Povo Preto, Pan-Africanismo e Poder Preto
Publicado por X · 27 de março, 2018 · Diáspora Afrikana ·
Para meu povo1
Irmãos Pretos e irmãs Pretas, eu quero que vocês saibam que eu amo vocês e eu
espero que em algum lugar nos seus corações vocês tenham amor por mim. Meu
nome é Assata Shakur (nome de escrava joanne chesimard) e eu sou uma
revolucionária. Uma revolucionária Preta. Isso significa que eu declarei guerra a
todas as forças que têm estuprado nossas mulheres, castrado nossos homens e
mantido nossos bebês com a barriga vazia.
Eu declarei guerra aos ricos que prosperam com a nossa pobreza, aos
políticos que mentem para nós com faces sorridentes e a todos os estúpidos, robôs
sem coração, que protegem a eles e a sua riqueza.
Eu sou uma revolucionária Preta e, como tal, sou vítima de toda a ira, ódio e
difamação que a amérika é capaz. Como a todos os outros revolucionários Pretos, a
amérika está tentando me linchar.
Eu sou uma mulher Preta revolucionária e, por causa disso, eu tenho sido
culpabilizada e acusada de cada suposto crime do qual uma mulher teria condições
de participar. Os crimes alegados, nos quais, supostamente, somente homens
foram envolvidos, eu tenho sido acusada de planejar. Eles pregaram imagens
supostamente minhas em postos dos correios, aeroportos, hotéis, carros de polícia,
metrôs, bancos, televisão e jornais. Eles oferecem cinquenta mil dólares em
recompensas pela minha captura, e eles emitiram ordens para atirar à primeira
vista e atirar para matar.
Eu sou uma revolucionária Preta e, por definição, isso me faz ser parte do
Exército de Libertação do Povo Preto. Os porcos têm usado seus jornais e suas TVs
para retratar o Exército de Libertação do Povo Preto como criminosos cruéis,
brutais e cachorros loucos. Chamaram-nos de gangsters e prostitutas armadas e
têm nos comparado a personagens como john dillinger e ma barker. Poderia ser
claro, deveria ser claro a qualquer um que pode pensar, ver ou ouvir, que nós
somos as vítimas. As vítimas e não os criminosos.
Deveria ser claro para nós, ainda, quem são os verdadeiros criminosos, até
agora. Nixon e seus parceiros do crime assassinaram centenas de irmãos e irmãs
no Terceiro Mundo no Vietnã, Camboja, Moçambique, Angola e África do Sul. Como
foi provado pelo Watergate, os altos funcionários responsáveis pela aplicação da
lei neste país são um bando de criminosos mentirosos. O presidente, os generais, o
chefe do fbi, o chefe da cia, e o chefe da casa branca estavam implicados nos crimes
de Watergate.
Eles nos chamam de assassinos, mas nós não assassinamos cerca de
cinquenta homens, mulheres e crianças Pretos desarmados, ou ferimos outros
milhares nas manifestações dos anos sessenta. As regras para esse país sempre
consideraram as propriedades deles mais importantes que nossas vidas. Eles nos
chamam de assassinos, mas nós não somos responsáveis pelos vinte e oito irmãos
detidos e os nove reféns assassinados em aticca. Eles nos chamam de assassinos,
mas nós não assassinamos e ferimos, também, mais de trinta estudantes Pretos
desarmados na Universidade Estadual de Jackson – ou Estado Sulista.
1
Letter to my people, carta de Assata Shakur escrita enquanto estava na prisão, em 4 de julho de 1973.
Retirado do livro ‘Assata Shakur – Escritos’. Páginas 52-56. Transcrição por Ammit Garvey.
Eles nos chamam de assassinos, mas nós não assassinamos Martin Luther
King Jr., Emmet Till, Medgar Evers, Malcolm X, George Jackson, Nat Turner, James
Chaney e incontáveis outros. Nós não matamos, com tiro nas costas, Rita Lloyd de
dezesseis anos, Rickie Bodden de 11 anos ou Clifford Glover de 10 anos. Eles nos
chamam de assassinos, mas nós não controlamos ou forçamos um sistema de
racismo e opressão que mata, sistemáticamente, Pretos e pessoas do Terceiro
Mundo. Apesar de pessoas Pretas supostamente compreenderem cerca de quinze
por cento da população total amerikkkana, pelo menos sessenta por cento das
vítimas de homicídio são Pretas. Para cada porco que é morto no chamado
cumprimento do dever, há pelo menos quinze pessoas Pretas assassinadas pela
polícia.
A expectativa de vida Preta é muito menor do que a branca e eles fazem seu
melhor para nos matar antes mesmo de nós termos nascido. Nós somos queimados
vivos em armadilhas de fogo. Nossos irmãos e irmãs em overdose de heroína e
metadona diariamente. Nossos bebês morrem de envenenamento por chumbo.
Milhões de pessoas Pretas morreram como resultado de assistência médica
indecente. Isso é assassinato. Mas eles têm a ousadia de nos chamar de assassinos.
Eles nos chamam de sequestradores, mas o Irmão Clark Squires (que é
acusado, junto comigo, de matar um policial estadual de nova jersey), foi
sequestrado em X de abril, 1969, na nossa comunidade Preta e (eles) realizaram
um resgate de um milhão de dólares no caso de conspiração New York Panther 21.
Ele foi absolvido em 13 de maio de 1971, juntamente com todos os outros, de 156
acusações de conspiração, por um júri que levou menos de duas horas para
deliberar. Irmão Squires era inocente. Mesmo assim ele foi sequestrado de sua
comunidade e família. Mais de dois anos de sua vida foram roubados, mas eles nos
chamam de sequestradores.
Nós não sequestramos os milhares de Irmãos e Irmãs feitos cativos nos
campos de concentração amerikanos. Noventa por cento da população prisional
neste país são Pretos e pessoas do Terceiro Mundo que não podem nem pagar
fiança nem advogados.
Eles nos chamam de ladrões e bandidos. Eles dizem que nós roubamos. Mas
não fomos nós que roubamos milhões de pessoas Pretas do continente africano.
Nós fomos roubados de nossa língua, dos nossos Deuses, da nossa cultura, da nossa
dignidade humana, do nosso trabalho e das nossas vidas. Eles nos chamam de
ladrões, ainda que não sejamos nós que desviamos bilhões de dólares todo ano em
evasões fiscais, fixação ilegal de preços, peculato, fraude contra o consumidor,
subornos, propinas e corrupção. Eles nos chamam de bandidos, ainda que toda vez
que a maioria das pessoas Pretas pegam os seus salários estejam sendo roubadas.
Toda vez que entramos numa loja na nossa vizinhança, nós estamos sendo
extorquidos. E toda vez que nós pagamos nosso aluguel o locador enfia uma arma
em nossas costelas.
Eles nos chamam de ladrões, mas nós não roubamos e assassinamos
milhões de Indígenas arrancando sua terra natal e, em seguida, chamando a nós
mesmos de pioneiros. Eles nos chamam de bandidos, mas não somos nós que
estamos roubando a África, Ásia e América Latina de seus recursos naturais e
liberdade enquanto as pessoas que lá vivem estão doentes e famintas. As regras
desse país e seus lacaios cometeram alguns dos crimes mais brutais e violentos da
história. Eles são os bandidos. Eles são os assassinos. E eles devem ser tratados
como tais. Esses maníacos não estão aptos a julgar a mim, ou a Clark, ou a
nenhuma outra pessoa Preta em julgamento na amérika. Pessoas Pretas poderiam
e, inevitávelmente, devem determinar nossos destinos.
Toda revolução na história foi realizada por ações, apesar de palavras serem
necessárias. Nós temos que criar escudos que nos protegem e lanças que penetram
nossos inimigos. Pessoas Pretas devem aprender como lutar pela luta. Nós temos
que aprender com nossos erros.
Eu quero me desculpar com vocês meus irmãos e irmãs Pretos, por estar no
pedágio de nova jersey. Eu deveria ter sabido melhor. O pedágio é um posto de
controle no qual pessoas Pretas são paradas, revistadas, perseguidas e agredidas.
Revolucionários nunca devem ficar com muita pressa ou tomar decisões
descuidadas. Aquele que corre quando o sol está dormindo vai tropeçar muitas
vezes.
A cada vez que um Lutador Preto pela Liberdade é assassinado ou
capturado, os porcos tentam criar a impressão de que eles anularam o movimento,
destruíram nossas forças e pararam a Revolução Preta. Os porcos também tentam
nos dar a impressão que cinco ou dez guerrilhas são responsáveis por toda ação
revolucionária feita na amérika. Isso é absurdo. Isso é absurdo. Revolucionários
Pretos não caem da lua. Nós somos criados por nossas condições. Moldados na
nossa opressão. Nós estamos sendo fabricados em massa nas ruas do gueto,
lugares como attica, san quentin, colinas de belford, leavenworth, and sing sing.
Eles estão formando milhares de nós. Muitos veteranos Pretos desempregados e
mães carentes estão engrossando nossas fileiras. Irmãos e irmãs de todas as
esferas da vida, que estão cansados de sofrer passivamente, compõem o Exército
de Libertação Preta.
Há, e sempre haverá, um Exército de Libertação do Povo Preto, até que todo
homem, mulher e criança Pretos sejam livres. A principal função do Exército de
Libertação do Povo Preto neste momento é criar bons exemplos, para lutar pela
liberdade Preta, e para se preparar para o futuro. Devemos nos defender e não
deixar ninguém desrespeitar a gente. Temos que ganhar a nossa libertação por
qualquer meio necessário.
É nosso dever lutar por nossa liberdade.
É nosso dever ganhar.
Devemos amar uns aos outros e apoiar uns aos outros.
Não temos nada a perder, senão nossas correntes.
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