o ‘contêiner’ de metal que transportava
os escravos: “(...) isso é indigno, cruel, discriminatório (...) repugnante a maneira como
a ciência foi mal-usada” (PEDRETTI, 2004, p. 41).

As duas exposições fazem os visitantes refletirem sobre os processos na ciência,


o papel do poder, da política e da cultura das crenças pessoais. Significativos 8% dos
cinqüenta entrevistados disseram que A Question of Truth não parecia pertencer a um
museu de ciências, chegando a dizer que a exposição era anticiência. Por outro lado,
25

84% das mensagens analisadas parabenizavam a exposição, valorizando a tentativa de


desmistificação e desconstrução da ciência ao mostrarem seu contexto sociocultural.

A atualidade das questões trazidas por essas exposições é reforçada pela


pesquisa desenvolvida por Cameron (2005), na qual investiga o papel dos museus de
ciências e de história ante assuntos contemporâneos e políticos, colocando-os como
espaços civis propícios para esse diálogo. A pesquisa foi realizada com público e com
membros da equipe de museus de história e de ciências em diferentes cidades da
Austrália, Estados Unidos, Canadá e Inglaterra. À parte as óbvias diferenças entre o
contexto dos países onde a pesquisa foi desenvolvida e o Brasil, ela traz resultados
muito interessantes sobre como as pessoas vêem o papel desses museus na sociedade
contemporânea.

Uma das etapas da investigação consistiu em perguntar para as pessoas sobre


qual era o papel dos museus para tratar de tabus e questões controversas. Nessa
pesquisa, 60% dos entrevistados concordaram que os museus devem apresentar tabus e
questões controversas, enquanto 20% dos respondentes discordaram, dizendo que os
museus são locais para fornecer informações, histórias e documentos, para fatos, e não
opiniões: aos museus cabe a divulgação depois que o assunto já deixou de ser polêmico,
e já estiver consolidado.

De 70% a 80% dos entrevistados vêem os museus como lugares para desafiarem
a maneira de pensar das pessoas. Experiências desafiadoras, nesse contexto, significa
fornecer informação equilibrada, honesta e sem censura, além de uma variedade
balanceada de pontos de vista na tentativa de representar as diferentes facetas de um
assunto.

Complementando suas colocações, Cameron (2005) explicita a opinião de dois


entrevistados. O primeiro afirma que o museu não pode assumir uma posição, que deve
apenas dar argumentos para que o visitante forme sua própria opinião. O outro afirma
que tudo que lemos, ou que é exposto, na verdade expressa a opinião de alguém, e que
diante disso o museu deveria colocar o maior número possível de opiniões, para que,
assim, o visitante pudesse formular a sua.

Em relação ao tratamento de temas polêmicos e da atualidade, para Macdonald e


Silverstone (1992), os museus de ciências têm a potencialidade de estabelecer relações
26

significativas entre controvérsia científica e comunicação pública da ciência. No


entanto, afirmam que as exposições são definidas não só pelos interesses de seus
proponentes, mas também pelos limites e obstáculos do próprio processo de construção
da exposição e sua filosofia, o que acaba por dificultar, muitas vezes, o tratamento
desses temas.

No artigo, Macdonald e Silverstone (1992) afirmam que a controvérsia pode


trazer a idéia de que os fatos científicos são sempre negociados, e que essa negociação
não está confinada à comunidade científica, pelo contrário, envolve, de vários modos,
outros atores sociais relacionados com os processos de representação e apropriação
pública da ciência.

Os autores citados destacam algumas considerações relevantes sobre a


dificuldade de inserção de temas polêmicos e controversos nas exposições dos museus
de ciências. Afirmam que, na intenção de facilitar a compreensão da ciência pelo
público, os museus acabam, algumas vezes, por adotar estratégias como simplificação
dos textos e adoção de um grande número de experimentos interativos que poderiam
restringir a exploração de temáticas mais complexas. Ou seja, mesmo quando a intenção
é promover a reflexão e formação de uma opinião crítica nos visitantes, ainda
predomina a questão do “fornecimento” da informação ao público.

Mintz (2005) é bastante dura em sua crítica sobre a escolha das temáticas nos
museus de ciências. Diz que chega a ser irônico que em um mundo imerso em assuntos
extremamente importantes, baseados em questões de ciência e tecnologia, vários
museus tratem quase que exclusivamente de mostrar a ciência de forma lúdica e
divertida. Continua sua argumentação dizendo que muitos museus usam
demasiadamente as imagens de crianças explorando, interagindo, etc., e que, apesar de
esse ser um público importante, ele não é o único que precisa entrar em contato com a
ciência, tampouco a interatividade é a única maneira de fazê-lo.

Para Mintz (2005), os museus de ciências são locais propícios para pessoas
aprenderem juntas, trocarem idéias e vivenciarem experiências ricas do ponto de vista
da aprendizagem. No entanto, isso só vai acontecer se os museus não tiverem medo de
tratar de temas polêmicos, como evolução e mudanças climáticas, por exemplo. Essas
teorias, apesar de aceitas por grande parte da comunidade científica, são controversas
27

para outras facções da sociedade e, afirma Mintz (2005), tirar a responsabilidade de


incluir temáticas como essas pode comprometer a integridade intelectual dos museus.

Para argumentar a favor da exposição de temáticas contemporâneas nos museus


de ciências, a autora expõe alguns dados levantados por pesquisas americanas e
européias sobre percepção de C&T; afirma que, apesar de para os americanos e
europeus a TV ser a principal fonte de informação em C&T, em ambos os casos os
museus aparecem em destaque, se comparados com a mídia impressa. Corroborando
esses dados, em uma pesquisa feita pela National Science Foundation (NSF), 30% dos
respondentes afirmam que obtêm duas vezes mais informações sobre C&T dos museus
de ciências do que da mídia impressa.

Na tentativa de transferir essas considerações para a realidade brasileira, vale


trazer alguns dados levantados pela pesquisa realizada pelo MCT13. Essa pesquisa nos
mostra que apenas 4% dos entrevistados visitaram um museu ou centro de ciência
durante o ano anterior ao da pesquisa, enquanto que 52% dos entrevistados não
visitaram qualquer espaço, tampouco freqüentaram qualquer evento ligado ao tema.
Para esses que não visitaram, a principal razão se deve ao fato de essas instituições não
existirem em sua região (35%). Isso nos mostra que, para grande porção da população
brasileira, os museus de ciências ainda não fazem parte de sua realidade, a ponto de
serem locais significativos para acesso à informação sobre C&T. Contudo, já foi
destacado, é intenção explícita da Secretaria de Inclusão Social e Popularização do
MCT reverter esse quadro (MCT, 2007).

Esse conjunto de dados nos mostra uma poderosa oportunidade para os museus
de ciências. No cenário norte-americano e europeu, o fato de o público adulto procurar
os museus para se informar sobre C&T é um forte motivo para incorporarem em suas
exposições debates sobre o desenvolvimento contemporâneo de C&T (MINTZ, 2005).

Delicado (2007) discute, em seu artigo intitulado “‘What do scientists do?’ in


museums: representations of scientific practice in museum exhibitions and activities”,
se o fazer científico está representado nos museus. A autora afirma que os museus de
ciências dão preferência a expor ou a história da ciência – materializada na exposição de

13
Pesquisa nacional sobre percepção pública da C&T disponível em:
<http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/50875.html>. Acesso em agosto de 2008.
28

instrumentos científicos obsoletos – ou os resultados da ciência – conceitos


materializados em aparatos interativos – e que pouquíssima referência é feita à
ciência contemporânea, à organização do trabalho científico, à vida cotidiana do
laboratório, etc.

De acordo com Delicado (2007), no caso dos museus portugueses


(universitários, em sua maioria), as exposições temáticas usualmente são desenhadas a
partir do último conhecimento ‘acabado’ sobre um assunto, raras vezes se referindo a
sua origem (aos cientistas, às instituições, ao processo de pesquisa, às publicações ou
patentes). Afirmações científicas são confirmadas por aparatos interativos e painéis, e
pouca margem é deixada para incertezas, controvérsias e desconhecimento.

Em contrapartida, a autora afirma que, diante das acusações de que os museus


expõem uma visão idealizada de ciência, centrada no progresso tecnológico, nos
sucessos da ciência, e em princípios e leis inquestionáveis, esforços estão sendo feitos
para incorporar novos temas às exposições, como pesquisas atuais, controvérsias
científicas, implicações sociais do desenvolvimento científico, além dos processos da
ciência, entre outros. Destaca ainda que, por diversas razões – entre elas o fato de serem
espaços públicos, de a maioria possuir auditórios, sala de exposições e por, em geral,
possuírem relação com universidades e centros de pesquisa –, os museus de ciências
têm sido considerados locais propícios para o debate entre cientistas e público.

Outro aspecto relevante levantado por Delicado (2007) refere-se aos modelos de
desenvolvimento científico-tecnológico utilizados. Experimentos e aparatos interativos
que convidam o visitante a vivenciarem o método científico de observar, experimentar,
analisar e concluir estão – embora de acordo com a retórica científica – representando a
ciência de forma crua, idealizada e mecânica. Experimentos desse tipo não mostram o
indeterminismo e as escolhas subjetivas que envolvem o trabalho científico.

Bennett (1998), em seu artigo “Can science museums take history seriously?”,
traz dois exemplos interessantes de exposições que tiveram como prerrogativa inovar na
maneira de se apresentar história da ciência no museu. As duas exposições são do
Whipple Museum of the History of Science; a primeira intitulada Empire of Physics
(1993) e a segunda, 1900: The New Age (1995).
29

Empire of Physics era dividida em dois espaços: o laboratório e a exposição. A


exposição não tinha uma dinâmica progressiva ou cronológica. O visitante podia
movimentar-se livremente entre o mundo público – a exposição – e o mundo privado –
o laboratório –, examinando suas relações e suas diferenças. As vitrines eram cheias de
instrumentos, mas não para mostrar um resultado ou uma descoberta, mas para evocar a
cultura científica de forma ampla (BENNETT, 1998).

A exposição 1900: The New Age também era dividida em dois espaços. O
primeiro recriava alguns ambientes expositivos da Grande Exposição de Londres de
1851, com o objetivo de mostrar uma imagem de progresso e inovação. E o segundo
recriava o laboratório do antropólogo e criminalista Alphonse Bertillon, onde os
próprios visitantes se tornavam objetos de análise. Com esses dois exemplos, o autor
mostra como é possível um museu de história da ciência discutir, por meio de suas
exposições, aspectos da cultura científica, em vez de apenas fornecer datas, dados e
fatos aos seus visitantes.

Todos esses autores trazidos aqui nos mostram a existência de um


questionamento sobre a maneira como a ciência tem sido representada nos museus de
ciências, além de nos apontarem novas formas de fazê-lo; partilham da mesma opinião
de que uma mudança nesse sentido é necessária, para que esses museus cumpram, de
maneira mais adequada e completa, o papel de mediadores entre a ciência e o público na
sociedade contemporânea.
30

Capítulo II: Ciência-Tecnologia-Sociedade, Comunicação pública da ciência,


Controvérsia científica: referenciais para análise

A partir das leituras realizadas e do contato com as exposições de diferentes


museus de ciências nacionais e internacionais, feito por meio de visitas técnicas, foi
possível perceber que as interações entre ciência, tecnologia, sociedade e meio ambiente
podem emergir de forma mais latente em exposições que exploram as controvérsias
científicas, os debates éticos e as questões de cunho ambiental, as abordagens históricas
e filosóficas, ou ainda quando estimulam a participação do público de forma ativa.

Para dar conta da discussão dessas temáticas no âmbito dos museus de ciências,
o referencial teórico desta pesquisa foi construído a partir de diferentes áreas do
conhecimento. Apesar de maior ênfase ter sido dada aos estudos sociais da ciência
focado no movimento CTS e CTSA (AIKENHEAD, 1994, 2003; AULER, 2002;
AULER; BAZZO, 2001; CEREZO, 1999; GARCÍA; CEREZO; LÓPEZ, 1996; entre
outros), também contribuíram de forma significativa as discussões sobre a comunicação
pública da ciência (DURANT, 1999; EINSIEDEL; EINSIEDEL, 200414 apud NAVAS,
2008; LEWENSTEIN, 2003; WYNNE, 1995; entre outros), as controvérsias científicas
(COLLINS, 1999; RESTREPO, 2007) e as controvérsias nos museus (HALL, 1998;
MACDONALD; SILVERSTONE, 1992; MCCONNELL, 1998; entre outros). Neste
momento iremos, portanto, apresentar o referencial teórico elaborado a partir desses
campos do conhecimento.

2.1 Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS)

Se, por um lado, o movimento CTS ainda não é um referencial incorporado pelo
campo dos museus de ciências, por outro, a sua maturidade no campo da educação

14
EINSIEDEL, A. A.; EINSIEDEL, F. E. Museums as Agora: Diversifying Approaches to Engaging
Publics in Research. In: CHITTENDEN, D.; FARMELO, G.; LEWENSTEIN. B. (Eds.).
Creating Connections: Museums and the Public Understanding of Current Research. Oxford:
Althamira Press, 2004.
31

formal é perceptível e aponta caminhos frutíferos para a reflexão e análise das


interações entre ciência, tecnologia e sociedade no âmbito tanto da própria educação
formal, quanto no da educação não-formal.

Um dos principais desafios que nossa sociedade enfrenta é a negociação das


relações entre ciência e sociedade (CEREZO, 1999), com dimensões acadêmicas, ético-
políticas, econômicas e educativas. Essa negociação se torna um problema difícil de
resolver ante a extraordinária relevância que adquiriram a ciência e a tecnologia no
mundo atual.

Se, a princípio, o otimismo incondicional surgido logo após a Segunda Guerra


Mundial – quando o progresso científico era visto como sinônimo de bem-estar social
(SEVCENKO, 2001) – determinava a relação entre ciência e sociedade, uma atitude
crítica e cautelosa diante da C&T começou a pairar no ar a partir dos anos 1960.

Foi entre os anos 1960 e 1970 que os movimentos ambientalistas e aqueles


contra as armas nucleares tiveram início. Isso se deu em reação a alguns acontecimentos
marcantes como acidentes nucleares, envenenamentos farmacêuticos, derramamento de
petróleo, entre outros (CEREZO, 1999). Nesse contexto, a ciência e a tecnologia
começaram a ser vistas com um olhar mais crítico e cauteloso. Até então, o modelo
unidirecional de desenvolvimento – maior desenvolvimento científico gera mais
tecnologia, que promove mais riqueza e, portanto, um aumento do bem-estar social –
serviu de base para as políticas públicas em questões de ciência e tecnologia. Foi nesse
contexto, do surgimento dos movimentos de oposição, que se passou de uma política do
laissez-faire para uma política intervencionista em questões de C&T (CEREZO, 1999).

Tal política intervencionista abarcava dimensões técnicas, administrativas e


legislativas para o encaminhamento do desenvolvimento científico-tecnológico. E
também supervisionava seus efeitos sobre a natureza e a sociedade. Essa reação não
ficou restrita ao campo social e político, e repercutiu também no campo acadêmico e
educativo. No âmbito acadêmico, cresceu uma crítica à tradicional imagem essencialista
da ciência, em defesa de uma visão de ciência interdisciplinar, abarcando filosofia e
história da ciência, sociologia do conhecimento, educação e economia (CEREZO,
1999).
32

Na sociologia, essa mudança de olhar em relação ao desenvolvimento da ciência


e da tecnologia teve como uma das principais catalisadoras a obra de Thomas Kuhn A
estrutura das revoluções científicas (1962). Sua caracterização da ciência em períodos
de ciência normal, interrompidos por revoluções científicas e conseqüente mudança de
paradigma, não só introduziu uma nova terminologia em história e filosofia da ciência,
mas também mudou radicalmente o modo como era encarada a atividade científica.

Kuhn, do lado acadêmico, e o Projeto Manhattan, bombas atômicas, etc., do lado


mais social e político, foram alguns dos fatores que interferiram para uma mudança na
concepção acerca da ciência e da tecnologia, favorecendo o crescimento de uma visão
mais crítica ou, pelo menos, mais questionadora sobre sua neutralidade. De acordo com
García, Cerezo e López (1996) os estudos sobre CTS constituem a resposta acadêmica à
crescente insatisfação com a concepção tradicional da ciência e da tecnologia vigente
até o momento.

Historicamente, os estudos CTS têm duas diferentes correntes: a européia e a


norte-americana (AULER, 2002; GARCÍA; CEREZO; LÓPEZ, 1996). Para García,
Cerezo e López (1996), essas duas tradições têm interesses e pontos de partida
diferentes, embora ambas ressaltem a dimensão social da ciência e da tecnologia,
opondo-se à visão que trata a ciência como uma forma especial de conhecimento e a
tecnologia simplesmente como uma ciência aplicada. A dimensão social pode ser
dividida em duas grandes vertentes: uma relacionada às condicionantes que contribuem
para o surgimento e a consolidação do complexo C&T; a outra, relacionada com as
conseqüências, ou seja, como os produtos da ciência e da tecnologia influenciam a
forma de vida e a organização social. De acordo com os autores (Ibid.), a tradição
européia dos estudos CTS está focada na primeira vertente, ou seja, nas condicionantes
sociais, e a tradição norte-americana está focada nos estudos sobre as conseqüências
sociais do desenvolvimento da C&T.

De acordo com Auler (2002), essa divisão – que foi muito marcante na origem
do movimento – ficou mais tênue com o passar do tempo, e hoje é possível estabelecer
um núcleo de idéias comuns: (1) O rechaço da imagem da ciência como atividade pura e
neutra; (2) A crítica da concepção de tecnologia como ciência aplicada e neutra; e (3) A
rejeição de estilos tecnocráticos, ou seja, a defesa da promoção da participação pública
na tomada de decisões.
33

Para Aikenhead (2003), apesar de existirem diversas tendências sobre o que são
os estudos CTS, e quais são suas bases, podemos dizer que tratam de alguma forma da
interação entre ciência e tecnologia ou entre ciência e sociedade, ou qualquer outra
combinação entre: conhecimento, processo ou aparato tecnológico; conteúdo social da
ciência que ilumine um assunto na sociedade relacionado à ciência e à tecnologia;
assuntos filosóficos, históricos ou sociais sobre a comunidade científica e tecnológica.

Já de acordo com Cerezo (1999), os estudos CTS dizem respeito tanto aos
fatores de natureza social, política ou econômica, que modelam as transformações
científicas e tecnológicas, quanto às conseqüências éticas, ambientais e culturais dessas
transformações. O foco destas questões pode ser resumido por alguns pressupostos: (1)
maior controle público dos efeitos adversos das mudanças científicas e tecnológicas; (2)
necessidade de um exame cuidadoso das políticas científico-tecnológicas; (3) mudança
da imagem pública da ciência; e, por último, (4) alfabetização científica dos cidadãos.

É recorrente depararmo-nos com uma tipologia da natureza das questões de


cunho CTS que as divide entre externalistas e internalistas com relação à ciência. Para
Aikenhead (2003), questões externalistas tratam de assuntos sociais externos à
comunidade científica que englobam dimensões sociais, políticas e econômicas,
discussões sobre produção e uso de energia, geração e controle da poluição, riscos de
contaminação, entre outros. E questões internalistas tratam de assuntos sociais internos
à comunidade científica, como a relação entre os cientistas, a própria constituição da
comunidade científica, a organização do trabalho científico, a vida cotidiana do
laboratório, por exemplo.

Para além de toda a discussão aqui levantada – fundamental para a constituição


dos alicerces desta pesquisa – essa divisão específica das relações CTS entre questões
internalistas e externalistas foi também um referencial importante para a organização e
estruturação dos atributos CTS. A definição dos atributos dentro desses grandes
conjuntos foi fundamental para a compreensão da natureza dessas relações, presentes
nas exposições analisadas.
34

2.1.1 Educação com enfoque CTS

Parte dos desafios anunciados no campo dos museus de ciências refere-se à


necessidade de rever a maneira de apresentar a ciência e a tecnologia, e à necessidade de
propiciar e proporcionar maior participação do público. Ao aproximar as discussões
CTS que nascem no campo da educação em ciências, é intenção apresentar subsídios
teóricos já consolidados a fim de apontar caminhos para a inserção destas discussões no
campo da educação não-formal.

Essa nova forma de entender a ciência e a tecnologia assim como a renegociação


de suas relações com a sociedade fizeram aparecer durante a década de 1980 numerosas
propostas para um ensino de ciências mais crítico e contextualizado. Aikenhead (2003)
recorre a Fensham (1988) ao afirmar que as mudanças nos currículos acontecem devido
e em resposta às mudanças na realidade social; no caso da educação com enfoque CTS
– nos países anglo-saxões –, tal mudança da realidade incluiu acontecimentos como a
Segunda Guerra, o movimento Pugwash15 a favor da ciência para responsabilidade
social, o movimento ambientalista, o feminismo, a reforma curricular pós-Sputnik, entre
outros fatores já citados.

Embora a discussão sobre a mudança na maneira de encarar a ciência e a


tecnologia, e suas conseqüências para o ensino de ciências, já estivesse em pauta até
mesmo na década de 1970, cada grupo se referia a ela com uma nomenclatura diferente:
science and society, science and technology, an interaction of science and technology
with society and culture, S/T/S e STS (AIKENHEAD, 2003). O termo CTS16 foi
cunhado no simpósio IOSTE (International Organization for Science and Technology
Education) de 1982, por ocasião da criação de um grupo de discussão que se auto-
denominou CTS (Ibid.), provavelmente influenciado pelo trabalho de Ziman (1980)

15
A Conferência de Pugwash tem esse nome devido ao local onde se deu o primeiro encontro, em 1957,
na cidade de Pugwash, Nova Escócia, Canadá. O estímulo para esse encontro foi o manifesto publicado
em 1955 por Bertrand Russell e Albert Einstein – e assinado também por Max Born, Frederic Joliot-
Curie, Linus Pauling, entre outros – que chamava os cientistas para um encontro para discutirem as
conseqüências para a sociedade do desenvolvimento das armas nucleares. Informação disponível em:
<http://www.pugwash.org/about/conference.htm>. Acesso em dezembro de 2007.
16
STS em língua inglesa; CTS em línguas latinas.
35

‘Teaching and learning about science and society’, ao longo do qual, embora não
explicitado no título, ele utiliza o termo CTS.

A evolução desse movimento educacional é algo complexo e cada país o


incorporou de um modo diferente. O que faz com que as críticas acabem sendo pontuais
mesmo se colocadas ao movimento como um todo. Segundo Aikenhead (2003), a
maioria das críticas são direcionadas a um aspecto de um projeto curricular específico, o
que não garante que essa dimensão não esteja colocada de outra maneira em outro
projeto de outro país, ou de outro contexto.

A fim de organizar esses projetos curriculares e esclarecer os rumos tomados


pelo diferentes países, Aikenhead (1994) monta um quadro-síntese de diferentes tipos
de currículos com enfoque CTS. Auler (2002)17 apresenta uma versão traduzida desse
mesmo quadro no qual estão presentes, por uma lado, projetos curriculares mais radicais
como aqueles denominados Conteúdo de CTS, descritos como o estudo de uma questão
tecnológica importante no qual o conteúdo de ciências é mencionado somente para
indicar uma vinculação com as ciências; por outro, o quadro apresenta iniciativas com
pequenas ‘pinceladas’ de conteúdos CTS dentro do currículo tradicional, denominado
Conteúdo de CTS como elemento de motivação e descrito como ensino tradicional de
ciências acrescido da menção ao conteúdo de CTS com a função de tornar as aulas mais
interessantes. Um dos exemplos de projeto curricular de enfoque intermediário aparece
denominado Disciplina científica por meio de conteúdo CTS, no qual os temas de CTS
são utilizados para organizar o conteúdo de ciências e sua seqüência, mas, nesses casos,
a seleção do conteúdo científico ainda é feita a partir de uma maneira disciplinar.

Ainda segundo Aikenhead (1994), alguns desses projetos curriculares focaram


assuntos de ciência correlacionados com a sociedade, mas não enfrentaram o desafio de
mexer na visão positivista da ciência, tão presente na maioria dos currículos
tradicionais. Um tratamento mais completo de um currículo CTS incluiria questões do
contexto social interno à ciência (epistemologia, sociologia e história) e questões do
contexto social externo à ciência, tocando tanto nas condicionantes sociais para o

17
A versão do quadro que consta no trabalho de Auler (2002) foi traduzida e apresentada originalmente
por Santos e Mortimer (2000), p. 15-16.
36

desenvolvimento de C&T, quanto nas conseqüências sociais, ambientais e econômicas


do seu desenvolvimento.

Os Estados Unidos, a Inglaterra e os Países Baixos foram os pioneiros na


implementação desses currículos, no que se refere tanto ao ensino universitário, quanto
ao secundário. Esses currículos tinham como objetivo aproximar as duas culturas18, a
humanística e a científico-tecnológica, na formação dos indivíduos. Essa mudança
deveria contribuir para que os cidadãos adquirissem independência dos especialistas,
fossem capazes de tomar decisões informadas, e que desenvolvessem um pensamento
crítico em relação ao desenvolvimento de C&T.

Segundo Auler (2002), apesar de não haver um discurso consensual quanto aos
objetivos, conteúdos, abrangências e modalidades de implementação desse movimento
na educação formal, alguns pressupostos podem ser considerados bases dessas
propostas de ensino: (1) Relacionar a ciência com as aplicações tecnológicas e os
fenômenos na vida cotidiana; (2) Abordar o estudo daqueles fatos e aplicações
científicas que tenham uma maior relevância social; (3) Abordar as implicações sociais
e éticas relacionadas ao uso da ciência e do trabalho científico; e (4) Adquirir uma
compreensão da natureza da ciência e do trabalho científico.

A consolidação acadêmica e institucional do movimento CTS nos países ibero-


americanos não começa antes dos anos 1990. Os estudos CTS podem ser encarados
como um aparato cultural dos países capitalistas centrais que, quando chega aos países
ibero-americanos, acaba por transformar-se e adaptar-se às realidades locais.

No Brasil, o movimento encontra outras correntes e tendências educacionais


como a educação problematizadora e dialógica de Paulo Freire e a pedagogia social dos
conteúdos, representada, entre outros autores, por Dermeval Saviani. Em linhas gerais,
tais abordagens tinham por foco a escola como agente de transformação social, sendo
que, para isso, os conteúdos de ciências deveriam surgir a partir dos interesses da
comunidade escolar e do contexto social local. A perspectiva da pedagogia social dos
conteúdos também reforça o papel desses elementos na transformação da sociedade,

18
Para melhor compreensão desse conceito, ver Snow, C. P. (1995), As duas culturas: uma segunda
leitura.
37

mas aposta no domínio crítico pelos cidadãos dos conhecimentos socialmente


produzidos como forma de cidadania.

Tais características do movimento da educação com enfoque CTS que se


destacam no caso brasileiro parecem se aproximar dos elementos apontados pelo quadro
de Aikenhead (1994) apresentado por Auler (2002). De qualquer forma, para não
importarmos modelos – mesmo que os ter como referência seja algo importante –, o
desenvolvimento de pesquisas locais no âmbito dos estudos CTS é de extrema
importância para o seu amadurecimento (Cerezo, 1999) e para o desenvolvimento de
propostas curriculares contextualizadas. Apesar desse crescimento na pesquisa, o
movimento não foi largamente incorporado pelas instituições de ensino no país.
Segundo Auler e Bazzo (2001), podem ser considerados alguns dos principais motivos
dessa apropriação reduzida, a formação altamente disciplinar dos professores,
incompatível com a perspectiva interdisciplinar presente no movimento CTS, e a pouca
produção de material didático que dê suporte a trabalhos nessa linha. No entanto, essas
dificuldades e obstáculos à sua inserção não o afastam da pauta de discussão da
educação de ciências, em espaços formais e não-formais de educação, e o mantêm atual
em suas colocações.

Sobre os currículos CTS no contexto brasileiro, Santos e Mortimer (2001)


destacam como a questão da tomada de decisão vem sendo amplamente discutida na
literatura, relacionada com processos de letramento científico e associada à formação de
alunos/cidadãos capazes de exercer uma ação social responsável. Para os autores, a
tomada de decisão em uma sociedade democrática pressupõe um debate político e a
busca de soluções que atendam amplos setores da sociedade.

Para corroborar com a nossa aposta de que o referencial CTS pode fornecer
elementos para a renegociação das relações entre ciência, tecnologia e sociedade
também nos espaços de educação não-formal, vale destacar um dos apontamentos do
relatório (SECTS, 2006) do Seminário Educação em Ciência, Tecnologia e Sociedade19.

19
O Seminário visou catalisar um processo, semelhante ao que ocorre em muitas outras áreas acadêmicas,
de formação de uma rede capaz de impulsionar, com qualidade e relevância, as atividades de educação
CTS. O objetivo central do Seminário foi promover um intercâmbio de experiências de grupos situados
em universidades brasileiras e em instituições de países ibero-americanos em educação CTS (ECTS) para
conceber um plano de ação envolvendo aspectos acadêmicos e de planejamento estratégico, visando à sua
38

O relatório cita, entre outras propostas e considerações, a necessidade de trabalhar a


relação CTS em outros espaços que não apenas as escolas e as universidades, entre eles,
os museus de ciências.

2.1.2 Ciência, Tecnologia, Sociedade e Meio Ambiente (CTSA)

Desde a Conferência Mundial do Meio Ambiente, realizada em 1972 em


Estocolmo, discute-se a contribuição da educação para a resolução dos graves
problemas ambientais atuais (LIMA; COPELLO, 2007). Mas foi só em 1977, em
Tbilisi, que ficou estabelecido que a educação ambiental deveria ser incorporada em
diferentes níveis do ensino e encarada como um direcionamento das práticas
pedagógicas adotadas no ensino formal (Ibid.).

A educação ambiental, assim como o movimento CTS no Brasil, é herdeira do


pensamento pedagógico crítico e propositivo de Anísio Teixeira, Paulo Freire e Darcy
Ribeiro, entre tantos outros (REIGOTA, 2007). Também, por virem desta escola, ambos
os movimentos estimulam a participação cidadã e visam à construção da cidadania.

De acordo com Santos (2007), o sucesso da educação ambiental depende


também da perspectiva epistemológica adotada. Seu êxito exige conexões e trânsito
entre o ensino tradicional e as formas emergentes de ensino de ciências, como é o caso
CTS. E, nesse trânsito, existe um grande desafio, pois, de acordo com a autora, apesar
de a educação já ter ultrapassado alguns mitos ancestrais sobre a ciência, ainda
predomina um estilo discursivo de natureza internalista, o que acaba contribuindo mais
para excluir e marginalizar do que para levar os cidadãos a uma forma ativa de
participação. Ainda é comum depararmo-nos com um ensino de ciências fechado no
interior da lógica disciplinar que omite as interações CTS.

Lima e Copello (2007) propõem, em seu artigo “Educação ambiental desde o


enfoque Ciência/Tecnologia/Sociedade – um possível caminho”, a ambientalização do
currículo de biologia pela vertente CTS. Segundo os autores, o movimento CTS

institucionalização nos ensinos médio e superior brasileiros. Relatório disponível em:


<http://www.ige.unicamp.br/gapi/SECTS.html>. Acesso em setembro de 2007.
39

constitui uma linha de trabalho de caráter interdisciplinar que discute a natureza social
do conhecimento científico e tecnológico, e suas implicações nos diferentes âmbitos
econômicos, sociais, ambientais e culturais. E afirmam que, ao se propor uma discussão
democrática, aberta e sem preconceitos da ciência e da tecnologia e suas implicações na
melhoria da qualidade de vida de todos, está se fazendo educação ambiental.

Os argumentos trazidos por esses autores (LIMA; COPELLO, 2007; REIGOTA,


2007; SANTOS, 2007) nos mostram uma rica interface entre a educação ambiental e a
educação em ciência via CTS. Tantas interfaces existem, que passou a ser comum
depararmo-nos com a sigla CTSA, uma vertente que inclui, nos pressupostos da
educação CTS, as questões de cunho ambiental.

Sobre essas interações, Santos (2007) afirma que:

O cidadão precisa ser ajudado a compreender o processo através do qual o


conhecimento científico e tecnológico é gerado. Esse papel compete à educação
científica, mas também à educação ambiental. Uma e outra ao cultivarem o
conhecimento do conhecimento científico estimulam a aprender sobre ciência.
(Ibid., p. 87).

Deve-se aprender sobre ciência por razões pedagógicas, utilitárias, democráticas,


cívicas, culturais e morais. Esse componente é indispensável para que os cidadãos
possam apreciar a ciência como elemento da cultura contemporânea e, sobretudo, para
que possam dar sentido a problemáticas socioambientais e participar no processo de
tomada de decisões. Por essas razões, a cultura científica pode ser encarada como um
requisito e um instrumento gerador de cidadania ambiental (SANTOS, 2007).

De acordo com os autores aqui apresentados (LIMA; COPELLO, 2007;


REIGOTA, 2007; SANTOS, 2007), muitas das questões trazidas pela educação
ambiental estão também imbricadas nas relações entre ciência, tecnologia e sociedade,
sendo impossível, e talvez até de certa forma imprudente, dissociá-las. Ao assumir uma
perspectiva CTSA neste trabalho, estamos assumindo que esses campos, que se
sobrepõem e se completam na educação em ciências, também o fazem no universo da
educação não-formal.
40

2.2 Comunicação pública da ciência

Em recente artigo, Valério e Bazzo (2006) chamam a atenção sobre o importante


papel da divulgação científica para a formação de uma sociedade mais participativa em
questões de C&T. Trazendo o conceito de sociedade de risco e o referencial CTS,
colocam a divulgação científica como um dos caminhos pelos quais é possível dar
atualidade ao papel da sociedade como reguladora das questões de ciência e tecnologia.

Com base nessas considerações, vale aproximar os referenciais teóricos da área


de comunicação pública da ciência com aqueles que sustentam a educação com enfoque
CTS, em uma tentativa de teorizar sobre a complexa e dinâmica relação entre a ciência,
a tecnologia e a sociedade.

Por defender uma aproximação entre ciência e tecnologia e população, e estudar


caminhos para a participação dos cidadãos nas tomadas de decisão sobre C&T,
apresentamos uma breve discussão sobre a mudança de paradigma dos modelos de
comunicação pública da ciência, utilizando especialmente referenciais de Durant (1999,
2004), Lewenstein (2003) e Wynne (1995), entre outros.

No contexto de modelos unidirecionais de comunicação pública da ciência,


encontramos o modelo de déficit fortemente associado à visão dominante da
popularização da ciência (LEVÝ-LEBLOND, 1992; MYERS, 2003), onde os cientistas
são considerados como os especialistas que “possuem” o conhecimento, e o público é
visto como carente (ou com um déficit) de conhecimento de fatos relevantes de ciência
e tecnologia (DURANT, 1999; LEWENSTEIN, 2003). Nesse modelo, o processo
comunicativo acontece em uma única via, sendo os cientistas os emissores e o público,
os receptores passivos, no qual a chave é a disseminação do conhecimento.

Com uma visão diferenciada de público, mas centrado ainda na linha de modelos
unidirecionais, encontramos o modelo contextual que assume que os indivíduos não
recebem a informação como recipientes vazios, pelo contrário, processam os
conhecimentos de acordo com os próprios esquemas sociais e psicológicos
(LEWENSTEIN; BROSSARD, 2006). Nessa perspectiva, esse modelo valoriza as
experiências culturais e os saberes prévios, ao mesmo tempo em que reconhece que,
quando os conhecimentos científicos ou tecnológicos fazem parte do contexto e do
41

entorno de quem está se aproximando deles, o processo de compreensão é facilitado


(LEWENSTEIN, 2003).

As críticas geradas ao redor do modelo de déficit e imbuídas dentro das


mudanças estruturais da sociedade democrática do século XX levaram ao surgimento de
modelos mais democráticos de comunicação pública da ciência. Se antes os modelos
ditos deficitários eram utilizados de maneira difundida e incondicional, hoje existe um
número crescente de propostas e projetos que valorizam os modelos dialógicos, ou seja,
aqueles que de alguma forma compreendem que a comunicação entre ciência e
sociedade não é uma via de mão única, mas sim que a sociedade tem um papel
determinante – e pode vir a ter ainda mais – nos rumos da ciência.

Sob a perspectiva de modelos dialógicos ou bidirecionais de comunicação,


encontramos o modelo de experiência leiga, que valoriza os conhecimentos locais.
Conhecimentos esses que podem ser tão relevantes para a resolução de problemas
científicos e tecnológicos como os conhecimentos científicos (LEWENSTEIN, 2003).
Cabe destacar que, nessa abordagem, saberes locais podem envolver desde experiências
de uma comunidade até práticas tradicionalmente desenvolvidas (no âmbito, por
exemplo, da agricultura) e conhecimentos herdados de geração para geração
(LEWENSTEIN; BROSSARD, 2006).

Ainda dentro dos modelos dialógicos ou bidirecionais de comunicação,


encontramos o modelo de participação pública, baseado no compromisso de
democratização da ciência e da tecnologia (LEWENSTEIN; BROSSARD, 2006). No
referido modelo, a participação do público e dos cientistas em assuntos de C&T e na
formulação de políticas científicas e tecnológicas se dá nas mesmas condições e em
espaços propícios para isso como fóruns, debates e conferências (DURANT, 1999;
LEWENSTEIN; BROSSARD, 2006). Pressupõe-se como condição necessária para o
desenvolvimento dessas atividades, a valorização do diálogo entre os cientistas e os
não-cientistas.
42

É cada vez mais freqüente encontrarmos publicações que têm explorado a


interface da comunicação pública da ciência e dos museus de ciências20. Para diversos
autores, os museus de ciências são lugares naturais para a valorização do diálogo entre
ciência e público.

Einsiedel e Einsiedel (2004, apud NAVAS, 2008) sugerem, quanto aos modelos
de comunicação pública da ciência, a existência de um continuum que vai desde
atividades mais passivas e ligadas ao papel mais tradicional dos museus de ciências, até
abordagens mais participativas. Atividades como leituras estariam no extremo mais
passivo, enquanto que fóruns e o contato com cientistas trabalhando estariam no meio e,
no extremo participativo, estariam as conferências de consenso21, por exemplo.

É possível, através da análise da trajetória dos museus, perceber que, durante


varias décadas, as atividades de divulgação científica, bem como os processos
comunicativos nos museus foram baseados na disseminação da informação, portanto na
idéia de um público mais passivo (NAVAS, 2008). Seguindo uma tendência mais atual
de popularização e comunicação da ciência, os museus também têm tentado levar à
prática modelos dialógicos, que dêem conta da participação ativa e crítica do público
(NAVAS, 2008; NAVAS et al., 2008).

A discussão acerca da mudança de paradigma na comunicação pública da


ciência é relevante no âmbito desta pesquisa, uma vez que os museus de ciências são
consensualmente espaços onde ocorre comunicação científica, e que também alternam
suas ações e suas abordagens entre modelos mais passivos e modelos mais
participativos. As escolhas vão depender do objetivo da atividade, da época em que está
sendo desenvolvida, da concepção acerca de ciências e tecnologia que possuem suas
equipes, e de tantos outros fatores.

Apesar da inevitável coexistência dessas abordagens, vale destacar a importância


na adoção de modelos mais participativos em atividades nas quais o objetivo for

20
O livro de CHITTENDEN, D.; FARMELO, G.; LEWENSTEIN, B. (Eds.). Creating Connections:
Museums and the Public Understanding of Current Research. Oxford: Althamira Press, 2004 traz diversos
artigos que discutem essa relação.
21
As conferências de consenso são encontros entre cidadãos e cientistas, abertos ao público, para debater
algum tema previamente definido de interesse da sociedade.
43

possibilitar e promover o maior envolvimento do público em questões de C&T nos


museus de ciências.

2.3 Controvérsias na ciência, controvérsias nos museus

Levantar questões sobre a natureza das controvérsias científicas, e também como


os museus lidam com questões controversas, sendo elas científicas, ou não, é relevante,
uma vez que questões dessa natureza favorecem e possibilitam a imersão de debates de
cunho CTS nesses espaços. Uma controvérsia pode ser interpretada como uma polêmica
referente a uma questão sobre a qual muitos divergem, um choque entre opiniões
opostas ou um fato que gera muitas opiniões, muitos pontos de vista.

De acordo com Cerezo (1999), o elemento-chave das explicações e


reconstruções históricas do conhecimento científico é a controvérsia científica. O autor
afirma que a controvérsia na ciência reflete a flexibilidade interpretativa da realidade e
dos problemas abordados pelo conhecimento científico.

Os temas das controvérsias científicas possuem importância significativa nos


estudos sociais da ciência. De acordo com Restrepo (2007), as controvérsias podem ser
de naturezas diferentes: por alianças profissionais; por questão de demarcação; por
diferentes trajetórias e comprometimentos profissionais (sociais, políticos e morais);
diferentes patrocinadores e fontes de financiamento, entre outros. Mas, segundo a
autora, podemos entender uma controvérsia (contemporânea ou histórica) como de
caráter científico quando há pretensões de conhecimento enfrentadas e pelo menos uma
das partes tem status científico, mas, freqüentemente, as duas têm.

Mudanças climáticas, produção de alimentos transgênicos, pesquisas com


células-tronco, uso de pesticidas, a relação entre genética e conduta humana, expansão
do universo são exemplos de temáticas controversas na ciência. Ao expor ou falar sobre
essas questões é quase inevitável levantar suas polêmicas e dar vez às diferentes vozes
envolvidas em sua construção e aplicação. E essa é uma das maneiras de se explorar as
interações entre ciência, tecnologia e sociedade.
44

Nessa discussão, existe sempre uma tentativa de diferenciação entre


conhecimento e crença. Conhecimento seria aquilo que é compartido como verdade,
justificável, razoável, evidente. Crença seria aquilo que pensam ‘os outros’ (os
indígenas, os exóticos, os externos, ou seja, aqueles que se encontram fora do que é
conhecido como o domínio da ciência) sobre o mundo, a realidade e a sociedade.
Durante uma controvérsia, está em jogo a realidade do fenômeno (sua existência), a
aceitabilidade de um procedimento ou sua teoria. Sem que haja finalizado a
controvérsia, e a falta de consenso entre as partes, não podemos dizer que é
conhecimento ou crença; ambas as partes merecem atenção (RESTREPO, 2007).

Durante as controvérsias, as partes examinam cuidadosamente seus respectivos


argumentos e pressupostos (condições, convicções e interesses são claramente vistos, se
acusam e examinam mutuamente); esses são bons momentos para observar o quão
rígidos são os métodos, os valores e as normas. O processo de resolução das
controvérsias (consenso ou resolução formal) é claramente um processo social, do qual
participam indivíduos e diferentes entidades, entre outros, academias, mídia e
instituições políticas.

De acordo com Collins (1999), a controvérsia científica termina quando algum


cientista renomado toma partido e se manifesta publicamente (normalmente por meio de
um artigo), defendendo um dos pontos de vista da questão. A partir desse momento,
essa divisão se propaga para as demais camadas sociais da cultura, formando uma
camada que ele denomina subcultura.

A controvérsia é um tema que tem sido debatido no contexto dos museus de


ciências por se reconhecer que, ao explorar a negociação entre pontos de vista, estamos
explorando aspectos mais complexos sobre a construção do conhecimento. No entanto,
vale destacar que a controvérsia explorada não necessariamente é uma controvérsia
científica, uma vez que uma controvérsia do ponto de vista da ciência pode não ser uma
controvérsia do ponto de vista do público. Nos museus, para aproveitar as
potencialidades de se abordar uma controvérsia, interessa aquela que engaja o público
(MAZDA, 2004; MCCONNELL, 1998) e que não necessariamente é uma controvérsia
do ponto de vista da ciência. Para o museu, a controvérsia pode ser de natureza estética,
ética ou moral, o que interessa é que ela cause um impacto no público, que crie nele
uma reação e que, com isso, aproxime-o emocionalmente do museu.
45

Esse debate sobre as potencialidades da controvérsia nos museus é um tema


sobre o qual podemos encontrar algumas publicações relevantes. A revista Journal of
Museum Education (JME), por exemplo, publicou em 1998 o número especial Too Hot
to Handle? Musem and Controversy22 sobre a controvérsia nos museus – incluindo os
museus de ciências e tecnologia, os museus de arte e os museus de história. Para nortear
essa publicação, os editores convidados circularam pela rede Museum Ed-Net uma
pesquisa dirigida aos profissionais de museus para responder às seguintes perguntas:

Como lidamos com assuntos controversos? Essa é uma tarefa dos educadores?
Dos elaboradores das exposições? Devemos simplesmente evitar esses
assuntos? Os museus podem expor qualquer coisa para qualquer público? Existe
algum benefício na controvérsia? O que deve fazer um educador de museu
quando um assunto desses “explode”? Quando pega fogo? Ou quando ninguém
toca no assunto? (HESS; MCCONNELL, p. 2, 1998).

As respostas de mais de cinqüenta pessoas ajudaram a escolher, dentro do


grande universo das controvérsias, os temas que seriam selecionados. Os editores
comentam, no entanto, que não foi fácil encontrar pessoas que estivessem dispostas a
escrever sobre suas experiências (HESS; MCCONNELL, 1998). Apesar dessa
dificuldade, o número traz oito artigos com diferentes perspectivas sobre o tema. Vale
destacar aqui aspectos levantados por alguns autores que podem contribuir na análise
das exposições selecionadas para esta pesquisa.

Para Hall (1998), uma das principais controvérsias relacionadas ao universo dos
museus se refere à relação entre essas instituições e seus financiadores. O autor
questiona a liberdade que os museus possuem para apresentar determinadas temáticas
dependendo de quem financia suas exposições; exemplifica, lembrando o impasse sobre
a manutenção, ou não, do financiamento federal norte-americano para a cultura, em
decorrência da reação pública sobre exposições e outras ações que traziam o sexo
explícito como tema.

Afirma, ainda, que quanto mais em evidência os museus estiverem, mais


controlados eles serão. É como se os museus sempre devessem uma satisfação cada vez
maior para seus financiadores (HALL, 1998). O que expor e o que não expor não

22
Journal of Museum Education, vol. 23, n. 3, 1998.
46

depende apenas da agenda da própria instituição; muitas vezes o tema ou a abordagem


sobre ele acabam sendo determinados em uma esfera externa, por financiadores e
políticos.

Tal obstáculo é mencionado também por Macdonald e Silverstone (1992) ao


descreverem a trajetória de elaboração de uma exposição sobre intoxicação alimentar
que foi em grande parte financiada por produtores de alimento. Nessa exposição, a
controvérsia em jogo era como debater o papel da produção industrial dos alimentos na
intoxicação alimentar. E, justamente pela delicada relação com os financiadores, o que
acabou acontecendo – depois de muitas idas e vindas – foi optar por mostrar o cuidado
que as pessoas devem ter com a higiene sem tocar no assunto da produção industrial.

No artigo ‘A Controversy Timeline’, McConnell (1998) faz uma compilação em


forma de linha do tempo de exposições que causaram algum tipo de controvérsia na
América do Norte ao longo do século XX23.

De acordo com as exposições levantadas, não é difícil perceber que nudismo e


moralidade são temas crônicos para os museus de arte, por exemplo. O autor se
pergunta quais seriam esses assuntos-problema para os museus de ciências. Com essa
pergunta como guia, vale destacar algumas das exposições de museus de ciências que
aparecem nessa linha do tempo, e qual foi a controvérsia gerada por elas.

A exposição An Age of Man, de 1924, do Museu de História Natural de Nova


York, foi criticada por antropólogos por ter uma visão racista. A Endings: An Exhibit
about Death and Loss, de 1985, do Museu da Criança de Boston, suscitou a discussão
sobre a adequação, ou não, de uma exposição sobre morte para um público infantil. All
about AIDS, de 1993, do Franklin Institute Science Museum gerou um choque entre
ativistas dos direitos gays e a igreja católica. Science and American Life, de 1994, do
National Museum of American History suscitou uma reação na mídia de que a
exposição mostrava uma visão negativa sobre o impacto da ciência na vida moderna. E,
por último, a já citada A Question of Truth, do Ontario Science Centre, que mostra um
fenômeno científico de pontos de vista culturais diferentes, explora a natureza da
ciência e seus intrínsecos preconceitos.

23
Disponível em: <http://austmus.gov.au/amarc/contested/timeline.htm>. Acesso em agosto de 2008.
47

McLaughlin (1998), curador da exposição A Question of Truth, enfatiza, em seu


artigo, a necessidade dos museus de provocarem emoções. Diz que ao negarem a
experiência emocional estão deixando de aproveitar uma oportunidade de engajar o
público. Todo o seu artigo é construído em cima do argumento de que os museus estão
cada vez mais preocupados em estimular a experiência educacional, deixando de lado a
experiência sensitiva. Para ele, as exposições que estimulam questões controversas
favorecem esse envolvimento emocional do visitante.

Kamien (1998), partindo do exemplo da elaboração da exposição Endings: An


Exhibit about Death and Loss, enfatiza quatro níveis de problemas potenciais ao se
desenvolver uma exposição controversa: com a equipe, com os financiadores, com a
mídia e com os visitantes.

Poucos museus têm uma missão que encoraje completamente o tipo de


experimentação que esses tópicos difíceis demandam. Por isso, na maioria dos casos, é
somente quando existe uma unanimidade sobre a importância de se trabalhar com
determinado tema, ou certa paixão por parte dos desenvolvedores, que temas assim são
levados adiante dentro do museu (KAMIEN, 1998).

Para Kamien (1998), elaborar uma exposição controversa é um trabalho


arriscado que exige um grande esforço por parte dos envolvidos. Para antecipar
qualquer grande problema, a exposição deve ser bem-feita, expor diferentes pontos de
vista sobre a questão – além de espaços para os visitantes se colocarem – e acolher bem
a mídia.

Afinada com esse argumento de que, ao se tratar de um tema controverso, a


exposição deve, de alguma maneira, dar voz aos diferentes atores envolvidos, vale
lembrar a exposição temporária Energia Brasil, do Museu de Astronomia e Ciências
Afins (MAST) do Rio de Janeiro, que apresenta um panorama da história da utilização
da energia no país, com ênfase no uso da energia nuclear para a geração de energia
elétrica (MAST, 2007). Nessa exposição – composta por fotografias e informações
científicas, objetos interativos, filmes e jogos –, o painel intitulado ‘Controvérsia: O
Brasil deve produzir energia nuclear para gerar energia elétrica?’ faz isso ao apresentar
depoimentos de pesquisadores, políticos, ativistas e professores universitários com
diferentes pontos de vista sobre a questão.
48

Kamien (1998) e Cooks (1998) dão igual destaque ao fato de que, ao se elaborar
uma exposição controversa, deve-se preparar a equipe e conhecer a opinião do público.
Uma exposição controversa demanda uma fase de pré-teste e ajustes bem-feita e
cuidadosa. É de extrema importância conhecer o impacto e os pontos mais complicados
antes da abertura oficial. Ambas as autoras também enfatizam a importância de reservar
locais dentro da exposição para que o público expresse sua opinião.

Em Endings: An Exhibit about Death and Loss, existiam quatro desses pontos ao
longo da exposição, onde o visitante podia dar sua opinião. Alguns visitantes de fato
utilizavam os pontos para dizer que determinado item era inapropriado, mas a maioria
usou o espaço para relatar suas próprias experiências relacionadas ao tema da
exposição.

Para Cooks (1998), uma exposição que lida com emoções fortes sempre
necessita de um local onde os visitantes possam expressar suas opiniões. Na exposição
All about AIDS, depois de diversas tentativas, a melhor solução foi uma mesa com
cartões onde as pessoas escreviam suas opiniões e depois colocavam o cartão em uma
urna. De tempos em tempos, a equipe do museu lia os cartões e selecionava alguns para
ficarem expostos em um mural. Propositalmente eram selecionados cartões com
opiniões positivas e negativas para que as pessoas soubessem que a exposição
estimulava diferentes pontos de vista. Como já levantado por Pedretti (2004), a mesma
estratégia foi utilizada na exposição A Question of Truth.

No caso do Franklin Institute Science Museum, a preocupação de envolver todos


no processo de elaboração de uma exposição controversa trouxe para o museu uma nova
maneira de se trabalhar: sempre capacitar toda a equipe – desde os seguranças e
faxineiros até os educadores e diretores – sobre o assunto que será tratado pela
exposição (COOKS , 1998).

2.4 Interfaces entre CTS, Modelos de comunicação, Controvérsia e Museus

Os três referenciais apresentados – educação com enfoque CTS e CTSA,


comunicação pública da ciência e estudo das controvérsias – têm em comum o fato de
49

questionarem a visão tradicional da ciência e o papel do público ante as questões de


C&T. Os três campos trazem contribuições para compreendermos e podermos analisar
exposições que de alguma forma abordam as relações entre ciência, tecnologia e
sociedade.

A discussão sobre modelos participativos, que envolve uma concepção de


ciência humana e dinâmica, e uma concepção de público ativo, crítico e participante, é
enriquecida pelas discussões que permeiam o movimento CTS e que defendem,
justamente, uma apresentação da ciência mais contextualiza, crítica e politizada. A
intersecção desses dois referenciais para uma análise crítica das exposições nos museus
de ciências pode contribuir para que os cidadãos, ao entrarem em contato com esses
espaços, lidem, de maneira mais consciente, com os riscos e benefícios da ciência e da
tecnologia.

De acordo com os pressupostos do movimento CTS, o aumento da participação


da sociedade em assuntos de ciência e tecnologia seria desenvolvido a partir de algumas
mudanças (radicais) no currículo de ciências no contexto da educação formal,
apresentando uma visão diferente de ciência e de tecnologia, que passasse a explorar
suas relações intrínsecas, mas omitidas, com a sociedade. O que propomos aqui são,
justamente, algumas mudanças (também radicais) na maneira como os museus
apresentam a ciência para também contribuírem com o aumento da participação da
sociedade em assuntos de ciência e tecnologia.

Se, por um lado, a educação com enfoque CTS e a comunicação pública da


ciência teorizam sobre as relações entre ciência, tecnologia e sociedade, ou ciência,
tecnologia e público, o estudo das controvérsias científicas mostra como essas questões
emergem. Ao fazer isso, o estudo das controvérsias fornece-nos significativos exemplos
de episódios concretos sobre os quais é possível enriquecer tanto a reflexão sobre
relações e interferências entre ciência e público, quanto uma reflexão sobre a maneira
pela qual os museus de ciências fazem emergir questões dessa natureza.

A comunicação e a educação em ciências são duas dimensões complementares


da formação de cidadãos participativos que estão presentes nos museus de ciências.
Diante dessa complementaridade, a aproximação sugerida entre o movimento CTS e os
modelos participativos de comunicação em ciência dão subsídio para as discussões
50

sobre temáticas controversas contemporâneas e polêmicas de assuntos de C&T no


âmbito desses espaços.

Na mesma direção, Mazda (2004) afirma que os museus de ciências têm usado a
reação do público em relação aos temas controversos como uma maneira de envolvê-los
ainda mais em assuntos de C&T. Afirma que esse novo paradigma de comunicação
dialógica é especialmente útil para lidar com a controvérsia no museu. Como assuntos
controversos são normalmente abstratos e complexos, o autor afirma que, se os
visitantes participarem do debate de maneira ativa, ou seja, compartilhando sua opinião
e tendo acesso à opinião de outras pessoas, o assunto, que antes se mostrava abstrato e
complexo, vai se tornar mais significativo.
51

Capitulo III: Abordagem metodológica

3.1 Escolhas metodológicas

Esta pesquisa está estruturada no referencial metodológico de pesquisa


qualitativa que, de acordo com Ludke e André (1986), tem algumas características
específicas: o ambiente natural como sua fonte direta de dados – no caso, as exposições
– e o pesquisador como seu principal instrumento; os dados coletados são
predominantemente descritivos; o “significado” que os entrevistados dão aos
“processos” de elaboração das exposições e suas “visões” sobre as mesmas são foco de
atenção especial. A análise de dados tende a seguir um processo indutivo, ou seja, é uma
atividade de interpretação na qual o pesquisador tem como desafio superar as intuições
ou as impressões precipitadas (LUDKE; ANDRÉ, 1986).

A coleta dos dados para a realização desta pesquisa consistiu na seleção da


exposição, ou parte da exposição, a ser analisada em cada um dos três museus
selecionados – Museu de Ciências e Tecnologia da PUC/RS, Museu da Vida/Fiocruz e
Estação Ciência/USP; observação sistemática das mesmas; entrevista com um membro
da equipe de concepção de cada uma das exposições; e análise de documentos
institucionais e publicações relacionados a essas exposições.

O estudo e a sistematização do referencial teórico no campo da educação e


museus, da comunicação pública da ciência e da educação em ciências, mais
especificamente do movimento CTS, formaram a base para o desenvolvimento dos
instrumentos de coletas de dados e das respectivas análises.

Em seguida, será apresentada uma breve descrição de como foram selecionados


os museus e suas exposições, e de como foram construídos os instrumentos de coleta de
dados. Foi durante o desenvolvimento dessas etapas que o objeto a ser pesquisado foi
sendo moldado e se tornando algo cada vez mais delimitado e passível de ser analisado.
52

3.2 Definição do objeto de estudo

3.2.1 A escolha dos museus

Como já foi colocado, o objetivo desta pesquisa é mapear como as relações e


interferências mútuas entre ciência, tecnologia e sociedade estão presentes nas
exposições dos museus de ciências e tecnologia do Brasil, neste contexto de crescente
incentivo a essas instituições. Para isso, foram selecionados museus que possuíssem
exposições permanentes que abordassem de alguma maneira as interações entre ciência,
tecnologia e sociedade.

Além disso, os museus foram escolhidos por suas trajetórias, pelo


reconhecimento das instituições às quais estão vinculados, por serem referência de
visitação nas comunidades em que estão inseridos, além de terem sido agraciados com
recursos de alguns dos editais já citados e também com recursos da Fundação Vitae. Ou
seja, foram selecionadas principalmente por fazerem parte da história recente do
crescimento dos museus de ciências no Brasil.

Estabelecido esse recorte, foram selecionados três museus, de diferentes cidades


do Brasil, a saber: Estação Ciência/USP (1987) – São Paulo/SP; Museu da Vida/
Fiocruz (1999) – Rio de Janeiro/RJ; e Museu de Ciências e Tecnologia da PUC – Porto
Alegre/RS (1967, novo formato 1998)24.

3.2.2 A escolha das exposições

Uma vez determinados os museus, foi preciso selecionar, em cada um deles, que
exposições seriam analisadas. Essa seleção foi realizada em etapas. Primeiro foram

24
Vale destacar que, durante o período de seleção e coleta de dados, o Museu de Astronomia e Ciências
Afins (MAST/MCT) – reconhecida instituição por sua trajetória e contribuição no campo da divulgação e
educação em ciências – estava em fase de reformulação de sua exposição permanente. Apesar de cumprir
todos os pré-requisitos acima listados, pelo fato de estar trocando sua exposição, não foi possível incluí-lo
entre os museus analisados, uma vez que havia sido feita a opção de analisar apenas exposições
permanentes.
53

feitas visitas exploratórias às instituições, a fim de mapear em quais exposições as


relações CTS eram potencialmente exploradas. Só depois dessa seleção é que foram
realizadas as visitas para registro e documentação em cada uma delas.

Nessas visitas exploratórias, o interesse era mapear as temáticas apresentadas


nos diferentes museus e, particularmente, em que exposições as relações entre ciência,
tecnologia e sociedade eram abordadas de maneira explícita.

Imbuída pelos referencias teóricos já apresentados, a identificação de exposições


sobre algumas temáticas específicas já seria um indício da existência de discussões de
caráter CTS. Portanto, nessas visitas, a intenção foi verificar a existência, ou não, de
exposições que tratassem de temas científicos contemporâneos (temas que aparecem na
grande mídia e são alvo de grandes investimentos e debates públicos como mapeamento
genético, alimentos transgênicos, células-tronco, etc.): exposições sobre questões
controversas, exposições de cunho ambiental e exposições sobre a história e/ou filosofia
da ciência, por exemplo.

Nessas visitas, foi possível identificar a pouca representatividade de exposições


que abordassem temáticas dessas naturezas. Nos três museus, existiam poucas
exposições que possibilitariam emergir debates de cunho CTS. Diante dessa escassez de
possibilidades, não foi difícil selecionar em cada um dos três museus as exposições que
seriam um caso digno para se explorar as relações entre ciência, tecnologia e sociedade.
Como afirmam Kenny e Grotelueschen25 (1980, apud ANDRÉ, 1995), “a unidade vai
ser escolhida porque representa por si só um caso digno de ser estudado, seja porque é
representativo de muitos outros casos, seja porque é completamente distinto de outros
casos” (p. 51). No entanto, a opção por essas exposições não significa que em cada um
dos museus não existam outras que também permitam essas discussões de alguma
maneira, nem que seja de forma mais pontual e diluída.

Estabelecidos os critérios, no Museu da Vida foi selecionada para análise a área


expositiva Reprodução e genética do Espaço Biodescoberta; no MCT, a área Educação

25
KENNY, W. R.; GROTELUESCHEN, A. D. Making the Case for Case Study. Urbana-Champaign:
College of Education, University of Illinois, 1980. (Occasional paper, Office for the Study of
Continuing Professional Education).
54

Ambiental, incluindo Nossa água, nossa vida; e, na Estação Ciência, a área Os Ciclos
Biogeoquímicos e o Meio Ambiente, da exposição O Planeta Terra e a preservação
ambiental.

O recorte das áreas expositivas selecionadas foi feito a partir da demarcação do


próprio projeto expositivo de cada um dos museus. As áreas selecionadas constituem
unidades expositivas com uma proposta, uma linguagem e um projeto museográfico que
as caracterizam como tal. Cada uma das áreas é composta por objetos expositivos,
aparatos interativos, painéis de textos, entre outros elementos cenográficos.

3.3 Instrumentos de coleta de dados

3.3.1 Observação das exposições

A observação das exposições representadas pelo próprio objeto expositivo e


pelos textos de suporte foi realizada seguindo um roteiro de observação desenvolvido a
partir da sistematização do referencial teórico e aprimorado depois da realização de um
pré-teste. Esse roteiro deveria dar conta: (1) da descrição da unidade expositiva e de
seus elementos; (2) do registro dos textos; e (3) de ajudar na futura análise das relações
entre ciência, tecnologia e sociedade.

O pré-teste do roteiro de observação foi realizado em janeiro de 2007 no Museu


Universum da Universidade Nacional Aberta do México/UNAM, localizado na cidade
do México, dentro do campus da universidade. Esse pré-teste foi realizado nessa
instituição por oportuna somatória de fatores. Primeiro, era pretendido que o pré-teste
fosse realizado em uma quarta instituição, que não viesse a ser objeto de estudo na fase
subseqüente. E, por ocasião de uma viagem à cidade do México, e dada a importância e
o reconhecimento desse museu, o Universum foi escolhido para o estudo.

A área expositiva selecionada para análise foi Cosechando el Sol, por tratar de
um tema atual e polêmico. Essa exposição, dedicada à agricultura e à alimentação, tinha
como objetivo mostrar os progressos científicos que o México e outros países atingiram
55

nesse campo, assim como informar e despertar a curiosidade sobre novas tecnologias
utilizadas na agricultura e transformação de alimentos (UNIVERSUM, 2007)26.

Essa área está dividida em seis seções: Fotossíntese, Domesticação das plantas e
dos animais, Sistemas agrícolas tradicionais, Controle de pragas, Engenharia genética
de plantas e Alimentação. Em relação à sua estrutura, ela é composta por alguns painéis
de texto – Alimentos transgénicos, Normatividade sobre transgénicos, Terminator,
Ingeniería genética – e um painel interativo intitulado Mitos y realidades de los
transgênicos, que possui seis imagens (entre alimentos e itens de laboratório) e seis
perguntas de respostas do tipo falso-verdadeiro.

Figura 1: Painel Alimentos transgénicos, localizado na entrada da exposição

26
Disponível em: <www.universum.unam.mx>. Acesso em maio de 2006.
56

Figura 2: Painel interativo Mitos y realidades de los transgénicos

Com esse pré-teste, percebemos limites no instrumento de coleta de dados


elaborado, já que este não dava conta da riqueza do conteúdo trabalhado na exposição.
O instrumento desenvolvido para essa etapa era composto por muitas questões com
respostas em tópicos, pressupondo que seria possível a realização de uma análise
interpretativa durante o momento de observação, o que de fato não ocorre. Concluiu-se,
portanto, que seria melhor, no momento de observação, possuir um roteiro que desse
conta da descrição da exposição e dos seus elementos, e que esse pudesse fornecer
material para uma posterior análise. Ficou claro também o quanto o registro fotográfico
é importante para assegurar a precisão das informações num momento posterior ao da
coleta.

Depois de realizado o pré-teste do instrumento no Universum, optou-se por


desenhar um roteiro mais aberto de observação (ANEXO I). Esse roteiro foi composto
por um espaço para o esboço da planta da exposição a ser analisada, ou seja, um
57

desenho da distribuição espacial dos elementos expositivos, um local para a descrição


do tipo de aparato e um local para a transcrição dos textos, quando não fosse possível
obtê-los em arquivo, via equipe da instituição, tampouco pelo site institucional.

Para dar conta da descrição das exposições selecionadas foi utilizado o debate
sobre as escolhas museográficas nos museus de ciências trazido por alguns autores
como Davallon27 (1989 apud CHELINI, 2006), Lourenço (2000), Marandino (2001) e
Wagensberg (2005).

De acordo com Davallon (1989 apud CHELINI, 2006), o sentido da exposição


nasce também da disposição, cenarização dos objetos, do uso de esquemas, fotografias e
outros meios visuais, ou seja, “A museografia torna-se então ferramenta essencial na
comunicação do museu com a sociedade e na efetividade do processo de divulgação”
(CHELINI, 2006, p. 111). Segundo Davallon (1989 apud CHELINI, 2006), essa
dimensão interessa especialmente aos museus de ciências que visam não só apresentar
obras que falem por si mesmas, mas também fazer com que o público descubra alguma
coisa, adquira um conhecimento e/ou forme uma opinião sobre determinado assunto.

Em seu trabalho, Lourenço (2000), divide os objetos expositivos em três grandes


grupos: objetos científicos – que foram construídos com o propósito de investigação
científica; objetos pedagógicos – que foram construídos com o propósito de ensinar
ciência; e objetos de divulgação – que foram construídos com o propósito de apresentar
os princípios da ciência a um público mais vasto.

Cada um desses grupos possui subcategorias. As subcategorias dos objetos de


divulgação são: modelos ilustrativos, como as maquetes; modelos esquemáticos (ou
diagramas), que seriam uma representação simplificada de um conceito, fenômeno ou
processo; objetos interativos do tipo ‘push button’, ou seja, aqueles que permitem
apenas uma resposta; e objetos interativos exploratórios, que possibilitam múltiplas
respostas e um maior envolvimento do visitante.

27
DAVALLON, J. Peut-on parler d'une “langue” de l’exposition scientifique? In: SCHIELE, B.
(Coord.). Faire voir, faire savoir: la museologie scientifique au présent. Canadá: Musée des
Civisations, p. 47-59, 1989.
58

Entre os objetos científicos, estão objetos como máquinas e instrumentos


científicos e, entre os objetos pedagógicos, as réplicas e os modelos, ou seja, as peças
que foram desenvolvidas com objetivos didáticos. Vale destacar que no sistema de
classificação de Lourenço, os atributos “valor histórico” e “participatividade” ou
“contemplação” são transversais, podendo ser encontrados em qualquer objeto, seja
científico, pedagógico ou de divulgação (MARANDINO, 2001).

Os museus selecionados para esta pesquisa são museus de terceira geração


(MCMANUS, 1992), que têm em seu acervo predominantemente peças produzidas
especialmente para aquelas exposições, ou seja, peças que não advêm de um contexto
ou de uma história anterior (LOURENÇO, 2000). Dado esse fato, para a descrição das
exposições analisadas, serão utilizadas principalmente as nomenclaturas da categoria
dos objetos de divulgação.

Sabendo que os museus selecionados apostam, em suas exposições, na


interatividade como um dos caminhos de comunicação com o público, vale trazer as
considerações de Wagensberg (2005) em relação aos objetos interativos. Este autor
afirma que existem três níveis possíveis de interatividade: interatividade manual ou de
emoção provocadora (hands-on); interatividade mental ou de emoção inteligível (minds-
on) e interatividade cultural ou de emoção cultural (hearts-on).

Para o autor, apesar de os três tipos serem importantes para um bom processo de
comunicação no museu, existe uma hierarquia entre eles. A hands-on seria conveniente,
pois possibilita que o visitante obtenha uma resposta a partir da sua interação; a cultural
seria recomendável, pois prioriza as identidades coletivas em torno do museu,
valorizando as realidades locais; e a mental seria imprescindível, pois leva o visitante a
compreender a ciência, pois, afastando-se do experimento do museu e associando com
idéias da vida cotidiana, a interatividade mental leva à generalização do fenômeno
(WAGENSBERG, 2005).

Para dar conta da descrição das exposições selecionadas, deve ser considerado
também o grupo dos elementos expositivos textuais. Esse conjunto de elementos tem
em comum o fato de construir um discurso baseado na linguagem escrita, narrada ou
semiótica. Para melhor precisar a descrição, esses elementos foram divididos em dois
59

subgrupos: o primeiro, dos painéis com textos e/ou imagens; e o segundo, dos elementos
multimídia, englobando os softwares, vídeos e projeções.

A partir dos elementos trazidos por esses autores (DAVALLON, 1989 apud
CHELINI, 2006; LOURENÇO, 2000; MARANDINO, 2001; WAGENSBERG, 2005),
foi possível estabelecer um padrão para nomear os diferentes elementos expositivos
presentes em cada uma das exposições analisadas ao longo do trabalho. Isso foi feito
com a intenção de tornar claras e coerentes a descrição e a análise de cada uma delas.

3.3.2 Entrevistas

Os profissionais entrevistados foram escolhidos por terem tido um papel central


na concepção e desenvolvimento das exposições selecionadas. Esses profissionais
ocupavam cargos diferentes em cada uma das instituições. No Museu de Ciências e
Tecnologia da PUC/RS foi entrevistada a coordenadora da exposição; no Museu da
Vida, a responsável pelo serviço de visitação e atendimento ao público do museu e ex-
coordenadora do Espaço Biodescoberta; e, na Estação Ciência, o responsável pelo setor
de arquitetura e museografia. A entrevista com cada um desses profissionais teve como
principal objetivo entender as escolhas feitas durante o desenvolvimento das
exposições. Foi intenção também entender o porquê da reincidência de algumas
temáticas e a ausência de outras nos museus analisados.

A identificação desses sujeitos se deu durante a fase das visitas exploratórias já


descritas. As entrevistas foram semi-estruturadas, partindo de um esquema básico, mas
não rígido, com base em um roteiro formado por tópicos, organizado de forma lógica e
respeitando o encadeamento dos temas (LUDKE; ANDRÉ, 1986 apud MARANDINO,
2001), com o intuito de trazer à luz escolhas e referenciais não explícitos no objeto
expositivo. O cruzamento das respostas dos sujeitos com a observação e a análise
documental é importante para a elaboração de uma análise mais completa das
exposições.

Elaborou-se um roteiro inicial de entrevista que foi validado a partir de um teste


feito com um dos responsáveis pela elaboração da exposição Aspectos Científicos das
60

Viagens Espaciais – uma parceria entre a Agência Espacial Brasileira e a Estação


Ciência. O sujeito foi escolhido pela facilidade de acesso e aproximação da temática da
exposição com o interesse da pesquisa. Essa validação foi importante, pois mostrou que
o roteiro da entrevista era capaz de contemplar os objetivos, mas que era preciso
apresentar melhor a pesquisa e a estrutura da entrevista para que o entrevistado se
sentisse mais à vontade na construção de sua fala, sabendo mais ou menos até onde
deveria chegar ao responder cada uma das questões28.

O roteiro final da entrevista foi dividido em seis grupos de questões: o primeiro,


sobre o entrevistado; do segundo ao quinto, sobre a elaboração da exposição
selecionada em cada um dos três museus (motivações, desenvolvimento, descrição e
avaliação/desafios, e reflexões); e o último, motivado pela pouca representatividade
dessa categoria de exposições identificada na fase das visitas exploratórias, trata-se de
um questionamento sobre as escolhas temáticas dos museus de ciências de um modo
geral (ANEXO II).

3.3.3 Análise documental

Para complementação dos dados levantados por meio das entrevistas e da


observação, foi realizada a análise de documentos institucionais sobre as exposições. A
análise desses documentos coletados colaborou para a compreensão das motivações e
intenções da concepção das exposições selecionadas. Foram considerados documentos
de interesse: projetos de elaboração, relatórios técnicos, artigos publicados sobre a
exposição e folders ou materiais didáticos.

Os documentos coletados foram: o trabalho “O Planeta Terra e a preservação


ambiental”, apresentado na X Reunión de la RED POP por Teixeira e Medeiros (2007),
da Estação Ciência; os capítulos publicados pelo diretor do MCT/PUCRS, intitulados
“O processo de criação do Museu de Ciências e Tecnologia da PUCRS”
(BERTOLETTI, 2001) e “A experiência de concepção e construção do Museu de

28
Vale destacar que, na transcrição das entrevistas, optou-se por deixar as falas o mais próximo possível
do original, em detrimento de erros ou incorreções na língua portuguesa.
61

Ciências e Tecnologia da PUCRS” (BERTOLETTI, 2002); e o artigo “Espaço


Biodescoberta: Uma Exposição Interativa em Biologia” (GRUZMAN; TEIXEIRA,
1999), sobre o processo de desenvolvimento da exposição, publicado na revista
História, Ciências, Saúde-Manguinhos.

Foram considerados também, como documentos, os textos sobre as exposições –


e sobre os próprios museus – disponíveis nos sites das instituições29, e a descrição dos
mesmos contida no guia Centros e Museus de Ciência do Brasil, da Associação
Brasileira de Centros e Museus de Ciência (ABCMC, 2005).

3.4 Condução da análise

A análise está dividida em duas perspectivas: a primeira se refere à análise das


exposições selecionadas em relação aos seus conteúdos CTS, e tem como objetivo
identificar os atributos CTS que tornam possível identificá-las como exposições CTS ou
CTSA; a segunda se refere a uma discussão dirigida principalmente pelas entrevistas
realizadas com os elaboradores das exposições, com o objetivo de discutir justamente a
pouca representatividade de exposições CTS ou CTSA nos museus de ciências
brasileiros.

3.4.1 Natureza das interações CTS e CTSA

As interações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade podem aparecer nas


exposições de diversas maneiras. Para identificar de que maneira elas de fato aparecem,
foram elencados alguns atributos (características) relacionados a essas interações que
poderiam estar presentes nas exposições. Esses atributos foram eleitos em função das
características das próprias exposições selecionadas e do referencial teórico em questão.
Este último engloba tanto educação com enfoque CTS (AIKENHEAD, 1994; AULER,

29
Disponíveis em: <www.museudavida.fiocruz.br> ; <www.eciencia.usp.br>; e <www.mct.pucrs.br>
(endereço atual <www.pucrs.br/mct/>).
62

2002; CEREZO, 1999, entre outros), como aspectos sobre exposições críticas
(MACDONALD; SILVERSTONE, 1992; PEDRETTI, 2004), controvérsias científicas
(COLLINS, 1999; RESTREPO, 2007), controvérsia nos museus (HALL, 1998;
MCCONNELL, 1998; MCLAUGHLIN, 1998, e outros) e modelos de comunicação
pública da ciência (DURANT, 1999; LEWENSTEIN, 2003, entre outros).

O contato com os estudos CTS norteou, de forma ampla, a análise das


exposições, mas a organização desses atributos teve como referência inicial o artigo
sobre a elaboração do instrumento de pesquisa Views on Science-Technology-Society
(VOSTS) desenvolvido por Aikenhead e Ryan (1992) no Canadá, a fim de mapear as
visões sobre Ciência, Tecnologia e Sociedade de alunos do ensino médio. Nesse
instrumento as perguntas são divididas em quatro grandes grupos: definições de C&T,
assuntos sociais externos à ciência, assuntos sociais internos à ciência e epistemologia
da ciência30.

A divisão dos assuntos sociais da ciência presente no trabalho de Aikenhead e


Ryan (1992) confirma o discurso utilizado por alguns autores sobre CTS que dividem
suas questões em internalistas e externalistas (AIKENHEAD, 1994, 2003; AULER,
2002; CEREZO, 1999). A partir desse trabalho, mas também com base nos demais
autores da abordagem CTS, optou-se por criar três grandes grupos de atributos. O
primeiro refere-se ao conjunto de atributos que trazem ou exploram debates sociais
externos à ciência; o segundo refere-se ao conjunto de atributos que exploram debates
sociais internos à ciência; e, por último, atributos que trazem debates históricos e
filosóficos.

O objetivo da identificação desses atributos é poder justificar a inserção dessas


exposições no que chamaremos de exposições CTS ou CTSA. Cada uma das exposições
analisadas foi considerada pertencente a esse grupo por possuir um ou mais desses
atributos.

Da mesma forma que Pedretti (2004) estabelece que as exposições críticas são
aquelas que humanizam os conteúdos científicos; que provocam emoções; que
estimulam o diálogo e o debate; e que promovem a reflexão, queremos, com este

30
Definitions, External Sociology of Science, Internal Sociology of Science e Epistemology.
63

trabalho, estabelecer que, ao possuir alguns desses atributos aqui listados, as exposições
podem ser chamadas de exposições CTS ou CTSA.

Os atributos selecionados formam um conjunto de características de naturezas


diferentes, não-excludentes, definidos a partir dos diferentes elementos trazidos pelo
referencial teórico utilizado e pelas características das próprias exposições analisadas.
Em suas definições, tentaremos, na medida do possível, exemplificar a presença deles
em exposições já ocorridas. Quando isso não for possível, traremos exemplos
hipotéticos, a fim de clarear em que situações poderia ser identificada sua presença.

I. Atributos relacionados a debates sociais externos à ciência

1. Impacto social do desenvolvimento de C&T. Problematiza o impacto social


causado pelo desenvolvimento de C&T, como o deslocamento de populações devido à
construção de uma barragem ou usina em uma cidade; os riscos e os danos causados à
saúde humana devido à contaminação da água pelas indústrias; ou as mudanças de
hábitos causadas pela implementação de determinada tecnologia na agricultura, por
exemplo. A exposição Mine Games (PEDRETTI, 2004), por explorar os múltiplos
impactos da potencial construção de uma mina numa cidade imaginária, é um bom
exemplo de como um museu de ciências pode trazer para o palco questões dessa
natureza.

2. Resolução de problemas sociais, práticos e cotidianos. Enfatiza os


benefícios do desenvolvimento de C&T para a humanidade como a melhoria na saúde,
aumento da oferta de emprego, a evolução na eficiência da comunicação e dos meios de
transporte, por exemplo. Exposições sobre genômica31, que falam sobre os benefícios
das terapias gênicas, e exposições que enfocam as mudanças de hábito e comportamento
em decorrência da evolução dos meios de comunicação32 são exemplos da presença
desse atributo.

31
Como a exposição itinerante do AMNH, Revolução Genômica, que esteve em cartaz em São Paulo de
fevereiro a julho de 2008.
32
Como na Linha do Tempo da exposição permanente do museu Oi Futuro, inaugurada em 2006 no Rio
de Janeiro. Site institucional disponível em: <http://www.oifuturo.org.br/museu/>. Acesso em setembro
2008.
64

3. Questões de cunho ambiental. Explora as interferências entre o


desenvolvimento científico e tecnológico, e o meio ambiente enfatizando a questão da
preservação, como colocado pelo enfoque CTSA. Exposições que exploram os
problemas ambientais causados pela produção do lixo e as alternativas via reciclagem
são exemplos de como os museus de ciências podem abordar essas questões33.

4. Questões controversas. Explicita controvérsias dando espaço a diferentes


vozes sobre um mesmo tema. Como colocado no painel Controvérsia: O Brasil deve
produzir energia nuclear para gerar energia elétrica?, da exposição Energia Brasil
(MAST, 2007), que apresenta depoimentos com diferentes pontos de vista sobre a
questão; ou na exposição All about AIDS (COOKS, 1998) que disponibilizava cartões
para as pessoas escreverem suas opiniões (positivas e negativas), para ficarem expostos,
estimulando a troca e o confronto de diferentes pontos de vista sobre a questão.

5. Questões éticas. Levanta debates éticos presentes no desenvolvimento de


alguns assuntos científicos, como na pesquisa com células-tronco, no desenvolvimento
da clonagem ou a questão sobre a legalização do aborto, por exemplo. Exposições sobre
genética ou reprodução que explicitassem os debates éticos envolvidos nessas questões
possuiriam esse atributo.

6. Influências políticas do desenvolvimento de C&T. Evidencia a influência


política sobre o desenvolvimento científico e tecnológico, através de linhas de
financiamentos, lançamento de editais, financiamentos por iniciativas privadas, etc.
Explicitar nas exposições que o avanço de determinada área do conhecimento não se dá
só por sua notória importância, mas também por políticas de incentivo, como é o caso
da genômica e da nanociência no Brasil, por exemplo.

7. Estímulo à participação do público. Estimula a participação do público na


exposição. Como defendido pelos autores que discutem os modelos participativos, a
inserção do público em debates acerca do desenvolvimento da ciência e da tecnologia é
um caminho para a construção de uma ciência socialmente mais comprometida. O

33
Como a exposição Die Umweltchecker, sobre reciclagem, do ZOOM KinderMuseum de Viena, em
cartaz de março a agosto de 2007. Site da exposição disponível, em:
<http://www.kindermuseum.at/jart/prj3/zoom/main.jart?rel=de&content-id=1188243159944&reserve-
mode=active>.
65

fórum de debate da exposição Mine Games (PEDRETTI, 2004) e exposições que


permitem que os visitantes deixem sua opinião mostram alternativas para que as pessoas
se posicionem e se coloquem ante questões de cunho científico dentro de um museu de
ciências.

II. Atributos relacionados a debates sociais internos à ciência

1. Características pessoais dos cientistas. Explora o contexto sociocultural da


formação dos cientistas e não apenas referenciam-nos por nomes, datas e feitos. Esse
atributo pode estar presente em exposições sobre um personagem específico, como
Darwin34, Santos Dumont35 e Pasteur36, por exemplo.

2. Coletivização do trabalho científico. Explicita que a ciência se desenvolve a


partir de troca entre pessoas e instituições, e não é fruto apenas da sabedoria de alguns
poucos “iluminados”. Essa dimensão do fazer científico é explorada por Latour e
Woolgar na sua pesquisa antropológica sobre o dia-a-dia de um grande laboratório que
resultou no livro A vida de laboratório (LATOUR; WOOLGAR, 1997). Explorar o dia-
a-dia de um laboratório, ou a colaboração entre cientistas para o desenvolvimento de
uma teoria, seria uma maneira de se trabalhar esse atributo dentro de uma exposição.

3. Procedimentos de consenso. Explicita como se dão os procedimentos para


finalizar uma controvérsia. Como debatido por Collins (1999) em seu artigo “A
comunidade científica em tempos de disputa”, em que explica que uma controvérsia
termina quando um cientista renomado toma partido e se manifesta publicamente sobre
a questão; ou como ocorrido em 2006 na conferência para a redefinição do conceito de
planeta37, em que um novo conceito de planeta foi definido e votado pela comunidade
em questão. Uma exposição sobre o sistema solar que explicitasse como Plutão deixou
de ser considerado um planeta poderia explorar esse atributo.
34
Como na exposição itinerante do AMNH, Darwin: descubra o homem e a teoria revolucionária que
mudou o mundo, que ficou em cartaz no MASP, em São Paulo, de maio a julho de 2007.
35
Como na exposição temporária Passo a passo, salto a salto, vôo a vôo: O cientista Santos-Dumont, do
MAST, em cartaz de novembro de 2007 a junho de 2008.
36
Como na mostra 100 anos do Instituto Pasteur de São Paulo, em cartaz de agosto a setembro de 2003,
no Espaço Fiat, ao lado do Instituto, em São Paulo.
37
A votação ocorreu durante a 26ª Assembléia Geral da União Astronômica Internacional, realizada em
Praga, em agosto de 2006.
66

4. Responsabilidade social dos cientistas. Explicita a preocupação dos


cientistas em torno de algum tema de grande impacto social. Como ocorreu durante a
Conferência de Pugwash ocorrida em 1957 para discutir as conseqüências sociais do
desenvolvimento das armas nucleares; ou o próprio IPCC (Intergovernmental Panel on
Climate Change), em 2007, que reuniu diferentes especialistas de diferentes países para
debater os impactos (ambientais, sociais e econômicos) do aquecimento global.
Exposições sobre Energia ou sobre o Planeta Terra poderiam explorar esse atributo,
utilizando os casos citados, por exemplo.

III. Atributos relacionados a debates históricos e filosóficos

1. Dimensão histórica. Mostra o processo de construção do conceito científico


ao longo do tempo, explicitando os métodos, as técnicas, os procedimentos e o contexto
sociocultural de seu desenvolvimento. Esse atributo pode estar presente em exposições
que tratem de episódios clássicos da história da ciência, como o desenvolvimento da
aviação38 e a revolta da vacina39, por exemplo.

2. Natureza da ciência. Traz a discussão sobre a própria natureza do


conhecimento científico do ponto de vista filosófico. Uma exposição que problematiza a
produção – mediada por equipamentos – de imagens e fotos na ciência40, ou a já referida
A Question of Truth, do Ontario Science Centre, que discute como as idéias são
constituídas e como os fatores políticos e sociais afetam as ações dos cientistas
(MCLAUGHLIN, 1998; PEDRETTI, 2004) são exemplos de como esse atributo pode
estar presente em uma exposição.

38
Novamente, como na exposição temporária Passo a passo, salto a salto, vôo a vôo: O cientista Santos-
Dumont, do MAST.
39
Como na exposição temporária Revolta da Vacina – da Varíola às Campanhas de Imunização, da Casa
de Oswaldo Cruz/Fiocruz, do ano de 1994, que esteve em cartaz também em 2005 durante a EXPO do IV
Congresso Mundial de Centros e Museus de Ciências, no Rio de Janeiro.
40
Como na exposição internacional Iconoclash: Beyond the Image Wars in Science, Religion and Art, de
2002, do Center for Art and Media [ZKM] em Karlsruhe, Alemanha, que teve Bruno Latour como um dos
curadores.
67

3.4.2 Outros aspectos analisados

Além da análise das exposições selecionadas em relação aos atributos CTS, foi
incluída, no Capítulo V: “Sobre o que falam as exposições, e o que deixam de falar?”,
uma discussão sobre a pouca representatividade de exposições CTS e CTSA levantada
nas entrevistas feitas com os elaboradores das exposições. Esse tópico foi incluído na
análise por se considerar que a pouca representatividade de exposições CTS e CTSA
nos museus de ciências brasileiros deveria ser também foco de problematização e
debate.

Sob o título “Sobre as ausências e as intenções”, o item explora os argumentos


trazidos pelos entrevistados quando questionados sobre a pouca representatividade de
exposições que tratassem de temas da atualidade, história da ciência e temas
controversos e polêmicos.

Os motivos trazidos para a compreensão sobre a ausência desse tipo de


exposição nos ajudam a entender também a ausência de determinados atributos CTS nas
exposições analisadas, como questões controversas, questões éticas, estímulo à
participação do público, coletivização do trabalho científico, dimensão histórica, entre
outros. As respostas a esses questionamentos iluminam a compreensão sobre essa pouca
representatividade de exposições CTS ou CTSA nos museus de ciências brasileiros.
68

Capitulo IV: As exposições analisadas

4.1 Museu de Ciências e Tecnologia da PUC/RS

Figura 3: Saguão de entrada do Museu de Ciências e Tecnologia da PUC/RS, onde fica


a área das Atrações

O Museu de Ciências e Tecnologia em Porto Alegre está vinculado à Pontifícia


Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS) e atualmente é considerado o
maior museu interativo da América do Sul41. Na edição de 2007 do Guia Quatro Rodas,
aparece como o museu mais visitado do estado, com 1,3 mil visitantes por dia. Fundado
em 1967, no âmbito dos museus de história natural, como um pequeno museu com
coleções de animais, rochas e minerais, hoje ocupa uma área total de 22 mil metros

41
Informação disponível no site institucional em: <www.mct.pucrs.br> (endereço atual
<www.pucrs.br/mct/>). Acesso em dezembro de 2007.
69

quadrados no campus da universidade. Em 1993 ganhou as instalações atuais42, com


cinco pavimentos e dois mezaninos, e foi inaugurado para o público em 1998 (ABCMC,
2005).

Então isso foi em oitenta e... como eu tenho dito, várias viagens para conhecer
como é, o que era isso, o que era essa nova forma de expor. Porque também nós
estávamos aqui num prediozinho de 200 metros quadrados lá da década de
60/70, então a gente não tinha muita visão. Começamos a viajar, fazer
observações, contatos, consultores de vários países. Então começamos a
entender o que era o processo. Aí começamos a definir o prédio, como é que
seria, o que se colocaria nessa exposição, desta área de exposição. (Entrevistada
MCT).

De acordo com as informações disponíveis no site da instituição, a sua exposição


permanente:

Conta com mais de setecentos experimentos interativos que oferecem aos


visitantes uma maneira inusitada e estimulante de conhecer os fenômenos
naturais e as relações do homem com o mundo. A idéia é que o visitante
participe de experiências ligadas a grandes descobertas da humanidade. O
objetivo principal do museu é despertar o espírito científico, a curiosidade e o
gosto pelas ciências.43

Sua estrutura expositiva está dividida em diversas áreas do conhecimento, e cada


uma concentra um grande número de aparatos interativos.

Então, começamos a fazer o projeto da nova área de exposição nesta linha de


interatividade porque já no mundo, nas últimas décadas, já começaram também
a pairar as novas linhas de experimentos interativos, com a participação, a
interatividade. A maior participação do visitante. (...) Quais os assuntos, os
conteúdos que a gente iria selecionar, por exemplo, não seria um museu só de
biologia, não seria só um museu de tecnologia. (...) Nossa escolha foi colocar
vários assuntos, então daí é que surgiu a idéia da área, e junto com o reitor na
época, então ele também era físico, então ele tinha experiência também de

42
Com financiamento da própria PUC e do Edital 2/92 da CAPES/PADCT (BERTOLETTI, 2002).
43
Disponível em: <www.mct.pucrs.br> (endereço atual <www.pucrs.br/mct/>). Acesso em dezembro de
2007.
70

física. (...) Então fomos colocando vários conteúdos, e a tecnologia então


também, a parte de ciências, matemática e tecnologia mostrando com a ciência
mais atual, várias conquistas... (Entrevistada MCT).

No térreo estão as áreas das Atrações, da Educação Ambiental, do Mundo das


Crianças e das Interações Vivas. No segundo pavimento, encontramos outras nove
áreas expositivas, a saber: Universo; Planeta Terra; Dioramas; Milhões de anos; Seres
vivos; Ser humano; No passado; Saúde; e Mundo microscópio. No terceiro pavimento,
estão mais oito: Clube do computador, força e movimento; Fluidos; Luz, ondas e som;
Eletricidade; Calor; Matéria e energia; Tecnologia; e Espaço jovem cientista. Ainda
existem mais duas áreas expositivas nos mezaninos: Comunicação e Desafios com
figuras e números.

Como já foi dito, a exposição selecionada para a análise no MCT foi Educação
Ambiental, incluindo Nossa água, nossa vida, por trazer uma discussão de caráter
CTSA.

4.1.1 Educação Ambiental, incluindo Nossa água, nossa vida

A exposição Educação Ambiental foi inaugurada junto com a abertura do museu


para o público, em 1998, e, de acordo com a entrevistada, é considerada uma das
principais áreas expositivas do museu:

A Educação Ambiental, está bem claro, é uma necessidade mundial e que o


homem tenha por esse motivo, respeito da natureza. Então, esse é nosso
objetivo principal. Cada experimento ali, desde animais, tem experimentos que
estão sem animais em extinção. E a gente tem essa idéia. E desenvolver uma
nova contribuição do museu também para conscientizar o respeito. O respeito à
natureza. Então isso aí, essa área é uma das mais importantes do museu. E nós
vamos continuar cada vez mais investindo nela e temos muita coisa a partir dali,
temos vantagens. Não sei se tu viu, em vários experimentos, caixas com avisos.
Animais e plantas em extinção e na Região Sul. Aquela Árvore de Floresta.
Então todas transmitem uma mensagem de preservação e esta parte também de
análise... o que é certo fazer, o que nós devemos fazer para preservar a natureza.
71

Então todos esses experimentos procuram chamar a atenção do visitante pra


isso. (Entrevistada MCT).

Essa exposição é composta por doze elementos expositivos. Logo na entrada,


estão dois elementos cenográficos, uma representação artística da solidariedade
mundial, na qual esculturas de pessoas de diferentes etnias estão de mãos dadas ao redor
do globo terrestre, de frente para uma fonte de água. Em seguida, encontramos o Bingo
da biodiversidade. No jogo, todos os dez participantes devem se sentar em bancos em
frente a um tabuleiro fixo com imagens de plantas e animais. Em um monitor de TV,
aparecem os elementos sorteados e que, caso existam no tabuleiro do jogador, devem
ser marcados com peças soltas. Não há início ou fim de jogo, o programa sorteia
elementos seqüencialmente, até que alguém reinicie.

Figura 4: Monitor preparando as peças do jogo para iniciar uma nova rodada no
Bingo da biodiversidade
72

O segundo elemento da área expositiva é o Equilíbrio da Vida, um aparato


interativo do tipo ‘push button’, composto por seis painéis backlights ilustrando os
seguintes ciclos: ciclo do nitrogênio, ciclo do oxigênio, ciclo da água, ciclo do carbono
e energia abiótica e energia biótica. Os painéis acendem quando o visitante aperta o
botão do texto correspondente. Nas laterais existem dois painéis com fotos do Rio
Grande do Sul, na região de Porto Alegre.

(Texto do aparato expositivo Equilíbrio da Vida)


Energia Abiótica: Da energia solar que atinge a Terra, apenas a luz visível é
importante para esse ciclo. Cerca de um terço desta luz reflete constituindo o
albedo. O restante é absorvido e transformado em calor (infravermelho). Esta
energia aquece regiões emersas, água e ar. Uma pequena fração, de
aproximadamente um milésimo da energia absorvida no planeta, é utilizada
pelos seres vivos. A energia em condição termal também retorna ao espaço,
juntamente com o albedo.
Ciclo da Água: O sol aquece a Terra, evaporando a água dos oceanos e
continentes. Esta, em estado de vapor, condensa e forma as nuvens,
precipitando sob forma de chuva, neve ou granizo, para retornar às superfícies
aquáticas e terrestres.
Ciclo do Nitrogênio: As bactérias do solo e dos nódulos das raízes de
leguminosas captam o nitrogênio da atmosfera e produzem nitratos, enquanto
que outras bactérias os produzem decompondo matéria orgânica. Os nitratos são
utilizados pelas plantas na síntese de suas proteínas, sendo estas incorporadas
pelos animais na cadeia alimentar.
Energia Biótica: As plantas, através da fotossíntese, são capazes de armazenar
energia da luz solar em compostos orgânicos. Estes são transferidos para os
animais, através da cadeia alimentar. Os seres vivos, ao completarem seu ciclo
vital, morrem e são reduzidos a elementos químicos simples.
Ciclo do Carbono: O carbono do gás carbônico é incorporado pelos vegetais no
início da cadeia alimentar. Assim, esse elemento é transferido do ambiente aos
seres vivos, para depois retornar. O gás carbônico resultante de combustões,
respiração e decomposição, retorna para a atmosfera. O ciclo é completado com
sua utilização do gás carbônico na fotossíntese e os compostos orgânicos
transferidos como alimentos, para os animais.
Ciclo do Oxigênio: O oxigênio é fundamental para a vida na Terra, pois é
indispensável, principalmente, à respiração dos seres vivos. As plantas terrestres
73

e aquáticas, especialmente o fitoplâncton, liberam oxigênio através da


fotossíntese. Os seres vivos, durante a respiração absorvem o oxigênio e liberam
o gás carbônico, que é reaproveitado na fotossíntese.

Na seqüência, encontramos dois totens multimídia com informações


adicionais44. O próximo elemento é um modelo esquemático 3D (existem óculos
disponíveis para a visualização da imagem tridimensional) que enfoca a teia e a cadeia
alimentar, intitulado Adivinhe quem vem para o jantar?
Em seguida, temos um ambiente reservado, onde encontramos um aparato
multimídia chamado Caleidosfera, no qual um monitor de TV e um jogo de espelhos
criam a imagem de uma esfera de aproximadamente dois metros de raio. No monitor
central, passa uma seqüência de belas imagens da natureza criando, com o jogo de
espelhos, uma espécie de Globo Terrestre natural.

Saindo dessa sala de projeção, deparamo-nos com outro aparato interativo do


tipo ‘push button’, chamado Animais em extinção e plantas em perigo de extinção. Este
aparato é composto por um painel com imagens de plantas e animais da Região Sul do
Brasil e botões correspondentes a quatro categorias: aves, mamíferos, plantas e répteis.
Quando cada um destes botões é acionado, todos os representantes desse grupo se
acendem no painel. Cada um dos organismos é apresentado pelo seu nome científico e
por seu nome popular.

44
Que não estavam funcionando na época da coleta de dados.
74

Figura 5: Painel do aparato Animais em extinção e plantas em perigo de extinção

O próximo elemento, intitulado O Planeta em Alerta é um modelo ilustrativo


giratório do Globo Terrestre. Na superfície do Globo estão dispostas várias ilustrações
de atividades humanas e de riscos para o meio ambiente, representados por situações
como: lixo nos oceanos; árvores e chaminés; a Terra em símbolo de radiação; imagens
de seca; drogas e cigarros; coleta seletiva de lixo; o globo no lixo; pombos da paz;
animais e seres humanos de mãos dadas, entre outras.
75

Figura 6: Aparato expositivo O Planeta em Alerta

Ao lado do experimento, encontramos a seguinte mensagem:

(Texto do aparato expositivo O Planeta em Alerta)


Observe as ilustrações na esfera. O experimento apresenta diversas paisagens e
situações que têm o planeta Terra como cenário. Cabe a cada um de nós refletir
sobre a continuidade que daremos para essa história
A água é vida.
Não deixe a vida secar.
Indústria consciente faz reflorestamento.
A reciclagem de lixo gera empregos e preserva recursos naturais.
A vegetação protege o solo contra a erosão.
As ações militares são o mais rápido destruidor do meio ambiente.
Diga não à guerra.
A desertificação consome a produtividade dos solos e aumenta a fome no
mundo.
76

Não mande a terra para a fogueira, preserve a camada de ozônio.


Não jogue o planeta no lixo.
Diga não à poluição.
Cidade limpa é melhor para se viver.
Todas as criaturas da natureza merecem respeito.
Diga não à violência.
Proteja a natureza.
Preserve a vida.
Só jogue na água o que o peixe pode comer.

Seguindo o percurso, encontramos outro aparato interativo do tipo ‘push button’


Árvores e Florestas. O aparato apresenta uma vitrine apagada e dez mensagens entre
ecologicamente corretas e incorretas. Existe um botão correspondente a cada uma das
mensagens. Ao serem acionados aqueles das mensagens positivas, a vitrine se ilumina e
aparece a representação de uma floresta. Ao serem acionados os botões com mensagens
negativas, a vitrine se apaga e nenhuma árvore aparece.

(Texto do aparato expositivo Árvores e Florestas)


Como devemos proteger as árvores e as florestas? Aperte o botão para iniciar
Escolha três frases ecologicamente corretas. Ao escolher uma frase incorreta o
experimento desliga.
Florestas em encostas promovem a erosão e o assoreamento dos rios.
O desmatamento pode causar o aparecimento de desertos.
Após a queimada, o solo da floresta torna-se ideal para agricultura.
As árvores oferecem abrigo e alimentação à fauna.
As florestas abrigam imensa diversidade de formas de vida.
Não devemos plantar árvores porque suas folhas sujam o chão e as raízes
quebram o cimento das calçadas.
A energia solar é uma solução para diminuir a queima de combustíveis fósseis.

Ao lado deste experimento fica uma vitrine chamada Preserve a fauna com
animais taxidermizados entre tatus, tamanduás, toupeiras e ornitorrincos, identificados
como Mamíferos exóticos e Mamíferos da América do Sul.

O último aparato desta área expositiva tem o título de Faça Seu Planeta Feliz.
Seguindo a mesma idéia do Árvores e Florestas, é um aparato interativo do tipo ‘push
77

button’ que se molda de acordo com o teor da mensagem selecionada. Neste caso, em
vez de uma vitrine com a representação de uma floresta, encontramos um painel com
uma representação da Terra que fica ‘feliz’ ou ‘triste’, dependendo da mensagem
selecionada, entre as seguintes:

Figura 7: Aparato expositivo Faça Seu Planeta Feliz

(Texto do aparato expositivo Faça Seu Planeta Feliz)


Escolha frases ecologicamente corretas e faça seu planeta sorrir:
Ao comprar, lembrar dos três “erres”: reciclar, reutilizar, reduzir.
Utilizar vasos feitos de xaxim.
Queimar papéis, madeiras, plásticos e outros materiais que produzem fumaça.
Regular o motor do carro para não poluir o ar.
Separar o lixo seco de sua casa para que seja reciclado e não depositado sobre o
solo.
“Adotar” animais silvestres como animais de estimação.
Utilizar o verso de folhas de papel já utilizadas.
Dormir com a televisão ligada.
78

Aumentar as áreas verdes das cidades plantando árvores.


Não retirar da natureza mais do que ela pode repor.

À Educação Ambiental foi incorporada a área expositiva Nossa Água, nossa


vida, uma exposição temporária criada para um evento no Shopping Praia de Belas em
2005. Essa exposição é composta por uma maquete interativa do lago Guaíba, e pelo
chamado Espaço da Água que por sua vez é composto por cinco pôsteres com textos e
modelos esquemáticos (biombos) e uma maquete de estação de tratamento de água
(ETA). Neste trecho, a entrevistada fala da criação desta nova exposição:

O museu tem que apresentar novidades. Isso aí nós não podemos parar, trazer
exposições temporárias, itinerantes também, organizar. (...) Todos os biombos
ali fazem parte da Estação de Tratamento de Água (ETA). Nós estamos também
construindo outro módulo como aquele de Estação de Tratamento de Esgoto.
Essa maquete que mostra, principalmente, nós, nosso lado do lago Guaíba. E
também estamos fazendo, quando passa numa maquete menor... (...) Ela vai ser
uma exposição permanente, mas com possibilidade... porque aquela maquete foi
construída pra uma exposição no [shopping] Praia de Belas. Nós ocupamos todo
o shopping Praia de Belas, três pavimentos. Então nós tínhamos que preencher
vários locais. Então fiz um espaço só com a parte da água. Então levei a Estação
de Tratamento, levei a maquete e ainda numa loja ali por perto, ali na frente
fizemos a apresentação dos biombos e tudo. Então ela é preparada pra ser
desmontada. (Entrevistada MCT).

Sobre o porquê de incorporar essa nova exposição à área de Educação


Ambiental:

Nosso objetivo é que seja tratada como Educação Ambiental, porque nós damos
o nosso recado também. Nós chamamos atenção tanto para a economia, quanto
para os cuidados, de onde vem a nossa água... Isso aí é também considerado por
nós como sendo parte dessa área de Educação Ambiental. (Entrevistada MCT).

Na maquete interativa do lago Guaíba, os diferentes elementos – Estações de


Tratamento de esgoto e de água, arroios e ilhas – são identificados com lâmpadas tipo
led que se acendem de acordo com a seleção do visitante.
79

Figura 8: Visitantes interagindo com a maquete do lago Guaíba

Ao lado da maquete, encontra-se um painel que possui a seguinte mensagem:

(Texto do aparato expositivo Nossa água, nossa vida)


Nossa água, nossa vida: A vida de Porto Alegre passa pelo Guaíba.
Você já se perguntou de onde vem a água que abastece sua casa cada vez que
uma torneira é aberta?
Já imaginou como é feito o processo de tratamento dessa água para que você a
receba prontinha para ser consumida?
Este experimento objetiva responder tais questões, apresentando os recursos
hídricos de Porto Alegre através de uma reprodução em escala do Lago Guaíba
e das ilhas, arroios e estações de tratamento de água e esgoto localizadas no
município.
Porém, muito mais do que isso, pretende chamar a sua atenção para a
importância de preservar tais recursos e garantir que eles também estejam à
disposição das próximas gerações.
80

Aperte um botão de cada vez conforme o seu interesse e identifique na maquete


os tópicos escolhidos.
A água é vida. E a responsabilidade de preservá-la é de cada um de nós.

O Espaço da Água é constituído por biombos (painéis textuais) intitulados Onde


está a água do mundo?; O que são mananciais?; ETA (Estação de Tratamento de
Água); O desperdício começa em casa; E se as coisas continuarem assim?; e por uma
maquete de Estação de Tratamento de Água.

Figura 9: Aparato expositivo Estação de Tratamento de Água.

(Texto do aparato expositivo Estação de Tratamento de Água)


O desperdício começa em casa.
Água é bom e todo mundo gosta. Então economize.
Poluição e contaminação.
Esgoto não tratado = meio ambiente doente.
Se as coisas continuarem assim, em breve terminará a água potável do mundo.
81

Você sabe quem pode mudar essa história de terror? (confira a resposta
levantando o pano ao lado)

4.2 Museu da Vida – Fiocruz

O Museu da Vida, fundado em 1999, integra a Casa de Oswaldo Cruz, um centro


de pesquisa, documentação e informação pertencente à Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz) no Rio de Janeiro.

A Fundação Oswaldo Cruz começa sua história com a criação do Instituto


Soroterápico Federal na região da antiga Fazenda de Manguinhos, na Zona Norte da
cidade do Rio de Janeiro em 1900. O instituto foi inaugurado com o objetivo de fabricar
soros e vacinas contra a peste bubônica. O levantamento pioneiro sobre as condições de
vida das populações do interior, realizado pelos cientistas de Manguinhos, fundamentou
debates acirrados e resultou na criação do Departamento Nacional de Saúde Pública, em
1920. Após setenta anos desempenhando um importante papel na história da saúde
pública do Brasil, o complexo se torna a então conhecida Fundação Oswaldo Cruz45.

A Casa de Oswaldo Cruz (COC), criada em 1986, integra a Fiocruz. Dedicada à


preservação da memória da Fiocruz e a atividades de pesquisa, ensino, documentação e
divulgação da história da saúde pública e das ciências biomédicas no Brasil, a COC
desenvolve estudos sobre a realidade brasileira e difunde informações sobre saúde,
ciência & tecnologia, e cidadania46.

Ligado à COC, o Museu da Vida nasce, portanto, dentro de uma instituição de


pesquisa em uma unidade que tem como cerne um viés histórico e de divulgação, fato
que acaba por marcar a história da criação do museu que se torna um espaço de
interação entre ciência, cultura e sociedade.

45
Informações no site institucional, disponível em: <www.fiocruz.br>. Acesso em agosto de 2008.
46
Informações no site institucional, disponível em: <www.fiocruz.br>. Acesso em agosto de 2008.
82

O Museu da Vida tem por objetivo informar e educar em ciência, saúde e


tecnologia de forma lúdica e criativa, através de exposições permanentes,
atividades interativas, multimídias, teatro, vídeo e laboratórios.
Por ser vinculado à Fundação Oswaldo Cruz, o Museu assume características
únicas, refletindo a cultura, a missão e o compromisso social da instituição.
Seus temas centrais são a vida enquanto objeto do conhecimento, saúde como
qualidade de vida e a intervenção do homem sobre a vida.47

O Museu da Vida é composto por cinco espaços distribuídos pelo campus da


Fiocruz: o Centro de Recepção, Ciência em Cena, o Parque da Ciência, Passado e
Presente e Biodescoberta. Os espaços abrigam exposições permanentes que abordam os
temas de biodiversidade, energia, arte e ciência, percepção sensorial, ótica, história
institucional, etc. (ABCMC, 2005).
O Centro de Recepção lembra uma antiga estação de trem inglesa, e está
localizado em área de preservação ambiental. No Centro, o visitante recebe informações
e orientações e pode embarcar no Trenzinho da Ciência para conhecer os outros quatro
espaços temáticos do Museu.

O espaço Ciência em Cena utiliza a arte para estimular o interesse científico e a


percepção do quanto existe de ciência e tecnologia na vida cotidiana, promovendo a
junção entre áreas de conhecimento por meio de teatro, vídeos, laboratórios interativos e
artes plásticas.

O Parque da Ciência é composto por dois espaços, uma área externa, onde estão
localizados diversos aparatos interativos, e uma área interna, denominada pirâmide da
ciência, que permite ao visitante experimentar e construir conceitos que o ajudarão a
entender como os sistemas vivos funcionam, suas relações com a saúde, a ecologia e a
qualidade de vida, utilizando como linguagem a cultura local e regional, perguntas do
cotidiano e curiosidades.

Na pirâmide do Parque, uma das atrações é a câmara escura, onde o visitante


experimenta a sensação de estar dentro de um olho, vendo como as imagens se
formam. É possível ainda conhecer mais sobre lentes e problemas de visão na
bancada de óptica. Outro tema do espaço é o mundo dos microorganismos. Um

47
Informação no site institucional, disponível em: <www.museudavida.fiocruz.br>. Acesso em dezembro
de 2007.
83

grande móbile ilustra a relação de tamanho entre vírus, bactérias e células do


sangue. Jogos de associação e memória discutem a relação entre
microorganismos, ambientes de risco e saúde. Em bancadas de experimentos, é
possível brincar com temas de física, química e biologia.48

Localizado no Castelo Mourisco, o Espaço Passado e Presente faz uma ponte


entre os primórdios e a atual Fiocruz. É neste espaço que o visitante tem acesso a
questões relativas à divulgação científica, ciência e sociedade, higiene e arquitetura.
Além de abrigar um espaço para exposições temporárias.

Figura 10: Castelo Mourisco, onde está localizado o Espaço Passado e Presente

48
Informação no site institucional, disponível em: <www.museudavida.fiocruz.br>. Acesso em dezembro
de 2007.
84

Situado na antiga cavalariça, o Espaço Biodescoberta tem como tema transversal


a biodiversidade, e abriga uma exposição permanente sobre o conhecimento científico a
respeito da vida e suas dimensões culturais e históricas. Painéis, experiências, atividades
interativas, observações ao microscópio, jogos, multimídias e vídeos mostram a história
e os conceitos básicos da biologia49.

Figura 11: Vista frontal do prédio da antiga cavalariça onde está localizado o Espaço
Biodescoberta

49
Informação no site institucional, disponível em: <www.museudavida.fiocruz.br>. Acesso em dezembro
de 2007.
85

4.2.1 Espaço Biodescoberta

O Espaço Biodescoberta tem como tema transversal a biodiversidade, e como


eixos auxiliares a história e a saúde. Dentro desse espaço, encontramos diversas
unidades expositivas: a Cavalariça; a Diversidade da vida; Veja o vivo; O surgimento
da diversidade: a evolução das espécies; Organizando a diversidade: a classificação
biológica; Mundo invisível; A unidade básica da vida: as células; A diversidade
humana: carteira de identidade; e Reprodução e genética.

A utilização da biodiversidade como eixo temático transversal também procede


de nossas inquietações sobre como deveríamos orientar a apresentação de nossa
temática, de modo que os conteúdos selecionados não ficassem restritos à
compreensão dos conceitos, mas pudessem estabelecer pontes com questões
presentes no cotidiano da população. Propiciar a articulação de conceitos da
biologia como saúde às questões como condições de vida e como estas se
relacionam com a preservação do meio ambiente são essenciais na afirmação da
cidadania. (...) a biodiversidade nesse sentido, também cumpre bem o papel de
eixo aglutinador destas várias visões sobre os problemas atuais que afetam a
sociedade. (GRUZMAN; TEIXEIRA, 1999, p. 383).

Como já foi colocado, a área expositiva selecionada para análise no Museu da


Vida foi a área Reprodução e genética, por possuir elementos pertinentes às discussões
no âmbito CTS.

4.2.2 Reprodução e genética – Espaço Biodescoberta

Como, ao longo dos tempos, os homens imaginavam que se dava a reprodução?


Como os diferentes organismos se reproduzem? Estes são alguns dos temas dos
painéis e multimídia deste módulo, que enfoca também a história da genética,
de Mendel à Dolly. Além de um vídeo sobre o desenvolvimento de um feto
86

humano no útero materno, o visitante poderá aprender sobre a reprodução nas


flores e sobre o desenvolvimento de insetos.50

Reprodução e genética ocupa a última sala da cavalariça e concentra uma grande


quantidade de textos. Ao todo são seis painéis, quatro sobre reprodução e dois sobre
genética:

Então nós temos um lado falando mais da genética, e outro lado falando mais da
reprodução. São painéis que falam da história da reprodução e todos os mitos
que o homem construiu em cima disso, desde Aristóteles. A gente conversou
muito entre nós, a gente teve várias discussões, sobre o momento do cientista, a
época em que ele vive, como ele interpreta o que ele vê. Mesmo que ele não
esteja vendo o muco do espermatozóide, porque é assim, olhar no microscópio,
olhar para o espermatozóide e ver o Homem, está cheio de homem lá dentro,
cheio de portas abertas então, tem várias representações assim, sobre
reprodução, é a sala que é mais pesada, que se eu pudesse mudaria, mas eu não
sei como mudaria, porque é muito pesado o texto. (Entrevistada MV).

Ao entrar na exposição, o visitante encontra um painel backlight com fotos


ampliadas de plantas e animais. Caminhando no sentido anti-horário, encontra o
primeiro painel A reprodução sempre foi um tema instigante que traz uma visão
histórica sobre a reprodução:

50
Informação no site institucional, disponível em: <www.museudavida.fiocruz.br>. Acesso em dezembro
de 2007.
87

Figura 12: Painel A reprodução sempre foi um tema instigante

(Texto do painel A reprodução sempre foi um tema instigante)


Desde a antiguidade, a busca de compreensão sobre os mecanismos de
reprodução gerou intensas controvérsias relacionadas ao papel de cada um dos
pais no processo de surgimento de uma nova vida.
Legenda: Hipócrates (460-437 a.C.) acreditava que os dois sexos produziam por
igual uma substância seminal, responsável pela formação de um novo ser.
Legenda: Platão (428-384 a.C.) afirmava que o macho carregava no sêmen um
novo ser. Caberia à mãe recebê-lo e garantir o seu desenvolvimento.
Entre os séculos XV e XVII era comum a idéia de que o sêmen tinha uma
característica não material (força vital) responsável pela fecundação. Para o
médico inglês William Harvey (1578-1657), as sementes masculina e feminina
tinham um importante papel na formação dos novos indivíduos. Assim como
atração do ímã, a ação do sêmen sobre o ovo dispensava contato.
88

Legenda: em 1667, o naturalista holandês Anton van Leeuwenhock observou ao


microscópio e descreveu, pela primeira vez, o espermatozóide. Para ele, o
líquido seminal masculino possuía um grande número de seres pré-formados.
No início do século XVIII, as controvérsias sobre a reprodução giravam em
torno de duas grandes teorias. Para os pré-formistas, o novo ser encontrava-se
pré-formado no ovo ou no esperma. Já os epigenistas sustentavam que o novo
ser era resultado da combinação das substâncias germinativas dos pais.
Para o epigenista Buffon, macho e fêmea possuíam em seus líquidos seminais
“receitas de fabricação” enviadas por cada parte do corpo. A partir da mistura
desses líquidos surgiam os órgãos.
Legenda: o canhão que dispara bebês sugere uma transposição do órgão
masculino. À mãe caberia receber a criança já pronta. (Gravura anônima do
século XVIII.)
No séc. XIX, com o desenvolvimento da teoria celular e o aperfeiçoamento da
ótica, o conhecimento sobre a fecundação se ampliou e possibilitou a
compreensão dos espermatozóides e óvulos como células reprodutivas
especializadas.
Em 1887, o biólogo alemão Hertwig deu um grande passo para a compreensão
da reprodução ao constatar que a união dos núcleos das células sexuais
masculinas e femininas forma os novos seres.
Legenda: Oskar Hertwig (1849-1922) observou pela primeira vez o processo de
fecundação em ouriços do mar.
O conceito atual de fecundação está fundamentado na união das células
reprodutivas do macho – os espermatozóides – com as da fêmea – os óvulos.
Para ocorrer a fecundação, são necessários vários espermatozóides e apenas um
óvulo; contudo, somente um espermatozóide consegue fertilizar o óvulo. É na
fusão dos dois núcleos que se forma o ovo, início de uma nova vida.

O segundo elemento expositivo é outro painel sobre reprodução Macho e


fêmea/sem sexo trazendo o tema da reprodução sexuada e da reprodução assexuada. Em
seguida, encontramos outro painel um pouco menor e sem título, com menos texto e
menos imagens, contando um pouco sobre como a fecundação externa se dá na água.

O próximo elemento expositivo também é um painel que conta sobre a


reprodução animal interna, afirmando que, nesse caso, uma quantidade menor de
gametas é envolvida. Na seqüência, encontramos um monitor no qual passa um vídeo
89

em looping sobre a reprodução humana, concentrando-se na gestação e no


desenvolvimento fetal.

O próximo elemento é uma bancada com três microscópios onde ocorrem


atividades interativas mediadas, numa dinâmica conduzida por um mediador, na qual
são discutidas as questões de reprodução sexuada e assexuada por meio da observação
do sistema reprodutor das samambaias e de outras plantas.

Do outro lado da sala está a área da genética, que é proporcionalmente menor,


constituída por dois painéis apenas, e por um elemento arquitetônico da antiga
cavalariça. Sobre essa diferença de tamanho:

Explorou brevemente por causa do espaço físico. Acho que a gente falou muito
da reprodução nos outros, quis explicar muito a parte de tipos de reprodução,
uma porção de tipos, naquela época e não menos importante é que assim você
não pode falar de um tipo de reprodução assexuada sem falar daquele outro (...).
O da genética ficou com essa abordagem do que se considera a História da
Genética, em que momento você pode observar que houve um start, os
primeiros passos da origem, a gente falou muito sobre que tem que ter as fotos,
e mostrando quase uma linha do tempo... (Entrevistada MV).

O primeiro painel da Genética, intitulado Hereditariedade, traz uma ilustração


de uma árvore representando uma árvore genealógica com dez pessoas (três gerações),
com algumas perguntas dirigidas ao visitante: “Com quem você se parece? Seus pais,
seus avós, seus tios? Como explica isso?”
90

Figura 13: Painel Hereditariedade

O outro painel, intitulado Código da Vida, contém imagens e uma grande


quantidade de textos que exploram desde a origem dos estudos de genética até a ética e
os limites dessa manipulação.

Figura 14: Painel Código da Vida


91

(Texto do Painel Código da Vida)


Em 1865, o monge austríaco Mendel desvendou os mecanismos básicos da
hereditariedade. Em seus experimentos com ervilhas, observou que os filhos de
um determinado cruzamento, embora muitas vezes não se parecessem com seus
pais, herdavam suas características, já que elas iriam surgir em suas
descendentes.
Mendel concluiu que a transmissão dos fatores herdados era o resultado do
cruzamento de pares de fatores específicos (mais tarde chamados genes) que
controlam cada uma das características.
Legenda: a partir de 1910, o biólogo americano Thomas Hunt Morgan (1866-
1945) e sua equipe, estudando os cromossomos da mosca da banana
Droshophila melanogaster, comprovam que eles transportam informações
genéticas.
Legenda: no início deste século, o alemão Aodor Boveri (1862-1915) e o
americano W. S. Sutton (1876-1916) perceberam que, na divisão celular, os
cromossomos se comportavam de forma semelhante às observações de Mendel
com as ervilhas. Foi o primeiro passo para a descoberta de que os genes se
localizam nos cromossomos.
Legenda: cromossomos são filamentos presentes no núcleo das células,
constituídos basicamente por DNA e proteínas, neles estão localizados os genes.
Legenda: os genes controlam cada uma das características dos indivíduos
e são compostos por uma substância química conhecida como ácido
desoxirribonucléico – DNA –, molécula muito longa em forma de dupla hélice.
A estrutura foi descoberta em 1953 pelo biólogo americano James Watson
(1928-) e pelo bioquímico inglês Francis Crick (1916-).
Legenda: o DNA comanda todo o funcionamento das células e é o responsável
pelo armazenamento da informação genética, transmitida através de sua
autoduplicação. É encontrado no núcleo das células – nos cromossomos –, em
mitocôndrias, em cloroplastos e em alguns vírus.
A engenharia genética vem sendo muito utilizada na melhoria de animais e
vegetais de importância agropecuária com o objetivo, por exemplo, de aumentar
a resistência de plantas a doenças e pragas ou produzir animais com mais carne
e menor teor de gordura. Estas técnicas também são aplicadas na produção de
medicamentos.
No campo da saúde pública, a produção de vacinas através da engenharia
genética já começa a apresentar bons resultados. A vacina contra a hepatite B é
92

um exemplo: é elaborada a partir da seleção de uma seqüência do genoma do


vírus, capaz de estimular a defesa do organismo sem causar a doença. Ela é
introduzida numa levedura não patogênica ou numa célula de mamíferos
superiores, que passa a produzir uma proteína do vírus da hepatite B,
provocando a formação de anticorpos nos indivíduos vacinados.
Legenda: na biologia molecular utilizam-se enzimas que cortam o DNA em
pedaços, para serem transferidos para as células de um outro organismo. Assim,
os genes selecionados são incorporados ao DNA do organismo receptor, que
apresentará as características do organismo doador. Ele passa, então, a ser
chamado de organismo transgênico.
Legenda: por ter recebido o gene do hormônio de crescimento humano, o porco
se desenvolveu com maior porcentagem de carne e menos gordura.
Legenda: sementes de feijão recebem o gene 2S da castanha-do-pará e passam a
produzir a metionina, um aminoácido essencial para o ser humano.
Legenda: a bactéria coli recebeu o gene da insulina humana, passando a
produzi-la em escala comercial.
Legenda: a clonagem de vacas de qualidade poderia garantir uma maior
produção de leite.
Os avanços da engenharia genética são constantes. Em março de 1997, o
cientista escocês Ian Wilmut anunciou a criação de um clone de ovelha a partir
de células das glândulas mamárias desse animal. A possibilidade de clonagem
de animais trouxe apreensões à sociedade. Por um lado, ela pode ser de grande
importância prática em diversos setores, como no aumento da produção
de alimentos e no controle de experimentos a partir da criação de uma
população de cobaias com as mesmas características. Por outro lado, reduz
a biodiversidade e provoca temores quanto a este conhecimento ser utilizado
para uma pretensa melhoria ou purificação da raça humana.
Discute-se hoje a ética e os limites da manipulação genética de seres vivos,
principalmente no que se refere aos riscos à saúde da humanidade e ao meio
ambiente. Regras para o controle destas experiências vêm sendo estabelecidas
pela sociedade em conjunto com a comunidade científica.
Legenda: uma população de cobaias idênticas pode ser utilizada em laboratório
para monitorar com mais precisão os testes de medicamentos.
93

4.3 Estação Ciência – USP

A Estação Ciência, atualmente vinculada à Pró-Reitoria de Cultura e Extensão


da Universidade de São Paulo, está instalada em galpões construídos no início do século
XX, para abrigar uma tecelagem no Bairro da Lapa, ao lado da Estação Barra Funda
do metrô, portanto fora do campus da universidade. Ao longo dos anos, esses galpões
foram utilizados por diferentes órgãos do governo para desempenhar diversas funções.
Em 1986, atendendo a uma reivindicação da comunidade científica de São Paulo, o
governo do estado cedeu o uso do imóvel ao CNPq para a criação da Estação Ciência,
tendo sido inaugurada oficialmente em 1987 (ABCMC, 2005).

Com mais de 3 mil metros quadrados de área com exposições e experimentos


interativos e lúdicos que abordam temas como física, biologia, astronomia, matemática,
meteorologia, geografia, urbanismo e geologia, atende mais de 400 mil pessoas por
ano51. A Estação tem como missão institucional “popularizar a ciência e tecnologia para
jovens e adultos por meio de experimentos lúdicos interativos, atividades afins e
eventos, promovendo a apropriação do método científico, o conhecimento
multidisciplinar e a cultura”52.

A Estação Ciência está dividida em cinco áreas expositivas: Ciências


Biológicas; Ciências Físicas; Ciências da Terra; Ciências Humanas; Ciência
Matemática e Tecnologia. Para esta pesquisa, interessa caracterizar a área expositiva
Ciências da Terra, constituída, por sua vez, por cinco unidades expositivas: O Planeta
Terra e a preservação ambiental; Paleontologia; Terremoto; Simulador de tsunami; e
Viagem ao Tempo Profundo, por tratarem de temáticas de cunho CTS.

51
Informação no site institucional, disponível em: <www.eciencia.usp.br>. Acesso em dezembro de 2007.
52
Informação no site institucional, disponível em: <www.eciencia.usp.br>. Acesso em dezembro de 2007.
94

4.3.1 O Planeta Terra e a preservação ambiental

O Planeta Terra e a preservação ambiental: maquetes, painéis, objetos, rochas,


minerais e mapas explicam os principais conceitos da geologia, além da
formação do petróleo. Uma animação computadorizada mostra o processo de
deriva dos continentes e formação dos fundos oceânicos. Experimentos,
exemplares de amostras geológicas, oficinas e vídeos disponíveis no mezanino e
computadores com livre acesso à internet complementam a exposição. Trata-se
de uma das exposições mais completas e interativas de todo o mundo na área de
Ciências da Terra.53

A exposição, de caráter permanente, foi inaugurada em janeiro de 2007 com


patrocínio da Petrobras, marcando lançamento oficial do Ano Internacional do Planeta
Terra no Brasil. De acordo com seus elaboradores, uma das principais propostas da
exposição é que todos tenham racionalidade no uso dos recursos naturais não-
renováveis e adotem posturas responsáveis em relação ao meio ambiente, em benefício
das futuras gerações, além de ampliar a área de Geologia e Meio Ambiente da Estação
Ciência, diversificando os temas e implantando equipamentos com maior interatividade
(TEIXEIRA; MEDEIROS, 2007). Apesar de inaugurada em 2007, a trajetória até essa
montagem foi longa:

Dentro da Estação Ciência havia a plataforma tecnologia, que convidava


diversas empresas para que elas apresentassem o que elas faziam, sua profissão
tecnológica. Entre essas empresas estava a Petrobras. A plataforma de
tecnologia foi se desfazendo ao longo dos anos, porém a Petrobras se manteve
como patrocinadora da Estação Ciência, desde 1989. Até 1995, 1996, a idéia era
manter um stand da Petrobras, contando sua história, mostrando suas atividades,
a prospecção de petróleo: a Petrobras mostrando a Petrobras. Em 1994, 1995
tivemos uma conversa para que a Petrobras abarcasse a exposição das Ciências
da Terra dentro do espaço que ela patrocinava. Isso foi feito num primeiro
momento pela Petrobras e por contratados dela; a Estação Ciência não teve
interferência alguma. Já em 2000, 2001, nós renovamos o projeto, desta vez

53
Informação no site institucional, disponível em: <www.eciencia.usp.br>. Acesso em maio de 2008.
95

com interferência da Estação Ciência, mas ainda era uma coisa pequena – quer
dizer, na época já não era uma coisa tão pequena, era bem maior em relação ao
que era antes e já foi incorporando alguns temas. (Entrevistado EC).

Até chegar à configuração desta última montagem:

Nosso contrato com a Petrobras havia terminado e a gente pensou em propor


algo maior – aproveitando que o diretor da Estação Ciência era da área – a idéia
era fazer uma coisa bem mais ambiciosa. A área das Ciências da Terra era
muito pequena, mas a idéia era criar uma grande exposição sobre o Planeta
Terra. Em 2004 nós fizemos o projeto, inclusive realizando algumas pesquisas
em museus, em sites de museus internacionais para ver o que eles expunham
sobre isso e então formatamos um projeto que ampliava muito a área das
Ciências da Terra, a área tinha duzentos metros e agora tem cerca de mil metros
de exposição. E a idéia era mostrar todos os fenômenos. No começo pensamos
em mostrar coisas mais ligadas às áreas da Petrobras, mas depois achamos que
algumas coisas tinham de ser mostradas e estavam completamente fora da área
da Petrobras, como a questão de terremotos, do tsunami – que surgiu devido ao
tsunami ocorrido mesmo e era um assunto muito perguntado por nossos
estagiários, a questão das placas tectônicas. (...) A Ciências da Terra era um
atrativo grande, nós tínhamos uma parceria de longa data com a Petrobras então
juntaram as duas coisas e surgiu a idéia da exposição. (Entrevistado EC).

Entre os principais temas da exposição, estão: As origens do Planeta; Forças


Tectônicas; Terremotos e Tsunami; Vulcão; Viagem ao Tempo Profundo; Os Ciclos
Biogeoquímicos e o Meio Ambiente; O Ciclo das Rochas, os Minerais e os Recursos
Minerais Não-Renováveis; Energia e Petróleo; Intervenção Humana e Plataforma
Petrobras (TEIXEIRA; MEDEIROS, 2007).

A nova exposição utiliza como eixo condutor a separação continental entre


América do Sul e África, para explicar os processos naturais internos e
externos. O conceito do Sistema Terra é ilustrado pela dança das placas
tectônicas e proporciona entender fenômenos como o vulcanismo, os
terremotos, a construção das montanhas, a modificação das paisagens no tempo
e no espaço, o efeito estufa, o ciclo do carbono e a formação do petróleo, a
formação dos aqüíferos, entre outros assuntos que fazem parte ou condicionam
o desenvolvimento social e tecnológico. (TEIXEIRA; MEDEIROS, 2007, p. 3).
96

Sobre a relevância de tratar esses temas em uma exposição:

Eram temas que há bastante tempo já víamos sendo discutidos em jornais,


revistas, em todas as mídias. Eram temas importantes. Era uma exposição que
trabalhava uma questão mais técnica, que falava menos da intervenção do
homem no planeta. E o que faltava era um pouco isso. Pensamos muito na
questão da multidisciplinaridade de que você tem um planeta que tem um
funcionamento próprio dele, mas que há, ao mesmo tempo, uma intervenção
humana que acaba alterando esse funcionamento. Então, pensar em que
momentos essa intervenção humana funciona. (Entrevistado EC).

Entre essas temáticas, foi selecionada para análise a área expositiva Os Ciclos
Biogeoquímicos e o Meio Ambiente por explorar de maneira mais explícita as relações
entre ciência, tecnologia e sociedade, e o meio ambiente.

4.3.2 Os Ciclos Biogeoquímicos e o Meio Ambiente – O Planeta Terra e a


preservação ambiental

A área expositiva Os Ciclos Biogeoquímicos e o Meio Ambiente é composta por


sete aparatos expositivos que discutem para cada um dos ciclos “suas utilizações e os
problemas ambientais causados pela interferência do homem” (TEIXEIRA;
MEDEIROS, 2007, p. 6).
97

Figura 15: Montagem feita com a imagem de cada um dos painéis: Ciclo da Água,
Ciclo do Oxigênio, Ciclo do Carbono e Ciclo do Nitrogênio

O trajeto pela exposição pode começar pelo Ciclo do Carbono. Para abordar o
assunto, encontramos: um diagrama – como o da figura 15; um painel de texto; e uma
vitrine com diferentes elementos – estruturas moleculares, carrinhos de plásticos,
pedaços de madeira –, para mostrar as diferentes formas de carbono presentes na
atmosfera, biosfera, hidrosfera e litosfera.

(Texto do painel Ciclo do Carbono)


O carbono contido no gás carbônico é incorporado pelos vegetais no início da
cadeia alimentar. Desse modo, esse elemento químico é transferido do ambiente
98

aos seres vivos. O gás carbônico resultante da respiração e decomposição e


também de combustões retorna para a atmosfera.
O ciclo é completado com a utilização do gás carbônico na fotossíntese e os
compostos orgânicos transferidos, como alimentos para os animais.

Na seqüência, está um painel de texto sobre a camada de ozônio acompanhado


por animação multimídia explicando o seu funcionamento.

Figura 16: No canto direito da imagem, podemos ver a vitrine com diferentes elementos
feitos de carbono e, mais ao fundo, o painel Camada de Ozônio

(Texto do painel Camada de Ozônio)


CAMADA DE OZÔNIO
O gás ozônio está concentrado na estratosfera, localizada a uma altura entre 15 e
50 km do solo. A camada de ozônio, como ficou conhecida, funciona como um
filtro natural, retendo 95% da radiação ultravioleta (UV-B) e protegendo os
seres vivos dos danos causados por essa radiação. A absorção do UV-B por esse
99

escudo cria uma fonte de calor, desempenhando um papel fundamental na


manutenção de temperatura aprazível no nosso planeta.
O BURACO NA CAMADA DO OZÔNIO
Algumas substâncias produzidas pela atividade humana como os gases CFCs*
vêm destruindo essa camada protetora. O resultado é que uma quantidade muito
maior de raios UV-B está chegando à Terra. Nos seres humanos, a exposição a
longo prazo ao UV-B está associada ao risco de danos à visão e ao sistema
imunológico e ao desenvolvimento do câncer de pele. Os animais também
sofrem as conseqüências com o aumento do UV-B. Os raios ultravioletas
prejudicam os estágios iniciais do desenvolvimento de peixes, camarões,
caranguejos, e outras formas de vida aquática. O famoso “buraco” da camada de
ozônio foi detectado em algumas estações de medição experimental na região
da Antártica, na década de 1980.
*Os clorofluorcarbonos (CFCs) foram inventados em 1928, a partir de então,
muito utilizados em geladeiras, condicionadores de ar, sistemas de refrigeração,
isolantes térmicos, como propelentes em aerossóis e na produção de plásticos.
O Ozônio na baixa atmosfera
Ozônio troposférico é aquele encontrado na baixa atmosfera (troposfera).
Forma-se a partir da reação entre a luz solar, os óxidos de nitrogênio e
compostos orgânicos voláteis, liberados na queima incompleta e evaporação de
combustíveis e solventes. Nesse caso o ozônio (O3) é considerado um poluente,
pois causa prejuízos à saúde como diminuição da capacidade pulmonar e
irritação nos olhos e vias respiratórias. A exposição a altas concentrações pode
resultar em sensações de aperto no peito, tosse e chiado na respiração. Também
pode causar danos à vegetação.

Logo na seqüência, encontramos os elementos do Ciclo do Carbono, um painel


de texto e um diagrama – como o da figura 15.
100

Figura 17: Imagem das três maquetes pertencentes ao aparato do Aqüífero Guarani e
ao fundo o painel backlight Ciclo do Oxigênio

(Texto do painel Ciclo do Oxigênio)


O oxigênio é parte fundamental da atmosfera da Terra, sendo indispensável,
principalmente, à respiração dos seres vivos. As plantas terrestres e aquáticas,
especialmente o fitoplâncton, liberam oxigênio através da fotossíntese. Os seres
vivos, durante a respiração, absorvem o oxigênio e liberam gás carbônico que é
reaproveitado na fotossíntese.
Da energia dos raios solares que atinge a Terra, apenas a luz visível é
importante para o ciclo do oxigênio. Cerca de um terço desta luz reflete
retornando ao espaço. O restante é absorvido no planeta e transformado em
calor. Esta energia aquece regiões emersas, a água e o ar. Uma pequena fração,
de aproximadamente um milésimo de energia absorvida, é utilizada pelos seres
vivos.
O sol aquece a Terra, evaporando a água dos oceanos e dos continentes. Esta,
em estado de vapor, condensa e forma as nuvens, retornando às superfícies
aquosas e terrestres em forma de chuva, neve ou granizo.
101

As plantas, através da fotossíntese, são capazes de armazenar energia luminosa


solar em compostos orgânicos. Estes são transferidos para os animais através da
cadeia alimentar. Os seres vivos, ao morrerem, são reduzidos a elementos
químicos simples.

O painel Efeito estufa está exposto na parte de trás do suporte do painel e vitrine
do Ciclo do Carbono.

Ele [o painel Efeito estufa] estava mais atrás ainda. Nós o mudamos de lugar. A
idéia era fazer a estufa ao lado dele, que seria uma coisa mais atrativa. Como
não teve estufa, ele acabou ficando meio deslocado – senão ele ficaria perto do
carbono. Acho que em termos de projeto talvez seja a área que eu menos goste.
Algumas partes ficaram espaçadas demais e outras concentradas demais. Acho
que o efeito estufa ficou muito concentrado, o carbono também ficou muito
apertado enquanto o oxigênio está enorme, sendo que a parte do carbono tem
muito mais informação que a do oxigênio. (Entrevistado EC).

(Texto do painel Efeito estufa)


EFEITO ESTUFA
As mudanças do clima da Terra estão relacionadas à ação do ser humano, que
polui a atmosfera, devasta florestas e contamina os oceanos, entre outros danos
ao ambiente.
Os gases-estufa, como o dióxido de carbono, são produzidos naturalmente pelos
vulcões, aquecendo o planeta e permitindo a existência da vida. Contudo, a
queima de combustíveis fósseis pelo homem produz muito gás carbônico (CO2),
entre outros, aquecendo ainda mais a atmosfera.
Esses gases permitem que a radiação solar penetre na atmosfera, mas retêm
grande parte dessa radiação, gerando com isso o aumento da temperatura
superficial da Terra. O resultado é exatamente como em uma estufa verdadeira
onde se cultivam plantas.
O aumento constante de dióxido de carbono na atmosfera está comprovado a
partir de ampolas contendo amostras de ar coletados desde o século XX em
muitos locais incluindo o Pólo Sul e o Ártico. Os estudos comprovaram que
cada vez menos radiação solar consegue escapar para o espaço e que a média de
temperatura global aumentou 0,6º C nos últimos 140 anos. As conseqüências do
aquecimento são claras, em especial geleiras retrocedendo em muitos lugares e
derretimento do gelo nos pólos e o conseqüente aumento no nível dos oceanos.
102

Se a calota de gelo da Antártica Ocidental derreter, o nível do mar aumentará de


5 a 6 metros.
Com o derretimento das geleiras, o volume de água doce pode causar outras
conseqüências como mudanças na temperatura e salinidade dos oceanos, além
dos padrões de circulação de ar na atmosfera e das correntes marítimas. Isto
também afetaria o clima, provocando em vez de superaquecimento, um grande
resfriamento global.

Para complementar a discussão sobre o efeito estufa, existe um painel


comparando o planeta Terra e Vênus.

(Texto do painel Modelo Comparativo Terra Vênus)


MODELO COMPARATIVO TERRA VÊNUS
A Terra é um planeta único por ter água e hospedar várias formas de vida.
Próximo ao nosso mundo está Vênus, um planeta gêmeo por ter quase o mesmo
tamanho e massa da Terra. Contudo, ele é muito mais quente que a Terra. Ali
não há oceanos, e muito menos vida.
Vênus está envolto por uma camada opaca e de nuvens densas, ocultando sua
superfície e refletindo a luz do Sol. Esta atmosfera é 90 vezes mais densa que a
da Terra, sendo composta por dióxido de carbono, vapor e outros gases. Ela
permite a entrada da luz visível do Sol, mas ao mesmo tempo bloqueia a luz
infravermelha que a superfície de Vênus irradia. Dessa forma a temperatura
aumenta até que a radiação infravermelha irradiada se equilibre à luz visível
solar que atinge a superfície. Assim se forma o efeito estufa em Vênus.
Nossa atmosfera tem dióxido de carbono e vapor, mas em muito menor
quantidade. Isto cria na Terra um tênue efeito estufa – o suficiente para aquecer
o solo acima de zero grau e impedir o congelamento da água. Mas não há
garantia de que o clima do nosso planeta será sempre assim. Evidências do
aumento da temperatura na Terra são claras, causado pela queima de petróleo,
gás e carvão, entre outros fatores, lançando mais dióxido de carbono (CO2) na
atmosfera, aquecendo a superfície e descongelando gradativamente as calotas
polares.
O ambiente “infernal” de Vênus é um alerta dos perigos que podem afetar a
humanidade. Para conservar nosso mundo e seu delicado equilíbrio precisamos,
antes de tudo, respeitá-lo e entender o seu funcionamento.
Adaptado de Carl Sagan, série Cosmos, vol. 2 (Editora Abril).
103

No centro do espaço está uma maquete do Aqüífero Guarani com três painéis
explicativos nos quais é destacada a importância deste complexo para a região.

Figura 18: Maquete do Aqüífero Guarani, mais à frente, elemento cenográfico que
representa os ciclos biogeoquímicos

(Texto do painel 1 da maquete Aqüífero Guarani)


O Aqüífero Guarani é o maior reservatório de água subterrânea da América do
Sul, ocupando uma área de 1.195.200km2. Deste total, 839.800km2 situam-se no
Brasil, especialmente nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná,
São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Goiás. A reserva
do Aqüífero Guarani é estimada em 498.000km3 anuais.
O aqüífero está contido em um conjunto subterrâneo muito extenso de rochas
arenosas cujos poros e fendas encontram-se preenchidos por água.
Dimensões
Área total 1.195.200 km2
Área de recarga 150.000 km2
104

Área confinada 1.000.000 km2


Espessura média 250 m
Índices Hidrológicos
Precipitação média 1.500 mm
Recarga natural 160 km3/a
Permeabilidade 3 m/dia
Porosidade eficaz 15%
Coef. de armazenamento 10-4
Reservas
Estimada 498.000 km3
Ativa 60 km3/a
Explorável 40 km3/a
Quanto de água subterrânea tem o Brasil?
Os 8.512.000 km2 do território nacional podem armazenar um volume superior
a 112.000 km3 de água subterrânea. Essa colossal quantidade de água poderia
abastecer a população do planeta durante 250 anos. Infelizmente, nem toda a
água subterrânea pode ser extraída e nem mesmo a sua distribuição é igual em
todo o país. Diferentes rochas têm diferentes capacidades de armazenar e
transmitir água. Em certas áreas o regime climático limita a recarga dos
aqüíferos, reduzindo a sua produção.

(Texto do painel 2 da maquete Aqüífero Guarani)


FONTES DE CONTAMINAÇÃO
FOSSAS SÉPTICAS: são unidades de tratamento primário de esgoto doméstico
nas quais são feitas a separação e transformação da matéria sólida contida no
esgoto. Os efluentes domésticos possuem substâncias poluentes, como os
compostos de nitrogênio, além de concentrações variadas de microorganismos
patogênicos que apresentam grandes riscos à água.
DEPOSIÇÃO INCORRETA DE RESÍDUOS DA REDE DE ESGOTO:
resíduos sólidos de origem doméstica têm causado muitos incidentes de
contaminação na água subterrânea. Isto ocorre especialmente quando a
deposição é feita em locais vulneráveis.
APLICAÇÃO DE FERTILIZANTES E AGROTÓXICOS EM ÁREA
AGRÍCOLA: o comportamento pouco conhecido dos agrotóxicos em
subsuperfície, associado a sua ampla aplicação, faz da atividade agrícola uma
105

das mais difíceis de serem avaliadas em termos de riscos para a contaminação


da água.
ATIVIDADE INDUSTRIAL: a contaminação dos aqüíferos ocorre quando
efluentes líquidos gasosos e resíduos sólidos são depositados incorretamente.
Uma prática comum é a utilização das lagoas para a estocagem de efluentes
industriais que necessitam de isolamento e controle.

(Texto do painel 3 da maquete Aqüífero Guarani)


AQÜÍFEROS
As águas subterrâneas representam 98% da água doce líquida do planeta. Os
aqüíferos ocorrem em rochas porosas e são constituídos por água superficial que
se infiltra. Somente algumas camadas geológicas são capazes de armazenar a
água e, ao mesmo tempo, permitir sua circulação. Os aqüíferos são responsáveis
não só pela recarga de nascentes de rios, mas também constituem fonte
confiável de abastecimento de água. Estima-se que mais de 1,5 bilhão de
pessoas em núcleos urbanos e uma grande parcela da população rural tenham
suas necessidades supridas pela água subterrânea.
Recarga:
Parte da água de chuva ingressa ao aqüífero diretamente infiltrando-se na
superfície do terreno ou através de rios. A água que ingressa é denominada
“recarga” e é quantificada por meio de um volume anual.
EXTRAÇÃO SUSTENTÁVEL
A extração de água de um aqüífero deve ser feita de forma equilibrada. Em
outras palavras, o volume de água que pode ser extraído precisa ser menor que o
volume de recarga natural do aqüífero. Além disso, os rios e as zonas úmidas
devem ser preservados por serem fontes de recarga dos aqüíferos.
Quanto à preservação da qualidade, devem ser tomadas providências de
proteção necessárias para controlar os efeitos das atividades potencialmente
poluentes: espalhamento de residuais sólidos, excesso de agroquímicos,
construção de poços negros, entre outras.
A EXTRAÇÃO DAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS:
O poço é uma das formas de se retirar água do aqüífero. Caso a extração seja
moderada e controlada, o nível de água se equilibrará em função da recarga
efetivada pelas chuvas. Entretanto, se a extração for maior que a capacidade de
reposição de água no aqüífero, o nível da água continuará caindo ao longo dos
anos podendo comprometer seriamente o recurso subterrâneo.
106

Atrás da maquete Aqüífero Guarani, encontramos outras três maquetes menores


que mostram o processo de desertificação de um ambiente fictício ocasionado pelo uso
intensivo do solo. A primeira maquete representa o estado inicial do ambiente; a
segunda, o desmatamento e o processo de assoreamento do rio; e a terceira, o ambiente
já desertificado.

Do lado direito das três maquetes, encontramos um aparato interativo que


discute O uso da água ao mostrar a quantidade de água utilizada em alguns
equipamentos domésticos. Esse aparato contém 108 garrafas pet que se acendem
conforme a atividade que é selecionada pelo visitante através de um botão: descarga
com caixa acoplada, válvula de descarga, escovar os dentes, fazer a barba, lavar a
roupa na máquina, banho de chuveiro, lavar a louça na pia, lavar a calçada, lavar o
carro, banho de ducha.

Figura 19: Garrafas pet iluminadas do aparato interativo O uso da água e, ao fundo, o
painel backlight do Ciclo da Água

Ao lado, encontramos um painel sobre o Ciclo da Água, um esquema em


backlight e um vídeo com imagens de natureza.
107

Figura 20: À direita, um dos painéis da maquete do Aqüífero Guarani e, ao fundo,


outra visão do aparato interativo que discute o uso da água e os painéis do Ciclo da
Água
(Texto do painel Ciclo da Água)
A água percorre um caminho cíclico na Terra: dos oceanos, terras emersas, rios
e seres vivos para a atmosfera; e de volta para os oceanos, continentes, rios e
seres vivos, através da chuva, neve e orvalho.
Parte da água escoa superficialmente (rios e oceanos) e outra parte infiltra-se,
para recarregar lençóis subterrâneos de água (aqüíferos) que, por sua vez,
reabastecem as nascentes dos rios e oceanos. Parte da água dos rios e oceanos
evapora e retorna à atmosfera, assim como a água utilizada por plantas e
animais, que volta à atmosfera através da evapotranspiração. Este caminho de ir
e vir é chamado ciclo da água ou ciclo hidrológico.
A água doce líquida é encontrada nos rios, lagos, terras inundáveis e
principalmente (cerca de 98%) nos aqüíferos.
As matas e os solos atuam como recipientes naturais das águas das chuvas. Sem
a cobertura vegetal, a água, em vez de infiltrar no solo, escoa diretamente aos
rios podendo causar enchentes e erosão. Além disso, a água deixa de ser
armazenada nos lençóis de água subterrânea. Esse fato provoca a deficiência no
reabastecimento de nascentes de rios e riachos. A falta de vegetação também
diminui a umidade do ar responsável por novas chuvas. Com o processo de seca
e desmatamento, milhares de hectares de terra podem se transformar em
desertos ao longo do tempo.
108

O solo desprotegido também é carregado pelas chuvas para os rios, que se


tornam mais rasos e assoreados. O transporte pela chuva de solos com
agrotóxicos e, muitas vezes, com excesso de fertilizantes, pode contaminar a
água superficial, o que pode causar a eutrofização (excesso de nutrientes) em
lagos e o desequilíbrio da flora e fauna ambiental.
No solo, os componentes nitrogenados, essenciais para o desenvolvimento das
plantas, são absorvidos e fixados por elas através da associação das raízes dos
vegetais com as bactérias. Alguns tipos de bactérias são capazes de decompor
elementos nitrogenados e liberar para a atmosfera o nitrogênio em forma gasosa
(N2), fechando assim o ciclo.
No decorrer do ciclo da vida, os animais excretam compostos nitrogenados
como resíduos da atividade metabólica. Esses compostos também são liberados
quando matérias orgânicas de origem vegetal e animal se decompõem com a
ação de bactérias decompositoras.

Sobre a elaboração do vídeo A água no mundo:

Na parte da hidrosfera, cuja preocupação já vem da Acqua Brasilis, era mostrar


as formas de água existentes no planeta, que conseguimos por meio de um
vídeo que nós editamos a partir de imagens de vários outros lugares. Era uma
coisa bastante complicada, mas acho que nós conseguimos, era mostrar desde as
nuvens, da chuva, os cursos d’água, a água dentro das cavernas, dentro dos
oceanos, a água em todas as situações dentro do planeta. Acho que foi muito
legal porque todo mundo elogia muito o vídeo. A idéia era trabalhar com essa
questão da beleza e das cores e das formas. (...) Porque geralmente é aquela
coisa de narração, e as pessoas não têm paciência de ficar em pé ouvindo, e nós
conseguimos trabalhar com imagens, o que na verdade virou um grande painel
em movimento. É mais contemplativo e tem um papel na exposição de
ambientar, mais cenográfico do que passar uma informação, e acho que
funciona muito melhor. (Entrevistado EC).

O último elemento da área é um painel sem texto, só com um esquema do ciclo


do nitrogênio, como pode ser visto na figura 15.
109

Capitulo V: Sobre o que falam as exposições, e o que deixam de falar?

Como já foi colocado no Capítulo III, referente à abordagem metodológica, as


exposições Educação Ambiental do Museu de Ciências e Tecnologia da PUC,
Reprodução e genética do Museu da Vida e Os Ciclos Biogeoquímicos e o Meio
Ambiente da Estação Ciência, foram analisadas em relação aos seus conteúdos CTS e
CTSA. Essa análise foi conduzida identificando os atributos CTS presentes em cada
uma delas. Como apresentado anteriormente, os atributos foram agrupados da seguinte
maneira:

I. Atributos relacionados a debates sociais externos à ciência (que incluem


impacto social do desenvolvimento de C&T, resolução de problemas
sociais, práticos e cotidianos, questões de cunho ambiental, questões
controversas, questões éticas, influências políticas do desenvolvimento
de C&T, estímulo à participação do público);

II. Atributos relacionados a debates sociais internos à ciência (incluindo


características pessoais dos cientistas, coletivização do trabalho
científico, procedimentos de consenso, responsabilidade social dos
cientistas); e

III. Atributos relacionados a debates históricos e filosóficos (referente a


dimensão histórica, natureza da ciência).

A presença dos atributos foi identificada nos elementos das próprias exposições
– objetos expositivos, aparatos interativos, painéis de textos, entre outros elementos
cenográficos, nos trechos das entrevistas realizadas com os elaboradores e nos
documentos de referência. Quando pertinente, foram trazidos elementos das
bibliografias utilizadas como referência para a construção dos atributos.

Além da análise destas exposições em relação aos conteúdos CTS, foi incluída
também uma análise sobre a pouca representatividade de exposições que trazem
discussões de caráter CTS de um modo geral. Essa análise foi motivada pela perceptível
ausência desta categoria de exposições durante a fase das visitas exploratórias. Para dar
conta dessa dimensão, foi incluído, na entrevista com os elaboradores de cada uma das
110

exposições, um bloco de perguntas que fizesse emergir explicações para esse fato.
Nesse bloco de perguntas, os entrevistados foram questionados sobre a presença ou
ausência de exposições que abordassem temas da atualidade, história da ciência e temas
controversos e polêmicos. A análise deste bloco de questões nos mostra um rico
universo de motivos e explicações para essas latentes ausências que consideramos
fundamentais para o aprofundamento sobre as potencialidades do desenvolvimento de
exposições CTS e CTSA.

5.1 Exposições CTS e CTSA

5.1.1 Educação Ambiental, uma necessidade mundial

A exposição Educação Ambiental do Museu de Ciências e Tecnologia (MCT)


foi enquadrada como uma exposição CTSA por ter sido possível identificar, em
diversos de seus elementos expositivos, evidências do atributo Questões de cunho
ambiental. Como o próprio nome da exposição denuncia, ela tem como objetivo discutir
questões de caráter ambiental e conscientizar seu público sobre a importância da
preservação dos recursos naturais.

Não sei se tu viu, em vários experimentos caixas com avisos. Animais e plantas
em extinção e na Região Sul. Aquela Árvores e Florestas. Então todas
transmitem uma mensagem de preservação e esta parte também de análise, o
que é certo fazer, o que nós devemos fazer para preservar a natureza. Então
todos esses experimentos procuram chamar a atenção do visitante para isso.
(Entrevistada MCT).

O Planeta em Alerta, Árvores e Florestas e Faça Seu Planeta Feliz são aparatos
interativos dessa exposição nos quais podemos identificar evidências do atributo
Questões de cunho ambiental. Como colocado pela entrevistada, essas evidências
aparecem em suas mensagens de preservação e alerta:

Indústria consciente faz reflorestamento. A reciclagem de lixo gera empregos e


preserva recursos naturais. As ações militares são o mais rápido destruidor do
111

meio ambiente. Não mande a Terra para a fogueira, preserve a camada de


ozônio. (Trecho do aparato O Planeta em Alerta, Educação Ambiental, MCT).

O desmatamento pode causar o aparecimento de desertos. A energia solar é uma


solução para diminuir a queima de combustíveis fósseis. (Trecho do aparato
Árvores e florestas, Educação Ambiental, MCT).

Ao comprar, lembrar dos três “erres”: RECICLAR, REUTILIZAR, REDUZIR;


regular o motor do carro para não poluir o ar; separar o lixo seco de sua casa
para que seja reciclado e não depositado sobre o solo; utilizar o verso de folhas
de papel já utilizadas. (Trecho do aparato Faça Seu Planeta Feliz, Educação
Ambiental, MCT).

O Bingo da biodiversidade, o Ciclo da Vida, Calendosfera e Animais em


extinção e plantas em perigo de extinção também trazem para o visitante questões de
cunho ambiental. O Ciclo da Vida e as Animais em extinção e plantas em perigo de
extinção são aparatos interativos do tipo push button e o Bingo da biodiversidade é um
jogo – mas que também possui respostas fechadas – e a Calendosfera, uma projeção.
Diferentemente dos outros elementos já discutidos, esses têm como principal objetivo
apresentar a diversidade da fauna e da flora para os visitantes, tangenciando a questão
da preservação:

Como nós temos espaço que é muito visitado, se a gente pode auxiliar com
alguma coisa que chame a atenção do público, que possa ajudar a comunidade,
a gente pega esse enfoque então, pode então pegar várias, como o Bingo da
biodiversidade. O que se consegue com aquilo: tentar passar para o visitante de
uma maneira mínima, mínima, mas para que ele conheça a diversidade tanto de
flora quanto de fauna, então são objetivos que a gente tem. (Entrevistada MCT).

De acordo com a fala da entrevistada, essas escolhas museográficas apostam na


idéia de que, a partir da interação com esses aparatos, os visitantes sejam despertados
para a questão da importância da preservação ambiental de uma “maneira mínima”, sem
a necessidade de um discurso textual.

Na área expositiva Nossa água, nossa vida também foi possível identificar a
presença do atributo questões de cunho ambiental. Essa evidência pode ser identificada
no texto de abertura da maquete do lago Guaíba:
112

Porém, muito mais do que isso, pretende chamar a sua atenção para a
importância de preservar tais recursos e garantir que eles também estejam à
disposição das próximas gerações. (Trecho da maquete do lago Guaíba, Nossa
água, nossa vida, MCT).

E em algumas frases dos biombos, do Espaço da Água:

Esgoto não tratado = meio ambiente doente.


Se as coisas continuarem assim, em breve terminará a água potável do mundo.
(Trecho dos painéis, Nossa água, nossa vida, MCT).

A intenção de mostrar não só a existência do lago Guaíba no Rio Grande do Sul,


mas, além disso, de trazer para o visitante a importância dos recursos hídricos e como
funciona o sistema de abastecimento e tratamento da água, é destacada na fala da
entrevistada:

Nossa água, nossa vida, porque não ficaria só aqui mostrando aqui em Porto
Alegre o nosso lago Guaíba, chamar a atenção pra essa parte, onde é captada
nossa água, onde tem estações de tratamento de água aqui, tratamento de
esgoto, isso aí nosso público não sabe. Muitas pessoas que vêm aqui não sabem.
Então essa é uma maneira de alertar a população. Deixar claro de onde vem a
água que está utilizando, como é tratada, quais são os pontos. (Entrevistada
MCT).

Como pode ser visto nos trechos destacados, na exposição Educação Ambiental,
com recorrência, o discurso é construído numa perspectiva de alerta. Em alguns textos
essa perspectiva é construída dirigindo o discurso para o próprio visitante. Um exemplo
dessa abordagem pode ser visto no trecho de instrução do experimento O Planeta em
Alerta:

O experimento apresenta diversas paisagens e situações que têm o Planeta Terra


como cenário. (...) Cabe a cada um de nós refletir sobre a continuidade que
daremos para essa história. (Trecho do painel de instruções O Planeta em
Alerta, Educação Ambiental, MCT).

Essa perspectiva também pode ser identificada no texto de um dos painéis do


Espaço da Água:
113

Se as coisas continuarem assim, em breve terminará a água potável do mundo.


Você sabe quem pode mudar essa história de terror? (Confira a resposta
levantando o pano ao lado54) (Trecho do painel E se as coisas continuarem
assim?, do Espaço da Água, MCT).

Essa maneira de construção do discurso mostra alguma intenção de incluir o


visitante no debate, e mostrar que ele pode contribuir para a preservação ambiental. A
identificação de apenas esse indício não é suficiente para considerar a presença do
atributo estímulo à participação do público, mas mostra alguma preocupação em
mostrar que o público é um agente da interação sociedade-meio ambiente. Para que o
atributo estivesse presente, precisaria haver na exposição algum local para que o
visitante se colocasse em relação a essas questões, alguma maneira para que pudesse
expressar sua opinião.

Algumas mensagens presentes nos textos dos elementos expositivos enunciam


questões complexas sobre as interações CTS, como: “Indústria consciente faz
reflorestamento” ou “As ações militares são o mais rápido destruidor do meio
ambiente”. Talvez pela opção de utilizar poucos textos e textos de linguagem simples,
essas questões não sejam aprofundadas e fiquem somente como mensagens, ou questões
para reflexão. Essa escolha – apoiada na idéia de que o visitante não lê textos longos – é
confirmada pela entrevistada nos trechos abaixo:

De cada experimento, então a gente já sabe o que quer. Então no momento em


que a gente idealiza já sabe o que a gente quer... uma linguagem muito... não se
pode desenvolver muito, porque, porque o museu é como lançar uma idéia para
o visitante. Então o texto tem que ser bem, pro nosso público... o visitante nem
lê. Tem que ser bem objetivo, com linguagem... então no momento que a gente
idealiza... dá toda a explicação. Aí tu prepara um texto simples, vai. Isso aí não
é um texto só, isso aí a gente trabalha muito. Mas é também a parte mais
complicada... (Entrevistada MCT).

E continua:

Então, depois de toda essa análise e de uma linguagem simples, tudo, tu também
tem que ver a linguagem popular. Não dá pra deixar um texto muito científico.

54
Embaixo do pano referido no texto, existe um espelho para que o visitante se veja.
114

Tu tem que transformar, e isso aí nós temos também ajuda do... da programação
visual que são jovens, que também têm certas expressões assim... (...) Então tem
que procurar no museu que ele se comunique com o público. Então como vai vir
um público jovem, às vezes tu vê uma linguagem bem simples, bem atrativa
(...). Eles [os textos] têm que se tornar um auxiliar nesse processo todo, não
podem explicar tudo. (Entrevistada MCT).

Os textos nos museus são objeto de algumas publicações, como manuais que
auxiliam na sua construção adequada a esses espaços (EKRAV55, 1999 apud CHELINI,
2006) e de pesquisas sobre sua elaboração e uso pelos visitantes (CHELINI, 2006;
MARANDINO, 2001; MCMANUS, 2000). Muitos autores indicam que os textos nos
museus devem ser curtos e objetivos, já que o público em geral, apesar de ler, não
despende muito tempo em pé exercendo essa atividade. E essa foi claramente a linha
adotada pelos elaboradores da exposição do MCT. Na Educação Ambiental os textos
têm muito mais a função de dar instruções ao visitante e auxiliar na ‘leitura’ dos objetos
interativos do que ser informativos.

A recorrência de aparatos interativos do tipo push button ou hands-on, que


associa uma ação a uma resposta fechada, reflete uma escolha museográfica específica.
A aposta na interatividade como principal canal de comunicação com o público,
característica de uma geração de museus, é reconhecida pela coordenadora da
exposição:

Então começamos a fazer o projeto da nova área de exposição nesta linha de


interatividade porque já no mundo, nas últimas décadas, já começaram também
a pairar as novas linhas de experimentos interativos, com a participação, a
interatividade. A maior participação do visitante. Então isso foi em oitenta e...
como eu tenho dito, várias viagens para conhecer como é, o que era isso, o que
era essa nova forma de expor. (Entrevistada MCT).

Essas duas escolhas – poucos textos, de linguagem simples, e um grande número


de aparatos interativos – podem, de acordo com Macdonald e Silverstone (1992),

55
EKRAV, M. Combating Redundancy: Writing Texts for Exhibitions. In: HOOPER-GREENHILL, E.
(Ed.). The Educational Role of the Museum. 2. ed. Londres e Nova York: Routledge, 1999. p.
201-204.
115

dificultar a inserção de temas polêmicos e controversos nas exposições dos museus de


ciências. Afirmam que, na intenção de facilitar a compreensão dos fenômenos e
conceitos da ciência pelo público, os museus acabam justamente por adotar estratégias
como simplificação dos textos e adoção de um grande número de experimentos
interativos que poderiam restringir a exploração de temáticas mais complexas.

Apesar de ser um dos alicerces da própria proposta museográfica do MCT, o


grande número de aparatos interativos do tipo push button ou hands-on é também
questionado pela própria coordenadora da exposição. No trecho a seguir, a entrevistada
fala sobre a dificuldade de escapar desse formato de interatividade fechada em uma
exposição de biologia56:

Luta muito até transformar em experimentos. Que o visitante chega ali e


entenda, consiga visualizar, entender. Tanto a parte de experimentos, a parte de
biologia é muito difícil... Física, matemática, tecnologia é também difícil fazer...
por isso que na exposição tu vai encontrar muitos botões. Então tu tem que fugir
daquele aperte o botão. Então a física é mais fácil do que a biologia. Na biologia
tu tem que dar um... tentar bastante para transformar aquele conteúdo em
alguma coisa mais de... como vou te dizer... mais que o visitante entenda
facilmente... é bem mais difícil. (Entrevistada MCT).

Apesar dessa fala, fica evidente que, na exposição Educação Ambiental, os


aparatos interativos do tipo push button se sobrepõem a outras formas possíveis de
interatividade. No entanto, vale destacar que alguns elementos expositivos que
valorizam a realidade local estão de alguma forma trazendo a dimensão da
interatividade cultural (WAGENSBERG, 2005).

Indícios da interatividade cultural podem ser identificados nos aparatos Ciclos


da Vida, Animais em extinção e plantas em perigo de extinção e na maquete do Lago
Guaíba. Ciclos da Vida traz, em seu cenário, duas fotos de Porto Alegre e região;
Animais em extinção e plantas em perigo de extinção fazem o recorte das plantas e
animais da Região Sul do Brasil; e a maquete do lago Guaíba escolhe justamente um
ecossistema de grande relevância local.

56
No caso, a entrevistada está incluindo a exposição Educação Ambiental como pertencente à grande área
da biologia.
116

Apesar de não ter sido definido nenhum atributo que exclusivamente trate da
valorização do contexto local, essa é uma dimensão que permeia os alicerces da
educação com enfoque CTS e que, por isso, merece ser destacado. A valorização do
contexto local pode inclusive aproximar o visitante das questões apresentadas no
museu, e contribuir para que ele se sinta parte integrante das relações CTSA.

De acordo com esta análise foi possível verificar a presença do atributo Questões
de cunho ambiental em diversos elementos da exposição Educação Ambiental e,
portanto, classificá-la como uma exposição CTSA. No entanto, não foram encontrados
elementos capazes de atribuir-lhe qualquer outro atributo CTS. Não foram identificadas
evidências em qualquer dos elementos que caracterizassem um atributo de cunho
internalista, nem histórico ou filosófico.

A predominância de atributos externalistas pode estar relacionada à própria


temática tratada pela exposição. As questões de cunho ambiental suscitam discussões
mais intervencionistas, tanto do ponto de vista de que o desenvolvimento científico e
tecnológico traz conseqüências para o meio ambiente, quanto que a conscientização do
homem em relação a essa deterioração pode interromper ou suavizar esse processo.
Tanto em um caso quanto em outro, não se está colocando em xeque a lógica de
estruturação do conhecimento científico e tecnológico, mas sim alertando para as
conseqüências do uso inadequado ou irresponsável dos recursos naturais pela nossa
sociedade tecnológica, ou seja, debates de cunho externalista.

5.1.2 Reprodução e genética, de Mendel à Dolly

A área expositiva Reprodução e genética do Espaço Biodescoberta do Museu da


Vida foi considerada uma exposição CTS por trazer questões relacionadas a diversos
atributos CTS, nos três âmbitos, debates externos, debates internos, e debates históricos
e filosóficos.

A parte da exposição referente a Reprodução está dividida basicamente em dois


enfoques: um bastante informativo, sobre sistemas reprodutores em diversas espécies
animais e vegetais; e outro que traz uma dimensão histórica do tema. O texto do painel
117

A reprodução sempre foi um tema instigante mostra o processo de construção da idéia


de reprodução ao longo do tempo, contextualizando a explicação em cada época, até
chegar à compreensão que temos hoje sobre o tema. Encontramos também, nesse painel,
uma referência à controvérsia em relação à compreensão do conceito de reprodução em
diferentes momentos da história. Portanto, como pode ser visto nos trechos a seguir, os
dois atributos, questões controversas e dimensão histórica se sobrepõem:

Entre os séculos XV e XVII era comum a idéia de que o sêmen tinha uma
característica não material (força vital) responsável pela fecundação.
(...) No séc. XIX, com o desenvolvimento da teoria celular e o aperfeiçoamento
da ótica, o conhecimento sobre a fecundação se ampliou e possibilitou a
compreensão dos espermatozóides e óvulos como células reprodutivas
especializadas.
(...) O conceito atual de fecundação está fundamentado na união das células
reprodutivas do macho – os espermatozóides – com as da fêmea – os óvulos.
(Trechos do painel A reprodução sempre foi um tema instigante, Museu da
Vida).

Nos dois trechos seguintes, podemos verificar a referência explícita à existência


de controvérsias ao longo do tempo, em torno desse tema:

Desde a Antiguidade, a busca de compreensão sobre os mecanismos de


reprodução gerou intensas controvérsias relacionadas ao papel de cada um dos
pais no processo de surgimento de uma nova vida.
(...) No início do século XVIII, as controvérsias sobre a reprodução giravam em
torno de duas grandes teorias. (Trechos do painel A reprodução sempre foi um
tema instigante, Museu da Vida).

Essa intenção de trazer diferentes idéias sobre o mesmo tema é confirmada por
um dos artigos publicados sobre a concepção do Espaço Biodescoberta:

A apresentação do processo de construção histórica dos conteúdos selecionados


é a segunda marca deste espaço. Nos voltamos para o passado para procurar
compreender o surgimento da dinâmica dos conhecimentos apresentados. Este
procedimento objetiva mostrar a ciência como uma produção social.
(GRUZMAN; TEIXEIRA, 1999, p. 383).

E continua:
118

(...) ou seja, evitamos uma representação acrítica da ciência que veja os


cientistas como um grupo especializado em pensar corretamente e chegar à
descoberta de novas verdades; indivíduos portadores de uma inteligência fora
do comum a serviço do progresso do conhecimento. Evitamos também mostrar
os processos envolvidos na produção científica, como um caminho puramente
racional e experimental, afastado de qualquer possibilidade de contaminação
pela subjetividade. (Ibid., p. 383).

Por mais que seja em cima de um episódio de ciência-acabada (DURANT, 2004)


– aquela ciência que já deixou de ser debatida pelos cientistas –, ao trazer essa
controvérsia histórica, a exposição está apresentando a ciência como processo, atingindo
um dos objetivos levantados por Gruzman e Teixeira (1999). Mas vale destacar que uma
controvérsia científica histórica não aborda necessariamente uma controvérsia do ponto
de vista do público. Com os elementos que temos disponíveis, não podemos saber se o
público encara essa controvérsia histórica sobre a reprodução como algo que lhe toca
especialmente, como algo com que se sente incomodado ou envolvido.

Na parte da exposição dedicada à Genética, o painel Código da Vida traz


evidências da presença do atributo resolução de problemas sociais, práticos e
cotidianos, quando afirma que a engenharia genética possibilita melhoria para a
agropecuária e para a saúde:

A engenharia genética vem sendo muito utilizada na melhoria de animais e


vegetais de importância agropecuária com o objetivo, por exemplo, de aumentar
a resistência de plantas a doenças e pragas ou produzir animais com mais carne
e menor teor de gordura. Estas técnicas também são aplicadas na produção de
medicamentos. (Trecho do painel Código da Vida, Museu da Vida).

O trecho seguinte, do mesmo painel, mescla o atributo resolução de problemas


sociais práticos e cotidianos e o atributo impacto social do desenvolvimento de C&T.
Faz isso ao lembrar que a clonagem pode aumentar a produção de alimentos e ajudar no
controle de experimentos, e ao falar da possibilidade de redução da biodiversidade e
temores em relação a uma possível melhoria ou purificação da raça humana:

A possibilidade de clonagem de animais trouxe apreensões à sociedade. Por um


lado, ela pode ser de grande importância prática em diversos setores, como no
aumento da produção de alimentos e no controle de experimentos a partir da
119

criação de uma população de cobaias com as mesmas características. Por outro


lado, reduz a biodiversidade e provoca temores quanto a este conhecimento ser
utilizado para uma pretensa melhoria ou purificação da raça humana. (Trecho
do painel Código da Vida, Museu da Vida).

Além disso, colocar diferentes pontos de vista sobre a questão evidencia a


intenção de mostrar a existência de uma controvérsia em torno do tema e, portanto,
podemos considerar também a presença do atributo questões controversas.

No último trecho desse painel, encontramos uma referência explícita à


negociação entre ciência, tecnologia e sociedade para o estabelecimento de normas e
diretrizes de pesquisa e desenvolvimento, levantando a dimensão ética em torno do
tema:

Discute-se hoje a ética e os limites da manipulação genética de seres vivos,


principalmente no que se refere aos riscos à saúde da humanidade e ao meio
ambiente. Regras para o controle destas experiências vêm sendo estabelecidas
pela sociedade em conjunto com a comunidade científica. (Trecho do painel
Código da Vida, Museu da Vida).

No trecho seguinte, a entrevistada comenta sobre a inserção do debate sobre


clonagem na exposição:

Na época, quando a gente estava fazendo essa próxima sala, apareceu a Dolly e
a gente teve que, de algum jeito... já estava quase pronto o painel e a gente teve
que encaixar o tema. Na exposição Vida, a gente falava sobre a discussão da
clonagem, o que seria a identidade do indivíduo, o que é vida e falava de
genética aí. (Entrevistada MV).

Essa fala mostra como a construção da exposição – por uma opção das pessoas
envolvidas com a elaboração – foi determinada também pela agenda científica do
momento. Os conteúdos não estavam restritos somente àqueles já cristalizados e aceitos
pela comunidade científica e pela sociedade, existia uma preocupação em trazer para a
exposição discussões atuais e polêmicas. A exposição, inaugurada em 1999, começou a
ser desenvolvida justamente no momento ápice das discussões sobre clonagem em
decorrência do nascimento da ovelha Dolly em 1996. Interessante notar que, ao trazer o
120

tema para a exposição, o discurso é construído de forma a mostrar possíveis benefícios e


também possíveis malefícios da nova técnica:

A possibilidade de clonagem de animais trouxe apreensões à sociedade. Por um


lado, ela pode ser de grande importância prática em diversos setores, como no
aumento da produção de alimentos e no controle de experimentos a partir da
criação de uma população de cobaias com as mesmas características. Por outro
lado, reduz a biodiversidade e provoca temores quanto a este conhecimento ser
utilizado para uma pretensa melhoria ou purificação da raça humana. (Trecho
extraído do painel Código da Vida, Museu da Vida).

Além de expressar que existem diferentes pontos de vista sobre a questão, a


exposição poderia dar espaço para que os visitantes se colocassem em relação a ela,
contemplando assim sua dimensão dialógica. A potencialidade de temas controversos é
destacada por Mazda (2004), quando afirma que os museus têm usado esses temas
como uma maneira de envolver o público em assuntos de ciência e tecnologia, ou seja,
promovendo o diálogo nesses espaços.

Ainda sobre o painel Código da Vida, a utilização da simples expressão “e sua


equipe”, quando se refere a Thomas Hunt Morgan e os cromossomos da mosca da
banana, demonstra uma preocupação – mesmo que de maneira muito pontual – em
expor o trabalho coletivo da ciência:

A partir de 1910, o biólogo americano Thomas Hunt Morgan (1866-1945) e sua


equipe, estudando os cromossomos da mosca da banana Droshophila
melanogaster, comprovam que eles transportam informações genéticas. (Trecho
extraído do painel Código da Vida, Museu da Vida).

Nos dois painéis, A reprodução sempre foi um tema instigante e Código da Vida,
são feitas referências a diversos cientistas desde Hipócrates e Platão passando por
Harvey, Buffon, Herting, Mendel, Watson e Crick, até Wilmut – criador da ovelha
Dolly –, mas eles não são contextualizados além de seus feitos e datas.

Platão (428-384 a.C.) afirmava que o macho carregava no sêmen um novo ser.
(...) Para o médico inglês Willian Harvey (1578-1657), as sementes masculina e
feminina tinham um importante papel na formação dos novos indivíduos.
(Trechos do painel A reprodução sempre foi um tema instigante, Museu da Vida).
121

Mendel concluiu que a transmissão dos fatores herdados era o resultado do


cruzamento de pares de fatores específicos (mais tarde chamados genes) que
controlam cada uma das características.
(...) A estrutura foi descoberta em 1953 pelo biólogo americano James Watson
(1928-) e pelo bioquímico inglês Francis Crick (1916-). (Trechos do painel
Código da Vida, Museu da Vida).

De acordo com a definição estabelecida para o atributo características pessoais


dos cientistas, o simples fato de fazer referências aos cientistas não acarretaria a
presença deste atributo. A presença de um debate interno desta natureza seria
identificada se fossem explorados os contextos socioculturais dos cientistas.
Interessante notar que, apesar de não estar evidente nos textos, a intenção de
contextualizar os cientistas aparece na fala da entrevistada:

A gente conversou muito entre nós, a gente teve várias discussões, sobre o
momento do cientista, a época em que ele vive, como ele interpreta o que ele vê,
mesmo que ele não esteja vendo o muco do espermatozóide, porque é assim,
olhar no microscópio, olhar para o espermatozóide e ver o Homem, tá cheio de
homem lá dentro, cheio de portas abertas [risos] então, tem várias
representações assim, sobre reprodução... (Entrevistada MV).

Essa intenção pode ser identificada apenas no caso de Buffon, no qual existe
uma tímida referência ao fato de ele pertencer a uma corrente de pensamento –
epigenista – e não ser um pensador isolado sobre o tema:

Para o epigenista Buffon, macho e fêmea possuíam em seus líquidos seminais


“receitas de fabricação” enviadas por cada parte do corpo. (Trecho do painel A
reprodução sempre foi um tema instigante, Museu da Vida).

Vale destacar que a maior parte dos atributos foi identificada nos painéis da
exposição, concentrados em A reprodução sempre foi um tema instigante e Código da
Vida. A consciência sobre a necessidade do uso de uma grande quantidade de textos
para se comunicar com o visitante fica evidente na fala da entrevistada:

E a sala que é mais pesada, que se eu pudesse mudaria, mas eu não sei como
mudaria, porque é muito pesado o texto (...) pra mim é a sala que tem mais peso
de texto, mas por causa dessa situação, pra mim é assim, “então reprodução
assexuada do tipo brotamento é isso?”, aí a gente dizia, “mas, tem exceção” não
122

existe um texto de biologia que você diga que é sempre assim, não, tem sempre
exceções. Você vai descrever uma determinada espécie, faz uma frase lá, com
exceção... E isso prova o quê? A biodiversidade. (Entrevistada MV).

Contrariando a tendência apresentada pelos manuais de elaboração de textos nos


museus (EKRAV, 1999 apud CHELINI, 2006), nesta exposição os textos são elementos
centrais e juntamente com os infográficos são a principal fonte de informação para o
público. Sem dúvida, se, por um lado, essa escolha possibilita trazer à tona questões
mais complexas acerca do desenvolvimento da C&T, por outro, deixa de explorar
inúmeras outras formas de interação e envolvimento do público.

Como pode ser visto na análise, a área expositiva Reprodução e genética traz
evidências de vários atributos CTS. Apesar de estarem mais concentrados no conjunto
dos debates externos – resolução de problemas, impacto social, dimensão ética e
controvérsia –, foi possível identificar atributos dos três conjuntos: externo, interno –
característica pessoal dos cientistas, coletivização do trabalho científico –, e histórico e
filosófico – dimensão histórica. Os atributos do conjunto dos debates sociais externos
aparecem mais na parte da exposição dedicada à Genética, enquanto que os atributos
mais relacionados aos debates internos e histórico-filosóficos são mais bem
identificados na parte dedicada à Reprodução.

A presença de atributos de cunho internalista, histórico e filosófico pode estar


relacionada ao compromisso institucional com a história da ciência. Vale lembrar que o
Museu da Vida está vinculado à Casa de Oswaldo Cruz, um centro de referência em
pesquisa sobre história da ciência, que tem como principais objetivos a preservação da
memória da Fiocruz e atividades de pesquisa, ensino, documentação e divulgação da
história da saúde pública e das ciências biomédicas no Brasil.

Outro ponto que deve ser levado em consideração é como a escolha do tema
pode favorecer ou dificultar a emersão de determinados atributos CTS. Sabemos que as
incertezas em relação ao avanço científico e tecnológico são mais evidentes durante o
processo de construção de um fato científico (RESTREPO, 2007) e que a engenharia
genética é sem dúvida um assunto que está dentro dessa categoria. Por esse motivo a
escolha da temática pode influenciar a inserção dessas questões no discurso da
exposição. É claro que a referência, ou não, a essas polêmicas – tanto históricas quanto
123

atuais – faz parte da escolha dos elaboradores, mas sabemos que esse assunto faz parte
de um conjunto de temas que a priori propiciam mais discussões dessa natureza do que
outros.

Na apresentação sobre uma possível quarta geração de museus, Cazelli et al.


(2002) destacam o papel de se trabalhar com temas atuais ou polêmicos para dar conta
de uma abordagem social e cultural da ciência e da tecnologia:

Uma terceira dimensão presente nas exposições contemporâneas é a abordagem


social e cultural da ciência e da tecnologia. Exemplos são aquelas apoiadas em
temáticas atuais e/ou polêmicas, entendidas como as que na maioria das vezes,
não se constituem em conhecimento estável, estão presentes na mídia e geram
debates por causarem repercussões positivas e negativas em diferentes áreas
(...). (CAZELLI et al., 2002, p. 217).

Da mesma forma como apresentado por Mazda (2004) para temas controversos,
para Durant (2004), a apresentação da ciência em desenvolvimento também tem a
potencialidade de envolver seus visitantes de uma nova maneira. De acordo com o
autor, ao abordar o processo da ciência, o visitante não deveria ser encarado como um
simples espectador, o museu deveria contemplar um espaço para que ele se colocasse e
opinasse sobre esse processo, ou seja, abrir espaço para um diálogo na exposição57.

5.1.3 Os Ciclos Biogeoquímicos e o Meio Ambiente, os problemas ambientais


causados pela interferência da humanidade

A área expositiva Os Ciclos Biogeoquímicos e o Meio Ambiente da exposição O


Planeta Terra e a preservação ambiental da Estação Ciência se enquadra como uma
exposição CTSA, por trazer, em seus elementos expositivos, alguns atributos CTS,
principalmente aquele relacionado a Questões de cunho ambiental.

57
Apesar de na área expositiva da Reprodução e genética existir uma atividade mediada na qual são
discutidas as questões de reprodução sexuada e assexuada por meio da observação do sistema reprodutor
das samambaias e de outras plantas, neste trabalho não estão sendo considerados, para análises, interações
e debates promovidos via atividade mediada.
124

O painel Camada de Ozônio, presente na exposição, faz diversas referências


explícitas às conseqüências do buraco na camada de ozônio para a sociedade e para o
meio ambiente, mesclando os atributos Impacto social do desenvolvimento de C&T e
Questões de cunho ambiental:

Algumas substâncias produzidas pela atividade humana como os gases CFCs


(inventados em 1928, a partir de então, muito utilizados em geladeiras,
condicionadores de ar, sistemas de refrigeração, isolantes térmicos, como
propelentes em aerossóis e na produção de plásticos) vêm destruindo essa
camada protetora.
(...) Nos seres humanos, a exposição a longo prazo ao UV-B está associada
ao risco de danos à visão e ao sistema imunológico e ao desenvolvimento
do câncer de pele. Os animais também sofrem as conseqüências com o aumento
do UV-B. Os raios ultravioletas prejudicam os estágios iniciais do
desenvolvimento de peixes, camarões, caranguejos, e outras formas de vida
aquática.
(...) Nesse caso o ozônio (O3) é considerado um poluente, pois causa prejuízos à
saúde como diminuição da capacidade pulmonar e irritação nos olhos e vias
respiratórias. A exposição a altas concentrações pode resultar em sensações de
aperto no peito, tosse e chiado na respiração. Também pode causar danos à
vegetação. (Trechos do painel Camada de Ozônio, Estação Ciência).

Como pode ser visto nos trechos abaixo, o painel Efeito estufa também faz
referência ao atributo Questões de cunho ambiental, ao enfatizar as conseqüências
ambientais do aquecimento global:

As mudanças do clima da Terra estão relacionadas à ação do ser humano, que


polui a atmosfera, devasta florestas e contamina os oceanos, entre outros danos
ao ambiente.
(...) Contudo, a queima de combustíveis fósseis pelo homem produz muito gás
carbônico (CO2), entre outros, aquecendo ainda mais a atmosfera.
(...) O aumento constante de dióxido de carbono na atmosfera está comprovado
a partir de ampolas contendo amostras de ar coletados desde o século XX em
muitos locais, incluindo o Pólo Sul e o Ártico.
(...) Com o derretimento das geleiras, o volume de água doce pode causar outras
conseqüências como mudanças na temperatura e salinidade dos oceanos, além
125

dos padrões de circulação de ar na atmosfera e das correntes marítimas.


(Trechos do painel Efeito estufa, Estação Ciência).

O entrevistado da Estação Ciência fala sobre a intenção de colocar esse debate


não só nos textos da exposição, mas também por meio de um ambiente de imersão. No
entanto, essa idéia acabou não se concretizando por receio do perigo que um ambiente
desses poderia representar para o visitante:

E, na verdade, nós queríamos fazer uma série de coisas que não conseguimos,
como a questão do efeito estufa, mostrar de uma forma clara o que é o efeito
estufa. É um equipamento que ainda estamos tentando desenvolver, em que se
tenha a sensação do que é o efeito estufa. Por motivos até de riscos de
queimadura, seguramos o equipamento para não colocar em risco o público.
Mostrar de forma mais clara o que é uma estufa, monóxido de carbono e os
efeitos que isso tem. (Entrevistado EC).

O painel comparativo entre a atmosfera da Terra e de Vênus faz uma breve


menção às mesmas conseqüências levantadas no painel Efeito estufa e, por isso,
caracterizando mais uma identificação do atributo Questões de cunho ambiental:

Evidências do aumento da temperatura na Terra são claras, causado pela queima


de petróleo, gás e carvão, entre outros fatores, lançando mais dióxido de
carbono (CO2) na atmosfera, aquecendo a superfície e descongelando
gradativamente as calotas polares. (Trecho do painel Modelo Comparativo
Terra Vênus, Estação Ciência).

Interessante destacar que, neste trecho, assim como no trecho do painel Efeito
estufa, o aquecimento global é colocado como um fato. Em nenhum destes textos é
levantada a controvérsia existente ao redor do tema, tampouco mencionada a divulgação
do relatório do IPCC58 que ocorreu em 2007 – mesmo ano da inauguração da exposição.
A opção por não mencionar o IPCC é justificada na fala do entrevistado para não datar a
exposição:

Na verdade, uma coisa que evitamos, tanto nesta exposição como nas outras,
inclusive nós fizemos um vídeo e eu achei muito engraçado, porque não aparece

58
Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), site institucional disponível em:
<http://www.ipcc.ch/>. Acesso em outubro de 2008.
126

o diretor [da Estação Ciência] no vídeo, a idéia era não datar as coisas para que
tivesse uma durabilidade maior. E era um tema [o aquecimento global] que já
estava fervendo, nós já tínhamos feito umas duas ou três exposições sobre esse
tema aqui na Estação. É um tema que ia estourar a qualquer momento, e este
ano foi o ano do planeta Terra. (Entrevistado EC).

No painel Fontes de contaminação do Aqüífero Guarani também podemos


identificar evidências do atributo Questões de cunho ambiental ao problematizar as
conseqüências ambientais da deposição incorreta de resíduos da rede de esgoto, da
aplicação de fertilizantes e agrotóxicos em áreas agrícolas, e da atividade industrial:

Aplicação de fertilizantes e agrotóxicos em área agrícola: o comportamento


pouco conhecido dos agrotóxicos em subsuperfície, associado a sua ampla
aplicação, faz da atividade agrícola uma das mais difíceis de serem avaliadas
em termos de riscos para a contaminação da água.
(...) Atividade industrial: a contaminação dos aqüíferos ocorre quando efluentes
líquidos gasosos e resíduos sólidos são depositados incorretamente. Uma prática
comum é a utilização das lagoas para a estocagem de efluentes industriais que
necessitam de isolamento e controle. (Trechos extraídos do painel Fontes de
contaminação do Aqüífero Guarani, Estação Ciência).

Também foi possível identificar o atributo Questões de cunho ambiental no


aparato interativo O uso da água. O aparato estimula uma reflexão crítica sobre o gasto
e consumo de água das pessoas ao fazerem tarefas cotidianas como tomar banho, lavar
louça ou dar descarga. No trecho abaixo, o entrevistado conta sobre o desafio de se
elaborar um aparato interativo dessa natureza:

Pensamos muito em como representar os 200 litros de água. No fim, chegamos


à conclusão de que as pessoas não conseguiam quantificar isso: o que são 200
litros de água? O que são 100 litros de água? O que são 50 litros de água? E, um
dia, na sala do Wilson, de repente, surgiu a idéia. Quando colocamos as garrafas
de refrigerante lá, elas entenderam tudo. Deu uma força tão grande à exposição.
Um equipamento dentro de uma exposição é tudo. Se você põe um painel,
um livro, eles não funcionam. O texto é para se ler em casa, sentado,
confortavelmente, com uma boa luz e tomando um chazinho. Uma exposição
tem que ter uma coisa mais atrativa que o texto. Trabalhar com garrafas e com
luz criou uma empatia com o público. Por exemplo, se você põe um grupo com
127

40 crianças, todas as crianças querem apertar os botões e ver as luzes acender e


todas elas ficam contando as garrafas. A luz é atraente e a garrafa é algo que ela
conhece de longe; eu sei o que é uma garrafa, eu sei quanto cabe lá dentro,
então é muito mais fácil fazer a matemática. Você tirou a palavra litros e
colocou a palavra garrafas de refrigerante. Então ficou fácil do público
compreender. Acho que o equipamento foi uma grande sacada por falar muita
coisa em um espaço muito pequeno. (Entrevistado EC).

Interessante notar que, nesta fala, o entrevistado valoriza o fato de ter um


equipamento59 para comunicar uma idéia ou um conceito, num museu. A mesma
valorização pode ser percebida na fala sobre a tentativa de criar um ambiente que
simulasse a sensação causada pelo efeito estufa. No entanto, se retomarmos a descrição
dessa exposição, vamos perceber que ela possui poucos aparatos interativos, e sua
mensagem acaba sendo transmitida majoritariamente por painéis textuais. Essa aparente
contradição pode estar relacionada à dificuldade em transpor mensagens de natureza
mais complexa para elementos expositivos interativos

Vale ressaltar, no entanto, que aparatos interativos podem, ou não, estimular a


participação ativa dos visitantes. Ou seja, a existência de aparatos interativos não leva
necessariamente à existência do atributo Estímulo à participação do público na
perspectiva CTS. Para que isso ocorra, seria preciso que o aparato estimulasse o
visitante a se colocar ante uma questão, ou que estimulasse uma reflexão crítica sobre
determinado assunto. Aparatos que estimulam a interatividade do tipo minds-on e
hearts-on podem cumprir melhor esse papel do que aqueles que estimulam apenas uma
interatividade hands-on.

O atributo Questões de cunho ambiental também pode ser identificado no painel


O Ciclo da Água. Em dois momentos no texto é feita uma breve menção ao fato de que
o uso inadequado do solo pode levar à contaminação da água e do próprio solo:

Com o processo de seca e desmatamento, milhares de hectares de terra podem


se transformar em desertos ao longo do tempo.

(...) O transporte pela chuva de solos com agrotóxicos e, muitas vezes, com
excesso de fertilizantes, pode contaminar a água superficial, o que pode causar a

59
Que entendemos aqui como um sinônimo para experimento ou aparato interativo.
128

eutrofização (excesso de nutrientes) em lagos e o desequilíbrio da flora e fauna


ambiental. (Trechos do painel O Ciclo da Água, Estação Ciência).

Apesar de não ser feita nenhuma referência às causas desse desmatamento, ou do


uso abusivo de agrotóxicos e fertilizantes, o trecho enfatiza o impacto desse abuso no
meio ambiente.

As três maquetes que mostram o processo de desertificação, devido ao uso


abusivo do solo, também trazem o atributo Questões de cunho ambiental. É interessante
notar que as maquetes trazem o debate de uma maneira não discursiva – uma vez que
não há painéis de texto ou legendas associados a elas. Cada uma representa uma etapa
do processo – situação inicial, assoreamento do rio e ambiente desertificado –
possibilitando que, por meio da observação, o visitante reflita sobre as conseqüências do
uso inadequado do solo.

A partir desta análise, podemos concluir que a área expositiva Os ciclos


Biogeoquímicos e o Meio Ambiente acaba por trazer apenas atributos do conjunto dos
debates sociais externos à ciência. Várias referências são feitas a Questões de cunho
ambiental e uma ou outra ao Impacto social do desenvolvimento C&T. Nesta exposição,
não foi identificada nenhuma referência aos atributos dos debates internos, tampouco
aos históricos e filosóficos. Como já foi colocado em relação à exposição Educação
Ambiental, essa restrição pode estar relacionada ao fato de a exposição ter a questão
ambiental como o principal eixo expositivo.

5.2 Sobre as ausências e as intenções

Devido ao desafio de encontrar exposições de cunho CTS no início deste


projeto, incluiu-se, no roteiro das entrevistas com os elaboradores de cada uma das
exposições, um bloco de perguntas que fizesse emergir explicações para a baixa
representatividade dessa categoria de exposições. Nesse bloco, os entrevistados foram
questionados sobre a presença ou ausência de exposições em museus de ciências, de um
modo geral, e não apenas em suas instituições, que abordassem temas da atualidade,
história da ciência e temas controversos e polêmicos. Esses tópicos foram escolhidos
129

por se mostrarem, de acordo com o referencial teórico utilizado, propícios a fazerem


emergir debates de natureza CTS.

Para Mazda (2004), os museus de ciências devem explorar temas polêmicos e


controversos por algumas razões. Primeiro, por ser parte constituinte de como a ciência
se desenvolve; segundo, porque, ao se deixar de fazer isso, está se propagando uma
visão simplista da ciência na qual as descobertas caminham em direção à última teoria;
e por último, porque a controvérsia é também uma maneira de inserir assuntos sociais e
conscientizar os visitantes sobre os ângulos políticos, econômicos e ambientais dos
debates científicos.

De acordo com Mazda (2004), quatro atributos caracterizam um assunto como


controverso ou polêmico: (1) o fato de envolver risco, e principalmente risco para a saúde
humana; (2) o fato de incluir uma dimensão moral ou ética; (3) assuntos sobre os quais as
pessoas se sentem impotentes; e, por último, (4) temas que têm relevância pessoal ou social.

Quando questionados sobre a presença de temas controversos ou polêmicos, os


entrevistados foram capazes de identificar alguns exemplos em suas exposições e
trouxeram elementos que valem ser discutidos nesta análise. Um dos aspectos que mais
chamou a atenção nas respostas dos entrevistados foi a incidência unânime do tema
‘evolução’ como principal exemplo de uma exposição polêmica ou controversa. De
acordo com os atributos de Mazda (2004), esse tema pode ser considerado de natureza
polêmica ou controversa por ter relevância pessoal ou social para os visitantes.

No trecho abaixo, a entrevistada do MCT esclarece a opção do museu em não


entrar em uma questão tão polêmica:

Nós falamos [sobre evolução], mas a gente tem que deixar, porque como é um
museu por mais assim... a gente não pode debater. No caso de exposição... a
gente tem que procurar, como é que eu vou te dizer... tornar um assunto assim
que dê... que o visitante... que fique em aberto, que estas questões polêmicas
fiquem em aberto, como é o que eu te falei agora: Evolução do Homem. Nós
temos que encontrar um caminho que deixe em aberto, que vai conseguir dali
tirar as conclusões, então são questões polêmicas que a gente não pode firmar
numa exposição. A gente tem que deixar a coisa em aberto. Nós não estamos ali
pra debater, né? (Entrevistada MCT).
130

Para esclarecer sua resposta, devemos reforçar que, no Museu de Ciências e


Tecnologia, o tema da evolução não aparece de forma explícita na exposição. Ele é
apresentado apenas em um mural ilustrativo na parte da exposição sobre biologia. Como
pode ser visto na imagem, esse mural traz imagens da fauna e da flora de diferentes
períodos que se mesclam a um ciclóide da Terra, sem deixar muito claro o que está
sendo exposto.

Figura 21: Painel que aborda o tema da evolução no Museu de Ciências e Tecnologia
da PUC/RS

Mintz (2005) afirma que algumas instituições evitam o tópico da evolução por
medo de ofender seus visitantes, e que nesse ponto a preocupação com marketing acaba
comprometendo a missão institucional. E, de acordo com a fala da entrevistada, a opção
por não explicitar o debate está justamente relacionada ao impacto (negativo) que isso
teria para o visitante.

Para contrapor a afirmação da entrevistada de que o museu não pode tomar


partido sobre uma questão como esta, vale trazer os dados de uma pesquisa realizada
131

por Cameron (2005), na qual investiga, do ponto de vista do público, o papel do museu
para apresentar, ou não, questões controversas. De acordo com seus dados, 60% dos
entrevistados concordam que os museus devem apresentar tabus e questões
controversas, enquanto 20% dos respondentes discordaram, dizendo que os museus são
locais para fornecer informações, histórias e documentos. Lugares para fatos, e não
opiniões. Para essas pessoas, aos museus cabe a divulgação depois que o assunto já
deixou de ser polêmico e já estiver consolidado, nas palavras de Durant (2004), um
local para ciência-acabada.

Na mesma pesquisa, de 70% a 80% dos entrevistados vêem os museus


justamente como lugares para desafiarem a maneira de pensar das pessoas. Para
Cameron (2005), entrar em contato com informação equilibrada, honesta e sem censura,
além de uma variedade balanceada de pontos de vista na tentativa de representar as
diferentes facetas de um assunto é uma maneira de desafiar o público.

A entrevistada do Museu da Vida também reconhece o tema ‘evolução’ como


um tema polêmico presente na exposição do Espaço Biodescoberta. Diferentemente da
postura da entrevistada do MCT, enfatiza que algumas vezes os monitores abordam em
suas falas o debate em torno da questão:

Evolução tinha que ter, a parte da evolução, o que você se pergunta: como é que
tem tanto bicho diferente no mundo? Não poderia para nós, e dentro da
discussão de Ciências, ser a resposta de que Deus botou um casal de cada
espécie, que todos eles vieram do nada, vieram do Éden. (...) Inclusive na
monitoria que a gente trabalha, deu muito certo e tal. Então o que é que a gente
faz? Com esse público que está em formação conosco, o que a gente trabalha?
Que essa é a visão da ciência, a visão da religião é uma, essa é a visão da
ciência. Se você quer se aproximar, quer estudar conosco, você tem que
entender qual é a visão da ciência, e sobre esse ponto de vista, é pra você ter
uma idéia, nesse sentido. (Entrevistada MV).

No Museu da Vida, a área expositiva dedicada ao tema da evolução, intitulada O


surgimento da diversidade: a evolução das espécies, é constituída por quatro painéis e
um vídeo. O primeiro painel tem como tema as perguntas ‘Como surgiram tantos seres
vivos?’ e ‘Será que eles se transformam com o tempo?’ O painel seguinte traz uma
132

seqüencia cronológica de explicações passando por Buffon, Lamarck, e também por


Charles Lyell na geologia. Os outros dois painéis falam de Darwin e da Teoria da Evolução.

Figura 22: Painel sobre Charles Darwin e a Teoria da Evolução

Em um dos textos de referência sobre a concepção do Espaço da Biodescoberta


(GRUZMAN; TEIXEIRA, 1999), também encontramos um trecho que marca a
consciência dos elaboradores sobre a capacidade de explorar a negociação de diferentes
saberes na ciência por meio do tema da evolução:

Para além desse objetivo mais geral, procuramos levar ao visitante a idéia de
que sob o epíteto de ciência agrupam-se um conjunto de campos disciplinares e
práticas materiais e cognitivas muito diferenciadas, tanto no que concerne aos
distintos campos dos saberes, como no que se refere aos mesmos campos em
diferentes momentos da história. Assim, ao se tratar da evolução, por exemplo,
mostramos que este mesmo campo abriga um conjunto de saberes diferenciados
133

que podem, em diferentes momentos, ter como base desde concepções


teológicas a práticas experimentais. (GRUZMAN; TEIXEIRA, 1999, p. 384).

Vale destacar que a fala da entrevistada e o trecho do artigo acima trazem


concepções um pouco diferentes acerca dessa questão. Na fala da entrevistada é
enaltecido que, por mais que existam diferentes maneiras de entender evolução e
diversificação das espécies, o museu traz em sua exposição a visão da ciência. Já no
trecho extraído do artigo de Gruzman e Teixeira (1999) é destacado o fato de a
exposição conseguir mostrar que existem diferentes saberes nesse campo. Essa
diferença é esclarecida quando entendemos que a controvérsia aparece na fala do
monitor e não nos textos da própria exposição. Ou seja, o museu reconhece a
potencialidade de explorar esse tema como um tema controverso, mas só o faz quando
julga pertinente.

Assim como os demais entrevistados, o entrevistado da Estação Ciência também


reconhece que o tema da evolução pode gerar um conflito entre a instituição e o
público:

Porque há uma questão que nos aflige e que deve afligir mais pessoas. Quando
falamos da origem da vida e da origem do universo, criamos uma polêmica que
eu considero a pior de todas, porque você tem uma visão religiosa que permeia
isso e que é ditatorial, na verdade. O monitor está explicando e as pessoas não
querem nem ouvir. Isso já aconteceu milhões de vezes. Essa é uma questão
muito complicada e temos de conseguir contornar isso. (Entrevistado EC).

O entrevistado afirma – sob a mesma ótica da entrevistada do Museu da Vida –


que, apesar de existirem diversas explicações para a origem da vida e do universo, o
museu deve apresentar a visão da ciência:

Você não vai conseguir convencer as pessoas que o universo nasceu do Big
Bang. As pessoas, no mínimo, têm de saber que a ciência pensa assim. Isso tem
de ser apresentado de qualquer maneira, não pode ser negligenciado. E de
qualquer maneira nossa posição é colocar o conhecimento científico em
detrimento de um conhecimento religioso. Essa é uma questão tão polêmica que
nós criamos um equipamento que é a corda em cima da rampa que a idéia era
mostrar que a origem do universo também é discutida por diversas culturas e
religiões desde os primórdios. Isso é uma necessidade, mesmo porque criamos
134

uma das maiores equipes de pesquisadores que tivemos na Estação para criar
aquilo porque tínhamos um problema e era muito sério. O problema de mostrar
que existem, dentro da cultura, várias explicações sobre a origem do universo,
mas existe uma explicação que é a visão da ciência. Nós não negamos as
explicações. A ciência estuda todas as visões da origem do universo.
(Entrevistado EC).

Apesar de essa controvérsia em torno do tema da evolução não ser uma


controvérsia do ponto de vista da ciência – uma vez que o conflito advém do embate
entre o campo da ciência e outros campos do conhecimento –, como pode ser visto nas
falas dos entrevistados, ela causa controvérsia do ponto de vista do público.

Diversos autores destacam que a potencialidade comunicacional de um tema


controverso em uma exposição está mais relacionada à sua capacidade de provocar
alguma sensação de risco, impotência ou relevância pessoal para o público do que o fato
de expor uma controvérsia do ponto de vista da própria ciência (MAZDA, 2004;
MCCONNELL, 1998). Uma exposição sobre evolução pode contemplar o atributo de
ter uma relevância social ou pessoal, e por isso as pessoas podem – dependendo de seus
valores – se sentir incomodadas e se envolverem emocionalmente com a exposição.
Para os defensores da potencialidade comunicacional das controvérsias, possibilitar um
maior envolvimento emocional do público é justamente uma das justificativas para sua
inserção (MCLAUGHLIN, 1998; PEDRETTI, 2004).

Fora o tema da evolução, mais outros dois exemplos são citados pelos
entrevistados como temas polêmicos ou controversos nas exposições. A entrevistada do
MCT levanta, como polêmicos, alguns aparatos que incomodam o público do ponto de
vista moral, como, por exemplo, a vitrine de fetos humanos e o diorama com um índio nu.

Veja a minha parte, eu sou muito aberta. Não tenho essa ‘nossa’ de esconder as
coisas. Então, como eu vou te dizer, pra nós não tem polêmica. A gente fica
sabendo que existe polêmica quando falam. Porque, senão, é uma coisa tão...
para nós não tem mistérios. Em outros museus, ‘Deus me livre’ colocar uma
coisa daquela ali. Polêmica sempre vai ter ali [se refere à vitrine dos fetos
humanos]. É um tabu. Porque eu acho que sou muito prática. Eu vejo a coisa de
uma outra maneira, um olhar científico. E deu tudo certo ali. Não houve
comunicação entre os pais, entre o médico que atendeu e entre o hospital, se o
135

pai queria ou não aquele feto, não houve isso. Ele foi entregue e se tornou uma
peça científica, por isso minha visão é essa. Então a partir dali ele virou uma
peça científica, ele perdeu o elo. Perdeu o elo com a família, com tudo. Porque
se tivesse tido essa comunicação entre a família, e a família proibisse seria outra
coisa, seria respeitado, mas naquele momento ele se tornou uma peça científica
para estudo. O mesmo no necrotério, o cadáver quando vai para estudo para os
alunos verem medicina, então é considerado outra coisa. (Entrevistada MCT).

A afirmação de que, apesar de serem polêmicas para o público, essas questões


não são polêmicas para o museu, mostra a aposta de que a neutralidade deve guiar o que
é exposto no museu. Vale lembrar que, de acordo com alguns autores (COOKS, 1998;
MAZDA, 2004), a neutralidade de uma exposição não está relacionada ao fato de as
pessoas acharem a exposição neutra, mas sim ao fato de um número próximo de pessoas
concordar ou discordar sobre determinada abordagem ou tema exposto.

O outro exemplo é citado pelo entrevistado da Estação Ciência que, em sua fala,
traz como polêmica uma exposição temporária sobre o desenvolvimento tecnológico:

Acho que em outras áreas tivemos várias exposições polêmicas, como questões
relativas ao aquecimento global, ou uma exposição que veio da França, há uns
dois anos, que questionava o ‘desenvolvimentismo’. Ela era gigantesca, com
dois contêineres, e ela colocava o desenvolvimento como uma coisa mitológica
e criava uma polêmica: O que é o desenvolvimento? Para que desenvolver? O
que sobra disso tudo? O que a tecnologia está fazendo para melhorar a vida do
ser humano e o que está fazendo só por fazer? Era uma exposição que super
criava, que super trazia essa polêmica mesmo. Porque o desenvolvimento traz
mais efeitos negativos que produtivos e o consumismo que está permeado
dentro disso tudo. (Entrevistado EC).

Diferentemente dos outros exemplos, nesta exposição parece ter existido a


intenção de questionar o desenvolvimento científico e tecnológico. Vale notar, no
entanto, que duas características tornam essa exposição diferenciada das demais: a
primeira, por ser uma exposição temporária, e a segunda, por ter sido uma exposição
desenvolvida fora do país. Apesar de trazer esse questionamento sobre o
desenvolvimento tecnológico, essas duas características acabam de alguma forma
descontextualizando-a para a discussão aqui levantada.
136

As respostas nos mostram que a exploração das potencialidades de exposições


sobre temas polêmicos e controversos são escassas nas instituições pesquisadas,
confirmando assim os dados coletados por meio da observação das exposições. As
controvérsias que apareceram ou estão relacionadas à questão da evolução ou a
polêmicas muito pontuais do ponto de vista da interação com o público. Em nenhuma
das exposições permanentes de qualquer um dos três museus analisados, ou na fala dos
entrevistados, foram identificadas exposições que tivessem a intenção de colocar de
maneira explícita uma questão controversa para discutir a natureza do conhecimento
científico ou para provocar emoção e participação ativa do visitante. Os entrevistados,
apesar de reconhecerem a existência de alguns pontos polêmicos e controversos em suas
exposições, nos contam que os museus acabam não explorando suas potencialidades
comunicacionais e educacionais.

De acordo com Mazda (2004), assuntos controversos são normalmente abstratos


e complexos, o que os torna difíceis de ser apresentados pelas maneiras tradicionais,
como aparatos interativos ou objetos expositivos. Em virtude disso, os elaboradores
sempre enfrentam o medo de que as exposições controversas se tornem textualmente
muito pesadas e de pouco apelo ou motivação para o público. No entanto, o autor afirma
que, se os visitantes participarem do debate explorando as controvérsias a partir de uma
exposição dialógica, o assunto vai se tornar mais significativo para ele. Ou seja, ao abrir
espaço para a introdução de exposições que tenham como foco a questão da
controvérsia, cria-se a possibilidade de um lugar para que o público se coloque.

Também para Macdonald e Silverstone (1992), os museus de ciências têm a


potencialidade de estabelecer relações significativas entre controvérsia científica e
comunicação pública da ciência. Nessa perspectiva, se estes espaços explorassem de
alguma maneira tais polêmicas poderiam contribuir de forma mais efetiva para a
formação de visitantes/cidadãos críticos e participativos, capazes de se colocarem em
relação a assuntos de ciência e tecnologia. Ainda para Macdonald e Silverstone (1992),
a controvérsia pode trazer a idéia de que os fatos científicos são sempre negociados e
que essa negociação não está confinada à comunidade científica, pelo contrário,
envolve, de vários modos, outros atores sociais relacionados com os processos de
representação e apropriação pública da ciência.
137

Diferentemente da temática das controvérsias – que mesmo sem haver a intenção


de explorar os debates em toda a sua potencialidade, foram de alguma maneira
exemplificadas nas respostas dos entrevistados –, exposições sobre temas da atualidade
e história da ciência foram reconhecidas como realmente escassas ou inexistentes nos
museus de ciências brasileiros. A análise destas respostas nos mostra um rico universo
de motivos e explicações para essas latentes ausências. Essas respostas também podem
ajudar a entender a ausência de diversos atributos CTS nas exposições analisadas.

A entrevistada do MCT, ao ser questionada sobre com que tipo de dificuldade as


equipes se deparam para incorporar temáticas da atualidade, fala sobre a falta de
respaldo e de infra-estrutura para fazer exposições sobre esses temas. Afirma que, para
dar conta dessa incorporação, mais pesquisa e consultorias seriam necessárias, e que,
por isso, às vezes, é mais fácil ficar com a ciência que já é consenso. Expor atualidades
significa ter mais dinamismo para a produção.

Nós teríamos que ter mais respaldo tanto de verba quanto de... por exemplo, se
tu vai apresentar uma pesquisa, tu precisa do contato direto. Ou precisa do
pesquisador ou precisa imaginar como vai ser esse contato...
(...) a verba tu tem que pensar... e... seria muita coisa pra fazer, por isso que
determinados museus ficam só com um assunto restrito, né... pra conseguir
acompanhar. Imagina a diversidade que tem o nosso, então... é difícil.
(Entrevistada MCT).

Delicado (2007) confirma que a ausência da representação da ciência


contemporânea pode estar relacionada à sua complexidade e dinamismo:

A ciência hard contemporânea é considerada muito difícil e complexa para ser


exposta. Os instrumentos utilizados são como caixas-pretas, muito grandes e
caras para comporem uma exposição, e sem valor estético. Os processos e temas
de pesquisa são complexos, os consentimentos mudam rapidamente, e as
controvérsias são inúmeras (e em virtude disso se torna oneroso manter uma
exposição que teria que mudar tão rapidamente). (DELICADO, 2007, p. 6).

A afirmação de que temas da atualidade são difíceis de ser apresentados de


forma elementar mostra uma visão de que os museus de ciências devem abordar os
conteúdos de maneira simplificada. Ou seja, que os museus de ciências não devem
138

explorar temas que demandem conhecimentos científicos prévios muito elaborados. Tal
escolha pode estar associada à idéia de que o público-alvo dessas instituições é
composto por crianças e adolescentes que não estariam preparados para se deparar com
discussões mais complexas.

A falta de respaldo citada pela entrevistada pode estar relacionada à


conformação das equipes que, em geral, são muito pequenas e não costumam ter o
contato direto com os pesquisadores. No entanto, em alguns casos, são os próprios
pesquisadores os elaboradores das exposições e, mesmo assim, debates atuais não são
tão freqüentes nessas exposições. Esse fato pode reforçar alguns argumentos aqui
levantados de que a não-apresentação desses temas pode estar relacionada a uma visão
estereotipada de público, à falta de recursos para atualização das exposições e à
dificuldade de musealizar temáticas mais complexas.

Sobre as dificuldades de se trabalhar com questões atuais ou polêmicas, o


entrevistado da Estação Ciência afirma que, por serem muitas vezes questões políticas,
são difíceis de ser transpostas para uma linguagem museográfica:

Acho que é muito difícil se trabalhar com questões políticas porque você não
vai ter equipamento. E aí a questão de você ter um equipamento, como, por
exemplo, ao se trabalhar a questão da economia de água, que é uma questão até
polêmica, mas você consegue fazer com que um equipamento acenda, que as
pessoas vão lá e mexem, você criou um gancho. Mas na hora em que você vai
trabalhar uma questão política, que é uma questão de discurso, tem uma
dificuldade muito grande pela forma como você deve chegar no público. É
preciso fazer com que essa discussão se concretize em um equipamento e não
em um texto ou discurso. O discurso tem de estar embutido no equipamento.
Em algumas questões o que dificulta é isso. Agora, colocar essas questões eu
acho que não é difícil, também se você não coloca as questões polêmicas você
não tem uma dinâmica. Você tem um museu estático. E então se cria uma coisa
chata. Não há uma dinâmica do discurso do museu com o público. Sempre há as
questões polêmicas que envolvem as questões sociais e as questões internas da
ciência. E eu acho que essas questões dentro da ciência são muito interessantes
também porque as pessoas vão para lados diferentes, para explicações.
(Entrevistado EC).
139

Esse tipo de explicação vai ao encontro das colocações de Macdonald e


Silverstone (1992) de que temas que são difíceis de ser apresentados em forma de
equipamentos ou aparatos interativos acabam algumas vezes sendo excluídos dos
museus de ciências. Ao priorizarem os aparatos interativos como recurso expositivo,
esses museus acabam limitando os temas tratados por suas exposições.

O mesmo entrevistado levanta outra possível explicação para essa ausência,


afirmando que questões polêmicas e da atualidade acabam aparecendo mais em
exposições temporárias:

Eu acho que essas questões [polêmicas] são mais colocadas nas exposições
temporárias e nas itinerantes. A Acqua Brasilis é muito crítica também em
relação ao uso dos mananciais. (Entrevistado EC).

Ante a colocação acima, em relação às exposições temporárias, o entrevistado


foi questionado se seria mais fácil corresponder a essa demanda com exposições
temporárias, do que alterando as exposições permanentes. E, ao responder, afirma que
na Estação Ciência, por terem acesso a recursos, e mão-de-obra disponível, possuem
certa facilidade para atualizar sua exposição permanente:

Aqui na Estação Ciência, diferentemente dos outros museus, nós até temos
condições de mexer constantemente na nossa exposição permanente, tanto em
termos de recursos humanos, quanto em termos de verba. Não vou dizer que
nossa situação é ótima, mas sempre captamos um dinheirinho aqui e ali, e, no
fim da história, temos certa facilidade. (Entrevistado EC).

Apesar de afirmar que na Estação Ciência essa questão não é muito pertinente,
reconhece que, de um modo geral, essas questões poderiam emergir com mais facilidade
em exposições temporárias ou itinerantes. Isso porque sabemos que, às vezes,
exposições temporárias, por serem encaradas como eventos, acabam recebendo verbas
diferenciadas e agregando equipes multidisciplinares de maneira dinâmica; fatos que
poderiam colaborar para a exploração de temáticas mais complexas nas exposições.
Além disso, fora as controvérsias históricas, temas polêmicos e da atualidade costumam
ser datados, o que seria um obstáculo para sua inserção nas exposições permanentes.

Quando questionados sobre a presença, ou não, de exposições sobre a história da


ciência, houve um consenso de que essas exposições são pouco representativas nos
140

museus de ciências. Apesar dessa consciência, os entrevistados não trouxeram


elementos muito elaborados em suas considerações, o que pode ser uma evidência de
que essas questões ou não têm relevância ou são um desafio para esses locais.

A entrevistada do MCT apenas confirma a pouca representatividade do tema na


exposição, mas não chega a explicitar qualquer razão para isso:

Acho que está pouco representada ainda. Como te falei tem muito, muitas coisas
pra desenvolver. Acho que por enquanto está pouco representada. Então nós
temos tópicos. (...) Tem pouca coisa. A razão eu... como eu vou te dizer... a
gente sempre está focando em áreas e em experimentos que de acordo com o
público de visitantes que imaginamos que são atuais, mas tem essa, essa, esse
enfoque que também a gente pretende colocar... porque aqui tem uma prova
[mostra um papel]: a galeria dos cientistas. Não sei se tu chegaste a ver.
(Entrevistada MCT).

O entrevistado da Estação Ciência fala que, apesar dessa ausência, os museus


deveriam abordar a natureza da ciência para diferenciá-la da religião:

Porque muitas vezes, dentro de um museu de ciências, ela pode parecer uma
religião é assim, é isso, a Terra tem placas tectônicas, etc. Eu acho que é preciso
ter um cuidado muito grande com esse discurso. Acho que é necessário falar da
construção do conhecimento e aí se inserem os cientistas. (Entrevistado EC).

E continua:

Mas eu quero que cada vez mais isso funcione, porque senão você coloca o
conhecimento como um dado e não como uma coisa conseguida. Parece fácil,
mas as coisas foram conquistadas. A ciência foi se colocando e ganhando
conhecimento. Na verdade, a ciência é assim, se você criou um novo modelo de
um átomo, todos os modelos anteriores complementaram e desenvolveram esse.
E o conhecimento científico é assim. Hoje nós sabemos isso, mas amanhã
podemos ter uma outra visão sobre as coisas, desde o universo a um átomo.
(Entrevistado EC).

O mesmo entrevistado afirma que essa ausência pode estar associada a uma
possível falta de interesse do público por essas exposições:
141

Eu acho que, apesar dela aparecer, de qualquer maneira, dentro das exposições
em geral, a história da ciência mesmo não aparece. Talvez seja uma falha, talvez
não. Antes eu achava muito importante criar uma exposição sobre os cientistas
brasileiros porque eu acho que é preciso divulgar e porque o país é produtor de
ciência e tecnologia. Sempre achei que deveria trabalhar nesse sentido. Mas
também penso no interesse do público. Será que o público se interessará? Ou
será uma exposição de física e falar sobre o Mario Schenberg, por exemplo? Ou
fazer uma exposição específica sobre aviação. Quantas oportunidades de fazer
uma exposição sobre o Santos Dumont, e não fizemos, estamos fazendo ainda
uma sobre o desejo de voar, trabalhar a tecnologia do vôo, a ciência que
propiciou o vôo. Porque é uma coisa chata falar onde ele nasceu, quando, etc.
Isso torna as exposições todas iguais. E todas em tom sépia. Eu vi umas dez em
tom sépia. Eu já cheguei a falar para uma pessoa, mas essa não foi uma que vi
em tal lugar? Não? Então foi uma parecida! Eu acho, portanto, que vale mais a
pena criar exposições científicas e dentro delas inserir a história. E não fazer
exposições específicas sobre a história, porque criamos imagem de mocinho
para todo mundo e fica aquela história muito oficial. Estávamos discutindo essa
semana sobre a exposição do átomo e acho interessante abordar como a ciência
pensa a coisa e como isso evolui. (Entrevistado EC).

Essa explicação sobre a falta de interesse por parte do público é confirmada pela
colocação de Mazda (2004) sobre o medo dos elaboradores de exposições muito
complexas e carregadas de textos não serem atrativas para o público. Para o autor, esse
receio pode ser contornado ao abrir uma dimensão participativa na exposição, pois
defende que, com isso, o conteúdo pode se tornar mais significativo para o visitante.

De acordo com Durant (2004), a maioria dos museus de ciências ainda está hoje
preocupada em mostrar os grandes feitos científicos e tecnológicos do passado, ou em
explicar princípios bem-estabelecidos. De maneiras diferentes, nos dois casos está
envolvido o que o autor chama de ciência-acabada, a ciência que já deixou de ser
debatida pelos cientistas, aquela que já é consenso. Nem os museus clássicos de história
da ciência nem os museus interativos de terceira geração estão envolvidos no desafio de
interpretar a ciência em desenvolvimento. Fato que chama a atenção, uma vez que
outras instâncias também envolvidas com a comunicação científica enfrentam esse
desafio com muito mais constância (DURANT, 2004).
142

Das explicações levantadas pelos entrevistados para a baixa representatividade


de exposições que tratem de temáticas que poderiam fazer emergir debates CTS,
podemos agrupá-las em algumas categorias. Primeiro, seriam as questões de ordem
mais prática, como a falta de agilidade das equipes, falta de recursos e a falta de contato
mais próximo com os pesquisadores. Depois viriam as questões relacionadas à própria
natureza dos temas abordados, que são complexos, abstratos, difíceis e, às vezes,
datados, o que os tornariam difíceis de ser musealizados e exigiriam certo dinamismo na
produção. Em seguida, questões relacionadas ao público, como a possível falta de
interesse dos visitantes por temas mais complexos, o medo de ofendê-los ao expor
determinada temática polêmica, e até mesmo uma preocupação com marketing e com o
compromisso de neutralidade assumido pela instituição.

Esse conjunto de razões levantadas pelos entrevistados – reforçadas pelas idéias


desses autores que têm trabalhado na interface museus de ciências, comunicação e
controvérsia – nos ajuda a entender quais são os desafios para aumentar a freqüência de
exposições que tenham como objetivo provocar e questionar os visitantes em relação ao
papel da ciência e da tecnologia na sociedade contemporânea e que assumam esse novo
paradigma participação e o incentivo a uma postura mais crítica do público
143

Capitulo VI: Considerações

Os museus devem ser lugares diferenciados na sociedade – e não


catedrais do conhecimento como no século XIX, começo do XX, nem
espaços exclusivamente educativos como muitos foram no final do
século XX (e ainda o são). Devem sim tornarem-se fóruns públicos para
o envolvimento ativo dos cientistas e da sociedade nas questões mais
interessantes, intrigantes e importantes dos dias de hoje. (DURANT,
2004).

O primeiro aspecto que vale ser levantado nas considerações desta pesquisa
refere-se à dificuldade em identificar exposições que abordassem temáticas de cunho
CTS. Apesar de ter sido possível selecionar algumas exposições para análise, essa
categoria de exposições representa um universo bastante restrito, no que diz respeito aos
museus de ciências brasileiros. Vale ressaltar que, apesar de nos museus selecionados
podermos encontrar outras exposições que fazem referência a outros atributos CTS, as
exposições analisadas foram selecionadas por oferecerem mais possibilidades para a
análise pretendida. E que, apesar desta aposta, as referências às relações entre ciência,
tecnologia e sociedade – confirmadas pela identificação de poucos atributos CTS – não
foram muito recorrentes nessas exposições.

No universo estudado existe uma predominância de exposições que relacionam a


ciência com as aplicações tecnológicas e os fenômenos na vida cotidiana, e que trazem
questões de cunho ambiental, ou seja, dimensões dos debates externos à ciência e uma
menor incidência de exposições que abordem o estudo dos fatos e aplicações científicas
que tenham uma maior relevância social e que explicitem as implicações sociais e éticas
relacionadas ao uso da ciência e do trabalho científico. Menor ainda é a incidência de
exposições que incitam a compreensão da natureza da ciência e do trabalho científico,
ou seja, exposições que tragam debates sociais internos à ciência e debates
epistemológicos.

Alguns atributos CTS não foram identificados em nenhuma das três exposições,
como Influência política no desenvolvimento de C&T; Estímulo à participação do
público; Procedimentos de consenso; Responsabilidade social dos cientistas e
Discussões em torno da natureza da ciência.
144

Delicado (2007) enuncia algumas razões para a ausência de temáticas mais


políticas, no caso particular dos museus portugueses, dizendo que existe pouca
mobilização cidadã sobre assuntos controversos e pouco interesse público sobre
financiamento de pesquisa, e que por isso os museus não são pressionados a lidar com
essas temáticas em suas exposições.

Sobre a falta de interesse do próprio público, Mintz (2005) afirma que parte das
razões dessas omissões está relacionada à rentabilidade e aceitação que essas temáticas
trariam para os museus, afirmando que é mais fácil atrair o público com entretenimento
e diversão do que com exposições que tratem de aquecimento global ou extinção das
espécies.

Essa visão de público acaba influenciando também nas escolhas museográficas


desses espaços. O fato de os museus de ciências, na maioria, serem concebidos para um
público infantil, para Delicado (2007), faz que a interatividade e a diversão sejam
prioridade, já para Mintz (2005), o direcionamento a esse público dificulta a abordagem
de temas mais complexos. Como já foi colocado por Macdonald e Silverstone (1992), a
restrição à exploração de temáticas mais complexas está relacionada à adoção de
algumas estratégias, como simplificação dos textos e adoção de um grande número de
aparatos interativos.

Não é o fato de uma exposição ter sua museografia apoiada em aparatos


interativos que exclui, ou não, o contexto sociocultural. O que acontece, muitas vezes, é
que mostrar o contexto sociocultural não é objetivo do projeto da exposição. A
interatividade foi lançada num contexto específico, para suprir objetivos específicos.
Para ser possível incorporar esses debates, é necessário que de fato exista essa intenção
e que seja feito um esforço nessa direção.

Outro dado que chama a atenção é que a dimensão dialógica, tão referenciada
pelos autores do campo de comunicação pública da ciência (DURANT, 1999, 2004;
LEWESTEIN, 2003, 2006), e também sendo um dos pilares da educação CTS, foi um
145

atributo ausente nas três exposições analisadas. Nenhuma das três exposições dispõe de
um espaço para discussão e debate onde o visitante possa se posicionar60.

De acordo com Durant (2004), nós estamos no limiar de uma nova era na
comunicação científica. Nessa nova era de diálogo e debate entre ciência e sociedade,
existe um grande espaço para os museus de ciências. São locais onde se pode debater o
processo das pesquisas e suas escolhas – científicas, técnicas, econômicas, ambientais,
éticas, sociais, políticas e legais. Esse esforço pode transformar os museus de ciências
do século XXI, e vai ajudar a transformar nossa cultura de tal maneira a promover
benefícios tanto para a própria ciência, quanto para a sociedade.

Delicado (2007) confirma, em seu artigo, que os museus de ciências dão


preferência por expor ou a história da ciência – materializada na exposição de
instrumentos científicos obsoletos – ou os resultados da ciência – conceitos
materializados em aparatos interativos, e que pouquíssima referência é feita à
ciência contemporânea, à organização do trabalho científico, à vida cotidiana do
laboratório, etc.

Para além da presença ou ausência da história da ciência, também podemos


questionar qual é a história apresentada por essas instituições. Nos exemplos trazidos
por Bennett (1998), fica claro que, se houver a intenção em exposições sobre história da
ciência, podem emergir vários atributos CTS, principalmente de cunho internalista,
histórico e filosófico: como a coletivização do trabalho científico ou procedimentos de
consenso, por exemplo.

Outra razão também identificada por esta pesquisa, que dificulta a inserção de
debates CTS nas exposições, está relacionada à conformação das equipes. O fato de
essas equipes serem muitas vezes formadas apenas por cientistas das áreas específicas
de conhecimento acaba dificultando a inserção de debates históricos e filosóficos em
suas exposições. Delicado (2007) afirma que são raras as vezes em que cientistas sociais
da ciência participam da concepção das exposições, apesar de muitas vezes serem
público dessas exposições, e que os alunos dos cursos de graduação em ciências

60
Como já foi colocado, neste trabalho não estão sendo consideradas interações e debates promovidos via
atividade mediada.
146

recebem pouco, ou nenhum, treinamento em comunicação da ciência, além de não


existirem cursos específicos para o design de exposições.

O desenvolvimento desta pesquisa nos fez refletir sobre o que seria o mínimo de
atributos necessários para uma exposição poder ser considerada CTS ou CTSA.
Conforme os casos analisados, não poderíamos considerar que, para tal, uma exposição
devesse apresentar evidências de todos os atributos, nem que exista um atributo mais
relevante do que o outro. Mas, de fato, existem exposições que exploram mais as
relações CTS e outras que exploram menos. Com base nessas constatações, poderíamos
construir um contínuo entre exposições que explorassem apenas um dos atributos de
maneira pontual até as que explorassem todos eles. Entre esses extremos, estariam
aquelas que trouxessem apenas um atributo, mas em quase todos os elementos
expositivos – como é o caso da Educação Ambiental do Museu de Ciências e
Tecnologia, por exemplo – ou exposições que trouxessem alguns atributos, mas de
apenas um dos grupos, como é o caso de Os Ciclos Biogeoquímicos e o Meio Ambiente
da Estação Ciência, ou aquelas que abordassem um grande número deles, mas não de
todos – como é o caso da Reprodução e genética do Museu da Vida, por exemplo.

Acreditamos que, para além da análise dessas exposições, este trabalho de


pesquisa pode ter contribuído para o campo da educação e museus na determinação
desses atributos CTS. Como pode ser visto nas referências levantadas, a intersecção dos
campos Educação com enfoque CTS e Educação e museus ainda não é muito explorada.
A construção desses atributos emergiu de um trabalho intenso de aproximação das
referências nas duas áreas e do contato direto com as exposições dos museus de
ciências, por acreditar em suas intersecções, sobreposições e complementações.
147

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* De acordo com:

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: informação e documentação:


referências: elaboração. Rio de Janeiro, 2002.
151

Anexo I

Roteiro de observação das exposições

Instituição:
Título da área expositiva:
Tema:

I. Planta baixa (desenho) com indicativo de cada elemento

II. Descrição Geral


152

Nome/referência:
Tipo:
Descrição:
Texto:
Natureza CTS:

Nome/referência:
Tipo:
Descrição:
Texto:
Natureza CTS:

Nome/referência:
Tipo:
Descrição:
Texto:
Natureza CTS:

Nome/referência:
Tipo:
Descrição:
Texto:
Natureza CTS:

Nome/referência:
Tipo:
Descrição:
Texto:
Natureza CTS:
153

Anexo II

Roteiro de entrevista

O roteiro está dividido em seis grupos de questões: o primeiro, sobre o entrevistado; do segundo ao
quinto, sobre a exposição (motivações; desenvolvimento; descrição; e avaliação/desafios e reflexões); e o
último grupo trata-se de um questionamento sobre as escolhas temáticas dos museus de ciências de um
modo geral.

1. Sobre o entrevistado

Nome
Instituição
Ocupação
Formação
Que tipo de vínculo possui com a instituição?
Como se deu o envolvimento na elaboração desta exposição?
Qual o seu papel no desenvolvimento da exposição?

2. Motivações

Como surgiu a idéia de se trabalhar essa temática? Quando?


Quanto tempo durou esse processo?
Quais foram as motivações para se trabalhar essa temática “XXX”? De natureza interna ou
externa à instituição?
Qual seria a relevância de expor essa temática na exposição NOME DA EXPOSIÇÃO?
Qual o impacto que se espera dessa exposição no público?
Quais seriam as vantagens de se trabalhar esse tema no museu? E as desvantagens?

3. Desenvolvimento

Como a exposição foi elaborada (equipe, organização interna, prazos, custos, etc.)?
Qual o perfil das pessoas que trabalharam na elaboração dessa exposição?
Foram realizadas pesquisas prévias sobre a temática da exposição? De que tipo?

4. Descrição

a. Descreva a exposição contemplando os seguintes tópicos (e acrescentando outros, se achar


necessário...):

A escolha dos conteúdos e conceitos

A escolha dessas soluções expográficas


A mensagem a ser transmitida
Os objetivos educacionais
A relevância de se expor essa temática
O impacto esperado no público

b. Sobre os textos:
154

Como foi a produção dos textos?


Quem elaborou esses textos?
Foram usadas referências? Quais? Em que fontes? Foram feitas consultas a pessoas de outras
áreas?
Foram produzidos materiais de apoio ou catálogos para a exposição? Em caso positivo, com que
objetivo? Para que público? <solicitar cópia desses documentos>

5. Avaliação/Desafios e reflexões

Foram percebidas dificuldades na apresentação de algum dos temas abordados nessa exposição?
Quais e por quê?
Houve tensões durante o processo de elaboração?
Por que a escolha dessas soluções expográficas para falar sobre essa temática? Houve outras
idéias ao longo do percurso? Por que foram abandonadas?
Quais são, em sua opinião, os pontos positivos, os elementos fortes da exposição? Por quê?
Em que aspectos que você a considera frágil? Por quê?
Em sua opinião, o público compreende a mensagem da exposição?
Existe alguma alteração prevista para a área expositiva? Qual? Com que objetivo?
Numa possível reestruturação da exposição, que alterações proporia? Por quê?

6. Questionamentos sobre as escolhas temáticas dos museus de ciências de um modo geral

a. Sobre História da Ciência

Considera que alguma das exposições do museu explora a história da ciência?


Se sim, quais e de que forma?
Se não, existe alguma razão específica para a ausência dessas temáticas?
Considera o museu um espaço adequado para expor essas temáticas?
Acha que existem dificuldades para se trabalhar temáticas dessa natureza?

b. Sobre atualidades

Temas da atualidade (nanotecnologia, alimentos transgênicos, biotecnologia) estão presentes de


maneira adequada na instituição? Saberia dizer quais as razões para isso? Quais seriam os
entraves e as repercussões para se tratar dessas questões?
Como o museu se coloca ante os debates e assuntos científicos que estão na mídia?
Considera o museu um espaço adequado para expor essas temáticas?
A divulgação do relatório do IPCC (aquecimento global e mudanças climáticas) trouxe alguma
discussão para o museu? Existe a intenção de incluir algo sobre o aquecimento global e as
mudanças climáticas na exposição? De que tipo? Com que finalidade?
O museu fez alguma ação na época do ápice da discussão sobre Plutão? O que fez? Qual foi o
impacto? O museu foi procurado para emitir opinião sobre o assunto? Como se colocou?

c. Sobre controvérsias e polêmicas

Considera que alguma das exposições da casa (Museu da PUC, Estação Ciência, Museu da Vida)
debate questões polêmicas ou controversas?
Se sim, quais e de que forma?
Se não, existe alguma razão específica para a ausência dessas temáticas?
Considera o museu um espaço adequado para expor essas temáticas?
Acha que existem dificuldades para se trabalhar temáticas dessa natureza?

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