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Ed, Movi Populares e Transformação

O documento aborda a história dos movimentos sociais no Brasil, organizando-os em fases históricas e destacando a importância da educação na construção da cidadania. Ele explora movimentos sociais e associações civis, movimentos identitários e culturais, além de lutas sociais nos séculos XIX e XX. A reflexão sobre a consciência de classe e a participação sociopolítica é enfatizada como fundamental para a compreensão das lutas por direitos e justiça social.

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O documento aborda a história dos movimentos sociais no Brasil, organizando-os em fases históricas e destacando a importância da educação na construção da cidadania. Ele explora movimentos sociais e associações civis, movimentos identitários e culturais, além de lutas sociais nos séculos XIX e XX. A reflexão sobre a consciência de classe e a participação sociopolítica é enfatizada como fundamental para a compreensão das lutas por direitos e justiça social.

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Educação,

Movimentos Populares
e Transformação
Material Teórico
História dos Movimentos Sociais

Responsável pelo Conteúdo:


Profª. Ms. Wanderli Cunha de Lima

Revisão Técnica:
Prof.ª Me. Denise Jarcovis Pianheri

Revisão Textual:
Profª. Esp. Vera Lidia de Sá Cicaroni
História dos Movimentos Sociais

• Movimentos Sociais e Associações Civis

• Movimentos Identitários e Culturais

• Movimentos e Lutas Sociais no Brasil nos séculos XIX

• Movimentos, Lutas Sociais no Brasil no Século XX

Nesta unidade, vamos, a partir de um breve mapeamento,


conhecer as lutas e movimentos sociais que fazem parte da
construção da cidadania de classes sociais no Brasil e observar
a participação da educação nesse processo.

Esta unidade tem como tema principal os Movimentos Sociais no Brasil. O texto foi organizado
em fases históricas. Essa cronologia – baseada nos estudos de Gohn (2012) – contribui
para a percepção das ações coletivas, do ponto de vista não só da ordem de sucessão dos
acontecimentos, mas também das razões que levaram um acontecimento a outro.
A organização desta unidade apresenta o retorno a alguns assuntos já discutidos na unidade
anterior. Iniciamos situando as questões relativas à historicidade das divisões em classes
sociais. Também abordamos os movimentos identitários e culturais e, em seguida, pontuamos
os movimentos e as lutas sociais (como já citado) de acordo com a cronologia.
Fique atento a essa correlação de acontecimentos e observe a participação sociopolítica da
sociedade civil.
Para realizarmos aprofundamento da discussão acerca do tema, faremos uma atividade
reflexiva, com a escrita de um texto argumentativo. Participe dessa atividade, colocando em
prática o que foi estudado na unidade.
Como você já sabe, é muito importante aproveitar as indicações feitas no material teórico
e no material complementar. Elas favorecem a compreensão e completam o conteúdo
estudado, auxiliando-o no momento da realização das atividades tanto de sistematização do
conhecimento como de aprofundamento do tema.

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Unidade: História dos Movimentos Sociais

Contextualização
“Como pode o educador assumir o papel dirigente na sociedade se na sua formação o todo
social resume-se a uns poucos conhecimentos de métodos e técnicas pedagógicas ou a uma
história da educação que se perdeu no passado e nunca chega aos nossos dias? Como pode
uma nação esperar que as novas gerações sejam educadas para o progresso, o desenvolvimento
econômico e social, para a construção do bem-estar para todos, sem uma sólida formação
política?” (GADOTTI, 2010, p. 89).

Explore
http://www.youtube.com/watch?v=406ujmrth_w

Assista ao vídeo: “A História dos Movimentos Sociais”. Observe as várias manifestações


populares em diferentes tempos e lugares, autoquestionando-se sobre:
• Por que é importante conhecer essas lutas e movimentos?
• Como esse conhecimento irá contribuir para a minha formação enquanto pessoa?
• E, na minha formação e atuação profissional, o que implicam esses conhecimentos?

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1. Movimentos Sociais e Associações Civis
A conquista da cidadania, em nosso país, não se deu de modo linear e tranquilo, mas, ao
contrário, dependeu de várias lutas sociais.
Entretanto, apesar de ter sido uma grande conquista, ainda não se pode dizer que vivemos
em uma sociedade justa e igualitária. A esse respeito Cortella (2011) afirma:
“[...] a vida social é, também, uma vida política, isto é, configura-se como espaço de conquista
e manutenção de poder sobre os bens e pessoas, não havendo, ainda, sociedades complexas de
composição igualitárias.” (CORTELLA, 2011, p. 41).
É fato que as divisões de classe datam de muito tempo. Já no período clássico grego (V e IV
a.C.), pode-se observar a revelação de bases fundadoras da divisão de classes. Isso aparece
com maior evidência no Período Arcaico1, com a ocorrência de inúmeros conflitos sociais.
Seja em qual tempo for, as lutas e os movimentos sociais sempre são vistos como disfunções
da ordem social em vigor.
Segundo Gohn (2012), na história do nosso país, essas lutas pela conquista dos direitos ou
ações contra as injustiças que foram realizadas por diferentes classes e categorias aparecem nos
registros e estudos históricos como acontecimentos marginais. A respeito dessas manifestações,
a autora ainda ressalta que “várias transformaram-se em movimentos, lutas prolongadas ou até
guerras. Outras se institucionalizaram e foram incorporadas ou absorvidas pela sociedade civil
e política brasileira.” (GOHN, 2012, P. 7).
Na formação de classes sociais o poder econômico, ideológico e político é elemento constituinte
fundamental. E os “indivíduos dos grupos” são determinados pelo lugar que ocupam nessa
luta – dominados ou dominadores; subordinados ou mandantes; burgueses ou trabalhadores.
Portanto ser pertencente a uma classe implica a existência de problemas ou interesses comuns.
Mas a consciência de ser pertencente a uma determinada classe social não significa estar
satisfeito com essa condição; por isso muitas lutas foram desbravadas contra a dominação. Para
Gadotti (2010):
“Consciência de classe não significa apenas uma tomada de consciência
da realidade, acima de qualquer ato de transformação da sociedade. [...].
A libertação não se opera no interior da consciência dos homens, mas na
história que eles fazem.” (GADOTTI, 2010, p. 190).

Daí a manifestação se dá por essa consciência de classe dentro de um determinado contexto,


passando a ser denominada como luta de classes.

Para conhecer um pouco mais sobre lutas de classes, leia o texto escrito por Carlos
Gomes sobre os antecedentes do capitalismo no site: http://www.eumed.net/libros-
gratis/2008a/372/LUTA%20DE%20CLASSES.htm

1 - Período após o período homérico, marcado pela consolidação de Cidades-Estado, principalmente as de Esparta, Tebas, Corinto e Atenas.

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Unidade: História dos Movimentos Sociais

2. Movimentos Identitários e Culturais


Os movimentos sociais apresentam diferentes correntes
teóricas. Entre elas a histórico-estrutural e a culturalista-
identitária. Esta tem como base o idealismo kantiano, o
romantismo rousseauniano, as teorias utópicas e libertárias
do século XIX, e aquela, baseada nas abordagens de Marx,
Gramsci, Lefevre, Rosa de Luxemburgo, Trotsky, Lênin, Mao
John Leach - Flickr.com
Tse Tung. (GOHN, 2008).
O movimento histórico-estrutural constituiu-se de eventos ocorridos ao longo dos
tempos, os quais favoreceram ou fortaleceram outros já existentes, possuindo um caráter de
movimento de classe. Entretanto esse caráter de movimento de classe pode não ocorrer nos
“novos movimentos sociais”.
Gohn (2006) entende o culturalista-identitário como integrante dos “novos movimentos
sociais organizados”, que envolvem sujeitos de diferentes classes sociais, unidos por algum
traço identitário ou alguma causa e não pela classe social pertencente. Ainda a autora reforça
que esses novos movimentos sociais colocam como horizonte a construção de uma sociedade
democrática, lutam pela inclusão, atuam pelo reconhecimento da diversidade cultural e fazem
parcerias com outras entidades da sociedade civil e política.

[…] é sempre expressão de uma ação coletiva e decorrente de uma luta


sociopolítica, econômica ou cultural. Usualmente ele tem os seguintes
elementos constituintes: demandas que configuram sua identidade;
adversários e aliados; bases, lideranças e assessorias – que se organizam
em articuladores e articulações e formam redes de mobilizações; práticas
comunicativas diversas que vão da oralidade direta aos modernos recursos
tecnológicos; projetos ou visões de mundo que dão suporte a suas
demandas; e culturas próprias nas formas como sustentam e encaminham
suas reivindicações (GOHN, 2008, p. 14).

Explore

Leia o artigo de Joziane M. Fialho, no qual ela faz breves considerações sobre os Movimentos Sociais
no Brasil. Acesse: https://bit.ly/3SPp0d7

Esses novos movimentos podem ter sua identidade configurada pelo gênero, pela etnia, ou
pela geração (geração: em defesa dos idosos, jovens, etc.).
Os novos movimentos sociais foram fortalecidos e impulsionados pela promulgação, em
1948, da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Constituindo ponto de referência na luta
contra a discriminação e a favor do reconhecimento dos direitos.

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3. Movimentos e Lutas Sociais no Brasil nos séculos XIX
Na história do Brasil, nos períodos do Império e Colônia, os conflitos existentes eram similares
em diferentes regiões, apesar da vasta extensão territorial e da falta de comunicação existente
em nosso país. Segundo Gohn (2012), no século XIX, as lutas tinham como herança as lutas
sociais do século XVIII, por isso vamos relembrar algumas delas.
No século XVIII, a luta social era movida pelo desejo de libertação da Metrópole; seus líderes
eram “liberais radicais” inspirados nos modelos da Revolução Francesa e Revolução Norte-
americana (GOHN, 2012).
Começaremos pela Inconfidência Mineira (1789). Participaram
desse movimento as elites intelectuais, mineradores ricos ou
proprietários rurais, clérigos e militares. Este foi o primeiro movimento
a determinar claramente as intenções de separação da Metrópole.
Ele se deu a partir de três dimensões: a dimensão econômica,
pois havia uma insatisfação com a cobrança abusiva de impostos;
dimensão política, que surgia de uma ordem interna, devido às
inúmeras arbitrariedades do, então, governador da Capitania de
quadro A resposta de Tiradentes, de
Minas Gerais; e a dimensão ideológica, pois o liberalismo inglês e Leopoldino de Faria
os filósofos da época, com suas ideias e produções, influenciaram
os inconfidentes. O desenrolar desse movimento foi conhecido
por todos. Com a delação de um dos participantes, Tiradentes – Degredo: Pena de
principal líder do movimento – foi enforcado e esquartejado e os desterro imposta a
demais participantes sofreram a pena do degredo. criminosos.

Em 1794/1795, surgiu o movimento conhecido como “Conjuração


do Rio de Janeiro”, em que congregados da Academia Científica do Rio
Devassa:
de Janeiro – fundada, em 1771, por escritores – começaram a discutir
sindicância,
questões científicas e políticas e a demonstrar simpatia pelas ideias
inquérito.
republicanas. Houve delação e o grupo sofreu processo de devassa, mas
foi absolvido por faltas de provas (GOHN, 2012).
No ano de 1797, houve a “Revolta de Mulatos e Negros” e, no ano seguinte (1798), a
”Conspiração dos Alfaiates”, também conhecida por “Conjuração dos Alfaiates”, ambas na
Bahia. Esta composta por membros de duas categorias sociais: baianos brancos, pertencentes
às elites; e baianos pobres, brancos e negros – artesãos, soldados, oficiais e escravos. Daí a
segunda denominação, devido à participação predominante de alfaiates no grupo dos artesãos.
E foi exatamente a diferenciação de classes que se tornou um complicador quando as ações
cresceram, pois o desejo de liberdade dos escravos chocou-se com a posição dos senhores
brancos da elite. Esta também foi delatada. A punição resumiu-se à morte ou degredo das
lideranças populares – somente os pertencentes à classe popular foram punidos.
A primeira metade do século XIX (1800 a 1850) foi marcada por lutas, movimentos e
rebeliões nativistas. Esses foram eventos importantes para a construção da cidadania em nosso
país, apesar de muitos deles não terem tido força suficiente para alcançar o objetivo.

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Unidade: História dos Movimentos Sociais

Os movimentos tinham dificuldades de se estabelecer ou de permanecer


no poder, sendo em maior ou menor tempo massacrados, nas várias
regiões do país, pelas forças da legalidade colonial ou imperial. As alianças
de classe existentes eram tênues e contraditórias. (GOHN, 2012, p. 23).

Isso acontecia porque, muitas vezes, era o calor da luta e a


revolta que os motivava, faltando estruturação racional que
fundamentasse as ações e “a falta de unidade criava espaço
também para delações e traições.” (GOHN, 2012, p. 24).
Essa falta de unidade, neste período, facilitava, para as elites
dominantes, a desarticulação das lutas, assinalando-as como
A batalha dos farrapos, de Wasth Rodrigues
ações de barbáries.
A seguir, apresentamos um quadro com todos os Movimentos e Lutas Sociais da primeira
metade do século XIX, mapeados por Gohn (2012), em seus estudos, registrando o nome, o
local e o ano em que aconteceu. Depois faremos uma breve pontuação sobre alguns deles.

Movimentos e Lutas Ano Local

Conspiração dos Suassunas 1801 Pernambuco

Luta Sete Povos das Missões 1801

Movimento dos Maçons 1801-17 Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro

Atos de Insubordinação de Clérigos 1806 Rio Grande do Norte

Revolta de Escravos 1807-1835 Bahia

Revolta de Escravos 1814 Alagoas

Ajuntamento de Pretos 1815 Pernambuco

Revolução Pernambucana 1817 Pernambuco

Movimento de Monte Rodeador 1817-20 Pernambuco

Atos de Adesões à Revolução no Porto 1820 Rio de Janeiro e São Paulo


Agitações políticas de rua em torno da
1821 Rio de Janeiro
partida de D. João VI
Bernarda 1822 São Paulo e Rio de Janeiro

Movimentos de Goiana 1822 Recife

Proclamação da Independência do Brasil 1822


Rebeliões contra as Juntas
1822-23 Bahia, Pará, Piauí e Paraíba
Constitucionais e Infantarias Lusas
Motins de Pedroso 1823 Recife, Pernambuco

Confederação de Equador 1824 Recife

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Constituição de 1824 1824

Guerra Cisplatina 1825-31 Região do Rio da Prata

Revolta dos Roma 1827 Pernambuco

Revolta Popular em Afogados 1829 Recife, Pernambuco

Conflitos entre brasileiros e portugueses 1829-31

Atos de Protesto 1830 Minas Gerais

A Balaiada 1830-41 Maranhão

Setembrizada 1831 Pernambuco

A Novembrada 1831 Pernambuco

Revolta dos “Exaltados” 1832 Rio, Minas, São Paulo, etc.

Caramurus 1832 Rio de Janeiro

Os Chimagos 1831-35

Movimento Cabanada 1832 Pernambuco, Maranhão, Alagoas e Piauí

A Abrilada 1832 Recife

Noite das Garrafadas 1831 Rio de Janeiro

As Carneiradas 1834-35 Pernambuco

Movimento Cabanagem 1835 Belém do Pará

A Revolta dos Malês 1835 Bahia

A Guerra dos Farrapos 1835-45 Rio Grande do Sul

Movimento Messiânico Sebastianista 1836-38 Bahia

A Sabinada 1837 Bahia

Revoltas Escravas 1838 Maranhão e Minas Gerais


Criação do Falenstério de Saí e do
1841 Santa Catarina
Palmital
Rebelião Liberal 1842 São Paulo

Rebelião Liberal 1842-44 Minas Gerais

Revolução Praieira 1847-49 Pernambuco


Quadro 1 – Lutas e Movimentos Sociais na primeira metade do século XIX

Como podemos observar, foram várias as resistências e os combates nesse período. Alguns,
inclusive, de caráter internacional, como a Luta Sete Povos das Missões e a Guerra Cisplatina.
Esta, marcada por um conflito bélico entre Brasil e Argentina, resultando em muitas perdas,
tanto de vidas humanas quanto materiais, culminando na “perda da região de Cisplatina pelo
Brasil, dando origem à República do Uruguai.” (GOHN, 2012, p. 31.).

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Unidade: História dos Movimentos Sociais

Ainda é possível verificar que algumas lutas e movimentos colocavam-se contra o governo e
outras a favor, como “Caramurus (1832)”, que objetivava a volta de D. Pedro I e a restauração
do absolutismo; o “Movimento Cabanada (1832)” e “A Abrilada (1832)”, ambos de caráter
conservador, que também aspiravam à volta de D. Pedro I.
Mas a maioria revelava-se contrária às arbitrariedades do governo e caminhava em busca
de um governo Republicano. Com essa pretensão, encontramos a “Revolução Pernambucana”,
em 1817, – também conhecida como Revolução dos Padres, por ser composta por comerciantes
brasileiros e vários padres, destacando-se Frei Caneca – a qual chegou a tomar o poder em
Recife, mas que também culminou na derrota.

Eles chegaram a tomar o poder em Recife e implantar um Governo


Provisório, elaborando uma Lei Orgânica para orientar o novo regime
até a promulgação de uma nova Constituição para o país, a qual deveria
ser elaborada por uma Assembleia Constituinte. Assim como outros
movimentos da época, a Revolução de 1817 foi esmagada e vários de
seus líderes presos e mortos. (GOHN, 2012,p. 27).

Também com caráter liberal e constitucionalista, em 1820, a Revolução do Porto fermentou-


se a partir das notícias da Revolução em Portugal.
A Proclamação da Independência, em 1822, também apareceu, no cenário histórico, como
um movimento social, mas, segundo historiadores, seu ato, propriamente dito, deu-se a partir
de um figurante, D. Pedro I.

A partir do crescimento do sentimento de “lusofobia” e do agravamento


da crise nas relações com a corte, o príncipe D. Pedro I chefia um
processo político do qual era figurante, aliás um figurante de oposição.
O povo discutiu, segundo o registro de historiadores do período, nas
ruas, os acontecimentos, sem ter participado diretamente do ato.
(GOHN, 2012, p. 29).

Após a Independência, continuaram as lutas pela Constituição e pela inserção do povo


na participação do governo (direito de representação). A “Confederação do Equador”, em
1824, – liderada por Frei Caneca e por Cipriano Barata – deu-se pela oposição ao processo
Constituinte pós-Independência. Esse movimento buscava aglutinar as províncias da região
norte do país, de forma federativa, com um governo representativo e republicano. Realizou ações
como a formação de uma Assembleia Constituinte, o preparo de um projeto de Constituição, a
suspensão do tráfico de escravos e a criação de uma nova bandeira, representando, assim, uma
reação contrária ao absolutismo de D. Pedro I. Essa revolta contou com intensa participação
popular – “população livre: mulatos, pretos, forros, e militares de baixa patente”, constituía as
brigadas armadas, embora também houvesse as milícias, batalhões armados. Mas essa revolta
também foi massacrada e dezenas de seus líderes mortos (GOHN, 2012, p. 30).
Nossa primeira Constituição (1824) consignava poder absoluto ao Imperador e altos poderes
aos parlamentares. Os poderes políticos eram hierárquicos, e era excluída a nacionalidade dos
escravos, não sendo estes, dessa forma, considerados brasileiros.

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Outras revoltas surgiram com sentido republicano e por reformas na Constituição. Podemos
citar a “Revolta dos Roma” (1829) e a “Revolta Popular, em Afogados” (1829-31), com sentido
republicano; e “Os Chimagos” (1831-35), com a perspectiva de reformas na Constituição,
a fim de “reforçar os poderes locais de representação nos municípios e evitar o excessivo
domínio do governo central” (GOHN, 2012, p.33). Essa revolta tinha em sua composição
liberais moderados.
Queremos ainda ressaltar três movimentos que ocorreram no primeiro período de século
XIX, devido à sua importância para a história dos movimentos sociais no Brasil. São eles: a
“Guerra dos Farrapos” (1835-45), “A Sabinada” (1837) e a “Revolução Praieira” (1847-49).
A mais longa revolta armada da nossa história, no século XIX, foi a Guerra dos Farrapos,
liderada pelos gaúchos que se organizavam em companhias de guerrilha, as quais “varreram
as tropas imperiais da região dos pampas”, mas foram “obrigados a se
render diante dos ataques das forças imperiais comandadas por Caxias e subjugado:
atacados ao sul pelos uruguaios” (Gohn, 2012, p. 35-36). Era composta submetido pela
por uma grande quantidade de homens livres, não proprietários e pobres. força das armas,
Eles foram subjugados, porém foram lhes concedidas várias condições dominado, reprimido.
nunca dadas, antes, a grupos revoltosos (GOHN, 2012).
A Sabinada foi uma revolta urbana na província da Bahia. Ela foi precedida de ampla
campanha de opinião, através da imprensa da época – essa é a grande diferenciação deste
movimento. Grupos maçons participavam dos movimentos. Chegaram a conseguir a adesão de
tropas do governo e proclamar a república na província, mas, a exemplo da “Cabanagem” e
dos “Farroupilhas”, também foi esmagada com grande brutalidade (GOHN, 2012).
A Revolta Praieira contou com participação marcante de elites intelectuais e políticas (a
exemplo da maioria dos movimentos dessa época), porém teve uma grande participação
popular – dois mil homens e armas. A marca dessa revolta foi a “perspectiva de mudança social
diferente da do projeto das oligarquias rurais latifundiárias” (GOHN, 2012, p.38). Defendiam a
Reforma Agrária e a abolição do latifúndio. Foi um movimento de defesa das camadas médias
urbanas: brancos, mulatos e negros livres. Em 1849 resolveram deflagrar a Revolução, a qual
durou dois meses, mas foram dominados pelas forças armadas legais e os seus líderes mortos
ou deportados (GOHN, 2012).

Explore

Para exercitar o seu pensamento crítico, assista ao vídeo, atentando para a letra da música e condu-
zindo sua reflexão para o conteúdo desta unidade. https://youtu.be/qbUo0wdEd4k
Reflita: “É possível se fortalecer frente às derrotas?”

Por esse recorte, é possível observar a fragilidade dos movimentos da época na sua concepção,
devido à falta de clareza nos projetos e de politização e à ambiguidade das alianças que foram
fatores contribuintes para sua derrota. E devemos assinalar que esses fatores “fizeram com que
as camadas populares fossem sempre as mais reprimidas.” (GOHN, 2012, p. 25).

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Unidade: História dos Movimentos Sociais

Segunda Metade do Século XIX


Na segunda metade do século XIX, as lutas sociais, em grande parte, giraram em torno da
questão dos escravos e também de movimentos de auxílio mútuo e das lutas contra o fisco.
Esses movimentos “envolviam aspectos da luta pela cidadania, identidade, liberdade humana,
assim como a luta por questões que interferiam no cotidiano dos meios coletivos urbanos, como
o transporte.” (GOHN, 2012, p. 40).
Gohn (2012) aponta setenta movimentos sociais ocorridos na segunda metade do século,
incluindo as guerras contra os países vizinhos ao sul, entretanto nossa atenção estará voltada
para os movimentos que tiveram maior influência na vida política e social em nosso país.
Iniciaremos pelas lutas em torno da questão dos escravos. Gohn (2012) aponta que a luta
contra o escravismo foi uma luta dos próprios escravos, com avanços e recuos devido à resistência
dos fazendeiros à abolição. Mas eles – os escravos – tiveram o apoio, em vários momentos, de
intelectuais e políticos. Foi uma luta longa e árdua.
Nos anos de 1850, foi promulgada a Lei Eusébio de Queiroz, que abolia o tráfico negreiro no
Brasil. Vale ressaltar que houve pressões externas, mas a própria pressão interna dos escravos
contribuiu, visto que as revoltas eram constantes, “vindo a se transformar nas décadas seguintes
na principal questão social do país.” (GOHN, 2012, p. 42).
Entre os vários movimentos, podemos mencionar: a “Luta da Associação Tipográfica
Fluminense” (1853), para libertar escravos; a “Primeira Greve de Escravos-Operários do Brasil”
(1857); a “Lei do Ventre Livre” (1871), que foi mais uma concessão que as elites dominantes
tiveram que fazer: tornar os filhos de escravos nascidos no Brasil livres (isso, devido ao
movimento escravista); o “Movimento Antiescravista Caifazes” (1880), que apoiava a fuga de
escravos; e a “Sociedade Abolicionista Ouropretana” (1881) e “Clube do Cupim” (1884), as
quais organizavam e promoviam fugas de escravos.

“Nos anos de 1880 a Campanha Abolicionista difundiu-se por todo


país e teve apoio popular. [...]. A abolição da escravatura surgiu, assim
como as conquistas anteriores, via projeto legislativo, assinado pela
princesa regente, D. Isabel, consagrada posteriormente pela mídia como
a “libertadora dos escravos”. A lei que acabou com o cativeiro de negros
africanos no Brasil teve o nome de Lei Áurea.” (GOHN, 2012, P. 51).

O Movimento Abolicionista durou dez anos (de 1878 a 1888), mas,


como vimos, as lutas antiescravagistas que precederam esse movimento
foram de fundamental importância.
Os Movimentos de Auxílio Mútuo configuraram-se numa forma peculiar de associação das
classes populares. Esses Movimentos visavam ao cuidado tanto das necessidades econômicas,
quanto dos aspectos culturais, como bibliotecas, festas, jogos, etc. Também representavam um
forte componente social, partindo da solidariedade para com os doentes, os idosos, as viúvas,
os inválidos, etc., e dedicando-se, ainda, à construção de casas, creches, abrigos, hospitais
e orfanatos. Para a camada assalariada, o Movimento Mutualista, no Brasil, desempenhou o
papel de uma Previdência Social (GOHN, 2012).

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Alguns desses movimentos foram: “Sociedade Artística Beneficente” (1859); “Sociedade
Humanitária dos Empregados no Comércio de Santos” (1879); “Sociedade Suíça de Beneficência
Helvétia” (1880); “Sociedade Protetora dos Portugueses Desvalidos” (1885); “Associação
Beneficente dos Funcionários Públicos” (1888); “Sociedade Humanitária dos Empregados
no Comércio” (1888); “Associação de Socorros Mútuos Artes e Ofícios” (1889); “Sociedade
Beneficente dos Alfaiates de São Paulo” (1891); entre outros.
Também foi na segunda metade do século XIX que aconteceram a Revolta de Canudos
(1874 -1897) e o Movimento Republicano (1880 -1889).
A Revolta de Canudos tinha um cunho religioso; figurava-se, no início, como uma revolta
contra a cobrança de impostos. Após alguns anos, Canudos tornou-se um espaço geopolítico
totalmente distinto do território nacional, sendo procurado por milhares de pessoas. Foi
caracterizado pelos historiadores tradicionais como um movimento de fanatismo religioso e
pelos historiadores contemporâneos como um movimento de resistência e de caráter social-
libertário. (GOHN, 2012).

Canudos tornou-se questão de política nacional, por lhe ter sido


atribuído um caráter antirrepublicano, o novo regime político brasileiro;
a República decretada em 1889, necessitava de “vítimas” para perseguir,
quanto às supostas conspirações monarquistas. [...]. Em 1887, após
quatro expedições militares, onze meses de luta sangrenta, com a morte
de mais de oito mil pessoas, Canudos foi esmagado pelas forças militares
(GOHN, 2012, p. 49).

O Movimento Republicano representava a luta pela queda da Monarquia e a implantação da


República. Esta luta constituía-se em um fato político extremamente ligado à luta abolicionista e
à questão militar. Essa questão do escravismo deu à causa um caráter muito mais social do que
político. Foi um movimento predominantemente militar, apesar de contar com apoio popular.
O Movimento Republicano foi precedido de outro movimento chamado de “Questão Militar”.

“A chamada Questão Militar foi um dos fatos que levaram à proclamação


da República em 1889. Entretanto suas origens datam de 1866, quando
o Duque de Caxias assumiu o comando total das operações na guerra
contra o Paraguai.” (GOHN, 2012, p.45).

Em 1891 foi promulgada a Nova Constituição, inspirada no modelo americano e com


pouca participação do povo em sua elaboração. Ao contrário da Constituição de 1842,
que trazia a obrigatoriedade da escolarização, a Nova foi omissa quanto às questões da
educação e do ensino. Além disso, vetou o direito de voto aos analfabetos. Não assegurou
o direito de greve, mas garantiu o direito de reuniões, liberdade de pensamento e expressão
(imprensa sem censura).

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Unidade: História dos Movimentos Sociais

4. Movimentos, Lutas Sociais no Brasil no Século XX


A partir do século XX, as lutas sociais passaram a ter caráter urbano, com o que surgem
novas categorias de lutas. Essas categorias são diversas e vão desde lutas da classe operária até
lutas cívicas e movimentos por questões ambientais.
De acordo com a conjuntura sociopolítica do país, cada uma dessas lutas teve maior ou
menor importância, fazendo parte da História do Brasil.
Durante Primeira República (1900-1930), devido ao avanço da urbanização em razão da
economia do café na região centro-sul do país, as lutas centraram-se na questão do trabalhador
imigrante, que reivindicavam melhores salários, rebaixamento do preço dos gêneros alimentícios,
redução da jornada de trabalho e congelamento dos aluguéis, formando organizações anarco-
sindicalistas. Foram criados vários sindicatos de categorias e, a partir desses, fizeram-se inúmeras
greves. Os anarco-sindicalistas combatiam toda forma de organização burocratizada e rígida –
Estado, Igreja –; eles “deram grande ênfase à cultura, à educação das massas e à igualdade
entre os sexos.” (GOHN, 2012, p. 62).
A questão social nessa época era tratada como “caso” de polícia. Na área da Previdência, as
políticas eram tímidas e pontuais, configurando-se como política nacional somente nos anos de
1930, continuando, assim, a cargo das Associações de Mútuo Auxílio realizar esse papel.
Foi uma fase marcada, de um lado, pela pobreza, agravada pelas epidemias: febre amarela,
varíola, peste bubônica, surtos de gripe; e, de outro lado, pelas elites dominantes, priorizando
construções de estradas voltadas aos interesses dos donos de cafezais.
Por isso deram-se várias revoltas, algumas voltadas para as questões da saúde, como a
“Revolta contra a Desinfecção Sanitária” (1900) e “Revolta das Vacinas” (1904); outras de
cunho político, como o “Movimento Político Contra o Regime Republicano (1902); a “Revolta
da Escola Militar” (1904), que visava à derrubada do presidente e à instauração de uma
“nova República” e que abrangeu a jovem oficialidade, sendo esmagada pelo poder central;
“Liga Republicana” (1906); “Campanha Civilista” (1910), que visava ao lançamento de uma
candidatura civil para a Presidência da República, movimento que foi derrotado nas urnas com
a eleição do militar Hermes da Fonseca; “Movimento de Criação do Partido Comunista do
Brasil”(1922); a “Revolução em São Paulo” (1924), que articulou a Coluna Prestes; a “Coluna
Prestes” (1925-27), que trazia, em sua plataforma, entre outras coisas, a reivindicação do
direito ao voto secreto, ao voto das mulheres, à liberdade de imprensa, entre outros; além dos
movimentos grevistas e ainda a criação de outras associações mútuas.

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Para saber, mais leia o capítulo 1, páginas 61-81, de: GOHN, Maria da Glória. História dos mo-
vimentos e lutas sociais: a construção da cidadania dos brasileiros. – 7. ed. – São Paulo:
Edições Loyola, 2012.

A “Revolução Política” (1930) que levou Getúlio Vargas ao poder dá início a uma nova fase
na história brasileira.

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Trata-se da vitória de um projeto liberal industrializante, que em oposição
às elites conservadoras rurais, delineará com muita vagarosidade um
novo cenário para a nação: o urbano passa gradativamente a ser objeto
de atenção das políticas públicas, visando-se criar condições para o
adensamento da mão de obra, as indústrias crescem paulatinamente
na região sul do país, as correntes de imigração estrangeiras são
definitivamente substituídas pelas migrações nacionais, criam-se
legislações e ordenamentos jurídicos novos, o Estado passa a organizar
e a interferir na economia e na sociedade com mais vigor. Ainda que
as elites conservadoras tenham mantido suas influências junto ao poder
público, dada a redefinição das alianças políticas que estabelecem
no cenário do país, o caráter da luta social adquire novos contornos.
(GOHN, 2012, p. 82)

É nessa fase que vemos as camadas populares emergirem como atores históricos dentro
de um novo prisma, deixando de ser caso de polícia para transformarem-se em cidadãos com
alguns direitos, como os trabalhistas. Nessa fase (1930 -1945), houve várias lutas e movimentos,
entre eles, a “Marcha da Fome” (1931); o “Movimento dos Pioneiros da Educação” (1931), a
“Revolução Constitucionalista” (1932); a “Nova Constituição” (1934) e os “Movimentos de
Associações de Bairros”.
Os anos de 1945 a 1964 marcaram um período conhecido como populista ou nacional-
desenvolvimentista, devido às formas de participação social, pois, a partir do processo de
redemocratização, houve a retomada das disputas político-partidárias no país. Nessa fase os
movimentos reivindicaram várias questões. Esse período também corresponde à fase de grande
intervenção do Estado na economia, com o objetivo de criar condições básicas para a nova
etapa de acumulação do capital. Iniciou-se a intervenção do Estado na sociedade por meio de
políticas públicas de cunho clientelístico. Também se pode dizer que foi uma fase muito fértil
culturalmente (GOHN, 2012).
Agora adentramos um período de grande repressão na sociedade brasileira, a ditatura
militar (1964- 1974), um período de grande efervescência do movimento de esquerda no país.
Ocorreram várias lutas de resistência e protestos, resultando em prisões, torturas e perseguições.
Corresponde também à fase do milagre econômico, no qual as massas populares, em geral,
sofreram com o arrocho salarial, mas mantiveram-se caladas devido à necessidade do emprego
(GOHN, 2012).
As lutas pela redemocratização correspondem ao período de resistência e enfrentamento ao
regime militar, ocorrido nos anos de 1975 a 1982, sendo este um dos mais ricos “da História do
Brasil, no que diz respeito às lutas, movimentos e, sobretudo, projetos para o país.” (GOHN, 2012).

Ele corresponde a uma fase de resistência e de enfrentamento ao regime


militar, que já perdera sua base de legitimidade junto à sociedade
devido à crise econômica que se esboçava desde 1973 com a chamada
crise do petróleo, a retomada vagarosa da inflação, o desmonte das
facilidades do paraíso do consumo das classes médias. As eleições de
1974 significaram um vigoroso “não” da população ao regime político
vigente, fazendo do partido de oposição, o MDB, o vitorioso das urnas
(GOHN, 2012, p.114).

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Unidade: História dos Movimentos Sociais

Foi uma fase de crença na volta pela democracia em nosso país e na possibilidade de
mudanças históricas, não conseguidas no passado, a partir da força do povo, das camadas
populares organizadas. Gohn (2012) fala dessa esperança, apontando o desejo “dos excluídos”
da sociedade de serem os novos atores históricos:

Os moradores das periferias, das favelas, cortiços e outros submundos


saem da penumbra e das páginas policiais para se tornarem os depositários
das esperanças de serem novos atores históricos, sujeitos de processos de
libertação e de transformação social (GOHN, 2012, p.114).

A Nova República e a Restauração Democrática são apontadas por Gohn (2012) como uma
fase marcada pela negociação: a era dos direitos (1982-1995). Essa compreende a sexta fase do
mapeamento feito pela autora. Ela afirma que, apesar de ser o período mais curto, ele é repleto
de movimentos e lutas.
É um período de intensa movimentação social devido à característica da conjuntura política e
à dimensão dos problemas sociais, resultantes do aumento da população no país e também da
facilidade de divulgação e reprodução das ações coletivas através dos meios de comunicação
de massas. (GOHN, 2012).
Após quase duas décadas de indicações de governadores dos estados brasileiros pelo regime
militar, o povo conquista o poder do voto e de eleger seus representantes ao governo do estado
por meio de eleições diretas.
A década de 1980 foi marcada por muitas experiências político-sociais, como a “luta
pelas diretas já”, trazendo a implantação de um calendário político que trouxesse de volta as
eleições presidenciais e a redução do mandato do presidente. Houve, também, o surgimento
das Centrais Sindicais e a criação de entidades organizativas e de inúmeros movimentos
sociais (GOHN, 2012).
Contudo, junto com a volta do jogo democrático, veio a crise econômica, com altos índices
de inflação e o altíssimo número desemprego. Muitas greves foram deflagradas e houve tumulto
das massas, chegando ao extremo de saquearem mercados, fazerem linchamentos populares na
ânsia de fazer justiça com as próprias mãos, revelando um desespero social.
“Os anos de 1980 são fundamentais para a compreensão da construção da cidadania dos
pobres no Brasil, em novos parâmetros.” (GOHN, 2012, p. 126). Apesar das perdas em termos
econômicos, foi uma década muito positiva em termos políticos e culturais. Todavia foi uma
década que findou com a desmobilização e a descrença em massa (GOHN, 2012).
Nos ano de 1990, uma pequena luz de esperança voltou a fazer parte da história social
do Brasil, com o “Movimento pela Ética na Política”, culminando no impeachment do ex-
presidente Collor. Assim, as lutas sociais foram redefinidas, os movimentos sociais alteraram-se
substancialmente, chegando até, em alguns casos, a entrar em crise. “Surgem novos movimentos
sociais, centrados mais em questões éticas ou de revalorização da vida humana.” (GOHN,
2012, p. 127).
Dessa forma deslocou-se o eixo das reivindicações das questões econômicas para as questões
de moral, e retomou-se a questão dos direitos sociais tradicionais.

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Nesse cenário cresceu o número de “Organizações Não-Governamentais” (ONGs) e de
políticas de parcerias implementadas pelo poder público.

Trata-se das novas orientações voltadas para a desregulamentação do


papel do Estado na economia e na sociedade como um todo, transferindo
as responsabilidades do Estado para as “comunidades” organizadas, com
a intermediação das ONGs, em trabalhos de parceria entre o público
estatal e o público não estatal e, às vezes, com a iniciativa privada também.
(GOHN, 2012, p. 128-129).

Com a volta das eleições gerais, em 1994, alterou-se o cenário sociopolítico.


“Um novo plano econômico, uma nova moeda e um novo candidato, surgido de um pacto
político entre as elites, possibilitaram a ascensão de novos quadros ao poder central.” (GOHN,
2012, p. 129).
Procuramos delinear, em poucas linhas, um pouco da história das lutas e dos movimentos
sociais ocorridos no Brasil nos séculos XIX e XX. Mas, nas próximas unidades, retomaremos
alguns pontos desses estudos.

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Unidade: História dos Movimentos Sociais

Material Complementar

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O artigo “Movimentos identitários e a formação de professores” é fruto de uma pesquisa, realizada


por Vera Maria Nigro de Souza Placco et.al., que buscou compreender como os movimentos identi-
tários ocorrem durante a formação continuada de professores.
Veja acessando o site: https://goo.gl/Bjqbgn

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Para conhecer um pouco mais sobre os Movimentos Sociais, acesse o site abaixo e leia a resenha
do livro: Novas Teorias dos Movimentos Sociais, de Maria da Glória Marcondes Gohn. São Paulo:
Edições Loyla, 2008.
https://goo.gl/1QmJJ2

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Para complementar seus estudos, acesse o link:


https://goo.gl/dseiex
E assista a uma entrevista com o filósofo Mario Sérgio Cortella falando sobre politizar-se. Entrevista
concedida ao programa “Mais Você”, da Rede Globo.

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Referências
CORTELLA, Mario Sérgio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos
e políticos. 14. ed. – São Paulo: Cortez, 2011.

GADOTTI, Moacir. Pedagogia da práxis. 5. ed. – São Paulo: Cortez, 2010.

GOHN, Maria da Glória. História dos movimentos e lutas sociais: a construção da


cidadania dos brasileiros. – 7. ed. – São Paulo: Edições Loyola, 2012.

______. Teorias dos movimentos sociais. 5.ed. São Paulo: Loyola, 2006.

______. Novas teorias dos movimentos sociais. São Paulo: Edições Loyola, 2008.

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Unidade: História dos Movimentos Sociais

Anotações

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Campus Liberdade
Rua Galvão Bueno, 868
CEP 01506-000
São Paulo SP Brasil
Tel: (55 11) 3385-3000
Educação,
Movimentos Populares
e Transformação
Material Teórico
Educação, Movimentos Sociais e Transformação

Responsável pelo Conteúdo:


Profª. Ms Wanderli Cunha de Lima

Revisão Textual:
Profª. Dra Patricia Silvestre Leite
Educação, Movimentos Sociais
e Transformação

• A Educação e a Crise Educacional

• Educação, Conhecimento e Cultura

• Movimentos, Lutas Sociais e a


Consequente Transformação

Nesta unidade, faremos um breve estudo sobre as crises


da educação e veremos as transformações decorrentes da
apropriação da cultura e do conhecimento pela humanidade.
As indicações de leitura darão subsídio para a realização das
atividades propostas nesta unidade.

O tema central é a Educação e as transformações ocorridas na sociedade. Você terá


oportunidade de realizar um breve estudo sobre as crises da Educação e a relação assimétrica
entre educação e sociedade.
Se atente para essa relação “da mesma forma que a educação pode reproduzir a sociedade,
também pode transformá-la, contrapondo-se” e para a função do educador dentro do
contexto sócio-político-educacional. Observe que as crises na Educação são decorrentes de
raízes históricas.
E ainda nesta unidade você irá conhecer um pouco sobre a luta pela conquista da cidadania.
Na organização dessa unidade, buscamos resgatar de modo bem sucinto a história da
democratização do ensino e suas consequências. Apontamos a neutralidade como uma
problemática para a educação procurando destacar a importância da consciência crítica do
educador e, mostramos a relação existente entre trabalho, conhecimento e cultura. A seguir
situamos o Homem como um ser social e discorremos sobre a concepção de cidadania e sua
construção ao longo da história.

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Unidade: Educação, Movimentos Sociais e Transformação

Contextualização

Nesta unidade procuramos apontar as concordâncias e as discordâncias existentes na


construção da sociedade e sua importância para que se atinja uma sociedade justa e democrática.
Dentro deste contexto, revelamos a função da Educação e da ação do educador para que as
transformações ocorram.
Como vocês puderam perceber, não há educação sem transformação, e nem transformação
sem conflitos. Portanto, quando a educação visa à cidadania ela não deve esconder os conflitos,
antes afrontá-los.

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Para ilustrar nossos argumentos, sugerimos que assistam ao vídeo apresentado na calourada da USP
de 2007, feito por um militante do movimento estudantil, e a partir dele reflita sobre a assimetria exis-
tente entre Educação e Sociedade e, a não neutralidade necessária dentro do contexto educacional.
http://www.youtube.com/v/1eSSAV6vKAQ&fs=1&source=uds&autoplay=1

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A Educação e a Crise Educacional
É comum ouvirmos a todo instante, nos dias de hoje, que a educação em nosso país está
em crise. Contudo, a crise educacional sempre fez parte da história da educação nacional, visto
que ainda não atingimos os patamares mínimos de justiça social frente à riqueza produzida em
nosso país. (cf. CORTELLA, 2011).
É possível referenciar vários fatores que conduzem à crise educacional. Na atualidade, os mais
comuns encontram-se na democratização do ensino, na progressão continuada X promoção
automática, na desvalorização profissional dos docentes, na qualidade do ensino X quantidade
de alunos por sala de aula, no despreparo dos educadores, na evasão e retenção escolar, no
planejamento curricular. Mas, como ressalta Cortella (2011), esses e outros fatores têm raízes
estruturais históricas.
Historicamente, o acelerado processo de urbanização – vivenciado a partir da Revolução
Industrial – trouxe consequências indubitáveis para a sociedade que, em diferentes tempos marcou
a exclusão e a dominação social. A produção capitalista industrial resultante do poder político
central atendia a interesses das elites dominadoras. Assim, na década de 60 a escolarização dos
trabalhadores, em nosso país, não era foco de atenções. (CORTELLA, 2011).
A acelerada industrialização ocasionou o inchaço da urbanização, que aconteceu de forma
desorganizada causando um verdadeiro colapso nos serviços públicos, em especial na educação
e na saúde. Isto aponta que “crise” faz parte de todos os setores sociais e não somente da
Educação. (CORTELLA, 2011).
Apesar de todas as mudanças sociais e políticas ocorridas ao longo dos séculos em nosso
país, vemos que a escola não acompanhou, com o mesmo ritmo, essa evolução.
Para Gadotti (2010), as sociedades primitivas (assim chamadas impropriamente) apresentavam
certa estabilidade social e nelas a educação exercia papel conservador “reproduzindo valores,
cultura e estágio do seu progresso técnico e científico” (GADOTTI, 2010, p.82). Mas, hoje,
as transformações fazem parte das sociedades, não existindo sociedade que não esteja neste
contexto. A mudança e a transitoriedade são essenciais na dinâmica das sociedades atuais.
Não há sociedades estáveis ou estáticas. Contudo, a educação e, em
particular, os sistemas educacionais não tem acompanhado esse ritmo de
transformação. (GADOTTI, 2010, p.79).
Segundo Teixeira (1953), saímos de um período de grande lentidão das mudanças, e
adentramos um novo período, de expansão do sistema escolar, o qual trouxe grandes problemas
e preocupações devido à falta de estrutura do sistema escolar.
Com a abolição e a república, entramos, porém, no período de mudanças
sociais, que a escola teria de acompanhar. O modesto equilíbrio dos
períodos monárquicos, obtido em grande parte às custas da lentidão do
nosso progresso e do número reduzido de escolas, em que se buscava
conservar a todo transe os melhores padrões, rompe-se definitivamente,
e começamos a expandir o sistema escolar sem maior reflexão nem
prudência.(TEIXEIRA, Anísio, 1953, p. 23).

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Unidade: Educação, Movimentos Sociais e Transformação

Na verdade, no Brasil naqueles tempos, a escola não era exigida ou imposta como instituição
da cultura, apenas procurava-se copiar padrões transplantados de padrões europeus, ou seja,
um sistema educacional aristocrático e feito para preparar os homens intelectualmente, estava
sendo usado para preparação de homens comuns, tornando a escola como algo irreal.
A falta de estrutura nos sistemas de educação, ainda hoje se acrescenta aos fatores que
conduzem à crise educacional.
Esta falta de estrutura no atendimento da demanda cria diferentes formas de se conceber
a educação, iniciando a segregação de acordo com os interesses dominantes. A educação antes
pensada somente para a formação de intelectuais passa a ter agora, com a ”universalização do
ensino”, um cunho mais voltado para a formação técnica, a fim de servir esses interesses.
Na nova escola o objetivo da educação detinha-se em preparar o homem comum para
o trabalho ou o ofício, tornando-o suficientemente técnico, utilizando da tradição e dos métodos
das antigas escolas. (TEIXEIRA, 1953).
É fato que a democratização do ensino trouxe em seu bojo a queda da qualidade de
ensino, ocasionada por diversos fatores já citados (salas de aula superlotada, falta de preparo
do docente, desvalorização do magistério, burocracia educacional, entre outros) o que mostra
uma insuficiência na execução dos paradigmas pedagógicos relegando esse direito social e
democrático às classes trabalhadoras.

Pense
Onde está o antagonismo entre esta “fala” de Mario Sérgio Cortella (o texto da citação) e a charge?

“A qualidade na educação passa,


necessariamente, pela quantidade. Em uma
democracia plena, quantidade é sinal de
qualidade social e, se não tem a quantidade
total atendida, não se pode falar em qualidade.”
(CORTELLA, 2011, p. 14-15).

É possível afirmar que a neutralidade da ação


não
pedagógica ocorre quando o educador acredita que estas Nesta unidade
s
ater a toda
mensagens sejam analógicas. iremos nos ap en a s
as teorias,
Partindo do princípio que educar é transformar, esse s um pou co
revisitaremo
diálogo para
da teoria do
ato não pode ser considerado neutro. E os educadores
o
stematizaçã
devem posicionar-se de maneira crítica frente às ajudar na si d a
social
diferentes discussões sobre teorias do conhecimento, da função e
erspectiva d
para não cair nas amarras ou armadilhas ocultas nos escola na p l.
o socia
sistemas político-educacional. transformaçã

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As teorias vêm ao longo dos anos tentando dar respostas a várias questões da educação.

É certo que todos os educadores têm sua interpretação acerca do que é o conhecimento,
contudo nem sempre essa interpretação se apresenta de modo consciente e reflexivo. Muitas
vezes, o educador adota a interpretação do que seja o conhecimento sem perceber claramente
qual é a sua fonte e as quais consequências essa interpretação pode levar. Mas é certo que todos
têm uma “teoria do conhecimento”, a qual ele toma para si. Para verdadeiramente entendê-las
seria necessário revisitar as raízes históricas.

Com o fracasso da educação, surge a teoria do diálogo, representada principalmente


por Paulo Freire que nos oferece melhor compreensão dessa teoria, dando um caráter
eminentemente político ao diálogo.

As teorias dialógicas contribuem para o desenvolvimento da escola pública e das ciências


da educação trazendo uma nova compreensão do educando e da relação entre a educação
e a sociedade. (Gadotti, 2010).

Sócrates situava o diálogo como uma relação de privilégio entre duas pessoas em igualdade
de condições e reciprocidade. Mas a teoria do diálogo assevera quanto à importância do conflito
a fim de que não seja somente um diálogo ingênuo. Se educar é transformar, temos que nos
atentar para o fato de que não há transformação que possa ser considerada pacífica, isto porque
envolve a ruptura de uma situação estável.

Na história da educação brasileira vimos em diferentes momentos – ainda hoje o vemos em


alguns educadores – a tentativa da neutralidade da ação educativa, como se a escola não fizesse
parte da sociedade e de seus conflitos, e isto, segundo os defensores da escola nova, torna-se
uma problemática para a educação.

O diálogo é uma postura do educador comprometido com a transformação social,


contrapondo-se à neutralidade da escola tradicional.

Para Cortella (2011), faz-se necessário a democratização do saber como objetivo último
da Escola Pública, dando acessibilidade ao conhecimento universal acumulado, sem tornar
esse acesso impositivo e/ou restrito a uma formação erudita. Então, a proposta de uma
Escola Pública na qual, não somente, seja valorizado o saber vivencial dos educandos,
mas também, proporcione conteúdos selecionados de modo a favorecer a compreensão da
própria realidade e o fortalecimento como cidadão, capaz de realizar transformações que
atendam aos interesses da maioria social.

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Para se ter uma ideia global sobre a educação no Brasil, os avanços e as faltas, e o que se espera
dos alunos e dos professores no contexto educacional, veja o debate realizado pelo programa Globo
News Painel com especialistas da área no site: http://www.youtube.com/watch?v=oLgwMYueIsQ

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Unidade: Educação, Movimentos Sociais e Transformação

Educação, Conhecimento e Cultura


A educação escolar nos transporta ao objetivo principal da
atividade docente, ou seja, o trabalho com o conhecimento. Porém,
o mesmo não pode ser reduzido à sua modalidade científica, visto
que outras modalidades (conhecimento religioso, estético, afetivo,
etc.) também se fazem presente nas ações profissionais cotidianas.
E é certo que o resultado da ação científica não atinge a todos da
mesma forma. (CORTELLA, 2011). foto de Ricardo André Frantz

Sabemos que o conhecimento se faz a partir da informação e da formação e este é constituído


pelo ser humano dentro de suas realidades.

Mas quem é esse ser humano?

Podemos afirmar que é um ser que na sua fragilidade


buscou adaptar-se e tornou-se superior às demais espécie
animal a partir de sua capacidade de raciocinar criando o
próprio ambiente.

Logo, é o único animal capaz de realizar ações transformadoras conscientes. Segundo Cortella
(2011), é a consequência de um agir intencional que chamamos de trabalho. O trabalho é a ação
intencional que realizamos sobre as coisas e as ideias e por meio dele produzimos o meio humano.

“Esse meio humano, por nós produzido e no qual somos produzidos, é a cultura.” (CORTELLA,
2011, p. 35). Ou seja, o que fazemos resulta no conhecimento e está repleto da cultura que por
nós foi produzida no decorrer dos tempos. É o nosso caminhar histórico que constrói a cultura
e a modifica ao passar do tempo – um movimento ininterrupto de transformação – dentro da
relação Homem-Mundo.

Isto significa que o Homem tem a necessidade de lutar com mundo por sua sobrevivência,
dessa forma ele (o Homem) altera o mundo e é alterado por ele (o Mundo). Essa foi a principal
luta da história da humanidade durante muito tempo.

Sendo a cultura o resultado da intervenção do trabalho humano sobre o mundo, podemos


afirmar que somos então, um produto cultural. “... o Homem não nasce humano, e sim, torna-
se humano na vida social e histórica no interior da Cultura.” (CORTELLA, 2011, p. 37).

A cultura não é estática, mas permanece em constante movimento de criação e recriação


através dos tempos, de acordo com a necessidade de cada geração através do conhecimento,
utilizando a cultura já existente, porém não se limitando a ela.

“A escola não é o único local de apropriação da cultura.” (GADOTTI, 2010, p. 239). A cultura
pode ser apropriada pelo humano através da experimentação direta, ou seja, pelo contato
realizado diretamente com a sociedade em que vive.

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A construção do conhecimento não se faz em um passe de mágica, mas vivenciando na prática, e a


partir da reflexão das produções históricas da humanidade. Convido você a assistir o vídeo e refletir
sobre a importância do conhecimento não ser entendido dentro de uma visão estática e extática.
* extática Extática: posto em êxtase, enlevado.
http://www.youtube.com/watch?v=Pz4vQM_EmzI

As instituições sociais: família, igreja, escola, mídia etc. surgem como fonte de preservação e
inovação dos valores e conhecimentos por meio de processos educativos.
Neste contexto, aparece a escola como cerne da educação, carregada de valores,
conhecimentos e preconceitos mutáveis. Estes são elaborados pelos humanos que lhes dão
significados. Portanto, em sociedade, a produção de valores e conhecimentos não é neutra, mas
encontra-se envolvida do poder sócio-político-econômico.
...a vida social é, também vida política, isto é, configura-se como espaço de
conquista e manutenção de poder sobre os bens e pessoas, não havendo
ainda, sociedades complexas de composição igualitária. (CORTELLA,
2011, p. 41).
O conhecimento além de não ser neutro, ainda tem um caráter político, isto porque está
envolto de interesses, sobretudo na luta pelo poder.
Então, se a cultura não é neutra, o conhecimento não é neutro, não há como o educador
permanecer na neutralidade da ação pedagógica. Ele tem que assumir a “tarefa de partido: ou
educa a favor dos privilégios ou contra eles, ou a favor das classes dominadas ou contra elas.”
(GADOTTI, 2010, p. 87).
Portanto, o poder se encontra no centro da ação pedagógica, essa questão foi ignorada por
muito tempo, e é por isso que deve haver uma revisão crítica do papel do educador.
O educador mede-se, portanto, pelo grau de consciência crítica que tiver,
pois, por educador, no seu sentido amplo, entendo o intelectual capaz de
transmitir uma ideologia que organize e cimente os homens entre si, um
grupo, uma pequena comunidade, uma categoria social, etc. (GADOTTI,
2010, p. 87).
A tarefa do educador supera os limites da escola, sua ação educativa também conduz à
organização da sociedade através de uma visão macroeducacional. Assim, a educação apresenta-
se com a expectativa de transformação social.
Na perspectiva de uma educação visando a transformação, a escola
tem um papel estratégico, na medida em que pode ser o lugar onde as
forças emergentes da nova sociedade, muitas vezes chamadas de classes
populares, podem elaborar a sua cultura, adquirir a consciência necessária
à sua organização. (GADOTTI, 2010, p. 24-25).

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Unidade: Educação, Movimentos Sociais e Transformação

Alteridade:
A educação escolar como veículo de formação e “transformação”,
Caráter do
sendo não neutra (como já foi dito), devido ao seu processo pedagógico que é outro;
estar imerso em intencionalidade, conduz a necessidade de uma visão diversidade,
de alteridade por parte dos educadores. diferença.

Freire (1997) ressalta a necessidade do educador se perceber criticamente:


No exercício crítico de minha resistência ao poder manhoso da ideologia,
vou gerando certas qualidades que vão virando sabedoria indispensável
à minha prática docente. A necessidade desta resistência crítica, por
exemplo, me predispõe, de um lado, a uma atitude aberta aos demais,
aos dados da realidade; de outro, a uma desconfiança metódica que
me defende de tornar-me absolutamente certo das certezas. Para me
resguardar das artimanhas da ideologia, não posso nem devo fechar
aos outros, nem tampouco me enclausurar no ciclo da minha verdade.
Pelo contrário, o melhor caminho para guardar viva e desperta a minha
capacidade de pensar certo, de ver com acuidade, de ouvir com respeito,
por isso de forma exigente, é me deixar exposto às diferenças, é recusar
posições dogmáticas, em que me admita como proprietário da verdade.
(FREIRE, 1997, p. 151).
A prática educativa deve instituir o conhecimento como inacabado, mutante e resultante
da produção histórica. Há a necessidade dos educadores reforçar que os valores e
conhecimentos são resultados de uma sucessão de ocorrências existenciais, e não algo
imóvel da natureza humana.

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indicação do vídeo: O Sorriso de Monalisa, com Julia Roberts.


Contextualização do filme: Este filme mostra uma jovem professora criativa, meiga, inteligente, revo-
lucionária, cáustica. Convivendo com os ditames da rígida educação para moças, nos anos 50; que
entra em conflito com as alunas e a instituição e decide deixar a escola, mas não antes de dar um
novo olhar, outra expectativa de vida às alunas. Ótimo para refletir sobre a ação educativa!

Há uma relação assimétrica entre educação e sociedade, sendo que da mesma forma que a
educação pode reproduzir a sociedade, também pode transformá-la contrapondo-se a ela.
O sistema escolar não é apenas um subsistema do sistema social. Há
uma contradição interna na educação, própria da sua natureza, entre
a necessidade de transmissão de uma cultura existente – que é a tarefa
conservadora da educação – e a necessidade de criação de uma nova
cultura, sua tarefa revolucionaria. (GADOTTI, 2010, p. 74).
Portanto, vê-se tarefas contraditórias: conservadora e revolucionária. Uma se contrapõe a

12
outra em diferentes momentos históricos da humanidade, ou se reproduz a sociedade, ou se
contraria e conflita-se com ela.
No Brasil, as diferentes concepções da relação Sociedade-Escola, encontram-se presentes e
são adotadas pelo educador de acordo com sua compreensão política.
A educação se apresenta como um fator importante de transformação social a partir das
estratégias político-pedagógicas da formação e do trabalho do educador.

Movimentos, Lutas Sociais e a Consequente Transformação


No início, a relação entre Homem e Mundo envolvia uma
questão de sobrevivência. Lutar com o mundo significava alterá-
lo e ser alterado por ele. Contudo, a relação do Homem com o
Mundo não se dá individualmente, mas coletivamente, por isso a
denominação ser social.
O Homem em sociedade realiza a construção cultural, a qual
pode ser entendida como verdade em certo momento histórico e Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr
não o ser em outro.
Cabe enfatizar: o conhecimento e, nele, a verdade, são construções
históricas, sociais e culturais. São resultantes do esforço de um grupo
determinado de homens e mulheres (com os demais elementos disponíveis
na sua cultura e no tempo em que vivem) para construir referências
que orientem o sentido da ação humana e o sentido da existência.
(CORTELLA, 2011, p.79).
Mas é a luta pelo poder que levou a humanidade a mudar seu foco. Se antes a luta se
dava pela sobrevivência no e com o mundo, agindo nele e sobre ele, transformando-o e
se transformando. Afinal, o Homem é um ser criador de sua própria história, a qual vai se
transformando na medida em que ele (o Homem) transforma o mundo. Entretanto, essa luta
no decorrer do tempo passa a ser substituída pela luta de interesses, revelando a relação de
confronto: Homem-Homem.
Nessa relação Homem X Homem, o conhecimento tem relevância, porque sendo construída
a partir de interesses de uma determinada camada da sociedade, essa irá atuar na submissão de
outra exercendo o poder. Com isso a sociedade passa a ser regida por regras de controle social
através da política.
E o que é o poder senão “a capacidade, a potência, a virtualidade de realizar algum ato,
mesmo que nunca venha a se realizar.” (GADOTTI, 2010, p. 23).
A relação entre educação e poder é muito complexa. “Se educar é conscientizar, a educação
é ato essencialmente político. Portanto, ninguém educa ninguém sem uma proposta política.”
(GADOTTI, 2010, p. 88).

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Unidade: Educação, Movimentos Sociais e Transformação

O século XX é marcado pela descoberta de como o poder é tramado. E foi justamente neste
século que a sociedade vivenciou com maior intensidade o poder de dominação, e neste cenário,
vendo seus direitos sendo desrespeitados. Foi um século de descoberta do caráter negativo do
poder, porém, também da descoberta da possibilidade de mudança a partir da organização.
Na busca de corrigir as diferenças sociais surge a concepção de cidadania.
O termo cidadania nos remete – em uma de suas várias dimensões – aos direitos e deveres
dos indivíduos, denominada cidadania individual, em que a liberdade e a autonomia são
pressupostas destacando-se a dimensão civil. E dos grupos, cuja denominação é cidadania
coletiva e pressupõe tanto a dimensão cívica, quanto a dimensão sociocultural. (GOHN, 2012).
No Brasil, a cidadania foi construída ao longo de sua história. Contudo, até mesmo a conquista
do direito de ser cidadão em nosso país exigiu lutas, pois ela (a cidadania) não era um direito
de todos. Caracterizando-se num processo não linear.
No período Imperial, eram considerados cidadãos somente os homens de posse e/ou
nobreza. Ou seja, somente os grandes proprietários – sejam pelos números de escravos, ou por
possuírem muitas propriedades – e os que detinham título de nobreza podiam exercer o direito
da cidadania. Desta forma, excluíam-se os pobres e escravos, sendo vistos como não cidadãos.
Na fase da República, a cidadania era cerceada no direito do voto, assim se restringia o perfil
dos indivíduos aptos a exercê-la. Excluía-se da cidadania política as mulheres, os mendigos, os
analfabetos, os soldados e os religiosos, ou seja, a maioria da população existente no Brasil
naquela época, caracterizando a ausência de participação popular.
Amorfo:
“A marginalização do povo do debate público levou à construção de uma sem forma
cultura política em que a sociedade é vista como amorfo e difuso, e o Estado definida,
como provedor e o organizador da ordem necessária.” (GONH,2012,p. 200). informe.
A luta pela cidadania cresceu no século XX devido a novas demandas que incorporaram
noções de direitos políticos, buscando alterar a ordem conservadora do momento.
Surge assim a luta por eleições “limpas”, pelo voto das mulheres e de
outras categorias que não possuíam propriedades e, fundamentalmente a
luta pelos direitos sociais dos trabalhadores. Introduzidos no país nos anos
de 1930, por meio de legislação trabalhista que se apresentava como
uma concessão as elites esclarecidas, baseadas em modernos contratos
de relações de trabalho na Europa. Os novos direitos regulamentados
passam a compor um novo cenário na cidadania brasileira. Trata-se da
construção da figura do brasileiro enquanto trabalhador, com direitos e
deveres legitimados. (GOHN, 2012, p. 200).
É importante ressaltar que a conquista das leis se deu a partir
da luta de várias décadas, dos trabalhadores pertencentes às
camadas populares ou médias da população, originárias de
movimentos de diversas organizações.
Essa cidadania conquistada nos anos de 1930 – mesmo não
sendo completa, pois ainda excluía os analfabetos – propiciou o
reconhecimento dos novos cidadãos pelo lugar que estes ocupavam
no processo de produção. (GOHN, 2012).

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A cidadania exercida pelo voto (direito civil) no período populista (de 1945 a 1964) favorecia
ao exercício dos direitos sociais. Esses conduziram a uma melhoria coletiva necessária para a
sobrevivência das camadas populares, especialmente as que viviam na área urbana.
A partir das conquistas abriu-se espaço para que a população se organizasse em
Sociedades Amigos de Bairro (hoje denominadas Associações Amigos de Bairro) o que
levou à politização dos envolvidos.

Explore

Para conhecer um pouco mais sobre a mudança na denominação de Sociedade Amigos de Bairro,
para, Associação Amigos de Bairro acesse o site abaixo:
http://jus.com.br/revista/texto/6416/as-associacoes-e-o-novo-codigo-civil

E as lutas sociais continuaram nos anos de 1980, após duas décadas de repressão social –
anos de 1960 e 1970 com Ditadura Militar. Vários militantes de lutas sociais no Brasil, antes
acuados pela conjuntura politica do país, aliaram-se a novos parceiros, e com isso novas
bandeiras foram construídas, visto que a insatisfação da população brasileira era geral. Várias
lutas sociais surgiram. Gohn (2012) aponta que a conjuntura internacional contribuiu com essas
lutas sociais, as quais conduziram a conquistas que desagradaram a elite do nosso país:
Fortalecida pela conjuntura internacional, que também destacava a
questão dos direitos humanos como básicos, a cidadania tornou-se o móvel
e o articulador das lutas ocorridas. O saldo configurado foi a inscrição,
em leis, de diversos direitos sociais demandados pelos movimentos
sociais daquelas décadas. O referendum popular, a iniciativa popular,
o plebiscito foram mecanismos de participação popular conquistados
pelos cidadãos brasileiros, por meio das pressões populares. Num país
de tradição autoritária, eles significaram verdadeiros atos heroicos. Por
isto incomodaram vários setores das elites, que logo se articularam para
eliminá-los ou muda-los. (GOHN, 2012, p. 202).
Essas lutas e movimentos ansiavam pela redemocratização do país com a participação
popular, em busca de uma sociedade sem discriminações, exclusões ou segmentações.
Nos anos de 1990, as camadas médias da população começam a dar apoio aos pluriclassistas
que passam a participar dos movimentos sociais, isso gera uma mudança no perfil dessas lutas,
com maior participação dos pluriclassistas, havendo alterações na hierarquização dos valores
sociais, enfatizando a ética e a moral, já que a corrupção, a burocracia e a ineficiência das ações
do governo geraram descrença. “A sociedade civil passou, nos anos de 1990, a desacreditar da
política, dos políticos e das ações do Estado em geral.” (GOHN, 2012, p. 206).
Acredita-se que os movimentos sociais junto às camadas populares continuarão a ocorrer,
mais isso ainda é uma incógnita.

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Unidade: Educação, Movimentos Sociais e Transformação

Material Complementar

Explore
Explore um pouco mais sobre a relação existente entre Educação e Sociedade e os fatores
que intervém no processo educativo, através do artigo: “A relação educação e sociedade.”
De Alberto Noé, visitando o site:
http://antroposmoderno.com/antro-articulo.php?id_articulo=243

Para conhecer um pouco mais sobre a sociedade capitalista e a educação acesse:


http://www.histedbr.fae.unicamp.br/revista/edicoes/32/art10_32.pdf
E leia o artigo de Marcos Cassin: “Sociedade capitalista e Educação: uma leitura dos clássicos
da sociologia”

Para complementar sua leitura visite o site abaixo e veja as reflexões feitas por Mario Sergio
Cortella sobre a educação e a melhoria na Educação Básica. (Entrevista com Mario Sergio
Cortella, por Luiza Oliva)
http://www.direcionaleducador.com.br/artigos/entrevista-mario-sergio-cortella

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Referências
CORTELLA, Mario Sérgio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos
e políticos. 14. Ed. São Paulo: Cortez, 2011.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São


Paulo: Paz e Terra, 1997.

GADOTTI, Moacir. Pedagogia da práxis. 5. ed. – São Paulo: Cortez, 2010.

GOHN, Maria da Glória. História dos movimentos e lutas sociais: a construção da


cidadania dos brasileiros. 7. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2012.

TEIXEIRA, Anísio. A crise educacional brasileira. Revista Brasileira de Estudos


Pedagógicos. Rio de Janeiro, v.19, n.50, abr./jun. 1953. p. 20-43. Disponível em: <http://
www.bvanisioteixeira.ufba.br/produde.htm>. Acesso em 20 dez 2012.

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Unidade: Educação, Movimentos Sociais e Transformação

Anotações

18
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Rua Galvão Bueno, 868
CEP 01506-000
São Paulo SP Brasil
Tel: (55 11) 3385-3000
Educação
Movimentos Populares
e Transformação
Material Teórico
Os Princípios Éticos e Políticos nos Movimentos Sociais

Responsável pelo Conteúdo:


Profa. Ms. Wanderli Cunha de Lima

Revisão Textual:
Profa. Esp. Márcia Ota
Os Princípios Éticos e Políticos nos
Movimentos Sociais

• Os Princípios Éticos

• Os Regimes Políticos e a Questão da Ética

• Os Movimentos Sociais

··Saber os princípios éticos da política exercida pelo cidadão


político representante da sociedade civil.
··Nessa unidade, serão discutidas questões acerca de como os
princípios éticos e políticos estão presentes nos movimentos
sociais. Aproveitem as indicações de leitura a fim de contribuir
com seus estudos.

Nesta unidade, a questão fundamental é a compreensão de como a ética interfere na política


e como atua nos movimentos sociais. Você também poderá conhecer um pouco mais sobre
o processo organizativo dos movimentos sociais e as mudanças por eles sofridas.
Faça relações entre o conteúdo dessa unidade e a função da educação (como meio de
garantir a formação do cidadão crítico e participativo na sociedade).
Daremos a introdução de como vem sendo a organização dos movimentos, mostrando as
categorizações feitas por Gohn (1997, 2011, 2012) a partir de seus estudos, para que na
próxima unidade possamos aprofundar nossos conhecimentos sobre o protagonismo da
sociedade civil.
Organizamos essa unidade de modo a favorecer a compreensão dos conceitos procedentes
da política exercida pelo cidadão que representa a sociedade civil.
Novamente, realizaremos um fórum de discussão na atividade de aprofundamento. Lembre-
se que sua participação além de fazer parte da avaliação da disciplina, ainda pode contribuir
com o aprendizado dos demais colegas. A interação é a “grande chave” para abrir as portas
neste século! Participe! Não se esqueça de ser claro e objetivo nas suas colocações.
Aproveite a atividade de sistematização do conhecimento, para verificar quais pontos dessa
unidade ainda merecem sua atenção, beneficie-se da autocorreção!
Aproveite as indicações de sites e leituras para a ampliação do conhecimento, afinal, elas são
ferramentas imprescindíveis na apropriação do conteúdo em estudo!

5
Unidade: Os Princípios Éticos e Políticos nos Movimentos Sociais

Contextualização
Nesta unidade, procuramos contribuir para a elucidação das semelhanças e diferenças
existentes entre ética e moral, a fim favorecer a compreensão referente aos princípios éticos nos
movimentos sociais. Também perpassamos pela história dos regimes políticos no Brasil, para
ilustrar como a ética se faz, ou não, presente.
A esse propósito, adentramos nos movimentos sociais, mostrando como eles participam das
transformações em nossa sociedade e, como podem agir a partir da participação de diferentes
classes e camadas sociais.
Visando fazê-los refletir sobre o conteúdo estudado, propomos que assistam ao vídeo
“Movimento Novos Líderes – O Brasil do Futuro é Agora”, o qual aponta questões presentes na
sociedade atual e nos convida a participar das mudanças.

Explore
https://www.youtube.com/watch?v=Ls3IoSUQKko

6
1. Os Princípios Éticos
Antes de promovermos uma introdução ao tema desta unidade, vamos relembrar o que já foi
visto nas unidades anteriores. Assim, Iniciamos nossa conversa acerca da educação, apontando
seu papel fundamental na transformação social, depois discorremos sobre as lutas pela conquista
da cidadania e expusemos os movimentos populares no Brasil. Também pontuaremos sobre
a desigualdade e a injustiça social, ainda existentes em nosso país, mesmo frente todas as
conquistas já ocorridas, e, por conseguinte, traçaremos uma linha do tempo dos movimentos
mais “importantes”1 na luta pela igualdade, pela liberdade, e pela democracia, culminando
no movimento que levou ao o impeachment do ex-presidente Collor, intitulado “Movimento
pela Ética na Política”. Desta maneira, finalizaremos a Unidade II, mostrando que houve um
deslocamento das questões econômicas para as questões relativas à ética, as quais adentraram
os novos movimentos sociais, pensando na revalorização da vida humana.
Destarte, a partir dos anos de 1990, passou a haver um novo olhar dos movimentos sociais
transferindo as reivindicações de questões econômicas para as de questões de moral.
Mas, o que são princípios éticos?
Poderíamos afirmar que é a base para que haja uma convivência social dentro de um
ambiente harmonioso pautado pelo respeito mútuo.
É possível observar a existência de princípios éticos em diferentes circunstâncias e relacionados
a diferentes atividades profissionais como: ética política, ética religiosa, ética médica, ética
profissional, entre outras. Referindo-se, nesses casos, às normas de conduta de um determinado
segmento, ou seja, aquilo que deve ser feito dentro da área em que está inserido.
De qualquer forma, quando nos referimos à ética, estamos nos pautando em um conjunto de
princípios pré-determinados, para reger as ações do “bom” comportamento humano.

1.1 A Ética e a Moral


Muitas vezes, os termos ética e moral parecem
ser usados como sinônimos, por isso faremos um
pequeno resgate da origem desses termos.
Etimologicamente, os termos ética e moral
possuem origens distintas. A palavra ética vem
do grego “Ethos” que significa o “modo de ser”
ou “caráter”. E a palavra moral vem do latim
“Mores” que significa “relativo aos costumes” ou
“lugar onde mora”.
Alguns autores apontam a distinção entre ambas,
Fonte site:http://www.ivancabral.com/2011/09/charge-do-dia- atribuindo à ética a busca de valores universais, e a
etica-e-educacao.html
moral, como código de valores específicos.

1 Não desmerecendo os demais movimentos e lutas ocorridos ao longo de nossa história, buscamos apontar aqueles que tiveram maior
repercussão nas mudanças sociais.

7
Unidade: Os Princípios Éticos e Políticos nos Movimentos Sociais

Segundo Cortella (2011), até o século VI a.C., a palavra “Ethos” em grego “significava ‘morada
do humano’, no sentido de caráter ou modo de vida habitual, ou seja, nosso lugar.” Portanto, é
aquilo que nos abriga e nos dá identidade. Para o autor, essa noção original da palavra “Ethos”
não se perdeu com a tradução da expressão “more” para o latim, com o significado de “o lugar
onde você morava, que era o teu habitus.” (CORTELLA, 2011, p. 138).

Diante dessa interpretação, os dois termos: ética e moral assumem o mesmo significado, o
de estar relacionado aos costumes e hábitos sociais. Onde a ética é o princípio, e a moral é a
prática de uma ética.

Dentro do campo filosófico, ética é diferente de moral, pois ela busca fundamentar
teoricamente o modo de viver a fim de se encontrar o melhor estilo de vida, abrangendo, dessa
forma, diversos campos do conhecimento, como: a antropologia, a psicologia, a sociologia,
a pedagogia, etc.. Já a moral é fundamentada na obediência a normas e regras, costumes e
mandamentos culturais.

Segundo Boff (2003), ética é um conjunto de valores e princípios, de inspirações e indicações


que nos orientam e valem para todos, pois estão ancorados na nossa própria humanidade. E
moral é a concretização de como a ética é vivida dependendo da cultura de cada povo. Então,
ética é uma só e moral são várias.

Outros autores pontuam a questão da moral como um conjunto de regras e crenças


que determinam o comportamento das pessoas e, a ética como sendo a reflexão crítica
sobre a moral.

Boff (2008) aponta algumas fontes que estimulam a existência da ética. Segundo o autor, as
religiões são fontes permanentes, que dão significado à vida da humanidade a partir dos valores
e comportamentos ditados. Mas, atenta para o fato de não se fundar em um consenso ético,
visto que, devido às muitas e diferentes religiões, as normas éticas podem apresentar variações.
Ainda para o autor, a razão, o desejo e o cuidado também são fontes de ética, e encontram-se
presentes em todos os seres humanos.

Essa inclusão do desejo e do cuidado como também sendo fontes de ética são fundamentadas
no fato de que para Boff (2003), a essência da existência não reside na razão – como foi
proposta pelos filósofos –, mas antes na paixão.

“A ética, para ganhar o mínimo de consenso, deve nascer da base


última da existência humana. Esta não reside na razão, como sempre se
pretendeu no Ocidente. A razão não é o primeiro nem o último momento
da existência. Por isso não explica tudo nem abarca tudo. Ela se abre para
baixo de onde emerge, de algo mais elementar e ancestral: a afetividade.
Abre-se para cima, para o espírito, que é o momento em que a consciência
se sente parte de um todo e que culmina na contemplação. Portanto, a
experiência de base não é “penso, logo existo”, mas “sinto, logo existo”.
Na raiz de tudo não está a razão (“logos”), mas a paixão (“pathos”).”
(BOFF, 2003).

8
É fato que vivendo em sociedade, faz-se necessário elaborar
certos consensos, restringir certas ações e desenvolver projetos
que visem à coletividade a fim de dar sentido e rumo à história.
Pois, não há sociedade seja no presente ou no passado que
consiga coexistir sem uma ética. (BOFF, 2008).
Mas, há de se concordar que ambas: ética e moral
apresentam objetivos muito semelhantes, pois irão alicerçar a
conduta dos seres humanos, definindo o caráter, favorecendo o
sentimento de solidariedade e fraternidade dentro de uma vida
em sociedade.

1.2 A Ética e a Liberdade


Como vimos, a ética está baseada em valores morais, que
estão a serviço de “dirigir” o comportamento humano para
a vida em sociedade.
A respeito da ética, Cortella (2011) afirma que ela é uma
questão incondicionalmente humana, visto que pressupõe
a possibilidade da escolha, da decisão, da opção. Então,
a partir da racionalidade, somos o único animal capaz
de realizar esta ação conscientemente – por isso, somos
Fonte: http://prasersincera.blogspot.com.
br/2009/03/como-fundar-etica-hoje.html
considerados: animais racionais.
Nessa perspectiva de sermos capazes, Cortella (2011) reforça a impossibilidade de se falar
em ética sem falar em liberdade. Logo, o livre arbítrio é imprescindível para que o ser humano
possa tomar para si o poder de decisão.
Então, para Cortella (2011), todos nós – inicialmente – temos a ética. Assim, para o autor
só pode ser considerado “aético”, ou seja, uma pessoa que não tem a ética, aquele que não
é capaz de exercer a plena liberdade de escolha – “como crianças até certa idade e idosos a
partir de determinada idade, ou ainda pessoas que tenham distúrbios mentais” – ou seja, não
a possui, devido à sua incapacidade de decidir, julgar e avaliar. Portanto, se a ética está ligada
aos princípios que regem a sociedade, aqueles que não seguem esses princípios, podem ser
considerados antiéticos. (CORTELLA, 2011, p.135).
Para o autor, ética é o modo como as pessoas compreendem as três grandes questões da
vida: eu devo, eu posso, eu quero?

“Tem coisa que eu devo, mas não quero, tem coisa que eu quero, mas
não posso, tem coisa que eu posso, mas não devo. Aqui, nestas questões,
vivem aquilo que a gente chama de dilemas éticos; todas e todos sem
exceção temos dilemas éticos, sempre, o tempo todo: devo, posso, quero?”
(CORTELLA, 2011, p. 136).

9
Unidade: Os Princípios Éticos e Políticos nos Movimentos Sociais

Explore

Para melhor entendimento dessas três grandes questões, assista ao vídeo “Filosofia explica o que é a
ética” que apresenta uma entrevista com Mario Sérgio Cortella no programa do Jô Soares.
https://www.youtube.com/watch?v=L_V0Y0lFJUs

Logo, a questão de liberdade de escolha está atrelada à ética, ou diretamente relacionada à


ética. Mas, observe que essa liberdade está condicionada ao bem-estar coletivo, já que vivemos
em sociedade. Como afirma Boff (2003):

“Faz-se mister uma ética comum, um consenso mínimo no qual todos


possam se encontrar. E, ao mesmo tempo, respeitar as maneiras diferentes
como os povos organizam a ética. [...]. A ética e as morais devem servir à
vida, à convivência humana...” (BOFF, 2003, p. 13,14).

E, ainda, a ética e a moral estão relacionadas aos tempos históricos, por isso, algo que
possa ser considerado antiético ou imoral em um determinado momento histórico, pode
não o ser em outro.

2. Os Regimes Políticos e a Questão da Ética


Desde a colonização até os dias atuais, o Brasil passou por diferentes regimes políticos. Na
época do Brasil Colônia, o regime político estava baseado na Monarquia, isto porque a forma
de governar visava à realeza – um só para todos. No Brasil Império, a forma de governar passou
a ser de alguns para todos – aristocracia. E no Brasil República, a forma de governo tornou-se
constitucional – de todos para todos, portanto, regime democrático.

Mas, será que podemos afirmar o Brasil passou a viver em plena democracia após
a proclamação da República em 1889?

A palavra democracia vem do grego: “demo = povo”, “kracia = governo”. Então, um


sistema político do povo para o povo, ou seja, o povo tem soberania sobre o poder legislativo
e executivo do país.

10
Para Pensar

O que você acha da atitude da Mafalda (da tirinha) frente o significado da palavra DEMOCRACIA?
Há fundamento para esse comportamento?

Aristóteles já alertava para o fato de que muitos modos de governar não tinham em vista o
bem comum.
É fato que o regime democrático no Brasil passou por vários momentos históricos e em muitos
deles ainda se via envolto das influências do poder econômico, apresentando inclusive fraudes
eleitorais. Desde a proclamação da República até os dias de hoje, foi possível ver avanços e
retrocessos no regime democrático.

Atenção
Não podemos esquecer que na época do Regime Militar, a democracia foi substituída
pela autocracia instituída durante esse regime político

Contudo, o movimento das “Diretas-Já” – apesar da derrota da


emenda das “Diretas-Já” em 1984, na Câmara dos Deputados, Carta Magna:
fazendo com que as eleições para presidente fossem mais uma vez No texto representa
realizadas pelo colégio eleitoral – resgata o real sentido do regime a Constituição da
democrático, com o início da “Nova República” e a promulgação República Federativa do Brasil.
da Carta Magna em 1988.
Como se deu a questão da ética nos diferentes regimes?
Como já pontuamos anteriormente, os princípios éticos modificam-se com o passar do tempo,
de acordo com as mudanças econômicas, sociais e tecnológicas. (VÁZQUEZ, 2000).
Na Unidade I, ressaltamos a mudança da luta pela sobrevivência (Homem X Mundo) pela
luta de interesses (Homem X Homem), ou seja, o “poder político”.

11
Unidade: Os Princípios Éticos e Políticos nos Movimentos Sociais

Analisando o termo “política”, temos sua origem na Grécia Antiga com a organização das
cidades-estados em “polis”, fazendo referência à organização da vida urbana. O dicionário
Aurélio define “política” como: a arte e ciência de bem governar, de cuidar dos negócios públicos.
Dessa maneira, podemos dizer que a busca pelo bem estar coletivo é algo que se encontra no
princípio tanto ético, quanto político.
Entretanto, há que se convir a contradição existente entre política e ética. Pois o que vemos
na política – desde os tempos da colonização do Brasil – não é a prática do bem comum, mas
o bem próprio dos detentores do poder. Inclusive, muitas vezes, daquele que elegemos como
nossos representantes.

Para Pensar
Ora, se no regime monárquico a forma de governo era de um só para todos, onde se concentrava
o principio ético?

É fato que desde os tempos da colonização de nosso país, assistimos a política de privilégios,
se nessa época esta se dava com a divisão das capitanias hereditárias aos nobres indicados
pelo próprio Rei português aqui no Brasil. No período Imperial, o favorecimento continuou e a
vontade da maioria da população não foi levada em conta.
No período Republicano, desde o início, o que se viu foi a elite
Coronelismo:
governando para a elite. Além do “coronelismo” que garantiu durante Forma de poder
muito tempo a dominação social através da alienação, mantendo o político consiste
poder econômico nas mãos de poucos. Foram anos da política “café na figura de uma liderança
com leite” até que se conseguiu colocar um civil para governar nosso local – o Coronel - que
define as escolhas dos
país. E, infelizmente, ainda hoje, vemos essa política de apadrinhamento eleitores em candidatos
e de coronelismo acontecer em nosso país, garantindo um poder por ele indicados.
elitista e antiético.
Daí, há de se concluir que a marginalização e a divisão da sociedade em classes faz parte
desse processo político que deixou à margem os princípios éticos e morais.
E, onde, reside a mudança dessa realidade senão na educação?
A escola tem como grande desafio, nos dias de hoje, resgatar valores morais e éticos na luta
por uma sociedade igualitária e justa, recuperando, ou seria melhor dizer, inserindo a junção
entre política e ética.
Não será, nessa expectativa, a afirmação de Mario Sérgio Cortella?

“...qualidade tem a ver com quantidade total, qualidade é uma noção social, qualidade
social só é representada por quantidade total, qualidade sem quantidade não é qualidade,
é privilégio.” (CORTELLA, 2011, p. 139).

12
3. Os Movimentos Sociais
Os movimentos sociais partem do princípio do
compromisso ético e de propostas que tenham como base a
participação social como parte integrante do desenvolvimento
da sociedade. Antigamente, os movimentos contrapunham as
opressões e a exploração dos governos, lutando por melhorias.
Na atualidade, os movimentos apresentam-se como forma de
Fonte site: http://www.anticapitalistes.net/spip. denunciar as contradições existentes na sociedade capitalista.
php?article2872

Os movimentos sociais “possuem identidade, têm opositor e articulam-se ou fundamentam-


se em um projeto de vida e de sociedade” (GOHN, 2011, p. 336), apresentam-se como formas
de reivindicações sociopolíticas na busca por reformas que visem à qualidade das relações
sociais. Essas são representadas por interesses comuns e projetos sociais.

“A educação de um povo consiste no processo absorção, elaboração


e transformação da cultura existente, gerando a cultura política de
uma nação. [...]... vários elementos da cultura política brasileira do
final do século XX foram gerados no período colonial e constituem,
atualmente, obstáculos para a modernização das relações sociais no
país.” (GOHN, 2012, p. 174).

Os movimentos sociais podem ter uma organização formal ou informal. Muitos, inicialmente,
ocorrem de maneira informal e à medida que vão se tornando mais consistente torna-se, também,
necessária maior formalização das ações dentro desses movimentos. Nessa estruturação dos
movimentos sociais, é possível observar que eles não se realizam no vácuo, ao contrário, são
iniciados a partir de projetos, possuem ideologia e apresentam certa organização. Porém, não
queremos com isso fazer uma generalização, visto que há singularidades na constituição de
cada movimento social e como já estudamos nas unidades anteriores, muitos apresentavam
problemas em sua organização.
Gohn (1997) atenta para o fato de haver movimentos de diferentes classes e camadas sociais,
sendo que o caráter do movimento será indicado pelo tipo de ação envolvida podendo-se
assim, separá-los em categorias.
Assim, a autora realiza a seguinte categorização:
• Os movimentos sociais que são construídos a partir da origem social da instituição (a igreja,
o partido, o sindicato, a escola, etc.).
• Os movimentos sociais construídos a partir das características presentes na natureza
humana: sexo, idade, raça e cor.
• Os movimentos sociais construídos a partir de determinados problemas sociais (saúde,
transportes, habitação, etc.).
• Os movimentos sociais construídos em função de questões da conjuntura das políticas de uma
nação sejam elas socioeconômica, cultural, etc. (insurreições, revoltas, motins, revoluções, etc.).
• Os movimentos sociais construídos a partir de ideologias. (o anarquismo, o marxismo, o
cristianismo, etc.).

13
Unidade: Os Princípios Éticos e Políticos nos Movimentos Sociais

As formas de ação dos movimentos sociais podem variar de uma simples denuncia passando
pela pressão direta com mobilizações, concentrações, passeatas e etc., e podem chegar até a
pressão indireta. Na atualidade, as lutas estão relacionadas a um ideário civilizatório contra a
exclusão e por novas culturas de política de inclusão. Eles possuem grande poder de controle
social, pois tematizam e redefinem a esfera pública, além de realizar parcerias com outras
entidades da sociedade civil e política, construindo modelos de inovação social. (GOHN, 2011).
Surgem outras formas de organização popular, a partir dos anos de 1990, como os Fóruns –
nos quais se definem metas e objetivos para solucionar problemas sociais, a partir dos grandes
diagnósticos – com encontros nacionais em larga escala; outra forma de organização popular
são as parcerias entre sociedade civil organizada e poder público – atuando nas questões
relacionadas à gestão dos negócios públicos com a participação dos cidadãos. (GOHN, 2011).
Essas mudanças organizacionais vêm crescendo nas ultimas décadas. Segundo Gohn (2012),
na primeira década do século XXI a estrutura dos principais movimentos sociais apresenta-se
em três formatos organizativos:
• os movimentos identitários;
• os movimentos de luta por melhores condições de vida e de trabalho;
• os movimentos globais ou globalizantes.
Optamos por fazer uma sucinta exposição desses formatos – de acordo com os estudos da
autora –, isto porque os mesmos serão revistos de forma mais intensa na próxima Unidade.
Segundo a autora, nos movimentos identitários – chamados de “Novos Movimentos Sociais”
(NMS) – a luta é por direitos sociais, econômicos, políticos e, mais recentemente, culturais. São
compostos pelos segmentos sociais excluídos, os quais podem, ou não, pertencer às camadas
populares. Incluem-se “nesse formato as lutas das mulheres, dos afrodescendentes, dos índios”,
entre outros. (GOHN, 2012, p. 226).
O segundo formato diz respeito à luta demanda do acesso às condições de moradia, por terra,
alimentação, emprego, salário, educação, entre outros. Também se enquadram no movimento
de luta por melhores condições de vida, os movimentos e organizações sociais contra a violência
e em favor da paz. E, ainda, “os movimentos sociais, criados a partir da conjuntura atual,
articulados com ONGs e voltados para as questões relativas à democratização do Estado ou das
políticas públicas.” (GOHN, 2012, p. 230).
Os movimentos globais ou globalizantes são pertencentes ao novo milênio e foram
estruturados ao longo dos anos de 1990, com a internacionalização de muitas lutas sociais.
Esses movimentos atuam virtualmente em “redes sociopolíticas e culturais por intermédio de
fóruns, plenários, colegiados e conselhos”, extrapolando as fronteiras nacionais e apropriando-
se das transformações tecnológicas. (GOHN, 2012, p. 231).
Portanto, os movimentos sociais abarcam uma série de questões sociais através das lutas,
denotando o compromisso com que adentram na sociedade trazendo consigo um inalienável
caráter ético e político. Isto porque, carrega em seu cerne o princípio do “bem comum”.

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Material Complementar

Para complementar seu estudo, visite o site abaixo e leia o artigo sobre a
importância dos movimentos sociais para o fortalecimento da democracia.
http://migre.me/ex1mP

Explore

Explore um pouco mais sobre a ética e a política no Brasil, a partir do texto de Ludmila Coelho
Loiola, visitando o site:
http://www.webartigos.com/artigos/etica-e-politica-brasileira/5829/#ixzz2KnN4werU

Para conhecer um pouco mais sobre a ética e a moral, acesse:


https://www.youtube.com/watch?v=SJ-KxHrF4vo&list=PLF004C1BA81FF0F0E
E assista a um vídeo do Novo Telecurso Ensino Médio - Filosofia

15
Unidade: Os Princípios Éticos e Políticos nos Movimentos Sociais

Referências
BOOF, Leonardo. Ética e moral: a busca dos fundamentos. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003.
_________. Como fundar a ética hoje? – Folha de São Paulo –UOL. Disponível em: www1.
folha.uol.com.br/fsp/opinião/fz1506200309.htm. Acesso em: 09 fev. 2013.
_________. Saber cuidar: ética do humano: compaixão pela Terra. 14 ed. Petrópolis: Vozes,
2008.
CORTELLA, Mario Sérgio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e políticos.
14. ed. – São Paulo: Cortez, 2011.
VÁZQUEZ, Adolfo Sanchez. Ética. 20. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.
GOHN, Maria da Glória. História dos movimentos e lutas sociais: a construção da cidadania dos
brasileiros. – 7. ed. – São Paulo: Edições Loyola, 2012.
___________. Movimentos sociais na contemporaneidade. Revista Brasileira de Educação. v. 16
n. 47 maio-ago. 2011. p. 333-361.
___________. Teoria dos movimentos sociais, paradigmas clássicos e contemporâneos.
São Paulo: Edições Loyola, 1997.

16
Anotações

17
www.cruzeirodosulvirtual.com.br
Campus Liberdade
Rua Galvão Bueno, 868
CEP 01506-000
São Paulo SP Brasil
Tel: (55 11) 3385-3000
Educação,
Movimentos Populares
e Transformação
Material Teórico
O protagonismo da sociedade civil

Responsável pelo Conteúdo:


Profª. Ms. Wanderli Cunha de Lima

Revisão Técnica:
Prof.ª Me. Denise Jarcovis Pianheri

Revisão Textual:
Profª. Dra. Maria Isabel Andrade Sousa Moniz
O protagonismo da sociedade civil

• Os movimentos populares e sociais no


Brasil: ontem e hoje

• A institucionalização no Brasil

• As ONGs e o Terceiro setor

Serão apontadas algumas alterações ocorridas nos movimentos


sociais e populares. Você terá a oportunidade de conhecer
um pouco mais sobre os novos movimentos sociais e o novo
associativismo civil.
Iremos conhecer um pouco mais sobre as singularidades
existentes na institucionalização das práticas civis ocorridas no
Brasil nas últimas décadas. E os ideais dos movimentos sociais
e populares durante os séculos XVIII, XIX e XX. Destacamos as
mudanças ocorridas nos movimentos decorrentes do contexto
político ao longo da década de 1990 e partir do início do século
XXI. Finalizamos a unidade mostrando como o terceiro setor vem
despontando no cenário social brasileiro e concluímos apontando
a importância da educação dentro de todo esse contexto.

Aproveite para consolidar suas aprendizagens, pois nesta unidade retomaremos alguns estudos
já realizados nas unidades anteriores, a fim de favorecer a compreensão do protagonismo,
bem como as mudanças decorrentes da conjuntura sociopolítica do nosso país. Bom estudo!

5
Unidade: O protagonismo da sociedade civil

Contextualização
Nesta unidade, procuramos “amarrar” os conteúdos das quatro unidades, trazendo para a
discussão questões que revelassem o protagonismo da sociedade civil.
Dentro deste contexto, apontamos as alterações ocorridas de acordo com as mudanças
sociopolíticas do nosso país.
É claro, muito mais há que se falar e estudar sobre o assunto, mas acreditamos que esta
unidade servirá de incentivo para futuros aprofundamentos, não só de estudos sobre o tema,
mas que seja também uma sementinha e favoreça sua participação na sociedade civil. Afinal,
como educadores, não podemos nos situar na neutralidade, não é?!

Explore

Com o propósito de ilustrar a possibilidade do que estamos argumentando, sugerimos que assistam
ao vídeo “Por uma Barcarena justa, democrática e sustentável”.
O vídeo mostra a proposta de implantação de um Fórum de diálogo na busca de mudanças socio-
ambientais no município de Barcarena, na região do Amazonas. Esta proposta foi motivada pelas
disparidades entre a riqueza gerada no município pela industrialização e a negação dos direitos bási-
cos, vivida pela população local.
Servindo de exemplo, ele mostra como a sociedade civil pode se tornar protagonista frente aos pro-
blemas sociais.
Assista e reflita sobre a possibilidade de fazer a diferença na sociedade civil.
http://www.youtube.com/watch?v=SblCTOofbVo

6
1. Os movimentos populares e sociais no Brasil: ontem e hoje

agencia Brasil
Iniciaremos esta unidade discorrendo sobre o
conceito de sociedade civil a partir dos estudos de
Gohn (2005) e faremos pontuações sobre algumas
diferenças entre os movimentos populares e
movimentos sociais.

Assim como outros conceitos, também o conceito de sociedade civil vem se alterando
ao longo do tempo. Segundo Gohn (2005), esse conceito passou por muitas reformulações,
adquirindo maior destaque no final dos anos de 1970. Nesse período, havia a crença de que
a sociedade civil deveria se mobilizar e organizar, com a finalidade de alterar o regime militar
vigente. O eixo articulador era a noção de autonomia.
Nos anos de 1970 e 1980 houve destaque dos movimentos que surgiram para reivindicação
de bens e serviços, de terra e moradia, tendo por identidade a exigência de mais liberdade e
justiça social (GOHN, 2005).

Ideias Chave
Os movimentos formados por grupos e organizações da sociedade civil que atuavam em busca de
mudanças pela coletividade foram denominados “movimentos populares”. Nesses, lutava-se por
garantias de direitos, os quais poderiam se transformar em políticas públicas permanentes e de uso
coletivo. Ideologicamente, atuavam contra as classes dominantes.
Já os movimentos sociais tinham como característica a mobilização de massa. Sua atuação
representava uma dimensão mais ampla a partir de lutas por garantia de direitos em várias frentes.
Desta forma, pode-se afirmar que não existe simplesmente um posicionamento ideológico, mas,
principalmente, um posicionamento político, no que diz respeito aos movimentos sociais.

Nos séculos XVIII, XIX e XX, a maioria dos movimentos sociais foi marcada pelas lutas
contra o governo, seja pela contrariedade às arbitrariedades do governo, seja pela conquista de
direitos, pela democratização, ou outras. Esses movimentos eram compostos – em sua maioria
– pela população mais pobre, que tinha maior privação de direitos (e/ou “benefícios”) sociais.
Como já apresentamos na unidade II, as lutas na primeira metade do século XIX eram
oriundas de outras, que as antecederam, no século XVIII.
Na primeira metade do século XIX, houve várias lutas, movimentos e rebeliões nativistas
que contribuíram para a construção da cidadania do nosso país. Foram movimentos voltados
para questões relativas à luta pela mudança do regime político ou dos governos locais. Nesse
período, o sistema escravocrata não era contestado.
Na segunda metade do século XIX, muda-se o olhar e se inicia a luta em prol da liberdade
humana, tendo as questões dos escravos como eixo central de muitas lutas. Também se podem
observar movimentos de auxílio mútuo e contra o fisco.

7
Unidade: O protagonismo da sociedade civil

Gohn (2012) afirma que, no geral, foram os ideais democráticos liberais que impulsionaram
os movimentos até o século XIX. Mas a autora pontua que também houve movimentos
conservadores nessa época (os movimentos conservadores fundamentavam-se em ideologias
antidemocráticas ou elitistas).

Importante
É importante atentarmos para o fato de que as lutas e os movimentos situavam-se nas questões
sociais de cada época.
Assim, temos na história do nosso país, nas décadas e séculos anteriores, movimentos organizados
para combater ou conquistar o Estado.
O Brasil passou por um longo tempo de lutas e movimentos e “durante os primeiros séculos
objetivavam a inclusão dos excluídos”, sendo estes os pobres que, em geral, estavam excluídos do
“sistema socioeconômico mais amplo, dos deserdados e dos sem-direitos ao sistema legal-jurídico
existente”. (GOHN, 2012, p. 160).

Conforme já foi observado por alguns autores, os movimentos são a forma que as pessoas
(ou cidadãos) utilizam para reivindicar, quando desejam que seus interesses e anseios sejam
vistos e reconhecidos. Pode ser considerada a forma mais legítima de manifestação popular.
É interessante observar que, no âmbito das conquistas sociais, os movimentos se fazem
presentes em vários acontecimentos históricos. Essas ações decorrentes dos movimentos
históricos contribuem para a modificação de comportamentos e de regras existentes no
sistema político. Com isto, podemos afirmar que a influência exercida pelos movimentos
ultrapassa os efeitos políticos que os mesmos produzem, ou seja, contribuem para as
transformações sociais em nosso país.
Nos anos de 1960 e 1970 foram muitos os movimentos sociais e
populares no Brasil, os quais tinham por objetivo a mobilização de defesa,
a conquista e a ampliação dos direitos civis, políticos, sociais e trabalhistas.
(DURIGUETTO, 2005).
Num plano mais diretivo, podemos afirmar que foi a partir dos anos de 1970
que se acentuou a luta pela redemocratização do Brasil.
Podemos citar ainda os movimentos estudantis e sindicais na década de 1970,
agencia Brasil marcados, especialmente, por greves dos metalúrgicos nas indústrias de São Paulo.
A partir dos anos de 1980, vemos a aparição dos movimentos sociais voltados para
outras questões, como as ambientais (Movimentos ecológicos) e de defesa do consumidor
(Movimento em defesa dos direitos do consumidor), incluindo parcelas mais amplas da
sociedade civil. Portanto, o protagonismo dos movimentos sociais foi muito forte e presente
até a década de 1980.

8
Nos anos de 1980, as lutas se articulavam num panorama de busca de
mudanças político-sociais, de ordem estrutural. Havia um projeto político
implícito. Existiam outros referenciais e o modelo socialista era o grande
inspirador. (GOHN, 2012, p. 205).

Com a saída dos militares, em 1985, há uma ressignificação do conceito de sociedade civil e
os movimentos começam a perder a centralidade. Desse modo, observa-se que o “sujeito social
histórico”, até então, protagonista dentro do processo de transformação social, começa a sofrer
uma fragmentação (GOHN, 2005).

Observa-se que ao final dos anos de 1980 – coincidentemente ou não, com a conquista
da nova Constituição de 1988 – e ao longo dos anos de 1990, com as transformações do
contexto político, os movimentos sociais começam a apresentar mudanças no perfil das
lutas, apresentando um declínio das manifestações de rua, que proporcionavam visibilidade
aos movimentos populares. Houve uma rearticulação interna e externa no papel que eles
desempenhavam na sociedade, entrando em cena outros atores sociais, como as ONGs e
outras entidades do terceiro setor (GOHN, 2012).

Gohn (2012) faz referência a alguns fatores, tanto de ordem interna como de ordem externa,
que levaram ao enfraquecimento dos movimentos sociais.

A queda do muro de Berlim, as mudanças políticas na ex-Rússia, a


descrença nas utopias, a crise do modelo cubano, etc., levaram ao
enfraquecimento, e abandono pela maioria, daquele projeto político.
Causas internas, presentes no interior dos movimentos sociais também
devem ser consideradas. Elas dizem respeito ao clima de competição e
de disputas internas, de divergências político-ideológicas, da adoção de
modelos centralizadores, tidos como verdadeiros, que são “aplicados”
no trabalho junto às bases, sem respeitar a diversidade cultural destas
mesmas. (GOHN, 2012, p. 205-206).

Essas considerações da autora conduzem ao entendimento das mudanças tendo por base a
modificação do modelo referencial nos anos de 1990, com ênfase nos valores éticos e morais,
visto que a sociedade passou “a desacreditar da política, dos políticos e das ações do Estado em
geral.” (GOHN, 2012, p. 206).

[...]. o saldo disto tudo apresenta um resultado paradoxal: o que foi ganho
na década de 1980, a organização da sociedade brasileira em vários níveis
e instâncias, pois este mesmo período foi considerado como perdido do
ponto de vista econômico, passou a ser o grande complicador nos anos de
1990. Isto porque houve alterações na hierarquização dos valores sociais
no conjunto da sociedade. (GOHN, 2012, p.206).

9
Unidade: O protagonismo da sociedade civil

Desta forma, os grupos da sociedade civil – impulsionados pelo desejo de alterações pontuais,
como os de liberdade e de autodeterminação para expressar as individualidades, contrapondo-se
à política nacional, devido a sua descrença – passa a acreditar cada vez mais em sua capacidade
de atuação independente. Neste modelo “o plano da moral e da cultura ganham lugar central
nas ações coletivas”. (GOHN, 2012, p. 207).
Esses novos atores sociais aparecem com uma forma de organização mais institucionalizada e
apresentavam iniciativas de parcerias entre a sociedade civil organizada e o poder público (GOHN, 2004).
Com a democracia, altera-se o eixo estruturante – antes representado pela autonomia dos
membros da sociedade civil –, conferindo ao conceito de cidadania lugar de relevância. Assim,
há um descentramento do sujeito social, emergindo uma pluralidade de atores sociais.
A partir dos anos de 1990, o termo cidadania passa a fazer parte dos discursos oficiais, tendo
seu significado voltado para a ideia de participação civil.
Vemos, pois, que os movimentos sociais nos séculos XIX e XX desempenharam papel
fundamental no processo democrático de nosso país, levando-o a transformações sociais a
partir de suas mobilizações reivindicativas dos direitos dos cidadãos.
Nesse sentido, vemos a capacidade de conscientização, mobilização e participação política
existente nos movimentos sociais dos quais a sociedade civil se apresenta como protagonista.

2. A institucionalização no Brasil
As conquistas realizadas nos últimos séculos tiveram como protagonista a sociedade civil. Esta
se organizou nos decorrer dos tempos em busca de seus direitos à cidadania e à democracia.
Neste cenário, a Constituição de 1988 apresenta-se como um marco histórico e se revela como
uma vitória no que tange ao combate a um regime autoritário e repressivo, assegurando o
direito à participação social.

Explore

Foram várias lutas até que o povo brasileiro chegasse à conquista da democracia. Mesmo esta não
sendo plena, apresentando desvios, há que se convir que a conquista foi grande. Para ilustrar os
avanços conquistados com os movimentos sociais, sugerimos que você assista a este vídeo, que faz
um breve resgate da ditadura e da luta pela democracia.
http://www.youtube.com/watch?v=F61-9JuzVR4

Presenciou-se, nas duas últimas décadas, a institucionalização de práticas civis em espaços


públicos. No Brasil, muitas foram as inovações democráticas conduzindo a uma reorganização
da participação civil.

10
A partir dos anos de 1990, os movimentos sociais começam a enfraquecer e perdem um
pouco de sua autonomia, desta forma precisam alterar suas práticas deixando o caráter crítico e
reivindicativo para tornarem-se mais propositivos. Com isso, vê-se uma inversão da relação entre
os movimentos sociais e as ONGs. Também nesta época, desponta no cenário do associativismo
nacional outro ator social: as fundações e organizações do Terceiro Setor (GOHN, 2011).
Destarte, “os projetos sociais passam a ser eixos de mobilização e articulação de demandas e
pessoas, articulados/gerenciados por ONGs e entidades do terceiro setor” (GOHN, 2011, p. 228).
Assim, no Brasil, a institucionalização foi construída, histórica e concomitantemente, com o
processo de democratização da nossa sociedade.
Gohn (2011) divide esse processo em dois momentos, sendo o primeiro resultado das
trajetórias de lutas para implantar as conquistas constitucionais, ainda nos anos de 1990. Deste
momento, destacam-se os Conselhos Gestores e outros espaços institucionais.

No plano institucional do cenário do associativismo na sociedade política


governamental, as principais novidades desse período foram: a criação dos
Orçamentos Participativos (OPs) em prefeituras administradas pela oposição
ao governo federal da época, tendo Porto Alegre e o Partido dos Trabalhadores
(PT) como exemplos principais; e a implementação de conselhos gestores
setoriais, com a participação da sociedade civil. (GOHN, 2012, p. 218)

No início, os conselhos foram vistos como instrumentos com potencial de transformação


política, porque seriam uma forma de expressão, representação e participação de segmentos
sociais na formulação de políticas públicas. Davam à população acesso a esses espaços de
decisão, possibilitando a ela exercer controle social sobre o estado (GOHN, 2011).
Conforme observou a autora, se esses conselhos fossem efetivamente representativos, eles
realmente poderiam imprimir um novo formato às políticas públicas. Entretanto, vários pareceres
oficiais notabilizaram apenas o caráter consultivo dos conselhos, desta forma, suas ações ficavam
restritas ao campo da opinião, da consulta e do aconselhamento, descaracterizando sua função
deliberativa e paritária.

Importante
É importante atentarmos para o fato de que mesmo quando há a paridade nos conselhos, muitas
vezes as reuniões destes são articuladas de modo que não proporcionam condições verdadeiras
para que se efetive a participação da sociedade civil. Isto ocorre, muitas vezes, por essas reuniões
acontecerem em horário comercial – horário em que os cidadãos participantes podem encontrar-se
no trabalho – inviabilizando sua participação nos conselhos. Outras vezes, a ausência dessa parcela
de representante – a sociedade civil – se dá devido à falta de condições financeiras, visto que estes
muitas vezes não têm sequer o dinheiro da passagem do ônibus para chegar ao local da reunião (que
na maioria das vezes são realizadas nas dependências de órgãos públicos, em locais da área central
das cidades, dificultando a participação dos moradores da periferia).

11
Unidade: O protagonismo da sociedade civil

Nos municípios sem tradição organizativa-associativa, os conselhos passaram


a ser apenas uma realidade jurídico-formal, e muitas vezes um instrumento a
mais nas mãos dos prefeitos e das elites, falando em nome da comunidade,
como seus representantes oficiais, não atendendo minimamente aos
objetivos de serem mecanismos de controle e fiscalização dos negócios
públicos. (GOHN, 2011, p. 231).

O segundo momento na institucionalização das


Deliberativo:
políticas públicas se deu a partir do ano 2000,
Capaz de deliberar; resolver
com a ampliação das formas de gestão deliberativa após discussão, ponderação.
inovando no campo da participação popular
democrática. Nesse período se redesenhou o formato Paritário:
de várias políticas sociais, com a generalização de Em que os elementos com direito
a voto pertencem a dois grupos
fóruns e conferências nacionais. Nesse contexto,
igualmente representados.
incorporou-se o uso das novas tecnologias.
Com isso “o campo do social passou a ser dominado por comunidades organizadas em
projetos sociais” (GOHN, 2011, p. 233). Neste formato, o poder da comunidade é visto como
uma parcela da sociedade civil organizada, que diferentemente dos anos de 1980, não se
encontra contra o Estado, mas agora participa e interage com os poderes constituídos, e segundo
Gohn (2011), parte da força das comunidades advém dessa interação.
Desta forma, a participação da sociedade civil torna-se de suma importância para a
democratização da gestão pública.

3. As ONGs e o Terceiro setor


Os sujeitos coletivos, antes existentes nos movimentos sociais, com as mudanças sociais,
convergem para uma parceria entre a sociedade civil e o Estado, e assim há uma fragmentação
de sua força coletiva em vários campos isolados.
É justamente a partir dessas mudanças – como já sinalizamos anteriormente – que surge a
institucionalização das ações coletivas, passando de processos de mobilização de massas para o processo
de mobilizações pontuais. É nesse contexto que emerge o novo universo das ONGs no terceiro setor.
A caracterização das ONGs se altera na última década do século XX. Durante a luta contra o
regime militar e pela democratização do país, nos anos de 1970 e 1980, as ONGs eram apenas
instituições de apoio aos movimentos sociais e populares. Nessa fase, elas se posicionavam por
detrás deles, com a preocupação de fortalecer a representatividade das organizações populares.
Eram ONGs cidadãs, movimentalistas, militantes, que ajudavam a própria organização popular a
estruturar-se, muitas vezes trabalhando na conscientização dos grupos organizados (GOHN, 2004).
Com a diversificação e ampliação da organização da sociedade civil, no início dos anos
de 1990, surgem entidades autodenominadas de “Terceiro Setor”, com ideologia e projetos
políticos definidos.

12
Dentro deste cenário, as ONGs “saem da sombra e colocam-se à frente e até mesmo na
dianteira dos movimentos, tornando-se, em alguns casos, instituições autônomas e desvinculadas
dos movimentos” (GOHN, 2004, p. 146).
Essas organizações, articuladas por empresas, bancos, redes de indústria e comércio, ou
por artistas famosos, passaram a realizar projetos em parceria com o Estado, atuando junto
às populações tidas como mais vulneráveis. Os projetos realizados contavam com apoio de
recursos financeiros públicos (oriundos de inúmeros fundos públicos que foram criados) e
privados, tendo em sua composição uma equipe de profissionais capacitados, selecionados por
suas competências de trabalho e não por suas ideologias (GOHN, 2004, 2010, 2012).
A conjuntura econômica, a partir de 1995, contribuiu para a mudança da dinâmica dos
movimentos sociais e das ONGs. Muitos movimentos incorporaram-se às ONGs que os apoiavam
ou então transformaram-se em ONGs.

Na segunda metade da década de 1990, [...], novos ingredientes foram


acrescentados alterando ainda mais a dinâmica dos movimentos sociais,
em geral, e dos populares, em particular. Começo citando as crises internas,
em movimentos populares e ONGs cidadãs, que os levaram a repensar seus
planos, planejamentos de ação, estratégias e forma de atuar. [...]. Algumas
entidades de apoio aos movimentos até fecharam suas portas; outras fizeram
enxugamentos, em termos de regiões de atuação, fundiram-se a outras ou,
ainda, deslocaram suas áreas de atuação para setores específicos, dentro do
leque dos programas sociais institucionalizados, governamentais ou de apoio
advindo da cooperação internacional.

Com isso, uma das mudanças observadas foi a introdução de novas pautas orientadas
por agências internacionais de fomento para as políticas sociais. Essas agências indicavam o
trabalho com “os setores tidos como excluídos e em situação de vulnerabilidade socioeconômica,
subdivididos segundo as questões de gênero, etnia, idade, etc.” (GOHN, 2012, p. 219).
Devido às dificuldades relativas a estruturas mínimas e às novas demandas e regras da
cooperação internacional, não havia mais disponibilidade de tempo para articulações com a
população. Outros fatores, como o desemprego, o aumento da violência urbana, ou ainda os
poderes paralelos do narcotráfico nas regiões pobres, desmotivaram a participação da população
pobre nos movimentos (GOHN, 2012).

Importante
É importante ressaltar que a atuação do terceiro setor tem apresentado um dualismo, pois de um
lado reforça as políticas sociais compensatórias – visto que assume um papel de intermediário das
ações assistenciais do governo – e de outro lado, atua como espaços associativos, imprimindo a
solidariedade e também a conscientização da população acerca dos problemas sociais e políticos da
realidade, atuando dentro de um campo educativo da população.

13
Unidade: O protagonismo da sociedade civil

Relembrando o estudo da unidade anterior, temos que na primeira década do século XXI
os movimentos sociais passaram a se estruturar de diferentes formas. Gohn (2012) separa
em três categorias distintas: 1) a categoria dos movimentos identitários, 2) a categoria dos
movimentos por melhores condições de vida e de trabalho e 3) a categoria dos movimentos
globais ou globalizantes. A autora ainda acrescenta as ações e as redes cidadãs, que também se
apresentam como movimentos sociais. Contudo, segundo ela, “são na realidade organizações
civis que atuam em fóruns, conselhos, câmaras, consócios, em escala local, regional, nacional,
etc.”, fazendo parte do que vem sendo chamado de participação social institucionalizada
(GOHN, 2012, p. 232).

Esses “Novos Movimentos Sociais” (NMS) trazem à tona novas formas de participação
social. “Conselhos, conferências nacionais e assembleias organizadas por esferas do poder
público são outras arenas de participação no novo associativismo civil deste novo milênio”
(GOHN, 2012, 232).

Mas, como já foi pontuado, ainda há muitas lacunas referentes à participação da sociedade
civil nesses NMS. Para Gohn (2012), os conselhos, conferências e assembleias, enquanto
participação social institucionalizada, devem ser espaços políticos de formação e não apenas
um local para repasse de informações.

Por exemplo, eles devem ser dotados de recursos, ter cursos voltados para a
formação, e não ser mero repasse de informações (lembrando que o exercício
em si já é um processo formativo; há um caráter educativo nele); eles são
espaços políticos de formação, visibilidade das demandas, clarificação dos
cidadãos organizados que atuam como atores políticos, interagem com os
poderes instituídos, não são apenas usuários (muitas vezes seus participantes
são vistos como usuários), devem ter direito a falar, e não só a ouvir. Uma
interlocução pública, que se supõe transparente, pressupõe também que os
conselhos sejam qualificados; eles têm de ter legitimidade, autoridade moral
para ter representatividade. (GOHN, 2012, p. 232-233).

Há que se ressaltar que o que se propõe nada mais é do que o caráter deliberativo e paritário,
onde os representantes da sociedade civil possam exercer o controle social democrático partindo
de uma gestão compartilhada.

Essa nova formação sugerida por Gohn deve estender-se não somente ao representante da
sociedade civil, mas também ao funcionário do Estado, visto que se trata de uma nova cultura:
de gestão compartilhada. Portanto, de um novo processo de aprendizagem. Este deve ser
discutido por ambos os lados, para que se construa uma cultura de compartilhamento. Em uma
gestão compartilhada não basta incluir a participação, é preciso que seu sentido e significado
sejam discutidos a fim de que se alcance a qualificação (GOHN, 2012).

Gohn (2012), em seus trabalhos, destaca a importância da educação não-formal, apoiada em


Paulo Freire no que tange às suas críticas à educação bancária, que muitas vezes não capacita,
não habilita, porque não gerou de fato a construção de novos saberes e, dessa forma, não
propiciou novas práticas.

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Encerramos esta unidade deixando alguns questionamentos
que julgamos ser pertinentes ao nosso estudo sobre Educação,
Movimentos Populares e Transformação: e a nós educadores,
o que nos cabe? Qual a nossa função frente a essas novas
demandas sociais? Como operacionalizar o aprendizado?
Será que isso é possível?
Qual caminho seguir?!

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Unidade: O protagonismo da sociedade civil

Material Complementar

Para saber um pouco mais sobre a diferença entre movimento popular e movimento
social, acesse o site abaixo e leia o artigo que discorre sobre o assunto.
https://bit.ly/3pk1sPY

Assista ao vídeo abaixo e reflita sobre a importância da redemocratização. As


imagens ilustram os avanços e retrocessos vividos e a música que as acompanha
serve de referencial em nossa profissão de educador.
https://goo.gl/dzw2dB

E que tal uma sugestão de filme para contextualizar o que estudamos nesta unidade?!
Minha sugestão é: “Escritores em liberdade”, um filme que retrata a crença de uma
professora na mudança do ser humano através da educação. Apesar de ser um
exemplo de poder transformador a partir da literatura, o que chama a atenção
e serve de “inspiração” para nós é o fato de que o educador tem na educação
ferramentas para a transformação social.
Vale a pena conferir!

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Referências

CORTELLA, Mario Sérgio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos


e políticos. 14.ed. São Paulo: Cortez, 2011.

DURIGUETTO, M. L. Sociedade civil, esfera pública, terceiro setor: a dança dos


conceitos. Serviço Social & Sociedade. Juiz de Fora: Cortez, n. 81, mar. 2005. Disponível em:
<www.uniesp.edu.br/revista/revista9/pdf/artigos/18.pdf> Acesso em: 28 dez 2012.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São


Paulo: Paz e Terra, 1997.

GADOTTI, Moacir. Pedagogia da práxis. 5. Ed. São Paulo: Cortez, 2010.

GOHN, Maria da Glória. História dos movimentos e lutas sociais: a construção da


cidadania dos brasileiros. 7. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2012. Disponível em: <http://
www.periodicos.ufsc.br/index.php/politica/article/view/2175-7984.2011v10n18p233> Acesso
em 15 fev. 2013.

________. Participação de representantes da sociedade civil na esfera pública na


América Latina. Política & Sociedade. Santa Catarina. Vol. 10 – nº 18 – abri 2011. P. 223-244.

_______. Sociedade civil no Brasil: movimentos sociais e ONGs. Colombia: Nómadas.


Universidad Central. (COL), nº 20, 2004, p.140-150. Disponível em <HTTP://redalyc.uaemex.
mx/src/inicio/ArtPdfred.jsp?iCve=105117734013> Acesso em 16 fev. 2013.

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Unidade: O protagonismo da sociedade civil

Anotações

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