A perspectiva multicultural no projeto
politico - pedagógico -
Lúcia Maria Gonçalves de Resende
Anotações
Lúcia Maria Gonçalves de Resende – Docente da Universidade de Brasilia –
faculdade de educação; assessora de educação da UNESCO; doutoranda da UNESP
Multiculturalismo realidade cultural, com a presença de diferentes grupos
culturais numa mesma sociedade
Interculturalismo ação deliberada de intervenção entre as diferentes culturas
Posição da autora multiculturalismo na imbricação dos dois significados, quais
sejam, no reconhecimento da diversidade e no caráter intervencionista das ações ,
desvelando o cotidiano das pessoas, que é identificado como natural e comum a todos,
embora não o seja, permeado que é pelas disputas de relações de poder construídas
socialmente de forma desigual.
Abordar o caráter multicultural como transversalidade de um fazer e um pensar
no mundo requer a compreensão de um restropecto histórico ou pelo menos de fatos
que, se não justificam , explicam a faceta relativa à dificuldade comumente encontrada
em adotar uma postura multicultural nos mais diferentes campos de atuação e entre
eles, naquele que diz respeito, a educação.
A pertinência das reflexões sobre o multiculturalismo
A escola, ao longo de sua história, tem evidenciado uma monocultura que se
expressa pela intransigência e pela impermeabilidade em relação tanto às realidades
diversas como ao multifacetado mundo das crianças e dos adolescentes.
Segundo SACRISTAN “a cultura dominante nas salas de aula é a que corresponde à
visão de determinados grupos sociais: nos conteúdos escolares e nos textos aparecem
poucas vezes a cultura popular, as subculturas dos jovens.
Nas malhas construídas nas relações de poder, essas diferenças acabam se
transformando e travestindo de forma a se constituírem em um bloco justificador de
discriminações. Conceitos de normalidade e anormalidade, do que é comum e diferente se
misturam enquanto os estereótipos “desejáveis”adquirem uma supremacia quase absoluta.
A problemática apresentada nos coloca frente a frente com uma necessidade muito
concreta, a do multiculturalismo. Atualmente, fortalece-se o movimento no sentido de
melhor compreender o chamado hibridismo cultural em que, por exemplo, está imerso
o povo brasileiro. Poderíamos dizer que o grau de conscientização a respeito ainda é
embrionário, mas que já não é mais possível negar que a necessidade de resgate das
várias verdades culturais adquire uma forte concretude.
A globalização da educação, assim como da economia, se, por um lado, oportuniza
a imersão em contextos diferentes, pode provocar, por outro, a descaracterização do
regionalizado e, mais particularmente, da identidade local.
A realidade de um mundo multicultural é hoje, uma das verdades mais latentes e
uma questão que necessita ser captada, e administrada pelas relações sociais das mais
diversas instituições, dentre elas as educacionais.
Os espaços educativos nada multiculturais
A fragilidade da escola no trato com o multiculturalismo representa a própria
fragilidade da relação entre educação e sociedade.
As diferenças devem ser analisadas como produto da história, da ideologia e das
relações de poder e constituem-se em fato incontestável.
Candau (1997) explicita que a desestabilização, a relativização e a própria
contestação são ingredientes necessários no encontro entre culturas e, ao defender a
transparência e autenticidade cultural via currículo, considera :
• A colocação da cultura como foco central dos currículos, desenvolvendo nos
processos de aprendizagem o estudo das diferenças historicamente delineadas
• A sustentação da linguagem como eixo central, buscando sua identidade social
• A busca da articulação entre currículos e experiências vivenciadas pelos alunos;
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• A consideração da estruturação da vida em comunidade e as diferentes definições Anotações
do “eu”
• A concepção da história como sequência de rupturas e deslocamentos;
• A ampliação da concepção de pedagogia, compreendendo-a como modo de
produção cultural.
Com essas reflexões, fica claro que a escola e sua gestão se vêem diante da
necessidade de reestruturar-se e ressignificar os princípios do que sejam os processos
do ensinar e do aprender na entrada do terceiro milênio.
A própria figura do professor, estereotipada ao longo de sua história, está a exigir
uma revisão, bem como seu papel, que, longe de buscar suas bases na homogeneidade,
funda-se na diversidade como construção social
O projeto politico-pedagógico como indicador de diversidades
Como pensar e atuar na escola pública de que se espera a construção coletiva
de um projeto que traduza seus rumos e seus princípios? Primeiramente a escola
contemporânea deve priorizar a competência para a autonomia de decisão, para a
criatividade, para a responsabilidade coletiva e, principalmente, para o exercício do
aprendizado do espaço coletivo. Cuja diversidade e cujo multiculturalismo constituem-
se em componentes inerentes.
Os desafios da ruptura
Rompimento com modelos liberais conservadores, que desconsideram a
competição desigual.
A ideia do fazer coletivizado e inclusivo é conhecida e aceita pelos profissionais
da educação, mas a dificuldade de viabilização pode ter seu embrião na rapidez e na
intensidade com que temos convivido com rupturas de explicações que, por vezes,
estavam cristalizadas e bem instaladas.
Podemos trazer como referência a figura do professor que se vê imerso em confusões
a respeito de propostas pedagógicas ditas progressistas. É possível ouvir e observar
docentes “convictos” de que desenvolvem uma proposta didática construtivista, até
porque esta é a tônica atual nas escolas, até organizando ações em suas salas de aula
dentro dessa proposta. No entanto, como sua concepção epistemólogica não mudou
e acultura da não – diversidade está amparando seus conceitos, o resultado das ações
sempre se identifica via reprodução e homogeneização.
Diante dessas circunstâncias, como reverter posturas ou instalar outra referência
epistemológica interagindo multiculturalmente?
Num primeiro momento é necessário que a leitura das ambiguidades seja feita.
Criar espaços para confrontos entre o pensar e o agir, identificar diferenças, revisar
e revisistar princípios, teorias, categorias e conceitos é prioritário e antecedente. É
preciso, ainda, admitir rupturas e produzir superações que incluam o exercício da
transcendência do discurso. É necessário que uma outra postura diante da realidade
concreta seja processada.
A possibilidade concreta da construção coletiva do projeto politico-pedagógico
da escola nos aparece não como uma fórmula milagrosa, mas como proposta
desencadeadora para uma real superação de um projeto hegemônico, que pressupõe
uma concepção de mundo e relações sociais reducionistas e empobrecidas.
Algumas dificuldades nos procedimentos multiculturais
O grande desafio : a incorporação do multiculturalismo ao currículo, de forma que
sua transversalidade possa perpassar os conteúdos tratados no cotidiano do processo
de aprendizagem.
Nós educadores, devemos estar atentos, abertos a críticas e conscientes de que
contradições deverão estar presentes na construção de um projeto que se pretenda
multidisciplinar
Vivemos o momento não apenas das intensas dificuldades em entender e
denunciar as raízes dos processos discriminatórios, como, também da necessidade da
construção de ações coletivas que as combatam.
O mais esperado é que as relações sociais se tensionem e os conflitos apareçam.
Vale mais a pena viver senão pelo próprio desafio por uma vida mais digna, de inclusão,
em que cada vez mais se construa pelo coletivo, porque o individual ficou fortalecido?
Prof. Pimentel 96 Bibliografia