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Caderno103 Pingo01 o Sol Atravessa Tudo

O documento apresenta 'O Sol Atravessa Tudo', que explora a relação entre o Sol e a vida na Terra, utilizando mitos e cosmologias de povos indígenas, como os Guarani e Dessano. O caderno acompanha uma animação chamada Pingo Selvagem, que promove saberes tradicionais e atividades educativas para crianças. A obra destaca a interconexão de todos os seres e a importância do Sol como fonte de vida e energia.

Enviado por

Tatiana Cardoso
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Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
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Caderno103 Pingo01 o Sol Atravessa Tudo

O documento apresenta 'O Sol Atravessa Tudo', que explora a relação entre o Sol e a vida na Terra, utilizando mitos e cosmologias de povos indígenas, como os Guarani e Dessano. O caderno acompanha uma animação chamada Pingo Selvagem, que promove saberes tradicionais e atividades educativas para crianças. A obra destaca a interconexão de todos os seres e a importância do Sol como fonte de vida e energia.

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O SOL ATRAVESSA TUDO

PINGO SELVAGEM

cadernos
SELVAGEM
O SOL ATRAVESSA TUDO
“Há milhares e milhares, no meio do escuro,
surgiu um deus.
Ele criou uma luz.
Há milhares e milhares, no meio do escuro,
criou o beija-flor, mensageiro do dia.
Há milhares e milhares, no meio do escuro,
criou uma árvore originária.
Há milhares e milhares, no meio do escuro,
criou uma cobra.
Há milhares e milhares, no meio do escuro,
criou uma ave, a coruja, mensageira da noite.
Criou os deuses de proteção.
Há milhares e milhares, no meio do escuro,
criou o planeta.
Há milhares e milhares, no meio do escuro,
criou a água, o vento, a vida no planeta.
Por isso, você não pode ter medo do escuro.”

Poética Guarani narrada por Carlos Papá

3
O Sol a t r a v e ss a t u d o
Pingo Selvagem

Este caderno acompanha um Pingo, animação de poucos minu-


tos que reverbera aprendizagens da Selvagem para crianças de todas
as idades.
Selvagem é uma associação que promove um ciclo de estudos sobre
a vida e apoia Escolas Vivas, movimento de fortalecimento e transmis-
são de saberes tradicionais em territórios indígenas.
Pingo Selvagem concentra um mar de conhecimentos presentes em
ciclos, cadernos, audiovisuais, encontros, livros, que compõem a Selva-
gem, especialmente estudos com as Escolas Vivas Guarani, Maxakali,
Tukano-Dessano-Tuyuka, Baniwa e Huni Kuï.
Pingo, por definição, é uma pequena porção de algo. Mesmo dimi-
nutos, pingos propagam ondas e nutrem solos. Por natureza, o Pingo
Selvagem é radial. Este pingo tem o Sol como centro e expressa as
interações dessa força cósmica com a vida no planeta. Nada no Pingo
é linear, assim como a vida, que não cabe numa linha do tempo. Cia-
nobactérias, humanos, micélio, a vida na terra e no mar, tudo coexiste,
colabora e propicia um sistema mais complexo, que interage como
uma dança.
Aqui, você encontra mitos de origens, cosmologias, astronomias,
ciências da vida e propostas de atividades, além de links para conteú-
dos mais amplos do nosso ciclo que podem ajudar a aprofundar sua
pesquisa e animar a sua curiosidade. Que este Pingo traga frescor!

4
Sumário

6 escuro

9 beija-flor

14 so l

20 cianobactérias

23 vida no mar

26 micélio

29 vida na terra

35 m ã os

37 o so l a t r a v e ss a t u d o

5
Escuro

O escuro é a mãe de todo o universo.


Carlos Papá

O povo Guarani Para o povo Guarani, o escuro é a mãe de Nhamandu, o ser criador
habita a região meri- de tudo. Para os Dessano, do escuro surge a avó do mundo, Yebá Buró.
dional da Améri-
Muitos mitos de origem começam no escuro, assim como a vida que
ca do Sul em um
amplo território, no brota de dentro do solo, do útero ou de um ovo.
qual se sobrepõem Do outro lado da Terra está o escuro da noite, quando aqui é dia. No
os territórios de cosmos, quando não existem corpos celestes para refletir a luz, tudo é
Paraguai, Brasil,
escuro, assim como, dentro de nossos corpos, tudo funciona no escuro.
Argentina, Uru-
guai e Bolívia. Eles O escuro é misterioso, por vezes assustador, mas também acolhe o
nomeiam toda essa sono. Sonhos e pensamentos surgem no escuro como um cineminha
região como da mente.
Yvy Rupa.

Saiba mais na
página das
Escolas Vivas. Antes o mundo não existia. A escuridão cobria tudo. Enquanto
não havia nada, apareceu uma mulher por si mesma. Isso
aconteceu no meio da escuridão. Ela apareceu sustentando-
Os povos Tukano se sobre seu banco de quartzo branco. Enquanto estava
(Yepamahsã) e aparecendo, ela cobriu-se com seus enfeites e fez como que
Dessano (Umukori-
um quarto. Esse quarto chama-se Uhtãboho taribu, ‘o Quarto
-mahsã) vivem na
região fronteiriça
de Quartzo Branco’. Ela se chamava Yeba Buró, a ‘Avó do
entre o Brasil e Mundo’, ou também ‘Avó da Terra’.
a Colômbia, em
ambos os países.
Antes o mundo não existia, Mitologia Dessano-Kehíripõrã, Dantes, 2019
Nessa região, no
Noroeste Amazôni-
co, habitam a bacia
do Alto Rio Negro,
às margens dos rios
Uaupés, Apapóris e
seus afluentes.
Saiba mais na
página das
Escolas Vivas. 6
ATIVIDADE
Esta atividade pode ser feita de várias maneiras.
Consiste em sentir o escuro através de algumas experiências.
Para aprofundar os sentidos, a sala pode estar escurecida
e os participantes, vendados.

1 EXPERIÊNCIA - VER DE OLHOS FECHADOS


Em grupo, um orientador entrega elementos com diferentes aro-
mas, sabores e formas para várias pessoas vendadas; ou várias pes-
soas entregam esses elementos para uma única pessoa vendada.
Os objetos podem estar no ambiente, ser coletados ao redor ou
trazidos de casa.

O que você vê?


O que você sente?
O que você reconhece?
O que você lembra?
O que você escuta?
O que nasce em você de olhos fechados?

7
2 EXPERIÊNCIA - VER O SOM
Uma pessoa vendada no meio da sala.
Os outros participantes espalhados pelo ambiente.
Um de cada vez, os participantes emitem sons, falam coisas e cantam.

Você reconhece de quem são as vozes?


Você identifica de onde elas vêm?
Você consegue escolher uma pessoa e encontrá-la no escuro?

3 EXPERIÊNCIA - PERCEBER O ESPAÇO


Sob orientação de uma pessoa não vendada, os participantes ven-
dados exploram o espaço ao redor e se permitem dançar ao som de
uma música.

O que você sente?


O seu corpo se move de forma diferente no escuro?

8
Beija-flor

Para os Guarani, o beija-flor é o mensageiro.


José Werá

Beija-flores são aves do continente conhecido como América, habi-


tando áreas que vão do Alasca à Terra do Fogo. Seres encantados para
diversos povos originários deste continente, figuram em cantos e mitos.
Beija-flores, ou colibris, são da família Trochilidae e são as únicas aves
que conseguem voar para trás e permanecer imóveis no ar. Seu voo é
extremamente ágil, e são capazes de bater suas pequenas asas de 70 a 80
vezes por segundo.
Em outros lugares, como nos continentes europeu, asiático e afri-
cano, há pássaros da família Nectariniidae, um pouco maiores que bei-
Os Ashaninka habi- ja-flores e sem tanta agilidade de voo.
tam uma área que Para os Ashaninka, beija-flor é um espírito livre e curandeiro.
se estende por um
No mito de origem Guarani, o beija-flor originário, Maino, é o men-
vasto território, des-
de a região do Alto
sageiro do dia e alimenta Nhamandu, o ser criador de tudo.
Juruá e da margem
direita do rio Envira,
em terras brasileiras,
até as vertentes da
cordilheira andina
no Peru, ocupando
parte das bacias dos
rios Urubamba, Ene,
Tambo, Alto Perene,
Pachitea, Pichis, Alto
Ucayali, e as regiões
de Montaña e do
Gran Pajonal.
A maior parte de
sua população está
no Peru. Saiba mais
no Instituto Socio-
ambiental.

9
Beija-flor Ruivo
Beija-flor Marrom
Beija-flor Rajado

Beija-flor Vermelho

Beija-flor de Pescoço Vermelho


Beija-flor de Anna

Beija-flor Bico de Espada Beija-flor Tesoura Verde

Beija-flor de Gravata Vermelha

Beija-flor Azul
de Rabo Branco
Beija-flor de Tesoura

Beija-flor de Orelha Violeta


10
Nosso pai, o último, nosso pai, o primeiro,
fez com que seu próprio corpo surgisse
da noite originária.

A divina planta dos pés,


o pequeno traseiro redondo:
no coração da noite originária,
ele os desdobra, desdobrando-se.

Divino espelho do saber das coisas,


compreensão divina de toda coisa,
divinas palmas das mãos,
palmas divinas de ramagens floridas:
ele os desdobra, desdobrando a si mesmo, Nhamandu,
no coração da noite originária.

No cimo da cabeça divina,


as flores, as plumas que a coroam,
são gotas de orvalho.
Entre as flores, entre as plumas da coroa divina,
o pássaro originário, Maino, o colibri,
esvoaça, adeja.

A fala sagrada: mitos e cantos sagrados dos índios Guarani.


Pierre Clastres. Papirus, 1990.

11
O voo de beija-flor

Esta é a história de uma grande floresta em chamas. O


fogo voraz estala e chia, se alastrando rapidamente com o
vento e a seca. Os animais fogem das suas casas no susto.
Anta e Onça correm, Sucuri sai deslizando e Sapo se manda
aos pulos. Nas copas, Carcará revoa na fumaça densa. Se
amontoam no pasto à beira da floresta, olhos arregalados,
mas Beija-Flor dispara para o riacho. Ela pega uma única
gota de água no seu bico. Volta, deixa a água cair no fogo
feroz e volta ao córrego. Traz outra gota. Beija-Flor vai
indo e voltando no calor ardente. Os outros animais olham,
imobilizados. “Não sei o que fazer”, soluça Sagui, “essas cha-
mas queimam demais e eu estou com medo”. Faíscas voam
e o ar tem um cheiro acre. “Este fogo é tão grande”, uiva
Lobo-Guará, “e eu sou tão pequeno”. “Essa fumaça arde, não
consigo respirar”, coaxa Sapo. Todos os animais bem maiores
que Beija-Flor estão apavorados demais para tentar con-
ter o fogo. “Não consigo enxergar”, grita Bem-Te-Vi. “Minha
cauda vai queimar”, geme Serelepe. Beija-Flor continua sua
tarefa. Ela acelera, buscando mais água, e despeja gota por
gota na floresta em chamas. Até que Capivara pergunta:
“Beija-Flor, o que você está fazendo?” Beija-Flor olha para
os outros animais. E diz: “Eu faço o que posso”.

O voo de Beija-Flor, recontada por Gerrie Schrik.

12
ATIVIDADE
Esta atividade consiste em fazer tintas a partir de materiais que
você encontre por perto: frutas, flores, outros vegetais, terra, borra
de café, entre outros. Depois de produzir as tintas, faremos lindas
aquarelas de beija-flores em papéis bem absorventes.

OBSERVAÇÃO
Alguns tipos de plantas possuem muito pigmento, como beter-
raba, espinafre, repolho roxo, couve, açafrão, entre outras, assim
como a casca da cenoura e a borra do café. Ao coletar materiais
para fazer tintas, é importante respeitar as plantas. Retire apenas
materiais que já estejam caídos no chão e evite colher plantas vivas
em grandes quantidades para não causar danos ao ecossistema lo-
cal — plantas são a casa e o alimento de muitos seres na natureza.
Cuidado: algumas plantas são tóxicas, não colha folhas e frutos que
você não conhece.

MODO DE PREPARO
• Beterraba, cenoura, raízes e tubérculos em geral devem ser ralados
ou batidos no liquidificador com pouca água. Depois de coado em
tecido, utilize o líquido para pintar suas aquarelas;
• Folhas e flores devem ser maceradas. Acrescente um pouco de
água, coe o líquido num tecido e utilize o líquido para pintar
suas aquarelas;
• O pó do café de sobra pode ser utilizado desde que seja sem açúcar;
• A água em que o feijão fica de molho também carrega pigmento.

Para pintar, você precisará de papel, preferencialmente que aceite


tinta bem líquida, e pincel.

13
Sol

Astro luminoso que gira em seu eixo imaginário e faz tudo girar ao redor:
Terra, planetas, satélites, pequenas luas, asteroides, cometas, poeiras cósmicas.
O Sol gira emitindo as radiações luminosas que tornam visível o nosso planeta...
Esses raios transportam energia como ondas eletromagnéticas, luz visível
e invisível. Transportam também o calor que afeta os movimentos da Terra.
Essa energia torna a biosfera ativa e possível.
Flecha Selvagem 2, O Sol e a flor, Anna Dantes

Sol é uma estrela. Do nosso ponto de referência é uma estrela enor-


me, mas, em relação a outras estrelas no universo, é considerada uma
estrela anã. O Sol é o núcleo de um sistema onde 8 planetas e inúme-
ros corpos celestes orbitam. Vivemos em um desses planetas e, só por
aqui, o Sol se transforma em vida.
O Sol é a fonte de luz, calor, energia e vida do nosso planeta. A Ter-
ra é um planeta formado por vários mundos, todos relacionados, to-
dos com pontos de vista ou perspectivas próprias. Mundos de formigas,
cupins, tamanduás, minhocas, bactérias, peixinhos, 435 mil espécies de
plantas diferentes. Muitos mundos. Todos conectados. Até mesmo o
mundo dos humanos não é apenas um: cada povo, cada cultura vive e
cria um mundo a partir de entendimentos diferentes. E o Sol, além do
que a NASA descreve, do que aprendemos com cientistas, ou do que
cada um de nós vê quando olha para o céu, o Sol é Nhamandu, Oriya,
Heeri, Bari, Muhipu, Mãyõn e muitos outros, ou outras.

14
Era uma vez, há 5 bilhões de anos, uma grande nuvem de
hidrogênio (principalmente hidrogênio, mas não só) que sofreu
uma certa instabilidade. Por que ela sofreu uma instabilida-
de? Porque uma outra estrela estava morrendo por perto e
explodiu. E quando explodiu, ela jogou toda a matéria, que
antes estava contida nela, no espaço. Isso tudo chegou, como
uma espécie de onda quebrando na praia, nessa nuvem de hi-
drogênio. A nuvem sentiu aquele impacto, ficou meio desequi-
librada e começou a entrar em colapso. E aí foi ficando cada
vez mais densa, mais densa, mais densa, porque a gravidade não
descansa, está sempre trabalhando. Essa nuvem de hidrogênio
foi se comprimindo. Eventualmente, ela ficou tão densa que a
temperatura lá em seu coração chegou a 15 milhões de graus.
E quando isso aconteceu, a estrela nasceu. Por quê? Por-
que quando a estrela chega a essa temperatura, o hidrogênio
é tão comprimido que ele se transforma num outro elemen-
to, chamado hélio, que é o elemento número dois em termos
de complexidade. O hidrogênio tem um próton e o hélio tem
dois. Esse processo se chama fusão nuclear, e é a conversão
do hidrogênio em hélio, no coração da estrela, que gera toda
a energia, toda a luz. Todo o calor que a gente sente aqui na
Terra vem desse processo de fusão nuclear.

- -

+ +
-

hidrogênio hélio

15
O que é incrível nessa história é que, nesse processo de
vida e morte da estrela, toda a química do universo é produ-
zida. E isso é muito lindo. Todos os elementos químicos que
existem no universo, o cálcio que tem nos seus ossos, o ferro
que tem no seu sangue, o carbono nas suas células, o oxigênio
que respiramos, todos esses elementos químicos são forma-
dos durante a vida de uma estrela e quando ela começa a
morrer. Porque a estrela é assim, né? É meio feito a gente:
tem o nascimento, tem uma vida e, eventualmente, aquele
combustível, que era o hidrogênio que vira hélio, vai acaban-
do e a estrela vai começando a morrer. E, quando morre, ela
morre numa grande explosão.
Nossa dança é totalmente ligada ao Sol. Então, quando
falamos que o Sol é o grande propulsor da vida, é isso mesmo.
E tem mais. Não é só a luz e o calor do Sol que são a ponte
entre aquela estrela e a gente. Por causa da fusão nucle-
ar de que falei no início e que faz com que o Sol brilhe, são
geradas, nesse processo, partículas chamadas neutrinos. Ela
também tem o apelido de partícula fantasma, porque conse-
gue atravessar tudo. Os neutrinos do Sol estão atravessando
a gente agora. Mas não é que passa só um, não. São trilhões e
trilhões. O trilhão é 1 com doze zeros. Trilhões de neutrinos
por segundo passando por você. Eles são uma ponte entre o
coração do Sol e o seu coração.

O Casamento da Vida com o Sol, Marcelo Gleiser, Caderno Selvagem

16
NHAMANDU - PRIMEIRO SOL GUARANI

Canto Nhamandu
Nhamandu Tenondé, ho yvá rapy re [O primeiro Sol, do reflexo]
Mba’e kuaa gui, onhembojerá… [Da sua sabedoria divina, se originou...]
Pytü ymã mbyte gui [Do meio do escuro originário]
Nhanderu, Nhamandu Tenondé [Nosso pai, o primeiro Sol]
Nhamandu Tenondé [O primeiro Sol]
Tenondé, Tenondé…. [O primeiro, o primeiro...]

Nhamandu - Primeiro Sol, Carlos Papá, caderno e vídeo Selvagem

ORIYA - SOL ASHANINKA

Oriya, como nós chamamos o Sol, esse ser também foi trans-
formado. Deus, o Pawa, entregou para ele e disse: “olha, você vai
continuar cuidando de todo o clima, da quentura, do calor”. É esse
calor que faz nascer e morrer, essa temperatura que controla a
nossa vida. Então Oriya fazia essa parte.

Oriya - Sol Ashaninka, Moysés Piyãko, caderno e vídeo Selvagem

Os Medzeniako- HEERI - SOL BANIWA


nai (Baniwa) são

habitantes do sistema
No tempo antigo, quando Ñapirikoli estava em seu mundo, o
cultural e multilíngue
Sol não mudava de lugar, ele ficava parado em um único lugar, pois
do Alto Rio Negro,
área que abrange o era seu próprio corpo. Ele se sentia parte de Ñapirikoli. Assim ficou
noroeste da Bacia o tempo para nós da nova geração e para toda a humanidade do
Amazônica, em uma mundo. Houve mudança para que pudesse haver noite, e o Sol pu-
região transfrontei-
desse girar. Ñapirikoli foi buscar a noite com seu sogro, assim é a
riça com Venezuela
história para nós Baniwa sobre o Sol.
e Colômbia. Saiba
mais na página das
Escolas Vivas. Heeri - Sol Baniwa, Francisco Baniwa, caderno e vídeo Selvagem

17
Huni Kuï é um povo

da floresta tropical
BARI - SOL HUNI KUï
amazônica que se
distribui pelo Peru e
pelo Brasil, no Acre No outro dia, o Sol surge e continua sempre surgindo. Ele deixou
e no sul do Amazo- plantas medicinais para nós com o significado do nome dele: o Sol se
nas. Constitui a mais chama Bari. São plantas para tratar o espírito mal, para defumação,
numerosa população
para banho, para colírio, para cheirar e para curar. Ele deixou quatro
indígena do Acre.
Falam Hãtxa Kuï, a
espécies: Bari sitã ashü, ou raio do Sol, Bari mukaki, amargoso do Sol,
“língua verdadeira”. Bari pakeski, pedaço de cerâmica do Sol, Bari rau ki, medicina do Sol.
Saiba mais na página
das Escolas Vivas. Bari - Sol Huni Kuï, Dua Busë e Netë, caderno e vídeo Selvagem

MUHIPU - SOL TUKANO

Yepa-oãku fez surgir o Sol para iluminar o mundo terrestre. O


Sol (Muhipu) foi colocado no status de irmão maior dos humanos. Ele
ficou com a responsabilidade de fornecer luz aos futuros humanos
e ser iluminador do mundo terrestre. Sendo luz do mundo, o Sol
ficou sendo a própria vida dos humanos, a própria existência huma-
na. Assim, Yepa-oãku disse: o Sol será um ser amado, ser de coração
grande, será ser de vida. Disse ainda: humanos e Sol viverão juntos
como seres de complementariedade nesse novo mundo terrestre.

Muhipu • Abé - Sol Tukano e Dessano, Carla Wisu e Kumü Doe,


caderno e vídeo Selvagem
Os Maxakali são
habitantes ancestrais
das florestas que
cobriam todo o leito
MÃYÕN - SOL MAXAKALI
dos rios Pardo, Jequi-
tinhonha e Mucuri,
na região compre- O Sol e a Lua nos ensinam a fazer muitas coisas, linha, panela
endida, hoje, como de barro, o barro da nossa Mãe Terra e a formiga também. Também
nordeste de Minas
conversamos com a Lua, mas o Sol é quem fez o barro e, com o
Gerais e extremo
barro, fazemos panelas. Sem o barro e o Sol não teria como fazer.
sul da Bahia.
Saiba mais na página
das Escolas Vivas. Mãyõn - Sol Maxakali, Isael Maxakali e Sueli Maxakali, caderno e vídeo Selvagem

18
ATIVIDADE
Esta atividade pode ser feita de várias maneiras.
Consiste em se localizar a partir do Sol.

Como se guiar pelo Sol?


De onde você está, localize a direção do nascer do Sol.
Ali está o leste.
Vire de frente para o leste.
Atrás de você, onde o Sol se põe, está o oeste.
À sua direita está o sul e à esquerda, o norte.

Assim são os pontos cardeais.

NO NE

Bússola é um instru-
mento de orienta- O L
ção espacial que
usa o campo mag-
nético da Terra
para indicar os pon- SO SE
tos cardeais.
S

1 EXPERIÊNCIA - ORIENTE-SE PELO SOL


Em grupo, sem a utilização de uma bússola, um orientador sugere
caminhos a partir dos pontos cardeais. Por exemplo: vire a leste, ago-
ra ande três passos para o norte, dê um pulo para o sul…

2 EXPERIÊNCIA - MAPA
Pense em alguns lugares que você costuma frequentar e, a partir
de onde você está, tente localizá-los. Desenhe um mapa guiado
pelo Sol.

19
Cianobactérias

As cianobactérias encontraram uma maneira de usar


a luz do Sol para quebrar as ligações de hidrogênio da água,
espalharam-se como um fogo verde vivo, liberando oxigênio para a atmosfera.
A mais de dois bilhões e meio de anos atrás, a Terra começou a ficar azul.
O azul vem da dispersão da luz pelos átomos de oxigênio.
Flecha Selvagem 5, Uma flecha invisível, Anna Dantes

Microscópios ópti- Os seres invisíveis só podem ser vistos com o uso de instrumentos
cos são instrumen- específicos, como microscópios, mas estão por toda parte. Há quem
tos compostos de
os enxergue de outras formas, em sonhos ou visões. As cianobactérias,
lentes que ampliam
a imagem tornando
também conhecidas como algas azuis, são micro-organismos capazes
visíveis elementos de fazer fotossíntese. Elas habitam as águas desde tempos primordiais e
de difícil visualiza- continuam aqui. Há aproximadamente 3 bilhões de anos, elas foram as
ção ou, até, invisí- responsáveis pela acumulação de oxigênio na nossa atmosfera, uma mu-
veis a olho nu.
dança que tornou possível a vida em nosso planeta como a conhecemos.
As diferentes formas de vida, comumente apresentadas numa linha
do tempo evolutiva, na realidade não se sucedem por substituição ou
aprimoramento; ao contrário disso, elas coexistem, como numa teia.
Os processos mais importantes para a vida no planeta não são feitos
por seres humanos. Nós, as cianobactérias, as plantas e uma multipli-
cidade de seres visíveis e invisíveis compartilhamos esse planeta-casa.
Até mesmo os dinossauros, já extintos, têm parentesco com répteis e
aves do nosso tempo.

20
Como as cianobactérias são provedoras primárias de comida
na Terra, sua importância não pode ser subestimada. Apesar
de seu tamanho diminuto, elas transformaram visivelmente o
planeta. Antes das viagens espaciais, especuladores, cientistas
e autores de ficção científica, frequentemente, imaginavam
que a Terra, vista do espaço, seria verde. Como bem sabemos,
eles estavam errados: a Terra é azul. Ao produzir oxigênio (O2)
como gás residual, as cianobactérias coloriram a Terra de azul,
pois os átomos de oxigênio dispersam a luz azul vista do espaço.

Livro de seres invisíveis, Dorion Sagan, Dantes, 2021.

Ilustração de Aza Kali, Livro de seres invisíveis. Dorion Sagan, Dantes, 2021.

21
ATIVIDADE
Aqui, duas atividades dialogam com diferentes características das
cianobactérias. Uma mostra como a luz reage ao meio que atravessa.
A outra explora a passagem do tempo, a interação entre elementos
em colaboração e o todo que se forma.

1 ATIVIDADE - A LUZ E AS CORES


Essa atividade vai precisar de uma folha de papel, um copo de vidro
quase cheio de água e luz do Sol. Segure o copo sobre o papel branco
deixando que a luz o atravesse. Você deve ver a sombra do copo so-
bre o papel. Em seguida, varie a inclinação do copo até que ele pro-
jete sobre o papel um arco-íris. Isso acontece pois a luz é composta
por diferentes cores. Quando a luz brilha através da água, se divide
nas cores do arco-íris: vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, anil
e violeta. Por isso, quando a luz do Sol brilha através dos pingos de
chuva, forma-se um arco-íris.

2 ATIVIDADE - COLABORAÇÃO E COEXISTÊNCIA


Numa roda, um orientador, como um maestro, sugere um ritmo.
Cada criança faz um som dentro desse ritmo. Aos poucos, o maestro
determina a entrada de cada criança na composição até que todas
estejam envolvidas na criação sonora. Em intervalos, o regente de-
termina quem sai e quem fica, alterando o volume da composição.

Como foi enquanto todos emitiam sons juntos?


E quando poucas pessoas produziam o som?

22
Vida no mar

Os oceanos são as regiões de máxima transformação da energia solar...


A superfície do oceano é coberta de uma contínua vida verde
­— o plâncton ­— onde se forma o oxigênio livre.
Biosfera, Vladimir Vernadsky, Dantes, 2019

70% do planeta é água; 70% do corpo humano, também. No corpo


humano, a água está dentro das células, ao redor delas e no sangue. A
água dentro dos nossos corpos tem um teor de sais minerais que se as-
semelha à água do mar. Nossas lágrimas e nosso suor são como a água
do mar. A vida precisa da água para existir. A vida começou na água há
mais de 3 bilhões de anos. Mais da metade do oxigênio da atmosfera da
Terra vem do mar.
No mar vive o plâncton, composto de micro-organismos que fazem
a fotossíntese utilizando a luz solar e o gás carbônico para se alimentar.
O oxigênio, tão importante para a atmosfera, é o resíduo desse banque-
te de luz. As cianobactérias compõem o plâncton e coexistem com uma
abundante vida aquática: polvos, serpentes marinhas, anêmonas, cavalos-
-marinhos, arraias, algas, corais, tartarugas, tubarões, moreias, golfinhos,
plantas marinhas, baleias… Para os Guarani, o mar é o portal para a Terra
sem males. Para os Tukano e Dessano, é no mar, mais especificamente na
Baía de Guanabara, onde desembarca a canoa cobra, a canoa da transfor-
mação, trazendo a futura humanidade, ainda na condição de gente-peixe.

Canoa cobra de Torãmü Këhíri, Antes o mundo não existia,


Umusi Pãrõkumu e Torãmü Këhíri, Dantes, 2019

23
Depois ele [Umukosurãpanami - bisneto do mundo]
subiu à superfície da terra para formar a humanidade.
Levantou-se num grande lago chamado Diá ahpikõdihtaru,
isto é, “Lago de Leite”, que deve ser o Oceano. Enquanto ele
vinha subindo, o Terceiro Trovão desceu nesse grande lago na
forma de uma jiboia gigantesca. A cabeça da cobra se parecia
com a proa de uma canoa. Para eles, parecia uma grande
canoa que se chama Pamürïgahsiru, isto é, “Canoa da Futura
Humanidade” ou “Canoa de Transformação”.

Antes o mundo não existia, Umusi Pãrõkumu e Torãmü Këhíri, Dantes, 2019.
E Flecha Selvagem, a serpente e a canoa

Moreia

Moreias são conhecidas como Caramuru pelo povo Tupinambá. São


peixes com o corpo alongado e cilíndrico, parecendo uma cobra. Podem
chegar a 4 metros de comprimento. Gostam de mares tropicais e subtro-
picais. Existem mais de 200 espécies de moreias.

Serpentes marinhas

São répteis aquáticos da subfamília Hydrophiinae. Como todos os ha-


bitantes do mar, elas podem viajar pelo mundo das águas, mas são mais
encontradas em litorais do Oceano Índico ao Pacífico. As serpentes ma-
rinhas são míticas. É a canoa cobra para os Tukano e Dessano. Leviatã,
um monstro marinho bíblico, Tiamet, deusa na mitologia babilônica,
Hydra, na mitologia grega. Está nas mitologias de todo o mundo, dos
nórdicos aos chineses, de Nárnia à Odisseia, dos Baniwa aos Guarani.

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ATIVIDADE
Estas são atividades para brincar com a palavra e o som
do mar.

ATIVIDADE - TERRA-MAR
Conhecido em diversas cidades do Brasil, este jogo é uma variação
de outro originado em Moçambique e é muito fácil de brincar! Basta
riscar uma grande linha no chão delimitando dois espaços. De um
lado, escreva a palavra “terra”, do outro, a palavra “mar”. Escolha,
entre os participantes, quem será responsável por ditar os comandos
da brincadeira. Os demais dispõem-se em fila ao longo da linha tra-
TERRA

çada, sem pisar nela. Não há número limite de participantes. Todos


MAR

começam a jogar do mesmo lado e obedecem aos comandos “terra”


e “mar”, a cada vez pulando para o respectivo lado. Os comandos
devem ser cada vez mais rápidos. Quem pular para o lado errado, ou
ameaçar pular quando não deve, é eliminado. A brincadeira termina
quando restar apenas uma criança.

ATIVIDADE - CAIXA DO MAR


Vamos fazer um instrumento musical de material reciclável para
brincar com o som das ondas do mar. O tambor oceânico é um ins-
trumento de percussão que simula os sons do oceano.
Precisaremos dos seguintes materiais:
• 1 caixa de pizza redonda ou qualquer caixa de papelão achatada;
• Milho de pipoca ou miçanga;
• Fita adesiva;
• Tinta para deixar bem bonito.
Coloque os grãos na caixa, feche com a fita e decore. Depois basta
mexer o tambor em movimentos circulares.

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Micélio

O que acontece debaixo do chão da floresta é tão interessante —


e tão importante — quanto o que acontece acima dele.
Uma rede vibrante de fios quase microscópicos está reciclando ar,
solo e água em um ciclo contínuo de equilíbrio e reabastecimento.
Fantastic Fungi: How Mushrooms Can Heal, Shift Consciousness, and
Save the Planet, Suzanne Simard, Editora Earth Aware, 2019 (livre tradução)

Por volta de 600 milhões de anos atrás, a terra era seca, inóspita
e muito quente. A vida, portanto, era mais possível na água, onde os
nutrientes flutuam e se distribuem livremente. Por outro lado, na ter-
ra, a luz solar, fonte de energia principal para o planeta, é abundante,
incidindo diretamente. Para a vida aquática vir para a terra, houve co-
laboração. E essa colaboração também pode ser chamada de simbiose.
Algas do mar e fungos estabeleceram relações simbióticas propiciando
a vida na Terra.
Da ponta inferior dos fungos, crescem as hifas. Elas são como fios
que conseguem sentir o ambiente ao seu redor e se comunicar com
outras hifas, formando redes. Essas redes, chamadas de micélio, se co-
municam silenciosamente por debaixo da terra, conectando-se com as
raízes das árvores, sustentando-as e auxiliando-as na busca de água, ab-
sorvendo e transportando nutrientes e compartilhando informações.
O micélio é a base invisível da vida da floresta.

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Os fungos são reservatórios de carbono na natureza e
têm um papel vital na prevenção das mudanças climáticas.
Graças às suas relações mútuas com as árvores, eles recebem
carbono de suas raízes, que os ajuda a crescer. O carbono é
armazenado pelo micélio no subterrâneo e não na atmosfera.
Por meio da decomposição, eles reciclam toda matéria
orgânica no planeta! Tem fungos que conseguem até de-
compor plásticos e petroquímicos.
Grande parte da vida na Terra depende da interação das
Micorriza é uma plantas com fungos micorrízicos que, usando suas redes de
associação simbióti- filamentos (micélio) para alcançar poros menores, expandem
ca entre raízes de
a quantidade de solo que as árvores podem explorar com suas
plantas e micélio,
raízes, possibilitando o acesso à água e a nutrientes que, de
que possibilita
troca de nutrientes outra maneira, estariam indisponíveis para elas.
entre espécies.
Fungi Foundation website, livre tradução

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ATIVIDADE
Essa atividade propõe uma experiência de equilíbrio coopera-
tivo. O objetivo é levantar uma placa do chão e movê-la sem
que caia. Isso só funciona se todos trabalharem juntos.

ATIVIDADE - TODO MUNDO JUNTO


• No mínimo 8 crianças;
• 1 fita para cada 2 crianças (cada fita deve ter aproximadamente
1cm, com 2 metros de comprimento);
• Uma placa retangular de aproximadamente 30cm x 20cm x 2cm
(madeira, MDF, cerâmica, entre outros);
As crianças se organizam em um círculo. As fitas são dispostas no
chão para que cada duas crianças segurem as pontas de lados opos-
tos da roda. Antes de segurar as fitas, elas são colocadas estendidas
no chão, formando o desenho de um asterisco. No centro é colocada
a placa. Agora sim, cada criança vai apanhar a sua ponta e todas jun-
tas tentarão levantar a placa.

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Vida na terra

Onde quer que haja fluxos de energia, como a luz do Sol


que vem de uma estrela, formam-se sistemas e estruturas
que sobrevivem durante um certo tempo e depois se extinguem.
A vida é um destes sistemas, mas diferentemente do resto, ela é quase imortal.
A razão disso é que ela pode transmitir, de uma geração para outra,
o conhecimento do que precisa ser feito para se manter.
Vida, Senhora da Terra, James E. Lovelock, caderno Selvagem

Por que o planeta se chama Terra se é 70% água? Acontece que nós,
os seres humanos, usamos esse tipo de linguagem que fala, desenha,
escreve e dá nome às coisas, mesmo que em línguas diferentes. Nós,
humanos vivemos na terra, sobre o solo, e demos ao nosso planeta um
nome relacionado ao lugar onde vivemos: a Terra. Não habitamos no
céu, nem na água. A Terra é como uma rocha redonda orbitando ao
redor do Sol. A massa rochosa do nosso planeta é coberta por vida, e
essa vida influencia diretamente processos físicos e químicos, regulando
as condições para que sua existência continue possível. A Terra não é
apenas uma esfera, é uma biosfera. Na biosfera tudo está relacionado,
funcionando como um superorganismo. Vegetais crescem associados à
rede miceliar, animais circulam e polinizam. Resíduos de uns são apro-
veitados por outros. Apenas humanos produzem coisas que deixam re-
síduos difíceis de serem absorvidos. No entanto, tudo é natureza. Até o
que produzimos artificialmente com ela.
Na terra são as plantas que fazem a fotossíntese, a conversão da ener-
gia solar em vida. Apesar de a maior parte do oxigênio vir da fotossínte-
se feita por algas e bactérias na água, a fotossíntese das plantas alimenta
a trama da vida.

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F o t oss í n t e s e

6 CO 2 + 6 H 2 O + luz --> C 6 H 12 O 6 + 6 O 2
[dióxido de carbono] [água] [Sol] [glicose] [oxigênio]

Mas o mágico é o Sol por trás disso tudo. Para criar essa
vida toda, esse mágico precisa de uma espécie de tradutor-
-intérprete. Eu acho que o tradutor-intérprete do Sol são as
plantas, que fazem isso através da fotossíntese. E a fotos-
síntese é realmente uma mágica.
Esses seres incríveis conseguem pegar moléculas de dióxi-
do de carbono e de água, que, em interação com a luz, produ-
zem o oxigênio que respiramos, água e moléculas de carbono,
especialmente os açúcares. E essa transformação se dá por
todo um processo bioquímico, que a gente não precisa deta-
lhar aqui. Destaco apenas essas entidades, os cloroplastos,
que são muito importantes no processo.
Tanto se fala em inovação, que parece que tudo é inova-
ção hoje em dia. Normalmente associamos a palavra “inova-
ção” às máquinas, ao tecnológico, ao técnico. A fotossíntese,
para mim, é a grande inovação dos últimos 4,5 bilhões de anos
de existência do nosso planeta, porque, sem ela, não existiria
a diversidade de vida que hoje existe.

A memória ancestral do metabolismo das plantas, Fabio Scarano,


Caderno Selvagem

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Samaúma

A samaúma, ou sumaúma (Ceiba pentandra), é uma das maiores árvo-


res do planeta. Sua altura geralmente varia em torno de 50 a 70 metros
(um prédio de 10 andares tem 30 metros), chegando ao extremo de 90 me-
tros. Suas raízes se espalham pela floresta e conseguem alcançar água nas
profundezas do solo para a samaúma alimentar a si mesma e compartilhar
com diversas espécies de árvores, conectadas por extensas redes de micé-
lio, que promovem a comunicação subterrânea. Suas flores são poliniza-
das por insetos e também por morcegos, que, ao beberem seu néctar, car-
regam o pólen no pelo de flor em flor. Os Huni Kuï, também conhecidos
como Kaxinawá, povo morcego, sempre constroem suas aldeias próximas
a estas grandes árvores. A Samaúma é uma árvore sagrada para diversos
povos da Floresta Amazônica. Dizem que ela é a biblioteca da floresta.

M o r c e gos

Os morcegos estão presentes em todos os continentes, exceto nos po-


los, e representam um quinto de todos os mamíferos do mundo. São mais
de 1.400 espécies diferentes de morcegos, sendo que no Brasil encontram-
-se mais de 167 delas. Muitas têm grande importância para a manutenção
da vida. Os morcegos são polinizadores e semeadores de várias espécies
de plantas, e os únicos mamíferos realmente voadores. Suas asas são for-
madas por tecidos que se formam entre seus dedos compridos, com uma
envergadura pode variar de 5 centímetros a 2 metros. A maioria das es-
pécies usam a ecolocalização para se deslocar pelo espaço, emitindo sons
— algumas espécies pelo nariz, outras pela boca — e captando com seus
aparelhos auditivos ultrassensíveis. As espécies que navegam visualmente
têm olhos grandes, orelhas pequenas e focinho que lembra o de um cão,
por isso são conhecidas como raposas voadoras. Em Maxakali, morcego
é xünïm e seu canto é muito importante para a cura e para chamar a
chuva quando o Sol está muito quente.

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É por isso que tem história muito forte, tem o canto do
Sol, que o morcego canta para ele quando o Sol brilha muito
quente e não está chovendo. Então o morcego canta, e aí
chove. Quando cantamos o canto do Sol, então chove. Vai mo-
lhar as pessoas, as plantas, as matas e a água vai ficar limpa.

Mãyõn - Sol Maxakali, Isael Maxakali e Sueli Maxakali, caderno e vídeo Selvagem

Rhinolophidae rhinolophus Nyctalus noctula

Cormura brevirostris Hipposideros armiger

Furipterus horrens Pteronotus personatus

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Corujas

As corujas, em sua maioria, são caçadoras de hábitos noturnos. Di-


ferente da maioria das aves, elas têm os olhos voltados para a frente,
e, para compensar essa limitação no campo de visão, sua cabeça pode
virar em até 270o. Elas têm uma capacidade extraordinária de voar silen-
ciosamente, sem produzir nenhum ruído, e sua audição muito aguçada
permite distinguir os menores movimentos de suas presas. Em partes
da Amazônia, as penas da espécie Caburé são usadas como amuletos de
sorte. Para o povo Guarani, a coruja tem grande importância cultural e
espiritual. É mensageira da noite e representa a energia noturna. É ela
Nhanderu tenondé,
quem traz mensagens espirituais para o nosso planeta com seu voo si-
para os Guarani,
é o primeiro lencioso. No mito de criação do mundo, é nela que Nhanderu primeiro
Pai celestial. se transforma, para vir ao mundo e gerar a humanidade.

Veja aqui o silencioso voo da coruja

O Beija-flor dava voltas dando sopros, depois de desabro-


char. Aquele Beija-flor trazia em movimento o amanhecer
do dia e foi para isso que foi ordenado. E foi por isso que foi
desabrochado. A partir disso, no meio originário do escuro, fez
desabrochar a Coruja. Esse é um ser responsável pela noite,
responsável pelas melodias da noite.

Nhamandu - Primeiro Sol, Carlos Papá, caderno e vídeo Selvagem

33
ATIVIDADE
Essa é uma atividade de observação e compartilhamento.

ATIVIDADE - QUAIS PLANTAS FAZEM PARTE DA SUA VIDA?

Há quem viva rodeado de plantas e não saiba o nome nem a história


dos seres com quem compartilha a vida. As plantas são seres que
atravessam memórias e saberes cósmicos; elas são tão generosas que
podem habitar em florestas e dentro de seres. Os humanos estabele-
cem muitas relações com as plantas; de grande mestras a alimento,
todas as plantas têm uma história e transmitem um ensinamento.

Observe as plantas que estão presentes no seu dia a dia, faça um


lindo desenho de algumas delas. Convide as pessoas que moram
com você para também fazerem desenhos e conversarem sobre e
com as plantinhas de casa.

Você saberia contar a história dessa planta?


Como sua família a chama?

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MÃOS

No pensamento Guarani, os dedos são as flores do corpo.


Por isso, os antigos dizem: Txepo pyte rankã poty,
no meio do carpo das mãos, há flores que geram meu corpo.
Carlos Papá

A mão humana, assim como a linguagem verbal, é um divisor en-


tre a humanidade e os outros seres da natureza. Somos uma espécie de
animal muito peculiar. Criamos coisas e contamos histórias. Mesmo
assim, como somos natureza, tudo que produzimos ainda é natureza,
embora algumas produções sejam modificadas tão radicalmente que
alteram profundamente os ciclos da Terra. As máquinas derivam de
minérios; os plásticos, esmaltes de unha, a gasolina vêm do petróleo
(em latim óleo da pedra), um combustível fóssil. Tudo vem da Terra.
O que fazemos com nossas mãos? Quanta beleza! Quanta respon-
sabilidade!

35
ATIVIDADE
Essa atividade propõe uma reconexão com a terra e com as
avós do mundo. Vamos precisar de argila. Se você mora onde há
argila no solo, convido você a colher uma porção para criarmos
um mundo pingo.

ATIVIDADE - UM MUNDO DE ARGILA

O barro é sagrado para muitos povos. Di’i Mahso, a avó da argila,


para os povos Tukano, existe desde a fundação do mundo compar-
tilhando do seu próprio corpo argila para as mulheres modelarem
cerâmicas. Na mitologia afro-brasileira, Nanã retirou uma porção de
barro do fundo do lago em que morava para que Oxalá conseguisse
formar o ser humano.

A atividade com argila é uma forma rica e expressiva de incentivo à


criatividade, promovendo o desenvolvimento de habilidades manu-
ais e sensoriais.

Com a argila nas mãos, deixe seu imaginário fluir. Que tal seguir a
sequência de surgimentos do vídeo Pingo para criar um mundo todo
de argila? Modele os seres e tente recontar essa histórias para seus
amigos e familiares.

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O SOL ATRAVESSA TUDO

O Sol emite uma vasta quantidade de energia que, em forma de luz,


alcança o nosso planeta. Essa energia flui entre diferentes ecossistemas e
é essencial para a manutenção e o florescimento da vida.

Plantas, algas e algumas bactérias capturam uma porção dessa luz


pelo processo de fotossíntese. Neste processo, luz do Sol, dióxido de
carbono e água são convertidos em glicose e oxigênio. A glicose, ali-
mento produzido na fotossíntese, armazena energia em forma de liga-
ções químicas.

Para medir as unidades de energia contida nos alimentos, o termo


usado é caloria. Em termos biológicos, a unidade de caloria representa
a quantidade de energia necessária para aumentar a temperatura de um
grama de água em um grau Celsius.

Quando outros seres comem plantas, ou comem outros organismos


que comeram plantas, eles quebram a glicose e outras moléculas orgâni-
cas para liberar a energia química armazenada. Essa energia é utilizada
para crescimento, movimento, reprodução e outros processos da vida.
A energia originada do Sol é assim transferida entre uma multiplicidade
de organismos por meio da cadeia alimentar.

Quando os humanos comem, eles estão consumindo energia solar


que foi armazenada por outros seres, calorias que foram anteriormente
capturadas por plantas, algas ou bactérias, da luz erradiada pelo Sol. Por
exemplo, quando você come uma banana, você está consumindo a ener-
gia que a bananeira armazenou pelo processo de fotossíntese.

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O SOL ATRAVESSA TUDO
Português

MUHÏPU NIPETISEU AHSISTE SÃNUKAMI


Tukano

太陽はすべてに行き渡る
Japonês

KUARAY REXAKÃ MA OGUEROVY PA


Guarani

BARI KAPUKEAI
Hãtxa Kuï

MÃYÕN MÕTOPAHA
Maxakali

EL SOL LO PENETRA TODO


Espanhol

ABE NIPETIRI YËRË BORÉ SÏHÃ NÜKÃMI


Dessano

KAMOI YAALHAKA PHIOME


Nheengatu

SUN TRAVERSES ALL


Inglês

LE SOLEIL TRAVERSE TOUT


Francês

DIE SONNE DURCHQUERT ALLES


Alemão

IL SOLE ATTRAVERSA TUTTO


Italiano

太陽穿過了一切
Chinês
A n i m a ç ã o P i n go

Roteiro e direção: Anna Dantes


Desenhos: Aza Kali
Animação: Natalia Faria (Moreia e serpente por Matheus Marins)
Animação de abertura: Matheus Marins
Trilha sonora: Rodrigo Maré
Estúdio de gravação: Reurbana
Produção: Madeleine Deschamps
Assistente de produção: Daniel Grimoni
Coordenação de tradução: Alice Alberti Faria
Realização: Selvagem

C a d e r n o P i n go

Edição e textos: Anna Dantes e Tania Grillo


Desenhos: Aza Kali e Tania Grillo
Propostas de atividades: Veronica Pinheiro
Coordenação de tradução e revisão: Alice Alberti Faria

Tradutores

Tukano: Carla Wisu e Kumü Doe


Guarani: Cristine Takuá e Carlos Papá
Hãtxa Kuï: Isaka Huni Kuï
Maxakali: Isael Maxakali
Nheengatu: Francy Baniwa e Bianca Baniwa
Dessano: Jaime Diakara e Carla Wisu
Japonês: Antoine de Mena e Tomokazu Baba
Espanhol: Daniela Ruiz
Inglês: Marina Matheus
Francês: Madeleine Deschamps
Alemão e italiano: Alice Alberti Faria
Chinês: Ana Yang e Andrea Martins
A g r a d e c i m e n t os

Carlos Papá
Cristine Takuá
Digo Fiães
Gerrie Schrik
Reinaldo Teixeira

Às Escolas Vivas
A todos os apoiadores

O trabalho de produção editorial dos Cadernos Selvagem é realiza-


do coletivamente com a comunidade Selvagem. A direção editorial é de
Anna Dantes, a coordenação é de Alice Faria. A diagramação é de Tania
Grillo. Mais informações em selvagemciclo.org.br

Todas as atividades e materiais do Selvagem são compartilhados


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Biosfera, 2025

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