Nota da autora
Olá, querida leitora!
É um prazer imenso ter você em mais uma das minhas
histórias. E, se essa é sua primeira vez por aqui, seja muito bem-
vindo ao meu universo!
Essa história nos transporta para um cenário que eu
simplesmente amei explorar: aquele clima delicioso do ambiente
universitário, mas com personagens que já enfrentaram a vida o
suficiente para serem intensos, apaixonantes e… um pouco
quebrados.
Aqui você vai encontrar um romance cheio de reviravoltas, emoções
à flor da pele e momentos que, eu espero, te façam suspirar do
começo ao fim.
Ah, e um aviso importante: esse é apenas o primeiro casal
dessa jornada! Em breve, outro casal arrebatador vai chegar para
completar essa duologia incrível em parceria com uma autora que
admiro demais.
Os livros são independentes, então você pode ler em qualquer
ordem, mas confesso que, juntos, eles formam algo ainda mais
especial.
Com carinho,
Adri Luna
Sumário
Nota da autora
Dedicatória
Sinopse
Prólogo
01
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Epílogo
Leia Também
Agradecimento
Copyright © 2024 Adri Luna
Revisão: Sonia Carvalho
Diagramação: Adri Luna
Leitora beta: Carla Freitas e Ana Elói
Livro registrado na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, em abril de 2025.
Recife – Pernambuco, Brasil, 2025.
Todos os direitos reservados. Informamos que todos os direitos desta obra são
reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte ou
personagens deste livro, sem a autorização prévia da autora por escrito e
registrada, poderá ser reproduzido ou transmitido, seja em quais forem os meios
empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros.
Esta é uma obra fictícia, quaisquer semelhanças com pessoas reais vivas ou
mortas é mera coincidência.
CONTATO:
E-mail: [email protected]
Instagram: @autoraadriluna
WhatsApp: Entrar no grupo
Dedicatória
Para Andressa Duarte, Logan Donovan, com toda sua arrogância irresistível, o
coração ferido e instinto protetor é seu com todo o carinho e uma pequena
advertência: cuidado com o sorriso torto, ele é perigoso.
Para vocês, minhas leitoras que estão agora com o livro nas
mãos e o coração pronto para se apaixonar…
Essa história é sua.
Foi escrita com lágrimas, risadas soltas e muita entrega. Com
personagens que nasceram no caos da minha mente e encontraram
abrigo no colo das leitoras mais incríveis que eu poderia ter.
Obrigada por me permitir invadir suas noites, seus suspiros, e
até seus sonhos com personagens fictícios (eu entendo, eu também
me apaixonei por pelo Logan).
Se em algum momento você sentiu o coração acelerar, os
olhos marejarem ou aquela vontade louca de gritar “beija logo!”,
então saiba:
você viveu essa história comigo.
E não existe presente mais bonito que esse.
Com todo o meu amor, Adri Luna.
Sinopse
Enemies to lovers + fake Dating + mocinho possessivo e ciumento +
Second Chance
Um acordo perigoso. Um erro imperdoável. Um amor que pode
ter chegado tarde demais.
Depois de um acidente que arruinou sua carreira no gelo,
Lyanna Callahan viu sua vida virar pó.
Sem dinheiro, sem futuro e presa a um passado que se recusa
a deixá-la em paz, ela faz o possível para sobreviver, até que uma
proposta inesperada vira sua rotina de cabeça para baixo.
Logan Donovan tem tudo o que ela despreza: fama,
dinheiro, arrogância e um histórico de confusões. Mas,
prestes a perder sua carreira no hóquei, ele precisa
desesperadamente reconstruir sua imagem.
A ideia? Um namoro de mentira com a única garota que
não suporta sequer ouvir sua voz.
Ela precisa de estabilidade.
Ele precisa parecer confiável.
O plano é simples. A execução… nem tanto.
O que começa como um jogo se transforma em toques
proibidos e sentimentos que nenhum dos dois está pronto
para admitir.
Até que Logan cruza uma linha que jamais deveria ter cruzado
e a destrói na frente de todos.
Lyanna vai embora, magoada, humilhada, e levando no seu
ventre um segredo capaz de mudar tudo.
Agora, Logan terá que encarar a única jogada que nunca soube
controlar: O arrependimento.
Se quiser recuperar o que perdeu. Vai ter que lutar pela única
coisa que sempre fugiu do seu controle: o amor.
Conteúdo para maiores de 18 anos: contém, linguagem
explícita e temas sensíveis
Prólogo
Logan Donovan
O som do disco batendo contra a rede ecoou pela arena,
seguido pelo grito ensurdecedor da torcida. O placar confirmou o
que todos já sabiam: vitória. Meu time explodiu em comemoração,
enquanto os jogadores se abraçavam, batiam os tacos no gelo, e a
música alta tomava conta do rinque.
Alguém deu um tapa no meu capacete.
— Boa, Donovan! — Tyler gritou, ofegante, antes de erguer
os braços para comemorar com a torcida.
Fiz um aceno automático, forçando um sorriso. Mas não
sentia nada.
— O que foi, Donovan? Não gosta quando o seu time ganha?
— zombou um dos meus companheiros, rindo ao ver minha
expressão vazia.
— É motivo de comemorar, Logan. Temos olheiros na plateia
— disse Tyler, tentando me trazer de volta para a realidade.
Meu peito subia e descia, e minhas mãos estavam suadas
dentro das luvas. Eu amava o hóquei, mas isso nunca foi suficiente.
Não para o meu pai.
Meus olhos buscaram a arquibancada e lá estava ele, cercado
pelos olheiros da NHL, conversando como se o jogo nunca tivesse
acontecido. Ele sequer olhava para o gelo. Para mim.
A raiva cresceu como um nó na garganta. Eu devia estar feliz.
Devia estar comemorando com meu time. Mas, como sempre, tudo
que eu conseguia sentir era o peso da ausência dele.
Engoli em seco, forcei um último olhar para o placar e, sem
esperar pelo resto da comemoração, soltei o taco com força contra o
banco. Arranquei o capacete, passei a mão pelos cabelos suados e
saí, atravessando os corredores da arena sem olhar para trás.
Lyanna Callahan
O gelo abaixo dos meus patins era minha segunda pele, a
única coisa que fazia sentido. Deslizei fazendo aquilo que eu havia
ensaiado por muito tempo, a adrenalina corria pelas veias. O som da
multidão desaparecia enquanto eu me preparava para meu salto
mais difícil, o giro triplo que poderia garantir minha ascensão ao
circuito profissional.
Meus olhos captaram Troy na plateia, observando-me com
aquele olhar sombrio e intenso. Meu namorado. Capitão do time de
hóquei. Ou melhor, ex, pelo menos por enquanto. Eu não suportava
mais o ciúme sufocante dele e pedi um tempo.
Ele não aceitou bem.
Dava para ver a fúria contida em cada detalhe, desde o
maxilar travado até a forma agressiva com que apertou o cadarço do
meu patim antes de eu entrar no gelo.
— Boa sorte — murmurou, seco, sem sequer me encarar.
E foi assim que soube: ele estava furioso. Mas eu precisava
me concentrar para a chance da minha vida, eu queria muito entrar
para Grand Prix Sênior.
A música encheu a arena, e eu senti o coração acelerar. Cada
passo, cada deslize, cada giro estavam cravados em minha mente,
memorizados a ponto de se tornar instintivo. Eu era uma dançarina
do gelo, e aquele era o meu momento.
Meu corpo subiu no ar. O triplo giro, minha grande jogada,
minha assinatura.
Foi quando senti. A lâmina do patim deslizou de forma errada,
fazendo meu tornozelo torcer em um ângulo impossível. O equilíbrio,
que sempre fora meu aliado, me abandonou sem aviso. O mundo
girou descontrolado.
A queda aconteceu em câmera lenta, mas o impacto foi
brutal. Meu corpo atingiu o gelo com força, um estalo seco ecoou
pela arena.
Veio a dor. Uma dor cortante, ardente, diferente de qualquer
outra que já senti.
E então, o choque.
Meu olhar baixou instintivamente para minha perna, e o que
vi me fez engasgar em um grito sufocado. O gelo sob mim já não
era apenas gelo. Era vermelho. Vermelho vivo. Vermelho demais.
O corte era profundo. O patim, afiado como uma navalha,
rasgara minha pele, deixando um rastro de sangue quente se
espalhando pela superfície gelada.
Alguém gritou. Eu não sabia se era eu.
Dor. Silêncio. Fracasso.
O gelo, que sempre foi minha casa, agora se tornava o lugar
onde meu sonho morria.
E nada jamais seria o mesmo.
01
Logan Donovan
Um ano depois…
“Eu estava parado diante do caixão do meu irmão. O irmão
que eu nunca conheci pessoalmente. O horror tomava conta de mim
ao ver meu próprio rosto refletido no dele. Era eu quem deveria
estar ali. Ou melhor, eu nem deveria ter nascido. Para isso, ele
precisaria nunca ter morrido.”
Sobressalto, assustado com o sonho, despertar deles era
sempre um tormento. Um presságio de que meu dia seria um
completo desastre. Como se eu tivesse pisado em um gato preto
morto e passado debaixo de uma escada sete vezes seguidas. Eu
tenho uma sorte maldita, vim ao mundo para substituir alguém e ser
obrigado a viver vida de outra pessoa.
— Desculpa, Nathan, mas não dá para ter simpatia por você
— murmurei, encarando um dos inúmeros retratos dele espalhados
pela casa.
— Que porra você pensa que está fazendo? — A voz do meu
pai cortou o silêncio entrando na sala. Ele estava furioso.
Endireitei-me no sofá, sentindo a dor latejante nos dedos
ainda machucados pela briga depois do jogo.
— O treinador me ligou — ele continuou, cerrando os dentes.
— Disseram que você perdeu o controle fora do rinque.
Soltei uma risada seca, levantando-me lentamente.
— Diga ao treinador que tenho uma vida fora do rinque,
caralho.
— Abaixa esse tom comigo, Logan! — ele explodiu. — Estou
farto das suas brigas. Você foi suspenso de novo e o garoto está no
hospital!
— Sinto muito por ele. Talvez eu tenha exagerado —
murmurei com desdém, sem remorso algum. Ele que se fodesse.
Talvez assim aprendesse a nunca mais abrir a boca para falar merda.
Meu pai soltou um suspiro.
— Sim, você exagerou. Pela milésima vez. E não vou mais
pedir que reconsiderem a sua suspensão.
Meu maxilar travou.
— O quê? Não conseguiu subornar o treinador dessa vez? Ou
finalmente se convenceu de que eu nunca vou ser o Nathan? Ainda
dá tempo de fazer outro filho perfeito, aquele que aceite essa merda
de vida que você impõe.
Seu olhar endureceu.
— Chega, Logan. Você não percebe que está fazendo a sua
mãe sofrer?
Soltei uma risada amarga.
— E você, pai? Resolveu cancelar seus compromissos
milionários ou suas tardes de golfe para, de repente, agir como um
pai preocupado? Ou foram seus colegas que cancelaram primeiro e
te deixaram com tempo livre para fingir que dá a mínima para mim?
Seus punhos cerraram ao lado do corpo.
— Estou farto de você. Farto desse seu comportamento de
merda. Não gosta do hóquei? Não gosta da universidade? Não gosta
da vida confortável que tem? Então crie a sua própria.
Meus olhos se estreitaram.
Eu amava o hóquei. Sempre amei. Mas o que eu não
suportava era ser a peça que tapava o buraco que Nathan deixou.
Não suportava ser obrigado a viver os planos que eram dele, os
sonhos que eram dele.
Porque, no fim das contas, eu nunca fui visto como Logan
Donovan. Eu era apenas um rascunho malfeito do filho perfeito que
ele perdeu.
— Ótimo, agora posso viver do meu jeito.
Ele riu, mas sem humor.
— Você acha que o jeito que vive está ruim? Então faça
melhor. Arrume um emprego, pague suas contas e depois me diga
qual vida é mais fácil.
Uma risada amarga escapou dos meus lábios.
— Está me deserdando?
Meu pai me encarou por um longo momento, com o olhar
duro.
— Estou descartando o lixo da minha vida.
Eu sentia o sangue martelar em minhas têmporas. Deveria rir
na cara dele, fingir que não me importava. Mas me importava. Me
importava pra caralho. Porque, no fim das contas, eu era
exatamente isso: a sombra de alguém que nunca conheci, a
substituição barata de um filho que nunca poderia ser.
Lixo.
Apertei os punhos até as unhas se cravarem na pele. Respirei
fundo, forçando um sorriso torto.
— Que ótimo. Assim você não precisa mais fingir que eu sou
seu filho.
Meu pai não piscou.
— Você nunca quis ser.
— Então é isso? Vai fingir que eu nunca existi?
— Vou fazer melhor. — Ele pegou um maço de notas do bolso
e jogou sobre a mesa, como se estivesse pagando a conta de um
jantar barato. — Considere isso o seu último favor. Aproveite, porque
daqui para a frente, você está sozinho.
O som das notas caindo sobre o vidro ecoou pela sala, cada
batida soando como um tapa na cara. Meu sangue ferveu.
Passei os olhos pelo dinheiro, sem tocá-lo, sentindo o gosto
amargo da humilhação subir pela garganta. Então, ergui o olhar e
deixei um meio sorriso cínico se formar nos meus lábios.
— E o que exatamente você quer dizer com isso?
Meu pai cruzou os braços, o olhar frio.
— Vou bloquear sua conta. Você não vai mais tocar no
dinheiro das ações da empresa. E não quero te ver por lá também.
Arrume um estágio em outro lugar.
O silêncio se alongou entre nós.
— Você só pode estar brincando. — Sorri, debochando.
— Não. Estou falando sério. Deixe as chaves do carro quando
sair.
Meu sorriso desapareceu.
— Do meu carro?
— Não é seu. Fui eu quem comprou. Agora será assim,
Logan: ou você aceita as regras da casa, ou faz suas próprias regras
e vive a vida que considera tão boa e perfeita.
Engoli a raiva, deixando um sorriso frio surgir no canto dos
lábios.
— Tudo bem, senhor Donovan. — Peguei as chaves do carro
no bolso do casaco e as joguei sobre a mesa sem nem olhar. — Eu
vou viver a minha vida.
Sem olhar para trás, saí da sala.
02
Lyanna Callahan
Eu vinha me desdobrando para continuar estudando. Sem a
bolsa esportiva, tudo ficou mais difícil. As taxas anuais, os materiais,
cada despesa era um peso sobre meus ombros. Cada centavo era
contado.
Agora, tudo o que me restava era seguir em frente. Terminar
a universidade. Tornar-me fisioterapeuta esportiva. Eu ainda iria
respirar esporte, vivê-lo todos os dias, mesmo que nunca mais
pudesse competir.
Vasculhei o armário com pressa. Meu dinheiro tinha que estar
ali. Cada nota que eu guardei, cada centavo que economizei... Mas
tudo o que encontrei foram roupas emboladas, papéis amassados e
o vazio onde o meu dinheiro deveria estar.
Minha respiração ficou pesada. Não. Não de novo.
Saí do quarto com muita raiva. Eu já sabia a resposta, mas
ainda precisava ouvir.
— Mãe, onde está? — perguntei, entrando na cozinha.
Ela estava de pé, apoiada na pia, massageando as têmporas
como se a vida fosse um peso que só ela carregava.
— Lyanna, estou com dor de cabeça. Seja lá o que for, deixa
para outro momento.
— Mãe, você trouxe aquele cara para casa de novo? — minha
voz falhou. — Deu dinheiro para ele?
Ela bufou, impaciente.
— Não enche o saco, Lyanna. — O tom dela era ácido, como
sempre que eu a confrontava. — Leonel é a única coisa que ainda
me traz um pouco de alegria.
Meu estômago se revirou.
— Alegria? — Soltei uma risada incrédula. — Mãe, ele te bate.
Ele leva todo o nosso dinheiro!
Ela suspirou, revirando os olhos como se eu fosse uma
criança ingênua demais para entender a vida.
— Brigamos às vezes. Isso é normal. Não era assim com seu
namorado? O... como era o nome dele? Troy?
Meu corpo travou. O gosto amargo do nome dele na boca da
minha mãe me deu vontade de vomitar e eu ignorei, só o dinheiro
me importava agora.
— O dinheiro que eu estava juntando sumiu! — minha voz
saiu mais alta do que pretendia. — Eu não tenho mais a bolsa
esportiva, mãe. Eu preciso pagar a universidade!
Ela soltou uma risada curta e amarga.
— Desista disso, Lyanna. — Sua voz veio mais baixa. — Aceite
que vai morrer servindo café e bolos, igual a mim. Deveria agradecer
que ainda temos isso.
Eu a encarei com desgosto.
— Você tinha tudo para ser brilhante... — ela continuou, com
um olhar perdido. — Se ao menos eu não tivesse engravidado, se eu
não tivesse caído na lábia daquele...
Ela engoliu as palavras, mas não precisava terminá-las. Eu já
sabia o final daquela frase, já ouvi essa história várias vezes.
— Ah, Lyanna, jogadores de hóquei não prestam. — Ela me
encarou com um sorriso torto, repleto de arrependimento e
amargura. — Olha para você. Olha para mim.
Eu olhava. Sempre olhei. Minha mãe era um retrato do que
eu mais temia me tornar. Vivia presa no próprio rancor, lamentando
cada escolha, se afogando nos comprimidos para depressão e
tentando preencher o vazio da única forma que sabia: ou me
xingando, ou se entregando para aquele idiota que nos roubava e a
machucava.
E, como sempre, fazia questão de me lembrar que eu fui seu
maior erro.
Peguei minha mochila largada no sofá e saí de casa, batendo
a porta com força. Não tínhamos mais nada. O café que herdamos
da minha avó mal colocava comida na mesa.
Na rua, esperei pelo ônibus lotado e subi, espremida entre
desconhecidos. Fechei os olhos e segurei firme para não cair. A
universidade era minha única chance. Minha única saída para não
terminar como ela. Para ter um futuro.
Quando desço no ponto em frente ao campus, meu estômago
se revira ao vê-lo ali. Troy.
Encostado na entrada da universidade, braços cruzados, me
esperando. Ele não estudava aqui. Ele sequer deveria estar aqui.
Troy era aluno da Universidade de York, rival da Universidade
de Toronto em tudo, principalmente no hóquei. E todas as vezes que
ele e o time dele apareciam no campus, era questão de tempo até
uma briga começar com os Frost Raptors.
E pelo olhar que ele me lançava agora, parecia que eu era o
motivo dessa visita.
— Lyanna, vem, vamos conversar — Troy falou assim que
desci do ônibus.
— Estou atrasada para a aula — respondi rapidamente,
tentando me desvencilhar dele.
Os roncos dos motores de carros de luxo soaram atrás de
mim. Meu peito apertou. Respirei fundo antes de olhar para trás.
Dax e Owen, dois jogadores do time de hóquei, desceram do
carro, caminhando até nós.
— Troy, é melhor você ir embora. — Minha voz saiu firme,
mas sabia que ele não me ouviria.
Ele me empurrou de repente, me fazendo perder o equilíbrio.
Meu joelho raspou contra o asfalto, ardendo com o impacto.
— Onde está o Donovan? — Troy rosnou.
Dax sorriu de lado, aquele olhar sombrio e arrogante de
sempre.
— Pode deixar o recado.
Ninguém mexia com eles. Suas famílias eram poderosas,
influentes. Eles se achavam donos do mundo.
Troy soltou um riso seco antes de falar:
— Certo. Diga a ele que eu vou matá-lo. Dentro do rinque. Na
frente de todos.
Owen gargalhou, sem se importar com a ameaça.
Logan Donovan havia mandado o irmão de Troy para o
hospital depois de uma briga fora do rinque, era óbvio que as coisas
não ficariam assim.
O som de uma moto cortou o ar. Minha espinha gelou.
— Recado dado. Agora volta para o hospital e vai cuidar das
feridas do seu irmãozinho.
Virei-me na direção da voz, e lá estava ele.
Logan Donovan.
O loiro convencido, cheio de tatuagens e com um olhar que
sempre parecia avaliar tudo e todos como se estivessem abaixo dele.
Ele desceu da moto com a confiança desleixada de quem tem
o mundo na palma da mão.
O casaco esportivo marcava os ombros largos e os braços
fortes, e as mangas puxadas até os cotovelos revelavam a pele
coberta de tinta.
Tatuagens. Muitas.
Traços escuros serpenteavam pelo seu antebraço, deslizavam
sobre o bíceps definido e subiam até o pescoço, onde desapareciam
sob a gola da camisa de treino. Cada linha de tinta parecia ter um
propósito, um pedaço de uma história que ninguém ousava
perguntar, mas que ele carregava com a mesma naturalidade com
que vestia sua arrogância.
O cabelo loiro, cortado baixo, estava perfeitamente
desalinhado, como se ele tivesse acabado de sair do gelo ou da
cama de alguém e, sinceramente, as duas opções eram plausíveis.
A barba baixa e bem-feita acentuava ainda mais o maxilar
afiado, um detalhe que fazia um perigoso contraste entre o atleta
meticuloso e o cara que claramente não seguia regras.
E então, os olhos.
Azuis. Frios. Intimidantes.
Uma tempestade escondida sob um céu claro.
Ele andou em passos firmes, a expressão carregada de
desprezo enquanto avançava na direção de Troy.
Troy rangeu os dentes, eu podia sentir o ódio que vinha dele.
— Eu vou acabar com você, seu desgraçado.
Logan parou, analisando Troy com um sorriso torto, sem
pressa alguma.
— Admiro a sua coragem. Vir até aqui só pra me ameaçar.
Mas então, os olhos de Troy deslizaram para mim. Ainda caída
no chão e Donovan o seguiu.
Um brilho cínico passou pelo seu olhar antes que ele
estendesse a mão para me ajudar.
— Ah... então veio por ela? — constatou, debochando.
Seu tom fez minha pele arrepiar, mas não de um jeito bom.
Engoli em seco. Levantei-me o mais rápido que pude, jogando a
mochila sobre os ombros e virando as costas para ele.
Eu não tocaria em Logan Donovan, ele limparia as mãos
depois, com aquele ar superior de sempre. Porque ele era assim. Se
achava melhor do que todos. E, na cabeça dele, todos ao redor
fediam.
Apertei as alças da mochila e me levantei. Me afastei,
ignorando completamente o olhar que Logan lançou para mim. Que
ele achasse o que quisesse. Andei apressada pelo campus, quando
ouvi uma voz familiar.
— Pelo amor de Deus, Lyanna! O que foi aquilo?
Virei o rosto e vi Emma, minha melhor amiga, parada com os
braços cruzados, me olhando como se eu tivesse acabado de sair de
um ringue de luta.
— Nada. — Suspirei, ainda sentindo a tensão nos ombros. —
Só um péssimo jeito de começar o dia.
Ela arqueou uma sobrancelha.
— Nada? Você está toda suja, com cara de quem quer matar
alguém e, para completar, Logan Donovan estava ali te encarando
como se fosse te devorar viva.
Revirei os olhos.
— Ele encara todo mundo assim. Não se acha apenas melhor
do que todo mundo, acha que pode pisar em quem quiser.
Emma riu.
— Bom, se serve de consolo, ele definitivamente não ignora
você.
Como se aquilo fosse algo bom.
— Ótimo. Última coisa que eu preciso na minha vida é
chamar a atenção de Logan Donovan.
Emma me avaliou por um segundo antes de mudar de
assunto.
— E Troy? Que merda foi aquela? Você precisa se afastar dele
de vez.
Soltei um riso seco.
— Acha que eu não tento?
Emma suspirou, me puxando pelo braço.
— Vem, vamos para a aula se não vamos chegar atrasadas e
esse professor pega no meu pé.
03
Logan Donovan
Eu a observei se afastar sem nem ao menos me olhar. Os
passos dela eram firmes, apressados, como se estivesse fugindo.
— Deixa ela, Donovan. — Owen riu ao meu lado, chamando a
minha atenção de volta.
Meu olhar se desviou para o idiota do Troy, que ainda me
encarava como se quisesse arrancar minha cabeça ali mesmo.
Péssima ideia.
— Você tem sorte que estamos na porra do campus, Carter.
— Minha voz saiu baixa, mas afiada como uma lâmina.
Ele abriu um sorriso torto.
— Eu só preciso da minha oportunidade. No rinque.
Ri. O idiota achava que poderia comigo?
— Quando essa oportunidade chegar, vai ser a última vez que
você vai sair do gelo andando.
Dax segurou meu ombro, me puxando para trás antes que eu
decidisse quebrar a cara de Troy ali mesmo.
— Vamos nessa, Logan. Esse merda não vale o nosso tempo.
Respirei fundo, forçando-me a dar um passo para trás.
Quando nos afastamos, Dax apontou para a moto
estacionada na entrada do campus.
— E a minha moto?
— Meu pai pegou a chave do carro e bloqueou minha conta.
— E agora? Vai ter que arrumar emprego?
Revirei os olhos.
— Relaxa. Eu ainda sou um Donovan. Foi uma boa ideia
seguir o conselho do Tayler transferir meu dinheiro para outra conta
antes que ele tentasse me foder de vez.
— E como um bom milionário sem acesso imediato ao próprio
dinheiro, decidiu pegar minha moto emprestada?
— Vou te devolver assim que comprar outra.
Dax sorriu, balançando a cabeça.
— Use o tempo que precisar.
— Quem é a garota caída no chão? — perguntei, tentando
puxar da memória. Não me lembro de ter visto ela alguma vez.
Owen deu de ombros, sem dar muita importância.
Ele sempre sabia tudo sobre todo mundo. Habilidade dele.
Costumava hackear os computadores da universidade por diversão.
Um passatempo perigoso, mas que nunca deu errado. Ainda. Ele
aproveitava para fuçar as fichas dos alunos, descobrir segredos que
ninguém mais sabia.
— Ninguém relevante. Ex-patinadora, lesionada e namorada
do Carter.
Minhas sobrancelhas se ergueram com interesse.
— Namorada dele?
Dax me lançou um olhar curioso.
— O que você tem em mente?
Sorri de lado, sentindo uma ideia começar a se formar na
minha cabeça.
— Nada. Só imaginando como seria ver a namoradinha dele
de joelhos, de frente pro meu pau.
Gargalhei, e Dax não disse nada, mas o meio sorriso deixava
claro que não duvidava nem um pouco da minha capacidade de
transformar essa provocação em realidade.
— Ela mora em Rivertown — Owen hesitou por um segundo
antes de citar o nome do bairro.
Minha expressão se fechou no mesmo instante, mas logo me
recompus. Era o bairro onde meu irmão morreu.
— Interessante.
— O que é tão interessante?
— Ela é bem bonitinha, não acha? Acho que vou visitar
Rivertown.
— Só se for para o teu pai te deserdar de vez.
— E qual o problema?
Lyanna Callahan
Não olhe, Lya. Não olhe.
Olhei.
Droga!
Por que diabos ele estava me encarando?
— Ele está vindo — Emma anunciou como se narrasse um
jogo de hóquei.
— Quem? — perguntei, fingindo desinteresse.
— Logan Donovan. — O tom empolgado dela me irritou.
Eu nunca entendi o que as garotas viam nesses jogadores.
Eles passavam metade do tempo se esmurrando no rinque. Tá, eu
precisava admitir que eram bons no que faziam, mas, no fim, não
passavam de brutamontes que só sabiam brigar.
— Uau... — Emma murmurou, admirando o loiro de quase
1,90 m se aproximar.
Ele nem sequer sorriu. Nunca sorria. Sempre com aquela
expressão fechada, como se o mundo inteiro o irritasse. Como se
estivesse ali contra a própria vontade, pisando no chão apenas
porque era obrigado.
Ele apenas desviou o caminho, seguindo para uma mesa mais
à frente, perto da panelinha da elite, o lugar ao qual ele pertencia.
Soltei um suspiro aliviado.
— Ele está de olho em você. — Emma voltou a atenção para
mim, um sorrisinho sugerindo que achava aquilo interessante.
Revirei os olhos.
— Ele quer irritar o Troy, só isso — respondi, com indiferença.
— Me usar como motivo para mais uma briga fora do rinque —
Concluí.
Emma deu de ombros.
— Ele mandou o Liam para o hospital. É normal que Troy não
deixe isso passar.
— E enquanto isso, eu só queria uma chance de voltar para o
gelo — murmurei, a vida havia sido injusta comigo. — Mas eles
ficam brincando de guerra, arrumando brigas e sendo suspensos
como se nada disso importasse.
Meu olhar caiu sobre Logan novamente, mesmo contra minha
vontade. Ele estava ali, cercado pelos amigos, intocável,
inalcançável, e pelas mariposas que gravitavam ao seu redor,
garotas fúteis, tão superficiais quanto eles.
Enquanto isso, eu precisava me levantar e ir trabalhar, porque
todo o dinheiro que passei meses economizando foi levado por um
vagabundo qualquer.
Já era fim de tarde quando alguns pedidos chegaram,
trazendo com eles mais dívidas, mais notas a serem pagas e mais
trabalho para manter tudo de pé.
Limpei as mãos no avental e peguei algumas caixas
pequenas, levando-as para o depósito. O café não vinha tendo um
bom movimento esses dias.
— Você pode assinar aqui. — O entregador apontou para o
tablet.
— Ok — confirmei, contando novamente as caixas antes de
liberar a entrega. — Tudo certo, muito obrigada.
Antes mesmo de me virar, ouvi a voz da minha mãe atrás de
mim.
— Os descartáveis chegaram? — Ela saiu de casa, que era
praticamente uma extensão da cafeteria, ajeitando os cabelos
desgrenhados.
— Sim. — Suspirei. Mais uma conta. — Agora temos quinze
dias para pagar tudo. E como não temos mais funcionários, a
senhora vai precisar me ajudar nos horários em que eu não estiver.
Encarei sua expressão cansada.
— Este lugar ainda coloca comida na nossa mesa.
Minha mãe revirou os olhos.
— Pare de agir como se fosse a única preocupada, Lyanna.
Estou farta de você. Maldito momento em que decidi continuar com
isso.
Soltei um suspiro pesado e deixei meu punho fechado bater
contra o balcão. “O isso”, era eu.
— Talvez devesse ter me entregado para adoção quando
percebeu que não daria conta. Que me olhar seria uma tortura.
— Você é igual ao seu pai. Isso é tão irritante.
Meus lábios se curvaram em um sorriso amargo.
— Não fui eu quem se deitou com ele. A culpa não é minha.
O estalo veio rápido, cortando o ar antes que eu pudesse me
preparar. A ardência se espalhou pelo meu rosto e senti os dedos
dela queimando contra a minha pele.
Engoli em seco, mas mantive o olhar firme, segurando as
lagrimas que ameaçaram cair.
— A senhora pode ter me dado a vida, mas se ainda está viva
hoje, é por minha causa. — Minha voz saiu fria, eu era uma alma
vazia cheia de mágoa. — Deveria me agradecer por estar me
matando nesse lugar enquanto você só lamenta a vida que não teve.
Ela soltou uma risada curta.
— Você é inútil, Lyanna.
Fiquei imóvel esperando pelo resto das ofensas.
— Nem para se equilibrar nos patins serviu. Treinou aquele
movimento tantas vezes... chega a ser vergonhoso ter cometido um
erro tão ridículo.
Minhas mãos se fecharam com força, conforme sentia a
cicatriz na minha perna latejar como uma ferida aberta. Como se
alguém tivesse acabado de jogar sal nela. Como se eu nunca fosse
me livrar dessa dor.
— Boa noite. — Virei-me para atender o terceiro cliente do
dia.
Apenas três clientes. O café estava às moscas. Minha vida
estava um caos.
E então, como se o dia não pudesse piorar, ele estava lá.
Logan Donovan.
Mãos enfiadas no casaco, olhar desdenhoso, como se o lugar
inteiro fosse abaixo do padrão dele.
Que diabos ele estava fazendo aqui?
— Boa noite, em que posso ajudar?
Ele se aproximou do balcão com um maldito sorriso
presunçoso.
Irritante. Preferia que ele não sorrisse. Logan Donovan
sempre tinha um olhar fechado, arrogante, indiferente. Mas agora?
Agora ele parecia se divertir à minha custa.
— Aqui vende café, não vende? — perguntou, como se fosse
óbvio.
— Não só isso.
Ao meu lado, minha mãe soltou um suspiro cansado. Ela já
não tinha paciência para os poucos clientes que são da redondeza, e
com esse aí, nem tentaria.
Sem dizer nada, virou as costas e me deixou sozinha para ser
devorada pelo lobo à minha frente.
— Café puro. Sem açúcar.
— Tudo bem — murmurei, me virando para preparar.
— Ouvi dizer que você costumava ser uma estrela no gelo.
Que deprimente… agora você só serve café.
Virei-me lentamente, sem pressa e coloquei o café no balcão,
ignorando seu comentário estúpido.
Ele pegou a xícara, mas não antes de soltar mais uma
provocação:
— Sabe, atendente… você devia sorrir mais. Faz você parecer
menos deprimida e talvez esse lugar não estivesse às moscas.
Respirei fundo, levantei o olhar e sorri, com desprezo.
— E você? Está treinando para ser babaca ou isso é talento
natural?
Seu sorriso apenas se alargou.
— Talento natural.
Revirei os olhos.
— Ótimo. Agora volta para o mundinho perfeito de onde você
saiu e me deixa em paz.
Ele riu baixo, levando a xícara aos lábios. Mas não foi embora.
Pelo contrário. A maneira como se acomodou no banco alto,
relaxado, completamente à vontade, deixou claro que ele não estava
ali apenas para tomar café.
Ele estava ali para testar minha paciência, e, pelo jeito, não
sairia até esgotá-la por completo.
04
Logan Donovan
Minutos antes…
Eu nunca vinha para esse lado da cidade. Não tinha nada
para mim aqui.
Rivertown era um buraco esquecido, um lugar onde a cidade
parecia ter desistido de tentar. Ruas esburacadas, prédios
desgastados pelo tempo, um cenário tão decadente quanto as
pessoas que viviam nele, mas agora, aqui estava eu, estacionando a
moto em frente a um café caindo aos pedaços.
O cheiro de fritura velha e umidade impregnava o ar, como se
o próprio lugar estivesse apodrecendo lentamente. Suspirei,
encarando a fachada desgastada.
Eu já sobrevivi a coisas piores, um gole de café de
procedência duvidosa provavelmente não me mataria.
E lá estava ela. Lyanna. Seria Lya para mim em breve.
Seus cabelos ondulados estavam presos em um coque
displicente, e a pele alva destacava ainda mais as bochechas
rosadas, mas hoje, pareciam marcadas. Cruelmente tocadas.
Sentei-me no banco alto e, com toda a tranquilidade do
mundo, pedi um café. Corajosamente.
E provoquei, claro. Essa era a melhor parte de estar aqui. Ver
até onde ela aguentaria. Saber se daria conta dos planos que eu
tinha para ela.
— Não gostaria de conhecer o meu mundo perfeito? — Minha
voz saiu carregada de sarcasmo. — Estou com uma ótima oferta
hoje.
— Não faço seu tipo.
Sorri de lado.
— E qual seria o meu tipo?
Ela nem hesitou.
— Meninas sem cérebro que ficam feito moscas atrás de
cabeças de vento iguais a vocês.
Ergui uma sobrancelha, me divertindo.
— Vocês? — Inclinei ligeiramente a cabeça. — Ah, está
falando dos meus amigos?
— Sim, estou falando de você e dos seus companheiros de
time.
Inclinei-me um pouco mais sobre o balcão, estudando seu
rosto, o tom de voz afiado, a forma como cada palavra dela pingava
desgosto.
Ela parecia me odiar, ou talvez apenas fingisse. Nem nos seus
mais loucos delírios ela poderia imaginar que teria alguma chance
comigo. Isso tornava tudo ainda mais interessante. Porque, pela
primeira vez, eu estava lidando com algo diferente.
— Obrigado, Callahan. — Sorri de lado. — Percebi que
pagamos uma matéria juntos, então… nos vemos na universidade.
Deslizei uma nota de cem dólares pelo balcão, ela olhou para
o dinheiro e depois para mim, forçando um sorriso falso.
— Disponha. Mas não tenho troco. O café é por conta da
casa.
Apoiei os cotovelos no balcão, inclinando-me ligeiramente.
— Pode ficar. É pelo café e uma gorjeta pelo excelente
atendimento.
Ela fechou ainda mais a expressão, sem desviar o olhar.
— Não estou pedindo esmolas, Donovan.
Dei um meio sorriso, pegando minhas chaves e me
preparando para sair.
— Eu não costumo dar esmolas. — Pisquei para ela. — Eu
pago pelo que me satisfaz. E hoje, estou satisfeito.
Acordei com o som irritante do despertador, sentando-me na
cama ainda grogue, tentando afastar a névoa do sono.
Hoje eu receberia meu veredito final, saberia todas as
punições e o que precisaria fazer para voltar aos jogos. A parte pior?
Morar na mesma casa que o time. Isso significava ter que ouvir as
zoações e reclamações constantes sobre o fato de o capitão estar de
fora.
E eu precisava voltar. O quanto antes.
Levantei-me ainda com preguiça, entrei embaixo do chuveiro,
à medida que a água quente deslizava sobre minha pele e afastava o
torpor da manhã. De olhos fechados, minha mente fez o que eu
menos queria: voltou para ontem.
Para ela. Lyanna Callahan. Ela me odiava. Ou fingia muito
bem, todas queria um pedacinho do meu tempo.
Sorri de canto, passando a mão pelos cabelos molhados.
Sai do banho deixando um rastro molhado pelo caminho,
vesti uma camiseta preta, jeans escuros e calcei os tênis antes de
descer as escadas. Eu já conseguia ouvir o barulho dos meninos
antes de descer totalmente as escadas.
Dex estava largado no sofá, mexendo no celular, enquanto
Caleb e Owen discutiam alguma jogada. Tyler e Blake estavam de
pé, prontos para sair.
— Finalmente, o banido desceu — Owen debochou, jogando
uma bolinha de papel na minha direção.
— Aproveitou o banho para chorar, Donovan? — Caleb
provocou, rindo.
— Foda-se. — Peguei a bolinha e a atirei de volta, acertando
seu ombro.
Tyler se espreguiçou, pegando sua mochila.
— Precisamos ir logo. Treino extra antes do jogo do fim de
semana.
— É bom vocês treinarem mesmo. — Peguei as chaves da
moto na mesa. — Já que o time tá sem capitão.
Dex riu baixo, balançando a cabeça.
— E aí, qual é o veredito? Vão te deixar voltar ou vão fazer
você esfregar o chão do rinque até aprender a se comportar?
— Vou descobrir hoje — respondi, olhando para cada um
deles. — Mas não se preocupem. Eu volto.
Blake sorriu de lado.
— Espero que sim. Estamos com um jogo importante no fim
de semana.
Ó
— Ótimo. — Peguei minha mochila e fui até a porta. Porque
eu não tinha a menor intenção de continuar fora.
Cheguei à universidade e fui direto para o escritório do
treinador, que tinha aquele cheiro característico de couro velho e
gelo derretido. Era o cheiro da minha vida, do lugar ao qual eu
pertencia e para onde eu precisava voltar.
Sentei-me na cadeira de frente para a mesa dele, cruzei os
braços e espere pelo sermão de sempre. Ele me encarou por alguns
segundos antes de suspirar e passar a mão pelo rosto.
— Você se meteu numa bela merda dessa vez, Donovan.
Cruzei os braços e me recostei na cadeira, já esperando o
sermão.
— Olha, eu sei que errei. Me diz logo o que preciso fazer pra
voltar ao time.
O treinador me estudou por um instante, depois se inclinou
para a frente, apoiando os cotovelos na mesa.
— O conselho disciplinar decidiu que sua suspensão vai até o
fim do semestre.
Minha mandíbula travou.
— Você só pode estar brincando.
— Não estou — ele respondeu sério. — Eles querem ver que
você pode ser mais do que um brigão encrenqueiro. Precisam
acreditar que você representa o time de maneira positiva.
Revirei os olhos.
— E qual a solução brilhante? Um programa de controle de
raiva? Trabalhos comunitários?
Xavier pegou um papel e o deslizou para mim. Um programa
de reabilitação esportiva para atletas lesionados.
— Você vai passar as próximas semanas ajudando atletas que
perderam a chance de competir devido a lesões. O conselho quer
que você entenda o que é realmente perder um esporte.
Soltei uma risada seca.
— Ah, então é isso? Querem que eu sirva café e escute
lamentações?
Ele me lançou um olhar irritado.
— Quer sua vaga de volta ou não?
Pisquei devagar, ao passo que voltava a olhar para a papelada
à minha frente. Atletas lesionados. Pessoas que viram seus sonhos
se despedaçarem. Foi aí que um nome surgiu na minha cabeça.
Lyanna Callahan. A ex-patinadora. A garota que me odiava.
Minha mente começou a trabalhar rápido. Se o conselho
queria me ver como alguém envolvido em "ações positivas", por que
não fazer isso da melhor forma possível?
Inclinei-me na cadeira, um sorriso surgindo no canto da boca.
— Tudo bem, eu aceito.
O treinador me lançou um olhar desconfiado, como se
esperasse resistência.
— Sem reclamações? Sem tentar negociar um acordo melhor?
Dei de ombros.
— Você quer que eu ajude atletas lesionados? Beleza. Eu
ajudo. — Passei a língua pelos dentes, já sentindo a ideia se
moldando na minha mente. Mas do meu jeito.
Xavier me observou por um instante antes de assentir.
— Ótimo. Você começa amanhã. E, Donovan…
Levantei uma sobrancelha.
— Isso não é uma piada. O conselho quer ver mudanças. Se
você foder com isso, pode esquecer os jogos dessa temporada e as
suas chances de entrar pra NHL.
Levantei-me da cadeira, já pronto para sair.
— Relaxa, treinador. Eu sei exatamente o que estou fazendo.
Ou pelo menos, sabia como começar.
Sai do escritório procurando por Owen, caminhei pelo
corredor da administração da universidade, minha mente já
trabalhando rápido.
Lyanna Callahan. Eu tinha exatamente o que ela precisava.
Sorri sozinho ao pegar o celular e liguei para Owen.
— Preciso de informações sobre a Callahan. Tudo o que
conseguir.
A resposta veio em segundos, cheia de desconfiança.
— O que tá aprontando, Donovan?
— Amanhã começo no programa de reabilitação de atletas
lesionados.
Owen soltou um riso curto do outro lado da linha.
— Que empolgante. A Lyanna estuda fisioterapia esportiva, é
por isso que quer saber tudo sobre ela?
— E se eu fizesse algo ainda maior? Algo que chamasse mais
atenção?
Houve uma pausa. Eu conhecia Owen o suficiente para saber
que ele já estava interessado.
— O que você está pensando, Donovan?
— E se, além de ajudar esses atletas, eu mostrasse que
realmente me importo? E se eu estivesse envolvido emocionalmente
com alguém que representa essa reabilitação?
Owen assobiou, impressionado.
— Está dizendo que vai namorar a atleta lesionada?
Sorri.
— Algo assim.
Owen soltou uma risada seca.
— Você acha que essa garota vai aceitar entrar nesse seu
teatrinho?
— Você vai me ajudar.
— Isso parece um plano de merda, Donovan.
— Acredite, já fiz coisa pior.
— E por que diabos a Callahan?
— Porque ela é tudo que meu pai abomina e ele vai precisar
engolir para que eu volte a jogar. Vai ser divertido. Além de ser
gostosa, não perco nada com isso.
— E como pretende convencer a garota?
— Descubra algo que possa fazê-la ceder. Algo que a obrigue
a considerar minha proposta.
— Certo, e o que eu ganho com isso?
— Diversão. — Sorri, girando as chaves da moto nos dedos.
— E um lugar garantido no camarote quando ela estiver
apaixonadinha e o jogo acabar.
Ouvi um suspiro exagerado do outro lado da linha.
— Você é um filho da puta.
— Nada que vocês também não sejam.
Ele riu.
— Te mando o que descobrir.
Desliguei a chamada, guardando o celular no bolso da
jaqueta antes de sair do prédio, o sol da tarde batendo forte contra
meu rosto.
05
Lyanna Callahan
Estava na aula de Biomecânica do Movimento Humano,
tentando focar no conteúdo, mas minha mente insistia em vagar.
Emma, minha melhor amiga, estava sentada na cadeira da frente.
Não porque quis me abandonar, mas porque estava ocupada demais
de olho em um colega de classe.
Amiga falsa. Não de verdade, mas era assim que eu chamava
quando ela me trocava por um pedaço de carne ambulante.
Mas tudo bem. A cadeira ao meu lado estava vazia, e eu
gostava assim.
— Você está atrasado, Donovan. — Levantei os olhos assim
que a professora disse seu nome. Ótimo.
Logan Donovan. Ele não era exatamente um aluno assíduo.
Na verdade, essa era a quarta aula com essa professora e, até
agora, ele só havia aparecido uma única vez. Eu jurava que ele tinha
desistido da matéria. Ou que pelo menos tivesse encontrado uma
maneira de escapar dela sem afetar sua média.
Mas ali estava ele, parado na porta, as mãos nos bolsos da
jaqueta, com aquela expressão despreocupada, como se o mundo
girasse ao seu redor e não o contrário.
— Ainda tem um lugar ao lado da Lyanna. Se apresse, você
está atrapalhando a aula.
Não, não, não.
O sorriso torto de Logan apareceu no canto de sua boca,
como se isso fosse a melhor notícia que ele já tivesse recebido.
— Desculpe, professora. — Ele parecia tudo, menos
arrependido.
Ele começou a caminhar pelo corredor, e ouvi suspiros
baixinhos, enquanto algumas das garotas se ajeitaram nas cadeiras,
suspirando por ele como se ele fosse um maldito astro de cinema.
Emma se virou sutilmente para mim, contendo um sorriso.
A última coisa que eu queria era ser o centro das atenções
por estar sentada ao lado de Logan Donovan.
— Bom dia, Lya. — Ele se jogou na cadeira ao meu lado,
casual como se esse fosse o lugar dele o tempo todo.
— Lyanna — corrigi automaticamente, sem paciência para
apelidos.
Ele se inclinou ligeiramente na minha direção, sua presença
era intrusiva de um jeito que me irritava.
— Deveria se sentir honrada por eu estar me sentando aqui.
Revirei os olhos antes mesmo dele terminar.
— Ah, claro — murmurei, pegando minha caneta.
Mas ele continuou, como se minhas reações apenas o
incentivassem.
— Todas aqui lamberiam o chão que eu piso só para ter esses
minutos que estou permitindo que você tenha.
Tão irritantemente convencido. E o pior? Ele não estava
errado.
Bastou um olhar discreto ao redor para ver as garotas
encarando-o como se ele fosse feito de ouro. Algumas sussurravam,
outras ajeitavam o cabelo, e uma até mordeu o lábio,
completamente hipnotizada.
Ridículo.
Mas o que realmente me pegou foi o quase sorriso que ele
deu. Não um verdadeiro, mas o indício dele. Era raro. Logan
Donovan não sorria, e, mesmo sabendo o quão insuportável ele era,
tive que admitir: era irritantemente bonito.
Odiava isso.
— Se todas estão tão desesperadas assim, talvez você
devesse trocar de lugar — sibilei, tentando ignorar o fato de que
minha pele esquentou sob o olhar dele.
Ele se recostou na cadeira, relaxado.
— Você realmente namora o capitão do time rival? — ele
perguntou e minha coluna enrijeceu no mesmo instante.
Levantei o olhar lentamente, estreitando os olhos.
— Não namoro ninguém — sussurrei de volta.
Logan arqueou uma sobrancelha e, então, um sorriso lento
apareceu em seu rosto, um daqueles que deixavam claro o quanto
ele se achava.
— É mesmo? Então os boatos estavam errados?
— Boatos sempre estão errados — murmurei, voltando minha
atenção para o caderno.
Ele se inclinou um pouco mais para mim, cheio de arrogância.
— Então você tá solteira.
— E isso te interessa por quê?
— Porque isso me dá espaço para mudar isso.
Segurei um riso incrédulo, balançando a cabeça.
— Não namoro jogadores de Hóquei, Donovan.
Ele riu baixinho.
— Não se sinta pressionada. Sei que a ideia de me ter por
perto pode ser muito mais do que sonhou.
Virei-me devagar, encarando-o.
— Você realmente acredita que todas as mulheres são loucas
por você?
Ele fingiu pensar por um segundo, depois deu de ombros.
— Bom… até agora, nunca conheci uma que não estivesse.
Revirei os olhos tão forte que quase vi meu cérebro.
— Parabéns. Deixa eu ser a primeira.
Ele se recostou na cadeira.
— Não se preocupe. Não vai durar.
Bufei, voltando minha atenção para ele.
— Isso quer dizer que vai me perseguir?
— Não preciso perseguir ninguém, Callahan. — Seus olhos
deslizaram lentamente pelo meu rosto antes de voltarem aos meus.
— São as mulheres que imploram para sentir a minha língua enfiada
nas suas bocas, ou em outro lugar, se eu estiver muito interessado.
E você deve ser muito gostosa.
Engoli em seco, sentindo meu rosto queimar, até ouvir o sinal
tocar e soltar a respiração que eu nem percebi ter prendido.
Graças a Deus.
Peguei meus livros com pressa, enfiando-os na mochila,
ignorando o olhar de Logan ainda cravado em mim.
— Babaca — murmurei, fechando o zíper da mochila com
força.
Ele continuou me olhando, cheio daquela maldita presunção
que me fazia querer socá-lo.
— Você deve estar vibrando por dentro só de falar comigo.
Admita.
Parei no meio do movimento, meus olhos lentamente se
voltando para ele.
Ele não estava falando sério.
Quer dize, estava, porque Logan Donovan realmente
acreditava que qualquer mulher que respirasse no mesmo ambiente
que ele deveria se sentir abençoada.
— Claro. Estou tremendo de emoção. — Revirei os olhos. —
Só que não.
— Não precisa esconder, Callahan. Eu sei que seu coração
acelerou um pouquinho quando me viu entrar.
Soltei uma risada seca, descrente.
— Ou foi vontade de vomitar, difícil dizer — retruquei com
sarcasmo.
Ele me olhou com calma, como se estivesse me estudando,
saboreando cada resposta minha como se fosse exatamente o que
ele queria ouvir.
— Bom, seja qual for, ainda assim fiz seu coração acelerar. —
Ele se inclinou um pouco mais, sua voz baixa, arrastada. — Se
quiser, posso fazer mais que isso.
Minha respiração travou por um segundo, mas mantive a
postura.
— Posso fazer o meio das suas pernas vibrarem, seus olhos
revirarem... — ele falou com malícia. — E pense, Callahan, eu sou
um Donovan.
Revirei os olhos.
— Você também é um idiota. E eu sou imune a idiotas.
— Isso é o que você diz agora.
— E amanhã direi de novo.
Levantei-me sem olhar para trás.
06
Logan Donovan
Sentei-me na arquibancada e observei o treino, sentindo a
frustração se acumular em cada músculo do meu corpo.
Era insuportável.
Já fui suspenso outras vezes, e em todas elas meu pai
conseguiu reverter a decisão. Foi fácil. Sempre foi fácil. Mas dessa
vez? Dessa vez, eu sentia o peso real de estar ali, apenas assistindo,
sem poder fazer o que eu amo.
Sim, eu amo o hóquei. Mas não como uma extensão do
Nathan. Ele e eu não tínhamos as mesmas habilidades no rinque.
Nunca tivemos. E se eu ia voltar para os jogos, seria do meu jeito.
O som dos saltos ecoou pelo corredor, e eu virei a cabeça na
direção do barulho.
Minha mãe se aproximou com a postura impecável de
sempre, sentando-se ao meu lado na arquibancada. Colocou a bolsa
delicadamente no banco ao lado, como se estivesse se preparando
para uma longa conversa.
— Vim te ver treinar. — Sua voz era neutra, mas seus olhos
estavam fixos no rinque, não em mim.
Soltei um suspiro, apoiando os cotovelos nos joelhos.
— Hoje não será possível.
Ela manteve a atenção no gelo.
— Quando vai parar de agir como um adolescente?
— Já ouvi o suficiente do meu pai.
— Ele está bem zangado com você.
Ri, mas não havia humor no som.
— Zangado? Ele me odeia.
Ela suspirou pesadamente, finalmente me olhando.
— Ele não te odeia, Logan. Ele só não sabe como lidar com
você. Com o Nathan sempre foi fácil.
Meu maxilar travou.
Ah, o Nathan.
O filho perfeito. O herdeiro ideal. O garoto que nunca errou.
Soltei um sorriso amargo, balançando a cabeça.
— Eu lamento a morte dele, mãe.
Meus olhos encontraram os dela.
— Mas não lamento ser eu mesmo.
— Venha jantar em casa na sexta-feira — disse ignorando o
meu comentário.
— Não posso. Vou assistir à partida.
— Então venha antes do jogo. — Ela inclinou a cabeça
levemente, me observando com atenção. — Está precisando de
dinheiro? O que tem feito nos horários livres? Vi que seu pai
cancelou seu estágio… Seus cartões estão na mesa do escritório,
junto com a chave do seu carro.
Mantive meu tom despreocupado.
— Estou bem. Não preciso de nada. — Dei de ombros. — Vou
arrumar outra coisa para fazer. Talvez consiga um estágio na
concorrência. Eu seria valioso lá, já que conheço bem a empresa
rival.
O tom debochado na minha voz era evidente, e minha mãe
apenas suspirou, cansada.
— Você não jogaria sua herança fora desse jeito.
Meu sorriso foi frio.
— Eu vou entrar na NHL. Vou ter minha própria carreira, meu
próprio dinheiro. — Meu olhar encontrou o dela. — Que se exploda
aquela empresa, aquela casa, aquele…
— Chega, Logan! — ela me cortou, com a voz firme.
Respirei fundo, apertando a mandíbula.
— Ele me chamou de lixo. — Minha voz saiu amarga.
Minha mãe fechou os olhos por um segundo antes de
responder.
— Você sabe que seu pai não pensa antes de falar quando
está nervoso.
Soltei uma risada seca.
— Sim. Ele fala exatamente o que sente e o que vem à
cabeça.
O silêncio pairou entre nós por alguns segundos antes de eu
me levantar.
— Foi bom descobrir o que eu realmente sou para ele.
Passei as mãos pelos cabelos, exausto da conversa.
— Vou seguir minha vida, mãe. Do meu jeito.
Ela não tentou me impedir. Apenas me observou enquanto eu
saía, e, pela primeira vez, tive a sensação de que ela sabia que eu
realmente falava sério.
Chutei os armários assim que entrei no vestiário, o impacto
ecoou pelo espaço vazio.
— Droga!
— Relaxa, Logan. Você vai voltar logo pro time. — Owen
entrou logo atrás de mim, escorando-se contra os bancos.
Passei as mãos pelos cabelos, tentando conter a frustração.
— Você descobriu alguma coisa?
Owen sorriu de lado, o que significava que ele tinha algo
bom.
— Depende… quer saber só um detalhe qualquer ou algo que
realmente possa te ajudar?
— Fala logo, Owen — falei, impaciente.
Ele ergueu as mãos em rendição antes de pegar o celular e
me mostrar uma tela.
— Lyanna Callahan está quebrada — disse com simplicidade.
Meu olhar se estreitou ao ver o extrato bancário que ele havia
conseguido.
— Ela está devendo taxas na universidade, perdeu a bolsa
esportiva e o café que a mãe dela administra está quase falindo.
Levantei uma sobrancelha, interessado.
— Então ela precisa de dinheiro.
— E rápido — Owen confirmou.
Minha mente começou a trabalhar rápido.
— Isso quer dizer que ela está desesperada.
— Exatamente. — Ele observava minha reação. — Você disse
que precisava de algo que a fizesse ceder. Bom, aí está. Ela precisa
de dinheiro para continuar estudando. Você precisa melhorar sua
imagem. Parece uma troca justa.
Um sorriso lento surgiu no canto da minha boca.
— Então agora é só fazer uma oferta que ela não possa
recusar.
Owen riu, balançando a cabeça.
— E como pretende fazer isso?
Peguei meu celular, já montando o próximo passo na minha
cabeça.
— Simples. Eu vou fazer a senhorita Callahan perceber que a
única saída dela… — Girei o telefone nos dedos, satisfeito. — Sou
eu.
Dia seguinte…
O cheiro de hospital misturado com suor e desinfetante me
fizeram engulhar assim que entrei no centro de reabilitação. Ótimo.
Exatamente onde eu queria estar.
Passei os olhos pelo ambiente, os olhares curiosos de alguns
pacientes e funcionários pousando em mim. Claro que sabiam quem
eu era. Logan Donovan, a estrela do hóquei universitário, agora
reduzido a um voluntário forçado.
— Donovan?
Levantei os olhos e vi um homem mais velho se aproximando.
Moletom surrado, olhar avaliador.
— Você deve ser o novo voluntário.
— É o que dizem. — Cruzei os braços. — Onde quer que eu
comece?
Ele apontou para uma sala envidraçada onde algumas
pessoas estavam reunidas.
— Hoje, você vai acompanhar a sessão de fisioterapia e
observar como funciona. Depois, pode ajudar com os exercícios
básicos.
Revirei os olhos.
— Observar? Achei que eu estava aqui para fazer algo útil.
Rick riu seco.
— Só tente não atrapalhar.
Entrei na sala e me encostei na parede, observando os
pacientes. Gente que já esteve no topo e agora lutava para voltar.
Mas eu? Eu só precisava cumprir horas de serviço comunitário até o
conselho decidir que eu podia voltar para o gelo.
Foi quando a porta se abriu novamente. E Lyanna Callahan
entrou.
Ela parou no meio do caminho ao me ver. Seu olhar se
estreitou na mesma hora.
— O que você está fazendo aqui?
Soltei um sorriso preguiçoso.
— Aparentemente, me tornando um cidadão exemplar.
Ela bufou.
— Sério? Isso só pode ser piada.
— Estou tão animado quanto você, Callahan. Mas vou me
esforçar para não deixar minha presença te distrair.
Antes que ela pudesse retrucar, Rick voltou a falar.
— Ótimo, já se conhecem. Melhor ainda, porque a partir de
hoje, Lyanna será responsável por acompanhar você durante o
programa.
— O quê?
Ela arregalou os olhos, parecendo horrorizada.
— Lyanna você é uma das nossas melhores estagiárias. Como
já conhece o programa e os pacientes, vai garantir que esse
mocinho não faça merda.
Ela riu sem humor.
— Ótimo. Agora tenho que ser babá do Donovan.
Virei-me para ela, inclinando a cabeça com um meio sorriso.
— Se precisar de referências, posso te passar o número de
algumas mulheres que adoram o trabalho.
Ela revirou os olhos.
— Vocês dois vão se dar bem. Agora, sem mais tempo a
perder.
Ele se afastou, nos deixando sozinhos. Ela me encarou como
se estivesse decidindo se me jogava pela janela.
— Bom, parece que vamos passar muito tempo juntos,
Callahan.
Ela inspirou fundo, era divertido vê-la perder a paciência.
— Me escuta bem, Donovan. Eu levo esse lugar a sério. Se
você vier com suas piadinhas idiotas e sua arrogância, eu juro que
vou…
— Que vai o quê? — A interrompi, aproximando-me um
pouco mais, baixando a voz. — Me colocar de castigo? Me expulsar?
Tentar me ignorar? Me coloque de joelhos na sua frente faço
questão de levantar esse vestido e te deixar mais calminha com
algumas habilidades que tenho.
Ela travou no lugar, os olhos se arregalando por um segundo
antes de se estreitarem em pura fúria.
— Você é nojento, Donovan. — Ela cuspiu as palavras com
raiva.
Sorri de canto, me inclinando um pouco mais.
— Não precisa admitir agora, Callahan, mas você ficou
imaginando, não ficou?
— Sim. E imediatamente me deu vontade de vomitar.
— Relaxa, eu entendo. — Passei as mãos pelos bolsos da
jaqueta, analisando-a. — Deve ser difícil pra você. Cresceu cercada
de gente medíocre, e agora está na minha frente, tentando se
convencer de que não quer saber como seria ter a minha boca te
chupando inteirinha.
— Isso aqui é um centro de reabilitação, Donovan. Você está
aqui para aprender, não para bancar o idiota convencido.
— Errado. — Sorri, sem um pingo de remorso. — Estou aqui
para cumprir horas obrigatórias até voltarem a me deixar fazer o que
faço de melhor.
Ela parou, me analisando por um segundo.
— E o que você faz de melhor? — perguntou com sarcasmo.
— Ganhar. — Minha resposta foi automática, meu olhar fixo
no dela. — Em tudo.
Ela revirou os olhos e pegou um tablet que estava sobre a
mesa, ignorando completamente meu olhar.
Ó
— Ótimo. Então vamos começar logo com isso. Porque
acredite, Donovan, que você quer passar mais tempo comigo do que
o necessário.
Ela não fazia ideia do quanto eu queria que nosso tempo
juntos se estendesse.
O quanto eu queria essa boca me chupando até não sobrar
mais nada da arrogância dela.
O quanto eu queria enchê-la com a minha porra, até que não
sobrasse espaço para ela pensar em mais nada além de mim, mas,
por enquanto, eu me contentaria em vê-la tentando se convencer de
que me odiava. Porque quanto mais ela fingia desprezo, mais
delicioso seria tê-la rebolando gostoso no meu pau gritando meu
nome.
07
Lyanna Callahan
O dia foi longo e exaustivo. Não pelo trabalho em si, mas
porque eu passei a maior parte do tempo tentando ignorar Logan
Donovan.
E falhando miseravelmente.
Ele estava sempre ali, observando, fazendo comentários
sarcásticos, testando minha paciência a cada maldito segundo.
Mas agora, finalmente, acabou.
Peguei minha bolsa e fui em direção à saída, sem nem olhar
para trás.
— Foi um prazer trabalhar com você, Lya — ele falou cheio de
deboche.
Rolei os olhos, sem me dar ao trabalho de encará-lo.
— Espero que você volte logo para o lugar onde pertence,
Donovan.
E segui em frente.
Ou tentei.
Porque, antes que eu pudesse sair do estacionamento, senti
um braço forte deslizar sobre meus ombros, puxando-me de volta.
Eu conhecia aquele toque. Troy.
— Lyanna, vou te dar uma carona.
— Não precisa. Eu pego o ônibus — falei rápido, tentando
deslizar sutilmente para longe dele.
Seu aperto ficou mais firme.
— Vamos, Lyanna.
Senti seu braço se apertar um pouco mais ao meu redor.
— Parece que você se esqueceu de tudo que fiz por você. Dos
dias que perdi meu treino para ficar com você no hospital.
— Vamos falar sobre isso de novo? Agora?
— Você é ingrata. — Ele cuspiu as palavras com ódio. —
Ficamos juntos por um ano e, do nada, você resolve que eu não
sirvo mais?
— Troy, passamos mais um ano tentando não terminar de
vez. Lembra?
Mas ele nunca aceitava.
— Caralho, Lyanna, tudo que eu faço é por você!
Minha garganta apertou. Tudo que ele fazia era por mim? Me
controlar. Me sufocar. Me manipular e até mesmo me machucar.
— Desculpa, mas já conversamos sobre isso. Não gosto de
tudo que você faz justificando que é por mim. Você estava me
sufocando. E sem falar que você me mach…
— Shh… — Ele pressionou um dedo contra meus lábios, e
meu corpo inteiro gelou.
Eu conhecia esse tom.
— Eu te amo — ele sussurrou. — Eu nunca quis te machucar,
Lyanna. Vem, eu te levo para casa.
— Solta ela.
Troy me largou no mesmo instante, girando o corpo na
direção de Logan Donovan.
A voz dele não foi alta, ela saiu baixa, fria e autoritária.
Troy cerrava os punhos ao lado do corpo, a veia no pescoço
pulou.
— E o que diabos você faz aqui? — Troy rosnou.
Logan deu um meio sorriso, completamente relaxado.
Provocador.
— Não tá vendo? — Ele gesticulou ao redor. — Aqui é um
centro de estágio da universidade onde eu estudo. A pergunta certa
é: o que você faz aqui?
Troy deu um passo à frente, e meu corpo inteiro ficou rígido.
Isso não ia acabar bem.
Mas Logan? Ele nem se mexeu.
— Não se mete com a minha namorada, Donovan — Troy
rosnou.
Eu abri a boca para corrigir, para dizer que não era mais
namorada dele, mas Logan foi mais rápido.
— Sua? — Ele soltou uma risada baixa, cheia de desdém. —
Achei que estivesse rolando um clima entre mim e Lya.
Meu coração parou por um segundo. O quê?!
Troy ficou ainda mais tenso.
— Do que diabos você está falando?
Logan sorriu de lado, dando de ombros como se estivesse
apenas jogando conversa fora.
— Ela não para de encarar meus bíceps e dizer como meus
lábios são lindos.
— Não se mete entre mim e a Lyanna, Logan, ou eu te mato.
— Matar? — Logan riu baixo, balançando a cabeça. — Tanta
violência, Carter. Achei que você fosse mais disciplinado. Afinal, não
é isso que o seu treinador vive falando? Controle emocional e tal?
O Troy que não pensava antes de agir, no fundo os dois
homens na minha frente eram iguais e tudo que eu queria deles era
distância.
Eu segurei a respiração, pronta para intervir, pronta para
puxar Troy e evitar que ele fizesse alguma merda que só o
prejudicaria, mas Logan deu um passo à frente. Não muito. Só o
suficiente para deixar claro que se Troy quisesse brigar, ele não
correria. Mas ele também não revidaria.
Porque Logan Donovan não podia se meter em problemas. E
ele sabia disso.
— Relaxa, Carter. Eu entendo. Deve ser difícil perder pra mim
dentro e fora do rinque.
Foi o bastante. Troy avançou um passo violento. Meu coração
subiu para a garganta. Isso ia dar merda. Mas antes que Troy
pudesse sequer tocar nele, Logan levantou as mãos lentamente.
— Ah-ah — Ele debochou, balançando o dedo para Troy. —
Quer mesmo brigar comigo? Aqui, onde qualquer um pode filmar e
postar na internet?
O corpo de Troy tremeu de ódio.
Ele sabia que qualquer escândalo prejudicaria Troy, e ele não
tinha pais ricos como Logan, então não podia se dar ao luxo de
perder credibilidade com os olheiros da NHL.
— Eu vou te matar, Logan, eu vou acabar com esse seu
sorriso convencido de merda.
Ele me olhou de novo, e então se afastou. Deixei escapar um
suspiro que eu nem sabia que estava prendendo, passando as mãos
no rosto.
Logan apenas sorriu, se divertindo.
— Você quase fez ele te socar!
Ele deu de ombros.
— Quase. Mas o Carter sabe que um deslize e o sonho dele
da NHL vai pro espaço.
— Você sabia que ele não ia te bater.
Logan sorriu de lado, um brilho malicioso nos olhos.
— Eu jogo xadrez, Callahan. Não damas.
— E o que foi aquela porcaria de dizer que eu ficava
encarando seus bíceps?
Ele piscou, aquele maldito sorriso convencido ainda
estampado no rosto, ele vinha sorrindo muito na minha presença.
— Você pode encarar, pegar, fazer o que quiser. — Ele abriu
os braços, como se estivesse se oferecendo. — Sou todo seu,
Callahan.
Soltei um riso seco, cruzando os braços.
— Para de brincar comigo.
Logan inclinou a cabeça, com o olhar fixo no meu. Dessa vez,
sem deboche.
— Não estou brincando. Posso fazer ele nunca mais olhar na
sua direção.
Ele continuou, dando um passo à frente.
— Posso fazer muito mais, Callahan. — Ele manteve os olhos
presos nos meus. — Posso pagar suas taxas na faculdade. Você não
vai precisar se preocupar em como continuar estudando.
— Nossa, quanta gentileza. — Ironizei. — O que quer em
troca?
Perguntei apenas por perguntar. Não porque estava
interessada.
— Que você namore comigo.
Meu coração deu um salto e meus olhos se estreitaram.
— O quê?
Logan me encarou presunçoso, metido como sempre.
— Você ouviu. — Ele inclinou a cabeça, me analisando como
se eu fosse algum projeto interessante. — Seja minha namorada.
Eu pisquei, tentando processar aquela ideia absurda.
— Namorar você? — Soltei uma risada curta, descrente.
— Considere isso uma caridade. — Ele deu de ombros, como
se estivesse me oferecendo um favor inestimável. — Algo que faço
para te ajudar.
— E eu deveria agradecer, é isso?
Ele se aproximou, sem tirar os olhos de mim.
— Apenas reconheça a sorte que tem. Muitas queriam estar
nessa posição.
— Nossa. — Suspirei. — O ego realmente não cabe dentro de
você, né?
— Me cabe em lugares bem apertados, Callahan. Se quiser,
posso te mostrar.
— Você é nojento.
— Me chame do que quiser, não me importo. — Ele inclinou a
cabeça, com os olhos fixos nos meus. — Só diga que aceita e vamos
encurtar esse joguinho idiota onde eu finjo flertar com você.
— Você está brincando, né?
Ele balançou a cabeça negativamente.
— Eu nunca brinco, Callahan.
Soltei um riso incrédulo.
— Ah, entendi. Você está com preguiça de fingir me seduzir,
então quer pular direto para o contrato?
Ele ergueu uma sobrancelha.
— Exatamente.
Revirei os olhos. Claro que era isso.
— E o que te faz pensar que eu aceitaria?
Logan se inclinou um pouco mais para mim.
— Porque você precisa de mim. — Logan deu de ombros, o
tom despreocupado, mas os olhos fixos nos meus, analisando cada
mínima reação. — E eu preciso de você.
Estreitei os olhos.
— Eu não preciso de nada vindo de você.
— Ah, não? — Ele inclinou a cabeça, me observando com
aquele maldito ar superior. — Então me diz, Callahan. É isso que
você quer fazer pelo resto da vida? Servir café, contar moedinhas, se
matar para pagar contas que nunca fecham no final do mês?
Meu maxilar travou.
— Ou você quer estudar e se tornar uma fisioterapeuta de
verdade? — ele continuou, sem pressa. — Quer trabalhar com
atletas de elite? Quer seu nome reconhecido? Porque eu posso te
ajudar com isso também. — Ele abriu um meio sorriso. — Meus pais
têm ótimos contatos. Já imaginou seu nome oficialmente na NHL?
— Eu posso conseguir tudo isso sozinha. — Minha voz saiu
firme, mesmo que por dentro eu soubesse que não, eu talvez não
conseguisse. — Agradeço a oferta, mas não vou fechar um acordo
com alguém que quer usar minha lesão como marketing.
Seus olhos se estreitaram ligeiramente.
— Eu sei o quanto isso me fere, Donovan. Eu não sou um
jogo.
Ele me encarou por um longo momento, então, o olhar
presunçoso surgiu novamente.
— Vou te dar alguns dias para pensar. — Ele girou a chave da
moto entre os dedos, como se não estivesse minimamente
preocupado com minha recusa. — Mas não demora muito, Callahan.
Eu preciso voltar pro time logo.
08
Logan Donovan
Parei a moto em frente à mansão e desliguei o motor com um
suspiro pesado. A SUV preta estacionada na entrada fez meus olhos
revirarem no mesmo instante.
Merda.
Meu pai não costumava vir aqui e quando vinha, era
prenúncio de coisa ruim. Ele trazia consigo toda a negatividade do
universo, como se fosse uma nuvem carregada prestes a desabar
sobre qualquer um que cruzasse seu caminho. E eu? Eu sempre
parecia absorver essa merda toda.
Sempre que nos esbarrávamos, era como se algo dentro de
mim apodrecesse um pouco mais.
Apertei o guidão da moto por um segundo antes de soltar o
ar e descer. Se ele veio até aqui, é porque tem algo para despejar
em mim.
Ele não se virou quando entrei, ficou lá, parado diante da
lareira, os olhos fixos nas fotos que eu mantinha sobre o aparador.
— De onde está vindo? — perguntou com a voz baixa, sem
pressa, sem qualquer real interesse.
— Do programa de reabilitação — respondi, jogando a
mochila no sofá.
— Quem sabe agora você entenda o que é querer e não
poder jogar.
— Então, por que veio aqui? — perguntei ignorando o
comentário. A vida é minha, se estou ou não no hóquei não é da
conta dele.
Ele ajeitou a manga do terno antes de finalmente responder.
— Sua mãe quer que vá jantar em casa na sexta.
— Já disse a ela que não posso — respondi, seco. — Tenho
planos.
— Pode ignorar minha existência o quanto quiser, mas não
faça isso com ela.
Soltei um suspiro curto, olhando para o teto.
— Recado dado. Janto outro dia.
Ele se virou na minha direção, me encarando dessa vez.
— Logan, não pense que pode testar a minha paciência.
— Não fui à sua procura, pai, é você quem está parado no
meio da minha sala.
— Te devolvo o carro na sexta, no jantar — disse indo em
direção à saída.
— Onde vai estar na hora do jantar? — perguntei antes que
ele cruzasse a porta.
Ele se virou com um sorriso debochado, entendendo o motivo
da pergunta.
— Em uma partida de golfe.
— Mande estacionarem o meu carro ainda hoje na garagem e
avise a minha mãe que irei jantar COM ELA — enfatizei.
Ele virou as costas sem me responder, mas ele era tão sangue
ruim quanto eu, isso eu tinha herdado dele, não sei por que ele
ainda era tão insatisfeito quanto a isso.
Subi as escadas sem pressa, seguindo pelo corredor até o
salão de jogos, onde Owen e Tyler jogavam sinuca. O som abafado
das bolas se chocando se mesclava às provocações que trocavam.
— Pensei que o Donovan fosse chegar cantando hinos de
caridade hoje — Owen soltou assim que entrei, ajeitando a mira
antes de acertar a bola.
Tyler riu, apoiando o taco no ombro enquanto me lançava um
olhar curioso
— Conta aí, Logan. Como foi seu primeiro dia?
Encostei-me na parede, soltando um suspiro impaciente.
— Pelo visto, ainda preciso preencher um relatório detalhado
de quantos sorrisos distribuí e quantas toalhas entreguei. — Revirei
os olhos, jogando o corpo contra o sofá. — Ando me esforçando
para não ser expulso de lá também.
Tyler deu uma tacada na bola branca, errando o encaçape, e
bufou.
— Relaxa, nos próximos jogos você já vai estar de volta.
— Para isso, eu preciso que a Callahan aceite sair comigo. —
Cruzei os braços, observando Owen alinhar a mira.
Ele riu curto, sem desviar o olhar do jogo.
— O problema é que você joga hóquei.
— Problema para quem?
Tyler largou o taco sobre a mesa, me lançando um olhar
significativo.
— Para ela, Logan. Acho que tem a ver com o ex… que ainda
parece atuar como atual.
Minha expressão se fechou.
— Se ele se aproximar dela de novo, mando ele pro hospital
igual fiz com o irmão.
Owen arqueou uma sobrancelha, divertido.
— E perde a chance de voltar a jogar?
Passei a língua pelos dentes, inclinando-me para a frente.
— Dessa vez, vou me certificar de que ninguém saiba quem
mandou o infeliz quebrado para a enfermaria.
Tyler soltou uma risada curta.
— Você está defendendo ela? Já chegaram nesse nível?
Sorri de canto, pegando a bola oito da mesa e girando-a nos
dedos.
— Não estou defendendo ninguém. — Me levantei, jogando a
bola no ar e pegando-a com facilidade. — Só deixando claro que no
que é meu, ninguém toca.
Lyanna Callahan
Cheguei em casa e joguei a mochila sobre a cama, sem me
preocupar em organizá-la. Eu precisava de um banho para tentar
apagar o peso do dia. A água quente escorreu pelos meus ombros,
mas não aliviou a tensão acumulada. Nada aliviava ultimamente.
Vesti qualquer coisa e desci até o café, já esperando
encontrar o lugar tão vazio quanto nos últimos dias, mas, para
minha surpresa, havia algumas mesas ocupadas. Meia dúzia de
clientes conversava em tons baixos enquanto minha mãe, atrás do
balcão, preparava o café de forma manual.
Isso não era um bom sinal. Franzi o cenho, me aproximando.
— O que aconteceu?
Ela continuou mexendo no coador, sem me encarar.
— A máquina quebrou. Já chamei o técnico, mas teremos que
usar o dinheiro para pagar os suprimentos que chegaram no outro
dia.
Fechei os olhos por um segundo, suspirei, passando a mão
pelo rosto. Mais uma coisa para resolver.
— Problema, Lya? — A voz dele cortou o ambiente, e meu
corpo ficou rígido no mesmo instante.
Troy estava parado na entrada do café. Parei no meio do
balcão, os dedos apertando a borda da madeira. O que ele estava
fazendo aqui?
Ele entrou com as mãos nos bolsos, e os seus olhos avaliando
o café com calma.
— Precisa de ajuda, senhora Callahan?
Minha mãe soltou um suspiro pesado, o encarando com
desinteresse.
— Você sabe consertar máquina de café? — Ela ergueu uma
sobrancelha. — Se souber, pode fazer alguma coisa útil.
Troy sorriu de lado, dando um passo à frente.
— Posso tentar.
Antecipei-me antes que ele pudesse chegar mais perto.
— Não precisa, Troy. — Minha voz saiu mais firme do que eu
esperava. — Um técnico já está vindo.
Ele me olhou, e o sorriso em seu rosto vacilou apenas por um
segundo, mas então, ele voltou, mais controlado, mais presunçoso.
— Só estou tentando ajudar, Lyanna.
Minha mãe nos observou por um momento antes de balançar
a cabeça e voltar a cuidar dos pedidos.
Troy apoiou um dos braços no balcão, se inclinando um pouco
demais.
— Podemos conversar?
Revirei os olhos, já sabendo que ele não sairia dali até
conseguir o que queria.
Antes que eu pudesse recusar de novo, minha mãe suspirou
exausta.
— Vá logo, Lyanna. Esse moleque não vai parar de encher o
saco e eu preciso da sua ajuda aqui.
Mordi o lábio, hesitante, mas acabei levantando a parte do
balcão para que ele passasse. Quanto mais rápido isso terminasse,
melhor.
Ele me seguiu até a sala da minha casa, e assim que fechei a
porta, me virei de braços cruzados.
— O que você quer, Troy?
Ele me analisou por um instante antes de soltar, sem rodeios:
— Não se aproxime do Donovan novamente.
— Está me ameaçando?
— Estou te avisando, Lyanna. — Sua mão se fechou ao redor
do meu braço com força, os dedos pressionando minha pele.
A mão de Troy apertava meu braço com firmeza, o suficiente
para deixar marcas visíveis, e o bastante para me prender no lugar.
Eu já conhecia esse toque. E sabia exatamente o que ele
significava.
— Me solta, Troy.
Ele não se moveu de imediato. Sequer piscou.
— Você sabe que o Donovan só está brincando com você, não
sabe? — ele disse afrouxando a mão em volta do meu braço e
levando-a até meu rosto. — Ele não liga pra você. Ele nunca vai
ligar. Ele só está te usando.
— Isso não é da sua conta.
— É, Lyanna, eu não vou deixar que outro homem toque em
você.
— Lyanna, preciso da sua ajuda! — A voz da minha mãe
ecoou do café, cortando o silêncio sufocante entre mim e Troy.
Desviei os olhos dele, me recompondo antes de virar as
costas e sair da sala.
— Tchau, senhora Callahan — ele disse atrás de mim, antes
de sair pela porta.
Minha mãe sequer olhou para ele, mas assim que cheguei ao
balcão, ela segurou meu braço e baixou o olhar. Suas mãos pararam
exatamente onde os dedos dele haviam deixado a marca na minha
pele.
Ela ergueu os olhos para mim, estreitando-os.
— Engraçado. — Seu tom era seco. — Você me julga por
estar com o Mark, mas pelo visto serve de saco de pancadas para
esse moleque.
Ela fez uma pausa antes de soltar, com um suspiro.
— Pelo menos o Mark me ama, e cuida de mim.
Ah, claro. Ele ama, assim como Troy também me amava.
09
Logan Donovan
Do alto do camarote privado, eu assistia meu time entrar no
gelo sem mim.
Uma visão irritante.
O uniforme dos Frost Raptors refletia as luzes da arena, a
torcida explodia em gritos enquanto os jogadores se posicionavam
para o faceoff inicial.
No círculo central, Dax Bastien, estava no meu lugar e usava
a faixa de capitão. Apertei os dentes. Nada contra Dax. Ele era um
ótimo center, sabia ler o jogo e tinha uma boa tomada de decisão.
Mas ele não era eu. E ver alguém ocupando a posição que
deveria ser minha me queimava por dentro.
O disco caiu. O jogo começou.
O primeiro período foi uma guerra no gelo. O time adversário
vinha agressivo, pressionando pesado, mas os Raptors não se
intimidavam.
Dax estava jogando bem, como esperado. Tyler e Owen
mantinham a defesa sólida, impedindo os avanços do outro time.
O segundo período veio rápido. O placar marcava 2 a 2. E
então, no terceiro período, veio o momento decisivo.
Dax recebeu o disco na zona neutra, desviou de dois
defensores com um movimento ágil e avançou. Ele estava cercado.
Mas não hesitou. Fingiu um passe para Owen e, em um instante,
chutou o disco direto para o canto superior da rede.
Gol.
A arena veio abaixo, a multidão explodiu, os torcedores se
ergueram das cadeiras, e o som ensurdecedor das buzinas de gol
ecoou pelo local. O time inteiro se lançou sobre Dax em
comemoração.
Meus olhos percorreram a arquibancada lotada por puro
hábito e então, eu vi Lyanna com a expressão fechada, mas atenta
ao jogo. Eu nunca a vi em nenhum jogo, se bem que eu nunca a
havia notado na universidade, os meus planos corriam melhor do
que eu esperava, tê-la aqui já encurtava boa parte do caminho.
Desviei o olhar de volta para o gelo e o apito final veio,
selando a vitória.
Soltei um suspiro pesado, me levantando do assento
enquanto os jogadores patinavam até o centro do rinque para a
saudação final à torcida.
Eu precisava sair dali, ou melhor, eu precisava ir até ela,
estava me habituando a isso, tê-la por perto.
Mas, antes que pudesse sequer sair do camarote, alguém se
pendurou no meu braço.
— Logan!
Abaixei os olhos para a garota que se pendurava no meu
braço como se já soubesse que eu não a afastaria. Emily. Líder de
torcida do time de basquete. Pequena, delicada, sempre maquiada
na medida certa.
Seu sorriso era amplo e sugestivo, e as unhas longas
deslizavam pelo tecido da minha jaqueta.
— Vai estar na festa hoje? — ela perguntou, inclinando-se um
pouco mais, com a voz macia, quase cantada.
Pisquei lentamente, um meio sorriso surgindo nos meus
lábios.
— Claro, gatinha. A festa é na minha casa.
Emily riu baixinho, mordendo o canto do lábio.
— Ótimo. Espero que esteja pronto para comemorar…
Balancei a cabeça devagar, mantendo a expressão
despreocupada.
— Sempre estou.
Ela achou que isso fosse sobre ela.
Mas não era. Meus planos estavam focados em outra pessoa,
e para que eles dessem certo, Lyanna precisava ir à festa também.
Afastei-me de Emily, deixando-a para trás sem esforço, e
direcionei meu olhar para o outro lado da arquibancada.
Caleb já estava em ação. Ele se movia rápido em direção a
Emma, a amiga de Lyanna, exatamente como combinamos. A
missão dele era simples: convidá-la para a festa. O resto viria
naturalmente.
Emma era falante, animada, sociável. Se Caleb fizesse o
convite certo, ela arrastaria Lyanna junto.
E assim, meu plano começaria a se desenrolar. Nada muito
complicado. Nada agressivo. Apenas um empurrãozinho para que
Lyanna se decidisse mais rápido.
Eu não tinha tempo para jogar por muito mais tempo. Nem
paciência.
E, mais importante… não havia outra garota.
Tinha que ser ela, e tinha que ser agora.
Emma riu, parecendo feliz ao receber o convite de Caleb.
Ótimo! Ela logo se virou para Lyanna, fazendo um gesto animado
com o braço, claramente tentando convencê-la.
Mas então, vi Lyanna sacudir a cabeça em negativa.
Minha mandíbula travou.
Sério?
Fiquei observando Caleb intensificar a abordagem.
— Vamos lá, Caleb. Seja mais persuasivo — murmurei para
mim mesmo.
Na mesma hora, ele pegou na mão de Emma, puxando-a para
mais perto.
A garota se derreteu.
— Isso. Bom garoto.
Emma se inclinou ainda mais perto, claramente já envolvida
no jogo.
Agora, só faltava Lyanna. Eu precisava que ela estivesse lá.
Porque minha volta ao time dependia disso.
10
Lyanna Callahan
— Lyanna, nunca fomos convidadas para essas festas! —
Emma praticamente me sacudia, com os olhos brilhando de
animação. — Você tem noção do que isso significa?
— Não! — falei, taxativa.
— Por favor, Lya… — Ela juntou as mãos em súplica, fazendo
aquela cara de cachorro abandonado que ela sabia que eu odiava.
Suspirei pesadamente, desviando o olhar para o brutamontes
na nossa frente.
Caleb Thornton.
Ele apenas sorria de lado, convencido, como se já soubesse
que Emma venceria essa batalha.
Por que esses caras são todos assim? Arrogantes,
convencidos, irritantes.
— Tudo bem — soltei, relutante. — Mas não posso demorar.
Emma deu vários pulinhos, batendo palmas como se tivesse
acabado de ganhar na loteria.
— Você não vai se arrepender!
A convicção na voz dela só me fazia acreditar ainda mais no
contrário. Caleb, satisfeito, apenas sorriu mais largo antes de dar um
passo para trás.
— Então te vejo lá, Emma.
Ele se virou e saiu, ainda vestido com o uniforme do time, o
cabelo ruivo molhado de suor.
Franzi o cenho.
O que diabos ele tinha em mente para correr até aqui apenas
para isso?
O carro de Emma estacionou em uma das últimas vagas
disponíveis na rua, um pouco distante da mansão.
Mesmo do lado de fora, o som da música já era alto o
bastante, e o movimento intenso de universitários indo e vindo
deixava claro que essa não era uma festa qualquer.
A mansão dos Frost Raptors estava lotada. O jardim da frente
se transformara em um ponto de encontro caótico, com grupos
espalhados, alguns rindo alto, outros já claramente bêbados.
Casais se agarravam contra os carros, amigos se desafiavam
a virar garrafas de vodka sem piscar, e, mais ao fundo, o cheiro
inconfundível de maconha se misturava com o de perfume caro e
cerveja derramada.
E eu definitivamente não pertencia àquele lugar.
— Vamos, Lya! — Emma bateu as mãos no volante, animada.
Eu olhava para ela com uma expressão óbvia de “isso é uma
péssima ideia.”
— Tem certeza disso?
— É claro! — Ela já estava abrindo a porta, sem nem me dar
tempo de argumentar. — Quando mais teríamos essa chance?
Isso era verdade. Nós não éramos desse mundo.
Emma e eu não éramos ricas, não fazíamos parte de
fraternidades, não éramos namoradas ou ex-namoradas de atletas
famosos.
Éramos bolsistas. E, naquela festa, isso nos tornava intrusas.
Saí do carro devagar, ajeitando a blusa, tentando ignorar os
primeiros olhares que começaram a se virar para nós assim que
passamos pelos portões.
Alguns curiosos, outros debochados.
Duas garotas que estavam sentadas na borda da piscina
sussurraram algo uma para outra, rindo enquanto olhavam para nós.
Do outro lado, um cara do time de basquete arqueou uma
sobrancelha, claramente tentando entender quem diabos éramos e
por que estávamos ali.
A entrada da casa estava tomada por líderes de torcida e
jogadores universitários, cada um mais impecável que o outro, com
roupas caras, relógios brilhando no pulso e aquela postura que
gritava “nós pertencemos a esse lugar.”
— Relaxa. — Emma se inclinou em minha direção, notando
minha expressão rígida. — Se eles estão olhando, é porque
chamamos atenção. Isso é bom!
Suspirei, seguindo-a pelo caminho que levava até a porta
principal. Assim que cruzamos a entrada, o caos da festa nos
engoliu.
A música estava ensurdecedora, o cheiro de álcool
impregnava o ar, e a quantidade de corpos dançando, rindo e
bebendo fazia o lugar parecer um universo à parte.
Um universo onde regras não existiam.
No centro da sala, uma pista de dança improvisada havia se
formado, com luzes neon piscando ao mesmo tempo que um DJ
gritava palavras que ninguém realmente ouvia.
Em um dos cantos, uma mesa de beer pong estava cercada
por um grupo animado, enquanto apostas corriam soltas sobre
quem derrubaria mais copos.
No andar de cima, casais subiam e desciam, alguns já sem a
menor preocupação em disfarçar suas intenções.
E, no meio de tudo isso, os olhos ainda estavam sobre nós.
Porque, naquele ambiente, duas bolsistas sozinhas eram como um
experimento social. Suspirei, pegando um copo com refrigerante
apenas para ter algo nas mãos, quando senti um arrepio percorrer
minha nuca.
Emma já estava inquieta ao meu lado, os olhos varrendo a
multidão à procura de Caleb.
— Vou procurar o Caleb — ela disse animada, já se afastando.
— Emma, espera… — Tentei chamá-la, mas era inútil. Ela já
estava longe, atravessando a sala sem olhar para trás.
Ótimo. Agora, eu estava sozinha.
Soltei um suspiro, levando o copo de refrigerante aos lábios,
quando meu olhar foi atraído para um canto mais afastado da sala.
E lá estava ele. Logan Donovan. Cercado.
As mulheres ao redor dele se jogavam sem o menor pudor,
algumas rindo alto, outras arrastando as mãos pelos braços e peito
dele. Ele, por outro lado, parecia completamente confortável com a
atenção.
Claro que sim. O astro da universidade, o cara que todo
mundo queria agradar.
Revirei os olhos e me virei para sair dali, mas o universo
parecia determinado a me irritar. Porque, no mesmo instante,
esbarrei em alguém e o líquido do meu copo espirrou direto contra a
camisa do cara à minha frente.
Merda!
— Me desculpa! — falei de imediato, os olhos se arregalando
quando percebi que o refrigerante havia encharcado a parte da
frente da camiseta dele.
Ele não parecia bravo. Na verdade, ele sorriu. Um sorriso que
não me agradou nem um pouco.
— Agora você vai ter que lamber e enxugar.
Meu estômago revirou.
O cara puxou a camisa, tirando-a lentamente, sem desviar o
olhar de mim.
— Vamos, gata. — Ele sorriu de lado, dando um passo à
frente, se aproximando mais do que o necessário. — Não seja
tímida, quero sentir sua língua bem aqui. — Ele traçou um caminho
com o dedo pelo abdômen.
Dei um passo para trás, mas ele acompanhou o movimento,
encurtando a distância de novo. Meu coração acelerou. Eu não
gostava desse tipo de jogo.
— Eu já pedi desculpas. — Minha voz saiu firme, mas não fiz
ideia se ele percebeu.
Porque, antes que pudesse fazer qualquer outra coisa, o
impacto veio. Não contra mim. Contra ele.
O cara foi empurrado com força, dando dois passos para trás
antes de recuperar o equilíbrio.
E então, Logan Donovan estava entre nós.
— Ela é minha. Vaza — rosnou
O cara franziu o cenho, analisando Logan por um segundo,
mas não demorou para entender a situação.
Ele ergueu as mãos no ar, soltando um riso abafado,
carregado de cinismo, antes de dar um passo para trás.
— Relaxa, Donovan, eu estava só brincando com ela.
Logan nem se moveu. Sequer piscou.
— Ótimo. — Logan disse, a voz gelada, sem pressa. — Agora
sai da minha frente antes que eu brinque com a sua cara também.
O cara hesitou por meio segundo. Depois, fez o óbvio, virou
as costas e sumiu no meio da multidão, sem olhar para trás.
Meu corpo ainda estava rígido.
Senti o olhar de Logan em mim antes mesmo de virar o rosto
para encará-lo, e quando o fiz, encontrei exatamente o que
esperava.
Aquela superioridade irritante, misturada a um toque de
diversão no canto dos lábios.
— Isso foi fofo, Donovan. Mas eu não sou sua — falei,
erguendo o queixo.
Ele sorriu de canto.
— Não ainda.
Revirei os olhos e tentei me afastar, mas Logan foi mais
rápido, segurando meu pulso de leve.
Ele se inclinou um pouco, aproximando os lábios do meu
ouvido.
— Se quer jogar comigo, Callahan, vai ter que aprender as
regras primeiro.
— Engraçado. Eu estava prestes a dizer o mesmo pra você.
Logan sorriu, e foi um sorriso verdadeiro, o que não era
comum.
Ele me analisou por um momento, a expressão carregada
daquele divertimento irritante que sempre me fazia querer socá-lo.
— Não vai voltar para o seu harém? — Lancei um olhar para o
canto da sala, onde algumas garotas ainda pareciam ansiosas pela
atenção dele.
Logan apenas riu baixo, balançando a cabeça.
— Com ciúmes, Callahan?
Bufei, girando nos calcanhares.
— Sonha.
Dei um passo para me afastar, mas ele foi mais rápido,
segurando meu pulso novamente.
O suficiente para me fazer parar.
Ele se inclinou ligeiramente, na minha direção.
— Eu sonho, sim. — A voz dele veio baixa, arrastada,
carregada de malícia. — Mas, no meu sonho, você está gemendo
meu nome.
Minha respiração travou por um segundo.
Como ele conseguia ser tão irritante?
Meu olhar, maldito olhar, me traiu.
Eu olhei demais.
Os bíceps marcados sob o tecido da camisa, o jeito que as
veias sob a pele se destacavam levemente.
A barba baixa, bem-feita, que só acentuava ainda mais aquele
sorriso convencido.
Ele era irritante.
Arrogante.
E, pra piorar, tudo nele era lindo.
11
Logan Donovan
Eu não tinha tempo para errar, isso não era um jogo qualquer.
Era como um breakaway nos segundos finais do terceiro período.
Sem defesa. Sem margem para hesitação. Apenas eu, o disco e o
goleiro esperando minha jogada.
Eu sabia como jogar. Sabia ler o adversário, prever os
movimentos, criar a jogada perfeita para vencer. E com Lyanna
Callahan não seria diferente.
Ela era apenas uma garota frustrada, tentando provar algo
para si mesma. Eu só precisava acertar uma única vez. Um chute
preciso. Um movimento inesperado. E então, o disco atravessaria a
linha do gol.
E ela seria minha.
— Que tal uma partida de beer pong?
Lyanna estreitou os olhos.
— Não estou a fim.
Soltei um riso curto, balançando a cabeça.
— Medo de perder para mim?
Ela riu com deboche.
— O que estamos apostando?
Ergui as mãos, fingindo inocência.
— Nada. Quem perde, vira o copo. É só diversão, Callahan.
Ela hesitou.
Respirou fundo.
E então, como eu já sabia que aconteceria, cedeu.
— Tudo bem. Só uma partida.
Era exatamente disso que eu precisava.
Uma partida. Seis rodadas. Seis doses fortes.
A quantidade exata para deixá-la levemente bêbada, mais
solta, menos resistente.
A mesa estava pronta.
Os copos de plástico vermelho preenchidos com doses
generosas de cerveja e um pouco de algo mais forte, alinhados em
formato de triângulo de cada lado.
Lyanna Callahan estava parada na minha frente, ela não fazia
ideia de que já tinha perdido.
— Comece, Callahan. — Fiz um gesto para ela.
Ela pegou a bolinha, girando entre os dedos, e lançou.
Acertou de primeira.
— Nada mal. — Peguei o copo correspondente e virei a dose
sem hesitar.
Sorri de canto ao ver o brilho satisfeito nos olhos dela, mas
aquilo não duraria muito tempo.
Minha vez. Ajustei a mira e joguei. Acerto limpo.
Lyanna franziu o cenho, pegando o copo e levando-o aos
lábios.
Dei um passo para o lado, observando com atenção enquanto
ela bebia.
Primeiro copo.
O jogo continuou.
Segundo copo.
Terceiro copo.
Ela começou a ficar mais solta.
Os ombros menos rígidos, a expressão mais relaxada.
No quarto copo, ela já ria de algo que eu disse e nem era
engraçado.
No quinto, ela praticamente se apoiava na mesa, tentando
manter o foco.
No sexto, eu soube que tinha conseguido exatamente o que
queria.
Ela baixou o copo vazio na mesa, piscando algumas vezes
como se tentasse clarear os pensamentos.
— Você trapaceou — ela murmurou, apoiando os cotovelos na
mesa e encostando o queixo sobre as mãos.
Sorri.
— Eu avisei que sou bom em estratégias.
Ela bufou, mas não parecia brava.
— Minha vida já é uma grande trapaça. Isso não é novidade.
Levantei uma sobrancelha.
— Ah, é? Como assim?
Lyanna suspirou, o olhar desfocado, a língua solta pelo álcool.
— Nasci no lugar errado. Fui o erro da minha mãe. — Ela
girou o copo nas mãos, sem me encarar. — E depois, achei que a
patinação artística fosse me tirar disso, mas olha só... — Ela riu sem
humor. — Agora sou só a garota que um dia foi promissora, mas
caiu e nunca mais voltou.
Minha expressão ficou séria por um instante. Eu não esperava
isso. Eu esperava uma garota bêbada e rindo de qualquer besteira.
Ela respirou fundo, soltando o copo com mais força do que
precisava.
— Acho que bebi demais — ela murmurou, levando a mão à
testa. — Está girando.
É. Com certeza bebeu.
Aproximei-me, segurando seu braço antes que ela perdesse o
equilíbrio.
— Vem, Callahan. Você precisa de um lugar para descansar.
Ela tentou protestar, mas não tinha forças para resistir, então,
simplesmente deixei que se apoiasse em mim. E a levei direto para o
meu quarto.
Enquanto subíamos as escadas, eu sentia os olhares
queimando nas minhas costas. Perfeito.
Alguns cochichavam, outros filmavam. Exatamente como eu
queria.
Amanhã, todo mundo ia comentar que ficamos juntos. Que
Lyanna Callahan saiu da festa direto para o meu quarto.
Eu estava jogando sujo. E sabia disso, mas eu não ligava.
Quando paramos em frente à porta, ela empacou.
— Não vou entrar no seu quarto, seu pervertido.
Revirei os olhos, abrindo a porta de qualquer jeito.
— Relaxa, gatinha — falei, mantendo a paciência. — Não
vamos fazer nada. Você está muito bêbada. Só se senta e descansa
um pouco. Quando se sentir melhor, eu te levo para casa.
Ela hesitou, mas entrou. Suspirei e fui até o frigobar, pegando
uma garrafa d’água.
— Bebe isso — disse entregando a garrafa.
— Ah, droga!
O murmúrio veio acompanhado de um estrondo surdo e me
virei rápido o suficiente para vê-la no chão.
Sentada, pernas dobradas, o tecido da blusa encharcado.
— Você está bem? — perguntei, me aproximando para
ajudá-la, mas ela pareceu esquecer completamente onde estava.
Sem nem pensar duas vezes, simplesmente puxou a blusa
para fora do corpo, querendo se livrar do tecido molhado.
E foi aí que eu congelei.
O sutiã claro colado contra a pele, a curva dos seios
perfeitamente exposta diante dos meus olhos. A respiração dela
ainda estava acelerada pela bebida, o peito subindo e descendo
lentamente, e meu olhar foi direto para os bicos dos seios, marcados
contra o tecido fino.
Duros. Deliciosos.
Meus dedos se flexionaram ao lado do corpo, e por um
segundo, me permiti imaginar o gosto, a textura, a forma como
reagiriam ao toque da minha língua.
Uma onda quente percorreu meu corpo, descendo direto para
o meu pau que pulsou, e eu soube que precisava parar de olhar.
Desviei o olhar.
Mas foi apenas por um instante. Porque eu sabia que ela
estava bêbada, eu nunca forçaria nada com ela nesse estado.
Mas quando olhei de novo, vi o que não deveria estar ali.
As marcas, dedo a dedo, escuras, vincadas na pele pálida do
braço dela.
E, antes que pudesse pensar duas vezes, me abaixei e a tirei
do chão, carregando-a até a cama.
— Não me toca, Donovan — ela resmungou, com a voz
arrastada pelo álcool.
Ergui as mãos no ar.
— Calma, só estou te tirando do chão.
Ela não respondeu. Apenas se aconchegou contra os lençóis,
soltando um suspiro pesado.
— Nossa… como essa cama é macia.
Cruzei os braços, observando-a. Ela estava entregue.
E então, minha atenção voltou para as marcas no braço dela.
Me aproximei de novo, roçando os dedos sobre a pele marcada.
— Onde se machucou? — perguntei.
Lyanna piscou devagar, com os olhos pesados.
— Isso? — ela murmurou, como se demorasse a processar. —
Isso foi o Troy.
Meu maxilar travou.
— Aquele bastardo infeliz. — Ela riu, mas não havia humor na
risada.
Eu já sabia.
Já sabia que aquele desgraçado era um lixo.
— Ele não tem mais direitos sobre mim — Lyanna murmurou,
já meio sonolenta.
— Não, ele não tem. — Minha voz saiu fria. — Eu arranco os
dedos dele, se você quiser.
Dessa vez, ela riu de verdade.
Bêbada, leve, solta.
— Faça isso, Donovan — ela murmurou, a voz já se apagando
enquanto afundava no sono.
— Assim ele nunca mais vai me machucar.
E então, ela apagou, mas eu não.
Fiquei ali, sentado na beirada da cama, olhando para aquelas
marcas por um longo tempo.
12
Lyanna Callahan
A primeira coisa que senti ao acordar foi dor de cabeça.
A segunda, uma cama macia demais para ser a minha.
A terceira… o som de um zíper sendo fechado.
Abri os olhos devagar, sentindo a luz da manhã bater contra
meu rosto, e virei a cabeça para o lado.
E foi aí que vi Logan Donovan se trocando do outro lado do
quarto.
Ele estava de costas para mim, vestindo uma calça jeans e
puxando uma camiseta sobre os ombros largos e definidos.
Eu gritei.
— CARALHO, CALLAHAN! — Logan se virou bruscamente, os
olhos arregalados. — Você me assustou, porra!
Meu coração disparou enquanto minha mente tentava juntar
os pedaços da noite passada.
Eu estava na cama dele.
Com uma saia.
E sem blusa.
Minhas mãos voaram para segurar o lençol contra o peito,
conforme o pânico tomava conta.
— Filho da mãe… O que você fez?!
Logan piscou, e então sorriu. Aquele sorriso maldito,
convencido, debochado.
— O que eu fiz? Ou… o que nós fizemos?
— Logan… — Minha voz saiu fraca. — O que fizemos?
Ele inclinou a cabeça com aquele brilho de diversão nos olhos
azulados.
— Bom… nada demais — ele disse, como se estivesse
relembrando a noite. — Só se sentou gostoso no meu pau e gritava
meu nome tipo… “Sim, marca o gol!”
Ele gargalhou.
Eu quis morrer.
— Merda. Merda! — Pressionei os dedos contra as têmporas.
— Eu estava bêbada. Você sabe disso, não é?
Logan revirou os olhos e se jogou no sofá com uma
expressão entediada.
— Relaxa, gatinha. Não rolou nada.
Eu parei, piscando.
— O quê?
— Você ficou bêbada, eu te trouxe pra descansar e você
dormiu. — Ele apontou para o sofá. — Eu dormi aqui.
O alívio percorreu meu corpo.
— Mas ainda dá tempo.
Meu estômago revirou.
— Do quê?
Ele sorriu de canto.
— Agora que está sóbria, o que acha?
O travesseiro voou na cara dele antes que ele terminasse de
piscar.
— IDIOTA!
Logan gargalhou, desviando sem esforço.
— Calma, Callahan. Tá muito agressiva para quem teve uma
boa noite de sono.
Ignorei, levantando-me rapidamente e olhando ao redor,
procurando minha blusa.
— Onde diabos está minha…
Antes que eu terminasse, ele a segurou no ar, balançando de
um lado para o outro.
Com um olhar insuportavelmente presunçoso.
— Procurando isso?
Arranquei a blusa da mão dele, meu rosto queimando de
irritação.
— Você é um filho da…
— Vem, Callahan — ele cortou, se levantando. — Vamos
tomar café da manhã e eu te deixo em casa.
Fuzilei-o com o olhar, segurando minha blusa com força.
— A única coisa que eu quero agora é sair daqui e esquecer
que isso aconteceu.
Logan sorriu ainda mais.
— Boa sorte com isso, gatinha.
— Que droga, Lyanna — resmunguei para mim mesma,
esfregando o rosto com as mãos. — Que ódio.
— Você pelo menos lava os lençóis depois que traz suas
mulheres pra cá?
Ele riu, mordendo o lábio, claramente se divertindo com o
meu surto.
— Nunca trouxe nenhuma.
Franzi o cenho.
— Mentira.
Logan apenas deu de ombros.
— Se eu quiser foder, faço isso em outros quartos. — Os
olhos dele me prenderam no lugar. — Aqui é o meu espaço.
Entendeu?
Revirei os olhos, ainda irritada.
— Então devo agradecer por ter sido trazida ao seu quarto
sagrado? — Meu tom foi puro sarcasmo.
Ele riu baixo, o olhar percorrendo meu corpo com a calma de
quem já tinha vencido, e então, se inclinou ligeiramente para a
frente.
— Não. Mas deveria saber que eu te foderia aqui fácil.
Senti o ar preso na garganta. Meu rosto esquentou, e meu
corpo, o traidor que era, reagiu antes que eu pudesse impedir.
Joguei um travesseiro na cara dele.
— Babaca.
Desci as escadas e atravessei a saída tão rápido que tudo ao
meu redor virou um borrão. O ar frio da manhã bateu no meu rosto,
mas nem isso foi suficiente para esfriar o turbilhão de pensamentos
na minha cabeça.
Peguei o celular no bolso e a tela acendeu com mais de
cinquenta chamadas perdidas de Emma.
E uma mensagem.
"Amiga, estou indo para casa. Onde você se meteu?"
Fechei os olhos, soltando um suspiro pesado.
Onde eu me meti? Boa pergunta.
Logan Donovan
Suspirei, pressionando as têmporas assim que Lyanna cruzou
a porta e sumiu da minha vista.
Owen, Caleb e Tyler estavam reunidos em torno da grande
mesa de café da manhã. Dax, recostado contra a bancada, revisava
o noticiário no celular.
— Pela sua cara, você ficou sem foder essa noite. — Owen
soltou, um sorriso de pura provocação.
— Não me enche o saco, porra — resmunguei, jogando-me
em uma das cadeiras livres.
Caleb deu uma risada baixa, tomando um gole de suco.
— Devia ter deixado ela dormindo e ido aproveitar.
Passei a mão pelo rosto, sentindo uma leve dor de cabeça se
formando.
— Não dava — respondi, pegando a xícara de café. — A ideia
é todo mundo achar que eu e ela ficamos juntos.
Tyler arqueou as sobrancelhas, interrompendo a leitura de
seu celular.
— Você está mesmo disposto a bancar essa encenação até
quando?
Soltei um suspiro, girando a xícara entre os dedos.
— Caralho, Donovan, isso parece uma merda completa — Dax
comentou sem tirar os olhos do celular, mas obviamente prestando
atenção na conversa.
Owen apoiou os cotovelos na mesa, olhando-me de cima a
baixo.
— Vai fazer voto de castidade por quanto tempo, hein? — Ele
deu um risinho. — Ou melhor: quanto tempo esse teatro vai durar?
Revirei os olhos, apoiando-me no encosto da cadeira.
— Planejei levar até eu voltar para o rinque.
— Mas…? — Caleb incentivou, largando o copo.
— Mas seria muito na cara que foi armado se eu parasse
assim que fosse reintegrado. — Dei de ombros. — Então, acho que
dois meses tá de bom tamanho.
Tyler soltou uma risada, balançando a cabeça em descrença.
— Dois meses sem ir pra cama com ninguém, Donovan? Você
não dura uma semana.
Fiz uma careta, bebendo meu café em silêncio.
— Talvez eu descubra um jeito de deixar esse teatrinho
mais… divertido — completei, abrindo um leve sorriso de canto.
O silêncio que se seguiu foi cortado pelo riso curto de Dax.
— Bem, só não fode tudo antes de conseguir o que quer,
Donovan.
— Não sou desesperado, dois meses sem foder em troca de
ter a NHL, eu aguento — retruquei, sem humor.
— Você é desesperado, Donovan, mês passado foi uma
diferente para cada dia da semana — Owen e Caleb disseram ao
mesmo tempo, provocando a gargalhada de Tyler.
Fechei os olhos por um instante, me obrigando a não jogar a
xícara neles.
— Foda-se, depois que isso passar eu trepo dia e noite —
murmurei, voltando a beber meu café.
Owen riu, se jogando mais para trás na cadeira, os braços
cruzados atrás da cabeça.
— Se conseguir esperar dois meses, eu mesmo pago uma
rodada pra você no clube.
— Que generoso da sua parte. — Revirei os olhos, bebendo
mais um gole de café.
Dax, ergueu os olhos do celular e soltou um riso curto.
— Aposto que você não aguenta nem dois dias.
— Aposto que vocês são um bando de otários que deveriam
focar nos próprios problemas. — Joguei a xícara sobre a mesa, já
irritado.
Caleb riu, pegando um pedaço de bacon.
— Só estamos aproveitando o momento raro onde Logan
Donovan não está fodendo ou brigando com alguém.
— E, agora, bancando o namorado falso de uma bolsista —
Owen acrescentou, com um sorrisinho sacana.
Todos riram, menos eu.
— Callahan ainda não aceitou — Tyler afirmou.
— Mas vai — falei, confiante.
Dei de ombros, um sorriso de canto surgindo naturalmente.
— Se eu jogar direito, talvez nem precise de voto de
castidade.
Inclinei-me um pouco mais sobre a mesa, pegando um
pedaço de torrada e girando-o entre os dedos enquanto falava.
— Você sabe… ser atencioso, jogar umas palavras certas,
fazer uns carinhos no momento certo… — Dei um meio sorriso,
despreocupado. — Ela se encanta, relaxa, e quando perceber, já
está na minha cama.
Owen soltou uma risada curta.
— Você fala como se fosse uma ciência exata.
Dei de ombros, tranquilo.
— E, não é? Todo mundo gosta de sexo.
Mordi um pedaço da torrada, mastigando sem pressa antes
de continuar:
— Ela também deve gostar.
Caleb soltou um assobio baixo, enquanto Tyler apenas
balançava a cabeça, rindo.
— Isso significa que está mirando na Callahan de verdade? —
Dax perguntou, estreitando os olhos para mim.
Apenas segurei a xícara de café, observando o líquido escuro
dentro dela.
— Significa que os dois podem aproveitar o tempo juntos.
Owen riu, batendo na mesa.
— Caralho, você realmente acha que vai levar essa garota pra
cama?
Ergui o olhar para ele, mantendo minha expressão
indiferente.
— Eu não acho.
Um silêncio pairou sobre a mesa. Todos me encaravam.
E então, completei:
— Eu tenho certeza.
Caleb riu baixo, balançando a cabeça.
— Sabe que, se errar o chute, isso pode te foder de verdade,
né?
Joguei a cabeça para trás, soltando um suspiro entediado.
— Vocês falam como se eu não soubesse o que estou
fazendo.
Dax ergueu as mãos, como se não quisesse se envolver.
— Só não faça merda, Donovan.
— Relaxa. — Dei um sorriso preguiçoso, me levantando da
cadeira. — Quando eu jogar o disco no gelo, vai ser um gol limpo.
Owen riu, jogando um pedaço de bacon na minha direção.
Owen riu baixo, balançando a cabeça.
— Boa sorte, Donovan.
Levantei-me, pegando minha jaqueta, mas antes de sair, olhei
para Dax.
— Ei, Dax… conhece algum galpão onde eu possa ter uma
conversa reservada sem ser incomodado?
Ele ergueu uma sobrancelha, o interesse acendendo nos
olhos.
— Depende. Quem é o convidado?
Ajustei a gola da jaqueta, meu sorriso era frio.
— Troy Carter.
Owen soltou um assobio baixo, enquanto Caleb parou de
mastigar, me observando com mais atenção.
— E posso saber o motivo desse encontro amigável? — Dax
perguntou, interessado.
Apertei os nós dos dedos, sentindo o sangue ferver só de me
lembrar das marcas no braço de Lyanna.
— Ele tocou no que é meu, com uma força que não deveria
ter usado.
Dax riu, recostando-se na cadeira.
— Vai arrancar os olhos dele? — ele perguntou, animado.
— De início… só os dedos.
Dax gargalhou, batendo a palma da mão contra a mesa.
— Fácil. — Ele jogou um pedaço de bacon na boca, falando
casualmente. — Eu começo uma briga com ele no rinque. Quando
ele cair no gelo sem luvas, você pisa nos dedos dele com os patins.
— Problema resolvido.
Owen assobiou de novo, balançando a cabeça.
— Vocês são dois doentes.
Tyler apenas riu, enquanto Caleb se recostava na cadeira.
13
Lyanna Callahan
Cheguei ao campus e o burburinho começou antes mesmo
que eu pisasse dentro do prédio da universidade.
Risos abafados. Cochichos. Olhares diretos demais.
Franzi o cenho, puxando a alça da mochila e seguindo até
onde Emma estava cercada por algumas meninas.
Assim que cheguei perto, os sorrisos aumentaram.
— Do que vocês estão falando? — perguntei, já irritada.
E todos riram.
se virou para mim, eu podia ver nos olhos dela a preocupação
e curiosidade.
— Lyanna, onde você se meteu esse final de semana?
Suspirei, ajeitando a mochila no ombro.
— Estava no café. Só fiquei sem celular, mas já resolvi.
Ela ergueu as sobrancelhas, me analisando por um momento.
— Então você precisa se atualizar das fofocas.
O incômodo no meu peito aumentou.
— Por quê?
— Olha isso aqui.
Meus dedos deslizaram pela tela do celular, os vídeos da festa
estavam por toda parte.
O momento exato em que Logan me carregava escada acima.
O sorriso convencido dele. Meu corpo relaxado contra o dele.
E, abaixo dos vídeos, os comentários eram ainda piores:
"Logan anda fazendo caridade agora, meninas."
"Ele pegou essa menina? Eca, que nojo."
"De que buraco essa coisa saiu?"
"A bolsista deve ter implorado."
"Duvido que ele tenha encostado nela. Deve ter ficado
com pena e deixado dormir lá."
Senti minha garganta secar, o estômago embrulhar. Rolei mais
para baixo, e os comentários só pioravam.
"Acho que ele fez alguma aposta com os amigos. Só
pode."
"Esse tipo de garota acha que só porque dormiu na
cama de um jogador, agora pertence ao time."
"Provavelmente ele nem precisou falar nada, ela se
jogou pra cima dele."
Meus dedos apertaram o celular com força, meu peito
subindo e descendo de raiva.
O ar pareceu faltar por um momento, e eu precisei respirar
fundo para não explodir.
— Lyanna?
Emma chamou meu nome, me sacudindo levemente. Meus
dedos se fecharam ao redor do celular, meu peito queimando de
raiva.
— Você viu o Logan? — perguntei, entre dentes, tentando
controlar minha respiração.
Emma me olhou hesitante.
— Ouvi dizer que teve treino extra para o time de hóquei.
Mesmo fora, ele deve estar lá.
Nem me despedi.
Apenas virei nos calcanhares e caminhei direto para o rinque.
O barulho dos patins riscando o gelo ecoava no ambiente,
mas Logan não estava ali. Não vi nem sinal dele na arquibancada,
nem no banco de reservas. Então, sem pensar duas vezes, cruzei o
corredor e segui direto para o vestiário.
Abri a porta com tudo.
— Que merda é essa, Logan?! — Minha voz reverberou pelo
espaço.
Um grupo de jogadores se trocava, alguns apenas de toalha,
outros puxando camisas sobre a cabeça.
Um deles deixou cair a meia que estava calçando. Todos
congelaram. Incluindo Logan.
Ele estreitou os olhos.
— Que porra, Lyanna?! — ele rosnou, olhando ao redor antes
de soltar um suspiro exasperado.
Passou as mãos pelos cabelos molhados e gritou, irritado:
— Vaza todo mundo, porra!
Os jogadores não precisaram ouvir duas vezes. Pegaram seus
pertences e saíram em fila, trocando olhares debochados.
Um deles passou por mim rindo e murmurou um "A bolsista é
ousada", antes de desaparecer pelo corredor.
Respirei fundo, sentindo o sangue ferver na minha pele.
Os últimos jogadores passaram por mim rindo, murmurando
comentários que eu me recusei a ouvir.
Assim que o último saiu, Logan bateu a porta com força, o
som ecoando pelo vestiário vazio. Ele se virou para mim, os olhos
estreitos e a mandíbula travada.
— Que porra você faz entrando em um vestiário masculino?
— rosnou irritado.
— Quer me dizer agora que porra está acontecendo?! —
Joguei o celular no banco com as imagens da festa.
Logan arqueou uma sobrancelha.
— Seja mais específica, gatinha. Qual parte exatamente te
incomodou? A que acham que estamos juntos, ou a que estão te
chamando de esmola da semana?
Meu sangue gelou, porque ele sabia o que estavam falando e
não parecia dar a mínima.
Meu maxilar travou.
— Você armou essa merda toda.
Ele deu de ombros.
— Não posso controlar o que as pessoas falam, Callahan.
Meu ódio duplicou.
— Mas pode controlar o que você faz.
Ele riu, preguiçoso, como se minha raiva fosse puro
entretenimento para ele.
— E o que exatamente eu fiz?
Aproximei-me mais um passo, o peito subindo e descendo
rápido demais.
— Você me usou, conserta essa merda!
Ele piscou devagar, e então inclinou a cabeça.
— Hum… Não!
O ar escapou dos meus pulmões em um suspiro furioso.
— Como assim "não"?!
Logan sorriu de canto.
— Eu gosto assim.
Minha mandíbula travou.
— Você gosta assim?!
Ele deu de ombros.
— Claro. Agora todo mundo acha que estamos juntos. Você
tem noção do status que isso te dá?
Meus olhos arderam de frustração.
— Eu não quero status, seu babaca! Quero minha vida normal
de volta e não ser chamada de lanchinho de playboy.
Ele soltou uma risada baixa, me analisando de cima a baixo.
— Bom, aí já é tarde.
Respirei fundo, tentando não perder o controle.
— Então, o que você sugere, gênio do caos?
Ele deslizou a língua pelos lábios antes de responder, como se
estivesse apreciando cada segundo da minha raiva.
— Simples. Se dissermos que foi um erro, eu me safo fácil.
Você? — Ele fez uma pausa, olhando diretamente nos meus olhos.
— Vão dizer que tentou chamar atenção, que quer fama, que quer
se aproveitar de mim.
No fundo, eu sabia que ele estava certo. Eu já tinha lido os
comentários. Já sabia o que as pessoas estavam dizendo.
— Filho da puta — rosnei, entre dentes.
Ele riu de novo.
— Vamos encarar a realidade, Callahan. Se aceitarmos isso e
seguirmos com o teatro, você pode ganhar algo com isso também.
— E o que exatamente eu ganho com isso?
Ele se inclinou ligeiramente para a frente, me forçando a
encará-lo.
— Pago as suas taxas na universidade. Sua reputação intacta.
Um estágio muito bom. — Ele sorriu. — Talvez até uma vaga oficial
como fisioterapeuta na NHL, quem sabe? E eu volto pro rinque.
Eu queria gritar. Jogar algo nele. Socar sua cara convencida.
Mas, no fundo, eu sabia. Eu estava encurralada, minha vida
aqui seria difícil depois dessas fofocas.
A raiva fervia dentro de mim e minha mão voou na direção
dele antes que eu pudesse pensar, mas Logan era mais rápido. Ele
agarrou meu pulso no ar, puxando-me para mais perto com uma
facilidade irritante.
Antes que eu pudesse reagir, ele prendeu minha outra mão
acima da minha cabeça, me encurralando contra os armários frios do
vestiário.
Minha respiração falhou.
— Vou dizer a todo mundo que você é gostosa pra caralho —
ele sussurrou, com a boca a centímetros da minha. — Que estou
apaixonado, gatinha.
A sua mão livre traçou um caminho pelo meu corpo.
— Você não faz ideia do que essas palavras significam.
Meu corpo inteiro tremia de raiva… mas também de algo que
eu não queria nomear.
— Não estou nem aí — disparei entre dentes.
Mas minha voz não saiu tão firme quanto eu gostaria. Os
olhos dele baixaram para minha boca, e meu coração falhou uma
batida. O calor do corpo dele. O perfume fresco misturado com o
suor leve. Tudo era sufocante.
E antes que eu processasse, Logan abaixou a cabeça e me
beijou. E que beijo do inferno. Minha mente gritava para empurrá-lo,
mas meu corpo estúpido e traidor se moldou contra ele. Minhas
mãos, que antes estavam presas, agarraram os braços fortes dele,
sentindo os músculos se flexionando sob os meus dedos.
Ele gemeu baixo contra a minha boca, a língua roçando nos
meus lábios. Foi aí que meu cérebro voltou ao lugar.
Empurrei seu peito com força, quebrando o contato.
— Filho da puta!
Ele riu. Riu.
— Isso foi só um aperitivo, Callahan.
— Vai se foder. — Eu cuspi, limpando a boca com as costas
da mão.
Respirei fundo, tentando reorganizar meus pensamentos. Eu
sabia que não tinha escapatória. Então endireitei a postura e o
encarei de frente.
— Um mês nessa farsa, Donovan.
— Dois.
Mordi o interior da bochecha.
— Sem beijo, sem mão boba, sem gracinha.
Ele riu, balançando a cabeça.
— Se você acha que vai aguentar…
Ignorando a forma como meu corpo ainda tremia, continuei:
— E o principal, não vamos nos meter na vida um do outro.
Ele assentiu devagar, com os olhos fixos nos meus.
— Justo. Mas só tem uma coisa, Callahan.
— O quê?
— Só não quero sair de otário nessa história, não fique
andando com outros caras e muito menos fique perto do seu ex.
— Digo o mesmo a você. Não seja visto com nenhuma outra
mulher. Seja o namorado perfeito. Fiel. Carinhoso. Romântico.
Ele riu, pegando a toalha e jogando-a sobre o ombro.
— Te encontro na aula, gatinha.
14
Logan Donovan
Saí do vestiário com a mente ainda no gelo, o gosto da
adrenalina que continuava pulsando no meu corpo. O treinador
finalmente havia me deixado treinar, mesmo que separado do time,
e agora era apenas uma questão de tempo até eu estar oficialmente
de volta.
Ajustei a camisa enquanto caminhava pelo corredor, sentindo
os olhares se voltarem para mim. Cochichos discretos, sorrisos
maliciosos, olhares curiosos.
Era sempre assim depois das festas que dávamos em casa.
Eles estavam esperando o espetáculo de sempre, o momento em
que eu cruzaria com a garota da noite anterior e fingiria que ela não
existia.
As líderes de torcida sempre sabiam o que esperar. Elas
jogavam o jogo, aproveitavam a atenção, e depois seguiam em
frente.
Mas, desta vez, havia um detalhe diferente. Desta vez, não
era uma líder de torcida. Desta vez, o nome nos sussurros era de
uma garota qualquer. Lyanna Callahan, uma bolsista, alguém que
nunca havia chamado para si qualquer atenção.
Lyanna não estava em lugar nenhum no corredor. Talvez
estivesse escondida debaixo de alguma mesa, tentando evitar o
inevitável.
Revirei os olhos, passando a língua pelos dentes com tédio.
Eu sou Logan Donovan. Capitão do time de hóquei, herdeiro do
maior grupo imobiliário do país. As pessoas matariam para estar no
lugar dela.
Ela deveria se sentir honrada por ser a minha primeira
namorada, mesmo que fosse tudo uma farsa. Se isso fosse real, é
claro que nunca estaríamos nesse nível de relacionamento, eu não
me envolvo com ninguém. Mas isso não importava. O que importava
era a história que estavam contando, e, no final das contas, ela seria
lembrada como a garota que conseguiu prender Logan Donovan.
Entrei na sala e lá estava ela, sentada, as mãos se esfregando
uma na outra, os olhos fixos na entrada, como se estivesse
esperando uma bomba explodir.
E então, ela me viu.
Os ombros ficaram rígidos. O olhar endureceu. A tensão
tomou conta do corpo inteiro.
Delicioso.
Um sorriso preguiçoso surgiu no canto da minha boca. Eu
tinha que provar toda essa delícia.
Devagar, caminhei até minha cadeira, ignorando os olhares ao
redor.
— Bom dia, namorada — sussurrei apenas para ela ouvir, mas
todos nos observavam.
Lyanna fechou os olhos por um segundo.
— Não me chama assim.
— Por quê? — Inclinei a cabeça, me jogando na cadeira ao
lado da dela. — Estamos namorando, lembra? Ou já quer terminar?
Ela bufou, os dedos apertando o lápis entre as mãos como se
quisesse quebrá-lo.
— Estamos na sala de aula, Donovan.
Sorri. Eu adorava quando ela dizia meu sobrenome assim,
irritadinha, sexy, deliciosa. Caralho! Tenho que foder essa mulher.
— Sem mãos bobas, sem beijos, sem gracinha — ela
sussurrou quando me sentei ao lado dela.
Fiz um gesto com a mão, entediado.
— Mas Callahan, isso é um relacionamento. As pessoas
precisam ver química entre nós.
Ela me olhou de esguelha, desconfiada.
inclinei-me um pouco mais, reduzindo a distância entre nós.
— São os detalhes que fazem a diferença, Callahan.
Ela estreitou os olhos, analisando minhas palavras com mais
desdém do que deveria.
— Agora você virou especialista em namoros?
Ri baixo, passando a língua pelos lábios.
— Jamais. — Me inclinei um pouco mais, deixando meu olhar
prender o dela. — Está para nascer a mulher que vá amarrar Logan
Donovan.
— Então por que diabos estamos tendo essa conversa?
— Porque, por enquanto, você precisa fingir que me amarrou.
Ela soltou um suspiro irritado, cravando as unhas na mesa.
— Isso vai ser um inferno.
Inclinei-me ainda mais, até minha boca quase roçar a orelha
dela.
— Não, gatinha… Isso vai ser divertido.
Lyanna Callahan
Eu tentava focar no homem sentado ao meu lado.
Focar nas tatuagens que cobriam seus braços e pescoço, no
casaco despojado, no jeito relaxado e convencido de sempre. Focar
no fato de que ele era um playboy mimado, um jogador de hóquei
violento, alguém de quem eu prometi manter distância.
Mas a voz rouca dele… Os olhos azuis perfurando minha pele
como se eu estivesse nua, tiravam um pouco do meu foco.
Respira, Lya.
Dois meses.
Era só aguentar isso por um tempo.
O sinal tocou, me arrancando daquele pequeno transe
irritante. Juntei meus livros apressada e saí da sala como se o
próprio ar ali estivesse me sufocando. Emma veio atrás de mim
grudada como chiclete, até finalmente me barrar no meio do
corredor.
— O que significa isso, Lya?! — A voz dela saiu aguda, e ela
me encarou com os olhos arregalados.
Fiz uma careta. Não adiantava fugir. Ela ia insistir até
conseguir uma resposta. Então disparei de uma vez.
— Estou namorando o Logan.
Emma piscou.
Uma.
Duas vezes.
O choque escancarado nos olhos dela.
— O quê?! Quando?! Como?!
Suspirei, passando a mão no rosto.
— Na festa. Sei lá.
Cruzei os braços, incomodada.
— Veio de antes, talvez. Das olhadas. Do estágio. — Bufei. —
Não sei, Emma, só… aconteceu.
Por um segundo, achei que ela fosse surtar, mas então seus
olhos brilharam de empolgação.
— Eu sou amiga da namorada de Logan Donovan?!
Revirei os olhos.
— Eu me lembro de você ter ido atrás do Caleb ontem, então
estamos na mesma.
Emma fez uma careta.
— Não. Ele nem me deu bola quando o encontrei. Estava se
esfregando com a Emily, aquela oferecida.
Revirei os olhos, e ela me analisou de cima a baixo.
— Mas você fisgou o capitão. — Ela estreitou os olhos. — Tem
um talento natural para isso?
A insinuação era clara, ela estava falando do Troy.
Soltei um suspiro pesado, irritado.
— Eu conheci o Troy quando éramos crianças. Uma coisa não
tem nada a ver com a outra. Agora me deixe ir, eu tenho que ajudar
a minha mãe no café.
Eu parecia estar fugindo de alguém.
E, bem… eu estava.
Não me sentia pronta para dizer em voz alta que “namoro
Logan Donovan”.
Mesmo que fosse uma mentira.
Minha mente focava em um único detalhe:
Eu estava próxima demais do que prometi manter à distância.
Respirei fundo e apressei os passos pelo estacionamento, mas
a voz rouca e desdenhosa me fez pausar no mesmo instante.
— Aonde vai com tanta pressa, Callahan?
Antes que eu pudesse responder, ouvi o som do alarme
destravando a Ferrari azul-marinho, estacionada bem à minha
frente.
— Deixo você aonde quer que esteja indo.
— Não precisa. — Minha voz saiu firme, mas o corpo travou
quando senti sua presença se aproximar.
E então, ele fez.
Afastou meus cabelos e depositou um beijo na minha nuca.
O campus parou.
Sim, todos pararam.
Os cochichos cessaram, as pessoas congelaram. Todos
viraram para olhar.
E eu? Eu odiava essa exposição.
O peso do preço que estava pagando caiu sobre mim como
uma pedra.
Antes que pudesse me afastar, ele deu mais um passo,
parando ao meu lado, e entrelaçou os dedos nos meus.
Foi o suficiente. A declaração pública.
Agora não existiam mais dúvidas.
Logan Donovan estava namorando. E eu era a namorada.
A primeira namorada.
15
Logan Donovan
O motor do carro roncou quando estacionei em frente ao
café. Era cedo. Muito cedo para um Donovan estar num lugar como
esse.
Mas eu precisava deixar uma coisa bem clara para todo
mundo eu tinha uma namorada, perfeita, exemplar e que ia me
colocar nos trilhos, bom era nisso que eles precisavam acreditar.
Se era para fingir, que fosse convincente. A porta da casa dela
ficava ao lado do café, encostei-me no carro, ajeitei os óculos de sol
no rosto e esperei.
Cinco minutos.
Oito.
Então, finalmente, a porta abriu.
E lá estava ela de moletom surrado, mochila jogada de
qualquer jeito no ombro, cabelo preso no alto da cabeça.
Completamente despreparada para o que estava prestes a
acontecer.
Seus olhos demoraram alguns segundos para me ver ali. Mas
quando viram? Ah… que cara maravilhosa de quem quer me matar.
Ela congelou na porta. A expressão fechou e eu só pude
sorrir.
Cliquei a chave do carro, destravando as portas. O som ecoou
na rua silenciosa.
Ela piscou algumas vezes, como se tentasse absorver a cena,
e então, começou a andar rápido para passar direto por mim.
Peguei seu pulso no meio do caminho.
— Bom dia, Callahan.
O corpo dela ficou rígido.
— O que você está fazendo aqui? Isso não estava no
combinado.
Inclinei a cabeça, sem soltar seu pulso.
— Que tipo de namorado eu seria se não te buscasse para ir
pra faculdade?
Ela bufou, puxando o braço com força.
— O tipo que me deixa em paz?
Soltei uma risada baixa.
— Não soa muito convincente para um casal apaixonado,
você não acha?
Ela cerrou os dentes, e pude ver suas narinas inflarem.
— Eu não vou entrar nesse carro, Logan.
— Vai sim.
— Você não manda em mim.
— Não, mas eu tenho certeza de que você não quer que o
nosso namoro pareça falso, quer?
Seus olhos queimaram em fúria, com a mandíbula travada,
ela entrou no carro.
Lyanna Callahan
Eu podia matar esse desgraçado.
De todas as coisas que Logan Donovan poderia fazer para me
irritar, me buscar em casa foi a pior delas.
O filho do bilionário.
O capitão do time de hóquei.
E a bolsista do café?
Não fazia sentido.
Os olhares queimariam a minha nuca assim que chegássemos
na universidade.
O carro era espaçoso, luxuoso, completamente diferente de
qualquer veículo em que já tinha entrado na vida. Mas, de alguma
forma, parecia menor com ele dentro.
Logan apertou o botão de partida e o motor roncou, então,
antes de arrancar, ele olhou para mim.
— Relaxa, Lya.
— Não me chame assim.
Ele sorriu de canto, convencido.
— Ah, então já quer que eu te chame de “amor”?
— Vai se ferrar.
— Eu aceito um “bebê” também, mas só se for com aquele
tom manhoso.
Filho da puta.
Afundei no banco e cruzei os braços, irritada.
Ele apenas riu e acelerou.
Não demoramos a chegar na universidade que fervilhava
como sempre: corredores lotados, grupos espalhados pelos
gramados, vozes misturadas em conversas sobre provas, festas e
fofocas. Mas naquele instante, toda a rotina se quebrou.
O motivo?
A Ferrari azul-marinho deslizou pelo estacionamento principal
como se fosse uma cena de filme. O motor roncou baixo antes de
Logan Donovan estacionar bem na entrada, chamando atenção
instantaneamente. Eu senti o primeiro impacto antes mesmo da
porta se abrir.
Os cochichos começaram.
As cabeças se viraram.
Os olhares se fixaram.
Respirei fundo. Nada poderia me preparar para isso.
Antes que eu processasse a cena, a porta do lado do
motorista se abriu e, em seguida, a minha também, a mão de Logan
surgiu no ar, oferecendo ajuda.
Não toquei. Ele arqueou uma sobrancelha, o olhar zombeteiro
cintilando.
— Você quer que eu te carregue no colo, amor?
A maldita palavra escorregou dos lábios dele tão natural que
eu quase tropecei. O burburinho ao redor aumentou.
Ótimo.
— Que fofo. — Ouvi uma voz feminina zombar em algum
lugar.
Bufei, puxei minha mochila do banco e saltei do carro
sozinha, decidida a manter distância.
Achei que tinha escapado.
Mas Logan Donovan, pousou a mão na minha cintura.
Meu corpo travou com o toque inesperado.
— O que você está fazendo? — murmurei entre os dentes,
sem mover os lábios.
— Sendo um namorado perfeito, lembra? Perfeito, romântico
e blá, blá, blá. Foi você quem disse, gata.
— Sim, eu disse, mas preciso me acostumar, e você está me
irritando.
— Eu sei. — O tom preguiçoso e satisfeito foi a gota d’água.
Logan apertou a mão na minha cintura, aproximando nossos corpos.
— Mas eu também estou te fazendo parecer uma namorada
apaixonada. Cadê, onde está a minha namorada louca de paixão?
Maldito convencido.
— Todo mundo está olhando — murmurei.
— Ótimo — ele murmurou de volta, o hálito quente roçando
minha orelha.
O aperto na minha cintura se intensificou e eu senti a
eletricidade disparar sob minha pele.
Era um teatro.
Só um acordo.
Mas meu coração acelerado parecia discordar. Minha boca
estava seca, minha mente em alerta.
— Relaxa, Callahan. — Logan inclinou a cabeça, para me
analisar — Agora todo mundo sabe que você é minha, aliás, que eu
sou seu, porque convenhamos, o fato de você ter me ganhado é que
foi o que mais impressionou a todos.
Girei o rosto levemente para o lado, o suficiente para que
meu nariz roçasse o dele. Logan congelou por um segundo, como se
não esperasse minha reação.
Então, antes que ele pudesse recuperar o controle da
situação, depositei um selinho em seus lábios.
Rápido. Sutil, mas suficiente para ouvir alguns suspiros
chocados ao redor.
Quando me afastei, seu olhar azul estava cravado no meu, o
sorriso convencido desaparecendo aos poucos.
— Viu? — murmurei, arqueando uma sobrancelha. — Agora
todo mundo tem certeza de que fiquei com o partidão da
universidade. Quem é a fodona aqui?
Ele piscou devagar, analisando meu rosto, então sorriu de
lado.
— Olha só... — ele passou a língua pelos lábios, os olhos
brilhando com um novo interesse. — Você aprende rápido.
— Vamos fazer isso direito, você tem toda razão — disse
apressando os passos com ele ainda segurando a minha mão.
16
Lyanna Callahan
Se eu pudesse escolher entre almoçar com Logan e sua trupe
ou ser atropelada por um trator, eu escolheria a segunda opção sem
nem piscar. Mas, como a vida não me dava escolhas, eu estava aqui
com a bandeja de comida nas mãos, sendo puxada sem o menor
aviso para a mesa mais disputada do refeitório.
Ele não estava satisfeito com o que já tinha feito, ele queria
sempre mais e isso incluía me colocar no meio dos jogadores de
hóquei, as garotas ricas e os julgamentos não tão discretos.
Respirei fundo quando chegamos à mesa, os olhares caíram
sobre mim de imediato, os sorrisos não eram nada amigáveis.
— O que foi, gente? — Logan debochou, se jogando no
banco. Me puxando para me sentar ao lado dele. — Nunca viram um
casal almoçando junto?
As meninas se entreolharam.
Owen riu, mordendo um pedaço do hambúrguer.
— Sei lá, cara. Só é estranho ver você namorando em vez de,
sei lá, espalhado no sofá com uma líder de torcida no colo.
Senti o corpo de Logan relaxar ao meu lado, como se já
previsse esse tipo de comentário. Ele estava no controle, eu sabia
que estava. Os amigos dele certamente sabiam da farsa, e o
ajudariam a mantê-la. Comentários como aquele só reforçavam a
ilusão, tornando tudo ainda mais convincente para quem estivesse
observando.
— Ele tem que amadurecer algum dia, né? — brinquei, sem
olhar para ninguém.
Péssima ideia, porque, no segundo seguinte, uma voz aguda
e irritante surgiu na mesa.
— Awn, que fofo. Então, você acha que está aqui para
civilizar o Logan?
Levantei o olhar e vi Emily, a líder de torcida do time de
basquete, sorrindo como uma víbora.
Ótimo.
Aquela garota me odiava.
— Acho que estou aqui porque meu namorado quer que eu
esteja. — Dei um sorriso falso.
— Claro, claro. E você acha mesmo que combina com esse
lugar?
As meninas ao redor riram.
Pisquei devagar, sentindo o sangue ferver.
Antes que eu pudesse responder, Logan se adiantou.
— Você quer que eu desenhe, Emily? — Ele sorriu falso,
passando o braço sobre os meus ombros. — Eu quero ela aqui. Isso
já não é suficiente?
O tom de Logan não era brincalhão. Era um aviso.
Emily revirou os olhos, mas não rebateu, porém, outra garota
resolveu abrir a boca.
— Você trouxe um petisco novo pra gente, Logan? — uma
loira comentou, batendo as unhas na mesa.
A cadeira dele arrastou no chão e antes que eu percebesse,
Logan já estava de frente para ela.
— Escolha melhor suas palavras.
A mesa ficou em silêncio e todos das mesas ao redor
olharam, inclusive onde Emma estava agora louca para ser um
mosquito para ouvir tudo de camarote.
A garota engoliu em seco e, pela primeira vez, eu vi as
pessoas acreditando que ele estava falando sério, que eu e ele
tínhamos algo sério.
Logan Donovan
Eu sabia que ia acontecer.
Desde que decidi fazer isso, desde o momento em que pisei
na universidade com Lyanna ao meu lado, eu sabia que as pessoas
não iam engolir isso fácil.
As meninas da elite odiavam perder e, agora, elas estavam
perdendo para Lyanna, porque, no fim das contas, ela estava
sentada ao meu lado, o lugar onde muitas queriam estar.
Minha mão ainda estava na nuca da garota que ousou abrir a
boca para desrespeitar Lyanna. Ela se encolheu no banco, sem
coragem de me encarar.
— Se minha namorada quiser acabar com você, ela mesma
faz. — Meu tom era preguiçoso, mas minha expressão era pura
ameaça. — Mas se você falar uma merda dessas de novo, eu mesmo
te coloco pra fora dessa mesa.
A mesa inteira prendeu a respiração.
Lyanna me olhou de lado, mas eu ignorei. Meus olhos
permaneceram na garota, esperando a resposta dela. Ela não teve
coragem, então, se calou e eu voltei a me sentar, como se nada
tivesse acontecido.
— Que clima tenso, hein? — Tyler riu, pegando as batatas
fritas do prato de Owen.
— Relaxa, gente. — Dax esticou as pernas, bebendo o
refrigerante. — Logan só está protegendo a donzela.
Lyanna bufou.
— Eu não sou uma donzela.
— Mas é minha. — Soltei, sem pensar. — Desrespeitar a
minha namorada na minha frente é algo que eu não vou tolerar.
Ela me olhou, surpresa.
Owen, Blake e Caleb riram, mas o clima na mesa mudou.
Eu continuei comendo, tranquilo, porque já esperava por isso.
Os caras sabiam que eu nunca tive uma namorada antes.
Nunca precisei defender mulher nenhuma, porque nenhuma delas
importava. Mas agora eu tinha um acordo com Lyanna e se o nosso
relacionamento precisava parecer real, então eu tinha que agir como
um namorado de verdade.
Terminei meu lanche, peguei minha mochila e me levantei.
— Vamos, Callahan.
Ela não hesitou nem por um segundo, levantou como se a
vida dependesse disso.
Assim que saímos do refeitório, senti a mão dela segurando
meu braço, me puxando para o lado.
— O que foi aquilo lá na mesa?
Arqueei uma sobrancelha.
— Defina "aquilo".
— Aquilo de "desrespeitar minha namorada na minha frente é
algo que eu não vou tolerar". Isso.
Ah, então era isso? Soltei um sorriso de canto e enfiei as
mãos nos bolsos da calça.
— É simples, Callahan. Agora somos um.
Ela franziu a testa.
— Um?
Assenti.
— Se alguém desrespeita você e eu não faço nada, eu
também perco o respeito. Não posso deixar isso acontecer.
— Então é isso? Você me defende porque precisa manter sua
imagem?
Inclinei a cabeça, gostando do jeito que ela tentava me
analisar.
— Eu te defendo porque isso faz parte do acordo.
Ela piscou, surpresa, e soltou uma risada seca.
— Óbvio. Quase achei que você estivesse agindo como um
ser humano decente por um momento.
Sorri, me aproximando mais, diminuindo o espaço entre nós
de propósito.
— Não me iluda, Callahan. Eu sou um ótimo namorado de
mentira, mas não tão bom assim.
Os olhos dela brilharam com algo que eu não consegui
identificar. Mas, antes que ela falasse qualquer coisa, passei um
braço ao redor da cintura dela, puxando-a para o meu lado.
— Agora, para de pensar tanto e vamos. Tenho um tempo
livre antes de ir assistir ao treino, e você tem sorte de ter um
namorado dedicado o suficiente para escoltar você pelo campus.
Ela bufou, revirando os olhos, mas, mesmo assim, veio
comigo.
17
Logan Donovan
Três semanas depois…
Os dias iam passando, e eu sentia os efeitos da farsa
crescerem ao meu redor. No começo, eram só olhares, cochichos no
corredor.
"Logan Donovan namorando? Isso só pode ser uma
aposta."
"O que ele viu nela? Ele pode ter qualquer uma."
Mas então, vieram os resultados. O conselho esportivo
parecia satisfeito.
O treinador começou a me observar de um jeito diferente,
menos como um problema e mais como um jogador pronto para
voltar.
No programa de reabilitação, os olhares sobre mim mudaram.
Antes, os supervisores me viam como um cara que estava ali
apenas para cumprir uma punição.
Agora? Eu era o atleta redimido.
O que “está amadurecendo”, que “aprendia com os erros”,
que estava ajudando outros jogadores a se reerguerem.
Um modelo de conduta. Eu ouvia os elogios.
"Logan realmente mudou."
"Ele está levando isso a sério."
"Esse garoto tem futuro na NHL."
Se eu tivesse que engolir um pouco de orgulho para ouvir
essas palavras de volta? Ótimo. Porque o mais importante
aconteceu. Meu nome deixou de ser ligado a escândalos.
O bastardo do reitor, que antes mal me olhava na cara sem
me ver como um problema ambulante, agora me cumprimentava
com um sorriso falso no rosto. Eu podia sentir, as coisas estavam se
ajustando a meu favor.
Lyanna não percebia o quanto o nome dela, a imagem da
“namorada exemplar”, estava me ajudando. Mas eu sabia, e o mais
engraçado?
Agora todo mundo achava que eu era um cara melhor. Um
exemplo de atleta que superou os problemas e encontrou
"estabilidade emocional" ao lado de uma namorada.
Todos estavam comprando a nossa mentira. E eu? Eu estava
adorando. Porque significava que minha volta ao rinque era só
questão de tempo.
Eu estava saindo da sala do treinador. Era tarde, e ele me
prendeu lá por tempo demais.
— Revise os relatórios dos atletas em reabilitação. — Ele
jogou uma pasta na minha frente. — Analise o progresso deles, veja
como pode ajudar. Mostre que realmente se importa com o
programa.
Palavras bonitas para dizer que queria me manter ocupado.
Eu revirei os olhos, mas fiz o que ele pediu. Cada dia era um passo
mais perto da minha suspensão acabar.
Agora, finalmente livre, caminhei pelo corredor quando ouvi o
som. O deslizar afiado das lâminas no gelo. O impacto seco de uma
queda.
Franzi o cenho e olhei para o lado.
O rinque onde treinavam as patinadoras artísticas estava
quase vazio, mas não completamente, porque ela estava lá. Lyanna.
E ela era perfeita, por um momento, apenas fiquei ali, parado na
entrada, observando.
Eu nunca a tinha visto patinar.
Sempre soube que ela tinha sido boa, que tinha perdido a
bolsa esportiva, mas isso? Isso era outro nível, ela não se movia no
gelo. Ela flutuava.
O cabelo preso balançava levemente conforme ela deslizava,
os músculos tensos, firmes, a minissaia girava conforme ela se
movia. Ela é linda. Ela se lançou no ar e tentou girar. Por um
segundo, achei que fosse conseguir, mas então, ela caiu. Com força.
— Droga! — Eu a ouvi murmurar, batendo a mão contra a
superfície congelada.
Por um instante, ela ficou ali, respirando fundo, os olhos
fechados como se estivesse se recompondo.
E antes que percebesse, meus pés já estavam me levando até
lá. Não sabia patinar como ela, mas também não era um completo
amador, passei a vida no rinque. Seus dedos deslizavam pelo gelo,
como se ela tentasse processar o erro.
Então, parei bem ao lado dela, abaixando um pouco para
observar melhor.
— Você sempre é tão dramática quando cai?
Seus olhos se ergueram devagar até encontrarem os meus.
Ela bufou, empurrando o cabelo que escapou do coque.
— O que você tá fazendo aqui?
— Assistindo você falhar miseravelmente.
Ela revirou os olhos e tentou se levantar, mas escorregou.
Minha risada foi automática.
— Precisa de ajuda, gatinha?
— Não preciso de nada vindo de você, Donovan.
Eu dei de ombros e estendi a mão. Ela hesitou, mas, depois
de um segundo, aceitou.
Seus dedos pequenos se fecharam ao redor dos meus, e eu
senti o aperto quente e firme. Puxei-a de volta para os pés.
Ela me olhou como se estivesse avaliando se eu ia dizer algo
idiota. Eu apenas sorri.
— Sabe, Callahan… — inclinei um pouco a cabeça, mantendo
os olhos nos dela. — Você é muito boa.
Ela soltou minha mão imediatamente.
— Cala a boca.
Eu ri baixo. Meus olhos correram até o canto do rinque, onde
um par de patins extras estava largado no banco.
Uma ideia surgiu. Fui até lá, troquei os tênis pelos patins sem
pressa, ajustando os cadarços enquanto sentia o olhar dela me
queimando pelas costas.
Quando me levantei e deslizei para o gelo, Lyanna parou no
mesmo instante.
— O que diabos você tá fazendo?
— Patinando. — Dei de ombros, como se fosse óbvio.
— Você não sabe patinar desse jeito.
Ergui as sobrancelhas.
— E?
Ela revirou os olhos, mas não disfarçou a surpresa quando me
viu deslizar pelo gelo com facilidade. Ok, não era tão fluído quanto
os movimentos dela. Eu era jogador de hóquei, meu foco sempre foi
velocidade e resistência, não giros elegantes e saltos impossíveis.
Mas, ainda assim, não era um desastre. Me aproximei devagar,
mantendo os olhos nela.
— Mostre de novo.
Ela franziu o cenho.
— O quê?
— O salto. — Apontei para o ponto onde ela caiu. — Quero
ver como se faz.
— Por quê?
— Porque eu quero tentar.
A risada dela veio antes que pudesse segurar. E foi
verdadeira, algo que eu nunca tinha visto. Ela passou a mão no
rosto, ainda rindo.
— Você tá falando sério?
— Você acha que eu não consigo?
Ela me analisou.
Depois, soltou um suspiro e deslizou pelo gelo, voltando à
posição inicial.
— Eu não consigo mais executar esse salto, Donovan.
— Como seria, se conseguisse?
— Bom… seria assim… — E então, ela fez.
Impulsionou-se, dobrou os joelhos e girou baixo no ar. Dessa
vez, a aterrissagem foi limpa, de uma distância segura entre ela e o
gelo.
Sem quedas. Sem erros.
— Agora tenta.
Ótimo.
Fiz o mesmo movimento que ela, tentando copiar cada
detalhe que consegui memorizar. Não parecia tão difícil, e quando
tentei o giro no ar o gelo me lembrou que eu era um idiota. Minha
aterrissagem foi ridícula, meus patins perderam o equilíbrio, e antes
que pudesse reagir, já estava indo direto para o chão.
Só que Lyanna estava perto demais, e ao invés de cair
sozinho eu a derrubei junto.
O som da risada dela ecoou pelo rinque. E eu congelei. Não
era o riso carregado de ironia, nem aquele que ela soltava quando
me respondia com desprezo.
Era diferente. Verdadeiro. Leve. Solto. E, merda, foi
impossível não olhar.
Lyanna tinha caído ao meu lado, o cabelo meio solto,
espalhado no gelo, o rosto virado para cima enquanto ria sem parar.
E eu? Eu ri também. Baixo, rouco, me apoiando nos
cotovelos.
— Nem todo mundo pode ser talentoso no gelo, Callahan.
— Você tem razão, mas você está indo muito bem, ao
contrário de mim, tem um futuro brilhante pela frente.
Eu só conseguia olhar. O jeito que a ponta do nariz dela
estava rosada pelo frio. O brilho nos olhos escuros. A forma como os
lábios ainda estavam curvados em um sorriso.
E antes que eu percebesse, minha mão se moveu. Sem
pensar, ergui os dedos e rocei de leve no rosto dela. Só um toque.
Só para ver se era tão macia quanto parecia e foi aí que tudo
mudou. O sorriso desapareceu. O brilho leve se apagou dos olhos
dela. O corpo de Lyanna ficou tenso, como se eu tivesse acabado de
prendê-la em um lugar onde ela não queria estar. Então eu vi o
pânico rápido cruzar o rosto dela. O peito subir e descer de um jeito
errado. Ela prendeu a respiração, e antes que eu pudesse reagir, ela
virou de lado tão rápido que quase caiu de novo.
— Não me toca.
A voz dela não saiu irritada. Saiu baixa, quase um pedido.
Eu recolhi a mão imediatamente. Ela estava tremendo o
suficiente para eu perceber que alguma coisa estava errada. Ajeitei a
postura, passando a mão pelos cabelos, tentando voltar ao meu
normal.
Tentando fazer com que ela voltasse ao normal.
— Relaxa, gatinha. — Meu tom saiu mais leve do que eu
pretendia. — Eu só queria testar se você era de verdade.
Ela não riu, não fez piada, e então, se levantou de um jeito
apressado, como se precisasse sair dali o mais rápido possível.
Eu me levantei também, mas não fiz nada, porque, pela
primeira vez, eu não sabia o que fazer. Ela limpou as mãos nas
laterais da saia, evitando até mesmo olhar na minha direção.
— Isso foi um erro.
— Você quer dizer o tombo ou a parte onde eu estava
tentando me aproximar de você?
— Nenhuma delas devia ter acontecido.
Eu estava prestes a ir atrás dela, mas o celular vibrou no meu
bolso, me fazendo pausar.
Uma mensagem irritada do meu pai.
"Onde caralhos você está, Logan?"
Soltei um suspiro pesado, deslizando a tela para desbloquear.
Ótimo. Pelo jeito, ele já tinha descoberto sobre mim e Lyanna.
E conhecendo meu pai, ele estava puto.
18
Lyanna Callahan
Alisei o rosto exatamente onde os dedos dele traçaram um
caminho, como se pudesse apagar o toque, mas ele ainda estava ali.
Delicado demais para alguém como ele. E mais uma vez, meu corpo
tremeu.
Logan era lindo. Ridiculamente lindo. E quando não me
olhava com aquele ar de superioridade, como se tudo e todos ao
redor fossem insignificantes, eu esquecia quem ele era.
Mas eu não posso esquecer.
Eu vinha me concentrando em uma única coisa: serão apenas
algumas semanas para isso acabar. Cinco semanas para eu voltar a
ser ninguém, ser ignorada nos corredores, não receber mais convites
para festas de fraternidade e, principalmente, não precisar mais vê-
lo.
Não precisar mais sentir o toque dele. Não precisar mais fingir
que somos o casal perfeito.
Com um sorriso presunçoso nos lábios, Logan disse que me
daria a opção de terminar publicamente. Eu ri. Ele estava tentando
ser gentil? Me deixando pisar no orgulho dele? Ele nem deve ter
pensado sobre isso direito, ainda falta bastante tempo para isso
acabar.
Mas ainda é uma piada.
Ele sairia ganhando de qualquer forma. Homens magoáveis e
rejeitados pegam o triplo de mulheres, nem sei se isso já foi
comprovado cientificamente, mas eu sei que, no fim das contas, ele
continuaria sendo Logan Donovan.
E eu?
Eu voltaria a ser só a bolsista com quem Logan teve um
relacionamento rápido antes de voltar ao seu estado mental normal.
— Onde você estava? — minha mãe perguntou assim que
cruzei a porta.
— Com a Emma.
Ela me olhou de cima a baixo, absorvendo cada detalhe,
procurando qualquer pista que denunciasse minha mentira.
— Estava no gelo de novo?
Parei no meio do corredor, com a respiração presa. Ela cruzou
os braços, arqueando uma sobrancelha.
— Suas bochechas estão vermelhas, dá para ver a marca dos
cadarços nos seus tornozelos e o cheiro do gelo ainda está em você.
Quer tentar mentir de novo?
— Eu gosto de passar o tempo lá.
— Sabe que me deixou sozinha no café, não sabe?
Engoli seco.
— Sinto muito.
— Sente?
Ela ironizou.
— Espero que tenha comido algo no caminho, porque
estamos quase sem comida. E quem não trabalha… não tem direito
de comer.
Meu estômago reagiu na mesma hora. Um ronco alto.
— Já comi — menti, desviando o olhar e seguindo direto para
o quarto.
Joguei-me na cama, tentando ignorar a fome… e tudo o mais.
Ouvi a porta da sala abrir, seguida de passos pesados e
firmes. A batida forte ao fechá-la só confirmou o que eu já sabia.
Mark.
Ele sempre fazia questão de entrar como se fosse o dono da
casa.
— Coloque alguma coisa na mesa, estou com fome. — Sua
voz soou grossa, autoritária.
Ordenando. Como sempre.
— Claro, o que quer comer? — minha mãe respondeu rápido
demais, e o tom na voz dela me deu náuseas.
Apaixonada. Submissa.
Eu cerrei os dentes, puxando o cobertor sobre mim, querendo
desaparecer.
Mas não desapareci.
E, pela forma como ele puxou a cadeira com força contra o
chão, ele também sabia que eu estava ali.
— A princesinha já chegou? — Mark perguntou.
Minha mãe ficou em silêncio. Aquele silêncio que dizia que ela
já sabia para onde aquilo iria.
— Sim — respondeu baixo, sem coragem de me defender. E
por que ela me defenderia?
Eu me sentei, pressionando os punhos contra a cama para me
forçar a respirar fundo.
— Lyanna! — Mark gritou, como um comando.
Fechei os olhos, respirando fundo antes de me levantar. Eu
sabia que se não respondesse rápido, ele gritaria de novo.
Ou coisa pior, ele descontaria a frustração nela. Saí do quarto,
arrastando os pés até a cozinha.
Ele estava sentado à mesa, reclinando-se na cadeira como se
fosse o dono do lugar. O olhar dele me percorreu de cima a baixo.
Meu estômago revirou. Eu não precisava de palavras para
saber o que se passava pela cabeça dele. E eu odiava cada segundo
disso.
Minha mãe já percebeu. Claro que percebeu, mas o que ela
fez? Nada.
Ela abaixou a cabeça e continuou mexendo na jarra de café.
— O que está esperando? — Mark quebrou o silêncio, sem
tirar os olhos de mim. — Coloque outro prato na mesa.
Minha mãe tentou intervir.
— Ela não está com fome. Chegou cansada.
Mark arqueou uma sobrancelha, me observando de um jeito
que me fez querer desaparecer.
— Cansada? — ele repetiu, debochado. — Então pelo menos
sirva um café para mim.
Eu senti o olhar dele queimando minha pele enquanto me
movia até a cozinha. Minha mãe não disse nada. Não fez nada.
E era exatamente isso que me fazia odiar ainda mais essa
casa e ainda assim eu ficava aqui por pena dela, por medo do que
ele faria com ela se eu não estivesse para defendê-la quando ele
entrava bêbado por essa porta.
Logan Donovan
Ainda era cedo. Cedo demais para o meu padrão de vida.
Eu estava cansado de acordar tão cedo assim, mas se queria
encontrar Lyanna antes de ela sair e levá-la para a universidade,
precisava madrugar.
Venho considerando o sacrifício válido.
Estacionei a Ferrari em frente ao café, como das outras vezes
próximo à entrada da casa dela, e não demorou muito até que a
porta se abrisse. Lyanna saiu, mas meu olhar se estreitou ao ver que
ela não estava sozinha. Um homem saiu logo atrás dela,
observando-a de um jeito que me incomodou na mesma hora.
Minha mandíbula enrijeceu.
— Logan? — A voz dela me trouxe de volta, mas meus olhos
ainda estavam nele.
Na forma como ele avaliava cada curva dela. O olhar dele
subiu para mim, carregado de irritação.
— Quem é esse moleque? — ele perguntou.
— Sou Logan Donovan, namorado de Lyanna — falei com
calma, mas deixando claro que não estava ali para brincadeiras. — E
você?
Ele coçou o queixo, insatisfeito.
— Namorado?
Vi a irritação no rosto dele.
— Eu sou padrasto dela.
Parei um segundo, observando sua postura, a voz. O jeito de
se mover. O incômodo na forma como ele pronunciou "namorado".
Algo ali não batia certo, eu já vim aqui muitas vezes e nunca vi esse
cara. Ele era padrasto mesmo?
Forcei um sorriso, mas mantive minha atenção nele.
— Hum… Entendi.
Então, girei nos calcanhares e olhei para Lyanna. Garanti que
não havia marcas.
Só depois voltei minha atenção para ele, pronto para encerrar
essa merda e ir embora.
— Aonde pensa que vai? — ele perguntou, me fazendo parar
no meio do caminho.
Minha mão se apertou no chaveiro do carro.
— Estamos indo para a universidade.
Ele deu alguns passos, se aproximando do carro. Arrastou o
dedo lentamente pela lataria. Me olhou.
Sustentei o olhar.
— Um playboy? — ele zombou. — E jogador de hóquei
novamente, Lyanna?
Os olhos dele se desviaram para o banco de trás, onde meus
pertences denunciavam que eu jogava.
— Qual o problema com jogadores de hóquei? — quis saber.
Ele riu baixo e me ignorou,
— Não volte tarde para casa, Lyanna. — Seu tom era
recheado de malícia e aviso ao mesmo tempo. — Esses moleques
acham que podem fazer o que querem com meninas pobres. Mas
fique avisado, Lyanna não é qualquer uma.
Meus punhos se cerraram antes que eu pudesse controlar.
— Logan, vamos embora — Lyanna cortou, segurando meu
braço, me puxando na direção do carro.
O toque dela foi a única coisa que impediu que eu fizesse
algo idiota. O único detalhe que me fez soltar o ar e relaxar os
músculos.
Entrei no carro, batendo a porta com mais força do que o
necessário. Engatei a marcha, saindo dali.
— Qual é a dele?
Eu vi Lyanna desviar o olhar pela janela, e então veio a
resposta padrão.
— Não se meta na minha vida, Logan. Lembra? Esse era o
acordo.
Sim, lembrava. Mas, pela primeira vez, aquela merda de
acordo parecia difícil de seguir.
Puxei o ar com força, segurando o volante tão firme que
meus nós dos dedos ficaram brancos.
— Lembro perfeitamente — murmurei, tentando conter
frustração.
19
Logan Donovan
Eu tinha duas opções: a primeira? Seguir essa merda de
acordo, ficar na minha e fingir que não vi nada. A segunda? Ser eu
mesmo, esquecer essa porra de acordo e fazer o que eu bem
entendesse. Afinal, eu não sigo regras. Eu crio as minhas, e deixo
que o mundo se exploda.
— Se concentra, porra! Qual a tua, Logan? — Dax rosnou, os
olhos fixos em mim enquanto patinávamos pelo gelo.
Eu nem respondi. Meu corpo já se movia antes da minha
mente acompanhar.
A raiva queimava sob a pele, os músculos tensionados, e eu
só precisava descarregar em alguma coisa. O disco deslizou na
minha direção, rápido.
Tarde demais.
Caleb roubou antes que eu conseguisse interceptar.
— Você tá dormindo? — Tyler gritou.
A porra do treinador apitou tão forte que ecoou no rinque
inteiro.
— Logan, se perder a concentração mais uma vez, pode sair
do gelo.
Cerrei os dentes, minha mandíbula pulsando.
O problema? Eu estava focado.
Focado demais no que não é da minha conta, a porra da cena
que não saía da minha cabeça. O olhar daquele desgraçado para
Lyanna. Os olhos percorrendo o corpo dela. A merda do sorriso
carregado de aviso.
Minha visão ficou turva por um segundo. A jogada seguinte
veio e, dessa vez, eu não errei, o disco deslizou rápido e eu o
interceptei antes que chegasse ao outro lado.
Dax patinou na minha direção. Eu girei o corpo e embarrei o
ombro contra ele com força, enviando-o direto para a borda de
proteção.
A colisão foi forte.
— Que porra foi essa, Donovan?! — Dax rugiu, empurrando o
próprio corpo de volta ao equilíbrio.
— Foi mal, Bastien.
— Se concentra, caralho!
O apito soou de novo.
— Fim do treino! — O treinador berrou. — Todo mundo para
os vestiários.
Ele me olhou direto nos olhos.
— Donovan, fica.
Joguei o capacete no banco e arrastei a mão pelo cabelo
suado, enquanto os caras saíam, ainda jogando comentários sobre
meu humor de merda.
O treinador parou na minha frente.
— Se tem merda para resolver, faça fora do gelo.
— Não tem merda nenhuma.
Ele riu sem humor.
— Então talvez tenha um problema de desempenho. Quer
conversar sobre isso?
Eu quase ri. Filho da puta.
Passei a língua pelos dentes, tentando manter a paciência.
— Não se preocupa, vou ser o Donovan que você quer ver no
rinque.
Ele me analisou por um segundo antes de balançar a cabeça.
— Assim espero.
E saiu, me deixando sozinho no gelo.
Eu ainda podia ver os olhos daquele filho da puta sobre
Lyanna. Merda!
Eu precisava esfriar a cabeça.
— Que porra tá pegando com você? — Tyler perguntou assim
que entrei no vestiário, ainda sentindo o calor do treino grudado na
pele.
Joguei meu capacete no banco, passei a toalha no rosto e
suspirei.
— Nada. Só tem uma merda martelando na minha cabeça. —
Passei a mão pelo cabelo molhado, sem entrar em detalhes. — Vou
tomar um banho rápido e encontrar meu pai no restaurante aqui
perto.
Dax saiu da ducha, enxugando os cabelos e me lançou um
olhar curioso
— O que foi, está com problemas com a Lyanna?
Soltei um riso seco, pegando a toalha.
— Estamos iguais. — Dei de ombros. — Ela cumpre o
combinado na frente de todo mundo e age como se eu nem existisse
quando ninguém tá vendo.
— Você perdeu o jeito, Donovan? — Owen zombou, rindo.
Ergui o olhar para ele, sério, direto, sem paciência. Ele calou
a boca na hora.
Joguei-me no banco, esfregando a toalha no rosto.
— Vocês já sentiram que estão fazendo o certo, e que, no
momento, o certo é o que precisa ser feito?
Tyler franziu o cenho.
— Que porra você está falando?
Joguei a toalha no banco.
— Ela é bolsista, vive de servir café, se dedica àquele
programa de reabilitação como se a vida dela dependesse disso e, o
pior de tudo, age como se fosse melhor do que eu. Como se eu
fosse o merda da história, sendo que ela não é ninguém.
Owen soltou uma risada baixa.
Caleb se inclinou, apoiando os cotovelos nos joelhos, com
aquele maldito sorriso de sempre.
— Ah, cara, é isso, ela é orgulhosa? Já comeu? É gostosa? Se
for, deixa ela por cima, não tem mal nisso.
— Repete essa merda, Caleb — rosnei irritado.
Ele piscou, confuso.
— Qual é, cara, só tô brincando…
Joguei a garrafa de água com força no banco ao lado.
— Brincando? — Soltei uma risada seca, sem o menor humor.
— Se ela é gostosa ou não, não é da tua conta. Nem tua, nem de
ninguém aqui.
— Alguém mais quer saber detalhes sobre a Lyanna? Podem
colocar a curiosidade para fora, mas sabendo que eu quebro a porra
dos dentes de quem passar do limite.
Owen revirou os olhos e jogou a toalha no banco.
— Tá nervosinho, Donovan?
Dei um passo à frente, e ele se calou na hora.
— Não estou nervoso. Só não sou otário de deixar vocês
falarem merda sobre a Lyanna como se ela fosse essas meninas que
vocês pegam em fim de festa e depois ficam comentando no
vestiário.
Owen levantou as mãos no ar, como se tentasse amenizar a
situação.
— Relaxa, faltam cinco semanas para essa merda acabar e
você volta ao normal.
Caleb estalou os dedos, animado.
— Aliás, estou pensando em fazer uma festinha. Só com
líderes de torcida.
— Flexibilidade em dia? — Tyler provocou, arqueando uma
sobrancelha.
— Sempre. — Blake riu. — E você, Donovan? Vai continuar na
seca ou vai levar umas duas pra cama?
Owen jogou um protetor de ombro na minha direção. Peguei-
o no ar e ri, jogando de volta.
— Não se preocupem comigo, eu sei exatamente o que estou
fazendo.
— Só cuidado para não entrar no personagem demais,
Donovan.
Ergui o olhar para ele.
— Eu controlo essa merda, não ela.
Tyler riu baixo.
— Bom saber. Porque, por um segundo, achei que você
estivesse gostando do papel de namorado perfeito.
Soltei um riso curto e seco, pegando minha toalha e seguindo
para o chuveiro.
Meu pai estava sentado na mesa próxima à janela, olhando
para o mundo lá fora como se estivesse sozinho naquele
restaurante. Tenho certeza de que viu que eu me aproximava, mas
sequer moveu a cabeça.
Arrastei uma cadeira e me sentei de frente para ele, imitando
seu gesto ao encarar a janela. O silêncio entre nós durou alguns
segundos antes que ele começasse a falar.
— Sabe o que a maioria dessas pessoas têm em comum? —
ele perguntou, ainda sem me encarar.
— Não faço ideia — respondi, desinteressado, girando o anel
no meu dedo.
— Boa parte delas acorda cedo, segue para trabalhos
medíocres, leva bronca de chefes que muitas vezes vivem a mesma
rotina patética, mas ainda assim se acham superiores.
Soltei um riso curto, debochado.
— Anda se preocupando com a classe trabalhadora agora,
pai?
— Não. Ando me preocupando com o fato do meu filho estar
se misturando com esse tipo de gente. Sentando-se na mesma
mesa.
— Você me mandou arrumar um emprego. Agora sou um
deles.
Ele finalmente virou o rosto na minha direção, com aquele
olhar frio que sempre me fez sentir como um projeto falho.
— Você acha que tudo na vida é uma piada, Logan?
Sem esperar resposta, ele arrastou um envelope pela mesa.
Suspirei antes de pegá-lo e abrir.
Fotos. Fotos minhas, nos lugares que eu andava
frequentando.
Fechei os olhos por um segundo antes de jogá-las de volta
sobre a mesa.
— O que é isso? Está me seguindo agora?
— Você sabe muito bem onde esteve.
— E daí?
— Então também sabe o quanto isso fere a mim e à sua mãe.
Apertei os punhos embaixo da mesa.
— É só um bairro.
— O bairro onde o seu irmão morreu.
Meu peito subiu e desceu devagar.
— Foi um acidente. — Dei de ombros, observando a
expressão dele mudar. — O que foi? Não foi um acidente? —
provoquei.
Ele ignorou.
— Quem é a garota?
— Lyanna. Estudante de fisioterapia — respondi fingindo que
ele já não sabia. É claro que já tem a ficha completa dela sobre a
mesa.
— Apenas isso?
Ergui os olhos e sustentei seu olhar.
— Não.
O silêncio pesou por alguns segundos. Ele se inclinou
ligeiramente sobre a mesa
— Termine isso antes que acabe exatamente como acabou
para o Nathan.
— O que o Nathan tem a ver com isso?
— Ele também se encantou por uma qualquer.
— Lyanna não é “uma qualquer”.
Ele ignorou minha resposta e continuou:
— Você tem um futuro, Logan. Seu nome está garantido na
NHL. Você não pode se distrair com um relacionamento. Isso vai
atrapalhar seu desenvolvimento, seu foco.
Eu ri, balançando a cabeça.
— Então é isso? Você me chamou aqui para me lembrar de
que sou um investimento?
Ele soltou um suspiro, como se eu fosse uma criança irritante.
— No próximo jogo, você volta para o rinque. Até lá… termine
com isso.
Eu o encarei por um momento.
Depois, peguei as fotos, rasguei-as ao meio e deixei os
pedaços caírem sobre a mesa antes de me levantar.
— Eu não sou o Nathan, eu não preciso seguir tudo
exatamente como ele. Eu sei o que estou fazendo.
20
Lyanna Callahan
A noite já se arrastava há tempo demais. O cheiro de café
amargo e pão dormido impregnava o ar, misturando-se com a
umidade da cozinha. Eu queria fechar logo o caixa e subir para o
quarto.
Mas então, a porta rangeu e passos pesados ecoaram no
chão de madeira desgastado.
Mark se encostou no balcão com o descaso de quem se sente
confortável demais. Seus olhos me analisaram, demorando um
segundo a mais nos detalhes errados.
— A minha mãe está lá dentro, pode entrar — avisei, mas ele
apenas relaxou mais um pouco no banco alto.
— Você tá trabalhando muito, Lyanna.
— O café precisa de dinheiro — respondi seca, sem olhar para
ele, enquanto limpava o balcão.
Ele riu baixo.
— Imagino. Mas aposto que seu novo namorado pode te
ajudar com isso, né? Ele parece gostar de você.
Meu corpo ficou tenso, mas continuei esfregando a superfície
já limpa.
— Não sei do que você tá falando.
— Não? — inclinou-se um pouco, se aproximando de uma
forma asquerosa. — Deveria ter cuidado, Lyanna. Caras como ele
não se apaixonam por garotas como você.
— Não se preocupe comigo, eu sei me cuidar.
— Você vem se cuidando muito sozinha, a sua mãe deveria
olhar mais para você.
— A minha mãe já tem os assuntos dela.
— Espero que você não esteja se iludindo. Não gostaria de
ver você se machucar.
Logan Donovan
Eu devia estar indo para casa. Já estava tarde, e a conversa
com o meu pai tinha acabado comigo, mas eu queria ver Lyanna,
sim, isso é uma merda.
Parei do outro lado da rua do café, os faróis apagados, e
esperei até resolver se eu a veria e iria embora ou se entraria e
inventaria uma desculpa qualquer para ter vindo até aqui.
E então vi, algo que me deixou furioso, o tal padrasto muito
perto dela. O jeito que ele se inclinava, os dedos roçando o braço
dela em um gesto que fingia ser inocente, mas eu sabia que não
era.
Os ombros dela estavam rígidos. Tentando terminar a
conversa rápido. Sem pensar duas vezes, saí do carro e entrei no
café. A porta rangeu, e os olhos dos dois se voltaram para mim.
Fui direto até Lyanna, passei por baixo do balcão, colocando
um braço ao redor da sua cintura e puxando-a para perto.
— Oi, amor — murmurei, com o meu olhar direcionado para
Mark, que estreitou os olhos.
Mark nos olhou por um segundo a mais antes de soltar um
riso pelo nariz e dar de ombros.
— Aproveitem a noite — ele disse antes de sair.
Só soltei Lyanna quando ouvi a porta bater.
Ela não me olhou.
Eu não disse nada.
— Se ele encostar em você de novo, eu quebro a cara dele.
— Finalmente, quebrei o silêncio
Ela suspirou, mas, dessa vez, não brigou comigo.
— O que veio fazer aqui? — ela perguntou, dando um passo
para trás, como se precisasse de espaço.
— Não sei exatamente. Acho que meu carro se acostumou
com o caminho.
— Eu já estou fechando tudo.
— Então eu ajudo.
Seu olhar estreitou, analisando-me como se eu fosse um
alienígena.
— Você… quer ajudar?
Dei de ombros, mantendo a pose relaxada.
— Só me diga o que fazer.
Ela continuou me olhando como se esperasse o momento em
que eu desistiria. Como se eu estivesse ali apenas para provocá-la.
A verdade? Eu também não sabia direito o que diabos estava
fazendo.
Odeio cada segundo em que dirigi até esse bairro. Odeio as
ruas estreitas e esburacadas, o cheiro forte da fritura misturado com
umidade e lixo acumulado. Odeio os olhares dos bêbados na
calçada, as vozes altas e a sensação de que esse lugar tentava
grudar em mim.
Mas, ainda assim, eu vinha, porque, eu queria vê-la.
As palavras do meu pai voltaram à minha mente, não a parte
em que ele espera que eu termine com Lyanna, e sim sobre Nathan.
Ele também vinha aqui por alguém?
Quem? O que realmente aconteceu com ele?
— Não tem muito o que fazer aqui, vá para casa — ela disse,
virando-se para guardar algumas coisas no balcão.
— Queria te levar a um lugar antes.
Ela parou por um segundo antes de me encarar.
— A essa hora?
Dei de ombros, um sorriso de canto nos lábios.
— O que tem a hora, Lya? Somos adultos.
Ela cruzou os braços, desconfiada.
— E se eu disser que não quero ir?
— Vou te carregar mesmo assim, pois tenho certeza de que
vai gostar.
— Então venha, me ajude a guardar essas coisas.
Aproximei-me do balcão e comecei a pegar algumas caixas,
ignorando o olhar desconfiado dela.
O silêncio no carro era confortável, diferente de antes. Ela
estava inquieta, mexendo no pingente do colar em volta do pescoço,
provavelmente tentando adivinhar para onde eu a estava levando.
Quando estacionei, a surpresa nos olhos dela foi evidente.
— Um rinque? — Ela franziu o cenho, olhando para mim.
— Não qualquer rinque. Esse aqui é todo nosso hoje.
Ela abriu a boca para responder, mas nada saiu. Seus olhos
varreram o ambiente como se precisasse se certificar de que aquilo
era real. Respirou fundo antes de sair do carro, as botas afundando
levemente na neve acumulada ao redor da entrada.
— Você alugou isso? — perguntou baixinho, como se não
quisesse acreditar.
— Eu costumo alugar quando quero me distrair, sem a
pressão do treino.
Lyanna ficou parada na entrada por um instante, hesitante,
então deu um passo à frente. Eu segui atrás dela, destravando a
porta. O rinque estava completamente vazio, a superfície do gelo
brilhando sob as luzes fortes do teto.
— Então, Callahan, vai ficar parada aí ou vamos patinar?
Ela soltou um suspiro e, sem dizer nada, caminhou até o
vestiário.
Minutos depois, estávamos no gelo.
Era estranho. Apenas nós dois, sem ninguém assistindo, sem
olhares críticos. Apenas o som dos patins deslizando suavemente. Eu
girava ao redor dela, sem pressa, só aproveitando a sensação da
liberdade no gelo.
— Treinei algumas coisas. Tem muitos vídeos legais na
internet — comentei, tentando imitar um dos movimentos que vi nas
apresentações de dança no gelo.
O resultado? Um desastre.
Lyanna gargalhou, levando a mão à boca.
— Você é muito bruto, desengonçado.
Revirei os olhos, frustrado.
— Então me mostra como é.
Ela hesitou.
— Podemos apenas patinar? O que acha?
— Acho que você está fugindo.
Aproximei-me mais, puxando-a pela cintura antes que
pudesse escapar. Ela ficou tensa, com as mãos espalmadas contra
meu peito.
— Você cuida de todos e se esquece de si mesma.
Lyanna tentou recuar, mas segurei firme. No fundo, era isso
que eu queria, prendê-la entre os meus braços.
— Eu aprendi algumas coisas no centro de reabilitação. E
uma delas é que a maior lesão está aqui. — Toquei levemente a
lateral de sua cabeça com a ponta do dedo. — Você é graciosa e
talentosa, só está com medo.
Ela desviou o olhar, mordendo o lábio.
— Logan, por favor, não.
— Não o quê?
— Não seja legal comigo.
Soltei uma risada baixa, balançando a cabeça.
— Eu também tenho uma lesão, Lyanna.
Ela franziu a testa, confusa.
— Que lesão?
— Eu nasci para substituir meu irmão.
Eu nunca tinha falado isso em voz alta. Não com essas
palavras. Ela me olhou nos olhos, esperando que eu continuasse.
— Meus pais tiveram Nathan ainda adolescentes. Ele tinha um
futuro brilhante. Era o filho perfeito, a maior aposta para a NHL. Mas
então, ele morreu. E eu passei a vida inteira carregando o peso de
seguir os passos dele. De tapar o vazio que ele deixou.
Lyanna respirou fundo, os olhos suavizando levemente.
— E você sente que nunca será suficiente para eles.
Assenti, mantendo o olhar preso ao dela.
— Você pode trilhar seu próprio caminho, Lyanna. Já se
imaginou dançando em apresentações oficiais, coreografando
performances para competições? Você tem talento para isso. Seus
movimentos são perfeitos, você só precisa acreditar que é capaz.
Ela mordeu o lábio, abaixando o olhar para o gelo.
— Me mostra de novo o que você aprendeu nos vídeos,
Donovan — ela disse se soltando dos meus braços.
E, pela primeira vez, desde que tudo isso começou, senti que
era de verdade.
Eu não sabia exatamente por que me importava tanto com
isso. Com ela.
Não fazia sentido. Eu nunca me importei com ninguém além
de mim mesmo. Nunca fui o tipo que carrega os problemas dos
outros, que tenta consertar alguém. Mas, de alguma forma, estar
com ela parecia me consertar mais do que qualquer coisa que eu
pudesse fazer por ela.
E isso me incomodava. Porque, no fundo, eu não sabia o que
fazer com essa merda de sentimento.
21
Lyanna Callahan
Logan estava escorado na grade, me observando girar sobre
os patins com um leve sorriso no canto dos lábios. Um sorriso raro,
quase imperceptível.
Fiz o mesmo, deslizando até parar ao lado dele, ainda
ofegante.
— Como foi? — perguntei, quebrando o silêncio. — Digo,
quando você percebeu que estava sendo criado para ser igual ao
seu irmão?
O sorriso desapareceu. Ele desviou o olhar, respirando fundo
antes de responder.
— O quarto dele sempre foi proibido para mim. Um espaço
intocado, triste, impregnado pelo cheiro dele. Eu tinha sete anos
quando minha mãe me chamou de Nathan pela primeira vez. “Sou
Logan, mãe”, respondi enquanto ela preparava a comida favorita
dele… para mim.
Ele soltou um riso seco, sem humor, e continuou:
— Continuei repetindo quando ela me comprava roupas que
ele usaria, quando ela olhava para mim e via outra pessoa. Eu era só
um garoto… que mal havia nisso? Então, por um tempo, eu quis ser
ele. Ser Nathan parecia mais fácil do que tentar fazer com que me
amassem por ser Logan.
Meu peito apertou.
— Eu sinto muito.
Ele deu de ombros, a expressão voltando ao normal, fria e
indiferente.
— Eu não. Não sinto nada. Não mais. Essa é a vantagem de
crescer… poder viver a própria vida.
Mas, por algum motivo, eu não acreditei nele.
— Obrigada por hoje.
Logan arqueou uma sobrancelha, um sorriso preguiçoso se
formando no canto dos lábios.
— Você deveria me agradecer de um jeito mais decente.
Cruzei os braços, estreitando os olhos.
— Como?
Ele deu de ombros, girando suavemente sobre os patins até
parar bem na minha frente. As mãos firmes seguraram a grade atrás
de mim, me deixando presa entre seu corpo e o metal gelado.
— Me beija.
— Não tem ninguém vendo — disse recuando.
— Gatinha, você não faz ideia do que eu quero fazer com
você quando estamos sozinhos.
Um arrepio percorreu minha espinha. Meu rosto queimou
instantaneamente, e minha respiração vacilou.
— O quê? — perguntei, e minha respiração se acelerou antes
mesmo da resposta.
Logan inclinou o rosto para mais perto, o nariz roçando na
curva do meu maxilar, sua respiração quente contra a minha pele.
— Se eu disser, estraga a surpresa.
Meus olhos fecharam por reflexo quando os lábios dele
deslizaram levemente pelo meu pescoço, sem pressa, sem tocar de
verdade. Apenas provocação.
Minhas mãos foram parar automaticamente no peito dele, não
para afastá-lo, mas para me segurar. Eu deveria empurrá-lo, deveria
colocar um limite nisso antes que fosse longe demais. Mas, quando
ele pressionou os quadris contra os meus, meu corpo inteiro
derreteu.
— Logan…
Ele deslizou a ponta do nariz até a minha orelha, sussurrando
contra minha pele.
— O que foi, Callahan? Tá tremendo por quê?
Eu odiava o jeito que ele dizia meu sobrenome. Odiava ainda
mais o que aquilo fazia comigo.
Ele recuou o suficiente para me olhar nos olhos, mas não me
deu espaço.
— Me beija, Lyanna.
A forma como ele disse meu nome foi minha ruína.
Meus dedos se fecharam no tecido da blusa dele, e antes que
eu pudesse pensar, minha boca já estava colada à dele.
O beijo começou lento, mas carregado de algo que queimava
sob a minha pele. Logan não tinha pressa, explorava, brincava com
meu lábio inferior antes de mordê-lo de leve, arrancando um suspiro
dos meus lábios.
Ele sorriu contra a minha boca, os lábios roçando suavemente
nos meus enquanto sua mão deslizava até minha cintura, me
puxando para ainda mais perto. Meu corpo se moldou ao dele
automaticamente, como se estivesse esperando por esse contato há
muito tempo.
— Você é viciante — ele murmurou, a voz rouca e carregada
de desejo.
Minha respiração falhou quando senti os dedos dele subirem,
traçando um caminho lento pela lateral do meu corpo. Primeiro, a
curva da minha cintura, depois o quadril, até que deslizou pela
minha coxa, apertando-a com firmeza.
Meus músculos se contraíram sob o toque. Meu coração
disparou no peito.
Logan afastou a boca da minha por um segundo, apenas o
suficiente para me observar. Seus olhos estavam escuros, dilatados.
Ele queria saber até onde eu o deixaria ir.
Minha mente gritava para recuar. Para parar antes que fosse
longe demais.
Mas meu corpo já havia decidido.
Quando não me afastei, ele sorriu de canto, satisfeito, e seus
dedos deslizaram um pouco mais para cima, explorando lentamente
a pele quente da minha coxa, até alcançar a borda da minha saia.
O gelo abaixo dos nossos pés parecia insignificante
comparado ao calor que tomava conta do meu corpo.
— Você gosta de jogar, Callahan? — A voz dele era um sopro
contra a minha orelha.
Engoli em seco, sentindo minha respiração acelerar.
— Depende do jogo — murmurei, sentindo o toque dele subir
um pouco mais, os dedos perigosamente próximos da minha
intimidade.
Ele soltou um riso baixo e satisfeito, inclinando-se para
morder de leve meu queixo antes de sussurrar:
— Então me diz, gatinha… quer brincar comigo?
Logan Donovan
Eu sentia cada centímetro do corpo dela reagindo ao meu
toque. O jeito que ela respirava entrecortado, o jeito que as coxas se
pressionavam contra a minha mão, como se quisesse mais.
Ela queria mais.
Minha boca encontrou a dela de novo, faminta, profunda,
enquanto minha mão deslizava por baixo da saia, traçando o
caminho que eu já sabia que ela desejava.
— Você tá tremendo, Callahan… — murmurei contra seus
lábios, minha língua passando lentamente sobre o lábio inferior dela
antes de mordê-lo. — É pelo frio ou pelo meu toque?
Ela não respondeu, apenas cravou os dedos nos meus
ombros, as unhas arranhando de leve a blusa térmica que eu usava.
Soltei um riso baixo, satisfeito.
Afastei seus joelhos abrindo as suas pernas, deslizei os dedos
por cima da calcinha, sentindo o calor que escapava dela, o tecido já
úmido contra a minha mão.
— Caralho, está bem molhadinha — murmurei, sentindo meu
pau latejar dentro da calça.
Ela arfou, se apertando mais contra mim, a cabeça tombando
levemente para trás, o pescoço exposto, pedindo para ser marcado.
Eu aproveitei.
Mordi sua pele, sugando devagar, sentindo seu corpo se
contrair contra o meu. Minhas mãos exploravam, desciam e subiam,
provocando, torturando, sentindo cada tremor, cada suspiro que
escapava dos lábios dela.
Eu podia sentir o quão quente ela estava, o quanto ela estava
no limite.
E, caralho, eu estava tão duro que doía.
— Logan… — foi só o que ela conseguiu dizer.
E isso foi suficiente.
Meus dedos deslizaram para o centro da sua calcinha,
pressionando contra o tecido fino e encharcado, arrancando um
gemido baixo da garganta dela.
— Você quer que eu continue?
Ela mordeu o lábio, os olhos fixos nos meus, o corpo colado
contra mim, o calor dela me queimando. Afastei a calcinha para o
lado e introduzi um dedo, que entrou com facilidade.
Caralho! Ela é apertada, quente e tudo que eu desejava
naquele momento era me enfiar entre as suas pernas.
— Droga! — ela gemeu fazendo meu pau pulsar dentro da
cueca. Duro e louco para sentir a boceta dela se contraindo ao redor
dele.
Mordi levemente o mamilo duro por cima da blusa, e a senti
rebolar sobre os meus dedos.
— Assim você me fode, Lyanna.
Esfreguei meus dedos em seu clitóris em um movimento
gostoso de vai e vem afundando-os ao mesmo tempo que eles
entravam deslizando pela sua boceta encharcada. Se encaixava tão
perfeitamente que era impossível não sentir espasmos pensando
como seria gostoso estar ali dentro.
— Assim — ela gemeu quando o orgasmo chegou, suas
pernas tremeram e eu a beijei sentindo seu corpo amolecer.
Levei a mão dela até minha calça, guiando seus dedos pelo
volume rígido que pulsava contra o tecido.
— Sente isso? — murmurei contra seus lábios. — Olha o que
você faz comigo, Callahan.
Ela mordeu o lábio, a pele quente contra a minha. Suas mãos
deslizaram hesitantes, os dedos traçando meu contorno de forma
curiosa, testando, explorando.
Soltei um gemido baixo, inclinando a cabeça para trás por um
segundo, saboreando a sensação.
— Porra…
Eu a puxei pela nuca, tomando sua boca em um beijo
faminto, intenso. Ela retribuiu com a mesma vontade, e quando seu
toque ficou mais firme sobre mim, eu soube que não havia mais
volta.
Meus dedos deslizaram por suas coxas expostas, puxando-a
ainda mais contra mim.
— Você quer isso, Lyanna?
— Caralho! Eu achei que você estivesse sozinho.
A voz de Tyler cortou o momento como um balde de água
fria.
Lyanna congelou instantaneamente, seus dedos ainda
fechados ao redor de mim. Seu olhar encontrou o meu por um
segundo, a respiração acelerada, os lábios vermelhos pelo beijo
intenso, mas então, como se tivesse sido puxada de volta à
realidade, ela se afastou bruscamente.
— Merda! — ela arfou, dando um passo para trás e ajeitando
a saia com pressa.
Passei a mão pelos cabelos, fechando os olhos por um
segundo, tentando ignorar a frustração latejando no meu corpo.
Tyler, do outro lado da grade, cruzou os braços e ergueu uma
sobrancelha com um sorriso sem graça.
— Interrompi alguma coisa?
Eu o encarei com puro desgosto.
— Vai se foder, Tyler.
Ele riu, balançando a cabeça.
— Isso foi um erro — ela murmurou.
E então, sem me dar tempo para retrucar, ela saiu do rinque,
me deixando ali, duro, puto e completamente fodido.
Tyler me lançou um olhar divertido.
— Pelo visto, você ainda vai ter trabalho para comer essa aí.
Minha mandíbula travou, e, sem pensar muito, joguei uma
luva que estava na grade na cara dele.
— Vai se foder, Tyler.
22
Lyanna Callahan
Saí do rinque como se o gelo estivesse pegando fogo sob
meus pés.
Meus passos estavam apressados, mas meu coração batia
mais rápido ainda, descompassado, como se tentasse acompanhar a
bagunça que Logan Donovan tinha acabado de fazer dentro de mim.
O frio da noite cortava minha pele exposta, mas o calor que
ainda latejava entre minhas pernas me deixava tonta. Minhas coxas
ainda tremiam levemente, resquícios do que ele tinha feito comigo.
Merda.
Passei as mãos pelo rosto, sentindo a vergonha misturada
com raiva subir como um incêndio incontrolável.
"Isso foi um erro."
Eu disse.
Eu repeti.
Mas, porra… não parecia um erro quando os dedos dele
estavam dentro de mim.
Respirei fundo, tentando afastar a lembrança do toque
quente, da voz rouca ao pé do meu ouvido, dos olhos azuis me
devorando como se eu fosse a única coisa no mundo.
Não.
Isso não podia acontecer.
Eu prometi a mim mesma que nunca mais me envolveria com
um jogador de hóquei.
Prometi que manteria distância de homens como ele.
Arrogantes. Prepotentes. Violentos. Instáveis.
E Logan Donovan era assim, igual a todos.
Eu ainda estava tentando organizar meus próprios
pensamentos quando cheguei em casa. Meu corpo ainda estava
quente, minha respiração continuava errada, como se eu não tivesse
voltado completamente para a realidade. Mas assim que coloquei a
mão na maçaneta, o choque veio.
Ouvi os gritos da minha mãe.
Meu peito apertou, e eu nem percebi que estava prendendo a
respiração até ouvir a voz de Mark.
— Que tipo de mãe você é que deixa a sua filha sair com um
moleque a essa hora?!
Meus pés se moveram sozinhos, entrando depressa, e a cena
me atingiu com espanto.
Minha mãe estava encolhida no sofá, os braços erguidos num
reflexo automático de defesa. O cabelo bagunçado, os olhos
brilhando com lágrimas. Mark estava sobre ela, os punhos cerrados,
o peito subindo e descendo de raiva.
Eu deveria ter me acostumado com isso. Mas nunca me
acostumava. Ele estava cada dia mais violento.
— Mãe? — minha voz saiu mais baixa do que eu queria.
Ela ergueu os olhos para mim, desesperada.
— Vai pro quarto, Lyanna! — gritou, sem mover um músculo.
Eu tentei. Deus sabe que eu tentei me virar e ir embora, mas
não tive coragem de deixá-la. Mark se afastou dela no mesmo
instante e veio até mim.
Ele me olhou de cima a baixo. Eu conhecia esse olhar. Aquele
que me fazia sentir suja.
— Tava dando pro moleque, Lyanna? — as palavras
escorreram como algo pegajoso e nojento.
O nojo subiu pela minha garganta.
— Isso não é da sua conta.
— Vou dar uma surra em você qualquer dia desses para
aprender a não me responder.
O sorriso torto dele apareceu, e minha mãe… Ela não disse
nada como sempre.
Meu peito doeu mais do que eu gostaria de admitir. Mark riu,
satisfeito com o silêncio dela. Eu virei as costas, porque se ficasse ali
mais um segundo, talvez fizesse algo idiota.
Bati a porta do quarto e me joguei na cama, puxando o
cobertor até a cabeça. E então… Os gritos voltaram.
O som de algo quebrando, a voz chorosa da minha mãe.
Meu corpo tremia, mas não era de frio. Era de raiva. De nojo.
De exaustão.
Minha respiração falhava, meus olhos ardiam, mas eu não ia
chorar. Não ia.
Só queria que tudo aquilo acabasse.
Na manhã seguinte, a casa estava arrumada. Como sempre.
O sofá de volta ao lugar. O chão sem rastros de nada. A louça
lavada e guardada.
Tudo no seu devido lugar.
Tirando pelo rosto dela.
Os dedos trêmulos da minha mãe acenderam um cigarro
enquanto ela se jogava na cadeira da cozinha, apoiando um dos pés
sobre o assento. O silêncio pairou no ar antes que sua voz cortasse,
arranhada pelo cigarro e pelo ressentimento.
— Você viu o que causou ontem?
Prendi a respiração por um segundo antes de soltar, baixinho.
— Não fiz nada.
Ela soltou a fumaça devagar, como se tivesse todo o tempo
do mundo.
— Termine com o jogador de hóquei, Lyanna. Não quero vê-lo
aqui novamente.
Eu ainda tinha algumas semanas. Esse era o acordo com
Logan.
Não respondi. Peguei um pedaço de pão duro da cesta e
passei o resto da geleia de amora que sobrou na mesa.
— Logan não fez nada.
Ela riu. Baixo. Quase debochada.
— Acabe com isso. Não quero vê-lo rondando esse bairro. Se
ele insistir, pago para aqueles moleques que matam por um cigarro
de maconha esperarem ele assim que pisar aqui.
Minhas mãos apertaram o pão com força.
— Qual o próximo passo? Me colocar na cama do Mark?
Minha mãe virou a cabeça lentamente na minha direção, os
olhos estreitados, cheios de raiva e a descrença.
— Você tem uma mente doente, Lyanna. Ele só está cuidando
de você. — Ela tragou fundo, soltando a fumaça devagar. — Coisa
que o seu pai nunca fez.
Uma risada vazia escapou da minha garganta antes que eu
pudesse segurar.
— Jura? Porque eu não preciso que ele cuide de mim. Eu
nunca precisei. Aliás, nem você fez isso.
Ela fechou a cara, mas eu não parei.
— Eu sempre me virei sozinha, e não me espantaria se
tivesse sido você quem sabotou meus patins, porque você não
suportava me ver seguir a carreira que você tanto quis.
— Cala a porra da boca, Lyanna.
Dessa vez, sua voz tremeu.
O cigarro foi apagado com brutalidade no cinzeiro conforme
ela se levantava de repente, me pegando pelo braço.
— Sai dessa casa. Sai agora.
— Me solta!
— Não quero ver a sua cara hoje.
A porta foi aberta com força, e antes que eu pudesse reagir,
ela me arrastou para fora, jogando minha mochila no chão como se
eu fosse um lixo com o qual ela não queria mais lidar. Me virei,
respirando com força, sentindo o peito subir e descer rápido.
Eu deveria simplesmente ir. Mas não fui. Porque mesmo
depois de tudo, minha voz saiu, tremendo:
— Eu queria ter coragem, mãe. De te deixar sozinha com ele.
Ela travou e eu avancei um passo.
— Mas eu sou uma idiota, porque eu sei que no dia em que
eu não estiver mais aqui, ele te mata.
Ela deu um passo para trás e apontou para a rua.
— Vai, pirralha dos infernos. Me deixa em paz.
O som da porta batendo com força fez meu corpo estremecer,
recolhi algumas coisas que caíram da mochila aberta e segui para o
ponto de ônibus.
23
Logan Donovan
Pulei para fora do conversível assim que avistei Lyanna
atravessando o estacionamento da universidade. Meu olhar
percorreu seu rosto, os ombros tensos, a expressão fechada. Algo
estava errado.
Acelerei o passo até alcançá-la, envolvendo seus ombros com
um braço antes que ela tentasse fugir de mim.
— Você está bem? — perguntei.
Ela endureceu sob meu toque.
— Por que não estaria?
A resposta veio rápida, defensiva.
Apertei os lábios, deslizando os olhos para sua expressão
carregada.
— Porque eu te conheço, Callahan.
Ela bufou, tentando se soltar, mas eu segurei firme.
— Agora a gente se conhece? — provocou.
Apertei o maxilar, estudando seu rosto.
— Você não sabe nada sobre mim.
Soltei um suspiro impaciente.
— Ok. Se não quer papo, vamos só seguir com o que temos
que fazer.
Ela desviou o olhar.
— Podemos fingir que brigamos hoje?
Meu cenho franziu no mesmo instante.
— Por quê? — perguntei, segurando seus ombros, forçando-a
a me encarar.
— Porque eu não quero falar com ninguém hoje.
— Isso tem a ver com o que aconteceu no gelo, Lya…
Ela ergueu o rosto de supetão, era óbvio que eu iria tocar no
assunto.
— Não aconteceu nada no gelo, Logan. Para de ficar tentando
ser meu amigo quando ninguém está vendo. Não volta na minha
casa. Nem no café.
— Não aconteceu nada no gelo? — perguntei com ironia.
Ela me encarou, tensa, o queixo erguido num esforço para
parecer firme.
— Nada que deveria ter acontecido.
— Ah, então é assim? Não posso ir à sua casa, nem no café?
Ótimo. — Inclinei a cabeça, analisando-a por um instante antes de
dar um passo para mais perto. — Então vamos seguir com a nossa
farsa.
Antes que ela pudesse protestar, passei um braço ao redor da
sua cintura e a puxei para mim.
O burburinho ao redor aumentou.
Ela arregalou os olhos, surpresa, mas antes que pudesse me
empurrar ou soltar algum xingamento, minha boca cobriu a dela.
Não foi um beijo calmo ou delicado. Foi intenso, cheio de
domínio. Senti suas mãos pressionarem meu peito, como se
estivesse indecisa entre me afastar ou me puxar para mais perto.
E, por um instante, ela cedeu.
Os lábios macios se entreabriram, e eu aproveitei a
oportunidade, aprofundando o beijo, explorando, provando.
Droga.
Ela tinha gosto de desafio. E de algo que eu estava viciado.
Deslizei os dedos pelo seu maxilar, como se apenas reforçasse para
todo mundo que ela era minha.
Eu sorri contra seus lábios quando finalmente me afastei.
— Isso é pra ninguém duvidar da gente, gatinha — murmurei
baixo, apenas para ela.
Quando soltei sua cintura, ela cambaleou um pouco para trás,
os lábios vermelhos e inchados pelo beijo.
Todo mundo estava olhando. Lyanna respirou fundo e se
recompôs.
— Você é um filho da puta.
Eu apenas dei de ombros, passando o polegar nos próprios
lábios enquanto a olhava de cima a baixo.
— E você beija como se estivesse louca para mais.
Dei um passo para trás, observando seu rosto corar.
— Te encontro depois da aula.
Antes de sair, virei-me uma última vez, sorrindo de canto.
— Ah, e Callahan… amanhã é meu primeiro jogo de volta
depois da suspensão. Obrigado por isso.
Pisquei para ela e saí.
Lyanna Callahan
Passei a ponta dos dedos pelos lábios, ainda sentindo a
pressão do beijo ao passo que observava Logan se afastar com
aquele maldito andar confiante.
Ele era um playboy mimado. Arrogante. Um problema que eu
não precisava na minha vida. Mas meu corpo parecia discordar.
Respirei fundo, tentando ignorar o calor que ainda queimava
sob minha pele, quando ouvi meu nome ser chamado.
— Lyanna!
Virei-me na direção da voz e vi Tyler vindo em minha direção
com passos rápidos. Ele parou à minha frente, ofegante, como se
tivesse corrido para me alcançar.
— O que você quer? — perguntei, evitando seus olhos
enquanto sentia minhas bochechas esquentarem ao me lembrar do
que ele tinha visto ontem.
Droga.
Tyler passou a mão pelo cabelo, sem jeito.
— Queria me desculpar por ontem. Eu juro que não sabia que
Logan tinha levado você lá. Ele nunca levou nenhuma garota lá… —
Ele fez uma pausa, franzindo a testa. — Aliás, ele também nunca
havia levado ninguém para o quarto dele. Enfim… — Ele balançou a
cabeça. — Me desculpe.
Desviei o olhar, indo em direção ao prédio onde eu teria aula.
— Você fez bem. Chegou na hora certa. Teríamos feito uma
burrada se você não tivesse chegado.
Tyler arregalou os olhos, como se só agora percebesse o que
eu estava dizendo.
— Caralho! Já tava nesse nível?! — Ele passou a mão no
rosto, rindo nervoso. — Logan vai me matar, porra.
— Vocês moram na mesma casa, se você ainda está vivo é
um bom sinal. Não se preocupe tanto — falei com deboche.
— Lyanna, amanhã é o primeiro jogo do Logan depois da
suspensão.
— E o que eu tenho a ver com isso? — perguntei sem
esconder a indiferença.
— Você é a namorada dele. Precisa estar lá.
— E tem ingresso para o camarote?
A voz animada me fez virar o rosto. Emma sorria empolgada,
como se aquela fosse a notícia do ano.
— Claro! Eu entrego para vocês depois da aula.
Emma bateu palmas, empolgada.
— Vai ser incrível! O primeiro jogo que assisto do camarote.
Ótimo… era exatamente assim que eu queria passar a minha
sexta-feira à noite.
— É muito bom ser a melhor amiga da namorada do capitão
do time — Emma disse, praticamente saltitando ao meu lado
enquanto nos afastávamos de Tyler.
Lancei um olhar de canto para ela, arqueando a sobrancelha.
— Engraçado… não me lembro dessa empolgação toda
quando eu namorava o Troy.
Ela franziu o nariz.
— Não é a mesma coisa, Lyanna. — Revirou os olhos,
balançando a cabeça. — Logan é uma aposta alta para a NHL. Você
tá com um bilionário, talentoso e famoso.
Bufei, desviando o olhar.
— Ah, claro. Quase esqueci que agora sou uma sortuda.
— Sabe quem está voltando?
— Não faço ideia.
— Noah Bennett.
Meu corpo reagiu antes mesmo da minha mente processar.
Virei-me de imediato para Emma.
— O Noah?
O nome dele trouxe um turbilhão de lembranças. Não era
como se eu não gostasse do Noah, mas ele era meu ex-parceiro de
dança e filho do meu ex-treinador. Ele seguiu em frente. Eu fiquei
para trás. Ele representava tudo que eu poderia ter sido, tudo que
perdi.
— Sim — Emma continuou. — As meninas do time de
patinação estavam comentando.
— Ah… legal.
Minha resposta soou forçada até para mim.
— Você não está feliz? Vocês eram melhores amigos.
Parceiros dentro e fora do gelo.
Soltei uma risada curta, sem humor.
— O que foi? Está com ciúmes?
Emma revirou os olhos.
— Eu só quero que você fique bem, Lyanna. Mesmo quando
vê-lo voltando com as medalhas e troféus que…
Ela hesitou, mas eu completei por ela.
— Que deveriam ser nossos. Não se preocupe, eu vou ficar
bem.
24
Logan Donovan
Eu estava deitado na cama, encarando o teto enquanto o
relógio no meu pulso vibrava sem parar com as chamadas do meu
pai. Ignorei todas. Não queria ouvir mais sermões sobre
expectativas, sobre como esse jogo era importante para a minha
imagem.
Mas então, outra notificação acendeu a tela do meu celular
com o nome de Lyanna.
Lyanna: “Boa sorte no jogo”
Sorri de canto. Claro que consegui.
Digitei rápido.
Logan: “Onde você está agora?”
Demorou um pouco, mas quando a resposta chegou, me
deixou empolgado.
Lyanna: “Emma me arrastou para o parque perto da sua
casa. Tyler veio trazer os ingressos do jogo. Ele entregaria ontem,
mas marcou com ela hoje”
Meus dedos já se moviam antes mesmo de pensar.
Logan: “Você ainda está aí?”
Mais alguns segundos de espera.
Lyanna: “Sim.”
Sorri de lado, já saindo da cama.
Logan: “Me espere.”
Lyanna: “Não posso te esperar.”
Eu apertei os dentes.
Logan: “Você não precisa de ingressos, você vai
comigo.”
A resposta demorou alguns segundos.
Lyanna: “Se concentra no jogo, eu vou estar assistindo
você.”
Revirei os olhos, passando a mão no rosto. Ela é teimosa e
parece que eu venho buscando motivos para estar perto dela.
O som da porta de entrada se abrindo ecoou pelo andar de
baixo.
Levantei-me no mesmo instante, vestindo a camisa
rapidamente antes de descer as escadas. Tyler estava entrando na
sala, com aquele sorrisinho satisfeito no rosto.
— O que você estava fazendo com a minha namorada? —
perguntei, descendo as escadas com passos pesados.
Tyler me olhou divertido, coçando a cabeça.
— Calma, papai urso. Eu só fui entregar os ingressos.
— Devia ter me dito que ia encontrar a minha namorada.
— Emma ficou animada com as entradas pro camarote, foi só
isso.
Bufei.
— Eu vou buscar a Lyanna. E levo a amiga também.
Ele riu, se jogando no sofá.
— Você está cada dia mais ciumento.
Joguei-me ao lado dele, pegando meu celular.
— Eu? Ciumento?
— Sim, você. Tá parecendo um cachorro farejando território.
— Não enche o saco, Tyler.
— Nem tenta disfarçar, Donovan. A verdade é que você não
gosta da ideia de outro cara chegando perto da Lyanna.
— A gente tem um acordo. O mínimo que ela pode fazer é
cumprir a porra do combinado e não ficar se encontrando com caras
quando eu não estou.
Ele arqueou a sobrancelha.
— E o combinado inclui você rosnando pra qualquer um que
chegue perto dela?
Joguei a almofada nele.
Ele gargalhou.
Mas no fundo, ele não estava tão errado assim. Só que eu
ainda não havia admitido o quanto eu estava gostando de passar um
tempo com ela.
Lyanna Callahan
— Eu não vou. Não dá, Emma.
— Não dá o quê, garota? Só porque o seu ex vai jogar contra
o seu atual, você acha que não pode assistir ao jogo?
— Eu assisto outro jogo.
Emma cruzou os braços, me lançando um olhar impaciente.
— Lya! Eu não quero ir sozinha. E, pelo amor de Deus, é a
primeira vez que assistimos do camarote!
— Emma… — suspirei, esfregando o rosto.
— Ele é seu ex. O seu atual vai jogar. Ponto. Vida que segue.
Mordi o lábio, incomodada.
— Logan não comentou nada sobre isso. Ele deveria ter me
dito com quem ia jogar. Isso me deixa irritada.
Emma bufou.
— Relaxa, Lya. O cara deve estar surtando com o próprio
retorno. Ele nem deve ter parado para pensar nisso. Agora, me
deixa ir, vou me arrumar para o jogo.
E saiu antes que eu pudesse protestar.
Ótimo.
Agora, além de ter que lidar com essa farsa, também teria
que ver Troy em campo, jogando contra Logan.
Cheguei em casa e, como de costume, o som de vozes
alteradas preenchia o ambiente. Minha mãe choramingava,
tentando, sem sucesso, acalmar a fera. Passei direto pelo corredor,
evitando olhar para a cena que já se repetia tantas vezes.
Entrei no meu quarto sem ser notada, fechei a porta e
respirei fundo. Um banho quente me ajudaria a esquecer por alguns
minutos a realidade que eu não podia mudar.
Arrumei-me rápido. Jeans, um suéter simples e o cabelo solto
para disfarçar qualquer coisa. Peguei meu celular e abri a porta.
Mark estava espalhado no sofá como se fosse o dono da casa.
Assim que me viu, endireitou a postura e me analisou de cima a
baixo, os olhos deslizando por mim de um jeito que me fez encolher
os ombros.
— Aonde você vai a essa hora? — ele perguntou me
analisando.
Chequei o relógio no pulso, tentando não demonstrar o
incômodo.
— Combinei de assistir ao jogo de hóquei — respondi,
seguindo até a cozinha para pegar um copo d’água.
Mas antes que eu pudesse abrir a geladeira, a voz dele cortou
o ar.
— Tá vendo, Carolina? — Ele se virou para minha mãe, um
sorriso torto de escárnio no rosto. — Olhe bem para a sua filha, indo
ver aquele moleque. Você acha que isso vai acabar diferente?
Meu estômago se revirou quando ele avançou para minha
mãe e agarrou os cabelos dela, forçando-a na frente do espelho da
sala.
— Quer que ela termine igual a você? Grávida, fodida, presa
numa vida de merda?
Meu corpo congelou.
— Mark… — minha mãe tentou falar, mas ele apertou ainda
mais os dedos no couro cabeludo dela, puxando sua cabeça para
trás.
— Cale a boca. — Ele empurrou a cabeça dela com força
contra a parede ao lado do espelho.
O som do impacto me fez soltar o copo. O vidro estilhaçou no
chão.
— CHEGA! — minha voz saiu trêmula e ofegante, mas tentei
soar firme.
Mark se virou para mim, ajeitando as mangas da camisa
como se nada tivesse acontecido.
— Volte para o seu quarto. Você não vai sair hoje.
Minha mãe massageava a cabeça, respirando com dificuldade.
Então, de repente, ela murmurou algo que fez meu sangue gelar.
— Ele tem razão, Lyanna… volte para o quarto.
Pisquei, sem acreditar.
Mark sorriu satisfeito.
— Viu só? Até sua mãe concorda.
Ele se moveu até a cozinha e pegou um copo, abriu uma
cápsula e despejou um pó fino na água antes de estender para ela.
— Beba tudo, meu amor. Você precisa descansar.
Minha mãe pegou o copo sem hesitar. Meu coração acelerou.
— O que você tá fazendo? — minha voz saiu mais fraca do
que eu queria.
Mark se virou para mim, com uma expressão fria.
— E você. — Ele caminhou devagar até onde eu estava. —
Fique no seu quarto.
Meu corpo travou. Minhas mãos começaram a suar.
— Eu… já marquei com a minha amiga. Eu… não posso
desmarcar.
Antes que eu terminasse a frase, a mão dele subiu rápida e
atingiu meu rosto com força.
O impacto me fez dar um passo para trás. Levei a mão ao
local, sentindo a pele queimar, mas não deixei que as lágrimas
caíssem.
— Eu mandei você entrar, Lyanna.
Ele se aproximou mais, a respiração quente e repulsiva contra
meu rosto.
— Sua mãe vai dormir em breve — sussurrou, a voz baixa e
ameaçadora. — E aí vamos ter uma conversa sobre essa sua
rebeldia.
Minha garganta se fechou. Eu só queria sair dali.
— Eu… eu não posso. Emma já está me esperando.
Tentei me afastar, mas ele agarrou meu braço, os dedos
apertando com força.
— Você não entendeu, Lyanna? — Sua voz saiu baixa,
carregada de algo frio e doentio. — Isso não é um pedido. É uma
ordem.
O olhar dele brilhou com uma perversidade que fez minha
pele arrepiar de nojo.
Meu coração disparou.
Corre.
Agora.
Puxei meu braço com força, reunindo tudo o que tinha dentro
de mim para me livrar dele. Mas ele não soltou. O aperto só ficou
mais forte.
— Prometo melhorar a situação da sua mãe — ele sussurrou,
o hálito quente e repugnante roçando na minha pele. — Tratá-la
bem. Fazê-la feliz, como ela espera que eu faça.
Seu olhar se desviou para o sofá, onde minha mãe jazia
afundada, os olhos pesados, semicerrados, os movimentos lentos
demais. Efeito do remédio.
Ele voltou a me encarar, inclinando a cabeça como um
predador estudando sua presa.
— Não sente pena dela, Lyanna? — Sua mão subiu, lenta e
calculada, alisando meu braço. — Não quer que ela seja feliz?
Engoli em seco, meu corpo inteiro paralisado.
— Você tem sorte, sabia? — Mark murmurou, os dedos
subindo até minha clavícula. Minha pele queimou de repulsa. — Sua
mãe não é tão gostosa quanto você.
O mundo parou.
Um segundo.
Dois.
Minha visão escureceu, meu peito subiu e desceu em
desespero.
Corre, porra.
Mas antes que eu pudesse reagir, antes que meu cérebro
saísse do choque, ele se inclinou mais um pouco, os lábios
asquerosamente próximos do meu rosto.
Não.
NÃO.
Minha mão se moveu antes mesmo que eu percebesse, a
palma da minha mão encontrou seu peito e eu o empurrei com toda
a força que eu tinha.
Mark cambaleou para trás, os olhos arregalados de surpresa.
Não esperei para ver sua reação, agarrei minha mochila e
corri para a porta.
Corri, para o mais longe que consegui. Meu peito doía. Meu
joelho falhava. Minhas pernas tremiam.
Foi quando vi Emma.
Ela estava encostada no carro, mexendo no celular,
despreocupada com o mundo. Mas, assim que levantou o olhar e me
viu, ficou pálida.
— Caralho, Lya, o que aconteceu? — a voz dela tremeu, os
olhos escaneando meu rosto.
Minha boca abriu, mas nada saiu. Apenas ar. Apenas
desespero.
— Emma, me tira daqui. — A súplica escapou rouca, entre
soluços.
Ela largou o celular no banco do passageiro e veio até mim,
os braços me segurando firme enquanto eu desmoronava.
— Está tudo bem, estou aqui. Vamos sair daqui agora.
Eu assenti freneticamente, sem saber para onde ir, sem saber
o que fazer. Apenas me agarrando à única certeza que eu tinha no
momento: eu não podia voltar para casa.
Emma abriu a porta do carro e me empurrou delicadamente
para dentro. Meu corpo cedeu, mole, exausto. Meus dedos tremiam
enquanto eu os levava ao rosto, sentindo as lágrimas quentes
escorrendo sem controle.
O motor roncou, e Emma acelerou, saindo da rua como se
tivéssemos acabado de fugir de um crime.
— Aonde quer ir? — ela perguntou, os olhos grudados na
estrada, a preocupação estampada no rosto.
Eu não sabia. Não tinha para onde ir.
— Vamos para a minha casa. Minha tia viajou de novo, então
pode ficar tranquila. Estamos sozinhas.
Assenti em silêncio, sem forças para discutir, sem forças para
dizer nada.
O caminho foi um borrão. As luzes da cidade piscavam do
lado de fora da janela do carro, mas eu mal as via. Minhas mãos
tremiam sobre o colo, os dedos apertando a minha perna como se
aquilo pudesse me manter ancorada na realidade.
Quando chegamos, Emma me puxou para dentro e me levou
direto para o quarto dela.
— Senta aqui. — Ela abriu o guarda-roupa e pegou algumas
toalhas, depois colocou um vestido confortável sobre a cama.
Ajoelhou-se na minha frente, me estudando com o olhar.
— Quer tomar um banho?
Eu apenas acenei com a cabeça, sentindo minha garganta
queimar ao tentar engolir.
Ela me ajudou a levantar e me empurrou suavemente na
direção do banheiro.
A água quente deslizou sobre minha pele, mas eu ainda
sentia o toque asqueroso dele. Ainda sentia o cheiro dele
impregnado em mim.
Esfreguei os braços, os ombros, o pescoço… até minha pele
ficar vermelha.
Quando finalmente me rendi ao cansaço e saí do banho, vesti
o vestido que Emma tinha deixado e me joguei na cama.
Ela se sentou ao meu lado, os dedos deslizando pelo meu
cabelo ainda úmido, como se estivesse tentando me acalmar.
— Lya… o que aconteceu? — a pergunta veio em um
sussurro, carregada de preocupação.
Minhas lágrimas voltaram antes que eu pudesse contê-las. O
soluço veio junto, escapando sem controle.
Emma não insistiu. Ela apenas continuou ali, em silêncio, me
oferecendo o conforto que eu precisava.
— Descansa — murmurou, passando os dedos pelo meu
cabelo em um carinho leve. — A gente conversa amanhã.
Fechei os olhos, com o peito ainda pesado, seria difícil
adormecer, mas eu os fechei e esperei que o cansaço me vencesse.
25
Logan Donovan
O carro ronronava sob minhas mãos enquanto eu dirigia até o
bairro dela.
Um bairro de merda.
Um lugar onde eu nunca pisaria se não fosse por ela.
Mas, de alguma forma, meus pés sempre me levavam até lá.
Olhei para o relógio no painel do carro. Eu tinha exatamente
60 minutos antes de precisar estar na arena, tempo o suficiente para
pegá-la, passar em Emma no caminho e chegar com folga para o
jogo.
Mas quando virei a esquina da casa dela, tudo estava escuro.
Nenhuma luz acesa. Nenhum movimento.
Meu maxilar travou.
Lyanna deveria estar me esperando.
Fiz o que qualquer um faria, peguei o celular e disquei o
número dela.
Chamou uma vez.
Duas.
Nada.
Apertei os dentes, irritado.
Terceira tentativa.
Dessa vez, atendeu, mas a voz que veio do outro lado não
era dela.
— Oi, Logan. — A voz de Emma soou hesitante do outro lado
da linha.
— Cadê a Lyanna? — perguntei, direto.
— Tivemos um imprevisto… — Emma começou, com a voz
cuidadosa demais. — A Lya acabou dormindo aqui em casa.
Desculpa, mas não vamos poder ir.
Fechei os olhos por um instante.
— Que porra isso significa, Emma?
— Significa que você pode ir jogar tranquilo.
Minha mão apertou o volante.
— Por que ela não está me atendendo?
— Ela não pode falar agora, eu te disse, ela dormiu.
Fiquei em silêncio por um segundo, antes de disparar:
— Me passa o endereço da sua casa.
— Logan… não dá.
Minha paciência estava indo para o caralho.
— Emma, que caralhos vocês estão fazendo?
— Nada. Só cuida do seu jogo.
— Passa o telefone para Lyanna.
O silêncio dela foi a pior resposta.
— Emma… — Minha voz saiu baixa, porém irritada.
— Desculpa, tenho que desligar agora. — A voz dela saiu
apressada. — Se concentra no jogo, Logan. E marca muitos gols
para a Lya.
A linha caiu.
E eu fiquei ali, sentindo o sangue ferver enquanto olhava para
a escuridão na casa dela.
Algo estava errado. Muito errado. E eu ia descobrir o que era.
Nem que eu tivesse que rasgar o mundo inteiro para isso.
Minhas mãos apertavam o volante com força.
O silêncio na casa dela.
Emma desconversando.
Lyanna sem atender.
Tudo errado.
Minha paciência estava indo pro caralho.
Peguei o celular e disquei outro número, o único que poderia
me dar a resposta que eu preciso
— Caralho, Donovan, o treinador já tá surtando! Cadê você,
porra?! — Owen atendeu, com a voz irritada.
— Preciso do endereço da Emma, amiga da Lyanna. Agora.
Ele ficou em silêncio por meio segundo antes de resmungar:
— Que porra está acontecendo?
— Explico depois.
— Logan…
— Só me arruma o endereço, Owen!
Mais uma vez ele fica em silêncio.
— Caralho, Logan! Tem mando em alguns segundos!
— Beleza. Seja rápido. Preciso chegar a tempo pro jogo.
A linha ficou muda por alguns segundos antes de uma
notificação surgir na tela.
Endereço recebido.
Joguei o celular no banco do passageiro e pisei no acelerador.
Saltei do carro assim que estacionei na frente da casa.
O endereço não era longe da casa da Lyanna, mas ficava mais
próximo da arena. Isso era bom. Daria tempo.
Bati na porta com pressa, Emma abriu com um susto visível
nos olhos.
— Que merda, Logan! O que você tá fazendo aqui?!
— Chama a Lya.
— Que parte de que ela dormiu você ainda não entendeu?
Ela tentou bloquear a entrada, mas passei direto, colocando-a
de lado com um movimento rápido.
Ela me seguiu, reclamando, xingando, mas eu nem prestei
atenção. O corredor era estreito, portas alinhadas. Eu abri a última
sem hesitação.
E lá estava ela. Dormindo. Como Emma tinha dito, mas eu
ainda não estava convencido.
Aproximei-me da cama e afastei os cabelos do rosto dela. Foi
aí que meu sangue gelou. Minha mão tremeu quando vi.
As marcas, o rosto marcado, o roxo no braço.
Foda-se o jogo.
— Que porra é essa? — minha voz saiu baixa, mas carregada
de algo que fez Emma prender a respiração atrás de mim.
Lyanna se mexeu, o rosto franzindo antes dos olhos abrirem.
Ela me viu e congelou.
— Logan? — A voz dela saiu baixa, assustada. Ela se sentou
rápido na cama, se encolhendo, envolvendo as pernas em volta dos
braços.
— Quem fez isso com você, Lyanna?
Ela piscou algumas vezes, meio atordoada, os olhos indo do
relógio no pulso para mim.
— Você devia estar na arena… O que tá fazendo aqui?
— Quem fez isso? — insisti.
Ela se levantou rápido, tentando me empurrar para fora, mas
quando vi mais marcas de dedos no braço dela, algo dentro de mim
quebrou.
Minha mandíbula trincou. Eu ia matar esse filho da puta.
— Não importa a porra do jogo, Lyanna.
Ela congelou. O choque passou pelo rosto dela, rápido, antes
de ela tentar recuperar a compostura.
— Claro que importa. Foi por isso que começamos essa
mentira, lembra?
— Percebi que existem coisas mais importantes. — Meu olhar
percorreu as marcas, a pele machucada, os olhos dela carregados de
medo. — E, nesse momento, essa coisa importante tá machucada
bem na minha frente.
— Logan…
— Quem foi, Lyanna? — Minha voz saiu mais baixa, mas
carregada de fúria.
Ela fechou os olhos, respirou fundo e soltou um suspiro
tremido.
— Por favor… vai para o jogo e volta assim que brilhar no
rinque.
O pedido veio em um sussurro. Os olhos dela estavam cheios
de lágrimas.
Mas eu não me movi.
— Se eu for, você me diz quem fez isso?
Ela hesitou. Por um segundo, achei que ia me expulsar dali de
vez, mas então, ela assentiu.
— Sim. Eu te conto tudo.
Minha respiração saiu pesada. Eu precisava ir, mas antes, me
inclinei e tomei a sua boca em um beijo forte, cheio de posse e
dependência. Ela gemeu contra meus lábios, e senti o gosto da
raiva, da confusão, do medo.
Eu ia descobrir quem fez isso. E quando descobrisse… ele ia
pagar.
Afastei-me, mas antes de sair, deixei um aviso:
— Eu volto em três tempos.
E quando eu voltasse o Inferno ia quebrar.
O barulho da multidão ecoava nos corredores da arena
quando entrei no vestiário. Cheguei em cima da hora.
O suficiente para deixar o treinador puto da vida.
— QUE MERDA, DONOVAN?! — O grito dele bateu contra as
paredes, fazendo alguns jogadores olharem de canto. — Você tem
noção do que tá acontecendo?! Primeiro jogo depois da suspensão e
você chega ATRASADO?!
Joguei minha bolsa no banco sem me importar. Eu estava
com a cabeça em outro lugar.
Minha mandíbula ainda doía de tanto cerrá-la no caminho.
Eu não conseguia parar de ver as marcas no corpo da Lyanna.
Não conseguia esquecer os olhos dela, cheios de medo.
— Tá ouvindo, porra?! — o treinador insistiu, a cara vermelha
de raiva.
— Eu ouvi, mas já cheguei — respondi sem me importar
muito com ele.
O treinador estreitou os olhos.
— Então me diz, Logan, onde caralhos você estava?!
— Cuidando de um problema mais importante do que esse
jogo.
O vestiário ficou em silêncio.
Dava para ouvir o barulho das lâminas dos patins raspando no
gelo do lado de fora.
O treinador respirou fundo, cruzando os braços.
— Mais importante do que o seu time?
— Mais importante do que qualquer coisa.
Ele me analisou por um segundo.
Estava tentando decidir se valia a pena continuar discutindo
comigo.
Não valia.
Antes que ele pudesse retrucar, Owen apareceu do meu lado.
— Que merda aconteceu? — ele perguntou, a voz mais baixa,
mas carregada de preocupação.
Joguei a toalha sobre o banco e comecei a abrir minha bolsa,
tirando os equipamentos com movimentos bruscos.
Owen ficou esperando pela resposta. Eu sabia que ele não ia
largar do meu pé até que eu dissesse alguma coisa.
— Ainda não sei direito — respondi, finalmente.
Owen franziu a testa, trocando um olhar com Dax Bastien,
que chegou no mesmo instante e bateu no meu ombro.
— Bom que veio, porque se não aparecesse, Troy ia achar
que você estava com medo.
Endireitei-me.
— Medo? — Soltei uma risada seca, sem humor. — Estou
doido para acabar com a raça dele no rinque.
Dax trocou um olhar com Owen, que apenas assentiu em
silêncio.
— Beleza, mas foca no jogo primeiro, Donovan — ele alertou.
Tentei respirar fundo, mas estava difícil me concentrar.
O barulho do vestiário era o de sempre: jogadores rindo,
alguns aquecendo, outros concentrados.
Mas eu não estava ouvindo nada direito.
Minha cabeça ainda estava lá. Com Lyanna. Com as marcas
no corpo dela.
Fui para o meu armário e abri a porta com força, pegando
meus equipamentos.
Owen se sentou no banco ao lado, ainda me observando.
— Você parece pronto para matar alguém.
Não parecia. Eu estava.
— Só quero jogar.
O treinador passou pelo vestiário novamente, ainda irritado.
— Se vocês já terminaram o chazinho da tarde, se preparem
logo.
Dax riu baixinho e se inclinou.
— É hoje que você mete Troy no gelo?
— Eu estou doido para quebrar aquele filho da puta ao meio.
26
Logan Donovan
A arena pulsava.
O gelo refletia a luz intensa das arquibancadas, e as vozes da
torcida criavam um zumbido constante em meus ouvidos. Eu esperei
tanto o meu retorno, eu esperei tanto jogar contra ele novamente.
Troy Carter.
Ele estava ali, do outro lado do rinque, sorrindo.
Filho da puta.
Meus pais estavam lá, na primeira fila do camarote. Minha
mãe, com a postura impecável e o olhar orgulhoso. Eu não era o
filho perfeito, mas ela tentava me amar.
Meu pai, de braços cruzados, analisando cada maldito movimento
meu, esperando que eu errasse, ele não admitia isso, mas sei que
esperava, era uma forma de manter a ferida viva, uma forma de
lembrar que Nathan se foi.
Mas, pela primeira vez, eles não eram o centro da minha
raiva.
Era ele. O desgraçado que, agora, me olhava com aquela
expressão de deboche de sempre.
Apertando o capacete entre os dedos, deslizei o olhar para
ele. Não recuei. Não pisquei.
Ele abriu um sorriso de canto. Aquele maldito sorriso
convencido, como se pudesse se comparar a mim. Esqueceu quem
sou eu. Esqueceu que, em tudo, eu sou melhor que ele. No gelo, na
vida, em qualquer maldita coisa.
— O que foi, Donovan? — perguntou com sarcasmo. — Sentiu
meu cheiro na sua mulher?
Senti meus músculos travarem.
— Eu deveria ter sentido?
— O último cheiro é sempre o que fica, Carter. E o meu ainda
tá fresco.
— Você confia tanto assim nela para saber se outro não passa
depois de você?
Ri, sem humor, inclinando ligeiramente a cabeça.
— Confio o suficiente para saber que, se alguém tentar, vai
sair sem os dentes.
Filho da puta.
Eu podia não saber o que aconteceu com Lyanna naquela
noite, mas, naquele momento, meu corpo inteiro deduziu a resposta.
Foi ele.
Minha mente gritava "bate nele", mas minha razão berrava
"joga direito, destrói no gelo".
Então, segurei firme o taco. E esperei.
O disco foi jogado, Troy e eu avançamos ao mesmo tempo,
ombro contra ombro.
O primeiro choque veio forte. O impacto reverberou pelo meu
corpo, e eu empurrei de volta, firme, disputando o puck.
— Vai me bater, Donovan?
— Ainda não. Mas eu vou te enterrar nesse gelo.
O jogo começou intenso. Deslizei pelo rinque, bloqueei dois
ataques, e avancei em velocidade.
Troy tentou me barrar na lateral.
Não deixei.
Desviei.
Passei o disco.
Gol.
A arena explodiu, e eu nem comemorei.
Não tirava os olhos dele. O jogo estava só começando.
No segundo período o jogo ficou mais violento, cada tranco
no vidro era mais forte. Cada disputa de puck era mais agressiva.
O treinador gritava para eu me concentrar, mas eu estava
concentrado.
Concentrado em fazer esse filho da puta engolir o próprio
sangue.
No terceiro minuto, ele veio para cima. Minha reação foi
automática, o taco subiu e acertou de leve sua perna.
Ele revidou com um empurrão.
— Agora tá começando a ficar divertido.
— Espero que não se importe se eu marcar um gol — ele
zombou.
— Vai precisar sobreviver até lá.
O gelo virou guerra, o disco deslizava rápido entre os
jogadores, e cada choque com Troy se tornava uma briga não dita.
Na última jogada do segundo período, ele se aproximou do
gol, meu goleiro bloqueou.
O puck sobrou na minha frente.
Eu avancei, e então senti.
O tranco.
Forte.
Baixo.
Meu corpo tombou contra o vidro, o impacto rasgando meu
ombro no acrílico.
Minha visão escureceu por um segundo.
— Será que ela gemeu o teu nome ou o meu, Donovan?
O juiz apitou a penalidade dele.
Mas não me importei. Levantei-me com olhos em chamas
pronto para o terceiro período de jogo.
Eu podia sentir o olhar do meu pai sobre mim. A tensão no
treinador. O time inteiro esperando minha reação.
Minha cabeça latejava, e a única coisa passava pela minha
mente, eu ia matar esse desgraçado.
Avancei no rinque, o taco na minha mão parecia parte do
meu próprio corpo.
O disco deslizou.
Passei para Dax.
Troy veio me barrar.
Dessa vez, o corpo dele encontrou o meu, mas eu já estava
pronto, joguei meu peso contra o dele o desestabilizei e roubei o
puck. E, no segundo seguinte, acabei com a jogada.
Gol.
A arena explodiu, mas o verdadeiro barulho estava dentro da
minha cabeça.
Meu peito subia e descia, e a única coisa que senti foi o gelo
sob meus joelhos quando caí para deslizar em comemoração.
Levantei os olhos e encontrei Troy.
Ele não sorria mais. Não precisava dizer nada. Vencemos.
O apito final ecoou, mas eu mal registrei o fim do jogo.
Meu ombro latejava como o inferno. A pancada contra o
acrílico tinha sido pior do que eu imaginava, e agora uma dor quente
irradiava pelo braço, tornando cada movimento um incômodo. Mas
isso não era nada comparado à urgência dentro de mim. Eu só
queria me trocar, sair dali e ver Lyanna.
Ela prometeu que me contaria tudo, minha mente martelava
esse pensamento repetidamente.
Entrei no vestiário em passos largos, puxando a camisa com
brutalidade. O tecido grudado no suor e no sangue do corte aberto
no ombro fez com que eu soltasse um grunhido baixo de dor.
— Porra, Donovan. — Tyler franziu a testa ao me ver. — Seu
ombro tá uma merda.
— Está tranquilo. — Joguei a camisa no banco e comecei a
soltar as proteções.
— Não parece. — Owen estreitou os olhos. — Você tá
sangrando, imbecil.
Ignorei, arrancando os equipamentos e jogando tudo no
armário. Meu único objetivo era sair dali o mais rápido possível.
— Vai tomar banho antes de vazar, pelo menos. — Dax jogou
uma toalha na minha cara.
Soltei um suspiro impaciente, arrancando a toalha do rosto e
indo direto para o chuveiro. A água quente bateu contra meus
músculos tensos, e por alguns segundos, fechei os olhos, deixando a
mente vagar.
Mas tudo que eu via era o rosto dela, a porra do roxo no
rosto dela. O tremor na voz dela quando me pediu para ir ao jogo.
Eu não sabia exatamente o que estava sentindo, mas sabia
que precisava voltar para ela. Terminei o banho em tempo recorde,
passando a toalha de qualquer jeito pelo corpo. Me vesti rápido, a
camiseta preta grudando um pouco no ombro machucado, e peguei
minha bolsa.
Dax me estudava, a expressão desconfiada. Eu sabia que ele
já tinha percebido que eu não estava nos meus melhores dias. Ele
sempre percebia.
— Qual o problema? — ele perguntou, se aproximando.
— Lyanna foi agredida e não me contou que foi. Que porra…
— Se for agir no calor do momento, pode fazer merda e
acabar ferrando tudo. Se controla. Sua garota precisa de você inteiro
— disse, mantendo a voz baixa. — Traga ela para casa, se precisar.
— O que vai fazer com o cara?
Eu travei a mandíbula.
— Quero quebrar a cara dele, seja lá quem for.
Dax ficou em silêncio por um segundo, me encarando como
se avaliasse minha resposta.
— Quer que eu resolva?
Olhei para ele por alguns segundos, sabendo exatamente o
que significava quando ele oferecia esse tipo de solução.
— Do seu jeito?
Ele assentiu.
O jeito dele era matar sem deixar vestígio.
— Vou tentar do meu primeiro.
— Se precisar estou aqui.
— Valeu, irmão, agora eu preciso ir.
Estava prestes a sair quando ouvi a voz grave do meu pai do
outro lado do vestiário.
— Logan.
Fechei os olhos por um segundo.
Merda.
Virei-me devagar, vendo ele parado na porta com as mãos no
bolso da calça. Ao lado dele, um homem de terno, olhando
diretamente para mim com interesse.
— Quero que você conheça alguém. — Meu pai apontou para
o cara ao lado. — O técnico do…
Não ouvi o resto.
— Agora não.
O olhar do meu pai endureceu.
— Você acha que pode desperdiçar oportunidades como
essa?
— Não é o momento agora, pai.
O técnico manteve um sorriso diplomático, mas percebi que
ele me avaliava, provavelmente analisando minha postura. Mas eu
não estava interessado nisso, por hora.
Meu pai apertou a mandíbula.
— Logan — seu tom era baixo e frio. — Não banque o idiota.
Soltei um riso seco.
— Tenho uma coisa mais urgente pra resolver.
— O que pode ser mais importante que sua carreira?
Meus olhos se estreitaram.
— Hoje? Tudo.
Não esperei para ouvir mais gritos ou para dar explicações.
Apenas segui direto para a saída, ignorando os olhares dos outros
jogadores.
Eu tinha um único destino agora. Lyanna.
27
Lyanna Callahan
Eu não consegui mais pregar os olhos, a imagem de Logan
não saía da minha cabeça. A forma como ele me olhou, preocupado.
O toque dele, gentil demais para alguém tão bruto e,
principalmente, as palavras que saíram da sua boca. E quando ele
disse que eu era importante, que ele se importava comigo deixou o
meu coração acelerado.
— Você tem um rottweiler ao seu lado, amiga.
— Não quero envolver ele nisso.
— Ele não parece ser do tipo que cumpre ordens. Nem regras
— Emma disse, me lançando um olhar sugestivo.
Suspirei, passando as mãos pelo rosto.
— Logan é... complicado.
— Acho que ele não faria exatamente o que quer,
independentemente do que você diga. — Ela arqueou a sobrancelha.
— O cara já se meteu nisso. Já viu suas marcas, Lya. Acha que ele
vai simplesmente fingir que não viu?
— Eu não quero voltar para casa — desabafei, com a voz
baixa, cansada.
Antes que Emma pudesse responder, ouvi uma voz firme de
Logan atrás de mim.
— Então, vem para a minha.
Eu e Emma praticamente saltamos do sofá quando ele entrou
na sala sem cerimônia, como se não tivesse acabado de entrar sem
bater na casa de outra pessoa.
Ele caminhou até mim e sentou-se ao meu lado, afastando
uma mecha do meu cabelo e passando os dedos com uma
delicadeza que contrastava com sua postura tensa. Seus olhos
varreram meu rosto, parando na marca que ocupava boa tarde de
um lado do meu rosto.
— Não fale bobagens — murmurei, desviando o olhar.
— Que bobagem? Você é minha namorada, Callahan. Minha
casa é enorme. Meu quarto é imenso. Dá até para você morar no
meu closet. — Ele tentou um sorriso, mas seus olhos diziam outra
coisa.
— Logan…
— Estou preocupado com você, Lya. — Sua voz saiu mais
baixa agora. — Quem fez isso com você?
Ele não precisava de resposta. Eu vi nos olhos dele que já
sabia. Um músculo pulsou em sua bochecha antes dele se levantar
de repente.
— Filho da puta.
Emma me lançou um olhar de alerta.
— Logan… — Tentei conter o avanço dele, segurando seu
braço.
Ele riu. Um riso seco, sem humor.
— Eu vou meter aquele desgraçado na cadeia, Lyanna — ele
rosnou. — Mas antes, eu vou esmurrar muito a cara dele.
— Logan, não!
Ele não me ouviu, claro, saiu rápido e entrou no carro
acelerando em seguida. Emma fez o mesmo pegando a chave do
veículo e dirigindo rápido comigo ao lado dela.
Logan Donovan
O motor do meu carro roncava alto conforme eu pisava no
acelerador. Eu mal enxergava direito, minha visão tomada pelo
sangue fervendo nas veias. O volante estava apertado em minhas
mãos, e meu ombro latejava da porra do impacto no jogo, mas nada
disso importava agora.
Nada.
Porque eu só conseguia ver as marcas no rosto da Lyanna. Se
aquele desgraçado teve coragem de levantar a mão para ela, então
ia ter coragem de encarar um homem de verdade.
Virei a esquina rápido demais e freei bruscamente em frente à
casa dela. Saltei do carro estacionando de qualquer jeito, chutando a
porta sem hesitar.
A madeira cedeu com um estrondo, batendo contra a parede,
e eu avancei. Mark estava jogado no sofá, uma garrafa na mão,
parecendo surpreso. Mas o que realmente me fez perder o resto da
sanidade foi o que vi no sofá oposto. A mãe de Lyanna. Dopada.
Marcada.
Minha respiração ficou pesada, meu maxilar doía de tão forte
que travei os dentes.
— Que merda você faz aqui, seu fedelho? — Mark se
levantou, os olhos vermelhos de álcool e arrogância.
Meus punhos cerraram no instante em que ele abriu a boca.
— Se atreva a tocar nela de novo e eu enfio a porra de um
pau no seu rabo, seu filho da puta.
Eu estava além da fúria. Estava pronto para matar.
— Veio bancar o herói agora, garoto? Veio defender a
princesa da periferia?
Eu avancei antes que ele terminasse a frase, empurrando seu
peito com força.
— Eu vim quebrar a porra da sua cara, seu desgraçado. Se
quer bater em alguém, bata em um homem.
Meu ombro pulsou de dor com o movimento, mas foda-se. Eu
ia acabar com ele.
— Bater? Em quem eu bati? — ele zombou, um sorriso
nojento se abrindo no rosto. — Ah… a Lya? Eu não queria bater
nela.
Ele lambeu os lábios, como se saboreasse a própria merda
que dizia.
— Eu queria outra coisa.
Minha visão ficou vermelha. Não pensei. Só agi.
O impacto do meu punho contra o rosto dele foi a melhor
coisa que senti naquela noite.
Eu sentia a pele do meu punho arder, os nós dos dedos já
abertos pelo impacto. Mark estava encostado na parede, o rosto sujo
de sangue.
Avancei de novo, o agarrando pela gola e o puxando para
cima, pronto para acabar com essa merda.
Mas meu ombro gritou de dor.
Porra!
Meu braço esquerdo não queria responder como deveria, uma
dor quente se espalhava pela clavícula e subia pelo pescoço.
Não recua, porra.
Mark percebeu. Ele riu, aproveitando meu segundo de
fraqueza, e acertou um soco direto no meu lado direito do rosto.
A dor explodiu na minha mandíbula, meu pescoço virando
com o impacto. Tropecei para trás, rangendo os dentes. O filho da
puta batia forte.
Ele não parou.
Avançou, me acertando um golpe no estômago. O ar escapou
dos meus pulmões, meu corpo se curvando instintivamente para a
frente.
Porra, porra, porra!
Minha visão piscou por um segundo, mas assim que o senti se
preparando para outro golpe, reagi por puro instinto. Usei o peso do
meu corpo para empurrá-lo para trás, jogando-o contra a mesa de
centro.
O vidro estilhaçou quando o corpo dele bateu, e um grito
abafado escapou da garganta do desgraçado.
— Agora sim, estamos no mesmo nível — cuspi o sangue no
chão, sentindo o gosto metálico se espalhar pela boca.
Mas meu ombro estava fodido. Cada movimento fazia parecer
que ele ia se deslocar de vez.
Mark se levantou devagar, sorrindo. O maldito ainda sorria.
— Tá cansado, playboy? — zombou, limpando a boca
ensanguentada com o dorso da mão.
Eu ia arrancar a porra dos dentes dele se não fosse pela
sirene.
Porra!
O som alto cortou a rua lá fora, e, em questão de segundos,
luzes azuis e vermelhas brilharam pelas janelas.
Alguém tinha chamado a polícia.
Minha respiração estava pesada, meu peito subindo e
descendo com força. Eu já sabia como essa merda ia acabar.
E então ouvi a voz dela.
— LOGAN!
Levantei a cabeça e a vi.
Lyanna estava parada na porta, os olhos arregalados com
desespero.
Atrás dela, Emma também estava ali, mas foi Lyanna quem
me fez congelar.
Mark soltou uma risada baixa. Eu ia acabar com esse filho da
puta.
Mas antes que pudesse dar mais um passo, os policiais
entraram na casa.
— Mãos na cabeça!
Eu ergui as mãos, tentando conter a dor do ombro fodido.
Mark fez o mesmo. Mas os policiais não demoraram muito para
entender a situação.
Minha respiração estava pesada, o sangue ainda escorria pelo
canto da minha boca, quente e metálico, o gosto impregnado na
língua. Então, vi quando um dos policiais se virou para Lyanna,
enquanto outro se aproximava da mulher no sofá. A mãe dela.
Eu sabia que estava dopada, vi a minha mãe assim muitas
vezes lamentando a morte de Nathan.
Seu corpo parecia mole demais, a respiração irregular, os
olhos semiabertos, mas sem foco. Ela murmurava algo inaudível,
como se estivesse tentando acordar de um pesadelo.
Filho da puta.
Minha mandíbula trincou com tanta força que ouvi os dentes
rangerem. O ódio queimava no meu peito como gasolina em
chamas.
Se os policiais não estivessem aqui, eu teria feito algo que me
mandaria direto para a cadeia.
— Esse é o homem que te agrediu? — um dos policiais
perguntaram a Lyanna apontando para Mark.
Ela hesitou por um segundo, a garganta se movendo em
seco, mas então assentiu.
— Sim, ele tentou… — Ela hesitou, chorando em meio a
soluços.
Mark abriu um sorriso torto.
— Eu só estava tentando educá-la.
Eu me movi na direção dele antes mesmo de pensar.
— Cala a boca! — rosnei, mas um dos policiais me segurou.
Eles algemaram Mark na mesma hora. Eu observei enquanto
o levavam, mas então minha atenção se voltou para Lyanna.
E para o estado da mãe dela.
Merda.
A mulher estava dopada e o rosto marcado.
— Levem ela para o hospital — um dos policiais disse para os
paramédicos.
— Você também precisa de um hospital, babaca — Emma
disse, olhando para meu ombro fodido.
Eu queria negar. Eu queria cuidar disso depois, depois que eu
soubesse que Lyanna estava bem.
Mas Lyanna veio até mim.
Os olhos estavam vermelhos, as mãos tremendo.
— Por favor, Logan. — A voz saiu baixa, implorando. — Vem
com a gente.
E eu fui. Porra, é claro que eu fui.
28
Logan Donovan
Acordei com a sensação estranha de que algo estava
faltando. Meu braço.
Por um segundo, entrei em pânico. Eu deveria sentir alguma
coisa, dor, formigamento, qualquer coisa, mas tudo o que havia era
um vazio estranho, como se ele tivesse sido arrancado. Arrastei a
mão boa para o lado, tateando até encontrar a pele quente e firme
do meu próprio braço.
Ainda estava ali.
Soltei o ar pesadamente, relaxando contra o travesseiro,
quando uma voz suave quebrou o silêncio:
— O médico te deu um sedativo forte, e você já acordou.
A melodia na voz dela me atingiu como um toque suave que
eu não sabia que precisava. Eu nunca me senti assim antes.
Já passei por muitas situações fodidas. Tenho amigos ao meu
redor, sou cercado de gente que se importava de alguma forma. Mas
com ela era diferente.
Porque com ela, eu queria isso.
Eu queria a atenção dela.
Eu queria que ela estivesse aqui.
E pela primeira vez na vida, percebi o quão fodido isso era.
— Como está se sentindo? — perguntei, observando
atentamente seu rosto, tentando decifrar o que ela não diria em
palavras.
— Estou bem... — Ela hesitou, desviando o olhar. — Minha
mãe está internada. Isso me preocupa.
— O que exatamente te preocupa?
— Eu acho que deveria ter cuidado melhor dela.
Soltei um suspiro, passando a mão pelo rosto.
— Somos dois fodidos, Lya. A polícia vai chegar para pegar
meu depoimento antes mesmo dos meus pais, que com certeza já
sabem de tudo.
Ela fechou os olhos por um instante, e quando voltou a me
encarar, sua expressão era uma mistura de exaustão e frustração.
— Pare de se meter em problemas por minha causa, Logan.
Soltei uma risada baixa, balançando a cabeça.
— Eu sempre me meti em problemas. Um a mais, um a
menos, não faz diferença. A única coisa que importa é que aquele
filho da puta nunca mais vai encostar em você.
Seus olhos encontraram os meus, e por um momento, o
quarto pareceu pequeno demais para tudo o que estava no ar entre
nós.
— Você tem a mim agora, Lyanna.
Ela engoliu em seco e forçou um sorriso breve.
— Sim, ainda temos um ao outro... por algumas semanas.
— Sim... algumas semanas — repeti, mas dessa vez, a ideia
de um prazo parecia mais sufocante do que eu gostaria de admitir.
Ela se aproximou o suficiente para que eu conseguisse puxá-
la para a cama. Ela hesitou por um segundo antes de se inclinar um
pouco mais, o suficiente para que eu pudesse deslizar minha mão
pelo seu rosto.
— Me ajude, Callahan — murmurei, o polegar roçando de leve
sua bochecha.
— Com o quê? — A voz dela saiu baixa, desconfiada, mas ela
não se afastou.
Meus olhos caíram para sua boca, e um sorriso de canto
surgiu em meus lábios.
— Se incline só mais um pouco.
Ela estreitou os olhos, mas, sem perceber, fez exatamente o
que eu queria.
Minha outra mão se moveu para a nuca dela, puxando-a para
mais perto.
— Eu deveria ganhar algo como agradecimento, não acha?
Não esperei uma resposta.
Tomei sua boca com a minha, sentindo a forma como ela
prendeu a respiração por um segundo antes de ceder.
O beijo começou lento, exploratório, mas logo se tornou algo
mais intenso, mais urgente. Meus dedos apertaram sua cintura,
puxando-a contra mim, e ela soltou um suspiro contra meus lábios.
Eu queria mais dela, aprofundei o beijo, o gosto dela me
deixando cada vez mais faminto, mas assim que levantei o braço um
pouco mais, uma dor aguda rasgou meu ombro, me fazendo soltar
um gemido baixo de frustração e dor.
— Droga... — resmunguei, fechando os olhos por um
instante, tentando ignorar a fisgada que percorreu todo o meu
braço.
Lyanna se afastou no mesmo instante, os olhos arregalados.
— Logan?
— Estou bem — soltei, rangendo os dentes.
— Você não está bem, seu idiota. — Ela me encarou com
uma mistura de irritação e preocupação, os dedos tocando meu
ombro com cuidado. — Você deveria estar descansando.
Eu ri baixo, respirando fundo para controlar a dor.
— Se você parar de fugir de mim, eu consigo descansar bem
melhor, Callahan.
Ela revirou os olhos, mas não conseguiu esconder o rubor
subindo por seu rosto.
— Vou pegar algo para sua dor.
— Não demora. — Pisquei para ela. — Ainda não terminou de
me agradecer.
Ela resmungou, se levantando, e eu só consegui sorrir.
Eu a ouvi dizer que o sedativo que me deram era forte, mas o
efeito passou bem na hora que eu precisava.
Lyanna Callahan
Saí do quarto para procurar o médico quando avistei os
policiais conversando com os pais de Logan no corredor.
Eu já os tinha visto antes. A mulher, loira, alta,
impecavelmente vestida, o salto ecoando no chão frio do hospital
como se estivesse em um evento de gala. O homem ao lado dela
carregava a mesma expressão de sempre: irritado com o mundo,
como se tudo ao seu redor fosse uma grande decepção. Seu olhar
presunçoso era idêntico ao do filho.
— Aquele moleque! — O tom de voz dele reverberou pelo
corredor, carregado de frustração. Ele falava como se Logan ainda
fosse um adolescente rebelde que precisava de correção.
Senti um arrepio subir pela espinha, quando os olhos dele
encontraram os meus. Não esperei para ver o que aconteceria a
seguir. Virei as costas no mesmo instante, me afastando rápido,
fingindo que nunca os tinha visto.
Eu sabia que Logan odiava os pais. Ele já havia mencionado
algumas razões, e, pelo que vi ali, já eram o suficiente para justificar.
Mas, por mais curiosidade que me despertasse, eu não tinha o
menor interesse em descobrir por conta própria os muitos outros
motivos.
— Fugindo, Callahan?
Parei no mesmo instante ao ouvir a voz.
Tyler estava sentado próximo à porta do quarto de Logan, um
sorriso preguiçoso surgindo assim que nossos olhares se
encontraram. Assim como Logan, ele era alto, mas os cabelos
escuros contrastavam com a pele clara e os olhos esverdeados que
pareciam sempre carregados de diversão.
— Por que eu deveria? — Cruzei os braços, arqueando uma
sobrancelha.
— Seus sogros estão furiosos.
Revirei os olhos.
— A mãe dele parece dopada. Só segue o homem furioso na
frente dela como um fantoche.
— Sim, bem isso. — Ele suspirou, se ajeitando no banco. —
Eu esperava que, depois de tudo, ele nunca mais fosse atrás de
Logan.
— Depois de tudo? — questionei, estreitando os olhos.
— O pai dele já deixou claro que considera Logan um
desperdício. Na última briga, ele olhou na cara dele e disse que
estava descartando um lixo.
— Ele chamou o próprio filho de lixo?
Por que eu estava surpresa? Não era como se eu mesma
fosse tratada com mais consideração em casa.
Tyler riu sem humor e fez aspas com os dedos.
— Sim, e antes de sair, ainda declarou que estava deserdando
o filho ingrato. Vem, você parece exausta. Vou te pagar um café. —
Tyler se levantou, jogando um braço de forma descontraída sobre
meus ombros.
E, pela primeira vez desde que cheguei ao hospital, aceitei
um momento de respiro.
29
Logan Donovan
O cheiro de hospital misturado ao zumbido irritante dos
monitores já estavam me dando nos nervos. Meu ombro latejava,
minha boca ainda tinha um gosto metálico de sangue seco, e,
honestamente, a última coisa que eu queria era lidar com essa
merda.
Mas claro, meu pai estava ali, e como sempre, irritado.
Ele entrou no quarto como uma tempestade, cheio de fúria e
decepção como sempre. Minha mãe o seguiu, parecendo apenas
uma sombra, sem ousar interromper.
— Você está destruindo o seu futuro, Logan! — ele explodiu
assim que me viu, deitado. — Sabe quem já sabe disso? O treinador.
Sabe quem mais? Os olheiros da NHL! Você tem ideia do que isso
significa?
Apoiei o cotovelo bom na lateral da cama e bufei, jogando a
cabeça para trás.
— Significa que eles finalmente perceberam que sou um
desgraçado problemático, mas que jogo bem pra caralho e faço a
porra do time vencer?
— Não brinque com isso! — Meu pai bateu com força no
braço da cadeira ao lado da cama. — Você acabou de voltar para o
gelo, e se mete em briga por causa de uma garota qualquer?!
Meus músculos se enrijeceram no mesmo instante.
— Cuidado com o que fala.
— Ah, então agora você tem moral? Agora quer bancar o
protetor? — Ele riu seco, a voz carregada de sarcasmo enquanto
apontava um dedo para mim. — Primeiro, se mete em briga como
um moleque de rua. Depois, aparece com essa garota qualquer,
como se ela fosse prioridade na sua vida. Você tem que focar na
NHL, Logan, e não em namoros sem futuro.
Meu maxilar travou.
— Uma coisa não tem nada a ver com a outra.
— Não tem? — Ele ergueu as sobrancelhas, cruzando os
braços. — Porque, de onde eu estou vendo, essa garota já está te
desviando do seu objetivo.
Meu sangue ferveu.
— Ela precisou de mim — retruquei. — E como namorado
dela, eu fiz o que qualquer homem decente faria.
— Ah, então agora você quer dar lição de moral?
Dei um passo à frente, ignorando a fisgada no ombro.
— Me responde uma coisa — minha voz saiu baixa, mas
cortante. — Se alguém tentasse abusar da minha mãe, você
simplesmente viraria as costas?
O olhar dele se estreitou, mas ele não respondeu.
Ele não podia responder, porque sabe que qualquer homem
faria isso por uma mulher ainda mais sendo a mulher que gosta.
— O seu futuro está em jogo, seu moleque estúpido! — ele
rugiu, dando um passo à frente.
Sentei-me direito na cama, minha expressão completamente
fria.
— Você quer me dizer como viver minha vida, mas nem
consegue manter a porra da sua família inteira.
Minha mãe suspirou ao meu lado, fechando os olhos como se
quisesse sumir dali. Ela nunca tomava partido, nunca se colocava
entre nós, e isso só me irritava ainda mais.
Meu pai bufou, passando a mão pelo cabelo antes de apontar
para mim novamente.
— Você acha que é esperto, mas está jogando seu futuro
fora. Fizeram vista grossa da primeira vez, mas agora os olheiros da
NHL estão prestando atenção. O treinador já está de saco cheio das
suas merdas. Você acha que eles querem um jogador indisciplinado
e impulsivo?
— Eu fiz o que precisava ser feito.
— Fez o que precisava? — Ele soltou uma risada cínica. —
Você quebrou a cara de um homem e quase acabou na delegacia,
tudo por causa de uma vadiazinha qualquer!
Meus punhos se fecharam, meu corpo inteiro tensionou.
— Não a chame assim.
— Ah, claro. Agora ela é intocável? — ele zombou, dando um
passo à frente. — Você conhece essa garota há quanto tempo,
Logan? O suficiente para jogar sua carreira no lixo por ela?
— O suficiente para saber que ela precisava de mim.
— Você não pode sair socando todo mundo que te incomoda!
— Eu não sou você — retruquei com desdém. — Eu não viro
as costas pra quem precisa de mim.
O ar na sala ficou ainda mais pesado. Meu pai me olhava
como se estivesse prestes a explodir, e eu não me importava. Eu
nunca me importei.
Ele apertou os olhos e puxou uma respiração longa, tentando
se recompor.
— Você vai ficar em observação hoje. O médico disse que
precisa descansar para estar pronto para o próximo jogo.
— Ótimo.
— E, enquanto estiver aqui, mantenha essa garota longe dos
holofotes.
— Ela não é um problema para mim. Você é. Achei que já
tinha me descartado. Então agora você se importa com lixo?
Ele estreitou os olhos.
— Você não tem ideia do que tá fazendo, Logan. Eu tirei seu
estágio, cortei sua conta, e mesmo assim você insiste em agir como
um moleque mimado.
— Então por que você não me deixa em paz, hein? Se já me
jogou fora, se eu sou um fracasso pra você, por que ainda aparece
aqui?
Ele ficou em silêncio por um instante, a expressão fechada.
— Porque, apesar de tudo, você ainda é meu filho.
— Foda-se. Não preciso de você. Não preciso do seu dinheiro,
do seu estágio, nem da sua aprovação.
Ele saiu sem me responder, a minha mãe me olhou pela
última vez antes de segui-lo
Então, sem pensar duas vezes, disquei o número de Lyanna.
Chamou algumas vezes antes de atender.
— Logan? — perguntou baixo e hesitante.
Apertei os olhos.
— Onde você está?
Ela soltou um suspiro do outro lado da linha.
— No hospital, ainda.
Sentei-me na cama, o ombro reclamando com o movimento
brusco.
— Você tá com a sua mãe?
— Sim. Você está bem?
— Já me sinto melhor. Vou falar com o técnico para que o
médico do time acompanhe minha recuperação.
Passei a mão pelo rosto, eu estava exausto.
— Vamos para casa, Callahan. Você vai ficar comigo por um
tempo. Até sua mãe se recuperar, até eu ter certeza de que aquele
filho da puta vai apodrecer na cadeia e nunca mais vai encostar um
dedo em você.
— Logan, não precisa…
— Não perguntei se precisa.
Eu a ouvi suspirar de novo.
— Eu te espero na recepção.
Joguei o celular de lado e me levantei, ignorando qualquer
dor.
Meu pai podia tentar me descartar. Podia tentar apagar meu
nome da família.
Mas uma coisa ele nunca ia conseguir: me dizer o que fazer,
ainda mais em relação a Lyanna.
30
Lyanna Callahan
O quarto era frio. Frio demais. Eu sempre odiei hospitais. Eles
carregavam lembranças que eu preferia enterrar, cicatrizes invisíveis
de um passado que eu tentava esquecer.
Hospitais me lembravam do dia em que tudo desmoronou,
onde meus sonhos foram enterrados entre corredores iguais a esse.
Entre lençóis brancos e o som constante de monitores apitando.
E agora, aqui estava eu de novo.
Minha mãe estava ali, imóvel, deitada entre lençóis
impecavelmente brancos, parecendo ainda menor do que já era. O
peito subia e descia devagar, um bip constante monitorando seus
sinais vitais.
Ela sempre foi uma mulher dura. Mas agora, parecia apenas…
frágil.
Engoli em seco, apertando os braços ao redor do próprio
corpo para me manter firme.
O médico entrou, checando os monitores antes de me olhar.
— Você é a filha dela?
Assenti, incapaz de responder de imediato.
Ele suspirou antes de continuar:
— Sua mãe ingeriu uma dose muito alta de
benzodiazepínicos. É um sedativo forte, e, em excesso, pode causar
insuficiência respiratória. Conseguimos estabilizá-la, mas ela precisa
ficar sob observação por alguns dias.
Eu já sabia. Mas, a cada troca de plantão, alguém fazia
questão de repetir, como se eu precisasse de mais um lembrete do
peso dessa situação.
Minha mãe teria que ficar internada.
E eu teria que dar um jeito de pagar por tudo isso.
Sim, eu queria que ela ficasse bem. Claro que queria. Mas
não conseguia evitar o nó apertado no estômago toda vez que
pensava no custo disso.
Dias em um hospital não eram apenas longos. Eram caros.
— Ela vai ficar bem?
— Sim, mas precisamos ter certeza de que não há outros
problemas subjacentes. O excesso desse tipo de remédio pode gerar
dependência, além de episódios de confusão mental.
Meu estômago revirou.
Dependência.
Eu sabia que Mark tinha controle sobre tudo ao redor dela. O
que ela vestia, o que dizia, o que tomava, ele queria destruir as
nossas vidas.
— Há algo que possamos fazer para reverter isso? — Minha
voz saiu tensa, mesmo que eu tentasse parecer calma.
— Vamos acompanhar a recuperação dela e, quando acordar,
um psiquiatra fará uma avaliação.
Apertei os lábios. Minha mãe odiaria isso. Ela não queria
ajuda, ela achava que amava aquele traste.
Mas antes que eu pudesse processar essa ideia, outro
pensamento me atingiu, meu corpo enrijeceu. Eu não tinha dinheiro
para tudo isso.
Respirei fundo, tentando parecer indiferente quando
perguntei:
— E os custos? Como eu faço para acertar?
O médico me olhou por um momento antes de responder:
— Ah, não precisa se preocupar. Tudo já foi pago.
Minha testa franziu.
— Como assim?
— O pagamento foi feito está manhã. Um rapaz que disse ser
o seu namorado cuidou de tudo.
Meu coração parou.
— Meu… namorado?
— Sim, Logan Donovan. Ele garantiu que sua mãe recebesse
o melhor atendimento.
Eu deveria me sentir aliviada.
Mas, na verdade, o que me consumia era a sensação de estar
em dívida com ele.
Como alguém como Logan Donovan, que sempre fez questão
de me provocar, poderia, do nada, se tornar a pessoa que mais me
ajudava?
Agradeci ao médico com um aceno de cabeça enquanto ele se
retirava.
Minha mente ainda estava um caos quando meu celular
vibrou no bolso.
O nome de Troy na tela fez minha pele arrepiar.
Meu dedo hesitou antes de atender.
— O que você quer? — perguntei, seca.
Do outro lado da linha, ele suspirou.
— Ouvi sobre você e a sua mãe. Como ela está?
— Como você acha que ela está, Troy? Dopada em um
hospital depois de anos sendo manipulada por um desgraçado.
Ele ficou em silêncio por um momento.
— E você? Como está?
Revirei os olhos.
— Não precisa bancar o preocupado agora.
— Lyanna… — A voz dele ficou mais baixa. — Eu só queria
saber se precisa de algo.
Ri sem humor.
— Não preciso de nada de você. Já tenho problemas
suficientes para lidar.
— Lyanna…
— Tenho que ir.
Desliguei antes que ele dissesse qualquer outra coisa.
Minhas mãos estavam tremendo quando guardei o celular, eu
não precisava da preocupação dele.
Dei uma última olhada na minha mãe antes de sair do quarto.
Do outro lado do corredor, Logan estava encostado no balcão
da recepção, imóvel, tão inabalável quanto um daqueles soldados
britânicos que não piscam diante do caos.
Ele nem parecia respirar, mas, quando seus olhos
encontraram os meus, um sorriso curto e convencido surgiu em seu
rosto.
E foi naquele instante que um pensamento me atingiu como
um golpe certeiro.
Esse era o meu destino?
Apaixonar-me por outro jogador de hóquei?
Por outro babaca arrogante, que não se importava com
nada…
Exceto que, dessa vez, ele estava ali por mim.
Logan Donovan
Ela caminhava na minha direção, e eu sabia que deveria
desviar o olhar, mas não consegui.
Porque, porra, ela parecia exausta, os olhos carregados de
preocupação, os ombros tensos, como se estivesse carregando um
peso maior do que o próprio corpo podia suportar.
E algo dentro de mim odiou ver aquilo.
Meu peito apertou com uma sensação incômoda.
Preocupação.
Eu nunca tinha sentido isso por ninguém que não fosse eu
mesmo.
E não gostei.
Mas foda-se.
Porque, no momento em que ela parou na minha frente, a
primeira coisa que saiu da sua boca não foi um agradecimento.
— Você pagou a conta do hospital? — perguntou firme, mas
os olhos vacilaram.
Assumi a minha expressão mais indiferente.
— Você realmente acha que eu ia deixar sua mãe sem
atendimento por causa de dinheiro?
Ela respirou fundo.
— Logan, eu não posso aceitar isso.
Revirei os olhos.
— Ah, você pode e vai. Isso faz parte do acordo.
Ela franziu a testa.
— Desde quando "pagar um hospital" está no nosso contrato?
Inclinei a cabeça para o lado, com um sorriso torto surgindo.
— Desde que eu decidi que uma namorada preocupada e
endividada não combina com a minha imagem.
Ela abriu a boca, como se estivesse prestes a retrucar, mas
nada saiu.
Eu a vi engolir seco, os dedos se fechando ao redor do
celular.
— Mas isso… — Ela começou, mas parou no meio da frase.
Eu sabia o que ela queria dizer.
Que não era só sobre a conta do hospital.
Que não era só sobre a mentira que tínhamos contado para o
mundo.
E sim o quanto que estávamos envolvidos um com o outro,
mas eu não estava pronto para essa conversa.
Então, dei um passo mais perto, invadindo o espaço dela,
deixando meu tom mais baixo, mais calmo.
— Você tá bem?
Ela piscou, surpresa com a pergunta, a mudança brusca de
assunto.
E foi a minha vez de segurar o fôlego, porque ela abaixou a
guarda por um segundo.
O rosto dela suavizou.
A armadura que ela vestia o tempo todo tremeu um pouco.
E, naquele momento, eu soube.
Eu estava fodido.
Mas eu não ia admitir essa merda.
Então, ergui a sobrancelha e voltei ao meu tom normal,
indiferente e cheio de provocação.
— Não me olha assim, Callahan. Vai acabar se apaixonando
por mim.
Ela bufou e me empurrou pelo ombro.
Soltei um gemido exagerado, levando a mão até o ombro
machucado como se ela tivesse acabado de me dar um tiro.
— Porra, Callahan! Você quer me aleijar?
Lyanna arregalou os olhos, mas foi rápido. O pequeno sorriso
que ela tentou esconder entregou tudo.
— Drama, Logan? Não sabia que além de jogador de hóquei,
você também era ator.
Soltei um suspiro exagerado, massageando o ombro com a
outra mão.
— Sabe, eu tô aqui, sofrendo, todo fudido, e você me
maltrata.
Ela revirou os olhos, mas agora o sorriso estava ali, sem que
ela tentasse disfarçar.
— Vamos logo — murmurei, segurando a mão dela e puxando
suavemente. — Você precisa cuidar de mim.
Ela arqueou a sobrancelha.
— Desde quando eu virei sua enfermeira, Donovan?
Inclinei-me um pouco, deixando o rosto mais perto do dela, e
sussurrei:
— Desde que você virou minha namorada.
Ela piscou lentamente, o corpo travando por um segundo.
— Namorada falsa — corrigiu, a voz um pouco mais baixa.
— Detalhes. — Sorri de canto. — O que importa é que eu
tenho um jogo daqui a alguns dias e preciso estar inteiro. Então,
anda logo, Callahan.
Puxei-a pela mão, começando a andar antes que ela tivesse
tempo de pensar demais.
Mas, a julgar pelo jeito que ela apertou minha mão de volta,
eu sabia, que continuar o que começamos no gelo era só uma
questão de oportunidade.
31
Lyanna Callahan
O som dos pneus no asfalto silencioso fez minha barriga
revirar de nervoso, eu vim em silêncio todo o caminho desde que
passei em casa e peguei as minhas coisas. Era oficial. Eu ia morar
por um tempo, com Logan Donovan.
A casa estava vazia. O silêncio parecia estranho ali,
considerando que a última vez que estive nesse lugar foi com um
monte de pessoas barulhentas espalhadas por todos os cantos. Mas
hoje, Logan e eu estávamos sozinhos.
Ele pegou minha mala antes que eu pudesse argumentar.
— Logan, eu posso levar.
Ele me ignorou completamente, subindo as escadas como se
estivesse carregando uma sacola de compras e não uma mala cheia
de todas as roupas que eu tinha.
— Você precisa recuperar o ombro. Me dá isso.
Ele riu, jogando a cabeça para trás, mas não diminuiu o ritmo
nem me deu ouvidos.
— Callahan, se eu consegui jogar hóquei e acabar com a cara
daquele filho da puta do Mark com esse ombro fodido, carregar sua
malinha cor-de-rosa não vai me matar.
— É vermelha! — retruquei, mas ele apenas sorriu e seguiu
para o andar de cima.
Respirei fundo, subindo atrás dele. Eu já tinha estado aqui
antes, mas agora era diferente. Na primeira vez, tudo aconteceu tão
rápido que eu mal tive tempo de absorver os detalhes. Agora,
enquanto Logan abria a porta do quarto, meus olhos percorreram
cada canto.
Era grande. Maior do que eu me lembrava.
— Bem-vinda, Callahan. — Ele abriu a porta completamente,
me dando espaço para entrar.
A primeira coisa que me atingiu foi o cheiro. O cheiro dele.
Uma mistura de menta e algo amadeirado, masculino e viciante.
Olhei ao redor.
O quarto era puro excesso.
A parede principal exibia uma enorme prateleira embutida
cheia de troféus, medalhas e alguns discos assinados por jogadores
famosos da NHL. Havia camisas emolduradas nas paredes, incluindo
a dele, com o nome Donovan estampado nas costas.
A cama era gigante. Lençóis escuros, travesseiros grandes e
um edredom jogado de qualquer jeito, como se ele tivesse acabado
de sair dali.
No canto, um enorme setup de videogame ocupava parte do
espaço. Três telas alinhadas, um controle jogado na mesa e um
headset pendurado na lateral da cadeira ergonômica de couro. Era o
quarto de um típico jogador fodão, rico, mimado e viciado em
videogames quando não estava destruindo alguém no rinque.
Havia também um minibar num dos cantos, com garrafas de
bebidas organizadas numa prateleira iluminada por LED azul. A
bancada de mármore escuro dava um toque refinado, contrastando
com o pôster de um time de hóquei autografado pendurado logo
acima.
— Tá me olhando assim por quê? — Logan arqueou a
sobrancelha, jogando minha mala perto do sofá de couro no canto
do quarto.
— Eu só… — engoli em seco, observando tudo. — Seu quarto
é incrível.
Ele soltou uma risada preguiçosa, se jogando na cama e
apoiando as mãos atrás da cabeça.
— Você esperava o quê? Um colchão no chão e um pôster de
carro esportivo?
Cruzei os braços, ainda processando tudo.
— Talvez algo menos… luxuoso — murmurei, ainda
assimilando que o lugar era maior que a minha casa inteira.
Logan piscou devagar, e um sorriso torto se formou enquanto
se apoiava nos cotovelos, fazendo uma careta quando o ombro
protestou com o movimento.
— Você já esteve aqui, não se lembra de nada?
Suspirei, desviando o olhar.
— Não. Aquele momento passou como um borrão, não
assimilei nada.
Ele riu, aquele riso baixo e rouco que fazia minha pele
arrepiar.
— Hum… mas você ficou bem soltinha sem blusa, exibindo
esse corpinho delicioso.
Minhas bochechas queimaram instantaneamente.
— Logan!
Ele ergueu as mãos, fingindo inocência, mas os olhos ainda
brilhavam com diversão.
— O que foi? Tô numa seca terrível, você disse que eu tinha
que ser fiel.
Revirei os olhos, ignorando o formigamento na minha pele.
— Eu disse sem joguinhos, sem mãos bobas, sem gracinha.
Ele balançou a cabeça, os olhos deslizando lentamente pelo
meu corpo.
— Difícil, Callahan. Você dificulta o meu autocontrole.
Mordi o lábio, me odiando por sentir qualquer coisa com
aquela provocação barata.
— Se vira, Donovan. Você aceitou o acordo.
— Aceitei. Mas ninguém disse que eu não posso reclamar
disso.
Ele gemeu dramaticamente, passando a mão pelo rosto.
— Você tá querendo acabar comigo, Callahan. Como espera
que eu me concentre no próximo jogo desse jeito?
— Você devia estar se preocupando com a sua recuperação,
não com a sua falta de sexo.
— Você é muito má, Lya, eu te fiz gozar, você deveria fazer o
mesmo por mim. .
Minhas bochechas pegaram fogo.
— Logan!
Ele sorriu, satisfeito com minha reação, e passou a língua
pelos lábios antes de continuar.
— É sério. Isso aqui tá começando a ficar injusto. Eu tô aqui,
fiel, me comportando, enquanto você vai dormir debaixo do mesmo
teto que eu, desfilando por aí com essas pernas de fora…
Soltei um riso incrédulo.
— Ah, claro. Então agora a culpa é minha?
Ele deu de ombros, o sorriso convencido se ampliando.
— Eu só tô dizendo que um alívio ajudaria na minha
recuperação.
— O que ajudaria na sua recuperação é repouso, compressa e
os medicamentos que o médico passou.
Ele gemeu dramaticamente e tombou para trás na cama,
batendo a mão no colchão.
— Isso é tortura psicológica.
Revirei os olhos e peguei a mala que Logan havia jogado de
qualquer jeito no canto do quarto, começando a tirar algumas
roupas.
— E onde você acha que vai dormir?
Parei e o encarei.
— No sofá, óbvio.
Ele sorriu e negou com a cabeça.
— Não. Você vai dormir aqui.
Franzi a testa.
— Logan…
— Eu estou machucado, lembra? — Ele apontou para o
próprio ombro, como se eu já não soubesse disso. — Como espera
que eu sobreviva se minha namorada não estiver por perto para me
ajudar?
— Você não tem limites, né?
— Tenho. Mas não vejo sentido em usá-los com você.
Meu coração deu um salto no peito, mas me recusei a dar a
ele essa vitória.
— Eu posso te ajudar, mas isso não significa que eu vá dividir
a cama com você.
O sorriso convencido dele sumiu.
O silêncio se instalou, e Logan apenas me observou, o olhar
mais sério do que eu já havia visto antes.
Meu peito apertou sem motivo aparente, e meus olhos
instintivamente buscaram o que ele estava olhando, como se algo
estivesse errado.
— Lyanna… — Ele soltou o ar, passando a língua pelos lábios
antes de continuar. — Eu sei que sua vida está uma merda, que o
idiota do seu ex era um filho da puta, e que confiar em alguém de
novo deve parecer impossível.
Minha respiração ficou presa.
— Mas… se um dia você considerar dar uma chance para
outro jogador de hóquei inconsequente e impulsivo… — Ele inclinou
a cabeça levemente para o lado, os olhos azuis queimando contra os
meus. — Você promete que vai me considerar uma opção?
Meu coração parou.
Ele não estava brincando.
Por um segundo, tudo dentro de mim gritou para fugir. Para
fingir que não ouvi.
Mas minha garganta secou. Minhas mãos suaram.
Porque a verdade era simples e cruel.
Se um dia eu desse essa chance para alguém…
Eu já sabia que seria para ele.
32
Logan Donovan
Eu tinha só uma chance, e ela estava gritando agora na
minha frente.
Eu queria tê-la.
Cada parte de mim gritava por isso.
Eu sabia que em algumas semanas tudo terminaria. O acordo
que fizemos tinha prazo de validade. E quando chegasse a hora, ela
seguiria em frente, e eu teria que fazer o mesmo. Então, se esse era
o tempo que eu tinha, eu faria valer a pena. Porque essa mulher…
essa mulher era o desejo de qualquer homem. E, no momento, ela
era o meu.
— Que se dane tudo que a gente inventou. Eu quero muito te
foder.
Ela arquejou, surpresa com a minha confissão crua, mas não
recuou.
Eu a queria. Foda-se o acordo. Foda-se o prazo. Foda-se tudo.
A ponta da minha língua umedeceu os lábios enquanto eu a
puxava pela cintura, sentindo seu corpo quente contra o meu.
— Logan… — ela começou, mas sua voz saiu fraca, sem força
para protestar.
— Fala, Callahan. — Meu nariz roçou contra o dela, minha
boca pairando a centímetros da sua. — Diz que não quer. Diz que
não tá com a boceta pingando louca para que eu te toque.
Ela engoliu em seco, as mãos espalmadas contra meu peito.
— Isso não faz parte do acordo.
— Então me diz pra parar.
Ela apertou os olhos por um segundo. Seu peito subia e
descia rápido, como se estivesse travando uma guerra dentro dela
mesma.
Meus dedos deslizaram para sua nuca, puxando-a de leve,
forçando nossos corpos ainda mais juntos.
Ela suspirou.
E não disse nada.
Um sorriso satisfeito curvou meus lábios antes que eu
tomasse sua boca de uma vez.
O beijo não teve nada de suave. Ela gemeu contra meus
lábios, os dedos agarrando minha camiseta como se eu fosse
desaparecer.
— Caralho, Callahan… — murmurei, deslizando a boca para o
seu maxilar, descendo pelo pescoço até encontrar aquele ponto que
a fazia arfar.
Minhas mãos deslizaram para sua bunda, apertando e
puxando-a contra mim. Ela sentiu o meu pau duro louco para me
enterrar nela.
Soltou um suspiro trêmulo e rebolou instintivamente.
— Vai me dizer pra parar? — desafiei, minha voz mais rouca
do que eu esperava.
Ela mordeu o lábio, hesitante, então, de repente, afastou-se
um pouco, com os olhos fixos nos meus.
— Eu não vou ser só mais uma, Logan.
Meu coração bateu mais forte no peito.
Ela não era só mais uma. Ela era a única que eu queria agora,
mas eu sabia que palavras não significavam nada pra ela. Então, em
vez de responder, eu a segurei pela cintura e a joguei na cama.
— Você acha que pode só me jogar na cama e eu vou abrir as
pernas pra você?
Eu me inclinei sobre ela, minhas mãos firmes ao lado do seu
rosto.
— Não, Callahan. — Meus lábios roçaram contra os dela,
provocando. — Eu vou fazer você implorar, para ter o meu pau te
fodendo fundo e gostoso.
Ela soltou um riso curto, quase desafiador, mas seus olhos
brilhavam com um desejo que ela tentava esconder.
— Convencido.
Passei a língua pelos lábios, meu rosto perto do dela, meus
dedos traçaram um caminho lento por sua cintura, subindo por
debaixo da blusa, sentindo a pele quente e macia sob minha palma.
Ela estremeceu.
Ela queria.
Mas ainda lutava contra isso.
— Logan… — Sua voz saiu fraca, como um aviso sem
convicção.
— Fala, Callahan. — Minha boca roçou contra seu maxilar. —
Me diz que não quer.
Ela mordeu o lábio, suas unhas cravando levemente em meus
ombros.
Mas não disse nada.
Eu sorri.
— Foi o que eu pensei.
Minha mão subiu mais, empurrando a blusa até revelar a pele
nua da sua barriga.
Maldição. Ela era linda pra caralho.
Seus músculos se contraíram sob meus dedos quando deslizei
a boca por seu pescoço, distribuindo beijos lentos e molhados,
sentindo seu corpo reagir a cada movimento.
Minha respiração estava pesada quando ergui a blusa dela
ainda mais, revelando seus seios cobertos apenas pelo sutiã de
renda delicada. Meus dedos deslizaram por sua pele quente,
sentindo a suavidade que me deixava insano.
Ela arquejou quando passei a ponta da língua por sua
clavícula, descendo lentamente. Minhas mãos seguraram sua cintura
com firmeza, pressionando-a contra mim, enquanto minha boca
traçava um caminho de beijos molhados até o vale entre seus seios.
Afastei-me ligeiramente para olhá-la. Droga, ela era perfeita.
Seus olhos estavam semicerrados, sua boca entreaberta em um
suspiro carregado de desejo.
Sem hesitação, deslizei as alças do sutiã pelos seus ombros,
deixando a renda cair e revelando tudo para mim. Meus dedos
traçaram o contorno dos seus seios antes de abocanhar um deles,
sugando forte, minha língua girando ao redor do mamilo rígido.
Ela soltou um gemido rouco, arqueando as costas,
esfregando-se contra mim à proporção que minha outra mão
apertava seu outro seio, beliscando o mamilo, provocando-a sem
piedade. Meu pau latejava dentro da calça ao ver sua expressão
completamente entregue ao prazer. A cada nova lambida, chupada e
mordida, eu sentia o calor dela se intensificar, a tensão crescendo
entre nós de forma incontrolável.
Meus dedos deslizaram com mais firmeza entre suas pernas,
sentindo o calor que emanava dali, a resposta do seu corpo que
falava muito mais do que qualquer negação que ela poderia tentar
me dar.
— Logan… — a voz dela saiu entrecortada, hesitante, mas eu
não parei.
Apenas sorri contra sua pele.
— O que foi, Callahan? — minha boca roçou contra a linha do
maxilar dela, sentindo o cheiro viciante da sua pele. — Tá tremendo
por quê?
Seus olhos me fuzilaram por um segundo, talvez tentando
recuperar algum resquício de sanidade, mas ela não tinha mais
escapatória. Ela me queria.
E eu ia dar a ela tudo que ela não tinha coragem de pedir.
Pressionei meus dedos contra o centro quente entre suas
pernas, movendo em círculos lentos, e o gemido dela veio baixo,
contido, mas foda-se se eu não escutei.
— Porra, Lya… — sussurrei, minha respiração entrecortada.
Eu a queria inteira.
Agora.
E queria que ela soubesse disso.
— Me diz que quer — exigi, minha voz baixa e rouca contra
sua pele. — Abre bem essas pernas, me deixa ver essa boceta que
está pingando de desejo.
Seus olhos estavam pesados, os lábios entreabertos, seu
corpo já entregue, mas sua mente ainda lutando.
— Logan… — ela tentou de novo, como se tentasse se
segurar em algo.
Mas minha mão desceu mais, afastando o tecido fino da sua
calcinha, meu dedo deslizando sem nenhuma resistência entre seus
lábios molhados.
Ela se arqueou de imediato, a cabeça tombando para trás.
E ali estava minha resposta.
Meu pau pulsou na calça, duro e latejante, implorando pra
afundar dentro dela, pra senti-la se desfazer nos meus braços.
Minha boca encontrou seu peito, chupando novamente,
enquanto meus dedos traçavam um ritmo lento e torturante entre
suas coxas, explorando cada reação, cada suspiro entrecortado.
— Eu quero ouvir você dizer — pressionei mais forte, sentindo
sua boceta quente e molhada pulsar contra meu toque.
Seus olhos estavam vidrados nos meus, seus lábios vermelhos
e entreabertos, tentando encontrar alguma palavra que não fosse
um gemido.
Mas eu não ia deixá-la escapar dessa vez.
— Me diz que quer, Callahan.
Deslizei um dedo para dentro dela, sentindo como ela era
absurdamente quente e apertada, e o gemido que ela soltou foi
suficiente pra eu perder qualquer autocontrole que ainda me
restava.
— Porra! — grunhi, sentindo minha ereção latejar.
Ela agarrou meus ombros, as unhas arranhando minha pele
por cima da camiseta, os olhos arregalados e cheios de algo que eu
não sabia explicar.
Mas a resposta dela veio.
Baixa.
Entre suspiros, mas clara.
— Eu quero.
E foi o bastante para eu perder completamente o controle.
Meus lábios tomaram os dela no instante em que as palavras
saíram da sua boca. Eu quero.
Minhas mãos agarraram suas coxas e eu a ergui com
facilidade, sentindo suas pernas envolverem meu quadril
instintivamente. O gemido que ela soltou contra minha boca foi a
porra da música mais viciante que eu já tinha escutado.
— Você não faz ideia do que acabou de me dar permissão
para fazer — murmurei contra seus lábios, sentindo meu pau pulsar
com força dentro da calça.
— Então para de falar e faz logo — ela rebateu, os olhos
carregados de desejo e teimosia.
Eu a deitei na cama com cuidado, mas meu corpo logo pesou
sobre o dela, encaixando-me entre suas pernas. Minhas mãos
deslizaram pela lateral do seu corpo, sentindo cada curva, cada
arrepio que eu causava, até alcançar a barra da sua saia e puxei
para baixo, arrancando junto a calcinha sem nenhum esforço.
Ela arfou, suas mãos apertando os lençóis.
Porra, ela era linda.
E ela estava deitada debaixo de mim, molhada, aberta, pronta
para mim.
Desci os lábios pelo seu abdômen, sentindo os músculos dela
se contraírem sob meu toque, a respiração pesada e acelerada.
Meus dedos deslizaram entre suas pernas outra vez, explorando,
provocando.
— Você tá tão molhada — murmurei contra sua pele, minha
boca roçando a parte interna da sua coxa enquanto meu dedo
traçava círculos preguiçosos no centro quente e pulsante dela.
— Logan… — seu gemido veio carregado de necessidade.
— Eu sei, gatinha — sussurrei, antes de deslizar a língua
exatamente onde ela mais queria.
O grito que ela abafou mordendo os próprios lábios fez meu
pau pulsar dolorosamente.
Minhas mãos seguraram firme suas coxas, mantendo-a aberta
para mim, e minha boca trabalhou como se eu quisesse devorá-la
inteira. Porque, inferno, eu queria.
O sabor dela era doce, quente, perfeito.
Meu nome escapou em gemidos trêmulos, suas mãos
puxaram meu cabelo, suas costas arquearam.
Eu podia sentir seu corpo se contorcendo, se entregando
completamente ao prazer.
— Porra, Callahan… — murmurei, levantando a cabeça o
suficiente para ver o estrago que estava fazendo.
Seus olhos estavam pesados, seus lábios vermelhos, os seios
subindo e descendo rapidamente com a respiração descompassada.
Ela ia gozar.
E eu queria ver cada segundo disso.
Eu acelerei o ritmo, sugando seu clitóris com precisão
enquanto dois dedos deslizaram para dentro dela.
— Logan! — ela gritou, agarrando os lençóis, suas pernas
tremendo ao redor do meu rosto.
E então aconteceu.
Ela se desfez para mim, seu corpo inteiro se contraindo, os
gemidos vindo em ondas, o orgasmo a dominando completamente.
Eu mantive meus movimentos até que seus tremores
diminuíssem, até que ela relaxasse contra a cama, exausta e
completamente satisfeita.
Passei a língua pelos lábios, limpando os vestígios do prazer
dela, e subi pelo seu corpo até estar cara a cara com ela novamente.
— Você tem um gosto incrível, Callahan — murmurei, roçando
meu nariz contra o dela.
Ela ainda respirava de forma irregular, os olhos vidrados nos
meus, sua mão deslizando por meu braço até segurar minha nuca.
— Logan…
Seu tom era um pedido, e eu não ia negar nada a ela.
Eu a beijei com posse, permitindo que sentisse o próprio
sabor na minha língua, pressionando minha ereção contra seu
centro ainda pulsante.
Ela gemeu dentro da minha boca.
Seus dedos deslizaram por meu abdômen, explorando cada
linha, cada músculo, descendo até a barra da minha calça.
— Vai me deixar assim? — minha voz saiu rouca, carregada
de frustração e excitação.
Ela mordeu o lábio inferior, os olhos fixos nos meus.
— Você disse que queria me foder.
Eu sorri.
— Gatinha, eu não só quero… eu vou.
Suas mãos puxaram minha calça para baixo, libertando minha
ereção. Um gemido escapou de seus lábios quando ela olhou para
mim, os olhos se arregalando por um segundo antes de voltar para
meu rosto.
— Problema, Callahan? — provoquei, me apoiando nos
cotovelos. — Tenho certeza de que cabe tudo aí em você.
Ela não respondeu, mas sua respiração ficou presa por um
instante antes de deslizar os dedos hesitantes pela extensão do meu
pau, sua palma quente fechando ao redor de mim.
Fechei os olhos por um segundo, o suficiente para aproveitar
cada toque, mas não era isso que eu queria. Não era isso que eu
precisava.
Meus dedos envolveram seu pulso, parando seu movimento.
— Vira — ordenei. — Eu vou te foder de quatro — sussurrei
contra sua pele, beijando seu ombro nu.
Ela obedeceu.
Eu me ajoelhei atrás dela, minhas mãos deslizando
lentamente por suas costas, descendo pela curva da sua cintura até
suas coxas.
Ela estava completamente exposta para mim, sua pele quente
e pronta, seu corpo implorando silenciosamente para ser tomado.
Eu não hesitei.
Inclinei-me, passando a língua lentamente pela sua coluna,
saboreando o gosto da sua pele, sentindo os tremores sutis que
percorriam seu corpo.
Minhas mãos a seguraram firme enquanto eu a puxava
levemente para cima, encaixando sua bunda contra mim.
— Porra, Lyanna — rosnei contra sua pele, meu pau
deslizando contra sua entrada molhada.
Ela gemeu, pressionando-se contra mim, a cabeça tombando
para a frente.
— Logan…
Eu segurei sua cintura com força.
— Fala de novo.
Ela se moveu contra mim, se esfregando lentamente,
provocando.
— Logan…
Eu não podia esperar mais.
Com um gemido baixo e possessivo, me posicionei contra sua
entrada e a puxei para mim em um único movimento firme, sentindo
cada centímetro apertado e quente se acomodando ao meu redor.
— Caralho! — Soltei o ar com força, fechando os olhos por
um segundo.
Ela estava incrivelmente apertada, quente, perfeita.
Lyanna arfou, seus dedos apertando os lençóis.
— Logan…
Eu segurei seu quadril com firmeza e comecei a me mover,
lento no início, sentindo-a se acostumar comigo, seus gemidos
aumentando a cada estocada.
Mas eu não queria pegar leve. Eu queria que ela se lembrasse
disso, do meu pau fodendo ela gostoso. Então aumentei o ritmo,
minhas mãos apertando sua cintura enquanto meu pau se afundava
dentro dela, indo cada vez mais fundo.
Os gemidos dela se tornaram mais altos, mais desesperados,
sua respiração errática conforme eu a puxava contra mim.
— Você é tão gostosa — murmurei, puxando os seus cabelos
trazendo seu corpo para mim. Ela estremeceu.
— Logan… eu vou…
Sorri contra sua pele.
— Então goza pra mim, gatinha.
Eu senti quando seu corpo inteiro se contraiu ao redor de
mim, seu orgasmo vindo em uma onda forte, levando-me com ela.
Com um último movimento, me enterrei fundo dentro dela,
minha respiração entrecortada enquanto o prazer me rasgava por
inteiro.
Ficamos assim por alguns instantes, nossas respirações se
misturando, nossos corpos ainda entrelaçados. E, quando finalmente
me afastei, puxei-a contra mim, sua cabeça pousando no meu peito,
nossos corpos ainda quentes e satisfeitos.
Ela não disse nada, mas quando suas mãos deslizaram
levemente sobre minha pele, como se memorizasse cada parte de
mim, eu soube.
Eu estava fodido.
E ela também.
33
Lyanna Callahan
Acordei envolta pelos braços dele. Quente, firme, possessivo.
Era estranho. Perigoso. Mas, contra toda a lógica, eu me deixei levar,
porque, no meio desse caos, havia algo viciante na forma como ele
me segurava. No jeito como seus dedos deslizavam
preguiçosamente pela minha pele. No olhar intenso que parecia me
prender sem que eu quisesse fugir.
Eu deveria ter medo. Talvez tivesse, mas, naquele momento,
o que eu sentia era algo completamente diferente. E pior ainda, eu
estava gostando.
— Bom dia, Lya.
A voz rouca e preguiçosa me fez virar, encontrando Logan se
espreguiçando, o cabelo bagunçado, um sorriso satisfeito nos lábios.
— O que foi? O gato comeu sua língua? — Ele riu baixo, os
olhos azuis me estudando à medida que deslizava a ponta do dedo
pelo meu nariz.
Senti minha respiração travar por um segundo. O maldito
fazia isso de propósito.
— Bom dia — murmurei, afastando-me e jogando as cobertas
para o lado, determinada a sair dali.
Mas ele não deixou.
— Não! — protestou, com a voz arrastada de quem não
queria se levantar.
Antes que eu pudesse reagir, ele me puxou de volta com
firmeza, suas mãos quentes apertando minha cintura, me mantendo
exatamente onde ele queria.
— Fica — ele murmurou contra minha orelha.
O calor do corpo dele me envolveu por completo, e antes que
eu pudesse protestar, senti a rigidez pressionada contra minha
bunda.
— Logan… — comecei a dizer, mas minha voz falhou quando
ele deslizou uma das mãos lentamente pela minha barriga, puxando-
me ainda mais contra ele.
— Você quer mesmo sair?
Sim, eu queria. Eu precisava. Mas meu corpo dizia outra
coisa.
Ele roçou contra mim, o volume rígido de sua ereção,
esfregando-se entre minhas pernas cobertas apenas pela calcinha
fina.
— Para com isso… — minha voz soou sem convicção, e o
desgraçado sabia.
— Para com isso? — ele repetiu com um sorriso malicioso,
enquanto movia os quadris contra mim em um movimento lento e
delicioso.
Eu mordi o lábio, segurando o lençol entre os dedos, meu
corpo já quente e tenso.
Ele gemeu baixo, um som rouco, e deslizou as mãos por
minha cintura, guiando meus quadris contra ele.
— Assim… — ele sussurrou, me ajudando a rebolar sobre seu
pau, que agora se encaixava perfeitamente entre minhas pernas.
Meu clitóris latejava com cada fricção deliciosa, a frieza do
tecido da minha calcinha contrastando com o calor do pau dele, já
duro e quente, pressionado contra minha pele.
Meus movimentos ficaram mais intensos, minha respiração
falhando conforme eu rebolava sobre ele, aumentando a fricção.
Meu coração martelava no peito, e minha calcinha já estava úmida
contra o tecido da cueca dele.
— Toda molhadinha para mim — ele murmurou contra meu
pescoço, mordiscando a pele sensível enquanto empurrava os
quadris para cima, intensificando a pressão.
Eu apertei os olhos, tentando conter o gemido que ameaçava
escapar.
— Me deixa te sentir de verdade. — Ele deslizou a mão para
baixo, puxando minha calcinha para o lado, e sua ereção quente
roçou diretamente contra a minha pele.
O contato direto me fez arfar, minha pele queimando de
desejo.
— Logan…
— Isso — ele murmurou contra meu ouvido, segurando meus
quadris e me fazendo deslizar ainda mais sobre ele, provocando, nos
torturando.
Meus movimentos estavam mais desesperados agora, minha
respiração descompassada. O atrito era intenso, delicioso,
enlouquecedor.
— Fala pra mim, Lyanna… — ele gemeu quando minha mão
deslizou por seu abdômen definido, descendo até a barra da cueca.
— Diz que você quer que eu me enfie no meio das suas pernas de
novo.
Minhas mãos deslizaram por seu peito definido, sentindo os
músculos rígidos sob minha pele. Deslizei minhas mãos para a barra
da sua cueca, puxando-a lentamente. Ele gemeu baixo quando
minha palma roçou contra sua ereção, que pulou para fora, quente e
pulsante.
— Isso, porra… — Logan exalou, observando-me enquanto eu
deslizava os dedos ao longo de sua extensão,
— Olha só pra você… — Ele deslizou os lábios pelo meu
pescoço, sugando com força o suficiente para marcar. — Dizendo
que queria sair, mas olha como tá se esfregando em mim feito uma
gatinha carente.
Minhas unhas se cravaram nos lençóis quando ele empurrou
os quadris para cima, sua ereção dura deslizando entre meus lábios
molhados, espalhando minha excitação por toda a extensão dele.
— Logan… — gemi alto, sem conseguir conter.
— Isso, geme para mim. Deixa eu ouvir o quanto você quer
isso. — Sua mão desceu até minha bunda, segurando com força ao
passo que me fazia rebolar ainda mais sobre ele.
Ele me segurava firme, me fodendo com o atrito sem nem
precisar estar dentro de mim ainda. O pau dele deslizava contra o
meu clitóris, provocando, torturando, me deixando cada vez mais
desesperada.
— Você tá implorando, Lyanna. Seu corpo tá tremendo,
pedindo por mais — ele sussurrou contra minha orelha, seus dentes
capturando o lóbulo antes de mordiscar.
Eu não conseguia mais pensar. Meus quadris se moviam sem
controle, buscando mais, querendo mais.
— Fala, porra. Me diz o que você quer. — Sua voz estava mais
rouca, enquanto seu pau roçava contra mim mais forte.
— Eu quero… — tentei falar, mas meu gemido ficou preso na
garganta quando ele segurou meu pescoço com uma das mãos,
apertando de leve, me deixando tonta de prazer.
— Mais alto. — Ele aumentou a pressão contra mim, me
esfregando com mais força contra seu pau.
— Quero você, Logan! Por favor! — gritei sem vergonha
alguma, meu corpo inteiro se arqueando contra ele.
Ele riu, satisfeito.
— Assim que eu gosto. Pedindo com jeitinho. — Ele puxou
minha calcinha com brutalidade, rasgando o tecido fino. — Mas
agora eu vou te ensinar a nunca mais tentar fugir de mim.
Antes que eu pudesse responder, senti a cabeça quente do
pau dele pressionando contra minha entrada. Minhas pernas
tremeram. Meu corpo já estava tão desesperado que eu sabia que
não duraria muito.
Ele segurou minha cintura com força, os dedos se cravando
em minha pele enquanto deslizava lentamente para dentro, me
esticando deliciosamente.
— Porra, Lyanna… tão apertada. — Ele soltou um grunhido
baixo, afundando ainda mais.
Um gemido rouco escapou dos meus lábios quando ele
começou a se mover, sem piedade. Cada estocada era forte e
precisa, me fazendo afundar nos lençóis, completamente à mercê
dele.
— Tá sentindo isso? — Ele puxou meu cabelo para trás. —
Esse pau enterrado bem fundo na sua bocetinha molhada?
— Sim! — gritei, minhas mãos agarrando os lençóis enquanto
ele aumentava a velocidade.
Meus gemidos ficaram mais altos, desesperados. Meu corpo
inteiro tremia, o orgasmo se acumulando rápido demais.
— Logan… eu vou… — Minha voz falhou quando ele abaixou
uma das mãos, esfregando meu clitóris com força ao mesmo tempo
que continuava me fodendo sem piedade.
— Goza pra mim, porra. Goza sentindo meu pau te rasgando
toda.
Foi o suficiente para me levar à beira do abismo. O orgasmo
me atingiu como uma onda violenta, fazendo meu corpo inteiro se
contrair ao redor dele. Gritei seu nome enquanto meu prazer me
dominava por completo.
Ele segurou minha cintura com mais força, estocando mais
algumas vezes antes de enterrar-se fundo e gemer alto, seu corpo
estremecendo à proporção que se derramava dentro de mim.
O silêncio veio depois, apenas nossas respirações pesadas
preenchendo o quarto. Ele me beijou de uma forma doce antes de
relaxar sobre os travesseiros.
34
Logan Donovan
Eu moraria nessa cama, dentro dela, e viveria ouvindo seus
gemidos. Era viciante pra caralho. Mas, naquele momento, outra
necessidade começou a falar mais alto.
Minha barriga roncou.
— Vamos descer e comer alguma coisa? — perguntei, os
olhos ainda preguiçosos enquanto observava Lyanna se espreguiçar
ao meu lado.
Ela revirou os olhos, puxando o lençol até o peito.
— Seus amigos ainda devem estar comendo.
— E daí? Não vamos assaltar a geladeira.
Ela suspirou, mas não discutiu. Apenas se levantou e foi até o
banheiro. Me joguei de costas na cama, um sorriso satisfeito
brincando nos meus lábios.
Sim, eu estava bem satisfeito.
Quando entramos na cozinha, todos os olhares se voltaram
para nós.
Tyler se engasgou com o café. Owen abriu um sorriso
malicioso. Blake apenas balançou a cabeça, rindo de lado.
— E aí, campeão? — Dax provocou, com um sorriso
carregado de malícia. — Dormiu bem?
Senti Lyanna se encolher ao meu lado, enfiando o rosto na
xícara de café que eu tinha acabado de colocar na frente dela.
Sorri de canto e passei um braço ao redor da sua cintura.
— Dormi como um bebê — respondi, pegando um prato e
começando a me servir.
— Bebês não gemem daquele jeito, Donovan — Tyler
zombou, e os outros caíram na risada.
Lyanna tossiu, engasgando-se com o café.
— Vocês são insuportáveis — ela murmurou, escondendo o
rosto nas mãos.
Pisquei para ela, adorando vê-la corar.
— Relaxa, Callahan, eles só estão com inveja.
— Inveja? Nossa, como estou morrendo de inveja. — Dax riu,
pegando um pedaço de torrada.
— Não você, seu idiota — retruquei, revirando os olhos. — Dá
pra ouvir suas loucuras do meu quarto. Sério, não sei como sua
esposa te aguenta.
— Esposa? — Lyanna estreitou os olhos, me encarando com
curiosidade.
— Sim, ele e a Séfora se casaram sem festa, agora ela mora
aqui — expliquei, pegando meu copo de café. — Você
provavelmente vai cruzar com ela assim que ela sair do
confinamento do quarto, onde eles passam boa parte do tempo.
Lyanna arqueou uma sobrancelha, soltando um riso baixo.
— Entendi… é bom saber que não sou a única mulher aqui.
— Se todos começarem a trazer as suas mulheres, vamos ter
que ampliar essa casa — Blake comentou, se apoiando na cadeira.
Os caras riram, se divertindo à minha custa, mas minha
atenção já estava em Lyanna. Inclinei-me para perto dela, minha
mão deslizando pela sua coxa por debaixo da mesa.
— Vai querer panquecas? — perguntei, pegando uma para
colocar no prato dela.
Ela me lançou um olhar desconfiado, como se eu estivesse
armando algo.
— Você vai me servir?
Dei de ombros.
— Aproveita, você tem um namorado agora.
Owen assobiou.
— Eu diria que isso é fofo, mas vindo de você, Donovan, me
parece pura tática pra conseguir outra rodada.
Todos riram.
Mas Lyanna me olhava de um jeito diferente. Como se
tentasse entender se eu estava jogando ou se havia alguma verdade
ali.
A verdade? Nem eu sabia.
Lyanna Callahan
Na manhã seguinte…
Eu não sei como será daqui para a frente.
Se vou seguir assim, ignorando a linha tênue entre o real e a
mentira, fingindo que não sinto nada quando, na verdade, tudo ao
redor parece estar prestes a explodir.
Se vou continuar me deixando levar até que o momento de
dizer adeus finalmente chegue, ou se vou resistir da próxima vez.
Mas como resistir?
Como resistir quando acordo com esses malditos olhos azuis
me olhando com cuidado, como se eu fosse algo precioso, algo que
ele quer guardar, mas não sabe como?
Como ignorar o jeito que ele me observa, debruçado contra o
travesseiro, os cabelos bagunçados, o maxilar marcado pelo
resquício de uma barba por fazer?
Como fingir que nada está acontecendo quando meu corpo
ainda sente o peso do toque dele da noite passada?
Isso vai contra tudo que eu criei na minha mente.
Porque Logan Donovan nunca foi seguro.
Nunca foi calmo.
Nunca foi gentil.
Mas ali, deitado ao meu lado, observando-me com olhos
pesados de sono e um sorriso preguiçoso, ele parecia tudo isso ao
mesmo tempo.
— Você está me encarando, Callahan — murmurou, com a
voz rouca de quem ainda não falou com ninguém desde que
acordou.
Engoli em seco, desviando o olhar.
— Não estou.
— Está sim.
O riso baixo dele me fez cerrar os olhos. Ele rolou para mais
perto, me puxando pela cintura de um jeito possessivo, como se
meu corpo já pertencesse ao dele.
E talvez pertencesse, ou talvez eu estivesse deixando-o me
convencer disso.
— O que foi? — ele sussurrou, a respiração quente contra
minha pele.
— O quê?
— Está fugindo da minha pergunta.
Mordi o lábio, tentando afastar o arrepio na espinha que a voz
dele me causava.
— Só estava pensando…
— Em?
Respirei fundo, sabendo que não poderia falar a verdade. Que
não poderia dizer que a ideia de um dia ele não estar mais ao meu
lado me assustava.
Então, apenas fechei os olhos e murmurei:
— Nada que importe.
Ele ficou em silêncio por um momento antes de deslizar a
ponta do nariz pela minha clavícula, seu sorriso contra minha pele.
— Então para de pensar.
E, porra… Era exatamente isso que eu queria fazer.
— Preciso me levantar — murmurei, espreguiçando-me antes
de afastar o lençol. — Vou para a universidade, depois visitar minha
mãe e depois para o estágio.
Caminhei até o banheiro, mas parei no meio do caminho,
virando para ele.
— Aliás, você também precisa ir. Quando vai ser liberado?
Logan continuava largado na cama, um braço apoiado atrás
da cabeça, me observando com aqueles olhos azuis preguiçosos e
perigosos.
— Eu já fui — respondeu casualmente.
Franzi a testa.
— E por que continua indo?
Ele deu de ombros.
— Sei lá… acho que me acostumei a conversar com os atletas
mais velhos.
Mordi a parte interna da bochecha, estudando o rosto dele.
"Ah, não, Logan. Não se torne um mocinho. Não me obrigue
a gostar de você."
Ele arqueou a sobrancelha, como se pudesse ouvir meus
pensamentos.
— Para de me olhar assim. — Seu tom era despreocupado,
mas o sorriso torto denunciava que ele estava se divertindo. — Eu
não tenho nada melhor para fazer. No dia que tiver, simplesmente
não vou mais.
Cruzei os braços, tentando ignorar o aperto idiota no meu
peito.
— Entendi… então, vou me arrumar para não me atrasar para
minha primeira aula.
Virei para o banheiro, mas antes de fechar a porta, ouvi a voz
dele novamente.
— Você fica linda de manhã, Callahan.
Revirei os olhos, mas meu coração deu um salto traiçoeiro.
Filho da mãe.
35
Logan Donovan
Ajustei os óculos no rosto assim que estacionei na
universidade. Tudo parecia exatamente como sempre, mesmos
corredores, mesmos grupos espalhados, a mesma rotina.
Exceto pelo grupo de patinação artística, que parecia agitado
ao longe. Notei o alvoroço, mas ignorei. Não era da minha conta.
Os jogadores de basquete me cumprimentaram no caminho,
e algumas das líderes de torcida acenaram para Lyanna, que
respondeu com um sorriso educado.
Observei a cena por um momento. O dia em que eu voltaria a
andar por esses corredores sozinho estava cada vez mais próximo.
As festas, a rotina de sempre, minha liberdade.
Tudo isso também vai acabar. Vamos nos formar. Eu vou para
a NHL. Seguir minha carreira, como sempre foi planejado.
Mas por algum motivo, enquanto observava Lyanna se afastar
um pouco, cumprimentando alguns colegas de classe, o peso desse
pensamento não parecia tão leve quanto antes.
Lyanna se virou de repente em direção ao grupo de patinação
artística, como se tivesse ouvido a voz de um fantasma. Seus olhos
se arregalaram, e senti sua mão suar contra a minha.
— Algum problema? — perguntei, tentando entender sua
reação.
Ela não respondeu. Apenas ficou ali, imóvel, respirando de
forma irregular.
— Lya?
Segui seu olhar e encontrei a razão para o seu choque.
Ele não era como os jogadores de hóquei, não tinha ombros
largos ou a postura imponente que nós carregávamos. Mas o corpo
era esguio, firme, exatamente como o de um patinador que passou
a vida aperfeiçoando seus movimentos. Cabelos bem arrumados,
olhar atento, expressão confiante.
O cara se aproximou com um sorriso, e Lyanna murmurou
com a voz trêmula:
— Noah?
O nome dele fez algo em mim trincar por dentro. Ela soltou
minha mão no mesmo instante, e eu senti o lugar onde sua palma
estava contra a minha esfriar.
Antes que eu pudesse reagir, Noah a puxou para um abraço
forte, tão forte que os pés dela saíram do chão.
Eu deveria socá-lo por abraçar minha namorada assim.
Mas, em vez disso, dei um passo à frente, me colocando
entre eles quando ele a colocou no chão. Noah notou, sua expressão
mudou ligeiramente enquanto me analisava de cima a baixo.
— Esse é Logan, capitão do time de hóquei — Lyanna falou
rápido, como se quisesse evitar o assunto.
— Sei quem é Logan Donovan — ele respondeu, ainda me
encarando. — Vi muitas partidas dele antes de ir embora.
Eu sorri de canto, arrogante.
— E também sou o namorado dela — completei.
Vi as sobrancelhas de Noah arquearem, como se estivesse
surpreso. Reação normal de todos que me viam com Lyanna. Eu sou
Logan Donovan.
— Lya, achei que um jogador de hóquei não seria mais uma
opção.
Meu semblante mudou.
Quem esse filho da puta pensa que é?
— Bom, esse é Noah, meu antigo parceiro de dança — ela
disse, ignorando a provocação.
— Sinto falta do tempo que passamos juntos — ele
acrescentou, e a forma como olhou para Lyanna fez algo em mim
estalar.
Sério que esse idiota tá flertando com a minha namorada
bem na minha frente?
Fechei a mandíbula.
— Lyanna, achei que não queria se atrasar para a primeira
aula — soltei, a voz carregada de ironia. — Foi por isso que corri na
estrada, lembra?
Ela piscou, lembrando-se da pressa que teve antes de sairmos
de casa.
— Sim, eu vou indo. Até logo, Noah.
Antes que ela pudesse se afastar, puxei-a pela cintura e
encostei meus lábios nos dela. O beijo foi breve, mas firme, o
suficiente para deixar um recado claro.
Quando voltei minha atenção para Noah, ele ainda nos
encarava.
— Vai continuar olhando para a minha namorada? —
perguntei, sem paciência.
Ele riu de leve, cruzando os braços.
— Isso é o quê? Um acordo? Um namoro falso?
Meus olhos se estreitaram no mesmo instante.
— Depois do que aconteceu com Troy, Lyanna não iria se
envolver com outro jogador de hóquei.
Engoli em seco.
— Eu não sou o Troy.
— Mas também não é muito diferente — Noah rebateu, com a
expressão séria. — Possessivo, tóxico, controlador. O mesmo tipo
que fodeu a carreira de Lyanna.
Minha mão fechou em punho dentro do bolso.
— Eu apoio Lyanna no que ela quiser fazer.
— Você vai para a NHL. Vai viver a sua vida. Mas e Lyanna?
Ela tem um futuro que ainda não consegue enxergar, não depois de
tudo que aconteceu. Eu não tenho dúvidas de que foi Troy quem
sabotou os patins dela, porque ela ia embora comigo.
A raiva subiu como uma labareda dentro de mim. O cara na
minha frente não tinha voltado por acaso. Ele tinha voltado por ela.
Por Lyanna.
Meu maxilar travou.
Se eu já não fosse um cara ciumento, essa situação me faria
ser.
Noah não olhava para Lyanna como um velho amigo. Ele
olhava como um cara que voltou com um objetivo. E, pior ainda, ele
se sentia no direito de opinar sobre a vida dela.
Eu dei um passo mais perto, diminuindo o espaço entre nós.
— Você acha que pode se meter no que eu tenho com ela? —
perguntei.
— Eu só estou constatando um fato. — Noah deu de ombros.
— Lyanna perdeu tudo por causa de um relacionamento que a
sufocava. Só não quero que ela passe por isso de novo.
Minhas mãos coçaram para socar esse filho da puta bem ali,
mas, por algum motivo, eu queria ouvir o que Lyanna diria primeiro.
Lyanna Callahan
Emma estava sentada com a bolsa jogada na cadeira ao lado,
os fones de ouvido enfiados nas orelhas, completamente alheia ao
mundo.
Sem cerimônia, tirei a bolsa do lugar e me joguei ali.
— Ei! — Ela arregalou os olhos, puxando os fones de ouvido e
franzindo a testa. — Caramba, você quase me matou do coração.
Você tá viva, não tá?
Ela me encarou com um olhar acusador antes de soltar um
suspiro exagerado e cruzar os braços.
— Tá bem, sumida?
— Estou. — Apoiei os cotovelos na mesa, soltando o ar
lentamente.
— Garota, você tem o dom de sumir nos finais de semana.
Suspirei, me ajeitando na cadeira.
— Estive no hospital, depois… você sabe. Estou na casa do
Logan e ainda não me acostumei com isso. Preciso voltar para casa,
reabrir o café, eu não posso viver à custa dele.
Emma arqueou uma sobrancelha e me olhou como se eu
tivesse acabado de dizer a maior besteira do mundo.
— Claro que não pode, você tem sua vida. Mas... — Ela fez
um gesto com a mão, me analisando com um olhar suspeito. — Vou
fingir que não ouvi essa parte do "ainda não me acostumei".
— Não começa, Emma.
— Eu nem disse nada... ainda. Como está sua mãe? —
perguntou, mudando de assunto.
Meu peito apertou.
— Ela ainda não acordou. Vou passar lá hoje depois da aula.
Emma inclinou a cabeça, me estudando com atenção.
— É por isso que tá com essa cara?
— Que cara?
— De quem comeu e não gostou.
Revirei os olhos, mas antes que pudesse responder, ela
continuou, estreitando os olhos.
— Aliás, falando em comida, como foi o fim de semana com o
gato?
Senti o sangue subir direto para o meu rosto.
— Emma! O que isso tem a ver com comida?!
Ela soltou uma gargalhada e deu de ombros.
— Ah, Lya, não seja ingênua.
Mordi o lábio e suspirei, desviando o olhar.
— É estranho como eu gosto de estar com ele — admiti, de
repente.
Emma se inclinou mais, interessada.
— Continua...
É
— É diferente de tudo que já vivi. Ele… — Fiz uma pausa,
tentando organizar os pensamentos, mas o sorriso de Emma só se
alargou.
Eu já sabia. Estava com aquele maldito ar apaixonado.
— Ele é atencioso — admiti, mais baixo, como se isso
pudesse fazer menos efeito.
Emma soltou um assobio e balançou a cabeça.
— Garota, você está muito fodida.
— Você é insuportável — murmurei, pegando um lápis
qualquer da mesa e brincando com ele para tentar ignorar a forma
como minha mente repetia a última frase dela.
Emma riu, mas antes que pudesse continuar seu
interrogatório, meu celular vibrou sobre a mesa.
Meu estômago revirou, quando algumas garotas entraram
fofocando sobre a novidade, e falando do nome que eu não ouvia há
muito tempo. Noah.
Emma percebeu minha mudança de expressão e franziu a
testa.
— O que foi, elas estão falando do…?
Engoli em seco.
— Noah está de volta.
Os olhos dela se arregalaram.
— Ele já voltou?!
Assenti lentamente, lembrando-me do nosso encontro no
pátio.
— Sim. Voltei a vê-lo hoje. Ele estava com as meninas da
patinação.
Emma inclinou a cabeça, os olhos agora cheios de
curiosidade.
— E você? Como se sentiu?
Mordi o lábio, desviando o olhar.
— Não faço mais parte desse mundo. Não somos mais tão
próximos.
Emma soltou uma risada descrente.
— Lyanna, para.
— O quê?
Ela cruzou os braços, me olhando como se quisesse me fazer
enxergar o óbvio.
— Noah sempre foi apaixonado por você. Sempre. Você acha
mesmo que ele voltou por causa das atletas de patinação? Ele foi o
melhor entre todos, e você era a parceira dele.
— Eu e Noah sempre fomos amigos, Emma. Sempre. —
Cruzei os braços, tentando parecer firme. — Eu nunca o vi de outra
forma, e ele nunca me deu motivos para pensar diferente.
Emma arqueou uma sobrancelha, cética.
— Ah, claro. Porque homens são sempre tão óbvios e diretos
quando gostam de alguém.
Revirei os olhos.
— Às vezes, você tem a mente poluída demais, dona Emma.
Ela soltou uma risada curta e cruzou os braços.
— E às vezes, você é cega demais, dona Callahan.
36
Logan Donovan
Eu estava me sentindo um cão acuado. Pela primeira vez na
minha vida, eu não sabia como agir.
Seria muito mais fácil esmurrar a cara daquele idiota e gritar
na frente de todo mundo que ela era minha. Mas isso só faria com
que ele ganhasse… e eu a perdesse.
Porra, que merda.
Passei as mãos pelo rosto, tentando aliviar a tensão nos
ombros, quando ouvi Owen se aproximar.
— Só mostra a ela o quanto você gosta dela.
Meu pescoço estalou quando virei a cabeça em direção a ele.
— Do que você tá falando?
Owen se encostou no armário, com um olhar cheio de
malícia.
— Do amigo da Lyanna. Você tá morrendo de ciúmes.
Soltei uma risada seca, sem humor.
— Quem te falou essa merda?
— Ninguém. Eu andei fuçando umas coisas na rede, as
pessoas andam comentando.
Minhas sobrancelhas franziram na mesma hora.
— Que tipo de comentário?
— O tipo que diz que a Callahan tá sendo disputada. Até
ontem, ninguém falava dela. Agora, ela virou o centro das atenções.
Meus dentes rangeram.
— E por quê?
— Porque o Noah é popular. Ele sempre foi. Patinador
prodígio, voltou cheio de história pra contar… e pra recuperar o que
perdeu.
Meu maxilar trincou.
— Ele não perdeu nada.
— Isso é você quem tá dizendo. Porque ele tá agindo como
se tivesse.
Fechei os olhos por um segundo, tentando controlar o fogo
que crescia dentro de mim.
— Owen… Ele me disse uma coisa hoje que me deixou puto.
— O quê?
— Que Troy sabotou os patins da Lyanna.
Owen soltou um assobio baixo, erguendo uma sobrancelha.
— Hum. Interessante.
— Interessante o caralho! — bufei. — Isso significa que
aquele desgraçado acabou com a carreira dela de propósito.
Owen coçou o queixo, pensativo.
— E você quer fazer o quê com essa informação?
— Eu preciso que você me ajude a conseguir imagens do dia
do acidente. Quero entender como eles terminaram. Quero provas.
— Hum. Precisa, é? — Um sorriso divertido surgiu nos lábios
dele.
Fiquei irritado na mesma hora.
— O que foi?
Ele riu, balançando a cabeça.
— Você tá gostando dela, Logan. E o tempo tá acabando.
Minha boca se abriu, mas fechei os punhos ao lado do corpo.
— Só acaba quando eu decido que acabou.
Owen riu de novo, mas dessa vez não disse nada. Apenas
pegou o celular do bolso e começou a digitar.
— Beleza, vou ver o que consigo. Vou reunir imagens do dia,
e o que der pra te ajudar.
— Ótimo. Porque eu vou fazer aquele otário deixar ela em paz
de uma vez por todas.
— Olha, ela tá vindo. — Owen bateu no meu ombro com um
meio sorriso. — Vou deixar vocês dois sozinhos.
Acenei com a cabeça, mas meus olhos já estavam fixos nela.
Lyanna caminhava na minha direção, o cabelo solto
balançando levemente com o vento. Quando parou na minha frente,
sua voz saiu baixa, hesitante.
— Logan…
Eu coloquei as mãos no bolso, inclinando a cabeça para o
lado.
— Eu estava te esperando — falei, observando cada detalhe
da expressão dela. — Vou te levar ao hospital.
Lyanna soltou o ar lentamente, desviando o olhar.
— Não precisa.
Dei um passo à frente, diminuindo a distância entre nós.
— Eu sei, Callahan. Mas eu quero.
Ela hesitou por um segundo, depois apenas assentiu, sem
discutir.
E então, sem perceber, ela deixou escapar um pequeno
sorriso.
E caralho… ela era muito linda.
Andei ao lado dela em silêncio, mas minha mente ainda
estava um caos. Eu já estava acostumado com a bagunça que era a
vida dela, já sabia que Lyanna tinha um passado complicado, mas
esse filho da puta? Isso era demais para mim.
— O que foi? — A voz dela quebrou meus pensamentos.
Lyanna me olhava de lado, como se estudasse cada detalhe da
minha expressão. — Você está irritado?
Soltei um riso curto, descrente.
— Claro que não — respondi com sarcasmo. — Meu dia
começou ótimo.
Ela arqueou a sobrancelha.
— Acordei com você na minha cama, te fodi tão gostoso que
você ainda tá com as pernas bambas… — Continuei, vendo o rubor
subir pelas bochechas dela. — E agora seu ex-parceiro resolve dar o
ar da graça, achando que pode te convencer a parar de sair comigo.
Ela abriu a boca, provavelmente para me xingar, mas levantei
a mão antes que pudesse dizer qualquer coisa.
— Ah, e o melhor? — Inclinei a cabeça levemente, falando
com ironia. — Ele acha que eu sou igual ao filho da puta do Troy.
Lyanna fechou os olhos por um momento, soltando um
suspiro longo.
— Isso é comum, Logan, você é um jogador de hóquei
metido a bad boy, ele não sabe nada sobre você.
— E ele sabe tudo sobre você?
A pergunta a pegou desprevenida e ela mordeu o lábio,
desviando o olhar.
— Ele era meu melhor amigo — disse, por fim, com a voz um
pouco mais baixa.
Soltei uma risada seca.
— E agora ele voltou. E aí? A amizade de vocês? É só isso
mesmo?
O silêncio dela disse tudo e nada ao mesmo tempo. Me
afastei um passo, ergui as mãos e soltei o ar com força.
— Não se preocupa, Callahan — disse, abrindo a porta do
carro. — Vamos continuar jogando o acordo.
Senti meu sangue ferver enquanto ela entrava no carro sem
dizer nada. Se esse cara queria competir, ele estava fodido, porque
eu nunca perdi um jogo na minha vida.
E não seria agora que isso aconteceria.
37
Logan Donovan
Dias depois…
Acordei sentindo o lado da cama frio.
Franzi a testa, arrastando a mão pelo colchão vazio.
— Lya? — chamei, com a voz ainda rouca pelo sono.
Nenhuma resposta.
Sentei-me devagar, piscando algumas vezes para espantar a
sonolência enquanto meus olhos percorriam o quarto. Nenhum sinal
dela. Soltei um suspiro pesado, passando a mão pelo rosto antes de
me levantar. Meu ombro ainda protestou quando fui direto para o
chuveiro, mas ignorei.
O banho foi rápido. Apenas o suficiente para afastar os
resquícios da noite passada e da sensação irritante de acordar
sozinho. Eu estava me acostumando com ela.
Quando desci para a cozinha, encontrei Tyler e Blake jogados
na cadeira, assistindo alguma merda na TV. Dax estava encostado
no balcão com uma xícara de café, e Séfora estava ao lado dele,
preparando alguma coisa no fogão.
— Olha só quem apareceu — Tyler debochou. — O homem do
momento finalmente resolveu descer.
Revirei os olhos e fui até a geladeira pegar uma garrafa de
água.
— Cadê a Lyanna?
Dax tomou um gole do café antes de responder.
— Saiu cedo. Nem tomou café com a gente.
— Ah, é? E para onde?
— Sei lá, cara. Ela não te avisou?
Eu sabia que ele estava só me provocando, porque o sorriso
sacana estava lá.
— Se tivesse avisado, eu não estaria perguntando, né, gênio?
Dax riu, erguendo as mãos como se dissesse relaxa.
— Pode ser coisa da faculdade — Séfora interveio, lançando
um olhar breve para Dax antes de voltar a atenção para mim. — Ela
comentou que precisava resolver algumas pendências. Nosso curso
exige muito estudo.
Fiz uma careta.
Séfora e Lyanna cursavam fisioterapia ainda que estivessem
em turmas diferentes.
— E você viu para onde ela foi? — perguntei, tentando
parecer despreocupado.
— Não. Mas sei que ela estava focada em resolver algumas
coisas da aula.
Peguei o celular e disquei o número dela.
Chamou.
Chamou de novo.
Nada.
Tentei de novo.
E nada.
— Tá tudo bem, papai urso? — Blake brincou, me lançando
um olhar divertido.
— Vai se foder — resmunguei, travando o celular na tela
inicial.
— Relaxa, Logan — Séfora disse, pegando um prato para se
servir. — Se fosse algo importante, ela teria te avisado.
Lyanna Callahan
Caminhava apressada em direção à biblioteca, iria me
esconder lá até o início da primeira aula. Meu plano era simples:
mergulhar nos estudos e recuperar o tempo perdido. Com tudo que
vinha acontecendo nos últimos dias, acabei negligenciando algumas
matérias, e isso era um luxo que eu não podia me dar.
Manter minha bolsa de estudos exigia boas notas, e se já era
difícil pagar as taxas com ela, sem a bolsa seria impossível. A última
coisa que eu precisava agora era mais uma preocupação, então, pelo
menos por algumas horas, eu precisava deixar Logan, sua casa, seus
toques e sua maldita presença avassaladora de lado.
O corredor estava cheio, mas ainda assim, o silêncio da
manhã me envolvia como um cobertor de conforto. Eu só queria
chegar logo à biblioteca, encontrar um canto isolado e me perder
nos livros. Era a única coisa que eu conseguia controlar na minha
vida agora.
Ou pelo menos era isso que eu pensava… até ouvir aquela
voz familiar.
— Então você continua andando sem olhar para os lados,
hein, estrelinha?
Meu corpo travou no mesmo instante, só uma pessoa me
chamava assim.
Fechei os olhos por um breve segundo antes de virar e
encontrar Noah ali, parado a poucos metros de distância. Ele tinha
as mãos nos bolsos da calça jeans, os cabelos loiros caindo
levemente sobre a testa, e um meio sorriso nos lábios, um que me
levou direto para o passado.
— Eu… — engoli em seco, sem saber exatamente o que dizer.
Ele se aproximou devagar, sem pressa, como se estivesse me
dando tempo para processar sua presença. Mas a verdade era que
eu nunca tinha aprendido a lidar com despedidas e retornos
repentinos. E Noah… Noah foi um amigo importante na minha vida,
até que um dia, ele simplesmente se foi e eu fiquei com meus
sonhos destruídos
— Você ainda está me evitando ou foi só seu novo namorado
que te proibiu de falar comigo? — ele perguntou, inclinando a
cabeça de leve, como se tentasse ler meus pensamentos.
— Eu não estou te evitando. — Menti descaradamente. — E
Logan não tem nada a ver com isso — falei rapidamente, talvez
rápido demais.
— Ah, claro. Então é só você me evitando mesmo, porque
desde que voltei, você mal olhou na minha cara.
— Não é isso, Noah. Eu só… muita coisa mudou, entende?
— Eu entendo que você mudou. Mas eu ainda sou o mesmo.
— Eu não sei lidar com isso — confessei, finalmente
encarando seus olhos castanhos.
— Bom, eu sei. — Ele sorriu de leve. — Eu só quero retomar
de onde paramos, só isso.
Ele falava com tanta naturalidade que aquilo me desarmou
um pouco. Era exatamente como Noah sempre foi: paciente, leal,
sempre disposto a me acompanhar em qualquer loucura sem
questionar.
— Você está indo para a biblioteca? — ele perguntou,
mudando de assunto.
Assenti.
— Sim. Preciso colocar algumas matérias em dia.
— Ótimo. Eu também estava indo para lá. Que tal uma
ajudinha?
— Ah, Noah, não precisa…
— Ei. — Ele ergueu uma sobrancelha. — Você lembra que eu
sou um gênio quando se trata de estudar, certo?
Não pude evitar um pequeno sorriso. Era verdade. Noah
sempre foi brilhante, do tipo que conseguia ler um livro uma vez e
absorver tudo.
— Ok, mas só se você não me julgar por ter negligenciado
metade do conteúdo do semestre.
Ele riu.
— Estrelinha, eu nunca te julguei. Não vou começar agora.
Seguimos para a biblioteca, que estava quase vazia, e fui
direto até a sessão de fisioterapia, subindo na ponta dos pés para
alcançar um dos livros mais altos da prateleira.
Puxei o livro, mas ele estava mais preso do que eu esperava.
No mesmo instante em que ele saiu, me desequilibrei para trás,
soltando um pequeno grito surpreso.
Antes que pudesse cair, um par de mãos firmes segurou
minha cintura, me estabilizando.
— Ainda te salvando das suas próprias armadilhas. Nada
mudou, hein? — Noah brincou, me colocando de volta no lugar
certo.
Meu coração se acelerou pelo susto, não pelo toque, nunca o
vi como algo a mais que um amigo.
— Eu estava bem — murmurei, ajeitando o livro nos braços.
— Claro que estava. — Ele soltou uma risada leve. — Eu vou
fingir que a cena inteira não aconteceu, então.
— Eu realmente preciso estudar, então se você quiser pegar
um livro e me acompanhar, fique à vontade.
Ele sorriu, pegando um exemplar ao lado do meu.
— Com certeza. Como antes, lembra?
Balancei a cabeça, forçando um sorriso. Sim, eu lembrava.
Lembrava-me das tardes no rinque, dos treinos intermináveis,
da cumplicidade silenciosa entre nós. Mas isso parecia uma outra
vida, distante demais para tocar.
Agora, tudo era diferente.
Eu não estava mais no gelo com ele. Meu mundo não girava
mais em torno da patinação. Agora, eu estudava fisioterapia
esportiva, tinha um namorado temporário e, ainda que fosse um
acordo, Logan Donovan ocupava espaço demais na minha cabeça.
Ele apoiou o cotovelo na mesa, inclinando-se levemente para
a frente.
— Você me deve algo, Callahan.
— Do que você está falando?
— Você sabe. — O sorriso dele se alargou, e eu soube que
estava encrencada. — Uma dança.
Meu estômago revirou.
— Noah, não…
— Você prometeu. — Ele sorriu. — Uma última dança antes
de eu ir embora, mas você ainda estava machucada. E agora que
estou de volta, acho que é hora de cumprir.
Meus dedos apertaram a borda do livro.
— Isso foi há anos.
— E daí? Promessa é promessa.
Mordi o lábio, desviando o olhar. Eu não sabia como dizer a
ele que não era só uma questão de subir no gelo e me mover. Subir
no gelo com ele significava me lembrar do que eu perdi.
Mas Noah não cedeu.
— Vamos fazer assim, Lya… Se você recusar, eu vou infernizar
a sua vida até você aceitar.
Bufei, me jogando contra o encosto da cadeira.
— Isso é chantagem emocional.
Ele sorriu.
— E você sabe que eu sou bom nisso.
— Não sei, vamos ver.
— Hoje à noite, no rinque aqui do campos, e não aceito um
não como resposta.
38
Lyanna Callahan
Passei a aula inteira com a mente longe, presa nas palavras
de Noah. Uma última dança.
Ele realmente achava que tudo poderia ser como antes? Que
eu poderia simplesmente pisar no gelo ao lado dele sem sentir o
peso de tudo o que aconteceu? Sem me lembrar de como meus
sonhos foram destruídos?
Balancei a cabeça, tentando afastar a sensação incômoda que
aquela conversa havia deixado em mim.
Eu não quero mais isso. Eu escolhi um novo caminho. Escolhi
me concentrar nos estudos, construir minha carreira, ser uma
fisioterapeuta esportiva de excelência. Esse era o meu foco. Meu
objetivo.
Patinar novamente? Isso não estava nos planos.
Mas, no instante em que chequei meu celular, vi que Logan
tinha feito exatamente o que mais me irritava nessa droga de
acordo.
LOGAN DONOVAN: Callahan, espero que esteja
estudando bastante. Afinal, alguém precisa ter cérebro
nessa relação.
Revirei os olhos.
LOGAN DONOVAN: Avisa para o seu amiguinho do gelo
que você tem namorado antes que eu tenha que fazer isso
pessoalmente.
Respirei fundo, sentindo o sangue ferver. Idiota.
Não respondi. Apenas bloqueei o celular, terminei o que
precisava fazer e segui direto para o prédio de esportes.
Os treinos do time de hóquei já tinham acabado quando
entrei no vestiário. A maioria dos jogadores já estava trocando de
roupa ou discutindo estratégias. Logan estava encostado contra o
armário, segurando um energético e rindo de algo que Tyler dizia,
até seus olhos me encontrarem.
E então, aquele sorrisinho de canto irritante apareceu.
— Sai todo mundo, minha namorada quer ter uma DR — ele
anunciou, com um tom autoritário
Os jogadores riram, pegando suas coisas e saindo.
— Filho da puta! — rosnei, marchando até ele.
Ele apenas arqueou uma sobrancelha.
— Isso é jeito de falar com o homem que vem pagando as
suas contas?
— Vai se foder, Logan!
Ele riu, claramente se divertindo com o meu surto.
Fechei as mãos em punho.
— Você tem algum problema sério!
Ele bebeu um gole do energético e deu de ombros.
— Tenho. E o nome do problema é você. Se queria me ver
pelado, era só pedir, não precisava entrar assim no vestiário.
Cerrei os dentes.
— Você deve estar muito envolvido nesse acordo para bancar
o ciumento ridículo!
Ele abaixou a garrafa, os olhos azuis me perfurando.
— E você tá brincando de nostalgia com um cara que
claramente voltou pra te ter de volta.
— Noah é só meu amigo.
— É? Então por que você tá toda nervosinha?
Bufei.
— Porque você é um imbecil, Logan!
Ele inclinou a cabeça.
— E ainda assim você tá aqui, invadindo o vestiário, me
dando toda a sua atenção.
Respirei fundo, tentando conter a vontade de dar na cara
dele.
— Você precisa parar com esse ciúme idiota.
Ele deu um passo à frente, diminuindo o espaço entre nós.
— E você precisa aceitar que, enquanto esse namoro for real
para todo mundo, você é minha.
Logan Donovan
— Eu não sou sua Logan! — ela gritou.
Agarrei o braço dela e a puxei trancando a cabine atrás de
nós e liguei o chuveiro no máximo.
A água explodiu sobre ela.
Lyanna soltou um grito, os cabelos ficando encharcados no
mesmo instante.
— Que porra, Logan?!
A voz dela veio carregada de irritação, mas não me importei.
— Você está bem esquentadinha, Callahan.
Aproximei-me devagar, meu peito colando no dela, e prendi
seu corpo entre mim e a parede fria.
— Você enlouqueceu?! — Ela ofegou, tentando me empurrar.
Então eu a beijei.
Forte. Bruto. Com posse.
Ela arfou contra minha boca, mas abriu os lábios para mim no
instante seguinte. Minha língua invadiu a dela sem aviso, faminta,
exigente, dominadora.
O gosto dela era viciante e minhas mãos percorriam sua pele
molhada sem pressa, mas com posse. Deslizei os dedos pela curva
da sua cintura, apertando firme antes de subir, sentindo a pele
úmida, quente e arrepiada sob minhas palmas.
Agarrei sua coxa, puxando-a contra mim, encaixando nossos
corpos sem nenhum espaço entre nós. Ela gemeu contra minha boca
quando pressionei meu quadril contra o dela, deixando-a sentir
exatamente o que ela estava fazendo comigo.
Minha mão subiu, cobrindo um dos seios dela, o polegar
brincando contra o mamilo rígido sentindo como seu corpo reagia ao
menor toque. Ela se arqueou contra mim, se entregando sem
resistência, as unhas cravando em meus ombros, arranhando minha
pele molhada enquanto me puxava mais para perto.
— Para de se encontrar com outro, Lyanna — murmurei
contra seus lábios, mordendo seu queixo. Minha respiração estava
pesada, minha cabeça girando com o cheiro dela misturado ao
vapor.
Ela me encarou, os olhos brilhando de raiva e desejo.
— Você é um idiota.
— E você é minha.
Ela soltou um riso curto, debochado.
— Eu já disse que não sou sua.
Peguei sua perna e a enrosquei ao redor do meu quadril,
pressionando meu corpo contra o dela.
— Eu deveria te foder tão forte agora, de um jeito que você
nem pensaria em outro homem. Mas sabe o que é pior? Eu não
quero só te castigar. Eu quero te ter.
Ela fechou os olhos, jogando a cabeça para trás, respirando
fundo.
— Eu poderia pegar qualquer uma — continuei, roçando os
lábios pelo contorno do seu queixo. — Poderia sair daqui e foder
com qualquer garota que quisesse, só para esquecer você. Mas não
adianta. Porque eu quero você, porra.
— Logan…
— Diga que você é minha — ordenei deslizando minha mão
sob sua blusa encharcada, sentindo seus seios duros pelo frio e pelo
desejo. — Ou me diz que você quer que eu pare, que quer ir
embora, e eu paro agora.
— Me fode — disse ofegante, gemendo como uma cadela no
cio, se esfregando no meu pau por cima do tecido da bermuda.
Um sorriso satisfeito surgiu no meu rosto ao ouvi-la implorar
por mim. Afastei a calcinha dela com um puxão, deslizando meus
dedos por sua entrada quente e escorregadia. Ela gemeu, jogando a
cabeça para trás, o corpo inteiro entregue ao desejo.
— Que delícia sentir essa boceta molhada pulsando, louca
para ser fodida — murmurei contra sua pele, enfiando dois dedos
bem fundo dentro dela, sentindo-a se contrair ao meu toque.
Seus gemidos ficaram mais altos quando comecei a mover os
dedos, fodendo-a lentamente, provocando-a. Suas mãos
pressionavam a parede do chuveiro, buscando apoio enquanto seu
corpo tremia sob meus toques.
— Logan, por favor… — sua voz saiu rouca, carregada de
necessidade.
Segurei sua cintura firme e a virei de frente para a parede,
sentindo a água quente escorrer por nossas peles. Desci minha
bermuda e cueca com um único movimento, meu pau rígido roçando
contra suas coxas.
— Empina essa bunda pra mim — ordenei, deslizando minha
mão pelo seu clitóris, arrancando um gemido desesperado dela.
Ela obedeceu, arqueando as costas, expondo-se
completamente para mim. Com o pé, afastei ainda mais suas
pernas, abrindo-a para mim. Meu pau roçou sua entrada quente, e
eu fechei os olhos, segurando-me para não meter tudo de uma vez.
— Inferno, que boceta gostosa… — rosnei, pressionando
apenas a cabeça do meu pau contra ela, brincando, torturando-a
com a antecipação.
Ela gemeu, empurrando o quadril para trás, tentando me
forçar a entrar, mas eu segurei firme seus quadris, controlando o
ritmo.
— Você quer, não quer? — provoquei, deslizando apenas a
ponta, saindo e esfregando de novo. — Quer sentir cada centímetro
me enterrando fundo nessa boceta molhada?
— Sim! Para de me torturar e me fode logo! — ela gritou,
empurrando-se contra mim.
— Então diga que é minha — exigi, segurando seu quadril
com força, mantendo-a no lugar.
— Eu sou sua! — ela gemeu, a voz trêmula de excitação. —
Só sua!
Foi a minha ruína. Enterrei-me nela de uma só vez, sentindo a
parede quente da sua boceta me apertar tão forte que precisei
fechar os olhos e me segurar para não gozar ali mesmo. Ela
arquejou, as unhas cravando no azulejo molhado, a cabeça
pendendo para a frente enquanto eu segurava seus cabelos,
puxando-a para mim.
— Isso, porra — rosnei, meu corpo colado ao dela, meus
movimentos firmes e intensos, estocando fundo, ouvindo cada
gemido desesperado que escapava dos seus lábios.
A água do chuveiro deslizava entre nossos corpos, escorrendo
pelos nossos músculos tensos, misturando-se ao calor do nosso
desejo. Minhas mãos deslizaram por sua pele molhada, segurando-a
com firmeza, mantendo-a exatamente onde eu queria.
— Você ama ser fodida assim, não é? — murmurei contra sua
orelha, mordiscando seu lóbulo enquanto acelerava o ritmo das
estocadas.
Ela gritou meu nome, empurrando-se ainda mais para mim, o
corpo se movendo no mesmo compasso do meu. Minhas mãos
apertaram sua cintura, meus dedos deixando marcas na sua pele
conforme eu a tomava por completo.
Ela tremia, os gemidos se tornando mais altos e
desesperados, e eu sabia que ela estava perto.
— Goza para mim, Lyanna — ordenei, enfiando a mão entre
suas pernas, pressionando o clitóris com firmeza.
O grito que ela soltou ecoou pelo vestiário, quando seu corpo
explodiu em prazer, os músculos internos apertando meu pau com
força. Foi o suficiente para me fazer perder o controle, enterrando-
me nela uma última vez antes de gozar fundo dentro dela, sentindo
o prazer consumir cada célula do meu corpo.
Ficamos ali, ofegantes, a água quente ainda escorrendo sobre
nós. Minhas mãos deslizaram por sua pele, acariciando-a
suavemente enquanto a mantinha contra mim, meu coração batendo
forte contra suas costas.
— Lyanna, eu quero que tudo isso seja real. — As palavras
saíram sem que eu planejasse
— O que você quer dizer com isso?
— Você me quer tanto quanto eu te quero. Então por que
diabos continuamos fingindo?
— Logan… — O tom dela era incerto, a respiração
entrecortada.
— Me diz, Callahan… Você realmente quer que isso acabe?
Ela não respondeu.
Mas eu senti a resposta no jeito que suas unhas se cravaram
nas minhas costas, no gemido abafado quando deslizei minha boca
pelo seu ombro, no tremor sutil quando segurei sua cintura e a
pressionei contra a parede fria do chuveiro.
— Porque eu não quero. — Segurei seu rosto entre minhas
mãos, forçando-a a me encarar. — E não vou deixar você escapar.
Ela engoliu em seco, os olhos dançando entre os meus.
— Isso não faz parte do acordo… — sussurrou, quase como
uma última tentativa de manter distância.
Eu ri baixo, roçando os lábios nos dela, deixando que meu
hálito quente se misturasse ao dela.
— O acordo já era, Lya. Agora somos só nós dois. — Deslizei
os dedos pelo seu rosto, forçando-a a me encarar.
Aproximei-me ainda mais, prendendo seu corpo contra o
meu.
— Seja minha namorada.
39
Lyanna Callahan
Suspirei, desviando o olhar, mas os dedos dele deslizaram
pelo meu queixo, puxando meu rosto de volta. O toque era firme,
insistente, e os olhos azuis queimavam contra os meus.
— Então, Lyanna? — A voz dele veio carregada de
expectativa.
Minha mente girava. Um turbilhão de lembranças, de dúvidas,
de cicatrizes que ainda latejavam. Eu já tinha confiado antes, já
tinha me jogado sem pensar… e me quebraram. Mas Logan não era
Troy. E, droga, parte de mim já estava nele há muito tempo.
Soltei um suspiro pesado.
— Podemos tentar.
O sorriso que surgiu nos lábios dele foi lento, satisfeito. Ele
mordeu o lábio inferior, como se estivesse segurando uma
comemoração.
— Então, acho que agora eu tenho uma namorada de
verdade. Com todos os direitos que um namorado tem.
Arqueei uma sobrancelha.
— E quais seriam esses direitos?
Logan se inclinou, os dedos deslizando pelo meu braço,
criando um rastro de calor até minha cintura.
— Todos aqueles que você disse que eu não tinha antes.
— Por exemplo? — Testei, mordendo o canto do lábio,
tentando disfarçar o arrepio que percorreu minha pele.
Ele sorriu, o maldito convencido.
— Te beijar quando eu quiser.
A palma da mão dele deslizou pela lateral do meu pescoço, e
eu prendi a respiração.
— Te tocar quando eu sentir vontade.
Seus dedos apertaram minha cintura, puxando-me para mais
perto, o corpo colando no meu.
— E te lembrar, quantas vezes forem necessárias, que agora
você é minha.
Antes que eu pudesse responder, os lábios dele tomaram os
meus. Mas dessa vez, não era um beijo de provocação, não era uma
encenação.
Era posse.
Era real.
Meu telefone vibrou sobre a mesa de apoio ao lado da cama.
O nome de Troy brilhou na tela, e, por um momento, pensei em
ignorar.
Ele não desistiria.
Suspirei, pegando o aparelho e saindo para a varanda,
enquanto Logan ainda estava no banho.
— Alô. — Atendi com indiferença.
— Onde você está? — Troy perguntou com autoridade.
— Em casa.
O silêncio do outro lado durou alguns segundos antes dele
responder.
— Ótimo, então abre a porta.
Meu corpo travou.
— O quê?
— Estou aqui. Na sua porta.
Meu coração disparou.
— Troy, eu não estou aí.
— Onde então?
— Estou passando uns dias na casa do Logan.
O silêncio que se seguiu foi mais pesado dessa vez. Então, ele
soltou uma risada baixa, sem humor.
— Você o quê?
— Troy, não temos que falar sobre isso.
— Claro que temos. Como assim você está na casa dele?
Desde quando? Por quê?
Respirei fundo.
— Isso não é da sua conta.
Ele soltou um som frustrado do outro lado da linha.
— Porra, Lyanna. Esse cara não é pra você. Você sabe disso.
Minha mandíbula se apertou.
— E você era?
— Não compare as coisas, você sabe que é diferente. Eu
estive ao seu lado por anos, eu te conheço. Você não pertence a
esse mundo dele.
Antes que eu pudesse responder, a porta do banheiro se abriu
e Logan saiu, com a toalha pendurada frouxamente no quadril,
passando uma das mãos pelos cabelos molhados.
Seus olhos pousaram diretamente em mim, depois no celular
na minha mão.
Logan parou no meio do quarto, os olhos azuis se estreitando
para mim. O vapor do banho ainda subia de sua pele, e as gotas
escorriam pelos ombros largos e pela tatuagem no braço.
— Quem é? — perguntou com curiosidade.
Troy ainda falava do outro lado da linha, mas eu já não estava
ouvindo direito. Meu olhar estava preso em Logan, que agora
avançava alguns passos na minha direção.
Antes que eu pudesse reagir, ele arrancou o celular da minha
mão.
— Que porra? Logan! — protestei, tentando pegá-lo de volta.
Ele apenas ergueu o braço, me mantendo afastada enquanto
levava o aparelho ao ouvido.
— Aqui é o Logan. — O tom dele era calmo. Calmo demais.
Então, Logan sorriu. Mas não era um sorriso amigável.
— Você tem exatamente cinco segundos para me dizer o que
quer com a MINHA namorada antes que eu vá até você e te faça
engolir essa porra de telefone.
Meus olhos se arregalaram.
— Logan, me dá o telefone! — Tentei alcançá-lo novamente,
mas ele simplesmente se afastou, mantendo a postura relaxada, o
que era ainda pior.
Ele colocou no viva voz ao mesmo tempo que me encarava e
a resposta de Troy veio do outro lado, mais ríspida.
— Você acha que pode falar assim comigo, Donovan? Você
acha que ela é sua? Você não sabe NADA sobre ela.
Os olhos de Logan brilharam com diversão sombria.
— Engraçado, porque eu estava dentro dela essa manhã.
Meu coração parou.
— Logan! — Minha voz saiu sufocada, entre a indignação e o
puro choque.
Do outro lado da linha, o silêncio foi absoluto. Mas eu podia
imaginar a raiva estampada no rosto de Troy.
— O que foi? Ficou sem palavras? — Logan continuou,
provocando-o.
Logan abaixou o telefone um pouco, como se estivesse
ouvindo algo muito divertido, depois riu de leve.
— Você acha que ela ainda pensa em você? Eu vou te contar
uma coisa, Troy. Ela não pensa. Ela geme. E eu vou me certificar de
que ela continue gemendo meu nome todas as noites.
Troy gritou algo do outro lado, mas Logan apenas encerrou a
ligação e jogou o telefone no colchão depois de mexer na tela.
— Bloqueei e excluí o número, mas não precisa me agradecer.
Ele virou as costas, mas depois voltou grudando o rosto dele
no meu.
— Você tem a mim agora, entendeu? Eu posso proteger você
do mundo todo.
40
Lyanna Callahan
Uma semana depois…
Saí apressada do estágio assim que recebi a ligação do
hospital. Minha mãe havia acordado. Isso era bom. Tinha que ser
bom.
Meu coração martelava contra o peito enquanto eu subia as
escadas. A última vez que a vi, ela estava frágil, inconsciente. Agora,
ela estava desperta. Isso significava que eu teria que lidar com a
realidade, e a realidade com minha mãe nunca foi fácil.
Quando entrei no quarto, ela estava sentada na cama, o olhar
perdido, fixo na janela. Mas não era como se estivesse admirando a
vista, o vidro refletia apenas as luzes frias do hospital. A rua lá fora
estava longe demais para que ela visse qualquer coisa.
— Mãe? — chamei baixinho.
Ela demorou a reagir. Os olhos demoraram ainda mais para se
virarem para mim. Seus lábios se curvaram levemente para um lado,
um quase-sorriso que, se eu não estivesse focada nela, talvez nem
tivesse notado.
— Já soube que o Mark foi preso por sua culpa.
Meu estômago revirou.
— Você… soube?
— As pessoas adoram fofocas, Lyanna. Independentemente
do lugar onde estejam.
A frieza na voz dela me atingiu como uma rajada de vento. Eu
apertei os dedos contra a lateral do corpo, tentando conter a
frustração.
— E você não acha que ele mereceu?
Ela desviou o olhar, como se buscasse alguma resposta na
parede à sua frente.
— Eu não sei — disse após um longo suspiro. — O seu pai
também me abandonou quando eu mais precisei. Mark… ele pode
não ter sido perfeito, mas estava ali.
Eu senti meu sangue gelar.
— Estava ali te machucando — corrigi, a voz carregada de
incredulidade. — Ambos te machucaram, só que de formas
diferentes.
Ela virou o rosto para mim, os olhos sem emoção, sem culpa,
sem remorso. Apenas vazios.
— Talvez, mas a dor que a gente já conhece é sempre mais
fácil de suportar do que a incerteza de ficar sozinha.
Meus pulmões travaram.
Eu queria gritar, sacudi-la, fazer com que ela visse, mas, no
fundo, uma parte de mim sabia. Ela já via, só escolhia ignorar. E,
naquele momento, eu a entendi, ela nunca quis ser salva.
— E a mim? — Minha voz saiu firme, mas meu coração estava
um caos. — Eu deveria ter deixado que ele me machucasse
também, mãe?
Ela não me respondeu. Apenas baixou o olhar para as
próprias mãos, como se esperasse encontrar ali a resposta que não
queria me dar.
— Quem está pagando a conta do hospital? — perguntou
mudando de assunto.
Meu maxilar travou. Eu sabia que ela não perguntaria como
eu estava. Não perguntaria se eu estava lidando bem com tudo isso.
— Logan.
Ela ergueu o olhar para mim, seus olhos escuros avaliando
minha expressão.
— Ah, sim… O garoto que anda rondando você.
— Somos namorados.
Ela soltou um riso fraco, balançando a cabeça.
— Sim, imagino que seja assim que ele tenha definido o que
vocês têm — disse, com desdém. — Até você engravidar.
Meu estômago revirou.
— O quê?
Ela inclinou a cabeça para o lado, os olhos frios analisando
minha reação.
— Até você engravidar e ele ir para a NHL. E então, querida,
ele vai te dizer que um filho não estava nos planos dele. Que agora
ele tem uma carreira a seguir.
Cada palavra foi como uma faca afundando em meu peito.
— Eu não vou engravidar — soltei entre os dentes. — Não se
preocupe.
Ela deu um meio sorriso, como se soubesse mais do que eu.
— Sim. Cuide-se para que isso não aconteça.
Eu soltei o ar lentamente, tentando conter a raiva que pulsava
dentro de mim.
— E quanto ao Mark…
Meu corpo inteiro ficou tenso.
— O que tem ele?
— Retire a denúncia.
Eu pisquei, certa de que tinha ouvido errado.
— O quê?
— Você já conseguiu o que queria, Lyanna. Ele foi preso,
aprendeu a lição. Mas a prisão não é lugar para ele.
Soltei uma risada incrédula, sentindo uma fúria quente subir
pelo meu peito.
— Você tá me pedindo pra libertar o homem que quase
destruiu nossas vidas?
Ela não respondeu. Apenas continuou me olhando como se
fosse óbvio que eu faria isso.
Respirei fundo, tentando conter a raiva que borbulhava dentro
de mim.
— A denúncia foi feita pelo governo, mãe. Violência
doméstica. Não cabe a mim decidir se ele sai ou não de lá.
Ela não disse nada, apenas apertou os lábios em uma linha
fina, como se já soubesse disso, mas ainda quisesse me fazer sentir
culpa.
Engoli em seco, minhas mãos tremendo ao lado do corpo.
— E sabe de uma coisa? — Minha voz saiu mais baixa. — Eu
ia voltar para casa. Eu ia fingir que éramos mãe e filha de verdade.
Que podíamos recomeçar.
Ela me olhou, sem muita reação.
— Mas eu não acho que seja isso que você quer.
O silêncio dela disse tudo.
Meus olhos ardiam, mas eu não deixaria nenhuma lágrima
cair.
— Vamos seguir nossas vidas. Quem sabe um almoço aos
domingos?
Houve um segundo de hesitação, depois ela assentiu
lentamente, como se já tivesse aceitado essa ideia antes mesmo de
eu sugerir.
— Faça isso — disse simplesmente.
— Você vai ficar bem?
Ela deu um meio sorriso, mas não havia nada de felicidade
ali.
— Vou ter alta hoje — disse, ajustando os lençóis com os
dedos. — Vou para casa. Viver com a aposentadoria pequena que
sua avó deixou. Acho que é suficiente… só para mim.
Meu peito apertou. Ela estava dizendo, do jeito torto dela,
que não esperava que eu voltasse. Eu queria sentir dor por isso, mas
tudo o que senti foi alívio.
— Certo — murmurei, recuando um passo.
Ela não me pediu para ficar, e eu não olhei para trás.
41
Logan Donovan
Eu encarei a tela do computador, forçando meus olhos, mas
não conseguia ver nada.
— Eu não tô vendo merda nenhuma, Owen. — Minha
paciência estava acabando.
Owen girou a cadeira ao meu lado e apontou para a tela, um
brilho satisfeito no olhar.
— Aqui, Logan. Olha com atenção.
Franzi o cenho, apertando os olhos.
— O quê? — perguntei, impaciente.
O vídeo estava cortado. Eu via Lyanna se preparando,
entrando no gelo… Mas nada parecia suspeito.
— Ele entra antes dela — Owen explicou, pausando o vídeo
em um frame específico. — Olha só. O Troy já estava lá antes de
todo mundo.
— E daí? Isso não prova nada.
— Ele ajuda ela a calçar os patins.
Eu apertei o maxilar.
— E daí, porra? É um namorado ajudando a namorada.
Owen riu, mas não era um riso divertido. Ele minimizou a tela
e abriu um novo arquivo.
— E se eu te dissesse que o vídeo original foi cortado?
Minha coluna se endireitou na cadeira.
— O quê?
— Eu restaurei as imagens — ele disse, abrindo outro vídeo.
— E agora assiste isso.
Ele pressionou a barra de espaço e o vídeo começou a rodar
de novo, só que agora sem cortes.
E foi nítido, o filho da puta mexeu nos patins dela. Meus
pulmões congelaram.
O sangue rugiu nos meus ouvidos enquanto eu assistia Troy
se afastando um segundo antes de Lyanna entrar no gelo. Minha
visão ficou turva de raiva quando vi o momento exato em que a
lâmina dos patins dela cedeu no meio da apresentação, o
desequilíbrio repentino, a queda brutal.
— Ela poderia ter morrido. — Minha voz saiu baixa, mas
carregada de raiva.
Owen soltou o ar devagar.
— Sim — ele concordou. — Mas Lyanna é habilidosa. E
sabemos que treinam as quedas, porque elas fazem parte.
Fechei os olhos por um segundo, sentindo meus dedos
formigarem. Eu ia fazer esse filho da puta pagar.
Desliguei a tela rapidamente assim que Lyanna cruzou a
porta. Ela estava com uma cara péssima. Eu já sabia que ela tinha
ido ver a mãe, mas não achei que voltaria parecendo tão exausta,
tão... destruída.
— Que merda aconteceu com você? — perguntei, franzindo a
testa.
Ela soltou o ar devagar, jogando a bolsa no sofá e tirando os
sapatos com um suspiro pesado.
— Minha mãe teve alta.
Eu arqueei uma sobrancelha, esperando que ela continuasse.
— E? Isso não devia ser bom?
— Seria... se ela não tivesse deixado claro que eu não faço
mais parte da vida dela.
Fiquei em silêncio por um segundo, observando o jeito que os
ombros dela caíram, como se estivesse segurando o peso do mundo
sozinha. Eu já senti isso, é horrível mesmo que a gente finja que não
se importa.
— Lyanna... — chamei, com a voz mais baixa.
Ela levantou uma das mãos, me cortando antes que eu
dissesse qualquer coisa.
— Tá tudo bem. Sério. Eu já sabia que isso ia acontecer, só
que ver que ela não se importa foi mais difícil do que imaginei.
Ela passou as mãos no rosto, visivelmente cansada.
— E agora? Você vai atrás dela? Vai tentar insistir?
Ela balançou a cabeça.
— Não. Chega de correr atrás.
Meu peito se apertou com as palavras. Eu sabia exatamente
como era isso.
Não insisti. Apenas assenti.
— Você comeu alguma coisa?
Ela negou, peguei-a pela mão e a arrastei para a cozinha.
— Logan...
— Sem discussão, Callahan. Você não vai desmaiar de fome
aqui na minha casa.
— Bom, vou arrumar o meu quarto — Owen disse coçando a
garganta e Lyanna sorriu para ele.
— Agora senta aí e deixa que eu cuido disso — falei
apontando para a cadeira ao lado da mesa.
Ela suspirou, mas fez o que eu pedi, enquanto eu mexia nos
armários, buscando algo rápido pra preparar. Pouco depois,
entreguei um sanduíche pra ela e apoiei o quadril na bancada,
observando conforme ela mordia o primeiro pedaço.
— Isso aqui não tá envenenado, né? — murmurou,
arqueando uma sobrancelha.
Dei um sorriso torto.
— Só se for com a minha irresistível perfeição.
Ela revirou os olhos, mas mordeu mais um pedaço.
— Vem, vamos subir, vou levar umas coisas para comer no
quarto.
Ela me olhou, desconfiada.
— Não posso nem terminar de comer o sanduíche?
— Você come lá em cima, precisa de distração.
Entramos no quarto, e assim que liguei a TV e escolhi um
jogo, Lyanna ergueu uma sobrancelha, claramente duvidando da
minha estratégia.
— Sério? É assim que você anima uma pessoa?
Soltei um sorriso convencido, jogando-me na cama enquanto
mexia no controle.
— Acredite, isso funciona melhor que qualquer terapia. Agora,
troca de roupa e fica à vontade.
Peguei a primeira camisa que encontrei, uma das minhas
blusas do time, e joguei para ela. Lyanna a pegou no ar e, sem
protestar, começou a tirar a roupa.
E eu quase perdi o jogo antes mesmo de começar.
Minha garganta secou ao vê-la se desfazendo das peças uma
por uma, até ficar apenas de meia e vestindo minha blusa.
Porra.
Ela puxou a barra do tecido, ajustando a camisa folgada no
corpo antes de olhar para baixo, passando os dedos pelo nome
estampado no peito, onde definitivamente não deveria estar.
Franzi a testa e soltei um riso baixo.
— Você vestiu ao contrário?
Eu segurei o riso enquanto me endireitava na cama.
— Deixa assim — falei, dando de ombros. — Ela fica melhor
em você do que em mim.
Ela estreitou os olhos para mim, desconfiada.
— Você só tá falando isso porque quer me zoar.
— Errado. — Meu olhar percorreu o corpo dela, focando no
meu nome estampado no peito. Bem visível. Bem marcado. — Desse
jeito, parece um letreiro que diz: Essa garota é minha.
Ela riu, vi o brilho nos olhos dela voltar, ainda que por um
instante.
— Agora vem — chamei, batendo na cama ao meu lado.
Lyanna se jogou de frente para a tela, cruzando as pernas
enquanto estendia a mão para mim.
— Me dá o controle.
Ergui uma sobrancelha, pegando os controles e me
ajoelhando atrás dela, passando os braços ao redor dos seus ombros
à medida que iniciava o jogo.
— Você sabe jogar? — perguntei, inclinando-me um pouco
para sussurrar perto do ouvido dela.
Ela bufou, impaciente, estendendo ainda mais a mão.
— Eu sou ótima, principalmente em corridas. Escolhe um de
carros.
— Ah, então você acha que é boa? — zombei.
Ela sorriu de lado, ajeitando-se melhor na cama.
— Eu sei que sou.
— E se eu ganhar? Você me deve alguma coisa?
Lyanna nem piscou.
— Você não vai ganhar.
— Mas se ganhar... — pressionei.
Ela girou a cabeça, me encarando com um sorriso
presunçoso.
— Se você ganhar faço o que você quiser, se eu ganhar, você
faz o que eu quiser.
Inclinei a cabeça, estudando-a por um segundo antes de
sorrir.
— Fechado — aceitei.
— Logan Donovan, você acabou de se ferrar — ela disse
confiante.
O jogo começou. E, pela primeira vez em horas, vi Lyanna
realmente se divertir.
42
Lyanna Callahan
Conforme os dias passavam, as conversas nos corredores da
universidade ganhavam um novo foco: a tão esperada festa da
fraternidade Gamma Elite Nu. O baile dos invictos.
O evento do ano.
Uma festa de máscaras, glamour e exclusividade. Todos
queriam ser convidados. Mas essa era justamente a graça... e a
forma mais cruel de manter a hierarquia viva entre os alunos.
Nem todos seriam. E todos sabiam disso. Era esse o jogo.
— Não te perdoo se não me arrumar um convite — Emma
declarou dramaticamente, se jogando na cadeira ao meu lado na
biblioteca como se o mundo estivesse acabando.
Ergui os olhos do meu caderno, observando a expressão
desesperada dela enquanto apontava para um dos inúmeros
panfletos espalhados pela mesa. A máscara dourada impressa
parecia me encarar com arrogância.
— Sério isso, Emma? Ainda se deslumbrando com essa festa?
— Claro que sim! — Ela revirou os olhos como se fosse óbvio.
— É a festa da fraternidade. Máscaras, música, bebidas
absurdamente caras e gente rica agindo como se vivesse num filme
da Netflix. Isso é ouro puro!
É
— É uma festa, Emma. Só isso. Música alta, gente bêbada e
dramas garantidos antes da meia-noite. Nada de mágico.
— Sim, é como qualquer outra — ela concordou, cruzando os
braços. — Mas nessa eu vou. Já é o suficiente pra tornar a noite
interessante.
Soltei um suspiro, rindo de leve da insistência da Emma, mas
o sorriso se apagou no mesmo instante em que meus olhos
encontraram uma figura familiar cruzando a porta da biblioteca.
Meu corpo travou por reflexo, os dedos ainda segurando o
marcador de página no meio do livro.
— Olha quem chegou — Emma sussurrou, arqueando uma
sobrancelha como se tivesse acabado de presenciar o início de um
episódio de drama adolescente.
— Emma… — murmurei em alerta, tentando disfarçar o
nervosismo.
Mas era tarde. Não era como se eu não gostasse do Noah, só
era estranho, mas ele queria que tudo voltasse ao normal. Ele se
aproximou e, sem cerimônia, puxou a cadeira ao meu lado, jogando
a mochila sobre a mesa como se fôssemos melhores amigos que
nunca deixaram de ser ver todos os dias.
— Hey, estrelinha — ele disse, com a voz leve. — Emma. —
Cumprimentou com um aceno simpático.
— Noah! — Emma respondeu animada, como se fossem os
dois que tivessem uma amizade antiga. — Já decidiu se vai na festa
da fraternidade?
— Pensando seriamente nisso — ele respondeu, com aquele
meio sorriso que sempre fazia as garotas suspirarem no colégio.
Era óbvio que o convite havia chegado para ele.
Fiquei em silêncio, evitando olhar diretamente para ele, mas
sentindo sua atenção focada em mim.
— Você sumiu depois da aula ontem — ele comentou, como
se fosse normal reparar nos meus passos. — Achei que te
encontraria no café da tarde.
— Estava ocupada — respondi com um tom que beirava a
indiferença. Não que eu quisesse soar grosseira, mas... Logan.
— Com Logan? — ele arriscou, direto como sempre.
— Sim. — Foi tudo o que eu disse, sentindo o olhar da Emma
se alternando entre nós dois como se estivesse acompanhando uma
partida de tênis.
Noah assentiu lentamente, cruzando os braços sobre a mesa.
— E ele vai te levar na festa?
Levantei os olhos com calma.
— Claro que vai. E por quê? Você ia me oferecer carona?
Ele riu, como se minha resposta tivesse mais espinhos do que
ele esperava.
— Não. Só curiosidade. Você sempre odiou esse tipo de festa.
— As coisas mudam — respondi com um meio sorriso. —
Pessoas mudam.
Emma pigarreou, e aproveitei a deixa para mudar o foco da
conversa.
— E você? Vai sozinho?
— Talvez. Quem sabe eu apareça mascarado só pra ver se
reconhecem meus passos na pista de dança?
Emma riu. Eu também, ele sempre foi esse tipo de pessoa,
que me faz sorrir.
Noah se recostou na cadeira, virando o corpo na minha
direção.
— Fiquei sabendo que você tá procurando um estágio.
Ergui os olhos, surpresa com a mudança de assunto.
— É, tô vendo algumas opções.
— Eu posso ajudar com isso, se quiser. — Ele ofereceu com
um sorriso sincero. — O grupo em que estou treinando abriu uma
vaga para assistente de fisioterapia. É só meio período, mas o
técnico comentou que precisava de alguém com conhecimento e que
soubesse lidar com lesões de impacto.
Meu coração deu uma leve acelerada.
— A sua equipe, na qual você se apresenta?
— Sim. Estou treinando muito desde que cheguei. A base do
grupo tá forte, e eles precisam de gente qualificada por perto e
comprometida.
— Eu… — hesitei, pensando nas implicações. Logan não era
ciumento. Ele era… territorial. E se soubesse que eu estava
estagiando ao lado do meu ex-parceiro de dança, mesmo que fosse
profissionalmente…
— Não precisa decidir agora — Noah se apressou em dizer,
percebendo minha pausa. — Só estou te dando uma opção. Você é
boa. E seria uma ajuda imensa pra gente e quem sabe você não se
anima para voltar.
— Eu agradeço — falei, sincera, e Emma me cutucou de leve
por debaixo da mesa.
— Viu? Tudo está se encaixando, garota. Você só precisa
permitir.
— Permitir o quê? — perguntei, sem esconder a curiosidade.
— Permitir que pessoas que realmente se importam te
ajudem — Emma respondeu, como se fosse óbvio.
Noah apenas assentiu, ainda com aquele olhar calmo, de
quem sabia onde pisava, mas não fazia força para invadir.
E no fundo, por mais complicado que aquilo parecesse… eu
sabia que a oportunidade era real. Só precisava descobrir como
contar isso a Logan.
E torcer para que ele não surte.
Logan Donovan
Estacionei o carro em frente à casa dos meus pais, a minha
mãe havia me ligado dezenas de vezes enquanto eu estava no
treino, e quando finalmente retornei ela não atendeu.
Talvez fosse só uma tática barata pra me fazer vir até aqui. E
se foi, bem, parabéns para ela. Funcionou.
Empurrei a porta da frente sem bater. Não era como se eu
precisasse de permissão para entrar na casa em que cresci, mesmo
que, ultimamente, esse lugar parecesse mais estranho do que
familiar.
A luz da sala estava acesa, e o som suave do piano, quase
melancólico, ecoava da direção da biblioteca. Claro, minha mãe só
tocava quando estava estressada. Ou quando queria fazer cena.
— Mãe? — chamei, andando até a sala. — Tá tudo bem?
Você me ligou tipo, vinte vezes.
Ela apareceu na porta da biblioteca, vestindo um robe claro
de seda, com o cabelo perfeitamente arrumado, como se cada fio
tivesse sido posicionado com precisão cirúrgica. Isso era tão típico
dela.
— Logan, querido — disse com aquele tom doce ensaiado. —
Que bom que veio.
— Não me atendeu de volta. Quase achei que tinha
acontecido alguma coisa séria.
— E não aconteceu?
— Me poupa, mãe. Se fosse grave mesmo, eu teria recebido
uma mensagem do hospital, não vinte chamadas perdidas.
Ela suspirou e caminhou até mim, pousando uma das mãos
no meu rosto como se eu ainda fosse um moleque.
— Você está cada dia mais igual ao seu pai.
Revirei os olhos.
— Ótimo. Cadê ele, aliás?
— No escritório. Mas não é com ele que você vai falar hoje. —
Ela se afastou, caminhando em direção à cozinha. — Senta, vou
preparar um chá.
Chá?
— Mãe, eu não vim aqui para tomar chá. Fala logo. O que
você quer?
Ela se virou lentamente, com um olhar que eu conhecia bem,
manipulação disfarçada de preocupação.
— É sobre aquela garota. A Callahan.
Meus ombros tensionaram no mesmo segundo.
— O que tem a Lyanna?
— Você está cometendo um erro, Logan. Acreditando demais.
Apostando demais. E quando tudo isso acabar, quem vai juntar os
pedaços é você.
— Você me chamou aqui para dizer isso?
— Eu te chamei porque ainda quero proteger você — ela
falava de forma tão doce que parecia sincera, mas eu já caí nessa
antes. — Aquele tipo de menina… ela vai te arrastar para baixo.
Aproximei-me, encarando-a com a calma que só vem com
raiva contida.
— Ela não é um tipo, mãe.
Ela hesitou.
— E se ela aparecer grávida? Já pensou você na NHL com
uma carreira promissora e um filho nos braços?
— O quê?
— É só uma hipótese. Afinal, garotas como ela, bom, às vezes
sabem prender um homem.
— Estamos nos cuidando — rebati com firmeza. — A Lyanna
toma anticoncepcional. Eu os vejo sobre a mesa, ao lado da minha
cama.
— Hum. — Ela arqueou uma sobrancelha. — E você acha que
isso impede uma mulher determinada?
Ela hesitou por um instante.
— Logan… eu só me preocupo com você. — Sua voz ficou
mais baixa. — Você nunca teve namoradas e tem tudo isso com a
NHL, seu pai…
Esperei o que viria a seguir. Mas, para minha surpresa, ela
soltou um suspiro e encarou o chão por alguns segundos antes de
voltar a me olhar.
— Eu quero conhecê-la.
Arqueei uma sobrancelha.
— O quê?
— A Lyanna. — Ela ajeitou a alça do robe no ombro. — Se é
tão importante para você, então quero conhecê-la.
A desconfiança pulsou no fundo da minha garganta.
— Por quê?
Ela deu de ombros, como se aquilo não fosse grande coisa.
— Porque talvez eu esteja errada. — Seus olhos brilharam por
um segundo. — E se for, quero ver com os meus próprios olhos. Não
vou interferir... ainda.
Eu a encarei por alguns segundos, tentando entender se
aquilo era armadilha ou não. Mas não tinha certeza. Com a minha
mãe, nunca dava para ter certeza.
— Tudo bem — murmurei. — Mas eu vou estar junto.
Ela assentiu, com um meio sorriso.
— Eu não esperava diferente de você, Logan.
43
Logan Donovan
No dia seguinte…
Eu devia estar fazendo mil coisas agora… tipo beijando minha
namorada até deixá-la sem fôlego antes de me enterrar nela pelo
resto da noite. Mas isso... isso vai ter que esperar. Só por hoje.
Andei tranquilo pela lateral do ginásio enquanto o jogo onde o time
do Troy jogaria. Eu sabia o horário. Sabia que ele estaria ali, se
aquecendo como se nada tivesse acontecido. Como se ele ainda
tivesse o direito de competir. O direito de representar algo.
A arquibancada estava cheia, o som dos torcedores animados
enchendo o ar com expectativa. Ignorei todos os olhares ao passar
pela segurança com o crachá do time. Eu tinha o passe livre. E o
nome que fazia a diferença.
Entrei pela lateral do banco, bem na hora que ele saía do
vestiário, com o uniforme verde-escuro, ajustando a gola, os cabelos
ainda úmidos do banho. Patins calçados. Pronto para entrar no gelo.
Perfeito.
— Carter! — chamei, com a voz alta o suficiente para ele
ouvir mesmo com todo o barulho.
Ele se virou devagar, já franzindo a testa ao me ver ali,
parado, de braços cruzados, encarando-o como se estivesse diante
de um inseto.
— Que porra você tá fazendo aqui, Donovan? — ele
resmungou.
Eu dei um passo à frente e sorri, aquele meio sorriso que só
aparece quando estou prestes a fazer merda, não tão grande quanto
a que Dax sugeriu, que estava mais para uma morte lenta e
dolorosa para o Carter.
— Vim te dar uma notícia em primeira mão, você não vai
jogar hoje.
— O quê?
— Isso mesmo. Hoje, Carter, você vai esquentar banco. De
preferência o da delegacia, mas por enquanto vai só observar seu
time jogar.
Ele riu, descrente, e passou a toalha pelo pescoço.
— Você está delirando?
— Estou? Então dá uma olhada nisso.
Peguei o celular do bolso e coloquei o vídeo pra rodar. O
vídeo. Aquele que Owen restaurou. O que mostrava ele sozinho com
os patins da Lyanna. Um ângulo perfeito, uma imagem nítida.
O sorriso dele murchou no mesmo instante. A cor do rosto
sumiu. Os olhos arregalados.
— Que porra é essa?
— A prova do crime, Carter. Do quanto você é sujo.
— Isso é manipulação, não prova porra nenhuma! — ele
explodiu.
— Ah, mas prova sim. Prova para quem quiser ver. Para o
comitê. Para os patrocinadores. Para o mundo. Quer ver o impacto?
Posso postar agora — falei, levantando o celular e fingindo acessar
minhas redes.
— Porra, Logan! — ele gritou, tentando avançar. Um
segurança se aproximou, mas eu ergui a mão.
— Tá tudo bem. Ele só tá se dando conta de que a carreira
dele acabou.
— O que você quer? — ele perguntou entre os dentes,
tremendo de raiva.
— Eu quero que você desapareça da vida dela. Quero que
pare de rondar os lugares onde ela está. Quero que desista dessa
ilusão de que ainda tem algum espaço aqui. Porque você não tem.
— Ela era minha!
— Não — rosnei, chegando mais perto, tão perto que ele
sentiu o cheiro da minha raiva. — Ela era uma garota boa demais
para você. Você só destruiu o que podia, e agora ela é minha. E se
você se aproximar de novo, nem vídeo vai ser necessário. Eu mesmo
vou te quebrar no meio. Entendeu?
Ele tentou segurar o olhar, mas eu vi. A dúvida. O medo. O
fim.
Dei dois passos para trás, o celular ainda na mão.
— Dá a volta. Vai para o vestiário. Finge que se lesionou no
aquecimento. Se quiser preservar o pouco que ainda tem...
desaparece.
— Você não pode fazer isso — Troy rosnou, a raiva e o
desespero misturados na voz. — Eu vou pra NHL, porra! É a minha
carreira! O meu futuro!
Cruzei os braços, encarando-o como se fosse o lixo que
sempre foi.
— Vai? Tem certeza? Porque a Lyanna... bom, o futuro dela
você destruiu. Ela não vai mais patinar, não vai mais dançar. E tudo
isso porque você não sabe perder, Carter. É sonho por sonho agora.
Justiça por justiça. Você acabou com o futuro dela. E, por isso, eu
vou acabar com o seu.
— Isso é vingança?
— Não, isso é justiça. Você quer ir pra NHL? Problema seu.
Mas se acha que vai chegar lá fingindo que não fez nada, como se
não tivesse sabotado a garota mais talentosa daquela competição,
você é mais burro do que eu pensei.
— Foi um erro. Eu… eu nem sabia que ela ia se machucar
daquele jeito.
— Mas sabia que estava sabotando. Sabia que estava
mexendo onde não devia. E agora, vai pagar.
Ele passou a mão pelo rosto, nervoso, e depois me encarou
como se ainda tivesse alguma chance de mudar meu foco.
— Você tá fazendo isso porque gosta dela?
Aproximei-me, firme, encarando-o de perto.
— Eu estou fazendo isso porque eu posso. E porque você
precisa entender que não dá para sair por aí fodendo a vida das
pessoas e continuar sorrindo como se fosse o dono do mundo.
Puxei o celular do bolso, mostrei a tela com o vídeo pausado,
e encostei no peito dele com força.
— Eu vou soltar isso. E vai ser o seu fim, Carter. A NHL vai
cuspir você mais rápido do que você possa dizer a palavra
“contrato”. Confissão voluntária ou cancelamento público? Escolha
sua cruz.
Ele me olhou em silêncio, pálido.
— Se não fizer... bom, a internet adora um escândalo. E a
federação também. Especialmente quando envolve sabotagem e
tentativa de lesão.
Dei um passo pra trás, ajeitando a gola da minha jaqueta.
— Boa sorte, Carter. Você vai precisar.
— Não sou só eu quem vai precisar de sorte, Donovan — ele
respondeu com um meio sorriso torto. — Vai ter que tirar o Noah do
caminho se quiser continuar com ela.
Meus olhos se estreitaram imediatamente. Dei meia-volta,
voltando dois passos como se ele tivesse me puxado de volta com
uma corda invisível.
— O que você disse?
— Ah, você não sabia? — Troy ergueu uma sobrancelha. — O
queridinho do gelo voltou por ela. Sempre foi apaixonado. Ela só não
ficou com ele porque estava ocupada fingindo estar com você, era
uma questão de tempo, ela estava me deixando por ele.
Cerrei os punhos, mas mantive o queixo erguido. Ele queria
me provocar, me tirar do controle.
— Entre você e ele, ela vai escolher ele — ele continuou,
como se quisesse cravar a porra da faca. — Sabe por quê? Porque
ela odeia caras como a gente. Egocêntricos. Impulsivos. Cheios de
merda e trauma. Ela sempre admirou aquele idiota do Noah. Gentil,
talentoso, bom moço.
Ele se inclinou um pouco, como se fosse confidenciar algo
sujo.
— Então, Donovan, aproveita enquanto pode. Porque
amanhã, você vai ser o que eu sou hoje: o cara que perdeu.
— Quer saber a diferença entre mim e o Noah?
— Qual?
— Eu não preciso que ela me admire. Eu só preciso que ela
me queira. E isso, ela já deixou bem claro.
Dei as costas, respirando fundo para controlar o impulso de
fazê-lo engolir os próprios dentes.
44
Lyanna Callahan
— O que acha dessa? — perguntei, levantando a máscara
diante do espelho. Era dourada, com detalhes em preto e um leve
brilho nas bordas, moldada no formato de uma borboleta. Uma
mistura entre delicadeza e mistério.
Logan se aproximou por trás, parando tão perto que senti o
calor do corpo dele nas minhas costas. Seus olhos me examinaram
pelo reflexo do espelho, demorando-se um pouco mais na curva do
meu pescoço exposto.
— Você fica linda com todas — ele murmurou, com aquele
tom de voz rouco que parecia roçar direto na minha pele. — Mas
essa… — ele inclinou a cabeça, sorrindo de canto. — Essa parece
feita para você. Selvagem, mas elegante. Um pouco perigosa
também.
Arqueei uma sobrancelha, sem conter o sorriso.
— Perigosa?
Ele se aproximou mais um passo, e suas mãos deslizaram
pela minha cintura, devagar.
— Sim. Como se fosse capaz de seduzir e destruir ao mesmo
tempo. — Ele encostou o queixo no meu ombro, os olhos ainda
presos ao reflexo. — E, sinceramente? Eu gosto disso.
— Você só diz isso porque quer me ver com um vestido
colado e salto alto.
— Também. — Ele riu. — Mas, principalmente, porque essa
máscara esconde só o suficiente. O resto, eu já conheço. E é todo
meu.
Virei o rosto para ele, tentando manter a compostura. Mas
era difícil com Logan Donovan falando coisas daquele jeito.
— Estamos falando de uma festa, não de uma noite de
sedução.
— Ah, Callahan. — Ele roçou os lábios no meu maxilar, e meu
corpo automaticamente se enrijeceu — você ainda não entendeu?
Com essa máscara, você pode ser qualquer coisa. Uma dançarina.
Uma desconhecida. Minha garota em segredo ou a mulher por quem
eu perco a cabeça em público.
— Você realmente vai usar isso como desculpa para me
deixar nervosa a noite inteira?
— Eu vou usar isso para lembrar todo mundo que, mascarada
ou não, você é minha.
Ele pegou a máscara da minha mão e a colocou no meu
rosto.
— Pronto. Agora ninguém vai te reconhecer… — Ele inclinou a
cabeça. — Mas ainda assim, vão querer descobrir quem é a garota
mais linda da festa. E eu? Eu vou estar ali do lado, lembrando que
essa borboleta já tem dono.
— Você é muito idiota — retruquei, rindo e me sentando na
ponta da cama.
Ele caminhava pelo quarto arrumando algumas coisas, com
uma facilidade absurda de lembrar exatamente onde tudo ficava.
Isso num quarto que parecia maior que minha antiga casa.
Suspirei fundo, sentindo o peso da realidade voltar.
— Logan, estou procurando um trabalho. Você sabe, né? Não
dá para continuar morando aqui com você para sempre.
Ele parou perto da varanda, encostando-se no batente com
os braços cruzados.
— Não dá por quê?
— Porque eu preciso me sustentar sozinha. Preciso construir
algo para mim, sabe? E sem falar que, você também não faz nada.
Seu pai cortou o seu dinheiro, não posso ficar sendo um fardo para
você.
— Eu tenho o bastante no banco para viver até me aposentar
— respondeu, com um sorrisinho convencido no canto da boca. — E
em pouco tempo, eu vou para NHL.
— Noah me ofereceu um estágio — falei, tentando soar o
mais natural possível. — Pode se tornar algo fixo. Eles precisam de
uma assistente de fisioterapia no grupo dele.
Os olhos de Logan escureceram por um instante.
— No grupo que você faria parte?
— Sim — confirmei. Eu teria que aprender a lidar com isso. —
Estávamos conversando esses dias e ele acha que, mesmo sem
competir, eu ainda posso dançar, me apresentar, talvez fazer parte
de uma companhia. Não como atleta, mas como artista.
— Engraçado — Ele riu seco, virando-se de costas para mim
por um segundo. Depois se virou de novo, encarando-me com
aquele olhar de quem está segurando um furacão. — Quando eu
disse isso, você duvidou. Mas quando é ele, ah, claro. O maravilhoso
Noah, o prodígio do gelo. Quando ele fala, você escuta.
— Logan…
— Não, está tudo bem. — Ele levantou a mão, cortando o que
eu ia dizer. — Eu entendo. Ele tem experiência no gelo, né? Dança
bem, fala bonito e provavelmente não tem um histórico de brigar
com treinadores ou mandar o pai à merda.
— Não é isso…
— É sim. Você só não percebe. — Ele deu um passo em
minha direção, e mesmo sem elevar a voz, eu vi o quanto ele estava
irritado. — Você confia nele porque ele é seguro. Porque ele
representa tudo o que eu não sou. Mas sabe o que mais ele não é,
Callahan?
Fiquei em silêncio, esperando.
Ele se aproximou ainda mais e respondeu com os olhos
cravados nos meus:
— Ele não é o cara que te faz perder o fôlego toda vez que se
encosta em você. Ele não é o cara que conhece seu corpo de olhos
fechados. Que estaria disposto a bater em meio mundo por você.
Engoli em seco.
Logan deu um passo para trás e respirou fundo, forçando um
meio sorriso.
— Mas vai lá, aceita o estágio. Trabalha com ele. Dança. Faz
tudo. Só me avisa com antecedência se for embora, assim eu finjo
que não me importo.
Ele se virou e saiu do quarto, batendo a porta com mais força
do que pretendia ou talvez exatamente com a força que queria.
O som reverberou pelo quarto e dentro de mim.
Fiquei parada por alguns segundos e antes que eu pudesse
processar tudo ou correr atrás dele, meu celular vibrou em cima da
cômoda, iluminando a tela escura com uma notificação que me
puxou de volta à realidade.
Noah: Estrela, você pode vir hoje? O técnico quer falar com
você.
Meus dedos pairaram sobre a tela, sem coragem de
responder.
Eu me sentia dividida entre o passado que ainda cutucava
feridas e o presente. Mas era só um estágio. Só um convite para
conversar com um técnico.
Respirei fundo, deslizei o dedo pela tela e comecei a digitar.
Lyanna: Posso sim. Que horas?
A resposta veio quase instantaneamente.
Noah: Às 15h. Vai ser bom te ver de novo no rinque. E
lembra? Você ainda me deve a última dança.
45
Logan Donovan
— Você deixou o telefone jogado no sofá — Tyler comentou
assim que me viu descendo as escadas, girando o celular entre os
dedos como se fosse um brinquedo qualquer.
— Caralho! — resmunguei, descendo os degraus com pressa
e pegando o aparelho da mão dele.
— É só um celular, cara. Relaxa — disse ele, rindo do meu
desespero.
— Não é só isso — murmurei, deslizando o dedo pela tela. —
É a minha mãe.
— Hum… problema?
— Ela mandou umas dez mensagens em menos de uma hora.
Tá surtando de novo. Aqueles malditos remédios estão deixando ela
completamente instável.
— Droga… — Tyler coçou a nuca, o semblante finalmente
ficando mais sério. — Quer que eu vá com você?
— Não, tranquilo. Eu passo lá e vejo o que tá acontecendo.
Ele assentiu, mas logo voltou ao modo “Tyler despreocupado”.
— Vai tentar voltar a tempo da festa, né? Mesmo que não
seja a mesma coisa quando se está amarrado em outra. Eu, por
exemplo, planejo pegar no mínimo três garotas hoje. No mínimo. Se
rolar quatro, não vou reclamar…
— Tyler… — interrompi, levantando os olhos do celular. — Se
eu me atrasar, avisa a Lyanna que fui na casa dos meus pais, tá? Diz
para ela ir com você para festa, e eu encontro com vocês lá depois.
— Pode deixar — respondeu com um sorriso torto e um olhar
travesso. — E se ela não quiser ir comigo, juro que me contento com
duas. Ou só uma. Desde que não seja você.
Revirei os olhos.
— Vai se foder! Não dá em cima dela.
— Jamais. Tenho amor à vida. Vai tranquilo.
Assenti, já puxando a chave do carro do bolso.
Não demorei para chegar A porta da frente estava
destrancada, e eu não ouvi ruídos dos empregados.
Empurrei com o ombro, entrando devagar, os olhos
percorrendo cada canto da sala silenciosa. As luzes estavam acesas,
mas não havia nenhum som de TV, rádio ou passos. Só o silêncio
pesado de uma casa que deveria estar cheia de vida, mas parecia
vazia.
— Mãe? — chamei, a voz mais baixa do que o normal, mas
ela não respondeu.
Dei alguns passos, só quando virei o corredor que ouvi um
barulho abafado. Uma risada arrastada. Fraca. Descompassada.
Corri até a sala de estar e a encontrei ali, caída parcialmente
sobre o sofá, com uma taça de vinho quase vazia na mão e vários
frascos de remédio espalhados sobre a mesinha de centro.
— Merda... — Me aproximei rápido me abaixando ao lado
dela. — Mãe?
Ela ergueu os olhos lentamente, o rosto pálido, os olhos
marejados.
— Nathan… — disse num sussurro trêmulo. — Você veio.
— Sou Logan, mãe. — Segurei sua mão com firmeza. — O
que você fez? Você tomou todos esses remédios?
— Eu só queria dormir um pouco… — ela sussurrou, tentando
manter o sorriso no rosto. — Só um pouco.
— Misturou com vinho? — explodi, a voz falhando de raiva e
desespero. — Você podia ter morrido, mãe!
Ela virou o rosto, como se não quisesse me encarar.
— E talvez fosse melhor. Eu estou tão cansada, Nathan. Seu
pai não liga mais, seu irmão não atende, assim como você ele está
sempre longe.
Fechei os olhos, engolindo em seco a culpa que veio como
uma porrada no peito.
— Vou te levar para o hospital — anunciei, me levantando. —
Não discute.
— Eu não quero. Eu só preciso de você aqui hoje. Ligue para
o Logan, quero os dois comigo hoje.
Fiquei parado por alguns segundos, respirando fundo. Depois,
peguei o celular e enviei uma mensagem rápida para Tyler:
Logan: Mudança de planos. Cuida da Lya. Diz para
ela não me esperar. Não vou para a festa.
Guardei o telefone, tirei a taça da mão dela com cuidado e
comecei a recolher os frascos.
— Você vai tomar os remédios certos, na dose certa. Eu vou
organizar isso. E vou ficar aqui hoje. Certo?
Ela assentiu devagar, os olhos marejando de novo.
— Você é um bom filho, Nathan, sempre foi, mas liga para o
seu irmão, eu quero os dois.
Sentei-me no sofá ao lado dela, segurando sua mão, ainda
tremendo. Ela sorriu fraco, quase infantil, e se recostou no sofá
como se acreditasse que eu era Nathan. Meu coração se apertou de
um jeito que doía respirar.
O filho que ela perdeu. O filho que ela amava demais para
deixar ir.
Engoli em seco, minha garganta queimando.
— Vai ficar tudo bem, mãe — murmurei, acariciando o dorso
da sua mão. — Eu tô aqui, tá? E o Logan também vai chegar logo.
Ela assentiu com um movimento leve da cabeça, os olhos já
se fechando devagar. Os remédios estavam fazendo efeito, e agora
que o susto inicial passava, eu só conseguia sentir um aperto
sufocante no peito.
Levantei-me com cuidado e fui até o banheiro, molhei uma
toalha e voltei, limpando o rosto dela suavemente. Ela suspirou, se
acomodando melhor. No fundo, eu sabia que ela não queria morrer.
Ela só queria que a dor parasse.
Voltei para a cozinha, organizei os frascos de remédio, separei
os que ainda eram necessários, anotei os horários, deixei água ao
lado do sofá. Tudo o que um bom filho deveria fazer.
Mas nada disso era o suficiente para trazer o Nathan de volta.
Eu queria gritar, queria socar alguma coisa. Queria sumir. Mas ela
precisava de mim agora, e eu não ia deixar que ela acordasse
sozinha de novo.
Peguei uma manta e cobri suas pernas. Me sentei no chão ao
lado do sofá, encostando a cabeça no estofado, exausto.
Adormeci por um longo tempo, já estava escuro quando
despertei. O celular vibrava, mas eu não olhei, porque se eu visse
alguma mensagem da Lyanna agora, eu não ia aguentar.
A imagem dela na festa, linda, de máscara, talvez com
Noah… A porra do estômago embrulhou.
— Senhor? — Levei um leve susto ao ouvir a voz baixa da
empregada surgindo na entrada da sala.
Virei-me de onde estava, ainda sentado no sofá ao lado da
minha mãe, e franzi a testa.
— Onde está todo mundo nessa casa? — perguntei, me
levantando de imediato.
Ela abaixou o olhar, um pouco nervosa.
— A sua mãe deu folga a todos hoje.
— O quê? — soltei, incrédulo. — Isso é uma piada, né? Ela
não pode ficar sozinha, ainda mais nesse estado!
A mulher hesitou antes de responder, visivelmente
desconfortável.
— Ela insistiu, senhor. Disse que não precisava de ninguém,
que queria um pouco de silêncio.
— Ótimo. Silêncio para morrer sozinha no sofá — murmurei
com sarcasmo, passando a mão pelos cabelos e me afastando dois
passos.
— E o meu pai? — continuei, o tom mais ríspido do que eu
pretendia.
— Ele deve chegar em alguns minutos. Ele... ele tinha um
compromisso.
Revirei os olhos.
— Golf. Claro. — Soltei uma risada seca, amarga.
Ela apertou as mãos na frente do corpo, visivelmente
constrangida.
— Me dá licença, senhor. Eu só vim ver se precisava de algo.
— Você tem toda — respondi, com um aceno curto de
cabeça, tentando controlar a irritação.
Esperei ela sair antes de soltar o ar com força e voltar meu
olhar para o sofá, onde minha mãe ainda dormia sob o efeito dos
calmantes.
O que mais ela teria feito se eu não tivesse vindo?
Recompus-me, e fui direto para o corredor. Meus pés me
levaram automaticamente até o escritório do meu pai. Aquele
maldito lugar onde ele fingia trabalhar entre uma rodada e outra de
golf e suas reuniões com políticos que só pensavam em manter
aparências.
Girei a maçaneta.
— Claro que não está trancado — murmurei, empurrando a
porta.
O cheiro de charuto e couro antigo preencheu minhas
narinas. Me aproximei da mesa, vasculhando os papéis empilhados
com desleixo. Relatórios financeiros, doações, contatos políticos...
Nada que me interessasse.
Até que vi vários envelopes no canto, e a palavra
“Confidencial”. Puxei com cuidado e abri.
Minhas mãos tremeram com o que tinha ali.
Fotos. Impressas. Nítidas.
Lyanna e Noah.
Conversando na saída da universidade. Sentados juntos em
um banco. Caminhando pelo campus.
Em uma delas, ele segurava a cintura dela com aquele sorriso
ridículo no rosto, enquanto ela ria, distraída.
— Mas que porra é essa? — murmurei, apertando as bordas
das fotos.
Peguei outra folha. Um relatório. Algo que parecia um dossiê.
Tinha o nome dela no topo. Dados. Histórico acadêmico.
Informações pessoais.
Meu pai estava investigando a Lyanna.
— Filho da puta...
Minha mandíbula travou, os olhos queimando de raiva.
A última foto no fundo da pasta foi a pior, Noah segurando a
mão dela na porta da biblioteca. O sangue subiu de um jeito que me
fez amassar o papel com força.
O som da porta se abrindo atrás de mim me fez congelar,
segundos depois, ouvi passos tranquilos, e então a voz que eu
menos queria escutar naquele momento:
— Ah… é você?
Virei-me devagar, ainda com os punhos cerrados ao redor das
fotos. Meu pai parou na entrada do escritório com aquela expressão
entediada que ele sempre usava.
— Que merda é essa? — rosnei, erguendo as fotos
amassadas nas mãos.
Ele deu um passo à frente, calmo demais, e com um
sorrisinho presunçoso no rosto.
— A sua namorada. Ou pelo menos… é o que dizem.
— Por que essas fotos estão aqui? Por que você está fazendo
isso?
— Eu preciso saber que tipo de pessoa está se envolvendo
com meu filho. Com o único herdeiro do nome Donovan. — Ele deu
de ombros como se não tivesse feito nada de mais. — Mas, pelo que
vi, você vai ser descartado em breve. Então eu não deva me
preocupar. E, sim, o treinador Daves.
— O pai do Noah?
— Exatamente. Um homem de posses, respeitado, com
influência. Alguém que pode dar à Lyanna um futuro melhor. Ela está
sendo inteligente. Visionária.
Senti o sangue ferver.
— Você passou dos limites, pai. Você não tinha o direito.
Ele riu, baixo. Quase debochado.
— Eu não mostrei nada, Logan. Foi você quem veio fuçar no
que não devia. Você viu por que quis ver.
— E você quis que eu visse! — explodi. — Essas fotos, essas
malditas imagens… você sabia o que ia acontecer.
— Claro — ele respondeu, como se fosse óbvio. E, então,
caminhou até a mesa, abriu a pasta e jogou mais uma pilha de fotos
sobre o tampo de madeira escura. — Essas são de hoje.
Meu estômago virou.
Lyanna, no gelo, com Noah.
O braço dele firme ao redor da cintura dela, enquanto a
guiava em uma pirueta. O sorriso dela, leve, como se tudo estivesse
certo.
Meu peito apertou. Não. Não era possível.
— Ela disse que eles são apenas amigos — falei mais para
mim do que para ele.
— As pessoas dizem muitas coisas, filho. Mas mostram
outras. E veja só... — ele pegou uma das fotos, me mostrando. —
Não parece que ela está se divertindo?
Eu desviei o olhar, engolindo a dor.
— Sei de uma coisa: se você não for à festa, Logan, amanhã
você será a piada da universidade inteira. Porque a sua namoradinha
da periferia… vai com outro.
Minhas mãos tremeram.
— Cala essa boca — sussurrei.
— O que foi? Doeu? — Ele se aproximou, os olhos frios. — Eu
tentei avisar você desde o início. Esse tipo de garota sempre tem um
plano. E você é só o degrau.
Ele me seguiu, claro. Como sempre, querendo dar a última
palavra.
— Logan — chamou, com aquele tom contido, falso, como se
estivesse preocupado. — Cuida da sua cabeça, filho. Vai resolver o
que for preciso. E cuide de não perder o controle na frente de todos,
os técnicos estão de olho em você.
Parei por um segundo na porta da sala, sem olhar para ele.
— Cuida da mamãe — murmurei, a voz mais baixa do que eu
pretendia. — Ela precisa de alguém que esteja aqui de verdade.
— Sempre cuidei. — Ele deu de ombros. — Agora vá resolver
seus assuntos e depois me ligue.
Ele parou, e sua voz ganhou um novo tom, mais firme, mais
estratégico.
— Na sexta-feira temos aquela reunião com o técnico do
Toronto Maple Leafs. Não esqueça. Esse é o tipo de oportunidade
que aparece uma vez na vida.
Fechei os olhos por um segundo. A NHL. O sonho, o mesmo
que ele usava como moeda para tudo. Saí sem responder.
46
Lyanna Callahan
— Eu vou embora — repeti pela milésima vez naquela noite,
mais para mim do que para Emma.
— Não vai, Lya. A festa tá só começando a esquentar. E o
Logan sabe que você está aqui, não foi isso que o Tyler disse?
Suspirei, apertando a taça vazia nas mãos.
— Ele não me mandou mensagem. Nenhuma. E se o
problema é com a mãe dele, eu não devia estar aqui, rindo,
dançando, me divertindo.
Antes que Emma pudesse responder, ouvi uma voz familiar
atrás de mim.
— Gin com tônica ou cerveja?
Virei-me e dei de cara com Noah, sorrindo como sempre,
estendendo as duas opções nas mãos.
— Não quero beber — respondi, balançando a cabeça.
— Vem aqui, preciso te falar uma coisa — disse, já me
puxando pela mão em direção à varanda sem me dar chance de
recusar.
Do lado de fora, o som da festa ficou abafado, e o ar mais frio
me fez arrepiar. Noah se virou para mim com os olhos brilhando de
entusiasmo.
— O técnico me procurou depois que te viu patinando mais
cedo.
— E daí?
— Ele ficou impressionado, Lyanna. Disse que pode te
encaixar em um grupo de dança no gelo, talvez até te levar em
turnê. Disse que você é incrível.
Suspirei fundo, cruzando os braços.
— Eu disse, em algum momento, que era isso que eu queria?
Ele franziu o cenho, confuso.
— Mas Lya, é isso que você ama, não é? Você nasceu para
isso, eu vejo nos seus movimentos, no jeito que patina, você sente
aquilo.
— E eu sinto também quando estou no laboratório,
estudando, atendendo os atletas em reabilitação. Eu tô me
formando em fisioterapia, Noah. É isso que eu quero agora.
Ele abaixou o olhar por um segundo, depois me encarou de
novo.
— Eu sinto falta de nós dois. Dos nossos treinos, das
conversas de quando você sorria comigo sem esforço. Agora você
me olha como se eu fosse um estranho. Como se eu estivesse
invadindo algo que nunca foi meu.
Engoli em seco, sentindo o peso da culpa se acumular nos
ombros.
— Noah... a gente se fala todos os dias desde que você
voltou. Mas eu não posso te dar mais do que isso.
— Por causa do Logan?
— Sim. Por causa do Logan. E porque você sempre foi meu
amigo. Sempre.
Ele deu um passo à frente e esticou a mão, hesitante. Eu
sabia que ele tentaria me tocar, e por mais que quisesse me afastar,
permaneci ali. Por pena. Por remorso. Por tudo que ele representava
no passado.
— Eu só quero continuar sendo seu amigo, Lya — disse, com
a voz baixa. — Você pode esquecer essa conversa se isso for te
deixar mais confortável.
A mão dele tocou meu rosto, os dedos roçando minha
bochecha com delicadeza. Foi um carinho triste. E, mesmo sem
querer, não recuei. Talvez por fraqueza. Ou por respeito ao laço
antigo que nos unia.
Mas o momento que já estava desconfortável virou um
desastre em segundos.
— Atrapalho o casal?
A voz cheia de sarcasmo de Logan fez com que eu
congelasse. E como se ele tivesse gritado, as pessoas ao redor se
viraram com curiosidade, se aproximando da varanda para ver o
espetáculo prestes a acontecer.
Noah tirou a mão do meu rosto imediatamente, mas Logan já
caminhava na nossa direção, os olhos fixos em mim com fúria.
Logan parou a poucos passos de nós. O silêncio na varanda
era opressor, apesar do som da festa ainda vibrando atrás da porta
de vidro.
Seus olhos azuis queimavam em mim. Não como antes. Não
com desejo. Mas com raiva. Com ódio.
— Está se divertindo, Callahan? — perguntou com a voz fria.
— Com o seu parceiro de dança?
— Logan, não faz isso — pedi, sentindo minha garganta secar.
— O que eu fiz, Lyanna? — Ele riu, mas foi um som sem
humor, amargo. — Isso aqui, Lyanna, tudo isso entre nós, foi só um
acordo. Lembra? Um teatrinho.
— Não fala assim…
— Agora acabou. — Ele ergueu os ombros, como se estivesse
anunciando algo irrelevante. — Pode ir com o queridinho da
patinação. Ele parece mais, adequado. Mais no seu estilo.
Senti os olhares ao redor grudarem em mim como farpas.
— Logan, para… — sussurrei, implorando com o olhar.
— Quer saber? — Ele se virou para a plateia que começava a
se formar, com um sorriso cínico nos lábios e os celulares apontados
nos gravando. — Acho que todos aqui deveriam saber como a nossa
Callahan segura um homem.
— Logan! — exclamei, o rosto queimando, a vergonha me
sufocando.
— Relaxa, amor — ele cuspiu a última palavra com desprezo.
— Eu me diverti. Como todo mundo se diverte com garotas como
você. Paguei e cedeu.
Meus olhos marejaram. Noah deu um passo à frente, mas
Logan o fulminou com o olhar.
— Nem tenta, patinador, porque eu juro que acabo com a
porra da sua cara antes que você consiga acertar algum soco em
mim.
— Você passou dos limites, Donovan — ele rosnou.
— Não. Ela passou. Quando deixou de ser honesta. Quando
mentiu para mim e correu de volta para o passado como se eu fosse
uma fase temporária.
— Eu… não corri de volta para ninguém — consegui
murmurar, a voz fraca.
— Que se fodam, estou farto de toda essa merda.
— Logan, espera… — tentei contê-lo, mas ele já tinha virado
as costas, abrindo caminho entre os curiosos que cochichavam,
alguns com o celular na mão, registrando tudo.
Emma apareceu do meu lado, me puxando para dentro da
casa.
— Vamos sair daqui — sussurrou, passando o braço pelos
meus ombros.
— Ele… ele não podia ter dito aquilo.
— Eu sei, Lya. Eu sei.
Mas saber não tornava aquilo menos doloroso.
Logan Donovan tinha acabado comigo. Em público. Na frente
de todos.
47
Logan Donovan
O gosto do uísque queimava a garganta. Já era o terceiro
copo. Talvez o quarto. Não importava. Não era o suficiente para
apagar a porra da imagem dela com ele.
A varanda estava quase vazia agora, mas o som da festa
explodia lá dentro. Risadas, gritos, música alta… tudo me irritava.
Tudo parecia zombar de mim.
Inclinei o copo de novo, virei o resto da bebida de uma vez.
Ela estava com ele. Com aquele merda. Sorrindo. Deixando que ele
tocasse nela. A raiva subia no meu peito como gasolina em contato
com fogo.
Owen apareceu do nada.
— Cara, você precisa respirar. — Ele se encostou no batente,
analisando meu estado.
— Me deixa em paz — murmurei, virando para a mesa e
pegando a garrafa de novo.
— Logan, sério. Você tá surtando. Vai acabar fazendo merda.
A Lyanna…
— Cale a boca! — gritei, girando tão rápido que o líquido da
garrafa quase voou. — Me deixa em paz, caralho!
Ele levantou as mãos, mas não se afastou.
— Eu sou seu amigo, porra. Você acha que eu não entendo?
Mas eu já estava em outro lugar. Na porra da varanda. Vendo-
a sorrir pra ele. Vendo-o tocando a cintura dela como se fosse algo
comum. Como se ela fosse dele.
Joguei o copo que eu segurava e ele estourou contra a
parede em um segundo. No outro, meu punho já estava acertando o
rosto de alguém que tentou me conter.
Blake.
Eu nem vi ele chegando. Só senti ele tentando me segurar
por trás e então meu soco explodiu contra o maxilar dele.
— CARALHO, LOGAN! — ele gritou, cambaleando para trás, a
mão na boca, o sangue escorrendo pelo lábio.
Todos olharam. Alguém puxou Owen pelo braço.
— Deixa ele! Ele tá fora de si. — Ouvi um dos caras dizer.
— Porra, Donovan, que merda foi essa?! — Blake vociferou, a
voz meio embargada pela dor.
— A MERDA É ELA, ENTENDEU? — gritei de volta, meu peito
subindo e descendo com força. — Ela fez isso! Me fez achar que
essa porra era real!
Pisei com força, chutando uma cadeira no caminho, jogando
uma mesa de apoio para o lado. A garrafa estava firme na minha
mão. A outra tremia. Owen veio atrás de mim de novo, a mão
estendida como se fosse me acalmar.
— Logan, cara, pelo amor de Deus, vamos sair daqui. Vamos
para casa. Isso vai sair do controle.
— SAI DA MINHA FRENTE! — Empurrei ele com força, e
Owen perdeu o equilíbrio, batendo no encosto do sofá.
Eu não olhei para trás.
Peguei a garrafa inteira dessa vez e saí da festa, atravessando
o gramado enquanto ouvia cochichos atrás de mim. Gente
perguntando o que tinha acontecido. Se era por causa da “garota do
café”.
A porra da garota do café.
A porra da mulher que eu amava sem admitir.
Dirigi bêbado, era errado, mas eu precisava sair dali.
Quando cheguei em casa, o silêncio era uma tortura. Tirei a
jaqueta e joguei-A no chão. Subi para o quarto tropeçando nos meus
passos, e a primeira coisa que senti foi o cheiro dela. No travesseiro.
Na blusa jogada. Em mim.
Soltei um grunhido e soquei a parede com tanta força que
meus nós dos dedos começaram a latejar.
Minutos depois, a porta do quarto rangeu e eu ri da falta de
noção dessa mulher.
— Que porra você faz aqui? — rosnei.
Emily, a líder de torcida entrou com a boca vermelha demais.
Short curto demais. Vadia demais.
Ela entrou sorrindo, mordendo o lábio.
— Vim te ajudar a se sentir melhor…
— Sai. — Minha voz foi seca e fria.
— Logan… — Ela sussurrou, deslizando os dedos pela minha
barriga. — Vai me dizer que não precisa de um corpo quente agora?
Ela tentou puxar a barra da minha camiseta, mas eu segurei o
pulso dela com força.
— Você tá ouvindo o que eu tô dizendo? Sai.
— Eu só queria… — ela tentou falar, sendo mais ousada.
— Você acha que eu quero QUALQUER UMA agora? — Dei um
passo para a frente e ela recuou com o susto.
— Logan…
— VAZA, EMILY! ANTES QUE EU PERCA O RESTO DO
CONTROLE QUE EU TENHO!
Ela saiu. Correndo. Batendo a porta atrás de si. Eu joguei a
garrafa contra a parede. O som dos cacos se espalhando foi a única
coisa que me fez respirar.
Caí sentado na beirada da cama.
Lyanna Calahan
— Para o carro, Emma! — exigi, com a voz embargada pela
raiva e pelo nó na garganta.
— Lyanna... — Ela lançou um olhar preocupado enquanto
pisava no freio. — Aonde você vai? O que você vai fazer?
Apertei os punhos sobre as pernas, tentando manter o
controle.
— Eu vou falar com ele. Logan vai me ouvir, queira ele ou
não. Aquele filho da mãe não pode me tratar daquele jeito.
— Ele surtou, Lya — Emma disse rápido. — O Troy ligou e
disse que o Logan saiu da festa como um furacão. Bêbado, gritando,
quebrando tudo. Você não vai conseguir conversar com ele agora!
— Para o carro! — repeti, sem paciência. — O que eu tenho
pra falar não pode esperar. Eu vou dizer as verdades na mesma
moeda que ele usou para me machucar.
Emma soltou um suspiro tenso e virou o volante
bruscamente, encostando o carro na lateral da rua.
— Que merda, Lyanna — murmurou, encarando o painel por
um segundo. — Você sabe que ele destratou os próprios amigos,
né? Que ele esmurr… que ele tá fora de si. Se ele fez isso com quem
ele confia, imagina com você.
— Eu não tenho medo dele — respondi firme, abrindo a
porta.
— Noah tá seguindo a gente — Emma disse baixinho, olhando
pelo retrovisor.
— Ele tá fazendo isso porque quer, e sinceramente agora não
é o momento de me preocupar com isso. Me leva até lá. Eu vou
entrar, e você me espera do lado de fora. Se eu não sair em dez
minutos, aí sim, você entra. Pior do que o que ele fez comigo na
frente de todo mundo não dá para ser.
Emma assentiu devagar, contrariada.
— Tudo bem. Mas se ele levantar um dedo para você, eu
mesma arrebento esse jogadorzinho — resmungou enquanto voltava
a dirigir.
— Ele nunca me machucaria, não fisicamente — murmurei,
olhando pela janela, sentindo meu coração disparar.
Quando chegamos, Emma encostou o carro em frente à casa.
Meu coração batia como um tambor desgovernado no peito, mas
minha mente estava focada. Logan ia me ouvir. Nem que fosse a
última vez.
Desci do carro sem esperar por mais nada e caminhei até a
porta, mas assim que empurrei a porta da frente, congelei.
Emily estava descendo as escadas, os cabelos bagunçados, as
roupas fora do lugar — camisa torta, saia amassada, o rosto corado,
ofegante. Com cara de quem tinha acabado de transar.
Ela me viu e parou, ajeitando a postura como se quisesse
parecer triunfante. O sorriso maldoso se abriu em seus lábios
pintados de vermelho.
— Oi! — disse com o nariz empinado, o olhar venenoso
cravado em mim.
O ar saiu dos meus pulmões com força, como se eu tivesse
levado um soco no estômago.
— Claro… — murmurei, tentando manter a voz firme. — Você
não perderia a chance de se oferecer, né?
Emily deu de ombros, girando um dos cachos nos dedos,
cheia de si.
— E Logan não perderia a chance de me comer — disse com
deboche. — Dessa vez foi rápido, mas valeu cada segundo.
Nesse momento, Logan apareceu no topo da escada. Estava
sem camisa, o peito nu brilhando de suor, a expressão indecifrável.
Parou quando me viu, tão ofegante quanto ela.
Minhas pernas vacilaram, mas eu me mantive firme.
— Você… — minha voz saiu baixa. — Você realmente fez
isso?
Ele não respondeu. Apenas me encarou com aqueles olhos
que antes me devoravam e agora me queimavam de um jeito
diferente.
— Depois de tudo? — minha voz tremeu. — Você me
humilhou em público, e ainda ia me fazer de idiota aqui também?
— Você já chegou tarde, menina do café — Emily zombou,
descendo os últimos degraus e passando por mim como se fosse
dona da casa. — Mas relaxa, todo mundo sabe que Logan não é de
ninguém. Não precisa se iludir tanto.
Virei o rosto lentamente para Logan, esperando qualquer
coisa. Uma explicação. Um pedido de desculpa. Uma mentira mal
contada que me ajudasse a odiá-lo um pouco menos. Mas tudo que
ele fez foi passar a mão pelos cabelos molhados de suor e soltar,
com desdém:
— Você não devia ter vindo.
Meu coração, que já estava em frangalhos, despencou de vez.
Não tinha mais nada a ser dito. Respirei fundo, segurei as lágrimas e
ergui o queixo.
— Boa noite, Logan. E parabéns. Você conseguiu se tornar
tudo aquilo que jurou que não era.
E então, sem olhar para trás, eu fui embora e esse seria o fim
de nós dois.
Logan Donovan
Fiquei observando Lyanna se afastar pela janela. O carro
desapareceu rua abaixo e, junto com ele, a única coisa que me fazia
respirar direito nos últimos meses.
Eu estava fodido.
Suado, ofegante, com o peito queimando e a mente em
colapso. O quarto estava um caos, lençóis revirados, garrafa
quebrada no chão, travesseiro arremessado contra a parede. Nada
parecia suficiente para apagar a porra da dor no meu peito.
Sentar e ficar olhando a lua? Esquecer. Não era poeta. Não
era romântico. Era Logan Donovan, e Logan Donovan precisava
descontar a raiva em alguma coisa.
Mas quebrar a cara daquele patinador metido a príncipe da
Disney? Ia custar a minha carreira.
— Já mandei você ir embora, Emily — rosnei, virando o rosto
com desprezo ao notar que ela ainda estava na porta.
Ela se encostou no batente como se fosse dona do lugar,
braços cruzados, com o olhar cheio de malícia.
— Achei que tivesse mudado de ideia… — provocou,
arrastando as palavras e se aproximando com um rebolado irritante.
Meu maxilar travou.
— Você acha que isso aqui é o quê? Um jogo? — Dei um
passo à frente, os olhos cravados nos dela. — Vai pra casa do
caralho, Emily. Some da minha frente antes que eu perca ainda mais
o controle.
Ela forçou um sorriso, o rosto ainda levemente manchado
pelo batom borrado, mas os olhos arregalaram com a minha fúria.
— Você tá mesmo apaixonado por ela, não tá?
— Você não sabe de porra nenhuma — cuspi as palavras, e
minha voz saiu seca como ferro em brasa.
Emily recuou um passo, o sorriso morrendo nos lábios.
— Vai embora, antes que eu perca o resto da paciência e diga
coisas que você vai chorar depois.
Ela se virou nos calcanhares, finalmente entendendo que não
ia ter o final feliz que fantasiou. A porta bateu atrás dela, e só aí o
silêncio tomou conta.
Um silêncio pesado. Denso.
E eu fiquei ali, no meio do meu próprio campo de guerra, com
os dedos latejando, os olhos ardendo e a porra do nome de Lyanna
queimando na garganta.
Ela tinha me traído primeiro, não me importava se ela
achasse que eu também a trai.
E no fundo, eu nem sabia mais se o que eu estava fazendo
era o certo. Só sabia que doía pra caralho. E, eu precisava que
doesse nela também.
48
Lyanna Callahan
Duas semanas depois…
Voltar a ser invisível foi, ironicamente, a melhor coisa que me
aconteceu nos últimos dias.
Sim. A melhor.
Depois de tudo que Logan fez, de como ele passou por mim
como um furacão descontrolado, hoje me parece impossível reunir
os pedaços que ele deixou espalhados por toda parte.
Às vezes, alguém ainda solta um riso debochado pelos
corredores, sussurrando algo com os amigos como se eu não
ouvisse — como se eu fosse surda, além de descartável.
Mas, para a maioria, eu voltei a ser o que sempre fui antes
dele: ninguém. Invisível. E sabe de uma coisa? Isso me protege.
Porque ninguém espera nada de alguém que não se vê.
— Não vai descer do carro? — Emma perguntou, me
arrancando dos meus pensamentos.
Pisquei, encarando a fachada da faculdade como se estivesse
prestes a subir num ringue.
— Claro. — Forcei um sorriso, mesmo sem olhar para ela.
Agora, nem precisava mais respirar fundo para criar coragem. Eu já
não era um alvo. Já não era nada.
Exceto para Noah.
Porque ali estava ele. Do outro lado do estacionamento, vindo
com aquele sorriso largo como se nada tivesse mudado. Como se o
mundo não tivesse me engolido e cuspido de volta sem um pingo de
dignidade.
— Lyanna! — Ele abriu os braços como se quisesse me
envolver no mesmo abraço que eu não sabia mais aceitar. — O
treinador quer conversar com você. Precisamos ir até Montreal essa
semana. Ele te quer no grupo.
— Ir com você? — perguntei, tentando soar indiferente,
mesmo com o coração acelerando um pouco.
Ele assentiu, animado.
— Sim. Ele disse que assim que você se formar, o contrato
estará pronto. A gente embarca para Montreal em poucos dias. O
grupo tem um salário ótimo, moradia garantida no centro, perto da
pista… Lya, você precisa disso. Um recomeço. Um lugar onde você
possa voltar a brilhar — e ninguém te apagar por causa de um
babaca.
Engoli em seco. Porque parte de mim queria isso. E a outra
parte ainda sangrava.
— Eu não sei, Noah… — sussurrei. — Ainda tô tentando
lembrar como se respira sem me sentir esmagada.
Ele sorriu, mais calmo agora.
— Então, deixa que eu te ajudo. Como antes. Só que agora é
por você. Só por você.
Fiquei em silêncio, olhando o chão. A ideia de sair dali, de
começar de novo, era tentadora. Mas prometer qualquer coisa ainda
parecia cedo demais.
E, no fundo, eu me perguntava se Montreal seria longe o
suficiente para fugir do que Logan fez comigo.
— Pensa com carinho, tá? — ele completou. — Essa porta
não vai ficar aberta pra sempre.
Assenti, mas sem prometer nada. Porque voltar a viver ainda
parecia uma batalha que eu não sabia se podia vencer.
— Eu aceitei a proposta do treinador do Noah — Emma soltou
de repente, me fazendo parar no meio do corredor. A olhei,
completamente confusa.
— Como assim, aceitou?
— Ele me ofereceu uma vaga na equipe técnica. Então,
podemos ir juntos: eu, você e Noah, como sempre foi antes de toda
essa bagunça.
Engoli em seco, surpresa com o anúncio. Balancei a cabeça,
tentando organizar meus pensamentos.
— E por que você não me disse nada antes? Emma, você
nem queria trabalhar com uma equipe de dança, lembra? Seu sonho
sempre foi cuidar de jogadores de hóquei lindos, altos, musculosos
e… —
— Para, garota! — Ela gargalhou, me dando um leve
empurrão. — É um trabalho, Lya. E é melhor que eu não coma o pão
onde ganho a carne — completou, rindo ainda mais alto.
Sorri, mas logo fiquei séria outra vez, estudando o rosto dela.
Eu conhecia minha melhor amiga, e a última coisa que eu queria era
que ela mudasse os próprios sonhos apenas para cuidar de mim.
— Jura que não está fazendo isso só por mim? Não quero que
você ache que eu não consigo sobreviver sozinha.
Emma respirou fundo e segurou minha mão com firmeza,
olhando diretamente nos meus olhos.
— Lyanna Callahan, você é minha irmã. Se você fosse embora
e eu ficasse aqui, ou vice-versa, eu me sentiria incompleta. Somos
um pacote fechado, lembra? Desde sempre.
Engoli em seco, sentindo meus olhos marejarem.
— Tudo bem — sussurrei, finalmente cedendo um pouco. —
Eu prometo que vou pensar com carinho.
— Isso! — Noah vibrou, me abraçando com força antes que
eu pudesse recuar. Seu entusiasmo era contagiante, e pela primeira
vez em semanas, senti algo parecido com esperança.
Mas meu sorriso morreu antes mesmo de surgir por completo,
quando meus olhos encontraram Logan atravessando o corredor
com seus amigos. A cabeça erguida, o olhar arrogante de sempre,
aquele jeito que dizia que o mundo pertencia a ele. Algumas garotas
se aglomeravam ao redor do grupo, como mariposas atraídas por
uma luz que iria queimá-las.
Nossa velha rotina tinha voltado ao que era antes. Eles,
intocáveis, inalcançáveis, inalcançados. Nós, invisíveis, pertencendo
à classe que sequer merecia ser notada.
Só que, dessa vez, eu sabia exatamente como era estar do
outro lado.
E a dor era pior do que jamais imaginei.
Saí da aula sozinha naquele dia. Noah precisava resolver
alguns assuntos antes de retornar a Montreal, enquanto Emma tinha
suas próprias pendências. Eu estava hospedada temporariamente no
apartamento da tia dela, que me recebeu de braços abertos, algo
pelo qual eu era profundamente grata. Apesar disso, sempre que
podia, eu ainda passava discretamente na frente da minha antiga
casa, só para verificar minha mãe à distância, garantindo que ela
estivesse bem.
Eu caminhava distraída, perdida em pensamentos, quando
ouvi uma voz masculina e desconhecida me chamar com certa
firmeza:
— Garota?
Parei imediatamente, sentindo meu corpo tensionar ao ver
um homem calvo, vestindo um terno preto impecável, caminhando
rapidamente em minha direção. Instintivamente, dei um passo para
trás, desconfiada.
— Sim? — perguntei hesitante, sentindo meu coração
acelerar.
Ele percebeu minha reação cautelosa e parou alguns passos
adiante, mantendo uma distância respeitosa enquanto oferecia um
sorriso cuidadosamente treinado para parecer simpático.
— O senhor Donovan gostaria de falar com você.
Franzi o cenho, confusa.
— Quem?
Ele sorriu novamente, agora com um brilho de impaciência
nos olhos, mas mantendo a voz educada e firme.
— Você ouviu direito.
Ele fez um leve movimento com a cabeça, indicando um carro
luxuoso estacionado a poucos metros. No mesmo instante, a janela
traseira do veículo desceu lentamente, revelando a expressão fria e
intimidadora do pai de Logan Donovan, me encarando como quem
avaliava um incômodo problema a ser resolvido.
Senti um arrepio desconfortável percorrer minha coluna
conforme me aproximava lentamente do carro. Meus passos eram
lentos, cautelosos, como se parte de mim quisesse fugir enquanto a
outra insistia em enfrentar seja lá o que fosse.
Parei diante da janela aberta, sem coragem de entrar. Apenas
me inclinei levemente, mantendo um semblante neutro e distante.
— Pois não? — perguntei, tentando manter minha voz firme,
apesar da insegurança evidente.
Ele me encarou demoradamente, seus lábios se curvando
sutilmente num sorriso quase debochado antes de dizer, em um tom
que não deixava espaço para recusa:
— Entre, Lyanna. Vamos dar uma volta.
Engoli em seco, mordendo o lábio inferior de nervosismo. Meu
coração disparou, mas eu me lembrei rapidamente que o pai de
Logan, apesar de manipulador, nunca tinha se envolvido em algo
que me fizesse temer pela minha integridade física. Ao menos, não
até então.
Respirando fundo para ganhar coragem, entrei devagar no
carro, sentando-me no banco de couro luxuoso e evitando encará-lo
diretamente. Mantive meu olhar fixo no encosto do banco da frente,
esperando que ele falasse primeiro.
— Siga — ele ordenou ao motorista com autoridade. O
homem nos encarou brevemente pelo retrovisor, antes de acenar em
silêncio e começar a dirigir, afastando-nos rapidamente do campus.
Pelo canto do olho, notei que o senhor Donovan ainda me
observava atentamente, analisando cada reação minha, como se
estivesse decidindo exatamente como iniciaria a conversa que, pelo
jeito, nenhum de nós dois realmente queria ter.
O carro estacionou a alguns quilômetros do campus, em uma
rua deserta cercada por árvores e silêncio. O tipo de lugar onde
segredos são sussurrados e jogados no esquecimento.
O senhor Donovan permaneceu em silêncio por alguns
segundos, observando o nada pela janela, até finalmente quebrar o
clima tenso com um movimento contido.
Ele estendeu um envelope grosso em minha direção,
apoiando-o sobre minha perna como se estivesse entregando algo
sem qualquer valor emocional.
— Isso é para você. — Sua voz era fria, direta. — Considere
uma ajuda para seguir em frente… bem longe daqui.
Olhei para o envelope com desconfiança antes de encará-lo,
as sobrancelhas franzidas.
— Por que está me dando dinheiro?
Ele manteve o olhar fixo à frente, impassível, como se sequer
se importasse com a pergunta.
— Para que desapareça. Para que vá para bem longe… longe
o bastante para que eu não precise sequer lembrar que você existe.
Meu estômago revirou, mas minha voz saiu firme:
— E por que a minha existência incomoda tanto o senhor?
Ele soltou um suspiro impaciente, finalmente se virando para
mim com um olhar de quem já se cansou de fingir qualquer
gentileza.
— Porque eu preciso do meu filho cem por cento focado. E
ele acaba de ser aceito pelo Toronto Maple Leafs. Isso é grande. É o
início de tudo. Ele não pode se distrair com dramas, escândalos ou…
sentimentos confusos.
Revirei os olhos, contendo o impulso de rir com desprezo.
— Acho que está mal-informado, senhor Donovan. Eu e o seu
filho… não temos mais nada um com o outro.
— E mesmo assim — ele rebateu, erguendo uma sobrancelha.
— Você ainda está por perto. E eu não gosto de incertezas. Quero
garantir que isso permaneça assim: no passado.
Cruzei os braços, o envelope ainda intocado no meu colo.
— Imagino que o Logan vá para longe com esse time. Vai ter
jogos, treinos, entrevistas. Duvido que sobre tempo para se lembrar
de mim — falei, tentando soar indiferente, mesmo que por dentro
tudo doesse.
Ele inclinou o corpo levemente, como se estivesse prestes a
dar o golpe final.
— Você ainda não entendeu, não é? Não se trata do Logan vir
atrás de você. Eu duvido que isso aconteça. Olhe para você. — Seu
olhar percorreu meu corpo como se me analisasse com desprezo. —
Você não tem nada de especial. É só uma garota qualquer.
Meus punhos se fecharam ao lado do corpo, mas mantive o
queixo erguido.
— E mesmo assim o senhor achou necessário perder o seu
precioso tempo vindo até mim?
Ele sorriu. Um sorriso vazio, cínico.
— Porque ao contrário de você, eu finalizo o que começo.
— E o senhor acha mesmo que um envelope cheio de
dinheiro vai me fazer desaparecer?
Ele encostou as costas no banco com tranquilidade, como se
tudo aquilo já estivesse resolvido.
— Não me importa como vai usar esse dinheiro. Só me
importa uma coisa: não ouvir o seu nome de novo. Nunca mais.
Pegue, vá embora. E faça um favor a todos nós.
— Eu não preciso do seu dinheiro. Nem do seu filho. Nem de
nada que venha de você.
Ele me observou em silêncio por um instante, depois riu,
como se estivesse lidando com uma criança ingênua.
— Tudo bem. Mas deixarei uma coisa clara, Lyanna... — Ele
se inclinou para mais perto. — Eu sou capaz de tudo para garantir
que Logan faça exatamente o que tem que fazer. Tudo. Entendeu?
Suma ou faço você sumir — ele finalizou, com a certeza de quem
está acostumado a dar ordens e detesta ser contrariado.
Sem esperar uma palavra minha, o senhor Donovan abriu a
porta do carro e saiu, fechando-a com força como se quisesse deixar
claro que aquela conversa tinha acabado. Bateu a mão no capô com
violência, depois caminhou até um carro preto que estava
estacionado logo atrás. A porta se abriu imediatamente e ele entrou,
sem olhar para trás, como se eu já tivesse deixado de existir.
O silêncio que se seguiu foi cortado apenas pelo som suave
do motor ligando. O motorista, ainda sério, olhou para mim pelo
espelho retrovisor.
— Faça o que ele diz, garota — disse ele em voz baixa, quase
num sussurro rouco. — Esse homem, ele não alivia nem para o
próprio filho. Nem para a esposa.
Meu estômago virou.
— Como assim? — perguntei, a voz falhando ao perceber que
minha respiração estava completamente fora de controle. Meu peito
subia e descia rápido demais, como se o oxigênio estivesse se
esvaindo do carro.
O motorista continuou, com os olhos no caminho à frente.
— Eu trabalho com ele há tempo suficiente para saber.
Quando o senhor Donovan quer alguma coisa, ele consegue. E quem
entra no caminho dele desaparece.
— Isso é uma ameaça? — minha voz saiu trêmula, mas ainda
firme.
— É um aviso. — Ele me lançou um breve olhar pelo
retrovisor. — Ele não quer que você esteja por perto. E quando ele
não quer alguém por perto, essa pessoa aprende do pior jeito
possível.
— Pare o carro aqui — pedi jogando o envelope de volta no
banco. — E obrigada pelo aviso.
49
Logan Donovan
Dois dias depois…
— Caralho… — a voz veio de um dos jogadores, alta o
suficiente para silenciar o resto do vestiário.
Virei a cabeça, com a toalha ainda pendurada no ombro,
franzindo o cenho.
— Que foi?
Ele não respondeu. Só virou o celular na minha direção, como
se mostrasse uma cena de crime. De certa forma, era.
Ali, no topo da tela, o rosto suado de Troy Carter estampava a
capa de um dos maiores sites de esportes universitários do país.
"Atleta Troy Carter admite sabotagem contra Lyanna
Callahan. Universidade promete investigação e medidas
disciplinares."
Meu corpo enrijeceu.
Li uma, duas vezes, sem acreditar no que via, mesmo já
sabendo a verdade há muito tempo. Ele confessou. O desgraçado
admitiu que sabotou os patins dela.
É
E tudo o que vai acontecer agora é uma "investigação"? É
isso mesmo?
Meu maxilar travou, e os dedos da minha mão se fecharam
com tanta força que senti a unha cortando a palma.
O idiota colocou em risco a vida dela, destruiu a chance da
Lyanna competir novamente. Arrancou dela não só o sonho, mas o
futuro. Ele tem que ser preso, pagar pelo que fez.
— Isso vai dar merda — alguém murmurou do fundo.
— Já deu — respondi, a voz seca.
— Ei, Donovan — outro jogador se intrometeu com um
risinho idiota. — Esse aí não era o ex da sua ex?
Virei-me lentamente. O vestiário ficou em silêncio.
— Vai se foder — soltei, antes de sair andando, sem olhar
para trás.
— A putinha gosta de jogador de hóquei, né? Como é que
chama mesmo essas meninas? Ah, lembrei… Puck Bunny. — Ele riu.
— Será que eu devo tentar a sorte? E aí, Donovan? Ela é gostosa
mesmo?
Outros riram. Mas ele continuou, ignorando o aviso que meus
olhos já davam. Parei e virei vendo o riso morreu.
Em dois passos estava na frente dele. O som do meu punho
acertando a cara do desgraçado ecoou no vestiário.
O riso virou gemido. O impacto o jogou de costas no banco.
— Gostosa é a puta da sua irmã — cuspi com desprezo —,
que vive dando para o time inteiro na arquibancada do rinque.
Ninguém teve coragem de rir, de falar, de respirar. Virei as
costas como se não tivesse acabado de quase quebrar o nariz de
alguém, sem um pingo de arrependimento.
O corredor estava silencioso, e os nós dos dedos ardiam do
soco que acertei no idiota do vestiário. Foi então que o vi o meu pai.
Terno alinhado. Relógio caro. A expressão de sempre: fria,
calculada, como se ele estivesse apenas esperando o relatório final
de um investimento de risco.
— Que porra é essa na sua mão? — perguntou, sem olhar
diretamente para mim.
— Nada de mais, só quase quebrei o nariz de um imbecil
Ele ergueu uma sobrancelha, como se minha resposta não
fosse surpresa.
— Vai mesmo jogar fora tudo isso agora? Faltam dias para
sua formatura. A NHL já tem seu nome na lista. Era só manter a
pose, Logan.
— Eu vou pra NHL — respondi, firme. — Esse sempre foi o
plano.
Ele me lançou aquele olhar impassível, como se estivesse
ouvindo um funcionário teimoso, não o próprio filho.
— Então por que agir como um garoto mimado prestes a
jogar tudo fora? — rebateu, seco. — Você acha que vão querer um
encrenqueiro emocional no time principal?
— Eu não sou emocional — falei devagar, encarando-o. —
Sou intenso. O que é bem diferente. E, aliás, você devia saber disso,
já que me criou assim.
Ele suspirou como quem está perdendo tempo.
— Logan, não importa se você tem talento. Sem controle,
você vira problema. Você pode ser substituído.
Lyanna Callahan
Eu estava fechando a última mala, dobrando cuidadosamente
a blusa que insistia em escapar pela borda, quando percebi o
silêncio pesado vindo do outro lado do quarto.
Virei o rosto e vi Emma estatelada na cama, os olhos vidrados
na tela do celular, o corpo completamente imóvel, como se tivesse
congelado.
— O que você tá vendo aí? — perguntei, tentando soar leve,
mas um nó estranho se formou na minha garganta.
Ela não respondeu.
— Emma? — chamei de novo, me aproximando.
— Filho da puta! — gritou, apertando o celular com tanta
força que eu temi que a tela trincasse.
— O que aconteceu?
Emma virou o celular devagar.
E foi só então que eu vi. Troy estampado em um dos maiores
portais esportivos do país.
A manchete me atingiu como um soco:
"Jogador universitário Troy Carter admite ter
sabotado os patins de Lyanna Callahan.
Universidade promete medidas. Comunicado oficial
divulgado."
Por um momento, tudo sumiu ao redor. O quarto, a mala, o
som da chuva fina batendo na janela. Só sobrou aquela tela.
— Ele… — sussurrei, sem acreditar. — Ele realmente fez isso?
Emma assentiu com um ódio mudo nos olhos.
— Está tudo aqui. Ele admitiu. Disseram que a investigação
interna começou faz dias e agora ele soltou um vídeo. Disse que
estava arrependido, que foi “um erro juvenil movido por ciúmes” —
ela cuspiu as palavras com nojo. — Ele tá tentando limpar a própria
imagem.
Senti meu corpo tremer de raiva.
— Um erro juvenil? — repeti, com a voz baixa, fria. — Ele
destruiu a minha carreira. Me tirou do gelo. Me arrancou de mim
mesma. Ele tem que pagar.
Escorreguei pela parede, o corpo cedendo sob o peso do que
acabara de ler. As pernas fraquejaram como se minha alma tivesse
sido arrancada de dentro de mim.
Sentei-me no chão frio, abraçando os joelhos, e sussurrei,
sem fôlego.
— Como ele foi capaz de fazer isso comigo?
Minha voz saiu trêmula, despedaçada, como se estivesse
falando comigo mesma ou com a versão da Lyanna que acreditou
nele, que o defendeu, que engoliu cada dúvida com um sorriso
ensaiado.
Um segundo depois, escutei um barulho na frente da casa da
Emma. Uma voz. Uma respiração ansiosa.
— Lya… — Reconheci a voz de Noah
Levantei-me num impulso, ainda tonta, e corri até a porta.
Assim que a abri, ele estava ali, parado na varanda, os olhos
vermelhos, o rosto tenso, o peito arfando como se tivesse corrido
até aqui.
— Me desculpa — disse de imediato, com a voz embargada.
Fiquei parada, tentando entender.
— Pelo quê? — perguntei, confusa.
Ele hesitou por um segundo, depois passou a mão pelos
cabelos e murmurou, como se odiasse as próprias palavras.
— Ele tinha ciúmes de mim. De como eu olhava para você. De
como a gente se entendia sem esforço.
Meus olhos se fecharam por um instante.
— Noah… — murmurei, com a voz baixa — você não é
culpado de nada.
Ele deu um passo à frente, mas não tentou me tocar.
— Se eu não existisse, você não tivesse se machucado
daquele jeito. Talvez...
Balancei a cabeça, firme.
— A culpa é toda dele. Ele escolheu fazer aquilo. Ele escolheu
me machucar. Você só existiu. E isso foi suficiente para ele mostrar
quem realmente era. Assim como Logan.
Emma desceu as escadas em silêncio e parou ao lado de
Noah, seus passos leves, mas o olhar pesado. Ela passou a mão
devagar pelas costas dele, como se tentasse aliviar o peso que ele
carregava por algo que não era culpa dele.
— Eu quero ir embora daqui — disse, com a voz embargada,
mas decidida. — Quero esquecer esse lugar, apagar tudo isso da
minha vida.
Meus olhos encontraram os de Emma e depois os de Noah.
Não havia mais dúvidas. Nenhuma parte de mim pertencia aqui.
— Eu não quero voltar nunca mais.
50
Logan Donovan
Vários dias depois…
Não era fácil me despedir da casa onde vivi tantos anos, nem
dos meus amigos que fizeram parte da minha história. Cada parede
daquele lugar carregava ecos de risos, frustrações, derrotas e
conquistas que me moldaram até aqui.
Dizer adeus a eles, aqueles que estiveram comigo nos dias
bons e, principalmente, nos ruins, doía mais do que eu imaginava.
Agora, cada um de nós está seguindo seu próprio caminho. Novos
contratos, novas cidades, novas vidas. E eu começava a minha hoje.
A porta dupla da sala de imprensa se abriu devagar, mas o
som dos flashes foi imediato. Câmeras se voltaram para mim.
Microfones se ergueram na minha frente.
— Senhoras e senhores — anunciou o assessor de imprensa.
— É com orgulho que apresentamos nosso novo reforço para a
temporada: direto das ligas universitárias, um dos nomes mais
comentados da nova geração, Logan Donovan.
Dei dois passos à frente, vestindo o terno escuro com o
escudo do Toronto Maple Leafs no peito. A camisa azul-marinho do
time nas mãos.
Um repórter foi o primeiro a se pronunciar:
— Logan, você foi um dos jogadores mais vigiados do circuito
universitário. Seu nome esteve envolvido em polêmicas, mas
também em conquistas expressivas. Qual a sensação de vestir,
agora, a camisa dos Leafs?
— É o que eu sempre quis.
— Você chega com fama de jogador talentoso, mas também
temperamental. O que os torcedores podem esperar de você?
Inclinei o corpo ligeiramente em direção ao microfone, com
um meio sorriso.
— Gols. Assistências. Títulos. Foi para isso que fui escalado
para o time.
Alguns riram. Outros anotaram rápido, como se minha
resposta fosse combustível pra uma nova manchete.
Outro jornalista perguntou:
— Você se sente pressionado por estar entrando em uma das
franquias mais tradicionais da NHL?
— Eu gosto de pressão — respondi, direto. — Ela me faz
parecer ainda melhor quando entrego tudo o que prometi.
— Você teve algumas polêmicas no passado... — começou
outro.
— Se estão aqui, é porque elas venderam bem, né? — cortei
com um sorrisinho. — Vamos ser honestos: vocês sentiram falta de
um cara como eu por aqui.
Mais flashes e paciência zero para bajular ninguém ou ouvir
gracinhas de repórteres.
Quando enfim a coletiva acabou, fui direto para o vestiário.
Havia camisetas penduradas. Nomes lendários nas placas de metal.
— Esse é o famoso? — Ouvi uma voz atrás de mim.
Virei-me devagar. Um veterano me encarava com aquela
postura de macho alfa experiente que acha que vai intimidar o
novato.
— Logan Donovan. — Estendi a mão, mas firmei o olhar. — A
nova aposta de ouro de vocês.
Ele não apertou a minha mão. Só cruzou os braços.
— Espero que seu ego seja menor que seu talento.
Dei um sorriso preguiçoso, quase divertido.
— Se for, ainda assim continua maior que o seu.
Um ou dois risos abafados vieram de algum canto do
vestiário. Ele arqueou a sobrancelha, mas não respondeu. Virou as
costas e foi embora
Eu não vim aqui fazer amigos, era só entrar no gelo e mostrar
para todo mundo que Logan Donovan não veio para agradar.
Eu vim para ser o melhor.
Lyanna Callahan
O cheiro do gelo ainda era o mesmo. Limpo, cortante, cheio
de memórias que ardiam mais do que qualquer dor física que eu já
tratei.
Mas, dessa vez, eu não estava ali para competir. Estava ali
para manter outros de pé.
Primeiro dia no grupo como fisioterapeuta da equipe oficial.
Meu crachá ainda parecia estranho pendurado no pescoço. Tanto
tempo sonhando em estar nesse circuito e agora eu estava. Não
com um número no peito, mas com responsabilidade nas mãos.
A equipe técnica me recebeu com profissionalismo. Algumas
saudações formais, outras desconfiadas.
— Você é a nova? — uma voz soou atrás de mim.
Virei-me e encontrei uma patinadora jovem, suada e sem
paciência, com uma bolsa térmica no tornozelo.
— Lyanna Callahan. — Estendi a mão com um sorriso calmo.
— Fisioterapeuta da equipe.
— O mesmo nome da garota do escândalo de sabotagem… —
murmurou, mais para si mesma.
Senti o estômago apertar, mas mantive o sorriso.
— A mesma. Só que agora, com diploma e uma missão bem
diferente.
Ela não respondeu. Só entregou o tornozelo com um suspiro.
Enquanto aplicava compressas e avaliava os ligamentos, o velho
instinto de leitura corporal voltou. Eu conhecia aquele tipo de dor. E
não era só física. Todos ali tinham medo. Uns da queda. Outros do
fracasso. E alguns, como eu… do passado.
Durante o resto do dia, atendi mais dois atletas, fiz relatórios,
recebi olhares curiosos e senti olhares desconcertantes. Alguns
treinadores sabiam quem eu era. Alguns patinadores também. Mas
ninguém me disse nada diretamente.
Eu não voltei para o gelo para agradar ninguém. Voltei para
lembrar a mim mesma que ele ainda era meu, mesmo sem as
lâminas nos pés.
— E aí, cansada? — Noah perguntou, se aproximando com os
cabelos úmidos de suor e a respiração ainda pesada do treino.
Soltei um suspiro, sentando-me no banco com as pernas
moles.
— Me sinto mais cansada do que deveria, para ser sincera.
Ele se sentou ao meu lado, com aquele meio sorriso gentil
que sempre me dava nos dias difíceis.
— Talvez você só esteja sobrecarregada — disse ele, tentando
soar leve.
Antes que eu pudesse responder, Emma apareceu atrás de
nós, segurando o braço de Noah como se estivesse chegando de
mansinho, mas já com uma teoria pronta.
— Isso aí tem cara de TPM — comentou com um sorriso
enviesado.
— TPM? — Franzi o cenho.
— TPM, Lyanna. — Ela revirou os olhos. — Você tá irritada,
cansada, sensível...
Parei por um segundo. Fiz uma conta mental rápida.
— Eu… eu já deveria ter menstruado. Será que estou doente?
Os dois se entreolharam. Mas o jeito que Noah me olhou… Foi
diferente. O sorriso sumiu. Ele travou por um segundo, e quando
voltou os olhos para mim, já não era o mesmo olhar.
— Caramba, Lya! — Emma soltou, surpresa. — Acho que vai
chegar um bebê no nosso apê.
Soltei uma risada nervosa, balançando a cabeça.
— Não brinca com isso.
— Estou falando sério! — ela insistiu. — Você vomitou duas
vezes essa semana e quase desmaiou com o cheiro do bacon. Isso é
clássico.
Noah desviou os olhos. Passou a mão pela nuca, como
sempre fazia quando estava desconfortável.
— Tem alguma chance…? — perguntou, sem me encarar
diretamente.
A voz dele estava baixa. Controlada demais.
Senti o ar preso na garganta.
— Não sei. Talvez. Eu…
Merda.
Emma se agachou na minha frente, segurando minhas mãos
como se eu fosse desmaiar a qualquer momento.
— Quer que eu compre um teste?
Assenti, sentindo meu chão se abrir.
Emma foi rápida. Saiu como um furacão e voltou menos de
vinte minutos depois com uma sacolinha de farmácia nas mãos e um
olhar que misturava empolgação e pânico.
— Peguei o mais confiável, o que diz no rótulo que é “preciso
até antes do atraso” — ela disse, estendendo a caixa para mim.
Segurei o teste como se fosse feito de vidro. Meu coração
martelava no peito e as minhas mãos suavam.
Noah estava encostado na parede, em silêncio, os braços
cruzados, o maxilar travado.
Ele não disse nada desde que Emma saiu.
Respirei fundo, olhando para os dois.
— Tá. Eu vou fazer. Mas vocês dois ficam aí. Sem bater na
porta. Sem me chamar. Sem drama.
Emma assentiu rapidamente. Noah apenas fez um gesto com
a cabeça, sem tirar os olhos de mim.
Entrei no banheiro. Fechei a porta devagar, e pela primeira
vez me encarei no espelho com a pergunta estampada nos olhos:
E se for positivo?
Segui as instruções com as mãos trêmulas, estômago
embrulhado, e o mundo girando devagar.
Coloquei o teste sobre a pia e me afastei, como se ele fosse
explodir. Do lado de fora, o silêncio era quase pior do que a espera.
Dois minutos.
Talvez os mais longos da minha vida.
— Lya? — Ouvi a voz de Emma, suave.
— Estou viva — respondi, sem conseguir esconder o
nervosismo.
Engoli em seco, respirei fundo e me aproximei da pia.
Duas linhas. Duas malditas linhas cor-de-rosa.
Abri a porta devagar. Emma correu até mim, tentando decifrar
minha expressão antes mesmo de ver o teste.
Eu só estendi a mão e mostrei.
— Caramba… — ela murmurou, cobrindo a boca com as
mãos.
Noah não se mexeu. Ficou parado no mesmo lugar,
encarando o teste como se ele tivesse tirado o ar dos pulmões.
— É isso, então… — consegui dizer. — Estou grávida.
Emma me puxou para um abraço forte.
— Parabéns — Noah disse, por fim. Com a voz baixa,
educada.
— E agora? — Emma perguntou, baixando o tom da voz,
como se as paredes pudessem ouvir. — Você vai ter que contar para
o Logan.
Na mesma hora, minha mente me arrastou de volta para o
banco daquele carro.
O pai dele. A ameaça sussurrada com calma fria. Os olhos dele,
cheios de desprezo.
“Eu sou capaz de tudo para garantir que Logan faça
exatamente o que tem que fazer. Tudo. Entendeu? Suma... ou eu
faço você sumir.”
As palavras do pai dele ainda ecoavam na minha cabeça
como se tivessem sido sussurradas há segundos, não semanas.
Trinquei os dentes, desviando o olhar.
— Logan está no início da temporada. Ele tá focado, com a
mídia em cima, os olhos do país inteiro assistindo. Eu… não posso
bagunçar a vida dele agora.
Emma deu um passo à frente, indignada, com os olhos
faiscando.
— Como assim, Lyanna? O filho é dele!
— Eu sei! — rebati, mais alto do que pretendia. — Mas isso
não significa que ele precisa saber agora. Não quando ele finalmente
está onde sempre quis. Não quando ele tá vivendo exatamente o
que o pai dele sonhou pra ele, do jeito que o pai dele queria.
— Isso é injusto, Lya! Injusto com ele, com você e
principalmente com essa criança!
— Se eu contar agora, tudo desmorona. Vão dizer que é
chantagem, que eu apareci para me aproveitar da fama dele. Vão
me pintar como a oportunista. E ele como a vítima. E o pai dele…
— O que tem o pai dele? — ela perguntou, num tom mais
baixo, quase temendo a resposta.
Respirei fundo. Meu estômago virou.
— Emma… eu preciso garantir a segurança do meu filho.
— Ele te ameaçou? — a voz dela saiu trêmula de raiva.
Assenti levemente, sem encarar ninguém.
— Não quero falar sobre isso. Só confia em mim. É melhor
ninguém saber por enquanto.
O silêncio se espalhou entre nós. Emma mordeu o lábio,
segurando as próprias palavras como se elas fossem espinhos na
garganta.
— Você sabe que não vai conseguir esconder isso para
sempre, né?
— Eu sei — murmurei, sentindo minha voz falhar. — Mas
prefiro mais que ele descubra quando for inevitável a descobrir
agora.
— E você? Vai conseguir carregar tudo isso sozinha?
Senti meus olhos se encherem. Uma lágrima escapou antes
que eu pudesse segurar.
— Eu não tenho escolha, Emma.
Antes que ela respondesse, senti braços de Noah me
envolverem.
— Você tem a nós, Lyanna. Se você quer guardar esse
segredo por um tempo, a gente vai segurar com você.
Abracei-o de volta, com o coração em pedaços. Porque
naquele momento, eu não era forte. Eu só estava tentando parecer.
51
Logan Donovan
5 anos depois…
Entrei na minha mansão silenciosa, as luzes da entrada ainda
acesas, mas nenhum som além dos meus próprios passos. Os
funcionários já deviam estar dormindo.
Tudo ali era grande demais. Espaçoso demais para alguém
que vive sozinho.
Larguei as chaves sobre a mesa de mármore da entrada, tirei
o casaco e caminhei em direção à sala, sem vontade de subir para o
quarto. O silêncio pesava mais do que o cansaço. Joguei-me no sofá,
afundando nas almofadas. Fechei os olhos.
O celular vibrou sobre a mesa de centro. Eram quase dez
horas da noite. Peguei o aparelho com um suspiro pesado e atendi
sem nem conferir o número.
— Alô?
— Donovan? Aqui é da comissão médica. Desculpa incomodar
a essa hora, mas recebemos seus últimos exames e precisamos
conversar com urgência.
Minha coluna gelou.
Há semanas, talvez meses, uma dor vinha me
acompanhando. Disfarçada. Suportável.
— Fala. O que vocês encontraram?
— Uma alteração na lombar. Não é mais só sobrecarga. O
padrão de inflamação se agravou e há sinais de desgaste. Nada que
impeça você de jogar, mas se não for tratado imediatamente pode
comprometer sua temporada.
Fechei os olhos, levando a mão ao rosto.
— E qual é o plano?
— Vamos iniciar um tratamento intensivo, mas por
recomendação da diretoria, você será transferido para atendimento
fora da cidade.
Em sigilo total. Nenhum nome, nenhum registro público.
— Você parte amanhã cedo. O local já foi definido.
— Vocês vão me tirar de Toronto?
— É para sua proteção. A imprensa fica farejando coisas e
não queremos boatos sobre lesão. Você é a imagem do time, Logan.
Precisamos preservar isso e você.
— E quem vai me atender?
— Um profissional altamente recomendado. O Dr. Henrik
Meyer ia te receber, mas teve uma emergência e não poderá. Ele
indicou alguém da confiança dele, com experiência em atletas de
elite. Você saberá ao chegar.
Engoli em seco.
— Tá. Me mandem os detalhes.
— Estarão no seu e-mail em minutos. Boa noite, Donovan.
Cuide-se.
Desliguei, ainda meio sonolento, e joguei o celular de volta na
mesa.
Lyanna Callahan
O despertador tocou baixinho, mas o suficiente para quebrar
o silêncio do quarto.
Espreguicei-me devagar, ainda enroscada nos lençóis,
desejando mais cinco minutos naquela cama quentinha que parecia
me abraçar.
Foi então que senti.
Uma mãozinha pequena, quente, se arrastando por baixo das
cobertas. Sorri antes mesmo de abrir os olhos.
— Asher? — chamei com a voz mansa, ainda sonolenta.
Nenhuma resposta. Só aquele corpinho miúdo se esgueirando
pelo colchão até se encostar em mim.
Ele se enfiou no meu lado com habilidade de quem já fez
aquilo mil vezes e quando finalmente chegou perto, ele apoiou o
queixo no meu braço e sussurrou:
— Você já cordô, mamãe?
Abri os olhos e encontrei os dele, enormes, brilhando de
alegria.
— Quase… — sorri, puxando-o mais para perto. — Mas agora
que você tá aqui, não quero sair da cama nunca mais.
Ele soltou uma risadinha baixinha e enterrou o rostinho no
meu pescoço.
— Tá muiiiito flio, mamãe… posso me escondê aqui com
você?
— Claro que pode, amor. Aqui é seu lugar favorito, lembra?
— É o cantinho do abraço! — ele respondeu, todo enrolado,
como se fosse o nome de um lugar secreto.
Dei um beijo no topo da cabeça dele, sentindo aquele
cheirinho de xampu infantil com travesseiro. Ele é pequenininho
demais para entender o mundo, mas grande o suficiente para ser
tudo o que eu precisava nele.
Passamos um tempinho agarradinhos, enroscados sob as
cobertas. Ele com os pezinhos gelados grudados em mim, como
sempre fazia.
Mas a obrigação me chamou de volta à realidade.
Suspirei, resistindo por mais alguns segundos, antes de me
levantar com cuidado, puxando Asher no colo, ainda meio sonolento.
— Vamos lá, meu amor… a mamãe precisa se aprontar —
murmurei, beijando sua bochecha quentinha.
Ele esfregou os olhinhos, bocejando alto, e deixou a cabeça
cair no meu ombro como se o mundo estivesse pesado demais para
lidar antes do café da manhã.
Enquanto o ajudava a vestir o casaquinho, continuei:
— Mamãe vai trabalhar, tá bom? Só por hoje de manhã.
Ele franziu o rostinho, curioso, à medida que tentava colocar
os bracinhos nas mangas.
— Vai vê ateta?
Segurei o riso.
— Um atleta, meu amor.
Ele parou por um segundo e me encarou com aqueles
olhinhos atentos demais para alguém tão pequeno.
— E ele é seu amigo também? — respondi, rindo e ajeitando
o zíper da jaqueta.
— A mamãe ainda não sabe quem é.
Ajoelhei-me à frente dele e segurei suas mãozinhas geladas.
— Promete que vai ser um anjinho hoje com a tia Lú?
— Prometo, mamãe. Mas só se você volta para almoçá
comigo.
— Fechado.
Ele se jogou no meu pescoço com aquele abraço que sempre
parecia salvar os pedaços do meu coração que ainda estavam
quebrados.
— Te amo muiiiito.
— Também te amo, meu Asher.
Arrumei-me rápido, amarrando o cabelo em um coque
apressado e conferindo a bolsa pela terceira vez. Chaves, jaleco,
prancheta, café. Tudo certo.
Antes de sair, voltei os olhos para a sala e encarei Asher, que
agora assistia desenhos sentado no tapete, com um cobertor
amassado cobrindo metade do corpo e um ursinho entre os braços.
Aquele menino era o meu mundo. E deixá-lo, mesmo que por
algumas horas, ainda doía um pouco.
— Mamãe já volta, tá, meu amor?
Ele confirmou com a cabeça sem tirar os olhos da TV, com
aquele jeitinho doce de quem sabia que me derretia fácil.
Sorri, mesmo com o coração apertado, e saí.
Não demorei a chegar na clínica. Estacionei no mesmo lugar
de sempre e entrei, ainda revendo mentalmente os nomes que o
Henrik havia me passado na noite anterior.
Ele estava sobrecarregado, como sempre, e, por mais que
fosse excelente no que fazia, confiava o suficiente em mim para
dividir alguns de seus pacientes, o que era, sem dúvida, uma honra.
Eu adorava a clínica. O ambiente era acolhedor, respeitoso,
estruturado. Os profissionais ali sabiam o que faziam e me tratavam
com o mesmo respeito que eu sempre lutei para conquistar.
Eu tinha aceitado a proposta da clínica nova há poucas
semanas, e ela parecia um presente do universo depois de tudo que
enfrentei.
O salário era excelente, a equipe era incrível e com o bônus
da contratação, consegui dar entrada em um apartamento novo. Um
cantinho maior, com espaço para o Asher correr pela casa e com
uma janela enorme onde ele adorava se esconder com os carrinhos.
Sorri só de pensar nisso.
Eu me sentia bem. Estável. Em paz. Era como se, depois de
anos tentando juntar os cacos, eu finalmente tivesse reconstruído
uma versão nova de mim. Mais forte. Mais leve.
— Bom dia! — cumprimentei com um sorriso leve, ajeitando o
crachá no jaleco assim que entrei na recepção da clínica. — Tudo
certo para o paciente das oito?
A recepcionista me devolveu o sorriso.
— Bom dia, senhora Callahan. Até agora, tudo certo. Sala
preparada, ficha separada, só falta o paciente chegar.
Assenti, apoiando a prancheta no balcão.
— Ok, e o paciente da tarde, já sabe quem é?
Ela hesitou por um segundo. Olhou de lado, como se
estivesse conferindo se alguém ouvia.
— Na verdade, não. A diretoria do time dele pediu total sigilo.
Disse que o nome só pode ser revelado na hora do atendimento,
para evitar especulação.
Franzi a testa, surpresa.
— Sigilo? — repeti, com um sorrisinho irônico. — Nossa,
quem diria. Agora até lesão virou questão de segurança nacional?
Ela riu, um pouco sem graça.
— Acho que quando envolve nomes grandes tudo vira
sensível.
— Claro. Só faltava um jogador da NHL entrar de disfarce por
aqui — brinquei, rindo sozinha, e revirei os olhos. — Tudo bem.
Vamos tratar como uma missão secreta, então.
— Missão Callahan ativada — ela respondeu no mesmo tom
divertido.
Sorri de canto e segui pelo corredor com a prancheta na mão.
52
Logan Donovan
O celular vibrou no banco do carona. Eu já sabia quem era.
Atendi direto pelo painel do carro, sem pressa, sem interesse.
— Alô.
— Acabei de falar com o seu assessor. — A voz do meu pai
soou seca, como um aviso. — Fiquei sabendo sobre a decisão da
comissão médica. Isso é verdade? Vão te mandar para outra cidade?
Mantive os olhos na estrada, respirando fundo.
— É, estou a caminho do aeroporto. A recomendação é
repouso e tratamento intensivo. Fora do circuito. A dor nas costas
piorou, eu já vinha lidando com isso faz tempo. Agora passou do
ponto.
O silêncio dele veio como de costume, carregado de
reprovação.
— Você não vai sair de Toronto — ele disse, firme. — Não
agora. A temporada tá em andamento, a imprensa tá de olho. Se
sumir por semanas, vão desconfiar. Vão inventar. E a imagem que
você construiu vai desabar.
— A imagem que você construiu, você quer dizer — retruquei,
amargo. — Aquela em que eu sou indestrutível, imune à dor, um
robô em patins?
É
— Exatamente — ele rebateu, como se fosse um elogio. — É
essa a imagem que vende. Essa é a sua marca. Você é o pilar do
time. E pilares não quebram, Logan.
— Eu não sou uma maldita estátua. Eu estou com dor. E se
continuar assim, eu posso me quebrar de verdade. Quer que eu
fique em campo até o corpo apagar de vez?
— Quero que você seja inteligente. Que pense com a cabeça,
não com a dor. Deixa que eu resolvo isso com a diretoria. Tenho
contatos suficientes para manter seu nome limpo e o tratamento
discreto em Toronto.
— Já tá decidido — cortei. — Eles querem me tirar daqui para
evitar vazamento, e eu concordei. Eu preciso disso. Preciso de
espaço. De silêncio. De um lugar longe de tudo inclusive de você.
— Logan… você não faz ideia do que tá fazendo — ele avisou,
a voz mais tensa.
— Relaxa, é o meu corpo, a minha vida, eu sei o que estou
fazendo.
Desliguei antes que ele continuasse.
Cheguei em Montreal no início da manhã, com o céu
acinzentado e uma névoa fina cobrindo os prédios da cidade. O
vento gelado cortava como navalha, atravessando até o tecido
grosso do casaco. Era aquele frio seco que grudava no rosto e
deixava as mãos dormentes antes mesmo de você perceber.
O motorista enviado pela federação me esperava no portão
de desembarque com uma placa discreta onde se lia “M. Donovan”.
Ele me cumprimentou com um sotaque carregado.
— Bonjour, Monsieur. Bienvenue à Montréal.
Respondi com um aceno educado. Meu francês era péssimo e
ele percebeu rápido, trocando para o inglês com gentileza
profissional.
O trajeto até o apartamento foi silencioso. A cidade passava
pela janela como uma pintura: ruas limpas, placas em francês, cafés
aconchegantes com vitrines de vidro e bicicletas presas em postes
de ferro. Os prédios alternavam entre o moderno e o histórico, com
construções de pedra cinza, varandas com floreiras secas pelo
inverno e letreiros elegantes em letras cursivas.
Montreal tinha charme. Mas não era minha casa.
O carro estacionou diante de um edifício alto, de fachada
minimalista e entrada envidraçada. Luxuoso, reservado, funcional
como tudo que envolvia o meu nome precisava ser. O porteiro me
recebeu com um “Bonjour” e me entregou as chaves do 14º andar.
Subi pelo elevador privativo.
O apartamento era amplo, moderno, com janelas do chão ao
teto, revelando a cidade coberta por nuvens. A mobília era nova,
sem nenhum sinal de vida. A decoração neutra demais. Como se
tivesse sido montado por catálogo.
Era confortável, sim. Mas impessoal. Frio. Como quase tudo
na minha vida.
Soltei a mala no canto da sala e me encostei na janela,
observando a cidade lá embaixo. Montreal parecia estar sempre
sussurrando em outra língua, nos letreiros, nas conversas nas
calçadas, nos programas da TV.
Eu não entendia o idioma, e talvez fosse melhor assim.
O celular vibrou no bolso. Era uma chamada da coordenação.
— Donovan? Tudo certo com sua chegada? — a voz
masculina era formal, profissional.
— Sim. Acabei de entrar no apartamento.
— Perfeito. Enviamos por e-mail o endereço do centro de
recuperação. Você pode passar lá a hora que quiser para conhecer. É
um espaço fechado, reservado exclusivamente para atender atletas
que precisam como você.
— É um rinque?
— Sim. Com estrutura completa: sala de fisioterapia, piscina,
área de treino leve e suporte médico. Tudo que for necessário
durante sua recuperação estará à disposição.
— Ok. Eu vou.
— Ótimo. Qualquer coisa, estamos aqui para ajudá-lo. Seja
bem-vindo a Montreal, Donovan.
Desliguei.
Ainda não me sentia bem-vindo.
Suspirei, jogando a mochila nos ombros e deixando o
apartamento silencioso para trás.
O endereço do centro de recuperação ficava a poucos
minutos dali, e mesmo sem vontade de ver ninguém, eu precisava
daquilo.
A verdade era simples, a minha vida era no gelo. Sempre foi.
Eu nem sabia o que fazer quando estava fora dele.
O carro da federação me deixou na entrada. Um segurança
me recebeu com um aceno, e logo eu caminhava pelos corredores
limpos e modernos do centro, sob uma luz fria e um silêncio
estranho.
Foi então que eu vi, um garotinho pequenininho, agachado
com um minitaco de brinquedo nas mãos, empurrando um disco de
borracha como se estivesse jogando a final da Stanley Cup. A
concentração no rosto dele era séria demais para alguém tão
pequeno. Aquela postura, a forma como ele segurava o taco,
caralho. Eu já tinha visto aquilo antes. Em mim.
Ele usava um boné azul virado para trás, parecido com o que
eu usava quando era moleque.
E o casaco? Tinha meu número estampado nas costas. Como
se aquele menino fosse uma pequena versão minha andando por aí.
— Você é o Loga Dono... Donovã! — disse todo empolgado,
tropeçando no nome, mas sorrindo como se tivesse acabado de ver
um super-herói.
— É... sou eu — respondi.
Ele se levantou com pressa, deixando o brinquedo de lado.
— Eu te vi na tevê! Você é rápido igual zummm! — fez um
gesto com as mãos, imitando velocidade. — Eu gosto de vê você
jogá. Muito.
Soltei um riso baixo.
— É mesmo? Que bom! E qual é o seu nome, campeão?
— Asher — respondeu, ainda com aquele jeito acelerado.
Antes que eu pudesse perguntar mais, um funcionário da
clínica apareceu no final do corredor.
— Você está por aqui, Asher! — disse sorrindo. — Desculpa,
senhor Donovan. Ele é filho de uma das funcionárias aqui. Às vezes
a babá traz ele.
Assenti devagar, os olhos ainda grudados no menino.
— Asher. — Me abaixei na altura dele, olhando bem nos olhos
curiosos. — Preciso que você guarde um segredinho, tá bom?
— Segredo? — ele sussurrou com os olhos brilhando.
— Isso mesmo. Ninguém pode saber que você me viu aqui
hoje. É só entre nós. Pode ser?
Ele juntou as mãozinhas e fez que sim com a cabeça, solene.
— Eu num conto. Prometido. É missão de ninja.
Sorri e baguncei o boné dele com carinho.
— Boa, ninja.
— Você sabe patiná sem cair? — Asher perguntou, ainda me
observando como se eu fosse uma figura de ação que ganhou vida.
Sorri de canto, surpreso com a coragem dele.
— Acho que sim, estou tentando aprender faz uns anos —
brinquei.
Ele riu, olhei para o funcionário que se afastava sorrindo da
nossa conversa e voltei a minha atenção para o garoto que prendeu
completamente a minha atenção.
— Eu sei um pouquinho também. Minha mamãe deixa eu
treiná às vezes no rinque vazio. Posso mostrar?
— Aqui?
— Tem um lugar lááá no fim do corredor. Eu sei ir. Vem, eu te
mostro!
Antes mesmo que eu pensasse em responder, ele já estava
puxando minha mão com as mãozinhas pequenas e quentes, todo
empolgado.
Quando demos a volta no corredor, encontrei um pequeno
espaço com o gelo limpo, isolado, aparentemente usado para treinos
leves ou aquecimentos. Asher correu até uma prateleira lateral,
pegou dois minipatins e começou a calçá-los com a destreza de
quem faz aquilo todo dia.
— Você vai também? — ele perguntou, com os olhinhos
brilhando de expectativa.
— Posso te ver patinar um pouco.
— Mas você num pode patiná, né? — Ele fez uma carinha de
súplica, juntando as mãozinhas como se fosse um pedido muito
sério.
Soltei um riso abafado, já me rendendo.
— Você é bom em conseguir o que quer, hein?
Ele deu um sorrisinho tímido e balançou a cabeça.
— É que você é meu favolito — disse, do jeitinho dele, como
se aquilo explicasse tudo.
Peguei um par de patins emprestado, calcei com cuidado e fui
com ele até o centro do gelo.
Ele deslizou com os bracinhos abertos, equilibrado, leve,
como se o gelo fosse parte dele. Nada de perninhas trêmulas ou
passos desajeitados, ele se movia com confiança. Fez uma curva
suave, depois uma outra em sentido contrário, como se estivesse
desenhando no gelo.
— Viu? Eu sei fazer voltinha! — gritou empolgado, girando
devagar, mas com um controle que não combinava com a idade que
aparentava ter.
Fiquei parado por um segundo, observando. Ele não era só
uma criança brincando. Era talento. Puro. Bruto.
Inacreditável!
— Quem te ensinou isso, campeão?
Ele sorriu.
— Eu aprendi sozinho, minha mamãe disse que eu sou um
pinguim valente.
Soltei uma risada, ainda meio impressionado.
O tempo passou sem que eu percebesse. E por alguns
minutos, eu não era o capitão de nada, não era o foco da imprensa,
nem o filho de um homem obcecado por imagem. Eu era só alguém
patinando com um garotinho que ria alto demais.
— Asher! — uma voz feminina ecoou pelo espaço.
Virei-me e uma mulher já de idade, e expressão aflita, se
aproximava.
— Desculpa, senhor! Ele escapou de novo. Era só para ele
esperar na recepção.
— Tá tudo bem — interrompi, olhando para ela e depois para
o menino.
Asher já estava tirando os patins, ofegante, com as
bochechas coradas de tanto rir.
— A gente tava treinando. Eu mostrei pra ele meu zummm.
— E mandou bem — acrescentei.
— A mamãe vai ficar triste que perdeu — ele murmurou. —
Ela gosta de me ver patiná.
Antes que eu pudesse perguntar mais alguma coisa, a babá já
o puxava gentilmente pela mão.
— Vamos, Asher. Hora do lanchinho. Dá tchau para o moço.
Ele acenou animado.
— Tchau.
— Pensando em ter filhos?
Virei-me na direção da voz, surpreso por não ter percebido
que havia mais alguém ali. Um dos funcionários da clínica estava em
pé, perto dos armários, organizando alguns equipamentos. Ele
lançou um olhar divertido em minha direção, como se tivesse
captado exatamente meus pensamentos.
Soltei um suspiro, passando uma das mãos pelo cabelo ainda
bagunçado pelo boné.
— Não por enquanto — respondi com um leve sorriso. — Pra
ser bem sincero, a única mulher com quem dormi mais de uma vez
era exatamente aquela que eu podia imaginar sendo mãe dos meus
filhos… — A frase saiu sem querer, quase como um pensamento alto
demais.
Ele ergueu as sobrancelhas, curioso.
— E o que aconteceu com ela?
Balancei a cabeça devagar, desviando o olhar para o chão.
— Não estamos mais juntos — falei, com um toque de
amargura que não consegui disfarçar. — Acho que o destino tinha
outros planos.
Ele assentiu, compreendendo que era melhor não seguir com
as perguntas.
— Senhor Donovan? — Virei o rosto. Um homem de jaleco
claro e crachá no peito se aproximava com um sorriso profissional,
mas amigável.
— Você chegou cedo. O atendimento só começa oficialmente
à tarde.
— Achei melhor conhecer o espaço antes — respondi. —
Gosto de saber onde tô pisando.
Ele assentiu.
— Entendo. Bom, o centro está funcionando em regime
reduzido hoje, então a maioria da equipe só chega mais tarde. Mas
sua fisioterapeuta já está aqui. Ela está sozinha na sala, organizando
as coisas. Se quiser, posso te acompanhar até lá e apresentá-los.
— Claro. Quanto antes começarmos, melhor.
— O doutor Henrik Meyer teve um imprevisto e não pôde
assumir seu caso — explicou enquanto andávamos. — Mas ele
indicou alguém de total confiança. Ela é muito competente.
Especialista em reabilitação esportiva. Já trabalhou com atletas de
alto nível, inclusive internacionais.
— Que bom saber que estou em boas mãos.
— Boas? — ele ergueu uma sobrancelha, confiante. — As
melhores.
— Que bom... — murmurei, ajeitando o casaco nos ombros.
— Melhor saber que não vou sair daqui pior.
Ele riu e abriu a porta.
— Doutora? Seu paciente chegou um pouco adiantado. Achei
melhor acompanhá-lo até aqui. Ele tem prioridade total.
Ouvi um leve barulho de papéis sendo colocados de lado. O
som de passos suaves. E então, ela surgiu atrás da divisória de
vidro.
Por um segundo, o mundo inteiro ficou em silêncio.
Ela parou. Eu parei.
Era ela. Meu corpo inteiro a reconheceu antes da minha
mente conseguir reagir.
Os mesmos olhos. O mesmo jeito de franzir a testa quando se
surpreendia.
E tudo que consegui fazer foi encará-la. E tudo que ela fez foi
me olhar de volta.
53
Lyanna Callahan
Eu estava de costas, organizando as últimas fichas do dia. A
voz do funcionário veio leve, como qualquer outro aviso:
— Doutora? Seu paciente chegou um pouco adiantado. Achei
melhor acompanhá-lo até aqui.
Respirei fundo, ajeitando meu jaleco, e virei-me devagar para
recebê-lo. Minha voz já estava pronta para um cumprimento
profissional, neutro, impessoal…
Mas quando meus olhos encontraram os dele, tudo congelou.
O ar pareceu faltar de repente. Meu coração acelerou de um
jeito doloroso no peito, e por alguns segundos eternos, tudo que
consegui fazer foi encarar aquele rosto familiar demais, aqueles
olhos que um dia foram minha perdição.
Logan Donovan estava parado na minha frente.
Não o via há quase cinco anos. Tempo suficiente para fingir
que havia esquecido como ele mexia comigo, mesmo quando me
machucava.
— Você só pode estar de sacanagem comigo — Logan
Donovan disse, como se tivesse sido jogado ali contra a vontade.
Levantei o olhar devagar, encarando aqueles olhos azuis que
eu conhecia tão bem… e odiava o efeito que ainda tinham em mim.
— Boa tarde para você também, Logan — murmurei,
mantendo a voz firme.
Ele deu um passo à frente, e seu sorriso era tudo menos
amigável.
— Boa tarde? Sério? Entre todas as malditas fisioterapeutas
do Canadá, tinha que ser você?
— Foi uma substituição. O profissional designado não pôde
pegar o seu caso, e me pediram para assumir. Eu não sabia que era
você.
— Ótimo. Então faz um favor e desassume.
— Se quiser, posso indicar outro profissional. — Dei um passo
para o lado, mantendo a compostura. — Ninguém aqui é obrigado a
atender ninguém, Logan.
Ele riu sem humor, aquela risada seca que já era parte da
armadura dele.
— Claro. Eu não quero ser atendido por você.
— Você precisa de atendimento, não eu. E para ser bem
sincera, não estou nem aí se você quer ser atendido por mim ou
não.
— Então chame outro.
— Já disse, posso indicar, mas você vai ter que remarcar. Não
temos ninguém agora. Se quiser, aguarde.
— Eu tô tão insatisfeito quanto você, Callahan. Olha essa
piada, entre tantas pessoas no mundo, justo você. — Ele passou a
mão no rosto, frustrado. — Deve ser karma, né?
— Sai, Logan. — Minha voz saiu baixa, e calma, uma calma
que eu sem sábia de onde vinha.
O funcionário que o acompanhava estava parado na porta,
pálido. Parecia não saber se intervinha ou corria.
— S-senhor Donovan — ele gaguejou. — Não temos nenhum
outro disponível que consiga lhe atender como a senhorita Callahan.
A especialidade dela é exatamente o que foi solicitado pela
federação. Eles pediram a melhor.
— Que pena — falei, dando de ombros. — Porque eu não
quero mais atendê-lo.
Logan me olhou como se eu tivesse cuspido no orgulho dele.
Os olhos brilhando de raiva. A mandíbula travada.
— Saia — ele rosnou para o funcionário na porta, sem tirar os
olhos de mim.
O rapaz me olhou, pedindo com os olhos uma confirmação.
Assenti e ele saiu.
Logan ficou e sem dizer uma palavra, ele arrancou a camisa
com o casaco e sentou-se na maca com a força de quem queria
quebrá-la.
— Dor lombar, lado direito.
Fiquei parada. Não me mexi.
— Eu não perguntei nada.
— Você não é ninguém aqui. Apenas levante e faça o seu
maldito trabalho — ele disse, impaciente.
Dei um passo à frente, calma.
— Já disse, Logan. Eu não sou obrigada a te aturar. Você não
é especial aqui. Não é o astro da NHL nessa sala. Aqui, você é só
mais um homem com dor nas costas e um ego do tamanho de um
estádio. E sinceramente? Eu já tenho o suficiente disso na minha
vida.
Ele se levantou, pegou a camisa de volta com raiva e o
casaco de cima da maca com os movimentos bruscos.
— Dane-se essa merda — cuspiu as palavras, e saiu do
consultório batendo a porta atrás de si.
Eu fechei os olhos por um instante. Senti o corpo inteiro
tremer.
Soltei o ar que eu sequer percebi que estava prendendo. O
corpo inteiro tremia, meu coração acelerado, como se tivesse corrido
quilômetros sem parar.
Aquilo não estava acontecendo.
Apoiei-me na mesa atrás de mim, fechando os olhos com
força, enquanto tentava controlar minha respiração.
— Senhora, está tudo bem? — a recepcionista perguntou
assim que me viu sair da sala. — Ele saiu daqui furioso.
Parei por um segundo, tentando recuperar o fôlego e a
postura. Respirei fundo, ajeitando o jaleco antes de responder:
— Eu estou bem. Quem não parece bem é ele.
Tentei sorrir, mas a tensão ainda estava presa no meu maxilar.
Caminhei até a bancada e peguei minha prancheta, tentando fingir
normalidade.
— Ligue para o doutor Henrik, por favor. Avise que o paciente
designado para mim se recusou a ser atendido.
— Mas... — ela hesitou. — Não tem outro profissional com a
sua especialidade disponível na clínica. E ele é prioridade. A
comissão médica exigiu o melhor acompanhamento.
Dei de ombros, recolhendo minhas coisas da mesa conforme
ela me seguia.
— Então que ele decida o que quer fazer. Mas eu não sou
obrigada a tolerar desrespeito. Se ele quer continuar o tratamento,
que venha com outra postura.
— Ele era o seu paciente da tarde, certo? — ela confirmou,
ainda apreensiva.
— Sim. Só ele.
— Então a senhora vai almoçar?
Assenti, já pegando minha bolsa.
— Sim. Vou para casa almoçar com o meu filho.
A palavra escapou com naturalidade, mas assim que saiu da
minha boca, senti o corpo inteiro estremecer. O coração acelerou. A
respiração travou por um segundo.
Meu filho.
A realidade bateu como um tapa. Logan estava ali. Furioso.
Incontrolável.
Merda.
Ele não podia ver Asher. Não agora. Não assim.
Não era só o medo da verdade vindo à tona, era o medo da
forma como ele reagiria.
Logan sempre foi intenso, impulsivo, orgulhoso demais. E se
ele descobrisse tudo e por raiva de mim rejeitasse o nosso filho. Não
posso deixar meu filho passar por isso.
54
Logan Donovan
Chutei o pneu do carro com força, soltando um palavrão entre
os dentes. A raiva queimava no peito, fervendo até nos ossos. Tirei o
celular do bolso do casaco e disquei o número do coordenador do
time, tentando respirar antes de explodir no telefone.
Ele atendeu no segundo toque.
— Logan, já está na clínica para o atendimento? — perguntou
direto, como se estivesse correndo contra o tempo.
— Preciso de outro fisioterapeuta.
Ele ficou em silêncio por dois segundos.
— Logan... — ele suspirou. — Não começa a dar trabalho.
Você sabe como foi difícil conseguir essa vaga aí. A clínica é
referência, trabalha com discrição. Sabe quantos atletas tiveram os
nomes expostos em situações parecidas com a sua?
— Deve existir outra — rebati, seco. — Eu pago, você paga, o
time paga. Sempre tem outra.
— Não nessa cidade, com esse nível, e no sigilo que a
federação exigiu. — A voz dele subiu um tom. — Você quer que essa
história vaze para a imprensa? Quer manchete? “Estrela da NHL
afastado por lesão antes da nova temporada”? É isso que você quer,
Donovan?
Afastei o telefone da orelha, bufando. Fechei os olhos por um
segundo, tentando não gritar. Mas era inútil.
— Eu sei que você não quer isso — ele insistiu. — Então volta
para a clínica e começa esse maldito tratamento. Cala a boca,
engole o orgulho e faz o que tem que fazer.
— Não dá — murmurei, ríspido. — A fisioterapeuta disse que
não quer mais me atender.
— O quê? — ele disse, mais baixo, como se não tivesse
entendido.
— Foi isso mesmo que ouviu. Ela me dispensou.
— O que você fez? — ele perguntou, exausto. — Não, espera.
Nem me responde. Só... volta lá, Logan. Se desculpa. Faz o que tiver
que fazer. O seu retorno ao circuito depende disso. Você quer ir para
o banco? Quer perder a temporada inteira?
Terminei a ligação sem dar resposta. Só respirei fundo e
joguei o celular no banco do carona, deixando-o vibrar sozinho.
— Claro — murmurei para mim mesmo, encarando o nada. —
É isso. Tô dependendo da Lyanna de novo para voltar para o gelo.
Isso aqui é a porra de um karma.
Foi quando vi. Ela saía da clínica sem me notar, o cabelo
preso em um coque baixo, jaleco dobrado sobre o braço e a
expressão séria. Entrou em um carro preto, popular, sem nem olhar
para os lados. E então, partiu.
Voltei para a recepção.
— Onde ela foi? — perguntei, já impaciente, as mãos
fechadas nos bolsos da jaqueta.
A recepcionista me olhou, tensa.
— Ela… saiu para almoçar, senhor.
— Almoçar? — repeti, rindo com descrença. — Meu
atendimento com ela é em menos de uma hora.
— Sim, mas… eu achei que o senhor havia recusado o
atendimento — disse, hesitante.
— Manda ela voltar. Agora — falei, ríspido. — Meu tempo vale
muito dinheiro. A clínica vai me indenizar por isso?
Ela arregalou os olhos.
— Sinto muito, senhor, mas… o senhor foi claro ao dizer que
não queria ser atendido pela doutora Callahan. Por isso ela foi
liberada.
— Mas pensei melhor.
— E-eu… posso tentar ligar para ela — disse a recepcionista
rapidamente, já pegando o telefone com os dedos trêmulos,
visivelmente nervosa com a minha pressão.
Ela levou o aparelho ao ouvido, tentando manter a
compostura.
— Senhora… o senhor Donovan está aqui e está exigindo o
atendimento — murmurou, quase num sussurro, como se quisesse
evitar chamar ainda mais atenção para a situação.
Assim que desligou, virou-se lentamente para mim, com um
olhar tenso.
— Ela pediu que o senhor retorne amanhã. Disse que pode
conversar com ela pessoalmente sobre o andamento do tratamento.
— Fez uma pausa. — E acrescentou que, se o senhor realmente
quiser ser atendido, ela estará aqui. Ela é uma pessoa muito gentil.
Então, fique tranquilo.
— Sei. Estou muito tranquilo, você nem imagina o quanto —
murmurei com sarcasmo, antes de me virar de costas e sair dali.
Lyanna Callahan
Subi as escadas apressada, o coração acelerado. Se eu
quisesse almoçar com o Asher, tinha que ser rápida.
Abri a porta do apartamento com a chave já em mãos e
entrei, encontrando a cena que aquecia meu coração e gelava meus
nervos ao mesmo tempo.
— Puck no gelo, eu tô voando! — Asher gritava, deslizando
desajeitado pelo tapete da sala com um taco de brinquedo nas
mãos, fazendo poses como se estivesse num campeonato mundial.
— Asher! — chamei, tentando não rir da cena. — Você ainda
nem tomou banho para almoçar, mocinho?
Ele parou, suado e ofegante, o cabelo grudado na testa, e
virou-se para mim com os olhos brilhando de empolgação.
— Mamãe, hoje eu fui plo seu tlabalho! — gritou, correndo na
minha direção como se fosse a maior novidade do mundo.
Congelei na entrada, ainda com a bolsa no ombro. Meus
olhos imediatamente encontraram os de Lú, que estava na cozinha e
parou no meio do movimento com a colher de arroz na mão.
— Lú, vocês foram à clínica hoje?
— Fomos mais cedo — ela explicou, com um olhar culpado. —
Mas a senhora tava ocupada, e o Asher acabou escapando para o
rinque. Pedi para a menina da recepção não a incomodar, não
demoramos muito.
— Foi muito legal, mamãe! — Asher continuava,
empolgadíssimo.
Virei-me para Lú, ainda parada na cozinha, ela não tinha
noção do que aquilo significava.
— Não leve mais ele ao rinque. Nem à clínica. Nem perto.
Lú engoliu em seco e assentiu rapidamente.
— Tudo bem, senhora. Me desculpe. Eu só queria ocupar ele
até a senhora terminar…
— Eu entendo. Só... não leva por enquanto.
55
Logan Donovan
Acordei antes do despertador, com a cabeça latejando e os
lençóis embolados entre as pernas. A noite tinha sido uma merda.
Fechei os olhos por um segundo, tentando voltar a dormir,
mas era inútil.
Maldito sorriso. Maldito olhar.
E aquele cabelo…
— Que porra… ela ainda usa a mesma franja — murmurei
sozinho, virando de lado com raiva.
Como se o tempo não tivesse passado. Como se ela tivesse
congelado naquele maldito lugar da minha memória, que eu tentei
apagar.
Suspirei, jogando as pernas para fora da cama com um
movimento brusco. Me levantei, estalando o pescoço, e fui direto
para o banheiro.
Liguei a torneira e encarei o espelho. A barba por fazer, o
rosto mais abatido do que eu queria admitir.
Ela te desmonta sem nem tentar, Donovan.
Tomei um banho rápido, mas a água quente não lavou nem
metade da irritação que crescia no meu peito. Saí da ducha já
pronto para ignorar o mundo quando o celular vibrou em cima da
cômoda. O nome do meu pai iluminou a tela e meu humor, que já
era péssimo, ficou pior.
Atendi sem vontade.
— Logan. — A voz do meu pai veio seca, direta. — A
comissão médica entrou em contato. Confirmaram que a profissional
de ontem é a única disponível e qualificada para continuar seu
tratamento. Isso não está em debate, você aceitou ir, então, não
arrume problemas.
Revirei os olhos, pegando a camiseta jogada na cadeira.
— Entendi — murmurei com sarcasmo. — Então agora tenho
que ficar aqui e fazer fisioterapia como um bom garoto obediente
sem discordar de nada.
— Quero que você pare de agir como um adolescente
mimado e resolva isso logo — ele rebateu, firme. — Tem muito em
jogo. Seu contrato. Sua imagem. Sua carreira. Você entende isso ou
preciso desenhar com canetinha colorida?
Meu maxilar travou.
— Você não sabe nem metade da história — rosnei, vestindo
a camiseta com raiva.
— E nem quero saber — ele respondeu sem hesitar. — O que
eu sei é que, se você não seguir esse tratamento, pode dizer adeus
à temporada e talvez à carreira. Foda-se qualquer coisa. Se é isso
que vai te colocar de volta no gelo, você vai até lá e faz o que tem
que fazer.
Soltei um riso seco, sem humor. Ele desligou antes que eu
pudesse responder qualquer coisa.
Joguei o celular na cama com força.
— Filho da puta — murmurei entre os dentes.
O caminho até a clínica foi silencioso. Não coloquei música.
Não queria distração. Queria a raiva queimando ali, no lugar onde o
orgulho doía.
Estacionei o carro com mais força do que deveria. Desci,
ajeitei a jaqueta nos ombros e respirei fundo.
O prédio era moderno, discreto, mas eu odiava a fachada
branca como se ela me desafiasse. Atravessei a recepção com
passos longos, o olhar fixo, ignorando todos à minha volta.
A recepcionista me viu se aproximar e pareceu se encolher
atrás do balcão. Sutilmente, olhou para mim antes de falar.
— B-bom dia, senhor Donovan. A doutora Callahan já está te
aguardando na sala quatro.
Assenti com um movimento mínimo da cabeça e segui pelo
corredor.
Parei diante da porta da sala quatro. Respirei fundo, engoli o
orgulho, ou parte dele e empurrei a maçaneta.
De costas. Organizava frascos sobre a bancada, como se
estivesse tentando não pensar em nada. O jaleco branco alinhado, o
cabelo preso, a maldita franja caída sobre a testa exatamente como
antes. Como se o tempo tivesse parado só para torturar minha
sanidade.
Ela se virou com calma e me encarou como se eu fosse
apenas mais um nome na agenda do dia.
— Bom dia, senhor Donovan — disse, com a voz firme e
impessoal, como se estivesse me atendendo pela primeira vez na
vida.
Ergui uma sobrancelha.
— Doutora Callahan. Me informaram sobre a sua gentileza, é
assim que trata os outros ou o problema é só comigo?
— Aqui, trato todos com profissionalismo — respondeu sem
hesitar. — E espero o mesmo em troca. Hoje vamos fazer uma
avaliação mais detalhada da sua lombar. Se quiser continuar o
tratamento, vamos precisar de comprometimento e colaboração.
— Comprometimento — repeti. — Engraçado ouvir isso de
você. Costuma ser comprometida aos seus princípios, doutora?
Ela finalmente me encarou.
— Olha, Logan, o que aconteceu entre nós não tem espaço
aqui. Você tem um problema físico. E eu tenho as habilidades certas
para resolver. Se quiser continuar, tudo bem. Mas eu não vou tolerar
sarcasmo, insinuações ou joguinhos emocionais enquanto estiver
nessa sala.
Fiquei em silêncio por um instante. Encostei-me na maca, e
deixei escapar um sorrisinho de canto.
— Você parece bem treinada para lidar com pacientes difíceis.
— Eu lido com atletas lesionados, Logan. Muitos deles com
egos inflados e pouca paciência. Nada que eu já não tenha visto
antes.
— Mas nenhum com quem você dormiu, né? Ou deve ter
dormido, vai saber.
Ela travou por um segundo. Respirou fundo. Não piscou. Não
explodiu.
— Não — respondeu com indiferença. — Você foi o primeiro.
E fez questão de ser o último também.
Ela continuou, ajustando os papéis sobre a prancheta como
me eu não fosse Logan Donovan, o homem que um dia foi dela.
— Agora se deita, senhor Donovan. Tenho um trabalho a
fazer.
— Tudo bem, doutora. Vamos fazer isso do seu jeito.
Deitei-me na maca com a camisa erguida, os músculos tensos
demais para disfarçar. A dor era real, mas não chegava nem perto da
que queimava por dentro.
Ela colocou as luvas sem dizer nada. Fria. Profissional. Como
se nunca tivesse me olhado com desejo. Como se nunca tivesse
gemido meu nome. Como se nunca tivesse me deixado acreditando
que era só eu.
— Vamos começar — disse, tranquila.
— Que empolgação a sua — murmurei.
Ela ignorou. Começou a pressionar a lateral da minha lombar
com técnica e firmeza.
— Se continuar tenso assim, vai piorar. Seu corpo está
travado, inflamado. Isso não é só físico.
— Jura, doutora? Agora também virou psicóloga?
Ela apertou um ponto e eu grunhi, mas não ia dar esse
gostinho para ela.
— Relaxa, Logan. Respira. Eu sei o que estou fazendo.
— Você sempre soube — murmurei. — Soube mentir, soube
fingir. Isso está no seu currículo também?
Ela congelou por um segundo. O silêncio foi mais cortante
que qualquer resposta.
— Isso não tem espaço aqui — ela disse, firme.
— Claro que não tem. Porque aqui é sua nova vida perfeita,
não é? Tudo limpinho, controlado, profissional.
Ela se inclinou um pouco, pressionando um ponto mais fundo.
— Logan, eu estou tentando ajudar.
— Faça a merda do seu trabalho e faça tão bem, para que eu
possa ir embora.
Ela parou. Tirou as mãos da minha pele.
— Me odeia tanto assim? — A voz dela cortou o ar, finalmente
escapando daquela fachada fria e profissional.
Ela largou as luvas sobre a bancada e virou pra mim com os
olhos cheios de raiva — e alguma coisa a mais por trás.
— Sabe de uma coisa, Logan? Eu tô pouco me fodendo pro
que você pensa. Sabe por quê? Porque você foi um filho da puta.
Falou as merdas que quis, e minutos depois estava fodendo outra.
Fiquei parado por um segundo. O sangue ferveu nas veias.
Avancei um passo.
— Fodi? — perguntei com um sorriso amargo. — Você viu?
Ou só inventou essa merda na sua cabeça para justificar o que você
fez?
— E eu te traí, Logan? — ela rebateu, a voz embargando. —
Você viu alguma coisa? Porque eu não fiz nada.
Ela respirou fundo, tentando recuperar o controle. Apontou
para a porta com firmeza.
— Acabou por hoje.
— Que foi? — provoquei. — A verdade dói pra caralho, não é?
Ela se virou de costas, como se não aguentasse mais olhar
para mim.
— Eu tô aqui para tratar sua lesão, Logan. Só isso.
— Ótimo. Então trata logo. Porque a merda que você fez essa
não esqueço com gelo e alongamento.
Ela ficou em silêncio.
Peguei minha jaqueta, dei dois passos em direção à porta,
mas parei.
Virei-me devagar, encostando a mão na maçaneta, e a
encarei por cima do ombro com um sorriso cínico, amargo.
— Ah, quase esqueci. Parabéns pela atuação, doutora. Fria,
técnica, distante. — Fiz uma pausa, o olhar fixo no dela. — Quase
acreditei que você não sente nada.
Ela respirou fundo, o maxilar travado, o peito subindo e
descendo com força.
— Não dá, Logan. — A voz dela saiu baixa, crua. — Não
vamos conseguir fazer isso desse jeito.
Soltei uma risada seca, sem humor nenhum.
— Sabe por que tá difícil, Lyanna?
Ela não respondeu.
Dei um passo para a frente, olhando direto nos olhos dela, a
voz grave, quebrada, honesta demais para alguém tão ferido.
— Porque mesmo depois de tudo, de cada maldita dúvida, de
cada cena que eu revirei mil vezes na cabeça, depois de tudo que
você fez, eu ainda sinto vontade de te beijar.
Ela congelou.
Eu me aproximei mais um centímetro, mas não toquei.
— E isso… — sussurrei, com raiva de mim mesmo. — Isso é o
que mais me fode por dentro.
Deixei a frase no ar e saí da sala antes que ela pudesse dizer
qualquer coisa. Se ela dissesse, eu não ia resistir.
56
Lyanna Callahan
Dias depois…
Desde aquela maldita confissão curta, crua e inesperada,
Logan passou a entrar e sair do consultório sem dizer uma palavra.
Cumpriu cada exercício, cada etapa do tratamento, com a precisão
de quem só quer uma coisa: terminar logo.
E eu também quero. Quero que isso acabe. Que essa
angústia saia do meu peito. Que essa presença constante dele pare
de bagunçar tudo dentro de mim.
Só que não é tão simples. Suspirei, sentindo o peso da
semana nos ombros, quando ouvi batidas na porta. Três toques
firmes. Quem seria a essa hora da manhã?
Levantei-me rapidamente, e fui até a porta. Ao abrir, me
deparei com Noah, parado ali com um sorriso no rosto, equilibrando
um urso de pelúcia gigante debaixo de um braço e uma garrafa de
vinho na outra mão.
— Esse é para o Asher — disse, erguendo o urso. — E esse
aqui é nosso.
Sorri de leve, surpresa.
— Nosso?
— Pipoca e vinho amanhã à noite o que acha? — brincou,
entrando. — A gente merece, vai. Depois de tanto tempo sem se
ver, ao vivo.
Fechei a porta e olhei discretamente na direção do corredor,
como se esperasse alguma sombra aparecer.
Ele percebeu.
— Relaxa — disse, lendo meus pensamentos. — Emma ficou
com o grupo. Eles não podiam perder mais uma profissional agora.
Ficou puxado desde que você, enfim, nos deixou.
— Não seja dramático.
— Mas ela vem assim que conseguir uns dias de folga —
completou Noah, colocando a garrafa de vinho na bancada da
cozinha. — Disse que tá morrendo de saudade do Asher e de você
também. Ficou toda derretida quando falei que viria aqui.
Soltei um sorriso fraco, me virando para abrir a geladeira,
mas para me distrair do que por necessidade.
— A gente também sente falta dela. Muito.
— Tio! — a voz animada do Asher cortou o ar enquanto ele
corria feito um foguete em direção ao Noah.
Noah se abaixou com os braços abertos e pegou-o no colo
com facilidade, girando-o uma vez no ar antes de abraçá-lo com
força.
— Olha o que eu trouxe para você! — Apontou com orgulho
para o urso quase do tamanho do próprio Asher.
Asher olhou para o presente com uma careta dramática.
— Isso é coisa de bebê!
Noah gargalhou alto, como se estivesse esperando
exatamente aquela reação.
— Sabia! Por isso também trouxe outra surpresa — disse,
abaixando a voz como quem entrega um segredo. — Ingressos para
o jogo de hóquei hoje à noite. Primeira fileira.
— O Logan vai tá lá? — Asher perguntou rápido,
empolgadíssimo.
Meu corpo se enrijeceu na hora, e Noah virou o rosto devagar
para me encarar, sério.
— Não é o time dele que vai jogar filho — respondi com um
sorriso. Logan é um astro e é claro que uma criança apaixonada por
hóquei seja fã.
Dei de ombros, como se aquilo fosse normal, e fiz carinho
rápido no cabelo do Asher.
— Mas olha só, querido, agora corre lá para Lú e toma um
banho rapidinho, vai?
— Tá bom! — ele respondeu.
Assim que ele sumiu pelo corredor, Noah se virou de frente
para mim, os braços cruzados e a expressão firme.
— Lya… você precisa contar sobre o Asher. E sabe disso.
Suspirei, recostando-me na bancada da cozinha.
— Eu sei. — Minha voz saiu baixa, quase um sussurro. — Eu
nem sei se o Logan um dia sonhou em ser pai.
Ele balançou a cabeça, caminhando até mim com passos
calmos.
— E se ele tirar o Asher de mim? Ou se ele magoar meu filho?
— completei, com a voz falhando.
Noah parou ao meu lado. segurou minha mão, e nem fazia
ideia que Logan estava bem aqui, algo que o contrato de sigilo não
me permitia contar.
— Qualquer um teria orgulho de ser pai daquele garoto.
Asher é luz, Lyanna. E você criou ele sozinha. Com amor, com garra.
O Logan pode ter raiva de você, mas quando olhar para o filho de
vocês… ele não vai conseguir ignorar.
Olhei para ele com os olhos cheios de água, mas ainda
tentando me manter forte.
— Eu só queria proteger o Asher. Sempre foi só isso.
— E tá tudo bem. Mas agora talvez seja a hora de pensar que
se esconder ainda o protege ou só adia o inevitável.
— Eu preciso ir para a clínica — falei não só pelo horário, mas
para fugir da conversa.
— Nos vemos à noite, para ir ao jogo juntos.
Logan Donovan
Eu estava sentado no banco à beira do rinque vazio da clínica.
Terminei de ajustar os patins nos pés e deslizei sobre o gelo. O
silêncio sempre me acompanhava ali. Era como se a clínica fizesse
questão de evitar encontros entre seus pacientes. Isso era ótimo.
Ouvi passos suaves atrás de mim. Achei que fosse um
funcionário qualquer, mas então aquela voz ecoou pelo rinque:
— Olha só. Daqui a pouco estará novo em folha.
Parei imediatamente, virando-me para ela. Lyanna estava ali,
parada na entrada, me observando com um sorriso pequeno nos
lábios.
Meu peito apertou na hora, e precisei controlar cada músculo
para não deixar transparecer nada.
— É… — admiti, devolvendo um sorriso discreto. — Suas
mãos são realmente mágicas.
Ela riu com suavidade. Fazia muito tempo que eu não ouvia
aquilo, que não via aquele brilho nos olhos dela perto de mim.
Tempo demais. E aquilo me deixou sem reação. Vulnerável.
— Não exagera — ela respondeu com calma. — É só
resultado de muito estudo e prática.
— Aceita logo o elogio, Lyanna — murmurei, num tom mais
baixo, quase divertido. — Você sabe que não costumo distribuir
muitos por aí.
— É, eu sei bem disso. — Ela riu novamente, desviando o
olhar por um segundo. — Aliás, você não é muito bom com elogios
mesmo.
Deslizei até mais perto da beirada do rinque, me apoiando de
leve na mureta que nos separava.
— Estou melhorando nisso também.
Ela se aproximou devagar, olhando fixamente para o gelo sob
meus patins.
— Está se sentindo melhor de verdade?
— Estou. Graças a você — admiti com a voz mais baixa
agora. — Eu tinha esquecido como era patinar sem dor.
Ela ergueu o rosto e nossos olhos se encontraram. Por um
segundo, eu quis estender a mão, tocá-la. Quis perguntar tudo que
ainda me sufocava à noite, mas só fiquei ali, parado.
— Você sempre amou isso aqui — ela comentou, olhando em
volta. — O gelo sempre foi o seu lugar.
— Sim, sempre foi. — Fiz uma pausa, analisando o rosto dela
com curiosidade. Tentei soar casual, como se a resposta não
importasse. — Você achou o seu lugar? Acabou se casando? Teve
filhos?
Lyanna ficou imóvel por alguns segundos. O sorriso dela
sumiu lentamente, e os olhos ficaram turvos por um instante antes
que ela conseguisse se recompor.
— Não... Eu não tive muito tempo para essas coisas —
respondeu. — As tais “mãos mágicas” são resultado de muitas noites
em claro estudando.
— Entendi. Ocupada demais para pensar em filhos ou
casamento — murmurei, observando cuidadosamente sua reação.
Ela desviou o olhar, claramente desconfortável com o rumo da
conversa.
Deslizei lentamente até a borda do rinque, parando bem perto
dela. Lyanna ficou imóvel, respirando fundo enquanto tentava
recuperar a postura profissional.
— Está sentindo dor? — ela perguntou num tom mais sério,
tentando mudar o rumo da conversa.
— Não exatamente — respondi baixo, encarando seus olhos.
— Não fisicamente.
Ela engoliu em seco e deu um pequeno passo para trás,
tentando aumentar a distância entre nós. Só que era tarde demais.
— Logan…
— Caralho… — murmurei contra os lábios dela, sentindo
minha respiração pesada. — O meu nome soa tão bem na sua boca.
Puxei Lyanna firme pela cintura, aproximando nossos corpos,
colando minha boca à dela com uma urgência que me consumia. O
calor, o cheiro, o gosto… era viciante demais para resistir. Ela tentou
lutar, mas por apenas alguns segundos; logo seu corpo cedeu,
relaxando contra mim, enquanto sua respiração acelerava.
— Logan… isso não é apropriado — sussurrou ofegante,
tentando recuperar a razão, mas suas mãos já estavam agarradas ao
meu peito, me puxando ainda mais perto.
— Então me empurra. Me afasta de vez — desafiei com a voz
rouca, mordendo suavemente seu lábio inferior, fazendo-a
estremecer em meus braços. — Eu tô tentando resistir desde o
maldito dia em que nos reencontramos. E olha que a raiva que eu
sinto por você me rasga inteiro por dentro.
Ela afastou o rosto por um instante, encarando-me nos olhos.
A intensidade naquele olhar fez meu corpo inteiro reagir.
— Se me odeia tanto assim… por que tá aqui fazendo isso? —
perguntou com uma voz fraca, quase derrotada, o corpo ainda
pressionado contra o meu.
— Porque odiar você é fácil, Lyanna — respondi com a
respiração pesada, acariciando a pele exposta do pescoço dela. —
Difícil mesmo é parar de te querer.
Um gemido baixo escapou dos lábios dela quando voltei a
beijá-la com força, anulando qualquer protesto restante. Ela agarrou
meu cabelo com intensidade, rendendo-se completamente.
— Logan, a gente não pode continuar com isso aqui… —
murmurou, ainda tentando resistir, embora seu corpo dissesse
exatamente o contrário.
— Vamos pra sua sala, então.
— Não! — disse firme, como se finalmente recobrasse a
consciência. — Não podemos.
Ela se afastou abruptamente, deixando o gelo e caminhando
rápido em direção à saída do rinque. Praguejei baixinho, tirei os
patins às pressas e fui atrás dela. Quando cheguei ao
estacionamento, Lyanna já estava parada em frente ao carro,
tentando controlar a respiração. O céu escurecia lentamente ao
nosso redor, e o silêncio só aumentava a tensão entre nós.
Sem dar tempo para ela pensar ou argumentar, segurei firme
o pulso dela e a puxei de volta contra mim, prensando-a contra a
lateral fria do veículo. Nossos corpos estavam próximos demais, o
olhar dela preso no meu, intenso e assustado.
— Na sua casa, então — sugeri rouco, encarando-a nos olhos.
— Não, Logan. — Ela tentou desviar o rosto, mas segurei seu
queixo com firmeza, fazendo-a me olhar novamente. — Em lugar
nenhum.
Sorri com malícia e peguei lentamente a mão dela, guiando-a
devagar pelo meu abdômen até alcançar o meu pau rígido,
pressionado contra o jeans.
Ela soltou um gemido abafado.
— A gente pode mentir o quanto quiser, Lyanna — sussurrei
ao pé do ouvido dela, provocando-a ainda mais. — Mas eu aposto
que você já tá molhada, pronta para mim. Para isso aqui.
Ela fechou os olhos, engolindo em seco, trêmula contra o meu
corpo.
— Logan… isso é loucura — murmurou com dificuldade, ainda
tentando resistir.
— Então vamos enlouquecer juntos. Só por hoje. Só uma
última vez — desafiei, deslizando lentamente a outra mão pela
cintura dela, puxando seu corpo com mais força contra o meu.
— Logan… — o protesto dela morreu nos lábios enquanto eu
voltava a beijá-la intensamente, sem deixar qualquer brecha ou
possibilidade de fuga.
Peguei as chaves do carro diretamente da mão dela antes que
pudesse pensar em protestar. Lyanna me encarou, surpresa e um
pouco assustada.
— Logan, o que você está fazendo?
— Te levando para o meu apartamento — falei, abrindo a
porta do carro dela.
— Logan… Eu não posso, eu tenho compromisso agora — ela
argumentou, tentando segurar minha mão, mas desviei
rapidamente.
Parei, olhando-a fixamente nos olhos.
— Você disse que não é casada e não tem filhos. Tem
namorado, então? — minha voz saiu mais áspera do que eu
pretendia.
Ela hesitou por um instante.
— Eu não disse exatamente isso…
Meu corpo ficou tenso imediatamente. Cerrei os dentes.
— Como assim? Tem namorado?
— Logan, só me deixa ir embora, por favor.
— De jeito nenhum — rebati, entrando no carro, ligando-o
com um pouco de dificuldade e ela entrou em seguida se sentando
ao meu lado e batendo a porta com mais força que o necessário.
Porra, fazia anos que não dirigia um carro manual. Ela me
encarou aflita, olhando a hora no celular, inquieta.
— É o Noah? — perguntei, incapaz de esconder a irritação
enquanto dirigia apressado em direção ao apartamento.
— Logan, por favor, só encosta o carro — ela pediu com a voz
embargada.
Bufei de raiva e frustração, virando o carro abruptamente e
estacionando num pátio vazio de uma loja fechada. Desliguei o
motor e ergui as mãos em um gesto sarcástico de rendição.
É
— Então, é ele? É o Noah?
Lyanna respirou fundo, nervosa e inquieta.
— Eu e Noah nunca tivemos nada — disse, sem olhar para
mim.
— Ótimo. Vou ligar para o pessoal da comissão médica vir me
buscar — respondi seco. — Não deve demorar mais de quarenta
minutos.
— Tudo bem — respondeu, olhando ansiosa novamente para
o celular.
Saí do carro, batendo a porta com força. Andei até a lateral
do veículo, encostando-me com impaciência ao passo que ela
continuava lá dentro, mexendo nervosamente no celular.
Eu estava fervendo, puto, com o pau duro latejando de tesão
reprimido, eu não ia ficar ali esperando como um babaca. Meu corpo
já tinha decidido por mim. A sensação dos lábios dela, do corpo dela
contra o meu.
Sem paciência, abri a porta dela com brutalidade, agarrando-
a firme pela nuca, puxando-a para fora e pressionando seu corpo
contra o carro. Levantei-a pela cintura, abrindo suas pernas e
deixando-a sentada sobre o capô frio.
— Eu sempre amei o fato de você gostar tanto de usar saia —
sussurrei contra o ouvido dela, com a voz rouca e cheia de desejo.
— Facilita as coisas para mim.
Lyanna tentou dizer algo, mas as palavras morreram nos
lábios dela no instante em que arrastei a calcinha dela para o lado
com urgência e enfiei dois dedos fundo na sua boceta, sem avisar,
sem dar tempo para pensar.
— Porra, Lyanna… — gemi contra o ouvido dela ao sentir o
quanto estava encharcada. — Olha só como você tá molhada, pronta
pra mim. Sua boceta tá implorando por isso desde que eu te beijei
naquele rinque.
Ela arqueou as costas, gemendo alto enquanto agarrava meu
braço com força.
— Logan… — gemeu, ofegante, a resistência desaparecendo
no instante em que comecei a movimentar os dedos dentro dela.
— Shhh… — murmurei, mordendo o pescoço dela. — Só
deixa acontecer. Você quer tanto quanto eu.
Lyanna gemeu contra meu pescoço, os dedos enterrados nos
meus cabelos à medida que eu pressionava meus dedos cada vez
mais fundo na sua boceta quente e molhada.
— Caralho, Lyanna, você não faz ideia do quanto eu tô louco
para te foder — murmurei contra o ouvido dela, mordendo sua
orelha com vontade, enquanto sentia seu corpo inteiro estremecer
nas minhas mãos.
Ela abriu ainda mais as pernas, rendendo-se completamente
ao meu toque, e me puxou com mais força, sua respiração
entrecortada de desejo e excitação.
— Logan, por favor... eu quero você dentro de mim agora —
suplicou com uma voz rouca e desesperada.
Aquele pedido era tudo que eu precisava ouvir.
Sem hesitar, abri rapidamente o cinto e o zíper da calça,
puxando o jeans para baixo apenas o suficiente para libertar meu
pau duro, que pulsava ansioso para entrar nela. Segurei seu rosto
com firmeza e a beijei ao mesmo tempo que me encaixava
lentamente em sua entrada quente e apertada.
— Porra, Lyanna, você continua apertada como eu lembrava...
— rosnei com tesão, avançando fundo de uma vez só, sentindo a
boceta dela me envolver completamente.
Lyanna jogou a cabeça para trás com um gemido alto e
descontrolado, cravando suas unhas nas minhas costas.
— Sim, me fode... — implorou desesperada, rebolando contra
mim, fazendo meu pau deslizar ainda mais profundo dentro dela.
Não precisei de mais incentivo. Segurei firme seus quadris e
comecei a meter nela com força, estocando fundo, com movimentos
rápidos e intensos, preenchendo-a por inteiro. Arrancando dela um
gemido mais alto, mais desesperado, mais entregue.
— Isso... assim... não para! — Lyanna gritava, perdida na
sensação do prazer, seu corpo se contorcendo enquanto eu a fodia
cada vez mais forte.
Passei a mão por baixo da blusa dela, apertando seus seios,
sentindo os mamilos duros sob os dedos, à proporção que minha
boca devorava seu pescoço, deixando marcas.
— Você é tão gostosa... porra, que boceta deliciosa... —
murmurei entre dentes, enlouquecido com o quanto ela me
apertava.
— Logan... eu vou gozar... — ela avisou, tremendo
violentamente contra meu corpo.
— Então goza pra mim, Lyanna — ordenei rouco, acelerando
ainda mais o ritmo, metendo com intensidade, sentindo meu pau
latejar prestes a explodir.
Ela cravou as unhas no meu ombro, gemendo meu nome alto
conforme seu corpo se contraía fortemente ao redor do meu pau,
chegando ao orgasmo de forma intensa, descontrolada, me
apertando tão forte que eu perdi o controle por completo.
— Porra, Lyanna... eu tô gozando... caralho! — grunhi,
enterrando-me fundo dentro dela uma última vez, derramando toda
minha porra quente dentro da sua boceta ainda pulsante.
Ficamos ali, respirando pesado, por alguns minutos.
Afastei-me lentamente, ainda segurando-a firme pela cintura.
Encarei aqueles olhos escuros, agora repletos de um desejo saciado.
— Isso não pode acontecer de novo, Logan… — Lyanna
murmurou com a voz ainda fraca, tentando recuperar a razão.
Sorri devagar, com uma malícia inegável, aproximando meus
lábios dos dela novamente:
— Tarde demais para isso, doutora.
Agora que eu senti você de novo, não vou conseguir parar.
57
Lyanna Callahan
Dirigi de volta para casa com as pernas falhando, o volante
firme entre as mãos, mas os pensamentos totalmente fora de
controle. O corpo ainda ardia. O cheiro dele ainda estava em mim.
Misturado ao meu. Na pele. No meio das pernas. No pescoço.
Merda, Lyanna. O que você acabou de fazer?
O silêncio dentro do carro era ensurdecedor. Cada batida do
coração soava como um lembrete do quanto eu tinha cruzado uma
linha — profissional, emocional, racional.
Estacionei com pressa e entrei no apartamento como se o
chão fosse desabar a qualquer momento. Passei pela sala sem dizer
uma palavra e segui direto para o corredor. Do quarto, ouvi o som
abafado de risadas.
Noah estava sentado no tapete com Asher, jogando alguma
coisa no celular dele. Os dois levantaram os olhos assim que apareci
na porta.
Noah me encarou por alguns segundos, como se soubesse,
como se lesse nos meus olhos o que tinha acabado de acontecer.
Mas ele não disse nada. Só me observou em silêncio, como
sempre fazia quando percebia que eu estava em frangalhos e não
queria admitir.
Eu não consegui sustentar o olhar. Desviei e fui direto para o
banheiro.
Fechei a porta atrás de mim com um pouco mais de força do
que o necessário. Me apoiei na pia por alguns segundos antes de
finalmente encarar meu reflexo no espelho.
Meus lábios ainda estavam inchados. A marca dos beijos dele,
o rubor nas bochechas, o cabelo bagunçado. Tudo nele ainda estava
em mim.
Sem pensar duas vezes, comecei a tirar a roupa com
movimentos apressados. Abri o chuveiro e entrei antes mesmo da
água esquentar. Precisava disso. Precisava que a água levasse
embora os vestígios do que acabou de acontecer. O toque. O cheiro.
O gosto. A culpa.
Por mais que a água escorresse pelo meu corpo, nada
conseguia apagar o que ele despertava em mim.
Abracei-me debaixo da ducha, deixando a água cair com força
sobre os ombros. Fechei os olhos, tentando controlar a respiração.
Mas bastava um segundo de silêncio para sentir tudo de
novo.
O calor da boca dele. Os gemidos. A forma como ele dizia
meu nome. A raiva misturada com desejo.
Saí do banheiro com o corpo ainda quente, mas por motivos
completamente diferentes da água. Enrolada no roupão, cabelo
úmido pingando nos ombros, o rosto ainda marcado pelas emoções
que eu tentava esconder de mim mesma.
Caminhei devagar pelo corredor e me tranquei no quarto com
a sensação de que o chão podia sumir a qualquer momento.
Encostei a porta e respirei fundo, tentando colocar a mente no lugar.
Minha pele ainda carregava o toque dele, minha cabeça, o som da
voz dele, e meu corpo, o desejo de sentir tudo de novo.
Ouvi a voz de Noah do outro lado da porta. Ele estava calmo,
sempre era.
— Estamos só esperando por você... — disse com gentileza.
— Mas, se não quiser ir, não tem problema. A gente entende.
Fiquei em silêncio por um instante, encarando meu reflexo no
espelho da penteadeira. Eu parecia outra. Cansada, bagunçada,
vulnerável.
Mas então pensei em Asher. No quanto ele queria aquilo. No
quanto ele esperava aquele momento.
Abri a porta.
Noah estava parado com Asher ao lado, já com o boné do
time na cabeça e a maior empolgação do mundo estampada no
rosto.
— O Asher quer muito ir ao jogo — disse, com um sorriso
leve.
— Vai ser um programa de menino, né, Asher?
— Sim!!! — Ele pulou no lugar, vibrando.
Suspirei e forcei um sorriso maior, tentando ignorar o caos
dentro de mim.
— Então tudo bem. Podem ir. — Olhei para Noah. —
Obrigada por fazer isso.
Ele assentiu com um olhar compreensivo, como se dissesse
“você não precisa explicar”.
— Tudo bem — respondeu, pegando a mão de Asher. —
Vamos, campeão?
— Vamos!!! — gritou animado, saindo correndo na frente.
Fiquei na porta observando os dois irem embora. E quando a
porta finalmente se fechou, deixei meu sorriso morrer.
Ficar sozinha era tudo que eu não queria naquele momento,
mas era exatamente o que eu precisava.
Logan Donova
A única coisa que martelava na minha cabeça durante o
caminho de volta para o apartamento era: o quanto eu fui idiota.
Idiota por tê-la deixado ir.
Idiota por não ter lutado.
Idiota por ter me afundado no orgulho.
Se ela estava dividida naquela época, eu deveria ter insistido.
Devia ter batido na porta dela, gritado, implorado, fodido o mundo
se fosse preciso. Mas eu não fiz nada. Eu deixei.
Eu deixei Lyanna ir embora com outro.
A raiva ainda queimava dentro de mim, viva, pulsando, mas
agora, ela não era sozinha. Tinha companhia. Tinha o maldito
desejo, o tesão absurdo que ela fazia despertar com uma simples
troca de olhares.
Caralho, eu ainda sentia o cheiro dela na minha pele. O gosto
dela na minha boca. A porra da sensação do corpo dela colado no
meu como se nunca
tivéssemos nos separado.
E isso me consumia.
— Que merda, Logan... — murmurei sozinho, apertando o
volante com tanta força que meus nós dos dedos ficaram brancos.
Eu deixei ir embora a única mulher que me tirava do eixo, que
me enlouquecia com um toque, que encaixava perfeitamente na
cama e, de algum jeito que eu odiava admitir, também encaixava
dentro do caos que sou por dentro.
E agora, cada parte do meu corpo gritava por ela. Não só
meu pau. Tudo em mim.
Minha mente. Meus malditos sentimentos. O vazio que ficou.
58
Lyanna Callahan
A piscina da clínica era reservada para sessões especiais de
recuperação de pacientes com lesões mais graves, que precisavam
de exercícios sem impacto, guiados com precisão.
Quando me disseram que o horário das 10h estava agendado
para Logan, meu estômago revirou. Sessões na água exigiam
proximidade. Contato direto. Mãos que seguram, que guiam, que
tocam.
E eu ainda não estava pronta para isso.
Mas aqui estava eu, com o uniforme de treino da clínica,
cabelo preso e pés descalços no deck molhado, observando Logan
entrar com lentidão na piscina aquecida, o tronco nu, o olhar
distante. Ele estava mais quieto do que o normal. O que, nele,
sempre significava que a raiva estava fervendo por dentro, pronta
pra transbordar. A verdade é que nenhum de nós estava bem. Não
nos perdoamos. Não conversamos. Só ignoramos o passado como se
ele tivesse desaparecido. Mas o problema é que, no meio de toda
essa merda, ainda existe tesão. E isso é uma merda.
— Vai me dar ordens ou só ficar me olhando desse jeito? —
ele perguntou, com o tom rouco que sempre soava mais como uma
ameaça do que uma provocação.
— Quero que caminhe até o outro lado. Lentamente. Só para
adaptação da musculatura. A água reduz o peso do corpo, mas se
você tiver tensionado, vai sentir tudo.
Ele não respondeu. Apenas começou a andar, com passos
pesados, a água cobrindo até a metade do abdômen.
Meu olhar se prendeu nos músculos das costas dele, nas
cicatrizes antigas, na curva da cintura que eu conhecia bem demais.
Respirei fundo e entrei também, caminhando pela lateral até me
posicionar atrás dele.
— Agora, quero que dobre os joelhos e faça o movimento de
avanço. Como se fosse um ataque no rinque. Devagar.
Ele me olhou por cima do ombro.
— Você ainda não consegue falar comigo normalmente, não
é?
— Estou aqui como sua fisioterapeuta.
— É sempre essa desculpa. Profissionalismo. Ética.
Impessoalidade. — Ele sorriu de lado. — Uma piada, vinda da
mulher que gemia o meu nome contra a parede do meu quarto.
Senti o sangue subir para o rosto.
— E você continua usando o sexo para fugir de tudo que
realmente importa.
Ele avançou um pouco na água, o corpo tenso, e então
parou.
— Eu me afastei porque achei que você me traiu — ele disse,
com a voz baixa. — E você sumiu porque achou que eu te substituí
em questão de minutos.
— Acreditar era mais fácil do que perguntar — retruquei,
amarga. — Você me humilhou na frente de todo mundo, Logan. As
palavras, o desprezo, aquilo me destruiu. Doeu mais do que eu
quero admitir. Aquela cena acabou comigo, tanto quanto ver você
com Emily.
— Eu não fiquei com ela naquela noite. Nem depois — disse
com firmeza. — E você não vai mesmo dizer que não me traiu?
Suspirei, sentindo o peito apertar. Tudo aquilo me cansava. E
ainda doía.
— Isso não faz o tempo voltar, Logan. Não apaga as coisas
horríveis que você me disse, nem muda o que aconteceu depois.
Um silêncio denso pairou entre nós, só quebrado pelo som da
água sendo empurrada.
— Vem até mim. Agora a gente vai trabalhar o equilíbrio —
disse, tentando voltar para o que realmente importava. — Coloque
as mãos nos meus ombros. Eu vou te apoiar.
Ele hesitou por um segundo. Mas então, lentamente, suas
mãos tocaram meus ombros. O toque era firme. Pesado.
— Você tá tremendo — ele sussurrou, tão perto que eu senti
seu hálito quente no meu rosto.
— É só frio.
Mentira.
Ele me olhava com aquele olhar que dizia tudo o que a boca
dele se recusava a confessar: “Eu ainda quero você. Mas eu também
te odeio.”
— Vai me deixar cair se eu me desequilibrar? — ele provocou.
— Não. Eu sou profissional. Lembra?
— Eu me lembro de tudo — ele sussurrou mais baixo, a boca
perto demais da minha. — Cada som que você fazia. Cada lugar
onde minha boca te arrepiava. E isso não tem nada a ver com a
porra do meu tratamento.
Meu coração disparou, minha respiração falhou. Mas continuei
segurando firme.
— Acha mesmo que pode me quebrar outra vez, Logan? —
perguntei, engolindo em seco.
— Eu acho que você já tá quebrada, Lyanna. Igual a mim. —
Ele sorriu com dor, e então se afastou. — Só que a gente é teimoso
demais para admitir.
Eu já ia virar as costas quando a porta lateral da piscina se
abriu com um rangido leve.
Noah entrou com os olhos varrendo o ambiente, e parou
assim que nos viu.
— Merda — Logan resmungou baixo, e eu senti o ar ao meu
redor mudar.
Noah deu um passo hesitante.
— Desculpa... achei que você já tinha encerrado o turno,
Lyanna — disse Noah, entrando devagar, com um casaco dobrado
nos braços. — Começou a nevar lá fora e, como sempre, você tá de
saia e sem meia térmica. Vai acabar congelando.
— Já terminamos — respondi rápido. Olhei para Logan, que
mantinha os braços cruzados, o maxilar trincado. — Logan, a gente
se vê amanhã.
Ele não respondeu. Só desviou o olhar, os olhos fixos na
parede como se estivesse tentando segurar algo que queria cuspir.
Mas o corpo dele dizia tudo.
— Logan? — Noah disse, num tom mais baixo, finalmente
registrando o que estava acontecendo. — Você tá tratando o...?
Logan não respondeu. Nem virou o rosto. Saiu da água num
movimento brusco, pesado, jogando a toalha nos ombros como se
arrancasse a paciência junto com as gotas que pegaram do corpo.
Secava o cabelo como se estivesse esfolando a raiva. Os
dedos apertavam o tecido, os músculos do ombro pulsavam de
tensão. Ele nem olhou para mim quando passou.
Mas antes de sair pela porta, parou. Deu uma risada baixa,
sarcástica. Uma daquelas que doem mais do que qualquer grito.
— Boa noite, doutora Callahan — murmurou, sem se virar.
E saiu.
— Você tá tratando o Logan Donovan? — Noah perguntou de
novo, agora com os olhos presos aos meus.
Engoli em seco.
— Sim. Mas não era para você saber disso. Na verdade,
ninguém devia saber.
— E por que não?
— Eu assinei um contrato de sigilo com a comissão médica e
com a clínica. É confidencial. Nenhum profissional pode comentar ou
expor o tratamento dele — expliquei, o tom mais baixo do que eu
pretendia. — Eu não podia contar, Noah.
Ele ficou quieto por um tempo. Os olhos se desviaram dos
meus, e ele balançou a cabeça como quem digere uma verdade
amarga.
— Entendi. Mas porra, Lya…
— Vamos sair daqui — murmurei, tentando controlar o nó na
garganta, eu sabia o que ele falaria, sobre Asher de novo.
Logan Donovan
Meus passos ecoavam no corredor gelado, e o som das gotas
escorrendo do meu corpo era o único ruído além da merda pulsando
nas minhas têmporas.
Noah. Claro que seria ele. Sempre ele.
Fechei a mão em punho, tão forte que senti os nós dos dedos
estalarem. O casaco dele nas mãos, aquele tom cuidadoso, como se
fosse o maldito guardião da Lyanna.
"Começou a nevar, Lyanna."
"Você tá de saia e sem meia térmica."
Caralho!
Joguei a toalha contra a parede com força, o tecido batendo e
escorregando até o chão. Minha respiração estava descompassada, o
peito subia e descia como se eu tivesse saído de uma briga.
Ela nem tentou explicar. Nem negou nada. Como se o outro
filho da puta estar ali, trazendo casaco e se preocupando com a
temperatura do corpo dela fosse normal.
— Filha da puta... — murmurei entre dentes, chutando o
banco de madeira no canto com tanta força que ele virou. — Ela
sempre faz isso. Me quebra e finge que tá tudo certo.
Sentei-me no banco com as mãos nos cabelos, puxando com
força. O ciúme queimava, mas o que doía mais era saber que ainda
me importava.
59
Logan Donovan
Eu encarava a paisagem de Montreal pela varanda do
apartamento, os cotovelos apoiados no parapeito gelado.
Sentia-me um prisioneiro.
Não podia sair às ruas sem o risco de ser reconhecido.
Nenhuma liberdade, nenhuma distração. O rinque estava ali, a
poucos quilômetros, mas a simples ideia de pisar no gelo agora me
deixava nauseado. E a clínica… bom, estar na mesma sala que
Lyanna era um exercício de tortura emocional diária.
Eu só queria voltar para Toronto. Para os jogos. Para minha
vida de verdade.
Essa aqui? Isso aqui era um limbo com paredes brancas.
O celular vibrou em cima da mesa. Eu quase não quis olhar,
mas o nome que apareceu na tela me fez revirar os olhos antes
mesmo de atender.
— Que foi agora? — atendi seco, já sabendo o tom de
cobrança que vinha do outro lado.
— Estou chegando em Montreal daqui a dois dias — disse
meu pai, sem nem cumprimentar. — Quero ver de perto como anda
esse tratamento.
Respirei fundo, tentando conter o impulso de jogar o celular
da varanda.
— Vai cruzar o país para isso?
— Você sumiu. A imprensa tá perguntando, e eu odeio não
saber o que responder. Então, sim, Logan, eu vou até aí.
Fechei os olhos, apertando a mandíbula.
— Ótimo. Traga a mamãe, ela já passa muito tempo sozinha.
— Traga resultado — ele rebateu. — E trate de estar no gelo
quando eu chegar. Não quero encontrar meu filho trancado num
apartamento feito um adolescente mimado.
A ligação caiu. Sem despedida.
Tudo nele era sempre cobrança. Nunca pergunta. Nunca
preocupação. Voltei a encarar a cidade, os olhos perdidos na neve
que começava a cair lá fora.
Peguei um boné, os óculos escuros e joguei o sobretudo
sobre os ombros. Desci pelo elevador e, assim que a porta se abriu,
o funcionário do time, o encarregado de garantir que eu
comparecesse à maldita clínica, levantou-se como um soldado em
alerta.
— Senhor Donovan, o carro está pronto. A clínica já foi
avisada da sua chegada para a sessão das nove.
— Que maravilha — murmurei, sem parar de caminhar.
Ele apressou os passos para me acompanhar.
— O senhor tem apenas vinte minutos até o início da
avaliação. Posso acompanhá-lo até lá.
— Não vou — falei, sem sequer olhar na direção dele.
Ele empalideceu.
— Desculpe, senhor? A sessão é obrigatória. O relatório vai
ser apresentado à comissão técnica e ao seu pai em dois dias.
Precisa comparecer.
Parei, me virei devagar e o encarei com frieza por cima dos
óculos.
— Hoje vou dar uma volta. Não vou para a clínica.
— Senhor, se eu não o levar à clínica, vou ter que notificar à
diretoria. Vai constar como recusa ao protocolo de recuperação.
— Então anota aí: recusa deliberada e consciente. Bota em
caixa alta, se quiser. — Sorri de lado, irritado.
O cara engoliu em seco. Não respondeu. Apenas assentiu
com um aceno rígido.
— Bom passeio, senhor Donovan — disse ainda parado na
porta, como se esperasse que eu mudasse de ideia no último
segundo.
Parei de andar e me virei para ele.
— Sabe de uma coisa? — disse, erguendo levemente os
óculos escuros. — Você podia não notificar isso… e vir dar uma volta
comigo. O que acha?
Ele me olhou confuso, como se não estivesse acostumado a
ser convidado para nada fora do protocolo.
— Não estou afim de andar sozinho — completei, mais direto.
Ele hesitou por um segundo, depois pegou o casaco sobre a
cadeira e suspirou antes de vesti-lo.
— Certo… por que não?
Descemos em silêncio por uma quadra até eu quebrar o gelo.
— Qual o problema, então? — ele perguntou, aproveitando o
que parecia um raro momento de liberdade ao meu lado.
— O problema é que a mulher que me tira do eixo… é a
mesma responsável pela minha recuperação.
— A doutora Callahan — ele disse com um meio sorriso, como
quem já sabia e não queria se meter.
— Ela mesma — assenti. — E eu sou um filho da puta que
ainda sente alguma coisa por ela.
Ele soltou um risinho discreto, passando a mão pela nuca, e
não respondeu, mas também não precisava.
A gente parou perto de uma praça arborizada e atravessamos
a rua. Me sentei em um dos bancos, aproveitando o vento leve e o
barulho de risadas infantis ao redor. O cara se sentou ao meu lado,
tirando o boné que usava.
Foi quando vi, Asher.
Pequenininho, correndo de um lado para o outro com o
casaco aberto, bochechas coradas do frio, um sorriso que ocupava o
rosto todo.
— Asher! — chamei-o, levantando os óculos para que ele me
reconhecesse. Pisquei o olho.
Ele parou no mesmo instante, olhou bem… e abriu um sorriso
ainda maior, disparando na minha direção.
— Uaaau! Logan! Você aqui?
— Pois é, pequeno. Dando uma volta.
— Vamos jogar? — ele perguntou, já se ajeitando ao meu
lado, ofegante da corrida.
— Aqui não tem pista, pequeno. — Sorri.
— Hum... então vamos no rinque?
A babá correu até ele, nervosa.
— Asher! Deixa o moço, ele deve estar ocupado...
— Está tudo bem — eu disse, levantando a mão. — A gente
estava só caminhando.
— E que tal um pega-pega? — sugeri, com um sorriso
enviesado. — Aposto que você não me pega.
Os olhos dele brilharam.
— Vamos brincar juntos?
— Claro. — Olhei para o cara do meu lado e dei um sorriso de
canto. — Anda, dá tempo de esquecer que a gente tem vida adulta
por uns minutos.
O funcionário riu, sem graça, mas se levantou.
Depois de alguns minutos correndo, eu estava ofegante, com
a mão no joelho.
Asher parou bem na minha frente, com as bochechas
vermelhas e o cabelo bagunçado debaixo do gorro azul-marinho.
— Você não me pega — ele disse entre um fôlego e outro,
com o peito subindo e descendo rápido. — Não é mais lapido que
eu.
— Ah, é? — Ergui uma sobrancelha, desafiando. — Eu jogo
hóquei, garoto. Sou quase um super-herói no gelo.
— Eu também! — Ele abriu um sorriso orgulhoso. — A
mamãe disse que eu sou um foguete de patins.
Ri, balançando a cabeça.
— Aposto que é um foguete desgovernado.
Ele gargalhou. Aquela risada, caramba, ela batia em algum
lugar estranho no meu peito.
— Você já caiu jogando? — ele perguntou curioso, se
sentando no banco ao meu lado, cansado de tanto correr.
— Já. Uma vez eu escorreguei feio durante uma partida e fui
parar no colo do técnico adversário.
Asher arregalou os olhos.
— Sélio?
— Sério. Ele me xingou em francês e eu só conseguia rir.
Asher deu uma gargalhada gostosa e encostou a cabeça no
meu braço.
— Você é o meu jogadô favolito. Sabia?
Fiquei em silêncio por um segundo, só olhando para ele, que
parecia feliz, amado, e isso me deixou feliz também.
— Valeu, campeão — murmurei, pousando a mão sobre o
gorro dele. — Você também é o meu pequeno favorito.
Ele ergueu os olhos brilhantes para mim.
— Plomete que vai me ensinar a fazer umas coisas da hora no
gelo?
— Prometo — respondi sem pensar. — Só não conta para sua
mãe. Ela pode me processar se você quebrar um dente.
— Ela vai achar legal! — Ele riu de novo.
60
Lyanna Callahan
— Senhora Callahan — chamou a recepcionista, se
aproximando com o tablet nas mãos. — O senhor Donovan não
atendeu nenhuma das tentativas de contato. E hoje era o dia
agendado para realizar os testes clínicos, os que vão compor o
relatório da comissão técnica do time.
Fechei os olhos por um segundo, respirando fundo antes de
responder.
— Ele não veio. Eu não posso fazer nada quanto a isso,
infelizmente.
— O diretor da clínica acabou de ligar — ela continuou, com
um pouco mais de firmeza na voz. — Pediu que a senhora leve o
equipamento até o apartamento dele e realize o procedimento ainda
hoje. Diz que o prazo com a comissão é inadiável.
Suspirei pesadamente, recostando-me na cadeira com as
mãos no colo.
— Tudo bem — respondi, tentando manter a compostura. —
Me passe o endereço e prepare o equipamento. Eu mesma irei até
lá.
— Já está tudo pronto. A mala clínica está carregada e o
carro da unidade móvel está à disposição. É só assinar a saída.
Assenti, levantando-me devagar.
— Então vamos terminar logo com isso.
Peguei meu crachá e a prancheta, respirei fundo e caminhei
até a saída da clínica. Era fim de tarde e, com sorte, eu conseguiria
finalizar esse atendimento rápido e ainda chegar a tempo de jantar
com o Asher.
O endereço do Logan não ficava longe, o que, sinceramente,
me aliviava. Quanto mais rápido, melhor.
O carro da unidade me deixou na frente do prédio. Subi com
a mala clínica em uma das mãos e a prancheta na outra, o coração
batendo mais rápido do que eu queria admitir.
Quando parei em frente à porta, ela se abriu antes mesmo de
eu bater.
— Doutora Callahan — Logan disse, com aquele tom irônico
arrastado, encostado no batente, usando só uma calça cinza e uma
expressão debochada. — Que honra receber a melhor fisioterapeuta
do país na minha humilde residência.
— Vim fazer os procedimentos do protocolo — respondi, seca.
— Preciso preencher os dados para enviar à comissão técnica. Não
quero repetir isso, então se puder cooperar.
Ele deu um sorriso torto.
— Então era só isso? Não aparecer na clínica e você vem
pessoalmente até o meu apartamento? Que fácil.
— Não começa, Logan. — Empurrei a mala para dentro. —
Isso aqui é profissional. Eu quero terminar logo e ir pra casa jantar
com….
— Com?
— Não interessa, é a minha vida pessoal.
Ele arqueou uma sobrancelha e deu um passo para o lado,
me deixando entrar.
— Claro. Porque você sempre foi boa em separar as coisas,
né?
Fingi não ouvir.
Coloquei a mala sobre o sofá e comecei a tirar o equipamento
com os movimentos automáticos de quem quer terminar rápido. Gel,
eletrodos, cabos, controle digital. O visor acendeu com um bip
discreto.
— Deita de bruços no sofá. Vamos fazer a estimulação na
lombar.
Logan Donovan
— Ok, doutora — respondi com sarcasmo, fazendo o que ela
solicitou.
— Acho que o seu quadro está cada dia melhor, vai votar em
breve para a sua vida normal — ela disse passando o gel.
— Como é a sua vida? Você disse que não se casou, então o
que vocês são?
— Vou colocar os eletrodos agora — falou ignorando a minha
pergunta.
— Você vai jantar com ele?
Ela ligou o aparelho sem responder. Os primeiros impulsos
fizeram os meus músculos se contraírem e soltei um xingamento
abafado.
— Merda... esqueci como essa porra arde.
— Bem-vindo ao tratamento. Quer voltar a jogar, vai ter que
engolir um pouco da dor.
— Já engoli coisa pior. Tipo a imagem da mulher que eu
acabei de foder, sorrindo para outro cara.
— Logan...
— Cala a boca — rosnei, me virando de lado, sem se importar
com o fio preso nas costas. — Eu ainda sinto o gosto da sua pele na
minha boca, e horas depois vejo você com aquele merda.
— Eu não tenho que me explicar sobre nada da minha vida.
— Tem sim! — Levantei-me, arrancando os eletrodos de
forma bruta. O gel escorreu, mas não liguei. Segundos depois já
estava de pé, respirando pesado. — Porque você mentiu para mim!
— Logan, deita. O aparelho ainda não terminou.
— Dane-se o aparelho, Lyanna. Você queria terminar logo,
não queria? Então pronto... Terminamos.
— Você está tornando o meu trabalho difícil, Logan.
— Foda-se! — explodi. — Quando ele te beijar, lembra que fui
eu quem te ensinou a gostar de ser tocada daquele jeito.
Ela ficou parada. Sentada, me olhando com a porra dos olhos
castanhos dela ali, fixos nos meus. E a franja… Aquela maldita franja
ainda caía do mesmo jeito.
— Não que seja da sua maldita conta — ela disse, com a voz
trêmula. — Mas para ver se você me deixa em paz e me permite
trabalhar de uma vez por todas, eu vou repetir: eu nunca tive nada
com o Noah. Nem antes. Nem agora. E nunca vou ter. Porque somos
apenas amigos.
Quis rir. Quis socar alguma coisa. Caralho, eu não sabia o que
queria.
— Você quer que eu acredite nisso?
Ela se levantou devagar, com a prancheta na mão, sem me
dar espaço para continuar.
— Não. Eu não quero mais que você acredite em nada.
Porque você nunca confiou em mim mesmo.
Eu a puxei de uma vez só, esmagando nossos corpos, e colei
minha boca na dela como se aquilo fosse a única coisa capaz de
calar o inferno dentro de mim.
Foi um beijo sem doçura. Bruto. Desesperado.
A minha raiva encontrando a dela no atrito dos nossos
dentes, nas línguas que brigavam mais do que dançavam.
Ela tentou resistir, mas o corpo dela me traiu. As mãos
apertaram meus ombros, os quadris se encaixaram nos meus como
se buscassem algo que sabiam de cor.
— Tá vendo? Você ainda é minha. Essa boceta é minha, cada
pedacinho seu ainda me pertence. Vou te chupar tanto que você vai
implorar para eu parar.
Eu a puxei pela cintura, e ela tentou afastar minhas mãos em
uma resistência teimosa, mas inútil. Apertei-a contra a mesa da sala,
prendendo seu corpo entre meus braços.
— Para de lutar contra o que você quer e abre bem essas
pernas para mim. Já disse, vou te chupar inteira, lamber cada gota
que escorrer dessa boceta gostosa.
Passei a ponta da língua pelo seu pescoço, descendo
lentamente e deixando um rastro quente e úmido sobre sua pele
arrepiada. Sem nenhuma delicadeza, puxei a blusa dela, arranquei o
sutiã e chupei os mamilos duros e excitados com voracidade. Ela
gemeu deliciosamente, o som me deixando ainda mais duro e
faminto por ela.
— Eu vou encher essa boquinha linda de porra — disse,
colocando dois dedos em seus lábios carnudos. Ela lambeu meus
dedos devagar, provocando-me ao extremo, fazendo-me urrar de
tesão. — E você não vai desperdiçar nem uma gota.
Subi rapidamente a saia dela e tirei sua calcinha com pressa,
minha respiração pesada denunciando o desespero pelo seu corpo.
Deslizei meus dedos entre suas pernas abertas, tocando com firmeza
seu clitóris pulsante. Ela gemeu alto, desesperada, exatamente
como eu queria ouvi-la.
Sem esperar mais, caí de joelhos na frente dela, levantando
uma de suas pernas e apoiando-a sobre meu ombro. Rocei minha
barba pela pele delicada de suas coxas antes de mergulhar minha
língua quente profundamente nela, saboreando seu gosto doce e
inconfundível. Ela se agarrou à mesa, tremendo, enquanto eu
devorava sua intimidade com fome, chupando e lambendo cada
pedacinho até senti-la estremecer completamente.
— Por favor... — ela sussurrou, sem fôlego, tremendo,
completamente entregue aos meus toques.
Ergui os olhos, encarando-a com luxúria.
— Implora direito. Implora gostoso para eu te foder como só
eu sei.
Ela puxou os meus cabelos com força, e eu enfiei mais um
dedo nela, girando-os lentamente ao redor do seu clitóris. Um
gemido profundo escapou dos seus lábios e ela rebolou
deliciosamente contra minha boca.
— Isso mesmo, assim que eu gosto, você totalmente
entregue. — Chupei e mordisquei delicadamente aquela pontinha
dura e excitada, e seu corpo todo estremeceu em minhas mãos. —
Mas você não vai gozar ainda — falei, afastando-me por um
instante, observando-a com um sorriso provocante antes de me
aproximar novamente e lamber lentamente a pontinha de sua
orelha, sussurrando com voz rouca. — Hoje eu vou te foder gostoso,
vou preencher essa sua boquinha safada até você implorar por mais.
Voltei a ficar de joelhos diante dela, penetrando-a fundo com
dois dedos enquanto minha boca devorava com intensidade cada
centímetro daquela boceta molhada e quente.
— Agora goza para mim — ordenei com autoridade,
movimentando meus dedos mais rápido, chupando e sugando cada
pedacinho dela. Seu corpo inteiro se entregou ao prazer,
estremecendo forte, explodindo em um orgasmo intenso conforme
gemia descontrolada.
— Porra, como você é gostosa — murmurei satisfeito
Puxando-a pelos cabelos e guiando-a até a cama. Tirei
rapidamente a saia dela, deixando-a completamente nua à minha
disposição.
— Fica de quatro — ordenei, firme.
Ela obedeceu imediatamente, assumindo uma postura
deliciosamente provocante, exibindo-se com a carinha de puta que
me deixava louco. Tirei a calça e aproximei-me, esfregando meu pau
duro e lambuzado de prazer contra seu rosto corado.
— Chupa bem gostoso, porque eu vou foder essa sua
boquinha até o fundo.
Ela sorriu com malícia, abrindo os lábios lentamente para
receber minha ereção, deslizando suavemente sua língua quente ao
longo do meu pau, lambendo cada centímetro com sensualidade.
Segurei firme seus cabelos, guiando sua boca devagar, entrando
fundo até atingir sua garganta apertada. O calor úmido da sua boca
era quase insuportável de tão gostoso.
— Porra, que delícia… Isso mesmo, chupa fundo, me mostra
que você ainda é minha, inteira minha.
Ela aumentou o ritmo, chupando-me com avidez, deixando-
me ainda mais louco de tesão. Seus lábios apertados me sugavam
com força, e eu empurrava mais fundo, ouvindo-a gemer rouca ao
sentir meu pau preencher completamente sua boca.
— Você é uma putinha tão gostosa… Chupa com vontade,
porque eu vou te encher todinha de porra — ameacei-a com a voz
rouca, completamente dominado pelo prazer intenso que ela me
proporcionava.
Ela gemeu com minha glande pressionando o fundo da
garganta, os olhos lacrimejando enquanto me encarava com aquela
expressão de entrega que me deixava fora de controle. Puxei os
cabelos dela com mais força, controlando os movimentos, indo e
voltando, sentindo sua boca quente e molhada me sugar com
perfeição.
— Isso, engole esse pau, engole tudo — rosnei, arfando, a
respiração descompassada pelo prazer.
Ela apertava minhas coxas com as mãos, como se quisesse
que eu fosse mais fundo. E eu fui. Estocando sua boca com força,
ritmada, dominando-a por completo.
— Que boquinha safada, você nasceu para isso, para me
deixar louco — grunhi, os músculos da barriga se contraindo,
sentindo meu orgasmo se aproximar. — Mas não… ainda não. —
Puxei meu pau da sua boca com um estalo molhado, os lábios dela
inchados e o queixo todo melado.
Segurei seu rosto, erguendo seu olhar para o meu, e disse
entre os dentes:
— Eu ia encher sua boquinha, mas pensei melhor. Agora você
vai se deitar na cama, abrir bem essas pernas e aguentar.
Ela obedeceu, os olhos brilhando de tesão, o corpo trêmulo, e
se deitou de costas, abrindo as pernas lentamente, deixando-se
completamente. Subi por cima dela, roçando meu corpo quente no
dela, sentindo seu coração bater descompassado contra o meu
peito.
— Você tá sentindo? — sussurrei no ouvido dela, roçando a
glande na entrada da sua boceta molhada. — Tá sentindo o quanto
eu quero te foder até não sobrar nada além de gemidos?
— Sinto… eu sinto tudo — ela arfou, mordendo o lábio
inferior, os olhos semiabertos e cheios de tesão. — Me fode, por
favor, eu preciso de você agora.
Ela arqueou o quadril, implorando pelo que já era inevitável.
Atendi ao pedido sem demora, empurrando devagar, centímetro por
centímetro, até me enterrar por completo naquela boceta quente e
apertada.
— Aaaah… — ela gemeu alto, jogando a cabeça para trás, as
unhas marcando minha pele. — Isso… isso… continua… — implorava
entre gemidos desesperados, o corpo tremendo sob o meu.
— Isso… fica quietinha e sente — murmurei, começando a
estocar com força, o som molhado dos nossos corpos se chocando e
ecoando pelo quarto.
— Meu Deus… você tá me deixando louca — ela arfava entre
gemidos altos, apertando-se mais e mais ao meu redor, o corpo
inteiro se arqueando a cada estocada.
Inclinei-me e mordi os mamilos rijos, alternando entre
mordidas e lambidas, enquanto acelerava o ritmo.
— Goza de novo pra mim, porra — grunhi, sentindo-a cada
vez mais apertada. Ela se arqueou, gritando:
— Tô gozando! Não para, por favor, não para! — Ela tremia
inteira, as pernas envoltas em mim, o corpo explodindo em
espasmos e eu gozei junto, enterrando-me até o fundo, gemendo
forte contra sua boca.
A respiração ofegante dominava o quarto, nossos corpos
suados colados, corações acelerados batendo em sintonia.
— Você… me deixou… em pedaços — ela murmurou, ainda
trêmula, passando as mãos pelo meu peito.
Sorri contra sua pele, mordendo o lóbulo de sua orelha.
— Em pedaços? Que nada… — segurei seus quadris
novamente, erguendo-a. — Vou te desmontar. A noite está só
começando.
E com um movimento firme, virei-a de bruços, a bunda
empinada para mim, pronta para mais.
— Vamos ver quantas vezes sua garganta vai gritar meu
nome.
61
Lyanna Callahan
Adormeci nos braços de Logan, com o corpo ainda dolorido
em todos os lugares certos, e o cheiro dele grudado na minha pele.
O quarto estava em meia luz, e o único som era a respiração
ritmada entre nós.
Estiquei o braço devagar, tentando não o acordar, e alcancei
meu celular na mesa de cabeceira. A tela acendeu, já passava das
sete.
Eu estou me deixando levar de novo. Me permitindo ceder
aos desejos e às luxúrias.
— Continua dormindo. — A voz dele veio rouca e arrastada,
os olhos ainda fechados. Ele se esticou e começou a distribuir beijos
pelo meu braço.
— Logan, eu preciso que você se levante. Tenho que fazer os
testes, mandar o relatório para a comissão — falei baixo, tentando
manter a firmeza que já tinha se despedaçado algumas vezes.
Ele abriu um olho e soltou uma risada rouca.
— Sério isso, Lya?
— Sim. Eu vim aqui por causa disso, lembra? Não posso
voltar para clínica sem terminar.
Ele rolou na cama, jogando a cabeça contra o travesseiro.
— Que porra! Já sei. Agora é aquela hora em que você volta
com sua máscara fria e profissional.
— O que você esperava que acontecesse, Logan?
— Que você relaxasse, porra! Que ficasse aqui. Acabamos de
transar como se o mundo fosse acabar, e agora você já está com
uma prancheta imaginária na mão?
— E agora a gente volta para realidade — respondi, me
levantando e pegando minha roupa no chão. — Onde você é o astro
do hóquei e eu sou a fisioterapeuta contratada para te recuperar.
Você fica bom, volta para sua vida e eu continuo aqui, tratando
outro atleta machucado.
— Eu penso em me aposentar às vezes.
Parei por um segundo. Me virei, encarando-o com a camisa
ainda nas mãos.
— Não fala besteira. Seu pai teria um ataque.
— A vida é minha, Lyanna — ele rebateu, sério.
— Jura? E quando foi a última vez que você viveu como
Logan? Só Logan. Sem as câmeras, sem a porra da NHL, sem a
pressão do seu pai para que você seja Nathan?
— Logan também queria tudo isso, Lya. Eu sonhei com isso
desde moleque. Mas...
— E você conseguiu. É um astro. Tem o mundo aos seus pés.
— E não quero voltar para esse mundo tendo que te deixar
para trás — ele murmurou, baixo, quase amargo. — Não de novo.
— Você não sabe o que tá dizendo — rebati.
— Claro que sei.
O celular vibrou na minha mão. A tela mostrava a mensagem
da Lú:
“Asher ficou esperando para o jantar, mas acabou
dormindo no sofá. Está tudo bem, mas achei que você
gostaria de saber.”
— Merda!
— Algum problema?
— Eu preciso ir. Chegue à clínica amanhã bem cedo. A gente
faz os testes e finaliza o que precisa.
— Eu serei o primeiro a chegar. Precisamos terminar essa
conversa — ele respondeu, com os olhos presos em mim como se
quisesse segurar algo que já tinha escorregado das mãos uma vez.
Vesti minha blusa, peguei o casaco e coloquei o equipamento
na mala.
— Você pode... — ele começou, meio hesitante, o celular em
mãos. — Me dar seu número? Pra... sei lá, caso eu precise.
Hesitei por meio segundo. Mas aceitei o celular. Digitei.
— Aqui está. — Entreguei o celular de volta, sem encará-lo
por muito tempo.
Ele pegou o aparelho com calma, os dedos roçando nos meus
por um segundo a mais do que deveriam.
— Até amanhã, doutora — murmurou, com um meio sorriso
que não alcançava os olhos. — Mais uma vez me despeço de você…
e ainda odeio esse momento tanto quanto odiava antes.
Minhas mãos apertaram a alça da bolsa com força. Respirei
fundo, mas não disse nada.
Porque qualquer palavra naquele instante poderia abrir a
ferida que eu estava lutando tanto para manter fechada.
E então virei as costas e saí.
Dois dias depois…
— Qual é o problema, Lyanna? — perguntou Zac, um dos
atletas de hóquei que eu tratava há algum tempo. Estava sentado na
beira da maca, enquanto eu organizava os materiais da consulta
domiciliar. — Deixa o Asher entrar comigo no rinque antes do jogo.
Vai ser só no comecinho.
— Não sei, Zac... ele é muito pequeno. E a pista pode estar
escorregadia demais.
— Doutora Callahan, o garoto já me pediu isso umas cinco
vezes — ele disse, jogando um olhar cúmplice para o pequeno ao
meu lado. — Ele tá animado.
Suspirei, cruzando os braços e olhando de relance para Asher,
que já sorria como se tivesse ganhado um prêmio.
— Quando é o jogo?
— Hoje à noite. Nem é jogo grande. É coisa leve. Não vai ter
imprensa nem confusão.
Hesitei mais um segundo.
— Tá bom. Tá bom... vou deixar. Mas você cuida dele
direitinho, Zac.
— Aê! — ele vibrou, batendo palmas e piscando para Asher,
que já fazia um sinal de "legal" com os dedinhos. — Tá vendo,
baixinho? Amanhã a gente entra juntos no rinque.
— Eu posso mostla minhas habilidades, zummm, sou rápido!
— disse Asher, imitando um foguete com as mãos e girando sobre os
pés.
Zac gargalhou alto.
— Acho que o treinador vai amar ver essas habilidades. O que
você acha de chegar um pouquinho antes do jogo? A gente aquece
juntos.
— Zac... — comecei, em um tom de advertência.
— Relaxa, doutora — ele disse, ainda rindo. — Você vive
sempre tão tensa... parece que carrega o mundo nas costas.
— A consulta domiciliar acabou, Zac — cortei, fechando a
maleta com um clique seco. — Vamos, Asher.
— Tchau, Zac! — Asher gritou, dando tchauzinho com as duas
mãos.
— Até mais tarde, campeão — Zac respondeu com um sorriso
verdadeiro, batendo no peito como se fizesse parte de um clube
secreto que só os dois entendiam.
Peguei a mão de Asher e saímos juntos.
No início da noite, Asher já estava pronto. Vestia a camisa
oficial do time com o número de Zac nas costas, o boné virado para
trás e segurava firme o pequeno taco de brinquedo como se fosse
feito de ouro.
— Mamãe, eu tô lindo? — perguntou, girando em frente ao
espelho da sala.
— Tá maravilhoso, meu amor. Um verdadeiro jogador. —
Sorri, me abaixando para ajeitar a gola da camisa dele.
— O Zac vai me esperar lá no rinque, né?
— Vai sim. Ele disse que você é o convidado especial da
noite.
— Então eu vou fazer o gol mais rápido do mundo. Pshhhhhh!
— Ele fez um som de foguete e correu pela sala, chutando o ar
como se patinasse.
Peguei minha bolsa, chequei os documentos e me vesti
rápido, escolhendo um sobretudo grosso e as botas forradas. O frio
lá fora estava cortante, mas Asher insistia que não queria usar gorro,
“porque os jogadores não usam no gelo”.
— A gente está indo para ver o jogo, não jogar, pequeno
teimoso — brinquei, mas deixei passar. Ele estava radiante demais
para ser contrariado.
Fechei a porta do apartamento com um peso no peito. Era
uma noite especial para ele, mas eu sentia medo, medo de que
alguém o visse, medo de que ele fosse filmado.
Pegamos o carro e fui dirigindo em silêncio, ouvindo Asher
cantarolar no banco de trás, feliz da vida. Eu só rezava para que
fosse uma noite tranquila.
Quando chegamos, o estacionamento já estava movimentado.
Vi algumas famílias entrando com crianças, adolescentes com
camisetas do time, o burburinho animado que antecede qualquer
partida.
Asher saltou do carro com energia, quase esquecendo o
casaco.
— Ei! — o chamei, rindo. — Sem congelar hoje, campeão. A
gente combinou.
Ele voltou e deixou que eu colocasse o casaco, mesmo
revirando os olhos como se aquilo fosse o fim da liberdade.
— Tá bom, mamãe. Mas é só até o aquecimento, depois eu
tiro.
Caminhamos em direção à entrada lateral onde Zac disse que
nos encontraria, e meu coração começou a acelerar. No momento
em que chegamos ao saguão reservado para convidados e staff, Zac
apareceu com o uniforme meio desabotoado e um sorriso largo no
rosto.
— Aí está meu parceiro de gelo! — gritou, abrindo os braços.
— Vem cá, campeão!
Asher correu até ele, e Zac o ergueu como se fosse um
troféu.
— Tá pronto para arrasar?
— Tô sim! Posso dar um grito na entrada?
— Pode até fazer dancinha se quiser. — Zac riu. — Vamos
causar.
Assisti àquela cena com um nó na garganta.
— Lyanna... fica tranquila, tá? Ele vai ficar comigo o tempo
todo. Não deixo nem tropeçar no gelo — garantiu, guiando Asher
pela mão.
Assenti com um sorriso fraco.
— Eu sei. Obrigada, Zac.
E ali fiquei, observando meu filho ser levado para o centro de
um universo que, por ironia do destino, sempre pertenceu ao pai
dele e que Asher também amava.
62
Logan Donovan
— Qual a importância desse jogo, afinal? — perguntei,
jogando o celular no sofá e encarando meu pai, que desde que
chegou a Montreal não largava o telefone. Já tinha falado com
empresários, treinadores, agentes e até com um jornalista, tudo em
menos de uma hora.
Ele nem olhou para mim enquanto respondia.
— Vamos encontrar o presidente do time — disse, digitando
alguma coisa no celular. — Vamos ficar no staff, longe das câmeras.
Você coloca um boné, sobe a gola da jaqueta... sei lá, se alguém te
reconhecer, é só dizer que veio visitar a cidade. Tem um jogador que
estou de olho e vou sugeri-lo à diretoria.
Revirei os olhos, jogando a cabeça contra o encosto da
poltrona.
— Então basicamente eu vou me esconder como se fosse um
criminoso? Ótimo.
— É por precaução. Sua presença em Montreal ainda não é
pública. E prefiro que continue assim, pelo menos até decidirmos o
próximo passo com a imprensa.
Suspirei, sem conseguir disfarçar a irritação.
— Eu só vou porque faz tempo que não assisto a uma partida
ao vivo. Caralho, tô com saudade de toda essa merda.
Ele finalmente me lançou um olhar por cima dos óculos.
— Saudades do gelo? Da torcida? Do peso da camisa?
— De tudo. Até das porradas no rinque — respondi, com um
meio sorriso. — A verdade é que, mesmo com toda a merda, aquela
arena sempre foi o único lugar onde eu me sentia... vivo.
Ele não respondeu. Apenas assentiu com a cabeça e voltou
para o telefone.
Como sempre, a minha mãe já havia tomado os calmantes, e
estava dormindo.
O som dos patins cortando o gelo era como música para mim.
Cada estalo, cada freada, cada movimento do corpo sobre a pista
me trazia de volta para casa.
Entrei pelo acesso lateral da arena, usando o boné baixo e o
casaco fechado até o queixo. Eu tinha que evitar me expor, nada de
fotos, nada de manchetes. O plano era observar. Cumprir presença.
Ficar quieto.
— O jogo começa em dez minutos — murmurou um dos
assistentes do time local ao meu pai, que seguia à frente. — Mas os
atletas já estão se aquecendo.
Meu pai parou, abaixou o celular, e parecia ter parado de
respirar.
Um menino pequeno patinando com um taco menor que o
original na mão. A camiseta oversized do time de Zac pendurada no
corpo e do lado dele o próprio Zac. Rindo. Incentivando. Filmando.
Com o meu número estampado no boné da criança.
Sorri assim que consegui reconhecer o Asher. Ele era fofo,
mas voltei a minha atenção ao meu pai quando ele paralisou.
— Que merda é essa? — meu pai perguntou, franzindo o
cenho.
O garoto deslizou com firmeza, girou sobre os próprios pés
como se estivesse flutuando, e ao final da pequena volta, olhou para
a arquibancada e acenou com um sorriso gigante para alguém que
não consegui ver. A pessoa estava grudada na grade.
— Pai? O que foi?
Ele apontou com o queixo.
— Quem é aquele garoto?
— O nome dele é Asher, eu o vi na clínica, a mãe dele
trabalha lá, e deve ser parente de algum jogador também. Por quê?
— Olha para ele direito. — A voz dele saiu baixa e assustada
— O rosto dele. O cabelo. O jeito de patinar.
Meu pai arregalou os olhos por um segundo, e então desviou
o olhar para o outro lado como se aquilo fosse informação demais
para processar na frente de todos.
— O que tem isso?
— Que porra é essa… — murmurou, ignorando o que acabei
de falar.
Meu pai andou apressado até a grade.
— Quem é a mãe daquela criança? — ele perguntou de
repente.
— O quê? — Zac se virou sem entender.
É
— Quem. É. A. Mãe? — repetiu mais alto. Mas eu já conhecia
aquele tom. Era o mesmo que ele usava quando um jogo estava
prestes a ruir.
— Algum problema? — Zac perguntou.
Ele virou o rosto devagar, observando o menino outra vez.
— Que caralho… — ele gritou — Esse menino...
— O que tem ele? — perguntei, com o coração batendo mais
forte agora.
— Ele parece com você — meu pai respondeu sem me olhar.
— E patina como o Nathan.
O meu pai invadiu o rinque, indo até a criança que ficou sem
entender, com os olhinhos assustados.
— Se afasta do meu filho. — A voz que sempre fez o meu
corpo tremer reverberou e eu encarei Lyanna indo até o menino e o
tirando do gelo às pressas.
Todo o meu corpo estremeceu, a minha visão ficou turva. O
moleque podia ser o meu filho.
— Se afasta. — A voz de Zac soou firme, surgindo do nada ao
lado do meu pai, com o corpo meio à frente, como se estivesse
protegendo alguém. A postura dele me irritou na hora.
Ele estava sendo protetor com a minha mulher? O ciúme
queimou na hora.
— Lyanna — ele a chamou, virando-se rapidamente. E
quando segui o olhar dele, lá estava ela.
Saindo da arena às pressas, puxando o menino pela mão,
sem pensar, corri atrás dela. Ela parou em frente ao carro, ofegante,
encostada no capô. Asher parecia confuso, os olhinhos castanhos
pulando de um rosto para o outro.
— Logan! — ele gritou quando me viu, se soltando da mãe e
correndo até mim com um sorriso aberto. Me abaixei,
instintivamente, e o abracei com força.
Meu coração disparou. O choque no rosto da Lyanna foi
imediato. Ela congelou por dois segundos, depois se aproximou
apressada.
— Asher, vem aqui — disse baixinho, puxando o menino de
volta para os seus braços.
— Mamãe, eu sou amigo do Logan! Ele me deu um toque
secreto no rinque! — ele falou empolgado, e aquilo me quebrou por
dentro.
Ela permaneceu em silêncio por alguns segundos, apenas
segurando o filho e olhando para mim como se não soubesse o que
dizer.
— Você precisa me dizer alguma coisa? — perguntei com a
voz baixa, a respiração descompassada.
— Não agora. Não na frente do Asher — respondeu, sem
conseguir sustentar meu olhar por muito tempo.
Aproximei-me devagar, tentando não assustar o menino.
— Quem é o pai dessa criança, Lyanna? — perguntei entre
dentes.
Ela não disse nada. Ficou ali, imóvel, os olhos grudados nos
meus, como se estivesse tentando encontrar uma mentira que eu
acreditasse.
Abaixei-me até ficar na altura do garoto.
— Quantos anos você tem, campeão? — perguntei, forçando
um sorriso.
Ele ergueu a mãozinha com orgulho.
— Quatro! — mostrou, com os dedinhos bem esticados.
O chão pareceu sumir por um instante.
Quatro. A conta batia com perfeição, demais para ser
coincidência.
— Se você me disse que entre você e Noah nunca houve
nada, então…
— Lyanna, está tudo bem? — Zac se aproximou, ofegante.
Meus olhos imediatamente foram para a mão dele no ombro dela.
— Tira a mão dela. — Vociferei.
Ele me encarou, confuso.
— Donovan? O que está acontecendo aqui?
— Isso que eu quero saber — respondi sem desviar de
Lyanna. — Por que esse cara está te tratando com tanta intimidade?
Ela não respondeu. Apenas apertou Asher contra si e entrou
no carro.
— Vem, Asher. Não vai dar para assistir à partida hoje —
disse, tentando manter a calma enquanto destravava a porta com a
mão trêmula.
Eu dei um passo à frente, pronto para impedi-la, mas Zac
entrou no meu caminho.
— Sai da frente — rosnei, sem paciência.
— Não. Qual é o seu problema, Donovan? — ele rebateu, o
tom já alterado. — Tá assustando ela! Você não vê isso?
Nesse instante, ouvi o motor do carro ligando. Meus olhos
seguiram até Lyanna, que já estava no banco do motorista, com
Asher no banco de trás olhando pela janela, confuso.
— Me responde você! — explodi, voltando o olhar para ele
com o peito arfando. — Qual a porra do seu problema, hein? Tá
dando em cima da minha mulher ou você tem alguma outra merda
com ela?
Zac ergueu as mãos devagar, tentando manter a calma, mas
a tensão no maxilar denunciava que ele também estava por um fio.
— Você tá muito alterado, Donovan. Vai para casa, esfria a
cabeça antes de fazer uma merda maior.
— Vai se foder.
O soco saiu antes que eu pudesse pensar. A adrenalina
explodiu nas veias e, no segundo seguinte, Zac cambaleou para trás,
levando a mão ao rosto. Um filete de sangue escorria pelo canto da
boca.
Ele me encarou com ódio nos olhos. Mas ele não revidou. Em
vez disso, olhou ao redor.
Celulares. Filmagens. Gente comentando. Gente filmando.
Gente se preparando para postar.
— Caralho… isso vai dar uma merda daquelas — ele
resmungou, cuspindo de lado antes de virar as costas e voltar para a
arena, ignorando a plateia que se formava.
Virei a cabeça e dei de cara com meu pai, parado como uma
estátua, os olhos arregalados, a expressão completamente
desnorteada. Ele levou alguns segundos para se mover, mas quando
o fez, tirou o casaco e jogou-o sobre meus ombros como se tentasse
esconder um corpo ou um escândalo.
— Vamos sair daqui. Agora — disse em tom baixo, quase
entre os dentes.
Seguimos até o carro sem trocar uma palavra. Ele dirigia
tenso, o maxilar travado. Eu, afundado no banco, só conseguia olhar
pela janela como se tudo fosse uma simulação. Como se meu
mundo real tivesse colapsado.
Lyanna. O menino. O meu filho.
Chegamos à garagem do prédio. Ele desligou o veículo com
um estalo seco.
— Essa merda vai estar em todos os cantos amanhã —
murmurou, tentando manter o controle.
— Que se foda — rebati, já pegando o celular no bolso.
Disquei para Lyanna. Chamou. Chamou. Nada. — Porra! — rosnei,
jogando o telefone no banco ao lado. — Ela não atendeu.
Meu pai respirou fundo, apoiando as duas mãos no volante
como se fosse explodir de raiva, mas a voz dele veio fria.
— Vamos resolver isso. Pedimos um teste de DNA, provamos
que o menino é seu e depois tiramos ele dela. Um bom advogado
faz isso acontecer.
Virei a cabeça devagar, o coração batendo como um tambor.
— Eu não tô pedindo sua ajuda. Para nada.
— Você não viu? — ele rebateu com os olhos brilhando, como
se falasse de um troféu. — O garoto tem talento. Instinto. Ele é um
Donovan. Esse moleque pode ir longe com a orientação certa.
— Vi — falei seco. — Vi muito bem. Mas repito: não quero
sua ajuda. Não se meta na vida do Asher. Não tente moldar ele. Não
tente controlar ele.
Parei, sentindo a respiração falhar.
— Você já fodeu a minha. E eu não vou deixar você fazer isso
com o meu filho.
63
Lyanna Callahan
Estava prestes a estacionar o carro na vaga da garagem
quando ouvi a pergunta que congelou meu corpo.
— Mamãe... quem é o meu pai?
Meus dedos apertaram o volante.
Fiz o carro parar devagar, com o coração acelerado como se
eu estivesse prestes a bater o carro.
— Que pergunta é essa agora, Asher? — tentei soar calma,
mas a voz saiu trêmula.
— O Logan perguntou... — ele disse baixinho, olhando pela
janela. — Quem era o meu pai.
Fechei os olhos por um segundo, tentando pensar no que
dizer. Ele não estava pronto. Eu... também não.
— A gente vai conversar sobre isso, tá bom? Com calma. Eu
prometo.
Ele virou o rosto para mim, os olhos grandes, curiosos, do
jeito que sempre me desmontava.
— Eu vou ter um pai igual aos outros meninos?
Respirei fundo, engolindo a emoção que ameaçava subir pela
garganta.
— Você já tem um pai, meu amor — respondi com um sorriso
gentil. — Ele só não sabia ainda. Mas agora sabe.
Ele franziu a testa, tentando processar aquilo com a
cabecinha de quatro anos.
— Então ele vai vir brincar comigo? Igual ao tio Noah?
— Talvez. Mas isso vai acontecer no tempo certo. O mais
importante é que você é muito amado. Por mim. E agora, por ele
também.
Ele assentiu devagar, mas parecia satisfeito.
— Eu gosto do Logan. Ele me chama de pequeno e sorri
engraçado.
Sorri também, mesmo com os olhos marejados.
— Ele é engraçado mesmo.
— E ele patina igual a mim!
— Não, Asher, você patina igual a ele — sussurrei.
Ele soltou uma risadinha e estendeu os braços.
— Posso descer do carro agora?
— Pode sim, meu amor.
Desci do carro com Asher e segurei firme sua mãozinha.
Caminhamos em silêncio subindo as poucas escadas até o nosso
andar.
Assim que chegamos, avistei Noah escorado na porta do
apartamento. Estava concentrado em algo no celular, os olhos
semicerrados, como se o mundo ao redor estivesse em pausa.
Ele só levantou o olhar quando ouviu os passos.
— Como você tá? — perguntou baixinho, com preocupação.
Dei de ombros, cansada demais até para fingir que estava
bem.
— Sinceramente? Um desastre.
Noah assentiu, como se já esperasse aquela resposta. Mas,
ainda assim, ergueu o celular na minha direção.
— Acho que você ainda não viu isso.
Na tela, um vídeo. A minha imagem, nítida, entrando no
carro com Asher. Logan. Zac. Um soco. As pessoas filmando, e claro
os comentários… centenas deles.
“Logan Donovan tem um filho dessa idade?”
“Onde ele escondeu essa criança por tanto tempo?”
“Escândalo! Filho secreto?”
“Ela não é fisioterapeuta dos atletas?”
Senti o chão sumir sob meus pés por alguns segundos.
— Merda… — sussurrei, passando a mão no rosto
Asher olhou para mim, preocupado.
— Tá tudo bem, mamãe?
Sorri forçado, ajoelhando-me na frente dele.
— Tá sim, meu amor. Vai e troca de roupa, ok? — falei
entrando no apartamento. — A mamãe já entra para te ajudar.
Ele assentiu, entrando no quarto correndo, a mochila batendo
nas costas.
Fechei a porta atrás dele e encarei Noah.
— Isso é o começo do inferno, né?
— Sim — ele respondeu sem rodeios. — Mas você não tá
sozinha, Lya. E... talvez seja a hora de vocês dois se sentarem e
resolverem essa merda de vez. Por vocês. E principalmente, pelo
Asher.
Ouvi duas batidas firmes na porta e me apressei em ir até lá,
o coração já acelerado no peito. Quando abri, Logan estava lá, de pé
no corredor, mãos enfiadas nos bolsos do casaco escuro, o boné
abaixado parcialmente sobre os olhos. O maxilar travado, a
respiração visivelmente pesada.
— Podemos conversar? — ele perguntou, a voz baixa e rouca.
Logan Donovan
Não demorou muito para a merda toda estourar.
A direção do time ligou. Mensagens. Notificações. Um aviso
oficial sobre mais um escândalo com meu nome no topo dos
trending topics. Mas, honestamente?
Foda-se.
Dessa vez, eu só queria uma coisa: o endereço da Lyanna.
Peguei o telefone e mandei mensagem para Owen. Se tem
alguém que consegue
qualquer informação, é ele.
Em menos de dez minutos, ele me ligou com um tom de riso
debochado na voz.
— Você vai atrás dela de novo? — ele disse, como se fosse
óbvio.
— Só me passa o endereço, porra — rosnei.
— Vou te mandar. Mas só porque essa história tá mais
interessante que qualquer série da Netflix.
Desliguei assim que a mensagem chegou.
Peguei a chave do carro do meu pai em cima da mesa da
sala. Ele ainda estava ao telefone, falando com algum executivo, até
que me viu com as chaves na mão.
— Aonde você vai, Logan? — gritou, alarmado, quando eu já
estava com a porta aberta.
— Resolver uns assuntos.
E saí, batendo a porta atrás de mim.
A cidade parecia pequena demais para tanta coisa me
queimando por dentro.
Quando estacionei diante do prédio, nem me dei ao trabalho
de hesitar. Subi, e bati na porta.
— Precisamos conversar — falei assim que ela abriu.
Meus olhos foram diretos para Noah. Ele estava ali, parado no
meio da sala, mas naquele momento, ele não era o meu foco. Ela
era.
— Vamos para o terraço do prédio — ela sugeriu. — Você
fica com o Asher? É só por alguns minutos — perguntou virando-se
para Noah.
— Claro. Vai lá — ele respondeu, mas me lançou um olhar
preocupado.
Subimos em silêncio. Eu à frente, com o sangue fervendo. Ela
atrás, tensa.
O vento frio de Montreal nos recebeu quando empurrei a
porta do terraço. Parei no meio do espaço e me virei.
— Você quer me explicar agora ou vai continuar fugindo?
— Logan, eu sei que você está com raiva.
— Raiva? — soltei uma risada seca. — Estou para explodir.
Você me escondeu um filho por cinco anos, Lyanna. Cinco anos!
Ela apertou os braços contra o corpo, como se quisesse se
proteger. Mas manteve a voz firme.
— Você não estava pronto para saber. E eu não estava segura
para contar.
— Não vem com esse papo de que eu não tava pronto! —
gritei, dando mais um passo em direção a ela, sentindo o sangue
ferver. — Você sequer me deu a chance, Lyanna! Uma maldita
chance!
— Porque não era o momento, Logan — ela rebateu.
— Que caralho de momento seria o certo, então?! — cuspi as
palavras, o peito arfando. — É o meu filho, porra! Meu!
— Você não entende, não dava para contar!
— Por quê?! — berrei. — Porque me viu com a Emily e achou
que eu não merecia saber?! Porque a gente terminou daquele jeito
de merda?! Você se magoou, e decidiu que isso era motivo suficiente
para me arrancar da vida dele? Isso justifica esconder um filho de
mim?!
— Porque eu fui ameaçada, Logan! — ela explodiu de volta.
— O seu pai me encurralou no carro dele e disse que era capaz de
qualquer coisa para garantir que você seguisse o que foi planejado.
Qualquer coisa.
Aquelas palavras me pararam no meio do impulso. Minha
respiração falhou.
Meu pai. O filho da puta do meu pai.
— Você está dizendo que o meu pai…
— Me ameaçou — ela completou, firme. — Disse que se eu
não sumisse, ele acabaria com minha vida.
— Por que você não me contou?! — rosnei.
— Porque tive medo de que você não acreditasse. Porque
você estava no início da temporada. Porque você estava feliz. Porque
você… você tava exatamente onde ele queria. Eu não queria ser a
destruidora de tudo e eu queria manter meu filho seguro.
Engoli seco, a raiva se misturando com culpa, dor e aquele
maldito nó na garganta que eu odiava sentir.
— Você devia ter me contado mesmo assim. Ele é meu filho.
Meu. E eu… merda, Lyanna… — passei as mãos no rosto, tentando
respirar. — Eu perdi tudo. O primeiro sorriso. O primeiro passo. As
primeiras palavras. Você sabe o quanto isso me destrói?
Ela chorava agora. Baixo. Contido, mas não desviou o olhar.
— E você sabe como foi criar uma criança sozinha, assustada,
se sentindo ameaçada, sem poder falar com ninguém?
Ficamos em silêncio por um momento. Só o barulho do vento
e nós dois quebrados, diante um do outro.
— Ele é tudo para mim, Logan — ela disse com a voz
embargada, os olhos brilhando. — Tudo. E eu te juro, eu ia contar.
Só não sabia como.
Virei-me de costas, passando as mãos no rosto. A raiva agora
era outra. Uma mistura venenosa de culpa e frustração.
— A merda já tá feita — murmurei, virando-me para encará-la
novamente. — Aquele maldito vídeo já viralizou. — Soltei um riso
amargo. — Todo mundo tá vendo. Todo mundo tá comentando. E
agora a mídia vai cair em cima.
Ela ficou em silêncio, mas o rosto dela dizia tudo: ela sabia.
Estava aterrorizada.
— Vamos assumir tudo de uma vez — continuei. — Mas do
nosso jeito. Antes que transformem a vida do Asher num circo.
Precisamos proteger ele, mesmo que a gente ainda esteja fodido um
com o outro.
— Proteger como? — ela perguntou, com a voz fraca, sem
saber por onde começar.
— Primeiro, você não tá mais segura aqui. — Apontei para o
prédio com o queixo. — Assim que descobrirem esse endereço, a
imprensa vai acampar na sua porta. Vai ter carro parado na rua,
câmera apontada para janela, e paparazzi seguindo o Asher até a
escola assim que o período de férias acabar. Você quer isso?
Ela balançou a cabeça, negando. Os olhos marejados.
— Logan…
— Vamos fazer isso do jeito certo — interrompi. — Você sai
daqui com o Asher. Vai para um lugar seguro. Eu cuido da merda
que deixei acontecer. Assessor, imprensa, diretoria do time… eu
seguro a bomba.
Ela franziu a testa, o peito subindo e descendo rápido.
— E para onde você quer que eu vá, hein? — a voz dela
subiu, cheia de incredulidade.
— Você vai para Toronto. Para a minha casa — disparei, sem
hesitar. — Lá é seguro. Lá ninguém chega perto de vocês.
Ela soltou uma risada nervosa, quase amarga.
— Acha que é fácil assim? Largar minha casa, meu trabalho,
minha rotina? Eu tenho uma vida aqui, Logan! Você só pode estar
brincando.
— Não. Estou falando sério para caralho. — Avancei um
passo, olhando direto nos olhos dela. — Você é a mãe do meu filho,
Lyanna. A única mulher que eu não consegui esquecer. Que eu
nunca deixei de amar. Onde mais você acha que deveria estar se
não comigo?
64
Lyanna Callahan
Logan foi embora às pressas, com o celular tocando sem
parar. Era o pai dele. Como sempre, mandando, cobrando,
pressionando.
Mas eu fiquei. Fiquei com a cabeça cheia demais.
“Você vai para Toronto. Para minha casa.”
“A única mulher que eu não consegui esquecer. Que
eu nunca deixei de amar.”
Essas palavras ecoavam como um trovão dentro de mim. Era
muita coisa. Muita história não resolvida voltando à tona de uma vez
só.
Desci as escadas devagar, e ao abrir a porta do quarto,
encontrei Asher dormindo, ele estava encolhido sob o cobertor,
abraçado ao urso gigante que Noah tinha lhe dado. Noah estava, ao
lado da cama, sentado na ponta do colchão
— Obrigada — sussurrei, com a voz baixa, tentando não
acordar o meu pequeno.
Ele se levantou devagar, vindo até mim.
— Eu faria qualquer coisa por vocês dois — respondeu, e
havia sinceridade no olhar. — Mas… vou precisar voltar para
Vancouver. O grupo voltou a se preparar, e estão me esperando,
para os treinos.
Assenti com um leve aceno.
— Eu entendo. Você tem uma vida lá, tem
responsabilidades…
— Sim, mas isso aqui… — ele apontou para o quarto com os
olhos. — Importa para mim. Não queria ir embora agora. Não queria
te deixar sozinha com tudo isso.
Suspirei.
— Eu não estou sozinha. Tenho que admitir… o Logan tá
comigo. Ele está tentando.
— Espero que ele não erre com vocês de novo, que ele
proteja você e o Asher. Se ele vacilar eu volto, Lyanna. E não saio
mais da sua porta.
Sorri, fraco.
— Espero que você volte de qualquer jeito, somos amigos e
Asher ama você.
Ele sorriu de volta, e me puxou para um abraço apertado,
quente e protetor.
O som do meu celular vibrando sobre a mesa cortou o
silêncio. Soltei o ar com pesar e me afastei devagar, caminhando até
o aparelho. O nome de Zac piscava na tela. Suspirei antes de
atender.
— Alô?
— Lyanna? — A voz de Zac veio do outro lado da linha, cheia
de urgência. — Como você e o Asher estão?
Fechei os olhos por um segundo, tentando manter a calma.
— Estamos bem. Não se preocupe, Zac.
— Como não me preocupar? — ele rebateu. — Aquele vídeo
viralizou em poucas horas. A imprensa está enlouquecida, tentando
falar comigo, fazendo todo tipo de pergunta. Até inventaram que eu
sou o pai do Asher.
— Me desculpa — falei baixo, sentindo o peso da culpa
apertar no peito. — Eu nunca quis te envolver nisso, muito menos
causar problemas com o time ou a mídia.
— Você não causou nada, Lyanna. Mas estou preocupado
com vocês. — A voz dele suavizou. — Sabe, aquele circo na arena, a
forma como o Logan reagiu. Isso não vai parar por aqui. Ainda vai
ter repercussão.
Fiquei em silêncio por um momento, encarando o reflexo da
luz no vidro da janela.
Zac soltou um suspiro pesado do outro lado.
— A diretoria organizou uma coletiva de imprensa, o Donovan
também vai estar lá.
— Obrigada por se preocupar conosco.
— Então me avisa sobre qualquer coisa.
— Boa noite, Zac.
Logan Donovan
Meu pai estava sentado à mesa da cozinha, cercado por
papéis, anotações e seu maldito celular sempre apitando. Assim que
ouviu a porta bater, levantou a cabeça. Seus olhos me encontraram
por cima dos óculos, e ele se levantou de imediato, já com o tom
autoritário que me tirava do sério.
— Amanhã, às nove horas da manhã, temos uma coletiva de
imprensa com o Zac— anunciou, como se fosse um técnico falando
com um jogador qualquer. — Você vai pedir desculpas e esclarecer o
mal-entendido.
Soltei uma risada seca.
— E o que exatamente aconteceu, pai?
Ele respirou fundo, como se já estivesse cansado da conversa
antes mesmo de começar.
— Um pequeno mal-entendido. Nada que não possamos
controlar.
— Ah, claro. — Balancei a cabeça com sarcasmo. — Um soco
no meio da cara dele ao vivo, diante de câmeras e uma criança no
meio. Super controlável.
— Sobre a criança e as especulações sobre a paternidade.
Vamos informar que o exame de DNA já foi solicitado — continuou,
como se eu não tivesse falado. — Embora, honestamente, nem seja
necessário. O menino é sua cópia quando criança. E sem falar que...
— Que ele joga como o Nathan — completei entre dentes,
cerrando os punhos. — Já ouvi essa parte também.
Ele não reagiu. Continuou no seu tom arrogante e calmo,
como se tudo estivesse sob seu controle. Como sempre.
— Agora, pegue suas coisas, vá para um hotel e depois volte
para Toronto. Eu assumo daqui.
— O quê?
— Você ouviu muito bem — respondi — Você vai se afastar da
Lyanna, do Asher de tudo. Eu vou reconstruir tudo que perdi por sua
culpa.
— Tudo o que aconteceu, Logan… — ele disse, com aquele
tom venenoso — …é porque você não soube controlar seus
impulsos. Tudo isso foi culpa sua.
— Culpa minha? — explodi. — Você manipulou tudo.
Aquelas malditas fotos. Você ameaçou a Lyanna…
— Eu fiz o que precisava ser feito. Pelo seu bem. Pelo bem da
sua carreira.
— Pelo seu bem — cuspi com nojo. — Sempre foi sobre isso.
Os sonhos do Nathan, o seu ego, seu jogo sujo.
Fiquei tão próximo dele que quase senti sua respiração
vacilar.
— Não tenho mais dúvidas do que você fez. E se você não
sumir agora mesmo da minha vida e da vida deles, juro por Deus…
vou esquecer que você é meu pai e enfiar meu punho bem no meio
da sua cara.
Ele empalideceu. Pela primeira vez, hesitou. Mas a maldita
arrogância que sempre definiu meu pai logo retornou ao seu olhar
gelado.
— Se está com medo de ficar sem a criança… — disse,
ajeitando o paletó como se estivéssemos discutindo negócios — …
não se preocupe. Vamos pegá-lo. Ele vai ter o nome Donovan, vai
crescer com disciplina, com postura. Já vejo aquele prodígio
ganhando troféus com o escudo da família estampado no peito.
Tudo em mim estilhaçou. O sangue ferveu nas veias. Minha
visão ficou turva, e, num segundo, meu punho já tinha atravessado
o espaço entre nós.
— Seu desgraçado!
O soco atingiu em cheio o lado do rosto dele. Ele cambaleou
para trás, batendo contra a quina da bancada antes de despencar no
chão. Meu peito ainda subia e descia em fúria.
— Você nunca vai controlar assim o meu filho. Nunca vai
tentar tocar nele. Nem chegar perto da Lyanna! — gritei, apontando
o dedo para ele no chão.
Ele gemia, atordoado, o rosto vermelho.
— Você acha que ele é um troféu? Um número de camisa? Ele
é um garoto, porra! É meu filho. E Lyanna… — minha voz falhou por
um instante, mas continuei. — Lyanna é a única mulher que eu amei
na vida. E você destruiu tudo entre nós. Tudo.
Ele tentou se levantar, mas eu o empurrei de volta com o pé,
sem violência, mas com autoridade.
— Fica aí mesmo. No chão. É o lugar perfeito para você.
Peguei minha jaqueta pendurada na cadeira e a chave do
carro. Antes de sair, me virei uma última vez.
— Se você tentar qualquer merda, qualquer uma. Eu te
destruo. Com as minhas próprias mãos.
E saí, batendo a porta com força às minhas costas.
65
Lyanna Callahan
Ouvi batidas na porta e meu coração acelerou. Era tarde.
Muito tarde.
Ajeitei o roupão no corpo e caminhei até a porta, com os pés
descalços fazendo pouco ruído para não acordar Asher.
— Quem é? — perguntei, já com a mão na tranca, o tom
carregado de cautela.
— Lya? — a voz veio abafada, mas inconfundível.
Abri a porta no mesmo instante.
Logan estava ali.
Descomposto, suado, com a respiração pesada e os olhos
vermelhos.
Suas mãos estavam manchadas de sangue seco, e ele
mantinha os dedos fechados com força como se ainda segurasse
alguma raiva mal resolvida.
— Eu posso ficar aqui só por hoje? — a voz dele soou baixa,
arranhada.
Meu olhar foi direto para o corredor, como se pudesse
enxergar o quarto onde Asher dormia.
— Eu não pensei em mais nenhum lugar, Lyanna. Nenhum. Só
aqui. Só você — ele completou.
— Entra. — Abri espaço e dei um passo para o lado.
Antes mesmo de atravessar a porta, ele me puxou para um
abraço forte, o rosto escondido no meu pescoço, como se o mundo
estivesse desmoronando.
— Me perdoa… — ele sussurrou contra minha pele. — Eu
nunca tive ninguém de verdade. Você era diferente. Era real. E eu te
deixei ir porque senti tudo aquilo me assustou.
— Logan...
Os joelhos dele começaram a ceder, e quando percebi, ele
estava ajoelhado no chão da minha sala, os braços em volta da
minha cintura, apertando com força.
— Eu tive tanto medo de perder você que deixei você ir. Achei
que se me afastasse, se negasse o que sentia, ia ser mais fácil.
Mas não foi. Nunca foi.
Meu coração se quebrou em mil pedaços.
— Logan, levanta… — murmurei, engolindo o nó na garganta
enquanto segurava seu rosto, suado, esgotado. — Levanta. Vem
aqui.
Puxei-o com cuidado até que estivesse de pé outra vez.
Ele tremia. Não de frio. Mas de um cansaço emocional tão
profundo que doía de olhar.
— Você vai me odiar se eu disser que estou cansado de lutar
contra isso? — ele perguntou, com os olhos marejados. — Que eu só
queria me deitar ali, perto de você e do nosso filho, e por uma noite
fingir que somos só uma família normal?
Suspirei, sentindo os olhos se encherem também.
— Vem. Antes que eu me arrependa.
Ele assentiu, calado, e seguiu comigo até o sofá.
— Vem. Antes que eu me arrependa.
Ele assentiu, em silêncio, e me seguiu até o sofá.
— Dorme aqui. Amanhã a gente conversa melhor —
murmurei, já me afastando. — Vou pegar um cobertor e um
travesseiro.
Mas não consegui dar mais que dois passos em direção ao
quarto.
Assim que coloquei o pé no corredor, senti suas mãos firmes
na minha cintura, me puxando com urgência. Virei de frente e, sem
pensar, Logan tomou meus lábios em um beijo faminto, cheio de
saudade e desespero.
Beijava como se o tempo estivesse contra nós.
— Amanhã… — ele sussurrou contra minha boca, a respiração
quente no meu rosto. — Vou dizer ao mundo que você é a mulher
da minha vida. Que você é a mãe do meu filho.
— Logan… — tentei recuperar o ar. — Não esquece que o
Asher ainda não sabe de nada.
— Quando vai contar para ele? — perguntou sem me soltar.
— Eu não sei. Temos que ir com calma. Tudo isso ainda é
demais para ele.
Ele encostou a testa na minha por segundos.
— Vem comigo para Toronto. Acorda comigo todos os dias.
Me deixa fazer isso direito dessa vez.
Suspirei. Uma parte de mim queria dizer sim. A outra… ainda
tinha medo.
— Logan…
— Casa comigo, Lyanna.
A proposta caiu no silêncio como uma bomba. Me afastei
meio passo, encarando-o com os olhos arregalados.
— Logan… não é hora para falar sobre isso.
Ele soltou uma risada baixa, meio amarga, meio divertida,
como quem sabia que estava sendo impulsivo, mas não conseguia
evitar.
— Qual é a graça? — perguntei.
— É que você ainda faz essa cara quando fica assustada. A
mesma de quando eu te pedi para ser minha namorada falsa,
lembra?
Revirei os olhos, mas sorri.
— A diferença é que agora a gente tem um filho dormindo no
quarto ao lado, a imprensa enlouquecida e metade do país querendo
saber por que você socou o Zac.
— E mesmo assim, você ainda me deixou entrar. — Ele deu
um passo, os olhos suaves dessa vez. — Isso deve significar alguma
coisa, não?
Fiquei em silêncio por um segundo indo até o quarto com ele
me seguindo, depois me aproximei e coloquei o travesseiro no peito
dele.
— Significa que eu ainda sou burra o bastante para te deixar
dormir no meu sofá.
Ele sorriu.
“Casa comigo.” as palavras brincavam na minha mente e tudo
em mim queria dizer sim, mesmo com medo.
Logan Donovan
Levantei-me cedo. A luz fraca da manhã atravessava as
frestas da cortina e inundava a sala com um tom suave de dourado.
Caminhei até a cozinha em silêncio. Todos ainda dormiam.
Nem Lyanna, nem Asher haviam saído do quarto.
Abri a geladeira devagar, tentando não fazer barulho, e sorri
ao ver que tinha tudo o que eu precisava. Peguei pão, manteiga,
frutas e um pote de geleia.
Hoje o café teria carinhas nas torradas.
Enquanto cortava os morangos em forma de sorriso e usava
rodelas de banana para os olhos, ouvi um barulhinho de passos
arrastados vindo do corredor.
Virei e vi Asher, com o cabelo bagunçado, a camiseta torta e
os olhos ainda meio fechados.
— Oi, pequeno — falei baixinho.
Ele parou na porta, piscando confuso.
— Você tá fazendo café?
— Tô tentando. Vai me dizer que não parece um rostinho feliz
essa torrada aqui?
Ele se aproximou curioso, subindo no banquinho para espiar o
que eu estava montando no balcão.
— Parece um monstro com bigode — comentou com uma
risadinha sapeca.
— Ei! Isso é arte culinária.
Ele riu de novo, mas logo ficou sério, os olhos grandes me
encarando.
— Você e a mamãe tão namolando?
Abaixei-me até ficar na altura dele.
— E você? Ia achar legal se eu e a sua mãe estivéssemos
namorando?
Ele assentiu com um sorriso envergonhado.
— Hum rum… aí eu ia podê morá com você. A mamãe podia
me dá você de pai.
Eu nunca quis nada tanto na vida.
— Você… — limpei a garganta, tentando manter a voz firme.
— Você ia gostar se eu fosse seu pai?
Asher assentiu, animado:
— Hum rum! Ia ser da hora! Os meus amiguinhos na escola
iam morrer de inveja. Um pai jogador de hóquei? Ninguém tem!
— Assim que suas aulas voltarem, eu te levo na escola. Você
me apresenta para todo mundo, combinado?
Os olhos de Asher brilharam. Ele abriu um sorrisão,
empolgado.
— Jura?
— Eu juro.
Ele pulou do banquinho e me abraçou pelas pernas, pequeno
e quente como um raio de sol em pleno inverno.
Aquele abraço era tudo que eu não sabia que precisava.
— Agora me ajuda aqui — falei com um sorriso embargado.
— A mamãe vai acordar com fome, e a gente precisa impressionar.
— Eu faço os olhinhos com uva! — ele respondeu animado,
subindo de volta para o banquinho.
Terminamos de montar a bandeja com cuidado. Torradas com
rostinhos engraçados, um copo de suco de laranja espremido por
mim mesmo e um bilhetinho rabiscado por ele com canetinha azul:
“Mamãe, te amamos. Ass: seus meninos favoritos.”
— Acha que ela vai gostar? — Asher perguntou, empurrando
a uva que insistia em rolar pela borda da torrada.
— Ela vai amar — respondi com um sorriso. — Você é o
melhor ajudante que eu já tive.
— Eu sou o mini Logan — ele disse orgulhoso, estufando o
peito.
Depois de tudo pronto, pegamos a bandeja com cuidado e
caminhamos até o quarto. Ele ia na frente, abrindo a porta devagar
como se fosse uma missão secreta.
Lyanna ainda dormia, com os cabelos espalhados no
travesseiro e a expressão serena. Ela era bonita até dormindo e isso
me desarmava mais do que qualquer jogo ou lesão.
— Mamãe… — Asher sussurrou, subindo na cama e
encostando o nariz na bochecha dela. — Acooorda.
Ela gemeu baixinho, os olhos piscando devagar até se
abrirem por completo. Franziu a testa ao nos ver ali com a bandeja
nas mãos, e eu ergui as sobrancelhas com um leve sorriso.
— Surpresa.
— O que é isso? — ela murmurou, sentando-se, com a voz
ainda rouca de sono.
— Café na cama. Feito por dois dos homens que mais te
amam nesse mundo — falei.
— E esse aqui é o seu bilhete! — Asher apontou empolgado.
— Eu escrevi com a caneta azul da mamãe!
Lyanna pegou o papel e me olhou como se estivesse
preocupada.
— Relaxa, Lyanna. — Me sentei na ponta da cama.
Ela suspirou e sem dizer nada deu a primeira mordida na
torrada com carinha, Asher já contava animado como tinha feito os
“olhinhos com uva e tudo”, gesticulando como um pequeno chef de
cozinha.
Fiquei ali por alguns minutos, observando os dois juntos. O
som da risada dela, o brilho nos olhos dele. Aquilo parecia uma cena
de filme que eu nunca imaginei poder viver.
Mas logo olhei as horas no relógio da parede. Suspirei fundo.
— Preciso ir — falei, me levantando da cama. — A coletiva é
em duas horas, e eu ainda tenho que me arrumar.
Lyanna me olhou, tensa por um segundo, como se a realidade
pesasse de novo sobre os ombros.
— Vai dar tudo certo — ela disse, tentando soar confiante.
— Não se preocupe. Eu sei o que vou dizer. — Me aproximei e
dei um beijo em sua testa, depois me abaixei para beijar o topo da
cabeça de Asher. — Cuida bem da mamãe enquanto eu não estou,
mini Logan.
— Sim, senhor! — ele respondeu sério, batendo continência
com uma colher.
Sorri, e me forcei a sair antes que resolvesse ficar ali para
sempre.
66
Logan Donovan
Zac estava parado na entrada lateral da arena, onde a
coletiva de imprensa logo começaria. Vestia o casaco oficial do time
e segurava o celular com as anotações que revisava pela quinta vez.
Quando me aproximei, ele levantou o olhar e falou com
calma:
— Está tudo pronto lá dentro. — Sua voz era neutra, mas os
olhos mostravam cansaço.
Assenti com a cabeça.
— E o que você vai dizer?
— A verdade. — Ele suspirou. — Que o Asher não é meu
filho, que a Lyanna é apenas minha fisioterapeuta há anos. E que
você teve um surto de ciúmes em público.
Cruzei os braços.
— Então é isso?
— Tem algo errado? — Ele ergueu uma sobrancelha. — Eu
não vou inventar nada. Nunca tive nada com ela. E convenhamos,
Lyanna nunca foi o tipo de mulher que fica correndo atrás de
jogador de hóquei.
— Sim — falei, firme, olhando direto nos olhos dele. — Mas
ela ficou comigo. E nós temos um filho juntos.
Zac engoliu em seco. Um segundo de silêncio.
— Então você é um homem de sorte — disse por fim.
Sentei-me naquela cadeira e, lá estava, a porra da mesa com
os microfones, os flashes das câmeras explodindo na minha cara, e
uma fila de jornalistas prontos para tirar um pedaço. O assessor do
time estava suando antes mesmo da primeira pergunta ser liberada.
Ótimo. Pelo menos não era só eu com vontade de vomitar.
O gerente de comunicação fez a introdução formal. Bla, bla,
bla. “Declarações oficiais”. “Agradecemos a presença”. Nada que me
interessasse.
Eu só queria que essa merda acabasse, mas aí veio a primeira
pergunta.
— Senhor Donovan, o vídeo mostra você agredindo outro
jogador. A pergunta é por quê?
— E, por favor, responda, algum dos dois é o pai da criança?
Segurei o microfone com tanta força que meus dedos
estalaram.
— Eu sou o pai — respondi — E eu perdi o controle, mas eu e
Zac tivemos a oportunidade de conversar antes da coletiva e acho
que ficou tudo bem.
Outra jornalista cortou:
— Então, só para deixar claro: Zac não é o pai?
Ri, sarcástico.
— Zac não tem nada a ver com isso. O garoto é meu. Basta
olhar para ele, o menino é a minha cara.
Os flashes aumentaram. Os cochichos também. O assessor
me lançou um olhar como quem diz "menos, Logan."
Mas era tarde.
— E sobre a mãe do menino, vocês estão juntos? Ou ela está
com Zac?
Arregalei os olhos, respirei fundo e devolvi com frieza:
— Se depender de mim… — sorri de lado. — Ela vai estar
comigo, porque ela é a mulher que eu amo, e se não estamos juntos
criando nosso filho foi porque fui um idiota, mas agora vou ser o
homem que ela precisa que eu seja.
E então, finalizei:
— O nome do garoto é Asher. Ele é meu filho. Eu descobri
isso tarde demais. Mas agora que sei, não o largo por nada nesse
mundo. E se vocês acham que eu sou foda no gelo, me esperem
como pai. Porque aí, meus amigos, eu vou ser imparável.
Soltei o microfone com força sobre a mesa. O estalo seco
ecoou pela sala como um tapa. O assessor suava. O gerente de
comunicação engoliu em seco, mas ninguém tentou me impedir.
Ninguém teve coragem.
Levantei-me devagar.
Eu disse o que precisava. O resto que se resolvessem
sozinhos. Agora era com o Zac.
A sala explodiu em sons quando dei o primeiro passo fora da
mesa.
Flashes.
Gritos.
Microfones sendo estendidos.
— Quem é a mãe?
— Como vocês se conheceram?
— Por que escondeu o filho por tanto tempo?
— Vai se casar com ela?
Perguntas se atropelavam, ávidas, afiadas, desesperadas.
Ignorei todas, não olhei para os lados, não desacelerei, mas ainda
ouvi, quando Zac assumir o microfone, então parei para ouvi-lo.
— Só para deixar claro, de uma vez: Lyanna não tem nada
comigo. Ela é minha fisioterapeuta há anos. Uma profissional
impecável. Uma mulher incrível e o Donovan só teve um surto de
ciúmes, porque ama aquela mulher como um louco.
Fez uma pausa e olhou diretamente para mim.
— E sinceramente? Com um filho daquele e uma mulher
como a Lyanna, eu teria perdido o controle também.
Ele sorriu de canto, deu de ombros, e saiu da mesa.
Lyanna Callahan
Eu estava sentada no sofá, o celular apoiado no joelho,
assistindo à coletiva enquanto Asher brincava no quarto. Logan
estava sendo direto e protetor. O homem que eu conhecia e, ao
mesmo tempo, o que eu ainda não sabia lidar completamente.
Mas o alívio durou pouco, levantei-me, fui até a janela e vi o
inevitável acontecer.
Dois homens com câmeras e uma mulher com microfone na
mão se posicionaram na entrada do prédio. Eles conversavam entre
si, olhavam para cima como se já soubessem exatamente qual era o
meu andar.
Merda.
Ouvi batidas na porta. Rápidas. Secas.
Corri até a porta, e ao abrir esperava tudo, menos ver o pai
de Logan parado ali, com as mãos nos bolsos do casaco, o olhar
arrogante de sempre. E no canto da boca uma marca roxa, escura,
recém-formada.
Agora eu sabia exatamente de quem era o sangue no punho
do Logan na noite passada.
Não disse uma única palavra. Apenas o encarei.
Ele continuou ali, com aquela expressão controlada, o típico
homem que sempre acreditou estar no comando de tudo.
— Podemos conversar? — ele perguntou com a voz calma
demais para ser genuína.
Segurei firme a maçaneta, com o corpo inteiro em alerta.
— Acho que o senhor não tem mais nada a dizer para mim.
Ele sorriu de lado.
— O meu neto está? Eu gostaria muito de conhecê-lo.
— Agora não é o momento.
— Apenas chame o garoto, Lyanna — ele disse, dando um
passo à frente, forçando sutilmente a porta.
Empurrei de volta.
— Não. Eu e Logan ainda não conversamos com ele sobre
isso.
— Eu não vou dizer nada, só quero vê-lo por um instante —
insistiu.
Mas antes que eu pudesse responder, a voz de Logan soou no
corredor.
— Eu achei que tinha mandado você voltar para Toronto.
Virei-me e o vi parado ali, alto, com os punhos cerrados ao
lado do corpo.
— Logan… — murmurei.
Ele se aproximou lentamente, com os olhos fixos no pai.
— Não assuste o meu filho. Quando chegar a hora, eu mesmo
vou levá-lo para conhecer a minha mãe. E o senhor o conhecerá
nesse dia. Não antes.
— Eu não vou retornar a Toronto — o homem retrucou, com
um sorriso debochado. — A sua mãe se recusa a sair daqui. Como
eu explico que o próprio filho me agrediu?
— Explica dizendo a verdade. — Logan deu mais um passo. —
Diz que ameaçou a mulher que eu amo. Que manipulou toda a
minha porra de vida. Aí talvez a sua versão fique mais crível.
— Parabéns — ele disse, com aquele veneno na voz. —
Conseguiu colocar meu filho contra mim. Fez direitinho o seu papel.
— Não tente inverter as coisas — Logan rebateu. — Nunca
nos demos bem, você sabe disso. Então não venha bancar o pai
injustiçado agora.
Ele ajeitou o paletó com calma, tentando manter a pose
mesmo com o hematoma ainda visível no rosto.
— Pois bem… estarei aguardando o momento em que poderei
conhecer meu neto — disse, com um sorriso gélido no canto da
boca. — Tenham uma boa noite.
67
Logan Donovan
Dias depois…
Depois de muito insistir, consegui convencer Lyanna a aceitar
passar uns dias numa casa de campo afastada de Montreal. Longe
dos paparazzi, longe da imprensa, longe de tudo que pudesse
perturbar a nossa paz.
A casa era ampla, aconchegante, com fachada de madeira
clara e grandes janelas que davam vista para um jardim espaçoso
coberto pela neve fina. Os pinheiros ao redor garantiam privacidade
e deixavam a paisagem ainda mais serena. Minha mãe estava vindo.
Só deixei claro que queria que meu pai ficasse longe.
Observei Asher correndo no jardim, as botas afundando um
pouco na neve enquanto ele tentava alcançar algumas folhas secas
que voavam no vento. Lyanna parecia nervosa, mordendo o lábio
inferior e torcendo as mãos.
Era agora. Precisávamos contar para ele.
Lyanna respirou fundo, chamando-o com a voz calma,
tentando não transmitir ansiedade.
— Asher, filho, vem aqui um pouquinho. Precisamos
conversar.
Ele veio correndo, as bochechas coradas pelo frio, o gorro
escorregando pelos cabelos bagunçados. Se jogou no meu colo com
um sorriso enorme, olhando para a mãe com aqueles olhinhos
brilhantes.
— Oi, mamãe. O que foi?
Olhei para Lyanna, incentivando-a. Ela respirou fundo
novamente e se aproximou, segurando a mãozinha dele com
delicadeza.
— Bom, meu amor, você lembra que uma vez você perguntou
quem era seu papai?
Asher arregalou um pouco os olhos, balançando a cabeça
rapidamente.
— Sim, mamãe. Eu lembro. Você disse que um dia ia me
contar tudinho.
— Isso. E esse dia chegou, filho. — Lyanna me olhou, e senti
meu coração acelerar.
Eu afaguei a cabeça dele com suavidade, reunindo coragem.
— Asher, lembra quando você disse que seria legal se eu
fosse seu pai?
Ele sorriu, assentindo de novo.
— Sim! Eu disse que ia ser muito da hora! E que meus
amiguinhos iam ter um montão de inveja porque meu pai ia ser
jogador famoso!
Sorri. Lyanna olhou para mim tentando segurar as lágrimas.
— Então, pequeno… Eu realmente sou seu pai. Seu pai de
verdade.
Ele inclinou a cabecinha para o lado, confuso por um instante.
— Verdade verdadeira?
— Verdade verdadeira — respondi, sentindo um aperto na
garganta. — Mamãe e eu nos conhecemos antes de você nascer. A
gente se amava muito. — Olhei para Lyanna. — E eu ainda a amo.
— Suspirei antes de continuar. — Mas ficamos longe um do outro
por um tempo, e por isso eu não te conhecia. Agora eu te conheço,
e quero ser seu pai para sempre. Se você deixar.
Asher encarou Lyanna, buscando confirmação com os olhos
arregalados e curiosos.
— É sério, mamãe?
— Sim, meu amor. É sério. Logan é o seu papai. Sempre foi
ele.
Ele demorou alguns segundos em silêncio, como se estivesse
assimilando tudo aquilo, até que seus olhos se encheram de
lágrimas, e o sorriso dele foi se alargando aos poucos.
— Quer dizer… que eu tenho um papai agora? Que você é
meu pai pra valer?
— Isso mesmo — confirmei, com o coração quase saltando do
peito.
— Eu vou poder contar pros meus amiguinhos? — perguntou
ansioso.
Lyanna riu baixinho, assentindo.
— Claro que vai, querido. Pode contar para todo mundo.
Ele pulou no meu colo e envolveu os bracinhos no meu
pescoço com força, escondendo o rosto na curva do meu ombro.
Aquilo quebrou o resto de resistência que eu ainda tinha. Abracei
meu filho forte, fechando os olhos por um momento.
— Eu sempre quis ter um pai como você — ele murmurou,
ainda agarrado em mim. — Eu tô muito feliz.
Abracei-o mais apertado ainda, sentindo os olhos arderem.
— Eu também tô muito feliz, filho. E eu prometo que vou
estar sempre aqui. Não vou embora nunca mais.
Eu finalmente tinha tudo que nunca soube que precisava:
Lyanna e Asher. A minha família.
E nunca mais iria deixá-los.
Ouvimos o som de um carro se aproximando. Levantei-me
devagar, com Asher agarrado ao meu pescoço, e olhei pela janela.
— É a sua avó, filho — disse, sorrindo.
— Minha avó? — ele perguntou curioso, virando-se no meu
colo. — Eu tenho avó também?
— Tem sim. E ela vai adorar te conhecer.
Lyanna ajeitou os cabelos, enxugou os olhos, minha mãe
vinha pelo caminho de pedras, com os olhos já marejados antes
mesmo de nos ver de perto. Estava elegante como sempre, de
casaco longo bege, botas forradas e cachecol de lã. Mas dessa vez,
não parecia estar sob efeitos de medicamentos, ela parecia bem.
— Logan… — ela murmurou, parando diante de mim. Seus
olhos foram direto para o menino no meu colo. — Ele…
Assenti, engolindo em seco.
— Mãe… esse é o Asher. Meu filho.
Ela levou a mão trêmula à boca, os olhos se enchendo de
lágrimas de novo.
— Meu Deus… ele é tão parecido com você… — sussurrou.
Asher olhou para ela, um pouco tímido.
— Oi… — disse, baixinho. — Você é a mamãe do meu papai?
Ela riu entre o choro.
— Sou sim, meu amor. E você é meu neto?
Asher assentiu, e eu o coloquei no chão. Ele deu dois
passinhos até ela e ficou parado ali, olhando.
Ela se ajoelhou com certa dificuldade e o envolveu num
abraço cuidadoso, quase reverente.
— Eu esperei por esse momento sem nem saber. Você é
perfeito… — ela disse, com a voz embargada.
Lyanna estava com os olhos cheios d’água, segurando-se para
não desabar. Minha mãe, foi direto até ela.
— Obrigada. Por ter criado ele tão bem. Por ter sido forte. —
Sua voz falhou. — E me perdoe. Por tudo que você teve que passar
sozinha.
— Eu não estive sozinha o tempo todo… mas obrigada —
Lyanna respondeu, com um sorriso gentil e sincero. — Asher vai
adorar ter você por perto.
— E eu vou amar estar por perto — ela respondeu,
enxugando o rosto com as costas da mão. — Já perdi tantas coisas.
Não quero perder mais nada.
68
Lyanna Callahan
— E os seus pais, Lyanna? — a mãe de Logan perguntou com
delicadeza, tomando pequenos goles do chocolate quente enquanto
nos sentávamos na sala.
A pergunta me fez baixar os olhos por um instante, apertando
as mãos ao redor da xícara, aquecendo-as na porcelana quente.
— Meu pai eu nunca conheci — respondi com calma,
tentando não transparecer emoção. — E a minha mãe... bem, ela foi
morta há alguns anos pelas mãos do homem que ela pensava que
amava.
Ela engoliu em seco, claramente abalada.
— Me desculpe, querida. Não fazia ideia...
— Tudo bem. — Dei de ombros tentando parecer indiferente.
— Já superei. Agora tenho o Asher comigo. Isso é o que importa.
Ela sorriu, concordando. Mas antes que pudesse dizer
qualquer outra coisa, ouvi a voz desesperada de Logan vindo lá de
fora.
— Asher? Filho! Cadê você?
Levantei-me de um salto, derrubando a xícara e o chocolate
sobre o tapete.
— Logan? O que aconteceu?
Corri até a porta da frente, meu coração acelerado no peito.
Logan estava no jardim, olhando ao redor com os olhos arregalados,
respiração acelerada. Dava para ver o pânico no rosto dele.
— Asher! — ele gritou novamente, com mais força dessa vez.
— Filho, me responde!
Meu corpo inteiro gelou, um medo irracional tomou conta de
mim.
— Logan? Cadê o Asher? — Minha voz saiu estrangulada pelo
desespero que começava a crescer em mim. — Onde ele está?
— Ele estava aqui. — Logan apontou com as mãos trêmulas
para o balanço, que ainda se movia levemente com o vento. — Eu
estava cortando lenha. Ele pediu para ir pegar a bola ali na entrada,
foi só um minuto… Eu não tirei os olhos dele por mais do que um
minuto!
A mãe de Logan surgiu atrás de mim na porta.
— O que houve? — perguntou ela, colocando a mão sobre o
peito.
Olhei ao redor freneticamente, sentindo a garganta fechar,
sufocada por um medo que eu jamais havia sentido antes.
— Meu Deus… Asher! Filho! — gritei, correndo pelo jardim
desesperadamente. — Responde à mamãe!
O silêncio da casa de campo foi cortado apenas pelo eco dos
nossos gritos, pelo som dos nossos passos apressados sobre a
grama e pela sensação esmagadora de que, mais uma vez, a vida
estava prestes a nos arrancar algo precioso.
— Lyanna… — Logan veio até mim, o olhar atormentado pelo
medo. — Não vou deixar nada acontecer com ele. Eu prometo.
Vamos achar nosso filho agora mesmo.
Ele pegou minhas mãos, apertando com força.
Logan Donovan
Minha mãe estava imóvel, com os olhos arregalados e
assustados, tremendo em choque na minha frente.
— Foi ele… — repetia, trêmula, como se não conseguisse
aceitar a própria revelação. — Ele… ele estava obcecado pelo
menino, Logan. Falava nele como se fosse uma nova chance de fazer
tudo certo.
Senti um frio esmagador atravessar meu peito.
— Do que você está falando, mãe? — perguntei, tentando
conter a raiva. — Uma nova chance? O que ele pretende fazer?
As lágrimas brotaram nos olhos dela.
— Outro Nathan. Ele sempre estraga tudo, igual no dia que
perdemos Nathan. Ele vai fazer tudo de novo... — ela murmurou, a
voz se desfazendo em soluços. — Logan, ele foi o culpado pela
morte do seu irmão. Foi culpa dele, tudo aquilo.
O chão pareceu ruir sob meus pés.
— Como assim? Nathan morreu em um acidente… foi um
acidente, mãe!
Ela balançou a cabeça lentamente, incapaz de me encarar nos
olhos.
— Não, filho. Seu pai… ele queria aquela menina longe do
Nathan a qualquer custo. Queria que Nathan fosse para NHL sem
distrações, sem erros, sem que nada o prendesse… Ele… pagou
alguém pra fazê-la sumir. Mas…
— Mas Nathan estava no carro — completei.
Ela assentiu com o rosto nas mãos.
— Seu pai não sabia, não imaginava que ele estaria lá. Ele
está louco, Logan. E agora pegou seu filho, o meu neto.
— Logan, você precisa achar o nosso filho — Lyanna explodiu.
— Ele não vai tocar no Asher, não vai destruir minha família
como fez antes.
Sem mais uma palavra, me afastei correndo para dentro da
casa, com as mãos trêmulas, quase deixando o celular cair ao tentar
ligar para Owen.
— Logan, eu…
— Não agora, mãe — interrompi secamente, já discando. —
Fica com a Lyanna e não saiam daqui. Vou buscar meu filho.
— Logan, cuidado… quando ele enlouquece assim fica
perigoso.
— Eu sou mais — respondi entre dentes, cada músculo do
meu corpo fervendo com uma raiva que eu jamais havia
experimentado antes.
Mal esperei Owen atender, já gritando ao telefone:
— Meu pai sequestrou o Asher, Owen. Não quero saber como
você vai fazer isso, mas encontra ele agora! Rastreia tudo! Celular,
GPS do carro, qualquer coisa.
— Logan, calma, cara… me explica direito…
— Não tenho tempo! — interrompi brutalmente. — Só faz isso
rápido. E manda o endereço direto para o meu telefone.
Peguei as chaves, empurrando a porta com força.
Antes de sair, Lyanna segurou meu braço com força.
— Eu quero ir, Logan… — ela falou com a voz tremendo, os
olhos cheios de lágrimas. — Por favor. Eu não posso ficar aqui
parada. Ele é o nosso filho.
Travei a mandíbula, os dedos ainda pressionando as chaves
com força suficiente para enterrá-las na palma da mão. Meus
instintos gritavam para protegê-la. Mas ao mesmo tempo, o
desespero nos olhos dela me quebrou inteiro.
— Lyanna… não é seguro — murmurei, tentando manter a
calma que eu definitivamente não sentia. — Você viu o que ele fez
com o Nathan. Você ouviu a minha mãe. Ele é capaz de qualquer
coisa.
— E você acha que eu vou conseguir respirar enquanto meu
filho estiver nas mãos daquele homem? — a voz dela quebrou.
Fechei os olhos por um segundo, respirando fundo. Eu queria
gritar. Queria amarrá-la naquele sofá e trancar a porta, só para
garantir que ela estivesse segura. Mas ela estava certa. Era mãe. E
isso vinha acima de qualquer lógica, de qualquer plano.
— Entra no carro — falei com firmeza, abrindo a porta com
um puxão seco.
Ela assentiu, sem hesitar.
— Você tem o endereço? — ela perguntou já entrando no
banco do passageiro.
— Owen vai mandar a localização. Estou só esperando, ele
nunca demora.
O celular vibrou no mesmo segundo. Abri a mensagem e o
mapa se formou no visor.
— Merda… — murmurei, acelerando o carro e saindo com
tanta força que os pneus cantaram no asfalto úmido da entrada de
casa.
Lyanna se agarrou ao banco, os olhos fixos na estrada.
— Ele vai se arrepender de cada maldita palavra que te disse
— falei, sem tirar os olhos da estrada. — E se ele encostar um dedo
no meu filho… juro por Deus, Lyanna… eu não respondo por mim.
Ela virou o rosto para a janela, enxugando as lágrimas.
— Ele deve estar com medo.
— Nosso filho é corajoso — falei com o coração latejando. —
Ele vai estar bem.
69
Lyanna Callahan
Logan dirigia feito um louco, pela estrada estreita. Meu
coração estava acelerado, as minhas mãos estavam trêmulas sobre
as pernas. Eu só conseguia imaginar Asher assustado, confuso, e
isso me fazia querer gritar.
— Onde ele levou o nosso filho, Logan? — perguntei baixinho,
quase sem fôlego.
— Uma casa afastada da cidade. É de um dos sócios da
empresa dele. Não fica longe, mas é isolada. É onde o dono esconde
as coisas e as pessoas — disse com a mandíbula travada.
Quando chegamos, a propriedade parecia mais um retiro de
luxo do que um cativeiro. Uma casa moderna, de vidro e madeira
escura, cercada por pinheiros altos e muros baixos. Mas o mais
desconcertante era o portão eletrônico aberto, como se tudo
estivesse normal.
Dois homens de terno estavam na entrada. Logan não
hesitou. Saiu do carro, os olhos em chamas.
— Saiam da frente — ordenou com a voz baixa.
Um dos seguranças tentou impedir a passagem. Logan o
empurrou com tanta força que o homem caiu de costas no chão, e o
outro recuou sem dizer uma palavra.
Eu corri atrás dele, e quando entramos o som da voz de
Asher rasgou meu peito.
— Senhor, eu não quero mais, tô cansado.
— Sou o seu avô, Asher, e você precisa treinar mais, Asher.
Os melhores jogadores treinam muito.
— Mas eu quero ser médico... — a voz do meu filho vinha
embargada. — Eu gosto de cuidar das pessoas.
— Médico? Não! O Nathan te deu esse dom. Você tem um
futuro brilhante. Não desperdice.
A cena me gelou.
O espaço interno da casa era enorme, com um minirringue de
treino improvisado no salão central. E ali, no meio do gelo, estava o
meu filho. Patinando devagar, exausto, com o rosto corado e os
olhos caídos.
Logan parou ao meu lado. Eu olhei para ele e o vi ruir por
dentro.
Os punhos cerrados, os ombros tensionados, o peito arfando.
Aquela era a infância dele se repetindo diante dos olhos. E o olhar
dele, aquele olhar de menino quebrado por dentro, me cortou.
Senti pena. Por ele. Pelo Logan que cresceu com medo de
não ser suficiente.
— Eu disse, pai. Eu disse para não fazer isso com ele.
— Mamãe! — Asher gritou ao me ver e patinou cambaleando
para fora do gelo. Corri ao encontro dele, puxando-o para os meus
braços, abafando o choro dele contra o meu peito.
— Vem, amor. A mamãe tá aqui. Vem com a mamãe.
— Lyanna, leva ele para o carro. Agora — Logan disse com a
voz baixa, mas firme.
— Solta o menino! — gritou o pai dele, avançando na minha
direção.
Mas Logan entrou na frente como uma muralha, a mão
espalmada contra o peito do próprio pai, segurando-o.
Logan Donovan
— Eu queria tanto, mas tanto, te esmurrar até arrancar a
porra dos seus dentes, que meus dedos doem de me segurar —
falei, com o corpo inteiro fervendo. — Mas aí eu te vi. E tudo o que
senti foi pena.
Ele bufou, tentando me empurrar.
— Não seja ridículo. Esse menino precisa de um futuro. Eu só
quero garantir que ele seja um Donovan de verdade.
— Você quer outro Nathan. Quer consertar o que destruiu.
Mas o Asher não é seu segundo round, pai. Ele é meu filho. Não é
sua chance de redenção.
— Você não entende nada! — ele gritou. — Nathan era o
único que fazia sentido. Ele era perfeito. Você sempre foi o erro.
— E você matou ele — cuspi as palavras sem pena. — Foi
você. Você ameaçou a garota, você causou o acidente. E agora…
agora você acha que vai tocar no meu filho? Nem em mil anos.
Ele empalideceu.
— Você não sabe o que está dizendo.
— Eu sei exatamente o que estou dizendo. E se você chegar
perto da Lyanna ou do Asher de novo, eu juro que não vou deixar
passar novamente.
Vi nos olhos dele o exato momento em que ele entendeu que
me perdeu. Não só como filho. Mas como ser humano.
Minha respiração estava pesada, e por mais que eu tivesse
dito o que precisava dizer, ainda havia algo preso no fundo da
garganta.
Dei dois passos na direção dele.
— Você sabe o que é crescer tentando se provar o tempo
inteiro? — perguntei com a voz baixa. — Saber que, por mais que
você se esforce, nunca vai ser suficiente? Nunca vai ser bom o
bastante, rápido o bastante, perfeito o bastante?
Ele não respondeu. Só ficou me encarando, os olhos
apertados, sem coragem de me interromper.
— Você me moldou como quem molda um soldado pra
guerra. Treinamento, disciplina, metas impossíveis. Você tirou de
mim tudo que era leveza, tudo que era infância. Eu não me lembro
de uma porra de um abraço seu, de um “tô orgulhoso”. O que eu me
lembro é da cobrança. Dos olhares de decepção. Dos silêncios como
punição.
Aproximei-me mais um passo.
— E mesmo assim, mesmo assim eu fiquei. Tentei ser o filho
que você queria. O jogador que te orgulhava. O nome que elevava o
seu sobrenome. Até que eu percebi que isso nunca ia acontecer.
Porque você não queria um filho. Queria um reflexo. Uma sombra do
Nathan.
A menção ao meu irmão o fez estremecer.
— Mas eu não sou ele. Eu nunca fui. E sabe o que é mais
louco? Eu me culpei por isso por anos. Me odiei por não ser igual.
Quando o acidente aconteceu… quando ele morreu, eu achei que,
de alguma forma, a culpa era minha.
Meus olhos ardiam. A garganta apertava.
— Mas a culpa é sua. Você causou aquilo. Você destruiu tudo.
E agora quer transformar o Asher em mais um peão do seu jogo.
Meu filho.
Ele estava em silêncio, com o olhar frio de sempre.
— Você me perdeu. E agora, perdeu o direito de olhar para
minha família. Não me procure, não procure a Lyanna, e nunca…
nunca mais chegue perto do Asher.
Ele inclinou a cabeça, devagar, como se estivesse analisando
uma jogada num tabuleiro invisível. E então falou, baixo, seco,
venenoso:
— Você sempre foi impulsivo. Como sua mãe. Emocional
demais. Fraco demais.
Fez uma pausa.
— O Nathan era meu orgulho. Você foi meu investimento.
— E ainda assim, sou eu quem está aqui. E você? Vai morrer
sozinho com os seus troféus empoeirados e as medalhas que não
significam nada.
Ele tentou manter a postura, mas os olhos vacilaram por um
segundo. Foi rápido, mas eu vi.
Virei as costas. E dessa vez, ele não tentou me impedir.
Era o fim de um ciclo. Da dor, da obediência. Do medo.
Voltei para o carro e Lyanna estava no banco de trás com
Asher dormindo nos braços. O rosto dela estava pálido, mas havia
alívio ali.
Abri a porta e entrei, dando a partida no carro.
— Ele não tocou nele, né? — perguntei em voz baixa.
— Não. Só o forçou a patinar.
Assenti. A mão trêmula no volante, mas o coração um pouco
mais leve.
O caminho de volta foi silencioso. A neve começava a cair
devagar, como se limpasse os rastros do inferno que acabamos de
deixar.
Chegamos à casa.
Lyanna levou Asher direto para o quarto. Fiquei na sala.
Parado, a minha mãe dormia no sofá, provavelmente, dopada. Ouvi
os passos dela no andar de cima. A porta se fechando suavemente.
Minutos depois, Lyanna desceu.
— Ele continua dormindo — sussurrou.
Virei-me para ela. Estava exausto, mas meu peito
transbordava.
— Obrigado por confiar em mim — falei. — Por ter vindo
comigo.
Ela se aproximou devagar. Parou bem na minha frente. Toquei
o rosto dela. Beijei a testa com a reverência de quem entende que
perdeu tempo demais.
— Eu errei tanto. Mas agora eu sei o que é certo. É você. É
ele. É a nossa casa.
Ela suspirou contra meu peito.
— Me deixa ficar com vocês para sempre... — minha voz saiu
baixa, quase suplicante. — Não me tira da sua vida, Lyanna. Casa
comigo. Mora comigo. Vamos criar o nosso filho. Juntos. Como uma
família. Como devia ter sido desde o começo.
Ela não disse nada. Lyanna se ergueu devagar na ponta dos
pés, os olhos cheios de lágrimas, os braços envolvendo meu pescoço
e me beijou.
Não era um beijo qualquer. Era um sim. Era um vamos tentar
de novo. Era um eu também quero tudo com você.
E quando ela encostou a testa na minha, sussurrando contra meus
lábios:
— Eu te amo, Logan…
Eu soube. Era o começo da nossa eternidade.
70
Lyanna Callahan
Semanas depois…
O som da arena era diferente naquele dia.
Não era só o burburinho típico antes de uma partida. Era
expectativa.
Fazia semanas desde que Logan entrou em tratamento. E
hoje, finalmente, era o dia em que ele voltaria ao gelo.
A comissão médica autorizou. O técnico liberou. A torcida?
Bom, ela nunca parou de gritar por ele.
— Vai começar, mamãe? — Asher puxou a manga do meu
casaco, os olhos arregalados, colado ao vidro que separava as
cadeiras do rinque.
— Vai, meu amor. E sabe quem vai entrar agora?
Ele não respondeu. Só apertou a mão no taco de brinquedo
que levava sempre com ele.
A luz da arena mudou.
Os nomes começaram a ser anunciados. Um a um, os
jogadores entravam no gelo com a força de um exército. Mas
quando o nome dele ecoou…
— Com a camisa 87… o capitão está de volta… LOGAN
DONOVAN!
A multidão explodiu.
Gritos, aplausos, celulares levantados. O som foi tão intenso
que eu me assustei por um segundo. Mas Asher… Asher estava em
êxtase.
— É o papai! — ele gritou, pulando, e quase caiu da cadeira.
Meus olhos se encheram d’água.
Logan deslizou pelo gelo com a mesma confiança de sempre.
O olhar focado. O corpo mais forte do que nunca. Ele parou no
centro, ergueu o braço para a torcida e olhou para nós.
Os olhos dele encontraram os meus, depois os de Asher.
Ele sorriu.
Aquele sorriso de quem venceu a dor, a raiva, o passado. E
voltou.
Asher bateu no vidro com as mãozinhas, chamando a atenção
dele.
— PAPAAAAI! EU TE AMO!
E Logan bateu o taco no gelo, uma vez só, em resposta, um
gesto simples. Mas que significava tudo.
Asher Callahan
Naquele dia, meu coração tava batendo muito rápido.
O papai disse que precisava muito da minha ajuda, porque
era o dia mais importante da vida dele. E da minha também. E eu
fiquei me sentindo muito especial, porque ele disse que não dava
para fazer aquilo sem mim.
— Você tá pronto, campeão? — ele perguntou, sorrindo
enquanto arrumava meu uniforme que era igualzinho ao dele. — A
mamãe não pode desconfiar, hein?
— Eu sou o melhor de todos em planos secretos, papai! —
respondi, muito animado.
E eu era mesmo. Só não podia contar para ninguém que no
final do jogo, eu ia levar a caixinha com o anel de casamento para o
papai. Era um anel muito bonito que brilhava igual às estrelas que a
mamãe gostava de olhar comigo na janela antes de dormir.
Quando entramos na arena, eu fiquei no banco com o
treinador. O papai disse que ia jogar só um pouquinho, porque ainda
tava um pouco dodói. Todo mundo tava gritando muito alto,
chamando ele. Eu gritei também:
— Vaaaaaai, papai!!!
Ele virou a cabeça para mim, riu e piscou, e aquilo fez meu
coração ficar quentinho.
Eu fiquei lá esperando até o jogo acabar. Aí o treinador fez
um sinal com a cabeça, me deu um tapinha nas costas, que tinha
ido para o lado dele já fazia um tempo, entrei patinando no gelo
rapidinho pra entregar a caixinha pro papai.
Ele sorriu grandão, todo feliz, me pegou no colo e girou
comigo.
— Pronto para a surpresa? — ele perguntou, bem baixinho.
— Muito pronto!
Então ele olhou para a arquibancada, onde tava a mamãe, e
chamou bem alto:
— Lyanna! Amor, vem aqui!
Todo mundo ficou olhando pra ela e aplaudindo. A mamãe
tava com os olhos grandes e botou a mão na boca, bem surpresa.
Ela veio devagarzinho, andando pelo gelo, quase escorregando de
emoção.
Quando chegou perto, o papai me colocou no chão e se
ajoelhou na frente dela, pegando a caixinha da minha mão. Mamãe
já tava chorando, e eu achei graça porque adultos choram por coisas
felizes também.
— Lyanna Callahan — o papai falou, olhando bem nos olhos
dela. — Você quer casar comigo? Quer ser minha esposa para
sempre, viver comigo na saúde e na doença, nos dias bons e ruins,
nas manhãs cheias de risada do Asher e nas noites que eu sempre
vou querer você pertinho de mim?
Eu não aguentei e dei um pulinho:
— Aceita, mamãe! Aceita logo, por favor!
Todo mundo riu de novo, mas era um riso bom, porque as
pessoas tavam felizes igual a gente.
A mamãe fez que sim com a cabeça e abraçou o papai,
beijando ele muitas vezes. Todo mundo bateu palma bem alto. Eu
bati palma também.
Então o papai me puxou junto com eles num abraço bem
forte, e cochichou no meu ouvido:
— Obrigado, campeão. Eu te amo muito.
Eu sorri, muito, muito feliz.
Esse era mesmo o melhor plano secreto de todos.
Logan Donovan
Dias depois…
Tínhamos oficialmente nos mudado para Toronto.
Eu nunca pensei que poderia me sentir assim. Completo.
Feliz. Em paz, de uma maneira que eu nem sabia que existia.
Quando entrei, a primeira coisa que fui ver foi o nome dele na porta
do quarto: Asher Donovan.
Meu filho. De verdade. Oficialmente registrado como um
Donovan, embora ele fosse meu desde o primeiro momento que
coloquei os olhos nele naquela arena.
As letras coloridas brilhavam na porta do quarto, rodeadas
por pequenas estrelas e um disco de hóquei desenhado.
Vi o moleque girar no meio do quarto, vestindo o uniforme da
escolinha de hóquei que a Lyanna disse que ele só poderia usar no
primeiro dia de aula.
Mas claro que ele não obedeceu.
Tava tão empolgado que só tiraria aquilo se fosse pra dormir
— suando dentro, agarrado no taco de brinquedo e sonhando que
estava marcando gol no gelo.
— Ei, campeão — chamei.
Ele veio correndo, me abraçou nas pernas e depois olhou
para cima com aquele sorriso de dentes tortos e olhos brilhantes.
Beijei sua testa e fiquei ali, segurando o mundo nos meus
braços.
Porra… nunca pensei que ser “o pai de alguém” fosse ser o
título mais importante da minha vida. Mas era.
71
Lyanna Callahan
O dia do casamento…
— Você é a noiva mais linda que eu já vi.
Virei-me na direção da voz e quase desabei quando vi Emma
parada na porta. Os olhos brilhando, o sorriso aberto como sempre.
— Emma? — Levei a mão à boca, emocionada. — Eu não
acredito… o Noah disse que você não ia poder vir!
— Ah, me subestimou. — Ela riu e entrou no quarto com
aquele jeito leve que só ela tem. — Somos cúmplices, garota. Em
vários sentidos.
Ela piscou e ergueu a mão, exibindo uma aliança linda e
delicada. Meus olhos se arregalaram.
— Não! — Coloquei as duas mãos na boca, completamente
surpresa.
— Sim! — Emma girou no lugar como se estivesse dançando.
— Seremos os próximos em breve. Mas hoje…
Ela se aproximou e segurou minhas mãos.
— Hoje é o seu dia, Lyanna. E eu vim ajudar a minha melhor
amiga a dizer sim para o homem da vida dela.
Meus olhos se encheram de lágrimas.
— Ainda parece um sonho.
Emma apertou minha mão com carinho.
— Não é um sonho. É o começo da sua história favorita.
Logan Donovan
Eu nunca fui do tipo que sonha com casamentos.
Aliás, até pouco tempo atrás, eu nem sabia se queria me
casar algum dia.
Mas agora…
Agora eu estava parado em frente ao altar, com a respiração
descompassada e o coração disparando, esperando a mulher da
minha vida atravessar aquele corredor e virar, oficialmente, minha
esposa.
A minha mãe estava sentada na primeira fileira, ao lado de
Asher, que usava um terninho branco. Ele sorria de orelha a orelha,
segurando a almofadinha com as alianças. Orgulhoso, como se fosse
o dono da festa. E talvez fosse mesmo.
Olhei em volta, absorvendo cada detalhe daquele momento.
Meus amigos estavam todos ali.
Owen, como sempre, fingindo que não estava com os olhos
marejados, mas eu conheço aquele idiota bem demais. Dax tinha
aquela expressão serena de quem já passou por muita coisa e sabia
reconhecer quando algo bom finalmente acontecia. Caleb sorria de
canto, com as mãos nos bolsos, tentando parecer blasé, mas
claramente emocionado. Taylor filmava tudo com o celular,
provavelmente já pensando no vídeo épico que postaria mais tarde.
E Blake, bom… Blake estava exatamente como sempre: de braços
cruzados, postura firme, mas com um olhar que dizia "orgulho de
você, irmão".
Era a minha turma. Meus irmãos de vida.
E então a música começou.
Meus olhos se voltaram para o fim do corredor… e pronto. O
ar foi embora do peito.
Lyanna apareceu, vestida de branco, com um sorriso que
iluminava tudo. Não existia mais ninguém. Só ela. A mulher que me
transformou. A mãe do meu filho. O meu amor mais verdadeiro.
Ela andava devagar, na minha direção, ou era eu quem estava
vendo tudo em câmera lenta. E eu me lembrava de tudo, da primeira
vez que a vi, das brigas, dos beijos, do reencontro, da dor, do
perdão… do Asher correndo nos meus braços.
Ela chegou perto e me olhou nos olhos.
— Oi — sussurrou baixinho.
— Oi — respondi, com um sorriso torto e a voz embargada.
— Você está linda pra caralho.
Ela riu, baixinho, com aquele brilho que me destruía por
dentro. E então o celebrante começou a falar, mas eu mal ouvi.
Estava ocupado demais tentando memorizar cada detalhe dela.
Hoje era o nosso começo.
E eu sabia, tudo o que eu joguei no gelo, todos os troféus,
todas as quedas… não se comparavam à glória de tê-la agora. De
ter a minha família. De finalmente estar onde sempre foi o meu
lugar.
Ao lado dela.
E de um menino que, no meio da cerimônia, gritou com toda
a força:
— BEIJAAA, PAIIII!
E, bom… eu obedeci, com gosto.
Epílogo
Lyanna Callahan
Dois anos depois…
Dois anos se passaram. E ainda era difícil acreditar em tudo o
que vivemos desde aquele caos.
Logan estava no rinque. Jogando. Brilhando. Com a mesma
intensidade de sempre, talvez até mais. Só que agora, ele não
jogava só pelo time jogava por nós. Por mim. Pelo Asher.
E eu? Assistia tudo da arquibancada, com as mãos apertando
as de um menino de seis anos que vibrava a cada passe do pai.
— Vai, papai! Mostra para eles! — Asher gritava empolgado,
com o cachecol do time enrolado no pescoço e bochechas coradas
de emoção.
Eu sorri, sentindo o coração aquecido. Ainda era surreal saber
que essa era a nossa vida. Que aquele homem no gelo era o meu
marido. Que esse garotinho ao meu lado era nosso filho. Que a
gente venceu, apesar de tudo. E o melhor que vamos ter outro filho,
algo que Logan ainda não sabe.
— Mamãe, ele olhou para mim! — Asher disse de repente,
animado. — Ele sempre me procura antes de fazer um gol, né?
— Sempre, meu amor — respondi, passando a mão no cabelo
dele. — Porque você é o maior fã dele.
— E ele é o melhor papai do mundo.
Olhei de volta para o rinque. Logan nos viu e, como sempre,
ergueu o punho fechado em nossa direção. Era o nosso sinal. Nosso
código silencioso.
Duas vidas quebradas. Um reencontro inesperado. Um amor
que sobreviveu a tudo.
Eu nunca imaginei que um namoro de mentira pudesse se
transformar nisso.
Um casamento. Uma família. Um amor real.
Ele entrou na minha vida como uma tempestade, bagunçando
tudo. Mas ficou como um abrigo, protegendo cada pedaço do que
ainda existia em mim.
Hoje, olhando para ele, eu vejo muito mais do que um astro
do hóquei. Vejo o homem que segura minha mão nos dias difíceis.
Que faz panquecas com formatos estranhos para o nosso filho. Que
me beija a testa quando acha que estou dormindo.
Protetor. Cuidadoso. Romântico (sim, ele é, acreditem se
quiser).
Esse homem é o amor da minha vida. E a melhor coisa que já
me aconteceu.
Asher Callahan
O papai não sabia de nada. A mamãe me contou o segredão
na noite anterior, enquanto a gente comia panqueca de morango na
cozinha. Ela tava com aquele sorriso misterioso que só ela tem
quando tá escondendo alguma coisa boa. Eu achei que era uma
viagem, um brinquedo novo ou talvez um presente para o papai.
Mas aí, ela me contou.
— Asher… você vai ser promovido a irmão mais velho.
Eu arregalei os olhos. Quase deixei o garfo cair no chão.
— Você… vai ter outro bebê dentro da barriga?
Ela riu.
— Sim. E você vai ter um irmãozinho ou irmãzinha.
Meu coração quase explodiu de alegria. Eu pulei da cadeira e
abracei a barriga dela com força.
— Eu vou ensinar tudo para ele! Até a fingir que tá dormindo
para ganhar chocolate!
— Só não ensina as travessuras — ela disse rindo.
— Ah, mas essa parte é a melhor!
Depois ela me olhou sério.
— Mas é segredo, tá? O papai ainda não sabe. Quero contar
para ele de um jeito especial. Você me ajuda?
— ÓBVIO! — gritei com os braços no ar.
Aí a gente fez o plano. Um plano bem legal.
Mamãe me ajudou a fazer uma placa grande, com letras
coloridas e um desenho de bebê usando capacete de hóquei e
patins. A placa dizia:
“Papai, se prepara… eu vou ser o irmão mais velho!”
E hoje, na arena, tava cheia. MUITO cheia.
A gente torceu, gritou, e o papai jogou tão bonito que parecia
um super-herói no gelo. Ele deslizou, fez gol, comemorou com os
braços para o alto. Eu olhava para mamãe o tempo todo, e ela sorria
com os olhos brilhando. A gente sabia de um segredo que ele não
sabia. E isso era muito legal.
Quando o jogo acabou, e os fogos de luz começaram, o
treinador fez o sinal. Eu respirei fundo e corri até o gelo com a placa
escondida nas costas. Era o meu momento de brilhar.
Papai me viu e abriu os braços. Me pegou no colo e me
levantou no ar.
— O que tá aprontando, campeão? — ele perguntou com
aquele sorriso que só ele tem.
— Nada demais… só tenho um recado aqui — falei, quase
explodindo de ansiedade.
Virei a placa devagarzinho.
Ele leu.
Parou.
Olhou para mim.
Depois olhou para a mamãe, que agora descia as escadas da
arquibancada com os olhos cheios d’água e a mão sobre a barriga.
— É sério? — ele perguntou com a voz meio rouca, meio
engasgada.
Mamãe assentiu, mordendo o lábio, tentando segurar o choro.
Mas adultos choram por tudo, né?
O papai se ajoelhou no gelo, ainda me segurando, abraçando
a gente bem forte. Depois me girou no ar e gritou:
— EU VOU SER PAI DE NOVO. SOU O HOMEM MAIS FELIZ
DO MUNDO!
E a arena explodiu em aplausos.
Eu gritei junto:
— EU VOU SER IRMÃO MAIS VELHO!
Mamãe chegou perto, papai beijou a barriga dela, e depois os
dois me abraçaram juntos. A gente ficou ali, só nós três, no meio do
gelo.
E agora, tem mais um jogador entrando para o time Donovan.
Logan Donovan
Dias depois…
O som do riso do Asher preencheu o jardim. Era impossível
não sorrir quando ele corria daquele jeito, com os braços abertos,
achando que podia voar.
Talvez ele pudesse mesmo.
Lyanna estava sentada na cadeira de vime que ficava debaixo
da árvore. Os cabelos presos em um coque bagunçado, o vestido
claro esvoaçando com o vento e aquela mão repousada sobre a
barriga. Meu mundo inteiro estava ali, entre uma risada de criança e
o silêncio tranquilo da mulher que me ensinou o que era amar de
verdade.
Aproximei-me devagar. Já era meu hábito observar primeiro,
gravar cada detalhe, antes de interromper aquele tipo de paz.
Asher me viu primeiro. Gritou meu nome, correu na minha
direção e pulou no meu colo como se eu tivesse acabado de fazer o
gol da vitória.
— Papai! Eu tava ensinando o bebê a correr! — disse,
apontando para a barriga da Lyanna.
Soltei uma risada baixa, colocando o moleque sentado nos
meus ombros.
— Está contratadíssimo para ser o treinador oficial —
respondi. — Mas não pode exagerar, seu irmão ou irmã ainda é bem
pequeno, campeão.
Caminhei até Lyanna com Asher ainda pendurado em mim, e
me abaixei ao lado dela, deslizando a mão pela barriga onde agora
batia um coração que era metade dela, metade meu.
— O que foi? — ela perguntou, sorrindo daquele jeito que me
desmontava desde sempre.
— Nada. Só precisava olhar para vocês. Às vezes ainda não
acredito que isso tudo é real.
Ela virou o rosto devagar e me beijou de leve.
— Também não acreditava. Mas agora é.
Asher desceu correndo de novo, fazendo barulho, girando
como um furacãozinho pelo quintal. E a gente ficou ali, eu e ela,
sentados no chão do jardim, abraçados, observando a nossa
pequena bagunça crescer.
— Não tem jogo, nem torcida, nem troféu no mundo que
chegue perto disso aqui — falei, encostando a testa na dela.
— Nossa família? — ela sussurrou.
— Nossa família. Nossa casa. Nossa vida. Eu te amo
Vi minha mãe se aproximando, sorrindo enquanto Asher
corria ao redor dela. Ela estava bem. Tranquila. Finalmente livre
daquele casamento sufocante com um homem que só sabia exigir,
cobrar e moldar sonhos alheios como se fossem de barro.
Meu pai enlouqueceu.
Estava vivendo numa bolha de ambição vazia, tentando
transformar crianças em medalhas antes mesmo de aprenderem a
amarrar os próprios cadarços. Para ele, ninguém era bom o
suficiente. Nem eu, e nem mesmo as crianças que ele mal conhecia.
E acabou sendo internado em uma clínica psiquiátrica não muito
tempo depois da última vez em que nos vimos.
Eu não desejei isso para ele, mas também não me culpo
mais.
Eu passei a vida tentando ganhar o reconhecimento de um
homem que só sabia amar através de conquistas. E, no fim, entendi
que não era minha responsabilidade curar o que ele nunca quis
tratar.
Eu parei de tentar salvá-lo. Porque hoje, eu escolho salvar a
mim mesmo.
Nunca imaginei que teria isso, uma casa com cheiro de café e
brinquedo no chão, uma mulher de olhos atentos e respostas afiadas
que conhece todas as minhas cicatrizes e ainda assim escolhe ficar,
um filho que me olha como se eu fosse o super-herói de verdade.
Eu tinha tudo aqui.
Tudo.
A garota que disse, com aquela boca cheia de convicção, que
nunca mais daria uma chance a um jogador de hóquei. Ainda bem
que ela mentiu. Ainda bem que eu insisti. Que ela me testou, me
enfrentou… e me amou.
Se ela me pedisse, eu largaria tudo. O gelo, a fama, os
troféus, o barulho. Largaria tudo para ser só Logan.
Só o amor da vida dela.
E isso, ah... isso seria o maior título da minha carreira.
Fim.
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Livro dois da duologia Rebeldes do Hóquei
A jogada que me fez ganhar você (Casal, Dax Bastien e Sefora Lira)
Autora Thamy Batisda
Lançamento em breve
Sinopse:
Ele nunca soube amar. Ela nunca se sentiu segura. Mas quando os
dois colidem, o jogo muda — e só um deles pode vencer.
Dax Bastien não ama. Não perdoa. E definitivamente não esquece. O
centro do time de hóquei, sua vida é feita de sangue no gelo,
disciplina brutal e um passado que ele enterra a socos — quando
não enterra corpos.
Sefora Lira só queria escapar. De um lar quebrado, de fantasmas que
ainda a assombram, e das mãos que a marcaram. Ela achou que
ficar invisível era a única forma de sobreviver… até que entrou no
caminho de Dax.
Eles não têm nada em comum — exceto a dor, a loucura, o caos e
uma atração explosiva que ameaça destruir os dois. Dax a quer de
um jeito perigoso, possessivo, obsessivo. E está disposto a
atravessar qualquer linha para mantê-la perto, mesmo que precise
mover o mundo por ela.
Mas... e se o maior inimigo de Sefora for exatamente o único
homem que jura protegê-la?
Prepare-se para mergulhar em uma história de amor insana, violenta
e viciante — onde o perigo não vem só dos inimigos, mas do próprio
coração.
Enquanto espera, leia mais um dos meus Livros :
A esposa Rejeitada do Mafioso Cruel
Casamento por dever + redenção + máfia italiana +
vingança + casamento sem amor.
Tiziano Costanzo: Ser o Don da máfia foi uma obrigação, não uma
escolha. Casar-se por amor nunca foi uma opção para mim,
mas deveria haver algum interesse pela mulher escolhida. Bianca
Ferrucci parecia perfeita: fácil de controlar e ideal para gerar
herdeiros. No entanto, o destino brincou comigo e me fez ficar com
a mulher que tinha em suas veias o sangue que jurei odiar
Bianca Ferrucci: Nunca tive grandes sonhos. Como a filha mais
nova da minha família, sempre fui ofuscada pela minha irmã. Mas,
por ironia do destino, fui escolhida pelo Don da máfia italiana
para ser sua esposa. Tiziano era frio e calculista, mas algo nele
me atraía. Eu me apaixonei, mas logo descobri o quão cruel ele
poderia ser. Ele me rejeitou e me mandou embora sem
remorso. O que ele não sabia é que eu carregava seu filho,
e prometi que ele iria se arrepender de cada palavra e ferida
que me causou. Eu me encarregaria de fazer isso acontecer.
Aqui : Leia aqui
Agradecimento
Se você chegou até aqui… meu coração é todo seu.
Obrigada por embarcar nessa jornada comigo, por sentir, sofrer, rir e se apaixonar
com esses personagens que nasceram da minha imaginação, mas agora vivem
também dentro de você.
A cada página virada, a cada suspiro dado por Logan e Lyanna, você fez parte
dessa história. E é por você que continuo escrevendo, mesmo nos dias difíceis,
mesmo quando as palavras demoram a chegar.
Obrigada às leitoras que comentam, indicam, vibram e fazem da leitura um lar. Às
minhas amigas autoras, que me inspiram todos os dias. E a você, que pode estar
me lendo pela primeira vez, espero que não seja a última.
E não esquece de deixar a sua avaliação aqui na Amazon, ela é muito importante
para mim!
Se quiser interagir, compartilhar suas emoções e ficar por dentro dos próximos
lançamentos, me segue nas redes sociais. Vai ser um prazer ter você por lá!
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