Yonne Leite
Dinah Callou
Como Falam os Brasileiros
4ª edição
Sumário
Introdução
Uma visão geral do Brasil: o mito da homogeneidade
Assumindo a diversidade
O falar carioca no conjunto dos falares brasileiros
Sexo, idade e variação linguística
Para uma caracterização dos falares brasileiros
A fonética da fala culta
Os sotaques sintáticos da fala culta
Normas, pluralismo etc.
Traçando linhas imaginárias
Voltando ao começo
Cronologia
Referências e fontes
Sugestões de leitura
Sobre as autoras
Coleção Descobrindo o Brasil
Copyright
Introdução
É através da linguagem que uma sociedade se comunica e retrata o
conhecimento e entendimento de si própria e do mundo que a cerca. É na
linguagem que se refletem a identificação e a diferenciação de cada comunidade
e também a inserção do indivíduo em diferentes agrupamentos, estratos sociais,
faixas etárias, gêneros, graus de escolaridade. A fala tem, assim, um caráter
emblemático, que indica se o falante é brasileiro ou português, francês ou
italiano, alemão ou holandês, americano ou inglês e, mais ainda, sendo
brasileiro, se é nordestino, sulista ou carioca. A linguagem também oferece
pistas que permitem dizer se o locutor é homem ou mulher, se é jovem ou idoso,
se tem curso primário, universitário ou se é iletrado. E, por ser um parâmetro que
permite classificar o indivíduo de acordo com sua nacionalidade e naturalidade,
sua condição econômica ou social e seu grau de instrução, é frequentemente
usada para discriminar e estigmatizar o falante.
De uma perspectiva estritamente linguística, não se justificam julgamentos
de valor, uma vez que a faculdade da linguagem é inata e comum a toda a
espécie humana. As diferenças existentes entre as línguas representam apenas
formas de atualização distintas dessa faculdade universal. Assim, para o
linguista, todo homem é igual não só perante a lei, mas também frente a sua
capacidade linguística. Como assinala o filólogo do início do século XX João
Ribeiro, a primeira lição elementar de todas as ciências é que objetivamente não
pode haver um fenômeno bom e outro mau ou ruim, todos são essencialmente
legítimos. Não existe, assim, variante boa ou má, língua rica ou língua pobre,
dialeto superior ou inferior. O que ocorre é uma variabilidade na produção,
muitas vezes determinada por fatores sociais, que não é exclusiva de uma língua,
é universal e inerente a todas. O que há de concreto no cotidiano são as
realizações individuais que ocorrem à nossa volta, porém a comunicação só se
efetiva devido à existência de uma representação abstrata, compartilhada por um
grupo maior ou menor de indivíduos, que vem a ser a língua nacional x, y ou z.
É de se esperar dessa forma que na extensão do território brasileiro haja uma
unidade linguística, a língua portuguesa, mas também diversidade, os falares
brasileiros. O falante do norte do país não tem a menor dificuldade em entender
o falante do sul, embora ocorram diferenças na fonética, na sintaxe e no léxico.
Por exemplo, a uma mesma fruta atribuem-se palavras regionalmente diferentes,
tais como tangerina, mexerica, laranja cravo ou bergamota, pinha, fruta de
conde ou ata, goiaba ou araçá, ou seja, opções lexicais próprias de cada região.
Essas variações, que são mais flagrantes no vocabulário e na pronúncia, não
comprometem a unidade maior de entendimento entre os falantes.
Toda essa variação linguística explica-se, nas palavras de Antônio Houaiss,
pelo próprio processo de colonização do país: dialetação horizontal por influxo
indígena e diferenciação vertical entre a fala do luso e a fala do nascido e criado
na terra. Segundo o cientista social Manuel Diégues Jr., o Brasil pode ser
considerado como uma vasta experiência de pluralismo étnico e cultural, em que
as mais diversas relações de raças e culturas — que se processam e se
processaram no cenário brasileiro — são responsáveis pelas diferenças
existentes entre regiões e áreas geográficas do país e, consequentemente, pelas
diferenças entre os diversos falares brasileiros.
A grande questão nunca foi a da intercomunicabilidade, mas sim a da
padronização de uma língua falada e escrita para fins cultos. Por uma ou outra
razão, a escolha de um falar local padrão sempre girou em torno de três grandes
centros urbanos, a saber, a cidade do Rio de Janeiro, a de São Paulo e a de
Salvador. A preferência recaiu sobre a cidade do Rio de Janeiro e se deveu,
prioritariamente, a razões extralinguísticas: o fato de o Rio de Janeiro estar
geograficamente no centro de uma polaridade norte/sul, ser centro político há
mais tempo, capital da Colônia desde 1763, e ser uma área cuja linguagem culta
tende a apresentar menor número de marcas locais e regionais, com uma
tendência universalista, dentro do país. Não há como negar que, em termos
socioeconômicos, São Paulo há muito superou o Rio de Janeiro, mas, por outro
lado, mantém a sua marca localista, pelo menos na fala, a marca do chamado
“dialeto caipira”. Salvador, embora capital durante a maior parte do Brasil-
Colônia, sofreu forte importação lexical das línguas africanas, apresentando um
tipo de entoação descendente, denominada fala “cantada”, e características
fonéticas marcantes, como a de vogais abertas e perda pronunciada do r final.
Como todos sabem, essas marcas regionais, tanto do dialeto caipira quanto do
dialeto baiano, são estigmatizadas pelos falantes de outras áreas do país.
Costuma-se dizer que o falar carioca é o que mais equidistante se encontra
do nortista, do nordestino, do oriental, do sulista e do sertanejo, e que o Rio de
Janeiro possui condições geográficas, históricas, políticas e, inclusive,
linguísticas, para ser um centro unificador. Dois congressos nacionais, o de
Língua Cantada, organizado em 1937 por Mário de Andrade, escritor e figura
dominante do Modernismo em São Paulo, e o de Língua Falada no Teatro,
realizado em Salvador em 1956, debruçaram-se sobre essas questões com a
finalidade de estabelecer normas de âmbito generalista que, de um lado,
representassem o ideal linguístico da comunidade brasileira como um todo e, de
outro, não fizessem com que se corresse o risco de chegar a uma média que não
correspondesse a nenhuma das variedades faladas no Brasil, no passado ou no
presente. Cumpria também evitar, àquela altura e ainda hoje, o perigo dos
pruridos de orgulho regional, pois, conforme se escuta a todo momento, o
sotaque alheio “irrita”, tal pronúncia é “horrível” ou “engraçada”, principalmente
se caracterizadora de um falante de área não prestigiada.
Ainda que se admita partir de uma “base carioca”, que representaria, embora
com ressalvas, a média da pronúncia nacional dentro de um quadro geral de
características fonéticas e morfossintáticas, é de fundamental importância situar
esse linguajar carioca em relação aos outros falares e tornar evidente, se
verdadeiro, este comportamento médio.
Uma visão geral do Brasil: o mito da homogeneidade
A oposição entre as variantes brasileira e europeia da língua portuguesa já foi
reconhecida, conquanto tenha suscitado polêmicas, durante algum tempo, sobre
a existência ou não de uma “língua brasileira” e, por mais tempo ainda, sobre seu
caráter uniforme e conservador. No que se refere ao português do Brasil,
predominava a concepção de língua como reflexo e expressão da cultura e a da
superioridade cultural dos brancos sobre os negros e índios. Ao advogarem a
“lusitanidade” da cultura brasileira, os estudiosos teriam, necessariamente, de
admitir que havia uma identidade linguística e uma homogeneidade dentro de
um conjunto heterogêneo, mais recentemente chamado de “português
brasileiro”. Segundo José Honório Rodrigues, só por ocasião da Assembleia
Constituinte de 1823 os representantes de diversas províncias foram capazes de
observar a diferença de prosódia e, ao mesmo tempo, a igualdade da língua que
todos falavam. A célebre máxima “unidade na diversidade e diversidade na
unidade” é o ponto central da questão sobre o português do Brasil.
Um território de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, com uma população
hoje estimada em 170 milhões de habitantes — com índice ainda alto de
analfabetismo — não poderia apresentar um quadro linguístico homogêneo. A
diversidade que existe em qualquer ponto espelha uma pluralidade cultural e não
se pode presumir para a expansão do português no Brasil uma forma linguística
única, pois a época em que se deu a colonização, a origem dos colonizadores e
as consequências linguísticas de um contato heterogêneo são aspectos que
devem ser considerados. Uma região como a do Rio Grande do Sul, realmente
povoada no século XVIII, e cuja colonização se deu por processo diferente da
maior parte do país, na base de casais, com miscigenação relativamente
insignificante, não pode apresentar um quadro idêntico ao do Brasil Central,
Bahia, Rio de Janeiro e vários outros pontos do atual território nacional que
foram colonizados apenas por homens, com maior mestiçagem. Em decorrência
disso, às vésperas da Independência, o Brasil possuía uma população estimada
em 1.347.000 brancos e 3.993.000 negros e mestiços, entre escravos e livres,
mas a distribuição populacional era irregular, com maior concentração de negros
em Pernambuco, Bahia, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Na verdade, toda essa
complexidade dificulta ou torna praticamente impossível traçar um quadro
completo da variação dialetal e socialmente diferenciada resultante do contato
com outras línguas e, por sua vez, de mudanças ocorridas na língua portuguesa
trazida para cá.
Outro aspecto que surpreende os não especialistas e não pode deixar de ser
posto em relevo é o de que, até a primeira metade do século XVIII, a “língua
geral” indígena era predominante. O historiador Sérgio Buarque de Holanda
informa, com base em relatório escrito por volta de 1692 pelo então governador
do Rio de Janeiro, que os filhos de paulistas primeiro aprendiam a língua
indígena e só depois a materna, isto é, a portuguesa. Em alguns pontos, até 1755,
a língua portuguesa era minoritária, embora tivesse acabado por se impor na
Corte, segundo informações de historiadores.
Embora à época da conquista fossem faladas 1.273 línguas indígenas, no
Brasil atual há, além do português, segundo estimativa do pesquisador Aryon
Rodrigues, apenas 180 línguas indígenas — das quais a grande maioria se
encontra na Região Amazônica, que possui uma população de 350 mil pessoas
distribuídas em 206 etnias — e 41 famílias, dois troncos e uma dezena de
línguas isoladas. Em 500 anos, uma perda de 85%! É bom lembrar que, apesar
do grande extermínio, ainda hoje há grupos indígenas próximos a grandes
centros urbanos, como os guaranis, na costa do Rio de Janeiro, em São Paulo e
também no Rio Grande do Sul, que conservam sua língua nativa.
A Constituição de 1988 assegurou às populações indígenas o direito de
manter sua diversidade linguística e cultural, num reconhecimento oficial de ser
o país multilíngue. O português falado por essas populações tem sido alvo de
poucos estudos sistemáticos, mas o número já é suficiente para mostrar que se
tem um outro tipo de heterogeneidade, à qual se deve somar o do português
falado por contingentes de imigrantes japoneses, italianos, alemães, poloneses,
espanhóis, libaneses, sem esquecer de falantes de origem portuguesa, açorianos,
poveiros e transmontanos. Também devem ser lembrados os pequenos redutos de
antigos escravos africanos, como a localidade de Helvécia, no município de
Nova Viçosa, na Bahia, originária da antiga Colônia Leopoldina, fundada por
colonos alemães, suíços e franceses em 1818, pois apresentam até hoje
características de um “falar crioulo”, visto como resultante de transmissão
linguística irregular, devido ao contato precário com a língua portuguesa.
A verdade é que a hegemonia da língua portuguesa não dependeu de fatores
linguísticos, mas sim históricos, e só nos últimos dois séculos e meio ocorreu
uma normatização do português falado no Brasil em direção a um chamado
português “padrão”, que, apesar de intrinsecamente variado regional e
socialmente, passou a gozar de prestígio e a representar a “norma” para o bem
falar e o bem escrever.
Não resta dúvida de que a história da colonização brasileira se reflete na
diversidade linguística existente no país, a qual veio aos poucos sendo
reconhecida. Esse reconhecimento traduz-se, por exemplo, na eleição, pelo
eleitorado do estado do Rio de Janeiro, de um índio xavante como seu
representante junto ao Congresso Nacional nas eleições de 1982, o que evidencia
uma maior abertura étnica e linguística. Por outro lado, persiste a idealização de
um país monolíngue e de uma gramática pura, imutável, o mais próxima possível
do português falado no outro lado do Atlântico. O preconceito linguístico por
parte da sociedade é difícil de ser vencido, uma vez que a pressão social é
contínua e os meios de comunicação de massa atuam a seu favor.
Para o sociolinguista, cujo objeto de estudo é a língua e os fatores sociais que
condicionam sua produção, é natural aceitar a ideia de que, se em termos
relativos se justifica a qualificação de “espantosa” — que não raro se atribui à
unidade linguística do Brasil —, mais espantoso pareceria negar a diversidade
que ela pressupõe, dadas as características pluriculturais tanto de nosso passado
quanto de nosso presente. O uso de uma língua envolve, contudo, aspectos
ideológicos e o preconceito que existe em relação a determinadas variedades é
equivalente a outros, como o social, o religioso e o racial. O domínio de um
português-padrão é privilégio reservado a poucos membros de uma elite
econômico-social que, assim, assegura o seu poder e sua primazia político-
cultural. Cumpriria, a uma educação realmente democrática e igualitária,
reconhecer a diversidade e com ela trabalhar, no sentido de possibilitar a todos
os usuários da língua o acesso às normas prestigiadas e às mesmas
oportunidades.
Assumindo a diversidade
A diferença no tratamento dado aos fatos linguísticos de homogeneidade e de
unidade na visão anterior, e, na atual, de multiplicidade, ultrapassa o mero
registro de formas arcaizantes e populares e vai em busca da melhor forma de
descrição e análise da diversidade em todos os estratos socioculturais, no sentido
de explicar as diferenças e semelhanças que existem entre as diversas variedades
da língua portuguesa, não só internamente, dentro do país, mas também
externamente, entre o português brasileiro e o europeu.
Essa diversidade foi durante muito tempo enfocada apenas em variantes
populares, como nos glossários regionais e, mais tarde, nos atlas linguísticos,
iniciados no Brasil na década de 1960, a saber, o Atlas prévio dos falares
baianos, o Atlas linguístico de Sergipe, o Esboço de um atlas linguístico de
Minas Gerais, o Atlas linguístico da Paraíba e o Atlas linguístico do Paraná,
para citar apenas os atlas gerais. Só agora está em curso a elaboração de um atlas
geral, o Atlas linguístico do Brasil (ALIB), tarefa cogitada há quase 50 anos, mas
sempre adiada devido, entre outras razões, à extensão territorial do país, à
assimetria da densidade demográfica e à falta de recursos humanos e financeiros
para um empreendimento de tal vulto. O objetivo é fazer um retrato do Brasil,
isto é, dar conta da diversidade existente, ou melhor, da dialetação do português,
a fim de tornar viável a tão complexa delimitação de áreas próprias a cada
fenômeno linguístico. Em suma, seria importante confirmar ou infirmar a tese de
que as divisões dialetais no Brasil são menos geográficas que socioculturais e de
que as diferenças na maneira de falar são maiores, num determinado lugar, entre
um homem culto e o vizinho analfabeto do que entre dois brasileiros do mesmo
nível cultural, originários de regiões distantes uma da outra.
Surgiram, ao longo dos anos, várias tentativas de traçar áreas dialetais
brasileiras — algumas com base em critérios meramente geográficos —, como a
do filólogo Júlio Ribeiro, de Antenor Nascentes, a do africanista Renato
Mendonça, a do cientista social, Manuel Diégues Jr., entre outras. O que há de
comum em todas elas é que partem sempre de fatores históricos e/ou
socioculturais, sem um levantamento de traços linguísticos diferenciadores.
Nascentes é o único que, ao dividir o falar brasileiro em seis subfalares (o
amazônico, o nordestino, o baiano, o fluminense, o mineiro e o sulista) reunidos
em dois grupos, o do norte e o do sul, apresenta um critério de natureza
prosódica — que chama de cadência — e um de natureza estritamente fonética, a
pronúncia das vogais antes do acento (pretônicas): vogais abertas, características
da região norte, versus vogais fechadas, características da região sul.
Em 1953, Antenor Nascentes, que juntamente com Serafim da Silva lançou
as bases para a elaboração de um atlas linguístico do Brasil, ressaltava que a
divisão do nosso país em áreas linguísticas esbarrava numa grande dificuldade: a
falta de determinação das chamadas “isoglossas”, isto é, linhas demarcadoras de
cada um dos fenômenos linguísticos que singularizariam os dialetos. Isso é
verdade, mas não impediu, de todo modo, a aceitação da existência de
“variantes” delimitáveis. Todo brasileiro é capaz de reconhecer, intuitivamente,
um grande eixo divisório entre falares do “norte” e falares do “sul”: uma
“cadência” do nortista e outra do sulista, vogais pretônicas abertas do nordestino
e fechadas do sulista, o s sibilado do sulista em oposição ao chiante do carioca e
o r rolado do gaúcho em oposição ao aspirado do carioca.
Mapa 1. Divisão das áreas linguísticas, segundo Antenor Nascentes
Essas características são tão marcantes que chegam a ser imitadas nos meios
de comunicação de massa — nas novelas, por exemplo, assim como em
programas humorísticos — sempre que se quer ressaltar, ao compor um
personagem, a fala de uma determinada região geográfica. A linguagem
televisiva usa e abusa desses traços singularizadores, acabando por caricaturar e
igualar a fala de nordestinos e nortistas, baianos, pernambucanos, paraibanos ou
cearenses, amazonenses ou paraenses. Merece menção o caso da pronúncia
dental do t e do d antes do som i em palavras como tipo, mentira, desde e ditado.
Considerada típica do falar nordestino — no qual, em geral, se inclui o falar
baia- no —, é exacerbada, em algumas novelas, na fala de um personagem
nativo da cidade de Salvador ou do sul do estado da Bahia, sem atentar para o
fato de que nessas áreas, o t e o d são tão tch e dj como o de qualquer carioca.
Nessa hipercaracterização, a chamada cadência ou ritmo, sem dúvida um fator
identificador da origem do falante, se resume a uma fala si-la-ba-da, sempre
com a mesma entoação. Esse ritmo, porém, é algo mais intricado, por envolver
não só duração dos segmentos vocálicos, mas também a curva entonacional da
sentença, ora ascendente, ora descendente, ora neutra, ora contrastiva. Também a
substituição de vogais fechadas por abertas, na composição de um tipo regional,
não obedece aos condicionamentos naturais, chegando a criar pronúncias
improváveis em qualquer uma das regiões, tais como m[è]tido, [è]spécie
v[ò]cês, s[ò]fria.
O desconhecimento da interação de um conjunto de regras e representações é
que gera, portanto, as falas caricaturais de personagens nordestinas nos
diferentes meios de comunicação, e serve como motivação para crônicas como
“Grilos gramaticais” do escritor João Ubaldo Ribeiro, publicada no jornal O
Globo de 14.6.1987:
Antigamente, nordestino não falava “só-brinho” e “té-lhado”, como hoje a gente ouve, em
contraposição aos “centro-sulistas” “sô-brinho” e “tê-lhado”. Falava “subrinho” e “tê-lhado”
mesmo. Mas aí chegou o nortês da Rede Globo ... e até os nordestinos se convenceram de que o
certo é dizer “só-brinho”, que é como se escreve. A única diferença entre o escrito e o falado é a
de que todo nordestino tem de abrir a vogal e todo centro-sulista tem de fechar, em absolutamente
todos os casos. Outra doidice completa, mas que já levou atores de novelas a pronunciar “vó-cê”
em vez de “você”, a fim de mostrar como faziam bem o sotaque nordestino.
A identificação de um falante como membro de uma determinada
comunidade é complexa, pois somos surpreendidos, por vezes, por uma
semelhança de pronúncia entre regiões que foge às nossas expectativas. No
primeiro e único Congresso Nacional de Língua Falada no Teatro, o intelectual
cearense José Liberal de Castro apresentou uma comunicação em que afirmava
que, salvo o caso citado das pretônicas abertas e fechadas, as demais variantes
extravasariam fronteiras, aparecendo isoladas em diferentes e distantes pontos do
território nacional. Dava ainda o seu depoimento pessoal, na qualidade de
nascido e criado em Fortaleza mas morador do Rio de Janeiro há mais de 12
anos, àquela altura, de que a pronúncia carioca poderia chegar a ser parecida
com a do litoral cearense: se “fecharmos” as vogais pretônicas e “chiarmos” em
certos s, “passaremos por cariocas, não em outros estados, mas no próprio
Rio”, comprovando a possibilidade de sobreposição de pronúncias regionais.
Outra dificuldade, portanto, para estabelecer limites divisórios entre os
falares brasileiros reside no fato de rarissimamente coincidirem limites
administrativos com limites linguísticos e de haver faixas de interseção. O falar
baiano, por exemplo, na proposta de Antenor Nascentes, é intermediário entre os
dois grupos que estabelece, o do norte e o do sul, e não se restringe ao estado da
Bahia, invadindo parte de Sergipe, Minas Gerais e Goiás.
A variação dialetal não é apenas privativa dos níveis populares, mas de todos
os níveis em que exista diferenciação, e os atlas linguísticos, com sua ênfase na
fonética e no vocabulários, e calcados apenas no falar de iletrados, não
poderiam, por si só, dar conta dessa imensa diversificação. A variação atinge
também o nível culto, já que a norma culta padrão, consubstanciada nas
gramáticas escolares, nada mais é que uma abstração. As normas cultas regionais
devem ser focalizadas como fatos dialetais e essas modalidades populares devem
ser estudadas precisamente à luz dessas normas locais. Foi nesse sentido que
surgiu, em 1970, o Projeto de Estudo da Norma Linguística Urbana Culta
(Projeto NURC), que tinha por finalidade estudar as normas linguísticas de cinco
capitais brasileiras (Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Recife)
através da análise da fala culta média habitual. Essas cidades proporcionam uma
amostra relativa a uma população urbana concentrada em quatro cidades
fundadas no século XVI e uma — Porto Alegre — no século XVIII, distribuídas
por nossa extensão territorial mais densamente povoada, correspondendo, grosso
modo, às regiões geográficas do Sul (POA), Sudeste (SP e RJ) e Nordeste (SSA
e RE).
Mapa 2. Limites do falar baiano na divisão proposta por Antenor Nascentes
Esse projeto disponibilizou uma documentação sonora de mais de 650 horas
de registros magnetofônicos no país, capaz de fornecer dados sobre a língua
falada, em diferentes modos de interação, entrevistas, diálogos, aulas,
conferências. Desde o primeiro momento, os idealizadores do projeto brasileiro,
que buscaram inspiração no Projeto Internacional sobre o Espanhol na América,
pretenderam demonstrar que havia uma pluralidade de normas, normas
objetivas, calcadas em dados empíricos, e não uma norma imposta segundo
padrões externos de correção e juízo de valor. Questões do tipo como se fala
hoje em determinadas comunidades, que variações há, sejam sociais, regionais,
combinatórias ou distribucionais, e qual o afastamento existente entre as línguas
falada e escrita poderiam encontrar aí uma resposta.
Estudos sistemáticos de vários fenômenos, nas modalidades cultas de Porto
Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Recife, considerados centros
urbanos irradiadores de cultura, puderam comprovar, mais uma vez, essa
diversidade de falares e normas. Além disso, não se detectou, como seria de
esperar, uma coincidência entre o comportamento linguístico desses falares e
suas respectivas áreas geográficas: Recife, por exemplo, incluída na região
Nordeste, aproxima-se, muitas vezes, mais de Porto Alegre que de Salvador. O
Rio de Janeiro, cujo dialeto é considerado o “padrão” em relação aos falares
brasileiros e é incluído entre os dialetos do Sul, apresenta realizações que ora o
aproximam de uma região, ora de outra: no caso do r, de Salvador e Recife, e no
caso do famoso “chiado” carioca, apenas de Recife. Em outros casos, afasta-se
tanto de Recife quanto de Salvador, aproximando-se mais de São Paulo e Porto
Alegre, como no uso do artigo diante de nomes de pessoas, o João, a Maria,
usado mais frequentemente na região Sul, em oposição a João, Maria, típico da
região Norte e Nordeste e, por estranho que possa parecer, de Niterói, apenas do
outro lado da ponte, dentro do próprio falar fluminense.
Assim, a escalaridade de ocorrência de cada fenômeno não se sobrepõe pari
passu a uma continuidade geográfica. Ao menos, no que se refere a alguns
aspectos fonéticos e morfossintáticos, não se pode traçar um feixe de isoglossas
que determine áreas dialetais nítidas. Antes parece que cada dialeto tem uma
combinação própria de atualização de regras, o que permitiria dizer que cada
dialeto tem a sua “norma”.
O falar carioca no conjunto dos falares brasileiros
Há 80 anos, o carioca Antenor Nascentes, seguindo os passos do paulista
Amadeu Amaral, autor de O dialeto caipira, descrevia o falar do Rio de Janeiro,
afirmando, no prefácio da primeira edição, que seu trabalho não era para a sua
geração e que somente dali a cem anos os estudiosos encontrariam nele uma
fotografia do estado da língua e neste ponto seriam mais felizes do que ele, que
nada encontrara, é óbvio, do falar de 1822. Filho de pais cariocas, nascido e
criado no então Distrito Federal, considerava-se um “legítimo representante da
fala genuinamente carioca ... habilitado a fazer o estudo dela ...”.
No Brasil, nas primeiras décadas do século XX, essa era a forma de fazer um
estudo dialetal: uma monografia baseada no seu próprio falar, contrastando-o
com observações assistemáticas sobre os demais falares brasileiros em oposição
a um português europeu virtual. Os mapas 1, 2 e 3 são frutos do trabalho de
Antenor Nascentes no sentido de delimitar, através de observações de natureza
linguística, as áreas dialetais brasileiras e situar o “linguajar carioca” nesse
conjunto.
Como se pode ver, a área linguística “fluminense” abrange, além do estado
do Rio de Janeiro, o Espírito Santo e uma zona de Minas Gerais (Mata e parte do
Leste). O linguajar carioca seria uma variedade do subfalar fluminense.
Mapa 3. Limites do falar fluminense na divisão proposta por Antenor Nascentes
A cidade do Rio de Janeiro costuma ser caracterizada como um espaço de
contrastes, seja no plano geográfico, seja no plano socioeconômico, e é raro
encontrar, no mundo atual, uma cidade tão diversificada. Esse quadro não é
recente, a julgar por depoimentos de viajantes que passaram pela cidade no
século XIX, e que contribuíram para traçar o perfil sociolinguístico do local: os
diferentes idiomas da multidão dessa gente, de todas as cores e vestuários, se
cruzam.
A existência, de um lado, de um Rio localizado entre as montanhas e o mar e,
de outro, de uma cidade que se estende por uma área de baixada, “depois” da
montanha, justifica a diferença no plano geográfico. É no âmbito
socioeconômico, porém, que o contraste mais se evidencia, e foi em função disso
que a capital fluminense foi escolhida para ser o primeiro município a ter seu
próprio Relatório de Desenvolvimento Humano, feito em parceria pelo Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Instituto de Pesquisa
Econômica (IPEA) e a Prefeitura, conforme publicado no jornal O Globo de
24.3.2001.
As razões dessa diferenciação não se apoiam diretamente na geografia da
cidade, embora as diferenças sociais estejam relacionadas às diferenças
geográficas. Na verdade, ela tem origem no processo de mobilidade que se
desenvolveu, a partir do século XIX, e que levou diferentes classes sociais a
ocuparem pontos urbanos diversificados. A expansão da cidade conduziu, grosso
modo, à oposição orla versus interior, ou zona sul versus resto da cidade. Até o
início do século XIX, o Campo de Santana marcava o limite norte-urbano do Rio
e se tornou a unidade espacial em torno da qual caminhou a expansão norte
urbana, no decorrer do século, através da implantação do projeto da Estrada de
Ferro D. Pedro II, em 1850. A cidade, de início, dividia-se em diversas
freguesias ou paróquias, passando a abranger, mais tarde, os territórios de
jurisdição administrativa. A mobilidade espacial/populacional era privilégio de
poucos e talvez possa explicar, em parte, as diferenças linguísticas que existem
hoje na fala de moradores das tradicionais áreas da cidade — Zona Norte, Zona
Sul e Zona Suburbana, esta última com resquícios de características rurais e
abrangendo toda a área residencial e industrial constituída ao longo das linhas
férreas a partir das últimas décadas do século XIX.
São os diversos aspectos caracterizadores da mobilidade econômica, cultural
e social que marcaram o Rio de Janeiro nos últimos dois séculos que tornam
possível entender a dinâmica linguístico-educacional neste terceiro milênio. Os
resultados do Relatório de Desenvolvimento Humano apontam um Rio de
contradições, em que a escolaridade mais alta é a da Zona Sul, com 11 anos,
seguida da Zona Norte, com 9, e dos subúrbios, com quase 7. Com esse quadro,
o nível educacional na Zona Suburbana se assemelha ao das capitais do
Nordeste. Não há, porém, uma igualdade nem mesmo dentro de uma única zona,
já que Madureira-Jacarepaguá é a única área do subúrbio em que a escolaridade
média supera 8 anos de estudo e mais de 17% da população adulta possuem
curso superior. A tese de que a migração elevou a escolaridade dos cariocas
adultos não se confirma, uma vez que a média da população migrante, de 6,9, é
menor que a da nascida na cidade, de 8,8. De todo modo, na cidade do Rio de
Janeiro, a escolaridade média de 8,2 é 2,7 anos acima da média nacional.
O Rio de Janeiro representaria, por assim dizer, um denominador comum da
realidade brasileira por ocupar dentro do país uma posição privilegiada, com a
menor taxa de analfabetismo entre as 12 maiores capitais do país e com um em
cada cinco adultos, pelo menos, tendo iniciado o curso superior. A escolaridade
média da população é de 8,2 anos, taxa insatisfatória para os padrões dos países
desenvolvidos, mas bem acima da média nacional de 5,5 anos. Esses dados de
natureza educacional (publicados em O Globo de 12.5.2001) poderiam servir
como argumentos na defesa de que a linguagem do Rio de Janeiro é o “padrão”
nacional. Ressalte-se, porém, que o bom nível educacional não está igualmente
distribuído pela cidade, estando a população com nível superior concentrada na
Zona Sul e nos bairros ricos da Zona Norte, distribuição que, sem dúvida, terá
relação com as diferenciações linguísticas existentes, como já foi comprovado. A
cidade abriga, em seus limites geográficos, bairros como a Lagoa, cuja renda
familiar per capita média de R$2.126 chega a ser quase 23 vezes maior que a
dos moradores da área rural de Santa Cruz, de R$93.
Em relação à escolaridade, o Rio de Janeiro mostra uma grande diferença de
São Paulo, o maior contingente populacional do país. Na capital paulista, a
escolaridade média é de 7,44, contra 8,16 dos cariocas. No que se refere à
educação superior, o Rio de Janeiro, com média de 19,75%, perde apenas para
Porto Alegre, Vitória e Curitiba. Em alfabetização, o Rio saltou de terceiro lugar,
em 1980, para primeiro lugar, na década de 1990, com uma população analfabeta
de apenas 3,4%.
Para exemplificar a diferenciação por área geográfica de residência, numa
perspectiva linguística, pode-se tomar como ponto de referência a distribuição
do r, consoante que apresenta várias possibilidades de pronúncia, desde uma
realização considerada padrão, mais conservadora, de vibrante anterior, o
chamado r “rolado”, mais frequente nos falares gaúcho e paulista, até uma
aspiração ou ausência do segmento, em final de infinitivos, como em tomá(r),
fazê(r), realizações mais inovadoras. Dentro do Rio de Janeiro, quanto à fala
culta, é a Zona Suburbana que se revela mais inovadora e estável, com
frequência maior de aspiradas (56%), mas, por outro lado, com o maior índice de
preservação do segmento no contexto final dos verbos, embora essa preservação
se atualize quase sempre através de uma leve aspiração. A Zona Sul é mais
instável, apresenta quer as realizações mais conservadoras, de maior prestígio,
quer as mais inovadoras, no mesmo contexto. A Zona Norte ora se aproxima de
uma, ora de outra, com percentual significativo da forma mais conservadora,
talvez por ser uma área de ocupação mais antiga e tradicional da cidade.
Na opinião de alguns, a diferença nítida entre o r do interior paulista e o do
falar carioca só se acentuou na segunda metade do século XIX, com a imigração
portuguesa. Há referências também ao fato de, por volta de 1860, os baianos
poderem distinguir a fala “bastante aportuguesada” do sotaque fluminense.
Mesmo distante da era do rádio e da televisão, o falar do Rio de Janeiro já era
utilizado como base de comparação para moradores de outras províncias.
Outra marca reconhecida da pronúncia carioca é a palatalização do s, o
famoso “chiado”, que parece ter sido introduzido no Rio de Janeiro no início do
século XIX, trazido pela corte de D. João VI. Essa tese é contestada por alguns,
embora outros admitam haver uma relação entre o fato histórico e o linguístico.
Restaria por explicar a ocorrência desse som “chiante” em grandes contingentes
de Pernambuco e Alagoas, além de em outros pontos esparsos, conforme já
atesta um dos dialetólogos brasileiros, Mário Marroquim, ao descrever a língua
do Nordeste.
A constatação de que a Zona Sul, onde é mais acentuada a interação
sociocultural e espacial, apresenta maior grau de oscilação de pronúncia (70% de
s “chiado” versus 30% de s “não chiado”), à semelhança dos resultados relativos
ao r, sugere a necessidade de levar em conta a migração de indivíduos
procedentes de outras regiões do país para as diversas áreas da cidade. No
Centro, área inicial de residência da corte portuguesa, o índice de s “chiado”
chega a 96%.
Convém lembrar que a vinda da corte portuguesa impôs uma série de
mudanças na cidade e fez surgir uma classe social até então inexistente. A cidade
pouco a pouco passou a ser movida por lógicas distintas, a escravista e a
capitalista, com reflexos no espaço urbano e a separação de usos e classes que se
amontoavam no antigo espaço colonial: brancos e negros, livres ou escravos.
Pelo relatório de 1873 da Diretoria-Geral de Estatística, o chamado Município
Neutro — que corresponde à cidade do Rio de Janeiro — contava com uma
população total de 274.972, sendo 226.033 homens livres e 48.939 escravos.
A expansão urbana não foi acompanhada de uma preocupação social
igualitária e não beneficiou as áreas em que as camadas mais pobres da
população residiam. Deu-se, algumas vezes, o encontro de grupos pertencentes
às classes mais baixas da população com outros provenientes de setores mais
ricos da sociedade, mas nunca houve interação total entre eles, pois o conceito
de hierarquia social estava demasiadamente infiltrado na sociedade. Pode-se
sugerir que a polarização geográfico-social refletiria uma oposição linguística,
com a presença, em lados opostos, de dois possíveis personagens da história do
falar carioca: um mais popular, originário dos contatos estabelecidos ao longo de
três séculos, e outro mais próximo ao português europeu, originário do novo
contingente populacional que chegou aqui. Assim, a chamada polarização
sociolinguística situaria, em um pólo as normas vernáculas ou populares e, em
outro, as normas cultas. As normas populares ou vernáculas corresponderiam
aos usos dos falantes menos escolarizados e as cultas aos usos dos falantes mais
escolarizados, essas, por sua vez, distintas da norma-padrão, que corresponderia
aos modelos preconizados pelas gramáticas normativas.
No que se refere à alfabetização, havia, pelo menos até o final do século
XIX, uma grande diferença entre a população masculina e feminina: enquanto
95% dos homens sabiam ler e escrever, apenas 58% das mulheres tinham essas
habilidades. Essa proporção não surpreende, uma vez que durante 322 anos —
de 1500 a 1822, período em que o Brasil foi colônia de Portugal — a educação
feminina ficou geralmente restrita aos cuidados com a casa, o marido e os filhos.
A instrução era reservada aos filhos/homens dos indígenas e dos colonos. Tanto
as mulheres brancas, ricas ou empobrecidas, como as negras escravas e as
indígenas não tinham acesso à arte de ler e escrever. O texto abaixo, extraído de
um editorial publicado no Jornal da Sociedade de Agricultura, Comércio e
Indústria da Província da Bahia em 1833, é ilustrativo dessa postura, que
extrapola o Rio de Janeiro:
O destino das mulheres, pelo contrario, he differente do dos homens, quer na Ordem Social, quer
na da natureza. Seja qual for sua pozição, e o lugar, que tenhão de occupar um dia, a sua
condicção na Sociedade não he a de comparecer em publico, exercer empregos, prehencher
cargos, tomar assento nas Assembleas, marchar contra o inimigo, cultivar as Artes mecanicas,
exercitar trabalhos exteriores: mas o viver na familia, o cuidar do arranjo domestico, por que ahi
he que as mulheres se fazem estimaveis. Sendo pois a sua educação de deveres a cumprir no
interior, deve a sua instrucção conformar-se toda á este fim; e portanto a instrucção recebida na
casa paterna he a que mais lhes convem; pois que tem a vantagem de formal-as logo da infancia
ás minuciosas circunstancias da economia domestica, e de lhes imprimir o espirito de modestia,
de paciencia, de ordem, e a doçura de caracter, principios fecundos de todas as suas boas
qualidades, bem como de sua felicidade ...
Só mais recentemente as mulheres passaram a ter um papel economicamente
mais ativo nos grandes centros urbanos. E a diferença hoje existente na fala de
homens e mulheres com curso universitário completo, registrada em estudos
realizados numa perspectiva sociolinguística, talvez tenha tido sua origem nessa
política seguida por vários séculos e que nem mesmo os movimentos feministas
atuais conseguiram anular integralmente.
Sexo, idade e variação linguística
Os gêneros masculino e feminino são categorias procedentes de uma construção
histórica, cultural e social e, na sociolinguística, a diferença entre a fala de
homens e mulheres é objeto de permanente discussão. Além de a questão contar
com extensa bibliografia, já ficou demonstrado ser essa diferenciação um fator
condicionante da heterogeneidade linguística. Louis Gauchat, ao estudar a fala
da localidade de Charmey, na Suíça, no início do século XX, verificou que as
mulheres eram mais propícias às inovações, apresentando realizações de vogais
que corresponderiam a um estágio mais avançado do processo de mudança
vocálica. Os estudos dialetológicos clássicos, por sua vez, tinham procurado
mostrar que se por um lado as mulheres tendiam a manter traços arcaizantes, por
outro aceitavam mais facilmente os neologismos, apresentando maior
instabilidade na fala que os homens. Poderíamos resumir afirmando que, em
geral, a geografia linguística, de base rural, vê a fala feminina como
conservadora, enquanto a dialetologia urbana, pelo menos a dos grandes centros,
a vê como inovadora. A justificativa para essa inversão estaria talvez no fato de,
num grande centro urbano, nos últimos anos, a mulher ter passado a
desempenhar outros papéis que não apenas o de “dona de casa prendada”.
Para ilustrar como fenômenos sociais estão intrinsecamente ligados a
fenômenos linguísticos, tomemos como exemplo o processo de apagamento do r
em posição final. Considerado uma mudança “de baixo para cima”, usado nas
peças teatrais de Gil Vicente para caracterizar a fala de negros, tem hoje um uso
irrestrito, não sendo privativo de mulheres ou de qualquer etnia, classe social ou
nível de escolaridade. São as mulheres jovens, contudo, que, em termos
percentuais, utilizam mais frequentemente a variante marcada e mais inovadora,
apagando o r final nas formas verbais do infinitivo. Isso talvez indique que esse
tipo de pronúncia não seja mais estigmatizado. Por outro lado, as mulheres
adultas acima de 36 anos diminuem sensivelmente o percentual de uso,
comportamento esse oposto ao dos homens, e que talvez denote que uma marca
negativa ainda persiste. As mulheres, na fase de fixação no mercado de trabalho,
teriam, assim, um maior cuidado em sua utilização da linguagem, a fim de não
acrescentar um outro critério discriminatório.
No que tange ao “chiamento”, uma mudança considerada de “cima para
baixo”, por imitação ao falar da corte portuguesa, parece estar envolvida,
questão de natureza diversa, a de identidade regional, não havendo diferença
entre jovens e adultos nem tampouco entre homens e mulheres, no Rio de
Janeiro.
A generalização que se pode fazer sobre as diferenças existentes entre a
linguagem masculina e feminina é a de que a identidade homem/mulher interage
com outras identidades culturais, não podendo ser vista isoladamente, e sim em
conjunto com outros fatores. A interação gênero/faixa etária desempenha papel
de importância na análise do processo de mudança linguística.
Para uma caracterização dos falares brasileiros
As propostas de descrição dialetal baseavam-se, de início, na introspecção da
própria fala ou em impressões assistemáticas e generalistas, sob a forma
monográfica. Tentativas de caracterizar o falar brasileiro padrão através de uma
“média aritmética” que correspondesse ao tipo de pronúncia majoritária no
Brasil, sem incorrer no equívoco de comparar contingentes populacionais
diferenciados, social e regionalmente, e opor a variante popular da região x à
variante culta da região y não tiveram continuidade. A partir da década de 1960,
surgem os atlas linguísticos que incidem apenas sobre a linguagem popular e
umas poucas áreas do território nacional.
Trabalhos com metodologia quantitativa rigorosa só tiveram início, no
Brasil, a partir da década de 1970, com a utilização de programas
computacionais de análise variacionista. Pôde-se daí confirmar que se
contrapõem não só normas gerais distintas nas várias modalidades nacionais,
mas também normas específicas internas em cada uma delas. Os fenômenos
linguísticos enfocados abrangem cinco áreas urbanas, falantes com curso
superior completo, do sexo feminino e masculino, distribuídos por três faixas
etárias: 25-35 anos, 36-55 anos e 56 anos em diante.
A fonética da fala culta
Vocalismo átono
Nos estudos sobre o português, as vogais pretônicas têm sido consideradas um
fator de diferenciação não só entre os falares brasileiros, mas também entre o
português do Brasil e o de Portugal. Para o português do Brasil, as vogais
pretônicas, grafadas e e o, estabelecem a linha divisória entre os falares do
Norte, que em geral optam pela realização aberta, e os falares do Sul, que
geralmente optam pela realização fechada.
Para a determinação dos limites relativos a essas vogais, compararam-se
dados de Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador, Recife e São Paulo, obtendo-se
os seguintes percentuais no que se refere às pretônicas médias abertas [E] e [C]:
60% em Salvador, 47% em Recife, 5% no Rio de Janeiro, 0% em São Paulo e
0% em Porto Alegre.
Figura 1. Percentuais de vogais médias pretônicas abertas em Salvador, Recife, Rio de Janeiro, São Paulo e
Porto Alegre
A comparação entre os percentuais de cada cidade mostra que em Porto
Alegre e São Paulo não há ocorrências de vogais médias abertas, no Rio de
Janeiro o percentual é insignificante e em Salvador e Recife há uma
predominância das vogais abertas. Confirma-se, assim, a previsão de Antenor
Nascentes e pode-se traçar uma linha que separe Salvador e Recife das demais
cidades.
A opção por uma vogal baixa aberta, [E] ou [C], ou alta fechada, [i] ou [u],
obedece a condicionamentos estruturais e sociais, sutilezas que passam
desapercebidas aos falantes e ouvintes. O primeiro condicionamento é a
presença de uma vogal alta ou baixa na sílaba acentuada, como em c[u]ruja e
p[i]rigo, em vez de coruja e perigo, P[E]lé e b[C]lota, em vez de Pelé e bolota.
As consoantes adjacentes são também condicionadoras do processo de elevação.
A lateral palatal, grafada lh, tem o efeito de altear a vogal (c[u]lher e m[i]lhor).
As consoantes labiais (p/b, f/v, m) provocam a elevação apenas de o, como em
m[u]leque, b[u]neca, apesar da presença em sílaba tônica de uma vogal aberta.
A vogal pretônica da palavra melhor chega, em algumas áreas, a admitir as três
pronúncias, m[e]lhor, m[i]lhor e m[E]lhor, a primeira, em que nenhuma regra se
aplica, já que a elevação e abaixamento são processos facultativos, a segunda,
em que atua a consoante lh, e a terceira, em que o fator condicionante é a vogal
aberta da sílaba tônica.
A oposição entre a fala de homens e mulheres faz-nos pensar numa
sociedade cindida, a julgar pelos percentuais de uso do processo de elevação (e
→ i ; o → u), mas não no de abaixamento (e → E; o → C), na cidade de Recife.
As mulheres apresentam maior percentual de aplicação da regra de elevação que
os homens, o que pode ser um indício de que as mulheres estão liderando um
processo de mudança, isto é, seriam elas mais inovadoras por estarem usando as
variantes típicas da geração mais nova.
A distribuição dos resultados por faixas etárias mostrou, no caso das
pretônicas, que, no Rio de Janeiro, a elevação é mais frequente nos falantes mais
velhos (mais de 56 anos), diminuindo gradativamente nas gerações mais jovens
(25-35 anos). Já em Recife é a geração mais jovem, e não a mais velha, que
preferencialmente alteia a vogal, tanto a anterior e, quanto a posterior o. Esse
comportamento inverso nas duas cidades, uma do Nordeste e outra do Sudeste,
não é surpreendente, uma vez que o processo mais comum em Recife é o do
abaixamento da vogal e são os mais idosos que utilizam com maior frequência a
vogal aberta. Admitindo-se que faixa etária corresponde a estágios temporais
aparentes, os falantes mais velhos sendo depositários de formas mais antigas,
pode-se supor que a forma inovadora, a preferencial dos mais jovens, em Recife,
seja o alteamento, e, no Rio de Janeiro, seja a manutenção da vogal média, já
que o abaixamento não passa de 5% e atinge um número restrito de vocábulos.
As consoantes pós-vocálicas
Os fonemas s, r e l apresentam, em posição final de sílaba, variações
significativas e prestam-se à caracterização dos dialetos regionais. A tendência
expressa pelas variações dos fonemas parece ser a já observada em quase todas
as línguas: a posteriorização do ponto de articulação da consoante, acompanhada
de um processo de enfraquecimento e perda, se em final de palavra.
Tecnicamente, tem-se como possibilidades de realização do r, em palavras como
rato, carro, carta, uma vibrante ápico-alveolar múltipla, uma fricativa velar, uma
mera aspiração e, em palavras como amor e cantar, até mesmo a ausência do
segmento. Ocorre ainda, em raros casos, uma vibrante retroflexa, o famoso r
caipira. O s pode ser “chiado” ou “sibilante”, uma aspiração ou zero,
excepcionalmente, em palavras como rosto, cisco, mesmo, luz, pires. O l admite
basicamente duas possibilidades: uma variante vocalizada, que leva à confusão
na escrita de formas como mal e mau, e outra velarizada, que ficou célebre
graças aos pronunciamentos de políticos gaúchos no rádio. (Os resultados aqui
apresentados estão baseados na audição de 30 fitas magnetofônicas, 4.334
ocorrências de r, 9.026 de s e 2.595 de l.)
O r pós-vocálico
O estudo quantitativo da distribuição de variantes nas cinco capitais mostrou que
São Paulo e Porto Alegre opõem-se nitidamente ao Rio de Janeiro, Salvador e
Recife nos índices de frequência das variantes. Em São Paulo e Porto Alegre, a
vibrante simples apresenta percentuais muito próximos: 62% e 68%. No Rio de
Janeiro, Salvador e Recife, a variante quase não ocorre. No que tange à fricativa
velar, São Paulo e Porto Alegre apresentam um índice muito baixo de
ocorrência. No Rio de Janeiro e em Salvador é essa a realização mais frequente:
39%. Em Recife, esse percentual baixa para 28%. Por outro lado, em relação à
fricativa aspirada, variante ausente em São Paulo e com percentual de 1% em
Porto Alegre, é em Recife que se encontra o índice mais alto, 38%, enquanto Rio
de Janeiro e Salvador têm 23% e 25%, respectivamente.
A diferença entre as duas áreas fica ainda mais nítida se considerarmos
apenas o contexto final de sílaba, no interior do vocábulo, e opusermos a
realização anterior (vibrante apical simples e múltipla) à realização
posteriorizada (fricativa velar, aspiração), como se pode ver na Figura 2, em que
se apresentam os percentuais de posteriorização do r em posição medial.
Os resultados permitem traçar, mais uma vez, uma linha divisória que separa
São Paulo e Porto Alegre de Rio de Janeiro, Salvador e Recife, os primeiros
privilegiando as variantes vibrantes apicais e os segundos, as variantes não
vibrantes posteriores.
Figura 2. Não vibrante posterior nas cinco cidades
O s pós-vocálico
Palavras como cisco e mesmo podem ser pronunciadas com um s “sibilante” ou
“chiado”, a depender do dialeto. Análises quantitativas evidenciam que São
Paulo e Porto Alegre têm uma distribuição praticamente idêntica, com
predomínio quase absoluto da realização alveolar. No Rio de Janeiro, por outro
lado, predomina a realização palatal, comportando-se Recife de forma
semelhante, embora com percentual mais baixo, 69%. Salvador, por sua vez,
apresenta uma distribuição equilibrada das duas variantes.
Figura 3. "Chiamento" versus "não chiamento"
Observa-se, portanto, de novo, uma oposição “sul/norte”, caracterizando-se a
primeira pela não palatalização (realização sibilante). A região “norte”,
entretanto, não apresenta comportamento homogêneo: de um lado Recife e Rio
de Janeiro ostentam um elevado grau de “chiamento”, em oposição a Salvador.
Esses dados corroboram em parte a divisão de áreas linguísticas proposta por
Antenor Nascentes, que admite um falar baiano que se opõe aos falares
nordestino, sulista e fluminense. Assim, no Mapa 4, uma linha divisória separa
Porto Alegre e São Paulo de Rio de Janeiro, Salvador e Recife, e a maior
aproximação entre Rio de Janeiro e Recife é assinalada pela circunscrição de
Salvador.
O l pós-vocálico
O material examinado confirma um fato público e notório: a vocalização da
lateral é geral em todo o país. Não pode ser considerada um traço da fala popular
restrito a algumas áreas, como Ceará e Rio de Janeiro, como se poderia pensar, a
julgar por textos clássicos. Comparando a fala culta de São Paulo, Rio de
Janeiro, Salvador, Recife e Porto Alegre, é fácil perceber que Porto Alegre se
distingue das demais, sendo a realização alveolar/velar praticamente exclusiva
dessa capital.
Figura 4. Vocalização do l
Além disso, a pronúncia vocalizada concorre em Porto Alegre com a
pronúncia velar/alveolar, com predomínio da primeira entre os jovens, o que
indicaria uma mudança em progresso, mas apenas para os homens. As mulheres
apresentam outra configuração de uso, em que se igualam jovens e idosos em
contraste com os adultos, o que corresponde a uma variação estável.
Figura 5. Distribuição de uso da variante vocalizada do l por gênero/faixa etária
Padrão entonacional em estruturas de tópico
O ritmo da frase, ou cadência, pode ser considerado um tema de apaixonante
discussão, que supera mesmo, na maioria das vezes, a diferenciação fônica na
percepção auditiva do interlocutor. É justamente aí que fica ressaltada a maneira
de falar nordestina em relação às outras áreas, principalmente para as pessoas
que têm bom ouvido. Não é propriamente a pronúncia de um determinado som
por um cearense, pernambucano ou amazonense que pode chocar um falante
carioca; é o modo peculiar de falar “cantando” dos primeiros e não do último,
que não “canta”, embora todos pronunciem as vogais pretônicas abertas.
A análise realizada na fala culta das cinco capitais abrange apenas as curvas
entonacionais relativas às chamadas construções de tópico, isto é, aquelas
construções em que um sintagma nominal aparece deslocado à esquerda da
sentença e corresponde, em geral, ao tema da conversa, como “a passagem, eu
compro a prazo”, “o carro, o pneu furou”, “drama, já basta a vida”. Foram
estabelecidos sete padrões entonacionais com a finalidade de verificar se haveria
um padrão característico de cada região:
1. Ascendente simples: apresenta uma subida melódica na sílaba tônica final ou na pós-tônica.
2. Ascendente duplo: duas modulações ascendentes.
3. Ascendente/descendente: modulação ascendente na primeira tônica, alta até a pretônica final,
descendo na última tônica.
4. Ascendente contrastivo: modulação ascendente na pretônica ou na tônica, e, neste último caso,
mais acentuada que o padrão ascendente simples.
5. Descendente: modulação descendente na tônica final.
6. Neutro: tessitura normal, sem modulação.
7. Alto: tessitura alta, sem modulação.
Verificou-se que há, na verdade, uma distribuição regional mais nítida no que
se refere ao padrão descendente. A Figura 6 apresenta os percentuais de
ocorrência dos três padrões básicos, ascendente (simples, duplo ou contrastivo),
descendente e sem modulação (tessitura neutra ou alta):
Figura 6. Padrões entonacionais nas construções de tópico
Assim, Porto Alegre se singulariza por uma não ocorrência do padrão
descendente e total predominância do padrão ascendente (89%). O Rio de
Janeiro aproxima-se da distribuição de Porto Alegre, embora dele difira pela
possibilidade mínima de um padrão descendente. Ocupa, em geral, uma posição
intermediária entre Salvador e Recife de um lado e São Paulo e Porto Alegre de
outro. No caso específico, está mais próximo de Porto Alegre que de São Paulo.
As cidades de Salvador e Recife mais uma vez apresentam comportamentos
semelhantes, embora o padrão descendente seja mais característico da primeira.
Os dados referentes a esse padrão é que permitem traçar uma linha que separa
Salvador, Recife e São Paulo de Porto Alegre e Rio de Janeiro, conforme Mapa
4.
Os sotaques sintáticos da fala culta
Conquanto as diferenças que chamam de imediato a atenção de qualquer usuário
de uma língua fossem as de pronúncia, e não se esperassem nítidas diferenças
entre as cinco cidades na análise de fatos gramaticais, tornou-se evidente,
conforme palavras do linguista Fernando Tarallo, a existência de “sotaques
sintáticos”.
O artigo definido diante de nomes próprios e de
possessivos
O português do Brasil apresenta um aspecto diverso da maioria das línguas
românicas: a possibilidade de emprego de artigo diante de possessivos, o meu
livro, e diante de antropônimos, a Maria. Esses usos variáveis são mencionados
na gramática normativa, mas não se estabelece uma correlação entre os dois. O
uso diante de antropônimos é normalmente considerado indicativo do grau de
intimidade entre falantes e, embora não estigmatizado ou valorizado
socialmente, é evitado em textos jornalísticos e técnicos que utilizam uma
linguagem menos marcada, mais impessoal. O mesmo não se aplica aos textos
literários, em que o uso do artigo pode ter uma função estilística.
Sabe-se que houve um aumento gradual de uso do artigo nos dois contextos
nos últimos séculos, mas sua frequência de uso é assimétrica: diante de
possessivos é alta e diante de nomes próprios é neutra, se anuladas as distinções
existentes entre as diversas áreas do território brasileiro. No Brasil, na verdade, o
uso do artigo diante de nomes personativos obedece a uma distribuição regional
nítida e é suficiente, por si só, para determinar a região de origem do falante. A
frequência aumenta à proporção que se vai do nordeste para o sul do país,
embora cada cidade apresente um comportamento interno heterogêneo em
relação a homens e mulheres, jovens e idosos. O comportamento dialetal
diferenciado poderia apoiar-se, além de em critérios históricos, na diferença
entre o ritmo silábico e o ritmo acentual, geralmente considerados,
respectivamente, característicos dos falares “nortistas” e “sulistas”. Os primeiros
tenderiam a não empregar o artigo e os últimos a empregá-lo.
Figura 7. Distribuição regional de uso do artigo diante de nomes próprios e possessivos
Em termos absolutos, a distinção se situa no Rio de Janeiro e em São Paulo.
Enquanto, diante dos possessivos os falantes do Rio de Janeiro e de São Paulo
ficam a meio caminho entre “norte” e “sul”, diante dos antropônimos os falantes
de São Paulo são os que mais utilizam o artigo.
Os limites relativos à frequência de uso diante de nomes próprios são mais
nítidos: São Paulo e Porto Alegre opõem-se a Recife e Salvador, o Rio de
Janeiro permanecendo numa posição intermediária.
Alternância nós/a gente
A inclusão da expressão a gente no quadro dos pronomes pessoais já motivou
pesquisas tanto na fala culta quanto na popular. No português do Brasil, a
distribuição de uso de a gente e nós é mais ou menos equilibrada: 56% e 44%,
respectivamente. Não se encontram grandes divergências entre as cinco capitais
brasileiras, mas o Rio de Janeiro é a capital onde mais se usa a gente (59%) na
função de sujeito, enquanto as demais cidades ainda privilegiam o emprego de
nós, conforme se pode ver na Figura 8.
Os percentuais de uso indicam que a substituição de nós por a gente ainda
não atingiu na norma culta o mesmo nível de aceitação que se verifica na fala
popular. Na década de 1990, na verdade, a forma inovadora atingiu 75% no Rio
de Janeiro e nos jovens ultrapassou 90%. Esse fato sugere uma substituição
acelerada de nós por a gente nos últimos 20 anos.
Figura 8. Percentuais de uso de nós e a gente
Ter por haver em construções existenciais
Costuma-se dizer que a substituição de haver por ter, em estruturas existenciais,
constitui uma das marcas que caracterizam o português do Brasil, em oposição
ao português de Portugal e à semelhança do de Angola e Moçambique.
Na modalidade oral culta do português brasileiro contemporâneo, a
penetração de ter ainda não se completou. Observando os mesmos cinco centros
urbanos, a partir de gravações realizadas na década de 1970, verifica-se, mais
uma vez, que há diferenciação regional. No Rio de Janeiro, na década de 1990, o
uso de ter já alcançava 78% e, nos mais jovens, de 25 a 35 anos, chegava a
atingir 97%. Mesmo na década de 1970, são os jovens que apresentam um uso
maior de ter, oscilando entre 77 e 89%, com exceção de Salvador, cujos falantes
da faixa intermediária, entre 36 e 55 anos, é que usavam preferencialmente ter
(90%). Salvador apresenta um comportamento diferenciado também no que se
refere à distinção de gênero: é a única cidade, das cinco analisadas, em que os
homens usam mais ter que as mulheres.
Figura 9. uso de ter em estruturas existenciais
A análise de textos jornalísticos, no período de 29.10 a 8.11.1999, em três
jornais, O Globo, O Dia e Povo do Rio, o primeiro enquadrado entre os de
qualidade — que fornecem informação sóbria e séria e que gozam de prestígio
junto às classes A e B — e os dois últimos considerados populares — cujo
principal objetivo se restringe ao número de cópias de cada edição —, evidencia
que a substituição de haver por ter já atingiu a língua escrita. No jornal O Globo,
como seria de esperar, ainda se verifica uma preferência pela variante padrão,
com predomínio do verbo haver, enquanto nos jornais mais populares, o
percentual maior é de ter.
Figura 10.Distribuição de uso de ter e haver por tipo de jornal (década de 1990)
Normas, pluralismo etc.
A variação existente hoje no português do Brasil, que nos permite reconhecer
uma pluralidade de falares, é fruto da dinâmica populacional e da natureza do
contato dos diversos grupos étnicos e sociais nos diferentes períodos da nossa
história. São fatos dessa natureza que demonstram que não se pode pensar no
uso de uma língua em termos de “certo” e “errado” e em variante regional
“melhor” ou “pior”, “bonita” ou “feia”. No ensino da língua escrita, contudo,
procura-se neutralizar as marcas identificadoras de cada grupo social, a fim de
atingir um padrão único abstrato e idealizado que seja supranacional. O
paradoxo está em que cada falar, mesmo o culto, tem sua norma, variantes que
prevalecem estatisticamente, mas que não anulam a ocorrência de outras. Para
exemplificar, como se pode ver nas Figuras 11 e 12 referentes ao r, no contexto
final de sílaba, em carta ou porto, quase todas as variantes ocorrem, tanto em
Porto Alegre quanto no Rio de Janeiro. O que singulariza uma ou outra cidade é
a predominância de determinada variante sobre as outras: em Porto Alegre, o r
rolado; no Rio de Janeiro, o r posterior (velar ou aspirado).
Figura 11. Tipos de r em Porto Alegre
Figura 12. Tipos de r no Rio de Janeiro Que evidências inequívocas há para decidir que um determinado
tipo de realização do r ou qualquer outro fato linguístico do Rio de Janeiro representa o padrão e é melhor
que o de Porto Alegre, de Salvador ou de qualquer outra cidade?
E mais um adendo. Vocalizar o l, apagar o r dos infinitivos, dizer tem livros
em cima da mesa, em vez de há livros em cima da mesa, não constituem
ameaças à integridade da língua portuguesa. A vocalização do l já ocorria em
latim, o francês já cancelou o r de seus infinitivos há séculos e a invasão de ter
no domínio de haver já ocorreu desde, pelo menos, o século XVI, quando a ideia
de posse passou a ser expressa pelo verbo ter, e não mais pelo verbo haver. Nem
os empréstimos lexicais colocam a língua “a perigo”. São apenas reflexos de
contatos culturais, ontem e hoje. Convivemos perfeitamente bem com palavras
como álcool, almofada, do árabe, garagem e personagem, do francês, e futebol,
do inglês. E temos de conviver também com deletar, por empréstimo ao inglês,
que, por sua vez, tem origem latina (delere, deletum).
Traçando linhas imaginárias
Outra questão digna de destaque é a de que não há, necessariamente, uma
coincidência entre o comportamento linguístico dos falares e de suas áreas
geográficas respectivas: Recife, por exemplo, incluída na região Nordeste,
aproxima-se, muitas vezes, mais de Porto Alegre que de Salvador. O Rio de
Janeiro, cujo dialeto é considerado o “padrão médio” em relação aos falares
brasileiros e é incluído, segundo Nascentes, entre os dialetos do Sul, apresenta
realizações que ora o aproximam de Salvador e Recife, como no caso do r, ora
apenas de Recife, como no caso do s. O falar do Rio de Janeiro, pois, ora se liga
aos falares do Sul, ora aos do Nordeste, ora ocupa uma posição intermediária.
O Mapa 4 traça as linhas imaginárias que demarcam uma variante em
relação a cada um dos processos aqui exemplificados. O que este mapa quer
demonstrar é a possibilidade de identificar a origem de um falante apenas com
base em determinados traços fonéticos e/ou sintáticos: “chia o s, aspira o r, pode
apostar, é carioca, e mulher”; “não chia o s, vibra o r, tem entoação ascendente,
é gaúcho”.
Voltando ao começo
Tudo isso teve início com a chegada de Cabral, que, ao aportar no Novo Mundo,
se deparou com povos, costumes e línguas diversos, até então desconhecidos.
Pouco depois, chegaram os jesuítas, com a missão de transformar os indígenas
em cristãos. E daí surgiu a primeira gramática de falares brasileiros, Arte da
gramática da língua mais usada na costa do Brasil, do padre José de Anchieta.
A finalidade era ensinar a outros religiosos a língua tupinambá e tornar efetiva a
catequese. Como qualquer gramática, embora intentasse ser apenas descritiva e
pedagógica, terminou por ser um instrumento de normatização e
homogeneização. É bom lembrar que havia em tupinambá uma variação dialetal
bem-pronunciada. Fernão Cardim, um de nossos primeiros cronistas, menciona,
em 1584, 68 dialetos distintos do tupinambá que se estendiam por uma área
correspondente aos estados de Sergipe, Bahia, Espírito Santo e Rio de Janeiro,
aproximadamente. Anchieta até reconhece essa diversidade, ao comparar a
diferença de pronúncia de falantes de São Vicente/São Paulo e do Rio de Janeiro,
cujo dialeto retrata em sua gramática.
Mapa 4. Linhas demarcatórias de fenômenos linguísticos em áreas contínuas A política posta em prática
pelos jesuítas com o apoio da Coroa tirou dos índios seus costumes, suas terras, sua cosmologia, sua música
e sua língua. A uma diversidade condenada impôs-se uma homogeneidade, cujo objetivo era manter a
unidade do território conquistado. Essas populações sem fé, nem lei, nem rei deveriam passar a ter uma fé,
só uma lei, só um rei. Estavam assim lançadas as bases para um imaginário, que ainda hoje perdura, de uma
Terra Brasílica, linguística e culturalmente homogênea.
Os hospedeiros dos portugueses, os tupinambás, conviviam bem com a
variação e a heterogeneidade, já que sua sociedade não tinha como critério
classificatório o “bem” ou “mal” falar, que dirá o “bem” ou “mal” escrever. Mas
chegara também com Cabral uma sociedade portuguesa estratificada, em que
prevaleciam juízos de valor sobre a linguagem. E hoje legisla-se sem real
conhecimento da complexidade dos fatos que caracterizam cada falar. Elege-se
um padrão supranacional, do mesmo modo como se institucionalizou uma língua
indígena como língua geral.
E assim tudo continua.
Cronologia
1595 Primeira gramática de uma língua brasileira: Arte de grammatica da lingoa
mais usada na costa do Brasil, de José de Anchieta, escrita para ensinar o
tupinambá aos jesuítas com a finalidade de tornar mais eficaz a catequese.
1823 Reconhecimento oficial das diferenças de “prosódia” do português falado
no Brasil durante a Assembleia Nacional Constituinte.
1852 Publicação de Coleção de vocábulos e frases usados na província de São
Pedro do Rio Grande do Sul, de Antônio Alvares Pereira Coruja, primeiro
glossário regional representativo de uma primeira fase dos estudos
dialetológicos.
1920 Publicação de O dialeto caipira, de Amadeu Amaral, marco da dialetologia
brasileira, primeiro estudo monográfico de um falar não padrão.
1922 Publicação de O linguajar carioca, de Antenor Nascentes, com uma
primeira tentativa de divisão de áreas dialetais brasileiras, a partir de dados
linguísticos.
1937 Primeiro Congresso da Língua Nacional Cantada, realizado no Teatro
Municipal de São Paulo, com participação da alta intelectualidade da época,
tendo como finalidade estabelecer as “normas de dicção em língua nacional,
adequando-as às exigências dos fonemas nacionais”.
1956 Primeiro Congresso Brasileiro de Língua Falada no Teatro. Realizado em
Salvador, teve como objetivo a padronização de uma pronúncia não marcada
regionalmente a ser usada não só no teatro, mas também no Congresso Nacional,
em conferências, salas de aula e em todos os veículos de comunicação de massa.
1963 Publicação do primeiro atlas linguístico brasileiro, o Atlas prévio dos
falares baianos. Num reconhecimento da heterogeneidade, pela primeira vez
buscava-se estabelecer limites linguísticos através da distribuição espacial de
formas linguísticas. Serviu de modelo para os que seguiram.
1969 Início do projeto nacional de estudo da Norma Linguística Urbana Culta
(NURC) com a finalidade de caracterizar uma pluralidade de normas que
levassem em conta as diferenças regionais e socioculturais do país, opondo-se
aos desideratos do Congresso de Língua Falada no Teatro.
1997 Início do projeto nacional Para a História do Português Brasileiro,
empreendimento que tem por finalidade a reconstrução dos elementos sociais e
linguísticos da história do português brasileiro.
Referências e fontes
A “Introdução” retrata a tensão existente entre uma unidade linguística
supranacional e a constatação de uma diversidade regional e sociocultural,
utilizando os seguintes autores e obras: João Ribeiro, A língua nacional, São
Paulo, Companhia Editora Nacional, 2ª ed., 1933; Manuel Diégues Jr., Regiões
culturais do Brasil, Rio de Janeiro, MEC/INEP, 1960; Antônio Houaiss,
Sugestões para uma política do idioma, Rio de Janeiro, MEC/INL, 1960;
Primeiro Congresso Nacional de Língua Falada no Teatro. Rio de Janeiro,
MEC, 1958.
“Uma visão geral do Brasil: o mito da homogeneidade” apoia-se nos trabalhos
de: José Honório Rodrigues, História viva, São Paulo, Global Universitária,
1986; Sérgio Buarque de Holanda. Raízes do Brasil, Rio de Janeiro, José
Olympio, 20ª ed., 1988; Serafim da Silva Neto, Introdução ao estudo da língua
portuguesa no Brasil, Rio de Janeiro, Presença, 5ª ed., 1986; Nelson Rossi, “A
realidade brasileira. O mito da unidade e sua manipulação”, Revista do Instituto
de Estudos Brasileiros, 22, São Paulo, USP, p.34-44; Aryon Rodrigues, Línguas
indígenas: 500 anos de descobertas e perdas, Delta, vol.9, nº1, São Paulo, 1993,
p.83-103; Dante Lucchesi, “A constituição histórica do português brasileiro
como um processo bipolarizador: tendência atual de mudança nas normas culta e
popular”, in Grosze, S. e K. Zimmermann (orgs.), “Substandard” e mudança no
português do Brasil, Frankfurt, TFM, 1998, p.73-99.
“Assumindo a diversidade” apresenta as diversas propostas de divisão do Brasil
em áreas regionais, entre as quais se destaca a de Antenor Nascentes,
reformulada na 2ª edição de O linguajar carioca, Rio de Janeiro, Simões, 1953.
Registram-se também os atlas linguísticos gerais já publicados e os principais
estudos monográficos: Nelson Rossi et al., Atlas prévio dos falares baianos, Rio
de Janeiro, MEC/INL, 1963; José Ribeiro et al., Esboço de um atlas linguístico
de Minas Gerais, Rio de Janeiro, MEC/Fundação Casa de Rui
Barbosa/Universidade de Juiz de Fora, vol.1, 1977; Maria do Socorro Aragão e
Cleusa Menezes, Atlas linguístico da Paraíba. Cartas léxicas e fonéticas,
Brasília, UFPb/CNPq, 1984; Carlota Ferreira et al., Atlas linguístico de Sergipe,
Salvador, UFBA/Fundação Estadual de Cultura do Estado de Sergipe, vol.1,
1987; Vanderci Aguilera, Atlas linguístico do Paraná, Curitiba, Imprensa Oficial
do Estado do Paraná, vol.1, 1994. Além do trabalho de Antenor Nascentes, estão
referidos: Amadeu Amaral. O dialeto caipira, São Paulo, Hucitec/SCET/CEC, 3ª
ed.,1976 (1ª ed. 1920), e Mário Marroquim, A língua do Nordeste (Alagoas e
Pernambuco), São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1934. E também o
artigo de José Liberal de Castro, “Extração da média aritmética da pronúncia
nacional. Caracterização da base carioca, como resultado da média. Notas
subsidiárias a respeito do linguajar cearense”, Anais do Primeiro Congresso
Brasileiro de Língua Falada no Teatro, Rio de Janeiro, MEC, 1958, p.101-12.
“O falar carioca no conjunto dos falares brasileiros” e “Sexo, idade e variação
linguística” apoiam-se no traba-lho de Antenor Nascentes, anteriormente citado,
e em: Dinah Callou, Variação e distribuição da vibrante na fala urbana culta do
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, UFRJ/PROED, 1987; Dinah Callou e Maria
Helena Marques, “O -s implosivo na linguagem do Rio de Janeiro”, Littera, 14,
ano 5, Rio de Janeiro, Grifo, jul-dez 1975, p.9-137; Maurício Abreu, Evolução
urbana do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1987; Luiz Felipe
Alencastro (org.), História da vida privada no Brasil, vol.2, São Paulo,
Companhia das Letras, 1997. Os dados estatísticos foram extraídos de O Globo,
“Retratos do Rio”, edição de 24.3.2001, e de: Recenseamento do Brasil de 1872,
Município Neutro, vol.5, IBGE; Relatório de 1873, Directoria Geral de
Estatística, Rio de Janeiro, Typographia Franco-Americana, 1874, e
Recenseamento do Brasil de 1890, Distrito Federal, vol.1, IBGE.
“Para a caracterização dos falares brasileiros” e “Normas, pluralismo etc.”
baseiam-se em estudos realizados por Dinah Callou, Yonne Leite et al., “Um
problema na fonologia do português: variação das vogais pretônicas”, in Cilene
Pereira e Paulo Pereira (orgs.), Miscelânea de estudos linguísticos, filológicos e
literários in memoriam Celso Cunha, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1995,
p.59-70; Socorro Demasi, “O -l posvocálico na fala culta do Rio de Janeiro”, in
Cilene Pereira e Paulo Pereira (orgs.), op. cit., p.115-63; Dinah Callou, Yonne
Leite e João Moraes, “Processos de enfraquecimento consonantal”, in Maria
Bernadete Abaurre e Ângela Rodrigues (orgs.), Gramática do português falado,
vol.VIII, Campinas, Unicamp, no prelo, e, dos mesmos autores, “A topicalização
no português do Brasil: sintaxe e prosódia”, in Herold Hitly (org.), Actes du XXe
Congrès International de Linguistique et Philologie Romanes, Tübingen, A.
Francke, 1993, p.89-97; Dinah Callou & Giselle Oliveira e Silva, “O uso do
artigo em contextos específicos”, in Dermeval da Hora (org.), Diversidade
linguística no Brasil, João Pessoa, Ideia, 1997, p.11-27; Célia Lopes. “Nós” e
“a gente” no português falado culto do Brasil, Delta, 14/2, São Paulo, EDUC,
1998, p.405-22; Suzana Cardoso, “Ter e haver no português do Brasil: mudança
linguística e ensino”, Atas do I Simpósio sobre a Diversidade Linguística no
Brasil, Salvador, UFBA, p.223-36; Rosa Virgínia Mattos e Silva, “A variação
haver/ter”, in R.V. Mattos e Silva, (org.), A carta de Caminha — Testemunho
linguístico de 1500. Salvador, EDUFBA, 1996, p.182-93.
“Traçando linhas imaginárias” e “Voltando ao começo” tratam da tentativa de
estabelecer limites de fatos linguísticos e de situar o início da questão da unidade
e diversidade linguística, com o apoio de: Dinah Callou, Yonne Leite e João
Moraes, “Variação dialetal no português do Brasil: aspectos fonéticos e
morfossintáticos”, Revista Internacional de Língua Portuguesa, 14, número
especial, Lisboa/Associação das Universidades de Língua Portuguesa, Editorial
Notícias, 1995, p.106-18; Yonne Leite e Bruna Franchetto, “500 anos de línguas
indígenas no Brasil”, in Suzana Cardoso, Jacyra Mota e Rosa Virgínia Mattos e
Silva (orgs.), 500 anos de língua portuguesa no Brasil, Salvador, UFBA, no
prelo; Aryon Rodrigues, “Descripción del tupinambá en el período colonial: el
Arte de Anchieta”, in Klaus Zimmermann (org.), La descripción de las lenguas
amerindias en la época colonial. Madri, Iberoamericana, 1997, p.371-400;
Maria Candida Drummond Barros, Luiz Borges e Márcio Meira, “A língua geral
como identidade construída”, Revista de Antropologia, 39/1, São Paulo, 1996,
p.191-219.
Sugestões de leitura
ABREU, Maurício. Evolução urbana do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Jorge
Zahar, 1987. Trabalho que descreve a estrutura metropolitana do Rio de Janeiro
e suas interações com os processos econômicos, sociais e políticos.
CARDOSO, Suzana e Carlota Ferreira. A dialetologia no Brasil, São Paulo,
Contexto, 1994. Introdução à metodologia de trabalho dialetal: o que se escreveu
sobre a língua do país, quem e quando.
CASTILHO, Ataliba. Para a história do português brasileiro. Primeiras ideias,
vol.1, São Paulo, USP/Humanitas/Fapesp, 1998. Coletânea de textos que
levantam questões sobre uma história do português brasileiro.
CUNHA, Celso. A questão da norma culta brasileira, Rio de Janeiro, Tempo
Brasileiro, 1985. Apresentação do Projeto de Estudo da Norma Linguística Oral
Culta e de seus Objetivos. Para quem quer saber mais sobre observação e
estabelecimento de normas, de língua escrita e de língua falada.
LOPES, Eliane et al. (org.). 500 anos de educação no Brasil, Belo Horizonte,
Autêntica, 2000. Textos sobre a história da educação no Brasil que levam à
reflexão sobre o mundo, o homem e a cidade.
MATTOS E SILVA, Rosa Virgínia. Contradições no ensino do português, São
Paulo, Contexto, 1995. Para quem quiser saber mais sobre a língua que se fala
versus a língua que se ensina, falares, norma padrão e normas sociais.
OLIVEIRA E SILVA, Giselle M. e Marta Scherre (orgs.), Padrões
sociolinguísticos, Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1996. Artigos que versam
sobre as relações entre o social e o linguístico e a metodologia quantitativa na
análise de fenômenos variáveis do português falado na cidade do Rio de Janeiro.
RODRIGUES, Aryon. Línguas brasileiras, São Paulo, Loyola, 1986. Visão
panorâmica das línguas indígenas brasileiras com exemplificação de cada língua
e classificação genética em troncos, famílias e dialetos.
SILVA NETO, Serafim. Introdução ao estudo da língua portuguesa no Brasil,
Rio de Janeiro/Brasília, Presença/INL, 5ª ed., 1986. Livro clássico, publicado em
1950, escrito em linguagem clara, sobre os antecedentes históricos, geográficos e
socioculturais que modelaram a língua nacional brasileira.
Sobre as autoras
Yonne Leite e Dinah Callou são autoras do livro Iniciação à fonética e à
fonologia, publicado por Jorge Zahar Editor, que já se encontra em oitava
edição. Yonne é licenciada em letras neolatinas pela Universidade do Brasil e
doutora em linguística pela Universidade do Texas em Austin/EUA. É
professora-adjunta aposentada da UFRJ e integra o corpo docente do Programa
de Pós-graduação em Antropologia Social do Museu Nacional/UFRJ. Suas áreas
de pesquisa são as línguas indígenas brasileiras e a fonologia do português.
Dinah é graduada em letras anglo-germânicas pela UFBA, fez mestrado na UNB
e doutorado na UFRJ na área de língua portuguesa. Possui também um pós-
doutorado em linguística pela Universidade da Califórnia, em Santa
Bárbara/EUA. Atua como professora-titular do Departamento de Letras
Vernáculas da Faculdade de Letras da UFRJ, foi colaboradora principal do
primeiro atlas linguístico brasileiro, o Atlas prévio dos falantes baianos, e suas
pesquisas atuais versam sobre variação e mudança no português do Brasil.
Ambas são pesquisadoras IA do CNPq.
Coleção Descobrindo o Brasil
direcção: Celso Castro
A Modernização da Imprensa (1970-2000)
Alzira Alves de Abreu
O Brasil no Império Português
Janaína Amado e Luiz Carlos Figueiredo
O Sindicalismo Brasileiro após 1930
Marcelo Badaró Mattos
Processo Penal e Cidadania
Paula Bajer
O Movimento Operário na Primeira República
Claudio Batalha
Os Intelectuais da Educação
Helena Bomeny
A Era do Rádio
Lia Calabre
A Invenção do Exército Brasileiro
Celso Castro
A proclamação da República
Celso Castro
Cidadania e Direitos do Trabalho
Angela de Castro Gomes
A Belle Époque Amazônica
Ana Maria Daou
O Estado Novo
Maria Celina D'Araujo
Política Externa e Meio Ambiente
Lilian Duarte
O Livro e a Leitura no Brasil
Alessandra El Far
Os Índios antes do Brasil
Carlos Fausto
O pensamento nacionalista autoritário
Boris Fausto
Os Brasileiros e a Segunda Guerra Mundial
Francisco César Ferraz
Rebeliões no Brasil Colônia
Luciano Figueiredo
O Rio de Janeiro que Hollywood Inventou
Bianca Freire-Medeiros
Palmares, Ontem e Hoje
Pedro Paulo Funari e Aline Vieira de Carvalho
A arte rupestre no Brasil
Madu Gaspar
Sambaqui: Arqueologia do Litoral Brasileiro
Madu Gaspar
As Formas do Espaço Brasileiro
Pedro Geiger
Negros e Política (1888-1937)
Flávio Gomes
Código Civil e Cidadania
Keila Grinberg
Uma Viagem com Debret
Valéria Lima
O Nascimento da Imprensa Brasileira
Isabel Lustosa
Os Evangélicos
Clara Mafra
O Brasil da Nova Era
José Guilherme Magnani
Escravidão e Cidadania no Brasil Monárquico
Hebe Maria Mattos
O Período das Regências (1831-1840)
Marco Morel
Rio, Cidade-Capital
Marly Motta
Da Bossa Nova à Tropicália
Santuza Cambraia Naves
Arqueologia da Amazônia
Eduardo Góes Neves
História do Voto no Brasil
Jairo Nicolau
O Brasil dos Imigrantes
Lucia Lippi Oliveira
Política Externa Brasileira (1889-2002)
Leticia Pinheiro
Literatura Policial Brasileira
Sandra Reimão
Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade
Daniel Aarão Reis
O Mundo Psi no Brasil
Jane Russo
Partidos Políticos no Brasil (1945-2000)
Rogério Schmitt
O Império em Procissão
Ritos e Símbolos do Segundo Reinado
Lilia Moritz Schwarcz
A Independência do Brasil
Iara Lis C. Souza
No País do Futebol
Luiz Henrique de Toledo
Modernismo e Música Brasileira
Elizabeth Travassos
Brasil de Todos os Santos
Ronaldo Vainfas e Juliana Beatriz de Souza
A Fotografia no Império
Pedro Vasquez
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Vinheta da coleção: ilustração de Debret
ISBN: 978-85-378-0216-8
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Nesse livro, o leitor encontra um panorama abrangente da história do livro e da
leitura no Brasil - desde a proibição da impressão no período colonial, passando
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quando presenciamos a venda de livros em bancas de jornal e em estações de
metrô. Recupera e esclarece alguns pontos da história do livro e da leitura em
nosso país; interessante percurso que envolve editoras, livrarias, escritores e os
próprios leitores.
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É possível ensinar a um escritor o seu ofício? A questão é polêmica,
especialmente quando proliferam cursos de graduação e de extensão com essa
proposta. Escritora e crítica literária, Francine Prose defende que sim, há muito o
que aprender com os mestres. Virginia Woolf, Jane Austen, Nabokov, Philip
Roth e Flaubert são alguns dos autores a quem dedica uma leitura atenta e
cuidadosa, em busca do segredo do "escrever bem". De cada um, extrai valiosas
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E mais: a edição brasileira conta com acréscimos de Italo Moriconi, que analisa
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Notável de 2007 do "New York Times".
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da dinastia Tudor e a maior governante da história da Inglaterra, que sob seu
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uma perspectiva inédita e original da vida pessoal da monarca e de como ela
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"... uma nova abordagem de Elizabeth I, posicionando-a com solidez no contexto
da Europa renascentista e além." HistoryToday
"Ao mesmo tempo que analisa com erudição os ideais renascentistas e a política
elisabetana, Lisa Hilton concede à história toda a sensualidade esperada de um
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os movimentos sociais que eclodiram em 2011 - como a Primavera Árabe, os
Indignados na Espanha, os movimentos Occupy nos Estados Unidos - e oferece
uma análise pioneira de suas características sociais inovadoras: conexão e
comunicação horizontais; ocupação do espaço público urbano; criação de tempo
e de espaço próprios; ausência de lideranças e de programas; aspecto ao mesmo
tempo local e global. Tudo isso, observa o autor, propiciado pelo modelo da
internet.
<p>O sociólogo espanhol faz um relato dos eventos-chave dos movimentos e
divulga informações importantes sobre o contexto específico das lutas.
Mapeando as atividades e práticas das diversas rebeliões, Castells sugere duas
questões fundamentais: o que detonou as mobilizações de massa de 2011 pelo
mundo? Como compreender essas novas formas de ação e participação política?
Para ele, a resposta é simples: os movimentos começaram na internet e se
disseminaram por contágio, via comunicação sem fio, mídias móveis e troca
viral de imagens e conteúdos. Segundo ele, a internet criou um "espaço de
autonomia" para a troca de informações e para a partilha de sentimentos
coletivos de indignação e esperança - um novo modelo de participação cidadã.
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