Aula nº 4 - Bioquímica clínica II
AVALIAÇÃO LABORATORIAL DAS DOENÇAS
CARDIOVASCULARES
INTRODUÇÃO
As lesões isquêmicas causadas pelo IAM promovem um mecanismo
de morte celular por necrose. A morte destas células, denominadas
de miócitos, liberam substâncias e proteínas que podem ser
detectadas na circulação, é o caso das troponinas cardíacas. O
aumento da concentração de troponinas indica necrose no músculo
cardíaco. Os eventos de isquemia no músculo cardíaco podem variar
de angina (nenhuma morte celular) a IAM (morte celular), sendo
conhecidos como síndromes coronarianas.
Já para a ICC, os testes bioquímicos utilizados são o do peptídeo
natriurético tipo B (BNP) e do fragmento terminal do pró-BNP (NT-
proBNP). Essas substâncias são encontradas na circulação
sanguínea quando ocorre um processo de estiramento da parede do
coração devido à insuficiência cardíaca (TIETZ; BURTIS; BRUNS,
2016.
DOENÇA CARDÍACA – SÍNDROMES CORONARIANAS AGUDAS
O termo síndrome é comumente utilizado em pacientes que
apresentam várias formas de doenças cardíacas instáveis. Na maioria
dos casos, essas síndromes ocorrem devido a uma obstrução na
artéria coronária, impedindo a passagem de sangue para o tecido
adjacente, caso o bloqueio persista, a necrose (morte celular) ocorre
devido à isquemia aguda. A principal causa de obstrução dessas
artérias é a aterosclerose que resulta no infarto agudo do miocárdio
(IAM) (TIETZ; BURTIS; BRUNS, 2016).
Alguns fatores de risco estão associados ao risco de IAM. Por se tratar
de uma doença multifatorial pode estar associada a diversos fatores
de risco. Acadêmico, vejamos alguns dos fatores:
Idade;
Tabagismo;
Alta taxa de colesterol;
Hipertensão;
Diabetes mellitus;
Dislipidemias;
Obesidade;
Estresse e depressão;
Histórico familiar (MOTTA, 2009).
BIOMARCADORES CARDÍACOS NO IAM
TROPONINAS
As troponinas são proteínas estruturais da musculatura esquelética e
cardíaca, estando diretamente relacionadas no processo de
contração muscular. O complexo de troponina cardíaca (cTn)
apresenta três tipos de proteínas, a troponina I, C e T (Figura 14). As
subunidades I e T são as específicas do tecido muscular cardíaco, já
a subunidade C também é coexpressa no músculo esquelético
(TIETZ; BURTIS; BRUNS, 2016).
FIGURA 14 – COMPLEXO TROPONINAS, ACTINA E
TROPOMIOSINA
FONTE: A autora
Os níveis de cTnI no soro apresentam um aumento de 4 a 6 horas
após o episódio de dor precordial, atingindo o pico máximo em 12
horas. Pode ocorrer um segundo pico de menor intensidade entre 3 a
4 dias após o infarto. Normalmente, as troponinas são dosadas
através de imunoensaios com anticorpos monoclonais, os limites de
referência são, para troponina T, 0,1ng/mL e para a troponina I,
0,26ng/mL.
A coleta deve ser realizada em amostras seriadas, geralmente, na
admissão, 3, 6 e 9 horas, é de extrema relevância a avaliação dos
valores das medidas de troponina ao longo das horas em um caso
provável de infarto, pois resultados acima dos limites de referência
indicam injúria miocárdica e fornecem um panorama das
características do tipo de IAM.
É importante destacar outras doenças como insuficiência renal
terminal, sepse, miocardite, podem alterar os níveis das troponinas.
Portanto, associar os exames laboratoriais, eletrocardiograma e
condição clínica do paciente, são crucias para o diagnóstico de IAM
(FLEURY MEDICINA E SAÚDE, 2007).
CREATINA QUINASE TOTAL E ISOENZIMAS
A enzima creatina quinase é composta pela associação das
subunidades do tipo B e/ou M. Aqui, vamos falar da determinação da
isoenzima do tipo CK-MB, a opção mais adequada para casos de IAM,
pois essa isoenzima possui elevada sensibilidade e especificidade no
diagnóstico de lesão cardíaca. São realizadas coletas em amostras
de soro seriadas, normalmente, a coleta deve ser realizada em um
período de 9 a 12 horas. De preferência deve-se realizar a medida da
massa que corresponde à proteína da isoenzima CK-MB e não sua
atividade enzimática. O limite de referência para a massa da proteína
é de 5 ng/mL (FLEURY MEDICINA E SAÚDE, 2007).
MIOGLOBINA
A mioglobina é uma proteína globular presente nas células
musculares. É uma proteína utilizada em diagnóstico de IAM,
entretanto, a mioglobina não é um biomarcador específico de lesão
cardíaca, pode estar alterada em casos de insuficiência renal e em
danos à musculatura esquelética, por exemplo. Portanto, seu
resultado deve estar associado aos exames CK total, CK-MB e
troponinas. A mioglobina apresenta níveis elevados nas primeiras
horas após o início da dor (cerca de 1 a 2 horas), apresenta pico
máximo em 12 horas, e, normalmente, estabiliza seus níveis em até
24 horas. Seu limite de referência é de 0,15 ng/mL. (TIETZ; BURTIS;
BRUNS, 2016).
Acadêmico, a figura a seguir ilustra graficamente as curvas de
mioglobina, troponina e CK-MB em um quadro de IAM.
FIGURA 15 – CURVAS DOS BIOMARCADORES EM IAM
FONTE: Adaptado de Tietz, Burtis e Bruns (2016)
No gráfico, observamos que as curvas apresentam duas
características: a primeira, em um grande ou extenso MI (infarto do
miocárdio), e na segunda, em um pequeno MI. Note que as troponinas
cardíacas sobem mais rapidamente que os outros marcadores
(mioglobinas, CK total e Ck-MB), entretanto, em um pequeno MI, os
níveis de troponinas são exponencialmente maiores quando
comparados aos níveis de troponinas de um pequeno infarto. Este
resultado auxilia na conduta médica, propiciando a melhor escolha de
intervenção para o IAM (TIETZ; BURTIS; BRUNS, 2016).
Outros biomarcadores já foram utilizados no passado para
diagnóstico de IAM, mas atualmente não são mais comuns na prática
clínica, visto que os avanços metodológicos e de tecnologia
propiciaram biomarcadores que apresentam maior especificidade.
Citaremos aqui dois biomarcadores, a aspartato aminotransferase
(AST), antigamente chamada de TGO, e a desidrogenase lática
(LDH). O uso da AST para o diagnóstico apresenta um caráter
histórico, pois foi o primeiro marcador a ser dosado em pacientes com
IAM. Atualmente, o teste de AST para infarto não é mais utilizado,
devido a existência de testes mais sensíveis e específicos. Para a
LDH, a questão está em sua baixa especificidade, pois é uma enzima
que está presente em todas as células do nosso organismo, em maior
quantidade no fígado, coração, rins, músculo esquelético e eritrócitos,
portanto, não recomendada para o diagnóstico de casos de lesão
cardíaca (FLEURY MEDICINA E SAÚDE, 2007).
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CONGESTIVA (ICC)
A ICC ocorre devido a uma alteração no sistema de bombeamento do
coração, causando refluxo do sangue. As causas da ICC são
variadas, incluindo, IAM, hipertensão arterial, cardiomiopatias, lesões
valvares, entre outras. Estão associadas a fatores de risco, como,
diabetes mellitus, tabagismo, abuso de álcool e drogas (SOCIEDADE
BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA, 2019).
A falta de perfusão dos tecidos de uma maneira geral pode causar
lesão e perda da função do órgão. A ICC evolui de forma progressiva,
e envolve risco à vida do paciente. Por isso, a realização do exame
laboratorial é fundamental no diagnóstico precoce de ICC
(SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA, 2019).
BIOMARCADOR CARDÍACO NA ICC
O BNP (do inglês, brain natriuretic peptide), é um neuro-hormônio,
chamado de peptídeo natriurético cerebral, pois foi encontrado
primeiramente no tecido cerebral, mas, é produzido em maior
quantidade pelo ventrículo esquerdo do coração. O BNP é liberado
devido à pressão ou expansão exercidas sobre os ventrículos
cardíacos, portanto, utilizado como um biomarcador na clínica para o
diagnóstico de ICC (SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA
CLÍNICA, 2019).
Os exames medem a concentração do BNP ou do N-terminal pró-
peptídeo natriurético tipo-B (NT-próBNP). Normalmente, o coração
libera pequenas quantidades de proteína precursora pró-BNP, essa
proteína é então clivada e libera no sangue o hormônio BNP ativo e o
fragmento inativo, NT-próBNP.
O intervalo de referência para o BNP varia de 0 a 70 pg/mL, é
importante levar em consideração a idade e o sexo do paciente,
mulheres apresentam maiores valores de BNP quando comparada
aos homens (TIETZ; BURTIS; BRUNS, 2016).
Portanto, o BNP é um marcador bioquímico de relevância na clínica,
com papel importante no diagnóstico, tratamento e prognóstico de
pacientes com ICC. Alguns critérios para o diagnóstico de IAM são
utilizados de acordo com o documento redigido pelo Consenso dos
Especialistas representantes da Força Tarefa Conjunta das
Sociedades Americana e Europeia de Cardiologia. Vejamos esses
critérios.
Detecção de aumento e/ou falta de biomarcadores cardíacos
(preferencialmente troponina) com pelo menos um valor em torno do
percentil 99 do valor de referência, juntamente com evidência de
isquemia no miocárdio com pelo menos uma das condições a seguir:
1. Sintomas de isquemia;
2. Mudanças no ecg indicando nova isquemia (novas mudanças na
st-t ou novo bloco do ramo esquerdo (lbbb);
3. Desenvolvimento de novas ondas q (área de necrose miocárdica
se estende através de toda a espessura do músculo cardíaco –
usualmente na parede ventricular) patológicas no ecg;
4. Imagens com evidência de nova perda de miocárdio viável ou
nova anormali- dade no movimento regional da parede (motta,
2009).