Sa Doutrina Finalizado
Sa Doutrina Finalizado
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO 4
01 A SÃ DOUTRINA 6
02 PREPARO TEOLÓGICO 22
APÊNDICE: FALSOS ENSINOS E FALSOS MESTRES 36
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APRESENTAÇÃO
A doutrina não é apenas um conjunto de crenças para serem memorizadas, mas sim a
base sólida sobre a qual construímos nossa vida cristã. Sem ela, estamos suscetíveis a erros
que podem comprometer não somente a nossa caminhada pessoal com Cristo, como também
a saúde da comunidade de fé. A doutrina correta nos guia para um conhecimento mais
profundo de Deus, revelando Seu caráter, Seus propósitos e Seu amor redentor manifestado
em Jesus Cristo. Através dela, somos capacitados a viver de maneira que honra a Deus e
abençoa os outros.
O preparo teológico, por sua vez, é o instrumento que Deus nos dá para
aprofundarmos nosso entendimento das Escrituras e da fé cristã. Ele nos equipa para discernir
entre o que é verdadeiro e o que é falso, para articular nossa fé de maneira clara e persuasiva,
e para ministrar com eficácia em um mundo que desesperadamente precisa da mensagem
do evangelho. Não se trata apenas de adquirir conhecimento acadêmico, mas de formar o
coração e a mente para que possamos amar a Deus de todo o nosso entendimento, como nos
ordena o maior dos mandamentos.
Para que os cristãos possam transmitir a fé com convicção, a doutrina cristã deve ser
confessada pela Igreja, ensinada de geração em geração e aplicada à vida. A Bíblia nos
apresenta pilares fundamentais que chamamos de doutrinas, verdades que devemos crer e
obedecer. É através desses pilares que somos moldados e capacitados a viver de acordo com
a vontade de Deus.
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Nosso objetivo central é estimular cristãos de diversas tradições a desenvolver uma
vida espiritual robusta e saudável, que glorifique a Deus e edifique a Igreja. O BTCast, nosso
podcast semanal, tem sido uma extensão desse ministério, alcançando milhares de ouvintes
ao redor do mundo. Através de conversas envolventes e informativas, exploramos temas
teológicos, bíblicos e práticos que ajudam a edificar e desafiar os cristãos em sua caminhada
com Cristo. Com uma linguagem acessível e uma abordagem descontraída, buscamos tornar
a teologia relevante e aplicável para o dia a dia dos nossos ouvintes.
Esperamos que este ebook sirva como um guia prático e inspirador para todos que
buscam aprofundar sua fé e entendimento teológico. Que ele seja um incentivo para
mergulhar nas verdades bíblicas e viver de acordo com a vontade de Deus, promovendo
transformação genuína em suas vidas e comunidades.1
Boa leitura!
RODRIGO BIBO
1 Os episódios foram transcritos e adaptados para a forma escrita com a utilização de IA, porém, todo o
conteúdo é de autoria humana.
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01 A SÃ DOUTRINA 2
Rodrigo Bibo e Igor Miguel
Podemos falar em ortodoxia em pleno século 21, depois de tanta história? Rodrigo Bibo
Um livro que me abriu muito a mente para essa possibilidade, foi o livro “Paixão Pela
Verdade" do Alister McGrath, é um livro muito contemporâneo, e todas as discussões atuais
seriam facilmente resolvidas com uma leitura da obra. Primeiro, McGrath vai tentar delinear
uma característica comum do que seria uma teologia evangélica, lembrando que quando
falamos de teologia evangélica, falamos de alguns pilares, algumas ênfases tipicamente
evangélicas, que são destacadas por ele no livro e que perpassam diversas tradições
protestantes. Sendo assim, existem reformados que são mais evangélicos, existem
pentecostais que são inevitavelmente evangélicos, por causa das ênfases evangelicais,
existem luteranos, por exemplo, que são evangelicais, e existem até católicos que são
evangelicais.
Existe um livro de um autor americano, que se chama George Weigel, que ainda não
está traduzido para o português. Esse mesmo autor tem um livro em português “Cartas a Um
Jovem Católico”, mas ele tem um outro livro em inglês que chama “Catolicismo Evangelical”,
em que ele vai dizer que há um esforço na tradição católica e, claro, ele compara isso com o
protestantismo, de uma relação mais pessoal com o Cristo, uma ênfase no estudo das
escrituras, uma ênfase na evangelização, no trabalho missionário, na conversão pessoal, e
uma ênfase na obra de Cristo na Cruz da Regeneração. Ou seja, os efeitos transformadores e
uma capacidade de alta contextualização da pregação evangélica. E podemos dizer que isso
seria uma característica geral do evangelicalismo.
2 BTCast Vida Nova 037, episódio publicado em 30 de julho de 2020. Assista no Youtube ou ouça em seu
aplicativo de streaming favorito. Também disponível em nosso site https://bibotalk.com/podcast/sa-doutrina-
btcast-vida-nova-037/
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Se vamos para o Pacto de Lausanne, por exemplo, que aconteceu no final da década
de 70, que foi um grande encontro missionário evangélico e deu muita direção ao movimento
evangélico, essas ênfases estão lá presentes. Então eu não acho que seja muito honesto, por
exemplo, dizer que o movimento evangélico é tão caótico assim, pois temos alguma coisa que
nos conecta. Claro que às vezes pode acontecer de ter igrejas que se identificam como
evangélicas e que são pouco conscientes de que existe uma tradição evangélica, que existe
um patrimônio teológico doutrinário evangélico, e tem também aqueles que até já desistiram
dessa possibilidade.
Gosto muito de mencionar aqui, para citar uma referência brasileira, o saudoso Dom
Robinson Cavalcanti, importante símbolo do evangelicalismo brasileiro, por causa do seu
trabalho de diálogo teológico e da sua capacidade de trazer reflexão teológica para além do
denominacionalismo, que características muito fortes deste autor. Ele escreveu um texto no
final de 2010, falando sobre o neo anabatismo, o título era: “Brasil: um protestantismo
anabatista?”, já naquela época, ele falava sobre uma tendência que ele percebia no
movimento evangélico brasileiro de rejeição da sabedoria histórica da igreja, ou seja, de que
a igreja tem uma tradição de confissão, de reflexão, de teologia, de confissões de fé, de credos
ecumênicos, quando usamos esse termo “ecumênico”, as pessoas têm medo, mas ecumênico
quer dizer aquilo que é comum. Existe um ecumenismo protestante no sentido de que nós,
entre cristãos protestantes, podemos dialogar, podemos estar juntos e temos uma unidade
confessional.
Que evangélico, por exemplo, ousaria, questionar ou duvidar dos “Cinco Solas”? Em
que a Escritura é essencial, que somente Cristo é suficiente para a salvação, que a fé é o meio
pelo qual nós obtemos graça de Deus, que a Escritura é uma regra de autoridade para nós e
que somente a Deus a glória. Então é possível criar e inclusive ser profundo teologicamente,
sobre temas que são comuns ao movimento evangélico, sem um discurso sectário. Eu, por
exemplo, me encontro teologicamente, e com uma confissão dentro de uma tradição
teológica específica. Eu me identifico com a tradição reformada. Por outro lado, temos um
esforço, no sentido de mostrar que nós temos uma catolicidade, algo que é maior do que a
minha lealdade confessional, que é o meu senso de pertencimento à cristandade. Então para
mim, existe sim uma ortodoxia mais ampla, que é um solo comum entre as diferentes
confissões evangélicas. Igor Miguel
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Cremos numa Igreja que tem uma identidade comum, católica. Ser católico é ser
abrangente, comum a todos, universal e pleno. Ser católico é reconhecer que o
evangelho de Jesus independente das particularidades culturais ou das predileções
étnicas, ou seja, trata-se de uma mensagem que transcende qualquer particularidade
ou tipo de compromisso nacional, porque é abrangente e acolhe todos os tipos de
pessoas. Ou seja, o que nos torna UM não são nossas predileções esportivas,
ideológicas ou convencionais; o que nos torna UM é o compromisso que temos ao
redor de Jesus e do Deus Trino - isso, sim, é o que nos mantém unidos e nos identifica
como cristãos no mundo. Portanto, esse é o movimento que faz com que a igreja se
sinta unida, conectada, congregada. Vanhoozer classifica esse movimento como
movimento centrípeto do Espírito. É centrípeto porque puxa a igreja para o centro,
para a identidade que lhe é comum. Esse é um movimento autêntico, que acontece no
ato de congregar em igreja, em comunidade, para ouvir a Palavra e o testemunho do
evangelho. O ato de congregar é um ato do Espírito, é a identidade da Igreja.
(MIGUEL, 2022, p.38)
Eu queria trazer um texto que pudesse nos ajudar a pensar o tema da doutrina.
Quando estudamos os primeiros 4 séculos da igreja, é inegável que nós temos ali muitas
discussões teológicas profundas, sobre a pessoa de Jesus Cristo, sua essência, sua natureza
etc., mas você disse que existe um solo comum. Ao escrever a Segunda Carta de Paulo a
Timóteo, Paulo diz: “Portanto, você, meu filho, fortifique-se na graça que há em Cristo Jesus.
E as palavras que me ouviu dizer na presença de muitas testemunhas, confie-as a homens fiéis
que sejam também capazes de ensiná-las a outros.” (2 Timóteo 2:1,2 NVI). Esses versículos
nos ajudam a entender que, já no surgimento da igreja primitiva, havia um corpo doutrinário
a ser preservado? RB
Interessante, porque quando você lembra que Jesus deu uma ordem aos discípulos
dizendo que ele daria um Consolador e que seria o Espírito da Verdade, que daria testemunho
de Jesus e depois ele diz que “quando o Espírito da verdade vier, ele os guiará a toda a
verdade” (João 16:13 NVI). Olhamos para Efésios também quando Paulo diz:
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“E ele designou alguns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas,
outros para pastores e mestres, com o fim de preparar os santos para a obra do
ministério, para que o corpo de Cristo seja edificado, até que todos alcancemos a unidade
que a fé e do conhecimento do Filho de Deus, e cheguemos à maturidade, atingindo a
medida da plenitude de Cristo”. (Efésios 4: 11-13 NVI)
Me parece evidente que dentro do cânone bíblico do Novo Testamento, já existe uma
promessa de que Deus guiará a igreja há uma compreensão de unidade a respeito da fé. Esse
deveria ser um credo primitivo para nós, no sentido de que há uma providência do Espírito
na história da igreja. Eu sou muito insistente nisso, porque observe, o que o evangélico tem
como grande riqueza na sua tradição? A contextualização.
Então, nós, cristãos, mais do que nunca, precisamos anunciar uma boa-nova
claramente comunicável. Recentemente houve um debate entre estudiosos envolvidos
com a apologética, a defesa pública da fé, e concluiu-se que mais do que nunca os
cristãos têm de mudar o modo como comunicam a verdade. A mensagem é
inalterável, mas a maneira como é comunicada precisa ser melhorada. Passamos da
época simplesmente para apresentar argumentos irrefutáveis; agora precisamos
oferecer às pessoas uma história que faça sentido para elas. O homem pós-moderno
não está em busca de argumentos, mas, sim, de uma história que cative o seu coração.
Ele está em busca de uma narrativa, e nós temos um livro inteiro de narrativas, um
livro recheado de histórias sobre como Deus age, opera, salva e redime.
(MIGUEL,2022, p. 43)
Existe hoje um enorme debate sobre contextualização, Timothy Keller já fez vários
podcast sobre contextualização. Os evangélicos são os mestres da contextualização, isso está
comprovado. Os católicos precisam aprender, igrejas históricas precisam aprender, porque o
evangélico tem uma enorme capacidade de tornar acessível e popular verdades que são
profundas e eternas, porém, às vezes, na hiper contextualização, a doutrina se perde, a
riqueza da verdade se perde, porque as pessoas se preocupam tanto em tornar a Palavra
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aceitável que acabam sacrificando ou omitindo determinadas verdades pelo crescimento
numérico.
O CREDO APOSTÓLICO
Creio em Deus Pai Todo-poderoso, e em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor. E no
Espírito Santo, na santa Igreja, na ressurreição da carne. Creio em Deus Pai Todo-poderoso.
E em Jesus Cristo seu único Filho nosso Senhor, que nasceu do Espírito Santo e da virgem
Maria; concebido sob o poder de Pôncio Pilatos e sepultado; ressuscitou ao terceiro dia;
subiu ao céu e está sentado à mão direita do Pai, de onde há de vir julgar os vivos e os mortos.
E no Espírito Santo; na Santa Igreja; na remissão dos pecados; na ressurreição do corpo.
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Essa tradição continua e vai sofrendo desafios missionários na medida que o
Evangelho vai avançando. Um exemplo é o Concílio de Nicéia ou o concílio niceno-
constantinopolitano do quarto século, em que Atanásio deu um show de argumentação
teológica e houve um consenso da maioria em relação à posição trinitária. Mas é curioso
pensar que a igreja, nesse momento histórico, tem que ter definições mais claras sobre a
natureza de Jesus, a natureza do Pai, a relação dos dois, pois a obra do Espírito foi trabalhada
mais para frente com os pais capadócios.
Interessante a sua fala, concordo plenamente com ela, muitas pessoas utilizam a
história da Igreja nos primeiros séculos, para falar que existia essa variedade de crenças
acerca do próprio Cristo e acerca da natureza trinitária. E com isso colocam a ortodoxia em
dúvida usando o argumento de que existiam crentes que não acreditavam que Jesus era Deus,
que acreditavam que ele era apenas o filho de Deus, que não entenderam a natureza divina
de Jesus. Ninguém está negando que existe uma variedade de crenças e de doutrinas, não
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negamos que os três primeiros séculos foram bem fomentados nas discussões, porque a
igreja sempre vai vivendo momentos históricos e precisa responder a este momento
histórico, alguns vão dizer que a única crença, que é solo comum é: “Jesus Cristo é o Senhor”.
Não consigo concordar com isso, acho muito difícil você reduzir todo o trabalho apostólico
nessa única crença, que sim, eu creio que ela é basilar. Entender Jesus Cristo como o seu
Senhor, diante de um contexto de imperadores que se achavam deuses, realmente tem um
peso, mas eu não acredito que apenas isso seja o solo comum, porque Paulo está falando de
verdades que devem ser transmitidas.
Diante disso, percebo que o que eu acredito hoje, enquanto igreja e filho dessa
tradição, bate com as Escrituras. Então, eu creio sim, que não foi a opinião dos vencedores,
que faziam parte do grupinho de Constantino, que definiu o que acreditamos, que não foi por
causa do imperador, que hoje o pessoal acredita que Jesus Cristo é Deus. Inclusive alguns
ainda dizem que o cânon foi alterado para embasar essas opiniões. No entanto, se você
estuda a história da igreja, percebe que os 27 livros do Novo Testamento já circulavam e já
tinham autoridade na igreja muito antes. RB
Não precisa ir longe, eu já te contei essa história, uma vez eu estava no Líbano fazendo
um trabalho humanitário, e me encontrei com um teólogo ortodoxo oriental, quer coisa mais
diferente em relação à nossa tradição ocidental evangélica protestante, do que isso? Eu me
sentei com o teólogo ortodoxo oriental, estávamos tomando um Arak, que é uma bebida
tipicamente libanesa. Nós pertencemos a tradições totalmente distintas, mas conversamos
sobre C. S. Lewis, Chesterton, Trindade, a natureza de Deus etc. Uma conversa extremamente
agradável e nos sentimos parte da mesma cristandade, porque conversamos sobre coisas que
são de uma apreciação comum.
Então eu acho que nos falta a capacidade de olhar para aquilo que é rico de maneira
interconfessional, sempre cito uma frase do Bavinck sobre o catolicidade, na “Dogmática
Reformada”, lembrando que o Bavinck é um dos maiores teólogos sistemáticos de tradição
calvinista. E ele fala: “Deus não depositou a totalidade da verdade cristã em nenhuma
tradição”. Essa frase é maravilhosa, porque nos dá um senso de modéstia, diante de outras
tradições, então, por exemplo, eu que sou calvinista, tenho que aprender com os irmãos
católicos, tenho que aprender com irmãos anglicanos, luteranos, pentecostais-carismáticos,
de alguma tradição arminiana, metodistas. Meu irmão, não tenha dúvida, eu tenho que
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aprender com os morávios, tenho que aprender com nossos irmãos menonitas, a paixão dos
menonitas pela missão que é uma herança morávia, eu tenho muito o que aprender agora.
DEFININDO ORTODOXIA
Claro que é difícil definir uma ortodoxia fechada, temos dificuldade de lidar com
complexidade, mas pensa no sol brilhando, tem um núcleo que brilha mais, nitidamente é a
verdade, mas na medida que você se afasta do sol, você começa a ver um degradê de sombra
e sol, então é difícil dizer “aqui acaba o sol, aqui começa a sombra”, mas é nítido quando você
tem uma clareza a partir daquele núcleo que é o sol, que alguma coisa está indo mais para a
escuridão do que para a claridade, e você tem que apresentar os argumentos ou as
evidências, porque uma coisa está indo mais para as trevas do que para a luz, e dizer: “isso
aqui tem elementos de verdade e tem elementos que não são verdadeiros”, e aí apresentar
as evidências. É claro que falar de verdade no mundo da pós verdade, falar de ortodoxia no
mundo que anseia por ortodoxia generosa, ou uma ortodoxia privada, parece autoritário
demais.
Vou citar seis mitos que na minha opinião, existem sobre a doutrina cristã:
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6. Doutrina esfria o Espírito Santo, apaga o fogo do Espírito. Dizem por aí que o zelo
doutrinário é um inimigo do poder e da obra do Espírito Santo nas pessoas.
Lembrando que esses seis mitos tem um fundo de verdade, porque existem pessoas
que tratam doutrina como conceitos abstratos, pessoas que, por exemplo, tratam a doutrina
de maneira excessivamente acadêmica, com pouca preocupação com as implicações
pastorais da doutrina, e também é verdade que tem gente que trata a doutrina como uma
síntese subjetiva desenraizada, sem conexão histórica, pessoas que mantém um abismo
enorme entre doutrina e prática, ou que tentam usar a doutrina como meio de controle
político ou para exercer poder sobre pessoas e acaba impedindo, de fato uma certa liberdade
humana que também é uma dignidade que Deus deu ao ser humano, e finalmente é verdade
que existe uma ortodoxia morta, Francis Schaeffer falava sobre isso, o que é uma ortodoxia
morta? É quando a doutrina, como diz Calvino, ela se torna só de lábios e não penetra no
coração e não chega nos afetos.
Então, quando a doutrina não penetra no coração e não chega nos afetos, você pode
ter um indivíduo extremamente zeloso pela doutrina, mas com a vida desintegrada dessa
doutrina. A doutrina é um problema? Não! O problema é o ser humano.
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isso nas cartas de Paulo, na linguagem de Jesus, a separação entre doutrina e prática era
simplesmente inexistente, atualmente nossa cultura faz essa dicotomia, porque nós somos
filhos do racionalismo. Nós somos filhos da modernidade e a modernidade ensina que a
mente controla a realidade, os conceitos controlam a realidade, achamos que na teologia é a
mesma coisa, e isso é um grande equívoco. Na visão clássica, a doutrina está muito mais
próxima de uma linguagem de sabedoria do Antigo Testamento, que é uma linguagem de
viver sabiamente do que uma linguagem grega ou helênica, de uma teoria que controla o
mundo, das ideias que controlam a realidade.
Precisamos recuperar uma noção, digamos, mais sapiencial, mais sábia do que
significa a doutrina. Doutrina tem a ver com a vida, tem a ver com a existência, tem a ver com
o modo como eu crio filhos, como eu trabalho, como faço cultura, como me relaciono com as
pessoas, como eu comunico o Evangelho para o mundo. A doutrina é inescapável, mesmo
aqueles que dizem que se não há ortodoxia, não há doutrina, acabam elaborando suas
próprias certezas. IM
Defendemos que sim, existe uma doutrina correta que perpassa a história da igreja,
perpassa a formação do cânon e chegou nos dias de hoje até nós, por mais que tenha
variações, por mais que algumas tradições vão para um lado, outras para outro, o importante
é que todos se encontram num solo comum. Nós acreditamos em uma doutrina correta.
Gregg cita os conceitos bem básicos, de que a doutrina é crida e existe uma crença correta,
ou seja, a ortodoxia. Quando a doutrina é praticada, que é a ortopraxia, a prática correta e
uma vida santa. Temos o termo ortopodia do Ênio Muller, que é, um caminhar na verdade, a
sabedoria.
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O que é o caminho do evangelho? Sabemos que os cristãos da antiguidade eram
chamados "os do caminho". O que é o evangelho? Falar do evangelho é um universo,
por isso pense nele como um diamante multifacetado. Podemos eleger uma de suas
faces e explorá-la por um dia inteiro, mas, assim como o diamante, o evangelho tem
múltiplas faces, múltiplas perspectivas da boa-nova.( MIGUEL, 2022, p.48)
Porque nós somos filhos da modernidade, é meio inevitável usar essas classificações.
Não é curioso pensar que o dia que Deus decidiu se revelar ao mundo na sua forma mais
radical, Ele não fez isso como um artesão, como um cozinheiro ou como um soldado líder de
um exército? Ele decidiu se revelar como um professor cercado de alunos. Isso é
emblemático, se Jesus se revela no mundo como um professor cercado de alunos, porque
discípulo é aluno, discípulo é aprendiz. Deus um dia falou “quero me exibir no mundo”, e Ele
se exibiu como uma escola. Para mim é encantador, porque isso significa que não há nada
mais anticristão, nesse sentido, do que a aversão que algumas tendências vão ter à teologia
cristã ou aprendizagem cristã, ou a ênfase cristã no ensino A igreja cristã, historicamente é
uma igreja do ensino, você pega a carta de Paulo a Timóteo: “Pregue a palavra, esteja
preparado a tempo e fora de tempo, repreenda, corrija e exorte com paciência e doutrina”. (2
Timóteo 4:2 NVI)
Paulo insiste no ensino, na verdadeira doutrina, e ele bate no ensino o tempo inteiro,
na didaskalia, na doutrina. Paulo não enfatiza isso atoa, porque Paulo é fruto da escola de
Jesus, uma escola que é reproduzida por Jesus, a grande comissão, que é: “Portanto, vão e
façam alunos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”.
(Mateus 28:19 NVI)
Podemos até ter uma discussão sobre os limites da doutrina correta, da Sã Doutrina,
agora dispensar a possibilidade de uma doutrina sã, ou a possibilidade de uma doutrina
correta, é no mínimo infringir coisas que são claras nas Escrituras. Paulo não pensava em
verdade, como um homem pós-moderno, que relativiza a verdade como ponto de vista de
cada indivíduo. Inclusive a noção de indivíduo moderno e pós-moderno que nós temos hoje,
nem existia na época de Paulo. Então isso é muito mais uma intromissão cultural dentro do
cânone do que o contrário. Por isso, esse é um ponto importante para deixarmos claro, que
Jesus se apresentou ao mundo como um professor cercado de alunos. IM
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Olha só o que diz aqui em Tito: “Você, porém, fale o que está de acordo com a sã
doutrina. Ensine os homens mais velhos a serem moderados, dignos de respeito, sensatos, e
sadios na fé, no amor e na perseverança”. (Tito 2: 1,2 NVI) Paulo está falando de uma
comunidade pedagógica. Olha como a doutrina está na essência do que é ser igreja.
A IMPORTÂNCIA DA DOUTRINA
Existe também uma dúvida sobre qual a diferença entre sã doutrina e usos e costumes,
que é um erro muito comum nos movimentos pentecostais e carismáticos, onde pessoas
acabam oprimindo outros irmãos e irmãs por conta de um costume local. Podemos fazer essa
distinção entre a sã doutrina e os usos e costumes? RB
Outra coisa que o Gregg também fala aqui no livro dele é que a doutrina, além de ser
crida, além de ser praticada, ela é confessada. Confissão é a declaração pública da fé cristã,
ou seja, a doutrina me ajuda a fazer teologia pública? RB
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Exatamente. Eu não tenho dúvida, dando um exemplo de um dos raros teólogos que
têm essa capacidade, por uma influência da teologia reformacional, herança de Kuyper,
porque Kuyper tinha essa capacidade, de pegar temas clássicos da teologia cristã, temas que
pareciam até caseiros e transformar isso em subsídio para uma teologia pública.
Vou dar exemplo contemporâneo, pega o livro “Justiça generosa” do Timothy Keller.
Ele faz uma aplicação da doutrina da justificação para a justiça pública, e é extraordinário.
Então ele diz que cristãos justificados se preocupam com a justiça, cristãos que receberam a
graça se preocupam com a generosidade, Keller faz uma interface. Por exemplo, quando ele
escreve o “Ego Transformado”, que parece que a doutrina da justificação é uma doutrina
irrelevante para o mundo contemporâneo, Keller refuta essa ideia pois na verdade, a
justificação diz respeito a aceitação do homem perante Deus, é uma crise de aceitação,
basicamente, é isso que está por trás da doutrina da justificação
Timothy Keller pega um trecho de uma entrevista da Madonna dizendo que ela tem
que trabalhar todos os dias, se reinventar todos os dias, se não ela cai no esquecimento. O
que está por trás dessa motivação da Madonna? Uma crise de aceitação, para ser aceita, ela
tem que se reinventar, se refazer todos os dias. Keller traz isso para a doutrina da justificação,
o cristão precisa entender que essa crise de aceitação, de aprovação alheia é uma tentativa
de escapar ou sobreviver aos tribunais alheios. Estamos o tempo inteiro sendo colocados em
tribunais, tribunal das pessoas, da família, dos amigos etc. Só que Paulo diz que o único
tribunal que você tem que temer é o de Deus, que é o tribunal mais rigoroso que existe, é o
tribunal, que descreve o que o homem é de verdade, o que vai dizer quem você é de verdade,
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e para quem está em Cristo, não precisa temer mais nada. E ele diz, quem intentará, citando
Paulo, acusação contra os eleitos de Deus? Deus o justifica.
Então observe, ele traz um tema clássico doutrinário, que a justificação pela fé e
aproxima dos desafios contemporâneos que são apresentados para nós. Então, se o homem
contemporâneo tem um problema de aceitação, com a auto afeição, com a própria imagem,
a justificação é um antídoto para esse problema. Observe, descrevemos a justificação
doutrináriamente, mas ela é mais do que uma descrição doutrinária, ela é um modo eficaz
pelo qual Deus coloca os homens diante de si por meio de Jesus. Quando eu descrevo
doutrinariamente o que Deus está fazendo, isso produz em mim maravilhamento, e toda a
descrição doutrinária que produz maravilhamento está cativando o meu coração a se devotar
a quem Deus. Posso olhar para a doutrina como uma fórmula matemática e impessoal, mas
se olho para a doutrina como uma doutrina que tem como pano de fundo, uma história,
porque não tem como falar de justificação sem falar de Abraão, sem falar da cruz, não tenho
como eu falar de Regeneração sem falar da ressurreição de Cristo e de toda a história que
tem por trás disso. Por trás de toda a doutrina há uma narrativa, onde nos maravilhamos com
Deus, essa é a proposta da Doutrina. IM
Você não acha que em um cenário onde temos uma explosão de narrativas, o que é
típico da pós-modernidade, uma explosão de ofertas ideológicas, um cenário em que as
pessoas se agarram a qualquer visão política que aparece ou qualquer narrativa política. Não
parece evidente que, ao contrário do que muita gente anda pensando, as pessoas estão à
procura justamente de ortodoxia? IM
Sim, pois vivemos em uma confusão de narrativas, não é à toa que alguns movimentos
extremistas ganham tantos adeptos. Por que alguns movimentos extremistas ganham tantos
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adeptos? Por que mesmo num mundo globalizado as tribos que se fortalecem? Porque as
pessoas buscam identificação e senso de pertencimento. Olha que coisa maravilhosa é a fé
cristã, porque por trás da doutrina, existe uma história. Gosto muito de ouvir o Marco Cruz
quando ele fala da igreja perseguida, porque ele nos inclui na perseguição, se os nossos
irmãos são perseguidos, por sermos igreja, também somos perseguidos.
Nós precisamos da ortodoxia. Nós precisamos saber a doutrina correta. Mas nós não
queremos uma ditadura da ortodoxia, não quero ficar condenando quem acredita diferente
de mim. Não é uma ditadura da ortodoxia, como alguns fazem, é inegável, as pessoas
confundem muito erro teológico com heresia. Precisamos entender o mecanismo por trás
disso, pois nós acreditamos em um solo comum, é nele que apoiamos nossos pés,
acreditamos que Jesus Cristo é o Senhor, na soberania de Deus, nas doutrinas basilares que
constroem esse chão. Precisamos desse chão, pois oferta de narrativas de pertencimento
estão espalhadas por aí. RB
Não tenho nenhuma dificuldade de dialogar com irmãos, que se localizam dentro de
determinadas confissões de fé, mas eu tenho uma enorme dificuldade de dialogar com quem
não tem confissão nenhuma. É claro que a Bíblia é nosso livro de regra de fé e prática, mas
você precisa pertencer a uma comunidade local que tenha uma clara confissão de fé, que tem
uma clara identidade confessional. Então, de repente você tem uma sensação de que
consegue manter diálogo com quem tem confissão de fé, porque sabe, com quem está
conversando. Primeiro preciso saber com quem eu estou conversando para ter um diálogo,
preciso saber quais são os limites.
Por exemplo, eu tenho uma enorme dificuldade para dialogar em termos teológicos
com católicos liberais, porque eles questionam pilares que são do próprio catecismo católico.
Mas com um católico, por exemplo, que é minimamente conservador na teologia, que
caminha dentro dos limites do catecismo católico, eu consigo manter um diálogo excelente,
porque até nos pontos que eu discordo eu sei do que estou discordando, com quem que eu
estou falando. Então isso é importante mencionar, muita gente acha que lealdade
confessional é um inimigo da unidade. Ao contrário, eu vou ter como saber de onde você está
falando, quais são as riquezas da sua tradição que podem contribuir com a minha. Então o
pessoal tem medo de ter uma identidade doutrinária e dividir mais do que unir. O problema
não é a doutrina, o problema são os seres humanos. IM
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A quarta aplicação que o Gregg3 faz da doutrina cristã, lembrando que a primeira é
que ela é crida, a segunda é que ela é praticada, a terceira, é que ela é confessada e a quarta
é que ela é ensinada. É a transmissão fiel da crença cristã de uma geração para outra. RB
Tem um trecho do livro do Gregg que achei sensacional, com o título “Doutrina cristã
como sabedoria antiga para a igreja de hoje” em que ele lista uma série de tópicos, que são
os temas, inclusive, que ele explora no livro. Ele fala sobre algumas ênfases que é um terreno
super comum evangélico: inspiração, autoridade, veracidade, poder e centralidade da Bíblia
e da revelação divina, existência e conhecimento de Deus e sua natureza a Trindade, criação
e providência, realidade, operação de seres espirituais, Anjos e demônios, dignidade de seres
humanos como portadores da imagem de Deus, depravação ou queda, divindade e
humanidade de Jesus, incluindo o seu nascimento virginal, obra de salvação de Jesus, a pessoa
e obra do Espírito Santo, aplicação da salvação, perdão, justificação, Regeneração, a igreja
como povo de Deus, o corpo de Cristo, o templo do Espírito Santo, a igreja como Una Santa
católica, ou seja, universal e Apostólica, os meios de graça, escatologia, escatologia cósmica,
o Novo Céu e a Nova Terra.
Sei que podemos ter nuances de ênfases nesses tópicos, mas em termos gerais, nós
temos confissões, temos crenças comuns sobre esses tópicos, por exemplo, eu acho que
nenhum cristão da tradição evangélica, discordaria que a salvação é uma operação da graça
e que isso independe das nossas obras, que as nossas obras operam como uma resposta da
salvação. É muita coisa em comum, que podemos conversar e caminhar juntos como cristãos.
IM
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4
02 PREPARO TEOLÓGICO
Rodrigo Bibo, Ziel Machado, Ivone Botelho, Marco Botelho e Victor Fontana
Isso me leva a refletir sobre uma questão fundamental: por que alguns líderes
parecem tão despreparados biblicamente? É uma realidade que não podemos ignorar.
Mesmo que muitas vezes não se fale abertamente sobre isso, é evidente que há líderes que,
apesar de suas qualidades pessoais e do preenchimento de certas necessidades, carecem do
preparo adequado.
4 BTCast 561, episódio publicado em 2 de julho de 2024. Assista no Youtube ou ouça em seu aplicativo de
streaming favorito. Também disponível em nosso site https://bibotalk.com/podcast/preparo-teologico-
btcast-561/
22
(1 Timóteo 4:15 NAA) Assim, nesse texto, vemos
essas duas dimensões: a necessidade do Espírito que
nos orienta e a disciplina de nos ocuparmos em
estudar e refletir sobre isso.
Conhecer o Senhor Jesus Cristo e ter um encontro com Ele deveria criar um desejo
irresistível de saber mais e de conhecê-Lo melhor. Gosto de fazer uma analogia que aqueles
mais experientes entenderão. Hoje em dia isso não acontece mais, mas, se voltarmos um
pouco no tempo, quando eu era adolescente, quando estávamos apaixonados, ligavamos
para a pessoa amada e, no final do telefonema, havia uma disputa: "Desliga você." "Não,
desliga você." Era um desejo intenso de estar com a pessoa amada, ouvir sobre ela, e, em um
relacionamento verdadeiramente saudável, que talvez terminaria em casamento, havia um
desejo de conhecer melhor a pessoa: suas preferências, o que ela pensa, e seu histórico de
vida. E, mesmo em um casamento saudável, esse desejo persiste. Queremos conhecer melhor
a outra pessoa para nos relacionarmos com ela.
23
que nos amou de maneira única e surpreendente nos pede para ouvir Suas palavras de amor.
Assim, o preparo bíblico deve sempre partir de um encontro revelacional primeiro. Caso
contrário, não adianta nem mesmo o mais preparado intelectualmente, como era o apóstolo
Paulo, que inicialmente perseguiu a igreja, e foi a partir de um encontro, que isso mudou. Victor
Fontana
Um parêntese: essa sua fala me fez refletir sobre um ponto que não é o tema do nosso
podcast, mas é o perigo de conhecer a teologia sem um encontro com Cristo. Esse é um tópico
que já abordamos várias vezes no BTCast, mas sua fala ilustra bem esse problema. Afinal,
eram os fariseus que, apesar de seu profundo conhecimento teológico, não reconheceram
Jesus como o Messias. RB
Eu diria encontros, no plural. É claro que Paulo teve um encontro decisivo no caminho
para Damasco, mas Cristo também teve um encontro com seus discípulos, mesmo depois de
uma crise de fé. Estou falando do capítulo final do Evangelho de Mateus. Você pode se
perguntar: quando os discípulos estavam mais preparados? No final do discipulado, após três
anos de ministério com Jesus. No entanto, depois de Sua ressurreição, Ele marcou um
encontro com os discípulos. Eles chegaram lá, e alguns O adoraram, enquanto outros
duvidaram.
Qual era o preparo ali? Mesmo diante do Cristo ressuscitado, alguns duvidaram. E, em
vez de dar uma reprimenda, Jesus entregou a nós e àqueles discípulos, na crise de fé, a Grande
Comissão:
"Vocês duvidaram? Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Portanto, vão e
façam discípulos de todas as nações. Batizem em nome do Pai, do Filho e do Espírito
Santo, e ensinando a obedecer tudo o que eu lhes tenho ordenado." (Mateus 28:18-20
NVI). E a parte dos encontros: "E eu estarei com vocês todos os dias, até o fim dos
tempos." (Mateus 28:20 NVI)
24
cruzada contra algo ou alguém, em vez de ter encontros contínuos com Cristo. Mas é isso:
encontros ao longo do caminho. VF
O difícil de ser o último a responder uma pergunta é que todas as metáforas já foram
usadas. O Fontana usou Cantares para fazer analogia, então vou tentar usar o drama das
Escrituras. A importância de estudar a Palavra de Deus está no fato de que, por causa do
pecado, perdemos nossa capacidade de reconhecer e conhecer Deus. Deus decidiu se revelar
de uma forma única, não foi através da Bíblia, mas através de Jesus Cristo.
A importância de encontrar a fonte é que é lá que nós vamos beber a água da vida.
Assim, Deus decidiu se revelar plenamente em Jesus Cristo para nós, e, através das Escrituras,
conseguimos reconhecer Jesus e vê-Lo andando entre nós. Portanto, essa é a importância: se
não estudarmos a Bíblia, perdemos a capacidade do sopro do Espírito de reconhecer o que
Deus está fazendo e de reconhecer o Mestre. Marcos Botelho
Além disso, se nossa resposta ao chamado é um ato de obediência, esse chamado não
vem da nossa força, mas do encontro da graça com a nossa debilidade. Quando a graça de
25
Deus encontra nossa debilidade, nasce nosso ministério. Nos fortalecemos na graça, e não no
nosso diploma ou na nossa pretensa formação.
Essa formação também é uma expressão de
obediência e de graça.
Jesus sabia tudo sobre a Bíblia aos 12 anos, mas não começou seu ministério aos 13.
Imagina ser crucificado aos 15. Ele esperou 30 anos, dedicando 90% de sua vida ao preparo
para os 10% de ministério. A lógica do reino é diferente da nossa relação de custo-benefício.
Quando ouvimos pessoas mais velhas, como Billy Graham e outros, e perguntamos o que
fariam diferente, muitas vezes a resposta é: "Eu teria me preparado melhor." ZM
Paulo também é visto por muitos como alguém já preparado teologicamente, pois não
temos muitos relatos sobre sua conversão. Parece que ele já tinha uma base sólida de
conhecimento antes de descobrir que Jesus era o Messias. Após essa descoberta, ele esperou
de 10 a 15 anos antes de iniciar seu ministério. Durante esse tempo, ele se retirou para
refletir, amadurecer suas ideias e entender como aplicar o ensinamento de Cristo. Esse
período de preparação foi muito importante. MB
26
MULHERES NA TEOLOGIA
Primeiro, gostaria de fazer um comentário sobre o que meus amigos disseram. Estou
adorando e aprendendo muito com o que eles estão falando. É realmente magnífico. Sobre a
questão do preparo, quero dizer que muitos personagens bíblicos também se sentiam
despreparados – Moisés, Jeremias, entre outros. Esse sentimento de inadequação é comum
e faz parte da nossa experiência humana. Além disso, há algo que foge do nosso controle: o
Espírito Santo. É difícil para nós julgarmos quem Ele chama, como Ele capacita e qual será a
trajetória de cada um.
Quanto às mulheres, sim, houve e ainda há desafios. No entanto, estamos vendo cada
vez mais abertura para as mulheres. Embora o mundo da teologia seja predominantemente
masculino devido à nossa herança judaico-cristã e à história da mulher na humanidade, as
mulheres estão ganhando espaço. No campo do ministério prático, há mais oportunidades e
as mulheres estão pastoreando e evangelizando. IB
Eu concordo 100% com o que você falou. O universo ainda é bastante masculinizado.
No entanto, é incrível como as mulheres geralmente são mais atuantes na igreja. Em vários
ministérios, temos mais mulheres atuando. Isso não vai contra o que estamos falando? Elas
também não deveriam ter um bom preparo bíblico e teológico? Deveriam, a pergunta prática
27
é como fazer isso. Porque, ao mesmo tempo em que precisam trabalhar na igreja, elas têm
muitas outras tarefas. Às vezes, o peso das responsabilidades domésticas recai mais sobre
elas também. É uma situação complicada. Como podemos lidar com isso? RB
Ivone é minha mãe, fico até emocionado ao falar disso. Eu cresci no Jovens da
Verdade, um acampamento em Arujá, São Paulo. E eu tinha como vizinho um seminário cheio
de seminaristas que faziam bullying, brincavam e tudo mais. O interessante é que a referência
que tínhamos da diretora e fundadora dessa instituição, ao longo da minha vida, era uma
mulher. Aqui, como é Internacional, temos todas as denominações e respeitamos as
diferentes interpretações bíblicas, seja sobre ordenação ou não. Existem muitas linhas
históricas e diferentes perspectivas.
CRIANDO PONTES
Uma pergunta que Saulo está fazendo aqui: usando o gancho do Fontana e o período
de Paulo no deserto, quando ele estava se desconstruindo e se reconstruindo para o futuro
ministério, qual seria a melhor forma de nos desconstruirmos para o preparo teológico,
mesmo sendo parciais, ideológicos e políticos, de maneira a criar pontes sem muros sociais
neste mundo polarizado? RB
28
Chatice teológica. É importante perceber o que aconteceu com Paulo nesse período
no deserto. A gente não sabe exatamente. Pode ser que ele tenha usado esse tempo para se
desconstruir. Talvez ele estivesse evangelizando na Arábia—Paulo das Arábias. Mentira!
Talvez ele apenas quisesse conhecer o Monte Sinai e ter um momento espiritual. Mas o ponto
é o seguinte: acho que Paulo começa a responder a isso no capítulo 12 da Carta aos Romanos.
Ele passa onze capítulos explicando o Evangelho. Aparentemente, para ele, explicar o
Evangelho era uma tarefa complexa, especialmente porque aquela comunidade era nova para
ele. Então, ele dedica onze capítulos a isso. A consequência de entender bem o Evangelho é
a renovação da mente.
Devemos estar preparados para liderar, mas como nos tornamos e nos mantemos
preparados? Compreendemos a questão de que ler a Bíblia é obrigatório, mas como estudá-
la de forma eficaz? Como nos preparar? Como saber se o material de estudo é bom? É preciso
ler a Bíblia com mais profundidade, realmente entendê-la e crescer em maturidade e
liderança.
O livro do Botelho, Mosaico Bíblico, é muito bom. Eu considero que, para a nossa
cultura e para o nosso tempo, em termos de compreensão do texto bíblico para uso no
ministério, ele é superior a Entendes o Que Lês do Gordon Fee. VF
29
Ziel, lembro que uma vez você mencionou em um encontro de líderes há alguns anos
que você não abordava o texto sobre o qual estava trabalhando. Achei isso interessante. Você
acha pertinente trazer isso à tona? MB
É bom a gente habitar no texto antes de ele virar um texto expositivo ou um texto de
trabalho, é bom habitarmos nesse texto com certa antecedência e com certa calma. O mais
difícil não é ler a Bíblia, gente. O mais difícil é ser lido por ela: “Não te estribes no teu próprio
entendimento. Reconhece o Senhor em todos os teus caminhos.” (Provérbios 3:5-6 ARA)
Quais são as dinâmicas do nosso dia a dia que nos permitem reconhecer o Senhor nos
nossos caminhos? Como é que a Escritura nos lê? Se a nossa reflexão da leitura não nos leva
para uma vida de oração, não é uma boa leitura, não é uma boa reflexão. Então, precisamos
manter o nosso coração suave e convertível, manter o nosso coração atento a ser lido pela
Palavra, e dar tempo para que a Palavra encontre os caminhos do nosso coração e abaixe o
mato e tire as pedras.
Muitas vezes, fazemos uma leitura muito utilitária da Bíblia. Lemos porque temos que
ler 10 versículos por dia, porque queremos usar para algum estudo, porque queremos falar
com alguém ou para citar numa rede social. Mas nessa leitura utilitária, ainda que seja boa
(porque você está lendo a Bíblia), o grande desafio é ler a Bíblia de tal forma que a Bíblia leia
você.
30
pentecostal. Essa postura é importante, mas é uma tentação muito grande. Na verdade, é
inevitável que nossa leitura bíblica já seja influenciada pela nossa história.
O teu livro pode nos ajudar nisso, Marcos, no sentido de que conseguimos chegar
talvez um pouco mais desarmados perante o texto bíblico? Ou a Bíblia, por si só, suporta essa
diversidade e está tudo bem, se é que eu me fiz claro na pergunta. RB
Parte da leitura bíblica é permitir que a Bíblia nos torne conscientes dos nossos
pressupostos. Ela revela nossa ideologia, o lugar de onde estamos lendo, e nos surpreende. É
a Palavra de Deus. Assim, parte da nossa relação com a Escritura é permitir que ela nos revele
esses aspectos e diga: “Puxa, essa é a minha forma viciada de ler; essa é a minha forma
tradicional de ler.” Mas, ao ler o texto relacionando-o com toda a Escritura, nós nos
deparamos com uma realidade distinta daquela com a qual estávamos familiarizados. Então,
eu diria que essa combinação de oração, silêncio e leitura evita uma série de atropelos. ZM
Tem uma coisa que aconteceu no último século, que é a teoria da suspeita—ser
suspeito do texto. Como dizia Ziel Machado e outros em Condilícias, “nos ensinaram a
suspeitar do texto, mas não nos ensinaram a suspeitar de nós mesmos.” Isso é muito bom.
Nos ensinaram a desconstruir o texto, mas não nos ensinaram a desconstruir a nossa leitura,
que é o que você está mencionando.
Por outro lado, o relativismo diz: “Vai do seu jeito, já que você está levando um
caminhão para dentro do texto.” Mas também não é assim. Não é simplesmente “eu sou
assim, eu nasci assim.” A questão é: a chave é ter consciência de quem você é para ler o texto.
E, paradoxalmente, você só consegue ter consciência de quem você é se lê o texto. Para
entender o texto, você precisa ter consciência de quem você é, e isso se chama mover do
Espírito. É algo como o que Jesus disse a Nicodemos: "O vento sopra onde quer. Você o escuta,
mas não pode dizer de onde vem nem para onde vai. Assim acontece com todos os nascidos
do Espírito." (João 3:8 NVI). É como erguer a serpente no deserto; não tente explicar tudo.
Sabemos que aquilo nos curou. É o escândalo da cruz. MB
31
Para dar uma resposta bem simples à sua pergunta sobre como conhecer as Escrituras,
meus colegas e mestres sempre disseram algo muito direto: seja humilde diante das
Escrituras. Além disso, peça ajuda ao Espírito Santo, pois Ele é quem nos ilumina, clareia,
ensina e ajuda a nos conhecermos a nós mesmos. Como ele falou, se nós não nos
conhecemos, como poderemos conhecer a Deus? O Espírito Santo vai nos revelando as nossas
limitações e nos mostrando quem é Deus. E isso é um aprendizado para a vida toda.
Não chegamos a um ponto final; alguns talvez tenham chegado, mas a maioria de nós
continua sempre aprendendo, sempre buscando conhecimento com irmãos mais experientes
ou através de experiências que não tivemos. Estamos sempre em processo de aprendizado e
transformação. Esse ensino deve nos transformar e agir como uma luz que levamos e que
também transforma o ambiente onde estamos. Não é algo estagnado. Também é importante
procurar um mestre ou uma boa escola, busque um mestre que possa te proporcionar um
bom aprendizado. IB
Uma coisa interessante que eu acho que a gente poderia discutir é sobre como
enxergamos o texto bíblico. Começamos falando sobre como nos enxergamos, mas é
importante também falarmos sobre a perspectiva que temos do texto. Quando uma metáfora
se torna um dogma, ela pode complicar as coisas um pouco. MB
Por exemplo, eu cresci acreditando que a Bíblia era um manual de vida, e isso pode
parecer bonito à primeira vista. Há uma história sobre isso que ilustra bem a ideia. Diz-se que
um dia um carro parou no meio da estrada, e outro carro parou para ajudar. O motorista do
segundo carro perguntou: “Qual é o problema?” O proprietário do carro que havia parado
respondeu: “Comprei este carro agora e ele parou no meio da estrada.” Então, o outro
motorista foi até o motor e fez o carro ligar novamente. Surpreso, o proprietário perguntou:
“Como você consertou o carro?” E o outro motorista respondeu: “Meu nome é Henry Ford.”
Ele era o criador do carro. RB
Tem um grande problema nessa metáfora: a Bíblia não é o manual da nossa vida. O
manual tem um formato de escrita que parece ser assim: se eu estou precisando entender
sobre casamento, eu vou nos casamentos da Bíblia. Mas, se você for aos casamentos dos
patriarcas, você se depara com situações complicadas. Por exemplo, se você quer entender
sobre liderança, você vai a Neemias, mas Neemias não está lidando exatamente com
liderança em um sentido moderno; ele está reconstruindo muros. Se você busca sobre
32
plantação de igrejas, vai a Neemias novamente, que está envolvido na construção de um
templo, e depois você pode pensar em Moisés.
Assim, é complicado. Você entende que, se a Bíblia fosse um manual, você iria para a
área que está precisando de ajuda, mas a área só tem pessoas falhas, iguais a nós. Então, a
Bíblia não é um manual. Muitas vezes, vemos como uma pílula para o dia. Você lê três
versículos e recarrega suas energias. Lembra daquela caixinha de promessas? Na vigília, você
puxava um versículo, como "Onde pisar a sola do seu pé será seu." Todo dia você tirava um
versículo para começar bem.
Eu costumava brincar com isso. Em 2008, quando não era moda, tivemos um podcast.
Na época, eu dizia para os alunos do seminário: "Se a Bíblia toda é inspirada, então vamos
criar a caixinha da maldição, porque os versículos de maldição também são inspirados."
Assim, todo dia você puxava um versículo de maldição. Lembro também que, quando
tínhamos o podcast, toda vez que recebíamos um e-mail mal-educado, puxávamos um
versículo de maldição da nossa caixinha para nossos ouvintes que nos criticavam. Era uma
ideia divertida.
O princípio é que às vezes lemos a Bíblia como um manual, outras vezes como um
dicionário teológico, o que é um erro. Algumas pessoas a leem como pílulas para inspiração.
No entanto, o jeito certo de ler a Bíblia é como Jesus a leu. No caminho para Emaús, Jesus
explicou aos discípulos, começando pela Torá e pelos profetas, como toda a Bíblia
testemunha sobre Ele, falando da Sua morte e ressurreição. Jesus disse que as Escrituras
falam sobre Ele e que, n'Ele, encontramos a vida eterna. Portanto, a Bíblia não é um manual,
nem fala sobre você ou sobre mim, mas sobre Jesus. Em Jesus, encontramos nossa verdadeira
identidade. É importante entender isso e parar de usar a metáfora do manual, embora seja
interessante, mas com ressalvas. MB
Acho que seria muito interessante se você quebrasse um aparelho em casa e, ao abrir
o manual, encontrasse algo assim: "Livro da Genealogia do Senhor Toshiba". Isso reforça o
que o Marcos falou; ficaríamos muito frustrados com um manual assim. Uma parte da nossa
frustração com o texto vem da maneira como queremos lê-lo e da forma como o texto se
apresenta. Eu só queria amarrar um pouco com o que o Marcos trouxe, o que a Ivone trouxe
muito bem e o que o Ziel também mencionou. A questão é que podemos, de boa-fé e com
bom coração, ir para o texto como se fosse um manual e acabar frustrando as nossas
expectativas.
33
teologia e a academia são meios de poder. Se a minha aproximação do texto bíblico for
imaginar que ele me conferirá algum tipo de poder pessoal, em qualquer circunstância, eu
nunca conseguirei me permitir ser lido pelo texto. Isso não acontece apenas na academia;
pode ocorrer também fora dela.
Exatamente isso, e isso está relacionado à maneira como a Bíblia se apresenta, como
o Marcos mencionou. O que importa é o nosso coração diante da Bíblia e como somos lidos
por ela. A Bíblia se apresenta como o próprio Deus. Para ilustrar isso, imagine o seguinte: se,
por algum motivo urgente, você precisa marcar uma reunião com o prefeito de Arujá na
segunda-feira, seria extremamente difícil conseguir um espaço na agenda dele,
especialmente se não tiver agendado com antecedência. Você teria que ser muito importante
para conseguir esse tempo. Agora, a Bíblia é o rei do universo, não o prefeito de Arujá. Ela diz
a você: "Pode vir agora, eu estou aqui para um encontro com você, disponível para que você
me conheça."
Quando a Bíblia se apresenta dessa forma, com o rei do universo se fazendo menor
para que possamos nos encontrar com Ele, eu não posso mais ter uma aproximação ou uma
abordagem do texto em que ele seja um instrumento para mim. Não dá. A única conclusão
que posso chegar é que aqui começou uma história de diminuição e humildade, da qual me
aproximo sabendo que não sou digno. Me aproximo sabendo que, para falar com o prefeito
de Arujá, eu preciso ser importante. Agora, diante da dinâmica do universo, quem sou eu?
Uma gota no oceano. E ainda assim, o rei do universo disse: "Eu estou aqui para ser
conhecido." Daí, o livro da genealogia de Cristo Jesus começa a fazer sentido. Eu quero
conhecer esse Deus. Ele está se apresentando, e eu não preciso marcar horário.
Diante disso, começamos a conhecer esse Deus para ficar mais parecidos com o Filho
dEle. Então, a dinâmica se inverte, porque o texto bíblico se apresenta a nós, nos lê, e eu não
mais quero usá-lo para estabelecer determinadas estruturas de poder ou para deixar as coisas
34
mais parecidas com aquilo que eu sonhei ou, com o que é ainda pior, comigo. Eu começo a
me colocar como um servo de Deus para que o mundo seja mais parecido com aquilo que Ele
quer, para que as pessoas com as quais eu tenho contato sejam mais parecidas com Jesus.
Muda tudo. Não é mais sobre o Victor, nem sobre o Ziel. Não é mais sobre o meu mestrado
ou o doutorado do Ziel. Não é mais sobre o poder da academia ou o poder interno
eclesiástico. Não é mais sobre como a caixa de promessas vai servir o meu dia para me
motivar, mas sobre como as promessas de Deus fazem com que este mundo, a partir da
ressurreição de Cristo Jesus, comece a ser restaurado e as coisas erradas comecem a ser
colocadas no lugar, assim como o próprio Pai começou a colocar no lugar o próprio corpo de
Jesus no terceiro dia depois de Ele ter sido estraçalhado, assim como o mundo foi quando
colocamos a crueldade nele. VF
O CAMINHO DA CRUZ
Fico pensando que, já na primeira fala do Ziel, eu não conseguia parar; não dizia mais
nada, ficava aqui pensando, porque peguei um gancho sem querer no sentido de que é muito
tentador — falo por mim agora como produtor de conteúdo. Enfim, é muito tentador
aproximar o preparo bíblico para o meio, para a promoção, para a satisfação pessoal. É muito
tentador, e eu sei que não é uma tentação só minha; pastores, diretores, todos enfrentam
isso, porque é o poder. Acho que a única solução é oração e jejum. RB
35
Portanto, não podemos desconsiderar que o caminho da obediência é o caminho que
nos resta. Uma teologia sem a marca da obediência não serve para nada. Uma teologia
teórica, sem cicatrizes, não tem valor. Nosso Senhor tem as cicatrizes da obediência nas mãos.
As cicatrizes têm seu lugar na história; foi tocando uma cicatriz que a igreja formulou a oração:
"Senhor, meu Deus." Toda essa reflexão deve nutrir nosso caminho de obediência na história.
Então, a cruz está à frente. João nos lembra que o caminho de Deus, de Cristo ao Pai, é a cruz.
Nosso caminho ao Pai é pelo Filho, mas, na experiência da missão e do discipulado cristão, é
necessário tomar a cruz todos os dias. ZM
36
APÊNDICE: FALSOS ENSINOS E FALSOS MESTRES 5
Rodrigo Bibo
O conceito de falso ensino tem suas raízes na própria narrativa de Gênesis. A serpente,
ao questionar a palavra de Deus, introduz um elemento de dúvida e engano. Em Gênesis 3,
vemos como a serpente distorceu a verdade divina para promover a desobediência. Essa
primeira má teologia estabeleceu um padrão para as distorções que continuariam a surgir ao
longo da história. A maneira como a serpente manipula a verdade mostra a origem da
corrupção no ensino, um problema que se perpetua até os dias atuais.
O que Gênesis 3 nos ensina em relação ao falso ensino? O falso ensino nasce
justamente do coração e da mente que não estão dispostos a obedecer àquilo que Deus
manda. Há a mente opositora, ou seja, a mente que propõe o falso ensino e a mente que
acredita, porque há aquele que ensina o falso ensino e aqueles que seguem o falso
ensinamento. Isso acontece justamente por conta do nosso coração caído, como herdeiros
do pecado do primeiro casal. A humanidade em Gênesis 3 é uma humanidade que escolhe
não obedecer a Deus. Gênesis 3 é um reflexo do próprio povo de Israel; lembre-se de que
Gênesis 3 foi escrito, em primeiro momento, para o povo de Israel.
O autor de Gênesis quer passar, entre outras coisas, que vocês estão a todo momento
escolhendo não obedecer à lei do Senhor. Vocês estão constantemente escolhendo outros
deuses e se prostituindo com eles. Inclusive, já no Antigo Testamento, Jeremias e Ezequiel
dizem que vocês colocam ídolos no coração de vocês. Ou seja, já no Antigo Testamento, surge
a ideia de que o coração do homem produz falsos deuses. Falsos deuses são frutos de falsos
ensinamentos. É como se passássemos a acreditar em falsos deuses para que pudéssemos
viver falsos ensinamentos.
5BTCast M 030, episódio exclusivo para mantenedores, publicado em 22 de fevereiro de 2024. Quer se tornar
mantenedor? Acesse: https://bibotalk.com/mantenedores/
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que o povo atente à Palavra de Deus e a guarde. Eu sempre gosto de cantar Cassiane nesses
momentos, quando ela canta o Salmo. Qual é a música? "A Tua Palavra escondi, para eu não
pecar contra Ti, Senhor." A Tua Palavra escondi. Ou seja, é isso, cantando o Salmo. E eu guardo
essa Palavra, eu medito nela de dia e de noite. Por quê? Porque é meditando nessa Palavra e
guardando-a que me preservo dos falsos ensinamentos.
Só que é o seguinte: mesmo com todo esse cuidado, é uma tarefa individual. Cada
membro da comunidade precisa ter esse compromisso com a Escritura, mas, ao mesmo
tempo, o povo de Deus é um coletivo de humanos. O povo de Deus tem, em seu meio, homens
e mulheres que Deus levanta para conduzir o seu povo no caminho do Senhor. Então, o que
temos? Temos, no Antigo Testamento, sacerdotes, profetas e até mesmo reis, que tinham a
obrigação de conduzir o povo no caminho.
Como exemplo, temos Oséias. Os primeiros seis capítulos de Oséias são uma
advertência contra o povo e, principalmente, contra os sacerdotes do povo, que estavam
fazendo o quê? Deturpando os ensinamentos de Javé. Deturpando os ensinamentos de Deus
e, consequentemente, o povo estava perecendo por falta de conhecimento. "O meu povo
está sendo destruído, porque lhe falta o conhecimento." (Oséias 4:6 ARA)
Há, portanto, um erro duplo: o povo não buscava e os sacerdotes ensinavam errado.
Então, a culpa nunca é só da liderança. Fazendo uma
aplicação rápida para o nosso tempo, quando temos
igrejas que ensinam coisas erradas, é importante
lembrar que esses mestres do falso ensino serão
julgados por Deus, seja aqui ou no porvir. Mas
aqueles que andam no falso ensinamento são tão
culpados quanto. Por quê? Porque acreditam em
todo vento de doutrina. Então, vamos recapitular o
que falei até agora.
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A partir de Gênesis 3, vemos Deus, a todo momento, levantando homens e mulheres
para colocar o povo no caminho, para apontar a direção correta. Isso porque existe um ensino
verdadeiro. E temos, então, todo o Antigo Testamento, onde sabemos que a história não
acaba muito bem. O Antigo Testamento termina com um gosto amargo: um povo rebelde,
que foi para o exílio, voltou e está tentando se recompor.
Mas então temos Jesus. Jesus vem fazer o quê? Ser a finalidade da lei. "Eu não vim
abolir a lei, mas cumprir a lei." (Mateus 5:17 NVI). Jesus é o fim da lei, a finalidade da lei. Ele
traz o seu Espírito Santo e o derrama sobre toda a carne. Ou seja, agora todo o povo de Deus
tem acesso a Deus. Todo o povo de Deus pode ter comunhão com Deus, porque possui o
Espírito de Deus. E todo esse povo, agora, tem acesso à verdade, ao caminho da verdade.
Como funciona a dinâmica da igreja no Novo Testamento? Em Atos 2:42, lemos: "E
perseveravam na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações"
(ARA). Este versículo revela aspectos essenciais da vida da igreja primitiva. A importância
dessa perseverança não pode ser subestimada. Os primeiros cristãos não apenas seguiam
essas práticas; eles perseveravam nelas com todo o seu ser e pensamento. Eles se dedicavam
com fervor à doutrina dos apóstolos — aqueles que andaram e ouviram diretamente de
Cristo. O ensino recebido por eles era então transmitido para toda a comunidade. A devoção
à doutrina dos apóstolos, à comunhão, ao partir do pão e às orações refletia um compromisso
profundo e sincero com a fé que receberam.
É fascinante notar que, dois mil anos depois, continuamos seguindo a mesma tradição:
perseverando na doutrina dos apóstolos. Isso nos leva a um ponto importante: devemos ser
cautelosos com doutrinas novas. Embora nem toda
nova doutrina deva ser imediatamente descartada
— algumas conversas teológicas contemporâneas
podem ser bastante enriquecedoras — é importante
verificar sempre a base bíblica dessas novas ideias.
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buscam influenciar o povo com suas visões pessoais da palavra de Deus, o que destaca a
necessidade de vigilância e discernimento contínuos.
O falso ensino impõe um fardo desnecessário, sugerindo que a cruz é pesada demais
e que precisamos carregar um peso que Jesus Cristo já levou por nós. Um exemplo disso são
os judaizantes, que insistem que os cristãos devem se circuncidar e seguir dietas alimentares
e costumes judaicos que não têm mais sentido para os cristãos. Por isso, é estranho ver
pessoas que ainda hoje querem viver como judeus, sendo que a Bíblia não nos pede isso, e
ser judeu ou seguir a cultura judaica não nos torna mais santos. Para mim, isso reflete uma
falta de estudo das cartas de Paulo aos Gálatas, aos Hebreus e aos Colossenses.
Existem dois aspectos importantes do falso ensino a serem discutidos. Primeiro, ele
nos faz viver conforme nossas próprias vontades. Esse falso ensino customiza a fé, dizendo:
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"Eu quero isso, mas não quero aquilo. Isso aqui é legal, isso aqui não." Em outras palavras,
permite que escolhamos o que queremos sem alterar significativamente nosso modo de vida.
Essa é uma característica marcante do falso ensino.
LIBERTINAGEM X LEGALISMO
Tomem sobre vocês o meu jugo (Mateus 11:29, NVI). Quando Jesus nos convida a
tomar o seu jugo, Ele nos oferece um fardo leve e fácil de carregar. No entanto, o falso ensino
tende a sobrecarregar-nos com regras e exigências adicionais. Para ilustrar isso, podemos
considerar duas palavras que começam com a letra L. A primeira é a libertinagem.
Libertinagem é uma distorção do evangelho que nos leva a viver de qualquer maneira,
baseando-se apenas na ideia de que a graça é suficiente e que não precisamos mudar. É como
se a graça fosse uma licença para viver sem restrições. Esse conceito é exemplificado pela
atitude dos Coríntios, que dizia: "Tudo me é permitido, mas nem tudo me convém" (1 Coríntios
6:12, NVI). A libertinagem leva a uma fé superficial, onde a vida diária não reflete o impacto
da salvação em Cristo.
Por outro lado, o falso ensino também pode se manifestar como legalismo, uma
tentativa de remediar a libertinagem por meio de uma vida repleta de regras e imposições. O
legalismo é caracterizado por uma aderência rígida à letra da lei, com muitas restrições e
proibições: "Não manuseie, não prove, não toque" (Colossenses 2:21, NVI). Esse é o tipo de
ensino que Paulo critica em Romanos 14, onde ele aborda as disputas sobre dietas e dias
sagrados, enfatizando que a verdadeira fé em Cristo não se baseia em regras externas, mas
na transformação interna que Ele promove.
O legalista é aquele que, diante de todos, parece impecável, inabalável, santo e puro,
mas esconde segredos no armário. É um hipócrita, que exige dos outros o que nem ele mesmo
segue em privado. A vantagem do libertino, ao menos, é que ele é sincero, mesmo que essa
sinceridade o conduza por um caminho errado. A hipocrisia do legalista é, por si só, um
caminho incorreto.
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Então, como posso me libertar da libertinagem? E como me livrar do legalismo? Aqui
entra o terceiro "L" que está no meio: a liberdade em Jesus. É a liberdade do Evangelho. A
liberdade que o Evangelho oferece me revela que sou um pecador, expõe meus erros e
defeitos, mas, ao mesmo tempo, me aponta para a cura.
É a liberdade que Jesus me concede para reconhecer e desfrutar do Seu amor, e ouvir
a boa notícia de que Deus está conosco e nos salvou. É a fé que é suficiente, e, sendo amado,
amarei. Ou seja, quem vive na liberdade de Jesus Cristo sabe que é escravo de Deus e,
portanto, obedecerá à lei de Cristo, que Paulo resume em Gálatas 6:2: "Levai os fardos
pesados uns dos outros e, assim, cumpram a lei de Cristo" (NVI).
Eu vivo baseado na obra que Deus realizou por mim. Quando sigo o Evangelho, não
sigo apenas meus próprios desejos; busco viver conforme a vontade de Deus. No entanto,
viver segundo a vontade de Deus não é o caminho para a salvação. Isso é crucial na vida cristã:
viver de acordo com o Evangelho e obedecer aos mandamentos de Deus. Mas é importante
entender que a salvação não vem da obediência aos mandamentos. Se eu acreditar que a
salvação é resultado da obediência, estou caindo novamente no legalismo. O legalista
acredita que pode alcançar o céu fazendo as coisas certas.
Se eu pensar que vou para o céu por causa de alguma bondade em mim ou por minhas
boas ações, estou seguindo um falso ensinamento. Por isso, precisamos estar extremamente
atentos. É por isso que comecei esta conversa: para destacar a importância das cartas do
Novo Testamento. Elas nos ajudam a corrigir nossos caminhos e as doutrinas funcionam como
placas sinalizadoras ao longo da jornada.
As cartas do Novo Testamento foram escritas para corrigir desvios e oferecer diretrizes
doutrinárias que são fundamentais para a igreja. Essas diretrizes são indispensáveis para a
formação da fé. Você acredita em Deus? Mas, o que significa realmente ter fé? Fé é, entre
outras coisas, uma crença fundamentada. É um conjunto de credos e ensinamentos sobre
Deus. Quando você afirma crer em Deus, deve estar formulando em sua mente quem é esse
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Deus. Qual é a base de sua crença? Quais informações você possui sobre Ele? Isso constitui a
sua fé.
A Bíblia faz referência a uma "fé fraca", que pode ser entendida como uma fé
debilitada. Em Romanos 14:1 (NVI), lemos: "Aceitem o que é fraco na fé, mas não para discutir
sobre opiniões."
Algumas pessoas possuem fé, mas ela é fraca porque seu conhecimento sobre Deus e
Suas ações é superficial. O conjunto doutrinário delas é limitado. Portanto, há aqueles com
uma fé mais fraca e outros com uma fé mais robusta. E por que a fé de alguns é mais forte?
Não é simplesmente porque confiam mais em Deus, mas porque seu conjunto de crenças
sobre Deus está mais solidamente fundamentado na Palavra e na tradição dos apóstolos.
Quando ouvimos a palavra "tradição", muitos evangélicos a associam exclusivamente ao
catolicismo. Você conhece o Credo Apostólico de cor? Algumas pessoas se lembram dele
porque foram católicas no passado.
Quem se lembra do Credo Apostólico porque foi católico? A maioria que se lembra é
porque já teve contato com a reza católica. No entanto, isso é uma visão limitada. O Credo
Apostólico não é exclusivo da Igreja Católica; ele pertence à Igreja como um todo. O Credo
Apostólico é um dos primeiros credos da Igreja, estabelecendo uma base fundamental para a
crença cristã. Desde que Jesus Cristo subiu ao céu, a Igreja tem procurado esclarecer e
consolidar sua fé. À medida que a Igreja se desenvolvia e os apóstolos iam falecendo, era
necessário ter essas bases doutrinárias para garantir a continuidade e a correção da fé.
Afinal, eles não eram imortais e não cantavam Sandy. Então, quando as pessoas iam
morrendo, o que acontecia? Eles escreveram os evangelhos e preservavam as cartas. A
situação era crítica: estavam crucificando os apóstolos, queimando-os, exilando-os em ilhas e
até fervendo-os. A tradição dos apóstolos precisava ser preservada, e isso era feito por meio
da escrita.
Por isso, temos quatro evangelhos e várias cartas no Novo Testamento. Aqueles que
perseveraram na tradição dos apóstolos compreendiam a importância de conservar o que
aprenderam com Jesus, pois isso era essencial para a existência da igreja. Homens e mulheres
ouviram e praticaram os ensinamentos dos apóstolos, e havia um esforço consciente para
registrar, viver e manter viva essa tradição oral, que ainda era muito influente na época.
Contudo, com a expansão da igreja pelo mundo, surgiu a necessidade de sistematizar e
disseminar essas doutrinas de forma mais ampla e acessível.
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invenções e doutrinas falsas foram introduzidas. É por isso que a igreja persevera: pessoas
continuam a preservar e a lutar pela fé verdadeira. Portanto, a igreja deve cultivar uma fé
forte, pois sempre houve e sempre haverá falsos ensinamentos não apenas fora, mas também
dentro dela.
Por isso, quando alguém vem e diz: "Você viu o que aquele fulano falou sobre a igreja?
Ou o que aquele cantor disse sobre o evangelho?" — eu vejo esse tipo de conteúdo como
irrelevante. Recentemente, ouvi que a Anitta comentou algo sobre Deus. Não acho que seja
um conteúdo inútil porque a fala da Anitta reflete um entendimento que as pessoas têm de
Deus. Ela é uma figura pública com influência, e representa uma parte da cultura brasileira.
Mas, sinceramente, pouco me importa o que a Anitta pensa sobre Deus.
Da mesma forma, se alguém comenta o que um ator ou cantor disse, como, por
exemplo, uma declaração da Beyoncé sobre Jesus, isso não me afeta. Eu gosto da música
"Halo" dela e é isso que importa para mim. Não vou deixar de ouvir Beyoncé apenas por causa
de uma afirmação dela sobre Jesus. Ela canta "Halo", que eu considero uma excelente música
e a trilha sonora perfeita para o filme "Cidade dos Anjos". Lembra dele? Com Nicolas Cage e
Meg Ryan? Um clássico.
Portanto, não me preocupo com o que figuras públicas como Anitta, Beyoncé ou até
o Papa dizem. O que realmente me preocupa é o que estamos cantando nas igrejas aos
domingos e o que os pastores estão dizendo em podcasts. Isso é importante para mim, pois
esses são os que compartilham a mesma fé que eu. O que pessoas como a Anitta ou a Ivete
Sangalo falam não é a minha principal preocupação.
O que esperar da Ivete Sangalo? Ela não é cristã. Ivete, se você for crente, volte para
Jesus. Mas, sinceramente, eu não me importo muito com o que ela diz. Isso é cristianismo
cultural. Da mesma forma, fico cansado de ouvir sobre vídeos do Porta dos Fundos e
acusações de blasfêmia. Você realmente acha que Deus está preocupado com um especial de
Natal do Porta dos Fundos? Não. Deus não está lá pensando: "Olha o grupo de humor. Que
coisa horrível!"
O que importa é como estamos vivendo nossa fé. Fico mais preocupado com os
influenciadores cristãos que estão ensinando coisas erradas e disseminando teorias da
conspiração. Eles estão no nosso meio, ignorando a tradição cristã. Esses são os que
realmente me preocupam, não o Porta dos Fundos, a Ivete Sangalo, a Anitta, o Jay-Z ou o Elon
Musk.
Estou profundamente preocupado com irmãos e irmãs em Cristo que, embora não
questionem sua própria espiritualidade, acabam promovendo falsas doutrinas de maneira
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equivocada. Essa situação é alarmante, pois sua influência pode ser prejudicial. Gostaria de
compartilhar um trecho da Epístola de Judas. Esta carta, situada no final do Novo Testamento,
começa assim:
"Judas, servo de Jesus Cristo e irmão de Tiago, aos que foram chamados, amados por
Deus Pai e guardados por Jesus Cristo: misericórdia, paz e amor lhes sejam
multiplicados" (Judas 1:1-2, NVI).
Essa deve ser uma marca do povo de Deus: misericórdia, paz e amor. Essa é a nossa
marca: misericórdia, paz e amor. Mas, como diz o versículo 3:
"Amados, embora eu planejasse escrever-lhes com todo empenho sobre a salvação que
compartilhamos — ou seja, sobre as coisas boas, as doutrinas dos apóstolos e outras
questões importantes da nossa fé —, entendo agora que devo escrever a respeito de
outro assunto e insistir que defendam a fé que, de uma vez por todas, foi confiada ao
povo santo." (Judas 1:3 NVT)
Quem é o povo santo? Somos nós. É crucial lembrar que, ao nos referirmos a um povo,
o “eu” se transforma em “nós”. A santidade não é uma questão individual, mas coletiva.
Portanto, ao invés de pensarmos apenas em termos de “eu”, devemos enxergar o “nós” que
compartilhamos. Assim, nós somos esse povo santo.
Por isso, devemos batalhar pela fé que nos foi confiada e lutar juntos pela fé que foi
entregue ao povo santo.
Pois alguns indivíduos perversos se infiltraram em seu meio sem serem notados,
dizendo que a graça de Deus permite levar uma vida imoral. A condenação de tais
pessoas foi registrada há muito tempo, pois negaram Jesus Cristo, nosso único Soberano
e Senhor. (Judas 1:4 NVT)
Eles afirmam que a graça de Deus permite uma vida imoral. A condenação dessas
pessoas foi registrada há muito tempo, pois negaram Jesus Cristo, nosso único e soberano
Salvador.
"Mesmo que vocês saibam dessas coisas, desejo lembrá-los de que o Senhor libertou o
povo de Israel do Egito, mas depois destruiu aqueles que não permaneceram fiéis.
Também lembro dos anjos que não se limitaram à autoridade recebida e deixaram o
lugar a que pertenciam. Deus os mantém acorrentados em trevas eternas, aguardando
o dia do julgamento. E não se esqueçam de Sodoma e Gomorra e das cidades vizinhas,
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que estavam cheias de imoralidade e perversão sexual de todo tipo, que foram destruídas
pelo fogo e servem de advertência do fogo eterno do julgamento." (Judas 1:5-7 NVT)
Da mesma forma, essas pessoas afirmam ter autoridade com base em sonhos. A fonte
da autoridade delas é apenas "vozes na minha cabeça" — um sonho que tiveram, uma
revelação. Muitas seitas, inclusive, baseiam-se nisso.
A pessoa estava ali para receber uma revelação exclusiva, um conhecimento único.
Isso é comum nas figuras apostólicas hoje em dia. Ninguém pode questionar o apóstolo ou a
apostila. Eu não sei qual é o feminino de apóstolo. Ninguém pode questionar, isso é uma
característica de seita: “não se deve tocar no ungido, essa pessoa recebeu orientação, ela é
intocável e inquestionável”. Isso é seita, não tem a ver com o povo de Deus. Pastores, pastoras
e líderes eclesiásticos não dominam um conhecimento privado ou oculto. Sonhos e
revelações de líderes espirituais têm peso zero diante da tradição da igreja.
Não se deve buscar um conhecimento oculto acessível apenas por meio de ofertas ao
apóstolo, vigílias especiais ou caminhos secretos para descobrir coisas não reveladas. Isso é
heresia e mentira, algo que pode ter aparência de Deus, mas não é de Deus, pois Deus age às
claras. Ele tem uma doutrina que foi transmitida e guardada ao longo dos séculos. Então,
como se guardar dos falsos ensinos? A primeira etapa é estar em contato com a palavra de
Deus. A segunda etapa é pertencer a uma denominação.
Vocês fazem parte da união das igrejas de Cristo. O que a sua igreja acredita? Qual é
a soteriologia da sua igreja? Como ela entende a salvação? Como o batismo é realizado? Qual
é a compreensão da ceia? O que as igrejas de Cristo acreditam? Aprendam isso primeiro. Não
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adianta vir estudar comigo com 30% de desconto no plano anual, ou assistir vídeos de
Nicodemos, Yago, ou qualquer outro, se você não conhece a base doutrinária da sua igreja.
Pare de ouvir meu podcast ou de outros, se não sabe o que sua igreja acredita. Conheça a
base doutrinária da sua igreja antes de se render a outras doutrinas.
Pode parecer radical, mas estou cansado de ver pessoas com boa doutrina na igreja
se rendendo a outras doutrinas só porque foram influenciadas por pastores famosos.
Conheça a base doutrinária da sua igreja e, se precisar, tenha misericórdia e amor. Às vezes,
você pode perceber que a doutrina da sua igreja tem aspectos questionáveis. Toda doutrina
tem suas falhas e não é a verdade absoluta.
Tenha maturidade. Não abandone sua igreja simplesmente porque você agora é
amilenista e sua igreja é pré-milenista histórica. Se você é calvinista e seu irmão é arminiano,
não seja intolerante! Há intolerância em ambas as perspectivas. Mantenha o amor, a paz e a
misericórdia, mas também batalhe pela sua fé. Conheça a fé da sua denominação. A igreja
não é um caos onde cada um faz o que quer. Estamos na era do Espírito, e o Espírito ensina
as igrejas.
Descubra os ensinamentos que o Espírito Santo revelou ao povo de Deus. Embora haja
aspectos comuns a todos os cristãos, cada igreja também possui suas particularidades. Em
meio a ensinamentos bons e outros nem tanto, é essencial ouvir a voz profética e amorosa.
Evite os falsos ensinos e busque a sabedoria dos ensinamentos verdadeiros da sua igreja.
Conheça suas crenças e credos, e aprofunde-se na teologia da sua comunidade. Se sua igreja
oferece seminários ou escolas de teologia para leigos, aproveite essa oportunidade. Mesmo
que você não pretenda se aprofundar em teologia, uma base sólida é fundamental. Como
Michael Goheen observa, "A igreja é a comunidade de Deus, a qual vive em obediência ao
chamado de Deus para ser luz para as nações e um sinal do reino de Deus." Que Deus nos
ajude a manter a fé firme, pois falsos ensinos sempre estarão presentes até a volta de Jesus,
que separará o joio do trigo (Mateus 13:30). Que Deus tenha misericórdia de nós e nos guie
na verdade.
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